O CINEMA E AS NOVAS TECNOLOGIAS COMO … · cinema e das novas tecnologias pelos Povos indígenas...
Transcript of O CINEMA E AS NOVAS TECNOLOGIAS COMO … · cinema e das novas tecnologias pelos Povos indígenas...
O CINEMA E AS NOVAS TECNOLOGIAS COMO FERRAMENTA PARA LUTA
PELOS DIREITOS INDÍGENAS
Nataly Guimarães Foscaches1
RESUMO: Este artigo tem como objetivo promover a reflexão sobre como apropriação do
cinema e das novas tecnologias pelos Povos indígenas pode vir a favorecer a luta pela garantia
e conquista dos direitos indígenas a partir da experiência dos realizadores Kaiowá e Guarani
que atualmente integram a Associação Cultural dos Realizadores Indígenas (Ascuri). Com
esta finalidade, foi realizado o trabalho etnográfico nas terras indígenas sul-mato-grossenses,
Guyraroká (Caarapó), Panambizinho (Dourados) e Te’yikue (Caarapó), que resultou na
produção em parceria com a Ascuri do documentário “Jepea’yta- a lenha principal”, e
analisada a auto-representação indígena nos filmes “Guerreiro guarani”, “Kaiowá kunhatai”
rodados durante o projeto “Ava marandu- os guarani convidam” e “Te’yikue Mbarate Kaiowá
Guarani” produzido durante as oficinas de formação em cinema “Vídeo Índio Brasil”. Os
dados recopilados em campo aliados ao resultado do estudo da autoimagem Kaiowá e Guarani
em seus filmes sob a ótica antropológica indicam que a incorporação de ferramentas
elaboradas em outros contextos culturais por estes grupos étnicos está associada às novas
funções desempenhadas pelos jovens indígenas relacionadas ao domínio de conhecimentos
que procedem de contextos culturais diferentes, ou seja, indígena e não indígena, com
objetivo de elaborar estratégias de tradução de sua cultura e resistir aos ataques da elite rural e
do empresariado. Conclui-se que o cinema Kaiowá e Guarani e os demais produtos
informativos elaborados pelos realizadores indígenas possibilitam novas vias de acesso a sua
sabedoria ancestral, ao mesmo tempo em que criticam o modelo ocidental de representação,
provocam o abandono dos valores coloniais e etnocêntricos, promovem a reafirmação de sua
identidade por meio da evocação do seu capital étnico e instigam a recuperação de suas
praticas culturais mediante o fortalecimento dos vínculos intergeracionais.
Palavras-chave: Kaiowá Guarani, Empoderamento, Cinema, Novas Tecnologias, direitos
indígenas.
1 Autora: Doutora em Estudios Latinoamericanos/Ciências Sociais pela Universidad de Salamanca. E-mail:
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
2
1.INTRODUÇÃO
A escolha de Mato Grosso do Sul como palco da pesquisa se justifica devido a sua
realidade contraditória e pela trajetória histórica de resistência dos Povos Indígenas que vivem
nessa zona. Entre esses grupos étnicos, o enfoque dado aos Kaiowá e Guarani se fundamenta
na conquista de espaços de poder, principalmente nos âmbitos político e acadêmico por estes
coletivos, motivada pela baixa qualidade de vida nas terras indígenas (T.I) compreendidas
como cenários de fronteira (HALL,2003). Nestes espaços, estes grupos adaptam seu modo de
vida e organização ao modelo ocidental imposto pela sociedade não indígena por meio da
apropriação das culturas nacionais e globais, criando desta forma produtos híbridos
(CANCLINI,2001) que permitem a essas sociedades sobreviver dignamente à diáspora
promovida pela invasão dos seus territórios tradicionais.
Para complementar a justificativa de seleção do tema, citaremos alguns dados
relevantes:
1º. Mato Grosso do Sul caracteriza-se por ser o segundo estado com maior população
indígena do país, ficando atrás somente do Amazonas. De um total de 2.449.341 habitantes
sul-mato-grossenses, 67.574 indivíduos representantes das etnias Kaiowá e Guarani,
Kadiwéu, Kiniquinau, Atikum, Guató, Ofayé e Terena vivem em uma das 75 terras indígenas
dispersas em 29 cidades.
2º. Além desta característica populacional, Mato Grosso do Sul também se destaca pela
economia baseada no agronegócio. Os territórios antes ocupados pelos Kaiowá e Guarani para
reproduzir sua cultura, atualmente são utilizados para criação de gado e para o cultivo de soja
e cana de açúcar. Enquanto 21 milhões de cabeças de gado ocupam mais de 20 milhões de
hectares que correspondem de 3 a 5 hectares por vaca, aproximadamente 46 mil Kaiowá e
Guarani habitam somente 35 mil hectares de terras que representam menos de um hectare por
indígena (CIMI,2015).
O confinamento das famílias Kaiowá e Guarani em pequenas extensões de terra e a
desmatamento das terras indígenas impossibilitou a prática de suas atividades de subsistência
(caça, pesca e colheita) e o cultivo agrícola nestes territórios, o que a sua vez, repercutiu na
saúde física e mental destas populações. Segundo o Relatório da Fundação Nacional de
Saúde, publicado em 2003, 27,5% das crianças indígenas entre zero e cinco anos sofrem de
desnutrição severa (PELLEGRINI,2015). Estes dados levaram o líder Kaiowá, Anastácio
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
3
Peralta, afirmar que em Mato Grosso do Sul “o boi tem mais valor que uma criança guarani”
(INSTITUTO HUMANITAS UNISINOS,2011).
Por outro lado, a elite rural, ignorando ostentosamente estes dados e apelando ao
discurso do progresso econômico em favor da região e do país, a produção de alimentos para
manter as famílias brasileiras e a erradicação da fome, manipula os brasileiros para se
posicionar contra os direitos indígenas. No entanto, o crescimento do setor não evitou a crise
econômica instalada no Brasil, e ao contrario das afirmações dos defensores do agrobusiness,
é a agricultura familiar e não agricultura a grande escala a responsável por alimentar 70% dos
brasileiros (FACHIN;COSTA,2015).
Além de provocar a destruição do meio ambiente, este modelo de crescimento
econômico oferecido pela elite rural tampouco favoreceu uma maior igualdade social na
região. Em Mato Grosso do Sul, 100 mil pessoas, ou seja, 4,9% da população encontram-se
abaixo do limiar da pobreza.
3º. Este estado também é considerado o mais anti-indígena do Brasil. Segundo o último
relatório sobre violência contra os Povos Indígenas no Brasil publicado pelo Conselho
Indigenista Missionário (CIMI,2014), foram registrados 138 mortes de indígenas por
assassinatos em sua maioria motivadas por conflitos agrários entre autóctones e fazendeiros.
Deste total, 41 assassinatos foram cometidos em Mato Grosso do Sul, ou seja, 29% dos casos.
A faixa etária com maior incidência de vitimas nesta região é de 20 a 29 anos (32%). Também
é alarmante o número de assassinatos de crianças e adolescentes na faixa etária de 10 a 14
anos (12% dos casos) (CIMI, 2014).
Além da morte por assassinato, o alto índice de suicídio entre os jovens Kaiowá e
Guarani se transformou em um problema extremadamente preocupante. Entre 2000 e 2014
foram registrados 707 suicídios na faixa etária de 15 a 19 anos (CIMI,2014). Este fenômeno é
um problema que afeta a toda sociedade Kaiowá e Guarani, já que os indígenas que vivem em
zonas rurais e terras indígenas na região centro-oeste são predominantemente jovens: em
93,6% das TI’s, 50% da população não excede 24 anos, enquanto a maioria dos anciãos não
chegam aos 50 (IBGE,2010).
4º. Frente ao cenário de extrema violência, os Kaiowá e Guarani junto a outros povos
indígenas de Mato Grosso do Sul, desenvolveram estratégias para resistir às ameaças do setor
rural. Dentro desse contexto, as táticas levadas a cabo por esses grupos étnicos para recuperar
seus territórios de ocupação tradicional se produz por meio de uma ocupação forçada das
terras reivindicadas com o objetivo de pressionar o Governo brasileiro para que reconheça seu
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
4
direito aos seus territórios de origem; mediante a formação nas escolas indígenas
diferenciadas; por meio do acesso á universidade e mais recentemente, mediante a
apropriação de outros instrumentos criados em outros contextos culturais como é o caso do
cinema e das novas tecnologias.
Atualmente, mais de 800 indígenas cursam o ensino superior. Deste total, 270 são
professores Kaiowá e Guarani matriculados na Faculdade Intercultural Indígena (Faind) na
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Como consequência do empoderamento
da educação ocidental, jovens Kaiowá e Guarani e Terena autodenominados como
realizadores indígenas e que hoje integram a Associação Cultural dos Realizadores Indígenas
(Ascuri) deram início ao processo de apropriação do cinema e das Novas Tecnologias.
Frente a esse contexto, o objetivo desta pesquisa é refletir sobre como a apropriação
do cinema e das novas tecnologias pelos Povos indígenas pode vir a favorecer a luta pela
garantia e conquista dos direitos indígenas a partir da experiência da Ascuri. Para isso, iremos
apresentar parte da etnografia realizada em 2011 nas Terras Indígenas (T.I’s): Guyraroká e
Te’Yikue, no município de Caarapó e Panambizinho, no município de Dourados, todas em
Mato Grosso do Sul. Este trabalho fez parte do projeto “Cine documentário indígena:
construções, reflexões e protagonismo” desenvolvido em parceria com o realizador terena,
designer e representante da Ascuri, Gilmar Galache.
Tal projeto resultou na produção do documentário “Jepea’yta, a lenha principal”, o
qual traz à tona a discussão sobre as experiências de aprendizagem e apropriação do cinema e
das novas tecnologias pelos realizadores indígenas de Mato Grosso do Sul. As frustações dos
projetos de promoção cultural, “Vídeo Índio Brasil” e “ Ava Marandu- Os Guarani convidam”
consistem na falta de continuidade no processo de empoderamento das ferramentas de
comunicação ocidentais.
A escolha por essas Terras Indígenas Kaiowá e Guarani se justifica pelos seguintes
motivos: a aldeia Te’Yikue ou T.I Caarapó, por tratar-se de uma reserva indígena considerada
um exemplo para as outras comunidades devido aos exitosos projetos desenvolvidos em
colaboração com o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre os Povos Indígenas (Neppi) da
Universidade Católica Dom Bosco (UCDB); a T.I Panambizinho pelo seu histórico de
resistência por meio da manutenção das tradições e a T.I Guyraroká por tratar-se da realidade
de um acampamento indígena.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
5
Posteriormente, foram analisados os filmes “Guerreiro Guarani” rodado na T.I
Guyraroká, “Kaiowá Kunhatai2” produzida na T.I Panambizinho durante o projeto “Ava
Marandu- Os Guarani convidam” e “Te’Yikue Mbarate Kaiowá Guaraní3 ” realizada na T.I
Caarapó durante a oficina de formação em cinema promovida pela iniciativa “Vídeo Índio
Brasil”.
2. Apropriação do cinema e das novas tecnologias em favor do empoderamento dos
Kaiowá e Guarani
A demanda dos Kaiowá e Guarani por se apropriar do cinema e das novas
tecnologias nasce da reflexão sobre sua representação estereotipada difundida pela grande
imprensa brasileira a serviço da elite do agronegócio.
Entre as estratégias de boicote colocadas em prática pelos grupos dominantes para
impedir a efetivação dos direitos indígenas reconhecidos por lei legitimadas pela imprensa,
podemos destacar o discurso desinformado caracterizado pela superficialidade antropológica e
histórica que ressalta os preconceitos contra a sociedade indígena historicamente excluída; o
interesse quase exclusivo pela denuncia imediata, sem considerar os motivos geradores e
reflexões complexas, principalmente no que se refere à diferença, a invisibilidade dos
indígenas nas notícias, e a omissão em relação à busca e averiguação das fontes já que os
jornalistas que trabalham nos grandes meios de comunicação se restringem a entrevistar as
fontes oficiais (fazendeiros, empresários, instituições governamentais, como a Fundação
Nacional do Índio-FUNAI) e desconsideram o ponto de vista indígena.
Frente a essa realidade, não só os meios de comunicação de massa propiciam a
formação de uma autoimagem negativa (NOVAES,1993) por parte das populações
autóctones, também o cinema e a própria antropologia. De acordo com Ruby (1995), tanto os
filmes como a escritura etnográfica surgiram dos afanes da sociedade ocidental de conhecer e
submeter outros sistemas culturais por meio do seu domínio simbólico. Em geral, estas
representações, principalmente no cinema, baseiam-se na figura simbólica do indígena
“selvagem”, “bárbaro”, “romântico”, entre outras características pejorativas.
No entanto, ainda que no início a antropologia tenha favorecido a dominação
simbólica dos grupos considerados “subalternos”, com o passar do tempo, as técnicas de
2 Em português: Senhorita Kaiowá
3 Em português: Te’Yikue, a força Kaiowá e Guarani
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
6
representação dos sistemas culturais foram evoluindo. De acordo com Ardèvol (1998),
inicialmente, os antropólogos utilizavam técnicas cinematográficas com a única finalidade de
registrar o movimento corporal e o comportamento dos grupos sociais estudados. Somente
depois da produção do filme Childhood rivalry in Bali and New Guinea (entre 1940-1951)
por Margaret Mead e George Bateson e a obra escrita Balinese Character: A photografic
Analisys (1942) houve um avanço qualitativo no uso destes recursos em pesquisas
antropológicas.
A partir dessa mudança de perspectiva, no âmbito antropológico iniciou-se uma
reflexão sobre o uso do recurso audiovisual como modo de representação, técnica de
investigação e forma de comunicar o trabalho etnográfico e os resultados da pesquisa
(ARDÈVOL,1998).
O descobrimento dos benefícios da apropriação dos recursos audiovisuais por essa
ciência motivou a alguns antropólogos a utilizar a câmera para registrar seu trabalho
de campo de acordo com a estratégia de filmagem do gênero documentário. No
entanto, ainda que o documentário compartilhe o mesmo objeto de estudo com a
antropologia, esse gênero cinematográfico tem seu próprio referencial teórico e
método exclusivo de retratar a realidade social que não necessariamente está
relacionado com esta disciplina (ARDÈVOL,1996, p.128, tradução nossa).
Segundo explica Ardèvol (1996) dentro do gênero documentário desenvolveu-se o
cinema etnográfico orientado a televisão e ao âmbito universitário. Esta vertente
cinematográfica produzida por cineastas e produtores de televisão e antropólogos tem como
objetivo a divulgação com fins pedagógicos de outras culturas, com base em uma perspectiva
holística a partir da descrição dos aspectos relevantes da vida de diferentes sistemas culturais.
Diferente do cinema de pesquisa e de documentação etnológica baseados em
estratégias de caráter descritivo, o cinema etnográfico tem como função comunicar e
fazer o espectador experimentar outras formas de entender as relações humanas e a
natureza. No entanto, o problema metodológico apresentado por este tipo de
produção é como elaborar uma representação da realidade cultural acessível ao
entendimento do espectador (Ardèvol,1996, p.128, tradução nossa).
Além dessas características, o cinema etnográfico também é determinado pela
gravação dos fatos de forma direta e natural sem ajuda de atores, no sentido teatral do termo;
pela ausência da intervenção do produtor, e por uma sutil edição. Para os produtores deste
gênero cinematográfico, o uso destes critérios evita alterações na realidade, conforme explica
Lisón Arcal (1999).
No entanto, a meta de retratar a realidade como ela se apresenta é dificilmente
alcançável. Isso é assim porque a composição seletiva das tomadas, as cenas atuadas, a edição
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
7
para conseguir um efeito de continuidade e a utilização de efeitos e sons especiais gravados
em outro contexto alteram a exatidão e a veracidade dos fatos (HEIDER,1995).
Conforme explica Rebollo (1998), o termo realidade relacionado com os produtos
audiovisuais é um tema polemico que permanece em discussão no âmbito da antropologia
visual, já que o uso cada vez mais frequente dos recursos cinematográficos e das novas
tecnologias promoveu o surgimento de uma realidade virtual.
Do mesmo modo que para os antropólogos ocidentais, a virtualidade da realidade
também gera incertezas para as sociedades indígenas. Para os Kaiowá e Guarani, na maioria
das vezes a representação da sua cultura no cinema criada por não índios fomenta o
sentimento de angustia e confusão, pois para eles a imagem fílmica está associada ao seu dia a
dia. Entre os filmes produzidos sobre a realidade indígena de Mato Grosso do Sul destaca-se o
polêmico filme Terra Vermelha (2008) com direção do ítalo-chileno, Marcos Bechis,
protagonizado por autóctones das terras indígenas, Guyraroká e Panambizinho. O filme retrata
o conflito entre um grupo Kaiowá e Guarani e um fazendeiro enquanto sua esposa guia a
grupos de turistas interessados na flora e fauna da região e nos índios nativos.
Apesar das críticas de difamação, Terra Vermelha promoveu uma percepção mais
consciente de parte dos Kaiowá e Guarani sobre sua representação no cinema. Essa percepção
vem sendo motivada por uma serie de reflexões e questionamentos promovida pela formação
escolar e acadêmica e agora com a experiência de apropriação do cinema e das novas
tecnologias.
Quanto à experiência de apropriação do cinema e das novas tecnologias pelas
sociedades Kaiowá e Guarani, constatou-se que os primeiros passos nesta direção foram
dados durante o Governo de Luíz Inácio Lula da Silva (2003-2011) por meio do
financiamento dos projetos, Ponto de Cultura Tekoarandu, Vídeo Índio Brasil (VIB) e Ava
Marandu- Os Guarani convidam.
Ponto de Cultura Tekoarandu
Os Pontos de Cultura integram a iniciativa mais importante do Ministério da Cultura
(MinC), o Programa Nacional de Cultura, Educação e Cidadania, Cultura Viva. O programa
Cultura Viva favorece a promoção da descentralização das políticas culturais em termos
territoriais e temáticos. Por meio dos Pontos de Cultura, o MinC começou a atender as regiões
brasileiras que no passado não foram beneficiadas por esta instituição (REIS,2013).
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
8
Entre os Pontos de Cultura destacam-se os Pontos de Cultura Indígenas. Desde sua
implementação, organizações indígenas e indigenistas apresentam-se aos editais. Entre 2005 e
2007, o MinC estabeleceu um convenio com 23 Pontos de Culturas Indígenas e em 2010, 30
Pontos foram inaugurados em terras indígenas no Acre, Amazonas e Rondônia.
Entre estas inciativas, neste trabalho analisarei o caso do projeto do Ponto de Cultura
Tekoarandu (T.I Caarapó, Mato Grosso do Sul) que iniciou-se com a apresentação ao edital
em 2005. No entanto, o projeto somente entrou em vigor três anos depois, em fevereiro de
2008, quando os idealizadores desta ação receberam o dinheiro do Governo Federal brasileiro.
O Ponto de Cultura Tekoarandu tem como objetivo principal o levantamento,
digitalização, catalogação, produção, analise e divulgação da cultura e historia dos Kaiowá e
Guarani em Mato Grosso do Sul a partir da criação de uma rede digital de informação entre os
Pontos de Cultura. Este trabalho é realizado na sala de informática da Escola Ñandejara Polo
onde a comunidade tem acesso às câmeras fotográficas, filmadoras e internet.
Vídeo Índio Brasil
Quanto à realização do Vídeo Índio Brasil, o surgimento desse projeto se deu devido
à urgência em visibilizar a cultura indígena brasileira, em especial a cultura indígena sul-
mato-grossense, por meio da produção audiovisual em favor da inclusão social dos Povos
Indígenas. O objetivo principal desta iniciativa foi divulgar a representação e auto-
representação dos Povos Indígenas no cinema e na imprensa. Em total, foram realizadas cinco
edições.
Em 2009 e 2010 foram realizadas duas oficinas de formação em cinema, orientadas a
jovens autóctones e ministradas por cineastas indígenas e não indígenas que trabalham com
temáticas relacionadas aos Povos Indígenas. No total, foram realizadas 144 horas de curso. O
plano de estudos incluía temas como enquadramento, elaboração de roteiro, produção, edição,
montagem, fotografia, som, roteiro, capacitação de recursos e elaboração de projetos
audiovisuais.
Embora o evento tenha repercutido bem, a edição de 2011 limitou-se a exibir os
filmes produzidos pelos participantes nas edições anteriores e durante o projeto Ava Marandu.
Em 2014, o evento foi realizado no cinema Cine Cultura de Brasília onde foram exibidos
filmes sobre a temática indígena de forma mais geral.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
9
Ava Marandu- Os Guarani convidam
Em relação ao “Ava Marandu- Os Guarani convidam” foi um projeto cultural que
consistia em uma série de atividades orientadas a reflexão sobre direitos do Povo Guarani.
Esta ação teve início no dia 01 de janeiro e terminou no dia 30 de janeiro de 2010 e contou
com 15 mil participantes diretos e 60 mil participantes indiretos.
O objetivo do projeto foi sensibilizar a população em geral para as graves violações
dos direitos dos povos Kaiowá e Guarani de Mato Grosso do Sul, além de promover a
reflexão sobre o confinamento social e cultural ao qual estão submetidos estes grupos étnicos
por meio da valorização cultural a partir de ações orientadas ao fortalecimento da autoestima
principalmente dos jovens autóctones.
Essa iniciativa incluía a realização de oficinas de cinema e fotografia nas TI’s,
concursos sobre cultura e direitos humanos, publicação da Cartilha sobre a Declaração das
Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, ações culturais nas escolas, mostras,
exposições, manifestações e shows de artistas em prol da cultura e dos direitos do Povo
Guarani. Foram realizadas 12 oficinas de cinema e fotografia nas terras indígenas de MS
durante o período de fevereiro a abril de 2010. Os líderes indígenas que participam da Aty
Guasu4 foram os responsáveis pela seleção das T.I’s contempladas pelo projeto.
Ao total, sete aldeias foram beneficiadas: Guyraroká, Te’Yikue (Caarapó/MS),
Panambizinho, Jaguapiru (Dourados/MS), Yvy Katu (Japorã/MS), Amambai (Amambai/MS)
y Jaguapire (Tacuru/MS). Posteriormente, os filmes e as fotos produzidas pelos jovens
Kaiowá e Guarani durante o curso foram apresentadas na feira cultural realizada no dia 15 de
maio do mesmo ano.
3. Experimentos com cinema e novas tecnologias em Terras Indígenas
Esse é o ponto central do texto, em que tratamos das experiências relacionadas à
incorporação do cinema e das novas tecnologias pelos jovens Kaiowá e Guarani de
Guyraroká, Panambizinho e Te’yikue, na tentativa de se apropriarem dessa linguagem, para
consumo interno e, sobretudo, para favorecer a disseminação de outras narrativas sobre a
realidade indígena no Mato Grosso do Sul. 4 Tradução: Grande reunião. Este encontro tem como um dos seus objetivos principais reunir líderes de
diferentes TI’s com a finalidade de discutir temas como saúde, segurança pública e principalmente questões
relacionadas com a recuperação dos territórios de ocupação tradicional indígena.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
10
A maioria dos jovens da T.I Guyraroká deu início a sua trajetória no mundo
audiovisual durante o projeto “Vídeo Índio Brasil” e posteriormente no “Ava Marandu- Os
guarani convidam”. Entre os filmes produzidos e destacados pelos jovens de Guyraroká estão:
“Ipuné Kopenoty Terenoe”, “Guerreiro Guarani”, “Chamiri Jhega”, “Kagui”, “Jerosy Pukú-
cerimonia do milho branco”, “Kunumy pepy- furação do lábio” e “Kaiowá Kunhatai- mulher
Kaiowá”. É importante destacar que todos os filmes foram produzidos por grupos de até 12
pessoas durante os cursos de formação em cinema. Por esse motivo não é possível atribuir o
direito de autoria individual sobre as obras produzidas, pois são de caráter coletivo.
Já em Panambizinho a experiência que despertou o interesse desse coletivo,
especialmente de José5 22 anos, João, 18 anos, foi a participação no filme “Terra Vermelha”.
Ambos realizadores foram descobertos pela equipe “RAI cinema” (produtora italiana de Terra
Vermelha) responsável por selecionar jovens indígenas para atuar na produção. Neste período
o único conhecimento que José e João tinham, era como espectador. Devido ao êxito do filme,
os realizadores viajaram à Itália, França, Alemanha e outros países para participar de eventos
internacionais como o Festival de Cannes (França). No entanto, depois de vestirem-se de gala
e chamar atenção para a situação dramática dos Kaiowá e Guarani de Mato Grosso do Sul,
José e João voltaram à dura realidade de Panambizinho.
Posteriormente, esses realizadores tiveram outras oportunidades para se
aprofundarem no estudo sobre o cinema por meio dos projetos Vídeo Índio Brasil e Ava
Marandu, assim como o casal de realizadores: o professor Kaiowá, Pedro, 26 anos, e a
estudante e representante das mulheres na Ascuri, Maria, 20 anos.
Em Panambizinho, foram produzidos os filmes: “Jerosy Pukú- cerimônia do milho
branco”, “Kaiowá Kunhatai”, “Kagui”, “Te’Yikue Teko Mbarate Guarani Kaiowá” e
“Kunumy Pepy- furação de lábio”.
Diferente das experiências das outras T.I’s estudadas, na aldeia Te’Yikue as
ferramentas comunicacionais ocidentais há alguns anos já fazem parte do cotidiano dos
estudantes e dos professores da escola indígena Ñandejara Polo devido a existência do
projeto Teko Arandu.
É importante ressaltar que a infraestrutura e a organização da reserva favorece a
realização de projetos entre não indígenas e a comunidade. Historicamente, nem sempre estas
iniciativas de projetos e políticas para os índios trouxeram benefícios para estas sociedades;
5 Os nomes dos sujeitos entrevistados foram substituídos por nomes fictícios, a fim de preservar suas
identidades.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
11
durante muito tempo o Governo brasileiro utilizou-se dessa estratégia para manipular os
Kaiowá e Guarani a se submeterem às piores condições de vida dentro das reservas ou
“chiqueiros” como são denominados estes espaços pelos autóctones.
O site do Tekoarandu e twitter são mantidos por professores e estudantes da
comunidade, entre eles: o técnico Kaiowá e realizador, Ronaldo e os estagiários, Caio, 17
anos e Roberto, 18 anos. Atualmente, o trabalho destes jovens consiste em publicar notícias e
atualizar a web além de auxiliar outros estudantes a utilizar as ferramentas disponíveis pelo
projeto. Além de fazerem uso destas novas tecnologias, os realizadores da Te’Yikue também
produziram os vídeos: Kagui, Porahéi, Te’Yikue Teko Mbarate Guarani Kaiowá, Porahéi e O
difusor da sua cultura.
3.2 O Cinema e as novas tecnologias: novas “armas” na luta dos Kaiowá e Guarani
Antes da chegada dos projetos nas T.I’s, a necessidade do uso das ferramentas de
comunicação ocidentais para fazer valer os direitos do Povo Guarani já era destacada pelos
autóctones, entre eles os habitantes de Guyraroká. Em uma das entrevistas, a Kaiowá Amélia,
21 anos, comentou que durante uma Aty Guasu foi distribuído entre os participantes um
documento com o título “Diretriz sobre os direitos dos Povos Indígenas”, segundo ela:
Esse papel explica tudo assim, diz que tem que ter uma câmara fotográfica, pode ser
celular que tenha câmara assim, tem que ter mesmo porque se acontecer alguma
coisa tem que gravar, tem que tirar foto, tem que colocar no papel que veio, tem que
dar, mostrar como é, se foi acidente, se caiu de bêbado porque assim a pessoa tem
prova de como foi, ai o pessoal (as organizações públicas) que for ajudar, poderia
ajudar (informação verbal)6.
O discurso de Amélia reflete a primeira etapa do processo de apropriação do
audiovisual e das Novas Tecnologias pelos Kaiowá e Guarani de Guyraroká, marcada pelas
denúncias de violência física e psicológica fruto dos conflitos com os grandes proprietários de
terra, que com o apoio dos meios de comunicação de massa de Mato Grosso do Sul fomentam
o racismo contra a população indígena.
A imprensa, por intermédio dos meios de comunicação, constrói um discurso
ideológico sobre os fatos que acontecem nas terras indígenas. Da mesma maneira, os jovens
6 Informação fornecida por Amélia durante o trabalho de campo realizado na T.I Guyraroká, em Caarapó, em
2011.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
12
de Guyraroká pretendem denunciar a violação dos seus direitos utilizando-se das ferramentas
de comunicação ocidentais.
É importante destacar que devido à situação de descaso do governo brasileiro em
relação aos Povos Indígenas, em particular nos casos de retomada de território, a própria
pesquisa em Guyraroká significou uma oportunidade para dar visibilidade às suas denúncias.
Já na aldeia Te’Yikue podemos constatar que aos poucos e com mais frequência,
estas ferramentas começam a ser utilizadas para denúncia da violação dos direitos indígenas.
Caio relata sua primeira produção sobre uma manifestação em solidariedade a outros Kaiowá
e Guarani ameaçados por não indígenas durante o processo de retomada de um tekoha7:
Comecei a usar (a câmera) quando teve um manifesto lá na aldeia. Um pequeno
manifesto que tinha na aldeinha, estava recebendo ameaça (...) também participaram
os rezadores, nós estivemos lá registrando tudo também. Estava sendo ocupado,
estava (indígenas que reivindicam seu tekoha) tendo problemas e tiveram que
chamar este pessoal da outra aldeia para poder participar lá (informação verbal)8.
Caio chama a atenção para a estratégia de retomada dos territórios tradicionalmente
ocupados pelos indígenas. Além das orações dos rezadores que guiam as famílias Kaiowá e
Guarani durante o processo de reocupação de suas terras, as sociedades Kaiowá e Guarani
vislumbram agora o surgimento de novos atores: jovens munidos com câmeras fotográficas e
filmadoras que registram todo o processo e dão voz a suas comunidades.
A partir dessa perspectiva é importante destacar o caso da retomada do Tekoha Pindo
Roky. Em fevereiro de 2013, o jovem Kaiowá, residente na Reserva de Caarapó, Denilson
Barbosa, 15 anos, foi assassinado com um tiro na cabeça no Tekoha Pindo Rocky onde hoje
está localizada a fazenda de Orlandino Gonçalvez Carneiro. O jovem e outros indígenas
estavam indo pescar quando foram abordados por três capangas contratados pelo proprietário,
quando ocorreu a agressão.
Depois do enterro de Denilson, cerca de 200 famílias acamparam no local com o
objetivo de protestar contra o assassinato e retomar o território tradicional reivindicado.
Durante este período foi criado o perfil no facebook denominado Tekoha Pindo Roky e a
7 De acordo com o site do Instituto Socioambiental [ISA] (s.d.) “ O tekoha é o lugar físico-terra, mato, campo,
águas, animais, plantas, remédios etc., onde se realiza o teko, o modo de ser, o estado de vida guarani. Engloba a
efetivação das relações sociais de grupos macro familiares que vivem e se relacionam em um espaço físico
determinado. Idealmente este espaço deve incluir, necessariamente, o ka’aguy (mato), elemento apreciado e de
grande importância na vida desses indígenas como fonte para coleta de alimentos, matéria-prima para construção
de casas, produção de utensílios, lenha para fogo, remédios, etc”. 8 Informação fornecida por Caio durante o trabalho de campo realizado na T.I Te’Yikue, em Caarapó, em 2011.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
13
Ascuri produziu um vídeo chamando a atenção para a luta dos Kaiowá e Guarani da
Te’Yikue.
Segundo explicou Ronaldo, além da produção de conteúdo informativo visual e
escrito com denúncias e expressões culturais Kaiowá e Guarani, outra atividade que integra o
Teko Arandu é a coleta de informações sobre os conflitos entre índios e proprietário rurais,
durante o processo de retomada dos territórios de ocupação tradicional indígena. A finalidade
desse trabalho é dar visibilidade a essa realidade omitida pelos grandes meios de comunicação
de massa e também fortalecer o movimento indígena por meio da participação em uma rede
de informação digital entre sociedades indígenas:
Nós estamos tentando melhorar, sempre buscando novas alternativas de buscar
parceria com os velhos, com jovens, com escola. Nós estamos tentando coletar mais
informações sobre os conflitos, uma realidade muito difícil que não está sendo
visualizada pela política pública. Acho que o objetivo do Ponto de Cultura é
exatamente isso, ser um ponto de intercâmbio entre aldeias (informação verbal)9.
Também é importante destacar que embora o movimento audiovisual indígena ainda
não esteja totalmente estabelecido já gera temor no setor rural. De acordo com Gilmar, é
comum a coação e intimidação de parte dos produtores rurais aos realizadores indígenas
durante a produção de filmes que favorecem a perspectiva de suas comunidades.
Por essa razão a associação tem cautela no momento de divulgar notícias sobre
questões territoriais para não expor os representantes indígenas a situações perigosas.
3.3 Empoderamento audiovisual e das TIC a favor do ponto de vista indígena
A situação de violência na qual vivem essas comunidades e as ações de denúncias
que fazem, acompanham o desejo de transformar os estereótipos sobre os indígenas em uma
imagem real e mais favorável, conforme explicou Ambrósio:
Vai acontecer como aconteceu lá atrás (no passado), o índio é bandido é aquilo.
Toda a vida o índio sempre leva a pior parte. Acontece qualquer coisa joga nas
costas do índio. Nós temos que preparar os jovens dessa forma porque os meninos e
as meninas estão pensando em um futuro para ter uma história e uma vitória
(informação verbal)10
.
9 Informação fornecida por Ronaldo durante o trabalho de campo realizado na T.I Te’Yikue, em Caarapó, em
2011 10
Informação fornecida por Ambrósio durante o trabalho de campo realizado na T.I Guyraroká, em Caarapó, em
2011.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
14
Ana complementa a ideia do seu pai colocando ênfase na urgência em dar
visibilidade ao cotidiano de sua comunidade no âmbito exterior:
Quero mostrar mais a cultura, mostrar toda a aldeia, como é a reza, como é o
guaxiré11
, como é a caça, a pesca e o mais importante para nós: quando nosso pai vai
atrás de alguma coisa para gente comer quando não tem o que comer. Ele vai no
mato e caça para nós comer com mandioca ou farinha (informação verbal)12
.
É interessante observar como essa indígena busca ressaltar os valores da sua cultura,
relatando como exemplo práticas tradicionais, de caça e pesca para a sobrevivência. Nessa
mesma linha, Ronaldo, da aldeia Te’Yikue, enquanto apresentava o site do Teko Arandu,
comentou que o elemento inovador do projeto é o uso da web para valorizar a cultura
indígena dentro e fora de sua comunidade:
Nós temos um site que é o Teko arandu e objetivo desse site seria exatamente
trabalhar com esta sociedade para fora, para conhecer melhor os Povos Indígenas e
ver como é a realidade, as coisas que a aldeia oferece. As pessoas acessam a galeria
de imagem, galeria de vídeo, as redes sociais também, twitter. Estas redes também
trabalham com os Guarani e Kaiowá, o pessoal do nordeste, do norte (informação
verbal)13
.
Para o professor Kaiowá e realizador, Paulo, o processo de empoderamento das
novas tecnologias e audiovisual pelos Povos Indígenas deve consistir em um processo que
tenha como objetivo mudar as relações entre indígenas e sociedade não indígena a partir do
fortalecimento cultural e da autonomia das comunidades:
Nós precisamos construir um olhar desde dentro da comunidade, da luta, toda
questão indígena. Por exemplo, a questão da terra, da cultura, da língua, crença,
realidade, as dificuldades e expressar isso de dentro para fora para que toda a
sociedade perceba que o que a mídia fala sobre o índio não é bem assim. A formação
não se resume em conhecer somente a tecnologia. Devemos compreender o conceito
de mídia de forma geral e expressar através dela os nossos conhecimentos, a nossa
lógica de pensar, para que a sociedade compreenda que não é só negativa a nossa
realidade, existe coisa positiva (informação verbal)14
.
Nessa fala o professor Paulo deixa patente o que se pretende, ao se apropriarem das
novas tecnologias de audiovisual: mostrar os valores da história e cultura indígena.
11
Gênero de canto e dança Kaiowá e Guarani. Embora faça parte do sistema xamanístico, o guaxiré reflete um
momento de jogo e relaxamento (Mota e Mezacasa, 2012:2). 12
Informação fornecida por Ana durante o trabalho de campo realizado na T.I Guyraroká, em Caarapó, em 2011. 13
Informação fornecida por Ronaldo durante o trabalho de campo realizado na T.I Te’Yikue, em Caarapó, em
2011. 14
Informação fornecida por Maria durante o trabalho de campo realizado na T.I Te’Yikue, em Caarapó, em
2011.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
15
3.4 Protagonismo jovem por meio do empoderamento do vídeo e das TIC
Uma das formas mais recorrentes de aquisição de conhecimento indígena tradicional
se dá por meio da transmissão de saberes de geração em geração através da oralidade. Porém,
a falta de estabilidade da estrutura social Kaiowá e Guarani, a tensão permanente entre
indígenas e não indígenas e determinadas características demográficas dificultam este
processo de aprendizagem, que chamamos de “pedagogia indígena”.
Atualmente, a juventude Kaiowá e Guarani enfrenta muitos problemas os quais
minam sua perspectiva de vida: os altos índices de suicídios, obstáculos à promoção de sua
identidade étnica, falta de valorização de sua cultura, conflitos interculturais, dificuldade de
acesso à saúde, educação e geração de renda. Todos estes fatores somados à fragmentação de
suas respectivas famílias acabam gerando sofrimento mental que muitas vezes resulta no
consumo compulsivo de drogas lícitas e ilícitas.
Cabe destacar que a maioria dos jovens Kaiowá e Guarani nasceu fora de seus lares
(suas terras de ocupação tradicional) e vive atualmente nas reservas ou sobrevive em
acampamentos nas margens das estradas ou no fundo das fazendas. A falta de seu território
ancestral impede que as comunidades vivenciem suas principais expressões culturais: os
bailes, mitos, canções, orações e por este motivo o trabalho dos transmissores culturais
(anciãos) de conectar a juventude com o tekoyma15
é a cada dia mais difícil.
Frente à diminuição da população mais velha torna-se fundamental a busca por novas
alternativas dirigidas a manutenção das tradições. Diante deste quadro, os realizadores
indígenas consideram o uso das novas tecnologias e do vídeo uma forma de promover e
registrar os saberes kaiowá e guarani, conforme expressa Maria: “Aqui na aldeia sempre
acontece alguma coisa, alguma dança ou guaxiré. Ai a gente tem que relatar isso, mostrar para
outra pessoa que não vê, mostrar para a criança que não entende estas coisas. É como uma
memória (informação verbal)16
”.
As entrevistas com os jovens realizadores nos leva a constar que o processo de
empoderamento do cinema e das novas mídias está associado à valorização, reconstrução,
transmissão e reflexão das experiências do passado por meio da produção de conteúdo
informativo. Esta ideia reflete-se no discurso de José:
15
Tradução: modo de ser dos antepassados. 16
Informação fornecida por Maria durante o trabalho de campo realizado na T.I Panambizinho, em Dourados,
em 2011.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
16
Tem muito artesanato que está calado aqui, artesanato, a dança e a molecada se
interessa, mas está tudo calado (...) Meu sonho é ensinar o que eu aprendi, o meu
conhecimento (sobre cinema) passar para aquele que esta aprendendo ainda. Você
vai aprender tudo e morrer sem ensinar ninguém?17
Com base nessas experiências, os realizadores que hoje integram a Ascuri têm como
objetivo principal fortalecer a identidade étnica da juventude indígena a partir da sabedoria
elaborada por seus antepassados, resgatando vínculos desfeitos pela desapropriação de seus
territórios tradicionais e a tensão entre tradição e modernidade. Trata-se da busca por
reconhecer o lugar do jovem tanto na sociedade indígena como na não indígena, conforme o
modo de ser Kaiowá e Guarani.
3.5 A autoimagem dos Kaiowá e Guarani em seus filmes
A segunda parte deste trabalho corresponde ao resultado da analise dos filmes
“Guerreiro Guarani”, “Kaiowá Kunhatai” rodadas durante o projeto “Ava Marandu- Os
Guarani convidam” e “Te’Yikue Mbarate Kaiowá Guarani” produzida durante as oficinas de
formação em cinema Vídeo Índio Brasil. Para o estudo da autoimagem dos Kaiowá e Guarani
se elaboraram os seguintes indicadores e variáveis: indicador de atributos dos personagens;
indicador de elementos culturais; indicador de representação linguística; indicador de
representação do fator étnico; indicador de etnograficidad18
, e por último, indicador da
linguagem do cinema.
O filme “Guerreiro Guarani”, com duração de 11 minutos e 13 segundos, conta a
história de um jovem líder (o guerreiro guarani) que com ajuda de seus ajudantes defende a
sua comunidade. Já a produção “Kaiowá Kunhatai”, com duração de 17 minutos e 7
segundos, retrata parte do ritual de iniciação feminino Kaiowá. Por outro lado, o filme
“Te’Yikue Mbarate Kaiowá Guaraní” com duração de dez minutos e vinte quatro segundos,
revela o processo de construção da educação escolar diferenciada indígenas nesta T.I.
17
Informação fornecida por José durante o trabalho de campo realizado na T.I Panambizinho, em Dourados, em
2011 18
Segundo Heider (1995), todas as produções cinematográficas são em certo modo etnográficas, pois todas tem
como tema principal o ser humano e por este motivo, interessam a antropologia. A partir desta perspectiva, os
filmes podem ser considerados dados brutos ou documentos em uma pesquisa.
A partir desta constatação, Heider (1995) desenvolveu a variável denominada etnograficidad. O grau de
etnograficidad de uma produção depende das características etnográficas colocadas em cena. Dentro da
etnografia, a característica mais importante é o grau de informação. Este nível baseia-se na compreensão
etnográfica do filme.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
17
O estudo destes filmes nos permitiu constatar que a autoimagem dos Kaiowá e
Guarani está condicionada pela imagem de seus antepassados e pela forma como são
percebidos por outros sistemas culturais, especialmente pela sociedade não indígena.
Com o objetivo de romper com os estereótipos sobre suas comunidades, os Kaiowá e
Guarani, utilizam o recurso mimético19
(TURNER,1994), manipulam o imaginário ocidental
sobre o “nativo tradicional”, ao mesmo tempo em que afirmam sua capacidade de se
apropriarem de recursos que procedem de outros sistemas culturais.
Estas produções assinadas pelos realizadores Kaiowá e Guarani são caracterizadas
pela valorização do modo de vida tradicional, pelo resgate, recuperação e reprodução de suas
praticas culturais, pela elaboração de novas estratégias de tradução dos saberes indígena frente
ao modelo de vida imposto pela sociedade ocidental, e pela denuncia da situação colonial a
qual estão submetidos.
Todos esses elementos em conjunto favorecem o desenvolvimento da resiliência
destas comunidades, especialmente entre as crianças e os jovens. É por tudo isso que podemos
classificar os filmes Kaiowá e Guarani como contra hegemônicos, pois ao contrario do
estereotipo indígena difundido pelos meios de comunicação de massas que tem por finalidade
debilitar estas sociedades por meio do ataque a sua dignidade, os personagens autóctones
construídos pelos jovens realizadores promovem o fortalecimento da autoestima da juventude
indígena o que consequentemente, termina por favorecer a luta destas populações.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desta pesquisa, foi comprovado que o desejo dos realizadores indígenas
Kaiowá e Guarani de retratar uma copia exata da sua realidade em seus filmes é inviável
devido à virtualidade promovida pelo cinema. No entanto, isso não significa que a
autoimagem destes coletivos seja inverossímil.
Tanto nas terras indígenas como nos filmes estudados foi possível identificar a
presença ativa do jovem Kaiowá e Guarani, preocupado por defender sua comunidade,
aferrado às tradições, com habilidade para apropriar-se das ferramentas criadas em outros
19
Para Turner (1994), o caráter mimético de um filme é definido pela imitação da essência da cultura indígena.
Domènech (1999) complementa esta definição explicando que os diversos grupos sociais apelam ao recurso de
mimese com objetivo de refletir sobre sua imagem. A mimese acontece quando a representação deixa de ser a
copia da superfície da realidade e o individuo ou coletivo recorre ao símbolo como meio para estabelecer a ponte
entre o real e o interpretado.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
18
contextos culturais e para refletir e atualizar sua cultura as novas condições impostas pela
sociedade ocidental. Atualmente, esta juventude representa a maioria da população autóctone
que vive nas terras indígenas e se comunica por meio do cinema e das novas tecnologias
desde o entre-lugar20
(BHABHA,2013) configurado pela situação de confinamento e exclusão
social.
Neste cenário de fronteira, esses coletivos dialogam com o passado caracterizado
pelo bem viver indígena de seus antepassados, mediante os mecanismos oferecidos pela sua
cultura. Dentro do sistema cultural Kaiowá e Guarani, esse recurso se reflete especialmente
por meio da transmissão do conhecimento tradicional pela população adulta, principalmente
pelos anciões, as novas gerações. A estratégia denominada por Bhabha (2013) de entre-
tempo21
é utilizada por esses grupos étnicos com objetivo de que sua cultura perdure no tempo
e está vinculada a esperança de regresso redentor aos seus tekoha.
Os dados coletados e analisados a partir das teorias antropológicas comprovam a
presença do entre-tempo no imaginário destas populações expressado, principalmente, nos
discursos dos entrevistados, na dramatização das praticas culturais retratadas nestes filmes e
nas funções desempenhadas por estes personagens nestas produções. Todos estes aspectos
favorecem o enaltecimento do tekoyma. O estudo detalhado do cinema Kaiowá e Guarani,
além de nos permitir conhecer a autoimagem desses grupos étnicos, também deu acesso aos
sinais diacríticos da cultura autóctone utilizada pelos realizadores com o objetivo de elevar a
autoestima de suas comunidades, em especial das novas gerações, por meio do fortalecimento
do sentimento de pertencimento ao seu sistema cultural.
Nestes filmes, a cultura tradicional autóctone é valorizada, enaltecida e reconhecida
pelos realizadores Kaiowá e Guarani de múltiplas maneiras: mediante a seleção e
incorporação de determinados elementos culturais tradicionais, do uso do idioma nativo (no
caso, o guarani) pelo elenco; das funções dos personagens; da teatralização dos rituais de
passagem e religiosos, principalmente as músicas e as danças; das canções que acompanham
as cenas; da estimação da pedagogia indígena; da demonstração da preparação física,
intelectual e espiritual destas populações ante os desafios da modernidade, e através da
20
Bhabha (2013) chama de entre-lugar o interstício híbrido, onde as diferentes culturas disputam seus espaços e
negociam suas práticas culturais. Neste campo, são elaboradas estratégias de subjetivação, singulares ou
coletivas, que favorecem a criação de novos signos de identidades e novas posições de colaboração e contestação
no ato de definir a própria sociedade. 21
O conceito de entre-tempo, definido por Bhabha (2013), corresponde à ideia de transformar o presente em
lugar expandido e excêntrico de experiência e empoderamento. No entanto, ainda que o entre-tempo corresponda
à atualidade, também se projeta no passado por meio da reinterpretação dos símbolos.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
19
revitalização das praticas culturais por meio de novas estratégias de apropriação das
ferramentas do “dominador” como são as escolas indígenas e mais recentemente, o cinema e
as novas tecnologias.
Neste ponto, cabe destacar que mesmo quando os personagens e entrevistados se
exibem dominando ferramentas ocidentais, como no caso do filme Te’Yikue Mbarate Kaiowá
Guarani, o objetivo segue sendo o mesmo: afirmação da condição étnica em um contexto
onde a coexistência das duas culturas (indígena e não indígena) não representa uma ameaça
para nenhuma das duas.
Dentro do contexto de produção destes filmes, destaca-se notavelmente a pré-
produção dos filmes, pois se trata de uma etapa em que os participantes pesquisam aspectos
do seu sistema cultural e elaboram o roteiro de seus filmes a partir dos dados coletados e
refletem sobre sua cultura por meio de suas obras. Este processo promove aproximação dos
jovens aos anciãos de suas comunidades, visto que são eles os detentores de seu conhecimento
ancestral. Esta mediação cultural (TURNER:1994) favorece a recuperação dos vínculos
desfeitos entre estes dois setores da sociedade Kaiowá e Guarani pela desapropriação de seus
territórios tradicionais, ao mesmo tempo que, resulta no confinamento destas populações.
Não obstante, a falta de espaço para reprodução física e cultural e estabilidade da
estrutura social Kaiowá e Guarani, a tensão permanente entre indígenas e não indígenas, a
necessidade dos jovens de buscar trabalho fora de seus territórios, e consequentemente, a
pouca esperança de vida nas terras indígena provocou a marginalização dos anciãos.
Esta realidade resultou em uma situação de duplo vinculo (CANEVACCI:2012)
configurada pela tensão entre a tradição e a modernidade e destacada pelos anciãos como
causa do “esquecimento” das práticas tradicionais por estas sociedades. É por tudo isso que a
Ascuri dedica-se a promover o encontro de gerações e a fortalecer a identidade étnica da
juventude por meio do cinema e das novas tecnologias. Esta estratégia tem um grande valor
psicológico, terapêutico e educativo, pois favorece o desenvolvimento de um conjunto de
habilidades sociais (como autoestima, o trabalho cooperativo, a criatividade e etc) que ajudam
esses jovens a ter consciência da realidade que lhes envolve.
No entanto, ainda que a incorporação do cinema e das novas mídias pelas sociedades
Kaiowá e Guarani signifique a promessa de um futuro melhor para juventude Kaiowá e
Guarani, a falta de inversão em projetos que favoreçam o empoderamento destes coletivos por
meio destes meios dificulta sua concretização.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/
20
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ARDÈVOL, E. Por una antropología de la mirada: etnografía, representación y construcción
de dados audiovisuales. Revista de dialectología y tradiciones populares, Madrid, vol.LII,
pp.217-240.1998.
ARDÈVOL, E. Representación y cine etnográfico. Quaderns de l'ICA, Barcelona, n.2,
pp.125-168. 1996.
BHABHA, H.K. O Local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013. CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: Estrategias para entrar y salir de la modernidad. Buenos Aires:
Paidós,2001.
CANEVACCI, M. A linha de pó bororó: A cultura entre tradição, mutação e
autorepresentação. São Paulo: Annablume,2012.
CONSELHO INDIGENISTA MISIONÁRIO. Violência contra os Povos Indígenas no Brasil.
Brasília,2014. 175 p.
CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO. Porque pedimos o Boicote ao Agronegócio do
Mato Grosso do Sul? Conselho Indigenista Missionário, Brasília, 16 out.2015. Disponível em:
http://www.cimi.org.br Acesso em: 16 out. 2015. HALL, S. Da diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG,2003.
HEIDER, K. Hacia una definición de cine etnográfico. In: ARDÈVOL, E.P; PÉREZ-TOLÓN,
L. (Org.). Imagen y cultura: Perspectivas del cine etnográfico. Granada: Diputación Provincial
de Granada, 1995.p.75-73.
LISÓN ARCAL, J.C. Bases para la construcción de una antropología visual con
Iberoamérica. In: ESPINA BARRIO, A.E. (Org). Antropología en Castilla y León e
Iberoamérica,II. Salamanca: Instituto de Investigaciones Antropológicas de Castilla y León,
1999. P. 19-26.
NOVAES, S.C. Jogos de Espelhos: Imagens da representação de si através dos Outros. São
Paulo: Edusp, 1993.
PELLEGRINI, Marcelo. No MS, a questão indígena é um barril de pólvora prestes a explodir.
Carta capital, São Paulo, 09 set. 2015. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br
Acesso em: 09 set. 2015.
PÉREZ-TOLÓN, L. (Org.). Imagen y cultura: Perspectivas del cine etnográfico. Granada:
Diputación Provincial de Granada, 1995. p. 161-201.
REBOLLO, J. La antropología (audio)visual frente a las Nuevas Tecnologías de la
Información y la Comunicación. Apuntes en torno a una reflexión. Revista de Dialectología y
Tradiciones populares, Madrid, vol.53, nº2, pp.305-330.1998.
REIS, P.F. Políticas de Cultura a longo prazo: estudo comparativo entre o Plano Nacional de
Cultura do Brasil e da Colômbia. Salvador: Universidade Federal da Bahia,2014.
RUBY, J. Revelarse a sí mismo: reflexibilidad, antropología y cine. In: ARDÈVOL, E.P;
TURNER, T. Imagens desafiantes: apropriação Kaiapó do vídeo. Revista de antropologia, São
Paulo, vol. 36, pp.81-121. 1994.
Anais do X
IV C
ongresso Internacional de Direitos H
umanos.
Disponível em
http://cidh.sites.ufms.br/m
ais-sobre-nos/anais/