O impacto da estrutura de capital na avaliação de empresas
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Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa
Mestrado Profissional em Economia e Finanças Aplicadas
DELPHO ALBARELLA NETO
O IMPACTO DA ESTRUTURA DE CAPITAL NA
AVALIAÇÃO DE EMPRESAS: EVIDÊNCIAS DO
MERCADO BRASILEIRO
São Paulo
2014
Delpho Albarella Neto
O IMPACTO DA ESTRUTURA DE CAPITAL NA AVALIAÇÃO DE EMPRESAS: EVIDÊNCIAS DO
MERCADO BRASILEIRO
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças Aplicadas Orientador: Prof. Dr. Antonio Zoratto Sanvicente – EESP/FGV
São Paulo
2014
Neto, Delpho Albarella
O impacto da estrutura de capital na avaliação de empresas: evidências do mercado brasileiro/Delpho Albarella Neto; orientador: Antonio Zoratto Sanvicente – São Paulo: EESP/FGV, 2014. 43f. Dissertação (Mestrado – Programa de Mestrado Profissional em Economia. Área de concentração: Finanças Aplicadas) – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa.
FOLHA DE APROVAÇÃO
Delpho Albarella Neto
O impacto da estrutura de capital na avaliação de empresas: evidências do mercado brasileiro
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado Profissional em Economia do
Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Economia.
Área de concentração: Finanças Aplicadas
Aprovado em: Dezembro/2014
Banca Examinadora
Prof. Dr. Antonio Zoratto Sanvicente
Orientador
Instituição: EESP/FGV Assinatura: _________________________
Prof. Dr. Michael Viriato Araujo
Instituição: Insper Assinatura: _________________________
Prof. Dr. José Roberto Ferreira Savoia
Instituição: FEA-USP Assinatura: _________________________
Aos dezoito de dezembro de dois mil e catorze
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus queridos pais, e a minha namorada, Natacha
Perez.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus.
Ao meu orientador, por sempre acreditar em meu potencial, por sua paciência,
sua dedicação e seu profissionalismo.
Aos meus familiares, por ensinarem a priorizar e dar valor aos estudos, pela
dedicação, carinho e apoio incondicional.
Aos meus amigos, que apesar de minha ausência, sempre me apoiaram e
estiveram ao meu lado.
À minha namorada, Natacha Perez, que me apoiou incondicionalmente, me
aconselhou e que graças a seu carinho, amor e dedicação pude trilhar este
caminho.
RESUMO
NETO, Delpho Albarella. O impacto da estrutura de capital na avaliação de
empresas: evidências do mercado brasileiro, 2014. 43 f. Dissertação de
Mestrado – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014.
Este trabalho visa a analisar a relevância da dívida em termos de valor no
apreçamento de uma ação. Partindo do modelo de Ohlson (1995), o patrimônio
líquido é decomposto em seus dois principais componentes (ativos e capital de
terceiros), para que se possa testar se o mercado os precifica de forma
diferente. O valor informacional da dívida é analisado levando em consideração
as teorias da sinalização e da estrutura “ótima de capital”, além da relação
entre custo da dívida e retorno sobre investimentos. A amostra compreende
todas as empresas brasileiras não financeiras listadas na BM&F Bovespa. Os
resultados parecem suportar a teoria da sinalização, uma vez que o
endividamento em empresas com boas perspectivas futuras de lucratividade
tem sinal positivo para o preço da ação. Contudo, desvios da proporção “ótima”
(ou meta) de dívida sobre capital próprio não parecem ser relevantes para o
mercado, o que não suporta a teoria da estrutura “ótima” de capital. O impacto
da dívida no valor de uma ação parece ter impacto positivo (negativo) para as
empresas com custo de dívida inferior (superior) ao retorno sobre
investimentos.
Palavras-chave: Estrutura de Capital, Política de Financiamento, Preço de
Ação
ABSTRACT
NETO, Delpho Albarella. The impact of capital structure on firm valuation:
evidence from the Brazilian market 2014. 43 p. Dissertation (Mastership) –
Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014.
This paper analyzes the share value relevance of debt. Starting with the Ohlson
(1995) model, equity book value is decomposed into assets and liabilities, so
that one can test whether the market prices them differently. The information
content of debt is analyzed taking into account the signaling and "optimal"
capital structure theories, and also the relationship between the cost of debt and
the rate of return on investment. The sample includes all non-financial Brazilian
companies listed at the BM&F Bovespa. The results seem to support the
signaling theory, since the debt parameter in companies facing good future
profitability prospects is positively associated with share price. Deviations from
the "optimal" (or target) debt-to-equity ratio do not seem to be relevant to the
market, a result that does not support the "optimal" capital structure theory. The
impact of debt on share price seems to have positive (negative) impact on firms
with favorable (unfavorable) financial leverage.
Keywords: Capital Structure, Financing Policy, Stock Price.
JEL Code: G320, G120
SUMÁRIO EXECUTIVO
` De acordo com o mainstream da teoria de finanças, todas as decisões
tomadas por uma empresa devem ter como intuito a maximização da riqueza
do acionista, o que implica a maximização do valor da empresa. Dessa forma,
decisões, como por exemplo, a forma de alocação de recursos – que é
basicamente a decisão sobre os projetos em que a empresa vai investir – então
as maneiras de financiá-los – seja através de capital próprio e/ou de terceiros –
entre outras decisões, deveriam visar à maximização do valor da empresa. Isso
significa que, caso a empresa seja aberta, tais decisões deveriam ter como
objetivo a maximização do valor das ações desta empresa.
A partir da década de 50 nasceu o que é conhecido hoje como a
moderna teoria de finanças. Desde então muitos estudos foram feitos a
respeito de como precificar uma ação e como certas decisões afetam, ou
deveriam afetar os preços das ações. Dentre esses estudos, muitos se
preocuparam em analisar como a escolha da proporção entre capital próprio e
de terceiros, também chamada de estrutura de capital, impactaria o preço de
uma ação.
Assim surgiram muitas teorias sobre o impacto do uso de dívida no valor
de uma ação; por exemplo, teorias sobre qual seria a proporção ótima de
capital de terceiros e capital próprio em uma empresa (também conhecida
como teoria da estrutura ótima de capital), que impacto haveria para a riqueza
do acionista quando o retorno sobre os investimentos da firma é inferior ou
superior ao custo da dívida, ou ainda teorias a respeito de se o anúncio de
emissões, tanto de ações quanto de títulos de dívida traz alguma informação
adicional ao mercado a respeito do valor da empresa (também conhecida como
teoria da sinalização).
Este tema foi largamente estudado porque, ao longo das últimas
décadas, foi possível observar mudanças significativas nos preços das ações
após as empresas anunciarem mudanças em sua estrutura de capital, seja
através de emissão de ações, seja através de emissão de títulos de dívida.
Além disso, pode-se verificar que as empresas possuem estruturas de capital
bastante diferentes uma das outras, inclusive empresas do mesmo setor. Por
conta disso, é possível inferir que a escolha da estrutura de capital é uma
decisão gerencial bastante importante para uma empresa e seus acionistas.
A maioria dos trabalhos estuda o impacto do anúncio de mudanças na
estrutura de capital baseados em modelos de retorno acima do normalmente
esperado para um dado período. No entanto, as conclusões desses estudos
podem ser enganosas, pois as empresas podem anunciar mudanças na
estrutura de capital e também outros tipos de mudança ao mesmo tempo. Por
exemplo, uma empresa pode decidir emitir títulos de dívida para comprar outra
empresa ou recomprar dívidas de longo prazo. Adicionalmente, é possível que
ao mesmo tempo em que haja anúncio de uma emissão a empresa também
divulgue uma reorganização societária.
Portanto, os retornos acima ou abaixo do esperado para um dado
período estudado podem ser consequência de outros fatores, e não
necessariamente decorrentes da mudança na estrutura de capital, ou seja, o
contexto e a janela de tempo estudada podem alterar completamente a
conclusão com base em modelos de retorno.
Por estes motivos, o presente estudo se baseia em um modelo de
precificação direta do valor da ação, no qual é possível testar as teorias do uso
de capital de terceiros levando em conta o contexto no qual as firmas estão
inseridas, como por exemplo, se os retornos sobre seus ativos versus seu
custo de dívida geram resultado positivo ou negativo para o acionista, se suas
oportunidades futuras de crescimento são boas ou más, ou então, se sua
proporção de capital próprio e de terceiros está muito longe ou próxima do que
é considerado ser o seu nível ótimo.
É esperado que para empresas com proporção de capital próprio e de
terceiros muito diferente da meta, por estarem longe do que seria a proporção
ótima, haveria certa penalização no preço de suas ações, uma vez que não
estariam maximizando o valor da empresa. Além disso, empresas cujos
investimentos geram retornos inferiores (superiores) ao custo da dívida
também deveriam ser penalizadas (premiadas), pois o impacto é negativo
(positivo) para o acionista. Por fim, o endividamento não deveria ser
interpretado como um mau sinal para empresas com boas perspectivas futuras
de crescimento, pois para o mercado o uso de capital de terceiros para
empresas nesta situação sinaliza confiança na geração futura de caixa, o que é
bom para o acionista e o preço das ações.
O modelo foi estimado com dados trimestrais, compreendidos entre o 4º
trimestre de 2010 e o 2º trimestre de 2014, de empresas não financeiras
listadas na BM&FBovespa. Os resultados mostram que a dívida não é
relevante para precificar uma ação, ao se levar em conta quão afastada a
proporção dívida sobre capital próprio está do target. Por outro lado, quando o
retorno sobre investimentos é maior que o custo da dívida, o mercado paga um
prêmio por estas ações. Por fim, os resultados mostram que o uso de mais
capital de terceiros é relevante para empresas com boas oportunidades de
crescimento e que o mercado também paga um prêmio por estas ações.
Consequentemente, o trabalho mostra que a estrutura de capital é uma
decisão importante e impacta o preço da ação. É possível concluir que
empresas com boas perspectivas futuras de crescimento, e/ou cujos retornos
sobre investimentos sejam superiores ao custo da dívida possam se alavancar
mais (usar mais capital de terceiros em detrimento de capital próprio), pois o
mercado pagará um prêmio por suas ações. No entanto, o afastamento da
proporção ótima de capital de terceiros não parece influenciar no quão
relevante é a dívida para a precificação das ações.
Contudo, é necessário levar em conta que os resultados são
extremamente dependentes do modelo utilizado, e que as variáveis adotadas
como proxies para contextualizar as empresas (por exemplo, a proxy de
estrutura ótima de capital) podem ser substituídas por outras, o que poderia
alterar significativamente os resultados obtidos.
SUMÁRIO
SUMÁRIO EXECUTIVO .......................................................................... 8
1 INTRODUÇÃO ................................................................................. 12
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................. 13
2.1. Testes de Hipóteses .............................................................. 20
2.1.1. Componentes do patrimônio líquido (PL) e a relação entre
retorno sobre investimentos (ROI) e o custo da dívida (CD) ..................... 21
2.1.2. Estrutura ótima de capital ................................................... 22
2.1.3. Teoria da Sinalização ......................................................... 26
3 METODOLOGIA .............................................................................. 29
3.1. Local da Pesquisa .................................................................. 29
3.2. Período do Estudo ................................................................. 29
3.3. Critérios de Inclusão e Exclusão ............................................ 29
3.4. Procedimento e Instrumentos de Coleta de Dados ................ 30
3.5. Dados e Procedimento Econométrico .................................... 30
3.5.1. Descrição e análise dos dados ........................................... 30
3.5.2. Procedimento econométrico ............................................... 32
4 RESULTADOS ................................................................................. 34
5 CONCLUSÃO .................................................................................. 38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................... 40
12
1 INTRODUÇÃO
Por muito tempo, o principal foco dos estudos sobre precificação de
ações foi a análise de dados contábeis como lucro e seus componentes. No
entanto, menos atenção tem sido atribuída a outras informações advindas do
balanço patrimonial e de outras demonstrações financeiras das empresas
(GINER e REVERTE, 2001).
Focalizando a discussão em questões de valoração, ao invés de analisar
o conteúdo informacional das variáveis que influenciam a precificação de
ações, o presente ensaio tenta replicar, com empresas brasileiras, o estudo
realizado por Giner e Reverte (2001) com empresas espanholas.
Este estudo consiste em analisar a relevância da estrutura de capital em
termos de valor, no preço de uma ação. A análise é feita a partir do modelo
básico de avaliação de ações desenvolvido por Ohlson (1995), o qual é
utilizado para testar teorias alternativas que explicam a influência da presença
de capital de terceiros no preço das ações. Também são utilizadas variáveis de
controle como proxies de argumentos econômicos a respeito do efeito da
dívida no preço das ações.
Dentre vários argumentos conhecidos que tentam explicar a influência
do capital de terceiros no valor das ações, podem-se destacar a teoria da
estrutura “ótima de capital”, a teoria da sinalização e a relação entre o retorno
sobre investimentos (ROI) e o custo da dívida (CD).
No entanto, tais argumentos podem trazer conclusões conflitantes a
respeito do comportamento do mercado. Conforme o trabalho feito por Giner e
Reverte (2001), na tentativa de apurar melhor os motivos dos movimentos do
valor de mercado das ações, é adotada uma abordagem contextual, analisando
o valor informacional da dívida sob circunstâncias específicas de uma firma.
Posteriormente, é levado em conta o desvio da estrutura de capital de uma
firma com relação ao que seria sua estrutura “ótima” de capital. Por fim, para
analisar se endividamento é positivo ou negativo para a avaliação de uma
13
ação, são consideradas as perspectivas futuras de lucratividade de uma
empresa.
A amostra deste trabalho consiste em todas as empresas não
financeiras abertas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo, que tiveram
ações negociadas no 4º. trimestre de 2010 e o 2º trimestre de 2014.
De acordo com o levantamento bibliográfico realizado, o presente parece
ser o primeiro estudo com o referido enfoque para o mercado de capitais
brasileiro. Ele está organizado da seguinte forma: a segunda seção é dedicada
a uma breve recapitulação da bibliografia. A terceira parte apresenta a
metodologia adotada e a descrição da amostra, enquanto a parte quatro
discute os resultados obtidos. A parte cinco contém a conclusão.
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Este estudo consiste em analisar a relevância do nível de endividamento
em termos de valor na precificação de uma ação no mercado brasileiro. Para
tal análise, é usada uma versão simplificada do modelo de precificação de
ações desenvolvido por Ohlson (1995)1. O mesmo é baseado em variáveis
contábeis e oferece uma alternativa simples ao modelo de dividendos
descontados. Contudo, o modelo de Ohlson, conforme constatado por Rees
(1997, p. 1111): “(...) inclui a expectativa de lucros anormais, o que o torna de
difícil aplicação prática.”
1 O modelo de Ohlson (1995) é baseado no modelo abaixo de avaliação de lucro residual,
conforme Preinreich (1938) e Edwards e Bell (1961) apud Giner e Reverte (2001):
𝑃𝑡 = 𝑏𝑣𝑡 + ∑(1 + 𝑘)−𝜏
∞
𝜏=1
∗ 𝐸𝑡[𝑥𝑡+𝜏 − 𝑘 ∗ 𝑏𝑣𝑡+𝜏−1]
Em que 𝑃𝑡 é o preço da ação no final do ano t, 𝑏𝑣𝑡 é o valor patrimonial do capital próprio no
final do ano t, 𝑥𝑡 é o lucro líquido contábil no período t, e k é o custo de capital.
14
Para superar este problema há duas alternativas. A primeira delas seria
incorporar as estimativas feitas por analistas diretamente no modelo, pois
funcionariam como proxies de lucros anormais futuros. A segunda seria a de
utilizar as variáveis contábeis e financeiras disponíveis para modelar as
expectativas, conforme fizeram Rees (1997) e Giner e Reverte (2001).
Dessa forma, a versão de partida utilizada do modelo de Ohlson (1995)
é:
𝑃𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1𝑃𝐿𝑖𝑡 + +𝛼3𝐿𝑖𝑡 + 𝑒𝑖𝑡 (1)
Na equação (1), 𝑃𝑖𝑡 é o preço da ação ordinária da empresa i no fim do
ano t, 𝑃𝐿𝑖𝑡 é o valor do patrimônio líquido contábil da empresa i no fim do ano t
e 𝐿𝑖𝑡 é o lucro líquido no fim do ano t para a empresa i. Todas as variáveis são
medidas por ação ordinária.
Para que seja possível testar a relevância em termos de valor do
endividamento para a valoração de uma ação e, ao mesmo tempo, testar as
teorias alternativas que justificam o uso de capital de terceiros, a variável
patrimônio líquido é dividida em seus dois principais componentes: ativos e
passivos, além da inclusão de dummies, que servirão de proxies para os testes
das teorias alternativas, surgindo assim o seguinte modelo:
ln (𝑃𝑖𝑡
𝑅𝐿𝑖𝑡⁄ ) = 𝛽0 + 𝛽1 ln (
𝐴𝑖𝑡𝑅𝐿𝑖𝑡
⁄ ) + 𝛽2 ln (𝐵𝑖𝑡
𝑅𝐿𝑖𝑡⁄ ) + 𝛽3 (
𝐿𝑖𝑡𝑅𝐿𝑖𝑡
⁄ ) +
𝛽4𝐷1 (𝐵𝑖𝑡
𝑅𝐿𝑖𝑡⁄ ) + 𝛽5𝐷2 (
𝐵𝑖𝑡𝑅𝐿𝑖𝑡
⁄ ) + 𝛽6𝐷3 (𝐵𝑖𝑡
𝑅𝐿𝑖𝑡⁄ ) + 𝑒𝑖𝑡 (2)
Onde:
𝑃𝑖𝑡 = Preço da ação. Preço da ação ordinária da empresa i no final do
trimestre fiscal t.
𝐴𝑖𝑡 = Ativos totais por ação. Ativos líquidos totais da empresa i por ação
(subtraindo contas a pagar), no fim do trimestre fiscal t.
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𝐵𝑖𝑡 = Dívida por ação. Dívida total da empresa i no final do trimestre t,
definida como toda a dívida de curto e longo prazo (excluindo
contas a pagar).
𝐿𝑖𝑡 = Lucro por ação disponível aos acionistas detentores de ações
ordinárias. Lucros da empresa i no trimestre t.
𝑅𝐿𝑖𝑡 = Receita líquida por ação. Receita líquida da empresa i no
trimestre t, definida como receita bruta subtraída do custo de
mercadoria vendida (CMV).
𝐷1 = Afastamento da estrutura “ótima” de capital. Assume valor igual a
um se empresa estiver longe da estrutura “ótima” de capital, e
zero caso contrário. A proxy de afastamento é a razão B/PL. A
empresa é considerada longe da estrutura “ótima” se estiver no 1º
ou 4º quartil da distribuição dos valores da razão B/PL de todas as
empresas para o respectivo trimestre, e é considerada próxima da
estrutura “ótima” de capital se estiver no 2º ou 3º quartil.
𝐷2 = Oportunidade futura de crescimento do lucro. Assume valor 1 se a
empresa tiver boas perspectivas futuras de crescimento futuro do
lucro e 0 caso contrário. A proxy a ser utilizada é a razão P/PL. As
oportunidades futuras são boas se P/PL>1 e ruins se P/PL<1.
𝐷3 = Impacto da alavancagem para o acionista. Assume valor 1 se o
impacto da alavancagem for “positivo para o acionista” e 0 caso
contrário. A proxy a ser utilizada para medir o impacto é a
comparação entre ROI e CD. Se ROI > CD, então o impacto é
“positivo para o acionista”, caso CD > ROI o impacto é “negativo
para o acionista”.
Por fim, visto que a variável 𝐵it será introduzida com valores positivos,
β2 deverá ser um coeficiente com sinal negativo, pois a dívida total da empresa
é descontada do patrimônio líquido.
O foco está na análise dos coeficientes referentes à divida, 𝛽2, 𝛽4, 𝛽5 e
𝛽6, ou seja, em verificar o conteúdo informacional da presença de dívida na
16
estrutura de capital da empresa, inclusive sob os aspectos de algumas teorias
alternativas quanto ao uso de capital de terceiros, cujas proxies são as
dummies incluídas na equação (2), detalhadas mais adiante.
Modelos de valoração foram muito utilizados em outros estudos. Por
exemplo, Green et al. (1996), Rees (1997), Fama e French (1998) e Giner e
Reverte (2001) analisaram, entre outras variáveis, o impacto do endividamento
no preço das ações. Contudo, à exceção dos últimos, os resultados não foram
conclusivos, acabando por não trazer evidência suficiente a respeito do
impacto do endividamento no preço da ação de uma firma.
Autores brasileiros, como Brito Corrar e Batistella (2007), Bortoluzzo e
Sanvicente (2013) e Nakamura, Martin, et al. (2007), fizeram trabalhos com o
intuito de estudar os determinantes da estrutura de capital de empresas
brasileiras. Com exceção de Bortoluzzo e Sanvicente (2013), tais estudos
geralmente envolvem explicar o nível de alavancagem controlando para
variáveis proxies de geração interna de recursos, custos de falência, benefício
fiscal, entre outras. Contudo, este tipo de abordagem não é capaz de verificar
diretamente o efeito da decisão de estrutura de capital na criação ou destruição
de valor para o acionista, como é proposto no presente estudo, em que
procura-se explicar o preço da ação controlando para ativos, endividamento e
proxies de teorias a respeito da estrutura de capital. Estudar este efeito é
importante, uma vez que qualquer decisão tomada a respeito da estrutura de
capital deveria levar em conta a maximização de valor para o acionista.
Brito, Corrar e Batistella (2007) testaram os determinantes da estrutura
de capital ao estimarem como alguns fatores exógenos como risco,
rentabilidade operacional e crescimento, entre outros, determinam o nível de
endividamento das empresas (a variável dependente), tanto de curto, quanto
de longo prazo. Esta análise foi feita ao estimar, separadamente, tanto os
determinantes de endividamento total, como também de endividamento de
curto e longo prazo. A técnica estatística empregada foi regressão por MQO
(mínimos quadrados ordinários) com a técnica de pooling, que pode ser
inadequada, pois não leva em consideração a correlação temporal entre as
observações de cada cross section.
17
Em seu trabalho, Brito, Corrar e Batistella (2007) encontraram relação
positiva entre endividamento de longo prazo e crescimento. Isso mostra que as
empresas com altas taxas de crescimento emitem mais dívida para financiar
seus investimentos, o que pode ser explicado como sinalização ao mercado de
alta geração futura de caixa e que, portanto, suas ações estão subvalorizadas,
em concordância com a teoria da sinalização. Este resultado foi mesmo
encontrado no presente estudo, porém com uma proxy diferente.
O fator rentabilidade operacional não foi determinante da estrutura de
capital, e os autores atentam para o fato de que as empresas tomariam
recursos apenas se estes fossem atrativos economicamente. Neste trabalho,
essa abordagem é feita, ao levar em consideração a relação entre rentabilidade
para o acionista e o custo da dívida. Os resultados evidenciam tal relação como
significante e positiva para relevância da dívida em termos de valor ao se
precificar uma ação, conforme será detalhado mais adiante.
Bortoluzzo e Sanvicente (2013) analisaram de que forma as empresas
determinam sua estrutura de capital, porém utilizando uma abordagem
completamente diferente de outros trabalhos da literatura nacional. O estudo foi
feito levando em consideração a interdependência entre endividamento,
distribuição de dividendos e o custo de agência decorrente do uso de capital
próprio, além de incluírem outras variáveis de controle. Para levar em
consideração a relação de interdependência, Bortoluzzo e Sanvicente (2013)
estimam não somente a variável dívida como dependente, mas também
distribuição de dividendos e custo de agência, todas as três simultaneamente,
pela técnica de 3SLS (three stages least squares), comparando-os com
estimação por MQO, com o intuito de verificar se de fato há uma relação de
interdependência entre elas. Tal método pode ser considerado mais adequado
pois, ao levar em consideração a endogeneidade das variáveis dependentes,
os coeficientes estimados não sofreriam de problema de viés de
simultaneidade (Bortoluzzo & Sanvicente, 2013). Nenhum outro trabalho da
literatura brasileira abordou o tema dessa forma, por isso provavelmente as
conclusões destes estariam erradas, uma vez que os coeficientes podem ter
problemas de viés de simultaneidade.
18
Os resultados comprovam que as regressões por 3SLS são mais
apropriadas, pois a maioria dos erros padrão dos coeficientes estimados por
3SLS foram significativamente inferiores aos de regressões por MQO. Com
relação à estrutura de capital, os autores concluem que o nível de
endividamento é positivamente associado tanto com o custo de agência de
capital próprio como também com fluxo de caixa operacional, o que indica a
existência de uma estrutura “ótima” de capital, resultado este oposto ao
apresentado neste trabalho.
Nakamura, Martin, et al. (2007) estudam os determinantes da estrutura
de capital e sua dinâmica no tempo, testando basicamente duas teorias, a de
Trade-off (estrutura “ótima de capital)” e a teoria do Pecking Order (teoria da
sinalização). Para tal, foram criadas proxies defasadas e não defasadas para
cada teoria e para o nível de endividamento, como por exemplo, oportunidades
de crescimento do lucro e taxa de crescimento das vendas recentes como
proxies de geração interna de recursos para testar a teoria de Pecking Order,
liquidez corrente, risco financeiro, entre outras, como proxies para testar a
teoria de Trade-off, endividamento a mercado (dívida total/ativos totais a
mercado) e endividamento contábil (dívida total/ativos totais (contábil) como
proxies de alavancagem.
Os autores estimam duas equações, uma para cada proxy de
alavancagem, tanto pelo método de GMM (Generalized Method of Moments)
quanto pelo método AH (Anderson-Hsiao), com a técnica de painel dinâmico
com efeitos fixos de tempo e cross section. Este método foi utilizado por
permitir a exogeneidedade estrita dos regressores, e robustez a
heterocedasticidade e correlação dos erros com as variáveis explicativas.
Pelos resultados apresentados, empresas com maiores taxas de
crescimento das vendas, rentabilidade operacional e potencial de crescimento
futuro tendem a se endividar menos, ou seja, preferem se financiar com
recursos gerados pelas operações a se endividar, o que estaria em linha com a
teoria de Pecking Order, o oposto do resultado encontrado neste trabalho.
O resultado da proxy de risco financeiro mostra uma relação
ambivalente, na qual o risco defasado apresenta relação positiva com
19
endividamento, ao passo que o não defasado apresenta relação negativa. Além
disso, o coeficiente da variável risco não defasada é quase seis vezes maior,
em módulo, do que o da defasada. De acordo com os autores, essa
ambivalência pode ser explicada pela própria reação do mercado em sua
percepção de risco. Tal dinâmica está de acordo com a teoria de Trade-off,
pois uma empresa com alto grau de incerteza (alto risco do negócio) tende a se
endividar menos do que gostaria para manter a flexibilidade para futuros
investimentos. Dessa forma, seria possível tomar dívida quando necessário,
por exemplo, em caso de surgimento de novos projetos mais lucrativos, e
assim aumentar mais o seu valor. Novamente, tal resultado, compatível com o
da teoria de Trade-off, é oposto ao encontrado no presente estudo.
Outros autores, como Masulis (1983), Dann e Mikkelson (1984), Eckbo
(1986), Schipper e Smith (1986) e Janjigian (1987) utilizaram modelos de
retorno de ações ou modelos de retornos anormais de ações, com uma
abordagem de curto prazo, pois estudaram o impacto de mudanças - ou
anúncios de mudança - na estrutura de capital das empresas, como por
exemplo, anúncios de emissão de ações, de troca de ações ou dívidas, e de
emissão de dívidas conversíveis em ações.
Alguns destes estudos sobre eventos de anúncios de recompra ou
ofertas de troca mostram que o preço da ação diminui quando o efeito é o de
redução da alavancagem financeira, ao passo que, ao elevar a alavancagem, o
preço da ação aumenta. Já em outros estudos envolvendo anúncio de oferta de
títulos houve evidência de que o preço da ação cai com o anúncio de oferta de
ações ordinárias ou dívida conversível em ação; porém, o movimento no preço
da ação seria insignificante nos casos de emissão de dívida não conversível.
Infelizmente, tais estudos podem levar a conclusões enganosas e
conflitantes. Por exemplo, no caso de anúncio de recompra de ações, não
somente a alteração da estrutura de capital impactaria o preço de uma ação;
este também poderia ser impactado em decorrência de outros fatores, como
por exemplo, mudanças na estrutura societária, mudanças na composição dos
ativos, efeitos de sinalização ou ainda efeitos dos impostos. (Kim, Chen, &
Nance, 1992).
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Adicionalmente, Kim et al. (1992, p. 134) constataram que
A presença de eventos conjuntos torna difícil tirar conclusões a
respeito desses estudos. A maior parte das empresas da
amostra anuncia ofertas de dívida ou ações e,
simultaneamente, o uso dos recursos (i.e., adição de uma nova
linha ou redução do endividamento). Isso torna impossível
separar o efeito da intenção de uso dos recursos do efeito de
mudanças na alavancagem financeira.
Assim como fizeram Giner e Reverte (2001), para evitar os problemas
apontados anteriormente (como as conclusões conflitantes sobre os estudos de
eventos e a direção do movimento dos preços das ações), este trabalho adota
uma abordagem de longo prazo, com modelos de valoração e variáveis de
controle que possibilitam examinar a relevância da dívida para o valor da ação,
dadas as circunstâncias específicas das firmas.
Giner e Reverte (2001) utilizam-se da relação entre duas variáveis,
retorno sobre investimentos (ROI) e custo da dívida (CD). Dessa forma, é
possível analisar as firmas sob duas circunstâncias diferentes: (i) quando a
alavancagem financeira é “positiva para o acionista”, pois, se ROI é maior que
CD, há impacto positivo no retorno sobre o patrimônio líquido (ROE), e (ii)
quando a alavancagem é “negativa para o acionista”, pois, quando ROI é
menor que CD o impacto no ROE é negativo. A definição desses dois
parâmetros se dá conforme abaixo:
𝑅𝑂𝐼𝑖𝑡 = Retorno sobre investimentos. Definido como a razão entre (i)
lucros antes de impostos (LAIR) adicionados de despesas
financeiras e (ii) ativos totais subtraídos de contas a pagar de uma
firma i no trimestre t.
𝐶𝐷𝑖𝑡 = Custo da dívida. Definido como a razão entre (i) despesas
financeiras e (ii) dívida total subtraída de contas a pagar e
participação de acionistas minoritários.
2.1. Testes de Hipóteses
21
2.1.1. Componentes do patrimônio líquido (PL) e a relação entre retorno
sobre investimentos (ROI) e o custo da dívida (CD)
O primeiro teste a ser feito consiste em verificar se a decomposição do
patrimônio líquido (PL), presente na versão inicialmente utilizada do modelo de
Ohlson (1995), em seus dois principais componentes, ativos e passivos, traz
informação adicional ao modelo, ou seja, se os dois parâmetros em que PL é
dividido são relevantes em termos de valor. Dessa forma, a primeira hipótese
nula é:
𝐻01: Os dois principais componentes do patrimônio líquido (ativos e
passivos) são igualmente valorados pelo mercado.
Esta hipótese é examinada ao se testar se 𝛽1 = −𝛽2 na equação (2), ou
seja, se os coeficientes de ativo e passivo são iguais em módulo. Conforme
explicado anteriormente, aqui o objetivo é testar se o modelo de Ohlson (1995)
se aplica ao mercado acionário brasileiro quando modificado (decomposição do
patrimônio liquido).
Para testar a relação entre ROI e CD, será analisado o coeficiente 𝛽6
referente à iteração da dummy 𝐷3 com a variável dívida. Esta dummy assume
valor igual a 1 para empresas cujo endividamento gera retorno positivo ao
acionista – 𝑅𝑂𝐼𝑡 > 𝐶𝐷𝑡 – e assume valor 0 para empresas em que a
alavancagem é prejudicial ao acionista – 𝑅𝑂𝐼𝑖 < 𝐶𝐷𝑖. Por conta disso, é
possível analisar o impacto da dívida no valor da ação de empresas que se
encontrem em situações econômicas diferentes (com respeito à relação entre
ROI e CD).
Consequentemente, a segunda hipótese nula a ser testada é:
𝐻02: A relevância em termos de valor da dívida não depende da relação
entre CD e ROI.
22
Esta hipótese é testada ao analisar a significância e o sinal de 𝛽6. É
esperado que este coeficiente seja positivo, pois o mercado deve pagar um
prêmio por empresas em que a alavancagem financeira gere impacto positivo
no retorno aos acionistas.
Dentre uma série de argumentos que justificam a influência do capital de
terceiros no preço de uma ação, é possível destacar, além da relação entre
ROI e CD:
(i) Teoria da estrutura ótima de capital (proporção ideal de capital de
terceiros e capital próprio) e;
(ii) Teoria da sinalização
2.1.2. Estrutura ótima de capital
2.1.2.1. Estrutura “ótima” de capital e impostos
Modigliani e Miller (1958) argumentam que a estrutura de capital é
irrelevante para o valor de uma empresa, supondo mercado perfeito, no qual
não haveria impostos.
No entanto, é razoável pensar que, no caso de empresas que possam
abater de sua base tributária os juros do serviço da dívida, haveria alguma
criação de valor. Esse abatimento, também conhecido como benefício fiscal,
aumentaria a sobra de caixa futura da empresa. Se a empresa se endividar até
o ponto máximo de abatimento de sua base tributária, a geração de caixa seria
maximizada e, consequentemente, aumentaria a riqueza do acionista.
Entretanto, o aumento do endividamento traz consequências e custos
adicionais à firma. Os fluxos de caixa futuros, que já são incertos, tendem a se
tornar mais voláteis e, portanto, a empresa torna-se mais arriscada. Com isso,
o mercado pode exigir retornos maiores das ações como compensação pelo
incremento de risco. Adicionalmente, o risco também é maior para os credores,
23
que exigirão remuneração maior, pois além do aumento da volatilidade dos
fluxos de caixa, empresas mais alavancadas incorrem em maiores custos de
falência, entre outros custos. Por conta disso, é plausível que haja um nível
ótimo de endividamento, em que o incremento marginal do benefício fiscal se
iguale ao custo marginal de falência (Masulis, 1983).
Dessa forma, é possível que, por conta do benefício fiscal, exista uma
estrutura “ótima” de capital. Adicionalmente, a percepção dos investidores a
respeito do valor de uma empresa pode ser largamente influenciada pela
magnitude com a qual a razão dívida-capital próprio se afasta do que seria a
estrutura “ótima” de capital (Giner & Reverte, 2001). Portanto, desvios da
estrutura “ótima”, seja para qual direção forem, jamais deveriam ser
recompensados pelo mercado (Green, Stark, & Thomas, 1996).
2.1.2.2. Estrutura “ótima” de capital e custo de agência
Mesmo sem levar em consideração o benefício fiscal, a teoria de custo
de agência também justifica a existência de uma estrutura ótima de capital.
Para Jensen e Meckling (1984), as expectativas dos fluxos de caixa futuros de
uma empresa não são independentes de sua estrutura de capital. Por
conseguinte, os acionistas de uma empresa altamente endividada tenderiam a
investir em projetos muito mais arriscados. Caso o projeto fosse bem sucedido,
a riqueza dos acionistas poderia aumentar bastante, mesmo após o pagamento
aos credores. Porém, caso o projeto não seja bem sucedido, a riqueza dos
credores diminuiria bastante, pois os acionistas entregariam a empresa como
pagamento da dívida. Esse cenário, portanto, demanda a criação de
mecanismos de controle impostos pelos credores aos acionistas, como por
exemplo, auditorias, contratos, garantias e restrições expressas por indicadores
contábeis. Tais mecanismos, que geram custos às empresas, são os
chamados custos de agência de capital de terceiros (neste caso, o credor é o
agente, e o acionista é o principal).
24
Por outro lado, há também os custos de agência associados ao capital
próprio. À medida que uma firma emite ações – aumentando, portanto, a
proporção de capital próprio – há conflito de interesses entre os
administradores (ou sócio administrador) e os novos acionistas, pois o
administrador procurará maximizar a sua própria riqueza, o que pode levá-lo a
tomar medidas opostas aos interesses dos acionistas, de maximizar o valor da
empresa (um executivo pode preferir empregar recursos na compra de um jato
luxuoso, ou na reforma de sua própria sala no escritório, por exemplo). Por
estes motivos, os acionistas terão custos para monitorar os administradores,
como por exemplo, contratar auditorias independentes para assegurar que a
direção da empresa atue a favor dos controladores.
Logo, tais relações geram custos de agência tanto provenientes do uso
de capital de terceiros, quanto do uso de capital próprio. Assim sendo, o custo
de agência do uso de capital próprio aumenta a medida que há mais emissão
de ações, o que por outro lado, diminui o custo de agência de capital de
terceiros, uma vez que ao aumentar a proporção de capital próprio há dimuição
da proporção de capital de terceiros. A minimização da soma destes custos de
agência maximizaria o valor da empresa e levaria, portanto, a uma estrutura
“ótima” de capital.
Consequentemente, tais teorias de trade off estático das proporções de
dívida e capital próprio, como por exemplo o dilema do uso de dívida para
aproveitar benefício fiscal versus o custo de endividamento, ou ainda os custos
de agência para acionistas e credores, e para acionistas e sócios
administradores, sustentam a existência de uma estrutura ótima de capital, a
qual maximiza o valor da empresa.
Portanto, se há uma proporção considerada ótima de capital próprio e de
terceiros que maximiza o valor da empresa, espera-se que os investidores
exijam um desconto no preço das ações de firmas que optaram por desviar de
tal estrutura “ótima”.
Apesar das evidências da existência de uma estrutura “ótima” de
endividamento para uma firma, testar empiricamente o que seria o nível “ótimo”
é extremamente difícil, por conta da falta de conhecimento a respeito de como
25
determinar o que seria o nível desejado, ou a meta de endividamento de uma
empresa (Giner & Reverte, 2001).
De acordo com Giner e Reverte (2001), haveria duas proxies para medir
a estrutura de capital desejada:
(i) A mediana da razão dívida sobre capital próprio para todas as
empresas em um trimestre em particular.
(ii) A mediana de endividamento da indústria a que uma empresa
pertence.
Para fins práticos, e para posterior possibilidade de comparação com o
estudo de Giner e Reverte (2001), este trabalho usa a primeira proxy, porém
com alteração da periodicidade dos dados, de anual para trimestral.
A razão dívida sobre capital próprio é calculada para todos os trimestres
em análise. Para isso, são computados quartis da distribuição da razão dívida
sobre capital próprio para cada trimestre. Empresas no primeiro e no quarto
quartis são consideradas como estando longe da meta de estrutura “ótima”, ao
passo que as empresas pertencentes ao segundo e ao terceiro quartis são
consideradas como bastante próximas da meta.
Consequentemente, a terceira hipótese nula a ser testada é:
𝐻03: A relevância da dívida em termos de valor não depende de quão
perto do nível considerado “ótimo” está a alavancagem da
empresa.
Para testar essa hipótese, é analisado o coeficiente 𝛽4 da equação (2),
referente à interação da variável dívida com a variável 𝐷1, que é uma dummy
que assume valor 1 para empresas em que a distribuição da razão dívida sobre
capital próprio esteja no primeiro ou quarto quartis (o que significa que estariam
mais longe da estrutura “ótima” de capital) e assume valor 0 para os casos que
estejam nos quartis intermediários da distribuição da razão dívida sobre capital
próprio.
Por conta do efeito do termo de interação entre a dummy e a dívida
deflacionada, a inclinação da variável referente à dívida para as empresas
26
pertencentes ao grupo que está longe da estrutura “ótima” de capital se dá por
(𝛽2 + 𝛽4), enquanto que para o outro grupo a inclinação da dívida em relação
ao preço da ação se dá por 𝛽2.
O coeficiente 𝛽4, por consequência, pode ser interpretado como o efeito
incremental do conteúdo informacional da dívida para aqueles casos em que,
independentemente da direção, se desviaram da meta de estrutura de capital
desejada. Para Giner e Reverte (2001), é esperado que, para os casos com a
razão dívida sobre capital próprio longe da meta, a variável dívida penalizará
mais o preço da ação e, consequentemente, espera-se 𝛽4 menor que zero.
2.1.3. Teoria da Sinalização
A existência de assimetria de informação, neste contexto, se refere à
situação em que um executivo possui informações que os investidores externos
não têm a respeito das perspectivas futuras da empresa por ele administrada.
Com base nessa observação, alguns autores, como Ross (1977), Myers e
Majluf (1984) e Miller e Rock (1985) desenvolveram modelos que explicam o
impacto das decisões de financiamento no preço das ações.
Em seu trabalho, Ross (1997) diz que o anúncio de emissão de dívida
sinaliza “boa notícia”, pois indica que a firma tem boas perspectivas para a
geração de caixa no futuro, o que traria impacto positivo para a avaliação da
empresa.
Para Myers e Majluf (1984), os acionistas controladores de uma firma só
emitirão ações se acharem que suas ações estejam sobrevalorizadas, pois
preveem más perspectivas futuras para a empresa. Os investidores externos,
que são menos informados que os administradores e acionistas controladores
a respeito das perspectivas futuras da empresa, perceberão o sinal por trás
desta emissão e exigirão um desconto no preço das novas ações. Os autores
afirmam então que há uma hierarquia na forma como as empresas se
financiarão para investir em um novo projeto (conhecida como “pecking order”).
27
Neste modelo, a empresa sempre preferiria financiamento interno a
financiamento externo e, caso fosse realmente necessário captar recursos
externos, preferiria a emissão de dívida à emissão de ações.
Consequentemente, o anúncio de não emissão de qualquer tipo seria
interpretado como um bom sinal referente às perspectivas futuras da empresa.
O impacto de emissão de dívida teria um pequeno efeito negativo
(praticamente nulo) no preço das ações, ao passo que a emissão de ações
sempre geraria impacto negativo no preço das ações.
Na mesma linha, Miller e Rock (1985) chegaram à conclusão de que o
anúncio não esperado, ou acima do esperado, de qualquer tipo de emissão
seria interpretado pelo mercado como um mau sinal, indicando que a empresa
não dispõe de lucro suficiente para financiar seus investimentos.
Em suma, a teoria da sinalização nos diz que a direção da mudança no
preço da ação, por conta de alterações no endividamento, pode ser positiva ou
negativa, pois dependerá do uso dos recursos. Se eles forem utilizados para
investir em um novo projeto rentável, então mais endividamento será
interpretado como um bom sinal. Contudo, se os recursos forem utilizados para
cobrir furos de caixa não esperados, ou acima do esperado, então mais
endividamento será considerado um mau sinal.
Logo, o valor informacional da dívida depende das perspectivas futuras
da empresa. Giner e Reverte (2001) utilizam como proxy das perspectivas
futuras da empresa a razão entre preço da ação e patrimônio líquido (P/PL), ao
final do ano t. O modelo de lucro residual levaria então à seguinte equação
para a razão P/PL:
𝑃𝑖𝑡
𝑃𝐿𝑖𝑡= 1 +
(𝑅𝑂𝐸𝑖,𝑡+1−𝑘 )
(1+𝑘 )+
(𝑅𝑂𝐸𝑖,𝑡+2−𝑘 )
(1+𝑘𝑖)²∗
𝑃𝐿𝑖,𝑡+1
𝑃𝐿𝑡+
(𝑅𝑂𝐸𝑖,𝑡+3−𝑘𝑖)
(1+𝑘 )³∗
𝑃𝐿𝑖,𝑡+2
𝑃𝐿𝑡+ (… ) +
(𝑅𝑂𝐸𝑖,𝑡+𝑇−𝑘𝑖)
(1+𝑘 )𝑇 ∗𝑃𝐿𝑖,𝑡+𝑇−1
𝑃𝐿𝑡 (3)
Na equação (3), 𝑃𝑖𝑡 é o preço da ação ordinária da empresa i no período
t, 𝑃𝐿𝑖𝑡 é o valor do patrimônio líquido da empresa i no período t, 𝑅𝑂𝐸𝑖,𝑡 é o
28
retorno sobre o patrimônio líquido da empresa i no período t e 𝑘𝑖 é o custo de
capital próprio da empresa i.
Da equação (3) é possível inferir que o valor presente dos lucros
anormais futuros é positivo caso a razão preço da ação sobre patrimônio
líquido (P/PL) seja maior que 1, e negativo caso a razão P/PL seja menor que
1. Por conta disso, é possível interpretar que o valor de uma ação seja menos
negativamente afetado pela dívida nas empresas com um múltiplo P/PL alto em
contraste com aquelas empresas com múltiplo P/PL baixo (Giner & Reverte,
2001).
À vista disso, a quarta hipótese nula é:
𝐻04: O valor informacional da dívida não depende das perspectivas
futuras de crescimento do lucro da empresa.
Para se testar essa hipótese é analisado o coeficiente 𝛽5, referente à
interação da variável 𝐷2 com a dívida deflacionada, que é uma dummy que
assume valor 1 quando a razão preço da ação sobre patrimônio líquido (P/PL)
é superior a 1 (indicando boas perspectivas futuras de lucratividade), e 0 se
P/PL é inferior a 1.
Segundo Giner e Reverte (2001), o coeficiente 𝛽5, referente ao termo de
interação da dummy com a dívida deflacionada, pode ser interpretado como o
diferencial do valor informacional da dívida para as empresas com alto
potencial de crescimento de lucros. Adicionalmente, é esperado que o
parâmetro 𝛽5 seja significativamente maior que zero, pois o endividamento
poderia ser uma sinalização positiva para as firmas com alto potencial de
crescimento de lucro.
29
3 METODOLOGIA
No presente estudo é utilizada uma abordagem metodológica
quantitativa com vistas ao estudo da relevância da dívida em termos de valor
ao se analisar o apreçamento de uma ação, e a aplicação dos modelos
expostos por Giner e Reverte (2001) ao mercado acionário brasileiro.
3.1. Local da Pesquisa
A pesquisa se debruçará sobre empresas abertas não financeiras com
ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa).
3.2. Período do Estudo
O banco de dados para a presente pesquisa contempla ações ordinárias
que foram negociadas na BM&FBovespa no último dia útil de cada trimestre,
iniciando no último trimestre de 2010, até o segundo trimestre de 2014. Este
período foi escolhido por que a partir do último trimestre de 2010 todas as
empresas listadas na BM&F Bovespa foram obrigadas a utilizar a metodologia
contábil IFRS. A mudança da metodologia contábil pode influenciar a
precificação de uma ação, por conta disso, foi escolhido o período em que
todas as empresas utilizaram o mesmo padrão, evitando a contaminação das
estimações devido a diferenças metodológicas contábeis entre as empresas.
3.3. Critérios de Inclusão e Exclusão
30
Dentre as ações listadas na BM&FBovespa, foram consideradas, dentre
as não financeiras, apenas aquelas que tiveram negociação no último dia útil
de cada trimestre para todo o período compreendido na amostra. Para aquelas
ações que não foram negociadas no último dia útil de algum trimestre, foi
utilizada uma tolerância de 7 dias corridos anteriores ao último dia útil do
respectivo trimestre. Caso tenha havido negócio para esta ação em algum
desses dias, foi considerado o preço de fechamento do dia mais próximo ao
último dia útil do ano, caso contrário, a empresa foi excluída.
3.4. Procedimento e Instrumentos de Coleta de Dados
Os dados analisados foram coletados no banco de dados da
Economática e para as regressões se utilizou o pacote econométrico Eviews
7.1.
3.5. Dados e Procedimento Econométrico
3.5.1. Descrição e análise dos dados
Segundo os critérios de inclusão e exclusão descritos anteriormente, há
um total de 3125 observações (247 empresas X 15 trimestres) disponíveis para
o presente estudo.
A Tabela 1 abaixo apresenta as estatísticas descritivas das variáveis
utilizadas no presente estudo. O Painel A se refere às variáveis deflacionadas
por receita líquida, enquanto que o Painel B se refere às variáveis não
deflacionadas. Como se pode observar, a curtose das variáveis é bastante
elevada, o que indica a presença de grande quantidades de observações
extremas. Os valores de máximo e mínimo também são bastante díspares.
31
Tanto a curtose, quanto a assimetria e a diferença entre o máximo e o mínimo
são muito maiores nos dados deflacionados por receita líquida. Observa-se
inclusive uma mudança de sinal da variável lucro líquido, que passa de
positiva, no Painel B, para negativa no Painel A.
Essas diferenças ocorrem por conta do próprio deflacionamento, pois em
uma quantidade significativa de observações a receita líquida por ação é
bastante próxima de 0, fazendo com que alguns valores deflacionados
assumam valores muito maiores, em módulo, do que eram anteriormente. Por
isso observa-se, por exemplo, o aumento da curtose, das médias e da inversão
do sinal da média do lucro por ação.
Contudo, apesar da média do lucro mudar de positiva para negativa no
caso das variáveis deflacionadas, em média, por trimestre, apenas 35% das
observações são negativas, ao passo que as outras 65% são positivas.
Tabela 1 - Descrição da amostra: 4º trimestre 2010 ao 2º trimestre de 2014
Média Mediana Máximo Mínimo Assimetria Curtose
Painel A: Estatística descritiva, variáveis deflacionadas (n=3125) (em reais, por ação)
P 39,53 1,49 33.741,92 0,01 37,13 1.558,32
A 55,14 3,13 13.430,38 0,00 17,15 338,04
B 718,26 1,72 361.862,20 0,00 22,33 536,84
L -54,80 0,03 1.491,42 -122.524,16 -46,08 2.235,95
Painel B: Estatística descritiva, variáveis não deflacionadas (n=3125) (em reais, por ação)
P* 15,34 10,45 238,74 0,00 4,08 31,11
A* 43,97 20,43 1.157,27 0,00 7,08 80,76
B* 26,68 11,78 577,83 0,00 5,39 42,03
L* 1,24 0,18 318,10 -76,00 12,45 219,02
Painel C: Estatística descritiva, proxies (n=3125) (em reais, por ação)
B/PL 1,59 1,14 38,34 -18,79 2,86 35,27
P/PL 1,88 1,00 47,15 -4,88 5,98 57,20
ROI 0,06 0,05 1,24 -3,55 -8,05 226,46
CD 0,06 0,04 1,34 0,00 6,28 81,56
ROI-CD 0,01 0,01 0,97 -3,74 -8,73 217,12
Fonte: Autor Nota: P: Preço da ação ordinária no final do trimestre fiscal t; A: Total de ativos líquidos por ação ordinária, no fim do trimestre fiscal t; B: Dívida total por ação ordinária, no fim do trimestre fiscal t; L: Lucros por ação ordinária, no período t; B/PL: Dívida total sobre patrimônio líquido no trimestre t; P/PL: Preço da ação ordinária sobre patrimônio líquido no trimestre t; ROI: Retorno sobre investimentos no trimestre t; CD: Custo
32
da dívida no trimestre t; ROI-CD: diferença entre ROI e CD no trimestre t. As variáveis P*,A*,B* e L* são as variáveis P,A,B e L não deflacionadas por receita líquida por ação ordinária.
3.5.2. Procedimento econométrico
Essa seção visa apresentar os procedimentos econométricos utilizados
para estimação da relevância da dívida para o valor de uma ação.
Os modelos em Giner e Reverte (2001) foram estimados por pooled
cross section and time series, sem quaisquer transformações para remover
efeitos não observados de variáveis explicativas. A opção por não usar o
estimador de efeitos fixos, segundo os autores, seria devida ao número
reduzido de observações, já que isso geraria perda excessiva de graus de
liberdade.
Considerando que a amostra utilizada é constituída por dados em cross-
section ordenados no tempo, aqui adotou-se o método de mínimos quadrados
em painel desbalanceado, com efeitos fixos de tempo e cross sections.
Neste estudo também há necessidade de contornar o mesmo problema
econométrico encontrado por Giner e Reverte (2001), a heterocedasticidade.
Por conta disto, o método para estimar os erros padrão dos coeficientes
utilizado foi o de ajuste por clustering (ou period seemingly unrelated regression
- SUR), que leva em consideração heterocedasticidade e também
autocorrelação dos erros, porém adiciona a restrição de não correlação entre
os resíduos das várias cross sections.
Como vantagem, a regressão em painel permite controlar efeitos fixos
não observáveis que podem enviesar as estimativas dos coeficientes. O
estimador de efeitos fixos leva em conta a possibilidade de correlação entre
uma variável não observável e as variáveis explicativas em qualquer período
do tempo (não existiria exogeneidade estrita dos regressores). Assim, qualquer
variável explicativa constante ao longo do tempo para todas as cross-sections é
removida pela transformação de efeitos fixos (WOOLDRIDGE, 2006).
33
Entretanto, em termos do número de graus de liberdade, de fato, o
painel com efeitos fixos apresenta um número menor de graus de liberdade do
que a mesma regressão estimada por pooling.
Ao tomar-se como exemplo a equação (2), é possível calcular o número
de graus de liberdade; há um total de NT observações (N empresas, em T
períodos) e 6 variáveis (ativos, dívida, lucro e 3 dummies), mais o intercepto.
Assim, no caso de pooled regressions, há NT – 7 graus de liberdade. Contudo,
ao se adotar a transformação que elimina os efeitos fixos, para cada
observação da cross-section, abre-se mão de um grau de liberdade devido à
redução temporal. Portanto, os graus de liberdade são gl = NT - N – 6 = N(T-1)
- 6 (WOOLDRIDGE, 2006).
Porém, como a amostra aqui estudada é consideravelmente maior do
que a utilizada por Giner e Reverte (2001) – 3125 observações, enquanto os
referidos autores contavam com 599 observações – optou-se pela estimação
através do painel.
O estimador com dados em painel, vis-à-vis o de pooled regressions,
portanto, reduz a probabilidade de multicolinearidade e é mais eficiente
(estimador não enviesado, com variâncias menores para todos os possíveis
valores dos parâmetros), mesmo contando com um menor número de graus de
liberdade.
34
4 RESULTADOS
Os resultados preliminares para a primeira hipótese são apresentados
na Tabela 2. Todas as variáveis, exceto lucro e a dummy D1, são
estatisticamente significantes. Do ponto de vista de apreçamento, isto implica
que a separação do patrimônio líquido (PL) em seus dois principais
componentes, ativos e passivos, traz informações relevantes para a
precificação de uma ação.
Tabela 2 – Resultado das regressões para equação (2) com dados em painel estimados por efeitos fixos2
Intercepto A B L D1 D2 D3 R²
Ajustado Nº Obs.
-1,2009 1,5321 -0,5900 0,0000 0,0000 0,0017 0,0007 0,93 3125 (0,00)* (0,00)* (0,00)* (0,94) (0,16) (0,00)* (0,00)*
Fonte: Autor Nota: P, A e B (não interada) estão em log. A: Total de ativos líquidos divididos pela receita líquida, por ação ordinária, no fim do trimestre fiscal t; B: Dívida total dividida pela receita líquida, por ação ordinária, no fim do trimestre fiscal t; L: Lucros divididos pela receita líquida, por ação ordinária, no período t. D1: Dummy que assume valor igual a 1 se a empresa estiver contida no 1o ou 4o quartis da distribuição da razão B/PL no período t e 0 caso contrário. D2: Dummy que assume valor igual a 1 se razão P/PL > 1 e 0 caso contrário. D3: Dummy que assume valor igual a 1 se ROI > CD e 0 caso contrário. Dados entre parênteses representam os p-valores. *Significante ao nível de 1%. ** Significante ao nível de 5%.
Além disso, o coeficiente de β2 é negativo, conforme esperado.
A Tabela 3 abaixo resume o que era esperado com relação aos
coeficientes para cada hipótese e o que foi de fato obtido.
2 A equação (2) foi estimada por efeitos fixos e efeitos aleatórios. O teste de Hausman foi
aplicado. A hipótese nula de que o modelo apropriado seria o de efeitos aleatórios foi rejeitada, com estatística Chi-Quadrado de 15,33 e p-valor inferior a 5%.
35
Tabela 3 – Resultados versus hipóteses
Hipótese Coeficiente
P-valor Esperado Obtido
Decomposição do PL β1+β2 ≠ 0 β1+β2 ≠ 0
0,00 β2 < 0 β2 < 0
Relação ROI e CD β6 > 0 β6 > 0 0,00
Estrutura "ótima" β4 < 0 β4 > 0 0,16
Teoria da Sinalização β5 > 0 β5 > 0 0,00
Recapitulando a primeira hipótese nula:
𝐻01: Os dois principais componentes do patrimônio líquido (ativos e
passivos) são igualmente valorados pelo mercado.
Tal hipótese serve para testar se a versão do modelo de Ohlson
utilizada, dividindo PL em ativo e passivo, é relevante, ou seja, se essa
decomposição traz alguma informação diferente da variável PL. Os dados
mostram que os coeficientes de ativo e passivo são estatisticamente diferentes
(teste de Wald = 261, p-valor inferior 0,01%). Assim, a divisão do PL em seus
dois principais componentes traz informação relevante, pois o resultado mostra
que ambos são precificados de forma diferente pelo mercado.
Para testar a segunda hipótese:
𝐻02: A relevância em termos de valor da dívida não depende da relação
entre CD e ROI.
é analisado o coeficiente 𝛽6. Caso ele seja estatisticamente significante, rejeita-
se a hipótese nula de que a relação entre ROI e CD não é relevante para testar
o impacto da dívida na valoração de uma ação.
Neste caso, parece que a relação entre ROI e CD afeta o conteúdo
informacional trazido pela dívida, pois 𝛽6 é significante a 1%. Adicionalmente,
conforme o esperado, o sinal do coeficiente é positivo, o que mostra que o
36
mercado paga um prêmio para ações de empresas com alavancagem “positiva
para o acionista” (ROI > CD).
A terceira hipótese nula:
𝐻03: A relevância da dívida em termos de valor não depende de quão
perto do nível considerado “ótimo” está a alavancagem da
empresa.
referente ao afastamento da meta de estrutura de capital, é testada através da
análise do coeficiente 𝛽4, referente à interação da variável dívida com a dummy
𝐷1, que assume valor 1 para empresas longe da estrutura de capital meta e 0
caso contrário. Conforme o modelo estimado mostra, o sinal de 𝛽4 é positivo, o
que é distinto do esperado, pois o mercado deveria penalizar, ao invés de
premiar, empresas longe da estrutura ótima de capital, uma vez que estas,
conforme a teoria, estariam destruindo valor.
No entanto, o coeficiente é estatisticamente insignificante (p-valor =
16%). Por conta disso, o afastamento da estrutura ótima de capital não parece
relevante para explicar o impacto do uso de capital de terceiros na valoração
de uma ação.
Por fim, a quarta hipótese nula,
𝐻04: O valor informacional da dívida não depende das perspectivas
futuras de crescimento do lucro da empresa.
referente às oportunidades futuras de crescimento dos lucros, é testada ao se
analisar o coeficiente 𝛽5, que se refere à interação da variável dívida
deflacionada com a dummy 𝐷2, que assume valor 1 caso a empresa tenha
boas perspectivas futuras de crescimento do lucro, e 0 caso contrário.
Conforme descrito na Tabela 2, o coeficiente 𝛽5 estimado é significante a
1% e seu sinal é positivo, conforme o esperado. Dessa forma, rejeita-se a
hipótese nula de que o impacto da dívida na valoração de uma ação não
dependa das oportunidades de crescimento do lucro de uma empresa.
Adicionalmente, o sinal positivo mostra que ações de empresas com boas
oportunidades de crescimento do lucro são recompensadas pelo mercado.
37
38
5 CONCLUSÃO
Neste trabalho, uma versão simplificada do modelo de Ohlson (1995) foi
utilizada para fazer uma análise da relevância da dívida em termos de valor,
sob a ótica de algumas teorias alternativas que justificam o uso de dívida. Para
testar tais teorias foram utilizadas proxies que contextualizaram as empresas
de acordo com suas circunstâncias específicas, como por exemplo, suas
perspectivas futuras de lucratividade, situação atual do impacto do
endividamento para o acionista (se positivo ou negativo) e seu grau de
alavancagem em relação ao restante do mercado.
A necessidade de contextualizar e usar um modelo de precificação de
ação nasce para que seja possível interpretar melhor o valor informacional da
dívida, pois grande parte dos estudos sobre o assunto foi feito utilizando uma
abordagem de curto prazo, por serem baseados na análise da variação do
preço de uma ação em janelas de tempo que incluíam anúncios de eventos
relacionados a mudanças na estrutura de capital.
Neste estudo, assim como feito por Giner e Reverte (2001), foram
levados em consideração argumentos econômicos que justificam o uso de
capital de terceiros, como por exemplo, a teoria da estrutura “ótima” de capital,
a teoria da sinalização e a relação entre o custo da dívida (CD) e retorno sobre
investimentos (ROI).
Os resultados mostram que a decomposição da variável PL no modelo
de Ohlson (1995) em dívida e ativo é positiva, pois com essa separação foi
possível inferir que a dívida é relevante e que, ao valorar uma ação, a dívida é
avaliada de forma diferente dos ativos pelo mercado. Além disso, o impacto da
dívida no preço da ação depende da relação entre ROI e CD, sendo que
investidores pagam um ágio por ações de empresas com alavancagem positiva
para o acionista (quando ROI > CD). Com relação à teoria da estrutura “ótima”
de capital, os resultados revelam que o valor informacional da dívida não
depende do distanciamento do nível de alavancagem de seu nível meta. Por
fim, empresas com maior potencial de crescimento futuro de lucros mostraram
39
que o aumento do endividamento é percebido pelo mercado como um sinal
positivo, ao contrário daquelas com baixas perspectivas, resultado este em
linha com a teoria da sinalização.
Sobre as limitações deste estudo, vale citar a grande dependência dos
resultados relativos às proxies escolhidas para testar as teorias que justificam o
uso de capital de terceiros, há outras proxies que podem ser utilizadas para
realizar os testes. Além disso, os resultados são também bastante
dependentes do modelo de precificação de ações, que é uma versão
modificada daquele proposto por Ohlson (1995). Dessa forma, como sugestão
para estudos posteriores, é possível fazer tais análises através do modelo
completo proposto por Ohlson (1995). Adicionalmente, as proxies podem ser
calculadas por setor, ao invés de se comparar com todas as empresas.
40
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