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II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores
EDUCAÇÃO BÁSICA: FORMAÇÃO DOCENTE PARA A MODALIDADE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
Fabíula Tatiane Pires, Maria Rita Neto Sales Oliveira
Eixo 1 - Formação inicial de professores para a educação básica
- Relato de Pesquisa - Apresentação Oral
Este artigo é resultado de uma pesquisa, em desenvolvimento, sobre a formação de professores no contexto da Educação Básica, particularmente, na modalidade de educação profissional (EP) que a essa se integra. A análise empreendida refere-se aos resultados de estudos que tratam da temática no período de 1998 a 2013 e que compõem a pesquisa. Importa ressaltar que embora, as buscas tenham se dado nesse período, em relação à produção só se encontraram estudos sobre a temática no período de 2004 a 2012. Justifica-se a escolha do mesmo por sua relevância, sobretudo, no que se refere às alterações quanto às políticas para a EP e que influenciaram e influenciam a formação docente para essa modalidade. Por se tratar de um contexto específico, EP, selecionaram-se textos que anunciam explicitamente seu interesse por ele: a Coleção Educação Superior, v.8 – Formação de Professores para EPT, ano 2006 e a Revista Brasileira de EPT, ano 2008. Acrescentam-se a esses, textos de trabalhos recebidos para as reuniões anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), tanto nacionais quanto regionais, no Grupo de Trabalho (GT), que trata da formação de professores, no período mencionado. A análise dos textos apontam para sete temas de concentração dos estudos, são eles: carreira docente, demandas de formação e formação pedagógica, espaços de formação, conteúdos de formação, relação trabalho e educação, desafios e síntese. Os resultados das análises expressam algumas das particularidades da formação docente para EP. Palavras-chave: educação básica, educação profissional, formação de professores.
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EDUCAÇÃO BÁSICA: FORMAÇÃO DOCENTE PARA A MODALIDADE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
Fabíula Tatiane Pires; Maria Rita Neto Sales Oliveira. CEFET, MG
1 - Introdução
Este artigo é resultado de uma pesquisa, em desenvolvimento, sobre a formação de
professores no contexto da Educação Básica, particularmente, na modalidade de
educação profissional (EP) que a essa se integra. A análise empreendida refere-se aos
resultados de estudos que tratam da temática no período de 1998 a 2013 e que
compõem a pesquisa. Embora, as buscas tenham se dado nesse período, em relação à
produção só se encontraram estudos sobre a temática no período de 2004 a 2012.
Justifica-se a escolha do mesmo por sua relevância, sobretudo, no que se refere às
alterações quanto às políticas para a EP. Por se tratar de um contexto específico,
selecionaram-se textos que anunciam explicitamente seu interesse por ele: a Coleção
Educação Superior, v.8 – Formação de Professores para EPT, ano 2006 e a Revista
Brasileira de EPT, ano 2008. Acrescentam-se a esses, textos de trabalhos recebidos para
as reuniões anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
(ANPEd), tanto nacionais quanto regionais, no Grupo de Trabalho (GT), que trata da
formação de professores, no período mencionado.
2 - Formação docente para EP na legislação brasileira
No que se refere à legislação para a educação nacional e para a educação
profissional, em particular, as duas últimas décadas do século XX e a primeira do século
XXI representaram amplo movimento de debates e disputas. Na década de 80, a Lei
7044/82, extinguia a obrigatoriedade, dada pela Lei 5692/71, de profissionalização para o
ensino de 2º Grau. O que manteria, legalmente e na prática, o caráter dual de ensino de
2º Grau. A proposta de alteração da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) nº 4024/1961 inicia-
se na década de 90. Os objetivos da nova LDB nº 9394/1996 convergiam para a
constituição de um sistema nacional de educação, que se organizou em dois níveis: a
educação básica composta pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio,
e a educação superior.
Embora a LDB 9394/96 não regulamentasse particularmente a formação docente
para a EP, ao especificar, em seu artigo 39, a integração da EP aos diferentes níveis e
modalidades da educação, permitiu que se lhe aplicasse a mesma orientação dada à
Educação Básica e Educação Superior. Nesse sentido a formação mínima exigida, com
exceção da educação infantil, tal como estabelecido nos artigos 62 e 66 da referida lei,
seria: na educação básica, a licenciatura, de graduação plena e, no magistério superior, o
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nível de pós-graduação. Em 1997 por meio do Decreto 2.208, foram regulamentados o §
2º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da nova LDB. O tratamento dado à formação docente foi
um ponto criticado do decreto, pois, nele, para a docência, no nível técnico (cursos
concomitantes ou subsequentes ao Ensino Médio), reforça-se o caráter especial dessa
formação e legitima-se a sua desvalorização, uma vez que, para a função nas disciplinas
técnicas, poderiam ser recrutados não só professores, mas, também instrutores e
monitores (art. 9º). Por meio da Resolução 2/1997, os programas especiais de formação
pedagógica são propostos também para a EP com caráter equivalente à diplomação em
licenciatura, a despeito da sua carga horária reduzida em comparação com a dos cursos
de licenciatura.
Em 2001 foi aprovado o Plano Nacional de Educação, Lei nº 10172, e em seu item
7.3 definem-se objetivos e metas da Educação Tecnológica e Formação Profissional. Ao
analisa-las, no entanto, Machado (2008) conclui que não são explicitas as modificações
pretendidas, nem tão pouco é alterado o caráter especial dos programas de formação
docente. Três anos depois, o decreto 2.208/97 foi revogado e a EP recebeu uma nova
regulamentação, por meio do decreto 5.154/2004. Sua principal contribuição pautou-se
na possibilidade de reintegração da EP técnica de nível médio ao Ensino Médio. Ao
analisá-lo Oliveira (2011) atribui-lhe um caráter conciliador, pois, sem revogar as demais
formas de articulação da EP, possibilita a integração desta.
Sem explicitar, diretamente, a formação docente, as mudanças do decreto
5.154/04 na EP, indiretamente, implicaram demandas para a formação dos professores
dessa modalidade, em especial em seu preparo para a então integração curricular, como
mostram os resultados dos estudos de Gomes (2004) e Fernandes et al (2011). A
questão do currículo integrado foi indicada na pesquisa de Gomes (2004), como uma das
principais dificuldades encontradas pelo professor da EP. Junto a isso e reconhecendo a
complexidade de se pensar a formação dos docentes da EP, Fernandes et al (2011)
elencaram, com base em entrevistas feitas com sujeitos de um Instituto Federal de
Educação, suas demandas de formação continuada. Os resultados convergem para
aspectos próprios das Ciências da Educação, em especial para os saberes pedagógicos:
25% desejam formação sobre o currículo integrado, 19% em didática, mesmo índice
daqueles que desejam formação sobre avaliação e 14% sobre a elaboração de projetos
(p.2).
A Rede Federal de Educação foi redefinida por meio da Lei 11.892/2008, que cria
os Institutos Federais (IF). A eles compete, entre outras atribuições, ministrar cursos de
licenciatura, além dos programas especiais de formação pedagógica para a formação de
professores da educação básica e para EP (Seção III, art. 7º). Assim, a formação docente
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para a educação básica na Rede Federal tem sua oferta ampliada. A criação dos
Institutos, a consequente expansão da EP e o número de funções docentes impõem uma
reflexão sobre o melhor perfil destes para os cursos ofertados, bem como uma
redefinição quanto à sua formação inicial e continuada.
Desta visão geral sobre a política de formação docente para a EP conclui-se, tal
como apontado por Oliveira (2005), que esta continua marcada por um caráter “especial”
e “emergencial”, além da falta de integralidade própria. Neste caso consolidou-se, pelos
programas especiais, o acréscimo da formação pedagógica à formação profissional
superior, na área em que o profissional leciona. Falta à área uma política de Estado que
se comprometa com “o fortalecimento das relações entre cultura e trabalho, entre ciência,
técnica e tecnologia, e a integração entre formação geral e formação específica”
(OLIVEIRA, 2005, p.16) em favor dos sujeitos da EP.
3 - A formação docente para a EP nas publicações
A seguir, apresentam-se as fontes de referência de publicações que direta ou
indiretamente abordaram a formação docente para EP, no período de 2004 a 2012.
Textos sobre a formação docente para a EP Fonte Artigos
ANPED 11
Coleção Educação Superior, v.8 – Formação de Professores para EPT 10
Revista Brasileira de EPT 2
TOTAL 23
Fonte: sítio da Anped: www.anped.org.br sítio do INEP: www.publicacoes.inep.gov.br
Utilizou-se como critério de busca: a leitura dos títulos, identificando suas relações
com a formação docente para a EP. Posteriormente os textos foram lidos na íntegra, e o
resultado de suas análises será apresentado a seguir.
Dos 11 trabalhos presentes nas reuniões da ANPEd, três não explicitaram
palavras-chave, à semelhança do que ocorreu em todos os artigos presentes nas demais
fontes de referência. Nesses casos, o esforço feito para apontá-las, pautou-se em
indicação das categorias presentes no título acreditando referir-se aos temas que estão
sendo pesquisados. Como fruto desta primeira análise, o quadro 1 registra as palavras-
chave presentes nos textos, quer as indicadas, quer as que emergiram de categorias
presentes nos títulos desses.
Na primeira fase foram levantadas 28 palavras-chave, não comuns, que
posteriormente foram agrupadas, por semelhança quanto à abordagem feita nos textos.
Ressalta-se que as palavras do quadro 1 foram indicadas exclusivamente pelos autores
dos textos, as exceções são indicadas por asterisco (*) seguidas de explicação em nota.
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Quadro 1 – Palavras-chave em textos sobre a formação de professores para a EP
Palavras Chave Frequência
Educação 1
Formação de Professores* (inicial/continuada) 17
PROEJA 1
EPT /EP* 17
Movimentos construtivos da docência/aprendizagem da docência/ carreira docente/docência / atributos docentes 7
E. Médio integrado 1
Inovação educativa/ diferenciais inovadores*(trata-se da formação de professores para a EP) 2
Rede Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica (RFEPCT) / Itituto Federal (IF)* 3
Educação Tecnológica/ Cursos superiores de tecnologica/ Licenciatura tecnológica* 3
Estado do conhecimento( trata-se de publicações sobre a formação de professores em institutos federais de educação profissional e tecnológica) / aspectos históricos ( trata-se da formação de professores para a EPT) 2
Legislação ( trata da formação de professores para a EPT)/ Políticas públicas ** 3
organização curricular** 1
Ensino Superior** 1
Relação trabalho e educação / indústria e escola** 2
Educação socialmente produtiva** 1
* Categorias comuns tanto na indicação nos textos, quanto inferidas pelos títulos.
** Categorias inferidas a partir dos títuos dos textos O objetivo do levantamento dessas palavras é sintetizar os principais pontos
discutidos nas publicações: 74% dos textos referem-se à formação de professores e ao
contexto da EP; 30% buscam identificar o processo de construção da docência nessa
modalidade; 13% se debruçam sobre a RFEPCT, a oferta de cursos superiores de
tecnologia, que têm aquela como locus privilegiado, e as políticas públicas que
regulamentam a oferta desses cursos em 9% são resgatados os aspectos históricos da
EP, bem como as inovações na área e a relação trabalho e educação, categoria, que
segundo Oliveira (2011) tem se consolidado na EP; finalizando, as seis palavras-chave
restantes, congregam 4% de frequência, cada, demonstrando a particularidade dos
estudos na área da formação docente para EP.
A seguir far-se-á a análise de conteúdo propriamente dito das 23 publicações,
agrupadas por temas, sem, contudo, perder de vistas suas particularidades. Pela análise
os textos se distribuem por sete temas, tal como evidencia a tabela a seguir.
Temas sobre a formação docente
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Temas FrequênciaCarreira docente 3Demandas de formação e formação pedagógica 5Espaços de formação 7Conteúdos de formação 3Relação trabalho e educação 1Desafios 2Síntese 2Total 23
Fonte: Textos analisados
Há uma maior concentração de estudos que investigam e espaços e demandas
de formação docente para a EP, o que poderia ser justificado, entre outros, pela
expansão da RFEPCT. Pela frequência dos outros cinco temas verifica-se uma dispersão
dentro do campo formação docente para EP.
3.1 – Carreira docente
Abordando o contexto, de uma instituição do sistema S, Siewerdt et al (2012),
descrevem o perfil encontrado, dos docentes: formação stricto sensu é uma realidade da
minoria dos professores, e, quando ocorre, dá se no nível de mestrado; a maior carga
horária destinada à formação continuada refere-se às áreas técnicas e não propriamente
à pedagógica; a produção científica dos docentes é considerada baixa, em se tratando de
artigos científicos ou livros publicados. Diferentemente desse perfil, Visentini et al (2012)
têm como sujeitos da pesquisa, em sua maioria, professores doutores. Essa formação
pautada na pesquisa não altera a lacuna já apresentada por Gomes (2004): a ausência
de formação pedagógica.
A dispersão nas características da formação docente para EP demonstra seu
caráter historicamente fragmentário, demandando, à semelhança do que foi apresentado
por Valle (2008), ao referir–se à educação de forma geral, que se encontre: “uma
proposta de formação de profissional de educação que seja um referencial, porque cada
instituição, cada sistema está seguindo o seu caminho e fazendo do seu jeito.” (VALLE,
2008, p.88).
O início da carreira docente difere-se não só quanto às características da formação
inicial, mas também quanto á própria instituição em que se dá esse início. Visentini et al
(2012), revelam os primeiros momentos da docência em uma Escola Técnica da
Universidade Federal de Santa Maria, em cursos superiores de tecnologia“(...)os
primeiros anos da carreira docente caracterizaram-se pela ambivalência em relação aos
sentimentos de frustração e satisfação destes profissionais.(...)”( p.1).
3.2 – Demandas de formação e formação pedagógica
Indagando-se sobre a presença ou não de especificidades quanto às experiências e
representações dos professores da EP em relação aos professores da educação básica,
Burnier (2006) desenvolve uma pesquisa com 17 professores de escolas
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profissionalizantes. Os resultados apontam que para os professores a solidez de sua
experiência no chão de fábrica bem como o domínio dos conteúdos e técnicas, próprios
de sua área de atuação, são requisitos básicos para o exercício “natural” da docência,
argumento reforçado pelo Decreto 2208/97. Isto não impede, porém, que percebam a
fragilidade de sua formação quanto aos saberes pedagógicos necessários à prática
docente, o que levou alguns a qualificar-se através dos Programas Especiais ou em
outras modalidades semelhantes.
O estudo de Maciel et al (2010), corrobora a necessidade de se investir na
formação docente para a EP. Ao acompanhar a trajetória de iniciantes na docência, em
instituições públicas, em concomitância com a participação deles em programa especial
de formação de professores, as autoras destacam mudanças em suas posturas:
preocupação com as relações afetivas professor-aluno; desconstrução da exclusividade
da pedagogia tradicional; preocupação com questões éticas; compromisso do educador
com a sociedade; reconhecimento da importância do papel do educador como motivador;
maior tendência à problematização; e reconhecimento das necessidades de formação no
exercício da docência. Somam-se a essas as contribuições de Franco (2008). Para a
autora, a formação de professores para a EPT deve pautar-se nos “fins da educação do
aluno”: os professores, ao vincularem-se a uma instituição devem “pensar nas bases e
diretrizes da educação na sua historicidade, que é o nosso espaço de trabalho” e por fim
cabe “pensar nos desafios dessa educação que se refere ao mundo do trabalho e de
suas contradições”. (p.43).
O quesito experiência, embora, reconhecido como formador parece não ser
fundamental quando se trata, por exemplo, da formação docente, em nível de
especialização, para o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a
Educação Básica, na modalidade da Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), tal como
apontam os resultados de pesquisa de Benaduce (2012), por meio da análise de relatos
autobiográficos, concluiu-se que, dos sujeitos da pesquisa, “cerca de metade nunca
atuou como professor da Educação de Jovens e Adultos, que a maioria absoluta não
trabalhou com a Educação Profissional e alguns sequer sabiam o que era PROEJA”
(BENADUCE, 2012, p. 3-4), os entrevistados justificavam a escolha pelo curso como
forma de aperfeiçoamento demonstrando valorização da formação acadêmica.
Carvalho (2008, p. 142-149) aponta algumas tendências na formação profissional,
identificadas em pesquisas realizadas em diferentes países: “descentralização dos
sistemas e das ações de formação profissional”, “privatização”, “convergências nas
políticas de formação e utilização de mão de obra”, “surgimento de uma nova filosofia
pós-taylorista fordista”, “importação de determinados aspectos considerados bem
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sucedidos nas reformas em curso”, “expansão da oferta de formação profissional”, no
Brasil, “valorização do nível médio das competências e das qualificações”, “mudança na
estrutura da educação técnico profissional demanda uma formação que integre trabalho e
educação”, “mudança na concepção do processo de ensino-aprendizagem”, “autonomia
das escolas nos planos cultural, pedagógico e administrativo” e, por fim, “inclusão da
formação em contexto de trabalho e o reconhecimento da informalidade da
aprendizagem”.
3.3 - Espaços de formação
Embora havendo demanda para formação docente na EP, uma pesquisa do tipo
“estado do conhecimento”, realizada por Baptaglin (2012) revela a ausência, no Brasil, de
espaços dedicados à formação docente para os cursos técnicos e profissionalizantes,
tanto em sua área propedêutica quanto técnica. Nesse sentido, Oliveira (2008)
problematiza a falta de reflexão não só quanto à oferta, mas, também quanto à ausência
de Formação de Professores para a EP, na RFEPCT. Se por um lado a RFEPCT amplia
a oferta de formação de professores em licenciaturas ligadas às Ciências da Natureza e
Exatas, por outro não faz a opção pela formação do professor, naquelas disciplinas
técnica. Machado (2008) em texto base de uma palestra sobre a formação de
professores para a EPT afirma a necessidade de se pensar vias de formação docente
para EP, explicitando para tanto alvos e objetivos a fim de que não sejam proteladas as
ações.
Monteiro et al (2008) também discutem a presença/ausência das licenciaturas na
RFEPCT, retomando o caráter emergencial da formação docente bem como a falta de
conhecimento dos professores da EP quanto aos saberes próprios da docência. Os
autores contribuem, com base na experiência do Centro Federal de Educação
Tecnológica (CEFET)- Campos, com uma proposta de licenciatura tecnológica que busca
superar, embora reconhecendo as dificuldades, o caráter fragmentado dessa formação.
A formação docente foi analisada dentro do contexto das políticas públicas por
Gracindo (2008). Elas, segundo a autora, em grande medida têm proposto uma educação
“restrita e restritiva. Restrita e restritiva pela impossibilidade de universalização da
educação, com qualidade.” (GRACINDO, 2008, p.110).
Fazendo parte de uma política nacional mais ampla, os Institutos Federais de
Educação, Ciência e Tecnologia (IFECT) se apresentam, no cenário nacional, como
alternativa para ampliação da educação profissional e, para atender à grande demanda
por professores licenciados, sendo consideradas, portanto, instituições de educação
superior, básica e profissional. Flach (2012) e Lima (2012) destacam a atuação desses
Institutos na oferta de formação docente, retomando seu percurso histórico. O primeiro
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destaca como desafio a necessidade de se consolidar uma nova institucionalidade nos
Institutos recém-inaugurados. O segundo reafirma o caráter emergencial e especial da
formação de professores para EP, como uma consequência da expansão da
escolarização, baseada em pressões populares, em meados do século XX.
Tanto a ausência quanto á presença de espaços formativos para a docência na
EP abriga questões políticas, mas, também, dificuldades práticas, entre elas se a
RFEPCT possui tradicionalmente o conhecimento da EP não o faz, na mesma medida,
quanto ao conhecimento sobre as licenciaturas; ademais, não se trata de pensar uma
licenciatura, especificamente acadêmica, mas, estreitamente relacionada aos diferentes
eixos tecnológicos, aos diferentes setores da economia (industrial, comercial,
agropastoril, de serviços e de saúde).
3.4 – Conteúdos de formação
Se os espaços para a formação docente na EP têm se colocado como um desafio a
ser superado, desafiante também, é o conteúdo dessa formação. Moura (2008) faz
algumas considerações para se pensar esse conteúdo Para ele, a formação deve, entre
outros aspectos: ultrapassar a aquisição de técnicas didáticas de transmissão de
conteúdos; voltar-se para a preocupação com o ser humano e não com a formação
exclusiva para o mercado e o fortalecimento da economia; compreender o professor não
como um transmissor, mas, como um mediador no processo de ensino e aprendizagem,
que possui autoridade e responsabilidade, aliado à competência técnica própria de sua
área do conhecimento; orientar-se de forma crítica e reflexiva, pautada na
responsabilidade social; e, finalmente, ultrapassar os limites da educação bancária. Em
outro texto, apresentado em uma Mesa Redonda, Moura (2008), define dois grandes
eixos para a formação docente da EPT: o primeiro relaciona-se com o conhecimento
específico, adquirido na graduação; o segundo refere-se à formação didático-político-
pedagógico e às especificidades das áreas da EPT.
Estudos sobre os saberes docentes representam contribuições para se pensar o
conteúdo da formação docente, além de fortalecer a identidade própria desse
profissional. Pinto et al (2012) destacam os saberes em relação às práticas inovadoras de
docentes da EP pautadas não só na inovação, mas, também, na integração e na prática
social concreta. Essas inovações são propostas por docentes que, além do domínio dos
conhecimentos específicos da área, possuem formação pedagógica. Os autores
destacam: “Embora a Pós-Graduação não seja condição sine qua non para a inovação,
percebe-se que a maior parte dos professores que a realizam procuram modificar suas
práticas em direção à melhoria da aprendizagem” (PINTO, et al, 2012, p.4)
3.5 – Relação trabalho e educação
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A EP apresenta vínculos estreitos com o mundo do trabalho e o mercado de
trabalho, sendo fortemente influenciada por este. A relação entre o trabalho na fábrica e o
trabalho na escola, como uma forma possível de constituição da docência para os
professores da EPT, foi tratada em artigo de Negrini et al (2008), que buscou traçar tanto
as aproximações quanto os distanciamentos entre esses espaços. Os resultados
apontam a consciência de alguns professores sobre a necessidade do “saber pedagogia”
para atuar no espaço escola é preciso que as ‘técnicas’ também mudem para atender às
demandas da nova profissão. Revelam também a visão de alguns desses profissionais,
com experiências na indústria, sobre a instituição escolar: antes de ingressarem
efetivamente no trabalho como docentes concebem uma visão de escola ainda
relacionada ao tempo de infância e de aluno, não a reconhecendo na perspectiva do
trabalho, como uma instituição organizada, com regras e prazos à semelhança, por
exemplo, do que ocorre no espaço da indústria.
3.6 - Desafios
Ao longo das análises foram apontados alguns desafios postos à EP. A esses se
acrescenta pelo menos um identificado por Kuenzer (2008): o tratamento da relação entre
o conhecimento tácito e o científico. A categoria competência, no regime de acumulação
flexível, embora não privilegie, como no taylorista/fordista, a prática repetitiva e apurada,
não faz com que desapareça, a importância do conhecimento tácito em favor do
conhecimento científico. Antes, “se restabelece a dialética entre teoria e prática,
passando a competência a assumir dimensão práxica.” (KUENZER, 2008, p.22). Gomes
(2004) demonstra que os professores se mostram conscientes da necessidade de se aliar
o conhecimento teórico ao prático, uma vez que apenas a habilidade técnica é
insuficiente para uma melhor atuação do professor.
3.7 - Síntese
O artigo de Santos (2008), por sua característica – um pré-diagnóstico para
discussão de uma política de formação docente para a EPT – sintetiza muito das
discussões apresentadas. Organiza-se em três tópicos: “problemas que afetam a
formação docente”, englobando, a concepção de formação docente, a profissionalização
docente e a legislação; “propostas em pauta” que faz referência ao conteúdo da
formação, à legislação e à proposta de licenciatura; e, por fim, “esboço de proposta de
licenciatura a partir da experiência do CEFET/RN e CEFET/Campos”. Destacar-se-á o
último item, por se tratar de uma alternativa para a formação docente para a EPT. Pontos
essenciais que, segundo a autora, ao se pensar as licenciaturas para a docência na EPT,
devem ser considerados:
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(...) perfil de ingresso (...) e de saída – habilitação por área profissional, subáreas, ou por disciplinas desses cursos. (...) proposta de licenciatura a partir dos cursos superiores de tecnologia; propiciar a formação inicial para a docência em cursos tecnológicos com duração média entre três anos e meio e quatro anos. Os egressos desses cursos devem ter dupla habilitação para atuar como tecnólogos e como docentes; proposta pedagógica que valoriza a verticalização da EPT. (SANTOS, 2008, p.137-138)
4 – Considerações Finais
A análise dos textos expressam algumas particularidades da formação docente
para EP, entre elas: a carreira docente parece ser sensivelmente alterada pela instituição
em que se efetiva, pública ou particular, o que implicitamente revela um compromisso a
ser assumido por elas na oferta de formação continuada de seus professores; os estudos
sobre os espaços e demandas de formação ampliam-se, contudo, um número expressivo
dos trabalhos permanece indicando o caráter fragmentário dessas propostas, reiterando
a necessidade não só de intensificação do diálogo como também, de se propor uma
política perene para o campo; alia-se a esta necessidade, a intensificação de estudos
referentes aos conteúdos dessa formação, o que pode ser considerado um desafio dada
a diversidade de eixos tecnológicos e dentro de cada um desses a variedade de
disciplinas que os compõem; a introdução da discussão em torno do trabalho e da
relação entre educação trabalho parece ser ponto fundamental para uma proposta de
formação docente comprometida com um modelo de sociedade mais justa, sua
contribuição basicamente se dá no desvelamento da relação entre capital e trabalho
assentada na expropriação do saber do trabalhador, bem como na exploração de muitos
e no privilégio de alguns.
Finalmente pensar a formação docente para a EP requer pensar mudanças
práticas, mas, sobretudo, políticas que viabilizem uma nova proposta com vistas à
qualidade da educação.
Referências
BENADUCE, Marcia Isabel de Vargas. Relatos autobiográficos de professores em formação para o PROEJA. GT: 8, Anais do IX ANPEd SUL, 2012.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa diretrizes e bases da educação nacional. Brasil, Brasília, DF, 20 de dezembro de 1961.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. Brasil, Brasília, DF, 11 de agosto de 1971.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 7.044 de 18 de outubro de 1982. Altera dispositivos da Leia nº 5692, de 11 de agosto de 1971, referente a profissionalização do ensino de 2º grau. Brasil, Brasília, DF, 18 de outubro de 1982.
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BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 23 dez. 1996.
BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei Federal nº 9.394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasil, Brasília, DF, 17 de abril de 1997.
BRASIL. CNE. Resolução nº 2 de 26 de junho de 1997. Dispõe sobre os programas especiais de formação pedagógica de docentes para as disciplinas do currículo do ensino fundamental, do ensino médio e da educação profissional em nível médio. Brasil, Brasília, DF, 26 de junho de 1997.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Brasil, Brasília, DF, 9 de janeiro de 2001.
BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 5154, de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Brasil, Brasília, DF, 23 de julho de 2004.
BRASIL. Presidência da República. Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. Brasil, Brasília, DF, 29 de dezembro de 2008.
BURNIER, Suzana. A docência na Educação Profissional. ANPEd: 29ª R.A., GT08, Caxambu, 2006.
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