LEITURA OBRIGATÓRIA AULA 1 -...
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Pós-Graduação em Direito Tributário
Disciplina: Direito Internacional Tributário e Direito Penal Tributário
LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 1
LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 1
NARLON GUTIERRE NOGUEIRA
2
A Súmula Vinculante no Direito Penal Tributário: uma Nota Crítica à Decisão do Su-
premo Tribunal Federal no Julgamento do HC 108.037/ES
Misabel Abreu Machado Derzi
Thomas da Rosa de Bustamante
1. Formulação do Problema
A decisão do HC 108.037/ES, prolatada pela primeira Turma de Egrégio Su-
premo Tribunal Federal, reacende importantes discussões acerca da natureza e da
eficácia jurídica transindividual da jurisprudência, da súmula e das súmulas vinculan-
tes do Egrégio Supremo Tribunal Federal, bem como da relação desta Corte com os
demais órgãos do Poder Judiciário, assim como dos requesitos que devem ser ob-
servados para a legitimação de tais decisões.
Com efeito, a Súmula Vinculante 24 do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
apesar de em nenhum momento ter tido a sua validade impugnada pelo acórdão ora
comentado, contradiz frontal e cabalmente a decisão do caso concreto. Diz a referi-
da súmula vinculante, literalmente, que “não se tipifica crime material contra a ordem
tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento
definitivo do tributo”1. Como explica o Ministro Cezar Peluso na sessão em que se
deliberou pela criação da Súmula, “a postura de corte, hoje, não admite processo-
crime sem que esteja predefinido o crédito, que é elemento normativo do tipo [já]
que todo tipo penal referido no art. 1º desta lei se refere a crédito. Se há dúvida so-
bre a existência do crédito, evidentemente há dúvida sobre a existência de elemento
normativo do tipo”2 Como salientou o Ministro Sepúlveda Pertence no leading case
que firmou essa orientação pretoriana, o art. 1º da referida lei “é modalidade clara de
1 STF, Pleno. Súmula Vinculante 24, DJ de 19.2/2010.
2 STF, Pleno, Proposta de Súmula Vinculante 29/DF, j. em 12.2.2009, DJe de 19.2.2010 (explicação
do Ministro Cezar Peluso).
3
tipo misto alternativo, porém, de resultado: é dizer, qualquer uma das condutas co-
missivas ou omissivas descritas nos diversos incisos serve a aperfeiçoar o crime,
mas não basta à sua consumação, para a qual não se prescinde de que, de uma ou
mais delas, resulte a supressão ou redução do tributo devido”3
A Súmula Vinculante 24 assenta, portanto, com a autoridade que é própria de
todos os enunciados sumulares dotados de efeito vinculante, a tese da unidade do
injusto no âmbito do Direito Penal Tributário, por nós defendida desde muito antes
de a questão chegar ao Egrégio Supremo Tribunal Federal. 4 Se o próprio “tipo” pe-
nal, no sentido impróprio de Tatbestand, faz referência à existência de “tributo” como
um elemento definidor do ilícito, o delito como manifestações concreta do crime defi-
nido em abstrato pela norma jurídica não nasce antes da apuração da existência do
montante do tributo devido. Assim, “como o Tatbestand nada mais é do que a pró-
pria antijuricidade em concreção, postulamos que não é possível conhecer o Tatbes-
tand isoladamente, em uma apreensão independente para, em outro passo subse-
quente, conhecer-se antijuricidade”5. Se a existência do resultado “supressão” ou
“redução” do tributo é um elemento do ilícito, então sua verificação situa-se em um
momento lógico anterior ao da caracterização do ilícito penal.
Por mais apaixonantes que sejam esses temas jurídico-filósofos, no entanto,
não cabe aprofundar aqui na estrutura do ilícito penal ou nas questões teóricas que
subjazem a construção jurisprudencial que levou à Súmula Vinculante 24. A questão
fundamental do acórdão em questão, que atraiu a atenção da mídia e gerou a preo-
cupação dos juristas, é a concepção que a Corte revelou acerca da própria natureza
da súmula vinculante e da sua força normativa. Como se lê no voto do ilustre Minis-
tro Marco Aurélio, que foi acompanhado pelos Ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia, a
3 STF, Pleno, HC 81.611-8/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 10.12.2003, DJ de 13.5.2005
(exceto do voto do relator). 4 Vg.,DERZI, Mizabel Abreu Machado. “A intributalidade do ilícito penal”. In: MARTINS, Ives Gandra
da Silva (et al). Crimes contra a ordem tributária. Vol. 1. São Paulo: IOB, 2002, pp. 81-96. 5 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito Tributário, Direito Penal e tipo. 2ª ed. São Paulo: RT, 2008,
p. 215.
4
Primeira Turma parece rever por completo a própria norma geral estabelecida na
Súmula Vinculante, ao invés de se ater às circunstâncias individuais ligadas à sua
aplicação em casos excepcionais. É o que se pode constar no fragmento que se
transcreve:
“(...) Observem-se que a questão alusiva ao término do processo administrati-
vo-fiscal para ter-se a persecução criminal mostrou-se construção pretoriana.
A rigor, a Lei n. 8.137/90 não encerra, para a configuração da prática crimino-
sa, considerada a supressão ou a redução de tributo, contribuições sociais e
qualquer acessório, a necessidade de esgotar-se a via administrativa. (...)
Assim, não havendo disposição legal, no que seria inclusive conflitante com a
Carta da República, prevendo a fase administrativa para a persecução crimi-
nal quanto ao crime tributário, há de apreciar-se, caso a caso, as peculiarida-
des presentes na denúncia, para saber se é necessário, ou não, apurar admi-
nistrativamente, observando o contraditório, o tributo devido.”6
Como se vê, no argumento da Turma não se busca apenas questionar a apli-
cação da lei, no caso concreto, ou enquadrar a situação descrita nos autos como
episódio excepcionalíssimo que exigiria a criação, com base em argumentos extraí-
dos de outras normas constitucionais, de uma exceção na hipótese de incidência
descrita pelo enunciado sumular. Trata-se, ao contrário, de formulação de uma nova
diretriz jurisprudencial, oposta à veiculada na Súmula Vinculante. Enquanto na sú-
mula Vinculante 24 se lê que o crime “não tipifica”, por faltar-lhe um elemento do Ta-
tbestand, de modo que não haveria o requesito da justa causa antes da conclusão
do processo tributário-administrativo, na nova decisão a regra geral é inteiramente
outra: de que “Há de apreciar-se, caso a caso, as peculiaridades da denúncia”, na
medida em que a lei, propriamente interpretada, não prevê a necessidade do esgo-
tamento da vida administrativa para o surgimento de justa causa para a ação penal.
6 STF, 1ª Turma, HC 108.037/ES, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 29.11.2011, DJe de 1º .2.2012, pp. 1-
13 (exceto do voto do relator).
5
Como se vê, há sérias implicações acerca da natureza do próprio Direito Su-
mular, como passaremos a demonstrar.
2. Breves Considerações sobre a Natureza Criativa das Decisões Judiciais e da
Jurisprudência.
O instituto da súmula, com a configuração que lhe dá o sistema jurídico brasi-
leiro, não existe em qualquer outro sistema jurídico do mundo. Embora os teóricos e
filósofos de Direito hoje já não divirjam, ao menos em sua maioria, sobre o fato de
que toda sentença judicial inevitavelmente cria direito, não se encontra em outro sis-
tema jurídico um poder tão amplo para a Suprema Corte estabelecer enunciados
gerais que passam a gozar do status de norma jurídica válida, a ser aplicada de mo-
do desvinculado dos fatos e fundamentos jurídicos apresentados por ocasião de sua
elaboração.
Sem embargo, antes de enfrentarmos especificamente os contornos da súmu-
la vinculante no Direito brasileiro, cabe uma análise mais detida da asserção de que
toda sentença cria direito e possui, por conseguinte, natureza constitutiva. Uma vez
admitido o caráter criativo da decisão judicial gera-se a seguinte indagação: se a
sentença cria direito, ela é constitutiva de quê?
Toda sentença, porque é um ato jurídico (pleno de imperatividade), produz
efeitos e atinge a esfera jurídica das pessoas. Ainda que se pudesse supor a deci-
são judicial como mero ato de aplicação do Direito, boca pela qual falasse o legisla-
dor, de modo algum se lhe negariam efeitos retroativos ex tunc, ou ex nunc, confor-
me o caso. Toda sentença tem eficácia. E essa eficácia, como se argumentou em
trabalho anterior, transcende muitas vezes as partes de um litígio concreto, já que
6
essa sentença gera, em maior ou menor grau, expectativas normativas que muitas
vezes produzem efeitos jurídicos para muito além das partes do processo7.
A decisão judicial, mesmo sendo apenas declaratória ou condenatória, de-
sencadeadora de efeitos ex tunc, casa uma delas cria direito e, nesse aspecto, não
se diferencia uma da outra. Então ela constitui algo. Esse algo, constituído pela sen-
tença, é o direito novo, como expectativa normativa. Não apenas o direito inter par-
tes. A nova norma “judicial” (com seus efeitos específicos ex tunc ou ex nunc), em
certo momento, será convertida em expectativa normativa, para aplicação igual aos
casos similares que pertencem ao mesmo grupo de casos.
A formação das expectativas normativas no decurso do tempo não ocorre de
forma similar nas duas espécies de controle de constitucionalidade, o concentra-
do/abstrato e o difuso/concreto. Na verdade, existe uma gama rica de variedades.
Uma das duas espécies de controle de constitucionalidade das leis – o conce-
trado/abstrato, que confere a constitucionalidade da lei em tese, sem nenhuma pro-
vocação advinda de caso concreto, reconhecendo-se a constitucionalidade ou in-
constitucionalidade da lei ou ato normativo – culmina em sentença de efeitos gerais,
vinculantes para todos os Poderes e pessoas, erga omnes, e de eficácia retroativa,
em princípio ex tunc (embora modulável pela própria Corte Suprema). A publicação
da sentença proferida nessa espécie de controle é o termo a quo da própria vincula-
ção e constitutivo dela, sem prejuízo da eficácia inerente ao seu objeto. A vinculação
é a qualidade de que é dotada a decisão e torna transparente a expectativa normati-
va, desencadeada pela sentença (expectativa em tudo similar àquela desencadeada
pela publicação de uma lei), mas, ainda, supõe hierarquia. Em regra, como veremos,
a vinculatividade da decisão não apenas consolida um entendimento judicial,que
deve ser seguido, mas também obriga ainda os órgão inferiores àquele que a prola-
ta. Em princípio, tal espécie de controle, se a sentença está qualificada pela coisa
7 DERZI, Mizabeu Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no Direito Tributário. São Paulo:
Noeses, 2009, esp. Pp. 246 e ss.
7
julgada, não está vocacionada às mutações conflitantes, supervenientes. Embora
sustentem alguns a possibilidade de revisão, sob novos fundamentos, daquela sen-
tença que reconheceu a constitucionalidade, não poderemos abordar o tema neste
trabalho. Seja como for, se as decisões dessa espécie, proferidas na jurisdição
constitucional, apesar da coisa julgada e sem qualquer ocorrência de mudança no
estado do direito e de fato, merecerem alteração desencadeada, a segurança atingi-
da e até mesmo a retroatividade, em face dos direitos e garantias dos contribuintes.
No entanto, no segundo gênero de controle (que se dá de forma difusa, quan-
do se suscita incidenter tantum a inconstitucionalidade de uma lei ou outro ato nor-
mativo em determinado caso concreto), a sentença que declara a inconstitucionali-
dade, como se sabe, porque a lei inconstitucional é nula ou inexistente, gera tam-
bém efeitos ex tunc, retroativos (salvo determinação diferente, prevista na própria
sentença), mas somente atinge as partes envolvidas no processo sem repercussão
imediata em relação a terceiros. É que o modelo nacional, embora extraído do sis-
tema norte-americano, não adotou a solução stare decisis, por força do qual as de-
mais questões idênticas estão vinculadas ao precedente e recebem tratamento
igual, disseminando-se dessa forma, erga omnes, a decisão proferida em caso iso-
lado. No Brasil se preferiu, uma vez consolidado entendimento no Supremo Tribunal,
por via de decisões reiteradas em casos concretos, atribuir ao Senado Federal a in-
cumbência de suspender a execução da lei eivada de inconstitucionalidade (art. 52,
X, da Constituição da República). Nesse último modelo de controle, tradicional na
ordem jurídica brasileira, que se dá em sentenças em casos concretos, após a con-
solidação da jurisprudência, mas antes de o Senado Federal suspender a eficácia de
lei, há a evidente possibilidade de mudança de entendimento da Corte e, portanto,
de contradição. Embora as normas constitucionais não tenham sido alteradas em
seu enunciado linguístico, embora a lei – objeto do controle – também não tenha
sido modificada, nem os fatos – o novo entendimento da Corte, modificativo ao ante-
rior, cria uma nova norma judicial, geradora de expectativas normativas legítimas.
Pode-se indagar, portanto: se o controle de constitucionalidade difuso, no caso con-
creto, somente desencadeia efeitos, inter partes, em que momento surge para todos,
8
terceiros que não são parte, uma norma judicial. Uma expectativa normativa? Enfim,
surgirá confiança a ser protegida ou responsabilidade pela confiança?
A transformação dos julgados em expectativas normativas de conduta pode
variar na duração de tempo necessário, pode variar no grau de intensidade de ex-
pectativa, podendo chegar, em seu grau máximo, à obrigatoriedade da observância
geral da norma judicial, ou seja, a uma proibição de desvio. Sobre esse tema, há um
leque de discussões. Em que momento teremos um jurisprudência consolidada? O
que é jurisprudência? Sendo consolidada a jurisprudência, podem os tribunais inferi-
ores dele divergir? E os demais Poderes? E os cidadãos? Sobretudo, temos a con-
siderar, a partir do conceito de jurisprudência, o que significa uma modificação de
jurisprudência, a demandar a inovação dos princípios da irretroatividade, da prote-
ção da confiança e da boa-fé.
Um dos bons estudos recentes, relativos ao tema, encontra-se na tese de
Heiki Pohl, cujas conceituações levaremos em conta. Após dissertar sobre a impos-
sibilidade de se chegar a um conceito único, inequívoco, dos textos legislativos, que
configuram “sinais”, pondera que, via de regra, podemos atribuir significados alterna-
tivos, mais ou menos adequados (cadeia infinita de signos) àqueles textos, concluin-
do que as melhores técnicas de interpretação, a partir do texto e do contexto, da
compreensão prévia, das associações e dos precedentes, dos critérios sintáticos,
lógicos, teológico e sistemáticos, em princípio, somente são aptas a excluir determi-
nados significados da palavra legal, mas elas não conseguem determinar positiva-
mente aquela interpretação que seria exclusiva e corretamente única8. E, como o
Direito não é uma realidade concluída, forte em Schlink, afirma que a “verificação”
de seus achados não é adequada, impondo-se-lhe os critérios de “falsificação” da
fundamentação das decisões jurídicas.”Assim, a flexibilidade que a vinculação à lei
deixa para o juiz é limitada pelos critérios falsificadores, com os quais deve ser justi-
8 Cf. POHL, Heiki. Rechtsprechunganderung und Ruckanknupfung. Berlim: Duncker & Humboldt,
2005, pp. 23-24. Tradução não autorizada pelo autor de KISTEN LAGE.
9
ficada uma hipótese encontrada.”9Também Larenz, muito antes, já ponderara que
estar correto, do ponto de vista jurídico, não significa uma verdade atemporal, mas
que algo correto para este ordenamento legal e para este tempo10. A partir desses
pressupostos, Heiki Pohl distingue entre os precedentes judiciais, que configuram:
(a) precedentes em sentido estrito, que são jurisprudência, verdadeiros mandamen-
tos de aplicação e de respeito, com caráter vinculativo, ou seja, proibição de desvio,
de divergência. Essa espécie de jurisprudência vinculativa configura a decisão uni-
formizadora da Corte hierarquicamente superior, que obriga os tribunais inferiores,
sem possibilidade de modificação pelas primeiras instâncias. Sua alteração advém
tão somente das decisões da Corte Superior; e (b) precedentes como jurisprudência
estabilizada, que não supõem necessariamente o princípio hierárquico, nem tam-
pouco configuram a proibição de divergência, mas são singelos mandamentos de
recomendação para a consideração na solução de conflitos do mesmo grupo de ca-
sos similares11. Ou seja, por detrás das decisões judiciais, pode haver graus diferen-
tes de obrigatoriedade12. Mas o que seria uma jurisprudência, ou uma expectativa
normativa consolidada?
Tomemos a expressão expectativa normativa-judicial consolidada com sinô-
nimo de jurisprudência estável.
9 Cf. POHL, Heiki. Op. cit., p. 26. No mesmo sentido, LUHMANN adota a visão de que o papel da
Dogmática jurídica se presta a afastar o que não pode ser sacado corretamente, dentro dos limites da palavra do legislador, mas é imprestável a indicar o significado único em muitos casos, criando, ao contrário, pelo aprofundamento que engendra, hipóteses multiplicadoras de aplicação das alternativas de norma. 10
Cf. POHL, Heiki. Op. Cit., p. 27, nota 49. 11
Cf. POHL, Heiki. Op. Cit., p. 31. 12
No mesmo sentido, ver também o trabalho de PECZENIK, Aleksander. “The binding force of prece-dent” In: MACCORMICK, Neli; e SUMMERS, Robert (eds). Interpreting precedentes: a comparative study. Alershot: Ashgate, 1997, pp. 461 e ss., onde o autor sintetiza as conclusões do célebre grupo de estudos que ficou conhecido como os Bielefelder Kreis. Ver também, sobre os fatores institucionais e não institucionais que influenciam a forma do precedente, BUSTAMANTE, Thomas. Teoria do precedente: o peso da jurisprudência na argumentação jurídca. São Paulo: Noeses, 2012; e MACCORMICK, Neil. “Precedent as a source of law”. In: ATTWOOL, Elspeth; e COMANDUCCI, Pao-lo (orgs.). “Sources of law and legislation – proceedingg of the 17 World Congress of the International Association for Philosophy of Law and Social Phiosophy (IVR), Bolonga, June 16-21, 1995, vol. III”. ARSP-B 69, 1998, PP. 117-185.
10
É verdade que os casos concretos são únicos e que, quando nos referimos a
casos “iguais” ou similares, sem pressupomos o caso ou fato jurídico, já despido de
suas especificidades fáticas (econômicas, sociais, políticas, psicológicas, tempo-
rais...)que tornam cada caso, caso único. Os casos concretos comparáveis ou simi-
lares (“iguais”) assim o são, quando sejam reduzidos, por meio dos critérios jurídicos
relevantes, postos no ordenamento (não importa quantas características diferenciais,
não jurídicas, possam ter). O fático, na sua facticidade pura, não é apreensível pelo
Direito. Esses fatos, assim reduzidos, são postos sob a regência de uma norma judi-
cial comum. Essa norma judicial comum tanto serve para a redução de complexida-
de de um grupo de casos, como se presta a determinar-lhes a consequências – o
complexo de deveres, direitos e obrigações, faculdades, enfim, a esfera jurídica na
qual se inserem. Pois bem, o que é jurisprudência antiga ou nova, igual ou modifica-
da, somente pode ser medida por meio daquela norma judicial concreta extraída da
sentença, que se presta a reduzir e acolher os fatos a posteriori para dentro do sis-
tema. Não interessam as partes n o processo, os casos mais ou menos complexos
na ordem social, as peculiaridades “divergentes”de cunho extrajurídico. À vista de tal
riqueza do mundo da vida, cada caso, embora único, e cada julgamento sendo sem-
pre solitário, será comparável a outros ditos similares.
Se cada julgamento for considerado solitariamente, de forma única, então,
toda sentença será paralela à outra – ainda que levem a resultados idênticos, para
problemas, questões e situações muito similares (do ponto de vista jurídico). Não
poderíamos explicar a existência em nossa ordem jurídica, das súmulas, muito me-
nos das súmulas vinculantes, da qualificação de “repercussão geral”, nem tampouco
dos precedentes que se consolidam em repetição sistemática. Tem razão Heiki Pohl
quando pondera, com base no Direito alemão, que, em toda sentença em processo
subjetivo há uma questão geral e uma individual. A questão individual diz respeito o
caso concreto e à extensão limitada da parte da sentença propriamente dita. Mas,
por detrás de toda sentença, existe uma questão geral, uma norma concreta judicial,
que se sacou da norma legal a fundamentada. Assim, Pohl leciona:
11
“A decisão judicial não tem como conteúdo apenas uma decisão litigiosa sin-
gular, e sim, alem disso, a decisão de uma questão geral que se refere ao ca-
so isolado. Essa resposta geral age de forma prejudicial para outros casos e
desenvolve obrigatoriedade geral. A quantidade de respostas gerais é defini-
da pelo Direito judiciário. A diferenciação entre uma parte singular e uma par-
te geral, na decisão judicial, também pode ser encontrada na literatura e na
jurisprudência, no que podem ser reconhecidos, para a parte geral, termos
como „preceito legal‟ (BGHZ 18,81 (81), „princípio desenvolvido‟ (BAG, BB
1984, p. 1426), „precedente‟ (Amberg), ‘regulamento legal‟(Lubbe), „princípio
legal abstrato‟ (Weis), „diretriz‟ (Kirchhof), „razões mais importantes para a de-
cisão‟ (Viets), ‘ratio decidendi‟ (Schluter), ‘opinião jurídica‟ (viets), ou „obter
dictum‟ (Kisher).”13
E assim resume Heiki Pohl a própria tese sobre o conceito de jurisprudência:
“Uma decisão judicial contém sempre uma pergunta geral com a sua resposta
ao lado de uma pergunta singular com a sua resposta. Fazem parte da mes-
ma jurisprudência, as decisões que dão a mesma resposta a uma determina-
da pergunta geral.”14
Como se observa, a questão individual do caso sub judice esconde sempre
uma questão, um problema, uma pergunta geral. O que é decisivo para definir a ju-
risprudência, identificada com a mesma jurisprudência, será o fato de a pergunta
geral (que extrai de vários casos similares) obter a mesma resposta geral. Afirma,
Heike Pohl, que, se a pergunta geral obtém a mesma resposta geral, então estare-
mos diante de uma jurisprudência idêntica. Em resumo, uma jurisprudência consoli-
dada, fixa ou precedente, firmada pelo Supremo Tribunal Federal será qualquer de-
cisão, tomada em caráter definitivo pelo Plenário, que tenha dado resposta a uma
questão jurídica geral, verdadeira norma judicial. Concordamos com Heiki Pohl,
13
Cf. POHL, Heike. Op. cito., pp. 84-85. 14
Cf. POHL, Heike. Op. cito., pp. 86-87.
12
quando diz que, para o reconhecimento da jurisprudência como precedente, é des-
necessário considerar: (i) o tempo decorrido, mas ates é mais importante saber se a
decisão final, irreversível, e tomada por Tribunal superior, instância máxima para
exercer a jurisdição naquele campo de competência; (ii) também é irrelevante o nú-
mero de decisões iguais, se única decisão ou repetidas em série15. O argumento
mais importante se prende ao raciocínio de que, uma vez pacificada a jurisprudência
, o mesmo Tribunal superior (entre nós, o Supremo Tribunal Federal) pode se recu-
sar, tanto em nosso País, como Alemanha, a reexaminar a mesma questão jurídica
em outros casos considerados similares.
3. A Determinação da Norma Jurisprudencial e o Problema da Ratio Decidendi:
o Valor da Súmula do Supremo Tribunal Federal
A distinção entre a “norma geral” contida na decisão judicial e a norma con-
creta estabelecida diante do caso está relacionada, no mundo do common law, co-
mo problema da descoberta do ratio decidendi ou do elemento vinculante dos pre-
cedentes judiciais.
A grande questão a ser respondida por uma teoria dos precedentes judiciais
é: “o que vale como precedente judicial?”.
A questão passa, portanto, pela busca de um critério de interpretação das
decisões judiciais. Precedentes, súmulas e enunciados judiciais são, como enuncia-
dos legislativos, textos dotados de autoridade que carecem de interpretação. É tra-
balho do aplicador do Direito extrair a ratio decidendi – o elemento vinculante – do
caso a ser utilizado como paradigma. Mas a noção de ratio decidendi e os critérios
para sua determinação constituem algo ainda fortemente controvertido. Talvez este
seja o ponto mais polêmico da teoria dos precedentes e de toda a teoria jurídica
produzida no common law.
15
Cf. POHL, Heike. Op. cito., pp. 94-95.
13
Como explica Geoffrey Marshall, “não fá uma única forma de dizer o que
aconteceu em um caso particular, e descrevê-lo é escolher as suas notas mais rele-
vantes para o propósito em questão”. Ao selecionar os fatos materiais fixados pelo
juiz ou descrever as regras adotadas em um caso concreto, “é necessário definir
com certo grau de precisão o que constitui esse elemento (ratio decidendi)”16
É natural, portanto, que surjam disputas doutrinárias infindáveis acerca do
que deve ser considerado vinculante em um precedente judicial. O conceito de ratio
decidendi - pelo menos enquanto prevalecer a teoria predominante no Direito britâ-
nico, segundo a qual o que torna o case law relevante é apenas a autoridade do juiz
que tenha decidido a questão jurídica coberta pelo caso, sendo que essa autoridade
ou é absoluta ou “não existe”17- parece ser um conceito fadado à indeterminação.
A teoria tradicional dos precedentes – que floresceu na Inglaterra no século
XIX – toma como certo que os juízes têm um poder de criação de normas jurídicas.
Por isso há uma tendência a se buscar um conceito o mais estrito possível de ratio
decidendi para o fim de limitar o poder normativo reconhecido ao Judiciário: “Na ex-
periência dos juristas do common law, o problema da força do precedente é estrita-
mente ligado àquele da individualização da ratio decidendi da sentença: somente a
esta é reconhecido valor vinculante, não a um obiter dictum.”18
Talvez o critério mais tradicional, no mundo common law, para se identificar o
ratio decidendi seja o desenvolvido por Arthur Goodhart, para quem “a primeira regra
para se descobrir a ratio decidendi de um caso é que ela não deve ser buscada nas
razões em que o juiz tenha baseado sua decisão”19, mas nos fatos materiais “tais
como vistos pelo juiz” no caso citado. Para este autor “é pela sua escolha dos fatos
16
MARSHALL, Geoffrey. “What is biding in a precedent”. In: MACCORMICK, Neil; e SUMMERS, Robert (orgs.). Interpreting precedents – A comparative study. Aldershot: Ashgate, 1977, pp. 505. 17
ENG, Svein. “The doctrine of precedente in english and norwegian law – Some common and specif-ic deatures”. Scandinavian Studies in law 39, 2000, p. 305. 18
BIN, Marino. “Funzione uniformatrice della Cassazione e valore del precedente giudiziario”. 19
GOODHART, Arthur L. “Determining the ratio decidendi of a case”. Essays in jurisprudence and the common law. Cambrige University Press, 1931, p. 4.
14
materiais que o juiz cria Direito”20. No entanto, esse critério tem sido substituído,
mais recentemente, pelo proposto por Rupert Cross, que define a ratio decidendi
como “qualquer regra jurídica expressa ou implicitamente tratada pelo juiz como um
passo necessário para alcançar a sua conclusão”21.
Ainda na tradição do common law, Simpson acredita que a ratio decidendi
deve ser buscada na regra “aplicada pela corte” (acted upon in court). Para encon-
trá-la, seria necessário procurar os fatos considerados relevantes para a decisão
tomada como precedente. Mas, o que pode contar como “relevantes” para uma de-
cisão? Simpson responde a essa pergunta a partir de uma crítica à concepção de
Rupert Cross: “É difícil enxergar a força de qualquer necessidade lógica que iria gui-
ar o juiz ao decidir qual regra precisa foi necessária.”22 Ele corretamente sugere o
uso da expressão “suficiente” no lugar de “necessária”, e argumenta que tudo o que
o juiz necessita para decidir é uma regra suficientemente precisa para solucionar o
caso concreto. As regras jurisprudenciais são descritas como “entidades incomple-
tas”, pois elas estão sempre sujeitas a novas exceções a serem adicionadas por juí-
zes posteriores quando estes distinguem o caso a ser decidido daquele coberto pela
regra judicial.23.
Todos esses métodos para se determinar a ratio, apesar de diferentes em
vários aspectos, compartilham o pressuposto de fundo de que o juiz cria O direito
jurisprudencial. O debate entre esses juristas britânicos é, portanto uma discussão
entre juristas que compartilham a mesma ideologia judicial o mesmo pressuposto de
que o juiz está vinculado pelos que antecedem e faz leis para os que sucederão.
Como se nota, a noção de ratio decident permanece um conceito aberto e
dotado de alto grau de ambiguidade. A dificuldade para determinar a ratio decidendi
tem um caso qualquer decorre, em nossa opinião, da pressuposição de que há ape-
20
Ibidem, p. 10. 21
CROSS, Rupert. Precedent in English law. 3ª ed. Oxford: Clarendon, 1979, p.76. 22
SIMPSON, A. “The ratio decidendi of a case and the coctrine of binding precedent”. In: GUEST, A. G. (org.). Oxford essays in jurisprudence (first series). Oxford: Clarendon, 1967, p. 163. 23
Idem, 165.
15
nas uma ratio em cada caso julgado. Essa pressuposição, no entanto, é normalmen-
te falseada pela prática.
Julius Stone, por exemplo, consegue demonstrar com análise de casos que
sempre há uma larga margem de “fatos” que podem ser considerados “materiais” e,
portanto, parte da ratio decidendi24. Após apontar um série de ambiguidades semân-
ticas que surgiram na interpretação de célebre caso “Donoghue vs. Stevenson”25,
Stone conclui que os material facts “podem ser enunciados em vários níveis de ge-
neralidade” e pode haver um grande número de “rationes potencialmente vinculantes
competindo entre si para governar casos futuros em que os fatos possam incidir em
um nível de generalidade,mas não em outro”26 . A ratio decidendi seria, portanto,
uma “categoria de referência ilusória” (category of illusory rederence), pois, o Direito
deixa à Corte posterior uma escolha substancial quanto os fatos que devem ser
compreendidos na ratio decidendi de um precedente27.
A reconstrução da ratio decidendi – isto é, das regras adstritas que têm força
de precedente – deve ser, portanto, uma elucidação das premissas normativas to-
madas como etapas de justificação de uma decisão judicial. Parece adequado, nes-
se sentido, um modelo exegético28 de reconstrução das normas a partir da interpre-
tação das decisões judiciais. “Quando um juiz faz referência a uma decisão anterior,
o faz uma regra universal contida na decisão.”29 A interpretação dos precedentes
deve conter, portanto, uma “análise normativa”, cujo objetivo é “a individualização da
regra ou norma: mas não a situação individual que constitui o decisum, senão as
rationes decidendi”30.
24
STONE, Julius. “The ratio decidendi of the ratio decidendi”. Modern Law Review 22, 1959, pp. 603-4. 25
[1932] A. C. 562. 26
Ibdem, p. 607. 27
Idem. 28
SILTALA, Raimo. A Theory of orecedente: from analytical positivism to a post-analystical philosophy of law. Oxford: Hart Publishing, 2000, pp. 84-90. 29
SORIANO, Leonor Moral. El precedente judicial. Madrid: Marcial Pons, 2002, p. 138. 30
CHIASSONI, Pierluigi. La giurisprudenza civile – metodi d’interpretazone e tecniche argomentative.Milão: Giuffrè, 1999, p. 145.
16
Só que essas regras que constituem as rationes decidendi podem ter diferen-
tes níveis ou graus de generalização, e o valor delas vai depender sempre de uma
decisão de intérprete. É nesse contexto que se pode verificar, portanto, o principal
fator que leva à criação de uma súmula, e não especificamente de súmula judicial.
Com efeito, o que justifica a súmula do Supremo Tribunal Federal – estamos falan-
do, obviamente, do sentido originário do instituto da súmula, e não especificamente
da súmula vinculante – é justamente a indeterminação epistemológica decorrente do
direito judicial e a dificuldade de se sistematizar o conhecimento jurídico existente,
permitindo a sua transmissão e sua aplicação concreta a novos casos individuais31.
A Súmula cumpre a função de diminuir a incerteza e potencializar a previsibilidade
das decisões judiciais, de modo a proteger as expectativas normativas geradas por
essas decisões e desafogar as infindáveis discussões teóricas acerca de qual norma
pode ser extraída da totalidade da jurisprudência do Tribunal.
Quando a súmula estabelece um enunciado geral acerca de interpretação do
Direito ou uma diretiva genérica sobre como casos difíceis devem ser resolvidos, o
seu valor está justamente em criar uma norma geral aplicável a casos futuros e em
evitar as infindáveis divergências que surgem no âmbito common law acerca de
quais são os “fatos materiais”, no sentido de Goodhart, ou os elementos e similari-
dades “relevantes” entre casos concretos. A súmula, ao estabelecer um consenso
da própria corte acerca de uma “norma geral” inequivocamente estatuída e redigida,
favorece a aplicação universal do direito e a imparcialidade da jurisdição. Aplica-se
uma súmula quando, no caso a ser decidido, for possível subsumir os fatos compro-
vados pelo juiz na norma geral estabelecida pelo Tribunal.
4. Do Caso Específico da Súmula Vinculante
31
Nesse sentido, uma das principais funções da súmula é espitemológica. Ela permite uma sistematização do conhecimento jurídico, para sua transmissão. É nesse sentido que a melhor doutrina afirma que “a súmula faz parte de uma linguagem que descreve decisões” (MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo: RT, 2010. pp. 216-7).
17
No caso específico da súmula vinculante, há um dado a mais. A súmula vin-
culante, diferentemente do que acontece em geral no precedente judicial nos siste-
mas de civil law, opera não apenas por força da persuasão gerada pelos argumen-
tos empregados pesos juízes dos tribunais superiores.
O respeito ao precedente dos tribunais superiores, e, em grau máximo, à sú-
mula vinculante, encontra justificação não apenas em argumentos práticos e filosófi-
cos, mas também em argumentos institucionais. Esse peso institucional coloca os
precedentes em um patamar especial na argumentação jurídica. Como esclarece
Robert Alexy, os argumentos institucionais “se fincam direita ou indiretamente na
autoridade do direito positivo”, e por isso gozam de uma prioridade prima facie sobre
os argumentos práticos gerais (não institucionais), que “deveriam sua força somente
da correção do seu conteúdo”32 Os princípios formais de segurança jurídica e da
previsibilidade atuam – sempre, embora às vezes com maior ou menos intensidade
– como razões que militam para a observância do direito jurisprudencial. É claro que
o grau de institucionalização de um precedente pode variar, e em função desta vari-
ação os precedentes podem ser classificados como fontes do direito obrigatórias em
sentido forte (must-sources), obrigatórias em sentido frágil (should-sources) e mera-
mente permitidas (may-sources).
O peso ou grau de obrigatoriedade dos precedentes judiciais vai depender,
portanto, de uma série de fatores institucionais que influem sobre o peso dos prece-
dentes, como, por exemplo, a estrutura do Judiciário; o órgão, dentro de um mesmo
tribunal, que emitiu decisão; a teoria predominante no sistema jurídico acerca das
relações entre o Legislativo e o Judiciário; o tipo de ação em que a decisão é proto-
lada (se no controle de constitucionalidade concentrado, no controle difuso ou em
casos de jurisdição ordinária etc.); e, principalmente, as normas de Direito positivo
que influem sobre a força do precedente judicial. É nelas que se pode encontrar o
maior amparo institucional para a vinculação ao precedente. Todo sistema jurídico
32
ALEXY, Robert. Teoría del discurso y derechos humanos. Tradução de Luis Villar Borda. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 1995, p. 57.
18
tem uma série de normas institucionalizadas sobre a força do precedente judicial.
Mesmo onde essa institucionalização não é expressa, ela vigora implicitamente, e as
normas sobre precedentes judiciais podem ser identificadas como referência à regra
de reconhecimento hartiana ou aos próprios “precedentes sobre os precedentes ju-
diciais”33. Mas, contrariamente o que se poderia imaginar, mesmo nas tradições do
common law as normas sobre precedentes judiciais tendem a ser claras e escritas .
No caso do Reino Unido, por exemplo, as Practice Directions and Standing Orders
Applicable to Civel Appeals consolidam a maior parte das regras sobre a admissibili-
dade de recursos (appeals) e sobre a força do precedente judicial34.
Algumas das normas sobre precedentes judiciais podem ser encontradas em
basicamente todos os Estados Constitucionais contemporâneos. Princípios gerais
como o da segurança jurídica – de onde decorrem a exigência de “unidade da juris-
prudência”35, a busca de “estabilidade” e certeza do sistema jurídico e a necessidade
de se dotar o jurista prático de instrumentos para “reduzir o âmbito de discricionarie-
dade dos juízes na aplicação do Direito”36 -, da igualdade na interpretação da lei e
na aplicação do Direito37 e de coerência, seja esta entendida como coerência “sin-
crônica” – que não leva em conta o tempo – ou “diacrônica”38, estão tão próximos da
ideia de Estado de Direito que valem em todas as sociedades avançadas, indepen-
dentemente de uma positivação expressa.
O mesmo não acontece nas regras mais específicas que, em casa ordena-
mento jurídico, estabelecem diferentes critérios para o peso dos precedentes judici-
33
NANNI, Luca. “Ratio decidendi eobiter dictum nel giudizio de legitimità”. In: VISINTINI, Giovanna. Metodologia nello studio della giurisprudenza civile a commerciale. Milão: Giuffrè, 1999, p. 183. 34
Cf. Pratice directions and standing orders applicable to civil appeals, 2007-2008 edition, aprovadas pela House of Lords em 8 de outubro de 2007 (publicadas no sítio da internet http://www.publications.parliament.uk/pa/ld199697/ldinfo/ld08judg/bluebook/bluebk-1.htm, acesso e, 03 de abril de 2009). 35
TUNC, André. “Synthèse”.La Cour Judiciaire Suprême: une enquête comparative. Reve internacionale de Droit comparé 30-1, 1978, p. 13. 36
PULIDOM, Carlos Bernal. “La fuerza vinculante de la jurisprudencia en el orden jurídico colombiano”. El Derecho de los derechos. Bogotá: Universidad Extrernado de Colombia, 2005, p; 200. 37
OLLERO, Andrés. Igualdade em la aplicación de la ley y precedente judicial. 2ª ed. Madri: Centro de Estudios politicos y Constitucionales. 38
PECZECK, Aleksander. “Acerca de los precedentes vinculantes de facto”. Derecho y razón. Trasução de Ernesto Garzón Valdés. México: Fontamara, 200, pp. 57-66, p. 60.
19
ais. Como cada ordenamento jurídico tende a estabelecer suas próprias regras es-
pecíficas, uma teoria geral dos precedentes judiciais encontra limites quanto à sua
pretensão normativa.
Embora não caiba, aqui, uma análise geral de todas as normas sobre prece-
dentes judiciais existentes no Direito brasileiro, cabe notar que as decisões do STF
confirmadas por meio de súmulas vinculantes têm efeito (formalmente) vinculante e
erga omnes em relação a todos os órgãos administrativos e judiciários39. Qualquer
decisão judicial que desviar de uma súmula vinculante do STF pode ser imediata-
mente revertida pelo Tribunal através de uma “reclamação para preservação da
competência do STF e da autoridade de suas decisões”.
Os precedentes formalmente vinculantes, e entre eles as súmulas vinculan-
tes, portanto, constituem fontes vinculantes em sentido forte, cujo cumprimento é
processualmente garantido pela Constituição de 1988. Uma norma geral derivada de
um com precedente do STF prolatado em sede de controle concentrado de constitu-
cionalidade ou fixada em uma súmula formalmente vinculante enseja imediata re-
forma da decisão diretamente pela própria Corte Máxima. Pouca diferença há, quan-
to ao grau de eficácia, entre essas decisões e as da Suprema Corte Britânica, por
exemplo.
5. A Súmula Vinculante e o Supremo Tribunal Federal
39
O efeito formulamente vinculante foi instituído pela Emenda Constitucional 3/1993 e mantido pela Emenda Constitucional 45/2004 (que inseriu o art. 102, parágrafo 2º, da CF), tendo rapidamente sido implementado pelo STF no controle de constitucionalidade abstrato. O procedimento das ações direitas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade, bem como da arguição de descumprimento de preceito fundamental, foi detalhado pelas leis 9.868/1999 e 9.882/1999, que admitiram, pela primeira vez na história do país, a possibilidade de se restringir a eficácia de decisão de inconstitucionalidade para fatos e atos que tenham lugar depois da decisão do STF. A velha teoria da eficácia meramente declaratória – e necessariamente como efeitos ex tunc – da decisão de inconstitucionalidade foi abandonada.
20
Feitas essas breves considerações, cabe então enfrentar a questão de saber
que tipos de contribuições institucionais se impõem sobre o poder do próprio STF de
rever a uma súmula vinculante ou dela se afastar por meio de precedentes isolados.
Nesse ponto, podemos afirmar que há tanto restrições estabelecidas pela le-
gislação e pela própria estrutura do Tribunal como, também, outras que decorrem de
exigências decorrentes do princípio argumentativo da universalizabilidade, que cons-
titui um critério para aferir qualquer violação ao princípio da igualdade, e do papel
que o precedente judicial desempenha em geral na argumentação jurídica.
Entre as primeiras, que podemos chamar de “limitações formais”, menciona-
mos as normas que decorrem da própria legislação de regência das súmulas vincu-
lantes e das normas específicas constantes do Regimento do Supremo Tribunal Fe-
deral.
Quando o tribunal for diverso do Supremo tribunal Federa, a consequência
jurídica da violação à súmula é de fácil solução, já que o art. 7º da Lei 11.416/2006
prevê o cabimento de Reclamação a ser ajuizada diretamente perante o Supremo
Tribunal Federal, sem prejuízo de outros procedimentos e recursos que porventura
sejam cabíveis. No entanto, a questão mais delicada se dá quando é um órgão do
próprio Supremo Tribunal Federal que se aparta do enunciado da Súmula vinculan-
te. Com efeito, o art. 2º, parágrafo, 3º, da mesma lei, estabelece que “a edição, a
revisão e o cancelamento de enunciado da súmula com efeito vinculante depende-
rão de decisão tomada por dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal,
em sessão plenária”. Reza ainda o art. 354-B do Regimento Interno do Supremo Tri-
bunal Federal que, diante de uma proposta de criação ou modificação de súmula
vinculante, o Tribunal ouvirá, em cinco dias, os interessados e, ainda encaminhará
os autos ao Procurador-Geral DA República para sobre ela emitir parecer. Como só
se pode modificar uma regra jurídica por meio de outra que lhe estabeleça uma
cláusula excepcional, qualquer modificação da súmula, mesmo o seu excepciona-
mento em um caso concreto, ante a uma situação específica que foge à generalida-
de do enunciado da súmula, deve não apenas ser decidida pelo Plenário, único ór-
21
gão tido pelo legislador como competente para fazê-lo, mas também ser prolatada
com estrita observância do princípio do contraditório, dando-se oportunidade aos
eventuais interessados e ao Ministério Público, por meio do Procurador-geral da Re-
pública, para se manifestarem aduzindo razões contra ou em favor da manutenção,
revisão ou excepcionamento da Súmula.
Entre as segundas, por sua vez, que podemos chamar de “limitações subs-
tanciais”, se encontram todos os critérios e princípios de justiça que decorrem do
princípio da universalizabilidade e da exigência de igualdade ou justiça formal. Com
efeito, parece plausível sustentar, como faz, por exemplo, a professora Marina Gas-
cón Abellán, que é equivocada a asserção de que o precedente deve ser observado
apenas em função da autoridade do juiz ou do tribunal que o estabeleceu. Como
explica a autora, a noção de “precedente” pode ser entendida tanto no sentido tradi-
cional – ou seja, como a “doutrina ou os critérios jurisprudenciais assentados pelos
mais altos tribunais e cuja observância se ordena ou recomenda, com mais ou me-
nos vigor, pelos tribunais inferiores” – como em uma acepção mais restrita, a signifi-
car “a doutrina ou os critérios adotados pelo próprio juiz na resolução de casos ante-
riores”40. Nesse último sentido fala-se não em “precedente vertical” (estabelecido por
tribunais superiores) ou “horizontal” (por juízes que se situem no mesmo nível da-
quele que pretende aplicar a regra jurisprudencial ), mas no que Marina Gascón
Abellán denomina “autoprecedente”41. Nos casos em que se exige o respeito ao pre-
cedente com base em alguma “ideia sobre a estrutura piramidal de um poder do Es-
tado ou sobre o sistema de recursos jurisdicionais”, explica a professora de Castilla-
La Mancha, “a submissão ao precedente não difere do eu justifica à submissão à
lei”42: obedece-se ao precedente porque há uma norma que exige esse comporta-
mento. É justamente nos casos em que não há qualquer exigência de respeito aos
precedentes – não há qualquer ato de autoridade a estabelecer a força de vinculante
40
ABELLÁN. Marina Gascón. La técnica del precedente y la argumentación racional. Madri: Tecnos, 1993, p. 11. 41
Ibidem, p. 35. 42
Ibidem, p. 36.
22
para os precedentes – que se pode ver com mais clareza o equívoco, por exemplo,
do positivismo jurídico subjacente à teoria inglesa do precedente judicial.
Com efeito, nos ensina Mariana Gáscon Abellán que “o respeito ao preceden-
te [o próprio precedente, não necessariamente as decisões dotadas de uma autori-
dade superior] supõe uma exigência de autocongruência; exigência que, em princí-
pio opera em relação ao passado, mas que deve se conceber também e principal-
mente, em relação ao futuro, ou como consciência de que um bom critério de reso-
lução será aquele que valha também para resolver casos posteriores”43. Em suma:
“Qualquer que seja a sua sorte em determinado sistema normativo e jurisdici-
onal, respeitar o precedente constitui exigência de uma argumentação que se
pretenda racional, pois encarna nada menos que um dos princípios de corre-
ção kantianos, qual seja, o da universalização. Dito de outro modo, o papel
que a regra comportar-se segundo os princípios que poderíamos querer como
lei universal desempenha no âmbito da moralidade é o mesmo papel que o
respeito ao precedente desempenha no âmbito jurídico. Com isso, não defen-
do que a argumentação moral e jurídica sejam idênticas, mas simplesmente
que a racionalidade constitui um valor importante em ambas as esferas.”44
Por isso, se entendermos essa exigência de aplicação imparcial e universalis-
ta do Direito como algo que exige não apenas do juiz individual, mas de todos os
tribunais, chegamos à conclusão que o fundamento do dever de respeitar o prece-
dente não está apenas na autoridade, na força jurídica atribuída ao ato de criação
judicial do Direito. Pelo contrário, parece claro que a exigência de universalizabilida-
de – núcleo de concepção kantiana de racionalidade prática – é o principal funda-
mento para a técnica do precedente judicial. Como a universalizabilidade é o critério
mais imparcial de correção de uma norma, o dever de levar em conta o precedente
judicial pode ser fundamentado pelo método pragmático-universal de Jurgen Habe-
43
Ibidem, p. 11. 44
Ibidem, p. 12.
23
rmas e Robert Alexy: é um pressuposto para o entendimento do Direito como uma
empresa racional. Negá-lo seria negar a universalizabilidade do Direito e, com isso,
a racionalidade de suas normas.
Cumpre concordar com os autores como Chaim Perelman e Robert Alexy,
portanto, quando eles sustentam a aplicabilidade do Princípio da Inércia no âmbito
específico do Direito, que funciona como uma exigência jurídico-metodológica para a
argumentação jurídica, para dispor, da mesma forma como o faz a legislação ao re-
gular o ônus da prova, sobre as cargas de argumentação a serem assumidas por
cada um dos participantes do discurso jurídico. Com efeito, o princípio da inércia as-
sume a seguinte forma:
“Podemos presumir, até em contrário, que a atitude adotada anteriormente –
ou opinião expressa, conduta preferida etc. – continuará no porvir, seja pelo
desejo de coerência ou graças à força do hábito (...). A inércia permite contar
com a norma, o habitual, o real, o atual (...). A mudança, pelo contrário, deve
ser justificada; uma decisão, uma vez tomada, não pode ser revertida senão
por razões suficientes.”45.
Fica claro, portanto, que o princípio da inércia é uma valiosa regra de argu-
mentação que decorre do próprio dever de motivação/fundamentação, além de en-
contrar fundamento nas ideias de universalidade, de impessoalidade e de igualdade
de tratamento. É, portanto, um elemento vital do princípio da justiça formal. O princí-
pio da inércia, portanto, exige que o afastamento de uma súmula vinculante, pelo
próprio Supremo Tribunal Federal, encontre justificação racional: “Quem quer que
deseje se afastar de um precedente detém o ônus da argumentação.46
6. O afastamento da Súmula Vinculante e a Matéria Penal-tributária
45
PERELMAN, Chaim; e OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Traité de l’argumrntation: la nouvelle rhétorique. Brixelas, Université Libre de Bruxelles, 1970, p. 140. 46
ALEXY, Robert. Interpreting precedents – A comoarative study. Aldershot: Ashgate, 1997, p. 30.
24
Por derradeiro, cumpre salientar, apesar de ser óbvio, o fato de que o HC
108.037 versava sobre a matéria penal, a qual se acha absolutamente vinculada ao
princípio da legalidade, onde, mais do que em qualquer outra área do Direito, à ex-
ceção do Direito Tributário, as exigências de segurança e igualdade atingem o seu
grau máximo. Não há que se pensar, portanto, em qualquer razão minimamente
plausível que justifique o abrandamento da regra de que a justa causa para a ação
penal nasce apenas com o lançamento definitivo do crédito tributário. Com efeito, a
própria jurisprudência que estabeleceu a exigência de conclusão do processo tribu-
tário-administrativo reconhece, com tranquilidade, que a pendência do processo ad-
ministrativo que apura o crédito tributário suspende o curso da prescrição da ação
penal, de sorte que não há qualquer prejuízo para o Estado.
Ademais, é difícil imaginar uma situação tão excepcional a ponto de justificar
a quebra da regra geral, o abrandamento da súmula e a potencial mácula ao princí-
pio da confiança e da segurança jurídica, unicamente para fins de se punir alguém
por meio do Direito Penal. A quebra do Estado de Direito, da proteção da confiança
e das exigências que decorrem do princípio da boa-fé da administração só poderiam
encontrar guarida – e ainda sim se observasse o princípio da inércia e as normas de
Direito positivo que estabelecem a reserva de plenário, o quórum qualificado (dois
terços) e o princípio do contraditório – se fosse para evitar o processo penal ou para
que o Estado se acautelasse contra a possibilidade de restrição da liberdade de al-
guém, e não o contrário.
7. Conclusão: Riscos e Desafios para a Jurisprudência Constitucional
À guisa de conclusão, portanto, cabe-nos advertir acerca dos riscos adotados
pela postura interpretativa subjacente à opinião da maioria da Primeira Turma do
Egrégio Supremo Tribunal Federal.
Inicialmente, já tivemos ocasião de frisar que a própria existência de súmulas
pode constituir um risco para a independência das instâncias ordinárias do Poder
25
Judiciário. Com efeito, muitas vezes se adota um desenho institucional que exacerba
o âmbito de aplicação do princípio da praticidade, estendendo-o não apenas à esfe-
ra da Administração e da Legislação, mas também da Administração da Justiça.
Surge o risco de uma massificação das decisões judiciais, uma desatenção às parti-
cularidades do caso, que constituem uma ameaça à dimensão da justiça do caso
concreto. Uma aplicação mecanizada e automática das súmulas pode gerar uma
deslegitimação do Judiciário na medida em que ele perde a capacidade de ajustar o
direito aos casos concretos e, dessa forma, realizar a justiça em toda a sua plenitu-
de. 47
Esse inconveniente, no entanto, pode ser evitado se aplicar a súmula e o pre-
cedente de forma racional, sabendo realizar as analogias e os distinguishes neces-
sários para diferenciar os casos regulados pela súmula daqueles que apenas apa-
rentemente podem ser nelas subsumidos.
Se esse trabalho for bem realizado, então as súmulas e decisões vinculantes
passam a adquirir uma importância especial para o sistema, já que elas se tornam
veículos não apenas para a “agilidade” do Judiciário, mas também para a aplicação
coerente, racional e justa do Direito positivo.
A decisão do HC 108.037, no entanto, parece descumprir essas exigências.
De um lado, ela não justifica especificamente as razões pelas quais o caso
em análise era tão especial a ponto de merecer um tratamento diferenciado. Não se
desincumbe, portanto, das cargas de argumentação impostas pelo princípio da inér-
cia, que exige que quando o juiz pretenda se afastar de um precedente judicial ele
dê uma razão que justifique racionalmente esse afastamento. Não se enuncia, em
nenhum momento da decisão, um argumento universal em favor de uma exceção à
súmula.
47
DERZI, Misabel Abreu Machado. “A praticidade e o papel institucional do Poder Judiciário: a separação de poderes em jogo”. Estudos em Homenagem ao Prof. Sacha Calmon Navarro Coêlho, no prelo.
26
De outro lado, sequer impugna claramente a regra estabelecida pelo enuncia-
do sumular. Embora a decisão estabeleça uma norma geral contrária à súmula vin-
culante, e portanto dê ao caso uma resposta geral diferente da resposta geral esta-
belecida pelo precedente obrigatório, não toma o cuidado de enunciar claramente
essa resposta e, o que é mais grave, não respeita os caminhos e ritos estabelecidos
pela lei para revisar a súmula vinculante. Ao decidir a questão no interior da Turma,
viola-se claramente a competência do plenário e o princípio do devido processo le-
gal.
A decisão parece, portanto, um caso particularmente perigoso de ativismo
judicial, cuja consequência é a seguinte: enquanto o restante do Poder Judiciário
permanece inteiramente vinculado e incapaz de valorar as particularidades do caso,
sendo forçado a reproduzir decisões massificadas, os Ministros do Supremo, mesmo
quando atuando isoladamente ou por meio das Turmas, passam a ficar completa-
mente livres para decidir. O Supremo já não se encontra mais vinculado a respeitar
sequer o autoprecedente, isto é, a manter coerência e uniformidade para suas pró-
prias decisões. A exigência de respeitar o princípio da universalizabilidade, e assim
o princípio da igualdade, parece já não valer mais para o Supremo Tribunal Federal.
E, finalmente, a decisão gera uma enorme insegurança jurídica. Se for correto
o raciocínio de que o requisito da “justa causa” para a ação penal deve ser examina-
do “caso a caso”, independentemente da conclusão do processo administrativo, a
consequência prática será de que o Ministério Público sempre ajuizará a ação penal,
embora falte um parâmetro minimamente objetivo para aferir o momento em que se
considera praticado o delito contra a ordem tributária. Jamais se aguardará o término
do processo administrativo. Pouco importa se os elementos do delito estavam todos
presentes no momento do ajuizamento da ação penal. Pouco importa se o réu tinha
ciência de todos esses elementos e se o Ministério Público tinha total controle sobre
a ação penal; O que importa, afinal, é a praticidade, é o resultado de se condenar o
maior número de pessoas possível da forma mais rápida dentre as disponíveis para
o acusador. Se, no final das contas, o individuo for processado e julgado por ter dei-
27
xado de declarar ou pagar uma operação não tributada, de sorte que o delito não se
materialize, tanto pior para ele. O contribuinte então que vá buscar uma indenização
contra o Estado, se ele tiver forças e paciência para isso.
Misabel Abreu Machado Derzi Possui graduação em Faculdade de Direito pela Universidade Federal de Minas Ge-rais (1969) e é especialista e doutora em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1986). Atualmente é Professora Titular em Direito Financeiro e Tributário das Faculdades Milton Campos e da Faculdade de Direito da UFMG. É ex-coordenadora
dos cursos de pós-graduação e ex-chefe do Departamento de Direito Público da Fa-culdade de Direito da UFMG. É ex-procuradora geral do Estado de Minas Gerais e ex-procuradora geral do Município de Belo Horizonte. É advogada. Já publicou mais de 300 trabalhos entre artigos, capítulos de livros, livros e comunicações em con-gressos. Já participou de mais de 350 Congressos como palestrante ou conferencis-ta. Atualmente mantém projeto de pesquisa em desenvolvimento na pós-graduação da Faculdade de Direito da UFMG.Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário e Financeiro, atuando principalmente nos seguintes temas: di-reito tributário, tributação, constituição, reforma tributária e tributo. Thomas da Rosa de Bustamante Possui graduação em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2000), mestrado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2003) e douto-rado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2007), com período de investigação na University of Edinburgh, Reino Unido, como bolsista da CAPES. Atualmente é Professor Adjunto da Universidade Federal de Minas Gerais, onde é membro do corpo docente permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito, e Honorary Lecturer na University of Aberdeen, Reino Uni-do (sem vínculo empregatício com esta última instituição). Foi docente (Lecturer) do corpo permanente da Universidade de Aberdeen por dois anos completos e Profes-sor Adjunto da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde exerceu a função de Chefe de Departamento. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Teoria Geral do Direito, atuando principalmente nos seguintes temas: Teoria do Direito, Te-orias da Argumentação Jurídica, Filosofia do Direito, Hermenêutica Jurídica, Direitos Fundamentais e Direito Constitucional. Como citar este texto:
DERZI, Misabel AABREU Machado; BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. A súmula vinculante no Direito Penal Tributário: uma nota crítica à decisão do Supremo Tribu-nal Federal no Julgamento do HC 108.037/ES. Revista Dialética de Direito Tributá-rio, São Paulo, n. 200, mai. 2012, pp. 78-94. Material da 1ª aula da Disciplina Direito Internacional Tributário e Direito Penal Tributário, ministrada no Curso de Especiali-zação Telepresencial e Virtual de Direito Tributário – REDE LFG.