Neurologia Relacional - A experiência humana em situações de comunicação

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© Spritzer, Sergio 2014

Editoração e ilustraçõesLucas Marques Muccini

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Spritzer, SergioNeurologia relacional : E Estrutura da sua Experiência

de Comunicação. / Sergio Spritzer. - Porto Alegre, RS. 2014. 192 p.

ISBN 978-85-66146-05-9

1.Neurologia 2. Neurologia relacional 3. Comunicação interpessoal 4. Neurologia intrapessoal 5. Linguagem I. Título

13-0929 CDD 302.2

Índices para catálogo sistemático:

1.Comunicação humana

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Sumário

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Você pode imaginar uma grande diversidade de atividades de grupo pelas quais já passou: aulas, palestras, oficinas, atividades de congressos, reuniões de equipe e assim por diante. Possivelmente você já participou de muitas delas durante toda a sua vida, seja na condição de plateia ou na de expositor.

Observe como antes de começar a atividade todos estão relaxados conversando animadamente, fazendo novos amigos, circulando, apresentando-se e sendo apresentados, comentando o que esperam da atividade, de onde vem o que fazem e o que esperam.

Muitos se orientam pela proximidade geográfica, buscando pessoas ao lado. Outras atravessam o salão em busca de alguém conhecido. Alguns sentam e esperam comportadamente a atividade “principal” ser anunciada. E ficam em silencio, alheios, lendo algo ou mergulhados na internet. A maioria, porem, interage. Olham, sorriem e realizam pequenos gestos indicando disponibilidade e interesse em fazer contato; se correspondidos aproximam-se. Com o tempo, forma-se se pequenos grupos de afinidades. Inicialmente, muito instáveis, entrando uns e saindo outros até adquirirem certa constância e identidade de interesses e afinidades.

Quando o ministrante entra, todos se encaminham para seus lugares e se calam, adotando posturas e atitudes muito parecidas. A plateia agora é uma massa procurando captar o conteúdo exposto da melhor forma.

A maioria dos inscritos preferiria ver e ouvir a gravação da atividade proferida pelos professores ou palestrantes no conforto da sua casa ou ambiente de trabalho cercado de amigos e colegas para conversar, parando a analisando o que aparece no filme da palestra ou mesa redonda. É penoso ficar um bom tempo em silencio, fisicamente contidos, sem muita chance de interagir seja com os palestrantes ou com os outros inscritos de forma livre e espontânea. O esforço de realizar exercícios e das dinâmicas de grupo dirigidos não equivale a construção espontânea das vivencias semeadas pelos pequenos grupos de antes do evento.

Ir a um evento para aprender conteúdos não se justifica. O encontro físico é profundamente motivado pela necessidade das pessoas comunicarem-se realmente, presencialmente, uma com as outras, com o pretexto de absorver um conteúdo formal, o qual na verdade está ou poderia ficar disponível como informação na internet, apostilas e livros.

A Comunicação Humana contemporânea: De onde vem e para onde vai?

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As relações humanas não podem ser postadas nem simplesmente curtidas. Precisam ser constituídas em ato. Comparecer a um evento para divertir-se ou negociar interesses usando como pretexto a aquisição de conhecimentos formais está cada vez mais carente de sentido. Existem excelente comunidades de intercambio de informação e ambientes físicos para diversão e turismo. Ninguém mais precisa submeter-se a um gigantesco e caro deslocamento e reunir-se com milhares de pessoas imaginando que aí haverá maior interação.

As descobertas solitárias de Arquimedes, da lei da flutuação dos corpos (eureca: meus pés flutuam!!!) , de Isaac Newton sobre a descoberta de leis da queda dos corpos, o sonho de Einstein de viajar num raio de luz, a curiosidade de Alexander Fleming reparando algo que matava as bactérias que cultivava (descobriu o primeiro antibiótico, a penicilina). Freud estudou e atendeu pessoas em conflitos com elas mesmas. As relações interpessoais e as coletivas ficaram praticamente de fora. A cultura americana propagou os feitos dos “self made man”, os heróis solitários. Nossa cultura tornou-se individualista supostamente em antagonismo com o “comunismo”. Entretanto no fundo se assemelham como culturas de massa. Em ambas são necessários lideres concentradores e uma imensa maioria de pessoas subordinadas aos interesses de pequenos grupos, ideológicos ou financeiros.

O exame mais apurado revela como por trás da capacidade de cada notável em qualquer cultura, seja um ditador, um cientista ou um Nobel da paz. Existe um clima relacional sem o qual eles não teriam maior repercussão. Imagine todos os seus heróis solitários tendo nascido e se desenvolvido isoladamente. Por exemplo, cada um deles numa remota ilha. Que diferença cada um deles faria para a humanidade? O que saberíamos deles e eles de outros?

O que acontece antes e depois das reuniões, nas cantinas, nos cafés, nos intervalos das atividades formais, quando de fato acontecem as interações mais criativas, inovadoras e aonde nascem as decisões mais inteligentes. Estamos perdendo tempo alegando falta de tempo e dinheiro. E ficando cada vez mais estressados substituindo relações de conversa e dialogo por tarefas de resultados e efeitos duvidosos.

É na informalidade e discrição dessas redes de interações locais onde acontecem as grandes reviravoltas.

Sergio Spritzer

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Nas relações de muitos seguindo a poucos, supostos saberem muito mais que os outros. Implica em uma relação de subordinação e uma ignorância forçada pela desautorização de cada em buscar uma construção baseada na identificação de afinidades de intenções, experiências, posturas, atitudes e modos de agir compartilhando resultados e efeitos percebidos em comum. Na realidade, várias cabeças e corpos pensam, sentem e fazem melhor que uma. A construção de um pensamento e ações coletivas já transcende o velho antagonismo

Quando se olha o individuo ou organização isolados, não vemos a rede de interações em meio a qual elas estão implicadas. Sem ver, buscamos a “fórmula do sucesso” como se fossem ilhas de bem estar no oceano de gente mal sucedida. Uma ingenuidade. O sucesso é uma construção particular para cada um com cada outro. Sem receitas e muito dialogo.

“O que fazemos privativamente afeta o que fazemos em público. O que nós pensamos afeta o que falamos. E o que falamos juntos, afeta, sem duvida, a nossa efetividade.” ( William Isaac em “ Dialogo: A arte de pensar juntos”1999)

Há muito que aprender a respeito de nós mesmos como redes humanas implicadas. É necessário que isso aconteça com muito mais desembaraço antes que nos transformemos uma gigantesca torre de babel de seres conectados tecnologicamente, mas fragmentários, não relacionados.

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Dez mitos a respeito da comunicação humana

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A busca da compreensão do que nos impede e facilita de criar laços relacionais têm gerado mitos ao longo da história. Guardamos alguns pressupostos limitantes que nos confundem, colocando uma espécie de cortina de fumaça, ou estancam nossos sentidos em direção a uma comunicação fluida e plena.

A “sociedade do conhecimento” ou da “informação” se sustenta

neste pressuposto. Entretanto, a compreensão ocorre apenas quando os indivíduos atribuem o mesmo significado às mensagens que intercambiam. Depende cada vez menos do conteúdo e cada vez mais da forma à medida em que a liberdade relacional aumenta.

A única forma de descobrir com certeza a coerência e a efetividade da comunicação é verificando o que acontece. Se possíve de forma compartilhada. A comunicação “certa” é aquela que atende aos interesses comuns. A “errada” é a aquela que não atende ao que interessa.

Como saber o que realmente interessa? Pelo dialogo. A busca de formas de comunicação que sejam coerentes entre si e de interesse comum, constitui o diálogo.

Se uma pessoa não responder a uma pergunta isso já é uma resposta. A interpretação do sentido dessa resposta depende do contexto por exemplo; É diferente não responder por não saber como e não responder por não ter ouvido.

A comunicação está implícita no viver humano. A decisão é estratégica: como se posicionar frente à posição relacional do outro num dado contexto no qual você já está sendo percebido como presente ou ausente de uma certa forma. Antes de decidir como agirá precisará saber da sua posição tanto quanto da do outro. Dos seus interesses tanto quanto dos do outro.

Mito 1: Se as pessoas sabem do que falam, então, elas devem ser capazes de entender uma as outras.

Mito 2: Existem formas certas e erradas de comunicar-se.

Mito 3: Você pode decidir se quer ou não quer se comunicar.

Sergio Spritzer

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Depende conversar sem foco distraidamente, associando ideias ao acaso pode ser irritante para pessoas centradas em tarefas e objetivos. Para outras, centradas na relação, pode facilitar. Entretanto, em nenhum dos casos uma falação egocêntrica desperta interesse em direção à compreensão recíproca ao diálogo.

O significado vem sugerido pela linguagem, mas não acontece a não ser quando interagido no aqui e agora, então, o significado oferece sentidos e vira comunicação. O que era significado torna se um intercâmbio de sentidos dando origem a novos sentidos.

O fato de que os significados são atribuídosde maneira intensiva pelas relações culturais, se não houver espaço para o diálogo, traz consigo possibilidades de mal entendidos e, com eles, de conflitos.

Sem diálogo torna se imperativo seguir à risca, agir literalmente como se fala ou como se escreve. Centrando se em conteúdos e significados, a atividade linguística oral ou/e escrita vira tarefa e deixa de ser comunicação.

Acordos, leis, nacionais e internacionais têm a função de facilitar a convivência e a realização compartilhada das coisas. Tomadas como normas inquestionáveis, podem levar ao estancamento das próprias relações humanas que procuravam facilitar.

Por exemplo, as classificações internacionais de doenças (CID)são acordos a respeito do possível significado de sinais e sintomas de doenças, em escala supostamente mundial. Recentemente o código internacional (CID-5) de doenças mudou sua classificação, como faz de tempos em tempos, evocando muita polêmica quanto aos critérios utilizados. Na França, por exemplo, adota-se outro sistema de classificação.

Acordos e normas internacionais de como e quando realizar determinadas cirurgias em determinadas pessoas quando feitos de forma excessivamente genérica podem induzir a erros no exame de caso à caso.

Mito 4: Quanto mais conversam, mais as pessoas se compreendem.

Mito 5: Palavras têm significado.O desafio da comunicação é segui-los à risca.

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O mais objetivo fora uma metodologia relacional e dailógica é examinar de dentro da realidade particular, caso a caso, até a generalização progressiva e em escalas: de “baixo” (em pequena escala) para “cima” (em grande escala), passo a passo, sem perder a interatividade, o contexto. Os defensores das escalas padronizadas dirão: isso leva muito tempo!!! Se a interação for ágil, nem tanto. Seja como for, a negação do particular não é a solução mais objetiva.

A normatização e a burocratização dos saberes têm sido historicamente, uma forma de preservar o que foi descoberto no passado e exercer um efeito estrutural (inevitável) de limitar a busca, a experimentação e a utilização da prática de novas formas de pensar e agir.

É preciso, realmente, uma boa dose de livre iniciativa e vontade de saber além do já instituído para inovar e criar novas regras. Essa dose de humildade e flexibilidade para adaptá las e até remove las dependendo do caso específico.

“Uma mentira repetida à exaustão vira verdade”. (Joseph Goebbels,

ministro da propaganda do regime nazista). Isso é coerente em sociedades de massas humanas, mas não vale

quando lidamos com redes humanas: interações entre pessoas dialogicamente orientadas. Nelas as influências são construídas de forma compartilhada e não impostas.

Vários estudos no campo da propaganda demonstram o óbvio: a imensa maioria das compras por impulso não satisfazem realmente as expectativas de quem comprou e o que foi comprado vai para o lixo. São fatos internos ( insatisfação) e externos ( o desperdício).

Uma sociedade de consumo em massa leva ao desperdício, não só de mercadorias, como também do tempo e energia das pessoas e da coletividade aplicados na comercialização sem sentido entre as partes.

Em uma sociedade de massas podemos prever o movimento da “manada”, como é o caso das previsões do mercado financeiro, num futuro imediato. Mas não é tão previsível quando o prazo é longo.

Mito 6: Podemos controlar e manipular as pessoas através da comunicação.

Mito 7: Não se pode predizer o que poderá acontecer em comunicação.

Sergio Spritzer

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Construir realidades que são contratadas para acontecerem de uma certa forma, trata-se um compromisso compartilhado voluntariamente entre as partes. Nesse caso uma relação de sinergia e coordenação recíproca e não de uma programação passivamente imposta para acontecer.

A comunicação real é reconhecida pelos seus efeitos. Eles são perceptíveis como fenômenos objetivos e subjetivos. Por exemplo, uma mudança de padrão respiratório, frequência cardíaca, postura física, olhar, voz, do uso da linguagem, do comportamento, correspondendo às mudanças de estado físico e mental.

A comunicação real não são padrões pesquisados passivamente em populações. Por exemplo, mulheres tendem a comunicar se mais indiretamente que homens. E a mulher em particular aqui e agora? Como estudá la neste momento? Esse é o desafio do estudo e da utilização das informações no campo da comunicação real. Vivida no aqui e agora relacional.

O risco de adotar resultados de estudos experimentais em massa é o de produzir um efeito cultural de estereotipar e distorcer a interpretação da comunicação de cada situação específica (no aqui a agora relacional) o padrão estatístico não é neutro. Ele sugere que comportem se de acordo com “todo o mundo”, a generalização.

Precisamos permanecer críticos em relação às estatísticas genéricas e guiar-nos pela comunicação real.

Mito 8: Saber comunicação é teórico. Não tem valor prático.

Mito 9: Aprender a comunicar-se deveria acontecer na infância. O adulto não tem mais chance.

O ideal seria investir intensa e profundamente em comunicação real desde a infância. Nessa época, somos abertos a novidades, não temos nada a perder e tudo a ganhar apreendendo.

“Plasticidade cerebral” é muito maior: Ao que supúnhamos nossos neurônios e outras células associadas trabalham com muito mais flexibilidade associativa, vida afora

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Há uma crença bastante forte de que o ambiente virtual está “tomando conta” das relações presenciais humanas. E, então, as relações humanas estariam desaparecendo e perdendo o sentido. Seria o “fim da história” humana.

Não parece bem assim. Os meios de comunicação nunca foram a própria comunicação real. Sempre foram meios, “mídias”, mesmo quando eram tambores, riscos em pedras ou sinais de fumaça.

O fato das mídias adquirirem uma crescente complexidade não justifica a crença de que elas é que “são” a comunicação. Os eventos em todo mundo de multidões saindo às ruas reivindicando a sua participação ativa na sociedade e reivindicando o direito de organizarem-se como bem entenderem provam o contrário. O aparecimento de redes relacionais responsáveis origina novas realidades nas quais cada um precisará assumir a sua marca singular, no plural.

As próprias tecnologias de comunicação estão cada vez menos “digitais” (no sentido de interação a partir da digitação, mesmo) e cada vez mais “analógicas” (parecidas) aos modos humanos de interação: mostrar e ver, ouvir e falar, tocar e sentir. Estão ficando mais “amigáveis” com nossas vozes, olhares, movimentos e até respeitando o fluxo de nossos desejos, emoções e percepções.

Vamos precisar saber como usar cada vez mais e melhor nossos sentidos, vozes, imagens mentais, gestos e etc, em ambientes interativos cada vez mais semelhantes aos presenciais.

A “plasticidade comunicacional” por sua vez, ainda é muito pouco conhecida. Ainda somos, em muito sentidos, escravos de nossas crenças passadas e não construtores de crenças desejadas, voltadas para o futuro, expressas como vontade e tomadas de decisão ativas com o comprometimento íntimo de fazer valer.

A maior barreira à aprendizagem é a impressão de já se saber sem experimentar sistematicamente, sem dar a oportunidade de construir juízos baseados na experiência interagida.

A maior alavanca da comunicação dialógica construtiva é o genuíno desejo de saber. A partir dele, desde os tempos socráticos, vem o desejo de se comunicar, de ouvir, observar, perguntar, experimentar. Interativamente.

Mito 10: Os meios digitais irão substituir a comunicação real entre pessoas.

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Decifrando Redes Humanas

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Precisamos aprender a expandir nossa capacidade de comunicação real em ambientes analógicos e dialógicos. Não basta ficar assistindo e votando: você vai precisar , cada vez mais, opinar, interagir, propor e construir em conjuntos. Vai precisar dizer o que pensa e sente, agir e mostrar para ser visto, ouvido, compreendido e sentido. Os meios digitais não farão isso por você ou pelos outros.

A característica dos sistemas humanos de comunicação é justamente a “Com -Ciência” (ser e estar cientes juntos). A intersubjetividade: ver, ouvir e sentir em comum movendo se na mesma direção e sentido é o que torna isso possível.

Isso torna o modelo de investigação tradicional, usado para pesquisar realidades físicas estáveis (física newtoniana), onde o examinador de um lado e a “coisa” examinada do outro lado e uma barreira irreversível entre ambos. Isoo é inadequado para investigar a comunicação humana. O estudo prático da comunicação humano lida com relações entre experiências, não entre coisas. Nesse sentido também é alheia ao intelectualismo: “segundo fulano e beltrano tal coisa deveria ser pensada de forma X, Y ou Z.”

O conhecimento relacional se produz em ato. Aqui e agora como experiência estruturada em comum.

Ciências humanas são “com-ciências”, no sentido de realidades construídas em e por conjuntos de pessoas. É a ciência de estarmos em realidades internas, interpessoais e coletivas, inexoravelmente associadas.

Uma com-fusão interessante

Em Berlim de 1900, havia um cavalo capaz de dar respostas para cálculos matemáticos propostos por uma plateia, batendo a ponta dos cascos até o número de batidas chegarem à resposta certa. Ele acertava quase todas ou errava por muito pouco. As pessoas se perguntavam: Como fazia isso? Foi examinado por uma equipe de cientistas. Eles falavam cálculos ficando de costas para o cavalo. Dessa forma ele errava todas. Nas apresentações em frente ao público ele acertava quase todas. Qual era a diferença? [Knapp & Hall (1999)].

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O animal usava o espelhamento: monitorava os sinais corporais, tais como mudanças da expressão facial, dilatação pupilar, posturas, inclinações da cabeça, respiração, o olfato, sons da respiração e outras pistas que as pessoas não percebiam.

Quando a multidão respirava aliviada e preparava-se para aplaudir, ele percebia e desacelerava as batidas. Chegando próximo, a reação acentuava se e ele, sabiamente, parava de bater. Então, as pessoas aplaudiam. O cavalo não era “burro”. As pessoas é que eram ingênuas.

O que fica como lição é a espantosa predisposição de nós, seres falantes, inventarmos realidades como se fossem objetivas, sem testar sistematicamente em que ela consiste. Adoramos ver mágicos fazendo ilusões. Isso nos encanta. Por outro lado queremos decidir a respeito do que nos é verdadeiro ou falso por critérios confiáveis.

Não temos escolhas a não ser a de reinventarmos juntos a realidade a todo momento. Não há mais lugar para pensamentos e ações livremente provisíveis.

As redes humanas de comunicação e as outras

É comum que as pessoas confundam a sua comunicação com as tecnologias através das quais ela se realiza. Redes de computadores ou plataformas de interação social não têm desejos próprios. Simplesmente emitem e captam “informações”

Você nota alguma semelhança ou diferença entre o modelo que temos de nós mesmos e o modelo cibernético “inteligente” das máquinas complexas? A “inteligência emocional” “inteligência afetiva?” seria a capacidade de sentir a si e aos nossos semelhantes. Afetividade é a capacidade de expressar e compreender emoções. Sentir emoções é diferente de compreendê las e expressá-las.

O planejador e o executor têm, ambos, intenções e planos próprios e precisam interagir dialogicamente para dar certo. Não basta saber como nos comportamos de acordo com critérios externos e mal conhecidos ou indesejados.

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Estamos em transição de uma sociedade de massas passiva, reagindo impulsivamente aos estímulos para uma sociedade em redes interativas na qual o que interessa é criar convivência humana de alta qualidade. O crescimento da demanda por serviços é indicativo da importância crescente de compreender nossa comunicação como redes interativas. Quem souber relacionar-se nesses ambientes tenderá a ser bem sucedido.

Assistir atividades passivamente tem sido cada vez mais desafiador. As pessoas têm se mostrado inquietas e desejam interagir com quem está na frente e em torno. As relações humanas estão cada vez menos subordinadas e cada vez mais ordenadas. Mais reais e físicas. Menos abstratas.

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Querendo ou não, temos nosso próprios desejos intenções e expectativas. Precisamos saber o que nos move internamente e como. E o jogo de desejos, sonhos e expectativas implicado em nossos comportamentos.

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A ideia de que nos comunicamos diretamente uns com os outros pela linguagem codificada é análoga ao modo como uma rede de computadores interage. Redes de computadores são programadas para interagirem, de certa forma, com base no conteúdo da informação.

Redes de computadores, mesmo as chamadas de “inteligência artificial”, são de fato artificiais pelo fato de não serem movidas a desejos, intenções e propósitos próprios. Não se norteiam pela sua identidade subjetiva, como as redes de relações humanas.

Sergio Spritzer

Nós não transmitimos ideias: Expressamos que temos em mente

como estruturas de experiencias e não conteúdos trasmitidos de um ponto ao outro.

A figura mostra o modo tradicional das pessoas “trocarem ideias” acreditando que essas ideias podem ser tratadas pela palavra apenas e que o corpo fica fora disso.

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pessoas “pensam”, ou seja, representam suas experiências para si e para outros.

A consequência mais grave será a de tornar se um adulto que repete o padrão de desautorizar-se perante figuras de autoridade cresce acreditando se pouco competente para interrogar, interrogar se e propor novidades de forma compartilhada.

A subordinação escraviza e nossa capacidade de pensar e agir interativamente. A coordenação estimula. Por isso o trabalho subordinado tranca e o coordenado dá

resultados e efeitos multiplicativos.

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Os melhores líderes se destacam por facilitarem a percepção de novas possibilidades não com preleções e palavras de ordem e sim pelo próprio exemplo, inovando espontaneamente buscando e encontrando resultados e pistas de novas tendências.

Acham estimulante compartilhar suas demandas e descobertas se for dada a devida oportunidade, por exemplo, em uma conversa informal, ao tomar um café antes ou depois de uma reunião, palestra ou workshop. Os momentos lúdicos são fundamentais para a qualidade dos relacionamentos, seja no trabalho, família, relações pessoais, aprendizagem, etc.

Note como a interatividade nada tem a ver com a conectividade: você pode ter “um milhão de amigos” numa plataforma de rede social e não interagir com ninguém de forma realmente construtiva, dialógica.

Em reuniões como as pessoas expõem ideias com planilhas, gráficos e projeções estatísticas, procurando ganhar tempo. Fica a impressão que as palavras e dados numéricos significam perfeitamente as ideias, sem necessidade de dialogo. É uma impressão ingênua da realidade à qual tais número se referem.

A maioria não se dá conta da importância de construir juntos , via dialogo, esses dados e cifras para eles se sustentarem em experiências compartilhadas e então adquirirem um sentido comum, real e prático.

Transformar o diálogo em tarefas a serem feitas é uma estratégia elasiva comum para escapar da condição dialógica em nossa cultura. “O que é que tu queres que eu faça?” . “Você manda e eu faço”. Isso não resolve nem mesmo define o problema.

A demanda de dialogo aparece disfarçada. Por exemplo, convidar alguém para “tomar um cafezinho”, “jogar bola” ou “brincar no recreio” tem o evidente sentido de desburocratizar a relação abrindo espaço para uma interação mais livre, oferecendo novas ideias, possibilidades, descobertas, construídas e executadas em comum.

Mergulhados em tarefas, perdemos tempo, imaginando ganhr tempo. Como não dão resultados, corremos ainda mais, resultado cada vez menos. É preciso romper com esse padrão antes que nos paralise.

Como? Colocando em primeiro plano a consciência de estar em relação. Dai em diante fica muito mais fácil aprender juntos.

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Sistemas Humanos são “Com-Cientes”

É recente a compreensão de que estar consciente é um processo relacional, e não um ou pensamento isolado. Não combina com explicações abstratas

O adulto exclama: -“Por que você fez isso?”. A criança não sabe. Descobrirá interagindo. Se assumir a “culpa” de não saber sem primeiro observar e depois experimentar estará sendo induzida a punir-se ou a consentir em ser punida por algo impossível: Saber algo sem ter experiência disso.

Em uma educação baseada na construção de relações, ela não precisaria sentir-se culpada. Seguindo a cultura tradicional não é incentivada à autorizar se for observação e experimentação. Se ela se autorizasse por si mesmo(a), responderia confiante: “porque achei curioso”, “interessante”, ou algo assim. Ao adulto não restaria escolha a não ser respeitar o espaço aberto.

As pessoas transmitem ideias? O primeiro impulso é afirmar que sim. Entretanto, “ideias” são como

rótulos de arquivos, como um menu de um restaurante, O nome dos pratos oferecidos não tem gosto, cheiro, aparência nem consistência. Não é nem a tinta ou o papel escrito. O nome das coisas nao são a experiência de interagir com elas.

Quando você tem uma ideia ou muda de ideia, descarta ou reprime um pensamento ou comportamentos, aparecem pistas mínimas de alteração de estado interno: discretas mudanças na voz, postura, gesto, olhar, mímica, cor da pele, respiração, etc. São pistas geralmente muito sutis da comunicação. Ela se passa entre partes de uma pessoa, entre pessoas, ou em um grupo. E também entre grupos, numa comunidade.

Na comunicação instrumental ou instrucional as palavras parecem comandos de ação de forma muito semelhante ao funcionamento de máquinas. Você pode aprender a fazer coisas treinando por ordens repetindo à perfeição. Mas não pode compreender treinando. Aí já é outro tipo de comunicação: a dialógica. Nessa você precisa interagir para percebê la. Ela se constitui longas relações.

A intenção da comunicação instrumental é realizar a tarefa conforme planejado. A da comunicação dialógica é gerar possibilidades, planos, deixar aparecerem intenções e desejos e nuances da ação não percebidos,

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Em ambientes de trabalho e estudo instrumental, centrada em conteúdos e tarefas, os momentos dialógicos são, via de regra, considerados “perda de tempo” E tempo é dinheiro ou “vale nota”. É uma crença perigosa.

A comunicação dialógica, é aquela na qual há pelo menos duas lógicas diferentes entre pessoas ou dentro de uma mesma pessoa por exemplo, quando alguém fala: “Por um lado eu penso X, por outro penso Y”, temos duas lógicas interagindo entre si, com duas visões de realidade, duas intenções ou propósitos em busca de um denominador comum.

Albert Meharabian, (1972) e de Dale Leathers e outros (2008), demonstram em números como a comunicação corporal e sensorial são processados pela mente antes da informação verbal. Antes Piaget já tinha mostado como nós passamos à linguagem depois de desenvolvemos as coordenações sensório motoras e representações mentais práticas da realidade.

A linguagem não produz o pensamento nem a experiência: ele organiza e modela.

Só mais recentemente a comunicação tem sido percebida como um processo interativo e reciproco: O consultor, medico clínico profissional de vendas ou de planejamento estão em redes relacionais de oferta e procura de sentidos. Ambas as partes precisariam ser, co-ativas.

A minha, a sua e a nossa. Não tem mais sentido estudá-las em separado.

Até hoje ainda são raros cursos em nível de graduação ou pós graduação estudando a comunicação humana como fenomeno real, prático, com efeitos na vida real das pessoas. Isso vai depender da integração de reações, diferentes como psicologia, neurologia, linguística, antropologia, sociologia com forte ênfase na aplicação prática com nas psicoterapias.

É impossível estudar a comunicação como algo de “fora. O desafio é saber como estamos metidos na comunicação e não tratarmos dela como um objeto, inerte. Ela é viva e estamos dentro dessa vida.

Estamos saindo da “era digital” no sentido de pensamento binário e teclar com os dedos como se isso fosse conversar e entrando na era do relacionamento, das redes humanas.

As tecnologias estão cada vez mais amigáveis com nossas percepções.

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Decifrar a comunicação significa desvendar o modo como ela foi constituída, “cifrada” como conteúdo “informação” e desvelar a essência: como uma experiência vivida. Decodificando a readquirimos a liberdade de gerar novas formas de recompô la cada vez mais e de forma mais alinhada com nosso desejo e com a nossa vontade. É disso que se trata a aprendizagem da comunicação humana: a busca do fluir da vida através dela.

Estudar a comunicação sem saber como você está implicado nela é como tentar pegar o dedo da própria mão. A mão que tem o dedo não pode pegar a si mesma. Veja os desenhos a seguir:

O desafio da cominicação humana como campo de prática de diagnóstico de intervenção e desenvolvimentos de pessoas e organizações é o de estramos implicados no que estudamos. O conceito de redes humanas proporcionou realizar interações em conjunto construindo e testando realidades compartilhadamente. estando aplicadas nelas.

A comunicação não é certa ou errada e sim coerente ou incoerente. Quando incoerente, realmente fica difícil responder ao o que está sendo

comunicado.

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Entre os precursores do estudo da comunicação humana contemporânea está Charles Darwin, da teoria da evolução das espécies. Ele estudou o comportamento animal e a musculatura implicada na expressão fisionômica das emoções. Demonstrou como se dá o reconhecimento das fisionomias ao longo da evolução das espécies. A expressão das emoções se tornou assunto do dia até hoje.

Com a psicanálise de Sigmund Freud, as expressões do desejo humano como os sentimentos e afetos também passaram a estar em evidencia. Aí não se trata só de uma inteligência emocional. Começa a compreensão do que nos move intimamente e como. A psicologia cognitiva (Piaget e outros) aparece mais tarde estudando o pensamento. Recentemente, aparece a neuropsicologia no estudo dos comportamentos, percepções, pensamentos e atividades humanas complexas.

O desejo se torna vontade ao encontrar um motivo, uma motivação. Quando incoerentes entre si, aparecem os sintomas de sofrimento psíquico. Obseve como se relacionam:

Sergio Spritzer

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Uma breve história da Neurologia Relacional

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A “verdade” em comunicação coletivaNa cultura ocidental, especialmente de inspiração americana, dar

a opinião sincera e direta a respeito do que o outro está dizendo ou fazendo é coerência, objetividade e sinceridade. Nas culturas orientais, uma apreciação direta e negativa pode ser interpretada como ofensa, falta de respeito, pois, focam em valores coletivos e no encorajamento , o apoio, a facilitação de novas possibilidades e demonstra consideração com o grupo e com a pessoa.

Num time esportivo há momentos nos quais todos se aliam para alcançar a vitória sobre os adversários, e outros momentos em que os membros do mesmo grupo podem disputar quem vai liderar um lance da partida ou chutar a gol, servindo ao outro para que se destaque e não ele.

O sucesso numa cultura individualista é o quanto uma pessoa se destaca das demais. O coletivo é uma espécie de plataforma de lançamento do indivíduo, o foco é na competição. Por outro lado, numa cultura coletivista, cada pessoa se destaca em promover o grupo. Mantendo uma atitude de referência e reconhecimento com ele. O foco é na cooperação.

Uma comunidade coesa tem seus modos de funcionar e não está aberta a outras diferentes, por mais respeitosas que as pessoas possam ser. Na cultura individualista cada pessoa é valorizada em função do que é capaz, independente do grupo que pertence. Isso é interpretado como a liberdade individual. Em culturas individualistas o grau de confiança em si é maior. Já em culturas coletivistas o grau de confiança nos outros é mais elevado.

Em culturas individualistas a informação tende a ser mais explícita e orientada de um para outro, hierarquicamente. “Um manda e o outro obedece”. Em uma cultura coletivista a informação é compartilhada, sem precisar explicitar verbal ou por escrito. “Não precisa mandar, explicar ou falar; cada um sabe o que fazer” por observação e experimentação e muita conversação e diálogo.

Neurologia Relacional - A estrutura da sua experiência de comunicação.

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Comunicação dialógica em relações interpessoais

Quando duas ou mais pessoas querem interagir para compartilhar algo que lhes interessa, a primeira atenção é dada ao ambiente e ao contexto: O lugar é agradável, acolhedor limpo, atraente? Comunica status, educação ou outro valor significativo para você? O contexto é oportuno e estimula a interação? Se o ambiente é formal, não vai sentir-se bem entrando ali de cueca e chinelos, por exemplo.

O momento do “primeiro encontro” é lembrado em detalhes, muitas vezes pelo resto da vida, seja um primeiro encontro amoroso, primeiro dia de escola ou primeiro dia na nova empresa.

Se você está planejando um evento com outras pessoas, seja ele pessoal, familiar, social ou profissional, a sua neurologia pessoal e interpessoal tenderão à realizar uma simulação íntima de vocês vivendo a situação planejada como se fosse aqui e agora. Em frações de segundos você vai saber o que necessita para realizar o que quer e como lidar com interferências e obstáculos. Por exemplo: você imagina que a interação com o fulano(a) será assim (imaginada como sendo de um jeito) e simulando com ele, percebe que não é bem assim.

Quanto mais as pessoas simularem como acontecem as relações em diferentes cenários, examinando as possibilidades desde fora, desde dentro, desde um passado já vivido, recordado ou construído, até um futuro a ser testado, maiores serão as chances de acertar.

É hora de fazer de conta como as crianças e realizando simulações de futuro de forma divertida e interessante.

Se achar que “isso é brincadeira e deveria ser sério” poderá ficar inibido e trancado. Se esse for o seu caso, o melhor é ir devagar. De um tempo. Respire. Tome um café, converse, ouça uma música, cante, caminhe. Relaxe.

A mudança em contexto lúdico acontece efetivamente, brincando.

Experimente:Recorde, individualmente ou em grupos, situações vividas

como incoerentes e verifique o que acontece e o que faria para perceber a tempo e esclarecer essa situação. O que faltaria para entrar em coerência relacional. Experimente e verifique, mas por si mesmo(a). Dê tempo ao tempo.

Sergio Spritzer

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O contexto é altamente valorizado na cultura coletivista, o que não acontece na individualista. Isso tem implicações práticas, como por exemplo, nas negociações entre americanos e japoneses. Os orientais necessitam tempo para se contextualizarem e criar um ambiente de confiança mútua. Enquanto isso, os pragmáticos americanos dispensam esses “detalhes” e querem ir “direto ao ponto”.

Há vantagens e desvantagens em ambos os casos: o modo coletivizador é lentamente progressivo (lembre-se da famosa a paciência oriental) e gera um grau elevado de confiança. O modo pragmático/individualista é rápido e busca resultados imediatos, mas com baixo grau de confiança sustentação e previsibilidade à longo prazo.

Haverá a possibilidade de uma cultura que não seja polarizada entre ambas as tendências?

O desafio da comunicação entre diferentes coletividades é conhecerem-se o suficiente para negociarem uma forma comum de interagirem com relação aos costumes de cada um, visando à construção de uma realidade comum.

A comunicação não visa à redução dos interesses individuais aos interesses coletivos, mas a construção de interfaces entre eles.

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A,B,C têm diferentes modos de interação. Na zona central todos integrados com todos. Noas zonas laterais existiu especificidades que se incluem mutuamente.

Um encontro entre pessoas desconhecidas inicia comumente por um contato visual. De acordo com alguns pesquisadores, nos primeiros 4-5 minutos as pessoas formam uma impressão das outras pelas primeiras impressões visuais em grupos e auditivas ao telefone. O aperto de mãos por si mesmo também oferece uma primeira impressão. Comumente vem acompanhado da impressão visual conversacional e cumprimento verbal.

O conceito de turno (relacional) em comunicação compreende o intercâmbio de momentos de impressão e expressão. A interrupção dos turnos não é desejável a não ser para obter esclarecimentos a respeito do que está sendo expresso. Ela pode gerar confusão e colocar os integrantes em posições de conflito (“luta/fuga”).

A prática do rapport em acontece na construção de reciprocidades na qual não há uma parte que deva necessariamente liderar a outra. Se busca o estabelecimento de uma harmonia relacional e um novo modo comum a ambos e irredutível ao modo relacional das partes iniciais.

O estabelecimento de um padrão relacional consistente é um jogo de expectativas, uma dança com diferentes passos, com recuos e avanços até um ponto de equilíbrio. Tem riscos de desequilíbrios e quedas, reerguimentos e reinícios: Não é um processo linear.

A cocriação de rapport originando uma rede relacional a dois não é o mesmo do que conquistar a atenção do outro e dominar a comunicação.

Talvez esteja aí uma das mais claras diferenças entre uma cultura relacional voltada para a influência e a voltada para a construção de uma harmonia relacional centrada no “nós” e irredutível as características do Eu e do Tu. Veremos a diante as diferenças entre comunicação instrumental e comunicação dialógica.

Havendo redes humanas auto determinadas de pessoas designadas momentaneamente como líder com a liderança enquanto processo relacional. A liderança não fica depositada de forma fixa num cargo, função ou pessoa. Ela oscila entre as pessoas sem que haja a necessidade de uma das partes “mandar” e a outra executar de forma subordinada os cargos e funções são determinados pela demanada do fluxo relacional.

Líderança em Relações Humanas

Sergio Spritzer

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Seus conceitos de sinceridade, confiabilidade, verdade e mentira, hora de brincar ou de falar sério, são seus. Os dos outros, são deles. Isso vale na relação interpessoal tanto quanto nas relações interculturais.

Estabeleça uma conversação aberta suspendendo pré-julgamentos e colocando-se no lugar no lugar do outro, Pergunte e se informe, respeitando cada tempo. Ofereça um espaço relacional no qual cada um possa propor uma forma inicial de expressão sem medo de errar ou pressão de acertar.

Por exemplo, um convite para caminhar, tomar uma café, caminhar juntos, etc. A comunicação humana necessita múltiplos turnos para dar e receber retorno entre as partes, para o ajuste de modos de comportamentos, linguagem até uma “calibragem” ser suficiente para empreenderem algo em comum, com clareza de propósitos e modos de comportamentos, chegar aos resultados desejados.

Como não há garantias de haver diálogo, os encontros de conversação com temas abertos são espaços relacionais necessários para amadurecer o clima conversacional. Se for o caso de congressos ou palestras é interessante haver momentos de interação entre quem apresenta o tema aos demais, tanto antes, quanto depois dos encontros com a finalidade de promover a interatividade e a formação de redes relacionais de qualidade. Interessa abrir espaço e tempo de conversação espontânea em pequenos grupos de 3-6 pessoas podendo realizar-se.

Planejar e realizar como processo cooperativo em direção à fluídez relacional implica, quanto menos subordinação e mais cooordenações.

Dicas para uma experiência intercultural

Para examinar em grupos:Assim como temos diferenças interculturais, temos diferenças

históricas e costumes intraculturais e familiares. O mesmo modelo cultural pode ser proposto para abordar as relações

de trabalho, de namoro, de parcerias em viagens ou outros contextos de vida relacional? Dê exemplos.

Até que ponto as diferenças culturais e intraculturais (de classe social, de crenças valores e costumes sociais) decidem a coerência comunicacional?

Você estaria à vontade sendo vegetariano e pacifista com pessoas que adoram um churrasco e uma boa luta bem sangrenta nos ringues?

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O espaço conversacional é o momento de expressar ao outro como você imagina que é melhor de interagir com ele. Quando situarem suas diferenças e semelhanças, o que pretendem tratar juntos e o que não pretendem, como farão isso. Quando vocês já se situaram um em relação ao outro e sabem o que querem tratar juntos, abre-se um passo adiante da conversação: O diálogo.

Numa organização em rede autogerida, a liderança, assim como outras competências aparecem em rede e são capazes de serem exercidas por diferentes pessoas e em diferentes momentos de acordo com uma lógica de pensamento coletivo. É a liderança como processo relacional em lugar do indivíduo líder isolado.

A liderança em rede não é conquistada centralizada e sim atribuída e distribuída pelos mais hábeis, com tendência a habilitação de todos.

Sabemos como nas instituições políticas educacionais e comerciais o jogo de poder tem substituído a construção de lideranças como sistemas e processos entre pessoas. Figuras carismáticas têm substituído a identidade e a liderança coletiva, distribuída, formando redes autodeterminadas distribuídas e também incluídas entre si.

Em culturas mais individualistas, fica mais evidente como nas relações interpessoais existe uma “tensão natural” entre autonomia e conexão (Prusank, Duran, & DeLillo, 1993), entre voltar se para o plano intrapessoal ou para o plano interpessoal como se fossem exludente.

Converse em grupos com base em exemplos da vida real:Examine diferentes abordagens para estabelecer uma relação

interpessoal em diferentes situações e com diferentes sujeitos em um ambiente colaborativo.

O que dificulta e o que facilita? Como saber o modo e o momento de confiar nas pessoas? Compartilhe suas impressões. Verifique os diferentes modos de

perceber as relações humanas e as estratégia, conscientes ou não de mantê-las.

Sergio Spritzer

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Antes de um encontro é interessante ter uma boa representação dos modos de interação dos outros, seus valores, costumes e expectativas. Assim, você pode iniciar uma conversa franca e informal a respeito dos interesses de cada um.

Interessa saber do ambiente, do clima e da cultura pessoal dela antes do encontro através de outras fontes, como colegas, amigos de amigos(as) e pessoas do mesmo ambiente que sejam mais acessíveis na sua rede de relações.

Ao percorrer um novo ambiente, entre em estados internos receptivas dedicados por relacionamentos , descontração, sorriso franco, soltura postural.

A seguir, procure fazer contato visual com uma ou mais delas sorrindo e se abrindo corporalmente ao contato: descruzamento de braços, aproximação suave, calibrada pela postura, atitude e mímica da outra pessoa.

Você perceberá a possibilidade de ir em frente ou a necessidade de afastar-se em função da reciprocidade da expressão corporal, mímica, vocal, verbal etc.

Por exemplo, virar as costas e desviar o olhar pode ser indicadores de indisponibilidade para o contato no momento. Muitas vezes e interpretado aparentemente como uma recusa ao relaciomamento. Como saber? Perguntando suspendendo juízos e acompanhando mais a interação.

Os inter-agentes ainda podem não saber o suficiente um do outro para decidir com tanta certeza. Se esse for o caso, afastem-se, dêem um tempo e retornem. Logo saber se fez falta ou não, fica mais fácil de saber por onde começar, recomeçar ou continuar.

Quando o comportamento não verbal indica reciprocidades sustentadas é hora de passar à conversa. Antes, não. Esse é um equívoco frequente muito comum na cultura da objetividade (entrada em tarefas) em que vivemos procurar estabelecer uma conversação centrada em objetivos como se fossem estritamente conteúdos sem estabelecer o rapport ( afinidade) corporal. As “premilinares” não verbais e verbais são decisivas para uma conversação efetiva.

A prática da comunicação interpessoal.O primeiro encontro

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No caso de iniciar a conversação, apresente-se e solicite a apresentação da outra pessoa. Evite impressões confusas e pressuposições invasivas tais como “te conheço de algum lugar?” “Então você é fulana de tal...”. Procure pontos de interesse comum e evite conversar a respeito de sua vida íntima nesse primeiro momento.

De ênfase ao que lhe interessa e ao que possa lhe interessar na outra pessoa e não aos pontos que está procurando evitar. O foco no interativo evoca resistência e desconfiança de uma das partes e a outra tende a afastar se.

Sergio Spritzer

As relações interpessoais estão sujeitas à deterioração por diferenças de intenções de cada um com a sua própiria pessoa (determinação interna), pelas dificuldades de manter e expandir as interações com outros (determinação interpessoal) como, por exemplo, pelo distanciamento físico, por doenças que limitam a interação, ou por determinações coletivas (desastres, mudanças culturais, políticas e profissionais de grande impacto).

Um fator decisivo de deterioração e dissolução da relação entre pessoas (conjuges, amigos, parceiros, colegas e etc.) pode ser uma tranferência de emprego de uma das pessoas para regiões distantes ou países diferentes dificultando ou inviabilizando a interação presencial direta.

Quanto maior a variedade de pontos em comum não apenas no plano intra e interpessoal como também de contexto, cultura e ambiente, maiores as possibilidades da comunicação ser sustentável.

A proximidade física junto com a oportunidade de convivência social e profissional é o segundo facilitador de interações.

Quando as relações estão se deteriorando, o sistema neuro-relacional envia sinal de incongruência, “lidos” subjetivamente como o sofrimento. Quando isso acontece, é hora de parar e ambas as partes examinarem seus mapas de como estão relacionando-se.

O exame dos nossos mapas relacionais são feitos através das formas como o outro representa a realidade em comum, procurando nela o que é desejável ou não, redefinindo as metas e os objetivos para os melhores resultados. Isso requer uma competência dialógica expandida. É esse o desafio.

A deterioração da interação: O que fazer? Fazer o quê?

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Na vida pessoal, o desinteresse em apreciar o que veem, sentem e fazem juntos. O desinteresse em fazer planos futuros. A falta de conversação. No trabalho aparece como atrasos não justificados, frequentes, falta de conversação e de ânimo; falta de interesse pelos outros colegas e pelo negócio. A primeira ação a ser feita quando se percebe a deterioração da relação é reconhecê la. Só assim se é possível examinar, conversar a respeito. Marcar um momento para começar a tratar da situação deteriorada e deixar em aberto outras ocasiões, quantas forem necessárias, é um excelente indicador de competência relacional e dialógica das partes para tratarem das suas vidas. Isso é válido, evidentemente, quando há interesse em reparar a relação ou preparar um rompimento pacífico, se p diálogo não for possível. O afastamento sem maiores considerações de um em relação ao outro indica uma falta de consistência da relação interpessoal: não se pode falar em deterioração em uma relação que não houve investimento afetivo. Não há nada de estranho para as partes em romper uma relação na qual quase nada foi investido. Pelo contrário. Reconhecer o grau de investimento emocional (desejo, vontade, expectativas) é a condição essencial pra retornar a qualidade das relações interpessoais e levá-las adiante, assumindo o risco de sofrer perdas melhor “calculadas” relacionalmente.

Indicadores de deterioração das relações interpessoais

Para conversar em grupo:As estratégias de comunicação interpessoal variam com o gênero e

a idade das pessoas numa mesma cultura? Como? Evoque exemplos e examine.

Existem culturas mais adaptáveis à comunicação interpessoal que outras?

Como você identifica? Examine casos reais ou imaginários.Como cada um lidaria com um exemplo de conflito interpessoal?

Como diferenciar um conflito de uma deterioração e quando acontecem no plano intrapessoal ou interpessoal?

E a deterioração de uma comunidade inteira ou de um grupo familiar e de trabalho, como influi na saúde comunicacional das pessoas?

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O dar um tempo para compreender está presente em todas as áreas. No campo amoroso, uma relação pode necessitar de “um tempo”: “Preciso me afastar e ficar comigo mesmo por um tempo.” Isso é com frequencia mais interpretada como sendo rejeição. Até pode ser depende do conjunto das outras pistas da relação. Suspenda prejuízos, se for possível pergunte, se não acompanhe, observe o que se sugere, muitos mal entendidos acontecem por impaciência.

Em uma reunião de trabalho uma ideia pode ser proposta e necessitar de um tempo para ser assimilada e depois debatida entre as pessoas. Também aí, o silêncio e o tempo são estratégias úteis para tratar o assunto da melhor forma, através da compreensão prática da comunicação.

O grande problema da prática piscoterapica tradicional é, ainda, a concentração excessiva nas interações verbais em detrimento das interações corporais e espelhamentos comportamentais entre as partes. O uso de um divã, com o analista atrás dele mostra bem como as interações não verbais implicadas na comunicação tem sido evitadas. E não tem sido estudadas. Isso não nos parece bom para o avanço do modelo psicanalítico.

Havia e continua havendo uma infinidade de efeitos de comunicação verbal (jeitos de falar) e não verbal (atitudes, posturas, posicionamento no tempo e espaço, modo de vestir-se, etc.). Esses indicadores estão implicados nessas intervenções. Clínicos e psicanalistas precisariam aprofundar se sistematicamente no estudo desse campo. Assim como profissionais de serviços membros de organizações. Essa é também a demanda nas relações amorosas e sociais.

Sergio Spritzer

Quando os turnos da conversação e da comunicação dialógica não são identificados e respeitados, surgem tensões que tendem ao conflito. A falta de atenção no ritmo de intercambio fica dificil quando ambas das partes querem expor o que pensam ao mesmo tempo. Nesse caso, uma delas com frequeência não tem “paciência” de entender a outra.

Lidando com os turnos dialógicos

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Diálogo e conversação são palavras usadas muitas vezes como sinônimos. E não são.

Por exemplo, “Conversamos, mas não nos entendemos, pois “não há diálogo”. Conversar não implica em coordenar as intenções das partes. Dialogar, sim.

A etimologia do termo diálogo (“diá/logos”) implica na intenção de examinar algo para chegar a um compartilhamento de sentidos construindo “significados”. A conversação, é um meio para atingir um fim: a prática dialógica.

A prática dialógica é bem mais sistemática e voltada para a construção de realidades compartilhadas do que a conversação. E note também como no campo da sua comunicação (a comunicação real) não há como dividir conversação e diálogo em “fatias” verbais e não verbais, ou pedaços só da sua parte e só da parte do outro. É a relação que interessa.

As pessoas oferecem temas, chamam a atenção das outras para algo que está acontecendo como argumento para “puxar” uma conversa. A conversa permite que as partes se apresentem e se conheçam. Daí pode derivar um bom diálogo ou uma discussão, depende.

Da conversação ao diálogo. Sem discussões.

O intercâmbio relacional passa pela captação, absorção assimilação das mensagens e da construção de uma ou mais respostas. Damos respostas à nossa comunicação mesmo enquanto captamos a expressão do outro. Oferecemos retornos imediatos pela expressão de como estamos recebendo essas expressões. É impossível estar fora da comunicação ao comunicar-seIsso é inevitável. O comunicador precisa aprender a identificar respostas corporais e viscerais/emocionais mediadas pelo lado direito do cérebro, antes mesmo da percepção racional do conteúdo, via lado esquerdo. Aprende a expandir sua atenção e centrar no processo relacional.

Alguém pode estar empolgado querendo expressar se enquanto a outra parte não está interessada em receber a mensagem e sim em emitir. Nesse caso o conflito é esforçado se a condição não é reconhecida.

Os tempos da comunicação dialógica

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Pode acontecer que você diga impactante algo que necessite de um tempo considerável para você mesmo ou a outra parte assimilar. Se procurar um retorno imediato, uma explicação estará forçando, pressionando a construção espontânea da experiência. Isso pode levar tempo. Aprenda a dar o tempo necessário à assimilação

O psicanalista Frances Jaques Lacan se utilizava do que foi chamado de “sessões curtas” nas quais fazia uma “pontuação” (espelhava a fala do sujeito). Quando tal “intuìção” alternava o sujeito, suspendia o encontro e deixava a pessoa refletindo, absorvendo e se muitas vezes dando-se conta da sua própria expressão.

Inspirar profundamente em meio ao que está dizendo passa a impressão de estar se recompondo para continuar. Milton Erickson mostrou, em filmagens, como cadenciava a voz e inspirava e expirava o ar, ritmicamente, abrindo tempos para as pessoas entrarem em “sincronização” com ele e, então, consigo mesmas. Enquanto Milton conversava com a pessoa ela “conversava” privadamente consigo mesma. Os ritmos respiratórios “conservam” entre si.

Cada intercâmbio precisa de um tempo. Um tempo para ouvir, ver e sentir outro. Para ouvir, imaginar e compreender. Um para a realidade interna e outro para a externa.

Um efeito semelhante acontece numa fala literalmente “inspirada”, quando a pessoa realiza uma inspiração e então se expressa com intensa carga emotiva, prendendo a atenção dos demais. Já a expiração forçada exerce o efeito contrário: ”Ufa!’ Um peso deixado de lado. Um perigo que passou: Um “desabafo”.

Experimente. E verifique por si mesmo(a). Como varia a respiração de si e dos outros durante a respiração.

Manter um gesto em suspenso ou reiterá-lo indica que sua expressão verbal ainda precisa de tempo o mesmo quando prolonga uma expressão com “Hãã...”, “Eaí...” ou “ Quero dizer...” em tom sustentado e voz ascendente. Olhar nos olhos é muitas vezes, interpretado como pedido de retorno, incitando uma mudança de turno conversacional.

Pistas da intenção do falante em manter a sua condição sem ser interrompido

Sergio Spritzer

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Expressão e olhar atento ao olhar do falante, leves inclinações do corpo para frente e a cabeça fazendo movimentos discretos de “sim”. Tendência ao espelhamento das posturas e atitudes. Por exemplo, o torcedor empolgado chuta a bola quando o jogador do seu time chuta em campo.

Demonstrar, por comentários, perguntas ou gestos, que es- tá seguindo e está interessado em seguir e compreender melhor. “Pode descrever melhor?”; “É isso que você quer dizer?” Expressões de incentivo: “É isso mesmo...” “Entendo...”. Dar um retorno breve do que compreendeu. “O que quer dizer é...”

Pistas de acompanhamento da conversa pelo ouvinte

Resumir ou ressaltar os principais pontos e agradecer a oportunidade. “Era isso que esperavam?” (Observar as respostas verbais e não verbais).

Expressar seus sentimentos por ter exposto suas ideias e impressões. Agradecer a atenção.

A despedida. “Então vamos adiante a partir daí. Até a próxima!”

Indicadores de fechamento da conversação

Baixar o tom e intensidade da voz se precisar completar o que fala indicando que está quase terminando. Silenciar. Suspender seus gestos e olhar para os demais. Baixar os olhos.

Emitir sons, mudar padrão respiratório, mexer se elevar o olhar, a mão, o corpo. Uma mímica atenta, como se estivesse pronto para falar (olhos e boca bem abertos, inclinação para frente ou elevação do corpo), indica essa intenção.

Dicas de que a pessoa está encerrando seu turno conversacional

Dicas de que alguém está querendo falar enquanto o outro está falando (sem interrompê-lo)

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Na maioria das culturas é vista como uma violação dos turnos relacionais. Entretanto, em muitas ocasiões e culturas de pouca alteridade, pode indicar interesse pela conversação. O palestrante fica frustrado se, após sua exposição, ninguém tem perguntas.

A interrupção da conversação

O monitoramento da conversação por parte do falante permite avaliar com cuidado as relações entre a sua expressão e a forma como é recebida pelo outro em detrimento de uma maior naturalidade. A impressão é a de estar olhando através de uma câmera o processo relacional e dirigindo a cena e se ajustando para melhor influir e protagonizar a comunicação interpessoal. Expressões do tipo “quando eu... você...” quando você....eu...”, caracterizam o foco na interpessoalidade

O foco na interpessoalidade

Fundamente o que vai expor com base em experiências relacionais suas, de outros e em estudos realizados.

Sergio Spritzer

Lidando com antagonismos durante a conversação

Quanto tiver necessidade de fazer comentários que possam agregar valor a sua comunicação, peça licença, avise ou faça uma ponte: “isso que estamos tratando me lembra...(...) e eu peço licença para comentar/contar uma história, etc.”. “Falando nisso, me ocorre que”, nesse caso o falante faz uma ponte entre o que está falando e o que quer comentar em paralelo, sem dispersar o foco de atenção.

Não é nada raro uma das partes se posicionar de forma crítica ou irônica durante toda a fala da outra. Se isso não for bem tratado, levará ao conflito. Ao debate da discussão e não ao diálogo.

A sugestão é não deixar de expressar a contrariedade e seguir se posicionando em relação ao fato:

“O que você diz habitualmente me deixa desconfortável/contrariado. Mas serve de oportunidade para dizer/comentar/contar uma história ilustrativa (...) que...(...) e isso me deixa bem mais confortável à vontade a respeito.

” Você abre espaço para recompor se e seguir em frente de uma forma mais convicta e melhor assinalando aonde quer e como quer chegar.

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“Quero saber o que você pensa!”; Mostre do seu jeito!”. “Qual a sua opinião?”. Isso não se trata de insegurança em se expressar e sim no foco em oferecer espaço relacional ao outro.

Está muito mais atento ao modo como os outros poderão compreender do que no modo como quer se expressar.

Seu comportamento tende a ser discreto e receptivo. Tende a olhar, usar gestos e ter posturas, palavras e um sorriso indicando acolhimento e abertura de espaços relacionais.

O foco no outro (ou outros)

Comente e dialogue a respeito, com exemplos:O que acontece quando duas ou mais pessoas tem o mesmo foco? Por

exemplo, as duas partes com foco no outro ou em si ou centram se na relação interpessoal como o foco principal de atenção?

E quando não tem, como perceber?

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Quem não passou por um indigente na rua que lhe pediu um troco e você disse que não tinha? A rigor, tinha sim. Mas estava muito apressado para dar ou não se sentia animado para fazê-lo naquele momento, para aquela pessoa. Talvez estivesse com outras coisas na cabeça e considerou esse pedido inoportuno, invasivo. Você vai parar ali no meio da rua e ficar dando explicações para o sujeito? Não parece nada prático, além do risco de ofender um desconhecido de forma irresponsável e inconsequente. Pode acabar sendo agredido por “dizer a verdade.” O mesmo acontece em contextos bem mais elegantes, como o da diplomacia e da política. Ou na vida privada e nas relações de trabalho.

Dizer literalmente a verdade não é o mesmo que comunicar se de forma coerente. A diferença entre linguagem (centrada no conteúdo verbal) e comunicação (centrada na relação e no contexto dela) fica bem evidente.

A “verdade” é a coerência comunicacional e não o significado das palavras. É o sentido compartilhado.

O que é verdadeiro e coerente no plano intrapessoal não é a mesma experiência da verdade no plano interpessoal e coletivo. Os diferentes planos podem entrar em coerência em muitos momentos. É isso que a comunicação busca, continuamente.

Verdades e mentiras em comunicação dialógica

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Prevenindo conflitos na conversaçãoDiferencie o que você expressa do que você “é”. Suas impressões,

reflexões e sugestões decorrentes de sua experiência estão abertas à conversação. Não o seu Ser. Este é incondicional. Assim o outro receberá a sua comunicação como experiência e não com imposição de uma verdade absoluta.

Se houvesse “a verdade” não relacional, tomada de si mesma, não haveria necessidade de comunicação. Suspenda suas crenças e presupostos se quiser abertura comunicacional.

“Eu minto, então, digo a verdade.” Jaques Lacan, psicanalista francês.

Lembra se de estar muito desconfortável com o modo como se comunicou e as outras pessoas nem notarem que isso alterou o principal do que queria expressar? Ou o contrário, você é que não reparou e foi chamado a atenção pelos outros?

Mesmo sendo irreversível, a comunicação pode ser reparada mantendo se o foco nas intenções compartilhadas entre você e os outros. Essa é a diferença essencial da comunicação voltada para a tarefa (comunicação instrumental) e a comunicação voltada para o relacionamento (dialógica).

Experimente:Comente isso com base em exemplos conhecidos com outras pessoas

e examine como aparecem coerências e incoerências entre esses planos relacionais, entre linguagem e comunicação corporal, identificando as pistas e sugerindo meios de lidar com situações de incoerência, formando a coerência.

A palma da mão suada ao apertar as mãos pode significar nervosismo, excitação ou interesse. Depende. O significado da percepção é compartilhado. Não tem fórmulas prontas e definidas unilateralmente.

Um olhar pode ser interpretado como hostil, amigável, atento, desconfiado, em função de outros indicadores de mímica, postura, voz, etc. Nenhuma pista sensorial vem isolada das outras. Procure indicadores de coerência/incoerência e os acompanhe ao longo do tempo: Esses se mantém? Se dissolvem? Coerência e incoerência podem ser percebidos pela próppria pessoa produzirem mudanças para mehlor ao longo da interação, sem que ela perceba.

A percepção implicada na comunicação

Sergio Spritzer

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Neurologia Relacional - A estrutura da sua experiência de comunicação.

A primeira impressão é a que fica? Como ela é gerada? Será confiável? Existem indícios de que a primeira impressão tende a guiar as demais, sim. (Solomon Asch, 1946). Entretanto, isso não é uma razão para confiar cegamente nela.

É frequente pessoas percebidas em situação de estresse serem mentalmente rotuladas de uma forma, distorcida (profecia que se autocumpre). Só a interação desarmada, com a suspensão de prejuízos e preconceitos, aberta ao conhecimento de si e do outro é que poderá gerar impressões e dar oportunidade de testá las dialogicamente.

Em marketing e propaganda é tido como natural e desejável a criação de distorções de comunicação que exacerbem as expectativas das pessoas com a intenção de intensificar a demanda e vender a maior quantidade de serviços e produtos possíveis. É comum, por exemplo, dizer se que o vendedor “vende sonhos”, “felicidade” e “sucesso”. O problema da superestimação do produto do serviço é a dificuldade que, tanto o ofertante terá de entregar o que promete, quanto a do cliente em discernir o que realmente quer com essa oferta. Na comunicação contemporânea, cada vez mais dialógica, oferta e procura constroem-se em conjunto.

Todas as formas de percepção implicam a experiência pessoal, interpessoal e coletiva. Passada, presente e futura.

Algumas pesquisas apontam para uma percepção universal de estados “emocionais”. Por exemplo, as “micro expressões faciais” no trabalho de Paul Eckman e outros estudiosos de gestos e posturas. Como consideramos em outros momentos. Tais expressões se combinam tanto no plano interno quanto no plano interpessoal e coletivo e, na pratica não aparecem isoladas, nem independentes só acompanhando o processo relacional é possível parecer os padrôes relacionais que eles indicam.

Primeira impressão

Quanto mais alinhado dentro e fora estiverem os níveis “Neuro-lógicos” (Dilts, R.) de organização da esperiência da pessoa ou da organização, maior a facilidade para alcançar uma comunicação plena. Quanto menos coerência, mais conflitiva (sentidos contraditórios), ou vazia (sem sentido). A comunicação plena de sentidos é aquela construa co-ativamente entre as partes.

A coerência entre os níveis de complexidade e os campos relacionais em jogo na relação dialógica.

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-Negligenciar o contexto e o momento de expressar ou receber a impressão (timing).

-Desconsiderar as diferentes perspectivas de perceber um mesmo evento.-Falta de foco.-Falta de conhecimento dos estilos relacionais das pessoas (pesquisado

interativamente).-Desinteresse em estabelecer uma comunicação compartilhada.-Dificuldade em perceber os estados mentais de sí e do outro.-Falta de retorno na comunicação ou retorno percebido negativo ou

hostil: Leva ao antagonismo.-Polarização levando ao antagonismo: Ou é assim ou assado: Trava o

fluxo.-Falta de qualificação da experiência pela prática interativa.

Há necessidade de saberem qual o significado (ou significados) que cada um atribui ao que falam e, então, poderem definir qual é o sentido.

“Eu não acredito em religiões” pode ser entendido como “Eu não acredito em Deus.” Tem diferentes significados e na conversação podemos evidenciar diferentes sentidos.

Exemplos de fatores que interferem na qualidade e fluência relacional.

Sergio Spritzer

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