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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO BERNARDO SOARES TEIXEIRA BEMVINDO O Processo de Internacionalização de uma Multinacional Brasileira: Estudo do Caso Vale RIO DE JANEIRO 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO

BERNARDO SOARES TEIXEIRA BEMVINDO

O Processo de Internacionalização de uma Multinacional

Brasileira: Estudo do Caso Vale

RIO DE JANEIRO

2014

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BERNARDO SOARES TEIXEIRA BEMVINDO

O Processo de Internacionalização de uma Multinacional

Brasileira: Estuado do Caso Vale

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Administração,

Instituto COPPEAD de Administração da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do

título de Mestre em Administração.

Orientador: Luís Antônio da Rocha Dib, D.Sc

RIO DE JANEIRO

2014

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BERNARDO SOARES TEIXEIRA BEMVINDO

O Processo de Internacionalização de uma Multinacional

Brasileira: Estudo do Caso Vale

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação

em Administração, Instituto COPPEAD de Administração da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de Mestre em Administração.

Aprovada em 13 de Agosto de 2014, por:

__________________________________________________________________________

Luís Antônio da Rocha Dib, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)

__________________________________________________________________________

Renato Dourado Cotta de Mello, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)

__________________________________________________________________________

Jorge Manoel Teixeira Carneiro, D.Sc. (IAG/PUC-Rio)

RIO DE JANEIRO

2014

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Aos meus pais, minha maior fonte de apoio e carinho

e à minha saudosa avó, pelo exemplo de superação.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaria de agradecer aos meus pais, Carlos e Lenita, pelo apoio

incondicional, por acreditarem em mim e por não medirem esforços para que eu tivesse

condições de realizar meus sonhos. Sempre presentes na minha educação, estiveram ao meu

lado em cada uma das etapas que me levaram ao mestrado. Durante a confecção desse

trabalho, foram essenciais me reconfortando nos momentos de incerteza e comemorando

comigo nos momentos de felicidade.

Agradeço também à minha irmã, Carol, e ao seu marido, Bruno, grandes amigos com quem

sempre pude contar, pelas conversas, pelas risadas e por todos os bons momentos que

aliviaram as pressões desse trabalho. Agradeço também à minha avó, por participar da minha

criação e sempre me incentivar a estudar e apreender coisas novas.

Um agradecimento especial ao meu orientador Luís Dib, por todos os ensinamentos passados

ao longo desse trabalho e nas aulas do COPPEAD, por entender os meus momentos difíceis e

por me estimular a superar as dificuldades.

Agradeço aos professores Jorge Carneiro e Renato Mello por aceitarem fazer parte da minha

banca e pelas contribuições ao trabalho.

Agradeço também a todos os entrevistados nessa dissertação, que encontraram tempo em suas

agendas ocupadas para me ajudar e doar um pouco de seu conhecimento.

Agradeço a todos meus companheiros de turma do COPPEAD, por dividirem comigo essa

experiência fantástica, pelo companheirismo, pelas noites estudando até que o prédio do

COPPEAD fechasse, por tudo que aprendi com eles e por toda a diversão que tivemos juntos.

Aqui não posso deixar de fazer dois agradecimentos especiais. À minha sempre companheira

de trabalhos em dupla ou grupo e confidente das dores e alegrias da dissertação, Camilla

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Cordeiro. E à minha companheira de intercâmbio, Patrícia Souza, que gentilmente se

voluntariou para revisar essa dissertação.

Agradeço aos professores e funcionários do COPPEAD. Esse mestrado foi um período de

aprendizado incrível, e tenho certeza que isso só foi possível por causa da dedicação desses

profissionais.

Agradeço ao CNPQ pela bolsa dada durante o segundo ano do mestrado.

Por fim, gostaria de agradecer aos meus amigos da graduação, Letícia, Mateus, Sharisse,

Thaís e Vinícius, pela amizade e pelos momentos de descontração.

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RESUMO

BEMVINDO, Bernardo Soares Teixeira. O Processo de Internacionalização de uma

Multinacional Brasileira: Estudo do Caso Vale. Rio de Janeiro, 2014. Dissertação (Mestrado

em Administração) – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de

Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.

A pesquisa apresentada nesta dissertação buscou entender o processo de internacionalização

da mineradora Vale sob a ótica de diferentes teorias sobre a internacionalização de empresas.

A Vale é uma das maiores empresas brasileiras, a maior exportadora do país e uma das

empresas nacionais com maior presença em mercados estrangeiros. Foram abordadas as

convergências e divergências do caso da Vale com teorias econômicas e comportamentais

sobre a internacionalização. As teorias escolhidas para análise foram: Poder de Mercado,

Internalização, Paradigma Eclético, Modelo de Uppsala, Networks, Empreendedorismo

Internacional e Born Globals. O método utilizado foi o de estudo de caso único e a coleta de

dados se fez através de entrevistas em profundidade com três executivos que atuam ou

atuaram na empresa em áreas relevantes ao processo de internacionalização e complementada

por extenso uso de fontes secundárias, como matérias divulgadas na imprensa e comunicações

oficiais da empresa. Todos as teorias analisadas demonstram algum grau de relevância na

compreensão do caso da Vale. Ao mesmo tempo, todas apresentam divergências entre o

pregado pela teoria e o que efetivamente se observou no caso. Assim nenhuma teoria sozinha

é capaz de explicar o processo vivido pela Vale, apesar de algumas teorias demonstrarem um

poder explicativo maior do que outras. Em geral, as teorias comportamentais ofereceram uma

explicação mais completa para alguns dos movimentos de internacionalização da empresa,

mas falharam em fornecer explicação para outros movimentos. Em contrapartida, as teorias

econômicas forneceram explicações para um número maior de movimentos de

internacionalização, mas com um nível de detalhamento menos profundo

Palavras-chave: Internacionalização de empresas. Vale. Mineração. Teorias Econômicas.

Teorias Comportamentais.

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ABSTRACT

BEMVINDO, Bernardo Soares Teixeira. O Processo de Internacionalização de uma

Multinacional Brasileira: Estudo do Caso Vale. Rio de Janeiro, 2014. Dissertação (Mestrado

em Administração) – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de

Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.

The research presented in this dissertation sought to understand the internationalization

process of the mining company Vale from the perspective of different theories of

internationalization. Vale is one of Brazil’s largest companies, the country’s largest exporter

and one of the national companies with the largest presence in foreign markets. There were

addressed, convergences and divergences between the Vale case and the economical and

behavioral theories of internationalization. The theories chosen for analysis were: Market

Power, Internalization, Eclectic Paradigm, Uppsala Model, Networks, International

Entrepreneurship and Born Globals. The method used was a single case study and the data

collection was done through in-depth interviews with three executives who work or worked at

Vale in areas relevant to the internationalization process and supplemented by extensive use

of secondary sources, such as press reports and official communication from the company. All

the theories analyzed show some degree of relevance in understanding the Vale case. At the

same time, all show divergences between what the theory preached and what is actually

observed in the case. Therefore, no theory alone can explain the process experienced by Vale,

although some theories show a greater explanatory power than others do. In general, the

behavioral theories offered a fuller explanation of some of the internationalization movements

of the company, but failed to provide explanation for other movements. In contrast, the

economic theories provide explanation for a greater number of internationalization

movements, but with a smaller level of details.

Key-words: Internationalization. Vale. Mining. Economic theories. Behavioral theories.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

LISTA DE FIGURAS:

Figura 2.1: Mecanismo de Internacionalização do Modelo de Uppsala............................

Figura 2.2: Exemplo de Divisão do Trabalho (indústria automobilística simplificado)....

36

41

Figura 2.3: Rede de relacionamentos.................................................................................. 42

Figura 2.4:Elementos Necessários e Suficientes para um Novo Empreendimento

Internacional Sustentável.....................................................................................................

45

Figura 2.5: Tipos de manufaturas de alto valor agregado.................................................. 48

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LISTA DE QUADROS:

Quadro 2.1: Diferença no Comportamento de firmas tradicionais e Born Globals...........

Quadro 2.2: Variáveis e Sub-Variáveis do Modelo.............................................................

Quadro 2.3: Sumário das Teorias de Internacionalização Apresentadas...........................

49

51

53

Quadro 2.4: Respostas das Teorias às Questões Básicas da Internacionalização............ 54

Quadro 3.1: Situações Relevantes para Escolha da Estratégia de Pesquisa...................... 58

Quadro 3.2: Proposições do Estudo................................................................................... 60

Quadro 3.3: Maiores Empresas do Brasil........................................................................... 61

Quadro 3.4: Empresas Brasileiras com maior Índice de Transnacionalidade................... 62

Quadro 4.1: Receita com privatizações 1995 a 2002 por setor.......................................... 73

Quadro 4.2: Importância do Minério de Ferro na Pauta de Exportação Brasileira.......... 74

Quadro 5.1: Análise das Proposições da Teoria do Poder de Mercado............................ 85

Quadro 5.2: Análise da Proposição da Teoria da Internalização...................................... 87

Quadro 5.3: Análise das Proposições do Paradigma Eclético............................................ 91

Quadro 5.4: Análise das Proposições do Modelo de Uppsala............................................ 94

Quadro 5.5: Análise da Proposição da Teoria de Networks............................................... 96

Quadro 5.6: Análise da Proposição do Empreendedorismo Internacional........................ 98

Quadro 5.6: Análise da proposição do fenômeno das Born Globals.................................. 100

Quadro 5.7: Aderência e divergências do caso da Vale as teorias testadas....................... 100

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Sumário 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 14

1.1 Definição do Problema .......................................................................................................... 14

1.2 Importância do Tema ............................................................................................................ 15

1.3 Delimitação do Estudo .......................................................................................................... 16

1.4 Organização do Estudo .......................................................................................................... 17

2. REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................................................. 19

2.1 Abordagens Econômicas da Teoria da Internacionalização .................................................. 20

2.1.1 A Teoria do Poder de Mercado ..................................................................................... 20

2.1.2 Internalização ................................................................................................................ 23

2.1.3 Paradigma Eclético ........................................................................................................ 27

2.1.4 Análise Comparativa Crítica das Teorias Econômicas ................................................... 30

2.2 Abordagens Comportamentais da Teoria da Internacionalização ........................................ 33

2.2.1 Introdução às Teorias Comportamentais ...................................................................... 33

2.2.2 A Escola de Uppsala....................................................................................................... 34

2.2.3 A Perspectiva de Networks ............................................................................................ 40

2.2.4 O Empreendedorismo Internacional ............................................................................. 44

2.3 Born Globals .......................................................................................................................... 47

2.4 Sumário das Teorias de Internacionalização ......................................................................... 52

3. DISCUSSÃO DO MÉTODO .............................................................................................................. 56

3.1 Questões de Pesquisa ........................................................................................................... 56

3.2 Método de Pesquisa .............................................................................................................. 57

3.3 Procedimentos Metodológicos ............................................................................................. 59

3.3.1 Proposições ................................................................................................................... 59

3.3.2 Seleção do Caso ............................................................................................................. 60

3.3.3 Unidade de Análise ........................................................................................................ 63

3.3.4 Coleta de Dados ............................................................................................................ 63

3.4 Críticas ao Método de Estudo de Caso e Limitações do Estudo ........................................... 64

4. DESCRIÇÃO DO CASO .................................................................................................................... 67

4.1 A História da Vale .................................................................................................................. 67

4.1.1 Fundação ....................................................................................................................... 67

4.1.2 Os Anos como Empresa Estatal ..................................................................................... 70

4.1.3 A Privatização ................................................................................................................ 72

4.1.4 Os Primeiros anos como Empresa Privada e a Internacionalização (1998 – 2008) ...... 74

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4.1.5 A História Recente da Vale ............................................................................................ 78

5. ANÁLISE DO CASO ......................................................................................................................... 81

5.1 As Peculiaridades do Setor de Mineração............................................................................. 81

5.2 Aderências e Divergências em Relação à Teoria do Poder de Mercado ............................... 82

5.3 Aderências e Divergências em Relação à Teoria da Internalização ...................................... 86

5.4 Aderências e Divergências em Relação ao Paradigma Eclético ............................................ 87

5.5 Aderências e Divergências em Relação ao Modelo de Uppsala ........................................... 91

5.6 Aderências e Divergências em Relação à Perspectiva de Networks ..................................... 94

5.7 Aderências e Divergências em Relação ao Empreendedorismo Internacional ..................... 96

5.8 Aderências e Divergências em Relação à literatura Born Global .......................................... 98

5.9 Resumo das Aderências e Divergências entre o Caso da Vale e as Teorias Testadas ......... 100

6. CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 103

6.1 Sumário do Estudo .............................................................................................................. 103

6.2 Conclusões........................................................................................................................... 104

6.3 Sugestões para Pesquisas Futuras ...................................................................................... 108

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................... 110

APÊNDICE ............................................................................................................................................ 115

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1. INTRODUÇÃO

Este capítulo tem por objetivo apresentar o tema da pesquisa e estabelecer sua

relevância e suas delimitações. Também está descrita a organização da dissertação, com uma

apresentação sucinta dos capítulos seguintes.

1.1 Definição do Problema

A evolução do campo de pesquisa de internacionalização de empresas, trouxe muitas

teorias sobre o que leva uma empresa a buscar mercados estrangeiros. Além de procurar

estabelecer o “por quê”, essas teorias levantam hipóteses sobre “o quê” será

internacionalizado, “quando” a firma irá buscar esses mercados internacionais, “onde” a firma

concentrará seus esforços de internacionalização e “como” essa firma irá acessar tal mercado

estrangeiro. As respostas a essas perguntas são quase sempre diferentes dependendo da teoria

em questão, e algumas vezes são contraditórias. Essas diferenças derivam da ótica utilizada

por cada teoria, se econômica ou comportamental, das premissas feitas por elas e da

introdução de conceitos de outros campos de estudo, como o empreendedorismo. Existem

muitos trabalhos que buscam comparar essas teorias em suas bases teóricas (CARNEIRO e

DIB, 2007).

O objetivo da pesquisa descrita nesta dissertação foi, a partir do caso de uma das

maiores e mais internacionalizadas empresas brasileiras, analisar desde o início seu processo

de internacionalização até sua atual configuração internacional sobre a ótica das principais

teorias sobre internacionalização de empresas.

O caso escolhido foi da empresa mineradora Vale, por se tratar de uma empresa de

grande porte com extensa presença internacional. O fato de se tratar de uma companhia

brasileira, além de facilitar o acesso aos dados para elaboração do caso através também de

entrevistas pessoais, permitiu o estudo do processo de internacionalização de uma empresa

multinacional oriunda de um país emergente, um “animal” um pouco mais raro do que as

multinacionais oriundas de Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão, que tradicionalmente

dominam a arena dos negócios internacionais.

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Portanto, a pergunta de pesquisa que norteou o trabalho foi: “Como o processo de

internacionalização e a atuação internacional da Vale podem ser analisados à luz das

principais teorias sobre internacionalização de empresas?”

As principais teorias contempladas na análise do caso foram: Poder de Mercado,

Internalização, Paradigma Eclético, Modelo de Uppsala, Networks, Empreendedorismo

Internacional e Born Globals, todas devidamente apresentadas no próximo capítulo.

1.2 Importância do Tema

A internacionalização de empresas tem sido um assunto a continuamente despertar o

interesse de pesquisadores. O aumento da importância do comércio internacional na economia

mundial e os movimentos de globalização vividos nas últimas décadas aumentaram ainda

mais o interesse no tema. Dunning e Mucchielli (2001) já apontavam que embora o fenômeno

da globalização não fosse recente, havia se acelerado nos últimos anos, com a adoção de

estratégias verdadeiramente globais por muitas empresas. Os autores ressaltavam a criação de

áreas de comércio comum, como a União Europeia, o Mercosul, a ASEAN e a NAFTA e os

movimentos de integração regional como fatores que influenciaram mudanças estratégicas nas

empresas.

No Brasil, a internacionalização das empresas nacionais também tem sido um tema

recorrente nas pesquisas da área de administração. As mudanças ocorridas na economia

brasileira na década de 1990 possibilitaram a inserção do país em um contexto global. A

internacionalização passou a ser vista como um meio para aumentar a competitividade,

através de ganhos de escala, além de assegurar e expandir mercados para as empresas (ALEM

e CAVALCANTI, 2005).

A investigação de empresas foi abordada por economistas, administradores,

especialistas da área comportamental e da área de empreendedorismo, entre outras. As teorias

desenvolvidas apresentam algumas semelhanças e diferenças entre si, dependendo da base

teórica, premissas e foco utilizados. Além da comparação teórica das mesmas é possível

analisa-las através da verificação com casos reais. Esta verificação permite tanto analisar um

caso real de maneira mais ampla, entendendo melhor o processo ocorrido com a empresa em

questão, quanto avaliar a validade teórica dos arcabouços propostos.

O caso da Vale se mostra interessante para tal pesquisa por uma série de fatores.

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- A Vale é uma das maiores empresas brasileiras. Independente do critério usado para

a definição de tamanho da empresa, a Vale está entre as maiores empresas do Brasil. Na

pesquisa realizada pelo Valor econômico a empresa é apontada como a segunda maior

empresa brasileira atrás apenas da Petrobras no critério Receita Líquida (JORNAL VALOR

ECONÔMICO ONLINE <http://www.valor.com.br/empresas/2801254/ranking-das-1000-

maiores>) Com um total de mais de 85.000 empregados, é também uma das maiores

empregadoras do país.

- A Vale é a maior exportadora do Brasil. Em 2012, segundo dados da revista Exame,

a Vale manteve seu posto como maior exportadora do país. Com um total exportado chegando

a 25,5 bilhões de dólares, sua participação no total das exportações nacionais foi de 10,5%.

Além do desempenho da própria Vale, empresas onde ela possui participação como a

Samarco, também aparecem entre as maiores exportadoras brasileiras (REVISTA EXAME

ONLINE <http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/as-50-maiores-exportadoras-em-2012-

do-brasil?p=2>).

- A Vale está entre as empresas brasileiras mais internacionalizadas: Segundo a

Fundação Dom Cabral, a Vale é uma das empresas mais internacionalizadas do país, é

também a que possui subsidiárias em maior número de países, em 2013 (FUNDAÇÃO DOM

CABRAL <http://www.fdc.org.br/imprensa/Documents/2013/ranking_multinacionais_

brasileiras2013.pdf>).

1.3 Delimitação do Estudo

Este trabalho analisou o caso de internacionalização da Vale, uma multinacional

brasileira da área de mineração, e comparou o seu processo de internacionalização e sua

atuação no exterior com o proposto pelas principais teorias de internacionalização da

literatura. Algumas das teorias escolhidas apresentam uma abordagem econômica (Poder de

Mercado, Internalização e Paradigma Eclético), enquanto outras possuem uma abordagem

comportamental (Modelo de Uppsala, perspectiva de Networks e Empreendedorismo

Internacional). O fenômeno das Born Globals, que não é perfeitamente caracterizado em

nenhuma das duas abordagens, também foi estudado, pois a literatura gerada traz insights

interessantes sobre a internacionalização de empresas.

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A escolha da Vale delimita o estudo aos setores onde a companhia atua, especialmente

a indústria de mineração, e ao contexto de multinacionais brasileiras ou de países emergentes.

Extrapolações das conclusões da pesquisa a outras empresas devem ser feitas com cuidado,

respeitando-se as limitações do método de pesquisa utilizado, o estudo de caso.

Todos as etapas dos processos de internacionalização da Vale foram considerados para

traçar sua estratégia geral de internacionalização. No entanto, por questões práticas, alguns

processos podem ter sido apresentados com menos detalhes devido à escassez de dados e

documentos. O maior foco foi dado à compra da canadense Inco, devido à magnitude do

negócio mediante o portfólio internacional da companhia.

O período abordado no estudo vai desde a fundação da Vale, em 1942, até o ano de

2014. Maior ênfase foi dada ao período mais recente por este concentrar a maioria dos

esforços de internacionalização da companhia, assim como por questões práticas, como a

disponibilidade e fidelidade de dados e a possibilidade de entrevistar pessoas que

efetivamente participaram dos processos.

1.4 Organização do Estudo

Essa dissertação está dividida em seis capítulos. Neste primeiro são apresentados os

objetivos do estudo, definido o problema, a importância do tema, a delimitação do estudo e

sua organização.

O próximo capítulo apresentará o referencial teórico utilizado no estudo. São

apresentadas as teorias que posteriormente basearam a análise do estudo de caso. O capítulo

se inicia com a apresentação das teorias que se baseiam na abordagem econômica: as teorias

do Poder de Mercado e da Internalização e o Paradigma Eclético. Em seguida são analisadas

as teorias com base na abordagem comportamental: o Modelo de Uppsala, a perspectiva de

Networks e o Empreendedorismo Internacional. O capítulo se encerra com a apresentação da

literatura sobre o fenômeno das empresas Born Globals.

O terceiro capítulo é dedicado à discussão do método, explicando como a pesquisa foi

conduzida. O capítulo se inicia com a apresentação das questões de pesquisa e, a partir, delas

a explicação da escolha do método de pesquisa. Em seguida, são descritos os procedimentos

metodológicos, as justificativas para escolha do caso da Vale e os procedimentos de coleta de

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dados. Por fim, são apresentadas as críticas ao método de estudo de caso e as limitações desse

estudo.

O quarto capítulo descreve o caso Vale, apresentando a história da companhia. A

trajetória da Vale é subdivida em cinco momentos. Embora todos os aspectos da história

sejam comtemplados, o foco é o conjunto de movimentos de internacionalização. O capítulo

começa a mapear a história da companhia antes mesmo da sua fundação, passa pelos anos da

Vale como empresa estatal, destaca o momento da sua privatização e em seguida conta sua

história como empresa privada. A história da companhia como empresa privada é dividida em

dois momentos, sendo a crise de 2008 o ponto de corte entre os dois. Essa data foi escolhida

por representar um momento de ruptura na estratégia da empresa de forma geral, sobretudo no

seu processo de expansão e internacionalização.

O quinto capítulo apresenta a análise do caso, nele cada uma das teorias mencionadas

no capítulo 2 são comparadas com o real processo de internacionalização da Vale. O capítulo

busca encontrar semelhanças e divergências entre essas teorias e o caso Vale, usando como

base a história da companhia apresentada no capítulo anterior, dados da empresa e as

entrevistas realizadas com executivos da empresa.

Finalmente, o sexto capítulo apresenta as conclusões do estudo. Antes é feito um

pequeno sumário do trabalho realizado para suportar as conclusões apresentadas. Por fim, são

apresentadas sugestões de pesquisas futuras.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

Este capítulo apresenta uma revisão de literatura sobre as teorias de

internacionalização de empresa. Essa análise servirá de base para a análise da

internacionalização da Vale nos capítulos posteriores.

Vários autores (ANDERSEN; BUVIK, 2002; RÄISÄNEN, 2003), classificam as

teorias tradicionais de internacionalização em duas linhas de pesquisa. A primeira é a

abordagem com base em critérios econômicos, onde prevalecem soluções (pseudo-) racionais

na busca por maximização dos retornos econômicos para as questões relativas ao processo

internacionalização. A segunda é a abordagem com base na evolução comportamental, que

considera que o processo de internacionalização depende das atitudes, percepções e

comportamento dos tomadores de decisão, e que esses seriam orientados pela busca da

redução de riscos (CARNEIRO e DIB, 2007).

A abordagem econômica predominou nos estudos da área até a década de 1970,

quando foi questionada pelo Modelo de Uppsala. Segundo esse modelo o processo de

internacionalização não seria resultado de uma alocação ótima de recursos (nem na

perspectiva macroeconômica dos países e nem na perspectiva microeconômica das dinâmicas

indústrias entre as empresas). O processo seria incremental devido a racionalidade limitada

dos agentes envolvidos e de objetivos de redução de risco (CARNEIRO e DIB, 2007).

Essas duas abordagens dominaram a discussão sobre internacionalizações de

empresas, até que no início dos anos 1990, um novo tipo de empresa foi observado, as Born

Globals. Essa nova empresa não se encaixava com facilidade em nenhuma das duas

abordagens, nenhum dos dois modelos era capaz de explicar plenamente o processo de

internacionalização dessas empresas (CARNEIRO e DIB, 2007). Embora a importância do

papel do empreendedor e do uso de redes de relacionamentos aproxime essa nova teoria da

abordagem comportamental, o caráter não gradual da expansão internacional das Born

Globals desafia a abordagem tradicional.

A seção 2.1 analisa as abordagens econômicas. Os destaques dessa abordagem são: A

teoria de Poder de Mercado desenvolvida por Hymer (1960), a teoria da internalização

desenvolvida por Buckley e Casson (1976) e o Paradigma Eclético de Dunning (1977).

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Posterior à análise individual de cada uma dessas teorias é feita uma revisão das principais

obras que buscaram compará-las.

A seção 2.2 apresenta as abordagens comportamentais. Os principais modelos dessa

abordagem são analisados: O modelo desenvolvido pela Escola de Uppsala (JOHANSON e

WIEDERSHEIM-PAUL, 1975; JOHANSON e VAHLNE, 1977), a perspectivas de Networks,

concebida por Johanson e Matsson (1988), e o empreendedorismo internacional, que une dois

campos de estudo o empreendedorismo e negócios internacionais (MCDOUGALL, 1989).

Por fim, as seções sobre Networks e empreendedorismo internacional dão a base

necessária para a introdução do fenômeno das Born Globals, na seção 2.3.

2.1 Abordagens Econômicas da Teoria da Internacionalização

As abordagens econômicas, como mencionado, procuram explicações racionais para

as decisões de internacionalização, buscando maximizar o retorno econômico. Sua origem

reside na tentativa de buscar por teorias gerais da produção internacional, sendo que essa pode

ser analisada em três níveis: Macroeconômico, Mesoeconômico e Microeconômico. As

abordagens microeconômicas e mesoeconômicas estudam, respectivamente, o crescimento de

firmas individuais e a interação dessas firmas em um nível setorial. Em contrapartida as

teorias macroeconômicas examinam tendências amplas e internacionais (DIB, 2008).

2.1.1 A Teoria do Poder de Mercado

Segundo Hymer (1960) a abordagem vigente até então, de que a diferença das taxas de

juros entre países explicaria o fluxo de investimento internacional seria capaz de explicar

apenas os investimentos em portfólio, que ocorre quando um investidor apenas busca

diversificar suas operações financeiras, e, portanto, era incompleta. Mais precisamente, esse

autor defende que as diferenças nas taxas de juros entre os países não são capazes de explicar

os investimentos estrangeiros diretos, que estavam se tornando cada vez mais frequentes na

época, e que ocorrem quando uma companhia controla a empresa estrangeira que recebe seus

investimentos.

Se o determinante do fluxo de investimentos fosse a diferença na taxa de juros entre

duas nações, deveria haver um fluxo unidirecional de recursos, de nações com taxas de juros

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menores para nações com taxa de juros mais elevadas. No entanto, dados empíricos mostram

haver investimentos cruzados entre as nações. Ainda segundo Hymer (1960), tendo somente a

diferença de taxas de juros como estímulo ao investimento transnacional, dever-se-ia observar

um fluxo de capital para apenas alguns países, e dentro desses poucos países todas as

indústrias seriam contempladas com esses investimentos. No entanto, segundo suas

constatações empíricas essa não era a situação, Hymer observou que existia um fluxo de

capital para apenas algumas indústrias e em um grande número de países

Adicionalmente, operações de investimento direto não necessariamente envolvem o

fluxo de capital de um país para outro. Uma empresa estrangeira pode investir em outro país

obtendo um empréstimo em um banco local, por exemplo. Tal movimento também, não seria

explicado pela abordagem macroeconômica. De fato, Hymer (1960), em sua pesquisa

empírica, verificou que é uma tendência as empresas financiarem seus investimentos

estrangeiros através de empréstimos em bancos locais, em detrimento de empréstimos nos

seus países natal. Além disso, ele verificou firmas nativas de países com altas taxas de juros

faziam investimento direto em países que tenham baixas taxas de juros. Assim o fluxo de

investimentos diretos no mundo poderia ter o sentido oposto daquele descrito pela teoria

macroeconômica.

Insatisfeito com a explicação da diferença entre as taxas de juros Hymer afirmava que

dois principais motivos levavam uma empresa a investir em países estrangeiros eram :(i)

remover um competidor potencial; (ii) apropriar-se integralmente dos retornos que certa

habilidade desenvolvida por esta em seu país natal lhe proporcionava. Por exemplo, uma

empresa que desenvolveu um produto diferenciado para atender seu mercado local ou que

tenha desenvolvido um método de produção mais eficiente, pode maximizar os retornos

dessas vantagens competitivas ao replicá-las em outros mercados. No entanto, Hymer (1960)

faz a ressalva de que existem outros meios, além do controle direto das empresas nos

mercados estrangeiros, para garantir os objetivos das empresas. Por exemplo, a competição

pode ser removida também através de um conluio entre as empresas produtoras.

Isso também explicaria porque as firmas escolhem investir diretamente no exterior, ao

invés de utilizar o licenciamento de produto, por exemplo. Imperfeições de mercado

impediriam que a empresa se apropriasse de todo o lucro potencial que uma operação no

exterior poderia lhe render, a menos que essa investisse diretamente no país estrangeiro. Em

outras palavras, para Hymer (1960), exercer algum controle sobre a operação estrangeira era

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necessário para a maximização dos retornos do processo de internacionalização. Então, a

busca de controle é o grande motivador do investimento estrangeiro direto.

Hymer (1960), então, desenvolveu a teoria de que as empresas tendem a aumentar sua

participação no mercado local enquanto possível, atingindo um alto grau de poder de

monopólio. Quando o crescimento no mercado local não é mais possível, a empresa usa os

lucros obtidos em seu país de origem para financiar operações em um país estrangeiro. O

mesmo processo de concentração de mercado e obtenção de poder de monopólio ocorre no

país estrangeiro (DIB, 2008).

Hymer afirma que as operações internacionais irão ocorrer em algumas indústrias e em

todos os países, ao invés de em todas as indústrias e em apenas alguns países como previa a

teoria macroeconômica. Mas, como prever quais indústrias estarão sujeitas a esse processo de

internacionalização e qual seria extensão desse? Segundo o autor não é impossível prever isso

com precisão, pois os mercados seriam imperfeitos, o que poderia resultar em uma solução

monopolista. No entanto, o autor descreve quatro cenários “puros” considerando as variáveis

envolvidas no processo de internacionalização. Na vida real, entretanto, o que se observa é um

híbrido entre esses diferentes cenários.

No primeiro cenário ocorreriam operações internacionais por causa de alguma

imperfeição de mercado. Nesse cenário ocorreriam operações internacionais nas indústrias

onde empresas de diferentes países vendessem no mesmo mercado ou vendessem umas para

as outras sob condições de competição imperfeitas. A forma pode variar: podem existir

conluios, fusões ou até mesmo um acordo de divisão de lucros. No entanto, se houvesse

interdependência e um número suficientemente pequeno de empresas capazes de reconhece-

las, ocorreria alguma forma de acomodação (HYMER, 1960).

No segundo cenário, operações internacionais aconteceriam em casos onde uma ou um

grupo de empresas terem alguma vantagem sobre as demais. Um exemplo desse cenário é um

mercado onde uma empresa tem uma patente que lhe dê um direito exclusivo sobre a

comercialização de um produto ou quando apenas um grupo de empresas tem acesso a uma

tecnologia superior que lhes garantem uma grande economia no processo produtivo de

determinado produto (HYMER, 1960).

Um terceiro cenário, descrito por Hymer (1960), seria quando as operações de

internacionalização não ocorressem nem por uma imperfeição do mercado e nem um

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desequilíbrio nas capacitações. Por exemplo, como alguns mercados tem uma correlação

negativa uns com os outros (quando uma indústria em um país está gerando grandes lucros

isso implica que a mesma indústria está gerando prejuízos em outro país), operações

internacionais são estimuladas com o objetivo de diversificar o portfólio dos investidores.

Por fim, o quarto cenário seria aquele onde não haveria operações internacionais.

Indústrias que tem muitas firmas de pequeno tamanho costumam entrar nesse cenário. Fatores

como o nacionalismo e a integração com a economia mundial também podem levar a esse

cenário (HYMER, 1960).

2.1.2 Internalização

A teoria de internalização tem como base as ideias defendidas por Coase (1937). Esse

autor foi o primeiro a usar a figura do empreendedor como fator determinante do processo de

crescimento e diferenciação de uma firma. Para ele o empreendedor seria um gerente ou outro

empregado que apresentasse características de liderança e de tomada de decisões (DIB, 2008).

De acordo com Coase (1937), uma firma em particular cresceria conforme esse empreendedor

organizasse transações adicionais para essa firma, e diminuiria de tamanho conforme ele

abandonasse a organização de tais transações, ou seja, o crescimento ou decrescimento de

uma firma dependia do grau de internalização das atividades da mesma.

Segundo Dunning (2003), Coase discutiu porque as firmas internalizam determinadas

funções, ao invés de buscar soluções no mercado. A resposta dada foi que, para essas

atividades, o custo de transação do mercado seria maior do que os custos de se realizar essas

transações com uma única entidade. Dunning ainda aponta que Coase não levou em

consideração que poderia haver funções que simplesmente não poderiam ser feitas pelo

mercado e nem entrou na discussão de quem seria mais eficiente em fazer tais funções.

De qualquer forma, Dunning (2003) deixa claro que Coase foi uma influência crítica

para o desenvolvimento da teoria da internalização, anos mais tarde, por Buckley e Casson

(1976). Esses autores observaram o crescente número de multinacionais logo após a segunda

guerra mundial. Tal investimento estrangeiro não era condizente com a teoria

macroeconômica, que dizia que o fluxo de investimento seria dos países mais abundantes em

capital, e consequentemente com menores taxas de juros, em direção aqueles com escassez de

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capital, e consequentemente taxas de juros mais elevadas. O que se observa na realidade é que

eram investimentos no sentido contrário, e muitas vezes investimentos cruzados entre países.

Empiricamente Buckley e Casson (1976) chegaram a uma série de características

presentes nas multinacionais. A primeira delas é que quanto maior a firma maior tendia ser

seu grau de internacionalização. Além disso, eles verificaram que as multinacionais tendiam

ser diversificadas horizontalmente, produzindo o mesmo produto em fábricas diferentes e

muitas eram verticalmente diversificadas também, produzindo produtos intermediários da

cadeia produtiva.

Segundo os autores isso seria reflexo do fato que os negócios modernos são

complexos, não se limitando a rotina de produção de bens e serviços. As empresas alocariam

grande parte de seus recursos em atividades como marketing, pesquisa e desenvolvimento

(P&D), treinamento da força de trabalho, os procedimentos bancários e financeiros,

administração de ativos financeiros, entre outras atividades não diretamente ligadas a

produção ou à prestação do serviço. Todas essas atividades são interconectadas e são ligadas

por um fluxo de produtos intermediários. Esses produtos intermediários podem ser simples

matérias semi-processados ou, mais frequentemente, conhecimento, expertise e capital

humano. Esses novos mercados, de produtos intermediários, são difíceis de organizar. A

tentativa de organizá-los gerou mudanças radicais no modo de se fazer negócios, entre essas

mudanças está o crescimento das firmas multinacionais.

Buckley e Casson (1976) definem a firma multinacional como sendo aquela firma que

possui e controla atividades em diferentes países. Baseando sua teoria em três postulados:

(1) Firmas buscam maximizar seus lucros em um mundo de mercados imperfeitos;

(2) Quando os mercados de produtos intermediários são imperfeitos, existe um

incentivo para tentar escapar deles através da criação de mercados internos. Isso

envolve trazer para posse e controle atividades que estão ligadas pelo mercado;

(3) A internalização de mercados através das fronteiras nacionais gera firmas

multinacionais.

Ainda segundo Buckley e Casson (1976), existe um grau ótimo para a internalização.

Esse grau ótimo seria na margem, onde os custos e benefícios de qualquer internalização

adicional se equalizariam. Os fatores que governam essa margem, controlam a extensão da

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internalização. Cinco tipos de imperfeição de mercados que levam a internalização a ser

benéfica são apontados pelos autores:

- Atividades interdependentes podem envolver atividades com defasagens temporais

significativas. Quando a atividade envolve uma grande diferença temporal entre o início e o

final da produção, seria necessário um mercado futuro (que atuaria sinalizando o preço que

seria praticado no futuro) para coordenar tanto a produção no curto prazo quanto o calendário

de investimentos de longo prazo. Na ausência desses mercados futuros existe um forte

incentivo para as firmas criarem seu próprio mercado futuro, trazendo as atividades

interdependentes para seu controle.

- A exploração eficiente de Poder de Mercado sob um mercado intermediário pode

requerer descriminação de preços. Quando essa descriminação de preços não é possível o

monopolista tem um incentivo para se verticalizar, para que assim ele possa implementar o

sistema de discriminação apropriado.

- Uma situação onde haja bilateralidade de concentração de poder pode levar a uma

situação de barganha indeterminada ou instável. Por exemplo, quando um vendedor de um

produto intermediário é monopolista, mas tem como seu único cliente um comprador

monopsônico que por sua vez detêm controle sobre os canais de distribuição. Há um grande

incentivo a se realizarem contratos de longo prazo, ou uma solução mais permanente como

uma fusão ou compra de uma empresa pela outra, caracterizando assim uma internalização.

- Quando há uma assimetria de informação entre o comprador e o vendedor no que diz

respeito à natureza ou valor de um produto, a parte melhor informada tem um incentivo para

assumir o risco da outra parte, seja adquirindo essa outra parte ou entrando em competição

com ela por seu mercado.

- Normalmente, o preço dos bens e serviços, no mercado, deve ser público e por isso

não pode ser facilmente subestimado para efeitos tributários. Porém, em utilizando recursos

internos não existe tanta transparência, o que pode garantir um ganho fiscal. Esse tipo é

especialmente aplicado em casos de empresas multinacionais, já que o governo de cada país

estabelece tarifas ad valorem ou restrições de movimentação de capital e por causa das

discrepâncias entre as taxas dos impostos sobre receita e lucro que existe entre os países.

A discussão acima sugere que existem alguns mercados em que existe um incentivo

particularmente grande para a internalização. Segundo, Buckley e Casson (1976), alguns

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exemplos são os mercados que vendem algum tipo de conhecimento, produtos agrícolas

perecíveis, produtos intermediários em indústrias intensivas em capital e recursos naturais que

são geograficamente concentrados.

Buckley e Casson (1976) também descreveram os aspectos negativos da

internalização. Segundo os autores um mercado internalizado pode acarretar custos mais altos

em alguns aspectos, principalmente no que tange a comunicação. O aumento do fluxo de

informações, a necessidade de confidencialidade e a necessidade de visitas locais a unidades

distantes seriam os principais fatores que fariam o custo de comunicação ser mais dispendioso

em um mercado internalizado. Além dos custos de comunicação, o aumento da complexidade

administrativa da empresa, o aumento do risco incorrido pela empresa e dificuldades em se

igualar a escala de atividades diferentes são apontados como pontos negativos da

internalização.

Considerando as possíveis economias e custos do processo de internalização, cada

companhia escolhe se deve internalizar uma dada atividade, no agregado essas escolhas

determinam o grau de internalização de uma firma. Segundo Buckley e Casson (1976), são

quatro fatores relevantes na decisão de internalização:

(1) Fatores específicos da indústria: A natureza do produto, a estrutura do mercado

externo e a relação entre as escalas ótimas das atividades que estão ligadas pelo

mercado;

(2) Fatores geográficos específicos: As distâncias físicas e sociais entre as regiões

envolvidas, já que quanto maiores forem essas distâncias maiores serão os custos

de internalização e, consequentemente, menores serão os incentivos a essa decisão;

(3) Fatores nacionais específicos: Relações políticas e fiscais entre os países

envolvidos;

(4) Fatores específicos das firmas: Vários fatores que determinam a capacidade da

firma se internalizar, como por exemplo, o grau de profissionalização do seu

quadro gerencial.

Uma comparação entre a teoria de internalização e a de Hymer (1960), é feita por

Buckley e Casson (1976). Segundo os autores existem várias similaridades entre as teorias,

porém também existem diferenças significativas. Na teoria de Hymer (1960), as vantagens

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das firmas, especialmente a sua propriedade de conhecimentos, são consideradas dadas. O

planejamento e investimento necessários para obtê-las não são considerados. Como os custos

de aquisição dessas vantagens são ignorados, é impossível explicar ou prever o porquê das

firmas investirem nessas áreas em detrimentos de outras.

Em contraponto, a teoria de internalização, desenvolvida por Buckley e Casson

(1976), credita essas vantagens a investimentos realizados no passado em três frentes. A

primeira delas é na criação de uma área de pesquisa e desenvolvimento, o que proporciona as

empresas uma vantagem no campo tecnológico. A segunda é a criação de um conjunto

integrado de habilidades. E a última é o desenvolvimento de uma rede de transmissão de

informação, que permite que os benefícios das duas primeiras frentes sejam levados a toda a

organização por um custo mínimo, ao mesmo tempo em que protege tais conhecimentos,

impedindo seu acesso por terceiros. Além disso, a teoria de Buckley e Casson (1976)

apresenta uma ênfase na transmissão da capacidade de inovar, enquanto Hymer (1960) se

concentrava em uma única inovação ou patente.

2.1.3 Paradigma Eclético

A teoria do Paradigma Eclético foi desenvolvida por Dunning (1977). Segundo o autor

as firmas que desejam explorar um mercado externo encontram duas possibilidades:

- Produzir em seu país de origem, portanto usando recursos nacionais, e abastecer o

mercado externo com exportações. Sendo essa primeira compreendida pela teoria

convencional do comércio internacional.

- Produzir localmente no país estrangeiro, utilizando assim recursos localizados em

países estrangeiros. Abastecendo assim diretamente o mercado estrangeiro. Essa segunda

alternativa estaria no domínio da produção internacional e do investimento estrangeiro direto.

Segundo Dunning (1977) essas duas alternativas eram parte de um mesmo processo no

qual o principal objetivo do autor era entender a decisão de produzir em um mercado externo

ou não.

Partindo desse objetivo o autor buscou explicar, no seu artigo seminal e em trabalhos

posteriores, o “por que” uma empresa decide produzir diretamente no exterior em detrimento

de abastecê-lo com exportações, ou seja, quais são os motivos que impactam na decisão entre

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as duas possibilidades de abastecimento do mercado externo. Outra questão era “quando” se

torna atraente investir diretamente em um mercado estrangeiro. “Onde” esses investimentos

serão localizados, ou por que a mesma firma escolhe a opção de exportação para alguns

mercados estrangeiros e a produção direta para outros, também é uma questão levantada pelo

autor. Além disso, ele discute a forma em que a operação estrangeira é desenvolvida, ou seja,

“como” essas operações internacionais são estruturadas.

Segundo Dib (2008), em sua teoria Dunning explica que as falhas de mercado, tais

como custo de informação e transação, oportunismo dos agentes e especificidade dos ativos,

levariam uma empresa a utilizar o investimento direto para alcançar um mercado externo em

detrimento das exportações ou do licenciamento. As empresas agiriam dessa forma quando

tivessem vantagens diferenciais em relação às concorrentes e desejassem proteger tais

vantagens utilizando uma estrutura própria.

Mais especificamente, o autor aponta três variáveis interdependentes que influenciam

essa decisão. A primeira delas são as vantagens competitivas da empresa que são

especificamente derivadas de suas propriedades (também conhecido como vantagens de

propriedade). Segundo a teoria, com tudo o mais constante, quanto maiores as vantagens de

propriedades de uma empresa estrangeira, principalmente relativamente as empresas locais do

país em questão, mais disposta essa empresa estará a realizar um investimento direto

(DUNNING, 1977).

Outra variável interdependente, segundo Dunning (1977) é a atração local dos

diferentes países e regiões, também conhecido com vantagens de localização. Ou seja, alguns

países e regiões apresentam vantagens competitivas em relações aos outros, quanto maiores

essas vantagens maior será o incentivo de uma firma realizar um investimento direto.

A terceira variável, utilizada por Dunning (1977) para compor seu paradigma, é a

vantagem de internalização. Isto é, o quanto vantajoso é realizar todas as diferentes etapas do

processo produtivo dentro da mesma empresa em detrimento da opção de externalizar

algumas dessas etapas. Uma das vantagens de internalização é a redução dos custos de

transação, por exemplo. Quanto maiores as vantagens de internalização mais disposta a

empresa estará a fazer o investimento direto.

Considerando essas três variáveis Dunning (1980), conclui que existiria investimento

estrangeiro direto em três situações:

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(1) A empresa acredita ter uma vantagem de propriedade em relação às empresas de

outras nacionalidades para servir determinado país ou região.

(2) O país que recebe o investimento direto possui vantagens de localização. Essas

vantagens devem ser utilizadas em conjunto com as vantagens de propriedade e de

internalização.

(3) Existe um benefício em utilizar internamente um recurso, no qual a empresa detém

uma vantagem competitiva, ao invés de vendê-lo no mercado, por exemplo, via

licenciamento.

Além disso, existiriam fatores contextuais que influenciariam a decisão quanto a fazer

ou não o investimento direto. Entre eles estariam variáveis estruturais e conjunturais,

características específicas da indústria e do país em questão e variáveis operacionais e

estratégicas específicas da firma.

Dunning (1977) apontou que foram identificados quatro principais tipos de atividades

estrangeiras baseadas no investimento direto:

(1) Atividades desenhadas para satisfazer um mercado estrangeiro em particular,

seriam atividades orientadas pela demanda.

(2) Atividades desenhadas para se conseguir acesso a um recurso natural. Como por

exemplo, acesso a uma fonte de minério, a certos produtos agrícolas ou a uma

força de trabalho de baixo custo. Seriam, portanto, atividades orientadas pela

oferta.

(3) Atividades desenhadas para promover uma maior racionalidade, trazendo assim

mais eficiência para a empresa. Normalmente ocorre em sequência às atividades

orientadas pela demanda ou às atividades orientadas pela oferta.

(4) Atividades desenhadas para proteger ou aumentar as vantagens de propriedade da

firma em questão, ou ainda, para eliminar ou reduzir as das firmas concorrentes.

Portanto, seriam, atividades que buscam a obtenção de um ativo estratégico.

Ao refletir sobre o futuro do campo da internacionalização e de sua teoria Dunning

(1988) previu uma profunda mudança nas teorias que iriam surgir no futuro, como um reflexo

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das mudanças que a própria organização internacional de produção estava passando. Entre as

tendências ele apontava:

(1) Um maior interesse em modelar as falhas de mercado;

(2) Maiores estudos para se entender a dinâmicas das vantagens de propriedade,

localização e internalização;

(3) Mais pesquisas sobre as colaborações feitas entre as multinacionais de países

avançados e entre multinacional e seus fornecedores e consumidores;

(4) Maior interesse em identificar e quantificar as vantagens de propriedade, sobretudo

aquelas vantagens ligadas ao quadro de gerência da companhia;

(5) Uma tendência à teoria e aos trabalhos empíricos se tornarem tecnicamente mais

sofisticados e mais voltados para a construção de políticas.

2.1.4 Análise Comparativa Crítica das Teorias Econômicas

Muitos autores se dedicaram a comparar e agrupar as teorias econômicas sobre a

internacionalização, buscando semelhanças e diferenças entre elas. Um deles é Cantwell

(1991), esse autor considerou que as teorias de produção internacionais nasceram em 1960,

quando Hymer mostrou que as teorias de comércio e movimentos de capital existente até

então eram incapazes de explicar as operações estrangeiras das empresas multinacionais,

principalmente no que se refere aos fluxos de investimentos de mão dupla e entre países com

fatores de produção similares. O autor considera que desde então quatro grandes arcabouços

teóricos foram desenvolvidos, são eles:

(1) O arcabouço baseado na obra de Hymer (1960), tem a visão da firma como um

agente de Poder de Mercado e de conluio.

(2) A abordagem da internalização, baseado em uma visão institucionalista, onde a

firma é um mecanismo de substituição dos mercados. Tendo Buckley & Casson

(1976) como um dos principais autores.

(3) As abordagens baseadas na análise das interações competitivas em indústrias

internacionais. Inclui-se nesse arcabouço diferentes abordagens, como por

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exemplo, a abordagem da acumulação tecnológica, desenvolvida por vários

autores, incluindo o próprio Cantwell (1991).

(4) As abordagens de desenvolvimento macroeconômico. Inclui muitas formas

diversas, como, por exemplo, as primeiras versões da teoria do ciclo de vida dos

produtos, como a de Vernon (1966).

Além desses quatro arcabouços, segundo Cantwell (1991), o Paradigma Eclético de

Dunning poderia ser interpretado como um quinto arcabouço. Dunning (1977) buscou trazer

elementos dos seus precedentes, de tal maneira que ele é compatível com várias abordagens

teóricas diferentes. Cada um dos cinco arcabouços é subdividido em teorias particulares, o

autor ainda ressalva, que uma mesma teoria pode apresentar características de mais de um

arcabouço.

Ietto-Gilles (1997) é outra autora que se dedicou a comparar e agrupar diferentes

teorias da internacionalização. Ela subdividiu as teorias existentes até então em quatro

abordagens: (1) Neoclássica; (2) Macroeconômica; (3) Estrutura de mercado, poder e

conflitos; (4) Eclética. Sua visão é similar à de Cantwell, porém com algumas divergências,

como pode ser visto a seguir quando discutiremos a classificação das teorias que

mencionamos anteriormente.

Cantwell (1991) e Ietto-Gilles (1997) divergem quanto a classificação da teoria do

Poder de Mercado. Segundo Cantwell, a firma descrita no trabalho de Hymer (1967) agia

ativamente, criando barreiras à entrada e fazendo conluio com outras firmas, assim o

comportamento da firma moldava a estrutura de mercado e não o contrário. Por isso, Cantwell

classifica a teoria de Poder de Mercado como uma teoria da firma e do comportamento da

firma. Já Ietto-Gilles (1997), classifica a teoria de Hymer na abordagem de estrutura de

mercado e Poder de Mercado. Ou seja, a autora coloca a teoria de Hymer no mesmo grupo de

teorias que tinham como foco a estrutura do mercado e não no comportamento da firma.

Como visto anteriormente, a teoria da Internalização é um dos cincos arcabouços

teóricos apontados por Cantwell (1991). Já Ietto-Gilles (1977) inclui essa teoria na abordagem

neoclássica, porque seu foco são as trocas e não a produção, e por sua preocupação com a

maximização de lucros e com a eficiência. A teoria da Internalização seria o caso particular

onde a busca por maximização de lucro era feito através da redução dos custos de transação,

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atingido pela internalização. A abordagem neoclássica, segundo Ietto-Gilles (1977) era

caracterizada pelos seguintes princípios:

- Os agentes são racionais e todos tem acesso a todas as informações dos mercados e

das condições econômicas, não existe incerteza;

- Os consumidores buscam maximizar sua utilidade que eles conseguem extrair do

consumo, dado suas restrições orçamentárias;

- As empresas buscam maximizar seus lucros;

- Os mercados são perfeitamente competitivos;

- Os recursos são escassos e a sua alocação, dentre os diversos usos possíveis, é feita

através do mecanismo de preço;

- A distribuição de renda entre os vários fatores de produção (particularmente trabalho

e capital) ocorre via o mecanismo de preço e é baseado na contribuição de cada fator à

produção.

Assim como Cantwell (1991), Ietto-Gilles (1997) classifica o Paradigma Eclético

como uma abordagem única que tenta conciliar elementos das abordagens anteriores, a

colocando no grupo, denominado por ela de abordagem eclética.

Em uma revisão das teorias de internacionalização alguns autores também se

dedicaram a escrever sobre as perspectivas para o futuro desse campo de estudo. Para Buckley

(2002) a agenda de pesquisa do campo até então se centrava em três perguntas:

(1) Explicar o fluxo de investimento estrangeiro direto;

(2) Explicar a existência, estratégia e organização das multinacionais;

(3) Entender e prever o desenvolvimento da internacionalização da firma e o novo

desenvolvimento da globalização.

Segundo o autor vários temas devem permear o futuro do campo, como as questões de

aquisição e fusão, gerência de conhecimento, geografia, localização e o impacto das

instituições como as organizações não governamentais. Além de um aprofundamento (ou

desconstrução) do conceito de globalização, sugerindo uma maior integração (ou

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fragmentação) das economias mundiais. Segundo o autor a grande questão da agenda futura,

se é que vai haver uma, ainda não está definida.

2.2 Abordagens Comportamentais da Teoria da Internacionalização

2.2.1 Introdução às Teorias Comportamentais

O surgimento das teorias comportamentais se deu em 1970, quando pesquisadores da

Universidade de Uppsala se dedicaram a estudar como as empresas suecas internalizavam

seus negócios. A introdução dessa nova linha de pensamento fez com que os estudos de

negócios internacionais deixassem de analisar os fatores puramente econômicos, e

começassem a observar o tema sob a perspectiva da Teoria do Comportamento

Organizacional (HEMAIS e HILAL, 2002).

Essa nova abordagem buscava superar as limitações das abordagens econômicas,

principalmente no que se refere ao processo de internacionalização de empresas de menor

porte (DIB, 2008). Essa linha de pensamento gerou uma série de teorias, entre elas, Chetty e

Campbell-Hunt (2004), apontam o modelo desenvolvido pela Escola de Uppsala e o Modelo

de Inovação como os mais tradicionais.

O Modelo de Uppsala é focado na aquisição, integração e uso da experiência e do

conhecimento sobre o mercado estrangeiro, e no compromisso com a alocação de recursos

nesses mercados. O comportamento da empresa seria reativo, influenciado por mudanças nas

condições internas e externas e não pelo desenvolvimento controlado de uma estratégia. Já no

Modelo de Inovação, a internacionalização é vista como uma inovação da empresa. Uma

empresa teria um ritmo lento de internacionalização quando sua diretoria fosse avessa aos

riscos e sem conhecimento suficiente do mercado estrangeiro. Esses dois modelos apresentam

o processo de internacionalização como algo gradual e por isso são muitas vezes

referenciados na literatura como “modelos de estágio” ou “modelos de etapas”. Além disso,

ambos consideram o idioma, as diferenças culturais, a baixa velocidade para transporte e

comunicação internacionais, como barreiras que atrapalham a aquisição de informações sobre

o mercado estrangeiro (DIB, 2008).

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34

2.2.2 A Escola de Uppsala

2.2.2.1 Os Antecedentes do Modelo de Uppsala

Até metade do século XX os economistas se concentravam em estudar os aspectos

macroeconômicos, não observando o que ocorria dentro das firmas. Essa realidade foi

modificada por pesquisadores como Penrose, Cyert, March e Aharoni, que procuraram

escrever sobre os fatores internos da firma (DIB, 2008).

O trabalho de Cyert e March (1992) é considerado um dos principais referenciais

teóricos do Modelo de Uppsala. Os autores afirmam que a pesquisa econômica e a pesquisa

em organizações têm pontos em comum e podem ajudar uma a outra. No processo decisório

da empresa, tanto os dados econômicos e do mercado quanto o modo de operação interno da

empresa influenciam na escolha final.

Segundo Cyert e March (1992) considerar que a firma teria um único objetivo, a

maximização do lucro, e que esta teria conhecimento perfeito do mercado, era irrealista. Mais

do que isso, a teoria vigente até então, negligenciava aspectos importantes da firma, que

teriam grande impacto nas suas decisões, como por exemplo, seus problemas de controle. Os

autores então fizeram um esforço para combinar a teoria das firmas com a teoria das

organizações. O objetivo era prever o comportamento da firma quanto às decisões envolvendo

preço, produção e alocação de recursos. Johanson e Vahlne (1977) usaram essa ideia como

base para romper com a abordagem puramente econômica que era dado ao tema da

internacionalização, incluindo aspectos comportamentais em sua teoria (DIB, 2008).

Outra influência do Modelo de Uppsala foi Penrose (1959). Uma das principais ideias

da autora é que o crescimento da firma está ligado a sua aquisição de conhecimento, que por

sua vez é baseado na cumulatividade de experiências coletivas na firma. A autora também

colocou ênfase na figura do empreendedor (DIB, 2008). Essa ideia foi transferida para o

processo de internacionalização pelos autores da escola de Uppsala.

Além dessa base teórica, o trabalho de Johanson e Vahlne (1977) foi influenciado

pelas pesquisas empíricas de Johason e Wiedersheim-Paul (1975). Sendo esse um estudo

longitudinal sobre a internacionalização de quatro empresas suecas (Sandvik, Atlas Copco,

Facit e Volvo). A principal diferença desse trabalho é que ele considera a internacionalização

da empresa desde seu começo e não apenas nos anos em que essas já eram grandes

multinacionais. Com isso, os autores puderam constatar, que o comprometimento dessas

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35

firmas com a internacionalização foi um processo gradual. Tal conclusão teria grande

influência na concepção dos modelos de estágio.

2.2.2.2 O Modelo de Uppsala

O trabalho de Johanson e Vahlne (1977) é um dos primeiros que aplica a abordagem

comportamental às questões de internacionalização. Tendo como base um estudo empírico, os

autores desenvolvem um modelo baseado na aquisição gradual, integração e uso de

conhecimento sobre mercados e operações no estrangeiro, e no aumento gradual de

comprometimento de uma firma para alocar esforços e recursos em um mercado estrangeiro.

Assim o processo de internacionalização não seria dado por uma análise de todos os

fatores macroeconômicos relevantes, resultando em uma alocação ótima de recursos e sim por

um processo incremental, levando em consideração a racionalidade limitada das empresas e

seus gestores e objetivos de redução de risco. Para os autores, a falta de conhecimento do

mercado estrangeiro é um dos principais obstáculos para o desenvolvimento de operações

nesse mercado, tal conhecimento é adquirido justamente através de operações nesse mercado.

Quanto mais uma empresa se relacionasse com um mercado estrangeiro, mais informações

teria sobre esse mercado, esse maior número de informações diminuiria suas incertezas e seus

riscos, deixando a empresa mais à vontade para assumir um compromisso ainda maior com

esse mercado, movendo assim para o próximo estágio do processo de internacionalização.

Esse processo seria iniciado quando o mercado doméstico de uma empresa estivesse

próximo da sua saturação, forçando a firma a procurar novas alternativas nos mercados

estrangeiros. Para minimizar as incertezas inerentes ao processo de internacionalização, as

firmas buscariam como seus primeiros mercados alvo, localidades que parecessem o mais

familiar possível com seu mercado doméstico.

Johanson e Vahlne (1990) propuseram o seguinte mecanismo básico de

internacionalização, esquematizado na figura2.1:

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36

Figura 2.1: Mecanismo de Internacionalização do Modelo de Uppsala

Fonte: Johanson e Vahlne (1990)

Nesse esquema as variáveis de circunstância são subdividas em conhecimento de

mercado e comprometimento com o mercado. Seguindo a ordem utilizada pelo autor

começaremos analisando o compromisso com o mercado. Essa é composta por dois fatores: o

montante de recursos comprometidos e o grau de comprometimento. O montante de recursos

é dado pelo tamanho do investimento total, incluindo não só os gastos com instalações e

máquinas, mas também os gastos com marketing, organização, pessoal e todas as demais

áreas. O grau de comprometimento mede a dificuldade em se achar um uso alternativo para

um recurso. Alguns recursos são facilmente revertidos para outros fins, ou podem ser

vendidos gerando um capital que pode ser investido em outros mercados. Quanto mais difícil

for reverter o investimento em um mercado estrangeiro maior será o nível de compromisso de

uma firma com esse mercado.

A variável “conhecimento de mercado” é importante porque decisões de se

comprometer são baseadas em alguns tipos de conhecimentos. Primeiro, ter conhecimento das

oportunidades e dos riscos é essencial para se iniciar o processo decisório. Segundo, a

avaliação das alternativas é baseada em algum conhecimento sobre aspectos relevantes do

ambiente de mercado e sobre a performance de várias atividades. Esses conhecimentos podem

ser adquiridos de duas maneiras, alguns tipos de conhecimento podem ser ensinados,

enquanto outros só podem ser obtidos através da própria experiência. Esse conhecimento que

só pode ser adquirido através das próprias experiências é fator crítico na teoria de Johanson e

Vahlne (1977), no processo de internacionalização, esse conhecimento deve ser obtido

sucessivamente através das operações no mercado estrangeiro. Outra maneira de classificar o

conhecimento é separá-los em conhecimentos gerais e conhecimentos específicos.

Conhecimentos gerais são aqueles aplicáveis à firma, independentemente de sua localização

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geográfica, enquanto os conhecimentos específicos são aqueles que versam sobre as

características singulares de um mercado nacional (seu ambiente de negócios, padrões

culturais, estrutura de mercado e características dos seus clientes).

Segundo Johanson e Vahlne (1977) dois fatores são considerados na tomada de

decisão sobre a internacionalização. Um deles é o tamanho do mercado potencial, onde,

naturalmente, quanto maior o mercado potencial maiores são os incentivos para uma

internacionalização. O outro é a “distância psíquica”, esse conceito é definido por Johanson e

Wierdersheim-Paul (1975) como:

(...) fatores impedindo ou perturbando os fluxos de informações entre os mercados.

Exemplos de tais fatores são línguas diferentes, cultura, sistemas políticos, nível de

educação, nível de desenvolvimento industrial, etc. Por razões óbvias, a distância

psíquica é correlacionada com a distância geográfica. Porém, exceções são

facilmente encontradas. Alguns países da Commonwealth britânica são bem

distantes geograficamente, por exemplo Inglaterra e Austrália, mas por diferentes

razões eles são próximos uns dos outros em termos de distância psíquica. Os Estados

Unidos e Cuba são perto um do outro geograficamente, mas, por razões políticas,

bem distantes em relação a distância psíquica. Como esses exemplos indicam,

distância psíquica não é uma constante. Ela muda por causa do desenvolvimento de

sistemas de comunicação, comércio e outros tipos de mudança social. Em geral

esperamos que a maioria das mudanças aconteça bem lentamente. (JOHANSON, J.;

WIEDERSHEIM-PAUL, F. The internationalization of the firm – four Swedish

cases. Journal of Management Studies. p. 308, 1975.)

A “distância psíquica” teria um efeito inverso na internacionalização, quanto maior a

distância psíquica menor o incentivo a internacionalização. Por isso, Johanson e Vahlne

(1977) afirmam que a ordem de seleção de países para a internacionalização seguiria uma

relação inversa com a “distância psíquica” entre o país original da empresa e os países que são

alvos potenciais para um processo de internacionalização.

Outra preposição de Johanson e Vahlne (1977) é que o processo de

internacionalização ocorreria em estágios sequencias em ordem incremental de

comprometimento de recursos. Uma empresa começaria suas atividades explorando seu

mercado doméstico, depois passaria a exportar seu produto para outros mercados, essas

primeiras exportações poderiam ocorrer de forma indireta, através de um agente. Com a

intensificação das exportações e maior contato com o mercado estrangeiro, a firma passaria

para o próximo estágio, uma subsidiária de vendas. Por fim, o processo alcançaria seu ápice

com o estabelecimento de unidades de produção no estrangeiro.

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38

2.2.2.3 Comprovações Empíricas, Críticas e Evolução do Modelo

Johason e Vahlne (1990) destacam que o Modelo de Uppsala foi empiricamente

testado para a realidade de vários países, incluindo, mas não limitado à: Suécia, Estados

Unidos, Turquia e Austrália. Tais pesquisas empíricas comprovaram a validade do Modelo de

Uppsala e consolidaram os fatores comportamentais como parte importante do processo de

internacionalização. No entanto, segundo Petersen e Pedersen (1997) uma parte importante da

teoria, a de que o processo de internacionalização se daria em estágios consecutivos com um

comprometimento incremental por parte da firma, foi muito pouco testada empiricamente. Os

poucos trabalhos teóricos que testavam essa hipótese, não conseguiram apoiá-la. Para esses

autores o modelo apresentado por Johason e Vahlne (1977), onde a firma começava o

processo de internacionalização através da exportação, passando por uma subsidiária de

vendas, até cominar na abertura de uma unidade produtiva, era restritivo demais. A trajetória

de internacionalização de uma empresa poderia continuar tendo o caráter gradualista

defendido pelo modelo, mas as etapas em si poderiam ser totalmente diversas.

Quanto à questão do gradualismo no processo de internacionalização, Johason e

Vahlne (1990) também fizeram algumas considerações. Os autores identificaram três

exceções, onde o comprometimento poderia não ser lento e gradual:

- Quando as firmas tivessem grandes recursos, as consequências de um

comprometimento de recursos seriam pequenas, então firmas grandes ou com excedente de

recursos provavelmente farão passos maiores e menos graduais em seus processos de

internacionalização;

- Quando as condições do mercado são estáveis e homogêneas, os conhecimentos

relevantes sobre o mercado podem ser obtidos de outra forma que não a experiência;

- O conhecimento obtido em um mercado muito similar pode ser generalizado para o

mercado em que se deseja atuar, evitando assim parte do processo de acúmulo de

conhecimento e acelerando o processo.

O Modelo de Uppsala sofreu outras críticas significativas, algumas delas foram

comentadas pelos próprios Johanson e Vahlne (1990). Uma delas feito por Reid, Turnbull e

Rosson (apud JOHANSON e VAHLNE, 1990, p. 14) é que o modelo seria muito

determinístico. Esses autores defendem e comprovam empiricamente que as firmas teriam a

opção de fazer escolhas estratégicas quanto ao modo de entrada e suas atividades de expansão

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no mercado estrangeiro. Johanson e Vahlne (1990) julgam o argumento válido, mas não o

consideram contrário ao modelo em si. O modelo foi um esforço consciente de se capturar um

mecanismo com forte poder de explicação sobre o amplo aspecto de manifestações do

fenômeno de internacionalização da firma. Ele pode ser entendido como um argumento de

desenvolvimento e diferenciação do modelo.

Já Forsgren (apud JOHANSON e VAHLNE, 1990, p. 14) aponta que o modelo só

seria relevante para empresas nos primeiros estágios de internacionalização, onde a falta de

conhecimento de mercado ainda é um fator limitador. Essa crítica é suportada pelo fato que a

maioria das comprovações empíricas do modelo vem de estudos que analisam os estágios

inicias da internacionalização.

Outros autores, como Hedlund e Kverneland (apud JOHANSON e VAHLNE, 1990, p.

14), acreditam, baseados em suas pesquisas empíricas, que a internacionalização se tornou um

processo tão generalizado que a falta de conhecimento de mercados estrangeiros específicos

não é mais um limitador da velocidade e do padrão dos processos de internacionalização.

Assumindo que a internacionalização dos mercados é um processo irreversível, o resultado

seria que o Modelo de Uppsala se tornaria cada vez menos válido no futuro. Aqui há uma

discordância na interpretação dos dados empíricos, que segundo Johanson e Vahlne (1990),

na verdade, comprovariam o Modelo de Uppsala.

Nordström (apud JOHANSON e VAHLNE, 1990, p. 15) também faz uma crítica ao

modelo, segundo ele o mundo está se tornando cada vez mais homogêneo, e, portanto a

importância explanatória da distância psíquica nos processos de internacionalização, estaria

declinando. Essa crítica levou os autores a repensarem o conceito de distância psíquica, em

um trabalho posterior (JOHANSON e VAHLNE, 2003) eles afirmaram que embora

originalmente o conceito fosse aplicado a distância entre duas nações, ele parece ser mais

apropriado às organizações ou até mesmo indivíduos (DIB 2008).

Outra crítica comum ao modelo é quanto a sua aplicação na indústria de serviços.

Existem alguns trabalhos empíricos que comprovam a transferência da teoria do ambiente

industrial para o de serviços e outras que a refutam (JOHANSON e VAHLNE, 1990).

Johanson e Vahlne (1990) concluem que apesar do tema de internacionalização ter

captado a atenção de muitos pesquisadores, houve poucas tentativas de desenvolvimento

conceitual. Isso aconteceria porque o tema envolve muitas tradições teóricas (teoria

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econômica, organizacional e teoria de marketing), e os pesquisadores costumam se sentir

confortáveis discutindo apenas uma dessas tradições. Assim os economistas tendem a analisar

as razões econômicas, enquanto os adeptos da abordagem comportamental analisam as

questões organizacionais, sem que ninguém integre as duas visões em uma mesma teoria.

Outro ponto defendido pelos autores é que existe a necessidade de se dar mais atenção as

questões de estratégia da internacionalização. Os autores defendem que o processo de

internacionalização é fruto de uma mistura de pensamento estratégico, ações estratégicas,

desenvolvimentos emergentes, acaso e necessidades. Então, seria proveitoso analisar a

internacionalização das firmas considerando todos esses fatores.

Posteriormente, Johanson e Vahlne (2003) adicionam um novo elemento ao modelo, o

network. Agregando a estrutura de relacionamentos de negócios como um importante meio de

obtenção de conhecimento e experiência. A introdução desse elemento torna o modelo mais

complexo, mas permite sua manutenção, já que ele parece ainda ser válido. Ao mesmo tempo

esse elemento, adiciona ao modelo novas funções que permitem entender um importante

fenômeno do mundo dos negócios moderno. O Modelo de Uppsala foi o primeiro a usar a

abordagem comportamental no campo da internacionalização. Abrindo caminho para outros

modelos que não utilizam fatores puramente econômicos para a explicação dos processos de

internacionalização, como o modelo de Networks, explorado a seguir.

2.2.3 A Perspectiva de Networks

Como o Modelo de Uppsala a perspectiva de Networks também teve sua origem

acadêmica na Europa. Segundo Johanson e Matsson (1988) as empresas estabelecem

relacionamentos de longo prazo umas com as outras. O conjunto desses relacionamentos de

longo prazo formaria o network, ou rede de relacionamento, da empresa. Os autores tentaram

mostrar como esses laços influenciariam os processos e decisões de internacionalização.

Segundo Johanson e Mattson (1988), o sistema industrial é composto por firmas

individuais que se ocupam da produção, distribuição e uso de bens e serviços. Existe uma

divisão de trabalho entre diferentes firmas, o que significa que essas firmas são dependentes

umas das outras.

Por exemplo, para se colocar um automóvel no mercado é necessária uma divisão de

trabalho entre várias firmas diferentes, como pode ser observado na figura 2.2. Uma empresa

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de mineração vende minério de ferro extraído de suas jazidas para uma siderúrgica. A

siderúrgica por sua vez transforma esse minério de ferro em aço e o vende para a uma

montadora. A montadora utiliza o aço para a fabricação do automóvel. Em seguida a

montadora vende esse automóvel para uma concessionária que o disponibiliza para o

consumidor final.1

Figura 2.2: Exemplo de Divisão do Trabalho (indústria automobilística simplificado)

Johanson e Mattson (1988) afirmam que as atividades de firmas dependentes umas das

outras teriam que ser coordenadas. Tal coordenação não é atingida através de um plano

central, uma estrutura hierárquica ou através de um mecanismo de preços como em um

modelo de negócios tradicional. Essa coordenação ocorre através de interações entre as firmas

que participam dessa rede de relacionamentos. As firmas são livres para escolher as

contrapartes que desejarem. No entanto, para ganhar acesso aos recursos externos necessários

para se atuar no mercado, uma firma tem que estabelecer uma rede de relacionamentos com

outras firmas. O estabelecimento desses relacionamentos demanda tempo e esforço. Além

disso, são necessários ajustes de qualidade ou quantidade do produto para que uma firma

possa fazer parte da rede de relacionamento da outra, esses ajustes demandam uma

coordenação entre as empresas dependentes. Essa coordenação pode ser atingida através de

planejamentos de produção conjuntos ou através do exercício de poder da parte mais forte

sobre a outra parte.

Fonte: Elaboração do Autor

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A rede de relacionamentos de uma firma seria composta por quaisquer outras firmas

com as quais a empresa construísse um relacionamento estáveis de longo prazo, incluindo,

mas não limitado a: compradores, fornecedores, parceiros e até mesmo concorrentes. A figura

2.3 mostra uma rede de relacionamentos genérica. Em uma visão mais ampla, as firmas estão

conectadas as redes uma das outras, por exemplo, o fornecedor do seu fornecedor pode fazer

parte da sua rede. É importante ressaltar que apesar da exigência de um relacionamento

estável e de longo prazo, essas redes são dinâmicas, algum novo relacionamento pode ser

estabelecido, agregando uma firma à rede. Analogamente, velhos relacionamentos podem ser

descontinuados por alguma razão, por exemplo, por ação de uma concorrente (JOHANSON e

MATTSON, 1988).

Figura 2.3: Rede de relacionamentos

Em um trabalho posterior, Johanson e Mattson (2003) identificaram três tipos de

aprendizado que seriam alcançados por uma empresa através de sua rede de relacionamentos;

(1) Em um relacionamento de cliente e fornecedor uma empresa aprenderia características

específicas do seu parceiro; (2) Interagindo com um parceiro, aprenderia habilidades

transferíveis; (3) Aprenderia como coordenar atividades dentro de um relacionamento com

outro relacionamento, aprendendo a desenvolver uma rede de relacionamentos. Em suma,

essas redes permitem que uma firma conheça as capacidades e limites umas das outras, seu

acesso a recursos e suas características comportamentais.

Segundo Johanson e Mattson (1988), todas as firmas possuem recursos essenciais para

o desenvolvimento de seus negócios, esses recursos podem ser tanto tangíveis (máquinas,

equipamentos, instalações, etc.) quanto intangíveis (capital intelectual, capital humano,

marcas registradas etc.). Esses ativos seriam necessários para as empresas executarem sua

Fonte: Elaboração do Autor

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43

produção, ações de marketing, de desenvolvimento, entre outras atividades. Alguns desses

ativos são controlados diretamente pela própria empresa, e por isso são denominados ativos

internos. No entanto, um dos pressupostos básico da teoria dos Networks é que as empresas

dependem também de recursos controlados por outras empresas, e só é possível ganhar acesso

à estes através de sua posição na rede de relacionamento. Esses ativos não seriam diretamente

controlados pela empresa, mas sim alcançados através de sua rede de relacionamento.

Considerando que o desenvolvimento de uma posição em uma rede de

relacionamentos demanda tempo e esforço, Johanson e Mattson (1988) consideram a posição

de uma empresa em uma rede de relacionamento como um ativo intangível da mesma.

Segundo Johanson e Mattson (1988) o fenômeno da internacionalização pode ser

abordado seguindo a perspectiva dos Networks. No modelo de Networks a internacionalização

de uma firma ocorre quando essa estabelece e desenvolve uma posição na rede de

relacionamentos de uma contraparte estrangeira. Isso pode ocorrer de três maneiras:

- Extensão Internacional: Através do desenvolvimento de posições em redes

estrangeiras onde até então a firma não estava presente;

- Penetração: Desenvolvendo sua posição e aumentando o comprometimento de

recursos em redes estrangeiras onde a firma já possua alguma posição;

- Integração Internacional: Aumentando o nível de coordenação entre suas posições

em diferentes redes estrangeiras;

Segundo a perspectiva dos Networks um mercado tem alto ou baixo grau de

internacionalização dependendo do número e da intensidade de relacionamentos entre

empresas nacionais e estrangeiras. Segundo este modelo, o termo “internacionalização”

significaria o aumento no número e na intensidade das relações entre empresas de diferentes

partes do mundo (JOHANSON e MATTSON, 1988).

Dib (2008) também discute a relação entre a perspectiva de Networks e a

internacionalização. A base da teoria de Networks é a ideia de que as empresas são

dependentes de recursos controlados por outras empresas, logo, a força motriz para a

internacionalização seria o desejo de se utilizar recursos, disponíveis em Networks

internacionais, para alcançar os objetivos da empresa.

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2.2.4 O Empreendedorismo Internacional

Por muitas décadas foi considerado que apenas grandes firmas multinacionais

atuariam em negócios globais. Como consequência as teorias de negócios internacionais

buscaram entender o comportamento dessas firmas. No entanto, é crescente o entendimento

de que pequenas firmas empreendedoras tem um papel relevante nos negócios internacionais.

(MITGWE, 2006).

McDougall (1989) considera o Empreendedorismo Internacional como o campo de

estudo que integra outros dois outros campos de estudo o empreendedorismo e os negócios

internacionais. A autora constata que a pesquisa em negócios internacionais realizadas até

então, assumem que a empresa estudada já existia, ignorando assim o Empreendedorismo

Internacional.

Posteriormente, Oviatt e McDougall (1994), identificaram uma série de estudos de

casos que demonstram a importância de novos empreendimentos internacionais. Em seguida,

os autores definiram novos empreendimentos internacionais como (OVIATT e

MCDOUGALL, 1994):

(...) organizações de negócios que, desde início, buscam obter vantagens

competitivas significativas através do uso de recursos e a venda de produtos em

múltiplos países. A característica que distingue essas “start-ups” é que sua origem é

internacional, como demonstrado pelo observável e significante comprometimento

de recursos (material, pessoas, investimento, tempo) em mais de uma nação. O foco

aqui é na idade da firma quando ela se torna internacional, não no seu tamanho. Em

contraste com as organizações que evoluem gradativamente de uma firma doméstica

para uma empresa multinacional, esses novos empreendimentos começam com uma

estratégia internacional proativa. No entanto, eles não necessariamente são donos de

ativos estrangeiros, em outras palavras, investimento estrangeiro direto não é um

requisito. Alianças estratégicas podem ser arranjadas para o uso de recursos

estrangeiros, tais como capacidade de manufatura e marketing (...) (OVIATT, B.

M.; MCDOUGALL, P. P. Toward a theory of international new ventures.

Journal of International Business Studies, 25/1, p.49, 1994.)

Reconhecendo os problemas em aplicar a teoria tradicional de internacionalização a

esses novos empreendimentos internacionais, Oviatt e McDougall (1994) propuseram utilizar

elementos da teoria de negócios internacionais (como análises de custo de transação,

imperfeições de mercado e internalização) incorporando-os a conceitos do campo de

empreendedorismo e de gerência estratégica. Os autores ilustraram sua teoria com o esquema

mostrado na figura 2.4:

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45

Figura 2.4:Elementos Necessários e Suficientes para um Novo Empreendimento

Internacional Sustentável

Fonte: Oviatt e McDougall (1994)

A figura começa no quadrado do canto superior esquerdo, que representa todas as

transações econômicas. Em seguida, são descritos quatro elementos necessários e suficientes

para novos empreendimentos internacionais sustentáveis, em quatro grandes flechas, que

progressivamente distinguem essas transações em subcategorias

O primeiro elemento é a “Internalização de algumas transações”. Esse elemento

distingue as transações que ocorrem dentro das organizações daqueles que são governados

pelo mercado. Organizações só existem quando houver algumas vantagens em se internalizar

algumas transações, ou seja, quando houver imperfeições de mercado. Essa condição é

necessária para qualquer tipo de organização, seja ela doméstica ou internacional; nova ou

pré-estabelecida (OVIATT e MCDOUGALL, 1994).

Nesse subgrupo de transações, denominado “Organizações”, é aplicado o segundo

elemento, “Estruturas alternativas de governança”. Esse segundo elemento segrega as

transações de firmas pré-estabelecidas daquelas associadas a novos empreendimentos. Os

novos empreendimentos optam por internalizar somente uma pequena parte dos seus recursos

essenciais, pois os mesmos não têm grandes recursos a sua disposição, o que dificulta a

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aquisição e manutenção de ativos. Empreendedores têm então que buscar novas alternativas

para controlar ativos importantes. Algumas dessas alternativas são: licenciamento, franquias e

o uso de Networks (OVIATT e MCDOUGALL, 1994).

O subgrupo de “Novos empreendimentos” é em seguida testado observando o terceiro

elemento necessário e suficiente para novos empreendimentos internacionais sustentáveis,

“Vantagem de localização no estrangeiro”. Aqui os empreendimentos domésticos são

separados daqueles com caráter internacional. As firmas se internacionalizam porque

encontram uma vantagem em transferir recursos móveis (como matéria prima, ou produtos

intermediários e etc.) de um país para ser combinado com recursos imóveis (ou menos

móveis) em outro país (DUNNING, 1988). No entanto, as empresas locais têm vantagens em

relação às estrangeiras (barreiras institucionais, culturais e linguísticas são desvantagens das

empresas estrangeiras), tradicionalmente essas desvantagens eram superadas através de

ganhos de escala. Porém, novos empreendimentos não contam com tais ganhos de escala, eles

superam as desvantagens de ser uma firma estrangeira através de conhecimento.

Conhecimento é um recurso altamente móvel, que pode ser transferido de um país para outro,

literalmente na velocidade da luz, devido os avanços nas áreas de comunicação e tecnologia.

Um exemplo destacado por Oviatt e McDougall (1994) são softwares que demoram anos para

serem desenvolvidos, mas uma vez feitos podem ser copiados e usados infinitamente à um

custo marginal insignificante.

Por fim, o grupo restante, “Novos empreendimentos Internacionais” é submetido ao

quarto, e último, dos elementos. O elemento “Recursos únicos” separa os empreendimentos

internacionais sustentáveis daqueles que provavelmente terão uma curta duração. Como a

vantagem desses novos empreendimentos são seus conhecimentos, é vital que ele não possa

ser facilmente imitável. Os novos empreendimentos têm a sua disposição algumas alternativas

para evitar tais imitações: patentes, copyrights e segredos comerciais são algumas delas

(OVIATT e MCDOUGALL, 1994).

Posteriormente alguns autores se dedicaram a estudar a figura do empreendedor e

como suas características afetam o comportamento internacional de uma empresa. Segundo

Andersson (2000) definiu o empreendedor como um indivíduo que está realizando atividades

empreendedoras. Logo, em sua definição não é relevante se o empreendedor é o fundador ou

dono de uma empresa, ele pode ser um gerente ou outro funcionário. Segundo Schumpeter

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(1934), o empreendedor seria aquele que introduz novos produtos, novos métodos de

produção, abre novos mercados, conquista novos fornecedores e reorganiza uma indústria.

Mais recentemente, o próprio termo Empreendedorismo Internacional foi atualizado

por Oviatt e McDougall (2005). Segundo os autores: “Empreendedorismo Internacional é a

descoberta, a criação, avaliação e exploração de oportunidades através das fronteiras

nacionais, para criar produtos e serviços futuros” (p. 540). Os autores também afirmam que

seria desejável uma maior colaboração no futuro entre especialistas no campo do

empreendedorismo e no campo de negócios internacionais para acelerar os estudos em

Empreendedorismo Internacional.

2.3 Born Globals

Em um estudo sobre exportadores de produtos com alto valor agregado na Austrália,

realizado enquanto trabalhava na consultoria McKinsey, Rennie (1993) notou a existência de

um número crescente de jovens pequenas e médias empresas que competiam, com sucesso,

contra grandes corporações já estabelecidas globalmente. Essas firmas não consolidaram sua

posição no mercado local antes de buscar novas oportunidades no mercado internacional, elas

nasceram global. Segundo o autor essas firmas se internacionalizaram, em média, apenas dois

anos após sua fundação e tinham grande sucesso em mercados de nicho.

Rennie (1993) nomeou essas empresas “Born Globals”. O autor então comparou o

desenvolvimento dessas empresas, vis-à-vis as empresas tradicionais, ou seja, aquelas que

tinham, depois de atingir um tamanho significativo em seu país de origem, passado por um

processo gradual e incremental de internacionalização, os resultados estão apresentados na

figura 2.5:

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48

Figura 2.5: Tipos de manufaturas de alto valor agregado

Fonte: Adaptado de Rennie (1993)

Ainda na primeira metade da década de 1990 Rennie foi capaz de prever a importância

que essas novas firmas teriam no futuro. Um reflexo dessa importância é que o estudo das

Born Globals não ficou restrito as consultorias, o tema vem recebendo atenção de vários

acadêmicos. Bell e McNaughton (2000) sintetizaram as diferenças entre as firmas tradicionais

e as Born Globals, no quadro 2.1.

Vários autores se propuseram a definir o que seria uma Born Global. Embora, as

definições sejam diferentes em alguns pontos específicos, como por exemplo, qual seria a

proporção mínima de vendas oriundas do mercado externo para uma empresa ser considerada

uma Born Global, todas possuem uma base comum. Segundo, Madsen e Servais (1997), Born

Globals são empresas que desde seu nascimento, ou logo após, têm como objetivo o mercado

internacional ou até mesmo global.

Alguns fatores proporcionaram o surgimento desses tipos de empresa. Um dos mais

importantes deles está ligado às tendências do mercado consumidor. A busca por produtos

cada vez mais especializados e customizados criou mercados de nicho. As pequenas e médias

empresas se especializam em atender as necessidades de um mercado de nicho especifico, já

que elas seriam mais dispostas a abrir mão da economia de escala adaptando seu produto as

necessidades únicas de cada cliente (RENNIE, 1994).

76

2

12

12

15

20

27

12

37

10

Propensão a exportar(% das vendas)

Idade ao iniciar a exportação(em anos)

Valor Exportado(em milhões de dólares de 1993)

Experiência em exportações(em anos)

Taxa de crescimento(%)

Empresas Tradicionais Born Globals

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49

Quadro 2.1: Diferença no Comportamento de firmas tradicionais e Born Globals

Firmas Tradicionais Born Global

Motivação para a Internacionalização

Reativo Condições adversas no mercado doméstico Gerência Relutante Custo de novo processo de produção "força" o início da exportação Puxado pela demanda (pedidos não solicitados)

Proativo Mercados Globais de Nicho Gerência Engajada Internacional desde sua concepção Busca ativamente oportunidades internacionais

Objetivos Internacionais

Crescimento / Sobrevivência da Firma Aumento do volume de vendas Ganho de market share Estender o ciclo de vida do produto

Vantagem competitiva Vantagem de "first-mover" "Locking-in" dos consumidores Penetração rápida em nichos ou segmentos globais Proteger e explorar conhecimento

Padrão de Expansão Internacional

Incremental Expansão doméstica primeiro Foco em mercado físicos, de baixa tecnologia e menos sofisticados Evidência limitada de Networks

Concorrente Expansão doméstica e de exportação quase simultâneas (exportação pode preceder atuação no mercado doméstico) Foco em mercado "de ponta" Acompanha clientes em empreitadas internacionais Forte evidência de Networks

Velocidade da Internacionalização

Lenta / Gradual Um mercado internacional de cada vez Adaptação dos produtos existentes

Rápida Múltiplos mercados por vez Desenvolvimento de novos produtos globais

Método de Distribuição / Modo de Entrada

Convencional Uso de agentes / distribuidores ou atacadistas Vendas diretas ao consumidor

Flexível Uso de agentes / distribuidores mas também evidências de integração com canais de clientes, uso de licenciamento, joint ventures, produção internacional e etc.

Estratégia Internacional

Ad-hoc e oportunista Evidências de manutenção de um comportamento reativo a oportunidade de exportação Expansão para novos consumidores e mercados não relacionados entre si

Estruturada Evidências de uma abordagem planejada para a expansão internacional Expansão da network internacional

Fonte: Adaptado de Bell e McNaugton (2000)

Rennie (1994) também destacou os avanços tecnológicos e nos sistemas de

informação. Estes possibilitam que pequenas empresas atinjam um nível de qualidade

semelhante ao das grandes corporações. Ao diminuir os ganhos de economias de escala,

fazem com que pequenas empresas pudessem competir com grandes empresas em custo.

Madsen e Servais (1997) incluíram também os avanços tecnológicos na área de transporte,

como um impulsionador do surgimento das Born Globals.

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50

Outro fator seria os avanços tecnológicos nos sistemas de comunicação. Estes fazem

com que comunicações globais não sejam mais exclusividades de empresas de grande porte.

(RENNIE, 1994).

Segundo Rennie (1994) a redução do ciclo de vida de produtos também é um dos

fatores que impulsionaram o surgimento das Born Globals. Essa redução seria uma

consequência dos avanços tecnológicos e nos sistemas de comunicação. A redução do ciclo de

vida dos produtos faz com que os mercados sejam mais dinâmicos, favorecendo empresas de

pequeno porte que tipicamente são mais flexíveis e por isso se adaptam mais rapidamente as

mudanças no mercado.

Posteriormente, Madsen e Servais (1997) destacaram a importância da evolução dos

recursos humanos. Segundo os autores, nas últimas décadas do século XX o número de

pessoas que tinham experiência internacional e/ou eram capazes de se comunicar e

desenvolver negócios em países estrangeiros aumentou consideravelmente. Foi desenvolvida

assim a geração de empreendedores que iniciou o fenômeno das Born Globals.

Ainda segundo Rennie (1994), o fenômeno das Born Globals não é específico de

nenhum setor. O estudo encontrou empresas Born Globals até mesmo industrias mesmo

industrias consideradas em declínio. Madsen e Servais (1997) embora concordem que o

fenômeno ocorre em múltiplas industrias, reconheceram que o mesmo é concentrado em

setores de alta tecnologia.

As grandes diferenças, no comportamento e no processo de internacionalização, entre

as Born Globals e as empresas tradicionais (quadro 2.1) fazem com que as políticas públicas

tenham que ser revistas para suportar o crescimento desse novo tipo de firma. Segundo Bell e

McNaughton (2000), firmas tradicionais necessitam de estímulos para iniciar ou aumentar seu

nível de comprometimento com o comércio internacional. Porém, devido ao caráter proativo

das Born Globals em relação ao tema o valor desses programas de estímulo à exportação é

questionável. O que não significa que organizações de incentivo à exportação não tenham seu

papel em dar suporte as Born Globals, pelo contrário os autores destacam que devido o ritmo

acelerado de internacionalização dessas empresas elas demandam níveis maiores de

assistência. Além das organizações de incentivo à exportação, as Born Globals necessitam de

uma maior colaboração de outras agências de suporte a inovação.

Page 51: O Processo de Internacionalização de uma Multinacional ... · Internacional e Born Globals. ... 14 1.1 Definição do Problema ..... ... 4. DESCRIÇÃO DO CASO ...

51

Ainda segundo Bell e McNaughton, uma das funções das organizações de incentivo à

exportação, no contexto introduzido pelas Born Globals, é ser uma fonte de “inteligência de

mercado” para essas empresas, e também direcioná-las para fontes secundárias de

informações. Além de ajudar as firmas a desenvolverem relacionamentos com empresas

internacionais e a acessar Networks internacionais através de outras empresas do mercado

doméstico.

Apesar das grandes diferenças entre o comportamento de empresas tradicionais e de

Born Globals (quadro 2.1), pode haver firmas que iniciam seu processo de

internacionalização como as empresas tradicionais o fazem, mas em um segundo momento

adotam características típicas das Born Globals. Chetty e Campbell-Hunt (2004) observaram

a existência de empresas na Nova Zelândia que iniciavam seu processo de internacionalização

de maneira tradicional, entrando no mercado vizinho, a Austrália. Porém, o desenvolvimento

posterior de sua empreitada internacional, obedecia o previsto no modelo das Born Globals.

Essas firmas eram levadas a entrar múltiplos mercados estrangeiros simultaneamente para

rapidamente se aproveitar de um produto inovador, se focavam em um nicho do mercado

global e usavam extensivamente Networks.

A maioria dos estudos empíricos sobre Born Globals foi conduzida em países

desenvolvidos. Em um dos estudos que testa o fenômeno no contexto de um país emergente,

Dib, Rocha e Silva (2010) identificaram três conjuntos de variáveis que, de acordo com a

literatura, parecem explicar porque uma firma segue a estratégia de internacionalização típica

das Born Globals, em detrimento das estratégias seguidas por empresas tradicionais. Os

conjuntos de variáveis descritos no quadro 2.2.

Quadro 2.2: Variáveis e Sub-Variáveis do Modelo

Variáveis relativas a Firma Variáveis relativas a Networks Variáveis relativas ao empreendedor

Ativos intangíveis únicos Uso de parcerias Orientação internacional

Capacidade de Inovação Uso de redes de negócios Experiência internacional

Especialização ou Foco Inserção em "Clusters" Educação internacional

Orientação para o consumidor Tolerância ao risco

Diferenciação de produto "Know-how" técnico

Vantagens tecnológicas

Uso de TI

Fonte: Dib, Rocha e Silva (2010)

Em seguida foi formulada a hipótese de que as variáveis relativas a firma, network e

ao empreendedor, eram associadas com o tipo de estratégia de internacionalização utilizado

Page 52: O Processo de Internacionalização de uma Multinacional ... · Internacional e Born Globals. ... 14 1.1 Definição do Problema ..... ... 4. DESCRIÇÃO DO CASO ...

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pela empresa alvo da pesquisa (Born Global ou tradicional). Regressões logísticas binárias

foram usadas para testar as hipóteses formuladas. As empresas testadas foram 79 produtoras

de software brasileiras, das quais 35 seguiram o processo de internacionalização típico das

Born Globals e 44 seguiram o processo tradicional (DIB, ROCHA e SILVA, 2010).

O estudo sugere que as Born Globals foram mais inovadoras, mais orientadas ao

consumidor, seus empreendedores tinham um conhecimento técnico maior e eram mais

sensíveis em relação ao risco associados às operações em um mercado internacional do que as

empresas que apresentam um processo de internacionalização gradual (tradicional). Esse

resultado é coerente com a literatura teórica sobre o tema. No entanto, as outras variáveis

testadas não apresentaram diferenças significativas entre os dois tipos de empresa

pesquisados. Os autores ressalvam que algumas características históricas do Brasil podem ter

influenciado os resultados. Principalmente, o fechamento econômico que vigorou até a década

de 1990, que pode ter impedido que algumas firmas entrassem mais cedo em mercados

estrangeiros. Essas firmas talvez tivessem características de Born Globals, mas por causa das

barreiras institucionais encontradas no país foram impedidas de expandir rapidamente para

mercados estrangeiros. Esse ambiente singular pode ter obscurecido as diferenças entre os

dois grupos (DIB, ROCHA e SILVA, 2010).

2.4 Sumário das Teorias de Internacionalização

Esse capítulo buscou abordar algumas das principais teorias de internacionalizações

apresentando tanto a abordagem econômica quanto abordagem comportamental, além do

fenômeno das Born Globals, que parece não se adequar a nenhum modelo tradicional de

internacionalização. Algumas teorias econômicas como os modelos de comércio

internacional, as teorias de portfólio de investimentos e o modelo de ciclo de vida, foram

intencionalmente não estudados por apresentar menor relevância no escopo desse trabalho.

A fim de sumarizar as teorias apresentadas o quadro 2.3 apresenta um resumo de cada

uma das teorias.

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Quadro 2.3: Sumário das Teorias de Internacionalização Apresentadas

Teoria Descrição

Teoria do Poder de Mercado

Essa teoria desenvolvida por Hymer (1960) defende que em um primeiro momento as empresas buscam aumentar sua participação em seu mercado doméstico, através do aumento de sua capacidade produtiva, fusões e aquisições. Com o passar do tempo aumentar seu poder no mercado doméstico ficaria mais e mais difícil devido a concentração do mesmo. Nesse momento a empresa decidiria então usar os lucros obtidos em seu mercado doméstico para financiar a entrada em um mercado estrangeiro, aonde ela repetiria o processo de conquista e concentração do mercado.

Internalização

Proposta por Buckley e Casson (1976), segundo essa teoria as empresas contam com duas formas de obter produtos intermediários: (1) Buscando no mercado tal produto ou (2) internalizando sua produção. Uma ou outra forma seria mais eficiente dependendo dos custos de transação envolvidos, e é justamente buscando uma maior eficiência, através da redução de custos ou de riscos, que as firmas se internacionalizariam.

Paradigma Eclético

Segundo essa teoria, desenvolvida por Dunning (1977), as empresas se internacionalizariam para explorar ou desenvolver uma vantagem de propriedade. Uma empresa se internacionalizaria para uma localidade em que acredita ter uma vantagem sobre as empresas locais, e onde é mais vantajoso utilizar tal vantagem internamente do que vendê-la no mercado (através de um licenciamento, por exemplo). Alternativamente, outro motivo para a internacionalização seria a busca por uma vantagem de propriedade, por tanto uma empresa poderia entrar em um mercado estrangeiro buscando acesso a uma determinada tecnologia ou a um novo mercado consumidor.

Modelo de Uppsala

Originado na Universidade de Uppsala esse modelo defende que o processo de internacionalização ocorre em estágios sequenciais com gradual aumento de comprometimento da empresa. A princípio as empresas têm poucas informações sobre o mercado estrangeiro e por isso optam por modos de entradas que exigem menor comprometimento, como a exportação de mercadorias, conforme a empresa adquire mais conhecimento sobre o mercado ela aumento seu grau comprometimento, chegando até o investimento produtivo direto. Ainda segundo a teoria as empresas escolhem entrar primeiro em países que ela considera similar a seu país de origem, ou sejam que apresentam uma menor distância psíquica.

Networks

Essa perspectiva considera que os mercados são compostos por redes de relacionamento entre as empresas. Uma firma se engajaria no processo de internacionalização para acessar uma nova rede de relacionamento internacional ou para seguir alguma firma em sua rede de relacionamento local.

Empreendedorismo Internacional

Diferente das teorias tradicionais que assumem que as empresas foram fundadas bem antes da sua internacionalização, essa teoria proposta por McDougall (1989) analisa o processo de internacionalização de firmas jovens e de startups. A figura do empreendedor e sua experiência internacional são os principais fatores que levam uma empresa a se internacionalizar nessa teoria.

Born Globals

Rennie (1993) foi o primeiro a notar a existência de um novo tipo de firma, que já são concebidas com o objetivo de alcançar mercados internacionais. Essas empresas normalmente atuam em um mercado de nicho com abrangência global.

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Carneiro e Dib (2007) apresentam uma maneira interessante de resumir os principais

aspectos de uma data teoria, os autores propõem que “as principais dúvidas acerca do

processo de internacionalização de empresas sejam sintetizadas em cinco questões básicas:

por quê, o quê, quando, onde e como as empresas internacionalizam” (CARNEIRO e DIB,

2007, pág.5). O quadro 2.4, abaixo, procura responder essas questões para as teorias descritas

nesse trabalho. Em “por quê” encontramos os motivos, justificativas e condições que levam

ao processo de internacionalização. Em “o quê” tentamos entender o alvo do processo, sejam

produtos, serviços, tecnologias ou outras atividades. “Quando” abrange em qual momento o

processo se inicia, assim como sua progressão posterior. “Onde” busca entender o país ou

região escolhido. E finalmente, “como” aborda o modo de entrada, o grau de controle e o

modo de operação.

Quadro 2.4: Respostas das Teorias às Questões Básicas da Internacionalização

Por quê? O quê? Quando? Onde? Como?

Poder de Mercado

Busca de novos mercados. Otimizar recursos, competências ou explorar imperfeições nos mercados.

Não especificado. É implícito que tanto produtos e serviços podem ser alvos do processo de internacionalização.

Conforme surgisse uma oportunidade de consolidar sua posição de monopólio no país de origem ou quando fosse necessário buscar novos mercados

Localidades passíveis de conluio e concentração de mercado.

Investimento estrangeiro direto, com controle da operação no estrangeiro ou exportação.

Internalização

Garantir a eficiência e a redução de riscos de fazer negócios com terceiros no exterior.

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

Quando o custo de se produzir o recurso internamente no estrangeiro fosse menor do que obtê-lo no mercado.

Onde houver a possibilidade de maximização de lucros.

Existe um modo ótimo de entrada (controle, licenciamento, sub-contratação, etc) dependendo da configuração dos custos de transação do mercado.

Paradigma Eclético

Explorar ou desenvolver vantagens de propriedade, como por exemplo: redução de custo, acesso a mercados consumidores ou a tecnologias.

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

Quando a firma desejasse alcançar uma vantagem de localização presente em um país estrangeiro, para maximizar seu lucro ou por questões estratégicas.

Onde houver vantagens de localização, como incentivos fiscais ou amplo mercado consumidor.

Exportação, licenciamento ou investimento direto, dependendo de qual opção apresentasse maiores vantagens de propriedade, localização e internalização.

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Por quê? O quê? Quando? Onde? Como?

Modelo de Uppsala

Busca de novos mercados

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

O processo se iniciaria quando o mercado doméstico estivesse saturado e expandiria conforme a empresa aumentasse seu conhecimento do mercado estrangeiro.

Os países seriam escolhidos em uma sequência inversamente proporcional a distância psíquica em relação ao mercado doméstico.

Em estágios de comprometimento gradual, iniciando-se pela exportação, evoluindo para a presença via um escritório de vendas e culminando no estabelecimento de uma unidade produtiva.

Networks

Desenvolver relacionamentos em redes internacionais ou seguir participantes de sua rede local.

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

Quando algum participante de sua rede local de relacionamento solicita ou quando a empresa deseja desenvolver uma posição em uma rede estrangeira.

Países onde a empresa tem interesse em desenvolver uma rede de relacionamento ou países onde as firmas que fazem parte de sua rede doméstica possuem operações.

Depende do grau de internacionalização da própria firma.

Empreendedorismo Internacional

Procura de novos mercados ou por uma restruturação da indústria.

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

Quando o empreendedor achar adequado.

Onde houver demanda potencial ou oportunidades de restruturação.

Via exportação, licenciamento, criação de novos canais e, até mesmo, fusões e aquisições.

Born Globals

As empresas nascem com o objetivo de alcançar o mercado global, muitas vezes desejam explorar mercados de nicho globais ou obter as vantagens de "first-mover"

Não especificado. Entende-se que o escopo seja amplo incluindo produtos, serviços e tecnologias.

No momento ou logo após sua fundação. Inclusive a exportação pode preceder a atuação no mercado doméstico.

Múltiplos mercado internacionais são explorados simultaneamente. Forte evidência do uso de Networks para alcançar os mercados estrangeiros.

Bastante flexível com o uso de agentes, distribuidores, integração com o canal dos clientes, uso de joint ventures, produção internacional e etc.

Fonte: Adaptado de Carneiro e Dib (2007)

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3. DISCUSSÃO DO MÉTODO

Este capítulo aborda o método de pesquisa utilizada no estudo. Inicia-se com a

definição das perguntas de pesquisa e a escolha do melhor método para alcançar os objetivos

da pesquisa. Em seguida são apresentados os procedimentos metodológicos e as críticas ao

método escolhido, que permitiram apontar as principais limitações do trabalho.

3.1 Questões de Pesquisa

A definição da pergunta é fundamental para o sucesso de uma pesquisa. Segundo Yin

(1988) a forma como ela é elaborada fornece um melhor caminho para a execução da

pesquisa, já que alguns tipos de método se adequam melhor a determinados tipos de pergunta.

A pergunta deve apresentar ainda a substância da pesquisa, ou seja, sobre o que ele trata.

O objetivo da pesquisa descrita nesta dissertação foi, a partir do caso de uma das

maiores e mais internacionalizadas empresas brasileiras, analisar desde seu processo de

internacionalização até sua atual configuração internacional sobre a ótica das principais

teorias sobre internacionalização de empresas.

Assim a pergunta principal do estudo foi: “Como o processo de internacionalização e a

atuação internacional da Vale podem ser analisados à luz das principais teorias sobre

internacionalização de empresas?”

As principais teorias contempladas na análise do caso foram: Poder de Mercado,

Internalização, Paradigma Eclético, Modelo de Uppsala, Networks, Empreendedorismo

Internacional e Born Globals, todas devidamente apresentadas no próximo capítulo.

Da pergunta principal da pesquisa, foi possível extrair perguntas secundárias que

também orientaram a pesquisa e coleta de dados, são elas:

- Qual teoria melhor explicaria o processo de internacionalização da Vale?

- Quais são os fatores que contribuem para que uma teoria se afaste ou se aproxime de

fornecer uma melhor explicação para o processo de internacionalização e a atuação

internacional da Vale?

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57

3.2 Método de Pesquisa

Segundo Campomar (1991) o método científico foi a forma encontrada pela sociedade

para legitimar o conhecimento empiricamente adquirido, podendo este ser divido em duas

categorias:

- Métodos Quantitativos: Tem como objetivo encontrar medidas e indicadores

mensuráveis através da análise estatística de dados.

- Métodos Qualitativos: Busca entender motivações e percepções dos elementos que

fazem parte da pesquisa, fazendo uma análise mais profunda destes.

Além dessa divisão na forma, alguns autores se concentraram em diferenciar os

estudos segundo seus objetivos. Selltiz (1975) resumiu os possíveis objetivos de uma

pesquisa:

- Familiarização com um fenômeno, levantando ou não hipóteses ou problemas

pesquisáveis no futuro;

- Descrição de uma situação ou de um grupo de indivíduos;

- Verificação da frequência de ocorrência de determinado evento, ou ainda, a

frequência com a qual determinado evento estaria ligado a um outro evento;

-Verificação de uma hipótese de relação causal entre diferentes variáveis

Yin (1988) também se dedicou a explorar os diferentes objetivos que um estudo

poderia assumir. Segundo o autor os estudos poderiam ter objetivos exploratórios, descritivos

ou explanatórios. Além do objetivo, o autor enumerou e descreveu as possíveis estratégias que

poderiam ser empregadas: Experimento, questionários (survey), análise de dados históricos,

análise da história e estudos de caso. A escolha de uma estratégia em detrimento a outra

dependeria de três fatores, o tipo de pergunta, o controle sobre os eventos e se a questão era

contemporânea. O quadro 3.1, na próxima página, resume a estratégia mais adequada para

cada um desses fatores.

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Quadro 3.1: Situações Relevantes para Escolha da Estratégia de Pesquisa

Método Tipo de Pergunta Controle Sobre

Eventos Questões

Contemporâneas

Experimento Como, Por que Sim Sim

Pesquisa (Survey) Quem, Qual, Onde Não Sim

Análise de Dados Históricos

Quem, Qual, Onde Não Sim / Não

Análise Histórica Como, Por que Não Não

Estudo de Caso Como, Por que Não Sim

Fonte: Adaptado de Yin (1988)

Como base no descrito por Yin (1988) a pesquisa apresentada nesta dissertação tem

uma pergunta do tipo “Como, Por que”, já que busca entender como se deu o processo de

internacionalização da Vale e por que a companhia se engajou em tal tarefa para

posteriormente comparar com o que as principais teorias da área. Assim sendo, as opções

disponíveis seriam um experimento, análise histórica ou estudo de caso.

Como pode ser verificado no quadro 3.1, os experimentos são destinados para

situações onde o pesquisador tenha controle dos eventos, podendo de alguma maneira replicá-

los para analisa-los. No caso da internacionalização da Vale isso seria impossível.

Restando as opções análise histórica e estudo de caso. Yin (1988) ressaltou que a

análise histórica lida com eventos no passado, onde não há a possibilidade de entrevistar

pessoas que testemunharam ou tiveram um papel relevante nos eventos pesquisados, fazendo

com que a pesquisa se baseie em documentos históricos. No caso da Vale, os processos de

internacionalização ainda estão ocorrendo, e mesmo para aqueles eventos já encerrados, no

passado, há a possibilidade de entrevistar testemunhas e pessoas com papeis relevantes nos

mesmo.

O estudo de caso utiliza a observação direta dos acontecimentos e entrevista com

pessoas envolvidas, mas também análises históricas. Ou seja, a principal diferença entre os

estudos de caso e a análise histórica é a capacidade da primeira estratégia de lidar com uma

variedade mais ampla de evidências. Todos esses fatos apontam que a melhor estratégia para

o estudo alcançar os objetivos definidos é um estudo de caso. Resumindo as pesquisas quando

o estudo de casos, constitui o melhor método de pesquisa:

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“Geralmente estudos de casos são a estratégia preferida quando questões do tipo

“como” e “por quê” estão sendo feitas, quando o investigador possui pouco controle

sobre os eventos e quando o foco está sobre um fenômeno comteporâneo num

contexto de vida real” (YIN, R. K. Case Study Research: Design and Methods.

Londres: SAGE Publications, p.13, 1988.)

Yin (1988) também distinguiu estudos de casos múltiplos, onde mais de uma empresa

é observada, e estudos de caso simples, onde somente uma empresa é analisada. Pela própria

proposta desta pesquisa, de analisar a aderência e divergências de várias teorias ao caso de

uma empresa multinacional brasileira, o método utilizado foi um estudo de caso simples.

3.3 Procedimentos Metodológicos

Definido a pergunta de pesquisa e o método de pesquisa, passamos às questões de

operacionalização da pesquisa. Determinando as proposições usadas no estudo, seleção do

caso, a unidade de análise do caso e os procedimentos de coleta de dados.

3.3.1 Proposições

A partir da revisão da bibliografia sobre as teorias de internacionalização foram

estabelecidas proposições para investigar a aderência ou divergência entre o caso da Vale e as

citadas teorias. Como descrito por Yin (1988) as proposições apontam para os fatores que

foram estudados nessa pesquisa. A verificação dessas proposições será a base para a resposta

da nossa pergunta de pesquisa.

O quadro 3.2, na próxima página, apresenta as proposições utilizadas no presente estudo:

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Quadro 3.2: Proposições do Estudo

Proposição Referência Empresas se internacionalizam para remover um competidor

potencial e se apropriar integralmente dos retornos de certa

habilidade desenvolvida no país natal

Hymer (1960)

O processo de internacionalização tem início quando o mercado local

está em uma situação difícil

Hymer (1960) e Johanson e

Vahlne (1977)

Empresas se internacionalizam buscando internalizar a obtenção de

algum produto ou serviço intermediário, e assim, aumentar sua

eficiência

Buckley e Casson (1976)

As vantagens de localização são fatores fundamentais para uma

empresa decidir se deve se internacionalizar para um país

Dunning (1977)

Empresas se internacionalizam quando acreditam que possuem uma

vantagem em relações as empresas locais

Dunning (1977)

A busca por um recurso natural é um dos motivos que leva uma

empresa ao investimento estrangeiro direto

Dunning (1977)

Proteger ou aumentar suas vantagens de propriedade, assim como,

eliminar ou reduzir as vantagens de propriedade de suas concorrentes

é um dos motivos que leva uma empresa a efetuar um investimento

estrangeiro direto

Dunning (1977)

O comprometimento com mercados estrangeiros é gradual,

aumentando conforme as empresas ganham informações sobre tais

mercados

Johanson e Vahlne (1977)

A internacionalização para um país pode acelerar a

internacionalização para outra, fazendo com que ela seja menos

gradual

Johanson e Vahlne (1977)

Quanto menor a reversibilidade de um ativo o estrangeiro, maior o

comprometimento da empresa com aquele mercado

Johanson e Vahlne (1977)

Empresas são "puxadas" a se internacionalizar por outras empresas da

sua rede de relacionamento (fornecedores, clientes, parceiros...)

Johanson e Mattson (1988)

A figura do empreendedor é fundamental nos processos de

internacionalização de empresas

Anderson (2000)

Existe um novo tipo de empresa, que desde sua fundação busca a

internacionalização. Essas empresas buscam o mercado de

internacional proativamente, se internacionalizando rapidamente e

atingindo múltiplos mercados simultaneamente.

Rennie (1993)

3.3.2 Seleção do Caso

O estudo de caso não segue uma lógica amostral, assim não há necessidade de

aleatoriedade no processo de escolha da(s) empresa(s) analisada(s), podendo o pesquisador

escolher o caso que deseja apresentar de acordo com seus objetivos (YIN, 1988). Baseado

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61

nessa premissa iniciou-se o processo de definição da empresa que seria tema do estudo de

caso.

Primeiramente foi necessário optar entre um estudo de caso único ou múltiplos casos.

Sendo o objetivo do trabalhar comparar o caso de internacionalização de uma empresa

multinacional brasileira com várias teorias do tema, foi julgado ser mais apropriado focar em

uma única empresa devido ao grande número de teorias que seriam abordadas. Além das

dificuldades práticas da realização de um estudo de múltiplos casos, o estudo de caso único

possui vantagens como as apontadas por Zanni, De Moraes e Mariotto (2011). Segundo os

autores, estudos de casos únicos permitem gerar insights mais valiosos, já que o foco em um

caso permite uma visão particular, mais profunda, levando a compreensão mais valiosa dos

fenômenos e circunstâncias do que ocorre na comparação de dois casos ou mais. Os estudos

de casos únicos também servem para preencher a lacuna de especificidade deixada pelos

estudos que buscam generalização empírica.

Em seguida, era necessário escolher qual empresa seria tema do caso, observando a

exigência inicial de se tratar de uma multinacional brasileira. Outra característica desejada é

que fosse uma empresa de grande porte e com alto grau de internacionalização. Para a

adequação aos requisitos desejados foram observadas duas fontes de informações:

- A lista das maiores empresas brasileiras, pelo critério de maior receita líquida,

divulgada pelo jornal Valor Econômico, com dados de 2011 (parte da lista é reproduzida no

quadro 3.3)

Quadro 3.3: Maiores Empresas do Brasil

Posição Empresa Receita Líquida em 2011 (R$

milhões)

1 Petrobras 244.176,00

2 Vale 103.195,00

3 JBS 61.796,80

4 Ultra 48.661,30

5 Pão de Açúcar 46.594,50

6 Gerdau 35.406,80

7 Braskem 33.176,20

8 Eletrobras 29.532,70

9 Telefônica Brasil 29.128,70

10 Oi 27.907,00

11 AmBev 27.127,00

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62

12 BRF Brasil Foods 25.706,20

13 Carrefour 24.899,70

14 Cosan 24.096,90

15 Volkswagen 24.001,10

Fonte: Jornal Valor Econômico

(http://www.valor.com.br/empresas/2801254/ranking-das-1000-maiores

Acessado em 29/08/2013)

- O ranking das empresas brasileiras com maior presença no exterior divulgado pela

Fundação Dom Cabral, segundo o índice de transnacionalidade. Para empresas que atuam no

exterior a partir de unidades próprias o índice é calculado conforme a fórmula abaixo (parte

da lista é reproduzida no quadro 3.4):

Ativos no Exterior

+

Receitas no Exterior

+

Funcionários no Exterior

Ativos totais Receitas Totais Funcionários Totais

3

Quadro 3.4: Empresas Brasileiras com maior Índice de Transnacionalidade

Posição Empresa Índice de

Transnacionalidade

1 JBS 0,589

2 Gerdau 0,542

3 Stefanini 0,496

4 Magnesita Refratários 0,457

5 Marfrig Alimentos 0,433

6 Metalfrio 0,427

7 Ibope 0,364

8 Odebrecht 0,349

9 Sabó 0,333

10 Minerva Foods 0,32

11 Tigre 0,306

12 Vale 0,283

13 Weg 0,28

14 Suzano 0,271

15 BRF 0,271

Fonte: Fundação Dom Cabral

(http://www.fdc.org.br/imprensa/Documents/2013/ranking_multinacionais_brasileiras2013.pdf

Acessado em 08/10/2013)

O cruzamento dessas duas fontes de informação resultou em uma lista de empresas

desejadas, a escolha final da Vale, como objeto do estudo, derivou da conveniência

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63

geográfica, existente de um contato inicial com executivos da empresa, disponibilidade de

dados e atratividade do setor produtivo da empresa. A Vale ainda é a empresa brasileira mais

internacionalizada, no critério números de países com atuação através de subsidiárias. Ao

todo a Vale possui subsidiárias em 31 países.

3.3.3 Unidade de Análise

A unidade de análise delimita o que é o caso, ou seja, aquilo que os pesquisadores se

propõem a pesquisar, e está diretamente relacionada com a pergunta de pesquisa e

preposições do estudo (YIN, 1988). Também limita o que constitui o caso, focando o

pesquisador nos fatores relevantes e assim impedindo a coleta e análise de informações

desnecessárias.

Yin (1988) também descreveu a possibilidade de subunidades de análise, que dão a

oportunidade de uma análise mais profunda, reforçando descobertas e explicações do

fenômeno. Podemos apontar a Vale como um todo como a unidade de análise e as áreas

internacionais da Vale como nossa subunidade.

3.3.4 Coleta de Dados

O método de estudo de caso, permite a coleta de dados em diferentes fontes, podendo

ser utilizadas, entrevistas, publicações, e informações de bancos de dados, além de outras

observações (YIN, 1988). A utilização de múltiplas fontes de dados permite a triangulação

das informações, ou seja, a confirmação e verificação dos dados presentes nas diferentes

fontes, além de dar uma visão mais ampla do objeto de estudo.

No presente trabalho a técnica predominante foram entrevistas em profundidade com

roteiros semiestruturado (APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA). A escolha desse

tipo de roteiro foi feita visando dar liberdade aos entrevistados para compartilhar dados e

informações não previsto na confecção do roteiro ou ainda para possibilitar o aprofundamento

de questões secundárias que surgissem conforme as questões principais fossem sendo

respondidas.

Os entrevistados na pesquisa são ou foram executivos da Vale, dois deles pediram

explicitamente para não serem identificados, Respeitando o desejo dos entrevistados

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resolvemos então, suprimir o nome dos três e ainda generalizar os cargos daqueles que

pediram que suas entendidas fossem suprimidas. Os três entrevistados foram:

- Um atual diretor da Vale, tendo atuado nas áreas Iniciativas Estratégicas e de

Governança e Gestão da Mudança, na sede da empresa no Rio de Janeiro.

- Um ex diretor com longa história na Vale, tendo atuando nas áreas de Serviços

Compartilhados e Planejamento Logístico entre outros. Esse ex-diretor teve papel ativo em

vários processos de internacionalização, inclusive na compra da Inco, maior movimento de

internacionalização da Vale.

- Um atual diretor, tendo atuado nas áreas de serviço compartilhado e finanças de uma

das operações internacionais da Vale. O executivo se encontra expatriado em um dos

escritórios internacionais da Vale.

As entrevistas juntas tiveram uma duração de aproximadamente três horas e duas delas

puderem ser gravadas com o consentimento do entrevistado.

Além das entrevistas foram utilizadas diversas fontes de dados secundárias tais como

jornais, revistas e estudos de casos prévios sobre a empresa. Também foram utilizadas as

fontes de comunicação oficiais da Vale, site da empresa, comunicados a impressa e relatórios

financeiros e ambientais.

3.4 Críticas ao Método de Estudo de Caso e Limitações do Estudo

Uma vez estabelecido o estudo de caso como método de pesquisa a ser aplicado para

conclusão dos objetivos desse estudo, é importante ressaltar algumas críticas que esse método

encontra, para entendermos não só os ganhos, mas também as limitações da escolha deste.

Good e Hatt (1975) questionam a abordagem intuitiva do método, apoiado apenas na

observação e sem um plano adequado de análise. Também comentam sobre a influência do

ponto de vista pessoal do autor nas inferências retiradas do caso. Segundo o próprio autor a

maneira de evitar esses problemas é traçar um plano de pesquisa e segui-lo, além de buscar a

triangulação dos dados.

Yin (1988) admite que uma das principais críticas ao método é sua pouca estruturação

e falta de rigor metodológico. No entanto, ressalto que esses mesmo problemas assolam

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outros métodos de pesquisa. A influência do ponto de visto do pesquisador, por exemplo, é

um problema existente em qualquer método de pesquisa, tanto qualitativos como

quantitativos.

Outra crítica recorrente ao método citada por Yin (1988) é a falta de base para a

generalização. O autor concorda com a crítica, estudos de caso não podem ser generalizados

para populações, nem mostram a frequência de determinado evento, porém continua válido e

relevante, pois oferece a possibilidade de expandir e generalizar teorias. Com isso o método

não possibilita uma generalização estatística, mas sim uma generalização analítica.

“O método de estudo de caso não permite generalizações para o universo, a não ser

sob condições específicas, e restritas. Assim, a partir do que encontramos em um

pequeno número de casos não podemos fazer inferências quanto à frequência com

que os fenômenos estudados ocorrem na população. (Podemos, entretanto, afirmar

que determinado tipo de fenômeno (...) pode ocorrer em circunstâncias semelhantes

à(s) do(s) caso(s) estudado(s).)”( ROCHA, A. Estutura básica para o capítulo de

metodologia em teses com base em estudos de caso. Rio de Janeiro, Coppead, p.3,

sem data)

O tempo e recursos necessários para a realização de um estudo de caso também são

frequentemente discutidos. Segundo Yin (1988), diferentes tipos de estudo de casos diferem

muito na quantidade de tempo e recursos necessários a sua realização. Alguns exigem

observações participativas, que geralmente consumem muito tempo e recursos, enquanto

outros podem ser realizados somente com informações secundárias.

Em suma, os estudos de caso recebem críticas, assim como qualquer outra

metodologia de pesquisa, algumas delas com ampla aceitação acadêmica. Assim, como

defendido por Yin (1988), não pode ser considerado como um método informal, sem técnicas

que garantam a qualidade dos dados e das análises obtidas através desses.

O entendimento das críticas feitas ao método de estudo de caso, ajudam a traçar as

limitações do presente trabalho, assim como desenvolver estratégias para mitiga-las. São

limitações dessa pesquisa:

- A presença de viés na análise do pesquisador, dado que o método do caso é uma

abordagem intuitiva baseada na observação participante;

- A presença de viés dos informantes da pesquisa, tanto os entrevistados como as

matérias de jornais e revistas e até as fontes oficiais da companhia estão sujeitas a vieses, a

percepção dos mesmos pode não refletir fielmente a realidade. Como esses são usados como

fonte de dados para as pesquisas, seus vieses são transmitidos a mesma;

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66

- Impossibilidade de generalização para uma população.

Para minimizar a influência dos vieses foram usadas múltiplas fontes de dados e

entrevistas com mais de uma pessoa, essa triangulação, permite o descarte de algumas das

informações enviesadas.

Não é o objetivo deste estudo fazer quaisquer generalizações para uma população.

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4. DESCRIÇÃO DO CASO

O objetivo desse capítulo é apresentar a história da companhia objeto do estudo, a

Vale. Para isso foram utilizadas as fontes oficiais da companhia e reportagens de jornais e

revistas, assim como referência aos autores que se dedicaram ao estudo da mesma. Embora o

foco sejam os movimentos de internacionalização da empresa, outros temas são abordados,

uma vez que são importantes para contextualizar e traçar um panorama da situação

empresarial da companhia.

Por questões didáticas, a história da companhia foi dividida em quatro partes. A seção

4.1.1, traz a história da fundação da Vale, quais foram os objetivos do seu estabelecimento,

assim como o contexto em que a companhia foi criada. Essa análise se mostra fundamental

para entendermos o comportamento da companhia na época em que a mesma era uma

empresa estatal, esse período de sua história é abordado na seção 4.1.2. Por ter um profundo

impacto no comportamento que a companhia adotaria nos anos seguintes, a privatização da

mesma, recebe uma seção, a 4.1.3, dedicada somente a ela. As duas seções seguintes tratam

dos anos da empresa sob a administração privada. Na seção 4.1.4 são analisados os anos

desde a privatização até a crise de 2008 e na seção 4.1.5 os anos a partir da crise até os dias

atuais. A crise de 2008 foi escolhida como divisora entre as seções pela sua importância

mundial na econômica, mas principalmente porque marcou uma mudança no comportamento

empresarial da Vale, sobretudo na sua estratégia de internacionalização.

4.1 A História da Vale

4.1.1 Fundação

A região de Itabira no Estado de Minas Gerais atraiu desde cedo a atividade

mineradora. Acreditava-se que a região conhecida como Pico do Cauê concentrava uma

grande quantidade de ouro. A crença da existência desse minério na região aparece no nome

da região de origem tupi, pedra (Ita) que brilha (bira). No entanto, os garimpeiros que se

instalaram na região não encontraram o cobiçado minério. O brilho da montanha não vinha do

ouro e sim da sua grande quantidade de minério de ferro (Vale: Nossa História, 2012).

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A descoberta do potencial geológico da região é atribuída a L. F. Gonzaga de Campos

que tentou várias vezes estimar a quantidade de ferro no Estado de Minas Gerais. O trabalho

de Gonzaga foi posteriormente apresentado em um congresso em Estocolmo, Suécia, em

1909. A estimativa de 3.000 milhões de toneladas de minério de ferro causou um grande

interesse internacional na região, já que na época os países desenvolvidos estavam

preocupados com a diminuição de suas próprias reservas minerárias. Uma verdadeira corrida

para garantir acesso aos depósitos minerais do Estado começou logo após o congresso.

Representantes de sindicatos industriais de vários países como Estados Unidos, Reino Unido,

Alemanha, França, Bélgica entre outros demostraram interesse na área (PELAEZ, 1970).

Um grupo de ingleses fundou a Itabira Iron Ore Company, e concentraram seus

investimentos em compra de terras e construção de uma ferrovia para conectar a região a

Estrada de Ferro Vitória-Minas. Essa ligação lhes daria acesso à costa, possibilitando a

escoação da produção por via marítima. Quando a ferrovia já estava pronta, faltando apenas a

etapa de eletrificação da linha, acabaram os recursos financeiros do grupo. O projeto foi

paralisado em 1913 e em seguida, devido o começo da Primeira Guerra Mundial, foi

abandonado (PELAEZ, 1970).

Em 1918 esse grupo de ingleses vendeu o controle de Itabira para um grupo de

empresários do ramo de metais e banqueiros britânicos. Esse novo grupo convidou o

empresário Americano, Percival Farquhar, para representar seus interesses no Brasil

(PELAEZ, 1970).

Farquhar havia atuado na construção de várias ferrovias na América Latina e na

Rússia. Já no Brasil, fundou a Tramways, Light and Power (percursora da Light S.A.). Anos

depois de ser apontado como o representante da empresa no Brasil, Farquhar comprou a

Itabira Iron Ore Company. (Vale: Nossa História, 2012).

Um novo plano de exploração da área foi desenvolvido, com o redesenho da ferrovia.

O Estado de Minas Gerais, em uma manobra para forçar a construção de uma planta de

beneficiamento dentro dos limites do Estado, aumentou a taxa de exportação de minério para

um valor proibitivo, e em seguida ofereceu um desconto de 90% para aqueles produtores que

estabelecessem uma planta de beneficiamento no Estado. Com isso, o plano de Farquhar

passou a incluir tal planta de beneficiamento. O efeito colateral e indesejado dessa estratégia

do governo de Minas Gerais é que ela permitiu que a Itabira Iron Ore Company obtivesse o

monopólio das exportações e do mercado doméstico de ferro (PALAEZ, 1970).

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69

Porém, uma série de disputas tanto no nível federal quanto estatual, além do ataque

vindo da imprensa brasileira na época, paralisou novamente o projeto, em 1920. Somente em

1928, a empresa conseguiu um acordo com o governo Federal. O projeto parecia que

finalmente sairia do papel, mas a crise econômica de 1929 impossibilitou a capitação de

recursos necessários. Além disso, a crise diminui a atividade industrial em todo o mundo,

diminuindo significativamente a demanda por minério de ferro (PALAEZ, 1970).

Em 1930 um movimento armado, do qual o Estado de Minas Gerais tomava parte,

assumiu a administração federal no Brasil. O novo governo não considerou a crise econômica

mundial como um empecilho para a efetivação do plano de Farquhar e exigiu que o mesmo

fosse posto em prática imediatamente, sob pena de multa e até mesmo cancelamento do

contrato. Foi introduzida uma nova constituição em 1934 que deixou a situação de Farquhar

ainda mais delicada. Palaez (1970) aponta as principais mudanças na constituição que

afetaram a Itabira Iron Ore Company:

1. A posse de um solo foi separada da posse e direito de exploração do seu subsolo;

2. A exploração mineral, só poderia ser feita sob licença governamental;

3. Tais licenças só poderiam ser consentidas a cidadãos ou empresas brasileiras

Em face da nova legislação e da demora para a efetivação do plano de Farquhar o

contrato da Itabira Iron Ore Company foi reavaliado por uma série de comissões federais que

o invalidaram. O contrato foi cancelado em 1939 (PALAEZ, 1970).

O plano de explorar as reservas de Itabira passava agora para o governo federal.

Seguindo a onda de nacionalismo e de estatização da economia, em junho 1942 o então

presidente Getúlio Vargas assina o Decreto-Lei no 4.352 que criava a Companhia Vale do Rio

Doce (CVRD). Os bens, incluindo estoques de minério, instalações, veículos e utensílios, da

Companhia Brasileira de Mineração e Siderurgia S.A. e da Companhia Itabira de Mineração

foram incorporados ao patrimônio da União. Os acionistas das duas companhias foram

indenizados (Vale: Nossa História, 2012).

A CVRD foi constituída como uma sociedade anônima de economia mista, do seu

capital inicial de 200 mil contos de réis, 110 mil seriam subscritos pelo Tesouro Nacional

(ações ordinárias) e 90 mil ficariam à disposição do público (ações preferenciais). A sede

administrativa da nova empresa seria Itabira, mas seu domicílio para todos os efeitos legais

seria o município do Rio de Janeiro. A diretoria da empresa foi formada por nomes

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importantes da política mineira e capixaba, os estados mais diretamente envolvidos nas suas

operações, além de um representante do banco Eximbank, que concedeu um empréstimo de

US$ 14 milhões para a CVRD (Vale: Nossa História, 2012).

4.1.2 Os Anos como Empresa Estatal

A maior preocupação da CVRD nos primeiros anos era atingir sua meta de exportação

de minério de ferro. Para isso a empresa investiu pesado em infraestrutura e na compra de

equipamentos, necessitando logo em seus primeiros anos de um aumento de capital e de um

novo empréstimo junto ao Eximbank. Durante a Segunda Guerra Mundial, as exportações da

empresa tiveram um grande salto, permanecendo abaixo da meta porém. Com o fim da guerra

a demanda mundial por minério de ferro diminuiu, os principais mercados internacionais,

Estados Unidos e Inglaterra passaram a ser abastecidos por países situados a uma menor

distância, e portanto com custos de frete mais atraentes. As exportações desaceleraram, mas o

mercado interno continuou a se desenvolver, com a instalação de diversas empresas de ferro e

aço no entorno da CVRD (Vale: Nossa História, 2012).

Com o processo de reconstrução da Europa no pós guerra a demanda mundial de

minério voltou a crescer e a CVRD aumentou paulatinamente suas exportações nos últimos

anos da década de 1940 e na década de 1950, chegando a ser responsável por 98% das

exportações de minério de ferro do Brasil. A exportação de minério de ferro da CVRD,

passou de 41 mil toneladas em 1946 para 4.270 mil toneladas em 1960. A década de 1950

também foi chave para a diversificação de mercados da CVRD, em 1951 a empresa era

altamente dependente do mercado americano, destino de mais de 80% das suas exportações,

no final da década esse número caiu abaixo dos 30% e a companhia passou a atender um

número muito maior de países.

A chegada de Juscelino Kubitschek a presidência do Brasil, em 1956, marcou um novo

período de investimentos em infraestrutura. Reconhecendo o potencial do setor, o Brasil

detinha 15% das reservas de minério, mas só era responsável por 1% do mercado

internacional, seguiu-se um plano de modernização do complexo mina-ferrovia-porto,

pesquisa para o melhor aproveitamento do minério da região e mecanização dos processos de

embarque portuário. Além dos investimentos, a empresa passa adotar uma nova política de

vendas, assume contratos de fornecimento de longo prazo e abre seus primeiros escritórios

comerciais no exterior (Vale: Nossa História, 2012).

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Em 1962, é criada a companhia Vale do Rio Doce Navegação S.A. (Docenave),

empresa que seria responsável pela logística de exportação do minério da CVRD. Conjugando

a exportação de minério com a importação de carvão dos Estados Unidos a empresa

conseguiu reduzir os custos de frete do minério brasileiro, aumentando a competitividade da

empresa brasileira no mercado internacional.

Com a chegada do governo militar ao país a CVRD foi aberta ao capital estrangeiro,

em 1964 o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) aprovou o empréstimo de US$

28,8 milhões usado para vários investimentos na área de transporte, sobretudo a expansão do

Terminal Marítimo de Tubarão. Os investimentos possibilitaram uma grande expansão da

presença da CVRD no mercado externo entre os anos de 1968 e 1978. A expansão

internacional, foi acompanhada também por um forte crescimento no mercado interno, se

aproveitando do surto de industrialização que o Brasil viveu nesse período as vendas no

mercado interno passaram de 877 mil toneladas em 1968 para 9,5 milhões de toneladas em

1978 (Vale: Nossa História, 2012).

Todo esse crescimento de exportações e vendas no mercado interno levou a CVRD a

expandir seu complexo na região de Minas Gerais e também a buscar novas minas. A empresa

começou a investir mais em pesquisa geológica, culminando com a criação de uma subsidiária

integral, a Docegeo, responsável unicamente por esse tipo de pesquisa, em 1971. A Docegeo

também foi um importante instrumento no plano da CVRD de diversificar sua atuação para

além do mercado de minério de ferro, diminuindo assim os riscos ligados a depender da

exportação de um único produto. As descobertas da Docegeo possibilitaram vários projetos da

CVRD em joint venture com empresa estrangeiras, em mercados como alumínio, pelotas e

celulose.

Os anos 1970 foram marcados pela descoberta das reservas minerárias de Carajás no

Pará. A princípio o direito de explorar a região pertenceria a US Steel, mas um acordo

permitiu que a CVRD participasse com 51% da joint venture criada para implantar o Projeto

de Ferro Carajás. Posteriormente, já no início dos anos 1980, a CVRD indenizou a ex-parceira

e passou a implementar o projeto sozinha. Carajás possuía um grande potencial geológico,

com a presença de vários minérios, somente a reserva de minério de ferro foi avaliada em 18

bilhões de toneladas. Para explorar a região remota, no entanto, foi necessária a criação de um

novo complexo mina-ferrovia-porto, o que exigiu grandes investimentos na década de 1980.

Por seu potencial minerário e sua localização, longe do até então centro das atividades

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mineradoras do país, Carajás mudou o perfil da CVRD e também da indústria de mineração

brasileira como um todo (Vale: Nossa História, 2012).

O início dos anos 1990 foi marcado por recordes de produção na CVRD. A empresa

alcançou importantes certificações internacionais e avançou em suas práticas de

desenvolvimento sustentável e preservação do meio-ambiente. Toda essa evolução permitiu a

conquista de novos mercados, notavelmente a China. A empresa também prosseguia nos seus

planos de diversificação, apostando em commodities como manganês, ouro, cobre e alumínio.

Entretanto, a economia do Brasil passava por um momento difícil. O país enfrentava

uma inflação galopante que só foi resolvida em 1994 com a introdução do Plano Real. No

entanto, a estabilidade da moeda não trouxe crescimento econômico de imediato. Já em 1995

a balança comercial brasileira registrava déficit e a situação se agravou nos anos seguintes.

Para enfrentar essa situação o governo federal intensificou seus projetos de desestatização

com a intensão de aumentar o fluxo de capitais no mercado e amortizar os efeitos das dívidas

externas. Assim era montado o cenário para um dos acontecimentos mais importantes na

história da empresa, sua privatização em 1997 (Vale: Nossa História, 2012).

4.1.3 A Privatização

Criados nos anos 1990, o Programa Nacional de Desestatização (PND) foi um dos

instrumentos utilizados para equilibrar a balança comercial e as contas públicas, com o

objetivo de prolongar a estabilidade gerada pelo Plano Real. Quando Fernando Henrique

Cardoso assumiu a presidência, em 1995, as privatizações se aceleraram. Em seus dois

primeiros anos de governo 19 empresas foram privatizadas, totalizando uma arrecadação de

5,1 bilhões de dólares. Totalizando seus dois governos, entre 1995 e 2002, o total arrecado

com as privatizações superou 78 bilhões de dólares, conforme pode ser verificado no quadro

4.1.

O Poder Executivo incluiu a CVRD como alvo do processo de privatização, baseado

no inciso VI, do artigo 84, da Constituição Federal e na Lei 8.031/90, e em 06 de maio de

1997, ocorreu a primeira etapa do leilão de privatização. O leilão já havia sido adiado várias

vezes por liminares na justiça e o no dia do leilão houve uma manifestação na frente do prédio

da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, onde ocorria o leilão, que segunda a imprensa, reuniu

cerca de 300 pessoas (Vale: Nossa História, 2012).

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Quadro 4.1: Receita com privatizações 1995 a 2002 por setor (em US$ bilhões)

Fonte: BNDES (<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias

/Arquivos/ conhecimento/pnd/Priv_Gov.PDF>)

O vencedor do leilão foi um consórcio formado por investidores nacionais e

estrangeiros, que arrematou 41,73% das ações pertencentes ao governo brasileiro. Hoje

conhecido como Valepar, o consórcio detém o controle acionário da companhia. O lance final

foi de pouco mais de 3.338 milhões de reais, representando um ágio de aproximadamente

20% em relação ao preço afixado pelo governo. O financiamento aos compradores foi

garantido pelo BNDES.

Também em 1997 ocorreu a segunda etapa da privatização da companhia, com a

venda de parte do seu capital a seus empregados. A terceira e última etapa, ocorreu no início

dos anos 2000 quando milhares de pessoas em todo o país puderam utilizar parte do recurso

do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para adquirir ações da companhia.

A privatização significou, obviamente, um novo organograma, com a presidência

sendo exercida por um Conselho Administrativo, que contava com a atuação e influência dos

sócios controladores. A nova administração da dividiu a companhia em unidades de negócio:

Celulose e Papel, Minério de Ferro, Alumínio e um Centro Corporativo. Nomeando,

diretores-presidentes responsáveis por cada área de negócios, e lhes incumbindo de buscar

maneiras de inserir a CVRD no mercado global de suas devidas áreas (Vale: Nossa História,

2012).

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O processo de reestruturação e otimização da empresa levou a uma redução do seu

quadro de funcionários, de 15.483 em 1996 para 10.965 em 1997, uma diminuição de quase

30%. A maior parte dos desligamentos ocorreu pelo Programa de Demissão Incentivada,

criado em setembro de 1997.

Como resultado dos vários processos que visavam o ganho de eficiência,

principalmente a revisão dos antigos contratos da empresa, foi possível uma redução de 15%

nos custos por tonelada de minério em 1997. No mesmo ano, foram alcançados recordes de

produção de minério, tanto no Complexo de Tubarão como em Carajás, de alumínio e no

segmento de papel. Outros recordes ocorreram na quantidade de minério exportado,

principalmente devido a novos contratos com clientes Australianos e Chineses, e nos terminas

ferroviários e portuários da companhia.

No final de 1997 todas as mudanças ocasionadas pela privatização da companhia

resultaram em lucro líquido de 756 milhões de reais, um aumento nas vendas e na carteira de

clientes. O lucro obtido foi um recorde para a companhia, superando em 46% o resultado do

ano anterior (Vale: Nossa História, 2012).

4.1.4 Os Primeiros anos como Empresa Privada e a Internacionalização (1998 –

2008)

Os bons resultados da CVRD continuaram nos anos logo a após a privatização. No ano

de 1998 a empresa quebrou novamente seu recorde de lucratividade. A empresa ampliou seus

investimentos em transporte, e passou a usar sua estrutura não mais apenas para o transporte

de cargas próprias, mas também de terceiro. Foi o início de um negócio que mais tarde se

mostrou estratégico e lucrativo, a companhia passou a ofertar soluções logísticas para outras

empresas (Vale: Nossa História, 2012).

Em 1999, tomou posse o novo presidente da CVRD, o embaixador Jório Dauster. Sua

escolha reflete o foco no mercado internacional que a companhia ganhou após a privatização,

Dauster trazia à CVRD uma forte experiência internacional. Já no primeiro ano de sua gestão,

o número de clientes internacionais cresceu, as ações da companhia triplicaram de valor e

novamente a companhia superou seu lucro recorde anterior.

O final dos anos 1990 também foi marcado por aquisições. A empresa adquiriu

participações em várias empresas pelotizadoras (processo realizado após a extração do

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minério que propicia sua utilização nas indústrias siderúrgicas) como a empresa brasileira

Samarco, que na época era a produtora de pelotas de minério de ferro com menor custo no

mundo. Adquiriu também outras mineradoras especializadas em minério de ferro, como a

Ferteco, ampliando sua capacidade produtiva e infraestrutura logística. Além de seguir com

seu plano de diversificação, investindo, por exemplo, na produção de cobre com o Projeto

Sossego no Pará. Sossego foi um dos projetos com menor investimento por tonelada de

capacidade instalada no mundo, um marco da preocupação com eficiência que passou a

permear a CVRD após sua privatização. A crescente preocupação com o meio ambiente e as

comunidades afetadas pelas atividades da companhia também marcaram a década de 1990,

com a criação da Fundação Vale do Rio Doce, que foca no desenvolvimento social de forma

integrada, com projetos nas áreas de educação, saúde, geração de trabalho e renda, cultura,

esporte e desenvolvimento urbano (Vale: Nossa História, 2012).

O foco internacional que a empresa ganharia na década seguinte, é simbolizado pelo

início da comercialização das ações da companhia na Bolsa de Valores de Nova York

(NYSE), no ano 2000. A partir dessa data, investidores do mundo inteiro teriam acesso as

ações da companhia, que agora podiam ser compradas também em dólares e até euros, em um

mercado muito mais transparente. As ações de internacionalização da empresa estavam

apenas começando. Em 2001 a empresa, buscando parcerias com seus vizinhos sul-

americanos para explorar commodities cuja exploração no Brasil era pequena, a CVRD

firmou um joint-venture com a chilena Codelco, a maior produtora de cobre do mundo. Ainda

no início da década a CVRD foi buscar parceiros ainda mais longe adquirindo parte da GIIC

empresa, a maior empresa pelotizadora independente do mundo, localizada no Bahrain, uma

pequena ilha do Golfo Pérsico. A GIIC contava com clientes na região do Golfo Arábico, na

Ásia e no Norte da Africa.

Em 2004, a CVRD chegou à China, com um investimento de 10,6 milhões de dólares

ela participou, junto com sócios japoneses, da criação da Shandong Yankuang International

Coking Company. A China se transformaria nos anos 2000 no maior mercado de commodities

do mundo, devido suas altas taxas de crescimento e sua necessidade de investimentos para

renovar sua infraestrutura. A importância do minério de ferro na pauta de exportação

brasileira e em especial a relevância do mercado chinês desse produto pode ser observado no

quadro 4.2. O grande apetite chinês por minério de ferro afetou também o preço da

commodity que desparrou na primeira metade dos anos 2000. Como reflexo do aumento da

importância desse mercado, a Vale decidiu aumentar sua presença em solo chinês,

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construindo, em 2008, centros de distribuição no país. Tais centros permitiram atender as

siderúrgicas chinesas com mais rapidez e eficiência, além de proteger a companhia contra a

volatilidade dos preços dos fretes ultramarinos. Também em 2008 a Vale, concluiu a

construção da usina de processamento de Níquel de Dalian, na China (Vale: Nossa História,

2012).

Quadro 4.2: Importância do Minério de Ferro na Pauta de Exportação Brasileira

Fonte: Adaptado Vale: Nossa História (2012)

Porém a aquisição internacional mais notável do período foi sem dúvida a da

canadense Inco. Na época a Inco detinha as maiores reservas mundiais de níquel e era a

segunda maior produtora global dessa commodity. A compra foi aprovada pelas autoridades

canadenses em outubro de 2006 e o valor total investido foi de US$ 18,24 bilhões, fazendo

desta a maior aquisição na América Latina. A negociação entre a CVRD e a Inco foi o quinto

maior negócio do mundo em 2006. Nesse ano a Vale respondeu por 50% dos investimentos

feitos por empresas brasileiras. A compra serviu para diversificar ainda mais a CVRD, que

com ela se tornou a segunda maior produtora global de níquel, com a produção de 250,6 mil

toneladas. O minério de ferro continuou sendo o principal produto da companhia,

respondendo por 48% da sua receita bruta, porém o níquel ganhou espaço e passou a

representar 26% dos negócios da Vale em 2006.

A Inco era uma empresa global, com operações não só no Canadá, mas também na

Indonésia, Reino Unido, Japão, China, Taiwan e Coreia, além de um projeto na Nova

Caledônia. Portanto, a aquisição da Inco ampliou muito a presença global da CVRD.

Total de Exportações

Em milhôes US$ Em milhôes US$ Em % Em milhões US$ Em %

2002 60.362 3.049 5,1% 597 1,0%

2003 73.084 3.456 4,7% 765 1,0%

2004 96.475 4.759 4,9% 1.115 1,2%

2005 118.308 7.297 6,2% 1.785 1,5%

2006 137.807 8.949 6,5% 2.629 1,9%

2007 160.649 10.558 6,6% 3.710 2,3%

2008 197.942 16.539 8,4% 4.886 2,5%

2009 152.995 13.247 8,7% 7.011 4,6%

2010 201.915 28.912 14,3% 13.338 6,6%

2011 256.040 41.817 16,3% 19.797 7,7%

Exportação de Minério de

Ferro

Venda de Minério de Ferro

para a ChinaAno

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O processo de internacionalização da companhia apresentou inúmeros desafios para a

CVRD. Um dos maiores deles foi a adaptação aos diferentes tipos de relações trabalhistas

existente nos vários países onde agora a empresa operava. A companhia enfrentou greves nas

suas operações em Sudbury, Port Colborne, Voisey’s Bay, Newfoundland e Labrador, todas

no Canadá. Algumas greves chegaram a durar um ano, de julho de 2009 a julho de 2010. As

greves foram solucionadas com acordos coletivos firmados com os sindicatos representativos

dos empregados (Vale: Nossa História, 2012).

Em 2007 foi a vez da CVRD se internacionalizar para a Austrália, onde adquiriu a

AMCI, mineradora que operava vários ativos de carvão, por US$ 656 milhões.

Outro grande passo rumo à internacionalização foi a chegada a Moçambique onde a

Vale venceu uma licitação para explorar a maior província carbonífera ainda não explorada no

mundo. O Projeto Moatize, foi iniciado em 2008 e envolveu não só a construção da mina, mas

também de uma grande estrutura logística, até então inexistente no país.

Também em 2008 a Vale fechou parceria com o governo de Omã. Uma planta de

pelotização de minério foi estabelecida no país para atender melhor as características dos

fornos predominantes nas siderúrgicas da região do Oriente Médio.

Além das aquisições e desenvolvimento de minas, outro fato que impulsionou a

internacionalização da CVRD, foi a obtenção do grau de investimento. Esse é um sinal dado

pelas empresas de classificação de risco que uma empresa é sólida e segura para se investir,

sem risco de calote em seus títulos. A CVRD foi a primeira empresa brasileira a receber tal

classificação, atingindo-a antes mesmo do Brasil (as economias nacionais de um país também

são objetos da classificação dessas empresas). A obtenção do grau de investimento permitiu

que a empresa conquistasse mais investidores internacionais, aumento seus recursos, além de

projeta-la ainda mais no mercado global (Vale: Nossa História, 2012).

Outra importante mudança na empresa, que também teve origem em seu desejo de se

tornar uma empresa global, foi a alteração de seu nome. Em 29 de novembro de 2007, a

companhia anunciou que passaria a ser chamada apenas de Vale. Entre as razões para a

mudança de nome, está o fato de que Vale é uma palavra facilmente lida e entendida em todo

o mundo. A mudança no nome foi acompanhada também por uma mudança no logotipo, o

desenho traz a letra V estilizada, a fácil leitura visual do símbolo também mirava o mercado

global.

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O início dos anos 2000, no entanto, não foi benéfico somente na área da

internacionalização. A CVRD também fez aquisições no Brasil, em 2003 comprou a

mineradora brasileira Caemi. Também foi uma década de recordes, o ano de 2004 foi

especialmente positivo, a companhia registrou o maior lucro de sua história, R$ 6,46 bilhões.

Entre 2001 e 2004 a empresa exportou R$16,2 bilhões, o que a fez a maior exportadora

líquida do país no período, sendo responsável por 18,4% do superávit da balança comercial do

país. O período de grande prosperidade durou até 2007, quando a empresa apresentou

crescimento em todas as suas áreas de negócios. No entanto, em 2008 a economia mundial foi

atingida por um grande choque, a crise que havia começado no ano anterior no setor

imobiliário americano tomou proporções globais e se espalhou para os mais diversos ramos

da economia. Os reflexos da crise demoram para aparecer no setor de mineração, em 2008 a

Vale ainda apresentou bons resultados econômicos, no entanto, no último trimestre desse ano

já era possível avistar sinais da crise. Em novembro de 2008 várias operações da companhia

foram paralisadas. A situação se agravaria em 2009, e a Vale enfrentaria seu primeiro período

de recessão desde sua privatização (Vale: Nossa História, 2012).

4.1.5 A História Recente da Vale

O ano de 2009 foi de recessão global, a economia brasileira encolheu em 0,6%, a

americana 2,4%, a europeia 4,2% e a japonesa 5%. A demanda por minério de ferro e outras

commodities minerais foram altamente impactadas pelo esfriamento da economia mundial.

Como consequência o preço do minério de ferro também sofreu uma grande queda, 44,5% em

2009. Como resultado, a Vale passou por um dos períodos mais complicados da sua história,

seu lucro líquido caiu de US$13,2 bilhões em 2008 para US$ 5,3 bilhões em 2009. Sua

presença no mercado transoceânico caiu de 30,2% para 24,9% (Vale: Nossa História, 2012).

A crise vivida em 2009 exigiu que a companhia reavaliasse seu plano de crescimento e

expansão, tanto nacional quanto internacional. O ano de 2009 foi marcado por

desinvestimentos, que contribuíram para o resultado econômico positivo no ano, apesar da

maioria dos seguimentos onde a empresa atuava ter obtido resultados negativos. No Brasil, a

empresa vendeu uma fatia de sua participação na Usiminas, três usinas hidrelétricas e parte

dos ativos de alumínio de sua subsidiária, a Valesul, além de direitos de exploração mineral

na Bahia. Globalmente, se desfaz de negócios nos Estados Unidos e China. O plano de

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desinvestimento continuaria mesmo depois da crise se dissipar, com a venda de negócios

considerados não estratégicos indo até o começo de 2011 (Vale: Nossa História, 2012).

Já em 2010 a Vale se recuperaria da crise, impulsionada pela volta do crescimento

global, especialmente dos países emergentes, incluindo o Brasil. Esse ano foi extremamente

positivo para a Vale, que voltou a bater recordes de margem operacional e lucro líquido. No

entanto, a crise vivida em 2009, deixou marcas na estratégia de crescimento da Vale, a

empresa passou a ser mais conservadora.

Passada a crise a Vale retornou seus planos de internacionalização, mesmo que de

forma mais discreta. Em 2010, a Vale chegaria a Guiné, onde está executando o maior projeto

de minério de ferro, interligado com infraestrutura, de todo o continente africano. A

companhia ainda controla outro projeto na África, no Cinturão de Cobre da Zâmbia. Além

desses projetos no continente africano, a Vale fechou 2010, com presença no Congo, Angola e

na África do Sul, onde desenvolve pesquisas de inúmeras commodities minerais. Também em

2010, a empresa começou suas operações no Chile, onde possui duas minas e uma usina de

cobre. O total de investimento, em solo chileno, chegou a US$ 140 milhões (Vale: Nossa

História, 2012).

Seu plano de diversificação também foi retomado com o fim da crise. Notavelmente a

empresa investiu no mercado de fertilizantes, passando a atender também o segmento de

produção de alimentos. Foram adquiridos ou desenvolvidos projetos de fertilizantes em cinco

estados brasileiros, na Argentina, Canadá, Peru e Moçambique.

A crise também trouxe mudanças na área de logística da companhia. A principal

mudança foi a construção de uma frota de navios próprios para driblar a redução de oferta e

oscilação de preços no mercado de fretes marítimos. Os navios encomendados seriam os

maiores navios de transporte de minério de ferro do mundo e passaram a ser conhecidos como

Valemax. A importância da logística para a companhia pode ser resumida nessa declaração de

José Carlos Martins, então diretor-executivo de Minério de Ferro e Estratégia: “o custo de

para colocar uma tonelada de minério de ferro na Ásia está na faixa de US$ 50, sendo que,

desse valor, menos de US$ 10 é custo da mina, o resto é custo logístico”. Os investimentos

em logística não se resumiram ao transporte marítimo, a empresa continuou investindo na

malha ferroviária no Brasil e construiu um centro de distribuição em Omã (Vale: Nossa

História, 2012).

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80

A administração da Vale nos anos 2000 ficou a cargo de CEO Roger Agnelli, ex

diretor-executivo do Bradesco. Agneli geriu a companhia durante o forte período de

crescimento do início dos anos 2000, a crise de 2008-2009 e na retomada da empresa em

2010. Seu estilo de negócio, considerado agressivo pela impressa e por analistas de mercado,

trouxe resultado para a companhia, durante sua administração os lucros da Vale passaram de

R$3 bilhões ao ano para R$30 bilhões. O CEO foi o grande impulsionador do processo de

internacionalização da empresa. Agnelli também aumentou o foco da empresa, vendendo

negócios não estratégicos na área de celulose. Os investimentos em logística também

aumentaram, tornando a CVRD uma das líderes do setor no Brasil, responsável por 68% da

movimentação das cargas em ferroviária e 27% da movimentação portuária.

Agnelli deixou a Vale em 2011, a presidência da companhia foi assumida por Murilo

Ferreira. Funcionário da Vale desde 1998, quando foi diretor da Aluvale, passou pela diretoria

executiva de níquel e pela presidência da Vale Inco, no Canadá, antes de chegar ao cargo mais

alto da companhia. Nos primeiros anos da administração de Murilo Ferreira, de 2011 aos dias

atuais, sua atuação foi considera bem menos agressiva que a do CEO anterior. Os planos de

crescimento, diversificação e internacionalização continuaram, mais em um ritmo bem menor

do que se viu anos antes (Vale: Nossa História, 2012).

A menor demanda da China levou a uma redução nas expectativas para o mercado de

minério de ferro. Segundo projeções do BNDES os investimentos no setor devem cair 32%

entre 2014 e 2017, considerando o menor apetite da Vale por novos investimentos. O foco do

novo presidente da Vale tem sido a redução de custos e o desinvestimento de ativos

considerados não estratégicos, focando em minério de ferro, níquel, cobre e fertilizantes. O

maior investimento atual da companhia é a ampliação da produção de minério de ferro em

Carajás, que custará mais de R$ 40 bilhões, incluindo as modernizações logísticas necessárias

para o projeto (<http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/10/1359561-vale-pisa-no-freio-

e-investimento-de-mineracao-cai-32-preve-bndes.shtml>).

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5. ANÁLISE DO CASO

A partir da análise da história da Vale, apresentada no capítulo anterior, das entrevistas

realizadas com executivos da companhia e dos dados públicos da mesma é possível comparar

o processo de internacionalização vivido por esta com as teorias acadêmicas. Esse capítulo

tem como objetivo apresentar pontos de aderência e divergência entre o caso estudado e o

referencial teórico sobre internacionalização. Esse estudo ainda busca levantar proposições

que busquem explicar os pontos de divergência.

5.1 As Peculiaridades do Setor de Mineração

O primeiro fato que chama a atenção ao se analisar as teorias de internacionalização é

como a grande maioria tem como foco uma operação industrial. Alguns autores, também

consideram o setor de serviços ao desenvolverem suas teorias, ou em estudos subsequentes,

porém o foco é quase sempre na produção industrial. A exceção são as teorias mais recentes,

especialmente a das Born Globals, que ao descreverem um fenômeno relativamente recente

na economia mundial, encontram em empresas não tradicionais, como as indústrias de

tecnologia e comunicação, algumas de suas mais importantes representantes.

A indústria de extração mineral, no entanto, não costuma ser apresentada como

exemplo das teorias de internacionalização e, comparada a outros setores industriais,

apresenta características únicas, que afetam profundamente o seu processo de

internacionalização. Dois fatores, em especial, merecem ser mencionados devido a extensão

do seu impacto no processo de internacionalização.

O primeiro deles é que o minério é aleatoriamente distribuído pelo mundo,

impossibilitando a livre escolha no momento da empresa mineradora decidir onde concentrará

sua produção. Diferente de uma fábrica que pode escolher virtualmente qualquer país do

mundo para abrigar sua produção, as empresas de extração mineral estão limitadas aqueles

que apresentam reservas do minério desejado. Considere ainda que os fatores como a

quantidade e qualidade do minério também diferem entre os países, e ainda que algumas

reservas são, por condições naturais, mas acessíveis do que outras (por exemplo algumas

reservas são subterrâneas enquanto outras a céu aberto, obviamente, facilitando seu acesso).

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82

Esses fatores adicionais são extremamente importantes na decisão de estabelecer uma unidade

produtiva no estrangeiro, muitas vezes se sobrepondo aos motivos tradicionalmente

apontando pelas teorias de internacionalização e, assim, afastando a história de

internacionalização da Vale do prevista pelas teorias acadêmicas.

Agravando as consequências desse primeiro fator, está a diminuição das reservas

minerais não exploradas no mundo. O próprio processo de exploração de minério e a corrida

para garantir os direitos de exploração futura, por parte das mineradoras, reduziram ainda

mais as opções disponíveis para a escolha de para onde a firma desejaria internacionalizar sua

produção. Assim ao analisar o porquê uma determinada mineradora escolheu internacionalizar

a exploração de um minério para um dado país estrangeiro, a resposta pode não citar as

possíveis causas inumeradas pelas diferentes teorias de internacionalização, e sim o fato de

que aquele país era o único com reservas disponíveis daquele minério.

Segundo, commodities minerais, especialmente o minério de ferro, principal produto

da Vale, costumam ter um baixo valor em relação ao seu peso e volume. Mesmo considerando

o maior preço atingido pelo minério de ferro em todos os tempos, quase US$ 200 a tonelada,

no início de 2011 (<http://www.ft.com/cms/s/0/76bf9812-49ec-11e2-a625-

00144feab49a.html#axzz34fL3sUdz>), é possível perceber que a relação entre preço e peso é

baixa, especialmente quando comparados com produtos de alta tecnologia e, portanto, maior

valor agregado. Isso faz com o custo logístico seja proporcionalmente mais importante no

setor de mineração. Como consequência, diminuir as distâncias geográficas entre suas

operações, minas de extração, e o mercado consumidor, é mais relevante do que na maioria

dos outros setores da economia. Isso implica que a decisão de quais países são escolhidos

como consumidores é muito mais influenciada pela distância geográfica nas empresas de

mineração do que em outros setores. Diminuindo, assim, a importância relativa de fatores

apontados pelas teorias de internacionalização, como a distância psíquica por exemplo.

5.2 Aderências e Divergências em Relação à Teoria do Poder de Mercado

Hymer (1960) aponta dois motivos que impulsionariam uma empresa a se

internacionalizar: a remoção de um competidor potencial e se apropriar integralmente dos

retornos de certa habilidade desenvolvida no país natal da empresa. Quando perguntado os

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entrevistados não expressaram voluntariamente esses dois motivos, segundo eles os fatores

que motivaram a internacionalização da Vale foram:

- A vontade da companhia diversificar suas operações: Conforme descrito no capítulo

anterior a Vale a partir da sua privatização traçou um objetivo claro de diversificar suas

operações para além do minério de ferro. O principal motivo da perseguição pela

diversificação é diluir o risco da companhia deixando-a menos vulnerável, as volatilidades do

mercado de minério de ferro. A diversificação foi apontada em duas das três entrevistas como,

se não o principal, um dos principais motivos para a internacionalização da Vale.

- A situação do mercado de commodities e a corrida pela compra de ativos: No início

dos anos 2000, que marcou a transformação da Vale em uma empresa realmente global, o

mercado de commodities minerais, especialmente de minério de ferro, estava muito aquecido.

Os preços subiam rapidamente, à medida que a China passava a demandar quantidades cada

vez maiores de minério. Essa situação gerou uma corrida entre as principais mineradoras

mundiais, incluindo a Vale, para garantir o acesso às reservas de minério, e assim conseguir

aumentar a sua oferta do produto, tirando o máximo de proveito do bom momento do setor.

Um dos entrevistados, porém, ressalva que a situação não era uma luta pela sobrevivência,

que a Vale não se sentia pressionada a se internacionalizar, havia apenas uma vontade de

aproveitar o excelente momento do setor.

- A situação do caixa da companhia: A privatização da Vale e o bom momento vivido

pelo setor de mineração no início da década de 2000, com o “boom” do mercado chinês,

fizeram com que a companhia apresentasse uma grande sobra de caixa. A combinação de

dinheiro em caixa e perspectiva de crescimento ainda maior no mercado de commodities

minerais, fizeram com que o apetite por investimento da companhia crescesse. Esse apetite

levou a Vale procurar opções de investimento tanto no Brasil quanto no exterior, acelerando a

internacionalização da empresa.

- A busca por ativos de classe mundial: Como as reservas minerais são distribuídas

geograficamente de maneira aleatória no mundo, um dos motivos que levou a

internacionalização da companhia foi simplesmente o desejo de acessar reservas com

minérios de qualidade e em grande quantidade.

- O perfil da nova administração da companhia: Segundo um dos entrevistados o perfil

mais arrojado e extremamente voltado para o crescimento da administração que assumiu a

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84

companhia após sua privatização foi um dos motivos para a internacionalização da empresa.

As características do seu CEO na época, Roger Agneli, também foram destacadas.

A apropriação integral de uma vantagem adquirida no seu país natal, não configurou

entre as razões para a internacionalização mais citadas pelos entrevistados. No entanto, eles

puderam apontar várias vantagens que a Vale teria, em relação à uma empresa local, o que

colabora com a teoria do Poder de Mercado, já que essas vantagens foram desenvolvidas na

época que atuava no Brasil, seu país natal. As vantagens apontadas pelos entrevistados foram:

- A diversificação da companhia e o acesso a clientes: Muitas vezes commodities

diferentes têm em comum os mesmos compradores, assim os contatos e relacionamentos com

os clientes no negócio de minério de ferro, seriam uma vantagem para a firma também na

comercialização de outras commodities. Esse fato faz com a Vale, uma mineradora

diversificada, seja mais eficiente ao gerir uma operação de exploração de um minério

especifico do que uma empresa especializada somente nesse minério. Quando a Vale comprou

a Inco, que na época era uma empresa especializada em níquel, ela usou seu conhecimento e

contatos no mercado de minério de ferro, conquistado em grande parte na sua operação local

no Brasil, para alavancar os negócios da companhia canadense. Particularmente o acesso aos

clientes chineses, foi apontado como uma vantagem da Vale ao operar os negócios da Inco,

quando comparado a administração local.

- Condições Financeiras e acesso ao crédito: Como já citado a situação financeira da

Vele era muito boa quando ela intensificou seu processo de internacionalização. O tamanho

da Vale também garantia que ela podia suportar até perdas no curto prazo em alguns dos seus

ativos, essas perdas seriam absorvidas pelos lucros de outros ativos, o mesmo não pode ser

dito de empresas locais que muitas vezes dependem da lucratividade de um único ativo para

se manter no mercado. Isso fez com que ela tivesse uma vantagem em relação a

administrações locais de empresa em situação financeira não muito boa, como era o caso da

Inco. Além da condição financeira em si, outro fator muito importante é o acesso ao crédito, a

Vale como empresa global disponibilizava de uma facilidade muito maior de obter crédito

quando comparada a empresas locais. O tamanho e volume de negócios da Vale, assim como

sua grande carteira de garantias, também a colocavam em uma situação mais confortável na

hora de negociar os termos dos empréstimos.

- Ganhos de Escala: Outra vantagem apontada é a escala das operações da Vale. Já

sendo uma companhia com grandes operações dentro da Brasil, a Vale contava com um poder

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de barganha junto aos fornecedores que foi transferido para as suas operações internacionais.

Em vários insumos, como máquinas, equipamentos e pneus para mina a Vale conseguia

preços menores dos que as empresas locais, reduzindo assim seus custos.

- Filosofia de Negócios e Cultura: Também foi apontada por um dos entrevistados a

maneira de fazer negócios da Vale como uma vantagem frente as empresas locais. O foco em

resultados da Vale foi apontado como a principal marca da cultura da empresa que

representou uma vantagem em relação as empresas locais. No caso, da Inco especificamente,

a habilidade da Vale em lidar com o sindicato e com as pressões trabalhistas, foi apontada

como uma vantagem da Vale.

Também segundo a teoria de Poder de Mercado uma empresa aumentaria sua

participação no mercado local enquanto possível, atingindo um alto grau de poder de

monopólio e somente quando o crescimento local não fosse mais possível, ela usaria os lucros

obtidos no mercado local para financiar operações no estrangeiro. A Vale desde sua origem já

realiza exportação de seus produtos, como descrito no capítulo anterior, os ingleses e

americanos foram os grandes clientes nos primeiros anos da empresa. Posteriormente a Vale

também construiu uma sólida atuação no mercado nacional. Essa suposição de Hymer (1960)

não parece ser comprovada pelo processo de internacionalização da companhia.

O quadro 5.1 mostra os principais achados em relação as proposições da Teoria do

Poder de Mercado, definidas como escopo desse trabalho.

Quadro 5.1: Análise das Proposições da Teoria do Poder de Mercado

Proposição Referência Achados

Empresas se internacionalizam para remover um competidor potencial e se apropriar integralmente dos retornos de certa habilidade desenvolvida no país natal

Hymer (1960) Não pode ser diretamente comprovada, a remoção de um competidor potencial não foi citada. No entanto, o número significativo de vantagens para atuar no mercado internacional derivadas da atuação da empresa em seu mercado doméstico, indica que se apropriar de uma habilidade desenvolvida no país natal seja um dos motivos para a internacionalização.

O processo de internacionalização tem início quando o mercado local está em uma situação difícil

Hymer (1960) Refutada, a Vale inicia seu processo de internacionalização antes mesmo de consolidar sua presença no mercado local.

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5.3 Aderências e Divergências em Relação à Teoria da Internalização

Segundo essa teoria as empresas contam com duas formas de obterem os produtos que

são necessários para seu processo produtivo. A primeira seria buscar tais produtos no mercado

e a segunda produzir ela mesma, ou seja, internalizar sua produção. A utilização de uma ou

outra forma de obtenção desses produtos intermediários dependeria dos custos de transação

do mercado. Quando fosse mais vantajoso a internalização de uma atividade, e para isso que

tal internalização aconteça fosse necessário que a empresa passasse a atuar além do seu país

natal, haveria um incentivo a internacionalização.

Segundo os entrevistados não houve na internacionalização da Vale uma busca direta a

um dos seus produtos intermediários. Ou seja, a Vale não se internalizou para nenhum país

para passar a produzir um produto ou serviço intermediário que antes ela buscava no mercado.

No entanto, houve uma busca de atender as necessidades dos clientes, vendendo

produtos que normalmente são utilizados nas mesmas ocasiões que os produtos que a Vale já

vendia. Por exemplo, a Vale se internalizou para conseguir acesso a fontes de carvão, o desejo

de vender carvão vem do fato que os mesmos clientes, as siderúrgicas, que compravam

minério de ferro da Vale também precisavam do carvão, já que ambos são necessários para o

processo de fabricação de aço. A mesma situação acorre com o níquel. Assim a Vale

internalizou a venda de um produto que antes seus clientes tinham que buscar junto a outras

mineradoras do mercado. O objetivo era gerar soluções de “pacotes” para seus clientes. Caso

a Vale não buscasse o acesso a esses minérios em países estrangeiros, a única maneira de

gerar tal solução seria comprando estes no mercado, o que geraria maiores custos de

transação.

Ao produzir ela própria esses minérios a Vale reduziu o próprio custo de transação e

ao oferecer uma solução de “pacotes” para seus clientes ela reduziu os custos de transação

deles. Os clientes agora têm que negociar somente com a Vale, e antes tinham que negociar o

minério de ferro com a Vale, o carvão com um outro fornecedor e o níquel com um terceiro.

Parte da economia em custos de transação obtida pelos clientes é repassada para a Vale, e

funciona, como uma espécie de prêmio por ela oferecer uma solução que abrange a todas as

necessidades do cliente.

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87

Quadro 5.2: Análise da Proposição da Teoria da Internalização

Proposição Referência Achados

Empresas se internacionalizam buscando internalizar a obtenção de algum produto ou serviço intermediário, e assim, aumentar sua eficiência

Buckley e Casson (1976)

Refutada, nenhuma internacionalização da Vale tenha sido motivada para obter algum produto ou serviço antes adquirido no mercado. No entanto, a internacionalização por vezes motivadas pela vontade de oferecer uma solução de "pacote" para os clientes da Vale, reduzindo seus custos de transação e assim aumentando sua eficiência.

5.4 Aderências e Divergências em Relação ao Paradigma Eclético

Segundo essa teoria, três fatores influenciam a decisão de abastecer um mercado

estrangeiro via exportação ou internacionalizar a produção, um deles seria a vantagem de

localização. Dunning (2000) afirma que algumas regiões apresentam vantagens competitivas

em relações a outras, a busca por usufruir dessas vantagens levariam ao investimento

estrangeiro direto e, portanto, a internacionalização.

Durante as entrevistas como executivos da Vale foi possível comprovar esse aspecto

da teoria. Para analisar essa questão tendo como plano de fundo a experiência da Vale,

separaremos seu processo de internacionalização em dois momentos. O primeiro é a fase de

abertura de escritórios comerciais no estrangeiro. Nesse momento, as vantagens de

localização que foram importantes para definir para onde a Vale se internacionalizaria são:

(1) Vantagens de localização geográfica: Foram priorizados os países próximos às

principais siderúrgicas clientes da Vale, como por exemplo, a Holanda, que foi a

porta de entrada para o mercado europeu como um todo.

(2) Vantagens Fiscais: Países com uma estrutura fiscal atraente para centralizar as

vendas de suas regiões, como por exemplo, Suíça, Áustria e Cingapura.

A segunda fase a ser analisada é a de investimentos produtivos no estrangeiro. Nesse

caso uma vantagem de localização óbvia é a existência de minério e a qualidade deste. Além

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disso, outros fatores podem ser considerados vantagens de localização que influenciaram a

decisão de produzir ou explorar minério em países estrangeiros:

(1) Vantagens de custo: Alguns países apresentam custos menores de mão de obra,

incentivos fiscais e uma estrutura física que diminuiu os custos logísticos.

(2) Vantagens de localização geográfica: Novamente estar próximo aos mercados

consumidores é muito importante, dando mais agilidade no atendimento aos

pedidos e possibilitando um preço mais baixo. Como visto no capítulo anterior, a

Vale investiu em plantas de pelotização de minério de ferro no Bahrain devido à

sua proximidade com as siderúrgicas da região.

(3) Estabilidade jurídica e regulatória: Conforme a busca por minério no mundo

cresce, as reservas ainda não exploradas cada vez mais se localizam em países que

tradicionalmente não costumam receber investimentos diretos. Devido a esse fato,

todos os indicativos de estabilidade jurídica e regulatória têm grande influência na

decisão de investimento de empresas de mineração como a Vale.

Dunning (1980) afirma que uma das condições para haver investimento estrangeiro

direto é a firma acreditar ter uma vantagem em relação a firma local. Como já explorado na

seção 5.2, os executivos da Vale foram capazes de enumerar algumas vantagens que a firma

teria em contraponto as empresas locais ao operar um ativo no estrangeiro. Seriam essas

vantagens:

- A diversificação da companhia e o acesso a clientes

- Condições Financeiras e acesso ao crédito

- Ganhos de Escala

- Filosofia de Negócios e Cultura

Dunning (1977) buscou mostrar quais seriam os tipos de atividade estrangeira que se

baseariam no investimento direto. Uma delas seriam atividades desenhadas para se obter

algum recurso natural. Embora o Brasil seja um dos países rico em muitos minérios,

analisando a história da Vale vemos momentos em que ela estabeleceu uma operação no

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estrangeiro com o objetivo de obter um recurso natural que ela não conseguia em seu país

natal. Alguns casos podem ser mencionados:

- A Vale foi explorar grandes minas de carvão tanto em Moçambique quanto na

Austrália. Apesar do Brasil ter reservas de carvão, a magnitude das reservas nesses países é

muito superior. Além disso, o tipo de carvão presente nesses países também é diferente, o

Brasil é rico em carvão energético, enquanto Moçambique e Austrália têm grandes

quantidades de carvão metalúrgico, que é usado em siderurgias no processo de fabricação do

aço. Conforme já citado, o carvão metalúrgico é importante para a Vale porque entra no

processo de produção de aço junto com o minério de ferro, principal produto da mineradora.

Portanto, oferecer tanto o minério de ferro, quanto o carvão metalúrgico, possibilita a Vale a

oferecer uma solução total a seus clientes.

- Hoje um dos principais produtos vendidos pela Vale é o Níquel, no entanto, nem

sempre essa commodity deve lugar de destaque no portfólio de produtos da empresa. A Vale

tem produção de níquel no Brasil, mas a grande maioria das reservas da companhia está no

exterior, principalmente no Canada. Nesse caso a busca não foi por um tipo de minério em si,

mas pela quantidade das reservas.

- Assim como no caso do Níquel, o Cobre é um minério explorado no Brasil pela Vale.

No entanto, a quantidade produzida localmente é pequena fazendo com que a Vale detenha

operações no estrangeiro para garantir a quantidade desejada desse recurso natural.

Outro pressuposto do modelo de Dunning que pôde ser testada durante as entrevistas

com executivos da Vale foi a de que as firmas buscam o investimento estrangeiro direto para

proteger ou aumentar suas vantagens de propriedade, ou ainda, eliminar ou reduzir as

vantagens de propriedades das firmas concorrentes. Segundo os entrevistados, o principal

motivo da internacionalização era a busca de diversificação, mas dois deles reconhecem que

impedir a compra do mesmo ativo internacional por outra empresa de mineração era um fator

relevante. Assim há indícios deque a Vale poderia estar buscando reduzir as vantagens de

propriedades de suas concorrentes ao decidir comprar algumas das suas operações

internacionais.

Segundo um dos entrevistados na época em que a Vale iniciou seu processo de

internacionalização da produção, logo após sua privatização, havia um movimento de

consolidação entre as mineradoras mundiais. O mercado vivia um momento onde as empresas

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que não crescessem corriam o risco de serem compradas. Embora para a Vale essa “ameaça”

não fosse tão relevante, já que a grande participação do governo na companhia a transformava

em um alvo difícil para uma aquisição hostil, esse momento vivido pelo mercado mundial

impulsionou a companhia para uma fase de grandes aquisições internacionais. A ideia que

norteava, não só a Vale mas a maioria das grandes mineradoras internacionais era ser a maior

mineradora do mundo. Essa estratégia mostrou-se não rentável e abriu espaço para um

momento, onde os planos de expansão da Vale e das demais mineradoras se tornou mais

conservadora. Na Vale essa mudança de estratégia se tornou visível no momento de troca do

CEO da companhia, Roger Agnelli, liderou a companhia na fase de grande expansão e depois

entregou o cargo a Murilo Ferreira que faz até agora uma administração mais conservadora e

focada em redução de custos.

Embora nenhum fato da internacionalização da Vale contradiga a teoria do Paradigma

Eclético, alguns pontos da teoria não puderam ser verificados e alguns aspectos parecem não

se adaptar a indústria de extração mineral. Por exemplo, uma das bases da teoria a vantagem

de internalização não pode ser verificada.

A teoria, construída pensando nos processos industriais assume uma mobilidade em

escolher os países que receberam investimentos produtivos que não é encontrada na indústria

de mineração, onde a produção tem que estar onde as reservas de minério estão. Além disso a

teoria assume duas opções: (1) produzir localmente e abastecer os países estrangeiro com

exportações ou (2) produzir no estrangeiro; essa é uma simplificação muito forte para a

indústria mineradora já que nela existem um descasamento entre produtores e consumidores,

nem sempre o país que tem as reservas minerais é um consumidor daquele minério e vice-e-

versa. Assim a teoria não é capaz de explicar alguns dos arranjos produtivos que ocorrem no

setor de mineração, onde muitas vezes a mineradora se internacionaliza para países que não

são consumidores e continuam a suprir grandes mercados consumidores com exportações.

O quadro 5.3 resume os achados pertinentes em relação às proposições do Paradigma

Eclético.

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Quadro 5.3: Análise das Proposições do Paradigma Eclético

Proposição Referência Achados

As vantagens de localização são fatores fundamentais para uma empresa decidir se deve se internacionalizar para um país

Dunning (1977) Comprovada, vantagens de localização foram citadas como importantes fatores na decisão sobre se internacionalizar para um país

Empresas se internacionalizam quando acreditam que possuem uma vantagem em relações as empresas locais

Dunning (1977) Comprovada, os executivos entrevistados apotam diversas vantagens da Vale em relação as empresas locais para justificar a internacionalização para determinados países

A busca por um recurso natural é um dos motivos que leva uma empresa ao investimento estrangeiro direto

Dunning (1977) Comprovada, a Vale se internacionalizou para diversos países tendo como objetivo acessar reservas minerais que não eram encontradas em seu país de origem

Proteger ou aumentar suas vantagens de propriedade, assim como, eliminar ou reduzir as vantagens de propriedade de suas concorrentes é um dos motivos que leva uma empresa a efetuar um investimento estrangeiro direto

Dunning (1977) Comprovada, a compra de ativos estrangeiros para que outras concorrentes não pudessem comprá-los demostra que proteger suas vantagens de propriedade ou reduzir as vantagens de propriedade de concorrentes é um dos fatores que levaram a Vale a se internacionalizar.

5.5 Aderências e Divergências em Relação ao Modelo de Uppsala

Segundo essa teoria o processo de internacionalização teria início quando o mercado

doméstico estivesse próximo a sua saturação. Aqui constatamos o primeiro ponto de

divergência entre a teoria e o caso da Vale. Como vimos, a empresa tem como objetivo a

exportação desde sua concepção, e nos primeiros anos da companhia os principais mercados

explorados eram internacionais. Além disso, mesmo olhando para a fase mais recente e

acelerada de investimentos no estrangeiro, após a privatização, temos o mercado interno

passando por um ótimo momento, como pôde ser constatado nas entrevistas com executivos

da empresa.

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Outra divergência aparece quando a teoria tenta prever os primeiros alvos do processo

de internacionalização, segundo a teoria as empresas buscariam os mercados que fossem o

mais familiar possível com seu mercado doméstico. Considerando que países como Estados

Unidos, Canadá, Alemanha, Japão entre outros receberam tentativas de internacionalização

antes de países mais próximos do Brasil, como Portugal ou nossos vizinhos da América do

Sul.

Uma das principais premissas da escola de Uppsala é que a internacionalização se

daria de forma gradual. Ou seja, as empresas iriam comprometendo mais e mais recursos em

uma dada operação no estrangeiro conforme fossem adquirindo informações e experiência

nesse mercado. Partindo dessa premissa, as empresas primeiramente estabeleceriam relações

com um mercado estrangeiro abastecendo esse através de exportações, conforme a empresa

fosse conhecendo esse mercado estrangeiro se sentiria mais segura para comprometer mais

recursos, e aprofundaria seus investimentos no país, abrindo uma representação comercial.

Por fim, depois de conquistar ainda mais conhecimento do mercado, ela comprometeria ainda

mais recursos abrindo uma unidade produtiva.

Quando comparamos esse ponto com a história de internacionalização da Vale,

encontramos sinais de aderência e divergência. Uma divergência fundamental é que devido às

peculiaridades do setor de mineração já mencionadas, os países produtores e consumidores

não são, em muitos casos, os mesmos. Assim a história da Vale está repleta de exemplos de

países onde a primeira ação da Vale foi a construção de uma unidade produtiva, sem passar

pelo processo gradual descrito pela teoria, como Moçambique. Do mesmo modo, é existem

muitos exemplos onde a aquisição de conhecimento sobre o mercado estrangeiro não resultou

em um aumento no comprometimento da Vale naquele país, são países em que a Vale

estabeleceu uma relação de exportação, mas essa relação nunca evolui para um investimento

produtivo, como o Japão.

Ainda segundo os executivos da Vale que foram entrevistados muitas vezes embora

seja desejável um processo gradual, surgem oportunidades muito boas de compras de reservas

minerais no mercado. Nesses casos, o comprometimento não seria gradual, e a empresa

passaria direto para a última etapa do processo, a implantação de uma unidade produtiva no

país estrangeiro.

No entanto, outros exemplos, parecem colaborar com a teoria. Conforme visto no

capítulo anterior o relacionamento da Vale com a China, começou por meio de exportações,

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depois migrou para um investimento produtivo mas ainda no sistema de joint ventures (com

sócios japoneses), e mais tarde a empresa se aventurou sozinha com um projeto produtivo no

país. Também podemos citar o caso do Oriente Médio, onde um processo parecido ocorreu.

Na realidade, a própria Escola de Uppsala admite que o processo por vezes pode não

ser tão gradual. Segundo Johanson e Vahlne (1990) existem três exceções, onde o

comprometimento poderia não ser tão gradual:

- Quando as firmas tivessem grandes recursos, diminuindo as consequências de um

maior comprometimento de recursos: A história mais recente de internacionalização da Vale,

após sua privatização, se enquadra bem nessa exceção. A Vale e o setor de mineração como

um todo viviam um excelente momento e a companhia disponibilizava de uma boa quantia

em caixa segundo seus executivos, o que acelerou e deixou menos gradual seu processo de

internacionalização.

- Quando as condições do mercado são estáveis e homogêneas, os conhecimentos

relevantes sobre o mercado podem ser obtidos de outra forma que não a experiência: Não

foram encontrados indicativos que corroborassem esse ponto.

- O conhecimento obtido em um mercado muito similar pode ser generalizado para o

mercado em que se deseja atuar, evitando assim parte do processo de acúmulo de

conhecimento e acelerando o processo: Aqui os entrevistados divergiram quanto a

aplicabilidade desse ponto para o caso Vale. Um dos entrevistados foi cético e apontou que a

maioria dos processos de internacionalização da empresa aconteceram quase que ao mesmo

tempo, não dando a oportunidade de a empresa digerir o conhecimento adquirido e usá-lo em

um outro país. Porém, outro entrevistado colocou a aquisição da Inco como um processo que

abriu as portas para todos os outros processos de internacionalização. Então, nesse caso, o

conhecimento ganho no processo da Inco, teria sido generalizado e usado para acelerar

processos posteriores.

Por fim, mais um aspecto da teoria foi discutido com os executivos entrevistados foi a

reversibilidade dos ativos internacionais da Vale. A teoria diz que quanto menor a

reversibilidade dos ativos maior o comprometimento da empresa no país estrangeiro. Os três

executivos ouvidos concordam que os ativos são reversíveis, já que podem ser vendidos para

outras mineradoras. No entanto, ressalvam que o processo pode ser mais complexo hoje, já

que existe um apetite menor das outras mineradoras para realizar aquisições. Analisando a

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história da Vale, vemos que ela saiu de poucos países, o que indica um elevado grau de

comprometimento com suas operações no estrangeiro.

O quadro 5.4 resume os achados relativos as preposições do Modelo de Uppsala.

Quadro 5.4: Análise das Proposições do Modelo de Uppsala

Proposição Referência Achados

O comprometimento com mercados estrangeiros é gradual, aumentando conforme as empresas ganham informações sobre tais mercados

Johanson e Vahlne (1977)

Parcialmente comprovada, parte dos processos de internacionalização da Vale apresentam essa gradualidade. Os que não apresentam muitas vezes se encaixam as exceções descritas pela própria teoria.

A internacionalização para um país pode acelerar a internacionalização para outra, fazendo com que ela seja menos gradual

Johanson e Vahlne (1977)

Parcialmente comprovada, a Inco foi por vezes citadas como um processo de internacionalização que contribui para que os processos posteriores fossem menos graduais. No entanto, o fato de um grande número de processos de internacionalização da Vale terem ocorrido quase que simultaneamente, enfraquece constatação da proposição.

Quanto menor a reversibilidade de um ativo o estrangeiro, maior o comprometimento da empresa com aquele mercado

Johanson e Vahlne (1977)

Inconclusivo, existe evidências de que a proposição é verdadeira mas o caso da Vale falhou em mostrar bons exemplos que a suportem.

O processo de internacionalização tem início quando o mercado local está em uma situação difícil

Johanson e Vahlne (1977)

Refutada, a Vale inicia seu processo de internacionalização antes mesmo de consolidar sua presença no mercado local.

5.6 Aderências e Divergências em Relação à Perspectiva de Networks

Segundo Johanson e Mattson (1988) os mercados são compostos por redes de

relacionamento entre as empresas. Uma empresa se internacionalizaria para acessar uma rede

de relacionamentos no estrangeiro ou para acompanhar uma firma com a qual já possuía um

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relacionamento no mercado local. Para analisar a aderência da teoria com o processo de

internacionalização vivido pela Vale podemos então testar dois fatores:

(1) A Vale se internacionalizou para algum lugar buscando acompanhar um parceiro de

negócio;

(2) A Vale foi a responsável pela internacionalização de alguma outra empresa da sua rede

de relacionamentos, ou seja, algum fornecedor ou parceiro seguiu a Vale para algum

mercado internacional.

Analisando a história da Vale e com base nas entrevistas com executivos, podemos

achar indicativos do primeiro fator. Por exemplo, segundo um dos entrevistados praticamente

todas as operações de joint venture em siderúrgicas da Vale, foram puxadas por clientes,

como por exemplo a siderúrgicas da Vale na Califórnia, Estados Unidos. Quando as

siderúrgicas migraram suas atividades para regiões do Oriente Médio, Ásia e norte da África,

a Vale buscou presença na região através da compra parcial da GIIC, no Bahrain. Outro

indicativo são as iniciativas para entrar no mercado chinês, conforme o mercado desse país

ganhou relevância global, a Vale começou a intensificar sua presença nele. Partindo das

exportações, para unidades produtiva no sistema de joint venture e depois, finalmente,

partindo para o investimento em uma unidade produtiva própria. O esforço dedicado a

consolidação de seus negócios na China pode ser interpretado como uma tentativa de obter

uma posição na rede de relacionamentos das empresas chinesas.

O segundo fator também pode ser verificado. A Vale parece ter incentivado a

internacionalização de seus fornecedores, em 2009 ela convidou diversos parceiros para

conhecerem seus projetos internacionais e suas ferramentas de apoio à internacionalização.

Segundo o coordenador técnico da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Boris

Macedo: “Este contato com os projetos no exterior de uma empresa como a Vale é uma

oportunidade para a realização de parcerias e pode ser o início de um processo de exportação

para pequenos empresários” (<http://www2.defatoonline.com.br/noticias/ultimas/02-12-

2009/vale-apresenta-seus-projetos-no-exterior-para-fornecedores>).

Os executivos entrevistados complementaram que a Vale usou em seus diversos

projetos internacionais os mesmos fornecedores globais que já usavam no Brasil, e que os

ganhos de escala de compras foi um dos motivos que levou a Vale a reduzir o custo nas

operações no exterior, quando comparado a um competidor local. Isso também aponta que a

Vale possui um network global, ou seja, uma rede de relacionamento com outras empresas

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que, como ela, atuam em diversas partes do mundo. Por fim, um dos entrevistados mencionou

que os fornecedores da Vale estão dispostos e se mostram muito receptivos a ideia de

acompanhar a companhia em empreitadas internacionais. Essa disposição por parte dos

fornecedores é muito importante para a Vale, sobretudo conforme a companhia entra em

países com mercados locais ainda em desenvolvimento, onde é difícil contratar fornecedores e

garantir mão de obra qualificada, como no caso de Moçambique.

Não foram encontrados fatores que contradigam a perspectiva de Networks, no entanto

a teoria tem capacidade limitada de explicar o processo de internacionalização da Vale. Um

dos pontos de divergência é a escolha de para onde se internacionalizar, muitas vezes,

contrariando a teoria, o país escolhido está totalmente fora da rede de relacionamentos que a

companhia possui. Ou seja, não é um país onde nenhum membro da rede de relacionamento

local da Vale, possua uma posição. Mais uma vez, isso decorre do fato que no setor de

mineração, a internacionalização para um determinado país ocorre pela existência de reservas

minerais no mesmo.

Quadro 5.5: Análise da Proposição da Teoria de Networks

Proposição Referência Achados

Empresas são "puxadas" a se internacionalizar por outras empresas da sua rede de relacionamento (fornecedores, clientes, parceiros...)

Johanson e Mattson, 1988

Comprovada, na história da Vale existem movimento de internacionalização ocasionados pelo desejo de seguir seus clientes, fora isso a Vale incentiva a internacionalização de seus fornecedores e parceiros

5.7 Aderências e Divergências em Relação ao Empreendedorismo

Internacional

A princípio a teoria de Empreendedorismo Internacional parece não ser apropriada

para entender o caso da Vale. Isso porque a teoria foi construída para entender as dinâmicas

de internacionalização de empresas de menor porte, em detrimento das teorias anteriores que

focavam em grandes corporações. Como a Vale foi uma empresa que já nasceu grande e atua

em um setor dominado por companhias de grande porte, há uma incompatibilidade natural

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entre sua história e essa teoria. No entanto, isso não quer dizer que não haja pontos de

aderência entre o caso Vale e a teoria do Empreendedorismo Internacional.

Primeiro, segundo Oviatt e McDougall, as companhias que se enquadram no

Empreendedorismo Internacional são aquelas que, desde início, buscam obter vantagens

competitivas através da venda do seu produto em múltiplos países. A Vale teve esse foco

internacional desde sua fundação, o mercado brasileiro por minério era pequeno e seus

principais clientes potenciais eram países no estrangeiro, como Estados Unidos e Japão.

A teoria também diz que o investimento estrangeiro não é um requisito, e que muitas

vezes essas empresas utilizam alianças estratégicas para o uso de recursos no estrangeiro.

Mais uma vez, temos uma semelhança entre a teoria e o caso da Vale, onde embora os

primeiros investimentos estrangeiros diretos tenham demorado a acontecer, desde cedo

observamos alianças estratégicas. Um exemplo, são os contratos de fornecimento que a Vale

assinou com siderúrgicas japonesas após a segunda guerra.

A figura do empreendedor e como ele afeta o comportamento internacional da

empresa também é objeto de estudo da teoria. Segundo a definição de Anderson (2000) o

empreendedor é aquele que realiza atividades empreendedoras independentes se ele é o

fundador ou dono da empresa. Nesse contexto, nas entrevistas com executivos da Vale, foram

citados alguns nomes de pessoas que se destacaram no processo de internacionalização da

empresa, e que por causa disso se encaixariam na figura de empreendedor da teoria. São eles:

- Roger Agnelli: O ex-CEO da companhia foi citado pelos três entrevistados, que

ressaltaram sua audácia e coragem. Ele foi o principal viabilizador do processo que

transformou a Vale em uma empresa realmente global. Liderou a companhia em uma época

que o contexto era de crescimento e expansão.

- Pedro Rodrigues: O diretor de fusões e aquisições, foi apontado por um dos

entrevistados como alguém muito ativo na prospecção de oportunidades de aquisição, cuja

algumas foram em países estrangeiros;

- Leonardo Moretzsohn: Diretor financeiro da Vale em Toronto, que segundo um

entrevistado, analisou muitas oportunidades de internacionalização para a empresa;

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- A equipe da área de exploração mineral foi, segundo um dos entrevistados que

preferiu não citar um único nome, foi extremamente ativa na prospecção de boas

oportunidades de exploração e compra de ativos pelo mundo.

Quadro 5.6: Análise da Proposição do Empreendedorismo Internacional

Proposição Referência Achados

A figura do empreendedor é fundamental nos processos de internacionalização de empresas

Anderson (2000) Comprovada, apesar do porte da Vale, os entrevistados citaram alguns nomes de empreendedores que foram de grande importância para o processo de internacionalização da empresa.

5.8 Aderências e Divergências em Relação à literatura Born Global

A teoria das Born Globals a princípio também parece pouco apropriada para analisar o

caso de internacionalização da Vale. A teoria nasceu em 1993, mais de 50 anos depois da

fundação da Vale, e buscava entender um fenômeno atual de empresas que já nascem globais.

Como esperados existem muitos pontos de divergência entre a teoria e a história de

internacionalização da Vale, mas há também alguns pontos de aderência.

Em relação as motivações que levam a internacionalização, a Vale tem algumas

semelhanças com as Born Globals, já que procurou ativamente mercados internacionais no

início de sus história e não esperou a deterioração das condições em seu mercado doméstico

para começar a explorar o mercado estrangeiro. A companhia também conta com uma

gerência engajada, segundo a teoria uma característica das Born Globals. Um ponto de

divergência nesse aspecto é que a empresa não explora nichos globais, contrariando a teoria.

Os objetivos internacionais da Vale se aproximam mais com as de empresas

tradicionais do que com as Born Globals. Os objetivos da Vale são o crescimento e

sobrevivência da empresa, aumento das vendas e ganho de market share. Enquanto, segundo a

teoria o foco das Born Globals seriam obter vantagens de “first-mover”, o “lock-in” dos

consumidores e a penetração em nichos globais.

Quanto ao padrão de expansão internacional, a Vale começou a sua exploração do

mercado internacional em concomitância (ou até mesmo antes) da exploração do mercado

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local, o que a aproxima da concepção de Born Globals. No entanto, seu foco em mercados

físicos de baixa tecnologia e menos sofisticado entre em conflito com a definição do campo

de atuação de uma Born Global, normalmente descrito como “de ponta”.

No aspecto da velocidade de internacionalização, também são encontradas aderências

e divergências. A teoria descreve a velocidade de empresas tradicionais como lenta e gradual,

e das Born Globals como rápida, atingindo múltiplos mercados por vezes. Analisando a

trajetória da Vale vemos que a empresa começou sua internacionalização de maneira rápida,

exportando para diferentes mercados internacionais em um curto espaço de tempo. Porém,

após esse período passou um bom tempo sem acelerar seu ritmo de comprometimento com os

mercados estrangeiros, ficando na fase de exportação e representação comercial por um longo

período. Em compensação quando iniciou o processo de investimento em unidades

produtivas, voltou a apresentar uma grande velocidade de internacionalização, explorando

oportunidades em múltiplos mercados ao mesmo tempo. Por isso, no quesito velocidade de

internacionalização a Vale apresenta algumas características em comum com as Born

Globals.

Por fim, analisaremos a estratégia internacional descrita na teoria como típica das Born

Globals e compará-la com o caso da Vale. Segundo a teoria as Born Globals têm uma

estratégia internacional estruturada, uma abordagem estruturada para a expansão internacional

e construção e expansão de um network global. Já as empresas tradicionais têm uma estratégia

mais ad-hoc e oportunista, com um comportamento reativo as oportunidades de exportação, e

assim tendo a expansão para novos consumidores e mercados não necessariamente

relacionados entre si. A Vale, mais uma vez, fica entre as duas definições, sem dúvida parte

de sua internacionalização foi reativa as condições do mercado de mineração mundial, mas

principalmente após sua privatização, se tornar uma companhia global virou um dos objetivos

da empresa, e foi perseguido de forma mais estruturada.

Em suma, a Vale não pode ser descrita como uma Born Global, mas ela tem

características em comum com esse tipo de empresa. O quadro 5.6 mostra a análise da

preposição do fenômeno das Born Globals.

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Quadro 5.6: Análise da proposição do fenômeno das Born Globals

Proposição Referência Achados

Existe um novo tipo de empresa, que desde sua fundação busca a internacionalização. Essas empresas buscam o mercado de internacional proativamente, se internacionalizando rapidamente e atingindo múltiplos mercados simultaneamente.

Rennie (1993) Parcialmente comprovada, a existência de características comum entre a Vale e as Born Globals, mostram que mesmo empresas tradicionais podem atuar como Born Globals em alguns aspectos

5.9 Resumo das Aderências e Divergências entre o Caso da Vale e as Teorias

Testadas

A análise do caso da Vale mostrou pontos de aderência e divergência com todas as

teorias de internacionalização objeto desse estudo. Claramente algumas teorias trazem mais

aderência do que divergências, ou vice-e-versa. O quadro 5.7 resume esses pontos para cada

uma das teorias.

Quadro 5.7: Aderência e divergências do caso da Vale as teorias testadas

Teoria Pontos de Aderência Pontos de Divergência

Teoria do Poder de

Mercado

Os entrevistados puderam citar vários

exemplos de habilidades que a Vale adquiriu

nas suas operações locais que mais tarde

foram transferidas para suas unidades no

estrangeiro (diversificação, acesso ao

crédito, escala, cultura), sugerindo que se

apropriar integralmente de uma vantagem

desenvolvida em seu país local é uma das

razões que leva uma firma a se

internacionalizar, como diz a teoria de

Hymer (1960).

A remoção de um competidor potencial,

umas das principais razões para a

internacionalização segundo a teoria, não

foi citado nas entrevistas. O fato que uma

empresa aumentaria sua participação no

mercado local o quanto fosse possível

antes de explorar mercados estrangeiros

também não é visto na história da Vale,

desde sua concepção ela atua como

exportadora, tendo o mercado

americanos, europeu e japonês como um

dos seus primeiros alvos.

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Teoria Pontos de Aderência Pontos de Divergência

Internalização

A Vale se internalizou para alguns países

buscando minérios que eram usados por

seus clientes juntos com o minério de ferro

já produzido por ela. Isso possibilitou a Vale

oferecer aos seus clientes soluções de

"pacote" sem recorrer ao mercado para

obtenção desses minérios. Reduzindo os

custos de transação da própria Vale e de

seus clientes.

Nenhuma das ações de

internacionalização da Vale foi motivada

pela internalização de um produto

intermediário que antes ela própria já

adquiria no mercado.

Paradigma Eclético

As vantagens de localização realmente

influenciam a decisão de internacionalização

(tanto produção, quanto representação

comercial). Os executivos da Vale apontam

várias vantagens da Vale operar um ativo

estrangeiro em relação a firmas locais, o que

é uma das condições para existência de

investimento estrangeiro direto segundo a

teoria. A Vale busca acesso a recursos

naturais ao se internacionalizar o que está

de acordo com a teoria que diz que esse é

um dos quatro tipos de atividade

estrangeiras baseado no investimento

direto. Além disso, a vontade de adquirir

ativos internacionais para que suas

concorrentes não pudessem comprá-los

indica que eliminar ou reduzir as vantagens

de propriedades de concorrentes pode ser

um dos motivos que levou a Vale a se

internacionalizar, como descreve a teoria.

Nenhum fato da internacionalização da

Vale contradiz a teoria do Paradigma

Eclético. No entanto, alguns fatos, como

as vantagens de internalização

impulsionando a internacionalização, não

puderam ser demonstrados. Além disso a

teoria, construída pensando em industrias

mais tradicionais, ignora algumas

peculiaridades da indústria de mineração.

Por exemplo, a escolha de produzir em

seu país de origem e abastecer mercados

por exportação ou produzir no

estrangeiro abastecendo o mercado

diretamente, não se adapta bem à

dinâmica do setor de mineração. Devido

ao descasamento entre os países

detentores de reservas minerais e os

países consumidores, muitas vezes

arranjos diferentes de produção global

são adotados.

Modelo de Uppsala

Alguns exemplos de internacionalização da

companhia, como para a China e Oriente

Médio, apresentam a gradualidade descrita

pelo modelo. Das três exceções que

gerariam um processo de

internacionalização menos gradual, duas

estão presentes no caso da Vale (grande

disponibilidade de recursos e experiência

em um país estrangeiro sendo generalizada

e, assim, acelerando a internacionalização

para outro)

A internacionalização ocorreu antes da

saturação do mercado local, os primeiros

alvos de internacionalização da

companhia apresentam poucas

semelhanças com o Brasil, contrariando a

teoria. Muitos dos processos de

internacionalização não são graduais, por

causa das características próprias do setor

de mineração.

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102

Teoria Pontos de Aderência Pontos de Divergência

Networks

A Vale teve movimentos de

internacionalização cuja motivação foi

seguir empresas da sua rede de

relacionamento, no caso clientes. Fora isso

foi verificado que a Vale incentiva a

internacionalização dos seus fornecedores e

parceiros para que esses a sigam em países

estrangeiros.

Embora não haja pontos que contrariam a

teoria, a mesma parece não ser suficiente

para explicar muitos dos processos de

internacionalização da empresa.

Especialmente os processos de

internacionalização que buscavam

garantir o acesso da companhia a reservas

minerais parecem não se adequar à

perspectiva de Networks.

Empreendedorismo

Internacional

A Vale tem como objetivo o mercado

internacional desde sua concepção, assim

como as empresas descritas na teoria. Como

descrito pela teoria a Vale não precisou de

investimentos estrangeiros direto para

inicializar sua internacionalização, utilizando

em um primeiro momento, alianças

estratégicas. A figura do empreendedor

como forte influenciador no processo de

internacionalização da empresa é vista na

Vale, apesar do porte da empresa.

A teoria foi pensada para explicar a

internacionalização de empresas de

menor porte e por isso não se enquadra

muitas vezes no caso da Vale. O foco em

um empreendedor individual não é tão

grande quanto descrito na teoria, devido

ao porte da empresa.

Born Globals

O fato da empresa ter sido concebida para

exportar e o atual objetivo da empresa em

se tornar uma empresa global, assim como a

estruturação e coordenação das suas ações

de internacionalização, aproximam a Vale

das Born Globals. Momentos de rápida

expansão internacional, e entrada em

múltiplos mercados de maneira

concomitante, o que exige uma rápida

velocidade de internacionalização, também

são características que a Vale compartilha

com as Born Globals.

O campo de atuação da Vale, o tradicional

setor de mineração, é diferente das Born

Globals, geralmente focadas em setores

tecnológicos. A Vale tem objetivos com

seus processos de internacionalização

(crescimento, aumento das vendas) mais

próximos de empresas tradicionais do que

de Born Globals (vantagens de first-

mover, lock-in). Após seus anos iniciais, a

empresa passou por um período onde seu

comportamento em relações a

oportunidades internacionais era mais

reativo, só voltando a intensificar a busca

ativa por oportunidade no estrangeiro

quando o mercado de mineração apontou

para um movimento de concentração.

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103

6. CONCLUSÃO

Esse capítulo tem como objetivo apresentar as conclusões do estudo, para isso ele se

inicia com uma recapitulação do trabalho feito. Em seguida as perguntas da pesquisa são

resgatadas e as conclusões em si são apresentadas. O capítulo se encerra com sugestões para

pesquisas futuras que podem dar continuação ao trabalho iniciado nessa pesquisa.

6.1 Sumário do Estudo

O presente trabalho tinha como objetivo analisar a trajetória real de

internacionalização de uma empresa e compará-la com algumas das mais importantes teorias

de internacionalização. Assim seria possível apontar pontos de aderência e divergência entre

as teorias e o caso analisado. Entre as teorias utilizadas no trabalho algumas apresentam

abordagem econômica e outras, abordagem comportamental. Além disso, o fenômeno das

Born Globals também foi objeto do estudo.

O caso escolhido para o trabalho foi a internacionalização da Vale, uma grande

multinacional brasileira do setor de mineração. A Vale foi escolhida por ser uma empresa de

grande porte, com extensiva presença internacional e ser uma das maiores exportadoras do

país. Todas essas características garantiram um caso com dados e informações suficientes

para o teste de todas as teorias selecionadas.

Para alcançar os objetivos desejados foi realizada uma pesquisa qualitativa, utilizando

o método do estudo de caso. Esse método foi escolhido baseado nas perguntas da pesquisa, o

fato do pesquisador não ter controle sobre os eventos pesquisados e a característica

contemporânea da pesquisa. A utilização de um estudo de caso simples em detrimento de

casos múltiplos ocorreu devido à natureza da pesquisa proposta, que tenta analisar o mesmo

caso sob a ótica de várias teorias.

A escolha do método do estudo de caso possibilitou a coleta de dados em diferentes

fontes, permitindo assim a triangulação das informações. Grande parte das informações foi

obtida através de entrevistas em profundidade com roteiros semiestruturados (APÊNDICE A

– ROTEIRO DE ENTREVISTA) com três executivos da Vale, sendo que dois deles atuavam

na empresa no momento da entrevista e um era um ex-funcionário. Os três entrevistados

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104

atuam no nível da diretoria da empresa e juntos têm experiências em diversas áreas, com

ênfase nos negócios internacionais da mesma. Além dessas entrevistas, foram utilizadas

fontes de dados secundárias tais como jornais e revistas e estudos de casos prévios sobre a

empresa. Também foram utilizados os instrumentos oficiais de comunicação da Vale, o site

institucional da companhia, comunicados a imprensa e relatórios financeiros e ambientais. O

livro editado pela Vale sobre a sua história também se mostrou grande fonte de informações.

6.2 Conclusões

A partir das análises do capítulo anterior é possível abstrair respostas para as perguntas

de pesquisa do presente trabalho.

- Como o processo de internacionalização e a atuação internacional da Vale

podem ser analisados à luz das principais teorias sobre internacionalização de

empresas?

O fato de várias teorias mostrarem pontos de aderência ao caso da Vale é um

indicativo de que sua internacionalização precisa ser entendida usando diferentes teorias. É

possível perceber que muitos dos movimentos de internacionalização da Vale têm como

objetivos fatores descritos pelas teorias econômicas, como por exemplo, a apropriação de uma

vantagem desenvolvida localmente, a busca de redução de custos de transação e a busca por

acesso a recursos naturais. No entanto, também é possível observar fatores comportamentais

nas decisões de internacionalização, como o seguimento de clientes da rede de relacionamento

da empresa e até mesmo a figura de empreendedores individuais incentivando o processo.

Talvez a maior surpresa tenha sido a verificação de fatores da teoria das Born Globals, apesar

da idade da empresa e do fato dela atuar em um mercado tradicional, ela guarda semelhanças

com as empresas modernas e tecnológicas descritas por essa teoria.

Também não existe nenhuma teoria que não apresentem nenhum ponto de divergência.

Embora algumas teorias não sejam diretamente contrariadas pelo caso da Vale, como no caso

do Paradigma Eclético e da perspectiva de Networks, há sempre fatores da teoria que não

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105

puderam ser exemplificados pelo caso da Vale ou movimentos de internacionalização da Vale

que não puderam ser explicado pela teoria.

Portanto, todas as teorias analisadas, contribuem para o entendimento do processo de

internacionalização da Vale, mesmo que algumas de maneira mais extensiva do que outras.

Ao mesmo tempo nenhuma delas tem, sozinha, o poder de explicar esse processo. O fato de

não existir uma teoria única para explicar o caso da Vale, parece derivar do tamanho da

empresa e a consequente diversidade nos seus processos de internacionalização. Cada um dos

processos individuais (a compra da canadense Inco, as joint ventures no Oriente Médio, os

investimentos na China...) podem se aproximar mais de uma das teorias, o resultado é um

macro processo de internacionalização tão rico e complexo que não podem ser explicados por

uma única teoria e que reúne elementos de aderência e divergência com várias delas.

- Qual teoria melhor explicaria o processo de internacionalização da Vale?

Como explicado anteriormente não existe uma teoria que sozinha explique o processo

de internacionalização da Vale. No entanto, algumas teorias são mais completas nessa

explicação e apresentam menos pontos de divergência. Algumas teorias como a Born Globals

e Empreendedorismo Internacional foram desenvolvidas para um contexto muito diferente do

vivido pela Vale. Elas foram pensadas para empresas mais novas e de indústrias menos

tradicionais do que o setor de mineração, o que afeta muito sua capacidade de explicação do

caso da Vale, mesmo tendo sido encontrados pontos de aderência entre a teoria e a realidade.

Outros modelos, como a perspectiva de Networks, são muitos bons para explicar

alguns dos movimentos de internacionalização da companhia e apresentam poucos pontos

contraditórios, no entanto, possuem uma abrangência pequena. Ou seja, são capazes de

explicar alguns movimentos de internacionalização muito bem, mas oferecem pouca ou

nenhuma explicação para outros movimentos.

Há ainda modelos onde o caso Vale, é reconhecido como uma exceção pela própria

teoria. É o caso do Modelo de Uppsala, que adverte para três situações onde a principal

característica do modelo, a gradualidade nos processos de internacionalização, poderia não ser

observada. A Vale apresenta duas dessas três situações, tornando compreensível uma

adaptação não tão extensiva entre o modelo e sua experiência de internacionalização. No

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106

entanto, é importante ressaltar que o modelo apresenta bom poder de explicação para alguns

dos movimentos de internacionalização da empresa, só é difícil generaliza-lo.

Os modelos econômicos em geral, embora também apresentem divergência com o

caso real, foram os que mais se mostraram versáteis para explicar boa parte dos processos de

internacionalização da empresa. Esse fato parece derivar do grande porte da empresa e do fato

dela ser uma companhia privada com ações negociadas em bolsas, o que contribui para que

fatores econômicos sejam mais presentes nas decisões do que fatores pessoais e

comportamentais.

Entre as teorias econômicas, a teoria da internalização, não pôde ser totalmente

comprovada, apesar de a companhia ter feito movimentos internacionais cujo o objetivo

parece ter sido diminuir os custos de transação dela e de seus clientes. Faltou a percepção

mais clara de que alguns dos movimentos internacionais buscaram internalizar atividades

antes providas pelo mercado. Além disso, vários processos de internacionalização da

companhia não acham explicação nessa teoria.

A teoria do Poder de Mercado apresenta um bom poder explicativo para o processo de

internacionalização da Vale. As explicações são genéricas o suficiente para ajudarem o

entendimento da maioria dos movimentos internacionais da companhia. No entanto, a teoria

apresenta algumas divergências significativas em relação ao caso Vale, principalmente, ao

definir que o início da internacionalização se dará quando o mercado doméstico está

saturando, enquanto o que se observa na Vale é uma busca pelo mercado internacional desde

sua concepção, além de inúmeros movimentos internacionais ocorrendo em fases de expansão

do mercado doméstico.

O Paradigma Eclético parece ser a teoria que melhor explica o caso de

internacionalização da Vale como um todo. Ela se adapta à grande maioria dos movimentos

internacionais vividos pela companhia, mostrando ser bastante abrangente. Não existem

contradições diretas entre a teoria e o caso da Vale, apesar de alguns aspectos da mesma não

sejam exemplificados no processo de internacionalização da companhia. Existe também um

problema de adaptação entre a teoria, que parece ter sido formulada considerando setores

industriais de produção de bens e não um setor como o de extração mineral, e o caso da Vale.

No entanto, todas as teorias em algum grau sofrem desse problema de adaptação.

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107

Resumindo, como explicado na pergunta anterior não existe uma teoria que sozinha

explique o processo de internacionalização da Vale e todas as teorias apresentadas ajudam

nessa explicação. No entanto, algumas têm um poder de explicação mais profundo ou mais

abrangente que outras. Teorias como a perspectiva de Networks, são ótimas para explicar

alguns dos movimentos de internacionalização, mas para outros não trazem praticamente

nenhuma explicação, ou seja, trazem uma explicação profunda, mas não abrangente.

Analisando as teorias apresentadas nessa pesquisa, a que parece reunir o melhor conjunto, ou

seja, um bom poder de explicação com uma abordagem abrangente o suficiente para tirarmos

conclusões sobre vários dos processos de internacionalizações da Vale (e assim sobre a

companhia como um todo) parece ser o Paradigma Eclético.

Podemos verificar também que em geral as teorias comportamentais parecem oferecer

uma explicação melhor para um movimento específico, mas são menos abrangentes. Em

contraponto, teorias econômicas são mais facilmente generalizadas para uma quantidade de

diferentes processos de internacionalização.

- Quais são os fatores que contribuem para que uma teoria se afaste ou se

aproxime da história de internacionalização da companhia?

Em geral não foi identificada uma regra que permita generalizar os fatores que fariam

uma teoria se aproximar ou não do caso da Vale. Entretanto é possível fazer algumas

observações. O tipo de abordagem da teoria, se econômica ou comportamental, parece

influenciar a capacidade de explicação da teoria em relação ao caso real. Como já visto a

abordagem comportamental parece mais assertiva ao explicar processos específicos enquanto

a abordagem econômica apresenta uma maior abrangência, ou seja, oferece informações sobre

uma gama maior de processos de internacionalização.

O setor que foi foco do desenvolvimento da teoria também parece influenciar a

capacidade da teoria explicar o caso da Vale. As teorias que parecem ter sido concebidas

considerando indústrias mais tradicionais, como é o caso das teorias econômicas, parecem ter

um poder de explicação maior do que as teorias concebidas para indústrias de alta tecnologia,

como a teoria das born globals.

Por fim, parece pertinente ressaltar a data de elaboração da teoria como um dos fatores

que determina sua capacidade de explicação dos processos de internacionalização. As teorias

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108

mais recentes, ao descreverem fenômenos também mais recentes, mostram uma habilidade

maior de explicar processos de internacionalização recentes, em detrimentos daqueles

ocorridos há mais tempo. Enquanto teorias mais antigas parecem explicar melhor os

movimentos de internacionalização mais antigos. Por exemplo, a perspectiva de Networks

explica importantes casos recentes de internacionalização da Vale, depois da sua privatização,

mas tem participação limitada na explicação dos processos de internacionalização mais

antigos, da época quando a empresa era estatal. Esse fato mostra uma evolução natural das

pesquisas de internacionalização, que parecem estar absorvendo em suas bases teóricas as

mudanças nos critérios usados para as tomadas de decisões de internacionalização das

empresas.

Com base na análise feita sobre o caso Vale, a partir das entrevistas e coleta de dados

secundários, pudemos abstrair respostas para nossas perguntas de pesquisa. Essas respostas

nos permitem concluir que todas as teorias testadas apresentam aderências e divergências

quando comparadas ao caso da Vale, não existindo uma única teoria que possa explicar o

processo de internacionalização dessa empresa. Algumas teorias tem um poder de explicação

sobre caso de internacionalização da empresa, maior do que outras, sendo que algumas teorias

são ótimas para explicar processos específicos, mas tem pouca abrangência para explicar o

processo de internacionalização da empresa como um todo. Fatores como o tipo de

abordagem da teoria, os setores econômicos considerados no momento da concepção da

mesma e a época em que a teoria foi desenvolvida, parecem influenciar o poder de explicação

da teoria em relação ao caso real observado na Vale. Todas as conclusões aqui feitas estão

sujeitas ao viés do ponto de vista do pesquisador, devido às características do método do

estudo de casos. As limitações do método também não nos permite fazer qualquer

generalização sobre as conclusões feitas para outros casos de multinacionais brasileiras.

6.3 Sugestões para Pesquisas Futuras

Essa pesquisa se limitou, por questões práticas e metodológicas, ao caso da Vale, seria

interessante repetir sua metodologia e objetivos para casos distintos. Nessa linha de raciocínio

dois grupos de empresas seriam especialmente interessantes:

- Outras empresas multinacionais brasileiras: Como observado na seção 3.3.2, outras

empresas nacionais atingem os requisitos para o desenvolvimento de tal trabalho, a escolha da

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Vale, obedeceu a limitação da proposta de um estudo de caso simples e foi baseada na

disponibilidade de dados e interesse pessoal do pesquisador. Entretanto existe a oportunidade

de um estudo semelhante para empresas como a Petrobras, JBS, Gerdau, Ambev, entre outras.

- Outras empresas atuantes no setor de mineração: Como parte das conclusões se

baseou nas especificidades do setor de mineração, seria interessante um trabalho similar com

outras empresas do mesmo setor, a fim de corroborar ou refutar essas conclusões. Algumas

empresas internacionais do ramo como a BHP Billiton, Rio Tinto, Anglo American, Glencore

e Xstrata, poderiam ser o alvo dessa pesquisa.

Outra possibilidade de pesquisa futura seria buscar entender casos mais específicos de

internacionalização. Ao longo da pesquisa foi possível perceber que o caso de

internacionalização da Vale é muito extenso, e na verdade é formado por processos menores

(compra da canadense Inco, expansão do negócio para a China, criação de joint ventures no

Oriente Médio, entre vários outros). Muitas vezes cada um desses processos tem

características únicas e relevância suficiente para ilustrar um estudo por si só, assim seria

possível analisar mais profundamente o processo de internacionalização. A compra da Inco é

um excelente caso para ser estudado mais profundamente, devido sua relevância para a Vale e

para o Brasil como um todo, aqui conseguimos analisa-lo apenas em linhas gerais.

Em alguns momentos os entrevistados sugeriram que alguns dos comportamentos da

Vale teriam origem no fato dela ser uma empresa brasileira. Apontando assim possíveis

diferenças entre os processos de internacionalização das empresas desse país quando

comparadas a empresa de outras origens. O fato desta dissertação ter apenas um estudo de

caso, não permitiu a comprovação dessas hipóteses. Uma pesquisa futura poderia comparar os

processos de internacionalização de empresas semelhantes (mesmo porte, setor de atuação,

idade, entre outras características) brasileiras e estrangeiras, afim de inferir sobre o quanto o

fator “país de origem” interfere nos processos de internacionalização.

Por fim, outra oportunidade é, uma vez identificada a teoria do Paradigma Eclético,

como a que parece fornecer o maior poder explicativo para o caso da internacionalização da

Vale, aprofundar a análise do caso sob a ótica dessa teoria. Como o presente estudo tinha

como objetivo analisar sete teorias, o nível de profundidade em cada uma delas foi limitado,

um trabalho dedicado exclusivamente ao Paradigma Eclético ampliaria o entendimento do

processo de internacionalização da Vale.

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110

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APÊNDICE

APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA

Data:

Nome do Respondente:

Cargo / Empresa Atual:

Cargos Ocupados na Vale:

1. Quais motivos levaram a Vale a se internacionalizar?

2. Quais os indicadores que a Vale analisa ao decidir se deve ou não estabelecer um

relacionamento com um país estrangeiro e qual deve ser a natureza desse investimento

(exportação, representação comercial ou produção)?

3. Algum dos investimentos internacionais da Vale foi motivado pela vontade de passar a

produzir um insumo que antes era comprado no mercado? Ou passar a efetuar um

processo que antes era terceirizado?

4. Quais são as vantagens da Vale, em relação as empresas locais, para explorar uma

operação no estrangeiro?

5. Existe algum minério que a Vale não encontra no Brasil e por isso busca explorá-lo

em suas operações no estrangeiro?

6. As operações no estrangeiro buscam apenas contribuir financeiramente para a

empresa? Ou há também uma função estratégica? Se sim, qual seria essa função?

7. Quais geralmente são as etapas do processo de internacionalização? O processo

costuma ser gradual? Se sim, qual é a importância do processo ser gradual?

8. A experiência na internacionalização para um país acelerou a internacionalização para

outro?

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9. Como era a situação da Vale no mercado nacional quando ela iniciou seu processo de

internacionalização?

10. A Vale já saiu de algum mercado estrangeiro? O quanto os investimentos feitos no

estrangeiro são reversíveis? Há no mercado firmas interessadas em comprar os ativos

estrangeiros da Vale, caso ela decida desinvestir?

11. Qual a importância da rede de relacionamentos da Vale (fornecedores, compradores,

parceiros e até concorrentes) em sua estratégia de internacionalização? A Vale já se

internacionalizou para algum país para acompanhar um parceiro de negócios, como

um cliente, por exemplo? Ou a Vale já incentivou a internacionalização de algum

parceiro de negócios?

12. No processo de internacionalização da Vale alguma pessoa teve um destaque especial?

Alguém atuou como empreendedor, descobrindo e desenvolvendo uma oportunidade

internacional específica?