Mais MZ - Edição 0
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Negócios Salimo Abdula
O incontornável homem
de negócios
Cultura Calane da Silva Escritor com um músculo
intelectual erudito
Dossier Agricultura
Representa 25,5%
do PIB
MA
ISM
Z.C
OM
Edição 0 / 2012 80 Meticais 2,8 USD
Salimo Valá Economia Moçambicana: Crescimento Espantoso
2
Salimo Valá:Economia Moçambicana,Um crescimento espantoso
Moçambique na rota das tecnolo-gias de ponta
País de encantos
Salimo Abdula: O Incontornável homem de negócios
Verdadeira ascensão
Mais MZ por Sérgio Esteves
Sector da Agricultura em Moçambique
Vulnerabilidade associada à pobreza extrema
Calane da SilvaPrémio José Craveirinha 2011
Em Foco
Dossier
Ambiente
Cultura
Inovação
Tradição
Bio Missão
Repórter
Turismo
Crónica
08
24
38
48
18
46
56
16
42
54
30 34FDC:Ajudando o país a construir sorrisos
Autênticos milagres de carvãoe gás natural na Pérola do índico
Sumário
Vamizi: A ilha Esmeralda
Descobrir
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Todos os projectos nascem de um sonho, de um desejo de
criar algo que movimente o mundo, o ajude a crescer e o
transforma num espaço humano e de dignidade. Sei que não
é tarefa simples. Mas são estes desafios que me cativam. E a
+MZ nasceu desta vontade, uma revista que quero multite-
mática, que seja parte do desenvolvimento de Moçambique,
que crie ideias, derrube barreiras culturais e sociais e consiga
unir Moçambique em projectos válidos e de futuro.
Associado ao sonho da revista, a +MZ também nasce como
forma de intervir socialmente e traçar em arco-íris, nas dife-
rentes cores, matizes sociais de equidade, de liberdade, de
desenvolvimento do Homem, de desenvolvimento do país.
Na verdade, o desejo é simples: editar a +MZ como forma
de textos livres, torná-los de fácil leitura, atraentes; quero
criar uma unidade na diversidade de temas, de ideias, de
propostas, de conhecimentos, de vida.
Com o grupo que escolhi para dar corpo a este projecto, con-
segui dar fundamento a este desejo e tenho a certeza que,
aos poucos, ele será ampliado e reconhecido. Só com muita
dedicação e persistência se consegue concretizar sonhos.
Quero a +MZ como enciclopédia de saber múltiplo e plural,
e o caminho que vai percorrer ajudará a clarificar alguns
conceitos e a criar uma país mais crítico, inovador e
ambiental e socialmente mais responsável.
Estatuto Editorial
Editorial
Está nas vossas mãos a revista de apresentação. Não quero
destacar temas por sentir que todos fazem parte de um
conhecimento múltiplo e são, todos eles, a vida, o traba-
lho, o empenho de cada Moçambicano na construção de um
país. Será esta primeira imagem que vamos manter, com
muitas outras ideias e desejos que vão criar em cada +MZ
algo que acreditamos ser inovador e essencial.
Quero a +MZ como enciclopédia de saber múltiplo e plural, e
o caminho que vai percorrer ajudará a clarificar alguns con-
ceitos e a criar uma país mais crítico, inovador e ambiental e
socialmente mais responsável.
Tenho de agradecer a quem tornou este projecto possível, a
quem de perto sempre nos apoiou, às primeiras empresas
que acreditaram no nosso projecto e que patrocinam a +MZ,
são elas que tornam o projecto viável. Agradeço a quem tem
a revista neste momento nas mãos e lê estas curtas pala-
vras… mas o coração da revista são os textos e as palavras
que nos levam, nas nossas mãos, Moçambique.
Sádia Ibraimo.
+MZ é um projecto de informação. +MZ é uma revista mensal multitemática, orientada por critérios de rigor e criatividade editorial, sem qualquer dependência de ordem ideológica, política e económica. +MZ inscreve-se numa tradição de jornalismo exigente e de qua-lidade, recusando o sensacionalismo e a exploração mercantil da matéria informativa, comprometendo-se a assegurar o respeito pelos princípios deontológicos e pela ética profissional dos jornalistas. +MZ aposta numa informação diversificada dentro de áreas transversais à sociedade, orientada para a multiplicidade cultural de Moçambique. +MZ apresentará trabalhos jornalísticos de investigação, entrevistas, reportagens, dando cor à diversidade de temas em todas as edições. +MZ estabelece as suas opções editoriais sem hierarquias prévias, numa constante disponibilidade para o estímulo de tudo o que faz parte do desenvolvimento social sustentável, assumindo nas suas opções responsabilidade social e ambiental.
+MZ não fixa fronteiras regionais, nacionais, culturais e ideológicas. +MZ participa no debate das grandes questões se colocam à socie-dade Moçambicana na perspectiva de uma descoberta mútua entre palavras e realidade. +MZ é responsável apenas perante os leitores, numa relação rigorosa e transparente, autónoma do poder político e independente de pode-res particulares. +MZ situa-se no terreno dos que sentem que outro mundo é possível. +MZ terá autonomia para, nas suas opções editoriais, alargar o seu campo jornalístico. +MZ distingue claramente informação de opinião, respeitando sem-pre os leitores. +MZ terá a criatividade sustentada numa clara opção de rigor jorna-lístico, abrindo portas ao debate social de forma a fomentar e criar sociedades responsáveis e críticas.
Fabrico e comercialização de cartuchos
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Localização da Empresa/Contactos: Av. Samora Machel, Parcela nº 10, Estrada Nacional nº 4, C.P. nº 1007. Matola – Moçambique
Fabrico e comercialização de cartuchos
6
A Primeira exportação de minério de ferro produzido no dis-
trito de Lalaua, província de Nampula, terá lugar até ao final
do ano, tendo como destino a China. O primeiro lote será cons-
tituído por cerca de 28 mil toneladas de magnetite de ferro,
actualmente armazenado nas instalações da Damodar Ferro
Limitada, dona do projecto.
Mais de 300 turistas de diversas nacionalidades, com destaque
para sul-africanos, visitaram no primeiro trimestre do ano em
curso, o Parque Nacional de Zinave, em Mabote.
Antílopes, boi-cavalo, zebras e girafas são os animais que, neste
momento, podem ser observados no Parque Nacional do Zinave,
havendo previsões, segundo prometeu o respectivo administra-
dor, da introdução de mais quantidades dos mesmos animais,
alguns dos quais em extinção. Pretende-se com este acção que o
parque seja também de grande referência na região sul do país. Para
complementar as actividades turísticas, no interior de Inhambane,
funciona no Parque Nacional de Zinave um lodge comunitário edi-
ficado com objectivo de permitir o alojamento dos turistas.
Moçambique é o segundo país da Comunidade
de Desenvolvimento da África Austral (SADC)
com maior participação feminina no par-
lamento, cuja representação é estimada em
39,2% do total dos 250 deputados.
De acordo com os dados divulgados pela pre-
sidente do Grupo Regional de Mulheres Par-
lamentares da SADC, Beatrice Nyampinga,
sexta-feira última, em Maputo, a nível da
região, a África do Sul tem a maior represen-
tação feminina no parlamento, com 45 por
cento de mulheres no total dos deputados.
Minas de Lalaua em Nampula: Primeira exportação de ferro para China
Inhambane: Turismo cinegético em alta no Zinave
Parlamentos da SADC: Moçambique com segunda maior participação feminina
O Porto de Maputo projecta investir pelo menos 322 milhões
de dólares no período de 2012 a 2014 em obras de dragagem,
construção de novos cais de acostagem e desenvolvimento dos
terminais de carga.
Alinhados com o objectivo de aumentar a capacidade de carga
e melhoria da qualidade de serviços prestados aos utilizado-
res, os investimentos visam igualmente corresponder ao pre-
visto crescimento da demanda de serviços portuários devido ao
incremento do comércio entre os países bem como elevar a com-
petitividade do porto no contexto regional e internacional.
Sobre os investimentos projectados até 2014 a prioridade vai
para a construção de novos cais de acostagem, que deverá
consumir cerca de 121 milhões de dólares ao longo dos três
anos, o desenvolvimento de terminais de carga com orça-
mento estimado de 118 milhões de dólares, bem como a draga-
gem do porto para profundidades até os 14 metros, uma acção
prevista para 2013 com um custo estimado de 83 milhões de
dólares. Outras intervenções previstas para o mesmo período
abarcam os sectores de vias de acesso, nomeadamente estra-
das e vias-férreas, segurança e iluminação, serviços maríti-
mos, edifícios e outras infra-estruturas.
Nos próximos oito anos está previsto um incremento dos volu-
mes da carga manuseada no Porto de Maputo dos actuais cerca
de 12 milhões de toneladas para 40 milhões de toneladas por
ano. Na grande maioria esta carga será constituída por carvão,
magnetite e outros minerais, esperando-se que aumente tam-
bém a demanda de transporte de combustíveis, produtos agrí-
colas e carga contentorizada.
Com olhos postos na concorrência: Porto de Maputo seduz potenciais clientes na RAS
Breves
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- Curso de Formação de Vigilante Estático
- Curso de Formação em Reacção/Resposta Armada
- Curso de Formação de Vigilante Armado – Atirador de Posto
- Curso de Formação em Transporte de Valores
- Curso de Formação em Protecção Pessoal (Guarda – Costas)
- Curso de Formação de Supervisor de Segurança Privada
- Curso de Formação de Inspector de Seguranca Privada
- Reciclagem, Limpeza e Manutenção de armas de fogo
CFV – Centro de Formação de Vigilantes, Av. Samora Machel, Parcela nº 10, Estrada Nacional nº 4, C.P. nº 1007. Matola – Moçambique
Telefone: 00258 21 749 196 | Fax: 00258 21 749 197 | Cell: 00258 82 5945963 | E-mail: [email protected]
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AGRICULTURA EMPREGA 90% DA POPULAÇÃO ACTIVA
Os fundamentos da economia moçambicana estão estáveis, temos um país que nos últimos 12-15 anos tem estado a conhecer um ritmo de crescimento económico na ordem de 7-8%, numa média de 7,5%/ano, temos um nível de inflação controlado, com a previsão de cerca de 7,2% este ano” – ponto de vista do académico moçambicano Salimo Valá. O desempenho da economia moçambicana traduz-se igualmente no aumento progressivo do PIB per capita, situando-se actualmente na casa dos USD 580-588.
“Isto dá um sinal claro de que a economia está no bom
caminho”, diz Salimo Valá, exemplificando com cresci-
mento nas áreas de construção, infra-estruturas socio-
económicas, transportes e comunicações, electrificação
rural e agricultura, base de desenvolvimento do país. Ele
reconhece, no entanto, que o crescimento na agricultura
está aquém do desejado, situação que se pretende alterar
com o aumento dos níveis de produção e da produtivi-
dade, principalmente nas culturas alimentares.
O “bum” na exploração dos recursos naturais (gás, car-
vão, areias e pesadas) está a estimular, de forma especial,
a economia moçambicana, e a expectativa é que se traduza
numa estabilidade económica ainda maior para o país,
com a previsão de aumento da renda para os moçambica-
nos e de oportunidades de emprego, ajudando na redução
dos índices da pobreza.
Em Foco
A agricultura e a economia
Moçambicana
8
9
Em Foco
9
VALÁ
SALIMO
10
Capital estrangeiro
Muitos analistas consideram que os
ganhos dos grandes projectos não acres-
centam valor na economia moçambi-
cana, uma vez resultarem de capital
estrangeiro que volta a ser expatriado,
ficando muito pouco para o país (cerca
de 20 por cento). Salimo Valá contra-
põe, sustentando que as estratégias de
desenvolvimento, com realce para o
Programa Quinquenal do Governo e o
Plano de Acção da Redução da Pobreza,
mostram claramente que Moçambique
usa vários caminhos para o suporte da
sua economia.
“Um dos caminhos é a exploração sus-
tentável dos recursos naturais, mas
temos a plena consciência de que o
desenvolvimento socioeconómico não
depende exclusivamente da exploração
dos recursos naturais, através desses
projectos de grande dimensão, imple-
mentados fundamentalmente com
recurso ao capital estrangeiro. A par
dessas políticas (amigas), atractivas ao
investimento, nós temos consciência
de que o desenvolvimento socioeconó-
mico, sobretudo para aquela franja da
população, que ainda vive numa situa-
A agricultura é o principal
sector da economia que recebe
maior apoio e que emprega
a maior parte da população
(90% da população activa)
ção de pobreza, vai ter que contar com
grande contributo da agricultura e de
outras actividades que se desenvolve,
quer nas áreas rurais quer nas áreas
urbanas, relacionadas com comércio,
serviços, turismo e pesca, mas princi-
palmente a agricultura, incluindo o agro
processamento”, afirma Salimo Valá.
Sublinha que a par desta intervenção,
ao nível do capital intensivo estran-
geiro, Moçambique preconiza medidas,
ao abrigo do Plano de Acção de Redução
da Pobreza Urbana, de promoção de tra-
balho intensivo em empreendimentos
que empregam mão-de-obra intensiva,
permitindo que mais moçambicanos
tenham acesso ao emprego e também
à promoção de auto-emprego, através
da capacitação técnico-profissional.
“Quem tem o grande capital e o know-
-how ou tecnologia necessária para
esses projectos de grande capital, neste
momento da fase da nossa história, é
o capital estrangeiro, mas também há
medidas no sentido de o empresariado
nacional moçambicano, com ideias de
negócio, possa também entrar no cir-
cuito produtivo de exploração de recur-
sos naturais, através de parcerias com
um capital estrangeiro mais pujante,
tem mais tecnologia, tem mais capital,
tem a rede de comercialização destes
produtos que irão sair das iniciativas de
exploração dos recursos de que o país é
bastante forte”.
O Governo moçambicano defende a
tese de que cada família seja o cen-
tro de estratégia de combate à pobreza.
“Quem combate a pobreza são os indiví-
duos, são as famílias, são as comunida-
des, com as suas iniciativas, no quadro
de um ambiente adequado, para que
possam prosperar e criar riqueza”.
O Governo moçambicano defende a tese de que cada família seja o centro de estraté-gia de combate à pobreza. Quem combate a pobreza são os indivíduos, são as famílias, são as comunidades, com as suas iniciati-vas, no quadro de um ambiente adequado, para que possam prosperar e criar riqueza.
Em Foco
11Av. Abel Baptista, parcela 10
contacto - 82 1855217
FEDERAÇÃO MOÇAMBICANA DE TIRO DESPORTIVO
Com o desenvolvimento do desporto em Moçambique
12
Investir na agricultura
Muita terra arável continua adorme-
cida no país. São vários os factores de
ociosidade, destacando-se a falta de
dinheiro para investir na exploração
da enorme e vasta riqueza adormecida
no subsolo. Estima-se que Moçambique
tem cerca de 36 milhões de terra fértil,
cuja exploração não chega sequer a um
quarto. As estatísticas oficiais da terra
ociosa estão muito aquém da dimensão
real do problema.
Salimo Valá nega falar em falha nas
estratégias, referindo-se à necessidade
de se prosseguir com o trabalho que
não terá sido realizado, determinando
Em Foco
aquele panorama. Diz serem válidas
para este objectivo, as experiências do
passado. Aponta o desafio da promo-
ção da irrigação agrícola e de provi-
mento dos serviços de extensão com
recursos humanos à altura da dimen-
são real do país e das necessidades
cada vez crescentes. “Ainda temos uma
quantidade não significativa das áreas
irrigadas, que permite não depender
da chuva. Temos o desafio de incre-
mentar o número de extensionistas
(há 900 extensionistas públicos con-
tra 1.218 extensionistas de empresas de
fomento e de organizações não-gover-
namentais. O combate da pobreza
deve começar nas aldeias, onde vivem
as pessoas, que devem ser dotadas de
conhecimento das novas tecnologias”.
Moçambique é auto-suficiente apenas
na cultura de milho e mandioca, regis-
tando um défice acentuado nas restan-
tes culturas, incluindo nas hortícolas,
com mais peso na inflação.
Sobre os cinco problemas
São cinco os problemas que impedem
uma agricultura de desenvolvimento
em Moçambique, a começar pela abor-
dagem generalista. A solução des-
ses problemas passa por estratégias
pragmáticas e realistas que ponham o
sector familiar (agricultura de subsis-
tência) a produzir em pleno.
Mas não deve haver a utopia de que
um sector familiar, com elevados
níveis de produção e de produtividade,
resulte na acumulação necessária para
o desenvolvimento dos outros secto-
res. Isto só se consegue com a agricul-
tura de pequena, e médias empresas, a
agricultura comercial.
Aqui nota-se a ausência gritante da
cadeia de valor. As políticas e acções
definidas para os diversos sectores de
desenvolvimento muitas vezes deno-
tam a falta de harmonia e congruên-
cia. Em consequência, nenhuma acção
36Milhões hectares
de terra fértil
500Mestrados em eco-
nomia agrária
13
ou política tem sucesso. Se há finan-
ciamento de semente, não há finan-
ciamento de transporte nem de
armazenamento. Se há uma linha fér-
rea, não há agro processamento. Não
há ligação entre a produção, processa-
mento, armazenamento e distribuição.
“É verdade que temos um grande cami-
nho a percorrer, mas os sinais que estão
sendo dados mostram que pode, nos
próximos anos, ter uma melhoria sig-
nificativa, particularmente ao nível das
culturas chave para a segurança ali-
mentar”, precisou Salimo Valá.
No sector de pequena e média empre-
sas, não há empresários em número e
em potência diferenciados, isto é, em
número temos poucos ou quase ine-
xistentes, e em termos de potência,
os poucos que existem estão quase
descapitalizados, e não há um sis-
tema de financiamento de empre-
sas privadas para o desenvolvimento
agrário em Moçambique.
Não faz sentido que com o enorme
potencial agrícola que Moçambi-
que detém, não existam no país, pelo
menos 3-4 grandes empresas indus-
triais do ramo alimentar, que trariam
o almejado desenvolvimento. Estas
seriam uma espécie de joint ven-
ture entre o Estado e o Sector Privado,
nacional ou estrangeiro, para se preo-
cuparem com alta produção e produti-
vidade. Esta é que seria a maior fonte
de acumulação de riqueza, e não só,
como também o aproveitamento inte-
gral das zonas agro-ecológicas.
O segundo problema, não menos impor-
tante, prende-se com a falta de inves-
tigação, de facto, extensão e inovação.
Faz-se muita investigação, definem-
-se variedades e algumas vezes encon-
tram-se soluções específicas para zonas
agro-ecológicas.
Todavia, a transição da investigação
para a implementação, extensão e ino-
vação, é uma miragem. Este circuito
não está sendo financiado aos níveis
requeridos, não se aproveita o poten-
cial dos quadros formados. A tomada
de decisão técnica sobre o que se deve
fazer na agricultura não é feita pelos
melhores formados, que tratam, de
facto, da agricultura.
Definitivamente revela-se crucial o
financiamento à investigação e exten-
são, para o aproveitamento integral
dos recursos disponíveis.
A valorização dos recursos humanos, o
terceiro problema, passa por um plano
da sua distribuição, utilização e poten-
ciação. O país conta, hoje, com mais de
500 mestrados em economia agrária,
fitopatológica, a quem o país já devia
responsabilizar pela área de desenvol-
vimento das zonas com grande poten-
cial agro-ecológico, onde já deviam
estar a fazer maior diferença. Falta é a
sua mobilização para a grande tarefa.
Mobilizados recursos humanos, ata-
car-se-ia o quarto problema, a mobi-
lização dos recursos financeiros, para
que um quadro mobilizado se sinta
valorizado, em qualquer ponto do país
onde estiver, e tão importante como
aquele que está em Maputo.
A dinâmica actual determina que o
Ministério da Agricultura já devia
estar dotado de quadros calejados, que
já trabalharam o suficiente e carregam
uma experiência.
O combate da pobreza deve
começar nas aldeias, onde
vivem as pessoas, que devem
ser dotadas de conhecimento
das novas tecnologias
900Extensionistas
Públicos
1.218Extensionistas de
empresas de fomento e de organizações
não-governamentais
O desenvolvimento da nossa agricultura passa pela transformação da agricultura de subsistência em agricultura comercial.
Em Foco
14
Precisamos, igualmente, de valori-
zar os agricultores, principalmente de
pequena e média dimensões, e fazer
com que os jovens que saiem hoje das
universidades se engajem na activi-
dade. O desenvolvimento da nossa
agricultura passa pela transforma-
ção da agricultura de subsistência em
agricultura comercial.
Isto só é possível através dos estudan-
tes finalistas, médios e licenciados, que
cursaram agricultura, desde que se lhes
abra o caminho de serem empresários,
aliados a velhos empreendedores, que
fariam o papel de incubadores.
Ainda não provámos a nossa seriedade
para apostarmos de forma significa-
tiva e pôr dinheiro na agricultura, a
premiar os melhores deste sector, por
forma a transformar a agricultura de
subsistência em agricultura comercial.
Mesmo com o paradigma da minera-
O quinto problema está relacionado
com o excesso de planos e estratégias
que, entretanto, nunca chegam ao fim.
Não estaríamos a inventar a roda! A
União Europeia, por exemplo, durante
50 anos seguiu as mesmas políticas.
De políticas temos uma riqueza ines-
gotável. Precisamos de pegar em algu-
mas delas e implementá-las, juntando
a teoria à prática.
Em Foco
Salimo Valá nega falar em falha nas estra-
tégias, referindo-se à necessidade de se
prosseguir com o trabalho que não terá sido
realizado, determinando aquele panorama.
Ele diz serem válidas para este objectivo, as
experiências do passado.
A expansão da estrutura
está a facilitar o comércio de
cereais e outras culturas aos
mercados consumidores.
ção, se não apostarmos na agricultura,
não iremos a lado algum. Os recursos
minerais acabam e não matam fome.
Aliás, o dinheiro dos recursos mine-
rais não garante segurança alimen-
tar. E mais: 70-80% do investimento
em recursos minerais é estrangeiro e
dos retornos só 20% ficam em Moçam-
bique. Não vão servir para combater a
pobreza. Apenas contribuirão para a
imagem do país, sem representar solu-
ção para a segurança alimentar, nem
para o nosso desenvolvimento com
sustentabilidade.
A agricultura e a agro-indústria con-
tinuam a ser áreas importantes, de
facto. Temos que passar da retórica
para a implementação. Já tivemos os
Planos Prospectivo e Indicativo, pre-
paração do Sétimo Congresso, Nono
Congresso, etc., com ideias brilhantes
nunca materializadas.
Atingido salto necessário
O país deu-se ao luxo do excesso em
universidades, o nível mais alto de abs-
tracção e pensamento. Por cada licen-
ciado precisaríamos de apenas um
técnico médio, com conhecimentos
profundos da agricultura, para imple-
mentar. Este técnico deverá saber fazer
a lavoura devidamente, num solo are-
noso, franco argiloso, verte solo e
saber fazer a gradagem. Numa só pala-
vra: saber analisar o solo, estimar a
matéria orgânica no solo. O país ainda
não possui laboratórios para avaliar o
nível de acidez das águas dos rios e dos
solos, não tem fertilizantes, nem sabe
como aplicá-los, porque está despro-
vido de capacidade institucional e de
mercado, para providenciar os facto-
res de produção.
A nível superior, Moçambique já atin-
giu o necessário. Tem défice a nível
técnico-profissional. A nível do Estado
sobressai a premissa de materializar os
programas, sem mudanças de três em
três anos ou de quatro em quatro anos,
e detectando-se erros, a correcção não
faria mal a ninguém. Já lá se foram o
pré PROAGRI, PROAGRI-I, PROA-
15
GRI-II e outros tantos. Os problemas
encontrados deveriam servir de lição.
Isto pressupõe um momento de pausa,
para reflectir sobre o que andou mal
em cada um dos programas.
Sempre a redução da pobreza
Os níveis da redução da pobreza em
Moçambique continuam aquém das
expectativas criadas. Salimo Valá jus-
tifica a situação com dois grandes pro-
blemas de desenvolvimento no país, a
começar pelas calamidades naturais,
que afectam a produção agrícola, com
destaque para os pequenos produtores.
O segundo problema, que representa
um desafio para o presente e futuro
está ligado ao HIV/SIDA no desenvol-
vimento.
“Em termos de redução da pobreza,
eu queria reafirmar que o nosso país
está num bom caminho. Se nos recor-
damos, quando Moçambique apre-
sentou o seu relatório periódico, em
Nova Iorque, nas Nações Unidas, sobre
o progresso no quadro do alcance dos
Objectivos de Desenvolvimento do
Milénio (ODMs), o Presidente Barack
Obama referiu-se, na sua intervenção,
aos grandes passos que estamos a dar,
ao nível de África. Ele realçou Moçam-
bique relativamente ao cumprimento
dos ODMs”, recordou Salimo Valá.
Apontou como maior desafio do país,
as calamidades naturais que afectam
o país de forma quase cíclica, des-
truindo a produção dos campone-
ses, incluindo excedentes agrícolas
nos celeiros. “O que temos a fazer é
melhorar a nossa capacidade de men-
surar de forma adequada a pobreza,
porque este é um fenómeno multi-
dimensional. A pobreza é dinâmica
e muitas vezes é volátil. Em certas
zonas, como Zambézia e Sofala, tive-
ram um “bum” muito grande, mas
em 2008/2009 retrocederam (tive-
ram índices de pobreza elevados) por
causa dessa calamidade”.
O académico considera que o maior
índice de pobreza prevalecente em
Moçambique é mais alimentar do que
de activos económicos. No âmbito do
Plano de Acção de Redução da Pobreza,
espera-se que até 2014 os índices da
pobreza se fixem em 42 por cento e 40
por cento em 2015, o mesmo indicador
fixado pelos ODMs. “O caminho é longo
e sinuoso, mas os resultados que temos
estado a alcançar dão-nos a coragem de
que estamos no caminho certo”.
42%Previsão para o
índice de pobreza em 2014
40%Previsão para o
índice de pobreza em 2015
Em Foco
16
Segundo Salimo Valá, Moçambique é um
país que apresenta um quadro encoraja-
dor para o futuro. “É por isso que mui-
tos investidores ao nível mundial querem
investir em Moçambique, porque há esta-
bilidade e paz, há uma gestão macroeco-
nómica e das finanças públicas correcta,
as medidas de descentralização estão a
trazer uma lufada de ar fresco e ao nível
local estão a oxigenar a economia e a dinâ-
mica da sociedade. Temos de continuar a
prosseguir com essas medidas, afectando
mais quadros qualificados aos distritos,
implantar mais infra-estruturas econó-
micas e sociais para atrair investimento
para estes pólos de desenvolvimento”.
Crescimento inclusivo
“A grande questão que temos hoje,
quando se aborda a questão do cres-
cimento inclusivo e desenvolvimento
económico inclusivo, são que nós
vínhamos de uma situação muito difí-
cil. Moçambique quando alcançou a
paz em 1992, era considerado o país
mais pobre do mundo, com uma infla-
ção de quase 50 por cento e uma dívida
externa elevadíssima (200 por cento do
seu PIB) e fomos dando passos firmes.
À medida que vamos desmatando,
vamos criando mais oportunida-
des, melhorando a economia e esta-
bilizando as condições da população.
Obviamente vão surgindo também
novos desafios: o processo de electrifi-
cação, a melhoria de educação, incre-
mento significativo da agricultura.
Temos que ter em conta que Moçam-
bique é um país pobre, luta com afinco
para reduzir a dependência externa e
temos testemunhando o aumento gra-
dual de receitas internas”.
Moçambique aloca actualmente cerca
de 67 por cento de recursos públicos
para áreas prioritárias de combate à
pobreza (abastecimento de água, edu-
cação, saúde, infra-estruturas, agri-
cultura e desenvolvimento rural).
Apontou como maior desafio do país, as calamidades naturais que afectam o país de forma quase cíclica, destruindo a produção dos camponeses, incluindo
excedentes agrícolas nos celeiros.O que temos a fazer é melhorar a nossa capacidade de mensurar de forma ade-
quada a pobreza, porque este é um fenó-meno multidimensional.
1992O país mais
pobre do mundo
50%Valor de inflacção
anual em 1992
Em Foco
17
18
Ganham forma as obras de constru-
ção do Parque de Ciência e Tecnologia
de Maluana, distrito da Manhiça, pro-
víncia do Maputo com a construção
do Centro de Inovação e Desenvolvi-
mento Tecnológico (CIDT), o primeiro
dos vários edifícios a serem implanta-
dos no parque em alusão e cuja entrada
em funcionamento se prevê acontecer
até Setembro próximo.
O CIDT, cujo objectivo é promover a
aprendizagem, investigação e empre-
endedorismo, será equipado de infra-
-estruturas e facilidades, tais como
salas de aulas, laboratórios para ensino
e investigação, espaços para incubação
de empresas, administração, e para
albergar empresas de base tecnológica
e de conhecimento.
O Ministro da Ciência e Tecnologia,
Venancio Massingue, acredita que a
criação desta infra-estrutua tecno-
lógica não só vai beneficiar as comu-
nidades da Manhiça, distrito onde foi
implantada a obra, mas também aos
investigadores, que encontrarão no
parque um ambiente apropriado para
a transformação dos resultados da sua
investigação em produtos que possam
ser objecto de consumo na sociedade.
Massingue encoraja as empresas públi-
cas e privadas a se estabelecerem no
Parque de Ciência e Tecnologia, onde
poderão beneficiar-se de inúmeras
facilidades entre as quais se desta-
cam as isenções fiscais no contexto do
Código de Benefícios Fiscais aprovado
pela Assembleia da República, para
além da interacção com as instituições
de investigação.
Disse ainda existir um grande inte-
resse expresso de empresas nacio-
nais e estrangeiras em se estabelecer
no Parque de Ciência e Tecnologia.
“Este facto é bastante encorajador e
um indicador claro de que estamos no
caminho certo”.
O lançamento da primeira pedra que
marcou o início das obras de constru-
ção do Parque de Ciência e Tecnologia de
Maluana teve lugar em Fevereiro de 2010.
O empreendimento é um espaço com
infra-estruturas e serviços de gestão,
para o estabelecimento de empresas
baseadas no conhecimento, localiza-
das num ambiente com ligação formal
às instituições do Ensino Superior e
de investigação.
O parque, que vai ocupar um espaço
de cerca de 950 hectares, visa fomen-
tar o empreendedorismo, incubação
de pequenas e médias empresas, bem
como servir de local para a difusão do
conhecimento e terciarização de desen-
volvimento de produtos entre empre-
sas-âncora, incubadoras e instituições
nacionais de educação e de investigação.
Para o estabelecimento dos parques de
ciência e tecnologia, o Governo aprovou
o Programa de Estabelecimento do Par-
ques de Ciência e Tecnologia, que prevê
desenvolver quatro parques de ciên-
cia e tecnologia no país, nas provín-
cias de Maputo (Maluana, distrito da
Manhiça), entre a províncias de Sofala
(Estaquinha) e Manica (Dombe), Zam-
bézia (distrito de Mocuba), e Nampula,
num horizonte temporal de 10 a 15 anos.
Moçambique caminha a passos largos para um futuro, onde a inovação cientifica e tecnológica será uma realidade.
Inovação
JAIME CUAMBE
Moçambique na rota das tecnologias de ponta
19
Inovação
Obras do Parque de
Ciência e Tecnologia
decorrem a bom ritmo
20
Autênticos milagres de carvão e gás
na pérola do Índico
Repórter
BOAVENTURA MANDLATE
São vários os desafios que Moçambique enfrenta no con-texto da mineração de carvão no país, a começar pela
garantia que se impõe de forma imediata, de que os ganhos sejam efectivamente para os moçambicanos.
20
21
Só a Vale Moçambique já investiu
cerca de USD 1.7 bilião, mas até que
esse investimento se reflicta, em ter-
mos efectivos, na vida dos moçam-
bicanos, a distância a percorrer é
praticamente infinita. O que nos per-
tence é apenas o recurso carvão em
solo moçambicano, mas porque a sua
exploração requer capital financeiro
que não temos, os frutos dessa explo-
ração são expatriados quase na tota-
lidade para a origem desse capital, e
nós vamos assistindo, impotentes, à
nossa maldita pobreza perpetuada.
São 870 milhões de toneladas de car-
vão mineral que a Vale vai explorando
por longos anos, na região carboní-
fera de Moatize, em Tete, cuja primeira
exportação ocorreu em Setembro pas-
sado, num total de 35 mil toneladas,
para o Dubai. A previsão do empre-
endimento é de gerar 50 mil empre-
gos, directos e indirectos, dos quais
90 por cento moçambicanos. O sec-
tor passará, nos próximos anos, a res-
ponder por até 10 por cento do Produto
Interno Bruto do país e só em impos-
tos, o Estado moçambicano vai arre-
cadar o correspondente a cerca de USD
300 milhões anuais.
Por sua vez, a mina de carvão de Benga,
também em Tete, detido em 65 por
cento pela Rio Tinto, já investiu mais de
um bilião de dólares norte-americanos.
A previsão é de que apenas cerca de 15
por cento do orçamento do projecto
seja gasto no mercado local, criando-
-se oportunidades para os peque-
nos negócios locais e a indústria da
região de Moatize, havendo expecta-
tiva de gerar mais de 4.500 empregos
directos e indirectos, durante os pró-
ximos cinco anos.
O efeito multiplicador esperado deste
projecto de mineração de carvão
metalúrgico e de carvão térmico realça
o grande impacto positivo que ele terá
a longo prazo nas economias locais e
regionais. Estima-se um potencial na
ordem de biliões de toneladas de car-
vão só nas áreas de exploração deti-
das pela companhia australiana Rio
Tinto, que considera que a extensão
dos recursos de carvão em Benga per-
mite mineração a céu aberto, de custo
reduzido, com potencial para a produ-
ção bruta de 20 milhões de toneladas
anuais de carvão, por um período de
mais de 25 anos.
Ora, para os moçambicanos, estes
números dizem quase nada, porque no
dia-a-dia da maioria não se sentem os
efeitos dessa exploração. Muito haverá
que fazer, até que os frutos da actividade
geológico-mineira em Moçambique sir-
vam o país e que os ganhos da actividade
sirvam para melhorar o nível de vida
das pessoas, ou seja, garantir que a acti-
vidade seja feita de forma sustentável e
traga beneficiários para o país.
Não menos importante, a necessidade
de garantir que todas as actividades
de pesquisa se reflictam em actividade
produtiva. Por outro lado, deve-se
garantir que cada vez mais moçambi-
canos tenham conhecimento da activi-
dade geológico-mineira, e que possam
ser parte desta actividade. Mesmo que
não estejam directamente envolvidos
na pesquisa e na produção de recursos
minerais, assiste aos moçambicanos,
o direito e a oportunidade de presta-
rem serviços a montante e a jusante,
na actividade mineira.
Repórter
São 870 milhões de tone-
ladas de carvão mineral
que a Vale vai explorar
por longos anos, na região
carbonífera de Moatize.
21
22
Outro desafio que Moçambique enfrenta
é de viabilizar a exploração do gás
que está sendo descoberto na bacia
do Rovuma, em reservas duas ou três
vezes maiores que as de Temane, já em
plena exploração.
São reservas que aliás já atingiram a
classe mundial. O maior desafio é o
factor tempo, porque se se permitir
o mínimo de atraso, as dificuldades
serão extremas para se levar o pro-
jecto avante.
A rapidez e celeridade na execução são
o maior segredo para se aproveitar o
mercado mundial actualmente sedento
de receber o recurso. Caso contrá-
rio, muitos projectos similares pelo
mundo fora podem-nos roubar o negó-
cio. Os potenciais mercados são asiáti-
cos, nomeadamente o Japão, a Coreia,
China e Índia, abrindo-se igualmente
a possibilidade de envolvimento dos
mercados europeu e americano.
Entre dez e quinze mil milhões de
dólares é quanto deverá ser investido
proximamente até se iniciar a fase
de exploração comercial, que deverá
ocorrer entre os anos 2018 e 2019. A
magnitude das reservas de gás natu-
ral descobertas na Bacia do Rovuma
impõe enormes desafios a Moçambi-
que. O jazigo foi descoberto em águas
profundas, requerendo investimentos
estruturantes para o desenvolvimento
de infra-estruturas para viabilizar o
início da exploração.
Em perspectiva, a mobilização de
bens e serviços, numa actividade que
vai envolver mais de sete mil empre-
gos internos numa assentada, durante
a fase de construção, entre expatria-
dos e nacionais. Não menos impor-
tante, fazer tudo de modo a assegurar
o potencial mercado já identificado,
que garante pagar todos os custos
e o retorno inicial dos investimen-
tos a realizar. Só a Empresa Nacional
de Hidrocarbonetos terá de mobilizar
um investimento de cerca de 1.5 mil
milhões de dólares.
O Estado espera importantes provei-
tos a advirem dos recursos ora des-
cobertos: o contrato de concessão
prevê que depois do pagamento dos
custos prometidos haverá uma parte
de partilha que irá para o Estado
Moçambicano, para além dos impos-
tos inerentes ao funcionamento das
empresas que serão constituídas e o
imposto sobre a produção.
Enquanto o projecto de gás de Temane
está a ser desenvolvido em terra, na
bacia do Rovuma tudo vai acontecer
em águas profundas. Esta a maior
diferença entre os dois empreendi-
mentos, fora o facto de no Rovuma
as reservas poderem ser duas ou três
vezes maiores, com tempo mínimo
de exploração de 25 anos, havendo
no entanto potencial para o dobro
deste tempo.
Repórter
ENI, Exxon Mobil, BP, Petronas
da Malásia, Shell, Tullow
Oil, Vitol e Noble Energy, já
manifestaram interesse em
participar no concurso para
novos furos na bacia Rovuma
Pontualidade determinante
23
A estabilidade social, económica e política vigente em Moçambique são pressupostos funda-mentais para determi-nar a atracção de inves-timento para o país.
E a candidatura à ITIE?
No passado dia 19 de Agosto concluiu-
-se o primeiro ciclo do processo de
candidatura de Moçambique à Ini-
ciativa de Transparência na Indústria
Extractiva, ITIE.
Informações postas a circular na altura
indicaram que o Conselho da ITIE deci-
diu chumbar a candidatura do nosso
país, por não ter cumprido alguns dos
18 indicadores que compõem a matriz
de validação, que deve ser cumprida
por qualquer país que queira tornar-se
membro de pleno direito, ou cumpri-
dor, no jargão oficial, daquela inicia-
tiva, num período de dois anos.
Finalmente emergem notícias indi-
cando que o país corrigiu tudo que
havia a corrigir e proximamente, salvo
novas constatações imprevistas, esta-
remos na ITIE na próxima avaliação.
Mesmo na altura não se podia falar de
reprovação, pois o Secretariado Inter-
nacional da ITIE reconheceu publi-
camente que Moçambique realizou
progressos significativos na imple-
mentação da iniciativa, saudando e
encorajando o país a continuar o tra-
balho iniciado. As recomendações
de então eram no sentido de melho-
rias nas próximas avalizações. Há que
reconhecer que Moçambique conse-
guiu progressos significativos num
prazo relativamente mais pequeno que
aquele que habitualmente é dado aos
países, de dois anos.
Recomendava-se, por exemplo, um pro-
grama de trabalho mais abrangente, que
fosse aprovado e que fosse mensurável, e
que fosse divulgado. O que também foi
mencionado na altura é que devia haver
uma maior participação da sociedade
civil, não só no Comité de Coordena-
ção, que já existe, composto por qua-
tro representantes do Governo, quatro
da Sociedade Civil e igual número das
empresas, sendo duas delas da indústria
mineira e duas da indústria extractiva.
Finalmente Moçambique já realizou
estes objectivos.
Aliás, há que observar que quem deci-
diu sobre qual é o nível da participação
das empresas, que tipo de empresas
que deviam participar, quais são os
pagamentos que deviam ser incluídos
nesse primeiro relatório de reconcilia-
ção, foi o próprio Comité de Coordena-
ção. Moçambique limitou-se a seguir
todos os princípios, os critérios e a
metodologia preconizados pelo Secre-
tariado Internacional da ITIE para
este processo de reconciliação. Prati-
camente Moçambique já concluiu o
segundo relatório de reconciliação
e tem o prazo até Fevereiro de 2013
para uma nova avaliação do processo
de candidatura.
Impõe-se pois que Moçambique esteja
nesta iniciativa, uma vez que isso faz com
que haja maior confiança dos investido-
res e da sociedade em relação ao governo
e ao clima de investimento no país. A
estabilidade social, económica e polí-
tica vigente em Moçambique são pressu-
postos fundamentais para determinar a
atracção de investimento para o país.
devia haver uma maior
participação da socie-
dade civil.
Repórter
24
Dossier
O aumento do investimento e da produtividade na agricultura são vital-mente importantes em Moçambique como base para o crescimento sustentável, redução da pobreza, criação de emprego e aumento dos benefícios do comércio.
No sentido contrário, as contas nacio-
nais indicam que o valor acrescentado
da agricultura (a preços constan-
tes) cresceu a uma taxa média anual
de 5.7% entre 1996 e 2006, tendo ace-
lerado para 7.7% nos últimos cinco
anos. Os últimos dados incluem taxas
de crescimento de 8% para as cultu-
ras agrícolas, 6.7% para a pecuária,
5.3% para a silvicultura, 5.5% para
as pescas. O valor acrescentado glo-
bal da agricultura expandiu em cerca
de 74% nos últimos 10 anos. Grande
parte do crescimento inicial deri-
vou do reassentamento da popula-
ção deslocada em virtude da Guerra
Civil. Se as estatísticas do PIB forem,
no seu todo, precisas, o forte desem-
penho recente sugere que tem havido
um substancial investimento na agri-
cultura (incluindo investimentos em
limpeza das terras para uma extensiva
expansão de terras cultivadas).
Nos últimos 10 anos, a importância da
agricultura com fonte para as expor-
tações também decresceu, apesar do
forte crescimento em termos abso-
lutos. Este cenário misto resulta do
advento de mega-projectos de expor-
tação de lingotes de alumínio, electri-
cidade e gás natural.
Durante este período, o valor em dóla-
res das exportações da agricultura
(excluindo produtos pesqueiros) cresceu
a uma taxa média de 8.6% por ano e de
77.6% em termos globais. Não obstante,
a contribuição do sector nas exportações
totais decresceu de 42.6% no princípio
da década para 11.4% no ano passado.
A redução da contribuição da agricul-
tura no PIB e nas exportações mini-
miza significativamente a importância
do sector no desenvolvimento econó-
mico e social. Em 2005, aproximada-
mente dois-terços da população vivia
nas zonas rurais. Aproximadamente
93% destes vivem na base da agricul-
tura, e mais da metade (55.3%), de
acordo com Inquérito aos Agregados
Familiares (IAF 2002/03) – encontra-se
na pobreza absoluta (medida através
do consumo). Quase todos os agrega-
dos familiares nas zonas rurais têm a
agricultura como a principal fonte de
sobrevivência. Ademais, o Inquérito
a Força de Trabalho de 2004/05 cons-
tatou que a agricultura contribui com
cerca de 78.5% do emprego total em
Moçambique e 87.3% da população-
-feminina economicamente activa.
Com aproximadamente mais de três-
-quartos dos trabalhadores produ-
zindo apenas um quarto do PIB, é
evidente que a produtividade de traba-
lho na agricultura é mais baixa compa-
rativamente a indústria e serviços.
A agricultura representa 25.5% do PIB EUGÉNIO PINTO
25
Dossier
Moçambique é abençoado pela abundância de terra,
água e sol… As oportunida-des parecem enormes, desde a expansão de produtos tra-
dicionais como o milho, açú-car, algodão, caju e coco.
25
26
A extremamente baixa produtividade é sintomático de pre-
valência de insumos e técnicas agrícolas tradicionais de
baixo rendimento. O Trabalho de Inquérito Agrícola anual
(TIA) mostra que as pequenas explorações familiares repre-
sentam 99.5% do total da agricultura empresarial. A vasta
maioria destas explora-
ções familiares depende
de variedades de plan-
tas e técnicas de cultivo
tradicionais. Muito pou-
cas utilizam sementes
melhoradas, fertilizan-
tes inorgânicos, pestici-
das, herbicidas, tracção
animal ou mecânica, ou
irrigação. Este cenário
reflecte uma combina-
ção de conjunto de pro-
blemas, incluindo fraca
educação, fraco acesso a mercados de insumos e de produ-
ção, pobres infra-estruturas de todo tipo e fraco acesso a
financiamentos. Adicionalmente, a população rural encon-
tra-se geograficamente dispersa, aumentando, assim, os
custos e as dificuldades logísticas de providenciar infra-
-estruturas e serviços de apoio ao mercado.
As diferenças prevalecentes de produtividade entre os
sectores implicam que uma transformação estrutural -
que envolve a deslocação da mão-de-obra da agricul-
tura para outras actividades - será uma fonte importante
para aumento da produtividade e redução da pobreza
em Moçambique. Mas
existe igualmente uma
necessidade premente
de uma transformação
estrutural no seio do
próprio sector agrícola
de forma a introduzir
técnicas mais eficien-
tes para os pequenos
produtores, aumentar
a produção de culturas
comerciais, bem como
facilitar a expansão da
agricultura comercial
de média para grande escala. Além disso, a transforma-
ção da agricultura é também fortemente influenciada
pelo desenvolvimento de indústrias de agroprocessa-
mento competitivas e da melhoria da eficiência em toda
a cadeia de valor, ligando os agricultores aos mercados a
nível nacional, regional e internacional.
Dossier
Com aproximadamente mais de
três-quartos dos trabalhadores
produzindo apenas um quarto do
PIB, é evidente que a produtivi-
dade de trabalho na agricultura é
mais baixa comparativamente a
indústria e serviços.
O Trabalho de Inquérito
Agrícola anual (TIA)
mostra que as pequenas
explorações familiares
representam 99.5% do
total da agricultura
empresarial
27
Moçambique, um país agrícola
Moçambique é abençoado pela abun-
dância de terra, água e sol. Possui
igualmente uma localização vantajosa
em relação aos mercados regionais e
rotas marítimas para a Ásia e Europa;
uma abundância de mão-de-obra
barata; e uma variedade de zonas cli-
máticas proporcionando condições
favoráveis para cultivo de muitos tipos
de produtos e em épocas de alta de
mercado. As oportunidades parecem
enormes, desde a expansão de produ-
tos tradicionais como o milho, açúcar,
algodão, caju e coco, até ao desenvol-
vimento de novas culturas de ren-
dimento tais como biocombustíveis,
frutas e horticulturas.
Os dados sobre o emprego e a com-
posição do PIB dão a entender que a
produtividade média do trabalho na
agricultura é inferior a um décimo da
média de outros sectores. Este enorme
diferencial de produtividade é incon-
sistente com o relativamente pequeno
diferencial rural-urbano na incidência
da pobreza, o que lança dúvidas sobre
a exactidão das estatísticas.
O aumento da produtividade de cul-
turas alimentares básicas nas regi-
ões com fracas ligações aos mercados
nacionais ou internacionais pode ter
efeito negativo sobre o bem-estar, dado
que o excedente das famílias pode pro-
vocar uma descida no preço do mer-
cado local em épocas de colheita. Este
cenário poderia ser evitado através de
uma melhoria dos canais de comercia-
lização, transferindo mais trabalho e
terra para as culturas de rendimentos,
ou na melhoria da capacidade de apro-
visionamento de forma que a produção
adicional não inunde o mercado em
épocas de colheita. Além disso, os pre-
ços no mercado mundial para a maioria
destes produtos são muito favoráveis,
o que deveria catapultar ainda mais as
perspectivas de desenvolvimento.
Por estas razões, o sector de agricul-
tura em Moçambique deveria ser um
forte pólo de atracção do investimento
nacional e estrangeiro. No entanto,
persistem ainda sérios obstáculos
para o sucesso, tal como evidencia a
fraca capacidade do país atrair gran-
des investimentos para agricultura
e agroindústria, assim como o papel
limitado da agricultura comercial em
relação ao sector familiar.
Tendências do investimento privado na agricultura
Quais são os factos sobre a tendência
do investimento privado na agricul-
tura? Em busca de uma resposta, esta
secção analisa seis fontes de dados,
com uma ênfase para as deficiências
nas estatísticas disponíveis.
Dossier
Por estas razões e outras tantas, o sector de agricultura em Moçambique deveria ser um forte pólo de atracção do investimento nacio-nal e estrangeiro.
28
A discussão também identifica possíveis
abordagens para melhorar os sistemas
de dados existentes, de forma a propor-
cionar melhor informação para a moni-
toria da eficácia da despesa pública no
desenvolvimento agrícola, estimulando
o investimento para o sector.
Projetos de investimentos aprovados
O Centro de Promoção de Investimen-
tos (CPI) produz regularmente relató-
rios sobre projectos de investimentos
aprovados. Os dados cobrem investi-
mentos nacionais e estrangeiros, com
uma desagregação por sector, provín-
cia, distrito, e país de origem, incluindo
o capital social proposto, o valor de
empréstimos e suprimentos, bem
como o número esperado de postos de
empregos a ser criados. Os potenciais
investidores fornecem esta informação
no decurso da aplicação para assistên-
cia do CPI e para incentivos de investi-
mento ao abrigo da Lei do Investimento
e do Código dos Benefícios Fiscais. Os
incentivos incluem garantias sobre o
repatriamento de dividendos e capital,
o acesso à arbitragem internacional,
isenções de direitos aduaneiros sobre
bens de capital constantes da Classe "K"
e outros benefícios fiscais para deter-
minado tipos de investimentos. O total
do investimento no sector aumentou
mais de oito vezes, de US$ 69,5 milhões
em 2003 para US $ 594,3 em 2010.
Fluxo de investimento estrangeiro
O Banco de Moçambique (BM) com-
pila dados sobre fluxo de capital
estrangeiro para efeito das estatís-
ticas da balança de pagamentos. Os
dados são obtidos a partir dos docu-
mentos apresentados pelos investido-
res estrangeiros que devem registar
a entrada de capitais para efeitos de
Dossier
29
qualificação, mais tarde, no repatria-
mento de dividendos e capital.
Assim, os dados do BM fornecem situ-
ação real do fluxo de investimentos
estrangeiros para complementar os
dados CPI sobre o investimento apro-
vados. Obviamente, esta fonte não for-
nece nenhuma informação sobre os
investimentos nacionais. Tal como os
dados do CPI, as estatísticas de inves-
timentos estrangeiros compiladas pelo
BM distinguem os capitais próprios dos
capitais provenientes de empréstimos
e suprimentos. Tecnicamente, apenas
a componente dos capitais próprios
representa o Investimento Directo
Estrangeiro (IDE). O BM também apre-
senta a desagregação dos dados por
país de origem e por sector.
As estatísticas do CPI incluem outras
sete categorias de sectores: indústria;
transportes e comunicações; turismo e
hotelaria; recursos minerais e energia;
banca, seguros e leasing; e outros. No
entanto, a classificação dos sectores é
reportada a um alto nível de agregação,
existindo especificamente apenas duas
linhas relativas à agricultura: um para
a agricultura, produção animal, caça
e silvicultura, e outra para as pescas.
Além disso, os dados sobre o investi-
mento na agro-indústria constam do
sector de indústria manufactureira.
O investimento na agricultura,
excluindo as pescas, representa uma
média de 4,0% do total do investi-
mento estrangeiro, e 0,8 % do PIB
da agricultura. Incluindo as pescas,
os números respectivos são: 7,3% do
total dos investimentos estrangei-
ros e 1,2% do PIB do sector. Este nível
de investimento estrangeiro é dema-
siado pequeno para representar mais
do que uma fracção do crescimento na
agricultura como estimado nas contas
nacionais. No entanto, é claramente
uma fonte importante de crescimento
para alguns subsectores, tais como
açúcar e frutas tropicais.
Dossier
O investimento na agricultura, excluindo as pescas, representa uma
média de 4,0% do total do investi-mento estrangeiro, e 0,8 % do PIB
da agricultura. Incluindo as pescas, os números respectivos são: 7,3% do total dos investimentos estrangei-
ros e 1,2% do PIB do sector. Este nível de investimento estrangeiro é dema-siado pequeno para representar mais do que uma fracção do crescimento na agricultura como estimado nas
contas nacionais.
30
Crédito bancário para a agricultura
O Banco de Moçambique também com-
pila regularmente estatísticas sobre
crédito dos bancos comerciais para a
economia, desagregando-as por sec-
tor, tipo de crédito e províncias. Neste
caso, as categoriais sectoriais forne-
cem um nível razoável de detalhe.
Neste caso particular, os créditos para
a agricultura incluem uma sub-desa-
gregação em chá, açúcar, caju, sisal,
copra, algodão e outras culturas, bem
como pecuária, silvicultura e pescas.
Adicionalmente, os dados referentes a
indústria manufactureira apresentam
separadamente os empréstimos para a
agro-indústria, que abrange processa-
mento de produtos alimentares, bebi-
das e de tabaco. Em relação a utilização
dos empréstimos, o BM distingue entre
créditos para meios circulantes e cré-
ditos para investimento. A maio-
ria dos apuramentos mostra os créditos
em circulação no final de um determi-
nado período; a mudança de um período
para o outro é, portanto, uma medida do
fluxo líquido de créditos durante o perí-
odo. O BM também fornece informações
sobre os novos créditos brutos, reem-
bolsos e créditos líquidos, por uma clas-
sificação sectorial mais ampla e por tipo
de empréstimo.
Este conjunto de dados pode ser uma
base importante para acompanhar
a tendência do investimento agrí-
cola, mas apenas na perspectiva dos
investimentos financiados pelo sector
bancário. Esta é uma limitação grave
dado que os inquéritos as empresa
em Moçambique e outros países da
região mostram que o sector privado
depende muito mais do auto-finan-
ciamento e dos lucros retidos do que
propriamente dos créditos bancários,
particularmente devido a proble-
mas de acesso ao crédito e de taxas de
juro elevadas (bem como, a aversão ao
risco, que os inquéritos não costumam
mencionar). Assim, os dados sobre os
créditos bancários não constituem
uma medida do investimento total na
agricultura, mesmo das empresas for-
malmente registadas.
Outra limitação é que a classificação
dos sectores parece ser problemática.
Uma fonte bem informada advertiu
fortemente que muitos dos créditos
registados como sendo direccionados
a agricultura são efectivamente uti-
lizados para outras actividades, tais
como transporte, marketing, pro-
cessamento ou comercialização. Isto
é, em parte, um reflexo do facto de
empresas agrícolas frequentemente
estarem envolvidas nas diversas de
actividades relacionadas com agricul-
tura. Além disso, o Código de Impos-
tos cria fortes incentivos para os
grupos empresariais recorram a uma
contabilidade criativa para imputar as
suas actividades lucrativas como pro-
venientes da agricultura.
Uma fonte bem informada advertiu forte-mente que muitos dos créditos registados
como sendo direccionados a agricultura são efectivamente utilizados para outras acti-vidades, tais como transporte, marketing,
processamento ou comercialização.
Dossier
31
32
Bio
Salimo Abdula, uma figura que é incontornável no mundo empresarial em Moçambique, nasceu a 18 de Junho de 1963, na província da Zam-bézia, é um dos mais influentes homens de negócios moçambicano da actualidade. Salimo Abdula foi deputado na Assembleia da República e presidente da CTA, a Confederação das Associações Económicas.
É inevitável esta questão, para começar: quando é que nas-
ceu e como é que caracteriza a sua infância?
A minha infância não foi muito diferente da dos meninos
que nasceram em Moçambique. Foi uma infância bonita,
numa época em que ainda era de transição para a inde-
pendência. Dividi a minha infância entre a localidade de
Maruro, no distrito de Mopeia, com casa precárias, à beira
do Rio Zambeze e a cidade de Quelimane, na Zambézia.
Tenho memória de muitas brincadeiras interessantes que
fiz nessa altura...
Pode-se dizer que teve uma infância positiva...
Sim, positiva. Parto do princípio que quando uma criança
tem onde dormir, tem família, o que comer, tem acesso à
escola, tem onde brincar deve considerar a sua infância
como bonita. Sobretudo se tivermos em conta que muitas
crianças moçambicanas não têm essas condições. Por-
tanto, nós que tivemos acesso a essas condições não nos
podemos queixar nem tão pouco. Não temos esse direito.
Aliás, devemos desejar que todas as crianças no mundo
um dia tenham estas condições...
A sua formação, como é que ela foi feita?
Nós não tínhamos uma vida de luxo. O meu pai sempre
foi uma pessoa humilde e grande trabalhador para susten-
tar uma família com 8 filhos e a minha mãe, com a sua
machamba, também se esforçou muito. Ela também ven-
dia pão para ajudar na renda. Tive um tio que nos apoiou
muito e posso considerá-lo de segundo pai. Digo isso para
explicar que frequentei uma escola normal, como qual-
quer um. Olha, iniciei o ensino primário na Escola Vasco
da Gama, onde iniciei e criei muitas amizades e onde dei os
meus primeiros passos no desporto, num torneio de mini-
-basquete da Coca-Cola.
Um dos momentos marcantes da sua juventude parece ter
sido o basquetebol. Conte-nos essa fase...
Sim, acho que comecei a praticar com oito anos. Apoixo-
nei-me por este desporto. O meu primeiro clube foi a Asso-
ciação Africana. Naquela altura, ficávamos muito satisfeitos
sempre que havia jogos, porque davam-nos chá gelado. Era
um clube muito humilde e isso era tudo que nos podiam
dar, mas ficávamos mesmo muito satisfeitos.
Salimo Abdula, o incontornável homem de negócios ADAM JORESSE
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BioBio
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Depois de terminar a 4ª classe, passei para o ciclo preparató-
rio, na escola de padres. Lembro-me que tinha boas instala-
ções, boas condições para praticar desporto. Nessa altura ia a
pé e percorria cerca de 45 minutos, a partir de casa. Mas, neste
mesmo período o meu irmão mais velho estava em Maputo e o
meu tio, que estava doente em Portugal, falecera. Fui, então, à
Ilha de Moçambique para ficar com os meus pais, e onde, em
conjunto com outros amigos, reactivamos o basquete.
Como eu já vinha do Benfica de Quelimane, que depois passou
a chamar-se Desportivo de Quelimane, tinha alguma expe-
riência. Formamos 4 equipas, fizemos um torneio lá e depois
fiz parte da selecção de Nampula, participei de torneios esco-
lares. Foi nessa altura que conheci o Aníbal Manave. Quando
regressei a Quelimane, ajudei a reactivar a federação de bas-
quete e tínhamos todos os escalões, algo que nem Maputo
tinha. Foi muito interessante...
Quando Salimo Abdula consegue o seu primeiro emprego?
O meu primeiro trabalho era não formal, porque só tinha
15 ou 16 anos. Eu trabalhei no bar do cinema em que o meu
pai trabalhava. Acumulei algum dinheiro, mas um amigo
pediu-me emprestado e dei-o todo, sem hesitar. Só que ele
nunca mais devolveu. Foi a primeira ‘cabeçada’ que levei
na vida (risos)!... Mas, também fui à tropa. Depois fui à
Beira, onde conclui os estudos e comecei a trabalhar numa
empresa chamada Iluminante, em tempo parcial.
Bio
Duas grandes escolas
Na sua história profissional, a passagem pela Iluminante foi
marcante, não só por ter sido o primeiro emprego. Pode se
dizer que foi aí que se lançou como empresário?
Mais ou menos. Eu já estava em Maputo, na altura em que
me tornei proprietário da Iluminante. Recebi uma cha-
mada em que explicavam a situação de falência da empresa
essa altura e que eu era um dos procuradores para quem a
empresa havia sido deixada.
Mas, os trabalhadores incentivaram-me a aceitar o desafio
e eu, sem perceber muito bem a dimensão da responsabili-
dade, aceitei. Mas, com a ajuda de todos, conseguimos tra-
balhar reerguer a empresa e pagar gradualmente as dívidas
da empresa. Felizmente, rapidamente os nossos lucros eram
grandes porque a procura era muito maior que a oferta. E
foi assim que entrei no sector energético, acidentalmente.
Depois, apostei em várias oportunidades que apareceram.
Fui convidado, nas primeiras eleições multipartidárias, para
ocupar um lugar de deputado e aceitei, porque podia dar esse
contributo. Quando sai da AR fui convidado a liderar a CTA e
esses dois momentos foram duas grandes escolas.
Como empresário e líder de um grupo empresarial forte,
pode dizer-nos qual é a chave para se alcançar o sucesso?
Eu sempre procurei aproveitar a parte positiva das pessoas.
O importante é conseguir criar sinergias nas partes positi-
vas e deixar de lado as menos positivas.
Eu sempre desde jovem envolvi-me em acções sociais: fui
chefe de turma, fui presidente da OJM, na Ilha de Moçam-
bique, a nível da escola, depois da associação de basquete, e
tudo isso fez de mim quem sou hoje.
Portanto, quando saí da Assembleia da República e fui à CTA
tentei implementar essa filosofia. Introduzi o limite de dois
mandatos, porque, o ser humano quando senta na cadeira,
reduz a produtividade e aumenta a longevidade, surge aí o
conflito da inércia. Eu fui o primeiro a cumprir esses dois
mandatos, porque tinha a tarefa de restabelecer a boa ima-
gem que os empresários tinham.
Estou satisfeito comigo, com os meus trabalhadores e com as minhas empresas.
35
Maior capital é o humano
Para si, o que é mais importante: os
recursos materiais, financeiros ou
humanos?
Olha, o maior capital que uma
empresa pode ter é o capital humano.
Quero afirmar categoricamente que,
a minha conduta como empresário é
nunca passar por cima dos problemas.
Nunca desvalorizar qualquer recurso
humano. É formá-lo e traze-lo para a
equipa. Os trabalhadores que come-
çaram comigo na Beira, alguns deles
ainda estão comigo. Mesmo os que já
reformaram, ainda os tenho comigo.
Se tu estiveres bem financeiramente
e o teu vizinho, colega, colaborar não
estiver, então desengane-se: não estás
bem. Eu cresço no mundo empresarial
de escada em escada, só assim é que
torna realmente num empresário de
sucesso, mas é preciso também fazer
crescer as pessoas. Esta é a visão.
Salimo Abdula é sócio em negócios e
amigo pessoal do Presidente da Repú-
blica, Armando Guebuza. Como é que
surge essa relação?
Primeiro é preciso separar o trigo do
joio. Uma coisa é o cidadão Armando
Guebuza, por quem tenho muito res-
peito e outra é o Chefe de Estado, que
é o símbolo do nosso Estado. Devemos
separar muito bem isso.
Segundo, eu não tenho essa rela-
ção tão íntima com ele como as pes-
soas pensam. A minha relação com (o
cidadão) Armando Guebuza é sobre-
tudo de negócios. O que me liga a ele
é a Electrotec, uma sociedade estabe-
lecida há 15 anos. Nada mais me liga a
ele do que isso. E é preciso esclarecer
que, depois dele tornar-se Presidente
da República, demitiu-se de todas as
suas responsabilidades na sociedade,
mantendo, obviamente, os seus direi-
tos como accionista. Portanto, é pre-
ciso que se mantenha intacta a imagem
do senhor Guebuza.
Se pudesse voltar atrás no seu per-
curso como empresário há algo que
mudaria ou que gostaria que tivesse
sido diferente?
A minha vida empresarial tem tido
momentos de surpresa. Há momen-
tos menos bons, resultados de inex-
periência, de oportunidades. Mas, não
diria que mudaria algo. Acho que segui
o caminho possível. Provavelmente,
se soubesse o que sei hoje, poderia
melhorar a minha perfomance, mas
não mudaria nada. Estou satisfeito
comigo, com os meus trabalhadores e
com as minhas empresas.
Bio
O maior capital que uma empresa pode ter é o capital humano. Quero afirmar cate-goricamente que, a minha conduta como empresário é nunca passar por cima dos problemas. Nunca desvalorizar qual-quer recurso humano.
Conversa marcada pela boa
disposição de Salimo Abdula,
sem dúvida, um exemplo
para a classe empresarial
36
Ums das últimas acções da FDC, é o projecto integrado de
desenvolvimento rural de Ancuabe, um distrito locali-
zado na província de Cabo Delgado, no norte de Moçam-
bique. Este projecto, que está a ser implementado desde o
início de 2008, e tem como público-alvo a população dos
postos Administrativos de Metorro e Meza, beneficiou, só
em 2011, cerca de 11.500 famílias.
Apoiado pela Embaixada da Noruega, o projecto integrado de
desenvolvimento rural de Ancuabe é uma das mais significa-
tivas iniciativas de apoio às zonas rurais que actualmente está
a ser desenvolvido por esta organização. O mesmo tem tam-
bém como principal objectivo fortificar e desenvolver activi-
dades e iniciativas locais para a redução da pobreza em três
áreas consideradas importantes, nomeadamente, educação e
alfabetização, saúde, que inclui o saneamento, o acesso à água
potável e o HIV/Sida, e a segurança alimentar e nutrição.
FDC: Ajudando o País a construir sorrisos
Missão
A Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC), liderada por Graça Machel, viúva do Presidente Samora Machel, é uma orga-nização civil, sem filiação partidária, que tem por objectivo congregar forças de todos os sectores da sociedade na realização de um ideal de desenvolvimento, democracia e justiça social. Esta Fundação surge da convicção de que a pobreza não é uma fatalidade. É, precisamente por isso, que a FDC desenha e implementa vários projectos que carac-terizam-se por criar benefícios directos às populações.
ADAM JORESSE
37
A FDC é uma organização pri-vada, sem fins lucrativos, que trabalha para conjugar esfor-
ços de todos os sectores da sociedade com o propósito de promover desenvolvimento, democracia e justiça social.
37
Missão
38
-espera”, que são locais localizadas nas proximidades dos
hospitais e onde as parturientes se acomodam nas véspe-
ras dos partos, uma vez que a maior parte da população têm
as suas casas em zonas distantes das unidades sanitárias.
Isso permitiu que o número de consultas pré-natais e par-
tos realizados nos centros de saúde aumentasse. Para além
das casas “mãe-espera”, foram distribuídas 22 bicicletas-
-ambulância às unidades sanitárias e às comunidades, o
que tem contribuído de forma substancial para a diminui-
ção do tempo que os doentes ou mulheres grávidas levam
para chegarem aos hospitais.
A FDC procura garantir que as comunidades tenham o
básico para que possam desenvolver as suas actividades
rotineiras de forma segura. Tanto é que as acções desenvol-
vidas no âmbito do projecto integrado de desenvolvimento
rural de Ancuabe, há, para além das acções já mencionadas,
várias outras actividades, como capacitação sobre nutrição
e associativismo, abertura e manutenção de furos e poços
de água, construção de latrinas melhoradas e apoio à acções
de geração de rendimento.
A área de produção de amendoim duplicou de 8 para 16 hec-
tares e a de produção de gergelim, subiu de 80 para 180,
resultado do apoio directo aos grupos e associações de cam-
poneses criadas para a produção em massa de produtos ali-
mentares, garantido um dos objectivos desta iniciativa,
que é a segurança alimentar. Esse crescimento na produção
agrícola é visível através dos números: em 2011, o volume de
venda do gergelim atingiu os 4,4 milhões de meticais.
Não obstante algumas dificuldades enfrentadas, como a
escassez de chuva, o difícil acesso a algumas localidades,
sobretudo no período chuvoso, e algum atraso no desem-
bolso dos fundos, a Fundação para o Desenvolvimento da
Comunidade, com a ajuda de vários parceiros, vai dando
uma maior esperança às comunidades e ajudando a cons-
truir sorrisos no rosto de cada vez mais moçambicanos
espalhados pelo país.
Missão
A FDC procura garantir que as comunidades tenham o básico para que possam desenvolver as suas actividades rotineiras de forma segura. Tanto é que as acções desenvolvidas no âmbito do projecto integrado de desen-volvimento rural de Ancuabe, há, para além das acções já mencio-nadas, várias outras actividades, como capacitação sobre nutri-ção e associativismo, abertura e manutenção de furos e poços de água, construção de latrinas melhoradas e apoio à acções de geração de rendimento.
No que respeita à educação, o projecto de desenvolvimento
rural criou, só no Posto Administrativo de Meza, 22 centros
de alfabetização, contando com mais de 600 alfabetizados,
dos quais contam-se 429 mulheres, um número conside-
rado bastante encorajador, dado que as mulheres desem-
penham um papel preponderante na execução das várias
actividades educativas e comerciais, sendo portanto, uma
forma de garantir-lhes alguma autonomia.
Ainda no que se refere à educação, nota positiva é dada ao
número de desistências por parte dos alunos matriculados
nos diferentes centros educacionais, que caiu abruptamente
ao longo dos anos de implementação do projecto, depois de
no primeiro ano ter sido registado um número bastante alto
de desistências. No sentido inverso, estão as matrículas que
tiveram um acréscimo de cerca de 200% desde 2008, com
uma ligeira descida e com tendência à estabilização.
O projecto implantado pela FDC tem se mostrado de capi-
tal importância para a população de Ancuabe, sobretudo
por causa do impacto desta componente social. Na área da
saúde, por exemplo, foram construídas três casas de “mãe-
39
Fortalecer 100 organizações e redes da sociedade
A Fundação para o Desenvolvimento
da Comunidade surgiu em 1990. Na
altura como Associação para o Desen-
volvimento da Comunidade, a organi-
zação foi formada a fim de estabelecer
a base legal e as condições materiais
para o surgimento da Fundação. A
ADC estava preocupada com os agen-
tes de desenvolvimento das comu-
nidades moçambicanas, com as
Organizações Não-Governamentais
(ONGs) e com as Organizações de Base
Comunitária (OBCs), pois estas esta-
vam quase totalmente dependentes de
fundos externos. Tal situação denotava
que os moçambicanos não tinham assu-
mido a responsabilidade primária para o
estabelecimento das prioridades e para a
tomada de decisões, com vista a melho-
ria dos padrões de vida das comunidades
pobres. Havia, assim, a necessidade de
criar uma instituição moçambicana da
sociedade civil que pudesse apoiar as ini-
ciativas locais, investindo e capacitando
as comunidades bem como as organiza-
ções comunitárias de base. Como resul-
tado do trabalho preparatório realizado
pela ADC, no ano de 1994, assistiu-se ao
nascimento da Fundação para o Desen-
volvimento da Comunidade.
A FDC é uma organização privada, sem
fins lucrativos, que trabalha para conjugar
esforços de todos os sectores da sociedade
com o propósito de promover desenvolvi-
mento, democracia e justiça social.
Esta colectividade nasceu da convicção
de que a pobreza não é inevitável. É o
resultado de um processo complexo, em
que os mais necessitados são marginali-
zados e explorados. Estes não têm acesso
ao conhecimento científico e tecnoló-
gico, à informação sobre as tecnologias
mais apropriadas; têm acesso limitado
a recursos e à informação sobre como
fazer melhor uso dos recursos que pos-
suem; não recebem apoio suficiente das
instituições formais do país, incluindo
educação, saúde, serviços de trans-
porte, agrícolas e financeiros. A combi-
nação deste conjunto de circunstâncias
influencia, no geral, a atitude das pes-
soas perante a natureza e perante a vida
e, em particular, as suas convicções de
que têm possibilidades limitadas de
melhorar a situação em que vivem. Estes
são os obstáculos estruturais e psico-
lógicos, as causas principais que a FDC
pretende mudar.
Nos últimos quinze anos, a FDC imple-
mentou e apoiou uma vasta intervenção
em áreas prioritárias tais como a edu-
cação, a saúde, segurança alimentar, e
geração de rendimento, água e salubri-
dade e HIV/SIDA, com particular ênfase
para os grupos mais vulneráveis como o
das mulheres e das crianças.
Ao longo de todo o país, mais de 100
organizações e redes da sociedade
civil têm sido fortalecidas, e a FDC e
os seus parceiros de implementação
têm estado em actividade em mais de
metade dos 128 distritos do país. Ao
mesmo tempo, a Fundação tem estado
a trabalhar continuamente na sua
própria capacitação e fortalecimento
financeiro institucional.
Missão
22Centros de
alfabetização
600Mais de 600
alfabetizados
429São do sexo
feminino
Dados do projeto
de desenvolvimento
rural apenas no Posto
Administrativo de Meza
40
Ambiente
FRANCISCO MANJATE
Moçambique é um dos países mais vulneráveis às mudanças climá-ticas em África e no mundo. Esta situação é caracterizada pela ocor-rência de eventos extremos climáticos, como são os casos de cheias e secas cíclicas, ciclones tropicais, bem como a erosão costeira e o desmatamento florestal.
Por outro lado, o facto de possuir uma
longa costa, que é o limite ocidental
da zona activa em ciclones e tempes-
tades tropicais, faz com que o país seja
assolado, em média, por um ciclone
tropical por ano, pondo em causa os
esforços envidados para o cresci-
mento económico sustentável.
A ponto focal para Mudanças Climá-
ticas no Ministério para a Coorde-
nação da Acção Ambiental (MICOA),
Marília Telma Manjate, explica que
uma das razões para a vulnerabili-
dade do país às mudanças climáti-
cas prende-se com a sua localização
geográfica, dando como exemplos o
facto de possuir cerca de 2,700 Km
de costa, para além de que a maior
parte dos rios internacionais atra-
vessam o país antes de desaguarem
no Oceano Índico.
As altas temperaturas, a aridez e pobreza
dos solos, bem como a ocorrência de
doenças endémicas e epidémicas, asso-
ciado às deficientes vias de comunica-
ção, o alto nível de analfabetismo à par
da dependência de recursos naturais
cuja existência está na quantidade de
precipitação, criam um cenário desola-
dor, quando se olha para a pirâmide de
desenvolvimento em Moçambique.
Na visão de Marília Telma Manjate, a
localização geográfica é um dos princi-
pais factores que contribui para a vulne-
rabilidade do país aos eventos extremos,
na medida em que alguns dos ciclones
tropicais e depressões são formadas no
Oceano Índico, atravessam o Canal de
Moçambique e afectam a parte costeira.
Diz ainda que, com a subida da tempe-
ratura global aumentará a frequência e
severidade da seca no interior do País e
das cheias nas regiões costeiras.
As cheias dos anos 2000, na Zona Sul,
e 2001, na região Centro, e os vários
ciclones que afectaram a província de
Inhambane, particularmente o distrito
de Vilanculos, em 2007, e mais recente-
mente o primeiro semestre de 2012 são
dados como exemplos dos problemas
climáticos que afectam o país.
“Muitos moçambicanos vivem em con-
dições de extrema pobreza, com con-
sequências para a sua saúde. Por outro
lado, a ocorrência de eventos extremos
tem deteriorado as já precárias condi-
ções de vida destas populações, resul-
tando na eclosão de epidemias como
cólera, malária e disenterias”, explica
a ponto focal nacional.
Na sua perspectiva, a produção de ali-
mentos podia aumentar para satisfazer
a demanda da população moçambicana,
Vulnerabilidade associada à pobreza extrema
41
As altas temperaturas, a aridez e pobreza dos solos, bem como a ocorrên-cia de doenças endémicas e epidémicas, associado às deficientes vias de comu-nicação, o alto nível de analfabetismo à par da dependência de recursos natu-
rais cuja existência está na quantidade de precipitação, criam um cenário deso-lador, quando se olha para a pirâmide de
desenvolvimento em Moçambique.
Ambiente
42
Ambiente
em rápido crescimento, contudo a falta
de precipitação não permite tal deside-
rato, onde muitos agricultores depen-
dem da chuva.
Na mesma senda estão as pragas que
ocorrem frequentemente durante ou
depois de um evento extremo, reduzindo
a produção agrícola e piorando a situação
de emergência das famílias agrícolas.
“A insegurança alimentar e nutricional
e as epidemias exacerbam os efeitos das
doenças endémicas e epidémicas, o que
aumenta a vulnerabilidade das popu-
lações aos fenómenos de variabilidade
climática”, explica Telma Manjate, elu-
cidando que em Moçambique as secas,
cheias e ciclones tropicais são os princi-
pais eventos extremos, que se associam
às pragas, queimadas, erosão e desma-
tamento e degradação florestal.
Seca
Em Moçambique, a seca e desertifica-
ção são mais causadas por problemas
de origem climática, estando associa-
das à redução drástica na quantidade ou
mudanças no regime da precipitação.
No entanto, as queimadas e o desmata-
mento, associadas à abertura de novas
áreas de cultivo, ao corte de lenha, pro-
dução de carvão vegetal e a e explora-
ção industrial da floresta são os factores
mais comuns que se assistem no país e
que estão relacionados com a pobreza
das comunidades, o que põe em risco,
na visão da ponto focal, o seu próprio
futuro e o das gerações vindouras.
A seca – que é resultante da escassez de
chuva, associado ao fenómeno El Nino
– é, mais frequente nas regiões Cen-
tro e Sul do país, ocorrendo também
alguns focos no Norte.
Sublinhou que, em Moçambique a seca
e desertificação resultam da combi-
nação dos baixos índices de precipita-
ção que resultam na falta de água para
manutenção da cobertura vegetal e o
uso excessivo e inadequado dos solos
para agricultura e pecuária.
Sobre cheias
As cheias ocorrem durante a época
chuvosa principalmente ao longo das
bacias hidrográficas, zonas baixas do
litoral e áreas com problemas de dre-
nagem. Estas têm influência do fenó-
meno La Ninã, que provoca chuvas e
ciclones tropicais, ou seja, efeitos da
Zona de Convergência Intertropical.
Para além das cheias causadas pela
precipitação que ocorre dentro do
território nacional, Marília Telma
Manjate avança que Moçambique é
também afectado pelo escoamento
das águas provenientes das descar-
gas das barragens dos países vizinhos
situadas à montante das bacias hidro-
gráficas partilhadas.
O facto de o país ter nove bacias hidro-
gráficas internacionais e outras peque-
nas torna-o vulnerável às cheias.
Por exemplo, a ponto focal recorda que,
as cheias que afectaram o país nos anos
2000 e 2001, em parte foi devido às
chuvas torrenciais nos países vizinhos
que levaram ao agravamento do débito
dos rios internacionais e consequente
alagamento das áreas ribeirinhas.
Ciclones tropicais
Os ciclones normalmente ocorrem
ao longo da costa de Moçambique em
função de depressões tropicais que
têm origem no oceano Índico, mas às
vezes têm também afectado algumas
zonas do interior.
A época ciclónica é de Outubro a Abril
e a sua intensidade aumenta no perí-
odo de Fevereiro a Abril.
Os ciclones tropicais são entre os sis-
temas meteorológicos os mais fortes e
destrutivos, globalmente, estes ocor-
rem de forma cíclica, acompanhados
de ventos fortes e chuvas torrenciais.
Causam destruição de infra-estrutu-
ras resultando em falhas nos sistemas
de abastecimento de água potável e
energia eléctrica, considerável número
de desalojados e agravamento das
deficitárias condições de saneamento
do meio, retrocessos sociais e econó-
micos, perdas de vidas, sofrimento
humano, destruição de propriedades,
degradação do meio ambiente e rup-
tura das actividades normais. Con-
tudo, estes eventos extremos podem
contribuir para o suprimento de água
em zonas outrora secas, redistribuição
da flora e fauna.
Para contrariar esta situação, o Insti-
tuto Nacional de Gestão de Calamidades
(INGC), um órgão adstrito ao Conselho
de Ministros, e o Instituto Nacional de
Meteorologia (INAM) prepararam um
novo sistema de alerta e aviso de ciclo-
nes tropicais em Moçambique.
Secas, Cheias e Ciclones Três eventos que ameaçam a existência duma Nação
43
“Este sistema visa definir acções a serem
realizadas pelos diferentes actores e a
todos os níveis com vista a reduzir os
efeitos resultantes da ocorrência de ciclo-
nes no país”, diz, ressalvando que, após a
elaboração deste novo sistema realiza-
ram-se campanhas de educação cívica,
com o envolvimento da comunicação
social, de instituições públicas, autori-
dades comunitárias e da sociedade civil.
Contudo, pouco foi feito devido à falta
de recursos financeiros para imple-
mentação deste sistema, que se julga
serviria para alertar o público e as
comunidades locais sobre a proximi-
dade de ciclones para que estas pos-
sam tomar as devidas atitudes.
Danos na marginal
da baía de Maputo,
provocados pelo ciclone
Ambiente
Face à vulnerabilidade do país às
mudanças climáticas, várias acções
de adaptação aos efeitos e mitiga-
ção das causas (redução de emissões)
têm sido implementadas. Por outro
lado, a nossa fonte deu a conhecer que
as mudanças climáticas nas políticas
estão integradas nas políticas, estraté-
gias, planos de acção e programas de
governação de Moçambique.
O Programa Quinquenal do Governo
2010 – 2014 reconhece que as mudan-
ças climáticas constituem um desafio
para a redução da pobreza e preco-
niza a elaboração e implementação
de políticas de qualidade ambiental,
incluindo estratégia de adaptação e
mitigação das mudanças climáticas.
Está em curso a elaboração da Estraté-
gia e Plano de Acção Nacional para as
Mudanças Climáticas, a Estratégia de
Redução de Emissões por Desmata-
mento e Degradação Florestal (Estra-
tégia REDD+).
Apesar de não possuirmos uma polí-
tica nacional de mudanças climáticas,
algumas políticas, estratégias e pla-
nos de acção integram já a questão de
mudanças climáticas, são exemplos a
Política de Energias Novas e Renováveis,
a Política e Estratégia de Biocombustí-
veis, Estratégia Nacional de Gestão de
Recursos Hídricos, Plano de Acção para
a Redução de Pobreza, Estratégia de
Género, Ambiente e Mudanças Climáti-
cas, o Programa de Educação, Comuni-
cação de Divulgação Ambiental.
Em termos de acções concretas de
adaptação dos efeitos e mitigação das
emissões o país tem projectos imple-
mentados com financiamento inter-
nacional e nacional.
Contudo, estão em curso, desde 2009,
acções como as Iniciativas Presiden-
ciais “Um Aluno, Uma Planta Anu-
almente” e “Um Líder Comunitário,
Uma Floresta”, cuja perspectiva é
o aumento de florestas, fazer face à
degradação e desmatamento flores-
tal. Estas acções têm ainda sido acom-
panhadas com a electrificação rural,
usando-se energias limpas e renová-
veis (hídrica, eólica e painéis solares).
Moçambique está igualmente a imple-
mentar o projecto “Lidar com a Seca e
Mudanças Climáticas”, que decorre no
distrito de Guijá, província de Gaza.
Um outro projecto está a ser desenvol-
vido no distrito de Chicualacuala, em
Gaza, designado “UN Joint Program”
que conta com o apoio do Programa
Africano de Adaptação às Mudan-
ças Climáticas (AAP), sendo também
acompanhado pelo projecto piloto de
Resiliência Climática (PPCR) finan-
ciado através do Banco Mundial.
Planos de médio e longo prazo
44
Verdadeira ascenção
Turismo
Noor Momade explica que o sector do turismo em Moçambique
está a atravessar chamada “fase da crise de crescimento”, car-
acterizada pela falta ou escassez de disponibilidade financeira.
ADAM JORESSE
45
Está a crescer! Esta é a constatação, até certo ponto, cate-
górica de Noor Momade, Presidente da Associação de Agen-
tes de Viagens e Operadores Turísticos de Moçambique
(AVITUM). No entanto, esta constatação contrasta com os
ganhos financeiros, que ainda mostram-se distantes de
satisfazer os operadores aos vários níveis.
Para Noor Momade, actualmente, o investimento é
feito por entusiasmo, impulsionado pela presença em
Moçambique de grandes empresas e empreendimen-
tos. Esta é uma situação em que o turismo como tal não
é presente, mas aproveita-se a presença de prospecto-
res de negócios para a realização de investimentos em
hotéis para acomodação, por exemplo, mas não neces-
sariamente para a actividade turística.
É exactamente por isso, afirma Noor, que Moçambique tem
registado, nos últimos 3 anos, um crescimento no número
de camas acima de 100%, particularmente nos principais
pólos de desenvolvimento, como são os casos de Maputo,
Tete e Nacala, em Nampula, que registam um desenvolvi-
mento económico acentuado e a ritmo vertiginoso.
No que se refere ao turismo interno, o presidente da AVI-
TUM não tem ilusões. Noor Momade diz que ainda não
existe turismo interno em números significativos porque
a população moçambicana não tem recursos para tal. “O
turismo é uma daquelas necessidades que só aparece depois
de todas as necessidades básicas estarem resolvidas e outras
tantas necessidades secundárias terem sido minimiza-
das”, pelo que “é uma ilusão pensar-se que tão já tenhamos
turismo interno de forma visível”.
Para já, são na esmagadora maioria estrangeiros os que vão
se deliciando com as enormes e deslumbrantes paisagens. O
destaque vai para a Rota da Costa das Lagoas, que liga Maputo
a Vilankulos, em Inhambane, muito procurada pelos turis-
tas sul-africanos. O chamado ‘triângulo do norte’, que inclui
a província de Nampula, a Ilha de Moçambique, na mesma
província, e a cidade de Pemba, em Cabo Delgado. A com-
ponente cultural e histórica – como os edifícios com mais de
300 anos – são os principais atractivos. Os arquipélagos não
ficam para trás. Aqui sobressaem as já famosas Quirimbas e
o incontornável Bazaruto.
Moçambique tem regis-tado, nos últimos 3 anos, um crescimento no número de camas acima de 100%.
A magnifica costa Moçambicana banhada
pelo Oceano Indico é o principal ponto de
interesse para o turismo externo, Resorts e
alojamento de luxo são cada vez mais comuns
nas melhores zonas da orla marítima
46
A vegetação é densa e a sua forma esguia não revela de imediato
a sua inacreditável beleza. É, de facto, único o que aqui se vive.
Descobrir
Vamizi: A Ilha Esmeralda
47
Descobrir
Vamizi é uma ilha do Arquipélago das
Quirimbas, província de Cabo Del-
gado, em Moçambique. A vegeta-
ção é densa e a sua forma esguia não
revela de imediato a sua inacredi-
tável beleza. É, de facto, único o que
aqui se vive. A estrada feita de corais
mortos há milhões de anos é ainda
rudimentar, pois está em constru-
ção. São trinta minutos de uma pai-
sagem verde refrescante exalando
um cheiro maravilhoso. Os macacos
Samango pulam de galho em galho
assustados. São de pequena dimensão
mas com traços bem delineados. De
repente chega-se a um resort: amplo,
sem portas nem trancas edificado
com materiais locais e escandalosa-
mente a olhar um mar de cor esme-
ralda inacreditavelmente belo. Nunca
tinha visto uma cor assim.
Os quartos são divinais. Enormes,
extremamente bem decorados e
muito confortáveis mas a sua cons-
trução deixa o som das ondas emba-
lar-nos assim como a brisa suave da
noite moçambicana. O duche em már-
more colocado no meio de um amplo
espaço é magnífico. Cada pormenor,
cada detalhe nos surpreende. De uma
simplicidade difícil de alcançar. Ele-
gância, seria o adjectivo que utili-
zaria para descrever este local. Mas
confesso: o resort é mesmo o menos
importante desta maravilhosa ilha.
Vamizi entre os melhores destinos turísticos do mundo
A ilha Moçambicana de Vamizi está
entre os melhores destinos turísti-
cos do mundo. A prestigiada revista
de viagens de luxo, Condé Nast Tra-
veler, escolheu a Ilha de Vamizi, no
arquipêlago das Quirimbas, em Cabo
Delgado, como um dos lugares mais
fantásticos para férias e um destino
de lua-de-mel para casais que come-
çam a criar as suas primeiras lem-
branças da vida em matrimónio.
A lista da revista inclui 13 outros
locais, sendo que a moçambicana
Vamizi, norte de Moçambique, é con-
siderada por muitos, inclusive pela
lenda do mergulho Jacques Cousteau,
como um dos lugares mais fantásticos
para mergulho. As águas cristalinas do
litoral da ilha têm terrenos irregula-
res, com vales onde se reúnem cente-
nas de espécies de animais marinhos.
O resort da ilha de Vazimi tem 13 vilas
exclusivíssimas, onde é possível rela-
xar, degustando uma boa lagosta num
piquenique na praia. Fora da água, a
ilha também tem uma rica vida natu-
ral, com florestas tropicais com maca-
cos e mais de 100 espécies de pássaros.
A publicação especializada em turismo
mundial, escreve que “para relaxar,
Vamizi é, como se define, "um grande
spa", com uma ampla variedade de
tratamentos clássicos como shiatsu
e reiki e outros criados no local, com
produtos fabricados a partir de mine-
rais e algas do oceano Índico.
48
Descobrir
Sol e brisa
Arqueando para fora dos mares Vamizi
- doze quilómetros de comprimento e
um quilómetro de largura - esta curva
em forma de baleia da praia e mato está
encharcado de sol e brisa.
Os quilómetros de areia branca e inte-
rior selvagem também são um santuá-
rio para macacos simango, caranguejos
de coco e as 112 espécies de aves que
foram registadas como residentes ou
visitantes, bem como um refúgio para
as criaturas mais terrestres entre nós.
Como as 100 tartarugas que nidificam
nas praias vazias de Vamizi e são irre-
sistivelmente atraídas para a sua paz,
solidão e perfeita harmonia. Ano após
ano, os viajantes intrépidos e reque-
rentes de prazer rarefeito descobrem
que é apenas o lugar para descansar as
suas barbatanas cansadas.
Projeto Life The Vamizi Island
O projecto Life The Vamizi Island Pro-
jeto visa ajudar estas aldeias a vencer a
pobreza e a melhorar a vida diária. Vamizi
é muito mais do que Nirvana de férias
para os poucos privilegiados - é tam-
bém uma casa e uma comunidade para as
1.500 pessoas que vivem em três aldeias
no extremo oriental da ilha. Envolvi-
mento a nível comunitário tem sido uma
prioridade desde o início, conservação e a
comunidade são indissociáveis.
Historicamente, um lugar de retiro,
Vamizi começou a ser colonizada por
pessoas que tentam evitar as devasta-
ções da guerra civil em Moçambique, que
terminou mais de uma década atrás. A
vida nas aldeias é fundamental e extre-
mamente tradicional. A maioria das pes-
soas sobrevive da pesca, pescando com
canoas, pequenos veleiros locais (dhows)
ou apanhados à mão dos recifes da ilha.
Nunca houve água doce na ilha, por isso
cada gota a comunidade usa é trazido por
veleiros para as aldeias de colmo duas
vezes por dia a partir do continente.
O que pode parecer, de certa forma
romântico ou selvagem é, na sua ima-
gem no espelho, uma vida dura, à
miséria por recursos escassos e de
pouca oportunidade.
O Vamizi Projecto Ilha visa ajudar estas
aldeias a vencer a pobreza e a melhorar
a vida diária, para desenvolver decen-
tes instalações médicas e escolas, criar
novas opções e conservar casas na ilha
e as suas riquezas abundantes no oce-
ano, para o bem da comunidade e dos
seus filhos.
Vamizi, ilha de sonho
Abaixo da superfície dos mares
Vamizi é um excelente reefscape -
montanhas, vales planaltos e escar-
pas-cheias com uma quantidade
impressionante de vida marinha, de
baleias, golfinhos, tartarugas e tuba-
rões de recife de corais gregorianos
e moluscos gigantes. Vamizi situa-
-se junto ao ponto onde a corrente
sul equatorial se divide. As correntes
emergentes frios e quentes sustentam
quantidades anormalmente grandes
de plâncton microscópico e krill, uma
importante fonte de alimento, que
suporta uma vasta gama de espécies
até 46 tipos de corais e mais de 400
espécies de peixes, por si só.
Um olhar sobre um mapa marinho
revela outro segredo de Vamizi: um
desfiladeiro marítimo, oferecendo
locais de mergulho e habitats de corais
que foram considerados entre os sis-
temas saudáveis de recife. Simpli-
ficando, se quer mergulhar, pescar,
nadar, este é o lugar!
A ilha Moçambicana de
Vamizi está entre os melhores
destinos turísticos do mundo
49
50
Fomos ao encontro de Calane da Silva, uma figura cultural
moçambicana multifacetada. O pretexto para a conversa
foi ter sido laureado em Novembro do ano passado com o
Prémio José Craveirinha, que é o maior galardão literário
moçambicano, cujo valor pecuniário é de 25 mil dólares
(cerca de 700 mil meticais), patrocinado pela Hidroeléc-
trica de Cahora Bassa (HCB). Mas quem procura Calane
tem que estar preparado para “empreender uma odis-
seia” em torno dos vários assuntos que marcam e carac-
terizam o nosso mosaico social, artístico e cultural. E
nós não perderíamos essa oportunidade. Deixamo-nos
embrenhar pelas veredas do conhecimento deste escritor
e académico moçambicano. Como só aos fachos lhes com-
pete, Calane da Silva foi dissertando sobre as mais can-
dentes questões da vida do país, alumiando, igualmente,
os corredores da nossa História mais recente. Dono de
uma invejável oratória, ele falou de tudo um pouco, indo
da sua génese literária, passando pelo jornalismo, sua
eterna paixão, até ao mundo da academia que ele perse-
gue diariamente, de forma fervorosa, à importância que
ostenta para si o Prémio Craveirinha, por sinal, pessoa
que conheceu e muito privou. E aqui ficam os principais
excertos de uma conversa de quase hora e meia com o
autor de “Xicandarinha na Lenha do Mundo”.
Cultura
Quem procura Calane tem que estar preparado para “empreender uma odisseia” em torno dos vários assuntos que marcam e caracteri-
zam o nosso mosaico social, artístico e cultural.
Escritor com um músculo intelectual
erudito
Calane Da Silva Prémio José Craveirinha 2011
FRANCISCO MANJATE
50
51
Cultura
52
português em Moçambique, as influ-
ências das línguas Bantu no portu-
guês e desta para as línguas Bantu. As
minhas obras não são só de criação
artística, mas de investigação acadé-
mica. Embora também ainda conti-
nue a escrever artigos e crónicas para
os jornais. Deixei de estar a tempo
inteiro no jornalismo, mas continuo
a ser o jornalista que sempre fui… foi
a profissão que escolhi e que também
foi a profissão de José Craveirinha. É
isto que mais me emociona, pois rece-
ber o prémio que ostenta o nome de
um homem com quem convive e que
juntos batalhamos para algumas cau-
sas importantes e com que partilhei
ideias, algumas comuns, sobre o que
nos interessava, o que queríamos para
o nosso país.
A distinção muda algo no seu percurso
de vida?
Este prémio veio a calhar-me, diga-
mos, no último tempo da minha
vida, e veio me calhar bem. Por isso o
dedico a familiares, amigos e ao povo
moçambicano, porque me ajudaram a
crescer. Nós não crescemos sozinhos,
mas sim o nosso crescimento é fruto
também do crescimento dos outros.
O país e o planeta são uma escola para
todos nós e temos que os olhar como
o lugar de aprendizagem em cada um
dos momentos das nossas vidas. E foi
o mundo, foram os povos, particular-
mente deste país, que me fizeram abrir
os olhos e poder produzir as obras e
estar ainda empenhado numa escrita
investigativa, por um lado, e por outro
que leva a visão cultural do nosso povo,
continuando a ser o Calane sempre fui.
E assim tudo começou…
Este prémio honra um trabalho de
quase 45 anos de produção artístico-
-literária, desde os tempos em que era
“O Menino da Malanga” até que se tor-
nou no intelectual activo e de reco-
nhecido mérito dentro e fora do país.
É verdade. A gente nunca sabe para
onde a vida nos leva. Estava conven-
cido que ia morrer como um jornalista
a tempo inteiro, para além de sentir
em mim este fervilhar cultural. Sem-
pre estive ligado a questões culturais
desde os tempos do Liceu, fazendo
teatro, publicando poemas nos “livros
de parede”, até que apareceram “Os
Calane da Silva foi galardoado com o
Prémio José Craveirinha, sendo o pri-
meiro escritor a recebê-lo no novo for-
mato, e que distingue a sua carreira na
literatura, no ensaio e na academia.
Isso representa algo?
É um galardão relativo à vida literá-
ria de um cidadão. Para mim foi uma
honra receber este prémio, precisa-
mente por ostentar o nome que tem:
José Craveirinha. Eu me lembro que
quando instituíram o Prémio para uma
obra literária disse que não podia ser
assim, pois vulto literário de Cravei-
rinha é de tal maneira gigantesco que
merecia um outro tipo de distinção
para valorizar ainda mais a literatura
moçambicana. Passaram-se anos e a
Associação dos Escritores Moçambi-
canos (AEMO) achou por bem adaptá-
-lo para este formato, tendo o seu valor
monetário e também valor simbólico.
O que é mais importante para si?
Esse valor simbólico para mim é fun-
damental. O monetário desaparece em
pouco tempo se não for bem gerido.
Mas o prémio simbólico honra-me
bastante. O júri deve ter visto o cami-
nhado trilhado por mim nos últimos
45 anos e achou que à minha pessoa
cabia, no seu juízo de valor, a premia-
ção, isto do ponto de vista do trabalho
literário que desenvolvo em prol tam-
bém da literatura deste país.
Mas, a sua acção neste movimento
cultural para lá da literatura, roçando
outras expressões…
O meu trabalho literário não tem
somente que ver com a arte literária,
mas tem também a ver com a inves-
tigação académica que versa também
a parte literária. Faço análises aca-
démicas que versam a parte linguís-
tica moçambicana, as alterações do
CulturaSe nós conseguimos fazer milagres num tempo em que a cultura moçam-bicana era marginalizada, se nós con-quistamos uma bandeira de liberdade para nós, então por mais obstáculos que possam haver, duma outra forma, não seriam motivos impeditivos para que não façamos nada, mas antes devemos nos empenhar ainda mais na
construção da nossa cultura.
53
Meninos da Malanga” que eram muito
criticados porque na altura havia cen-
sura e não se gostava muito do que era
nosso. Esgrimir publicamente a nossa
situação social de explorados não era
fácil. Mas este percurso de quase 45
anos leva-me a olhar o país e a mim
mesmo de forma diferente e me fez
compreender melhor a vida. A escrita
foi o passo instrumental da exposição
de sentimentos que sempre me nor-
tearam no sentido de solidariedade,
no sentido de uma política a favor dos
explorados, no sentido de uma luta
constante pela dinamização cultural.
Eu desde que me conheço nos bairros
suburbanos ou noutros locais sempre
me vi envolvido em actividades cul-
turais. Por isso me sinto honrado com
o Prémio José Craveirinha, pois ele
representa um reconhecimento tam-
bém dessa trajectória. Bastante difícil
porque a vida não era nada fácil, mas
também por outro lado gratificante no
sentido de que conseguimos, apesar
de todos os obstáculos, cumprir com
aquilo que era o nosso desejo funda-
mental ou seja escrever em função de
uma atitude e de um empenhamento
solidário em prol do nosso povo.
Haverá alguma diferença na direcção
da sua escrita, ou melhor ela é inti-
mista ou colectiva?
Quando a gente escreve para os outros
ou para o nosso povo é evidente que
estamos a escrever para nós mesmos
porque não existimos sem aqueles que
nos rodeiam. Há um provérbio ronga
muito interessante que diz: “A Mhunu
hivhanwanhane” ou seja “Uma pes-
soa é constituída por outras pessoas”.
Portanto, nós não podemos estar dis-
tanciados dos outros. Nós somos parte
integrante uns dos outros. Eu não
existo sem o outro. Então isso levou a
empenhar-me na escrita literária.
Jornalismo: a escola dos escritores
O jornalismo em Moçambique sempre
esteve muito ligado à literatura. E isso
é algo que se viveu muito no período
colonial até mais ou menos no pós-
-Independência. Não era ao acaso.
O jornalismo sempre foi uma escola
de preparação dos escritores no nosso
país. A maior parte dos primeiros
grandes escritores em Moçambique
vieram do jornalismo, desde o Cam-
pus de Oliveira, em 1869; depois o João
Albasini, fundador do Brado Africano,
e mais tarde o Rui de Noronha que
foi Chefe de Redacção do Brado Afri-
cano. A escritora Noémia de Sousa foi
jornalista, José Craveirinha foi jorna-
lista, Rui Nogar foi jornalista e chegou
mesmo a trabalhar na revista Tempo e
era correspondente de jornais da opo-
sição lá fora. Grande parte dos escrito-
res moçambicanos veio do jornalismo.
Isso aconteceu num período em que
os “escribas” faziam tudo nos jornais e
tinham um rigor e paixão com a escrita.
Sim. Por isso, o jornalismo foi uma
escola tanto para aqueles escrito-
res como para mim. Como jornalis-
tas tínhamos a distância necessária
para ouvirmos todas as partes envol-
vidas, ao mesmo tempo que tínhamos
que saber expor, narrar e argumentar
porque na época o jornalista fazia um
pouco de tudo.
Até porque como jornalista tinha que
ter ainda uma alta capacidade expres-
siva e comunicativa?
Tínhamos que fazer a crítica literá-
ria, do teatro, das estreias cinemato-
gráficas, o que nos obrigava a termos
um músculo erudito. Éramos obriga-
dos a estudar e a ler muito, mesmo sem
cursos superiores – na altura até nem
haviam. No máximo tínhamos o 3º
Ciclo do Liceu, que era o pré-univer-
sitário. Na altura era um ensino enci-
clopédico que, diga-se de passagem,
dava-nos uma bagagem larga para
depois sermos autodidactas e avan-
çarmos. Inclusive, a própria 4ª Classe
– que José Craveirinha fez – era difí-
cil de consegui-la. E quando se tirava
mais não havia senão ser-se autodi-
dacta: ler tudo e avançar. Isto quer
dizer que o jornalismo deu-nos a mim
e a outros um caminho e uma capaci-
dade expressiva ao nível da escrita que
me valorizou e me permitiu também
abrir, com mais rapidez, caminhos
para a escrita a literatura.
A gente nunca sabe onde a vida nos leva.
Cultura
54
Um estudioso de Craveirinha
Fez várias obras de carácter académico
estudando a poesia de José Craveiri-
nha. Qual era a perspectiva?
Sendo ele um poeta e dono de uma
envergadura colossal aqui em Moçam-
bique, José Craveirinha é ainda um
manancial inesgotável de estudos. E
uma vez que ele é filho de mãe ronga
e pai português, tal como eu sou, fui
buscar na obra dele um estudo pro-
fundo a nível lexicológico dos lexemas
Bantu e dos neologismos luso-ronga,
anglo-boer e bantu-africanse, que
estão muito bem patentes na sua poe-
sia. Como é que isso se conjugava, qual
é o papel, qual é a função estético-
-estilística e linguística de tudo isso
na obra dele, é o que eu queria com-
preender. Foi uma pesquisa interes-
sante e que tem uma continuidade já
mais avançada na minha tese de Dou-
toramento, que também vai ser publi-
cada em livro.
Para além do livro “O Estiloso Cravei-
rinha”, Calane fez, entre outros tan-
tos textos, os estudos introdutórios
dos as obras “Xigubo” e “Karingana ua
Karingana”. Podemos aqui considerar
a existência de uma coincidência com
o que aconteceu: ser hoje detentor do
Prémio Craveirinha?
Para mim é agora mais gratificante
ainda porque ganhei um prémio que
ostenta o nome dele, isto muitos anos
depois de ter feito um trabalho sobre a
obra dele. E fi-lo sem nunca ter imagi-
nado que um dia haveria uma distinção
deste calibre. Mas foi uma feliz coinci-
dência. Para além do “Estiloso Craveiri-
nha”, tenho no “Xigubo” e “Karingana
ua Karingana”, das últimas edições da
Alcance Editores, um estudo introdutó-
rio. A família me pediu para fazer o texto
para as duas obras, que para mim são as
mais emblemáticas de José Craveirinha,
e fiz com muito gosto. Mas tenho muito
mais textos sobre ele que serão publica-
dos no livro “A Canção da Escrita”. E isso
só é possível acontecer porque Craveiri-
nha é um escritor inesgotável, basta ver
a quantidade de académicos que con-
tinuam a fazer dissertações, livros e
ensaios em torno da obra dele. Ao par-
ticipar no estudo de uma obra do prin-
cipal escritor, e o maior até agora, eu me
torno num estudioso da palavra do pró-
prio poeta, o que é gratificante sobre-
tudo quando não estava previsto que
ganhasse um prémio desta dimensão,
mas sim era apenas um estudo sistemá-
tico da obra do escritor.
Uma cultura rica e variada
Intelectual fervoroso, Calane da Silva,
tem um percurso de quase cinco déca-
das. E nos seus trabalhos não olha
somente os aspectos do passado, mas
também do presente. Para além de
que também participa activamente
no movimento cultural nacional. Que
radiografia faz o mosaico artístico e
cultural do nosso país, actualmente?
Ora, bem. Se nós conseguimos fazer
milagres num tempo em que a cultura
moçambicana era marginalizada,
se nós conquistamos uma bandeira
de liberdade para nós, então por
mais obstáculos que possam haver,
duma outra forma, não seriam moti-
vos impeditivos para que não faça-
mos nada, mas antes devemos nos
empenhar ainda mais na construção
da nossa cultura. E a nossa cultura
é das mais ricas e mais variadas que
existem. É só percorrer do Rovuma
ao Maputo para ver o que temos de
manancial inesgotável de valores cul-
turais espectaculares quer ao nível
da escrita, das histórias e contos tra-
dicionais, como da História propria-
mente dita, que é também cultura. E
do ponto de vista linguístico, é mais
interessante ainda, pois ter 23 línguas
não é brincadeira nenhuma. Em ter-
mos das nossas danças, canções e ins-
trumentos tradicionais que ainda não
estão totalmente estudados, pode-
mos dizer que Moçambique é detentor
de centenas e centenas deste tipo de
expressões. Tudo isso me leva a dizer
que, de maneira nenhuma, deve-
mos parar. Tanto de pesquisar, como
de documentar e divulgar as nossas
manifestações artísticas e culturais
e pô-las ao conhecimento tanto dos
estudantes como dos académicos.
Cultura
Quando a gente escreve para
os outros ou para o nosso
povo é evidente que estamos
a escrever para nós mesmos
porque não existimos sem
aqueles que nos rodeiam.
55
Calane da Silva em Vila Nova
de Gaia, Avintes, Portugal, em
casa das "As Quelimanes", ao
encontro da receita do Mitake
(broa de Avintes) 1995
A nossa cultura é das mais ricas e mais variadas que existem.
Será por isso que continua a criar ou a
fazer parte de movimentos e associa-
ções culturais?
É sim. Junto e crio movimentos cultu-
rais e literários. No Centro Cultural Bra-
sil-Moçambique criamos o Movimento
Cultural Kulapuxa, que hoje é uma
associação extremamente dinâmica.
Estive também envolvido com o grupo
Xitokozelo, e logo depois da Indepen-
dência, organizei, durante quatros, os
M’sahos, que eram encontros de poesia
ao ar livre no coreto do Jardim Tunduru.
Mais tarde o falecido escritor e jornalista
Gulamo Khan se juntou ao projecto. Mas
também este factor de abertura política
permitiu que nós nos empenhássemos
ainda mais na criação de associações,
grupos ou mesmo movimentos de cul-
tura em Moçambique.
Sente-se feliz com o movimento cul-
tural nacional?
Olha, num país tão grande como o
nosso, exige sempre cuidado quando se
fala de cultura, porque não existem cul-
turas maioritárias e nem minoritárias,
mas sim cultura. Mas também quando se
fala somente de cultura moçambicana, a
pergunta que vem a seguir é qual é essa
cultura, ou quais são os seus traços. Se
nós cavarmos em termos de Antropo-
logia iremos verificar que nós temos
muitas culturas das várias etnias que
constituem no seu todo o povo moçam-
bicano. E também temos comunidades
que se instalaram aqui em Moçambi-
que há mais de oito ou dez séculos ao
longo do litoral ou no interior, vindos de
outras zonas ou regiões, quer do inte-
rior de África, quer de continentes vizi-
nhos, como são os casos da Índia, China,
Pérsia. Vieram, se instalaram aqui e con-
nosco conviveram. E hoje vemos que as
pessoas ao longo do litoral estão perfeita-
mente à vontade nesse convívio secular.
Então, estamos perante uma situação
de uma cultura não homogénea, mas
produto de várias misturas, de traços
e expressões diferenciadas?
Todos esses povos que chegaram a
Moçambique, com as suas manifesta-
ções, constituem um manancial rico de
presença cultural moçambicana. Por
isso quando falamos de línguas não nos
esqueçamos que não temos somente
o Bantu e outras de origem europeia
como o português, mas sim temos lín-
guas fixas há cinco séculos, que são de
origem asiática. O Gujarato – uma lín-
gua de origem indiana – é falado em
muitas famílias moçambicanas há
cinco séculos, o Árabe clássico é estu-
dado nas nossas Madrassas. Portanto,
são coisas que as nossas universidades
devem estar atentas a elas para inclu-
írem no seu plano cultural de conheci-
mento porque a gente não pode amar o
que desconhece. É preciso estudá-las
e conhecê-las para poder amá-las,
pois elas não são culturas minoritá-
rias, mas sim existem no seio do povo
moçambicano e no interior de todo o
território nacional. Há uma realidade
cada vez mais rica de potencialidades
e de realidades que me leva a procurar
conhecer tudo isso e a fazer cada vez
mais em prol deste mosaico cultural
moçambicano que não é somente meu,
mas sim é nosso.
Cultura
56
País de Encantos
Tradição
O estilo de vida tradicional – que varia de província para província – é muito bem conservado em Moçambique,
a Pérola do Índico.
57
Os Makondes, na província nortenha de Cabo Delgado, são
conhecidos por serem um povo destemido e pelos seus ritos
de iniciação. Os participantes entram na roda do “mapiko”, a
dança da máscara. Os corpos são tatuados e os dentes são afia-
dos por questões puramente estéticas. Esses são os Makondes.
A música é um forte condimento na cultura do povo de Niassa.
Os instrumentos musicais são fabricados com recurso às mas-
salas e chifres ocos e secos, que funcionam como trompetes.
Os músicos formam grupos – que são verddeiras orquestras –
e tocam instrumentos de dimensões diversificadas.
A mulher Macua é famosa por pintar a sua cara com o
“muciro”, uma espécie de loção branca feita com base em
ervas e raízes locais. Os Macuas, tal como em outras par-
tes do país, são especilistas na produção de cestos, utensílios
domésticos e outros objectos artísticos de palha.
A cozinha da Zambézia é altamente apreciada por todos os
que têm a sorte de provar uma mucapata ou um frango assado
no carvão temperado com molho de côco típico da região. A
agilidade do povo Nhau, da província de Tete, é visível nas
suas coreografias e gera admiração de muitos que assistem
a verdadeiro espectáculo do género. Ao ritmo dos batuques,
os dançarinos Nhau exibem as suas máscaras num gesto fra-
terno que só neles é que se pode encontrar.
Da população Chope da província de Inhambane chega-
-nos a Timbila, um musical tradicional similar ao xilofone
declarado Património da Humanidade. Durante uma apre-
sentação de uma orquestra de Timbila, podem ser tocado
mais de 20 instrumentos em simultâneo com uma harmo-
nia impressionante. A Mbira é outro instrumento caracte-
rístico do povo Chope. Produzido com cabaças de massalas
e incorporados uma espécie de teclados de metal e tocados
somente com dedos.
TradiçãoMulher Makonde, ostentando
um disco ornamentado no
lábio inferior, simbolo de
beleza para a tribo
Exemplar do instrumento
Mbira, instrumento
característico do povo Chope
província de Inhambane
A mulher Macua é famosa por pintar a sua cara com o “muciro”
58
Mais MZ
Era um fim de tarde que nos pedia
perto. De véspera deixamos o nosso
jardim com um beijo, para mais logo
adormecer a espera.
Era uma tarde boa para partir, em
frente, por essa grande rua, a mesma
que nos traz o Norte.
Era um fim de tarde de inverno e não
parei na Manhiça, disseste "Capitão...
segue a luz" e aportei na primeira praia de
nós... trocamos mensagens e adormeci.
Depois do amanhecer não fomos longe
na separação, cortaste o trópico, subju-
gamos a saudade e encurtamos a distân-
cia em Vilankulos.
Voaste mais rápido, não me querias dei-
xar... uma manhã a mais de sono, mais
um livro na varanda, a música no Iphone
e o nosso matabicho.
Foi quando fizemos outro beijo e parti-
mos a latitude... fazia vento nessa manhã.
A estrada levou-me... Inchope, Goron-
gosa, Caia... a estrada levou-te... Mas-
singa, Maxixe, Inhambane... cruzei
Crónica
SÉRGIO ESTEVES
A estrada levou-me... Inchope,
Gorongosa, Caia... a estrada levou-te...
Massinga, Maxixe, Inhambane...
cruzei o Zambeze de noite...
e depois Quelimane... Estava estafado!
o Zambeze de noite... e depois Queli-
mane... Estava estafado!
Nessa noite falaste de Maputo.
Pela manhã segui às montanhas... estou
assim só nesta busca, intrépido, com
um cigarro e mais este pó que levanto.
Ali fica o Alto Molucue, logo depois
Nampula, a música do rádio foi a
mesma que dançamos no "Face" mas
tenho que ser breve, daqui a pouco
será outra vez noite.
Falta o último assalto, o último troço, as
últimas horas... mais um café... Nam-
pula fervilha de gente neste 25 de Junho
e tenho que ter cuidado na marcha.
Depois o breu, a estrada, o capim em
cima dela... Namialo, Namapa, Rio
Lurio, Pemba.
Cheguei!
Aqui mora o azul... o azul dos olhos
de Leonor.
É assim minha linda, que nos temos...
na maior viagem deste nosso encontro.
Mais Moçambique.
O QUEIMPORTA ESTÁ CÁ DENTRO
60
Director Aniceto MAtArucA
Director executivo SáDiA ibrAiMo
eDitor ADAM JoreSSe
reDAcção boAventurA MAnDlAte,
ADAM JoreSSe, FrAnciSco MAnJAte,
eugénio Pinto
DeSenho gráFico AnDré oliveirA /
the gAFe, lDA.
iluStrAção AnDré oliveirA
coPyDeSk eugénio Pinto
FotogrAFiA JuMA cAPelA
Director coMerciAl vASco cArvAlho
ServiçoS ADMiniStrAtivoS/
PubliciDADe cAMilA FAquir
ProPrieDADe the gAFe MeDiA, lDA.
tirAgeM 5.000 exeMPlAreS
www.MAiSMz.coM
contActoS
AveniDA cArl MArx, 173
7º AnDAr, bAirro centrAl
MAPuto – MoçAMbique
coMerciAl [email protected]
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FICHA TÉCNICA
Pelo menos duas mil pessoas, em Mocambique, entre doentes
de Sida em tratamento anti-retroviral, com tuberculose e mal
nutridos, passarão a partir deste mês, Agosto, a beneficiar de
uma cesta básica avaliada em 985 meticais.
A operadora móvel Mcel anunciou ter efectuado uma signifi-
cativa redução dos preços nos serviços de dados do pré-pago
e pós-pago. Os clientes do netmóvel pré-pago da Mcel passa-
ram a pagar apenas 200 meticais por 1GB de downloads contra
os anteriores 250 meticais, sendo que o netmóvel NTDIA de 3GB
passa a custar apenas 500 meticais.
Cesta básica já no próximo mês para duas mil pessoas em Moçambique
Mcel reduz preços nos serviços de dados
O Presidente Armando Guebuza promulgou ontem e mandou
publicar, através de dispositivos legais, três leis, nomeada-
mente a Lei de Protecção de Vítimas, Denunciantes e Outros
Sujeitos Processuais, a Lei de Probidade Pública e a Lei sobre os
Princípios e Critérios da Organização Territorial.
As presentes leis foram recentemente aprovadas pela Assem-
bleia da República e submetidas ao Presidente da República
para promulgação, tendo o Chefe do Estado verificado que as
mesmas não contrariam a Lei Fundamental, nomeadamente a
Constituição da República.
PR promulga três leis
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