Monografia Cinema Nazifascista

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ CURSO DE BACHARELADO EM CINEMA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO O IMPÉRIO IDEOLÓGICO CHEGA ÀS TELAS: A discussão acerca dos cinemas nazi-fascistas e a manipulação hipnótica de valores Paulline Röedel ORIENTADOR: Profa. Luciene Setta Rio de Janeiro, novembro de 2015

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Trabalho de conclusão de curso relacionado a discussão do cinema nazifascista e as novas mídias.

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ CURSO DE BACHARELADO EM CINEMA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

O IMPÉRIO IDEOLÓGICO CHEGA ÀS TELAS: A discussão acerca dos cinemas nazi-fascistas e a manipulação hipnótica de valores

Paulline Röedel

ORIENTADOR: Profa. Luciene Setta

Rio de Janeiro, novembro de 2015

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PAULLINE RÖEDEL

O IMPÉRIO IDEOLÓGICO CHEGA ÀS TELAS: A discussão acerca dos cinemas nazi-fascistas e a manipulação hipnótica de valores

Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Faculdade de Cinema da Universidade Estácio de Sá do Rio de Janeiro, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Cinema.

Orientadora: Luciene Setta

Rio de Janeiro

2015

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PAULLINE RÖEDEL

O IMPÉRIO IDEOLÓGICO CHEGA ÀS TELAS: A discussão acerca dos cinemas nazi-fascistas e a manipulação hipnótica de valores

Trabalho apresentado como requisito para a Conclusão do Curso de Bacharelado em Cinema da Universidade Estácio de Sá.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________

Profa. Luciene Setta (orientadora)

Universidade Estácio de Sá

______________________________________

Prof. Fabio Regaleira

Universidade Estácio de Sá

______________________________________

Profa. Silvia Oroz

Universidade Estácio de Sá

Rio de Janeiro, ____ de____________ de 20__

Page 4: Monografia Cinema Nazifascista

DEDICATÓRIA

Agradeço a compreensão e

paciência de todos os mestres que

cruzaram meu caminho durante a jornada

desta graduação, mas desejo agradecer

sobretudo a minha mãe, que esteve por

perto e me auxiliando em todos os

momentos.

Page 5: Monografia Cinema Nazifascista

AGRADECIMENTOS

Começo por agradecer o primeiro a ajudar neste caminho, a professora

orientara Luciene Setta, pela atenção e paciência em enxergar o melhor do trabalho,

aos demais professores que estiveram à disposição nestes quatro anos, em especial

ao Fabio Regaleira e Silvia Oroz que compõem a banca.

Aos professores entrevistados deixo meu mais sincero agradecimento, James

Stirling, Roberta Linhares e Sara Zarucki já que a pesquisa não seria a mesma sem

sua contribuição e dedicação e por fim, presto minha homenagem aos

coordenadores de curso Gisele Barreto e Paulo Ribeiro pela atenção e

disponibilidade sempre.

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Epígrafe

“Eu sempre achei mais fácil

convencer uma grande massa do que

uma só pessoa.”

Benito Mussolini

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RESUMO

A massificação provem de uma estratégia de comunicação antiga e

fundamentada que pode ser evidenciada desde os primórdios da história humana. O

governo pela dominação e os Estados autoritaristas dão vazão ao conceito do

estado tentacular de Foucalt, ou seja, a sociedade da vigilância. A estratificação

social se inicia pela ampla disseminação destes ideais fundamentais ao domínio de

determinado grupamento politico, partindo para como o próprio Hitler cita, uma

repetição incessante de suas crenças buscando a fixação por esgotamento sobre a

população, nesta fase encontra-se uma ferramenta de comunicação em massa

extremamente eficiente que pode camuflar-se sobre o égide de entretenimento: o

cinema. Logo a discussão acerca dos cinemas nazi-fascista que apresentam o

expoente mais nítido de dominação politica na sétima arte (mas que destaque-se,

não são os únicos) se faz necessário como forma de conhecer os artifícios da

imposição e principalmente, manipulação ideológica e ainda, destacar momentos

chave e relacionados a este mesmo tipo de ação manifestado durante a pós-

modernidade na era digital. O advento da comunicação e a transformação da

sociedade em aldeia global foi indiscutivelmente um grande avanço social e

tecnológico, porem com a interação instantânea e o diverso fluxo de informação a

disseminação de ideologias autoritárias também foi facilitado e adquiriu novas

facetas, logo em um ambiente atual de crise econômica, distribuindo desemprego e

situações alarmantes inclusive nos países centrais, a exclusão e o radicalismo

mostram-se novamente como opções válidas diante do desespero de algumas

populações, haja visto o aumento significativo da participação dos partidos de

extrema-direita no cenário politico internacional (destaque para França e Alemanha)

e inclusive em território nacional. Desta maneira, se faz necessária a extensa

investigação e questionamento de tais preceitos, através de uma revisão e avaliação

histórica além da aplicação de fato, nas mídias digitais.

Palavras-chave: regime autoritário; cinema nazi-fascita; manipulação

ideológica; meios de comunicação em massa; mídias digitais.

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ABSTRACT

The massification point comes thru an old and based communication strategy

that can be seen since the beginning of time and human history. The act of governing

using force and domination and the far-right State show the depth of the concept of

the “Octopus State”, or better saying the vigilance society. The social division begins

with the mass adoption of these ideals which are fundamental to the domination and

success of this special political group, using as the own Hitler himself thought, the

same repetition of believes over and over again until the population accepts it and

thinks it’s alright. In this phase, a very useful communication tool is applied, under the

entertainment disguise: the cinema. Soon, the discussion about the nazi-fascist

cinema presents the most exposed way of the political manipulation and above all,

domination in the seventh art (but these are not the only ones thou) where it makes

so urgent an investigation, research discovering the undercover methods of

ideological manipulation and besides, digging key moments related to this same kind

of behavior during the digital era in modern age. The gift of mass communication and

the society transformation into a global center were definitely a great social and

technological advance, although the one touch contact and the mass information

waves, helped the dissemination of the far-right ideas which gained new faces, soon

in a world endorsing a financial crisis, maintaining high levels of unemployment and

deep concerns including the developed countries, the exclusion and radicalism are

seen as options faced the despair growing in some populations, these can be seen

thru the increasing participation of the far-right parties in the European scene (as

Germany and France) and includes Brazil too. For all those motives said above, it’s

necessary a long investigation and reaction to these ideals, using a historical

analysis without forget the use of the digital media itself.

Key words: far-right system; ideological manipulation; nazi-fascist cinema ;mass

communication; new media

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 11

2 CAPÍTULO 1: A dominação ideológica histórica (os 4 pontos de

segurança: o medo, a sexualidade, a apropiração psicológica e a guerra) ....... 15

2.1 A manipulação nos primórdios do cinema.........................................................15

2.2 A punição pela sexualidade e a remoção do desejo............................................17

2.3 O brilho político de Hollywood..............................................................................22

2.4 A corrida armamentista nas telas.........................................................................24

3 CAPÍTULO 2: A consciencia de um organismo vivo e o desfacelamento do

cinema nazi-fascista ............................................................................................... 26

2.1 O trabalho de Kracauer e a sensibilidade cognitiva da vanguarda....................26

2.2 O cinema nazi-fascista.........................................................................................31

2.3 Obras primas e a importancia na guerra ideológica.............................................39

2.4 Heranças e a preservação de arquivo..................................................................44

4 CAPÍTULO 3: A paradoxal relação da satirização do domínio e a confluência

de informações das mídias digitais........................................................................47

3.1 Constituição da aldeia global, multiplicidade e a perda da aura da geração

Youtube......................................................................................................................47

3.2 A consolidação das novas midias e a incitação da intolerancia virtual, os reflexos

da narrativa nazi-fascista...........................................................................................52

3.3 Facilidade da disseminação ideológica e a criação de falsos profetas do

anonimato...................................................................................................................55

3.4 A prospecção de novos apoiadores e o combate virtual......................................60

4 CONCLUSÃO ................................................................................................... 62

5 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 64

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ANEXO A .......................................................................................................... 65

ANEXO B .......................................................................................................... 66

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1. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa de monografia se dedica a abordar a temática

relacionada aos cinemas nazifascistas de cunho altamente politico e de dominação

ideológica, desde os primórdios desta manifestação narrativa partindo do

nascimento da sétima arte como forma de exemplificar e compreender a fundo as

motivações seguidas por tal tipo de inserção doutrinadora (neste aspecto não

destacam-se somente as ideologias de ultradireita nacionalistas mas também

propostas ideológicas supostamente “livres” e de alçada capitalista) a partir de uma

construção de análise histórica detalhada, seguindo-se do cinema presente na

República de Weimar e todo seu contexto pré e pós-guerra, analisando suas

características mais intrínsecas e obscuras a fim de se determinar seu poderio e

origem não só como forma de corrente filosófica mas também de aspectos e

apurações técnicas como as abordagens adotadas pela sua consequente fotografia,

roteirização e montagem com o propósito de tornar o cinema uma poderosa arma

ideológica de massa. Neste parâmetro se fazem presentes o conceito do

inconsciente coletivo ainda que não fortemente colocado de forma analítica e

também a suposta presença de um organismo vivo dentro das artes, como feito a

partir do expressionismo alemão e sua concretização de vanguarda.

Este roteiro de pesquisa possui o objetivo de admitir as características e

consequências sociais e históricas da adoção desse tipo de funcionalidade politica,

utilizando-se do cinema para expor suas virtudes psicológicas mais profundas e com

isto, possibilitar a realização de uma analise e pesquisa que contemple não somente

uma visão histórica distanciada ou extensiva analise de dados sem a total

compreensão psicológica do período, mas sim a premissa de uma analise que

contemple a ótica viva e orgânica do cinema, entendo sua totalidade com uma breve

analogia de um organismo realmente vivo com sentimentos e antecipações que se

refletiram em sua forma de narrativa, com uma espécie de pressentimento baseado

no grande arquivo do inconsciente coletivo capaz de aguçar sua percepção para a

mudança do cenário político-social na Europa da década de 30. Da mesma forma

que décadas depois a grande rede mundial de computadores traria a tona o maior

banco de dados e interconexão já vistos, perpetuando a ideia de McLuhan da aldeia

global, onde o intenso fluxo de mídia e informações carregam consigo uma grande

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carga histórico-cultural de memória e pode da mesma forma reascender antigas

discussões e preceitos, entretanto em um mundo pós-moderno em constantes crises

cíclicas da economia, o reavivamento das propostas ultranacionalistas retornam ao

campo das discussões populares. Entender novos pontos de vista, ou pelo menos

conhecê-los, constitui uma parte muito importante do nervo curioso do pesquisador,

já que a adoção e ampliação de diferentes diretrizes metodológicas constrói a

possibilidade de outros caminhos científicos e o melhor entendimento da cultura e

sentimento do outro.

A questão-chave abordada nesta monografia é fundamentalmente como os

conceitos de ultradireita se manifestaram no cinema e refletem de maneira direta

nas novas mídias?

Diversos teóricos tocaram neste cerne para discutir o papel do cinema

nazifascista tanto da ótica histórica como filosófica, dentre todos se destaca o não

tão reconhecido nacionalmente Siegfried Kracauer, advindo da Escola de Frankfurt,

assim como Benjamin e Adhorno adepto da Teoria Crítica, trabalhando o viés social

da obra de arte e o sentimento envolto na depressão do momento pré-guerra na

Alemanha de Weimar, onde “... ao expor a alma alemã, o cinema pós-guerra parecia

insistir em acentuar seu caráter enigmático. Macabro, sinistro, mórbido eram os

adjetivos preferidos para qualificá-los.” (KRACAUER, 1947)

Ainda neste mesmo parâmetro, o objetivo primordial da pesquisa foi

constituir-se não somente das próprias conclusões nem muni-la de citações outrora

empregados com frequência neste tema, mas sim formar sua base de construção e

apoio visceral em experiência e depoimentos relatados por estudiosos da área

somados ao ensinamento angariado através da extensiva revisão bibliográfica

consultados na abordagem previamente selecionada para o desenvolvimento do

trabalho acadêmico. No entanto, vários outros segmentos e abordagens foram

relatados na concepção do estudo dos cinemas nazifascistas, partindo de uma

aproximação da vertente crítica e analise psicológica como Kracauer e por

pressuposto a vertente escolhida, ou como outros autores que seguem uma linha

história de forma descritiva e narrativa dos fatos dentro do cinema ou a extensa

exploração a partir das teorias de comunicação de massa e a correlação com a

Teoria Hipodérmica por exemplo.

Neste caminho, algumas hipóteses e premissas foram levantadas seguindo a

vastidão da analise em que se inicia uma pesquisa de ordem cronológica e fomento

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histórico destacando seus acontecimentos na ordem de acontecimento e com isto,

se exaltando sua importância e contribuição para o quadro que se formaria na

Europa na década de 30, preparando o cenário com tecnologias e estratégias já

acertadas de doutrinação em massa e a catalisação dos sentimentos aflorados da

população diante do cenário de total desconstrução econômica, para isto, a breve

citação da motivação e criação do próprio cinema traçam o primeiro capitulo deste

enredo, seguindo-se pelas politicas de censura, o corte violento dos impulsos e

desejos carnais humanos para a supressão da identidade e a preparação da cena

completa para a imposição dos partidos de ultradireita, após sua conceituação e

paradigmas desmistificados, o ponto de partida passa a ser a confluência destas

ideologias na era digital da informação e a disseminação instantânea de informação

de maneira a compreender como fenômenos ideológicos como os observados

anteriormente podem se manifestar em meio ao intenso fluxo de comunicação

alimentado pela internet.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de sintetizar a história

cinematográfica na virada do século e o surgimento da arte propriamente dita a partir

da invenção dos irmãos Lumiere e a adoção da narrativa como forma de expressão

e impressão de cunho ideológico ao espectador, utilizando-se do teorema de 4

pontos de segurança para a completa massificação, começando pelo medo e a

degradação do status quo através dos boatos e relatos inventados que usufruem

dos estereótipos para adquirir certa credibilidade, a punição e abafamento da

sexualidade, ante forma de punição e a perda de virtude, banalizando a liberdade de

escolha e a livre manifestação de impulsos naturais, transformando-se em pecado

ou impureza associado a dominação imposta pela censura, após a supressão do

sentimento e manifestação do Ego a apropriação pelo sistema torna-se muito mais

fácil e consolidado dentro do ideário social, que aceitando as imposições e

depredações impostas, tornam-se um receptáculo livre e repleto de revolta para a

aglutinação de novas ideologias e com o ganho e ampla adesão da massa ao

sistema, a guerra torna-se então, o ultimo passo vital para o sucesso da liderança

totalitária.

No Capítulo 2, seguindo a ordem cronológica é adentrado o espaço europeu

e as manifestações artísticas advindas do trauma da guerra anterior e o nascimento

do cenário propicio à origem dos partidos nacionalistas e a ditadura da intolerância,

desta forma são apresentados e discutidos os conceitos e apropriações do cinema

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nazifascista e a magnitude da sua atuação, a partir das artimanhas narrativas e

mercadológicas do Estado. Uma explicação acerca dos atributos técnicos como

estilo, enredo, fotografia e estúdios também é colocada em discussão assim como

suas principais obras remanescentes e a herança deixada pelo mesmo.

No Capítulo 3, a abordagem passa a analisar a relação entre as ideologias e

ferramentas do cinema totalitário com a internet na era das mídias digitais e a

disseminação de ideias constante. Tida como território amplo e incomensurável a lei,

a rede tornou-se um portal fundamental para a circulação de informações a nível

global e constitui uma cadeia de vital importância para todos os aspectos da

sociedade, desta forma, cabe também observar como um sistema de dominação em

massa de tal maneira que foi o cinema se manifesta e proclama nos tempos atuais,

a fim de descobrir qual o limite da liberdade de expressão e manifestação

interpessoal a favor dos sistema totalizantes.

Portanto, o presente trabalho visa traçar uma linha histórica dos

acontecimentos de maior destaque a partir do surgimento do cinema e a sua

configuração em arte e método de comunicação sob o égide sentimental e descrição

comparável a um organismo vivo diretamente ligado ao inconsciente coletivo e não

somente através da ótica distanciada do puro estudo histórico, antever reações que

mudariam o curso da história e a maneira como o mesmo foi concebido é a mais

vital analise proposta por este trabalho, o reconhecimento da narrativa e o sucesso

da dominação ideológica presente na mídia e cada vez mais forte nos dias atuais é

somente mais uma das intrigantes consequências esquematizadas pela propaganda

dos governos totalitários europeus, logo se faz necessário um profundo

desmantelamento de seu modus operandi para evitar e impedir que um cenário

como o visto antes possa vir a se repetir.

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2. CAPÍTULO 1: A dominação ideológica histórica (os 4 pontos de

segurança: o medo, a sexualidade, a apropiração psicológica e a guerra).

2.1 A manipulação nos primórdios do cinema.

Com as transformações tecnológicas do fim do século XIX, alimentadas

principalmente pelo fomento da Revolução Industrial, a sociedade permanecia em

uma constante transformação filosofia atrelada ao surgimento de novos aparatos

modernos, neste quadro também apresenta a entrada dos Estados Unidos no

cenário econômico mundial com maior representatividade e transformações

moldadas a partir da Revolução Francesa que culminaram na adoção de medidas

propiciaram a expansão da industrialização inglesa e a incessante busca por

dominação territorial caracterizaria um novo tipo de imperialismo, vital a manutenção

da hegemonia dos países centrais, de modo que a concentração de renda moldasse

as ações politicas e se voltasse suas atenções para um novo tipo de capitalismo,

cada vez mais feroz e agressivo, lugar onde a livre-concorrência dava inicio ao

monopólio, segundo as palavras de Woodrow Wilson “uma grande nação industrial é

controlada pelo seu sistema de crédito. Nosso sistema é concentrado. O

crescimento da nação, portanto, e de todas as nossas atividades estão nas mãos de

uns poucos homens.” (HUBERMAN,L. 1962). Desta forma, é inegável perceber que

a concentração do poder e assim da doutrinação é uma faceta amparada pela

economia da era moderna, a industrialização além de trazer consigo a oportunidade

de um desenvolvimento urbano como nunca visto, também contribuiu para a

concentração de terras e capital, dando origem aos grupos oligárquicos da politica.

Dentro deste contexto, o desenrolar econômico andou lado a lado com o

desenvolvimento técnico-cientifico que possibilitasse um maior sucesso da indústria

e de novas ferramentas e oportunidades, a partir daí o interesse crescente da

população largamente urbana pelos mistérios da natureza e o aspecto obscuro da

sua materialidade dão suporte aos fantasmagorismos e artefatos de diversão da

virada do século que buscavam reproduzir a ilusão de movimento.

Outro aspecto a se destacar é a obsessão de certa forma, que a população

adquiriu pelo movimento, seja pela rapidez alimentada pelas fábricas ou o ritmo de

vida frenético nas metrópoles recém-criadas na Europa, o fato é que cada vez mais

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como busca por entretenimento ou diversão, os truques de ilusão de ótima são os

primeiros chamarizes a uma semente do cinema. Em um breve contraponto com a

Alegoria da Caverna de Platão, a diversão da vez se baseava em observar o

movimento através das conhecidas Lanternas Magicas em atrações que faziam

parte do circo e também dos brinquedos óticos como o traumatrópio (1825), o

fenaquistiscópio (1832) e o zootrópio (1833), mas essa mesma interação e rápida

transformação constante, conduzem ao fato de que não houve um único descobridor

do cinema e nem que os aparatos para a reprodução repetida da imagem surgiram

em um só lugar.

As primeiras exibições se devem a Thomas Edison em 1893 através do seu

quinetoscópio enquanto em 28 de dezembro de 1895 é dado o nascimento do

cinema propriamente dito, pela exibição dos irmãos Lumiere em seu cinematógrafo

do filmete do trem chegando a cidade, é oportuno que uma plateia desavisada com

a novidade e muito menos com sua veracidade se assustasse e inclusive alguns

mais dissuadidos, levantassem de seus lugares com medo de que realmente o trem

adentrasse no café. “ Os primeiros filmes tinham herdado a característica de serem

atrações autônomas....” (MASCARELLO, 2010) pequenos filmetes de caráter

experimental que ainda não contemplavam narrativa e muito menos movimentos de

câmera, a maioria ainda se concentrava em registros de paisagens ou até retratos

familiares a serem exibidos em vaudevilles como um cinema de atrações, porém

com o seu sucesso, houve um aumento na demanda de produção e por isso, uma

reorganização da produção a nível industrial.

Empresas como a Edison, Vitagraph e a American Mutoscope and Biograph

passaram a idealizar e produzir em ritmo mais constante e acelerados diversos

filmetes originando a indústria cinematográfica, entretanto neste inicio do cinema, já

se pode observar que o potencial politico dessa nova área (que nem arte era

considerada ainda) pelo Estado onde é memorável a produção de um filmete

experimental de 1898 chamado Battle of Manila Bay (J. Stuart Blackton e Albert

Smith, Vitagraph) que retratava a guerra de um barquinho de papel na agua em

referencia ao atual contexto externo em meio a guerra americana com a Espanha

pelo domínio das Filipinas e Cuba, neste primeiro exemplo, em um estado germinal

do cinema, é necessário grifar como a indução politica se fazia presente em uma

atração tida no período como algo voltado para as classes mais baixas de

trabalhadores, construindo uma base importante as decisões do governo apoiadas

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no proletariado. Da mesma forma, outros exemplos de reconstituições inerentes a

fatos importantes da alçada politica também foram produzidos como em Viste sous-

marine du “Maine” (Meliés, Starfilm) de 1898 onde foi reconstituído o navio norte-

americano Maine, afundado perto de Havana e também em Attack on a China

mission (Williamson, 1900) que usando locações ao ar livre, reproduz um episodio

da guerra dos boxers entre chineses e ingleses.

Com a procura alavancando a produção de rolos cada vez mais elaborados

era inevitável que a busca pela narrativa se consolidasse.

As estruturas de narrativas mais integradas no cinema de transição são

fruto de uma tentativa organizada da indústria de atrair o público de classe

média e conquistar mais respeitabilidade para o cinema, mas isso não

significou a eliminação do público de classe baixa, que continuou a assistir

aos filmes nos cinemas mais baratos. (MASCARELLO, 2010)

No entanto, a popularização dos longas-metragens se dará somente após a

primeira guerra, já que as praticas de vão se desenvolvendo em reposta a demanda

dos exibidores, mesmo tendo a hegemonia do mercado pelas empresas europeias,

a indústria francesa era a maior do mundo e seus filmes eram os mais vistos. “De

60% a 70% dos filmes importados exibidos na Europa e EUA eram franceses (...) A

Companhia Gaumont e a Pathé controlavam o mercado norte-americano: dos 1200

lançamentos feitos, apenas 400 tinham sido produzidos nos EUA.” (PERSON, 1996)

Com a chegada da primeira década do século XX, a produção audiovisual

adquire outro formato ganhando estilo e a narrativa, filmes mais longos podiam ser

feitos apesar de o publico ainda não ter abraçado totalmente as histórias contadas

ou espaço-tempo demonstrado na tela, seja pela falta de costume ou deficiência

técnica, a movimentação de câmera e montagem amis elaborada, dentro da

decupagem clássica, se consagram como meios definitivos para a elevação do

cinema ao âmbito de sétima arte.

2.2 A punição pela sexualidade e a remoção do desejo.

Desde o rechaçamento da teoria de Édipo apresentada por Freud e pela sua

exaltação da importancia da sexualidade e seu esclarecimento na saude psicologica

do ser humano, o assunto sempre foi tratado a grosso modo como tabu e pouco

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discutido abertamente em um sociedade que aceitaria o sufrágio universal somente

no século XX, a aceitação de que seu sufocamento poderia causar graves

transtornos transpunham a suposição da histeria associada a simples loucura das

mulheres e sim a observar seu trato na submissividade como forma de expor sua

insatiafação e descontentamento com a posição social ocupada e liberdade de

esocolhas com seu parceiro. Os conflitos retratados por em sua obra “Tres ensaios

da sexualidade” relatam 3 principios basicos que fazem uma reflexão acerca da

importancia do dominição sobre a decisão das atitudes sexuais e o quanto tais

decisões afetam o poder sobre si mesmo e a relação com os demais no cotidiano do

individuo.

Os principais aspectos destas descobertas são:

1. A função sexual existe desde o princípio de vida, logo após o nascimento

e não só a partir da puberdade como afirmavam as ideias dominantes.

2. O período da sexualidade é longo e complexo até chegar a sexualidade

adulta, onde as funções de reprodução e de obtenção de prazer podem

estar associadas, tanto no homem como na mulher. Esta afirmação

contrariava as ideias predominantes de que o sexo estava associado,

exclusivamente a reprodução.

3. A libido, nas palavras de Freud, é a "energia dos instintos sexuais e só

deles". (BOCK, A. M.; FURTADO, O. ; TEIXEIRA, M. L.)

Desta forma a pura manipulação e violação do poder vital de decisão

sobre o prórpio corpo e a tomada de consciencia são ferramentas fundametais para

a garantia do poder a partir do monento que a sua expressão para a ser

descaradamente voltada aos interesses inerentes do Estado, ou seja, com a

desvirtualização do conceito do Super-Homem de Nietzche, Hitler em sua obra de

maior destaque, Mein Kampf e biblia para seu governo ditatorial, relata a importancia

da reprodução entre a dita espécie “superior” ariana e o dever para com o Estado

que os alemães puros teriam então em repopular o terrorio de dar origem ao seu

super-homem, segundo sua deturpada visão, individuos de caracteristicas nordicas

(fisicamente) que correpondessem a seriedade e virtude germânicas, logo a

reprodução e a sexualidade passaram a ser encargos do governo e não uma

liberdade indivudal e livre de escolha, as medidas de punição relacionadas a

interação entre judeus e não-judeus incluia castração e outras medidas de

esterelização como maneira de garantir o sucesso de seu infame projeto, da mesma

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forma que atraiu varios jovens para sua Juventude Hitlerista a fim de garantir a

imposição e dominação desde a infancia dos “arianos” possibilitando a permanencia

do Reich de mil anos. Tal nivel de manipulação conduz a consideração de que o

acesso ao id, a parte mais primitiva e também natural do insconciente do ser

humano, a manisestação mais pura de seus desejos seguindo a psicanálise, é um

dos meios eficazes para o caminho da doutrinação total, tanto que a supressão dos

desejos carnais e sexuais foi parte da estratégia de desumanização da população

judia vitima dos campos de trabalho ou concentração, a extrema fome e condições

precárias de vida e higiene levaram os corpos de seus sobriviventes a uma situção

limitrofe que pelo caminho natural retirou todas as suas possibilidades de realização

cognitiva e sentimental, suprimindo a sua sexualidade mesmo nos jovens, entretanto

a retomada da vida livre e a recuperação fisica levou a conclusão dos mesmos de

enxergar nesta via inconsciente uma forma de reconquistar o poder sobre o proprio

corpo, o sobrevivente de Auschwitz Aleksander Laks relata sobre este ponto:

Apesar da proibição de entrar nas casas, ocupamos um quarto na casa de

um açougueiro. (…) Vivendo nesta casa, em melhores condições, e com a

comida que conseguiamos obter nas fazendas, fomos melhorando nosso

estado de saúde. Começamos a ganhar forças e até a recuperar a nossa

virilidade. Essa foi uma grande preocupação que tínhamos, porque corria a

noticia de que os alemães estavam colocando um medicamento na comida

para deixar os homens estéreis e impotentes. Quando recuperamos a

potencia sexual, vimos que voltamos a ser pessoas normais.(LAKS, 2010)

O relato retrata o quão forte o regime nazista se assegurava acerca da

reprodução, destaque para o médico Joseph Mengele responsável pelo mesmo

campo a que sobreviveu Aleksander em realizar testes desumanos para

providenciar a gravidez múltipla ou evidenciar fenótipos considerados arianos nas

crianças judias. Apesar de seus registros nunca terem sido encontrados e após sua

fuga do julgamento do Tribunal de Nurembrg seu paradeiro seria desconhecido até

morrer afogado no litoral brasileiro. Seja como for, a impressão exaltada pelo cinema

e pelos discursos inflamados de Hitler delatavam uma censura inerente ao mesmo

tempo que difundiam a proliferação da raça ariana a qualquer custo, como uma

reprodução criminosa em massa para satisfazer seus interesses e criar a população

sobre seu mando e vontades. Não tão obstante, a imposição da censura e a

Page 20: Monografia Cinema Nazifascista

20

qualificação de sua manifestação sob as produções audiovisuais do inicio do século

XX nos EUA como reconhecidos anteriormente se tratavam basicamente de filmetes

feitos a base de poucos recursos para a população operária, como divertimento de

massa e baixo calão, o erotismo foi um prato cheio a ser explorado em um território

inovador e de amplas possibilidades como sucesso de bilheteria, a pouca ou

nenhuma fiscalização e regulamentação das obras acabou por alimentar essa

espécie de cinema clandestino que daria origem a indústria do cinema adulto

décadas depois, mas o fundamental a se destacar é a incessante exposição

pornográfica da produção rudimentar da virada do século que demonstra muito bem

o quanto a sexualidade é importante quando abordada nas telas e como seu

conteúdo passa a gerar incomodo as alas mais conservadoras do governo, já que

neste momento da história ainda nem sequer existiam regulamentações e legislação

voltada especificamente a este tipo de indústria, tão grande era a novidade que nem

instrumentos da lei que protegessem os direitos autorais haviam sido criados ainda,

obrigando Thomas Edison por exemplo, a registrar quadro por quadro de seus filmes

como fotografias únicas para proteger seus direitos de reprodução, curiosamente foi

a partir desse método ostensivo de proteção que muito de seus primeiros filmes

foram recuperados e remontados.

A temática discutida durante o período arcaico do cinema especialmente na

Europa variava entre pequenos esquetes de glorificação e estimulo a boa conduta e

caráter ou pequenas cenas pornográficas de fácil aceitação e entendimento do

publico, “estas películas de alto nível moral competiam com as pornográficas que

sem sua narrativa, reservavam sem surpresas suas excitantes promessas.”

(KRACAUER, 1947). De maneira global esse tipo de película atingia todos os

cinemas que ainda não haviam tomado a gênese de arte com exceção do francês

que pela sua alta produção já havia alçado publico de outras classes sociais e criado

uma vertente de produção com um objetivo mais artístico e experimentalista como

as obras de Meliés. Portanto, nesse período do cinema arcaico até o mudo, onde

começariam as grandes produções faraônicas de Griffith, Porter e as comédias de

Buster Keaton e Charles Chaplin que passaram a ser acompanhadas com voz e

musica ao vivo nas salas a regulamentação acerca do que se exibir ainda era muito

leve e pouco controladora praticamente tudo era permitido e não foi a toa o

surgimento de tantas musas durante esse momento no cinema americano

principalmente.

Page 21: Monografia Cinema Nazifascista

21

Sem restrições era inevitável que a sedução desse lugar a pura pornografia

na busca da elevação do status social do cinema e não bastaria somente salas

melhores e mais estruturadas para fazer desta arte recém-nascida alcançar o nível

de consagração das anteriores, deste modo surgiram ícones dentro dos filmes na

figura de atrizes ousadas e muito afinadas com a moda, sem demora estas figuras

comerciais tornam-se ícone dentre o publico feminino e a consequente venda de

artigos relacionados como cosméticos e vestuário, demonstrando ainda em fase

inicial a aplicação do marketing e a busca de venda além de associação de status

social as figuras criadas pelos estúdios americanos, especialmente através não só

da bilheteria mas também da venda desses subprodutos que estariam relacionadas

ao famigerado star system. Com a ousadia exibida nas telas de musas como Theda

Bara, que em Cleópatra (1917) usava um figuro transparente e quase semi-nu atraia

a atenção de tanto mulheres como homens por motivações diversas, seja pela pura

curiosidade ou entretenimento, o surgimento das vamps e depois se tornariam

femme fatales no filme noir, ressaltavam o domínio da mulher sobre o próprio e

decisão sob a sua sexualidade e liberdade, além de desmitificar a alcunha de

dependência masculina, entretanto este apoio a novas diretrizes sociais e a visão

mais distanciada da mulher submissa, traça uma linha histórica simultânea ao

primeiro momento de guerra onde esposas e donas de casa se viram sozinhas e

assumindo papeis masculinos na ausência dos soldados, acontecimento que se

repetiria de maneira ainda maior durante a segunda guerra, dando origem a

movimentos feministas e a defesa da entrada da mulher no mercado de trabalho, de

qualquer forma, a venda da imagem mais libertária e sexualizada também é

calculada de maneira a fomentar e apoiar o momento econômico passado no

período entre guerras, assim como alimentar a indústria através da venda da

imagem de beleza destes ícones do cinema e por fim, antecipariam uma tendência

fundamental do imperialismo americano, o American Way Of Life.

Porém o uso frenético e acelerado do capital culminou nas condições

essenciais para o surgimento do segundo conflito e diante desse cenário de total

desesperança e despreparo econômico, em 1930 como maneira de recuperar os

bons costumes e garantir maior credibilidade a indústria cinematográfica, note-se a

coincidência de pontos entre a maior censura que visava estabelecer a restrição de

temas como prostituição, alcoolismo, roubo, prostituição em um período de

deflagrada crise econômica em que ações como essa são mais comuns e

Page 22: Monografia Cinema Nazifascista

22

justificadas. Para alimentar o desejo do sistema americano o advogado Will Hays,

criou sua lista de censura sobre itens que não deveriam aparecer e muito menos

ditos, usando da criatividade dos diretores para insinuar situações de duplo sentido,

o código durou oficialmente cerca de 30 anos e correspondeu durante seu período

mais rígido aos anseios do governo regulamentador e na sua égide controladora

sobre os bons costumes garantindo a imagem imaculada dos americanos sobre as

outras nações, demonstrando um exercício da dominação sistemática através do

controle restritivo de imagens e ideias, seguindo a proposição do Estado tentacular

de Foucalt na dominação pela vigilância.

2.3 O brilho político de Hollywood.

A consolidação do cinema norte-americano pressupõe o sucesso de suas

politicas públicas e de amplo investimento em propaganda e comunicação mas

prinicipalmente vai muito além de seu aparato técnico garantindo produções de alta

qualidade com distribuição em massa, a entrada das produções que trazem nas

entrelinhas a venda do ideário tipicamente americano e do American Way of Life

foram o motivo por trás da falência de muitos cinema latino-americanos assim como

outros mercados ao redor do mundo, entre eles o asiático e o africano, não tendo

forças para competir com a grande demanda exportada e o domínio exercido pelos

mesmos através de apoio legislativo. A insurgencia de Hollywood e seus magníficos

estúdios representou o epítome da dominação ideológica e politica da forma mais

bem executada possível, para tanto basta observar que mesmo diante do conflito e

em meio a Segunda Guerra, a produção fílmica não cessou mas sim trouxe

clássicos que abordavam de forma estratégica o assunto vigente, como Casablanca

(1942) por exemplo e outros que se aproveitando da privação de demanda interna e

acabaram por ser bombardeados de produções que seguiam o gênero conhecido

como noir, tanto esta premissa é verdadeira que foi o critico e cineasta francês Nino

Frank que atribiu a nomeclatura a esse tipo de filme. Outro ponto a se citar nas

produções, é a intensa exploração e reflexo da divisão de gêneros tal qual convinha

ser aceita pela sociedade em geral, segundo as motivações por trás do conflito, “a

representação de um dos elementos centrais da cultura da desconfiança do pós-

guerra: a intensa rivalidade entre masculino e feminino.” (MASCARELLO, 2010).

Page 23: Monografia Cinema Nazifascista

23

A vitória na primeira guerra serviria como preposto para acentuar as

caracteristicas e articulações dominadoras do sistema capitalista e seu principal

detentor em escala mundial. Passando por um periodo conhecido como “grande

ilusão”, o alimento propulsor da crise se basearia nas suposições vendidas por uma

propaganda que iludiu meio mundo, o breve momento de prosperidade e

reconstrução se refletiu nas economias europeias destroçadas pelo primeiro conflito

mas principalmente nas falsas esperanças trabsmitidas aos proprios cidadãos, o

mesmo instante de revolução e renascimento tomaria forma filmica através da

inserção de novas tecnologias e parametros técnicos que entre a maior se destaca o

surgimento do som, que de primeiro momento foi rechaçado e rejeitado pelo publico

ainda pela falta de costume e pouca experiência mesmo da equipe técnica em

dominá-lo, mas se tornaria inseparável da imagem a partir de então.

O advento do som possiblitou a criação de uma nova gama de gêneros e

produções antes restritas pela falta do aparato, o sucesso mais nítido é a variedade

de musicais que apareceram seguindo a década de 30 e eram os grandes

propulsores do faturamento dos estúdios, mesmo curioso, eram estes filmes

esperançosos e altamente ricos, sustentando uma ostentação fora da realidade em

um meio de crise que alimentou a esperança e encorajou a reconstrução social

pelas telas, vale lembrar que mesmo em plena recessão, os cinemas ainda eram

parte da forma de entretenimento da população que buscava alguma forma de

abstração da trágica realidade, neste aspecto o cinema foi o meio perfeito para

cumprir esta função, poucos movimentos artísticos conseguem com tanta facilidade

e sutileza realizar tal suspenção da realidade como faz o cinema. Alguns estudiosos

apontam não só pelo caráter realista e a reprodução do movimento como pontos que

atraiam naturalmente o ponto de vista do espectador, mas também as amplas

possiblidades apresentadas pelo aperfeiçoamento da montagem e inclusive a

arquitetura básica das salas e sua tradicional poltorna localizada a frente do projetor,

algo que pode sustentar a teoria da captação dos sentidos e o aprisionamento da

atenção. Os musicais com toda sua interface majestosa e arte exacerbada, figurinos

e cenários ricamente construídos, transmitiam um momento oposto ao vivido pela

maioria dos espectadores, mas ainda assim conseguiam transpor a clássica

mensagem de reconquista e realizar como o antigo teatro grego já propunha, a

catarse final da plateia. Nenhum recurso, no entanto, seja técnico ou sensitivo,

passou desatento aos olhos do sistema e especialmente das armas manipulatórias

Page 24: Monografia Cinema Nazifascista

24

da propaganda e basta observar as breves correlações entre o instante econômico e

as produções artisticas de alta veiculação para notar que em períodos de profunda

crise economica ou social, as produções adotam um tom mais cômico e passam a

ter menor grau de questionamento e incissividade, como feito no caso brasileiro da

pornochanchada, genero distrativo que permeou toda a dominação militar.

A primeira metade do século XX foi marcada pela ascensão e consolidação

dos regimes que utilizaram os meios de comunicação de massas como

instrumentos de propaganda política e de controle da opinião pública. A

referência básica da propaganda é a sedução, elemento de ordem

emocional de grande eficácia na conquista de adesões políticas. Em

qualquer regime, a propaganda é estratégica para o exercício do poder,

mas adquire uma força muito maior naqueles em que o Estado, graças à

censura ou monopólio dos meios de comunicação, exerce rigoroso controle

sobre o conteúdo das mensagens, procurando bloquear toda atividade

espontânea ou contrária à ideologia oficial. O poder político, nesses casos,

conjuga o monopólio da força física e da força simbólica; tenta suprimir, dos

imaginários sociais, toda representação do passado, presente e futuro

coletivos que seja distinta daquela que atesta a sua legitimidade e cauciona

o controle sobre o conjunto da vida coletiva. (PEREIRA, 2003)

2.4 A corrida armamentista nas telas

Após a crise de 29, o cenário mundial adquiriu uma nova configuração e

conduziu a outra maneira de agir e pensar, as propostas antes rígidas e radicais

demais tomaram força como maneira de restaurar o estado anterior de prosperidade

e com a iminência de um conflito armado, a necessidade de uma melhor articulação

por parte dos órgãos de propaganda e estratégia de mercado se fez mais urgente,

se iniciava a era do dirigismo econômico, ou seja, o alto intervencionismo do Estado

na economia e o controladorismo iminente. “O fenômeno ocorreu em quase todos os

países. No plano politico levou ao reforço do autoritarismo (...) a forma mais radical

de intervencionismo estatal foi o nazismo, mas o modelo clássico de

regulamentação (...) foi o New Deal.” (AQUINO, 2002). Somado aos fatos anteriores,

como a imposição do medo, a manipulação da sexualidade e a apropriação

psicológica e interação ideológica, estes constituem os antecedentes que

prepararam a última tomada total da inconsciência suplantando a guerra e seu

Page 25: Monografia Cinema Nazifascista

25

amplo apoio pela sociedade coagida. A disseminação dessa possibilidade pelos

meios de comunicação de massa e a violência disfarçada colocada no cinema,

constroem o plano de ação da propaganda politica e o instante ideal para a ação de

governos mais radicais.

Logo no caminho tortuoso da ascensão ao poder, os setores de propaganda

e articulação politica conceberam uma impactante ação mercadológica como

maneira de acessar e entreter a população, assim como já na Roma antiga era

exercido pela estratégia do pão e circo, pelo qual escondendo suas atrocidades e

atitudes injustificadas de intolerância, os governos do pós-guerra, aliaram-se aos

recém-desenvolvidos meios de comunicação de massa para disseminar seus ideais

de forma implícita e convenientemente, associando tal doutrinação a elementos

descaracterizadores e grandes marchas de desarticulação questionadora, partindo

então do entretenimento para a cegueira em massa. Essa abordagem diferenciada

dos sentimentos e virtudes humanas nos enredos se fez necessária para o

espelhamento do espectador naquelas situações e fazem uma ligação inesperada

com o sentimento abrasivo causado pelo reboliço do desfacelamento da economia.

A politica da distração e doutrinação é antiga, mas exemplos nítidos de sua

utilização são observados até os dias de hoje, mesmo em regimes ditos

democráticos, a ação incisiva do Estado e o alto intervencionismo na liberdade de

expressão e obras independentes são claros pontos em comum com essa proposta

totalitária. Neste ínterim, ainda se tratando do período compreendido entre as

décadas de 30 e 40, a temática cinematográfica passa abordar cada vez com mais

frequência a guerra como plano de fundo, seja para produções romanceadas e

defensoras ideológicas da ocupação americana, ou mesmo outros tipos de drama e

ação que se muniram do momento histórico para produzir chamarizes de público,

outro ponto interessante que inclusive é demonstrado em diversas obras de ficção,

são os cinejornais transmitidos previamente às sessões durante o período entre

guerras, meio pelo qual as principais vitórias eram anunciadas e havia a glorificação

de seu exército, entretanto mesmo com a suposta predefinição jornalística a maioria

se tratava de artigos manipulatórios e enveredados para a satisfação do regime

imposto. Muito além do campo de batalha propriamente dito, a guerra se fez

vitalmente pelo consumo e apoio ideológico da sociedade, o sucesso do vasto

segmento de suporte ao conflito se conecta a premissa de Foucalt do governo pela

vigilância, onde através dos entraves tecnológicos antes tido como libertários, o

Page 26: Monografia Cinema Nazifascista

26

sistema passa a observar e deliberadamente influenciar seus cidadãos de modo a

obedecer seus interesses políticos e participar da glorificação pela denúncia, ou

seja, para assumir o real papel de cidadão modelo, o protótipo da vigilância não se

garante somente a partir dos olhos ferinos do Estado mas conta também com a

incitação coletiva da denuncia a desobediência dos demais, assim a bonificação em

seguir os desmandos políticos integra parte da doutrinação sistemática e transforma

a atuação do Estado tentacular em várias camadas da estratificação social, partindo

das participações pequenas individuais até a ação generalizada do governo. Mesmo

que em ficção, George Orwell supõe essa situação em uma sociedade futurista em

1984, onde depois de retirados seus acesso e características mais humanizadas,

passam a responder unicamente pelos interesses do estado doutrinador maior e a

servir pela sua guerra na dominação de outros países e a criação de uma população

superior as dominadas, nesta trama a desobediência é fatalmente punida e o

sucesso da implementação do sistema se baseia na vigorosa ampla atuação do

poder e também adesão popular. No entanto, não é necessário procurar por

exemplos somente na ficção de situações como as imaginadas pelo autor, muito

antes de 1984 o governo pelo medo e a satisfação na denuncia foram armas vitais

do sistema nazista na ocupação de territórios vizinhos e até a massiva repreensão

aos judeus se muniu de forças através da denuncia da população, as investidas

agressivas da SS e Gestapo caracterizaram a faceta mais indiscriminada e

desumana do governo alemão do Reich que pode ser pressentido de certa maneira

pelas manifestações culturais anteriores como pressupõe Siegfried Kracauer.

3. CAPÍTULO 2: A consciência de um organismo vivo e o desfacelamento do

cinema nazi-fascista.

2.1 O trabalho de Kracauer e a sensibilidade cognitiva da vanguarda.

Parte do sucesso e grande adaptação e recepção do público às obras nazistas

se devem aos antecedentes históricos que anteviram a ascensão desse sistema, a

população alemã de certa forma, tinha como parte do hábito o entretenimento pelo

cinema e a vanguarda teve papel fundamental ao criar espaço para a adesão e

procura do público por suas obras além da estruturação que o mesmo exigia com

vários espaços dedicados a arte cinematográfica, a produção cultural de uma forma

Page 27: Monografia Cinema Nazifascista

27

genérica correspondia aos anseios de todas as camadas sociais, com o cinema

mais critico e artistico para as elites e as obras mais acessíveis e dramáticas para

as classes mais baixas, mas de qualquer forma é importante ressaltar o quanto a

estrutura prévia do espaço e doutrinação da sociedade foram fatores necessários

para a suplantação da ética totalitária. Como contextualização histórica, o período

que compreende o pós-guerra, a crise econômica de 29 até a ascensão de Hitler

ficou conhecido com a República de Weimar, governo de características

democratas porém com pouca influencia sobre o desesepero da população,

situação tal que se refletia indiretamente no cinema de vanguarda, ou seja, pelos

olhos vitrificados do experissonismo alemão. Advindo das artes plásticas, o

movimento expressionista como a propria nomeclatura explicita, trata a

exacerbação e exploração angustiantes dos sentimentos de maneira dramática,

uma forte motivação para tal surgimento deste sentimento foi a dislaceração

causada pelo trauma da Primeira Guerra, ainda que pouco situado, o primeiro

grande conflito trouxe perdas humanas e materiais imensas principalmente para os

paises europeus em baixa, o desgaste angariado através da estratégia da guerra de

trincheiras levou ao trauma e desolução geral da população, tanto agresivo foram as

batalhas que muitos filmes de terror de baixo orçamento da década de 30 e 40

produzidos pela Universal enquanto ainda um estúdio B de Hollyowwod,

abordavam a mutilação e desfiguração sofrida pelos soldados em campo, que com

imagens fortes basearam a criação do medo e das figuras monstruosas geralmente

encarnadas por Conrad Veidt. Essa degradação humana e total desesperança

também conduziu diretamente a uma ligação intriseca das artes com o sentimento

permeado na Alemanha do pós-guerra, logo a partir da década de 20 e o

surgimento das variadas vanguardas, a visão angustiante acerca do

desenvolvimento industrial e a desesperança mortificada pelo impacto do conflito

conduziram a uma arte forte, sentimenal e depressiva na sua forma de construir,

suas figuras pálidas, disformes e que beiram a loucura nada mais representam dos

que os fantasmas que perseguiam a imaginação da sociedade em meio a uma crise

sem precedentes, que propiciou a corroboração dos ideais nacionalistas.

O expressionismo alemão trouxe uma lufada de novas interpretações e uso da

técnica atraindo estantaneamente o publico mais intelectualizado, sua obra de maior

destaque e estreia foi O gabinete do Dr. Caligari (1920) que usando tanto de uma

estética quanto abordagem inovadoras, conseguiu marcar a história do cinema com

Page 28: Monografia Cinema Nazifascista

28

o enredo sobre um doente doutor que a partir da hipnose conseguia dominar outros

individuos e realizar suas atitudes maléficas, neste ponto já é possivel perceber a

semelhança com a realidade que se daria anos mais tarde, pela figura hipnótica do

Fuhrer e os discursos pragmáticos de Hitler, seu poder de indusão e carisma foram

argumentos imprescindíveis para seu apogeu e a utilização de um contexto tão

próprio e inovador diante a temática da época fazem refletir sobre o clima

decadentista que se arrastava desde o século anterior pelas obras de Baudelaire e

as novas vertentes filosóficas de Nietzche, esta dramaturgia do ego somada aos

aparatos e estudos tecnológicos proporcionam a formação do expressionismo como

arte contestadora e de cunho altamente critico. Apesar da improvável ligação, a

herança deixada pelo expressionismo praticamente dizimado pela Segunda Guerra

e o governo de Hitler, são a influencia fundamental para o posterior

desenvolvimento da indústria cinematografica americana como um dos grandes

polos produtores dos filmes de terror e suspense, como citado anteriormente não

somente a guerra e seus soldados feridos fizeram parte de sua construção estilistica

mas principalmente que depois da perseguição politica, a maior parte destes

autores e atores que compunham o cenário da vanguarda alemã se refugiaram na

recente indústria americana e foram abraçados pelos estúdios, até pela motivação

religiosa já que a maioria dos donos dos grandes estúdios americanos eram

também judeus que haviam emigrado da Alemanha, assim grandes mestres como

Fritz Lang entre outros atores também puderem continuar sua carreira com a

segurança e liberdade artisitica que mereciam. Ainda acerca das produções do

periodo, outro aspecto a ser frisado se tratando de Fritz Lang, é a obra prima

Metropolis (1927) de narrativa incrivelmente futurista para a época e dotada de

restritos recursos de efeitos especiais e montagem, reconstitui uma realidade muito

similar ao que cita Marinetti no modernismo e a revolta contra a dominação das

máquinas em uma perpectiva totalmente industrial, desta forma a revolta e a

retomada pelos poderes proletários é uma defesa sintética do pavor que tomaria

conta da Europa anos depois pela febre vermelha do comunismo soviético, desta

maneira mais do que sintetizar a ação libetária e o poder coletivo da força de

trabalho, Lang consegue concluir com primazia a breve analogia com a luta de

classes e também da manipulação politica através do aprimoramento tecnológico,

como mostrado em sua cena icônica da construção do androide, entretanto seria

um outro momento que seria capaz de antever e resumir em poucos frames uma

Page 29: Monografia Cinema Nazifascista

29

das maiores tragédias da história moderna, hoje exaustivamente analisada e

teorizada, que seria a cena das fornalhas em que milhares de trabalhadores em

protesto são queimados vivos dentro das grandes fronalhas sem qualquer remorço

por parte da classe dominante, este instante se repetiria dentro de algumas décadas

com as fornalhas dos campos de concentração nazistas perpetuando uma previsão

amedrontadora do futuro. Uma curiosidade se baseia no fato de que o roteiro de

Metropolis foi escrito em parceria de Lang com sua esposa na época, que após a

tomada nazista e o exilio do mesmo, permaneceria na Alemanha e tomaria um alto

cargo de comando do governo hitlerista, dando lugar a realidade antes apropriada

pela ficção.

O expressionismo alemão e a produção fílmica alemã em geral, se dão a partir

da criação da Deulig uma empresa cinematográfica com a função de produzir

documentários de guerra como forma de propaganda, neste contexto e no seu

desenrolar que levaria a criação da UFA, a intervenção direta do Estado e sua

intenção primordial de produzir propaganda (lembrando que a própria palavra tem

origem da língua germânica) mas com a alta demanda esta foi incapaz de suprir

todo o mercado e em 1917 o governo alemão com apoio privado funda a UFA

(Universum Film Aktiengesellschaft) responsável então por centralizar a cadeia de

produção alemã, sendo a energia motriz da produção, distribuição e exibição de

filmes no país em um exemplo clássico de integração vertical da produção nos

moldes norte-americanos. Desta forma, os alemães acreditavam que para o

domínio do mercado externo deveriam acentuar a produção de obras

intelectualizadas e artísticas, fator que também motivou a produção de obras

expressionistas, mas o sucesso absoluto de Gabinete do Dr. Caligari foi um reflexo

do emprego da estética revolucionária brincando com o jogo de luz e sombra e as

distorções típicas conseguidas a partir do domínio dos ângulos de câmera e

detalhada construção dos cenários, exaltada pela interpretação exagerada e

caricata dos atores em cena buscando ressaltar os conflitos emocionais de seus

perturbados personagens. “Baseado na experiência de Mayer com psiquiatras e no

testemunho (...) a respeito do assassinato de uma moça (...) em Hamburgo, o

roteiro pretendia ser uma critica do absurdo e da violência de qualquer autoridade

social (MASCARELLO, 2003)”.

Apesar da indiscutível apuração técnica e roteiros fora do convencional

explorando o âmago da questão do psicológico e as descobertas ainda em profusão

Page 30: Monografia Cinema Nazifascista

30

no campo da psicanálise, os filmes do movimento expressionista representam uma

mobilização de tal maneira que alguns teóricos buscam desvendar o conceito

ideológico por trás de sua concepção, um deles também de nacionalidade alemã e

pertencente à mesma corrente crítica de Adhorno e Benjamin propõe uma visão

mais amplificada e desmitificada do assunto, Siegfried Kracauer assume

primeiramente a obra fílmica não somente como um recurso midiático e de origem

material, mas sim pela sua capacidade de levar ao questionamento e induzir a

certas perturbações sociais como algo a ser encarado como organismo vivo,

assumindo adjetivações próximas as dadas aos seus expectores, reiterando que a

mesma também possui cernes de discussão e indagação que inclusive fazem parte

do mesmo momento histórico da população. Assumir a postura de viabilizar o

dispositivo audiovisual como figura orgânica dotada de percepção é também

assumir que a mesma faz parte e é fruto do inconsciente coletivo de seus criadores

e espectadores ao expor na tela suas inseguranças, medos e postulações,

demonstrando assim, uma forma de supervisionar o futuro através das expectativas

transmitidas pelo retrato mais fiel do inconsciente humano: a arte. “Em De Caligari a

Hitler, Kracauer sugere que os loucos e tiranos tão populares nas telas alemãs após

a Primeira Guerra eram protótipos da loucura e da tirania que tomaram a Alemanha

nos anos 30, jogando o país e o mundo em sua guerra desastrosa.”

(MASCARELLO, 2003).

A analise precedida por Kracauer se beneficia de uma coleção de filmes

selecionados que buscam determinar esses sintomas sociais principalmente

relacionados à dominação e manipulação ideológica, mesmo Caligari sendo o

exemplo sucinto desta teoria, através da indução e controle de Cesare, outros

dentro desta gama se utilização dos medos e o pressentimento da dominação para

construir em tela, um retrato fidelizado do futuro, seguindo preceitos estabelecidos

em padrões subjetivos mas definitivamente reconhecidos pela população alemã, a

habilidade de unificar o puramente artístico por um lado exibido no cinema e somar

ao reconhecimento das atrocidades tirânicas cometidas posteriormente advêm de

uma sutil combinação segundo estudos psicológicos de uma formação semântica

da própria língua nativa germânica, onde a construção aglutinativa de palavras que

adquirem um novo significado é uma característica única e segundo estudos

relacionados é um grande propulsor ao costume da livre associação e analogia

entre acontecimentos correlatos, esse fator também explica a grande quantidade de

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31

pensadores de renome de origem alemã, como Nietzche, Freud e muitos outros. Em

sua obra mais reconhecida, Kracauer destaca toda a comparação e justificava de

sua teoria ao relacionar e imputar valor orgânico a obra fílmica alemã da década de

20, suas motivações adquirem forma segundo a capacidade analítica de seus

cidadãos:

Os filmes de uma nação refletem a mentalidade desta de uma maneira

mais direta do que qualquer outro meio artístico (...) Primeiro os filmes

nunca são produto de um individuo (...) segundo porque os filmes são

destinados às multidões anônimas (...) Ao gravar o mundo visível, não

importa se a realidade vigente com um universo imaginário, os filmes

proporcionam a chave de processos mentais ocultos (...) Assim por trás da

história explicita da Alemanha (...) existe uma história secreta envolvendo

dispositivos internos do povo alemão. A revelação desses dispositivos

através do cinema alemão pode ajudar a compreender a ascensão e

ascendência de Hitler. (KRACAUER, 1947)

2.2 O cinema nazifascista.

A sustentação e ascensão dos movimentos nazifascistas são provenientes de

um momento histórico muito expressivo na historia mundial, diversos fatores

culminaram por resultar no cenário ideal para o sucesso de tais ideologias. Apesar

de certa forma calculista, este anteparo ocorreu através de anos a fio em uma

preparação em reposta ao fiasco do desempenho na Primeira Grande Guerra,

alguns outros pontos revanchistas, no entanto, trataram por selar esse destino

trágico e aumentar ainda mais o sentimento de revolta e desesperança da

população. Um destes fatores primordiais começando pelas irreparáveis perdas

humanas também se aliou a perdas materiais e territoriais estabelecidas pela

Tríplice Entente na assinatura do Tratado de Versalhes, uma resposta mais do que

contundente de repreensão principalmente a Alemanha, que teve todos os seus

flancos desarticulados seguindo as cláusulas estabelecidas: primeiro por cláusulas

de segurança (visando desarmar o país), seguido de cláusulas territoriais, cláusulas

econômico-financeiras e cláusulas diversas que incluíam a proibição de gases

venenosos e atrocidades diversas que retomam ao clima revanchista e irônico pelo

qual a articulação alemã desobedeceria as seguintes proibições em pleno regime

nazista. Após então semear o futuro de um novo conflito mundial, o Tratado de

Page 32: Monografia Cinema Nazifascista

32

Versalhes foi seguido pela criação da Liga das Nações, nome pomposo para

destacar e glorificar as ações de paz por parte dos países vencedores e uma

tentativa fracassada de recolher os fragmentos europeus e juntá-los numa possível

harmonia, suas investidas iniciais se resultaram em esforços que por um breve

momento fez crível a reorganização da paz, porém a prosperidade baseada no

apoio franco-inglês logo viria a se dissipar seguindo a queda da bolsa nova-iorquina.

A queda também do liberalismo econômico do centro europeu e o surgimento de

novos polos de influencia, como o Japão conduziram a elite burguesa a optar pela

manutenção de sua hegemonia e proteção através do apoio dos governos fascistas

colocando-os no poder respectivamente em 1922 pela figura do Il Dulce, Benito

Mussolini e 1933 pelo Fuhrer Adolf Hitler, “a ideologia fascista manifesta-se(...) no

irracionalismo, no antiparlamentarismo e no nacionalismo agressivo.”

(MASCARELLO, 2003). É sobretudo incontestável que ambos os regimes

totalitários foram reações diretas ao socialismo em plena efervescência na Rússia

com a tomada pelo poder do czar pelos bolcheviques e se muniu através do medo

da chamada febre vermelha retroalimentada pelo pavor que corria nos países

capitalistas da suposta ampliação dos efeitos da Revolução Russa se alastrando

por toda a Europa.

Como forma de garantia ao poder, a propaganda foi uma arma fundamental

ao nazi-fascismo, tanto que a Itália pioneira em reconhecer o governo fascista de

Mussolini em 22,o primeiro a subir no contexto europeu, já se utiliza de artimanhas

propagandísticas em pleno inicio da década de 20, mesmo que de forma

desordenada e já entende o potencial catalisador e dominante dos meios de

comunicação disponíveis. As ferramentas dos camisas negras além da associação

inerente da população se deteve a partir do rádio e do cinema como maneira de

recrutamento, logo utilizando a sua serventia os efeitos da comunicação, criam em

1933 o Subsecretariado para Imprensa e Propaganda como saída para regular e

organizar os produtos de propaganda ideológica em uma prévia do que se exerceria

no Ministério de Cultura Popular, Miniculpop de 1937 que passou a regular todas as

atividades culturais italianas. Entretanto, o cinema sempre exerceu um fascínio

especial sobre o líder Mussolini: mesmo que ainda afetados pelos entrecursos do

pós-guerra, não haviam se estruturado completamente e vencido a concorrência

americana nas salas de exibição, sendo somente em 29 que as primeiras obras de

apoio ao fascismo surgem dentro do país. A incumbência e necessidade pelo

Page 33: Monografia Cinema Nazifascista

33

cinema educativo foram denotados como fortes aliados ao regime suplantando a

estruturação dos: “L’Unione Cinematografica Educativa, a Luce foi instituída em

1924; a Federação Fascista das Indústrias de Espetáculos, em 1925, e a Lei de

Ajuda da Produção Cinematográfica em 1931”, essa retomada por assim dizer da

produção nacional, resultou de esforços efetivos e direcionados a comunicação pelo

partido fascista e demonstram o quanto a constante e anestesiante propagação de

ideias se fez um dos pilares de sustentação do Estado maior, inclusive parte dessa

dominação demandou um ultimo esforço na construção da Cinecittà, uma indústria

aos moldes hollywoodianos americanos com fundação em 1937 visando o domínio

do mercado doméstico e a retirada dos filmes americanos dos cinemas. Porém sem

exercer tanta censura a demanda criativa, o sistema italiano ao contrario do que

faria o alemão não controlava diretamente a produção cinematográfica de maneira

tão agressiva, sua preferencia e estimulo continuava a perpetuar cinemas que

beneficiassem sua ideologia e induzissem ao apoio inquestionável, no entanto sua

forma de difundir conteúdo se deu por modelos muito mais amenos se comparados

ao nazismo. O maior epitome da propaganda fascista surge a partir dos cinejornais,

pequenas peças audiovisuais que contavam com órgão de produção específico, o

Istituto Nazionale Luce e mantinha o formato já conhecido dos mesmos cinejornais

americanos, os cinejornalis procuravam enfatizar noticias de exaltação do controle

governamental supridos por imagens românticas dos discursos e vida pessoal de

Mussolini, mas também pincelar imagens familiares e um culto exagerado ao

esporte, uma narração breve e de tom militar acompanhava a exibição, da mesma

forma que os americanos a usavam na prévia da projeção de seus filmes. O

Instituto Luce porém produzia paralelamente de forma mais bem elaborada

documentários que seguem a receita clássica acerca do acompanhamento das

atividades do partido, não deixando de aprimorar toda sua parte técnica mesmo que

dentro das formulas pré-estabelecidas e controladas pelo governo. A permanência

do cinema documental e politico na Itália não resultou na morte do cinema ficcional

e sim o contrário, antes sem qualquer tipo de apoio financeiro governamental, as

produções italianas pouco podiam competir com as bem executadas produções

americanas que abarrotavam os cinemas mas a visão do cinema como a arma

ideológica mais importante do regime por Mussolini fez da construção do enorme

complexo da Cinecittá um meio de equiparar as produções à Hollywood e fundar um

subsídio a produtores a partir do Ente Nazionale Italiano Cinematografico (Enic).

Page 34: Monografia Cinema Nazifascista

34

Mesmo sem o teor tão politizado e nítido do parceiro alemão, o cinema de ficção

não deixou de exaltar e reforçar a ascensão fascista ao criar o movimento

conhecido como produções de “telefone branco” (telefono bianco) que se traduziam

em megaproduções feitas dentro de estúdio na Cinecittá com conhecidas estrelas,

cenários suntuosos e figurinos caros sempre carregando como elemento de cena o

telefone branco, um símbolo de riqueza e status social na época, reforçando o

elitismo e o caráter de estratificação social pelo qual passava o país. Seria somente

a partir da década de 30 que filmes explicitamente manipuladores ideológicos

seriam produzidos em muito alimentados pelo medo da tomada socialista, a

resposta midiática levou a moldes explorados posteriormente como a

documentação de discursos apoteóticos e a tomada do poder pelos camisas

negras. Uma característica interessante e única associada ao cinema fascista seria

a livre associação concebida pela comparação dos feitos heroicos na Roma Antiga

pelos gladiadores como figuras simbólicas nacionais e a conquista dos fascistas

também glorificados como supostos heróis por salvar população da doutrinação

socialista, o uso da associação a grandes figuras ou momentos históricos de

formação de identidade nacional são táticas amplamente aplicadas em situações

criticas que necessitam da adesão popular como feito, por exemplo, pelo período

indianista da literatura brasileira se apropriando da imagem do indígena como o

herói original e puro e posteriormente pelos nazistas na figura do super-homem

desvirtuado de Nietzche.

Na validação de uma contra resposta ao suposto perigo da dominação e

alastramento do socialismo pelo território europeu, os ideais nacionalistas do partido

nazista se favoreceram do cinema ao vê-lo como importante instrumento de

mobilização social, sua derradeira justaposição de conceitos em expor os judeus

como etnia inferior e a justificativa para sua extinção seria somente mais uma faceta

da história de frustações e desequilíbrios psicológicos de seu líder emocionalmente

instável, megalomaníaco e egocêntrico. Sua trama repleta de atrocidades e uma

inexplicável repressão sexual tomará forma mais explicita no onipresente controle de

natalidade exercido pelos próprios órgãos do partido propositalmente visando

garantir a hegemonia do homem ariano superior e fabricação por assim dizer, em

massa, para a reposição da população de um estado bélico e que se encontrava

com diversas perdas no front, a base doentia e a sociopatia de Hitler é narrada a

partir dos abusos constantes sofridos por sua sobrinha ao ir morar junto dele e ser

Page 35: Monografia Cinema Nazifascista

35

fatalmente torturada e sexualmente abusada pelo tio com traços de sadismo e

manutenção de uma espécie de cativeiro para a mesma como forma de garantir sua

dominação e controle sobre a vitima, apesar de absurda a concepção de tais atos, a

noticia sobre o Fuhrer era pública e bem aceita pelo partido, tanto que após a morte

da sobrinha, uma caçada foi encomendada pelos recursos que o poder lhe concedia

e todos seus benefícios, em uma busca frenética por outra mulher tão parecida

fisicamente com a anterior para que a mesma assumisse seu lugar dentro do

pesadelo transviado no interior da casa de Hitler e após algum tempo uma sósia

idêntica foi providenciada e assumiu os mesmos abusos imputados anteriormente1.

Essa breve narrativa preocupante demonstra as características de líder de

preferencias atípicas e um interesse pela submissão em todos os parâmetros de sua

vida, este típico cinismo tanto retratado no cinema de propaganda da época acaba

por ser o grande enfoque nos estudos da Alemanha nazista e seus detalhes

sórdidos, já que sendo aparando pelo ideal dito por Goebbels chefe de propaganda

do partido de “um mentira dita mil vezes se torna verdade”, a manipulação da própria

verdade e a incapacidade de discernimento por parte de uma população saturada e

bombardeada constantemente por propaganda totalitária conduzem a uma

romantização da doutrinação que busca o enaltecimento de seus líderes e criam

ditames que hoje se constituem em cânones para a propaganda moderna, onde

mesmo em um cenário aterrador, se faz necessário frisar o avanço cientifico sem

precedentes feitos com a ciência nazista e seus estudos em vários campos de

conhecimento como o raio X e posteriormente a radioterapia que seria

desenvolvimento através dos experimentos de Mengele na esterilização de mulheres

judias pela exposição agressiva a radioatividade e os efeitos da mesma no corpo

humano assim como a própria comunicação e consequente propaganda que

receberam conclusões assertivas a respeito da manipulação e monopólio do

mercado que são aplicadas regularmente pelo marketing. O pioneirismo dentro do

regime do suposto reich de mil anos se vale da propaganda para se consolidar em

um esforço sem antecedentes do entendimento da importância do investimento

pesado em propaganda e sua ampliação através dos meios de comunicação de

massa, o culto ao líder e a nação feito de forma mais competente possível se deu

pela criação de um órgão com uma nomenclatura que resume o espírito do período,

1 Informação fornecida pelo professor James Stirling em entrevista concedida no dia 23 de agosto de

2015, via internet.

Page 36: Monografia Cinema Nazifascista

36

o Ministério do Esclarecimento Popular e Propaganda, ou seja, o maior órgão censor

e regulador das diretrizes governamentais em busca da viabilização dos conceitos

do partido e a total crença da importância do controle restrito dos meios de

comunicação de massa com destaque para o cinema, outras artimanhas também

faziam parte do levantamento popular e o incentivo artificial ao sentimento

nacionalista como a criação de feriados e também a influencia sob as transmissões

de rádio. A propaganda dentro deste contexto se daria pelos mínimos detalhes e

pela suplantação das crenças anteriores como a politica do medo se baseava até no

vestuário dos soldados e colaboradores do governo, sempre de cores escuras e

empunhando caveiras na farda assumindo que boa parte do poder de

convencimento nazista está na articulação psicológica, ansiando por incutir o medo

e não apenas vender o medo, demonstrando a necessidade de mobilizar a

população e seu apelo público, já que se torna mais simples angariar o suporte

popular através do ódio do que pelo amor, baseando-se no apontamento de inimigos

e a imposição da denuncia, desta mesma forma, a propaganda serve como

ferramenta inclusive para justificar os erros do governo e na eficiência de manipular

descaradamente a verdade.

Mesmo sendo uma ditadura de extremo teor violento, um lado a se ressaltar

dentro da politica ultranacionalista foi a sua eficiência em sanar a crise econômica

de maneira a ampliar seu apoio entre as camadas urbanas e auxiliar na justificativa

da tomada de decisões mais polêmicas e a priori, injustificadas, como a criação dos

guetos para o alocamento da população judia e depois sua remoção para os

campos, visto que o ideal previsto pelo Plano Reinhard se baseia não só na

eliminação dos judeus mas também no uso de sua força como mão de obra escrava

para a construção de ferrovias e outras obras que careciam dos trabalhadores por

hora desviados para o front de guerra, mas não apenas as atrocidades cometidas

contra a população judia foram exploradas ou melhor, “esclarecidas” pelos filmetes

de propaganda e doutrinação, mas também um fator importante e seminal para a

sobrevivência do partido, seu ferrenho controle a natalidade. Os planos de aumento

e sobrevivência da raça ariana dependiam vitalmente do sucesso da implementação

de atividades que seriam em outro contexto considerados contra a religião católica

de base histórica na Alemanha, mas dentro da realidade paralela criada dentro dos

limites germânicos e a suspensão da verdade, o cadastramento de mulheres arianas

solteiras para visitas periódicas de soldados-modelo da SS durante seu período fértil

Page 37: Monografia Cinema Nazifascista

37

com a vil intenção puramente de reprodução, demonstram um lado sombrio e

manipulatório sadista da politica de repovoamento consolidado pelo Estado. A

suplantação de ideais fundamentais como o intercurso após o casamento e o

respeito pela virgindade seriam afundados diante dos desejos faraônicos por uma

superpopulação e da demanda que a guerra também contribuiu em baixas, algumas

das medidas atualmente consideradas e concebidas como desumanas, eram os

orfanatos públicos das crianças frutos desses relacionamentos entre desconhecidos

para sua doutrinação desde o nascimento e futuro encaminhamento para a

Juventude Hitlerista, dando inicio a um plano de manipulação ideológica sem

qualquer influencia da vontade interior ou das escolhas individuais, estas crianças no

pós-guerra se tornaram órfãs sem destino e ainda pior, sem passado, sem o

conhecimento de qualquer pista sobre os pais; Este controle assíduo da natalidade

também foi feito em outro momento durante a ditadura brasileira porém sem

comparação da dimensão do programa nazista, pois na época militar o Brasil ainda

contava com baixos índices demográficos em certas regiões do país e por este

motivo o governo recriminava o uso da pílula recém-descoberta, mas de forma

infinitiva, a questão da sexualidade permeia este universo e corresponde

diretamente aos interesses do nacionalismo, já que num estado totalitarista a

população é o recurso belicista e justifica seu investimento na propaganda constante

em virtude da homogeneização da população e dos valores de consumo.

O cinema propriamente dito dentro do regime nazista nasce já no período

entre guerras assumindo a dianteira depois do seu impacto em plena Primeira

Guerra e os resultados positivos obtidos pelo seu investimento, a UFA responsável

pela organização da produção alemã partiu de uma iniciativa de rivalizar com a

produção de conteúdo feita pela Tríplice Entente (em especial os americanos) na

guerra ideológica. Um de seus principais acionistas Alfred Hugenberg se tornaria

apoiador de Hitler durante a República de Weimar sendo um fio condutor

fundamental ao aumento da popularidade do Fuhrer ao retratá-lo em seus

cinejornais, em exemplo semelhante ao da Itália fascista, divulgando os discursos e

conceitos difundidos pelo chanceler e garantindo seu cargo de ministro da economia

no governo posterior e deixando a Goebbels o domínio sobre o Ministério de

Propaganda, “desde o início de sua carreira política, Adolf Hitler já reconhecia o

enorme potencial oferecido pelas imagens , em especial pelo cinema , na veiculação

de ideologias e na conquista das massas. (WAGNER,) Tanto que em sua obra no

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38

exilio, Mein Kampf, Hitler deixa claro suas alusões ao papel do cinema e dos meios

de comunicação para a consolidação e disseminação dos preceitos políticos, para

tanto o mesmo chegou até a usar o cinema como cabo eleitoral através de

pequenos filmetes documentais antes mesmo da sua escalada ao poder, entretanto

com a criação do Ministério do Reich para Esclarecimento Popular e Propaganda

(Reichsministerium für Volksauflärung und Propaganda) em 13 de março de 1933, o

fenômeno da politização e nazificação de todas as atividades culturais alemães

tomou forma sendo inclusive o primeiro setor a ganhar departamento responsável

próprio, denominado Reichsfilmkammer (Câmara do Cinema do Reich) foi fundada

no mesmo ano e antes mesmo de todos os outros departamentos da

Reichskulturkammer (Câmara de Cultura do Reich). A adoção desta medida garantiu

o domínio da produção cinematográfica pelo governo que assumiria a dianteira

perdendo somente para os Estados Unidos em produção audiovisual, contabilizando

foram mais de 1.350 longas-metragens feitos durante a dominação de ultradireita,

de forma mais contundente do que a demonstrada pelo fascismo que mais se

baseava na propaganda politica direta pelos cinejornais, a Alemanha nazista exercia

a alcunha de maior controle e censor ideológico que os vizinhos ibéricos, sua

produção era definitivamente mais ativa politicamente e se constituía a partir de

muito conteúdo documental enquanto os filmes escapistas ficcionais ainda existiam

mas em menor volume, do contrário ocorrido no cinema de “telefone branco”

fascista. Vale destacar também os períodos pelos quais nesses 12 anos de regime

nazista, o cinema passou destacando as temáticas mais abordadas e também

somadas a qualidade técnica aprimorada pela experiência a nível industrial, o

primeiro momento da tomada de poder e consolidação da ditadura, se caracteriza

por uma produção mais voltada a exaltação dos feitos e discursos de Hitler e a

divulgação do partido, posteriormente a caricaturização e estereotipação dos

socialistas e dos judeus seria o tema recorrente para a banalização dessa população

e visando o afastamento de uma suposta tomada socialista, em outro momento a

dedicação total ao partido e a importância da adesão dos jovens será abordado em

dramas categóricos justificando a existência e incentivo a Juventude Hitlerista, a

partir de 1933 uma certa onda artística influencia por Leni Riefenstahl aborda de

forma documental a figura pragmática do líder em um discurso na capital Berlim na

obra mais famosa de todo o período, O Triunfo da Vontade (1935), um outro tipo de

Page 39: Monografia Cinema Nazifascista

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fotografia e recursos técnicos empregados resultaria numa vertente poética e culto

ao físico perfeito dos arianos em Olympia (1938).

Com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o cinema

nazista produziu quatro tipos de filmes de propaganda de guerra: 1) os

cinejornais semanais, intitulados Die Deutsche Wochenschau; 2) os

documentários de campanhas militares: Feldzug in Polen (“Campanha da

Polônia”, 1939), Feuertaufe (“Batismo de Fogo”, 1940) e Sieg im Westen

(“Vitória no Ocidente”, 1941); 3) os filmes ficcionais (musicais, romances,

dramas, aventuras) de guerra: Wunshkonzert (“Concerto a Pedidos”, 1940)

Stukas (1941), Die grobe Liebe (“O Grande Amor”, 1942); e 4) os filmes

históricos: Bismarck (1940), Die Entlabung (“A Demissão”, 1942) e Der

grobe König (“O Grande Rei”, 1942).

Com o fim do conflito se aproximando e a derrota inevitável, a última saída

explorada pelo regime foi através da suposição e glorificação da realidade em

superproduções que delineassem o futuro segundo a vitória do Reich, promovendo

mais uma vez a suspensão da realidade em detrimento do ponto de vista favorável a

ser explorado, a manipulação da verdade permaneceria até o fim, de forma que a

direção e mensagem de Hitler fosse se não realmente, ao menos virtualmente

registrada pelas câmeras de cinema.

2.3 Obras primas e a importancia na guerra ideológica.

Buscando uma interpretação cronológica das fases ocorridas dentro do

cinema de guerra manipulatório e da propaganda militar, tanto fascismo como

nazismo assumem formas distintas ao procurar retratar segundo seus interesses a

população tomada de maneira enérgica através de linguagens diversas, sendo

registros documentais ou o mockumentary, um tipo de filmagem encenada seguindo

a fórmula do documentário original, um tipo muito usado pela Alemanha ao encenar

discursos e desfiles militares totalmente planejados e por fim, o uso mais dominante

da ficção obedecendo ainda, de certa forma, as ideologias partidárias e os

interesses do Estado local, aparentemente envoltos por uma roupagem de produção

ingênua e enredos cotidianos, esses registros fílmicos também contavam com a mão

Page 40: Monografia Cinema Nazifascista

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dos regimes aliando-se a venda de valores complementar ao exposto pelos

documentários e cinejornais. A ampliação e centralização de investimento e órgãos

de aporte a cultura e fomento ao audiovisual, foram bases aliadas para o

desenvolvimento de uma linguagem única e o lançamento de uma montagem muito

bem executada para o período, não se relacionando a montagem intelectual

soviética no entanto, mas possuindo tanto quanto ou até mais dispositivos

tecnológicos empregados, além de estrutura física importante que no caso da Itália,

os remanescentes da Cinecittá seriam fundamentais ao surgimento do neorrealismo

italiano, algo que renova e destaca as suposições implementadas por Kracauer de

observar o aparato cinematográfico como figura orgânica dotada de vontades e

sensibilidade, já que a trajetória percorrida pelos cinemas do período de guerra se

constituem como o fundamento para vários outros movimentos de viés mais artístico

e temática completamente diferente, mas a sua ligação é inegável pelo fato de que o

cenário e o próprio espectador já haviam incorporado a importância das salas de

exibição.

Outro ponto a ser destacado dentro da filmografia fascista são as películas já

coloridas empregadas para poucos filmes ficcionais e mais aplicadas para registros

documentais que surgiram como pioneiras ante inclusive à indústria hollywoodiana,

sua preservação havia trazido algumas poucas obras já conhecidas a público, com

maior ênfase no cinema italiano, porém a descoberta há alguns anos atrás de um

bunker na Alemanha após obras de revitalização urbana repleto de películas

imaculadamente preservadas e com um conteúdo desconhecido, trouxe uma nova

visão do registro feito acerca dos fronts de guerra na África, o Africa Korps e até

dentro das lideranças estratégicas do partido em Berlim, esse material já colorido

originalmente pelo tipo de película, tinham dois aspectos esclarecedores: o primeiro

era sua função, que se baseava a principio em demonstrar para os comandantes e

generais a distancia dos fronts o que estava acontecendo e assim poder transmitir a

situação com maior fidelidade pelo advento das cores, auxiliando nas estratégias e

criação de equipamentos específicos e o caráter expansionista e esbanjador do

regime ressaltado pelo fato de que sem suas reservas naturais de minério, em

grande parte liquidadas pelo Tratado de Versalhes, a Alemanha dispendia de um

gasto imenso na importação das matérias primas necessárias para a fabricação de

tal película sensível e com a capacidade de captar as cores, buscando minérios em

áreas ocupadas e de maneira clandestina. A dimensão dos esforços de guerra se

Page 41: Monografia Cinema Nazifascista

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refletiram inegavelmente no cinema, tanto pela sua busca interminável pelo apoio

popular quanto pelo investimento na tecnologia a ser aplicada no campo visando

novos dispositivos de comunicação e o seu aprimoramento.

Ainda que relacionados, as definições distintas do cinema

fascista e o nazista começam já na sua abordagem em fase inicial, o cinema fascista

por um lado, permaneceu desestruturado até 1929, com Sole de Alessandro Blasetti,

concebido como o primeiro filme verdadeiramente fascista, após esse período com a

fundação da Luce, os “cinejornalis” constituíram a principal forma de propaganda do

regime, ainda que não assumindo uma linguagem tão doutrinada quanto no

nazismo, suas entrelinhas eram carregadas de apoio ao Dulce e eram previamente

aprovados pessoalmente por Mussolini, o “L.U.C.E. (L’Unione Cinematografica

Educativa), com sua ultramoderna instalação no sudeste de Roma, produziu e

distribuiu os documentários e noticiários do regime.”(WAGNER,) Em relação aos

documentários, de maior produção e bem elaborados se comprados ao cinejornais,

se destaca Noi, relatando a Marcha sobre Roma e as viagens de Mussolini a Milão e

Turim e considerado uns dos primeiros a ser elaborados pela Luce, no entanto,

algumas outras produções não influenciavam diretamente o apoio ao regime e

tratavam mais de um registro histórico da transformação urbana das cidades como

fez Dell’acquitrino alla giornata di Littoria sobre a modificação dos pântanos de

Pontino, por um lado, outros partiram para a glorificação dos atos de expansão

territorial e mostraram uma interpretação favorável do imperialismo fascista na

guerra da Etiópia, como em Il cammino degli eroi (O Caminho dos Heróis), mas

seria somente a partir da criação do imenso complexo da Cinecittá que obras mais

elaboradas e escapistas seriam feitas a partir das conhecidas películas de “telefono

bianco”, paralelamente o Estado passou a acirrar a campanha ideológica em filmes

de propaganda politica direta, como os exemplares Camicia nera de 1933 e Vecchia

guardia de 1934, entretanto esse tipo de abordagem não agradou ao publico , o que

refletiu na criação obras chamadas epopeias fascistas que fizerem a comparação

direta dos seus feitos com a Roma antiga, em grandes épicos, esse subgênero foi o

maior expoente da indústria ibérica, contando com obras como Scipione l’ Africano

(1937), de Carmine Gallone, Ettore Fieramosca (1938), Squadrone bianco (1936) e

Bengasi (1942), ambos de Augusto Genina, este tipo de filme de puro apoio bélico,

procurava ressaltar os aspectos heroicos de cada personagem do conflito, como os

aviadores, marinha e colaboradores vindos do Clero em suporte ao fascismo, uma

Page 42: Monografia Cinema Nazifascista

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breve interligação entre o franquismo espanhol apareceria nas telas correlacionados

a melodramas que narravam as conquistas da Guerra Civil Espanhola, como

retratado em L’assedio del’Alcazar de 1940 que contou com a participação de vários

atores espanhóis em uma regime de coprodução Itália-Espanha. Os últimos anos

finais no poder de Mussolini foram dominados pelo apoio de cineastas que

produziam filmes que não agradavam mais a população como antes, talvez até

alimentados pelo fracasso governamental ou o fim iminente da Segunda Guerra,

alguns artistas apoiaram Mussolini mesmo após sua deposição, mas a indústria

italiana cinematográfica não seria mais a mesma depois da devastação ocasionada

pelo embate.

No contexto nazista, a indústria alemã já enfrentava uma

situação muito mais bem estruturada se comparada à Itália pelo estimulo levado por

produções de vanguarda, intelectualizadas e até mesmo produções mais vulgares,

voltadas ao entretenimento das classes mais baixas, o cinema já era parte da cultura

do povo alemão, algo que foi incorporado imediatamente pelo partido nacionalista,

antes mesmo de Hitler chegar a ter amplos poderes seu apoio já vinha através

também dos cinejornais e pela construção da UFA. Em 1927 diversos filmetes de

propaganda eleitoral foram feitos em favorecimento de sua campanha politica, como:

Parteitag der NSDAP in Nürnberg (“O Congresso

do NSDAP em Nuremberg”, 1927), Hitlers Braune Soldaten Kommen (“Os

Soldados Marrons de Hitler Chegam”, 1930), Hitlerjugend in den Bergen (“A

Juventude Hitlerista nas Montanhas”, 1932), Triumphfahrt Hitlers durch

Deutschland (“Viagem Triunfal de Hitler pela Alemanha”, 1932), Hitler über

Deutschland (“Hitler sobre a Alemanha”, 1932) e Deutschland erwacht!

(“Desperta, Alemanha!”, 1932). (WAGNER,)

Com a tomada do poder por Hitler e a criação do Ministério de Propaganda e

Esclarecimento Popular e o fundo especifico para o cinema, as primeiras produções

propriamente nazistas focavam na adesão da juventude e a importância do seu

apoio por campanhas de fraternidade e colaboracionismo, posteriormente teria inicio

a fase de exaltação ao líder que perdurou por todo o Reich, o filme inaugural

relacionado ao enobrecimento de Hitler foi dirigido por Leni Riefenstahl, Der Sieg

des Glaubens de 1933 e apesar de sua controvérsia, caiu no gosto de Hitler e abriu

as portas para aquela que seria a obra mais conhecida de todos os regimes

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totalitários, O Triunfo da Vontade de 1935. Esse pseudodocumentário que mescla

imagens reais com as milimétricamente encenadas em Nuremberg, parte do registro

magistral da cineasta em fantasiar a realidade de forma a mascarar os limites entre a

verdade e o irreal, não existe forma de discutir quais partes são reais ou encenadas,

mas seja pela figura categórica do Fuhrer ou do poder incutido por Leni em seu

retrato do poder e dimensão da esfera nazista, o filme se tornou uma forte arma

ideológica que permanece até os dias de hoje discutida pela sua eficiência e

capacidade de manipulação. Nenhum outro filme posterior abordou de forma tão

clara a figura do ditador nem pela sua abordagem mais artística conforme o pedido

do mesmo, a saída encontrada foi relacioná-lo a figuras históricas de grande

importância como compositores e artistas plásticos, feito em películas como

Friedemann Bach de 1941 e Andreas Schülter em 1942. A mesma genialidade em

retratar a propaganda ideológica mas com uma abordagem e captura artísticas sem

comparações foi repetida em Olympia de 1938 no momento conveniente das

Olimpíadas realizadas em Berlim, no auge da doutrina nazista e sob as lentes

novamente de Leni, os corpos vistos como esculturas de culto a perfeição e as

aptidões físicas especificamente da população ariana exultaram em um resultado

fotograficamente exuberante mas principalmente no fortalecimento da crença acerca

as qualidades do super-homem de Hitler, os “poderes” cedidos aos arianos desde a

cultura nórdica nas runas como destacado em Mein Kampf e a justificativa para a

expansão territorial necessária para o desenvolvimento do raça ariana, além de uma

forma documental, os filmes da cineasta abordavam a temática de dominação sob

uma ótica estética única, combinando elementos artísticos e temáticos fundamentais

ao convencimento da população e levitando o carisma de seu líder, a forma

assumida para a montagem e dispositivos técnicos conduz a uma manipulação

muito perigosa da verdade que tende a enaltecer as conquistas nazistas e recrutar

novos membros. De qualquer forma, o retrato trazido por Leni foi mapeado

ostensivamente como maneira de estudo a comunicação de massa e sua

consequente eficácia, além de contribuir com a linguagem cinematográfica e da

propaganda em escala global.

Aliado aos filmes de exaltação racial, surgiram aqueles também em que se

inferiorizava os povos que constituíam a oposição ao regime, ou seja, judeus e

socialistas, a ferramenta antissemita de analogia entre o povo judeus e todas as

pragas mais comuns como ratos e vermes, foi um dos argumentos aplicados pela

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doutrinação ideológica como maneira de inferiorizar e justificar o ódio a esse grupo

social em uma interpretação didática expandida para toda a população, a

desvirtuação e reinterpretação errônea de supostos fatos históricos foi uma temática

abordada a partir de 1940 para produzir as primeiras obras carregadas de

antissemitismo, a venda da ideia do beneficio com as guerras napoleônicas e a

criação do personagem de um nobre do século XVIII que abusava de mulheres e

levou a morte de uma jovem ariana faziam parte da gama de enredos usados para

disseminar a estereotipação e raiva contra o povo judeu. Um exemplo de filme

clássico do assunto, seria Der Ewige Jude, traduzido como O Judeu Eterno de 1940,

feito por Fritz Hippler, uma espécie de documentário educacional sobre os malefícios

da população semita comparando-os de maneira didáticas a ratos oportunistas

dentre a crise alemã, outra obra importante para o período foi Der Führer Schenckt

de Juden eine Stadt (O Führer doa uma cidade aos judeus de 1944), um

documentário já ludibriado pela decadência do Reich em que é narrada e mostrada

a vida dos judeus como prolifera e farta dentro dos campos de concentração, a

tentativa incessante do Estado de maquiar sua real ação e as medidas tomadas

contra a população foi levada até o final de sua queda e é a tentativa principal desse

enredo. Mas não somente os judeus foram alvos das criticas e perseguições

nazistas e sim outras etnias como poloneses e tchecos também eram tachados de

alcoólatras e comparados aos bárbaros e inclusive a oposição dos Aliados,

compostas por americanos e ingleses eram abordados e moldados na imagem de

covardes e omissos como em Die Rotschilds (1940) e Titanic (1942) criticando o

capitalismo irracional que diziam ser exercido por esses países. Ao fim e já

consolidada a posição de derrota do sistema nazista, Goebbels investe pesado em

uma superprodução colorida chamada Kolberg (1945) que narra a resistência da

cidade as invasões napoleônicas e o espirito determinado da população alemã, o

filme voltado a reconstituição da moral e otimismo popular não obteve o resultado

esperado e serviria somente como argumento das lideranças nazistas em não

aceitar sua rendição. O contato e preservação posterior dessas obras se tornou uma

qualidade muito característica da cultura europeia.

2.4 Heranças e a preservação de arquivo.

Page 45: Monografia Cinema Nazifascista

45

Tão fundamental quanto a discussão sobre o conteúdo abordado nas obras

nazifascistas se faz também a preocupação acerca de sua importância histórica e

herança cultural assim como sua consequente preservação e valorização da

memoria de arquivo. O respeito pela própria historia conduz ao habito do registro e

as adversidades ocorridas em solo europeu fomentaram a iniciativa de arquivar seus

acontecimentos, exemplo nítido disto foi a facilidade com que os Aliados reuniram

provas contra os executores nazistas de suas atrocidades pela quantidade de

registro e documentação encontrado que descrevia nos mínimos detalhes todo o

plano de ação que englobava o transporte e massacre dos judeus nos campos de

trabalho e extermínio em grande parte do território polonês, a organização alemã

que por ora foi seu maior artificio, durante a ocupação e divisão do território para o

Tribunal de Nuremberg, iniciativa estrangeira para o julgamento dos crimes de

guerra, acabou sendo o maior acusador das provas irrefutáveis dos abusos sofridos

pelos enviados aos campos, as vitimas apesar da maioria esmagadora se

concentrar na população semita, também incluíam homossexuais, deficientes físicos

e mentais e outros que compunham a oposição como russos e ingleses. No

momento posterior a tomada e derrocada de Hitler o povo (conhecido como volk)

alemão negava a existência dos campos e insistia em não acreditar nas atrocidades

cometidas pelo regime que tanto apoiaram e acabaram por conduzir a tal situação, o

desconhecimento das mortes e os meios utilizados pelo controle radical do Reich na

execução do Plano Reinhard era a maior argumentação colocada pela população

alemã que preferia não acreditar nas noticias trazidas pelos vitoriosos, ainda como

forma de convencimento das próprias autoridades distantes desse cenário, a

Inglaterra até como forma também de propaganda politica encomendou um

documentário de um jovem cineasta de destaque em inicio de carreira para relatar e

filmar os campos como maneira de garantir sua veracidade e narrar o estado pelo

qual foram submetidos os judeus, esse jovem aspirante era na verdade Alfred

Hitchcock que concebeu um apanhado de imagens tão impactantes e bem

montadas que o filma acabou sendo proibido e arquivado no país de origem pelo

seu teor forte e realista, essa obra a pouco tempo atrás passou a ter trechos

disponibilizados na Internet mas ainda pouco se sabe dessa primeira impressão do

diretor mas foi definitivamente através desta oportunidade que Hitchcock encontrou

destaque para sua carreira e renome dentro do gênero de suspense, sua visão

deturpada da realidade e a distorção psicológica de seus protagonistas em muito

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simbolizam a experiência obtida pelo mesmo ao conhecer os campos e os horrores

cotidianos sofridos naqueles lugares, seu aprofundamento na distorção e

incapacidade de discernimento do ser humano, levaram a enredos perturbados

repletos de elementos aterrorizantes e uma ótica voyerista aflorada, como feito

também pelos nazistas ao se deleitar com o sofrimento alheio, vale destacar que

Hitchcock consagrado no gênero de thriller conseguiu sua posição não somente

pelas reviravoltas de roteiro, os mcguffins, domínio da fotografia e direção impecável

de atores mas também pela profunda prospecção e investigação dos aspectos mais

sombrios da mente humana, o relacionamento de Édipo entre mãe e filho abordados

em Psicose ou até mesmo a insistência na superioridade entre certos indivíduos

argumentada pelo personagem principal de Festim Diabólico com o consequente

assassinato sádico de outro colega como forma de justificar e comprovar seu

argumento, denotam uma concepção inovadora dos medos humanos e tornam

explícitos certos aspectos suprimidos no subconsciente como coloca Freud, pelo

convívio social.

A discussão sobre certos filmetes e documentários do período nazifascista

somente tornaram-se possíveis pela cultura de preservação que manteve esse

material histórico devidamente arquivado e estudado, essa preocupação com os

fragmentos originais de um período de anestesia social se tornam um passo

importante para a herança audiovisual pelo fato de que nessa época da exibição em

massa dos produtos do Estado totalitário, o corte final era feito pelo exibidor que

adequava o conteúdo ao seu gosto pessoal, mesmo com a edição marcada pelo

diretor original as peças de celuloide sofriam grandes influencias do mercado e

praticamente cada sala exibia sua versão da obra, essa característica que vem do

cinema mudo prejudicou a preservação de peças originais como Metropolis de Fritz

Lang que sempre foi exibida com a montagem feita a partir de diversos fragmentos

encontrados em cinematecas e museus ao redor do mundo sem se aproximar no

entanto, da intenção original do diretor, logo um documentário investigativo argentino

procurou supervisionar a descoberta recém-executada no mesmo país de uma

suposta cópia intocada de Metropolis com duas horas de duração e que incluía

cenas inéditas, a comprovação da descoberta provocou comoção mundo afora e

destaca a necessidade das condições apropriadas de preservação de material

fílmico e seu impacto nas gerações futuras, os filmes coloridos realizados sob altos

custos durante a guerra são uma memoria irrefutável da magnitude que o cinema

Page 47: Monografia Cinema Nazifascista

47

atingiu não somente dentro dos regimes totalitários mas principalmente a nível

global e a consagração conseguida através de seu poder de influenciar massas e

alto convencimento popular, a suspensão da realidade proposta por esse aparato

bidimensional rompe a quarta parede ao se aproximar de forma perigosa do

espectador mas é de fato, uma aplicação empírica de todos os estudos que abarcam

as teorias relacionadas a comunicação e construíram uma base formal sólida para a

consolidação do marketing e as estratégias mercadológicas de venda aplicada nos

meios de comunicação de massa até os dias de hoje.

4. CAPÍTULO 3: A paradoxal relação da satirização do domínio e a confluência

de informações das mídias digitais.

3.1 Constituição da aldeia global, multiplicidade e a perda da aura da geração

Youtube.

O advento tecnológico que propiciou e definiu a era digital a nível global,

trouxe consigo uma ferramenta fundamental que se caracterizou o pós-modernismo,

a internet. Os conceitos de Marshall McLuhan de aldeia global definem e

apresentam fielmente as transformações pelas quais tanto população quanto

economia e politica sofreriam com a rápida disseminação e alto fluxo de

informações, o fenômeno de globalização por uns definido como a partir do próprio

mercantilismo e o fomento a troca financeira e ao imperialismo enquanto outros dão

seu marco inicial com a revolução tecnológica ocorrida principalmente na segunda

metade do século XX, se formula como um conceito de múltipla interação e troca de

culturas conduzindo ao fenômeno de aculturação, ou seja, pela mistura e encontro

de vínculos culturais, as pequenas sociedades dotadas de manifestações próprias

passaram a ser massacradas e dominadas pela cultura de massa e de interesse

financeiro, as particularidades e costumes locais deram lugar a uma cultura

homogeneizada que não possui nenhuma afinidade com os trejeitos locais ou até

mesmo relação com raiz de determinado grupo social, esses resquícios únicos de

aprendizado e diferenciação passam a ser sorrateiramente substituídos por valores

Page 48: Monografia Cinema Nazifascista

48

de mercado e que correspondam as necessidades movimentadas pelo aspecto das

transnacionais, uma evolução das multinacionais que com esse fenômeno deixam

de ter um local ou sede original e ultrapassam as fronteiras físicas integrando

simultaneamente vários países ao redor do globo. O fim da polarização e o conflito

de blocos hegemônicos catapultou o fim da Guerra Fria mas consequentemente deu

inicio a uma disputa muito mais acirrada do que a anterior, porém ocorrida atrás das

cortinas, uma disputa de caráter capitalista financiado pela disputa de polos de

domínio e mercados encarcerados aos produtos de maior efetividade e poder de

decisão através de medidas como os monopólios e oligarquias gerais de apoio

politico ou inclusive por praticas que incluem o dumping por sua vez ilegal ou pela

bifurcação das holdings, seja como for o surgimento da globalização demonstra de

maneira empírica como a propaganda trata de homogeneizar a população e o

aparato fascista militarista retoma o cenário mundial pela imposição de valores por

determinado grupo social não restando escolha ao consumidor ou local de influência

estrategicamente invadido, analisando por uma vertente repleta de analogias, a

ideologia totalitária, seja ela do fascismo, nazismo ou qualquer outro grupo

extremista, faz menção a ferocidade capitalista pela inserção dos conceitos de

consumo, sendo a propaganda o grande herdeiro dos instrumentos práticos de

dominação. A contextualização histórica se faz presente pelo panorama propicio

para a rápida adesão as mídias sociais e a assimilação global da internet, o

surgimento do vídeo e sua praticidade de produção de conteúdo se comparada a

película suplanta antigos problemas de viabilidade e abre novos caminhos inclusive

a textura visual e abordagem técnica, traduzindo os anseios de uma sociedade fruto

das modificações tecnológicas e o rápido avanço cientifico, as preocupações

trazidas pela antecipação do imediatismo digital são demonstrados em obras como

Videodrome (1983) que inaugura um gênero, ainda que de certa maneira observado

como undergroud, de validar a ligação estreita em seres humanos e tecnologias em

especial a manipulação hipnótica exercida por seus meios de massa, a

correspondência instantânea leva em consideração o padrão insatisfeito que as

novas gerações carregam pela fome de informações constante, já que o trafego de

comunicação e troca é tão intenso que sua disseminação imediata conduz ao terno

estado cíclico da insatisfação, justificando o sucesso do mergulho virtual concedido

pela internet e o afastamento da vida real e deturpação do bem-estar, criando uma

nova sociedade refém da tecnologia e amparada por seus recursos, além de

Page 49: Monografia Cinema Nazifascista

49

viciados digitais que necessitam inclusive de reabilitação para retomar uma vida em

convívio social. Esse estado de bombardeamento psicológico também evidencia o

isolamento social perceptível nas gerações X e Y, criando a relação de

interpendência e expectativa antes esperada para se tornar um laço afetivo de

interação humana substituídos pelos entrepostos tecnológicos que dividem espaço

com os relacionamentos interpessoais, o crédito também cedido a esse tipo de

intercessão abre espaço para uma crença consolidada sobre os valores

fundamentais e de respeito ao diferente como os casos de ampliação da

discriminação e retalhamento as culturas opostas sempre amparados pelo interesse

financeiro do momento, a exemplo da xenofobia aliada das redes sociais para

propagar seu ideário intolerante tornou-se um alvo de maior destaque com o fatídico

11 de Setembro e a subsequente invasão deliberada dos países árabes produtores

e detentores do petróleo mundial, como as Guerras do Iraque e Afeganistão, o

embarreiramento sugestionado pelo estado para a falta de questionamento ou apoio

popular funcionam de maneira efetiva ao impedir a participação de grupos

opositores utilizando da ferramenta massificante amparada pelos meios de

comunicação.

Como forma também de disseminação de ideais em massa, o cinema seria

diretamente impactado pela transformação insurgente das modificações

instantâneas, o surgimento da internet e principalmente a chegada o vídeo, este

amplo cenário de intensa transformação tecnológica, acabou por incluir novas

características e opções de linguagens aos novos aspirantes e diretores que com o

aparto digital, puderam de certa maneira, democratizar a indústria, se anteriormente

somente grandes produtores e artistas de renome tinham acesso a bons

equipamentos para a produção de um longa, com o surgimento de câmeras com alta

qualidade de captação e outros aparelhos fundamentais para a construção fílmica a

um preço mais acessível, a revolução digital impactou diretamente o volume

produtivo das ações fílmicas pela facilidade no processo de criação e aumento na

concorrência inclusive com filmes maiores pela qualidade dos processos dos

vidomakers em regime homemade, em um cenário mais distante a priorização e

detenção dos grandes estúdios pela exibição nas salas de cinema, praticamente

inviabilizando o escoamento de menores produções experimentais que

permaneciam geralmente em exposições de arte ou cinemas de pequena

movimentação para a exibição desses produtos, porém com a democratização

Page 50: Monografia Cinema Nazifascista

50

trazida pelos equipamentos digitais e o portal de divulgação que se tornou a internet,

toda e qualquer produção audiovisual encontrou uma forma de ser sugestionada e

amparada por outros espectadores, este grande exibidor dentro da rede tomou

forma através do site Youtube. De inicio desacreditado, a ferramenta se tornou um

dos maiores domínios da internet mesmo tendo chegado há poucos anos atrás no

Brasil, o volume de produção de conteúdo é incontável e o bombardeamento de

novos rostos anônimos que do dia para a noite explodem em virais é

impressionante, vale destacar neste sentido, além da viabilização da produção e a

oportunidade dada pelo mesmo aos cineastas em inicio de carreira e até estudantes,

o caráter da propagação de ideologias e massificação promovida pela rápida

disseminação de padrões e estereótipos trazidos pincipalmente pela figura dos

vloggers que passaram a usar uma linguagem basicamente de jump cut (antes visto

mais comumente na Nouvelle Vague) para dar mais agilidade aos seus vídeos e

dessa forma muito diferenciada dos produtos vistos em TV ou cinema, a exibir suas

opiniões sem censura já que essa possibilidade é muito mais explorada no âmbito

virtual pela falta de entraves ou aparelhos que regulem a opinião ou interesses

alheios e desse forma ao se espelhar no anonimato e vestir a figura de uma pessoa

comum que dá seu depoimento em frente a câmera, passaram a respaldar uma

legião de seguidores que glorificam esses “ídolos” da internet e passam novamente

a adquirir e ser dominado por estas mesmas opiniões. Uma faceta perturbadora do

mundo virtual se dá na sua maior caraterística e por um lado dádiva, a rápida

disseminação e fluxo de informações instantâneas, já que pela sua rapidez um

mesmo conteúdo como um vídeo aleatório, por exemplo, começa a ser

compartilhado e comentado nas redes sociais em um fenômeno em cadeia que

constitui os virais, esses subprodutos tem vida curta mas enquanto permanecem em

seu pico demonstram o poder manipulatório da rede, através de uma febre

promovida pela massificação de opiniões e homogeneização de sentidos, pelo efeito

corrente, esse viral passa a ser propagado por mais e mais grupos sociais até

chegar ao seu esgotamento, onde por não ter realmente um conteúdo capaz de criar

novas fagulhas de interesse como o anterior, retorna ao mesmo anonimato de que

surgiu, logo da mesma forma que os virais passaram a integrar o movimento digital,

o poder de profusão dos mesmo passou a ser manipulado por certos fatores em

comum por experimentadores digitais que passaram dessa forma, a viver em função

dos mesmo e criar os virais propositalmente como porta para o sucesso, não é

Page 51: Monografia Cinema Nazifascista

51

incomum depois de uma overdose de determinada viralização, observar seu criador

criar novos canais e tentar reproduzir a mesma façanha para permanecer no topo,

apesar de arriscado algumas tentativas tem sucesso e demonstram como a internet

e a revolução digital dentro do espectro audiovisual modificaram a compreensão do

publico e principalmente a maneira de sua abordagem, entretanto esse impacto em

massa da informação transforma a internet em uma chave para a criação e

propagação de conteúdo ideológico, sendo seu perigo reservado não somente na

liberalidade ou aparente falta de censura e maior democratização, mas sim no

aspecto quantitativo, a imensa quantidade de pessoas atingidas por um mesmo

conteúdo se comparado ao período pré-digital.2

As modificações angariadas no dispositivo fílmico após as mediações

tecnológicas demonstram uma relação mais afinada entre arte e mídia trazendo

ainda novas sensibilidades e assim novos problemas de representação, com isto a

forma de se compreender o mundo se mostra atrelada aos conceitos estéticos

adotados dentro da hibridização do espaço em uma rede de conexões trazida pelas

múltiplas imagens, com isto, o período de pós-modernismo no âmbito

cinematográfico consolida a desintegração de qualquer unidade ou homogeneidade

discursiva alimentando as narrativas fragmentadas e o uso não-linear da imagem,

com isto um dos primeiros adventos percebidos nesse cenário se manifesta através

da linha do neobarroco salientando a estética da saturação e do excesso, tendo a

máxima concentração de informação num mínimo espaço-tempo, mas com uma

sociedade que emerge de conexões eletrônicas e anseia por uma demanda enorme

de informação a cada minuto, uma saturação de informação e exagero seria a saída

para a continuidade do interesse do espectador pela sétima arte, onde acostumado

a esses fluxo constante da globalização, terminaram por demandar o mesmo

enquanto publico de uma obra fílmica, por outro lado, o cinema anseia por refletir

diretamente as agonias sociais e sua demonstração não poderia ser diferente ao

englobar os afluxos característicos da modernidade e o compartilhamento

incessante de informação. Sendo assim, as novas produções advindas da revolução

digital exigem de certa forma uma nova postura de compreensão do receptor, ao

dissolver as fronteiras e apresentar a possibilidade da execução de planos híbridos,

representando desafios estéticos e por fim, dando espaço a manipulação da

2 Informação fornecida pela professora Roberta Linhares em entrevista concedida no dia 29 de agosto

de 2015, via internet.

Page 52: Monografia Cinema Nazifascista

52

linguagem e sua representação, essa metamorfose estética e linguística dá vazão

ao fim da referencia e uma nova abertura ao domínio sob o olhar do espectador, em

que partindo de uma metalinguagem, opta por expor a realidade desarticulada do

mundo moderno, pela síntese temporal de um conjunto de formas em mutação,

assim como as ideologias transitórias que circundam o universo das informações

instantâneas. O suporte também recebe modificações ao inteirar os dispositivos

imateriais, ou seja, a própria mídia digital, deste movimento a nostalgia cede aporte

ao novo na substituição de tecnologias, sendo imprescindível para fornecer novas

propostas criativas e dar origem ao paradigma digital, no consonante entre

democratização e ampliação da produção concedida pelas mídias digitais, um marco

histórico importante foi o “expanded cinema” que posteriormente seria uma base

estética aos vlogs e se constituem como uma prévia do conteúdo abordado

diretamente na internet, assim como a experimentação, traçando uma linha de

contextualização do cinema sinestésico que engloba os simulacros digitais de forma

em que a tecnologia de ponta visa reproduzir a realidade e propor o encapsulamento

do convívio, estas artimanhas tecnológicas representam a sede de manipulação e

principalmente domínio dos sentidos de maneira a consolidar todo e qualquer apoio

pela dominação dos preceitos e sentidos individuais, a representação da realidade

ou melhor sua busca, acaba por borrar as barreiras anteriores entre real e ficção, um

aspecto limítrofe cuidadoso da sociedade moderna sob a ótica das ferramentas

sistemática de manipulação.

3.2 A consolidação das novas midias e a incitação da intolerancia virtual, os reflexos

da narrativa nazi-fascista

A realidade passa enquanto amparada pelos dispositivos eletrônicos, a ser

moldada conforma a bagagem cultural de seu observador, de forma que as

modificações concedidas pelo capitalismo financeiro na ultima metade do século XX

e seus desdobramentos nas cíclicas crises atuais do sistema, resultam em uma

propagação de ideologias discriminatórias, distorcidamente amparada por fatores

econômicos e históricos, como a xenofobia crescente nos países europeus,

decorrente do êxodo entre países e a busca por parte das nações africanas e

orientais especialmente vindas do Oriente Médio pelas oportunidades oferecidas em

Page 53: Monografia Cinema Nazifascista

53

um país melhor estruturado e em alguns casos pela liberdade de expressão

apresentada em um ambiente sem a dominação intensiva do radicalismo religioso,

neste ínterim com o desemprego crescente e a má gestão dos recursos e serviços

públicos, a revolta popular toma forma de maneira similar ao visto anteriormente no

período nazifascista, com população e ideologias desestruturadas pelo desespero

da fome e falta de emprego, essas sociedades se mostram terrenos férteis para a

tomada de ideologias totalitárias e intolerantes como maneira de apontar culpados e

desviar o inconformismo para outros “culpados”, essa prática é crescente em

território europeu como demonstrado por seus parlamentos e articulações politicas

em que grupos de ideologia afinada a ultradireita neonazista já representam cerca

de 3% das cadeiras, apesar de aparentemente pouco, o poder trazido pelo apoio

destas ideologias e a demonstração de apoio a discriminação, priorizam o

retrocesso sociocultural de nações em amplo desamparo econômico, figurando os

causadores de seu estado em novas figuras sob o égide dos imigrantes, se por um

lado a globalização trouxe uma conexão e homogeneização de costumes pela

interatividade e contato de culturas distintas, a mesma também evidencia a rapidez

da propagação da intolerância e as ideologias contrarias ao contato das culturas

estrangeiras, a aversão ao respeito pelo “diferente” se manifesta na rede pela falsa

sensação de impunidade e controle da mesma, dando suporte, por exemplo, ao

bulliying virtual e às praticas de discriminação explicitas, a eclosão de movimentos

intolerantes tem uma marca no massacre do jornal francês Charlie Hebdo que

questiona os limites jornalísticos da liberdade de expressão e o respeito religioso,

entretanto os limites da liberdade e o respeito são profusos neste período em que

virtualmente o território parece livre a todos e principalmente sobre uma visão

estereotipada e discriminatória, um único individuo consegue angariar apoiadores

rapidamente e em qualquer local do mundo, facilitando o processo e a aparente

impunidade, essa facilidade que não existia no período entre guerras e era um forte

entrave a propagação de ideais por parte do Estado mas hoje essa desvirtuação do

propósito original da rede, se mostra como um dos maiores suportes a manipulação

e empoderamento de lideres ideológicos.

A expansão da consciência humana e das interações sociais ocasionaram um

fenômeno que apropria o erudito pelo massivo, denominado hibridismo, essa faceta

da multiplicidade remete ao conceito de Benjamin da perda aura da obra de arte,

onde ao mesclar origens e propostas universais a aura primitiva da obra dotada de

Page 54: Monografia Cinema Nazifascista

54

capacidade criadora passa a ser desviada ao incluir outras origens e abordagens em

si além de sua reprodução em massa acabar por desvirtuar seu impacto original e

sentido inspirador, pois a massificação e a ampliação de seu sentido passa a

corromper a proposta da apreciação individual e tomada de consciência única, logo

a reprodução em massa finaliza a mensagem e proposta criadora da obra para

substituir nas obras digitais a peculiaridade da participação e adesão do espectador

como montador e intérprete final, enquanto a interatividade é a chave para a

comunicação nas obras modernas, essa interação constante e sugestão participativa

do receptor é um ideal explorado pelas mídias digitais especialmente pela internet

em que o conteúdo passou a ser voltado pela construção de seu próprio publico,

essa ferramenta criativa foi determinante para o sucesso da rede em que a

personalização e participação encontrou um aporte na necessidade de apoio e

encontro psicológico do individuo em meio a uma realidade homogênea que não

constrói vínculos ou relacionamentos solidificados pela fluidez dos sentidos e

dinâmica de fluxo das informações constantes, logo se utilizando de aparatos

sensoriais como o giro, looping, a vertigem e o deslocamento, a realidade virtual

munida das sensações características da modernidade passou a figurar os

interesses e obter a identificação imediata de seus expectadores, isso explica de

certa forma, o sucesso e ascensão do anonimato por determinadas figuras que

simbolizam a vitória do cotidiano, comum sobre a fama e até explica como os sites e

a internet de forma geral, constituem uma parte complementar à própria narrativa

fílmica sendo amplamente exploradas como recurso pelas produtoras, a interação

passou a ser fundamental para a disseminação de qualquer conteúdo. Ainda dentro

do âmbito da metamorfose do olhar, o alongamento das modalidades perceptivas e

o consequente rompimento da quarta parede constituem elementos fundadores para

a hibridação dos suportes e linguagem construindo o corpo do cinema como

dispositivo e salientando o aspecto relacional (interatividade) surgido na era digital.

A rápida disseminação dos meios e fluxos de informações por fim, são

ferramentas e suportes fundamentais a propaganda politica e a propaganda de

maneira geral, a suplantação de ideais e identificação momentânea do público são

ditames utilizados desde a propaganda totalitária nazista e posteriormente adaptada

aos interesses capitalista de submeter à visão mercadológica, assim as descobertas

e resoluções funcionais da propaganda extremista forma aplicadas de maneira

semelhante pela indústria por sua alta efetividade e adaptação ao consumidor e da

Page 55: Monografia Cinema Nazifascista

55

mesma forma que consegue homogeneizar a população, o sistema capitalista se

espelha no fascismo através da imposição dos valores de consumo, submetendo

condições a determinados grupos sociais e se tornando assim, o grande herdeiro

dos instrumentos de manipulação, a exemplo claro disto, assim como os filmetes

ficcionais de alta produção eram exibidos seguindo uma imposição subliminar de

valores como comparar os feitos fascistas a glória dos gladiadores ou a coragem

alemã pelo desbravamento do seu território, a propaganda subliminar no Brasil teve

um caso famoso com marca Nescafé durante a ditadura militar, em um comercial

mostrando um casal alegre consumindo o produto da marca, uma música ludibriante

de fundo repetindo hipnoticamente a marca Nescafé era repetida incessantemente

atingindo níveis do subconsciente pela repetição, por essa faceta manipulatória após

esse comercial, criou-se a lei contra propagando subliminar no país visando

restringir esse tipo de ação de consumo direta.

3.3 Facilidade da disseminação ideológica e a criação de falsos profetas do

anonimato.

Uma das potencialidades mais performáticas que distingue os regimes

totalitários se concentra na importância do carisma de seu líder, chamados de Il

Dulce e Fuhrer, tanto Mussolini quanto Hitler desfrutaram do prestigio e admiração

do povo para consolidar seu poder e capacidade de manipulação massiva, a

propaganda mais do que necessária formou a ferramenta atroz que alimentou a

ferocidade de tais sistemas e salientou a necessidade de uma figura forte e de

capacidade inigualável no ganho de seguidores e apoiadores na sociedade.

Enquanto Hitler utilizou seu discurso baseado em distorções ideológicas e falsos

fundamentos científicos, a força de seu argumento se concentra basicamente no

crédito cedido a ele por sua articulação propagandística ao retratá-lo como herói do

povo que suplantou os agouros da prisão e exilio injustos, visando uma melhora de

vida do povo alemão e a conquista de um espaço que fosse condizente com a

posição supostamente superior ocupada pelo povo germânico, suas referencias iam

desde os druidas indianos para contar a confabulosa epopeia da origem divina dos

primeiros arianos e sua ascendência até a formação real da sua população

europeia, seguindo deste principio consegue com sucesso subverter os significados

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56

de tradicionais símbolos hindus como a suástica e mesclar seus interesses atrelados

a interpretação subjetiva das runas nórdicas, esse símbolo estaria presente inclusive

no uniforme da SS e a subjetividade imposta a interpretação de seus objetivos já

demonstra uma personalidade megalomaníaca e egocêntrica centrada em seu

universo particular, somada ainda a retorica do super-homem de Nietszche, a

propaganda ideológica nazista optou por deturpar valores já pré-assimilados e

aceitos pela população e usá-los em prol de seu interesse no apoio a tomada de

poder do partido, logo um das maiores contradições e prova irrefutável do carisma e

efetividade da figura de liderança do Fuhrer seria a adoção e principalmente

aceitação da concepção do ideal ariano enquanto seu próprio comandante e símbolo

maior da vitória sobre o povo semita, era fisicamente oposto ao ideal propagado por

sua obra e segundo apontado pelo partido, Adolf Hitler era de baixa estatura, de

feições grosseiras, cabelos escuros e constituição física contraria ao idealismo do

homem ariano padrão, sendo descrito como alto, forte e de traços finos com cabelos

e olhos claros, demonstrando a enorme disparidade entre as suposições de um

golpe de propaganda muito bem executado e a realidade demonstrada pelo mesmo.

Aliados de todos os grandes meios de comunicação de massa, a associação direta

entre o negativo e os semitas e a gloria com a população original, foram jogadas

bem executadas e amparadas para o sucesso definitivo do nazismo no poder, a

promessa de longevidade e resposta clara aos clamores maiores do anseio popular

serviram para saciar, mesmo que momentaneamente, as reinvindicações dos

setores mais impactados da sociedade, a imposição da figura do líder é uma

articulação necessária para a figuração de uma manipulação sistemática e

identificação imediata proposta pela base politica, todo sistema mesmo que não

doutrinador aparentemente, se baseia na liderança como maneira de assegurar o

sucesso e dar maior assertividade a suas propostas, exemplos disto ocorreram no

país a principio com Getúlio Vargas, dando inicio a politica do populismo, incitando a

reivindicação popular e apoio incondicional ao seu modo de governar, onde pelas

medidas de criação das leis e regulamentação da CLT foi alçado ao pedestal de pai

dos pobres e trabalhadores, originando uma condição de peleguismo, ou seja, troca

de interesses entre líder e povo contribuindo para sua imagem paternal

cuidadosamente construída, seu regime espelhado no cenário internacional durante

o Estado Novo de uma ditadura aos moldes mais conservadores foi completamente

esquecida ou justificada pelo massivo suporte popular causado pelo carisma reunido

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57

por Getúlio durante os anos de apoio aos sindicatos que consolidou seu retorno na

década de 50, outro exemplo de como o carisma e a venda da imagem certa pode

atrair os interesses voltado as vontades do Estado foi o uso por parte do governo

norte-americano do poder de manipulação e conquista do cantor Elvis Presley para

reunir jovens dispostos a servir no exercito durante a guerra após o mesmo ser

recrutado para fazer parte do poderio militar, a estratégia funcionou apesar de Elvis

nunca ter entrado em um combate efetivo mas a jogada de marketing sobre a figura

jovial serviu como forma de espelhamento para vários jovens que passaram a servir

o exercito depois do episódio, a grande preocupação do líder é a sua carência

dentre a população. Esse reflexo é sentido atualmente pela alimentação deste afluxo

de identificação pelas mídias digitais, a figura dos grandes lideres hoje se consolida

pelo estimulo virtual e sua relação imediata com o espectador, a mediação

tecnológica impulsiona a técnica de escritura múltipla que se caracteriza pela ampla

compreensão de valores e a escolha interativa do receptor no produto audiovisual,

mesmo com a necessidade que a imagem eletrônica possui por um mediador, sua

potencialidade e complexidade aumentam de forma exponencial se comparada aos

produtos arcaicos do período nazifascista, desta maneira a concepção de lideres na

rede se constrói pela figura mundana e caseira dos vloggers no caso do produto

midiático e inclusive pela incitação de valores em alta como pressuposto para a

conquista de uma legião de seguidores que passa a imitar e compartilhar das

mesmas opiniões de seu ídolo virtual, a rápida identificação do espectador com as

figuras que emergem do aparato digital se dão através da intensidade da troca de

informações e principalmente pela substituição da imagem antes inatingível imposta

pelo star system para ídolos mais palpáveis e atingíveis com defeitos mundanos e

que assim passam a ser admirados por este mesmo motivo, a irrealidade e o mundo

paralelo criado pelas estrelas hollywoodianas de vida idílica passa a cada dia ser

mais substituída pelos ídolos do real e da produção de contracultura se comparados

ao convencional, ou seja, das formas de produção caseiras e independentes.

Os resultados somatizados a partir do valor do culto ao líder também se

beneficiam de outros ditames dentro da propaganda e do marketing consequente

que auxiliam na construção e aceitação do sistema imposto, a manipulação

ideológica no campo digital se dá atualmente com base nos resultados das ações

publicitárias na internet e a agilidade na disseminação de compartilhamentos em

escala muito maior se comparada ao tradicional boca a boca, a personalização das

Page 58: Monografia Cinema Nazifascista

58

campanhas que acompanham os interesses individuais da população que se utiliza

dos meios midiáticos e a persuasão que conduz a crença de informações sem

qualquer investigação prévia, suscitam o bombardeado e profusão de novas ideias

que optam por rodear o imaginário do consumidor e não deixa-lo fazer suas próprias

escolhas sem julgamento pré-concebido incitado pelas campanhas. Os casos de

marketing virtual que disseminam os valores de obras fílmicas e auxiliam em seu

lançamento ao incumbir uma falsa verdade é uma técnica usada pelas produtoras

especialmente em produtos de terror voltados para o publico adolescente que acaba

sendo o maior consumidor do universo virtual e consequentemente o que se adentra

e conhece melhor este aspecto e com isto demonstra a vulnerabilidade a que os

internautas estão sujeitos ao sustentar a crença de que o produto audiovisual é

dotado de uma verdade intrínseca, já que ver nem sempre é crer dentro da internet,

um filme que se beneficiou na época do marketing boca a boca e da rápida atenção

dada às lendas urbanas que reúnem medos coletivos e a lembrança associada a

fatos reais, foi o filme A Bruxa de Blair (1999) novamente um pseudodocumentário

que relata a busca pela tal bruxa por três jovens estudantes, segundo a ação

publicitária a obra se tratava de filmagens reais encontradas na floresta e depois

remontadas, parte do planejamento foi incluir no enredo atores desconhecidos sem

creditá-los e espalhar a lenda dentre grupos jovens, de qualquer forma o impacto do

filme foi marcante dentro do cinema tanto pelo seu feito orçamentário quanto em

logística de produção mas demonstra a maleabilidade a que o real está sujeito

quando alçado dentro dos interesses capitalistas, esse mesmo artificio foi

novamente usado em dois casos diferentes mas com uma grande ajuda das redes

sociais para sua divulgação das produções, a primeira em Desaparecidos (2007) foi

uma proposta nacional de um conceito americanizado de terror após um grupo de

jovens se perder em uma floresta em Ilha Bela durante uma festa porém sendo uma

coprodução Brasil/Canadá o maior destaque foi reservado aos efeitos especiais e a

uma inteligente jogada de marketing para conquistar a plateia em que já reside um

certo preconceito com produções nacionais ainda mais desse gênero, logo a ação

se baseou na criação de perfis falsos no Facebook dos personagens do filme como

se realmente fossem pessoas reais e em poucas horas a produção do filme reuniu

milhares de amigos para esses “simulacros” dando maior veracidade as suas

paginas e depois criou outra pagina de divulgação de uma suposta festa que seria a

divulgação de uma marca de bebida e apenas alguns sortudos seriam sorteados

Page 59: Monografia Cinema Nazifascista

59

para participar, obviamente os escolhidos foram os mesmos perfis dos personagens

que após a viagem pararam de movimentar suas redes sociais, logo em uma

sociedade que vangloria o selfie, a morte virtual representou um reboliço na rede em

busca dos jovens que teriam desaparecidos, o aspecto mais interessante deste

apelo comercial que beirou o experimento social foi a comoção por jovens que

ninguém nunca havia visto e a crença inquestionável na verdade fornecida por um

meio volátil como a internet, a abordagem funcionou e mesmo não rendendo forte

bilheteria, a propaganda bem alinhada e disseminada como maneira de demonstrar

um uso inteligente e barato das redes sociais como divulgação eficiente, ganhou

destaque. Depois da obra nacional, novamente as produtoras, nesse caso

americanas, se utilizariam dos virais para criar uma nova realidade sobre as lendas

urbanas e o ocultismo, mesmo este tema atraindo naturalmente a atenção do

publico por ressaltar o inexplicável e o sobrenatural, a produção de pequenos vídeos

que retratavam a brincadeira Charlie Charlie que buscava trazer a tona um demônio

mexicano com um contexto bem executado pelo planejamento de merchandising,

inundou a internet com experiências que em muito lembravam as tradicionais

brincadeira do copo ou o tabuleiro ouija, uma das maiores consolidações do viral foi

através da adesão de vloggers e figuras da internet já com certo numero de

seguidores que creditavam a experiência e relatavam o distúrbio por essa entidade,

o pânico geral se espalhou pelas redes e vários também buscaram reproduzir o

jogo, após alguns dias de rebuliço a produtora emitiu uma nota no Twitter admitindo

se tratar de apenas um artifício de marketing para a divulgação do filme A Forca

(2015) e ressaltar mais uma vez a confiança e crença inquestionável da população

sobre os meios digitais e o perigo apresentado pelo seu poder de indução e

manipulação.

O alcance da fama e a preocupação com o reconhecimento são também

alguns dos motivos pelos quais o surgimento da internet e o compartilhamento foi

tão bem sucedido, em um retrospecto histórico e artístico em plenos anos 60, época

da efervescia jovem e as novas reinvindicações politicas trazidas pela criação da

pílula, a luta pelos direitos civis da população negra e uma maior liberalidade das

drogas, a pop art pelas mãos de Andy Warhol visava expor a multiplicidade pela

repetição que a modernidade havia trazido para os meios de comunicação, sua

distorção de símbolos já reconhecidos e admirados como Marilyn Monroe e até a

lata da sopa de tomate Campbell buscava levar ao questionamento e reivindicar o

Page 60: Monografia Cinema Nazifascista

60

bombardeamento dos meios de comunicação de massa pelos padrões da sociedade

de consumo, seus filmes de horas a fio retratando ações cotidianas foram influentes

no encontro de cinema e videoarte para a comunhão do fluxus, ou seja, arte e mídia

interconectadas, estabelecido a necessidade de mediação para sua arte eletrônica.

Sendo também um investigador social, Warhol estabeleceu um ditame para a

sociedade midiática e a sua cultura de culto as celebridades que se traduziu na

frase: “No futuro todos serão famosos durante quinze minutos”, profetizando a

situação da massificação das artes e manifestações culturais do futuro,

demonstrando o maior interesse na sociedade moderna e as atribuições adquiridas

pelo meio digital facilitando a criação de novas figuras capazes de fomentar a

formação de opinião e influenciar nas crenças individuais com maior agilidade se

comparadas ao período sem a presença da internet, o aparente desaparecimento

dos suportes e a reapropriação da mídia levam a crer num futuro rondado de bytes e

informação imaterial em uma aproximação com outros tipos de linguagem

audiovisual, reservando ao cinema um futuro incerto mas garantido a permanência

das influencias e opiniões por parte da sentenciação e domínio sistemático.

3.4 A prospecção de novos apoiadores e o combate virtual

A adaptação como parte do mecanismo de sobrevivência e evolução do

marketing, assim como feito pelos organismos orgânicos se utiliza da ferramenta

pela vigilância virtual com enfoque nos hábitos de consumo, essa tomada irrestrita

de dados pessoais é ainda mais comum do que parece, o registro de compras de

determinado consumidor é usado para validar o logaritmo que reconhece possíveis

interesses de compra atrelados ao ato anterior, o reconhecimento também de

gênero e faixa etária segundo registrado em outras contas também é um fator para

discernir as possibilidades de compra e oferecer algo mais personalizado para o

receptor, além disso a vigilância é um característica cada vez mais presente na

sociedade integrada as mídias digitais tanto pela necessidade de compartilhamento

da rotina com conhecidos quanto pelo status fornecido e alimentado pelas redes

sociais, da mesma forma a vigilância pelo sistema dominante se baseia na captação

dos mesmos hábitos de consumo e rotina assim como os dispositivos de segurança

que permeiam os grandes centros urbanos incessantemente, a realidade

multicultural e integracionista remete ao ambiente suscitado por George Orwell em

Page 61: Monografia Cinema Nazifascista

61

1984 pelo controle incisivo do Estado e o auxilio das mediações eletrônicas neste

controle, as garras do sistema passam a se estender sobre sua população que

segue acostumada com a situação, o mesmo ocorre atualmente pelo controle

invisível exercido pela rede e dispositivos moveis, a integração total de todo e

qualquer aparato reaviva o argumento do Estado tentacular de Foucalt, referência na

construção da obra 1984 que já demonstrava a preocupação com o futuro depende

do entreposto eletrônico, além das habilidades práticas compostas pelos aparelhos

multitarefa, a conexão integral ilimitada já constrói vínculos sólidos na vivencia da

sociedade que se vê entrelaçada com o advento digital, a restrição do uso de tais

aparatos ou até a falha de um desses sistemas já é capaz de desnortear relações e

mercado interconectados pela internet, mais do que um facilitador, a tecnologia

passou a conceber integralmente o espaço-tempo dentro dos grupos sociais

urbanos. A relativização da verdade e a interconexão dos meios passaram a

evidenciar a busca pela totalidade nas artes dando origem a hipermídia, fenômeno

que passa a romper limites e barreiras entre uma área e outra e a englobar multi

interpretações, a apropriação da mídia anterior pela nova mídia como salientado no

hibridismo, cria quimeras tecnológicas que naturalmente absorvem conceitos

anteriores e os reapropriam segundo abordagens alternativas pelos novos

interesses e possiblidades narrativas amparados pelo desenvolvimento tecnológico,

em um movimento cíclico de “continuidade e ruptura”, este estado de hipermídia se

constrói pela gama de possibilidade apresentadas na flexibilidade do material digital,

permitindo sua maior manipulação e onipotência do espectador, com papel decisivo

na interpretação das obras, logo a adaptação do aparato tecnológico e a

interdependência em relações humanas, remete ao conceito da inteligência artificial

como aporte para a quebra das relações humanas e sentimentais, o tema abordado

em Ela (2013) retrata exatamente a criação de um novo sistema operacional dotado

de personalidade própria e capaz de interagir de maneira orgânica com seu

detentor, assim o futuro incerto narrado pelo protagonista apaixonado pelo seu

sistema operacional passa a refletir as oportunidades deixadas de lado quando a

ótica tecnológica passa a dominar os interesses sociais, mesmo como ferramenta

eficiente para a propaganda e venda imediata de conceitos e produtos, a mediação

eletrônica acaba por fragmentar uma porção fundamental da intercessão e

aprendizado humano pelas relações que exerce em sociedade, assim como o

fracasso sentimental do personagem é exposto no filme e a facilidade pela qual se

Page 62: Monografia Cinema Nazifascista

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expressar através da mídia eletrônica como uma espécie de barreira aos desatinos

da convivência em grupo, a participação dos simulacros de forma cada vez mais

ativa na realidade contemporânea demarca a opção de viver e saborear uma

realidade criada e que segue certos limites de dificuldade impostos pelo seu criador

em detrimento de aprender a sobreviver a uma realidade palpável das interações

pelo medo do fracasso e rejeição, logo são nestas brechas que a dominação do

sistema e a vigilância se inteiram para impor sua ideologia pretendida e passam a

mediar toda e qualquer inter-relação humana, de forma mais abrangente é

indiscutível que a tecnologia reconfigura a experiência cinematográfica de maneira

que o olhar do espectador deve se adaptar a novas experimentações e

interpretações do próprio significado de “cinema”.

4. CONCLUSÃO

Seguindo uma analise histórica que justifica os motivos da aceitação e

adesão aos sistemas nazifascista pela desesperança geral da situação político-

econômica, se faz possível a narração história e a percepção apurada dos

sentimentos da população através da ótica cinematográfica que permanece ligada

as ferramentas de dominação dos sistemas políticos e já em seu nascimento

contribui para o relato e disseminação de ideais que compreenderam a

suplementação dos quatro pontos de fortificação da identidade social individual e

através do primeiro impacto pôde evidenciar a luta bélica e o afastamento da

sexualidade do ideário popular além de construir o cenário propicio a aceitação da

crise de 29 e o apoio na consolidação dos Aliados, desta forma usando a analise

empírica dos fatos narrados sobre a ótica de mestres como Freud e Kracauer, o

cinema alemão do pós guerra passa a ser observado como um chamariz para as

atrocidades que viriam a seguir pelo Estado nazista e a intolerância propagada por

Hitler na distorção dos argumentos de Nietzche, o surgimento dos outros sistemas

totalitários pela Europa como Mussolini principalmente, mas também Salazar e

Franco, demonstram a vulnerabilidade social aos governos de ultradireita e as

ferramentas de desenvolvimento da propaganda que foram o artificio de maior

eficiência para a consolidação dos partidos pelo culto ao líder e a narração fílmica

Page 63: Monografia Cinema Nazifascista

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dos feitos nazifascista na comparação direta com a glorificação histórica, seja pelos

gladiadores ou pelos druidas na formação do povo ariano, de qualquer maneira,

além da prova irrefutável da ação corrosiva da propaganda sobre a ideologia

popular, os arquivos remanescentes desse período servem também para denotar a

atenção ao registro e o cuidado sobretudo com a preservação de um momento

histórico único que rendeu heranças até os dias atuais, tanto que a manifestação da

intolerância pelas mídias digitais se dá de forma efusiva e ágil demonstrando que as

ideologias passadas não foram esquecidas mas sim reconfiguradas aos dispositivos

eletrônicos, vale dessa maneira estudar e entender os princípios da dominação pela

propaganda e a influencia direta da internet nas relações interpessoais como a

ultima alternativa para se impedir que a intolerância e o radicalismo em meio a um

mundo de progressivas crises financeiras não se torne novamente um terreno fértil a

proliferação do ódio e discriminação.

Page 64: Monografia Cinema Nazifascista

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AQUINO, Rubim Santos Leão de et al. História das Sociedades: Das

Sociedades Modernas às Sociedades Atuais, 41 ed. Rio de Janeiro: Editora Record,

1999. 643 p.

BOCK, Ana Mercês; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi.

Psicologias: Uma Introdução ao estudo de Psicologia, 13 ed. São Paulo: Editora

Saraiva, 1999. 361p.

KRACAUER, Siegfried. De caligari a Hitler: Una historia psicológica del cine

alemá. 1 ed. Barcelona: Paidos Espanha, 1985. 339p.

LAKS, Aleksander Henrik; SENDER, Tova. O Sobrevivente: Memórias de um

brasileiro que escapou de Auschwitz, 10 ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 2000.

172p.

LINHARES, Roberta. Análise histórica acerca do periodo nazifascita e as

implicações da imposição ideológica. Rio de Janeiro, 29 ago. 2015. Entrevista

concedida via internet. (Professora licenciada em história pela UNISUAM, filosofia e

sociologia pela Gama Filho, pós-graduada em gestão da filosofia e mestrado em

educação)

MASCARELLO, Fernando (org), História do cinema mundial, 6 ed. Campinas:

Papirus, 2006. 432p.

PEREIRA, Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda política no fascismo,

nazismo, salazarismo e franquismo. História: Questões & Debates, Curitiba, ano 20,

n. 38, p. 102, jan./jun. 2003.

STIRLING, James. As implicações do cinema nazi-fascista e a decorrência na

internet. Rio de Janeiro, 23 ago. 2015. Entrevista concedida via internet. (Professor

licenciado em história pela UERJ desde 1987, pós-graduado em Brasil República)

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ANEXOS

ANEXO A – Comparativo entre cenas de Metropolis (1920) e os campos de

concentração nazistas.

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ANEXO B – Cenas retiradas dos filmes de propaganda nazifascista.

O Triunfo da vontade e Olympia de Leni Riefenstahl

Camicia Nera de 1933 e Squadrone bianco de 1936