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or reconhecer o valor histórico deste texto,originário do final dos anos 1960, o PENSE

oferta-o a estudiosos e pesquisadores do pensa-mento espírita vinculado à temática sociológica. Trata-se de uma conferência proferida pelo grande orador paranaense Jacob Holzmann Netto, em 1964, transcrita e editada em livro no início de 1970 pelo Movimento Universitário Espírita (MUE), em pleno período da ditadura militar.

Natural de Ponta Grossa (PR), Jacob Holzmann Netto nasceu em 28 de julho de 1934 e faleceu nodia 26 de agosto de 1994, em Curitiba (PR).

Bacharelou-se em Direito, em 1958, e formou-seem psicologia no ano de 1972, profissão que exerceu até o final desua vida. Dominava, além da língua pátria, os idiomas inglês e francês.

Holzmann Netto se destacou como um orador cativante, carismático e extremamente culto. Ganhou dezenas de concursos estaduais e nacionais de oratória. Era considerado o maior orador espírita de sua época. Foi também o idealizador e um dos fundadores da Comunhão Espírita Cristã de Curitiba.

Suas posições doutrinárias controversas o colocaram em rota de co-lisão com o movimento espírita, pois via o Espiritismo como uma podero-sa alavanca de libertação e transformação social, sem os prejuízos do religiosismo e do conservadorismo político. O resultado disso foi seu afastamento das fileiras espíritas no final dos anos 1960, fato que também ocorreu com várias lideranças do MUE.

Tema delicado para a época, as correlações entre o marxismo e o Es-piritismo são aqui abordadas por Holzmann Netto com maestria e sólidafundamentação filosófica em pensadores como Manuel S. Porteiro (*), Gus-tavo Geley, Allan Kardec e Humberto Mariotti, filósofo espírita portenho que prefacia a obra e situa a atuação do orador paranaense como a de um lídimo representante do que denominou de esquerda kardeciana.

Esta publicação, de difícil acesso, teve pequena tiragem, tendo si-do lançada com poucos recursos gráficos e editoriais. Mas é uma obra que se impôs com o tempo pelo conteúdo e a ousadia na análise crítica do marxismo e do socialismo, agora disponível em sua versão digital.

(*) O site ressalva que, embora o autor cite com ênfase a obra Espiritismo Dialé-tico, de Manuel S. Porteiro, em algumas partes do texto há expressões idênticas às desse pensador espírita argentino, sem menção da fonte, o que não exclui o seu valor histórico. Fonte biográfica: http://www.feparana.com.br

PENSE – Pensamento Social Espírita Maio de 2008

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Edição A FAGULHA

JACOB HOLZMANN NETTO

ESPIRITISMO E MARXISMO

A FAGULHACx.P. 1536 - CampinasE s t a d o SP - B r a s i l

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ESPIRITISMO E MARXISMO

Introdução de HUMBERTO MARIOTTI

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ÍNDICE

PRÓLOGO 1

1 - O IDEALISMO FILOSÓFICO DE GELEY 10a) Geley e Kardec 10b) O Dinamopsiquismo de Geley 11

2 - O MARXISMO COMO DIALÉTICAE COMO MATERIALISMO 15a) Os Dogmas do Materialismo Dialético.. 18

b) A Economia Como Fator Essencialdo Determinismo Histórico 22

3 - O CONCEITO DINAMOGENÉTICO DA HISTÓRIASEGUNDO O ESPIRITISMO DIALÉTICO 25a) A Interpenetração Homem-sociedade..... 29

4 - A FALÊNCIA DO ESPIRITUALISMORELIGIOSO CLÁSSICO 31a) A Razão de Ser do Homem de Marx....... 32

5 - A CONCILIAÇÃO DO SOCIALISMOCOM A REALIDADE ESPIRITUAL 35a) Materialismo e Socialismo 35b) Socialismo e Espiritismo 36

6 - PELA VIVÊNCIA SOCIALDA DOUTRINA ESPÍRITA 42

NOTA EXPLICATIVA 48

NOTAS DA EQUIPE A FAGULHA 50

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NOSSA SEGUNDA EDIÇÃO

Esta obra responde aos imperativos dosdias que correm. Fruto de palestra cunhada pelainteligência de Jacob Holzmann Netto, dispõe-sea traçar novas rotas ao conhecimento humano, emface das quais insta o homem a inaugurar umaatitude autenticamente cristã perante seussemelhantes e a vida social em si mesma. Não seavoca, contudo, o direito de dizer a últimapalavra a propósito do assunto que se propõe. Semestar imune a falhas, erros e omissões, representa,acima de tudo, uma corajosa tentativa deabordagem de um problema sumamente intrincado.Constitui-se, pois, num convite ao estudo e à ação.

Em assim sendo entendido, "ESPIRITISMOE MARXISMO" logrou polarizar a atenção de quantoscompreendem que o saber configura o primeiropasso rumo ao ser. A bem da verdade, os pedidosde remessa já haviam se sucedido de talmaneira que — por força do interesse despertadojunto às hostes espíritas e universitárias —decorridas apenas algumas semanas do anúnciodessa publicação, vimos, como que por encanto,esgotar-se sua primeira edição.

Este livro tem uma missão a cumprir. E dela se desincumbirá embora esta segunda ediçãolhe custe o opróbrio de pessoas que — por avessasao progresso — se deixam imantar a ideaisconservadores. Ele reflete nossa ânsia de sabere ser, propósito do qual jamais recuaremos, mesmoporque a cruzada de esclarecimento que a EQUIPE A FAGULHA empreende, encontra, a pouco epouco, acústica no seio daqueles que, dialeticamente,laboram no sentido de criar condições parao surgimento do novo, cientes de que somos,

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os homens, os fios condutores da evolução.

Dessa maneira — malgrado nós saibamospercorrer um caminho atapetado por incompreensõesde toda ordem — esse fato, aliado a tantosoutros, só nos soa à moda de fator de estímuloa que prosseguimos, intimoratos, eretos,confiantes, com vistas a rasgar os horizontesconceituais da nova civilização. Ou, numa palavra,a abreviar o amanhã. Nossa plataforma é,sobretudo, a conscientização sócio-espiritual do homem.

Campinas, março de 1970

EQUIPE A FAGULHA

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PRÓLOGO

Respondendo a um gentil convite darevista A FAGULHA e de seus jovens diretores, paraque escrevamos um prefácio para Espiritismoe Marxismo, do Dr. Jacob Holzmann Netto, é quetraçamos estas linhas, a fim de dar cumprimentoa tão amistosa solicitação. Conhecemos de hámuitos anos o autor do presente trabalho e nosaventuramos a dizer que pertence ao que bem po-deria chamar-se esquerda kardeciana. Encontra-mo-nos, porém, diante de um jovem que, não obs-tante sua vocação socialista, começa sua exposi- ção com estas palavras: "Caríssimos irmãos emCristo Jesus", as quais, ante certos "radicais"do Espiritismo, poderiam menoscabar sua posturaprogressista e revolucionária. Mas, apesar dis-so, o Dr. Jacob Holzmann Netto se nos apresentacomo um dinâmico crítico espírita do marxismo,no que se refere à sua concepção materialistado homem e da história, demonstrando-nos, assim,que a visão cristã que o Espiritismo tem do pro-cesso histórico em nada anula o vigor progres-sista que o caracteriza.

Estas palavras de Jacob, "Caríssi-mos irmãos em Cristo Jesus", nos falam do quesignifica o homem espírita forjado ideal e dou-trinariamente ao calor da codificação kardeciana,pois, como se verá, o Espiritismo não é umnovo ópio religioso, à moda clássica, que vemadormecer as consciências, como o supõem os orto-doxos do marxismo. Ao contrário, ele nos indi-ca que, embora o espírito evangélico do homemespírita, sua visão do mundo e da sociedade res-ponde aos mais elevados ideais de justiça e li-berdade. Do que resulta que o Dr. Jacob Holz-mann Netto, e com ele toda a juventude que con-vive com o processo histórico contemporâneo, não

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se aparta da essência evangélica do Espiritismo,apesar do seu afã de ver no mundo uma sociedademais eqüitativa no que respeita à justiçasocial.

E isto nos leva a pensar que a ju-ventude universitária dos nossos tempos é a quedará cumprimento, dentro do movimento espírita,à grande determinação de Léon Denis: "Dar uma al-ma ao Socialismo". Com efeito, o presente estu-do tende a essa sublime finalidade: espirituali-zar o Socialismo e descobrir no processo dialé-tico da história sua dimensão idealista e psico-lógica, sobre a base espírita do Espírito emsua situação encarnada e desencarnada.

Isto posto, sem subestimar a obrade notáveis homens espíritas já maduros, cremosque à juventude compete levar o Espiritismo aosplanos da cultura moderna, especialmente a ju-ventude espírita universitária, que está maispreparada para contrastar os diversos valorescientíficos, filosóficos e religiosos do MundoModerno. E este trabalho assim no-lo demonstra,pois cremos que pode enfrentar os mais severossimpósios universitários, já que, com sua análi-se do marxismo, coloca a filosofia espírita,axiologicamente considerada, ao mesmo nível domaterialismo histórico e dialético e ao dos maisgraves problemas da filosofia contemporânea.

Nota-se em Holzmann Netto um novoespírito militante que ressoa com notáveis pen-sadores espíritas, já entrados em anos, como J.Herculano Pires, Remo Fedi, André Dumas, ManuelS.Porteiro, Santiago A. Bossero, Hugo L.Nale, osquais colocam o pensamento kardeciano frenteaos mais delicados problemas da civilização mo-derna. Alegra-nos agora que com o Dr. Jacob Holz- mann Netto se engrandeça a lista dos que elabo-

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raram um novo humanismo social à luz do ideárioespírita, pois assinala-nos ele que o Espiritismonão será sobrepujado por nenhum fato cientí-fico ou filosófico. Mas o de que a doutrina espí-rita necessita é de homens preparados para jul-gar e sentir a evolução do Mundo Moderno, de a- cordo com suas evoluções e progressos atravésdas grandes concepções ideológicas que nos ofe-rece a Codificação Kardeciana. Só assim o Es-piritismo será reconhecido como uma verdade pe-la gnosiologia atual e penetrará o processo evo-lutivo dos povos com a força espiritual mais vi-va e verdadeira que terão visto os tempos.

E isto é que nos faz pensar que a juventude não deverá envelhecer ao ritmo dascoisas já caducas e superadas. Ademais, na con-cepção espírita da vida não cabem os anos docorpo, assim como no Espírito não contam essasrelatividades objetivas de espaço e tempo. Navisão espírita da história só se nos mostram a dinâmica revolucionária das almas e a beleza doprogresso sobre a base da eterna juventude dasidéias. Por isso cremos que o futuro pertenceao Espiritismo e que Kardec resplandecerá sem-pre como uma estrela no céu científico, filosó-fico e religioso da humanidade.

O presente estudo contribuirá parademonstrar que não é pelas vias do materialismodialético que se manifestará a nova sociedadehumana. Ele acentua que o Idealismo não foi ul-trapassado, como supõem os teóricos do marxismo,posto que a filosofia espírita possui os elemen-tos necessários para comprovar que é a Idéiaque rege a marcha da história e, portanto, é o Espírito quem modificará a sociedade e não oschamados "modos de produção", como dizia KarlMarx. Eis porque consideramos que o Espiritis-mo será mais bem conhecido se se avocar o estudo

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dos fenômenos sociais e históricos, vale dizer,se penetrar na essência viva do que determina es-se violento espetáculo social chamado "luta declasses". E este trabalho do Dr. Jacob HolzmannNetto tende a isso, pois deixará confundidos a quantos hajam suposto que o Espiritismo era umamanifestação do demônio e, entre os esotéricos,o produto fenomenológico de larvas e cascões as-trais.

Sustentamos, portanto, que o Espi-ritismo, na hora atual da humanidade, se afirmará — triunfalmente, diríamos — mais pelo estu-do dos problemas sociais que pela análise exclu-sivamente científica, já repetida até o cansaço,dos fenômenos mediúnicos. E ele nos explicaque o processo histórico se acelerará, por leide evolução, mais pela interpretação espiritualdo homem e de seu verdadeiro sentido existencial,o que nos demonstra que a Lei de Sociedadese cumprirá amplamente para desembocar na Leide Igualdade assentada na Lei de Justiça, Amor eCaridade.

Se o Espiritismo, como movimentohistórico, se distanciasse dos fenômenos so-ciais por considerá-los de natureza política, re-nunciaria à missão transcendente que lhe competecumprir: restabelecer os valores do Cristianis-mo à luz da filosofia palingenésica. De modoque tudo quanto se faça para que o Espiritismopenetre no processo histórico da humanidade nãoserá senão cumprir com as diretrizes traçadaspor Kardec, quando falou da ação que o movimen-to espírita desenvolveria no que ele chamou deperíodo social.

O Espiritismo realizará na socieda-de o que já está realizando no religioso. Suavisão, com efeito, revolucionou o conceito clás-

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sico de religião; elaborou outra ciência reli-giosa, ultrapassando assim o estreito espaço dosdogmas e atingiu as profundezas do Espírito, atédemonstrar que o autenticamente religioso estána essência divina do indivíduo. Deste modo,diz-nos o saber espírita, se dá execução ao de-senvolvimento da Lei de Adoração. Do mesmo mo-do ele atingirá a essência dos fenômenos sociaise produzirá com suas luzes uma revolução socialsem necessidade dessa força catastróficaque determina a luta de classes, visto que a ge-rara por uma absorção pacífica dos fenômenoscontraditórios da sociedade, mediante a aplica-ção da Lei de Justiça, Amor e Caridade, mostran-do-se assim como feliz conseqüência os benefí-cios da Lei de Igualdade.

Por outro lado, é sumamente impor-tante a interpretação que o Dr. Jacob HolzmannNetto faz da ideologia de Gustavo Geley, esse in-signe codificador da filosofia cientifica do Es-piritismo, a qual se parece tanto, no social,coma de José Ingenieros, o talentoso pensador ar-gentino e mestre da juventude latino-americana.O pensamento de Geley pode proclamar-se como a Fi-losofia Espírita da Universidade Moderna, já quepossui elementos filosóficos adequados à juven-tude contemporânea. Cremos, por isso, que Kar-dec é o codificador espírita no universal, en-quanto Geley representa a expressão da Ciênciado Ser para a cultura universitária moderna. Mastanto Kardec quanto Geley se consubstanciam en-tre si pelas grandes raízes de uma mesma verdade.

Louvável, portanto, que HolzmannNetto haja penetrado no pensamento geleyano, jáque o grande sábio francês se encontrava olvida-do entre os estudiosos espíritas, até mesmo naFrança, de cuja situação só podemos excluir An-dré Dumas, o inteligente autor de "A Ciência da

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Alma". E uma obra como a de Gustavo Geley nãomerece tão ingrato esquecimento de parte do Ve-lho Mundo; mas nós outros confiamos em que os in-telectuais espíritas, especialmente a juventudelatino-americana, saberão reivindicar uma tare-fa filosófica tão importante como a do autordessa fonte inesgotável da filosofia palingené-sica, como o do livro "Do Inconsciente ao Cons-ciente", cuja solidez metafísica é capaz de re-sistir, como continuação que é da codificaçãokardeciana, às mais pujantes críticas do marxis-mo feitas à concepção idealista do homem e dahistória.

O Espiritismo é a única Ciência doEspírito que possui realmente duas naturezas paraestabelecer um autêntico conhecimento do Ser eda Sociedade, já que participa em sua elaboraçãocientífica, filosófica e religiosa do objetivoe do subjetivo, vale dizer, do visível e do invisível. Daí que só sua doutrina, dentro da cultura moderna, poderá dar ao Idealismo umaverdadeira base espiritual, o qual foi rechaçadocomo fator reacionário pela filosofia marxista.

Sem embargo, à luz do pensamentoespírita a visão idealista do homem e da socie-dade é uma realidade assentada sobre os fatosmediúnicos, especialmente nos de ideoplastia,tão bem estudados por Geley. É por isso que o marxismo perde vigor e validez científico-filo-sófica quando faz da Idéia um reflexo determina-do pela realidade material na mente do indiví-duo. De tal modo, o marxismo se limita antropo-logicamente ao reduzir o homem a um sujeito des-tinado á morte e ao nada. Coloca-se, assim, aonível dos demais sistemas cujas aspirações éti-cas deixam-se apresar nas garras de um niilismodesolador e anti-humano.

Se bem que não seja uma religião, o

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marxismo, não obstante, em suas concepções dia-léticas, abarca toda a vida do Ser e do Univer-so, pelo que toca nos maiores problemas metafísi-cos e religiosos. Por isso, ante a morte, o mar-xismo é uma ciência inerme e só se limita aapoiar-se em raciocínios naturalistas que em na-da diferem dos que nos dá o materialismo mecani-cista e vulgar.

A morte é soberana frente ao mar-xismo, razão por que toda sua ciência social fi-ca reduzida ao silêncio. O filósofo marxistasabe que seu mestre Karl Marx se perdeu parasempre nas sombras do nada e que seu Ser já nãoparticipa do desenvolvimento de sua ideologiano mundo. Mas a nova consciência da humanidadepede algo mais que a existência de um homem mor-tal: pede aos gritos um novo Ser, uma nova vi-são do Espírito e da História, uma nova formade existir que o vincule ao passado, ao presen-te e ao futuro através de um Ser eterno e atuan-te, nascendo, morrendo e renascendo para darforma a uma nova imagem da realidade históricaem cujo desenvolvimento seja ele um ativo e di-nâmico protagonista.

Contudo, o marxismo, apesar do vi-gor social que o caracteriza, é somente uma idéiana mente do homem, chamada, por lei de destrui-ção, a se extinguir e se perder entre as bru-mas da morte. Daí que o autêntico Socialismoestá na Idéia e no Espírito; vive em estado la-tente na natureza profunda dos seres e na reali-dade divina e criadora da palavra do Nazareno.Pois não haverá autêntico Socialismo sem a con-cepção espírita do homem e da sociedade, nem seaplacará a luta de classes enquanto a filoso-fia da história não souber que a criatura humana,como todo o existente, evolui do menos ao maispor meio de uma palingenesia dinâmica e criadora

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que aproxima o homem a Deus, até transfigurá-lototalmente como Espírito encarnado e desen-carnado.

Esta a razão pela qual o Espiri-tismo é a única base para o estabelecimento naTerra do Socialismo, tal como ressuma do Evange-lho de Jesus. O marxismo cumprirá, sem dúvidasua missão histórica, mas será o kardecismo quecompletará sua obra no que respeita à JustiçaSocial, para cuja tarefa aplicará no todo o pen-samento do Galileu, fonte inesgotável do maispuro e real dos sistemas socialistas.

O presente trabalho merece ser es-tudado à luz da situação histórica do nosso tem-po, pois (repetimos) a penetração do Espiritismona cultura e nas massas se dará mais facilmentepor meio do Humanismo Espírita que pelosfenômenos mediúnicos observados de um ponto devista exclusivamente científico. Porque entãoos gabinetes e laboratórios também abrirão suasportas aos deserdados, recordando que Jesus nãoficou inativo entre as penumbras da Sinagoga, se-não que se mesclou com o povo em meio ao qualrealizou sua divina obra de redenção humana.

O filósofo espírita deverá proce-der da mesma maneira e o Dr. Jacob Holzmann Netto,destacado intelectual brasileiro, assim o en-tendeu ao se defrontar com o vigor científico domarxismo contemporâneo.

Humberto MariottiBuenos Aires, novembro de 1969.

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Do apóstolo Paulo ao discípulo Timó-

teo na memorável epístola: "Ninguém despreze a

tua mocidade; mas sê o exemplo dos fiéis na pa-

lavra, no trato, na caridade, no espírito, na

fé, na pureza. Persiste em ler, exortar e ensi-

nar, até que eu vá. Não desprezes o dom que há

em ti, o qual te foi dado por profecia, com a

imposição das mãos do presbitério. Medita es-

tas coisas: ocupa-te nelas, para que o teu apro-

veitamento seja manifesto a todos. Tem cuidado

de ti mesmo e da doutrina: persevera nestas coi-

sas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a

ti mesmo como aos que te ouvem".

Caríssimos Irmãos em Cristo Jesus:

Que a Paz do Mestre Divino a todos nos envolva!

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1. O IDEALISMO FILOSÓFICO DE GELEY

a) Geley e Kardec

René Sudre, o célebre psiquistaque os espíritas tão bem conhecemos pela irredu-tibilidade em sua não-admissão da sobrevivênciaindividual e cujos conceitos Ernesto Bozzano re-futou com maestria na primorosa obra "MetapsíquicaHumana", editada em português pela FederaçãoEspírita Brasileira, teve ocasião de escrever —referindo-se ao Dr. Gustavo Geley e fazendo per-functória apreciação da filosofia geleyana, comoum tributo de admiração à memória do eminenteDiretor do Instituto de Metapsíquica Internacio-nal, que acabava de morrer em conseqüência deum estúpido acidente — René Sudre, dizíamos, te-ve ocasião de escrever que, "se a filosofia deAllan Kardec pode ser considerada como o ensinointrodutório do Espiritismo, a filosofia de Ge-ley é o ensino superior".

A afirmação de René Sudre, se en-tendida não no sentido de que Geley haja supe-rado e aposentado Kardec, mas no de que Geleydesenvolveu e aprofundou as teses de Rivail à luz dos conhecimentos novos e novas descobertasda ciência do primeiro quarto deste século, fa-rá justiça a um e outro, porquanto, em que peseseu escrúpulo — aliás, compreensível e legíti-mo, quando se atenta para sua posição de dire-tor de um instituto científico — de não se pro-nunciar abertamente sobre um tema que sabia lhecarrearia o repúdio da opinião oficial da ciên-cia, o Dr. Gustavo Geley foi um espiritista con-victo, aceitando do Espiritismo as três verda-des fundamentais (a imortalidade da alma, a re-encarnação e a comunicação com os mortos),e, tan-to quanto Kardec, que declarara ser de inteiravantagem a quem quer que se queira tornar espí-

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rita o estudo prévio da teoria, asseverando, em-bora sem menosprezo dos fatos, que se poderiaabstrair das manifestações mediúnicas sem que a doutrina deixasse de subsistir ("O Livro dos Mé-diuns", Iª parte, capítulo III, item 32), Geleyafirmou que a sobrevivência individual não é tanto demonstrada diretamente pelos fatos meta-psíquicos quanto o é indiretamente pela "síntesefilosófica racional" da evolução e do indivíduo.

Não obstante separados por uma ge-ração, Kardec e Geley sustentaram, pois, o mes-mo ponto de vista; e quem quer que conheça aobra de um e de outro há de reconhecer que omaior mérito do Dr. Gustavo Geley — dilatando, nãohá negar, a magnífica exposição metódica que o apóstolo lionês teve a audácia de propor numaépoca de encoscorado materialismo, onde o cepti-cismo era uma questão de moda e de bom-tom — foio de ter legado à posteridade seu esboço de umafilosofia racional palingenésica, que, corrobo-rando as assertivas de Kardec, promove autênticarevolução nos postulados assim da Fisiologiacomo da Psicologia, da Filosofia e das CiênciasNaturais, da Religião e da Moral, explicando o até então inexplicável, solucionando o angus-tiante problema do mal (pedra de toque de todasas teologias), revelando ao indivíduo a razãode seus sofrimentos, fundamentando a legitimidadede suas esperanças de justiça e fraternidade,e afirmando a realização da consciência eternano desenvolvimento infinito.

b) O Dinamopsiquismo de Geley

O idealismo filosófico de Geley,eminentemente dialético e ainda mais cientificodo que o sistema proposto por Oliver Lodge em"A Formação do Homem", ele o expõe em seu livro

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"Do Inconsciente ao Consciente", que tivemos a oportunidade de ler na edição argentina de "Cons-tancia", e repousa sobre dois postulados capitais:

1º) O que há de essencial no Uni-verso e no indivíduo é um dinamopsiquismo único,primitivamente inconsciente, mas que contém emsi todas as potencialidades de suas futuras me-tamorfoses: as aparências diversas e inumeráveisdas coisas não são mais do que meras repre-sentações daquele princípio; e

2º) O dinamopsiquismo essencial e criador passa pela evolução, do inconscienteprimitivo ao consciente realizador.

O Dr. Geley penetrou, assim, o conhe-cimento da teoria da unidade substancial, aoconcluir que "a forma não é senão uma ilusãotemporal", o que corresponde plenamente aosavanços da Física moderna, que hoje fala de mate-rialização e desmaterialização da energia, comoa Metapsíquica nos diz de materialização e des-materialização de forças psíquicas supranormais.

Em termos filosóficos geleyanos,portanto, o organismo não é o indivíduo; pelocontrário, não é mais do que a representaçãodesse indivíduo: "o complexo orgânico se nosoferece não como o indivíduo completo, senãocomo um produto ideoplástico do que há de essen-cial no indivíduo — um dinamopsiquismo superior,que é o próprio indivíduo em sua essência".

Considerando o eu como um dinamo-psiquismo essencial, Geley destruiu as já frá-geis noções da Psicologia clássica, que o tomamcomo a soma de estados de consciência, e concei-tuou, sempre assentando suas conclusões sobreos fatos, que o dinamopsiquismo inconsciente ou

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subconsciente tende, pela evolução, a converter--se em dinamopsiquismo consciente. Segundo suaconcepção, o progresso espiritual e psicológiconão é outra coisa que não a conversão dos conhe-cimentos em faculdades, as quais se adquirempor experiências, através das vidas sucessivas,na evolução palingenésica do ser. Da mesma for-ma, a evolução é, para Geley, "a passagem do in-consciente ao consciente no Universo": "quanto o indivíduo, também o Universo deve conceber-secomo representação temporal e como dinamopsi-quismo essencial e real; assim como o organismonao é senão um produto ideoplástico de um dina-mopsiquismo essencial, o Universo não se apre-senta senão como a formidável materialização dapotencialidade criadora".

De acordo com esse principio, aevolução se resume a um processo de aquisição daconsciência, tanto no microcósmico quanto no ma-crocósmico, o que explica muito melhor as facul-dades evolutivas do que é capaz o transformismoclássico e faz compreender como o mais podesair racionalmente do menos, posto que a imanên-cia criadora, que está na essência mesma dascoisas, possui todas as capacidades potenciaisde realização.

"O indivíduo, o ser aparente, subme-tido ao nascimento e à morte, limitado em suascapacidades, efêmera em sua duração — proclamaGeley — não é o ser real, mas tão só uma repre-sentação ilusória, atenuada e fragmentária: o ser real, aprendendo pouco a pouco a conhecer-see a conhecer o Universo, é a chispa divina nocaminho de realizar sua divindade, infinita emsuas potencialidades, criadora, eterna. Tambémno Universo manifestado, as diferentes aparên-cias das coisas são meramente a representaçãoilusória, atenuada e fragmentária da unidade

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divina,a realizar-se majestosamente numa evoluçãosem fim. A constituição dos mundos e dos indi-víduos não é senão a realização constante eininterrupta da consciência eterna, por via damultiplicidade progressiva de criações temporaise de objetivações sucessivas no tempo e noespaço".

E é então que o gênio de Geleyopõe seu idealismo filosófico à estreiteza con-cepcional do existencialismo ateu, que nos ar-rasta, irresistivelmente, pela perspectiva inal-terável da morte e do caos, ao mais negro pessi-mismo: "existes efemeramente, constróis sem es-perança e sem objetivo, lutas sem sentido nemdireção, vives para morrer!" Contra tão cru e amargo pessimismo filosófico, só o ensino e a idéia da doutrina palingenésica podem subsistir,devolvendo ao homem seu amanhã e substituindo a visão do nada pela da imortalidade e progresso.Assim, afiançava Geley, "tudo se esclarece: astumbas deixam de ser tumbas; são asilos passageiros para o fim da jornada das ilusões. E assimcomo se desvanece, pela idéia palingenésica,o caráter fúnebre da morte, também assim sederrói o monumento de injustiça edificado peloevolucionismo clássico. Já não há na evoluçãosacrificados nem privilegiados. Todos os esfor-ços individuais e coletivos, todos os sofrimen-tos e amarguras desembocarão na realização dajustiça e na preparação do bem; mas o bem e a justiça para todos, porque todos teremos contri-buído para a justiça e o bem."

"O objetivo da evolução — concluíaGeley — é a aquisição da consciência, a pas-sagem indefinida do inconsciente ao consciente;e é por meio dessa passagem que se desenvolvemtodas as potencialidades imanentes, configurandoa realização coletiva, na evolução, da soberanaInteligência, da soberana Justiça e do sobera-no Bem!"(1)

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2. O MARXISMO COMO DIALÉTICAE COMO MATERIALISMO

Não nos teríamos aventurado a estabreve e imperfeita incursão nas teorias do Dr.Geley — cuja obra, para a melhor compreensãodo que vos dissemos, recomendaríamos procu-rásseis conhecer em apoio de vossa erudição e co-nhecimento do Espiritismo em seu aspecto filosó-fico — senão como introdução necessária à nossatentativa de demonstrar ser o Espiritismo aúnica doutrina, de quantas se rotulam de espiri-tualistas, capaz de fazer frente ao materialismodialético, cujas conquistas no campo social,de irresistível poder persuasivo, avançam e sesobrepõem à civilização pseudocristã, mas quesó o Espiritismo poderá completar validamente,deslocando-as na consecução de objetivos infini-tamente mais amplos.

Ora, nos dias que correm, o materia-lismo dialético atinge suas culminâncias , e asatinge porque a experiência tem evidenciado queseu método de conhecimento se apresenta, ao me-nos até aqui , como o único que pode determinaruma transformação social que propicie a ereçãode um novo tipo de sociedade, apto a realizarum maior índice de justiça social pela proprie-dade coletiva dos meios de produção. Todavia,segundo seus princípios, o homem não é mais umaentidade que conduz a marcha dos fenômenos so-ciais: é uma simples máquina manobrada pelasforças exteriores. É a matéria que tem proemi-nência sobre o espírito. "A matéria — disseLênin — a natureza, o ser, o físico, é o primá-rio; e o espírito, a consciência, a sensação, o psíquico, é o secundário". Toda a dialéticamaterialista parte desse pretendido predomínioda matéria sobre o espírito, ficando este condi-cionado àquela.

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Ao contrário, na dialética de He-gel, o grande filósofo idealista alemão dosprincípios do século XIX, os fenômenos mate-riais outra coisa não são que objetivações daIdéia, e o mundo subjetivo se desenvolve por umalei de contradições que se opera através de umatese, de uma antítese e de uma síntese. Em prin-cípio, a filosofia hegeliana corresponde ao mesmoprocesso da filosofia palingenésica do Espiri-tismo, conforme o próprio Geley admitiu expressa-mente. Com efeito, para Geley o Absolutode Hegel chama-se dinamopsiquismo, o qual evolvedo inconsciente ao consciente, de modo que o espírito absoluto do filósofo alemão e o dinamo-psiquismo essencial do metapsiquista francês de-finem uma mesma entidade, e as três fases dadialética hegeliana (tese, antítese e síntese)correspondem, respectivamente, à trilogia espíritado nascer, morrer e renascer.

Sabe-se, por outro lado, que KarlMarx, seguido por Friedrich Engels, inverteu o sentido original da dialética hegeliana, crendocom isso demonstrar que o mundo material é quedetermina e condiciona a realidade espiritual.O marxismo — ou antes, o materialismo dialético— comporta, pois, um duplo estudo:

1º) como dialética; e 2º) como materialismo

Estudado como dialética, aproxima--se extraordinariamente do Espiritismo, em suafeição dialética proposta por Geley, que conser-va daquela os quatro grandes princípios funda-mentais:

1º) tudo se relaciona, ou "lei daação recíproca e da conexão universal";

2º) tudo se transforma, ou "leida transformação universal e do desenvolvimentoincessante";

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3º) a mudança qualitativa; e 4º) a luta dos contrários,como fun-

damento e móvel de toda evolução.

Todavia, estudado como materialismo,já o marxismo se distancia erroneamente do Espiritismo dialético, por isso que vem definido por duas características que repugna a este:

1º) a materialidade do mundo; e 2º) a matéria é anterior à consciência.

Partindo daí, pretende o marxismo formular uma concepção científica do mundo; mais ainda, a única científica, isto é, a única que está conforme ao que ensinam as ciências. E, por conforme ao que ensinam as ciências, apresenta-se como uma visão total do homem e do mundo. Mas essa visão do mundo e do homem, em que pese a pretensão dos teóricos do marxismo, está muito longe de ser total, e nisso consiste sua maior falha; está longe de ser total porque des-conhece, ou finge ignorar, os progressos da Pa- rapsicologia e, ipso facto, a realidade metapsí- quica do homem, que hoje não mais comporta dúvi- das. Efetivamente, ainda que os parapsicólogos modernos não reputem suficientemente provada a sobrevivência individual, reconhecem que a mente transcende a matéria, ou seja, transcende as limitações do tempo e do espaço, o que vale por um desmentido cabal da clássica afirmação de Engels, um dos filósofos do materialismo dialé- tico, de que "as formas essenciais de todo ser são o espaço e o tempo, e um ser fora do tempo é um absurdo tão grande quanto um ser fora do espaço". As mais recentes constatações da Para- psicologia rechaçam, portanto, a concepção mate-rialista do universo e revalidam a posição doEspiritismo, que encontra naquela sua sanção

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perante a ciência de nossos dias.

a) Os Dogmas doMaterialismo Dialético

Um estudo despretensioso, qual o a que vimos procedendo, não comporta uma refuta-ção completa dos dogmas do materialismo dialético,que já se tornam insustentáveis em face doavanço da ciência metapsíquica; e dissemos dogmasmas propositadamente, embora isso muito escanda-lize aos teóricos do marxismo, porque afirmar,como questão de fé, a materialidade do mundo,quando a Parapsicologia faz essa afirmaçãoresultar assaz discutível, é uma atitude tão dog-mática quanto a do Espiritualismo religiosoclássico, que parte de verdades reveladas eestabelecidas a priori, às quais os fatos deveriamadaptar-se a posteriori . Vemo-nos assim forçadosa fugir, pela exigüidade de tempo, à atraentetarefa de refutação dos dogmas do materialismodialético, preferindo antes remeter-vos à leiturade duas obras que executam essa tarefa demaneira completa e brilhante: "EspiritismoDialético", de Manuel S. Porteiro, e "Parapsicolo-gía y Materialismo Histórico", de HumbertoMariotti, ambas publicadas por "Editorial VictorHugo", de Buenos Aires.(2)

Digamos apenas que os teóricos domarxismo erram ao basear seu sistema na descon-tinuidade biopsíquica, esquecidos de que a des-continuidade morfológica não importa necessaria-mente a descontinuidade da vida. Em todo servivente (e pelo simples fato de ser tal), há umelemento substancial psicodinâmico, que trans-cende a matéria e as limitações do espaço e dotempo, como o demonstram as pesquisas parapsico-lógicas; há um elemento substancial psicodinâmico,que permanece essencialmente idêntico a si

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mesmo, apesar de sofrer modificações e estar su-jeito à lei de evolução e perfectibilidade. A evolução não tem o poder de mudar a essenciali-dade das coisas; supõe, ao contrário, uma causa-lidade essencial, sem a qual não se concebenenhum desenvolvimento progressivo. O movimentoe o tempo não podem criar, por si sós, o quenão existe: só evolve o que tem existência po-tencialmente ou em desenvolvimento. Não se passado não-ser ao ser, nem da quantidade à qualidade,senão em virtude de uma existência e uma quali- dade análogas anteriores, de uma causalidadesubstancial que as compreende, desenvolve emodifica. Não se pode conceber nenhuma trans-formação, nenhuma mudança morfológica fundamen-tal, sem uma causa essencial persistente, semcontinuidade biopsíquica, sem um elemento orga-nizador e diretor da matéria, que leve em simesmo, potencialmente, as possibilidades de suasfuturas metamorfoses.

"Como — pergunta o Dr. Geley — oréptil, antepassado da ave, teria podido adap-tar-se a um meio que não era o seu, nem poderiasê-lo senão depois da passagem da forma-réptilà forma-pássaro?" Sem dúvida, tal mudança fun-damental de forma não pode efetuar-se em funçãoda necessidade, porque o réptil não tinha neces-sidade de voar nem por acaso; porque o acasonão lograria operar o milagre de transformar umréptil em ave, nem muito menos porque a matériativesse desejos de criar asas e voar. Esse fatoreclama uma causa essencial, um poder psico-dinâmico que obre de acordo com um fim, uma con-tinuidade biopsíquica que condicione o organismo,ainda que à força de tentativas e erros, a novaforma de vida. "À concepção da evoluçãotão somente pela ação dos fatores externos, o testemunho do inseto — diz o Dr. Geley — opõesuas transformações, suas metamorfoses formidáveis

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e, por assim dizer, espontâneas, dentro deuma crisálida fechada, subtraída em grande par-te à ação dos fatores exteriores. À concepçãoda evolução contínua e ininterrupta por assimi-lação funcional, o testemunho do inseto opõesuas alterações progressivas e regressivas duran-te sua vida larval e opõe, sobretudo na crisálida,o incrível fenômeno da histólise, reduzindoa maior parte de seus órgãos a uma papa amorfa,antes das transformações iminentes". O resultadodesses fatos (e de muitos outros análogos) éque tais metamorfoses, necessárias à morfologiado inseto perfeito, reclamam um princípio dire-tor, inalterável e imanente, ou seja, a continui-dade biopsíquica, através das formas e qualida-des passageiras.

A causa essencial da evolução nãoestá, pois, na influência do meio exterior, nemnas reações da matéria orgânica em presençadessa influência, mesmo que o meio atue como fatorsecundário ou como causa da transformação, mas numdinamismo psíquico biocêntrico, independente,superior e diretor da matéria orgânica — o prin-cípio essencial da vida, que Leibnitz entreviuna concepção da "mônada" e Claude Bernard confi-gurou na "idéia diretriz": em última análise, o princípio anímico, o elemento Espírito, que evolveindefinidamente do inconsciente ao consciente.

A continuidade biopsíquica não im-plica a continuidade morfológica: as formas pas-sam e desaparecem, mas a vida psíquica permane-ce essencialmente a mesma; é ela que se aperfeiçoae evoluciona, dando progresso e perfeição rela-tivos às formas que cria e desenvolve, e, quandoestas chegam ao máximo de seu desenvolvimento,desaparecem ou se fundem em outras sob a açãopsicodinâmica do ser vivente, que as trabalha

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para a realização de um fim específico ou quetranscende o limite da espécie. As espécies,tanto quanto os indivíduos, podem desaparecer e deixar nos fósseis os vestígios de sua existên-cia, mas a vida psíquica que as animava persis-te em outras espécies próximas, em outras indi-vidualidades, sem deixar de ser a mesma vida, o mesmo dinamopsiquismo, a mesma essência.

De maneira que, à semelhança do ma-terialismo dialético, também o Espiritismo con-sidera toda forma material em estado de movimen-to: na evolução, tudo é trânsito para lograr for-mas e qualidades novas, tudo está em perpétuovir a ser, sem ser nunca coisa perfeita, defini-tivamente acabada. Todavia, ao contrário daquele,o Espiritismo dialético supõe o Universo mate-rial e todas as formas dos seres objetivos,animados de um dinamismo biopsíquico que não sealtera em sua essência. O que muda e se trans-forma continuamente são as formas e qualidades,não a essência íntima das coisas.

Como? — perguntará o materialista,para quem o espírito e seus atributos outra coisanão são além do resultado da fisiologia cerebral.Como? Pode existir alma, espírito, consciênciaetc., sem sujeito, isto é, sem cérebro? Osespíritas afirmamos que sim, e os fatos nos dãorazão. São numerosos, nos anais médicos, oscasos de indivíduos que viveram e pensaram, porlongo tempo, com o cérebro feito papa, seccionadono bulbo ou convertido em tumor ou água, fatosque desmentem a mitologia das localizaçõescerebrais absolutas. O cérebro, portanto, nãocria coisa alguma; é mero instrumento de mani-festação de um princípio que o dirige e ultra-passa. A matéria, em suas múltiplas e variadasformas vitais, não é criação, porém manifesta-ção de vida. E a vida psíquica insufla todos os seres viventes e se manifesta de diversos modos

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e em diferentes graus de desenvolvimento. Nadaé, pois, absolutamente descontínuo na evolu-ção da vida em si: só a aparência das formas ma-teriais transitórias pode sugerir tal desconti-nuidade. Ao contrário, tudo se encadeia e ten-de para a unidade, numa aspiração teleológicaconstantemente renovada pelo poder psicodinâmicodo espírito, que evolve infinitamente.

b) A Economia como Fator Essencialdo Determinismo Histórico

O materialismo dialético, negandoa continuidade biopsíquica, nega conseqüentementea finalidade da vida e incide no mesmo errodo existencialismo ateu: o homem resulta um sercriado para a morte e o nada, conseqüência lógicade suas premissas e que muito lhe amesquinhaa pretendida visão total do homem e do mundo.

Mas onde essa visão se torna clara-mente insuficiente é quando se põe a examinara história, cuja força motriz o marxismo concen-tra exclusivamente no fator econômico. Para Marxe Engels, a história da humanidade é a históriada luta de classes, a qual repousa na base eco-nômica da sociedade e não na consciência dos in-divíduos, como se, suprimindo-se a consciênciados indivíduos, pudesse haver luta de classes...De acordo com esse conceito, a humanidade nãose move essencialmente senão por necessidadesmateriais, dependendo destas as necessidades deordem espiritual, e não persegue nenhuma finali-dade: o fator essencial da evolução humana nãoradica no homem, em nenhum princípio de justiçainerente a sua natureza psíquica, não está nacausalidade eficiente e teleológica (o espírito),que leva em si mesma o

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poder virtual de modificar

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sua existência e aperfeiçoá-la, condicionandoos meios a seus fins, a suas necessidades ma-teriais e espirituais, ou adaptando-se às condi-ções naturais e do meio social já estabelecidas,com a tendência ou predisposição para melhorá--las. Na conceituação marxista, o fator essen-cial do determinismo histórico é a economia: o modo de produção material de uma época determi-na o modo de pensar dessa mesma época. A econo-mia e a infra-estrutura de toda sociedade: ciên-cia, filosofia, religião, moral, ideologia sãoa super-estrutura, o reflexo da economia, seusepifenômenos, seus derivados. Segundo esse de-terminismo materialista da história, o materialcondiciona e determina o espiritual, a sociedadedetermina e condiciona o indivíduo, e este nãoé mais do que um produto da sociedade, comoo espírito é um mero produto da matéria.

O materialismo histórico se apre-senta, assim, ainda que a isso reajam os teóri-cos do marxismo, como um determinismo fatalista,cuja força motriz é o fator econômico: nele, o cego (a matéria) comanda o que vê (o espírito);o acaso supre a consciência e a inteligência, o poder psicodinâmico teleológico das forças revo-lucionárias individuais e coletivas. E é de-terminismo fatalista porque os próprios teóri-cos do marxismo o fazem ressaltar inconsciente-mente como tal, seja Lafargue, quando diz queas forças econômicas da produção capitalista ar-rastam fatalmente a sociedade ao socialismo; se-ja Marx, quando sustenta que, no conflito dosinteresses sociais, as vontades e os propósitospessoais se entrechocam e se anulam, e o que re-sulta é aquilo que ninguém quis nem desejou; se-ja finalmente Engels, quando coloca a causa es-sencial e determinante do progresso "atrás" efora do homem, impulsionando-o ao acaso. Determi-nismo fatalista, sim, porque obedece à cega

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necessidade, a qual, por ser cega (como o acaso),é tão anticientífica quanto este e não sabe pa-ra onde vai nem porque vai; determinismo fata-lista, em contraposição às aspirações teleológi-cas do Espiritualismo religioso clássico, que étambém, por lógica, determinista e que — diga-sede passagem — embora irracional, tem ao menos a vantagem de saber aonde vai e o que quer...

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3. O CONCEITO DINAMOGENÉTICO DA HISTÓRIASEGUNDO O ESPIRITISMO DIALÉTICO

O marxismo — ou antes, o materia-lismo histórico — queiram ou não seus teóricos,oferece-nos uma visão apenas parcial e insufici-ente da história. Bem mais amplo é, entretanto,o conceito dinamogenético da história que nospropõe o Espiritismo dialético: tanto quanto noUniverso, também na história tudo se move e setransforma em constante renovação, nada é perma-nente e igual a si mesmo em dois momentos histó-ricos diversos, mas tudo vem a ser, mudando per-petuamente de lugar e de tempo, de quantidade e de qualidade; a história não se repete e não sedetém, nem há nela dois fatos idênticos ou quepossam ser transplantados a diferentes meios e épocas com idênticos resultados; tudo se modificasem cessar, sob a ação da lei dos contrários(fundamento, móvel e razão de ser de toda evolu-ção), pois que, sem a luta de dois princípiosaparentemente antagônicos, mas que se complemen-tam e se solidarizam na consecução de um únicoobjetivo, não se pode conceber a evolução, senãoa inércia, o eterno repouso. Tudo, pois, se re-nova continuamente, tanto nos indivíduos comonos povos, no material e no espiritual, elevan-do-se de umas formas a outras mais perfeitas, deum progresso a outro progresso maior, que resu-me os progressos anteriores, e de uma civiliza-ção a outra mais pujante, que representa a sín-tese de dois regimes antagônicos a se fundiremnum terceiro, distinto de ambos e que marca umnovo ciclo na história da humanidade.

Todavia, esse movimento progressi-vo incessante não se realiza mecanicamente, nemtao só em função dos fatores materiais, que sãocausas concorrentes, mas não a causa essen-cial da evolução. O homem não é um veículo quea necessidade empurre por detrás e ao acaso, como

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pretendem os mestres do materialismo histórico,porém leva em si mesmo a força motriz e direto-ra de suas decisões, capaz de dominar as forçasmateriais da história, de reagir contra o meio,contra a estrutura econômico-social, e traçarnovos rumos à sociedade.

De modo que, tanto quanto o mate-rialismo histórico, o Espiritismo considera osfenômenos históricos em seu movimento causal, en-cadeando-se harmonicamente uns aos outros; contu-do, por motivos de ordem científica e filosó-fica, evidenciados nos fenômenos biológicos epsíquicos, repele a causalidade cega a impulsio-nar a evolução ao acaso.

Se há progresso no desenvolvimentoda humanidade, esse progresso deve obedecer ne-cessariamente a uma lei — lei de ordem forçosa-mente intelectual — em virtude da qual os fenô-menos históricos se encaminham a um fim cadavez mais elevado; e esse fim, indefinido, reclama— também necessariamente — uma direção. Pois, se não existira progresso nem finalidade,nem conseqüentemente direção, o mecanicismo, o fatalismo histórico se imporia iniludivelmente,e os teóricos do marxismo não negam o progresso,antes o desejam e o apontam na construção do co-munismo. Ora, porque o progresso é evidente, a sociedade não é um simples mecanismo, nem os ho-mens são meras engrenagens que se movem, cega-mente, ao impulso de forças exteriores. Ao con-trário, a sociedade é também um dinamopsiquismo,que põe em movimento os elementos da vida mate-rial e ao qual cada indivíduo vem somar sua co-ta de esforço ao progresso adquirido, com a con-tribuição de sua vontade e sua inteligência, comsuas idéias, seus sentimentos e ações.

Não há, é certo, na sociedade humana,uma finalidade de conjunto, nem poderá haver

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enquanto os interesses e as aspirações nãosejam comuns. É que a direção da sociedade nãodepende da própria sociedade em seu todo, masdos indivíduos e coletividades cujas ideologiasrevolucionárias marcham na vanguarda do progressomoral e social, terminando por impor-se à consciência dos povos. São as tendências parti-culares — individuais e, por afinidade, tambémcoletivas — as que, triunfando das tendênciasgerais e, por isso mesmo, conservadoras, traçamdireção à sociedade; e quando essas tendênciasparticulares se generalizam e vencem as contra-dições do processo social, tornando-se por suavez conservadoras, outras tendências — intér-pretes de novas necessidades tanto materiaisquanto espirituais e com uma visão mais avançadado progresso — nascem em seu seio e imprimemnovo rumo à sociedade. E assim, de ciclo em ci-clo, a humanidade se eleva de umas formas a ou-tras cada vez mais perfeitas, de um progresso a outro maior, de uma civilização a outra civilização.

Na marcha da humanidade, desde seualvorecer até o presente, houve relações, enca-deamentos, influências e determinismo, porémnão houve coordenação universal de propósitospara atingir um fim social comum, conscientementedeliberado pela totalidade de seus membros. Avisão desse fim é individual — e, por afinidadeideológica, coletiva — e se deve aos indivíduosmoral e intelectualmente mais capacitados,cujo poder de intuição fá-los superar os hori-zontes alcançados pela maioria. Portanto, se háum determinismo histórico — e os espíritas o reconhecemos desde Allan Kardec (leia-se o capí-tulo final de "A Gênese") — esse determinismonão vai ao ponto de anular o livre-arbítrio, nemsequer está absolutamente condicionado ao fatoreconômico, que é apenas um dos muitos fatores,

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de natureza material e espiritual, que intervémno processo da história (especial e essencial-mente, o fator-homem, sem o qual não há econo-mia social), cabendo aos indivíduos que persi-gam ideais de emancipação econômica e social,conseguintemente, confiar mais em suas forçasespirituais, em seu valor moral, em suas idéias,do que no cego determinismo econômico que,por isso mesmo que é cego, reclama direção efinalidade .

O marxismo, encarando a históriado ponto de vista objetivo e o Universo por viadas ciências empíricas e experimentais, além dealhear-se às conclusões da Parapsicologia, que o sucedeu no desenvolvimento científico da humani-dade, não descobre senão fatos, causas fenomeno-lógicas e relações causais, mas a lei geral e complexa, a causalidade essencial do Universo e da história lhe escapa. O mundo fenomenal nãose explica por si mesmo. Para ter conhecimentocabal das coisas em particular e do Universo emgeral, há que remontar do fenômeno ao princípiosubstancial, do visível ao invisível, da formaà idéia, da matéria ao espírito, desentranhandoa lei que rege e unifica o verdadeiro conceitognoseológico tanto da história como do Universo.Quando considerem a história da humanidadecomo a continuidade de um processo biológicoe histórico, evolvendo através de formas de vidae de sociedade enlaçadas em suas relações cau-sais e transmudando em formas superiores e cadavez mais perfeitas, e ao mesmo tempo como umprocesso espiritual, através de sucessivas exis-tências encarnadas nas formas biológicas, masencadeada a causalidade espírita dessas existên-cias no determinismo histórico, então os histo-riadores terão principiado a conhecer as verda-deiras raízes da história.

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a) A InterpretaçãoHomem-Sociedade

Se, para o materialismo econômico,as gerações que se sucedem no desenvolvimentohistórico são estranhas e desvinculadas umasdas outras, vindo do pó para ao pó retornar, jáo Espiritismo afirma, com base nos fenômenos me-tapsíquicos, que o homem não é somente um produ-to fisiológico a desenvolver-se em determinadomeio geográfico e social, limitada sua trajetó-ria ao curto período que separa o berço da tum-ba, mas é sobretudo um espírito imortal, quetranscende os limites da existência terrena; pre-existe ao nascimento do corpo e sobrevive a suadestruição. A evolução do espírito se processainfinitamente, em existências sucessivas, atra-vés do tempo e do espaço, do que resulta que cadaespírito humano, no conceito reencarnacionista,tenha seu determinismo próprio, sua causalidadepsíquica e moral, seu próprio processo evolutivo;porém todos esses processos individuais seencadeiam uns aos outros e se renovamsem cessar, seguindo ao mesmo tempo o determi-nismo da história. Assim, nessa incessante renova-ção da humanidade e de seus valores morais e in-telectuais, cada ser que volta ao mundo engrenasua própria causalidade no determinismo histórico;e do conjunto de todas as séries causais seforma um determinismo mais amplo, que solidarizao mundo espiritual com a humanidade corpóreaem perpétua e reconfortante interpenetração.Matéria e espírito, sociedade e indivíduo, meio e homem reagem reciprocamente um sobre o outro,complementando-se na consecução de um único ob-jetivo: a evolução universal. Tanto o meio agesobre o indivíduo quanto este age sobre aquele:uma vez no plano terrestre, o espírito fica não

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apenas vinculado à matéria e sujeito a suasleis e necessidades, como ainda ao determinismoda história, dentro do qual deve evoluir edesenvolver o curso de sua existência; todavia, o determinismo histórico depende, por sua vez, dadireção que lhe tracem as novas influênciasindividuais, que serão tanto mais benfazejas àhumanidade quanto mais evolvidos intelectual emoralmente sejam os indivíduos e mais empreende-dora a atividade que exercitem nessa direção.

Em síntese, o Espiritismo dialéticoconclui que, se a estrutura político-econômicada sociedade, o meio social, a educação etc.exercem poderosa influência sobre os seres quese engrenam no desenvolvimento histórico, comvistas a um fim inconscientemente previsto edesejado, mas só gradativamente cognoscível erealizável, esses mesmos seres, por sua vez, comsua influência pessoal e também coletiva, trans-formam, constantemente ou de súbito, a estruturapolítico-econômica da sociedade, o meio e a educa-ção, e dirigem o determinismo histórico àquelefim, sempre perfectível, por meios cada vez maisjustos e elevados. E é assim que, conciliandoo determinismo histórico com a lei de causalidadeespírita (karma), o Espiritismo define suaideologia própria, que se distancia a um sótempo do individualismo histórico de Emerson e do fatalismo histórico de Santo Agostinho, quenão é nem o puro idealismo de Hegel, com o qualse identifica parcialmente, nem é o materialismoabsoluto de Marx e Engels, cujas verdadesparciais lhe aproveitam, mas configura a síntesemaior do conhecimento humano, lançando novaluz sobre a grande questão do nosso século: oavanço irrefragável do socialismo, com uma esca-tologia fascinante e de forte apelo humanista,que ameaça destruir o imobilismo espiritualista.

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4. A FALÊNCIA DO ESPIRITUALISMORELIGIOSO CLÁSSICO

Por divorciada da realidade socialde nossos dias, sente-se o esvaziamento progres-sivo e alarmante da fé religiosa, o que bem re-flete a insuficiência dos credos tradicionaispara responder às ânsias libertárias do homemhodierno. Por isso mesmo, teóricos religiososdas mais variadas confissões eclesiásticas com-batem ferrenhamente o marxismo, fazendo-o to-davia mais no interesse de um "partidismo deigreja", como diz o Dr. Humberto Mariotti, do queno interesse universal da humanidade. Os credosda atualidade, misoneístas quando não retrógra-dos, lutam pela manutenção do status quo e nadefesa de seus privilégios milenares, mas estãoinabilitados a enfrentar o marxismo numa dis-cussão filosófico-científica, porquanto se baseiamem verdades reveladas, impostas pela fé cega e que não admitem qualquer discussão. Atacar sis-temas partidariamente, fugindo à discussão eapenas por temer a morte numa tentativa desen-freada de sobrevivência às realidades novas, é atitude irracional e anticientífica.

Ora, o espiritualismo religiosoclássico sustenta a existência do espírito, masnão a prova nem a pode provar, a menos que sedisponha a aceitar a ciência espírita como basede suas afirmações, coisa que dificilmente fará,por intransigente na salvaguarda de seus dogmas;mas, se a existência do espírito é uma irrealidade,todo o sistema religioso dominante resultacomprometido e carunchado, garantindo a vitóriado materialismo e, conseqüentemente, do marxismo.Enquanto isso, a ideologia marxista sefundamenta na ciência experimental, de que faz

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derivar suas conclusões materialistas, referentesà origem da vida, e unicamente uma contraprovacientífica poderia obrigá-la a mudar de orienta-ção. Sim, porque, se o marxismo repele a espi-ritualidade do mundo e da história, não o fazpor ódio a essa idéia, mas simplesmente porquenem a Igreja nem o idealismo lhe fornecem a provaexperimental da realidade espiritual do homeme também, forçoso é reconhecer, porque identifi-cou, com boa dose de razão, a ideologia espiri-tualista à submissão econômica e social dohomem aos regimes reacionários e conservadores,dos quais ela tem sido o sustentáculo, mantendoa consciência social imersa na ignorância e nasuperstição, no fanatismo, e jamais favorecendoa liberdade e o direito das classes desprotegidas.

Em verdade, só o Espiritismo é capazde forjar um realismo espiritual que suplanteo realismo marxista, opondo fatos a fatos e demonstrando, através dos fatos, que o metafísicoexiste e é uma realidade. E, quando a pugna se resume a uma luta entre o espírito e a matéria,o Espiritismo não pode nem deve calar-se:cabe-lhe intervir na discussão e provar a insufi-ciência do marxismo como visão total do homeme do mundo.

a) A Razão de Serdo Homem de Marx

Entretanto, lembra com propriedadeo Dr. Humberto Mariotti, o homem de Marx, emboraconcebido como um mero composto físico-químico,como um organismo material governado e conduzidopelos modos de produção, revela-se já melhordo que o "homem velho", dependente da exploração

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capitalista e forçado a vender sua força de trabalho como mercadoria. O homem de Marx,teoricamente, é um ser liberado da exploraçãoeconômica, mas cumpre se lhe aditem as virtudesde que ainda carece: é um homem insuficiente,porque sem perspectivas metafísicas e amesqui-nhado em suas dimensões espirituais, incapaz desatisfazer o anelo de imortalidade que o espíritohumano alimenta em suas entranhas. Marx exigiumais desse homem do que lhe podia ofertar:esqueceu que um homem chamado a promover a transformação do velho mundo e convulsionar a sociedade decadente, a construir o mundo dofuturo, não devia morrer. O homem de Marx, quetermina na morte e no nada depois de se haversacrificado pela ereção de uma civilização maishumana e mais justa, não tem quaisquer vincula-ções palingenésicas com o processo histórico:nasce e morre desconhecendo o sentido da luta e a finalidade de sua existência. O desejo deemancipar o homem da escravidão econômica, a fimde alçá-lo à condição de cidadão livre e enobre-cido pela nova ética do trabalho, levou Marx a bosquejar um homem sem implicações com o espiri-tual e o eterno. Crendo que o espírito repre-sentava um entrave para o advento de uma socie-dade sem classes, porque tanto o filósofo idea-lista quanto o religioso sufocavam as reivindi-cações dos oprimidos ao falar-lhes de uma hipo-tética felicidade ultraterrena, com o que legi-timavam a indiferença e o egoísmo dos opressores,o autor de "O Capital" preferiu matar ohomem espiritual e suas poéticas esperanças derecompensa no mais além, atendo-se tão somente à realidade das coisas objetivas, e concebeu umhomem material, cujo destino não ultrapassa suamorte física. Marx acreditava que a verdadejamais submete o homem, antes o eleva e melhorasuas condições de vida social, e sentiu que otipo de verdade espiritual que pregavam os teóri-cos do cristianismo, pelo menos até meados do

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século XIX, era o que convinha à exaltação dospotentados sobre as agruras dos humildes. Rechaçou,portanto, essa verdade espiritual sancionadapela estrutura social vigente e chegou àconclusão de que a única realidade se encontrano mundo físico e na vida material do homem,sustentando que a ciência e a verdade libertam oindivíduo e que toda idéia religiosa, tendentea sujeitá-lo com vãs promessas pós-mortais, é uma falsa verdade, ou um argumento das forçasreacionárias para deter o advento da justiçasocial e da democracia. Todavia, se o homem deMarx — assim justificado — é um erro em seuaspecto espiritual, é não obstante uma verdadeem sua face social: o gênio de Marx demonstroua inteligência humana que o socialismo, ou oregime da propriedade coletiva dos meios deprodução, é o que melhor atende aos anseios deliberdade e justiça da nova humanidade.

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5. A CONCILIAÇÃO DO SOCIALISMOCOM A REALIDADE ESPIRITUAL

a) Materialismo e Socialismo

Karl Marx, ao erigir o socialismoque ele classificou de científico em contraposi-ção ao socialismo utópico de seus precursores,julgou ser irreconciliável o socialismo com a realidade espiritual do homem; contudo, ao con-trário do que ele supôs, o materialismo não é de modo algum essencial nem ao socialismo e nemà ciência, e é mesmo uma lástima que a palavrasocialismo esteja hoje comprometida com a ideo-logia marxista como um todo, pois que a comuni-dade de bens, ou propriedade coletiva, antes queao marxismo pertence, como sistema social, aoprimitivo cristianismo. Marx e Engels criaramo socialismo científico sobre os alicerces daciência de sua época; por isso, suas teoriasassumiram uma forma necessariamente materialista.Aplicando-se unicamente à consideração do mundomaterial, que é apenas um dos aspectos da reali-dade, a ciência do século XIX foi materialistae, além de materialista, foi também dogmática,como dogmático é o marxismo. Hoje, porém, aciência enfrenta problemas e enigmas antesinsuspeitados e que a forçam a abandonar suacrença acentuadamente materialista: a técnicamoderna pôs o homem em contacto com aspectos novosda realidade e, em face da Física quântica e dateoria da relatividade, até o conceito clássicode matéria perde seu sentido e sua razão de ser;a Medicina é agora psicossomática; tanto aBiologia quanto a Psicologia tiveram de se defron-tar com a realidade da psique, que se expressaalém da conduta e dos processos fisiológicos; e a Parapsicologia, provando que a mente transcende

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a matéria e independe de suas leis, está a umpasso de admitir, por decorrência lógica desuas premissas, a sobrevivência do psíquico aomaterial. Despojada assim do dogma do materia-lismo absoluto, a ciência moderna deslegitima o marxismo como base única e indiscutível para o socialismo.

Falar hoje em socialismo é correro risco de ser apressadamente rotulado de comu-nista e ateu; mas lentamente se esboça a possi-bilidade de conceber-se uma solução socialistadiversa da proposta por Karl Marx. Albert Eins-tein, que nunca deixou de ser profundamente deístae espiritualista, admitiu expressamente essapossibilidade e reconheceu como inevitável a marcha da humanidade para o socialismo, em suabusca incansável de justiça e eqüidade paratodos.(3) De Einstein para cá, o que se temobservado é a adesão entusiástica das elitesintelectuais de todo o mundo aos fins preconi-zados pelo socialismo, e já deixa de ser temeridadeque nos afirmemos também socialista. Somos, sim,socialista, como socialistas têm sido Leão Tols-tói, Madame Curie, Gabriela Mistral, Albert Eins-tein e Helen Keller; somos, sim, socialista, masestamos procurando conceituar o socialismosobre bases nitidamente espíritas, seguindo aspegadas pioneiras de Porteiro e Mariotti.

b) Socialismo e Espiritismo

Ora, se a própria Igreja tem agorasua doutrina social, fundamentada em dois deseus maiores papas — Leão XIII e João XXIII, ho-mens de apreciável visão e invejável equilíbrio— por que não a teria o Espiritismo? Se FreiCarlos Josaphat, à semelhança de um Abbé Pierre

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e de um Padre Lebret, não se acovarda ante aquestão social e a encara objetivamente em seulivro "Evangelho e Revolução Social", encarnandoo próprio ideal da revolução no seio do povobrasileiro, não vos parece estranho que os espí-ritas nos omitamos e permaneçamos alheios a ela?Não sentis que o Espiritismo, longe de ser o"ópio do povo", deve assumir a defesa e a vanguar-da dos ideais de justiça e renovação? Não perce-bestes que o Espiritismo, dialeticamente consi-derado, não apenas supera o marxismo, senão ain-da se insinua como a base natural de um socia-lismo mais autêntico? que só o Espiritismo nosdá uma visão total do homem e do mundo? que, seo homem de Marx é uma verdade parcial, o homemde Kardec pode ser uma realidade integral, afir-mando-se progressivamente em sua face espirituale em seu aspecto social? que o homem de Marxtem uma só perna e o de Kardec é bípede e completo?

Não vos parece que, aferrando-nos osespíritas à manutenção do "status quo" e de todoum sistema político-econômico condenado à extin-ção por suas próprias contradições internas epela injustiça que o caracteriza, estaremos tam-bém condenando o Espiritismo a morrer em meio a derrocada do carunchoso arcabouço da civiliza-ção do dinheiro, da concorrência iníqua, dadesigualdade econômica, da corrupção e do espíritopossessivo? Não vos escandaliza constatarque o materialismo encampa os reclamos dospobres e deserdados, prometendo-lhes a paz e ajustiça, enquanto os espíritas nos opomos ao pro-gresso social, à marcha natural da história e tememos denunciar os males de um regime inteira-mente assentado na exacerbação do egoísmo? Nãoé paradoxal que os espíritas — que pregamos a evolução como medida comum dos indivíduos e dospovos, dos mundos e das constelações — nos

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cheguemos à nau que já quase aderna, sob o pre-texto de que tudo está bem e deve permanecer comoestá, porque tal é a vontade de Deus, esquecidosde que Deus nos criou para o perpétuo evolver e chamou-nos a compartir a construção geral do pro-gresso? Não é paradoxal nossa reação à forçaevolutiva da história?

Lembremo-nos de que o Espiritismonão é mais um subproduto da sociedade materia-lista e burguesa, nem se concebe que lhe assumaa inglória defesa; é antes a condenação cabaldo materialismo burguês e religioso, que corrom-pe e avilta, amesquinha e insensibiliza o homem,tornando-o mais egoísta e mais voraz na ânsiada posse e na ambição sem limites.

Debalde se objetara que a desigual-dade social e econômica é inarredável porque a lei de causalidade espírita prescreva que hajapara sempre ricos e pobres, pois, se assim fora,teríamos de sustentar que também haverá parasempre bons e maus na humanidade, conclusão querepugna ao evolucionismo espírita; tanto maisque a história nos ensina que as classes favore-cidas foram sempre minoria perante as multidõesesfaimadas e oprimidas, sendo de perguntar ondehaveria tanto espírito de mau rico para animartanto corpo desnutrido e pobretão... A reen-carnação ou lei palingenésica não justificará jamais, por si só, os desníveis sociais, porquantoa lei de causalidade espírita não determinaas formas de sociedade; ao destino individualfalta força histórica para estabelecer um regimesocial baseado no sistema de propriedade privada.As condições sociais e econômicas são meramentecircunstanciais para o espírito e de modoalgum indispensáveis a sua evolução moral, numgrau superior dessa mesma evolução. A lei derenascimentos origina destinos individuais, masnão pode, sozinha, engendrar regimes sócio-políticos;

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tivesse ela esse poder, seríamos forçados aaceitar a perpetuidade do sistema capitalistade vida, o que desfaz toda possibilidadede progresso e encarcera a humanidade toda numcírculo vicioso, em que o plebeu de ontem é o nobre de anteontem e o proletário de hoje é o capitalista de ontem, e assim indefinidamente.

Nem é válido objetar que o Espiri-tismo não pode ocupar-se de assuntos político--sociais por não ser deste mundo o Reino doCristo. Demonstraria fraco entendimento da filo-sofia cristã quem nela pretendesse ver um instru-mento de acomodação e conformismo, quando — con- figurando um caminho para a paz e a construçãodo Reino de Deus entre os homens — é ela, acimade tudo, um brado de libertação e de luta,pois que não haverá paz enquanto houver injus-tiça. A interpretação individualista do Evan-gelho é atitude que agrada e convém aos credostradicionalistas, porém não ao Espiritismo, quelhe ressalta a dimensão social, afirmando que o Evangelho deve ser o patrimônio comum do povo.E, depois, ai de nós — espíritas — se não nosdecidirmos por fundamentar uma sociologia deinspiração espírita sobre os fenômenos da cole-tividade! Seremos então relegados à margem doprogresso social, como uma esdrúxula religiãode alienados e fanáticos, sem conteúdo filosóficonem estruturação científica...

O Espiritismo tem de ser também so-ciológico, sob pena de desfigurar-se e fugir aopróprio pensamento kardecista, que lhe constituio núcleo (4). Se fordes ao capítulo final de "A Gênese" ("São Chegados os Tempos"), láencontrareis dezenas de afirmações que bem assi-nalam o papel reservado ao Espiritismo na cons-trução de uma nova humanidade. Seria bom e pro-veitoso que os espíritas nos compenetrássemosda grandeza desse papel, principiando por aceitar

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o socialismo como uma aspiração ética, cien-tífica e filosófica, enraizada na consciênciadas almas evolvidas que clamam por justiça e fra-ternidade, e não como um fenômeno exclusivamentepolítico, se bem que seu advento pela açãomeramente política e social, liberando o homemda moral capitalista, resulte uma etapa útilpara o progresso do gênero humano, porquanto a revolução social do socialismo deverá ser comple-mentada pela revolução espiritual e definitivado Espiritismo. E o socialismo, enfim espiritua-lizado pelo ideal espírita, será a grande forçahistórica que nos há de levar à realização indi- vidual e coletiva dos postulados cristãos.

O cristianismo, como Frei CarlosJosaphat admite e propala, é a negação peremptó-ria do sistema capitalista; e não só deparareis,no Evangelho, numerosos versículos que legiti-mam o regime de propriedade coletiva, como ain-da ficareis sabedores, nos Atos dos Apóstolos,de que os primitivos cristãos viviam em comuni-dade de bens.

Também não podereis alegar que a Doutrina dos Espíritos repele o instituto dapropriedade coletiva dos meios de produção, pois,se é certo que Allan Kardec, em comentário à pergunta nº 882 de "O Livro dos Espíritos",assevera que a propriedade é um direito natural,tão sagrado quanto o de trabalhar e de viver,tem o cuidado de esclarecer que se trata dapropriedade que resulta do trabalho, e os Espí-ritos, em resposta à questão nº 884, que deveser cotejada com a de número 808, definem que"propriedade legítima só é a que foi adquiridasem prejuízo de outrem", o que dificilmenteacontece num regime em que os meios de produçãosão suscetíveis de apropriação particular. E aindamais enfática é a resposta dos Espíritos à pergunta nº 885: "É fora de dúvida que tudo o quelegitimamente se adquire constitui uma propriedade.

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Mas, como havemos dito, a legislação doshomens, porque imperfeita, consagra muitosdireitos convencionais, que a lei de justiçareprova. Essa a razão por que eles reformamsuas leis, à medida que o progresso se efetuae que melhor compreendem a justiça. O que numséculo parece perfeito afigura-se bárbaro noséculo seguinte".

Da mesma forma, é infundada a ale-gação de que a igualdade entre os homens é im-possível e que, por isso, o socialismo é impra-ticável. Desconhece absolutamente o socialismoquem o suponha igualitarista: o socialismo nãoapenas reconhece a desigualdade, como ainda nãopretende eliminar ou ignorar as disparidadesque são da natureza humana, ou — diríamos nós — que são inerentes ao grau evolutivo e à necessi-dade cármica de cada um; a desigualdade que elese propõe corrigir é aquela criada pelo regimesocial, sobreposta e acrescentada à desigualdadenatural e biológica, quando não psíquica e espiritual.

Como último argumento, recorremosà autoridade do próprio Cristo, servindo-nos danarrativa do Evangelho Segundo São Mateus (capí-tulo 19, versículos 21 e 22): "E disse o Mestre"ao moço rico que quisera saber como possuir a vida eterna: — Se queres ser perfeito, vai,vende tudo o que tens e dá-o aos pobres e terás umtesouro nos céus; e vem e segue-me. E o manceborico, ouvindo essas palavras, retirou-se triste,porque possuía muitas propriedades".

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6. PELA VIVÊNCIA SOCIALDA DOUTRINA ESPÍRITA

Com tudo o que dissemos, pudemosofertar-vos farto material para estudo e cremoshaver estimulado vossa ânsia de saber. Meditaino que ouvistes e não vos furteis ao dever dapesquisa. Lêde, estai informados: não vos aco-modeis nem receeis conhecer e cotejar as diversassoluções sociais que se desenham no mundo,erigindo novas sociedades na Ásia, na África e na América Latina. Encarai as conquistas domaterialismo histórico no campo social como reali-dade que se não mais pode negar: dispondes deimensa bibliografia, apta a vos esclarecer o queverdadeiramente acontece nos atuais paísessocialistas. Não temais constatar até que pontoaquelas comunidades hão resolvido a problemáticasocial e onde terão falhado: a negação a priorié atitude adversa ao estudioso espírita, quetem de ser livre para estudar, discutir e compa-rar, ou não saberá julgar com precisão e hones-tidade.

Entretanto, convém submetais ao crivoda razão as coordenadas que vos trouxemos;não vos disponhais a acatá-las sem antes bemponderar nossos argumentos. Nossa doutrina des-conhece chefes espirituais, e não seríeis espí-ritas se nos tomásseis à conta de condutor. Nãoqueremos conduzir nem comandar; ao contrário, muitonos doeria saber-vos a apoiar nossas idéiaspelo simples fato de provirem de um suposto poder,pois que, tanto quanto vós , apenas buscamosaprender e corrigir-nos, conhecer e aprimorar-nos.Conclamamo-vos , isto sim, a que estudeisconosco e juntos construamos a doutrina socialdos espíritas: o "socialismo com Jesus", segundo

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a feliz expressão de Emmanuel na obra queleva seu nome; enfim, o socialismo cristão, quehá de florescer no Brasil. E isso acontecerá,não porque o Brasil seja efetivamente "Coração do Mundo e Pátria do Evangelho", na poética ima-gem de Humberto de Campos; é a própria observaçãoda marcha dos acontecimentos que nos induza intui-lo. Ora, se em nenhuma outra nação oEspiritismo fez tão grande número de adeptos eem parte alguma os espíritas realizamos tantoquanto aqui, por que não imprimiríamos ao rumoda história, a partir do Brasil, um cunho novoe autenticamente espírita? Nossa opinião maciçae nossa constante identificação com o bem nãopesarão porventura sobre a direção dos fatos? Setal não se der, é porque não teremos sido fiéisdepositários da Terceira Revelação, ou não a te-remos sabido mobilizar a serviço de nossa reformainterior e da renovação do meio em que vivemos.

Lêde "A Nova Geração" de Kardec, em"A Gênese", e compreendereis que não vos prega-mos diatribes, fantasias ou imposturas. A reno-vação social é iminente, e nós somos ou podemosser co-instrumentos dessa renovação; nós somosou devêramos ser a nova geração.

Como, porém, intentar uma transfor-mação eficaz no campo fecundo das relações huma-nas, se ainda não aprendemos a renovar-nos a nóspróprios ou a renovar o meio espírita que tibia-mente integramos? Como construir a paz e a fra-ternidade no mundo, ou o Reino de Deus entre oshomens, se ainda não conseguimos entender-nosdentro de nossas fronteiras ideológicas? Comopretender a semeação da união e da concórdiauniversais, se a cizânia e a discórdia minam nossafortaleza e nos fazem desconfiar uns dos outros?Há mister atendamos, primeiro que tudo, ao

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imperativo da união. Por que não procuramosestimular os laços que nos unem e destruir osmotivos que nos separam? Por que não nos unimosnum objetivo único, já que temos aderido à mesmafilosofia de vida?

Quando lançamos nosso controvertidoartigo "Palavra aos Jovens Espíritas do Brasil"pelas colunas de "Mundo Espírita", nãoaspirávamos a outra coisa que não unir: não fomoslá muito feliz em nosso intento e demos origema um escândalo ainda maior. Choveram pedras e apupos sobre nós, mas também é certo que muitosforam capazes de perceber a sinceridade de nossaexortação. De qualquer modo, penitenciamo-nosdo mal que tenhamos causado, porém reafirmamosque nosso propósito maior é a união dos espíritas:união real, fraterna, objetiva e eficiente.E nosso apelo se dirige principalmente aosjovens, não porque pretendamos um movimentode separação ou rebeldia contra os menos jovens,de cuja experiência não podemos nem devemosprescindir, senão porque nossos maiores, aureo-lados pelo cumprimento do dever, já se avizinhamdo termo da jornada e são os jovens que,dentro em breve, assumirão a responsabilidadede nortear os destinos da Doutrina Espíritaneste país. Para nós, jovens, as desinteligênciase os dissídios, as divergências doutrinárias e os velhos antagonismos, que por mais de uma veztêm abalado nossa cidadela e comprometido nossaunidade, não nos dizem coisa alguma: não lhesdemos causa nem queremos herdá-los, senão superartodas as antigas divergências, a ver se nãorepetimos o mesmo erro de quem nos precedeu.

Unamo-nos, pois, estudando juntose conservando o Espiritismo sempre uno e harmô-nico, sem lhe diminuir qualquer dos aspectos.Mantenhamo-lo indene da superstição e do fanatismo,

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do misticismo e da fantasia, por via do estudo metódico e progressivo, mas também a pretextode preservá-lo contra as deturpações que aignorância lhe aporta a todo instante, não noscristalizemos na intransigência e no misoneísmo,nem muito menos convertamos nossa doutrinanuma torre de Babel, sustentando pontos de vistameramente pessoais ou negando-nos a uma coorde-nação de propósitos. Sufoquemos o personalismo,que nos divide e incompatibiliza; exaltemos asolidariedade, que nos aproxima e reconforta.(5)

Somos todos moços. Mas que ninguémdespreze nossa mocidade: queremos servir a Deus, ao homem, à vida e à sociedade. Sirvamos,portanto, que nosso estandarte foi desfraldadohá mais de um século e outro não há que o subs-titua: "Fora da caridade não há salvação". Sir-vamos e trabalhemos, imprimindo à caridade espí-rita seu sentido real, o do amor posto a serviçodo bem comum, e roubando-lhe o caráter aviltantede institucionalização da esmola: promovamosa caridade-trabalho, a caridade-escola, a cari-dade-soerguimento, a caridade-respeito, a cari-dade-compreensão, a caridade-perdão, a cari-dade-amor (6). Aprendamos a descer ao charcopara elevar à planície os que — vítimas daopressão, do egoísmo coletivo e da injustiçasocial — chafurdam na ignorância, relegados à margem da faina competitiva em que nos consumimos,desumanizados e indiferentes à fome e à misériaque nos circundam a privilegiada existência;atendamos aos analfabetos, aos famintos,aos míseros, aos nus, aos párias e aos deserdados,respirando-lhes o convívio nos próprios redutosdo infortúnio, amando-os intensamente ealevantando-os à dignidade da condição humana,enquanto justificamos, no amor, nossa própriacondição de homens.

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Eduquemos. Construamos. Antecipemoso amanhã, como vanguardeiros de uma novacivilização, mais justa e mais equânime. Nossasarmas nessa batalha gigantesca, que não é dedestruição dos fundamentos, senão de revitalizaçãodas bases genuinamente humanas da sociedadeterrestre, serão o esclarecimento, a renúncia e sobretudo o exemplo (7). Pela força do exemplo,Buda, Tolstoi e Gandhi assinalaram a históriae revolucionaram o mundo. E o maior exemplofoi e será sempre o de Jesus, que desceu aopovo para fazê-lo ascender. Desçamos então àsmassas, elevando-as pelo poder do amor, em vezde nos elevarmos delas pelo poder da ambição.Exemplifiquemos: multipliquemos os exemplosde renúncia, de abnegação e desprendimento!

A Comunhão Espírita Cristã de Curi-tiba, que fundamos e dirigimos em nossa cidade,pretende ser um desses exemplos. Ao contráriodo que insinuam nossos detratores, não é umagrupamento de rebeldes ou um foco de subversão,nem tampouco um quisto religioso ou um movimentoseparatista a ameaçar a ortodoxia espiritista:é um centro espírita como outro qualquer,mas em que a mera rotulagem cedeu lugar à vivên-cia e em que as palavras se fizeram atos, corpo-rificadas em tarefas eficazes de educação, detrabalho, de promoção humana, de recuperação, deserviço social e amor cristão; é uma sociedadede jovens espíritas, conscientes de sua missãode construtores do futuro; é uma célula dinâmicade Espiritismo social a serviço do povo.

Quanto fizemos lá, dinamizemos todosos nossos núcleos de trabalho e nos estreitemosas mãos: sejamos um só coração, uma só alma,um só pensamento, para servir, amar e construir!

Que então Deus nos abençoe. E, emEle nos abençoando, dir-Lhe-emos assim:

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"Senhor Deus, pai dos que choram,Dos tristes, dos oprimidos,Fortaleza dos vencidos,Consolo de toda dor,Embora a miséria amargaDos prantos de nosso erro,Deste mundo de desterroClamamos por vosso amor.

Nas aflições do caminho,Na noite mais tormentosa,Vossa fonte generosaÉ o bem que não secará...Sois, em tudo, a luz eterna Da alegria e da bonança,Nossa porta de esperançaQue nunca se fechará.

Quando tudo nos desprezaNo mundo da iniqüidade,Quando vem a tempestadeSobre as flores da ilusão,Oh, Pai! sois a luz divina,O cântico da certeza,Vencendo toda aspereza,Vencendo toda aflição.

No dia de nossa morte,No abandono ou no tormento,Trazei-nos o esquecimentoDa sombra, da dor, do mal...Que nos últimos instantesSintamos a luz da vida,Renovada e redimida,Na paz ditosa e imortal!

o . o . o

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NOTA EXPLICATIVA

A palestra que você acabou de ler, meu jovem amigo, foi proferida há questão de cinco anos; gravaram-na em Lins e, vertida para o papel, aqui ressurge sem maiores retoques.

Se hoje tivesse de reescrevê-la, por certo eu alteraria muita coisa (sobretudo as conclusões, que me pareceram fracas ante o arrojo das premissas), porquanto o pensamento progride sempre e ninguém estaciona em sua procura da verdade, quando possuído de autenticidade e do desejo de saber e ser. Mesmo assim, autorizei-lhe a publicação à guisa de apoio substancial à cruzada esclarecedora de “A Fagulha” e, notadamente, em forma de homenagem ao Armando OliveiraLima e ao Adalberto Paranhos, dois moços que reagem bravamente à melancólica “igrejificação” daquilo que há cem anos era um ideal de liberdade e universalismo:a Doutrina dos Espíritos, ora reduzida por seus próprios profitentes a uma teorização dogmática e sectária sobre fatos imperfeitamente estudados. O caminho que aqueles dois vêm trilhando, malgrado a santa cólera de seus confrades, que tressuam intransigência em nome da divisa do “trabalho, solidariedade e tolerância”, é irreversívele de certo modo constitui o prosseguimento da jornada que eu iniciei, sozinho e desassistido, justo na época da produção da conferência acima transcrita. Daí porque tanto me identifico ao que eles dizem e realizam, pois o que realizam e dizem é a reafirmação dos ideais e princípios que ainda mantenho vivos dentro de mim. Frustrem-se, assim, quantos hajam identificadomeu silêncio de mais de dois anos a um recuo nas idéias ou a uma deserção na luta: meramente encerrei um capítulo de minha vida, em que insisti até o limite

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da conveniência, e quem almeja crescer sempre, a fim de realizar o infinito de suas potencialidades, não pode deter-se em etapas já superadas de sua marcha ascensional. Liberto de preconceitos e limitações mais fortemente condicionantes, vivo agora nova fase: freqüento um curso superior de Psicologia, onde colho farto material para as empreitadas de amanhã; procedo a uma revisão completa de meus artigos de fé espírita, para constatar até que ponto o em que creio individualmente pode objetivar-se em termos de comunicação científica; enfim, recuso-me a parar no tempo e repisar, em total alheamento à ciência de nossos dias, conceitos ultrapassados e discutíveis, dado que as pesquisas espíritas morreram com os Crookes, os Geleys e os Bozzanos, e é preciso que se descubra uma linguagem que melhor corresponda às exigências do presente século. A fé raciocinada, que o Espiritismo ontem facultava, é cada vez mais fé e menos razão. Se isso lhe basta, o problema é seu... Quanto a mim, seguirei adiante em minha busca permanente de mais largos horizontes e se, ao cabo de algum tempo, descobrir algo de novo para ofertar-lhe, que não seja a repetição enfadonha daquilo que você encontra na melíflua literatura espírita contemporânea, voltarei a seu convívio e outra vez lhe falarei. Mas falarei de coisas que não sirvam apenas a você, que se acomodou a uma grei religiosa onde lhe não permitem pensar livremente, senão a todos os homens, espíritas ou não, católicos ou judeus, muçulmanos ou budistas, agnósticos ou ateus. Até lá, fica com você a amizade e o sincero abraço do

Jacob Holzmann NettoCuritiba, 10/10/1969

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NOTAS DA EQUIPEA FAGULHA

(1) Aos que tomarem gosto ao estudodas questões de cunho filosófico e científicodesenvolvidas neste capítulo, remetêmo-los à leitura da obra de Humberto Mariotti, "O Homeme a Sociedade numa Nova Civilização", e, maisespecificamente, aos seus capítulos IV e V, emque o filósofo argentino se põe a analisar,respectivamente, "A Filosofia Científica deGustavo Geley" e "O Significado Espírita doMaterialismo Dialético".

(2) Vertida para o português,vindo a lume pela EDICEL, o livro intituladooriginalmente "Parapsicología y MaterialismoHistórico" recebeu o nome de "O Homem e a Sociedadenuma Nova Civilização",sendo-lhe dado, ademais,o subtítulo de "Do Materialismo Histórico auma Dialética do Espírito".

(3) Todos quantos se interessaremem se cientificar das expressões de Albert Einstein,ao efetuar uma análise acurada do tema "Porque o Socialismo?", deverão se endereçar às páginas 167 a 173 de "O Homem e a Sociedadenuma Nova Civilização", que transcreve artigoinserido na revista "Gauche Européene", de Paris.

(4) Em assim pensando, os jovensintegrantes do Movimento Universitário Espírita (MUE)

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de Campinas houveram por bem se cometer a obrigação de esboçar um trabalho de naturezacientífica nesse sentido. Nele examinarão asimplicações entre a Sociologia e o Espiritismo,conferindo ênfase especial às contribuições queuma ao outro se podem prestar mutuamente.Semelhante estudo, frise-se, fará parte da tese que,em forma de anteprojeto, será apresentada emSorocaba-SP , dias 5 ,6 e 7 de setembro de 1970,quando da efetivação da III Concentração dos MUEsdo Estado de São Paulo, a qual, ulteriormente,virá a público em mais uma edição de A FAGULHA.

(5) Reconhecendo que a busca daunidade na diversidade deve preocupar todos osespíritas, jovens e adultos, considerados em péde igualdade, o MUE de Campinas, juntamente como Departamento de Mocidades do 39º CRE da USE-SP,deu a conhecer sua proposta "Novos Rumos aoMovimento de Unificação", que se encontra em viasde ser submetida à apreciação do ConselhoDeliberativo Estadual da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo. Procuramos assim,os moços, delinear uma nova vivência entre osespíritas em geral, na qual a co-participação e a co-responsabilidade lhes propiciem tornarcomuns os problemas com que se deparam, tendo porfim traçar uma ação conjunta, sob o halo dafraternidade, rumo ao cumprimento de seus encargosespecíficos. A esse respeito, aliás, foi dedicadatoda uma edição de A FAGULHA, precisamentea de nº 8, correspondente a julho de 1969.

(6) A prática do Serviço Social, à luz dos princípios espiritistas, aqui preconizada,já constitui, de algum tempo a esta parte, motivode preocupação dos universitários espíritaspaulistas. Assim é que, quando da efetivação

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da II Concentração dos MUEs do Estado, levadaa efeito nesta cidade, a 19, 20 e 21 de abrilde 1969, procedeu-se ao estudo das correlaçõesexistentes entre o Espiritismo e aquelatécnica que, sob a égide doutrinária, se fada a se tornar um meio de promoção social e espiritualdo homem. Demais, naquela oportunidade, resultouaprovada, com algumas alterações, uma teseelaborada pelo Departamento de Serviço Socialdo Movimento Universitário Espírita de SãoPaulo, a qual está prestes a ser divulgada aosborbotões. Importa salientar também, que, aliandoa teoria à prática, assistentes sociais vinculadosao MUE da capital paulista desenvolvempresentemente um trabalho com foros de serviçosocial junto à Casa Transitória Fabiano de Cristo,instituição mantida pela Federação Espírita doEstado de São Paulo.

(7) Ciente de que nada guarda tãopreponderante poder de transformação como o exemplo, que é pronunciado na linguagem concretados fatos e das realizações, o MUE de Campinas— começando por exemplificar o ideal derenúncia — instituiu, por sugestões de todosos seus componentes, o dízimo, tributo pelo qualcomo o próprio nome o indica — cada um dos que o integram recolhe aos cofres da entidade somacorrespondente a 10% de seus proventos.

Porém, acima de tudo, cumpre notarque eles intentarão dar contornos de realidadea uma experiência comunitária, na qual o trabalhoassociativo identificará todas as relaçõeshumanas. Juntarão, também nesse ponto, a teoriaà prática, em sua campanha de esclarecimentoque promovem em favor da libertação sociale espiritual do homem.

Para tanto, numa primeira fase dessavivência comunitária, cuidarão de oferecer aos

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que a seu lado trabalharem — possivelmentenum empreendimento gráfico — uma vigorosaorientação sócio-espiritual. Numa palavra, porãocobro à exploração do homem pelo homem, que fereos princípios da isonomia divina. Isso porqueentendem os rapazes do MUE de Campinas que a autoridade racional constitui condição paraajudar a pessoa que, temporariamente, se encontraem posição inferior. E à parte superior, porexercer uma autoridade fundada em princípios deamor e solidariedade, toca se empenhar mais e mais no afã de elevar a parte subordinada, paraque cada vez menor seja a diferença que as separa.

Dessa maneira, afinando-se por umdiapasão inovador, em tal experiência comunitáriaos universitários espíritas campineiros abdicarão— depois de convenientemente preparados,espiritual e culturalmente, os empregados —dos seus direitos e prerrogativas de proprietários.Todos quantos nela trabalharem virão, então,a ser guindados à condição de sócios, banindo-se,por conseguinte, a distinção entre patrões eempregados. Por outro lado, é de bom alvitreacentuar que semelhante gráfica não teráoutro objetivo fundamental que não o deproclamar o advento de uma nova era decompreensão entre os homens!

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NOTA À PARTE

Já conhecia seu termo o trabalho de confecção desta obra, quando, mediantegestões empreendidas junto ao diretor da EDICEL,ficou concertado que o MUE de Campinas avocaraa si a obrigação de, para tal editora, traduzir olivro Espiritismo Dialectico, de Manuel S. PorteiroE fá-lo-emos para gáudio de todos os espíritasconscientes, aos quais o estudo se incorporoua sua rotina de vivência doutrinária. Dessa forma, não move aos universitáriosespíritas paulistas senão a vontade de colaborar,ainda mais, para que o Espiritismo seja levado apartilhar o convívio dos mais altos planos dacultura contemporânea.

Edição digital: PENSE

- Pensamento Social Espíritawww.viasantos.com/pense

Santos, maio de 2008 - Brasil.

Produção e Revisão: Eugenio Lara.

Revisão Final: José Rodrigues.

1ª/2ª edição: 1970.