Monografia Lei 7102-83

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1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO NAIPPE - NÚCLEO DE ANÁLISE INTEDISCIPLINAR DE POLÍTICAS E ESTRATÉGIA Mauro Tavares Cerdeira Segurança Privada no Brasil Panorama Atual - Situação dos Vigilantes e Seguranças Monografia apresentada no Curso de Pós- Graduação em Políticas e Estratégia do Naippe – Universidade de São Paulo Orientador: Prof. Dr. Braz de Araújo SÃO PAULO 2004

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO NAIPPE - NÚCLEO DE ANÁLISE INTEDISCIPLINAR DE POLÍTICAS E ESTRATÉGIA

Mauro Tavares Cerdeira

Segurança Privada no Brasil Panorama Atual - Situação dos Vigilantes e Seguranças

Monografia apresentada no Curso de Pós-Graduação em Políticas e Estratégia do Naippe – Universidade de São Paulo

Orientador: Prof. Dr. Braz de Araújo

SÃO PAULO 2004

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ÍNDICE Introdução..................................................................................................... 04 Capítulo 1 – Segurança Privada – Conceito e Regulação..............................07 1.1 – Introdução ao panorama dos serviços de vigilância privada............... 07 1.2 – Legislação e outras normas de regulação........................................... 12 1.3 – Análise dos principais pontos da normatização.................................. 19 1.4 – Caráter privado dos serviços de segurança......................................... 27 1.5 – Outras questões relevantes.................................................................. 28 Capítulo 2 – Direitos consolidados e convencionados dos vigilantes.......... 29 2.1 - Situação dos vigilantes no contexto das legislação trabalhista - CLT. 30 2.2 – Direitos previstos na próprias normas reguladoras da atividade......... 35 2.3 – Normas de segurança do Ministério do Trabalho................................ 37 2.4 – Os instrumentos coletivos e os direitos convencionados.................... 38 2.4.1 – Funções convencionadas e remunerações........................................ 41 2.4.2 – Jornadas e escalas de trabalho......................................................... 43 2.4.3 – Registro de ocorrências policiais..................................................... 48 2.4.4 – Desgaste do profissional e equipamentos de trabalho..................... 49 2.4.5 – Formação profissional....................................................................... 50 2.4.6 – Uniformes.......................................................................................... 51 2.4.7 – Colete à prova de balas...................................................................... 51

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2.4.8 – Assistência jurídica aos empregados................................................ 58 2.4.9 – Seguro de vida.................................................................................. 59 2.4.10 – Auxílio funeral................................................................................ 60 2.4.11 – Assistência nas rescisões................................................................ 61 2.4.12 – Medidas de proteção ao emprego................................................... 62 2.4.13 – Inibição ao desvio funcional.......................................................... 64 2.4.14 – Câmara setorial da categoria.......................................................... 66 2.4.15 – Conclusão acerca das normas convencionais................................. 67 Capítulo 3 – Custo dos serviços de segurança privada................................. 69 Capítulo 4 – Desvio funcional e clandestinidade......................................... 74 4.1 – As diversas facetas do mesmo problema............................................. 74 4.2 – Prerrogativas dos fiscalizadores.......................................................... 74 4.3 – Financiamento das atividades de fiscalização......................................78 4.4 – Atuações do poder jurisdicional...........................................................79 4.5 – O nocivo aproveitamento dos policiais................................................82 4.6 – Violência descontrolada – Segurança descontrolada.......................... 86 4.7 – Possíveis soluções............................................................................... 89 4.8 – Mundo (im)possível – A ética nos serviços de segurança................... 95 Conclusão..................................................................................................... 98 Bibliografia................................................................................................. 101

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INTRODUÇÃO O presente texto, procura tratar das questões atuais atreladas à prestação dos serviços de vigilância e segurança privada no Brasil. Tratam-se, os serviços de segurança privada, de uma modalidade de transferência do uso lícito da força, do estado para os particulares, criando uma atividade paramilitar, e portanto com necessidade de ampla e integral regulação. Embora informalmente executados há algumas décadas, sua regulamentação surge em 1.969, através de um decreto, em face da onda de assaltos a bancos, promovidos muitas vezes por atos políticos e inclusive para o financiamento de atividades terroristas. A sua regulação por lei, surge em 1.983, com o publicação da Lei 7.102, que vige, com diversas modificações, até hoje, e que contempla também especialmente os serviços de segurança e vigilância do setor financeiro, em face do risco inerente à atividade, à exigência de grandes companhias seguradoras para a diminuição desses riscos, e também das necessidades particulares existentes à época. Ocorre que, de lá para cá, a atividade do setor se elevou significativamente. Alastrou-se por setores públicos e privados, empresariais e residenciais, passando a contemplar inclusive a forma orgânica – prestação dos serviços por empresas de outros ramos de atividade, para as suas necessidades internas -.

Os responsáveis apontados por esta onda gigante de crescimento, são o aumento exacerbado da violência, principalmente nos grandes centros, e o fraco desempenho da segurança pública.

Há ainda, nós sabemos, outros fatores relacionados a este intenso crescimento da atividade, como a tendência mundial contemporânea de privatização dos serviços públicos, a elitização da segurança – formação de uma milícia protetora à acumulação capitalista -, e mesmo o efeito psicológico e multiplicador da “onda de violência”, que cria extensões da atividade por um movimento apenas aparente. Em um segundo momento, já na orla da ilegalidade, começam a gerir e multiplicar este processo as próprias polícias públicas, que comercializam a diferenciação dos serviços e a formação de esquadrões de “autônomos” agindo “extra-muros” – em realidade, a regulação da segurança privada indica

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exatamente o contrário, ou seja, que os seguranças devem estar sempre atrelados a uma empresa específica e responsável, e atuar apenas em ambientes privados (intra-muros) -. Importante, porém, é que a elevação dos níveis da atividade, deveria ser necessariamente acompanhada, dada a sua natureza e a necessidade de máximo controle da sociedade, de uma regulamentação firme e abrangente, e, mais ainda, de uma fiscalização absolutamente rigorosa e eficaz. No que tange ao primeiro aspecto, temos que a legislação hoje existente não é das piores. Exige a satisfação de vários requisitos para o exercício das atividades pelas empresas. Tem, contudo, alguns problemas sérios. Está desatualizada, não contemplando várias modalidades de serviço hoje existentes. Nem mesmo os auto-atendimentos e caixas eletrônicos, que são uma realidade, estão inseridos no sistema. Não há, até hoje, uma regulamentação da função do profissional vigilante, o que auxiliaria no controle da atividade e no controle da terceirização freqüentemente ilegal. Há poucas penalidades para questões relevantes, como o funcionamento de empresas clandestinas e crimes praticados. Há, ainda, leis acessórias, como é o caso da Lei 8.666, que cuida das licitações públicas, que por seus critérios, não impede a apresentação de propostas inexeqüíveis, que criam diversos problemas no futuro. Este é também o caso da legislação penal utilizada para a punição dos infratores. Ainda outros problemas existem, conforme se verá. No segundo aspecto, no que se refere a fiscalização, realmente a questão se complica de vez. O Departamento da Polícia Federal, encarregado da fiscalização e acompanhamento da atividade em nível nacional, não possui efetivo suficiente, nem ao menos para o cuidado das empresas que atuam legalmente. Os recursos, inclusive provenientes de taxas de atos administrativos, ao contrário do que prevê a legislação, não são efetivamente utilizados na atividade. A corrupção e o pagamento de “propinas” é outro problema sério do setor. E os problemas não param por aí. Estes dois fatores conjugados levaram a uma proliferação de serviços ilegais e clandestinos, inclusive com uso de armamento, atuação de verdadeiros bandidos, transgressão recorrente dos direitos e garantias trabalhistas, sonegação de impostos e contribuições previdenciárias, desvio freqüente de função, e as mais diversas infrações. A segurança privada, portanto, está absolutamente descontrolada. O sistema de fiscalização é precário. Os trabalhadores são freqüentemente enganados e lesados, e possuem condições, de trabalho e de vida, muitas vezes

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também precárias. Armas são utilizadas sem autorização. Há criminosos infiltrados no sistema. Órgãos públicos acumulam dívidas em face de sua responsabilidade civil e trabalhistas por serviços mal prestados e por danos gerados. E tudo isso cria, ao invés de segurança, um risco efetivo a toda a sociedade. Este trabalho de monografia visa a análise desse ambiente. Possui um primeiro tópico, bastante amplo, que objetiva situar o leitor no universo da regulação da atividade em nosso País. Em um segundo tópico, procuramos analisar a questão da ótica do “vigilante”, trabalhador da segurança privada, em uma tentativa de mostrar ao leitor de que efetivamente se trata este serviço e como são e vivem os profissionais envolvidos. No terceiro tópico, faz-se uma análise dos custos dos serviços de segurança. No último tópico, também bastante amplo, há uma análise do mercado atual da segurança privada, especialmente dos problemas atrelados à clandestinidade e ao desvio funcional, em que são apontados os diversos problemas e os riscos à sociedade. Ao final, procuramos contribuir com algum direcionamento para a análise crítica do problema, indicando os principais pontos que deverão ser revistos pela sociedade, apontando inclusive que a solução definitiva do problema passa necessariamente por um processo de conscientização social sobre de que exatamente trata a segurança privada e de como executar seus objetivos com verdadeira responsabilidade e segurança.

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Capítulo 1) Segurança Privada – conceito e regulação 1.1) Introdução ao panorama dos serviços de vigilância privada A segurança tornou-se um dos maiores ideais de toda a sociedade brasileira. É, sem dúvidas, junto com a geração de empregos, a maior preocupação dos grandes centros urbanos, e passa, cada vez mais, a constar da pauta também dos pequenos municípios e das áreas rurais. Talvez a primeira causa para a situação de crescente violência social, seja realmente a péssima distribuição de renda que enfrentamos, asseverada nos tempos de hiperinflação, e mantida como barreira ao próprio crescimento sustentado da economia, o que nos leva a concluir que a verdadeira solução do problema está muito distante, e a exigir uma profunda alteração na estrutura econômico-social, cumulada necessariamente com farto crescimento. Enquanto, no entanto, espera-se pelas mudanças capazes de afetar a causa do problema, o certo é que convivemos hoje com um ambiente de franca violência, que abarca tanto o crime organizado quanto a criminalidade avulsa, em constante desenvolvimento e mutação, capazes de colocar o nosso país nos níveis de países que convivem com guerras e catástrofes. A população, oprimida, busca formas de proteção que superem os patamares da insuficiente e fraca segurança pública. Há que se dizer, que o conceito de segurança, no momento em que vivemos, não passa mesmo de um ideal. Melhor talvez seria se falar em formas de defesa para se chegar a segurança. Pois o que realmente é atingível pela população são formas, melhores ou piores, de defesa contra a patente insegurança. Some-se a isto, o fato de que a segurança, freqüentemente associada ao combate à violência, não é conceito que se restringe a isso, pura e simplesmente. Segurança atinge também todas as outras situações e processos que possam colocar em risco as pessoas e seu patrimônio. O desenvolvimento, particularmente, traz inúmeras formas de proteção contra eventos da natureza e suas conseqüências, como é o caso das enchentes e alagamentos; furacões e ciclones, como está em moda, além de eventos naturais ou provocados, como incêndios, tumultos, “arrastões”, e outros tantos, que fazem parte de um leque enorme de situações que se encontram acolhidas no conceito amplo de segurança, definida como a proteção das pessoas e dos patrimônios. Acompanhando, pois, este movimento da violência urbana, bem como a elevação do número de eventos que colocam em risco a vida e o patrimônio das

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pessoas, é que surge e ganha grande força a segurança privada, como conceito mais amplo, e a vigilância privada, como parte daquele conceito mais ligado a situações propriamente de ameaça e violência, que tem em seu centro a figura de um homem, o “vigilante” ou “segurança”, contratado, sempre através de uma empresa de segurança, com o fim específico de aumentar a defesa na esfera particular de indivíduos, empresas, e outras entidades. As ações de segurança, de iniciativa privada, somente são possíveis através de uma regulamentação legal, que transfere, licitamente, o monopólio do uso da força, do Estado – seu legítimo detentor - para o particular, a partir de certas regras de conduta rígidas estampadas obrigatoriamente na legislação. A transferência de tal poder de monopólio, no princípio inconcebível, mas atuante no estado moderno, como se vê na maioria dos governos atuais, sobre o qual se estrutura e amolda a sociedade ocidental contemporânea, é bem identificada já na obra de Max Weber1, um dos maiores teóricos sobre o tema do uso lícito da violência como forma de dominação.

“Na época atual, a relação entre violência e Estado é profundamente próxima. No passado, associações tão diferenciadas – começando pela família – utilizaram como instrumento de poder a força física como algo inteiramente normal. Entretanto, atualmente, devemos dizer que um Estado é uma comunidade humana que se atribui (com êxito) o monopólio legítimo da violência física, nos limites de um território definido. (...) No período contemporâneo, o direito ao emprego da coação física é assumido por outras instituições à medida que o Estado o permita.”

Esta transferência da prerrogativa/poder do estado, é que permite a existência da denominada segurança privada, como forma das pessoas protegerem, a si e a seu patrimônio, em ambiente privado. Como sabemos, o direito ao patrimônio e a sua manutenção é protegido constitucionamelmente2, sendo uma das maiores garantias da estrutura jurídica do capitalismo moderno. O processo de proteção da propriedade, consoante se observa, permite uma superconcentração, em quantidade e qualidade, da segurança privada, nas mãos das elites econômicas e políticas, em face de seu poder econômico atual, o que favorece a manutenção da ordem, e intensifica o problema patente da elevada concentração de renda, circunstância que será melhor abordada mais adiante neste trabalho. 1 – A Política como Vocação – pág. 11 2 - Constituição da República – 1988 – art. 5o – “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade, nos termos seguintes: XXII – é garantido o direito à propriedade”.

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Esta característica relaciona-se com uma tendência clara de que os serviços de vigilância privada, verdadeira transferência do monopólio da força do Estado para o cidadão, seja cada vez mais atrelado à proteção da propriedade, mesmo aquela adstrita ao domínio público. A figura do vigilante privado, como todos sabemos, é antiga e se evidenciou com o advento do capitalismo, e está portanto agregada ao conceito de proteção, principalmente do patrimônio privado. Era, para centrarmos o passado menos longínquo, há algumas décadas atrás, o “guarda de quarteirão”, o “fiscal da obra”, ou o “protetor (ou jagunço) das propriedades rurais”. O crescimento da atividade, no entanto, exigiu sua regulamentação, e o ritmo rápido e desordenado, aliado à grande e confusa preocupação com a segurança, acabou gerando inúmeros problemas sérios nos últimos anos, que passam pelo questionamento sobre a necessidade e conveniência do uso de armas por tais profissionais, a um maciço desvio funcional na atividade, que acaba por gerar uma clandestinidade perigosa, por vezes criminosa. O crescimento a que nos referimos, que pode inclusive ser facilmente notado, fica bem evidenciado pela matéria publicada no Jornal do Brasil, em data de 16.05.2003, baseada em dados do IBGE:

“O crescimento da violência fez com que mais empresas contratassem serviços de transporte de valores, segurança, vigilância e investigação privadas em todo o país. É o que mostra a Pesquisa Anual de Serviços, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O levantamento aponta um crescimento de 26,8 % no número de empresas que prestam serviços de segurança em todo o país. Em 2001, 2580 companhias atuavam nesse seguimento. Em 2000, eram 2.034. “O aumento da violência tem levado mais gente a contratar os serviços dessas empresas. Basta olhar quantas estão surgindo” – disse Roberto Saldanha, técnico do IBGE. O maior exército de vigilantes particulares está em São Paulo. Em 2000 havia no Estado 579 empresas. Em 2001 o número se elevou para 885, com um aumento de 52 %. No Rio, onde a população convive com a violência diariamente, houve aumento de 57 %. No Estado, 385 empresas prestavam serviços relacionados a segurança em 2001, contra 244 em 2000. Com o aumento do número de empresas, o faturamento do setor também cresceu. Passou de R$5,939 bilhões em 2000 para R$6,036 bilhões em 2001. Também cresceu o número de profissionais de segurança privada empregados. Houve um aumento de 4,2 % em 2001, segundo o IBGE. Em 2000, trabalhavam no ramo 337.900 pessoas. No ano seguinte, o número subiu para 351.980. No Rio, o crescimento foi de 3,8 % - de 50.328 pessoas empregadas para 52.221.”

Somados aos fatores ligados ao inquestionável aumento da violência, existem outras causas para a elevação, hoje indiscriminada, das atividades privadas de segurança. O maior deles, talvez, seja a efetiva ineficácia do estado como ente garantidor da segurança social. Outras causas ainda se prendem a maior especificidade das ações criminosas, e a sua organização técnica. Atrela-se, ainda, ao desenvolvimento do próprio liberalismo, e das leis de mercado, que

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de um lado torna natural a menor presença do estado nas atividades econômicas, e de outro se tem um mercado altamente rentável, que se desenvolve a cada dia, oferecendo inovações tanto no que diz respeito ao treinamento humano, quanto na tecnologia empregada. Em seu texto, Leonarda Musumeci 1 expõe com clareza muitas destas questões relacionadas à diminuição e mesmo ineficiência do estado na modernidade, em seus múltiplos espectros, e inclusive nas relações da vigilância privada com o seu poder intrínseco, originariamente público:

“Para alguns, esse fenômeno ultrapassa muito em seus efeitos a tendência geral de encolhimento do Estado e ampliação dos espaços sob domínio da iniciativa privada, abalando, no limite, a própria definição moderna de Estado – “comunidade humana que pretende, com êxito, o monopólio do uso legítimo da força física dentro de um determinado território” (Weber (1974)), e à qual cumpre garantir ordem e segurança para as vidas e propriedades dos seus cidadãos. Transformação da segurança em mercadoria e a transferência crescente para mãos privadas do “uso legítimo da força” poderiam trazer sérias ameaças à manutenção dos direitos humanos e civis penosamente conquistados ao longo dos últimos dois séculos.” (...). “Na outra ponta do debate, estão os que defendem – com maior ou menor radicalismo – a transferência de funções de segurança para a iniciativa privada, utilizando como argumentos básicos: a) a comprovada incapacidade de o Estado deter o avanço da criminalidade nos grandes centros urbanos; b) a ineficiência da segurança pública (e dos serviços estatais de um modo geral), em termos de relação custo-benefício; c) a inoperância concreta dos mecanismos protetores de que o indivíduo dispõe contra os abusos do Estado, mesmo em países democráticos (segundo esse argumento, seria mais fácil defender-se de vigilantes particulares, submetidos à lei comum, que de policiais, promotores e juízes, acobertados pela corporação estatal); d) a “disciplina” rigorosa que o mercado impõe sobre as empresas privadas de segurança e estas sobre o comportamento de seus agentes: omissão e Reynolds (1990 e 1994), Hakin e Shachmurove (1996), Anderson e Cannan (1997)).

Campo próspero, portanto, a atividade da vigilância privada, sofrendo influência tanto da tendência de substituição do estado por serviços de ordem privada, quanto do crescimento da violência e das impressões e previsões que este movimento geral. Sobre este último tema, argumentam Sérgio Olímpio e Márcio Lemos2.

“A violência tem amplo campo para progredir no Brasil devido aos seguintes aspectos: miséria social, drogas, consumismo estimulado pela mídia, facilidade de obtenção de armas, organização arcaica do Sistema de Segurança Pública, legislação defasada e complacente, Estatuo da Criança e maioridade penal. Todos estes fatores contribuem para uma nefasta sensação de impunidade que se solidifica nos seguintes dados: a

1 – Serviços Privados de Vigilância no Brasil – pág. 10 2 - Insegurança Pública e Privada – pág. 157

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probabilidade, no Brasil, de alguém ser preso em flagrante; indiciado pela Polícia, julgado pela Justiça, condenado, e cumprir pena sentenciada é de 0,001483%, ou seja, para cada 1000 delitos praticados, apenas 1 chega a reta final. “

Por um ou outro motivo, o certo é que a segurança privada cresce, tanto no que diz respeito ao enfrentamento da maior criminalidade, quanto no que se refere à ampliação do leque das suas atividades, vindo muitas vezes a substituir a segurança pública. É o caso da crescente aplicação de tais serviços junto a órgãos públicos, que constituem, no entanto, espaços privados, como é o caso de estações de trem e metrô, museus, hospitais, parques e praças, e mais recentemente até para a guarda e fiscalização de presídios; tudo com ampla propaganda de resultados positivos. As atividades dos vigilantes, na atualidade, estão ligadas, em aspecto amplo, à defesa, proteção e fiscalização de patrimônios, pessoas e situações. Segundo a particularização de objetivos do professor Paulo Roberto Aguiar Portella1, as principais atividades corriqueiras específicas dos vigilantes são as seguintes:

implementar e fiscalizar a obediência ao sistema de controle e identificação do pessoal;

observar e patrulhar perímetros designados, áreas, estruturas e atividades do interesse

da segurança;

apreender pessoas ou veículos que tenham entrado sem autorização nas áreas de segurança;

fiscalizar determinados depósitos, salas ou edifícios do interesse da segurança,

particularmente fora do horário de expediente normal, visando verificar se estão corretamente protegidos e em ordem;

executar serviços essenciais de escolta;

implementar e fiscalizar a obediência ao sistema estabelecido de controle sobre

circulação de documentos e materiais de interesse da segurança nas áreas controladas;

responder aos sinais de alarme de proteção ou outras indicações de atividade suspeita;

agir conforme necessário em situações que afetem a segurança, inclusive em acidentes, incêndios, desordem internas, tentativas de espionagem, sabotagem ou outros atos criminosos;

1 – Gestão de Segurança – págs. 101/102

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comunicar ao supervisor, como dever prescrito de rotina, as condições de trabalho e, conforme necessário, em todas as circunstâncias anormais; e

proteger de modo geral dados, materiais e equipamentos contra acesso não autorizado,

perda, furto ou dano. 1.2) Legislação e outras normas de regulação

Feitas as considerações iniciais e descrição sumária das características da atividade profissional, e para começarmos a melhor entender a questão, é providencial o conhecimento dos termos principais das normas que regem a atividade no Brasil. Em primeiro lugar, diga-se que a vigilância privada é atividade que necessita de regulamentação. Conforme o artigo 5o, inciso XII, da Constituição Federal vigente, “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

Oficialmente, os serviços particulares de segurança surgiram em 1.969, através de um decreto-lei (decreto-lei 1.034, de 21.10.69) que obrigava a sua contratação pelos bancos, sob pena de intervenção pelo Banco Central. O objetivo primeiro, naquela época, era combater os “ataques subversivos”.

Mas foi em 1.983 que se estabeleceu uma regulação mais abrangente e válida da matéria, através da lei que instituiu e regulamentou a atividade de segurança e vigilância privada no país, que é a 7.102/83, e data de 20 de junho de 1.983, estando vigente até hoje, e que passa a ser analisada. Vejamos o teor da referida lei.

LEI Nº 7.102, DE 20 DE JUNHO DE 1983.

Dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

Art.1º - É vedado o funcionamento de qualquer estabelecimento financeiro onde haja

guarda de valores ou movimentação de numerário, que não possua sistema de segurança com parecer favorável à sua aprovação, elaborado pelo Ministério da Justiça, na forma desta Lei. (Art.1º com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

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A competência estabelecida ao Ministério da Justiça será exercida pelo Departamento

de Polícia Federal, conforme o Art.16 da Lei nº 9.017, de 30/03/1995. Parágrafo único. Os estabelecimentos financeiros referidos neste artigo compreendem

bancos oficiais ou privados, caixas econômicas, sociedades de crédito, associações de poupanças, suas agências, subagências e seções

Art.2º - O sistema de segurança referido no artigo anterior inclui pessoas

adequadamente preparadas, assim chamadas vigilantes; alarme capaz de permitir, com segurança, comunicação entre o estabelecimento financeiro e outro da mesma instituição, empresa de vigilância ou órgão policial mais próximo; e, pelo menos, mais um dos seguintes dispositivos:

I - equipamentos elétricos, eletrônicos e de filmagens que possibilitem a identificação

dos assaltantes; II - artefatos que retardem a ação dos criminosos permitindo sua perseguição,

identificação ou captura; e III - cabina blindada com permanência ininterrupta de vigilante durante o expediente

para o público e enquanto houver movimentação de numerário no interior do estabelecimento. Parágrafo único - (Revogado pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995) Art.3º - A vigilância ostensiva e o transporte de valores serão executados: (Art.3º,

"caput", com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995). I - por empresa especializada contratada; ou II - pelo próprio estabelecimento financeiro, desde que organizado e preparado para tal

fim, com pessoal próprio, aprovado em curso de formação de vigilante autorizado pelo Ministério da Justiça e cujo sistema de segurança tenha parecer favorável à sua aprovação emitido pelo Ministério da Justiça.

Parágrafo único. Nos estabelecimentos financeiros estaduais, o serviço de vigilância

ostensiva poderá ser desempenhado pelas Polícias Militares, a critério do Governo da respectiva Unidade da Federação. (Parágrafo único com redação dada pela Lei 9.017, de 30/03/1995).

Art.4º - O transporte de numerário em montante superior a vinte mil UFIR, para

suprimento ou recolhimento do movimento diário dos estabelecimentos financeiros, será obrigatoriamente efetuado em veículo especial da própria instituição ou de empresa especializada. (Art.4º com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995)

Art.5º - O transporte de numerário entre sete mil e vinte mil UFIR poderá ser efetuado

em veículo comum, com a presença de dois vigilantes. (Art.5º com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

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Art.6º - Além das atribuições previstas no Art.20, compete ao Ministério da Justiça: (Art.6º, "caput", com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

I - fiscalizar os estabelecimentos financeiros quanto ao cumprimento desta Lei; II - encaminhar parecer conclusivo quanto ao prévio cumprimento desta Lei, pelo

estabelecimento financeiro, à autoridade que autoriza o seu funcionamento; III - aplicar aos estabelecimentos financeiros as penalidades previstas nesta Lei.

A competência estabelecida ao Ministério da Justiça será exercida pelo Departamento de Polícia Federal, conforme o Art.16 da Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

Parágrafo único. Para a execução da competência prevista no inciso I, o Ministério da Justiça poderá celebrar convênio com as Secretarias de Segurança Pública dos respectivos Estados e Distrito Federal. (Parágrafo único com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995). Art.7º - O estabelecimento financeiro que infringir disposição desta Lei ficará sujeito

às seguintes penalidades, conforme a gravidade da infração e levando-se em conta a reincidência e a condição econômica do infrator: (Art.7º com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

I - advertência; II - multa, de mil a vinte mil UFIR; III - interdição do estabelecimento. A aplicação das penalidades referidas neste artigo é da competência do Ministério da

Justiça - Departamento de Polícia Federal -, conforme o Art.16 da Lei nº 9.017, de 30/03/1995.

Art. 8º - Nenhuma sociedade seguradora poderá emitir, em favor de estabelecimentos financeiros, apólice de seguros que inclua cobertura garantindo riscos de roubo e furto qualificado de numerário e outros valores, sem comprovação de cumprimento, pelo segurado, das exigências previstas nesta lei.

Parágrafo único. As apólices com infringência do disposto neste artigo não terão

cobertura de resseguros pelo Instituto de Resseguros do Brasil. Art. 9º - Nos seguros contra roubo e furto qualificado de estabelecimentos financeiros,

serão concedidos descontos sobre os prêmios aos segurados que possuírem, além dos requisitos mínimos de segurança, outros meios de proteção previstos nesta lei, na forma de seu regulamento.

Art. 10 - São considerados como segurança privada as atividades desenvolvidas em

prestação de serviços com a finalidade de: (Art. 10, caput alterado, incisos e parágrafos incluídos pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994).

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I - proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como a segurança de pessoas físicas;

II - realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de

carga; § 1º - Os serviços de vigilância e de transporte de valores poderão ser executados por

uma mesma empresa. § 2º - As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e

transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, além das hipóteses previstas nos incisos do caput deste artigo, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas; a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos; e órgãos e empresas públicas.

§ 3º - Serão regidas por esta lei, pelos regulamentos dela decorrentes e pelas

disposições da legislação civil, comercial, trabalhista, previdência e penal, as empresas definidas no parágrafo anterior.

§ 4º - As empresas que tenham objeto econômico diverso da vigilância ostensiva e do

transporte de valores, que utilizem pessoal de quadro funcional próprio, para execução dessas atividades, ficam obrigadas ao cumprimento do disposto nesta lei e demais legislações pertinentes.

§ 5º - (Vetado) § 6º - (Vetado) Art. 11 - A propriedade e a administração das empresas especializadas que vierem a se

constituir são vedadas a estrangeiros. Art. 12 - Os diretores e demais empregados das empresas especializadas não poderão

ter antecedentes criminais registrados. Art.13 - O capital integralizado das empresas especializadas não pode ser inferior a

cem mil UFIR. (Art.13 com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995). Art. 14 - São condições essenciais para que as empresas especializadas operem nos

Estados, Territórios e Distrito Federal: I - autorização de funcionamento concedida conforme o Art. 20 desta lei; e II - comunicação à Secretaria de Segurança Pública do respectivo Estado, Território ou

Distrito Federal. Art. 15 - Vigilante, para os efeitos desta lei, é o empregado contratado para a execução

das atividades definidas nos incisos I e II do caput e parágrafos 2º, 3º e 4º do Art. 10. (Art. 15 com redação dada pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994).

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Art. 16 - Para o exercício da profissão, o vigilante preencherá os seguintes requisitos: I - ser brasileiro; II - ter idade mínima de 21 (vinte e um) anos; III - ter instrução correspondente à quarta série do primeiro grau; IV - ter sido aprovado em curso de formação de vigilante, realizado em

estabelecimento com funcionamento autorizado nos termos desta lei; (Inciso IV com redação dada pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994).

V - ter sido aprovado em exame de saúde física, mental e psicotécnico; VI - não ter antecedentes criminais registrados; e VII - estar quite comas obrigações eleitorais e militares. Parágrafo único. O requisito previsto no inciso III deste artigo não se aplica aos

vigilantes admitidos até a publicação da presente lei. Art. 17 - O exercício da profissão de vigilante requer prévio registro na Delegacia

Regional do Trabalho do Ministério do Trabalho, que se fará após a apresentação dos documentos comprobatórios das situações enumeradas no artigo anterior. (Vide Medida Provisória nº 2.184-23, de 24.8.2001)

Parágrafo único. Ao vigilante será fornecida Carteira de Trabalho e Previdência

Social, em que será especificada a atividade do seu portador. Art. 18 - O vigilante usará uniforme somente quando em efetivo serviço. Art. 19 - É assegurado ao vigilante: I - uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular; II - porte de arma, quando em serviço; III - prisão especial por ato decorrente do serviço; IV - seguro de vida em grupo, feito pela empresa empregadora. Art.20 - Cabe ao Ministério da Justiça, por intermédio do seu órgão competente ou

mediante convênio com as Secretarias de Segurança Pública dos Estados e Distrito Federal: (Art.20, "caput", com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995).

I - conceder autorização para o funcionamento: a) das empresas especializadas em serviços de vigilância; b) das empresas especializadas em transporte de valores; e c) dos cursos de formação de vigilantes.

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II - fiscalizar as empresas e os cursos mencionados no inciso anterior; III - aplicar às empresas e aos cursos a que se refere o inciso I deste artigo as

penalidades previstas no Art.23 desta Lei; IV - aprovar uniforme; V - fixar o currículo dos cursos de formação de vigilantes; VI - fixar o número de vigilantes das empresas especializadas em cada Unidade da

Federação; VII - fixar a natureza e a quantidade de armas de propriedade das empresas

especializadas e dos estabelecimentos financeiros; VIII - autorizar a aquisição e a posse de armas e munições; e IX - fiscalizar e controlar o armamento e a munição utilizados. X - rever anualmente a autorização de funcionamento das empresas elencadas no

inciso I deste artigo. (Inciso X acrescido pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994). Parágrafo único. As competências previstas nos incisos I e V deste artigo não serão

objeto de convênio. (Parágrafo único com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995). Art. 21 - As armas destinadas ao uso dos vigilantes serão de propriedade e

responsabilidade: I - das empresas especializadas; II - dos estabelecimentos financeiros quando dispuserem de serviço organizado de

vigilância, ou mesmo quando contratarem empresas especializadas. Art. 22 - Será permitido ao vigilante, quando em serviço, portar revólver calibre 32 ou

38 e utilizar cassetete de madeira ou de borracha. Parágrafo único. Os vigilantes, quando empenhados em transporte de valores, poderão

também utilizar espingarda de uso permitido, de calibre 12, 16 ou 20, de fabricação nacional. Art.23 - As empresas especializadas e os cursos de formação de vigilantes que

infringirem disposições desta Lei ficarão sujeitos às seguintes penalidades, aplicáveis pelo Ministério da Justiça, ou, mediante convênio, pelas Secretarias de Segurança Pública, conforme a gravidade da infração, levando-se em conta a reincidência e a condição econômica do infrator:

I - advertência; II - multa de quinhentas até cinco mil UFIR; (Inciso II com redação dada pela Lei nº

9.017, de 30/03/1995).

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III - proibição temporária de funcionamento; e IV - cancelamento do registro para funcionar. Parágrafo único. Incorrerão nas penas previstas neste artigo as empresas e os

estabelecimentos financeiros responsáveis pelo extravio de armas e munições. Art. 24 - As empresas já em funcionamento deverão proceder à adaptação de suas

atividades aos preceitos desta lei no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data em que entrar em vigor o regulamento da presente lei, sob pena de terem suspenso seu funcionamento até que comprovem essa adaptação.

Art. 25 - O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 90 (noventa) dias a

contar da data de sua publicação. Art. 26 - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 27 - Revogam-se os Decretos-leis nº 1034, de 21/10/1969, e nº 1103, de

06/04/1970, e as demais disposicões em contrário. Brasília, 20 de junho de 1983; 162º da Independência e 95º da República.

A vigilância privada no Brasil, compreende, portanto, segundo a legislação vigente, constituída pela Lei 7.102/83, e alterada pelas Leis 8.863/94 e 9.017/95 os seguintes serviços e prestadores:

empresas prestadoras de serviços de vigilância patrimonial, transporte de valores ou cargas, de segurança privada a pessoas, a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências e órgãos e empresas públicas e à entidades sem fins lucrativos;

serviços orgânicos de segurança em empresas;

empresas de fabricação, instalação, manutenção e operação de

dispositivos de segurança. A lei transcrita, como bem se vê, contém as alterações legislativas posteriores, bem como remissões aos decretos regulamentadores, e as portarias que disciplinam os seus desdobramentos.

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1.3) Análise dos principais pontos da normatização A avaliação crítica da lei, nos dá um panorama exato das condições em que foram regulados, os serviços de vigilância privada no Brasil, forma na qual permanecem até os dias atuais. A primeira constatação, para o entendimento dos referidos serviços, é de que não existe vigilante fora do âmbito de uma empresa privada especializada em segurança, ou departamento análogo existente em empresa de outro setor de atividade. A regulamentação que se faz, para o bom entendedor, tem como objeto não o vigilante em si, mas a empresa de prestação de serviços de segurança e vigilância ou transporte de valores, em que o vigilante logicamente é a célula dos serviços prestados. - Art. 15 – “Vigilante, para os efeitos desta lei, é o empregado contratado para a execução das atividades definidas nos incisos I e II do caput e parágrafos 2º, 3º e 4º do Art. 10. (Art. 15 com redação dada pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994)”-.

O próprio registro do profissional empregado das empresas, denominado vigilante, no Ministério do Trabalho, conforme originalmente previsto em lei, foi abolido, sendo substituído pelo registro na própria Polícia Federal – na verdade, foi estabelecido um convênio entre os dois órgãos, para passagem do registro para o Ministério da Justiça. De qualquer forma, o registro está sempre vinculado à empresa em que o profissional trabalha. Essa primeira constatação é muito importante, pois que é bastante comum depararmos com um “vigilante” que se diz “autônomo”, vendendo seus serviços a particulares, em ambientes domésticos ou comerciais. Essa forma de contratação, portanto, é absolutamente ilegal. Pode tratar-se de um homem irregularmente armado, despreparado, e sem qualquer responsabilidade efetiva, que põe em risco a vida das pessoas, que contraditoriamente se julgam protegidas. É providencial a citação do entendimento de Carlos Mauritônio Júnior1:

“A legislação diz que o vigilante é o empregado. Tal expressão é sábia, pois evita-se a possibilidade da existência de uma associação de vigilantes para que estes prestem o serviço de forma autônoma.”

Portanto, de acordo com a nossa legislação, a segurança privada sempre é prestada através de uma empresa, que é responsável pela atuação dos vigilantes a ela vinculados.

1 - Vigilância Patrimonial Privada – pág. 269

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Mais recentemente, ante à necessidade, cada vez mais premente, de controle das atividades de vigilância privada, através da portaria 891, de 12 de agosto de 1.999, foi instituída uma carteira de identificação, de uso obrigatório para o vigilante, denominada CNV – Carteira Nacional do Vigilante. Isso, porém, não significou a quebra do sistema de vínculo empresarial obrigatório, uma vez que dispõe o artigo 4o da referida portaria ministerial:

Portaria 891/99 – Departamento de Polícia Federal – Art. 4o – “Somente será expedida a Carteira para o vigilante que comprovar vínculo empregatício com empresa especializada ou empresa executante de serviços orgânicos de segurança autorizada a funcionar pelo DPF.”

Pela mesma razão, temos que é ilegal a prestação de serviços de vigilância por cooperativas e associações, uma vez que transfeririam a responsabilidade da atividade para o próprio profissional, em situação não prevista na lei ora analisada. Agora, além disso, para que se torne um vigilante de alguma empresa, o profissional deverá obrigatoriamente preencher certos requisitos, que são: - ser brasileiro; ter idade mínima de 21 (vinte e um) anos; ter instrução correspondente à quarta série do primeiro grau; ter sido aprovado em curso de formação de vigilante, realizado em estabelecimento com funcionamento autorizado nos termos desta lei; (Inciso IV com redação dada pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994); ter sido aprovado em exame de saúde física, mental e psicotécnico; não ter antecedentes criminais registrados; e estar quite comas obrigações eleitorais e militares. –; tudo de acordo com o que está previsto no artigo 16 da mesma lei. São ainda garantidos aos vigilantes, os direitos ao seguro de vida, prisão especial, uso de uniformes e armamentos. Esses direitos e outros serão melhor abordados em parte específica deste trabalho, em que trataremos do espectro legal protetor à coletividade profissional dos vigilantes. Tem sido notado, inclusive, que os requisitos exigidos pelas empresas vão além dos que estão previstos no artigo da lei. Aquelas costumam exigir maior escolaridade, porte e habilidades específicas, além de facilidade de comunicação e grande controle psicológico, todos ditados pelas necessidades cada vez mais qualificadas dos mercados. Somente para informação, o que será melhor analisado posteriormente, temos que o exercício da função do vigilante e sua regulamentação específica, independentemente do que se relaciona com as empresas, é hoje objeto de projeto de lei que tramita no poder legislativo, cuja tentativa é a regulamentação do exercício, na “iniciativa privada”, da função de Agente de Segurança Privada. Na visão de alguns, a nova lei serviria a melhor regulamentar o exercício da atividade, resolvendo problemas atrelados à clandestinidade. Para outros,

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haveria ainda maiores problemas com tal regulamentação, tendo em vista que o controle dos novos ingressos seria muito difícil. Outra constatação, que é decorrente da primeira, é que a empresa de vigilância deve estar registrada no Ministério da Justiça, cujo controle é delegado exclusivamente à Polícia Federal – “A competência estabelecida ao Ministério da Justiça será exercida pelo Departamento de Polícia Federal, conforme o Art.16 da Lei nº 9.017, de 30/03/1995” -, tendo de ter uma autorização para o funcionamento, que depende por sua vez de vários requisitos, que vão da nacionalidade brasileira dos administradores, até o depósito de importância como garantia, e que deve ser renovada periodicamente. Além das empresas especializadas em segurança, que são terceirizadas em relação aos tomadores dos serviços, existe a possibilidade das empresas dos vários ramos de atividade, inclusive bancos, de constituírem os chamados departamentos orgânicos de vigilância, ou seja, departamentos específicos e internos, especializados em contratação de serviços de vigilância, que para sua existência e funcionamento dependem do cumprimento das mesmas formalidades. O que se vê, aliás, hoje em dia, principalmente nos bancos e em grandes empresas, é a convivência de serviços próprios (orgânicos) de vigilância, com serviços terceirizados. Essa simbiose permite a utilização de serviços de terceiros, mas com o controle da atividade por profissionais da própria empresa. Reduz, portanto, os custos da atividade, mantendo parte do controle. A forma é perfeitamente legal, desde que atendidos, pela tomadora e pela terceirizada, os requisitos da lei. A atividade de vigilância privada, obedecidas as diretrizes da lei já citada, é livre. Conforme disposto no artigo 10, § 2º, - “As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, além das hipóteses previstas nos incisos do caput deste artigo, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas; a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos; e órgãos e empresas públicas” -.

No que se refere aos bancos, porém, a segurança privada é mesmo obrigatória, conforme disposto no artigo 1º - “É vedado o funcionamento de qualquer estabelecimento financeiro onde haja guarda de valores ou movimentação de numerário, que não possua sistema de segurança com parecer favorável à sua aprovação, elaborado pelo Ministério da Justiça, na forma desta Lei. (Art.1º com redação dada pela Lei nº 9.017, de 30/03/1995”).

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O sentido teleológico desta norma, que obriga a existência de segurança privada nos estabelecimentos financeiros, prende-se ao alto risco de roubos e furtos nestas localidades, e a freqüência constante e numerosa de pessoas, que são alvos potenciais destes assaltos. A segurança obrigatória nestes estabelecimentos, segundo a lei, deve se constituir de – “pessoas adequadamente preparadas, assim chamadas vigilantes; alarme capaz de permitir, com segurança, comunicação entre o estabelecimento financeiro e outro da mesma instituição, empresa de vigilância ou órgão policial mais próximo; e, pelo menos, mais um dos seguintes dispositivos” -, que são equipamentos de identificação dos infratores, artefatos retardatários da ação dos criminosos, e cabina blindada, um desses três. Tudo, na verdade, deve constar de um sistema de segurança, também chamado de “plano de segurança”, apresentado pela instituição e aprovado pelo Departamento de Polícia Federal. A Polícia Federal, no entanto, único órgão encarregado de conceder autorização de funcionamento para empresas de vigilância privada, bem como também de fiscalizar todo o sistema, não possui um efetivo mínimo suficiente ao bom exercício de tal mister, estando pois a segurança privada, já há algum tempo, e conforme aqui reportado, vivendo grande onda de ilegalidades de toda sorte, servindo inclusive de fachada para organizações criminosas, o que será melhor abordado oportunamente neste trabalho. Vale salientar, que não são poucas as ocorrências de tentativas e projetos de regulações diversas das atividades de segurança privada por estados e municípios. Muitas delas, entendendo que a fiscalização efetivada pela Polícia Federal é precária, acabam por tentar passar a responsabilidade para as polícias estaduais. Outras mudam as regras para o registro e controle das empresas. Existiram outras, ainda, que tentaram regularizar os chamados “bicos” de policiais, que representam inclusive uma usurpação de poder e uma ameaça social. As tentativas, apesar de causarem ampla discussão, são desprovidas de efeitos, uma vez que, pela norma constitucional, cabe à União, através de lei ordinária, a regulamentação da atividade, e a parceria da fiscalização e controle somente seria possível a partir da estipulação de convênios com o próprio Departamento de Polícia Federal/Ministério da Justiça. Até mesmo as normas emitidas pelo próprio Departamento de Polícia Federal, em geral portarias, muitas vezes são acusadas de inconstitucionalidade ou ilegalidade, na medida que contrariam a própria lei ou a constituição, ou ainda que extrapolam os seus limites. Neste sentido, a pouco mais de um ano, foi editado Parecer do DPF obrigando o enquadramento dos “Caixas Eletrônicos” nas definições da Lei 7.102, sendo que este ato não vem sendo cumprido, alegando os Bancos a ausência de total de competência para a

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referida extensão de aplicabilidade da lei. As controvérsias não param por aí, e são mesmo históricas, sem que até hoje tenha havido solução para os problemas. Um dos questionamentos trata da própria criação da Comissão (deliberativa) Executiva para Assuntos de Vigilância e Transporte de Valores, que tem inclusive a participação de empresas e sindicatos econômicos e profissionais. Há a questão da Portaria 214/89, expedida pelo presidente desta mesma comissão, em que se oficializam os serviços de segurança pessoal (guarda costas) sem o respaldo legal necessário. Outra portaria ainda, também sem respaldo legal, eleva o poder das empresas do setor, autorizando a aquisição de equipamentos para recarga de munições, atividade até então exclusiva das forças armadas. Ou seja, em matéria de vigilância privada, muito se tem criado e extrapolado, através de portarias e atos normativos diversos, acusados de não terem respaldo legal suficiente. Mas voltando a análise da lei, temos que os artigos 21 e 22 estabelecem os critérios para o uso de armas pelas empresas de vigilância, que tem de ser de sua propriedade e obedecer algumas especificações. O uso, logicamente, se restringe ao ambiente e período de trabalho. As novas e atuais modificações legislativas no que se refere à propriedade e posse de armas, ressalvaram as condições de seu uso pelas empresas de vigilância, mas vários outros projetos em tramitação procuram restringir o uso de armas na atividade de vigilância privada, inclusive porque muitas delas acabam por cair nas mãos de bandidos, obtidas em assaltos a bancos (somente no Estado de São Paulo, dados do Sindicato dos Bancários mostram que mais de mil armas caem todos os anos nas mãos de bandidos, obtidas em ações de assaltos a bancos). Não faltam quem seja contra o uso de armas pelos vigilantes, como é o caso de Carlos Miguel Aidar, ex-presidente da seccional paulista da OAB, que assim se manifesta em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo1:

“A conclusão não pode ser mais evidente: a vigilância armada é um pavio aceso. E por que isso ocorre? Primeiro, por conta da própria cultura da vigilância. As exigências são mínimas: bons antecedentes, porte de arma, aulas elementares de legislação e tiro. A lei estadual que deseja armar os vigias não amplia os requisitos da lei federal 7.102, que dispõe sobre segurança em estabelecimentos financeiros. Numa sociedade que se arma intensamente, a rede de segurança privada acaba se tornando mais um sistema capaz de alimentar a violência em vez de soluciona-la.”

Nesse aspecto, temos que a já citada novel lei sobre comercialização, registro e posse de armas, publicada em 22 de dezembro de 2.003, veio sem dúvida, sem criar grandes empecilhos ao correto exercício da atividade, a contribuir para um melhor controle dos armamentos de posse das empresas de vigilância e de seus empregados. Vale a pena analisar os termos desta lei que 1 – F. S. Paulo – Caderno Opinião / Tendências / Debates – 18.01.2003

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dizem respeito a matéria ora analisada, que, diga-se, muito vem preocupando as empresas do setor, em especial as que atuam, infelizmente, na ilegalidade.

LEI No 10.826, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2003.

Dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras providências.

(...) Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos:

I – comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal;

II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa;

III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.

(...) Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:

(...)

VIII – as empresas de segurança privada e de transporte de valores constituídas, nos termos desta Lei;

(...)

Art. 7o As armas de fogo utilizadas pelos empregados das empresas de segurança privada e de transporte de valores, constituídas na forma da lei, serão de propriedade, responsabilidade e guarda das respectivas empresas, somente podendo ser utilizadas quando em serviço, devendo essas observar as condições de uso e de armazenagem estabelecidas pelo órgão competente, sendo o certificado de registro e a autorização de porte expedidos pela Polícia Federal em nome da empresa.

§ 1o O proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança privada e de transporte de valores responderá pelo crime previsto no parágrafo único do art. 13 desta Lei, sem prejuízo das demais sanções administrativas e civis, se deixar de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de armas de fogo, acessórios e munições que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte e quatro) horas depois de ocorrido o fato.

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§ 2o A empresa de segurança e de transporte de valores deverá apresentar documentação comprobatória do preenchimento dos requisitos constantes do art. 4o desta Lei quanto aos empregados que portarão arma de fogo.

§ 3o A listagem dos empregados das empresas referidas neste artigo deverá ser atualizada semestralmente junto ao Sinarm.

Evidencia-se na nova lei, que a partir de agora, os empregados das empresas de segurança que portarem armas de fogo em serviço (e exclusivamente no seu ambiente privado), deverão estar especificados em uma relação, renovada a cada seis meses, além de preencherem os requisitos do artigo 4o da mesma lei - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal; apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei. Como tais requisitos devem ser considerados, no caso dos vigilantes, somado aos previstos na Lei 7.102 e suas atualizações, a novidade fica a cargo da exigência de um maior leque de certidões negativas, comprobatórias de idoneidade, e da capacidade técnica e aptidão psicológica, de acordo com a regulamentação que vier a ser disposta (até o momento somente existe um projeto de regulamentação, através de decreto), que, espera-se, seja superior ao que se exige normalmente nos chamados cursos de formação de vigilantes, hipótese que forçará uma atualização dos currículos hoje praticados por tais cursos.

Por último, há uma previsão de punição de caráter criminal para o proprietário ou diretor responsável pela empresa, nos casos de perda, furto, roubo ou extravio das armas em poder da empresa. É mais uma penalidade que se soma as já existentes, decorrente da regulamentação específica. Logicamente que visa, principalmente, evitar o desvio de armas, que, sabe-se, intencionalmente ou não, é hoje responsável por vasto arsenal que se encontra nas mãos da marginalidade e do crime organizado. Lamentável é que, por ausência de requisitos mais severos, grande parte das empresas encontram-se irregulares, ou ainda que regulares, registradas em nome de meros “laranjas”, muitas vezes pessoas que sequer sabem-se proprietárias de empresas, ou que não são encontráveis.

Há ainda um fato a ser observado na nova lei. A regulamentação trazida, segundo citado, diz respeito apenas às empresas de segurança e transporte de valores, enquanto existem também, de acordo com a Lei 7.102 e alterações posteriores, os departamentos orgânicos de outras empresas, a elas equiparadas. O fato está a merecer uma interpretação. Ou estes departamentos, que são também regulados pela Polícia Federal, passam a não mais poder utilizar

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armamentos, pois que sua situação não foi expressamente prevista na nova lei que regula o registro e porte de armas. Ou ainda, por equiparação contida na legislação própria, passarão a ter a mesma regulação relativa ás empresas específicas. De fato, não haveria motivo para a diferenciação, a esta altura, tendo a ausência da previsão decorrido de falha no rigor da nova lei. De qualquer forma, o espaço à interpretações está aberto, e a questão corre o risco de acabar sendo decidida pelo Judiciário.

Voltando aos acréscimos legislativos trazidos pela regulamentação so sinarm, logicamente que, ainda assim e por tudo isso, uma melhor análise e regulação do setor é uma necessidade óbvia. A vigilância privada é direito do cidadão, tornou-se mesmo uma necessidade, e deve ser possível em uma economia de mercado. A razão está no ponto em que a sua regulamentação deveria ser repensada, assim como a sua coordenação e fiscalização, para que se evitem abusos e ilegalidades, e também para que o sistema efetivamente funcione, e seja inclusive democrático.

Do ponto de vista da democracia, inclusive, temos que como ocorre exemplificativamente com a saúde e a educação, o que se vê é uma superproteção das elites, que se servem de homens bem formados e farta tecnologia no que se refere à vigilância privada, enquanto a grande maioria da população fica realmente desprotegida. Sob este aspecto, a vigilância privada serve mais aos poderosos, e constitui mais um problema gerado pela péssima distribuição de renda em nosso país. Mais ainda, se a mesma proteção passa, como vem ocorrendo, a representar processo de força capaz de sustentar o sistema de desigualdade social. Sobre esta tendência, que contraria o princípio da igualdade, previsto em sede constitucional, recorremo-nos novamente às bem postas observações de Leonarda Musumeci1.

“De volta ao noticiário nacional, percebe-se que o elenco aparentemente inesgotável de denúncias alarmantes relacionadas ao crescimento da segurança particular é vez por outra entremeado de matérias que reportam o crescimento de uma “indústria VIP” nas regiões Sudeste e Nordeste, voltada para consumidores de alta renda, oferecendo “seguranças de primeira classe” para proteção de executivos ou para vigilância de ambientes “nobres”, sofisticados aparatos de rastreamento eletrônico e diversos serviços (investigação, perícia, recuperação de bens, etc.) muito mais modernos e alegadamente mais eficazes que aqueles prestados pelos órgãos de segurança pública. Em outras palavras, registra-se processo de segmentação da oferta, não só entre serviços privados e públicos (mercantis e não mercantis), mas também no interior dos primeiros, diferenciando qualidade segundo estratos de renda. Se esse processo é comum a grande parte dos mercados, torna-se entretanto um fator especialmente perverso, do ponto de vista da consolidação democrática, quando atinge requisitos essenciais da cidadania, como são os serviços de saúde, educação, segurança e justiça

1 - Serviços Privados de Vigilância no Brasil – pág. 16

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(Saavedra (1997)). A “eficiência” desigualmente distribuída no provimento desses serviços gera efeitos diretos de exclusão social; no caso específico da segurança, combinado uma proteção “VIP” para as elites econômicas à desproteção e maior exposição à violência nas camadas sociais (Caldeira (1991) e Heringer (1992)), ou, como afirma Paixão (1991, p. 138), institucionalizando “o pior dos mundos possíveis”, onde se somam “aos dilemas antigos de domesticação da polícia e abertura do judiciário às classes populares (...) os problemas modernos postos pela privatização da segurança” (Paixão e Beato (1997).Tal segmentação afeta não só os usuários, mas também os trabalhadores do setor, diferenciando a qualidade dos empregos no que se refere a condições de trabalho, renda, recursos materiais, treinamento e risco de vida. A baixa qualificação da mão-de-obra recrutada nesses serviços, sobretudo nos particulares (excetuando-se os segmentos de elite), é outro alvo recorrente de notícias da mídia desde a criação oficial da vigilância privada no Brasil, quase três décadas atrás. Por seu turno, o sucateamento e a deterioração salarial das polícias nos anos 80 e 90 são temas que vêm à tona quando se discute, por exemplo, o “bico” em atividades de vigilância particular, ou, no momento atual, quando se assiste a uma inédita mobilização de policiais em todo o país, reivindicando melhores salários.”

1.4) Caráter privado dos serviços de vigilância

O crucial, no entanto, na nossa análise, para que não nos percamos de nossa proposta prática, é o que decorre da lei em comento, e de outros dispositivos, inclusive a nova lei sobre armas já mencionada. Trata-se da característica da segurança privada de se dar sempre “intra-muros”, ou seja, somente pode ser prestada no interior dos locais de sua contratação, sejam eles públicos ou privados. Assim, o segurança do banco limita sua ação ao interior da agência, o mesmo ocorrendo com o vigilante de casa comercial, industrial, etc. O vigilante de um evento, esportivo ou festivo, somente deve atuar no interior do recinto em que aquele se desenvolve. O próprio vigilante de carro forte, tem sua atividade limitada a proteção do carro e do numerário que carrega. A atuação, portanto, do chamado “guarda de rua” é totalmente descabida, mesmo até que ele esteja vinculado a uma empresa de segurança. Por ser bastante esclarecedor, transcrevemos trecho de artigo de autoria do advogado Luis Fernando Andrade de Oliveira, publicado na Gazeta Mercantil 1:

“A proibição de formação de organizações paramilitares, ou reunião de civis armados,

é afirmada com mais clareza na atual Constituição. Assim, a lei e atos normativos autorizaram porte de arma às empresas de segurança patrimonial e vigilância, desde que só disponibilizem armas e profissionais treinados e capacitados – e só no local de trabalho, durante o turno. A saída de civis armados e serviço de terceiros não tem amparo legal; não é permitido um vigilante se deslocar armado da empresa até a residência ou estabelecimento do cliente. Quando um alarme disparar, se não houver vigilante no local, as únicas iniciativas que a lei permite às empresas de vigilância ou de alarmes, são comunicar logo o fato à autoridade policial mais próxima e encaminhar funcionário desarmado para constatar danos e ajudar a vítima.” 1 – Gazeta Mercantil – Edição de 26 de maio de 2000

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A questão tem mesmo natureza constitucional, já que o artigo 144 da Constituição Federal estabelece que quem exerce exclusivamente as atividades de Polícia nas vias e áreas públicas são: Polícia Federal; Polícia Rodoviária Federal; Polícia Ferroviária Federal; Polícia Civil; Polícia Militar e as Guardas Municipais. 1.5) Outras questões relevantes

Outra questão, ainda de máxima relevância, que deve ser destacada, é que na época do advento da lei, os estabelecimentos financeiros limitavam-se às agências bancárias. Hoje, fruto do desenvolvimento das relações do setor terciário, bem como da tecnologia, os serviços financeiros e o manuseio de valores são realizados também nos chamados “caixas eletrônicos, “postos bancários”, além das lotéricas e agências dos correios. A grande dúvida, portanto, está em se saber se tais estabelecimentos revestem-se das características definidas em lei, pois que na maioria dos casos estes estabelecimentos não são guarnecidos por vigilantes, além dos outros mecanismos de segurança. A questão, por ser bastante relevante, será tratada em tópico posterior. Por último, no que concerne as alegações iniciais, temos que também estão enquadrados na lei os cursos de formação de vigilantes, que são obrigatórios, inclusive no que se refere à reciclagem. Estes também estão sob a supervisão e fiscalização da Polícia Federal. São estas as considerações iniciais, que visam situar o nosso tema em seu contexto, de forma atual. Entendido, brevemente, o funcionamento da vigilância privada no Brasil, e algumas das principais questões que caracterizam o setor, passemos, nos próximos tópicos, a uma análise dos aspectos que tocam a figura humana e profissional do vigilante, bem como à análise das principais questões hodiernas.

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Capítulo 2) Direitos consolidados e convencionados dos vigilantes Os vigilantes, conforme já foi dito, são sempre empregados. Isso porque, de acordo com a nossa legislação, só é regulamentada a atuação da empresa de segurança e vigilância ou departamentos orgânicos de segurança e vigilância de empresas de outros ramos de atividade. Daí a ilegalidade, inclusive, de associações e cooperativas de vigilantes, pois que essas somente poderiam existir caso o profissional vigilante pudesse trabalhar individualmente, com autonomia.

É importante citar os casos das cooperativas, pois algumas delas, há algum tempo atrás, constituídas praticamente por “vigilantes autônomos”, chegaram a conseguir liminares na Justiça Federal, para sua atuação, invocando para tanto o princípio da liberdade do exercício profissional, princípio geral previsto na Constituição da República. É assustador que alguns juízes federais possam ter concedido tais liminares, em se tratando de profissão de características especiais, cuja lei exige vínculo de emprego e responsabilidade da empresa para o seu exercício, além de alguns requisitos pertinentes aos próprios funcionários. Certo é que a liberdade constitucional encontra várias limitações, em se tratando de exercício de profissão, e nem os maiores teóricos liberais poderiam conceber a idéia do exercício de tal atividade (segurança privada – inclusive com emprego de armamento) por quem esteja em situação irregular, absolutamente despreparado, ou ainda sem qualquer critério de responsabilidade.

As empresas ou departamentos que atuam no ramo de segurança e vigilância, como também já foi visto, tem alguns critérios para a contratação dos seus empregados vigilantes - ser brasileiro; ter idade mínima de 21 (vinte e um) anos; ter instrução correspondente à quarta série do primeiro grau; ter sido aprovado em curso de formação de vigilante, realizado em estabelecimento com funcionamento autorizado nos termos desta lei; (Inciso IV com redação dada pela Lei nº 8.863, de 28/03/1994); ter sido aprovado em exame de saúde física, mental e psicotécnico; não ter antecedentes criminais registrados; e estar quite com as obrigações eleitorais e militares. –, embora, como também já foi afirmado, o mercado esteja a exigir outros requisitos, o que não deixa de ser saudável, ainda mais em uma economia de livre mercado e em uma atividade em que a seleção deve ser mesmo rigorosa. Estes são os requisitos mínimos para o exercício da função de vigilante privado. Estar empregado em uma empresa regular, e cumprir tais condições. Somam-se inclusive a tais condições, conforme já foi visto no item anterior, os novos regramentos sobre porte de arma, previsto na Lei 10.826/2003.

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Importante agora compendiarmos os direitos mínimos que assistem à categoria dos empregados vigilantes, procedimento que ajudará a entendermos um pouco mais sobre quem são as pessoas que atualmente prestam tais serviços em nosso país. 2.1) Situação dos vigilantes no contexto das leis trabalhistas - CLT Em primeiro lugar, temos que a vigilância privada constitui, nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, categoria profissional denominada “diferenciada”. Isso porque, em geral, a categoria profissional se espelha na categoria econômica respectiva. Exemplificativamente, uma empresa comercial possui funcionários comerciários, que integram categoria profissional específica, espelhada pois na atividade principal da empresa. O mesmo se dá com o ramo metalúrgico, têxtil etc. No caso do ramo de vigilância, temos extraordinariamente diversos trabalhadores que atuam, não diretamente na empresa empregadora, mas junto a empresas diversas, não tendo qualquer relação de proximidade entre os demais profissionais da empresa tomadora de seus serviços, e tendo em comum com outros vigilantes as características próprias da profissão. O vigilante, pois, faz parte de categoria dita diferenciada, regulada pelo parágrafo terceiro do artigo 511 consolidado, aqui transcrito para um melhor entendimento.

“CLT – Artigo 511 – É lícita a associação para fins de estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autônomos, ou profissionais liberais, exerçam respectivamente, a mesma atividade ou profissão ou atividades ou profissões similares ou conexas.” “Parágrafo 1o – A solidariedade de interesses econômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas, constitui o vínculo social básico que se denomina categoria econômica.” “Parágrafo 2o – A similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum, em situação de emprego na mesma atividade econômica ou em atividades econômicas similares ou conexas, compõe a expressão social elementar compreendida como categoria profissional.” “Parágrafo 3o – Categoria profissional diferenciada é a que se forma dos empregados que exerçam profissões ou funções diferenciadas por força de estatuto profissional especial ou em conseqüência de condições de vida singulares. (gg. nn.)”

Assim também são, da mesma forma, o advogado, o médico, o contador e o dentista; todos obedecem a regras específicas e estão adstritos à entidades

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representativas não abarcadas pela categoria preponderante à que estão vinculados. Ou seja, qualquer destes profissionais conservam sua identidade e similitude entre si, estejam eles nas empresas ou instituições em que estiverem, de qualquer ramo de atividade econômica.

A única diferença, no caso dos vigilantes, como já foi dito, é que eles sempre estão vinculados necessariamente a uma empresa, já que o estatuto regulamentador trata da situação apenas daquela, não tendo pois o profissional vigilante a autonomia presente na condição dos outros profissionais citados. E, sendo o vigilante um empregado nato, somente sua condição é possível, enquanto atividade terceirizada, por meio de uma exceção legal, que considera a sua atividade como alheia à finalidade específica das empresas que recebem efetivamente seus serviços, e que não são as suas empregadoras diretas, a exceção dos casos em que se dá a constituição dos chamados departamentos orgânicos de vigilância, já aqui definidos. A exceção legal a que nos referimos, é sustentada, principalmente, por um ato de inteligência do Tribunal Superior do Trabalho, que é o mais alto grau do judiciário trabalhista, e que reflete o conjunto de decisões jurisprudenciais sobre o tema. Trata-se do enunciado da súmula 331 do TST, que dispõe o seguinte:

“Enunciado da súmula 331 da CLT – 1 – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (l. 6.019, de 3.1.74). II – A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da Constituição da República). III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (l. 7.102, de 20.6.83), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da lei 8.666/93) (red. Res. TST 96/00. DJ. 18.9.00) (1993).”

Ou seja, a atividade de vigilância no Brasil, enquanto prestada pelas empresas específicas a que se refere a Lei 7.102, somente é possível graças a exceção da interpretação legal, cuja regra se prende à contratação direta dos trabalhadores pelos tomadores de serviço.

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A exceção, que tem como cerne a regulamentação própria quanto às empresas do ramo, tem por fundamento fático a circunstância de que a vigilância não se relaciona com a atividade própria da empresa contratante dos serviços, mas com prestação acessória e não envolvida com o seu objeto social, definida como “atividade meio”. Ainda assim, existe a hipótese da contratação direta, através do já mencionado mecanismo de constituição do departamento orgânico, com igual registro no Departamento da Polícia Federal. O item VI da súmula citada, revela uma outra preocupação dos Julgadores, que é a responsabilidade subsidiária dos tomadores dos serviços, pelos valores contratuais eventualmente inadimplidos.

Esta obrigação foi constituída na jurisprudência, primeiro por tratar-se de proteção ao trabalhador, em sistema que ordinariamente vincula o empregado ao beneficiário de seus serviços; e segundo, pela prática usual das empresas prestadoras de serviços terceirizados, em nosso país, de darem calotes em seus empregados, aproveitando de sua natural ausência de patrimônio.

No âmago dessa preocupação, estão as empresas de vigilância. Como prestadoras de serviços, funcionam desprovidas de patrimônio. Nem mesmo o depósito exigido pela Polícia Federal, de “cem mil ufir”, é factível, pois que nunca é integralizado, e nem isso é de fato exigido. Em geral, essas empresas trabalham com imóveis e veículos alugados. Costumam sumir da noite para o dia, deixando os seus empregados em situações calamitosas, sem o salário do mês, as verbas rescisórias, e impossibilitados do saque do FGTS e até mesmo do seguro desemprego, já que para o levantamento de tais verbas é necessário que tenha havido uma dispensa formalizada, com o cumprimento de todos os requisitos legais.

Esses empregados de empresas terceirizadas, como é o caso típico dos vigilantes, por elevada preocupação do julgador, que aqui funcionou, por uma daquelas particularidades do sistema nacional, como órgão legislador (criador do direito), ainda acabam sendo amparados, na maioria das vezes, pelo patrimônio do tomador dos serviços (restando a este o direito de regresso contra quem não mais existe no mundo jurídico), em face da determinação da responsabilidade subsidiária, tendo que se valer, no entanto, da competente ação trabalhista. O ideal, portanto, seria que fossem exigidas garantias ao funcionamento das empresas terceirizadas, como por exemplo um depósito integralizado por empregado contratado, ou um mínimo de patrimônio em relação também ao número de trabalhadores, ou até uma espécie de seguro para os casos de

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insolvência. A solução teria de vir necessariamente do poder legislativo, e ao que parece, está muito longe de se efetivar.

Mas, no caso das empresas de segurança, os problemas não acabam por aí, pois que existem as armas, que no caso de desaparecimento ou falência fraudulenta da empresa, simplesmente são desviadas. E mais ainda, em geral, por conta dessa “sistemática de mercado”, a tal empresa que deixou de existir estava no nome de meros “laranjas”, pessoas que muitas vezes nem tem conhecimento de sua “propriedade”, sendo, após a descoberta, impossível até mesmo se punir os responsáveis. Estes, provavelmente já estarão “montando” outra “empresa de vigilância”, em nome de outro “laranja”, para dali algum tempo lesar novamente os trabalhadores, e servir, com as suas armas, ao banditismo, aos esquadrões de extermínio, ao tráfico de drogas, e à própria “vigilância clandestina”.

Portanto, se o sistema criado pode, em algumas hipóteses, proteger o

trabalhador, embora a duras penas do tomador dos serviços, que já os havia pago e terá que pagá-los de novo, no que tange à sociedade em geral, não há defesa, sendo o sistema realmente obsceno.

Espera-se, contudo, como já foi dito anteriormente, que a nova legislação

sobre comercialização, registro e porte de armas, com a nova regulação da matéria em relação ao setor da vigilância privada, possa, pelo menos em parte, solucionar estes problemas.

Tal análise, de acordo com o caráter trabalhista, e no que se refere ao freqüente desvio funcional na atividade de vigilância privada, traz ainda outra constatação.

O problema se refere ao grande número de profissionais que atuam hoje na vigilância privada, de forma irregular, com “funções” as mais variadas, como “porteiro”, “vigia”, “fiscal de piso”, “controlador de acesso” e outras tantas.

Não se tratam aqui dos chamados “clandestinos”, que são um verdadeiro esquadrão, maior que o regular, de pessoas, muitas vezes com antecedentes criminais, que são verdadeiros marginais, ou policiais em sistema de bicos, que exercem ilegalmente a vigilância privada, e que a Polícia Federal, pelo baixo efetivo, não consegue minimamente controlar ou fiscalizar.

. Tratam-se, aqui, de profissionais que poderiam até mesmo trabalhar de forma regular, mas que atuam, como verdadeiros vigilantes, em funções porém com denominação distinta, embora assemelhada, e custam mais barato, pois

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ganham menos, e não estão adequadamente preparados, pois tiveram da empresa um menor investimento em sua formação. É, portanto, o típico desvio funcional.

Estes profissionais, em geral, estão em shopping centers, condomínios, lojas e outros ambientes. Passam a impressão de dar segurança aos consumidores, moradores e fregueses, mas não estão adequadamente preparados e ganham pouco em relação ao que seria devido à função de vigilante. Geralmente, são oferecidos pelos mesmos grupos empresariais que fornecem a mão de obra de vigilância (em geral, estes grupos possuem duas empresas, com o mesmo nome principal, sendo alterado apenas os acessórios – uma delas tem o termo “vigilância privada”, e a outra “serviços gerais”, ou algo parecido), só que por preços mais baixos, e nessa categoria estão pessoas que outrora eram vigilantes, mas foram “readaptados”, ou melhor “rebaixados”. Esse chamado desvio funcional contribui, indubitavelmente, para um rebaixamento do nível da segurança privada. Os baixos salários pagos (em torno, hoje, no estado de São Paulo, de R$300,00 a R$400,00) e a ausência de direitos convencionados, ou pelo menos o cumprimento deste, acaba por gerar trabalhadores mal preparados para a função, atraindo pessoas que não teriam condições do exercício da atividade. Gera, em verdade, um exército de miseráveis, que estão alheios a proteção legal de sua categoria, e que submetem a população a um nível de proteção inferior à noção que lhe é passada, e ao que seria minimamente esperado.

A importância da colocação deste problema neste momento, é revelar que a categoria de vigilância privada sofre um movimento de pauperização de seus direitos, tornando-se pior do que poderia ser, e pior do que a imagem que é passada a população. Em conclusão, no que diz respeito à grande parte dos vigilantes, os direitos normatizados ou convencionados, simplesmente não existem. Dessa forma, grande parte dos direitos que serão doravante relatados, não os alcança. Posteriormente, nesse trabalho, voltaremos a falar sobre o patente desvio funcional existente, bem como do mecanismo da clandestinidade que abarca a profissão em nosso país.

Pois bem, quanto aos direitos propriamente ditos, temos que como empregados, os vigilantes fazem jus ao conjunto de normas trabalhistas protetivas existentes, que constam da CLT – Constituição das Leis do Trabalho, Constituição Federal, principalmente capítulo dos direitos sociais esmiuçado no texto de 1988, e de outras leis esparsas que forma o referido conjunto em nosso país.

Desse conjunto de direitos, que assistem a todos os trabalhadores ditos celetistas, não iremos propriamente falar, uma vez que não é aqui nosso

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objetivo. Analisaremos apenas os direitos especiais da categoria, previstos em leis particulares, ou oriundos de negociação coletiva específica. 2.2) Direitos previstos nas próprias normas reguladoras da atividade

Em primeiro lugar, repetindo um pouco o que já foi dito no capítulo anterior, existem alguns direitos que estão previstos na própria lei que regulamenta a atividade das empresas contratantes dos trabalhadores (7.102 e suas alterações) – Art. 19 - É assegurado ao vigilante: I - uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular; II - porte de arma, quando em serviço; III - prisão especial por ato decorrente do serviço; IV - seguro de vida em grupo, feito pela empresa empregadora.

Embora estejam previstos em lei específica de natureza diversa, parece

óbvio que são direitos trabalhistas, decorrentes da relação de emprego e adaptados à profissão específica. O item I serve a regulamentar a atividade, conferindo o uniforme para que o profissional seja obrigatoriamente identificado, mas prevê que o seu custo será arcado exclusivamente pela empresa, o que se revela numa ordem de fornecimento obrigatório de vestimenta para o exercício do trabalho.

O porte de arma, que se destina ao vigilante que atua armado, já que

existem os desarmados, é uma obrigação da empresa, em relação aos órgãos regulamentadores e também ao próprio trabalhador, que tem a providência determinada como obrigação exclusiva da empresa. Ressalte-se que a arma está vinculada ao posto de trabalho, não podendo ser usada ou portada de qualquer outra forma pelo profissional.

A prisão especial é em virtude do exercício da modalidade de trabalho

específica, e se revela em um privilégio e também numa medida protetiva do profissional em relação à marginalidade, sendo evidente o risco de confronto.

O seguro de vida em grupo, decorre da natureza da atividade

profissional e do risco envolvido. Existe inclusive regramento que detalha este direito, sendo este o presente na Resolução CNSP 05/84, que delimita os termos da proteção e os prêmios envolvidos. Eis a seguir o seu texto.

MINISTÉRIO DA FAZENDA CONSELHO NACIONAL DE SEGUROS PRIVADOS

RESOLUÇÃO CNSP Nº 05/84

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O CONSELHO NACIONAL DE SEGUROS PRIVADOS (CNSP), no uso de suas atribuições legais, tendo em vista o disposto no art. 21 do Decreto nº 89.056, de 24.1183 e o que consta do Proc. CNSP nº 11/84-E, RESOLVE:

1 - Na contratação do seguro a que se refere o art. 19, inciso IV, da Lei nº 7.102, de 20.06.83, serão obedecidas as normas vigentes para o Seguro Vida em Grupo, devendo ser concedidas, no mínimo, a cobertura básica de morte por qualquer causa, obedecidas as exclusões legais, e a cobertura adicional de invalidez permanente, parcial ou total, por acidente. 1.1 - As importâncias seguradas, por vigilantes e por cobertura, corresponderão em cada mês no mínimo a: a) 26 (vinte e seis) vezes a remuneração mensal do vigilante, verificada no mês anterior, para cobertura de morte por qualquer causa; b) a 2 (duas) vezes o limite fixado na letra a, para cobertura de invalidez permanente, parcial ou total, por acidente. 1.1.1 - No caso do vigilante que estiver afastado do trabalho por motivo de acidente ou tratamento de saúde, será considerada a remuneração mensal que lhe seria atribuída se estivesse em atividade, excluindo-se apenas as horas extras. 1.1.2 - Os casos de invalidez serão indenizados de acordo com a importância segurada vigente no mês de pagamento da indenização.

2 - Outras coberturas adicionais e cláusulas suplementares poderão ser incluídas no seguro, a critério da seguradora, do estipulante e dos segurados, obedecidas as normas vigentes.

3 - Quando o número de segurados de uma empresa não atender o mínimo exigido, isto não constituirá motivo de recusa do seguro pela seguradora, podendo a mesma, em tais casos, agrupar mais de uma empresa em uma mesma apólice.

4 - Esta Resolução entrará em vigor 30 (trinta) dias após sua publicação.

Esta, portanto, a regulamentação especial do seguro de vida e invalidez para o empregado vigilante. Estipula, como visto, os limites mínimos de indenização para morte, por qualquer causa, e para a invalidez, esta exclusivamente decorrente de acidente. Os valores fixados são o mínimo admissível, sendo possível a elevação dos prêmios, por acordo entre as partes, inclusive coletivo, em prol da categoria. A obrigação de fazer o seguro é da empresa. Caso esta não cumpra sua obrigação e venha a ocorrer o evento, fica obrigada à indenização direta ao empregado, que poderá, caso não paga, ser cobrada na Justiça do Trabalho. Há, ainda, um direito que decorre de uma obrigação legal, que atinge em especial os bancos e instituições financeiras, e cujo intuito primeiro foi o de garantir maior segurança ao cliente/usuário. Trata-se da “cabina blindada”, para utilização do vigilante, e que pode salvar sua vida, quando atuando no exercício de sua função. O artigo 2o da Lei 7.102 diz o seguinte: - Art.2º - O sistema de segurança referido no artigo anterior inclui pessoas adequadamente preparadas, assim

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chamadas vigilantes; alarme capaz de permitir, com segurança, comunicação entre o estabelecimento financeiro e outro da mesma instituição, empresa de vigilância ou órgão policial mais próximo; e, pelo menos, mais um dos seguintes dispositivos: I - equipamentos elétricos, eletrônicos e de filmagens que possibilitem a identificação dos assaltantes; II - artefatos que retardem a ação dos criminosos permitindo sua perseguição, identificação ou captura; e III - cabina blindada com permanência ininterrupta de vigilante durante o expediente para o público e enquanto houver movimentação de numerário no interior do estabelecimento. (gg. nn.) Conforme se percebe, o direito não é obrigatório, na medida que cabe ao próprio banco escolher apenas um dos três dispositivos previstos nos três incisos da lei, sendo o terceiro o que prevê a existência da cabina referida, capaz de proteger, se utilizada, também a vida do profissional vigilante. É, sem dúvida, um direito importante, embora não obrigatório. 2.3) Normas de segurança do Ministério do Trabalho

Há, por último, que se analisar o texto da Portaria 25 do Ministério do Trabalho, que estabelece a NR6. sendo esta uma norma regulamentadora que disciplina o uso de EPI por trabalhadores em diferentes situações. São, evidentemente, direitos dos empregados vigilantes, já que tratam de medidas para sua segurança na atividade. Por esta norma, entendemos que o vigilante que atua em locais onde há risco efetivo de sua incolumidade física, como é o caso do trabalho em agências bancárias, deva receber, como um direito trabalhista, o colete a prova de balas, sendo este um EPI adequado à situação. Analisemos a seguir o teor de tal dispositivo legal, e sua relação com o caso do empregado vigilante.

N R 6 - EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL

6.1 - Para os fins de aplicação desta Norma Regulamentadora - NR, considera-se Equipamento de Proteção Individual - EPI, todo dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde no trabalho.

6.3 - A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito estado de conservação e funcionamento, nas seguintes circunstâncias: a) sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho ou de doenças profissionais e do trabalho; b) enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas; e, c) para atender a situações de emergência.

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6.4 - Atendidas as peculiaridades de cada atividade profissional, e observado o disposto no item 6.3, o empregador deve fornecer aos trabalhadores os EPI adequados, de acordo com o disposto no ANEXO I desta NR.

ANEXO I

E - EPI PARA PROTEÇÃO DO TRONCO

E.1 - Vestimentas de segurança que ofereçam proteção ao tronco contra riscos de origem térmica, mecânica, química, radioativa e meteorológica e umidade proveniente de operações com uso de água.

Para nós, portanto, parece óbvio, que em se tratando de vigilante que efetivamente se ativa em locais de risco, como é o caso das agências bancárias, carros fortes, e outros, o EPI colete a prova de balas, com nível adequado à absorção de impacto mecânico proveniente das armas atualmente utilizadas em assaltos, automáticas e de grosso calibre – no caso, segundo os especialistas, o colete de nível II -, é obrigatório, nos termos da NR6. Trata-se de vestimenta especial de segurança para proteção do tronco e dos órgãos envolvidos, contra impactos de natureza mecânica.

Logicamente que, em se tratando de locais que possuam cabinas blindadas para uso e proteção do vigilante, o colete torna-se desnecessário, pois que a proteção já existe. Outra ressalva ainda se faz para os escritórios bancários, que embora possuam vigilantes, não transacionam mais dinheiro ou outros meios de pagamento, atuando via sistemas de transferência e em aportes ou investimentos. Neste caso, não há risco suficiente, no nosso entender, para a adoção da medida de segurança em comento. 2.4) Os Instrumentos coletivos e os direitos convencionados

Além dos direitos já verificados, decorrentes da legislação aplicável ao vigilante, existem os benefícios obtidos por negociação com a categoria econômica, que constituem as convenções coletivas de trabalho.

Este tipo de negociação é, sem dúvida, o caminho mais vantajoso para a estipulação de condições de trabalho específicas, relativamente às necessidades particulares das categorias profissionais, dependendo, no entanto, da atuação das Entidades Profissionais representantes (sindicatos, federações e confederações).

Como tais convenções são firmadas por região de representação dos sindicatos, existe uma diferença entre os direitos convencionados da categoria entre os diversos estados e até mesmo no interior destes. Analisaremos, então, a

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situação no Estado de São Paulo, tendo em vista a nossa maior proximidade, além deste Estado ser o que “mais emprega vigilantes”, e de possuir uma particularidade, que é a de todos os sindicatos do estado, em número de vinte e dois, chegarem, já há vários anos, há um contrato comum, representados pela Federação estadual – FETRAVESP – FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES EM SEGURANÇA VIGILÂNCIA PRIVADA, TRANSPORTE DE VALORES, SIMILARES E AFINS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Os sindicatos que fazem parte da convenção que será analisada, estão elencados abaixo. Assusta efetivamente o número de entidades representativas profissionais, que espelham no entanto a quantidade de profissionais vigilantes existentes – outro fator, que efetivamente merece destaque, é realmente o número muito grande de entidades sindicais em nosso país, matéria a ser enfrentada na reforma sindical que é hoje discutida pelo Poder Legislativo -. Somente no que diz respeito aos vigilantes regulares (estima-se que o exército de irregulares seja quase o dobro), algo em torno de 200.000 em todo o estado, cerca de 1/3 deles somente na cidade de São Paulo.

01) SINDICATO DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE VIGILÂNCIA, SEGURANÇA E SIMILARES DE SÃO PAULO – "SEEVISSP" – SP;

02) SINDICATO DA CATEGORIA PROFISSIONAL DOS EMPREGADOS E DE TRABALHADORES EM VIGILÂNCIA NA SEGURANÇA PRIVADA / CONEXOS E SIMILARES AFINS DE ARARAQUARA E REGIÃO – “SINDIVIGILÂNCIA DE ARARAQUARA” – SP;

03) SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE BARUERI/SP;

04) SINDICATO DOS VIGILANTES E DOS TRABALHADORES EM SEGURANÇA E VIGILÂNCIA, SEUS ANEXOS E AFINS DE BAURU E REGIÃO –SP;

05) SINDICATO DA CATEGORIA PROFISSIONAL DOS EMPREGADOS E DE TRABALHADORES EM VIGILÂNCIA NA SEGURANÇA PRIVADA / CONEXOS E SIMILARES, DE CAMPINAS E REGIÃO - “SINDIVIGILÂNCIA CAMPINAS”;

06) SINDICATO DOS TRABALHADORES EM SERVIÇOS DE SEGURANÇA, VIGILÂNCIA, SEGURANÇA PESSOAL, GUARDAS NOTURNOS E SEGURANÇA PATRIMONIAL DE GUARATINGUETÁ E REGIÃO – SP;

07) SINDICATO DOS VIGILANTES DE GUARULHOS, ITAQUAQUECETUBA, E REGIÃO;

08) SINDICATO DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE JUNDIAÍ – SP;

09) SINDICATO DOS VIGILANTES E DOS TRABALHADORES EM SEGURANÇA, SEUS ANEXOS E AFINS DE LIMEIRA E REGIÃO – SP;

10) SINDICATO DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE OSASCO, REGIÃO E VALE DO RIBEIRA – SP;

11) SINDICATO DA CATEGORIA PROFISSIONAL DOS EMPREGADOS E DE TRABALHADORES EM VIGILÂNCIA NA SEGURANÇA PRIVADA / CONEXOS E SIMILARES DE PIRACICABA E REGIÃO - “SINDIVIGILÂNCIA PIRACICABA”;

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12) SINDICATO DOS EMPREGADOS DE EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE PRESIDENTE PRUDENTE;

13) SINDICATO PROFISSIONAL DOS EMPREGADOS DAS EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE SANTO ANDRÉ E REGIÃO;

14) SINDICATO DOS EMPREGADOS DE EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE SANTOS;

15) SINDICATO DOS EMPREGADOS VIGILANTES E SEGURANÇAS EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E AFINS DE SÃO BERNARDO DO CAMPO – SP;

16) SINDICATO PROFISSIONAL DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA, CURSOS DE FORMAÇÃO DE VIGILANTES, SEGURANÇA PESSOAL PRIVADA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS E REGIÃO – SP;

17) SINDICATO DOS EMPREGADOS DE EMPREGADOS DE EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO;

18) SINDICATO DOS TRABALHADORES EM SERVIÇOS DE SEGURANÇA, VIGILÂNCIA, CURSOS DE FORMAÇÃO, TRANSPORTE DE VALORES, SEGURANÇA PESSOAL, SIMILARES E SEUS ANEXOS E AFINS DE SOROCABA E REGIÃO – SP;

19) SINDICATO DOS EMPREGADOS OPERACIONAIS E ADMINISTRATIVOS DAS EMPRESAS DE SEGURANÇA, VIGILÂNCIA E SEUS ANEXOS DE SÃO PAULO – SP;

20) SINDICATO DOS TRABALHADORES EM VIGILÂNCIA DE BARRETOS E REGIÃO – SP; 21) SINDICATO DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE VIGILÂNCIA, SEGURANÇA E SIMILARES DE MOGI DAS CRUZES E REGIÃO – SEEVIS – MC – SP; 22) SINDICATO DOS TRABALHADORES EM SERVIÇOS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA DE RIBEIRÃO PRETO E REGIÃO – SP.;

Os direitos convencionados, serão analisados de acordo com a previsão atual, que tem vigência a partir de 01 de maio de 2.004, até 30 de abril de 2.006. Eventualmente, serão feitas alusões a regras convencionadas em períodos anteriores, para efeito de análise comparativa da evolução ou involução dos direitos. Será analisado o caso do vigilante convencional, em algumas de suas modalidades, já que, no estado de São Paulo, os vigilantes de carro forte constituem categoria distinta, com negociação em apartado e direitos diversos. Até porque a atividade de transporte de valores exige níveis distintos de treinamento, e envolve ordinariamente grau superior de risco.

Muitos dos direitos convencionados não nos interessarão, uma vez que tratam-se de mera repetição da lei, como ocorre na grande maioria das categorias. Freqüentemente este comportamento é questionado, sendo apontada mera repetição que não gera qualquer benefício, e prejudica a objetividade dos instrumentos. Porém, existem os que defendem essa repetição, alegando ser mais uma forma de informação sobre os direitos existentes. Outros motivos prendem-se à característica das negociações coletivas, principalmente ao hábito de se convencionar direitos, por exemplo, hora extra com adicional de 50%, já

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previsto na Constituição Federal, mas com o intuito de tentar, nas próximas negociações, elevar este adicional. Ou seja, o direito, ainda que básico, está lá, ficando, segundo estes defensores do argumento, mais fácil sua elevação em negociações vindouras. Um último argumento, está relacionado a existência de um instrumento para que a entidade sindical possa cobrar dos empregadores o cumprimento da convenção firmada. Este instrumento, denominado “ação de cumprimento” de normas coletivas, exige, para sua efetivação, que os direitos estejam convencionados. A atitude, então, seria uma forma de possibilitar uma atuação processual específica. De qualquer forma, o que nos interessa neste momento, é que serão analisados os direitos que estão particularizados, que não se tratam de mera repetição legal, e ainda aqueles que possuam algumas condições peculiares, que serão relatadas e analisadas. 2.4.1) Funções convencionadas e remunerações

Iniciemos, pois, pela relação das funções presentes na vigilância privada, e dos respectivos salários existentes na categoria, vigentes a partir de maio/2004, e aplicáveis e todos os municípios do estado de São Paulo. São os seguintes: Gratificação de Função I – Vigilante R$ 681,65 sem gratificação II – Vigilante feminino R$ 681,65 sem gratificação III - Vigilante/monitor de segurança eletrônica 5% IV – Vigilante condutor de animais 10% V – Vigilante/condutor de veículos motorizados. 10% VI – Vigilante/segurança pessoal 10% VII – Vigilante/brigadista 10% VIII – Vigilante/supervisor 74,71% IX – Vigilante/inspetor 44,71% X-Supervisor de monitoramento eletrônico 74,71% XI-Operador de monitoramento eletrônico 11,77% XII - Auxiliar de Monitoramento Eletrônico R$ 562,40 XIII - Atendente de sinistro R$ 749,80 XIV - Instalador de sistemas eletrônicos R$ 653,07 XV – Vigilante em regime de tempo parcial R$ 387,31 XVI - Empregados administrativos R$ 544,05

Conforme pode ser notado, o vigilante, hoje, em São Paulo, com formação básica, e exercício da função convencional, sem qualquer particularidade, ganha um salário base, bruto, de R$681,65. O valor representa, considerando o salário mínimo de R$260,00, a partir também de maio, 2,62 vezes o seu valor.

Não é objetivo deste trabalho avaliar o poder de compra do trabalhador, ou do salário mínimo, ou o cumprimento da função constitucional deste último, que são problemas muito mais abrangentes, e objeto de vários estudos. O que

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nos limitamos a comentar, neste ponto, é que o valor do salário do vigilante é, de fato, muito baixo, quanto mais se considerado que trata-se de um profissional de quem se espera bom preparo técnico, psicológico, e humano. Considere-se ainda, a informação das empresas, de que a grande maioria de seus trabalhadores vigilantes auferem o salário base. Como ainda veremos, não há mais nenhum benefício salarial obrigatório efetivo (vale refeição, cesta básica, e outros), além do convênio médico, que é de certa forma dividido com a empresa, temos que a sobrevivência do profissional vigilante, quanto mais se considerarmos o município de São Paulo, e outros de custo de vida elevado, como é o caso, por exemplo, de Campinas e Ribeirão Preto, é bastante difícil, sendo quase certo, que na média, lhes faltam inclusive bens de primeira necessidade, como alimentação e vestimenta.

A constatação, portanto, que inclusive parece análoga ao que ocorre com os profissionais da segurança pública, é de que a proteção do cidadão e de seu patrimônio, está na mão de pessoas absolutamente carentes de meios dignos de sobrevivência, o que de fato representa um grave problema a ser enfrentado, quanto mais se considerado o poder concorrente da marginalidade.

A situação, no entanto, é ainda mais grave, pois que, conforme já dissemos, a categoria ainda é vítima de um intenso desvio funcional, sendo certo que grande parte dos profissionais da segurança ainda auferem valor inferior ao piso categorial. Há ainda, conforme trataremos em tópico específico, o problema do bico dos policiais, que de certa forma constitui simbiose nefasta presente no nosso sistema de segurança, com claras propensões à ainda maior intensificação. Isso tudo, somado ao problema da clandestinidade, torna os setores de segurança em uma evidente “bomba relógio”, que já teve a explosão iniciada. Conforme se depreende da tabela exposta, existem outros vigilantes, que por terem formação específica e exercerem funções mais qualificadas, recebem diferentes gratificações. Estas, no entanto, não são capazes de alterar o quadro que já expusemos. Outra constatação que é pertinente, é que pode-se notar a influência do setor da vigilância eletrônica, que já tem várias funções associadas, como é o caso dos operadores, auxiliares e supervisores de monitoramento eletrônico. As remunerações, no entanto, nos mostram que todo o setor está mesmo arrochado, pois que nem mesmo as técnicas modernas da vigilância eletrônica são capazes de elevar a base salarial da categoria. No entanto, a notícia boa talvez seja que a modernização dos sistemas de segurança não prescinde do material humano,

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sendo que de fato a segurança gera, a cada ano, mais vagas de emprego, em todos os seus setores. Conclui-se, portanto, que aquela elite de seguranças, que freqüentemente vemos em reportagens, filmes e assemelhados, bem vestidos, bem preparados, fluentes em outras línguas, extremamente confiáveis, etc, não passam de um privilégio das verdadeiras elites, o que reflete, como já dissemos, a nossa péssima distribuição de renda. A realidade, portanto, nos leva a pensar, mais uma vez, se a segurança privada em nosso país traz menos, ou ainda mais insegurança à população. Em verdade, além de maior controle e fiscalização, e de uma nova sistemática legal, o que o setor precisa, é de ampla conscientização de sua importância, e dos riscos representados à sociedade, pois enquanto não houver a efetiva valorização da atividade e do profissional envolvido, não haverá tranqüilidade para a população. 2.4.2) Jornadas e escalas de trabalho Pois bem, outra questão a ser analisada, do ponto de vista dos direitos da categoria profissional, mas que nos revelam, da mesma forma, outros efeitos, inclusive nocivos, é a jornada praticada na atividade. A vigilância faz parte daquele leque de atividades que apresentam inúmeros problemas relativos à jornada de trabalho. A necessidade de serviços dessa natureza no decorrer das 24 horas do dia, e nos finais de semana e feriados, torna imprescindível uma boa regulamentação, que evite o excesso de horas trabalhadas, e os prejuízos à saúde, que aqui podem significar inclusive prejuízos muito maiores, a toda sociedade. Por outro lado, a cobertura de jornada no decorrer de todo o dia leva as empresas a uma séria dificuldade atinente a elaboração das escalas, com implicação inclusive no custo de seus serviços. Basta dizer, neste aspecto, que a constituição federal fixa jornada máxima diária de 8 horas, e semanal de 44 horas, sendo os dois limites logicamente concomitantes. Outras leis e normas, fixam ainda um limite ao exercício diário habitual de horas extraordinárias, que é de mais 2 horas após a oitava, ou seja, são permitidas, no limite, 10 horas diárias, 8 normais e 2 extras. As horas extras merecem remuneração especial. Acima desse limite de 2 horas extras diárias, somente se houver motivo de força maior ou necessidade premente, e a infração ao dispositivo é passível de penalidades administrativas pecuniárias.

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Ocorre que, um pouco por conveniência das empresas, e “um muito” pela ampla e generalizada dificuldade de fiscalização do Ministério do Trabalho, temos como realidade que a vigilância privada é uma atividade que se formou com jornadas ilegais e absurdas de 12 horas diárias. Com isso, de forma prática, as empresas sempre precisaram de apenas dois funcionários para a cobertura do período diário, esses inclusive que tem habitualmente sonegados, em geral parcialmente, os direitos ao recebimento das respectivas horas extras. Há casos até em que tais profissionais, que laboram 12 horas por dia, nem ao menos folga semanal possuem. Essa prática das empresas, de impingir jornadas de 12 horas diárias, por vezes em 7 dias na semana, além de gerar uma degradação na vida dos funcionários, que são exigidos sobremaneira, tem ainda dois efeitos nocivos. O primeiro, é a inibição à criação de empregos. Ao invés da contratação de 3 ou até 4 funcionários, são contratados apenas 2. A segunda é ainda mais nociva. Como os trabalhadores recebem horas extras habitualmente, embora, em geral, um pouco ou “um muito” menos do que seria realmente devido, acabam se acostumando com um salário irreal, que somente é possível a custa de jornada ilegal e muito extensa. Passam, então, a raciocinar, sempre, com o valor do total auferido, e não se dão conta da efetiva remuneração de sua atividade, que é bem menor. Isso, a longo prazo, impede melhores conquistas salariais. Ou seja, os vigilantes, em sua maioria, não se dão conta de quão ínfimo é o seu salário. Caso acabassem as horas extras, e eles se dessem conta do quanto realmente recebe, seriam mais perseverantes na luta por melhores condições, inclusive cobrando uma atitude mais dura de seus sindicatos. Para tentar resolver tais problemas, os próprios sindicatos obreiros propuseram, há alguns anos, a implementação de uma jornada especial, de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. A chamada 12x36. Tal jornada teria o condão de permitir vários benefícios. Primeiro o incremento do emprego na categoria. Segundo, o exercício de uma jornada mais humana, com mais tempo para o descanso e para o convívio familiar, inclusive com menos “idas” e “vindas” do trabalho, o que por si já é bastante dispendioso. Terceiro, a mais longo prazo, com a redução da jornada, e conseqüente retirada das horas extras, a conscientização da categoria quanto à sua real remuneração, esperava-se, nas negociações futuras, por uma elevação salarial. A proposta, aceita pelo patronato, foi efetivada, revelando-se, inclusive, o que talvez tenha sido descoberto só mais tarde, muito prática para o controle das empresas. As expectativas do operariado, no entanto, se frustraram. A jornada se viu maciçamente implementada. O vigilante perdeu as horas extras habituais, e teve

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rebaixado seu salário. Como não se conseguiu um benefício salarial real, pelo menos no curto prazo, o que ocorreu foi que os vigilantes passaram, em grande parte, a trabalhar em dois empregos. Ou seja, a jornada permaneceu dupla, ainda com o agravante da prestação em dois locais distintos, os problemas normais continuaram, e a remuneração média baixou, em face da retirada dos adicionais de horas extras. Além disso, tornou-se comum o vigilante passar a trabalhar em duas empresas do mesmo grupo econômico, sendo que em um dos contratos não tem alguns direitos, como é o caso do convênio médico, o que gera maior apropriação para as empresas, e muitos destes grupos, tem se descoberto, estão a sonegar os recolhimentos previdenciários e de FGTS em um dos contratos. A caótica situação, absolutamente não esperada pelo setor laboral, levou as representações dos trabalhadores a reivindicar o fim da jornada 12x36, o que ainda, pelo menos por enquanto, não se efetivou, em face da resistência das empresas, que se viram beneficiadas, em maior ou menor grau, com o sistema. Além disso, tornou-se comum a prática, através da iniciativa das empresas, de várias outras jornadas, todas de 12 horas com dias de folga intercalados, sendo as mais comuns a 4x2 (quatro dias de trabalho intercalados por dois de descanso), a 5x2, e a 5x1, sendo que são praticadas na categoria até mesmo jornadas 2x2. Esta prática foi delimitada na Convenção Coletiva de 2002/2004, em que foi reafirmado os limites de jornada diária de 8 horas, sendo certo que, em todos os dias, o que passar desse montante deve ser pago como extra, não se admitindo pois as chamadas “compensações” nesse sentido, prática infelizmente ainda muito perpetrada, apesar de ilegal. Vejamos, pois como estão dispostas atualmente, as cláusulas de jornada de trabalho da categoria dos vigilantes no estado de São Paulo. Em primeiro lugar, faz-se menção à denominada “jornada normal”.

CLÁUSULA 14 - JORNADA DE TRABALHO A jornada normal admitida na categoria compreende o trabalho de 8 (oito) horas diárias, 44 (quarenta e quatro) horas semanais e 191 (cento e noventa e uma) horas mensais. Parágrafo primeiro – Serão admitidas quaisquer escalas de trabalho (4x2, 5x2, 5x1 e 6x1), desde que não haja extrapolação dos limites estabelecidos, e respeitada a concessão da folga semanal remunerada de no mínimo 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, nos termos da lei, incidindo pelo menos uma vez ao mês no domingo. Parágrafo segundo - A remuneração do DSR e do feriado não compensados será refletida nos pagamentos de férias e 13o salários dos empregados, inclusive quando indenizados. Parágrafo terceiro - Será admitido o acordo individual de trabalho, para a compensação do sábado não trabalhado com acréscimo proporcional de horas nos dias de semana, por apresentar-se benéfico ao trabalhador, preservadas sempre as condições mais favoráveis existentes.

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Parágrafo quarto – Será concedido intervalo intrajornada de acordo com o artigo 71 da CLT, admitida a sua redução para 30 (trinta) minutos, nos locais em que houver possibilidade e mediante acordo coletivo celebrado com o Sindicato Profissional da Base Territorial. Parágrafo quinto – Em face do teto estabelecido como trabalho normal a cada mês, não haverá por parte dos empregados que não atingirem esse limite, nenhuma compensação de trabalho e nem se tornarão devedores de horas a trabalhar, como também não sofrerão nenhum prejuízo nos salários e nem nas férias e 13o salário. Parágrafo sexto – O trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, sujeita as empresas ao cumprimento das normas constitucionais e legais existentes.

Fica claro, que a chamada jornada normal, pode se efetivar em qualquer escala de dias de trabalho, sendo citados os esquemas 4x2, 5x2, 5x1 e 6x1, apenas exemplificativamente. No entanto, o que passar de 8 horas diárias, ou de 44 horas semanais, ou 191 mensais, deverão ser pagas como extras. Ou seja, as jornadas de 12 horas, apesar de ilegais nos termos das leis trabalhistas vigentes, que permite, como já vimos, um teto de 10 horas dia, é tolerada, dadas as circunstâncias da categoria, desde que porém sejam consideradas extras aquelas que ultrapassem a oitava. Ainda assim, o que se verifica da prática da maioria das empresas, é que esta cláusula não vem sendo respeitada, já que o cálculo das horas extras não vem respeitando os limites diários fixados. De qualquer forma, o empregado tem acesso ao judiciário visando a reparação dessas lesões ao seu direito, e diga-se, o passivo do conjunto de empresas de segurança, particularmente por este motivo, é hoje bastante elevado. Conforme já visto, continua mantida a jornada 12x36, como modalidade especial. A cláusula que estabelece seus parâmetros é a seguinte.

CLÁUSULA 15 – JORNADA DE TRABALHO ESPECIAL 12X36 Será admitida na categoria a jornada especial, compreendendo 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. I – Considera-se já remunerado o trabalho realizado aos domingos e feriados que porventura coincidam com a referida escala, face à natural compensação das 36 (trinta e seis) horas seguintes, destinadas a descanso. II – Em virtude da implantação da jornada 12x36, na hipótese de ocorrer supressão das horas extras prestadas pelos empregados, durante pelo menos um ano, a indenização prevista no Enunciado 291 do TST será indevida, desde que haja manutenção do emprego por um ano dos respectivos empregados, contando da data da referida supressão. III – Ao empregado que rescindir o contrato por sua iniciativa e nas rescisões por justa causa, não será aplicável a indenização ou a manutenção de emprego previstos no inciso anterior. IV – Quando houver dissolução de contrato de prestação de serviços entre a empresa empregadora e a cliente – tomadora dos serviços de vigilância e segurança, torna-se

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indevida a manutenção do emprego, sendo indenizado de formaproporcional o período remanescente, se houver. V – O intervalo para descanso e refeição na jornada 12x36, será de 30 minutos, com pagamento das horas corridas, Na hipótese de inexistir gozo do mesmo, será obrigatório o pagamento de uma hora extra com adicional previsto no presente instrumento normativo. Parágrafo primeiro – Aplica-se para a referida jornada a não compensação de trabalho e muito menos que os trabalhadores se tornem devedores de horas a trabalhar. Parágrafo segundo – Esta jornada fica expressamente excluída da limitação mensal exposta no caput da cláusula 14 (quatorze)

A jornada em estudo, além das particularidades já citadas, e segundo o texto da Convenção, considera já remunerado os domingos e feriados coincidentes com os dias de trabalho; dá direito ao empregado um intervalo mínimo, não descontado, de 30 minutos, sendo que na sua não ocorrência será devida uma hora extra; e não sujeita o empregado a qualquer desconto, em razão da quantidade inferior de horas laboradas no mês. . Há ainda uma segunda jornada especial aplicável, que é a 12x12 exclusiva para eventos de curta duração, que são muito comuns na categoria, e fonte de grande parte dos postos de trabalho. Diz o seguinte a cláusula em referência.

CLÁUSULA 16 – JORNADA ESPECIAL PARA EVENTOS Será admitida excepcionalmente a jornada 12x12, ficando a sua aplicação restrita ao trabalho em eventos de curta duração (feiras, espetáculos, seminários, eventos esportivos, etc), respeitados o limite constitucional em relação à semana e o limite convencional em relação ao mês, e desde que haja comunicação prévia ao Sindicato da Base. I – O intervalo para descanso e refeição na jornada 12x12, será de 30 minutos, com pagamento das horas corridas, Na hipótese de inexistir gozo do mesmo, será obrigatório o pagamento de uma hora extra com adicional previsto no presente instrumento normativo.

A jornada em comento é excepcional. Demanda necessária comunicação prévia ao sindicato representativo da base territorial, é limitada em 44 horas semanais e 191 horas mensais, e tem o intervalo da mesma forma que a jornada 12x36. Por último, diga-se que, conforme prevê o artigo seguinte (17), a hora extra na categoria é remunerada com adicional de 60%, sendo superior ao que é previsto na Constituição (50%), e que o divisor para o cálculo é 220, que é o normal. Note-se, que embora o limite de horas de trabalho mensal seja de 191 horas, inferior ao mínimo previsto em lei, o divisor continua a ser de 220 horas.

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Estas, em nosso ver, as disposições sobre a jornada na categoria dos vigilantes, que merecem nossa análise. Passemos agora ao convencionamento de outros direitos.

2.4.3) Registro de ocorrências policiais Vejamos o disposto na cláusula 21, que trata de registro de ocorrência de

atos criminosos praticados em locais em que atua o vigilante, ou em seu caminho de ida e volta de casa para o trabalho.

CLÁUSULA 28 – REGISTRO DE ASSALTO, FURTO OU ROUBO Os empregados vitimados por assalto, furto ou roubo no posto de trabalho ou no trajeto de ida e volta ao domicilio, ficam obrigados a registrar ocorrência perante unidade policial mais próxima, informando quais os pertences que tenham sido arrebatados, comunicando o fato ao seu superior funcional no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, além de solicitar da autoridade duas cópias do boletim ou do termo circunstancial de ocorrência, que entregará à empresa e no caso de extravio da CNV ou do Crachá, ao Sindicato Profissional. Poderíamos dizer que se trata mais de uma obrigação que um direito. Mas

não há dúvidas de que também se trata de uma condição especial do vigilante, que garante que não sofrerá punição por atos de terceiros, ou seja, não é culpa do empregado o fato de haver ocorrido assalto, furto ou roubo, devendo ele apenas providenciar o registro formal da ocorrência, de cunho policial.

No que se refere especialmente ao trajeto entre o seu domicílio e o local

do trabalho, como ao vigilante não é permitido retirar suas armas do posto de serviço, temos que a preocupação se refere basicamente ao seu uniforme, crachá, e Carteira de Vigilante (CNV), que são objetos que comumente são utilizados pela criminalidade. Quanto às armas, na ausência do vigilante do posto, nos momentos em que não está trabalhando, a responsabilidade é integral da empresa.

Já dissemos anteriormente, que é bastante comum o assalto de postos de

vigilância para a apropriação de armamentos. O problema aumenta muito, tendo em vista que tais postos, muitas vezes, são guardados de forma imprópria, tanto no aspecto quantitativo (homens insuficientes à demanda), como no qualitativo. A questão, conforme já dissemos, somente será solucionada por uma maior exigência da lei e do mercado, além de melhores níveis de organização e fiscalização do setor.

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2.4.4) Desgaste do profissional e equipamentos de trabalho A cláusula 31 diz respeito a alguns direitos que se relacionam com a tentativa de minorar o desgaste típico da profissão, bem como zelar pela saúde e segurança do trabalhador. Vejamos o seu teor.

CLÁUSULA 31 – CONFORTO, HIGIENE E SEGURANÇA NO TRABALHO As empresas ficam obrigadas a manter condições de higiene e segurança nos locais de trabalho, disponibilizando aos empregados local adequado para as refeições e o fornecimento de água potável, além de EPI's, visando assegurar a prevenção de acidente ou doença no trabalho e ainda mais: I - Assentos para serem utilizados pelos empregados, durante dez minutos a cada uma hora, inclusive em postos bancários; II - Guarita, cabine ou outro equipamento de proteção física, principalmente nos postos a céu aberto; III - Armas e munições de boa qualidade; e IV – Caso houver possibilidade, armário individual para a guarda de roupas e pertences de uso pessoal, no próprio posto de trabalho.

Parece até brincadeira, mas em se tratando do profissional vigilante, o caput do artigo prevê a obrigatoriedade de acesso à água potável e local adequado às refeições. A necessidade do convencionamento de tais normas apareceu em virtude do fato de tais profissionais, muitas vezes, ficarem em ambientes isolados, distantes de outros funcionários, e muitas vezes esquecidos. Assim, caso não existentes tais condições, as empresas se sujeitam a multas normativas especialmente previstas nos instrumentos. Há menção ainda, de forma genérica, de necessidade de manutenção de condições de higiene e segurança. Tal previsão assim generalista, como ocorre em muitos instrumentos coletivos, acaba por cair no vazio. Mais feliz foi a previsão taxativa, conforme trazido nos incisos I a IV. Em primeiro lugar, assentos para o uso dos empregados, que tem direito ao mínimo de 10 minutos sentados, a cada hora trabalhada. Saliente-se aqui que, em pesquisas nas normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho, não pudemos detectar nenhuma situação em que o fato do empregado permanecer em pé em todo o expediente, traria algum prejuízo à sua saúde, A hipótese não é considerada insalubridade e o adicional de “penosidade”, com previsão constitucional, ainda não se efetivou, pois é norma que depende de regulamentação, até o momento inexistente. A norma coletiva, portanto, bastante modesta, traz o direito mínimo à categoria, sendo que seria louvável a realização de estudos para averiguar possíveis danos ao físico e à saúde, ao que

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parece, de pouco interesse dos empregadores e do próprio Ministério do Trabalho. No item II é prevista a necessidade de guarita, cabine ou outros meios de proteção física, especialmente em casos de trabalho a céu aberto. A cláusula tem sido usada, juntamente com a NR6 já analisada, para fundamentar a necessidade proteção do vigilante contra lesões oriundas de armas de fogo, em confrontos. No entanto, talvez o seu sentido de finalidade prenda-se mais aos casos em que o vigilante não tem acesso a coberturas, ficando ao relento, o que se evidencia inclusive pela forma em que se deu a finalização do inciso. Ainda mais, não parece decorrer da norma, da forma em que está redigida, uma ordem, mas apenas uma faculdade. No inciso III, há a menção à armas e munições de boa qualidade. O motivo do ordenamento é óbvio, porém, infelizmente não há efetiva fiscalização que garanta o cumprimento desta ordem. De fato, os custos de substituição da munição não utilizada, por ser muito alto, enseja a infração da várias empresas quanto à sua correta manutenção. Os armamentos, também, de acordo com o que se observa, não possuem, em sua maioria, manutenção regular, e muitos estão obsoletos.

Por último, fala-se em armário individual no local do trabalho, o que sem dúvida representa um maior conforto. Porém, a previsão, como se vê dos seus termos, não passa de uma faculdade. 2.4.5) Formação profissional O artigo 33 trata da formação profissional e reciclagem. Como já vimos, esta matéria é tratada também por legislação própria, já que a boa formação do vigilante é necessária à regulamentação da profissão. Vejamos o que acrescenta a norma coletiva nesse aspecto.

CLÁUSULA 33 – FORMAÇÃO PROFISSIONAL – EXTENSÃO E RECICLAGEM O treinamento dos vigilantes será sempre por conta das empresas, sem ônus para os empregados e, neste caso, o beneficiário permanecerá no mínimo um ano na empresa que custeou o respectivo curso. Havendo demissão por justa causa ou se o empregado se demitir antes de decorrido o prazo de um ano, deverá reembolsar a empresa na base de 1/12 (um doze avos) do valor do curso por mês não trabalhado. Parágrafo primeiro - Na hipótese de reciclagem, conforme dispõe a Lei 7.102/83, o vigilante deverá permanecer na empresa por um período de no mínimo 06 (seis) meses. Caso não permaneça, por sua iniciativa, deverá o mesmo reembolsar a empresa na base de 1/6 (um sexto) do valor da reciclagem por mês não trabalhado.

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Parágrafo segundo - Não será admitida, em nenhuma hipótese, a ocorrência ou marcação de reciclagem e outros cursos ou atividades de caráter profissional em períodos de férias e na escala 4 X 2, quando a folga coincidir com domingo.

Conforme pode ser visto, as regras sobre formação profissional e reciclagem não sofrem qualquer interferência da norma coletiva. A regulação desse aspecto se faz através de normas federais públicas. O que prevê a norma é apenas que o curso e a reciclagem serão sempre arcados pelo empregador. Na hipótese de desligamento por iniciativa ou culpa do empregado, este fica obrigado ao reembolso dos valores gastos com sua formação, na forma especificada. Logicamente que a justa causa, por ser medida arbitrária do empregador e muitas vezes visar apenas uma economia no momento da rescisão, poderá ser questionada junto ao judiciário trabalhista federal. O parágrafo segundo traz somente uma previsão, para que os cursos e reciclagens, que são obrigações contratuais trabalhistas, não sejam realizados nos momentos de folga do trabalhador. 2.4.6) Uniformes A cláusula 38 traz as disposições referentes aos uniformes e instrumentos de trabalho, e deve ser interpretada conjuntamente com a de número 31.

CLÁUSULA 38 – UNIFORMES, ROUPAS E INSTRUMENTOS DE TRABALHO Para o período de doze meses as empresas se obrigam a fornecer inteiramente grátis os uniformes, roupas e instrumentos de trabalho aos vigilantes e demais empregados, sendo duas calças, duas camisas, dois pares de sapatos ou coturnos, uma gravata, um quepe, um cinto, coldre, jaqueta ou blusa de frio caso necessário, e outras peças de vestuário exigidas pela empresa. Parágrafo único – Poderá a empresa descontar do empregado o fornecimento de vestuário excedente ao previsto no caput.

A cláusula traz a obrigação da empresa, sempre, de fornecer o vestuário do vigilante, que como já vimos, sempre trabalha uniformizado, por exigência legal. 2.4.7) Colete à prova de balas A cláusula 39 trata especificamente do colete à prova de balas, forma de proteção física ao profissional vigilante. Conforme já reportamos, em nossa opinião, a obrigação do colete, em ambiente de risco, está prevista de forma obrigatória na Norma Regulamentadora número 6, do Ministério do Trabalho.

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Além disso, existe outra cláusula (31), já analisada, que faz menção à proteção física, e que, segundo a opinião de alguns, faria o reforço, na categoria, da necessidade, pelo menos em alguns casos, do EPI colete à prova de balas. Mas, a análise desta cláusula 39, revela que a questão não é tranqüila, e que as empresas de segurança se recusam a fornecer tal EPI, a menos que o seu custo não seja arcado por elas, mas pelos tomadores dos seus serviços. Vejamos a norma citada.

CLÁUSULA 39 – COLETE A PROVA DE BALAS Condicionado ao repasse da totalidade dos custos da aquisição do colete a prova de balas de nível II ao tomador de serviços, mediante apuração de necessidade, esta definida por acordo obrigatório entre o sindicato da base, o tomador de serviço e empresa prestadora; previsibilidade no plano de segurança de cada posto de serviço; e com previsibilidade contratual ou do certame licitatório; as empresas prestadoras o fornecerão gratuitamente aos vigilantes. Parágrafo primeiro – Havendo transferência ou remoção do posto de serviço que preencher os requisitos fixados no caput da presente cláusula, para outro que não haja tais previsibilidades, fica a empresa prestadora desobrigada do fornecimento do mesmo. Parágrafo segundo – O disposto na presente cláusula, tem validade a partir da vigência desta Convenção Coletiva.

A cláusula, como podemos ver, indica que realmente a aceitação da obrigatoriedade do colete à prova de balas pelos empresários de segurança é pequena. O equipamento é enxergado muito mais pelo aspecto do acréscimo no custo da prestação de serviços, do que pela importância na prevenção dos eventos morte ou lesão grave. Apenas para que se tenha uma idéia da parca utilização do EPI em análise, Roberto Antônio de Oliveira Sampaio1, em obra que trata especificamente do tema, contabiliza que em 2.002 e 2.003 foram adquiridos pelas empresas de segurança, respectivamente 694 e 553 coletes à prova de balas, isso em um ambiente em que, para as transportadoras de valores, o uso pelos empregados e a sua regular renovação são obrigatórios por norma específica do Ministério da Justiça (Portaria 1264/95). Com raras exceções, portanto, as empresas só adquirem os coletes para os empregados que atuam no interior dos carro-fortes, deixando os demais vigilantes desprotegidos, inclusive os que se ativam nas agências dos bancos, com elevado grau de risco.

O caput contém uma série de condições para o fornecimento do colete. A redação truncada retrata a dificuldade em negociar o tema entre as representações profissional e econômica. 1 – Balística Forense – Aspectos Técnicos Utilização de Coletes Balísticos em Defesa da Vida – Monografia Naippe/Usp – Tabela 6

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Segundo nos parece, o colete à prova de balas, via norma coletiva, seria devido como EPI aos empregados vigilantes em uma das seguintes situações:

1. Quando notório o risco, deve o colete ser fornecido, às expensas, diretamente ou por transferência de custos, ao tomador dos serviços, querendo isso significar que haverá um acréscimo contratual a ser arcado por este último, colocando as empresas de vigilância em situação de igualdade concorrencial na prestação dos serviços.

2. Quando existente dúvida sobre a necessidade do emprego do EPI, deverá

a necessidade do uso ser apurada por acordo entre o sindicato profissional representativo, a empresa prestadora de serviços e a empresa contratante dos serviços, e também nesta hipótese, o seu custo será arcado, direta ou indiretamente, mas integralmente, pela terceira (tomadora dos serviços). Logicamente que, na estrutura jurídica que possuímos, e caso não haja acordo entre as partes, caberá ao judiciário trabalhista, que possui aqui inclusive o poder dito normativo, quando acionado por uma delas, dizer da existência ou não de necessidade do uso do referido EPI

3. Quando sua necessidade for estampada no plano de segurança do posto de

serviço, e esta circunstância constar do contrato de prestação de serviços, caso se trate de empresa privada, ou do certame licitatório, caso se trate de empresa pública, ou entidade que deve contratar necessariamente por concorrência pública.

. Pois bem, trata-se, portanto, além de uma norma, de um empenho entre as entidades sindicais na tentativa do convencimento das contratantes dos serviços, de que na hipótese de haver risco efetivo, estas arquem com o custo do colete, e assim o vigilante possa estar protegido.

Entendemos, no entanto, que o esforço seria mais contundente e objetivo, caso houvesse sido estampada a obrigatoriedade do colete à prova de balas nos casos de risco. Assim, os contratantes, obrigatoriamente, teriam que arcar com o custo do EPI em comento.

A situação atual indica, sem dúvida, a frágil situação das empresas de

vigilância, representadas por seu sindicato econômico, nas negociações de contratos com seus clientes, especialmente os bancos, que tem o maior contingente de risco para a atividade.

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E, quem “paga o pato”, é o empregado vigilante, que está na linha de frente dos assaltantes e criminosos, sem a proteção adequada, tecnologicamente disponível, e inclusive a baixo custo relativo. As próprias estatísticas da Prefeitura Municipal de São Paulo, indicam, por exemplo, que o índice de mortalidade dos vigilantes, no município, é maior, proporcionalmente ao seu número, que a dos policiais militares. Isso, conforme se constata da tabela abaixo transcrita, ocorre em face da colocação do vigilante junto a locais de alto risco, em maior proporção que os policiais, bem como pelo fato de que o vigilante enfrenta a ação criminosa de frente, face a sua condição, de proteção e enfrentamento, enquanto que os policiais em geral exercem atividade investigativa e de perseguição, com menor exposição ao risco.

Registre-se ainda, que os sindicatos profissionais tem realizado diversas denúncias ao Ministério do Trabalho, invocando a negativa de aplicação da NR6 pelas empresas. O órgão, no entanto, mostra-se incapaz da fiscalização adequada dos estabelecimentos, quanto mais em se considerando que os maiores provocadores dos descumprimentos legais são os bancos, mormente por sua força política e econômica.

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Os Sindicatos também tem tentado que a ordem para o uso do EPI venha da Justiça, através da propositura de ações de cumprimento em face das empresas e dos bancos. Algumas delas tem trazido efetivos resultados. Mesmo naquelas que são ganhas, porém, os réus recusam-se à obediência da ordem, e por vezes tentam vencer pela “força” que julgam ter. Para ilustrar, é importante que transcreva algumas destas decisões, com referência à fonte.

Processo n. 856/2004 - 14ª Vara do Trabalho de São Paulo SEEVISSP – Sindicato dos Empregados nas Empresas de Vigilância de São Paulo x Estrela Azul Vigilância e Segurança Ltda e Banco Panamericano S/A

Vistos, etc... Trata-se de ação de cumprimento, na qual a

entidade representante dos empregados em empresas de segurança, pleiteia o cumprimento de cláusula convencional da categoria, em particular, a de nº 39: “Colete à prova de balas – Condicionadas ao repasse da totalidade dos custos da aquisição do colete a prova de balas de nível II, para os tomadores dos serviços, na contratação dos postos de trabalho em locais de maior incidência de riscos, as empresas fornecerão gratuitamente este Epi aos vigilantes, especialmente aos que trabalham em instituições financeiras ou postos de movimentação de valores e numerários ou na segurança/incolumidade física de pessoas.” Concedo a tutela antecipada requerida pelo autor, Sindicato dos Empregados em Empresas de Vigilância e Segurança de São Paulo, eis que vislumbro os pressupostos previstos no artigo 273 do CPC, o periculum in mora e o fumus iuris, conquanto a ausência de fornecimento do colete à prova de balas, aos empregados, para o exercício de suas atividades diárias, representa inequívoco perigo à vida dos vigilantes, considerando-se, ainda, tratar-se, a tomadora de serviços, de Instituição Bancária. Intimem-se, com urgência, a primeira ré, para que cumpra, imediatamente, a presente tutela, sob pena de, em não o fazendo, arcar com a responsabilidade direta, arcando, inclusive, com o pagamento da multa diária ora fixada. Além disso, após, citem-se as reclamadas para responderem aos termos da ação.São Paulo, data supra.

LÚCIO PEREIRA DE SOUZA JUIZ DO TRABALHO

Processo nº 00980-2004-030-02-00-3 - 30ª Vara do trabalho de São Paulo SEEVISSP – Sindicato dos Empregados nas Empresas de Vigilância de São Paulo x Vanguarda Segurança e Vigilância Ltda e Banco Safra S/A

Vistos etc. Antecipam-se os efeitos da tutela pretendida pelo autor.

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O código de Processo Civil dispõe, em seu art. 273, que: “o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança de alegação e: I- haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; II- Fique caracterizado ou o abuso de direito de defesa ou manifesto

propósito protelatório do réu. Parágrafo 1º: Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.

Parágrafo 2º: Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. Parágrafo 3º: A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, parágrafos 4ºe 5º, e 461-A. Parágrafo 4º: A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. Parágrafo 5º: Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.”

No caso dos autos estão presentes os requisitos exigidos pelo legislador.

Assim, DETERMINO: que as reclamadas forneçam aos vigilantes bancários que são seus empregados coletes a prova de bala nível II, a partir de ciência desta decisão, dob pena de pagamento de multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais) por cada vigilante que não receber o colete, até decisão final de mérito.

INTIMEM-SE as partes, cm urgência, citando-se as reclamadas. São Paulo, data supra.

GUSTAVO FELIPE BARBOSA GARCIA

Juiz do Trabalho

PROCESSO Nº 867/2004-07-21 - 43ª Vara do Trabalho de São Paulo SEEVISSP – Sindicato dos Empregados nas Empresas de Vigilância de São Paulo x Estrela Azul Segurança e Vigilância Ltda e Banco Sudameris S/A

Vistos, etc... O sindicato autor, na exordial, alega

que as empresas reclamadas, embora obrigadas por Convenção Coletiva de Trabalho, não estão fornecendo à seus empregados vigilantes os EPI’s necessários (colete à prova de balas – nível II). Requer a concessão da tutela antecipada “inaudita altera pars” para o fornecimento dos equipamentos de proteção.

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Conforme se verifica na cláusula 39 da Convenção Coletiva de Trabalho de 2002/2003, mantida pela cláusula 7ª da Convenção de 2003/2004, trazidas a Juízo pelo sindicato autor (fls. 98/118), deve ser fornecido gratuitamente aos empregados da categoria de vigilantes e segurança privada. Colete a Prova de Balas, cujo repasse da totalidade dos custos da aquisição do equipamento deve ser repassada à empresa tomadora de serviços. Considerando-se que a prova inequívoca do direito está cabalmente demonstrada nas convenções de trabalho acima referidas e que o dano eventualmente sofrido não é apenas de difícil reparação, mas sim de reparação impossível, posto que diz respeito ao bem maior de qualquer ser humano, que a própria, defere-se a pretendida antecipação da tutela.

Tendo em vista que na cláusula 39 da Convenção Coletiva de Trabalho, consta como já acima mencionado, que o custo pelo fornecimento de EPI’s deve ser repassado à empresa tomadora de serviços e, que às fls. 04 dos autos, consta que a quinta reclamada BANCO SUDAMERIS S/A mantém contrato de prestação de serviços com as demais reclamadas, por ora, determina-se que esta fique responsável pelo fornecimento dos equipamentos de proteção necessários (Coletes a prova de balas – nível II).

Intimem-se às reclamadas, por oficial de justiça, acerca da concessão da antecipação da tutela, fixando-se a multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento da determinação, bem como de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por empregado vitimado (morto ou ferido) na instituição bancária, sem utilização do equipamento de proteção acima descrito.

Intimem-se, por oficial de Justiça. SP, data supra

RICARDO APOSTÓLICO SILVA

Juiz do Trabalho

Mas, de qualquer forma, nos casos em que não há acordo para a adoção do equipamento de proteção em comento, temos como certo que, além e em sobreposição de tal norma, está a obrigação oriunda da NR6, e os mecanismos administrativos e judiciais, embora nem sempre tenham se apresentado eficazes, deverão, cada vez mais, ser invocados. A segunda hipótese normativa, para o caso das empresas privadas, trata dos casos em que a proteção em referência está prevista no plano de segurança. O plano é obrigatório para os bancos, e deve ser individualizado por agência e aprovado pelo Departamento da Polícia Federal. Assim, caso haja previsibilidade do colete, para uma agência específica, e a aprovação deste plano pelo órgão competente, o colete deve ser fornecido.

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Note-se que o ordenamento é redundante, pois se consta a obrigatoriedade do plano de segurança da própria contratante, é notório que esta, através de seu contrato, requisitará o uso do colete, e o fará constar no contrato. Por último, existe a hipótese das entidades públicas, que contratam por edital. Caso conste no edital, a contratada é obrigada a fornecer o colete, que deve, desde o início, constar de sua planilha de custo. É incrível, mas existem casos em que a necessidade do colete consta do edital, mas a prestadora, depois de vencer o certame e assumir o contrato, não o fornece aos seus empregados. As entidades profissionais vem denunciando constantemente tais casos de afronta legal, mas encontra empecilhos nas falhas dos sistemas, e na falta de efetivo dos órgãos fiscalizadores. De se lamentar as atitudes, tanto dos empregadores quanto dos contratantes, na maioria bancos e casas financeiras, em negar o EPI aos trabalhadores. Hoje, inclusive, após uma grande redução de seu custo, em virtude do desenvolvimento tecnológico. Deve-se lembrar ainda, que o vigilante, mais que o policial, merece a proteção, através de cabina à prova de balas ou colete de mesma finalidade; já que, quando atacado pela violência, enfrenta os criminosos de frente, fazendo papel de autêntico escudo, enquanto as atividades da polícia em geral são persecutórias, ou seja, perseguem marginais após a concretização dos crimes, sendo o verdadeiro confronto armado reservado a poucas e específicas situações. 2.4.8) Assistência jurídica aos empregados Analisemos agora a cláusula 40 da CCT de 2.004/2006, que é nossa base para estudo. Trata esta cláusula da obrigação das empresas de prestar assistência jurídica gratuita, através de profissionais habilitados, aos empregados que, em serviço e em funções precípuas de sua profissão, praticarem atos que os levem a responder a ações judiciais ou mesmo ficarem reclusos por ordem judicial.

CLÁUSULA 40 – ASSISTÊNCIA JURÍDICA PELAS EMPRESAS As empresas se obrigam a prestar assistência jurídica, compatível e gratuita aos seus empregados vigilantes, quando estes incidirem na prática de atos que levem a responder por ação judicial, quando em serviço e em defesa dos bens patrimoniais, ou dos interesses e direitos da entidade ou de pessoa sob sua guarda, desde que o mesmo não se desligue voluntariamente da empresa ou por justa causa. Parágrafo único – Na medida do possível, as empresas cuidarão junto a autoridade policial para que o vigilante, ao ser preso, tenha garantido o direito assegurado no inciso III, do artigo 19, da Lei 7.102/83, ou seja, cela especial.

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As únicas hipóteses em que as empresas não estariam obrigadas a tal assistência, seriam no caso do pedido de demissão pelo empregado, ou ainda no caso de aplicação de justa causa. Esta última apresenta-se bastante improvável, e pode infelizmente servir de válvula de escape da empresa para o descumprimento da obrigação de assistência, já que inclusive a justa causa é ato arbitrário do empregador, que necessita, para sua anulação ou revisão, de manifestação do judiciário. Quanto á prisão especial, é, como diz a própria cláusula, um direito previsto em lei, e a obrigação é apenas de cuidar para que haja o seu correto cumprimento. Para os menos abastados, no Brasil, não basta ter o direito. Tem que ter alguém, mais abastado e inserido no processo jurídico e institucional, para zelar por ele. Esta, infelizmente, é uma realidade até agora insuperável. O instrumento normativo, portanto, procura apenas desempenhar este papel. 2.4.9) Seguro de vida A cláusula 41 diz respeito ao seguro de vida dos empregados, cujos beneficiários são seus familiares de dependentes. O direito já está previsto, como vimos, na Lei 7.102 e na Resolução CNSP 05/84, e tem por causa o elevado risco do exercício da profissão. O texto atual da convenção é o seguinte.

CLÁUSULA 41 – SEGURO DE VIDA Preservadas as condições mais favoráveis existentes na empresa, a todos os vigilantes fica assegurada uma indenização por morte ou invalidez permanente ou parcial, advindas de qualquer causa. A indenização por morte do vigilante será de 26 (vinte e seis) vezes o Piso Salarial do mês anterior ao falecimento. Para os casos de invalidez total para o trabalho, a indenização será de 52 (cinqüenta e duas) vezes o valor do Piso Salarial do mês anterior, e para o caso de invalidez parcial, a indenização obedecerá à proporcionalidade disposta nas regras da Susep fixada na Circular Susep 029 de 20.12.91, tendo por base de cálculo equivalente ao índice de 100%, do mesmo valor de 52 (cinqüenta e duas) vezes o valor do Piso Salarial do mês anterior, sendo aplicável ainda, nos casos omissos, o disposto na Resolução CNSP 05/84. Parágrafo primeiro – Os valores decorrentes serão pagos ao cônjuge ou dependentes do empregado, ou à pessoa beneficiária, mediante comprovação como tal, e serão quitadas num prazo máximo de 30 (trinta) dias, a contar da entrega da documentação completa à seguradora. Parágrafo segundo – Para comprovação da contratação do seguro de vida em grupo, bastará apresentação de Contrato de Seguro com empresas do sistema, de livre escolha das Empresas Contratantes, e que especifique apenas que, como segurados, estão compreendidos todos os empregados.

Os valores mínimos de indenização previstos são os mesmos da Resolução já analisada. Nisso portanto não há novidade. Existe um acréscimo no

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que diz respeito à hipótese de invalidez. Na resolução, que regulamenta a lei, somente há indenização no caso de invalidez resultante de acidente. Na convenção coletiva, há a extensão do benefício para a invalidez decorrente de qualquer causa. O fato de estar expresso que o pagamento do prêmio independe da causa do evento, significa que o seguro protege o vigilante, ou sua família, em todas as circunstâncias, o que é sem dúvida um benefício. Na Resolução já citada não existe distinção, para o recebimento da indenização integral prevista, quanto ao grau de invalidez. Até abril de 2.004, também na Convenção Coletiva, a invalidez, fosse ela qual fosse, total ou parcial, e ainda que permitisse o exercício de outras profissões, ensejaria o recebimento do valor total previsto para a indenização. Em geral, como a seguradora fazia o pagamento seguindo uma tabela de proporcionalidade da invalidez, a empresa estava obrigada a arcar com o restante da indenização, discutindo depois a questão contratual com a seguradora. A partir de maio de 2004, com a vigência da atual convenção coletiva, foi inserida a proporcionalidade, tal qual estabelecido na circular susep 029, de 20 de dezembro de 91, que relaciona o dano sofrido aos órgãos e funções do organismo, fixando percentuais em relação ás limitações ocorridas. A dificuldade agora está em saber qual instrumento apresenta-se aplicável. De um lado, as convenções coletivas tem previsibilidade constitucional e destinam-se a adaptar o direito às circunstâncias concretas da categoria. De outro lado, a Resolução traz direito público, que dificilmente poderia ser revogado ou alterado por acordo entre as partes. Não há dúvida, portanto, que haverá uma série de litígios, em situações concretas, envolvendo tal situação. Outra questão é que, tanto a lei quanto a norma convencional, não se preocupam em definir as regras para a consideração da invalidez. Esta, então deve ser considerada quando declarado pelo órgão previdenciário, o que, em nosso sistema, no mínimo vem a causar uma grande demora no pagamento do prêmio, nesses casos. Como já dito anteriormente, na hipótese de não contratação do seguro, ou sua contratação irregular, a empresa empregadora se responsabiliza pelo prêmio, ou por sua complementação, conforme a hipótese. 2.4.10) Auxílio funeral A cláusula 42 prevê o pagamento de um auxílio funeral à família do empregado vigilante que venha a falecer.

CLÁUSULA 42 – AUXÍLIO FUNERAL Independente das indenizações securitárias e dos direitos e benefícios assegurados em lei, no caso de falecimento de empregados (as), a empresa pagará um auxílio funeral

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de 1,5 (um e meio) piso salarial da categoria vigente no mês do falecimento, inclusive àqueles que estiverem afastados do trabalho por doença ou acidente e/ou outros motivos amparados em Lei. Parágrafo único – O auxílio funeral será pago no prazo máximo de 10 (dez) dias do falecimento às pessoas herdeiras ou beneficiárias do empregado(a) devidamente qualificada como tal.

Mais uma vez, embora a principal causa da inclusão de tal direito seja o risco do evento morte em tal profissão, temos que este deve ser pago por morte advinda de qualquer causa, mesmo que se trate de falecimento de empregado afastado do trabalho, cujo afastamento inclusive pode mesmo ter ocorrido por acidente anterior.

2.4.11) Assistência nas rescisões A cláusula 49 trata da rescisão contratual e da assistência pelo sindicato

profissional. O que interessa aqui em nossa abordagem, é apenas o Parágrafo Primeiro, que trata da hipótese de atraso ou inadimplemento das verbas rescisórias devidas.

CLÁUSULA 49 – ASSISTÊNCIA ÀS RESCISÕES DE CONTRATOS Parágrafo primeiro - No caso de atraso ou inadimplemento de tais verbas, as empresas serão penalizadas com a multa compulsória fixada no dobro do previsto no Art. 477 da CLT – par. Oitavo, além das demais penalidades previstas neste Instrumento..

A partir da vigência da CCT de 2004 (maio), a multa paga ao empregado que tiver atrasadas ou inadimplidas suas verbas rescisórias, terá valor dobrado. A lei fala no valor de uma remuneração, e a convenção estabelece pois duas remunerações. A iniciativa visa coibir prática comum das empresas de vigilância e de outras de prestação de serviços, de atrasarem o pagamento das verbas rescisórias, e até mesmo não efetuar o seu pagamento, aguardando a atuação do judiciário, e em geral resolvendo as questões por acordos baixíssimos, aproveitando-se da situação difícil em que elas próprias o colocaram. Uma reflexão sobre o tema, sem afastar os benefícios oriundos da dobra da multa referida, seria uma avaliação, pelo judiciário, dos danos materiais e morais, que tal prática (deixar de quitar direitos contratuais rescisórios), em concreto, teria causado ao empregado, e a condenação nos danos correspondentes. Trocando em miúdos, o empregado, que deixa de receber seus haveres, fica devedor de aluguel, tributos e outras tantas despesas, por situação causada exclusivamente pelo mau empregador. Além disso, esta situação causa-

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lhe danos na esfera moral, sentindo-se impotente, deprimido etc. A única solução, portanto, seria, além de condenar a empresa no pagamento das verbas, condena-la também nos danos diversos causados, inclusive na esfera moral. Isso sim viria coibir sua atitude, e não apenas a condenação naquilo que teria mesmo que pagar muito antes, e ainda com os benefícios de conseguir acordos vantajosos com base na demora do judiciário e na situação calamitosa do ex-empregado, que como já dissemos aqui, na hipótese de atraso, nem mesmo acesso ao FGTS e seguro desemprego tem, enquanto não resolvida a situação. É uma questão de responsabilidade e justiça social, que exige pronta reflexão dos juízes e demais profissionais envolvidos. Essa medida, aliada a já sugerida exigência de garantias patrimoniais para o funcionamento de empresas prestadoras de serviço, iriam, sem dúvida, ajudar em muito os trabalhadores do setor. De um lado, a primeira impediria que os empregados ficassem a ver navios na hipótese de desaparecimento fraudulento das empresas, e de outro, a segunda obrigaria a indenização dos verdadeiros e efetivos danos que o destrato contumaz e a transgressão da lei provocam, especialmente na oportunidade da ruptura contratual. 2.4.12) Medidas de proteção ao emprego Passemos para a cláusula 52, que será analisada, por proximidade, juntamente com a 55 e 56, que tratam de questões específicas que afetam a categoria em estudo.

CLÁUSULA 52 – ADMISSÃO DE NOVOS EMPREGADOS - PREFERÊNCIA As empresas se obrigam a dar preferência por ocasião de novas contratações, aos portadores da CNV – Carteira Nacional do Vigilante, com a tolerância pela falta desta, desde que seja apresentado o respectivo protocolo. CLÁUSULA 55 – PREFERÊNCIA NA CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS Na ocorrência de dissolução do contrato de prestação de serviços da empresa empregadora com seu cliente, será dada preferência de admissão aos vigilantes vinculados ao respectivo contrato, pela empresa beneficiária do novo contrato do cliente. CLÁUSULA 56 – PREENCHIMENTO DE VAGAS Para o preenchimento de vagas, quando da contratação de novos empregados, as empresas poderão utilizar-se de indicação dos sindicatos profissionais em suas respectivas bases, e sempre que possível, darão preferência de readmissão aos seus ex-empregados.

Como vemos, todas as cláusulas em referência tem objetivos corporativistas, de forma a proteger o emprego dos vigilantes que atuam no

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setor. A primeira (52) indica a preferência, pelas empresas, da contratação de vigilantes portadores da CNV. Para ser portador de CNV, o profissional já deve estar inserido ao mercado, já que para consegui-la, conforme já vimos, necessariamente teve que passar por empresa anterior. A questão da validade do protocolo, prende-se a uma deficiência do sistema da Polícia Federal, responsável por sua emissão, que trabalha, em geral, com um atraso gigantesco, apesar do auxílio das entidades sindicais profissionais, que também participam do sistema na captação e envio da documentação, assim como na distribuição e entrega dos documentos prontos. Realmente, a situação da Polícia Federal, em todos os aspectos ligados à vigilância privada, é mesmo reconhecidamente lamentável, conforme será melhor analisado em item específico. A segunda cláusula (55) trata de uma situação peculiar a empresas terceirizadas que se ativam nas chamadas “atividades meio”, alheias portanto ao objeto final das tomadoras dos serviços. Prevê que haverá uma preferência, pela empresa nova contratada em um determinado posto de serviço, dos empregados integrantes do quadro da antiga contratada. Ou seja, a empresa que assume o posto deve dar preferência a contratação dos ex-empregados da empresa que perdeu o posto. Note-se que nenhuma dessas cláusulas é obrigatória. São apenas faculdades, orientadas por recomendações de preferência. Até porque, a empresa que assume o posto já tem, muitas vezes, seus funcionários ociosos para a atividade no novo posto, e, da mesma forma, a empresa que perde o posto pode aproveitar o empregado em outro de seus postos. Há, ainda, a vontade do tomador, que em geral solicita pela manutenção de alguns empregados, com os quais já está acostumada. A recomendação, portanto, sempre adaptada ao caso concreto, vale pela intenção das partes, e como argumento, em alguns casos, pelo sindicato profissional. Longe portanto de refletir qualquer orientação efetiva ou obrigatoriedade. É bom que se aproveite aqui para abordar um tema correlato, de muito interesse na categoria. As empresas terceirizadas, como são o caso das de vigilância privada, correm riscos de perda de grandes postos de trabalho, de repente. São contratos públicos cuja concorrência foi vencida por outra, grandes contratos com bancos, empresas, condomínios etc. Portanto, o que seria de se esperar, é que tivessem reservas financeiras suficientes para o pagamento do lote de verbas salariais e rescisórias, a todos os empregados, e na forma da lei, já que, por conceito econômico e jurídico, os empregados não devem correr o risco da atividade produtiva, que cabe sempre e integralmente aos empregadores. Ocorre, porém, que muitas empresas não possuem tais reservas. Ou por má administração, ou por desvios de recursos, ou ainda, o que é bem comum, por trabalharem com preços irreais, abaixo do custo, e portanto terem que queimar todas as reservas. Em conclusão, os empregados acabam “pagando o pato”,

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deixando de receber, de forma recorrente e criminosa, seus direitos trabalhistas, inclusive salários, engrossando as filas da Justiça do Trabalho, muitas vezes vendo a empresa devedora falir antes do recebimento de seu crédito. A questão torna-se ainda pior, no caso das prestadoras de serviços a órgãos públicos. Isso porque, no Brasil, a concorrência pública, via licitação, se dá apenas pelo menor preço, e os preços em geral cobrados pelas vencedoras do certame são realmente inexeqüíveis, ou seja, visam, através da lesão do trabalhador e de tributos, trabalhar por um tempo até uma proposital falência. E aí, as empresas, em nome de laranjas, são substituídas por outras etc. O setor de terceirização de mão de obra, e especialmente o de segurança privada, necessita, portanto, em amplos aspectos, de uma ampla revisão, a bem da sociedade. A última cláusula em análise (56), trata de priorização, pelas empresas, de contratação de ex-empregados que ainda estejam desempregados, e de indicados pelo Sindicato Profissional, que em geral mantém bancos de cadastro de desempregados. A medida, neste segundo ponto, é também logicamente corporativista, e visa a proteção do setor e a especialização de seus funcionários, sendo porém uma estratégia não condenável de proteção do setor profissional. A tentativa, no entanto, também não obrigatória, evidencia principalmente uma grande preocupação na formação do profissional específico da vigilância privada. Isso tem a ver com fato muito observado na categoria, de que, em geral, o vigilante não “é vigilante”, mas apenas “está vigilante”. Ou seja, o vigilante é aquele profissional que, quando não consegue vaga em sua função específica, por exemplo, metalúrgico, construção civil etc, acaba por aceitar vaga de vigilante. A exigência do curso de formação e o advento da CNV vem ajudando a alterar este cenário, que no entanto tem por válvula de escape o desvio funcional e a clandestinidade, que devem ser combatidos. 2.4.13) Inibição ao desvio funcional A cláusula 59 trata especificamente da questão atrelada ao desvio funcional na categoria.

CLÁUSULA 59 - INIBIÇÃO AO DESVIO FUNCIONAL. As partes convenentes se obrigam a envidar esforços, em busca da adoção de meios que impeçam e/ou dificultem a prática do "desvio de função" ou qualquer tipo de contratação inadequada nas atividades de vigilância privada. Parágrafo primeiro - Fica expressamente proibida a contratação de profissionais alheios à vigilância privada, com funções como porteiro, fiscal, guarda, vigia, e outras, para o exercício das suas funções específicas, que devem ser desempenhadas, sempre, por profissionais enquadrados na legislação existente, e segundo funções constantes da Convenção Coletiva.

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Parágrafo segundo - No caso de contratação irregular, na forma preconizada no parágrafo anterior, a Empresa, além das sanções trabalhistas e administrativas pertinentes, incorrerá em multa de 50% do piso salarial da categoria, por empregado e por mês de trabalho, cujo beneficiário será o próprio Empregado prejudicado.

É uma evidente tentativa de controle na contratação dos vigilantes, impedindo que haja o intencional desvio da atividade. Vigilante deve ser o profissional adequado, com a formação adequada e remuneração adequada, não se admitindo a sua contratação irregular e fraudulenta. A cláusula, portanto, não deixa de evidenciar o problema, e até chamar a atenção das autoridades, sendo um instrumento inclusive para embasamento de ações judiciais em que se reivindique o correto enquadramento do profissional. Porém, por ser um instrumento contratual entre as partes signatárias, não tem o condão, por si só, de obrigar terceiros, mas apenas as empresas de vigilância representada pelo sindicato econômico. No entanto, a cláusula esconde uma grata possibilidade, de controle de empresas de terceirização – portaria, recepção etc. – que pertencem ao mesmo grupo das empresas de vigilância. A questão já foi aqui ventilada. Muitas empresas de vigilância acabaram por criar empresas acessórias, de portaria e similares, o que facilita a venda dos serviços, “ao gosto do freguês” e de acordo com o custo exigido. Estas empresas, portanto, em grande maioria, são verdadeiras percussoras do desvio funcional na categoria da segurança privada. E a cláusula visa, por vias indiretas, pressionar tais empresas, que são dos mesmos proprietários e compõem o mesmo grupo, a abolirem a prática do desvio funcional. Esperamos que instrumento venha a dar resultados, pelo menos no aspecto de conscientização do “capital”. A cláusula 62 trata da ação de cumprimento, que, na categoria, teve extensão de sua aplicabilidade.

CLÁUSULA 62 - AÇÃO DE CUMPRIMENTO DOS DIREITOS CONVENCIONADOS As empresas reconhecem a legitimidade e a representatividade dos Sindicatos Profissionais, como substituto processual, para a propositura, em suas respectivas bases territoriais, de ações de cumprimento, podendo utilizar todos os meios processuais cabíveis, visando obrigar as empresas ao cumprimento da integralidade dos direitos dispostos nas leis e na presente norma coletiva, e eventuais acordos coletivos outros, sem limitações, em defesa de todos os empregados e ex-empregados legitimamente representados.

A ação de cumprimento é a ação em que o Sindicato, agindo como representante ou substituto processual dos membros da categoria, reivindica justamente o cumprimento das cláusulas coletivas ajustadas ou normatizadas. Por muito tempo, a substituição processual pelo sindicato se viu limitada aos empregados associados devidamente nominados e qualificados, e se restringia a

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cláusulas de natureza salarial. Hoje, após a derrubada do Enunciado 310 do TST, que trazia tais limitações, temos que espectro alcançado por estas ações é bem mais amplo. Antes disso, na categoria dos vigilantes, já havida (desde 2002) uma cláusula contratual, que a que transcrevemos acima, que permitia uma modalidade mais ampla dos direitos categoriais, estendendo a hipótese para todas as normas, inclusive decorrentes de outros instrumentos legais aplicáveis, em substituição de todos empregados e mesmo dos ex-empregados. A cláusula, de tal amplitude, se justifica frente a realidade da categoria, em que é ordinário a transgressão das normas fixadas. 2.4.14) Câmara setorial da categoria A cláusula 66, última a ser estudada, trata da criação da Câmara Setorial da Categoria, vigente desde 2.003.

CLÁUSULA 66 - CÂMARA SETORIAL DA CATEGORIA. As partes manterão uma Câmara Setorial da Categoria, regida por normas próprias, com o objetivo de regular e garantir as relações de interesse entre os diversos segmentos que compõe o setor, e impedir a lesão dos direitos convencionados, normatizados e legais, inclusive no intuito de estabelecer a ética concorrencial.

A Câmara criada, que funciona com a participação das Entidades Sindicais econômicas e profissionais, e que tem como convidados freqüentes autoridades do poder público, como é o caso do Ministério do Trabalho, através da DRT, INSS, Caixa Econômica Federal, dentre outros, tem a intenção de exercer uma regulamentação das atividades das empresas, evitando que os empregados sejam lesados. Denuncia aos órgãos competentes principalmente empresas que praticam preços inexeqüíveis e que acabam por lesar os seus funcionários, empresas que atuam na clandestinidade, etc. Foi criado, pelo Sindicato Econômico, até mesmo um selo (CRS) que atesta a regularidade das empresas, exigindo várias certidões e documentos, inclusive que comprovem a correção da área trabalhista. Embora ainda tímida, a atuação representa notável avanço. Por último, diga-se em ratificação ao que já foi dito, que a categoria, de nível salarial extremamente baixo em contrapartida á responsabilidade da função, não tem quaisquer outros direitos significativos. Possui convênio médico, em geral de péssima qualidade, com desconto de parte de seu custo do salário (consoante a prática, pelo menos a metade do custo total). Cesta básica e vale refeição não são direitos consolidados. Apenas em 2004, passaram a constar da CCT, porém restritivamente às hipóteses em que o custo seja repassado no contrato ao tomador, ou em casos de licitação, em que o edital

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expressamente preveja. Outros direitos são privilégios de alguns poucos postos privilegiados, dos profissionais que servem a elite, como já nos referimos. Estas as particularidades relativas aos direitos consolidados dos vigilantes, que mereciam a nossa atenção nesse espaço. 2.4.15) Conclusão acerca das normas convencionadas Do que se demonstrou, temos que os vigilantes privados, em nosso país, são pessoas simples, de baixo nível salarial e escassos direitos, muitas vezes oriundos de outras categorias profissionais em razão do desemprego. As empresas estão longe da solidez desejada, e o mercado é extremamente volátil e irregular. O setor é desorganizado, de regulamentação deficiente, e padece de total falta de fiscalização, o que facilita o desvio funcional, a clandestinidade, e até o banditismo. Esse o triste retrato da vigilância privada em nosso país. A condição do setor, está longe de possibilitar, de forma geral, o atingimento da noção ideal do profissional vigilante, expressada por Paulo Portella1 – “As qualificações dos guardas devem ser baseadas nos serviços a serem executados e no nível de execução que se espera. É preciso fazer uma distinção entre o idoso atendente de portão ou vigia, cuja principal responsabilidade é estar fisicamente presente e o membro treinado de uma guarda de segurança, que se considera capaz de proteger a instalação. (...) Alta confiança e responsabilidade são inerentes à função de guarda. Conhecimentos e materiais vitais podem ser confiados à sua proteção e o guarda pode ser designado para proteger elementos de grande valor econômico ou estratégico. Caráter inatacável, lealdade e integridade são requisitos para os candidatos que pretendem funções sensíveis de guarda. Desvios dos padrões estabelecidos quanto à idade, altura, peso, condições físicas e outras qualidades não devem ser permitidas. (...) Todas as pessoas consideradas para funções de guarda devem ser cuidadosamente investigadas e ter seu grau de acesso classificado antes da contratação. A investigação deve seguir, de um modo geral, os padrões para a classificação do acesso de outros candidatos para funções sensíveis, inclusive o contato com vizinhos, colegas de trabalho, ex-empregados, credores e agências de crédito e uma verificação dos antecedentes policiais” A constatação, portanto, é que as empresas, em sua maioria e de forma geral, estão muito mais interessadas em manter parcos os direitos da categoria, e ainda lesá-los continuamente, do que oferecer treinamento, triagem e classificação, para transformar o setor no ideal ditado pelos especialistas. Os prejudicados são os funcionários do setor e a comunidade que demanda os seus serviços, isso sem considerar o maciço desvio funcional e a clandestinidade, que serão melhor tratados em tópico específico. 1 – Gestão de Segurança – págs. 105/107

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O mercado também, confuso, mal organizado e mal fiscalizado, povoado de empresas fantasmas e transgressores de direitos, em que as maiores vítimas são a própria sociedade e os trabalhadores vigilantes, não se coaduna com a necessidade de formação dos profissionais e com a atuação segundo a ética, em sentido social e econômico.

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Capítulo 3) Custo dos Serviços de Segurança Privada Analisamos no tópico acima, os principais direitos do profissional vigilante, e mais adiante passaremos a analisar as razões e características dos serviços clandestino, que se alastram em proporção geométrica. Neste capítulo, analisaremos o custo dos serviços de segurança. Embora os patamares salariais da categoria esteja abaixo do que seria conveniente, temos que o custo final dos serviços legalizados, para o contratante, apresenta-se elevado. Isso se dá em função de três motivos principais, que são os seguintes.

1. A necessidade da contratação de serviços por pessoas e/ou empresas que originariamente não seriam consumidoras de tais serviços. Somente o são, em face do aumento da criminalidade, e da insuficiência da segurança pública. Hodiernamente, portanto, os serviços de segurança privada são demandados, principalmente nos grandes centros urbanos, por estabelecimentos que normalmente não atrairiam a atenção dos marginais. São o caso típico dos pequenos comércios, como padarias, mercados, armarinhos e assemelhados, e também em pequenos condomínios e locais privados e também públicos, como é o caso de pequenas repartições, escolas, clubes, locais de lazer, cemitérios etc. Ou seja, a necessidade que está sendo gerada não encontra respaldo nos valores que são faturados ou arrecadados/destinados a tais estabelecimentos, e mesmo assim, até por exigência do público de usuários e consumidores, estes são obrigados à contratação dos serviços.

2. A necessidade, muitas vezes, do serviço de vigilância se dar por período

contínuo, nas 24 horas do dia. Dessa forma, para cobertura de um único posto, são necessários três homens, mais os folguistas, sendo que o valor total da contratação sai muito caro.

3. O excesso de encargos trabalhistas, tributários e previdenciários gerados

pela contratação regular, o que não é particularidade da categoria, mas afeta todos os setores da economia.

Estes motivos principais, são responsáveis inclusive por grande parte da situação de clandestinidade que assola o mercado, e que tem seu efeito

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aumentado pela absoluta falta de fiscalização dos órgãos competentes, o que será melhor explicitado em tópico específico. O Sesvesp, Sindicato das Empresas de Segurança do Estado de São Paulo, divulga inclusive1 tabelas dos custos apresentados pelas empresas regulares, na contratação e disponibilização dos serviços de segurança privada. Transcrevemos abaixo, as principais destas tabelas referidas. PLANILHA DE CUSTOS POSTO 8h 48min. - 2ª a Sexta - c/ rep s/ adm - base econômica - 01/05/2004 s/ lucro 1 Salário base 681,65 1 vigilante ao salário piso de R$ 681,65 2 Horas extras 0,00 não há neste regime 3 Adicional noturno 0,00 não há neste regime 4 Hora reduzida 0,00 não há neste regime 5 Reflexo no DSR 0,00 não considerado por não haver horas extras 6 Subtotal (massa salarial)) 681,65 total da massa salarial 7 Encargos Sociais (81,36%) 554,59 taxa estudada no âmbito da FGV 8 Subtotal (mão-de-obra) 1236,24 total da mão-de-obra incluindo encargos 9 Vale transporte 133,10 ( 21,75 dias x 2,00 x 4 viagens/dia - 0,06 x 681,65 ) 10 Vale refeição

11 Convênio médico 30,92 ( 1 x 65,00 - 0,05 x 681,65 ) - valor de pesquisa compatível c/ mercado

12 Seguro de vida 6,59 valor unitário resultado de pesquisa de mercado 13 Auxílio funeral 0,58 ( 1,5 x 681,65 x 0,676% / 12) - acordo coletivo

14 Reciclagem 5,45 ( 1 x 130,76 / 24 ) - pesquisa de mercado (valor inclui custo de reposição)

15 Intervalo de Refeição 205,67 vide Tabela 1 c/ detalhamento dos custos do intervalo da refeição

16 Uniformes 23,22 vide tabela 2 com relação de itens, quantidades e vida útil

17 Equipamentos 12,98 vide tabela 2 com relação de itens, quantidades e vida útil

18 Subtotal (despesas diretas) 418,51 despesas diretas exceto mão-de-obra

19 Subtotal(8+18) total custos diretos 1654,75 total de custos diretos (inclui mão-de-obra)

20 Taxa de Administração 0,00 21

22 Subtotal(19+20+21) cust total s/ imp 1654,75 total sem impostos e sem lucro

23 Taxa de Lucro (sobre 26) 0,00

1 – www.sesvesp.com.br

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24 Subtotal (22+23) preço s/ imp 1654,75 total sem impostos

25 Tributos (9,03% de 26) 164,26 impostos básicos sobre receita ( ISS 5% - COFINS 3% - PIS 0,65% - CPMF 0,38% )

26 Total Geral Mensal (posto) 1819,00 total geral mensal

27 Custo Posto/Dia 83,63 total mensal / 21,75 dias 28 Custo hora 9,50 total dia / 8,8 horas

29 Fator K 2,38 fator multiplicador que aplicado à massa salarial resulta no preço final

PLANILHA DE CUSTOS POSTO 12x36 - 24 hs - 2ª a Domingo - c/ rep S/ adm - base econômica - 01/05/2004 s/ lucro

1 Salário base 2726,60 4 vigilantes ao salário piso de R$ 681,65 2 Horas extras 0,00 não há neste regime 3 Adicional noturno 132,04 7 horas noturnas x 30,44 dias x 681,65/220 x 0,2

(adicional de 20%) 4 Hora reduzida 113,18 1 hora reduzida x 30,44 dias x 681,65/220 x 1,2

(c/ adicional de 20%) 5 Reflexo no DSR 0,00 não considerado por não haver horas extras 6 Subtotal (massa salarial) 2971,82 total da massa salarial

7 Encargos Sociais (81,36%) 2417,87 taxa estudada no âmbito da FGV 8 Subtotal (mão-de-obra) 5389,69 total da mão-de-obra incluindo encargos

9 Vale transporte 323,44 ( 2 turnos x 30,44 dias x 2,00 x 4 viagens/dia - 0,06 x 4 x 681,65 )

10 Vale refeição 11 Convênio médico 123,67 ( 4 x 65,00 - 0,05 x 4 x 681,65 ) - valor de pesquisa

compatível c/ mercado 12 Seguro de vida 26,36 (4 x 6,59 ) valor unitário resultado de pesquisa de

mercado 13 Auxílio funeral 2,30 ( 4 x 1,5 x 681,65 x 0,676% / 12) - acordo coletivo 14 Reciclagem 21,79 ( 4 x 130,76 / 24 ) - pesquisa de mercado

(inclui reposição) 15 Intervalo de Refeição 604,49 vide Tabela 1 c/ detalhamento dos custos do intervalo

da refeição 16 Uniformes 63,29 vide tabela 2 com relação de itens, quantidades e vida

útil 17 Equipamentos 33,47 vide tabela 2 com relação de itens, quantidades e vida

útil 18 Subtotal (despesas diretas) 1198,82 despesas diretas exceto mão-de-obra

19 Subtotal(8+18) total custos

diretos 6588,51 total de custos diretos (inclui mão-de-obra)

20 Taxa de Administração 21

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22 Subtotal(19+20+21) cust total

s/ imp 6588,51 total sem impostos e sem lucro

23 Taxa de Lucro (sobre 26)

24 Subtotal (22+23) preço s/ imp 6588,51 total sem impostos

25 Tributos (9,03% de 26) 654,00 impostos básicos sobre receita ( ISS 5% - COFINS

3% - PIS 0,65% - CPMF 0,38% ) 26 Total Geral Mensal (posto) 7242,51 total geral mensal

27 Custo Posto/Dia 237,93 total mensal / 30,44 dias 28 Custo hora 9,91 total dia / 24 horas 29 Fator K 2,26 fator multiplicador que aplicado à massa salarial

resulta no preço final

A primeira planilha revela que para a contratação de um único vigilante,

para um posto de serviço comum, de oito horas de trabalho diário, sem considerar o lucro e a taxa de administração da empresa de vigilância, é de R$1.819,00. Para a cobertura de um posto de 24 horas, em que no geral se aplica a jornada especial 12x36, temos um custo, também sem considerar lucro e taxa de administração, de R$7.242,51. Logicamente que os custos indiretos e a taxa de administração e de lucro servem a elevar tais valores em algo em torno de 15% a 20%, o que vem demonstrar que realmente, conforme já dissemos, o excesso de encargos e a natureza do serviço, com necessidade de cobertura muitas vezes em período integral, servem a colocar os serviços de vigilância em elevados patamares de custo, quanto mais se contratados por pequenos comerciantes ou órgãos públicos, obrigados a consumir os serviços pela onda de criminalidade e insuficiência dos serviços públicos de proteção. Tais planilhas aqui citadas, são inclusive utilizadas em conjunto pelo Sesvesp e pela Fetravesp, que é a federação estadual paulista dos empregados em vigilância e segurança privada, para alertar órgãos públicos e empresas sobre os valores mínimos exeqüíveis em contratos de vigilância privada, tentando assim evitar o povoamento do setor por empresas irregulares ou clandestinas, ou que vivem de sonegar impostos e encargos. Essa inclusive uma característica do setor, que tem elevado índice de quebras de empresas, que é inclusive proposital. As empresas, geralmente, praticam preços inexeqüíveis a custa do não recolhimento de impostos e da sonegação de direitos trabalhistas (FGTS, horas extras, adicionais etc) e previdenciários, em sistema que gera a “quebra” da empresa em alguns anos de atividade. A maioria destas empresas, encontra-se em nome de “laranjas”, que

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são usadas em função não possuírem patrimônio, ficando os verdadeiros donos sempre protegidos da legislação. As maiores vítimas deste processo, são mesmo os órgãos públicos, principalmente por conta da Lei 8666/93, que cuida da forma das licitações públicas, ter por único critério de contratação pela apresentação do menor preço, na maioria das vezes “inexeqüível”. De acordo com Sérgio Olímpio e Márcio Lemos:

“Uma fatia significativa do mercado de segurança está na prestação de serviços a Órgãos Públicos. Baseado na Lei 8.666/93 (Lei das Licitações) além da busca constante de moralidade e legalidade pública, deveriam ser os Órgãos Públicos os primeiros a primar pelo rigoroso cumprimento da Lei. É uma vergonha observar-se o resultado das licitações públicas nos níveis Federal, Estadual e Municipal e Autarquias: 90% dos resultados das licitações de vigilância não atendem a um preço mínimo exeqüível que permita o pagamento do salário, encargos, tributos, mesmo que se considere uma taxa de administração e lucro zero. Não existe milagre; ou o empresário de segurança sonega, ou o Órgão Público se corrompe e “administra” o contrato. Por exemplo, onde o contrato prevê 10 postos 24 horas, na verdade só são executados 5, ou ainda ocorrem as duas coisas. Em qualquer das hipóteses, o cidadão está sendo lesado.”

A questão inclusive gera um passivo trabalhista gigantesco a tais órgãos,

pois, em face de sua responsabilidade trabalhista subsidiária, e dada a extinção da empresa, acabam por responder pelos processos intentados pelos trabalhadores, que ainda por falta de documentos para uma correta defesa, tornam-se condenações especialmente elevadas. Infelizmente, não existem estatísticas oficiais sobre tais prejuízos, mas sabe-se que as principais vítimas são os bancos públicos, como é o caso do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, e instituições como o INSS e os diversos Ministérios, e, no final, quem paga a conta, é o cidadão contribuinte. Situação mesmo absurda. O Sesvesp – Sindicato das Empresas de Vigilância do Estado de São Paulo, e a Fetravesp – Federação dos Trabalhadores do Estado de São Paulo, estabeleceram inclusive em instrumento coletivo, conforme já citado, uma Câmara Setorial, com o objetivo de detecção das situações irregulares e de contratação com preços inexeqüíveis, privilegiando o contato com Órgãos Públicos para o alerta sobre todos os problemas relatados. Infelizmente, a falta de interesse da direção de tais Órgãos vem emperrando o desenvolvimento dos trabalhos e a apresentação de soluções viáveis, que passariam pelo necessário estabelecimento de condições mínimas para a prestação dos serviços de segurança, especialmente em relação ao trato com os funcionários, constantemente lesados.

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Capítulo 4) Desvio funcional e clandestinidade 4.1) As diversas facetas do mesmo problema A questão já foi introduzida nos capítulos anteriores. O fato é que, no Brasil, principalmente por absoluta falta de fiscalização, e também pelo alastramento descontrolado dos serviços de segurança, com a conivência da sociedade e do mercado, segundo estimativas, de cada três vigilantes em atividade, dois estão em situação irregular. Parte deles são policiais civis ou militares em período de folga, que trabalham exaustos, utilizando muitas vezes armas e acessórios do próprio estado, agindo freqüentemente com exacerbação de poder. Não é incomum a notícia, de que “um policial a paisana”, em um banco ou ônibus ou loja, alvejou bandidos, ou foi alvejado ao sacar sua arma. A notícia passa como se fosse um mero acaso a presença do profissional, fora de serviço, naquele local, e armado. Na grande maioria das vezes, trata-se de um policial em período de folga, prestando segurança – clandestina – a algum estabelecimento, que se vê em confronto com a criminalidade. O trabalho clandestino de policiais é tão comum e mesmo institucionalizado, que por exemplo, em São Paulo, a maioria das agências bancárias de maior risco de ocorrência de assaltos possuem um serviço clandestino denominado “mão branca”, que consiste na inserção de alguns policiais “em folga” nas imediações da agência bancária, munidos de rádio e armamentos, que fiscalizam a entrada de eventuais suspeitos, e se ativam em caso de algum perigo.

Este tipo de vigilância, que compreende pessoa armada em ambiente externo, e portanto duplamente ilegal (já que a própria segurança privada deve ser intra-muros) torna-se cada vez mais comum. Como já mencionado acima, na hipótese de ocorrer algum evento, os jornais noticiarão a ocorrência citando que “um policial a paisana que estava no local dos fatos...”. Muitas vezes, a forma de atuação leva à morte ou lesão de um inocente. O fato é tão comum, que os assaltantes até mesmo se preocupam em anular a defesa dos bancos, detectando os “seguranças” externos e os atingindo antes mesmo do assalto ao banco.

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Segundo Sérgio Olimpio e Márcio Lemos1, a despeito da atuação dos policiais como seguranças privados, inclusive nas suas próprias áreas de atuação ordinária:

“Pior ainda, quando tais proponentes do serviço são policiais da área pois estarão demonstrando já seu caráter de péssimo profissionalismo e que vão vender proteção justamente onde tem o dever legal de atuar. Nesse caso além de criminoso como veremos adiante é extremamente imoral deixando no cidadão um ar de eventual extorsão. Imaginemos um caso concreto em que 4 edifícios de uma mesma rua se cotizem e paguem tal “serviço” e 2 não paguem. Qual será a conduta dos agentes ao pressentirem um crime se passando contra pessoas não pagantes? Se omitirão? E se forem policiais que tem o dever de intervir? E se imaginarmos que tais agentes ainda poderão estar servindo de informantes para criminosos atuarem contra os não pagantes?”

Em edição especial sobre o tema do Jornal da Tarde2, é chamada atenção para os problemas dos bicos de policiais militares, que estão se alastrando também no transporte coletivo.

“Para os policiais, o álibi perfeito para fazer “bico” – Trabalhar como segurança em ônibus tem uma vantagem, conta um policial militar que chefia uma equipe de 25 homens em algumas linhas da zona leste; fica mais fácil dbiblar a vigilância da PM, que proíbe os bicos. “Se acontecer algum assalto e a gente tiver de atirar no ladrão, tem o álibi perfeito. É só dizer que estava indo para a casa da mãe ou para o quartel. Nos ensinam que somos policiais 24 horas por dia. Então, se acontece um assalto na minha frente, não vou reagir?” Mas a desvantagem não é menor: “Dentro de um ônibus, há dois riscos: de matar ou o de morrer”. O PM, que recebe R$800,00 por Mês para passar algumas horas dentro dos ônibus de olho nos ladrões, conta que a maioria dos policiais de sua equipe trabalha a noite, o período mais crítico. (...)”

Outra parcela da dita clandestinidade, é constituída por profissionais sem o devido treinamento e com condições de nível inferior ao da categoria, denominados fraudulentamente de “guardas”, “vigias”, “fiscais” de “piso” ou de “área”, “controlador de acesso” e outras denominações diversas, utilizadas para a consagração da fraude do desvio funcional. Existem ainda outros que sequer tem algum registro profissional, e freqüentemente não sabem bem nem ao menos para quem trabalham. Ativam-se em condomínios e lojas, geralmente a mando de um policial, que coordena os serviços, e é identificado em geral apenas por um apelido. Outros trabalham por “conta própria”, e cobram a sua féria diretamente dos moradores e freqüentadores de determinada região, os chamados “guardas 1 – Insegurança Pública e Privada – pág. 149 2 - Edição de 31 de março de 2003 – Caderno A – pág. 12

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de quarteirão”, que como vimos inclusive podem ser policiais, até mesmo da própria área. Sobre estes afirmam Sérgio Olímpio e Márcio Lemos:

“Diante desse quadro está surgindo um grande e perigoso mercado paralelo de segurança clandestina que são as Empresas especialistas em Segurança de quarteirão. O que no passado era um subemprego de vigias noturnos, “bico”, para vigilantes desempregados, agora está disseminando principalmente nos bairros nobres com empresas que se apresentam como legalmente constituídas mas que na verdade possuem registros falsos, autorização para funcionamento da Polícia Federal falsificados pois cabe à Polícia Federal através de suas Delegacias Especializadas de Controle de Segurança Privada e respectivas Comissões de Vistoria, o controle e fiscalização das atividades de segurança privada no país. Essas Empresas que se mostram inicialmente com uma fachada de seriedade promovendo reunião com condôminos de vários edifícios se propondo a colocar homens armados nas ruas com rádio comunicação, automóveis e moto de apoio dando cobertura aos moradores que estiverem amparados pelo “contrato” posteriormente se mostrarão um fiasco, até por não poderem realizarem o que prometeram. Os cidadãos apavorados com a violência desconhecendo a legislação e até por imaginar que é lícita tal situação acabam por cair na artimanha desses “camelôs da segurança”.”

O conjunto, portanto, que compõe o sistema existente, facilita inclusive a atuação de marginais e bandidos, além do evidente despreparo dos profissionais, o que gera talvez mais insegurança do que segurança. Há ainda o caso também muito comum, atrelado ao desvio funcional, promovido muitas vezes pelos próprios grupos de empresas do setor. Torna-se, por exemplo, cada vez mais comum nos dias atuais, a contratação de profissionais para o exercício da vigilância privada, inclusive sem o treinamento adequado, de forma camuflada, sob as mais curiosas denominações, como já dito, desde a do popular “porteiro” ou “vigia”, até “fiscais de piso”, “fiscais de portaria”, “fiscais de apoio”, “orientadores”, e outros diversos. Em realidade, tratam-se todos de profissionais que se ativam clandestinamente em serviços de segurança patrimonial e pessoal, porém, sem a formação apropriada, recebendo remunerações ínfimas e insuficientes, muitas vezes sem ao menos “registro” na Carteira de Trabalho. E ainda pior, muitas vezes estes serviços são vendidos por empresas co-irmãs, do mesmo grupo das de segurança privada, que apresentam o seu serviço como alternativa mais barata à “proteção desejada”. Sua atuação coloca em risco a sociedade, tanto pelo despreparo quanto pela falsa impressão que geram na população, e sua atuação, cada vez mais freqüente, sobrevive na absoluta falta de fiscalização da polícia federal e no descaso de órgãos ligados ao Ministério do Trabalho e Ministério Público do trabalho.

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Há ainda, empresas clandestinas que servem à indústria do crime, facilitando a entrada de bandidos nos meios privados, como condomínios comerciais e residenciais, e mesmo outras que conforme já amplamente noticiado na imprensa, servem de fachada para grupos de extermínio, inclusive de crianças. Existe, da mesma forma, na clandestinidade, por vezes o nocivo aproveitamento de policiais civis e militares, sem qualquer registro efetivo, na atividade, o que denota graves problemas, inclusive o de abuso de poder e excesso de carga de trabalho. Os problemas, portanto, são de ordem grave. De um lado a sujeição da sociedade a profissionais que deveriam protegê-la, mas que não possuem o mínimo preparo e condição para tal mister, utilizando da qualificação da vigilância apenas para a obtenção de lucro fácil, sem o menor compromisso social. De outro, verdadeiras quadrilhas que atuam sob a denominação falsa de uma empresa de segurança, facilitando seu acesso aos bens maiores dos cidadãos. É sobre isso que discorre de forma incisiva o Delegado Federal Gesival Gomes de Souza1.

“(...) “A indústria da segurança clandestina prospera no Brasil, principalmente nos grandes centros urbanos, operando com a máscara do oferecimento do serviço do “vigia” ou “porteiro especial noturno” ou “guardiães”. Na realidade, executam a atividadde de vigilância patrimonial, a princípio desarmada, mas às vezes até mesmo armada e com arma de procedência duvidosa. Uniformizam seus “vigias” com coletes escritos “disciplina”, “apoio”, o armam com um cassetete do lado e simplesmente colocam tal trabalhador no posto sem proceder sequer a uma orientação do que eles devem fazer. Como a rotatividade em tais empresas é altíssima, dada as péssimas condições de trabalho, às vezes o “empresário” leva o canditato diretamente ao lugar em que irá prestar o serviço, sem que haja a mínima preocupação com a origem de tal canditato. O cliente nem sempre toma conhecimento de tal fato. A atividade de segurança pode ser exercida legalmente por um único tipo de trabalhador, que deverá estar habilitado para tal: o vigilante. Todas as outras designações são mascaramento da função e exercidas de forma ilegal. No entanto, esta situação ilegal existe pelo aproveitamento de brecha deixada por decisões anacrônicas e pelo desconhecimento, em geral da legislação de segurança,

1 – Trabalho de divulgação interna e estudos da Delesp – São Paulo

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tanto do público como dos clientes que conseguem alvarás de funcionamento na Prefeitura para o oferecimento de “vigias”. Proeedem anúncios nos órgãos de leitura e comunicação como: “não deixe sua segurança nas mãos de qualquer um”. É cômico para quem conhece o assunto e desesperador para quem possui uma empresa de segurança e tem seus clientes atacados por tais pseudo-empresários de segurança. Trata-se até mesmo de uma concorrência desleal. (...)”

Na realidade, portanto, a segurança, em mais este aspecto, não tem sido levada a sério. De um lado estão as empresas legalizadas, que possuem infra-estrutura, vigilantes treinados, compromisso e responsabilidade sociais, embora o nível salarial normal seja também bastante baixo, como vimos, incompatível com a condição de trabalho. De outro, inúmeras empresas fraudulentas, que oferecem supostamente o “mesmo serviço”, porém com profissionais sem treinamento, mal remunerados, sem verificação de antecedentes e histórico de vida pregressa, o que coloca em risco toda a sociedade. Entre os dois patamares de serviços, o legal e o ilegal, existe um abismo representado pela diferença de custos, o que, em uma economia abalada como a nossa, significa uma tendência invencível à clandestinidade. Neste contexto, o próprio empresário da vigilância privada, cansado de perder postos de serviço para a concorrência ilegal, acaba por entrar na clandestinidade, criando empresa diversa de “serviços de portaria”, que apresenta como opção de menor custo para os anseios dos clientes. Mais uma vez, a atividade tende a se firmar na clandestinidade, em prejuízo dos verdadeiros vigilantes e de toda a sociedade. 4.2) Prerrogativas dos fiscalizadores Para que possamos fazer uma análise correta do tema, é necessário que façamos uma abordagem da regulamentação das atividades de fiscalização do setor, que caso tivessem efetivo funcionamento, sem dúvida serviriam para a correta coordenação dos serviços, o que evidencia que embora a legislação pudesse ser atualizada, a sua aplicação efetiva, da forma em que se encontra hoje, já seria suficiente para um controle pelo menos satisfatório do setor. Pois bem, além da legislação já citada nos tópicos anteriores, de regulamentação da atividade de segurança privada, existem também outros instrumentos normativos específicos, que estabelecem regras rigorosas para o setor, dentre as quais merecem destaque o Decreto 89.056/83, além de Portarias

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específicas; que fixam inclusive elevadas multas para eventuais descumprimentos de tais regras. A coordenação e fiscalização, bem como a aplicação de penalidades, que podem chegar à cassação de autorização de funcionamento – e que nesse caso somente servem para o setor regulamentado, uma vez que existem diversas empresas atuando que nunca chegaram a estar regulares, e nem isso lhes interessa -, ou ao imediato fechamento das empresas clandestinas, fica a cargo do Departamento de Polícia Federal (DPF) de cada Estado, a partir de sua Superintendência Regional, ao qual se vincula a respectiva “Comissâo de Vistoria”. Acerca dos procedimentos e da competência para tais atos, encontra-se disposto nos artigos finais da Portaria 992 do Ministério da Justiça o seguinte:

Art 110 – As Comissões de Vistoria do DPF, ao constatarem a prática de infração por parte de qualquer empresa de segurança privada, deverão: I – lavrar o competente auto de constatação de infração, notificando os responsáveis pela empresa a apresentarem, no prazo de 10 (dez) dias, alegação de defesa; (...) Art. 111 – Sendo constatada a existência de empresa clandestina funcionando sem autorização do Departamento de Polícia Federal na prestação de serviços de vigilância armada, desarmada, transporte de valores, cursos de formação, escolta armada e segurança pessoal privada, a Comissão de Vistoria do DPF deverá: I – fiscalizar de ofício e, também, tomar por base denúncia escrita de Federações, Sindicatos e Associações dos empresários e empregados das classes envolvidas para, após as investigações de praxe, lavrar o respectivo auto de constatação de infração, notificando e promovendo o encerramento de suas atividades; II – comunicar o encerramento das atividades da empresa aos órgãos administrativos, fiscais e de segurança pública de âmbitos federal, estadual e municipal, em face do que preceitua ao artigo 50 do Decreto 89.056, de 24 de novembro de 1983; III – instruir o procedimento dentro de 10 (dez) dias úteis e encaminhar à Coordenação Central de Polícia Federal.

4.3) Financiamento das atividades de fiscalização Para o financiamento da atividade essencial de fiscalização dos agentes de segurança privada, que deve desenvolver o Ministério da Justiça, através dos Departamentos de Polícia Federal respectivos, e que estão previstas na norma

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exposta, existem os recursos ordinários, oriundos de repasse do orçamento, e, especificamente, uma fonte de custeio própria, conforme estipulado no artigo 112 da Portaria 992, que assim dispõe:

“Art. 112 – As multas e taxas decorrentes da atividade de fiscalização das empresas de segurança privada constituirão recursos diretamente arrecadados na Fonte 150 (cento e cinqüenta) a serem consignados no Orçamento do Departamento de Polícia Federal, no Programa de Trabalho 06.030.0174.2081.001 – Operação do Policiamento Federal.”

Em conclusão a tudo que foi posto, e como lembrete do que já foi visto aqui, temos que a vigilância privada é atividade essencial à segurança dos cidadãos, no combate à intensa marginalidade social e ao banditismo. Pela importância que representa, bem como pelo fato de se relacionar diretamente com a proteção dos bens e valores humanos e sociais, existe a necessidade de autorização do Estado para o seu funcionamento. Tais serviços, portanto, que compõem tanto a vigilância armada quanto a desarmada, dependem, em nosso bem montado contexto legislativo, do “alvará de funcionamento” e do “certificado de segurança” expedidos pelo Departamento de Polícia Federal, vinculado ao Ministério da Justiça. Registre-se que também são expedidas as licenças da atividade orgânica, e ainda especialmente os denominados Planos de Segurança das Agências Bancárias. Para a obtenção da licença para atuar no setor, necessitam as empresas de segurança e vigilância, portanto, apresentar a estrutura determinada por lei, que inclui treinamento e formação constante dos vigilantes para lidarem com situações que representem danos ao patrimônio e às pessoas. De forma bastante apurada, a atividade de vigilância, portanto, deve servir institucionalmente à proteção da população, à possibilidade do exercício da cidadania e ao respeito aos direitos humanos. E todo este aparato somente funcionará de forma apropriada, caso exista o efetivo controle da atividade, segundo a fiscalização constante do Departamento da Polícia Federal. O que ocorre, porém, conforme já foi inclusive visto, é que vivemos hoje, no ramo da vigilância privada, em meio a inúmeras irregularidades, sendo certo que cresce o número de empresas clandestinas, de forma assustadora, sem

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qualquer controle, o que põe em risco toda a população; de outro lado, constata-se que existe fonte para a arrecadação de recursos para tal fiscalização, que no entanto, ao que parece, não são aplicadas. Dados fornecidos pelo SIAR (Sistema Informações de Arrecadação) do Departamento da Polícia Federal – Ministério da Justiça, demonstram claramente que o dinheiro arrecadado com as atividades de regulação e fiscalização não estão sendo direcionados para um correto direcionamento do setor. Os dados demonstram a arrecadação nos anos de 1.998 a 2.002.

Já o quadro demonstrado abaixo, indica o montante arrecadado por cada atividade, e indica inclusive a inexistência da aplicação de multas, ou pelo menos de seu efetivo recebimento pelos cofres do Departamento.

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Há então, que se analisar a questão, sob o enfoque atinente ao crescimento da atividade clandestina na vigilância privada e as conseqüências malévolas sobre a sociedade, e a efetiva insuficiência de fiscalização que sirva a coibir tal crescimento, apesar de existirem fontes de recursos específicas para tal atividade fiscalizadora. E mais ainda, como é fonte de recursos a aplicação de multas e recolhimento de taxas para licença, temos que caso houvesse fiscalização eficaz, o sistema seria capaz de uma auto-sobrevivência. Ou seja, a fiscalização maior, em um ambiente de franca transgressão, poderia gerar cada vez mais arrecadação, que poderia então ser reaplicada. 4.4) Atuações do poder jurisdicional Como a fiscalização é incapaz de resolver tais problemas, vários deles, e sob a ótica principalmente de lesão de direitos trabalhistas, em vista de desvio de função praticado pelas empresas, são levados todos os dias para o Judiciário, que tem então a tarefa de disciplinar, individualmente, os casos que lhe são apresentados. Embora o número de pessoas atendidas esteja muito aquém da necessidade, há constatações de que tais reparações acabam por corrigir uma

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parcela do problema, principalmente pelo exemplo que é dado, que influencia o empresário a refletir antes de passar para a clandestinidade. Citamos, como exemplo, trecho de um Acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região – SP., no Processo TRT/SP 20040338341, relatado pelo Juiz Sérgio Junqueira Machado.

“Do enquadramento sindical – Tem razão a recorrente. A formação e a qualificação são requisitos para o exercício da função de vigilante. Só que o recorrente tem essa formação, como mostra o certificado de fl. 18. Se não participou de cursos de reciclagem, isso é apenas irregularidade que por si só não afasta a realidade da função exercida. Para a lei, aliás, é vigilante “o empregado contratado para a execução das atividades definidas nos incisos I e II do caput e parágrafos 2o, 3o e 4o do artigo 10o (art. 15 da lei 7.102)”, sendo que o parágrafo 4o, ali referido, dispõe que “As empresas que tenham objeto econômico diverso da vigilância ostensiva e do transporte de valores, que utilizem pessoal de quadro funcional próprio, para execução dessas atividades, ficam obrigadas ao cumprimento do disposto nesta lei e demais legislações pertinentes”. Ou seja, é também vigilante o empregado de empresa que, muito embora tenha objeto diverso da vigilância ostensiva e do transporte de valores, mantenha pessoal próprio para a execução dessa atividade. Ao vigilante a lei permite o porte e uso de arma. Mas não quer isso dizer que só é vigilante quem trabalha armado.”

Esta decisão do Judiciário Trabalhista é um modelo a se seguir. De fato, o correto é a consideração da função do vigilante enquadrada na Lei 7.102, como profissional que se ativa na proteção da vida e do patrimônio. Ao contrário, muitos juízes entendem que justamente em função das irregularidades, como não fornecimento de curso de formação e reciclagem, não registro no Departamento da Polícia Federal, e outras, são impeditivo à obtenção da condição de vigilante. O caminho é exatamente o contrário, pois uma vez constatada a função exercida, o que se deve fazer é ordenar a correção das irregularidades e a concessão dos direitos decorrentes.

Outra coisa a ser considerada é a tendência de muitos juízes trabalhistas de somente considerarem como vigilantes aqueles profissionais que portam armas. O caminho é justamente o inverso, sendo comum hoje em dia a necessidade de um profissional bem preparado para o trabalho inclusive desarmado, pelo menos no que se refere à armas de fogo, e mesmo assim eficaz. E não decorre da legislação qualquer condição de utilização de armamento para a configuração da função, sendo esta prerrogativa não obrigatória, e muitas vezes, hoje cada vez mais, indesejável. A se lembrar que cabe ao vigilante muitas vezes a proteção das pessoas e do patrimônio também contra riscos como incêndio, tumulto, ocorrências oriundas de causas naturais, alem de atitudes ligadas à preservação do meio ambiente, do valor histórico etc.

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Assim, o judiciário pode contribuir em muito para a adoção de medidas corretas que inibam o desvio funcional, justamente declarando a exata função exercida pelo profissional, da qual decorre a necessidade do treinamento e da formação adequada, além do cumprimento dos direitos mínimos da categoria. Diga-se que caminham para a plena superação as diferenciações esdrúxulas antes existentes entre as figuras de “vigia” e “vigilante”, que contribuíam para um intenso desvio funcional, colocando em risco a sociedade.. Há um doutrinador, de nome Emílio Gonçalves, que chegou, na década de 80, a definir a diferença como a seguinte: “os vigias tem como incumbência circular no estabelecimento do empregador, por meio de ronda diurna ou noturna observando os fatos, não estando obrigados à prestação de outros serviços, - ao passo que os vigilantes ou guardas de segurança, além das funções de guarda propriamente dita têm a seu cargo a defesa policial para impedir ação criminosa contra os bens”. Ou seja, a perseverar a sua definição, o vigia seria mero fiscal da natureza, sem qualquer obrigação. Sabemos, na verdade, que trata-se, de fato, de um vigilante, que faz rondas, observa e analisa as situações, previne riscos, chama por reforços, etc..., agindo sempre na proteção do estabelecimento e das pessoas que ali se encontram, e deve estar preparado para tais funções. 4.5) O nocivo aproveitamento dos policiais Questão à parte é a do aproveitamento de policiais militares e civis na atividade de vigilância privada, o que configura, também, sobre vários aspectos, em atividade clandestina. Em geral, são empresas de pseudo-vigilância, sem registro competente, que contratam tais profissionais, vendendo inclusive seu peixe como a “melhor segurança existente no mercado”, ou ainda empresas estabelecidas no mercado e regulares, que possuem verdadeiros “departamentos clandestinos”. No dizer mais uma vez de Gesival Gomes de Souza1, no mesmo tratado sobre a questão já citado:

“(...) A indústria da segurança prospera no Brasil, principalmente nos grandes centros urbanos, e a priori não há qualquer problema nisto. Existem todavia algumas características específicas na prestação deste serviço no Brasil que tornam a situação algo problemática. Em primeiro lugar, uma imbiose por vezes suspeita entre o setor público e o privado na área da segurança. Ainda que não seja legalmente permitido, é

1 – Trabalho de divulgação interna e estudos da Delesp

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público e notório que muitos dos proprietários de empresas privadas de segurança pertencem aos quadros superiores das polícias: geralmente delegados de polícia civil ou oficiais superiores da polícia militar, embora as empresas estejam legalmente em nome de familiares, como esposas e filhos. O mesmo ocorre com relação aos empregados, geralmente policiais civis e militares. Numa tese sobre a caracterização do policial militar no Estado de São Paulo, Álvaro da Silva Gullo encontra indícios claros desta simbiose: segundo dados levantados na ocasião (1992), 33% dos policiais tinha algum trabalho remunerado fora da PM e a proporção era tanto maior quanto menor o posto ou graduação. Dos que tinham algum outro trabalho remunerado, cerca de 1% eram empregadores (obviamente os estratos superiores), 20% trabalhavam como autônomos e 12% como empregados assalariados. Este “bico”, como revelou a pesquisa, garantia rendimentos iguais ou mesmo superiores aos auferidos na atividade policial. Em alguns casos a atividade policial se torna secundária em detrimento do bico. Não se sabe ao certo quantos destes 33% que possuem outro trabalho atuam na área de segurança privada, mas estima-se que seja a maior parte. Além da proibição legal para que um policial de rua, que trabalha com base numa escala, exerça atividade de segurança privada, os policiais são treinados durante meses pelo Estado – defesa pessoal, tiro, legislação, investigação, etc – com o dinheiro público, e todo este treinamento é aproveitado pelas empresas particulares ou clandestinas, que utilizam esta mão de obra sem que tenham que pagar nada por isso, o que representa uma apropriação privada de um “bem” público. Há ainda o problema do stress: os policiais, ao invés de estarem repousando de uma atividade estressante, estão na rua exercendo mais uma vez uma atividade perigosa, de modo que voltam ao trabalho tão ou mais exaustos que antes, prejudicando o trabalho policial. Existe ainda o problema das perversões , que são casos isolados, mas que levantam sérias dúvidas sobre a compatibilidade entre a prestação pública e privada dos serviços de segurança: casos de policiais que deixam de policiar determinadas áreas da cidade para se aproveitar da insegurança e oferecer proteção particular; uso de armamento, viaturas e outros equipamentos públicos pelos policiais, durante a atividade particular; extorsão pura e simples de dinheiro de comerciantes em troca de “proteção”; venda de “autorizações de trabalho” para perueiros irregulares; prestação de serviços de segurança à pessoas envolvidas em atividades ilegais, como “banqueiros do bicho”; uso de “informações privilegiadas”, como dados sobre criminalidade e operações policiais, para fins privados, etc. Em decorrência do bico policial, o número de policiais militares mortos é maior em folga – quando estão exercendo o bico – do que em serviço. Isto significa que eles se envolvem mais em confrontos letais quando estão trabalhando como vigilantes (em tese, uma situação passiva) do que quando estão policiando a cidade, procurando criminosos e respondendo a chamados de crimes (uma situação ativa).

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A explicação para esta mortalidade elevada durante a folga é complexa e passa pela violência dos criminosos brasileiros, elevada disponibilidade de armas na sociedade, falta de equipamentos de segurança, falta de preparo e treinamento para o enfrentamento de situações de alto risco, dupla jornada de trabalho a que muitos são obrigados a enfrentar para complementar sua renda, stress emocional, etc. Durante o bico o policial está mais vulnerável porque atua sem a cobertura de outros policiais e sem os mesmos equipamentos de segurança. O criminoso, por outro lado, torna-se mais ousado pois geralmente não sabe que se trata de um policial ou então sabe e aproveita para se vingar quando o policial está sozinho. Mas é possível especular também que a ausência de maiores constrangimentos para o uso da arma de fogo explique o elevado envolvimento de vigilantes (policiais no bico) em homicídios e a alta proporção de policiais militares mortos fora de serviço. O segurança particular envolvido em confronto armado talvez tenha que responder a um processo criminal. O policial, por outro lado, está sujeito a outras medidas: investigação pela corregedoria ou ouvidoria, processo administrativo, acompanhamento psicológico, afastamento do policiamento de rua e conseqüente perda do bico, pressão dos superiores ou da opinião pública, etc. Existem mais entraves para que se puxe o gatilho na condição de policial do que na condição de segurança particular, porque a sociedade fiscaliza o primeiro e se esquece do último. É preciso, em resumo, voltar um pouco os olhos para o que acontece no setor privado de prestação de segurança, que tende a se expandir ainda mais velozmente nas próximas décadas. A sociedade e os clientesdestas empresas tem que saber como eles são treinados ou fiscalizados em caso de abusos. Os padrões devem ser semelhantes aos exigidos das forças policiais. A elevação dos padrões de atuação dos seguranças particulares contribuirá para melhorar o serviço prestado aos clientes e reduzirá o número de incidentes fatais envolvendo seguranças, tanto como algozes quanto como vítimas. Um vigilante despreparado e não fiscalizado em sua atuação é um perigo para os clientes que contratam proteção, para a população como um todo e para si próprios, além de um mal negócio para as empresas de segurança. (...)”

4.6) Violência descontrolada - Segurança descontrolada Voltando a questão central, a elevação incontida da violência urbana tem gerado uma demanda por segurança privada. A ponto de criar um descontrole na oferta de serviços, o que vem incentivando o surgimento descontrolado de empresas clandestinas, incentivadas pelo alto custo dos serviços legalizados. E mais, na proporção em que se situa a segurança clandestina, temos, ao contrário, um regime de alastramento da violência, pois grande parte de seu efetivo situa-se na própria criminalidade.

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Há ainda, um intenso processo de responsabilização, inclusive de leigos, por atos e contratações muitas vezes impensadas e mal analisadas, que envolve principalmente o contratante tomador dos serviços, que deve, nesta era da responsabilidade, ser amplamente considerada. Segundo o já citado Paulo Portella1.

Nas médias e grandes cidades brasileiras, o quadro de insegurança, quer objetivo pelas altas taxas criminais que apresentam, quer subjetivo pela percepção da população para este fato e seus desdobramentos, conduz a um ambiente propício ao desenvolvimento da atividade da segurança privada. Isto acaba ocorrendo tanto através de empresas legalmente constituídas para operar nessa atividade, quanto de grupos ilegais e/ou despreparados que vendem a ilusão – a baixos preços é verdade – de que a ilegalidade e a impunidade podem contribuir para a manutenção da Ordem Pública e melhorar a qualidade de vida da população. Esses grupos formados, administrados e operados por policiais civis e militares, por militares, bombeiros militares, guardas municipais e agentes penitenciários, bem como por integrantes de corpos de vigilância orgânica de órgãos públicos e por leigos, atuam predatoriamente no mercado da segurança privada, sonegando impostos e taxas, ocupando postos de trabalho de pessoal qualificado, gerando insegurança e colocando o contratante desses serviços ilegais em posição perigosa, pois poderá levar empresa ou pessoa idônea, porém leiga, a processos judiciais de variadas naturezas, com conseqüências criminais e patrimoniais. Os grupos prestadores de segurança clandestina estão sujeitos no Rio de Janeiro à ação da DELESP/DPF (Delegacia de Controle da Segurança Privada / Departamento de Polícia Federal) e do DGAE/SSP (Departamento geral de Atividades Especiais / Secretaria de Segurança Pública), que poderão, no exercício de suas atribuições legais, reprimir a atividade destes grupos, bem como prender em flagrante qualquer pessoa que esteja prestando serviços de vigilância sem estar devidamente habilitada. Trata-se de violação do art. 47 da LCP – Exercício Ilegal de Profissão. Caso esteja armado, o clandestino também poderá ser penalmente responsabilizado (art. 10 da Lei n. 9.437 de 20 de fevereiro de 1997) e ainda vir a responder pelo crime de contrabando ou descaminho, caso a arma seja de procedência estrangeira. Ademais, pode ver sua situação piorada pela figura do concurso de pessoas (art. 29 do CP). O fato poderá ser agravado se a arma tiver procedência ilícita, sendo produto de roubo, furto, ou apropriação indébita, se for arma desviada das Forças Armadas por qualquer motivo ou arma de calibre proibido. Há ainda que ser considerado que esta atividade ilegal geralmente é exercida por mais de três pessoas, o que em tese, possibilita a aplicação do art. 288 do CP – formação de quadrilha ou bando. Os contratantes dos grupos clandestinos estão sujeitos a uma série de contratempos de natureza legal, como o vínculo trabalhista com os empregados desses grupos (Enunciado 331, item III, do TST) e impostos sobre o serviço (art. 9o do Decreto-Lei n. 406 de 31 de dezembro de 1968), constituindo-se ainda em sujeito passivo da obrigação tributária, na forma do art. 121, I e II do Código Tributário Nacional. Ficam ainda obrigados a reparar qualquer dano decorrente de ato ilícito praticado pelo grupo

1 - Gestão de Segurança – R. J. - 2003

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contratado, na forma do art. 159 do Código Civil, além da possibilidade de enquadramento penal por co-autoria, concurso material ou formação de quadrilha ou bando. (...) Outro problema referente ao tema ilegalidade diz respeito não ao mercado clandestino e ilegal, mas ao mercado ostensivo e regulado, tanto dos prestadores de serviços de segurança quanto dos seus contratantes. O tema refere-se à chamada terceirização. Neste campo, as irregularidades e omissões nos contratos para serviços temporários ou não, tem provocado problemas tanto para contratantes com para contratados. A terceirização tem sido vista como uma alternativa não só no Brasil mas também em outros países, e visa uma maior dedicação das empresas ás suas atividades-fim, ganhando assim flexibilidade para competir num mercado cada vez mais globalizado. A estratégia de algumas empresas prestadoras de serviços de segurança é oferecer para as contratantes de mão de obra cada vez mais barata e nem sempre qualificada, deixando de efetuar o pagamento dos direitos trabalhistas a seus funcionários. Neste ponto alegam a prestação de serviços temporários, os quais, pela legislação em vigor, só se caracterizam nos casos específicos de contratação para cobertura de férias ou licença maternidade de funcionários e, ainda, nas contratações com duração máxima de três meses, renováveis por igual período. Existe hoje uma tendência para aumentar a responsabilidade legal das empresas contratantes, face à freqüência com que as decisões judiciais reconhecem como sendo delas a responsabilidade final sobre o pagamento daqueles direitos, mormente os decorrentes de riscos presentes em ambientes de trabalho ou sobre medidas de proteção adequadas aos riscos presentes. Para evitar tais problemas, certos cuidados na contratação de empresas prestadoras de serviços de segurança podem minimizar ou até mesmo anular tais problemas. Quando da licitação ou da tomada de preços deve-se tomar o cuidado de especificar os serviços a contratar, o efetivo necessário, as funções a serem desempenhadas e a carga horária específica e total, estabelecendo que as propostas tenham como base esses dados. Deve-se ainda comparar as propostas oferecidas com o piso salarial da categoria, verificar a idoneidade das empresas proponentes, exigindo na entrega das propostas as certidões negativas de débito com o INSS, Receita Federal, prefeituras e FGTS, requerer cópia de contrato social e composição societária, bem como autorização para funcionamento da Polícia Federal e SSP. Deve-se ademais, informar-se junto aos sindicatos da categoria (patronal e laboral) e inserir no contrato cláusulas punitivas para casos de descumprimento do contrato, bem como exigência de garantias financeiras. Na execução do contrato, cabe o cuidado de monitorar as notas fiscais dos serviços prestados e verificar se a prestadora está em dia com o pagamento dos salários, encargos trabalhistas e demais benefícios. Finalmente, é necessário que tanto a empresa contratante como a contratada tenham presente que a relação contratual implica ligações e situações especiais que a legislação estabelece, tais como a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços no caso de inadimplência das obrigações trabalhistas e o vínculo direito com o tomador de serviços no caso de contratação irregular de mão-de-obra. A responsabilidade pelas medidas de prevenção de acidentes e doenças do trabalho é

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integrada por ambas as empresas e a empresa contratante tem obrigação de especificação e transmissão das informações sobre riscos presentes no ambiente de trabalho e das medidas de proteção adequadas.

A situação tornou-se tão gritante, que os meios de comunicação e entidades envolvidas apostam em números assustadores em se tratando da chamada “segurança clandestina”. Neste sentido, matéria publicada no Jornal da Tarde1 noticia, em suas chamadas, o seguinte:

“Exército de 300 mil faz segurança clandestina – Efetivo de cerca de 1500 empresas de segurança irregulares que atuam em São Paulo é mais que o dobro do número de policiais e pode estar empregando criminosos travestidos de vigilantes. – Quem contrata esse serviço corre um grande risco de estar contratando verdadeiros bandidos – A ineficiência do Estado criou brechas para os clandestinos – Quando o inimigo está ao lado vigiando sua casa.”

4.7) Possíveis soluções E, para conter a onda de clandestinidade, seria de se imaginar três soluções, duas delas impossíveis de se concretizar, pelo menos a curto e médio prazos. Logicamente, que a primeira solução seria elevar a quantidade e qualidade da segurança pública, a ponto de repercutir em uma sensível redução da criminalidade. Apesar dos reconhecidos esforços de nossos governantes, a realidade se mostra bem outra, sendo improvável que, a curto e médio prazo, o problema da segurança pública em nosso País seja solucionado, até porque encontra-se atrelado a fatores estruturais como a má distribuição de renda. Há ainda a verdade inconteste de que a vigilância intra-muros se faz necessária mesmo com altos índices de eficácia da segurança pública. A segunda solução, também impossível, pelo menos a curto e médio prazo, passaria por uma conscientização da sociedade, de que, como é verdade, a corrida desenfreada por segurança, a qualquer custo, acaba por gerar mais insegurança, de forma mesmo descontrolada como vem ocorrendo. E ainda, por que não dizer, que se esperar pelo desenvolvimento de uma consciência hoje inexistente sobre as necessidades e limites da segurança privada e dos conceitos de defesa aliados ao mercado, em uma sociedade que tende à social democracia. 1 – Jornal da Tarde – edição de 13.01.2001

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A questão, necessariamente, passaria por uma campanha publicitária bem elaborada e pela elevação dos níveis educacionais e culturais da população envolvida, esbarrando, mais uma vez, no efetivo custo da segurança privada e no desejo de lucro fácil dos pseudo-empresários. A curto prazo, no entanto, o que nos resta é cobrar das autoridades a efetiva fiscalização da atividade de segurança privada, que está a cargo, como já dito, do Departamento de Polícia Federal, vinculado a este Ministério da Justiça. Neste sentido, o mínimo que seria de se esperar seria a pronta fiscalização das denúncias apresentadas pela própria sociedade, em especial Federações e Sindicatos, e Associações de Empregadores e Empregados do setor, nos moldes do preceituado no Inciso I do Artigo 111 da Portaria 992, quanto às “empresas clandestinas”, ou outras modalidades atuando sem os requisitos legais. No entanto, como é notório, a fiscalização da Polícia Federal, por absoluta falta de efetivo e recursos, não tem sequer funcionado, quanto mais feito frente ao contingente avassalador de ilegalidades. Neste diapasão, conforme retratado e noticiado no Jornal da Tarde1:

“A Polícia Federal, no entanto, no momento pouco pode fazer para coibir a expansão das empresas de segurança clandestinas. O efetivo da Delegacia de Controle de Segurança da PF tem 11 agentes. Só que alguns estão em férias, outros fazem serviços burocráticos e os três encarregados da fiscalização das empresas de segurança foram deslocados para reforçar a vigilância no aeroporto de Guarulhos depois dos ataques terroristas nos Estados Unidos, em 11 de setembro do ano passado. Hoje, o Delegado Gesival Gomes de Souza conta com apenas cinco homens, sendo que um deles fica fora das investigações para se encarregar da escolta de presos. Nessa Delegacia da Polícia Federal, as 320 empresas de segurança e as mais de 800 de segurança orgânica, como são denominados as indústrias, comércio e bancos que mantém corpos próprios de vigilantes, tem de apresentar documentos para a expedição de autorização de funcionamento, válida por um ano. No momento da renovação da autorização, segundo o delegado, os agentes costumam fazer uma vistoria na sede da empresa. Nessa fiscalização, verificam se ela conta de acordo com a 7.102/83, com um mínimo de 30 vigilantes, se o armamento está guardado em local adequado, se os revolveres, pistolas e espingardas estão legalizadas e se os equipamentos de comunicação estão autorizados a funcionar pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

1 – Jornal da Tarde – edição de 13.01.2001

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“Já pegamos armas duplicadas, com numeração raspada e mesmo armas que deveriam ainda estar nas lojas porque a documentação ainda não estava regularizada” conta o delegado Gomes de Souza. “E isso nas empresas autorizadas”. O policial federal conta que antes de a equipe de repressão às clandestinas ser deslocada para o aeroporto, a PF desativava cerca de quatro empresas por semana. Agora, além da falta de efetivo para fazer o trabalho, o delegado tem mais duas dificuldades; as sedes das empresas clandestinas mudam com freqüência e ele mantém centenas de denúncias à espera de investigação.” (...) Quem contrata os serviços de uma empresa clandestina também pode ajustar contas com a PF por cumplicidade em uma atividade ilegal. “Além disso, quem contrata esses serviços, corre o risco de estar contratando bandidos”, alerta o delegado federal. Criminosos travestidos de vigilantes podem usar o trabalho como “olheiros” de seqüestradores e ladrões. De um posto privilegiado, conhecem os hábitos de empresários ou de moradores de um condomínio e repassam as informações para os criminosos”

Em conclusão, e tomando como exemplo a Cidade de São Paulo, temos que o efetivo hoje atuante da Polícia Federal, no que se relaciona com a fiscalização da atividade de vigilância e segurança privadas, não é suficiente ao menos para lidar com a vigilância legalizada. E é mesmo somente isso, como já reportamos, que a Polícia Federal parece que tem feito, a julgar pelo quadro de atividades divulgado pelo SISVIP (Sistema Nacional de Segurança e Vigilância Privada).

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Como veio retratar polêmica reportagem publicada pela Revista Carta Capital1, analisando irregularidades e conferindo pareceres absolutamente distantes e despreocupados da Polícia Federal.

“A verdade é que a PF pouco sabe das empresas além da ficha cadastral preenchida pelas próprias firmas.”

Toda a clandestinidade, portanto, age livremente, sem qualquer empecilho, e a Polícia Federal sequer consegue contatar e advertir os clientes contratantes dos serviços ilegais, para que possam tomar ciência dos riscos que estão correndo e das responsabilidades que possuem. Diga-se que somente tal providência, já serviria a reduzir a atividade clandestina. A situação é ainda melhor visualizada na análise do parecer já citado, do próprio Delegado Federal Gesival Gomes de Souza1, onde narra com clareza, apresentando inclusive números, conforme transcrito abaixo:

“(...) A questão da fiscalização das atividades dos seguranças clandestinos não tem sido esquecida pelo Departamento de Polícia Federal, mas muito pouco se tem feito em

1 - Carta Capital, Ed 19.02.2003 – pág. 28 1 – Trabalho de divulgação interna e estudos da Delesp

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face da carência de efetivo policial nas Delesp’s e Comissões de Vistorias em todo o Brasil. Em São Paulo o número de seguranças clandestinos é demasiadamente elevado, entretanto, a Delesp possui, atualmente, 05 (cinco) agentes para exercer toda a atividade do Setor Operacional, que vai desde a realização de vistorias em aproximadamente 4.000 (quatro mil) estabelecimentos financeiros, vistorias em aproximadamente 1.000 (mil) empresas orgânicas e 400 (quatrocentas) empresas de segurança, o que é matematicamente impossível!! Desta forma, uma eficaz fiscalização e repressão à clandestinidade fica prejudicada, haja vista serem as vistorias atividade vinculada do Estado, pois, decorrem do recolhimento de taxas e exigem a contraprestação do serviço pago. Em São Paulo, foi iniciado um trabalho de levantamento de possíveis empresas que se utilizam de serviço de segurança clandestina, tendo se chegado a um número aproximado de 5.000 (cinco mil). Iniciada operação policial para coibir a clandestinidade, com uma equipe composta de viatura ostensiva e dois agentes, não se pode dar continuidade aos trabalhos em face do desmantelamento do Setor de Operações, com a retirada de 05 (cinco) Agentes de Polícia Federal. Atualmente, a Delesp encontra-se aguardando a elaboração de concursos e nomeação de Policiais Federais, para recompor seu efetivo e reiniciar o combate às clandestinas. (...)”

As condições descritas, segundo nos parece, são as mesmas em todo o Estado de São Paulo, como é o caso de Jundiaí, Ribeirão Preto e Campinas, esta última constantemente e cada vez mais apontada como centro da criminalidade paulista. E mais, nos poucos casos em que a fiscalização atua, sua atividade não se mostra efetiva, em face de ausência de continuidade no procedimento e em vista também de limitações legais. É o que se depreende do relato de Carlos Mautitônio Nunes1, com a experiência de anos na fiscalização do Departamento de Polícia Federal: “Ora, o agente investiga, colhe as provas, autua, é determinado o encerramento das atividades, mas, no entanto, o infrator não cumpre, desobedece, e o máximo que vai responder é a um inquérito, que para ser decidido levará um bom tempo, sendo que a prescrição pode ocorrer e o infrator nem punido será. O agente fiscalizador, no entanto, observa que a cada dia ele embolsa o dinheiro que seria ou de impostos ou do trabalho dos funcionários e, o que é mais ultrajante, ainda pode influenciar para prejudicar o agente fiscalizador.”

1 - Vigilância Patrimonial Privada – Comentários à Legislação – págs. 421/422

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“Temos experiência vivida para relatar que diante de tal situação, esse infrator, que é orientado sobre quais as possibilidades de punição que teria (ou seja, quase zero), perde totalmente o escrúpulo e começa a visar somente o que pode ganhar, enquanto a situação perdurar. Aí é que ele explora mesmo seus empregados, deixando de pagar o salário em dia, as horas extras, não recolhe qualquer tipo de imposto e espera o melhor momento para deixar a firma quebrar, pois nem os direitos que seus ex-funcionários reclamam na justiça terão condições de ser pagos. Desaparece por um tempo e depois monta outro tipo de negócio ou até mesmo volta para a área de segurança privada.” “No entanto, com tal atitude o infrator coloca em risco a credibilidade de empresas que passaram anos investindo na prestação do serviço de segurança privada e também do órgão fiscalizador. Está em jogo não só o conceito de terceirização do serviço de segurança privada como também a efetiva capacidade de existir um órgão fiscalizador que faça cumprir a legislação.” “Tem ocorrido, também, que tais infratores recorrem à justiça para questionar a validade do ato de encerramento. Apesar de haverem vários mandados de segurança cassados, no entanto, alguns juízes de primeira instância ainda concedem liminares quando infratores recorrem da decisão tomada pelo órgão fiscalizador.” “Utilizam um argumento que é pouco convincente. O de que sua empresa gera empregos e, se for fechada, de certa forma, aumentará a crise social. Pura balela. Na realidade, sua empresa está gerando empregos ilegalmente. Guardadas as devidas proporções, é o mesmo que um cidadão não médico montar uma clínica e oferecer trabalhos a enfermeiras e utilizar o mesmo argumento para com elas. Ora, não se pode permitir que o infrator continue a efetuar a profissão sem ser qualificado, colocando em risco a vida de terceiros somente para resquardar o que seria de interesse dos funcionários. Mentira. Ele esta usando os outros em benefício próprio. Já pensaram então um traficante pedindo para continuar com o tráfico, pois dá empregado aos seus soldados, ou aos seus entregadores de drogas?” Sendo assim, a conclusão óbvia é de que carecemos, de imediato, de maior fiscalização na área da segurança privada, e que mesmo a fiscalização que temos mostra-se ineficaz para coibir a ilegalidade praticada. É necessário impedir a expansão da clandestinidade, fazendo com que as empresas do setor cumpram as regras específicas existentes, que são essenciais para a proteção da população. As próprias empresas legalizadas, sem dúvida, necessitam de melhor fiscalização, já que é comum que trabalhem em parte legalizadas e em parte ilegais, utilizando a parte legal como fachada. Isto é inegável. E, para o incremento de tal fiscalização, é essencial o aumento do contingente de agentes federais, assim como o incremento da estrutura existente. Sobre o custeio da maior fiscalização, e conforme já dissemos, por primeiro, há que se argumentar que tal atividade é obrigação pública, para a qual são recolhidos os impostos. Além disso, como também já dissemos, o setor gera divisas oriundas de taxas de serviços. São cobradas as avaliações e fiscalizações

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para a concessão e renovação de autorizações, aprovações de planos de segurança dos bancos e outras; isso sem se falar nas multas cujo campo de aplicação é vastíssimo. Logicamente que caso fosse incrementada a fiscalização, seria gerada uma renda proveniente de outras multas aplicadas, criando um mecanismo auto-sustentável. Dados mais recentes, indicam que somente no Estado de São Paulo (maior arrecadador), houve arrecadação administrativa (taxas de vistoria de instalações e veículos, inclusive de entidades financeiras, renovação de certificados, alvarás de funcionamento, carteiras nacionais dos vigilantes, etc.), entre janeiro e dezembro de 2.002, de cerca de R$.10.000.000,00 (dez milhões de reais), recursos estes que poderiam estar sendo aplicados na gestão e consecução de fiscalização e coordenação efetivas. Logicamente, mais uma vez, temos que o fomento da atividade de fiscalização virá certamente gerar mais recolhimentos de taxas e aplicação de multas, o que se traduz em procedimento auto-sustentável. A longo prazo, a solução seria a conscientização, pela sociedade e por suas instituições, da importância da atividade de segurança privada, da responsabilidade envolvida, do grau de treinamento e preparo psicotécnico e psicológico exigido para o exercício do cargo, bem como da necessidade da função estar atrelada a uma remuneração compatível à confiança, responsabilidade e preparo que são esperados, e do empenho de fiscalização a ser exigido.

Além disso, o incremento de políticas de segurança pública eficazes, eliminariam focos de demanda atrelados a situações corriqueiras; e é indubitável que a própria legislação sobre segurança privada deve ser atualizada e aprimorada, inclusive com a transformação de algumas portarias em lei, sabendo que para isso é necessário um grande empenho do legislativo.

4.8) Mundo (im)possível - A ética nos serviços de segurança

Somente assim, com a alteração profunda da estrutura da segurança

privada, que constitui poder decorrente do re-direcionamento de atividade estatal, poderemos esperar das empresas a criação de condições legítimas de proteção da comunidade, e aos profissionais para o cumprimento das mais avançadas normas de cunho mundial de conduta, como a resolução 17 da ONU, a seguir transcrita.

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CÓDIGO DE CONDUTA PARA FUNCIONÁRIOS ENCARREGADOS DE FAZER CUMPRIR A LEI (Resolução de 17 de dezembro de 1979, da Assembléia Geral das Nações Unidas):

1. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei cumprirão, em todos os

momentos, os deveres que lhes impõe a mesma, servindo a sua comunidade e protegendo todas as pessoas contra atos ilegais, em concordância com o alto grau de responsabilidade exigido por sua profissão.

2. No desempenho de suas funções, os funcionários encarregados de fazer cumprir a

lei respeitarão e protegerão a dignidade humana, e manterão e defenderão os direitos humanos de todas as pessoas.

3. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei poderão usar a força apenas

quando seja estritamente necessário ou na medida em que o requeira o desempenho de suas tarefas.

4. As questões de caráter confidencial que tomam conhecimento os funcionários

encarregados de fazer cumprir a lei serão mantidas em segredo, salvo se o cumprimento de dever ou necessidade de justiça exijam estritamente o contrário.

5. Nenhum funcionário encarregado de fazer cumprir a lei poderá infligir, investigar

ou tolerar ato de tortura ou outros atos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes, nem invocar a ordem de um superior ou circunstâncias especiais, como estado de guerra ou ameaça de guerra, ameaça à segurança nacional, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública, como justificativa para a tortura ou outros atos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes.

6. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei assegurarão a plena proteção

da saúde das pessoas sob sua custódia e, em particular, tomarão medidas imediatas para proporcionar cuidados medidos aos necessitados.

7. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei não cometerão nenhum ato de

corrupção. Opor-se-ão também rigorosamente a todos os atos dessa índole e os combaterão.

8. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei respeitarão a mesma e o

presente código. Farão também o que estiver ao seu alcance para impedir qualquer violação a eles e opor-se-ão rigorosamente a tais violações. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei, que tenham motivos para crer que há ou haverá violação ao presente código, informarão o fato a seus superiores e, se for necessário, a qualquer outra autoridade ou organismo apropriado que tenha atribuições de controle ou corretivas.

9. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei que, ao observar as

disposições do presente código, romperam os limites da mesma devido a uma avaliação errônea, desde que honrada e consciente, darão direito a toda proteção que proporciona a legislação nacional.

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10. Os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei, que cumprirem as disposições

do presente código, merecerão o respeito, o total apoio e a colaboração da comunidade e dos organismos de execução da lei em que prestam seus serviços, assim como dos demais funcionários encarregados de fazer cumpri-la.

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CONCLUSÃO Conforme vimos, trata a segurança privada de transferência do uso lícito da força do estado ao particular. É prestada por empresas especializadas ou por departamentos constituídos em empresas de outros setores da atividade (segurança orgânica). Não há a modalidade de serviço autônomo, e nem mesmo pode ser prestado por intermédio de cooperativas. A regulação, hoje, se dá inclusive para a atividade do prestador, e não da função exercida. Deve ser sempre intra-muros (privada), com exceções para o caso de segurança pessoal (guarda-costas) e transporte e custódia de valores. É obrigatória apenas no que se refere ao setor financeiro, sendo opcional nos demais casos, embora a realidade mostre que os serviços estão amplamente alastrados. Em face de sua natureza, deve sujeitar-se a regras rigorosas e fiscalização contundente, que é realizada pela Polícia Federal (acoplada ao Ministério da Justiça). Os próprios profissionais tem que ter formação e preparo físico e psicológico específicos. É um setor, portanto, de regras próprias, nem sempre conhecidas, e que exige absoluto controle. No entanto, temos que o setor encontra-se amplamente desorganizado e descontrolado em nosso País. Cresceu demasiadamente, ocupando espaços vazios deixados pela segurança pública, aproveitando o movimento de expansão dos serviços privados e terceirizados, de forma visivelmente elitizada no topo da pirâmide social, e, de forma confusa, em todos os setores, até mesmo nos mais miseráveis, como aliado da sensação de insegurança, muitas vezes imaginária. Do ponto de vista profissional e trabalhista, os direitos das categorias ainda são escassos, com remuneração baixa, baixo índice de conquistas, constante lesão de trabalhadores por empresas terceirizadas e fraudulentas, concorrência desleal de “policiais biqueiros”, amplo e efetivo desvio funcional, inadimplemento constante de verbas e direitos, inclusive com participação do setor público, péssimo contratante e mal pagador, que hoje representa grande parcela da demanda por serviços. Ao mesmo tempo, a regime de utilização dos serviços (24 horas por dia), a utilização dos mesmos por quem originariamente não deveria ou poderia utilizar, e o excesso de encargos acabam por maltratar mais ainda o setor, empurrando-o para a clandestinidade e para o inadimplemento das obrigações. Do ponto de vista legislativo, o setor conta com uma legislação razoável, mas desatualizada, que tem problemas de inconstitucionalidade em face da emissão descontrolada de portarias, e vive as agruras da ausência de punição dos crimes e da concorrência a preços inexeqüíveis da lei de licitações públicas.

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Mas o pior fator é mesmo o da fiscalização. As penalidades aplicadas são fracas, e caem no vazio em face da nossa legislação penal. Não há efetivo suficiente nem mesmo para o controle do setor legalizado. Os recursos administrativos auferidos não são aplicados no setor. Existe ainda o problema da corrupção. Quem perde com tudo isso, é o cidadão, que tem uma segurança, tanto pública quanto privada, ineficaz e mesmo perigosa. Em grande parte dos casos, no que se refere ao setor privado, a busca de segurança acaba por gerar mais insegurança. Em um ambiente tão desorganizado e mesmo promíscuo, fica difícil engendrarmos uma solução efetiva, já que esta seria de longo prazo e multifacetada. Concluímos no entanto por algumas providências, de curto e de longo prazo, que poderiam melhorar o ambiente, que são as seguintes. A conclusão óbvia é de que carecemos, de imediato, de maior fiscalização na área da segurança privada. É necessário impedir a expansão da clandestinidade, fazendo com que as empresas do setor cumpram as regras específicas existentes, que são essenciais para a proteção da população. As próprias empresas legalizadas, sem dúvida, necessitam de melhor fiscalização, já que é comum que trabalhem em parte legalizadas e em parte ilegais, utilizando a parte legal como fachada. Esta fiscalização deve ser realizada também nos aspectos trabalhistas e tributários, já que grande parte do problema se atrela a natureza dos serviços terceirizados. Para o incremento de tal fiscalização, no que pertine ao Departamento de Polícia Federal, é essencial o aumento do contingente de agentes federais, assim como o incremento da estrutura existente, e o desenvolvimento de um gerenciamento do trabalho. Para o custeio da maior fiscalização, por primeiro, há que se argumentar que tal atividade fiscalizadora é obrigação pública, para a qual são recolhidos os impostos. Além disso, o setor gera divisas oriundas de taxas de serviços. São cobradas as avaliações e fiscalizações para a concessão e renovação de autorizações, aprovações de planos de segurança dos bancos e outras; isso sem se falar nas multas cujo campo de aplicação é vastíssimo. Logicamente que caso fosse incrementada a fiscalização, seria gerada uma renda proveniente de outras multas aplicadas, criando um mecanismo auto-sustentável. E é óbvio que os valores arrecadados devem ser rigorosamente aplicados no setor.

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No aspecto trabalhista, é patente que a organização da atividade iria reduzir a clandestinidade e a ilegalidade. Reduzindo a clandestinidade e a ilegalidade, haveria ganho na arrecadação de impostos. Haveria economia também na melhor regulação das políticas de licitações públicas, já que as propostas inexeqüíveis que vem sendo aprovadas geram amplos prejuízos ao erário. Outra questão a ser tratada seria a exigência de depósitos e patrimônio para o funcionamento de empresas terceirizadas, que muitas vezes lesam os direitos dos trabalhadores. E isso somente se faz por intermédio de lei. Uma lei, também, que regulasse os requisitos da função do vigilante ou segurança privado, seria bastante útil, sendo de se declarar que existe projeto nesse sentido em tramitação no congresso. A longo prazo, a solução seria a conscientização, pela sociedade e por suas instituições, da importância da atividade de segurança privada, da responsabilidade envolvida, do grau de treinamento e preparo psicotécnico e psicológico exigido para o exercício do cargo, bem como da necessidade da função estar atrelada a uma remuneração compatível à confiança, responsabilidade e preparo que são esperados, e do empenho de fiscalização a ser exigido.

Além disso, o incremento de políticas de segurança pública eficazes, eliminariam focos de demanda atrelados a situações corriqueiras. A conscientização da natureza e importância do setor, sem dúvida, é o foco que motivará as mudanças necessárias, e que poderá gerar um ambiente de efetiva segurança.

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