Libdoc00000032v001Dimensoes Da Interatividade Na Cultura Dig

154
Dimensões da Interatividade na Cultura Digital Hermano José Marques Cintra Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Comunicação e Semiótica sob a orientação Prof. Dr. Rogério da Costa São Paulo 2003

description

Libdoc00000032v001Dimensoes Da Interatividade Na Cultura Dig

Transcript of Libdoc00000032v001Dimensoes Da Interatividade Na Cultura Dig

Dimenses da Interatividade na Cultura Digital Hermano Jos Marques Cintra Dissertao apresentada Banca Examinadora da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, como exigncia parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Comunicao e Semitica sob a orientao Prof. Dr. Rogrio da Costa So Paulo 2003 Otemadestadissertaoobviamenteincentivaainteraocomseusleitores.Paraestefim,informomeuslocalizadoresdigitaisecoloco-medisposio para a discusso dos temas abordados neste trabalho: [email protected] ICQ 37939314 (favor referenciar a dissertao no pedido de autorizao) EstacpiafoidisponibilizadaatravsdositedaTerraForum (www.terraforum.com.br),empresadeconsultorianaqualatuaoautordo trabalho.EmparceriacomoutrosconsultoresesobalideranadoDr.Jos CladioTerra,renomadoespecialistamundialemgestodoconhecimento, oferecemosassessoriaemgestodoconhecimento,e-businessee-learning. Particularmente,oautorestenvolvidoemprojetosdeformulaode estratgiasdee-business,dedesenvolvimento de ambientes digitais com foco na eficincia interativa e de construo de comunidades virtuais. - 2 - Para Satomi, minha companheira,pela pacincia, pelo apoio e, em especial, pelo carinho to essenciais durante a redao deste trabalho. - 3 - Agradecimentos Em primeiro lugar, cabe expressar meu profundo apreo compreensoeconfianademeuorientador,Prof. RogriodaCosta,semasquaisteriasidoimpossvel retomaropercursodomestradoechegaraoseufinal medianteaproduodestadissertao.Suasindicaes bibliogrficaseassugestesdastrilhaserotasforam extremamentevaliosaseprecisas.Emsegundolugar, tenhoqueagradecerminhame,Prof.AnnaMaria Marques Cintra, que pacientemente fez a reviso de vrias versesdestetexto,expurgandoerrosderedaoede lgica,almdediversaspreciosasdicasaolongodo caminho.Emterceirolugarcabemencionarovalioso apoiodemeugrandeamigo FranciscoYonamine,quedo outroladodoICQestavasempreprontoatrocaruma idia,confirmarumadvida,oulocalizaralgonarede, coisaquefazcomoningum.Vrioscolegasdetrabalho, quedesde1996acompanharamminhasperambulaes profissionaispelaInternet,tambmsotitularesdeuma dvidadegratido.Vriasdasexperinciasqueinformam estadissertaosofrutodedebates,fracassose sucessos vividos em equipe. - 4 - Resumo Oobjetivodestadissertaodiscutirainteratividadequeseestabelecenos meios digitais. Ela prope um entendimento especfico do fenmeno diante da incipiente cultura digital. A interatividade um aspecto central da potncia de transformaoqueasmdiasdigitaiscomportam.Seuestudofundamental paraacompreensodarevoluodigitalcujasetapasiniciaisatualmente presenciamos. Estetrabalhoinicia-secomadescriodetrsconceitosfundamentais: interatividade, o fenmeno estudado; cultura digital, o territrio dentro do qual ofenmenoestudado;einterface,oprincipaloperadordofenmenoneste territrio.Emseguida,elepropeummtodoparticulardeanlisedainteratividadena culturadigital.Suaprincipalhipteseaexistnciadequatrodimenses identificveis, a partir das quais a interatividade pode ser praticada e percebida. Estas dimenses do conta das variaes nas formas pelas quais os agentes da comunicaoatuam,osentidoproduzido,otempoperformadoea espacialidadeconstruda.Emcadaumadestasdimenses,umasriede vetoresidentificadaediscutidaatravsdosexemplosdevriastecnologias quesuportamainteratividadenomeiodigital,comoemail,aplicativosde mensagem instantnea e conferncias eletrnicas. Naterceirapartedestadissertao,osmecanismosdeinteratividadeso analisadosemfacedaperspectivadasdimensespropostaseseusvetores, para a qual um quadro resumo construdo. Eles so divididos em trs grupos: os viabilizados de espaos de publicao, os potencializadores de dilogos e os formadores de comunidade. Vrias tecnologias so apresentadas dentro destes grupos. Elas so discutidas em suas funcionalidades e principais conseqncias. Umamanifestaoespecficadeummecanismodeinteratividadeescolhida em cada grupo, com o objetivo de demonstrar a viabilidade da anlise que as dimenses e seus vetores possibilitam. A presente dissertao apresentada na expectativa de persuadir seus leitores daimportnciadainteratividade.Omodelodeanliseconstrudopela identificaodasdimensesdainteratividadepretendeinformaro entendimento,aaplicaoeodesenvolvimentodeferramentasde interatividade e seus ambientes de interao. - 5 - Abstract Thegoalofthisdissertationistodiscussinteractivityinthedigitalrealm.It proposes a specific understanding of this phenomenon in the midst of a nascent digitalculture.Interactivityisacentralaspecttothetransformationalpower that digital media entails. Its study is fundamental to the comprehension of the digital revolution, of which we live the early stages. This paper begins with the outline of three fundamental concepts: interactivity, the studied phenomenon; digital culture, the territory at which the phenomenon is studied; and interface, the main operator of the phenomenon in the territory.Following, it proposes a particular method for the analysis of interactivity in the digitalculture.Themainhypothesisisthattherearefouridentifiable dimensions,bywhichinteractivitycanbeperformedandperceived.They accountforthevariationsinaspectsofhowagentsofcommunicationsact, meaningisproduced,timeperformedandspatialityisbuilt.Withineachof theseproposeddimensions,aseriesofvectorsareidentifiedanddiscussed throughexamplesofvarioustechnologies,whichsupportsinteractivityinthe digital medium, such as email, instant messaging and electronic conferences. Inthethirdpartofthedissertation,themechanismsofinteractivityare analyzedintheperspectiveoftheproposeddimensionsanditsvectors,for whichasummarizingtableisconstructed.Theyaredividedinthreegroups: enablers of publishing spaces, potentializers of dialogues and builders of virtual communities. Various technologies are presented within these groups. They are discussedfortheirfunctionalitiesandmajorconsequences.Aspecific manifestationofaninteractivitymechanismischosenineachgroupforthe purposeofdemonstratingtheviabilityoftheanalysisthatdimensionsandits vector entails. The present dissertation is presented in the expectation of persuading readers oftheimportanceofinteractivity.Theanalysismodelconstructedbythe identification of the dimensions of interactivity should inform the understanding, the application and the development of tools of interactivity and environments. - 6 - Sumrio Resumo __________________________________________________5 Abstract__________________________________________________6 Sumrio__________________________________________________7 Introduo________________________________________________9 Captulo I Conceitos _______________________________________17 Cultura Digital _____________________________________________________ 20 As fronteiras do discurso digital ________________________________________________ 20 Experimentaes premonitrias do discurso ps-moderno ___________________________ 21 Algumas implicaes sociais da cultura digital _____________________________________ 23 O pensamento na Cultura digital _______________________________________________ 25 A gnese da cultura digital ____________________________________________________ 27 Operaes do digital: a Digitalizao ____________________________________________ 29 Operaes do digital: a Conectividade ___________________________________________ 32 Operaes do digital: a Virtualizao ____________________________________________ 34 A complexidade e o fim das utopias finalistas _____________________________________ 35 Interatividade _____________________________________________________ 38 Interatividade e produo de significado _________________________________________ 38 A mdia digital e a capacidade de dilogo_________________________________________ 42 O potencial interativo da leitura ________________________________________________ 44 Graus de interatividade _______________________________________________________ 48 Interface _________________________________________________________ 52 A natureza transformadora da interface digital ____________________________________ 52 A interface enquanto metfora _________________________________________________ 56 Elementos da interface _______________________________________________________ 58 Captulo II Dimenses______________________________________62 Dimenso do Agente ________________________________________________ 66 Fluxo: Um-um / Um-muitos / Muitos-muitos ______________________________________ 67 Natureza: Homem-Homem / Homem-Mquina ____________________________________ 68 Identidade: Conhecida / Desconhecida __________________________________________ 70 Dimenso do Sentido________________________________________________ 72 Mecanismo: Seleo / Dilogo _________________________________________________ 73 Mtodo: Dinmico / Procedimental / Pr-determinado ______________________________ 75 Polaridade: Escritor / Leitor / Neutra ____________________________________________ 76 - 7 - Dimenso do Tempo ________________________________________________ 79 Ritmo: Sncrono / Assncrono __________________________________________________ 80 Reteno: Permanente / Fugaz_________________________________________________ 81 Simultaneidade: Favorveis / Desfavorveis ______________________________________ 82 Dimenso do Espao ________________________________________________ 85 Metfora: Simples / Complexa _________________________________________________ 86 Acesso: Pblico / Privado _____________________________________________________ 87 Localizao: Imediata / Possvel ________________________________________________ 88 Captulo III Mecanismos ____________________________________91 Os viabilizadores de espaos de publicao ______________________________ 98 A cada um, um pedao de cho na WWW________________________________________ 98 Para cada leitor um site diferente______________________________________________ 100 Contando visitas e muito mais ________________________________________________ 101 As possibilidades tecnolgicas_________________________________________________ 103 Anlise demonstrativa: Projeto Tofte ___________________________________________ 107 Os potencializadores de dilogo ______________________________________ 111 Email: o verdadeiro killer application __________________________________________ 111 Papo cabea e papo furado___________________________________________________ 113 Contatos imediatos _________________________________________________________ 118 Conversas em txt___________________________________________________________ 121 Anlise demonstrativa: ICQ___________________________________________________ 124 Os formadores de comunidade _______________________________________ 127 Os primeiros passos ________________________________________________________ 127 As bases da vida comunitria no ciberespao ____________________________________ 129 As tecnologias de suporte ____________________________________________________ 132 A criao de mundos complexos_______________________________________________ 138 Anlise demonstrativa: Brainstorms ____________________________________________ 141 Concluso ______________________________________________146 Bibliografia _____________________________________________150 - 8 - Introduo- 9 - Introduo Adecisodeescreversobreainteravitidadenombitodaculturadigitalfaz parte de meu percurso pessoal de encantamento com revoluo digital. Embora possarecorr-loaosmeusprimeirospassoscomcomputadoresnoincioda dcada 80, a descoberta dos bulletin board systems (BBS), h dez anos, que iniciaesteencantamentocomaspossibilidadesabertaspelaInternet.Na verdade, as BBS ainda no podiam prover acesso rede das redes no incio dos anos90.ElasnosconectavamaoutrasredescomoaBitnet,aFidonetea Usenet, mas j permitiam uma experincia premonitria da potncia do email, dos newsgroups, e do acesso a documentos digitais arquivados a distncia. A experincia com as BBS tinha sabor de antepasto. Antes da regulamentao do provimento de acesso comercial em 1995, as nicas alternativas de conexo InternetnoBrasileramasuniversidadeseaBBSAlternexdoInstituto Brasileiro de Anlises Sociais e Econmica - Ibase, ONG fundada pelo socilogo Betinho, que havia viabilizado acesso Internet, em funo de suas atividades deapoioconfernciaECO-92,noRiodeJaneiro[Ercilia2000].Nofinalde 1994,afiliei-meaoIbase,instaleiobrowserdaNetscapeerealizeiminhas primeiras visitas World Wide Web (WWW). Emumadestasincurses,encontreirefernciasaorecmlanadolivrode Nicholas Negroponte, diretor do importante instituto de pesquisa Media Lab do MassachusettsInstituteofTechnology,BeingDigital[1995].Aleituradeste livro competou a operao de encantamento. A otimista viso do impacto que a revoluodigitalteriaemnossasvidascotidianas,compostaporNegroponte, era fascinante. Continua s-lo, mesmo aps quase oito anos, durante os quais aspromessasdavidadigitalforamextensamentepropagadaspelamdia, largamente abusadas por empreendores ansiosos em enriquecer na corrida ao ouro virtual do final dos anos 90 e duramente contestadas em face do debacle das bolsas em 2000. O livro de Negroponte dirigiu-me a leitura da revista Wired, o que se tornou um hbitoquemantenhodesdesetembrode1995,eestalevou-meatHoward - 10 - Introduo RheingoldeseulivroTheVirtualCommunity[1994].Esteoutrorelatodas possibilidadesqueociberespaoengendrava,aliadoavrioseexcelentes artigosdaWired,comunsnosprimeirosanosdarevista,rarosatualmente, alimentaramoencantamentoecomearamadespertarquestionamentos pessoais que acompanhavam uma progressiva compreenso das conseqncias da revoluo digital. Em1996,acuriosidadeintelectualencontrouaprticaprofessional.Desde 1991,estavaenvolvidocomtelevisoporassinaturae,naquelemomento, trabalhavaparaaholdingdasOrganizaesGloboquegerenciavaseus negcios no setor. Fui convidado a gerenciar o projeto que deveria desenvolver o produto de acesso Internet em banda larga, a ser lanado pelas operaes de televiso a cabo da empresa. Durante dois anos, tive a oportunidade de aliar pesquisaeprticanainvestigaodaspossibilidadesdarevoluodigital.A atividadededesenvolvimentodeprodutopermitiaquemuitodomeutempo fosse dedicado a leituras de relatrios e newletters que privadamente no teria condiodepagar,assimcomodiversasviagens,congressosecontatocom consultoresinternacionais.Noladodaprtica,coordeneitodasasatividades que levaram ao lanamento do produto Virtua em operao piloto na cidade de Sorocaba, no incio de 1998 (desliguei-me da empresa dias antes do incio das atividades),oqueincluiutestesdatecnologiadecablemodeme desenvolvimento de sites prottipos que exploravam as possibilidades da banda larga, entre outras atividades. Foinesteperodoquedediciengajar-meaomestradodoProgramade ComunicaoeSemitica,daPontifciaUniversidadeCatlicadeSoPaulo. Duranteosanosde1997e1998,tiveaoportunidadedelevarmeus questionamentospessoaisaoencontrodopensamentoacadmicoem disciplinas,dentreosquaissedestacam:doiscursosministradospormeu orientador,professorRogriodaCosta,umquecolocavaemdiscussoa inteligncia coletiva e outro focado na epistemologia do tempo; outros dois com - 11 - Introduo oprofessorPhiladelfoMenezes,oprimeiroqueinvestigouaexistnciadeum novo sentimento religioso no bojo da globalizao e, um segundo, que discutiu otextoeaculturadigital;eumoutroconduzido pelo professor Srgio Bairon queconvidouatuaoprtica-tericanaconstruoderoteirosem hipermdia. J na primeira monografia escrita para o programa de mestrado, a opo pelo estudodainteratividadefoiconfigurada.Estetrabalhoapresentavaa proposio das dimenses de interatividade e o incentivo do saudoso professor Philadelfo Menezes levaram-me a transformar esta proposio na base do meu projetodepesquisa.Em1999,trabalhandosobaorientaodeRogrioda Costa,inicieioempreendimentoquedeveriaproduzirestadissertaoato final do mesmo ano. Estatrajetriafoiinterrompidaporumeventodeminhavidaprofissional.Em outubro de 1999, fui convidado pelo presidente da empresa em que trabalhava amontarumnovonegcio,aproveitandomeusconhecimentossobrea Internet.Tambmqueramosembarcarnacorridadoourovirtual.Decidimos criarumservioquedeveriaoferecerapequenasemdiasempresasas vantagens de eficincia que a Internet viabilizava para as grandes. A misso era criarumacomunidadedeempresas,apartirdeferramentasqueomercado apelidoudeB2B(businesstobusiness).Paratornarumalongaetortuosa histria curta, durante trs anos mergulhei de corpo e alma neste projeto que infelizmenteaindanologrouestabelecerumacomunidadepulsantede empresas,apesardeteratradomilharesdelasehaverdadomargemao desenvolvimento de diversos aplicativos. Nesteperodo,duranteoqualafastei-medoprogramademestrado,os desafiosprofissionaislevaram-mediscussoeprticacomvriosdos mecanismos de interatividade que analiso nesta dissertao. Chegamos tarde corrida do ouro virtual e com o estouro da bolha especulativa em abril 2000, as dificuldadesqueseabateramsobreasempresasdomercadodeserviosde - 12 - Introduo Internet,proporcionaramumavidaduraeumricoaprendizado.Asgloriosas promessas,quehaviamsidoextensamenteexploradasporempreendedores vidos em levantar fortunas na bolsa e reverberadas por jornalstas facilmente encantveisporumaboamanchete,deramlugaraoceticismo.Revoluo digitalenovaeconomiapassaramasertratadascomopartedeumembuste criado para inflar, absurdamente, o valor das empresas pontocom. Certamente,houvemuitoexageroevriascertezasquejtiveme abandonaram, porm continuo absolutamente encantado com as possibilidades do ciberespao. No tenho a menor dvida de que vivemos os primeiros anos de uma profunda revoluo. Como diz Lcia Santaella: Propiciada,entreoutrosfatores,pelasmdiasdigitais,arevoluo tecnolgicaqueestamosatravessandopsquica,culturalesocialmente muitomaisimportantedoquefoiainvenodoalfabeto,doquefoi tambmarevoluoprovocadapelainvenodeGutemberg.ainda maisprofundadoquefoiaexploso da cultura de massas, com os seus meiostcnicosmecnico-eletrnicosdeproduoetransmissode mensagens.Muitosespecialistasemciberculturanotmcessadode alertar para o fato de que a revoluo teleinformtica, tambm chamada derevoluodigitaltovastaapontodeatingirpropores antropolgicasimportantes,chegandoacompar-lacomarevoluo neoltica. [2002:389] Sobestaperspectiva,eramesmoestranhoqueastransformaesprovocadas pelodigitalenfrentassemtopequenaresistncia,emespecial,quando comparadas s crticas e ao ceticismo ocasionados pela inveno da imprensa. Seriamaisnormalqueumarevoluodestasproporescriassediversas rupturas nos meios de produo, levando a processos de destruio de riqueza enoaumavertiginosavalorizaodosativosmotivadaspeloqueAlan Greenspan,presidentedoFederalReserveamericano,definiucomo exuberncia irracional. As promessas da revoluo digital so vlidas, porm - 13 - Introduo elasvoseinstalardemaneiramuitomaisproblemticadoquesesups durante a corrida do ouro e, como todas as revolues que envolvem grandes transformaes scio-culturais, vo tomar o perodo de geraes para que todo seu potencial se realize. Desdedeoincio,tivebastanteclaroquenobojodamultifacetadarevoluo digitaloquemeinteressavaestudareraaInternetcomofenmenode comunicao.Oquemaismeencantavaeramaspossibilidadesinterativasdo meio, sua capacidade de colocar em dilogo mltiplos agentes afastados entre sinocontnuodotempo-espao.Noscursosjuntoaoprogramade Comunicao e Semitica e durante a pesquisa que empreendi, pude confirmar queainteratividadeconstituiaumtemarelevantenosomenteporsua centralidade diante da cultura digital nascente, como tambm pela carncia de anlises que a tomassem como objeto primrio. Ao longo das leituras, das disclipinas e da prtica profissional, vrias perguntas interpunham-se.Existiaumanovalinguagem?Formava-seumanovacultura? Configurava-se uma nova forma do pensar? Havia veracidade na proposio de umaintelignciacoletiva?Constituiamascomunidadesvirtuaisorganizaes sociasefetivas?Estasquestesforamsendoaclaradasemtextosnosquaisa interatividadefazia-sesemprepresente.Falava-sedainserointerativado leitorimersivo[Santaella2002],daculturaconstitudaporumaaudinciaque participa [Costa 2002], da inteligncia colocada em fluxo coletivo pela interao [Lvy1999],dascomunidadesquenascememfunodainteraosocial contnuanociberespao[Rheingold1994]edediversastecnologiasesuas conseqnciasquasesemprecaracterizadaspelopotencialdeinteratividade. FicavaclaroquehaviaumaculturadigitalequeaInterneteraumartefato cultural [Hine 2000] que tinha na interatividade sua fonte de potncia. Apretensodestadissertao,portanto,construirumentendimentodo objetointeratividadedentrodocontextoespecficodaculturadigital.Amaior dificuldade que isto oferece isolar a interatividade do discurso. Por exemplo, - 14 - Introduo no interessam as manifestaes da arte digital em si, mas, sim, como ocorrem as interaes dos agentes da comunicao entre si, atravs das mensagens que esta compe. A principal indagao reside em como funcionam os mecanismos quenospropocionamainteratividadenomeiodigital.Quaisascaractersticas quedeterminamsuapotnciae,porconseguinte,contituemomeiodigital como um territrio transformador. Almdaextensaprticanosmbitosprofissionalepessoalcomdiversos mecanismos de interatividade que habitam o ciberespao, os diversos relatos e anlisesqueconstituemabibliografiadestadissertaoinformarama construo de um entendimento particular do objeto interatividade. Trata-se de umapropostadeabordagemanalticaquepretendeinstrumentalizara compreenso,aaplicaoeaconstruodemecanismosdeinteratividadeno meiodigital.Estetextooferece-secomoumaferramentanamedidaque procura caracterizar a interatividade na cultura digital, a partir de um conjunto de dimenses dentro das quais uma srie de vetores criam as possibilidades de interao entre os agentes e as mensagens no ciberespao. Otextopartedacaracterizaodetrsconceitoscentraisinvestigao:a cultura digital, a interatividade em si, e a interface que a possibilita. O primeiro captuloserveparaexporminhacompreensodestesconceitosluzdas leituras realizadas, que no se pretendem panormicas do estado da arte, mas, sim,refernciaisparaaconstruodaproposiocentraldestetrabalho, desenvolvidanocaptuloseguinte.Adiscussoconceitualtemporobjetivo demitar a pesquisa ao configurar o fenmeno, seu territrio e seu operador. So quatros as dimenses da interatividade que apresento no segundo captulo. Elasremetemaopapeldoagente,dosentido,dotempoedoespao.Nessa etapadadissertao,fundamentoaconfiguraoconceitualdasdimensese proponhoquedentrodelasexistemosvetoresquedoluzpotnciada interatividade na cultura digital. Discuto as dimenses e seus vetores um a um, - 15 - Introduo apresentando-os em face dos mecanismos de interatividade especficos como o email, a Web e as conferncias eletrnicas. O terceiro captulo, d conta de aplicar esta proposio conceitual como mtodo deanlise.guisadeexemplodaviabilidadedomtodo,oquadrodas dimensesdainteratividadeaplicadoemtrsdemonstraesanalticas, eleitasapartirdadistribuiodosmecanismosdainteratividadeemtrs grupos, segundo objetivos distintos: a viabilizao de espaos de publicao, a potencializaodedilogos,eaformaodecomunidades.Asprincipais tecnologiasqueoperamainteratividadenestestrsgrupossoapresentadas em funo de seus aspectos mais relevantes e as dimenses so discutidas vis a vis a suas funcionalidades. Naconcluso,discutoautilidadeeaslimitaesdaanliseproposta.Na tentativadeoferecercontinuidadeparaapesquisadainteratividadeaqui empreendida,elencoduasindagaesproblemticasemfaceaoproposto mtodo de anlise. Por fim, rapidamente relato as indagaes pessoais nascidas durante o projeto que esta dissertao encerra e as possibilidades de caminhos intelectuais que elas me apresentam para o futuro. - 16 - Captulo I Conceitos - 17 - Captulo I - Conceitos O primeiro estgio desta dissertao colocar em perspectiva os trs principais conceitosqueoperamnouniversotemticoescolhido:ainteratividade,o fenmenoemanlise;aculturadigital,oterritriodeatuaonoqualse analisaofenmeno;eainterface,oprincipaloperadordofenmenoneste territrio. Pretendodemarcarestesconceitosnosomenteemrelaoaosseuslimites, quanto tambm s suas implicaes mais relevantes, em especial, aquelas que osinter-determinamemconjunto.Pretendotambmreferenciarculturalmente estesconceitosesuascrticas,porm,semqualquerpreocupaocoma representatividadequantitativadaanlise.Aseleorealizadaparticulare referencial, no panormica. Embora a razo da escolha esteja sinteticamente exposta no primeiro paragrfo acima,cabesituarosconceitosescolhidosemconjunto,antesdetomarcada umcomoobjetodeanlise.Nonecessriodefenderaexistnciadeuma interconexoconceitualentreculturadigital,interatividadeeinterface,mas cabe discutir sua natureza. Astecnologiasdaculturadigitalproduzemalteraessignificativasnos mecanismosdainteratividadequeporsuavezestoemgrandeparte implicadosnaprpriaconstituiodociberespaoesuacultura.Rogrioda CostaabreseulivroACulturaDigitaldizendoAculturadaatualidadeest intimamente ligada idia de interatividade... [2002:8]. Aredeantesdemaisnadaummeiodecomunicao.AlainKay,umdos pioneirosdaconstruodeinterfaces,vaialmaoafirmar:Ocomputador um meio de comunicao! [apud Johnson 2001:41]. A cultura digital pode ser delimitada como aquela que surge do fenmeno da comunicao mediada por computador(CMC)potencializadapelaaltaconectividadeproporcionadapela Internet.Asalteridadesdaculturaatualresultam,emgrandeparte,de - 18 - Captulo I - Conceitos alteridadesnainteratividadeque,porsuavez,surgememfunodas tecnologias desta mesma cultura.Existeummovimentodedupladeterminaocentralaopotencial transformadordaculturadigital.Astecnologiasquefundamasalteridadesna interatividadenascemdaspulsesdestaculturadigitalque,porsuavez,se nutrem deste potencial da interatividade. Nocampodestadupladeterminao,operaainterface.Soasinterfacesque pragmatizamainteratividadenacomunicaomediadaporcomputador.So suascapacidadescomunicacionaisquedesenhamosnovoslimitesda interatividade e condicionam, em grande parte, sua eficincia. nas inovaes da interface que o virtual realiza seu potencial de interatividade. Fechando o circuito, a interface ocupa um papel central entre as manifestaes daculturadigital,comodefendeStevenJohnsonemseuCulturadaInterface [2001]. Uma nova cultura pressupe um novo discurso. A cultura digital opera seudiscursodemaneiraprimriaemseuprpriomeio.Pragmatiza-se, portanto, atravs de interfaces que nos atualizam o digital. As possibilidades da interface determinam este discurso. Ainterfacetambmcentralculturadigitalnamedidaemque,umavez digital, a arte depende de uma interface para se tornar presente a seu pblico. A interface est na obra, no mera moldura, visto que a arte digital implica a interatividade.Aartedigitalnoseadmiteesttica,noconstrudapara contemplao.Elasupeainteraodopblicocomoobjetoartstico,como nota Lvy: Organizandoaparticipaoemeventosmaisdoqueespetculos,as artes da cibercultura reencontram a grande tradio do jogo e do ritual. [1999:155] - 19 - Captulo I - Conceitos Cultura Digital As fronteiras do discurso digital Emborasejahistoricamentemuitorecente,ouniversodaculturadigitalpor natureza profcuo. Suas dimenses so da escala do inimaginvel. A quantidade deproduoquepodeserconsideradaculturalassustadora.AInternet, principal repositrio das manifestaes da cibercultura, um universo infindvel de textos, imagens e sons que se conectam de maneira mltipla e intrincada. Diversossoosaparatosqueprocuramdaralgumaorganicidadeaoimenso contedodarede.OsmecanismosdebuscacomoGoogle(www.google.com) ouYahoo!(www.yahoo.com)soparadaobrigatriaatodosaquelesque procuramalgonaInternet;easeventuaisfrustaesdiantedosresultados destas pesquisas so inescapveis. Porm, a exploso informacional e a ansiedade que dela resulta so anteriores ao crescimento exponencial provocado pela Internet. Vannevar Bush j tratava do tema em seu seminal ensaio As We May Think em 1945. Rogrio da Costa apontaqueaprofusodecanaisdeteleviso,revistas,livrosefilmes,entre outrasproduesdasmdiasdecomunicaodemassa,jacarretavama sensaodeimpotnciadiantedaquantidadedeinformaoaserassimilada. [2002] AInternettransformaaescaladestatendncia.Elaproduzumaverdadeira exploso da produo de contedo por meio da World Wide Web (WWW). So milhesdepessoasdistribudaspeloplaneta,produzindodiariamente informaesdeimediatodisponveismundialmente,atravsdesitespessoais, corporativosecomunitrios.Estaproduocorrespondeamanifestaes culturais cuja qualidade pode ser questionada, mas cuja realidade no pode ser negada. - 20 - Captulo I - Conceitos Primariamente,asproduesdestaculturadigitalocorrememseuprprio meio,portanto,envolvemoprocessodadigitalizaoeosuportedeum computador.Nonecessariamenteimplicamacomunicaoatravsderedes, emborageralmentepressuponhamaconectividade.Analisandoprodues artsticas prprias da cultural digital, Lvy escreve: As obras offline podem oferecer de forma cmoda uma projeo parcial e temporria da inteligncia e da imaginao coletivas que se desdobram na rede. Podem tambm tirar proveito de restries tcnicas mais favorveis. Emparticular,noconhecemoslimitesdevidosinsuficinciadastaxas de transmisso. Trabalham, enfim, para construir ilhas de originalidade e criatividade fora do fluxo contnuo da comunicao. [1999:146] Tambm no se excluem do universo da cultura digital manifestaes culturais suportadasporoutrasmdias.Umacrticadaculturadigitalpublicadano formatodeumlivrodeveserincludanocorpusdestamesmacultura.Da mesma maneira, devem ser considerados determinados programas de televiso queestoinseridosnocontextodaculturadigital,sejaemfunodeseus temas, de seus mecanismos ou de sua abordagem esttica. Steven Johnson relaciona entre as manisfestaes do digital alguns programas de televiso que praticam uma metaforma, uma nova forma cultural que paira emalgumlugarentremeioemensagem[2001:33],cujaexpresso prototpicaseriaocanaldetelevisoacaboE!EntertainmentTelevision. Johnson argumenta que estas j so expresses da cultura digital, ou, em suas palavras, so formas digitais aprisionadas em um meio analgico [2001:35]. Experimentaes premonitrias do discurso ps-moderno Assim como as manifestaes da cultura digital excedem o suporte digital, suas formastambmseanteciparamnotempo.JanetMurray,nasuabrilhante exploraosobreanarrativadigital,HametontheHolodeckTheFutureof - 21 - Captulo I - Conceitos Narrative in Cyberspace [1997], traa as origens do discurso digital em diversas obras culturais que antecedem a formao de uma cultura digital, aceitando-se que esta s se faa presente quando a comunicao mediada por computador passaaocuparumpapelrelevantenaexperinciahumana,comoveremosa seguir. A professora do MIT, discutindo o conto O Jardim dos Caminhos que Bifurcam de Borges e o filme Rashomon de Kurosawa, entre outros exemplos, aponta paraaexistnciadeumtipodeestruturanarrativaaqualdonomede estriasmultiformes.Tratam-sedetramasquesedesenrolamemmltiplas possibilidades,sejacriandorealidadessimultneasdistintas,sejanarrandoo mesmoenredoapartirdediferentespontosdevista.Aautorasustentaque estaformadanarrativatrabalhacomoumaantecipaodaspossibilidadesda mdia digital. O mesmo movimento tambm est presente na arte que demanda umaaudinciaativa,comoasinstalaeseperformances,oteatrocoma participaodopblicoouatmesmoaliteratura,quandooautorreconhece diretamenteaexistnciadoleitor,passandoatravarcomesteumdilogo criativo,aoqualtransferepartedaresponsabilidadedacriaodocontexto narrativo. [Murray,1997:Chapter 2] RichardLanham,emseuestudosobreapalavraeletrnica,afirmaqueas tecnologias digitais trabalham no sentido da suplantao de vrias barreiras da linguagemqueasvanguardasdocomeodosculoXXtentaramultrapassar [1993]. Lvy, em Cybercultura, argumenta que a fbula do progresso linear e garantido [1999:120], que a cultura digital vem deslocar, j havia sido objeto de contestao das vanguardas e, citando Jean-Franois Lyotard, afirma que a ps-modernidade j havia proclamado o fim das grandes narrativas totalizantes, antes da cultura digital. [1999: Captulo VI] O Professor Philadelfo Menezes, tambm, defendia este carter antecipador do discursodasvanguardas,quandoidentificavanestasosprimeirospassosno sentidodadesconstruodalgicalineardanarrativa[1996].Nestesentido, - 22 - Captulo I - Conceitos citava tanto a narrativa em fluxo de conscincia, cujo monumental exemplo de Ulysses,deJamesJoyceamplamentecitadoporStevenJohnson[2001], quanto as experimentaes sintticas e estilsticas da poesia concreta, do Jogo deAmarelinha,deCortazaredasfusesmultimiditicasdavideoarte, largamente documentadas por Artur Matuck em seu livro O Potencial Dialgico da Televiso [1995]. Algumasoutrasproduesculturaistambmantecipamaculturadigital, emborajpossamser,temporalmente,enquadradasemseusprimrdios. Certamente,NeuromancerdeWiliiamGibsonoexemplomaisclssicodesta antecipao.Gibsonnoscunhaotermociberespaonestevolume,como tambmopovoacomsuasprimeirasimagensemitos.Suasmetforasdo ciberespao, assim como as interfaces que descreve, permanecem desafiadoras at hoje. O holodeck, que Janet Murray coloca no ttulo de seu livro, referencia oseriadoGuerranasEstrelas:Voyager,aquartaversodopopularprograma deteleviso.O holodeck um aparelho de projeo hologrfica utilizado para contarhistriasemalgunsepisdiosdasrie.Murrayapresentaoholodeck como uma antecipao do carter imersivo da narrativa digital [1997: Chapater 1 e Chapter 4]. Algumas implicaes sociais da cultura digital Para que possamos entender a cultura digital como um fenmeno abrangente, tambm preciso identificar suas manifestaes fora do ambiente do discurso. precisopercebersuasimplicaesnasrelaessociaisqueflorescemno ciberespao. Umprimeiroaspectoaevidenciar a existncia de um sistema de normas de conduta. A instncia mais aparente destas regras de conduta so a netiquette. NicholasNegropontereconheceaexistnciaeanecessidadedosistemade conduta, porm aponta para o fato de que, em funo da juventude do meio, - 23 - Captulo I - Conceitos estasregrasnosoaindanemconsolidadasnemconhecidas,muitomenos respeitadas.[1996:191-193]Seistoverdadeparaaredetomadaemseu todo,deixades-loquandoolhamosparacomunidadesvirtuaisestabelecidas narede.HowardRheingoldrelataumasriedeeventosquedemonstrama formao de comportamentos socialmente vlidos, seja pela simples repetio, seja pela coero a desvios no aceitos por esta conduta [1994]. Outros indcios demonstram que esta cultura envolve um projeto tico prprio. EntreelesestaexistnciadeumaorganizaocomoaEletronicFrontier Foundation (www.eff.com) que se dispe a defender os valores do ciberespao. Nestamesmalinha,soma-seacolunaTheNetizen,publicadadurantecerto perodonarevistaWired,queseatevemesmatarefa,emboraaindaseja difcilperceberaexistnciadeumconjuntocomumecoerentedevaloresno mbitodarede,queseestendaalmdeumpequenaelite.JohnKatz, escrevendo para a mesma Wired, identifica: I saw the primordial stirrings of a new kind of nation - the Digital Nation - and the formation of a new postpolitical philosophy. This nascent ideology, fuzzy and difficult to define, suggests a blend of some of the best values rescuedfromthetiredolddogmas-thehumanismofliberalism,the economicopportunityofconservatism,plusastrongsenseofpersonal responsibility and a passion for freedom. [1997:49]Almdoprojetotico,aculturadigitaltambminstauranovosformatosde relacionamento social. As comunidades virtuais so a grande novidade. Se uma comunidadeumgrupodepessoasqueinteragesocialmente,comunidades virtuaissogruposquemantmestreitoslaossociaisdemaneira independentedoespaofsico.Suasrelaessomediadasatravsdos mecanismosdaCMC.Apertosdemososubstitudosporcumprimentos eletrnicosquetrafegamnaformademensagenseletrnicas.Olivrode Howard Rheingold The Virtual Community [1994] um extenso testemunho da - 24 - Captulo I - Conceitos existnciadestascomunidades,apartirdaexperinciadoautornasorigense desenvolvimento de algumas delas: VirtualcommunitiesaresocialaggregationsthatemergefromtheNet when enough people carry on those public discussions long enough, with sufficienthumanfeeling,toformwebsofpersonalrelationsin cyberspace. [1994:5] Oqueformaascomunidadesopartilhardeinteressescomunsqueconstri um repertrio coletivo a partir da interao contnua. A experincia virtual no condicionadademaneiraalgumapeloespaofsico.Asconexesentreas pessoas que constituem o espao virtual. J em 1968, os diretores da ARPA (AdvancedResearchProjectsAgency),ponderandosobreascomunidadeson-line, percebiam que ... there will be communities not of common location but of common interests... [Licklider, J and Taylor, R apud Rheingold, 1994:24]. O pensamento na Cultura digital Dentro do campo da cultura digital, tambm se identificam novos processos de produoeacumulaodoconhecimento.aintelignciacoletivaqueLvy identificacomoumdosprincipaismotoresdacibercultura[1999:28].O conhecimentointerconectadoqueresidenociberespaoconstituiumanova forma de memria cultural: coletiva como a que reside nas bibliotecas, porm muito mais dinmica e mltipla, visto que no mediada por uma indstria do saber que exclui o que no valida. Nombitodaculturadigital,osobstculosparaadistribuioeparaa permannciadoconhecimentoparticularsomnimos.Nomaisnecessrio teroavaldeumaacademiaouoapoiodeumaeditoraparapublicar manifestaes culturais das mais variadas tendncias. Os mecanismos do digital tambmdeslocam,semsubstituir,asinstituiesdosaberdopapelde validaodacultura.Aautoridadedeumdiscursopassaaserestabelecida - 25 - Captulo I - Conceitos dentro das comunidades virtuais de maneira direta, ou fora delas por meio de umamploprocedimentodeconexoentrepublicaesdigitaisoperadopor links hipertextuais. Aqui a cultura digital se destaca das formas que a precedem. Existe um retorno transmissodaculturaporcoletividadeshumanasvivas.Asmanifestaes culturais transitam sem a interferncia de agentes mediadores como indstrias culturaisdosaberedoentrenimento.Nestemovimento,autorescomoPierre Lvy [1999], Steven Johnson [2001] e Philadelfo Menezes [1996] percebem um retornooralidade,caractersticadasculturasanterioresescrita.Porm,os discursos digitais no se perdem como os orais; eles so feitos permanentes na estrutura do ciberespao. Aculturadigitalinauguraprofundastransformaesemnossosmodosde pensar,vistoqueistoserealizaapartirdonovastecnologiasdainteligencia [Lvy1994].ComocomentaSantaella,naculturadigitalestogeminando formas de pensamento hetergeneas, mas, ao mesmo tempo, semioticamente convergenteseno-lineares,cujasimplicaesmentaiseexistnciais,tanto paraoindivduoquantoparaasociedade,estamosapenascomeandoa compreender [2002:392]. Como destaca Lvy, a inteligncia coletiva fruto de um conjunto de: ...tecnologiasintelectuaisqueamplificam,exteriorizamemodificam numerosasfunescognitivashumanas:memria(bancosdedados, hiperdocumentos,arquivosdigitaisdetodosostipos),imaginao (simulaes),percepo(sensoresdigitais,telepresena,realidades virtuais),raciocnios(intelignciaartificial,modelizaodefenmenos complexos). [1999:157] - 26 - Captulo I - Conceitos A gnese da cultura digital Secomovimos,asfronteirasdaculturadigitalsolargas,cabeentodiscutir sua gnese e seus principios de fundao. De maneira simples, podemos dizer queaculturadigitalaquelaqueacompanhaacomunicaomediadapor computador.Porm,precisotomarumcuidado.EmboraaCMCpossaser recorrida at s experincias iniciais que originaram a Arpanet, a rede ancestral da Internet, na dcada de 60, preciso ressaltar que somente a partir de uma determinada quantidade de atores conectados que a rede atinge maturidade para constituir uma nova cultura. Como ressalta Lvy, o ciberespao fruto de umverdadeiromovimentosocial,comseugrupolder(ajuventude metropolitana escolarizada), suas palavras de ordem (interconexo, criao de comunidades virtuais, inteligncia coletiva) e suas aspiraes coerentes [1999: 123]. Por quase duas dcadas, todo o aparato que viabiliza a CMC se manteve dentro decentrosdepesquisaacadmicosemilitares.oadventodocomputador pessoal(PC)quetransformaapotnciadacomunicaomediadapor computador.OjornalistaRobertCringleyfazumexcelentehistricodo surgimento do PC em seu livro Accidental Empires [1996]. Cringley relata como ummovimentoiniciadocomohobby,porumpequenogrupodeengenheiros, se transforma em um fenmeno industrial de larga escala. Aculturadigitalcomeaaseengendrarquandoocomputadordeixadeser exclusivodasredomasasspticasdoscentrosdeprocessamentodedados (CPD)dasgrandesempresas,universidadesecentrosdepesquisa,ese transfereparaasmesasdetrabalhodemilhesdecidadosannimos.Ao longodasduasltimasdcadas,oPCalastrou-sedemaneiracontnua, passando a estar presente nos mais diversos ambientes da sociedade moderna. Atingiu os universos profissionais, domsticos, escolares, comerciais e de lazer. - 27 - Captulo I - Conceitos Porm,comocomentaGeorgeGuilder,ensastadasrevistaForbes,o computador desconectado de uma rede de comunicao pode ser comparado a umfuscanomeiodaselva fechada. Ele pode ser muito til, pois nos protege dos bichos e da intemprie, mas no nos leva a lugar nenhum. na confluncia docomputadorpessoaledacomunicaomediadaporcomputadorque encontramos o nascimento da cultura digital. Em seu relato da emergncia das comunidadesvirtuais,HowardRheingolddescreveboapartedos acontecimentos que delimitam o surgimento desta cultura [1994]. TantoRheingoldquantoCringleydocumentamosprimeirospassosdesta convergnciaaorelatarcomoosengenheiros,usuriosdosprimeirosPC, criaramosprimeirosbulletinboardsystems(BBS).Animadospeloimpulsode compartilharsuasexperinciaseconhecedoresdopotencialdaCMC,j presente no ambiente acadmico, eles passam a conectar seus computadores a linhas telefnicas, utilizando aparelhos de modulao / demodulao (modems), oquelhespermitiatrocararquivoscomcomputadoresdistantestambm conectados a linhas telefnicas e modems. Este movimento leva constituio de centros agregadores, as BBS que, funcionando como repositrio de arquivos e mensagens, passam a mediar a comunicao entre vrios usurios equipados com PC e modem. OimpulsoqueprovocaacriaodosBBSevoluiparaumadiversidadede formatos durante a dcada de 1980. A mais citada das comunidades virtuais, a The Well, nasce em 1985. Neste perodo, proliferam tambm os Usenet groups, oInternetRelayChat(IRC)eosmulti-userdomains(MUD).Porm,o adventodaWWWqueoperaamassificaodaCMCnoinciodadcadade 1990. A cultura digital certamente anterior a WWW, mas no h como negar queaWebsejacentralaofenmeno,vistoqueapopularizaoaumentaa relevncia de uma cultura. - 28 - Captulo I - Conceitos Operaes do digital: a Digitalizao No imbricamento entre o PC e a CMC que funda a cultura digital, se encontra a operaodedigitalizao.NicholasNegropontefazdaafirmaoredundante bits so bits o ttulo da primeira parte de seu livro Being Digital [1995], para reforar a idia de que as palavras, imagens e sons que nos so apresentados pelas interfaces do computador so, antes de mais nada, conjuntos de zeros e uns.adigitalizaoqueviabilizatrscaractersticasmarcantesdas manifestaes da cultura digital: a multimodalidade, o hipertexto e a simulao. Escolhootermomultimodalidadeenomultimdiaparanoincorrerna confusoconceitualexpostaporLvyemCibertura[1999:61-66].Bitsso misturveis,portantotextos,fotos,vdeosemsicapodemfazerpartedo mesmo bit stream, seqncia de bits. A digitalizao permite construir discursos quesensibilizammltiplossentidos,ouoqueLvychamademodalidades perceptivas. Embora a multimodalidade do discurso digital esteja condicionada alimitesimpostostantopelasfuncionalidadesdainterfacequantopela eficinciadarede,asmanifestaesdaculturadigitalpressupema possibilidade de conectar imagens, sons e textos. Porm,nodevemosdeixardenotarqueoprocessodedigitalizaotambm potencializaodiscursomultimdia,entendidocomoaquelequeseproduz utilizandodiferentesmdias,comoaTV,ordio,ocomputador,ouolivro.A junodaslinguagenssonoras,visuaiseverbaisumfatordeacelerao prepoderantedomovimentodeconvergnciadasmdias[Santaella2002]. Porm, o discurso multimdia no resultante exclusivo da digitalizao. O livro Maciste no Inferno de Valncio Xavier [1983] demonstra muito bem este ponto ao criar na velha mdia do livro impresso um discurso no qual combina imagens decinema,pautasmusicaisetextolinearparaconstruirumanarrativa intersgnica. Outro exemplo no digital a videoarte que desde o incio abusou dacolagem,valendo-sedemateriaisadvindosdediferentesmdiascomoa televiso,ocinemaeafotografia[Matuck1995].Oqueoprocessode - 29 - Captulo I - Conceitos digitalizaooperaafacilitaodestesamlgamas.Quandoateleviso,o rdio,ojornalseconvertemparaosuportedigital,acolagemsetornamais transparente. Em relao ao hipertexto, necessrio tomar o mesmo cuidado de perceber a anterioridade do mecanismo do hipertexto em relao digitalizao. Diversos mecanismosanalgicos,queprovocamo encadeiamento no linear da leitura, podemserarroladoscomoprecursoresdohipertextodigital.Algunsexemplos so:ossistemasderemissoemnotasderodapdeumlivro,asreferncias cruzadas de uma enciclopdia ou o sistema de mapas de um guia de ruas.Agrandenovidadequeadigitalizaoinvocaaremissoautomtica.O suportedigitalpermiteanavegaoinstantneaentreasrefernciasno lineares de um hipertexto. A velocidade da remisso automtica altera tanto a leituracomoaescritura.Ohipertextopermiteaconstruodediscursosno lineares cuja leitura tem que lidar com mltiplas possibilidades de percurso. A operao de remisso permite modificar o discurso. Liberto da linearidade o texto pode ser construdo a partir de elementos atmicos que se entrelaam em percursosmltiplos.Cadaumdesteselementosadquirenovassignificaes atravsdaconexocomoutroselementos.Seconsiderarmosquea digitalizao viabiliza a utilizao de elementos multimodais, vemos o hipertexto transformar-seemhipermdia[Santaella2002:CaptuloVIII].Nestecenrio, constituem-seasbasesdeumanovalinguagemqueimplicaumleitorimerso em discursos que exigem a sua participao interativa [ibidem]. Neste sentido, como aponta Steven Johnson, os links, elementos bsicos do hipertexto digital, so a caracterstica mais marcante do ciberespao: PeaaqualquerusuriodaWebpara lembrar o que primeiro o seduziu no ciberespao; pouco provvel que oua descries rapsdicas de uma figurinha animada rodopiando, ou de um clipe de som fraco e distorcido. No,omomentodeeurekaparaamaiorpartedensveioquando - 30 - Captulo I - Conceitos clicamosemumlinkpelaprimeira vez e nos vimos arremessados para o outro lado do planeta. [2001:83] Estadescrionodenotasomenteopotencial da hipermda, tambm aponta para a segunda operao fundamental do imbricamento entre o PC e a CMC: a conectividadedasredes.Pormantesdetratardestetema,vamosterceira caracterstica implicada pela digitalizao: a simulao.Novamente,adigitalizaonoinauguraofenmeno,mastransforma fundamentalmentesuapotncia.Oteatrojfuncionavacomoumasimulao do real na Grcia antiga. Uma simulao analgica foi a fonte de inspirao do projetodaARPA,amesmaquepatrocinouacriaodasbasesdaInternet, responsvelpelonascimentodeboapartedaquiloqueerroneamente,como vimos, chamado de multimdia. Impressionadoscomosucessodosisraelenses no resgate em Entebe, no ano de1976,oDepartamentodeDefesaamericanoencomendouARPAo desenvolvimentodemeioseletrnicosdetreinamentoquepermitissemasuas tropasomesmonveldeaptido.OsucessoemEntebehaviasidogarantido pela simulao do ataque em uma reproduo detalhada do aeroporto, no qual ospassageirosestavamaprisionados.Porm,areconstruofsicade ambientesseriamuitocaraedemorada.Amultimdia,oumelhordizendo,as interfacesdemultimodalidadenasceramdoesforodereconstruode ambientesapartirdacombinaodesons,imagensemovimento. [Negroponte, 1995:65-67] No caso das simulaes, a diferena de potencial que o digital opera de outra natureza.Noestamosfalandodeumaremissoquepoderiaserfeitacom menorrapidezeeficinciapormeiosanalgicos,oudeumacolagemde diferentesestmulossensoriaisquepassaaserfacilmenteexeqvel.As simulaesqueoambientedigitalpermitesoefetivamenteimpossveisno mundoanalgico.Ascapacidadesdeclculodocomputadorcontribuempara - 31 - Captulo I - Conceitos istodeduasformas:aumentandoonmerodevariaesquepodemser calculadaseinstrumentalizandoumconjuntomaiordeperspectivassobrea simulao. O computador excede a possibilidade humana em relao simulao. Fugindo deumexemplocientfico:simplesmenteimpossvelparaohomemsimular todasasvariaesdecenrios,paratodososmovimentospossveisdeum jogador, em uma arena como as do jogo eletrnico Quake. O homem conhece todasasequaes,elequeoperasuadigitalizao,masaeficinciadeum esforo humano-analgico impossibilita no s a concluso do clculo, como a produo da imagem. Operaes do digital: a Conectividade A conectividade a segunda operao fundamental do encontro do PC com as possibilidadesdacomunicaomediadaporcomputador.Osbitsso endereveis, portanto, em um meio compartilhado como a Internet, possvel enviarmensagensparaseremlidasporseusdestinatrios[Negroponte 1995:PartOne].Tambmpossvelestabelecerconexesentreelementos digitais armazenados em locais fsicos distantes ou imediatos. A capacidade de remisso que, como vimos, a caracterstica bsica do hipertexto, elevada a umanovapotncia,quandocolocadaemrede.Odiscursoapresenta-secomo umacadeiadeconexesabertaquepermiteconectarcontedosinternose externosasimesmo.Noestamosmaispresosdentrodocorpodeum hipertextoespecfico;podemosinteragircomdiversosdiscursosanteriores,da mesma maneira que navegamos pelas remisses internas. A conectividade generalizada da cultura digital resulta da inovao tecnolgica quedorigemInternet,arededasredes.Trata-sedoTransferControl Protocol / Internet Protocol (TCP/IP) que foi desenvolvimento para permitir que computadores com as mais diferentes configuraes possam estabelecer canais - 32 - Captulo I - Conceitos de comunicao entre si. Por ser absolutamente independente de plataforma do computador,sistemaoperacionalousoftwareaplicativo,acomunicaovia Internetpermitiuconectarmilhesdecomputadoreseredesexistentes. Atualmente,agrandemaioriadasredespblicaseprivadasexistentesno planeta tem gateways (portas) para Internet. Asegundaconseqnciadaconectividadeoprivilgiodadocomunicao bidirecional.Naculturadigital,quasesemprepossvelinteragircomo produtordamensagem.Acapacidadedilogica,queatelevisotembuscado pormeiodemecanismodeparticipaodaaudincia,fatorconstituinteda novacultura.NaWWW,queconstituiumdosambientesmenosdialgicosda Internet,apublicaodoendereode email do responsvel pelo contedo de umsiteconsideradaumaprovidnciamnimaeobrigatria.Algunsoutros aplicativoscomochats,sistemasdeconfernciaounewsgroupsdaUsenet propiciamainteratividadeentreosinterlocutoresnaformadiretadedilogos efetivos. Aconectividadeconstituioprincpioterritorialdaculturadigital.elaque forma o ciberespao. Fora do campo da geometria, o territrio da cultura digital determinado pelas possibilidades de percurso atravs de mltiplas conexes. SeoespaofsiconospermitecaminhardopontoAaopontoBporum corredor,masnosimpededeiraopontoC,emfunodeumaparede,o espaodigitalnospermitetransitarapartirdoslinkseendereosque interligam e localizam diferentes objetos digitais. Vale notar que como no guarda correspondncia direta ou determinante com oespaofsico,aculturadigitaltendeasedesenvolveracimadasculturas nacionaiseregionais.Aculturadigitalprimariamenteglobal.Nessesentido, podemos notar como o processo de globalizao da economia mantm relao ntima com esta cultura. Negroponte chega a afirmar: - 33 - Captulo I - Conceitos As business world globalizes and the Internet grows, we will start to live onaseamlessdigitalworkplace.Longbeforepoliticalharmonyandlong beforetheGATTtalkscanreachagreementonthetariffandtradeof atoms,bitswilldeborderless,storedandmanipulatedwithabsoluteno respect to geopolitical boundaries. [1995:228] Operaes do digital: a Virtualizao Paracompletaroquadro,precisamosencararaquestodavirtualidade discutidaporPierreLvyemseuOQueoVirtual?.Eledemonstraqueo virtual no se ope ao real, uma vez que o real uma condio das substncias e o virtual uma condio dos acontecimentos. O virtual ope-se ao atual, pois elepropeumarededetendncias,deproblemas,desituaespossveis, enquantooatualumasoluoparticular.Porsuavez,orealopostoao potencial,masaqui,orealquedeterminaacoisaconstitudaeparticular, enquanto o potencial so as possibilidades predeterminadas dos corpos. O real e o atual so manifestos, o virtual e o potencial so latentes [1996]. Avirtualizao,portanto,oprocessoatravsdoqualumacontecimento qualquertransformadoemrededepossibilidades.umretorno problemtica, contrrio atualizao que a soluo desta. Lvy descreve uma srie de processos de virtualizao. Fala da virtualizao do corpo, do texto, da economia.Eledemonstraqueestesmovimentosnopertencemapenasao mundops-moderno.Estopresentesemvriasatividadeshabituaisdo homem, como a leitura. Segundo o autor, a leitura pressupe a virtualizao do texto,poisasoluoparticulardoescritotransforma-seemproblemaparao leitor,redesdepossibilidadesquesuacapacidadedesignificaovoltara atualizar. [1996] Osprocessosdevirtualizaosocomunsnociberespao.Oslinksentresites criam possibilidades muitas vezes inesgotveis para o surfar ou navegar na - 34 - Captulo I - Conceitos rede.Asrelaessociais,livresdanaturezargidadosespaosfsicosedos valoresdascomunidadesgeogrficas,tornam-selatentesnasmltiplas alternativas de conexo que so viabilizadas. Desprendendo-se de seus prprios corpos,sexoeposiosocial,osindivduosvirtualizam-se,criandopersonas que interagem socialmente nos MUD, chats e conferncias da Internet. O prprio ciberespao um virtual, visto que no se apresenta diretamente. Ele um campo de possibilidades que nos atualizado por interfaces. Voltando ao incio deste captulo, a virtualidade que empresta cultura digital sua escala assustadora.Camponoresolvidoquepermiteumaquantidadesemfimde atualizaes, o ciberespao difere da biblioteca que se apresenta atualizada nos diversos volumes que a compem. Tomada em um momento instantneo, uma bibliotecapormaiorqueseja,umcorpofinito,capturvel.Certamente,no ser possvel ler todos os seus volumes, mas podemos apreender seu tamanho. O ciberespao incomensurvel, visto que se atualiza de maneira particular nas telas de cada um de seus habitantes e se transforma, constantemente, a partir destasatualizaes.Quandovisitoumabiblioteca,aosairelapermance basicamenteintacta;aonavegarnociberespao,tenhoapossibilidadede deixarmeuscomentrios,participardevotaesouinteragircomoutros internautas. A complexidade e o fim das utopias finalistas Aoaumentodaescalaprovocadopelavirtualizao,soma-seaquestoda complexidade.Existeummovimentodecrisedapercepoque potencializadopelaexplosoinformacional,queresultanamultiplicidadede pontos de vista. A Internet, atravs da virtualizao do espao social, contribui para a instaurao do complexo como novo paradigma. A realidade no mais redutvele,comodemonstramDeleuzeeGuattari,astentativasdeexplicao da realidade por modelos englobalizadores fracassam [1995]. - 35 - Captulo I - Conceitos Osfilsofosfranceses,propemaconstruoderizomticas,teoriasquese libertem da procura do uno, da explicao reducionista que tenta prender todas as manifestaes a um nico modelo. Eles sugerem que preciso ... escapar da oposio abstrata entre o mltiplo e o uno, para escapar da dialtica, para chegarapensaromltiploemestadopuro,paradeixardefazerdeleo fragmento numrico de uma Unidade ou Totalidade perdidas ou, ao contrrio, o elementoorgnicodeumaunidadeoutotalidadeporvire,sobretudo,para distinguirtiposdemultiplicidades.[1995:46]Aproposiodosfilsofos bastantedesafiadora,jquetodoopensamentoocidentalestruturou-sea partir de categorias, unidades, modelos desde os tempos de Plato. Trilhandooutrocaminho,ofilsofoitalianoGianniVattimopropeatransio da sociedade da cultura que constri sua prpria objetividade atravs de um processodefabulaodomundo,paraumasociedadetransparenteque opereadesmistificaodadesmistificao.Vattimopostulaquedebaixodos mitosexistemmitos,ouseja,debaixodesignos,signos.Emproldeuma heterogenia, ele prope o fim do ideal da auto-conscincia. Diantedaculturadigital,asproposiesdistintasdeDeleuze/Guatarie Vattimo permitem defender que o homem deve emancipar-se da priso finalista da utopia. A simultaneidade e fragmentao do cotidiano, operada na polifonia dosmeiosdecomunicao,afastamoindivduodapossibilidadedobelo utpico.Sustenta-seumaheterotopiadoconhecimento,o...reconhecimento demodelosquefazemmundoequefazemcomunidadeapenasnomomento emqueestesmundoseestascomunidadessedoexplicitamentecomo mltiplos. [Vattimo, 1992:74]Nestemesmosentido,temosaproposiocentraldePierreLvyem Cibercultura:ouniversalsemtotalizao:Quantomaisociberespaose amplia,maiselesetornauniversal,emenosomundoinformacionalsetorna totalizvel.[1999:111]Lvydedicaasegundapartedeseulivrosobrea cultura digital a demonstrar como a tese do universal sem totalizao perpassa - 36 - Captulo I - Conceitos campos to diversos quanto a arte, a educao e a democracia. [1999:Segunda Parte] Sua tese que o digital produz o universal por contato, ou seja, o universal quesefazpresente,diretamente,apartirdofenmenodaconectividade generalizada.Acomunicaoocorrenapresenadocontextoemque produzida,vistoqueestecontextotambmdigital.Demaneiradiversa,as culturasfundadasapartirdotextoescritoconstroemocontextopormeiode operaes de interpretao e traduo. Estas culturas buscam a universalidade atravsdatotalizaodosentido.asignificaoqueproduzosentes abstratosquedevemalcanarouniversal;porconseqncia,estesuniversais sepretendemtotalizantes,vistoquealmejamabarcaroconjuntodas possibilidadesdeumcontextoquenopresente.Naculturadigital,o universalpresenteimpossibilitaatotalizao.Aculturadigitalpressupea convivnciadocontraditrioedomltiplo,portanto,osprojetostotalizantes no fazem mais sentido. Nas palavras do filsofo: O universal da cibercultura no possui centro nem diretriz. vazio, sem contedoparticular.Ouantes,eleosaceitatodos,poissecontentaem colocar em contato um ponto qualquer com qualquer outro, seja qual for a carga semntica das entidades relacionadas. [1999:111] - 37 - Captulo I - Conceitos Interatividade Interatividade e produo de sentido Emprimeirolugar,cabedelimitarqueainteratividade,nostermosdesta dissertao,deveserentendidacomoatividadeprodutoradesentido,apartir da comunicao direta ou mediada entre dois sujeitos. Est, portanto, excluda ainteraodeumsujeitocomumobjetoquenoimpliquesignificao.No entanto, no se atribui qualquer condio de sucesso operao significao. A interatividadequebuscamosanalisarenvolve,antesaintenodeumsujeito em comunicar algo, que sua habilidade em faz-lo. Desta forma, como comenta RoyAscott...osignificadocriadoapartirdainteraoentrepessoas,ao invs de ser algo que enviado de uma para outra [apud Matuck 1995:251]. Comopretendodiscutirpossveistransformaesnainteratividadedentroda culturadigital,vourestringirminhaanliseinteratividademediadapor computadores.Istonodeveindicarqueaculturadigitalnopossaprovocar modificaesnainteratividadedacomunicaonomediada,nemexcluia possibilidadedetransformaesdainteratividadenombitodeoutros mecanismosdemediao,comoasmdiasdemassa.Arestriocorresponde apenas ao procedimento metodolgico de ajuste de foco. Teremossemprepresenteaomenosumainstnciademediaoentreos agentesdacomunicao.Aspossibilidadeserestriesdomeiodigitalso, portanto,determinantesparaainteratividadequepretendodiscutir.Os mecanismosqueaviabilizamapresentamnovosaspectosdeeficincia,assim como acrescentam novas camadas de rudo ao processo de comunicao entre os agentes cognoscentes. O objetivo desta dissertao destacar quais fatores condicionam a interatividade neste contexto. - 38 - Captulo I - Conceitos Ainteratividadecompreendidacomooprocessoquepermitequeagentes manipulemtantoosdiscursosquepretendemcomunicarquantoascondies nasquaisestessoproduzidos,apreendidosetransmitidos.Esteprocesso exige a participao ativa dos agentes na atualizao das condies virtuais de significao e, portanto, excluem situaes que se caracterizam pela apreenso passivadasmensagens.Ofenmenoqueinteressaaestaanliseconfigura sistemascomplexosesimples,queapresentammltiplasalternativasde produodeobjetossignificantesedeapreensodesignificados.A interatividadeumjogodepossibilidadesquecondicionaosentidodas mensagens.Interativoosistemaqueseabreenosrecebe,comouma construo arquitetnica nos recebe. O entorno, umwelt, nos aborda e expande nossacompreensotalcomoalinguagem...[BaironePetryapudSantaella 2002:407]. Vale destacar que no estarei preocupado com o processo de interao homem emquinaemsi.Esteprocessosinteressanamedidaemqueinterferena comunicaoentredoissujeitoscognoscentes.Noentanto,noestou determinando a natureza do agente, como veremos na anlise da dimenso do agentenoprximocaptulo.Apenaspretendoexcluirdaanliseainterao homem-mquinaqueserveaobjetivodiversodaproduodesentido.Por exemplo, existe um processo de interao entre homem e mquina quando um programador senta-se frente de seu computador para escrever um programa que,posteriormente,farclculosdeestruturaarquitetnica.Pormeste processo no interessa minha pesquisa. Posteriormente,seoprogramadorpretendequeoutraspessoasutilizemseu cdigo,elevaiestarenvolvidonoprocessodecriaodeumainterfaceque, ento,caracterizaumainteraoentredoisagentescognoscentes,quese opera no meio digital, visto que a inteno de comunicar do programador se faz presentenainterface.Nestemomento,voltamosaocampodeanlisedesta dissertao.Igualmente,estariadentrodenossoescopoaatividadede - 39 - Captulo I - Conceitos apresentarosresultadosdoprogramaparaoutraspessoas,apartirdeum suportedigitalmentemediado.Porm,nomomentoemqueprograma,a interaoentrehomememquinanotransmissoradesentidoentredois sujeitos cognoscentes,emboraestaatividadepossaserprodutorade significado a posteriori. Cabetambmnotarqueasignificaoqueproduzidapeloprocessode interao ocorre em diferentes nveis de complexidade. Ou seja, podemos dizer que uma troca de emails entre dois especialistas sobre uma questo complexa desuaspesquisasoperaprocessosdesignificaoquenopodemser comparadosleituradaprevisodotempoemumsitenaweb.Porm,isto no interessa a minha anlise, j que o que pretendo discutir a natureza dos mecanismos de interao no meio digital e no a complexidade das processos mentais de apreenso do sentido de uma mensagem. O que no quer dizer que ainteratividadenocondicioneaapropriaodosentido.Ouseja,a complexidade da mensagem pode condicionar o processo de significao, sem determinarsistemasdeinteratividade.Voltandoaoexemplo,umemailpode tanto servir a um debate acadmico intrincado, quanto a uma simples consulta sobreotempo,assimcomoumsitenawebpodeinformarsobreotempoou sobre a alta cincia. Retornaremos a este ponto no segundo captulo. Algunsautorestrabalhamainteratividade,distinguindodoisoutrosconceitos: interao [Lemos / Vittadini apud Mielniczuk 2000:174] e reatividade [Vittadini / Williams apud Mielniczuk 2000:175]. Segundo a primeira distino, a interao deveriacaracterizarocontatointerpessoal,enquantoainteratividade caracterizariaacomunicaomediada.Achoduvidosaautilidadedesta distino.Alinguagemtambmpodeserentendidacomomediao.Neste caso,osconceitosdistiguiriamacomunicaomediadaunicamentepela linguagemeacomunicaomediadanosomentepelalinguagem.Agora,se entendo que a arte produz objetos de linguagem, devo exclu-la do campo da interatividade.Porm,comoentendoainteratividadecomosistema - 40 - Captulo I - Conceitos configurvelquepermiteaosagentesdacomunicaotransformartextoe contexto,tenhodificuldadeemaceitarqueasinstalaesps-modernasno seriam ser entendidas como objetos interativos. A outra sada seria trabalhar a distino a partir da caracteriao de contato interpessoal. Neste caso, como lidarcomatelepresena?Otelefoneeavideoconfernciaconstituiriam interaoouinteratividade?Seinteratividade, teriamos que questionar porque umdilogoemcontatodiretodiferedaquelerealizadoviateleconfncia.Se interao,caberiaperguntarseacomunicaoatravsdeumaplicativode mensageminstntanea,mesmomediadapelocomputador,teriadeixadode caracterizar interatividade para ser classificada como interao. Seguindoparaasegundadistino,entrereatividadeeinteratividade,temos, deumalado,acapacidadedesuscitarareaodaaudinciae,deoutro,a interatividadequeimplicariaumarespostagenunadaaudincia[Williams apud Mielniczuk 2000:175]. Meu primeiro problema como caracterizar o que uma resposta genuna. Os trs fatores citados para resolver esse impasse so apresenade:aocomumentredoisumamaisagentes;capacidade igualitriadeao...aodeumdeveservircomopremissaparaaaodo outro;eimprevisibilidadedasaes[Mielniczuk2000:175].Deverficar claro,nodecorrerdotexto,quevriosdosmecanismosdeinteratividadeque identificoeanalisonocumpremumoumaisdosrequisitosacima.A construodestadistinotemovisdeanlisedasmdiasdemassa.Neste contexto, a desigualdade entre os agentes da comunicao preponderante e a idiadareatividade,talvez,faasentido. No meio digital, esta desigualdade dinmica e no, necessariamente, determinada pelo poder econmico. O conceito de interatividade utilizado nesta dissertao abarca o que na anlise acimachamadodeinterao,interatividadeereatividade.Asdiferentes resultantesdainteratividadeproduzidaspelavariaodoscontextosde comunicaosoentendidascomoquestodeintensidade,comoveremosao finaldesteitem,quandoserapresentadaaformulaodaidiadegrausde - 41 - Captulo I - Conceitos interatividade,utilizadaporPierreLvy[1999].Utilizareiostermos interatividade e interao como referentes do mesmo conceito. A mdia digital e a capacidade de dilogo Umdospontosmaisinteressantessobreomeiodigitalaubiqidadeda capacidade de interao direta entre os agentes. Mesmo quando o formato da comunicaonopressupeodilogoemsuaprimeirainstncia,esta possibilidadeapresentadacomoformadefeedbackpeloprodutorde discursosdigitais.Raramente,encontramosumsitenaWebqueno disponibilize um email para contato. No devemos, no entanto, ter a impresso de que a interao dialgica ocupa uma posio central na cultura digital. Boa parte das manifestaes da cultura digital so publicadas em meios digitais, para leitura por diversos pblicos, no pressupondo que um dilogo venha a se estabelecer com estes leitores. Mesmo emumaconfernciaeletrnicacomoTheWellouBrainstorms,acomunidade atualmente liderada por Howard Rheingold, a maior parte dos participantes se resume a ler os debates que se produzem, sem fazer uso do potencial dialgico do meio. Cerca de 80% dos participantes de fruns tcnicos jamais fazem um comentrio [Zhang 2002:26]. Noobstante,acapacidadedilogicaqueanimaacrescenteutilizaodo meiodigitalpelosveculosdemdiademassa.Quandocanaisdetelevisoe rdio,jornaiserevistasprocurammaiorinteratividade,oque,normalmente, est em jogo a capacidade de ouvir a audincia. So j inmeros os exemplos deveculosdecomunicaoemmassaqueprocuraminteragircomseus pblicos, por meio de votaes, utilizando sites na web ou mensagens de texto (SMSshortmessagingsystem)emtelefonescelulares.Entreoutras,ardio EldoradodeSoPauloeaMTVtmutilizadoaWebdemaneirabastante efetivaparaestabelecerumdilogocomsuaaudincia.NoBrasil,tambm - 42 - Captulo I - Conceitos podemosarrolarosexemplosrecentesdasvotaesatravsdeSMS,em realityshowscomoBigBrothereCasadosArtistas.NaEuropa,ondeo fenmenodoSMSmaisconsolidado,hvriosexemplosdeinterao audinciaveculo,utilizandoestatecnologia(ver www.xiam.com/news/business-gets-the-message/b2c/television.shtml).Mas nodevemossupervalorizarestatendncia.Umarecentepesquisadarevista inglesaTheEconomistdemonstra,demaneirabastanteclara,queateleviso permanececomoummeiodeentretenimento,basicamente,passivo [Pedder:2002]. Tambmdevemosnotarqueopotencialdialgicoqueestimplicadoneste cruzamentoentremdiasdemassaemeiodigitalbastanterestrito,emface doqueocorrenoambientedesteltimo,pormeiodevriosmecanismos.O dilogo digital traz diversas novas possibilidades que sero analisadas em maior detalhenoterceirocaptulo.Ofenmenodoemail,umadasprimeirase,na minhaopinio,aindaamaisimportantetecnologiadomundodigital, operacionaliza a interatividade atravs do dilogo. Da mesma forma, operam os sistemas de mensagens instantneas, os fruns eletrnicos e as salas de chat. Um dos aspectos mais importantes do dilogo no meio digital a telepresena. As tecnologias do ciberespao permitem que seus agentes se faam presentes edisponveisparaodilogo,pormeiodeumasriedemecanismos.Embora umemailpossasercomparadosantigascorrespondncias,nohcomo negar que eu no me fao presente na casa de um amigo que mora em outro pas, pelo fato de que ele pode me enviar uma carta. J quando algum visita meu site e se depara com meu endereo de email, bastando um click para se comunicarcomigo,seriavlidoafirmarqueeuestoupresentenosite,dadaa natureza quase imediata desta comunicao. Alguns, talvez, defendam que a ausncia da sincronia no permite caracterizar telepresena.Mas,setomarmosoexemplodascomunidadesvirtuais, percebemosqueapresenavirtualtratadanestesambientesdemaneira - 43 - Captulo I - Conceitos bastante equivalente presena fsica. comum usurios de fruns eletrnicos sereferirem,nomeiodeumadiscusso,aoutrosparticipantesdaseguinte maneira: tenho certeza que fulano quando chegar aqui ter algo a dizer sobre esteassunto.Asdiscussessotratadascomoespaos,porque,comovimos anteriormente,caracterizampossibilidadesdeconexo.Osmembrosdeuma comunidade virtual sentem-se presentes nelas. No quero, no entanto, disputar o fato de que, quando envolve a possibilidade dodilogosncrono,comonosaplicativosdemensagensintantneasounas salasdechat,atelepresenaseapresentedemaneiramuitomaisdireta. Nestesambientes,elasecomparademaneiradiretaaotelefone,oformato mais corriqueiro de telepresena que conhecemos. O potencial interativo da leitura Qualquer processo de leitura pressupe a interatividade do leitor com o escritor atravsdamediaodotexto.Omeiodigitaltransformaestecampoda interaodemaneirabastantesignificativa,graasdigitalizaoeseusj discutidosmecanismoscaractersticos:amultimodalidade,ohipertextoea simulao. Cabe agora discutir como se altera a interatividade do leitor com o texto. Demaneirageral,ostextosanalgicos,tomadosaquidamaneiraampla, abrangendodiferentesformatosquenoapenasotextoescrito,conduzemo leitorproduodosentido,apartirdeumaordemlinearpreviamente determinada pelo autor. claro que esta tendncia que bvia no exemplo do livro,menospresenteemumaexposiofotogrfica,oupodesermesmo evitadaemumainstalaops-moderna.Porm,aspossibilidades manipulativasdaleituradoobjetoanlogicoso,definitivamente,restritas, quando comparadas com os objetos digitais. - 44 - Captulo I - Conceitos Nomeiodigital,aleituraseabresobreumnovocampodepossibilidades.As diversas sees de um folheto eletrnico no se apresentam por uma seqncia de pginas; transformam-se em uma lista de ttulos ou expresses resumos que procuramatrairaatenodoleitorquedeveroptarpeloitemquemaislhe interessa.certoqueesterecursopodesercomparadoaummerondice eletrnico,noentanto,quandobemconstrudo,otextodigitalpodepermitir que esta remisso constitua uma multiplicidade de sentidos.Umobjetodigital,comoumjogoeletrnico,demonstra,demaneiramais eloqunte,aspossibilidadesdeinteratividadedaleitura.OjogoMyst,que caracterizaummarconaproduodejogosdeaventura,constituium excelente exemplo. Existe uma histria em Myst: uma ilha abandonada em que aconteceualgomisteriosoqueprecisamosdesvendar.Porm,aleituradesta histria,queinclusivedeterminaosucessodojogador,feitaapartirda interao com os mltiplos objetos que o mundo grfico do jogo nos apresenta. exceo de um pequeno manual, no h qualquer indicao do caminho a ser seguido na leitura deste objeto digital. Cada leitor / jogador faz o seu percurso, construindo de maneira interativa o sentido do texto escrito pelos criadores do jogo. Haindamuitoaserexplorado.Ofatodequejogoseletrnicosvoltadosao pblicojovemconstituamalgunsdosexemplosmaisricosdaspossibilidades destanovaleitura,bastanteilustrativo.Criadoresdejogosesto,por natureza, habituados a planejar interaes abertas com um grande espectro de possibilidades, visto que sem isto teramos jogos montonos. Porm, em muitas outrasescrituras,persisteodesafiodeconstruodeumdiscursoquese aproprie,porcompleto,daspossibilidadescriadorasdestaleiturainterativa. JanetMurraysustentaessaafirmaoemsuaanlisedoencontrodaarteda narrativa com o ciberespao, ao mesmo tempo em que documenta os diversos avanosrealizadosporpioneiroscomoMichaelJoyce,autordoromance hipertextualAfternoon[1997].Demaneirasimilar,StevenJohnsonrecorreao - 45 - Captulo I - Conceitos exemplodadescontinuadarevistaeletrnicaSuck(www.suck.com),para demonstrar quo mais rica pode ser a utilizao do recurso do hipertexto para a construo de um discurso intersgnico.OrestodaWebviaohipertextocomoumsumrioeletrificado,ouum suprimento anabolizado de notas de rodap. Os Sucksters o viam como uma maneira de frasear um pensamento. [2001:99] Ainda no exemplo dos sites da WWW, fcil perceber que a escritura continua aserlinear,emboraapossibilidadedanolinearidadeestejalatentena profuso de links utilizados. Por mais que se utilize de links para enriquecer sua mensagem, o autor pretende que seu leitor siga de um paragrfo ao prximo. Os links no constroem uma leitura alternativa; apenas acrescentam uma nova camadarefencialexplcita,queadicionasentidoaotexto,masnopertencea ele. No entanto, preciso perceber que, mesmo neste estgio embrionrio em que sedesenvolveumanovaescrituraque,efetivamente,seapropriadas possibilidades interativas do meio digital, existe um movimento de transferncia do plo da significao da escritura para a leitura. No quero aqui contradizer osensinamentosdeUmbertoEcodequeoleitorsemprefoiagenteda significao,masotextolinearpermitiaaoescritorummaiorcontrolesobre suamensagem.Comopotencialdeinteratividadedotextodigital,oescritor produz uma obra ainda mais aberta, visto que mais determinada pelas selees do leitor diante de alternativas explicitas do objeto digital. Um outro ponto muito importante desta nova leitura a presena imediata do contexto.Otextoimpressosedissociadeseucontextodeproduo.Quando lemosumromancedeGoethe,notemospresenteoconjuntodereferncias implicadopelomomentohistricoemquefoiescrito.Destaforma,otexto implica um aparato de interpretao, uma tecnologia lingustica nas palavras de Lvy [1999:114]. J o texto digital apresenta a possibilidade de referenciar - 46 - Captulo I - Conceitos seucontexto.possveldarpermannciaaodebatequeenvolveuo pensamentodoautornaconstruodotexto.Nosetrataapenasdeum conjuntoderefernciasquejerampossveisvianotasderodapnotexto escrito;agora,umemaranhadodelinkspermitequeoleitorcontextualizeo discursodentrodeummomentohistrico.Noestamosmaisrestritoss referncias selecionadas pelo autor, mas, a partir da web, possvel absorver o espritdutempsqueenvolveotexto.claroquepermanceumesforode interpretao,massendootextodigital,asconexessoimediataseo contexto se apresenta por contato. TantoRichardLanham[1993],quantoPierreLvy[1999],citandoosestudos deWalterOngsobreaoralidade,percebemnestemovimentoumretornos condiesqueprevalecemnodiscursooral.Nasculturasanterioresaotexto impresso, o contexto era presente na figura do narrador. O trovador carregava consigoocontextodaquiloqueinterpretavaemseudiscurso.Suaaudincia tinha acesso imediato a suas referncias, j que escritura e leitura coexistiam. Nociberespao,otemposefazpermanente,atravsdasrefernciasqueso persistidas em bancos de dados, as memrias eletrnicas da cultura digital. Uma ltima particulariedade da interatividade da leitura no meio digital so as novas possibilidades de incluso do leitor no texto. Como a digitalizao opera a virtualizao do texto, um autor versado nas possibilidades do meio pode criar ambientesquesodeterminadosapartirdainterao.Tomareiumjogo eletrniconovamente.OpopularSimCitycarregaumtextocomplexonobojo desuasregras.Nestejogo,ousurio convidadoadesenvolverumacidade. Eletomadecisestpicasdeplanejamentourbanoeenfrentaasrepercusses sociais de seus atos. Sua cidade pode crescer e prosperar ou empobrecer e ser abandonadaporseushabitantes.Elepodeserelogiadoouexecradopelos jornaislocais.Obviamente,todasestaspossibilidadesforampreviamente escritaspelosautoresdojogo,massomenteainserodoleitor/jogador queatualizaotexto.Aocomentarestacaractersticadotextodigital,Janet - 47 - Captulo I - Conceitos Murrayconcluiquealeituranomeiodigitalconstituiumaexperinciade imerso [1997]. O exemplo mais potente desta nova insero do leitor no texto soosMUD.Nestesambientes,oleitorpossuiumapersonaquesefaz presentenotextocoletivoquecriaoambiente.Paralertemqueagir.Seao entrar em uma sala, peo para ver o que l existe, posso descobrir uma caixa quenecessitaserabertaparaserexplorada.Almdestaoperaoativaque me projeta no texto, posso ser surpreendido por um inexperado ataque, que ocriador/programadordasala,programouparaocorrersemprequealgum tentar abrir a caixa. Minha persona est no texto. Graus de interatividade O que o meio digital apresenta, de maneira inovadora, o aumento de potncia daparticipaoativadosagentesnaconstruodosentidodasmensagens. Antes de demonstrar as novas dimenses que esto implicadas no fenmeno da interatividadenaculturadigital,queserotemadoprximocaptulo,quero apontar para algumas conseqncias desta potencializao da interatividade. A possibilidadedereapropriaoederecombinaomaterialdamensagempor seureceptorumparmetrofundamentalparaavaliarograude interatividade... [Lvy 1999:79] Em primeiro lugar, preciso perceber que o potencial de interatividade no se distribui igualmente, atravs das manifestaes da cultura digital. Certamente, ociberespaosempreimplicaemalgumnveldeinteratividade,comono poderiadeixardeseremqualquermeiodecomunicao.Noentanto,temos discursos mais e menos interativos; algumas vezes, por fora das tecnologias e interfacesquelhesdosuporte,outrasvezes,emfunodasopes particulares do autor.Umarpidaanlisecomparativaentrealgumastecnologiasqueconvivemno ciberespaotilparaexemplificarasdiferenasentreosgrausde - 48 - Captulo I - Conceitos interatividade.Estesmecanismossoinvestigados,emmaiordetalhe,no terceiro captulo. As tecnologias viabilizadoras de dilogo, como os softwares de messagem instantnea, o email e as salas de chat, apresentam um potencial de interatividadesuperiorasitesexpositivosnaWeb.Nestes,oautorno imediatamente influenciado pelo feedback da leitura, e seu texto , geralmente, predeterminado,emborapossaacolherumasriedepossibilidadesde manipulaopeloleitor.Jodilogorepresentaaformaclssicada interdeterminaodiretadodiscursoporseusagentesquesealternamem interlocuo. Agora,quandosecomparaainteraoviaumsoftwaredemensagem instantneaaoqueocorreemumMUD,possvelpercebermaiorpotncia interativanosegundo,poiseste,almdepermitirareprocidadeefetivaentre os agentes da comunicao, viabiliza a reapropriao do texto pelo leitor e sua efetivatransformao.Nesteltimocaso,aleituranosomenteatualizao texto,comotambmotransformaapartirdenovaoperaodevirtualizao. Porfim,tomandocomoexemploumaconfernciaeletrnica,temostextos particulares que no podem ser alterados por seus leitores, mas que constituem umtextocoletivo:oconjuntodasmensagensenviadasconferncia,que formadopelainteraodeescritos/leitores,envolvendo,portanto,mltiplos processosdeproduodesentido.Ainteratividadenaculturadigitalconstitui um universo complexo, visto que comporta vrias tecnologias de comunicao e que estas se combinam, formando diversos hbridos. Dentrodesteuniverso,cabedestacarainteratividadecomoconvivncia.Se aceito a idia de ciberespao e percebo que sou capaz de investir uma persona a minhas interaes, possvel perceber que o ato de interagir nos ambientes digitaismaisparticipativos,comoascomunidadesvirtuaiseosMUD,tema natureza de se fazer presente. Uma vez que estamos falando de ambientes nos quaismuitosagentesinteragem,estapresenaterminaporseconfigurarem - 49 - Captulo I - Conceitos convivnciaqueoperadaatravsdainterao.Descrevendosuaexperincia no The Well, Howard Rheingold caracteriza bem este fato: ThefeelingofloggingintotheWellforjustaminuteortwo,dozensof times a day, is very similar to the feeling of peeking into the caf, the pub, thecommonroomtoseewhosthereandwhetheryouwanttostay around for a chat. [1994:26] Outro ponto a destacar a existncia de uma escritura coletiva. Uma escritura emdilogoquesetransformaemtextocoletivo,atravsdavirtualizao operadapelociberespao.oqueLvycaracterizacomo...basesdedados vivas,alimentadaspermanentementeporcoletivosdepessoasinteressadas pelosmesmosassuntoseconfrontadasumassoutras[1999:100].Para ilustraresteponto,vamostomarolivroquenosapresentaacorrespondncia entre Herman Hesse e Thomas Mann. Embora a escritura ainda permanea um exerccio isolado, o produto livro um texto com dois autores e, quando leio o texto, construo sentidos a partir da interao entre os textos de Hesse e Mann. Se tomamos um newsgroup da Usenet bem organizado temos diversos autores, e,novamente,aescriturapermanceumexerccioindividual;porm,quando visitoestaconfernciaeletrnicaeleioseuconjuntodemensagens,a significaoserrealizadaapartirdoconjuntodasmensagenspublicadas. Agora, neste ambiente, h duas novidades: a primeira que o texto permanece aberto para minha atuao: posso participar da sua escritura; a segunda, que de tempos em tempos, as pessoas mais freqentes, neste grupo, se organizam com o objetivo de publicar um resumo daquilo que seu debate discute, gerando documentos que muitas vezes tomam o formato de um FAQ (frenquently asked questions)comoobjetivodeinformarnovosvisitantessobreasprincipais convergncias e divergncias que a interao entre seus participantes produziu. Por ltimo, quero destacar que interagir atualiza o ciberespao. Mesmo quando uminternautaexerce,demaneiramaissimples,opotencialdeinteratividade do meio, navegando despretenciosamente entre sites e links, ele deixa rastros. - 50 - Captulo I - Conceitos Os sites que visita, os links em que clica so armazenados pelos servidores que hospedamestessiteseconstituemdadosdetrfegoqueserviro, posteriormente,parainformar,aocriadordosite,comoseusleitorestm interagidocomocontedoquepublicou.Estaatualizaoimplcitaquea navegao provoca no ciberespao, soma-se a diversas possibilidades explcitas deinterao,comopublicarcomentriosempginasnasquaisnavegamos, contribuir em fruns eletrnicos, publicar links com sites favoritos, entre outros.- 51 - Captulo I - Conceitos Interface A natureza transformadora da interface digital Emltimainstncia,ociberespaoconstituidodepulsoseltricosque transitamatravsdecabostelefnicos,fibraticas,circuitosintegradose processadores. Como no temos condies de compreender estas informaes nesteestado,construmosmecanismosadequadosanossossentidos.As interfacesreproduzemospulsoseletrnicosnaformadesmbolosquesomos capazesdeinterpretar.Elasconstituemasportasdeentradaesadado computador.Atravsdelas,capturamosinformaesarmazenadase transmitidasdigitalmenteeinserimosasinformaesquepretendemos digitalizar, armazenar e, posteriormente, transmitir. A interface se aproxima da linguagem, visto que, tambm, no temos condies decompreenderospensamentosalheiosdiretamentedasconscincias humanas.Inicialmentevouproporqueainterfacesejaumainstnciada linguagem que justape as linguagens verbal, visual e sonora, condicionando as relaesdesignificaoqueatuamnomeiodigital.Sendoainterfacedigital produtodacombinaodevriasmodalidadesperceptivas,seguindoa termologiapropostaporLvy[1999:61-66],elasecomparaaosdiscursosdas mdiaseletrnicas,pormsuanaturezamaisampla.Enquantoalinguagem televisiva,porexemplo,condicionaumaformadeproduodesentidoque envolveaprticadecriaodeumdiscurso,assimcomocondicionasua recepo,ainterfacedigitalcondiciona,tambm,novasformasdodilogo. Portanto,seaproximadotelefoneedordio,masseusrecursossomuito maisabrangentesqueotecladonumricoeotoquedeocupadodoprimeiro, ouasabreviaesecomandos,utilizadosemcomunicaesemcanalaberto, do segundo. - 52 - Captulo I - Conceitos Nosentidodestacomplexidade,ainterfacedigitaltambmseapresentade maneirabastantediversadentreasexperinciasmiditicas.Nomeiodigital,a interfaceexigecapacidadesdemanipulaomuitomaisabrangentes.A primeira vez que algum entra em um chat, necessrio dominar uma srie de elementosdainterfacecomo:aondeclicarparaintroduzirotextoatravsdo teclado;qualbotousarparaenviarotexto;comodefinirparaquemotexto estsendoenviado;almdeumasriedealternativascontextuaisque permitemenviarumconequedemonstreumaemoo,definirquesua mensagem deve ser reservada a uma nica pessoa da sala de chat ou optar por no receber mensagens vindas de um participante, em particular. Comparemos este ambiente, interface que devemos dominar para escutar rdio: o dial e o boto de volume. Soma-se a esta constatao o fato de que cada sala de chat apresentaseuselementosdemaneiraparticularequeexisteumasriede outros mecanismos de comunicao no ciberespao com diferentes interfaces. Neste ponto, temos que retroceder no raciocnio proposto acima, para desfazer asimplificao:ainterfacedigitalaproxima-sedalinguagem,masno linguagem. A linguagem digital condicionada pelas possibilidades da interface, masnoseconfundecomela.Umtextodigitalqueutilizalinksdemaneira eficiente,parajustapordiversoselementosepermitirumaleituramais interativa,esttomandoproveitodainterfaceparasetransformar,masse constitui linguagem, na medida em que produz significao, enquanto sistema simblico partilhado pelos agentes do processo de comunicao. Destamaneira,aopercebermosopapelinovadordainterface,nodevemos desprezar o potencial da linguagem digital, que, embora incipiente, bastante transformador.Tomandooexemplodocinema,podemosdizerquediferentes estilosediferentesautoresrequeremdiferentescapacidadesinterpretativas, mas a interface de recepo basicamente a mesma: a tela grande dentro da salaescura.Noobstanteanaturezasimplesdainterface,alinguagem cinematogrfica comporta hoje uma complexidade que se apresenta nas opes - 53 - Captulo I - Conceitos estticas de diversos discursos. Porm, isto no foi uma conseqncia imediata doinventodosirmosLumire.Osprimrdiosdatelevisosoaindamais ilustrativosdohiatoqueseimpeentreodesenvolvimentodainterfaceeda linguagem.Asprimeirastransmissestelevisivas,aindasemlevaremcontao potencialcnicodomeio,exibiamafilmagemdeatoresdordiofrentede microfones.Alinguagemdigitalseencontranesteestgio,sendoquea proficuidadedainterfacedigitalconstituiaomesmotempoumdesafioeuma oportunidade.ComocomentaStevenJohnson,arepresentaodetodaessa informao(ociberespao)vaiexigirumanovalinguagem,tocompletae significativa quanto as grandes narrativas metropolitanas do romance do sculo XX [2001:20]. Ainterfaceumobjetodemediaodociberespao.Suanaturezapermitir queosatoresdosdiversosprocessosdecomunicaomanipulemosobjetos cognitivosquehabitamesteuniverso.Ainterfacedobrowsermediaa comunicaoentreprodutordeumsiteeointernauta.Porm,amensagem estcontidanoselementosdelinguagemengendradospeloprodutor,seus textos,imagens,sons.Ainterfaceomediadorquepermitequeoprodutor construasuamensagemequeointernautaamanipule.Paraqueuma comunicaoseproduza,osagentesdevemcompartilharumcertonvelde compreensodosmecanismosdainterface,damesmamaneiraque necessrioquecomunguem,minimamente,domesmocdigodelinguagem, mesmo porque a linguagem tambm opera uma mediao na significao entre os agentes. Porm,enquantoalinguagemcarregaamensagem,ainterfacecondicionaa linguagem.Voltandoaoexemplodocinema,podemosperceberoquantoa evoluodesuainterfacetransformouseudiscurso.Doadventodocinema falado,simagenscoloridas,eaocontnuoavanodastcnicasdeefeitos especiais,alinguagemcinematogrficasetransformouprofundamenteecom elaacapacidadedoartistatransmitirsuamensagem.Demaneiraparalela, - 54 - Captulo I - Conceitos quandoadicionamosaoemail,anteriormenterestritoaotextocorrido,a capacidade de manipular cdigo HTML (hypertext markup language), com seu potencialdemultimodalidadeehipertextualidade,permitimosacriaode mensagensmaiscomplexas,vistoqueutilizamdemaiorgamaderecursosde linguagens. Contribui para a dificuldade em definir os limites entre linguagem e interface no ambientedigital,ofatodeestaltimarequererumaapreensoinicial.A interfaceprecisaserdominada.Paraisto,elacarregaemsiumdiscursode auto-explicao. Trata-se, em princpio, de um texto repetitivo, visto que no particularaumacomunicaoespecfica.Funcionaparapermitirqueseu usurio compreenda sua lgica. Este metadiscurso da interface , obviamente, expressopelousodalinguagem.Seemnossousocotidianopodemosrelevar estetextoexplicativo,umavezdominadaainterface,nasmanifestaesda artedigitaloexercciodeapreensodoobjetoartsticoimplicanaleiturado discurso da interface. O artista digital que Lvy identifica como um engenheiro demundos,produztantoainterfacequantooprprioobjeto[1999].A significao envolve, portanto, a apreenso da interface, assim como do prprio objeto. Esperamosmuitasvezesdasartesdovirtualumfascnioespetacular, uma compreenso imediata, intuitiva, sem cultura. Como se a novidade do suporte devesse anular a profundeza temporal, a espessura do sentido, a pacinciadacontemplaoedainterpretao.Masaciberculturano, justamente,acivilizaodozapping.Antesdeencontraroque procuramosnaWorldWideWebprecisoaprenderanavegare familiarizar-se com o assunto. Para integrar-se a uma comunidade virtual, precisoconhecerseusmembroseprecisoqueelesoreconheam comoumdosseus.Asobraseosdocumentosinterativosemgeralno fornecemnenhumainformaoouemooimediatamente.Senolhes foremfeitasperguntas,senofordedicadoumtempoparapercorr-los - 55 - Captulo I - Conceitos ou compreend-los, permanecero selados. Ocorre o mesmo com as artes do virtual [Lvy 1999:68-69] Poroutrolado,devomanifestarminhadiscordnciacomStevenJohnson quandoestepretendeelevarainterfaceaumaformademanifestao artstica[2001].Prefirodizerqueaarteseenriqueceporpassaraincluir,de formamaisabrangente,aspossibilidadededesenvolvimentodesuaprpria interface.Nohnistoqualquerineditismo.Apraxisdaartedigitalincluia construodainterface,damesmamaneiraqueapoesiaconcretaincluia disposiodotextoemseuprocessodesignificao;noentanto,a diagramao no se tornou arte por ter sido includa dentro das possibilidades dacriaoartstica.Valetambmlembrarqueasartesplsticas,jhmuito tempo, realizaram a apropriao da interface em seu universo. As instalaes, abandonandoumaperspectivameramentecomtemplativadoobjetoartstico, hmuitopassaramaincluirosambientes e os mecanismos de sua percepo no mbito do objeto artstico. A interface enquanto metfora A interface condiciona o discurso, medida que seus mecanismos ampliam ou restrigemascapacidadescomunicacionaishumanas.Voltandoaoexemploda sala de chat, a possibilidade de ignorar, automaticamente, as manifestaes de umdeterminandoparticipante,funcionacomoumacrscimoanossas capacidadesnaturais,vistoquenotemoscondiesdedesabilitarnossos sentidosdemaneiratoseletiva.Poroutrolado,setomarmosacomunicao pormeiodemensagensdetexto,emaparelhoscelulares(SMS),fcil perceberquantoodiscursoinfluenciadopelasrestriosimpostaspela extensomximade160caracterespormensagemepeladificuldadede manipulaodos128caracteresdatabelaASC,emumtecladode10teclas. Estas condies da interface transformam o texto Voc tambm vai festa! Te vejol,atmais.emvctbvaiafestatvjlt+.Demaneiraparalela,a - 56 - Captulo I - Conceitos ausnciadecontextocaractersticodacomunicaofaceafacepropiciaa utilizaodosemoticonsousmileys,imagensformadasdecaracteresque procuramreproduziremoescomo::-)feliz;:-(triste;ou:-)))risada(ver http://members.aol.com/bearpage/smileys.htmparaumacompilaode emoticons) Um computador (...) sistema simblico em todos os aspectos. Aqueles pulsos de eletricidade so smbolos que representam zeros e uns, que por sua vez representam conjuntos de instrues matemtica simples, que por suavezrepresentampalavrasouimagens,planilhasemensagensd