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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
POS-GRADUAÇÃO PSICOPEDAGOGIA
O DESENHO E AS DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM:
UMA VISÃO A PARTIR DA PSICOPEDAGOGIA
NELI PASSOS DA SILVA BERNARDO
PROF. ORIENTADOR: VILSON SERGIO DE CARVALHO
Rio de Janeiro 2009
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NELI PASSOS DA SILVA BERNARDO
O DESENHO E AS DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM:
UMA VISÃO A PARTIR DA PSICOPEDAGOGIA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a AVM - Instituto a Vez do Mestre, como requisito parcial para Pos-Graduação em Psicopedagogia Institucional.
ORIENTADOR PROF. VILSON SERGIO DE CARVALHO
Rio de Janeiro
2009
2RESUMO
O presente trabalho teve por objetivo mostrar a importância do desenho
para a Psicopedagogia principalmente para dar subsídios na constatação da
dificuldade de aprendizagem e na maturação do indivíduo. Para tanto foi
necessário conhecer as conceitos de aprendizagem e suas características, as
dificuldades de aprendizagem e suas possíveis causas, e a atuação da
Psicopedagogia junto a aprendizagem, juntamente com evolução do desenho
no desenvolvimento humano.
Palavras-chave: Psicopedagogia. Aprendizagem. Dificuldades de
aprendizagem. Desenho.
3SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 04
CAPÍTULO I – A APRENDIZAGEM 06
CAPÍTULO II – DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 12
CAPÍTULO III – A PSICOPEDAGOGIA E A APRENDIZAGEM 21
CAPÍTULO IV – O DESENHO 25
CONCLUSÃO 34
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 35
4
INTRODUÇÃO
A aprendizagem é um processo contínuo que ocorre ao longo da vida e
individualmente, isso porque cada pessoa possui um ritmo próprio de
aprendizagem. A aprendizagem é também um processo cumulativo, a partir de
experiências anteriores criam-se pré-requisitos para novas experiências. Esta
acumulação do conhecimento não é estática, o indivíduo reorganiza suas
idéias estabelecendo relações entre as anteriores e novas idéias, tornando a
aprendizagem um processo integrativo e dinâmico.
A capacidade de aprender depende da saúde física e mental do indivíduo,
pois ele precisa ter seu sistema neurológico e demais órgãos funcionando
perfeitamente bem. Com a da motivação o indivíduo se sente seguro vendo
que há uma necessidade em aprender.
A partir de experiências de observação dos desenhos de crianças
podemos ver como é um grande auxiliar do diagnóstico de transtornos de
aprendizagem, seja atraso ou déficit.
O desenho tem sido estudado por vários autores, entre eles podemos citar
Piaget, Luquet, Sully, Berson, Walon, etc.. A partir do acompanhamento do
crescimento da criança através do seu desenho, é possível ter uma noção de
em que período da maturação ela se encontra.
Apesar da pouca assiduidade do esforço gráfico da criança, constata-se
que o rabisco vai se transformando e adquire com o passar do tempo firmeza,
do vai e vem nervoso e/ou movimentos circulares, a mão quanto mais hábil
maior é o progresso e mostra-nos como a imaginação já faz parte da
combinação dos traços.
Neste trabalho, tenho por objetivo esclarecer no primeiro capítulo sobre a
aprendizagem, o que é e suas características, sua associação com a
motivação e a maturação. No segundo capítulo, serão expostas as dificuldades
5de aprendizagem e suas possíveis causas. No capítulo 3, abordaremos sobre a
Psicopedagogia, o que é e sua atuação junto à aprendizagem. Ao final, no
capítulo 4, será caracterizado o desenho, quais são os primeiros riscos e
primeiros movimentos da criança.
Não podemos afirmar que o desenho é indispensável ao diagnóstico das
dificuldades e/ou atrasos de aprendizagem, mas é possível dizer que o
desenho auxiliar os psicopedagogos neste intuito.
6
CAPÍTULO I – APRENDIZAGEM
A Aprendizagem é estudada de forma sistematizada desde a antiguidade.
Na Idade Média a aprendizagem e o ensino, ambos seguiam o mesmo rumo
eram determinados pela religião e seus dogmas. Durante as décadas de 1950
a 1970 tomou grande relevância no meio acadêmico e foram criados diversos
conceitos para explicá-la. Ainda que existam diferentes conceitos, todos eles
concordavam que a aprendizagem implicava numa relação bilateral, tanto de
quem ensina quanto de quem aprende (Bossa, 1994).
Para Bentham (2002), a aprendizagem é um processo de transformação
constante e contínua do comportamento do ser humano que se dá através da
conduta do indivíduo, principalmente através das experiências. Cada indivíduo
tem seu ritmo próprio de aprendizagem (ritmo biológico) que aliados ao seu
esquema próprio irá constituir uma individualidade. A aprendizagem ocorre
dentro e fora da escola. É gradual, onde se aprende pouco a pouco, durante
toda a vida.
Aprendizagem é um processo inseparável do ser humano e ocorre
quando há uma modificação no comportamento, mediante a experiência ou a
prática, que não podem ser atribuídas à maturação, lesões ou alterações
fisiológicas do organismo. Do ponto de vista funcional é a modificação
sistemática do comportamento em caso de repetição da mesma situação
estimulante ou na dependência da experiência anterior com dada situação.
É necessário haver condições necessárias para a aprendizagem sendo
seus. Para que haja a aprendizagem são necessários fatores fundamentais: a
saúde física, a motivação, prévio domínio maturação inteligência, concentração
ou atenção e memória, em determinadas condições, como se pode ver:
Ø Fatores Fisiológicos - maturação dos órgãos dos sentidos, do sistema
nervoso central, dos músculos, glândulas etc.;
7Ø Fatores Psicológicos - motivação adequada, autoconceito positivo,
confiança em sua capacidade de aprender, ausência de conflitos
emocionais perturbadores, etc.;
Ø Experiências Anteriores - qualquer aprendizagem depende de
informações, habilidades e conceitos aprendidos anteriormente.
1.1.Características do processo de aprendizagem
Segundo Correia (2009), os processos podem se caracterizar como:
Ø Processo é dinâmico - A aprendizagem é um processo que depende
de intensa atividade do indivíduo em seus aspectos físico, emocional,
intelectual e social. Só acontece através da atividade, tanto externa –
física – como também de atividade interna do indivíduo envolve a sua
participação global.
Ø Processo é contínuo - Todas as ações do indivíduo, desde o início da
infância, já fazem parte do processo de aprendizagem. O sugar o seio
materno é o primeiro problema de aprendizagem: terá que coordenar
movimentos de sucção, deglutição e respiração. Os diferentes aspectos
do processo primário de socialização na família, impõem, desde cedo, a
criança numerosas e complexas adaptações a diferentes situações de
aprendizagem. Na idade escolar, na adolescência, na idade adulta e até
em idade mais avançada, a aprendizagem está sempre presente e
acontecendo.
Ø Processo é global - Todo comportamento humano é global. Inclui
sempre aspectos motores, emocionais e mentais, como produtos da
aprendizagem. O envolvimento para mudança de comportamento terá
que exigir a participação global do indivíduo para uma busca constante
de equilíbrio nas situações problemáticas que lhe são apresentadas.
8Ø Processo é pessoal - A aprendizagem é um processo que acontece de
forma singular e individualizada, portanto é pessoal e intransferível, quer
dizer ela não pode passar de um indivíduo para outro e ninguém pode
aprender que não seja por si mesmo.
Ø Processo é gradativo - A aprendizagem sempre acontece através de
situações cada vez mais complexas. Em cada nova situação um maior
número de elementos serão envolvidos. Cada nova aprendizagem
acresce novos elementos à experiência anterior, sem idas e vindas, mas
em uma série gradativa e ascendente.
Ø Processo é cumulativo - A aprendizagem resulta sempre das
experiências vividas pelo indivíduo que servem como patamar para
novas aprendizagens. Ninguém aprende senão, por si e em si mesmo,
pela automodificação. Desta maneira, a aprendizagem constitui um
processo cumulativo, em que a experiência atual aproveita-se das
experiências anteriores.
1.2. Aprendizagem e maturação
A maturação é constituída no processo de desenvolvimento pelas
mudanças do organismo que ocorrem de dentro para fora do indivíduo. Mas
apesar destas mudanças acontecerem apenas quando existe uma
predisposição natural no organismo do indivíduo, elas dependem de
estimulações no meio ambiente para se desenvolverem plenamente (Davidoff,
2001).
As características essenciais da maturação são:
1. Aparecimento súbito de novos padrões de crescimento ou
comportamento;
2. Aparecimento de habilidades específicas sem o benefício de práticas
anteriores;
93. A consistência desses padrões em diferentes indivíduos da mesma
espécie;
4. O curso gradual de crescimento físico e biológico em direção a ser
completamente desenvolvido.
A aprendizagem, diferente da maturação, envolve uma mudança
duradoura no indivíduo, que não esta marcada por sua herança genética. Ela
se constitui no processo de socialização do indivíduo e desenvolve gostos,
habilidades, preferências, contribuem para formação de preconceitos, vícios,
medos e desajustamentos patológicos.
De maneira geral, concluindo-se pelas próprias definições acima, na
questão escolar, por exemplo, a influência dos professores é restrita aos
padrões de maturação dos alunos. Na aprendizagem esta influência pode ser
determinante, com conseqüências que podem ser tanto positivas quanto
negativas. As características específicas do ser humano: a fala, a noção de
tempo, a cultura e a capacidade de abstração, que confere uma qualidade
única ao estudo do seu comportamento. Ainda mais significativo que tudo o
que foi dito, o homem, em seu processo de percepção, pode observar-se
simultaneamente como sujeito e objeto, como o conhecedor e como o que
deve ser conhecido.
A criança molda os seus múltiplos padrões de comportamento. O período
relativamente de dependência da criança, em relação ao adulto, que se segue
à necessidade total de ajuda logo após o nascimento, contribui para que ele
adquira a cultura de seu grupo.
O homem compartilha com outros mamíferos alguns impulsos orgânicos
primários como a fome, a sede, o sexo, a necessidade de oxigênio, de calor
moderado e de repouso e, possivelmente, umas poucas aversões primárias
tais como medo, raiva. A primeira manifestação de tais impulsos e aversões é
um processo de maturação. No entanto, o ser humano parece transcender de
alguma forma tais impulsos e aversões hereditárias. O homem encontra
satisfação no uso de suas capacidades e habilidades.
10
1.3. Aprendizagem e desempenho
Para Papalia (2001) é fundamental a conclusão de como esta
transcorrendo a aprendizagem a observação do comportamento do indivíduo.
O desempenho pode ser considerado como o comportamento observável
do indivíduo. A aprendizagem não pode ser observada diretamente, só pode
ser inferida do comportamento ou do desempenho de uma pessoa.
Para tanto devem ser observadas determinadas características do
desempenho que servirão como indicadores do desenvolvimento da
aprendizagem ou da aquisição de uma habilidade. A característica principal é
quando o desempenho da habilidade melhorou, durante um período de tempo
no qual houve a prática. A pessoa sendo assim mais capaz de desempenhar a
habilidade do que era anteriormente.
A melhoria do desempenho deve ser marcada por certas características:
1. O desempenho deve ser, como resultado da prática, persistente, ou
seja, relativamente constante. Deve ser duradoura no tempo.
2. As flutuações do desempenho devem ser cada vez menores,
ocorrendo menos variabilidade.
Aprendizagem é uma mudança no estado interno do indivíduo, que é
inferida de uma melhora relativamente permanente no desempenho como
resultado da prática.
11
1.4. Aprendizagem e motivação
Segundo Papalia (2001), dentre todos os fatores que influenciam no
processo de aprendizagem, o mais importante deles é, sem dúvida, a
motivação. Sem motivação não há aprendizagem. Podem existir os mais
diversos recursos para a aprendizagem, mas se não houver motivação ela não
acontecerá.
A motivação existe quando o indivíduo se propõe a emitir um
comportamento desejável para um determinado momento em particular. O
indivíduo motivado é aquele que se dispõe a iniciar ou continuar o processo de
aprendizagem.
Os objetivos que motivarão o indivíduo têm a função de manter ativo o
organismo para que a necessidade que gerou o desequilíbrio seja satisfeita.
Eles dão direção ao comportamento para que os objetivos sejam alcançados,
definindo quais os mais adequados para conduzir a ação e fazem a seleção
das respostas que satisfazem as necessidades para que possam ser
reproduzidas posteriormente, quando situações semelhantes se apresentarem.
12
CAPÍTULO II – AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Organicamente, de acordo com Correia e Martins (2006), as dificuldades
de aprendizagem
“[...] são desordens neurológicas que interferem com a recepção, integração ou expressão de informação, caracterizando-se, em geral, por uma discrepância acentuada entre o potencial estimado do aluno e a sua realização escolar. Numa perspectiva educacional, as dificuldades de aprendizagem refletem uma incapacidade ou impedimento para a aprendizagem da leitura, da escrita, ou do cálculo ou para a aquisição de aptidões sociais” (2006, s.p.).
Isto significa que alunos com dificuldades de aprendizagem manifestam
dificuldades na realização de algumas tarefas escolares, mas não
necessariamente em todas, podendo se destacar em algumas delas. Significa,
ainda que analisando estes alunos em termos de inteligência, pode-se dizer
que normalmente possuem inteligência dentro da média ou até mesmo acima
da média.
Algumas das causas das dificuldades de aprendizagem são: problemas
familiares; aquisição da leitura e escrita; disortografia; disgrafia; imaturidade;
falta de perseverança na execução das tarefas; problemas de saúde;
hiperatividade; distúrbios psicossociais; domínio dos conceitos básicos da
Matemática; deficiência motora; relacionamento interpessoal; deficiência visual;
deficiência auditiva; ou a escola que muitas vezes não oferece oportunidades
diversificadas de alfabetização.
Podemos exemplificar, resumidamente, algumas causas das dificuldades
de aprendizagem:
13v Problemas Familiares
Segundo Morais (1999), compreender essas dificuldades é o ponto de
partida do trabalho do professor. Nem todos os alunos pertencem a famílias
com pai e mãe, com recursos suficientes para uma vida digna e convivem com
problemas.
Os principais problemas familiares são:
a) Separação – uma separação pode ser traumática e trazer sérios
problemas emocionais e de aprendizagem se não for bem conversada e
discutida com os filhos.
b) Abandono – o abandono descontrola a vida da criança, levando ao
fracasso na escola, à diminuição da auto-estima, ao sentimento de
menos valia. É necessário uma intervenção social e psicológica para dar
suporte, levando-o a confiar em si mesmo e estabelecer vínculos positivos com
o processo ensino-aprendizagem.
c) Dificuldades financeiras – esta é uma questão econômica que gera
outros comprometimentos; quando as dificuldades financeiras são apontadas,
surge a desnutrição, falta recursos para adquirir material adequados à
aprendizagem, irritação, instabilidade, depressão, perda do interesse pela
aprendizagem, agressividade e desatenção.
d) Alcoolismo / drogas / promiscuidade – crianças que convivem com
estas experiências vão apresentar maiores conflitos e tensões, pois convivem
com duas realidades diferentes, de um lado a família sem estrutura, de outro a
escola que exige ordem e organização.
Para amenizar os problemas familiares faz-se necessário uma atmosfera
familiar adequada. Para isto, é preciso que cada um cumpra seu papel, sendo
eficazes no seu trabalho enquanto pai e mãe, mesmo que separados, devem
ser compreensivos e carinhosos, enfatizando valores de respeito e justiça,
encorajando a participação da criança em todos os momentos.
14Quando o problema se estende a dificuldades financeiras, de
imediato esses pais devem ser encaminhados a Assistência Social para
provimento das necessidades básicas e a busca por trabalho, entretanto no
que se refere à criança, deverão ser orientados os pais no sentido de que a
punição para as faltas, podem ser repreensões sem dramaticidade e violência,
evitando o exagero. A educação ideal é desenvolver uma atitude tal que faça a
criança respeitar os pais e professores sem ter medo deles.
v Aquisição da Leitura e escrita
De acordo com Morais (1999):
“O momento ideal do desenvolvimento da escrita em cada criança depende de quatro fatores: Fisiológicos: incluem maturação física e o crescimento, predomínio cerebral e lateralidade, maturação neurológica, visual, auditiva e o funcionamento dos órgãos da fala.
Ambientais: incluem as experiências sociais acumuladas pelas crianças em interação com o meio ambiente. Emocionais: incluem a motivação para aprender e a adaptação e interação com o meio ambiente. Intelectuais: atividade mental, ter desenvolvido percepção visual e auditiva, raciocínio e pensamento. Alguns autores defendem a hipótese de que os distúrbios emocionais precedem e causam as dificuldades para aprender a escrita e a leitura, baseado nesta teoria podemos diagnosticar: agressividade da criança dirigida à figura paterna e ao professor enquanto autoridade; condicionamentos negativos; desatenção e inquietude frente à situação escolar; pais que superprotegem a criança criando uma relação de dependência dela com adultos, o que transforma a aprendizagem numa tarefa impossível de ser realizada sozinha; crianças com dificuldades em aceitar limites; pais e escola que exigem da criança a realização de funções simbólicas de ler e escrever antes que tenha condições físicas, emocionais e cognitivas para fazê-lo; angústia e depressão diminuem a eficiência da aprendizagem para aquisição da leitura e domínio da escrita; auto-imagem negativa; inadaptação ao ambiente escolar” (p.103-104).
A percepção das palavras envolve, necessariamente e, no mínimo dois
sistemas: o visual e o auditivo. No caso da leitura silenciosa, as informações
15chegam ao cérebro através da visão. Na leitura oral, as informações são
recebidas tanto pelos órgãos de audição como pelos órgãos visuais. No caso
do ditado, a criança recebe as informações através da audição.
Os distúrbios da leitura que são decorrentes das dificuldades de
percepção são:
“Discriminação auditiva: problemas auditivos que envolvem a perda parcial da audição. A criança não distingue corretamente os sons acusticamente próximos, a confusão entre os sons está, intrinsecamente relacionada com o ponto de articulação de cada um, no momento da emissão sonora.
Discriminação visual: para a aquisição de uma boa leitura emergem como fundamentais para que se discriminem satisfatoriamente as letras, e os números alguns fatores. São eles: em cima e embaixo, esquerda e direita” (Morais, 1999, p.107).
Com as crianças que têm dificuldade de memorizar o fonema e o grafema
deve-se utilizar exercícios específicos que trabalhem o som da sílaba,
cantarolando qualquer canção bem conhecida, com os sons das consoantes e
das vogais.
v Atraso na linguagem
Algumas pessoas pensam que a criança que apresenta atraso na
linguagem será pouco inteligente. Porém, nem sempre esta afirmação é
correta, pois muitas crianças apresentam atraso na fala por motivos diversos,
muitas vezes transitórios.
Normalmente, a criança com 3 anos já fala. Algumas crianças
conseguem superar o atraso de linguagem somente após os 4 anos. Em
outras, o problema se agrava, transformando-se em um distúrbio específico da
articulação durante alguns anos, mas depois resolve-se naturalmente ou com o
auxílio de um tratamento especializado.
16Problemas referentes à audição podem interferir na aquisição da
linguagem provocando atraso, mas o fator emocional é a principal causa. As
causas mais frequentes são os traumas, carência de afeto, superproteção e
uso de outros idiomas no ambiente familiar.
v Dislalia
Dislalia é conceituada por Pamplona (1999) como “um transtorno
específico do desenvolvimento no qual a capacidade da criança de utilizar a
linguagem expressiva falada está marcadamente abaixo do nível apropriado
para sua idade mental” (p.111).
Deve-se enriquecer o vocabulário ampliando o universo de palavras,
selecionar palavras apropriadas, explorar os textos com interpretação oral,
dramatizar, cantar, recitar; poesias, rimas, parlendas, explorar os elementos
gramaticais como preposições, pronomes, artigos, flexões verbais e nominais.
Retomar a memória passada solicitando que a criança conte coisas e fatos
acontecidos no passado. Explorar sempre a fala ao invés do gesto, jogos da
imaginação, faz-de-conta, etc.
A dislalia pode se manifestar de várias maneiras: “omissão na
pronúncia de alguns sons; inserção de sons; distorção, quando a criança
pronuncia as palavras com a língua entre os dentes; ou substituição de sons”
(PAMPLONA 1999, p.112).
v Dislexia
De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia - ABD (2009):
17“Pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a 15% da população mundial é disléxica. Ao contrário do que muitos pensam, a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição sócio-econômica ou baixa inteligência. Ela é uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda alterações no padrão neurológico.
Por esses múltiplos fatores é que a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe multidisciplinar, sobre a qual falaremos mais adiante. Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento pós-diagnóstico mais efetivo, direcionado às particularidades de cada indivíduo, ou resultados concretos” (Disponível em: <http://www.dislexia.org.br/abd/dislexia.html>. Acesso: 14 Março 2009).
Considera-se disléxicas as crianças saudáveis, de inteligência normal e
sem déficits sensoriais, mas que apresentam dificuldades para ler e escrever,
demonstrando atraso com relação as demais crianças de seu nível escolar.
Situa-se entre os dislexos as crianças que ao ler ou escrever um texto,
apresenta sempre dificuldades como:
a) Inverter a ordem das letras. Por exemplo: “rop” ou “pro”, em vez de por;
b) Trocar letras, pois confunde ao ouvir “ta” e “da”, ou “fa” e “va”, etc.
c) Nunca saber, com segurança, de que lado fica a parte redonda das
letras “d” e “b” ou “p” e “q”. (“Fica do lado de cá ou do lado de lá?”). Por ser mal
lateralizado, o aluno sempre hesita em dizer esquerda ou direita.
d) Não distinguir o “n” do “u” por não saber, ao certo, distinguir a parte de
cima da de baixo;
e) Confundir o “m” e o “n” por serem parecidos, etc. Ainda, algumas
crianças apresentam escrita invertida que é comumente chamada “escrita ao
espelho”.
No início, todas as crianças sentem essas dificuldades, mas quem não
paresenta as disfunções, supera em pouco tempo. Em crianças disléxicas,
18porém, essas dificuldades podem manter-se por muito tempo, ou persistir pelo
resto da vida, de modo mais grave ou mais atenuado.
A leitura do disléxico pode manifestar-se entrecortada, sem ritmo,
repetitiva, com omissão e inversões de sílabas. Devido à sua dificuldade na
direcionalidade, a criança pode saltar linhas e, muitas vezes, até parágrafos.
Os erros na leitura e escrita parecem resultar não apenas da própria
dificuldade em lidar com símbolos, mas também de dificuldades emocionais
que vão se acumulando pelos fracassos repetidos. A ansiedade intervém, em
grau variável, nesses distúrbios. Por isso, a criança atrasada em leitura não
gosta de ler nem de escrever, pois essas atividades representam um esforço
sempre penoso.
A incapacidade de lidar com símbolos, além de prejudicar a realização do
aluno em leitura e escrita, interfere em outras áreas. Por exemplo: em
matemática, uma criança solicitada a adicionar 783 a 227, pode ler os números
como se fossem 873 e 272, sem perceber a inversão. Assim, ela não entende
por que sua resposta é considerada “errada”. Para uma pessoa que não é
disléxica, é muito difícil entender e aceitar que a criança é quase totalmente
inconsciente das inversões que faz nas letras e números.
Ao identificar-se a dislexia interferindo no rendimento escolar ou em
sintomas isolados, percebidos em casa ou na escola, deve-se procurar a ajuda
especializada de uma equipe multidisciplinar composta por psicólogo,
fonoaudiólogo e psicopedagogo clínico. Estes profissionais deverão verificar
através de anamnese realizada com os pais e parecer da escola, todas as
possibilidades antes de confirmar o diagnóstico de dislexia.
v Imaturidade
A criança age como se fosse mais jovem do que realmente é e pode
preferir brincar com crianças menores. Alguns tornam-se tão frustrados
19tentando fazer coisas que não conseguem que desistem de aprender e
começam a desenvolver estratégias para evitar isso.
Quando se fala em maturidade para o aprendizado, nos remetemos ao
conceito de maturação que é “o momento ideal do desenvolvimento em que
cada criança individualmente pode aprender com facilidade e proveito” (Visca,
1987, p.74), isto depende de fatores emocionais, físicos, ambientais,
intelectuais.
Se a maturidade depende de todos esses requisitos, não se pode esperar
que todas as crianças amadureçam ao chegarem a determinada idade
cronológica.
v Falta de perseverança na execução das tarefas
Segundo Visca (1987), a memória é uma área na qual a inconsistência,
normalmente, é mais óbvia; as crianças com dificuldades de aprendizagem
recordam alguns tipos de informações muito melhor que outros. Algumas vezes
não concluem a atividade. Uma criança com dificuldades de aprendizagem
pode ser capaz de desenhar bem, mas não de escrever claramente. Muitas
vezes estas discrepâncias confunde os pais e professores, convencendo-os de
que elas estão sendo desatentas, não tendo persistência ou que não estão
cooperando. Está intimamente ligado a perda do interesse por aprender.
Problemas familiares, preocupações com a saúde, professor ineficiente,
desajuste ao ambiente escolar ou conteúdo, curricular podem comprometer o
entusiasmo pela aprendizagem.
20v Outros problemas de saúde
Lesão cerebral, desequilíbrios neuroquímicos, erros no desenvolvimento
cerebral, hereditariedade, doenças infecciosas (encefalite, meningite),
acidentes, hemorragias cerebrais, tumores, transtornos glandulares não-
tratados na primeira infância, hipoglicemia na primeira infância, desnutrição,
exposição a substâncias químicas. Eventos envolvendo sufocação,
afogamento, inalação de fumaça, algumas complicações no parto.
A exposição durante o pré-natal a drogas (álcool, nicotina e alguns
medicamentos prescritos, bem como drogas de “rua” está associada a uma
variedade de dificuldades de aprendizagem, incluindo atrasos cognitivos,
déficits de atenção, hiperatividade e problemas de memória.
O professor deve estar atento a qualquer sinal de que o organismo não
vai bem, esperar para ver pode trazer sérias conseqüências. Os cuidados com
a alimentação, o sono e a higiene devem ser lembrados sempre.
v Distúrbios Psicossociais
Transtorno de conduta caracterizado por um padrão repetitivo de
agressividade, comportamento anti-social e desafiador, bem mais graves que
as travessuras infantis, podem envolver situações psiquiátricas e ambientes
psicossociais diversos, incluindo relacionamento familiar insatisfatório e o
conseqüente fracasso escolar.
21
CAPÍTULO III – A PSICOPEDAGOGIA E A
APRENDIZAGEM
Embora seja uma profissão relativamente nova no Brasil, a
psicopedagogia é reconhecida não só institucionalmente, mas também
profissionalmente pela importância que tem na ação interativa junto aos
professores e alunos de forma a completar o ciclo da aprendizagem. Embora
haja uma grande necessidade do profissional e reconheçam esta importância,
ainda não existe um programa de contratação efetiva (Bossa, 1994).
A Psicopedagogia busca realizar um trabalho frente à aprendizagem, o
conhecimento, como se processaria sua aquisição, desenvolvimento e
distorções, constituindo-se em uma corrente epistemológica calcada na
melhoria das condições do ato de aprender e ensinar. Nasce da necessidade
de uma melhor compreensão do processo da aprendizagem humana,
investigando e propondo estratégias em relação às dificuldades de
aprendizagem ocorridas no processo de aquisição do conhecimento.
Traçando o percurso da Psicopedagogia no Brasil, delineando seu objeto
de estudo. Num primeiro momento, no período de “medicalização” dos
problemas de aprendizagem, os sujeitos eram encaminhados ao médico:
pediatra e depois ao neurologista. Em um segundo momento, denominado
psicologização dos problemas de aprendizagem, os sujeitos eram
encaminhados ao Psicólogo, submetendo estes a uma bateria de testes.
Frente a estas situações, coloca Bossa (1994), não se chegava a uma
explicação clara sobre as dificuldades de aprendizagem do sujeito, o que
desencadeou o fortalecimento sobre a necessidade de formação de um único
profissional apto a integrar conhecimentos para atuar de maneira objetiva e
eficaz, não só na resolução dos problemas escolares, mas também na
prevenção dos mesmos, facilitando o vínculo do aluno com o processo de
aprendizagem e o resgate do prazer de aprender.
22A Psicopedagogia, atualmente, constitui-se num campo de atuação que
visa à complexidade dos problemas de aprendizagem, em um trabalho
desenvolvido em uma perspectiva transdisciplinar, utilizando-se de
conhecimentos de distintas áreas do saber, enfocando dois campos de
atuação: institucional e clínico.
Desta forma, a Psicopedagogia se torna um campo com conhecimentos
amplos, onde se têm um objeto central de estudo que seria o processo de
aprendizagem humana, seus padrões evolutivos normais e patológicos, bem
como a influência do meio (família, escola, sociedade). As dificuldades
escolares não podem ser explicadas apenas por um fator, esteja ele na
criança, no meio familiar ou escolar, e sim deveria ser explicado pela interação
de vários fatores, entre os quais as construções culturais-sociais que permeiam
o ato educativo.
Observando seu objeto de estudo, podemos perceber a complexidade da
área de atuação e o quanto o psicopedagogo em sua formação e atuação
deveria perceber, problematizar e buscar transformar as construções e práticas
sociais relacionadas às dificuldades de aprendizagem.
Visca considera que a,
“Psicopedagogia foi se perfilando como um conhecimento independente e complementar, por assimilação recíproca das contribuições das escolas psicanalítica, piagetiana, e da psicologia Social de Enrique Pichéon-Riviéri, desta forma, é possível compreender a participação dos aspectos afetivos, cognitivos e do meio que confluem no aprender do ser humano” (Visca apud Bossa, 1994, p.17).
A leitura psicopedagógica nos distintos espaços educativos possibilitaria
assim, a identificação do significado de aprendizagem para cada sujeito, bem
como sua modalidade de aprendizagem, da etapa do pensamento, das suas
dificuldades e possibilidades, contribuindo também no redimensionamento da
prática educativa.
23A psicopedagogia pode ser caracterizada como uma área do psicológico e
do educacional; o psicopedagogo ensina como aprender e, para isso ele
precisa aprender a aprendizagem.
A aprendizagem é a responsável pela integração da pessoa no mundo da
cultura, através dela, o indivíduo passa a fazer parte do mundo cultural de
forma ativa, ao adquirir conhecimentos e técnicas. O trabalho de ensinar a
aprender, cabe ao psicopedagogo recorrer de critérios diagnosticados, a fim de
entender a folha da aprendizagem, partindo daí, o caráter clínico da
Psicopedagogia.
Para Bossa (1994), o psicopedagogo na clínica é praticar, ou seja, que os
fatos tenham sentido, sentido para não aprender, uma escola inadequada,
separação dos pais, nascimento do irmão, doença em família, e outros que a
criança não consegue entender e nem aceitar, compreender a sua
aprendizagem. Entretanto, há uma controvérsia nisto tudo, existe muitas
crianças mal alimentadas, órfãs, com pais separados e que estudaram em
escolas de baixo padrão pedagógico e ambientais, mesmo vivenciando tudo
isso, assimilavam, satisfatoriamente, o conteúdo escolar, esta é uma
percepção complexa da aprendizagem, uma vez que é necessário, que se
encontre o fator externo e interno que atua na formação da personalidade.
Existe também o caso de crianças que estudam em escolas de boa
qualidade pedagógica, com professores bem formados, espaço físico bom e
outros, mas que possuem uma aprendizagem insatisfatória. No trabalho clínico
e, diante de tantas controvérsias que acontece em consultórios ou hospitais, o
Psicopedagogo busca compreender o porquê da criança não aprender, mas o
que ele pode aprender e como acontece neste momento, o processo
diagnóstico, destacando a leitura da realidade daquela criança, para em
seguida, entrar com a intervenção ou o encaminhamento.
O trabalho clínico ocorre em dois momentos: a fase diagnóstica, com
testes para servir de pistas e a fase de intervenção, no início, o profissional
procura o sentido da problemática do aluno que lhe é encaminhada para, em
seguida, entrar com a intervenção, a partir daí, ele já tem dados sobre o
24indivíduo, o que lhe permite uma definição, de qual forma, seja mais correta,
para que possa conduzir trabalhos.
Para a Psicopedagogia Institucional, a dificuldade de aprendizagem pode
ser entendida como sintoma de uma dinâmica de relações entre o sujeito que
não-aprende e o meio familiar e social em que vive, onde esse não aprender
tem um significado. Mas muitas vezes este não aprender pode estar
relacionado à prática educativa. Uma prática educativa destituída de uma
relação teórico-prática.
Assim, atualmente ocorrem movimentos para que o psicopedagogo se
faça presente desde a educação infantil no sistema escolar, a fim de auxiliar o
corpo docente frente às questões do não aprender, conjuntamente com os
Orientadores e Supervisores da Escola (Bossa, 1994).
25CAPÍTULO IV – O DESENHO
Os primeiros estudos sobre a produção gráfica das crianças datam do
final do século passado e estão fundados nas concepções psicológicas e
estéticas de então (Greig, 2004).
Greig (2004) cita alguns autores para falar da criança e seu desenho.
Segundo ele, Luquet apontava os erros e imperfeições do desenho da criança
como inabilidade e falta de atenção, já Sully colocava que é uma arte
embrionária onde não se deve entrever nenhum senso verdadeiramente
artístico, mais simbolistas do que realistas em seus desenhos.
No final do século XIX os psicólogos descobrem a originalidade dos
desenhos infantis e publicam as primeiras notas e observações sobre o
assunto. Jean Piaget foi um grande estudioso e pesquisador sobre o
desenvolvimento cognitivo, ele não negou a existência e a importância de
outras funções o desenvolvimento humano, mas delimitou e especificou o
campo da sua investigação ao domínio da epistemologia genética.
Modo de expressão próprio da criança, o desenho constitui uma língua
que possui vocabulário e sua sintaxe. Percebe-se que a criança faz uma
relação próxima do desenho e a percepção pelo adulto. Ao prazer do gesto
associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar a sua marca. Os
primeiros rabiscos são quase sempre efetuados sobre livros e folhas
aparentemente estimados pelo adulto, possessão simbólica do universo adulto
tão estimado pela criança pequena.
Segundo Greig (2004), o desenho é a primeira manifestação da escrita
humana e continua sendo a primeira forma de expressão usada pala criança.
Círculos, garatujas, girinos, sóis, desenhos transparentes são as
representações de como a criança lê o mundo, enxerga a vida, expressa o que
sente. À medida que vai sendo alfabetizada, a escola se encarrega de afastar a
criança desta forma de expressão.
26O desenvolvimento progressivo do desenho implica mudanças
significativas que dizem respeito à passagem dos rabiscos iniciais da garatuja
para construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros
símbolos. Essa passagem é possível graças às interações da criança com o
ato de desenhar e com desenhos de outras pessoas. Na garatuja, a criança
tem como hipótese que o desenho é simplesmente uma ação sobre uma
superfície e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação
produziu.
No decorrer do tempo, as garatujas, transformam-se em formas definidas
que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a objetos
naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da
garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança desenvolve a
intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando com símbolos
muito simples, ela passa a articulá-los no espaço bidimensional do papel, na
areia, na parede ou em qualquer outra superfície. Passa também a constatar a
regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos
quais ela tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias
produções.
No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve
para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização,
a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de
representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de
que o desenho serve para imprimir o que se vê (Greig, 2004).
É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria individualmente
formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e
sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de
outras crianças e adultos.
27Segundo Retondo (2000), o desenho não constitui uma reprodução fiel da
realidade, é antes uma interpretação da realidade, uma maneira de ver as
coisas e de se colocar diante delas. Os desenhos representam um reflexo da
personalidade de seu autor e mostram mais sobre o artista do que sobre o
objeto retratado e, completa, “as atividades psicomotoras do sujeito ficam
gravadas no papel. O princípio básico para a interpretação dos mesmos é que
a folha de papel representa o ambiente e o desenho, o próprio sujeito” (p.16-7).
A linguagem do inconsciente é fundamentalmente imaginativa e simbólica
e, emerge com bastante facilidade por meio dos desenhos, tanto a linguagem
simbólica como o desenho alcança níveis primitivos da personalidade
acessando o mundo interno.
Segundo Campos (1969), a primeira menção do desenho como fenômeno
expressivo foi feito por Ricci em 1987, com o estudo de vários estágios da
evolução do desenho da figura humana. Os autores que se dedicam a
psicologia do desenho infantil tem por objetivos estudar diversos aspectos, por
exemplo: “fases do desenvolvimento, métodos do exame e medida da
inteligência, motricidade, traço e uso da mão, noção de espaço, função da
percepção visual, expressão, caráter, tipos, psicopatologia, etc.” (p.12).
É através do desenho que podemos valorizar todas as relações que se
determinam entra a totalidade psíquica da criança emocional e intelectual no
processo de maturação e seu meio social e cultural, envolvendo também a
educação sistemática a que se submeteu.
Para Campos (1969), a representação gráfica, assim como qualquer traço
expressivo da personalidade, tende a se integrar na direção de um gradual
processo de maturação psíquica.
Resumidamente, a autora coloca que o campo da interpretação do
desenho como técnica projetiva tem por base, entre outras, a experiência
clinica com os mecanismos de deslocamento e substituição, como também
com uma extensa gama de fenômenos patológicos, especialmente os sintomas
28de conversão, obsessões e compulsões, fobias e estados psicóticos, enfim
todos os que se tornam compreensíveis somente na estrutura conceitual do
simbolismo.
Segundo Greig (2004), é por volta dos dois anos de idade já são feitos os
primeiros rabiscos. A criança está livre das influências externas. Suas garatujas
são realizadas pelo puro prazer cinestésico, pela possibilidade de poder
registrar os movimentos. Aos poucos as linhas vão ficando mais controladas,
conforme a criança adquire um controle visual sobre elas. O pensamento deixa
de ser cinestésico para ser imaginativo quando a criança relacionar as
garatujas a elementos do seu meio. Essas são as primeiras manifestações de
suas experiências sensoriais, e é o desenvolvimento da base para a retenção
visual.
A partir dos quatro anos, surgem às primeiras experiências
representativas. Ainda que sejam ligadas às garatujas, não impedem a
identificação dos elementos que estão sendo representados. Nessa fase, o
desenho é a oportunidade da criança organizar suas experiências, convertendo
o pensamento em forma concreta. O importante não é o aspecto externo dos
desenhos, mas o processo total de criação. Não se deve estabelecer técnicas e
padrões.
Por volta dos sete anos, a criança está começando a estruturar seus
processos mentais de tal forma que pode começar a ver relações em seu
ambiente. Os desenhos são estruturais e esquematizados. As primeiras
experiências representativas decorrem, naturalmente, das garatujas infantis.
Entre os nove e doze anos, a criança deixa de lado a repetição dos
mesmos símbolos. Ela adquire auto-crítica e também consciência do ambiente
natural. Entre os doze e os quatorze anos, alguns jovens já têm o sentimento
de serem adultos, mas seus desenhos são apreciados como algo infantil. Isso
lhes causa um grande choque. Assim, a criança se torna muito crítica em
relação aos seus trabalhos, devido à pressão que ela sente para que ele se
conforme aos padrões adultos de comportamento. Isso pode sufocar seus
29impulsos criadores. A ânsia de crescer gera certa vergonha na criança em
relação aos seus desenhos. A criança não quer ser vista como criança, e sim
como adulto merecedor de respeito perante a sociedade.
Luquet (1969) distingue quatro estágios no desenvolvimento da criança
através do desenho:
1- Realismo fortuito: começa por volta dos 2 anos e põe fim ao período
chamado rabisco. A criança que começou por traçar signos sem desejo de
representação descobre por acaso uma analogia com um objeto e passa a
nomear seu desenho.
2- Realismo fracassado: Geralmente entre 3 e 4 anos tendo descoberto a
identidade forma-objeto, a criança procura reproduzir esta forma.
3- Realismo intelectual: estendendo-se dos 4 aos 10-12 anos, caracteriza-se
pelo fato que a criança desenha do objeto não aquilo que vê, mas aquilo que
sabe. Nesta fase ela mistura diversos pontos de vista ( perspectivas ).
4- Realismo visual: É geralmente por volta dos 12 anos, marcado pela
descoberta da perspectiva e a submissa às suas leis, daí um empobrecimento,
um enxugamento progressivo do grafismo que tende a se juntar as produções
adultas.
Podemos citar também Marthe Berson, que distingue três estágios do
rabisco:
1 - Estágio vegetativo motor: por volta dos 18 meses, o traçado e mais ou
menos arredondado, conexo ou alongado e o lápis não sai da folha formando
turbilhões.
2 - Estágio representativo: entre dois e 3 anos, caracteriza-se pelo
aparecimento de formas isoladas, a criança passa do traço continuo para o
traço descontinuo, pode haver comentário verbal do desenho.
303 - Estágio comunicativo: começa entre 3 e 4 anos, se traduz por uma
vontade de escrever e de comunicar-se com outros. Traçado em forma de
dentes de serra, que procura reproduzir a escrita dos adultos.
Em uma análise piagetiana (Piaget, 1948), temos:
1 - Garatuja: Faz parte da fase sensório motora ( 0 a 2 anos) e parte da fase
pré-operacional (2 a 7 anos). A criança demonstra extremo prazer nesta fase. A
figura humana é inexistente ou pode aparecer da maneira imaginária. A cor tem
um papel secundário, aparecendo o interesse pelo contraste, mas não há
intenção consciente. Pode ser dividida em:
• Desordenada: movimentos amplos e desordenados. Com relação a
expressão, vemos a imitação "eu imito, porém não represento". Ainda é um
exercício.
• Ordenada: movimentos longitudinais e circulares; coordenação viso-motora. A
figura humana pode aparecer de maneira imaginária, pois aqui existe a
exploração do traçado; interesse pelas formas (Diagrama).
A expressão é o jogo simbólico: "eu represento sozinho". O símbolo já
existe. Identificada: mudança de movimentos; formas irreconhecíveis com
significado; atribui nomes, conta histórias. A figura humana pode aparecer de
maneira imaginária, aparecem sóis, radiais e mandalas. A expressão também é
o jogo simbólico.
2 - Pré- Esquematismo: Dentro da fase pré-operatória, aparece a descoberta
da relação entre desenho, pensamento e realidade. Quanto ao espaço, os
desenhos são dispersos inicialmente, não relaciona entre si. Então aparecem
as primeiras relações espaciais, surgindo devido à vínculos emocionais. A
figura humana torna-se uma procura de um conceito que depende do seu
conhecimento ativo, inicia a mudança de símbolos. Quanto a utilização das
cores, pode usar, mas não há relação ainda com a realidade, dependerá do
31interesse emocional. Dentro da expressão, o jogo simbólico aparece como:
"nós representamos juntos".
3 - Esquematismo: Faz parte da fase das operações concretas (7 a 10 anos).
Esquemas representativos, afirmação de si mediante repetição flexível do
esquema; experiências novas são expressas pelo desvio do esquema. Quanto
ao espaço, é o primeiro conceito definido de espaço: linha de base. Já tem um
conceito definido quanto a figura humana, porém aparecem desvios do
esquema como: exagero, negligência, omissão ou mudança de símbolo. Aqui
existe a descoberta das relações quanto a cor; cor-objeto, podendo haver um
desvio do esquema de cor expressa por experiência emocional. Aparece na
expressão o jogo simbólico coletivo ou jogo dramático e a regra.
4 - Realismo: Também faz parte da fase das operações concretas, mas já no
final desta fase. Existe uma consciência maior do sexo e autocrítica
pronunciada. No espaço é descoberto o plano e a superposição. Abandona a
linha de base. Na figura humana aparece o abandono das linhas. As formas
geométricas aparecem. Maior rigidez e formalismo. Acentuação das roupas
diferenciando os sexos. Aqui acontece o abandono do esquema de cor, a
acentuação será de enfoque emocional. Tanto no Esquematismo como no
Realismo, o jogo simbólico é coletivo, jogo dramático e regras existiram.
5 - Pseudo Naturalismo: Estamos na fase das operações abstratas (10 anos
em diante). É o fim da arte como atividade espontânea. Inicia a investigação de
sua própria personalidade. Aparecem aqui dois tipos de tendência: visual
(realismo, objetividade); háptico (expressão subjetividade) No espaço já
apresenta a profundidade ou a preocupação com experiências emocionais
(espaço subjetivo). Na figura humana as características sexuais são
exageradas, presença das articulações e proporções. A consciência visual
(realismo) ou acentuação da expressão, também fazem parte deste período.
Uma maior conscientização no uso da cor, podendo ser objetiva ou subjetiva. A
expressão aparece como: "eu represento e você vê" Aqui estão presentes o
exercício, símbolo e a regra.
32E ainda alguns psicólogos e pedagogos, em uma linguagem mais
coloquial, utilizam as seguintes referencias:
• De 1 a 3 anos
É a idade das famosas garatujas: simples riscos ainda desprovidos de
controle motor, a criança ignora os limites do papel e mexa todo o corpo para
desenhar, avançando os traçados pelas paredes e chão. As primeiras garatujas
são linhas longitudinais que, com o tempo, vão se tornando circulares e, por
fim, se fecham em formas independentes, que ficam soltas na página. No final
dessa fase, é possível que surjam os primeiros indícios de figuras humanas,
como cabeças com olhos.
• De 3 a 4 anos
Já conquistou a forma e seus desenhos têm a intenção de reproduzir algo.
Ela também respeita melhor os limites do papel. Mas o grande salto é ser
capaz de desenhar um ser humano reconhecível, com pernas, braços, pescoço
e tronco.
• De 4 a 5 anos
É uma fase de temas clássicos do desenho infantil, como paisagens,
casinhas, flores, super-heróis, veículos e animais, varia no uso das cores,
buscando certo realismo. Suas figuras humanas já dispõem de novos detalhes,
como cabelos, pés e mãos, e a distribuição dos desenhos no papel obedece
certa lógica, do tipo céu no alto da folha. Aparece ainda a tendência à
antropomorfização, ou seja, a emprestar características humanas a elementos
da natureza, como o famoso sol com olhos e boca. Esta tendência deve se
estender até 7 ou 8 anos.
33• De 5 a 6 anos
Os desenhos sempre se baseiam em roteiros com começo, meio e fim. As
figuras humanas aparecem vestidas e a criança dá grande atenção a detalhes
como as cores. Os temas variam e o fato de não terem nada a ver com a vida
dela são um indício de desprendimento e capacidade de contar histórias sobre
o mundo.
• De 7 a 8 anos
O realismo é a marca desta fase, em que surge também a noção de
perspectiva. Ou seja, os desenhos da criança já dão uma impressão de
profundidade e distância. Extremamente exigentes, muitas deixam de
desenhar, se acham que seus trabalhos não ficam bonitos.
Como podemos perceber uma linha de evolução é similar mudando com
maior ênfase o enfoque em alguns aspectos. O importante é respeitar os ritmos
de cada criança e permitir que ela possa desenhar livremente, sem intervenção
direta, explorando diversos materiais, suportes e situações.
Para tentarmos entender melhor o universo infantil muitas vezes
buscamos interpretar os seus desenhos, devemos lembrar que a interpretação
de um desenho isolada do contexto em que foi elaborado não faz sentido.
34CONCLUSÃO
Em conclusão, podemos colocar que o estabelecimento de uma ligação
entre o desenvolvimento da criança, o desenho e a imensa diversidade do que
se pode analisar através dele é possível.
O desenho é um objeto de conhecimento podendo ser revelador. A
entrada do desenho na educação e no trabalho do psicopedagogo aumenta as
possibilidades de conhecer as dificuldades de aprendizagem, como também
podem auxiliar a descartar a existência das mesmas.
Não é possível ter certeza se a criança tem ou não distúrbios de
aprendizagem através dos desenhos, mas eles podem dar indícios, pois ele é
auxiliar nas avaliações psicopedagógicas. Os desenhos feitos partem de
estímulos direcionados ou não para uma avaliação.
Ao citar Bender, Campos (1969) coloca que ele pode verificar que certas
crianças, classificadas pelos professores como portadoras de certos traços
psicopatológicos, concluindo que crianças emocionalmente perturbadas não
desenham a figura humana na proporção de suas aptidões intelectuais.
Assim, nada melhor que um trabalho profundo na busca por possíveis
causas de um comportamento que esteja prejudicando a aprendizagem da
criança.
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Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
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de diagnóstico da personalidade. Petrópolis: Editora Vozes, 1969.
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aprendizagem? Disponível em: <http://www.educare.pt/BibliotecaDigitalPE/
Dificuldades_de_aprendizagem.pdf>. Acesso: 23 Mar 2009.
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MORAIS, Manuel Pamplona. Distúrbios da Aprendizagem: uma Abordagem
Psicopedagógica. 9 ed. São Paulo: Edicon, 1999.
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São Paulo: Edicon, 1999.
PIAGET, Jean. A formação dos símbolos na Infância. PUF, 1948.
RETONDO, Maria Florentina N. Godinho. Manual Prático de Avaliação do
HTP e familia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.