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1 Biblioteca Escolar | Semana da Leitura | 40 anos de abril: refazer a revolução

Dar a Ver | Dar a

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS GIL VICENTE

BIBLIOTECA ESCOLAR

LEITURAS EM SIMULTÂNEO

No âmbito da Semana da Leitura e do Projeto Dar a Ver, Dar a Ler+, vai decorrer a quarta edição das «Leituras em simultâneo». Para a edição deste ano, a Biblioteca Escolar propõe poemas de seis escritores portugueses: Álvaro de Campos, Miguel Torga, Jorge de Sena, Sophia de Mello Breyner Andresen, Ruy Belo e Alexandre O’Neill.

A atividade decorrerá no dia 17 de fevereiro e consistirá na leitura dos poemas destes escritores feita, em simultâneo, em todas as escolas do nosso Agrupamento. Haverá duas sessões de leitura: uma de manhã, às 10h20 e uma à tarde, às 15h30.

Para que a atividade possa abarcar toda a comunidade escolar, solicita-se a colaboração de todos os alunos, professores e funcionários, no sentido de disponibilizarem, nesse dia e às horas referidas, algum tempo para procederem à leitura de um ou de todos os poemas a seguir apresentados. A leitura será efetuada nas salas de aula e em todos os serviços do Agrupamento. Os textos estão também disponíveis em suporte papel na Biblioteca e na sala de professores da escola-sede.

A Coordenadora da BE, Maria João Queiroga

O Diretor do Agrupamento, João Cortes

«QUEM A TEM…» O PORTUGAL FUTURO

Não hei de morrer sem saber

qual a cor da liberdade.

Eu não posso senão ser

desta terra em que nasci.

Embora ao mundo pertença

e sempre a verdade vença,

qual será ser livre aqui,

não hei de morrer sem saber.

Trocaram tudo em maldade,

é quase um crime viver.

Mas, embora escondam tudo

e me queiram cego e mudo,

não hei de morrer sem saber

qual a cor da liberdade.

Jorge de Sena

O portugal futuro é um país

aonde o puro pássaro é possível

e sobre o leito negro do asfalto da estrada

as profundas crianças desenharão a giz

esse peixe da infância que vem na enxurrada

e me parece que se chama sável

Mas desenhem elas o que desenharem

é essa a forma do meu país

e chamem elas o que lhe chamarem

portugal será e lá serei feliz

Poderá ser pequeno como este

ter a oeste o mar e a espanha a leste

tudo nele será novo desde os ramos à raiz

À sombra dos plátanos as crianças dançarão

e na avenida que houver à beira-mar

pode o tempo mudar será verão

Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz

mas isso era o passado e podia ser duro

edificar sobre ele o portugal futuro

Ruy Belo FLOR DA LIBERDADE

Sombra dos mortos, maldição dos vivos.

Também nós… Também nós… E o sol recua.

Apenas o teu rosto continua

A sorrir como dantes,

Liberdade!

Liberdade do homem sobre a terra,

Ou debaixo da terra.

Liberdade!

O não inconformado que se diz

A Deus, à tirania, à eternidade.

Sepultos insepultos,

Vivos amortalhados,

Passados e presentes cidadãos:

Temos nas nossas mãos

O terrível poder de recusar!

E é essa flor que nunca desespera

No jardim da perpétua primavera.

Miguel Torga

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Dar a Ver | Dar a

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS GIL VICENTE

BIBLIOTECA ESCOLAR

UM ADEUS PORTUGUÊS Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual

Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal. * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti.

Alexandre O’Neill

Não! Só quero a liberdade! Amor, glória, dinheiro são prisões. Bonitas salas? Bons estofos? Tapetes moles? Ah, mas deixem-me sair para ir ter comigo. Quero respirar o ar sozinho, Não tenho pulsações em conjunto, Não sinto em sociedade por quotas, Não sou senão eu, não nasci senão quem sou, estou [cheio de mim. Onde quero dormir? No quintal… Nada de paredes — só o grande entendimento — Eu e o universo, E que sossego, que paz não ver antes de dormir o [espectro do guarda-fato Mas o grande esplendor, negro e fresco de todos os [astros juntos, O grande abismo infinito para cima A pôr brisas e bondades do alto na caveira tapada de [carne que é a minha cara, Onde só os olhos — outro céu — revelam o grande [ser subjetivo.

Não quero! Dêem-me a liberdade! Quero ser igual a mim mesmo. Não me capem com ideais! Não me vistam as camisas-de-forças das maneiras! Não me façam elogiável ou inteligível! Não me matem em vida! Quero saber atirar com essa bola alta à lua E ouvi-la cair no quintal do lado! Quero ir deitar-me na relva, pensando «amanhã vou [buscá-la…» Amanhã vou buscá-la ao quintal ao lado… Amanhã vou buscá-la ao quintal ao lado… Amanhã vou buscá-la ao quintal Buscá-la ao quintal Ao quintal Ao lado…

Álvaro de Campos

25 DE ABRIL Esta é a madrugada que eu esperava O dia inicial inteiro e limpo Onde emergimos da noite e do silêncio E livres habitamos a substância do tempo

Sophia de Mello Breyner Andresen