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Como Diagnosticar e Tratar Hipertensão arterial sistêmica Systemic arterial hypertension Rodrigo Pinto Pedrosa Pós-graduando do Instituto do Coração (InCor). Médico assistente da Divisão de Clínica Médica do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP). Luciano Ferreira Drager Médico assistente da Unidade de Hipertensão do Instituto do Coração (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Recebido para publicação em 11/2008. Aceito em 11/2008. © Copyright Moreira Jr. Editora. Todos os direitos reservados. Indexado na Lilacs sob nº: S0034-72642008001300009 Unitermos: hipertensão arterial, sistema cardiovascular, terapêutica. Unterms: arterial hypertension, cardiovascular system, therapeutics. Numeração de páginas na revista impressa: 74 à 84 Resumo A hipertensão arterial sistêmica é um dos mais importantes fatores de risco para a ocorrência de doenças como o acidente vascular cerebral, o infarto do miocárdio e a insuficiência cardíaca. O diagnóstico e tratamento precoces são as ferramentas de prevenção de grande impacto socioeconômico, devendo ser divulgados e implementados nos diversos níveis de atenção à saúde. O presente artigo tenta padronizar o diagnóstico e tratamento da hipertensão arterial de forma prática e didática para o clínico geral. Introdução A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é condição com alta prevalência no mundo, acarretando gastos com o tratamento das suas complicações de proporções vultosas. O subdiagnóstico é freqüente e, por tratar-se de condição essencialmente assintomática, acarreta efeitos deletérios no sistema cardiovascular, ao longo de décadas, antes do seu diagnóstico. Cerca de 90% a 95% dos pacientes hipertensos são considerados como portadores de hipertensão primária(1), o que significa que as causas precisas são desconhecidas. Indubitavelmente, a HAS é em sua grande maioria de origem poligênica e apresenta interação direta com fatores ambientais(2). Estudos genéticos de associação têm identificado polimorfismos em diversos genes candidatos para a hipertensão, porém ainda não se pode quantificar com exatidão a importância relativa de cada polimorfismo na etiopatogênese da hipertensão. Casos de hipertensão monogênica são raros e freqüentemente subdiagnosticados. Em 5% a 10% dos casos a hipertensãoé secundária, ou seja, são identificadas doenças responsáveis pela gênese da hipertensão (ver adiante). Diagnóstico e classificação A medida da pressão arterial é comprovadamente o elemento chave para o estabelecimento do diagnóstico da HAS. De acordo com as V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, classificamos os níveis de pressão arterial conforme a Tabela 1.

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Como Diagnosticar e Tratar

Hipertensão arterial sistêmica

Systemic arterial hypertension

Rodrigo Pinto Pedrosa

Pós-graduando do Instituto do Coração (InCor). Médico assistente da Divisão de Clínica Médica do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP).

Luciano Ferreira Drager

Médico assistente da Unidade de Hipertensão do Instituto do Coração (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Recebido para publicação em 11/2008. Aceito em 11/2008.

© Copyright Moreira Jr. Editora.

Todos os direitos reservados.

Indexado na Lilacs sob nº: S0034-72642008001300009

Unitermos: hipertensão arterial, sistema cardiovascular, terapêutica. Unterms: arterial hypertension, cardiovascular system, therapeutics.

Numeração de páginas na revista impressa: 74 à 84

Resumo

A hipertensão arterial sistêmica é um dos mais importantes fatores de risco para a

ocorrência de doenças como o acidente vascular cerebral, o infarto do miocárdio e a

insuficiência cardíaca. O diagnóstico e tratamento precoces são as ferramentas de

prevenção de grande impacto socioeconômico, devendo ser divulgados e implementados

nos diversos níveis de atenção à saúde. O presente artigo tenta padronizar o diagnóstico e

tratamento da hipertensão arterial de forma prática e didática para o clínico geral.

Introdução

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é condição com alta prevalência no mundo,

acarretando gastos com o tratamento das suas complicações de proporções vultosas. O

subdiagnóstico é freqüente e, por tratar-se de condição essencialmente assintomática,

acarreta efeitos deletérios no sistema cardiovascular, ao longo de décadas, antes do seu

diagnóstico.

Cerca de 90% a 95% dos pacientes hipertensos são considerados como portadores de

hipertensão primária(1), o que significa que as causas precisas são desconhecidas.

Indubitavelmente, a HAS é em sua grande maioria de origem poligênica e apresenta

interação direta com fatores ambientais(2). Estudos genéticos de associação têm

identificado polimorfismos em diversos genes candidatos para a hipertensão, porém ainda

não se pode quantificar com exatidão a importância relativa de cada polimorfismo na

etiopatogênese da hipertensão. Casos de hipertensão monogênica são raros e

freqüentemente subdiagnosticados. Em 5% a 10% dos casos a hipertensãoé secundária,

ou seja, são identificadas doenças responsáveis pela gênese da hipertensão (ver adiante).

Diagnóstico e classificação

A medida da pressão arterial é comprovadamente o elemento chave para o

estabelecimento do diagnóstico da HAS. De acordo com as V Diretrizes Brasileiras de

Hipertensão Arterial, classificamos os níveis de pressão arterial conforme a Tabela 1.

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A publicação do VII JNC (Joint National Committee), em 2003, forneceu uma nova

classificação da hipertensão arterial e introduziu o conceito de pré-hipertensão (Tabela 2).

O termo pré-hipertensão não significa uma condição de doença. Ele foi introduzido como

forma de alertar o médico para a promoção de modificações no estilo de vida, já que os

dados da Coorte de Framingham mostraram que pacientes com estes níveis pressóricos

têm uma incidência maior de doenças cardiovasculares no seguimento de dez anos em

relação às pessoas com níveis pressóricos abaixo dos mencionados.

Hipertensos que usam três ou mais drogas em doses máximas toleradas, incluindo

preferencialmente um diurético entre elas, e que ainda não têm a PA controlada são

classificados como hipertensos resistentes ou refratários(3). Aqueles que, usando quatro

ou mais drogas, apresentam controle pressórico, são considerados resistentes controlados.

Essa classificação é útil para uniformizar as informações científicas, bem como para alertar

o clínico da necessidade de investigação de HAS secundária nesses pacientes.

Monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA)

A MAPA é o método que permite avaliar o comportamento fisiológico da pressão arterial

nas 24 horas. Diversos estudos demonstram maior correlação entre os níveis de pressão

da MAPA com lesões em órgãos-alvo em comparação com a medida casual da pressão

arterial(4-7).No entanto, a medida de consultório ainda é o principal instrumento no

diagnóstico da HAS, não devendo ser subvalorizada. As principais indicações da

monitorização ambulatorial da pressão arterial são:

· Hipertensão de consultório ou do avental branco

· Avaliação da hipertensão arterial resistente

· Suspeita de episódios de hipotensão arterial sintomática

· Avaliação da eficácia da terapêutica anti-hipertensiva.

Fonte: V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, 2006.

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Fonte: Modificado de Chobanian AV, Bakris GL, Black HR et al. The seventh report of the

Joint National Committee on prevention, detection, evaluation and treatment of high blood

pressure. JAMA 2003 289:2560-72.

Monitorização residencial da pressão arterial (MRPA)

A MRPA é o registro da pressão arterial por método indireto, com três medidas pela manhã

e três à noite durante a vigília, por cinco dias(8). Estas medidas devem ser realizadas com

equipamento validado e podem ser realizados pelo próprio paciente ou por outra pessoa,

desde que previamente treinado. Portanto, não confundir MRPA com medidas casuais da

pressão arterial. Suas indicações são basicamente as mesmas da MAPA.

A Tabela 3 mostra os critérios de diagnóstico das condições clínicas mais comuns

associadas com a medida da pressão arterial

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DTPA: Diethylenetriamine pentaacetic acid RNM: Ressonância nuclear magnética IECA:

Inibidores da enzima de conversão de angiotensina TC: Tomografia computadorizada RNM:

Ressonância nuclear magnética MMSS: Membros superiores MMII: Membros inferiores I-

123 MIBG: Metiliodobenzilguanidina marcada com iodo-123 TSH: Hormônio estimulante da

tireóide PTH: Paratormônio.

* Dependendo da disponibilidade e da experiência do serviço se pode pedir a cintilografia

renal ou o doppler de artérias renais como rastreamento da HAS renovascular.

** A angioRNM complementa as informações obtidas com a cintilografia ou o doppler de

artérias renais. Se não houver disponibilidade do exame, deve-se optar pela realização da

arteriografia renal para confirmação diagnóstica e tratamento.

Achados clínicos

A HAS é uma doença essencialmente assintomática. Não existem comprovações científicas

que muitos sintomas como cefaléia, tonturas e epistaxe são uma conseqüência da HAS. No

entanto, em certas circunstâncias, certos sinais e sintomas podem significar uma

complicação potencialmente grave da HAS, tais como dor precordial, alteração no nível de

consciência, déficits motores e sensitivos etc., devendo ser investigados e tratados

conforme cada caso.

Diante deste conceito, a avaliação do hipertenso deve ser baseada na busca ativa de

complicações que possam estar relacionadas com a presença da hipertensão,

destacadamente a presença das chamadas lesões de órgãos-alvo. A importância desta

designação reflete a gravidade da doença e alerta o médico para a necessidade de um

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tratamento intensivo, visando o controle pressórico. Dentre as várias lesões de órgãos-

alvo, podemos destacar a retinopatia hipertensiva(9), nefropatia hipertensiva, hipertrofia

ventricular esquerda, insuficiência coronariana, insuficiência cardíaca, doença

cerebrovascular, aneurisma aorta e doença vascular periférica(10).

Exames complementares

Avaliação inicial de rotina para todos os pacientes hipertensos:

· Urina tipo 1

· Dosagem de potássio e creatinina

· Glicemia de jejum

· Colesterol total, LDL, HDL, triglicérides

· Ácido úrico

· Eletrocardiograma convencional.

Exames complementares poderão ser solicitados quando houver indicação clínica adicional

ou necessidade de investigação de causas secundárias. Assim sendo, para pacientes

hipertensos com diabetes, hipertensos com síndrome metabólica e hipertensos com três ou

mais fatores de risco se recomenda pesquisa de microalbuminúria. Para pacientes com

glicemia de jejum entre 100 e 125 mg/dL, recomenda-se determinar a glicemia duas horas

após sobrecarga oral de glicose. Em hipertensos estágios 1 ou 2 sem hipertrofia ventricular

esquerda ao ECG, mas com três ou mais fatores de risco considerar (portanto não

obrigatório) o emprego do ecocardiograma para a detecção da hipertrofia ventricular

esquerda. Para pacientes hipertensos com suspeita clínica de insuficiência cardíaca

considerar a utilização do ecocardiograma para avaliação da função sistólica e diastólica.

Exame fundoscópico deve ser reservado para pacientes hipertensos graves.

Quando investigar hipertensão secundária?

Durante a avaliação de um paciente hipertenso, alguns achados da anamnese e do exame

físico servem como indício de que causas secundárias podem estar presentes. Nestes

casos, uma abordagem direcionada e criteriosa permite um correto diagnóstico, evitando

os exames muitas vezes desnecessários e caros na investigação de hipertensão

secundária. Entre os indícios iniciais de HAS secundária estão o início de hipertensão antes

dos 30 anos ou após os 50 anos de idade e a hipertensão arterial refratária à terapia.

Demais achados e formas de investigação se encontram especificados na Tabela 4.

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Tratamento

O objetivo primordial do tratamento da hipertensão arterial é a redução da morbidade e da

mortalidade cardiovasculares. Na avaliação inicial do paciente hipertenso e decisão

terapêutica deve ser levado em conta não só os níveis de pressão arterial, mas todos os

fatores de risco associados que possam aumentar o risco cardiovascular global desse

paciente. Em linhas gerais, os valores de pressão arterial a serem atingidos com o

tratamento são: PA < 140/90 mmHg na população geral e PA < 130/80 mmHg para

pacientes hipertensos diabéticos ou portadores de nefropatia. Para atingir essa meta em

termos de nível de pressão arterial, devem ser consideradas medidas não farmacológicas e

farmacológicas.

Tratamento não farmacológico da hipertensão

Medidas não farmacológicas, tais como redução do peso, consumo de dieta rica em frutas e

vegetais, redução no consumo de bebidas alcoólicas, interrupção do tabagismo, redução no

consumo de sal e realização de exercícios físicos regularmente, resultam em queda

significativa da pressão arterial. A combinação dessas medidas pode resultar em efeitos

aditivos bastante favoráveis para o controle pressórico. Quantitativamente, os estudos

mostram que das medidas não farmacológicas, a perda de peso resulta na redução de 5 a

20 mmHg de pressão arterial sistólica (para cada 10 kg de perda de peso) o consumo de

dieta rica em frutas e verduras resulta na redução de 8 a 14 mmHg na pressão arterial

sistólica a redução do consumo de bebidas alcoólicas resulta na redução de 2 a 4 mmHg na

pressão sistólica o abandono do tabagismo, bem como o uso de dieta hipossódica resultam

na redução de 2 a 8 mmHg de pressão sistólica e a realização de exercício físico com

regularidade resulta na redução de 4 a 9 mmHg de pressão sistólica (para atividade

aeróbica regular)(12). Portanto, essas medidas devem ser recomendadas para todo

paciente com HAS. Vale mencionar também o papel da equipe multiprofissional para uma

abordagem integral, possibilitando maior compreensão da doença pelo paciente, bem como

facilitando a adequação e o envolvimento no tratamento.

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Tratamento farmacológico da hipertensão

Diferentes estudos demonstraram que a redução da pressão arterial per se por meio de

diferentes agentes anti-hipertensivos resulta na redução da morbimortalidade

cardiovascular. As informações do estudo multicêntrico ALLHAT(13) mostraram que o uso

de diuréticos, IECA ou antagonistas de cálcio controlam adequadamente a pressão arterial

e diminuem similarmente o risco cardiovascular de pacientes hipertensos. Entretanto,

existem condições clínicas que, pela sua particularidade, impõem um tratamento

diferenciado das orientações gerais de pacientes com HAS (ver adiante - subgrupos

específicos).

Para o início da terapia medicamentosa, procure seguir os passos propostos nas Tabelas 6

a 8, baseadas nas orientações das IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão.

Fonte: V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão, 2006.

Diuréticos (Tabela 9)

Os diuréticos foram os primeiros anti-hipertensivos utilizados no tratamento da HAS. Esse

grupo de fármacos é efetivo e bem tolerado, atualmente são considerados como

medicamentos de primeira linha no tratamento da HAS. Os vários estudos na literatura

foram importantes no sentido de definir a dose ideal para atingir o controle pressórico com

menos efeitos colaterais. Recentes estudos, como o ALLHAT, mostraram que o diurético e

tão eficaz quanto outros medicamentos no controle da pressão arterial.

Vasodilatadores diretos (Tabela 10)

São drogas que agem diretamente na musculatura lisa do vaso, promovendo

vasodilatação. Portanto, eles diferem de outras drogas que também provocam

vasodilatação por mecanismos de ação diferentes, como é o caso dos inibidores da enzima

de conversão de angiotensina, os antagonistas do cálcio e os alfa-bloqueadores.

Bloqueadores dos canais de cálcio (Tabela 11)

Os bloqueadores dos canais de cálcio foram introduzidos no mercado como agentes anti-

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hipertensivos na década de 80. Eles se tornaram o grupo de anti-hipertensivos mais

prescrito para pacientes com hipertensão arterial nos Estados Unidos na década de 90.

Dispomos de três grupos: fenilalquilaminas, benzotiazepinas e diiiridinas, sendo as

diiiridinas as mais prescritas no tratamento da hipertensão arterial.

Inibidores da enzima de conversão da angiotensina (Tabela 12)

Os inibidores da enzima de conversão agem inibindo a conversão do decapeptídeo

angiotensina I, que é inativo, em angiotensina II, que é um potente vasoconstritor.

Fonte: V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão, 2006.

Bloqueadores do receptor da angiotensina II (Tabela 13)

Esse grupo de fármacos também reduz a atividade do sistema renina-angiotensina através

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do bloqueio competitivo dos receptores AT1 da angiotensina II. Esse grupo de drogas anti-

hipertensivas vem sendo largamente investigado e os vários fármacos testados têm sido

efetivos e bem tolerados. São usados com freqüência naqueles pacientes em uso de

inibidores da enzima de conversão da angiotensina que apresentam como principal efeito

colateral a tosse seca persistente.

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Inibidores da renina (Tabela 14)

Pesquisas recentes mostraram a eficácia de uma classe de medicação anti-hipertensiva

denominada de inibidores darenina. O aliskireno, único medicamento comercialmente

disponível, tem se mostrado até o momento seguro e eficaz no tratamento de pacientes

com HAS. O aliskireno é uma droga desenhada por engenharia molecular, análogo da

angiotensina, que se liga com alta afinidade ao sítio ativo da renina, impedindo suas ações.

É absorção reduzida, porém sua eliminação, preferencialmente hepática, também é lenta,

permitindo uso único diário(14). Estudos de fase II demonstraram sua segurança e

tolerabilidade nas doses preconizadas (150 a 300 mg/d). Diarréia foi o único efeito

colateral significante na dose de 600 mg/dia. Estudos de fase III em subgrupos específicos

de pacientes estão fornecendo as primeiras evidências dos potenciais terapêuticos do

aliskireno. No estudo AVOID(15), hipertensos diabéticos com proteinúria foram

randomizados para doses crescentes de aliskireno contra placebo. Ao final do estudo,

houve redução adicional de 18% da proteinúria no grupo tratamento em comparação a 2%

no grupo placebo, não havendo diferença da pressão arterial entre os grupos. Esses dados

preliminares apontam para o potencial uso dessa classe em pacientes com intolerância a

outras classes de drogas, como os beta-bloqueadores, que também atuam na inibição da

renina.

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* Em associação. ** Referem-se a preparações farmacêuticas de preparação lenta e ação

prolongada. ASI: Atividade simpaticomimética intrínseca.

Inibidores adrenérgicos (Tabela15)

Os inibidores adrenérgicos agem em nível central (agonistas dos receptores a-2) e

perifericamente (bloqueio dos receptores a-1) e são considerados como drogas de segunda

escolha no tratamento da HAS. São freqüentemente associados a outras drogas

consideradas de primeira linha no tratamento da HAS.

Bloqueadores dos receptores b-adrenérgicos (Tabela 16)

Além das propriedades anti-hipertensivas, os beta-bloquedores reduzem o consumo de

oxigênio pelo miocárdio, sendo uma excelente escolha nos pacientes com insuficiência

coronariana.

Associações

Existem algumas associações de anti-hipertensivos que constituem um atrativo para

facilitar a aderência do paciente por diminuir o número de comprimidos ao dia. Contudo,

estas associações fixas dificultam a titulação de doses de cada medicamento e podem ser

optadas após a estabilização da pressão arterial. Algumas das principais associações são

descritas na Tabela 17.

Avaliação para pacientes de subgrupos específicos

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1. Negros

A prevalência e a gravidade da hipertensão são maiores, o que pode estar associado a

fatores étnicos e socioeconômicos. Eles apresentam maior acometimento renal, mesmo

com o tratamento efetivo da pressão arterial. O mecanismo predominante de hipertensão

parece ser o do excesso de volume, com uma alta prevalência de pacientes com níveis

baixos de renina e uma excelente resposta aos diuréticos. Entretanto, não há evidências

claras de ação diferenciada das drogas anti-hipertensivas em nossa população.

2. Idosos

Estima-se que 65% dos idosos brasileiros sejam hipertensos. A maioria apresenta pressão

arterial sistólica isolada com conseqüente aumento da pressão de pulso. Para o tratamento

deste grupo, além da estratificação de risco, é fundamental a avaliação de comorbidades e

do uso de medicamentos. As recomendações de tratamento para os indivíduos idosos,

incluindo aqueles com hipertensão sistólica isolada seguem os mesmos princípios gerais,

ou seja, obtendo a redução gradual da pressão arterial para valores abaixo de 140/90

mmHg. Em pacientes com valores muito elevados de pressão sistólica, podem ser

mantidos inicialmente níveis de até 160 mmHg. Nos idosos, dois achados refletem as

mudanças do sistema cardiovascular induzidas pela idade: 1) atentar para a chamada

pseudo-hipertensão, em que a rigidez arterial proporcionada pela aterosclerose impede o

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colapso da artéria quando realizamos a insuflação do manguito, resultando na necessidade

de pressões maiores para sua oclusão superior ao que realmente se esperaria dentro dos

vasos. Nestes casos, uma terapia agressiva poderia levar à uma hipotensão iatrogênica.

Em casos de suspeita de pseudo-hipertensão, pode-se confirmar o diagnóstico pela

comparação da medida obtida pelo manguito com a medida intra-arterial 2) hipotensão

postural ou pós-prandial, observada em 20% a 30% dos idosos. Usualmente reflete a

perda progressiva do barorreflexo com a idade.

3. Obesidade, síndrome metabólica e apnéia do sono

A obesidade (índice de massa corpórea > 30 kg/m2) é freqüentemente associada com um

maior risco para o surgimento da hipertensão e doença cardiovascular. O National

Cholesterol Evaluation Program/Adult Panel Treatment III (NCEP/ATP III) considera como

portador de síndrome metabólica o paciente que apresentar três ou mais dos seguintes

critérios: obesidade central (circunferência abdominal > 102 cm nos homens e > 88 cm

nas mulheres), glicemia de jejum alterada (> 110 mg/dL), pressão arterial > 130/85

mmHg, triglicérides elevado (> 150 mg/dL) ou HDL-colesterol baixo (< 40 mg/dL nos

homens, < 50 mg/dL nas mulheres). Devem-se dar ênfase na redução do excesso de peso,

prática de atividade física regular e restrição de sal para se obter o controle pressórico,

além de atuarem favoravelmente sobre a tolerância à glicose e o perfil lipídico nesses

pacientes. Os inibidores da enzima de conversão de angiotensina são benéficos para o

obeso, pois aumentam a sensibilidade à insulina. Os bloqueadores dos canais de cálcio

demonstram neutralidade sobre os metabolismos lipídico e glicídico. Na síndrome

metabólica a terapêutica medicamentosa apropriada deve ser instituída para cada

componente da síndrome. Em pacientes com apnéia do sono, o uso do CPAP pode reduzir a

pressão arterial e diminuir a necessidade de medicações anti-hipertensivas(16,17).

4. Gravidez

Duas formas de hipertensão podem complicar a gravidez: a chamada hipertensão

preexistente (crônica) e a hipertensão induzida pela gravidez (pré-eclâmpsia/eclâmpsia).

Elas podem ocorrer de forma isolada ou associada. A primeira está presente antes da

gravidez ou diagnosticada antes da 20ª semana de gestação. A alfa-metildopa é a droga

preferida, por ser a mais bem estudada e não haver evidência de efeitos deletérios para o

feto. Opções alternativas incluem os beta-bloqueadores (podem estar associados ao

crescimento fetal restrito), outros bloqueadores adrenérgicos, bloqueadores dos canais de

cálcio e diuréticos. Não usar inibidores da enzima de conversão e os antagonistas do

receptor AT1 da angiotensina II. Na pré-eclâmpsia/eclâmpsia ocorre o desenvolvimento

gradual de hipertensão e proteinúria. A interrupção da gestação é o tratamento definitivo

da pré-eclâmpsia e deve ser considerada em todos os casos de maturidade pulmonar fetal

assegurada. A hipertensão arterial grave na grávida é tratada com hidralazina endovenosa,

na dose de 5 mg. A nifedipina também pode ser usada, porém sua associação com o

sulfato de magnésio pode provocar queda súbita e persistente da pressão arterial.

5. Diabetes mellitus

A prevalência de hipertensão em diabéticos é pelo menos duas vezes maior que na

população em geral. No diabetes tipo 1 a hipertensão se associa a nefropatia diabética,

sendo que o controle da pressão arterial é crucial para retardar a perda da função renal.

No diabetes tipo 2, a hipertensão se associa à resistência à insulina e ao alto risco

cardiovascular. O controle do nível glicêmico contribui para a redução do nível de pressão.

Recomenda-se que a pressão arterial seja reduzida a valores inferires a 130/85 mmHg e a

125/75 mmHg se houver proteinúria > 1g/24 h. Cabe ressaltar que todos os anti-

hipertensivos podem ser usados no paciente diabético. Destacadamente, os inibidores da

enzima de conversão de angiotensina não interferem no metabolismo glicêmico, reduzem a

resistência à insulina e o risco de eventos cardiovasculares em pacientes hipertensos ou de

alto risco cardiovascular, além de exercerem proteção renal em diabéticos tipo 1 com

nefropatia diabética. Os antagonistas do receptor AT1 da angiotensina II mostraram

nefroproteção em diabéticos tipo 2(18).

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6. Acidente vascular cerebral

A redução da pressão arterial deve ser gradual e cuidadosa nos idosos com acidente

vascular cerebral (AVC) ou ataque isquêmico transitório (AIT) pelo risco de redução da

perfusão cerebral. Neste sentido, o tratamento da fase aguda do AVC é diferente da

abordagem para o paciente com hipertensão e AVC no passado. As recomendações dos

Consensos Americanos mostram que a pressão arterial não deve ser tratada com anti-

hipertensivos se a pressão arterial sistólica for £ 220 mmHg e a pressão arterial diastólica

for £ 120 mmHg(19). Nestes casos, o tratamento deve ser baseado no tratamento de

sintomas como dor, cefaléia, náuseas, hipóxia etc. Posteriormente, deveremos seguir as

mesmas recomendações já mencionadas para o controle da hipertensão. Alguns estudos

mostram que o uso de diuréticos no tratamento da hipertensão está associado a uma

menor incidência de AVC na evolução.

7. Doença renal crônica

Nos pacientes com insuficiência renal crônica, os objetivos terapêuticos são o de diminuir a

deterioração da função renal e prevenir o surgimento de doenças cardiovasculares. Neste

sentido, os pacientes devem receber tratamento agressivo em casos de hipertensão, sendo

freqüente a associação de drogas, visando manter os valores de pressão arterial menores

de 130/80 mmHg. Os inibidores da enzima de conversão de angiotensina e os antagonistas

do receptor AT1 da angiotensina II têm demonstrado efeitos benéficos na progressão da

lesão renal em pacientes diabéticos e não diabéticos. Um aumento de até cerca de 35% da

creatinina basal em pacientes que estão em uso destes medicamentos é aceitável, não

havendo necessidade de suspensão. Quando o clearance de creatinina é menor que 30

ml/min é necessária a utilização de diuréticos de alça, muitas vezes associada a outros

medicamentos. O nível sérico de potássio deve ser monitorado regularmente

(mensalmente) em pacientes com IRC e em uso de antagonistas do receptor AT1 da

angiotensina II ou IECA. Se os níveis de potássio sérico forem maiores do que 6 mEq/L, a

droga deve ser suspensa.

8. Insuficiência cardíaca

A hipertensão arterial pode promover alterações estruturais no ventrículo esquerdo,

contribuindo para o desenvolvimento e a progressão da insuficiência cardíaca. Deve-se

usar o tratamento considerado padrão para a insuficiência cardíaca, baseado no uso de

inibidores da enzima de conversão de angiotensina ou bloqueadores do receptor de

angiotensina, diuréticos (incluindo a espironolactona), beta-bloqueadores (destacadamente

o carvedilol, metoprolol e bisoprolol).

9. Anticoncepcionais orais

A hipertensão é duas a três vezes mais comum em usuárias de anticoncepcionais orais,

especialmente entre as mais idosas e obesas. O aparecimento de hipertensão arterial em

usuárias destas medicações impõe a interrupção imediata da medicação. A reposição

estrogênica após a menopausa pode ser usada por mulheres hipertensas, pois têm pouca

interferência sobre a pressão arterial. Casos selecionados de elevação da pressão arterial

devem ser monitorizados de forma periódica após o início da reposição.

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10. Authors/Task Force Members Mancia G, De Backer G, Dominiczak A, Cifkova R, Fagard

R, Germano G, Grassi G, Heagerty AM, Kjeldsen SE, Laurent S, Narkiewicz K, Ruilope L,

Rynkiewicz A, Schmieder RE, Struijker Boudier HA, Zanchetti A ESC Committee for Practice

Guidelines (CPG) Vahanian A, Camm J, De Caterina R, Dean V, Dickstein K, Filippatos G,

Funck-Brentano C, Hellemans I, Kristensen SD, McGregor K, Sechtem U, Silber S, Tendera

M, Widimsky P, Zamorano JL ESH Scientific Council Kjeldsen SE, Erdine S, Narkiewicz K,

Kiowski W, Agabiti-Rosei E, Ambrosioni E, Cifkova R, Dominiczak A, Fagard R, Heagerty

AM, Laurent S, Lindholm LH, Mancia G, Manolis A, Nilsson PM, Redon J, Schmieder RE,

Struijker-Boudier HA, Viigimaa M Document Reviewers Filippatos G, Adamopoulos S,

Agabiti-Rosei E, Ambrosioni E, Bertomeu V, Clement D, Erdine S, Farsang C, Gaita D,

Kiowski W, Lip G, Mallion JM, Manolis AJ, Nilsson PM, O’brien E, Ponikowski P, Redon J,

Ruschitzka F, Tamargo J, van Zwieten P, Viigimaa M, Waeber B, Williams B, Zamorano JL.

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