"O nosso verde, o da agroecologia, é um verde mais espontâneo, mais democrático".

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 8 • nº1612 Palmeira dos Índios Agosto/2014 “O nosso verde, o da agroecologia, é um verde mais espontâneo, mais democrático”. No mundo em que vivemos ainda soa estranho chamar um homem de flor, mas é assim que Florisval é conhecido, e isso é uma das coisas que faz dele um grande homem. Nasceu em uma casa em Arapiraca cercada por uma grande roça de fumo, onde os pais tinham se refugiado da seca, analfabeto até os 13 anos de idade, o quarto de 12 irmãos, desde cedo inconformado com a vida imposta pelo acaso, já queria trilhar seu próprio caminho. Apesar de ter nascido em Arapi- raca Flor e sua família moravam no sitio Santa Rosa perto do distrito que viria a ser o município de Craíbas. Flor sempre foi e é cercado de pessoas e inquietações, políti- ca partidária, movimentos sociais, fazeres, historias e amores. “A primeira vez que me envolvi com a sociedade foi a partir dos 12 ou 13 anos, despertei para o mundo em uma viajem a olho D’agua das Flores, quando vi uns meninos da minha idade, bem instruídos. Nossa comunidade não tinha escola e tínhamos que ficar na roça. Nessa viajem me decepcionei muito comigo mesmo, só consegui pegar um ônibus porque perguntei. Quando voltei pra casa pensei que não podia ficar desse jeito, provoquei primos e vizinhos, essa foi minha primeira provocação, provoquei todos a estudar. Eu sabia que o Tonho estuda- va, então disse que tinha um grupinho de amigos querendo estudar, umas seis pessoas. Tinha que ser cedo da noite, pois o Tonho acordava Pela primeira vez em Brasília participou do 3º Congresso da Confede- ração Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, no inicio da década de 1980 “nunca tinha visto cidade grande, nem hotel cinco estrelas. O povo do nordeste não conhecia o próprio rosto. O camarada quando ia entrar no elevador e via o reflexo no espelho achava que era outra pessoa.” Recorda - se dos inúmeros momentos de embaraços em que ele e seus companheiros de congresso viveram, inclusive o lamentável acidente de um que teve suas costelas quebra- das ao ficar preso na porta do elevador do hotel. as 4:00 horas para ir estudar de bicicleta em Arapiraca. Com 14 anos, aprendi a fazer o nome e ler algumas palavras. Foi a primeira vez que articulei um grupo.” Suas historias são o reflexo de períodos historicos e aconteci- mentos que marcaram um povo, no caso o povo do semiárido alagoa- no, onde Flor é um de seus representantes que traz de forma muito viva o sofrimento e a luta por um mundo melhor. Nas idas e vindas, decorrente da seca de 70 a família tornou a morar em Arapiraca, e lá Flor e seus irmãos, trataram logo em arranjar escola, “eles não aceitavam, porque não tínhamos certificados. Mas eu soube que tinha uma escola abrindo no Alto do Cruzeiro, que fez um teste e nos aceitou” Novamente em Santa Rosa na década de 70 continuou os Realização Apoio bom”. Depressão desejo de morrer quando ficava só. “Não queria viver”, desenvolveu o mal Parkinson, dois anos depois o corpo travou, não conseguia tomar banho, calçar as botas, a filha Isabela e a esposa Amara faziam isso, o olhar distante, não escrevia o próprio nome. “Só sei que o que tem vida, um dia morre”. Um novo tratamento, novos remédios, foi melhorando, “graças a Deus e ao meu Padrinho Cícero Romão, voltou ao partido, as reuniões da associação, com tudo isso, foi criando vida novamente. O sitio adoeceu com ele, ficou sem cuidados, mas quando tornou, limpou a casa, voltou a plantar, sete anos a terra esperou e a mata cresceu, brotando a mais belas riquezas da caatinga, hoje ao redor de casa experimenta mais ou menos de 30 espécies de plantas nativas da caatinga, entre fruteiras, hortaliças e plantas ornamentais. Seu sitio se tornou laboratório agroecologico e de experiências de convivência com o semiári- do, diante sua vasta experiência Flor é referencia como agricultor experimentador e educador popular onde o menino que tanto buscou formação se tornou um grade formador de pessoas.

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No mundo em que vivemos ainda soa estranho chamar um homem de flor, mas é assim que Florisval é conhecido, e isso é uma das coisas que faz dele um grande homem. Nasceu em uma casa em Arapiraca cercada por uma grande roça de fumo, onde os pais tinham se refugiado da seca, analfabeto até os 13 anos de idade, o quarto de 12 irmãos, desde cedo inconformado com a vida imposta pelo acaso, já queria trilhar seu próprio caminho. Apesar de ter nascido em

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 8 • nº1612Palmeira dos Índios

Agosto/2014

“O nosso verde, o da agroecologia, é um verde mais espontâneo, mais democrático”.

No mundo em que vivemos ainda soa estranho chamar um homem de flor, mas é assim que Florisval é conhecido, e isso é uma das coisas que faz dele um grande homem. Nasceu em uma casa em Arapiraca cercada por uma grande roça de fumo, onde os pais tinham se refugiado da seca, analfabeto até os 13 anos de idade, o quarto de 12 irmãos, desde cedo inconformado com a vida imposta pelo acaso, já queria trilhar seu próprio caminho. Apesar de ter nascido em Arapi-raca Flor e sua família moravam no sitio Santa Rosa perto do distrito que viria a ser o município de Craíbas. Flor sempre foi e é cercado de pessoas e inquietações, políti-ca partidária, movimentos sociais, fazeres, historias e amores.“A primeira vez que me envolvi com a sociedade foi a partir dos 12 ou 13 anos, despertei para o mundo em uma viajem a olho D’agua das Flores, quando vi uns meninos da minha idade, bem instruídos. Nossa comunidade não tinha escola e tínhamos que ficar na roça. Nessa viajem me decepcionei muito comigo mesmo, só consegui pegar um ônibus porque perguntei. Quando voltei pra casa pensei que não podia ficar desse jeito, provoquei primos e vizinhos, essa foi minha primeira provocação, provoquei todos a estudar. Eu sabia que o Tonho estuda-va, então disse que tinha um grupinho de amigos querendo estudar, umas seis pessoas. Tinha que ser cedo da noite, pois o Tonho acordava Pela primeira vez em Brasília participou do 3º Congresso da Confede-

ração Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, no inicio da década de 1980 “nunca tinha visto cidade grande, nem hotel cinco estrelas. O povo do nordeste não conhecia o próprio rosto. O camarada quando ia entrar no elevador e via o reflexo no espelho achava que era outra pessoa.” Recorda - se dos inúmeros momentos de embaraços em que ele e seus companheiros de congresso viveram, inclusive o lamentável acidente de um que teve suas costelas quebra-das ao ficar preso na porta do elevador do hotel. as 4:00 horas para ir estudar de bicicleta em Arapiraca. Com 14 anos, aprendi a fazer o nome e ler algumas palavras. Foi a primeira vez que articulei um grupo.” Suas historias são o reflexo de períodos historicos e aconteci-mentos que marcaram um povo, no caso o povo do semiárido alagoa-no, onde Flor é um de seus representantes que traz de forma muito viva o sofrimento e a luta por um mundo melhor.Nas idas e vindas, decorrente da seca de 70 a família tornou a morar em Arapiraca, e lá Flor e seus irmãos, trataram logo em arranjar escola, “eles não aceitavam, porque não tínhamos certificados. Mas eu soube que tinha uma escola abrindo no Alto do Cruzeiro, que fez um teste e nos aceitou” Novamente em Santa Rosa na década de 70 continuou os

viajem me decepcionei muito comigo mesmo, só consegui pegar um ônibus porque perguntei. Quando voltei pra casa pensei que não podia ficar desse jeito, provoquei primos e vizinhos, essa foi minha primeira provocação, provoquei todos a estudar. Eu sabia que o Tonho estudava, então disse que tinha um grupinho de amigos querendo estudar, umas seis pessoas. Tinha que ser cedo da noite, pois o Tonho acordava Pela primeira vez em Brasília participou do 3º Congresso da Confede

Realização Apoio

estudos, ampliou os contatos, se juntou a um grupo de jovens católi-cos, em seguida foi convidado para outro grupo chamado Animação dos Cristãos no Meio Rural – ACR. “eu já tinha destaque nos grupos da igreja, assim em 1983 me tornei o primeiro presidente do sindicato do município. Tinha repressão militar, e nesse tempo tinha reuniões em Recife, e tinha que ir disfarçado, a luta era por libertação do trabalho escravo, nessa época em que os grileiros matavam muita gente e tava surgindo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST”. Outro momento importante em sua vida militante foi duran-te o Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores – CUT, também em Brasília, de onde saiu para articular o estado de Alagoas, na Secretaria Rural da CUT do estado. Esse tempo marca também o nascimento do Partido dos Trabalhadores – PT, ao qual ele é filiado desde então. “era momento de anistia, o Lula já tinha sido preso algumas vezes, nesse momento o partido já estava se articulando com novas frentes para esse novo momento político no Brasil”. Nesse contexto aconteceu o 1º Congresso do MST, em 1985 em Piracicaba, São Paulo, e em Alagoas o primeiro assentamento ligado ao movi-

mento, em Delmiro Gouveia, o Assentamento Peba. “Comecei a viajar e ver as diferenças. Os sem terra começaram a me chamar, então no estado fui um dos primeiros a botar o coro pra bala, o Luis Valério com um gancho de peteca e o Noé que era um índio.” Fala se referindo aos companheiros de luta. Em 1986 foi candidato a Deputado Estadual, o Brasil cami-nhava para a reabertura democrática, com o fim da Ditadura Militar. Foi uma candidatura dos movimentos sociais, com trabalho de base nas comunidades, do sertão ao litoral com apoio do Movimento Revo-lucionário de 8 de Outubro – MR8. Flor orgulha-se dos resultados obtidos, 1.836 votos em 75 municípios alagoanos, onde sua participa-ção na política partidária é repleta de convicções e ideologias. Tudo isto era vivenciado por Florisval de forma voluntária. “Tive muitos embates com o velho meu pai, por minhas opções políti-cas, ele dizia, você parece que é comunista (risos), isso nós dois traba-lhando virando fumo. Mas depois o pai se convenceu, fui questionan-do pelos meus em casa. Já nos anos de 1990 vi que eu estava engessa-do, fui sócio fundador na Escola Quilombo dos Palmares desde 1988 onde fui questionado, pois ocupava muitos lugares, CPT, a Central

Sindical, MST, o Partido e ainda a ACR. Comecei a ver que tava errado. Deixando a família e os amigos. Fui me embora pra São Paulo, fiquei seis meses, parei de fumar.” De volta a Alagoas, um Padre chamado Aldo o tinha chamado “venha cá, conversar mais eu” então lhe fez uma propos-ta de três salários mínimos, para rearticular uma associação em Colônia Leopoldina, “três salários mínimos pra quem não tinha visto dinheiro e sempre fez de graça?!” Além do trabalho com a associação acompanhava as assembleias dos sem teto, isso nos anos 1991 e 1992, com esse trabalho de articulação a associação tinha mais de 70 associados. Então o Padre dizia “esse é de quali-dade”. Existia o desejo de algumas pessoas em sair do corte da cana, então venderam um caminhão que tinham na associação para organizarem uma horta comunitária chamada Nossa Esperança, porém as pessoas acostumadas com a cana não se adaptaram. “Tinham uns meninos que ficavam na rua cheirando cola e começaram a me acompanhar para a roça/Horta e deu certo, só não podia queimar nem matar passarinho, então dei uma bola para eles, chegou a ter 220 meninos e meninas. O movimento de meni-nos e meninas de rua começou a dar formação, faziam varias atividades, moveis, tijolos, cuidavam da horta, era tudo por vonta-de das crianças, a estrutura era pequena e eles ficavam sentados no chão embaixo das arvores”. Flor conheceu Amara, militante do Movimento da Juven-tude Rural Cristã – MJRC, nesse periodo coordenação nacional. O

movimento estava se expandindo a partir de São Paulo para onde Amara foi passou algum tempo e voltou, já se conheciam desde 1986 quando ainda era candidato, as vezes se encontravam em meio a luta. “demorou muito não, e agente juntou os troços, morávamos em uma pobreza tão grande!”. Na época tinham os círculos de leitura do método Freiriano de alfabetização de jovens e adultos, o pessoal da cana estudava a noite e tinha reforço dinamizado para as crianças que frequentavam a horta, padre Aldo começou a receber ameaças e sofrer perseguições políticas, aviam muitas mortes, era feito o “colar” onde as pessoas eram postas dentro de pneus e queimadas, padre Aldo teve que voltar para Itália, e os recursos se acabaram para manter algumas atividades, Flor vendeu vinte e oito sacos de feijão de sua própria roça para seguir com algumas atividades. Já de volta a Santa Rosa iniciou um trabalho de assessoria a associações do sertão ligadas a CEAPA, Amara conti-nuou em Colônia Leopoldina onde era conselheira tutelar. A partir de uma grande articulação a Articulação no Semiári-do Brasileiro - ASA foi fundada no estado, após o ano 2000 na Coope-rativa dos Pequenos Produtores Agrícolas dos Bancos Comunitários de Sementes - COPABACS enquanto Unidade Gestora Municipal – UGM, Flor começou a realizar cursos de Gerenciamento de Recursos Hídricos - GRH e participar das reuniões da coordenação estadual, se associou a Associação dos Agricultores Alternativos - AAGRA que também era UGM.

Em 2007 Amara foi trabalhar em Inhapí. Em 2000 Flor já tinha ajudado a articular as ASAs municipais no estado “levei muito não, da igreja católica principalmente, naquela época alguns padres diziam, essas cisternas vazam”. Passou anos como agente de campo na AAGRA e articulador do PT também. Fez sondagem para barragem subterrânea e formação de pedreiros. No sertão a Visão Mundial, chamo-o para fazer uma sondagem para uma barragem subterrânea, no dia 05 de dezembro de 2007, uma fatalidade, sofreu um acidente “o mundo se acabou pra mim”, justamente o Flor, de mil e uma atividades, das pessoas e dos amores. Dias desacordado, pocas vezes respondia as perguntas dos médicos. Ficou no corredor da emergência, com um irmão e Amara do seu lado, boca seca três dias, só no soro médicos em greve no estado, crânio e clavícula quebrados, 24 dias internado, o médico psiquiatra disse ao analisar os exames “pra você a casa caiu”, logo quando ele achava que iria ficar bom logo e voltaria a trabalhar, um outro medico chamado Walan Rocha disse que ele iria ficar bom, não precisaria de cirurgia, ia demorar muito, mas ficaria bom. Perdeu o labirinto, perdeu parte da audição e tomava remédios muito fortes, que o fazia dormir sempre. “Eu não sirvo mais pra nada, eu não sirvo mais pra vida, ocupo o lugar de alguém

bom”. Depressão desejo de morrer quando ficava só. “Não queria viver”, desenvolveu o mal Parkinson, dois anos depois o corpo travou, não conseguia tomar banho, calçar as botas, a filha Isabela e a esposa Amara faziam isso, o olhar distante, não escrevia o próprio nome. “Só sei que o que tem vida, um dia morre”.Um novo tratamento, novos remédios, foi melhorando, “graças a Deus e ao meu Padrinho Cícero Romão, voltou ao partido, as reuniões da associação, com tudo isso, foi criando vida novamente. O sitio adoeceu com ele, ficou sem cuidados, mas quando tornou, limpou a casa, voltou a plantar, sete anos a terra esperou e a mata cresceu, brotando a mais belas riquezas da caatinga, hoje ao redor de casa experimenta mais ou menos de 30 espécies de plantas nativas da caatinga, entre fruteiras, hortaliças e plantas ornamentais. Seu sitio se tornou laboratório agroecologico e de experiências de convivência com o semiári-do, diante sua vasta experiência Flor é referencia como agricultor experimentador e educador popular onde o menino que tanto buscou formação se tornou um grade formador de pessoas.

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Articulação Semiárido Brasileiro – AlagoasBoletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

No mundo em que vivemos ainda soa estranho chamar um homem de flor, mas é assim que Florisval é conhecido, e isso é uma das coisas que faz dele um grande homem. Nasceu em uma casa em Arapiraca cercada por uma grande roça de fumo, onde os pais tinham se refugiado da seca, analfabeto até os 13 anos de idade, o quarto de 12 irmãos, desde cedo inconformado com a vida imposta pelo acaso, já queria trilhar seu próprio caminho. Apesar de ter nascido em Arapi-raca Flor e sua família moravam no sitio Santa Rosa perto do distrito que viria a ser o município de Craíbas. Flor sempre foi e é cercado de pessoas e inquietações, políti-ca partidária, movimentos sociais, fazeres, historias e amores.“A primeira vez que me envolvi com a sociedade foi a partir dos 12 ou 13 anos, despertei para o mundo em uma viajem a olho D’agua das Flores, quando vi uns meninos da minha idade, bem instruídos. Nossa comunidade não tinha escola e tínhamos que ficar na roça. Nessa viajem me decepcionei muito comigo mesmo, só consegui pegar um ônibus porque perguntei. Quando voltei pra casa pensei que não podia ficar desse jeito, provoquei primos e vizinhos, essa foi minha primeira provocação, provoquei todos a estudar. Eu sabia que o Tonho estuda-va, então disse que tinha um grupinho de amigos querendo estudar, umas seis pessoas. Tinha que ser cedo da noite, pois o Tonho acordava Pela primeira vez em Brasília participou do 3º Congresso da Confede-

ração Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, no inicio da década de 1980 “nunca tinha visto cidade grande, nem hotel cinco estrelas. O povo do nordeste não conhecia o próprio rosto. O camarada quando ia entrar no elevador e via o reflexo no espelho achava que era outra pessoa.” Recorda - se dos inúmeros momentos de embaraços em que ele e seus companheiros de congresso viveram, inclusive o lamentável acidente de um que teve suas costelas quebra-das ao ficar preso na porta do elevador do hotel. as 4:00 horas para ir estudar de bicicleta em Arapiraca. Com 14 anos, aprendi a fazer o nome e ler algumas palavras. Foi a primeira vez que articulei um grupo.” Suas historias são o reflexo de períodos historicos e aconteci-mentos que marcaram um povo, no caso o povo do semiárido alagoa-no, onde Flor é um de seus representantes que traz de forma muito viva o sofrimento e a luta por um mundo melhor.Nas idas e vindas, decorrente da seca de 70 a família tornou a morar em Arapiraca, e lá Flor e seus irmãos, trataram logo em arranjar escola, “eles não aceitavam, porque não tínhamos certificados. Mas eu soube que tinha uma escola abrindo no Alto do Cruzeiro, que fez um teste e nos aceitou” Novamente em Santa Rosa na década de 70 continuou os

O Quarto Poder - O quadro de Pellizza,Representa a luta e a consciência de

classe, orgulhosamente posto na sala de Flor.

Sr. Florisval

estudos, ampliou os contatos, se juntou a um grupo de jovens católi-cos, em seguida foi convidado para outro grupo chamado Animação dos Cristãos no Meio Rural – ACR. “eu já tinha destaque nos grupos da igreja, assim em 1983 me tornei o primeiro presidente do sindicato do município. Tinha repressão militar, e nesse tempo tinha reuniões em Recife, e tinha que ir disfarçado, a luta era por libertação do trabalho escravo, nessa época em que os grileiros matavam muita gente e tava surgindo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST”. Outro momento importante em sua vida militante foi duran-te o Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores – CUT, também em Brasília, de onde saiu para articular o estado de Alagoas, na Secretaria Rural da CUT do estado. Esse tempo marca também o nascimento do Partido dos Trabalhadores – PT, ao qual ele é filiado desde então. “era momento de anistia, o Lula já tinha sido preso algumas vezes, nesse momento o partido já estava se articulando com novas frentes para esse novo momento político no Brasil”. Nesse contexto aconteceu o 1º Congresso do MST, em 1985 em Piracicaba, São Paulo, e em Alagoas o primeiro assentamento ligado ao movi-

mento, em Delmiro Gouveia, o Assentamento Peba. “Comecei a viajar e ver as diferenças. Os sem terra começaram a me chamar, então no estado fui um dos primeiros a botar o coro pra bala, o Luis Valério com um gancho de peteca e o Noé que era um índio.” Fala se referindo aos companheiros de luta. Em 1986 foi candidato a Deputado Estadual, o Brasil cami-nhava para a reabertura democrática, com o fim da Ditadura Militar. Foi uma candidatura dos movimentos sociais, com trabalho de base nas comunidades, do sertão ao litoral com apoio do Movimento Revo-lucionário de 8 de Outubro – MR8. Flor orgulha-se dos resultados obtidos, 1.836 votos em 75 municípios alagoanos, onde sua participa-ção na política partidária é repleta de convicções e ideologias. Tudo isto era vivenciado por Florisval de forma voluntária. “Tive muitos embates com o velho meu pai, por minhas opções políti-cas, ele dizia, você parece que é comunista (risos), isso nós dois traba-lhando virando fumo. Mas depois o pai se convenceu, fui questionan-do pelos meus em casa. Já nos anos de 1990 vi que eu estava engessa-do, fui sócio fundador na Escola Quilombo dos Palmares desde 1988 onde fui questionado, pois ocupava muitos lugares, CPT, a Central

Sindical, MST, o Partido e ainda a ACR. Comecei a ver que tava errado. Deixando a família e os amigos. Fui me embora pra São Paulo, fiquei seis meses, parei de fumar.” De volta a Alagoas, um Padre chamado Aldo o tinha chamado “venha cá, conversar mais eu” então lhe fez uma propos-ta de três salários mínimos, para rearticular uma associação em Colônia Leopoldina, “três salários mínimos pra quem não tinha visto dinheiro e sempre fez de graça?!” Além do trabalho com a associação acompanhava as assembleias dos sem teto, isso nos anos 1991 e 1992, com esse trabalho de articulação a associação tinha mais de 70 associados. Então o Padre dizia “esse é de quali-dade”. Existia o desejo de algumas pessoas em sair do corte da cana, então venderam um caminhão que tinham na associação para organizarem uma horta comunitária chamada Nossa Esperança, porém as pessoas acostumadas com a cana não se adaptaram. “Tinham uns meninos que ficavam na rua cheirando cola e começaram a me acompanhar para a roça/Horta e deu certo, só não podia queimar nem matar passarinho, então dei uma bola para eles, chegou a ter 220 meninos e meninas. O movimento de meni-nos e meninas de rua começou a dar formação, faziam varias atividades, moveis, tijolos, cuidavam da horta, era tudo por vonta-de das crianças, a estrutura era pequena e eles ficavam sentados no chão embaixo das arvores”. Flor conheceu Amara, militante do Movimento da Juven-tude Rural Cristã – MJRC, nesse periodo coordenação nacional. O

movimento estava se expandindo a partir de São Paulo para onde Amara foi passou algum tempo e voltou, já se conheciam desde 1986 quando ainda era candidato, as vezes se encontravam em meio a luta. “demorou muito não, e agente juntou os troços, morávamos em uma pobreza tão grande!”. Na época tinham os círculos de leitura do método Freiriano de alfabetização de jovens e adultos, o pessoal da cana estudava a noite e tinha reforço dinamizado para as crianças que frequentavam a horta, padre Aldo começou a receber ameaças e sofrer perseguições políticas, aviam muitas mortes, era feito o “colar” onde as pessoas eram postas dentro de pneus e queimadas, padre Aldo teve que voltar para Itália, e os recursos se acabaram para manter algumas atividades, Flor vendeu vinte e oito sacos de feijão de sua própria roça para seguir com algumas atividades. Já de volta a Santa Rosa iniciou um trabalho de assessoria a associações do sertão ligadas a CEAPA, Amara conti-nuou em Colônia Leopoldina onde era conselheira tutelar. A partir de uma grande articulação a Articulação no Semiári-do Brasileiro - ASA foi fundada no estado, após o ano 2000 na Coope-rativa dos Pequenos Produtores Agrícolas dos Bancos Comunitários de Sementes - COPABACS enquanto Unidade Gestora Municipal – UGM, Flor começou a realizar cursos de Gerenciamento de Recursos Hídricos - GRH e participar das reuniões da coordenação estadual, se associou a Associação dos Agricultores Alternativos - AAGRA que também era UGM.

Em 2007 Amara foi trabalhar em Inhapí. Em 2000 Flor já tinha ajudado a articular as ASAs municipais no estado “levei muito não, da igreja católica principalmente, naquela época alguns padres diziam, essas cisternas vazam”. Passou anos como agente de campo na AAGRA e articulador do PT também. Fez sondagem para barragem subterrânea e formação de pedreiros. No sertão a Visão Mundial, chamo-o para fazer uma sondagem para uma barragem subterrânea, no dia 05 de dezembro de 2007, uma fatalidade, sofreu um acidente “o mundo se acabou pra mim”, justamente o Flor, de mil e uma atividades, das pessoas e dos amores. Dias desacordado, pocas vezes respondia as perguntas dos médicos. Ficou no corredor da emergência, com um irmão e Amara do seu lado, boca seca três dias, só no soro médicos em greve no estado, crânio e clavícula quebrados, 24 dias internado, o médico psiquiatra disse ao analisar os exames “pra você a casa caiu”, logo quando ele achava que iria ficar bom logo e voltaria a trabalhar, um outro medico chamado Walan Rocha disse que ele iria ficar bom, não precisaria de cirurgia, ia demorar muito, mas ficaria bom. Perdeu o labirinto, perdeu parte da audição e tomava remédios muito fortes, que o fazia dormir sempre. “Eu não sirvo mais pra nada, eu não sirvo mais pra vida, ocupo o lugar de alguém

bom”. Depressão desejo de morrer quando ficava só. “Não queria viver”, desenvolveu o mal Parkinson, dois anos depois o corpo travou, não conseguia tomar banho, calçar as botas, a filha Isabela e a esposa Amara faziam isso, o olhar distante, não escrevia o próprio nome. “Só sei que o que tem vida, um dia morre”.Um novo tratamento, novos remédios, foi melhorando, “graças a Deus e ao meu Padrinho Cícero Romão, voltou ao partido, as reuniões da associação, com tudo isso, foi criando vida novamente. O sitio adoeceu com ele, ficou sem cuidados, mas quando tornou, limpou a casa, voltou a plantar, sete anos a terra esperou e a mata cresceu, brotando a mais belas riquezas da caatinga, hoje ao redor de casa experimenta mais ou menos de 30 espécies de plantas nativas da caatinga, entre fruteiras, hortaliças e plantas ornamentais. Seu sitio se tornou laboratório agroecologico e de experiências de convivência com o semiári-do, diante sua vasta experiência Flor é referencia como agricultor experimentador e educador popular onde o menino que tanto buscou formação se tornou um grade formador de pessoas.