Humor e Decepção - Ética e Legislação Publicitária

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Universidade de São Paulo Escola de Comunicações e Artes Departamento de Relações Públicas, Turismo e Propaganda HUMOR E DECEPÇÃO Julia Isabel Miranda Travaglini Louise Stahl

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Trabalho realizado na disciplina de Ética e Legislação Publicitária, orientado pelo Prof. Dr. Leandro Batista, pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

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Universidade de São Paulo

Escola de Comunicações e Artes

Departamento de Relações Públicas, Turismo e Propaganda

HUMOR E DECEPÇÃO

Julia Isabel Miranda Travaglini

Louise Stahl

Trabalho de Ética e Legislação Publicitária

Professor Doutor Leandro Leonardo Batista

São Paulo, 2011

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JULIA ISABEL MIRANDA TRAVAGLINI

LOUISE STAHL

HUMOR E DECEPÇÃO

Trabalho apresentado à disciplina de Ética e Legislação Publicitária, ministrada

pelo Professor Doutor Leandro Leonardo Batista, como parte do requisito para

composição da nota final referente ao segundo semestre do ano de 2011.

São Paulo,

2011

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Sumário

1. Introdução2. Análises de Anúncios Publicitários2.1 Não Humorísticos e Decepcionantes2.1.1 Anúncio da Companhia AirFrance - Agência Auro RSCG2.1.2 Anúncio das lentes Varilux Especialistas, da empresa Essilor - Agência Publicis do Brasil2.1.3. Análise Conjugada2.2 Humorísticos e Não Decepcionantes2.2.1 Anúncio da Revista Época - Agência Neograma/BBH2.2.2 Anúncio do MasterCard Travel Card - Agência W/McCANN2.2.3 Análise Conjugada2.3 Humorísticos e Decepcionantes2.3.1 Anúncio da Renault Duster, da empresa Renault - Agência Neogama/BBH2.3.2. Anúncio da premiação GQ Men of The Year Brasil, da revista GQ Brasil - Agência LewLara\TBWA2.4 Não humorísticos e não decepcionantes2.4.1 Anúncio dos relógios Technos Slim - Agência Artplan2.4.2 Anúncio da H. Stern - Agência não identificada2.4.3 Análise Conjugada3. Conclusão4. Referências Bibliográficas

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1) Introdução

As questões éticas que envolvem a publicidade sempre foram

abordadas e discutidas. Apesar disso, muitas questões continuam por serem

resolvidas, como a publicidade dirigida ao público infantil, anúncio de bebidas

alcoólicas, a decepção causada pela propaganda, entre outros.

A propaganda, tendo como objetivo vender um produto, divulgar uma

ideia ou propagar uma marca, acaba por ressaltar e explorar os pontos

positivos do seu objeto de divulgação.  Através de artifícios, aqui tratados como

máscaras, a propaganda esconde defeitos, aumenta benefícios, explora

qualidades, acabando assim distorcendo a realidade. Segundo Moore (apud

Shabbir, H. & Thawaites, D., 1988) mascarar é um termo da psicologia e ocorre

quando o processamento de um estímulo é interrompido pela apresentação

imediata e subsequente de um estímulo diferente.  O segundo estímulo age

retroativamente, obscurecendo o anterior.  No contexto da propaganda, o

primeiro estímulo é o objetivo da mensagem, seja apresentar o produto ou

serviço ou difundir ideia, enquanto o segundo estímulo é a máscara. Essa

máscara altera a percepção do consumidor sobre a mensagem.

A percepção é baseada em experiências anteriores e conhecimentos

prévios, assim tende-se a enxergar a propaganda de forma que a mensagem

supra as expectativas, direcionando o olhar do receptor. Na propaganda, a

máscara atua distraindo o receptor, facilitando o processamento de falsas

percepções. Dessa forma, acaba por manipular o consumidor, pois altera sua

racionalidade, facilita associações ilusionárias, aumenta sua sensibilidade,

altera seu equilibrio emocional, fazendo com que passe a absorver sem critério

o que está implícito. Dentre os inúmeros tipos de máscara utilizados pela

propaganda atual, se encontra o uso de celebridades, o uso de manipulação

gráfica de imagens, humor, entre outros.  

No caso da utilização de famosos para estampar a propaganda, a

máscara serve para atribuir credibilidade à mensagem. Sendo a celebridade

um pessoa admirada pela sociedade, sua presença na propaganda traz

credibilidade ao produto anunciado. Assim, essa presença serve como

argumento que se sobrepõem sobre outros fatores que deveriam ser levado em

conta. Um exemplo é o anúncio do Fiesta Rocam com Deborah Secco e

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Anderson Silva, no qual inclusive citam a presença dos dois famosos (Anexo

1).

Outra máscara é a manipulação gráfica de imagens através de

programas, como photoshop e outros softwares. O anúncio da Academia Bio

Ritmo (Anexo2) é um exemplo ao qual se aplica esse tipo de máscara, pois

certamente a imagem da modelo foi manipulada através da computação.

Desse modo, o produto que está sendo anunciado - o corpo em sua melhor

forma - se torna perfeito, atraindo o consumidor a adquiri-lo.

Nesse trabalho analisaremos o papel do humor em relação às causas da

decepção.  O humor pode ser utilizado com o mesmo intuito de outras

máscaras, porém, a manipulação do receptor gerada através dessa máscara

pode desencadear consequências que merecem maior atenção. O humor,

enquanto máscara, funciona como o segundo estímulo apresentado pela

mensagem que age retroativamente sobre o primeiro, que como veremos

adiante, se trata do que é decepcionante.

Existem três tipos de humor utilizados como máscara para a decepção,

segundo Speck (apud Shabbir, H. & Thawaites, D., 1988). Um deles é o de

excitação, que aumenta o conteúdo emocional de qualquer tipo. Outro é o de

incongruência, tipo de humor que requisita do receptor um certo esforço para

entender a situação . Por último, existe o humor de depreciação. Esse tipo de

humor se caracteriza por apresentar uma mensagem que ressalta uma

situação fora do comum e em geral relacionadas a alguma caracterização do

indivíduo. Ao abordar esse tipo de situação corre-se o risco de causar ofensas

e decepção. Desse modo, o humor depreciativo se desprende das normas

morais, ou seja, a propaganda que se utiliza desse tipo de humor como

máscara de decepção pode ser interpretada como imoral.

No caso da propaganda, o humor possui diversos papéis. Entre eles se

foi estudado que pessoas em estado de humor positivo identificam falsas

informações, mas ainda desenvolvem simpatia pelo anunciante, o que acaba

por impedir o filtro dessas falsas informações e mais adiante leva a decepção.  

A decepção ocorre quando a propaganda passa uma percepção ou cria

falsas crenças na mente do consumidor. De acordo com Gardner (apud

Shabbir, H. & Thawaites, D., 1988), a decepção acontece quando a

propaganda deixa o consumidor com uma impressão ou crença diferente do

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que se esperaria dele, já que possui o conhecimento razoável para interpretar a

realidade. Essa impressão ou falsa crença potencialmente leva aos erros por

parte do receptor.

Segundo Carlson, Groove e Kangun (apud Shabbir, H. & Thawaites, D.,

1988), a decepção ocorre através de três mecanismos: ambiguidade, omissão

e mentira. A ambiguidade se caracteriza por possuir um significado

interpretativo demasiamente vago, ser demais amplo e não ter um sentido

claro. A omissão ocorre quando informações importantes e necessárias para a

avaliação da veracidade e da razoabilidade da mensagem não são reveladas.

Por último a mentira apresenta uma situação inviável ou uma realidade

fabricada.

O estudioso Ram N. Aditya (apud Shabbir, H. & Thawaites, D., 1988) cita

os possíveis erros cometidos pelo receptor em consequência da propaganda

decepcionante. Ele adiciona às definições anteriores o efeito potencial da

decepção a longo prazo, dando o foco para a parte mais importante: o público.

Essa mudança de perspectiva acaba por complementar, no assunto discutido

nesse trabalho, um dos artigos mais relevantes, porém constantemente

subestimado, do código do CONAR, o Artigo 17 de acordo com o qual ao

avaliar a conformidade de uma campanha ou anúncio aos termos do código, o

teste essencial é o impacto provável do anúncio a todos que recebam sua

mensagem. Dessa maneira a reação do consumidor acaba sendo, na maioria

das vezes, a faísca que dispara as discussões e julgamentos de anúncios

dentro do CONAR.

Apesar disso, o CONAR não possui artigos específicos para as

categorias de “decepção” ou de “humor”. O que ocorre para evitar que um

anúncio cause nos consumidores decepçãosão inumeros artigos que exigem o

respeito a verdade, honestidade, responsabilidade social em uma mensagem

publicitária. Fica bem claro, comparando com os tipos de decepção que já

descrevemos, como o CONAR pretende impedir isso através do parágrafo 2o. -

Alegações do Artigo 27, Seção 5, Capítulo 2 em que se lê:

O anúncio não deverá conter informação de texto

ou apresentação visual que direta ou indiretamente, por

implicação, omissão, exagero ou ambiguidade, leve o

Consumidor a engano quanto ao produto anunciado,

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quanto ao Anunciante ou seus concorrentes, nem

tampouco quanto à:

a. natureza do produto (natural ou artificial);

b. procedência (nacional ou estrangeira);

c. composição;

d. finalidade.

Máscaras, de qualquer tipo, quando usadas na publicidade, acabam

dificultando a identificação da propaganda decepcionante, tanto pelo CONAR,

quanto pelo consumidor, este que pode acabar acreditando em algo não

verificável sobre o produto ou marca e até mesmo tomando decisões que não

tomaria caso a mensagem da propaganda fosse sem máscaras. No caso da

máscara ser o humor esse papel se acumula ainda com mais outro no ato do

julgamento dos anúncios. O que se vê, é o uso frequente do humor como

argumento para a presença de certos aspectos na propaganda, o que dificulta

e muitas vezes altera a decisão do caso.

O uso do humor na propaganda não é proibido. Pelo contrário, hoje em

dia é cada vez mais incentivado como ferramenta da criatividade.  O grande

número de peças publicitárias com humor acaba tornando o consumidor

indiferente às decepções, sejam elas pequenas ou grandes, que decorrem do

uso desse tipo de máscara. A partir da análise de propagandas com conteúdo

húmorístico e não-humorístico e com decepção e sem decepção, pretendemos

observar e discutir o papel do humor em anúncios publicitários como máscara e

causa dos efeitos de decepção.

2) Análises de Anúncios Publicitários

2.1 Não Humorísticos e Decepcionantes

2.1.1 Anúncio da Companhia AirFrance - Agência Auro RSCG (Anexo 3)

O anúncio traz a imagem de um prédio rosado com duas janelas de

madeira, uma delas está sendo aberta por uma moça. Em volta dessa mesma

janela existe um planta trepadeira formando o desenho de um avião na parede.

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Abaixo da imagem, existe o seguinte texto: “O comandante e sua tripulação

desejam a todos um agradável despertar, após um sono sem nuvens em uma

poltorna-cama espaçosa na classe Affaires ou em uma cama com edredom e

travesseiro de pensas de ganso na classe La Première, e um serviço atencioso

para preservar o seu descanso”.

Nesse anúncio duas características chamam atenção, a partir da análise

do aspecto deceptivo da propaganda. Uma delas é a imagem utilizada para

estampá-lo, muito provavelmente essa imagem não é natural e foi manipulada

com programas para esse fim. O modo como se apresenta essa imagem faz

com que o receptor associe o avião com a própria casa. Essa associação não é

explícita, portanto, mesmo que mínima, existe um grau de manipulação do

consumidor através do anúncio. Outro aspecto na imagem que chama atenção

é a moça que abre a janela, uma jovem, loira e branca. O estereótipo utilizado

pode trazer muito significado ao objetivo do anúncio, já que o público-alvo é de

classe alta.

O texto abaixo da imagem garante total qualidade do serviço, por

exemplo, um sono tranquilo enquanto se voa. Porém, em se tratando do

anúncio de uma companhia aérea, um sono tranquilo não pode ser totalmente

garantido. Além disso, as informações divulgadas no anúncio não são

suficientes para que o consumidor conheça realmente o produto oferecido.

Portanto, esse anúncio pode ser considerado decepcionante. A falta de

informações suficientes e a garantia completa de satisfação significando uma

mentira, caracteriza a decepção presente no anúncio.

Para chamar a atenção do consumidor o anúncio não utiliza, portanto,

de humor e sim de uma linguagem visual e verbal que trabalham com a

emoção do consumidor. A imagem e o texto produzem sensação de

superioridade e de calma criando uma percepção diferente daquela esperada

do receptor se o anúncio não se utilizasse desses artifícios para tratar de

viagens aéreas. Criando essa percepção que supera as expectativas do

consumidor, o anúncio pode ser considerado decepcionante. Assim, todos

aspectos desse anúncio levam à conclusão de que se trata de anúncio que não

usa de humor e é decepcionante.

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2.1.2 Anúncio das lentes Varilux Especialistas, da empresa Essilor -

Agência Publicis do Brasil (Anexo 4)

O anúncio das lentes Varilux é composto pela imagem de uma família

que olha balões no céu, acompanhada da frase “Visão natural a qualquer

distância”. Ao fim da página, encontram-se algumas informações, entre elas a

frase “A Essilor investe toda a sua experiência óptica e seu conhecimento

sobre o funcionamento do olho no desenvolvimento de novas de novas

gerações de lentes que se adaptam a sua fisiologia de forma inigualável. O

olho e a lente se tornam um só, proporcionando a você visão natural a qualquer

distância’.

O que mais chama atenção no anúncio é a falsa garantia de uma boa

visão a qualquer distância. Sabe-se que isso não é possível apenas com boas

lentes, portanto, o anunciante está fazendo uma generalização. Essa

generalização, que pode ser considerada como uma hipórbole pois apresenta

exagero, tem por objetivo  criar uma outra visão do consumidor sobre o

anúncio.Além disso, o anúncio coloca o produto acima do nível de outros

produtos com a palavra “inigualável”.

Essas informações nos levam a concluir que o anúncio é decepcionante,

pois se utiliza de mentira. Outro tipo de decepção presente no anúncio é

causada pela falta de informações necessárias a serem apresentadas ao

consumidor através do anúncio.

Portanto, o anúncio das Lentes Varilux Especialistas não apresenta

informações suficientes e mostra falsas expectativas criando uma percepção

ao receptor da mensagem sem utilizar de humor, o que caracteriza um anúncio

não humorítistico e decepcionante.

2.1.3. Análise Conjugada

Os dois exemplos apresentam semelhanças que vão além de se

enquadrarem na categoria Não Humorísticos e Decepcionantes, neste trabalho

criada. A linha de pensamento sob a qual foram criadas é a mesma, imagens e

textos que juntos compõe uma percepção criada afim de levarem o consumidor

à compra não somente pelo produto, mas pelas sensações produzidas e

garantidas pelo anúncio.

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A decepção presente nesses exemplos não foi mascarada pelo humor,

porém por outras máscaras. Ainda sim, essa decepção não é favorável ao

consumidor e para isso a sociedade deve estar atenta.

2.2 Humorísticos e Não Decepcionantes

2.2.1 Anúncio da Revista Época - Agência Neograma/BBH (Anexo 5)

O anúncio faz parte de uma campanha da revista Época que tem como

objetivos promover a compra e leitura da revista e anunciar o novo projeto

editorial, o novo visual do veículo, que se diz acompanhar o mundo que não

para de mudar. Tudo isso e mais se lê em um pequeno texto ao fim da

segunda página da propaganda.

O humor é a principal maneira usada para atrair a atenção do

consumidor. Primeiramente a atenção do leitor da revista é atraída pela

imagem caricata, cômica e de cor vibrante do anúncio. Percebe-se que o que

está sendo representado é o mundo (planeta Terra) através de uma

personificação bem humorada, que corre em uma esteira.

A parte ilustrativa do anúncio sozinha, no entanto, não daria o mesmo

impacto e o mesmo humor que consegue quando associada ao texto escrito da

propaganda, no qual se lê: "Se tem tanta gente morrendo de fome, como

existem cada vez mais obesos? Entenda melhor o mundo em que você vive.

Leia Época." Através dessa questão que apesar de fazer parte da realidade, se

mostra um tanto paradoxal, por isso a escolha da mesma, o leitor acaba por

perceber o humor, mesmo que ligeiramente trágico, da pergunta e a maneira

como é colocada.

Por último, acrescentando ainda mais ao humor da propaganda, é feita a

associação entre a questão escrita e a imagem como representação caricata

dessa. Sem essa associação o anúncio não teria o mesmo impacto e nem o

mesmo humor que a propaganda completa tem. Pelo processo exigido do leitor

para compreender o humor presente no anúncio podemos classificar esse

como humor de incongruência.

Apesar da presença de humor nessa propaganda, consideramos que

esse anúncio não possuí decepção, pois o humor é usado de maneira criativa,

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com o objetivo de atrair a atenção do leitor e incentivar sua curiosidade. Além

disso, a parte humorística da propaganda não se refere ao produto ou a seus

atributos. O anúncio se torna menos decepcionante ainda ao apresentar um

texto explicativo e de tom mais formal, que torna clara a relação entre toda a

parte humorística do anúncio já descrita acima e o produto, a revista Época,

este sim que fala sobre o produto, seus atributos e faz um convite ao leitor, ler

a revista Época. Desse modo esse anúncio possuí conteúdo humorístico, mas

não tem decepção.

2.2.2 Anúncio do MasterCard Travel Card - Agência W/McCANN (Anexo

6)

O anúncio do MasterCard Travel Card também usa o humor na forma de

associação de um texto escrito com sua representação em forma de imagem

bastante literal e caricata. O primeiro impacto da propaganda está novamente

na imagem, que retrata um homem carregando em suas costas, com esforço

evidente, personagens animados, aparentemente fora de contexto, mas que

reconhecemos das notas de dólares, George Washington, Abraham Lincoln e

Benjamin Franklin. O contraste visual entre o executivo e o fundo nova-

iorquino, distinguível através do táxi amarelo e da Brooklyn Bridge à distância,

realistas e nada extraordinários com os três personagens das notas de dólares,

representados com cores e texturas semelhantes as originais da nota, de forma

meio animada  acaba atraindo muita atenção para a imagem.

Logo abaixo é possível ler: "Não é nada prático carregar dinheiro vivo

em viagens para o exterior.". Esta frase isolada não acrescenta nenhum humor

a propaganda, se referindo apenas a dificuldade e falta de praticidade que

viajantes costumam ter ao precisar carregar "dinheiro vivo", em notas, durante

as viagens.

Novamente quando se percebe que a imagem é a representação do

escrito de forma caricata e exagerada o humor é ainda mais evidente. A

interpretação literal de " carregar dinheiro vivo" feita na imagem com o homem

carregando os personagens históricos que figuram as notas de dólares torna o

anúncio mais atraente e com um humor mais inteligente. Assim como na

propaganda da revista Época, o leitor precisa ter todo um raciocínio e um

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mínimo esforço para compreender o humor desse anúncio, que também pode

ser considerado humor de incongruência.

O que torna essa peça publicitária, apesar de humorística, sem

decepção, é como o humor não chega a abordar o produto, apenas apontando

um problema. Em um box delimitado na mesma página do anúncio, vem, em

formato mais claro e formal,  a apresentação do produto, seus atributos, qual

sua relação com a parte humorística, neste caso uma alternativa ao "dinheiro

vivo" no exterior, e fornece o caminho para interessados obterem mais

informações.

2.2.3 Análise Conjugada

Podemos perceber muitas semelhanças entre esses dois exemplos de

anúncios humorísticos e sem decepção. Não apenas no tipo de humor que é

encontrado é o mesmo, de incongruência, mas sua sua construção segue o

mesmo caminho. A associação entre um texto com sua tradução literal em uma

imagem impactante e cômica leva ao humor.

Do mesmo modo, em ambos anúncios o que permite o uso do humor

sem causar decepção foi a nítida separação entre a parte humorística e a parte

informativa a respeito do produto. Apenas a última fazia referência a primeira,

enquanto o contrário não acontecia. Dessa maneira o humor é utilizado como

ferramenta da criatividade, procurando atrair a atenção do consumidor e não

como máscara para alterar a percepção do consumidor a respeito das

mensagens, marcas e produtos.

2.3 Humorísticos e Decepcionantes

2.3.1 Anúncio da Renault Duster, da empresa Renault - Agência

Neogama/BBH (Anexo 7)

O anúncio do carro Duster traz a imagem do produto em uma paisagem

natural. No topo da primeira página do anúncio existe um cartão de visita de

um psicólogo. Acima desse cartão existe a frase “Nossas desculpas a quem

comprou um SUV ontem. Mas ao menos temos uma dica para ajudar: ligue pra

ele”. Não fica claro que o consumidor deve ligar para o psicólogo porque se

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abalou, já que comprou um carro no dia anterior e lançaram outro do dia em

que o consumidor está lendo o anúncio. É preciso pensar para entender o

humor. Nesse tipo de humor, o de incongruência, é exigido do receptor da

mensagem certo esforço para entender a situação.

Certamente nenhum consumidor irá ligar para um psicólogo porque

ficara abalado por ter comprado um carro ontem e terem lançado um novo

hoje. A mensagem transmitida pelo anúncio se utiliza, portanto, de uma

realidade fabricada e de estereótipos, pois quem tem problemas deve ir ao

psicólogo. Dessa forma, o anúncio apresenta-se decepcionante.

Enfim, o anúncio da Renault é caracterizado por conter humor de

incongruência e decepção através da mentira, formulando uma nova percepção

ao consumidor que desvia sua atenção do produto e do objetivo final do

anúncio.

2.3.2. Anúncio da premiação GQ Men of The Year Brasil, da revista GQ

Brasil - Agência LewLara\TBWA (Anexo 8)

O anúncio da premiação é extremamente simples, conta com a foto de

uma instalação de metal pendurada por cordões, com o nome da premiação

“GQ Brasil, Men of The Year”. Ao lado da instalação, existe um texto, no qual a

primeira frase é “Para conhecer os homens do ano, leia a GQ. Para ser um

deles, também”.

Esse anúncio segue as mesmas características do exemplo anterior, em

que o humor é do tipo incongruente, é preciso pensar para entender a graça do

anúncio. Além disso, a mensagem produz uma realidade, a de que se um

homem que simplesmente lê a revista GQ se tornará um homem no ano. Essa

realidade é produzida através da ambiguidade presente na frase. Então,

concluímos que esse anúncio é humorístico através da incongruência e

decepcionante pela ambiguidade e pela mentira.

2.3.3. Análise Conjugada

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Nos dois exemplos de anúncios analisados o tipo de humor utilizado e o

tipo de decepção são os mesmos, humor de incongruência e decepção através

da mentira, respectivamente. Porém as características em comum não cessam

nesses aspectos. O público-alvo que os dois pretendem atingir é o mesmo:

homens maduros, com maior repertório e até com maior capacidade financeira.

Esse quesito influencia muito na construção do anúncio, em como ele foi

pensado pelos.

A partir disso, podemos perceber que os dois anúncios foram

elaborados de tal maneira que é preciso pensar no humor para entendê-lo. Isso

faz com que o consumidor que possui capacidade suficiente de interpretação

se distraia com a máscara e não perceba a decepção a qual é submetido.

2.4 Não humorísticos e não decepcionantes

2.4.1 Anúncio dos relógios Technos Slim - Agência Artplan (Anexo 9)

O anúncio dos relógios da linha Slim da marca Technos é bastante

simples. Sobre um fundo neutro quatro relógios são exibidos com seus

respectivos códigos do produto, sendo que um deles está em maior escala

ocupando quase metade da página. Nos espaços sem as imagens se

encontram o logotipo da marca e logo abaixo a palavra "Slim" ligada ao relógio

maior, dando a entender que se refere a uma linha de produtos. Ainda no

mesmo anúncio em letras simples, pretas e sem maior destaque estão escritas

as palavras "Leveza, conforto, sofisticação." caracterizando os produtos e a

marca.

Este anúncio não se utiliza de outros truques, artificios ou até mesmo

ferramentas criativas para atrair a atenção do leitor da revista. Acreditamos que

o que irá atrair por fim, no mínimo a atenção é o tamanho do maior relógio, que

se destaca aos olhos do leitor. Assim o anúncio não apresenta nenhuma

máscara e principalmente nenhum tipo de humor.

A propaganda cumpre a sua função de apresentar para o leitor a

existência do produto, sem utilizar artifícios e sem criar expectativas sobre o

produto. Dessa maneira ela acaba sendo uma propaganda não humorística e

sem decepção.

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2.4.2 Anúncio da H. Stern - Agência não identificada (Anexo 10)

O anúncio da joalheria H. Stern também é marcado pela simplicidade. O

grande impacto é causado pela beleza da imagem, muito natural apesar das

jóias, através da elegância da famosa modelo, Katie Holmes. O fundo branco, a

pose singela, o vestido que pouco aparece, os cabelos presos e maquiagem

apenas essencial, dão o espaço necessário para a beleza da atriz mostrar

como as jóias são o acessório perfeito para realçar a elegância natural de

qualquer mulher.

Essa peça publicitária não utiliza nenhum tipo de humor, por outro lado

usa outros tipos de máscara como o uso de celebridades, Katie Holmes, que é

ressaltado também no anúncio abaixo do logotipo da marca, onde se lê: "Katie

Holmes usa jóias H.Stern". Também pode-se perceber, ou ao menos supor,

que houve manipulação de imagem, para tornar a composição com a atriz, que

já é linda naturalmente, e as jóias perfeita para esse anúncio.

Consideramos que essa propaganda não é deceptiva apesar do uso de

máscaras citadas acima por diversos motivos. O principal deles é que

acreditamos que os consumidores dessa propaganda e desse produto

conseguem discernir entre as características da celebridade, usada como

exemplo de beleza e graça, e os benefícios que serão trazidos pelo uso das

jóias como mais elegância e status. Assim havendo essa separação entre as

máscaras e a marca e seus produtos essa propaganda é não humorística e

sem decepção.

2.4.3 Análise Conjugada

No caso desses dois anúncios considerados sem conteúdo humorístico

ou decepcionante também podemos ver semelhanças em suas características.

Os dois anúncios são muito simples, compostos principalmente de imagem e

muitas poucas expressões verbais. São propagandas que não chamam tanto a

atenção do leitor da revista e possuem cores neutras. É curioso notar que

ambos exemplos que pegamos são de acessórios, relógios e jóias

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respectivamente. Nos dois anúncios quase nada se diz a respeito do produto o

que acabe por evitar a decepção.

3) Conclusão

Com o objetivo de entender as relações entre o humor em anúncios

publicitários e a decepção chegamos ao final desse trabalho. Como dissemos

no início, o humor é uma das questões éticas da propaganda que esteve

sempre em debate e assim permanecerá por muito tempo. Pudemos perceber

que nesse assunto, não tendo a ajuda do CONAR com o estabelcimento de

parâmetros tanto para humor quanto para decepção e apesar de, através de

textos, entendermos e dividirmos os tipos de humor e decepção, cabe a nós

julgar cada exemplo em uma experiência um tanto empírica.

Com a separação que fizemos juntando todas as possibilidade de

presença de humor ou não e decepção ou não pudemos notar detalhes

condicionados pela visão de estudantes de publicidade. Pudemos perceber que

as propagandas com humor foram consideradas muito mais atrativas e

interessantes. O que se nota é que o humor não é utilizado sempre como

máscara que leva a decepção, como vemos em dois dos exemplos, mas em

todos os quatro casos acaba sendo o principal ponto de atenção da

propaganda.

Vemos também que outras máscaras geram tanta decepção quanto o

humor, sendo que essas estão sendo exploradas por serem mais comuns em

nosso cotidiano, assim temos menos "filtros" no momento de uma propaganda.

O que concluimos é que cada vez mais o consumidor possui mais

maneiras, mais recursos e mais informação que o permite fazer uma separação

entre o que é máscara e o que é a informação verdadeira, a realidade, a

respeito do produto ou marca. As máscaras ainda serão usadas e ainda haverá

decepção, porém pouco a pouco o que chamamos de máscaras passam a ser

ferramentas criativas.

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4) Referências Bibliográficas

CONAR, Código e anexos. Disponível em <http://www.conar.org.br/>

Acesso em: 30/10/11

ÉPOCA, São Paulo: Editora Globo. ed. 702 2011

Shabbir, H.A., Thwaites, D. (2007) The Use of Humor to Mask

Deceptive Advertising - It's No Laughing Matter! Journal of Advertising, Vol 36,

No.2, p. 75-87.

VEJA, São Paulo: Editora Abril. ed. 2241 ano 44 no. 44 2011