Núcleo de Ciências e Tecnologia Programa de Pós-Graduação ... · formulação de indicadores...
Transcript of Núcleo de Ciências e Tecnologia Programa de Pós-Graduação ... · formulação de indicadores...
0
Ncleo de Cincias e Tecnologia
Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente
ANLISE DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL EM JI-PARAN PELO
IDS-J
ANA PAULA BALDEZ SANTOS
PORTO VELHO (RO)
2010
0
Ficha catalogrfica elaborada pelo Bibliotecrio: EDSON RODRIGUES CAVALCANTE CRB 11/677
S2373a SANTOS, Ana Paula Baldez.
Anlise do desenvolvimento social em Ji-Paran pelo IDS-J. / por Ana Paula Baldez
Santos. Porto Velho, Rondnia, 2010.
77f. ; Il. tabelas; 21x29,7 cm.
Dissertao (Programa de Ps-Graduao da UNIR) Mestrado em Desenvolvimento
Regional e Meio Ambiente, Universidade Federal de Rondnia (UNIR), Porto Velho,
Rondnia, 2011.
Orientador (a): Prof. Dr. Manuel Antnio Valdes Borrero.
1. Desenvolvimento Regional. 2. Desenvolvimento Econmico. 3. ndice de
Desenvolvimento Social Justo. 4. Ji-Paran.
I. BORRERO, Manuel Antnio Valds. II. Universidade Federal de Rondnia (UNIR).
Ttulo.
CDU: 338.9
1
Fundao Universidade Federal de Rondnia
Ncleo de Cincias e Tecnologia
ANA PAULA BALDEZ SANTOS
ANLISE DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL EM JI-PARAN PELO IDS-J
Dissertao de Mestrado apresentada junto ao Programa
de Ps-Graduao em Desenvolvimento Regional e Meio
Ambiente, rea de Concentrao em Polticas Pblicas e
Desenvolvimento Regional, como requisito final para a
obteno do Ttulo de Mestre em Desenvolvimento
Regional e Meio Ambiente.
Orientador: Prof. Manuel Antonio Valds Borrero, Dr.
Porto Velho (RO)
2010
2
ANA PAULA BALDEZ SANTOS
ANLISE DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL EM JI-PARAN PELO IDS-J
Dissertao julgada e aprovada para a obteno do ttulo de Mestre em Desenvolvimento
Regional e Meio Ambiente no Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Regional e
Meio Ambiente da Universidade Federal de Rondnia.
Prof Dr. Vanderley Rodrigues Bastos
Coordenador do Programa
Banca Examinadora
___________________________________
Prof. Dr.Manuel Antonio Valds Borrero Orientador e Presidente da Banca Examinadora
____________________________________________
Prof. Dr. Vanderlei Maniesi Membro Titular
____________________________________________
Prof. Dr. Joo Vicente Andr Membro Titular
____________________________________________
Prof Dr. Artur de Souza Moret Membro Substituto
Porto Velho 26 de fevereiro de 2010.
Porto Velho (RO)
2010
3
DEDICATRIA
Dedico este trabalho aos moradores da cidade de Ji-
Paran, em especial, s famlias que l residem e se encontram
em situao de vulnerabilidade, na esperana de contribuir para
a discusso da sua problemtica e a garantia da sua liberdade de
direitos sociais.
4
AGRADECIMENTOS
Ao Coordenador do Mestrado Prof. Dr. Wanderlei Bastos, exemplo de profissional
voltado ao bem coletivo no exerccio da docncia.
Ao Prof. Dr. Manoel Valds, orientador deste trabalho, pela sua ateno e pacincia
diante das minhas limitaes, acima de tudo por ter emprestado seu conhecimento para que eu
conquistasse o meu.
Ao Prof. Dr. Artur Moret, pela sua ateno e por ter me ensinado que a humildade
uma virtude.
Aos professores Dr. Joo Vicente Andr e Dr.Vanderlei Maniesi pelas orientaes
precisas e crticas necessrias.
Agradeo a mestre Rudmeire da Silva pelo material fornecido e a disposio em
indicar caminhos.
Aos colegas de trabalho do Tribunal de Justia de Rondnia e da FIMCA, que
entenderam as minhas ausncias no trabalho.
As minhas alunas do CEULJI e da FIMCA, meu muito obrigado por terem
compartilhado comigo os momentos de angstia e dificuldades.
Aos magistrados Dr. Sergio William Domingues Teixeira e a Dr. Ana Valria de
Queiroz S. Ziparro, que no podaram meu sonho de voar alto.
s companheiras de jornada (de Ji-Paran e Porto Velho) por terem me motivado a
continuar, pois sabiam que havia pedras no caminho, mas tambm sabiam que tantas pedras
no caminho no seriam ruins.
Agradeo especialmente a minha famlia (pais, marido e filhos), por terem suportado
as minhas variaes de humor, as minhas ausncias e me dado foras para continuar quando
eu mesma no acreditava que seria possvel.
5
A privao de liberdade econmica pode gerar a privao de liberdade social,
assim como a privao de liberdade social ou poltica pode, da mesma forma, gerar a
privao de liberdade econmica.
(Amartya Sen)
6
RESUMO
Faz algum tempo que a discusso sobre os diferentes nveis de desenvolvimento econmico
entre pases e regies ocupa o centro das atenes de cientistas de diversas reas. A
formulao de indicadores do crescimento das riquezas nacionais, utilizando-se, para tanto,
indicadores macroeconmicos como a Renda per capita, Produto Interno Bruto (PIB) e/ou
Produto Nacional, foram os primeiros resultados tericos e prticos dessas discusses. A
construo de um modelo sustentvel de desenvolvimento econmico e social tem sido o foco
das mais recentes polticas pblicas, mas at hoje no tem passado de uma utopia. Pases,
estados, municpios e regies buscam o to almejado desenvolvimento econmico e social no
meio de uma economia de mercado cada vez mais instvel e de interveno estatal cada vez
mais intermitente. Os resultados no poderiam ser diferentes de uma aguda excluso social e
de uma distribuio desigual dos benefcios econmicos, sociais, culturais e polticos. nesse
contexto, de um conceito sempre em aperfeioamento, que este estudo se props a analisar o
desenvolvimento pelo social na cidade de Ji-Paran do Estado de Rondnia, mediante a
construo do ndice de Desenvolvimento Social Justo IDS-J. A cidade de Ji-Paran, segunda
cidade do Estado em termos populacionais e econmicos, alvo desta pesquisa, em virtude de
ser a realidade prxima da autora, demonstrou que crescimento econmico no implica
necessariamente desenvolvimento social. Para a avaliao do estgio de desenvolvimento
social do municpio de Ji-Paran optou-se pela agregao e adaptao de metodologias de
avaliao do desenvolvimento social, principalmente, o ndice de Excluso Social elaborado
para So Paulo e o ndice de Desenvolvimento Social do Cear, concomitantemente com os
estudos sobre o Desenvolvimento Sustentvel (DS) do Par, de Rondnia, de Guajar Mirim e
o IDH-M de Porto Velho. Neste estudo, avaliou-se o desenvolvimento social do municpio de
Ji-Paran atravs da construo de um ndice com as principais dimenses da vida social
(renda, educao, qualidade de vida e ambiental), que para o clculo foram denominadas de
Utopias (autonomia, qualidade de vida, desenvolvimento humano e poltica). O IDS-J
encontrado para a cidade de Ji-Paran, de 0,35, coloca este municpio em uma situao no
confortvel de sustentabilidade. O ndice descreve um desenvolvimento excludente, em que a
maioria da sociedade do municpio no usufrui dos benefcios da economia local e/ou as
polticas sociais no permitem homogeniz-lo. Nesta concluso, as utopias que mais
contriburam para este dficit foram as de autonomia (0,4), a de desenvolvimento humano e
educao (0,026) e a da qualidade de vida (0,43). Assim, a populao em questo no est
apta para satisfazer suas necessidades bsicas devido a m distribuio de renda, da mesma
forma que o baixo nvel de escolaridade tornar-se um obstculo para sua insero no mercado
de trabalho.
Palavras-Chave: ndice, Desenvolvimento econmico, Desenvolvimento social, ndice de
Desenvolvimento Social
7
ABSTRACT
Made time that the discussion about the different levels of economic development among
countries and regions is at the center of attention of scientists from various areas. The
formulation of indicators of the growth of national wealth, using to this end, macroeconomic
indicators such as Income Per Capita, Gross Domestic Product (GDP) and / or National
Product, were the first theoretical and practical results of those discussions. Building a
sustainable model of economic and social development has been the focus of recent public
policy, but until today has gone from a utopia. Countries, states, cities and regions seeking the
much desired social and economic development in the midst of a market economy
increasingly unstable and state intervention increasingly intermittent. The results could not be
different from an acute social exclusion and unequal distribution of economic, social, cultural
and political. In this context, a concept ever further, that this study was to examine the social
development in the city of Ji-Paran Rondnia State, through the construction of the Index of
Social Development Fair IDS-J. The city of Ji-Parana, second city of the state in terms of
population and economic aims of this research, because the reality of being close to the
author, showed that economic growth does not necessarily imply social development. For
assessing the stage of social development in the city of Ji-Parana opted for the aggregation
and adaptation of methodologies for assessment of social development, especially the Social
Exclusion Index prepared for Sao Paulo and Social Development Index of Cear, in
conjunction with Studies on Sustainable Development (SD) of Para, Rondonia, Guajar
Mirim and the HDI-M of Porto Velho. In this study, we evaluated the social development of
the city of Ji-Paran by constructing an index with the key dimensions of social life (income,
education, quality of life and environmental), which were named for the calculation of
Utopias (autonomy , quality of life, human development and politics). The IDS-J found for
the city of Ji-Parana, 0.35, places the city in a comfortable situation is not sustainable. The
index describes an exclusive development, where the majority of society in the municipality
does not enjoy the benefits of the local economy and / or social policies do not allow
homogenise it. This finding, the utopias that most contributed to this deficit were those of
autonomy (0.4), human development and education (0.026) and quality of life (0.43). Thus,
the population in question is unable to meet their basic needs due to poor income distribution,
the same way that the low level of education become an obstacle to their integration into the
labor market.
Keywords: Index, Economic Development, Social Development, Social Development Index
8
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Demonstrativo sinttico de metodologias para construo do
ndice de desenvolvimento social............................................
32
Quadro 2 Descrio das despesas municipais com Educao e Sade.... 43
Quadro 3 Metodologia da construo dos indicadores do
IEX/SP/1996............................................................................
48
Quadro 4 Descrio dos padres territoriais de excluso/incluso
social do IEX/SP......................................................................
50
Quadro 5 Apresentao da Composio do IDS-CE por
indicador...................................................................................
52
Quadro 6 Critrios de indicao de desempenho do IDS-J..................... 54
Quadro 7 Demonstrativo das dimenses do IDS-J................................. 54
Quadro 8 Resultado final do IDS-J........................................................ 63
Quadro 9 Clculo dos Indicadores das Utopias autonomia e
Desenvolvimento Humano
71
Quadro 10 Clculo dos Indicadores das Utopias Qualidade de Vida e
Ambiental
72
Quadro 11 Clculo dos Indicadores das Utopias Qualidade de Vida e
Ambiental - continuao
73
Quadro 12 Clculo dos Indicadores da Utopia Poltica 74
Quadro 13 Clculo dos Indicadores da Utopia Poltica - continuao 75
Quadro 14 Clculo dos Indicadores da Utopia Poltica - continuao 76
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Mapa de Rondnia.......................................................................... 37
Figura 2 Grfico demonstrativo do rendimento mdio dos chefes de
famlia de Ji-Paran.........................................................................
41
Figura 3 Grfico demonstrativo da percentagem da populao de Ji-Paran
com abastecimento de gua.......................................
41
Figura 4 Grfico demonstrativo da percentagem do tipo de esgotamento
sanitrio............................................................................................
42
Figura 5 Grfico demonstrativo da percentagem do destino do lixo em Ji-
Paran
43
Figura 6 Grfico demonstrativo de escolaridade dos chefes de famlia em
Ji-Paran
44
10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Populao residente por grupos de idade e alfabetizadas de Ji-
Paran..............................................................................................
39
Tabela 2 Demonstrativo do clculo do IEX/SP............................................... 49
Tabela 3 Esquema dos indicadores transformados da utopia autonomia........ 59
Tabela 4 Esquema dos indicadores transformados da utopia
desenvolvimento humano.................................................................
60
Tabela 5 Esquema dos indicadores transformados de qualidade de vida e
ambiental...........................................................................................
61
Tabela 6 Esquema dos indicadores transformados da utopia poltica............. 62
11
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANEEL Agncia Nacional de Energia Eltrica
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social
CSD Comission on Sustainable Development
DATASUS Banco de Dados do Sistema nico de Sade
ELETRONORTE Centrais Eltricas do Norte o Brasil
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria
FAO Organizao das Naes Unidas para a agricultura e alimentao
FURNAS Centrais eltricas FURNAS
IASAM - ndice Agregado de Sustentabilidade da Amaznia
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renovveis
IDEBE ndice de Desenvolvimento da Educao Bsica
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
IDH-M ndice de Desenvolvimento Humano Municipal
IDS ndice de Desenvolvimento Social
IDS/IBGE ndice de Desenvolvimento Sustentvel
IDESE ndice de Desenvolvimento Socioeconmico
IDS- J ndice de desenvolvimento social justo
IEX ndice de Excluso Social
IGP Indicador Genuno de Progresso
INAE ndice Nacional de Altos Estudos
INCRA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renovveis
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira
IPECE Instituto de Pesquisa e Estratgia Econmica do Cear
IPRS ndice Paulista de Responsabilidade Social
ISA - ndice de Sustentabilidade Ambiental
LOAS Lei Orgnica de Assistncia Social
NEPP Ncleo de Estudos de Polticas Pblicas da UNICAMP
NUAR Ncleo administrativo rural
OCDE Organizao de Cooperao e de Desenvolvimento Econmico
OIT Organizao Internacional do Trabalho
12
OMS Organizao Mundial da Sade
ONU Organizao das Naes Unidas
PAC Programa de Acelerao do Crescimento
PAD Projeto de Assentamento Dirigido
PETI Programa de Erradicao do Trabalho Infantil
PIB Produto Interno Bruto
PIC - Projeto Integrado de Colonizao
PIN Projeto de Integrao Nacional
PLANAFLORO Plano Agropecurio e Florestal de Rondnia
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de domiclios
PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
POLOAMAZONIA Programa de Plos Agropecurios e Agrominerais da Amaznia
POLONOROESTE Programa de Desenvolvimento Integrado do Noroeste do Brasil
PUC Pontifcia Universidade Catlica
REBIOJARU Reserva Biolgica de Jaru
SEPLAN/CE Secretaria de Planejamento e Coordenao do Cear
SUDAM Superintendncia do Desenvolvimento da Amaznia
UFPA Universidade Federal do Par
UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, para a cincia e a cultura
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
UNICEF Organizao das Naes Unidas para a Infncia e Juventude
13
SUMRIO
1 INTRODUO
1.1 - Contextualizao da Pesquisa ....................................................................... 14
1.2- Apresentao do Problema ............................................................................ 15
1.3 - Pressupostos do problema da pesquisa ......................................................... 16
1.4 Objetivos ...................................................................................................... 17
1.4.1 Objetivo Geral ........................................................................................ 17
1.4.2 Objetivos Especficos ............................................................................. 17
1.5 - Justificativa e relevncia da pesquisa ........................................................... 17
1.6 Estrutura da Dissertao ............................................................................... 18
2. CONTRIBUIES AO CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO .............. 20
2.1 - Em busca de uma definio de desenvolvimento ......................................... 20
2.2 - Definies prticas de desenvolvimento ...................................................... 22
2.3 - O desenvolvimento social: um conceito de desenvolvimento ...................... 25
2.4 - Avanos na avaliao de desenvolvimento .................................................. 27
3. BREVE CARACTERIZAO DO DESENVOLVIMENTO NA REGIO
EM ESTUDO: JI-PARAN ...................................................................................
33
3.1 - Origem e formao do municpio ................................................................. 33
3.2 - Evoluo econmica de Ji-Paran ................................................................ 35
3.3 - Evoluo Social de Ji-Paran ........................................................................ 38
4. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS DA PESQUISA .......................... 45
4.1 A construo do IDS-J ................................................................................. 45
4.1.1 Base metodolgica para a construo do IDS-J ................................... 46
a) ndice de Excluso Social da cidade de So Paulo (IEX/SP) .................. 46
b) ndice de Desenvolvimento Social do Cear (IDS/CE) .......................... 50
4.1.2 - Construindo a proposta do IDS-J .......................................................... 53
4.1.3 - Transformao das variveis em ndices .............................................. 55
4.2 - Tratamento e apresentao dos resultados .................................................... 56
4.3 - Tipo de Pesquisa ........................................................................................... 56
4.4 - Limitaes do trabalho ................................................................................. 57
5. RESULTADOS E AVALIAO DO IDS-J PARA JI-PARAN .................. 58
5.1 - Resultados da utopia Autonomia .................................................................. 58
5.2 - Resultados da utopia Desenvolvimento Humano ......................................... 59
5.3 - Resultados da utopia Qualidade de Vida ...................................................... 60
5.4 - Resultados da utopia Poltica ........................................................................ 61
5.5 - Resultados do IDS-J para Ji-Paran .............................................................. 62
CONCLUSO E CONSIDERAES FINAIS .................................................... 64
REFERNCIAS ....................................................................................................... 66
APNDICE - Descrio dos clculos dos indicadores componentes do IDS-J ...... 70
14
INTRODUO
1.1- Contextualizao da pesquisa.
Faz algum tempo que a discusso sobre os diferentes nveis de desenvolvimento
econmico entre pases e regies ocupa o centro das atenes de cientistas de diversos ramos.
A formulao de indicadores do crescimento das riquezas nacionais utilizando-se, para tanto,
indicadores macroeconmicos como a Renda Per Capita, Produto Interno Bruto (PIB) e/ou
Produto Nacional, foi o primeiro resultado terico e prtico dessas discusses.
Com o passar do tempo observou-se que a despeito do crescimento e nvel do PIB,
persistiam altos nveis de pobreza e aprofundamento das desigualdades sociais na maioria dos
pases capitalistas desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento. Assim, novos raciocnios
enriqueceram as discusses em termos de desenvolvimento, passando a considerar que
crescimento econmico no era condio suficiente para garantir o desenvolvimento
(JANNUZZI, 2002).
Diferentemente de momentos em que a evoluo dos conceitos se deu no mbito da
cincia, o tratamento do conceito de desenvolvimento de forma mais ampla, e no exclusiva
ao mbito econmico, se deu pela prpria sociedade civil organizada a partir do momento que
percebeu que seus interesses individuais e coletivos estavam sendo afetados pelos interesses
de mercado. O reducionismo do desenvolvimento aos aspectos econmicos transformou a
dimenso social em um cruel espao de desigualdade entre os homens e conseqentemente de
destruio da natureza. Ficou claro que no podia existir desenvolvimento com excluso
social, pobreza e desigualdade de oportunidades para a maioria dos membros da sociedade.
difcil reconhecer que haja desenvolvimento quando seus benefcios acumulam-se longe da
massa da populao, impedindo-a de participar no s dos frutos da riqueza como da sua
produo (MARTINS, 2002).
A discusso poltica e acadmica sobre a necessidade de incorporao de indicadores
sociais ao conceito de desenvolvimento ganhou vulto em meados dos anos sessenta quando,
por iniciativa de instituies internacionais como a Organizao de Cooperao e de
Desenvolvimento Econmicos (OCDE), Organizao das Naes Unidas para a Educao,
para a Cincia e a Cultura (UNESCO), Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e
Alimentao (FAO), Organizao Internacional do Trabalho (OIT), Organizao Mundial da
15
Sade (OMS), Organizao das Naes Unidas para a Infncia e Juventude (UNICEF) e a
Diviso de Estatstica da Organizao das Naes Unidas (ONU), incluram a perspectiva
social na elaborao dos planos de desenvolvimento.
Nesse novo cenrio do conceito de desenvolvimento, Amartya Sen e Ignacy Sachs
defendem que uma caracterizao consistente da sustentabilidade social do desenvolvimento
deve ter como base os valores primordiais de equidade e democracia. Entendendo
democracia, segundo Sachs, a apropriao efetiva de todos os direitos humanos polticos,
civis, econmicos, sociais e culturais por todas as pessoas e que segundo Sen apud Sachs
(2007), a democracia deve aumentar continuamente a capacidade das pessoas de fazerem e
serem aquilo que tem razo em valorizar (SACHS, 2007).
Assim historicamente, de acordo com interesses diversos, foram sendo agregados
adjetivos ao termo desenvolvimento passando pelo social, humano, local, endgeno e
sustentvel com o intuito de cobrir as lacunas deixadas por indicadores muito abrangentes,
contudo desenvolvimento deve ser antes de tudo social, pois o fim ltimo desse emaranhado
conceito a sociedade.
nesse contexto, de um conceito sempre em aperfeioamento, que este estudo se
prope a analisar o desenvolvimento pelo aspecto social na cidade de Ji-Paran do Estado de
Rondnia.
1.2- Apresentao do problema da pesquisa.
A construo de um modelo sustentvel de desenvolvimento econmico e social tem
sido o foco das mais recentes polticas pblicas, mas at hoje no tem passado de uma utopia.
Pases, estados, municpios e regies buscam o to almejado desenvolvimento econmico e
social no meio de uma economia de mercado cada vez mais instvel e de interveno estatal
cada vez mais intermitente. Os resultados no poderiam ser diferentes de uma aguda excluso
social e de uma distribuio desigual dos benefcios econmicos, sociais, culturais e polticos.
Da que a ONU passou a se preocupar tanto com os direitos humanos quanto com a
noo de desenvolvimento no decorrer dos ltimos 50 anos e desde ento a sua concepo de
desenvolvimento tem se enriquecido consideravelmente.
A idia simplista de que o crescimento econmico por si s bastaria para assegurar o
desenvolvimento foi rapidamente abandonada em proveito de uma caracterizao mais
complexa do conceito, expressa pelas adies sucessivas de adjetivos: econmico, social,
16
cultural, naturalmente poltico e sustentvel. Por ltimo, e o mais recente acrscimo, foi o
epteto humano. O desenvolvimento humano significa ter como objetivo o desenvolvimento
dos homens e das mulheres, do homem em lugar da multiplicao simplesmente material
(SACHS, 2007, p.352).
Durante a dcada de setenta constatou-se que a industrializao, o mesmo processo de
industrializao que alavancaria o desenvolvimento econmico e social, gerou acidentes
ambientais irreversveis e, por sua vez, acelerou a distncia entre pobres e ricos. Os
movimentos sociais surgidos poca passaram a questionar no somente o papel da classe
dominante economicamente mas, tambm, o papel do Estado e a sua insuficiente ao
institucional para efetivao de polticas pblicas eficazes que consolidassem um modelo
alternativo de desenvolvimento.
A cidade de Ji-Paran (antiga Vila de Rondnia), objeto desta pesquisa, teve sua
origem vinculada ao processo de colonizao de Rondnia. Essa cidade funcionou como
receptora da migrao, principalmente, matogrossenses, paulistas e nordestinos, que se
alojaram na regio como resultado de uma poltica desenvolvimentista do governo brasileiro
na dcada de sessenta. Da que tenha iniciado seu crescimento em atividades agrcolas,
pecurias e extrativistas, pois essas atividades estavam muito enraizadas na populao
ocupante.
Na atualidade, Ji-Paran o segundo municpio em importncia econmica no Estado,
perdendo apenas para Porto Velho. Possui um PIB per capita de R$10.412,001 e uma
populao de 107.8002 habitantes. Assim sendo, cabe averiguar qual o nvel de
desenvolvimento social desse municpio, apesar dos avanos tidos na rea econmica.
Assim sendo, pode-se resumir a questo da pesquisa: Qual o nvel de
desenvolvimento social do municpio de Ji-Paran do estado de Rondnia?
1.3- Pressupostos do problema de pesquisa
Pesquisar o nvel de desenvolvimento social do municpio de Ji-Paran significa
explicar o desenvolvimento atravs de uma nica dimenso, a social. Essa proposta est
alicerada no estabelecimento de alguns pressupostos tericos, que se apresentam a seguir.
Pelo exposto at aqui, mesmo tendo o conceito de desenvolvimento evoludo para algo
mais complexo que a dimenso econmica e mesmo acrescentando diversos adjetivos sua
1 Dados IBGE/GEP/SEPLAN-RO (2007)
2 Dados IBGE/2007
17
essncia, o social continua prevalecendo perante as outras dimenses, pois desenvolvimento
precisa ser, antes de tudo, humano. Assim, possvel presumir que, a dimenso social explica
corretamente o nvel de desenvolvimento de uma regio considerando os resultados das
polticas pblicas implantadas para o bem-estar social.
Por outro lado, e em conseqncia da questo anterior, necessrio compilar um
conjunto abrangente de indicadores sociais que expliquem eficientemente o nvel de
desenvolvimento de uma regio. No se pode inferir que uma sociedade desenvolvida
considerando apenas indicadores do desempenho econmico ou da produo material.
1.4- Objetivos da pesquisa
Geral
Analisar qualitativamente o desenvolvimento social do municpio de Ji-Paran no
Estado de Rondnia mediante a construo do ndice de Desenvolvimento Social Justo
(IDS-J).
Especficos
Selecionar, na literatura, o conceito de desenvolvimento em suas vrias interpretaes;
Relacionar indicadores da dimenso social do municpio de Ji-Paran;
Levantar as informaes necessrias para a construo do ndice e realizar a anlise
pertinente;
Propor metodologia de avaliao da dimenso social pelo ndice de Desenvolvimento
Social Justo (IDS-J).
1.5- Justificativa e relevncia da pesquisa.
Dar continuidade ao processo de discusso e aperfeioamento do conceito de
desenvolvimento na sua dimenso social muito importante pois, esse conceito, ainda est em
construo e em constantes renovaes, revelando assim a importncia terica desta pesquisa
sobre o desenvolvimento pelo social.
De fato a anlise de um municpio da Amaznia, hoje espao cobiado por grandes
investimentos em prol do desenvolvimento econmico e social da regio, torna esta pesquisa
relevante. O atual projeto desenvolvimentista do governo Lula, o Programa de Acelerao do
Crescimento (PAC), transforma a Amaznia, em especial Rondnia, uma janela virada para o
18
mundo, para indagaes e conjecturas sobre o impacto do desenvolvimento econmico no
social, uma vez que o discurso oficial sobre o Complexo Hidreltrico do Madeira propaga que
Porto Velho poder alcanar nveis mais elevados de desenvolvimento econmico e social,
contudo verifica-se que apesar do contnuo crescimento da economia de Rondnia no cenrio
norte e nacional, ainda persistem as mesmas caractersticas de um desenvolvimento social
atrasado.
A cidade de Ji-Paran, segunda cidade do Estado em termos populacionais e
econmicos, alvo desta pesquisa, em virtude de ser a realidade prxima da autora, tambm h
de demonstrar que crescimento econmico no implica necessariamente desenvolvimento
social.
1.6 - Estrutura da Dissertao
Este trabalho foi estruturado considerando a relevncia do tema e a iniciativa em
destacar a cidade de Ji-Paran como estudo de caso do desenvolvimento sustentvel com foco
na dimenso social.
O trabalho est constitudo de cinco partes, onde a primeira especifica a inteno da
autora em discutir, no meio acadmico, a dimenso social como condio precpua para o
alcance de um desenvolvimento sustentvel em uma determinada regio. Essa parte
introdutria contextualiza o tema e sua problemtica, e delimita os objetivos que se quer
alcanar.
O desenvolvimento do trabalho est apresentado pelo referencial terico em torno de
um consenso sobre a definio de desenvolvimento sob vrios aspectos dimensionais, entre
eles a discusso histrica de desenvolvimento visto apenas como crescimento econmico e a
defesa intransigente de que no h desenvolvimento sem que as necessidades bsicas do
homem estejam satisfeitas. Nesta segunda parte do trabalho, optou-se por contextualizar o
local onde se d o estudo, a cidade de Ji-Paran, e sua importncia no panorama scio-
econmico e poltico do Estado de Rondnia.
Na quarta parte esto contidos os passos metodolgicos utilizados para a construo de
um ndice que demonstrasse o estgio de desenvolvimento social do municpio de Ji-Paran a
partir de outras experincias j havidas em cidades brasileiras. Aos esforos empreendidos
para a construo desse ndice, tendo por indicao o ndice de Excluso Social da cidade de
19
So Paulo e o ndice de Desenvolvimento Social do Estado do Cear, decidiu-se por
denomin-lo de ndice de Desenvolvimento Social Justo IDS-J.
Na quinta parte foram discutidas as concluses e consideraes sobre o tema, a fim de
que estas possam auxiliar futuramente um planejamento municipal que otimize a dimenso
social.
Por ltimo, as referncias bibliogrficas citadas no decorrer do trabalho e o apndice
contendo informaes sobre os clculos da metodologia proposta.
20
2 CONTRIBUIES AO CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO
2.1 - Em busca de uma definio de desenvolvimento
Alm de considerar desenvolvimento uma utopia, o dicionrio da lngua portuguesa
explica que desenvolvimento sinnimo de crescimento, progresso ou expanso. Assim, se
algo ou algum desenvolvido porque cresceu e/ou se expandiu, dessa forma poderamos
definir que desenvolver um processo qualitativo de mudanas. Desenvolver significa
expandir ou ter conscincia de seu potencial para, gradualmente, atingir um estado mais
abrangente, maior, ou melhor. Quando algo cresce, torna-se maior. Quando algo se
desenvolve, torna-se diferente3.
H consenso entre um grupo de especialistas ao afirmarem que, para desenvolver a
sociedade, necessrio que ela passe por um processo de crescimento diferenciado ou de
evolues sucessivas, de um estgio menos perfeito a um estgio mais perfeito ou mais
altamente organizado, ou seja, preciso melhorar gradualmente as condies econmicas,
sociais e culturais da humanidade, de uma nao ou comunidade.
No intuito de explicar os diversos estgios de desenvolvimento percorridos pela
humanidade, historiadores padronizaram periodizaes que ordenam os acontecimentos mais
importantes ocorridos em perodos marcantes da humanidade, sendo assim denominados: pr-
histria, antiguidade, idade mdia, idade moderna e a idade contempornea. Considera-se que
a humanidade obteve seu desenvolvimento graas busca incessante em satisfazer suas
necessidades bsicas de sobrevivncia, pois em cada estgio da historia humana havia um
obstculo a ser superado e, por conseguinte, um avano em prol daquilo que hoje
consideramos evoluo social (KIECKHFER, 2005).
Entretanto, esses estgios de desenvolvimento da humanidade tambm tm sido
classificados a partir do tipo de relaes de poder entre os indivduos, o grau de
desenvolvimento tecnolgico e a capacidade de domnio das foras e leis naturais em
benefcio da sociedade. Assim, registram a idade moderna como um palco de grandes
transformaes na cultura, na religio, na criao do Estado Moderno e o nascimento do
capitalismo.
3 DALY, Herman E. Crescimento Sustentvel: Um Teorema da Impossibilidade. 1992.
21
Os lucros auferidos pela industrializao mais os obtidos pela agricultura, que
se amplia amparada pela tecnologia industrial, formam slido embasamento
financeiro com o qual os pases da Europa Ocidental podem, a partir da segunda
metade do sculo XVIII, comear a criar uma infra-estrutura necessria ao processo
de desenvolvimento econmico e social em longo prazo e, conseqentemente,
solidificar o capitalismo (KIECKHFER, 2005, p.38).
A solidificao do capitalismo d-se pela busca incessante na obteno de lucros, que
gera acumulao de riquezas, a mquina substituindo homens e a explorao extensiva de
recursos naturais, sistema que traz em sua gnese a diviso social em classes e a propriedade
privada.
Boisier (1999) considera que o mesmo fator que estimulou o desenvolvimento da
sociedade impede alcanar seu verdadeiro desenvolvimento. O autor ressalta que, em se
tratando de sociedade e indivduos, no se poderia reduzir o termo desenvolvimento apenas a
evoluo, sem considerar as relaes sociais estabelecidas entre os homens, haja vista que so
as relaes sociais que os homens mantm entre si e a natureza que moldam os sistemas
econmicos. Esta, por sua vez, uma relao dinmica, mutvel e pluridimensional, um
objetivo a ser almejado, porm nunca alcanado por que est baseado em aspectos
intangveis: as necessidades humanas. El desarrollo es la utopa social por excelencia. En un
sentido metafrico es el miltoniano paraso perdido de la humanidad, nunca alcanzable ni
recuperable debido a su naturaleza asinttica al eje de su propia realizacin (BOISIER,
1999, p. 6).
Assim, pode-se dizer que, devemos ao capitalismo a determinao em crescer
economicamente e a qualquer custo em nome do desenvolvimento, e tambm se deve a ele o
abismo entre desenvolvimento econmico e social. O reducionismo do termo
desenvolvimento apenas dimenso econmica impe ao social uma cruel desigualdade entre
os homens e a destruio da natureza. Segundo Furtado4, estamos longe do verdadeiro
desenvolvimento, que s ocorre quando beneficia toda a sociedade. Superar o atual quadro
requer criatividade.
Do exposto, constata-se que no existe uma definio precisa do termo de
desenvolvimento que abranja todas as aspiraes da sociedade em termos econmicos,
sociais, culturais e ambientais. Talvez a impreciso deva-se necessidade de cada gerao
4 Celso Furtado no O Novo Brasil em :http://gab.miltontemer.sites.uol.com.br/tribuna_debates/307.html
acessado em 29/09/2009.
http://gab.miltontemer.sites.uol.com.br/tribuna_debates/307.html
22
construir seu prprio termo de desenvolvimento, o que seria impedido caso o termo estivesse
fechado a novas perspectivas.
2.2 - Definies prticas de desenvolvimento
Apesar de no existir uma definio precisa de desenvolvimento, o termo tem sido
utilizado por cientistas preocupados com o assunto. Assim, Singer (1982) tentou ordenar as
conceituaes universalmente aceitas sobre desenvolvimento econmico em duas correntes
corriqueiramente distinguveis pelo uso. A primeira identifica o desenvolvimento com
crescimento, sob este foco tende-se a avaliar o desenvolvimento econmico a partir dos
ndices de crescimento econmico, renda per capita ou renda nacional, desprezando a
melhoria do padro de vida e bem-estar social. A segunda corrente, diferentemente, distingue
desenvolvimento e crescimento, em que mesmo sendo ambos interligados ou intrnsecos
possuem diferentes indicadores para medi-los.
Desenvolvimento gera mudanas qualitativas e o crescimento gera mudanas
quantitativas, da a sua complexidade, uma vez que incidem sobre ele diversas formas de
olhar para um mesmo territrio, pois aferir valores monetrios pode vir a ser mais fcil do que
aferir satisfao de necessidades humanas.
Desenvolvimento, portanto, um conceito complexo. Seja na regio
amaznica, ou em qualquer outra parte do pas, uma constatao histrica relevante
a de que, de fato, o Brasil ainda no desenvolvido. Mesmo no perodo de
1949/1961, caracterizado pelo grande crescimento da economia brasileira (pacto
populista), tendo implantado em seu contexto uma industrializao inspirada no
modelo fordista (produo em massa de bens de consumo durveis), o Brasil
desprezou as conseqncias sociais deste regime de acumulao, e isso sem a
regulao/ao mais efetiva de um Estado de bem-estar social (ANDR, 2004,
p.62).
Assim, num primeiro momento, desenvolvimento era visto como crescimento
econmico, onde desenvolvidos eram aqueles pases com o PIB mais elevado e com
significativa contribuio das indstrias existentes em seu territrio. Nesse momento, como j
mencionado, utilizava-se de indicadores macroeconmicos per capita para a medio e
comparao de nveis de desenvolvimento econmico. Segundo Celso Furtado, entre outros
autores:
23
A literatura sobre desenvolvimento econmico do ltimo quarto de sculo
nos d um exemplo meridiano desse papel diretor dos mitos nas cincias sociais:
pelo menos noventa por cento do que a encontramos se funda na idia, que se d
por evidente, segundo a qual o desenvolvimento econmico, tal qual vem sendo
praticado pelos pases que lideram a revoluo industrial, pode ser universalizado.
Mais precisamente: pretende-se que os Standards de consumo da minoria da
humanidade, que atualmente vive nos pases altamente industrializados , acessvel
s grandes massas da populao em rpida ascenso que formam o chamado terceiro
mundo. Essa idia se constitui, seguramente, uma prolongao do mito do
progresso, elemento essencial na ideologia diretora da revoluo burguesa, dentro da
qual se criou a atual sociedade industrial (FURTADO, 1974, p. 16).
Posteriormente, com a compreenso de que crescimento econmico no era suficiente
para propiciar desenvolvimento, foram incorporados outros indicadores, mesmo da rea
econmica, para substanciar a anlise da problemtica da distribuio da renda e da riqueza
produzidas, aspectos no considerados anteriormente.
Outra contribuio prtica do conceito de desenvolvimento foi dada pela ONU que,
desde seu surgimento em 24 de outubro de 1945, passou a se preocupar com a paz e a
segurana dos 51 pases signatrios, o progresso social e coletivo e os direitos humanos,
respeitando em todo momento o princpio da autodeterminao dos povos. Ao longo dos
ltimos 50 anos a sua concepo de desenvolvimento e progresso social foi enriquecida
consideravelmente, superando a idia simplista de que o crescimento econmico, por si s,
bastaria para assegurar o desenvolvimento. Uma perspectiva mais complexa do conceito
passou a ser implementada, acrescentando para cada perspectiva de desenvolvimento um
epteto do tipo: econmico, social, cultural, naturalmente o poltico, o sustentvel e, por
ltimo e mais recente, foi acrescentado o humano. Este ltimo possuindo como objetivo o
desenvolvimento do ser humano, em lugar da multiplicao das coisas materiais da dimenso
econmica (SACHS, 2007, p.352)
A ONU, para classificar os pases de acordo o grau de desenvolvimento, utiliza
indicadores como ndice de mortalidade infantil, expectativa de vida mdia, grau de
dependncia econmica externa, nvel de industrializao, potencial cientfico e tecnolgico,
grau de alfabetizao, instruo e condies sanitrias (SACHS, 2007, p.243), tal tarefa
delegou ao PNUD5 em 22/11/1986 e asseverou os direitos dos povos ao desenvolvimento em
04/12/19866.
5 O Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) a rede global de desenvolvimento da
Organizao das Naes Unidas, presente em 166 pases. Seu mandato central o combate pobreza.
Trabalhando ao lado de governos, iniciativa privada e sociedade civil, o PNUD conecta pases a conhecimentos,
experincias e recursos, ajudando pessoas a construir uma vida digna e trabalhando conjuntamente nas solues
traadas pelos pases-membros para fortalecer capacidades locais e proporcionar acesso a seus recursos
humanos, tcnicos e financeiros, cooperao externa e sua ampla rede de parceiros. responsvel por medir
24
As mudanas ocorridas nas Naes Unidas nos paradigmas de anlise sobre
desenvolvimento, possuem as influncias dos tericos Mahbub ul Haq (dcada de setenta) e
Amartya Sem (dcada de noventa). Mahbub, props um modelo de desenvolvimento que
combatesse as piores formas de pobreza atravs do pleno emprego, fixao de padres
mnimos de ndices sociais e economia estvel. J Sen (1999) define que, um modelo de
desenvolvimento tem que ser visto como o aumento da capacidade dos indivduos de fazerem
escolhas de natureza diversas, como a econmica, incluindo o direito de ir, vir, comprar e
vender, a poltica e a cultural. O enfoque de liberdade de Sen (2000), est resumido em cinco
tipos de liberdades (SEN apud PEDROSO, 2003, p.18):
1. Liberdades polticas: referem-se s oportunidades que as pessoas tm para
determinar quem deve governar e com base em que princpios, alm de inclurem a
possibilidade de fiscalizar e criticar as autoridades, de ter liberdade de expresso poltica e
uma imprensa sem censura;
2. Facilidades econmicas: so as oportunidades que os indivduos tm para utilizar
recursos econmicos com o intuito de produo, distribuio, troca e consumo. A ttulo de
exemplo pode-se citar a disponibilidade regional do aa, fruto abundante na regio
amaznica, mas requer estradas, geleiras, mquinas processadoras, entre outros investimentos
de capital para que o aaizeiro d valiosa contribuio no desenvolvimento.
3. Oportunidades sociais: so as disposies e modos de acesso da sociedade para a
educao, sade, cultura, segurana, sem as quais dificulta-se em muito a liberdade dos
indivduos de viverem melhor. A sua influencia repercute at mesmo na participao efetiva
dos indivduos nas atividades econmicas e polticas;
4. Garantias de transparncia: referem-se s necessidades de sinceridade que as
pessoas podem esperar dos indivduos responsveis pelas decises sobre o rumo da sociedade.
Quando essa confiana gravemente violada, as vidas de numerosas pessoas podem ser
afetadas negativamente.
5. Segurana protetora: necessidade de proporcionar uma rede de segurana social,
impedindo que a populao afetada seja reduzida misria abjeta e, em alguns casos, at
mesmo fome e morte. A esfera da segurana protetora inclui disposies institucionais
fixas, como benefcios aos desempregados e suplementos de renda regulamentares para os
o grau de desenvolvimento de um pas no pelo crescimento econmico, mas pelo desenvolvimento da
populao. http://www.pnud.org.br/pnud/#topo. Acessado em 06/06/2009. 6 Declarao sobre os Direitos ao Desenvolvimento.
http://www.pnud.org.br/pnud/#topo
25
indigentes, bem como medidas ad hoc, como a distribuio de alimentos em crises de fome
coletiva ou empregos pblicos de emergncia a fim de gerar renda aos necessitados.
As idias deles contriburam para a adoo do termo Desenvolvimento Humano7
assumido pelo PNUD.
Pelo exposto, no basta que a lei garanta certos direitos aos indivduos, essencial que
estes tenham capacidades, qualificaes e as prerrogativas de se deslocar, de participar dos
mercados e de estabelecer relaes humanas que enriqueam sua existncia (SEN apud
PEDROSO, 2003).
Essas questes discutidas por Sen resumem os princpios da moderna economia do
bem-estar e os princpios do Desenvolvimento Social. Sendo este ltimo o que busca
igualdade de oportunidades, proteo contra as situaes estruturais de risco, o combate
pobreza e desigualdade e, assim como tambm, a eliminao de todas as formas de
discriminao social (KIECKHFER, 2005).
2.3 - O Desenvolvimento do social: um conceito de Desenvolvimento
Como anteriormente explicado, o conceito de desenvolvimento tem sido enriquecido e
ampliado no decorrer do tempo em que problemas importantes derivados do prprio
desenvolvimento passam a ocupar o centro das atenes das polticas pblicas. Inicialmente, o
desenvolvimento foi reduzido apenas ao campo da economia, a partir da segunda metade da
dcada de setenta com o crescente reconhecimento dos limites das polticas e projetos de
desenvolvimento junto aos eventos ambientais vividos pela sociedade, o conceito passou a
considerar outras dimenses, a social e a ambiental. Logo surge o desenvolvimento
sustentvel e, recentemente, o desenvolvimento social. (MALUF, 2000, p.36).
Concebe-se como desenvolvimento social, a trajetria de transformaes histricas
percorridas por uma determinada sociedade no processo histrico de reduo ou soluo das
desigualdades sociais (DEMO,1978, p.45). Desenvolvimento social implica, necessariamente,
7O conceito de Desenvolvimento Humano a base do Relatrio de Desenvolvimento Humano (RDH), publicado
anualmente, e tambm do ndice de Desenvolvimento Humano (IDH). Ele parte do pressuposto de que para
aferir o avano de uma populao no se deve considerar apenas a dimenso econmica, mas tambm outras
caractersticas sociais, culturais e polticas que influenciam a qualidade da vida humana. Esse enfoque
apresentado desde 1990 nos RDHs e foi idealizado pelo economista paquistans Mahbub ul Haq (1934-1998).
http://www.pnud.org.br/idh. Acessado em 06/06/2009.
http://www.pnud.org.br/rdh/http://www.un.org.pk/hdc/Tribute%20Page.htmhttp://www.pnud.org.br/pnud/#topo
26
desenvolvimento da sociedade no aspecto cultural, no econmico, no tecnolgico de forma
equitativa e totalitria.
Segundo SACHS, a referncia a um processo de desenvolvimento sustentvel deve
atentar a cinco dimenses: sustentabilidade social, econmica, ecolgica, espacial e cultural,
sendo que:
O Objetivo da sustentabilidade social melhorar os nveis de distribuio de
renda, com a finalidade de diminuir a excluso social e a distncia (econmica) que
separa as classes sociais. A sustentabilidade econmica diz respeito a aumentos na
eficincia do sistema, seja na alocao de recursos ou na sua gesto.
Sustentabilidade ecolgica concerne preservao do meio ambiente, sem contudo
comprometer a oferta dos recursos naturais necessrios sobrevivncia do ser
humano. A sustentabilidade espacial refere-se ao tratamento equilibrado da
ocupao rural e urbana, assim como de uma melhor distribuio territorial das
atividades econmicas e assentamentos humanos. J a sustentabilidade cultural diz
respeito alterao nos modos de pensar e agir da sociedade de maneira a despertar
uma conscincia ambiental que provoque reduo no consumo de produtos
causadores de impactos ambientais (SACHS, 2007, p.288).
Diversos autores (SIENA, 2002; SILVA, 2009; COSTA, 2008), mediante a construo
de ndices agregados, realizaram esforos para explicar desenvolvimento sustentvel a partir
de um nmero final elaborado considerando a melhor quantificao das cinco dimenses.
Apesar da valiosa contribuio desses trabalhos, de natureza quantitativa, percebe-se
nitidamente que as questes sociais so tratadas superficialmente e talvez a causa mais
provvel dessa desateno possa ter sido o volume de dados necessrios para a construo dos
ndices e indicadores agregados.
Destaca-se como prtica pioneira na preocupao com o desenvolvimento do homem,
o ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) que, segundo da SILVA (2009), a partir de 1990
ganhou notoriedade devido simplicidade de clculo e a disponibilidade de dados para todos
os pases. Com este indicador demonstrou-se que o progresso humano e a evoluo das
condies de vida das pessoas no podem ser medidos apenas por sua dimenso econmica.
imprescindvel que exista crescimento econmico, estabilidade monetria,
equilbrios econmicos e financeiros, sem o que no haver meios para se apoiar o
desenvolvimento social; no entanto, por sua vez, eles no sero sustentveis a mdio e longo
prazo sem que se produza um desenvolvimento social ativo (KLIKSBERG, p.34, 1998).
A anlise do desenvolvimento social, com base nos indicadores da qualidade de vida
da sociedade, tem como dificuldade principal o fato de que o social no est desvinculado das
27
outras dimenses e, necessariamente, a anlise requer variveis econmicas, polticas,
ambientais e culturais, mas a possibilidade de realizao desta suposta fragmentao do
conceito de desenvolvimento est baseada na considerao de que desenvolvimento antes de
tudo social, por ser exclusivamente para o homem social. Assim pode-se assumir que essa
dimenso representa muito bem o desempenho das outras dimenses e do conceito de
desenvolvimento em si. E como diz Sachs, no aceitvel, nem necessrio, que os
progressos financeiros econmicos sejam pagos por meio de desemprego ou subemprego
estruturais, resultando em fenmenos cada vez mais generalizados de excluso social e
pobreza (p.251, 2007).
No se pode referir uma sociedade como desenvolvida, mesmo tendo altos ndices de
renda per capita, investimento cultural, investimento em sade, etc. se no redor desses ndices
existe um ambiente desigual de acesso a essa riqueza ou de excluso social. Da mesma forma,
no se pode falar de desenvolvimento sustentvel, preservao da dimenso ambiental, se a
sociedade encontra-se passando fome. Pobreza, excluso social, violncia social, fome so
termos que no combinam com o de desenvolvimento.
Assim, h de se considerar como importante, tambm, a funo do Estado, isto , que
o Estado esteja em sintonia com as novas demandas sociais e exera um papel de facilitador
do desenvolvimento, articulando plano econmico com plano social.
2.4- Avanos na avaliao do desenvolvimento.
A discusso em torno do termo desenvolvimento tem-se enveredado sob a concepo
de que o conceito ou complexo ou sistmico, formado por diferentes partes essenciais da
vida humana, por conseguinte nesse enfoque, as partes afetam o todo e o todo afeta as partes.
Assim, pela circularidade em torno dos aspectos que compem a vida em sociedade, se faz
necessrio eleger indicadores que possam aferir os graus de desempenho de cada uma das
partes para posteriormente planejar aes eficazes rumo ao mundo desejvel, socialmente
desenvolvido e de forma sustentvel.
A Conferncia Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, na dcada de noventa,
constitui-se um evento importante na elaborao de indicadores que expliquem a
sustentabilidade do desenvolvimento. Segundo Ribeiro (2002), pode-se distinguir trs nveis
de indicadores de sustentabilidade, atendendo a rea de origem e de abrangncia: Nvel
Internacional, Nacional e Regional. Em nvel Internacional se tem: modelo CSD ONU; o
indicador de medio de sade das naes; o IDH e o ISA.
28
Em nvel nacional podem ser mencionados: Correo dos Sistemas de Contas
Nacionais, o mtodo da Bacia do Mar Aral (sia Central, abrangendo os pases: Cazaquisto,
Quibguisto, Tadjiquisto, Turconiquisto e Uzbequistao localizados no ecossistema da
bacia do mar Aral. E regional a elaborao de Indicadores de Sustentabilidade da Cidade de
Seattle.
Alguns desses modelos merecem destaques, como por exemplo: o modelo do
CSD/ONU tem como objetivo mensurar os progressos obtidos na implementao da pauta de
sustentabilidade da Agenda 21. O IDH tem sido muito utilizado pela ONU para comparar
pases quanto ao desenvolvimento das pessoas, considerando sade, grau de instruo e
expectativa de vida, Este indicador j possui verses at em nveis municipais, pode-se citar o
trabalho local de Silva (2009) em sua dissertao de mestrado, em relao ao municpio de
Porto Velho/Rondnia.
Para Nahas (2002, p.05) a contribuio da criao do IDH foi grande, ele marcou a
expanso de iniciativas de avaliao de desenvolvimento, das condies plenamente
econmicas para a considerao da qualidade de vida em recortes espaciais distintos: estados,
regies e cidades. Dentre as experincias brasileiras para grandes cidades destacam-se os
ndices desenvolvidos ao longo da dcada de 90, para Curitiba8 (PR), So Paulo
9 (SP) e Belo
Horizonte10
. KOGA (2003, p.84) destaca que, em 1991 foi realizada a primeira construo de
indicadores intra-urbanos aplicados a uma cidade brasileira com nfase na qualidade de vida
das pessoas e justia social, o Mapa de Excluso/Incluso Social da cidade de So Paulo ps
essa iniciativa, seguiram outros trabalhos semelhantes nas cidades de Belo Horizonte, Rio de
Janeiro, Curitiba, Recife, Santo Andr e Piracicaba.
Por sua vez, outra importante contribuio na anlise do desenvolvimento pela
dimenso ambiental, o ndice de Sustentabilidade Ambiental (ISA), tambm criado pela
ONU, para medir a capacidade econmica dos pases e sua relao com a preservao
ambiental.
Outro modelo muito utilizado, e tambm criticado, o de Sistema de Contas
Nacionais ou tambm chamado de Contabilidade Social, tal sistema apresenta indicadores
agregados das riquezas produzidas pelas naes como o PIB e a Renda Nacional (RN) totais
ou per capitas. Uma das crticas realizadas a no informao de como se distribui realmente
8ndice Sinttico de Satisfao da Qualidade de Vida (ISSQV), elaborado pelo Instituto de Pesquisa e
Planejamento Urbano de Curitiba (1996) 9ndice de Excluso Social (IEX), elaborado pelo Ncleo de Estudos e Pesquisa sobre Seguridade e Assistncia
Social da PUC/SP 10
ndice de Qualidade de Vida Urbana e pelo ndice de Vulnerabilidade Social pela Secretaria de Planejamento
da Prefeitura de Belo Horizonte e os pesquisadores da PUC-MG.
29
essa riqueza produzida e a outra o no cuidado com o meio ambiente, necessrio para a
gerao futura de riquezas. Da primeira crtica se evoluiu para os Indicadores de Excluso
Social e o chamado Indicador Genuno de Progresso (IGP).
O IGP desenvolveu uma estimativa do bem estar social, a partir de 20 indicadores
econmicos, ampliando o clculo do PIB e posteriormente criando o PIB Verde, uma tentativa
de desenvolver um indicador semelhante ao clculo do PIB, mas que considerasse a
depreciao ocorrida no meio ambiente.
A elaborao do Atlas da Excluso no Brasil com base nos dados censitrios do
IBGE/2000, partiu da conveno de que a excluso social fruto da forma dependente como
o pas se inseriu na diviso internacional do trabalho, sendo o processo de industrializao
brasileiro resultado da obedincia ao capital internacional. Assim, os autores propuseram um
conjunto significativo de indicadores sociais e econmicos capazes de desenharem, no mapa
brasileiro, a cara da excluso no processo de desenvolvimento brasileiro (POCHMANN e
AMORIM, 2004, p.10).
Siena (2002) menciona a existncia de outras metodologias em relao incorporao
da questo ambiental na mensurao do desenvolvimento, entre elas a Pegada Ecolgica, que
mensura a quantidade de espao territorial e o consumo das pessoas, e a tecnologia que se usa
para se manter de forma equilibrada nesse espao. Outro que merece destaque o Barmetro
de Sustentabilidade, pelo qual se avalia a sustentabilidade atravs da combinao do bem
estar humano (sade, educao, desemprego, pobreza, etc.) e do ecossistema (terra, ar, gua,
etc.).
Outras experincias fazem avaliaes mais pontuais em nvel municipal e at em nvel
de bairros. Dentre os exemplos colocados se tem, novamente, uma verso de IDH-M
municipal, considerado por Veiga (2008) um indicador de segunda gerao ao incluir outros
aspectos alm do econmico. Esse autor reconhece uma terceira gerao de indicadores,
representada pelo ndice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS) e o ndice de
Desenvolvimento Socioeconmico (IDESE) gacho, que foram criados para evitar a
armadilha do PIB per capita e as insuficincias do IDH. Destaque-se novamente Silva (2009)
que incorpora outras variveis nas dimenses de economia, educao e sade, assim como
agregou outras novas dimenses ao IDH tentando dar uma maior complexidade ao indicador
para explicar desenvolvimento municipal, no caso de Porto Velho.
Mais adiante surgiria uma quarta gerao de indicadores em virtude das limitaes dos
indicadores sintticos da terceira gerao, entre eles o ndice DNA Brasil criado pelo Ncleo
de Estudos de Polticas Pblicas (NEPP) da Universidade Estadual de Campinas
30
(UNICAMP)11
e o ndice de Desenvolvimento Social (IDS) do Instituto Nacional de Altos
Estudos (INAE) (VEIGA, 2008).
Em um plano histrico e metodolgico tratar das condies de qualidade de vida de
uma determinada populao era uma tarefa da rea da medicina social sob uma viso
eugnica ou higinica, com ou sem suporte do Estado. O surgimento das cidades, expanso do
capitalismo no sculo XVIII, o problema das doenas dos pobres, fez da medicina social um
poder nico e homogneo que contribua para diminuir as tenses, a manuteno e
conservao da fora de trabalho e o aumento de sua utilidade. Esboa-se o projeto de uma
tecnologia da populao: estimativas demogrficas, clculo da pirmide das idades, das
diferentes esperanas de vida, das taxas de morbidade, estudo do papel que desempenha um
em relao ao outro o crescimento das riquezas e da populao, diversas incitaes ao
casamento e natalidade, desenvolvimento da educao e a formao profissional.
(FOUCAULT, 1979, p.198)
No sculo XX, indicadores para construo de perfis j possuam uma intrnseca
relao com a economia e o planejamento pblico, tendo forte amparo na dcada de 60.
Com a crise desse modelo em meados da dcada de 60, na sociedade norte americana,
surge a necessidade de construo de modelos estatsticos que conseguissem interpretar o
descompasso entre o crescimento econmico e os nveis altos de pobreza. Face a este quadro,
empreendeu-se um imenso esforo conceitual e metodolgico para desenvolvimento de
instrumentos de mensurao do bem estar e da mudana social, sob os auspcios das
instituies multilaterais como OCDE, UNESCO, FAO, OIT, OMS, UNICEF e Diviso de
Estatstica das Naes Unidas. A publicao dos livros Social Indicators e Toward a Social
Report, elaborados sob encomenda do governo americano em meados dos anos 60,
representaram marcos importantes no processo, inaugurando o que viria se chamar de
Movimento de Indicadores Sociais na poca (JANUZZI, 2002, p.01).
A partir da dcada de 70 apareceram, ou foram planejados, em vrios pases uma srie
de compndios de estatsticas sociais e de indicadores sociais; em 1970, Social Trends na
Inglaterra; em 1973, Donnes Soclales na Frana, Social Indicators nos EUA e
Geselischaftsliche Daten na Alemanha; e, em 1974, Social Indicators of Japan e White
Paper on National Life no Japo, entre outros (SANTAGADA, p.248).
11
O ndice DNA Brasil criado no mbito da UNICAMP contou, em maio de 2005, com a presena de 46 ilustres
pessoas das diversas reas sociais, desde estudantes at economistas renomados como Celso Lafer, para discutir
a construo de um ndice mais abrangente que o IDH e que levasse em considerao um maior nmero de
dimenses estratgicas da sociedade como: bem estar econmico, competitividade econmica, condies
socioambientais, educao, sade, proteo social e coeso social.
31
Os insucessos, sucessos parciais e excessos do Planejamento Tecnocrtico no perodo
acabaram criando um grande ceticismo com relao s atividades de planejamento pblico e
portanto, com relao finalidade e utilidade dos Sistemas de Indicadores Sociais. Este
descrdito durou pouco, j que em meados da dcada de 80, com aprimoramento das novas
experincias de formulao e implementao de polticas pblicas Planejamento Local,
Planejamento Participativo- a pertinncia instrumental dos Indicadores Sociais acabou sendo
restabelecida (JANUZZI, 2002, p.01).
Na dcada de 1990, atravs do chamado Ciclo Social de Conferncias das Naes
Unidas, a ONU buscou imprimir uma dinmica poltica aos programas de ao social em
determinados campos e auxiliar no avano de um consenso internacional acerca das
prioridades no que diz respeito ao tema do desenvolvimento (CANO, 2006, p.62).
A mensurao da sustentabilidade da dimenso social, do conceito de
desenvolvimento, considera que a partir dela que se sustenta qualquer processo de
desenvolvimento a contra gosto dos reducionistas econmicos que priorizam que o progresso
econmico decisivo no social. A sustentabilidade social responde a finalidade do
desenvolvimento, enquanto que a econmica responde a sua necessidade (SACHS, 2002).
Recentemente, mereceu destaque na mdia, o pedido do presidente da Frana, Nicolas
Sarkozy (2009) agncia de estatstica francesa (INSEE) para incorporar ao PIB medidas de
bem-estar social, com base na percepo de que o robusto crescimento econmico das
economias capitalistas pe "em perigo o futuro do planeta, destri mais do que cria". O
desenvolvimento da nova proposta foi entregue ao premio Nobel de economia Joseph Stiglitz.
O quadro seguinte resume algumas dessas metodologias importantes e suas estruturas
temticas na perspectiva social.
32
METODOLOGIAS/TEMAS AVANOS LIMITAES ID
H1
2 Educao
Renda
Longevidade
- os dados so de fcil obteno e a simplicidade do clculo metodolgico garante a aplicao
comparativa para diversas variveis
- a dimenso social fica em segundo plano e as disparidades regionais so avaliadas
uniformemente
UN
CS
D1
3
Equidade Sade
Educao Segurana
Demografia Governana
- indicadores agrupados conforme a Agenda 21 e detalhados de forma de fcil entendimento
- nmero excessivo de indicadores
- nfase exagerada aos indicadores biofsicos e ambientais
SE
AT
LE
14
Equidade social e renda
Segurana alimentar Tomada de deciso
participativa, liderana e
responsabilidade Economia comunitria
prspera
Negcio sustentvel
- comunidade o elemento crucial - no h definio de metas futuras
IEX
15
Autonomia de renda
Desenvolvimento
Educacional e Delinqncia Juvenil
Qualidade domiciliar
Equidade
- elabora uma leitura do todo com base no
cotidiano e da experincia de vida das pessoas;
- constri referncias sobre incluso social atravs de utopias, daquilo que desejado como
ideal individual e coletivo;
- uma medida de referncia do perfil do cidado
- longos debates com a populao, ONG,
governo, universidades, etc. - informaes oficiais dispersas e
limitao da representao cartogrfica
AV
AL
IA
O
DE
BE
M E
ST
AR
16
Sade e populao
Riqueza
Conhecimento e cultura Comunidade
Equidade
- nfase no ser humano como beneficirio final do processo rumo a sustentabilidade;
- quadro visual de seus resultados atravs do
barmetro de sustentabilidade
- nmero elevado de indicadores;
- no apresenta um mtodo claro;
- ao supervaloriza uma dimenso, desconsidera as peculiaridades de cada
sistema
IDS
17
Renda
Sade
Educao
- elaborao anual pela PNAD/IBGE; - dar visibilidade as diferenas sociais existentes
no pas, por regio e Estados;
- os componentes tm pesos iguais;
- instrumento quantitativo e produz uma
medida sinttica;
AT
LA
S D
A
EX
CL
US
O
SO
CIA
L N
O18
BR
AS
IL
Padro de vida digno
Desigualdade de renda
Anos de estudos do chefe de
famlia
Vulnerabilidade Juvenil
- indicador comparativo das desigualdades
sociais;
- disponibilizao das informaes em forma de mapas temticos;
- a utilizao do geoprocessamento em
unidades com grandes vazios espaciais ou
com elevada renda, pode dar a impresso errada de maior incluso;
QUADRO 1 Demonstrativo sinttico de metodologias para construo de ndice de desenvolvimento
social. Fonte: Elaborao prpria.
Para a avaliao do estgio de desenvolvimento social do municpio de Ji-Paran, foi
considerado os indicadores sociais propostos por estas metodologias, no entanto optou-se pelo
estudo e anlise da metodologia de dois ndices de sustentabilidade social: ndice de Excluso
Social de So Paulo (SPOSATI, 1991) e o ndice de Desenvolvimento Social do Cear/2007,
para posterior construo do IDS-J proposto.
12
ndice de Desenvolvimento Humano 13
Comisso para o desenvolvimento sustentvel das Naes Unidas. 14
Projeto de indicadores de Seattle sustentvel (1990), parte da premissa que as pessoas deveriam escolher os
meios para mensurar seu bem estar comunitrio a longo prazo. 15
ndice de Excluso Social, a ser discutido no captulo 4 deste trabalho. 16
Desenvolvido pelo World Conservation Union (IUCN) para avaliar a condies ambientais, humanas e
progresso em direo ao desenvolvimento sustentvel. 17
ndice de Desenvolvimento Social elaborado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) que tem por
base a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios (PNAD). 18
Elaborado em 2002 por Marcio Porchmann e Ricardo Amorim.
33
3 BREVE CARACTERIZAO DO DESENVOLVIMENTO NA
REGIO EM ESTUDO: JI-PARAN
3.1- Origem e formao do municpio
No territrio onde est situada hoje a cidade de Ji-Paran viviam os ndios Muras
(Parintins), Urups e Jars. Estes iniciaram uma luta, com data de final do sculo XIX, entre
1877 e 1900, em defesa de suas terras pelo fato dos seringalistas terem construdo barraces
ao longo do complexo hidrogrfico da bacia do Rio Machado. A este lugarejo os seringueiros
denominaram de Urup (BASSEGIO; PERDIGO, 1992).
Importante fato histrico para a consolidao do Estado de Rondnia e para o
municpio de Ji-Paran foi o projeto de implantao da linha telegrfica em 1909, pelo
consagrado Mal. Cndido Rondon que tinha o intuito de tirar do isolamento as regies do
extremo norte e oeste do pas, garantindo a segurana das fronteiras. A instalao do
Telgrafo transformou a Vila Urup em Vila Afonso Pena (TEIXEIRA; FONSECA, 2001).
O nome de Vila Afonso Pena permaneceu at 1943, quando o ento presidente Getulio
Vargas, ao criar o territrio do Guapor, instituiu o distrito de Vila de Rondnia. Vila de
Rondnia sofreu um processo de estagnao em seu desenvolvimento devido ao
desaquecimento do mercado internacional da borracha, permanecendo assim at a descoberta
de diamantes na regio,na dcada dos anos cinqenta (SILVA, 2004). Mais uma vez os
indgenas nativos da localidade tiveram que lutar duplamente, pela reconquista de seu espao
contra a vontade opressiva governamental e contra os primeiros migrantes nordestinos que
vieram para a explorao mineral e produo da borracha. Segundo dados do IBGE, Vila de
Rondnia contava com cerca de 30 habitantes, mas com chegada dos garimpeiros esse
nmero aumentou para 2.000, sendo novamente alterado somente no incio da construo da
rodovia BR -29, atual BR 364 (IBGE, 1984). A construo da rodovia d incio a outro ciclo
de desenvolvimento e de aes sob critrios de segurana nacional.
Sem dvida o atual nvel de desenvolvimento econmico e social do municpio de Ji-
Paran tem por base as conseqncias do processo de colonizao do Estado de Rondnia,
dadas as polticas pblicas de cunho desenvolvimentista das dcadas de sessenta e setenta do
governo brasileiro, em plena ditadura militar. O ento espao do atual estado de Rondnia, foi
ocupado para atender uma demanda do projeto nacional de desenvolvimento econmico,
desprestigiando as necessidades das populaes locais. Cabe ressaltar que o pressuposto
34
daquele modelo de desenvolvimento consistiu em considerar Amaznia desocupada e
disponvel para abrigar a massa falida de camponeses do sul, expulsos pela expanso do
grande capital na agricultura capitalista brasileira, ou do norte, fugitivos das grandes secas.
Em 1963 tem incio o projeto de colonizao particular pelo Grupo Vitrelli na regio
de Vila de Rondnia, em virtude do insucesso do projeto ocasionado pela apropriao
indevida de terras da Unio (incluindo tambm as empresas Calama S/A e Itaporanga), em
01/04/1971, atravs de Decreto-Lei, o INCRA assume a colonizao (BASSEGIO e
PERDIGO, 1992):
importante ressaltar que a ocupao e colonizao recentes do Estado de
Rondnia so resultado da estratgia do governo brasileiro no sentido da ampliao
das condies para a expanso do capital na economia brasileira, fundamentada na
economia de mercado, que preconizava a ocupao da fronteira por meio de uma
poltica de integrao nacional. Esta concepo desenvolvimentista se sedimentou
no incio dos anos 70, com nfase em investimentos de recursos financeiros em
programas e projetos de infra-estrutura econmica e social, estimulando e
orientando o fluxo migratrio em direo Amaznia (BATISTA, 2001, p.06).
A Poltica interna do INCRA convergia para o atendimento da poltica externa
brasileira na busca pela resoluo de problemas como reforma agrria, mecanizao da
lavoura na regio sul, conflitos no nordeste, fornecimento de mo-de-obra barata para o
capital, entre outros. A colonizao desenvolvida pelo INCRA foi realizada mediante dois
tipos de projetos: os Projetos Integrados de Colonizao (PIC), destinados populao de
baixa renda, sem terra e com perfil de agricultura familiar; e os Projetos de Assentamento
Dirigido (PAD), destinados queles que possuam recursos financeiros para investir em
projetos agrcolas ou que tivessem acesso obteno de crdito bancrio.
O desenvolvimento de Vila de Rondnia deu-se atravs da implantao do PIC Ouro
Preto, tornando-se alvo de um intenso movimento migratrio e de investimentos
governamentais na rea agrcola (plantao de cacau e caf) contribuindo para sua elevao
em municpio em 11/10/1977, mas que caracterizou um desenvolvimento desigual, e
naturalmente agressivo por causa da diversidade de tamanho de propriedade da terra e o
incentivo a atividades predatrias do local para a obteno do ttulo fornecido pelo INCRA.
Em Rondnia, a dimenso rural e urbana constituda simultaneamente; no
se pode classificar como um processo de hiperurbanizao, mas que se pode
denominar de um urbano das reas de expanso de fronteira [...] Os Ncleos
Urbanos de Apoio Rural NUAR j surgiam como uma grande favela no meio da
floresta, nos projetos de colonizao, lugar onde as pessoas ficavam aguardando
35
servio e terra para trabalhar. Os diversos ncleos urbanos que no evoluem
condio de cidade mantm-se como ncleos de excludos, lugar de pobreza, lugar
dos expropriados da terra (AMARAL, 2007, p.61/62).
Ao INCRA dado o papel de Estado Regulado, com poderes suficientes para garantir
a ocupao da fronteira em prol dos interesses do capital, deixando em segundo plano o
grande volume de pessoas que para o Estado vieram em busca da construo de um espao.
Em Ji-Paran houve a formao de trs nuares: NUAR Nova Londrina, NUAR Nova
Colina e o NUAR Mirante da Serra, estes por sua vez passaram a integrar o elo entre a
expanso capitalista no campo em detrimento a supresso da agricultura familiar, onde o
pequeno agricultor junto com sua famlia tornaram-se um assalariado do capital. A prova
dessa falcia desenvolvimentista que dos trs ncleos, somente o Mirante da Serra foi
emancipado a condio de municpio.
3.2- Evoluo econmica de Ji-Paran
Na dcada de 70 a cidade de Ji-Paran foi agraciada, tal como outras cidades
brasileiras, com grandes somas de investimentos do governo federal atravs do Programa
Nacional para as Cidades Mdias e Capitais. Esse programa visava transformar algumas
cidades amazonenses em rotas alternativas de migrao aos grandes centros industriais do
pas. Assim, Ji-Paran, Porto Velho e Vilhena (RO), Boa Vista (RR) e Rio Branco (AC)
deveriam servir de porto final para um intenso fluxo de emigrantes e precisavam estar
preparadas para receber esse contingente populacional. Era de interesse do capital e do
Estado, a fixao do migrante na Regio Amaznica atravs da implantao de infraestrutura
bsica para que o mesmo pudesse suportar as adversidades da regio (PEREIRA, 2004).
O critrio utilizado para a alocao dos recursos descansava no aporte ao
desenvolvimento regional da cidade, de acordo com as premissas estabelecidas pelo Programa
de Plos Agropecurios e Agrominerais da Amaznia (Polamaznia), em que se expressava:
promoo dos ncleos urbanos de ocupao estrategicamente selecionados ao longo das
rodovias de integrao amaznica, bem como em funo das potencialidades sub-regional
para o desenvolvimento agropecurio, agroindustrial e agromineral (SUDAM apud
PEREIRA, 1976, p. 6).
36
Considerada uma cidade de porte mdio, pelo nmero de habitantes, acima de 100 mil
habitantes19
, mas tambm por seu papel na diviso social do trabalho regional, Ji-Paran
constitui-se em um centro ou sub-regio econmica com setores comerciais e industriais bem
diferenciados. Segundo Ribeiro apud Pereira (2001), Ji-Paran tem alcanado nveis
econmicos, quanto ao volume de produo e distribuio de bens e servios, como as
capitais estaduais da Amaznia Legal, ou de Imperatriz, no Maranho; de Santarm e Marab,
no Par; Vrzea Grande e Rondonpolis, no Mato Grosso e/ou de Araguana, no Tocantins e,
no que tange ao papel das cidades na distribuio de bens e servios, o autor classifica a
cidade como um centro sub-regional que apresenta trao da frente pioneira agropastoril e
mineral.
Tambm Steinberger e Alencar (2004, p.09) descreveram Ji-Paran como um ncleo
urbano de poder20
, este deve aglomerar pessoas e decises sobre atividades econmicas,
sejam elas referidas ao espao urbano ou no. Assim, se um determinado ncleo possuir,
simultaneamente, estes dois aspectos, pode-se dizer que ele ser um ncleo que tem poder
sobre as reas ao seu redor, incluindo as reas rurais, as reas florestadas e os demais ncleos
de menor importncia. Segundo os autores, atravs dos dados IBGE/2000, em Rondnia havia
oitoncleos de poder urbanos por ordem de importncia: Porto Velho, Ji-Paran, Cacoal,
Ariquemes, Vilhena, Jaru, Ouro Preto e Guajar-Mirim.
A Figura 1 localiza a situao geogrfica de Ji-Paran.
19
Segundo a Pesquisa Nacional de Amostra por domiclios PNAD- 2007, Ji-Paran possui 107.638 habitantes. 20
As duas variveis escolhidas para construir o patamar urbano de poder foram o Produto Interno Bruto
municipal (PIB) e a populao urbana. Para verificar a existncia de relao mtua, ou seja, a dependncia entre
as funes de distribuio das mesmas, calculou-se a correlao entre elas. O resultado de + 0,972, valor muito
prximo do mximo que 1,revela que essas duas variveis caminham no mesmo sentido. www.abep.nepo.unicamp.br/enconto2004.
http://www.abep.nepo.unicamp.br/enconto2004
37
Fonte: http://www.portalbrasil.net/estados_ro.htm. Figura 1: Mapa de Rondnia.
Dentre os setores econmicos merece destaque o madeireiro, que teve um rpido
crescimento nas dcadas de 80 e 90, passou de 20 para 72 empresas industriais no perodo de
1994 a 1997; no setor pecurio, segundo o IBGE/2005, Ji-Paran21
apresentava-se como a
primeira bacia leiteira do Estado e a segunda do pas.
O Censo Agropecurio/2006 revelava o municpio como responsvel por 18,9% da
produo de caf do Estado, atrs apenas de Cacoal (32%) e Alvorada (20,9%).
No segmento energtico, Ji-Paran encontra-se na rota de construo de usinas
hidreltricas. Em 1983, a Centrais Eltricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE) pretendia,
atravs do represamento do Rio Machado, criar uma hidreltrica com vistas ao
desenvolvimento regional, com ela seria afetado os municpios de Ariquemes, Jaru e Ouro
Preto DOeste, desestruturando o modo de vida de agricultores, populaes indgenas (como
os arara e gavio) e a reserva biolgica de Jaru (REBIOJARU). Por este impacto social
projeto no saiu do papel contando com acirrada mobilizao social, contudo em 2005 o
projeto retorna a pauta da Agncia Nacional de Energia Eltrica (ANEEL) e um segundo
inventrio, feito pela empresa FURNAS, colocou a vista o potencial hdrico da regio para o
21
Micro regio de Ji-Paran, segundo a EMBRAPA/RO, se constitui dos municpios de: Ji-Paran, Ouro Preto,
Jaru e Presidente Mdici.
http://www.portalbrasil.net/estados_ro.htm
38
atendimento da demanda regional e a possibilidade de exportao do excedente energtico
para as demais regies do pas, atravs do sistema interligado. Segundo relatrio de furnas:
Em 2005, os estudos de inventario do Rio Machado foram retomados numa
parceria entre ELETRONORTE, FURNAS e a Construtora Queiroz Galvo, e em
abril de 2007, a ANEEL os aprovou. No relatrio final, o eixo JP-14 foi descartado.
Agora, a opo pelo eixo JP-04, batizado de Usina Tabajara, situado rio abaixo, no
municpio de Machadinho DOeste. Um rearranjo do projeto original reduziu a rea
de alagamento para 128,8 km2 e a potncia prevista para 350 MW. Em junho do
mesmo ano, os responsveis pelo novo projeto hidreltrico do rio Machado
protocolaram o pedido de abertura do processo de licenciamento ambiental da Usina
Ji-Parana junto ao IBAMA, ainda em avaliao. (NBREGA, 2008, p.59).
No existem dvidas de que a construo de uma hidreltrica na localidade traria
mudanas significativas ao seu PIB, a comear pela elevao no nvel de atividade econmica
pelo aumento do nmero de empresas complementares e pelo aumento do produto interno da
regio.
3.3- Evoluo social de Ji-Paran
Surpreendentemente Ji-Paran, a segunda economia do Estado de Rondnia vem
apresentando indicadores sociais de nveis relevantes dentro do Estado e na regio norte.
Conforme dados do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD/2000), o
IDH-M de Ji-Paran, considerado de desempenho mdio22
, com valor de 0,75, era o terceiro
maior do estado. Este era inferior somente em relao aos valores da capital do estado, Porto
Velho e do municpio de Vilhena.
Nos aspectos de educao e renda, duas dimenses do IDH de Ji-Paran tambm
ficavam abaixo dos mesmos municpios anteriormente citados. Nessas dimenses Ji-Paran,
respectivamente, apresentou mdias de 0,71 e 0,85. No obstante, ao observar o nmero de
alfabetizados em 2000, segundo o censo de IBGE, verifica-se um quantitativo reduzido. A
Tabela 1 identifica a populao do municpio.
22
O resultado do IDH varia entre 0 e 1. Um IDH explica baixo, mdio ou alto nvel de desenvolvimento
humano, se seu valor se encontrar compreendido, respectivamente, entre 0 e 0,5; 0,5 e 0,8; e; 0,8 e 1.
39
Tabela 1 Populao residente, por grupo de idade e alfabetizadas de
Ji-Paran/2000
Populao residente de 5 anos ou mais de idade
por grupos de idade, total e alfabetizada Idades N de pessoas % 5 a 7 anos 7.043 7%
8 a 10 anos 7.074 7%
11 a 13 anos 7.163 8%
14 a 15 anos 4.962 5%
16 a 17 anos 4.788 5%
18 a 19 anos 4.945 5%
20 a 24 anos 10.684 11%
25 a 29 anos 9.409 10%
30 a 34 anos 8.914 9%
35 a 39 anos 8.144 9% 40 a 49 anos 10.997 12%
50 a 59 anos 5.914 6% 60 anos ou mais 5.888 6%
Total: 95.925 100% Fonte: Censo Demogrfico/IBGE, 2000. Elaborao prpria
Em relao ao IDH de 0,70 da regio Norte, Ji-Paran com 0,75 mostrou maior ndice
de desenvolvimento que a mdia da regio, contudo no se pode perder de vista que os ciclos
econmicos vividos por Rondnia, e especificamente por Ji-Paran, tem por base uma
ocupao territorial sob presso poltica e econmica, seja nacional ou internacional, com o
intuito de atender as demandas do capital, presso essa denominada por Becker (2004) de
estratgia de coero velada.
Assim, no decorrer da implantao das polticas de desenvolvimento para a regio, o
governo federal promovia a ocupao territorial e deixava, em segundo plano, as aes
necessrias para a incluso social daqueles indivduos que por muito tempo ficaram isolados
do resto do pas.
Os planos desenvolvimentistas para a regio amaznica, como Projeto de Integrao
Nacional (PIN), Programa de Plos Agropecurios e Agrominerais da Amaznia
(POLAMAZONIA), Programa de Desenvolvimento Integrado do Noroeste do Brasil
(POLONOROESTE) e Plano Agropecurio e Florestal de Rondnia (PLANAFLORO),
apesar de terem contribudo com a ocupao da fronteira tambm foram responsveis pelo
desmatamento acelerado, a invaso de terras indgenas e de unidades de conservao,
desrespeito a cultura das populaes tradicionais e as disparidades intrarregionais. Na
40
verdade, a partir do momento em que governo brasileiro realizou acordos com os bancos
internacionais criou-se uma obrigao perptua de submeter-se lgica financeira
globalizante, mas na condio de pas dependente do capital externo, oriundo de naes
poderosas economicamente que objetivam ampliar seu mercado interno (IANNI, 2004).
Assim, as polticas pblicas implantadas em Rondnia nos ltimos 20 anos no
conseguiram amenizar os diversos conflitos scio-ambientais surgidos, uma vez que a sua
aplicao verticalizada as tornavam incuas das particularidades regionais. Nesse contexto,
Diegues (2001) consegue caracterizar muito bem esse modelo intervencionista de fora para
dentro, o resultado negativo na questo social da ocupao territorial rondoniense. Segundo
ele, a condio humana em rea de colonizao apresenta-se como uma tragdia dos
comunitrios, uma vez que esta populao expulsa de seus territrios tradicionais pela
expanso da grande propriedade privada, da propriedade pblica e dos grandes projetos. A
situao desses comunitrios comeou a ser ameaada com o processo relativamente recente
de incorporao desses territrios pela expanso urbano-industrial e dos limites impostos
expanso da fronteira agrcola no sul pas.
Os colonos incentivados pelas propagandas governamentais, at porque em seu
habitat a fome, a seca e a mecanizao da lavoura os impediam de viver dignamente,
deslocaram-se a terra prometida no af de mudarem de vida e se deparavam com um ambiente
inspito e endmico, sem infraestrutura estatal. Na realidade, houve apenas uma mudana
territorial daqueles excludos economicamente do sistema metropolitano, uma vez que a cada
decadncia dos ciclos se formava uma legio de excludos da fronteira.
A precariedade das habitaes, que no contavam com tela de proteo nas