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Graça Maria de Oliveira e Silva Rio-Torto Relatório da disciplina de "Linguística Portuguesa IV" [Sintaxe e semântica do Português] dos Cursos de Licenciatura em "Línguas e Literaturas" da Faculdade de Letras de Coimbra cujos planos curriculares entraram em vigor no ano lectivo de 2003-2004 apresentado em Provas públicas de Agregação em Letras/Linguística na Universidade de Coimbra (25 e 26 de Julho de 2005)

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  • Graa Maria de Oliveira e Silva Rio-Torto

    Relatrio da disciplina de "Lingustica Portuguesa IV" [Sintaxe e semntica do Portugus] dos Cursos de Licenciatura em "Lnguas e

    Literaturas" da Faculdade de Letras de Coimbra cujos planos curriculares entraram em vigor no ano lectivo de 2003-2004

    apresentado em Provas pblicas de Agregao em Letras/Lingustica na Universidade de Coimbra (25 e 26 de Julho de 2005)

  • Prembulo

    O presente Relatrio toma por objecto a disciplina de "Lingustica Portuguesa IV" dos novos Cursos de Licenciatura em "Lnguas e Literaturas" da Faculdade de Letras de Coimbra cujos planos curriculares entraram em vigor no ano lectivo de 2003-2004 (cf. Despacho n 9988/2003, publicado em Dirio da Repblica n 116, II Srie, em 20 de Maio de 2003).

    O perfil da disciplina que aqui se apresenta constitui uma proposta de trabalho, entre vrias outras possveis, necessariamente ancorada nas opes conceptuais, tericas e metodolgicas de quem a desenha, e assente na convico de que se trata de uma proposta ajustada aos objectivos da formao universitria que o curso em que se insere persegue.

    A escolha desta disciplina, consagrada ao estudo da semntica da lngua portuguesa, motivada por duas razes essenciais: uma, de natureza pessoal e profissional, prende-se com o facto de ter sido responsvel pela concepo programtica e pela leccionao de uma cadeira equivalente em vrias edies dos Cursos de "Lngua Portuguesa e Lnguas Estrangeiras Aplicadas" da Universidade Catlica Portuguesa, no seu Plo de Leiria; outra, de natureza terica e epistemolgica, radica numa concepo da linguagem em que a semntica, a par com a morfossintaxe, ocupa um lugar de inequvoca centralidade na estrutura e no funcionamento das lnguas. Recorde-se que a semanticidade, entendida como para Lyons (1977,

  • 3.4., p. 79) uma das propriedades definitrias da linguagem humana como sistema semitico.

    A importncia capital desta rea disciplinar para o conhecimento da arquitectura e do modo de funcionamento das lnguas reflecte-se na no contingencialidade da sua presena na estrutura curricular das Licenciaturas em Humanidades que tenham por objecto as lnguas e, nomeadamente, a lngua portuguesa.

  • O presente Relatrio consta de duas partes: uma primeira parte que preenchida com o programa e respectivas referncias bibliogrficas; e uma segunda parte em que se apresentam os fundamentos tericos, programticos e metodolgicos que presidem orgnica e ao modo de funcionamento da disciplina, e em que se descrevem os processos pedaggico-didcticos e avaliativos activveis.

    A segunda parte compreende quatro seces: a primeira de enquadramento (1.1.) e de delimitao dos objectivos (1.2.) da disciplina. Nela se procede apresentao da disciplina, tendo em conta a sua insero curricular e a sua caracterizao em funo dos objectivos por que se define.

    A segunda seco consagrada apresentao, fundamentao e justificao do programa. Nela se descrevem os pressupostos tericos e programticos que norteiam a seleco e a organizao dos contedos da disciplina, bem como os apoios bibliogrficos que os sustentam.

    Na terceira seco descrevem-se as modalidades de ensino e as estratgias pedaggico-didcticas adoptveis, em vista a uma bem sucedida apreenso das matrias exploradas.

    Na seco quatro so analisadas as modalidades de avaliao que podem ser postas em prtica no mbito desta disciplina.

    Uma nota se impe por respeito a quem vier a ler este Relatrio. No se alteraram no essencial as concepes acerca da filosofia e dos objectivos do sistema de ensino universitrio que tive ocasio de expor no Relatrio apresentado aquando do concurso para Professor Associado, h dez anos atrs. Por isso h um dilogo intertextual entre estes dois documentos, no que a algumas ideias-chave sobre o sistema universitrio diz respeito, e por isso algumas posies ento assumidas aqui se replicam, quando consideradas ainda vlidas, sem prejuzo dos ajustamentos que a distncia temporal, a especificidade dos pblicos actuais e os novos desideratos que a instituio universitria chama a si, neste sculo, impem ao recorte dos cursos que esta desenha e oferece.

  • Parte I

    Lingustica Portuguesa IV

    Programa

    1. Introduo ao estudo da semntica1.1. Objecto de estudo. Lugar e identidade da semntica na gramtica da lngua.1.2. Modelos e concepes de semntica. Semntica estruturalista e axiologia. Concepo referencialista e denotacional. Semntica formal e verocondicional. Concepo cognitivista, representacional e mentalista. Significao e verdade. Significao e estrutura conceptual. Significao e contexto.1.3. Conceitos bsicos de Semntica. Natureza, dimenses e nveis de significao. Significao e referncia. Intenso e extenso. Denotao e conotao. Elementos de semntica lexical. Sema, classema, classe semntica, campo semntico.

    2. Semntica da palavra2.1. Estrutura semntica da palavra. Organizao das propriedades semnticas dentro da palavra. Propriedades definitrias e propriedades prototpicas.2.2. Relaes semnticas entre palavras: antonmia, sinonmia, hiperonmia, hiponmia, holonmia, meronmia.2.3. Semntica da palavra em co(n)texto. Relaes paradigmticas e relaes sintagmticas em interaco. Combinatrias entre palavras: restries de seleco, solidariedades lexicais.2.4. Polirreferncia, polissemia, homonmia, vagueza. Variao co(n)textual da significao.2.5. Extenses de significao. Literal e figural. Metfora, metonmia, metaftonmia.

  • 3. Semntica frsica3.1. Conceitos bsicos: predicador, predicao, argumentos; proposio, contedo e estrutura proposicional; expresses referenciais e expresses predicativas.3.2. Relaes semnticas, papis temticos e grelha argumental. Funes sintcticas e funes semnticas: coincidncias e descoincidncias.3.3. Temporalidade, aspectualidade, modalidade, polaridade3.4. Relaes de significao entre frases3.4.1. Relaes de parfrase, de contradio, de implicao, de pressuposio3.4.2. Relaes de parataxe, de hipotaxe, de coordenao e de subordinao. 3.4.3. Construes de coordenao. Coordenao copulativa, adversativa, disjuntiva e alternativa.3.4.4. Construes de subordinao3.4.4.1. Construes de subordinao adverbial. Construes causais, condicionais, concessivas, finais, temporais. 3.4.4.2. Construes comparativas e consecutivas.3.4.4.3. Construes de subordinao completiva.

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    Hampshire, Gregg Revivals. Zuber, Richard (1989), Implications smantiques dans les langues naturelles. Paris, ditions

    du Centre National de la Recherche Scientifique-CNRS.

    Observao

    Da bibliografia que aqui se elenca e que se faculta aos alunos no incio das actividades lectivas faz-se desde logo uma seleco prvia, devidamente comentada, dos ttulos e dos textos fundamentais a trabalhar com carcter prioritrio.

    Sobre o modo como feita a gesto pedaggica desta base bibliogrfica veja-se o que a este respeito se expe na segunda parte, mormente em 2.2.

  • Parte II

    1. Enquadramento e objectivos da disciplina

    1.1. A disciplina de "Lingustica Portuguesa IV" faz parte do elenco de cadeiras obrigatrias dos Cursos de Licenciatura em Lnguas e Literaturas melhor seria dizer em Lngua(s), Lingustica(s), Literatura(s) e Cultura(s) com a componente de Estudos Portugueses, da Faculdade de Letras de Coimbra, cujos planos curriculares entraram em vigor no ano lectivo de 2003-2004 (cf. Despacho n 9988/2003, publicado em Dirio da Repblica n 116, II Srie, em 20 de Maio de 2003).

    Na arquitectura curricular em que se insere, e que parcial ou totalmente consagrada aos Estudos Portugueses, "Lingustica Portuguesa IV" precedida por uma disciplina que se ocupa da Sintaxe da Lngua ("Lingustica Portuguesa III"), por uma outra consagrada Morfologia ("Lingustica Portuguesa II"), e ainda por "Lingustica Portuguesa I", que tem por objecto o estudo da Fontica e da Fonologia do Portugus. Ou seja, antecedendo o estudo diacrnico da lngua, de que se ocupam "Lingustica Portuguesa V" e "Lingustica Portuguesa VI" (esta apenas impositiva para a variante de Estudos Portugueses), a disciplina de "Lingustica Portuguesa IV" culmina o estudo no-diacrnico da lngua portuguesa, mais especificamente o estudo da lngua portuguesa contempornea falada em Portugal.

  • A fisionomia desta cadeira indissocivel da filosofia e dos objectivos do curso em que se insere, do lugar que a cadeira nele ocupa e do papel especfico que desempenha no seu interior.

    De acordo com os seus fundamentos, os cursos de Licenciatura em que esta disciplina se integra so cursos universitrios de banda larga, sejam monodisciplinares, bidisciplinares ou tridisciplinares.

    Estes cursos continuam, como os seus antecedentes, a oferecer um tronco comum de disciplinas, unidas em torno do tringulo j clssico "Lngua, Lingustica e Literatura", ou do binmio "Lingustica e Literatura" quando se trata da lngua materna. No primeiro caso trata-se de licenciaturas essencialmente bidisciplinares, em que uma das suas componentes pode ser reservada aos estudos portugueses. No segundo caso trata-se de uma licencitura monodisciplinar.

    Como aspectos inovadores destes cursos sobressai o facto de eles intentarem proporcionar uma formao marcada por forte multidisciplinaridade e interdisciplinaridade e pela possibilidade de escolha de um leque variado de cadeiras de opo, sejam de (uma) rea (especfica), sejam disciplinares, sejam transversais ou sejam livres, em obedincia a um desiderato de abertura por parte do aluno seleco e construo do seu prprio percurso acadmico.

    Assim, em funo das suas aptides ou preferncias, o aluno pode optar, a partir do quinto semestre, por um percurso via ensino, que lhe dar acesso ao magistrio no actual terceiro ciclo do Ensino Bsico ou no Ensino Secundrio, ou por um percurso no to dedicado e mais aberto, que o poder conduzir a vias diversas de exerccio profissional escorado nas reas especficas das Humanidades por si escolhidas, uma das quais poder ser a da investigao.

    neste universo que se insere a cadeira de "Lingustica Portuguesa IV", no opcional, para os alunos que frequentem singulativa ou cumulativamente Estudos Portugueses, e que at ao presente se ocupa fundamentalmente de temas de Semntica da Lngua Portuguesa.

    Quando frequenta esta cadeira, o aluno dever ter feito a sua opo entre via de ensino ou via cientfica. Em teoria, este aspecto poderia condicionar fortemente a seleco aqui apresentada dos contedos programticos de "Lingustica Portuguesa IV". Todavia, porque na prtica a maior parte dos alunos tende a escolher a primeira via, uma vez que so ainda escassas as sadas profissionais que os caminhos da investigao parecem entreabrir, as opes conteudsticas por ns assumidas so as que, sem uma excessiva concesso a desideratos profissionalizantes, consideramos indispensveis para um futuro docente de lngua portuguesa.

  • O estudo da semntica em "Lingustica Portuguesa IV", que tem lugar no primeiro semestre do terceiro ano lectivo, reflecte uma filosofia do ensino da Lingustica que parte do estudo da Fonologia e da Morfologia para s de seguida se debruar sobre a Sintaxe e a Semntica da lngua. Trata-se de um paradigma epistemolgico h largos anos assumido e praticado pela Faculdade de Letras de Coimbra, que se tem revelado operacional, mas que est longe de ser consensual.

    O programa que aqui se apresenta supe uma estreita articulao com os de duas reas com a Semntica intimamente ligadas: a Sintaxe e a Pragmtica. A primeira, porque codifica, ao nvel sintagmtico e frasal, os contedos semnticos que o falante pretende transmitir; a segunda, porque tem por objecto as relaes entre as motivaes e os efeitos que se pretendem alcanar e/ou que se alcanam com o recurso aos materiais sintctico-semnticos formatados, em cada acto de fala, pelos seus actantes. Uma remisso para os textos fundadores de J. L. Austin (1962), How to do things with words, de J. Searle (1969), Speech acts, de Grice (1975), Logic and conversation, j explorados em Introduo aos Estudos Lingusticos, dever reavivar a importncia da dimenso pragmtica da linguagem, colmatando a lacuna a que de seguida se faz aluso.

    A ausncia de uma disciplina obrigatria que a nosso ver deveria ter estatuto de disciplina nuclear de Pragmtica, nos elencos curriculares dos cursos em referncia, torna ainda mais imperativo que se estabelea uma articulao estreita das matrias leccionadas em Semntica com as leccionadas em Sintaxe. Em causa est a convico, enraizada tambm no ministrio destas matrias, de que o estudo destas duas reas disciplinares ganha em ser emoldurado por um quadro epistemolgico e conceptual de cada uma e das duas reas disciplinares fortemente articulado, de tal sorte que os programas de ambas as cadeiras, ainda que sejam concebidos e operacionalizados como programas de duas disciplinas singulativamente consideradas, tanto mais optimizado quanto for encarado como uma via de abordagem da Sintaxe ou da Semntica do Portugus tendo como referncia a Semntica ou a Sintaxe respectivas (veja-se a propsito Pieter A. M. Seuren (1997), Semantic syntax. Cambridge, MA, Blackwell).

    Mais ainda: uma concepo holstica e arquitectural do funcionamento da lngua, em que todas as suas componentes se interarticulam permanentemente, faz-me considerar que, sem prejuzo da especificidade cientfica de cada rea do saber, a concepo e a leccionao de cada cadeira de Lingustica Portuguesa ganha em ser levada a cabo numa relao de acentuada complementaridade e interdependncia, no apenas pedaggico-didctica, mas sobretudo conceptual e terica.

  • Este entendimento est na base de algumas opes relativamente aos contedos programticos seleccionados para esta cadeira. Tratando-se de uma disciplina includa no primeiro ciclo de estudos universitrios, no tm nela cabimento questionaes tericas marcadas por acentuada especializao, ou dedicadas a micro-segmentos do saber cuja problematizao e cujo alcance devem ser transferidos para um ciclo ulterior de estudos. Paralelamente, alguns tpicos de semntica que poderiam ser explorados em "Lingustica Portuguesa IV" tm igualmente espao aquando do estudo dos respectivos suportes morfossintcticos, podendo portanto ser previamente leccionados, ainda que de forma bsica, nas cadeiras consagradas Morfologia e Sintaxe.

    1.2. Objectivos

    J em momentos anteriores da carreira acadmica tive ocasio de explicitar que o perfil e os objectivos duma disciplina devem estar em consonncia com a identidade e com os objectivos do curso, e naturalmente tambm com os desideratos do sistema e do nvel de ensino em que a disciplina se insere.

    Sobre os objectivos gerais e especficos dos cursos de "Lnguas e Literaturas" remete-se o leitor para o prembulo contido no despacho funda(menta)dor dos mesmos, objectivos que merecem a minha anuncia (cf. Despacho n 9988/2003, publicado em Dirio da Repblica n 116, II Srie, em 20 de Maio de 2003)

    No obstante, a configurao do programa e dos objectivos especficos de uma cadeira reflectem necessariamente as concepes que o seu docente tem da especificidade das reas temticas por ela abarcadas.

    Considerando a Universidade como uma instituio simultaneamente de ensino-aprendizagem e de investigao, logo de produo e de subsequente difuso de conhecimentos nos diferentes domnios de especialidade dos saberes, o Programa de Semntica do Portugus que aqui se apresenta concebido para cursos universitrios de primeiro grau de uma Faculdade de Letras ou de uma Faculdade de Humanidades, entendidas como instituies de magistrio e de pesquisa, promotoras da investigao cientfica e da formao cultural e profissional dos seus alunos.

    Pela sua natureza eminentemente humanstica e, por issso, necessariamente pluridimensional, as Licenciaturas em Humanidades e, em particular, os Cursos de Lnguas, Literaturas e Culturas, afirmam-se como multivalenciais, proporcionando formao cultural e cientfica de nvel superior, simultaneamente genrica e especfica, capaz de travejar um espectro

  • diversificado de prticas profissionais. O Programa que se apresenta procura conciliar a formao mais generalista em Semntica, servindo uma formao hetero-vocacional alargada, com uma formao mais especfica, dirigida a profissionais de ensino de portugus, nos nveis mencionados no prembulo.

    Os objectivos que presidem organizao desta disciplina no podem deixar de estar intimamente relacionados com o quadro de referncia acabado de delinear.

    Constituem por isso objectivos basilares desta disciplina facultar uma slida, diferenciada e actualizada preparao nas matrias de semntica nela leccionadas, promovendo uma formao cientfica criteriosa, actualizada e crtica, capaz de propiciar as competncias e as capacidades necessrias a um desempenho profissional qualificado e idneo da semntica da lngua portuguesa.

    Como objectivos especficos, pretende-se que o aluno conhea de forma crtica os conceitos operatrios fundamentais que constam do programa e que saiba usar essas ferramentas de trabalho na anlise das estruturas semnticas do portugus, consideradas a nvel lexical ou frsico. A manipulao e a aplicao dos conhecimentos tericos em textos reais dever conduzir a uma interpretao mais sustentada da semntica das palavras, dos sintagmas e das frases, e a uma compreenso holstica do modo como cada elemento contribui para o sentido global do texto. Em termos prticos, e ao longo deste Relatrio sucessivamente explicitados, o aluno deve ser capaz de identificar os traos definitrios e os traos convencionais da semntica de uma unidade lexical, ser capaz de distinguir as significaes literais das figurais, deve conhecer o modo de funcionamento dos mecanismos de processamento de umas e de outras, deve saber que relaes semnticas uma unidade estabelece com as demais unidades dos paradigmas a que pertence e com as unidades sintagmticas com as quais co-ocorre, que relevncia semntica nestas tem, que papel temtico ocupa na frase, e quais as relaes semnticas interfrsicas que a lngua portuguesa activa.

    Ao mesmo tempo, e sem concesses ao discurso em eduqus dos objectivos duma cadeira, aspira-se a que o aluno conhea de forma adequada ao nvel de ensino em causa os grandes momentos e as grande linhas de fora dos quadros de referncia terica mais relevantes em semntica, por forma a saber compaginar teoria e prtica, saber seleccionar e congraar opes terico-metodolgicas diversas, mas complementares, sempre que tal se revele operatrio e uma mais-valia para o entendimento dos factos semnticos em anlise.

    Dizia-se acima que os alunos devem dominar os instrumentos tericos, conceptuais e metodolgicos basilares que lhes so facultados, e que permitem conhecer, de forma crtica e especializada, aspectos essenciais da semntica do portugus. Mas porque o conhecimento deve resultar de opes criteriosas e selectivas, promove-se a equacionao de perspectivas e de

  • propostas de abordagem diversas, permitindo no s alargar os horizontes e os ngulos de enfoque, mas sobretudo avaliar e seleccionar os mais adequados descritiva e/ou explicativamente e, encontrando nexos de coerncia, de contradio, ou de (in)compatibilidade entre eles, construir modelos/snteses capazes de dar conta da realidade em anlise. No concebo a leccionao de uma disciplina e a definio dos seus objectivos e contedos sem que seja feita a delimitao de uns e de outros face s diferentes abordagens que dela podem ser levadas a cabo, em funo das diferentes concepes dela perfilhadas.

    Uma palavra sobre os reflexos das opes e dos quadros conceptuais e tericos em que se situam os docentes sobre o modo como operacionalizam o ensino das matrias em referncia.

    A preocupao em compaginar, de forma maximamente coerente, o estudo da Semntica com o das suas manifestaes morfossintcticas, por forma a que qualquer assunto que seja objecto de reflexo venha a ser explorado em termos de morfo-sintaxe-semntica, radica numa concepo multimodal da linguagem, numa viso integrada e pluridimensional dos factos lingusticos, que no se confina, a no ser por imperativos de natureza metodolgica, a abordagens demasiado sectorializadas, e que no se compadece portanto com uma partio excessiva dos saberes sobre a lngua.

    No me parece que os objectivos aqui traados, os percursos e ncleos temticos seleccionados sejam demasiado ambiciosos ou se apresentem como dificilmente operacionalizveis. Pelo contrrio, procurando ajustar o grau de dificuldade dos contedos programticos ao perfil socio-cultural do universo discente que actualmente frequenta os nossos cursos, considero que este um programa acessvel e no demasiado exigente para os alunos de Licenciatura. Ao invs do que em outros momentos do meu transcurso acadmico defendi e activei, e sem desprimor da quantidade pela qualidade, sou hoje em dia de opinio que prefervel que os alunos aprendam menos mas melhor, sejam capazes de se movimentar com mais vontade pelos caminhos do saber, adquiram tcnicas de pesquisa, de compreenso e de apreenso das matrias que lhes confiram autonomia hermenutica. Por isso a opo deliberada e consciente por um programa que entendo no maximalista ou desmesurado, seja qualitativa, seja quantitativamente.

    A seleco dos contedos programticos e o modo como se encontram organizados /so objecto da seco seguinte.

  • 2. Organizao do programa

    2.1. Consideraes prvias

    Constitui objectivo fundamental desta disciplina promover um conhecimento criterioso e qualificado da semntica lexical e da semntica frsica do portugus. Para ser aprovado nesta cadeira, o aluno deve dominar os conceitos operatrios e tericos fundamentais e ser capaz de os aplicar de forma eficaz realidade emprica da lngua portuguesa, movimentando com mestria as dimenses lxico-conceptuais, semnticas, temticas e proposicionais que permitem descrever e analisar cabalmente o complexo fenmeno que a semntica da lngua.

    Na actual conjuntura, com a semestralizao de todas as cadeiras, as treze semanas de que dispomos, com trs horas de aula em cada uma, so escassas para fazer apreender as matrias, nomeadamente quando so amplas e complexas, como o caso, pelo que dificilmente h tempo para avaliar paulatinamente a qualidade e motivao da populao discente que efectivamente frequenta a cadeira e, em consonncia, ir adaptando o programa s caractersticas idiossoncrticas da turma.

    A programao por objectivos torna-se, assim, mais impessoalizada, porventura mais objectiva e operacional, mas por isso menos personalizada, mormente quando o nmero de alunos por turma no o permite. Uma forma de superar este dficit de personalizao que a aprendizagem de uma qualquer matria requer sem dvida a realizao de pesquisa individual, devidamente orientada e enquadrada, pesquisa que se promove na medida das possibilidades e das capacidades dos alunos, e que de resto se inscreve perfeitamente no mbito da avaliao contnua ou continuada que se pretende praticar o mais possvel.

    Talvez mais do que nenhumas outras, as matrias prprias da semntica, porque perpassam transversal e diagonalmente todos os sectores e nveis da lngua/da realidade sgnica, esto em permanente dilogo umas com as outras, mantendo interconexes estreitas que por vezes tornam artificial a compartimentao, necessria por razes de natureza pedaggica e prtica, imposta reflexo metalingustica aqui empreendida. Por isso o modo como estas matrias so leccionadas implica deliberadamente uma constante e pendular remisso, retrospectiva ou prospectiva, de sectores temticos j antes contemplados ou a serem objecto de ulterior considerao. Trata-se de uma modalidade de ensino em rede temtica, que se pretende o mais interactiva possvel, por forma a estabelecer ou sublinhar os elos que os conceitos descritivos e analticos mantm entre si e com a realidade a que se aplicam. No se estranhar por isso que em vrios momentos um mesmo tpico seja evocado ou tratado, ainda que com diferentes graus de proeminncia e/ou de aprofundamento.

  • Embora no conste explicitamente do programa que se faculta aos alunos, um dos momentos iniciais do curso preenchido com uma incurso necessariamente sucinta sobre a concepo de linguagem que vai nortear a reflexo a produzir ao longo do semestre. Para tal, faz-se apelo indagao epistemolgica que a este respeito foi feita em "Introduo aos Estudos Lingusticos" e recordam-se as coordenadas por que se pauta o estudo da Fonologia, da Morfologia e da Sintaxe, em vista a evidenciar algumas das linhas de fora que do coeso interna ao Curso e que viro a escorar tambm a abordagem da Semntica a empreender.

    A concepo de linguagem e de modo de funcionamento das lnguas que preside ao estudo da semntica do portugus aqui proposto assenta em alguns pressupostos basilares que de seguida se expendem.

    (i) concepo modular e interactiva do modo de funcionamento da lngua. Pressupe-se que a arquitectura da lngua se tece com base na articulao e na interaco das suas diversas componentes, em que cada componente fonolgica, morfolgica, sintctica, lexical, semntica, pragmtica tem acesso em permanncia s informaes contidas nas demais. Uma estrutura multi-capa ou multi-estratal pode servir de interface entre componentes. O conexionismo , pois, o modo de processamento da lngua, seja internamente, seja nas suas interrelaes com a mente ou com o real.

    (ii) linguagem como sistema e instrumento semitico, ao mesmo tempo reflexo simblico e mediador-codificador da realidade, cuja activao se norteia por parmetros de natureza cognitiva e por finalidades teleolgicas, comunicativas ou interactivas.

    (iii) relaes entre sistema e uso: muitos dos modelos conceptuais e tericos actualmente dominantes, sejam os influenciados pelo funcionalismo-lexematismo de Simon C. Dik (1983, Advances in functional grammar. Dordrecht, Foris), os mais ou menos directamente inspirados na anlise do discurso, ou tributrios da socio- e da pragmalingustica, privilegiam o uso e no a langue ou a competncia, como acontecia no estruturalismo ou no gerativismo.

    Aqui a sistmica e a pragmtica, ou seja, sistema, funcionamento e uso so entendidos como faces conversas da mesma realidade, s metodologicamente dissociveis: uma lngua aquilo que o seu funcionamento e o seu uso instanciam. Se o uso conforma a lngua, esta que potencia e legitima os diversos tipos de uso a que ela prpria se presta (Dik, 1983; Fonseca, 1993 e 1998). A semntica representa uma componente central da lngua, mas em relao aos usos pragmticos da lngua que todo o sistema se configura. Por isso no possvel conceber a

  • lingustica de um dado sistema sem ao mesmo tempo ter em conta a lingustica do seu uso ilocutrio e do enquadramento cultural-civilizacional em que esse uso se insere. O estudo cientfico da estrutura interna duma lngua, das suas componentes e do seu modo de funcionamento no pode deixar de ser feito tendo em conta as diferentes funes semisicas que aquelas desempenham, e as dimenses gnoseolgica, representacional, discursiva, interaccional nelas envolvidas.

    (iv) relaes entre semntica e sintaxe: a sintaxe concebida como tendo por objecto de estudo a frase e as relaes interfrsicas, a estrutura sintagmtica interna de cada uma, dotada de uma dada ordenao linear e de uma dada organizao hierrquica, as funes sintcticas desempenhadas pelos constituintes internos da frase.

    A sintaxe no entendida como mero suporte formal da semntica ou da componente lexical, mas antes como uma das componentes da lngua tambm capaz de gerar significao, pela ordenao e pela subsequente hierarquizao temtica e informativa que faz dos seus termos.

    Em suma, perfilha-se uma viso interactiva e conexionstica das componentes da lngua, em vista a uma perspectivao integrada de todos os domnios que concorrem para o processamento da linguagem, para a actividade verbal, nas suas dimenses cognitiva, representacional e interactiva. Por isso fundamentalmente numa perspectiva holstica e arquitectural que importa conhecer a semntica do portugus. Longe vo os tempos em que se considerava que (N. Chomsky, 1957: 106, em Syntactic structures. The Hague, Mouton). Mas tambm por alguma razo Bloomfield entendia que a anlise (da) semntica .

    Uma palavra sobre a pluralidade de perspectivas tericas que fundamentam a concepo do programa que aqui se apresenta e a consequente abordagem dos factos semnticos que se promove.

    essencialmente uma atitude formativa e crtica a que norteia a abordagem dos factos lingusticos, e que por isso pondera as virtualidades e as insuficincias que toda a teoria, modelo ou perspectiva de anlise comporta. A convico de que a complexidade e a pluridimensio-nalidade da realidade lingustica no se confina aos limites de um s quadro ou de um s modelo terico, por mais abrangente que seja, aliada de que os factos ganham em serem abordados multidimensionalmente, conduz opo por uma reflexo plurivectorial da sistmica e do funcionamento da semntica da lngua. Assim, a abordagem levada a cabo alicera-se numa sntese dos aspectos positivos extrados de diferentes modelos de anlise. Comop j antes escrevi, minha convico, cada vez mais enraizada, que uma abordagem multivectorial, assente na complementaridade entre perspectivas distintas, desde que coerentes entre si, tem

  • virtualidades insubestimveis na anlise dos factos lingusticos. Da conjugao de pontos de vista diversos, compatveis e confluentes, caldeia-se uma viso mais verstil, mais enriquecida, e portanto mais explicativa da realidade sobre que se debrua.

    2.2. Contedos programticos e apoios bibliogrficos

    O programa desta disciplina encontra-se organizado em trs grandes mdulos: um mdulo introdutrio de definio do objecto de estudo da semntica, de

    caracterizao do lugar desta rea disciplinar relativamente s demais reas da gramtica, ou seja, de descrio das relaes entre semntica, sintaxe e pragmtica. Neste mdulo introdutrio se integra uma reflexo panormica, mas selectiva, sobre modelos e teorias semnticas, e bem assim sobre conceitos bsicos para o estudo da semntica das lnguas, que viro a ser desenvolvidos e aplicados medida que forem surgindo nos mdulos seguintes.

    um mdulo consagrado semntica da palavra e dos seus constituintes, s relaes que as lnguas naturais estabelecem entre as palavras, ao modo como estas se organizam em conjuntos e/ou em paradigmas e/ou sintagmaticamente, aos eixos e s dimenses semntico-conceptuais com base na/os quais se configuram as reas e as relaes semnticas.

    um mdulo consagrado semntica da frase, s relaes semnticas entre frases, s condies de verdade que a estas presidem, sua estrutura proposicional, predicativa e referencial, s funes temticas e argumentais desempenhadas pelos constituintes sintagmticos e/ou lexicais.

    A razo de ser desta estrutura programtica, para alguns porventura considerada com uma excessiva extenso, prende-se com opes e objectivos especficos que ao longo deste relatrio so explicitados.

    Ora, um dos desafios que a semestralizao das disciplinas de Licenciatura coloca o de um acrscimo de eficincia na docncia, na aprendizagem e na avaliao. Assim se explica tambm a aposta num enfoque concentrado sobre estes trs grandes mdulos temticos, a seleco preferencial por estes temas e sub-temas, em detrimento de outros que igualmente teriam lugar numa abordagem da semntica da lngua.

    Passemos ento anlise dos contedos programticos propostos.

    Lingustica Portuguesa IV. Contedos programticos

  • 1. Introduo ao estudo da semntica1.1. Objecto de estudo. Lugar e identidade da semntica na gramtica da lngua.Um primeiro momento de leccionao consagrado delimitao do objecto da

    semntica e reflexo sobre a identidade desta rea disciplinar no seio das demais componentes da gramtica da lngua.

    Em princpio, o prprio objecto de estudo duma cadeira traa as fronteiras da identidade desta face aos domnios abrangidos pelas restantes cadeiras de rea.

    A semntica, ou , como a caracterizava Michel Bral (1924), tem por objecto o estudo das significaes, dos significados e dos sentidos (sobre estes conceitos veja-se 1.3.) linguisticamente codificados e processados; assim entendida, a semntica explora dimenses necessariamente tambm recobertas pela morfologia e pela sintaxe.

    Como delimitar ento o mbito de trabalho desta cadeira? Sendo eu docente de "Lingus-tica Portuguesa II", cadeira que se ocupa de Morfologia, e tendo tido a experincia de leccionar em simultneo "Sintaxe e Semntica", a distribuio temtica das matrias e dos enfoques a privilegiar em cada uma (Lingustica Portuguesa II, III e IV), pode fazer-se do modo que de seguida se expe. Comearei pelo que se exclui.

    As dificuldades de delimitao do campo de trabalho da semntica face ao do da morfossintaxe, pois que muitos aspectos semnticos tm uma manifestao morfolgica e/ou sintctica, podem ser capitalizadas em termos de valorizao da interdisciplinaridade e da interacco constantes entre reas disciplinares, e do relativismo da autonomia de cada uma. Trata-se de enfoques diferenciados sobre faces, planos ou dimenses tambm ela/es diferenciada/os dos signos, considerados na sua sintaxe interna ou na sua sintaxe externa, ou seja, nas combinatrias intra-lexicais, inter-lexicais, sintagmticas e frsicas que entretecem.

    Em "Lingustica Portuguesa IV" no nos debruaremos sobre a semntica dos constituintes internos das palavras, mormente das palavras derivadas e das compostas, ou das palavras quando marcadas por traos de flexo, por se pressupor que destas matrias se ocupou a Morfologia. Em todo o caso, ter-se- em conta que, semelhana do que se observou em relao aos constituintes internos, tambm em relao s palavras possvel entrever nveis de significao, uns literais e etimolgicos e outros j cristalizados (contagem digital, isto , contagem j no dgito a dgito, no analgica, mas automtica; relgio (de corda) manual vs relgio digital), uns mais sistmicos, opositivos e regulares outros irregulares e idiossincrsicos, e que, entre estes dois extremos, se situam os que so marcados por menor grau de sistematicidade, mas ainda assim afectados por regularidades ou semi-regularidades convencionalmente conhecidas e interiorizadas pelas comunidades que os usam, sejam de natureza axiolgica ou pragmtica (cf. Rio-Torto, 1998). No binmio denotao vs conotao, que a seu tempo ser objecto de reflexo mais circunstanciada (cf. 1.3.), muitas d(est)as

  • significaes no sistmicas so albergadas no seio da conotao. Tambm em 2.3. se estudam as relaes entre o semantismo e o valor em langue e as modulaes que este sofre em contexto.

    No mbito das significaes lingusticas inscrevem-se no apenas as lexicais mas tambm as gramaticais, inerentes s chamadas classes funcionais. Entre estas encontram-se as preposies, as conjunes, algumas sub-classes de advrbios (Maria Helena de Moura Neves (2000), Gramtica de usos do portugus: As conjunes p. 739-929; O advrbio, p. 231-282). O valor funcional destas classes de palavras assenta na coexistncia de significaes gramaticais e de significaes lexicais, com prevalncia das primeiras . A este respeito vejam-se os trabalhos de referncia de Joo Andrade Peres e Telmo Mia (1995), 2.2.3. (Problemas relativos a preposies argumentais) e de Maria Helena de Moura Neves (2000), Gramtica de usos do portugus. Parte IV (As preposies: A) As preposies introdutoras de argumentos e B) Preposies no introdutoras de argumentos, p. 603-731).

    Tambm aqui se fazem sentir de forma premente as estreitas relaes entre semntica, morfologia e sintaxe. Ainda que de forma breve, pode evocar-se a dicotomia coseriana, a meu ver de toda a pertinncia e actualidade, entre significado categorial e significado lexical, para evidenciar, ao nvel da palavra, e das diferentes classes categoriais de palavras, as diferenas e as interseces entre ambos, e bem assim o modo como se projectam e interagem estes dois modos de significao. Em todo o caso, j no so aqui objecto de caracterizao pormenorizada as sub-classes semnticas dos nomes e dos adjectivos, porque abordadas em "Lingustica Portuguesa II", bem como a semntica das preposies.

    Porque se supe que ter sido empreendida em "Lingustica Portuguesa II e/ou III" uma reflexo sobre estas matrias, elas no sero aqui retomadas. De igual modo, no so aqui exploradas, por terem sido objecto de abordagem em morfologia e em sintaxe, outros temas e problemas que, em curricula de outras Faculdades, figuram na cadeira homloga desta. Refiro-me, por exemplo, semntica das construes nominais (definidas, no definidas, partitivas), semntica do sistema de demonstrativos, semntica do tempo, do aspecto, do modo no flexionalmente instanciado. De uma maneira geral, a semntica dos constituintes e dos processos flexionalmente expressos ou dos operadores de determinao e de quantificao fica fora do escopo de "Lingustica Portuguesa IV".

    Relativamente s fronteiras entre Semntica e Pragmtica, disciplina que se ocupa do estudo dos mecanismos que presidem ao uso comunicativamente adequado e eficaz das expresses lingusticas, e que visa portanto descrever a competncia comunicativa (Lyons 1990, 5.2.), entendida como os saberes que permitem ao falante produzir e interpretar textos comunicativamente eficazes, em distintas situaes de interaco, importa que os alunos sejam capazes de distinguir o valor puramente lexical duma unidade ou duma expresso dos valores

  • pragmticos a que ela(s) se presta(m). Assim, sempre que pertinente, assinalam-se os contextos que viabilizam ou convocam utilizaes ilocutrias especficas de determinadas estruturas sgnicas, do mesmo modo que se sublinham as configuraes lingusticas que servem (de suporte a) objectivos comunicativos-interactivos ad hoc e/ou que activam leituras ilocutrias determinadas.

    Como acima ficou dito, lingustica do sistema no se contrape a lingustica do uso, antes se complementam reciprocamente, dado que se consideram as dimenses interlocutiva, dialogal e interactiva como matrizes definitrias da linguagem verbal (cf. Fonseca, 1993 e 1998). Tal no invalida que no raro exista um desfasamento entre o que se diz, de forma explcita e literal, e o que efectivamente se quer dizer, mas o estudo dos mecanismos e dos clculos interpretativos que permitem aceder ao intendido reserva-se para a esfera da Pragmtica.

    Ao nvel semntico so estudados os constituintes e os mecanismos de seleco e de representao sgnico-conceptual que consubstanciam o contedo informativo dos actos de fala. Ao nvel pragmtico so marcadas as estruturas informativas relativamente sua relevncia ilocutria ou textual. Mas, como veremos, a semntica dum enunciado nem sempre se satura ao nvel das significaes literais e muito menos das dimenses vero-condicionais que as sustentam; a percepo das significaes subentendidas, das significaes intendidas e das significaes figurais requer que sejam convocados mecanismos de natureza discursivo-pragmtica, para cabalmente se entenderem as dimenses semnticas discursivamente orientadas e pragmaticamente condicionadas.

    O estudo das significaes lexicais , portanto, levado a cabo tendo em conta no apenas o cotexto frsico e textual em que a unidade/expresso se insere, mas tambm o contexto vivencial e cultural dos falantes, seja em termos psicolgicos, sociolgicos ou referenciais. A linguagem reflecte inevitavelmente a cultura, a cognio, a construo do(s) universo(s) dos falantes (cf. J. Taylor, 1991, cap. 5 (Linguistic and Encyclopaedic Knowledge), Augusto Soares da Silva, Amadeu Torres, Miguel Gonalves, organizadores (2004), Linguagem, Cultura, Cognio. Estudos de Lingustica Cognitiva. 2 vol.s Coimbra, Livraria Almedina), pelo que o significado das palavras recorta-se necessariamente tambm em funo de todas essas variveis contextuais (cf. as conotaes culturais e/ou ideolgicas de vermelho ou de branco para um europeu ou para um asitico). Em todo o caso, a significao ressalta da tenso existente entre sistema e uso, pelo que o significado definido antes do mais ao nvel do sistema, mantendo-se por isso uno e constante, independentemente dos usos e dos contextos em que activado, das motivaes que serve, das interpretaes (ordem, pedido de ajuda, insulto, etc) ou dos efeitos que provoca.

  • Outro aspecto a ter em considerao o de que as opes sintcticas efectuadas, as formataes sintcticas que o falante selecciona so determinadas, em ltima instncia, pelas intenes/motivaes ilocutrias, em funo dos contedos lexicais a transmitir. O aluno dever ser capaz de metodologicamente dissociar os vrios nveis de processamento sgnico, formulando juzos de gramaticalidade e de boa formatao sintctica, mesmo que em dissociao com parmetros de natureza semntica (*o sol hoje est descalo), e do mesmo modo dever ser capaz de desmontar ambiguidades interpretativas ancoradas sintacticamente (vi o av quando passeava beira-mar).

    A culminar as consideraes expendidas, nomeadamente no que diz respeito s mltiplas dimenses a ter em conta na anlise do fenmeno semntico, e de alguma forma procurando fazer uma sntese a um tempo retrospectiva e prospectiva dos contedos da cadeira, importa chamar a ateno para os dois grandes eixos em que se situa a reflexo a empreender a semntica lexical e a semntica frsica e, assim sendo, remeter desde j para os nveis de anlise a considerar futuramente, e a seu tempo circunstanciadamente retomados.

    Assim, e de acordo com Lyons (1990), sob um ponto de vista ontolgico-lingustico podem considerar-se (i) entidades de primeira ordem, os individuais, (ii) entidades de segunda ordem, que compreendem eventos, processos, estados de coisas, localizados no tempo e no espa-o, e (iii) entidades de terceira ordem, as proposies, que se situam fora do tempo e do espao. Os predicado(re)s, que designam propriedades ou relaes, aplicam-se e referem-se a entidades. A activao dessas relaes a predicao, que permite recortar um estado de coisas, real ou possvel. A um nvel mais abstracto se situam os esquemas proposicionais e os actos de fala.

    Para o estudo do objecto e da identidade da semntica podem ser consultados Christian Baylon & Xavier Mignot (2002), Initiation la smantique du langage, Howard Gregory (2000), Semantics, Richard Larson and Gabriel Segal (1995), Knowledge of meaning. An introdution to semantic theory, Sebastian Lbner (2002), Understanding semantics, Christian Touratier (2000), La smantique, Ramn Trujillo (1979), Elementos de semntica lingstica.

    A estes acrescem os seguintes manuais, recorrentemente invocados, e por isso conside-rados de referncia para esta cadeira: E. Coseriu (1977b), Princpios de semntica estructural e (1978), Gramtica, semntica, universales. Estudios de lingstica funcional; D. A. Cruse (1997), Lexical Semantics e (2004), Meaning in Language. An Introduction to Semantics and Pragmatics: J. Lyons (1996), Linguistic semantics. An introduction, (1977), Semantics ou, nas verses francesas (1978), lments de smantique e (1990), Smantique linguistique.

    Neste mdulo introdutrio se integra uma reflexo panormica mas selectiva sobre modelos e teorias semnticas, e bem assim sobre conceitos bsicos para o estudo da semntica

  • das lnguas, que viro a ser desenvolvidos e aplicados medida que forem surgindo no decurso do processo de ensino-aprendizagem.

    O estudo de conceitos operatrios basilares de Semntica deve ser feito de forma articulada com o conhecimento, ainda que sumrio, dos quadros de referncia terica em que eles nascem e se desenvolvem. Dada a proliferao, intensificada nas ltimas dcadas, de concepes e de teorias semnticas, torna-se difcil congraar a reflexo (mais) terica com a (mais) instrumental. Uma opo pedagogicamente mais adequada parece-me ser aquela em que o estudo de conceitos operatrios basilares precedido e/ou acompanhado de uma clarificao dos grandes quadros de referncia tericos dominantes em semntica.

    1.2. Modelos e concepes de semnticaUm momento fulcral, porque fundador de toda a cadeira, na medida em que ajuda a

    melhor a caracterizar conceptual e epistemologicamente, o da reflexo em torno das diferentes e possveis concepes dela disponveis.

    Isto tanto mais agudo no caso de "Lingustica Portuguesa IV" quanto conhecida a grande diversidade e controvrsia de concepes e teorias semnticas.

    Essa diversidade radica essencialmente nas diferentes concepes de significao, de significado, de sentido, que lhes esto subjacentes.

    A este respeito, vrias modalidades podem ser avocadas: uma concepo estritamente lingustica da semntica, uma concepo referencialista, uma concepo verocondicional do semantismo, uma concepo cognitivista, uma concepo sistmico-funcional da semntica do sistema e/ou da semntica dos usos e portanto tambm uma concepo contextualizada da significao. No presente momento empreende-se uma reflexo panormica sobre teorias e modelos de anlise semntica considerados representativos e relevantes para um estudo polidimensional, dinmico e construcional da semntica da lngua. Nos grandes mdulos subsequentes do programa, consagrados semntica da palavra e da frase, haver ocasio de operacionalizar, de forma aplicada, os conceitos e os instrumentos operatrios seleccionados como pertinentes para a descrio e conhecimento da realidade semntica da lngua. Como ponto de partida pode consultar-se e explorar-se em aula Chierchia, 2003, cap. 2 (Trs abordagens para a semntica e seus limites. 2.1. A abordagem representacional; 2.2. A abordagem pragmtico-social; 2.3. A abordagem denotacional)).

    Em 1.3. sero expostos os pressupostos centrais da semntica estruturalista, que balizaro a anlise que ento se empreender, pelo que neste momento podemos limitar-nos a uma sntese remissiva dos mesmos. A concepo de semntica aqui adoptada compreende as dimenses conceptuo-intensional (cf. 1.3. e 2.1.) e extensional-referencial (cf. 1.2.) dos

  • signos, considerados em sistema e em uso, integrando portanto dimenses sistmicas (cf. 1.3., 2.2.), dimenss prototpi-cas, culturais, ideolgicas (cf. 2.1.), e ainda as que relevam do contexto frsico e ilocutrio (cf. 2.3., 2.4. e 3.).

    Uma concepo estritamente lingustica da semntica confina esta disciplina ao estudo do significado explcito e convencionalizado das expresses lingusticas. Este significado no extravasa o mbito do sistema lingustico e suposto ser invariante, porque independente das situaes de uso, das intenes e dos objectivos comunicativos do falante.

    Face ao anteriormente exposto, no esta concepo monodimensional ou autocntrica de significao a que aqui perfilhada, adoptando-se antes uma concepo pluridimensional e interactiva da significao (cf. Cruse, 2004: 3. Types and dimensions of meaning), seja da palavra em si mesma considerada, seja das palavras organizadas em frases, e destas mesmas.

    Prxima desta a concepo que distingue Semntica de Axiologia (A. Martinet (1977), L'axiologie, tude des valeurs signifies. In: Estudios oferecidos a E. Alarcos Llorach, vol. I., p. 157-163), e que reserva a esta o estudo das significaes distintivas e especificamente lingusticas. Embora defensvel, a dissociao entre semntica e axiologia tem contornos e implicaes difceis de apreender neste nvel de ensino. A axiologia confinar-se-ia ao estudo dos valores significativos de lngua, reservando-se semntica o estudo das significaes de natureza no estritamente lingustica. Como delimitar as fronteiras entre uma e outra, nomeadamente quando as dimenses referenciais so homorgnicas da metalinguagem semntica usada, um dos problemas maiores que, do ponto de vista prtico e descritivo, este modelo convoca. A assuno de um modelo que privilegia a substncia semntica pode acarretar uma metalinguagem de elevado teor abstracto, que a aproximaria de formalizaes to hiperlingusticas quanto as que so adoptadas por alguns modelos conceptualistas e/ou de concepes meta-semnticas no consentneas com o nvel de ensino a que nos reportamos.

    Para desenvolvimentos da semntica de inspirao funcionalista vejam-se, entre outros, Claude Germain (1981), La smantique fonctionnelle. Paris, P.U.F. e Salvador Gutirrez Ordoez (1992), Introduccin a la semntica funcional. Madrid, Editorial Sntesis.

    Em plo quase oposto situam-se as teorias referenciais ou denotacionais da signi-ficao, que valorizam a dimenso informacional da linguagem verbal, as conexes entre as expresses lingusticas e os objectos dos mundos por elas representados. Importa sublinhar que ainda que o estatuto ontolgico dos objectos (em sentido lato) acerca dos quais podemos falar atravs da linguagem seja filosoficamente problemtico, a linguagem permite-nos verbaliz-los e at mesmo (re)categoriz-los, pelo que uma semntica lingustica no pode ignorar essa dimen-so referencial do significado. A importncia da dimenso ontolgico-referencial avulta na pr-pria categorizao e tipologizao lingustico-gramatical, que em parte reflecte o estatuto ontol-gico das entidades denotadas: a comprov-lo basta ter em conta as diferentes classes semnticas

  • de nomes [-prprios] nomes contveis e no contveis, discretos, densos, massivos e compac-tos , com comportamentos morfossintcticos distintos, em funo da classe denotacional a que correspondem, e em consonncia com as operaes de determinao que os afectam.

    Em suma, saber o que uma expresso lingustica denota ou a que faz referncia faz parte do nosso conhecimento acerca do significado dessa expresso, sob pena de no sermos capazes de reconhecer relevncia semntica e/ou semitica a signos que denotam realidades novas, como sistemas operativos (linux), anti-virus (norton), planetas (sedna), ou a signos que denominam realidades cujos contornos especficos podemos desconhecer (anemotropo, anatista).

    Como bem observa Lyons (1977, 3.4., p. 79), Semanticity is defined by Hockett in terms of the associative ties that hold between signals and features of the external environment. This definition, however, [] says nothing about the nature of the association; and it does not say whether the external features are a necessary or sufficient cause of the signal.

    No obstante, e sem negar a importncia crucial da referncia, no epistemologicamente e ontologicamente possvel identificar o significado de uma expresso com aquilo que ela denota ou refere. Como atesta Lyons (1977, 3.4., p. 79), .

    Se verdade que a natureza da gramtica mental e, em particular da competncia semn-tica e do lxico mental no extralingustica ou referencial, no ser questionvel que o conheci-mento do mundo permeia o conhecimento lingustico e, muito em particular, o semntico e o le-xical. Dissociar em absoluto a linguagem da representao que esta faz do real, e a semntica do conhecimento daquilo a que se vem convencionando chamar o enciclopdico, denega os mais significativos avanos em teoria semntica e cognitiva. O texto de Laurie Bauer, The illusory distinction between lexical and encyclopedic information (In: Henrik Gottlieb, Jens Erik Mogensen and Arne Zettersten, editd by (2003), Proceedings of the Eleventh International Symposium on Lexicography (University of Copenhagen, 2-4 May, 2002). Tbingen, Max Miemeyer Verlag) ilustra bem o cerne da questo. O problema est em delimitar a fronteira entre (J. Taylor, 1991:80).

    Por conseguinte, a dimenso referencial uma das componentes da significao, mas esta no se esgota ou subsume naquela. Os exemplos de no homologia ou de no univocidade entre referncia e significao lingustica e vice-versa so dessa realidade ilustrativos (cf. o clssico exemplo de "o vencedor de Iena" e de "o vencido de Waterloo", ambos referindo-se a Napoleo Bonaparte. Neste caso, como em outros congneres, pode falar-se em equivalentes funcionais de um mesmo referente, porque a extenso a mesma e as condies de verdade so preservadas em caso de intersubstituio. Mas a significao de uma e de outra expresses, apesar de referencialmente equivalentes, claramente contrastante (vencedor vs vencido).

  • Do mesmo modo que o significado de uma palavra no se confunde com a sua denotao, tambm nem sempre o sentido de uma frase consiste nas condies da sua verdade, por sua vez dependentes da referncia dos seus termos. Exemplos em que a uma mesma referncia ou denotao correspondem significaes, informaes e enfoques diferentes (todos cumprimentaram o Presidente da Repblica vs todos cumprimentaram o mais alto representante da nao vs todos cumprimentaram Jorge Sampaio) ilustram a no homologia entre os dois nveis. De igual modo, no so claros e unvocos os referentes de entidade mticas, como os duendes, o deus Pan, de entidades como os marcianos, ou de palavras funcionais. Ainda que se trate de um conceito que vir a ser desenvolvido adiante, por denotao entende-se aqui a relao que o lexema mantm com coisas, entidades, propriedades, eventos, actividades, processos externos ao sistema lingustico. Estes so os denotados, denotata (Lyons, 1977, 7.4. Denotation) ou os referentes para que a lngua remete.

    Sobre esta temtica vejam-se os textos matriciais de Bertrand Russel, On denoting e de Peter Fredereick Strawson, On referring, ambos in Javier Gutirrez-Rexach, edited by (2003), Semantics.Critical Concepts in Linguistics. London and New York, Routledge, vol.1, caps 2 e 3.

    Strawson, neste texto reproduzido de Mind, vol. 59, 1950, p. 320-344, vai mais longe, e postula mesmo que pelo facto de uma estrutura lingustica poder ter usos referenciais diversos, a sua significao no deve ser identificada a partir do uso que dela feito numa ocasio particu-lar, mas com base nas regras e nas convenes que governam o seu uso, em quaisquer ocasies.

    Em conexo com os modelos referencialistas da significao esto os verocondicionais. Nestes, como veremos quando reflectirmos sobre relaes semnticas interproposicionais, a noo de verdade desempenha um papel central na semntica da frase e interfrsica, ainda que possamos compreender o significado de uma frase independentemente da sua verdade objectiva. O que est em jogo quando se coloca a questo do significado de uma frase no necessariamente o seu real valor de verdade, ou seja, se o que ela denota efectivamente verdadeiro ou falso. O que est em jogo antes associar o significado de uma frase s suas condies de verdade, ou seja, forma que o mundo teria de assumir para que a frase seja ou fosse verdadeira. No mdulo consagrado semntica frsica teremos ocasio de aprofundar esta temtica. Em todo o caso, por demais consabido que para todas as frases no declarativas o conceito de verdade parece ser irrelevante. O valor de verdade est ausente dos enunciados jussivos, dos performativos, usados para fazer algo e no para asserir algo, e muito menos para dizer se algo verdadeiro ou falso. J as construes factivas (O Joo esqueceu-se que tinha bebido cerveja) pressupem a verdade do complemento. De igual modo, muitos outros aspectos da linguagem h que so se revem nas condies de verdade. As pressuposies pragmticas e as implicaturas constituem aspectos da significao no vero-

  • condicionados, pois representam algo que mentado, significado, implicitado, sugerido (cf. pobre mas limpo; um poltico, mas honesto), mas no dito (the meant-but-unsaid).

    Para a chamada semntica lgica ou formal, que postula uma concepo lgico-matemtica da lngua, e de que um dos expoentes primeiros Carnap, a semntica encarada como um ramo da lgica ou da matemtica, acusando portanto um grau de formalizao no negligencivel, e contrapondo-se assim, enquanto semntica pura, semntica lingustica perfilhada pelo estruturalismo e pelo funcionalismo.

    Como contributos maiores da semntica formal devem aduzir-se os conceitos de clculo proposicional e predicativo e a caracterizao dos principais tipos de relaes lgicas presentes, nomeadamente, em termos interproposicionais.

    Pode neste momento fazer-se uma breve apresentao dessas relaes, a saber: negao (termos unidos por uma relao bilateral de verdade-falsidade: p verdadeiro, q falso e vice-versa); conjuno (em que ambos os termos tm de ser verdadeiros para que a conjuno tambm o seja); disjuno, exclusiva (condio de verdade: se p verdadeira, mas no q, ou se q verdadeira, mas no p; doutro modo, situao de falsidade) ou inclusiva (condio de verdade: se p verdadeira, ou se q verdadeira, ou se ambas so verdadeiras; doutro modo, situao de falsidade); implicao, tambm denominada de condicionalidade, em que p e q estabelecem uma relao unidireccional de antecedente e de consequente (se p, ento q); e de equivalncia, ou de implicao bilateral e recproca. Complementares destas so as relaes lgicas de simetria, de transitividade e de reflexividade, cuja relevncia avultar aquando do estudo da relao de sinonmia lexical e de estrutura sintctico-argumental do verbo. Tambm as relaes de incluso e de interseco, presentes na organizao lgica de classes, extensionalmente concebidas, sero retomadas aquando do estudo dos campos semnticos e das relaes de hiponmia-hiperonmia.

    No que ao clculo das funes predicativa e referencial diz respeito, assinala-se a impor-tncia deste enquanto sistema de representao da estrutura interna das proposies, a relevncia dos conceitos de termos, expresses e funes predicativo/as e de termos, expresses e funes de denominao (naming), que se referem a individuais. Estes so especificados por operadores de determinao e de quantificao, que pode ser universal ou existencial. Por seu turno, as expresses de predicao tm por funo fornecer informaes sobre propriedades dos individuais ou sobre as relaes que estes entre si estabelecem ou mantm. Chama-se a ateno para a importncia da estrutura argumental dos predicado(re)s verbais, que permite distribu-los por classes de predicados mondicos, didicos, tridicos, ou de um, dois ou trs lugares.

    Importa tambm salientar a importncia das relaes lgicas ao nvel da anlise no proposicional, mas intra- e inter-lexical. Com efeito, conhecer o significado de uma unidade ou expresso lingustica envolve ser capaz de estabelecer quais as relaes de implicao ou

  • postulados de significao (meaning postulates) que ela autoriza. Por exemplo: se x nada, ento desloca-se em meio aqutico; se x solteiro, ento no casado.

    Uma sntese crtica do contributo da semntica formal para o estudo da semntica lingustica pode encontrar-se em Lyons, 1977, 6. (Logical Semantics) e em Chierchia, 2003, cap. 1, 3 (Semntica e Lgica) e cap. 4, 4 (A verdade em semntica) e 6 (Contra a verdade em semntica). Para uma anlise mais aprofundada sobre as relaes entre lgica e linguagem veja-se Frdric Nef (1988), Logique et langage: essais de smantique intensionnelle. Paris, Herms; sobre a relao entre interpretao lingustica e verdade, ver Mario Bunge (1974), Semantics II: interpretation and truth. Dordrecht, Boston, Reidel Publishing Company.

    Um outro modelo de concepo da linguagem e da sua componente semntica o que proposto pelas teorias cognitivistas da linguagem, que valorizam a dimenso ideacional, mentalista, conceptualista desta. Concebido como meio de expresso e de suporte do pensa-mento, o significado de uma expresso entendido como fortemente conexionado com a repre-sentao mental ou com a estrutura conceptual. Por isso esta abordagem tambm conhecida como abordagem mentalstica ou representacional, j que ao significado das palavras est associada uma imagem, um esquema ou uma representao mental, mais ou menos prototpico/a, que codifica as informaes que os falantes possuem sobre aquilo que as palavras denotam.

    um facto que a linguagem reflecte a actividade da mente humana, uma manifestao da nossa vida mental, representando uma porta de acesso ao estudo e ao conhecimento desta. Por isso o estudo da lngua uma componente central das disciplinas conhecidas como cincias cognitivas. Por isso tambm o conhecimento dos esquemas e dos princpios de discretizao e de combinatria das unidades lexicais, nas suas dimenses intralexicais e interlexicais, so uma parte conceptualmente necessria de uma teoria da linguagem.

    Em todo o caso, no consensual que se possa identificar a linguagem com os mecanis-mos psicolgicos e neurolgicos que so responsveis pela capacidade humana de conceptuali-zar linguisticamente a significao e, genericamente, de falar. Os fundamentos epistemolgicos da lingustica no se revem em absoluto nos das teorias mentalistas, conceptualistas ou cogni-tivistas do significado, na identificao deste com e de alguma forma na reduo deste a as estruturas conceptuais com que ele se encontra correlacionado (cf. (Lbner, 2002: 22)). Sobre o contributo fundamental das cincias e teorias cognitivistas para o estudo da semn-tica das lnguas far-se- uma reflexo circunstanciada mais adiante. Como leitura opor-tuna neste momento pode recomendar-se Ray S. Jackendoff 1995 (Semantic Structures), cap. 1 (Overview of Conceptual Semantics). Uma viso crtica sobre os contributos das cincias cogni-tivas pode colher-se em Jerrey A. Fodor (1998), Concepts: where cognitive science went wrong. Oxford, Oxford University Press.

  • para muitos inquestionvel a existncia de um arquivo ou de um lxico mental e de prottipos mentais, associados ao significado das palavras, mas no se confundindo com eles, pois que o significado tem de ser algo estvel e intersubjectivo, por todos partilhado, e os prottipos e representaes podem ser, por natureza, bem mais variveis. Todavia, a existncia de um lxico mental debate-se com zonas em que estes pressupostos so de difcil aplicabilidade, como a dos nomes abstractos, dos denotadores de propriedades, ou as das palavras funcionais (conjunes, preposies). Muitas incgnitas h ainda no que diz respeito prpria base neuronal do funcionamento do crebro e ao processamento lingustico. Por isso, o modo como so as informaes fnicas e semnticas codificadas mentalmente e qual a natureza das representaes conceptuais associadas a cada categoria so matrias em aberto das cincias cognitivas e neurolingusticas, que aqui apenas so equacionadas (cf. Jerrey A. Fodor (1993), The modularity of mind. Cambridge, Mass. The MIT Press).

    As teorias behavioristas, porque antimentalistas, esto nos antpodas dos modelos an-teriores. Em todo o caso, ainda que de forma mitigada, elas afloram uma abordagem da lingua-gem em alguns aspectos precursora de teorias ulteriores. Estas teorias, de que so expoentes mximos Skinner e Bloomfield, assentam numa concepo comportamentalista e instrumen-talista da linguagem humana, encarada como um sistema semitico anlogo ao animal, e em que o funcionamento representado em termos de estmulo-resposta. Sobre as limitaes que um modelo deste tipo encerra, sobretudo na medida em que subestima o papel da intencionalidade e do no mecanicismo do comportamento humano e lingustico, veja-se o captulo 5. (Behaviourist semantics) do vol. 1 de Lyons (1977), Semantics, e Pierre Attal (1994), Questions de smantique: une approche comportementaliste du langage. Louvain, Paris, ditions Peeters.

    Mais recentemente, e situando-se num quadro epistemolgico e terico distinto, o experiencialismo e o realismo corporalizado (v.g. M. Johnson, G. Lakoff, A. Wierzbicka) permitem fazer o contraponto, com base numa filosofia de natureza cognitivista e culturalista, com a herana de inspirao comportamentalista.

    Para as concepes experiencialistas e vivencialistas, o significado j no identificado luz das motivaes que a sua actualizao evoca e/ou das respostas que provoca. Porque a categorizao lingustica do real se fundamenta no experiencialmente vivido, a significao encontra-se indissociavelmente ligada quer ao real, ao cultural, quer ao vivencial, logo tambm aos comportamentos humanos. Mais ainda: o realismo experiencial valoriza de forma mpar a importncia da experincia corporizada, da corporalizao (embodiment), das vivncias biolgicas, aos vrios nveis, do conceptual ao comportamental. Os factores biolgicos, em interaco com os mecanismos cognitivos e com as idiossincrasias culturais das diferentes

  • comunidades lingusticas, so responsveis pela conceptualizao e, em estreita associao com esta, pela semanticizao linguisticamente diversificada do real.

    O livro de George Lakoff & Mark Johnson (1999), Philosophy in the Flesh. The embodied Mind and its Challenge to Western Thought. New York, Basic Books e, j antes, o de Mark Johnson (1987), The Body in the Mind. The Bodily Basis of Meaning, Imagination and Reason. Chicago, The University of Chicago Press, ilustram de forma exemplar o exposto.

    A linguagem e a produo e interpretao de sentidos /so um fenmeno multidimensional, para o qual contribuem, pois, factores biolgicos, referenciais, cognitivos e culturais. Vrios textos includos em Augusto Soares da Silva, Amadeu Torres, Miguel Gonalves, organizadores (2004), Linguagem, Cultura, Cognio. Estudos de Lingustica Cognitiva. 2 vol.s Coimbra, Livraria Almedina, testemunham este carcter multidimensional.

    Do exposto ressalta o carcter plural e complexo das dimenses significativas da significao lingustica, sendo nesta de destacar as suas vertentes denotacional (capacidade denotacional do nome, do verbo, das proposies), conceptual e pragmtica.

    Fazendo uma sntese, e antecipando sumariamente matria a ser desenvolvida em 1.3. e em 2.1., no nos situaremos entre os que, como Ray Jackendoff, em Semantics and cognition (1983), postulam a no distino entre o nvel das representaes semnticas lingusticas e o das representaes conceptuais. O captulo 6 da obra mencionada, intitulado Semantic Structure is Conceptual Structure, ilustra bem o pensamento do autor, poca, para quem ento as estruturas semnticas so um sub-conjunto das estruturas conceptuais que necessitam de ser verbalmente expressas, e representadas sob a forma de "mundo projectado".

    Embora admitindo a estreita correlao entre estruturas conceptuais e estruturas de significao, a natureza de umas e de outras no se recobre ou se sobrepe. Como veremos, em publicaes posteriores (j em 1987, em Consciousness and the Computational Mind) Jackendoff viria a rever radicalmente o seu pensamento, considerando que a capacidade lingustica uma manifestao das representaes e do processamento mental, e que ao nvel de uma interface conceptual (CIL: Conceptual Interface Level) que se processa a articulao entre o sistema de representaes mentais, que no faz parte da linguagem em si mesma, e a verbalizao lingustica ou sgnico-discursiva propriamente dita.

    No seu livro de 1997, The Architecture of The Language Faculty, o captulo 8. (How language helps us think) e as sub-seces 8.3. Language is not thought, and viceversa e 8.7.3. Language provides a way to pay attention to thought, cuja leitura se recomenda aos alunos, ilustram com clareza a inflexo no pensamento do autor, que representa actualmente uma das referncias marcantes em teoria semntica. Para um desenvolvimento destas problemticas veja-se ainda, entre outros, Jackendoff 2002 e Lbner (2002), cap. 9 (Meaning and Cognition).

    Em verso recente, Cruse 2004 prope a "dynamic construal approach" da linguagem,

  • em que a significao de cada palavra (re)construda por processos mentais em funo das constries que lhe so contextualmente impostas. A proposta de Cruse , de modo sinttico, caracterizada nos seguintes termos, que podem vir a ser explorados e comentados em aula:

    In the dynamic construal approach, words do not have meanings permanently assigned to them; rather, meanings emerge in actual use as a result of various processes of construal (mental processes of meaning construction). What every word does have as a permanent property is a mapping onto a body of conceptual content [] which is an essential part of the raw material for the construal processes, but which under-determines any specific meanings. The processes of construal which result in contextualized meanings are subject to a battery of constraints of various kinds and of different strengths which make some readings more likely than others (Cruse 2004: 14.2., p. 262).

    No mbito desta cadeira, importa reter que a linguagem humana, como outros sistemas simblicos, um instrumento gnoseolgico, intermedirio entre o mundo e o crebro, que h forte articulao entre a IL (Internalized Language) e a EL (Externalized Language), ou seja, entre o conhecimento lingustico interiorizado, a nossa gramtica mental e a competncia lingustica empiricamente activada, reservando para os especialistas indagar de que modo a linguagem se encontra incorporada ou embebida no crebro, de que modo se processa a articulao entre estruturas neurolgico-cerebrais, mentais e conceptuais e lingusticas. Sobre a natureza da estrutura conceptual e o modo como interage com a linguagem recomenda-se a leitura de Cruse, 2004: 7. (Word meaning and concepts).

    Embora seja difcil tomar posio em matrias como estas de evidncia emprica to escassa, sustenta-se aqui portanto a separao entre entidades do mundo real, entidades do mundo projectado, cuja natureza ser conceptual, e no propriamente lingustica, estando mais prximas da substncia semntica do que dos produtos verbais-verbalizados propriamente ditos, e signos lingusticos. O modo como se processa o mapeamento e a interaco das estruturas lingusticas e das redes (networks) conceptuais matria cuja equacionao aprofundada se reserva para outros nveis de ensino, at porque a base neuronal do funcionamento do crebro ainda hoje largamente desconhecida no que ao processamento (I e E) lingustico diz respeito.

    De momento, o aluno deve ter conscincia de que o conhecimento lingustico armazenado na memria e a que se chama gramtica mental (cf. Internalized grammar vs externalized grammar) no est conscientemente acessvel, sendo convocado pelo processador lingustico ou estando neste embebido, representa