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Geogebra no Ensino do C´ alculo Forma¸ ao Cont´ ınua de Professores de Ensino B´ asico e Secund´ ario Novembro/Dezembro 2010 ed¢£fl~} > [fF¤ e d ¢ £ fl ~ ~ } Jo˜ ao Nuno Tavares Dept. Matem´atica, Faculdade de Ciˆ encias da Univ. Porto 1 1 E-mail adress: [email protected]

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Geogebra no Ensino

do Calculo

Formacao Contınua de Professores de

Ensino Basico e Secundario

Novembro/Dezembro 2010

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Joao Nuno Tavares

Dept. Matematica, Faculdade de Ciencias da Univ. Porto 1

1E-mail adress: [email protected]

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INDICE:

1 Kepler e Newton 3

1.1 Kepler (1571-1630) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

1.2 Newton (1643-1727) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.3 Algumas propriedades sobre elipses . . . . . . . . . . . . . . . . 12

1.4 Newton - o limite da razao dinamica . . . . . . . . . . . . . . . 17

2 Discussao das Leis de Kepler e de Newton usando calculo mod-erno 21

2.1 Representacao parametrica de curvas planas . . . . . . . . . . . 21

2.2 Equacoes polares das conicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

2.3 Mecanica orbital (Newtoniana) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

2.4 Problema directo - Como deduzir a lei de gravitacao universal apartir das leis de Kepler? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

2.5 Problema inverso - Como deduzir as leis de Kepler a partir dalei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton? . . . . 33

3 Duas aplicacoes 38

3.1 Parabola de seguranca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

3.2 Zona de Audibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

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Introducao

O objectivo desta accao de formacao contınua de professores e ensinar afazer construcoes geometricas com o software de acesso livre Geogebra. Ge-oGebra e um programa livre de geometria dinamica criado por Markus Hohen-warter para ser utilizado em ambiente de sala de aula. Seu criador, MarkusHohenwarter, iniciou o projeto em 2001 na University of Salzburg e tem contin-uado o desenvolvimento na Florida Atlantic University. O GeoGebra e escritoem Java e assim esta disponıvel em multiplas plataformas.

Permite realizar construcoes utilizando pontos, vetores, segmentos, retas,seccoes conicas bem como funcoes e alterar todos esses objetos dinamicamenteapos a construcao estar concluıda. Por outro lado, podem ser incluıdas equacoese coordenadas directamente. Assim, o GeoGebra e capaz de lidar com variaveispara numeros, vetores e pontos, derivar e integrar funcoes e ainda oferece co-mandos para encontrar raızes e pontos extremos de uma funcao. Deste modo,o programa reune as ferramentas tradicionais de geometria, com outras maisadequadas a algebra e ao calculo. Assim tem a vantagem didactica de apresen-tar, ao mesmo tempo, duas representacoes diferentes de um mesmo objeto queinteragem entre si: sua representacao geometrica e sua representacao algebrica.

Optei por escolher tres temas da historia da Matematica onde as tecnicasdo calculo (diferencial) desempenham um papel relevante. De facto o primeirotema, Kepler e Newton, esta na origem da criacao do calculo por Newton. Naofaremos referencia a contribuicao de Leibniz.

Faz-se pois uma aprendizagem do uso do Geogebra motivada pela neces-sidade de ilustrar os conceitos que vao surgindo durante a discussao dos trestemas escolhidos.

Este e, na minha opiniao, o melhor metodo para aprender a lidar com oGeogebra.

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Modulo 1

Kepler e Newton

1.1 Kepler (1571-1630)

Johannes Kepler foi um astronomo,matematico e astrologo alemao e figura-chave da revolucao cientıfica do seculoXVII. E mais conhecido por formularas tres leis fundamentais da mecanicaceleste, conhecidas como Leis de Ke-pler, codificada por astronomos pos-teriores com base em suas obras As-tronomia Nova, Harmonices Mundi, eEpıtome da Astronomia de Copernico.Elas tambem forneceram uma das basespara a teoria da gravitacao universal deIsaac Newton, como veremos.

Durante a sua carreira, Kepler foi professor de matematica numa escola sem-inarista em Graz, Austria, assistente do astronomo Tycho Brahe, matematicoimperial do imperador Rodolfo II e de seus dois sucessores, Matias I e Fer-nando II, professor de matematica em Linz, Austria e assessor do general Wal-lenstein. Tambem fez um trabalho fundamental no campo da optica, inventouuma versao melhorada do telescopio refractor (o telescopio de Kepler) e ajudoua legitimar as descobertas telescopicas de seu contemporaneo Galileo Galilei.

Kepler viveu numa epoca em que nao havia nenhuma distincao clara entreastronomia e astrologia, mas havia uma forte divisao entre a astronomia (umramo da matematica dentro das artes liberais) e a fısica (um ramo da filosofianatural). Kepler tambem incorporou argumentos religiosos e o raciocınio no seutrabalho, motivado pela conviccao religiosa de que Deus havia criado o mundode acordo com um plano inteligıvel, que e acessıvel atraves da luz natural darazao. Kepler descreveu sua nova astronomia como ”fısica celeste”, como ”umaexcursao a metafısica de Aristoteles”e como ”um suplemento de Sobre o Ceu

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1.1. Kepler (1571-1630) 4

de Aristoteles”, transformando a antiga tradicao da cosmologia fısica ao tratara astronomia como parte de uma fısica matematica universal.

No princıpio do seculo XVII Kepler, a partir de uma grande quantidade deobservacoes astronomicas efectuadas por Tycho Brahe (1546-1601), nos ultimos20 anos da sua vida, formulou as seguintes tres leis para o movimento dosplanetas em torno do Sol:

Primeira Lei de Kepler [Lei das elipses]

Cada Planeta move-se sobre uma elipse com o Sol num dos seusfocos.

Segunda Lei de Kepler [Lei das areas]

O vector de posicao de cada Planeta, relativamente ao Sol, varreareas iguais em tempos iguais.

Terceira Lei de Kepler [Lei dos perıodos]

O quadrado do perıodo (i.e., o tempo necessario para completaruma orbita completa) e proporcional ao cubo do eixo maior daelipse, sendo a constante de proporcionalidade a mesma para todosos planetas.

¨ Exercıcio 1 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando as Leis de Kepler.

Poucos contestaram a segunda e terceira leis. Eram resultado de observacoese so restava fazer os calculos para as confirmar. Mas a primeira lei muitoperturbou quem estava habituado a pensar em rectas e cırculos! Porque umaelipse? Porque e que os ceus, uma manifestacao pura da vontade divina, optavapor uma forma distorcida de uma figura perfeita - o cırculo?

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1.2. Newton (1643-1727) 5

Figura 1.1: Leis de Kepler

1.2 Newton (1643-1727)

Foi Newton nos seus Principia Math-ematica, publicado em 1687 que, emultima instancia, confirmou o modelode Kepler e restaurou a sua pureza, aomostrar que as orbitas elıpticas, comoprevistas pelas leis de Kepler, sao defacto equivalentes ao facto de que aaceleracao gravitacional e inversamenteproporcional ao quadrado da distanciaao corpo em orbita.

Isaac Newton (1643-1727) foi um cientista ingles, mais reconhecido comofısico e matematico, embora tenha sido tambem astronomo, alquimista, filosofonatural e teologo.

Sua obra, Philosophiae Naturalis Principia Mathematica, e consideradauma das mais influentes da Historia da Ciencia. Publicada em 1687, esta obradescreve a lei da gravitacao universal e as tres leis de Newton, que fundamen-taram a mecanica classica.

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1.2. Newton (1643-1727) 6

Ao demonstrar a consistencia que havia entre o sistema por si idealizado eas leis de Kepler do movimento dos planetas, foi o primeiro a demonstrar queo movimento de objetos, tanto na Terra como em outros corpos celestes, saogovernados pelo mesmo conjunto de leis naturais. O poder unificador e profeticode suas leis era centrado na revolucao cientıfica, no avanco do heliocentrismo ena difundida nocao de que a investigacao racional pode revelar o funcionamentomais intrınseco da natureza.

Newton no seus Principia Mathematica, comeca por definir massa, mo-mento (a que chama movimento : massa × velocidade), varios tipos de forcase aceleracao, e formula entao 3 axiomas ou Leis de movimento que vao ser opilar da sua teoria:

Lei de inercia

Um corpo em repouso permanecera sempre em repouso e um corpoem movimento rectilıneo uniforme (com velocidade constante),assim continuara, a nao ser que, em ambos os casos, sobre eleactue uma forca exterior.

2a lei de Newton

A aceleracao de um corpo e proporcional a forca que sobre eleactua e esta dirigida segundo a direccao dessa forca:

F = ma

Lei de accao-reaccao

A toda a accao corresponde uma reaccao igual e oposta.

Isaac Newton utilizou a sua propria lei: “Forca = massa × aceleracao”paradeduzir, a partir das leis de Kepler, a natureza basica da forca que mantemcada planeta na respectiva orbita.

Newton trabalha sempre com pequenas forcas instantaneas que provocammudancas discretas na velocidade dos corpos onde actuam. So posteriormente,com o genio da concepcao do calculo, apercebe-se que as mudancas contınuaspodem ser aproximadas pelo (e sao de facto) o limite das mudancas discretas.

Em 1687 Newton usou um metodo de aproximacao poligonal para demons-trar a lei das areas de Kepler, valida para qualquer forca central. Este metodoe consecutivamente usado por Newton em toda a sua Dinamica.

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1.2. Newton (1643-1727) 7

Teorema (Newton Proposicao I)

Seja S um ponto fixo (o Sol) e P um ponto movel (um planeta)sobre o qual, em cada instante, a unica forca que nele actua ecentral, isto e, tem a direccao da recta PS. Entao:

• a trajectoria de P e plana,

• o segmento SP varre areas iguais em intervalos de tempoiguais.

Nota... Note que isto afirma muito mais do que a 1a lei de Kepler! Defacto, areas iguais em intervalos de tempo iguais e consequencia de qualquerforca radial, independentemente da forma como ela varia em intensidade!

Dem.:

E claro que o teorema e verdadeiro quando nao ha forcas a actuar em P -neste caso, a 1a lei de Newton diz que P tem movimento rectilıneo uniforme,com velocidade constante u. Isto implica que P percorre distancias iguais emem intervalos de tempo iguais sobre uma recta `.

Podemos supor que S /∈ `, e claro, ja que, caso contrario, SP varre areanula. Fixemos um certo intervalo de tempo ∆t e sejam A, B ∈ ` dois pontos taisque P percorre o segmento AB no intervalo de tempo ∆t. Se P tem movimentorectilıneo uniforme, com velocidade constante u, entao:

|AB| = u∆t

A area varrida por SP , quando P vai de A a B, e igual a area do trianguloABS e e claro que esta area se mantem seja qual for a posicao do segmentoAB na recta `. O teorema esta pois demonstrado neste caso.

¨ Exercıcio 2 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando a situacao descrita.

Suponhamos agora que o planeta P , quando atinge o ponto B, e actuadopor uma forca instantanea radial - dirigida portanto segundo a recta BS (ver afigura 1.2). A 2a lei de Newton diz-nos que isto faz surgir uma nova componentepara a velocidade v de P em B, dirigida segundo a recta BS.

Note que−−→BV pode apontar para S ou no sentido oposto. Por outras

palavras, a forca instantanea pode empurrrar P em direccao a S (forca atrac-tiva) ou afastar P de S (forca repulsiva).

Partindo de B, com a mesma velocidade u, e se a forca instantanea naoexistisse, o corpo P atingiria a posicao C, com |AB| = |BC| = u∆t.

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1.2. Newton (1643-1727) 8

Figura 1.2: Newton - Proposicao I.

Mas agora a forca instantanea actua fazendo surgir a nova componente vda velocidade de P em B (ver a figura 1.2).

Newton assume que a velocidade resultante w e obtida pela regra do par-alelogramo:

w = u + v

e, ao fim do tempo ∆t, o corpo atinge o ponto E com |BE| = w∆t.

Como E esta no plano definido por S e por `, o movimento e plano.

A area varrida por PS, quando agora P vai de B a E, e a area do trianguloBES. Mas esta e tambem a area do triangulo BCS, uma vez que eles tem amesma base, o segmento BS, e a mesma altura, ja que a recta CE e paralelaa recta BS.

¥

¨ Exercıcio 3 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando a situacao descrita.

Define-se a constante de Kepler κ da orbita, atraves de:

κ =A(∆t)

∆t=

Area varrida no intervalo ∆t

∆t(1.2.1)

que nao e mais do que a velocidade areolar (constante) do varrimento dearea pelo raio vector SP .

Hoje em dia e mais usual deduzir a 2a lei de Kepler - orbitas elıpticas - apartir da lei da atraccao universal de Newton - forca inversamente proporcional

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1.2. Newton (1643-1727) 9

ao quadrado da distancia entre os dois corpos. Faremos isso posteriormente comos metodos do caculo diferencial moderno.

No entanto, Newton nao procedeu desta forma. De facto, nos seus Prin-cipia, comecou por testar outras possibilidades para a forca de atraccao. Sodepois destas tentativas, assume como verdadeiras as duas primeiras leis deKepler e entao, usando argumentos muito engenhosos baseados essencialmenteem geometria de conicas, em grande parte criada por Appolonius de Perga(262-170 AC), que Newton conhecia, deduz a sua lei da atraccao universal.

Vale a pena descrever as linhas gerais do argumento de Newton.

Teorema (Newton Proposicao XI)

Suponhamos que P se move numa elipse E e que a aceleracao deP e sempre radial, isto e, tem sempre a direccao de PS, onde S eum foco da elipse E .Entao a intensidade dessa aceleracao, e portanto da forca radialatractiva que actua em P , e inversamente proporcional a distanciaentre P e S.

¨ Exercıcio 4 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando este teorema.

Suponhamos que o corpo se move sob a accao de uma forca central, decentro S (o Sol). Seja F(P ) a forca que actua no corpo quando este ocupa aposicao P .

Qual a relacao entre a grandeza da forca F (P ) = ‖F(P )‖ ea forma geometrica da trajectoria do corpo?

Seja ∆t um pequeno intervalo de tempo e suponha que o corpo se move deP ate Q nesse intervalo de tempo. Neste percurso a forca central que actua nocorpo nao varia muito e podemos supor que e constante, igual ao valor F (P )que tem em P , tal como Newton o fez.

Consideremos a tangente a orbita no ponto P (ver a figura 1.3).

Newton imagina que o percurso de P a Q e composto por dois movimentos:

• Movimento rectilıneo uniforme de P a R, situado sobre a tangentereferida. De facto, se o corpo nao fosse sujeito a accao da forca, eledeslocar-se-ia por inercia, com velocidade uniforme igual a que tem emP . Este movimento tem pois aceleracao nula.

• Movimento rectilıneo de R a Q com uma direccao paralela a PS,com velocidade inicial nula. Este movimento e provocado quando o corpo

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1.2. Newton (1643-1727) 10

Figura 1.3:

e “percurtido”pela forca central que o obriga a deslocar-se na direccaode PS. Esta componente do movimento tem aceleracao inteiramentedeterminada pela forca central.

Quando o corpo se desloca de P para Q estes dois movimentos ocorremem simultaneo. Mas, ao decompor o trajecto de P para Q nas duas partesseparadas acima descritas, Newton foi capaz de isolar o efeito da forca centrale analisar o problema.

Suponha que o corpo tem massa m (Kg por exemplo). Como Forca = massa

× aceleracao, a forca F(P ) produz uma aceleracao constante igual a1m

F(P ),durante o intervalo ∆t, correspondente ao movimento de R a Q.

Como se sabe, um corpo que, partindo do repouso, se move com aceleracao

constante a =1m

F (P ), tem no instante t uma velocidade igual a:

v(t) = at + v(0)

=1m

F (P )t + 0

=1m

F (P )t (1.2.2)

e percorre uma distancia igual a:

d(t)− d(0) =a

2t2

=1

2mF (P )t2 (1.2.3)

Concluindo: a forca F (P ) produz um deslocamento igual a

12m

F (P )(∆t)2

no intervalo de tempo ∆t. Isto e:

12m

F (P )(∆t)2 = QR

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1.2. Newton (1643-1727) 11

Figura 1.4:

e Newton calcula portanto que:

F (P ) =2mQR

(∆t)2(1.2.4)

Newton completa agora a figura 1.3 para incluir a informacao da lei dasareas de Kepler (ver a figura 1.4).

Como ∆t e muito pequeno, e portanto Q esta muito proximo de P , a areado sector SPQ e quase igual a area do triangulo SPQ, que e, por sua vez, iguala 1

2 (SP ×QT ).

Como SP varre a area do sector SPQ no intervalo de tempo ∆t, segue-seda definicao da constante de Kepler κ da orbita do corpo, que:

12 (SP ×QT )

∆t=

area do sector SPQ

∆t= κ

Portanto ∆t =2κ

SP ×QTe substituindo em (1.2.4) vem que:

F (P ) =8κ2m

(SP )2QR

(QT )2(1.2.5)

Como a area do sector SPQ e aproximadamente igual a area do trianguloSPQ, esta e uma expressao aproximada da grandeza F (P ) da forca. Contudoesta aproximacao melhora a medida que ∆t → 0, isto e, a medida que Q → P .

Como κ e m sao constantes e SP e a distancia de P a S, concluımos que8κ2m

(SP )2nao depende de Q e portanto:

F (P ) =8κ2m

(SP )2lim

Q→P

QR

(QT )2(1.2.6)

Newton chamou ao quociente QR(QT )2 a razao dinamica linear.

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1.3. Algumas propriedades sobre elipses 12

O calculo da forca consiste pois em analisar em detalhe qual olimite desta razao dinamica quando Q → P .

Note que a analise nao fez intervir a natureza geometrica da orbita deP . Em particular nao se supos que era uma elipse. Newton analisou variashipoteses para a geometria da orbita. De facto, em 1687 criou um metodo geralque permite determinar a grandeza da forca central responsavel por um dadomovimento orbital em torno de um centro de forcas fixo.

Os exemplos ilustrativos deste metodo geral, desenvolvido por Newton nosseus Principia, foram os seguintes:

Orbita Centro de forcas Forca

Cırculo Centro do cırculo ConstanteCırculo Um ponto qualquer F ∝ 1/|SP |5

no cırculo onde C e uma constanteElipse Centro da elipse F ∝ |SP |Elipse Um foco da elipse F ∝ 1/|SP |2Espiral Polo da espiral F ∝ 1/|SP |3

Por exemplo, F ∝ 1/|SP |5 significa “F (P ) e proporcional a 1/|SP |5”.

De seguida vamos acompanhar a analise feita por Newton para o caso emque a orbita e uma elipse e S e um dos focos dessa elipse. Trata-se de um dosargumentos mais famosos em toda a historia da ciencia e por isso vale a penadetermo-nos nessa analise.

Newton baseou-se apenas em factos geometricos sobre elipses que conheciado tratado sobre conicas de Appolonius de Perga (262-170 AC). Vamos comecarpor listar essas propriedades cuja demonstracao se propoe usando metodosmodernos de Geometria Analıtica.

1.3 Algumas propriedades sobre elipses

A equacao geral de uma elipse num sistema de coordenadas cartesiano centradono seu centro e cujo eixo maior pertence ao eixo dos x’s, e:

x2

a2+

y2

b2= 1

onde a ≥ b > 0. Os vertices da elipse sao os pontos (±a, 0) e (0,±b) onde elaintersecta os eixos coordenados. a diz-se o semi-eixo maior e b o semi-eixomenor.

Um ponto P da elipse pode ser parametrizado por:

P (θ) = (a cos θ, b sin θ), 0 ≤ θ ≤ 2π

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1.3. Algumas propriedades sobre elipses 13

Note que θ nao e, em geral, o angulo entre OP e a parte positiva doeixo dos x’s.

¨ Exercıcio 5 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando uma elipse e a sua parametrizacao.

Se definirmos:P ′ = −P = (−a cos θ,−b sin θ)

o segmento PP ′ passa em O e diz-se um diametro da elipse. Definamos agoradois pontos M e M ′ alterando o parametro θ de ±π/2:

M = (a cos(θ + π/2), b sin(θ + π/2))= (−a sin θ, b cos θ)

M ′ = (a cos(θ − π/2), b sin(θ − π/2))= (a sin θ,−b cos θ)

O diametro MM ′ diz-se o diametro conjugado ao diametro PP ′. Note que,em geral, diametros conjugados nao sao perpendiculares entre si.

¨ Exercıcio 6 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando uma elipse e um par de diametros conjugados.

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1.3. Algumas propriedades sobre elipses 14

I Propriedade 1.1 ... A tangente a elipse num ponto P e paralela aodiametro conjugado a PP ′.

I Propriedade 1.2 ... Qualquer corda da elipse paralela a tangente aelipse num ponto P , e bissectada pelo diametro PP ′.

I Propriedade 1.3 ... Se a corda QQ′ e paralela a tangente num pontoP e intersecta o diametro PP ′ num ponto V , entao:

PV × P ′V(QV )2

=(OP )2

(OM)2(1.3.1)

onde MM ′ continua a ser o diametro conjugado a PP ′.

I Propriedade 1.4 ... A area do paralelogramo cujos lados sao as tan-gentes a elipse nos pontos extremidade de um par de diametros conjugados esempre igual a 2ab.

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1.3. Algumas propriedades sobre elipses 15

¨ Exercıcio 7 (i). Faca applets com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando as 4 propriedades anteriores.

(ii). Demonstre analiticamente as 4 propriedades anteriores.

Os focos de uma elipse sao os pontos:

F1 = (−√

a2 − b2, 0), F2 = (√

a2 − b2, 0) (1.3.2)

I Propriedade 1.5 ... Se P e um ponto qualquer da elipse entao a somadas distancias de P aos focos e constante e igual a 2a:

F1P + F2P ≡ 2a, ∀P ∈ elipse

I Propriedade 1.6 ... Seja P um ponto qualquer da elipse. Entao a rectaque bissecta o angulo ∠(F1PF2) e perpendicular a tangente a elipse em P .

Esta e a chamada propriedade reflectora da elipse. Num bilhar eliptico, seuma bola, situada num dos focos, e batida em direccao ao bordo, entao elapassa pelo outro foco.

¨ Exercıcio 8 (i). Faca applets com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando as 2 propriedades anteriores.

(ii). Demonstre analiticamente as 2 propriedades anteriores.

(iii). Faca um applet animado, com Geogebra, ilustrando a propriedadereflectora da elipse.

I Propriedade 1.7 ... Seja P um ponto qualquer da elipse, MM ′ odiametro conjugado a PP ′ e E o ponto de interseccao de F1P com MM ′ (verfigura).

Entao a distancia EP e igual ao semi-eixo maior a:

EP = a

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1.3. Algumas propriedades sobre elipses 16

Dem.: [Newton]

Observe a figura seguinte.

IF2 e paralela a MM ′. Desenhamos ainda, a tracejado, a bissectriz doangulo ∠(F1PF2). Pela propriedade 1.6, essa bissectriz e perpendicular a tan-gente em P , portanto perpendicular ao diametro MM ′, pela propriedade 1.1,e portanto perpendicular ao segmento IF2. Vemos pois que:

IP = PF2

Da semelhanca dos triangulos 4(F1IF2) e 4(F1EO), e uma vez que F1F2 =2(F1O), deduzimos que F1I = 2(F1E), isto e:

F1E = EI

Pela propriedade 1.5, vem agora que:

2a = F1P + PF2

= F1E + EP + PF2

= EI + EP + IP

= 2(EP ) (1.3.3)

¥

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1.4. Newton - o limite da razao dinamica 17

Figura 1.5: O limite da razao dinamica.

1.4 Newton - o limite da razao dinamica

Temos tudo o que e necessario para analisar como Newton calcula o limite darazao dinamica:

limQ→P

QR

(QT )2(1.4.1)

quando a trajectoria de P e uma elipse, e portanto como calcula a grandeza daforca central:

F (P ) =8κ2m

(SP )2lim

Q→P

QR

(QT )2(1.4.2)

Vejamos como:

Toda a analise se refere a figura essencial 1.5, que o proprio New-ton usa.

N1. Os triangulos 4(POE) e 4(PV X) sao semelhantes. Daı que:

PX

PV=

EP

PO

Como RQXP e um paralelogramo, QR = PX e como EP = a, pelapropriedade 1.7, substituindo acima vem que:

QR

PV=

a

PO(1.4.3)

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1.4. Newton - o limite da razao dinamica 18

N2. Apliquemos agora a propriedade 1.3 a corda QQ′ que intersecta o diametroPP ′ no ponto V . Essa propriedade afirma que:

PV × P ′V(QV )2

=(OP )2

(OM)2

isto e:1

(QV )2=

(OP )2

(OM)21

PV × P ′V(1.4.4)

N3. Construımos agora PG perpendicular ao diametro MM ′ (conjugado aPP ′). E facil ver que os triangulos rectangulos 4(QTX) e 4(PGE) saosemelhantes e portanto:

QX

QT=

EP

PG

Como EP = a vem entao que:

(QX)2

(QT )2=

a2

(PG)2

Para Q muito proximo de P , podemos tomar QV ' QX nesta formulae, resolvendo em ordem a 1/(QT )2, obtemos:

1(QT )2

=a2

(PG)21

(QV )2(1.4.5)

N4. A area do paralelogramo MM ′ZW (ver figura 1.5) e igual a base×altura,isto e, e igual a 2 OM × PG e, pela propriedade 1.4, essa area e tambemigual a 2ab. Portanto, 2 OM × PG = 2ab e daı:

a2

(PG)2=

(OM)2

b2(1.4.6)

N5. O numero:

` =2b2

a(1.4.7)

chama-se o lactus rectum principal da elipse.

Insira-se o lactus rectum ` e (1.4.5) em`×QR

(QT )2e usemos entao (1.4.6),

(1.4.4) e (1.4.3) para obter sucessivamente o seguinte:

`×QR

(QT )2=

2b2

a· (QR) · a2

(PG)2· 1(QV )2

por (1.4.5)

=2b2

a· (QR) · (OM)2

b2· 1(QV )2

por (1.4.6)

=2b2

a· (QR) · (OM)2

b2· (OP )2

(OM)2· 1P ′V × PV

por (1.4.4)

=2a· a · (OP )2 · 1

P ′V × POpor (1.4.3)

=2 OP

P ′V

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1.4. Newton - o limite da razao dinamica 19

Portanto:QR

(QT )2=

2 OP

P ′V1`

e quando Q → P , P ′V → 2 OP e daı que:

limQ→P

QR

(QT )2=

1`

(1.4.8)

Newton chega assim ao seu objectivo principal.

N6. Inserindo (1.4.8) na formula (1.2.6) para F (P ), que aqui se recorda:

F (P ) =8κ2m

(SP )2lim

Q→P

QR

(QT )2

obtem-se:

F (P ) =8κ2m

`2· 1(SP )2

(1.4.9)

Concluindo:

Suponhamos que

• um corpo se move sob a accao de uma forca central de centroS e que

• a sua orbita e uma elipse em que um dos focos e S

Entao a grandeza dessa forca num ponto P da orbita e igual a:

F (P ) =8κ2m

`2· 1r2(P )

(1.4.10)

onde r(P ) e a distancia de P a S, κ e a constante de Kepler daorbita, m a massa do corpo e ` = 2b2/a o lactus rectum da elipse.

De facto Newton provou este mesmo resultado tambem para uma parabolae para um hiperbole.

Ainda para o caso de uma orbita elıptica, seja T o perıodo da orbita, istoe, o tempo que o corpo demora a percorrer uma volta inteira. Uma vez que aarea da elipse e igual a π ab entao a constante de Kepler e igual a κ = π ab/Te a formula de Newton pode escrever-se na forma:

F (P ) =4π2a3m

T 2· 1r2(P )

(1.4.11)

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1.4. Newton - o limite da razao dinamica 20

Escrevamos o valor da forca, dada por (1.4.10), na forma:

FP = CP m1r2

onde CP = 8κ2/`. Se S exerce uma forca de atraccao sobre P , P tambemexerce uma forca de atraccao sobre S. De facto, pela 3a lei de Newton, aforca F (P ) com que S atrai P tem uma reaccao igual mas oposta. Por outraspalavras, P atrai S com uma forca de grandeza FS = FP na direccao oposta aque S atrai P .

A simetria da situacao exige pois que:

FS = CS M1r2

onde M e a massa de S e CS e uma constante. Como FS = FP vemos queCSM = CP m e portanto:

CP

M=

CS

m

def= G (1.4.12)

Notando que GM = CP e Gm = CS e pondo F = FP = FS obtemos:

F = GmM

r2(1.4.13)

que e a famosa lei da atraccao universal de Newton. G e uma constanteuniversal independente dos corpos em questao.

Actualmente o valor adoptado para a constante de gravitacao universal e:

G = 6.67428× 0−11m3Kg−1s−2 (1.4.14)

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Modulo 2

Discussao das Leis deKepler e de Newton usandocalculo moderno

2.1 Representacao parametrica de curvas planas

Uma curva plana pode ser representada:

• parametricamente em coordenadas cartesianas, na forma:

t 7→ (x(t), y(t)) = x(t) i + y(t) j (2.1.1)

• em coordenadas parametricas polares, na forma:

t 7→ (r(t), θ(t)) (2.1.2)

• atraves de uma equacao polar, na forma:

r = f(θ) (2.1.3)

¨ Exercıcio 9 Faca applets com Geogebra, com parametros variaveis, ilus-trando as curvas seguintes:

(i). t 7→ (r(t) = 2e−kt, θ(t) = ωt + α) (iv). r = 3 + eθ

(ii). r = a(1− cos θ) (v). r = eθ

(iii). r = eθ (vi). r = eθ

Dada uma curva em representacao parametrica polar t 7→ P (t) = (r(t), θ(t)),e conveniente exprimir a sua velocidade e aceleracao, para cada valor do pa-rametro t, como combinacao linear de dois vectores perpendiculares unitarios:

21

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2.1. Representacao parametrica de curvas planas 22

Figura 2.1:

er na direccao dos r’s crescentes e eθ na direccao dos θ′s crescentes, como nafigura 2.1.

E importante notar que er e eθ sao ambos funcao de t. E tambem usualrepresentar esses vectores unitarios aplicados no ponto P (t) e, para simplificarnotacoes, omite-se a dependencia de t.

A er-componente de um vector diz-se a sua componente radial, enquantoque a eθ-componente diz-se a sua componente transversa. Atencao: naoconfundir com a componente tangencial (a curva).

Da figura 2.1, vemos que:

er(t) = cos θ(t) i + sin θ(t) jeθ(t) = − sin θ(t) i + cos θ(t) j (2.1.4)

donde se deduz imediatamente que:

der

dt=

dteθ(t)

deθ

dθ= −dθ

dter(t) (2.1.5)

Suponhamos agora que uma partıcula se move ao longo de uma curva e queesse movimento (ou a curva) e parametrizada na forma polar parametrica:

t 7→ P (t) = (r = r(t), θ = θ(t))

O vector de posicao da partıcula relativamente a origem O, e:

−−−−→OP (t) = r(t) = r(t) er(t)

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2.2. Equacoes polares das conicas 23

Portanto, o seu vector velocidade e:

v =drdt

=dr

dter(t) + r(t)

der

dt

=dr

dter(t) + r(t)

dteθ por (2.1.5)

= r er + rθ eθ (2.1.6)

Pondov = vr er + vθ eθ (2.1.7)

obtemos as chamadas velocidade radial vr e velocidade transversa vθ

dadas respectivamente por:

velocidade radial = vr = r

velocidade transversa = vθ = rθ

Derivando uma segunda vez obtemos a aceleracao a = dv/dt. Apos algunscalculos, analogos aos anteriores, calculamos as componentes radial e transver-sal dessa aceleracao:

Pondoa = ar er + aθ eθ (2.1.8)

obtemos as chamadas aceleracao radial ar e aceleracao transversal aθ

dadas respectivamente por:

aceleracao radial = ar = r − rθ2

aceleracao transversa = aθ =1r

d

dt(r2θ)

¨ Exercıcio 10 Deduza as formulas anteriores para ar e aθ.

¨ Exercıcio 11 Suponha que uma partıcula se move ao longo de uma curvae que esse movimento (ou a curva) e parametrizada na forma polar parametrica:

t 7→ P (t) = (r = r(t) = 2 cos t− 1, θ = θ(t) = t), 0 ≤ t ≤ 4π

Calcule as velocidades e aceleracoes radial e transversa. Faca um applet comGeogebra, com parametros variaveis, ilustrando este movimento.

2.2 Equacoes polares das conicas

Uma das possıveis definicoes de conica, e a seguinte:

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2.2. Equacoes polares das conicas 24

Figura 2.2: Conica polar

I Definicao 2.1 Seja δ uma linha recta fixa no plano, F um ponto fixo,nao pertencente a δ, e ε > 0 um numero positivo. Ao conjunto:

{P ∈ IR2 :

distancia(P, F )distancia(P, δ)

≡ ε

}(2.2.1)

chama-se conica com excentricidade ε, foco F , e directriz δ. A conica deequacao (2.2.1) diz-se uma:

• elipse se ε < 1,

• parabola se ε = 1

• hiperbole se ε > 1.

Escolhamos um sistema de eixos cartesianos centrado no foco F (de tal formaque F = O), tal que a directriz δ seja perpendicular ao eixo dos x’s, e estejasituada a direita do foco F = O, a uma distancia d deste (isto e, δ e a recta deequacao x = d) (ver a figura 2.2).

Pondo P = (x, y) e atendendo a que:

distancia(P, F ) = (x2 + y2)1/2 e distancia(P, δ) = |d− x|

concluımos que a equacao (2.2.1) pode ser escrita na forma:

(x2 + y2)1/2 = ε |d− x| (2.2.2)

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2.3. Mecanica orbital (Newtoniana) 25

ou em coordenadas polares:

r = ε |d− r cos θ| (2.2.3)

Analisemos as varias possibilidades:

1. Se P esta situado a esquerda da directriz δ, entao x = r cos θ < d, eportanto |d − r cos θ| = d − r cos θ. Neste caso a equacao (2.2.3) podeser escrita na forma r = ε · (d − r cos θ) e, resolvendo em ordem a r, naforma:

r = r(θ) =ε d

ε cos θ + 1(2.2.4)

2. Se P esta situado a direita da directriz δ, entao x = r cos θ > d, e obtemosde forma analoga a equacao:

r = r(θ) =ε d

ε cos θ − 1(2.2.5)

Como r > 0, esta ultima equacao implica que ε > 1, isto e, existem pontosa direita de δ apenas no caso da hiperbole.

Resumindo:

Seja C uma conica com excentricidade ε > 0, foco F = O, e directrizδ : x = d, situada perpendicularmente ao eixo dos x´s e a uma distancia d,a direita de F = O. Entao se 0 < ε < 1, C e uma elipse, e se ε = 1, umaparabola. Nestes dois casos, todo o ponto de C situa-se a esquerda de δ, esatisfaz a equacao polar:

r = r(θ) =ε d

ε cos θ + 1(2.2.6)

Se ε > 1, C e uma hiperbole com um ramo em cada um dos lados de δ. Pontosdo ramo esquerdo satisfazem a equacao polar (2.2.6), enquanto que os do ramodireito satisfazem a equacao polar:

r = r(θ) =ε d

ε cos θ − 1(2.2.7)

¨ Exercıcio 12 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando a discussao anterior.

2.3 Mecanica orbital (Newtoniana)

Em mecanica orbital (Newtoniana) e usual considerar os problemas seguintes:

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2.3. Mecanica orbital (Newtoniana) 26

Figura 2.3: Problemas inverso e directo

• Problema directo ... Dada a trajectoria de um corpo P e um centrode forcas S fixo, determinar a forma como depende a forca da distanciaentre P e S:

F (P ) ?= funcao de |PS| (2.3.1)

• Problema inverso ... Conhecida a forca central determinar a trajectoriade de um corpo que se move sob a accao dessa forca central.

Vamso abordar estes dois problemas:

• na seccao 2.4 resolvemos o problema directo - assumimos as leis de Keplere deduzimos a lei de atraccao universal de Newton.

• na seccao 2.5 resolvemos o problema inverso - deduzimos as leis de Keplera partir da lei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton.

Consideremos entao o Sol S de massa M atraindo um planeta P de massam, de acordo com a lei da gravitacao universal de Newton. Supomos que o Solesta estacionario e que o planeta se move em torno do Sol ao longo de uma certaorbita cuja equacao pretendemos calcular. Supomos ainda que o planeta temuma certa velocidade inicial nao colinear com SP , caso contrario seria atraıdopor S em linha recta e colidiria com S ao fim de um certo tempo.

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2.3. Mecanica orbital (Newtoniana) 27

Usamos coordenadas polares com polo em S. De acordo com a lei dagravitacao universal de Newton, a forca (de atraccao) F que o Sol exerce noplaneta e:

F = −GMm

r2er

Por outro lado, essa forca comunica ao planeta uma aceleracao a, dada pelasegunda lei de Newton

F = ma

Concluımos pois que:

a = −GM

r2er (2.3.2)

isto e:

I1. a aceleracao transversa aθ anula-se, ar = 0. Entrando com a formula

aθ =1r

d

dt(r2θ), obtida anteriormente, deduzimos que:

1r

d

dt(r2θ) = 0 (2.3.3)

I2. a aceleracao radial ar e igual a:

ar = −GM

r2

Entrando com a formula ar = r − rθ2, obtida anteriormente, deduzimosque:

ar = r − rθ2 = −GM

r2(2.3.4)

As equacoes (2.3.3) e (2.3.4) contem a informacao basica sobre o movimento.Gostarıamos de deduzir, a partir delas, a equacao da trajectoria do planeta.No entanto as equacoes contem derivadas, em ordem ao tempo t, de r e θ e naoexiste um processo simples para as resolver.

Podemos, apesar disso, retirar informacoes muito uteis. Em primeiro lugar,da equacao (2.3.3) deduzimos imediatamente que:

r2θ ≡ h (2.3.5)

onde h e uma constante.

O que e que isto significa?

Nos cursos de calculo (veja por exemplo Apostol) aprende-se que a areavarrida pelo raio vector entre θ = α e θ = β e igual a (ver a figura 2.4):

A =∫ β

α

12r2 dθ

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2.3. Mecanica orbital (Newtoniana) 28

Figura 2.4:

Derivando (teorema fundamental do calculo), obtemos:

dA

dθ=

12r2

e, pela regra da cadeia, obtemos para a chamada velocidade areolar dA/dt:

dA

dt=

dA

dt=

12r2 θ (2.3.6)

Portanto (2.3.5) diz-nos que, se A = A(t) e a area varrida pelo raio vectorSP entao a velocidade areolar A = dA/dt e constante:

dA

dt≡ h

2(constante) (2.3.7)

Logo

A(t) =ht

2+ c (2.3.8)

o que implica que “areas varridas em intervalos de tempo iguais saoiguais”, que nao e mais do que a Lei das areas de Kepler.

Derivamos pois a Lei das areas de Kepler a partir da segunda lei de Newtone do facto de que a forca e radial. Nao precisamos de supor que ela e da forma

F = −GMm

r2er. De facto, o mesmo acontece para qualquer forca radial, i.e.,

qualquer forca do tipo:F = f(r)er

Ainda nao usamos a equacao (2.3.4): ar = r− rθ2 = −GM

r2. Podemos usar

a equacao (2.3.3): r2θ = h para substituir θ = h/r2 em (2.3.4) e obter:

r − h2

r3= −GM

r2(2.3.9)

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2.4. Problema directo - Como deduzir a lei de gravitacao universala partir das leis de Kepler? 29

que e uma equacao diferencial de 2a ordem para r = r(t).

No entanto, nao existe um processo simples de integrar esta equacao. Ver-emos adiante como usa-la para deduzir as leis de Kepler a partir das leis deNewton.

2.4 Problema directo - Como deduzir a lei degravitacao universal a partir das leis de Ke-pler?

Como vimos antes, Newton deduziu a partir das leis de Kepler, a naturezabasica da forca que mantem cada planeta na respectiva orbita. Fizemos issoseguindo o fascinante metodo geometrico que Newton usou nos seus PrincipiaMathematica, baseado nas propriedades geometricas das conicas descobertasem grande parte por Appolonius.

Vamos nesta seccao fazer essa mesma deducao, utilizando agora os metodosdo calculo diferencial moderno.

I Proposicao 2.1 As duas primeiras Leis de Kepler implicam que:

1. a forca exercida sobre cada planeta, e uma forca central, cujo centro e oSol.

2. essa forca e atractiva (dirigida em direccao ao Sol), e a sua intensidade

e proporcional a1r2

, onde r e a distancia do planeta ao Sol.

Dem.:

[1.] A primeira lei de Kepler implica que o movimento e plano. Nesseplano escolhemos um sistema de eixos cartesianos centrado no Sol, e fazemosos calculos em coordenadas polares, supondo que o movimento e descrito pelacurva parametrizada:

t 7→ P (t) = (r(t), θ(t)) (2.4.1)

Seja A(θ) a area varrida pelo vector de posicao r(t), quando este se deslocade to a t. Como vimos na seccao anterior, a velocidade de variacao desta area,ou velocidade areolar e dada por:

A(t) =dA

dt=

12r2 θ (2.4.2)

e a segunda lei de Kepler afirma que:

dA

dt=

12r2θ ≡ h

2(constante)

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2.4. Problema directo - Como deduzir a lei de gravitacao universala partir das leis de Kepler? 30

Portanto:d2A

dt2= rrθ +

12r2θ ≡ 0 (2.4.3)

Mas a aceleracao e dada:

a(t) = r(t) = r − rθ2

︸ ︷︷ ︸acel. radial

er + rθ + 2rθ︸ ︷︷ ︸acel. transversa

eθ (2.4.4)

Estas duas ultimas equacoes implicam que a aceleracao transversa se anula, eportanto:

a = r = (r − rθ2) er (2.4.5)

o que, pela segunda Lei de Newton (Forca=massa × aceleracao), implica quea forca e tambem radial.

[2.] Demonstremos agora a segunda parte da proposicao. Para isso supon-hamos que a orbita e elıptica (de acordo com a primeira lei de Kepler), comequacao polar:

r = r(θ) =ε d

1 + ε cos θ(2.4.6)

de tal forma que r(t) e θ(t) satisfazem esta equacao ∀t.Pretende-se demonstrar, atendendo a (2.4.5) e a lei de Newton, que:

r − rθ2 = −C

r2(2.4.7)

onde C > 0 e uma constante.

Para fazer os calculos facamos uma mudanca de variavel, considerando umanova variavel:

u =1r

(2.4.8)

Isto ja tinha sido sugerido antes, atendendo a presenca de 1/r na equacao(2.3.9)! Calculemos du/dθ:

du

dθ= − 1

r2

dr

dθ(2.4.9)

Mas:

dr

dt=

dr

dt

=dr

h

r2, porque r2θ = h

=⇒ dr

dθ=

r2

h

dr

dt

Substituindo isto em (2.4.9) obtemos:

r = −hdu

dθ(2.4.10)

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2.4. Problema directo - Como deduzir a lei de gravitacao universala partir das leis de Kepler? 31

Derivando novamente, obtemos:

r(t) =d

(−h

du

)dθ

dt

= −hd2u

dθ2

dt

= −h2u2 d2u

dθ2, porque r2θ = h

Substituindo na aceleracao radial ar = r − rθ2, obtemos:

ar = r − rθ2 = −h2u2

(d2u

dθ2+ u

)(2.4.11)

Recorde que, por hipotese, estamos a supor que a orbita e elıptica (de acordocom a primeira lei de Kepler), com equacao polar:

r = r(θ) =ε d

1 + ε cos θ(2.4.12)

de tal forma que r(t) e θ(t) satisfazem esta equacao ∀t. Usando u = 1r em

(2.4.12), e derivando, obtemos:

d2u

dθ2+ u =

1ε d

e substitindo isto em (2.4.11) obtemos finalmente que:

ar = r − rθ2 =−h2

ε du2

= −h2

ε d

1r2

(2.4.13)

isto e C =h2

εd> 0, o que termina a demonstracao.

¥.

I Proposicao 2.2 (Lei da atraccao universal de Newton) As Leis deKepler implicam que existe uma constante k > 0, a mesma para todo o planeta,

tal que a aceleracao radial e igual a − k

r2. Portanto, a intensidade da forca de

atraccao exercida sobre cada planeta, e igual a:

−k m

r2(2.4.14)

isto e, e proporcional a massa m desse planeta, e proporcional ao inverso doquadrado da sua distancia ao sol.

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2.4. Problema directo - Como deduzir a lei de gravitacao universala partir das leis de Kepler? 32

Dem.: O eixo maior 2a, da elipse dada por (2.4.6), e igual a soma dosvalores maximo e mınimo de r:

2a = rmax + rmin =ε d

1− ε+

ε d

1 + ε=

2ε d

1− ε2(2.4.15)

Representemos o perıodo de revolucao por T (=tempo necessario para com-pletar uma orbita), e por A, a area total da elipse (2.4.6). Como ja sabemos,

a area e varrida a uma velocidade constante: A(t) =12r2θ ≡ h

2(constante).

Portanto a area total A, da elipse e igual a A = h2 T , ja que e necessario um

perıodo T para varrer toda a elipse. Logo:

T =2A

h(2.4.16)

Por outro lado sabe-se que:

A =πε2d2

(1− ε2)3/2(2.4.17)

e portanto:

T =2πε2d2

h(1− ε2)3/2(2.4.18)

Atendendo agora a formula (2.4.15) para 2a, obtemos:

a3

T 2=

ε3d3

(1− ε2)3h2(1− ε2)3

4π2ε4d4=

h2

4π2ε d

e substituindo este resultado na formula (2.4.13), para a aceleracao radial deum planeta a uma distancia r do sol, concluımos que:

ar = r − rθ2 = −h2

ε d

1r2

= −4π2

(a3

T 2

)1r2

(2.4.19)

Finalmente a terceira lei de Kepler afirma quea3

T 2, e o mesmo para cada

planeta, o que atendendo a (2.4.19), termina a demonstracao.

¥.

E usual tomar a constante k, referida na proposicao anterior, igual a GM ,onde M e a massa do sol e G e a chamada constante de gravitacao universal.Resumindo, a Lei da atraccao universal de Newton afirma que a forcacentral de atraccao exercida sobre um planeta de massa m, e dada por:

F(r) = −GMm

r2er = −G

Mm

r3r (2.4.20)

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2.5. Problema inverso - Como deduzir as leis de Kepler a partir dalei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton? 33

2.5 Problema inverso - Como deduzir as leis deKepler a partir da lei de atraccao universalde Newton e da lei de Newton?

Retomamos a equacao (2.4.11):

ar = r − rθ2 = −h2u2

(d2u

dθ2+ u

)(2.5.1)

onde substituımos ar = −GMr2 , uma vez que estamos a supor que conhecemos

a lei de atraccao universal de Newton. Obtemos entao a equacao diferencial:

d2u

dθ2+ u =

GM

h2(2.5.2)

Para eliminar a constante pomos:

y = u− GM

h2

e obtemos a equacao:d2y

dθ2+ y = 0 (2.5.3)

cuja solucao geral pode ser escrita na forma:

y = C cos(θ + α) (2.5.4)

onde C e α sao duas constantes que dependem das condicoes iniciais. Emtermos de u vem:

u = C cos(θ + α) +GM

h2(2.5.5)

o que pode ainda ser escrito na forma:

u =GM

h2(1 + ε cos(θ + α)) (2.5.6)

com:

ε =h2C

GM(2.5.7)

Finalmente, como u = 1/r, vem que:

r =h2

GM

1 + ε cos(θ + α)(2.5.8)

Nesta equacao G e M conhecem-se, enquanto que h, ε e α sao constantes quedependem das condicoes iniciais.

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2.5. Problema inverso - Como deduzir as leis de Kepler a partir dalei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton? 34

Figura 2.5:

Esta e, como vimos, a equacao de uma conica, com excentricidade ε =h2C

GMe parametro d = 1/C. α e um angulo que corresponde a tomar a

directriz diferente do eixo polar como na figura 2.5.

Suponhamos que o planeta parte com velocidade inicial vo, perpendicularao eixo polar, a uma distancia ro do Sol, como na figura 2.6.

Neste caso, α = 0 e r(θ = 0) = ro. Como vo e transversal ao movimento, ecomo a velocidade transversa e igual a vθ = rθ, vem que:

roθo = vo (2.5.9)

Nota: a notacao θo significa o valor da derivada θ para t = 0.

Podemos ja calcular h. De facto, h = r2θ e portanto h = r2o θo = rovo:

h = rovo (2.5.10)

Com α = 0, a equacao (2.5.8) fica na forma:

r =h2

GM(1 + ε cos θ)(2.5.11)

Para θ = 0, r = ro donde:

ro =h2

GM(1 + ε)

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2.5. Problema inverso - Como deduzir as leis de Kepler a partir dalei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton? 35

Figura 2.6: Diversas orbitas para varias velocidades iniciais vo.

ou:

ε =h2

GMro− 1

Mas h2 = r2ov2

o e portanto:

ε =rov

2o

GM− 1 (2.5.12)

e:

r =

r2ov2

o

GM

1 +(

rov2o

GM− 1

)cos θ

(2.5.13)

Como ε =rov

2o

GM− 1 > 0 vem que vo >

√GM/ro. Se 0 < ε < 1, isto e, se a

orbita e uma elipse entao:

√GM

ro< vo <

√2GM

ro(2.5.14)

Se ε = 1, isto e, se a orbita e uma parabola entao:

√vo =

2GM

ro(2.5.15)

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2.5. Problema inverso - Como deduzir as leis de Kepler a partir dalei de atraccao universal de Newton e da lei de Newton? 36

Se ε > 1, isto e, se a orbita e uma parabola entao:

√vo >

2GM

ro(2.5.16)

¨ Exercıcio 13 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando os varios casos descritos.

Para terminar esta seccao vamos deduzir a terceira lei de Kepler.

A area total da elipse e πab, onde a e b sao, respectivamente o semi-eixosmaior e menor. Como ja tınhamos visto antes, essa mesma area e igual a hT/2.Portanto, como ja vimos:

πab =hT

2(2.5.17)

Por outro lado, sabemos ja que:

εd =h2

GM

εd e tambem o semi-lactus rectum da elipse que, como se viu antes, e igual ab2/a:

h2

GM=

b2

a=⇒ h2 = GM

b2

a(2.5.18)

De (2.5.17) obtemos:

T 2 =4π2a2b2

h2

e portanto, de (2.5.18):T 2 = 4π2a2b2 a

GMb2

ou:

T 2 =4π2

GMa3 (2.5.19)

Como 4π2/GM e o mesmo para todo o planeta, isto diz-nos que o quadradrodo perıodo de revolucao e proporcional ao cubo do semi-eixo maior,que nao e mais do que a 3a lei de Kepler.

E importante notar que tudo o que se fez e apenas o princıpio de uma longahistoria e e apenas uma primeira aproximacao a descricao do movimento realdos planetas. De facto, no modelo que analisamos suposemos que apenas oSol e um planeta estao presentes e ignoramos a presenca de outros planetas.Mas, na realidade, todos estao presentes e todos exercem atraccao gravitacionalsobre o planeta em estudo. Consideramos tambem o Sol estacionario o que naocorresponde a realidade (nao ha referenciais de inercia...), e a historia continuacom Laplace, Poincare, Einstein e muitos outros!...

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Modulo 3

Duas aplicacoes

3.1 Parabola de seguranca

Descricao do problema:

Suponhamos que um canhao, colocado num ponto A, yo metros acimado solo, dispara uma bala com uma certa velocidade inicial:

−→v o = (vox, voy) (3.1.1)

A bala esta sujeita apenas a accao da gravidade, isto e, desprezamos,por simplicidade, a resistencia do ar ou quaisquer outras forcas que nelapossam actuar.

Portanto, a unica forca que actua na bala e:

−→F = m−→g (3.1.2)

que supomos constante e dirigida verticalmente para baixo. Por outraspalavras, a gravidade comunica a bala uma aceleracao que e sempreconstante em direccao, sentido e tambem em grandeza:

m−→g =−→F = m−→a︸ ︷︷ ︸

Lei de Newton

⇒ −→a = −→g (3.1.3)

¨ Exercıcio 14 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando o problema descrito.

Objectivo:

37

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3.1. Parabola de seguranca 38

Figura 3.1: zona de fogo quando yo = 0.

Analisar a zona de seguranca, ou, alternativamente, calcular a zonade fogo, isto e, a regiao do espaco constituıda pelos pontos que saoatingidos por alguma das balas, quando usamos diferentes angulos ϕ dedisparo, embora sempre com a mesma grandeza vo da velocidade inicial(ver a figura 3.1):

vo = |−→v o| =√

v2ox + v2

oy (3.1.4)

Dados do problema:

• a altura yo do ponto A onde esta o canhao e de onde se dispara abala.

• a velocidade inicial −→v o do disparo.

• a aceleracao da gravidade −→g = −gk (na terra, g ' 9.8 m/seg2).

Analise do problema:

Como a aceleracao −→a e a variacao instantanea da velocidade:

−→a =d−→vdt

(3.1.5)

e como a componente horizontal da aceleracao e nula, ja que −→a = −→g = −gk,concluımos que a componente horizontal da velocidade vx e constante. Por-tanto:

vx ≡ vox

Por outro lado, a variacao instantanea da componente vertical da velocidadevy e igual a −g e portanto:

vy ≡ voy − gt

Concluindo:

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3.1. Parabola de seguranca 39

Figura 3.2:

{vx(t) ≡ vox

vy(t) = voy − gt(3.1.6)

Escolhemos agora um referencial cartesiano tal que A = (o, yo), onde A e oponto onde esta o canhao e de onde se dispara a bala.

Se P (t) = (x(t), y(t)) e a posicao da bala no instante t, vemos pois quex(0) = 0, y(0) = yo e portanto:

x(t) = voxt

e ainda:

y(t) = yo + voyt− 12gt2

Concluindo: {x(t) = voxty(t) = yo + voyt− 1

2gt2(3.1.7)

¨ Exercıcio 15 Para uma dada velocidade inicial vo, qual e a altura maxima,ymax, que a bala atinge (relativamente ao solo)?

Solucao:

ymax = yo +v2

oy

2g(3.1.8)

¨ Exercıcio 16 Para uma dada velocidade inicial vo, e supondo que yo = 0,qual o alcance maximo da bala? Isto e, qual o ponto em que atinge o solo (figura3.3)?

Solucao:

xmax =2voxvoy

g(3.1.9)

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3.1. Parabola de seguranca 40

Figura 3.3:

Figura 3.4:

¨ Exercıcio 17 Suponhamos que disparamos a partir do solo, i.e. yo = 0,com a mesma grandeza da velocidade inicial (figura ??):

vo = |−→v o| =√

v2ox + v2

oy

mas com diferentes angulos ϕ de disparo.

a. Para que valor de ϕ a altura maxima e maxima?

b. Para que valor de ϕ o alcance e maximo?

Solucao:

a. Para ϕ = 90o e nesse caso:

Ymax =v2

o

2g(3.1.10)

b. Para ϕ = 45o ou = 135o e nesse caso:

Xmax = ±v2o

g(3.1.11)

Zona de fogo:

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3.1. Parabola de seguranca 41

Figura 3.5: Trajectoria auxiliar.

Figura 3.6:

Continuando a supor que o disparo se faz do solo, isto e yo = 0, mantemosa grandeza da velocidade inicial vo mas disparamos com varios angulosϕ de disparo. Obtemos entao uma zona de fogo, isto e, uma regiao doespaco constituıda pelos pontos que sao atingidos por alguma das balas(figura 3.4).

Parabola de seguranca:A zona de fogo e delimitada por uma curva que e a envolvente dasdiversas trajectorias das balas (para vo fixo mas ϕ variavel). Esta curvae uma parabola a que se chama parabola de seguranca (figura 3.4).

Como calcular esta parabola de seguranca?

Para calcular a parabola de seguranca vamos calcular uma trajectoriaauxiliar. Concretamente, vamos calcular a trajectoria de uma balalancada a partir do ponto C = (0, Ymax), com velocidade inicial horizon-tal −→u , e que aterra no ponto D2 = (Xmax, 0) (figura 3.6).

¨ Exercıcio 18 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando a trajectoria auxiliar.

¨ Exercıcio 19 Calcular a velocidade inicial −→u = (u, 0).

Solucao:u = vo (3.1.12)

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3.1. Parabola de seguranca 42

Figura 3.7: Trajectoria auxiliar.

Formulas para a parabola auxiliar:

• Para a velocidade:{

vx(t) = vo

vy(t) = −gt(3.1.13)

• e para a posicao:

x(t) = vot

y(t) =v2

o

2g− 1

2gt2

(3.1.14)

Analise da envolvente:

Vamos calcular agora a distancia entre uma trajectoria particular deuma certa bala, disparada com velocidade inicial vo, e a parabola de se-guranca, medida ao longo de uma recta vertical. Queremos pois calculara distancia (ver a figura 3.7):

d = FP ′ − FP

O calculo da distancia d = FP ′ − FP , faz-se nos passos seguintes:

a. Suponhamos que P e a posicao da bala t segundos apos o disparo. Por(3.1.7) temos que:

OF = abcissa de P = voxt

b. Suponhamos que P ′ e a posicao da bala auxiliar t segundos apos o disparo.Pela primeira equacao em (3.1.14) temos que:

OF = abcissa de P ′ = vot

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3.1. Parabola de seguranca 43

c. Igualando as duas expressoes anteriores, temos portanto que:

voxt = vot ⇒ t =voxt

vo(3.1.15)

d. Por outro lado, por (??), com yo = 0, temos que:

FP = voyt− 12gt2

e. enquanto que, por (3.1.14) e (3.1.15), temos que:

FP ′ =v2

o

2g− g

2

(voxt

vo

)2

Conclusao:

d = FP ′ − FP

=v2

o

2g− g

2

(voxt

vo

)2

− voyt +12gt2

=v2

o

2g− voyt +

gt2

2

[1−

(vox

vo

)2]

=v2

o

2g− voyt +

gt2

2

(voy

vo

)2

=12g

(vo − gt

voy

vo

)2

≥ 0 (3.1.16)

isto e: a distancia FPP ′ − FP e sempre positiva e e nula quando t =v2

o

gvoye,

neste caso, P ′ ≡ P .

Conclusao

A trajectoria de qualquer bala disparada de O com a mesmagrandeza vo da velocidade inicial, mas com angulos diferentes dedisparo, esta sempre abaixo da parabola auxiliar e toca-a tangen-cialmente apenas num unico ponto P ′ ≡ P . Portanto a parabolaauxiliar nao e mais do que a parabola de seguranca - a envolventede todas as trajectorias referidas.

¨ Exercıcio 20 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando a discussao anterior.

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3.1. Parabola de seguranca 44

Resolucao dos exercıcios

Resolucao do exercıcio 15 ... No ponto em que a bala atinge a alturamaxima, a componente vertical da velocidade vy anula-se. Como, por (??),vy = voy − gt, vem que:

vy ≡ voy − gt = 0 ⇒ t =voy

g

isto e, a altura maxima e atingida t = voy

g segundos apos o disparo. Substi-tuindo este valor em (??), vem que:

ymax = yo + voyt− 12gt2

= yo + voyvoy

g− 1

2g

(voy

g

)2

= yo +v2

oy

2g(3.1.17)

Resolucao do exercıcio 16 ... Nesse ponto y(t) = 0 para um certo t > 0,que determinamos resolvendo a equacao de 2o grau em t:

yo + voyt− 12gt2 = 0

Obtemos a raiz positiva:

tmax =voy +

√v2

oy + 2gyo

g

valor que, quando substituıdo em (3.1.7) da:

xmax = voxtmax

Em particular, quando yo = 0, isto e, quando o projectil e disparado a partirdo solo, vem que:

tmax =2voy

g(3.1.18)

e:xmax =

2voxvoy

g(3.1.19)

Resolucao do exercıcio 17 ... Escrevemos (3.1.19) na forma:

xmax =2voxvoy

g

=v2

oy + v2ox − (voy − vox)2

g

=v2

o − (voy − vox)2

g

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3.2. Zona de Audibilidade 45

donde se conclui que este valor e maximo quando voy = vox isto e, quandoϕ = 45o. Nesse caso, o alcance maximo e dado por:

Xmax =v2

o

g(3.1.20)

Resolucao do exercıcio 19 ... Pomos voy = 0, vox = u, que e o quepretendemos calcular, e ainda yo = Ymax = v2

o

2g = u2

2g em (??). O que nos daisto? Da-nos a altura da bala auxiliar t segundos apos o disparo:

u2

2g− gt2

2

Em que instante t e que esta altura e 0? Isto e, em que instante t e que a balaauxiliar toca o solo? Este t calcula-se resolvendo:

u2

2g− gt2

2= 0 ⇒ t =

u

g

Nesse instante o alcance da bala auxiliar (a abcissa do ponto D) e, por (3.1.7),igual a:

ut =u2

g

Mas, por outro lado, esta abcissa e igual a Xmax = v2o

g . Portanto:

u2

g=

v2o

g⇒ u = vo

3.2 Zona de Audibilidade

Descricao do problema:Um aviao voa com uma velocidade superior a velocidade do som. Emcada instante, o motor do aviao emite um som que se propaga no espaco,com velocidade s, em todas as direccoes, sob a forma de ondas esfericas- estas esferas chamam-se as frentes de onda. Quando atingem o solo,intersectam-no em cırculos cujo raio vai crescendo a medida que o tempoavanca. Se um habitante da regiao sobrevoada pelo aviao estiver dentrodestes cırculos, ele ouvira o ruıdo dos motores do aviao.

Objectivo:Analisar a zona de audibilidade num certo instante. Por outraspalavras, fixemos um instante (paramos o tempo nesse instante) e ve-jamos como e a regiao do solo em que o aviao foi ouvido.

Analise:

Dados do problema:

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3.2. Zona de Audibilidade 46

Figura 3.8:

• a altura h > 0 do voo (suposta constante, medida em Km, por exemplo).

• a velocidade v do aviao (suposta constante, medida em Km/h).

• a velocidade s de propagacao do som (suposta tambem constante, medidaem Km/h).

• v > s - voo supersonico

¨ Exercıcio 21 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando o problema anterior.

Calculos:

Vamos analisar a zona de audibilidade no instante t = 0. Neste instante oaviao esta por cima do ponto O (a origem das coordenadas). Suponhamos queo aviao voa da esquerda para a direita.

T > 0 horas mais cedo o aviao estava no ponto de coordenadas:

P (T ) = (−vT, h)

Nesse ponto o motor do aviao emitiu um som que se prapaga em todas asdireccoes com velocidade s. A (frente de) onda tem pois a forma de uma esferacujo raio cresce com velocidade s < v.

Qual o raio dessa esfera no instante t = 0?

Como passaram T horas , e claro que esse raio e igual a:

Ts

Esta mesma esfera, no instante t = 0, intersecta o plano do chao numa circun-ferencia centrada em:

(−vT, 0)

e cujo raio e: √(Ts)2 − h2 (3.2.1)

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3.2. Zona de Audibilidade 47

Figura 3.9:

¨ Exercıcio 22 Fazer e justificar os calculos com detalhe.

Generalizacao:

O mesmo acontece em cada instante t : −T ≤ t ≤ 0 - nesse instante oaviao esta no ponto (vt, h) e, nesse ponto, o motor do aviao emite um somque se prapaga em todas as direccoes com velocidade s. A (frente de) ondacorrespondente tem mais uma vez a forma de uma esfera cujo raio cresce comvelocidade s < v. Essa esfera, no instante t = 0, tem um raio igual a st eintersecta o plano do chao numa circunferencia centrada em:

(vt, 0)

e cujo raio e: √(ts)2 − h2

¨ Exercıcio 23 Analisar com detalhe a animacao feita no exercıcio 21, comT = 20 e em que se ve a emissao das esferas em varios instantes de tempo.

¨ Exercıcio 24 Observar agora a mesma animacao mostrando a interseccaodas esferas com o chao (suposto plano). Isto e, temos uma famılia de circun-ferencias parametrizada por t. Por outras palavras, para cada t : −T ≤ t ≤ 0temos uma circunferencia Ct centrada em:

(vt, 0)

e cujo raio e: √(ts)2 − h2

Construir com detalhe uma animacao ilustrativa mostrando as diversas circun-ferencias.

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3.2. Zona de Audibilidade 48

Figura 3.10:

Zona de Audibilidade:

E agora claro que a zona de audibilidade no instante t = 0 e constituıdapor todos os pontos que estao dentro de todas estas circunferencias.

¨ Exercıcio 25 Qual e a equacao da circunferencia Ct?

Solucao: Ct : (x− vt)2 + y2 = (ts)2 − h2

A zona de audibilidade no instante t = 0 e pois constituıda por todosos pontos (x, y) que satisfazem as inequacoes (uma para cada t):

(x− vt)2 + y2 ≤ (ts)2 − h2, −T ≤ t ≤ 0 (3.2.2)

ou, fazendo as contas:

(v2 − s2) t2 − 2vx t + (x2 + y2 + h2) ≤ 0, −T ≤ t ≤ 0 (3.2.3)

Esta e uma inequacao do segundo grau em t.

Quais as condicoes em que admite solucao? A resposta esta dada no teoremaseguinte:

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3.2. Zona de Audibilidade 49

Teorema

Considere um polinomio quadratico da forma:

at2 + bt + c

com coeficientes a > 0 e c > 0. Para que exista um t ≤ 0 quesatisfaca a inequacao:

at2 + bt + c ≤ 0

e necessario e suficiente que

1. b > 0

2. b2 − 4ac ≥ 0

Dem.:

Se [1.] nao se verifica, i.e., se b ≤ 0, entao at2 + bt + c > 0, ∀t ≤ 0, umavez que a > 0, c > 0. Por outro lado, se [2.] nao se verifica, i.e., se b2 − 4ac < 0,entao a equacao do 2o grau at2 + bt + c = 0 nao tem raızes reais e como a > 0,at2 + bt + c > 0, ∀t ∈ IR. Concluindo, se existe um t ≤ 0 que satisfaca a inequacaoat2 + bt + c ≤ 0 entao [1.] e [2.] devem verificar-se simultaneamente.

Reciprocamente, suponhamos que [1.] e [2.] se verificam simultaneamente. Asraızes da equacao polinomial at2 + bt + c = 0 sao, como se sabe:

−b±√b2 − 4ac

2a

Se [1.] e [2.] se verificam obtemos uma raız negativa tomando o sinal -, e, para essa

raız, at2 + bt + c = 0.

¥.

No nosso caso, a inequacao e (3.2.3) com:

a = v2 − s2 > 0, b = −2vx e c = x2 + y2 + h2 > 0

Aplicando os criterios do teorema:

• b = −2vx > 0 ⇔ x < 0

• b2 − 4ac ≥ 0 ⇔ (2vx)2 − 4(v2 − s2)(x2 + y2 + h2) ≥ 0

Esta ultima desigualdade pode ser escrita na forma:

x2

[(v2 − s2)/s2]h2− y2

h2≥ 1

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3.2. Zona de Audibilidade 50

ou, fazendo:c =

v

sh

x2

c2 − h2− y2

h2≥ 1 (3.2.4)

Conclusao 1

A zona de audibilidade no instante t = 0 consiste de todos ospontos (x, y) que satisfazem:

x2

c2 − h2− y2

h2≥ 1 e x < 0 (3.2.5)

Conclusao 2

A hiperbole de equacao:

x2

c2 − h2− y2

h2= 1 (3.2.6)

e a envolvente das circunferencias Ct, dadas por (??).

¨ Exercıcio 26 Faca um applet com Geogebra, com parametros variaveis,ilustrando as circunferencias Ct e a respectiva envolvente.