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O Alaafin na diáspora - Adriano Azevedo O Alaafin na diáspora. Adriano Azevedo 11/08/2014 Em tempo, consegui escrever algumas linhas falando sobre a visita do Rei Adeyemi III ao Brasil e mais especificamente às cinco casas anfitriãs. Por estar nos bastidores, não puder ver muita coisa nos quatro Axés (Terreiros) por onde o Rei passou, todavia, por estar mais efetivo no Opô Afonjá, conseguir visualizar algumas intervenções. No dia 29 de julho, o Ilê Axé Iyá Nassô Oká – Casa Branca foi o primeiro Terreiro a receber o Alaafin. No mesmo dia o Ilê Axé Oxumarê o recebeu com o mesmo esplendor. No dia seguinte foi a vez do Opô Afonjá e Alaketu. Enfim, no dia 31, o rei visitou o Gantois e a grande pedra de Xangô, localizada no bairro de Cajazeiras, primeiro bairro planejado de Salvador e onde grande parte da população negra e de santo reside.

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O Alaafin na diáspora - Adriano Azevedo

O Alaafin na diáspora.Adriano Azevedo

11/08/2014

Em tempo, consegui escrever algumas linhas falando sobre a visita do Rei Adeyemi III

ao Brasil e mais especificamente às cinco casas anfitriãs. Por estar nos bastidores, não

puder ver muita coisa nos quatro Axés (Terreiros) por onde o Rei passou, todavia, por

estar mais efetivo no Opô Afonjá, conseguir visualizar algumas intervenções.

No dia 29 de julho, o Ilê Axé Iyá Nassô Oká – Casa Branca foi o primeiro Terreiro a

receber o Alaafin. No mesmo dia o Ilê Axé Oxumarê o recebeu com o mesmo esplendor.

No dia seguinte foi a vez do Opô Afonjá e Alaketu. Enfim, no dia 31, o rei visitou o

Gantois e a grande pedra de Xangô, localizada no bairro de Cajazeiras, primeiro bairro

planejado de Salvador e onde grande parte da população negra e de santo reside.

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A chegada do rei no Opô Afonjá, foi superemocionante. Coloquei uma quartinha com

água na porteira e antes dele entrar, pingou três vezes no chão cochichando bem

baixinho com Onilé. Os fogos estouravam no céu com alegria e ao som dos batás,

tambor falante e clarim, o Alaafin era recebido com honrarias e muita felicidade.

A Ialorixá – Mãe Stella de Oxossi, a Iyákekerê – Ditinha de Iemanjá, a Iyá Dagan –

Mundinha de Ogun e Obá Terê – Gilsete de Xangô receberam o rei na varanda de

Afonjá. Os Alabês tocavam e um coro bem alinhado cantavam uma cantiga em iorubá

que perguntava:

O que vocês acham do rei?

E o coro respondia:

O rei é o dono do Axé...

Aquele que é misterioso...

Aquele que é vestido de beleza...

O rei é o dono do Axé!

A comitiva se deslumbrava com o espaço físico. Eles olhavam as árvores, a terra, as

casas, as pessoas. Depois dos comprimentos, subimos para o Ilê Ibó, casa de adoração

aos ancestrais.

O corpo de Ojé, liderado por Balbino Daniel de Paula, Alagbá baba mariwô, chefe do

culto aos Egunguns do Ilê Agboula em Itaparica, deu início ao louvor saudando a terra.

Ojé Adêniji do Ilê Axipá e também Ogan do Opô Afonjá, Jefferson Ferreira, mais

conhecido como Nino, entoou o oriki reverenciando Iyá Obá Biyi, Mãe Anninha, a

fundadora do Opô Afonjá. A cada cantiga, o rei e sua comitiva acompanhava cantando

conjuntamente, mostrando o entendimento no diálogo.

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Para ele foi impactante encontrar do outro lado do Atlântico uma história que foi

extraída de sua origem de forma violenta a séculos atrás, e que hoje é perpetuada por

descendentes brasileiros e que lutam para preservação deste patrimônio.

Do Ibó ao Palácio de Afonjá, as crianças da escola do ensino fundamental, situada

dentro do Terreiro e que tem em sua grade curricular a cultura africana, cantavam o hino

de Afonjá. O rosto dele era só alegria em ver aquela quantidade de criança cantando

ioruba.

Quando ele entrou no quarto de Xangô, seu olho brilhava. Tirei do bolso dois orobôs e

dei pra ele. Ele me olhou e sorriu. Pegou os orobós de minha mão, partiu com os dentes,

levantou e jogou-os no chão aos pés de Afonjá.

Dai ele disse:

-Alaáfia!!!

E todos gritaram:

-Kawô Kabiêsi!!!

Ele repartiu o orobô com seus filhos e comeu o restante. Ele olhou pro altar de Xangô e

disse emocionando que estava se sentindo em casa.

Já na varanda da casa de Xangô, ele sentou de frente à multidão que esperava ansiosa

pelo seu pronunciamento, quando um grupo formado por mulheres da terceira idade,

Grupo Fênix de Teatro e Dança, apresentou um número de dança com o tema África.

Em seguida, Fábio Lima, Bossi Òla, falou sobre Mãe Anninha e o corpo de Obás e a

importância deste para o Terreiro. Seguindo a tradição, antes do rei falar, a rainha entoa

um oriki.

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Este momento foi de extrema emoção para ela, não sei porque, mais de todos os

momentos em sua estada aqui no Brasil, acredito que este tenha sido o mais enérgico,

digo isto, porque o que vir e sentir, ia além da emoção. Talvez pelo fato de estarem na

casa de Xangô e como todos nós sabemos, Xangô é um Orixá vivo. A rainha cantou, e a

sua voz aguda, segura e bem entoada começou a ficar trêmula, como se fosse chorar. O

rei automaticamente, tomou o microfone de suas mãos e disse:

- “Ela chamou Xangô com muita veemência... Consigo sentir sua energia presente.

Vamos parar por aqui!”. E riu.

O rei saiu daqui maravilhado com tudo que viu. Por diversas vezes, ela falava do

orgulho que sentia em ver tudo aquilo de perto. Da perpetuação da tradição e

similaridade dos elementos.

Nós brasileiros baianos, somos um pedaço da África. A comunicação, o sangue que

corre nas veias, os costumes e a fé são a continuação desta tradição, por isso, nossa luta

é diária e continua, para que a preservação deste legado seja mantido.

Em conversa com Mãe Stella, ela me disse:

- “Nossa Majestade, nos deixou como exemplo a dignidade, consistência, determinação

e força... E é essa atitude que devemos levar pra toda vida!”

Sem mais delongas, fico por aqui e plagiarei as palavras de Mãe Stella, contudo,

acredito que todos tenham este mesmo sentimento:

- “Sinto muito orgulho em descender de uma raça que pisou pela primeira vez no

Brasil na qualidade de escravo e que hoje retorna como rei!”

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Iku baba yeye!

Saudações,

Adriano Azevedo, Obá Abiodun.

Fonte:

INTERNET. Facebook, Página do autor, Acessado em 12/08/2014. Disponível em:

https://www.facebook.com/notes/adriano-azevedo/o-alaafin-na-di%C3%A1spora/831494916874323

Adaptação: Luiz L. Marins - www.luizlmarins.com.br