O processo de desnaturalização da realidade

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1º ano do EM – O processo de desnaturalização ou estranhamento da realidade A primeira pergunta que surge na disciplina de Sociologia para o 1º ano é: O que é a Sociologia? A sociologia é a ciência que estuda a sociedade os fenômenos sociais. Para entendermos melhor o que a Sociologia vai se propor a ensinar, devemos olhar de forma mais ampla onde ela vai se enquandrar. O nome Sociologia não expressa a amplitude da disciplina no Ensino Médio, mas sim o nome Ciências Sociais, que abrange, além da Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política. A sociologia tem cerca de 2 séculos, idealizada por filósofos, como Augusto Comte, que queriam estruturar uma ciência que pudesse dar explicação sobre fenômenos que estes acreditavam não mais serem possíveis sere dados pela filosofia. Assim, ela vem se aperfeiçoando desde então, com nomes famosos como Émile Durkheim, Max Weber, Karl Marx, os famosos “Três Porquinhos”. Este é um pequeno momento histórico da Sociologia no país: A sociologia como disciplina surge no Brasil em 1925, introduzida na Reforma Rocha Vaz. Então, assim como disciplina do Ensino Secundário, ela também passa a ser cobrada nos vestibulares da época. Entretanto, Rui Barbosa defendia a colocação da disciplina desde 1882, quando já era muito relevante no ensino em países europeus; Em 1942, Getúlio Vargas, na época ditador no país, torna a disciplina optativa. A disciplina se mantém no Curso Normal como Sociologia Geral e Sociologia da Educação; No ano de 1971, na época da Ditadura, a disciplina, ainda optativa, era mal-vista por ser entendida como associada ao comunismo – a ideologia política a qual os militares afirmavam que deveriam impedir que se alastrasse no Brasil quando tomaram o poder em 1964. Nas ultimas 3 décadas, com o enfraquecimento da ditadura, os sociológos se voltaram para a necessidade de novamente implementar este campo do conhecimento na educação dos jovens no país. Entretanto, houve um impasse de todas as maneiras. Assim, desde a implementação da lei que inseria novamente a sociologia no Ensino Médio até a sua implementação no estado de São Paulo, foram 5 anos. Assim, o ano de 2010 é o segundo ano onde a sociologia se mostra como uma nova ferramenta na formação intelectual, politica e social dos jovens paulistas. Um aspecto interessante, e possivelmente o mais importante desta disciplina, é a ferramenta de trabalho dos cientistas sociais: o olhar desnaturalizado em detrimento do senso comum. Muitas das idéias que se difundem do nosso dia-a-dia são condicionadas com idéias absurdas que não ajudam a entender fenômenos e nem problemas sociais/políticos/culturais. Assim, quando olhamos para uma determinada situação sob uma ótica

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1º ano do EM – O processo de desnaturalização ou estranhamento da realidade

A primeira pergunta que surge na disciplina de Sociologia para o 1º ano é: O que é a

Sociologia? A sociologia é a ciência que estuda a sociedade os fenômenos sociais. Para

entendermos melhor o que a Sociologia  vai se propor a ensinar, devemos olhar de

forma mais ampla onde ela vai se enquandrar. O nome Sociologia não expressa a

amplitude da disciplina no Ensino Médio, mas sim o nome Ciências Sociais, que

abrange, além da Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política.

A sociologia tem cerca de 2 séculos, idealizada por filósofos, como Augusto Comte,

que queriam estruturar uma ciência que pudesse dar explicação sobre fenômenos que

estes acreditavam não mais serem possíveis sere dados pela filosofia. Assim, ela vem

se aperfeiçoando desde então, com nomes famosos como Émile Durkheim, Max

Weber, Karl Marx, os famosos “Três Porquinhos”.

Este é um pequeno momento histórico da Sociologia no país:

A sociologia como disciplina surge no Brasil em 1925, introduzida na Reforma Rocha

Vaz. Então, assim como disciplina do Ensino Secundário, ela também passa a ser

cobrada nos vestibulares da época. Entretanto, Rui Barbosa defendia a colocação da

disciplina desde 1882, quando já era muito relevante no ensino em países europeus;

Em 1942, Getúlio Vargas, na época ditador no país, torna a disciplina optativa. A

disciplina se mantém no Curso Normal como Sociologia Geral e Sociologia da

Educação;

No ano de 1971, na época da Ditadura, a disciplina, ainda optativa, era mal-vista por

ser entendida como associada ao comunismo – a ideologia política a qual os militares

afirmavam que deveriam impedir que se alastrasse no Brasil quando tomaram o poder

em 1964.

Nas ultimas 3 décadas, com o enfraquecimento da ditadura, os sociológos se voltaram

para a necessidade de novamente implementar este campo do conhecimento na

educação dos jovens no país. Entretanto, houve um impasse de todas as maneiras.

Assim, desde a implementação da lei que inseria novamente a sociologia no Ensino

Médio até a sua implementação no estado de São Paulo, foram 5 anos. Assim, o ano

de 2010 é o segundo ano onde a sociologia se mostra como uma nova ferramenta na

formação intelectual, politica e social dos jovens paulistas.

Um aspecto interessante, e possivelmente o mais importante desta disciplina, é a

ferramenta de trabalho dos cientistas sociais: o olhar desnaturalizado em detrimento

do senso comum. Muitas das idéias que se difundem do nosso dia-a-dia são

condicionadas com idéias absurdas que não ajudam a entender fenômenos e nem

problemas sociais/políticos/culturais. Assim, quando olhamos para uma determinada

situação sob uma ótica crítica, possibilitamos entender suas nuances e mudarmos

caso esta se mostre perniciosa.

Imediatismo do olhar

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Para todas as coisas que temos contato, desde as mais comuns quanto as mais imprevisíveis,

tentamos encontrar uma explicação. Assim, baseados no cabedal que acuulamos durante a

vida, damos respostas as nossas indagações. Existe algum problema nisso? Depende. Na

maioria dos casos, sim. Aquilo que chamamos de olhar científico possibilita uma nova

ferramenta para se avaliar todas as coisas que nos rodeiam, mesmo sabendo que todos nós,

sem exceção, estamos carregados de senso comum. Essa ferramenta tem uma base

puramente racional, e, como tal, procura se distanciar ao máximo de todas as possíveis idéias

preconcebidas de quem está trabalhando com ela. É um trabalho moroso, mas recompesador,

uma vez que possibilita, dentre outras coisas, derrubar dogmas e preconceitos nocivos.

Quando os portugueses chegaram ao Brasil em 1500, não entendiam quam eram aqueles

serem nus, sem maldade no olhar, nem as árvores, os frutos, os animais. Assim, nas primeiras

cartas, os navegantes tentavam explicar toda a riqueza da “Terra de Santa Cruz”: O que era

uma manga, jabuticaba ou babaçu? Como descrever algo que além-mar ninguém nunca viu.

Tentaram resolver esse problema comparando com aquilo que já haviam visto, seja com

animais, com plantas. Neste mesmo caso, animais fantásticos, como o unicórnio, pode ter sido

apenas um erro e ignorância: Alguns creem que pode ter sido apenas um cervo com alguma

alteração genética. E como “quem conta um conto, aumenta um ponto”, todas as

características místicas podem ter surgido através de boatos.

Tudo isso está respaldado naquele tal cabedal, o qual chamados de senso comum. As bases do

senso comum seriam:

Imediatismo: o senso comum se caracteriza muitas vezes por ser simplista, ou seja, muitas

vezes não e fruto de uma reflexão mais cuidadosa. Não se preocupa em definir nada muito

bem, não tem, portanto, preocupação com a terminologia (ou seja, o significado das palavras)

que emprega.

Superficialidade: a superficialidade dessa forma de conhecimento está relacionada com o fato

de que ele se conforma com a aparência, “com aquilo que se pode comprovar simplesmente

estando junto das coisas: ‘porque vi’, ‘porque senti’, ‘porque disseram’, ‘porque todo mundo

diz’.” (ANDER-EGG apud MARCONI e LAKATOS, 2003, p. 77)

Acriticidade: outra característica é o fato do senso comum ser, muitas vezes, uma forma de

conhecimento que não aprofunda sobre que se vê, não avaliando, criticando ou questionando o

que é dito.

Sentimentalismo: muitas vezes nossa visão da realidade é excessivamente marcada pelas

nossas emoções normalmente tiram a objetividade da pessoa, pois são pessoais e não estão

baseadas na razão. Elas podem fazer com que ajamos de forma irracional.

Preconceito: o senso comum é muitas vezes repleto de preconceitos. O preconceito é atitude

de achar que já sabe, sem conhecer algo de verdade, pois usa explicações prontas que estão

repletas de juízos de valor. Portanto, a atitude preconceituosa com relação à realidade e a tudo

o que a cerca é aquela da pessoa que julga sem conhecer, com base no que acredita que é ou

no que deva ser.

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O Processo de “desnaturalização” da realidade.

A Sociologia sempre foi uma disciplina presente em todas as escolas, entretanto, durante momentos de ditadura em

nosso país, o ensino de Sociologia sofreu uma série de complicações.A Sociologia já esteve presente no currículo do

Ensino Médio, visto que, acreditava-sena importância da disciplina para todos aqueles que necessitam entender e se

situar na sociedade em que vivem. Porém, mesmo sendo de extrema importância, a Sociologia foi retirada do ensino

por razões ideológicas e políticas. Sociologia: a ciência que estuda o homem e as suas relações na sociedade.

Construção do “olhar sociológico.”

A base de qualquer olhar sociológico é o fato de ter uma visão de estranhamento da realidade, ou seja, deve-se

desnaturalizar o olhar. O objetivo disso é tomar consciência de que o olhar jamais é neutro, nem natural, mas, sim, que

está repleto de prenoções. Existem basicamente dois tipos de “olhar”:

•Olhar do Senso Comum: No conhecimento comum que é uma forma válida de pensamento, mas não é o único

possível.

•Olhar Científico: No conhecimento científico, muitas vezes parte do senso comum para olhar a realidade, mas ele

sempre vai além do senso comum.

Como é adquirido?

O senso comum normalmente é o resultado das experiências que a pessoa vive nos seus ambientes próximos,

exemplo: a família, os amigos, o bairro etc.O resultado de um conhecimento científico é totalmente embasado em

teorias que anteriormente foram devidamente comprovadas por cientistas.

Obs:

Nosso olhar nunca é um olhar neutro, ele está sempre repleto dessas prenoções que vêm do senso comum. Para

lançar um olhar sociológico é necessário afastar-se dessa forma, pois a Sociologia é uma ciência e não se faz ciência

baseando-se no senso comum.

Problemas do Olhar de Senso Comum

O problema existente em olhar a realidade com o Senso Comum seria a fragilidade de suas comprovações. Sem

base científica aquilo que é verdade em um determinado lugar pode não ser em outro um pouco mais distante. O

Senso Comum produz vários tipos de “olhares”, entre eles são:

a) imediatista: é simplista, ou seja, muitas vezes não é fruto de uma reflexão profunda e cuidadosa. Não tem

preocupação em definir realmente as coisas.

b) superficial: se conforma com a aparência das coisas, como se pudesse comprovar somente por estar junto das

coisas;

c) acrítico: não questiona o que é dito e simplesmente aceita;

d) cheio de sentimentos: marcado por emoções que normalmente tiram das pessoas sua objetividade;

e) cheio de preconceitos: conceitua antecipadamente as coisas, ou seja, a atitude de achar que já sabe sem entender

profundamente uma coisa.

No caso da Sociologia, deve-se ter em mente que sempre será necessário fazer um esforço mental de procurar

diferentes ângulos para conseguir aproximar-se da realidade. Afastar-se dos juízos de valor é um cuidado

metodológico fundamental do estudante de sociologia para que ele possa entender as situações sociais.

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Sociologia no Ensino Médio: o estranhamento e a desnaturalização dos fenômenos sociais na prática

pedagógica

novembro 30, 2011 in Uncategorized

O objetivo deste artigo surge na tentativa de se discutir algumas questões e possibilidades do ensino da disciplina de

Sociologia no Ensino Médio a partir de um caminho de análise que sugere a ampliação das alternativas para a prática

docente.

Num primeiro momento, é importante destacar um princípio epistemológico que caracteriza a estrutura da pesquisa e

do ensino das Ciências Sociais, ou seja, que aparece como perspectiva, como fundamento para o desenvolvimento

do ensino da Sociologia no Ensino Médio: O movimento de estranhamento e desnaturalização.

O movimento do estranhamento é o ato de estranhar no sentido de se admirar, de se espantar diante de algo que não

se tem conhecimento ou costume; pode-se alcançar o “estranho” ao perceber algo ou alguém de forma diferente do

que se conhece, ao assombrar-se em função do desconhecimento de certos fatores, ao se sentir incomodado diante

de um fato novo ou de uma nova realidade, ao não se conformar com algo ou com a situação em que se vive; ao não

se acomodar. Ao rejeitar.

O Estranhamento, nesse sentido, se apresenta ao ensino das Ciências Sociais como uma via que possibilita no

individuo o surgimento de uma vontade primeira do saber, de uma vontade em se conhecer o novo, em se habituar a

ele e assim o entender melhor. Surge como uma ferramenta essencial para o início da problematização de um

fenômeno social a partir das perguntas que suscita em cada aluno: “Por que isso ocorre?”, “Sempre foi assim?”, “É

algo que só existe agora?”. Por exemplo, frente à questão da violência podemos perguntar: “Houve violência em todas

as sociedades?”, “Como era a violência na Antiguidade?”, “Em outros países, há a violência que vemos no nosso

cotidiano?”, “Há um só tipo de violência?”, “Quais as razões para tais e quais tipos de violência?”, etc. Estranhar as

situações, inclusive as que fazem parte da experiência de vida do aluno, é uma condição necessária às Ciências

Sociais. O estranhamento possibilita o início de um movimento capaz de caminhar para além das interpretações

marcadas pelo senso comum. Surge como uma maneira de se começar a estruturar o objetivo de uma análise

sistemática da realidade.

Ao lado do estranhamento, outro movimento epistemológico tem papel importante na fundamentação do ensino da

disciplina de Sociologia no Ensino Médio: a desnaturalização.

É comum ouvirmos no cotidiano da prática pedagógica a expressão: “Isso é natural”. Esta expressão aponta para a

idéia de algo que sempre foi, é ou será da mesma forma, imutável na relação tempo e espaço. Em consequência, por

exemplo, podemos nos deparar com uma situação assim: “É natural que exista a desigualdade social, é normal, afinal

ela sempre existiu e sempre existirá. O mundo é assim mesmo”. Dessa forma, os indivíduos manifestam o

entendimento de que os fenômenos sociais são de caráter natural, ou seja, não lhes é sabido que tais fenômenos são

na verdade constituídos socialmente, isto é, historicamente produzidos e reproduzidos, resultado das relações sociais

em suas mais diversas estruturas. A desnaturalização das concepções a respeito dos fenômenos sociais surge como

um papel central do movimento do pensamento sociológico.

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Há desestruturação da tendência de se compreender as relações sociais, as instituições, os modos de vida e de

organização das sociedades, o aparato político, etc., a partir de argumentos “naturalizadores” possibilita o resgate,

primeiro, da historicidade desses fenômenos e, segundo, da noção de que certas mudanças ou continuidades

históricas decorrem e dependem de um jogo de poder calcado em razões objetivas.

Um paralelo entre a noção do estranhamento e da desnaturalização nos leva de encontro à noção de que a vida em

sociedade estrutura-se de forma dinâmica, ou seja, está em constante processo de transformação; constitui-se a partir

da multiplicidade das relações sociais que, por sua vez, são capazes de revelar as mediações e as contradições da

realidade objetiva de um período histórico. É também apreendida por um conjunto de ações capazes de alterar o

curso dos acontecimentos, provocando transformações notórias nas formas de organização humana. O saber

sociológico, portanto, pode ser construído a partir da sistematização teórica e prática do processo social.

Dessa forma, a postura inicial de atuação das Ciências Sociais no Ensino Médio pode ser compreendida pela

superação do senso comum em direção a uma análise científica da sociedade. O movimento de estranhamento e

desnaturalização mesmo diante de situações tidas como óbvias, como, por exemplo, na temática familiar, confere

especificidade ao ensino da Sociologia, pois permite que fenômenos aparentemente consolidados suscitem dúvidas,

revelem contradições, etc.

O processo de estranhamento oferece ao aluno um ponto de partida, uma possibilidade para o desenvolvimento de

um saber capaz de levar o indivíduo de encontro a um debate mais amplo. Somado a isso, a desnaturalização surge

como o início da superação de certas noções consolidadas naturalmente, o que permite que o aluno ultrapasse os

limites do senso comum. Esse movimento permite ao individuo inquietar-se criticamente com questões corriqueiras e

consagradas pela normalidade.

O pensamento sociológico propicia aos jovens o exame de situações que fazem parte do seu dia a dia, imbuídos de

uma postura crítica e investigativa, quando traz à tona a tarefa do estranhamento e da desnaturalização dos

fenômenos sociais. Despertar no aluno a sensibilidade para perceber e modificar o mundo à sua volta deve ser a

tarefa de todo professor.

Bibliografia:

Coleção Explorando o Ensino – Sociologia : ensino médio / Coordenação Amaury César Moraes. Brasília: Ministério

da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. (Coleção Explorando o Ensino; volume 15).