Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

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FISIOLOGIA ARTICULAR

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FISIOLOGIA ARTICULAR

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À minha mulher

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A. I. KAPAN DJ I

Ex-Interno dos Hospitais de ParisEx-Chefe de Clínica-Auxiliar dos Hospitais de Paris

Membro da Sociedade Francesa de Ortopedia e Traumatologia (S.O.F.C.O.T.)Membro da Sociedade Francesa de Cirurgia da Mão (G.E.M.)

FISIOLOGIA ARTICULARESQUEMAS COMENTADOS DE MECÂNICA HUMANA

VOLUME 11

5ª edição

MEMBRO INFERIOR

I. - O QUADRIL

11. - O JOELHO

111.- O TORNOZELO

IV. - O PÉ

V. - AABÓBADA PLANTAR

Com 690 desenhos originais do autor

___ ~c.-.._ ;"~'~ __ o(',",~ _

• Este livro p&:'ie~<;e80 Sistema de Bibliote- •cas da UC2.",··.~ sór entregue nos pra­zos prevltilü, OJ quandO solkitado O alunoserá responsavel pelo livro e em caso dedanificação ou perda deverá repo-Io.

- EDITORIALMEDICA-

Cpanamericana -=:>~Tr

MALOINE

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Título do original em francêsPHYSIOLOGIE ARTICULAIRE. 2. Membre Inférieur

© Éditions MALOINE. 27, Rue de l'École de Médecine. 75006 Paris.

Tradução deEditorial Médica Panamericana S.A.

Revisão Científica e Supervisão por Soraya Pacheco da Costa, fisioterapeuta

ISBN (do volume): 85-303-0044-0

ISBN (obra completa): 85-303-0042-4© 2000 Éditions MALOINE.

27, rue de l'École de Médecine. 75006 Paris.

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ~

K26fv.2

00-1624.

Kapandji, A. L (Ibrahim Adalbert)

Fisiologia articular, volume 2 : esquemas comentados demecânica humana / A. r. Kapandji ; com desenhos originaisdo autor; [tradução da 5.ed. original de Editorial Médica

Panamericana S.A. : revisão científica e supervisão por SorayaPacheco da Costa]. - São Paulo: Panamericana ; Rio de

Janeiro: Guanabara Koogan, 2000: 690 il.

Tradução de: Physiologie articulaire, 2 : membreÍnférieur

Inclui bibliografiaConteúdo: v.2. Membro inferior: O quadril - O joelho ­

O tornozelo - O pé - A abóbada plantarISBN 85-303-0044-0

1. Mecânica humana. 2. Articulações - Atlas. 3.Articulações - Fisiologia - Atlas. L Título.

CDD 612.75CDU 612.75

UNIVERSIDADE CAT()IICADE BRASil IA

Sistema de Bjtliiotecas

231100 241100 009948

Todos os direitos reservados para a língua portuguesa. Excetuando críticas e resenhas científico-

literárias, nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, armazenada em sistemas computadorizados ou transmitida

de nenhuma forma e por nenhum meio. sejam eletrônicos, mecânicos, fotocopiadoras, gra\'adoras ou qualquer outro,sem a prévia permissão deste Editor

(Medicina Panamericana Editora do Brasil Ltda.)

Medicina Panamericana Editora do Brasil LTDA,

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Distribuição exclusiva para a língua portuguesa por Editora Guanabara Koogan S.A.Travessa do Ouvidor, 1I - Rio de Janeiro - RJ - 20040-040Te!.: 21-222 I -962 IFax: 21-2221-3202

www.editoraguanabara.com.br

Depósito Legal: M-53.356-200lImpreso en Espana

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PREFÁCIO À EDIÇÃO EM PORTUGUÊS

Passaram mais de vinte e cinco anos desde o momento em que se escreveram estes três volu­mes de Esquemas Comentados de Fisiologia Articular obtendo grande sucesso entre os leitores detodo tipo, estudantes de medicina e fisioterapia, médicos, fisioterapeutas e cirurgiões. O fato de quecontinue atual se deve ao particular caráter destas obras, cujo objetivo é o ensino do funcionamentodo Aparelho Locomotor de maneira atrativa, privilegiando a imagem diante do texto: o princípio ée).plicar uma única idéia através do desenho, o qual permite lima memorização e uma compreensãodefinitivas. O fato de que estes liiTos não tenham competidor sério demonstra nitidamente o seu valorintrínseco. Na verdade, é a clareza da representação espacial do funcionamento dos músculos e dasarticulações o que faz com que seja tão evidente: estes esquemas não integram unicamente as trêsdimensões do espaço, mas também uma quarta dimensão, a do Tempo, porque a Anatomia Funcionalestá i'iva e, conseqiientemente, móvel- isto é. inscrita no Tempo. Isto diferencia a Biomecânica daMecânica propriamente dita, ou Mecânica Industrial. A Biomecânica é a Ciência das estruturas evo­lutims, que se modificam segundo os contratempos e evoluem em função das necessidades, capazesde renovar-se cOllStantemente para compensar o desuso. É lima mecânica sem eixo materializado,móvel inclusive no percurso do movimento. As suas supofícies articulares integram um jogo mecâni­co que seria por completo impossível na mecânica industrial, porém lhe outorga possibilidades adi­clOnazs.

Eis aqui o espírito que impregna estes volumes, ao mesmo ternpo que deixa a porta aberta aosoutros métodos de ensino para o futuro. Este é, na verdade, o segredo da sua perenidade.

A. I. KAPANDJI

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ADVERTÊNCIA DO AUTOR À QUINTA EDIÇÃO

A partir de sua primeira edição, há sete anos atrás, este lin'o, inspirado principalmente por. Duchenne de Boulogne, o "grande precursor" da Biomecânica, permaneceu fiel a si mesmo, exceçãofeita por algumas pequenas correções. Neste momento, na oportunidade do aparecimento da quintaedição, achamos necessário incluir modificações importantes, em especiai no que se refere à mão. Defato, o rápido desenvolvimento da cirurgia da mão exige um incessante aprofundamento quanto aoconhecimento de sua fisiologia. Este é o motivo pelo qual, à luz de recentes trabalhos, temos escrito edesenhado novamente tudo relacionado ao polegar e ao mecanismo de oposição: a função da articu­lação trapézio-metacarpeana na orientação e rotação longitudinal da coluna do polegar se explica demaneira matemática a partir da teoria das articulações de dois eixos tipo cardan: assim mesmo, se es­clarece afunção da articulação metacarpofalangeana no "bloqueio" da preensão de grandes objetose, enfim, a função da articulação inteJfalangeana na "distribuição" da oposição do polegar sobre apolpa de cada um dos quatro dedos. A riqueza na variedade de preensão e preensões associadas àsações está ilustrada com novos desenhos. Temos apelfeiçoado a definição das distintas posições fzlll­cionais e de imobilização. Porfim, com o O,bjetivo de estabelecer um balanço fzlllcional rápido da mão.propõe-se uma série de provas de movimentos, as "preensões mais ação" que, melhor do que as ,'a­lorações analíticas da amplitude de cada uma das articulações e da potência de cada mÚsculo, faci­litam uma apreciação sintética do valor da utilização da mão.

No final do livro suprimimos alguns modelos obsoletos ou que não oferecem muito interesse.e substituímos por um modelo da mão que explica, neste caso de maneira satisfatória, a oposição dopoleg([J~

Em resumo, este é um livro renovado e enriquecido em profundidade.

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PREF ÁCIO À EDIÇÃO EM PORTUGUÊS

Passaram mais de vinte e cinco anos desde o momento em que se escreveram estes três volu­mes de Esquemas Comentados de Fisiologia Articular obtendo grande sucesso entre os leitores detodo tipo, estudantes de medicina e fisioterapia, médicos,jisioterapeutas e cirurgiões. O fato de quecontinue atual se deve ao particular caráter destas obras, cujo objetivo é o ensino do funcionamentodo Aparelho Locomotor de maneira atratim, prh'ilegiando a imagem diante do texto: o princípio éexplicar uma Única idéia através do desenho, o qual permite uma memorização e uma compreensãodefinitivas. O fato de que estes lii'J"OSnão tenham competidor sério demonstra nitidamente o seu valorintrínseco. Na verdade, é a clareza da representação espacial do funcionamento dos mÚsculos e dasarticulações o que faz com que seja tão evidente: estes esquemas não integram unicamente as trêsdimensões do espaço, mas também uma quarta dimellSão, a do Tempo, porque a Anatomia Funcionalestá i'iva e, conseqiientemente, móvel- isto é, inscrita no Tempo. Isto diferencia a Biomecânica daMecânica propriamente dita, ou Mecânica Industrial. A Biomecânica é a Ciência das estruturas evo­lutims, que se modifIcam segundo os contratempos e evoluem em função das necessidades, capazesde renovar-se constantemente para compensar o desuso. É uma mecânica sem eixo materializado,móvel inclusive no percurso do movimento. As suas supelfícies articulares integram um jogo mecâni­co que seria por completo impossível na mecânica industrial, porém lhe outorga possibilidades adi­CIOIICIlS.

Eis aqui o espírito que impregna estes i'olumes, ao mesmo tempo que deixa a porta aberta aosoutros métodos de ensino para o futuro. Este é, lia i'erdade, o segredo da sua perenidade.

A. I. KAPANDJI

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ÍNDICE

o QUADRIL

Movimentos de flexão do quadril

Movimentos de extensão do quadril

Movimentos de abdução do quadril

Movimentos de adução do quadril

Movimentos de rotação longitudinal do quadril

O movimento de circundução do quadril

Orientação da cabeça femoral e do cótilo

Relações das superfícies articulares

Arquitetura do fêmur e da pelve

A orla cotilóide e o ligamento redondo

A cápsula articular do quadril

Os ligamentos do quadril

Função dos ligamentos na flexão-extensão

Função dos ligamentos na rotação externa-rotação interna

Função dos ligamentos na adução-abdução

Fisiologia do ligamento redondo

Fatores de coaptação da coxo-femoral

Fatores musculares e ósseos da estabilidade do quadril

Os músculos flexores do quadril

Os músculos extensores do quadril

Os músculos abdutores do quadril

A abdução

O equilíbrio transversal da pelve

Os músculos adutores do quadril

Os músculos rotadores externos do quadril

Os músculos rotadores do quadril

A inversão das ações musculares

Intervenção sucessiva dos abdutores

o JOELHO

Os eixos da articulação do joelho

Os deslocamentos laterais do joelhoOs movimentos de flexão-extensão

A rotação axia1 do joelho

Arquitetura geral do membro inferior e orientação das superfícies articulares

As superfícies da flexão-extensão

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8 ÍNDICE

As superfícies em função da rotação axial

Perfil dos côndilos e .das glenóides

Determinismo do perfil côndilo-troc1ear

Os movimentos dos côndilos sobre as glenóides na flexão-extensão

Os movimentos dos côndilos sobre as glenóides nos movimentos de rotação axial

A cápsula articular

O ligamento adiposo, as pregas, a capacidade articularOs meniscos interarticulares

Os deslocamentos dos meniscos na flexão-extensão

Os deslocamentos dos meniscos na rotação axial. Lesões meniscais

Os deslocamentos da patela sobre o fêmur

As ligações fêmoro-patelares

Os deslocamentos da patela sobre a tíbia

Os ligamentos laterais do joelho

A estabilidade transversal do joelho

A estabilidade ântero-posterior do joelho

As defesas periféricas do joelho

Os ligamentos cruzados do joelho

Ligações da cápsula e dos ligamentos cruzados

Direção dos ligamentos cruzados

Função mecânica dos ligamentos cruzados

A estabilidade rotatória do joelho em extensão

Os testes dinâmicos em rotação interna

Os testes dinâmicos de ruptura do ligamento cruzado ântero-externo

Os testes dinâmicos em rotação externa

Os músculos extensores do joelho

Fisiologia do reto anterior

Os músculos tlexores do joelho

Os músculos rOladores do joelho

A rotação automática do joelho

O equilíbrio dinâmico do joelho

o TORNOZELO

O complexo articular do péA flexão-extensão

As superfícies da tíbio-tarsiana

Os ligamentos da tíbio-tarsiana

Estabilidade ântero-posterior do tornozelo e fatores lirnitantes da flexão-extensãoEstabilidade transversal da tíbio-tarsiana

As articulações tíbio- fibulares

Fisiologia das articulações tíbio- fibulares

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OPÉ

Os movimentos de rotação longitudinal e de lateralidade do pé

As superfícies articulares da subastragaliana

Congruência e incongruência da subastragaliana

O astrágalo, um osso singular

Os ligamentos da articulação subastragaliana

A médio-tarsiana e os seus ligamentos

Os movimentos na subastragaliana

Os movimentos na subastragaliana e na médio-tarsianaOs movimentos na médio-tarsiana

Funcionamento global das articulações do tarso posterior

O cardão heterocinético da parte posterior do pé

As cadeias ligamentares de inversão e eversão

As articulações cúneo-escafóides, intercuneiformes e tarso-metatarsianas

Movimentos nas articulações do tarso anterior e na metatarsiana

A extensão dos dedos do péMúsculos interósseos e lumbricais

Músculos da planta do pé

Canais tendinosos do dorso e da planta do péOs flexores do tornozelo

O tríceps suralOs outros extensores do tornozelo

Os músculos abdutores-pronadores: Os fibulares

Os músculos adutores-supinadores: Os tibiais

A ABÓBADA PLANTAR

A abóbada plantar em conjuntoO arco interno

O arco externo

O arco anterior e a curvatura transversal

Distribuição das cargas e deformações estáticas da abóbada plantar

O equilíbrio arquitetônico do pé

Deformações dinâmicas da abóbada plantar durante a marcha

Deformações dinâmicas segundo a inclinação lateral da perna sobre o pé

Adaptação da abóbada plantar ao terreno

Os pés cavos

Os pés chatos

Os desequilíbrios do arco anterior

BIBLIOGRAFIA

MODELOS DE MECÂNICA ARTICULAR PARA CORTAR E ARMAR

ÍNDICE DE ABREVIATURAS

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2. MEMBRO INFERIOR 11

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12 FISIOLOGIA ARTICULAR

o quadril é a articulação proximal domembro inferior: situada na raiz do membroinferior, a sua função é orientar-lhe em todas asdireções do espaço, por isso possui três eixos etrês graus de liberdade (fig. 1-1):

- um eixo transversal XOX', situado noplano frontal, ao redor do qual se execu­tam os movimentos de fiexão-extensão;

- um eixo ântero-posterior YOY', situadono plano sagital, que passa pelo centroda articulação, ao redor do qual se reali­zam os movimentos de abdução-adução;

- um eixo vertical OZ, que se confundecom o eixo longitudinal OR do membroinferior quando o quadril está numa po­sição de alinhamento. Este eixo longitu­dinal permite os movimentos de rotaçãoexterna e rotação interna.

Os movimentos do quadril são realizadospor uma única articulação: a articulação coxo­femoral, em forma de enartrose muito coapta­da. Esta característica se opõe totalmente à daarticulação do ombro, que se caracteriza por serum verdadeiro complexo articular cuja articula­ção escápulo-umeral é uma enartrose com pou­ca capacidade de coaptação e uma grande mobi-

lidade com detrimento da estabilidade. Conse­qüentemente, a articulação coxofe~oral temmenos amplitude de movimento - compensa­da, em certa medida, pela coluna vertebral lom­bar -; contudo, é muito mais estável e é a arti­culação mais difícil de luxar de todo o corpo.Todas estas características próprias do quadrilestão condicionadas pelas funções de suporte dopeso corporal e de locomoção desempenhadaspelo membro inferior.

Foi justamente por causa da articulação doquadril que surgiu a era das próteses articulares,transformando a cirurgia do aparelho locomotor.Esta articulação, aparentemente a mais simplesde amoldar, devido às suas superfícies articula­res muito parecidas com as de uma esfera, aindahoje provoca muitos problemas: dimensão daesfera protética, natureza das superfícies de con­tato com relação ao coeficiente de atrito, resis­tência ao desgaste, eventual toxicidade dos resí­duos do desgaste; mas, principalmente, o pro­blema mais difícil de abordar é a união com oosso vivo, sob a controvérsia de incrustação ounão. Também graças ao quadril, a investigaçãosobre as próteses se desenvolveu de tal formaque a quantidade de modelos disponíveis au­mentou bastante.

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Fig.1-1

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14 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DE FLEXÃO DO QUADRIL

A ftexão do quadril é o movimento que pro­duz o contato da face anterior da coxa com otronco, de modo que a coxa e as porções rema­nescentes do membro inferior ultrapassam o pla­no frontal da articulação, situando~se por diantedela.

A amplitude da flexão varia dependendo dediversos fatores:

No conjunto, a ftexão ativa do quadril não étão ampla como a passiva. A posição do joelhotambém intervém na amplitude da ftexão: quandoo joelho está estendido (fig. 1-2), a ftexão nãopassa dos 90°, ao passo que quando o joelho estáfiexionado (fIg. 1-3), atinge ou ultrapassa os 120°.

No que diz respeito à flexão passiva, asua amplitude sempre ultrapassa os 120°, po-

rém a posição do joelho é importante: se estáestendido (fig. 1-4), a flexão é muito menorque quando está flexionado (fig. 1-5); neste úl­timo caso, a amplitude ultrapassa os 140° e acoxa quase toca totalmente o tórax. Constata­remos mais adiante (pág. 150) como a flexãodo joelho, sempre que os ísquio-tibiais estejamrelaxados, permite uma maior flexão do qua­dril.

Se ambos os quadris se fiexionam de formapassiva ao mesmo tempo estando os joelhostambém fiexionados (fig. 1-6), a face anteriordas coxas mantém um amplo contato com otronco, já que, além da fiexão das articulaçõescoxofemorais, vemos a retroversão da pelve fa­zendo desaparecer a lordose lombar (seta).

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16 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DE EXTENSÃO DO QUADRIL

A extensão leva o membro inferior paratrás do plano frontal.

A amplitude da extensão do quadril é mui­to menor que a da flexão, estando limitada pelatensão do ligamento ílio-femoral (ver pág. 36).

A extensão ativa é de menor amplitude quea extensão passiva. Quando o joelho está esten­dido (fig. 1-7), a extensão é maior (20°) quequando está tlexionado (fig. 1-8), isto se deve aofato de os músculos ísquio-tibiais perderem to­talmente a sua eficácia como extensores do qua­dril, porque utilizam grande parte de sua forçade contração na flexão do joelho (ver pág. 150).

A extensão passiva é de apenas 20° nopasso para diante (fig, 1-9); alcança os 30°quando o membro inferior se situa bem paratrás (fig. 1-10).

É necessário destacar que a extensão doquadril aumenta notavelmente devido à básculade pelve produzida por uma hiperlordose lom­bar. Esta participação da coluna lombar pode

medir-se nas figuras 1-7 e 1-8 pelo ângulo com­preendido entre a vertical (traços finos) e a posi­ção de alinhamento normal da coxa (traços gros­sos). Esta última posição se obtém graças ao ân­gulo invariável que a coxa forma com a linhaque une o centro do quadril e a espinha ilíaca ân­tero-superior. Todavia, este ângulo varia depen­dendo de cada sujeito, visto que depende da es­tática da pelve, ou seja, do grau de retroversãoou anteversão pélvica.

As amplitudes citadas aqui se correspon­dem com indivíduos "normais" sem treina­

mento prévio. Estas podem aumentar-se consi­deravelmente graças ao exercício e ao treina­mento apropriados; por exemplo, as bailarinaspodem realizar a abertura de ambas as pernassem problemas (fig, 1-11) inclusive sem apoiono chão, graças à flexibilidade de seu ligamen­to de Bertin; porém, é necessário destacar quea escassa extensão relativa da coxa posterior écompensada com uma importante anteversãoda pelve.

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Fig.1-9

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18 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DE ABDUÇÃO DO QUADRIL

A abdução dirige o membro inferior dire­tamente para fora e o afasta do plano de sime­tria do corpo.

Se teoricamente é possível realizar a abdu­ção de só um quadril, na prática a abdução deum quadril se acompanha de uma abduçãoidêntica a do outro quadril. Isto acontece a par­tir dos 30° (fig. 1-12), amplitude em que se ini­cia uma báscula da pelve pela inclinação da linhaque une as duas fossas laterais e inferiores (quecorrespondem à projeção cutânea das espinhasilíacas póstero-superiores). Prolongando-se oeixo de ambos os membros inferiores, constata­mos que se cortam no eixo simétrico da pelve:portanto, podemos deduzir que nesta posição osquadris estão em abdução de 15°.

Quando se completa o movimento de ab­dução (fig. 1-13), o ângulo formado pelos doismembros inferiores atinge os 90°. A simetria deabdução de ambos os quadris reaparece, entãodeduzimos que a amplitude máxima de abduçãode um quadril é de 45°. Observe-se que, nestepreciso instante, a pelve apresenta uma inclina-

ção de 45° com respeito à horizontal, do ladoque suporta a carga. A coluna vertebral, em con­junto, compensa estâ inclinação da pelve comuma convexidade para o lado que suporta a car­ga. De novo reaparece a participação da colunanos movimentos do quadril.

A abdução está limitada pelo impacto ós­seo do colo do fêmur com o rebordo cotilóide(ver pág. 34), porém antes que isto aconteça, in­tervêm os músculos adutores e os ligamentosílio-femorais e pubofemorais (ver pág. 42).

Com exercício e treinamento adequados, épossível aumentar a máxima amplitude da abdu­ção, como no caso das bailarinas, que podematingir de 120° (fig. 1-14) a 130° (fig. 1-15) de ab­dução ativa, isto é, sem apoio. Na abdução passi­va, os indivíduos que se treinam podem alcançaros 180° de abdução frontal (fig. 1-16a); na reali­dade, não se trata de abdução pura, visto que pa­ra distender os ligamentos de Bertin a pelve bas­cula para diante (fig. l-l6b), enquanto a colunalombar adquire uma hiperlordose (seta) de modoque o quadril está em abdução-flexão.

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Fig.1-16

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Fig.1-13

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20 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DE ADUÇÃO DO QUÂDRIL

A adução leva o membro inferior para den­tro e o aproxima do plano de simetria do corpo.Como na posição de referência ambos os mem­bros inferiores estão em contato um com o outro,não existe movimento de adução "pura".

Pelo contrário, existem movimentos deadução relativa (fig. 1-17) quando, a partir deuma posição de abdução, o membro inferior sedirige para dentro.

Também existem movimentos de aduçãocombinada com extensão do quadril (fig. 1­18) e movimentos de adução combinada comflexão do quadril (fig. 1-19). -

Finalmente, existem movimentos de adu­ção de um quadril combinada com uma abdu­ção do outro quadril (fig. 1-20), acompanhadosde uma inclinação da pelve e de um encurvamen-

to da coluna. Destacar que a partir do momentoem que os pés se separam - e isto é necessáriopara assegurar o equilíbrio do corpo - o ângulode adução de um quadril não é exatamente omesmo que o ângulo de abdução do outro quadril(fig. 1-21): a sua diferença é igual ao ângulo for­mado pelos eixos de ambos os membros inferio­res na posição simétrica de partida.

Em todos estes movimentos de aduçãocombinada, a amplitude máxima de adução éde 30°.

Entre todos estes movimentos de aduçãocombinada, existe um que realiza uma posiçãobastante freqüente (fig. 1-22): a posição de senta­do com as pernas cruzadas. Neste caso, a aduçãoassocia-se à flexão e à rotação externas. É a posi­ção mais instável do quadril (ver pág. 46).

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2. MEMBRO INFERIOR 21

Fig.1-19Fig.1-18Fig.1-17

Fig.1-20 Fig.1-21 Fig.1-22

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22 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO LONGITUDINAL DO QUADRIL

Os movimentos de rotação longitudinal doquadril se realizam ao redor do eixo mecânicodo membro inferior (eixo OR na figura l-I). Naposição normal de alinhamento, este eixo seconfunde com o eixo vertical da articulaçãocoxofemoral (eixo OZ, figo 1-1). Nestas condi­ções, a rotação externa é o movimento que le­va a ponta do pé para fora, enquanto a rotaçãointerna leva a ponta do pé para dentro. Quan­do o joelho está totalmente estendido não exis­te nenhum movimento de rotação nele (verpág. 136), sendo o quadril, neste caso, o únicoresponsável pelos movimentos de rotação.

Contudo, esta não é a posição utilizada pa­ra apreciar a amplitude dos movimentos de rota­ção. É preferível realizar este estudo com o su­jeito em decúbito prono ou ventral, ou sentadosobre o bordo da mesa com o joelho tlexionadoem ângulo reto.

Em decúbito ventral, a posição de referên­cia (fig. 1-23) se obtém quando o joelho tlexio­nado em ângulo reto está vertical. A partir destaposição, quando a perna se dirige para fora, me­de-se a rotação interna (fig. 1-24), cuja ampli­tude máxima é de 30 a 40°. Quando a perna sedirige para dentro, mede-se a rotação externa(fig. 1-25), cuja amplitude máxima é de 60°.

Estando o sujeito sentado no bordo da me­sa de exame, quadril e joelho tlexionados emângulo reto, a rotação externa mede-se da mes­ma maneira que no caso anterior, quando a per­na se dirige para dentro (fig. 1-26), com a coxagirando sobre si mesma, e a rotação internaquando a perna se dirige para fora (fig. 1-27).Nesta posição, a amplitude máxima da rotaçãoexterna pode ser maior que na posição de decú­bito ventral, porque a tlexão do quadril distendeos ligamentos ílio-femorais e pubofemorais,que são os principais fatores limitantes da rota­ção externa (ver pág. 40).

Na posição de sentado com as pernas cru­zadas (fig. 1-28), a rotação externa se combinacom uma tlexão que ultrapassa os 90° e comuma abdução. Os adeptos do Yoga chegam a for­çar a rotação externa até tal ponto que os eixosde ambas as pernas ficam paralelos, sobrepostose horizontais (posição denominada de "lótus").

A amplitude das rotações depende do ângu­lo de anteversão do colo do fêmur. Geralmente,esta anteversão está bastante acentuada na crian­ça, o que leva a uma rotação interna da pel71a­a criança caminha com "os pés para dentro" eapresenta com freqüência um pé plano valgo bi­lateral -. Com o crescimento, o ângulo de ante­versão volta a ter o seu valor norn1al, fazendocom que os problemas citados anteriormente de­sapareçam. Contudo, é necessário citar uma cir­cunstância na qual a anteversão pode permane­cer perene e inclusive exagerada: algumas crian­ças adquirem o hábito de sentar-se no chão so­bre os seus calcanhares com os joelhos tlexio­nados; isto leva a uma rotação interna do fêmure a uma anteversão exagerada dos colos femo­rais, porque a plasticidade do esqueleto ainda émuito grande. Uma forma de remediar esta si­tuação é obrigar a criança a realizar uma atitudeinversa, ou seja, sentar-se com as pel71ascruza­das, o melhor ainda, na posição de Yoga, que,com o passar do tempo, amolda o colo do fêmurem retroversão.

Até pouco tempo atrás a medida do ângulode anteversão dos colos femorais suscita, pelomenos com o método radiológico clássico, algu­mas dificuldades para interpretar os resultados.Atualmente, graças à tomografia computadori­zada, esta medida se realiza de forma simples eprecisa. Portanto, convém utilizar este métodoquando queremos diagnosticar rotações defei­tuosas dos membros inferiores, visto que, geral­mente, ~ moléstia "origina-se" no quadril.

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Fig.1-24

Fig.1-26

Fig.1-23

2. MEMBRO INFERIOR 23

Fig.1-25

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24 FISIOLOGIA ARTICULAR

o MOVIMENTO DE CIRCUNDUÇÃO DO QUADRIL

Como no caso de todas as articulaçõescom três graus de liberdade, o movimento decircundução do quadril se define como a com­binação simultânea de movimentos elemen­tares realizados ao redor de três eixos. Quan­do a circundução atinge a sua amplitude máxi­ma, o eixo do membro inferior descreve no es­paço um cone cujo vértice é o centro da articu­lação coxofemoral: ele é o chamado cone decircundução (fig. 1-29).

Este cone está longe de ser regular, por­que as amplitudes máximas não são iguais emtodas as direções do espaço; portanto, a traje­tória descrita pela porção distal do membro in­ferior não é um círculo, mas uma curva sinuo­sa que percorre diversos setores do espaço de­terminados pela intersecção dos três planos dereferência:

A) Plano sagital, no qual se realizam osmovimentos de flexão-extensão.

B) Plano frontal, no qual se executam osmovimentos de abdução-adução.

C) Plano horizontal.

Os oito setores do espaço numerados de I aVIII demonstram que a trajetória atravessa su­cessivamente os setores III, lI, I, IV, V e VIII*.

* Nota do autor: os setores VI, VII e VII não são vi­síveis na figura porque estão situados por trás, entre os pla­nos I e lI. São deduzidos por raciocínio lógico.

Observar como a trajetória contorna omembro que suporta o peso; se ele se desviasse,a trajetória sofreria um leve deslocamento paradentro. A seta R que prolonga o membro inferiorno setor IV para baixo, para diante e para forarepresenta o eixo do cone de circundução, quecorresponde à posição funcional e de imobiliza­ção do quadril.

Strasser propôs projetar esta trajetória so­bre uma esfera (fig. 1-30) cujo centro O estáocupado pelo centro da articulação coxofemo­ral, cujo raio OL está formado pelo fêmur e naqual o eixo dos pólos EI é horizontal. Nesta es­fera as amplitudes máximas podem ser localiza­das graças a um sistema de meridianos e de pa­ralelas (não ilustrados nesta figura).

Este mesmo sistema foi proposto para amedida do ombro, embora neste último casoseja certamente muito mais interessante, vistoque a rotação sobre o eixo longitudinal é maiorpara o membro superior do que para o inferior.

A partir de uma posição determinada OL do fêmur, aarticulação pode realizar movimentos de abdução (seta Ab)ou de adução (seta Ad) percorrendo o meridiano horizontal(MH), movimentos de rotação interna (seta rI) ou de rotaçãoexterna (rE) pela rotação ao redor do eixo OL Quanto aosmovimentos de fiexão-extensão, estes são de dois tipos se­gundo se realizam no sentido do paralelo P - se diz entãoque a fiexão FI é circumpolar- ou no sentido do círculo

grande C - em cujo caso se diz que a f1exão F2 é circun­central -. Estas distinções parecem não ter muita utilidadeprática.

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c

VI

V

--

B

Fig.1-29

E

2. MEMBRO INFERIOR 25

Fig.1-30

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26 FISIOLOGIA ARTICULAR

ORIENTAÇÃO DA CABEÇA FEMORAL E DO CÓTILO(as legendas são comuns a todas as figuras)

A articulação coxofemoral é uma enartro­se: as suas superfícies articulares são esféricas.

A cabeça femoral (fig. 1-31, vista anterior)está constituída por 2/3 de uma esfera de 40 a 50mm de diâmetro. Pelo seu centro geométrico Opassam os três eixos da articulação: eixo horizon­tal (1), eixo vertical (2), eixo ântero-posterior (3).O colo femoral serve de suporte para a cabeça fe­moral e assegura a sua união com a diáfise. O ei­xo do colo femoral (seta Cf) é oblíquo para cima,para dentro e para diante, formando assim o eixodiafisário (D), ângulo denominado "de inclina­ção", de 125° no adulto; ele forma um ângulo como plano frontal (fig. 1-37, vista superior) denomi­nado "de declinação ", de 10 a 30°, aberto paradentro e para diante e também denominado ângu­lo de anteversão. Desta forma (fig. 1-34, vistapóstero-intema), o plano frontal vertical que passapelo centro da cabeça femoral e pelo eixo dos côn­dilos (plano P) deixa a diáfise femoral e a sua ex­tremidade superior quase totalmente atrás de si;dito plano P contém o eixo mecânico MM' domembro inferior, que junto com o eixo diafisário(D) forn1a um ângulo de 5 a 7° (ver pág. 76).

A forma da cabeça e do colo varia segundo osindivíduos, de maneira que os antropólogos cons­tataram que ela era o resultado de uma determina­da adaptação funcional. Portanto, se distinguemdois tipos extremos (fig. 1-35 segundo Bellugue):

- um tipo "longilíneo" no qual a cabeçarepresenta mais de 2/3 de uma esfera eos ângulos cérvico-diafisários são máxi­mos (I = 125°, D = 2SO). A diáfise femo­ral é fina e a pelve pequena e alta. Umamorfologia como esta favorece grandesamplitudes articulares e corresponde auma adaptação à velocidade da corrida(esquemas a e c);

- um tipo "brevilíneo": a cabeça mal ul­trapassa a semi-esfera, os ângulos sãopequenos (I = 115°, D = 10°), a diáfise émais larga e a pelve maciça e larga. Aamplitude articular não é tão grande, po­rém o que a articulação perde em velo­cidade ganha em robustez (b e d). É umamorfologia de "força".

A cavidade cotilóide (fig. 1-32, vista exter­na) recebe a cabeça femoral; ela está situada naface externa do osso ilíaco, na união das trêspartes que o compõem. Ela tem a forma de semi­esfera limitada no seu contorno pelo rebordo co­tilóide (C). Apenas a periferia do cótilo está re­coberta de cartilagem: é a meia.:lua articular(Ml), interrompida na sua parte inferior pelaprofunda incisura ($quio-púbica. A parte centraldo cótilo está situada para trás em relação àmeia-lua articular e, portanto, não entra em con­tato com a cabeça femoral: é o fundo cotilóide(Tf) que uma fina lâmina óssea separa da super­fície endopélvica do osso ilíaco (fig. 1-33, ossotransparente). Veremos mais adiante (pág. 32)como a orla acetabular (La) se encaixa no re­bordo cotilóide (Rc).

O cótilo não está orientado diretamente parafora, mas sim para baixo e para diante (a seta C'representa o eixo do cótilo). Sobre um corte ver­tical (fig. 1-36) esta orientação para baixo podeser nitidamente vista: o eixo do cótilo forma um

ângulo de 30 a 40° com a horizontal, isto faz comque a parte superior do cótilo ultrapasse a cabeçapara fora; esta ultrapassagem se mede pelo ângu­lo de cobertura W, que geralmente é de 30° (ân­gulo de Wiberg). No nível do teto do cótilo apressão da cabeça é maior e a cartilagem dela e dameia-lua articular é mais grossa. Sobre um cortehorizontal (fig. 1-37) aparece a orientação paradiante: o eixo do cótilo (C') forma um ângulo de30 a 40° com o plano frontal. Distingue-se tam­bém o fundo (Tf) para trás da meia-lua (Ml) e daorla encaixado no rebordo cotilóide (Rc). O pla­no tangente ao rebordo cotilóide (Pr) é oblíquopara diante e para dentro.

Na prática, para realizar estes dois tipos de corte po­demos utilizar:

- para o corte vértico-frontal, a tomorradiogra­fia, que oferece uma imagem semelhante à da fi­gura 1-36;

- para o corte horizontal, ao exame escanográficodo quadril, que nos dá uma imagem semelhante ada figura 1-37 e permite medir o ângulo de ante­versão do cóti10 e do colo femoral, que é muito útilpara o diagnóstico das displasias do quadril.

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2. MElviBRO I;-";FERlOR 27

Tf

Fig.1-33

Pr

Fig.1-35

Fig.1-31

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- uma flexão próxima aos 90° (seta 1);

- uma leve abdução (seta 2);

- uma leve rotação externa (seta 3).

Nesta nova posição (fig. 1-45), o eixo do có­tilo C' está alinhado em CU com o eixo do colo.

No esqueleto (fig. 1-41), é possível conse­guir a coincidência das superfícies articularesgraças aos mesmos movimentos de flexão, ab­dução e rotação externa: a cabeça se encaixatotalmente no cótilo. Esta posição do quadrilcorresponde à situação de quadrúpede (fig. 1­42), que é, portanto, a autêntica posição fisio­lógica do quadril. A evolução, que fez o ho­mem passar da marcha quadrúpede para amarcha bípede, é responsável pela falta decoincidência das superfícies articulares dacoxofemoral. Por outro lado, esta falta de coin­cidência das superfícies articulares pode serutilizada como argumento a favor da origemquadrúpede do homem.

28 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÕES DAS SUPERFÍCIES ARTICULARES

Quando o quadril está em alinhamento totalmente as superfícies articulares da cabeça e(fig. 1-38), o que corresponde à posição de pé o cótilo: neste caso a meia-lua preta desaparece

também denominada posição "ereta" (fig. 1-39)~ totalmente. Graças aos planos de referência S e

a cabeça femoral não está totalmente recoberta 'l\ é fácil comprovar que para que as superfíciespelo cótilo, toda a parte ântero-superior da sua art;iculares coincidam, são necessários três mo-cartilagem está descoberta (seta, figura 1-38). ls- vimentos elementares:to deve-se (fig. 1-44, vista em perspectiva dostrês planos de referência do quadril direito) aofato de que o eixo do colo femoral (Cf) oblíquopara cima, para diante e para dentro não está noprolongamento do eixo do cótilo (C') oblíquopara baixo, para diante e para fora. Graças a ummodelo da articulação do quadril (fig. 1-40), po­de-se constatar a seguinte disposição: uma esfe­ra suportada por uma haste encurvada segundoos ângulos de inclinação e de declinação, o pla­no D representa o plano que passa pelos eixosdiafisário e transversal dos côndilos. Por outrolado, uma hemi-esfera convenientemente orien­tada num plano sagital S; um pequeno plano Frepresenta o plano frontal que passa pelo centroda hemi-esfera. Na posição ereta, a esfera ficaamplamente descoberta por cima e pela frente: ameia-lua preta representa a parte da cartilagemque não está coberta.

Fazendo girar de determinada maneira ahemi-esfera-cótilo com relação à esfera-cabeçafemoral (fig. 1-43), chegamos a fazer coincidir

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Cf

Fig.1-44

Fig.1-38

2. MEMBRO INFERIOR 29

Fig.1-43

C"

Fig.1-45

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30 FISIOLOGIA ARTICULAR

ARQUITETURA DO FÊlVIUR E DA PELVE

A cabeça, o colo e a diáfise do fêmur formam umconjunto que realiza o que se denomina, em mecânica,um suporte falso. Na verdade, o peso do corpo que recaisobre a cabeça femoral se transmite à diáfise femoralatravés de um braço de alavanca: o colo femoral. Pode­mos observar o mesmo sistema de "suporte falso" numaforca (fig. l-50), na qual a força vertical tem a tendênciaa "cortar" a barra horizontal no ponto de junção com ahaste e fechar o ângulo que formam ambas as peças. Pa­ra evitar um acidente desta envergadura, basta intercalarobliquamente uma perna de força.

O colo do fêmur constitui a barra superior da forca e.observando o membro inferior no seu conjunto (fig. 1--1-8),se pode constatar que o eixo mecânico (traços grossos) noqual se alinham as três articulações do quadril. joelho e tor­nozelo, deixa para fora a forca femoral (observar tambémque o eixo mecânico não coincide com a vertical, represen­tada na figura por uma linha de traços intercalados de ta­manhos diferentes). Veremos mais adiante (fig. 1-128) ointeresse mecânico desta disposição.

Para evitar o corte da base do colo de fêmur (fig. 1­51), a extremidade superior do fêmur possui uma es­trutura bem visível sobre um corte vertical de osso seco

(fig. 1-46). As lâminas do osso esponjoso estão dispostasem dois sistemas de trabéculas que correspondem a linhasde força mecânicas.

- um sistema principal formado por dois feixesde trabéculas que se expandem sobre o colo e acabeça:

- o primeiro (1) origina-se na cortical externada diáfise e termina na parte inferior da cor­tical cefálica. É o feixe arciforme de Gallois

e Bosquette;

- o segundo (2) se expande a partir da corticalinterna da diáfise e da cortical inferior do co­

lo e se dirige verticalmente para a parte su­perior da cortical cefálica: é o feixe cefálicoou leque de sustentação.

Culmann demonstrou que carregando excentricamenteum tubo de ensaio em forma de cajado ou grua (fig. 1­49) podem-se fazer aparecer dois leques de linhas deforça: um oblíquo, na convexidade, que corresponderiaaforças de tração e representa o homólogo do feixe ar­ciforme; e outro vertical, na concavidade. que corres­ponderia a forças de pressão e representa o feixe cefá­lico (haste de força da forca):

- um sistema acessório formado por doisfeixes quese expandem em direção ao trocânter maior:

- o primeiro (3), a partir da cortical interna dadiáfise: é o feixe trocanteriano:

- o segundo (4), de menor importância. forma­do por fibras verticais paralelas à cortical ex­terna do trocânter maior.

É necessário destacar três pontos:

1. No maciço trocanteriano se constitui um sistemaogival pela convergência dos feixes arciforme(1) e trocanteriano (3). O cruzamento destes doispilares forma uma chave de arco mais densa quedesce da conical superior do colo. O pilar inter­no é menos sólido e se debilita com a idade, de­vido à osteoporose senil.

2. No colo e na cabeça se constitui um outro sistemaogiral formado desta vez pela convergência do fei­xe arciforme (I) e do leque de sustentação (2). Naintersecção destes dois feixes, uma zona mais den­sa forma o nÚcleo da cabeça. Este sistema cérvico­cefálico se apóia 'numa zona extremamente sólida,a cortical inferior do colo, que forma o esporãocervical inferior de Merkel (Ep). também denomi­nado de Adams ou "Calcar".

3. Entre o sistema ogival do maciço trocanteriano eo sistema de sustentação cérvico-cefálico existeuma zona de menor resistência (+) que a osteo­porose senil torna ainda mais vulnerável e maisfrágil: esta é a zona onde se localizam as fraturascérvico-trocanterianas (fig. I-51).

A estrutura da cintura pélvica (fig. 1-46) também sepode analisar do mesmo modo. Formando um anel total­mente fechado, transmite as forças verticais da coluna lom­bar (seta tracejada e desdobrada) para as duas coxofemorais.

Existem dois sistel1lus rrabeculares principais quetr:msmitemas forças através da faceta auricular, em direção aocótilo por um lado e ao tsquio. pelo outro (figs. 1-46 e 1-47).

- As trabéculas sacrocotilóides se organizam segun­do dois sistemas:

1. O primeiro (5). procedente da parte superior dasuperfície auricular. condensa-se no bordo poste­rior da incisura ciática - formando o esporãociática (Ec) - para expandir-se na parte inferiordo cótilo. onde continua com as trabéculas de tra­ção do colo femoral (1).

2. O segundo (6), procedente da parte inferior da su­perfície auricular. condensa-se no nível do estrei­to superior - formando o esporão inominado (Ei)- para expandir-se na parte superior do cótilo on­de continua com as trabéculas de pressão do lequede sustentação (2).

- As trabéculas sacroisquiáticas (7) se originam na su­perfície auricular com os dois feixes citados antetiormente,para descer até o ísquio. Entrecruzam-se com as trabéculasque nascem no rebordo cotilóide (8). Este sistema de trabécu­Ias isquiáticas suporta o peso do corpo em posição sentada.

- Finalmente, as trabéculas que se originam no esporãoinominado (Ei) e no esporão ciático (Ec) se inserem no ramohorizontal do púbis. completando o anel pélvico.

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2. MEMBRO INFERIOR 31

Fig.1-51

Fig.1-46

Fig.1-50

Fig.1-49

Fig.1-47

Fig.1-48

7

8

5

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32 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ORLA COTILÓIDE E O LIGAMENTO REDONDO

A orla cotilóide (Rc) é um anel fibro-car­tilaginoso que se insere no rebordo cotilóide(fig. 1-52), aumentando notavelmente a profun­didade da cavidade cotilóide (ver pág. 44) eigualando as irregularidades do rebordo (C): seremovemos a palie superior da orla, podemosver a incisura flio-púbica (IP). Quanto à incisu­ra ísquio-púbica (IlP), a mais profunda das três,a orla forma uma ponte inserindo-se no ligamen­to transverso do acetábulo (LT), fixado por suavez nos dois bordos da incisura: no esquema es­tão "desmontados" LT e Rc. No corte (fig. 1-53),a orla se fixa com firmeza no bordo do ligamen­to transverso (ver também a figo 1-36).

De fato, no corte pode-se apreciar a formatriangular da orla além das três faces que sedescrevem a continuação: uma face interna quese insere totalmente no rebordo e ligamentotransverso; uma face central (que está orienta­da para o centro da articulação) recoberta decartilagem, continuação da meia-lua articulare, portanto, em contato com a cabeça femoral,uma face periférica na qual se insere a cápsulaarticular (Ca), embora esta inserção capsular sóocorra na parte mais interna dessa face, deixan­do livre o bordo cortante da orla dentro da ca­vidade articular; desta forma, aparece um re­cesso circular delimitado entre a orla e a cápsu­la (fig. l-54, segundo Rouviere), denominadoprega perilímbica (Pp).

O ligamento redondo (LR) é uma bandafibrosa achatada (fig. 1-56), de 30-35 mm decomprimento, que se estende da incisura ísquio­púbica (fig. 1-52) até a cabeça femoral e se en­caixa no fundo do cótilo (fig. 1-53). Asua inser­ção na cabeça femoral (fig. 1-55) situa-se naparte superior de uma fosseta localizada umpouco abaixo e por trás do centro da superfíciecartilaginosa; na parte inferior da fosseta, o liga-

mento somente desliza-se sobre ela. A banda sedivide em três feixes:

- um feixe posterior isquiático (fp), o demaior comprimento, que sai pela incisu­ra ísquio-púbica, passando por baixo doligamento transverso (fig: 1-52), para in­serir-se abaixo e atrás do corno posteriorda meia-lua articular,

- umfeixe anterior púbico (fa) que se fixana mesma inéisura, por trás do corno an­terior da meia-lua articular,

- um feixe médio (fm) mais fino, que seinsere no bordo superior do ligamentotransverso (fig. 1-52).

O ligamento redondo se localiza (fig. 1-53),junto com tecido celular adiposo, na cavidadeposterior (CP), onde está recoberto pela sinovial(fig. 1-54); esta membrana se insere, por umaparte, no bordo central da meia-lua articular e nobordo superior do ligamento transverso e, pelaoutra, na cabeça femoral, no bordo da fosseta deinserção do ligamento redondo. Portanto, a sino­vial tem uma forma troncocônica, e por isso le­va o nome de tenda do ligamento redondo (Ts).

O ligamento redondo não desempenha umafunção mecânica importante, apesar de ser ex­tremamente resistente (carga de ruptura = 45kg); contudo, contribui para a vascularização dacabeça femoral. De fato (fig. 1-57, vista inferiorsegundo Rouviere), do ramo posterior da artériaobturatória (1) se desprende uma arteríola, a ar­téria do ligamento redondo (6), que passa porbaixo do ligamento transverso e penetra na es­pessura do ligamento redondo. Por outro lado, acabeça e o colo estão vascularizados pelas arté­rias capsulares (5), ramos das artérias circunfle­xas anterior (3) e posterior (4), colaterais da ar­téria femoral profunda (2).

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I00 . SISTEMADE BIBlIOIi:U! I

GM

T2

2. MEMBRO INFERIOR 33

Fig.1-52

Fig.1-57

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34 FISIOLOGIA ARTICULAR

A CÁPSULA ARTICULAR DO QUADRIL

A cápsula do quadril tem a forma de bainhacilíndrica (Fig. 1-58) que se estende do osso ilíacoaté a extremidade superior do fêmur. Esta bainha es­tá constituída por quatro tipos de fibras:

- fibras longitudinais (1), de união, paralelasao eixo do cilindro;

- fibras oblíquas (2), também de união, po­rém formando uma espiral, mais ou menoslonga, ao redor do cilindro;

- fibras arciformes (3), cuja única inserção éo osso ilíaco, expandidas em forma de"guirlandas" de um ponto ao outro do re­bordo cotilóide, formam um arco, de com­primento variável, cuja parte mais proemi­nente sobressai do centro da bainha. Estes

arcos fibrosos "envolvem" a cabeça femo­ral como se fossem um nó de gravata e aju­dam a mantê-Ia no cótilo;

- fibras circulares (4), sem nenhuma inser­ção óssea. São abundantes no centro dabainha, ao qual retraem ligeiramente. So­bressaem-se na face 'profunda da cápsulaformando o anel de Weber ou zona orbicll­

lar, que rodeia e estreita o colo.

Pela sua extremidade interna, a bainha cap­sular se fixa no rebordo cotilóide (5), no ligamentotransverso e na superfície periférica da orla (verpág. 32), estabelecendo relações estreitas com otendão do reto anterior (RA, figo 1-52).

o seu feixe direto (T) se fixa na espinha ilíaca ântero­inferior, o seu feixe reflexo (T,) se fixa na parte posterior dacorredeira supracotilóide após haver-se deslizado por um des­dobramento da inserção capsular (fig. l-53) e do ligamentoílio-tendino-pré-trocanteriano (Lit) que reforça a parte supe­rior da cápsula (ver pág. 36); o seu feixe recorrente (T,) refor­ça a parte anterior da cápsula.

A extremidade externa da bainha capsularnão se insere no limite da cartilagem da cabeça,mas na base do colo, seguindo uma linha de inser­ção que passa:

- adiante, ao longo da linha intertrocante­riana anterior (6);

- atrás (fig. l-59), não na linha intertrocan­tellana posterior (7), mas na união do ter­ço externo e dos dois terços internos da fa-

ce posterior do colo (8), por cima da cor­rede ira (9) do tendão do obturador exter­no, antes de fixar-se na fossa digital (Fd);

- a linha de inserção cruza, obliquamente, osbordos superior e inferior do colo. Embai­xo, passa por cima da fosseta pré-trocanti­niana (10), e 1,5 cm acima e adiante dotrocânter menor (Tme). Ás fibras mais pro­fundas sobem pela parte inferior do colopara fixar-se no limite da cartilagem da ca­beça. Desta forma elevam as pregas sino­viais ou frenula capsulae (11), o mais sa­liente de todos forma a prega pectíneo-fo­veal de Amantini (12).

A utilidade destes fremtla capsulae se tomaevidente nos movimentos de abdução. De fato, seem adução (fig. 1-60) a parte inferior da cápsula (1)se distende enquanto a sua parte superior (2) se con­trai, durante a abdução (fig. 1-61) a longitude da par­te inferior da cápsula (1) seria insuficiente e limita­ria o movimento se as frenula capsulae (3), ao de­senrolar-se, não acrescentassem uma folga adicio­nal. Podemos ver de que maneira a cápsula se dobrapara cima (2) enquanto o colo bate com o rebordocotilóide através da orla (4) que se deforma e seachata: este mecanismo explica que a orla aumentea profundidade do cótilo sem limitar o movimento.

Nos movimentos de flexão extrema, a por­ção ântero-superior do colo faz impacto contra orebordo, o qual em alguns indivíduos deixa no co­lo (fig. 1-58) a marca de um trilho ilíaco (Ri) lo­calizado abaixo do limite da cartilagem.

Se infiltramos um produto opaco na cavidade articularpodemos obter, radiologicamente, uma artrografia do qua­dril (fig. 1-62), que põe em evidência alguns detalhes da cáp­sula e da orla.

O anel de Weber ou zona orbicular (9) forma uma retra~ção evidente que divide a cavidade articular em dois compar­timentos: o compartimento externo (1) e o compartimento in­terno (2). Ambos constituem os recessos superiores na suaporção superior (3) e os recessos inferiores na sua porção in­ferior (4). Na porção superior do compartimento interno se ra­núfica um esporão, cujo vértice se orienta em direção ao re­bordo cotilóide: é o recesso supralímbico (5) (comparar com afigo 1-53); de sua porção inferior se desprendem duas "ilhas"pequenas e arredondadas separadas por um profundo "golfo":são os dois recessos acetabulares (6) e o trilho de parte do li­gamento redondo (7). Finalmente, entre a cabeça e o cótilo fi­ca desenhada a interlinha articular (8).

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Fig.1-62

Tme

3 352 8

Fig.1-60

2. MEMBRO INFERIOR 35

5

Fig.1-58

Fig.1-61

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36 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DO QUADRIL---(as explicações são comuns a todâs as figuras)

A cápsula da articulação coxofemoral estáreforçada por potenfe-slig}tmentos nas suas facesanterior e posterior:

Na face anterior (fig. 1-63) se encontramdois ligamentos:

• o ligamentoQi.Q.:-femoral ou ligamento'de Bgtin (LB), leque fibroso cujo vérti­'ce-se insere nó-b-ordü"ilnterior do Ossoüíaco abaixo da espinha ilíaca ântero-in­ferior (onde se insere o reto anterior:RA) e cuja base se adere ao fêmur, aolongóde toda a linha intertrocanterianaanterior. Este leque é mais fino na suaporção mé~~a (c), enquanto os seus doisbordos são espessados por:

- o feixe superior ou z1io-pré-trocante­riano (fs), o mais forte dos ligamentosda articulação (8 a 10 mm de espessu­ra), que termina fora no tubérculo pré­trocanteriano e na parte superior dalinha intertrocanteriana. Está reforça­do, acima, pelo ligamento tlio-tendino­trocanteriano (Litt), o qual, segundoRouviere, está formado pela união dotendão recorrente do reto anterior (Tr)e de uma lâmina fibrosa que sai do re­bordo cotilóide (Lf). A face profundado glúteo mínimo (Gm) desprendeuma expansão aponeurótica (Exa) quese funde com a parte externa do liga­mento ílio-pré-trocanteriano;

- o feixe inferior ou ílio-pré-trocanti­niano (fi), cuja origem se confundecom a do anterior, se insere maisabaixo, na parte inferior da linha in­tertrocanteriana anterior.

• o ligamento pubofemoral (Lpf) se inse­re acima, na parte anterior da eminênCiaílio-pectínea e a orla anterior da corre-

d~ira infrapúbica, onde as suas fibras seen{ÍeIaçair1'_c~rn.:li~s:efção dOlfntsculopéctíneo. Abaixo, se fixa na p?-!:!eante­rigLda fos~a pré~{rocantiniana.

__1ifl1_~!!!!junto(fig. 1-64), estes dois liga­mentos formam na face anterior da articuJaçãd~~um:N deitado (We1cker) ou melhor, um Z cuJotraço superior (hs), o feixe ílio-pré-trocanteria­no, é quase horizontal, o traço médio (hi), o fei­xe ílio-pré-trocantiniano, é quase vertical e otraço inferior (Lpf): o ligamento pubofemoral, éhorizontal. Entre o ligamento pubofemoral e o li­gamento de Bertin (+), a cápsula mais fina cor­responde à bolsa serosa que a separa do tendãodo ílio-psoas (PI); às vezes, a cápsula está per­furada neste nível, o que faz com que a cavida­de articular e a bolsa serosa do ílio-psoas se co­mumquem.

.Naface posterior (fig. 1-65) existe um úni­co ligamento, o ligamento ísquio-femoral

-tLif): a sua inserção interna ocupa a parte pos­terior do rebordo e da orla cotilóides; suas fibras,sedirigem para cima e para fora, cruzando a fa­ce posterior do colo (h) para fixar-se na face in­terna do trocânter maior pela frente da fossa di­gital; o obturador externo termina nesta fossa eoseu tendão se desliza (seta branca) por umacorr.e.deiraque passa ao lado da inserção capsu­lar;! também podem-se distinguir (fig. 1-66) al­gurnas fibras (i) que se dirigem diretamente àzona orbicular (j).

Na passagem da posição quadrúpede à posi­ção bípede, a pelve se estende sobre o fêmur (verpág. 28), todos os ligamentos se enrolam, no mes­mo sentido, ao redor do colo (fig. 1-67): num qua­dril direito _"isto pela sua face externa, os liga­mentos giram no'sentido horário (dirigindo-se do2ss0 ilíaco para o fêmur), isto significa que-a ex­te.nsão enrola os ligamentos ao redor do colo en­quanto aflexão os desenrolq.-

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2. MEMBRO IJfFERIOR 37

Lpf

LBfi

Fig. 1-67

Fig. 1-65

Fig.1-63

h

ji

Fig.1-66

RA

PI ~1'1I // -.r _Trfs

fiLpf••• ~ •• ___ • ~ - - I'

~.I~.-~. - - - ..~,-Lif

VE

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38 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO DOS LIGAMENTOS NA FLEXÃO-EXTENSÃO

Na posição de alinhamento normal (re­presentada na figo 1-68), os ligamentos estãomoderadamente tensos. Isto está esquematizadosobre \) diagrama (fig. 1-69), onde a coroa re­presenta o cótilo e o círculo central representa acabe~'a e o colo femoral: os ligamentos, queaparecem representados por molas, estão dis­postos entre a coroa e o círculo central e tam­bém podemos ver o ligamento de Bertin (B) e oísquio-femoral (Lif) (o ligamento pubofemoralnão está representado na figura para não sobre­canegar o desenho).

Na extensão do quadril (fig. 1-70) todos osligamentos entram f!m tensão (fig. 1-71), vistoque se enrolam no colo femoral. Contudo, entretodos eles, o feixe ílio-pré-trocantiniano do liga­mento de Bertin é o que apresenta mais tensão,devido à sua posição quase vertical (fig. 1-70):portanto é o que limita, essencialmente, a retro­versão pélvica.

Na flexão do quadril (fig. 1-72) produz-seo inverso (fig. 1-73): todos os ligamentos se dis­tendem, tanto o ísquio-femoral, quanto o pubo­femora1 ou o ílio-femoral.

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Fig. 1-71

Lif

Fig.1-68

2. MEMBRO INFERIOR 39

Fig.1-69

Fig.1-72

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40 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO DOS LIGAMENTOS NA ROTAÇÃO EXTERNA-ROTAÇÃO INTERNA

Quando o quadril realiza uma rotação ex­terna (fig. 1-75), a linha intertrocanteriana ante­rior se afasta do rebordo cotilóide; de maneiraque todos os ligamentos anteriores do quadrilestão tensos, e, portanto, a tensão é máxima nosfeixes cuja direção é horizontal, isto é, o feixeílio-pré-trocanteriano e o ligamento pubofe­moral. Esta tensão dos ligamentos anteriorespode ser observada tanto num corte horizontalvisto desde cima (fig. 1-75) quanto numa vista

póstero-superior dq articulação (fig. 1-76); de­monstrando que durante a rotação externa o li­gamento ísquio-femoral está distendido.

Pelo contrário, na rotação interna(fig. 1-77), todos os ligamentos anteriores sedistendem e em particular o feixe ílio-pré-tro­canteriano e o ligamento pubofemoral, en­quanto o ligamento ísquio-femoral entra emtensão (figs. 1-78 e 1-79).

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1- -

Fig.1-74

Fig.1-75

Fig.1-76

2. MEMBRO INFERIOR 41

Fig.1-79

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42 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO DOS LIGAMENTOS NAADUÇÃO-ABDUÇÃO

N a posição de alinhamento normal(fig. 1-80), em que os ligamentos anterioresestão moderadamente tensos, é simples cons­tatar que:

- durante os movimentos de adução(fig. 1-81), o feixe ílio-pré-trocante­riano entra em tensão e o ligamentopubo-femoral se distende. Quanto aofeixe ílio-pré-trocantiniano, este entraligeiramente em tensão;

- durante os. movimentos de abdução(fig. 1-82) acontece o contrário: o liga­mento pubofemoral entra consideravel­mente em tensão, enquanto o feixe ílio­pré-trocanteriano se distende, assim co­mo o feixe ílio-pré-trocantiniano, po­rém este último num grau menor.

Quanto ao ligamento ísquio-femoral, vi­sível somente numa vista posterior, se disten­de durante a adução (fig. 1-83) e entra emtensão durante a abdução (fig. 1-84).

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Fig.1-83

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2. MEMBRO INFERIOR 43

Fig.1-82

Fig.1-84

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44 FISIOLOGIA ARTICULAR

FISIOLOGIA DO LIGAMENTO REDONDO

o ligamento redondo representa uma relí­quia anatômica e desempenha um papel bastan­te inadvertido na limitação dos movimentos doquadril.

N a posição de alinhamento normal(fig. 1-85, corte vértico- frontal) está levementetenso e a sua inserção femoral ocupa na parteprofunda (fig. 1-86, diagrama da parte cotilóideprofunda com as diferentes posições da fossetado ligamento redondo) sua posição média (1),um pouco abaixo e atrás do centro (+).

Durante a flexão do quadril (fig. 1-87), oligamento redondo se prega sobre si mesmo e afosseta (fig. 1-86) acaba situada acima e adiantedo centro da parte profunda (2). Por conseguin­te, o ligamento redondo não intervém na limita­ção da flexão.

Durante a rotação interna (fig. 1-88, cortehorizontal, vista superior), a fosseta se deslocapara a parte posterior e a inserção femoral do li­gamento entra em contato com a parte posteriorda meia-lua articular (3). O ligamento se man­tém ligeiramente tenso.

Durante a rotação externa (fig. 1-89), afosseta se desloca para diante e o ligamento en­tra em contato com a parte anterior da meia-luaarticular (4). O ligamento, novamente, só apare­ce ligeiramente tenso. Observar o impacto da

face posterior do colo no rebordo cotilóide re­presentado pela orla deslocada e comprimida.

Na abdução~fig. 1-90), a fosseta desce emdireção à incisura ísquio-púbica (5) e o ligamen­to está dobrado sobre si mesmo. A orla está

comprimida entre o bordo superior do colo e orebordo cotilóide.

Finalmente, a adução (fig. 1-91) desloca afosseta para cima (6) até o contato com o limitesuperior da parte profunda. Esta é a única posiçãoonde o ligamento está verdadeiramente tenso. Aparte inferior do colo empurra ligeiramente tantoa orla quanto o ligamento transverso.

Assim sendo, parece que a parte cotilóideprofunda representa a localização em todas asposições possíveis da fosseta do ligamento re­dondo, incluindo as incisuras posterior (7) e an­terior (8): de fato, nelas se localiza a fosseta du­rante os movimentos de adução-extensão-rota­ção interna (7) e adução-flexão-rotação externa(8). Entre ambas as incisuras a parte proeminen­te e arredondada da cartilagem corresponde àposição na qual a adução está mais limitada noplano frontal, pelo obstáculo que representa ooutro membro inferior. Portanto, o perfil internoda meia-lua articular não é devido ao acaso, masrepresenta a linha das posições extremas da fos­seta do ligamento redondo.

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J Fig.1-85

Fig.1-91

2. MEMBRO INFERIOR 4S

Fig.1-90

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46 FISIOLOGIA ARTICULAR

FATORES DE COAPTAÇÃO DA COXOFEMORAL

Ao contrário da articulação escápulo-ume­ral, que pode padecer um deslocamento pela for­ça da gravidade, a articulação do quadril se be­neficia com esta força, pelo menos na posiçãode alinhamento normal (fig. 1-92): na medidaem que o teto do cótilo recobre a cabeça femo­ral. esta se encaixa no cótilo pela força de reação(seta branca ascendente) que se opõe ao peso docorpo (seta branca descendente).

Sabemos que a cavidade cotilóide óssea re­presenta, apenas, uma semi-esfera; portanto, nãoexiste o que em mecânica se denomina umajun­ta de encaixe: do ponto de vista mecânico, o có­tilo ósseo não pode reter a cabeça femoral devi­do Ü sua forma semi-esférica. Porém, a orla co­tilóide prolonga a superfície do cótilo e lhe pro­porciona mais profundidade, embora toda a ca­,'idade cotiláide ultrapasse a semi-esfera (setaspretas), criando um par de encaixe fibroso: a or­la retém a cabeça com ajuda da zona orbicularda cápsula cujo corte está designado por peque­nas setas brancas, e que aperta o colo.

A pressão atmosférica é um fator impor­tante na coaptação do quadril, como foi provadopela experiência dos irmãos Weber. De fato, elesconstataram que, seccionando todas as partesmoles que unem o osso ilíaco ao fêmur (incluí­da a cápsula), a cabeça femoral não saía espon­taneamente do cótilo, e que, inclusive, precisa­va-se de uma força muito grande (fig. 1-93) pa­ra extrair a cabeça do seu encaixe. Contudo (fig.1-94), realizando um pequeno furo no fundo docótilo, a cabeça femoral e o membro inferiorcaíam pelo seu próprio peso. A experiência in­versa, que consistia em tapar o orifício após terreintegrado a cabeça no cótilo, demonstrava que,como no princípio, a cabeça permanecia no có­tilo. Esta experiência é comparável com a clássi-

ca experiência dos hemisférios de Magdebourg,na qual é impossível separar os hemisférios apósse ter feito o vácuo no seu interior (fig. 1-95),tomando-se muito fácil separá-los quando o arentra através de uma abertura (fig. 1-96).

Os ligamentos e os músculos desempenhamum papel essencial na manutenção das superfíciesarticulares. É necessário destacar (fig. 1-97, cortehorizontal) que existe um determinado "equilí­brio" entre suas respectivas funções: na face ante­rior da articulação não existem muitos músculos(seta branca A), mas os ligamentos são potentes(seta preta), enquanto na face posterior acontece ocontrário: predominam os músculos (B).

Também é necessário destacar que a açãodos ligamentos é diferente segundo à posiçãodo quadril: em alinhamento normal ou em ex­tensão (fig. 1-98), os ligamentos estão tensos ea coaptação ligamentar é eficaz; porém, em fle­xão (fig. 1-99) os ligamentos estão distendidos(ver pág. 38) e a cabeça não está coaptada nocótilo com a mesma força. É fácil compreendereste mecanismo com um modelo (fig. 1-100):entre dois círculos de madeira estão estendidosfios paralelos (a), de forma que quando se fazgirar um dos círculos em relação ao outro (b)eles se aproximam.

Portanto, a posição de flexão do quadril éuma posição instável para a articulação, devi­do ao relaxamento ligamentar. Quando se somaa adução, como na posição de sentado com aspernas cruzadas (fig. 1-101), basta um choquerelativamente pequeno na direção do eixo dofêmur (seta) para provocar uma luxação poste­rior do quadril com fratura ou não do bordoposterior do cótilo (choque com o painel nosacidentes de carro).

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2. MEMBRO Th'FERIOR 47

~4'!' , + Fig.1-96

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Fig.1-100

Fig.1-97

Fig.1-101

Fig.1-98

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48 FISIOLOGIA ARTICULAR

FATORES MUSCULARES E ÓSSEOS DA ESTABILIDADE DO QUADRIL

Os músculos têm uma função essencial na es­tabilidade do quadril, porém com a condição de quetenham uma direção transversal. De fato (fig. 1-102),os músculos cuja direção é semelhante à do colomantêm a cabeça no cótilo; isto é rigorosamente ver­dadeiro no caso dos pelvitrocanterianos (aqui apare­cem representados o piramidal (Pm) e o obturadorexterno (Obe); a mesma coisa acontece com os glú­teos, principalmente o glúteo mínimo e o glúteo mé­dio (GM), cujo componente de coaptação (seta pre­ta) é muito importante, e graças à sua potência de­sempenham uma função primordial, por isso se de­nominam músculos suspensores do quadril.

Contudo, os músculos que têm uma direção lon­gitudinal, como é o caso dos adutores (Ad), têm atendência de luxar a cabeça femoral para cima do có­tilo (lado direito da figo 1-102) especialmente se o te­to do cótilo está achatado; esta malformação do cóti­10 pode-se observar nas luxações congênitas do qua­dril e se identifica com facilidade numa radiografiaântero-posterior da pelve (fig. 1-103): normalmenteo ângulo de Hilgenreiner, localizado entre a linha ho­rizontal que passa pelas cartilagens em Y (denomina­da "Iinha dos Y") e a linha tangente ao teto do cótilo,é de 25° no recém-nascido e de 15° no final do primei­ro ano; quando este ângulo ultrapassa os 30° se podeafirmar que existe uma malformação congênita docótilo. A luxação pode ser diagnosticada pela subidado núcleo cefálico por cima da linha dos Y (signo dePutti) e pela inversão do ângulo de Wiberg (verfigo 1-36). Quando existe uma malformação do cóti­10. a ação luxante dos adutores (-I-') está mais acentua­da quando a perna está em adução (fig. 1-102), porémo componente de luxação dos adutores diminui coma abdução (fig. 1-104) de forma que acabam sendocoaptadores em abdução máxima.

A orientação do colo femoral intervém, de ma­neira importante, na estabilidade do quadril, conside­rando sua orientação tanto no plano frontal quanto noplano horizontal. Já vimos (pág. 24), que no planofrontal, o eixo do colo do fêmur forma um ângulo deinclinação de 120-125° com o eixo diafisário (a, figo 1­105, diagrama do quadril, vista de frente); na luxaçãocongênita do quadril existe uma abertura do ângulo deinclinação (coxa valga) que pode alcançar os 140° (b);durante a adução (c), o eixo do colo estará "adianta­do" 20° com relação à sua posição normal: uma adu­ção de 30° no caso de um quadril patológico (P) corres­ponde, portanto, a uma adução de 50° num quadrilnormal; contudo, como vimos anteriormente, uma

adução deste tipo reforça o componente de luxaçãodos adutores. A coxa valga favorece a luxação pato­lógica. Pelo contrário, este quadril malformado estaráestabilizado com uma posição em abdução, o que ex­plica as posições utilizadas para o tratamento ortopé­dico da luxação congênita do quadril, consistindo aprimeira manobra numa abdução de 90° (fig. 1-106).

No plano horizontal (fig. 1- to7, diagrama doquadril vista superior), o valor médio do ângulo dedeclinação é de 20° (a), devido à orientação diver­gente do colo e dó cótilo na posição bípede, tal co­mo vimos anteriormente (pág. 26), a parte anteriorda cabeça femoral nãó está coberta pelo cótilo; se ocolo está mais orientado para frente por um aumen­to, por exemplo, de 40° do ângulo de declinação(b), podemos dizer que existe uma anteversão docolo e a cabeça se encontra mais exposta à luxaçãoanterior. De fato, numa rotação externa de 25° (c),o eixo de um colo normal ainda "cai" no cótilo (N),enquanto o eixo do colo em anteversão (P), situado20° pela frente do colo normal, "cai" sobre o rebor­do cotilóide: o quadril está prestes a sofrer uma lu­xação anterior. A ante versão do colo favorece aluxação patológica. Pelo contrário, a retroversãodo colo femoral é um fator de estabilidade; assim

como a rotação interna (d); isto explica por que aposição 3 de redução ortopédica da luxação congê­nita (fig. 1-106) se realiza em alinhamento normale rotação interna.

Estes fatores arquitetônicos e musculares sãomuito importantes na estabilidade das próteses. Naartroplastia total do quadril, o cirurgião deve cuidarespecificamente:

- a orientação correta do colo: que não tenhamuita anteversão, especialmente se operapor via anterior e vice-versa;

- a orientação correta do cótilo protético que,como o cótilo natural, deve "orientar-se" pa­ra baixo (fig. 1-106) (inclinação máxima so­bre a horizontal: 45-50°) e ligeiramente paradiante (15°);

- o restabelecimento de um "comprimento fi­siológico" do colo femoral, isto é, um braçode alavanca normal dos glúteos, que desem­penham uma função essencial na estabilida­de das próteses.

Também deve-se ter em conta a importância daescolha da via de abordagem, para alterar o menos

possível o equilíbrio muscular.

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2. MEMBRO INFERIOR 49

Fig. 1-104Patológico

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50 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS FLEXORES DO QUADRIL

Os músculos flexores do quadril estão si­tuados pela frente do plano frontal que passapelo centro da articulação (fig. 1-108), todoseles passam adiante do eixo de fiexão-extensãoXX' incluído neste plano frontal.

Os músculos flexores do quadril são mui­tos, porém os mais importantes são (fig. 1-109):

- o psoas (Ps) e o ilíaco (I), cujos tendões,unidos, se fixam no trocanter. Ele é omais potente de todos os flexores e oque tem um trajeto mais longo (as fibrasmais superiores do psoas se inserem naD12). Embora o seu tendão passe pordentro do eixo ântero-posterior, muitosautores discutem a sua ação adutora; es­ta ausência de adução poderia ser expli­cada pelo fato de que o vértice do tro­canter menor se projeta sobre o eixo me­cânico do membro inferior (ver figo 1­48). Contudo, a favor da sua ação aduto­ra pode constatar-se, no esqueleto, queem flexão-adução-rotação externa a dis­tância entre o trocânter menor e a emi­

nência ílio-pectínea é menor. O ílio­psoas também é rotador externo;

- o sartório (Sa) é, principalmente, flexordo quadril e age como acessório na abdu­ção e rotação externa (fig. 1-110); tam­bém participa no joelho (flexão-rotaçãointerna; ver pág. 152). Sua potência (2kg) não deve-se desprezar, visto que assuas 9/1O partes são utilizadas na flexão;

- o reto anterior (RA) é um potente fle­xor (5 kg), porém a sua ação no quadrildepende do grau de flexão do joelho:quanto maior seja a flexão deste, maioré a eficácia do reto anterior no quadril(ver pág. 148). Ele intervém, principal­mente, nos movimentos que associam aextensão do joelho com a flexão do qua­dril, como na fase de oscilação da mar­cha quando o membro inferior avança(fig. 1-111);

- o tenso r da fáscia lata (TFL), além dasua ação estabilizadora da pelve (verpág. 58) e sua potente ação de abdu­ção, possui um grande componente deflexão.

Alguns músculos possuem, acessoriamen­te, um componente de flexão sobre o quadril,ação coadjuvante que não deve desprezar-se; sãoos seguintes: _

- o pectíneo (Pec) principalmente adutor,e também

- o adutor médio (AM), que flexiona atéum determinado ponto (ver pág. 68),

- o reto interno (VI) e, finalmente,

- os feixes mais anteriores dos glúteosmínimo (Gm) e médio (GM).

Todos os flexores do quadril têm, comoações secundárias, componentes de adução-ab­dução ou de rotação externa-interna, de tal for­ma que, sob este ponto de vista, podem classifi­car-se em dois grupos:

No primeiro grupo se incluem os feixes an­teriores dos glúteos mínimo e médio (Gm e GM)e o tensor da fáscia lata (TFL): são os fiexores­abdutores-rotadores internos (perna direita dafigo 1-109), cuja contração isolada ou predomi­nante determina o movimento do jogador de fu­tebol (fig. 1-112).

No segundo grupo se incluem o ílio-psoas(PI), o pectíneo (Pec) e o adutor médio (AM),que realizam o movimento defiexão-adução-ro­tação externa (perna esquerda da figo1-109), co­mo no jogador de futebol da figura 1-113.

Durante a flexão direta, como acontece namarcha (fig. 1-111), é necessário que ambos osgrupos realizem uma contração sinérgica-anta­gonista equilibrada. A flexão-adução-rotaçãointerna (fig. 1-114) necessita de que predomi­nem os adutores e o tensor da fáscia lata, assimcomo os glúteos mínimo e médio como rotado­res internos.

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2. MEMBRO INFERIOR 51

Fig.1-114

Fig.1-108

Fig.1-110

Fig.1-109

Fig.1-111

XI

Fig.1-113

Fig.1-112

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52 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS EXTENSORES DO QUADRIL

Os músculos extensores do quadril estão si­tuados atrás do plano frontal que passa pelocentro da articulação (fig. 1-115), este planocontém o eixo transversal XX' de fiexão-exten­são.

Distinguem-se dois grandes grupos demúsculos extensores dependendo se eles se in­serem na extremidade superior do fêmur ou aoredor do joelho (fig. 1-116).

No primeiro grupo, o mais importante é oglúteo máximo (G e G'); é o músculo mais po­tente do corpo (34 kg para um comprimento de15 cm), também é o de maior tamanho (66 cm2

de secção) e, naturalmente, o mais forte (238kg). A sua ação está complementada pelos feixesmais posteriores dos glúteos médios (GM) e mí­nimo (Om). Estes músculos também são rotado­res externos (ver pág. 64).

No segundo grupo figuram essencialmenteos músculos ísquio-tibiais: porção longa do bí­ceps femoral (B), semitendinoso (ST) e semi­membranoso (SM), cuja potência total é de 22 kg(isto é, 2/3 da do glúteo máximo). Trata-se demúsculos biarticulares e a sua eficácia no quadrildepende da posição do joelho: o bloqueio dojoelho em extensão favorece a sua ação de exten­são sobre o quadril; portanto, existe uma relaçãode antagonismo-sinergia entre os ísquio-tibiais eo quadríceps (principalmente o reto anterior).Uma parte dos adutores deve incluir-se entre es­tes músculos extensores (ver pág. 62) e em parti­cular o terceiro adutor (A'), cuja função acessó­ria é a extensão do quadril.

Os músculos extensores do quadril pos­suem ações secundárias dependendo da sua po­sição com relação ao eixo ântero-posterior YY'de abdução-adução:

- aqueles cujo trajeto passa acima do eixoYY' determinam uma abdução simultâ­nea à extensão, como no movimento dedança da figura 1-117: são os feixesmais posteriores dos glúteos mínimo(Gm) e médio (GM) e os feixes maiselevados do glúteo máximo (G');

- aqueles cujo trajeto passa abaixo do ei­xo YY' são tanto extensores quanto adu­tores, como ilustra a figura 1-118: são osísquio-tibiais, os adutores {os que estãosituados por trás do plano frontal) e amaior parte do glúteo máximo (G).

Quando queremos obter um movimento deextensão direta (fig. 1-119), ou seja, sem com­ponente de abdução nem de adução, é necessá­rio que estes dois grupos musculares entrem emação em contração aptagonista-sinérgica equili­brada.

Os extensores do quadril têm uma funçãoessencial na estabilização da pelve no sentidoântero-posterior (fig. 1-120).

- quando a pelve é basculada para trás (a),isto é, no sentido da extensão, a estabili­dade se consegue unicamente através datensão do ligamento de Bertin (LB) ­que limita a extensão (ver pág. 38) -;

- existe uma posição (b) na qual o centrode gravidade (C) se localiza exatamenteacima do centro do quadril: nem os fle­xores nem os extensores intervêm, po­rém o equilíbrio é instável;

- quando a pelve bascula para diante (c),o centro de gravidade (C) passa pelafrente da linha dos quadris e os ísquio­tibiais (IT) são os primeiros a iniciar aação para endireitar a pelve;

- nos esforços de extensão sobre uma pel­ve muito basculada (d) o glúteo máximo(G) se contrai energicamente, assim co­mo os ísquio-tibiais, cuja eficácia au­menta se o joelho estiver em extensão(posição de pé, tronco inclinado parafrente, mãos tocando os pés).

Durante a marcha normal, os ísquio-ti­biais realizam a extensão e o glúteo máximonão intervém. Não acontece o mesmo ao correr,saltar ou caminhar num plano ascendente,quando o glúteo máximo é indispensável e temum papel principal.

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2. MEMBRO INFERIOR 53

Fig.1-118

Xl

f)d

IT

Fig.1-115

....•-

c

IT

Fig.1-120

[)b

VI

Xl

a

Fig.1-116

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54 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ABDUTORES DO QUADRIL

São músculos que estão geralmente si­tuados fora do plano sagital que passa pelocentro da articulação (fig. 1-121) e cujo tra­jeto passa por fora e por cima do eixo ântero­posterior YY' de abdução-adução contidoneste plano.

O principal músculo abdutor do quadril éo glúteo médio (GM): com seus 40 cm2 de su­perfície de secção e 11 cm de longitude, elerealiza uma potência de 16 kg. Ele é de umagrande eficácia, visto que a sua direção é qua­se perpendicular ao seu braço de alavanca OT(fig. 1-122). Podemos constatar também queele desempenha uma função essencial junto aoglúteo mínimo, na estabilidade transversal dapelve (ver pág. 58).

O glúteo mínimo (Gm) é principalmenteabdutor (fig. 1-123), sua secção de 15 cm2 e seucomprimento de 9 cm lhe dão urna potência trêsvezes menor que a do glúteo médio (4,9 kg).

O tensor da fáscia lata (TFL) é um poten­te abdutor com o quadril em alinhamento nor­mal; a sua potência é aproximadamente a meta­de da do glúteo médio (7,6 kg), embora seu bra­ço de alavanca seja muito mais longo. Ele tam­bém estabiliza a pelve.

O glúteo máximo (G) só é abdutor atravésde seus feixes mais superiores (na sua maiorparte, este músculo é adutor) e da sua porção

mais superficial, que forma parte do glúteo del­tóide (fig. 1-127).

O piramidª.l da pelve (Pm) possui umaação abdutora inegável porém difícil de apreciarexperimentalmente .devido à sua localizaçãoprofunda.

Dependendo das suas funções secundáriasna flexão-extensão e abdução-adução, podemosclassificar os músculos abdutores em dois gru­pos.

No primeiro grupo se incluem todos osmúsculos abdutores situados pela frente do pla­no frontal que passa pelo centro da articulação:o tensor da fáscia lata, quase todos os feixes an­teriores dos glúteos médio e mínimo. Estes mús­culos determinam, pela sua contração isolada oupredominante, um movimento de abdução-fle­xão-rotação interna (fig. 1-124).

No segundo grupo se encontram os feixesposteriores dos glúteos mínimo e médio (os queestão situados por trás do plano frontal), assimcomo os feixes abdutores do glúteo máximo. Es­tes músculos determinam, pela sua contraçãoisolada ou predominante, um movimento de ab­dução-extensão-rotação externa (fig. 1-125).

Para obter urna abdução direta (fig. 1­126), isto é, sem nenhum componente parasita,é necessário que ambos os grupos entrem emcontração antagonista-sinérgica equilibrada.

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2. MEMBRO INFERIOR 55

Fig.1-123

Fig.1-121

Fig.1-124

Fig.1-122

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56 FISIOLOGIA ARTICULAR

AABDUÇÃO(continuação)

o glúteo deltóide (Farabeuf) forma umamplo leque muscular (fig. 1-127) na face exter­na da perna, no nível do quadril. Sua denomina­ção se deve à sua forma triangular com umaponta inferior e à sua analogia tanto anatômicaquanto funcional com o deltóide braquial. Con­tudo, não está formado por uma camada muscu­lar contínua, mas por dois corpos muscularesque ocupam os bordos anterior e posterior dotriângulo; pela frente, o tensor da fáscia lata(TFL), que se insere na espinha ilíaca anterior esuperior (Eil), se dirige obliquamente para baixoe para trás; por trás, a porção superficial do glú­teo máximo (G), que se fixa no terço posterior dacrista ilíaca e crista sacra, para dirigir-se parabaixo e adiante. Ambos os músculos finalizamcom um desdobramento do bordo anterior e dobordo posterior da banda ílio-femoral ou bandade Maissiat (CM), espessamento longitudinal dafáscia lata (porção externa da aponeurose CfU­

ral); deste modo, a partir da inserção do tensor edo glúteo superficial, esta banda se converte notendão terminal do glúteo deltóide (DG) que iráfixar-se na face externa da tuberosidade tibialexterna, no tubérculo de Gerdy (TG). Entre otensor e o glúteo máximo, a aponeurose glútea(AO) recobre o glúteo médio. Naturalmente, asduas porções musculares do glúteo deltóide po­dem contrair-se de forma isolada, porém quandoagem de maneira equilibrada a tração sobre otendão se realiza no eixo longitudinal e o glúteodeltóide realiza uma abdução pura.

A eficácia dos glúteos médio e mínimo es­tá condicionada pelo comprimento do colo fe­moral (fig. 1-128). De fato, supondo que a cabe­ça femoral esteja "colocada" diretamente sobrea diáfise, a amplitude total da abdução aumenta­ria consideravelmente, porém o braço de alavan­ca OT/ do glúteo médio seria quase três vezesmais curto, o qual dividiria por três sua potênciamuscular. Desta forma podemos "explicar" ra­cionalmente a montagem da cabeça femoral no"postigo" (ver pág. 30), solução mecânica mais

frágil que limita mais rapidamente a abdução,porém reforça a ação do glúteo médio, indispen­sável para a estabilidade transversal da pelve.

A ação do glúteo médio (fig. 1-129) sobreo braço de alavanca do colo femoral varia deacordo com o grau de abdução:- na posição dealinhamento normal do quadril (a), a força domúsculo F não é perpendicular ao braço de ala­vanca OTj; de forma que pode ser decompostanum vetor fU dirigid<?ao centro da articulação eportanto centrípeto, componente coaptador doglúteo médio (fig. 1-102) e num vetor perpendi­cular f/, e portanto tangencial, que representa aforça eficaz do músculo no início da abdução.Por isso, à medida que a abdução aumenta (b), ovetor fU tem a tendência a diminuir, enquanto ovetor f' aumenta. Por conseguinte, o glúteo mé­dio é cada vez menos coaptador e mais abdutor.Sua máxima eficácia se desenvolve em abduçãode 35° aproximadamente: neste momento, a di­reção da sua força é perpendicular ao braço dealavanca OT2 e r se confunde com F - toda aforça do músculo se utiliza para realizar a abdu­ção. O músculo encurtou-se numa longitudeTjTZ' que representa aproximadamente um terçodo seu comprimento: porém conserva um sextodeste.

A ação do tensor da fáscia lata (fig. 1-130)pode ser analisada do mesmo modo (a). Sua for­ça F aplicada na espinha ilíaca CI se decompõeem dois vetores: flu centrípeto e fi' tangencialque fazem bascular a pelve. À medida que a ab­dução se consolida (b) o componente f2/ aumen­ta, porém nunca poderá ser igual à força global Fdo músculo. Por outro lado, é fácil ver neste es­quema que o encurtamento CITz do músculo re­presenta uma fração mínima do seu comprimentototal, da espinha ao tubérculo: isto explica que ocorpo muscular seja curto com relação ao com­primento do tendão, visto que sabemos que ocomprimento máximo de um músculo não ultra­passa a metade do comprimento das suas fibrascontráteis.

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Fig.1-128

Eil

AGeM

G

T TFL

DG

TG

2. 1IEMBRO INFERIOR 57

Fig.1-127

a b a

Fig.1-130

b

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58 FISIOLOGIA ARTICULAR

o EQUILÍBRIO TRANSVERSAL DA PELVE

Quando a pelve está em apoio bilateral(fig. 1-131), seu equilíbrio transversal está asse­gurado pela ação simultânea e bilateral dos adu­tores e abdutores. Quando estas ações antago­nistas estão equilibradas (a), a pelve é estávelnuma posição simétrica, como na "posição desentido" por exemplo.

Se, por um lado, os abdutores dominam, en­quanto do outro predominam os adutores (b), apelve se deslocará lateralmente para o lado noqual predominam os adutores; se não se restabele­ce o equihôrio muscular se produz a queda lateral.

Quando a pelve está em apoio unilateral(fig. 1-132), o equilíbrio transversal se assegu­ra unicamente sob a ação dos abdutores do la­do do apoio: solicitado pelo peso do corpo Paplicado ao centro de gravidade, a pelve tem atendência a bascular em volta do quadril quesuporta o peso. Neste caso podemos considerara cintura pélvica como um braço de alavancade primeiro gênero (fig. 1-133), cujo ponto deapoio está constituído pelo quadril que carregaO, a resistência pelo peso do corpo P aplicadoao centro de gravidade G e a potência pela for­ça do glúteo médio GM aplicada à fossa ilíacaântero-superior. Para que a linha dos quadrispermaneça horizontal em apoio unilateral é ne­cessário que a força do glúteo médio seja sufi­ciente para equilibrar o peso do corpo, tendoem conta a desigualdade dos braços de alavan­ca OE e OG. Neste equilíbrio da pelve, os glú­teos médio e mínimo não estão sozinhos, con-

tam com a poderosa ajuda do tensor da fáscialata TFL (fig. 1-132).

Se um destes músculos se debilitar (fig. 1­132, b), a ação da gravidade não estará contra­balançada e veremos como a pelve se "inclina"do lado oposto, de um ângulo a que aumentasegundo a importância da paralisia. O tensor dafáscia lata estabiliza, não somente, a pelve, mastambém o joelho: como se demonstrará maisadiante (ver pág. 118), é um verdadeiro liga­mento lateral externo ativo, portanto a sua de­bilidade pode, depois de algum tempo, favore­cer uma abertura externa da interlinha articular

do joelho (ângulo B).

A estabilização da pelve através dos glú­teos médio e mínimo e o tensor da fáscia lata é

indispensável para uma marcha normal (fig. 1­134). De fato, durante o apoio unilateral, a linhada pelve, representada pela linha biilíaca, per­manece horizontal e sensivelmente paralela àlinha dos ombros. Quando os músculos do ladodo apoio unilateral se paralisam (fig. 1-135), apelve bascula para o lado oposto, o qual provo­caria uma queda se o tronco não se inclinasseem bloco para o lado do apoio junto com umainclinação inversa da linha dos ombros. Esta ati­tude característica do apoio unilateral, que asso­cia a basculação da pelve para o lado oposto e ainclinação da parte superior do tronco, constituio sinal de Duchenne- Trendelenburg, diagnósticode paralisia ou de insuficiência dos glúteos mí­nimo e médio.

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Fig.1-135

Fig.1-132 ba

Fig.1-134

b

Fig.1-131

Fig.1-133

a

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60 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ADUTORES DO QUADRIL

Os músculos adutores do quadril se locali­zam geralmente dentro do plano sagital quepassa pelo centro da articulação (fig. 1-136).De qualquer modo, a direção destes músculospassa abaixo e por dentro do eixo ântero-pos­terior YY' de abdução-adução, situado no planosagital.

Os músculos adutores são particularmen­te numerosos e potentes. Numa vista poste­rior (fig. 1-137), formam um amplo leque quese estende por todo o fêmur:

-o músculo grande adutor (A) é o maispotente (13 kg); sua conformação tãoespecial (fig. 1-138) se deve a suas fi­bras mais internas do ramo ísquio-pú­bico se inserirem na porção superior dofêmur e as mais externas no ísquio, ter­minando mais abaixo, na linha áspera.Por conseguinte, seus feixes superior(2) e médio (1) formam urna corredeirade concavidade póstero-externa quepode ser vista graças à transparência dofeixe superior e à desarticulação doquadril com rotação externa do fêmur.Na concavidade de ambos os feixes

(detalhe que representa o corte indica­do pela seta) se encontra em tensão oterceiro feixe, o inferior, denominadotambém terceiro adutor (A'), que formaum corpo muscular diferente.Esta disposição das fibras musculares tem comoresultado a redução do alongamento relativoque se realiza durante a abdução, portanto per-

mite uma maior amplitude de abdução manten­do a eficácia do músculo, tal como podemos vernafigura 1-139:

do lado A, a direção real das fibras;

do lado B, a direção real das fibras (traços longos)e a direção. "simplificada" (pontilhado):

as fibras mais internas e mais baixas, as fibrasmais externas (;J mais altas (disposição inversa dadisposição real). Estas duas posições estão repre­sentadas em adução (adu) e em abdução (abd). Oalongamento das fibras entre a abdução e a adu­ção, tanto na disposição real (faixa preta) quantona disposição "inversa ou simplificada" (faixabranca), aparece nitidamente.

- O reto interno (Ri) forma o bordo inter­no do leque muscular;

- o semimembranoso (SM), o semiten­dinoso (ST) e a porção longa do bícepsfemoral (B), embora sejam músculosísquio-tibiais, essencialmente extenso­res do quadril e flexores do joelho, têmum importante componente adutor,

- o glúteo máximo (G) é adutor quase to­talmente (todos seus feixes passam pordebaixo do eixo YY');

- o quadrado crural (CC) é adutor e ro­tador externo;

- também é assim com o pectíneo (P);

- o obturador interno (Obi) ajudado pe-los gêmeos pélvicos (não figurados) e

- o obturador externo (Obe) possuemum componente de adução.

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Fig.1-136

A

Fig.1-137

Fig.1-139

3

Fig.1-138

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62 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ADUTORES DO QUADRIL(continuação)

o esquema frontal dos adutores (fig. 1-140)mostra:

- o adutor médio (AM), cuja potência (5kg) alcança apenas a metade da do adutormalOr;

- o adutor curto (Am), cujos dois feixesestão recobertos pelo adutor médio, porbaixo, e o pectíneo (P), por cima;

- o reto interno (Ri) limita, por dentro, ocompartimento dos adutares.

Junto à sua ação principal, os adutores pos­suem componentes de flexão-extensão e de rota­ção axial.

Sua função na flexão-extensão (fig. 1-141,vista interna) depende da localização da sua in­serção superior. Quando esta inserção se en­contra no ramo ísquio-púbico, atrás do plano

frontal que passa pelo centro da articulação(linha de pontos e traços), agem como exten­sares; éo caso específico dos feixes inferioresdo adutor magno, do terceiro adutor e, natural­mente, dos ísquio-tibiais. Quando a inserçãosuperior se localiza adiante do plano frontal.os adutores são também flexores, é o caso dopectíneo, dos adutores mínimo e médio, do fei­xe superior do adutor magno e do reto interno.Contudo, este componente de flexão-extensãodepende também da posição de partida do qua­dril (ver pág. 68).

Como vimos anteriormente, os adutoressão indispensáveis para o equilíbrio da pelveem apoio unilateral; além disso, desempenhamum papel essencial em certas atitudes ou mo­vimentos esportivos, como a prática do esqui(fig. 1-142) ou a equitação (fig. 1-143).

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yfIJIC.

-----

2. MEMBRO INFERIOR 63

Fig.1-141

Fig.1-143

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64 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ROTADORES EXTERNOS DO QUADRIL

Os rotadores externos do quadril são nu­merosos e potentes. Seu trajeto cruza por trásdo eixo vertical do quadril. Esta característicaaparece nitidamente num corte horizontal dapelve que, realizado ligeiramente por cima docentro da articulação (fig. 1-144, vista supe­rior), mostra o conjunto dos rotadores externos.Estes são:

- os pelvitrocanterianos, que desem­penham o papel principal:

- o piramidal da pelve (Pm), que se fi­xa no bordo superior do trocântermaior, se dirige para dentro e atrás,penetra na incisura ciática maior (fig.1-145, vista póstero-superior) e se in­sere na face anterior do sacro;

- o obturador interno (Obi), que se­gue primeiro um trajeto sensivel­mente paralelo ao piramidal, porémlogo se reflete em ângulo reto no bor­do posterior do osso ilíaco, abaixo daespinha ciática (fig. 1-145). A segun­da parte do seu trajeto (Obi') é endo­pélvica e o conduz até suas inserçõesno bordo interno do forame obtura­dor. Na primeira parte de seu trajetoestá acompanhado pelos dois gê­meos pélvicos, pequenos músculosque se estendem ao largo dos seusbordos superior e inferior e se inse­rem (fig. 1-145) nas proximidades daespinha ciática (+) e da tuberosidadeisquiática (+) respectivamente .. Elesterminam na face interna do trocân­ter maior através de um tendão co­mum com o do obturador interno.Sua ação é idêntica;

- o obturador externo (Obe) se inse­re no fundo da fosseta digital, na fa­ce interna do trocânter maior, a se-

guir o seu tendão rodeia a face poste­rior do colo femoral e a face inferior

da articulação, suas fibras carnosasse fixam na face externa do contornodo forame obturador. Em conjunto,ele se enrola ao redor do colo e parapoder vê-Io inteiro é necessário fle­xionar ao máximo a pelve sobre o fê­mur (fig. 1-146, vista póstero-ínfero­externa' da pelve, com o quadril fle­xionado). Desta forma podemos en­tender duas características da sua

ação: é principalmente rotador exter­no com o quadril flexionado (ver apágina seguinte) e é ligeiramente fle­xor do quadril devido à sua disposi­ção, enrolado em volta do colo;

- alguns músculos adutores são tambémrotadores externos:

- o quadrado crural (CC), que se estendeda linha intertrocanteriana posterior (fig.1-145) até a tuberosidade isquiática.Além disso, ele é extensor ou flexor se­gundo a posição do quadril (fig. 1-153);

- o pectíneo (Pec), que se expande da linhamédia de trifurcação da linha áspera(fig. 1-146) até o ramo horizontal do pú­bis, é adutor, flexor e rotador externo;

- os feixes mais posteriores do adutormagno possuem um componente de ro­tação externa, do mesmo modo que osísquio-tibiais (fig. 1-147);

- os glúteos:

- o glúteo máximo inteiro, tanto sua por-ção superficial (G) quanto sua porçãoprofunda (G');

- os feixes posteriores do glúteo mínimoe, principalmente, os do glúteo médio(Gm) (figs. 1-144 e 1-145).

/

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Fig.1-145

Fig.1-144

2. MEMBRO INFERIOR 65

Fig.1-146

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66 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ROTADORES DO QUADRIL

o corte horizontal (fig. 1-147) que passa li­geiramente abaixo da cabeça femoral (em pontia­do) mostra o componente de rotação dos ísquio-ti­biais e adutores. A projeção horizontal da porçãolonga do bíceps femoral (B), do semitendinoso,do semimembranoso e do terceiro adutor (setabranca A) e inclusive dos adutores médio (AM) emínimo passa por trás do eixo vertical: portantoestes músculos são rotadores externos quando omembro inferior gira ao redor do seu eixo mecâ­nico longitudinal (fig. 1-148), isto é, com o joelhoestendido, e o quadril e o pé servindo como eixo.Além disso, é necessário destacar que na rotaçãointerna (RI) o trajeto de uma parte dos adutorespassa pela frente do eixo vertical e que, por isso,eles se transformam em rotadores internos.

Os rotadores internos são menos numero­

sos que os externos e sua potência é três vezesmenor (54 kg para os rotadores internos, emcomparação com os 146 kg dos rotadores exter­nos). A trajetória destes músculos passa pelafrente do eixo vertical do quadril. O corte hori­zontal (fig. 1-148) mostra os três rotadores inter­nos do quadril:

- o tenso r da fáscia lata (TFL), que se di­rige à espinha ilíaca ântero-superior(Eil);

- o glúteo mínimo (Gm), rotador internoquase totalmente;

- o glúteo médio (GM), spmente pelosseus feixes anteriores.

Na rotação interna de 30 a 40° (fig. 1-149),o trajeto do obturddor externo (Obe) e do pectí­neo se projeta exatamente abaixo do centro daarticulação; assim, estes dois músculos não sãorotadores externos. Os glúteos mínimo e médiocontinuam sendo rotadores internos.

Contudo, se a rotação interna continua (fig.1-150), o obturador externo e o pectíneo setransformam em rotadores internos, visto que oseu trajeto passa pela frente do eixo vertical, en­quanto o tensor da fáscia lata e os glúteos míni­mo e médio se transformam em rotadores exter­

nos. Isto só é verdade quando a rotação internaalcança a sua amplitude máxima; este é umexemplo da inversão das ações musculares de­pendendo da posição da articulação.

Esta inversão das ações musculares é devi­da a uma mudança na orientação das fibrasmusculares, cuja vista em perspectiva ântero-sú­pero-externa (fig. 1-151) demonstra que com oquadril em rotação interna máxima os músculosobturador externo e pectíneo (setas tracejadas)passam pela frente do eixo vertical (linha empontos e traços), enquanto os glúteos mínimo emédio (setas pretas) tomam uma direção oblíquapara cima e para trás.

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Fig.1-150

Fig.1-148

2. .\fEMBRO INFERIOR 67

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68 FISIOLOGIA ARTICFLAR

A INVERSÃO DAS AÇÕES MUSCULARES

Os músculos motores de uma articulaçãocom três graus de liberdade não possuem amesma ação, dependendo da posição da articu­lação; as ações secundárias podem-se modifi­car e até mesmo se inverter. O exemplo maistípico é a inversão do componente de flexãodos adutores (fig. 1-152): a partir de uma po­sição de alinhamento normal (0°), todos osadutores se transformam em flexores menos osfeixes posteriores do adutor magno e principal­mente do "terceiro adutor" (A') que é, e conti­nua sendo, extensor até a extensão de -20°.Contudo, o componente de flexão somentepersiste enquanto não se sobrepassa a inserçãosuperior de cada músculo: assim sendo, o adu­tor médio (AM) é flexor até os +50°, mas a par­tir de +70° se transforma em extensor. Do mes­mo modo, o adutor menor é flexor até os +50°,depois disso se transforma em extensor; quan­to ao reto interno, o limite da flexão é de +40°.Neste esquema se vê nitidamente que somenteos flexores podem levar o movimento de fle­xão até o seu limite: para + 120° o tensor dafáscia lata (TFL) esgota o seu comprimento(encurtando a distância aa' que é igual à meta­de do comprimento das suas fibras); quanto aopsoas (Ps), ele também alcança o limite da suaeficácia, visto que o seu tendão tem a tendên­cia a se "descolar" da eminência ílio-pectínea(o esquema faz compreender "por que" o tro­cânter está situado tão atrás: o tendão do psoaspossui um trajeto suplementar igual à espessu­ra da diáfise femoral).

Para o quadrado crural, a inversão docomponente de flexão também é muito nítida (fi­gura 1-153: o osso ilíaco, transparente, deixa vero fêmur e o trajeto do quadrado crural): na ex­tensão (E), o quadrado crural é flexor, enquantona flexão (F) ele se transforma em extensor, oponto de transição corresponde à posição dealinhamento normal.

A eficácia dos músculos depende da posi­ção da articulação. A flexão prévia (fig. 1-154)coloca os músculos extensores do quadril emtensão: na flexão de 120°, o alongamento passivodo glúteo máximo corresponde a um compri­mento FF' que em algumas fibras alcança os100%, por sua vez, o alongamento dos ísquio-ti­biais corresponde a um comprimento JJ' próxi­mo dos 50% do seu comprimento em alinhamen­to normal, mas o joelho deve permanecer em ex­tensão. Isto explica a posição de partida doscorredores (fig. 1-155): máxima flexão do qua­dril, seguida de uma extensão de joelho (um se­gundo tempo não figurado aqui), que coloca osextensores de quadril em uma tensão favorável à

poderosa impulsão de saída. Esta tensão dos ís­quio-tibiais é a que limita a flexão do quadrilquando o joelho está estendido.

O esquema (fig. 1-154) mostra, ainda, queda posição de alinhamento normal à posição deextensão a -20°, a variação do comprimento JJodos ísquio-tibiais é relativamente fraca: isto con­firma a noção de que a máxima eficácia dos ís­quio-tibiais é na posição de semiflexão.

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Fig.1-152

Fig.1-155

Fig.1-154

2. MEMBRO INFERIOR 69

Fig.1-153

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70 FISIOLOGIA ARTICULAR

A INVERSÃO DAS AÇÕES MUSCULARES(continuação)

Na posição de flexão acentuada do quadril(fig. 1-156), o piramidal modifica as suas ações(fig. 1-157: vista externa): enquanto no alinha­mento normal é rotador externo-flexor-abdutor(seta branca), na flexão acentuada se transfor­ma (seta tracejada) em rotador interno-exten­sor-abdutor, a transição entre estas duas zonasde ação se situa perto da flexão de 600, onde eleé somente abdutor. Em flexão sempre acentuada(fig. 1-158: vista póstero-externa do quadril fle-

xionado), não somente o piramidal (Pm) é abdu­tor, mas também o obturador interno possui amesma ação (Obi), assim como todo o glúteomáximo (G); a ação destes músculos permite as­sim, com os quadris flexionados a 900, separar osjoelhos um do outro. O glúteo mínimo (Gm) éum rotador interno evidente e se transforma emadutor (fig. 1-159), bem como o tensor da fáscialata (TFL); o movimento global realizado é umaflexão-adução-rotação interna (fig. 1-160).

~---~--~---------

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2. MEMBRO INFERIOR 71

Fig.1-159

Fig.1-158

Fig.1-160

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Fig.1-157

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72 FISIOLOGIA ARTICULAR

ENTRADA EM JOGO SUCESSIVA DOS ABDUTORES

Segundo o grau de flexão do quadril, a pel­ve, em apoio unilateral, está estabilizada pordiferentes músculos abdutores.

Com o quadril em extensão (fig. 1-161), ocentro de gravidade cai por trás da linha dosquadris e este não pode realizar a báscula poste­rior da pelve devido à tensão do ligamento deBertin (ver também página 38) e à contração dotensor da fáscia lata que, ao mesmo tempo, é fle­xor do quadril: portanto, o tensor corrige a bás­cula lateral e a báscula posterior da pelve aomesmo tempo.

Quando a pelve está menos basculada paratrás (fig. 1-162), o centro de gravidade continuacaindo por trás da linha dos quadris e o glúteomínimo começa a agir: não devemos esquecer

que este músculo também é abdutor-flexor, co­mo o tensor.

Quando a pelve está em equilíbrio no planoântero-posterior (fig. 1-163), o centro de gravida­de cai na linha dos quadris, e neste caso será oglúteo médio que estabiliza a pelve lateralmente.

A partir do momento no qual a pelve bas­cula para frente, o glúteo máximo intervém, aoqual se juntam sucessivamente o piramidal(fig. 1-164), o obturador interno (fig. 1-165) eo quadrado crural (fig. 1-166), à medida que aflexão do tronco aumenta: estes músculos sãosimultaneamente abdutores - com o quadrilem flexão - e extensores, o que permite quese corrija a báscula da pelve, simultaneamente,nos dois planos.

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2. MEMBRO INFERIOR 73

Fig.1-166

Fig.1-162

Fig.1-164

Fig.1-165

Fig.1-163

Fig.1-161

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74 FISIOLOGIA ARTICULAR

ojoelho é a articulação intermédia do mem­bro inferior. É, principalmente, uma articulaçãocom só um grau de liberdade - a ftexão-exten­são -, que lhe pennite aproximar ou afastar,mais ou menos, a extremidade do membro à suaraiz, ou seja, regular a distância do corpo com re­lação ao chão. O joelho trabalha, essencialmente,em compressão, pela ação da gravidade.

De forma acessória, a articulação do joelhopossui um segundo grau de liberdade: a rota­ção sobre o eixo longitudinal da perna, que sóaparece quando o joelho está jlexionado.

Do ponto de vista mecânico, a articulaçãodo joelho é um caso surpreendente, visto que de­ve conciliar dois imperativos contraditórios:

- possuir uma grande estabilidade em ex­tensão máxima. Nesta posição o joelhofaz esforços importantes devido ao peso

do corpo e ao comprimento dos braçosde alavanca;

- adquirir uma grande mobilidade a partirde certo ângulo de ftexão. Esta mobili­dade é necessária na corrida e para aorientação ótima do pé com relação àsirregularidades do chão.

O joelho resolve estas contradições graçasa dispositivos mecânicos extremamente sofisti­cados; porém, como suas superfícies possuemum encaixe frouxo, condição necessária parauma boa mobilidade, ele está sujeito a entorsese luxações.

Quando está em ftexão, posição de instabi­lidade, o joelho está sujeito ao máximo a lesõesligamentares e dos meniscos.

Em extensão é mais vulnerável a fraturasarticulares e a rupturas ligamentares.

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2. MEMBRO INFERIOR 75

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76 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS EIXOS DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO

o primeiro grau de liberdade está condi­cionado pelo eixo transversal XX' (fig. 2-1, vis­ta interna e 2-2, vista externa do joelho semifie­xionado), ao redor do qual se realizam os movi­mentos de fiexão-extensão no plano sagital. Es­te eixo XX', contido num plano frontal, atraves­sa horizontalmente os côndilos femorais.

Por causa da forma "em alpendre" do colofemoral (fig. 2-3), o eixo da diáfise femoral nãoestá situado, exatamente, no prolongamento doeixo do esqueleto da perna, e forma com este umângulo obtuso, aberto para dentro, de 170-175°:se trata do valgo fisiológico do joelho.

Contudo, os três centros articulares do qua­dril (H), do joelho (O) e do tornozelo (C) estãoalinhados numa mesma reta HOC, que represen­ta o eixo mecânico do membro inferior. Na per­na, este eixo se confunde com o eixo do esque­leto; porém, na coxa, o eixo mecânico HO for­ma um ângulo de 6° com o eixo do fêmur.

Por outro lado, o fato de que os quadrisestejam mais separados entre si que os torno­zelos faz com que o eixo mecânico do membroinferior seja ligeiramente oblíquo para baixoe para dentro, formando um ângulo de 3° coma vertical. Este ângulo será mais aberto quantomais larga seja a pelve, como no caso da mu­lher. Isso explica por que o valgo fisiológicodo joelho é mais marcado na mulher do que nohomem.

O eixo de fiexão-extensão XX' é mais ho­rizontal, assim sendo, não constitui a bissetriz(Ob) do ângulo de valgo: medem-se 81° entre

XX' e o eixo do fêmur e 93° entre XX' e o eixoda perna. Do qual se deduz que, em máxima fie­xão, o eixo da perna não se situa,exatamente portrás do eixo do fêmur, mas por trás e um poucopara dentro, o qual desloca o calcanhar em dire­ção ao plano de' simetria: a fiexão máxima fazcom que o calcanhar entre em contato com anádega, no nível da "tuberosidade isquiática.

O segundo grau de liberdade consiste narotação ao redor do eixo longitudinal YY' da per­na (figs. 2-1 e 2-2), com o joelho em flexão. Aestrutura do joelho toma esta rotação impossívelquando a articulação está em máxima extensão;assim, o eixo da perna se confunde com o eixomecânico do membro inferior e a rotação axialnão se localiza no joelho, mas no quadril que osubstitui.

Na figura 2-1 aparece desenhado um eixoZZ' ântero-posterior e perpendicular aos dois ei­xos mencionados. Este eixo não representa umterceiro grau de liberdade; quando o joelho estáfiexionado, uma certa folga mecânica permitemovimentos de lateralidade de 1 a 2 em no tor­nozelo; porém, em extensão completa, estes mo­vimentos de lateralidade desaparecem totalmen­te: se existissem, deveriam ser considerados pa­tológicos.

Contudo, é necessário saber que os movi­mentos de lateralidade aparecem normalmentesempre que se flexione minimamente o joelho;para saber se são patológicos, é indispensávelcompará-Ios com os do lado oposto, com acondição de que este lado seja normal.

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Fig.2-3

Fig.2-2

2. MEMBRO INFERIOR 77

x

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78 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS LATERAIS DO JOELHO

Além das suas yariações fisiológicas de­pendendo do sexo, o ângulo de valgo sofre va­riações patológicas dependendo de cada indiví­duo (fig. 2-4).

Quando este ângulo se inverte, se trata deum genu varo (lado esquerdo da figo 2-4): nor­malmente diz-se que o indivíduo está "camba­do" (fig. 2-6); o centro do joelho, representadopela incisura interespinhosa da tíbia e a incisuraintercondiliana do fêmur, se desloca para fora. Ogenu varo pode ser apreciado de duas maneiras:

- medindo o ângulo entre o eixo diafisá­rio do fêmur e o da tíbia: quando émaior do que o seu valor fisiológico de170°, por exemplo, 180 ou 185°, repre­senta uma inversão do ângulo obtuso;

- medindo o deslocamento externo(fig. 2-5) do centro do joelho com re­lação ao eixo mecânico do membro in­ferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.Observa-se D.E. = 15 mm.

Pelo contrário, quando o ângulo de valgo se"fecha", corresponde ao genu valgo (lado direi­to da figo 2-4): se diz então que o indivíduo é"zambro" (fig. 2-8). Também existem dois mé­todos possíveis para se detectar o genu valgo:

- medindo o ângulo dos eixos diafisários,cujo valor estará menor do que o ângulofisiológico de 170°: por exemplo 165°.

- medindo o deslocamento interno(fig. 2-7) do centro do joelho com re­lação ao eixo mecânico do membro in­ferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.Observa-se D.I = 15 mm.

A medida do deslocamento externo ou in­terno é mais rigorosa do que a do ângulo de val­go, porém requer excelentes radiografias de to­do o conjunto dos membros inferiores deno­minadas "de goniometria" (fig. 2-4). No esque­ma da figura, cúmulo do azar, o indivíduo apre­senta um genu valgo à direita e um genu varo àesquerda. Esta circunstância é estranha, visto

que na maior parte dos casos a deformação é se­melhante e bilateral, porém não é obrigatoria­mente simétrica, já que um joelho pode estarmais desviado que o outro; todavia, existem ca­sos muito raros de desvios em "rajada", ou seja,com os dois joelhos do mesmo lado, como mos­tra o esquema: esta é uma situação muito incô­moda, que provoca um desequilíbrio do lado dogenu valgo; podemos encontrar este caso, quan­do após uma osfeotomia, se hipercorrigiu umgenu varo em genu valgo; assim sendo, é neces­sário operar rapidaménte o outro lado para resta­belecer o equilíbrio.

Os desvios laterais dos joelhos não são raros,visto que com o passar do tempo podem geraruma artrose; de fato, as cargas não estão repartidascom igualdade entre os compartimentos externo einterno do joelho, provocando um desgaste pre­maturo do compartimento interno, uma artroseremoro-tibial interna, no genu varo, ou sob omesmo mecanismo, uma artrose remoro-tibialexterna no genu valgo; isso pode levar a realizar,no primeiro caso uma osteotomia tibiaI (ou fe­moral) de valgização e no segundo caso, uma os­teotomia tibiaI (ou femoral) de varização.

Na atualidade, para prevenir estes proble­mas, se dá muita importância à vigilância dosdesvios laterais dos joelhos nas crianças peque­nas. Isto se deve a que o genu valgo bilateral émuito freqüente nas crianças, e embora desapa­reça progressivamente durante o crescimento, énecessário realizar um seguimento desta evolu­ção favorável com radiografias do conjunto dosmembros inferiores, visto que no caso de per­sistir um desvio importante até o final da infân­cia, seria conveniente avaliar uma intervençãopor epifisiodese tíbio-femoral interna no casode genu valgo, ou externa no caso de genu varo,que deve ser realizada antes do final do períodode crescimento visto que estas intervençõesagem impedindo o crescimento de um lado pro­vocando um maior crescimento do lado "maisdesviado" .

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Fig.2-8

Fig.2-4

Fig.2-6

2. 1'1EMBRO INFERIOR 79

Fig.2-5

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80 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DE FLEXÃO·EXTENSÃO

A fiexão-extensão é o movimento principaldo joelho. A sua amplitude se mede a partir daposição de referência definida da seguinte ma­neira: o eixo da perna se situa no prolongamen­to do eixo da coxa (fig. 2-9, perna esquerda). Deperfil, o eixo do fêmur segue sem nenhuma an­gulação, com o eixo do esqueleto da perna. Nes­ta posição de referência, o membro inferior pos­sui o seu comprimento máximo.

A extensão se define como o movimentoque afasta a face posterior da perna da face pos­terior da coxa. Na verdade, não existe uma ex­tensão absoluta, pois na posição de referência omembro inferior está no seu estado de alonga­mento máximo. Porém, é possível realizar, prin­cipalmente passivamente, um movimento de ex­tensão de 5° a 10° a partir da posição de referên­cia (fig. 2-11); este movimento recebe o nome,sem dúvida errado, de "hiperextensão". Em al­guns indivíduos, esta hiperextensão está maismarcada por razões patológicas, provocando umgenu recun1atum.

A extensão ativa, poucas vezes ultrapassa,e por pouco, a posição de referência (fig. 2-9) eesta possibilidade depende essencialmente daposição do quadril: de fato, a eficácia do reto an­terior, como extensor do joelho, aumenta com aextensão do quadril (ver pág. 148). Isto significaque a extensão prévia do quadril (fig. 2-10, per­na direita) prepara a extensão do joelho.

A extensão relativa é o movimento quecompleta a extensão do joelho, a partir de qual­quer posição de fiexão (fig. 2-10, perna esquer­da); se trata do movimento que se realiza nor­malmente durante a marcha, quando o membro"oscilante" se desloca para frente para entrar emcontato com o chão.

A flexão é o movimento que aproxima a fa­ce posterior da perna à face posterior da coxa.Existem movimentos de fiexão absoluta, a partirda posição de referência, e movimentos de fiexãorelativa, a partir de qualquer posição em fiexão.

A amplitude da flexão do joelho é dife­rente dependendo da posição do quadril e se­gundo às modalidades do próprio movimento.

Aflexão ativa atinge os 140° se o quadrilestiver previamente flexionado (fig. 2-12), esomente chega aos 120° se o quadril estiver emextensão (fig. 2-13). Esta diferença de ampli­tude se deve à diminuição da eficácia dos ís­quio-tibiais quando o quadril está estendido(ver pág. 150). Porém, é possível ultrapassaros 120° de flexão çlo joelho com o quadril es­tendido, graças à contração balística: os ís­quio-tibiais se contraem potente e bruscamen­te iniciando a flexão do joelho que termina co­mo uma flexão passiva.

Afiexão passiva do joelho atinge uma am­plitude de 160° (fig. 2-14) e permite que o cal­canhar entre em contato com a nádega. Estemovimento é uma prova muito importante paracomprovar a liberdade da fiexão do joelho. Paraapreciar a sua flexão passiva pode medir-se adistância que separa o calcanhar da nádega. Emcondições normais, a flexão está limitada apenaspelo contato elástico das massas musculares dapanturrilha e da coxa. Em condições patológi­cas, a flexão passiva do joelho está limitada pe­la retração do aparelho extensor -. principal­mente o quadríceps - ou pelas retrações capsu­lares (ver pág. 108).

Embora sempre seja viável detectar umdéficit de flexão diferenciando o grau de fle­xão atingido e a amplitude da flexão máxima(160°), ou também, comprovando a distânciacalcanhar/nádega, o déficit de extensão se de­termina por um ângulo negativo, por exemplo- 60°: este é o que se mede entre a posição deextensão passiva máxima e a retitude. Destaforma, na figura 2-13 também podemos dizerque a perna esquerda está flexionada a 120°,ou, se não pode atingir uma extensão maior,que apresenta um déficit de extensão de-120°.

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Fig.2-9

Fig.2-14

2. MEMBRO INFERIOR 81

Fig.2-10

Fig.2-13

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82 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO

Rotação da perna ao redor do seu eixolongitudinal: este movimento só pode ser reali­zado com o joelho flexionado, enquanto com ojoelho estendido o bloqueio articular une a tíbiacom o fêmur.

Para medir a rotação axial ativa, devemosflexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduosentado com as pernas penduradas para fora damesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho ex­clui a rotação do quadril. Na posição de referên­cia, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fo­ra (ver pág. 84).

A rotação interna (fig. 2-16) leva a pontado pé para dentro e intervém, de forma importan­te, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).

A rotação externa (fig. 2-19) leva a pontado pé para fora e também intervém no movi­mento de abdução do pé.

Para Fick, a rotação externa é de 40° comrelação aos 30° de rotação interna. Esta amplitu­de varia com o grau de flexão, visto que, segun­do este autor, a rotação externa é de 32° quandoo joelho está flexionado a 30° e de 42° quandoestá flexionado em ângulo reto.

A medida da rotação axial passiva se rea­liza com o indivíduo em decúbito prono, com ojoelho flexionado em ângulo reto: o examina­dor segura o pé com as duas mãos e o gira, le­vando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e paradentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, estarotação passiva é um pouco mais ampla que arotação ativa.

Finalmente, existe uma rotação axial de­nominada "automática", visto que está, inevi­tável e involuntariamente, ligada aos movimen­tos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.nos últimos graus de extensão ou no início daflexão. Quando o joelho se estende, o pé é leva­do para a rotação extema (fig. 2-20); se indicauma simples regra mnemotécnica para lembraresta associação: EXTensão e rotação EXTerna.De maneira inversa, quando o joelho está flexio­nado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).O mesmo movimento se realiza quando, ao do­brar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é le­vada para dentro. Esta postura também corres­ponde à posição fetal.

Mais adiante vamos estudar o mecanismodesta rotação automática.

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82 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO

Rotação da perna ao redor do seu eixolongitudinal: este movimento só pode ser reali­zado com o joelho flexionado, enquanto com ojoelho estendido o bloqueio articular une a tíbiacom o fêmur.

Para medir a rotação axial ativa, devemosflexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduosentado com as pernas penduradas para fora damesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho ex­clui a rotação do quadril. Na posição de referên­cia, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fo­ra (ver pág. 84).

A rotação interna (fig. 2-16) leva a pontado pé para dentro e intervém, de forma importan­te, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).

A rotação externa (fig. 2-19) leva a pontado pé para fora e também intervém no movi­mento de abdução do pé.

Para Fick, a rotação externa é de 40° comrelação aos 30° de rotação interna. Esta amplitu­de varia com o grau de flexão, visto que, segun­do este autor, a rotação externa é de 32° quandoo joelho está flexionado a 30° e de 42° quandoestá flexionado em ângulo reto.

A medida da rotação axial passiva se rea­liza com o indivíduo em decúbito prono, com ojoelho flexionado em ângulo reto: o examina­dor segura o pé com as duas mãos e o gira, le­vando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e paradentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, estarotação passiva é um pouco mais ampla que arotação ativa.

Finalmente, existe uma rotação axial de­nominada "automática", visto que está, inevi­tável e involuntariamente, ligada aos movimen­tos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.nos últimos graus de extensão ou no início daflexão. Quando o joelho se estende, o pé é leva­do para a rotação extema (fig. 2-20); se indicauma simples regra mnemotécnica para lembraresta associação: EXTensão e rotação EXTerna.De maneira inversa, quando o joelho está flexio­nado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).O mesmo movimento se realiza quando, ao do­brar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é le­vada para dentro. Esta postura também corres­ponde à posição fetal.

Mais adiante vamos estudar o mecanismodesta rotação automática.

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Fig.2-16

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Fig.2-21

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Fig.2-20

Fig.2-18

2. MEMBRO INFERIOR 83

Fig.2-17

Fig.2-19

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84 FISIOLOGIA ARTICULAR

ARQUITETURA GERAL DO MEMBRO INFERIOR. E ORIENTAÇÃO DAS SUPERFÍCIES ARTICULARES

A orientação dos côndilos femorais e dosplatôs tibiais favorece a flexão do joelho(fig. 2-22, segundo Bellugue). Duas extremida­des ósseas móveis uma com relação à outra (a)modelam rapidamente a sua forma em funçãodos seus movimentos (b) (experiência de Fick).Todavia, a flexão não pode atingir o ângulo re­to (c), a menos que não se elimine um fragmen­to (d) do segmento superior a fim de retardar oimpacto com a superfície inferior. O ponto fra­co criado no fêmur se compensa pela transpo­sição para diante (e) da diáfise, o qual deslocaos côndilos para trás. Simetricamente, a tíbia setorna mais fraca atrás e mais forte adiante (f),deslocando para trás a superfície tibial. Destaforma, na flexão máxima, as importantes mas­sas musculares podem situar-se entre a tíbia e ofêmur.

As curvaturas gerais dos ossos do mem­bro inferior representam os esforços que agemsobre eles. Obedecem às leis das "colunascom carga excêntrica" de Euler (Steindler).Quando uma coluna está articulada pelos seusdois extremos (fig. 2-23, a), a curvatura ocupatoda a sua altura, este é o caso da curvatura deconcavidade posterior da diáfise femoral (fig.2-23, b). Se a coluna está fixada embaixo e émóvel em cima (fig. 2-24, a), existem duascurvaturas opostas, a mais alta ocupa 2/3 dacoluna: estas correspondem às curvaturas dofêmur no plano frontal. Se a coluna estivessefixada pelos seus dois extremos (fig. 2-25, a),a curvatura ocuparia as duas quartas partescentrais, o que corresponde às curvaturas datíbia no plano frontal (fig. 2-25, b). No planosagital, a tíbia apresenta três características(fig. 2-26, b):

- a retrotorção (T), deslocamento poste­rior citado anteriormente;

- a retroversão (V), declive de 5-6° dosplatôs tibiais para trás;

- a retroflexão (F), curvatura de concavi­dade posterior de uma coluna móvel emambos os extremos (fig. 2-23, a), comono caso do fêmur.

Durante a flexão (fig. 2-27), as curvaturascôncavas do fêmur e da tíbia estão face a face,aumentando, portanto, o espaço disponível paraas massas musculares.

As figuras na margem inferior da páginaexplicam através de uma espécie de "álgebraanatômica" as torções axiais sucessivas dos seg­mentos do membro inferior, vistos desde cimano esquema. "

Torção do fêmur (fig. 2-28): se a cabeça eo colo (1) com o maciço condiliano (2) se unem(a); sem torção (b), o eixo do colo está no mes­mo plano que o eixo dos côndilos; porém, naverdade, o colo forma um ângulo de 30° com oplano frontal (c), de modo que o eixo dos côndi­Ias permanece frontal (d) e é necessário introdu­zir uma torção da diáfise femoral de -300 poruma rotação interna que corresponde ao ângulode anteversão do colo femora!.

Torção do esqueleto da perna (fig. 2-29):se a tíbio-tarsiana (1) e os platôs tibiais (2) seunem (a); sem torção (b), o eixo dos platôs e oeixo da tíbio-tarsiana são frontais; na verdade(c), a retroposição do maléolo externo converteo eixo da tíbio-tarsiana oblíquo para fora e paratrás, o qual corresponde a uma torção do esque­leto da perna de +250 por uma rotação externa.

Se unirmos (fig. 2-30, a) os côndilos (1) eos platôs, parece que os dois eixos deveriam serfrontais (b). Na realidade, a rotação axial auto­mática acrescenta +5° de rotação externa da tí­bia sobre o fêmur em extensão máxima.

Estas torsões escalonadas ao longo domembro inferior (-30° +25° +5°) se anulam(fig. 2-31, a) de tal modo que o eixo da tíbio­tarsiana está quase na mesma direção do que oeixo do colo, ou seja, em rotação externa de30°, provocando um deslocamento de 300 parafora do eixo do pé, na posição de pé, com oscalcanhares juntos e a pelve simétrica (b). Du­rante a marcha, o avanço do membro oscilanteleva o quadril homólogo para diante (c); se apelve gira 30°, o eixo do pé se dirige diretamen­te para frente, no sentido da marcha, o que per­mite um "ótimo desenvolvimento do passo".

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2. MEMBRO INFERIOR 85

a b cFig.2-22 e

c---~ ~+25

+30

a

Fig.2-25+30

c

Fig.2-31O

b

a b

Fig.2-26

~30~;c

Fig: 2-27

b

~30~30

@ ~+5

b a

Fig.2-23

b

a b

Fig.2-24

1.6-+

O-

'G-_~+

-W- Fig. 2-28 b2

a 1W+ --.­

Fi9.2-302 -O~4-

a

Fig.2-29

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86 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES DA FLEXÃÜ-EXTENSÃü

o principal grau de liberdade do joelho é oda flexão-extensão, que corresponde ao eixotransversal. Ele está condicionado por uma ar­ticulação de tipo troclear: de fato, as superfí­cies da extremidade inferior do fêmur consti­tuem uma polia ou, mais exatamente, um seg­mento de polia (fig. 2-32), que, por sua forma,lembra um trem de aterrissagem duplo de avião(fig. 2-33). Os dois côndilos femorais, convexosem ambos os sentidos, formam as duas faces ar­ticulares da polia e correspondem às rodas dotrem de aterrissagem; eles se prolongam parafrente (fig. 2-34) pelas duas faces da tróclea fe­moral. Quanto à garganta da polia, está repre­sentada, adiante, pela garganta da tróc1ea femo­ral e, atrás, pela incisura intercondiliana, cujosignificado mecânico será explicado maisadiante. Alguns autores descrevem o joelho co­mo uma articulação bicondiliana; isto é verda­deiro do ponto de vista anatômico, porém doponto de vista mecânico é, sem nenhuma dúvi­da, uma articulação troclear específica.

Na parte tibial, as superfícies estão inversa­mente conformadas e se organizam sobre doissulcos paralelos, incurvados e côncavos, sepa­rados por uma crista romba ântero-posterior(fig. 2-35): a glenóide externa (GE) e a glenóideinterna (Gr) se localizam cada uma num sulcoda superfície (S), além de estar separadas pela

crista romba ântero-posterior na qual se encaixao maciço das espinhas tibiais; adiante, no prolon­gamento desta ~rista, situa-se a crista romba daface posterior da patela (P) cujas duas vertentesprolongam a superficie das glenóides. Este con­junto de superfícies é dotado de um eixo trans­versal (1), que coincide com o eixo dos côndilos(U) quando a articulação está encaixada.

Assim, as glenóides correspondem aos côn­dilos enquanto o maciço das espinhas tibiais sealoja na incisura intercondiliana; fimcionalmen­te, este conjunto constitui a articulação fêmo­ro-tibial. Adiante, as duas vertentes da superfí­cie articular da patela correspondem às duas fa­ces da tróclea femoral, enquanto a crista rombavertical se encaixa na garganta da tróclea, destaforma se constitui um segundo conjunto funcio­nal, a articulação fêmoro-patelar. As duas ar­ticulações funcionais, fêmoro-tibial e fêmoro­patelar, estão incluídas numa única e mesma ar­ticulação anatômica, a articulação do joelho.

Considerada somente sob o ângulo de fIe­xão-extensão e numa primeira aproximação,podemos imaginar a articulação do joelho co­mo uma superfície em forma de polia deslizan­do-se sobre um sulco duplo, côncavo e parelho(fig. 2-36). Porém, como poderemos ver maisadiante, a realidade é mais complexa.

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Fig.2-34

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Fig.2-32

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2. MEMBRO INFERIOR 87

Fig.2-33

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88 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES EM FUNÇÃO DA ROTAÇÃO AXIAL

As superfícies articulares, tal corno estãodescritas na página anterior, só permitem umúnico movimento que é o da fiexão-extensão.De fato, a crista romba da superfície inferior, aoencaixar-se na garganta da polia em todo o seucomprimento, impede qualquer movimento derotação axial da superfície inferior sob a super­fície superior.

Para que a rotação axial seja factível, deve­se modificar a superfície inferior (fig. 2-37) de talforma que a crista romba reduza o seu compri­mento. Com esta finalidade, se limam (fig. 2-38)as duas extremidades desta crista, de forma que aparte média que permanece forme um pivô, en­caixado na garganta da polia e ao redor do qual asuperfície inferior pode girar. Este pivô é o ma­ciço das espinhas tibiais que forma a vertenteexterna da glenóide interna e a vertente internada glenóide externa; por este pivô central, oumais concretamente, pela espinha tibial interna,passa o eixo vertical (R), ao redor do qual se rea­lizam movimentos de rotação longitudinal. Al­guns autores designam os dois ligamentos cru­zados, denominando-lhes pivô central, conside­rados o eixo de rotação longitudinal do joelho.Esta terminologia parece não ser muito apro­priada, visto que o conceito de pivô significa umponto de apoio sólido, e portanto se deveria re­servar para a espinha tibial interna, que é o ver­dadeiro pivô mecânico do joelho. Quanto ao sis-

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terna dos ligamentos cruzaqos, parece maISapropriado o termo união central.

Esta transformação das superfícies articula­res é mais fácil' de entender quando se utiliza co­rno exemplo um m!Jdelo mecânico (ver o mode­lo lU no final do volume).

Se pegarmos duas peças (fig. 2-39), umasuperior que apresenta urna fenda e outra infe­rior, com uma espiga de tamanho e medidas in­feriores à fenda, as duas peças podem deslizar­se com facilidade uma sobre a outra, mas não

podem girar uma com relação à outra.Se eliminarmos as duas extremidades da

espiga da peça inferior para que permaneça so­mente a sua parte central, cujos diâmetros nãoexcedem o comprimento da fenda (fig. 2-40), sesubstitui a espiga por um pivô cilíndrico, capazde ser encaixado na fenda da peça superior.

Então (fig. 2-41), as duas peças são capazesde realizar dois tipos de movimento, uma em re­lação à outra:

- um movimento de deslizamento da espi­ga central ao longo da fenda, que corres­ponde à fiexão-extensão;

- um movimento de rotação da espiga nointerior da fenda (seja qual for a posiçãona fenda), que corresponde à rotação aoredor do eixo longitudinal da perna.

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Fig.2-39

Fig.2-40

2. MEl\IBRO INFERIOR 89

Fig.2-37 ;

Fig.2-38

Fig.2-41

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90 FISIOLOGIA ARTICULAR

PERFIL DOS CÔNDILOS E DAS GLENÓIDES

Vistos pela sua face inferior (fig. 2-42), oscôndilos formam duas proeminências convexasem ambas as direções e alongadas de diante paratrás. Os côndilos não são estritamente idênticos:

seus grandes eixos ântero-posteriores não são pa­ralelos, mas sim divergentespara trás; além disso,o côndilo interno (I) diverge mais que o externo(E) e também é mais estreito. Entre a tróclea e oscôndilos se perfila, de cada lado, a fenda côndilo­trodear (r), a interna normalmente mais marcadaque a externa.

A incisura intercondiliana (e) está no eixoda garganta trodear (g). A face externa da trócleaé mais proeminente do que a interna.

Num corte frontal (fig. 2-43) nota-se que aconvexidade dos côndilos em sentido transversal

corresponde à concavidade das glenóides.Para analisar as curvaturas dos côndilos e

das glenóides no plano sagital, é conveniente rea­lizar um corte vértico-sagital nas direções aa' ebb' (fig. 2-43); de forma que se consegue o perfilexato dos côndilos e das glenóides sobre o ossofresco (figs. 2-45 a 2-48). Então, torna-se eviden­te que o raio da curvatura das superfícies condilia­nas não é uniforme, mas sim que sofre variaçõescomo se fosse uma espiral.

Em geometria, a espiral de Arquimedes (fig.2-44) está construída ao redor de um pequenoponto denominado centro (C), e cada vez que oraio R descreve um ângulo igual, aumenta o seucomprimento na mesma medida.

A espiral dos côndilos é muito diferente; éverdade que o raio da curvatura cresce regular­mente de trás para diante, que varia de 17 a 38 mmno caso do côndilo interno (fig. 2-45) e de 12 a60 mm no caso do côndilo externo (fig. 2-46), po­rém não existe um centro único nesta espiral, exis­te uma série de centros dispostos, por sua vez, so­bre outra espiral mm' (côndilo interno) e nn'(côndilo externo). Portanto, a curvatura dos côndi­Ias é uma espiral de espiral, como demonstrouFick que denominou curvatura voluta à espiraldos centros da curvatura.

Por outro lado, a partir de um certo ponto tdo contorno condiliano, o raio da curvatura come­ça a diminuir, de forma que passa de 38 a 15 mm

pela frente do côndilo interno (fig. 2-45) e de 60 a16 mm pela frente do côndilo externo (fig. 2-46).Novamente, os centros da curvatura se alinhamnuma espiral m'm" (côndilo interno) e n'n" (côn­dilo externo). No total, as linhas dos centros dacurvatura fonnam duas espirais juntas, cuja cús­pide muito aguda (m' e n') corresponde sobre ocôndilo ao ponto t de transição entre dois segmen­tos do contorno condiliano:

- atrás do ponto t, a parte do côndilo for­ma parte da articulação fêmoro-tibial;

- adiante do 'ponto t, a parte do côndilo eda tróclea formam parte da articulaçãofêmoro-patelar.

Portanto, o ponto de transição t representao ponto mais adiantado do contorno condilianoque pode entrar diretamente em contato com a su­perfície tibial.

O perfil ântero-posterior das glenóides(figs. 2-47 e 2-48) é diferente segundo a glenóidede que se trate:

- a glenóide interna (fig. 2-47) é côncavapara cima (o centro da curvatura O estásituado acima) como um raio de curvatu­ra de 80 mm;

- a glenóide externa (fig. 2-48) é convexapara cima (o centro da curvatura O' estásituado para baixo) como um raio de cur­vatura de 70 mm.

Enquanto a glenóide interna é côncava nosdois sentidos, a externa é côncava transversal­mente e convexa sagitalmente (no osso fresco). Oresultado desta afirmação é que se o côndilo femo­ral interno é relativamente estável na sua glenóide,o côndilo externo está numa posição instável so­bre a lombada da glenóide externa e a sua estabi­lidade durante o movimento depende essencial­mente da integridade do ligamento cruzado ânte­ro-externo (LCAE).

Por outra parte, os raios da curvatura doscôndilos e das glenóides correspondentes não sãoiguais, portanto existe uma certa discordância en­tre as superfícies articulares: a articulação dojoelho é uma verdadeira imagem das articulaçõesnão concordantes. O restabelecimento da concor­dância depende dos meniscos (ver pág. 102).

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Fig.2-47

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92 FISIOLOGIA ARTICULAR

DETERMINISMO DO PERFIL CÔNDILO- TROCLEAR

Utilizando um modelo mecânico (fig. 2-49),em 1967, foi demonstrado (Kapandji) que o con­torno da tróc1ea e os côndilos femorais estão de­terminados corno lugares geométricos que depen­dem, por uma parte, das relações estabelecidas en­tre os ligamentos cruzados e suas bases de inser­ção na tíbia e no fêmur e, por outra parte, das re­lações existentes entre o ligamento patelar, a pate­Ia e as asas patelares (ver modelo li ao final do vo­lume). Quando movemos um modelo deste tipo(fig. 2-50), podemos ver o desenho do perfil doscôndilos femorais e da tróc1ea como se fosse aparte envolvente das posições sucessivas das gle­nóides tibiais e da patela (fig. 2-51).

A parte póstero-tibial do contorno côndilo­troclear (fig. 2-51) se determina pelas posiçõessucessivas, numeradas de 1 a 5 (além de todas asintennédias), do platô tibial, "submetidas" ao fê­mur pelo ligamento cruzado ântero-externo(LCAE) (traços pequenos) e o ligamento cruza­do póstero-interno (LCPI) (grandes traços), ca­da um deles descrevendo um arco de círculo cen­trado pela sua inserção femoral, de raio igual aoseu comprimento; note-se que numa flexão máxi­ma, a abertura anterior da interlinha fêmoro-tibialdemonstra a "distensão" do LCAE no final da fle­xão, enquanto o LCPI está contraído.

A parte anterior patelar do contorno côn­dilo-troc1ear (fig. 2-52) está determinada pelasposições sucessivas, numeradas de 1 a 6 (e todasas intermédias), da patela, unidas ao fêmur pelasasas patelares e à tíbia pelo ligamento patelar.

Entre a parte anterior patelar e a parte pos­terior tibial do perfil côndilo-troc1ear existe umponto de transição t (figs. 2-45 e 2-46) que re­presenta a fronteira entre a articulação fêmoro­patelar e a articulação fêmoro-tibial.

Modificando as relações geométricas dosistema dos ligamentos cruzados, é possível tra-

çar uma família de curvaturas dos côndilos e datróclea, a qual demonstra a "personalidade" decada joelho: nenhuma se parece com a outra noplano estritamente geométrico, daí a dificuldadeem se colocarem próteses especificamente adap­tadas a cada uma delas: elas somente podem seruma aproximação relativamente ,fiel.

A mesma dificuldade se apresenta no casodas pIastias ou das próteses ligamentares, porexemplo (fig. 2:53), se a inserção tibial doLCAE se desloca para diante, o círculo descritopela sua inserção feinoral vai deslocar-se tam­bém para diante (fig. 2-54), o que vai induzir umnovo perfil condiliano, no interior do que esta­va antes, determinando por sua vez a aparição deumjogo mecânico que seria um fator de desgas­te das superfícies cartilaginosas.

Mais tarde, em 1978, A. Menschik, de Vie­na, realizou a mesma demonstração com meiospuramente geométricos.

Evidentemente, toda esta teoria do determi­nismo geométrico do perfil côndilo-troc1ear sebaseia na hipótese da isometria, isto é, da inva­riabilidade do comprimento dos ligamentos cru­zados, da qual se sabe atualmente (ver abaixo)que não está confirmada pelos fatos. Isso nãosignifica que não explique corretamente as COllS­

tatações e possa servir de guia no conceito dasoperações sobre os ligamentos cruzados.

Mais recentemente, P. Frain e cols., utili­zando um modelo matemático baseado no estu­do anatômÍco de 20 joelhos, confirmaram a no­ção de curvatura-envolvente e de policentrismodos movimentos instantâneos, insistindo nasconstantes inter-relações funcionais dos liga­mentos cruzados e laterais. O traçado dos veta­res de velocidade em cada ponto de contato fê­moro-tibial, feito por computador, reproduz exa­tamente a envolvente do contorno condiliano.

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Fig.2-54

Fig.2-50

2. MEMBRO INFERIOR 93

Fig.2-52

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94 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDESNA FLEXÃO-EXTENSÃO

A forma arredondada dos côndilos poderia fa­zer pensar que eles rolam sobre as superfícies ti­biais; esta é uma opinião errônea. De fato, quandouma roda gira sem resvalar no chão (fig. 2-55) acada ponto do chão corresponde só um ponto daroda; a distância percorrida no chão (OOU) é, por­tanto, exatamente igual à parte da circunferência"desenvolvida" no chão (compreendida entre a re­ferência triangular e o retângulo). Se fosse assim(fig. 2-56), a partir de certo grau de flexão (posiçãoII), o côndilo bascularia para trás da glenóide ­produzindo uma luxação - ou então seria neces­sário que o platô tibial fosse mais longo. A possi­bilidade de um rolamento puro não seria possíveldado que o desenvolvimento do côndilo é duas ve­zes maior do que o comprimento da glenóide.

Supondo agora que a roda resvale sem rolar(fig. 2-57): toda uma porção de circunferência daroda corresponderia a um só ponto no chão. É oque acontece quando uma roda "derrapa" ao desli­zar-se sobre uma superfície gelada. Tal desliza­mento puro é concebível para ilustrar (fig. 2-58) osmovimentos do côndilo na glenóide: todos os pon­tos do contorno condiliano corresponderiam a umúnico ponto na glenóide; porém se pode constatarque, deste modo, ajlexão ficaria limitada prematu­ramente, visto que a margem posterior da glenóide(seta) representa um obstáculo.

Também é possível imaginar que a roda giree resvale ao mesmo tempo (fig. 2-59): ela derra­pa, porém avança. Neste caso, à distância-percorri­da no chão (00') corresponde um maior compri­mento na roda (entre o losango e o triângulo pre­tos) que se pode apreciar desenvolvendo-a no chão(entre o losango preto e o triângulo branco).

Em 1836 a experiência dos irmãos Weber(fig.2-60) demonstrou que, na realidade, as coisasocorriam da seguinte maneira: em várias posiçõesentre a flexão e a extensão máximas, eles marcaramos pontos de contato entre o côndilo e a glenóide nacartilagem. Desta forma, puderam constatar que oponto de contato na tlôia recuava com a jlexão(triângulo preto: extensão - losango preto: flexão)e, por outra parte, que a distância entre os pontos decontato marcados no côndilo era duas vezes maior

que a que separava os pontos de contato da glenóide.Portanto, esta experiência demonstra, sem dúvida

nenhuma, que o côndilo roda e resvala sobre a gle­nóide simultaneamente. De fato, esta é a única ma­neira de se evitar a luxação posterior do côndilo per­mitindo simultaneamente uma flexão máxima (160°:comparar a flexão nas figs. 2-58 e 2-60).

(Estas experiências podem ser Feproduzidascom o modelo m incluído no final do volume.)

Experiências mais recentes (Strasse, 1917)demonstraram que a proporção de rolamento e dedeslizamento não era a mesma durante todo o mo­

vimento de flexão-extensão: a partir de uma exten­são máxima, o côndilo começa a rolar sem resva­lar e depois o deslizamento começa progressiva­mente a predominar sobre o rolamento, de manei­ra que no fim dajlexão o côndilo resvala sem rolar.

Finalmente, o comprimento do rolamento pu­ro, no início da flexão, é diferente segundo o côn­dilo considerado:

- no caso do côndilo interno (fig. 2-61) esterolamento ocorre apenas nos primeiros 10a 15 graus de flexão;

- no caso do côndilo externo (fig. 2-62) o ro­lamento prossegue até os 20° de flexão.

Isto significa que o côndilo externo rolamuito mais que o côndilo interno, o que explica,em parte, que o caminho que ele percorre sobre aglenóide seja mais longo que o percorrido pelo in­terno. Voltaremos a esta noção importante para ex­plicar a rotação automática (ver pág. 154).

Por outro lado, também é interessante notarque estes 15 a 20° de rolamento inicial correspon­dem à amplitude habitual dos movimentos de jlexão­extensão que se realizam durante a marcha normal.

P. Frain e cols. demonstraram que em cadaponto da curvatura condiliana pode ser definido,por uma parte, o centro do círculo basculante, querepresenta o centro da curvatura condiliana nesteponto e, por outra parte, o centro do movimento,que representa o ponto ao redor do qual o fêmur gi­ra com relação à tíbia; somente quando estes doispontos se confundem existe um rolamento puro, ouentão a proporção de deslizamento com relação aorolamento é mais importante quanto mais afastadoo centro instantâneo esteja do movimento do cen­tro da curvatura.

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2. MEMBRO INFERIOR 95

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96 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDESNOS MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO AXIAL

Mais adiante veremos por que os movi­mentos de rotação axial só podem ser realizadosquando o joelho está fiexionado. Em posição derotação neutra (fig. 2-63), joelho fiexionado, aparte posterior dos côndilos entra em contatocom a parte central das glenóides. Este fato éposto em evidência pelo diagrama (fig. 2-64), noqual a silhueta dos côndilos se superpõe portransparência sobre o contorno tracejado dasglenóides tibiais. Também se pode constatarneste esquema que a fiexão do joelho separou omaciço das espinhas tibiais do fundo da incisuraintercondiliana, onde está encaixada durante aextensão (esta é uma das causas do bloqueio darotação axial em extensão).

Durante a rotação externa da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-65), o côndilo externo avança so­bre a glenóide externa, enquanto o côndilo inter­no recua na glenóide interna (fig. 2-66).

Durante a rotação interna (fig. 2-67) pro­duz-se o fenômeno inverso: o côndilo externo

recua na sua glenóide, enquanto o interno avan­ça na sua própria (fig. 2-68).

Os movimentos ântero-posteriores docôndilos nas suas glenóides correspondentesnão são totalmente semelhantes:

- o côndilo interno (fig. 2-69) se deslocarelativamente pouco na concavidade daglenóide interna (1);

- o côndilo externo (fig. 2-70) pelo con­trário, possui um trajeto (L) quase duasvezes maior sobre a convexidade da gle­nóide externa. Durante o seu desloca­mento na glenóide de diante para trás,"ascende" primeiro na vertente anterior,até o vértice da "lombada", e depoisdesce novamente sobre a vertente poste­rior; de forma que muda de "altura" (e).

A diferença de forma entre as duas glenói­des repercute na forma das espinhas tibiais(fig. 2-71). Quando se realiza um corte hori­zontal XX' do maciço das espinhas, pode-seconstatar que a face externa da espinha externaé convexa de diante para trás (como a glenóideexterna), enquanto a face interna da glenóideinterna é côncava (como a glenóide interna).Se a isto juntamos que a espinha interna é niti­damente mais alta do que a externa, se podecompreender que a espinha interna forme umaespécie de ressalto sobre o qual o côndilo inter­no vai embater, enquanto o côndilo externocontorna a espinha externa. Por conseguinte, oeixo real da rotação axial não passa entre asduas espinhas tibiais, mas sim, no nível davertente articular da espinha interna queforma o verdadeiro pivô central. Este deslo­camento para dentro se traduz, justamente, porum trajeto maior do côndilo externo, como vi­mos anteriormente.

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Fig.2-65

Fig.2-66

Fig.2-69

Fig.2-63

Fig.2-64

Fig.2-71

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Fig.2-68

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Fig.2-70

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98 FISIOLOGIA ARTICULAR

A CÁPSULA ARTICULAR

A cápsula articular é uma bainha fibrosaque contorna a extremidade inferior do fêmur ea extremidade superior da tíbia, mantendo-as emcontato entre si e formando as paredes não ós­seas da cavidade articular. Na sua camada maisprofunda está recoberta pela sinovial.

A forma geral da cápsula do joelho(fig. 2-72) pode ser entendida facilmente se forcomparada com um cilindro ao qual se deprimea face posterior segundo uma geratriz (a setaindica este movimento). Assim se forma umsepto sagital cujas estreitas relações com os li­gamentos cruzados serão tratadas mais adiante(ver pág. 126) e que quase divide a cavidadearticular em duas metades, externa e interna.Na face anterior deste cilindro se abre umaja­nela, na qual vai "inserir-se" a patela. As mar­gens do cilindro se inserem no fêmur na partede cima e na tíbia na parte de baixo.

A inserção sobre o platô tibial é relativa­mente simples (fig. 2-73): passa (linha de pontos)para diante e para os lados externo e interno dassuperfícies articulares; a inserção retroglenóideinterna se une com a inserção tibial do LCPI;quanto à linha retroglenóide externa, contorna aglenóide externa no nível da superfície retroes­pinhal e se funde de novo com a inserção tibialdo LCPI. Entre os dois ligamentos cruzados, acápsula é interrompida e a fenda interligamentarfica ocupada pela sinovial que recobre os dois li­gamentos cruzados; portanto, eles podem serconsiderados como espessamentos da cápsula ar­ticular na incisura intercondiliana.

A inserção femoral da cápsula (figs. 2-74 a2-77) é um pouco mais complexa:

- pela frente (fig. 2-74), ela contorna afosseta supratroc1ear (Fs) por cima; nes­te local a cápsula forma um profundofundo de saco (figs. 2-76 e 2-77), ofun­do de saco subquadricipital (Fsq), cuja

importância veremos mais adiante (verpág. 108).

- dos lados (figs. 2-74 e 2-75), a inserçãocapsular segue ao longo das faces arti­culares da tróc1ea, onde forma os fundosde saco látero-patelares (ver pág. 108),para depois percorrer a certa distância olimite cartilaginoso dos côndilos, emcujas superfícies cutâneas desenha asrampas capsulares de Chevrier (Rch);no côndilq externo, a inserção capsularpassa por cima da fosse ta onde se fixa otendão do poplíteo (Pop), a inserçãodeste músculo é, assim, intracapsular(figs. 2-147 e 2-232);

- atrás e em cima (fig. 2-75), a linha deinserção capsular contorna a margempóstero-superior da cartilagem condi­liana, justamente debaixo da inserçãodos gêmeos (Oe); a cápsula recobre aface profunda destes músculos, sepa­rando-os dos côndilos, neste nível temmaior espessura e forma as calotas con­dilianas (Cco) (ver pág. 120);

- na incisura intercondiliana (figs. 2-76e 2-77, com o fêmur serrado no planosagital), a cápsula se fixa na face axialdos côndilos em contato com a cartila­

gem, e no fundo da incisura, de modoque passa de um lado ao outro da carti­lagem. Na face axial do côndilo interno(fig. 2-76), a inserção capsular passa pe­la inserção femoral do ligamento cruza­do póstero-interno (LCPI). Na faceaxial do côndilo externo (fig. 2-77), acápsula se fixa com a inserção femoraldo cruzado ântero-externo (LCAE).

Também neste caso, a inserção dos cruza­dos se confunde praticamente com a da cápsula,constituindo os reforços da cápsula.

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Fig.2-74

Fig.2-76

Fig.2-73

2. MEMBRO INFERIOR 99

Fig.2-75

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100 FISIOLOGIA ARTICULAR

o LIGAMENTO ADIPOSO, AS PREGAS, A CAPACIDADE ARTICULAR

Entre a superfície pré-espinhal do platá ti­bial, a face posterior do ligamento menisco-pate­lar e a parte inferior da tróc1eafemoral existe umespaço morto (fig. 2-78), ocupado pelo corpo adi­poso do joelho equivalente a uma faixa volumosade gordura. Este corpo adiposo (1) tem a forma deuma pirâmide quadrangular, cuja base repousa naface posterior (2) do ligamento menisco-patelar(3) e sobressai da parte anterior da superfície pré­espinhal. Sua face superior (4) é reforçada por umcordão celular adiposo que se estende do ápice dapate1a ao fundo da incisura intercondiliana (figs.2-78 e 2-79): é o ligamento adiposo (5).Aos lados(fig. 2-79, o joelho está aberto pela frente e a pa­tela está separada), o corpo adiposo se prolongapara cima ao longo da metade inferior das mar­gens laterais da pate1a por estruturas adiposas: aspregas alares (6). O corpo adiposo age como "ta­pulho" na parte anterior da articulação; na flexão,ele fica comprimido pelo ligamento patelar e so­bressai em cada lado da ponta da pate1a.

O ligamento adiposo é o vestígio do septomédio, que no embrião divide em dois a articula­ção até a idade de quatro meses. No adulto existenormalmente (fig. 2-78) um hiato entre o ligamen­to adiposo e o septo médio formado pelos liga­mentos cruzados (seta I). As metades externa e in­terna da articulação se comunicam através destehiato e também por um espaço situado acima doligamento (seta li) e atrás da pate1a. Às vezes, osepto médio persiste no adulto e a comunicação sóse estabelece acima do ligamento adiposo.

Esta formação também se denomina plicainfrapatellaris ou ligamento mucoso. O sistemadas plicae (plural do latim plica) é composto (fig.2-83) de três pregas sinoviais, inconstantes porémmuito freqüentes: segundo Dupont, presentes em85% dos joelhos. Na atualidade, são bem conheci­dos graças à artroscopia:

- aplica infrapatellaris (Pif), que prolon­ga o corpo adiposo infrapatelar, existe em65,5% dos casos;

- aplica suprapatellaris (Psp), em 55%dos casos; forma um septo transversalmais ou menos completo, acima da pate-

Ia, podendo separar o fundo de sacosubquadricipital da cavidade articular; elasó é patológica quando obstrui completa­mente o fundo de saco, provocando umquadro de "hidrartrose suspensa".

- aplica mediopatellaris (Pmp) existe em24% dos casos; pode formar um septo in­completo, estendido horizontalmente damargem interna da pate1a até o fêmur, co­mo uma "prateleira" (shelf dos autoresamericanos). Ela pode provocar dorquando a sua margem livre irrita, por atri­to, a margem interna do côndilo interno.Os problemas cessam imediatamentecom a ressecção artroscópica.

A capacidade articular apresenta variaçõesde importância, tanto normais quanto patológicas.Um derrame patológico - hidrartrose ou hemar­trose - pode aumentá-Ia consideravelmente (fig.2-80), sempre que o derrame seja progressivo; olíquido se acumula nos fundos de saco sub-quadri­cipitais (Fsq) e látero-patelares, assim como atráse abaixo das calotas condilianas, nos fundos de sa­cos retrocondilianos (Frc). Segundo a posição dojoelho, a distribuição do líquido varia: na exten­são (fig. 2-81), os fundos de sacos retrocondilia­nos estão comprimidos pelos gêmeos em tensão eo líquido se desloca para diante acumulando-senos fundos de sacos subquadricipital e látero-pate­lares; na flexão (fig. 2-82), são os fundos de sacosanteriores os que estão comprimidos pelo quadrí­ceps em tensão e o líquido se desloca para trás.Entre a flexão e a extensão máximas, existe umaposição denominada "capacidade máxima" (fig.2-80), na qual a pressão do líquido intra-articularé menor: é a posição de semiflexão que adotam, deforma espontânea, os pacientes com derrame arti­cular, porque ela é a menos dolorosa.

Em condições normais, a quantidade de lí­quido sinovial - ou sinóvia - é escassa (apenasalguns centímetros cúbicos). Contudo, os movi­mentos de flexão-extensão asseguram a limpezapermanente das superfícies articulares pela sinó­via, o que contribui para a boa nutrição da cartila­gem e, principalmente, para a lubrificação das zo­nas de contato.

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2. MEMBRO INFERIOR 101

-

Frc

LCAE

Fsq

Fig.2-82

Pmp

Psp

Pif

Fig.2-78

5

1

32

Fig.2-83

Fig.2-79

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102 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MENISCOS INTERARTICULARES

A não concordância das superfícies articula­res (ver pág. 90) se compensa pela interposição dosmeniscos ou fibrocartilagens semilunares, cujaforma é fácil de compreender (fig. 2-84): quandouma esfera (E) é colocada sobre um plano (P), elasó entra em contato com o plano através do pontotangencial. Se queremos aumentar a superfície decontato entre ambas, é suficiente interpor um anelque represente o volume compreendido entre o pla­no, a esfera e o cilindro (C) tangencial à esfera. Es­te anel (espaço de cor cinza) tem a mesma forma deum menisco, triangular quando é seccionado, comsuas três faces (fig. 2-85, os meniscos foram des­locados para cima das glenóides):

- superior (1) côncava, em contato com oscôndilos;

- periférica (2) cilíndrica, sobre a qual se fi­xa a cápsula (representada pelos traçosverticais) pela sua face profunda;

- inferior (3) quase plana, situada na perife­ria da glenóide interna (GI) e da glenóideexterna (GE).

Estes anéis estão interrompidos ao nível dasespinhas tibiais com uma forma de uma meia-lua,com um como anterior e outro posterior. Os cor­nos do menisco externo estão mais próximos entresi que os do interno, além disso, o menisco exter­no forma um anel quase completo - tem a formade O - enquanto o interno se parece mais comuma meia-lua - tem a forma de C -. Como nor­

ma mnemônica é simples usar a palavra CItrOEn,para lembrar a forma dos meniscos.

Os meniscos não estão livres entre as duas

superfícies articulares, mas mantêm conexões mui­to importantes do ponto de vista funcional:

- já vimos a inserção da cápsula (fig. 2-86)na face periférica;

- cada um dos cornos se fixa no platô tibial,no nível da superfície pré-espinhal (cor­nos anteriores) e retroespinhal (cornosposteriores):

- o como anterior do menisco externo

(4), pela frente da espinha externa;

- o como posterior do mesmo menisco(5), por trás da espinha externa;

- o como posterior do menisco interno(7), no ângulo póstero-interno da su­perfície retroespinhal;

- o como anterior do mesmo menisco

(6), no ângulo ântero-interno da super­fície pré-espinhal;

- os dois cornos anteriores se unem peloligamento jugal (8) ou transverso, fixa­do à pa.tela através dos tratos do corpoadiposo;

- as asas menisco-patelares (9), fibras quese estendem de ambas as margens da pate­Ia (P) até as faces laterais dos meniscos;

- o ligamento lateral interno (LU) fixa assuas fibras mais posteriores na margem in­terna do menisco interno;

- pelo contrário, o ligamento lateral externo(LLE) está separado de seu menisco pelotendão do mÚsculo poplíteo (Pop), que en­via uma expansão fibrosa (10) à margemposterior do menisco externo; formando oque alguns denominam o ponto do ângu­lo póstero-externo ou PAPE e que des­creveremos mais adiante quando tratar­mos das defesas periféricas do joelho;

- o tendão do semimembranoso (11) tam­bém envia uma expansão fibrosa à mar­gem posterior do menisco (nterno: for­mando simetricamente o ponto do ângu­lo póstero-interno ou PAPI;

- finalmente, diferentes fibras do ligamen­to cruzado póstero-interno se fixam nocomo posterior do menisco externo paraformar o ligamento menisco-femoral(12). Também existem fibras do ligamen­to cruzado ântero-externo que se fixamno corno anterior do menisco interno

(fig. 2-152).

Os cortes frontais (fig. 2-86) e sagitais inter­nos (fig. 2-87) e externos (fig. 2-88) mostram co­mo os meniscos se interpõem entre os côndilos eas glenóides, exceto no centro de cada glenóide enas espinhas tibiais, e corno os meniscos limitamdois espaços na articulação: o espaço supramenis­cal e o espaço submeniscal (fig. 2-86).

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p

2

6

4

LU

Fig.2-87

GI

57

Fig.2-85

Fig.2-86

2. MEMBRO INFERIOR 103

Fig.2-84

Fig.2-88

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104 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA FLEXÃO-EXTENSÃO

Vimos (pág. 94) anteriormente que o ponto decontato entre os côndilos e as glenóides recua sobreas glenóides no caso da fiexão e avança no caso daextensão; os meniscos seguem este movimento, comose pode constatar perfeitamente numa preparaçãoanatômica na qual se conservaram apenas os liga­mentos e os meniscos. Em extensão (fig. 2-89), a par­te posterior das glenóides está descoberta, principal­mente a glenóide externa (GE). Emflexão (fig. 2-90),os meniscos (Me e Mi) cobrem a parte posterior daglenóide, principalmente o menisco externo que des­ce pela vertente posterior da glenóide externa.

Uma vista superior dos meniscos sobre as gle­nóides mostra que a partir da posição de extensão(fig. 2-91), os meniscos recuam de maneira desigual:na fiexão (fig. 2-92), o menisco externo (Me) recuaduas vezes mais do que o interno. De fato, o trajetodo menisco interno é de 6 mm, enquanto o do exter­no é de 12 mm.

Os esquemas mostram, além disso, que, aomesmo tempo que recuam, os meniscos se defor­mam. Isto se deve a que eles têm dois pontos fixos, osseus comos, enquanto o remanescente é móvel. Omenisco extemo se deforma e se desloca mais do queo intemo, visto que as inserções de seus comos es­tão mais próximas.

Certamente, os meniscos desempenham um pa­pel importante como meios de união elásticos trans­missores das forças de compressão entre a tíbia e ofêmur (setas pretas, figs. 2-94 e 2-95): é necessáriodestacar que, na extensão, os côndilos têm o seu raiode curvatura maior nas glenóides (fig. 2-93) e os me­niscos estão peifeitamente intercalados entre as su­perfícies articulares. Estes dois elementos favorecema transmissão das forças de compressão durante aextensão máxima do joelho. Contudo, no caso da fie­xão, os côndilos têm o seu menor raio de curvaturanas glenóides (fig. 2-96) e os meniscos perdem par­cialmente o contato com os côndilos (fig. 2-98): es­tes dois elementos, junto com a distensão dos liga­mentos laterais (ver pág. 114), favorecem a mobili­dade em detrimento da estabilidade.

Depois de ter definido os movimentos dos me­niscos, vão-se expor os fatores que intervêm neles.Podem-se classificar em dois grupos: os fatores pas­sivos e os ativos.

Só existe um fator passivo do movimento detranslação dos meniscos: os côndilos empurram osmeniscos para diante, como um caroço de cereja quefoge entre dois dedos. Este mecanismo, que pode pa-

recer muito simples, é muito evidente quando se mo­biliza uma preparação anatômica na qual foram eli­minadas todas as conexões dos meniscos, exceto asinserções dos cornos (figs. 2-89 e 2-90): as superfí­cies são muito deslizantes e a "esquina" do meniscoé expulsa entre a "roda" do côndilo e a "base" da gle­nóide (portanto, se trata de uma cunha completamen­te ineficaz).

Os fatores ativos são numerosos:

- durante..a extensão (figs. 2-94 e 2-95), osmeniscos se deslocam para diante graças àsasas meniscQ-patelares (1) tensas pelo as­censo da patela (ver pág. 112), que arrastatambém o ligamento jugal. Além disso, ocorno posterior do menisco externo (fig. 2­95) é impulsionado para diante devido à ten­são do ligamento menisco-femoral (2), si­multânea à tensão do ligamento cruzadopóstero-interno (ver pág. 134);

- durante a ftexão:

- o menisco intemo (fig. 2-97) é impul-sionado para trás pela expansão do se­mimembranoso (3), que se insere na suamargem posterior, enquanto o como ante­rior é impulsionado pelas fibras do liga­mento cruzado ântero-extemo (4) que sedirigem até ele;

- o menisco extemo (fig. 2-98) é impul­sionado para trás pela expansão do poplí­teo (5).

A função de articulação de transmissão de forçasde compressão entre o fêmur e a tíbia foi subestimadaaté que os primeiros pacientes submetidos a uma me­niscectomia "de princípio" começaram a sofrer artroseantes da idade habitual, em comparação com os pa­cientes que não foram operados de meniscectomia. Achegada da artroscopia supõe um grande progresso,visto que, por uma parte, permitiu conhecer melhor aslesões meniscais duvidosas naartrografia, ou os falso­positivos, que derivavam numa meniscectomia "à-toa"(na qual se removia o menisco para ver se estava lesa­do!), e, por outra parte, fez possível a meniscectomia"à Ia carte", na qual se extirpa apenas a parte lesada domenisco que provoca a alteração mecânica e que podeser causa de uma lesão das superfícies carti1aginosas.Também permite entender que a lesão meniscal é so­mente uma parte do diagnóstico, visto que com muitafreqüência a lesão ligamentar é a que produz ao mes­mo tempo a lesão menisca1 e a lesão carti1aginosa.

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2. MEMBRO INFERIOR 105

LULCAE

MI~\\~

LCAELCPILLE

I.J I. "J I •• \/11. ~v·

LLEMe GE

Fig.2-90Fig.2-89

Fig.2-93

Mi

Fig.2-91 Fig.2-92 ~/Fig.2-96

1-

Fig.2-97 Fig.2-94 Fig.2-95 Fig.2-98

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106 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA ROTAÇÃO AXIAL.LESÕES MENISCAIS

Durante os movimentos de rotação axial,os meniscos seguem exatamente os desloca­mentos dos côndilos sobre as glenóides (verpág. 96). A partir da sua posição em rotaçãoneutra (fig. 2-99), se pode observar como se­guem caminhos opostos sobre as glenóides:

- durante a rotação externa (fig. 2-100)da tíbia sobre o fêmur, o menisco exter­no (Me) é puxado para frente (1) da gle­nóide externa, enquanto o menisco in­terno (Mi) se dirige para trás (2);

- durante a rotação interna (fig. 2-101),o menisco interno (Mi) avança (3), en­quanto o externo (Me) recua (4).

Também neste caso, os meniscos se deslo­cam ao mesmo tempo que se deformam, em vol­ta dos seus pontos fixos, as inserções dos cornos.A amplitude total do deslocamento do meniscoexterno é duas vezes maior do que a do meniscointerno.

Os deslocamentos meniscais na rotaçãoaxial são, principalmente, passivos - arrastadospelos côndilos -; contudo, também existe umfator ativo: a tensão da asa menisco-patelar, de­vido ao deslocamento da patela com relação à tí­bia (ver pág. 112); esta tração arrasta um dosmeniscos para frente.

Os movimentos do joelho podem ocasio­nar lesões meniscais quando estes não seguemos deslocamentos dos côndilos sobre as glenói­des; assim, eles são "surpreendidos" em posi­ção anormal e terminam "esmagados entre a bi­gorna e o martelo". É o caso, por exemplo, deum movimento de extensão brusca do joelho(como um pontapé numa bola): não há tempopara que um dos meniscos se desloque parafrente (fig. 2-102), de forma que, quanto maisforte se estenda o joelho, mais o menisco ficaráentalado entre o côndilo e a glenóide. Este me-

canismo, muito freqüente nos jogadores de fu­tebol, explica (fig. 2-107) as rupturas transver­sais (a) ou as desinserções do corno anterior(b), que se dobra como "um canto de um cartãode visita". O outro mecanismo de lesões menis­cais se deve à distorção do joelho associando(fig. 2-103) um movimento de lateralidade ex­terna (1) e uma rotação externa (2); desta for­ma, o menisco interno é deslocado para o cen­tro da articuláção, para baixo da convexidadedo côndilo interno, o esforço de endireitamentolhe surpreende nesta posição e ele fica entaladoentre o côndilo e a glenóide, provocando umafissura longitudinal do menisco (fig. 2-104), ouuma desinserção capsular total (fig. 2-105), ou,inclusive, uma fissura complexa (fig. 2-106).Em todas as lesões longitudinais citadas, a par­te central livre do menisco pode ficar elevadadentro da incisura intercondiliana, formandoum menisco em "alça de balde". Este tipo de le­são meniscal é muito freqüente nos jogadoresde futebol (durante as quedas sobre uma pernadobrada) e nos mineiros que são obrigados atrabalhar de cócoras nas galerias estreitas dasminas de carvão.

Outro mecanismo de lesão meniscal é aruptura de um ligamento cruzado, por exemploo LCAE (fig. 2-108). O côndilo interno não ficaforçosamente retido na parte posterior, se deslo­ca "cisalhando" o corno posterior do meniscointerno, provocando uma desinserção capsularposterior, ou uma fissura horizontal (ver o de­senho pequeno).

A partir do momento no qual um meniscose rompe, a parte lesada não segue os movimen­tos normais e se encaixa entre o côndilo e a gle­nóide; conseqüentemente, se produz um blo­queio do joelho numa posição de flexão maisacentuada quanto mais posterior seja a lesão me­niscal: a extensão completa torna-se impossível.

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2. 1lEMBRO INFERIOR 107

Fig.2-100 Fig.2-99 Fig. 2-101

Fig.2-108

b

Fig.2-107

a

Fig.2-106Fig.2-105Fig.2-104

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108 FISIOLOGIA ARTICLLAR

OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE O FÊMUR

o aparelho extensor do joelho se deslizasobre a extremidade inferior do fêmur como sefosse uma corda numa polia (fig. 2-109, a). Atróclea femoral e a incisura intercondiliana(fig. 2-11 O) formam, de fato, um canal verticalprofundo (fig. 2-109, b), por onde a patela des­liza. Desta forma, a força do quadríceps, diri­gida obliquamente para cima e ligeiramentepara fora, se converte numa força estritamen­te vertical.

Portanto, o movimento normal da patelasobre o fêmur durante a flexão é uma translaçãovertical ao longo da garganta da tróclea e até aincisura intercondiliana (fig. 2-111, segundo ra­diografias). Assim, o deslocamento da patela éde duas vezes o seu comprimento (8 cm), sendorealizado com um giro sobre um eixo transver­sal; de fato, sua face posterior, dirigida direta­mente para trás em posição de extensão (A), seorienta diretamente para cima quando a pate1a,no fim do seu trajeto (B), se encaixa, na flexãoextrema, sob os côndilos. Por conseguinte, setrata de uma translação circunferencial.

Este deslocamento tão importante só é pos­sível porque a patela está unida ao fêmur por co­nexões com comprimento suficiente. A cápsulaarticular forma três fundos de saco profundos aoredor da patela (fig. 2-111): por cima, ofundo desaco sllbquadricipital (Fsq) e, a cada lado, osfundos de saco látero-patelares (Lp). Quando apatela se desliza por baixo dos côndilos de A aB, os três fundos de saco se abrem: graças à pro­fundidade do fundos de saco sub-quadricipital, adistância XX' pode transformar-se em XX" (ouseja, quatro vezes mais); e graças à profundida­de dos fundos de saco látero-patelares, a distân­cia YY' pode transformar-se em YY" (ou seja,duas vezes mais).

Quando a inflamação une as duas lâminasdos fundos de saco, estes perdem toda sua pro­fundidade e a patela fica aderida ao fêmur(XX' e YY' se tornam inextensíveis) e não po-

de deslizar-se pelo seu canal: esta retraçãocapsular é uma das causas da rigidez do joelhoem extensão após traumatismos ou infecções.

Na sua "descida" a pate1a é acompanhadapelo ligamento adiposo (fig. 2-112), que passada posição ZT à posição ZZ", modificando 1800a sua orientação. Quando a pate1a "ascende", ofundo de saco subquadricipital se encaixaria en­tre a patela e a tróclea, se algumas fibras separa­das da face profunda do crural não lhe puxassempara cima, e que fo.rmam o chamado músculosubcrural (Msc) ou tensor do fundo de sacosubquadricipital.

Normalmente, a patela só se desloca de ci­ma para baixo e não transversalmente. De fato,a patela está muito bem encaixada (fig. 2-113)na sua fenda pelo quadríceps, mais quanto maioré a flexão (a); no fim da extensão (b), esta forçade coaptação diminui e em hiperextensão (c) in­clusive tem a tendência a inverter-se, isto é, adescolar a pate1a da tróclea. Neste momento (d),tem tendência a deslocar-se para fora, porque otendão quadricipital e o ligamento menisco-pa­telar formam um ângulo obtuso aberto para fo­ra. O que impede realmente a luxação da patelapara fora (fig. 2-114) é a face externa da trócleamuito mais proeminente do que a interna (dife­rença = e). Se, devido a uma malformação con­gênita (fig. 2-115), a face externa está menos de­senvolvida (igualou menos proeminente do quea interna), a pate1a não está suficientemente fixa­da e se luxa para fora durante a extensão com­pleta. Este é o mecanismo da luxação recidivan­te da pate/a.

A torção externa da tíbia debaixo do fêmur,assim como o genu valgo, ao fechar o ângulo en­tre o tendão quadricipital e o ligamento menis­co-patelar, aumentam o componente dirigido pa­ra fora e favorecem a instabilidade externa dapate1a. Estes são fatores de luxação e de sublu­xação externas, de condromalacia patelar e deartrose fêmoro-patelar externa.

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110 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS LIGAÇÕES FÊMORO-PATELARES

A face posterior da patela (fig. 2-116) es­tá envolvida por uma cartilagem muito espessa(4 a 5 mm), principalmente no nível da cristamédia: é a cartilagem de maior espessura detodo o organismo. Isto pode ser explicado pelasconsideráveis pressões (300 kg, sem mencionaros halterofilistas!) que se exercem neste níveldurante a contração do quadríceps sobre o joe­lho flexionado, por exemplo quando descemosumas escadas ou quando ficamos de pé estandoagachados.

De um lado e do outro da crista média exis­tem duas faces articulares côncavas em ambosos sentidos:

- a face externa, em contato com a super­fície externa abaulada da tróclea;

- a face interna, em contato com a super­fície abaulada interna;

- esta última face se subdivide, por umacrista oblíqua pouco proeminente, numaface principal e uma face acessória, si­tuada no ângulo súpero-interno e que searticula com a margem interna da inci­sura intercondiliana na flexão máxima.

Durante o seu deslocamento vertical aolongo da tróclea quando se realiza uma flexão(fig. 2-117), a patela entra em contato com a tró­clea pela sua parte inferior em extensão máxima,pela sua parte média em flexão de 30° e pela suaparte superior e a face súpero-externa em flexãomáxima. Observando a topografia das lesõescartilaginosas, é possível conhecer o ângulo crí­tico de flexão, e vice-versa, apontando o ângu­lo de flexão dolorosa para prever o surgimentode lesões.

Até agora, as conexões da articulação fê­moro-patelar se constatavam por meio de radio­grafias denominadas "em incidência axial da pa­tela" ou também "em incidência fêmoro-pate­lar", tomando a interlinha "em fileira" (fig. 2­118): se abarcam as duas patelas na mesma pla­ca, flexionando os joelhos a 30° (A), 60° (B) e

90° (C) sucessivamente, com a finalidade de ex­plorar a articulação em toda sua extensão.

Estas radiografias em incidências fêmoro­patelares permitem apreciar:

- o centrado da patela, principalmente naradiografia com flexão de joelho a 30°(A), por correspondência entre a cristapatelar e a garganta troclear, e pelotransbordamento do ângulo externo dapatela com o limite da convexidade ex­terna; este procedimento permite diag­nosticar uma subluxação externa.

- a diminuição da espessura da interlinha,principalmente na sua parte externa, emcomparação com o lado supostamentesadio e utilizando um compasso de pon­tas duras; nas artroses já "avançadas",uma erosão cartilaginosa pode ser ob­servada;

- a densificação óssea subcondral na faceexterna, que representa uma síndromede hiperpressão externa;

- um deslocamento para fora da tubero­sidade tibial anterior com relação àgarganta da tróclea; este sinal só podeser visto nas radiografias com flexão dojoelho de 30° (A) e de 60° (B); repre­senta uma torção externa da tíbia parabaixo do fêmur nas subluxações e nashiperpressões externas.

Atualmente, graças ao escaner, cortes daarticulação fêmoro-patelar em máxima exten­são e inclusive em hiperextensão podem ser rea­lizados, o que era impossível com a radiografia;isto permite observar a subluxação externa dapatela no momento em que a força de coaptaçãoé nula ou negativa, permitindo assim reconheceras instabilidades fêmoro-patelares menores.

Quanto à artroscopia, ela permite diagnos­ticar as lesões cartilaginosas fêmoro-patelaresque não aparecem nas radiografias em incidên­cia axial e os desequilíbrios dinâmicos.

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Fig.2-117

Fig.2-118

2. MEMBRO INFERIOR 111

Fig.2-116

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112 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE A TÍBIA

Pode-se-ia imaginar a patela aderida à tíbiapara formar um olécrano (fig. 2-119) como nocotovelo. Esta disposição impediria qualquermovimento da pateIa sobre a tíbia e limitaria demodo notável a sua mobilidade, impedindoqualquer movimento de rotação axial.

De fato, a patela realiza dois tipos de mo­vimento sobre a tíbia, dependendo se realiza fle­xão-extensão ou rotação axial.

Nos movimentos de flexão-extensão (fig.2-120), a patela se desloca no plano sagital. Apartir da sua posição em extensão (A), ela recuadeslocando-se ao longo de um arco de circunfe­rência cujo centro se situa na tuberosidade ante­rior da tíbia (O) e cujo raio é igual ao compri­mento do ligamento menisco-patelar. Ao mesmotempo, bascula 35° sobre si mesma, de formaque sua face posterior, orientada para trás, seorienta para trás e para baixo durante a flexãomáxima (B). De modo que realiza um movimen­to de translação circunferencial, com relação àtíbia. Este retrocesso da pateIa se deve a dois fa­tores: por um lado, o deslocamento para trás (D)do ponto de contato dos côndilos nas glenóidese, por outro, a redução da distância (R) da pate­Ia ao eixo de flexão-extensão (+).

Nos movimentos de rotação axial (figs.2-121 a 2-123), os deslocamentos da patelacom respeito à tíbia se realizam no plano fron­tal. Em rotação neutra (fig. 2-121), a direçãodo ligamento menisco-patelar é ligeiramenteoblíqua para baixo e para fora. Durante a rota­ção interna (fig. 2-122), o fêmur gira em rota­ção externa com relação à tíbia, deslocando apatela para fora: o ligamento menisco-patelarfica oblíquo para baixo e para dentro. Durante arotação externa (fig. 2-123), acontece o contrá-

rio; o fêmur arrasta a patela para dentro, de for­ma que o ligamento menisco-patelar fica oblí­quo para baixo e para fora, porém mais oblíquopara fora que na rotação neutra.

Conseqüentemente, os deslocamentos dapatela com relação à tíbia são indispensáveistanto para os, movimentos de fiexão-extensãoquanto para os de rotação axial.

Graças a um'modelo mecânico se demons­trou (ver modelo II ao final deste volume) que apatela amolda a tróclea e o perfil anterior doscôndilos. De fato, nos seus deslocamentos, a pa­tela está unida à tíbia pelo ligamento menisco­patelar e ao fêmur pelas asas patelares (ver pági­na seguinte). Quando os côndilos realizam seumovimento sobre as glenóides no percurso daflexão do joelho, a face posterior da patela,arrastada por suas conexões ligamentares, gerageometricamente o perfil anterior dos côndilosrepresentado pela curvatura envolvente das su­cessivas posições da face posterior da patela. Operfil anterior dos côndilos depende essencial­mente das conexões mecânicas da pateIa e dasua disposição, assim como o seu perfil poste­rior depende dos ligamentos cruzados.

Já citamos anteriormente (pág. 92) de quemaneira o perfil côndilo-troclear está literalmen­te "fabricado" pela tíbia e a patela, unidas ao fê­mur pelo sistema de cruzados por uma parte, epelo ligamento e as asas patelares por outra.

Certas intervenções cirúrgicas, ao transpora tuberosidade tibial para diante (Maquet) ou pa­ra dentro (Elmslie), modificam as conexões en­tre a patela e a tróclea, e principalmente os com­ponentes de coaptação e subluxação externa, oque explica que eles se pratiquem nas síndro­mes patelares.

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Fig.2-122

o

Fig.2-120

Fig.2-121

2. MEMBRO INFERIOR 113

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114 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS LATERAIS DO JOELHO

A estabilidade da articulação do joelho depen­de de ligamentos poderosos, que são os ligamentoscruzados e laterais.

Os ligamentos laterais reforçam a cápsula ar­ticular pelo seu lado interno e externo.

Eles asseguram a estabilidade lateral dojoelho em extensão.

O ligamento lateral interno (fig. 2-124) seestende da face cutânea do côndilo interno até a ex­

tremidade superior da tíbia (LU):

- sua inserção superior se situa na parte pós­tero-superior da face cutânea, atrás e acimada linha dos centros da curvatura (XX') docôndi10 (ver pág. 90);

- sua inserção inferior se situa atrás da zonade inserção dos músculos da "pata de gan­so", sobre a face interna da tíbia;

- suas fibras anteriores são diferentes da cáp­sula e compõem o seu fascículo superficial;

- suas fibras posteriores, que seguem as ante­riores, se confundem mais ou menos com acápsula, formando uma lâmina triangularde vértice posterior; este feixe profundocontém inserções muito próximas à faceperiférica interna do menisco interno na suaface profunda, constituindo assim um pon­to de união essencial, que alguns autoresdenominam o ponto do ângulo póstero-in­terno ou PAPI;

-. sua direção é oblíqua para baixo e paradiante; portanto, cruzada no espaço coma direção do ligamento lateral externo(seta A).

O ligamento lateral externo (fig. 2-125) seestende da face cutânea do côndilo externo até a ca­

beça da fíbula (LLE):

- sua inserção superior está localizada acimae atrás da linha dos centros da curvatura

(yy') do côndilo externo;

- sua inserção inferior se localiza na zona an­terior da cabeça da fibula; no interior dazona de inserção do bíceps;

- se diferencia da cápsula em todo seu tra­jeto;

- está separado da face periférica do meniscoexterno pela passagem do tendão do poplí­teo,que participa no que alguns autores de­nominam o ponto do ângulo póstero-exter­no ou PAPE;

- é oblíquo para baixo e para trás; de for­ma que a sua direção Sy cruza no espaçocom a direção do ligamento lateral inter­no (seta B).

Nestes dois esquemas (figs. 2-124 e 2-125) es­tão desenhadas as asas menisco-patelares (1 e 2) eas asas patelares (3'e 4) que mantêm a patela liga­da à tróclea femoral.

Os ligamentos laterais se contraem duran­te a extensão (figs. 2-126 e 2-128) e se disten­dem na flexão (figs. 2-127 e 2-129). Nos esque­mas (figs. 2-126 e 2-127) vemos a diferença decomprimento (d) do ligamento lateral interno en­tre a extensão e a flexão, além da obliqüidade pa­ra diante e para baixo que é um pouco mais acen­tuada. No lado externo (figs. 2-128 e 2-129), tam­bém se põem em evidência uma diferença de com­primento (e) do ligamento lateral externo e urnamudança de direção: de ser oblíquo para baixo epara trás, ele passa a ser oblíquo para baixo e li­geiramente para diante.

A mudança de tensão dos ligamentos pode serfacilmente ilustrada por um modelo mecânico (fig.2-130): uma cunha C se desliza da posição I à2 numa prancha B, esta cunha está encaixada num"estribo" fixo em a na prancha B; quando a cunha Cse desliza de 1 a 2, o estribo, que supostamente éelástico, se contrai e adquire um novo comprimentoab', a diferença de comprimento e corresponde à di­ferença de espessura da cunha entre as duas posi­ções 1 e 2.

Quanto ao joelho, à medida que a extensão secompleta, o côndilo se interpõe, como uma cunha,entre a glenóide e a inserção superior do ligamentolateral. O côndilo desempenha a função de urnacunha porque seu raio de curvatura aumenta regu­larmente, de trás para diante, e porque os ligamen­tos laterais se fixam na concavidade da linha doscentros da curvatura. A flexão de 30° que distendeos ligamentos laterais é a posição de imobilizaçãoapós a sutura dos ligamentos laterais.

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2. MEMBRO INrERIOR 115

Fig.2-124 Fig.2-125

Fig.2-130

Fig.2-127 Fig.2-126 Fig.2-128 Fig.2-129

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116 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE TRANSVERSAL DO JOELHO

o joelho está sujeito a importantes forçaslaterais e a estrutura das extremidades ósseas(fig. 2-131) representa estas violências mecâni­cas. Do mesmo modo que na extremidade supe­rior do fêmur, se encontram sistemas de trabécu­Ias ósseas que constituem as linhas de força me­cânica:

- a porção inferior do fêmur está estru­turada por dois sistemas trabeculares:um deles se inicia na cortical interna e

se expande ao côndilo do mesmo lado(fibras de compressão) e ao côndilo con­tralateral (fibras de tração); e o outro saida cortical externa e fica numa disposi­ção simétrica; ele é um sistema de trabé­culas horizontais que une ambos os côn­dilos;

- a porção superior da tíbia possui umaestrutura semelhante, com dois sistemasque se iniciam nas corticais interna e ex­terna e se expandem para baixo da gle­nóide do mesmo lado (fibras de com­pressão) e da glenóide contralateral (fi­bras de tração); com trabéculas horizon­tais que unem ambas as glenóides.

Devido à inclinação do eixo femoral parabaixo e para dentro, a força (F) que vai para aporção superior da tíbia não é totalmente verti­cal (fig. 2-132), o que permite que ela seja de­composta numa força vertical (v) e em outratransversal (t) dirigida horizontalmente paradentro. Ao deslocar a articulação para dentro,este componente (t) tem a tendência a acentuaro valgo ao fazer abrir a interlinha em um ângu-

10 (a) aberto para dentro. O sistema ligamentarinterno é o que norn1almente se opõe a este des­locamento.

Quanto mais acentuado é o valgo (fig.2-133), mais fürte é o componente transversal(t): para uma direção F2 que corresponde a umvalgo de 1600 (genu valgo), o componentetransversal t2 é duas vezes maior que no casode um valgo normal de 1700 (Fj e tJ Daí sededuz que quanto mais acentuado seja o val­go, mais ele necessita do sistema ligamentarinterno e maior é a tendência a acentuar-se.

Nos traumatismos das faces laterais do

joelho podem produzir-se fraturas da extremida­de superior da tíbia. Se o traumatismo se loca­liza na face interna do joelho (fig. 2-134), eletem a tendência a endireitar o valgo fisiológicoe determina em primeiro lugar uma fratura com­pleta do platô tibial interno (1), e também umaruptura do ligamento lateral externo (2), se aforça não está esgotada. Quando o ligamento é oprimeiro em romper-se, não se produz a fraturado platô tibial.

Quando o traumatismo se localiza na fa­ce externa do joelho (fig. 2-135), como no ca­so de um choque ocasionado por um pára-cho­ques de um carro, em primeiro lugar, o côndiloexterno se desloca ligeiramente para dentro, pa­ra introduzir-se depois na glenóide externa e fi­nalmente fazer estalar a cortical externa do pla­tô tibial: desta forma, se produz uma fraturamista (afundamento-separação) do platô tibialexterno.

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Fig.2-132

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Fig.2-133

Fig.2-135

2. MEMBRO INFERIOR 117

Fig.2-131

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118 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE TRANSVERSAL DO JOELHO(continuação)

Durante a marcha e a corrida, o joelho estácontinuamente submetido a forças laterais. Em al­guns casos, o corpo está em desequilíbrio internosobre o joelho que suporta o peso (fig. 2-136), oque provoca um aumento do valgo fisiológico euma abertura da inter1inha para dentro. Se a forçatransversal é muito importante, o ligamento lateralinterno se rompe (fig. 2-137): é o que se denomi­na entorse grave do ligamento lateral interno (énecessário reforçar esta,afirmação destacando queuma entorse grave nunca é o resultado de uma sim­ples posição de desequi1íbrio, para que isto aconte­ça é necessário um choque violento).

No outro sentido, um desequilíbrio externosobre o joelho de suporte de peso (fig. 2-138) tema tendência a endireitar o valgo fisiológico e a abrira interlinha para fora. Se a face interna do joelho so­fre um traumatismo violento, o ligamento lateral ex­terno pode sofrer uma ruptura (fig. 2-139): é a en­torse grave do ligamento lateral externo.

Quando existe uma entorse grave do joelho,os movimentos de lateralidade que se realizam aoredor de um eixo ântero-posterior podem aparecer.A exploração destes movimentos anormais se rea­liza tanto com o joelho em máxima extensão comoem ligeira flexão e sempre se compara com o ladosupostamente normal.

Estando o joelho em extensão (fig. 2"141),ou até mesmo em hiperextensão, o peso do mem­bro o desloca nesta direção:

- um movimento de lateralidade externa,ou em va1go, representa uma ruptura asso­ciada do ligamento lateral interno (fig. 2­137) e das formações fibroligamentares lo­calizadas atrás; se trata da convexidadecondiliana interna e do PAPI;

- o movimento de lateralidade interna, ouem varo, representa uma ruptura associadado ligamento lateral externo (fig. 2-138)e das formações fibro1igamentares poste­riores, principalmente a convexidade con­diliana externa.

Com o joelho flexionado 10° (fig. 2-142), osmesmos movimentos anormais representam umaruptura isolada do LU ou do LLE respectivamen­te, visto que as convexidades condilianas estão dis-

tendidas pelos primeiros graus de flexão. O fato deque não se pode estar seguro da posição em que serealizaram as radiografias faz com que não sejafidedigno o diagnóstico radiológico da oscilação dainterlinha interna em va1go forçado ou da oscilaçãoexterna em varo.

Na verdade, é francamente difícil conseguirum relaxamento muscular total num joelho doloro­so que propicie uma exploração válida. Isso indicao caráter quase obrigatório de uma exploraçãocom anestesia geral.

A entorse grave do joelho compromete a esta­bilidade da articulação. De fato, a ruptura de um li­gamento lateral impede que o joelho possa opor-seàs forças laterais que o solicitam continuamente(figs. 2-136 e 2-138).

Nas forças laterais bruscas da corrida e damarcha, os ligamentos laterais não são os únicosque asseguram a estabilidade do joelho; eles estãoreforçados pelos músculos que constituem liga­mentos ativos autênticos e que são os principaisresponsáveis da estabilidade do joelho (fig. 2-140).

O ligamento lateral externo (LLE) está mui­to reforçado pela banda de Maissiat (BM), contraí­da pelo tensor dafáscia lata - esta contração apa­rece no esquema 2-138.

O ligamento lateral interno (LU) também es­tá reforçado pelos músculos da "pata de ganso":sartório (Sa), semitendinoso (St) e reto interno (Ri)- a contração do sartório pode ser observada no es­quema 2-136.

Portanto, os ligamentos laterais estão "prote­gidos" por tendões consistentes. Eles também es­tão reforçados pelo quadríceps cujas expansões di­retas (Ed) e cruzadas (Ec) constituem, na face an­terior da articulação, uma camada fibrosa. As ex­pansões diretas se opõem à oscilação da interlinhado mesmo lado, e as expansões cruzadas impedema oscilação do lado oposto. Cada músculo age so­bre a estabilidade da articulação em ambos os sen­tidos graças a estes dois tipos de expansões. Deforma que se pode entender perfeitamente a impor­tância da integridade do quadríceps para garan­tir a estabilidade do joelho e, inversamente, as al­terações da estática ('joelho que se afrouxa") quesão o resultado de uma atrofia do quadríceps.

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Ed

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Fig.2-140

Fig.2-136@

Fig.2-138

2. MEMBRO INFERIOR 119

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Fig.2-139

Fig.2-141Fig.2-142

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120 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ÂNTERO-POSTERIOR DO JOELHO

A estabilidade do joelho é totalmente dife­rente se está ligeiramente flexionado ou se estáem hiperextensão.

Em alinhamento normal com ligeira fie­xão (fig. 2-143), a força que representa o peso docorpo passa por trás do eixo de flexão-extensãodo joelho e a flexão tem a tendência a aumentarpor si mesma se a contração estática do quadrí­ceps não intervém; portanto, nesta posição, oquadríceps é indispensável para a posição de pé.Pelo contrário, se o joelho se coloca em hiperex­tensão (fig. 2-144), a tendência natural ao aumen­to da citada hiperextensão fica rapidamente blo­queada pelos elementos cápsulo-ligamentaresposteriores (em preto), e é possível manter a po­sição de pé sem a intervenção do qltadríceps: setrata do bloqueio. Isto explica por que nas parali­sias do quadríceps é necessário acentuar o gemirecurvatum para que o paciente possa estar de péou caminhar.

Quando o joelho está em hiperextensão (fig.2-145), o eixo da coxa é oblíquo para baixo e pa­ra trás, e a força f desenvolvida pode decompor­se num vetor vertical (v) que transmite o peso docorpo para o esqueleto da perna, e um vetar ho­rizontal (h), que se dirige para trás e que tem atendência a acentuar a hiperextensão: quanto mais-oblíqua para trás seja a força f, mais importanteserá este vetor (h) e mais solicitados estarão oselementos do plano fibroso posterior; um gelllt re­curvatum muito acentuado termina distendendo osligamentos e se agrava a si mesmo.

Embora não se encontre um obstáculo rígidocomo é o caso do olécrano no cotovelo, a limitaçãoda hiperextensão dojoelho é de uma eficácia extre­ma (fig. 2-146). Esta limitação depende, essencial­mente, de elementos cápsulo-ligamentares e deelementos musculares acessórios.

Os elementos cápsulo-ligamentares contêm:

- o plano fibroso posterior da cápsula(fig.2-147);

- os ligamentos laterais e o cruzado pós­tero-interno (fig. 2-148).

A parte posterior da cápsula articular(fig. 2-147) é reforçada por potentes elementos

fibrosos. A cada lado, da face aos côndilos, umengrossamento da cápsula forma os capas con­dilianas (1), na face posterior, onde se inseremfibras dos gêmeos. Partindo da estilóide fibular,se expande um leque fibroso, o ligamento poplí­teo arqueado, no qual dois fascículos podem serdistinguidos:

- o fascículo externo, ou ligamento lateralexterno curto de Valois, cujas fibras fina­lizam ná capa condiliana externa (2) e nosesamóide do gêmeo externo, ou fabela(3), também nesta camada;

- o fascículo interno, que se expande emforma de leque para dentro e cujas fibrasinferiores (4) constituem o ligamentopoplíteo arqueado, arcada onde o poplí­teo se introduz (seta branca) para pene­trar na articulação; constituindo assim amargem superior do orifício de penetra­ção deste músculo através da cápsula.

No lado interno, o plano fibroso capsular es­tá reforçado pelo ligamento poplíteo oblíquo (5),constituído pelo fascículo recorrente, separadodo lado externo do tendão do semimembranoso(6); dirigindo-se para cima e para fora para termi­nar na camada condiliana externa e fabela.

Todas as formações do plano fibroso poste­rior entram em tensão na hiperextensão (fig.2-148), principalmente as capas condilianas (1).Já vimos anteriormente que a extensão provoca atensão do ligamento lateral externo (7) e do liga­mento lateral interno (8). O ligamento cruzadopóstero-interno (9) também entra em tensão du­rante a extensão. De fato, é fácil constatar que asinserções superiores (A, B, C) destes elementosse projetam para diante durante a hiperextensão,ao redor do centro O. Contudo, trabalhos recentesdemonstraram que o ligamento mais tenso nestaposição é o cruzado ântero-externo.

Por último, os fiexores (fig. 2-149) são fato­res ativos de limitação: os músculos da "pata deganso" (10) que passam por trás do côndilo inter­no, o bíceps (11) e também os gêmeos (12) namedida em que estejam tensos pela flexão dorsalda articulação tíbio-tarsiana.

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Fig.2-149

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122 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS DEFESAS PERIFÉRICAS DO JOELHO

As diferentes estruturas cápsulo-ligamentares, des­critas até agora de maneira analítica, se organizam em for­ma de um conjunto estruturado e coerente que constitui asdefesas periféricas do joelho (fig. 2-150).

Neste corte transversal do joelho, no nível da inter­linha, se podem reconhecer:

- por dentro, a glenóide interna (1), com o meniscointerno (2);

- por fora, a glenóide externa (3), com o meniscoexterno (4), unido pela frente com o interno peloligamento jugal (5);

- pela frente, a patela (6), recobrindo a tuberosida­de tibial anterior (TTA) (7), e a inserção anteriordo LCAE (8);

- por trás, a inserção posterior do LCPI (9).

Três formações principais são responsáveis pelas de­fesas periféricas do joelho: o ligamento lateral interno, o li­gamento lateral externo e o plano cápsulo-fibroso posterior:

- o ligamento lateral interno (10) apresenta, segun-do F. Bonnel, um impedimento à ruptura de115 kg/cm' e uma deformação à ruptura de 12,5%:

- o ligamento lateral externo (11) apresenta umimpedimento à ruptura de 276 kg/cm' e uma de­formação à ruptura de 19%. Portanto, e sur­preendentemente, é mais resistente e mais elásti­co que o interno;

- o plano cápsulo-fibroso posterior está formadopela convexidade condiliana interna (12), a convexi­dade condiliana externa (13) com o seu sesamóideou fabela (14) e os reforços: o ligamento poplíteooblíquo (15) e o ligamento poplíteo arqueado (16).

As formações acessórias constituem quatro camadasfibrotendinosas de resistência e importância diferentes:

• a camada fibrotendinosa póstero-interna é amais importante. F. Bonnel denomina núcleo fibrotendino­so, o que sem dúvida alguma é correto no caso do póstero­interno, porém de jeito nenhum para as outras. G. Bousquetdestaca um ponto de ângulo póstero-interno, abreviadoPAPI, o que representa um aspecto mais cirúrgico que ana­tômico. Em todo caso, esta camada fibrotendinosa póstero­interna, situada detrás do LU, é constituída por:

- fibras mais posteriores do LU (10 bis),

- margem interna da convexidade condiliana inter-na (12),

- dois prolongamentos do tendão do sernimembra­noso (16), o fascículo refletido (17) que percorrea margem infraglenóide interna e a expansão me­niscal (18), que se fixa na periferia posterior domenisco interno, da qual constitui um ponto im­portante de inserção.

• a camada fibrotendinosa póstero-externa ou PA­PE, bastante menos potente que a interna, visto que o me­rusco externo, neste nível, está separado da cápsula e doLLE pela passagem do tendão do poplíteo (19) que se in­sere no côndilo externo. Contudo, este tendão também temuma expansão meniscal (20) que mantém a parte posteriordo menisco externo. O reforço fibroso se completa com oligamento lateral externo curto (21) E; a margem externa daconvexidade condiliana externa.

• a camada fibrotendinosa ântero-externa (PAAE)é constituída pela'banda de Maissiat (22), que envia umaexpansão (23) para a margem externa da pateIa, e pelas ex­pansões diretas e cruzadas dos vastos (24) que formam aparte externa do aparelho extensor.

• a camada fibrotendinosa ântero-interna (PAAI)é constituída pelas expansões diretas e cruzadas dos vastos(25), reforçadas pela expansão do tendão do sartório (26)que se insere na margem interna da patela.

Os músculos periarticulares também partiCIpamnas defesas periféricas do joelho: com a sua contração per­feitamente sincronizada no percurso do esquema motor ena previsão dos possíveis problemas que o córtex cerebralantecipa, eles se opõem às distorsões articulares, sendouma ajuda indispensável para os ligamentos que só podemreagir passivamente. Entre estes músculos, o mais impor­tante é o quadríceps, sem o qual não é Úável nenhuma es­tabilidade no joelho; pela sua potência e sua perfeita coor­dinação, é inclusive capaz, em certa medida, de compensaras claudicações ligamentares. O seu bom trofismo é umacondição imprescindível para o sucesso de qualquer inter­venção cirúrgica. Sabemos que ele é muito propenso a atro­fiar-se e difícil de recuperar, então concluímos que ele me­rece uma grande consideração por parte dos cirurgiões edos fisioterapeutas.

No lado externo, a banda de Maissiat (22) deve con­siderar-se como o tendão terminal do deltóide glúteo. Nolado póstero-interno se localizam o semimembranoso (16)e os músculos da "pata de ganso": o sartório (27), o reto in­terno (28) e o sernitendinoso (29).

No lado póstero-externo se situam dois músculos: opoplíteo (19), cuja fisiologia será analisada mais adiante, eo bíceps (30), cujo potente tendão reforça o LLE.

Finalmente, por trás, o espaço está ocupado pelos gê­meos que se inserem por cima e nas convexidades condilia­nas: o gêmeo interno (31), cuja lâmina tendinosa de inser­ção cruza em forma de X alongada o tendão do semimem­branoso através da bolsa serosa do gêmeo interno e do se­mimembranoso (32), comunica, amiúde, com a sinovial ar­ticular; o gêmeo externo (33), cuja lâmina tendinosa de in­serção cruza da mesma maneira o tendão do bíceps, porémsem interposição da bolsa serosa.

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2. MEMBRO INFERIOR 123

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Fig.2-150

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124 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS CRUZADOS DO JOELHO

Quando se abre pela frente a articulação dojoelho (fig. 2-151, segundo Rouviere), observa-seque os ligamentos cruzados estão situados empleno centro da articulação, alojando-se principal­mente na incisura intercondiliana.

O primeiro que se encontra é o ligamento cru­zado ântero-externo (1), cuja inserção tibial (5) selocaliza (fig. 2-152, segundo Rouviere) na superfí"cie pré-espinhal, ao longo da glenóide interna, en­tre a inserção do como anterior do menisco interno(7) pela frente e a do menisco externo (8) por trás(ver também a figo 2-73). O seu trajeto é oblíquopara cima, para trás e para fora e sua inserção fe­moral (1) se realiza (fig. 2-153, segundo Rouvie­re) sobre a face axial do côndilo externo, no nívelde uma zona estreita e alongada verticalmente emcontato com a cartilagem, na parte mais posteriordesta face (ver figo 2-77). O ligamento ântero-ex­temo é o mais anterior sobre a tíbia e o mais exter­

no sobre o fêmur, fazendo jus ao nome que o iden­tifica, de maneira que é preferível seguir denomi­nando-o ântero-externo e não simplesmente ante­rior, como se faz na atualidade.

Descrevem-se três fascículos:

- o fascículo ântero-interno: o mais longo, oprimeiro que se localiza e o mais expostoaos traumatismos;

--'-'-o fascículo póstero-externo: oculto pelo an­terior, é o que persiste nas rupturas parciais;

- o fascículo intermédio.

Em conjunto, na sua forma se apresenta torci­do sobre si mesmo, visto que suas fibras mais ante­riores sobre a tíbia apresentam as inserções mais in­feriores e mais anteriores no fêmur, e suas fibrasmais posteriores sobre a tíbia se inserem na partemais superior do fêmur, embora todas as suas fibrasnão tenham o mesmo comprimento.

Segundo F. Bonnel, o comprimento médio dasfibras do LCAE varia entre 1,85 e 3,35 cm; assimsendo, existe uma grande diferença dependendo dalocalização das fibras.

O ligamento cruzado póstero-interno (2) apa­rece no fundo da incisura intercondiliana, por trás doligamento cruzado ântero-externo (fig. 2-151). A suainserção tibial (6) se localiza (fig. 2-152) na partemais posterior da superfície retroespinhal; inclusive

ultrapassa (figs. 2-153 e 2-154, segundo Rouviere)a margem posterior do platô tibial (ver tambémfigo 2-73). A inserção tibial do cruzado póstero-in­terno está localizada bem para trás (fig. 2-152) dainserção dos cornos posteriores do menisco exter­no (9) e do menisco interno (10). O trajeto do pós­tero-interno é oblíquo para diante, para dentro epara cima (fig. 2-154, joelho flexionado em 90°).Sua inserção femoral (2) ocupa o fundo da incisu­ra intercondiliana (fig. 2-155, segundo Rouviere),e inclusive ultrapassa nitidamente (fig. 2-154) aface axial do côndilo interno, ao longo da cartila­gem, no limite inferior desta face, numa zona deinserção alongada horizontalmente (ver tambémfigo 2-76). O ligamento póstero-interno é o maisposterior sobre a tíbia e o mais interno sobre o fê­mur, por isso merece a sua denominação. De formaque é mais correto denominá-Io póstero-interno.

Descrevem-se quatro fascículos:

- o fascículo póstero-externo: o mais poste­rior sobre a tíbia e o mais externo sobre ofêmur;

- o fascículo ântero-interno: o mais anteriorsobre a tíbia e o mais interno sobre o fêmur;

- o fascículo anterior de Humphrey, in­constante;

- o fascículo menisco·femoral de Wrisberg(3), que se insere no como posterior do me­nisco interno (figs. 2-152 e 2-153) para, a se­guir, aderir-se ao corpo do ligamento ao qualacompanha normalmente na sua face ante­rior (fig. 2-151) e inserir-se finalmente comele na face axial do côndilo interno. Existe,às vezes, um equivalente desta mesma dis­posição para o menisco interno (fig. 2-152):algumas fibras (12) do LCAE se inserem nocomo anterior do menisco interno, próximoà inserção do ligamento transverso (11).

Os ligamentos transversos estão em contatoum com o outro (fig. 2-155, com os ligamentos cru­zados perto da sua inserção femoral seccionados)por sua margem axial, enquanto o ligamento exter­no passa por fora do interno. Estes ligamentos nãoestão livres no interior da cavidade articular, mas es­tão recobertos pela sinovial (4) e estabelecem im"portantes conexões com a cápsula, como veremosna página seguinte.

Page 127: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

42

1

4

Fig.2-151

Fig.2-155

102

6

3

2

Fig.2-152

2. MEMBRO INFERIOR 125

32

3

Fig.2-1548

3

Page 128: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

126 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÕES DA CÁPSULA E DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Os ligamentos cruzados estabelecem co­nexões tão íntimas com a cápsula articular quepoderia dizer-se que na realidade eles são es­pessamentos da cápsula articular, e que, co­mo tais, são parte integrante dela. Na página98 vimos como a cápsula penetra na incisuraintercondiliana para formar um septo duplo noeixo da articulação. Por comodidade, dizemosque a inserção tibial da cápsula (fig. 2-156)deixava as inserções dos ligamentos cruzadosfora da articulação, quando na realidade a in­serção da cápsula passa pela inserção dos li­gamentos cruzados. Simplesmente, a espessu­ra capsular dos cruzados se "espalhe" pela fa­ce exterior da cápsula e, portanto, no interiordo septo duplo.

Em vista póstero-interna (fig. 2-157),após ter sido removido o côndilo interno e sec­cionado parte da cápsula, o ligamento cruzadoântero-externo aparece nitidamente "incrusta­do" na lâmina externa do septo capsular (o li­gamento cruzado póstero-interno não pode servisto no desenho).

Em vista póstero-externa (fig. 2-158) nasmesmas condições que a anterior, o ligamentocruzado póstero-interno aparece "incrustado"na lâmina interna do septo capsular.

É necessário destacar que nem todas as fi­bras cruzadas têm o mesmo comprimento, nema mesma orientação (ver também figo 2-159):portanto, durante os movimentos não se con­traem todas simultaneamente (ver pág. 130).

Além disso, estes esquemas permitem des­tacar as capas condilianas, intactas no côndilointerno (fig. 2-158) e que se ressecaram no côn­dilo externo (fig. 2-157).

Em corte vértico-frontal (fig. 2-156), quepassa pela parte posterior dos côndilos, pode-seobservar a divisão da cavidade articular emcompartimentos (o fêmur e a tíbia se separaramartificialmente):

- o septo capsular, reforçado pelos liga­mentos cruzados na parte central, e se­parando a cavidade em duas metades,externa 0 interna; este septo é prolonga­do adiante pelo corpo adiposo (ver pág.100);

- cada uma das duas metades da articula­

ção está separada, por sua vez, pelosmeniscos em dois espaços, o superior ousuprameniscal, que corresponde à in­terlinha fêmoro-meniscal, e o interior ouinframeniscal, que corresponde à in­terlinha tíbio-meniscal.

A presença dos ligamentos cruzados é oque modifica profundamente a estrutura destaarticulação troc1ear (do ponto de vista mecâniconão tem nenhum sentido denominá-Ia bicondi­liana). O LCAE (fig. 2-159), tomando como po­sição de partida sua posição média (1), começahorizontalizando-se (2) sobre o platô tibial du­rante a flexão de 45-50°, até alcançar a sua posi­ção mais elevada (3) na flexão máxima; quandodesce, se aloja na incisura interespinhosa, comose o platô das espinhas tibiais estivesse "serra­do", como quando cortamos pão (destaque). OLCPI (fig. 2-160), no percurso da extensão (A) àflexão máxima (B), varre um setor muito maisimportante (aproximadamente 60°) que o LCAEe, com relação ao fêmur "secciona" a incisuraintercondiliana, separando as duas convexidadesda tróc1ea fisiológica constituída pelos dois côn­dilos.

Page 129: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

Fig.2-156

2. MEMBRO INFERIOR 127

Fig.2-157

Fig.2-160

Page 130: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

128 FISIOLOGIA ARTICULAR

DIREÇÃO DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Vistos em perspectiva (fig. 2-161), os liga­mentos cruzados aparecem realmente como cru­zados no espaço, um com relação ao outro. Noplano sagital (fig. 2-162) estão cruzados (fig. 2­162), o ântero-externo (LCAE) é oblíquo paracima e para trás, enquanto o póstero-interno éoblíquo para cima e para diante. As suas dire­ções também estão cruzadas no plano frontal(fig. 2-163, vista posterior) visto que as suas in­serções tibiais (pontos pretos) estão alinhadas noeixo ântero-posterior (seta S), enquanto as suasinserções femorais estão a 1,7 cm de distância:conseqüentemente, o póstero-interno é oblíquopara cima e para dentro e o ântero-externo éoblíquo para cima e para fora. Pelo contrário, noplano horizontal (ver figo 2-185) eles são para­lelos e entram em contato entre si através da sua

margem axial.

Os ligamentos cruzados não estão somentecruzados entre si, mas também estão cruzadoscom o ligamento lateral do lado homólogo. As­sim sendo, o cruzado ântero-externo se cruzacom o ligamento lateral externo (fig. 2-165) e ocruzado póstero-interno com o ligamento lateralinterno (fig. 2-166). Portanto, existe uma alter­nância regular na obliqüidade dos quatro liga-

mentos quando eles são considerados por or­dem, de fora p?fa dentro e vice-versa.

~xiste uma diferença de inclinação entreos dois ligamentos cruzados (fig. 2-162); com ojoelho em extensão, o ligamento cruzado ântero­externo (LCAE) é mais vertical, enquanto o pós­tero-interno (LCPI) é mais horizontal; aconteceo mesmo com a direção geral das zonas de inser­ção femorais: a do póstero-interno é horizontal(b), enquanto a do ântero-externo é vertical (a).Uma norma mnemotécnica lembra este fato gra­ças ao adágio clássico: "O externo está em péquando o interno está deitado."

Com o joelho flexionado (fig. 2-164), oLCPI, horizontalizado durante a extensão, se en­direita verticalmente, descrevendo um arco decírculo de mais de 60° com relação à tíbia, en­quanto o LCAE se endireita pouco.

A relação de comprimento entre ambos osligamentos cruzados varia, dependendo de cadaindivíduo, porém, junto com as distâncias dospontos de inserção tibiais e femorais, constitui acaracterística própria de cada joelho, visto quedetermina entre outras, como já vimos, o perfildos côndilos.

Page 131: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

2. MEMBRO mFERIOR 129

LCPI

Fig.2-166

Fig.2-163

LU

LCAE

LCPI

Fig.2-165

a

LLE

~

Fig.2-161

Page 132: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

130 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS

Existe o costume de considerar os ligamen­tos cruzados como cordas quase lineares, fixaspor inserções pontudas. Isto só é verdadeiro nu­ma primeira aproximação e tem a vantagem deesclarecer a ação geral de um ligamento, porémem nenhum caso permite conhecer as suas rea­ções finas. Por este motivo, é necessário levarem conta três fatores:

1. A ESPESSURA DO LIGAMENTO

A espessura e o volume do ligamento sãodiretamente proporcionais à sua resistência e in­versamente proporcionais às suas possibilidadesde alongamento, podendo-se considerar cada fi­bra como uma pequena mola elementar.2. A ESTRUTURA DO LIGAMENTO

Devido à extensão das inserções, nem todasas fibras possuem o mesmo comprimento. Conse­qüência importante: não se solicita cada fibra aomesmo tempo. Como no caso das fibras muscula­res, se trata de um verdadeiro recrutamento dasfibras ligamentares durante o movimento, o quefaz variar a sua elasticidade e a sua resistência.

3. A EXTENSÃO E A DIREÇÃO DASINSERÇÕES

De fato, as fibras não são sempre paralelasentre si, se organizam muito amiúde segundoplanos "ladeados", torcidos sobre si mesmos,porque as linhas de inserção não são paralelasentre si, mas sim, com freqüência, oblíquas ouperpendiculares no espaço; além disso, a direçãorelativa das inserções varia durante o movimen­to, o que contribui para "o recrutamento"; modi­ficando a direção da ação do movimento, consi­derado globalmente. Esta variação na ação dadireção do ligamento não se realiza somente noplano sagital, mas nos três planos do espaço, oque demonstra suas ações complexas e simultâ­neas na estabilidade ântero-posterior, na estabi­lidade lateral e na estabilidade rotatória.

Assim sendo, a geometria dos ligamentoscruzados determina o perfil côndilo-troclear noplano sagital e também nos outros dois planosdo espaço.

Globalmente, os ligamentos cruzados asse­guram a estabilidade ântero-posterior do joe­lho ao mesmo tempo que permitem os movi­mentos de charneira mantendo as superfíciesarticulares em,contato.

A sua função pode ser ilustrada com ummodelo mecânico' (fig. 2-167) fácil de realizar:duas tábuas A e B (vistas pelo corte) unidas en­tre si por fitas (ab e cd) que se estendem de umlado de uma delas ao lado oposto da outra, deforma que podem bascular uma com relação àoutra, ao redor de duas chameiras: quando a seconfunde com c, e b se confunde com d, porém éimpossível o deslizamento de uma sobre a outra.

Os ligamentos cruzados do joelho têm umamontagem e um funcionamento semelhantes,com a diferença de que não existem apenas doispontos de chameira, mas uma série de pontosalinhados sobre a curvatura do côndilo. Como

acontece no modelo, o deslizamento ântero-pos­terior é impossível.

Seguindo com a demonstração, os liga­mentos estão representados de forma linear(LCAE = ab, LCPI = cd) nas figuras pequenas;nas maiores estão representadas as fibras extre­mas e médias, assim como as linhas de inserção.

Partindo da posição de alinhamento normal(fig. 2-168), ou de uma flexão mínima de 30°(fig. 2-169), na qual os ligamentos cruzados es­tão contraídos igualmente, a flexão faz basculara base femoral bc (fig. 2-170), enquanto o LCPIcd se endireita e o LCAE ab se horizontaliza. No

esquema mais completo (fig. 2-171) com flexãode 60°, a tensão das fibras elementares de cadaum dos ligamentos cruzados varia muito pouco.

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2. MEMBRO INFERIOR 131

A

Fig.2-167

Fig.2-168

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Fig.2-169

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Fig.2-170

Page 134: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

132 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS(continuação)

A partir do momento em que a flexão au­menta até 90° (fig. 2-172) e depois até 120°(fig. 2-173), o LCPI se endireita verticalmentee se contrai proporcionalmente mais que oLCAE: no detalhe do esquema (fig. 2-174) sepode observar que as fibras médias e inferioresdo LCAE estão distendidas (-), enquanto as fi­bras ântero-superiores são as únicas que estãotensas (+); pelo contrário, no caso do LCPI asfibras póstero-superiores estão pouco distendi­das (-), enquanto as fibras ântero-inferiores es­tão tensas (+). O cruzado póstero-interno es­tá tenso em flexão.

Em extensão e hiperextensão (fig. 2-175),com relação à posição de partida (figs. 2-176 e2-177), todas as fibras do LCAE estão, pelo con­trário, tensas (+), enquanto só as fibras póstero-su­periores do LCPI estão tensas (+); por outro lado,

em hiperextensão (fig. 2-178), o fundo da incisuraintercondiliana c se apóia sobre o LCAE que secontrai como se fosse um cavalete. O cruzado ân­tero-externo está tenso em extensão e é um dos

freios da hiperextensão.

Então, os trabalhos recentes de F. Bonnelconfirmam o que pensava Strasser (1917); quem,graças a um modelo mecânico, descobriu que oLCAE está tenso na extensão e o LCPI na flexão.Contudo, uma análise mais minuciosa das con­dições mecânicas confirmam que Roud (1913)também estava certo, visto que pensava que oscruzados permanecem sempre tensos em algu­mas de suas fibras. por causa do seu comprimen­to diferente. Como acontece amiúde em biome­

cânica, duas propostas aparentemente contradi­tórias podem ser certas simultaneamente e nãose exc1uirem.

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2. :-'JEMBRO INFERIOR 133

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Fig.2-172

Fig.2-173

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134 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS(continuação)

Antes, analisando o movimento dos côndilossobre as glenóides (ver pág. 94), se pôde constatarque este movimento combina rolamento e desliza­mento; assim como o rolamento pode ser explica~do com facilidade, mas, como explicar o desliza­mento numa articulação tão pouco encaixada co­mo o joelho? Certamente, intervêm fatores ati­vos; os extensores puxam a tíbia sobre ofêmur pa­ra diante na extensão (ver pág. 146) e inversamen­te os tlexores fazem com que o platô tibial se des­lize para trás na tlexão; porém, quando os movi­mentos numa amostra anatômica são estudados,predomina o papel dos fatores passivos e, maisconcretamente, o dos ligamentos cruzados. Os li­gamentos cruzados solicitam aos côndilos de for­ma que fazem com que se deslizem sobre as gle­nóides em sentido inverso ao do seu rolamento.

Partindo (fig. 2-179) da extensão (I), se ocôndilo rolasse sem deslizar-se deveria recuar à

posição II e a inserção femoral b do cruzado ânte­ro-externo ab deveria situar-se em b', descreven­do o suposto trajeto bb', eventualidade ilustradana figura 2-108 (página 107), e causa das lesõesdo como posterior do menisco interno. Contudo, oponto b só pode deslocar-se ao longo de uma cir­cunferência de centro e e de raio ab (supondo queo ligamento seja inextensível), a conseqüência éque o trajeto real de b não é bb', mas bb", o quecorresponde à posição m do côndilo, mais ante­rior que a posição II de comprimento e. Durante aflexão, o cruzado ântero-externo age dirigindo ocôndilo para frente. Então, pode-se dizer que o li­gamento cruzado ântero-externo é responsávelpelo deslizamento do côndilo para diante, asso­ciado ao seu rolamento para trás.

Do mesmo modo pode-se demonstrar (fig.2-180) o papel do cruzado póstero-interno durantea extensão. Passando da posição I à posição II porum rolamento simples, o ligamento póstero-internocd desloca o côndilo para trás, a trajetória de sua in­serção femoral c não é cc', mas sim cc" numa cir­cunferência de centro d e de raio dc. A conseqüên­cia é que o côndilo se desloca a um comprimento fpara trás para situar-se numa posição m.Durante aextensão, o ligamento cruzado póstero-interno éresponsável pelo deslizamento do côndilo paratrás, associado ao seu rolamento para diante.

Esta demonstração se pode retomar graças aum modelo mecânico (ver modelo m no final des­te volume), que faz reaparecer a tensão alternadados ligamentos representados por elásticos.

Os movimentos de gaveta são movimentosanormais de deslocamento ântero-posterior da tí­bia com respeito ao fêmur. Exploram-se em duasposições: com o joelho tlexionado em ângulo retoe com o joelho ~m extensão máxima.

Com o joelho fiexionado em ângulo reto(fig. 183): o paciente em decúbito supino sobre umplano duro, o joelho que vai ser explorado em ân­gulo reto, o pé apoiado sobre a mesa de exame; oexaminador bloqueia o pé do paciente sentando-seem cima dele, para a seguir segurar com ambas asmãos a extremidade superior da perna; pluando pa­ra ele, explora uma gaveta anterior, empurrandopara trás explora uma gaveta posterior; esta explo­ração deve ser realizada com o pé em rotação neu­tra - gaveta direta -, o pé em rotação externa ­gaveta em rotação externa - e o pé em rotação in­terna - gaveta em rotação interna -. É preferívelesta terminologia à denominação "gaveta rotatóriaexterna ou interna", que tem implícita uma idéiade rotação durante o movimento de gaveta.

A gaveta posterior (fig. 2-181) se manifestapor um deslocamento da tíbia sobre o fêmur paratrás; devido a uma ruptura do cruzado póstero-in­temo. A regra mnemotécnica é simples: gavetaposterior = cruzado posterior.

A gaveta anterior (fig. 2-182) se traduz porum deslocamento para diante da tíbia sobre o fê­mur devido à ruptura do cruzado ântero-externo.Gaveta anterior = cruzado anterior.

Com o joelho em extensão, uma mão seguraa face posterior da coxa, enquanto a mão anterior,segurando a extremidade superior da perna, tentamover a perna de diante para trás e vice-versa: é oteste de Lachmann- Trillat. Se um deslocamento

para frente pode ser percebido, este "Lachmannanterior" é a prova de uma ruptura do LCAE, as­sociada por Bousquet a uma ruptura da camada fi­brotendinosa póstero-externa (PAPE); esta explo­ração é complicada, visto que o movimento é deescassa amplitude e, por conseguinte, difícil de seafirmar.

Page 137: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

Fig.2-183

Fig.2-179

Fig.2-181

2. MEMBRO INFERIOR 135

Fig.2-180

Fig.2-182

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136 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO

Sabemos que os movimentos de rotaçãolongitudinal do joelho só são viáveis quando eleestá flexionado. Contudo, na extensão máxima,a rotação longitudinal é impossível: ele está im­pedido pela tensão dos ligamentos cruzados elaterais.

Em visão anterior do joelho em rotaçãoneutra (fig. 2-184, as superfícies se ilustram "se­paradas" devido a uma "elasticidade" anormaldos ligamentos), os ligamentos cruzados estãobem cruzados um com relação ao outro, e suadupla obliqüidade, bem visível em vista de pla­no (fig. 2-185), faz com que esbocem um movi­mento de enrolamento um ao redor do outro.

Durante a rotação interna da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-186, vista anterior), a direção dos li­gamentos é nitidamente mais cruzada no planofrontal (detalhe), enquanto no plano horizontal(fig. 2-187, vista superior) entram em contato en­tre si através da sua margem axial (detalhe); des­ta fOffi1a,se enrolam um ao redor do outro (fig.2-188) e se contraem mutuamente (fig. 2-189) co­mo as cordas de um "torniquete", conseguindo aaproximação das supeifíâes da tiNa e do fêmur,embora a rotação interna se bloqueie rapidamente.

Simultaneamente, como o centro desta ro­tação - marcado com uma cruz - (fig. 2-187)não coincide com o centro da articulação (de fa­to corresponde à vertente interna da espinha ti­bial interna), este movimento distende o LCPI(-) e contrai o LCAE (+) assim como a sua ex­pansão para o como anterior do menisco inter­no, que se desloca para trás.

Durante a rotação externa da tíbia sobre ofêmur (fig. 2-190, vista anterior), os ligamentostêm a tendência a tornar-se paralelos (detalhe),enquanto no plano horizontal (fig. 2-191, vistasuperior) estão mais cruzados, porém perdem ocontato de sua margem axial, distendendo o"torniquete" e permitindo uma ligeira separa­ção das superfícies articulares (fig. 2-193). Porconseguinte, a rotação externa não está limitadapela tensão dos ligamentos cruzados.

Contudo, o fato de que o centro de rota­ção não coincida com o centro da articulação

(fig. 2-191) determina, por razões inversas àrotação interna, uma distensão do LCAE (-) euma tensão do LCPI (+) assim como do freiomenisco-femoral (seta branca) que se insere nocorno posterior do menisco interno, deslocan­do-o para diante.

Os ligamentos cruzados impedem a rota­ção interna do joelho estendido.

A rotação, interna contrai o LCAE e dis­tende o LCPI.

A rotação externa contrai o LCPI e dis­tende o LCAE.

Donald B. Slocum e Robert L. Larson (J. Bone andJoint Surg., março 68) analisaram a estabilidade rotatóriadojoelho fiexionado nos esportistas, principalmente nos jo­gadores de futebol, que quando giram bruscamente para olado oposto da perna que suporta o peso solicitam brusca­mente o seu joelho em rotação externa. Estes autores de­monstraram a função relevante que desempenha a parte in­terna da cápsula:

- o seu terço anterior está excessivamente exposto àruptura se o traumatismo em valgo-rotação exter­na ocorre com o joelho tlexionado em 30 a 90°;

- o seu terço posterior é vulnerável sempre que ojoelho esteja estendido;

- o seu terço médio, assimilado a um fascículo pro­fundo do ligamento lateral interno, se rompequando o traumatismo ocorre com o joelho emtlexão de 30 a 90°.

Além disso, se o joelho está tlexionado em 90° oumais, o ligamento cruzado ântero-externo começa a disten­der-se durante os 15-20 primeiros graus de rotação externa,para a seguir contrair-se e inclusive romper-se enrolando­se na face axial do côndilo externo se a rotação externacontinua.

Finalmente, a metade posterior do menisco interno,pelas suas conexões capsulares com a tíbia, pode impedir,por si mesma, a rotação externa com o joelho tlexionado.

Em conclusão, um traumatismo em valgo-rotaçãoexterna com o joelho tlexionado produz sucessivamente eseguindo uma força crescente:

- uma ruptura do terço anterior da cápsula;

- uma ruptura do ligamento lateral interno, come-çando com a camada profunda primeiro e conti­nuando com as fibras superficiais;

- uma ruptura do ligamento cruzado ântero-externo;

- uma desinserção do menisco interno.

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J~Fig.2-192

\ Fig.2-191

Fig.2-190

Fig.2-185

Fig.2-193

Fig.2-188

Fig.2-189

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138 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ESTABILIDADE ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO(continuação)

A função dos ligamentos laterais na esta­bilidade rotatória do joelho pode ser explicadapor razões simétricas.

Em posição de rotação neutra (fig. 2-194,vista superior, côndilos transparentes), a obli­qüidade do LU para baixo e para diante, e doLLE para baixo e para trás, faz com que esbo­cem um movimento de enrolamento ao redor da

porção superior da tíbia.

A rotação interna (fig. 2-195) se opõe aeste enrolamento, e diminui a obliqüidade dosligamentos laterais, embora sua tendência seja ade converter-se em paralelos (fig. 2-196, vistapóstero-intema: superfícies "separadas"); comob enrolamento diminui, as superfícies articulares

estão menos coaptadas pelos ligamentos laterais(fig. 2-197) - enquanto estão mais coaptadaspelos ligamentos cruzados. O "jogo" que permi­te a distensão .dos ligamentos laterais é compen­sado pela tensão dos cruzados.

Ao contrário; a rotação externa (fig. 2-198)aumenta o enrolamento (fig. 2-200), com o qualas superfícies articulares se aproximam (fig.2-200) e se limita o movimento, enquanto oscruzados se distendem.

Os ligamentos laterais limitam a rotaçãoexterna, os cruzados a rotação interna.

A estabilidade rotatória do joelho em ex­tensão está assegurada tanto pelos ligamentoslaterais quanto pelos ligamentos cruzados.

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2. MEMBRO INFERIOR 139

Fig.2-197

Fig.2-194

Fig.2·199

~

Fig.2-198

Fig.2-200

Fig.2-196

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140 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO INTERNA

Junto com os testes estáticos de estabilida­de do joelho, tão clássicos como a exploração dalateralidade ou da gaveta, se elaboraram testesdinâmicos de estabilidade (ou de instabilidade)que pretendem a aparição de um movimentoanormal inclusive no percurso de um movimen­to de prova. Estes testes dinâmicos de instabili­dade são numerosos (cada escola de cirurgia dojoelho propõe mais um em cada congresso!), porisso é necessário tentar classificá-los e, princi­palmente, destacar os mais significantes.

O mais prático é classificar estes testes di-nâmicos em dois grupos:

- os testes em valgo-rotação interna e

- os testes em valgo-rotação externa.

Em primeiro lugar vamos analisar os testesdinâmicos em valgo-rotação interna.

O teste de Mac-Intosh ou lateral PivotShift Test é o mais conhecido e utilizado. Po­

de ser explorado com o paciente em decúbitosupino (fig. 2-201) ou em inclinação de 45°(fig. 2-202). No primeiro caso (fig. 2-201), amão que segura o pé pela planta força uma ro­tação interna, enquanto o próprio peso domembro aumenta um valgo no joelho. No se­gundo caso (fig. 2-202), a mão segura o pé pe­la face anterior do tornozelo passando por trásdele e provocando uma rotação interna com aextensão do punho. A posição de partida dojoelho é a extensão (fig. 2-201), a mão livreempurra o joelho para diante para esboçar aflexão e para baixo para aumentar o valgo. Du­rante este movimento de flexão (fig. 2-202),para os 25-30°, após ter experimentado umaresistência, se percebe de repente um desblo­queio, enquanto se aprecia e se observa o côn-

dilo femoral externo pular, literalmente, paradiante do platô tibia1 externo.

A positividade do teste de Mac-Intosh, ouseja, a existência de um ressalto externo em rota­ção interna, diagnostica uma ruptura doLCAE. De fato, o LCAE, ao limitar a rotação in­terna, se o joelho está em extensão e rotação in­terna (fig. 2-203), o côndilo femoral externo sesubluxa posteriormente (SLP) sobre a vertenteposterior (1) da "lombada" da glenóide externa;é mantido nesta situação pelo tensor da fáscia la­ta (TFL) e pelo valgo que coaptam o côndilo so­bre a glenóide. Enquanto a fáscia lata passa pelafrente da lombada, o côndilo permanece blo­queado em subluxação posterior, porém quandose ultrapassa este ponto devido a uma ftexãocrescente (fig. 2-204), o côndilo supera o vértice(S) e se bloqueia para diante (2), sobre a verten­te anterior onde permanece retido (fig. 2~204) pe­lo LCPI. Um fato importante é a sensação de res­salto que o paciente percebe espontaneamente.

O jerk test de Hughston é o inverso do Mac­Intosh. Explora-se também com o paciente em de­cúbito supino simétrico (fig. 2-205) ou em um de­cúbito intermédio (fig. 2-206), com uma inclina­ção de 45°, com as mesmas posições das mãos. Adiferença está em que a posição de partida é defle­xão de 35-40° para estender de novo o joelho,mantendo a rotação interna do pé e a limitação emvalgo do joelho. O côndilo femoral externo parte,então, de sua posição (fig. 2-203) mais "adianta­da" (em pontilhado) correspondendo a um conta­to (2) com a vertente anterior da glenóide externa,para "pular" bruscamente (1) em subluxação pos­terior, sem ficar retido pelo LCAE quando seaproxima à extensão. A positividade do jerk testtambém indica uma ruptura do LCAE.

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Fig.2-201

Fig.2-202

Fig.2-205

Fig.2-206

2. MEMBRO INFERIOR 141

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142 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS DE RUPTURADO LIGAMENTO CRUZADO ÂNTERO-EXTERNO

(continuação)

Embora os testes de Mac- Intosh e deHughston sejam os mais utilizados, os mais fá­ceis de explorar e os mais fidedignos, não são osúnicos que permitem diagnosticar uma rupturado ligamento cruzado ântero-externo (LCAE).Podem-se utilizar outros três testes; se trata dostestes de Losee, de Noyes e de Slocum.

O teste de Losee (fig. 2-207) se exploracom o sujeito em decúbito supino, o examinadorsegura o calcanhar com uma mão mantendo ojoelho fiexionado em 30°, com a outra mão man­tém o joelho pela sua face anterior, enganchan­do o seu polegar na cabeça da fíbula. Simulta­neamente realiza uma rotação externa com a pri­meira mão, o que impede qualquer subluxaçãoposterior do côndilo externo, e um valgo com aoutra mão; conduzindo o joelho em extensão re­laxando a rotação externa - este último ponto émuito importante, visto que no caso contrárioseria em todos os casos negativo. Quando a ex­tensão se completa, o polegar da mão que segu­ra o joelho desloca a fíbula para diante: quandoo teste é positivo, se produz um ressalto do pla­tô tibial para diante ao final da extensão.

O teste de Noyes (fig. 2-208), ou fiexionrotation drawer test, se explora também com opaciente em decúbito supino, com o joelho fie­xionado em 20 a 30° e rotação neutra, as mãosdo examinador se limitam a segurar a perna, e éunicamente o peso da coxa o que provoca umasubluxação posterior do côndilo externo (1) euma rotação externa do fêmur. É possível redu­zir esta subluxação empurrando a porção supe­rior da tlôia para trás (2), como quando se ex-

pIora uma gaveta posterior, daí o nome inglêsdeste teste que indica também uma ruptura doLCAE.

O teste de Slocum (fig. 2-109) se exploracom o paciente em decúbito supino, semigiradopara o lado oposto e com o membro a explorarsobre a mesa de exame; desta forma, quando ojoelho está em extensão, o próprio peso da per­na provoca um valgo automático - rotação in­terna; o fato de não ter que segurar o membro éde grande ajuda nos pacientes obesos. As duasmãos do examinador se colocam no nível dojoelho, a um e outro lado da interlinha, de formaque se pode flexionar progressivamente, en­quanto o valgo aumenta. Como no teste de Mac­Intosh, aparece um ressalto nos 30-40° de flexão,e como no teste de Hughston, se reproduz emsentido inverso quando o joelho se estende. Esteteste de Slocum também diagnostica uma ruptu­ra do LCAE.

Embora os cinco testes sejam indicativosde uma ruptura do LCAE, existem duas circuns­tâncias nas quais não são exatos:

- no caso das adolescentes hiperlaxas:podem ser positivos sem existir umaruptura do ligamento, daí a necessidadede explorar também o lado oposto quepode ser também hiperlaxo;

- uma lesão importante da camada fibro­tendinosa póstero-interna impede o blo­queio do côndilo externo sob a ação dovalgo e pode dificultar a aparição de umressalto.

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Fig.2-208

- __ n_

Fig.2-207

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Fig.2-209

2. MEMBRO INFERIOR 143

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144 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO EXTERNA

A exploração de um joelho não seria com­pleta sem os testes dinâmicos em rotação externa,que procuram um ressalto externo em rotaçãoexterna.

O teste em rotação externa, valgo e exten­são ou pivot shift reverse test (fig. 2-210) estáconstituído pela mesma manobra que o teste deMac-Intosh, no qual a rotação interna se substituipela rotação externa da perna realizada pela mãoque segura o pé; partindo de uma flexão entre60-90°, a extensão progressiva combinada comuma pressão contínua na face externa do joelhosempre consegue que a extensão não ultrapasse os30° (fig. 2-211), produzindo-se um ressalto brus­co do côndilo femoral externo para a pendenteposterior da glenóide tibial externa.

De fato, quando o joelho está fiexionado, emrotação externa (fig. 2-212), o côndilo externo, que jánão é retido pela tensão do LCPI em rotação externa(RE) se subluxa para diante (SLA) sobre a pendenteanterior da lombada da glenóide externa (seta 1); du­rante a extensão progressiva (fig. 2-213), o tensor dafáscia lata (TFL) passa para diante do ponto de con­tato entre o côndilo e a glenóide, embora o côndiloexterno esteja deslocado para trás (fig. 2-212) na suaposição normal (pontilhado), ultrapassando brus­camente o ponto mais proeminente da lombada epara entrar em contato (seta 2) com a vertente pos­terior da glenóide. A percepção do ressalto, pelopróprio paciente em ocasião dos episódios de ins­tabilidade e pelo examinador quando realiza estamanobra, se deve à redução brusca da subluxaçãoanterior do cándilo externo, o que é possível devi­do à ruptura do LCPI.

O teste em rotação externa, valgo e flexão(fig. 2-214) se explora com a mesma manobra,porém partindo da máxima extensão: o ressaltoque se percebe quando a flexão atinge os 30°corresponde (fig. 2-212) à subluxação anterior(SLA) do côndilo externo que pula bruscamente(S) de sua posição normal (seta 2) na pendenteposterior da glenóide externa a uma posição anor­mal (seta 1) na vertente anterior, o que é possívelgraças à ruptura do LCPI.

Outros três testes permitem diagnosticar umalesão da camada fibrotendinosa póstero-externa (oPAPE) e do LLE em ausência de ruptura do LCPI.

O teste da gaveta póstero-externo ou póste­ro-Iateral drawer test de Hughston: os pés se apói­am planos na mesa de exame, os quadris fiexionados45° e os joelhos 90°. Sentando-se sobre o pé do pa­ciente, o examinador pode bloquear a rotação dojoelho sucessivamente em rotação neutra, externa15° e interna 15°. Segurando com ambas as mãos aporção superior da tíbia, se procura uma gaveta pos­terior em suas três posições. O teste é positivo quan­do se aprecia !lma sublu.xação póstero-externa doplatá tibial externo, enquanto o platõ interno nãorecua - é, portanto, uma verdadeira gaveta rotató­ria - pela rotação externa do pé. Esta gaveta rotató­ria externa se detém em rotação neutra e desapareceem rotação interna pela tensão do LCPI intacto.

O teste em hipermobilidade externa deBousquet ou HME se explora com o joelho flexio­nado em 60°; ao acrescentar uma pressão na por­ção superior da tíbia para tentar que se deslize pa­ra baixo e para trás dos côndilos, se percebe umressalto posterior enquanto o pé gira em rotaçãoexterna. Portanto, também neste caso se. trata deuma verdadeira gaveta rotatória externa.

O teste de recurvatum e rotação externa sepode explorar de duas formas, procurando, em am­bos os casos. um bom relaxamento do quadríceps:

- em extensão: ambos os membros inferio­

res, segurados pela parte anterior do pé. seelevam em extensão, o que comporta, nomembro lesado, um recurvatum e uma ro­tação externa, representados por um deslo­camento da tuberosidade tibial anterior

(TTA) para fora; a subluxação póstero-ex­terna do platô tibial externo conduz a umgenu varo.

- em flexão: enquanto uma mão segura o pée dirige progressivamente o joelho para aextensão, a mão que mantém o joelho per­cebe a subluxação póstero-externa da tíbiarepresentada por um recurvatum, um genuvaro e um deslocamento para fora da tube­rosidade tibial anterior.

Todos estes testes, com freqüência difíceis dedemonstrar em um paciente acordado, com um re­laxamento muscular imperfeito, aparecem nitida­mente sob anestesia geral.

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2. MEMBRO INFERIOR 145

Fig.2-211

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Fig.2-210

Fig.2-214

Fig.2-213

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146 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS EXTENSORES DO JOELHO

o quadríceps crural é o músculo exten­sor do joelho. Trata-se de um músculo potente:sua superfície de secção fisiológica é de 148cm2, o que num trajeto de 8 em lhe confere umapotência de trabalho de 42 kg. O quadríceps étrês vezes mais potente do que os flexores; o fa­to da sua luta contra a gravidade o explica. En­tretanto, vimos que quando o joelho está em hi­perextensão a ação do quadríceps não é necessá­ria para manter a posição de pé (ver pág. 120);porém quando se inicia uma mínima flexão, umaintervenção enérgica do quadríceps é necessáriapara evitar a queda por flexão do joelho.

O quadríceps (fig. 2-215) é constituído, co­mo o seu nome o indica, por quatro corpos mus­culares que se inserem por um aparelho exten­sor, na tuberosidade tibial anterior (TTA):

- três músculos monoarticulares: o crural(Cr), o vasto externo (VE) e o vasto in­terno (VI);

- um músculo biarticular: o reto anterior(RA), cuja fisiologia, um tanto específi­ca, será analisada na página seguinte.

Os três músculos monoarticulares são so­mente extensores do joelho, embora tenham umcomponente lateral, no que se refere a ambos osvastos; é necessário destacar, falando no vastointerno, que é mais potente do que o externo,desce mais para baixo e que seu relativo predo­núnio está destinado a opor-se à tendência que apatela tem para luxar-se para fora. A contraçãode ambos os vastos, geralmente equilibrada, en­gendra uma força resultante dirigida para cima,no eixo da coxa. Todavia, se um dos vastos pre­dominasse sobre o outro, como seria o caso deum vasto externo predominante sobre um vastointerno insuficiente, a patela se "escaparia" parafora: este é um dos mecanismos causadores daluxação recidivante da patela, que sem dúvidaalguma é sempre externa. Pelo contrário, é pos­sível evitar a subluxação externa da patela refor­çando seletivamente o vasto interno.

A patela é um osso sesamóide que pertenceao aparelho extensor do joelho entre o tendão

quadricipital por cima e o ligamento menisco­patelar por baixo. Sua função é primordial, vis­to que aumenta a eficácia do quadríceps deslo­cando para diante a sua força de tração. Somen­te devemos traçar o esquema das forças com esem patela para estar convencido deste fato.

A força Q do quadríceps efetuada sobre apatela (fig. 2-216) se pode decompor em doisvetores: uma ~orça Ql' dirigida para o eixo deflexão-extensão, que encaixa a patela na tróc1ea,e uma força Q2' qirigida no prolongamento doligamento menisco-patelar. Por sua vez, estaforça Q2' aplicada sobre a tuberosidade anteriorda tíbia pode decompor-se em dois vetores per­pendiculares entre eles: uma força Q3 dirigidapara o eixo de flexão-extensão, que encaixa a tí­bia sobre o fêmur, e uma força tangencial Q4'único componente eficaz para realizar a exten­são: faz com que a tíbia se deslize para diantesobre o fêmur.

Se a patela é extirpada - operação deno­minada "patelectomia" - e se segue o mesmoraciocínio (fig. 2-217): a força Q do quadríceps,supondo que seja idêntica, se dirige tangencial­mente para a tróc1ea e diretamente sobre a tube­rosidade tibial anterior; se pode decompor emdois vetores: Q5' força de coaptação que encaixaa tíbia sobre o fêmur, e Q6' força eficaz para aextensão; o componente tangencial Q6 diminuiconsideravelmente enquanto o componente cen­trípeto Q5 aumenta.

Se compararmos agora as forças eficazesem ambas as hipóteses (fig. 2-218), se podeconstatar que Q4 é 50% maior que Q6: a pate/a,afastando o tendão quadricipital como um cava­lete, aumenta nitidamente a eficácia do quadrí­ceps. Também se pode constatar que na ausênciade patela a força de coaptação Q5 aumenta, po­rém este efeito favorável é contrariado pela per­da de amplitude da fiexão, devido tanto ao en­curtamento do aparelho extensor, quanto à suafragilidade. Assim, a patela é muito útil, o queexplica a má reputação e a escassa freqüência dapatelectomia.

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Fig.2-216 Fig.2-215

2. MEMBRO INFERIOR 147

Fig.2-217

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148 FISIOLOGIA ARTICULAR

FISIOLOGIA DO RETO ANTERIOR

o reto anterior somente representa a quintaparte da força total do quadríceps e não poderealizar a extensão máxima sozinho, porém o fa­to de ser um músculo biarticular lhe confere uminteresse especial.

Graças a seu trajeto para diante do eixo deflexão-extensão do quadril e do joelho, o retoanterior é tanto flexor do quadril quanto exten­sor do joelho (fig. 2-220), porém sua eficácia co­mo extensor de joelho depende da posição doquadril, assim como a sua ação como flexor doquadril está relacionada com a posição do joe­lho. Isto se deve (fig. 2-219) a que a distânciaentre a espinha ilíaca ântero-superior (a) e amargem superior da tróclea é menor em flexão(ab) do que em extensão (ab). Esta diferença decomprimento (e) determina um alongamento re­lativo do músculo quando o quadril está em fle­xão e o joelho se flexiona sob o peso da perna(lI); nestas condições, para obter a extensão dojoelho (lU), os outros três fascículos do quadrí­ceps são muito mais eficazes que o reto anterior,já distendido pela flexão do quadril.

Pelo contrário, se o quadril passa de umaposição de alinhamento normal (I) à extensão(IV), a distância entre as duas inserções do re­to anterior aumenta (ad) um certo comprimen­to (f) que contrai o reto anterior (encurtamen­to relati vo), e aumenta outro tanto a sua eficá­cia. Isto é o que acontece durante a marcha oua corrida, ao distender o membro posterior(fig. 2-223): pela ação dos glúteos o quadril seestende, enquanto o joelho e o tornozelo tam­bém se estendem; assim, o quadríceps desen­volve a sua máxima potência, graças à eficáciaaumentada do reto anterior. O glÚteo máximo é

sinérgico-antagonista do reto anterior: anta­gonista no que diz respeito ao quadril e sinér­gico no joelho.

Na fase de apoio unilateral da marcha,quando o membro oscilante avança (fig. 2-222),o reto anterior se contrai para realizar a flexão doquadril e a extensão do joelho ao mesmo tempo.Então, constata-se que a condição biarticular doreto anterior é útil nos dois tempos da marcha:na fase de impulso do membro posterior e na fa­se de avanço do merp.bro oscilante.

Durante a ação de ficar de pé, partindo daposição de cócoras, o reto anterior desempenhaum papel muito importante, visto que é o únicodos quatro fascículos do quadríceps que não per­de sua eficácia durante o movimento. De fato,enquanto o joelho se estende, o quadril, sob aação do glúteo máximo, também se estende, no­vamente o reto anterior se contrai na sua inser­

ção superior, conservando assim um compri­mento constante no início da ação. Neste caso seconstata outra vez a função exercida como trans­missor de força por um músculo potente da raizdo membro, o glúteo máximo, sobre uma articu­lação mais distal, o joelho, por um músculo bi­articular, o reto anterior.

Finalmente, ao contrário, a flexão do joelhosob a ação dos ísquio-tibiais favorece a flexão doquadril pelo reto anterior. Isso pode ser útil nosalto, com os joelhos flexionados (fig. 2-221): osretos anteriores possuem muita eficácia na flexãodos quadris. É outro exemplo da relação antago­nismo-sinergia entre os ísquio-tibiais, que são fle­xores do joelho e extensores do quadril, e o retoanterior, flexor do quadril e extensor do joelho.

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2. MEMBRO INFERIOR 149

Fig.2-219

Fig.2-223 - Fia. 2-222 Fig.2-221

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150 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS FLEXORES DO JOELHO

Os fiexores do joelho formam parte docompartimento posterior da coxa (fig. 2-224);se trata dos músculos ísquio-tibiais: bíceps CfU­

ral (B), semitendinoso (ST), semimembranoso(SM), os músculos da "pata de ganso": reto in­terno (Ri), sartório (Sa) e o semitendinoso (quetambém forma parte dos ísquio-tibiais), o poplí­teo (ver pág. seguinte); os gêmeos (Ge) não sãorealmente fiexores do joelho, mas sim extenso­res do tornozelo (ver pág. 218).

Contudo, os gêmeos desempenham um pa­pel importante na estabilização do joelho: se in­serem por cima dos côndilos, quando se con­traem, durante a fase do passo, isto é, quando ojoelho e o tornozelo se estendem ao mesmo tem­po, deslocam os côndilos para frente, de formaque são antagonistas-sinergistas do quadríceps.

Todos estes músculos, exceto dois, são bi­articulares: a porção curta do bíceps e o poplí­teo que são monoarticulares (ver página seguin­te). Portanto, os fiexores biarticulares possuemuma ação simultânea de extensão do quadril esua ação sobre o joelho depende da posição doquadril.

O sartório (Sa) é fiexor, abdutor e rotadorexterno do quadril, ao mesmo tempo que éfiexore rotador interno do joelho.

O reto interno (Ri) é principalmente adutor eacessório da fiexão do quadril, ao mesmo tempoque é fiexor do joelho, de maneira que tambémforma parte dos ratadores internos (ver pág. 152).

Os ísquio-tibiais são tanto extensores doquadril (ver pág. 52) quanto flexores do joelho,e sua ação no joelho está condicionada pela po­sição do quadril (fig. 2-225). Quando o quadrilse flexiona, a distância ab que separa as inser­ções destes músculos aumenta regularmente,visto que o centro do quadril O, ao redor doqual o fêmur gira, não se confunde com o pon-

to a, ao redor do qual se orientam; deste modo,quanto mais se flexiona o quadril, maior é o en­curtamento relativo dos ísquio-tibiais e mais secontraem. Quando o quadril está flexionado40° (posição lI), o encurtamento relativo aindapode ser compensado pela flexão passiva dojoelho (ab = ab'), porém no caso de uma flexãode 90° (posição lU) o encurtamento relativo étal, que emboHl o joelho esteja flexionado emângulo reto, ainda persiste um encurtamentorelativo importante (f). Se a flexão do quadrilultrapassa os 90° (posição IV), é muito difícilmanter os dois joelhos (fig. 2-226) em máximaextensão: a elasticidade dos músculos, que di­minui bastante com a falta de exercício, quasenão absorve o encurtamento relativo (g). A en­trada em tensão dos ísquio-tibiais pela fIe­xão do quadril aumenta a sua eficácia comofIexores do joelho: quando, no percurso deuma escalada (fig. 2-227), um dos membros in­feriores avança, a flexão do quadril favorece aflexão do joelho. Ao contrário, a extensão dojoelho favorece a ação dos ísquio-tibiais comoextensores do quadril: é o que se produz duran­te os esforços de endireitamento do tronco apartir de uma posição de inclinação para frente(fig. 2-226), e também durante a escalada,quando o membro inferior, situado anterior­mente, passa a ser posterior.

Se agora (fig. 2-225), o quadril se estendecompletamente o quadril (posição V), os ísquio­tibiais se alongam relativamente (e), o que ex­plica que a fiexão do joelho seja menos intensa(ver figo2-13); isso ressalta a utilidade dos mús­culos monoarticulares (poplíteo e porção curtado bíceps), que conservam a mesma eficácia in­dependentemente da posição do quadril.

A potência global dos fiexores do joelho éde 15 kg, ou seja, um pouco mais de um terço dado quadríceps.

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2. MEMBRO INFERIOR 151

Fig.2-224

Fig.2-226

Fig.2-227

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152 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ROTADORES DO JOELHO

Os flexores do joelho são, ao mesmo tem­po, os seus rotadores; se dividem em dois gru­pos segundo o seu ponto de inserção na perna(fig. 2-228):

- os que se inserem por fora do eixo ver­tical XX' de rotação do joelho: são osrotadores externos (RE), representados(fig. 2-231) pelo bíceps (B) e o tensorda fáscía lata (TFL). Quando deslocama parte externa do platá tibial para trás(fig. 2-229), fazem o joelho girar de talforma que a ponta do pé se dirige direta­mente para fora. O tensor da fáscia latasó age como flexor-rotador externoquando o joelho está flexionado; numjoelho totalmente estendido, perde a suaação de rotação para transformar-se emextensor: "bloqueia" a extensão. A por­ção curta do bíceps (fig. 2-232, B ') é oúnico músculo rotador externo monoar­tiCldar; o que significa que a posição doquadril não repercute em absoluto sobrea sua ação.

- os que se inserem por dentro do eixovertical XX' de rotação do joelho: sãoos rotadores internos (RI), representa­dos (fig. 2-231) pelo sartório (Sa), o se­mitendinoso (ST), o semimembranoso(SM), o vasto interno (VI) e o poplíteo(fig. 2-232, Pop). Quando deslocam pa­ra trás a parte interna do platá tibial (fig.2-230), o joelho gira de tal forma que aponta do pé se dirige para dentro. Agemcomo freios da rotação externa com ojoelho flexionado, de forma que prote­gem os elementos cápsulo-ligamentaresquando estes são requeridos violenta­mente durante um giro inesperado parao lado oposto ao da perna que suporta o

peso. O poplíteo (fig. 2-234, vista poste­rior) é a única exceção desta disposiçãogeral: se insere na face posterior da por­ção proximal da tíbia, para penetrar, aseguir, na cápsula do joelho debaixo daogiva que forma o ligaj1lento poplíteoarqueado (ver também figo2-147); antesde que isso aconteça, ele envia uma ex­pansão que se insere na margem poste­rior do menisco externo; no interior dacápsula

-porém para fora da sinovial- se desli­za entre o ligamento lateral externo e omenisco externo (fig. 2-232) para termi­nar fixando-se no fundo de uma fossetaque ocupa a parte inferior da superfíciecutânea do cándilo externo. É o únicorotador interno monoarticular, de formaque a sua ação não está influenciada pe­la posição do quadril. Esta ação pode sercompreendida com facilidade por umavista superior do platô tibial (fig. 2­233): o poplíteo (seta preta) desloca aparte posterior do platá tibial para fora.

Embora esteja situado por trás da articula­ção, o poplíteo é extensor do joelho: durante aflexão, a fosseta de inserção do poplíteo se des­loca para cima e adiante (fig. 2-232), estendendoo músculo e reforçando a sua ação como rotadorinterno. Pelo contrário, quando se contrai com ojoelho flexionado e, especialmente, em rotaçãoexterna, desloca a fosseta para baixo e atrás, pro­vocando um deslizamento do cándilo externo pa­ra a extensão. Em resumo, o poplíteo é tanto ex­tensor quanto rotador interno do joelho.

Em conjunto, o grupo dos rotadores inter­nos é mais potente (2 kg) do que o grupo dos ro­tadores externos (1,8 kg); porém, esta diferençanão tem muita importância.

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Fig.2-230 Fig.2-229

Fig.2-232

Fig.2-234

RE

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154 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO AUTOMÁTICA DO JOELHO

Já vimos (ver pág. 84) que o fim da extensãose acompanha de uma ligeira rotação externa eque o início daflexão não épossível sem uma ligei­ra rotação interna, e tudo isso de forma automáti­ca, sem intervenção de nenhuma ação voluntária.

Esta rotação automática é evidente numa pre­paração anatômica com a experiência de Round:

- duas varetas transversais e horizontais, para­lelas entre si quando o joelho está em exten­são, são introduzidas (fig. 2-235, vista supe­rior) no platô tibial e no maciço condiliano;

- se o fêmur se flexiona sobre a tíbia

(fig. 2-236), que permanece fixa, se podecomprovar como o eixo do fêmur se in­clina para trás e para dentro (o desenhorepresenta um joelho direito); no caso deuma flexão de 90°, pode-se constatar queambas as varetas formam, no plano hori­zontal, um ângulo de 30° aberto para fo­ra e para trás (Roud propõe 45°);

- quando o eixo do fêmur numa direção sa­gital se situa outra vez (fig. 2-237) pode­se observar que a vareta tibial se orientanesta situação de dentro para fora e de tráspara diante; o que indica uma rotação in­terna da tíbia sobre o fêmur. Esta vareta

forma um ângulo de 20° com a perpendi­cular ao eixo do fêmur. Portanto, a ftexãodo joelho se acompanha de uma rotaçãointerna automática de 20°. A diferençade 10° se deve a que a vareta femoral (nãoilustrada aqui), por causa do valgo fisioló­gico do joelho, não é perpendicular ao ei­xo diafisário, mas sim que forma com eleum ângulo de 80° (ver figo 2-3);

- esta experiência também pode ser realizadano sentido inverso: partindo de uma posi­ção de ftexão em ângulo reto, em que as va­retas divergem (fig. 2-236), para alcançar amáxima extensão na qual as varetas são pa­ralelas (fig. 2-235): deste modo se eviden­cia uma rotação externa automática con­temporânea da extensão do joelho.

A rotação interna da tíbia aparece porque du­rante a ftexão do joelho (fig. 2-238) o côndilo ex­terno recua mais do que o interno: com o joelho

estendido, os pontos de contato a e b estão alinha­dos sobre uma transversal Ox; a ftexão provoca oretrocesso do côndilo interno de a para a' (5-6 mm)e do côndilo externo de b para b' (10-12 mm); ospontos de contato a' e b' que correspondem à fle­xão estão alinhados sobre Oy que junto com Oxformam um ângulo xOy de 20°. Para que Oy este­ja transversal, é necessário que a tíbia realize umarotação interna de 20°.

Este retrocesso diferencial dos côndilos se de­

ve a três fatores:

1) A desigualdade do desenvolvimento docontorno condiliano (figs. 2-239 e 2-240).Quando se desenvolvem as superfícies ar­ticulares do côndilo interno (fig. 2-239) ese comparam com o desenvolvimento dassuperfícies do côndilo externo (fig. 2-240)pode-se constatar que o desenvolvimentobd' da curvatura posterior do côndilo ex­terno é um pouco maior do que o do inter­no (ac' = bc'). Isso explica, em parte, que ocôndilo externo rode mais do que o interno.

2) A forma das glenóides: o côndilo internorecua pouco, visto que está dentro de umaglenóide côncava (fIg. 2-241), enquanto ocôndilo externo se desliza sobre a verten­

te posterior da glenóide externa convexa(fIg. 2-242).

3) A orientação dos ligamentos laterais:quando os côndilos recuam sobre as gle­nóides, o ligamento lateral interno entraem tensão mais rapidamente (fig. 2-241)que o externo (fig. 2-242); deixando esteúltimo ao côndilo externo mais margem deretrocesso, devido à sua obliqüidade.

Além disso, existem pares de rotação:

- a ação predominante dos músculos ftexo­res-rotadores internos (fig. 2-243), múscu­los da "pata de ganso" (seta preta) e poplí­teo (seta branca);

- a tensão do ligamento cruzado ântero-ex­temo no fim da extensão (fig. 2-244): o li­gamento passa por fora do eixo, de formaque a sua tensão provoca uma rotação ex­terna.

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2. MEMBRO INFERIOR 155

RE

RI

y

x

Fig.2-236

Fig.2-244

Fig.2-238

Fig.2-240

o .------:

Fig.2-237

Fig.2-239

Fig.2-241 Fig.2-242

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156 FISIOLOGIA ARTICULAR

o EQUILÍBRIO DINÂMICO DO JOELHO

Ao final deste capítulo, parece que a estabilidade dojoelho, articulação frouxamente encaixada, se mantémgraças a um milagre constante. É por este motivo que ten­tamos expor num esquema sinóptico (fig. 2-245) os prin­cipais testes com relação às estruturas implicadas. A es­colha destes testes pode gerar discusão, assim como a suainterpretação, embora se baseie nas publicações mais re­centes. De todo modo, devemos ser conscientes de que setrata de uma classificação provisória.

1) A gaveta anterior em rotação neutra, ou ga­veta "direta", pode existir, em menor grau, deforma fisiológica; portanto, sempre será neces­sário comparar com o lado supostamente nor­mal. Contudo, quando seu sinal é claro (+)diagnostica uma ruptura do LCAE. Quando eleé muito acentuado, se une uma ruptura do LLIà anterior. Porém, cuidado com uma falsa ga­veta anterior que corresponderia à redução deuma subluxação posterior espontânea por rup­tura do LCPI!

2) A gaveta anterior em rotação interna de15° constitui um sinal claro de ruptura doLCAE que pode estar unido com uma lesãoda CFTPE (camada fibrotendinosa póstero­externa ou PAPE).

3) A gaveta anterior em rotação interna de30° traduz uma ruptura do LCAE associada àdo LCPI, e quando se percebe um ressalto seassocia a uma desinserção do corno poste­rior do menisco externo.

4) O ressalto externo em valgo, rotação internae ftexão, ou lateral pivot shift de Mac-Intosh eo jerk test de Hughston são sinais claros deruptura do LCAE.

5) A gaveta anterior em rotação externa,quando é moderado (+) indica uma lesão daCFTPE (PAPE), e se pode-se perceber umressalto se associa a uma desinserção do cor­no posterior do menisco interno.

6) A gaveta posterior em rotação neutra ou ga­veta posterior direta é o sinal infalível da rup­tura do LCPl.

7) O ressalto externo em valgo, rotação externae extensão ou pivot shift reverse test, assim co­mo o ressalto externo em valgo, rotação exter­na e flexão, indicam uma ruptura do LCPI.

8) A gaveta posterior em rotação externa tra­duz uma lesão da CFTPE (PAPE), podendo-seassociar a uma ruptura do LCPI.

9) A gaveta posterior em rotação interna seriaum sinal específico da ruptura do LCPI asso­ciada a uma lesão da CFTPl (PAP/).

10) Um movimento de lateralidade em extensão,de forma que provoque um ligeiro valgo (+)corresponde a uma ruptura do LLI; quando ovalgo é mais acentuado (++) indica uma lesãoassociada da convexidade condiliana intema:

por último, quando é muito acentuada (+++)existe, além disso, uma ruptura do LCAE.

11) Um movimento de lateralidade externa emligeira ftexão (10-30°) indica uma ruptura as­sociada do LU, da convexidade condiliana in­terna e da CFTPI, assim como uma lesão docorno posterior do menisco interno.

12) Um movimento de lateralidade interna emextensão indica, quando existe um varo mode­rado (+), uma ruptura do LLE que pode estarou não associada a uma ruptura da banda deMaissiat, e quando é acentuado (++), uma rup­tura associada da convexidade condiliana ex­

terna e da CFTPE (PAPE).

13) Um movimento de lateralidade interna emligeira ftexão (I 0-30°) indica as mesmas lesõesque no caso anterior, porém sem que a rupturada banda de Maissiat esteja associada.

14) O teste de recurvatum, rotação externa evalgo ou inclusive o teste de suspensão do de­do polegar do pé indicam uma ruptura associa­da do LLE e da CFTPE (PAPE).

Para entender a mecânica do joelho é necessáriocompreender que o joelho em movimento realiza umequilíbrio dinâmico e, principalmente, abandonar a idéiade um equil1brio de dois termos, como o dos dois pratosde uma balança. Contudo, uma tábua de vela (fig. 2-246)é muito mais representativa, visto que corresponde a umequilíbrio de três termos:

- o mar, que segura a tábua, corresponde à açãodas supeifícies articulares;

- o vento, que bate na vela, é a força motora, ouseja, os músculos;

- o indivíduo, que dirige o movimento pelas suasconstantes reações em função do vento e do mar.corresponde ao sistema ligamentar.

O funcionamento do joelho está determinado, emtodo momento, pelas reações mútuas e equilibradas des­tes três fatores, superfícies articulares, músculos e liga­mentos em equilíbrio dinâmico trilateral.

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2. MEMBRO INFERIOR 157

LAT.INT.EXT

+-;;@Y

'@VUREC/RE(Suspensão)

(j) TA/R0(Direto)

// ""± ® TAlRE

++ + "\ +çj+ +

@ TP/R0 (Direto) IRes. VURE/EX (J)(Pivot Shift Reverse Test)Res VURE/FL

Res. VURI/FL @(Lateral Pivot Shift)Res. VURI/EX

Fig.2-245

DI

Fig.2-246

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158 FISIOLOGIA ARTICULAR

A articulação do tornozelo, ou tíbio-tarsia­na, é a articulação distal do membro inferior. Elaé uma tróclea, o que significa que possui só umgrau de liberdade. Ela condiciona os movimen­tos da perna com relação ao pé no plano sagital.Ela é necessária e indispensável para a marcha,tanto se esta se desenvolve em terreno planoquanto em terreno acidentado.

Trata-se de uma articulação muito "fecha-

da", muito encaixada, que tem limitações impor­tantes, visto que quando está em apoio monopo­daI suporta todo o peso do corpo, que pode in­clusive estar aumentado pela energia cinéticaquando o pé entra em contato com o chão a cer­ta velocidade durante a marcha, na corrida ou napreparação para o salto. É fácil imaginar a quan­tidade de problemas que têm que ser resolvidospara criar próteses tíbio-tarsianas totais, comcerta garantia de longevidade.

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2. MEMBRO INFERIOR 159

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160 FISIOLOGIA ARTICULAR

o COMPLEXO ARTICULAR DO PÉ

Na realidade, a tíbio-tarsiana é a articula­ção mais importante - "a rainha" como diriaFarabeuf - de todo o complexo articular daparte posterior do pé. Este conjunto de articu­lações, auxiliado pela rotação axial do joelho,tem as mesmas funções que uma articulaçãode três graus de liberdade sozinha, que permi­te orientar a abóbada plantar em todas as dire­ções para que esta se adapte aos acidentes doterreno. Novamente encontramos um parale­lismo com o membro superior, no qual as arti­culações do punho, auxiliadas pela pronação­supinação, permitem a orientação da mão emqualquer plano. Contudo, a amplitude destacapacidade de orientação é muito mais limita­da no pé do que na mão.

Os três eixos principais deste complexoarticular (fig. 3-1) se interrompem aproxima­damente na parte posterior do pé. Quando o péestá em posição de referência, estes três eixossão perpendiculares entre si; neste esquema aextensão do tornozelo modifica a orientaçãodo eixo Z.

O eixo transversal XX' passa pelos doismaléolos e corresp.onde ao eixo da articulaçãotíbio-tarsiana. De modo geral, ele está com­preendido no plano frontal e condiciona os mo­vimentos de flexão-extensão do pé (ver pág.162) que se realizam no plano sagital.

O eixo longitudinal da perna Y é verticale condiciona os movimentos de adução-abduçãodo pé, que se realizam no plano transversal. Jávimos (ver pág. 82) que estes movimentos sãopossíveis graças à rotação axial do joelho flexio­nado. Em uma medida menor, estes movimentosde adução-abdução se localizam nas articula­ções posteriores do tarso, embora sempre este­jam combinados com movimentos ao redor doterceiro eixo.

O eixo longitudinal do pé Z é horizontal epertence ao plano sagital. Condiciona a orienta­ção da planta do pé permitindo-lhe "orientar-se"tanto diretamente para baixo quanto para fora oupara dentro. Por analogia com o membro supe­rior, estes movimentos se denominam pronaçãoe supinação.

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Fig.3-1

2. MEMBRO INFERIOR 161

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162 FISIOLOGIA ARTICULAR

A FLEXÃO-EXTENSÃO

A posição de referência (fig. 3-2) é a que aplanta do pé está perpendicular ao eixo da perna(A). A partir desta posição, a flexão do tornozelo(B) é definida por ser o movimento que aproxi­ma o dorso do pé à face anterior da perna; tam­bém se denomina flexão dorsal ou dorsiflexão.

Pelo contrário, a extensão da articulaçãotíbio-tarsiana (C) afasta o dorso do pé da faceanterior da perna enquanto o pé tem a tendênciaa situar-se no prolongamento da perna. Este mo­vimento também se denomina flexão plantar,embora esta não seja a denominação mais ade­quada porque a flexão sempre corresponde a ummovimento que aproxima os segmentos dosmembros ao tronco. Nesta figura se pode com­provar que a amplitude da extensão é muitomaior do que a da flexão. Para medir estes ângu­los é melhor avaliar o ângulo entre a planta dopé e o eixo da perna (fig. 3-3) tomando como re­ferência o centro da articulação tíbio-tarsiana:

- quando este angulo é agudo (b), se tra­ta de uma flexão. Sua amplitude é de 20a 30°. A zona assombreada indica a

margem de variações individuais deamplitude, isto é de 10°;

- quando este ângulo é obtuso (c), pode­se afirmar que se trata de uma extensão.Sua amplitude é de 30 a 50°. A margemde variações individuais é maior (200)

que o da flexão.

Nos movimentos extremos não intervémsomente a tíbío-tarsiana. mas também se associa

a amplitude própria das articulações do tarso,que, sendo menos importante, não é desprezível.Na fiexão extrema (fig. 3-4) as articulações dotarso aumentam alguns graus (+), enquanto aabóbada se aplana. Pelo contrário. na extensãomáxima (fig. 3-5), a amplitude suplementar (+)provém de uma escavação da abóbada.

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2. MEMBRO INFERIOR 163

C'

Fig.3-3

C

Fig.3-2

(~ jJ)

),

) / I

A

Fig.3-4

c

A

B

A

+

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164 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES DA TÍBIO- TARSIANA(as legendas são comuns a todas as figuras)

Se compararmos a tíbio-tarsiana com ummodelo mecânico (fig. 3-6), ela pode ser descri­ta da maneira seguinte:

- uma peça inferior (A), o astrágalo ou ta­lo, que suporta uma superfície cilíndrica(em primeira aproximação) com umgrande eixo transversal XX';

- uma peça superior (B), a porção inferiorda tíbia e a fíbula, que formam um blo­co - aqui supostamente transparente ­cuja superfície inferior apresenta umorifício em forma de segmento cilíndri­co idêntico ao anterior.

O cilindro maciço, encaixado no segmentode cilindro oco, e mantido lateralmente entre osdois flancos da peça superior, pode realizar mo­vimentos de fiexão (F) e de extensão (E) ao re­dor do eixo comum XX'.

Na realidade anatõmica (fig. 3-7, vista ân­tero-interna da tíbio-tarsiana "desmontada" e

figo3-8, idem, vista póstero-externa), o cilindromaciço corresponde à polia astragaliana com­posta de três partes: uma superfície superior eduas superfícies laterais, as faces articulares.

A superfície superior, a polia propria­mente dita, convexa de diante para trás, marca­da longitudinalmente por uma depressão axial,a "garganta" da polia (1), para a qual conver­gem a vertente interna (2) e a vertente externa(3) da tróc1ea. Como pode constatar-se em vis­ta superior (fig. 3-9), esta "garganta" não é es­tritamente sagital, mas sim ligeiramente desvia­da para diante e para fora (seta Z), na mesma di­reção do eixo longitudinal do pé, enquanto ocolo do astrágalo se dirige para diante e paradentro (seta T) de forma que o astrágalo estátorcido sobre si mesmo. Esta vista superior tam­bém mostra que a tróc1ea é mais larga (L) paradiante que para trás (1). Esta superfície troc1earcorresponde a uma superfície inversamenteconformada, situada na superfície inferior dopilão tibial (figs. 3-7 e 3-8): côncava de diante

para trás (fig. 3-12, corte sagital, vista externa),apresenta uma crista romba sagital (4) que se in­troduz na "garganta" da tróclea (fig. 3-11, cortefrontal, vista anterior). A cada lado, um "sulco"interno (5) e outro externo (6) recebem as res­pectivas vertentes da polia.

A face interna (7), visível em vista inter­na do astrágalo (fig. 3-10), é praticamente pla­na - salvo adiante, onde se desvia para dentro(fig. 3-7) - e sagital (fig. 3-9). Toca a face ar­ticular (8) da superfície externa do maléolo in­terno (9), recoberta com uma cartilagem queprolonga a da superfície inferior do pilão tibial.Entre estas duas superfícies, o ângulo diedro(10) recebe a aresta aguda (11) que separa avertente e face articular internas da polia.

A face externa (12) está fortemente desviadapara fora (fig. 3-8), côncava tanto de cima para bai­xo (fig. 3-11) quanto de diante para trás (fig. 3-9);seu "plano" é ligeiramente oblíquo para diante epara fora. Entra em contato com a face articular(13) da face interna (fig. 3-7) do maléolo fibular(14). Esta face está separada da superfície tíbial pe­la interlinha tíbio-fibular inferior (15), ocupada poruma faixa sinovial (16) (ver pág. 174) em contatocom a aresta (17) que separa a vertente e face arti­cular externas da tróclea. Esta aresta está biselada

para diante (18) e para trás (19) (ver pág. 172).

Portanto, as duas faces laterais da polia doastrágalo estão mantidas pelos maléolos, cujasdiferenças são:

- a externa é mais volumosa do que a in­terna;

- desce mais para baixo (m, figo3-11):

- é mais posterior (fig. 3-9), o que explicaa ligeira obliqüidade (20°) para fora epara trás do eixo XX'.

Também se descreve como terceiro maléo­10 de Destot (fig. 3-12) a margem posterior dasuperfície tibial (20) que desce mais abaixo (p)que a margem anterior.

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27

13

21

Fig.3-11

5

Fig.3-10

2. MEMBRO INFERIOR 165

6514

Fig.3-12

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166 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DA TÍBIO- TARSIANA(estas quatro figuras se baseiam em Rouviere; as explicações são comuns a todas elas e às da página anterior)

Os ligamentos da articulação tíbio-tarsianase compõem de dois sistemas ligamentares prin­cipais, os ligamentos laterais externo e interno, edois sistemas acessórios, os ligamentos anteriore posterior.

Os ligamentos laterais formam, a cada la­do da articulação, leques fibrosos potentes cujovértice se fixa no maléolo correspondente, pertodo eixo XX', e cuja periferia se expande pelosdois ossos do tarso posterior:

O ligamento lateral externo (LLE) (fig.3-13, vista externa) é formado por três fascícu­los, dois deles se dirigem para o astrágalo e ooutro para o calcâneo:

- o fascículo anterior (21), fixado na mar­gem anterior do maléolo fibular (14), sedirige obliquamente para baixo e paradiante para inserir-se no astrágalo, entre aface articular externa e a abertura do seiodo tarso;

- o fascículo médio (22) se inicia nas pro­ximidades do ponto mais proeminentedo maléolo para dirigir-se para baixo epara trás e inserir-se na face externa docalcâneo. O ligamento astrágalo-calcâ­neo externo (32) percorre toda a suamargem inferior;

- o fascículo posterior (23) se origina naface interna do maléolo (ver figo3-7), de­trás da face articular, para dirigir-se hori­zontalmente para dentro e ligeiramentepara trás e inserir-se no tubérculo póstero­externo do astrágalo (37). Sua posição edireção fazem com que seja mais visívelno plano posterior (fig. 3-14). Prolonga-seatravés de um pequeno ligamento deno­minado astrágalo-calcâneo posterior (31).

Do maléolo externo saem também os dois

ligamentos tíbio-fibulares inferiores (figs. 3-14 e3-15): o anterior (27) e o posterior (28), cujafunção será analisada mais adiante.

O ligamento lateral interno (LLI) (fig.

3-16, vista interna) se divide em dois planos,superficial e profundo.

- O plano profundo é formado por doisfascículos astrágalo-tibiais:

- fascículo anterior (25), oblíquo parabaixo e para diante, se' insere no ramointerno do jugo astragaliano;

- o fasclculo posterior (24), oblíquopara baixo e para trás, se insere numafosseta profunda (fig. 3-10) localiza­da debaixo da face articular interna;suas fibras mais posteriores se fixamno tubérculo póstero-interno (39).

- O plano superficial, muito extenso etriangular, fonna o ligamento deltóide(26). Recobrindo os fascículos profun­dos, na vista anterior (fig. 3-15), foi ne­cessário seccionar e separar o ligamentodeltóide para poder ver o fascículo pro­fundo anterior (25); e na vista interna (fig.3-16) foi representado transparente. Apartir da sua origem tíbial (36), se expan­de por uma linha de inserção inferior con­tínua sobre o escafóide (33), a margeminterna (34) do ligamento glenóide e oprocesso medial da tuberosidade do cal­câneo (35). Assim, o ligamento deltóide,como no caso do fascículo médio doLLE, não tem inserção no astrágalo, daíos clássicos o denominarem tíbio-esca­fo glenosustentacular transastragaliano.

Os ligamentos anterior (fig. 3-15, vista an­terior) e posterior (fig. 3-14, vista posterior) da tí­bio-tarsiana são simples espessamentos capsula­res. O anterior (29) une obliquamente a margemanterior da superfície tibia1e o ramo da bifurcaçãoposterior do jugo astragaliano (fig. 3-13). O poste­rior (30) é formado por fibras de origem tíbial e fi­bular que convergem para o tubérculo póstero-in­temo do astrágalo (39), formando, com o tubércu­lo póstero-externo (37), os limites do sulco pro­fundo do flexor do hálux (38). Pode-se ver comose prolonga na face inferior do sustentáculo.

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2. MEMBRO INFERIOR 167

143723X

312232

Fig.3-13

39

38

37

Fig.3-14

Fig.3-16Fig.3-15

27~ I~

3614 . '/~~IJ .I1tl/klIJJli, , Mil 29

26

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168 FISIOLOGIA ARTICULAR

ESTABILIDADE ÂNTERO-POSTERIOR DO TORNOZELOE FATORES LIMITANTES DA FLEXÃO-EXTENSÃO

A amplitude dos movimentos de flexão-ex­tensão está, principalmente, determinada pelo desen­volvimento das superfícies articulares (fig. 3-17). Sa­bendo-se que a superfície tibial tem um desenvolvi­mento de 70° de arco e que a polia do astrágalo seestende de 140 a 150°, se pode deduzir, por umasimples subtração, que a amplitude global da fie­xão-extensão é de 70 a 80°. Também se pode cons­tatar que o desenvolvimento da polia é maior paratrás que para diante, o que explica o predomínio daextensão sobre a fiexão.

A limitação da flexão (fig. 3-18) depende defatores ósseos, cápsulo-ligamentares e musculares:

- fatores ósseos: na fiexão máxima, a facesuperior do colo do astrágalo embate (1)contra a margem anterior da superfície ti­bial. Se o movimento é muito forçado, ocolo pode inclusive sofrer uma fratura. Aoser deslocada (2) pela tensão dos fiexores, aparte anterior da cápsula está protegida dopinçamento, graças às aderências que elacontrai com as bainhas dos fiexores;

- fatores cápsulo-ligamentares: a parteposterior da cápsula se contrai (3), assimcomo os fascículos posteriores dos liga­mentos laterais (4);

- fator muscular: a resistência tônica do mús­

culo tríceps (5) intervém antes que os fatoresanteriores. Portanto, uma retração muscularpode limitar prematuramente a fiexão; o tor­nozelo pode, inclusive, permanecer em ex­tensão (pé eqüino); neste caso, se pode recor­rer a uma intervenção cirúrgica para o alon­gamento do tendão de Aquiles.

A limitação da extensão (fig. 3-19) tem a vercom fatores idênticos:

- fatores ósseos: os tubérculos posteriores doastrágalo, principalmente o externo, entramem contato (1) com a margem posterior dasuperfície tibial. Apesar de serem raras,também existem fraturas do tubérculo exter­no por hiperextensão, mas muitas vezes otubérculo externo é isolado anatomicamen­

te do astrágalo, formando o osso trígono. Acápsula está protegida do pinçamento (2)por um mecanismo análogo ao da fiexão;

- fatores cápsulo-ligamentares: a parte ante­rior da cápsula se contrai (3) assim como osfascículos anteriores dos ligamentos laterais.

- fator muscular: a resistência tônica dos

músculos fiexores (5) limita em primeirolugar a extensão. A hipertonia dos fiexoresprovoca uma fiexão permanente (pé talo).

A estabilidade ântero-posterior da tíbio-tar­siana e sua coaptação (fig. 3-20) estão asseguradaspela ação da gravidade (1) que o astrágalo aplica so­bre a superfície tibial cujas margens anterior (2) eposterior (3) representam barreiras que impedemque a polia escape para diante ou, com muito maiorfreqüência, para trás quando o pé estendido entra emcontato com o chão com muita força. Os ligamentoslaterais (4) asseguram a coaptação passiva e todosos músculos (não representados aqui) agem comocoaptadores ativos sobre uma articulação intata.

Quando os movimentos de fiexão-extensão ul­trapassam a amplitude permitida, um dos elementosdeve necessariamente ceder. Assim, a hiperexten­são pode provocar uma luxação posterior (fig. 3-21)com uma ruptura cápsulo-ligamentar mais ou menoscompleta, ou uma fratura da margem posterior (fig.3-22), ou terceiro maléolo, provocando uma subluxa­ção posterior. A deformação pode reproduzir-se in­clusive após uma redução correta (deformação in­coercível) se o fragmento marginal supera em de­senvolvimento o terço da superfície tibial. Neste ca­so, será necessário fixá-lo cirurgicamente (coloca­ção de um parafuso). A hiperflexão também podeprovocar uma luxação anterior (fig. 3-23), ou umafratura da margem anterior (fig. 3-24).

Na entorse do ligamento lateral externo, o fas­cículo anterior (fig. 3-25) é o primeiro a entrar emjogo: em primeiro lugar, no caso de entorse benig­na estará simplesmente "alongado", mas se rompenas entorses graves. Então é possível observar umagaveta anterior, clinicamente ou, sobretudo, ra­diologicamente: o astrágalo se desloca para diantee os dois arcos de círculo da polia do astrágalo e doteto da mortalha tibial não são concêntricos; quan­do os centros da curvatura estão deslocados maisde 4-5 mm, existe uma ruptura do fascículo anteriordo LLE.

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5

Fig.3-21

Fig.3-17

Fig.3-19

2. MEMBRO INFERIOR 169

Fig.3-23

Fig.3-25

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170 FISIOLOGIA ARTICuLAR

ESTABILIDADE TRANSVERSAL DA TÍBIO- TARSIANA

A tíbio-tarsiana é uma articulação com sóum grau de liberdade, visto que sua própria estm­tura lhe impede qualquer movimento ao redor deum dos seus outros dois eixos. Esta estabilidadese deve a um estreito encaixamento, verdadeiraunião entre espigão e mortalha: o espigão do as­trágalo está fixado na mortalha tíbio-fibular (fig.3-26). Cada ramo da pinça bimaleolar fixa late­ralmente o astrágalo, com a condição de que a se­paração entre o maléolo externo (A) e o interno(B) permaneça inalterado. Isto supõe, além da in­tegridade dos maléolos, a dos ligamentos tíbio-fi­bulares inferiores (1). Além disso, os poderososligamentos laterais externo (2) e interno (3) impe­dem qualquer movimento de balanço do astrága­10 sobre o seu eixo longitudinal.

Quando um movimento forçado de abduçãodirige o pé para fora, a face articular externa do as­trágalo exerce uma pressão sobre o maléolo fibular.Podem ocorrer então várias possibilidades:

- a pinça bimaleolar se desloca (fig. 3-27)por mptura dos ligamentos tíbio-fibularesinferiores (1): assim aparece a diástaseintertíbio-fibular. O astrágalo não maisestá mantido e pode realizar movimentosde lateralidade (oscilação astragaliana);também pode realizar (fig. 3-28) uma ro­tação sobre o seu eixo longitudinal (incli­nação ou "alojamento"), favorecida poruma entorse do LLI (3) - neste caso. oligamento sofreu somente um alonga­mento: se trata de uma entorse benigna-; por último, pode girar (fig. 3-33) aoredor do seu eixo vertical (seta Abd), en­quanto a parte posterior da polia faz sal­tar a margem posterior (seta 2),

- se o movimento vai mais longe (fig. 3­32), o LU se rompe (3): se trata da entor­se grave do LU associada à diástase in­tertíbio- fibular;

- ou então o maléolo interno (B) cede (fig.3-30) ao mesmo tempo que o externo (A)por cima dos ligamentos tíbio-fibularesinferiores (1). Assim se produz uma fra­tura de Dupuytren "alta". Às vezes, alinha de fratura fibular está situada muito

mais acima, no colo: se trata da fratura deMaisonneuve, não representada aqui;

- muitas vezes, os ligamentos tíbio- fibularesinferiores resistem (fig. 3-29), ou pelo me­nos o anterior. A fratura do maléolo inter­

no (B) se associa a uma fratura do maléo­10 externo para baixo ou através da arti­culação tloio-fibular inferior. Fala-se en­tão de uma fratura de Dupuytren "bai­xa" ou dê um dos seus equivalentes quan­do a ruptura do LU (3) substitui a fraturado maléolo interno (fig. 3-31). As fraturas"baixas" de Dupuytren se associam amiú­de a uma fratura da margem posterior comdesprendimento de um terceiro fragmentoposterior que pode formar um bloco como fragmento maleolar interno.

Junto com estes deslocamentos da pinça ma­leolar produzidas por um movimento de abdução,podem observar-se fraturas bimaleolares poradução (fig. 3-34): a ponta do pé, dirigida paradentro, faz com que o astrágalo gire (fig. 3-33) aoredor do seu eixo vertical (seta Adu), a face arti­cular interna faz saltar (seta 3) o maléolo interno(B) e a basculação do astrágalo quebra o maléoloexterno (A) no nível do pilão tibial.

Contudo, muitas vezes o movimento de adu­ção ou de inversão não provoca uma fratura, massim uma entorse do ligamento lateral externo. Fe­lizmente, na maior parte dos casos, a entorse é be­nigna, visto que o ligamento está distendido, porémnão quebrado. Pelo contrário, no caso de uma entor­se grave, com ruptura do ligamento lateral externo,a estabilidade da tíbio-tarsiana está comprometida.Numa radiografia anterior do tornozelo em inver­são forçada (se é necessário, sob anestesia local) sepode constatar (fig. 3-35) uma basculação do as­trágalo: ambas as linhas da interlinha superior, emvez de estar paralelas, formam um ângulo aberto pa­ra fora superior aos 10-12°. De fato, alguns tornoze­los são hiperlaxos e é necessário realizar uma radio­grafia comparativa do tornozelo sadio.

Não é necessário afirmar que todas estas le­sões da pinça bimaleolar exigem uma correçãoestrita se desejarmos restabelecer a estabilidadeda articulação e o seu funcionamento normal.

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A

Fig.3-28

Adu

2. MEMBRO INFERIOR 171

Fig.3-32

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172 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS ARTICULAÇÕES TÍBIO-FIBULARES

A tíbia e a fíbula se articulam pelas suasduas extremidades no nível das articulações tí­bio-fibulares superior (figs. 3-36 a 3-38) e infe­rior (figs. 3-39 a 3-41). Como se poderá ver napágina seguinte, estas articulações estão meca­nicamente comprometidas com a tíbio-tarsia­na: portanto, é lógico fazer a sua análise paratratar o tornozelo.

A articulação tíbio-fibular superior po­de ver-se claramente (fig. 3-36) quando se des­loca a fíbula após a secção do seu ligamentoanterior (1) e a expansão anterior (2) do tendãodo bíceps (3). Assim sendo, a articulação seabre ao redor da charneira formada pelo liga­mento posterior (4): a tíbio-fibular superior éuma artródia que põe em contato duas superfí­cies ovais planas ou ligeiramente convexas. Aface articular tibial (5) se localiza no contornopóstero-externo do platô tibial; está orientadaobliquamente para trás, para baixo e para fora(seta). A face articular fibular (6) se localiza naface superior da cabeça da fíbula. A sua orien­tação é oposta à da face articular tibia!. Ela es­tá localizada por baixo do processo estilóide dafíbula (7) no qual se insere o tendão do bícepscrural (3). O ligamento lateral externo do joelho(8) se insere entre o bíceps e a face articular.Uma vista externa (fig. 3-37) mostra a posiçãoposterior da cabeça da fíbula na articulação.Também se pode observar o ligamento anterior(1) da tíbio-fibular, curto e retangular, assimcomo a espessa expansão do bíceps (2), que seinsere na tuberosidade externa da tíbia. Umavista posterior (fig. 3~38) mostra as estreitasconexões do músculo poplíteo (9) com a articu­lação tíbio-fibular superior, enquanto se deslizasobre seu ligamento posterior (4).

Com a abertura semelhante, a articulação tí­bio-fibular inferior (fig. 3-39) revela a ausênciade superfícies cartilaginosas: portanto, se trata deuma sindesmose. Na tíbia, uma superfície cônca­va (1) mais ou menos rugosa, delimitada pela bi­furcação da margem externa do osso, se opõe auma superfície fibular (2) convexa, plana ou inclu­sive côncava, debáixo da qual se localiza a face ar­ticular fibular (3) da tíbio-tarsiana, flanqueada pe­la inserção do fascícuio posterior (4) do LLE. O li­gamento anterior (5) da tíbio-fibular inferior, es­pesso e nacarado, se dirige obliquamente para bai­xo e para fora (fig. 3-40, vista anterior); sua mar­gem inferior ocupa o ângulo externo da mortalha;de forma que bisela (seta dupla) a parte anterior daaresta externa da polia do astrágalo nos movimen­tos de flexão do tornozelo. O ligamento posterior(6), mais espesso e mais largo (fig. 3-41, vista pos­terior), se expande, muito longe, para o maléolointerno. Pelo mesmo mecanismo, ele faz chanfra­dura sobre a parte posterior da mesma aresta du­rante os movimentos de extensão do tornozelo.

Além dos ligamentos tíbio-fibulares, osdois ossos da perna estão unidos pelo ligamen­to interósseo, que se insere na margem externada tíbia e na face interna da fíbula (traço ponti­lhado grosso nas figs. 3-36 e 3-39).

A tíbio-fibular inferior não coloca os dois

ossos em contato direto: permanecem separadospor um tecido celular adiposo e este espaço se po­de ver numa radiografia anterior (frontal) correta­mente centrada do tornozelo (fig. 3-42). Normal­mente, a projeção da fíbula (c) penetra mais(8 mm) no tubérculo tibial anterior (a) do que asua separação (2 mm) do tubérculo posterior (b).Se a distância cb é maior do que a distância ac,podemos falar de diástase intertibio-fibular.

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5

3

5

2

6

Fig.3-39

a c b

Fig.3-42

2. :\1EMBRO INFERIOR 173

3

2

1

Fig.3-37

1

5

6

Fig.3-41

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174 FISIOLOGIA ARTICULAR

FISIOLOGIA DAS ARTICULAÇÕES TÍBIO-FIBULARES

A flexão-extensão da tíbio-tarsiana provocaautomaticamente a entrada em jogo das duas arti­culações tíbio-fibulares: elas estão mecanicamen­te unidas.

A articulação tíbio-fibular inferior é a pri­meira interessada. O seu funcionamento foi escla­

recido perfeitamente por Pol Le Coeur. Em primei­ro lugar, a forma da polia do astrágalo (fig. 3-43,vista superior) permite deduzir que a face articulartibial interna (Ti) é sagital, enquanto a externa, fi­bular (Fi), pertence a um plano oblíquo para dian­te e para fora. Por conseguinte, a largura da polia émenor para trás (aa') que para diante (bb'): a dife­rença é de 5 mm. Para manter as duas faces articu­lares da polia estreitamente ligadas, a separaçãointermaleolar deve variar dentro de certos limi­tes: mínimo na extensão (fig. 3-44, vista inferior),máximo na flexão (fig. 3-45). No cadáver, se podedeterminar a extensão do tornozelo apenas compri­mindo os maléolos com força e no sentido trans­versal.

Além disso, se pode constatar numa prepara­ção anatõmica (figs. 3-44 e 3-45) que este movi­mento de separação e de aproximação dos maléo­los se acompanha de uma rotação axial do ma­léolo externo, às vezes fazendo de charneira o li­gamento tíbio-fibular anterior (1). Esta rotação éfacilmente posta em evidência por uma haste queatravessa o maléolo externo em sentido horizon­

tal: entre sua posição na extensão (nn', figo 3-44)e sua posição na flexão (mm', figo 3-45) existeuma diferença de 30° em rotação interna. Simul­taneamente, o ligamento tíbio-fibular posterior(2) se contrai. Contudo, esta rotação axial do ma­léÇ>loexterno é mais limitada no ser vivo, sem dei­xar de estar presente. Por outra parte, a faixa sino­vial (f) da articulação se desloca: desce (1) quan­do os maléolos se aproximam na extensão (fig. 3­46) e sobe (2) na flexão (fig. 3-47).

Finalmente, a fíbula realiza movimentos ver­ticais (figs. 3-48 e 3-49, a fíbula aparece representa­da como uma régua). De fato, unido à tíbia pelas fi­bras oblíquas para baixo e para fora da membranainteróssea (para melhor compreensão só aparece odesenho de uma fibra), a fíbula, separando-se da tí­bia (fig. 3-49), sobe ligeiramente, enquanto descequando se aproxima dela (fig. 3-48). Para concluir:

Durante a flexão do tornozelo (fig. 3-50):

- o maléo10 externo se afasta do interno(seta 1);

- simultaneamente, ele sobe ligeiramente (se­ta 2), enquanto as fibras dos ligamentos tí­bio-fibulares e da membrana interóssea têma tendência a tornar-se horizontais (xx');

- finalmente, ele gira sobre si mesmo nosentido da.rotação interna (seta 3).

Durante a extensão do tornozelo (fig. 3-51),acontece o contrário ..

- aproximação do maléolo externo ao inter­no (seta 1). Este movimento é ativo: a con­tração do tíbial posterior (TP), cujas fibrasse inserem nos dois ossos, fecha a pinçabimaleolar (fig. 3-52, secção do lado direi­to, fragmento inferior, as setas correspon­dem à contração das fibras do TP). Assim,a polia do astrágalo está bem fixa seja qualfor o grau de flexão-extensão do tornozelo;

- descenso do maléolo externo (seta 2) comverticalização das fibras ligamentares (yy');

-ligeira rotação externa do maléolo externo(seta 3).

A articulação tíbio-fibular superior recebe ocontragolpe dos movimentos do maléolo externo:

- durante a flexão do tornozelo (fig. 3-50) aface articular fibular se desliza para cima e ainterlinha se entreabre para baixo (separaçãodos maléolos) e para trás (rotação interna);

- durante a extensão do tornozelo (fig. 3-51)se podem observar os movimentos inversos.

Estes deslocamentos são muito leves, porémexistem: a melhor prova é que, através da evolução,a articulação tíbio-fibular superior ainda não estásoldada.

Assim, pelo jogo das articulações tíbio-fibula­res, dos ligamentos e do tíbial posterior, a pinçabimaleolar se adapta permanentemente às variaçõesde largura e de curvatura da polia do astrágalo, asse­gurando a estabilidade transversal da articulação tí­bio-tarsiana. Entre outras razões, para não compro­meter esta adaptabilidade se abandonou a fixaçãocom pregos no tratamento da diástase tíbio-fibular.

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2. MEMBRO INFERIOR 175

x

Fig.3-50 Fig.3-435mm

Fig.3-51

Fig.3-48Fig.3-49

Fig.3-47Fig.3-45

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176 FISIOLOGIA ARTICULAR

As articulações do pé são numerosas ecomplexas; elas unem os ossos do tarso entre sie com os do metatarso. São elas:

- - a articulação astrágalo-ca1cânea, tam­bém denominada subastragaliana;

- a articulação médio-tarsiana ou deChopart;

--a articulação tarso-metatarsiana ou deLisfranc;

- e as articulações escafocubóide e esca­focuneais.

Estas articulações têm uma dupla função:

- Em primeiro lugar, orientam o pé comrelação aos outros dois eixos (visto quea orientação no plano sagital correspon­de à tíbio-tarsiana) para que o pé possaorientar-se corretamente no chão, seja

qual for a posição da perna e a inclina­ção do terreno.

- Em segundo lugar, modificam tanto aforma quanto a curvatura da abóbadaplantar para que o pé possa adaptar-se àsdesigualdades do terreno e, desta manei­ra, criar entre o chão e a perna, transmi­tindo o peso do corpo, um sistema amor­tecedor que concede elasticidade e flexi­bilidade ao passo.

Portanto, o papel que desempenham estasarticulações é fundamental. Pelo contrário,as articulações dos dedos, metatarsofalangea­nas e interfalangeanas, são muito menos im­portantes do que suas equivalentes na mão.

Porém, uma delas desempenha um papelessencial no desenvolvimento do passo: a arti­culação metatarsofalangeana do hálux.

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2. MEMBRO INFERIOR 177

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178 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO LONGITUDINALE DE LATERALIDADE DO PÉ

Além dos movimentos de flexão-extensão,localizados, como já vimos, na tíbio-tarsiana, opé também pode realizar movimentos ao redor doeixo vertical da perna (eixo Y, pág. 160) e do seueixo longitudinal e vertical (eixo 2).

Ao redor do eixo vertical Y se realizam os

movimentos de adução-abdução, no plano hori­zontal.

- adução (fig. 4-2): quando a ponta do pése dirige para dentro, para o plano de si­metria do corpo;

- abdução (fig. 4-3): quando a ponta do pése dirige para fora e se afasta do plano desimetria.

A amplitude total dos movimentos de adução­abdução realizados no pé é apenas de 35° (Roud) a45°. Contudo, estes movimentos da ponta do pé noplano horizontal podem ser produto da rotação ex­terna-interna da perna Goelho flexionado) ou da ro­tação de todo o membro inferior a partir do quadrilGoelho estendido). Neste caso, os movimentos deadução-abdução são muito mais amplos e podematingir até 90°, nas bailarinas clássicas.

Ao redor do eixo longitudinal Z, o pé girade tal forma que a planta se orienta:

- para dentro (fig. 4-4): por analogia como membro superior, este movimento sedefine como uma supinação;

- para fora (fig. 4-5), e então se denominapronação.

A amplitude da supinação 52° (Biesalski eMayer, 1916) é maior do que a da pronação 25-30°.

Acabamos de definir por abdução-adução epronação-supinação movimentos que, em reali­dade, não existem em estado puro nas articula­ções do pé. De fato, se poderá constatar que es­tas articulações estão configuradas de tal formaque um movimento num dos planos se acom­panha, obrigatoriamente, por mn movimentonos outros dois planos. Desta forma, a adução seacompanha necessariamente (figs. 4-2 e 4-4) deuma supinação e uma ligeira extensão. Estestrês componentes caracterizam a posição deno­minada inversão. Se a extensão se anula poruma flexão equivalente do tornozelo, se obtém aatitude denominada varo. Por último, se uma ro­tação externa do joelho compensa a adução, en­tão só se pode observar um movimento aparen­temente puro de supinação.

No outro sentido (figs. 4-3 e 4-5), a abdu­ção se acompanha necessariamente da prona­ção e da flexão: se trata da posição de eversão.Se a flexão se anula por uma extensão equiva­lente do tornozelo (nas figuras está hipercom­pensada em extensão), se obtém a atitude deno­minada valgo. Por outro lado, se uma rotaçãointerna do joelho oculta a abdução, se pode ob­servar um movimento aparentemente puro depronação.

Deste modo, salvo compensações à distân­cia das articulações do pé, a adução jamais sepoderá associar com uma pronação e, vice-ver­sa, a abdução jamais se poderá associar comuma supinação. Assim, existem combinaçõesproibidas pela própria configuração das articu­lações do pé.

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Fig.4-2

V \1..

Fig.4-4

\

Fig.4-5

2. MEMBRO INFERIOR 179

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180 FISIOLOGIA ARTIClJLAR

AS SUPERFÍCIES ARTICULARES DA SUBASTRAGALIANA(as explicações são comuns a todas as figuras)

o astrágalo se articula pela sua face inferior(A, figo4-6, se separaram os dois ossos e o astrá­galo foi deslocado ao redor do eixo XX' de mo­do que forma uma charneira) com a face supe­rior do calcâneo (B, figo4-6). Estes dois ossosentram em contato, cada um deles, através deduas superfícies articulares, constituindo o quese denomina articulação subastragaliana:

- a superfície posterior do astrágalo (a) seadapta à superfície maior (a') localizadana face superior do calcâneo: é o tálamode Destot. Estas duas superfícies estãounidas entre si por ligamentos e umacápsula que fazem delas uma articula­ção anatomicamente autônoma;

- a superfície menor (b), localizada na faceinferior do colo e da cabeça do astrágalo,descansa na superfície anterior do calcâ­neo (b'), alongada em sentido oblíquo emantida pelas apófises maior e menor.Estas superfícies, a astragaliana e a calcâ­nea, pertencem anatomicamente a umaarticulação mais ampla que inclui, tam­bém, a face posterior do escafóide (d') eque constitui com a cabeça do astrágalo(d) a parte interna da articulação médio­tarsiana, ou interlinha de Chopart.

Antes de introduzir o funcionamento destas

articulações, é indispensável compreender a for­ma das suas superfícies. Trata-se de artródias:

- o tálamo (a') é uma superfície oval, comum grande eixo oblíquo para diante epara fora, convexa ao longo de todo oeixo (fig. 4-7, vista externa e 4-8, vistainterna) e retilínea ou ligeiramente côn­cava em sentido perpendicular. Portan­to, se pode comparar com um segmentocilíndrico (f) cujo eixo seria oblíquo detrás para diante, de fora para dentro e li­geiramente de cima para baixo. A super­fície astragaliana (a) oposta à anterior

também possui esta forma cilíndrica,..com o mesmo ralO e o mesmo eIXO,po-rém se trata de um segmento de cilindrooco (fig. 4-7), enquanto o tálamo é umsegmento de cilindro compacto (sólido);

- globalmente, a cabeça do astrágalo é es­férica e os planos que possui podem serconsiderados como faces articulares ta­

lhadas sobre uma esfera (linha traceja­da) de centro g (fig. 4-6). De fato, a su­perfície anterior do calcâneo (b') é côn­cava em ambos os sentidos, enquanto asuperfície astragaliana (b), que se opõea ela, é convexa nos seus dois sentidoscom os mesmos raios de curvatura. Com

freqüência, a superfície calcânea estápinçada na sua parte central, como sefosse uma palmilha de sapato (fig. 4-6)e inclusive, às vezes, se subdivide emduas faces articulares (figs. 4-7 e 4-8),uma (b') mantida pelo processo me­dial da apófise e outra (b') pelo pro­cesso lateral da apófise do calcâneo.Constatou-se que a estabilidade do cal­câneo é proporcional à superfície destaúltima face articular. No astrágalo sepode observar esta subdivisão (b1 e bJ

A superfície calcânea (b' ou b'l+ b'z) for­ma parte de uma superfície esférica oca maisampla que inclui a superfície posterior (d') doescafóide e a parte superior do ligamento glenói­de (c'), que se estende entre as duas superfícies.Estas superfícies formam uma cavidade de re­cepção esférica para a cabeça do astrágalo, como ligamento deltóide (5) e a cápsula. Na cabeçado astrágalo se encontram as faces articularescorrespondentes: a maior parte da superfície (d)corresponde ao escafóide; entre esta superfície(d) e a face articular calcânea (b) se interpõe umcampo triangular (c) de base interna que corres­ponde ao ligamento glenóide (c').

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2

A

x

Fig.4-6Xl B

Fig.4-7

2. MEMBRO INFERIOR 181

6

91

Fig.4-8

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182 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONGRUÊNCIA E INCONGRUÊNCIA DA SUBASTRAGALIANA

A descrição da página anterior permitecompreender a disposição e a correspondênciadas superfícies articulares, porém não permitecaptar a sua forma tão específica de funcionar.De forma que para poder entender o seu fun­cionamento é necessário aprofundar na descri­ção das superfícies da articulação astrágalo­calcânea anterior representada aberta na figura(figs. 4-9 e 4-10), o astrágalo, situado como sefosse as páginas de um livro que passam emtomo a um eixo ântero-posterior, visto pela suaface inferior, enquanto a parte anterior do cal­câneo (fig. 4-10) se observa pela sua face supe­rior (as explicações são comuns a todas as figu­ras desta página, porém não se correspondemcom as da página anterior).

Sobre a face inferior do colo do astrágalo(fig. 4-9), a face articular (b) corresponde à facearticular (b') localizada na face superior do cal­câneo (fig. 4-10), no nível da apófise menor doca1câneo. Na cabeça do astrágalo (fig. 4-9) se en­contram de novo o campo escafóide (e) e o cam­po glenóide (g). Contudo, a porção cartilaginosalocalizada por fora do campo glenóide é subdivi­dida em três faces articulares: de dentro para fo­ra (cl' c2 e c3), que correspondem globalmente àface aI1icular situada na face superior da apófisemaior do ca1câneo (fig. 4-10), por sua vez subdi­vidida em duas faces articulares: de fora paradentro (C'I e c'J Por trás, se encontram as duassuperfícies da articulação astrágalo-ca1cânea pos­terior: o tálamo (a') e a superfície inferior do cor­po do astrágalo.

Existe apenas uma posição de congruên­cia da subastragaliana: a posição média. O péé alinhado com o astrágalo, isto é, sem inversãonem eversão, esta é a posição adotada por um pénormal (nem chato, nem cavo) com o indivíduode pé sobre um plano horizontal, em posição dedescanso, com apoio simétrico. Assim, as super­fícies articulares da subastragaliana posteriorsão completamente correspondentes, a face arti­cular (b) do colo do astrágalo descansa sobre aface articular (b') da apófise menor do calcâneo

e a face articular média (cz) da cabeça do astrá­galo descansa na face articular horizontal (C'I)da apófise maior. Esta posição de alinhamentoem que as superfícies se adaptam umas às outraspela ação da gravidade e não pelos ligamentos,além de ser estável, pode ser mantida durantemuito tempo graças à congruência. Todas as ou­tras posições são instáveis e provocam uma in­congruência mais ou menos acentuada.

No movimento de eversão, a extremidadeanterior do calcâneo (fig. 4-11, vista superiordo lado direito. o astrágalo se supõe transparen­te) se desloca para fora e tem a tendência a"deitar-se" (fig. 4-12, vista anterior) sobre a suaface interna. Neste movimento, as duas facesarticulares (b e b') permanecem em contato, deforma que constituem um pivô, enquanto a su­perfície subastragaliana (a) se desliza para bai­xo e para diante sobre o tálamo (a') fazendo im­pacto com o soalho do seio do tarso; a partepóstero-superior do tálamo fica "descoberta".Pela frente, a pequena face articular astragaliana(c) se desliza até entrar em contato (fig. 4-12)com a face articular oblíqua (c'z) do calcâneo.Por este motivo. estas duas faces articulares (cz>e (c') podem denominar-se "faces articularesde eversão".

Durante o movimento de inversão, o cal­câneo se desloca ao inverso: a extremidade an­

terior para dentro (fig. 4-13) e tem a tendênciade "deitar-se" sobre a sua face externa (fig. 4­14). As duas faces articulares-pivô permane­cem em contato entre si; a grande superfíciesubastragaliana (a) se desloca sobre o tálamo(a') deixando descoberta a sua parte ântero-in­ferior; pela frente, a face articular de inversão(c) do astrágalo repousa sobre a face articularhorizontal (c') do processo lateral da apófise doca1câneo (fig. 4-14).

Portanto, estas duas posições são evidente­mente instáveis, incongruentes, de forma quesolicitam ao máximo os ligamentos. Elas so­mente podem ser transitórias.

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2. MEMBRO INFERIOR 183

b'

a'

Fig.4-10

a

Fig.4-9

e

a

a'

Fig.4-11

a'

a

Fig.4-13

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184 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ASTRÁGALO, UM OSSO SINGULAR

N a estrutura da parte posterior do tarso, oastrágalo é um osso singular desde três pontosde vista:

Em primeiro lugar, se localiza no pontomais proeminente da parte posterior do tarso, éo osso que distribui o peso do corpo e as forçasexercidas sobre o conjunto do pé (fig. 4-15):

- pela sua face articular superior, a trócleado astrágalo recebe (seta 1) o peso docorpo e as forças transmitidas pela pin­ça bimaleolar e distribui todas estas so­licitações em três direções;

- para trás, o calcanhar (seta 2), isto é, atuberosidade maior do calcâneo, através

da articulação astrágalo-calcânea poste­rior (superfície talâmica do astrágalo);

- para diante e para dentro (seta 3), em di­reção ao arco interno da abóbada plan­tar, através da articulação astrágalo-es­cafóide;

- para diante e para fora (seta 4), em di­reção ao arco externo da abóbadaplantar, através da articulação astrága­lo-calcânea anterior.

Ele "trabalha" em compressão, e sua fun­ção mecânica é muito importante.

Além disso, ele não tem nenhuma inser­ção muscular (fig. 4-16): todos os músculosque vêm da perna passam ao redor dele forman­do uma ponte, que lhe dá o apelido de osso "en­jaulado". Podem-se distinguir:

1. o extensor comum dos dedos do pé,

2. o fibular anterior (inconstante),

3. o fibular lateral curto,

4. o fibular lateral longo,

5. o tendão calcâneo ou de Aquiles, que éa terminação do tríceps da panturrilha,

6. o tibial posterior,

7. o fiexor próprio do hálux,

8. o fiexor comum dos dedos do pé,

9. o extensor próprio do hálux,

10. o tibial anterior.

Finalmente, ele é completamente cobertopor superfícies articulares e inserções ligamen­tares, o que lhe _dáo apelido de osso relevo. Po­dem-se distinguir:

1. o ligamento interósseo ou astrágalo-cal-câneo inferior,

2. o ligamento astrágalo-calcâneo externo,

3. o ligamento astrágalo-calcâneo posterior,

4. o fascículo anterior do ligamento lateralexterno da tíbio-tarsiana,

5. o plano profundo do fascículo anteriordo ligamento lateral interno da tíbio­tarsiana,

6. o fascículo posterior do ligamento late­ral interno da tíbio-tarsiana,

7. o fascículo posterior do ligamento late­ral externo da tíbio-tarsiana,

8. a cápsula anterior da tíbio-tarsiana como seu reforço,

9. o reforço posterior da cápsula tíbio­tarsiana,

10. o ligamento astrágalo-escafóide.

Dado que não possui inserção muscularnenhuma, o astrágalo se "nutre" somente dosvasos que chegam das inserções ligamentares, oque constitui um aporte arterial suficiente emcondições normais. No caso de fratura do colodo astrágalo, principalmente com luxação docorpo do osso, o seu trofismo pode estar irreme­diavelmente comprometido, provocando umapseudo-artrose do colo ou, pior ainda, uma ne­crose asséptica do corpo do osso.

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1

2

9

10

Fig.4-15

2. MEMBRO INFERIOR 185

3476

8

5

3

Fig.4-17

7

69

3

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186 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DA ARTICULAÇÃO SUBASTRAGALIANA(as explicações são comuns às da página anterior)

o calcâneo e o astrágalo estão unidos porpotentes ligamentos curtos, visto que devem su­portar forças importantes durante a marcha, acorrida e o salto.

O sistema principal está constituído pelo li­gamento astrágalo-calcâneo interósseo, tam­bém denominado "fileira interóssea", formadopor duas lâminas tendinosas fortes e retangula­res, que ocupam o seio do tarso (fig. 4-18, vistaântero-externa):

-. o fascículo anterior (1) se insere no sul­co calcâneo, que constitui o soalho doseio do tarso, por trás da superfície ante­rior. Suas fibras, espessas e nacaradas, sedirigem obliquamente para cima, paradiante e para fora, para inserir-se na fen­da astragaliana, situada na face inferiordo colo do astrágalo e formando o tetodo seio do tarso (fig. 4-6, A), imediata­mente por trás da superfície cartilagino­sa da cabeça;

- o fascículo posterior (2) se insere portrás do anterior, no solo do seio, justo pe­la frente do tálamo. Suas fibras, igual­mente espessas, oblíquas para cima, paratrás e para fora, se inserem no teto do seio(fig. 4-6, A), imediatamente pela frenteda superfície posterior do astrágalo.

A disposição dos fascículos do ligamentointerósseo aparece nitidamente quando o astrá-

galo se afasta do calcâneo se sup,usermos que osligamentos sejam elásticos (fig. 4-19).

Do mesmo modo, o astrágalo está unido aocalcâneo por outros dois ligamentos menos im­portantes (figs. 4-18 e 4-19):

- o ligamento astrágalo-calcâneo externo(3), que se origina no processo lateral doastrágalo e, após um trajeto oblíquo parabaixo e para trás, paralelo ao fascículomédio do ligamento lateral externo da tí­bio-tarsiana, se insere na face externa docalcâneo;

- o ligamento astrágalo-calcâneo poste­rior (4), banda fina que se expande dotubérculo póstero-externo do astrágaloaté a face superior do calcâneo.

O ligamento interósseo desempenha um pa­pel essencial na estática e na dinâmica da articu­lação subastragaliana, visto que, como mostra oesquema (fig. 4-20) no qual se colocou uma tró­clea do astrágalo, supostamente transparente, nassuperfícies calcâneas, ocupa uma posição central.Deste modo, se pode constatar que o peso do cor­po, que se transmite à tróclea do astrágalo atravésdo esqueleto da perna, se reparte sobre o tálamo esobre as superfícies anteriores do calcâneo. Tam­bém se pode observar que o ligamento astrágalo­calcâneo interósseo está situado exatamente noprolongamento do eixo da perna (círculo com acruz), o que explica o trab"tlho que realiza tantoem torção quanto em alongamento (ver pág. 190).

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4

Fig.4-18

3 2

1

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2. MEMBRO INFERIOR 187

Fig.4-19

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188 FISIOLOGIA ARTICULAR

A MÉDIO- TARSIANA E OS SEUS LIGAMENTOS(as explicações são comuns às das duas páginas anteriores)

Com a articulação mediotarsiana aberta, ocubóide e o escafóide são deslocados para baixo(fig. 4-21, segundo Rouviere), e a articulaçãoaparece composta por duas partes: a interlinhaastrágalo-escafóide, côncava para trás, constituia parte interna (ver pág. 180), a parte externa éformada pela interlinha ca1câneo-cubóide, ligei­ramente côncava para diante, de modo que, vistadesde cima, a interlinha de Chopart tem a formado S itálico. A superfície anterior (e) do ca1câneotem uma forma complexa: no sentido transversalé côncava na sua parte superior e convexa na suaparte inferior; de cima para baixo é côncava emprimeiro lugar e depois convexa. A superfície pos­terior (e') do cubóide, oposta à anterior, tem umaestrutura inversa, embora com freqüência (fig. 4­26, vista posterior do escafóide e do cubóide) seprolongue por uma face articular (e') para o esca­fóide, que repousa através da sua extremidade ex­terna sobre o cubóide: o contato se realiza porduas faces articulares planas (h e h') e os dois os­sos estão fortemente unidos por três ligamentos,um dorsal externo (5), um plantar interno (6) e uminterósseo (7) curto e muito espesso (aqui ambosos ossos foram separados artificialmente).

Os ligamentos da mediotarsiana são cinco:

- o ligamento glenóide (c') ou ca1câneo­escafóide inferior, que une o calcâneocom o escafóide (fig. 4-22) e constitui aomesmo tempo uma superfície articular(ver pág. 180). Sua margem interna (8)serve de inserção para a base do ligamen­to deltóide (ver pág. 166);

- o ligamento astrágalo-escafóide supe­rior (9), que se estende da face dorsal docolo do astrágalo até a face dorsal do es­cafóide (fig. 4-25);

- o ligamento em Y de Chopart (figs. 4­22 e 4-25), que constitui a chave da arti­culação, graças à sua posição média. Eleé composto por dois fascículos cuja ori­gem é comum (10) na face dorsal da apó­fise maior do ca1câneo, próximo a suamargem anterior. O fascículo interno(11) ou calcâneo-escafóide externo se es-

tende no plano vertical para inserir-se naextremidade externa do escafóide, en­quanto sua margem inferior se une, às ve­zes, com o ligamento calcâneo-escafóideinferior, de modo que divide a articulaçãomediotarsiana em duas, cavidades sino­viais diferentes. O fascículo externo (12)ou calcâneo-cubóide interno, menos es­pesso que o anterior, forma uma lâminahorizontal que se fixa na face dorsal docubóide. OS'dois fascículos do ligamentode Chopart constituem assim (fig. 4-24,vista anterior esquematizada) um ânguloreto diedro, aberto para cima e para fora;

- o ligamento calcâneo-cubóide dorsal(13) é uma banda fina (figs. 4-22 e 4-25)que se expande para a face súpero-exter­na da ca1câneo-cubóide:

- o ligamento calcâneo-cubóide plantar,espesso e nacarado, se estende sobre a fa­ce inferior dos ossos do tarso. É constituÍ­do por duas camadas diferentes:

- uma camada profunda (14) que une (fig. 4­23, vista inferior, se seccionou e removeua camada superficial) a tuberosidade ante­rior do ca1câneocom a face inferior do cu­bóide, atrás do sulco por onde se desliza otendão do fibular lateral longo (FLL);

- uma camada superficial (15) que se inserepor trás, na face inferior do ca1câneo entreas tuberosidades posteriores e a tuberosi­dade anterior; este leque fibroso se adere àface inferior do cubóide pela frente do sul­co do FLL e suas expansões (16) terminamna base dos quatro últimos metatarsianos.Deste modo, o sulco do cubóide se trans­forma num canal ósteo-fibroso percorridopelo FLL, de fora para dentro (fig. 4-25,17). Uma vista interna (fig.4-27) com doiscortes paramédios (fig. 4-28, direção dosdois planos de secção) mostra o tendão doFLL quando se desprende do cubóide.

O grande ligamento ca1câneo-cubóide plan­tar é um dos elementos essenciais de suporte daabóbada plantar (ver pág. 232).

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190 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS JVIOVIMENTOS NA SUBASTRAGALIANA

Tomadas em separado, cada uma das super­fícies da subastragaliana pode ser comparadacom uma superfície geométrica: o tálamo é umsegmento cilíndrico e a cabeça astragaliana umsegmento de esfera. Contudo, ela deve ser consi­derada como uma artródia, porque é geometri­camente impossível que duas superfícies esféri­cas e duas superfícies cilíndricas pertencentes aum mesmo conjunto mecânico se deslizem si­multaneamente uma sobre a outra, sem que apa­reça uma abertura, pelo menos, num dos pares,isto é. a perda de contato mais ou menos extensaentre as superfícies que estão de frente. O funcio­namento desta articulação implica determinado"jogo" devido à sua própria estrutura. Neste sen­tido, ela se opõe totalmente a uma articulaçãomuito fechada como no caso do quadril, cujas su­perfícies são geométricas e concordantes, e o jo­go fica reduzido ao mínimo. Contudo, se as su­perfícies da subastragaliana concordam perfeita­mente na posição média, posição que necessitada maior superfície de contato para transmitir opeso do corpo, nas posições extremas se tomammuito discordantes, reduzindo assim a superfíciede contato, embora as forças que se deveriamtransmitir sejam muito menos contundentes.

Partindo da posição média (fig. 4-29, vistaanterior do calcâneo e do astrágalo, ambostransparentes), o movimento do calcâneo sobreo astrágalo, supostamente fixo, se realiza simul­taneamente nos três planos do espaço. Nomoyimento de inversão do pé (ver pág. 178), aporção anterior do ca1câneo realiza três deslo­camentos elementares (fig. 4-30, posição ini­cial em linha descontínua):

- ele baixa ligeiramente (t): ligeira ex­tensão do pé;

- deslocamento para dentro (v): adução;

- inclinação sobre a sua face externa (r):supinação.

(A mesma demonstração pode ser feita, emsentido inverso, no caso da eversão.)

Farabeuf descreveu perfeitamente este mo­vimento complexo, dizendo que "o calcâneo os­cila, vira e roda sabre o astrágalo". A compara­ção com um navio está totalmente justificada(fig. 4-33):

- oscila: sua proa se submerge nas ondas (a);

- vira (b);

- roda ao inclinar-se sobre o seu lado (c).

Estes movimentos elementares em tomodos eixos de oscilação, de virada e de balanço seassociam de maneira automática quando o naviodesce obliquamente às ondas (e).

Em geometria se pode demonstrar que ummovimento em que se conhecem os componen­tes elementares com relação a três eixos podereduzir-se a um simples movimento em tornode um só eixo oblíquo com relação aos outrostrês. No caso do ca1câneo, esquematizado nodesenho em forma de paralelepípedo (fig. 4­31), este eixo mn é oblíquo de cima para baixo,de dentro para fora e de diante para trás. A ro­tação ao redor deste eixo (fig. 4-32) provoca osdeslocamentos descritos anteriormente. Esteeixo, descrito por Henke, penetra pela parte sú­pero-interna do colo do astrágalo, passa peloseio do tarso e emerge pela tuberosidade pós te­ro-externa do ca1câneo (ver pág. 196 e tambémo modelo do pé no final do volume). Como ve­remos mais adiante, o eixo de Henke não só re­presenta o eixo da subastragaliana, mas tam­bém o da mediotarsiana, de modo que condi­ciona todos os movimentos da porção posteriordo pé com relação ao tornozelo.

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Fig.4-29

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Fig.4-31

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2. MEMBRO INFERIOR 191

Fig.4-30

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Fig.4-32

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Fig.4-33

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192 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS NA SUBASTRAGALIANA E NA MEDIOTARSIANA

Os deslocamentos relativos dos ossos do tar­so posterior são fáceis de analisar sobre uma pre­paração anatõmica onde se fazem radiografias emposição de inversão e de eversão. Deve-se tomara precaução de atravessar cada um dos ossos comuma vareta metálica (a: para o astrágalo, b: para oca1câneo, c: para o escafóide, d: para o clibóide);os ângulos também podem ser observados.

Numa radiografia de incidência vertical(vista superior), com o astrágalo fixo, a passa­gem da eversão (fig. 4-34) à inversão (fig. 4-35)se produz pelos seguintes deslocamentos:

- - o escafóide (c) se desliza para dentro so­bre a cabeça do astrágalo e gira SO,

- o cubóide (d) segue o movimento, gira omesmo ângulo e se desliza para dentrocom relação ao ca1câneo e ao escafóide;

- o ca1câneo (b) avança ligeiramente e gi­ra também 5° sobre o astrágalo.

Estas três rotações elementares se realizamno mesmo sentido, o da adução.

Uma incidência frontal (vista ântero-pos­terior), com o astrágalo sempre fixo, mostra osseguintes deslocamentos ao passar da eversão(fig. 4-36) à inversão (fig. 4-37):

- o escafóide (c) gira 25° e quase não ul­trapassa o astrágalo para dentro;

- o cubóide (d) desaparece totalmente de­trás da sombra do calcâneo e gira 18°;

- o ca1câneo (b) se desliza para dentro de­baixo do astrágalo e gira 20°.

Estas três rotações elementares se realizamno mesmo sentido, o da supinação, e o escafói­de gira mais que o calcâneo e, principalmente,mais do que o cubóide.

Finalmente, numa incidência lateral (vistade perfil), entre a eversão (fig. 4-38) e a inversão(fig. 4-39), se podem constatar os seguintes des­locamentos:

- o escafóide (c) se desliza, literalmente,debaixo da cabeça do astrágalo e girasobre si mesmo 45°, de tal forma quesua face anterior tem a tendência aorientar-se para baixo;

- o cubóide (d) também se desliza parabaixo, com relação ao astrágalo e aoca1câneo ao mesmo tempo. Esta desci­da com relação ao astrágalo é muitomais importante que o do escafóidecom relação ao astrágalo. Simultanea­mente, o cubóide gira 12°;

- por último, o ca1câneo (b) avança comrelação ao astrágalo, cuja margem pos­terior cobre a superfície retrotalâmica.Ao mesmo tempo, gira 10° para a exten­são, como o escafóide.

Estes três movimentos elementares se reali­zam no mesmo sentido, o da extensão.

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b

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Fig.4-38

Fig.4-34

Fig.4-36

Fig.4-35

Fig.4-37

2. MEMBRO INFERIOR 193

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194 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS NA MEDIOTARSIANA

Os movimentos na mediotarsiana estãocondicionados pela forma das superfícies articu­lares e pela disposição dos ligamentos.

Globalmente (fig. 4-40), as superfícies arti­culares estão dispostas de acordo com um eixoXX' oblíquo de cima para baixo e de dentro pa­ra fora, inclinado 45° sobre a horizontal e queserve de charneira, permitindo os deslocamentosdo escafóide e do cubóide para baixo e para den­tro (setas E e C) ou para cima e para fora. A su­perfície da cabeça do astrágalo, oval, com umgrande eixo yy' inclinado 45° sobre a horizontal(ângulo "de rotação" do astrágalo), está alonga­da no sentido do movimento.

Os deslocamentos do escafóide sobre acabeça do astrágalo se realizam para dentro(fig. 4-41) e para baixo (fig. 4-42), devido à tra­ção do tibial posterior (TP), cujo tendão se inse­re no tubérculo do escafóide. A tensão do liga­mento astrágalo-escafóide dorsal (a) limita estemovimento. A mudança de orientação do escafói­de provoca, por meio dos cuneiformes e dos trêsprimeiros metatarsianos, a adução e a escavaçãodo arco interno da abóbada plantar (ver pág. 230).

Simultaneamente, o escafóide se deslocacom relação ao calcâneo: na posição de ever­são (fig. 4-43, vista superior, o astrágalo foi ex­tirpado) o ligamento glenóideo (b), a margeminferior do ligamento deltóide (c) e o fascículointerno do ligamento de Chopart (d) entram emtensão; a contração do TP durante o movimentode inversão (fig. 4-44) aproxima o escafóide aocalcâneo e provoca uma subida do astrágalo so­bre o tálamo (seta tracejada), de forma que os li-

gamentos antes citados se distendem. Agora po­demos entender por que as superfícies anterio­res do ca1câneo não se prolonga~ até o escafói­de: uma superfície articular, fixa por uma conso­la óssea, e portanto rígida, não permitiria estesdeslocamentos relativos do escafóide com rela­

ção ao calcâneo. Pelo contrário, a ligeira super­fície do ligamento glenóideo (b) é indispensável,como se poderá comprovar mais adiante (pág.230), para a elasticidade do arco interno da abó­bada plantar.

Os movimentos do cubóide sobre o calcâ­neo estão muito limitados para cima (fig. 4-45,vista interna) por dois fatores:

- a proeminência do processo lateral (se­ta) da apófise do ca1câneo, verdadeiroesporão constituindo um ressalto na par­te superior da interlinha;

- a tensão do potente ligamento ca1câneo­cubóide plantar (f), que limita com rapi­dez a abertura inferior (a) da interlinha.

Pelo contrário, (fig. 4-46) o cubóide se des­liza para baixo com facilidade pela convexidadeda face articular calcânea. Ele é detido somente

pela tensão do fascículo externo (e) do ligamen­to de Chopart.

No sentido transversal (fig. 4-47, corte ho­rizontal segundo o nível AB da figo4-40), o des­lizamento do cubóide é mais fácil para dentro,limitado somente pela tensão do ligamento cal­câneo-cubóide dorsal (g). Em resumo, o deslo­camento do cubóide se realiza preferentementepara baixo e para dentro.

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Fig.4-41

Fig.4-45

Fig.4-44

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Fig.4-46

Fig.4-47

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196 FISIOLOGIA ARTICULAR

FUNCIONAMENTO GLOBAL DAS ARTICULAÇÕES DO TARSO POSTERIOR(as explicações são as mesmas da pág. 188)

Ao observar e manipular uma preparaçãoanatômica do tarso posterior, há um fato que éevidente: todas estas articulações constituem umconjunto funcional indissociável, o complexoarticular da parte posterior do pé, que possuio papel de adaptar a orientação e a forma totalda abóbada plantar. As articulações subastraga­liana e mediotarsiana estão mecanicamente uni­das e equivalem, todas juntas, a uma única arti­culação, com um grau de liberdade em tomoao eixo de Henke (mn) (ver também o modelodo pé no final do volume).

Os esquemas desta página mostram os quatroossos do tarso posterior desde dois pontos de vis­ta diferentes: vistas ântero-externas (figs. 4-48 e 4­50) e vistas anteriores (figs. 4-49 e 4-51). Paracada um destes pontos de vista, as posições quecorrespondem à inversão (figs. 4-48 e 4-49) e àeversão (figs. 4-50 e 4-51) foram justapostas nosentido vertical. Deste modo, é possível observaras mudanças de orientação do escafóide e do cu­bóide em relação ao astrágalo que permanece fixo.

Movimento de inversão (figs. 4-48 e 49):

- o tibial posterior desloca o escafóide(esc), que deixa descoberta a parte súpe­ro-externa da cabeça do astrágalo (d);

- o escafóide desloca o cubóide (cub) atra-vés dos ligamentos cubóide-escafóides;

- o cubóide, por sua vez, desloca o calcâ­neo (cale), que se introduz, para diante,debaixo do astrágalo (astr);

- o seio do tarso se abre ao máximo (fig.4-48), enquanto os dois fascículos do li­gamento interósseo (1 e 2) entram emtensão;

- o tá1amo (a') fica descoberto na sua por­ção ântero-inferior, enquanto a interlinhaastrága1o-calcânea se entreabre para ci­ma e para trás.

En resumo:

- o par do escafóide e do cubóide (fig. 4­49) se desloca para dentro (seta Adu.), o

que dirige a parte anterior do pé paradiante e para dentro (fig. 4-48: seta I);

- ao mesmo tempo, ele gira em tomo de umeixo ântero-posterior que passa pelo liga­mento de Chopart, que deste modo trabal­ha em alongamento-torção. Esta rotação,conseqüência da subida do escafóide e dadescida da cubóide, realiza uma supina­ção (seta Supin.): a planta do pé "se orien­ta" para dentro devido ao descenso do ar­co externo - a face articular cubóide quecorresponde ao 5.° metatarsiano (5.om) seorienta para baixo e para diante - e por as­censo do arco interno - a face articularpara o primeiro cuneiforme (le) do esca­fóide se orienta para diante.

Movimento de eversão (figs. 4-50 e 4-51):

- o fibular lateral curto, que se insere noprocesso estilóide do 5.° metatarsiano,desloca o cubóide para fora e para trás;

- o cubóide desloca o escafóide que dei-xa descoberta a porção súpero-internada cabeça do astrágalo;

- igual ao caleâneo, que se desloca paratrás, debaixo do astrágalo;

- o seio do tarso se fecha (fig. 4-50) e omovimento se detém pelo impacto do as­trágalo contra o soalho do seio do tarso;

- a parte póstero-superior do tálamo (a')fica descoberta.

Em resumo:

- o par do escafóide e do cubóide (fig. 4­51) se desloca para fora (seta Abd.), oque dirige a parte anterior do pé paradiante e para fora (fig. 4-50, seta E);

- ao mesmo tempo, gira sobre si mesmono sentido da pronação (seta Pron.)devido ao descenso do escafóide e àabdução do cubóide cuja face articulardo 5.om, se orienta para diante e parafora.

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2. MEMBRO INFERIOR 197

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198 FISIOLOGIA ARTICULAR

o CARDÃ HETEROCINÉTICO DA PARTE POSTERIOR DO PÉ

o eixo de Henke que se acaba de definir,não é, como se poderia imaginar, um eixo fixo eimutável; na realidade, é um eixo evolutivo, oque significa que se desloca no percurso do mo­vimento. Isto se pode deduzir do exame das su­cessivas radiografias do tarso posterior, obtidasdurante o movimento de inversão-eversão:quando se criam os centros instantâneos de rota­ção nos pares de radiografias, eles não coinci­dem entre si. Pode-se propôr a hipótese de umeixo de Henke evolutivo (fig. 4-52) entre umaposição de partida (1) e uma posição de chegada(2), descrevendo entre estas duas posições extre­mas um "plano inclinado" que contenha suasposições intermédias. Resta fazer a demonstra­ção matemática por computador.

Portanto, no nível da parte posterior do péexistem dois eixos sucessivos, não paralelos,o eixo da tíbio-tarsiana e o eixo de Henke, re­presentando, como se acaba de ver, o eixo glo­bal da subastragaliana e a médio-tarsiana. As­sim, podemos considerar o cardã como ummodelo mecânico do complexo articular daparte posterior do pé.

Em mecânica industrial, o cardã se defi­ne como Llmaarticulação com dois eixos per­pendiculares entre si, compreendida entre duasárvores (fig. 4-53); tais articulações transmi­tem o movimento de rotação de uma árvore àoutra, seja qual for o ângulo formado entreelas; nos automóveis existe uma "tração dian­teira" entre a árvore motora de cada uma dasrodas dianteiras e o seu eixo. Denomina-se"articulação homocinética", visto que o parmotor permanece igual a si mesmo indepen­dentemente das posições relativas.

Em biomecânica se conhecem três articu­

lações deste tipo:

- a esternocostoclavicular, articulação"em sela";

- o punho, que é um complexo articularde tipo condilar;

- a trapézio-metacarpiana, segunda articu­lação em sela, cujo funcionamento foiexaustivamente analisado (ver volume I).

No que se refere à parte posterior do pé, agrande diferença está no fato de que se trata deum "cardã heterocinético". Isto significa que ocardã não é "regular": seus eixos, em vez de serperpendiculares entre si no espaço - se diz quesão ortogonais -, são oblíquos um com relaçãoao outro. Para materializar este fato (fig. 4-54),se superpôs sobre um esquema do tornozelo omodelo mecânico deste cardã heterocinético, noqual se podem observar:

- o esqueleto da perna (A) e o da parte an­terior do pé (B);

- o eixo XX' da tíbio-tarsiana, transver­sal, porém ligeiramente oblíquo paradiante e para dentro;

- o eixo de Henke. oblíquo de trás paradiante, de baixo para cima e de forapara dentro;

- uma peça intermédia (C), que não temequivalente ósseo, tetraedro deformado,cujas duas arestas opostas estão ocupa­das pelos dois eixos do cardã.

A falta de "ortogonalidade" destes eixos criadireções preferenciais nos movimentos do com­plexo articular da parte posterior do pé, os múscu­los, que se organizam conforme estes dois eixos(ver pág. 214), só podem realizar dois tipos demovimentos, ficando "proibidos" os que restam:

- a inversão (fig. 4-55), que dirige o pépara a extensão e orienta a planta paradentro;

- a eversão (fig. 4-56), que flexiona o pésobre a perna e dirige sua planta de mo­do que fica orientada para fora.

A compreensão do mecanismo deste "cardãheterocinético" é fundamental para interpretaras ações musculares, a orientação da planta dopé, sua estática e sua dinâmica.

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2. MEMBRO INFERIOR 199

Fig.4-53

2

A

Fig.4-54

2

Fig.4-56

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200 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS CADEIAS LIGAMENTARES DE INVERSÃO E EVERSÃO

Os movimentos de inversão e de eversão do pé es­tão limitados por dois tipos de resistências:

- os ressaltos ósseos,

- as cadeias ligamentares da parte posterior do pé.

LIMITAÇÃO DO MOVIMENTO DE INVERSÃO

Como já vimos, durante a inversão, o deslocamen­to do calcâneo para baixo e para dentro provoca um as­censo do astrágalo para a parte superior da superfície ta­lâmica onde não encontra nenhum ressalto ósseo, en­quanto a parte ântero-inferior do tálamo permanece des­coberta; simultaneamente, a cabeça do astrágalo ficadescoberta pelo escafóide que se desliza para baixo epara dentro sem ser detido por nenhum ressalto ósseo.

Portanto, nenhum ressalto ósseo limita o movi­mento de inversão, salvo o maléolo interno que mantéma tróclea do astrágalo para dentro.

A cadeia ligamentar de inversão é o único fa­tor que limita este movimento no percurso no qual sepode observar como se contrai (fig. 4-57), seguindoduas linhas de tensão:

A linha de tensão principal parte do maléoloexterno,

-logo continua o fascículo anterior (1) do LLEda tíbio-tarsiana,

- se desdobra para o calcâneo e o cubóide pas­sando por:

- ligamento interósseo (2),

- fascículo calcâneo-cubóide do ligamento deChopart (3), seu ramo externo,

- ligamento calcâneo-cubóide súpero-externo(4) ou dorsal,

-ligamento calcâneo-cubóide plantar (sem re­presentação aqui),

- fascículo escafóide do ligamento de Chopart(5),

- a partir do astrágalo, a tensão se transmite aoescafóide através do ligamento astrágalo-es­cafóide dorsal (6).

A linha de tensão acessória se inicia no maléolointerno,

- continua o fascículo posterior do LLI da tí­bio-tarsiana (sem representação aqui),

- e o ligamento astrágalo-calcâneo posterior(sem representação aqui).

Como relevo ligamentar, o astrágalo constitui, du­rante a inversão, dois pontos de chegada e três pontos departida ligamentares.

LIMITAÇÃO DO MOVIMENTO DE EVERSÃO

Durante o movimento de eversão, a superfície pos­terior principal da face inferior do astrágalo "desce" pelapendente do tálamo para bater contra a face superior docalcâneo, no nível do solo do seio do tarso; a face articu­lar externa do astrágalo, deslocada para fora, bate contra omaléolo externo, e o fratura se o deslocamento continua.Portanto, os ressaltas ósseos são preponderantes.

A cadeia ligamentar de eversão também incluiduas linhas:

A linha de tensão principal se inicia no maléolointerno, utilizando os dois planos do fascículo anteriordo LU da tíbio-tarsiana,

- o plano supeificial, o ligamento deltóide (1),o une diretamente com o escafóide e o calcâ­

neo, ambos unidos entre si pelo ligamentoglenóide (2);

- o plano profundo o une ao astrágalo pelo fascícu­lo tíbio-astragaliano (sem representação aqui), eao calcâneo através do ligamento interósseo (3),

- por sua vez, o ca1câneo é unido ao cubóide e aoescafóide pelo ligamento de Chopart (4); sepode constatar que este ligamento assegura acoesão entre os três ossos no percurso da inver­são tanto quanto da eversão,

- a união plantar é assegurada pelo grande li­gamento calcâneo-cubóide plantar (sem re­presentação aqui).

A linha de tensão acessória se origina no maléo­10 externo,

- por um lado, o fascículo posterior do LLE datíbio-tarsiana (sem representação aqui) para oastrágalo e, daí, para o calcâneo graças ao liga­mento astrágalo-calcâneo externo (5);

- por outro lado, através do fascículo médio doLLE da tíbio-tarsiana (6) diretamente para ocalcâneo.

Em resumo, o relevo astragaliano recebe duas che­gadas e é a origem de duas saídas ligamentares.

Globalmente, pode-se deduzir que a inversão rom­pe os ligamentos e, em particular, o fascículo anterior doLLE da tíbio-tarsiana e que a eversão fratura os maléo­los e o externo em primeiro lugar.

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2

3

Fig.4-57

2. NfEMBRO INFERIOR 201

4

3

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202 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS ARTICULAÇÕES CÚNEO-ESCAFÓIDES, INTERCUNEIFORMESE TARSOMETATARSIANAS

(as explicações são comuns às das págs. 188 e 196)

Todas estas articulações são artródias querealizam movimentos de deslizamento e de

abertura de escassa amplitude.

Em vista anterior do par do escafóide e docubóide (fig. 4-59) se podem distinguir três facesarticulares (lc, IIc, lHc) que articulam o escafói­de com o primeiro, o segundo e o terceiro cunei­formes, e outras três faces articulares que articu­lam o cubóide com o quinto metatarsiano (5ºm),quarto metatarsiano (4ºm) e terceiro cuneiforme(lI!' c); além disso, o cubóide fixa a extremidadeesquerda do escafóide (articulação escafocubói­de, setas brancas).

Uma vista em perspectiva ântero-extema(fig. 4-60) permite observar como o bloco dostrês cuneiformes (Cj, Cl e C3) se articula com oescafóide e o cubóide: a seta dupla indica comoo terceiro cuneiforme repousa sobre o cubóide,numa face articular (U!'c) localizada na frenteda face articular da articulação com o escafóide(articulação cubóide-cuneal).

As articulações intercuneiformes com­preendem (fig. 4-61, vista superior das articula­ções cúneo-escafóides, intercuneiformes e a deLisfranc parcialmente) cada uma faces articula­res e ligamentos interósseos: entre o primeiro e osegundo cuneiforme o ligamento interósseo foiseccionado (19); entre o segundo e o terceiro cu­neiforme, este ligamento (20) se deixou intacto.

A articulação tarsometatarsiana, ou in­terlinha de Lisfranc, permite observar (fig. 4-63,vista superior), por um lado, os três cuneiformes(CI' Cl e C) para dentro e o cubóide (cub) parafora; por outro lado, a base dos cinco metatar­sianos (Mj, Ml, M3, M~ e MJ Ela é constituídapor uma sucessão de artródias intimamente im­bricadas. Em vista dorsal da articulação aberta(fig. 4-62 segundo Rouviere) se podem distin-

guir as diferentes faces articulares do tarso e asfaces articulares que correspondem à base dosmetatarsianos. A base do segundo metatarsiano(lvf) se encaixa na mortalha dos três cuneiformescomposta por: face articular externa (lImC) doprimeiro cuneiforme (C), face articular anterior(lImC) do segundo cuneiforme (C) e face arti­cular interna (lImC3) do terceiro cuneiforme(C). Além disso, éla está mantida por potentes li­gamentos, fáceis de di~tinguir (fig. 4-61), quandose abre a articulação para cima, se faz girar sobreo seu eixo o primeiro metatarsiano (seta 1) e sedesloca para fora o terceiro metatarsiano (seta 2).Então podemos observar:

- por dentro, o potente ligamento de Lis­franc (18), que se estende da face exter­na do primeiro cuneiforme à face inter­na da base do segundo metatarsiano. É achave da desarticulação;

- por fora, um sistema ligamentar queinclui fibras diretas (21) entre Cl e Ml e(22) entre C3 e M3 e fibras cruzadas (23)entre C3 e Ml e (24) entre Cl e M3.

Por outra parte, a solidez da articulaçãotarsometatarsiana é assegurada por numerososligamentos (fig. 4-63, vista dorsal e figo 4-64,vista plantar) que se expandem da base de cadametatarsiano até o osso correspondente do tarsoe para a base dos metatarsianos vizinhos. Espe­cialmente, na face dorsal (fig. 4-63) existem li­gamentos que se expandem da base do segundometatarsiano para todos os ossos vizinhos, e pa­ra a face plantar (fig. 4-64) dos ligamentos es­tendidos do primeiro cuneiforme aos três pri­meiros metatarsianos. No lado plantar da basedo primeiro metatarsiano se fixa o tendão do fi­bular lateral longo (FLL) após percorrer o seusulco plantar (linha descontínua 25).

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2. MEMBRO INFERIOR 203

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Fig.4-62

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C3

C3 C2C2 C1C1

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Fig.4-64

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204 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS NAS ARTICULAÇÔES DO TARSO ANTERIORE NA METATARSIANA

As articulações intercuneiformes (fig.4-65, corte frontal) permitem ligeiros movi­mentos verticais que modificam a curvaturatransversal da abóbada plantar (ver pág. 236). Oterceiro cuneiforme (C3) repousa sobre o cubói­de (cub), cujo terço interno (tracejado) serve deapoio ao arco formado pelos cuneiformes.

No sentido longitudinal (fig. 4-66, corte sa­gital), os ligeiros deslocamentos dos cuneifor­mes com relação ao escafóide (esc) contribuempara a modificação da curvatura do arco interno(ver pág. 230).

Os movimentos na articulação tarso­metatarsiana se podem deduzir segundo a for­ma da interlinha de Lisfranc e segundo a orien­tação das superfícies articulares, perfeitamentedescritas na anatomia clássica (fig. 4-67, vistasuperior):

- No seu conjunto, a interlinha de Lis­franc é oblíqua para dentro e para fora,de cima para baixo e de diante paratrás: sua porção interna se localiza doiscentímetros para diante da externa. Aobliqüidade geral deste eixo de flexão­extensão dos metatarsianos contribui,assim como a obliqüidade do eixo deHenke, para os movimentos de eversão­inversão (ver modelo mecânico do pé).

- A ultrapassagem dos cuneiformes segueuma progressão geométrica:

O terceiro cuneiforme (C) ultrapassa2 mm ao cubóide (cub);

O terceiro cuneiforme ultrapassa 4 mm osegundo (C);

O primeiro cuneiforme (C) ultrapassa8 mm o segundo.

Desta forma, entre os três cuneiformes sedesenha a mortalha na qual se encaixa a base dosegundo metatarsiano. Portanto, este é o menosmóvel de todos e constitui a parte superior daabóbada plantar (ver pág. 234).

- Os dois segmentos extremos da interlinhapossuem uma obliqüidade oposta:

• a interlinha M/CI, oblíqua para diante epara fora, cai, quando se prolonga, nomeio do quinto metatarsiano;

• a interlinha M/cub, oblíqua para diantee para dentro, finaliza, após um prolon­gamento idôneo, perto da cabeça do pri­meiro metatarsiano.

Portanto, o eixo de flexão-extensão dos me­tatarsianos localizados nos extremos, os maismóveis, não é perpendicular ao eixo longitudi­nal destes metatarsianos, mas sim oblíquo. Con­seqüentemente, estes metatarsianos não se des­locam no plano sagital, mas numa superfície cô­nica; quando se flexionam, se deslocam ao mes­mo tempo no sentido lateral para o eixo do pé(fig. 4-69, vista esquemática súpero-externa dainterlinha de Lisfranc com os dois metatarsianoslocalizados nos extremos):

- o movimento aa' da cabeça do primeirometatarsiano compreende um compo­nente de flexão (F) e um componente deabdução (Abd) de 15° (Fick);

- simetricamente, o movimento bb' da ca­beça do quinto metatarsiano se compõede uma flexão (F) associada a uma adu­ção (Adu)

Deste modo, não somente as cabeças destesmetatarsianos descem, mas também se aproxi­mam do eixo do pé, o que provoca (fig. 4-70) umaumento da curvatura do arco anterior e, emconseqüência, uma escavação da parte anteriorda abóbada plantar. Ao contrário, a extensão dosmetatarsianos se acompanha de seu achatamento(ver modelo mecânico do pé no final do volume).

O movimento de aproximação dos metatar­sianos localizados nos extremos também está fa­vorecido (fig. 4-68, vista anterior das superfíciescubóides e cuneais) pela obliqüidade dos eixostransversais (xx' e yy') de suas superfícies arti­culares: o movimento segue a seta espessa nosdois sentidos.

Em resumo, as modificações da curvaturado arco anterior são a conseqüência dos movi­mentos ocorridos na interlinha de Lisfranc.

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Fig.4-67

Fig.4-66

2. MEMBRO INFERIOR 205

astr

esc

C1.2.3.

E + Adu

Fig.4-68

Fig.4-70

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206 FISIOLOGIA ARTICULAR

A EXTENSÃO DOS DEDOS DO PÉ

Não vamos descrever as articulações meta­tarsofalangeanas e as articulações interfalangea­nas dos dedos dos pés, visto que são similares àsdos dedos das mãos (ver volume I); as únicas di­ferenças são de ordem funcional e implicam,principalmente, as metatarsofalangeanas. De fa­to, enquanto no caso das metacarpofalangeanasa flexão supera a extensão, no caso das metatar­sofalangeanas a extensão supera a flexão:

- a extensão ativa é de 50-60° em compa­ração com os 30-40° da flexão ativa;

- a extensão passiva, imprescindível naúltima fase do passo (fig. 4-71), alcançaou ultrapassa os 90° em comparaçãocom os 45-50° da flexão passiva.

Os movimentos de lateralidade dos de­dos do pé nas metatarsofalangeanas são de me­nor amplitude que os dos dedos da mão. Em par­ticular, o primeiro dedo do pé do homem, comdiferença do macaco, perdeu todas as possibili­dades de oposição, o que traduz a adaptação dopé humano à marcha bípede no solo.

A extensão ativa dos dedos do pé se de­ve a três músculos: dois músculos extrínsecos,o extensor próprio do hálux e o extensor co­mum, e um músculo intrínseco, o extensor cur­to dos dedos.

O músculo extenso r curto dos dedos(fig. 4-72) se localiza por completo no dorso dopé. Os quatro corpos carnosos que o compõemtêm uma inserção no soalho calcâneo do seiodo tarso, no desdobramento de origem do liga­mento anular anterior da garganta do pé. Osquatro tendões de pouca espessura que os pro­longam se unem com o tendão extensor dosquatro primeiros dedos, salvo no caso do pri­meiro que se insere diretamente na face dorsalda primeira falange do hálux. O quinto dedocarece de extensor curto dos dedos. Portanto,

este músculo é extensor da metatarsofalangea­na dos quatro primeiros dedos (fig. 4-73).

O extensor comum dos dedos e o extensorpróprio do hálux se localizam no compartimen­to anterior da perna, seus tendões se inserem nasfalanges de acordo com as modalidades que se­rão analisadas mais adiante (ver pág. 208).

O tendão do extenso r comum (Ecd) (fig.4-74) se dirige para a face anterior da gargantado pé pelo feixe externo do ligamento fundifor­me, se subdivide em quatro tendões que vão in­serir-se nos quatro últimos dedos após ter passa­do por baixo da lâmina inferior do ligamentoanular anterior (ver também figo4-89). Portanto,o quinto dedo só se estende pelo extensor co­mum. Este músculo, como o seu nome indica, éextensor dos dedos, mas também é, principal­mente, flexor do tornozelo (ver pág. 214). Paraque a sua ação nos dedos seja pura, se deve as­sociar a contração sinérgica-antagonista dos ex­tensores do tornozelo (o tríceps (T) é representa­do por uma seta).

O tendão do extensor próprio do hálux(Eph) (fig. 4-75) passa debaixo da lâmina supe­riordo ligamento anular anterior, no feixe inter­no do ligamento fundiforme, para, a seguir, pas­sar por baixo da lâmina inferior (ver também figo4-89) e terminar nas duas falanges do hálux: nasmargens laterais da primeira e na face dorsal dabase da segunda. Portanto, é extensor do hálux,mas também é, principalmente, flexor do torno­zelo. Como no caso do extensor comum, a con­tração sinérgica-antagonista dos extensores dotornozelo é necessária para que a sua ação sobreo hálux seja pura.

Para Duchenne de Boulogne, o verdadei­ro extensor dos dedos do pé é o músculo exten­sor curto dos dedos; mas adiante justificare­mos esta afirmação.

Page 209: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

Fig.4-71

Fig.4-74 Fig.4-75

Fig.4-73

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208 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS INTERÓSSEOS E LUMBRICAIS(as explicações são comuns a todas as figuras)

Os músculos interósseos, como na mão, sedividem em dorsais e palmares (no caso do pédenominam-se plantares), embora sua disposi­ção seja um pouco diferente (fig. 4-76, cortefrontal, fragmento posterior): os quatro inte­rósseos dorsais (Isd) estão centrados no segun­do osso do metatarso (e não no terceiro como nocaso da mão) e se inserem (setas brancas) no se­gundo dedo (1Q e 2Q interósseos) ou no dedomais próximo do segundo: 3Q interósseo no 3Q

dedo, 4Q interósseo no 4Q dedo (fig. 4-83). Ostrês interósseos plantares (Isp) se inserem namargem interna dos três últimos ossos do meta­tarso e terminam (fig. 4-84) no dedo correspon­dente ao metatarsiano de origem.

A forma com que terminam os interós­seos do pé (fig. 4-77, vista dorsal do aparelhoextensor e figo 4-79, vista lateral dos músculosdos dedos) é parecida com a da mão:

- na parte lateral da base da primeira fa­lange (1) e

- por uma lâmina tendinosa (2) na bandalateral (3) do tendão do extensor.

De fato, o tendão do extensor comum (Ecd)se insere, como na mão, nas três falanges, pormeio de:

- algumas fibras (4) nas margens da pri­meira falange (e não na base);

- uma faixa média (5) na base da segundafalange e

- duas faixas laterais (3) na base da terceira.

Na porção superior da articulação metatar­sofalangeana (fig. 4-78, vista dorsal), o tendãoextensor do segundo, o terceiro e o quarto dedosrecebe, por sua margem externa, o fino tendãodo extensor curto dos dedos (Ecu).

Como na mão, existem quatro músculoslumbricais (figs. 4-76, 4-78 e 4-88) anexosaos tendões do flexor comum dos dedos do pé(homólogo do FPC dos dedos da mão). O ten­dão de cada lumbrical se dirige para dentro(fig. 4-88) para finalizar (figs. 4-78 e 4-79) co-

mo um interósseo: na base da primeira falange(6) e na banda lateral (7) do extensor.

O tendão do flexor dos dedos (Fd) secomporta como o FPC dos dedos da mão (figs.4-79 e 4-88): passa próximo à fibrocartilagemglenóide (8) da metatarsofalangeana para, a se­guir, perfurar o tendão do fiexor plantar curto(FPC) e finalizar na base da terceira falange.Portanto, o flexor plantar curto, músculo in­trínseco do pé, é o equivalente do FCS dos de­dos da mão: superfiCial, ele é perfurado pelo an­terior e finaliza nas faces laterais da segunda fa­lange. O fiexor dos dedos fiexiona a terceira fa­lange sobre a segunda (fig. 4-81). O fiexor plan­tar curto fiexiona a segunda falange sobre a pri­meira. Os interósseos e os lumbricais, como namão, são (fig. 4-80) fiexores da primeira falangee extensores das duas últimas. Desempenhamum papel fundamental na estabilização dos de­dos. Flexionando a primeira falange, proporcio­nam um ponto de apoio sólido aos extensoresdos dedos como fiexores do tornozelo. Quandoos interósseos e os lumbricais são insuficientes,se produz uma deformação em "martelo" ou em"garra" dos dedos do pé (fig. 4-82): os interós­seos não estabilizam a primeira falange, de formaque, devido à tração do extensor, se hiperestendepara deslizar-se pela face dorsal da cabeça do me­tatarsiano. Em segundo lugar, esta deformação sefixa pela luxação dorsal dos interósseos, para ci­ma do eixo (+) da metatarsofalangeana. Além dis­so, as duas primeiras falanges se fiexionam devi­do ao encurtamento relativo dos fiexores, e estadeformação fica fixa quando a interfalangeanaproximal se luxa (seta) entre as bandas laterais doextensor, cuja ação fica invertida.

Como na mão, a posição dos dedos depen­de assim do equilíbrio entre os diferentes mús­culos. De forma que, como afirma Duchenne deBoulogne, só o extensor curto dos dedos é real­mente extensor dos dedos, e se os verdadeirosextensores fossem os fiexores do tornozelo, es­tariam fixados diretamente nos ossos do meta­tarso (Duchenne sempre demonstrou).

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2. MEMBRO INFERIOR 209

Ecd .-.Eph

Ecu

IsdFig.4-76CFp

'-- ~'-.'-.~'\

Adu.g

""'-.

'\. ~Fph

"

~Abd.1+2

Fd+LFPC

Ecu

Fig.4-78 Fig.4-77

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210 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PLANTA DO PÉ(as explicações são comuns à página anterior)

Os músculos da planta do pé se dispõem, da pro­fundidade até a superfície, em três planos.

A. O plano profundo é composto pelos interós­seos e os músculos anexos do 5º dedo e do hálux:

- os interósseos dorsais (fig. 4-83, vista infe­rior) possuem, além de sua participação na fte­xão-extensão, uma ação de abdução dos dedoscom relação ao eixo do pé (segundo osso dometatarso e segundo dedo). A separação dohálux é realizada pelo adutor do hálux (Adu.h)e a abdução do quinto dedo a realiza o abdutordo quinto dedo (Abd.5). Estes dois músculossão os equivalentes dos interósseos dorsais;

- os interósseos plantares (fig. 4-84, vista infe­rior) aproximam os três últimos dedos ao segun­do. O hálux se aproxima do eixo do pé graças aoseu abdutor, constituído por duas porções:

- o abdutor oblíquo (Abd.l) que se originanos ossos do tarso anterior;

- o abdutor transverso (Abd.2) que se adere aoligamento glenóide da terceira, da quarta eda quinta articulações metatarsofalangeanase ao ligamento intermetatarsiano profundo.Desloca diretamente para fora a primeira fa­lange do hálux e desempenha uma função desuporte do arco anterior (ver pág. 234).

- os músculos anexos do 59 dedo (fig. 4-85,vista inferior) são três e se localizam no com­partimento plantar externo:

- o oponente do 59 dedo (Op.5) é o maisprafundo; se estende do tarso anterior atéo quinto osso do metatarso, tem uma fun­ção análoga, embora em menor grau, à dooponente do 5º dedo: afunda a abóbada eo arco anterior;

os outras dois músculos se inserem am­

bos no tubérculo externo da base da pri­meira falange. São:

- o flexor curto do 59 dedo (FC.5) que seorigina no tarso anterior;

- o abdutor do 59 dedo (Abd.5), citado an­teriormente, cujas inserções posteriores selocalizam (fig. 4-86) na tuberosidade pós­tera-externa do calcâneo e na estilóide do

59 osso do metatarso. É um dos suportesdo arco externo (ver pág. 232).

- os músculos anexos do hálux (fig. 4-85) sãotrês e se localizam no compartimento plantar

interno (exceto o abdutor). Inserem-se nos tu­bérculos laterais da base da primeira falange enos dois ossos sesamóides anexos à metatarso­

falangeana do hálux. Este é o motivo pelo qualtambém se denominam músculos sesamóides:

- no lado interno, sesamóide e falange re-cebem a porção interna do flexor curto(FC.h) e o adutor (Adu:h) que se originana tuberosidade póstero-interna do calcâ­neo (fig. 4-86) e constitui um dos supor­tes do arco interno (ver pág. 230);

- no lado externo, sesamóide e falange re­cebem as duas porções do abdutor (Abd.le Abd.2) e a porção externa do fiexor cur­to do hálux (FC.h) que tem origem nos os­sos do tarso anterior.

Os músculos sesamóides são potentes fle­xores do hálux: desempenham um papel impor­tante na estabilização do hálux (insuficiência =garra do hálux sob ação do extensor curto) e naprimeira fase do passo (ver pág. 240).

B. O plano médio é formado pelos músculos fte­xores longos (fig. 4-87). O flexor comum (Fd) cruzadebaixo do ftexor próprio do hálux (Fph) na saída docanal calcâneo. Posteriormente, eles intercambiamuma anastomose tendinosa (9) e, depois disso, o flexorcomum divide-se em quatro tendões destinados aosquatro últimos dedos. Os lumbricais nascem (fig. 4-88)de dois tendões adjacentes salvo o primeiro (LJ Cadatendão é perfurante para acabar na terceira falange. Atração oblíqua destes tendões é compensada por ummúsculo aplainado, expandido pelo eixo da planta,(fig. 4-87) entre as tuberosidades posteriores do ca1câneoe a margem externa do tendão do 5º osso do metatarso:se trata do quadrado camoso de Sylvius (S) ou acessóriodo ftexor comum. Sua contração simultânea corrige osdesvios axiais dos tendões.

O flexor próprio do hálux (Fph, figs. 4-85 e 4-87)se desliza entre os dois sesamóides para inserir-se na se­gunda falange do hálux a qual ftexiona com força.

C. O plano superficial é representado (fig. 4-86)por um músculo, incluído como flexor comum nocompartimento plantar médio, o flexor plantar curto(FPC), fixado atrás sobre as tuberosidades posterioresdo calcâneo e destinado aos quatro últimos dedos. É oequivalente do FCS dos dedos da mão: seus tendõessão perfurados (fig. 4-88) e se fixam sobre a segundafalange, a qual ftexionam.

Page 213: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

Fph

9

Fig.4-87Fig.4-85

2. MEMBRO INFERIOR 211

FPC

Abd.5

Fig.4-86

Isd

I

Fig.4-83

Fd

Fig.4-84

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212 FISIOLOGIA ARTICULAR

CANAIS TENDINOSOS DO DORSO E DA PLANTA DO PÉ

o ligamento anular anterior do tarso(fig. 4-89) adere os quatro tendões anteriores no es­queleto, na concavidade da face anterior do dorso dopé, servindo-Ihes de polia de reflexão, seja qual foro grau de flexão do tornozelo. Da sua origem nosoalho do seio do tarso, na face superior do proces­so lateral da apófise do calcâneo, este ligamento sedivide imediatamente em duas lâminas divergentes:

- uma lâmina inferior (a), que se perde namargem interna do pé;

- uma lâmina superior (b), que termina nacrista tibial perto do maléolo interno:

- por dentro é atravessada pelo tendão dotibial anterior (TA), cuja bainha serosa as­cende duas travessas de dedo acima de

sua margem supenor,

- por fora é reforçada em profundidade pe­lo ligamento fundiforme, cujas fibras seoriginam e se terminam no seio do tarso,de modo que formam duas espirais:

- o ramo interno, que contém o tendãodo extensor próprio do hálux (Eph),envolvido por uma bainha serosa queultrapassa por pouco o ligamento anu­lar por cima;

- o ramo externo destinado aos tendões

do extenso r comum dos dedos (Ecd) edo fibular anterior (FA) envolvidos nu­ma bainha serosa comum localizada

um pouco mais acima do que a anterior.

O resto dos tendões passam pelos canais retro­maleolares.

Por trás do maléolo externo (fig. 4-90) se desli­zam por um canal osteofibroso (1) que sai do ligamen­to anular externo, os dois tendões paralelos do fibularlateral curto (FLC) para cima e para a frente, e do fi­bular lateral longo (FLL) para trás e abaixo. Após re­fletir-se no vértice do maléolo ficam fixados à face ex­

terna do calcâneo em dois canais osteofibrosos (3 e 4),apoiados no tubérculo dos fibulares (5). Sua bainha se­rosa comum se desdobra neste ponto. Então, o FLC sefixa na estilóide do 5Q osso do metatarso (6) e na basedo 4Q• Um pequeno fragmento (7) foi ressecado paracomprovar quando o tendão do FLL muda de direçãopara introduzir-se no canal do cubóide. A seguir, apa­rece de novo na planta do pé (fig. 4-90), envolvido poruma nova bainha serosa, dirigindo-se obliquamentepara diante e para dentro num canal osteofibroso for-

mado, acima, pelo esqueleto e, abaixo, pelas fibras dofascículo superficial do ligamento calcâneo-cubóideplantar (fascículo profundo, 8) estendidas do calcâneo(9) até o cubóide e a base de todos os ossos do meta­tarso (x) e pelas expansões terminais (10) do tendão dotibial posterior (TP). O tendão do FLL se fixa na basedo 1Q osso do metatarso (11) e envia expansões ao 2Q

osso do metatarso e ao 1Q cuneiform~. De maneira qua­se constante, na entrada no canal, se localiza um sesa­móide (12) que facilita sua reflexão.

Portanto, a face plantar do tarso é coberta portrês sistemas fibrosos:

- as fibras longitudinais do grande ligamentocalcâneo-cubóide plantar;

- as fibras oblíquas para diante e para dentrodo tendão do fibular lateral longo;

- as fibras oblíquas para diante e para fora dasexpansões do tendão do tibial posterior, des­tinadas a todos os ossos do tarso e do meta­tarso salvo os dois ossos do metatarso loca­lizados nos extremos.

Por trás do maléolo interno (fig. 4-92) se des­lizam, por canais e bainhas diferentes, emariações doligamento anular interno, três tendões dispostos dediante para trás e de dentro para fora:

- o tibial posterior (TP), em contato com omaléolo interno: após refletir-se no seu canal(13) sobre o vértice do maléolo, se fixa notubérculo do escafóide (14) e envia numero­sas expansões plantares (10);

- o flexor comum dos dedos (Fd) se deslizacom o anterior e junto à margem interna dosustentáculo (15, ver também figo 4-94) antesde atravessar o tendão do flexor próprio porbaixo (16);

- o flexor próprio do hálux (Fph) passa, emprimeiro lugar, entre os dois tubérculos poste­riores (17) do astrágalo (ver também pág.166), e em segundo lugar, debaixo do rebordodo sustentáculo (18, ver também figo4-94), demodo que muda de direção duas vezes.

Dois cortes frontais (fragmentos anteriores, ladodireito), cujo nível fica especificado pelas setas A e Bnas figs. 4-90 e 4-92, ilustram perfeitamente as dispo­sições dos tendões e suas bainhas nos canais retro­maleolares: o corte A (fig. 4-93) compreende os ma­léolos; o corte B (fig. 4-94), mais anterior, se localizano nível do sustentáculo e do tubérculo dos fibulares.

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2. MEMBRO INFERIOR 213

FLC

5

FLL8

9

12

6

16

Fig.4-92

FLLFLC

354

a

b

Fig.4-89

2Tdd

FLC

FLL1Abd.5

TP

Fd

Fph

Adu.hS

FPC

Fig.4-93

Fig.4-94

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214 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS FLEXORES DO TORNOZELO

A mobilidade do pé e da parte posterior do pése realiza graças aos músculos fiexores e extenso­res do tornozelo, agindo com relação aos eixos docomplexo articular do tarso posterior, tal como sedefiniram no cardã heterocinético (fig. 4-95); defato, parece preferível abandonar o antigo esque­ma de Ombredane (fig. 4-96) no qual os eixosXX' e ZZ' são perpendiculares, visto que não co­rresponde à realidade. Por definição, os eixos XX'e UU' do cardã heterocinético não são perpendi­culares entre si, o que introduz direções preferen­ciais de movimentos, característica reforçada peladesigual distribuição dos músculos. Os dois eixosdo cardã determinam quatro quadrantes nos quaisse distribuem dez músculos e treze tendões.

Todos os músculos situados diante do eixotransversal XX' são fiexores do tornozelo, em­bora possam ser classificados em dois gruposcom relação ao eixo de Henke DD':

- os dois músculos localizados por den­tro deste eixo, isto é, o extensor própriodo hálux (Eph) e o tibial anterior (TA).quanto mais afastados estejam deste ei­xo mais adutores e supinadores serão aomesmo tempo: isso significa que o tibialé mais adutor-supinador do que exten­sor próprio;

- os dois músculos localizados por foradeste eixo, a saber, o extensor comumdos dedos (Ecd) e o fibular anterior(FA), são abdutores e pronadores aomesmo tempo. Pela mesma razão, o fi­bular é mais abdutor-pronador do que oextensor comum.

Para conseguir uma fiexão pura de tornoze­lo, sem componente de adução-supinação ou deabdução-pronação, é necessário que estes doisgrupos musculares atuem simultânea e equilibra­damente; são, por conseguinte, antagonistas-si­nergistas (estas ações podem reproduzir-se nomodelo mecânico do pé no final do volume).

Entre os quatro flexores do tornozelo,dois se inserem diretamente no tarso ou no me­tatarso:

- o tibial anterior (fig. 4-97) se insere noprimeiro cuneiforme e no primeiro ossodo metatarso; .

- o fibular anterior (fig. 4-98), músculo in­constanté, mas freqüente (90% dos ca­sos), se insere na base do quinto osso dometatarso.

Portanto, sua ação no pé é direta sem ne­cessidade de nenhum auxiliar.

Não ocorre o mesmo com os outros doismúsculos fiexores do tornozelo: o extensor co­

mum dos dedos e o extensor próprio do hálux,que agem nos dedos: se os interósseos (Is) estabi­lizam os dedos em alinhamento normal ou em fie­

xão (fig. 4-98), o extensor comum é flexor do tor­nozelo, porém se os interósseos são fracos, a fle­xão do tornozelo se realizará à custa da garra dosdedos (fig. 4-102). Igualmente (fig. 4-97), o fatode que os músculos sesamóides (Ss) estabilizemo hálux, permite ao extensorpróprio flexionar otornozelo. Quando os sesamóides são fracos, aação do extensor próprio sobre o tornozelo vaiacompanhar-se de hálux em garra (fig. 4-100).

Quando os músculos do compartimento an­terior da perna se paralisam ou enfraquecem,eventualidade relativamente freqüente no casode patologia, não é possível levantar a ponta dopé (fig. 4-99): se fala então de "pé eqüino" (o ca­valo, equus em latim, realiza a marcha sobre aponta dos dedos). Durante a marcha, o indivíduoé forçado a levantar a perna para que a ponta dopé não arraste pelo chão: é a marcha "em step­page". Em alguns casos, o extensor comum con­serva certa eficácia (fig. 4-101): o pé, emboracaído, é desviado para fora, se trata então de umpé "eqüino- valgo".

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2. MEMBRO INFERIOR 215

j\

Fig.4-97

Fig.4-101

Fig.4-98

Fig.4-95

Ecd

F1f:Fph

T

FLEX.

ADU.

SUPIN.

EphTA

Fig.4-102

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216 FISIOLOGIA ARTICULAR

o TRÍCEPS SURAL

Os músculos extensores do tornozelo pas­sam todos atrás do eixo XX' de flexão-extensão(fig. 4-96). Em teoria, existem seis músculosextensores da tíbio-tarsiana (sem contar o plan­tar delgado, visto que se pode omitir totalmen­te). Na prática, somente o tríceps é eficaz: tam­bém é um dos músculos mais potentes do cor­po, depois do glúteo máximo e do quadríceps.Por outra parte, sua posição ligeiramente axialfaz dele um extensor.

Como o seu nome indica, o tríceps sural éformado por três corpos musculares (fig.4-103) que possuem um tendão terminal co­mum, o tendão de Aquiles (1), que se insere naface posterior do calcâneo (ver página seguin­te). Das três porções, somente uma é monoar­ticular, o solear (2): que se insere simultanea­mente na tíbia e na fíbula e no arco fibroso dosolear (3) que unifica estas duas inserções.Músculo profundo, representado aqui atravésdos gêmeos, só aparece na parte inferior daperna, de um lado e outro do tendão calcâneo.As outras duas porções são biarticulares; setrata dos gêmeos. O gêmeo externo (3) se in­sere acima do côndilo externo do fêmur e so­bre a capa condilar externa, que às vezes con­tém um sesamóide. O gêmeo interno (5) se in­sere no nível do côndilo e da capa condilar in­ternos. Ambas as porções carnosas convergemna linha média, constituindo o V inferior dolosango poplíteo (10). Estão mantidos lateral­mente pelos tendões dos músculos ísquio-ti­biais, cuja divergência forma o V superior in­vertido do losango poplíteo: o bíceps (6) porfora e os músculos da "pata de ganso" (7) pordentro; o deslizamento entre os gêmeos e ostendões dos ísquio-tibiais está facilitado poruma bolsa serosa interposta no seu ponto deintersecção: a bolsa serosa do semitendinoso edo gêmeo interno (8), constante, a bolsa do bí-

ceps e do gêmeo externo (9), inconstante; bol­sas onde se localizam os quistos poplíteos. Gê­meos e solear finalizam num sistema aponeu­rótico complexo, descrito na página seguinte,que dá origem ao tendão ca1câneo propriamen­te dito.

O comprimento das diferentes porçõesdo tríceps (fig. 4-104) é ligeiramente desigual:o comprimento do 'solear (Ls) é de 44 mm, o dosgêmeos (Lg) é de 39 ~. Isso explica o fato deque a eficácia dos gêmeos, músculos biarticula­res, esteja sobreposta ao grau de fiexão do joe­lho (fig. 4-105): entre a fiexão e a extensão má­ximas, o deslocamento da inserção superior dosgêmeos comporta um alongamento ou um en­curtamento relativo (e) igualou superior ao seucomprimento (Lg). Em conseqüência, quando ojoelho é estendido (fig. 4-106), os gêmeos, es­tendidos passivamente, podem desenvolver suamáxima potência; esta disposição permite trans­ferir ao tornozelo parte da potência do quadrí­ceps. Contudo, quando o joelho é fiexionado(fig. 4-108), os gêmeos totalmente distendidos(e maior que Lg) perdem toda a sua eficácia, sóintervém o solear, porém sua potência seria in­suficiente para assumir a marcha, a corrida ou osalto se estas atividades não implicassem neces­sariamente a extensão do joelho. Portanto, osgêmeos não são fiexores do joelho.

Todos os movimentos que intervêm na ex­tensão do joelho e na do tornozelo ao mesmotempo, como trepar (fig. 4-107) ou correr (figs.4-109 - 4.110), favorecem a ação dos gêmeos.O tríceps sural desenvolve sua máxima po­tência quando, a partir de uma posição de fle­xão do tornozelo e extensão do joelho (fig. 4­109), se contrai para estender o tornozelo (fig.4-110) e proporcionar o impulso motor na úl­tima fase do passo.

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6

94

3

2

Fig.4-103Fig.4-106

Fig.4-110

2. MEMBRO INFERIOR 217

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218 FISIOLOGIA ARTICULAR

o TRÍCEPS SURAL(continuação)

o aparelho aponeurótico do tríceps sural é mui­to complexo (fig. 4-111, vista anterior: a tíbia foi re­movida): inclui as aponeuroses de origem e as de ter­minação que compõem, a seguir, o tendão de Aquiles:

- as aponeuroses de origem são três:

- as duas bandas aponeuróticas dos gêmeos,o interno (1) e o externo (2), que se locali­zam na parte lateral da zona de inserçãodos gêmeos, acima dos côndi10s femorais;

- a espessa lâmina aponeurótica do solear(3) que se origina na tíbia e na fíbula, es­tando separados estes dois pontos de ori­gem pelo arco do solear; a parte inferiordesta lâmina é profundamente decotada"em estandarte", com uma lingüeta inter­na (4) e uma externa (5).

- as aponeuroses de terminação são duas:

- uma espessa lâmina comum terminal (6),paralela à lâmina do solear, que continuacom o tendão calcâneo ou de Aquiles (A)inserindo-se no calcâneo (C);

- uma lâmina sagital (7), perpendicular àlâmina comum terminal em cuja face an­terior se adere; a particularidade destalâmina sagital é que se afina e ascendepara a face anterior da lâmina do solear,após passar pela sua incisura.

De trás para diante se encontram assim, sucessi­vamente, três planos aponeuróticos: o das bandas dosgêmeos, a seguir, o da lâmina comum terminal e, porúltimo, o da lâmina do solear; quanto à lâmina sagi­tal, ela cavalga sobre o plano desta última.

As fibras musculares do tríceps se organi­zam com relação ao citado sistema aponeurótico(fig.4-112):

- as fibras dos gêmeos (Gin e Gex) partem di­retamente da superfície supracondilar em for­ma de acento circunflexo e da face anterior de

cada uma das bandas; se dirige para baixo eadiante e para o eixo da perna para inserir-sena face posterior da lâmina terminal.

As fibras musculares do solear se dispõem emduas camadas:

- uma camada posterior (Sp), cujas fibras seexpandem pela face anterior da lâmina ter­minal e também um pouco sobre as faces la­terais da lâmina sagital;

- uma camada anterior cujas fibras internas(Sal) se inserem na face interna da lâminasagital e cujas fibras externas (SaE) se inse­rem na face externa da lâmina sagital.

Este esquema também lembra a estrutura em es­piral do tendão de Aquiles que lhe proporciona elas­ticidade.

A força do tendão de Aquiles se exerce sobre aextremidade posterior do calcâneo (fig. 4-113), numadireção que forma Ílm ângulo muito acentuado comseu braço de alavanca AO. A decomposição desta for­ça T demonstra que o componente eficaz t[ - perpen­dicular ao braço de alavanca - é mais importante queo componente centrípeto t2• Deste modo, o mÚsculotrabalha em excelentes condições mecânicas.

O componente eficaz ti predomina sobre t2, inde­pendentemente do grau de flexão-extensão do tornoze­lo. Isto se deve ao modo de inserção do tendão calcâ­neo (fig. 4-114) que se realiza na parte inferior da fa­ce posterior do calcâneo (ponto K), enquanto uma bol­sa serosa o separa da parte superior. A força muscularnão se exerce no ponto de inserção (K), mas no pontotangente (A) do tendão com a face posterior docalcâ­neo. Na flexão (fig. 4-114, a), este ponto A se localizarelativamente alto na face posterior do calcâneo. Naextensão (fig. 4-114, b), o tendão se "desenrola" e sedescola da face posterior do calcâneo, e o ponto de tan­gênciaA' "desce" com relação ao osso, embora a dire­ção do braço de alavanca A 'O permaneça ligeiramen­te horizontal,jormando um ângulo constante com a di­reção do tendão. Este modo de inserção do tendão cal­câneo permite assim que este se "desenrole" sobre osegmento de polia composto pela face posterior do cal­câneo de forma que aumenta a eficácia do tríceps du­rante a extensão. Ela é idêntica à inserção do trícepsbraquial no olécrano (ver volume I).

Quando a contração do tríceps alcança seu máxi­mo (fig. 4-115), se pode comprovar como se associa àextensão um movimento de adução-supinação que di­rige a planta do pé para trás e para dentro (seta). Estecomponente terminal de adução-supinação se deve aque o tríceps age sobre a tíbio-tarsiana através da sub­astragaliana (fig. 4-116). Assim, mobiliza sucessiva­mente estas duas articulações (fig. 4-117): primeiro atzôio-tarsiana, estendendo a mesma 30° em tomo do

eixo transversal XX', e a seguir a subastragaliana, pro­vocando uma basculação do calcâneo em tomo do ei­xo de Henke (mn), o que determina uma adução de 13°e uma supinação de 12° (Biesalski e Mayer, 1916).

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Gex

SaE

Fig.4-114

Fig.4-116

2. MEMBRO INFERIOR 219

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220 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS OUTROS EXTENSORES DO TORNOZELO

Todos os músculos que passam detrásdo eixo transversal XX' de flexão-extensão(fig. 4-118) são extensores do tornozelo. Alémdo tríceps sural (T), outros cinco músculostêm uma ação extensora na tíbio-tarsiana, - oplantar (não descrito aqui) é muito fraco paratomá-lo em conta; só interessa como "bancode tendão"; infelizmente ele é inconstante.

Por fora (fig. 4-119), o fibular lateral curto(FLC) e o longo (FLL), localizados por fora doeixo de Henke UU' (fig. 4-95), são abdutores epronadores (ver página seguinte).

Por dentro (fig. 4-120), o tibial posterior(TP), o fiexor comum dos dedos (Fd) e o fiexorpróprio do hálux (Fph), localizados por dentrodo eixo UU' (fig. 4-95), são adutores e supina­dores (ver pág. 224).

Portanto, a extensão pura deriva da açãosinérgica-antagonista dos músculos do grupoexterno e do grupo interno.

Contudo, a ação extensora destes múscu­los, que se poderiam denominar "extensoresacessórios", é muito modesta comparada com ado tríceps sural (fig. 4-121). De fato, a potência

do tríceps é de 6,5.kg enquanto a potência glo­bal de outros extensores (f) é de 0,5 kg, ou sejaa 1/14 da potência total de extensão. Se a po­tência de um músculo é proporcional à superfí­cie da sua secção fisiológica e ao seu compri­mento, ele pode ser esquematizado num volumecuja base é a superfície de secção e a altura é ocomprimento. O solear (Sol), cuja secção é de20 cm2 e comprimento é de 44 mm, tem umapotência um pouco inferior (8,80) à (8,97) dosgêmeos (Ge), cuja secção global é de 23 cm2 e ocomprimento é de 39 mm. Por outra parte, a po­tência dos fibulares (cubo cinza) representa ametade da potência global dos extensores aces­sórios. O fibular lateral longo é duas vezes maispotente do que o fibular lateral curto.

Portanto, quando o tendão calcâneo serompe, os músculos extensores acessórios po­dem estender ativamente o tornozelo, com opé livre sem apoio. Porém só o tríceps permitea elevação sobre a ponta do pé. A perda da ele­vação ativa sobre a ponta do pé - posição tam­bém denominada "espírito da Bastilha"- é, as­sim, o teste que permite diagnosticar a rupturado tendão calcâneo.

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2. MEMBRO li"lFERIOR 221

Fig.4-121

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222 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ABDUTORES-PRONADORES: OS FIBULARES

Os músculos fibulares, que passam detrásdo eixo transversal XX' e para fora do eixo deHenke UU', são simultaneamente (fig. 4-122):

- extensores (seta 1);

- abdutores (seta 2), desviando para forao eixo 22';

- pronadores (seta 3), orientando para fo­ra o plano geral da planta do pé.

O fibular lateral curto (FLC), que se inse­re (fig. 4-123) no processo estilóide do quintoosso do metatarso é, principalmente, abdutor dopé: para Duchenne de Boulogne inclusive, ele éo único abdutor direto (ver também figo 4-90).Ele é, em todo caso, mais abdutor que o fibularlateral longo. Ele participa (fig. 4-124) na prona­ção (seta 3) da parte anterior do pé, elevando(seta a) os raios metatarsianos externos. Nestaação, ele está reforçado pelo fibular anterior(FA) e o extensor comum dos dedos (sem repre­sentação aqui), que também são abdutores-pro­nadores e, ao mesmo tempo, flexores do torno­zelo. Portanto, a ação abdução-pronação pura éo resultado da ação sinérgica-antagonista dos fi­bulares laterais por um lado e do fibular anteriore do extensor comum dos dedos pelo outro.

O fibular lateral longo (FLL) (figs. 4-123 e4-125) desempenha um papel primordial tantonos movimentos do pé como na estática e dinâ­mica da abóbada plantar:

1. Ele é abdutor, como o fibular lateralcurto, e sua contração desloca a parteanterior do pé para fora (fig. 4-127), embaioneta, enquanto o maléolo internoestá proeminente;

2. Ele é extensor de forma direta e indireta:

- diretamente (figs. 4-124 e 125), descea cabeça do primeiro metatarsiano;

- indiretamente: deslocando o primeirometatarsiano para fora (fig. 4-125, se­ta 5), aproxima os ossos do metatarsointernos dos externos. Contudo (fig.4-126), o tríceps só estende direta­mente os metatarsianos externos (es­quematizados em forma de viga)."Engatando" os metatarsianos inter­nos sobre os externos (seta 5), o fibu­lar lateral longo permite que a forçado tríceps se reparta por todos osraios da planta. A confirmação estáclara nas paralisias do fibular laterallongo, nas que o tríceps só estende oarco externo: o pé gira em supinação.A extensão pura do pé é, assim, oresultado da contração sinérgica-an­tagonista do tríceps e do fibular late­rallongo: sinérgica na extensão e an­tagonista na pronação-supinação.

3. Ele é pronador (fig. 4-124), de modo quedesce (seta b) a cabeça do primeiro me­tatarsiano quando a parte anterior do pénão está apoiada no chão. A pronação(seta 3) é o resultado da elevação do ar­co externo (a) associado ao descenso dointerno (b).

Veremos (pág. 234) também como o fibu­lar lateral longo acentua a curvatura dos três ar­cos da abóbada plantar e constitui seu principalsuporte muscular.

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Fig.4-126

Fig.4-127

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224 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS ADUTORES-SUPINADORES: OS TIBIAIS

Os três músculos retromaleolares internos,localizados por trás do eixo XX' e pela frentedo eixo UU' (fig. 4-95) são simultaneamente(fig. 4-128):

- extensores (seta 1);

- adutores (seta 2), desviando para dentroo eixo longitudinal do pé;

- supinadores (seta 3), orientando paradentro o plano geral do pé.

O tibial posterior (TP), o mais importantedos três, se insere (fig. 4-129) no tubérculo doescafóide (cor cinza). Atravessando a tíbio-tar­siana, a subastragaliana e a médio-tarsiana, eleatua simultaneamente nestas três articulações:

- deslocando o escafóide para dentro(fig. 4-130), é um potente adutor (paraDuchenne de Boulogne é mais adutor doque supinador). Desta forma, é um anta­gonista direto do fibular lateral curto,que desloca o tarso anterior para fora(fig. 4-131) pelo quinto metatarsiano;

- graças às suas expansões plantares nosossos do tarso e do metatarso (ver figo4­91), é supinador e desempenha um pa­pel primordial no suporte e orientação daabóbada plantar (ver pág. 234). Foi pos­sível incriminar a ausência congênitadestas expansões do tibial posterior nadeterminação de um pé chato valgo. Os52° de amplitude da supinação se distri­buem em 340 na subastragaliana e em 180

na médio-tarsiana (Biesalski e Mayer);

- não só é extensor (fig. 4-132) da tíbio­tarsiana (seta a), mas também estende amédio-tarsiana descendo o escafóide(seta b): o movimento da parte anteriordo pé prolonga o do tornozelo (ver pág.163, figo4-5).

Em suas ações de extensão e de adução, otibial posterior está reforçado pelo flexor própriodo hálux e pelo fiexor comum.

O tibial anterior e o extensor próprio do há­lux (fig. 4-132) passampelafrente do eixo trans­versal XX' e por dentro do eixo de Renke UU'(fig. 4-95). De modo que são jiexores, adutorese supinadores do tornozelo simultaneamente.

O tibial anterior (fig. 4-128) é mais supi­nador do que adutor. Ele age elevando todos oselementos do arco interno (fig. 4-132):

- eleva a base do primeiro metatarsianosobre o primeiro cuneiforme (seta c),pelo qual a cabeça do primeiro metatar­siano ascende;

- eleva o cuneiforme sobre o escafóide

(seta d) e o escafóide sobre o astrágalo(seta e) antes de flexionar a tíbio-tar­siana (seta f).

Ao aplainar o arco interno durante a supina­ção, é antagonista direto do fibular lateral longo:

- a sua ação adutora é mais moderada quea do tibial posterior;

- é fiexor do tornozelo e sua contração si­nérgica-antagonista com o tibial poste­rior determina uma adução-supinaçãopura sem flexão nem extensão;

- sua contratura comporta um pé astrága­10varo com flexão de dedos (fig. 4-134),principalmente do hálux.

O extensor próprio do hálux (fig. 4-133)é um adutor-supinador mais fraco do que o tibialanterior. Ele pode substituir o tibial anterior naflexão do tornozelo, porém então se encontracom freqüência um hálux em garra.

A potência dos supinadores (2,82 kg) supe­ra à dos pronadores (1,16 kg): sem apoio, o pégira espontaneamente em supinação. Este dese­quilíbrio compensa a tendência natural do pé emapoio a virar em pronação (ver pág. 236) quan­do o peso do corpo provoca que o pé entre emcontato com o chão.

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Fig.4-128

Fig.4-134

Fig.4-129

Fig.4-133

Fig.4-130

2. MEMBRO INFERIOR 225

Fig.4-131

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226 FISIOLOGIA ARTICULAR

A abóbada plantar é um conjunto arqui­tetônico que associa com harmonia todos oselementos ósteo-articulares, ligamentares emusculares do pé. Graças às suas modificaçõesde curvatura e à sua elasticidade, a abóbada écapaz de adaptar-se a qualquer irregularidadedo terreno e transmitir ao chão as forças e opeso do corpo nas melhores condições mecâni-

cas e nas circunstâncias mais diversas. Ele de­sempenha o papel de amortecedor indispen­sável para a flexibilidade da marcha. As altera­ções que podem acentuar ou diminuir suas cur­vaturas repercutem gravemente no apoio nochão, de modo que obrigatoriamente alteram acorrida e a marcha, ou mesmo o simples fatode estar de pé.

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2. MEMBRO INFERIOR 227

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228 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ABÓBADA PLANTAR EM CONJUNTO

Considerada no seu conjunto, a estruturada planta do pé pode definir-se corno urnaabóbada sustentada por três arcos. Os arqui­tetos e engenheiros realizaram urna abóbadasemelhante (fig. 5-1, pavilhão do CNIT na LaDéfense): se fixa no chão por três pontos, A, Be C, que estão dispostos sobre um plano hori­zontal (fig. 5-2), nos vértices de um triânguloeqüilátero. Um arco que delimita os lados late­rais da abóbada foi colocado entre dois apoiosconsecutivos AB, BC ou CA. O peso da abóba­da recai (fig. 5-3) sobre a chave da abóbada(seta) e se reparte através dos dois arcobotantespara os pontos de apoio A e B, também deno­minados "estribos do arco".

Alguns autores posteriores a Lapidus, co­rno De Doncker e Kowalski, criticam o concei­to de abóbada, que consideram muito estático, eopinam, com certas justificativas, que os arcosexternos e anteriores somente são construçõesda imaginação. Eles preferem comparar o pécom urna "armadura de carpintaria" (fig. 5-4),parte da armação com duas vigas (SA) e (SB),articuladas conjuntamente no remate (S), e su­tentadas na base por um tirante de coberta (AB)que impede que o triângulo caia debaixo da car­ga sobre o remate. Portanto, o pé somente teriaurna abóbada axial com um tirante de coberta

principal composto essencialmente por potentesligamentos plantares e músculos plantares edois tirantes laterais secundários, no nível doque se denominava, até então, de arcos interno eexterno. Certamente, este conceito correspondemelhor à realidade anatômica, e particularmen­te, no que diz respeito aos elementos ligamenta­res e musculares que formam cordas de arcos eque, de fato, também podem ser comparadoscom tirantes de coberta. Contudo, os termos

abóbada e arcos estão tão expandidos e tão acei­tos na linguagem, que é preferível seguir utili­zando-Ihes de forma paralela aos termos de ar­madura de carpintaria e tirantes de coberta. Co­rno é freqüente em biomecânica, duas noçõesque parecem contraditórias não se excluem eparticipam num conceito sintético. Portanto, secontinuará empregando os termos de abóbadaplantar e arcos.

A abóbada plantar (fig. 5-5, vista interna,transparente) não forma um triângulo equilátero,mas ao ter três arcos e três pontos de apoio, suaestrutura é comparável: seus pontos de apoio(fig. 5-6, o pé visto desde cima, supostamentetransparente) estão incluídos na zona de contatocom o chão, ou impressão plantar (tracejada).Correspondem à cabeça do primeiro osso dometatarso (A), à cabeça do quinto osso do me­tatarso (B) e às tuberosidades posteriores docalcâneo (C). Cada ponto de apoio é comum aosdois arcos contíguos.

O arco anterior, o mais curto e baixo, selocaliza entre os dois pontos de apoio anterioresA e B. O arco externo, de longitude e altura in­termédias, se localiza entre os dois pontos deapoio externos B e C. Por último, o arco inter­no, o mais longo e alto, se localiza entre os doispontos de apoio internos C e A. Ele é o mais re­levante dos três, tanto no plano estático quantono dinâmico.

De modo que a forma da abóbada plantar(parte inferior da figo 5-5) é semelhante a umavela triangular inflada pelo vento. O seu vérti­ce é deslocado para trás e o peso do corpo seexerce na sua vertente posterior (seta) numponto (cruz preta da figo 5-6) situado no centroda garganta do pé.

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2. MEMBRO INFERIOR 229

A

c

B

Fig.'5-2

s

,~A- -B

A

c

Fig.5-3

A B

B

Fig.5-4

Fig.5-5

c

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230 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ARCO INTERNU

Entre os seus dois pontos de apoio anterior(A) e posterior (C), o arco interno (fig. 5-7), in­clui cinco peças ósseas; de diante para trás:

- o primeiro osso do metatarso (M), cujoúnico contato com o chão é sua cabeça;

- o primeiro cuneiforme (C), sem contatoalgum com o chão;

- o escafóide (esc), chave da abóbada (tra­cejado) deste arco, localizado a 15-18mm por cima do chão;

- o astrágalo (astr), que recebe as forçastransmitidas pela perna e as reparte(ver figo 5-34) pela abóbada;

- o calcâneo (cale), cujo único contato como chão é pela sua extremidade posterior.

A transmisão das forças mecânicas se podeconstatar (fig. 5-8) na disposição das trabécu­Ias ósseas:

- as trabéculas originadas na cortical an­terior da tíbia percorrem, oblíquas parabaixo e atrás, o arcobotante posterior,atravessando o corpo do astrágalo paraexpandir-se no leque subtalâmico para oarcobotante posterior do arco;

- as trabéculas originadas na cortical pos­terior da tíbia se orientam para baixo eadiante no colo e a cabeça do astrágalo,para atravessar o escafóide e o arcobotan­te anterior: cuneiforme e metatarsiano.

O arco interno conserva sua concavidadegraças aos ligamentos e aos músculos (fig. 5-7).

Numerosos ligamentos plantares unemas cinco peças ósseas: cúneo-metatarsiana, cú­neo-escafóide, mas especialmente a calcâneo­escafóide inferior (1) e a subastragaliana ouastrágalo-calcânea (3). Eles resistem todas asforças violentas, embora de curta duração, aocontrário dos músculos que se opõem às defor­mações prolongadas.

Os músculos que unem dois pontos mais oumenos afastados do arco formam cordas parciaisou totais. Eles agem como verdadeiros tensores.

O tibial posterior (TP) constitui uma cor­da parcial (fig. 5-10) situada perto do vértice

do arco, porém o papel que desempenha é pri­mordial. De fato (fig. 5-9), dirige o escafóidepara baixo e atrás, sob a cabeça do astrágalo(círculo tracejado); a um encurtamento relati­vamente pouco importante (e) correspondeuma mudança de orientação do escafóide quedetermina um descenso do arc9botante ante­rior. Além disso, as expansões plantares do seutendão (fig. 5-7, 3) se entrelaçam com os liga­mentos plantares' de modo que incidem sobreos três metatarsianos médios.

O fibular laterâllongo (FLL) também in­flui sobre o arco interno cuja cavidade aumen­ta (fig. 5-11), flexionando o primeiro osso dometatarso sobre o primeiro cuneiforme, e estepor sua vez sobre o escafóide (fig. 5-9) (vertambém sua ação sobre a curvatura transversal,pág.234).

O flexor próprio do hálux (Fph) formauma curvatura subtotal (fig. 5-12) do arco inter­no; portanto, age com potência em sua concavi­dade, ajudado pelo flexor comum dos dedos(Fd) que o cruza para baixo (fig. 5-13). O flexorpróprio também desempenha o papel de estabi­lizador do astrágalo e do calcâneo: passandoentre seus dois tubérculos posteriores, se opõe(fig. 5-14) ao retrocesso do astrága10 (r) pelo es­cafóide que empurra (seta branca): em primeirolugar, o ligamento interósseo entra em tensão (2)de modo que o astrágalo se desloca para dian­te pelo tendão que o propulsa como se fosse acorda de um arco que lança a seta. Ao passar porbaixo da proeminência do sustentáculo do astrá­galo (fig. 5-15), o tendão do flexor próprio, pelomesmo mecanismo, levanta a extremidade ante­rior do caleâneo que recebe o impulso vertical(seta branca) da cabeça do astrágalo.

O adutor do hálux (Adu.h) constitui a cor­da total do arco interno (fig. 5-16). Portanto, éum tensor particularmente eficaz: aumenta aconcavidade do arco interno aproximando assuas duas extremidades.

Contudo (fig. 5-17), o extensor próprio dohálux (Eph) - em certas condições - e o ti­bial anterior (TA) diminuem a sua curvatura eo achatam.

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Fig.5-8

Fig.5-10 ~. TP~ ~~

Fi9.5.11~ ~/ FLL~-.'

Fig.5-16

2. MEMBRO INFERIOR 231

Fd

/~Ph ~FPh- Fig.5-12 -- Fig.5-13

TA

;Z/~E:i,. ".17

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232 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ARCO EXTERNO

o arco externo somente contém três peçasósseas (fig. 5-18):

- o quinto osso do metatarso (5ºm), cujacabeça constitui o ponto de apoio ante­rior (B) do arco anterior;

- o cubóide (cub), sem nenhum contatocom o chão;

- o calcâneo (cale), cujas tuberosidadesposteriores constituem o ponto de apoioposterior (C) do arco.

Este arco, ao contrário do interno que se desco­la do chão, está pouco distanciado (3-5 mm) e entraem contato com o chão através das partes moles.

A transmissão de forças mecânicas (fig. 5-19)se realiza através do astrágalo, fixado ao calcâneopor dois sistemas trabeculares:

- Originadas na cortical anterior da tíbia, astrabéculas posteriores se expandem parao leque subtalâmico;

- Originadas na cortical posterior da tíbia,as trabéculas anteriores atravessam em

primeiro lugar o astrágalo, cuja cabeçarepousa em parte na apófise maior do cal­câneo e, em segundo lugar, o cubóide,através do qual alcançam o quinto ossodo metatarso e o apoio anterior.

Além do leque subtalâmico, o ca1câneo con­tém dois sistemas trabeculares principais:

- um sistema arciforme superior, côncavopara baixo, que se condensa numa lâminacompacta no chão do seio do tarso, suas fi­bras trabalham em compressão;

- um sistema arciforme inferior, côncavopara cima, que se condensa na cortical in­ferior do osso e trabalha em alongamento.

Entre estes dois sistemas se encontra um pon­to fraco (+).

Enquanto o arco interno é todo flexível, gra­ças à mobilidade do astrágalo sobre o calcâneo, oarco externo é muito mais rígido para poder trans­mitir o impulso motor do tríceps (fig. 5-125, pág.223). Esta rigidez se deve à potência do grande li­gamento calcâneo-cubóide plantar, cujos feixesprofundo (4) e superficial (5) impedem a aberturainferior das articulações ca1câneo-cubóide e cubói-

de-metatarsiana (fig. 5-20) sob o peso do corpo(seta). A chave de abóbada do arco é composta pe­la apófise maior do calcâneo (D) onde se opõemas forças do arcobotante posterior CD e anteriorBD. Quando se exerce verticalmente uma forçamuito violenta sobre o arco, pelo astrágalo - caí­da sobre os pés desde um lugar elevado - se pro­duzem duas conseqüências (fig. 5-21):

- o ligamento calcâneo-cubóide plantar re­siste, porém o arco se rompe no nível dasua chave de abóbada e a apófise maior sedescola por um .traço vertical que passa pe­lo ponto fraco;

- o tálamo se afunda no corpo do ca1câneo:o ângulo de Boehler (PTD) geralmente ob­tuso (fig. 5-20) para baixo está anulado einclusive invertido em PT'D;

- no lado interno, a apófise menor se desco­la com freqüência por um traço sagital(sem representar).

Este tipo de fraturas do ca1câneo são muitocomplicadas de reduzir-se, visto que não só é ne­cessário levantar o tálamo, mas também que a apó­fise maior tem que ser endireitada, sem a qual o ar­co interno permaneceria afundado.

Três músculos são os tensores ativos do cita­do arco:

- o fibular lateral curto (FLC) é uma cordaparcial (fig. 5-22) do arco, porém, como o li­gamento calcâneo-cubóide, impede a aber­tura inferior das articulações (fig. 5-23);

- o fibular lateral longo (FLL), que segue atéo cubóide um trajeto paralelo ao anterior,desempenha o mesmo papel; porém, tam­bém (fig. 5-24), enganchado ao calcâneo pe­lo tubérculo dos fibulares (6), mantém elas­ticamente sua extremidade anterior como o

flexor próprio do hálux no lado interno;

- o abdutor do quinto dedo (Abd.5) cons­titui a corda total do arco externo (fig. 5­25); como seu par o adutor do hálux: temuma ação análoga.

O fibular anterior (F) e o extensor comum dosdedos (Ecd) - em certas condições - diminuema curvatura do arco externo ao agir sobre a sua con­vexidade. O mesmo acontece com o tríceps (T).

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2. ivIEMBRO INFERIOR 233

Fig.5-25

Fig.5-23

Fig.5-19

FLC

..• ~ ..

/ Fig. 5-22 ~"'" --

B

Fig.5-185 6 4 Abd.5

Fig.5-21

Fig.5-20

Fig.5-26

T

c

c

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234 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ARCO ANTERIOR E A CURVATURA TRANSVERSAL

o arco anterior (fig. 5-27, corte I) se esten­de entre a cabeça do primeiro osso do meta­tarso, que repousa sobre os dois sesamóides,a 6 mm do chão (A), e a cabeça do quinto os­so do metatarso (B), também a 6 mm do chão.Este arco anterior passa pela cabeça de outrosmetatarsianos: a segunda cabeça, a mais eleva­da (9 mm), constitui a chave da abóbada. A ter­ceira (8,5 mm) e a quarta cabeças (7 mm) estãoem posição intermédia.

A concavidade deste arco é pouco acentua­da e entra em contato com o chão por intermé­dio das partes moles, constituindo o que algunsdenominam "o calcanhar anterior do pé". Estearco está subtenso pelo ligamento intermetatar­siano, sem uma grande eficácia, e por um sómúsculo, o fascículo transverso do abdutor dohálux (Abd.h), que forma uma série de cordasparciais e totais entre a cabeça do primeiro me­tatarsiano e a dos outros quatro. É um músculorelativamente pouco potente e fácil de forçar. Oarco anterior "cai" comfreqÜência - parte an­terior do pé chato - ou mesmo invertido - par­te anterior do pé convexo -, o que provoca aformação de calos debaixo das cabeças metatar­sianas rebaixadas (ver pág. 150).

Os cinco raios metatarsianos finalizam noarco anterior. O primeiro raio (fig. 5-29) éo mais erguido e forma, segundo Fick, um ângu­lo de 18 a 25° com o chão. A seguir, esteângulo metatarsiano/chão diminui regularmen­te: 15° para o segundo (fig. 5-30), 10° para o ter­ceiro (fig. 5-31), 8° para o quarto (fig. 5-32) e só5° para o quinto osso do metatarso (fig. 5-33),quase paralelo ao chão.

A curvatura transversal da abóbada seguede diante para trás. No nível dos cuneiformes(fig. 5-27, corte II), o arco transversal somentecontém quatro ossos e entra em contato com ochão através da sua extremidade no nível do cu­

bóide (cub). O primeiro cuneiforme (C1) está to­talmente suspenso, sem nenhum contato com ochão; o segundo cuneiforme (C,) constitui a cha­ve da abóbada (tracejado) e foma, com o segun­do metatarsiano que o prolonga para diante, o ei-

xo do pé, a cúspide da abóbada. Este arco ésubtenso pelo tendão do fibular lateral longo(FLL), que desta forma age com grande potên­cia sobre a curvatura transversal.

No nível do escafóide e do cubóide(fig. 5-27, corte lU), o arco transversal somenteentra em contato com o chão através da sua ex­

tremidade externa composta pelo cubóide (cub).O escafóide (esc), suspenso acima do chão, des­cansa "em suporté em falso" sobre o cubóide pe­la sua extremidade externa. A curvatura deste ar­co está mantida pelas' expansões plantares do ti­bial posterior (TP).

Uma vista inferior do pé (esquerdo) supos­tamente transparente (fig. 5-28) mostra como acurvatura transversal da abóbada está mantida

por três músculos, sucessivamente de diantepara trás:

- o abdutor do hálux (Abd.h), de direçãotransversal;

- o fibular lateral longo (FLL), o maisimportante do ponto de vista dinâmico eque constitui um sistema tensor oblíquopara diante e para dentro, que age sobreos três arcos;

- as expansões plantares do tibial poste­rior (TP), desempenhando um papelprincipalmente estático, e que consti­tuem um sistema tensor oblíquo paradiante e para fora.

A curvatura longitudinal do conjunto daabóbada plantar é controlada por:

- o adutor do hálux (Adu.h)* por dentro,junto com o flexor próprio (sem repre­sentação);

- o abdutor do quinto dedo (Abd.5) porfora.

Entre estes dois tensores extremos, o flexorcomum dos dedos (sem representação) e seu aces­sório e o flexor plantar curto (FPC) mantêm a cur­vatura dos três raios médios igual a do externo.

*Nota do autor: é abdutor com relação ao plano sagi­

tal e adutor com relação ao eixo do pé.

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Fig.5-28 Fig.5-27

2. MEMBRO INFERIOR 235

11

111

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236 FISIOLOGIA ARTICULAR

DISTRIBUIÇÃO DAS CARGAS E DEFORMAÇÕES ESTÁTICASDA ABÓBADA PLANTAR

o peso do corpo, transmitido pelo membroinferior, se exerce sobre o tarso posterior (fig. 5­34) no nível da polia do astrágalo através da ar­ticulação tíbio-tarsiana. Daí, as forças se distri­buírem em três direções, para os três pontos deapoio da abóbada (Seitz, 1901):

- para o apoio anterior e interno (A),através do colo do astrágalo, no arcobo­tante anterior do arco interno,

- para o apoio anterior e externo (B),através da cabeça do astrágalo e dagrande apófise do calcâneo, no arcobo­tante anterior do arco externo.

A direção divergente destas duas linhas deforça, para A e para B, forma um ângulo agudode 35-40°, aberto pela frente, que correspondeligeiramente ao ângulo compreendido entre o ei­xo do colo e o eixo do corpo do astrágalo;

- para o apoio posterior (C), através do co­lo do astrágalo, a articulação subastraga­liana e o corpo do calcâneo (leque subta­lâmico), nos arcobotantes posteriores eunidos com os arcos interno e externo.

A relativa distribuição das forças sobre ostrês pontos de apoio da abóbada (fig. 5-35) é fá­cil ser lembrada se pensarmos que quando seaplicam 6 kg sobre o astrágalo UM correspondeao apoio ântero-externo (B), DOIS ao apoio ân­tero-interno (A) e TRÊS ao apoio posterior (C)(Morton, 1935). Em posição de pé, vertical eimóvel, o calcanhar é o que suporta a maior for­ça, a metade do peso do corpo. Então, se podeentender que, quando esta força se concentra nomeio centímetro quadrado de salto fino de sapa­to, este perfure os pisos de plástico.

Sob a carga, cada arco se aplaina e se alonga:

- no arco interno (fig. 5-36): as tuberosi­dades posteriores do calcâneo, distantesdo chão de 7 a 10 mm, descem 1,5 mm, agrande apófise 4 mm; o astrágalo recuasobre o calcâneo; o escafóide ascende so­bre a cabeça do astrágalo ao mesmo tem­po que descende com relação ao chão; asarticulações cúneo-escafóides e cúneo-

metatarsianas se entreabrem para baixo; oângulo de alinhamento do primeiro ossodo metatarso diminui; o calcanhar recua eos sesamóides avançam ligeiramente;

- no arco externo (fig. 5-37): os mesmosdeslocamentos verticais do calcâneo;descenso de 4 mm do cubóide, de 3,5mm da estilóide do quinto metatarsiano;as articulações ca1câneo-cubóide e cu­bóide-metatarsiana entreabrem-se parabaixo; retrocesso do calcanhar e avançoda cabeça do quinto metatarsiano;

- no arco anterior (fig. 5-38): o arco seaplaina e se expande dos dois lados dosegundo osso do metatarso. A aberturaaumenta 5 mm entre o primeiro e o se­gundo metatarsianos, 2 mm entre U e lU,4 mm entre lU e IV, 1,5 mm entre IV e V,de modo que no total, a parte anterior dopé se alarga 12,5 mm sob o apoio. Du­rante a fase anterior do passo, a curvatu­ra do arco anterior desaparece e todas ascabeças metatarsianas entram em contatocom o chão, segundo diversas pressões;

- a curvatura transversal também diminuino nível dos cuneiformes (fig. 5-39) eno nível do escafóide (fig. 5-40) ao mes­mo tempo que estes dois arcos têm atendência de bascular em volta do seu

apoio externo um ângulo x proporcionalao aplainamento do arco interno.

Por outra parte (fig. 5-41), a cabeça do as­trágalo desloca-se para dentro de 2 a 6 mm e agrande apófise de 2 a 4 mm. Em conseqüência,aparece uma rotura-torção do pé localizada namédio-tarsiana: o eixo da parte posterior do pése desloca para dentro enquanto o eixo da par­te anterior do pé se desvia para fora, de modoque formam um ângulo y com o anterior. Aparte posterior do pé gira em adução-pronação(seta 1) e ligeira extensão, enquanto a parte an­terior do pé realiza um movimento relativo deflexão-abdução-supinação (seta 2). Este fenô­meno é especialmente marcado no pé chatovalgo (ver pág. 248).

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Fig.5-35

..•• +12,5m/m

Fig.5-38x

Fig.5-39

Fig.5-36

Fig.5-37

Fig.5-40

2. MEMBRO INFERIOR 237

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238 FISIOLOGIA ARTICULAR

o EQUILÍBRIO ARQUITETÔNICO DO PÉ

o pé tem uma estrutura triangular (fig. 5-42)com:

- um lado inferior (A), a base ou abóba­da, subtensas pelos músculos e os liga­mentos plantares;

- um lado ântero-superior (B), onde selocalizam os flexores do tornozelo e osextensores dos dedos;

- um lado posterior (C), que compreen­de os extensores do tornozelo e os fle­xores dos dedos.

Uma forma normal da planta do pé, quecondiciona sua correta adaptação ao chão, é oresultado de um equilíbrio entre as forças pró­prias de cada um destes três lados (fig. 5-43),organizados sobre três raios esqueléticos arti­culados entre si, no nível do tornozelo e do

complexo articular do tarso posterior:

- um aumento ~a curvatura plantar, pro­vocando um pé cavo, pode dever-se tan­to a uma retração dos ligamentos planta­res ou uma contratura dos músculos

plantares, quanto a uma insuficiênciados músculos flexores do tornozelo,

- um aplainamento da curvatura plantar, opé chato, pode dever-se tanto a uma insu­ficiência das formações ligamentares oumusculares plantares, quanto a um tônusexagerado dos músculos anteriores ouposteriores.

Novamente, encontra-se a noção de equilí­brio trilateral (fig. 5-44), ilustrada pela tábua devela que permite compreender o equilíbrio dinâ­mico do joelho.

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Fig.5-43

Fig.5-42

Fig.5-44

2. MEMBRO INFERIOR 239

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240 FISIOLOGIA ARTICULAR

DEFORMAÇÕES DINÂMICAS DA ABÓBADA PLANTAR DURANTE A MARCHA

Durante a marcha, o desenvolvimento dopasso vai submeter a abóbada plantar a forçase deformações que demonstram o seu papel deamortecedor elástico. O desenvolvimento dopasso se realiza em quatro fases.

Primeira fase: tomada de contato com o chão(fig. 5-45).

Quando o membro oscilante lançado paradiante está a ponto de entrar em contato com ochão, o tornozelo está alinhado ou em ligeiraflexão (fig. 5-45) devido à ação dos flexores datíbio-tarsiana (Ft). Portanto, o pé entra em con­tato com o chão através do calcanhar, ou se­ja, o ponto de apoio posterior (C) da abóbada.Imediatamente, sob o impulso da perna (setabranca), o resto do pé entra em contato com ochão (seta 1) enquanto o tornozelo se estendepassi vamente.

Segunda fase: máximo contato (fig. 5-46).

Então, a planta do pé entra em contatocom o chão com toda a sua superfície de apoio(fig. 5-46) que representa a impressão plantar.a corpo, propulsionado pelo outro pé, vaipassar por cima e depois para diante do péem apoio (fase de apoio unilateral). O torno­zelo passa passivamente da extensão anterior àflexão (seta 2). Ao mesmo tempo, o peso docorpo (seta branca) incide totalmente sobre aabóbada plantar que se aplaina. Simultanea­mente, a contração de todos os tensores plan­tares (Tp) se opõe a este afundamento da abó­bada (primeiro efeito amortecedor); aplainan­do-se, a abóbada se alonga ligeiramente: aoinício do movimento, o apoio anterior (A)avança ligeiramente, porém no final, quando oapoio anterior entra cada vez mais em contatocom o chão devido ao peso do corpo, o apoioposterior C, o calcanhar, recua. A superfície daimpressão plantar é máxima quando a pernapassa pela vertical do pé.

Terceira fase: primeiro impulso motor (fig. 5-47).

Agora, o peso do corpo se encontra para dian­te do pé em apoio, a contração dos extensores dotornozelo (T), e principalmente a do tríceps, vailevantar o calcanhar (seta 3). Entretanto, a tíbio­tarsiana se estende ativamente, o conjunto da abó­bada realiza uma rotação em volta do seu apoioanterior (A). O corpo se eleva e se dirige paradiante: se trata do primeiro impulso motor, o maisimportante, visto que põe em jogo músculos mui­to potentes. Contudo, a- abóbada, apanhada entre ochão pela frente, a força muscular por trás e o pe­so do corpo no meio (alavanca de segundo gêne­ro, denominada inter-resistente) teria a tendência aaplainar-se se não interviessem uma vez mais ostensores plantares (Tp): é o segundo efeito amor­tecedor, que permite reservar uma parte da forçado tríceps para restituí-Ia no final do impulso. Poroutra parte, é no momento do apoio anterior quan­do o arco interno se aplaina (fig. 5-48) e a parteanterior do pé se expande pelo chão (fig. 5-49).

Quarta fase: segundo impulso motor (fig. 5-50).

o impulso fornecido pelo tríceps se prolongapor um segundo impulso (seta 4), devido à con­tração dos flexores dos dedos (Fd), especialmen­te os músculos sesamóides e o flexor próprio dohálux. O pé, deslocado uma vez mais para cima epara diante, abandona seu apoio sobre o calcanharanterior e somente está em contato com os três pri­meiros dedos, especialmente o hálux, na fase ter­minal do apoio (A'). Durante este segundo impul­so motor, a abóbada plantar resiste, uma vez mais,ao aplainamento graças aos tensores plantares, en­tre os quais se destacam os flexores dos dedos. Éno final desta fase quando a energia reservada an­teriormente se restitui. O pé se levanta do chão en­quanto o outro começa a desenvolver seu passo:de modo que ambos os pés estão simultaneamen­te em contato com o chão, durante um pequenoinstante (fase do duplo apoio). Na fase seguinte,denominada apoio unilateral, a abóbada do pé os­cilante - o que acaba de descolar do chão - re­cupera a sua posição normal.

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2. MEMBRO INFERIOR 241

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Fig.5-51

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242 FISIOLOGIA ARTICULAR

DEFORMAÇÕES DINÂMICAS SEGUNDO A INCLINAÇÃOLATERAL DA PERNA SOBRE O PÉ

Nas páginas anteriores, analisamos as mo­dificações que ocorrem na abóbada plantar du­rante o passo, isto é, as diferentes inclinações daperna sobre o pé no plano sagital. Contudo, du­rante a marcha ou a corrida em curvas ou terre­no acidentado, é necessário que a perna possainclinar-se sobre o pé no plano frontal, ou seja,para fora e para dentro da impressão plantar. Es­tes movimentos de inclinação lateral se locali­zam na subastragaliana e na médio-tarsiana edeterminam modificações da forma da abóbadaplantar. Pelo contrário, a tíbio-tarsiana não par­ticipa: o astrágalo, fixado na pinça bimaleolar,se move com relação aos demais ossos do tarso.

A inclinação da perna para dentro, emrelação ao pé considerado fixo (fig. 5-51), temquatro conseqÜências:

1. Rotação externa da perna sobre o pé (se­ta 1), que só aparece quando a planta dopé entra com firmeza em contato com ochão. Manifesta-se pelo retrocesso domaléolo externo, nitidamente visível se écomparado com a posição na qual o pé,perpendicular à perna, somente entra emcontato com o chão mais com sua bordainterna (fig. 5-52). Esta rotação externada pinça bimaleolar provoca o desliza­mento do astrágalo para fora, principal­mente da sua cabeça no escafóide.

2. Abdllção-supinação da parte posteriordo pé (fig. 5-53). A abdução se deve auma fração de rotação externa sem com­pensar. Quanto à supinação, esta derivado movimento do ca1câneo para dentro,perfeitamente visto por trás (ângulo x) eem comparação com um pé sem apoiono chão (fig. 5-54): este varo do ca1câneose reconhece pela incurvação da bordainterna do tendão de Aquiles.

3. Adução-pronação da parte anterior dopé (fig. 5-51). Para que o arco anteriorentre em contato com o chão, a parte an­terior do pé deve deslocar-se para dentro:o eixo da parte anterior do pé, que passapelo segundo osso do metatarso, e o pla-

no sagital P, que passa por este eixo, sedesviam para dentro um ângulo m (P' re­presenta a posição final deste plano e Psua posição inicial) que mede esta adu­ção. Além disso, a parte anterior do pérealiza uma pronação, porém é bastanteevidente que estes movimentos de adu­ção-pronação são movimentos relati­vos aos da parte posterior do pé locali­zados na árticulação médio-tarsiana.

4. Escavação do arco interno (fig. 5-51).Este aumento da curvatura do arco inter­no (seta 2) é a conseqüência dos movi­mentos relativos da parte posterior e an­terior do pé. Ele se manifesta pela eleva­ção do escafóide com relação ao chão,fenômeno simultaneamente passivo(deslizamento para fora da cabeça do as­trágalo) e ativo (contração do tibial pos­terior). A modificação da curvatura glo­bal da abóbada plantar está clara na im­pressão plantar, cujo golfo se afunda,como no caso de um pé cavo varo.

A inclinação da perna para fora (fig. 5-55)tem quatro conseqÜências simétricas:

1. Rotação interna da perna sobre o pé (se­ta 3): retrocesso do maléolo interno(comparar com a figo5-56, na qual o pésó entra em contato com o chão pela suaborda externa), deslizamento do astrága­10 para dentro, cuja cabeça sobressai namargem interna do pé.

2. Adução-pronação da parte posterior dopé (fig. 5-57): adução por rotação internanão totalmente compensada, pronaçãopor valgo (ângulo y) do ca1câneo (com­parar com a figo5-58).

3. Abdllção-supinação da parte anterior dopé (fig. 5-55): ângulo de abdução (n) en­tre os planos P e P".

4. Aplainamento do arco interno (seta 4),com aumento da superfície da impressãoplantar, como no caso de um pé chatovalgo.

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Fig.5-51

2. ME\fBRO DlFERIOR 243

Fig.5-56==

Fig.5-57

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244 FISIOLOGIA ARTICULAR

ADAPTAÇÃO DA ABÓBADA PLANTAR AO TERRENO

o homem da cidade caminha sempre so­bre um terreno liso e resistente, com os pésprotegidos pelo calçado. Suas abóbadas plan­tares devem realizar poucos esforços de adap­tação e os músculos, que são o seu suporteprincipal, acabam por atrofiar-se: o pé chato éa conseqüência do progresso e certos antropó­logos não hesitam em prognosticar tempos queo homem "caminhará" com uns pés reduzidosa cotos. Esta teoria se baseia na atrofia dos de­dos e na perda da oposição do hálux, aindapresente no macaco.

Contudo, ainda não chegou este momentoe o homem, até mesmo o "civilizado", é capazde andar com os pés nus na areia ou entre aspedras. Este "retorno ao estado natural" bene­ficia consideravelmente a abóbada plantar (en­tre outros), que reencontra suas possibilidadesde adaptação.

Adaptação às asperezas do terreno sobreas quais o pé se agarra (fig. 5-59) graças aoafundamento da abóbada.

Adaptação às inclinações do chão com re­lação aos pés:

- o apoio anterior é mais amplo nas in­clinações para fora (fig. 5-60) graçasao comprimento decrescente de dentropara fora dos raios metatarsianos;

- de pé sobre uma inclinação transversal(fig. 5-61), o pé "de baixo" está em su­pinação, enquanto o pé "de cima" estáem eversão ou em astrágalo valgo;

- a escalada (fig. 5-62) necessita da an­coragem do pé de baixo, em posição depé cavo varo, perpendicular à linha dedeclive, enquanto o pé de cima entraem contato com o chão em flexão má­

xima e paralelo à inclinação;

- a descida (fig. 5-63) às vezes obriga asatitudes do pé em eversão para conse­guir uma aderência máxima.

Desse modo, como a palma da mão, quepermite a preensão graças às modificações desua curvatura e de sua orientação (ver volume I),a planta do pé pode, com algumas limitações,adaptar-se às irregularidades do terreno para as­segurar o melhor contato possível com o chão.

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Fig.5-60

2. MEMBRO INFERIOR 245

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246 FISIOLOGIA ARTICULAR

os PÉS CAVOS

A curvatura e a orientação da abóbada plantar depen­dem de um equilíbrio extremamente delicado entre as dife­rentes ações musculares, que o modelo de Ombrédanne(fig. 5-64) permite analisar:

- a abóbada está aplainada pelo peso do corpo (se­ta branca) e pela contratura dos músculos que se in­serem na sua convexidade: o tríceps (1), o tíbial efibular anteriores (2), o extensor comum dos dedose o extensor próprio do hálux (3); no caso dos doisúltímos, com a condição de que as primeiras falan­ges fiquem estabilizadas pelos interósseos (7);

- a abóbada está escavada pela contratura dosmúsculos que se inserem na sua concavidade: o tí­bial posterior (4), os fibulares laterais (5), os mús­culos plantares (6) e os tlexores dos dedos (8). Elatambém pode estar escavada por um relaxamentodos músculos da convexidade. Pelo contrário, umrelaxamento dos músculos da concavidade provo­ca um aplainamento da abóbada.

A insuficiência ou a contratura de só um dos

músculos destrói todo o equilíbrio e provoca uma de­formação; Duchenne de Boulogne afirma que, deste pon­to de vista, é melhor que a paralisia afete a todos os mús­culos antes que a um só, porque assim o pé conserva umaforma e uma atitude quase normais. Estes desequilíbriosmusculares podem ser estudados no modelo mecânico dopé (no final do volume).

Distinguem-se três tipos de pés cavos:

1. O pé cavo "posterior" (fig. 5-65), denominadodesta maneira porque a alteração se localiza noarcobotante posterior: insuficiência do tríceps(1). Os músculos da concavidade predominam(6) determinando o pé cavo; os flexores do tor­nozelo (2) flexionam o pé. De modo que apare­ce um pé cavo astrágalo "posterior" (fig. 5-66)que, por outra parte, pode inclinar-se lateralmen­te em valgo (fig. 5-67) devido a uma contraturados abdutores (extensor comum, fibulares late­rais e anterior).

2. O pé cavo "médio" (fig. 5-68), pouco freqüente,devido à contratura dos músculos plantares (6)por palmilhas muito rígidas, por exemplo, ou porretração da aponeurose plantar (doença de Led­derhose).

3. O pé cavo "anterior", do qual existem distintasvariedades cujo ponto em comum é uma atitudeem equino (fig. 5-69) com duas características:

- o equino da parte anterior do pé (e) por des­censo dos arcobotantes anteriores,

- o desnivelamento (d) entre os calcanhares an­terior e posterior, mais ou menos redutível emapoio.

Segundo o mecanismo, se define a variedade do pécavo anterior:

- a contratura do tíbial posterior (4) e dos fibulareslaterais (5) origina o descenso da parte anterior dopé (fig. 5-70). A contratura dos fibulares lateraispode ser suficiente por si mesma para provocarum pé cavo (fig. 5-71), que então se inclina emvalgo: pé cavo valgo equino;

- um desequilíbrio das metatarsofalangeanas (fig.5-72) é uma causa freqÜente do pé cavo: a insufi­ciência dos interósseos (7) deixa que os extensoresdos dedos predominem (3) que realizam uma hi­perextensão da primeira falange; provocando a se­guir um descenso da cabeça dos metatarsianos (b),que desce por sua vez a parte anterior do pé e daívem o pé cavo;

- o descenso das cabeças metatarsianas também po­de ser devido (fig. 5-73) a uma insuficiência do ti­bial anterior (2): o extensor comum (3) o tentasubstituir, de modo que bascula as primeiras fa­langes; os músculos plantares, sem contrabalan­çar, agravam a curvatura e o tríceps determina umligeiro eqÜino: o predomínio do extensor comumdos dedos origina uma inclinação lateral em valgo(fig. 5-7'+): pé cavo valgo eqiiino;

- uma causa freqÜente de pé cavo é o calçado mui­to apertado ou o salto alto (fig. 5-75): os dedostropeçam com a ponta do sapato e se hiperesten­dem (a). fazendo com que as cabeças metatarsia­nas (b) baixem; sob a intluência do peso do corpo(fig. 5-76) o pé desliza sobre o plano inclinado eo calcanhar se aproxima dos dedos (a), acentuan­do a curvatura da abóbada.

A análise da impressão plantar facilita o diagnóstico depé cavo (fig. 5-77): com relação à impressão normal (I), o iní­cio do pé cavo (lI) se caracteriza por uma proeminência conve­xa na borda externa (m) e por um aumento da profundidade do"golfo" (n) da borda interna; a seguir (m), o fundo do "golfo"alcança a borda externa (p) dividindo a impressão em dois; nospés cavos inveterados (IV). além de tudo se soma a desapari­ção da impressão dos dedos (q) devido à garra dos dados.

Contudo, convém saber que no pé chato valgo dascrianças e adolescentes se pode observar uma impressão de pécavo com interrupção da banda de apoio externa: o valgo docalcâneo. o aplainamento do arco interno provoca uma ligeira"descolagem" do externo, que perde contato com o chão porsua parte média, o que pode induzir a erros. Todavia, é fácil re­conhecer esta causa defalsa impressão do pé cavo:

- todos os dedos entram em contato com o chão;

- levantando o arco interno ou, melhor ainda, fa-

zendo girar o esqueleto da perna em rotação ex­terna, com o pé apoiado, se pode observar comoa banda de apoio externo se completa, enquantoo arco interno se escava novamente.

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2. MEMBRO INFERIOR 247

Fig.5-72

Fig.5-75

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11 Fig.5-77 111 IV

Fig.5-73

Fig.5-70

Fig.5-74

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248 FISIOLOGIA ARTICULAR

os PÉS CHATOS

o afundamento da abóbada plantar é devidoà debilidade de seus meios de suporte naturais,músculos e ligamentos. Os ligamentos são sufi­cientes para manter a curvatura normal da abóba­da durante um período curto de tempo, visto quea impressão plantar de uma amputação é normalsalvo se os ligamentos forem seccionados. Con­tudo, no ser vivo, se os suportes musculares seenfraquecem, os ligamentos acabam por disten­der-se e a abóbada se aplaina definitivamente.

Portanto, o pé chato se deve, principalmen­te, a uma insuficiência muscular (fig. 5-78), in­suficiência do tibial posterior (4) ou, mais fre­qüentemente, do fibular lateral longo (5). Semapoio, o pé adota uma atitude em varo (fig. 5­79), posto que o fibular lateral longo é abdutor.Contudo, no momento em que o peso do corpose descarrega sobre a abóbada, o arco interno seafunda (fig. 5-80) e o pé gira em valgo. Este val­go se deve a dois fatores:

1. A curvatura transversal da abóbada, nor­malmente mantida pelo tendão do fibularlateral longo (fig. 5-81), se aplaina (fig.5-82), ao mesmo tempo que o arco inter­no desce: isto está seguido por uma rota­ção da parte anterior do pé (e) sobre seueixo longitudinal de modo que a plantado pé entra em contato com o chão emtoda sua amplitude, ao mesmo tempoque a parte anterior do pé se desloca (d)para fora.

2. O calcâneo gira em pronação (fig. 5-83)sobre seu eixo longitudinal e tem a ten­dência a inclinar-se sobre a sua face inter­na. Este valgo, visível e mensurável peloângulo que forma o eixo do calcanharcom o tendão de Aquiles, ultrapassa os 5°de variação fisiológica para alcançar os20° no caso de alguns pés chatos; para

certos autores, isso poderia dever-se auma malformação das superfícies dasubastragaliana e a uma lassidão anormaldo ligamento interósseo, enquanto paraoutros estas lesões seriam secundárias.

Em todo caso, este valgo desloca o centrode pressão para a margem interna do pé e a ca­beça do astrágalo se slesloca para baixo e paradentro. Assim sendo, na margem interna do pé,com maior ou menor nitidez, aparecem trêsproeminências (fig. 5-82):

- o maléolo interno (a) anormalmentesaliente,

- a parte interna da cabeça do astrágalo (b),

- o tubérculo do escafóide (c).

A proeminência do tubérculo do escafóiderepresenta o vértice do ângulo aberto para foraque formam juntos o eixo da parte posterior dopé e o da parte anterior do pé: a adução-prona­ção da parte posterior do pé é compensada poruma abdução-supinação da parte anterior do pé,a seguir desaparece a abóbada cujo mecanismofoi manifestado pelos autores clássicos (Hoh­mann, Boehler, Hauser, Delchef, Soeur).

Este conjunto de deformações já foi descri­to, embora não minuciosamente, quando semencionaram as forças estáticas exercidas sobrea abóbada (pág. 237, figo5-41). Trata-se de umaalteração bastante estendida, conhecida com onome de pé chato valgo doloroso ou tarsalgiado adolescente.

A análise da impressão plantar facilita odiagnóstico de pé chato (fig. 5-84): com relaçãoà impressão normal (1), se vê um enchimentoprogressivo do "golfo" interno (U e lU), e o péchato acaba tomando-se convexo (IV) nos pésplanos inveterados.

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2. MEMBRO INFERIOR 249

Fig.5-81 Fig.5-82 Fig.5-83

2

Fig.5-78

Fig.5-80

II

Fig.5-84

IIIIV

Fig.5-79

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250 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS DESEQUILÍBRIOS DO ARCO ANTERIOR

No decurso das deformações da abóbada plantar, oarco anterior pode desequilibrar-se nos seus apoios oudeformar-se em sua curvatura.

Em geral, o desequilíbrio é secundário a um pé ca­vo anterior: o eqüino da parte anterior do pé aumenta aspressões suportadas pelo arco anterior segundo três pos­sibilidades:

1. O eqÜino da parte anterior do pé é simétrico(fig. 5-85), sem pronação, nem supinação; a cur­vatura do arco se conserva; portanto, existe umasobrecarga dos dois pontos de apoio, que pro­voca a formação de um calo debaixo das cabe­ças do primeiro e do quinto ossos do metatarso;

2. O eqÜino da parte anterior do pé acompanha­se de uma pronação (fig. 5-86) devido ao des­censo predominante do raio interno (contraturado tibial posterior ou do fibular lateral longo); acurvatura do arco permanece, a sobrecarga secentra no apoio interno do pé, aparecendo umcalo debaixo da cabeça do primeiro metatarsia­no;

3. O eqüino da parte anterior do pé se acompa­nha de uma supinação (fig. 5-87); a curvaturado arco permanece, a sobrecarga se centra noponto de apoio externo (calo debaixo da cabe­ça do quinto metatarsiano).

Em alguns pés cavos anteriores, a curvatura nor­mal do arco anterior se pode deformar:

- simplesmente levantada (fig. 5-88) ou inexis­tente: se trata de uma parte anterior do péchato, a sobrecarga se reparte por todas as ca­beças metatarsianas (calo debaixo de cada ca­beça);

- totalmente invertida (fig. 5-89): neste caso sedenomina parte anterior do pé redonda ouconvexa; a sobrecarga representada pelos calosse localiza na cabeça dos três metatarsianosmédios.

A inversão do arco anterior se deve à deforma­

ção dos dedos em garra ou em martelo; já vimos que acausa desta deformação poderia ser um desequilíbrioentre interósseos e extensores; muito freqüentemente é aconseqüência de calçado muito apertado, ou de saltosaltos (o que equivale a um calçado apertado): os dedostropeçam (fig. 5-90) e se dobram; a cabeça da primeirafalange se desloca para baixo e o calo aparece; a cabeçametatarsiana se desloca também para baixo (calo) pro­vocando o afundamento do arco.

A utilização de calçado de ponta fina para algunspés de conformação especial também favorece este fe-

nômeno: pé ancestral (ou Neanderthal foot ou pes an­ticus), que lembra o pé pré-humano com hálux preensor(fig. 5-91), este fenômeno também é favorecido por:

~ o primeiro metatarsiano é curto, hipermóvel e,especialmente, muito separado do segundo(metatarso varo ou aduzido), deslocando o há­lux numa direção oblíqua para diante e paradentro;

- o segundo metatarsiano nitidamente ultrapassaos outros, o que. provoca um apoio no final dopasso levando a uma sobrecarga, articulaçãodolorosa na base e algumas vezes fratura damarcha (pé forçado)';

- quinto metatarsiano muito separado para fora(quinto metatarsiano valgo ou abduzido).

Quando esta parte anterior do pé, amplamente ex­pandido, está aprisionada num calçado de ponta fina(fig. 5-92), o hálux se desloca para fora (a). O desequi­líbrio se transforma em permanente, fixado pelas retra­ções capsulares, a luxação para fora dos sesamóides (c)e dos tendões, acompanhado por uma exostose (b) dacabeça do metatarsiano, onde aparece uma calosidade:assim se forma um hallux valgus. O hálux atravessadodesloca os dedos médios (fig. 5-93) de modo que agra­va a deformação em martelo dos dedos. O quinto dedodeforma-se ao contrário (d): se trata do quintus varus,que contribui também para a garra dos dedos médios.Desta maneira o arco se toma convexo.

O tipo morfológico do pé desempenha um papelimportante na aparição destas deformações. Por referên­cia às artes plásticas e gráficas, distinguem-se três varie­dades de pés:

- o pé grego, como pode ser observado nas está­tuas da época clássica: o segundo dedo maislongo, depois o hálux e o terceiro dedo, quaseiguais, a seguir o quarto dedo e, por último, oquinto. Este tipo de pé é o que mais bem repar­tidas tem as cargas sobre a parte anterior do pé;

- o pé polinésio, ou pé "quadrado", como se po­de observar nos quadros de Gauguin, cujos de­dos são quase todos iguais, pelo menos os trêsprimeiros. Este tipo de pé "não tem história";

- o pé egípcio, visível nas estátuas dos faraós,cujo hálux é o mais longo e os outros se classi­ficam por tamanho e ordem decrescentes. É otipo de pé mais "exposto": o relativo compri­mento do hálux o obriga a inclinar-se para forano sapato (hallux valgus) e causa também umasobrecarga na fase anterior do passo, fator deartrose metatarsofalangeana (hallux rigidus).

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2. MEMBRO INFERIOR 251

Fig.5-93

Fig.5-90 t

Fig.5-86

Fig.5-87 t

Fig.5-92

t tFig.5-89

Fig.5-85

Fig.5-91

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2. BIBLIOGRAFIA 253

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2. :MEMBRO INFERIOR 255

MODELOS DE MECÂNICA ARTICULAR PARA CORTAR E ARMAR

RECOMENDAÇÕES

Para realizar um dos modelos, em primeiro lugardeve-se sobrepor o desenho em papelão, do tipo grosso.Para isso, pode-se colar a folha correspondente previamentedescolada (isso não é o mais adequado porque não permitecorreções em caso de erro), ou colar uma fotocópia da pági­na que interessa, ou inclusive reproduzir o desenho compapel carbono, sendo esta a melhor solução, visto que osincômodos gerados pelo papel colado se podem evitar.

A fabricação destes modelos é fácil, com a condiçãode seguir atentamente as instruções que acompanham aslâminas, ilustradas com esquemas de montagem. Jamais sedeve começar a cortar sem ter lido totalmente asinstruções. Se se comete um erro, a peça pode ser trocadapor outro papelão da mesma espessura e começar de novo.

As pregas são claras e regulares sempre que se tenhacuidado e se pratique antes uma ligeira incisão no papelão,de um quarto de sua espessura, com uma navalha, pelo ladoexterior da prega. Portanto, é necessário ficar muito atento àdireção das dobras, indicada sempre da mesma maneira:

- as dobras indicadas com uma linha de traçosdescontínuos devem cortar-se pelo anverso e pre­gar-se pelo verso (lembrar que o anverso é a faceimpressa e o verso é a parte de trás da folha);

- as pregas indicadas com uma linha de cruzes sedevem cortar pelo verso e pregar-se pelo anverso.Para assinalar as linhas de prega no verso, o maiscômodo é perfurar com uma agulha fina cadaextremidade das linhas.

Para colar os modelos, é necessário uma cola decelulose de secagem rápida. As superfícies tracejadasdelimitadas por linhas pontilhadas (atenção, não con­fundir estas linhas pontilhadas com os traços de umaprega) representam as zonas que se devem colar no anver­so. As superfícies quadriculadas correspondem às zonasque se devem colar no verso. Depois de ter feito isto, seindicam as superfícies que se vão colar juntas com amesma letra. Colar de uma em uma, e dar tempo a queuma esteja bem seca para passar à seguinte na mesmapeça. Entretanto, se podem ir colando outras peças dife­rentes. Enquanto estejam secando, é melhor colocar aspeças numa tábua de madeira fixadas por elásticos oualfinetes que fixam uma prega e mantêm uma lingüeta.

Excepcionalmente, no caso do modelo V, as dobrasque representam chameiras articulares se devem realizarsem incisões para que mantenham a solidez.

Como material acessório, precisa-se de:

- papelão grosso (l mm) para reforçar algumas peças(modelos I e III) ou servir de base (modelo III);

- alfinetes com cabeça redonda de cores (modelosIV e V): em papelarias (para assinalar mapas egráficos);

- grampos metálicos de pequeno tamanho (no casodo modelo II), em papelarias;

- elástico de 1 mm de espessura por 4 mm de largu­ra e de 1,5 m de comprimento: em lojas onde sevendem modelos reduzidos de motores de avião;

- borracha elástica quadrada de 1,5 x 1,5 mm e de2,5 de comprir.nento (idem);

- fio grosso, resistente ou cordão trançado (é omelhor).

A borracha elástica e os cordões se utilizam nos mo­delos IV e V para realizar os tendões e os ligamentos; sefixam com alfinetes nos pontos ou nos losangos (no casodos elásticos) assinalados com um número. Os alfinetesatravessam o cordão ou o fio por cima do nó de suporte.

Modelo I: As peças articuladas. Estabilidade ântero­posterior do joelho

Este modelo permite compreender como, graçasaos ligamentos cruzados, o deslizamento ântero-posteri­ar é impossível, sem que isso impeça a flexão-extensãodo joelho.

Realização (Prancha I):

1. recortar as duas peças A e B (Prancha I);

2. num papelão mais resistente, cortar outras duaspeças com as mesmas dimensões;

3. numa folha de papel comum, cortar três tiras de 1cm de largura por 14 cm de comprimento;

4. na peça A, colar a extremidade de cada uma dastiras nas zonas tracejadas a', b' e c', com a pre­caução de que elas fiquem paralelas com o ladomaior da peça;

5. colar acima da peça A e das extremidades das trêstiras, uma das peças de papelão grosso; devecobrir exatamente a peça A;

6. colocar o conjunto sobre a mesa, o papelão grosso

del<aixo,e dobrar por cima da peça A as três tirasde pãpel, que devem ficar paralelas entre si e como lado maior da peça;

7. colocar a peça B em cima, com o anverso paracima, orientando a zona tracejada a' para o ladoda extremidade livre da tira média;

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256 FISIOLOGIA ARTICULAR

8. dobrar a extremidade livre das três tiras sobre apeça que vão ser coladas em a, b e c;

9. colar a segunda peça de papelão grosso em cimae esperar que fique bem seco.

O esquema de montagem (fig. 1, Prancha I ) põe ocruzamento das tiras que representam os ligamentos cruza­dos em evidência, porém na montagem real, a tensão dastiras deve impedir qualquer separação das peças (se traçarampor separado para que o desenho seja mais cômodo).

Utilização:

Com este modelo se pode demonstrar que é impos­sível deslizar uma peça sobre a outra no sentido do com­primento.

Porém, se só a peça superior é tomada e inclinadapara um lado, a peça inferior gira ao redor de umacharneira constituída pelo lado menor e mais baixo, e vice­versa no caso de urna inclinação oposta. As duas peçasparecem não ter conexão nenhuma entre si, porém estãoarticuladas por cada uma de suas extremidades.

Os côndilos e as glenóides realizam uma montagemanáloga, embora existe a diferença de que as "tiras" nãosejam iguais entre si, e também não sejam fixas nosextremos numa base de igual comprimento. Em conse­qüência, o resultado é uma rotação. não somente em voltados dois eixos, mas também em volta de uma sucessão deeixos alinhados sobre a curva dos côndilos (esse ponto estáindicado no modelo seguinte).

Modelo lI: Determinismo experimental do contorno datróclea e dos côndilos

Este modelo traça por si mesmo o contorno da tró­clea e dos côndilos, o que esclarece a função dos ligamen­tos no deterrninismo da forma das superfícies articulares.

Realização (Prancha lI):

1. Cortar as peças do modelo:

A: o platô tibial;

B: uma peça denominada "base femoral" que sefixa em C;

C: a platina retangular na qual se realizará o traça­do; com traços espessos a referência do contornoarticular com a diáfise femoral;

P: a patela, prolongada para baixo pelo ligamen­to patelar;

AR: uma asa patelar;

LCAE: o ligamento cruzado ântero-externo;

LCPI: o ligamento cruzado póstero-interno e astrês tiras para confeccionar as "arandelas".

2. Realizar a dobragem em acordeão das tiras quevão constituir as "arandelas", depois fazer umfuro ao mesmo tempo nas seis partes dobradas.

3. Realizar uma prega dupla em cada extremidadedo LCPI antes de perfurar os furos 3 e 4.Cuidado!, fazer um corte na arandela do furo 4,mas sem cortar o LCPI.

4. Fazer os furos nas outras peças, exatamente noslugares indicados.

A montagem se realiza seguindo o esquema (fig. 3)com grampos metálicos de tamanho reduzido. Os furoscoincidem em cada peça e elas devem ser montadas porordem numérica sem esquecer de colocar urna arandelanos furos 5, 6 e 7. Por.último, a base femoral se fixa napeça C na zona tracejada, através dos furos 8 e 9.

Utilização:

O modelo está pronto para funcionar (fig. 4):

Partindo da posição de extensão - platô tibialdeslocado o máximo possível para a esquerda - (graçasao corte da arandela do furo 4), se traça com lápis o contornoposterior da patela e o contorno superior do platô tíbial nomaior número possível de posições de flexão.

À medida que a plataforma tibial se desliza para adireita, se pode observar como a sua face superiordescreve a curva do côndilo ao mesmo tempo que a faceposterior e o ângulo póstero-superior da patela desenhamo contorno da tróclea (fig. 5). Se o modelo foi montadocorretamente, essas duas curvas se unem com os doistraços espessos.

Assim fica demonstrado que os contornos da trócleae dos côndilos são a curvatura envolvente das respectivasposições sucessivas dos platôs tibiais e da patela num sis­tema mecânico definido pelo comprimento relativo e a dis­posição dos ligamentos cruzados e das conexões liga­mentares da patela. Poder-se-iam realizar perfeitamenteoutros contornos modificando um ou vários elementos

deste conjunto mecânico.

Modelo III: Exposição do papel desempenhado pelosligamentos cruzados e laterais

O modelo permite ver a tensão eletiva dos liga"mentos cruzados e laterais no caso de alguns movimen­tos (ver pág. 134). Assim se pode explicar de formaespecífica o papel de "chamada" do côndilo sobre aglenóide que os ligamentos cruzados desempenhamdurante a flexão-extensão.

Realização (Prancha I):

Antes de cortar, reforçar as duas peças do modelocolando-as sobre um papelão grosso (1 rnrn).

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1-

Fig.4

Fig.3

2. MEMBRO INFERIOR 257

Fig.5

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I -

258 FISIOLOGIA ARTICULAR

A seguir, instalar, tal como a figura no esquema demontagem, os elásticos que representam os dois ligamen­tos cruzados e o ligamento lateral interno; para isso, uti­lizar elásticos de cores diferentes em forma de pulseira ecortá-los. Fazer um nó num extremo e passá-los atravésdos furos do perfil tibial de trás para diante, de forma queo nó fique na parte posterior. Depois, colar o perfil tibial nametade inferior de um papelão retangular resistente (veresquema de montagem, figo2, Prancha I). Se os nós inco­modam ao colar, escavar um pouco de papelão neste nível.

Passar então cada elástico pelo furo correspondentedo perfil femoral, de diante para trás:

- o cruzado ântero-externo, parte de a e se fixa em b;

- o cruzado póstero-interno parte de d e se fixa em c,

- o ligamento lateral interno se origina em f e sefixa em e.

A tensão destes ligamentos se regula e posterior­mente se bloqueia com um adesivo na parte posterior.

Utilização:

Fazendo rodar o perfil femoral sobre o perfil tibialsem que se deslize, se pode comprovar de imediato que:

- o cruzado ântero-externo se alonga durante aflexão, o que corresponde à tensão do elástico.Para que o ligamento mantenha o mesmo com­primento, é necessário deslocar o côndilo paradiante: é o movimento de "chamada" do côndilo

pelo ligamento cruzado;

- do mesmo modo, a partir da posição de flexão, ocruzado póstero-interno se estica durante a exten­são (tensão). Para que recupere o seu compri­mento inicial, é necessário deslocar o côndilopara trás ("chamada").

Fazendo que o côndilo femoral rode no lugar (comdeslizamento) sobre a glenóide, se pode comprovar que oligamento lateral se encontra mais tenso na extensão doque na flexão.

Modelo IV: Superfícies articulares do joelho eligamentos

Este modelo permite compreender por que se afir­ma que o joelho é uma tróclea modificada (ver pág. 88).Também se pode observar como os ligamentos intervêmpara assegurar a estabilidade rotatória do joelho (verpág. 136).

Realização (Prancha IlI).Este modelo é constituído por duas peças principais

A e B e duas peças acessórias idênticas C e D. Também seadicionam quatro cordões que representam os ligamentos.

Peça A:

1. Cortar as nove partes que a constituem AI' A2, ArA', e A"" A', e A"" A6 e por último A,. Antesanotar com lápis as letras que se situam fora docontorno para facilitar a montagem. Atenção comas lingüetas para colar;

2. Fazer um cilindro com A" colando a lingüeta a noverso da borda oposta. Esperar que seque comple­tamente (fig. 6).

3. Dobrar as duas bordas das lingüetas para o interi­or e colar o fundo AI nas lingüetas da borda infe­rior (a que contém os pontos 1 e 2). Colar domesmo modo a coberta A" na qual não se cortounem se colou nenhuma peça. Deixar secar.

4. Fazer um cilindro pequeno com A, e A7 (coberta)e colá-lo no centro -deAJ'

5. Em A3 e a cada lado do cilindro pequeno, emprimeiro lugar colar as zonas tracejadas reser­vadas para as peças A', e A" •. A seguir, colar aspeças A', e A", em cima, de modo que seu ladoretilíneo esteja paralelo ao das duas peças ante­riores e que chegue até o cilindro centralpequeno.

Deste modo, a face superior da peça A comporta(fig. 7) um pequeno cilindro central limitado por dois sul­cos. Ele constitui o platô tibia!.

Peça B:

1. Cortar as cinco partes que a constituem Bl' B" B,.B, e B,;

2. Fazer o cilindro com B, (fig. 8).

3. Colar o fundo Bl'

4. Preparar a peça BJ: incisão no verso para dobrarpelo anverso em ângulo reto. Colar suas duasextremidades b' e b" nas lingüetas correspon­dentes b' e b" de B2 (partes retilíneas da bordasuperior). Dobrar as lingüetas para colar para ointerior no caso do cilindro e para o exterior nocaso de BJ'

5. Colar por B. e B, por cima, dando-lhes umaligeira forma curva.

Desse modo, se realiza uma ranhura profunda quesepara as duas superfícies convexas (fig. 9) que repre­sentam a tróclea femoral com sua garganta e suas duasfaces.

Peças C e D:

1. Cortar com muito cuidado C e D e realizar as

incisuras para as dobras (estão todas no anverso).

2. Pregar segundo indica o esquema.

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Fig.9

Fig.7

2. MEMBRO INFERIOR 259

Fig.12

Fig.10

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260 FISIOLOGIA ARTICULAR

3. Colar em primeiro lugar a lingüeta a no verso dea, depois dobrar e colar os lados nas suaslingüetas.

Estas duas peças C e D se encaixam por sua base nossulcos de A e recobrem o pequeno cilindro central por suaparte escavada (fig. 11).

Utilização:

1. O joelho é uma tróclea modificada.

Colar primeiro a peça A, completada por C e D(fig. 11). Nesta crista média se encaixa a peça B,que pode realizar sobre A movimentos de roda ede deslizamento, porém é impossível que B giresobre A em volta do eixo dos cilindros: é o caso

de uma tróclea pura cuja crista média impedequalquer movimento de rotação axial. Se as duasextremidades da crista forem tiradas, eliminandoas peças C e D, só fica o pivô central (fig. 12), aoredor do qual a tróclea pode efetuar os movimen­tos de f1exão-extensão e também os movimentos

de rotação axial. Nesta tróclea modificada o pivôcentral representa o platô das espinhas tibiais.

2. A estabilidade rotatória do joelho está asseguradapelos ligamentos.

Com um cordão fixo pelos seus extremos comalfinetes se formarão os ligamentos deste modeloarticular (fig. 13):

- ligamento lateral interno: entre 1 e 2;

- ligamento lateral externo: entre 3 e 4;

- ligamento cruzado ântero-externo: entre 5 e 6;

- ligamento cruzado póstero-interno: entre 7 e 8.

Tomar cuidado para deixar estes ligamentos sufi­cientemente tensos, ao contrário da figura, onde estão dis­tendidos de propósito.

Tentar fazer girar a peça A em rotação externa: osligamentos laterais entram em tensão e limitam o movi­mento. Também se pode constatar a tensão dos ligamentoscruzados que limitam a rotação interna.

Realizando os movimentos de flexão-extensão de

B sobre A se podem evidenciar os movimentos derotação automática (se os ligamentos estão dispostoscorretamente).

Modelo V: O pé

Este modelo mecânico é dotado das principais articu­lações e dos tendões principais, de modo que permite anal­isar a estática e a dinâmica da abóbada plantar, as açõesmusculares e as atitudes patológicas. Sua fabricação não édifícil, porém necessita de minuciosidade e paciência.

Realização:

1. Em primeiro lugar realizar cada parte que o cons­titui como se indica a continuação:

A) perna e tíbio-tarsiana;

B) tarso posterior e subastragaliana-médio-tar­Slana;

C) parte externa do tarso anterior;

D) parte interna do tarso interior;

E) e F) suportes da articulação de Lisfranc;

I, lI, III, IV, V) osso do metatarso e dedos;

2. Unir todas as peças.

3. Colocar os elásticos - que representam os liga­mentos e o tônus mlJscular - e os cordões - querepresentam os tendões. É a parte mais interessanteda construção, visto que permite compreender pelaprática os equilfbrios musculares e articulares.

L Partes constituintes

A) Cortar a peça A (Prancha IV) e realizar asincisões para dobrar; prestar atenção ao lado da incisura(ver Recomendações) e não confundir os traços (incisãono anverso) com os pontilhados que delimitam as zonasque se devem colar. Antes de dobrar as pregas, anotar noverso da face AJ as anotações que aí figuram. De fato,ficarão no interior da peça ao enrolar a face AJ em semi­cilindro (ver figo 14). Para colar a peça, o verso da lingüe­ta a de AJ deve coincidir com o anverso a de AI; e o anver­so da lingüeta b de A, coincidir com o verso b de AI' O cír­culo A4 se coloca sobre as lingüetas dobradas para o inte­rior da borda superior de AI_,_,(ver figo 15).

B) Cortar a peça B (Prancha V), porém antes anotarcom lápis nos lados correspondentes as letras que estãofora do contorno da peça: isto facilita muito a tarefa decolar. Todas as incisões da dobragem estão no anverso.Dobrar a peça (fig. 16) e colar as lingüetas no lado que cor­responda: desse modo se obtém um volume poliédrico(fig. 17) onde só a face B6está no "chão". A face BI é pos­terior. A aresta B/BJ representa o eixo da tíbio-tarsiana. Aaresta B/B, representa o eixo de Henke comum às articu­lações subastragaliana e médio-tarsiana. Assim, a peça Brepresenta, do ponto de vista funcional, todo o astrágalo ea parte posterior do calcâneo (a anterior se move com ocubóide).

C) Cortar a peça C (Prancha V) como em B. Traçaras incisões, porém cuidado, não fazer incisão no versoentre CI e B', (chameira). Colar as lingüetas no seu ladohomólogo, prestar atenção à lingüeta e que se cola noverso de CI ao longo da prega inversa C/B '5 que represen­ta o eixo de Henke na peça C. A aresta CIC6 representa oeixo da articulação entre o tarso ântero-interno e o tarsoântero-externo, a escafocubóide. A peça C representa

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a

Fig.14

Fig.16

Fig.17

2. MEMBRO INFERIOR 261

Fig.15

Fig.18

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262 FISIOLOGIA ARTICULAR

assim, do ponto de vista funcional, a parte anterior do cal­câneo e todo o cubóide.

D) Cortar a peça D (Prancha V) e traçar as incisõesda dobragem (salvo D/C'2: charneira). Ao colar, não temimportância se a lingüeta b não é a que se cola no versode DI' ao longo da aresta D/C'2 que representa o eixo daescafocubóide. A peça D, que tem a forma de umapirâmide triangular com uma enorme lingüeta (C,) cor-responde ao escafóide e aos três cuneiformes. -

E) e F) Cortar sem realizar dobra nenhuma aspeças E, E', F e F' (Prancha IV) que vão constituir ossuportes da articulação de Lisfranc.

I, II, IU, IV, V) Cortar estas peças (Prancha VI)tendo especial cuidado em seguir com precisão os con­tornos das bases cuja forma determina a orientação dososso do metatarso (ver mais adiante). Atenção, aslingüetas pequenas da base são frágeis, já que se devemesvaziar, segundo o quadrado preto (com um estilete).Também se esvaziam os outros dois quadrados pretossituados perto do dedo fazendo um orifício um poucomenor do que a borracha (ver mais adiante: colocaçãodos elásticos). Cuidado com o sentido das dobras:incisões no verso para as articulações interfalangeanas enenhuma incisão no caso da articulação tarsometatar­siana. Não confundir a zona do verso que deve ser cola­da (tracejada) com uma lingüeta que tem que ser dobra­da: portanto, nenhuma incisão neste caso. A dobra dabase não deve estar muito marcada, porém deve realizar­se exatamente, porque determina a orientação dometatarsiano. Quando começar a colar, não esquecer apequena lingüeta situada perto da metatarsofalangeana;porque esta origina uma face para o apoio da cabeça dometatarsiano no chão. As pequenas lingüetas esvaziadasse dobram em ângulo reto sobre o verso de modo queconstituem uma polia para o músculo extensor curto dosdedos (ver mais adiante).

lI. Encaixe

As partes constituintes já estão secas e prontas paraa montagem.

1. Montagem de A com B (fig. 18):

Passar cola no verso de B '3 da peça A e colá-Iosobre B3 de B fazendo com que coincidam. Destemodo fica constituída a articulação tíbio-tarsiana.

2. Montagem de C com D (fig. 19).

Passar cola no verso de C'2 de D e colá-Io na partede C2 que corresponde. Desta maneira fica consti­tuída a articulação escafocubóide, prolongadapara diante pela cúneo-escafóide.

3. Montagem do conjunto AB com o conjunto CD(fig. 20, vista superior; figo21, vista inferior).

Passar cola no verso de B '5 de C e colar sobretoda a face de B5 de B, o que conforma o com-

i---

plexo articular subastragaliana-médio-tarsiano(eixo de Henke). Deste modo fica constituída todaa parte posterior do pé e o tornozelo (fig. 22, vistaântero-inferior).

4. Encaixe dos três primeiros ossos do metatarso.

Colocar F' ,cujo anverso estará coberto previa­mente de cola, sobre uma pequena tábua.Colocar sucessivamente, por cima, o anverso dabase dos três ossos do metatarso fazendo com

que coincidam exatamente com a zona que cor­responde em F'. A base de cada um dos metatar­sianos deve estar em contato com a do adja­cente. Passar cola no verso de F e cobrir a basedos metatarsianos já colados sobre F'. Fixartudo com alfinetes e deixar secar o tempo sufi­ciente para que as três camadas de papelãoformem um conjunto sólido. Dessa maneira ficaconstituída a parte interna da interlinha deLisfranc.

5. Encaixe dos dois Últimos ossos do metatarso.

Fazer o mesmo que no caso anterior com E'(antes, marcar o losango I no verso), a base dosVI e V metatarsianos e E. Deste modo fica cons­

tituída a parte externa da interlinha de Lisfranc

6. Encaixe da articulação de Lisfranc.

Passar cola na zona tracejada do anverso de E ecolocá-Ia em C2, na face inferior de C, fixando­a com força com alfinetes para evitar qualquerdeslocamento durante a secagem. Realizar omesmo com F, que se cola sobre D I na face infe­rior de D.

m. Instalação dos ligamentos e tendões

Antes de começar com esta instalação, se devemcolar os pontos de inserção e os sulcos:

- verso de B'6 sobre B6' a dobra está pouco mar­cada. Esta peça constitui as inserções posteri­ores dos músculos plantares (pequenos quadra­dos perfurados);

- anverso de C'5 (dobrado em ângulo agudo) sobrea zona tracejada de C5. Esta zona proporciona ainserção ao flexor curto dos dedos (se colocaramcinco porções em vez de quatro de propósito);

- colar sobre a peça A os canais do tibiaI anterior(TA), do fibular anterior (FA), do tibial posterior(TP) e dos fibulares laterais (FLC, FLL), canaisrecortados da prancha IV. Cuidado com o sentidodas dobras;

- colar na peça B os canais do tibial posterior (TP) edos fibulares (FLC, FLL) recortados da prancha V;

- colar na peça C o canal do fibular lateral longo(FLL) recortado da prancha V.

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Fig.20

Fig.19

2. ~IEMBRO INFERIOR 263

Fig.21

Fig.22

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r--

264 FISIOLOGIA ARTICULAR

1. Instalação dos elásticos

Estes elásticos -representam os ligamentos e o tônusmuscular de base.

Com a borracha elástica plana se constroem cincoligamentos e um músculo da maneira seguinte:

Pregar um alfinete no extremo da borracha e, aseguir, colocá-Ia no lugar do modelo que a corresponde.Estendendo-a moderadamente, aproximá-Ia do seusegundo ponto de inserção; cortá-Ia deixando 3 ou 4 cma mais para poder encaixá-Ia depois, e pregar o segundoalfinete neste ponto atravessando a borracha. Para quefique fixada, os alfinetes devem atravessar as paredesadjacentes da mesma aresta:

a) na face inferior do tarso (fig. 27, vista ínfero­interna) entre os losangos 1 de E' e 2 de B8;

b) ao longo da borda interna do tarso (fig. 27) entreos losangos 3 de D, e 4 de Bg;

c) na face externa do tarso (figs. 23 e 26) entre oslosangos 5 de C3 e 6 de B7, na parte média docanal dos fibulares;

d) na borda externa da garganta do pé (figs. 23 e 26)entre os losangos 7 de C3e 8 de A,;

e) na borda interna da garganta (fig. 27) entre oponto 9 de D, que também fixa o FLL e o losango10 de A]; -

f) na face posterior do tornozelo (figs. 25,26 e 27)entre os losangos 11 de BI e 12 de A,. Esta bor­racha elástica representa o tônus dos extensores,especificamente o do tríceps cujo tendão nãoestá incluído.

Com a borracha elástica quadrada se fabricarão osmúsculos plantares e dorsais:

a) os músculos plantares (figs. 26 e 27): cortarcinco tiras de 30 cm e fazer um nó espessonuma das extremidades. Passar cada tira por umfuro quadrado de B'6 de cima para baixo demodo que o nó fique na parte superior. A outraextremidade de cada tira passa para baixo comum alfinete, pelo furo situado na face plantar dometatarsiano correspondente. A tensão se regulamais tarde graças à dificuldade da borrachaelástica para deslizar-se pelos furos que, portan­to, se devem recortar um pouco mais estreitosdo que o calibre dos elásticos;

b) os músculos dorsais (figs. 24 e 25): cortar cincotiras de 25 cm e fazer um nó espesso numa dasextremidades. Passar cada tira de baixo paracima por um furo de Cs de modo que o nó fiquena parte inferior. Passar a outra extremidade

pela pequena lingüeta do metatarsiano correspon­dente (esse furo, mais amplo, facilita o desliza­mento) e, a seguir, passá-Ia pelo furo (mais estrei­to) da face dorsal do mesmo metatarsiano.

Regular a tensão de todos estes elásticos não éuma tarefa fácil e só se consegue com tentativas suces­sivas que põem em evidência os fatores de equilíbrio daabóbada plantar. Por último, as extremidades livres doselásticos se dobram para o interior do metatarsiano cor­respondente.

2. Instalação dos cordões

Representam os tendões.

A inserção de cada tendão se fixa com um alfineteque atravessa o cordão por' cima do seu nó de suporte.Antes, passar o cordão pelos canais correspondentes:

a) o tibial anterior (TA) que neste modelo se con­funde com o extensor próprio do hálux, passapor dois canais de A] antes de fixar-se em D,(fig. 27);

b) o fibular anterior (FA), que se confunde com oextensor comum dos dedos, passa por dois canaisem A3 e se fixa em C3(figs. 23 e 26);

c) o tibial posterior (TP) passa por um canal de A, epor dois de Bs antes de fixar-se em D2 (fig. 27);

d) o fibular lateral curto (FLC) passa por um canalde A, e um de B, antes de fixar-se em C] (figs. 23e 26), também pode ser fixado em V, bem perto daarticulação;

e) o fibular lateral longo (FLL) passa também porum canal de A2 e de B, (fig. 23), e por outro situ­ado na borda externa de C, (fig. 26) para fixar-seno ponto 9 de D, (fig. 27). Também se pode fixarem I, bem perto da articulação.

Utilização:

Graças às cordas ligadas nas extremidades livres decada tendão, a tração exercida sobre um ou vários delespermite a demonstração de quase todos os movimentosdo pé e de todas as orientações da abóbada.Comprimindo a abóbada com a perna sobre um planoresistente, se obtém um pé chato valgo típico. O achata­mento do arco anterior determina a separação dos dedosdo pé; a flexão plantar dos metatarsianos os aproxima.Assim, é possível multiplicar os exemplos de ações fisio­lógicas e distúrbios patológicos suscetíveis de seremreproduzidos por este modelo.

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8

Fig.23

Fig.24

2. MHvffiRO INFERIOR 265

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266 FISIOLOGIA ARTICULAR

TAFig.26

Fig.27

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PRANCHA I

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\\

Page 270: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

PRANCHA I

A

A /"

.~

•Modelo I ~I ~~JI

\B

B

I

f .•••I

Modelo III

Fig.2

Fig.1

b

c

Page 271: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

PRANCHA 11

Tiras de 6 arandelas

c

(..- 1LCAE

LCPI

~

3~i~1+1

P/alô tibial

Base femoral

A

Modelo II

Page 272: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

Modelo IV

PRANCHA 11I

Região decolagem

ade A2

J

A2 (margem superior)/

i"+T+++++++t+++

8 ~~~b" a

o '~,:h~A~

~v,V

Page 273: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

PRANCHA IV

\Marcar no versoant~s <;tecolar

~~\i~mB•••••

Page 274: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

---- \\\\\\ B8\\\

B2 \

\

~

~\\\

c

Colar o reversode C'2 sobre C2

PRANCHA V

\~

J

~

sobre B7

,~j'FLLBB'

5

Page 275: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

PRANCHA VI

>

Modelo V

• I• I

I I01•I•I -•II I /

II II I

I I II II II

I I II

II IIIII I I

II III

IIII

I,II III

I I II %:I

III

I

a1

I IV I

I 111 :

II1

I III

I

IaI I

IIaIII I I III I

II II

I I I II I

II II I

I I II II

II I I

I

II

I

II I I

I

II

I

I IIII I

I III I

II

I III II

I

I 1I II

~~

I III II

III I

I~ÉÍ{a~~ ~~1~ ~~(i~'\/0 Colada sobre E' Coberta por E

Page 276: Fisiologia Articular - Kapandji - Volume 2 - Membro Inferior - 5ª ED 277 Pág

ÍNDICE DE ABREVIATURAS

2. MEMBRO INFERIOR 279

A Grande adutor (pág. 61, 69) EphExtensor próprio do hálux (págs. 207, 209, 213,A'

Feixe inferior do grande adutor ou terceiro adutor 215,221,231,235)

(pág. 53, 61)

escEscafóide (págs. 197,203,205,230,231)

AbdAbdução (págs. 171, 197,205) ExaExpansão aponeurótica (pág. 37)

Abd 1Abdutor oblíquo (pág. 211) FFlexão (págs. 69, 205)

Abd2Abdutor transverso (pág. 211) EphFlexor próprio do hálux (págs. 211, 213, 215,

Abd5

Abdutor do 5.° dedo (págs. 211, 213, 233, 235) 231)

Abdh

Abdutor do hálux (pág. 235)fa

Feixe anterior púbico (pág. 33) .

Ad

Adutores (pág. 49)FA

Fibular anterior (pág. 213, 215, 223)

Aduh

Adutor do hálux (págs. 211, 213, 233, 235)FC.h

Porção interna do flexor curto (pág. 211)

AG

Aponeurose glútea (pág. 57)Fd

Flexor dos dedos (págs. 209, 211, 213, 215, 221,

Am

Adutor curto (pág. 63)241)

Al\1

Adutor médio (págs. 51,63,67,69)Fd

Fossa digital (pág. ~5)

FG5

Flexor curto do 5.° dedo (pág. 211)astr

Astrágalo (págs. 197,205,230,231,233)

B

Bíceps femoral (págs. 53, 61,151, 153)Fi

Faceta articular externa (fibular) (pág. 175)

B'

Porção curta do bíceps (pág. 153)FLC

Fibular lateral curto (págs-.203, 213, 215, 221,223, 225, 233)C

Rebordo cotilóide (págs. 27, 29, 33) FLLFibular lateral longo (págs. 189,203,213,215,C'

Eixo do cótilo (págs. 27, 29) 221,223,233,235)

C[

Primeiro cuneiforme (págs. 203, 205) fmFeixe médio (pág. 33)

C,

Segundo cuneiforme (págs. 203, 205) fpFeixe posterior isquiático (pág. 33)

C3

Terceiro cuneiforme (págs. 203, 205) FPCFlexor plantar curto (págs. 209, 211, 213, 235)

Ca

Cápsula articular (pág. 33) FrcFundos de saco retrocondilianos (pág. 101)

cale

Calcâneo (págs. 197,231,233) fsFeixe superior ou ílio-pré-trocanteriano (pág. 37)

CC

Quadrado crural (págs. 61, 65) FsFosseta supratrodear (pág. 99)

Cco

Calotas condilianas (pág. 99) FsqFundo de saco subquadricipital (págs. 99, 101,

Cf

Eixo do colo femoral (págs. 27, 29)109)

CM

Banda de Maissiat (págs. 57,119, 129)Ft

Flexores da tíbio-tarsiana (pág. 241)

CP

Cavidade posterior (pág. 33)a

Garganta trodear (pág. 91)b

Cr

Crural (pág. 147)G

Glúteo máximo (págs. 53, 55, 57, 59, 61, 65)

cub

Cubóide (págs. 197,203,205,233,235)G'

Feixes mais elevados do glúteo máximo (pág. 53)

D

Eixo diafisário (págs. 27, 29)Ge

Gêmeos (pág. 99, 151)

DG

Glúteo deltóide (pág. 57)GE

Glenóide externa (págs. 87, 103, 105)

E

Côndil0 externo (pág. 91)Gex

Gêmeo externo (pág. 219)

E

Extensão (págs. 69, 205)Gl

Glenóide interna (págs. 87, 103)

e

Incisura intercondiliana (pág. 91) GinGêmeo interno (pág. 219)

Ec

Esporão ciático (pág. 31)Gm

Glúteo médio (pág. 37, 51, 53, 55, 67, 71)

Ecd

Extensor comum dos dedos (págs. 207, 209, 213,GM

Glúteo médio (págs. 33,49,53,55,59,65,67)

215,233)

HiTrilho ilíaco (pág. 35)

Ei

Esporão inominado (pág. 31) ICôndilo interno (pág. 91)

Eil

Espinha ilíaca (págs. 57, 67) IIlíaco (pág. 51)

Ep

Esporão cervical inferior de Merkel (pág. 31) IIPlncisura ísquio-púbica (pág. 33)

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280 FISIOLOGIA ARTICULAR

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