INDÚSTRIA DE DEFESA E MILITARISMO NO BRASIL 30/1283.pdf · Em 2014, o Complexo de Defesa e...
Transcript of INDÚSTRIA DE DEFESA E MILITARISMO NO BRASIL 30/1283.pdf · Em 2014, o Complexo de Defesa e...
9300
INDÚSTRIA DE DEFESA E MILITARISMO NO BRASIL
MARTA DA SILVEIRA LUEDEMANN1
Resumo: O desenvolvimento da indústria de defesa no Brasil está associado a quatro áreas de atuação das forças armadas: a formação militar; formação técnica (engenharias) e P&D; a produção de infraestrutura e; fabricação de materiais, equipamentos e meios de transporte e comunicação. No Brasil, a pesquisa nas forças armadas esteve direta ou indiretamente relacionada com o processo de industrialização e com a formação dos principais centros de pesquisa, incorporando tecnologias de ponta e novos ramos da ciência. Contudo, com o fim dos planos nacionais e a abertura de mercado dos anos 1990 a indústria de defesa foi em grande parte sucateada. Há um pouco mais de dez anos, o governo retomou a política de modernização do setor, abrindo uma nova fase de investimentos nacionais em P&D, industrialização e acordos de joint ventures.
Palavras-chave: Indústria de defesa brasileira; forças armadas; segurança nacional
Abstract: The development of the defense industry in Brazil is associated with the four areas of acting of the armed forces: the military formation; technical formation (engineering) and R&D; the production of infrastructure; and manufacture of materials, equipments and means of transport and communication. In Brazil, the research in the armed forces was directly or indirectly connected with the process of industrialization and with the formation of the main research centres, incorporating leading edge technologies and new branches of science. However, with the end of the national plans and the opening of the market for the years 1990 to the defense industry was in large part scrapped. There is a little more than ten years, the government retook the policy of modernisation of the sector by opening a new phase of national investments in R&D, industrialization and the joint venture agreements.
Key-words:
1 – Introdução
Ao tratar da indústria de defesa, três problemas despontam: o primeiro consiste
nas relações e conexões de sua composição que impede de abordá-la como os
demais setores industriais, por mais complexo que sejam; o segundo refere-se ao
acesso às estatísticas, que muitas vezes disponíveis nas empresas ou nas
associações, mas neste caso são geralmente rarefeitos, incompletos ou
descontínuos; o último, retrata a situação de disparidade tecnológica inter setorial
nesta indústria, que num extremo o sucateamento e noutro a produção de alta
tecnologia. Sua posição de vanguarda tecnológica integra P&D, cria externalidades,
1 Docente do programa de pós-graduação da Universidade Federal de Alagoas. E-mail de contato: [email protected]
9301
além de produzir desde vestuário de proteção até armas inteligentes, sensores de
comando e veículos balísticos não tripulados, passando por mísseis, aviões,
satélites e defesa cibernética. Por outro lado a indústria de defesa está em simbiose
com a indústria de segurança constituindo o Complexo de Defesa e Segurança que
se sustenta pela integração da indústria, insumos, serviços e distribuição.
Ao pesquisar a indústria militar, verifica-se que a construção de relações
políticas, econômicas, geográficas, sociais e tecnológicas se modificaram ao longo
da história2. Contudo o enfoque aqui será substancialmente da constituição da
indústria e sua inserção na sociedade e economia brasileira, considerando o papel
de incorporadora e difusora de tecnologias, o que faz de sua participação no
processo de desenvolvimento industrial do Brasil um fator relevante. Para
compreender a correlação entre indústria de defesa, Forças Armadas, ciência militar
e sociedade, há necessidade de compreender como estas quatro estruturas se
formaram até alcançarmos as condições reais de existência do complexo industrial
de defesa nacional e os seus produtos.
2 – A indústria de defesa da formação à crise atual
A Abimde (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e
Segurança) discrimina o Complexo em quatro segmentos: i) segurança privada3, e
segurança pública estadual, segurança pública federal e defesa nacional; ii) a
indústria, que detém seis itens: 1) Máquinas e Equipamentos Mecânicos, inclusive
armas, munições e equipamentos militares; 2) Máquinas e Equipamentos
Eletrônicos e de Informática; 3) Automóveis, Caminhões e Ônibus; 4) Outros
Equipamentos de Transporte; 5) Construção; e 6) Serviços Prestados às Empresas;
iii) os insumos, também no setor de transformação, compreendem os produtos não
enquadrados acima e que abastecem as indústrias citadas; iv) os serviços e
2 Como podemos observar em Antossiak et al. (1987) e Bobbio(1998), ainda que sob concepções
teóricas distintas. 3 Em nota, não será tratado aqui o segmento de segurança particular, ainda que este em certo grau também esteja
integrado
9302
distribuição constituem: comércio, serviços e transporte associado à todo o setor.
Brick (2014b, p. 93) descreve a característica do mercado e dos segmentos
industriais para produtos finalísticos caracterizam a indústria de defesa por: a)
Armas leves munições e explosivos ; b) Armas não letais ; c) Armas e munições
pesadas; d) Sistemas eletrônicos e sistemas de comando e controle; e) Plataforma
naval militar; f) Plataforma terrestre militar; g) Plataforma aeroespacial militar; h)
Propulsão nuclear.
Da Colônia aos governos de planejamento centralizado no Brasil (de Getúlio
Vargas, Kubitscheck e militares), houve concentração de investimentos públicos em
vários segmentos de tecnologia de ponta, desde engenharia civil e mecânica à
engenharia de telecomunicações, aeroespacial, microeletrônica, energia nuclear,
além de biotecnologia e bioenergia. Dos anos 1980 ao início dos anos 2005, as
forças armadas e a indústria de defesa sobreviveram com a estrutura que se
constituiu até o II PND. Ainda assim, vários setores se mantiveram vigorosos, como
o setor aeroespacial, do qual desponta a EMBRAER, o IEA, e a Marinha cujo
submarino nuclear manteve suas pesquisas durante o período, mesmo desfalcados.
No Exército Brasileiro, a IMBEL se manteve estatal, mas o fechamento da ENGESA
(fabricante brasileira de veículos militares) promoveu um desfalque de 1.100
veículos não entregues ao Exército ao choque econômico dos anos 1990. Depois de
forte sucateamento internacionalização da indústria nacional pelos governos
neoliberais, os governos Lula e Dilma retomaram os investimentos no segmento de
defesa, com importantes políticas e investimentos para o setor, marcando uma nova
fase da indústria de defesa e também das Forças Armadas.
No relatório de Brick (2014b, p. 99-100) observa-se que o mercado de
produtos, insumos e P&D que concerne o Complexo da Indústria de Defesa (CID) e
segurança são regidos igualmente por acordos nacionais e internacionais, dos quais
os EUA tem papel determinante, através do International Traffic in Arms Regulations
(ITAR) e do Bureau of Industry and Security (BIS). Senghaas (1974, p. 122-126)
contribui para compreensão disto porque demonstra que nos EUA a elite econômica
é o universo do complexo de armamento, tendo como pivô a relação entre o
Pentágono e a indústria de armamento, centros políticos. E neste universo há uma
9303
ordem de importância: o presidente da República, o Pentágono, a indústria de
armamento, a ciência de armamento, o Congresso, os meios de comunicação de
massa, pessoas que vivem da desse complexo, a população em geral – estes dois
últimos fora do universo da elite socioeconômica. A indústria bélica se autonomiza
na condição de mais um setor produtor de mercadorias, como também veículo de
intervenção do capital norte americano no mundo. Galbraith e Sweezy mesmo em
perspectivas diferentes demonstram que as grandes empresas (ou capital
monopolista) norte americanas determinam a intervenção militar no mundo, porque
participam do planejamento. E em períodos de paz, conforme Galbraith, os generais
tem caráter meramente figurativo na sociedade.
No caso brasileiro, a indústria de defesa está diretamente ligada ao Estado
através das Forças Armadas e estes estiveram diretamente associados ao processo
de industrialização do País. Nestes termos, o militarismo no Brasil toma ares ora
nacionalista progressista (tenentismo, período Vargas, governo Geisel), ora se
declara conservador e subserviente aos interesses das potências hegemônicas.
São, então, os elementos nacionalistas das Forças Armadas que contribem
decisivamente para a segurança nacional e para o processo de industrialização e
inovação tecnológica.
Em 2014, o Complexo de Defesa e Segurança movimentou 202 bilhões de
reais que representam 3,7% do PIB brasileiro. Deste montante 110 bilhões de reais
representaram o segmento de segurança e defesa, 71,4 bilhões de reais foram
referentes a comércio, serviços e transportes relacionados ao setor, 12,5 bilhões de
reais para insumos e serviços e 8,1 bilhões de reais às indústrias diretamente
relacionadas ao setor (ABIMDE, 2015).
Formação da indústria de defesa nacional (Vargas, JK, ditadura militar)
A influência francesa no exército ocorrerá até a década de 1920, com a vinda
da Missão Militar Francesa. Nessa mesma década surge a Universidade do Rio de
Janeiro e em 1930, a Universidade do Distrito Federal. Já na década de 1940, a
9304
influência será norte americana, com acordos instituídos na compra de materiais,
equipamentos, cursos e serviços de manutenção.
Dois importantes institutos se destacam sob o Estado Novo, o Instituto Militar
de Tecnologia (antecessor do IME) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)
ambos com apoio técnico dos EUA. O governo Vargas investiu no aparelhamento de
militar (equipamentos, institutos e centros de pesquisa) e igualmente na política de
industrialização brasileira (Petrobrás, Cia. Siderúrgica Nacional, Fábrica de Motores)
em sintonia com a II revolução industrial.
Nas décadas de 1930 e 1940, a engenharia militar auxiliou na ampliação e
implantação de malha ferroviária de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande
do Sul e Mato Grosso (antigo). Nos anos 1950 e 1960, foi a construção da linha
férrea e as rodovias de integração com Brasília. Nos anos 1970 as rodovias de
grandes extensões também tiveram a participação da engenharia militar, sobretudo
as de integração nacional (Belém-Brasília, Transamazônica, Transpantaneira, etc.),
além de grandes obras como pontes e tuneis (Verde Oliva, 2013).
A indústria de defesa se consolida no início dos anos 1960, quando as forças
armadas começam a receber novos incentivos para a modernização. Já em 1969 é
fundada a EMBRAER, a partir do esforço conjunto da FAB e do ITA/CTA.
A participação da Marinha do Brasil na I e II Guerra Mundial foi com
precariedade de equipamentos. Somente nos governos da ditadura militar foi
possível à Marinha fazer uma política de modernização, apoiada no milagre
econômico vivido pelo Brasil. Na década de 1970 com “Programa de Renovação e
Ampliação de Meios Flutuantes” a Marinha pode adquirir seis fragatas classe Niterói
(MK-10), das quais quatro foram construídos no estaleiro da Vosper na Inglaterra e
os outros dois construídos no Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro, com
transferência de parte da tecnologia. As fragatas foram vendidas com sistema
informatizados com restrições quanto à manutenção e manejo, o que impôs à
Marinha do Brasil a abrir uma licitação junto às universidades públicas paulistas para
a substituição dos computadores das fragatas em virtude da dependência
tecnológica que havia gerado. O primeiro submarino foi comprado da Itália, em
1914. Posteriormente vieram da Inglaterra e EUA. Conforme Goularti Filho (2011) a
9305
indústria de construção naval do Brasil foi implantada em 1958, na meta 28 do Plano
de Metas. Todavia as atividades de construção e reparos decorrentes da forte
dinâmica da Marinha Mercante brasileira desde o fim do século XIX4 proporcionou a
formação de aglomerados de empresas nacionais, sobre tudo nas cidades do Rio de
Janeiro e Niterói, gerando relações sistêmicas entre as empresas, o que garantiu
parte do sucesso da Meta 28. Nos anos 1980, o setor naval brasileiro era uma dos
maiores do mundo. Ainda, durante a primeira e segunda grandes guerras, foi o
mercado local que abasteceu o Arsenal da Marinha, substituindo importações,
contudo o abastecimento de aço nacional somente ocorreu com a criação da CSN.
Entre o fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, a Marinha conseguiu
dominar o ciclo completo do combustível nuclear. No fim dos aos 1980 a Marinha
adquiriu um submarino modelo IKL-209 da Alemanha e construiu outros quatro no
Arsenal da Marinha dos modelos Tupi e Tikuna com transferência de tecnologia
(Defesa Latina, 2009). Neste conjunto de ações, a Marinha projetou um modelo de
submarino nuclear vem desenvolvendo o programa nuclear no Centro Tecnológico
da Marinha em São Paulo (CTMSP), na Cidade Universitária, e no Centro
Experimental Aramar (CEA), em Iperó (SP), desde a criação do primeiro em 1986.
Em conjunto os centros de pesquisa estão integrados em P&D, com um moderno
Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica no CEA, cuja função é criar o protótipo do
motor de nuclear, dominar a tecnologia do ciclo de combustível nuclear, e produção
de combustível nuclear para o Programa Nuclear Brasileiro (cf. CTMSP). Em 2008
foi firmado o acordo com a empresa francesa para transferência de tecnologia na
construção de submarinos convencionais e nucleares.
Em 2014 o governo federal inaugurou o complexo Estaleiro e Base Naval da
Marinha do Brasil para a produção de submarinos, em Itaguaí (RJ), em condição de
joint venture entre a francesa Direction des Constructions Navales Services (DCNS)
(49%), a brasileira Odebrecht (50%) e a Marinha do Brasil (1%), acordado para
entregar 100% à Marinha em 20 anos. O programa de Desenvolvimento de
Submarinos (Prosub), com quase R$ 29 bilhões, tem o objetivo de produzir
4 Goularti Filho (2011) demonstra que somente no Arsenal da Marinha alcançou mais de
2.600 trabalhadores em 1877.
9306
submarinos 100% nacionais para proteger a costa brasileira, a Amazônia Azul e a
extração de petróleo da plataforma continental, com maior velocidade e
equipamentos modernos. A previsão sobre o complexo é promover 9 mil empregos
diretos e 32 mil indiretos, com 600 empresas nacionais, sendo que em 2021 o
complexo estará pronto e entregando quatro submarinos convencionais (SBR) e um
submarino nuclear (SNBR). O primeiro submarino será construído através da joint
venture com a DCNS, sendo uma primeira parte produzida na França. A capacidade
de produção é de um submarino a cada dois anos. Na cidade de Santa Cruz (RJ) foi
inaugurada em 2010 a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), uma parceira
entre a ThyssenKrup e a Vale, para o fornecimento de aços especiais para o
complexo, com capacidade de produção de 5 milhões de ton de aço ao ano. A
estatal Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep) tem duas áreas de atuação,
Nuclep Nuclear e Nuclep Não-Nuclear, ambas com know how reconhecido em
fornecimento de equipamentos nucleares para as Usinas de Angra, tendo criado o
primeiro reator nuclear naval e os cascos dos quatro submarinos produzidos na
década de 1990. A Nuclep também firmou contrato com a Wärtsilä Switzerland, para
a produção de motores de última geração de submarinos e navios de grande porte.
Em anexo ao Estaleiro de Submarinos, o Porto de Itaguaí está sendo reestruturado
para ser o único porto concentrador de carga com capacidade para a atracagem de
navios de última geração (acima de 6 mil TUs), com 4 terminais em operação de
granéis sólidos (especializado em minério de ferro), carvão, contêineres e de
alumina além de transporte intermodal (conforme SEPAC).
Anos 2000
Há mais de vinte anos sem uma política de desenvolvimento e inovação da
indústria de defesa nacional, o governo Lula retomou os investimentos no setor. A
partir de 4 importantes portarias do Ministério da Defesa, uma nova fase das forças
armadas e da indústria de defesa foi iniciada: em 2002 foi instituída a Política e as
Diretrizes de Compensação Comercial, Industrial e Tecnológica do Ministério da
Defesa (Portaria 764/MD, 27/12/02); em 2005, foi criada a Comissão Militar da
Indústria de Defesa (CMID) (Portaria 611/MD, 12/05/05); no mesmo ano o MD
9307
aprovou a Política Nacional da Indústria de Defesa (PNID) (Portaria 899/MD,
19/07/05); em 2007, foi estabelecida a Comissão de Implantação do Sistema de
Certificação, Metrologia, Normalização e Fomento Industrial (COMISCEMEFA
(Portaria 777/MD, 31/05/07).
Dagnino descreve que no primeiro do governo Lula, durante as rodadas de
debates sobre defesa e segurança 5, promovidas pelo Ministério da Defesa entre
setembro de 2003 a junho de 2004.
Defesa cibernética
A Defesa Cibernética foi implantada pelo Ministério da Defesa em 2009 a partir
da Estratégia Nacional de Defesa (END), ficando sob responsabilidade do Exército
Brasileiro em coordenar em caráter nacional. Em 2012 foi criado o Centro de Defesa
Cibernética do Exército (CDCiber), permitindo capacitar as forças armadas para dar
suporte aos eventos internacionais que o Brasil iria sediar, além de evitar ataques
cibernéticos em órgãos, instituições e setores estratégicos nacionais. O Centro está
estabelecendo acordos com universidades, empresas e outros setores das Forças
Armadas com o intuito de gestar recursos humanos e integrar os esforços.
Em conjunto, o Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército Brasileiro
(DCT), criado em 2005, tem a função de dirigir e controlar as atividades científicas e
tecnológicas do Exército, responsável pela inovação da Organização Militar, em
especial o Sistema de Monitoramento Integrado de Fronteiras (SISFRON) e o
CDCiber. Cabe ao DCT o desenvolvimento de produtos de defesa, como por
exemplo: “Família de Blindados Média sobre Rodas-Guarani; Radar SABER-M60;
Simulador do míssil 1.2 AC; Sistema de Protocolo Eletrônico de Documentos
(SPED); e das Medidas de Apoio à Guerra Eletrônica (MAGE) veicular” (cf. Exército
Brasileiro).
O CDCiber também terá uma Escola Nacional de Defesa Cibernética, conforme
portaria do MD em 2014, para formar quadros para as três forças armadas.
Anos 2010 5 Foram lançados quatro volumes sobre os ciclos de debates em uma coleção intitulada “Pensamento brasileiro sobre defesa e segurança”, publicado pela Secretaria de
Estudos e de Cooperação do Ministério da Defesa e acessíveis na web.
9308
Outro importante marco da indústria de defesa brasileira foi criou a criação em
2011 do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa (PAED). O PAED irá nortear
os investimentos em modernização de equipamentos das Forças Armadas e
incentivo à indústria de defesa. O governo federal se compromete em estabelecer
política de compras com o intuito de satisfazer as necessidades das Forças
Armadas, apoiar projetos de setores estratégicos e “fortalecer a cadeias de bens
industriais e de serviços” (Ministério da Defesa). É fundamental ao PAED a
independência tecnológica, permitindo a gestão de recursos humanos e físicos no
País, possibilitando que as estruturas operacionais se distribuam no território
nacional e consonância com os imperativos de “monitoramento/controle, mobilidade
e presença” para satisfazer os objetivos da defesa nacional.
O PAED prevê difusão tecnológica na cadeia de produção satisfazendo setores
da economia que se abastecem de alta tecnologia, gestar externalidades a partir da
indústria de defesa. O PAED e a Lei de Fomento à Base Industrial de Defesa
(Decreto nº 7970, de 28/03/13) são os marcos da nova fase de modernização da
indústria de defesa (Ministério do Desenvolvimento). Os projetos estratégicos de
defesa estão divididos conforme as três forças armadas:
• Projetos estratégicos da Marinha: 1) o Programa Nuclear da Marinha, que consiste
em produzir submarinos nucleares e instituir o Laboratório de Geração Núcleo-
Elétrica (Labgene) para construção, operação e manutenção de gerador nuclear; 2)
o Núcleo do Poder Naval, aquisição e distribuição de material, navios e instalações
da Marinha; 3) Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz).
• Projetos estratégicos do Exército são: 1) Sistema Integrado de Monitoramento de
Fronteiras (Sisfron); 2) Família de Blindados Guarani, com o intuito de substituir os
blindados Urutu e Cascavel com mais de 30 anos de uso; 3) Proteger, consiste em
ampliar a capacidade do Exército de proteger estruturas estratégicas e grandes
eventos contra ações terroristas e além de ataques cibernéticos.
• Projetos da FAB: 1) Cargueiro militar KC-390, o mais moderno e robusto veículo
produzido pela Embraer para renovação de frota de 28 aeronaves; 2) Projeto FX-2,
modernização de Caças, este item foi acordado com a empresa SAAB, Embraer e
9309
FAB, constituindo em joint venture denominada GRIPEN, para a renovação da frota
de 21 caças; 3) Vant-FAB, projeto da FAB de veículo não tripulado para fim de
vigilância.
A Estratégia Nacional de Defesa (END) determinou três setores estratégicos,
cada qual desenvolvendo pesquisas e dirigido por um segmento das forças
armadas: a Marinha do Brasil dirige o programa nuclear; o Exército do Brasileiro
coordena a defesa cibernética; e a Força Aérea comanda o programa espacial. O
Programa Nuclear da Marinha concentra-se Centro Experimental de Aramar,
desenvolve tecnologia na geração de energia, industrial, médica e combustível.
Desde 1979 a Marinha participa do Programa Nuclear Brasileiro com a intenção da
construção do reator para o submarino nuclear a ser construído no Estaleiro de
submarinos de Itaguaí. O Setor Cibernético, através do CDCiber do Exército foi
constituído para evitar ataques cibernéticos, garantir o sigilo de informação, por
outro lado evitar terrorismo ou incidentes na rede. O Setor Espacial, da FAB,
enfatiza as pesquisas em inovação e aprimoramento de sistema aeronáuticos e
aeroespaciais como a série de foguetes Sonda, da qual se originou o Veículo
Lançador de Satélites (VLS); trabalhando em conjunto com o Centro Técnico
Aeroespacial (CTA), o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), . Subordinados ao
Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), os Centros de
Lançamento de Alcântara (CLA) e da Barreira do Inferno (CLBI).
Conclusão
A indústria de defesa estará sempre em pauta nas principais economias do
mundo. Afora a função geopolítica de defesa nacional ou de intervenção, há o papel
definido na guerra oligopolista das corporações, cuja importância pode se nivelar
aos sistemas bancário e financeiro ou mesmo dos grandes centros de pesquisa
públicos (universidades e institutos de pesquisa) e laboratórios privados (grandes
companhias ou associações setoriais de empresas) para formação, incorporação e
difusão sistêmica de inovações tecnológicas6. O recente golpe institucional põe em
risco a segurança nacional o a autonomia tecnológica criada até então no País.
6 Como demonstra Chesnais (1996); e, notadamente para o Brasil, a tese de Leske (2013).
9310
Bibliografia
ABDI. Base Industrial de Defesa. Determinantes da acumulação de conhecimento para
inovação tecnológica nos setores industriais no Brasil. Relatório Setorial. Brasília: ABDI,
2010. Acesso em: www.abdi.com.br/Estudo/relatorio_neit_04-defesa_01b.indd.pdf
ABIMDE. Cadeia de valor e importância socioeconômica da indústria de defesa e
segurança no Brasil. Sumário do relatório final. São Paulo: Abimde/Fipe, abril/2015.
Acesso em: http://www.abimde.org.br/downloads.
ANTOSSIAK, A. B. et al. Geografia do militarismo. Moscou: Ed. Progresso, 1987.
BIASI, R. de. A energia nuclear. Rio de Janeiro: Atlântida, 1979.
BRICK, E. S. O perfil das empresas da ABIMDE. Relatórios de Pesquisa de Engenharia
de Produção. v.14, nº D5, 2014. p. 45-90 e p. 91-149.
CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.
DAGNINO, R. A indústria de armamentos brasileira: desenvolvimento e perspectivas. In:
ARNT, R. (Org.). O armamentismo e o Brasil: a guerra deles. São Paulo: Brasiliense,
1985. P. 69-108.
DAGNINO, R. A indústria de defesa no Governo Lula. São Paulo, Expressão Popular,
2010.
DEFESA LATINA. a 1, n. 1, julho-setembro 2009.: http://issuu.com/editorade
cultura/docs/defesa_latina_n1
DELLAGNEZZE, R. 200 anos da indústria de defesa no Brasil. Taubaté: Cabral Editora e
Livraria Universitária, 2008.
DUARTE, E. E. Tecnologia militar e desenvolvimento econômico: uma análise histórica.
Textos para Discussão, n° 1748. Rio de Janeiro: IPEA, junho 2012.
FGV/CPDOC. Diretrizes do Estado Novo (1937-1945): Força Aérea Brasileira (FAB). S/d.
Disponível em http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos37-
45/OBrasilNaGuerra/FAB.
FORJAZ, M. C. S. As origens da Embraer. Tempo Social, v. 17, nº 1, junho 2055, pp. 281-
298
GOMES, J. C.; SCHAFFEL, S. L. DURAN, D. Ciências militares em foco. Rio de janeiro:
Centro de Estudo de Pessoal, 2010.
GOULARTI Filho, A. História Econômica da Construção Naval no Brasil: Formação de
Aglomerado e Performance Inovativa. Revista Economia, v. 12, n. 2, Brasília, mai/ago
2011, pp. 309-336.
9311
JAPER, F. N. H. Controle do espaço aéreo brasileiro: jurisdição militar ou civil? ROCHA, M.
(Org.). Política – Ciência e Tecnologia – Defesa Nacional/Universidade da Força Aérea.
Rio de Janeiro: UNIFA, 2009.
LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto. São Paulo: Alfa-ômega, 1975.
LESKE, A. C. D. Inovação e políticas na indústria de defesa brasileira. Rio de Janeiro:
UFRJ/IE, abril de 2013.
LIMA Sobrinho, Barbosa. Desde quando somos nacionalista? Petrópolis: vozes, 1995.
LIMA, H. F. História político-econômica e industrial do Brasil. São Paulo: Cia. Ed.
Nacional, 1976.
LONGO, W. P. e. Impactos do desenvolvimento da ciência & tecnologia da defesa nacional.
ROCHA, M. (Org.). Poder Aeroespacial e Estudos Estratégicos. Rio de Janeiro: UNIFA,
2009.
MATOS, P. de O. A defesa nacional no contexto do planejamento econômico. ROCHA, M.
(Org.). Política – Ciência e Tecnologia – Defesa Nacional/Universidade da Força Aérea.
Rio de Janeiro: UNIFA, 2009.
MINISTÉRIO DA DEFESA. www.defesa.gov.br/
MONTORO; C. F.; MIGON, M.N.. Cadeia produtiva aeronáutica brasileira. Rio de Janeiro:
BNDES, 2009.
NASSIF, A. O complexo eletrônico brasileiro. BNDES 50 Anos: Histórias Setoriais. Rio de
Janeiro: BNDES, 12/2012
Revista Verde-Oliva. Ano XLI, nº 221, Brasília, EB/CCOMSEx, outubro 2013. Disponível
em: http://pt.calameo.com/read/0012382064b2b694df1df
PROENÇA Jr., D.. Indústria bélica brasileira. Rio de Janeiro: GEE/UFRJ, 1994.
ROSA, P. L. Da gênese da bomba à política nuclear brasileira. In: ARNT, R. (Org.) O
armamentismo e o Brasil: a guerra deles. São Paulo: Brasiliense, 1985. P. 29-67.
SENGHAAS, D. Armamento y Militarismo. Madrid: Siglo XXI, 1974.
SILVA, O. Capacidade de compra das Forças Armadas e sua contribuição para o
desenvolvimento econômico da nação. ROCHA, M. (Org.). Poder Aeroespacial e Estudos
Estratégicos. Rio de Janeiro: UNIFA, 2009.
SIMONSEN, R. C. História econômica do Brasil: 1500/1820. 8ª ed. São Paulo: Cia. Ed.
Nacional, 1978.
PREFEITURA DE SÃO BERNARDO DO CAMPO. São Bernardo do Campo, Grande ABC:
nova fronteira da indústria de defesa. São Paulo: MP Editora, 2011.
SODRÉ, N. W. História militar do Brasil. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010.