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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: E a Aplicação e Execução da Medida de Internação
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí ACADÊMICA: KELLY CRISTINA SCHEFFER
São José (SC), novembro de 2004.
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: E a Aplicação e Execução da Medida de Internação
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade do Vale do Itajaí, sob orientação do Prof. Esp. Juliano Keller do Valle. ACADÊMICA: KELLY CRISTINA SCHEFFER
São José (SC), novembro de 2004.
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: E a Aplicação e Execução da Medida de Internação
KELLY CRISTINA SCHEFFER
A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
São José, 08 de novembro de 2004.
Banca Examinadora:
_______________________________________________________ Prof. Esp. Juliano Keller do Valle - Orientador
_______________________________________________________ Prof. Rosane Patussi Braga - Membro
_______________________________________________________ Prof. Andreas Eisele - Membro
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Dedico este texto...
Aos meus PAIS, por quem tudo vale a pena, na tentativa modesta de externar o meu verdadeiro afeto, em retribuição pelo irresgatável carinho com que sempre me cercaram... Aos meus AVÓS, que me transmitiram o senso de amor à justiça e me ensinaram a lutar por meus ideais, meus grandes mestres e incentivadores... A BEBEL e ao CRIS, companheiros de todas as horas, estímulo e carinho incondicional, dos quais roubei preciosos momentos para permitir a realização do meu mundo de sonhos... E a todos os meus AMIGOS, que juntos enfrentando obstáculos, conhecemos a embriagues da vitória e a agonia da derrota... Amigos que me ensinaram que a vida não tem limites, que é pura magia, alegria e assombro... Amigos de cara lavada e alma exposta, metade bobeira, metade serenidade, fizeram da realidade a fonte de toda a minha aprendizagem... A todos meu muito obrigada...
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, grande autor da vida, que me ajudou a escolher este caminho e
superar todos os desafios que surgiram, que me possibilitou conhecer pessoas que foram
verdadeiros anjos a me apoiar em todas as etapas desta jornada;
À Universidade do Vale do Itajaí por ter me fornecido as ferramentas e
oportunidades para realização dos meus ideais profissionais e humanos;
Aos meus Professores, renomados profissionais, que me dedicaram seu tempo e suas
experiências, que souberam ser mestres e, acima de tudo, grandes amigos, que tornaram
minha formação num aprendizado de vida;
Em especial, ao Professor Juliano Keller do Vale, que me ajudou a mostrar que
escrever não é tão difícil, que me apoiou a enfrentar o desafio da vida acadêmica, me levando
a crer cada vez mais em minha própria capacidade;
À Turma de formandos do Curso de Direito - 2004, pois, foi convivendo lado a lado
que aprendemos humildemente a ouvir, entender, confrontar e ajudar uns aos outros;
Aos meus queridos colegas, Solange, Carla, Silvany, Jucir, Sandro, Pantaleão,
Eliane, Luciana e todos que juntos nestes cinco anos, não fizeram a menor questão de
entender, nem tão pouco ser intelectuais, apenas aprenderam a viver, com esperança,
dignidade e um pouco de loucura;
A todos, que participaram ativa ou anonimamente das idéias e ideais que
concretizaram este sonho, pessoas, que às vezes sorrindo para mim, me fizeram seguir em
frente, dando-me coragem e sabedoria para superar todos os problemas;
E por fim, a cada um dos adolescentes infratores que nestes últimos tempos passaram
pelo CER São Lucas e CIP, situados em Barreiros, São José, pois, enquanto internos,
ensinaram-me várias e grandes lições de vida, mostraram-me uma realidade que a maioria
tenta esquecer, fizeram-me questionar o mundo, entrar em conflito com meus ultrapassados
preconceitos, e compartilharam comigo momentos preciosos de sua juventude.
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“Não existe união de palavras mais dolorosa do que infância e crime”.
Dr. Sérgio Muniz de Souza
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SUMÁRIO RESUMO.....................................................................................................................................8 LISTA DE ABREVIATURAS...................................................................................................9 INTRODUÇÃO.........................................................................................................................10 1 ESCORÇO HISTÓRICO......................................................................................................12 1.1 RETROSPECTO MUNDIAL.............................................................................................12 1.2 O CÓDIGO DO IMPÉRIO .................................................................................................14 1.3 O CÓDIGO REPUBLICANO DE 1890 .............................................................................15 1.4 DECRETO N. º 16.272 .......................................................................................................16 1.5 O CÓDIGO DE MENORES...............................................................................................16 1.6 POLÍTICA NACIONAL DE BEM-ESTAR DO MENOR E O CÓDIGO DE 1979 .........20 2 A LEI 8.069/90 E AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS...............................................24 2.1 A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL ..................................................................24 2.2 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (8.069/90) .................................27 2.3 DO ADOLESCENTE INFRATOR ....................................................................................31 2.3.1 Ato Infracional..................................................................................................................31 2.3.2 Perfil .................................................................................................................................32 2.4 AS MEDIDAS APLICÁVEIS AO ADOLESCENTE INFRATOR...................................35 2.4.1 Advertência.......................................................................................................................36 2.4.2 Obrigação de Reparar o Dano ..........................................................................................37 2.4.3 Prestação de Serviço à Comunidade.................................................................................38 2.4.4 Liberdade Assistida ..........................................................................................................38 2.4.5 Semiliberdade ...................................................................................................................40 2.4.6 Internação .........................................................................................................................41 3 DA MEDIDA SOCIO-EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO..............................................42 3.1 PRÍNCIPIOS QUE REGEM A MEDIDA DE INTERNAÇÃO.........................................42 3.1.1 Da Brevidade ....................................................................................................................42 3.1.2 Da Excepcionalidade ........................................................................................................43 3.1.3 Do Respeito à Condição Peculiar de Pessoa em Desenvolvimento .................................44 3.2 DAS HIPÓTESES DE APLICAÇÃO.................................................................................45 3.2.1 Tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa .....46 3.2.2 Por reiteração no cometimento de outras infrações graves ..............................................47 3.2.3 Por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta...........47 3.2.4 Da Internação Provisória ..................................................................................................49 3.3 DA EXECUÇÃO ................................................................................................................52 3.3.1 Dos Direitos Reservados ao Adolescente Internado ........................................................58 3.3.2 Caráter Pedagógico...........................................................................................................59 3.4 FINALIDADE DA MEDIDA.............................................................................................61 3.4.1 Do Egresso........................................................................................................................65 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................70
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RESUMO
A monografia teve por fim verificar se a medida de internação aplicada ao adolescente autor
de ato infracional tem caráter educativo ou não passa de uma ação meramente punitiva.
Segundo estabelece as diretrizes do Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas sócio-
educativas são sanções de caráter pedagógico, sem caráter de pena, ou seja, não se busca a
punição ao adolescente pelo ato infracional praticado, tem-se como objetivo específico a
reeducação e o retorno à família e a sociedade. Pois, ao contrário do Código de Menores de
1927, de inspiração eminentemente autoritária e punitiva, que contrariava preceitos basilares
de proteção dos direitos humanos, impingindo aos menores infratores a condição de cidadão
de segunda categoria, o Estatuto da Criança e do Adolescente vem inspirado na Doutrina da
Proteção Integral estabelecendo que as medidas sócio-educativas, como o próprio nome já
diz, são sanções de caráter pedagógico. Concluí-se, portanto que ao aplicar a medida de
internação juízes e promotores e até mesmo a equipe técnica, não podem fugir dos objetivos
do Estatuto da Criança e do Adolescente e do artigo 228 da Constituição Federal, pois, estes
em consonância consagram-na como sanção sócio-educativa, que visa resgatar os
adolescentes das malhas da delinqüência.
PALAVRAS –CHAVES: ADOLESCENTE, ATO INFRACIONAL, INTERNAÇÃO.
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LISTA DE ABREVIATURAS
AI: Agravo de Instrumento Ap.: Apelação Art.: Artigo CF: Constituição Federal CONANDA: Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente CP: Código Penal (Dec.-lei 2.848/40) CPP: Código de Processo Penal (Dec.-lei3.689/41) CSDC: Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos da Criança Dec.: Decreto Dec.-lei: Decreto-lei Dr.: Doutor ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90) EUA: Estados Unidos da América FEBEM: Fundação Estadual de Bem-estar do Menor FONACRIAD: Fórum Nacional de Dirigentes de Políticas Estaduais para Criança e o
Adolescente FUNABEM: Fundação Nacional do Bem-estar do Menor GT: Grupo de Trabalho HC: Habeas Corpus ILANUD: Instituto Latino-Americano das Nações unidas para a prevenção do Delito e
Tratamento do Delinqüente Min.: Ministro MSE: Medida Sócio-educativa OEA: Organização dos Estados Americanos ONU: Organização das Nações Unidas p.: página PNBEM: Política Nacional de Bem-estar do menor RE: Recurso Extraordinário Rel.: Relator Resp: Recurso Especial RT: Revista dos Tribunais SAM: Serviço de Assistência ao Menor STF: Supremo Tribunal Federal STJ: Superior Tribunal de Justiça T.: Turma TJ: Tribunal de Justiça UNICEF: Fundação das Nações Unidas para Criança
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INTRODUÇÃO
O presente estudo consiste na pesquisa individual orientada sob a forma de uma
monografia jurídica, exigida como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em
Direito no Curso de Graduação na Universidade do Vale do Itajaí.
O trabalho objetiva compreender a responsabilização penal do adolescente infrator,
que ocorre através das medidas sócio-educativas, especificamente nos casos de aplicação de
medida sócio-educativa de internação, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Pois, muito se falou, fala-se, e se falará sobre o problema do adolescente infrator,
tema que além de atual e complexo é em toda sua extensão fascinante.
O principal objetivo é entender que, embora a sociedade de um modo geral tenha a
falsa impressão de que o adolescente infrator não sofre responsabilização por seus atos, na
realidade existe um amplo sistema de garantias e medidas previstas, estando de acordo
inclusive com as normativas internacionais.
Assim, este trabalho é fundamentado no estudo da medida sócio-educativa de
internação, como vem sendo utilizada e de que forma deveria ser aplicada, para que alcance
os objetivos propostos no Estatuto, que tem como base o caráter pedagógico e não punitivo.
Para isso, serão utilizadas pesquisas doutrinárias, observando de que forma os
juristas visualizam a situação do adolescente infrator, frente às medidas de internação, quais
suas críticas e sugestões.
O método indutivo foi aplicado na presente investigação, abordando, portanto,
premissas tidas como verdadeiras, que envolvem a questão pedagógica como caráter
ressocializador do autor de ato infracional.
Este estudo tratará da medida sócio-educativa de internação e procurará conhecer os
principais fatores que contribuem no processo de reeducação e reinserção social do
adolescente. Para tanto a pesquisa será desenvolvida em três capítulos.
Sendo que o primeiro capítulo faz uma breve abordagem sobre todas as legislações
brasileiras voltadas à criança e ao adolescente que antecederam o atual Estatuto, e consiste em
considerações sobre a evolução das normas e das instituições voltadas para a proteção e
responsabilização penal da criança e do adolescente, está subdividido em Historiocidade do
Direito Juvenil, o Código do Império, o Código Republicano de 1890, o Decreto n. º
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16.272/23, o Código de Menores de 1927, a Política Nacional de Bem-estar do
Menor e por fim o Código de 1979.
O segundo capítulo traz a baila o Estatuto da Criança e do Adolescente, dispondo
acerca da Doutrina da Proteção Integral, e abordando o perfil do adolescente em conflito com
a lei e as medidas sócio-educativas, quais sejam, advertência, reparação do dano, prestação de
serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, que são analisadas
individualmente.
Por fim, o terceiro capítulo trata especificamente da medida sócio-educativa de
internação, elenca os princípios norteadores da medida, que são o da brevidade,
excepcionalidade e respeito a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, trata das
hipóteses de aplicação da medida e também da internação provisória. Posteriormente, aborda
a execução, e os direitos reservados aos adolescentes internos, o caráter pedagógico, bem
como a finalidade da medida e o tratamento reservado aos egressos.
Ao final deste estudo, com base nos capítulos apontados, serão tecidas considerações
referentes ao tema abordado.
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1 ESCORÇO HISTÓRICO
A história da legislação brasileira relativa à infância e juventude será apresentada em
fases, de acordo com os momentos significativos da história política do país. Pois, a
problemática do menor sofreu inúmeras influências até a implantação da Lei n. º 8.069 de 13
de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente.
1.1 RETROSPECTO MUNDIAL
Os interesses da criança e do adolescente sempre existiram, mas nem sempre tiveram
dimensão suficiente para fomentar o reconhecimento de que suas relações pudessem
interessar ao Direito, como explica PAULO AFONSO GARRIDO DE PAULA:
Seus interesses confundiam-se com os interesses dos adultos, como se fossem elementos de uma simbiose onde os benefícios da união estariam contemplados pela proteção jurídica destinada aos últimos. Figuravam, em regra, como meros objetos da intervenção do mundo adulto, sendo exemplificativa a utilização da velha expressão pátrio poder, indicativa de uma gênese onde o Direito tinha como preocupação disciplinar exclusivamente as prerrogativas dos pais em relação aos filhos, suas crias. (2002, p. 11).
No Direito Romano, os juristas distinguiam os menores púberes dos impúberes, e era
feita uma avaliação física para saber se o jovem era púbere. Por outro lado, o povo judeu
amenizava a severidade das penas quando os autores eram menores impúberes ou órfãos.
Pode-se constatar tal afirmação, através de JORGE MUCCILO, quando este, citando alguns
doutrinadores, afirma que:
O Direito Romano das doze Tábuas, diferenciava os púberes dos impúberes, aplicando a estes últimos certas medidas policiais com propósito correcional, como a “castigatio” o “verbaratio”. Logo os jurisconsultos republicanos começaram a discutir o assunto. LABEON admitia o mesmo critério a respeito de certos delitos, enquanto SILVIO JULIANO excluía dele todos os mesmos que não sabiam falar corretamente. No Direito Justiniano se estabelece a idade de 7 anos como limite da incapacidade penal para delitos privados, mas as leis não tinham em conta a idade como causa atenuante, com exceção da “extraordinária cognitio”, quando determinava que até 14 anos completos nos rapazes, não se podia aplicar a pena de morte. (1961, p. 30).
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Assim, se pode notar que só com o desenrolar da história, a evolução da cidadania e
o aperfeiçoamento das legislações, foram sendo criadas regras específicas para a proteção da
infância e da adolescência.
No Direito Medieval, de acordo com JOSÉ DE FARIAS TAVARES:
[...] atenuou a severidade de tratamento das pessoas de idade mais tenra, em razão da influência do estoicismo e posteriormente do cristianismo. Já o Direito canônico manteve o princípio reverencial, que tinha profunda repercussão na educação doméstica cristã. (2001, p. 48).
O Direito Penal reconhecia que certos menores eram incapazes de distinguir o dolo
ou a malícia de seus atos. A partir daí deu-se início a discussão de como e quando deveriam
ser penalizados.
MARIA AUXILIADORA MINAHIM, ainda, dispondo a respeito do Período Feudal,
relata, que:
[...] em países como a Itália e a Inglaterra, era utilizado o método da ‘prova da maçã de Lubecca’, que consistia em oferecer uma maçã e uma moeda à criança, sendo que se escolhida a moeda, considerava-se comprovada a malícia, sendo inclusive aplicada pena de morte a crianças de 10 e 11 anos. (apud SARAIVA. 2003, p. 14).
As legislações que se seguiram, inspiradas na Escola Clássica, aprofundaram o
problema do discernimento na intenção de fundamentar a irresponsabilidade dos menores,
estabelecendo que quando faltava inteligência ou liberdade de escolha, não se podia exigir
responsabilidade penal.
FRANCISCO CARRARA expõe que:
Para que exista um delito na plenitude de sua força moral, é necessário que o agente esteja iluminado pela inteligência e em pleno gozo de sua liberdade. Atenuado ou ausente o concurso da primeira, se atenua ou cessa a imputação, como se atenua ou cessa, se tiver sido diminuído ou abolido o exercício da segunda. (apud MUCCILLO, 1961. p. 31).
Quanto à progressão da legislação em esfera mundial, JOÃO BATISTA COSTA
SARAIVA, em um breve resumo aduz:
O primeiro Tribunal de Menores foi criado em Ilinois, EUA, em 1899, sendo que a partir da experiência americana, outros países aderiram à criação de Tribunais de Menores, instituindo seus próprios juízos especiais: Inglaterra em 1905, Alemanha em 1908, Argentina em 1921, Japão em 1922, Brasil em 1923, Espanha em 1924, México em 1927 e o Chile em 1928. (2003, p. 31).
De acordo com MUNIR CURY, a constatação internacional de que as crianças e
adolescentes necessitavam de uma legislação especial foi prevista inicialmente em 1924,
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através da Declaração de Genebra, que determinava a necessidade de proporcionar à criança
uma proteção especial. (2002, p. 12).
Inúmeros autores complementam que em 1948, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos das Nações Unidas estabeleceu o direito a cuidados e assistência especiais.
Seguindo a mesma orientação, a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de
São José da Costa Rica), em 1960, declarou em seu art. 19: “Toda criança tem direito às
medidas de proteção que na sua condição de menor requer, por parte da família, da sociedade
e do Estado”.
Neste sentido, vários grupos se formaram, influenciando diversamente várias
legislações, quanto ao Direito Penal Brasileiro, este aboliu o Sistema da Irresponsabilidade do
Menor de 18 anos.
1.2 O CÓDIGO DO IMPÉRIO
O Código de 1830 foi o primeiro Código Criminal Brasileiro, prescrevia a
responsabilidade penal do menor aos 14 anos, no entanto tal responsabilidade poderia se
estender aos menores de 14 anos contanto que o agente agisse com discernimento, não
reconhecendo o aspecto social da questão.
Segundo NUNO DE CAMPOS:
A lei de 1830 estabelecia para os infratores menores de idade as seguintes condições: 1)presunção de irresponsabilidade para menores de quatorze anos, com exceção dos que comprovadamente tivessem agido com discernimento; 2) os que tivessem comprovadamente agido com discernimento seriam recolhidos em casas de correção por tempo a ser determinado pelo juiz, não podendo exceder a dezessete anos; 3) sujeição à pena de cumplicidade para maiores de quatorze anos e menores de dezessete anos; 4) jovens entre dezessete e vinte um anos teriam penas atenuadas pela menoridade. (1979, p. 92).
Segundo JORGE MUCCILO, os princípios Iluministas que originaram a Escola
Clássica, entendiam o ser humano como um ser dotado de livre arbítrio, devendo ser punido
em razão dos atos que escolheu praticar, sempre na proporção do mal que causara à
sociedade. O Código do Império era influenciado pela Escola Clássica, portanto estudava a
questão do menor de uma forma meramente jurídica. (1961, p. 37).
Toda a legislação dispensada à infância tinha como referência a Doutrina Cristã,
Católica, ou seja, nos idéias de caridade e amparo aos órfãos e abandonados: “A legislação
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referente a nítida associação existente entre as ações do governo e da Igreja, na esfera política
e mesmo no âmbito mais estritamente jurídico” (RIZZINI. 1995, p. 105).
Podemos comprovar o rigorismo do Código, citando o artigo 13 da legislação: “Se se
provar que os menores de 14 anos, que tiverem cometidos crimes, obrarem com
discernimento, deverão ser recolhidos à Casas de Correção, pelo tempo que ao juiz parecer,
contanto que o recolhimento não exceda a idade de 17 anos.” (MUCCILLO. 1961, p. 37).
Isto significava que a Teoria do Discernimento continuava dominando, sendo usada
pelo juiz, para apenar ou não menores de 14 anos. Não havia, portanto, uma presunção “juris
et de jure” de irresponsabilidade do menor, muito menos medidas de proteção e assistência.
1.3 O CÓDIGO REPUBLICANO DE 1890
O Código de 1890 foi o segundo Código Criminal do Brasil e o primeiro da
República, pouco inovou em relação à legislação anterior, os únicos marcos, foram as
fixações da responsabilidade plena para 09 anos e a melhoria no tratamento dos menores em
regime penitenciário, ou seja, os privados de liberdade.
Como destaca neste sentido, MUCCILO:
Os menores de 9 a 14 anos, julgados capazes de discernimento, eram recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, e não à Casas de Correção como prescrevia o Código do Império. O fator idade era, para os menores de 21 anos, circunstancia atenuante. A pena de prisão disciplinar deveria ser cumprida em estabelecimento Industrial Especial, com relação aos menores de 21 anos. (1961. p. 38).
Nesta época já havia uma crescente preocupação entre juristas, que deveria se afastar
da área penal, ações relacionadas a “criminalidade infantil”, são desta época, as primeiras
manifestações de que a legislação teria que mudar contemplando o espírito tutelar, protetor,
que propiciasse um “recuperação” do menor. (RIZZINI. 1995, p. 120).
Com o passar dos anos o Código da República sofreu inúmeras modificações. E foi
em 4 de dezembro de 1932, que foi promulgado o Decreto n.º 22.213, que recebeu o nome de
Consolidação das Leis Penais, onde o Desembargador Vicente Piragibe reuniu todas as leis
que tratavam da problemática do menor.
A Consolidação de 1932 tinha os menores de 18 anos sob tutela especial do Estado e
preceituava em seu artigo 3º que: “Os menores de 18 anos, abandonados e delinqüentes, ficam
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submetidos ao regime estabelecido pelo Decreto n. º 17.943-A, de 12 de outubro de 1927,
Código de Menores”.
Portanto, a Consolidação preconizava que os menores de 18 anos estavam subtraídos
das penas criminais.
1.4 DECRETO N. º 16.272
Promulgado em 20 de dezembro de 1923, foi a primeira manifestação legislativa
relativa a proteção e assistência ao menor no Direito Brasileiro.
O Decreto estatuía em seu artigo 1º que “o menor de qualquer sexo, abandonado ou
delinqüente, será submetido pela autoridade competente, às medidas de assistência e proteção
instituídas neste regulamento”.
Portanto, todos os menores que se enquadrassem nas circunstâncias previstas na
norma seriam postos sob proteção do Estado, o qual exerceria a sua função preventiva ou
corretiva. Ou seja, a matéria de proteção ao menor ganhou importância, institucionalizando o
dever do Estado em assisti-los, bem como, o poder de remoção da tutela, nos casos em que a
lei julgava conveniente.
1.5 O CÓDIGO DE MENORES
Influenciado por mudanças nas legislações de vários países e pelo debate
internacional sobre o tema o Decreto 17.943-A de 12 de outubro de 1927, foi o primeiro
Código de Menores do país e consolidava as leis de assistência e proteção aos menores
abandonados ou delinqüentes com idade inferior a 18 anos.
Sobre o assunto, muito bem leciona o ilustre Pedagogo, Doutor em Educação
ROBERTO DA SILVA:
O Código de Menores de 1927, que consolidou toda a legislação sobre crianças até então emanada por Portugal, pelo Império e pela República, consagrou um sistema dual no atendimento à criança, atuando especificamente sobre os chamados efeitos da ausência, que atribui ao Estado a tutela sobre o órfão, o abandonado e os pais presumidos como ausentes, tornando disponível os seus direitos de pátrio poder. Os chamados direitos civis, entendidos como os direitos pertinentes à criança inserida em uma família padrão, em moldes socialmente aceitáveis, continuou merecendo a proteção do Código Civil Brasileiro, sem alterações substanciais. (grifo nosso). (A construção do Estatuto da Criança e do Adolescente. In: Âmbito Jurídico. 2001, Acesso em janeiro/2004).
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Rezava o artigo 1º que: “O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinqüente,
que tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente às medidas
de assistência e proteção contidas neste Código”.
E, quanto à inimputabilidade, o Código de 1927, no seu artigo 68, resguardou
menores de 14 anos de processos penais:
Art. 68. O menor de 14 anos, indigitado ator ou cúmplice de fato qualificado crime ou contravenção, não será submetido ao processo penal de espécie alguma; a autoridade competente tomará somente as informações precisas, registrando-as sob o fato punível e seus agentes, o estado físico, mental e moral do menor e a situação social, moral e econômica dos pais ou tutor ou pessoas em cuja guarda viva.
O também chamado Código Mello Matos1 trouxe uma inovação em relação às
legislações anteriores. Pelo Código, estabeleceu-se que todos os menores que se
enquadrassem nas categorias de abandonados, vadios, mendigos ou libertinos, ficariam sob
proteção estatal, ou seja, houve uma modificação no que tange ao pátrio poder.
Para melhor elucidar, ROBERTO DA SILVA, apresenta de forma resumida qual a
classificação dada aos menores de 18 anos, baseando-se em suas condutas:
O Código denominou estas crianças de “expostos” (as menores de 7 anos), “abandonados” (as menores de 18 anos), “vadios” (os atuais meninos de rua), “mendigos” (os que pedem esmolas ou vendem coisas nas ruas) e “libertinos” (que freqüentam prostíbulos). (Op. cit. 2001, Acesso em 2004).
Noutro passo, JORGE MUCCILO assevera sobre o tema:
São menores que, por não terem pais ou responsáveis em condições de cumprir com suas obrigações precípuas para com os filhos ou pessoas sob sua guarda, são submetidos ao controle do Estado que os põem em Regime Especial. É a função supletiva do Estado que os substitui e completa a obrigação natural dos pais.(1961. p. 50).
Ainda a respeito do Código de Menores vale enfatizar as palavras de LEMOS
BRITO citando outros doutrinadores, onde expõem a problemática que leva os menores a
delinqüir:
O Prof. Mesquita Raul, numa interessante monografia que publicou em Porto, em 1923, já apontava o abandono e a orfandade como uma das causas primordiais da Delinqüência dos Menores. Sobre as causas do abandono diz: Umas vezes são os pais desavergonhados e criminosos, que lançam às pedras da calçada ou a lama dos caminhos, a criança que os incomoda ou lhes serve de estorvo aos seus atos menos corretos, e por isso, para se libertarem do tropeço, abandonam-no, sem sequer pensar que mais tarde podem ser origem de um monstro; outras vezes é o trabalho dos pais que origina o abandono, visto que aqueles, para poder angariar o necessário à vida, deixam os filhos horas seguidas, quando não são dias inteiros dentro de casa ou em
1 Em homenagem ao Primeiro Juiz de Menores – Dr. José Candido Albuquerque Mello Matos.
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plena rua entregues aos vizinhos que os não vigiam, que deles não cuidam; ficando os menores assim em contato com outros viciados que os industriam e encaminham para o mal, ou ficando à mercê do primeiro celerado que deles abusará, incutindo-lhes os mais vergonhosos vícios e arrastando-os para o lodaçal mais hediondo. (apud MUCCILLO. 1961, p. 51).
O Código de Menores elencava em seus capítulos as medidas aplicáveis aos menores
abandonados e aos menores delinqüentes. Quanto a estes últimos o Código em seu capítulo
VII conceituava-os como sendo aqueles que tendo menos de 18 anos praticassem atos
definidos como infrações penais.
Para PILOTTI, o Código, incorpora duas visões predominantes na época: a
“higienista” – o Estado deve proteger as crianças que são a raiz da sociedade, o futuro, deve
crescer com saúde e educação – e a visão “j urídica repressiva e moralista”. (1995, p. 63).
Na Era Vargas, em 1942, foi criado o SAM – Serviço de Assistência ao Menor. Este
serviço era vinculado ao Ministério da Justiça e aos Juizados de Menores.
COSTA assim o define:
Órgão do Ministério da Justiça e que funcionava como um equivalente do sistema penitenciário para população do menor de idade. A orientação do SAM é, antes de tudo, correcional – repressiva. Seu atendimento baseava-se em internatos (reformatórios e casas de correção) para adolescentes autores de infração penal e de patronatos agrícolas e escolas de aprendizagem de ofícios urbanos para os menores carentes e abandonados. (1994, p. 124).
Percebe-se a sistemática decadência do SAM, pelas palavras de COSTA: “Seu
caráter repressivo, embrutecedor e desumanizante é desvelado à opinião pública, que passa a
conhecê-lo como universidade do crime e sucursal do inferno”. (1994, p. 126).
O SAM tinha objetivos de natureza assistencial, enfatizando a importância de
estudos e pesquisas, bem como o atendimento psicopedagógico, no entanto, não conseguiu
contribuir suas finalidades, como explica JOSIANE ROSE PETRY VERONESE: “No
entanto, o SAM não conseguiu cumprir suas finalidades, sobretudo devido à sua estrutura
emperrada, sem autonomia e sem flexibilidade e a métodos inadequados de atendimento, que
geraram revoltas naqueles que deveriam ser amparados e orientados”.(1999, p. 32).
O Código de 1927 teve vários de seus artigos alterados por normas esparsas. Como
por exemplo o Decreto-lei 6.026/43 que aqui é exposto pelas palavras do ilustre doutrinador
JORGE MUCCILO:
O Decreto-lei n.º 6.026 que atualmente rege a matéria diz que “os menores de 18 anos ficarão sujeitos, pela prática de fatos considerados infrações penais, às normas estabelecidas neste decreto-lei” (artigo 1) No artigo seguinte especifica essas normas, que são as seguintes:
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a) se os motivos e as circunstâncias do fato e as condições do menor não evidenciam periculosidade, o juiz poderá deixa-lo com o pai ou responsável, confia-lo a tutor ou a quem assuma a sua guarda, ou mandar interna-lo em estabelecimento de reeducação ou profissional e, a qualquer tempo revogar ou modificar a decisão, b) se os elementos referidos na alínea anterior evidenciam periculosidade o menor será internado em estabelecimento adequado, até que, mediante parecer do respectivo diretor ou do órgão administrativo competente e do Ministério Público, o juiz declare a cessação da periculosidade; em casos excepcionais o juiz poderá mandar internar o menor perigoso em seção especial de estabelecimento destinado a adultos, até que seja declarada a cessação da periculosidade, na forma da alínea b. Completada a maioridade sem que haja sido declarada a cessação da periculosidade, o menor será transferido para Colônia Agrícola ou para instituto de trabalho, reeducação ou de ensino profissional, ou seção especial de outro estabelecimento a disposição do juiz criminal. (1961, p. 63 –64).
Tratava-se de uma legislação muito rígida, porém, quanto aos menores de 14 anos a
lei só estabelecia que não poderiam ser submetidos a processo penal de espécie alguma,
deveriam sim, ser postos sob assistência e proteção do Estado.
Conforme ROBERTO DA SILVA:
Apenas no Artigo 68 o Código ocupou-se do já então denominado “menor delinqüente”, já fazendo a diferen ciação entre os menores de 14 anos e os de 14 completos a 18 anos incompletos, sempre deixando clara a competência do Juiz para determinar todos os procedimentos em relação a eles e aos seus pais. Estabeleceu-se também a obrigatoriedade da separação dos “m enores delinqüentes” dos condenados adultos, mas em 1940 foi promulgado o Código Penal Brasileiro (Decreto-lei n° 2.848/40), consagrando a inimputabilidade criminal do menor de 18 anos de idade, depois regulamentada pelo Decreto-lei n°3.914/41 e até hoje em vigor. (Op. cit. 2001, Acesso 2004).
Também é de suma importância mencionar que o Código trazia em seu Capítulo V
os casos de Inibição ou Remoção de Pátrio Poder, pois, caso fossem descumpridas quaisquer
das obrigações estipuladas aos pais pelo Código Civil, bem como uma conduta anti-social por
parte da criança passava-se então a se justificar com base jurídica a transferência da tutela dos
pais para o Juiz, e conseqüentemente, do Código Civil para o Código de Menores.
O mesmo Código estabeleceu que os processos de internação destas crianças e o
processo de destituição do pátrio poder seriam gratuitos e deveriam correr em segredo de
justiça, sem possibilidade de veiculação pública de seus dados, de suas fotos ou de acesso aos
seus processos por parte de terceiros.
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1.6 POLÍTICA NACIONAL DE BEM-ESTAR DO MENOR E O CÓDIGO DE 1979
A Política Nacional de Bem-estar do Menor – PNBEM, foi implantada no Brasil pelo
então Juiz de Menores Alyrio Cavallieri, o qual propôs e fez aprovar o Código de Menores de
1979.
A transição entre os Códigos de 1927 e de 1979 ocorreu efetivamente com a criação
da Fundação Nacional do Bem-estar do Menor - FUNABEM, em dezembro de 1964, que deu
origem à criação das Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor.
A partir daí, a questão do menor tomou âmbito nacional, como podemos constatar:
Esboçada dentro do espírito da Doutrina da Segurança Nacional, a formulação teórica da Escola Superior de Guerra, que constituiu-se no norteador das ações dos governos militares, a Funabem propunha-se a resolver um problema nacional, pois nas palavras de seu primeiro presidente, o médico Mário Altefender, “ cada vez mais se acentuava a necessidade da elaboração de uma nova política, cuja execução fosse entregue a um órgão federal, fazendo desaparecer a idéia de que cada um pode resolver seus problemas locais, estanques, quase pessoais, sem pensar na Nação, como que ignorando a existência de 22 Estados e territórios e que tudo se chama Brasil”. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 1971, p. 476).
E ainda, a Política Nacional preceituava que deveriam ser feitos estudos dos
problemas com os menores e o planejamento das soluções possíveis. As Fundações Estaduais
foram criadas e formadas por equipes de técnicos de diversas áreas, os quais eram
responsáveis pela reformulação dos valores éticos e sociais dos menores.
Os princípios da Fundação Nacional do Bem-estar do Menor eram similares aos da
Declaração da ONU de 19592:
I - assegurar a prioridade aos programas que visem à integração do menor na comunidade, através de assistência na própria família e da colocação familiar em lares substitutos; II – incrementar a criação de instituições para menores que possuam características aproximadas das que informam a vida familiar, e , bem assim a adaptação, a esse objetivo, das entidades existentes de modo que somente se venha a admitir internamento de menor à falta de instituições desse tipo ou por determinação judicial. Nenhum internamento se fará sem observância rigorosa da escala de prioridade fixada em preceito regimental do conselho Nacional; III – respeitar, no atendimento às necessidades de cada região do país, as suas peculiaridades, incentivando as iniciativas locais, públicas ou privadas, e atando como fator positivo na dinamização e autopromoção dessas comunidades.
2 Declaração dos Direitos da Criança, adotada pela Assembléia das Nações Unidas de 20 de novembro de 1959 e ratificada pelo Brasil.
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Pode-se dizer que o Novo Código de Menores era mais severo que seu antecessor,
pois, nele foram aumentados os poderes dos juizes de menores, como postulava o artigo 8º
quando dizia que a autoridade judiciária, além das medidas especiais previstas na lei, poderia,
através de portaria ou provimento, determinar outras medidas de ordem geral, que ao seu
arbítrio, se demonstrassem necessárias à assistência, proteção e vigilância ao menor. Valendo
lembrar que, o magistrado responderia por qualquer ato de abuso ou desvio de poder.
Sobre a matéria, ROBERTO DA SILVA expõe:
Orientado por esse pensamento, instituiu-se o sistema de internação de carentes e abandonados até os 18 anos e no tratamento dos infratores substituiu-se a “política dos portões abertos” pela “pol ítica dos muros retentores”, sob a justificativa, apresentada pelo Grupo de Trabalho do Tribunal de Justiça de São Paulo, que propôs a criação das unidades de infratores, de que era necessário tranqüilidade para o trabalho dos técnicos e dos especialistas das várias modalidades profissionais. Para possibilitar isso, o mesmo GT recomendou que para essas unidades fossem contratados inspetores de alunos, monitores ou atendentes jovens e vigorosos (com um mínimo de escolaridade), a presença de guarda permanente (reedição do sistema penitenciário), correlacionamento policial perfeito (o mesmo tratamento para menores e adultos), que houvesse compreensão política (para justificar a necessidade de isolamento das instituições totais) e, sobretudo, confiança social (para que não houvesse ingerência no que acontecia dentro dos muros das instituições).(Op. cit. 2001, Acesso 2004).
Nessa época, como lembra JOSIANE ROSE PETRY VERONESE, o Estado
brasileiro não permitia a participação popular e armava-se de mecanismos que lhe garantiam
reprimir as formas de resistência popular, como por exemplo, a centralização do poder. A
própria Fundação Nacional do Bem Estar do Menor é um exemplo dessa centralização, pois a
instituição foi delegada para ser administrada pela Política Nacional do Bem-Estar do Menor.
A autora complementa ainda da seguinte maneira:
A PNBEM, como as outras políticas sociais definidas neste período do regime militar, revestiu-se com um manto extremamente reformista e modernizador, passando a colocar em relevo uma perfeição técnico-burocrática e metodológica. Dava-se ao problema do então "menor" soluções pragmáticas e imediatistas, que se propunham escamotear sua verdadeira natureza. (1998, p. 153-154).
O menor, era visto como dissemos uma ameaça. O enfoque é correcional repressivo,
para COSTA, um modelo assistencialista:
[...] o assistencialismo dirige-se à criança e ao jovem perguntando pelo que ele não é, pelo que ele não sabe, pelo que ele não tem, pelo que ele não é capaz. Daí que, comparado ao menino de classe média, tomando como padrão de normalidade, o menor marginalizado passa a ser visto como carente bio-psico-sócio-cultural, ou seja, um feixe de carência. Erigido sobre essa visão, o atendimento pautou-se pela tentativa de restituir à criança e ao jovem tudo o que lhe havia sido sonegado no âmbito das relações sociais. Isso levou a adoção dos centros de triagem, nas capitais, e das redes oficiais de
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internatos, no interior, como modelo básico de atendimento público ao menor em todo o país. (1994, p. 135).
O Código de Menores não se preocupava com toda a menoridade, mas com aqueles
que se encontravam em situação irregular. As situações irregulares eram assim previstas:
Art. 2º Para efeitos deste Código considera-se em situação irregular o menor: I – privado de condições essenciais a sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais o responsáveis para provê-las; II – vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III – em perigo moral, devido a: a) encontra-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV – de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais o responsável; V – desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; VI – autor de infração penal.
De fato, justamente por basear-se na doutrina da situação irregular, o Código de
Menores, e seu “direito do menor” dispensava na verdade um tratamento simplista e
autoritário ao menor dito com desvio de conduta, fugindo dos alicerces básicos do direito.
Em comentários sobre o polêmico Código de Menores, MARQUES assevera:
Trata-se de grave retrocesso de mais de 50 anos, pois coloca o menor numa situação pior que o criminoso adulto que não pode ser preso, a não ser em flagrante delito ou com prisão preventiva. Institui o Código a prisão provisória para o menor, prisão essa que será decretada, sem a audiência do Curador de Menores, o que é mais grave. (in SENADO FEDRAL. 1982, p. 391).
AMARAL E SILVA em sua obra A Criança e o Adolescente em Conflito com a Lei,
discorre:
[...] as Delegacias de Menores estavam “cheias” de meninos com pequenos furtos d e sobrevivência, outros sem qualquer comportamento desviante, estes injustamente acusados de “vadiagem” ou “atitudes suspeitas” [...] ai permaneciam aguardando outro “encaminhamento”, tudo em nome do “superior interesse do menor”. (1995, p. 15).
Ainda sobre a Fundação Nacional de Bem Estar do Menor, JOSIANE ROSE PETRY
VERONESE relata que serviu como instrumento de controle da sociedade civil, mas
demonstrou que não estava sendo eficiente, ante o crescimento do número de crianças
marginalizadas, além da incapacidade de proporcionar a reeducação:
No entanto, e infelizmente, apesar dos princípios ditos tuteladores que fundamentavam a doutrina da "situação irregular", as instituições que deveriam acolher e educar esta criança ou adolescente, no mais das vezes não cumpriam este
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papel. Isso porque a metodologia aplicada, ao invés de socializá-lo, o massificava, o despersonalizava, e deste modo, ao contrário de criar estruturas sólidas, nos planos psicológico, biológico e social, afastava este chamado menor em situação irregular, definitivamente, da vida comunitária. (1997, p. 96).
Com base em todo o exposto, pode-se dizer que a lei era muito autoritária e
centralizadora, e que o tratamento dispensado por esse diploma legal aos menores infratores
pouco divergia da legislação anterior, mesmo tendo garantido a inimputabilidade penal aos 18
anos, autorizava ao juiz o confinamento desses em centros de reeducação, se assim julgasse
necessário.
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2 A LEI 8.069/90 E AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
Pelo esforço da sociedade brasileira no final dos anos 80, foi restaurado o Estado
Democrático de Direito que vinha sendo violado pela Ditadura Militar. Com a apresentação
de emendas populares, foi garantida a inclusão na Constituição Federal de 1988 de artigos que
estabeleceram direitos a criança e ao adolescente, destacando-se o artigo 227, que os
inscreveu no novo ordenamento jurídico, como prioridade absoluta. Com isso, houve a
constatação da falência da gestão centralizadora da Fundação Nacional de Bem-estar do
Menor do obsoleto Código de Menores de 1979.
2.1 A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL
A Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral da Infância, que influenciou
nossa legislação incorpora todos os princípios fundamentais inerentes à legislação ligada a
infância e juventude. Compõe-se pela Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança,
Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores, Regras
Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade e por fim
pelas Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil.
Nesse passo, JOÃO GILBERTO LUCAS COELHO explica como se constitui a
Doutrina da Proteção Integral:
O dispositivo ora em exame é a síntese do pensamento do legislador constituinte, expresso na consagração do preceito de que “os direitos de todas as crianças e adolescentes devem ser universalmente reconhecidos. São direitos especiais e específicos, pela condição de pessoas em desenvolvimento. Assim, as leis internas e o direito de cada sistema nacional devem garantir a satisfação de todas as necessidades das pessoas de até 18 anos, não incluindo apenas o aspecto penal do ato praticado pela ou contra a criança, mas o seu direito à vida, saúde, educação, convivência, lazer, profissionalização. Liberdade e outros”. (Comentando o ECA – Artigo 1º. Acesso 2004).
Sobre essa transição na legislação brasileira ROBERTO DA SILVA aduz:
O reordenamento jurídico do país deu-se pelo Movimento Nacional Constituinte e pela promulgação de uma Constituição Federal em 1988. A marca do reordenamento jurídico foi a “remoção do entulho autoritário” e a preocupação que norteou os constituintes e as pressões dos movimentos populares e da sociedade organizada foi no sentido de assegurar a inclusão, aprovação e manutenção de diversos dispositivos que colocassem o cidadão a salvo das arbitrariedades do Estado e dos Governos.
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O Artigo 226 incorporou todos os preceitos das Cartas Internacionais de 45, 48, 51, 59, 66, 68, 69 e 79, no que se refere à proteção à mulher e à família, mas foi no Artigo 227, ao exigir uma lei específica que o regulamentasse, que possibilitou, através do Estatuto da Criança e do Adolescente, finalmente aprovado em 13 de julho de 1990, que o constituinte incorporou como obrigação da família, da sociedade e do Estado, assegurar, com absoluta prioridade, os direitos da criança e do adolescente. (Op. cit. 2001, Acesso: julho 2004).
No mesmo sentido ainda, ANTÔNIO CARLOS GOMES DA COSTA e ISABEL
MARIA SAMPAIO OLIVEIRA LIMA, colacionam que essa Doutrina “constitui um conjunto
de princípios de direitos para garantir à criança e ao adolescente um novo status, diferenciado
daquele que, até o final dos anos oitenta lhe era conferido internacional e nacionalmente”.
(Breves Anotações sobre direito à educação, medidas de proteção e medidas sócio-educativas.
2001, Acesso 2004).
No Brasil, foi através do Estatuto da Criança e do Adolescente que a Doutrina da
Proteção Integral assumiu corpo jurídico, ou seja, consagrou as crianças e os adolescentes
como sujeitos de direitos. Portanto, deixam de ser tratados como objeto passivo, passando a
ser partícipe de sua própria história, agora em condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento.
EMÍLIO GARCIA MENDES parafraseando NORBERTO BOBBIO, assevera que:
Em primeiro lugar, não creio que haja dúvidas em relação à ruptura radical que a Convenção representa em termos de enfoque jurídico da infância. Trata-se de um instrumento decisivo e fundamental que torna ociosa qualquer discussão que ponha em dúvida a compreensão da categoria infanto-adolescência como dotadas de sujeitos plenos de direito. (1998. p. 16).
Portanto, concebe a criança e adolescente como prioridade absoluta, apontando que a
proteção não é mais obrigação exclusiva da família e do Estado, é um dever social. Cujo
processo admite diferentes ações educativas, mediante as distintas fases do desenvolvimento
humano responsabilizando a família, a sociedade e o Estado pela efetivação de direitos
inerentes ao pleno desenvolvimento humano.
Em comentário ao Estatuto da Criança e do Adolescente o Instituto Latino-
Americano das Nações unidas para a prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente -
ILANUD estabelece que:
O sistema de garantias da doutrina da proteção integral ampara os direitos fundamentais da criança e do adolescente – direito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à convivência familiar, comunitária e social, à integridade física e psíquica, dentre outros – contra aqueles que porventura possam viola-los de alguma forma: a Família, a Sociedade e o Estado. (Comentando o ECA – Artigo 1º. Acesso 2004).
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Desta forma, a proteção integral surge como um sistema de normas jurídicas no qual
crianças e adolescentes “figuram como titulares de interesses subordinantes frente à família, à
Sociedade e o Estado”. (PAULA. 2002, p. 23).
Aponta a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, através de ações
articuladas entre Estado e sociedade na operacionalização da política para a infância e a
adolescência.
Nas palavras de EMÍLIO GARCIA MENDEZ, “esta nova doutrina deslegitima
política e, sobretudo juridicamente o velho direito de “menores” colocando -o paradoxalmente
em situação totalmente irregular”. (1998, p. 17).
Em sua tese de mestrado KARYNA BATISTA SPOSATO, anuncia que “O Estatuto
da Criança e do Adolescente por meio da doutrina da proteção integral, introduz no
ordenamento jurídico nacional todo um sistema de garantias e direitos para as crianças e
adolescentes consubstanciado em um conjunto de novos referenciais teóricos.” (2003, p. 34).
Segundo JOSÉ DE FARIAS TAVARES, destaca desta forma:
[...] enquanto o Código de Menores preocupava-se tão somente com os menores em situação irregular, o ECA inovou ao abranger toda criança e adolescente em qualquer situação jurídica, rompendo definitivamente com a doutrina da situação irregular, assegurando que cada brasileiro que nasce possa ter assegurado seu pleno desenvolvimento, mesmo que cometa um ato considerado ilícito. (2002, p. 07).
Com essa nova orientação, aboliu-se o termo estigmatizante “menor”, que passou a ser
tratado como “criança” ou “adoles cente infrator”, como sintetiza WILSON DONIZETI
LIBERATI. (2002, p. 15).
A proteção é considerada integral por alcançar todo o universo de relações
interpessoais nas quais a criança e o adolescente façam parte, além de envolver uma proteção
a todos os aspectos da condição de ser humano, como físico, moral, ético, religioso, etc., isto
é, revela-se um sistema de garantias fundado em políticas públicas preventivas.
Existem essencialmente três políticas públicas previstas no Estatuto da Criança e do
Adolescente, as quais pelas palavras do ILANUD são:
Políticas Básicas (prevenção primária), contempladas no artigo 4 do ECA: implicam em políticas de atendimento à criança e ao adolescente para garantia de saúde, alimentação, habitação, educação, esporte, lazer, profissionalização e cultura. Políticas Protetivas (prevenção secundária), contempladas nos artigos 23, parágrafo único, 34, 101 e 129 do ECA: dirigidas à criança e ao adolescente em situação de risco pessoal ou social cujos direitos fundamentais reconhecidos por lei foram ameaçados ou violados. Estas políticas visam promover a orientação, apoio e acompanhamento temporários; o regresso escolar; o apoio sócio-familiar; as necessidades especiais de saúde; o atendimento às vítimas de maus-tratos; tratamento de drogadição, a renda mínima familiar; a guarda subsidiada e o abrigo.
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As políticas protetivas são de competência do Poder Judiciário e dos Conselhos Tutelares. Políticas Sócio-educativas (prevenção terciária), contempladas dos artigos 112 e 129 do ECA: estas políticas implicam na responsabilização do adolescente em conflito com a lei por meio da aplicação de uma medida sócio-educativa (advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação). A Competência da aplicação desta sanção é exclusiva do Poder Judiciário. (grifo nosso) (Op. cit. Acesso: julho 2004).
ANTÔNIO CARLOS GOMES DA COSTA discorrendo sobre a doutrina da
proteção integral, preconiza:
[...] afirma o valor intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadoras da continuidade de seu povo e da espécie; reconhecimento da sua vulnerabilidade o que torna as crianças e adolescentes merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual deverá atuar através de políticas específicas para promoção e defesa de seus direitos. (in De menor a cidadão-criança e cidadão adolescente. 1990, Acesso 2004).
Portanto, a dita proteção integral se efetiva com o recebimento de proteção e socorro,
sempre, em primeiro lugar, atendimento preferencial na prestação de serviços públicos,
formulação e execução de políticas públicas prioritariamente e destinação privilegiada de
recursos públicos aos programas e serviços voltados à criança e ao adolescente.
2.2 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (8.069/90)
Em 13 de julho de 1990, o Congresso Nacional editou a Lei 8.069, o Estatuto da
Criança e do Adolescente, que regula tanto o artigo 227 quanto o artigo 228 da Constituição
Federal.
Constatou-se neste passo que, até o surgimento do Estatuto da Criança e do
Adolescente, todas as legislações se assemelhavam, não havendo muitas inovações quanto aos
menores como sujeitos de direitos.
O Estatuto baseia-se na Doutrina da Proteção Integral, e vem como dito
anteriormente regulamentar artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, que assim dispõe:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
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Este preceito Constitucional elencou como premissa fundamental à concepção da
criança e do adolescente como sujeitos de direitos, bem como sua condição de pessoa em
desenvolvimento. E também, trouxe a distinção legal entre criança e adolescente, retirando o
termo “menor”, que vinha sendo utilizado nas décadas anteriores, o qual trazia por seu
histórico um sentido de exclusão social.
AMARAL E SILVA discorre um breve comentário sobre a nova legislação:
A lei 8.069 de 13 de outubro de 1990 criou muito mais que uma nova Justiça da Infância e da Juventude. Ela estabelece o Estado democrático de direito em esfera onde esteve ausente desde a formação histórica. Ela aboliu o arbítrio e o subjetivismo, consagrando o Direito e dignificando a Justiça. (1995, p. 53).
O Estatuto da Criança e do Adolescente também tratou de conceituar a questão da
prática do ato infracional e quais possibilidades poderiam ser usadas para a resolução de tais
conflitos.
Também, incorporou o uso de medidas sócio-educativas e a garantia do princípio da
ampla defesa nos casos da ocorrência de atos infracionais. Onde os acusados de cometerem
atos infracionais, têm assegurado tanto seus direitos individuais quanto suas garantias
processuais.
Além disso, JOÃO BATISTA COSTA SARAIVA considera fundamental explicar que
o Estatuto da Criança e do Adolescente, estrutura-se a partir de três sistemas de garantia: o
Sistema Primário, o Sistema Secundário e o Sistema Terciário:
O Sistema Primário versa sobre as políticas públicas de atendimento a crianças e adolescentes, previstas nos arts. 4º e 87. O Sistema Secundário aborda as medidas de proteção dirigidas a crianças e adolescentes em situação de risco pessoal ou social, previstas nos arts. 98 e 101, e, por fim, o Sistema Terciário trata da responsabilização penal do adolescente infrator, através das medidas sócio-educativas, previstas no art. 112, que são aplicadas aos adolescentes que cometem atos infracionais. (2002 a, p. 16).
O autor complementa que:
Este tríplice sistema, de prevenção primária (políticas públicas), prevenção secundária (medidas de proteção) e prevenção terciária (medidas sócio-educativas), opera de forma harmônica, com acionamento gradual de cada um deles. Quando a criança ou o adolescente escapar ao sistema primário de prevenção, aciona-se o sistema secundário, cujo grande agente operador deve ser o Conselho Tutelar. Estando o adolescente em conflito com a lei, atribuindo-se a ele a prática de algum ato infracional, o terceiro sistema de prevenção, operador das medidas sócio-educativas, será acionado, intervindo aqui o que pode ser chamado genericamente de sistema de Justiça (Polícia/ Ministério Público/ Defensoria/ Judiciário/ Órgãos Executores das Medidas Sócio-educativas). (2003, p. 24).
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Apesar da complexibilidade da Doutrina da Situação Irregular, EMILIO GARCIA
MENDEZ de forma sucinta, porém com muita probidade expõe:
Na realidade, trata-se de uma doutrina jurídica que tem pouco de doutrina e nada de jurídico, se por jurídico entendemos - no sentido iluminista – regras claras e pré-estabelecidas de cumprimento obrigatório para os destinatários e para aqueles responsáveis por sua aplicação. Esta doutrina constitui, na realidade, uma colcha de retalhos do sentido comum que o destino elevo à categoria jurídica. Sua missão consiste, na realidade, legitimar a disponibilidade estatal absolta de sujeitos vulneráveis que, precisamente pr esta situação, são definidos em situação irregular. Nesse sentido, as hipóteses de entrada no sistema carecem em absoluto de taxatividade. (1998, p. 13).
Fica demonstrada assim de forma clara e gigantesca a diferença das legislações
anteriores, principalmente a que pregava a Doutrina da Situação Irregular e o atual Estatuto da
Criança e do Adolescente, que adota a Doutrina da Proteção Integral.
MENDEZ, ainda assevera que:
Crianças e adolescentes abandonados, vítimas de abuso ou maus-tratos e supostos infratores da lei penal, quando pertencentes aos setores mais débeis da sociedade, constituem os clientes potenciais desta definição. Mais ainda, como uma espécie de ato-ironia, as leis de menores expandem os limites da disponibilidade estatal ao resto da infância que se encontrar em perigo material ou moral. Neste contexto, a arbitrariedade não pode, jamais, constituir a exceção e sim o comportamento cotidiano daqueles encarregados de sua aplicação. (1998, p. 13).
Por derradeiro, pode se dizer com convicção que a lei foi um grande avanço na área
da infância e juventude, pois os anteriormente chamados “menores” passaram a ter seus
direitos e deveres instituídos. E saíram da chamada situação irregular para uma Doutrina de
Proteção Integral da Infância.
A Doutrina da Proteção Integral da infância trouxe a proibição taxativa de detenções
ilegais ou arbitrárias, reconhecendo o princípio constitucional de que ninguém poderá ser
detido a não ser em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade
competente. Alterando de forma gigantesca a elaboração das políticas para a infância e
juventude concebidas até então, reconhecendo assim, na criança e no adolescente sujeitos de
plenos direitos.
Especificamente no que se refere ao adolescente que pratica ato que em relação ao
adulto considera-se crime. O Estatuto em seu artigo 103 diz que considera-se ato infracional a
conduta descrita como crime ou contravenção penal.
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Nota-se a importância que a norma deu ao adolescente infrator por esta citação:
Considerado por muitos um divisor de águas, o Estatuto substituiu o antigo Código de Menores, instituído em 1979. A nova legislação ampliou os poderes dos cidadãos e dos municípios nas questões dos Direitos da Infância, apostando na descentralização e na participação da sociedade civil. Ao entender a criança e o adolescente como sujeito de direitos, o ECA rompeu com a idéia de serem mero objeto de intervenção jurídica e social ou simples portadores de necessidades. Essa revolução conceitual é base que permite todas as outras mudanças práticas. Seu caráter inovador fez com que fosse considerado uma referência internacional, inspirando legislação de mais de quinze paises. (http://andi.org.br/midia_edu/artigos/eca.htm. Acesso de 20 de outubro de 2003)
Em suas Reflexões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, JOSÉ CORDEIRO
SANTIAGO:
[...] prevê um tratamento diferenciado para os adolescentes infratores, classificando-os como pessoas especiais de direitos, procurando garantir que sua formação seja sólida e harmoniosa perante a sociedade, garantindo assim a retomada de uma vida social plena sem problemas ou incidentes, lastreados em valores éticos, sociais e familiares, afastando-os de uma vida pregressa gregária que não deve prevalecer, em nenhuma hipótese durante o seu desenvolvimento, sob pena de se tornar um ente incurável. (Reflexões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. 1999, Acesso 2004).
Essa modificação trouxe o uso de medidas sócio-educativas com o objetivo do
fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. E não menos importante, a certeza que
as crianças e adolescentes são tratados como sujeitos de direitos, independente de sua
condição social.
No entendimento de JOSÉ CORDEIRO SANTIAGO o Estatuto da Criança e do
Adolescente preleciona que:
[...] a sociedade, ao retirar o delinqüente do convívio social deve tratá-lo de tal modo a readaptá-lo as normas de convivência, não somente através do enclausuramento, mas através de outras penas substitutivas que, com certeza, surtirá melhores resultados, pois se este objetivo não for alcançado durante o período de reabilitação, o delinqüente tornar-se-á um problema social.(Op. cit. 1999, Acesso 2004).
Neste passo, JOSÉ FERNANDES DIAS, elucida: “O Estatuto é, acima de tudo, uma
fundamental e revolucionária Carta de Direitos, a Constituição da Criança e do
Adolescente”, e ainda, “o ECA estimula a voz e a ação das crianças e dos adolescentes em
todos os níveis”. (Construtores da Utopia. 2001, Acesso 2004).
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Em resumo, com o Estatuto ocorreu uma verdadeira mutação jurídica, onde a
sociedade como um todo, foi chamada à sua responsabilidade em proteger3, educar4, prover5,
assegurar6, tutelar7, garantir8 àqueles que se encontram em peculiar desenvolvimento, isto é as
crianças e adolescentes.
2.3 DO ADOLESCENTE INFRATOR
O adolescente em conflito com a lei é responsabilizado, de maneira pedagógica,
através das medidas sócio-educativas9.
2.3.1 Ato Infracional
O ato infracional é uma ação praticada por um adolescente, correspondente às ações
definidas como crime ou contravenções cometidas pelos adultos, e está definido no art. 103
do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Art. 103. Considera -se ato infracional a conduta
descrita como crime ou contravenção penal”.
Para HENRIQUETA SCHARF VIEIRA:
No direito penal, o delito constitui uma ação típica, antijurídica, culpável e punível. Já o adolescente infrator, embora inegavelmente causador de problemas sociais graves, deve ser considerado como pessoa em desenvolvimento, analisando-se aspectos como sua saúde física e emocional, conflitos inerentes à idade cronológica, aspectos estruturais da personalidade e situação sócio-econômica e familiar. (1999, p. 15).
3 Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violência dos direitos da criança e do adolescente. (ECA. 2001, p. 34). 4 Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de as pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, [...]. (ECA. 2001, p. 31). 5 Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações legais.(ECA. 2001, p. 26). 6 Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (ECA. 2001, p. 23). 7 O art. 36 do ECA, dispõe que: “A tutela ser á definida, nos termos da lei civil, a pessoa de até 21 (vinte e um) anos incompletos.” (2001, p. 28), e o Código Civil trata das situações que trazem a baila a tutela, em seu art. 1728, que diz: “Os filhos menores são postos em tutela: I – com o falecimento dos pais, o sendo estes julgados ausentes; II – em caso de os pais decaírem do poder familiar”.( Novo Código Civil, Lei 10.406, de 10-1-2002. 2003, p. 288). 8 Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório o constrangedor. (ECA. 2001, p. 25). 9 Art. 112 da Lei .8.069, de 13 julho de 1990. (2001, p. 43).
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Assim, embora o adolescente pratique uma conduta que constitua uma tipificação
penal, ele não poderá ser penalizado com base no Direito Material Penal e sim pelos meios
aplicáveis com sua condição de pessoa em desenvolvimento, como muito bem explica
VÁLTER KENJI ISHIDA:
Pela definição finalista, crime é fato típico e antijurídico. A criança e o adolescente podem vir a cometer crime, mas não preenchem o requisito da culpabilidade, pressuposto de aplicação da pena. Isso porque a imputabilidade penal inicia-se somente aos 18 (dezoito) anos, ficando o adolescente que cometa infração penal sujeito à aplicação de medidas sócio-educativas por meio de sindicância. Dessa forma, a conduta delituosa da criança e do adolescente é denominada tecnicamente de ato infracional, abrangendo tanto o crime como a contravenção. (2003, p. 171).
Em Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente LIBERATI, cita julgado
do Tribunal de Justiça de São Paulo, confirmando esta tese: “Todos os atos infracionais são
considerados pelo sistema estatutário como ação pública, porque este objetiva a prática do ato
em si”. (Rel. Cunha Camargo, 2002, p. 89).
E ainda, parafraseando NORONHA ensina que “crime é a conduta humana que lesa
e expõe a perigo um bem jurídico protegido pela lei penal”. (Noronha apud Liberati. 2002, p.
89 e 90).
No entanto, é preciso ter em mente, como lembra JOSÉ JACOB VALENTE, que “a
cada crime ou contravenção praticado por adolescente não corresponde uma medida
específica, ficando, como vimos, a critério do julgador escolher aquela mais adequada à
hipótese em concreto”. (2002, p. 66).
Desta forma a criança ou o adolescente jamais cometem crime ou contravenção,
incorrem somente em ato infracional, caso pratiquem conduta tipicamente idêntica.
2.3.2 Perfil
O Estatuto da Criança e do Adolescente, com fundamento na Doutrina da Proteção
Integral, bem como nos critérios médicos e psicológicos, considera o adolescente como
pessoa em desenvolvimento, prevendo, que assim deve ser compreendida a pessoa que possui
entre 12 e 18 anos de idade.
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Para diferenciar criança e adolescente WILSON DONIZETI LIBERATI, expõe
julgado do Superior Tribunal de Justiça:
A segunda parte do art. 104 define que os menores de 18 anos “ficarão sujei tos às medidas previstas nesta Lei”. A criança (que o Estatuto define como a pessoa até 12 anos), se praticar algum ato infracional, será encaminhada ao Conselho Tutelar e estará sujeita às medidas de proteção previstas no art. 101; o adolescente (entre 12 e 18 anos), ao praticar ato infracional, estará sujeito a processo contraditório, com ampla defesa. Após o devido processo legal, receberá ou não uma “sanção”, denominada medida sócio-educativa, prevista no art. 112 (STJ, RHC 3.139-5, Rel. Vicente Cernicchiaro). (2002, p. 91).
Como explica MIGUEL MOACIR ALVES LIMA:
Além disso, a adolescência é uma fase evolutiva de grandes utopias que, no geral, tendem a tornar mais problemática a relação do adolescente com o ambiente social, porquanto sua pauta de valores e sua visão crítica da realidade, ora intuitiva ou reflexiva, acabam destoando da chamada ordem instituída. (2002, p. 373).
O adolescente infrator é inimputável perante as cominações previstas no Código
Penal, ou seja, não recebe as mesmas sanções que as pessoas que possuem 18 anos completos
de idade, visto que, a inimputabilidade penal10 está prevista, com igualdade de redação tanto
no artigo 228 da Constituição Federal, como no artigo 27 do Código Penal: “São penalmente
inimputáveis os menores de 18 anos sujeitos as normas de legislação especial”.
Apesar de ser inimputável, o adolescente infrator é responsabilizado pelos seus atos,
através do Estatuto da Criança e do Adolescente, com a aplicação de medidas sócio-
educativas.
Para aferir imputabilidade ao adolescente, leva-se em conta a idade deste no dia da
ocorrência do fato. Se ele for maior de 12 anos e ainda não tiver completado 18 anos, apenas
responderá sindicância por ato infracional. Como é o entendimento de nossa Corte Maior:
Na aplicação de medidas sócio-educativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, leva-se em consideração a idade do menor ao tempo da prática do fato, sendo irrelevante, para efeito de cumprimento da sanção, a circunstância de atingir o agente a maioridade”. (STJ, RHC 7.308/98-SP, DJU 27-4-98).
A prova da menoridade se fará de acordo com a Súmula 74 do Egrégio Superior
Tribunal de Justiça: “Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer
prova por documento hábil.”, ou seja, a comprovação da ida de é realizada por meio da
10 Segundo DELMANTO, inimputabilidade é uma das causa de exclusão da culpabilidade. O crime persiste, mas não se aplica pena, por ausência de reprovabilidade.(2002, p. 50). Sobre a menoridade EDMUNDO JOSÉ DE BASTOS JUNIOR aduz: “adotou -se, nesse passo o critério biológico como presunção absoluta, de modo que não se indaga da capacidade de entendimento ou autodeterminação do individuo que ainda não atingi aquela idade, [...]. (2002, p. 124).
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certidão de nascimento, documento de identidade, o até mesmo certidão de batismo.
(DELMANTO. 2000, p. 54).
Quanto a prática do ato infracional, em pesquisa realizada no Estado de Santa
Catarina, HENRIQUETA SCHARF VIEIRA, constatou que entre os adolescentes infratores,
o maior índice de atos infracionais é praticado por adolescentes do sexo masculino, com idade
entre 16 e 17 anos. (1999, p. 23).
A mesma situação foi constatada por MÁRIO VOLPI no resto do país, como
demonstra o resultado de sua pesquisa:
Quanto ao gênero dos adolescentes privados de liberdade, 3.987 – 94,8% - pertencem ao sexo masculino, enquanto 320 – apenas 5,2%, portanto – pertencem ao sexo feminino [...]. A permanência mais prolongada das meninas no lar tem sido apontada como um dos fatores responsáveis pela sua maior frequência à escola, pela menor presença das mesmas nas ruas e pelo seu menor envolvimento em ato infracional. (1999, p. 57-58).
Como explica JOACIR DELLA GIUSTINA:
Segundo o último Censo, os adolescentes brasileiros são 20 milhões. Deste total, 20 mil estão envolvidos com atos infracionais, isto é, 0,1% daquele total. Destes 20 mil, cerca de 6 mil estão com a medida sócio-educativa da internação, compreendendo-se assim que 14 mil não detêm a denominada "alta periculosidade". (2001, p. 36).
JOÃO BATISTA COSTA SARAIVA partilha do mesmo pensamento, alertando
ainda que os delitos graves (homicídios, estupros e latrocínios) constituem apenas 19% dos
delitos praticados pelos adolescentes infratores, ou seja, menos de 2% dos delitos. (2002 b, p.
35).
O ato infracional típico da adolescência em conflito com a lei é o furto11.
Homicídios12, latrocínios13, estupros14 ocorrem, mas o percentual destes dados não se fazem
impressionantes, tanto que delito com violência praticado por adolescente (felizmente) ainda
dá manchete de jornal, ante a banalização da violência. (SARAIVA b, 2002, p. 37).
11 Furto é a subtração de coisa alheia móvel para si ou para outrem (art. 155, caput). É, pois, o assenhoramento da coisa com o fim de apoderar-se dela de modo definitivo. (MIRABETE. 2001, p. 219). 12 Homicídio está disposto no art. 121 do Código Penal e segundo MIRABETE, “[...] poder -se-ia definir o homicídio mais precisamente como a eliminação de vida humana extra-uterina praticada por outrem”. (2001, p.62). 13 Latrocínio é o roubo qualificado pelo resultado morte, e está disposto no art. 157, § 3º do Código Penal, pela redação da Lei 8.072/90 é tipificado como crime hediondo, com pena de 20 (vinte) a 30 (trinte) anos de reclusão. 14 Estupro é definido pelo art. 213 do Código Penal como: “Constranger mlher à conjunção carnal, mediante violência o grave ameaça.”, é considerado crime hediondo pela Lei n. º 8.072/90 e de acordo com o ensinamento de MIRABETE: “A conduta típica no crime de estupro é manter conjnção carna l por meio de violência ou grave ameaça. Conjunção carnal, no sentido da lei, é a cópula vagínica, completa ou incompleta (RT 590/333) entre homem e mulher”. (2001, p. 413).
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Sobre os motivos que levam o adolescente a cometer atos infracionais em Santa
Catarina, ainda, com embasamento nos dados fornecidos por HENRIQUETA SCHARF
VIEIRA, vão, desde a influência dos amigos, o uso de drogas, a evasão escolar, até a pobreza.
(1999, p. 48).
De acordo com MÁRIO VOLPI, verifica-se que:
[...] As respostas demonstram a fragilidade do adolescente à influência de terceiros e a íntima relação do ato infracional com o uso de drogas. No Brasil, além das causas mencionadas, outra grande causa da delinqüência juvenil é a falta de instrução e a evasão escolar, uma vez que sem estar estudando, o adolescente acaba ocioso e mais propenso a praticar atos infracionais. (1999, p. 56-57).
Assim, constata-se que o adolescente comete atos infracionais, na maioria das vezes,
por influência de amigos, uso de drogas, pobreza, evasão escolar entre outros problemas
sociais derivados da falta de políticas públicas na área da infância e juventude.
2.4 AS MEDIDAS APLICÁVEIS AO ADOLESCENTE INFRATOR
As medidas sócio-educativas, cujas disposições gerais encontram-se previstas nos
artigos 112 a 125 do Estatuto da Criança e do Adolescente são aplicáveis aos adolescentes que
incidirem na prática de atos infracionais.
Dispõe o art. 112 da mencionada Lei, que:
Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I – advertência; II – obrigação de reparar o dano; III – prestação de serviços à comunidade; IV – liberdade assistida; V – inserção em regime de semiliberdade; VI – internação em estabelecimento educacional; VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. [...]
De acordo com OLYMPIO SOTTO MAIOR, trata-se de um rol taxativo, sendo
portanto, vedada a imposição de medidas diversas das enunciadas. (2002, p. 362).
Então, para o adolescente autor de ato infracional a proposta é de que, no contexto da
proteção integral, receba ele medidas sócio-educativas (portanto, não punitivas), tendentes a
interferir no seu processo de desenvolvimento objetivando melhor compreensão da realidade e
efetiva integração social. (CURY. 2002, p. 364).
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Conforme muito bem adverte MÁRIO VOLPI:
As medidas sócio-educativas devem ser aplicadas de acordo com as características da infração, circunstâncias familiares e a disponibilidade de programas específicos para o atendimento do adolescente infrator, garantindo-se a reeducação e a ressocialização, bem como, tendo-se por base o Princípio da Imediatidade, ou seja, logo após a prática do ato infracional. (1999, p. 42).
Entende-se então que as Medidas Sócio-Educativas buscam principalmente a
ressocialização dos adolescentes, proporcionando-lhes educação, segurança e dignidade.
2.4.1 Advertência
A advertência está elencada no artigo 115 do Estatuto da Criança e do Adolescente e
consiste em repreensão verbal dada ao adolescente pelo Juiz Vara da Infância e Juventude, na
presença dos pais, do defensor e do Promotor de Justiça, é reduzida a termo, no qual estarão
contidos os deveres do menor e as obrigações do pai ou responsável, o qual é assinado por
todos os presentes.
LIMA ensina:
A advertência, na modalidade de medida sócio-educativa, deve ser destinada, via de regra, a adolescentes que não registrarem antecedentes infracionais e para os casos de infrações leves, seja quanto à sua natureza, seja quanto às suas conseqüências. Poderá ser aplicada, pelo órgão do Ministério Público, antes de instaurado o procedimento apuratório, juntamente com o benefício da remissão e, pela autoridade judiciária, no curso da instrução do procedimento apuratório de ato infracional ou sentença final. (1992, p. 352).
De acordo com MÁRIO VOLPI, a advertência constitui uma medida admoestatória,
informativa, formativa e imediata, devendo ser observado o princípio do contraditório na sua
aplicação. (1999, p. 23).
Como explica PAULO LÚCIO NOGUEIRA:
A advertência poderia dispensar perfeitamente o procedimento contraditório, pois trata-se de admoestação verbal, que deveria ser imposta de plano em face do boletim de ocorrência ou relatório policial. E sua imposição estender-se-ia aos pais ou responsáveis, o que tornaria a medida mais abrangente e eficaz, sendo apenas reduzida a termo. No entanto, dado o formalismo do processo legal, que pressupõe contraditório e amplitude de defesa, assim como apego às formalidades, também a advertência como medida sócio-educativa não pode prescindir do processo legal, como, aliás, têm reconhecido os tribunais. (1996, p. 170).
É a primeira medida judicial aplicada ao menor que delinqüe, tendo sentido
essencialmente educativo, explicando a ilegalidade da conduta praticada, bem como as
conseqüências da reiteração da prática de infrações, com vista à recuperação. Por isso é
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permitido ao adolescente permanecer em seu meio familiar, aplica-se às infrações de somenos
importância com o intuito de alertar os pais para as atitudes do adolescente.
2.4.2 Obrigação de Reparar o Dano
O artigo 116 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a obrigação de reparar o
dano, quando se tratar de ato infracional com reflexos patrimoniais, causados pelo adolescente
à sua vítima.
A medida tem como finalidade despertar e desenvolver o senso de responsabilidade
do adolescente em face do que não lhe pertence, caracteriza-se por ser coercitiva e educativa,
levando o adolescente a reconhecer o erro e repará-lo.
Cabe à vítima entrar com o pedido de reparação, ou executar a sentença penal
condenatória, para obter o ressarcimento do dano sofrido. No entanto, PAULO LÚCIO
NOGUEIRA questiona a constitucionalidade da obrigação de reparar o dano, nos seguintes
termos:
A medida de obrigação de reparar o dano, salvo melhor juízo, parece-nos de duvidosa constitucionalidade, pois não pode o Juiz de Menores impô-la como medida obrigatória, mas apenas tentar a composição do dano como previa o Código de Menores revogado (art. 103), já que nem mesmo ao adulto condenado criminalmente pode ser imposta pelo juiz a obrigação de reparar o dano causado, nem mesmo como condição do sursis, embora a não-reparação do dano causado pelo condenado constitua causa obrigatória de revogação desse benefício. (1996, p. 180).
Há três formas de reparação do dano, o adolescente pode restituir a coisa, ressarcir o
valor do dano causado ou por fim, compensar de qualquer forma o prejuízo da vítima.
Trata de uma medida com grande caráter pedagógico, pois ensina ao adolescente o
respeito por tudo que pertence às outras pessoas, proporcionando o desenvolvimento, como
explica WILSON DONIZETI LIBERATI, "do senso por responsabilidade daquilo que não é
seu". (2002, p. 90).
Assim, através desta imposição, o adolescente reconhece a ilicitude dos seus atos,
bem como garante à vítima a reparação do dano sofrido. Contudo, a efetividade da reparação
do dano, através do ressarcimento do prejuízo, muitas vezes, esbarra na impossibilidade do
cumprimento, ante as condições financeiras do adolescente infrator e da sua família.
Em decorrência disto, o parágrafo único do citado artigo prevê a substituição dessa
medida por outra adequada, quando da impossibilidade do cumprimento da obrigação, ficando
ao arbítrio do Juiz a fixação de outra medida.
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2.4.3 Prestação de Serviço à Comunidade
Como o próprio nome diz, a medida consiste em uma forma de punição útil à
sociedade, onde o infrator não é subtraído do convívio social, porém, desenvolve tarefas
proveitosas a seu aprendizado e a necessidade social.
Está prevista no artigo 117 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e consiste na
realização de trabalhos gratuitos, junto a entidades assiste