O Homem Vive_ Entrevista Com Viktor Frankl

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Entrevista com Viktor Frankl

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  • Quarta, 05 de Junho de 2013

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    O Homem Vive: entrevista com Viktor Frankl

    Escrito por Viktor Frankl

    Tera, 29 de Setembro de 2009 00:00

    O Homem Vive

    Mr. Roy Bonisteel entrevista Viktor FranklTraduo: Felipe Cherubin

    Nota do tradutor

    Man Alive foi uma srie de TV canadense sobre f e espiritualidade. O ttulo da srie foi retirado de umpoema de St. Irenaeus, bispo de Lugdunum (atualmente Lyon) no sculo II que escreveu A glria de Deus o homem verdadeiramente vivo. A srie teve inicio em 1967 na CBC Television. Foi na srie ManAlive, em 1977, que Viktor Frankl deu uma das suas mais impressionantes entrevistas cuja transcriofoi publicada posteriormente e de forma estendida em edio comemorativa do International Journal ofLogotherapy and Existential Analysis. Com muita satisfao apresento a traduo em portugus dessaclebre e tocante entrevista de um dos maiores pensadores do sculo XX.

    Confira tambm os artigos: A Mensagem de Viktor Frankl e Redescobrindo o sentido da vida

    ENTREVISTADOR: Dr. Frankl, o Senhor passou trs anos em quatro campos de concentrao durante aguerra, daria para me descrever como o Senhor encontrou sentido na vida, como o Senhor descobriu que avida vale pena aps esse tipo de experincia.

    FRANKL: Meus editores americanos costumam trazer baila a histria de que eusai de Auschwitz com um novo ramo de psicoterapia com um novo sistema etudo o mais. H um erro nisso: eu entrei em Auschwitz com o manuscritocompleto do meu primeiro livro escondido em meu bolso. E foi precisamenteneste manuscrito - que posteriormente foi publicado nos EUA sob o ttulo TheDoctor and the Soul - que eu desenvolvi a idia do significado incondicional davida. Portanto a idia de que a vida faz sentido e permanece significativa sobquaisquer condies um conceito a que cheguei anteriormente s minhasexperincias no campo de concentrao. Assim d para dizer que esta idia,esta convico da significao incondicional da vida foi mantida, ela sobreviveu experincia do campo, e ainda uma convico, apesar do sofrimento e detodas as mortes ao nosso redor no campo de concentrao. E o prprio campode concentrao estava ali servindo meramente como um campo de provas para confirmar -

    vivencialmente e experimentalmente - a justificativa de minha convico.

    ENTREVISTADOR: Assim ela confirmou a sua convico. Contudo o Senhor deve ter visto l pessoas queobviamente no viam nenhum sentido em suas vidas? Fale sobre aqueles que sobreviveram e aqueles queeram diferentes - como isso serviu para confirmar a sua teoria?

    FRANKL: A lio que a gente poderia aprender seja em Auschwitz seja em quaisquer outros campos deconcentrao, em ltima anlise, foi: aqueles que estavam orientados segundo a concepo de que haviaum sentido na vida, em direo a uma realizao que deveria ser executada por eles no futuro foramaqueles que tinham mais chances de sobreviver. E isto foi posteriormente confirmado por psiquiatras damarinha e do exrcito americano - em campos de prisioneiros de guerra japoneses, nos campos similares daCoria do Norte, e recentemente nos campos de prisioneiros de guerra norte vietnamitas. Na UniversidadeInternacional de San Diego, Califrnia, eu tive trs oficiais americanos no ano passado, durante o trimestredo inverno, quando eu estava lecionando naquela faculdade, que tinham sido aqueles que haviampermanecido por mais tempo internados em campos de prisioneiros de guerra norte vietnamitas - cerca desete anos. E ento improvisamos um painel; e eles realmente confirmaram o que eu tinha dito em meurelatrio sobre a experincia de campo de concentrao, Man's Search for Meaning - eles a reconfirmaramem sua essncia: que a orientao em direo ao futuro - em direo a uma tarefa, uma tarefa pessoal,que esteja lhes aguardando para ser realizada no futuro; ou alguma outra pessoa que eles estivessemamando, a ser encontrada novamente, a se reunirem novamente no futuro - isto foi o que decisivamentemanteve essas pessoas vivas. A questo no foi apenas de sobrevivncia, mas tinha que haver uma razopara a sobrevivncia. A questo era sobreviver para qu; a no ser que houvesse alguma coisa ou algum,uma causa pessoal pela qual viver, a sobrevivncia era altamente improvvel.

    ENTREVISTADOR: A maioria de ns jamais passou pela experincia do campo de concentrao. Nuncativemos que passar por este horror e tragdia e por isso tendemos a achar que hoje seria mais fcil buscarsignificado na vida - e ainda assim sinto que est sendo mais difcil encontrar sentido hoje do que era nosanos passados, o Senhor tambm pensa assim?

    FRANKL: Voc est totalmente certo.

    ENTREVISTADOR: E por que ser assim?

    FRANKL: Porque estamos vivendo em uma sociedade - seja em termos de uma sociedade afluente ou em

  • FRANKL: Porque estamos vivendo em uma sociedade - seja em termos de uma sociedade afluente ou emtermos de um estado de bem estar social como este em que vivemos hoje na ustria - seja l como for:estes tipos de sociedade virtualmente satisfazem, ou pelo menos eles se propem a satisfazer e gratificarcada uma das necessidades humanas, exceto por aquela necessidade - a mais bsica e fundamentalnecessidade operando no ser humano: a necessidade de um significado. As sociedades de consumo, elasesto at mesmo criando necessidades, mas a necessidade de significado - ou, como eu costumo dizer - odesejo de encontrar um significado - permanece inatingido. aquilo que eu costumo chamar ultimamentede o grito no escutado pela busca de significado.

    Por um lado, a sociedade est frustrando o desejo humano pela busca do sentido, e por outro, a psicologiaest negligenciando este fato. Se voc analisar as atuais teorias da motivao, voc dificilmenteencontrar qualquer referncia quilo que a preocupao mais fundamental e bsica do homem: no nem o prazer e nem a felicidade, nem tampouco poder ou prestgio, mas originalmente e basicamente suavontade, seu desejo de encontrar um sentido em sua vida e realiz-lo - ou em qualquer situao individualque a vida lhe apresente. E se existe um sentido a ser realizado, se ele est consciente disso, ou se elese torna consciente desse significado - ento ele est pronto a sofrer, ele est pronto a oferecersacrifcios, e pronto para submeter-se tenso, stress e assim por diante - sem maiores danos suasade.

    Se, porm, no houver um sentido discernvel, nenhum significado em seu campo visual, isso ento acabacom a vida da pessoa. Recentemente tive acesso a uma estatstica feita por uma universidade americanarelacionada a sessenta estudantes que haviam tentado cometer suicdio...

    ENTREVISTADOR: Esse nmero muito alto...

    FRANKL: Eles foram estudados posteriormente, psicologicamente, e resultou que oitenta e cinco por centodeles disseram aos doutores que a razo de sua tentativa foi porque eles no conseguiam discernir nenhumsentido na vida. E dentre eles, noventa e trs por cento estavam, obviamente, fsica e mentalmentesaudveis; desfrutando de bons relacionamentos familiares, e de boas condies econmicas; e comdesempenho acadmicos e notas satisfatrias, e assim por diante.

    ENTREVISTADOR: Isto foi o que ouvi; gastei um bom tempo com jovens, em sua adolescncia, e muitosdeles diziam estarem simplesmente entediados. Eles esto entediados com a escola, com seus pais, com avida e o que imagino que o Senhor diria que eles esto entediados com o sentido da vida.

    FRANKL: Nem os pais e nem os professores so corajosos o suficiente para desafi-los: no crie tenses,no coloque stress neles. Entretanto, at mesmo Hans Selye, o homem de Montreal que criou o conceitode stress, recentemente publicou um estudo em que ele diz que o stress o sal da vida, que o homemnecessita de tenses - eu diria de forma mais cautelosa que o que ele necessita de uma quantidadesaudvel de tenso. No tenses muito grandes, nem tenses muito pequenas, mas uma dose, uma dosesaudvel de tenso, tal como a tenso que se estabelece em um campo polar em que um plo representado por um homem e o outro plo por um significado nico e especfico que esteja aguardando

    por ele para ser realizado, e exclusivamente por ele.

    ENTREVISTADOR: Portanto no deveramos ficar preocupados com todos os stresses e ansiedades denossa vida. No deveramos... Bem, suponha que eu chegue aqui e diga-lhe, doutor, olhe, como que eu

    fao para lidar com as ansiedades e stress de minha vida?

    FRANKL: D para imaginar uma situao para um ser humano que seja mais cheia de stress do queAuschwitz? - E ainda assim, virtualmente toda a sintomatologia neurtica desapareceu em Auschwitz. E astaxas de suicdios em Auschwitz e Dachau foram surpreendente e incrivelmente baixas, de acordo comquem quer que estivesse escrevendo livros - psiquiatras escrevendo livros sobre psicologia e apsicopatologia da vida em campos de concentrao. E, por outro lado, no estado de bem estar social daustria um professor me mostrou uma lista de perguntas que seus estudantes tiveram permisso de fazer aele, escritas sem nenhuma inibio, sem dar seus nomes, de forma absolutamente annima. E o espectrodas perguntas variava desde a pergunta "existe vida em plantas ou no" at o vcio das drogas, problemassexuais e assim por diante. E voc sabe o que estava no topo da lista, medida pela freqncia com que elaaparecia? Suicdio! Dentre jovens de 14 a 15 anos de idade, em um estado de bem estar social como austria, onde virtualmente no existem stress nem tenses porque eles so todos paparicados, e no sepermite que ningum os desafie. O que os jovens precisam de ideais e desafios, tarefas pessoais e - emprimeiro lugar - exemplos, exemplos pessoais, mas no dos covardes, as pessoas covardes que no os

    enfrentam em nada porque eles podero ficar bravos porque esto sendo desafiados.

    ENTREVISTADOR: Fiz uma entrevista no ano passado com o metropolitano Anthony Blum de Londres e eledisse exatamente a mesma coisa que o Senhor est dizendo. Ele era mdico durante o ... e ele cuidou dossobreviventes dos campos de concentrao. Ele teve uma vida muito dura. E ele disse que a nica vez emsua vida inteira em que ele chegou a considerar a hiptese de suicdio foi posteriormente, quando ele se

    tornou rico.

    FRANKL: Isto bem conhecido, eu costumo comparar isso com o caso dos peixes de guas profundas, quequando so trazidos superfcie do mar so deformados. E este tambm o maior perigo para os

    mergulhadores, eles precisam ser trazidos lentamente para uma rea de tenso menor, de menor presso.

    bem conhecido entre neurologistas e psiquiatras que fazer grandes exigncias s pessoas at menosperigoso do que fazer muito poucas exigncias a elas. Hoje em dia no se est exigindo demais das

    pessoas, est se exigindo de menos.

    ENTREVISTADOR: Outra coisa que me ocorre que a gente sempre pode encontrar sentido em algumasdas instituies tradicionais que temos - a igreja, por exemplo, ou a famlia. E estas instituies parecemestar diminuindo. Parece que elas tem menos importncia em nossas vidas hoje em dia. E isto deve frustrar

    a nossa busca por sentido, acho.

    FRANKL: Voc est certo em diversos aspectos. Antes de mais nada, o que eu descrevi h 30 anos atrs,e previ e antevi, eu posso dizer: a emergncia - e atualmente a presena - daquilo que eu chamo devcuo existencial; a sensao de falta de sentido, de vazio; um sentimento de futilidade que agora toma olugar dos sentimentos de inferioridade, a frustrao existencial que agora toma o lugar das frustraessexuais contrastando com os tempos de Sigmund Freud. Agora, esta neurose em massa, essa falta desentido, deve ser explicada, da forma como eu a vejo, principalmente em duas direes. Primeiro,contrastando com um animal, as aes do homem no so ditadas por instinto e contingnciasespecficas. Alm disso, diferentemente do homem de tempos passados, hoje ele no mais constrangidopelas tradies e por valores tradicionais e universais que lhes diziam o que fazer. Agora, sem saber o queele tem que fazer ou o que ele deveria fazer, ele algumas vezes parece no saber mais o que elebasicamente deseja fazer. E qual a conseqncia? Ou ele simplesmente deseja fazer o que as outraspessoas esto fazendo - isto conformismo; ou ento ele apenas faz aquilo que as outras pessoas

    querem que ele faa - e isso totalitarismo.

  • Agora esta a origem do vcuo existencial. Mas, veja voc, uma vez que as tradies esto batendo emretirada, as tradies esto se desmoronando - existe uma queda das tradies, no apenas no campo dareligio, mas de modo geral - aquelas pessoas que so mais afetadas por esta perda de valores tradicionaisso naturalmente os jovens. E isto pode ser evidenciado. Existem quatro testes, testes logoterapeuticos,desenvolvidos por ex-estudantes meus. Com eles voc pode medir o grau de orientao de sentido, o graudo desejo de algum de encontrar uma razo de ser em sua vida, e por outro lado, a frustrao existencial,a frustrao de seu desejo em relao ao sentido, seus sentimentos de falta de sentido. E ficouevidenciado por projetos de pesquisa empricos e baseados em estatstica que os jovens de fato so osmais afligidos por esse sentimento de vazio e de falta de sentido. Assim, voc estava certo em basesintuitivas, como tem sido confirmado pelos testes efetuados pelos meus estudantes.

    ENTREVISTADOR: Mas em termos de nossos valores tradicionais e nossas instituies religiosas estaremperdendo importncia como dizemos - possvel algum encontrar sentido na vida sem uma f em Deus?

    FRANKL: Veja voc, eu tinha dito antes, existe um significado incondicional na vida. Eu ainda no tive umaoportunidade de apoiar...

    ENTREVISTADOR: prossiga...

    FRANKL: ...esta a minha convico pessoal. Mas de forma antecipatria, eu gostaria de dizer que umarazo de ser pode ser encontrada em cada uma e todas as pessoas, tambm por aqueles que no soreligiosos. Concordaria pessoalmente que mais fcil encontrar sentido na vida se voc for uma pessoareligiosa. Mas por outro lado, eu teria que acrescentar imediatamente a seguir, que voc no podecomandar, nem obrigar ningum a ter f.

    ENTREVISTADOR: Entendo..

    FRANKL: A crena, ou f, precisa crescer dentro de voc mesmo - organicamente. Voc tem que permitirque ela cresa - voc no deve contribuir para a represso da f. Mas em princpio cada um de ns podeencontrar um sentido na vida. E isto novamente tem sido empiricamente corroborado. Em casa tenho umalista de 17 autores, pessoas que escreveram suas dissertaes sobre este assunto - dentre eles dois,oriundos da Universidade em Ottawa. E para sumarizar o que foi evidenciado empiricamente por testes eestatsticas como eu disse antes o seguinte: que o sentido da vida pode ser encontrado em todas aspessoas, independentemente de sua idade; independentemente de seu sexo, independentemente de seunvel educacional, independentemente de seu Q. I., independentemente de seu carter, ou de suaformao estrutural e psicolgica; at mesmo independentemente do ambiente - basta pensar apenas emAuschwitz, nas prises, e das pessoas que so muito bem sucedidas e ficam entediadas. E, finalmente,ficou claro que essa busca por uma razo de ser est disponvel ao homem independentemente dele ser ouno religioso - e se ele for religioso a que denominao ele pertence. E um aspecto que merece registro: asltimas descobertas mencionadas por mim - as devemos padres que estavam empiricamente efetuandopesquisas nos departamentos de psicologia das universidades.

    ENTREVISTADOR: Exploremos por um momento como poderemos encontrar esse significado. Digamos queeu seja um sujeito mdio, e nunca estive em um campo de concentrao, ento no fui testado atravs dosofrimento. Por exemplo, vivo uma vida muito confortvel; talvez eu no tenha uma crena em Deus,talvez esteja entediado com meu trabalho, talvez esteja entediado com a minha famlia. Mas o Senhor estdizendo que ainda assim eu posso encontrar uma razo de ser para a minha vida. E importante que eu aencontre. Onde eu a encontro? Aonde eu me apoio? Isto , estou apenas sugerindo que podemos tercidados que estejam passando por isso...

    FRANKL: Estou cansado de repetir e repetir novamente: existem trs grandes avenidas conduzindo realizao. A primeira maneira, a primeira estrada pela qual voc pode chegar a um sentido a serencontrado e realizado, atravs do trabalho, atravs da criao de um trabalho ou executando um feito.Em segundo, atravs do amor, compartilhando a vida com algum em sua individualidade - e isto significaamor. O amor mais do que apenas sexo; ao contrrio, o sexo humano mais do que mero sexo -precisamente na medida em que ele serve como uma encarnao corprea, eu posso dizer, uma maneira deexpresso, uma maneira fsica de expresso, do amor de algum, de uma unio pessoal, de se apoderar deoutra pessoa em sua nica individualidade. E apoderar-se da individualidade de outra pessoa equivalente, a prpria definio de amor. - De qualquer forma, voc pode enriquecer a sua vida interior atravs daexperincia de algo - cultura, natureza, arte, ou outra coisa qualquer; atravs da pesquisa, passando poralguma experincia ou encontrando algum que seja nico - em outras palavras, atravs do amor. Trabalho

    e amor so as principais avenidas conducentes ao encontro do significado - mas:

    Se for necessrio - se voc for confrontado com um destino que voc no tem condies de mudar, sevoc for confrontado, digamos, com uma doena incurvel, com um cncer inopervel: mesmo assim vocpode encontrar um significado na vida. Talvez possa at encontrar o sentido mais profundo possvel, osentido mais alto concebvel, porque ento voc tem uma oportunidade de testemunhar o potencialhumano no que ele tem de melhor. Da mais humana de todas as capacidades humanas, que : transformaruma tragdia em um triunfo pessoal, em transformar o seu predicamento em uma realizao no nvelhumano. Em outras palavras, a vida potencialmente significativa literalmente at o ultimo suspiro de umapessoa, at o seu ltimo momento. Mesmo in extremis e in ultimis, como os telogos diriam; isto significaque em situaes de vida extremas - pense, por exemplo, em Auschwitz, e at o ltimo momento. Permita-me citar nem mais nem menos do que o ttulo do ltimo livro de Elisabeth Kubler-Ross Death, The FinalStage of Growth. ("A Morte: O Estgio Final do Crescimento").

    Portanto a vida potencialmente significativa sob quaisquer condies. O American Journal of Psychiatryuma vez escreveu uma crtica sobre um livro meu, e ali voc encontra esta sentena: "A mensagem do Dr.Frankl a crena, a f incondicional, na significao incondicional da vida." - Correto, mas mais do quef. Quando tinha 15 anos de idade, eu tive este relampejo, esta intuio. Mas posteriormente ela foicorroborada em terreno firme e slido, atravs da anlise fatorial de muitos milhares de questionrios, desujeitos que estavam sendo analisados psicologicamente, os dados sendo computadorizados, e assim pordiante. Estes so fatos slidos e estes so problemas ardentes, problemas ardendo sob as unhas dosdedos de nossos jovens.

    ENTREVISTADOR: Ento podemos encontrar a razo de ser de nossas vidas de trs maneirassignificativas, atravs do trabalho, amor...

    FRANKL: ... E potencialmente atravs do sofrimento. Mas no sofrimento apenas se no tiver outro jeito -lembre-se: eu disse "se no tiver outro jeito". Carregar a cruz nos ombros desnecessariamente, parasuportar o sofrimento quando for desnecessrio - isso no produz nenhum significado. Se voc tiver comomodificar uma situao, voc tem que faz-lo. Se voc pode fazer uma cirurgia para extrair um cncer,voc tem que faz-lo. Mas de qualquer maneira, o homem um ser mortal. Temos que morrer, e antes demorrer inelutavelmente teremos que sofrer algumas vezes - como um mdico tenho que confessar isso. Noexiste ningum que viva sob situaes que no possam ser modificadas. Pode ser, por exemplo, odesemprego por alguns meses - mas ainda assim existe um significado na vida. Nos anos trinta, na pocada grande recesso mundial, eu lidei extensivamente com jovens que tinham sido pegos em situaes de

  • da grande recesso mundial, eu lidei extensivamente com jovens que tinham sido pegos em situaes dedesemprego, e descobri que o desemprego por si s no era o que pesava demasiadamente em suas almas;e sim o erro em que eles caiam, o erro de achar que no ter um trabalho significa no ter uma razo deser, o que equivale a dizer ser intil! No momento em que eu conseguia que estes jovens se voltassem paraalguma organizao - tal como a Father Toms Youth Corps e outras tantas -, eles passavam a ter umobjetivo a ser realizado - mesmo sem ganhar um centavo -, e a depresso sumiu! Em outras palavras, oque necessitamos, veja voc, no apenas po. E o que o desempregado necessita no estar apenasbem, eles necessitam de uma razo de ser - e ela pode ser encontrada em qualquer lugar, mesmo na maisinsignificante palhoa. Por outro lado, voc encontra pessoas que so milionrias e bilionrias e eles notm uma razo de ser, e eles se matam. Meu ex-assistente durante um perodo de magistrio em Harvard,Rolf Von Eckhartsberg, pode demonstrar em sua dissertao que as pessoas depois de 20 anos de suaformatura em Harvard, estavam tendo carreiras maravilhosas, sendo muito bem sucedidos, mas noencontravam nenhuma razo de ser em suas vidas. - e por outro lado, eu posso te mostrar pilhas de cartasque por razes desconhecidas eu sempre recebo das prises americanas, cartas nesse sentido: somenteaqui na priso, a uns poucos metros da cadeira eltrica, eu consegui encontrar uma razo de ser para aminha vida, apenas aqui! E at mais: as pessoas dizem que esto felizes, que fizeram as pazes consigomesmas, e que suas vidas, bem l nas prises, sob aquelas condies! De modo que agora podemosentender como eu tinha razo em dizer: a razo de ser em nossas vidas pode ser encontradaindependentemente da situao ambiental em que nos encontrarmos, de uma dada situao; ela dependede ns mesmos. E ela depende de estarmos ou no submetidos a um doutrinamento - nos campiamericanos ou nos divs de analistas - um doutrinamento no sentido de que o homem no nada alm deum mecanismo, o homem no nada seno o resultado de condicionamentos ou processos psicodinmicos,que o homem no nada seno apenas um computador. Se voc doutrinar as pessoas de acordo comessas linhas, no admira nada que eles sejam purgados de qualquer entusiasmo ou idealismo.Recentemente tive que abordar como um palestrante convidado no encontro anual do International P.E.N.club - o clube internacional de escritores, novelistas, dramaturgos e poetas. E eu implorei a esses autoresde novelas e dramas e assim por diante... - eu implorei a eles: se vocs no forem capazes de imunizar osseus leitores contra o niilismo e o desespero, por favor, ento pelo menos se contenham e evitem inocularneles o seu prprio cinismo.

    ENTREVISTADOR: Isto , ao que me parece, parte do problema que enfrentamos hoje nesta era em quevivemos: a mdia e os escritores de dramas que assistimos na TV, que lemos nos jornais, eles no estorealmente utilizando aquele tipo de linguagem que lida com aquilo sobre o que voc est falando. Elesesto utilizando uma linguagem que superficial, um tipo de linguagem efmera. No falamos muito sobreisso, no mesmo?

    FRANKL: Voc no sai por ai para confrontar as pessoas dentro de seu prprio vcuo interno e vazio efalta de sentido. E, ao invs de fazer a sua prpria mdia de massa - e todas as facilidades epotencialidades inerentes a ela, disponvel nela - em vez de torn-las uma terapia, voc as usa como areflexo de seus prprios sintomas. E tambm, voc passa a fazer um julgamento muito baixo e muitopequeno a respeito do homem, entende? O que necessrio que se pense grande a respeito do homem.

    Na minha idade de 72 agora, h um par de anos atrs eu comecei a ter aulas de vo sempre que eu estavana Califrnia. E uma vez meu instrutor de vo me disse: se voc est comeando aqui e deseja aterrissarali, e voc tem uma condio de ventos laterais, voc ser envolvido por esses ventos e acabaraterrissando ao sul daquele local. Ento voc tem que apontar o avio mais ao norte do ponto em quedeseja aterrissar para compensar a fora dos ventos contrrios, naquilo que ns pilotos chamamos de "voarde lado" ("crabbing").

    E o mesmo acontece com o homem. Se voc tiver uma opinio baixa a respeito do homem voc o estcorrompendo. Ele se deteriorar; ele se tornar pior moralmente. Em contraste, se voc tiver uma altaopinio a respeito dele, ento voc far com que ele possa efetivamente chegar aonde ele tem condiesde chegar.

    Em outras palavras: "Se considerarmos o homem tal como ele , ns o tornaremos pior. Por outro lado, sens o considerarmos como ele deveria ser - ns o ajudamos a tornar-se naquilo que ele pode vir a ser". -Mas isso no foi algo que o meu instrutor de vo tenha me dito, e na verdade uma citao literal deGoethe.

    ENTREVISTADOR: Gostaria de lhe perguntar mais uma vez sobre a questo do sofrimento. Fico contenteem escutar que o Senhor no acha que tenhamos necessariamente que sofrer a fim de buscar um sentidona vida. Porque em uma entrevista que fiz com Elie Wiesel...

    FRANKL: Podemos apenas extrair o mximo proveito do sofrimento, se for possvel.

    ENTREVISTADOR: ... Eu estava interessado no que Elie Wiesel disse: que o sofrimento contrrio suacriao judia. Ele no considera que o sofrimento seja uma parte necessria da vida, e de fato uma partem da vida, mas o Senhor v valor no sofrimento - at certo ponto...

    FRANKL: Primeiro: o valor potencial; um valor de oferta, uma oferta de significado que voc tem que usar.Segundo: no em todo tipo de sofrimento. Existe um filsofo judeu famoso - o qual, incidentalmente, era omaior e melhor amigo de Franz Kafka e deve ser creditado pelo fato de que os trabalhos de Franz Kafka notenham sido destrudos aps a sua morte - falo de Max Brod. E Max Brod, em um livro filosficorelativamente desconhecido que transpirava filosofia judia - especificamente a filosofia judia - fazia umadistino entre o sofrimento nobre e no nobre. O sofrimento nobre aquele sofrimento que voc no temcomo evitar e no pode modificar. Ento voc tem que transcend-lo, voc tem que extrair o melhor dele,como eu havia dito em termos triviais, voc tem que transform-lo em uma realizao, e esta realizaoento - caso voc tenha conseguido fazer isso... esta conquista pessoal ... a mais alta realizaopossvel feita pela homem. Nenhum animal consegue fazer qualquer coisa semelhante. Nenhum animal sequestiona sobre se a vida tem um sentido ou no. Nenhum animal capaz de transformar um predicamentoem uma realizao - s o homem. Mas se ele o faz, ento ele atingiu o pico de tudo aquilo que o homem capaz de fazer.

    ENTREVISTADOR: Doutor, o Senhor sublinha bastante o tema de nossas sries: o ttulo da amostra OHomem Vive, e me parece que para que o homem esteja plenamente vivo ele precisa encontrar o tipo designificado de que o Senhor est falando. Apesar disso, existem pessoas que passam por esta vida dizendo,"bem, eu posso suportar esta vida, posso seguir em frente nesta vida, porque existe outra vida aps esta,eu irei para algum lugar melhor." E ainda assim ele no est vivendo a vida em toda a sua completude, no?

    FRANKL: Certamente que no. Mas eu gostaria de conversar com esse tipo de pessoa. E eu nodescartaria a priori a justificativa de uma tal crena. Mas permita-me reagir de uma forma mais positiva

    sua pergunta, observando que da maneira como eu encaro essa questo, temos que manter o significadopotencial da vida apesar de sua transitoriedade. Assim muitos pacientes me fizeram essa pergunta: "Masdoutor, afinal das contas, tudo vai acabar. Tudo transitrio. Qual o sentido que permanecer?" E eucostumo responder o seguinte: o que transitrio so apenas as potencialidades; so apenas as

  • oportunidades: para realizar um objetivo na vida, seja por fazer algo, seja por amar algum, seja poragentar corajosa e honestamente um sofrimento que voc no tem como evitar, e at mesmo enfrentar asua morte de uma forma dignificada, enfim, com seu prprio estilo. Uma vez, porm, que tenhamosconcretizado uma tal potencialidade transitria, uma vez que tenhamos utilizado essa oportunidade parafazer um ato qualquer, amar algum, nos dedicarmos a alguma tarefa ou a outra pessoa, uma vez quetenhamos utilizado a oportunidade para transcender nosso predicamento a uma realizao humana, entoteremos resgatado todo esse significado, o teremos resgatado no passado; teremos seguramente entreguee depositado no passado. Ningum pode nos tirar e nos roubar daquilo que depositamos no passado. O atofeito; um amor amado; um sofrimento que encaramos honestamente algo indelvel. Em geral apenasvemos os vestgios das colheitas do passado. O que no vemos, contudo, aquilo que ignoramos, o celeirocompleto, so os silos em que resgatamos nosso passado, nossos feitos, nossas experincias - a colheitade nossas vidas. Descobri uma formulao para isso no Livro de J, onde ele diz: voc ir para o seutmulo como um punhado de gro colhido, na sua prpria poca. Ento o passado a forma mais segurade ser. Ele acaba, mas no passado tudo permanece, pois eternalizamos tudo. E ao invs de olharmos parauma vida futura ou uma ps-vida, diria que o que importante o senso de responsabilidade pessoal,aquele sentimento de que eu sou responsvel por aquilo que estou depositando no passado - e ento,depois de ter logrado xito nesse mister, ningum pode desfazer o que eu fiz. - Me pergunto se euconsegui me fazer compreendido...

    ENTREVISTADOR: Eu entendo. Uma outra rea, porm, que o Senhor mencionou anteriormente, sobre oenvolvimento de cada um pelos cuidados com outras pessoas, que dariam significado vida - amar outrapessoa: vemos em nossa sociedade hoje que nos tornamos mais individualistas, mais materialistas.

    H tambm uma sociedade, e estou pensando na sociedade chinesa, em que estamos preocupados unscom os outros, eles trabalham para a comunidade, para o estado, ento talvez seja assim que elesencontrem essa razo de ser.

    FRANKL: Para o futuro da nao...

    ENTREVISTADOR: Para o futuro da nao. Seria este um sistema prefervel?

    FRANKL: Veja voc: h muitos anos atrs, estava dando umas palestras em uma das universidadesamericanas, e um Freudiano se levantou na parte das perguntas e respostas e me disse: "Dr. Frankl, acabode retornar de Moscou. E preciso dizer que agora entendo o que o Senhor quer dizer: Nos EUA estamostodos muito preocupados - ns estamos cultivando nossas neuroses, e estamos idolatrando a psicanlise.A incidncia, a ocorrncia de doenas neurticas atrs da Cortina de Ferro muito mais baixa, e creio queisso ocorre porque l as pessoas possuem tarefas a serem completadas".

    E depois, um ano mais tarde, eu estava fazendo uma palestra atrs da Cortina de Ferro, em umauniversidade comunista, dentre psiquiatras comunistas. Eu disse a eles aquela histria e eles exibiramsorrisos muito amplos - e ento disse a eles, por favor, no riam muito cedo. verdade, vocs aqui devemter mais tarefas para completar, mas vejam vocs: os americanos mantm a liberdade de escolher as suastarefas - O quo lindo seria essa sntese, de combinar ter uma tarefa e a liberdade de escolher uma tarefa.De qualquer forma: voc colocou corretamente o seu dedo no fato de que aquilo que um ser humano, umindivduo precisa aquilo que eu costumava chamar de auto-transcendncia. Ou seja: estar preocupadoconsigo mesmo, ou com o seu prprio prestgio, ou sua prpria felicidade auto-derrotismo. Perdoem-mepor contradizer a Declarao de Independncia Americana em que encontramos a frase: "...a busca dafelicidade". Julgo que a "busca da felicidade" uma contradio em termos. Porque a felicidade no podernunca ser buscada. A felicidade precisa surgir, a felicidade um efeito colateral, a felicidade umsubproduto e precisa permanecer um subproduto da realizao de um significado, de uma razo de ser navida, de sua dedicao a uma tarefa, uma causa maior do que voc mesmo, ou a uma pessoa outra queno voc mesmo. E isto se torna mais conspcuo nas neuroses sexuais, onde precisamente a extenso emque algum est caando, perseguindo, buscando a felicidade sexual ou o prazer - ele est fadado afalhar. Seja um paciente masculino que queria demonstrar a sua potencia sexual - na mesma extenso emque provavelmente ele acabar sofrendo de impotncia. Uma paciente feminina, precisamente no grau emque ela quer demonstrar a ela mesma que ela plenamente capaz de chegar ao orgasmo - na extenso emque ela provavelmente vai acabar frigida. Por outro lado, quanto mais voc se d, quanto mais vocesquece de si prprio, no amor ou no trabalho, pelo bem de uma causa de servir ou a uma pessoa a seramada na medida em que voc ser muito feliz - precisamente por no buscar a felicidade, precisamente

    por ignorar e esquecer se voc est ou no feliz.

    O mesmo ocorre com os nossos olhos. A capacidade de nossos olhos de fazer o seu trabalho que perceber visualmente o mundo que nos rodeia, de forma paradoxal contingente incapacidade que o olhotem de ver a si prprio. Quando o meu olho v a si prprio? - Quando estou afligido pelo glaucoma eu vejohalos de luz de arco-ris em torno das luzes: ento meu olho percebe o seu prprio glaucoma. Se eu estiversofrendo de catarata, eu vejo nuvens: essa nuvem alguma coisa que meus olhos percebem de si prprio.Em geral os olhos no se vem, mas vem o mundo; e quanto mais ele v, mais v de si prprio, maior odano sua funo visual. O mesmo ocorre com o homem. O homem se torna ele prprio, o homem atuasobre ele mesmo, o homem humano precisamente na extenso em que ele no esteja preocupado comele mesmo, ou alguma coisa dentro de si prprio, mas vivendo a sua auto-transcendncia - em que eleesteja servindo a uma causa, cumprindo um desgnio, ou amando outro ser humano.

    ENTREVISTADOR: Bem, voc sabe doutor, eu no sou um psiquiatra nem sou um telogo. E ainda assimme parece que existe um contedo enorme de religio nesta logoterapia sobre a qual o senhor discorre.Qual a diferena entre a logoterapia e a religio?

    FRANKL: Uma grande diferena. Porque o objetivo de qualquer psicoterapia, como uma metodologiasecular, oferecer sade mental; enquanto que o objetivo de um pastor, padre ou rabino no primariamente qualquer tipo de higiene mental, mas at mesmo com o risco de provocar mais tenses, elelutar, tal como Jac fez com os anjos com aquela pessoa por conta da salvao, ou seja l como vocchame isso. Existe muita diferena! E voc precisa entender que na qualidade daquele que criou o sistemadenominado logoterapia e como psiquiatra tenho que me certificar de que a logoterapia esteja disponvelpara todo e qualquer paciente, e que ela esteja disponvel tanto para o paciente religioso como para oateu. E mais do que isso: que ela seja utilizvel nas mos de cada um e de todos os doutores eterapeutas, tanto o agnstico como quele orientado pela religio. Porque de outra forma estariacontradizendo o juramento Hipocrtico que eu tive que fazer, no sentido de que eu estou disponvel paracada um e todos os seres que sofrem. Desta forma no posso discriminar entre pessoas religiosas e noreligiosas.

    ENTREVISTADOR: No, que o Senhor utiliza tantos termos religiosos quando o Senhor fala nonecessariamente o mesmo jargo, mas suas frases apresentam uma conotao religiosa.

    FRANKL: Por exemplo?

    ENTREVISTADOR: Bem, que temos que cuidar da outra pessoa, no de ns mesmos, que a gente noprocure a felicidade - ela vir at ns...

  • procure a felicidade - ela vir at ns...

    FRANKL: Isto alguma coisa humana, isto um fato antropolgico, no uma questo teolgica! Torneiisso explcito na medida em que voc est esquecendo-se de voc mesmo ao dar-se humano. Agora mediga: ser que se trata de uma questo religiosa se eu destaco este aspecto em casos de impotnciamasculina e frigidez feminina?

    ENTREVISTADOR: (risada) No.

    FRANKL: No admira; porque ser que os telogos ao longo de diversos milhares de anos no se tornaramconscientes desse fato humano - ainda assim fatos humanos eles so. Os telogos os colocam em umaviso mais ampla; eles acrescentam uma outra dimenso. Mas a dimenso religiosa alguma coisa que nose permite que ns psiquiatras entremos. Iramos imediatamente enfraquecer nossa mensagem, porque aspessoas diriam: agora ele comea a pregar. Mas desde que eu possa corroborar minha convicomediante a confirmao de mtodos empricos, voc no pode simplesmente descart-la e jogar fora seuspensamentos ou escritos oriundos dessa inspirao. E isto algo muito importante hoje em dia.

    Pode at ser religioso no longo prazo, mas implicitamente e no intencionalmente - tanto melhor para areligio e para a psicoterapia! Mas a distino tem que ser feita, e no podemos confundir as dimenses.Existem tantos telogos dando palpites no campo da psiquiatria que eu no gostaria de contribuir com talconfuso comeando a dar palpites no campo da teologia.

    ENTREVISTADOR: (risos)

    FRANKL: E o Senhor neste continente, est contribuindo para que os psiquiatras sejam vistos comogurus. O Senhor espera que eles tenham todas as respostas. Ns psiquiatras no temos as respostas. Osentido da vida de cada um deve ser determinada por ele prprio, ningum pode tirar de seus ombros a

    responsabilidade de lutar com essa questo: qual o significado especfico de minha vida? Ele pode serajudado por sua prpria conscincia pessoal - desde que ele esteja ouvindo cuidadosamente a suaconscincia. Mas nenhum psiquiatra pode executar esse trabalho por ele, e nenhum psicoterapeuta pode edeve impor nenhum sistema de valor ou direo de significado aos seus pacientes. Mas tambm no hnecessidade - ns, psiquiatras sequer sabemos hoje qual a causa real da esquizofrenia - e muito menosainda sabemos qual a cura verdadeira para a esquizofrenia. No somos oniscientes. E muito menos aindasomos onipotentes. O nico atributo divino que podemos aspirar para ns mesmos que somos onipresentes, que estamos emtodos os shows, estamos nos shows O Homem Vive e assim por diante, estamos em todos os lugares!Mas vocs, particularmente - perdoe-me por externar isso -, mas particularmente vocs americanosdeveriam parar de divinizar a psiquiatria, e deveriam ao invs disso comear a re-humanizar a psiquiatria.

    ENTREVISTADOR: Muito obrigado! Eu percebo como o Senhor diz que depende de cada um de ns,independentemente de quem sejamos descobrir onde estamos ou em que condies estamos vivendo. OSenhor nos disse o que podemos fazer, e agradeo-lhe muito por fazer parte de nosso programa.

    FRANKL: Obrigado.

    ENTREVISTADOR: Dr. Frankl, particularmente os jovens hoje em dia parecem ter dificuldades em encontrarobjetivos e propsito na vida. Por que particularmente essa gerao de jovens? E o que voc diria a eles?

    FRANKL: Antes de mais nada: no se trata de uma neurose, de nenhuma doena, , ao contrrio, umamanifestao do que h de melhor no homem, o melhor observvel no homem: honestidade e sinceridadeintelectual.

    Se algum simplesmente no busca as respostas s suas perguntas diretamente das mos da tradio, aresposta pergunta "qual o sentido de minha vida", ento isto, no frigir dos ovos, fala em um certosentido em favor deste indivduo. Mas veja voc, se algum no est buscando um significado para a suavida mas est, ao contrrio, questionando se existe um tal significado, ele deveria, se ele for corajoso osuficiente, no depender das tradies e tentar encontrar as respostas ao seu jeito, e ele deveria agregarpacincia a essa coragem pessoal . Ao invs de tirar a sua prpria vida em desespero, ele deveria sercapaz de aguardar pacientemente at que mais cedo ou mais tarde a razo de ser de sua vida caia sobreele.

    Mas, a conseqncia, o efeito colateral de todo esse desespero to disseminado entre os jovens a criseque algumas vezes chamada erroneamente de doena ou de loucura. Lembro-me de que uma vez eu fuiconvidado por um corpo de estudantes de uma universidade americana para dar uma palestra a eles; e elesinsistiam que o ttulo deveria ser A nova gerao est maluca? - Agora, eu no consegui mudar o ttulo,ento eu tive que aceitar o desafio. E quando eu tive que pegar um taxi at aquela universidade, omotorista me perguntou sobre o que eu iria falar, e eu disse "A nova gerao est maluca?" E ele comeoua rir. - "No ria", eu disse "eu te fao uma proposta. Eu passo a dirigir o seu carro e voc faz a minhapalestra" - "Ah, eu no poderia fazer isso. Eu disse "Eu venho de Viena, e voc certamente tem o seudedo no pulso da psique do tempo do que eu". E ele me disse que ainda assim no conseguiria dar apalestra. Ento eu lhe disse: "Francamente, diga-me qual a sua opinio, a nova gerao est maluca?" -e voc sabe o que ele me disse, como se fosse um disparo de uma pistola? - "Claro que eles esto

    malucos - eles se matam, eles se matam uns aos outros e depois se drogam!.

    Ao fazer isso, ele corretamente colocou o seu dedo nos trs aspectos da neurose coletiva de hoje. Eles sematam, depresso, vo at o suicdio. Basta considerar as taxas espantosas de suicdio, particularmenteentre os jovens. Nos Estados Unidos hoje entre os estudantes o suicdio , logo depois dos acidentes detrnsito, a causa mais freqente de morte.

    Primeiro, depresso; depois eles se matam: agresso. Voc tem as taxas espantosas de delinqnciajuvenil de violncia! Em terceiro lugar, eles se drogam: e assim temos, depois da depresso e da agresso, o vcio. Isto o queeu chamo de a "trade da neurose coletiva".

    E existe evidncia, evidncia emprica, no ocidente e no oriente, e tambm no sul de que todas essascoisas so devidas sensao amplamente disseminada pelo mundo afora da falta de sentido que permeianossa cultura e particularmente as almas de nossos jovens.

    ENTREVISTADOR: Ok, o Senhor est nos dando essa descrio, e a prescrio a de obter sentido -encontrar sentido em sua vida. O Senhor comentou mais cedo sobre sair de si prprio. E eu suspeitaria que

    isto uma coisa que os adolescentes poderiam fazer, porque eles de fato tendem a ficarem ligades, no mesmo, eles so muito auto-conscientes nessa idade - conscientes deles mesmos. Como eles e aspessoas mais idosas tambm podem sair de si mesmos?

    FRANKL: Olha s existe tambm evidncia emprica no sentido de que eles esto demasiadamentepreocupados com a auto-interpretao e auto-realizao. Ambas, naturalmente, so prejudiciais. Elas

  • explicitam aquilo que eu chamo de auto-transcendncia. Voc deve e pode se realizar somente na medidaem que voc coloque isso para fora! E at mesmo Abraham Maslow, o homem que mais do que qualqueroutro propagou e promulgou o conceito da auto-realizao, em seus ltimos trabalhos antes de morrer,estava admitindo e concordando com a minha crtica: que a auto-realizao no pode nunca serconsiderada um objetivo. Se voc consider-la um objetivo, voc no o atingir. O mesmo que ocorre coma felicidade, com o prazer e tudo o mais.

    Agora tem o seguinte: voc no pode dizer a nenhum paciente: por favor, esquea de voc mesmo. Vocsabe como que ele vai ficar? Da mesma forma que o maior filsofo da histria ficou. Immanuel Kant umavez observou que seu empregado era um ladro, e ele teria que despedi-lo. Mas ele estavademasiadamente acostumado com ele e assim ele queria esquec-lo. Voc sabe o que ele fez - o grandefilsofo? Ele escreveu em um pedao de papel: Lampe - este era o nome do empregado Lampe temque ser esquecido. E ele colocou o papel na parede oposta sua mesa. claro que desta maneira eleestava impedindo que ele esquecesse o Lampe. Voc no pode esquecer de nada, muito menos ainda devoc mesmo, a no ser que voc se devote a uma tarefa pessoal, uma tarefa pessoal concreta. Tambm,o desejo de buscar um significado no pode ser obtido a no ser que algum esteja elucidando umsignificado, o prprio significado. E isto o mais importante porque de outra forma fica sempre como sefosse um bumerangue. Uma vez eu estava dando uma palestra na Universidade de Melbourne, Austrlia, eeles me deram um bumerangue como um souvenir, um bumerangue genuno. Quando ele me foi dado eusubitamente tive aquilo que chamado em psicologia de acordo com Karl Buehler uma "experincia aha". Derepente eu tive esse lampejo, este o verdadeiro smbolo da existncia humana e da qualidade auto-transcendente da realidade humana. Porque geralmente se supe que a funo do bumerangue retornarao caador - mas isso no verdade, o Australiano me disse. Porque quando aquele bumerangue retornaao caador porque ele falhou em atingir o alvo, a caa!

    ENTREVISTADOR: (risos)

    FRANKL: O mesmo ocorre com o homem. Somente aquele tipo de pessoa to ligado nela mesma e toansioso em contemplar e observar a si prprio, de representar a si prprio, que em primeiro lugar noconseguiram encontrar - no um alvo, mas uma misso em sua vida; que no encontrou um significado foradeles prprios; ou um outro ser humano que no eles prprios. Isto auto-transcendncia: no estandoprimariamente preocupado com si prprio, mas com alguma coisa outra que si prprio, ou melhor ainda, comalguma outra pessoa do que si prprio.

    ENTREVISTADOR: Mais uma pergunta: h pouco quando estvamos falando o Senhor utilizou a frase "odeus inconsciente". O que o Senhor quis dizer com isso?

    FRANKL: Esse o ttulo de um dos meus livros mais recentes. Eu apenas me refiro ao fato, com o qual medeparei tantas e tantas vezes ao longo dos meus muitos anos de prtica psiquitrica, de que at aspessoas no religiosas so, no seu inconsciente profundo, religiosos - claro que no sentido mais amplo dapalavra. Porm, uma vez que voc concorde com a declarao feita uma vez por Albert Einstein no sentidode que ao se encontrar uma resposta a uma questo sobre o significado da vida significa ser religioso; umavez que voc concorde com uma definio de religio neste sentido mais amplo voc pode supor que todasas pessoas, inconscientemente e de uma forma muito universal podem ser religiosas. E algumas vezes vocpode tambm ressaltar que esta, no apenas inconsciente, mas tambm reprimida, religiosidade pode muitobem resultar em certas formas de doena neurtica. Desta forma a crena de Sigmund Freud de que areligio uma neurose da humanidade pode, de certa forma, ser revertida: na medida em que podemos nosdeparar com casos em que, ao contrrio, a neurose o resultado de um desejo religioso reprimido epersistente em um indivduo. Mas certamente isso no deveria estimular ningum a abraar e esposarfreneticamente alguma religio, e porque a religio institucionalizada est hoje em dia fora de moda, seguircada uma nova religio que surja - e particularmente est na moda abraar e esposar formas orientais dereligio. Tenho muita compreenso e muita simpatia pelo misticismo e tcnicas de meditao orientais, mastudo isso no pode ser obtido e realizado mediante um comando, mediante uma ordem, mediante demandasfeitas a voc, nem mesmo pela vontade, mas somente de forma espontnea. E voc no poderianegligenciar tambm o fato de que a religio oriental muito diferente da nossa ocidental tanto quanto amente ocidental... Ser que eu posso falar em mente ocidental? Ser que isso faz sentido?

    ENTREVISTADOR: Sim, sim, faz...

    FRANKL: ...a mente ocidental, na medida em que somos orientados religio, essa orientao profundamente personalizada...

    ENTREVISTADOR: verdade, verdade...

    FRANKL: ...religio - veja voc - mais do que uma religio impessoal. Esse fato se torna ainda maisconspcuo no fenmeno da prece: na prece voc est se dirigindo, voc est falando com uma entidadeinteiramente e absolutamente pessoal ao invs de uma entidade ou ser csmico. Eu diria, a prece no uma chamada de estao-para-estao e sim uma chamada de pessoa-para-pessoa, se que eu possofazer essa analogia. E este fato no pode ser negligenciado - que nossas mentes ocidentais esto muitoligadas formas pessoais de religio. O contrrio da religio institucionalizada a religio personalizada -mas ambas podem ser combinadas, e a responsabilidade de todo individuo pensante fazer uma sntese deambas. Existe lugar para uma religio personalizada dentro de uma religio institucionalizada - e tambmvice-versa.

    Por outro lado, tanto quando voc descreva divindades em termos de algum que esteja principalmente eprimariamente preocupado em ter tantos crentes nela quanto possvel - e crentes no sentido estrito deuma certa denominao - voc falhar, voc no atrair a profundidade religiosa ou os sentimentosreligiosos em um indivduo. Ele se tornar desgostoso, porque ele concebe Deus em uma maneira diferente:como algum que cuida das pessoas, como algum que o ama incondicionalmente ao invs de algum queesteja ansioso em ter o maior nmero de seguidores possveis no sentido estrito. E por isso que eu creioque as pessoas deveriam acabar com o hbito de apoiar uma denominao religiosa qualquer que fiquelutando, ou ridicularizando ou discutindo com todas as demais. Sabe, todas essas instituies religiosas nolongo prazo sairo perdendo. Estou acostumado a comparar - e talvez isso seja um sacrilgio - religiescom as linguagens.

    ENTREVISTADOR: O que o Senhor quer dizer com isso?

    FRANKL: Existem diferentes linguagens; mas ningum pode dizer que est contente que a sua prprialngua-me seja superior a todas as demais lnguas, simplesmente porque voc chega verdade em cadalngua, voc pode cometer erros, se perder, em cada lngua; voc pode at mesmo mentir em cada lngua.Ento no existe nenhuma superioridade ou inferioridade mtua respectivamente. E o mesmo vlido paratodas as religies ou denominaes individuais. Simplesmente no pode haver nenhuma superioridade.Existe certamente uma verdade, eu admito e aceito, mas o que eu tambm teria que acrescentar queninguem em hiptese alguma jamais poder dizer que ele, e somente ele o detentor do monoplio daverdade.

  • ENTREVISTADOR: Muito obrigado. Muitssimo obrigado.

    Fonte: Viktor Frankl Institut: http://logotherapy.univie.ac.at/e/indexe.htmlVdeo e texto original em ingls: http://logotherapy.univie.ac.at/e/clips2download.html

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