Fdpp u2 Final Baixa
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Coordenação Didático-PedagógicaStella M. Peixoto de Azevedo Pedrosa
Redação PedagógicaTito Ricardo de Almeida Tortori
RevisãoAlessandra Muylaert Archer
Projeto Gráfico Romulo Freitas
DiagramaçãoLuiza Serpa
Coordenação de ConteudistasFernando Velôzo Gomes Pedrosa
ConteudistaAnvalgleber Souza Linhares
Revisão TécnicaOtávio Bravo
ProduçãoPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Realização EsIE – Escola de Instrução EspecializadaExército Brasileiro
Fundamentos do direito público e privado : apostila 1DPP / coordenação didático-pedagógica: Stella M. Peixoto de Azevedo Pedrosa ; redação pedagógica: Tito Ricardo de Almeida Tortori ; revisão: Alessandra Muylaert Archer ; projeto gráfico: Romulo Freitas ; coordenação de conteudistas: Fernando Velôzo Gomes Pedrosa ; conteudista: Anvalgleber Souza Linhares ; revisão técnica: Otávio Bravo ; produção: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro ; realização: EsIE – Escola de Instrução Especializada [do] Exército Brasileiro. – Rio de Janeiro : PUC-Rio, CCEAD, 2013.
Curso de Habilitação ao Quadro Auxiliar de Oficiais – CHQAO.100 p. : il. (color.) ; 21 cm.Inclui bibliografia.
1. Direito público - Brasil. 2. Direito privado – Brasil. I. Pedrosa, Stella M. Peixoto de Azevedo. II. Tortori, Tito Ricardo de Almeida. III. Sá, Felipe Alexandre Paiva Dias de. IV. Linhares, Anvalgleber Souza V. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Coordenação Central Educação a Distância. VI. Brasil. Exército. Escola de Instrução Especializada.
CDD: 342
CHQAOCurso de Habilitação ao Quadro Auxiliar de Oficiais
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO
Unidade 2 DIREITO DISCIPLINAR MILITAR
APRESENTAÇÃO
O Curso de Habilitação ao Quadro de Auxiliar de Oficiais (CHQAO),
conduzido pela Escola de Instrução Especializada (EsIE), visa habilitar os
subtenentes à ocupação de cargos e ao desempenho de funções previstas
para o Quadro Auxiliar de Oficiais.
A disciplina Fundamentos do Direito Público e Privado possui carga
horária total de 90 horas.
Os objetivos gerais desta disciplina são:
• Conhecer conceitos constitucionais relacionados às instituições do
direito público e privado;
• Analisar o papel do cidadão diante da Constituição Federal, de fatos
relacionados à administração das instituições de direito público e
privado;
• Diferenciar atos e fatos jurídicos das instituições de direito público e
privado associados às noções de direito na administração pública;
• Descrever o Direito Internacional Humanitário e fornecer elementos
para identificação de sua problemática;
• Identificar as principais regras e convenções relacionadas ao Direito
Internacional Humanitário;
• Conhecer as principais regras da legislação penal militar brasileira;
• Conhecer as principais regras da legislação processual penal militar
brasileira; e
• Empregar de maneira correta a legislação vigente.
Será apresentada agora a Unidade II – Direito Disciplinar Militar –,
cujos objetivos estarão especificados no início de cada capítulo.
Boa leitura!
CONTEUDISTA
Anvalgleber Souza Linhares é bacharel em Ciências Militares pela Acade-
mia Militar das Agulhas Negras (AMAN) e em Direito pelo Centro Universitário
de Barra Mansa (UBM). Possui mestrado em Direito pelo Centro Universitário
Salesiano de São Paulo e em Operações Militares pelo Departamento de Ensino
e Pesquisa do Exército (DEP). Concluiu os cursos de atualização em Direito Civil
Constitucional pela PUC/MG e em Direito Internacional de Conflitos Arma-
dos (DICA) pela Escola Superior de Guerra. Na Academia Militar das Agulhas
Negras (AMAN) é docente da Cadeira de Direito e membro do corpo editorial
da Revista Científica Anuário. É membro do Colegiado do Curso de Direito no
Centro Universitário de Barra Mansa, onde ministra as disciplinas Direito das
Obrigações, Contratos, Direito das Relações de Consumo e Iniciação Científi-
ca. Foi chefe da Assessoria Jurídica da Academia Militar das Agulhas Negras
(AMAN) e adjunto do Gabinete Pessoal do Presidente da República. Como
advogado, atua com ênfase em Direito Civil, do Consumidor e Família.
Índice
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1. Hierarquia e disciplina
1.1 as Forças armadas e a singularidade do seu emprego
1.2 direito disciplinar militar
2. ilícitos disciplinares
2.1 crime e transgressão disciplinar: uma distinção baseada no conceito analítico tripartite de crime
2.2 as consequências das práticas de um crime militar ou de uma transgressão disciplinar
2.3 a submissão a conselHo de JustiFicação (cJ) e de disciplina (cd) como consequência de cometimento de conduta que em sentido lato agrida a Hierarquia e a disciplina
3. sanções disciplinares
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49505152
4. conselHos de JustiFicação e de disciplina
4.1 processo e procedimento
4.2 o processo administrativo e seus princípios orientadores
4.3 a lei nº 9.784/99 como reguladora dos processos administrativos Federais
4.4 o processo administrativo-disciplinar
4.5 o processo administrativo-disciplinar no exército brasileiro
4.6 o conselHo de JustiFicação (cJ)
4.6.1 causas de submissão de um oFicial ao cJ
4.6.2 as circunstâncias em que o oFicial submetido ao cJ é aFastado do exercício das Funções
4.6.3 competência para a nomeação, composição e Funcionamento do cJ (arts. 4º-6º da lei nº 5.836/72, respectivamente)
4.6.4 dos procedimentos na Fase administrativa do cJ
4.6.5 decisão do comandante da Força
4.6.6 o cJ no superior tribunal militar
4.7 conselHo de disciplina (cd)
4.7.1 causas de submissão ao cd
4.7.2 competência para a nomeação, composição e Funcionamento do cd (arts. 4º, 5º e 7º do decreto 71.500/72)
4.7.3 dos procedimentos do cd
4.7.4 solução da autoridade nomeante do conselHo
4.7.5 o recurso da decisão do cd
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5. direito de deFesa nos processos disciplinares
5.1 o direito de deFesa nos processos administrativos em geral
5.2 o direito de deFesa nos processos administrativos disciplinares
6. controle Judicial – competência do stm
6.1 sistemas administrativos
6.2 o controle Judicial dos atos administrativos
6.3 competência da Justiça militar no controle Judicial dos atos administrativos disciplinares
7. regulamento disciplinar do exército
7.1 das transgressões disciplinares
7.2 punições disciplinares
7.3 do comportamento militar
7.4 recursos e recompensas
7.5 das disposições Finais
7.6 anexos ao rde
8. bibliograFia
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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Objetivos específicos
• Conhecer a importância da hierarquia e da disciplina como pilares de
sustentação das instituições militares.
• Conhecer a importância da hierarquia e da disciplina como pilares de
sustentação das instituições militares.
HIERARqUIA E DISCIPLINA1
A hierarquia e a disciplina estão presentes em qualquer instituição militar e
são imprescindíveis para a sua estruturação, eficiência e eficácia, nos termos
do que determina a Constituição Federal. Esta Unidade Didática discute a im-
portância desses institutos para o Exército Brasileiro.
O texto oferece, ainda, o conhecimento dos Conselhos de Justificação (CJ) e
de Disciplina (CD), do Regulamento Disciplinar do Exército (RDE ou R4) – ins-
trumentos de controle do descumprimento da hierarquia e da disciplina – e a
reflexão sobre a competência da Justiça Militar, trazendo à discussão a possibi-
lidade ou não do seu controle sobre os atos administrativos disciplinares.
Permite, ainda, conhecer o direito de defesa nos processos disciplinares, inafas-
tável aplicação do princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa.
O dia a dia do oficial impõe-lhe o domínio deste conteúdo para o exercício das
funções inerentes aos seus cargos.
1.1 AS FORÇAS ARMADAS E A SINgULARIDADE DO SEU EMPREgO
Não há país que prescinda das Forças Armadas (FA). Segundo uma visão prag-
mática que os estudiosos das Relações Internacionais denominam de realista,
tais instituições constituem-se em instrumento de defesa contra ameaça ex-
terna, de respeito e manutenção da paz no [concerto das nações], na relação
entre os Estados, de integração e de desenvolvimento nacionais.
Concerto das (gran-des) nações: conjunto de
coisas combinadas. É uma expressão usada em Histó-
ria e Geopolítica que tem o sentido de um acordo entre
pessoas ou instituições, com vistas a um objetivo comum.
O Realismo é uma das prin-cipais correntes teóricas das Relações internacionais, que apresenta o estado como prin-cipal unidade de análise, ma-ximizador de seus próprios interesses na política externa, que dá à segurança nacional um papel relevante.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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No âmbito federal, o Brasil conta com as Forças singulares da Marinha, Exérci-
to e Aeronáutica, subordinadas diretamente ao Ministério da Defesa e, através
deste, ao Presidente da República, para cumprir as missões que a Constituição
Federal (CF) lhes estabeleceu.
Como se constata no [caput] do artigo 142, a missão [precípua] das FA é a
defesa da pátria – garantia da integridade e independência nacionais – e a
garantia dos poderes constitucionais – da forma de Estado e de Governo e do
Regime de Governo:
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha,
pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacio-
nais permanentes e regulares, organizadas com base
na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema
do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pá-
tria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa
de qualquer destes, da lei e da ordem (grifo nosso).
Em missões de garantia da lei e da ordem (GLO) do Estado Democrático de
Direito, as FA podem ser empregadas:
• Quando da decretação das medidas de defesa do
Estado, previstas nos artigos 136 – Estado de Defesa
– e 137 – Estado de Sítio;
• Nas situações de intervenção federal nos Estados e
no Distrito Federal, estabelecidas no artigo 34; e
• Nas situações em que órgãos de segurança pública,
discriminados no artigo 144, estiverem indisponí-
veis, inoperantes, ou mesmo com sua capacidade
operacional esgotada.
Os preceitos que regulam o seu emprego estão dispostos em Lei Complemen-
tar (LC), conforme manifesta a CF, artigo 142, § 1º: “Lei complementar esta-
belecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no
emprego das Forças Armadas”.
Em atenção a este mandamento, o legislador dispôs “sobre as normas gerais
para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas” no artigo 15
da Lei Complementar nº 97, que sinaliza o emprego das Forças Militares na de-
fesa da pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, na
participação em operações de paz e na garantia de eleições (Lei nº 4.737, de 15
Caput: do latim, “cabeça”. esse termo é usado, geralmente, em textos legisla-tivos, para se referir ao enun-ciado de um artigo que pode conter, na sua estrutura, um ou mais artigos ou incisos.
Precípua: principal; essencial; fundamental.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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de julho de 1965). Além disso, o artigo 16 da referida lei prevê o seu emprego
na cooperação com o desenvolvimento nacional e com a defesa civil, inclusive
“em campanhas institucionais de utilidade pública ou de interesse social”.
Ademais, o Presidente da República, pelo Decreto nº 3.897, de 24 de agosto
de 2001, “fixa as diretrizes para o emprego das Forças Armadas na garantia da
lei e da ordem, e dá outras providências”.
Este amplo e diversificado emprego das FA exige dos militares, além dos
deveres de qualquer servidor do Estado, uma normatização especial militar
disciplinar, administrativa e penal. Assim, em consequência desse [amálgama] regulamentar, surge um rígido e extenso rol de deveres militares.
Para que esses profissionais estejam aptos a cumprir tantas e tão complexas
atribuições que lhes impõe a Nação, é necessário, portanto, a existência de
dois pilares históricos de sustentação das instituições militares – a hierarquia e
a disciplina.
A hierarquia é a ordenação em níveis dentro de uma organização e a disciplina
corporifica-se como a obediência às normas estabelecidas dentro dessa estru-
tura organizacional, assim como aos que exercem papéis de mando. Estes dois
institutos, é importante ressalvar, são encontrados em quaisquer organizações
da sociedade cuja tendência estrutural seja vertical.
Esses institutos são pilares, seja das Forças Armadas, de acordo com o animus
normativo constitucional do artigo 142, seja das Forças Policiais Militares e dos
Corpos de Bombeiros Militares dos Estados e do Distrito Federal, como prevê
o artigo 42 da CF: “Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bom-
beiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina,
são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”.
Tais institutos também são mencionados no artigo 14, do Capítulo III, Da
Hierarquia Militar e da Disciplina, da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980
– Estatuto dos Militares (E1) – que define:
CAPíTULO III
Da Hierarquia Militar e da Disciplina
Art. 14. A hierarquia e a disciplina são a base
institucional das Forças Armadas. A autoridade e a
responsabilidade crescem com o grau hierárquico.
Amálgama: liga; mistu-ra de elementos que, embora diversos, contribuem para formar um todo.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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§ 1º A hierarquia militar é a ordenação da auto-
ridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura
das Forças Armadas. A ordenação se faz por postos ou
graduações; dentro de um mesmo posto ou graduação
se faz pela antiguidade no posto ou na graduação. O
respeito à hierarquia é consubstanciado no espírito de
acatamento à sequência de autoridade.
§ 2º Disciplina é a rigorosa observância e o aca-
tamento integral das leis, regulamentos, normas
e disposições que fundamentam o organismo militar
e coordenam seu funcionamento regular e harmônico,
traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por
parte de todos e de cada um dos componentes desse
organismo.
§ 3º A disciplina e o respeito à hierarquia devem ser
mantidos em todas as circunstâncias da vida entre
militares da ativa, da reserva remunerada e reformados.
(grifo nosso).
No E1, a hierarquia e a disciplina estão estatuídas nas três Seções do Capítulo II
– Dos Deveres militares. Na Seção I – Conceituação – a pátria exige do militar o
sacrifício da própria vida, como pode ser percebido no trecho citado a seguir:
CAPíTULO II
Dos Deveres Militares
SEçãO I
Conceituação
Art. 31 - Os deveres militares emanam de um conjun-
to de vínculos racionais, bem como morais, que ligam
o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem,
essencialmente:
I - a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integri-
dade e instituições devem ser defendidas mesmo com o
sacrifício da própria vida;
[...]
IV - a disciplina e o respeito à hierarquia;
V - o rigoroso cumprimento das obrigações e das
ordens (grifo nosso).
[...].
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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O Compromisso Militar, descrito na Seção II, se refere ao compromisso de hon-
ra que todo cidadão solenemente deve prestar ao ingressar nas Forças Arma-
das, destacando-se, nele, a aceitação consciente dos deveres militares:
SEçãO II
Do Compromisso Militar
Art. 32 - Todo cidadão, após ingressar em uma das
Forças Armadas mediante incorporação, matrícula ou
nomeação, prestará compromisso de honra, no qual
afirmará a sua aceitação consciente das obrigações
e dos deveres militares e manifestará a sua firme
disposição de bem cumpri-los (grifo nosso).
A hierarquia e a disciplina instrumentalizam o exercício do comando por quem
está posicionado em situação hierárquica superior na estrutura organizacional
militar. Assim, a subordinação não interfere na dignidade pessoal daquele que
deve obediência em razão de posição hierárquica ou funcional. A Seção III –
Do Comando e da Subordinação – destaca o valor do exercício do comando
e a dignidade do obedecer quando determina que:
Art. 34 - Comando é a soma de autoridade, deveres
e responsabilidades de que o militar é investido
legalmente quando conduz homens ou dirige uma or-
ganização militar. O comando é vinculado ao grau hie-
rárquico e constitui uma prerrogativa impessoal, em cujo
exercício o militar se define e se caracteriza como chefe.
......................................................................................
Art. 35 - A subordinação não afeta, de modo
algum, a dignidade pessoal do militar e decorre, ex-
clusivamente, da estrutura hierarquizada das Forças
Armadas (grifo nosso).
Pela importância que a hierarquia e a disciplina ostentam no seio militar, quan-
do não atendidas, podem levar o infrator a submeter-se às penalidades previs-
tas na legislação ou regulamento pertinente.
“(...) a hierarquia e a discipli-na militares não operam como simples ou meros predicados funcionais das Forças arma-das brasileiras, mas, isto sim, como elementos conceituais e vigas basilares de todas elas (...)”. (in STF, 2ª Turma, Ha-beas Corpus nº 107469, rel. Ministro ayres Britto, 12 abr 11). disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurispru-dencia/20627768/habeas--corpus-hc-107096-pr-stf>
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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1.2 DIREITO DISCIPLINAR MILITAR
A hierarquia, a disciplina, o comando e a subordinação são baluartes das insti-
tuições militares e, fundamentalmente, do Direito Disciplinar Militar, que os
tutela. Esse Direito figura como uma das modalidades do Direito Administrati-
vo Militar, que, por sua vez, tem o Direito Militar como gênero.
Para Assis (2011, p. 75), o Direito Militar é “composto por toda a legislação
material que se refere à organização e ao funcionamento das Forças Armadas
e das Forças Auxiliares, seja de natureza administrativa, civil ou penal militar”.
O Direito Administrativo Militar, ao seu turno, pode ser entendido como:
[...] o conjunto harmônico de princípios jurídicos pró-
prios peculiares que regem as instituições militares, seus
integrantes e as atividades públicas tendentes a realizar
concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo
Estado e fixados na Constituição Federal: a defesa da Pátria
e a preservação da ordem pública. (ASSIS, 2011, p. 75).
Já o Direito Disciplinar é aquela espécie de direito
[...] que se ocupa com as relações decorrentes do sistema
jurídico militar vigente no Brasil, o que pressupõe uma
indissociável relação entre o poder do mando dos Co-
mandantes, Chefes e Diretores militares (conferido por lei
e delimitado por esta) e o dever de obediência de todos
os que lhes são subordinados, relação essa tutelada pelos
regulamentos disciplinares quando prevê as infrações dis-
ciplinares e suas respectivas punições, e controlada pelo
Poder Judiciário quando julga as ações judiciais propostas
contra atos disciplinares militares (ASSIS, 2010, p. 75).
“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre as diferen-tes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e racionalida-de do sistema normativo, no que lhe confere tônica e lhe dá sentido harmônico” (MeLLO, 1995, p. 545).
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2 ILÍCITOS DISCIPLINARES
Objetivo específico
• Identificar as consequências das agressões à hierarquia e à disciplina.
O estatuto dos Militares (e1) trata contravenção discipli-nar e transgressão disciplinar como sinônimos.
Um dever submete o homem ao cumprimento de uma ação a que se obriga.
Se a obrigação é jurídica, o dever lhe segue a natureza, é jurídico; se disci-
plinar, o dever é disciplinar. O seu descumprimento caracteriza uma ilicitude,
passível de sanção.
As ações de um agente, quando forem contrárias às obrigações e deveres milita-
res, ou afetarem a honra pessoal, o [pundonor militar] e o decoro da classe,
podem levar à prática de um crime militar, contravenção ou transgressão
disciplinar.
Assis (2011) afirma que a distinção entre crime militar e transgressão militar
está na intensidade da violação das obrigações e deveres, sendo maior a do
crime militar. Costa, Ramos e Roth (2011, p. 429) expressam que a transgres-
são ”não está vinculada à estreita [tipicidade] determinada pelo princípio da
legalidade”, como ocorre com o crime. É por isso que quando em uma situação
forem identificados ambos os tipos de conduta, o crime absorve a transgressão.
O Estatuto dos Militares (E1) criado através da Lei nº 6.880/80 aborda o crime,
a contravenção ou a transgressão disciplinar no capítulo III, que trata da Viola-
ção das Obrigações e dos Deveres Militares, e define:
Art. 42 A violação das obrigações ou dos deveres mili-
tares constituirá crime, contravenção ou transgressão
disciplinar, conforme dispuser a legislação ou regulamen-
tação específicas.
.......................................................................................
§ 2° No concurso de crime militar e de contravenção ou
transgressão disciplinar, quando forem da mesma natureza,
será aplicada somente a pena relativa ao crime (grifo nosso).
Pundonor militar: dever de pautar a sua conduta
como a de um profissional correto, em qualquer ocasião, adotando um alto padrão de
comportamento ético que refletirá no seu desempenho
perante a instituição a que serve e no grau de respeito
que lhe é devido.
Tipicidade: o que é típico; qualidade de um
fato que abrange todo os elementos da definição legal
de um delito.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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2.1 CRIME E TRANSgRESSÃO DISCIPLINAR: UMA DISTINÇÃO BASEADA NO CONCEITO ANALÍTICO TRIPARTITE DE CRIME
Costa, Ramos e Roth (2011), com perspicácia e baseados na Teoria Geral do
Delito, elaboraram um conceito analítico da transgressão disciplinar,
baseando-se no conceito analítico tripartite do crime: fato típico, anti-
jurídico e culpável. Na ausência de qualquer destes elementos não há de se
considerar a existência de crime.
Uma conduta humana é classificada como crime quando se atende à descrição
abstrata do fato tipificado como tal na norma legal. Por exemplo, comete o
crime de “reunião ilícita” todo aquele que age em conformidade com esse fato
típico previsto no artigo 165 pelo Código Penal Militar:
Art. 165. Promover a reunião de militares, ou nela tomar
parte, para discussão de ato de superior ou assunto ati-
nente à disciplina militar:
Pena - detenção, de seis meses a um ano a quem promo-
ve a reunião; de dois a seis meses a quem dela participa,
se o fato não constitui crime mais grave.
Quanto à transgressão, há ainda, na doutrina, uma grande divergência no que
tange a sua atipicidade ou tipicidade. Entretanto, há uma forte corrente jurí-
dica, em relação à transgressão, que aceita uma tipicidade mitigada, ou seja,
moderada, pois, caso contrário, o transgressor poderia ficar ao inteiro arbítrio
da autoridade disciplinar com a competência de aplicar a punição.
Ademais, é possível identificar no Regulamento Disciplinar do Exército
(RDE) uma tipicidade menos estrita, presente no artigo 14, pelo qual a trans-
gressão disciplinar é entendida como todo ato de militar, contrário às prescri-
ções normativas, ofensivas à ética, aos deveres e às obrigações militares, ou
“que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe”. Some-se
a isso o rol descritivo das agressões à hierarquia e à disciplina constantes do
Anexo I do RDE – Relação das Transgressões.
É importante perceber que essas transgressões não se apresentam com os
estreitos limites dos fatos típicos criminais (a cada tipo positivado, uma pena
prevista). Os limites estabelecidos para a punição, entretanto, são mais amplos
−própriosdos[atos administrativos discricionários]−edependemdaanálisede quem tem a competência para a sua aplicação. Essa análise deve levar em
conta, segundo o artigo 16 do RDE, a pessoa do transgressor, as causas que
Competência é “o conjunto de atribuições das pessoas jurídi-cas, órgãos e agentes, fixadas pelo direito positivo [direito previsto em lei]” (di PieTRO, 2009, p. 203). a competência para a aplicação das punições disciplinares, para o exército Brasileiro (eB), está positivada no artigo 10 do Regulamento disciplinar do exército (Rde), infra, em 7.2.2 Capítulo i: das disposições Gerais.
Ato administrativo discricionário: na prática
dos atos administrativos, em regra, o administrador públi-co não tem liberdade, sendo
obrigado a praticá-los. entre-tanto, existem aqueles atos que, embora obrigatórios, a autoridade tem alguma
liberdade na sua execução: são os atos administrativos
discricionários. exemplo: se um agente administra-
tivo tem notícia da prática de alguma indisciplina de
subordinado, é obrigado a apurá-la, entretanto, a sanção
disciplinar devida e o seu quantum serão objeto de sua
análise para a aplicação.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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determinaram o seu cometimento, a natureza dos fatos ou atos que a envolve-
ram e as consequências que dela resultarem. Em razão dessa discricionarieda-
de, de acordo com o artigo 24 do RDE, as punições poderão se configurar em:
• Advertência;
• Impedimento disciplinar;
• Repreensão;
• Detenção disciplinar;
• Prisão disciplinar;
• Licenciamento;
• Exclusão a bem da disciplina.
Antijuridicidade: qua-lidade do que é antijurídico; ilicitude jurídica; contrarie-dade ao direito.
A aplicação de penalidades disciplinares de caráter eminente-
mente administrativo aos militares que incidem em contraven-
ções disciplinares constitui um ato discricionário da Administra-
ção, a quem incumbe exercer o juízo de conveniência e oportuni-
dade, sem a interferência do Judiciário quanto ao mérito do ato
administrativo de punição disciplinar (...)” (in TRF da 1ª Região,
1ª Turma, Apelação nº 2002.39.00.003511-0). Disponível em:
<http://trf-1.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/985760/apelacao-em-
-mandado-de-seguranca-ams-3511-pa-20023900003511-0>
A [antijuridicidade] de um fato é caracterizada pela sua desconformidade
com o direito. No caso do crime, a ilicitude está presente no tipo penal, no
ato proibido pelo ordenamento legal. Contudo, causas excepcionais legal-
menteadmitidas−comoalegítimadefesa,porexemplo–podemdescarac-
terizar a conduta criminosa.
São exemplos de exclusão de ilicitude:
• Estado de necessidade - quando o autor pratica a conduta para salvar
de perigo atual direito próprio ou alheio.
• Legítima defesa - consiste em repelir moderadamente injusta agressão
a si próprio ou a outra pessoa.
• Estrito cumprimento de dever legal - quando o autor tem o dever
de agir e o faz de acordo com determinação legal.
• Exercício regular de direito - consiste na atuação do agente dentro
dos limites conferidos pelo ordenamento legal.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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Por fim, vale o princípio traduzido pela expressão latina usada em direito
“nullum crimen sine culpa”, ou seja, não há crime se não há culpa. Portanto, a
culpabilidade é um fundamento da pena que permite a aplicação de uma pena
ao transgressor ou autor de um fato típico e antijurídico.
Assim, se uma conduta típica e antijurídica, como um homicídio, é praticada
por um absolutamente incapaz, a pena respectiva não lhe pode ser por inexis-
tência de culpa, em razão do agente não ter capacidade de entender a ilicitude
do ato. Assim, a culpa, em seu sentido amplo, também pode instrumentalizar
o [quantum] da pena e seus limites podem ser diretamente proporcionais à
culpabilidade do agente.
Na transgressão disciplinar, há simetria da aplicação da culpabilidade. Se o ato
for cometido por quem não tem capacidade de perceber a sua ilegalidade, não
há de se configurar a transgressão.
2.2 AS CONSEqUêNCIAS DAS PRáTICAS DE UM CRIME MILITAR OU DE UMA TRANSgRESSÃO DISCIPLINAR
Note-se que a prática de condutas ilícitas no contexto do direito militar, sejam
elas crimes, sejam transgressões militares, provocam as consequências que o
artigo 43 do Estatuto E1 estabelece:
A inobservância dos deveres especificados nas leis e
regulamentos, ou a falta de [exação] no cumprimento
dos mesmos, acarreta para o militar responsabilidade
funcional, pecuniária, disciplinar ou penal, consoan-
te a legislação específica.
O Estatuto dos Militares (E1) prevê em seus artigos 46 e 47 que o ordenamento
normativo relacione, classifique e trate das penalidades decorrentes da agressão
aos deveres militares. Se a conduta configurar um crime será julgada à luz do
Código Penal Militar (CPM) e responderá, se for qualificada como transgressão
disciplinar, ao Regulamento Disciplinar da Força Armada que lhe corresponda:
Art. 46 O Código Penal Militar relaciona e classifica
os crimes militares, em tempo de paz e em tempo de
guerra, e dispõe sobre a aplicação aos militares das penas
correspondentes aos crimes por eles cometidos.
quantum: do latim, significa “quantidade”.
Exação: exatidão; es-mero; primor; zelo.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
19
Art. 47 Os regulamentos disciplinares das Forças Armadas
especificarão e classificarão as contravenções ou transgres-
sões disciplinares e estabelecerão as normas relativas à am-
plitude e aplicação das penas disciplinares, à classificação do
comportamento militar e à interposição de recursos contra
as penas disciplinares (grifo nosso).
Dessa forma, os crimes militares serão julgados pelo Código Penal Militar
– Decreto-Lei nº 1.001/69 – que trata desses ilícitos e das suas consequências
em tempo de paz e de guerra.
As transgressões disciplinares são especificadas e tem as suas sanções
normatizadas através dos regulamentos disciplinares especiais de cada uma
das três Forças Armadas:
• Regulamento Disciplinar da Marinha – Decreto nº 88.545/1983.
• Regulamento Disciplinar do Exército – Decreto nº 4.346/2002.
• Regulamento Disciplinar da Aeronáutica – Decreto nº 76.322/1975.
2.3 A SUBMISSÃO A CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO (CJ) E DE DISCIPLINA (CD) COMO CONSEqUêNCIA DE COMETIMENTO DE CONDUTA qUE EM SENTIDO LATO AgRIDA A HIERARqUIA E A DISCIPLINA
As Forças Armadas dispõem da Lei nº 8.532/72, que regulamenta o Conselho
de Justificação (CJ), cujo objetivo é julgar oficiais no âmbito administrativo
e do Decreto 71.500/72, que normatiza a ação do Conselho de Disciplina
(CD), no julgamento de Guardas-Marinha ou Aspirantes-a-Oficial e praças com
estabilidade.
Duarte (1998, p. 56) sinaliza que a sujeição a esses Conselhos se dá quando há
indícios da “incapacidade de militares para permanecerem na ativa e simul-
taneamente criar condições para a sua defesa”. Certamente, tal submissão
se deve à imputação aos acusados de atos que, em sentido lato ou estrito,
tenham, em tese, lesado a hierarquia e a disciplina.
Sobre a constitucionalidade do Rde, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou ex-pressamente a respeito, ao jul-gar a ação direta de inconsti-tucionalidade nº 3.340-9/dF, em 3 de novembro de 2005.
Veja o acórdão na ínte-gra no link: <http://re-dir.s t f. jus.br/paginador-pub/paginador.jsp?docTP =aC&docid=409292>
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
21
3 SANÇõES DISCIPLINARES
Objetivo específico
• Identificar as sanções disciplinares e sua natureza jurídica.
As sanções disciplinares decorrentes das transgressões dos deveres militares
de hierarquia e disciplina são definidas no artigo 21 do Decreto nº 4.346, de
26 de agosto de 2002 da seguinte maneira: “a punição disciplinar objetiva a
preservação da disciplina e deve ter em vista o benefício educativo ao punido e
à coletividade a que ele pertence”.
Oreferidodecreto−quecriouoRegulamentoDisciplinardoExército(R-4)−
identifica e caracteriza nos artigos 23-33 as respectivas punições:
• Advertência é a forma mais branda de punir, consistindo em
censura verbal;
• Repreensão é a censura enérgica ao transgressor, escrita;
• Impedimento disciplinar é a obrigação de o transgressor não se afas-
tar da OM, sem prejuízo de qualquer serviço que lhe competir;
• Detenção é o cerceamento da liberdade do punido sem encarcerá-lo;
• Prisão disciplinar é a obrigação de o punido permanecer em local
próprio e destinado para tal;
• Licenciamento e exclusão a bem da disciplina, que são afastamen-
tos [ex officio] das fileiras da Corporação.
Além disso, segundo Assis (2011, p. 128), “em razão de processos administra-
tivos e/ou condenação por crime militar, existem ainda as penas de Demissão
do Oficial e a consequente perda do Posto e da Patente”.
Portanto, o que se pretende é estabelecer a natureza jurídica de uma sanção
disciplinar. Ora, estabelecer a natureza jurídica de um instituto é identificar a
que categoria jurídica tal instituto se integra, ou seja, fixar o gênero do qual o
instituto é espécie.
Ex officio: independente de requerimento; significa
dizer que a autoridade pode determinar ou adotar um
procedimento sem o requeri-mento do interessado.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
22
As sanções disciplinares são atos administrativos disciplinares pra-
ticados por quem tem competência para tal. Assim, a punição traduz
uma manifestação unilateral da vontade da Administração Pública no desem-
penho de suas funções, visando produzir algum efeito jurídico, nesse caso,
de caráter disciplinar.
Qualquer ato administrativo apresenta requisitos essenciais ou elementos obri-
gatórios e essenciais necessários à formação desse ato, cuja falta pode condu-
zir à sua invalidação. Cinco são os requisitos e todos devem estar presentes no
ato da autoridade que aplica a punição:
• Competência: poder estabelecido por lei a cada militar que ocupa
função de chefia, comando ou direção para o exercício de suas funções,
inclusive a disciplinar.
• Finalidade: cumprimento do [escopo] da lei; a sanção destina-se a
corrigir as agressões à hierarquia e à disciplina.
• Forma: se apresenta como requisito vinculado e imprescindível à per-
feição do ato administrativo; as punições exibem, em regra, a forma
estabelecida por norma, que deve ser por escrito, pela publicação em
boletim interno, excetuando-se a advertência, que é verbal.
• Motivo (ou causa): trata da situação de fato ou de direito que determi-
na ou autoriza a realização do ato administrativo disciplinar: a transgres-
são cometida é o fato e a sua tipificação cuja consequência, a sanção,
consta de previsão normativa, no RDE, por exemplo, é a norma;
• Objeto: conteúdo do próprio ato administrativo é a sanção expressa na
nota de punição do transgressor publicada.
Uma sanção disciplinar não é um ato totalmente vinculado, ou seja, não
é um ato que o agente militar deva cumprir, no todo. Assim, a autoridade
militar, ao tomar conhecimento de uma transgressão, não deve se esquivar de
apurar e estabelecer a punição e seus limites, dentro daquilo que a discricio-
nariedade lhe permite. Para tanto, considerando o artigo 16 do RDE, deve-se,
antecipadamente, proceder à análise da pessoa do transgressor, das causas
que determinaram a transgressão, da natureza dos fatos ou dos atos que a
envolveram e as consequências que possam decorrer. Cumpre ainda que sejam
apreciadas as circunstâncias atenuantes e as agravantes e as possíveis causas
de justificação, tudo para o estabelecimento de uma sanção justa, que atenda
à preservação da hierarquia e da disciplina e a sua finalidade educativa.
Escopo: fim; finalidade.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
23
Assim, portanto, é legítimo dizer que a natureza jurídica da sanção disci-
plinar é de ato administrativo, Sendo abusiva ou estando em desobediên-
cia ao que determina a lei, poderá ser anulada diretamente pela própria Admi-
nistração Pública, sem a necessidade de socorro do Judiciário. Por outro lado,
a sanção disciplinar também poderá ser invalidada pelo Judiciário, mediante
ação judicial, à [revelia] da Administração.
Revelia: juridicamen-te falando, é a situação na qual aquele que é citado para apresentar defesa deixa transcorrer o prazo legal sem apresentar resposta ou contestação.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
25
Objetivo específico
• Conhecer o funcionamento dos Conselhos de Justificação e de Disciplina.
A Constituição Federal estabelece, no inciso LIV do artigo 5º, o princípio do
devido processo legal ao definir que “ninguém será privado da liberdade ou de
seus bens sem o devido processo legal”. Esse comando constitucional deve ser
aplicado tanto aos processos judiciais como aos administrativos. A desobediên-
cia ao devido processo legal constitui uma medida arbitrária que pode levar à
[nulidade processual].
Os Conselhos de Justificação (CJ) e de Disciplina (CD) constituem mo-
dalidades de processos administrativos. Desse modo, para compreender o seu
funcionamento, deve-se, primeiro, apreender o que é processo, diferenciá-lo
de procedimento, reconhecer suas principais normas reguladoras e conhecer
suas principais modalidades.
4.1 PROCESSO E PROCEDIMENTO
Processo, em sentido amplo, no entender de Di Pietro (2009, p. 618), é ”uma
série de atos coordenados para a realização dos fins estatais”, podendo ser
legislativo, para a elaboração de leis, e judicial ou administrativo, para a aplica-
ção da lei pelo Estado.
Quando o fim estatal for administrativo, este conjunto de atos coordenados
denomina-se processo administrativo. Se exigir solução para uma controvér-
sia, no âmbito administrativo, entre o administrado e o Estado, trata-se de um
processo litigioso. Por outro lado, se o fim do processo for uma decisão final
da administração, sem envolver litígio entre o particular e o Estado, o processo
será não litigioso (CARVALHO FILHO, 2010).
CONSELHOS DE JUSTIFICAÇÃO E DE DISCIPLINA4
Nulidade processual: sanção que configura a
ausência de produção dos efeitos processuais cabíveis
em consequência da violação das formas processuais.
Os processos que apresentam litígio distinguem-se pelo conflito de interesses entre o estado e o administrado e são decididos, na esfera adminis-trativa, pelo estado. Os proces-sos não litigiosos, ao contrá-rio, não apresentam conflito.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
26
Entendido o significado de processo, deve-se distingui-lo, para maior clareza
doutrinária, de procedimento. Para tanto, conceitua-se procedimento como
uma sucessão de atos destinados a promover a execução de um ato final; em
complemento, pode ser também definido como o rito a que devem obedecer
todos os atos de um processo (DI PIETRO, 2009; ASSIS, 2011).
No processo administrativo, essa procedimentalização é mais do que uma
mera orientação ao administrador público, pois decorre do princípio cons-
titucional do devido processo legal. Há uma pluralidade de modalidades
procedimentais, já que os diferentes órgãos administrativos podem discipli-
nar modalidades próprias, por lei. O procedimento também limita o arbítrio
do administrador, ao garantir ao administrado, por previsão legal do rito, a
publicidade dos atos do agente público, o exercício da ampla defesa, no caso
de litígio em face da Administração, e uma decisão consentânea com os fatos
apurados e com a lei (JUSTEN FILHO, 2009).
Assim sendo, processo e procedimento não são sinônimos e
nem se contrapõem, são interdependentes; todo processo
apresenta um procedimento, seja judicial, seja administrativo,
entretanto, é possível encontrar procedimento que não se
refira a processo, como nas licitações e nos concursos.
(CARVALHO FILHO, 2010).
Embora não exista uniformidade procedimental, é plausível, qualquer que seja
a modalidade de processo administrativo, identificar fases comuns, que se
sucedem. Em não havendo uniformização, certamente dependerá das carac-
terísticas de cada caso concreto, ou de normatização estabelecida por órgão
competente. Contudo, Justen Filho (2009) e Carvalho Filho (2010) indicam
como etapas comuns do procedimento em todos os processos: a instaura-
ção, instrução, defesa (apenas no caso do processo litigioso) e decisão.
• Instauração é a apresentação escrita dos fatos e a indicação do direito
que enseja o processo. Quando provém da Administração Pública, nor-
malmente se consubstancia em portaria, auto de infração, representação
ou despacho inicial da autoridade competente; quando provocada pelo
administrado ou pelo servidor deve formalizar-se por requerimento ou
petição. Tal conhecimento permite ao acusado em processo administrati-
vo o exercício da ampla defesa.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
27
• Instrução é a fase de elucidação dos fatos. É a etapa de um proces-
so litigioso em que são produzidas as provas da acusação no processo
punitivo, ou de complementação das iniciais no processo de controle e
de [outorga]. Incluem, desde o depoimento da parte, até as inquirições
de testemunhas, as inspeções pessoais, as perícias técnicas e a juntada de
documentos pertinentes. O acusado deve ser notificado para o acompa-
nhamento da produção das provas, inclusive as testemunhais, podendo
até formular perguntas. Não há a obrigatoriedade do acompanhamento
por advogado, todavia, se assim ocorrer, não pode ser impedido de estar
presente no curso do processo. Deve ser garantido o constitucional exer-
cício da ampla defesa com liberdade de produção de provas (testemu-
nhais, documentais e periciais), desde que lícitas, e do contraditório, tudo
dentro do devido processo legal, nos termos do inciso LV do art. 5º da CF.
• Decisão é a última fase. Deve conter um relatório, síntese do que foi apu-
rado no processo, promovido por quem o presidiu, com apreciação das
provas, dos fatos apurados, do direito debatido e elaboração de proposta
conclusiva – opinativa – para decisão da autoridade julgadora competente.
Nela, quem tem a competência para julgar o processo – autoridade
ou órgão com essa atribuição – com base nos autos, poderá concordar
com a apreciação de quem conduziu o processo, inclusive com a
punição, ou discordar, adotando a medida que entender mais correta.
4.2 O PROCESSO ADMINISTRATIVO E SEUS PRINCÍPIOS ORIENTADORES
O processo administrativo, ao contrário do processo judicial, não apresenta uma
sistematização uniforme. É uma das modalidades de processo e presume o de-
sempenho de atividade administrativa. Para a sua instauração não há necessida-
de da existência de um conflito, bastando apenas existir um interesse que deva
ser instrumentalizado administrativamente pelo Estado. Naqueles processos em
que houver litígio, a relação será bilateral, ou seja, entre o particular e o Estado,
cabendo à Administração Pública decidi-lo. Admite, em razão do sistema de
jurisdição única, que [lides]administrativassejamobjetodeaçãojudicial−mes-mo sem o esgotamento da sindicânciaouoprocessoadministrativo−quando
se identifique “efetiva lesão ou ameaça de lesão ao direito do indivíduo”.
Há uma pluralidade de diplomas legais e até infralegais que regulam a diver-
sificada especialização processual administrativa. A par deste heterogêneo
Outorga: cede; concede.
Carvalho Filho (2010, p. 1082) afirma que a autori-dade com competência para julgar o processo, ao tomar a decisão de divergir de quem o presidiu, pode “adotar uma das seguintes posições: a) conceder ou não o objeto do processo, no processo não liti-gioso; b) no caso de litigioso, sancionar o acusado, se o en-carregado do processo o tiver absolvido, absolvê-lo, se tiver sido apenado e aplicar sanção mais grave ou mais leve, diver-sa da sugerida no relatório”.
Lide: é pretensão re-sistida, ou seja, em havendo duas partes, se uma deseja algo e a outra se recusa a conceder, aí haverá lide. Quando é objeto de um pro-cesso judicial, o juiz decide; quando de um processo administrativo, a autoridade administrativa, o fará.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
28
regramento, o processo administrativo federal se vê uniformizado pela Lei
nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que “regula o processo administrativo
no âmbito da Administração Pública Federal”; [destarte], a Administração
Pública direta e indireta e também os órgãos administrativos dos Poderes
Legislativo e Judiciário da União passam a submeter-se a este instrumento
regulador e uniformizador (CARVALHO FILHO, 2010).
Carvalho Filho (2010) aponta que os princípios informadores do proces-
so administrativo são: o devido processo legal, da oficialidade, do contra-
ditório e ampla defesa, da publicidade, do informalismo procedimental e da
verdade material.
I. O princípio do devido processo legal consta do artigo 5º, LIV, da CF
e significa a [subsunção] de todo processo às normas que o regulam. A
lei, portanto, estabelece os limites de atuação não só de toda a Socieda-
de como, também, do próprio Estado e de seus agentes. Dessa forma,
os processos devem submeter-se às normas legais que os regulam.
II. O princípio da oficialidade (ou impulsão) está consignado no artigo
29 da Lei nº 9.784/99. Permite que um processo, ainda que instaurado
por provocação de particular, se submeta ao impulsionamento da Admi-
nistração Pública, favorecendo a rapidez na sua conclusão. Faculta, ainda,
à Administração Pública, instaurar e impulsionar o processo ex officio, ou
seja, sem que haja necessidade de provocação das partes envolvidas.
III. O princípio do contraditório e ampla defesa está expresso no inciso
LV do artigo 5º da CF e vale não somente para o processo judicial, mas
igualmente para o processo administrativo litigioso. Dessa forma, em
havendo litígio suscetível de apreciação e decisão pela Administração
Pública, estão assegurados:
a) A ampla defesa: significa a possibilidade de utilização de qual-
quer meio de prova, exceto os ilícitos; o direito à adequada resistên-
cia às pretensões adversárias e o direito à defesa tanto na via ad-
ministrativa, quanto na via jurisdicional, com “produção de provas,
acompanhamento dos atos processuais, vista do processo, inter-
posição de recursos e, afinal, intervir, sempre que a parte entender
necessário para provar suas alegações”.
b) O contraditório: é corolário da ampla defesa. Trata do direito do
acusado contestar, redarguir a acusação, impugnar atos e atividades
que entender necessário.
Normas infralegais são todas as normas que não foram ela-boradas pelo Poder Legislativo através de rito próprio. São regramentos de abrangência mais limitada que uma lei, emanados de autoridade com competência para editá-las. São exemplos os decretos, as resoluções, as portarias, as ins-truções normativas etc.
Destarte: assim sendo, desse modo.
Subsunção: ato de submeter, de subjugar.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
29
IV. O princípio da publicidade está presente no texto constitucional do
artigo 37, caput. Sua aplicação importa no “dever do Estado de dar a
maior divulgação possível aos atos que pratica. É o dever de transparên-
cia das atividades administrativas” que, quando aplicado ao processo
administrativo, traduz-se no direito que as partes (ou qualquer pessoa
com interesse público a ser preservado) têm de dar vista nos autos.
V. O princípio do informalismo procedimental estabelece que o
processo administrativo prescinde de ritos sacramentais e formas
rígidas, particularmente para os atos a cargo do particular; bastam as
formalidades estritamente necessárias à obtenção da certeza jurídica e
à segurança procedimental.
[...] no silêncio da lei ou de atos regulamentares, não há
para o administrador a obrigação de adotar excessivo
rigor na tramitação dos processos administrativos, tal
como ocorre, por exemplo, nos processos judiciais. Ao
administrador caberá seguir um procedimento que seja
adequado ao objeto específico a que se destinar o pro-
cesso (CARVALHO FILHO, 2010, p. 1065).
VI. O princípio da verdade material ou liberdade na prova autoriza
a Administração a valer-se de quaisquer provas lícitas que a autoridade
processante ou julgadora tenha conhecimento, desde que a faça trans-
ladar para o processo. É a busca da verdade material em contraste com
a verdade formal, mais presente no processo judicial. O próprio admi-
nistrador pode determinar a produção das provas que entender mais
adequadas ao curso do processo e para atingir o seu fim.
4.3 A LEI Nº 9.784/99 COMO REgULADORA DOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS FEDERAIS
O processo administrativo na administração federal é regido por norma geral
representada pela Lei nº 9.784/99, tendo em vista a necessidade de uniformi-
zar pelo menos as regras básicas a serem adotadas nos expedientes adminis-
trativos federais.
Como adverte Carvalho Filho (2010, p. 1067), a lei é federal e não nacional,
aplicando-se, portanto, na tramitação processual da administração federal, em
qualquer dos seus poderes constituídos. Por ser federativa, a organização do
excepcionalmente, a eficácia do princípio da publicidade pode ser reduzida, de acordo com o artigo 5º, XXXiii, da CF, quando, justificadamente, o sigilo deve se sobrepor.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
30
Estado brasileiro, os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios não se sub-
sumem a ela, automaticamente, eis “que são titulares de competência privativa
para estabelecer as próprias regras a respeito de seus processos administrativos”.
Existem leis que tratam de determinados processos administrativos, com sin-
gularidade. Esses regramentos, pela sua especialidade, se sobrepõem à Lei nº
9.784/99, de caráter geral e subsidiário. Logo, na ausência de norma especial que
regule determinada modalidade de processo administrativo federal, vige a geral.
O caput do artigo 2º apresenta alguns dos mais importantes princípios aplicáveis
à Administração Pública federal direta e indireta. O seu parágrafo único elenca
os critérios processuais que devem ser observados. Por pertinente, ainda importa
dizer que a Administração Pública se subordina, também, aos princípios elenca-
dos no caput do artigo 37 da CF, nominados princípios expressos da Administra-
ção Pública, por estarem expressamente previstos no texto constitucional.
É importante esclarecer que a norma em apreço faculta a deflagração do
processo, ex officio, de acordo com o princípio da oficialidade, como acima
referido, ou por provocação do interessado, na medida em que houver um
interesse a ser legalmente atendido pela administração.
4.4 O PROCESSO ADMINISTRATIVO-DISCIPLINAR
Impropriamente chamado de inquérito administrativo, o processo adminis-
trativo-disciplinar−tambémdenominadoprocessodisciplinarprincipal−
“é o instrumento formal através do qual a Administração apura a existência de
infrações praticadas por seus servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao
regime funcional da Administração e, se for o caso, aplica as sanções adequa-
das” (CARVALHO FILHO, 2010, p. 1073).
Cada pessoa federativa tem seu estatuto funcional e cada um estabelece normas
específicas para apurar as infrações de seus servidores públicos. É esta a razão
de existir uma diversidade normativa de processos administrativo-disciplinares.
Ainda, na apuração da infração, a Administração pode utilizar-se de um meio
sumário para apurar as ocorrências anômalas: a sindicância. Permite apu-
rar, preliminarmente, os “indícios da existência de infração funcional”, “sua
autoria” e o “elemento subjetivo com que se conduziu o responsável”. Difere
do que doutrinariamente é chamado de processo disciplinar principal, pelo seu
menor rigor procedimental.
O artigo 2º da Lei nº 9.784/99 determina que a “administra-ção Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da lega-lidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionali-dade, moralidade, ampla de-fesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência”. a Constituição Fe-deral afirma no seu artigo 37 que a “administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos es-tados, do distrito Federal e dos Municípios” também obede-cerá aos mesmos princípios.
Leia o artigo Comentários à nova Lei do Processo Administrativo Fede-ral (Lei 9784/99). disponível em: <http://jus.com.br/arti-gos/409/comentarios-a-no-va-lei-do-processo-adminis-trativo-federal-lei-9784-99>
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
31
Apurada a falta infracional através do pertinente processo, resta à Administra-
ção aplicar a sanção devida ao servidor ou arquivar o feito, caso se demonstre
a ausência de transgressão funcional (CARVALHO FILHO, 2010).
4.5 O PROCESSO ADMINISTRATIVO-DISCIPLINAR NO ExéRCITO BRASILEIRO
Ao questionar sua natureza jurídica, constata-se que o processo adminis-
trativo-disciplinar vigente no Exército Brasileiro (EB) é um tipo de pro-
cesso administrativo-disciplinar da Administração Pública, mais precisamente
classificado como um processo administrativo disciplinar militar. Seu objeto
específico é a apuração de faltas de natureza moral, sendo por isso chama-
dos de Tribunais de Honra.
Na Administração Pública, para sancionar administrativamente os servidores
civis da União, há necessidade de instauração de um processo administrativo-
-disciplinar. No âmbito do EB não existe a figura do processo administrativo,
propriamente nominado, utiliza-se, integralmente, uma modalidade de proces-
so administrativo denominada de sindicância.
A Portaria nº 107, de 13 de fevereiro de 2012, aprovou as Instruções Gerais
para a Elaboração de Sindicância no âmbito do Exército Brasileiro (EB 10-IG-
09.001). Seu artigo 2º define sindicância como:
O procedimento formal, apresentado por escrito, que tem
por objetivo a apuração de fatos de interesse da adminis-
tração militar, quando julgado necessário pela autoridade
competente, ou de situações que envolvam direitos.
Como característica dessa espécie de processo administrativo, decorrente do
texto da norma reguladora castrense, há um rigor procedimental maior do que
o imposto à sindicância na Administração Púbica em geral. Por certo, a sindi-
cância no âmbito do Exército Brasileiro, como qualquer processo administrati-
vo, deve atender às normas gerais e de caráter subsidiário da Lei nº 9.784/99,
no que couber.
Verifica-se, ademais, a previsão de processos administrativos disciplinares, ou-
tros, especialmente regulados em normas especiais, para a apuração de faltas
de natureza moral, nominados de tribunais de honra: os Conselhos de Justifi-
cação e Conselho de Disciplina.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
32
4.6 O CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO (CJ)
A fundamentação legal desta modalidade de processo administrativo disci-
plinar no EB se encontra na Lei nº 5.836/72, porém o Regulamento Interno e
dos Serviços Gerais (R1) e o Regulamento Disciplinar do Exército (R-4) também
fazem alusão a esse instituto.
O artigo 1º dessa lei permite definir o CJ como o processo administrativo
disciplinar “destinado a julgar, através de processo especial, da incapacidade
do oficial das Forças Armadas - militar de carreira - para permanecer na ativa,
criando-lhe, ao mesmo tempo, condições para se justificar” e da incapacidade
do oficial da reserva remunerada ou reformado de “permanecer na situação de
inatividade em que se encontra”.
Incide, portanto, sobre todos os oficiais de carreira das Forças Armadas e das
Forças Auxiliares, da ativa, reserva ou reformado e julga a incapacidade do
oficial de permanecer na ativa, podendo propor a sua reforma ou até mesmo a
perda do posto. O Conselho também poderá julgar o oficial da reserva remu-
nerada ou reformado, nesse caso, podendo propor a perda do posto; não se
aplica ao oficial da reserva não remunerada.
Trata-sedeumtribunaldehonra−uminstitutotipicamentemilitareessencial-
mentedenaturezamoral−reguladoemleiespecialedestinadoaanalisarfatos
que dizem respeito à conduta do oficial, sempre que, a despeito dela, houver uma
acusação concreta que, uma vez comprovada, seja capaz de gerar incompatibili-
dade para o exercício de sua função militar, em decorrência do cometimento de
uma falta disciplinar grave ou de outro ato previsto nas leis ou nos regulamentos.
Os oficiais, devido à função de comando e chefia que exercem e por submete-
rem-se a um processo mais longo de formação militar, devem servir de exem-
plo para os seus subordinados e os atos ilícitos praticados por esta categoria
de servidores trazem maior repercussão junto à Instituição Militar.
O Conselho de Justificação, enquanto procedimento administrativo desenvol-
vido no âmbito da Administração Militar, esgota-se em si mesmo, podendo
resultar em:
• Arquivamento do processo;
• Aplicação de pena disciplinar;
• Inabilitação para o acesso;
• Ocorrência de crime militar;
Leia o artigo O Conselho de Jus-tificação e o Processo de Indignidade para o Oficialato. disponível em: <http://www.tjmsp.jus.br/exposicoes/art014.pdf>
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
33
• Instrução preliminar ou extrajudicial do julgamento da indignidade ou
incompatibilidade com o oficialato realizado no Superior Tribunal Militar.
4.6.1 Causas de submissão de um oficial ao CJ
No Estatuto dos Militares, a submissão de oficial a CJ encontra-se prevista no
artigo 48:
Art. 48. O oficial presumivelmente incapaz de perma-
necer como militar da ativa será, na forma da legislação
específica, submetido a Conselho de Justificação.
........................................................................................
§ 3º O Conselho de Justificação poderá, também, ser
submetido o oficial da reserva remunerada ou reformado,
presumivelmente incapaz de permanecer na situação de
inatividade em que se encontra.
A Lei nº 5.836/72 determina no artigo 2º que a instauração do Conselho pode
se dar a pedido ou ex officio e detalha as causas que levam um oficial a sua
submissão, em cinco incisos. É de se destacar que a intenção da Lei é primar
pelo comportamento e desempenho do oficial, sinalizando que a instituição
castrense não aceita conduta que agrida os princípios inatacáveis da disciplina
e da hierarquia (ASSIS, 2011).
A acusação oficial subentende um encaminhamento regular que chegue à
autoridade a quem o militar esteja subordinado através do canal de comando,
mesmo vindo do meio civil; já outro meio de comunicação social quer signifi-
car qualquer meio de comunicação existente, como por exemplo, mídia escrita,
televisada etc. que possa instrumentalizar a sua instauração pela autoridade
competente. Note-se que, em qualquer desses casos, estão vedadas as denún-
cias anônimas ou qualquer outro meio ilegal.
O inciso I do artigo 2º da Lei do Conselho de Justificação
versa sobre acusação, encaminhada oficialmente ou por
qualquer outro meio de comunicação social, do oficial ter:
a) procedido incorretamente no desempenho
do cargo;
b) tido conduta irregular; ou
c) praticado ato que afete a honra pessoal, o pun-
donor militar ou o decoro da classe.
O CJ instaurado ex officio (ou de ofício) é aquele em que o comandante tem a autoridade para punir e solicita a instau-ração sem haver a necessida-de de receber comunicado de algum fato desabonador. O comandante requer a ins-tauração quando ele próprio verifica que o procedimento do oficial motiva legalmente o início desse processo.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
34
Deve-se considerar que os tipos de acusação descritos nas alíneas desse artigo
são excessivamente subjetivos em função da norma não descrever detalha-
damente o que é um procedimento incorreto no desempenho do cargo ou
conduta irregular.
O procedimento incorreto no desempenho do cargo referido na alínea “a” é o
não cumprimento do que prescreve o artigo 20 do Estatuto dos Militares, que
descreve cargo militar como um local na Administração Pública com um conjun-
to de atribuições, deveres e responsabilidades cometidas a um militar em serviço.
Assim, quando o oficial, no exercício de suas funções previstas no cargo, não
procede com dedicação, não observando e nem respeitando as ordens superio-
res ou regulamentos, ficará passível de ser submetido a Conselho de Justificação.
O artigo 31 do Estatuto dos Militares enumera os deveres dos militares, entre
os quais destacam-se:
• A dedicação e a fidelidade à pátria;
• A disciplina e o respeito à hierarquia;
• O rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens;
• O tratamento digno que deve ser dispensado ao subordinado.
A conduta irregular do oficial da alínea “b“ é o cometimento de transgres-
são disciplinar grave prevista no Regulamento Disciplinar que comprometa a
imagem do oficial ou do Exército. Outros fatos, mesmo que não sejam trans-
gressões graves, podem configurar como conduta irregular, desde que pela sua
reincidência tornem o oficial incompatível com o exercício de suas funções.
A prática que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da clas-
se, presente na alínea “c”, é o cometimento de atos que atentem contra os
[preceitos] morais e éticos da instituição militar. São institutos cujos conceitos
estão presentes no RDE, artigo 6º, incisos I a III.
O inciso II do artigo 2º da Lei do Conselho de Justificação aborda uma situação
em que há uma caracterização mais objetiva, definindo que o oficial será “con-
siderado não habilitado para o acesso, em caráter provisório, no momento em
que venha a ser objeto de apreciação para ingresso em Quadro de Acesso ou
Lista de Escolha”.
A Lei nº 5.821/72, Lei de Promoção de Oficiais, estabelece que para a
promoção por merecimento, antiguidade ou escolha é imprescindível que o
oficial esteja incluído em Quadro de Acesso ou Lista de Escolha. O Presidente
Preceitos: cláusulas; regras; normas.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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da República, com base na lei, tem competência para escolher entre os oficiais
incluídos em Lista de Escolha os mais credenciados para o desempenho dos
altos cargos de comando, chefia ou direção. Para as demais promoções de
oficiais, a inclusão deverá constar em Quadro de Acesso.
O artigo 15 da referida Lei prevê que o oficial, para ser incluído em Quadro de
Acesso, deve preencher os seguintes requisitos:
a. Condição de acesso:
I) Interstício;
II) Aptidão física;
III) As peculiares a cada posto dos diferentes Corpos, Quadros, Armas ou
Serviços.
b. Conceito profissional.
c. Conceito moral.
Caso o oficial, à época da promoção, não preencha os requisitos para inclusão
em Quadro de Acesso, o presidente da Comissão de Promoção de Oficiais
(CPO) deverá requerer ao Comandante do Exército a instalação do Conselho
de Justificação para julgar o oficial.
O inciso III determinava que o oficial fosse submetido a CJ quando “afastado
do cargo, na forma do Estatuto dos Militares, por se tornar incompatível
com o mesmo ou demonstrar incapacidade no exercício de funções militares a
ele inerentes, salvo se o afastamento é decorrência de fatos que motivem sua
submissão a processo” (grifo nosso).
Esse instituto legal, portanto, não tem mais aplicação, pois se referia ao artigo
24 do Estatuto dos Militares, vigente em 1969 (Decreto-Lei nº 1.029, de 21 de
outubro de 1969) e revogado pelo Estatuto atual (Lei nº 6.880/80), que não
contém mais esse comando.
No caso do inciso IV, a lei apresenta a circunstância de condenação “por crime
de natureza dolosa, não previsto na legislação especial concernente à seguran-
ça do Estado, em tribunal civil ou militar, a pena restrita de liberdade individual
até 2 (dois) anos, tão logo transite em julgado a sentença”. Nesse caso, o ofi-
cial será submetido ao Conselho, se apenado com restrição de liberdade de até
dois anos por crime doloso, após o trânsito em julgado. É importante ressaltar
que esse inciso somente se aplica aos casos de crimes de natureza dolosa, ou
seja, aqueles em que o agente teve a intenção, premeditando o resultado, não
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
36
envolvendo os crimes de natureza culposa. Para os casos de penas superiores
a dois) anos, independente de crime culposo ou doloso, mesmo não haven-
do previsão de instauração de CJ, o oficial será submetido a julgamento no
Superior Tribunal Militar (STM) para que esse decida sobre a perda do posto e
patente, por previsão constitucional dos artigos 142, incisos VI e VII.
O inciso V prevê que o oficial seja submetido a CJ quando:
V - Pertencente a partido político ou associação, sus-
pensos ou dissolvidos por força de disposição legal ou
decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou
perigosas à segurança nacional.
Parágrafo único. É considerado, entre outros, para os
efeitos desta Lei, pertencente a partido ou associação
a que se refere este artigo o oficial das Forças Armadas
que, ostensiva ou clandestinamente:
a) estiver inscrito como seu membro.
b) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício.
c) realizar propaganda de suas doutrinas.
d) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo
inequívoco ou doloso, em suas atividades.
Em relação a esse aspecto, duas questões devem ser suscitadas. A primeira
refere-se ao inciso V, do artigo 2º, que impede ao militar fazer parte de parti-
dos políticos ou associações suspensas por força de dispositivo legal ou decisão
judicial. Tal proibição é considerada inconstitucional, pois atualmente não
existem partidos políticos ou associações na clandestinidade, nem considera-
dos nocivos à segurança nacional. O texto da Constituição Federal somente faz
alusão a partidos políticos.
A segunda questão, embora não contida no mandamento desse inciso, é a da
possibilidade ou não do militar da ativa filiar-se a partido político legalmente
registrado conforme a Lei Eleitoral. O texto constitucional não o admite, na
ativa, podendo, contudo, os militares alistáveis serem elegíveis, atendidas às
seguintes condições:
a. Se contar menos de dez anos de serviço, será, ao se candidatar a cargo eleti-
vo, excluído do serviço ativo mediante demissão ou licenciamento ex officio;
b. Se em atividade, com 10 ou mais anos de serviço, será, ao se candidatar
a cargo eletivo, afastado, temporariamente, do serviço ativo e agregado,
considerado em Licença para Tratar de Interesse Particular (LTIP);
Os crimes de natureza culposa referem-se à responsabilida-de atribuída a um pessoa que pratica um ato que gere pre-juízo material, moral ou espi-ritual para ela mesma ou para um terceiro.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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c. Se eleito, será, no ato da diplomação, transferido para a reserva remunera-
da, percebendo a remuneração a que fizer jus em função do seu tempo de
serviço (CF, artigo 14, §8º, artigo 142, V, §3º, e E1, artigo 82, xIV, § 4º).
4.6.2 As circunstâncias em que o oficial submetido a CJ é afastado do
exercício das funções
O artigo 48, § 1º do E1 estabelece que “o oficial, ao ser submetido a Conselho
de Justificação, poderá ser afastado do exercício de suas funções, a critério
do respectivo Comandante da Força, conforme estabelecido em legislação
específica”. Assim, o Comandante do Exército poderá manter o oficial em suas
funções normais ou afastá-lo, se verificar essa conveniência.
O artigo 3º da Lei nº 5.836/72 estabelece que o oficial submetido a CJ –
denominado justificante – é afastado do exercício das funções que exerce de
duas maneiras:
• Automaticamente, se “condenado por crime de natureza dolosa, não
previsto na legislação especial concernente a segurança do Estado, em
tribunal civil ou militar, a pena restrita de liberdade individual até 2 (dois)
anos, tão logo transite em julgado a sentença, e se “pertencente a parti-
do político ou associação, suspensos ou dissolvidos por força de dispo-
sição legal ou decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou
perigosas à segurança nacional;
• A critério do Comandante da Força, se “acusado oficialmente ou por qual-
quer meio lícito de comunicação social de ter: procedido incorretamente
no desempenho do cargo; tido conduta irregular ou praticado ato que
afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe”.
4.6.3 Competência para a nomeação, composição e funcionamento
do CJ (artigos 4º a 6º da Lei nº 5.836/72, respectivamente)
A comunicação de fato que enseja um CJ deve ser dirigida ao comandante do
oficial que tem a competência para puni-lo. Esse comandante, após verificar
a necessidade de instalação do Conselho, deverá requerer, através do canal
de comando, ao Comandante do Exército (ou da Marinha ou da Aeronáutica,
conforme o caso).
A competência para a nomeação do CJ é do Comandante da Força singular a
que pertence o oficial a ser julgado ou do “Comandante do Teatro de Operações
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
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ou de Zona de Defesa ou dos mais altos comandantes das Forças Singulares
isoladas, para os oficiais sob seu comando e no caso de fatos ocorridos na área
de sua jurisdição, quando em campanha no país ou no exterior”.
O parágrafo 1º do artigo 4º da Lei nº 5.836/72 prevê que, caso a autoridade
competente para a nomeação do Conselho verifique a inconsistência dos fatos que
fundamentam a instalação do Conselho, deve considerar, desde logo, a improce-
dência da acusação e indeferir o pedido da nomeação do Conselho de Justificação.
Qualquer indeferimento do pedido de nomeação do Conselho deve ser funda-
mentado, publicado no Diário Oficial da União e transcrito nas alterações do
oficial, caso este seja da ativa, conforme prescreve o parágrafo 2º do artigo 4º
da Lei nº 5.836/72.
A composição do CJ é de três oficiais da ativa da Força a que pertence o justi-
ficante, de posto superior ao do oficial que será julgado. Esses oficiais terão as
seguintes funções: presidente, interrogante/relator e escrivão.
As atribuições dos componentes do CJ são:
• Presidente é o oficial de maior posto ou antiguidade. É quem dirige os
trabalhos. Ele exerce também a polícia das sessões, não permitindo con-
dutas inconvenientes do acusado, testemunhas ou advogado. Procederá
de acordo com o artigo 389 do CPPM ou tomará as providências que
se fizerem necessárias. Em caso de desacato aos membros do Conselho
ou Comissão, determinará a apresentação do preso ao Comandante
da Organização Militar (OM) ou Oficial de Dia para a lavratura do auto
de flagrante delito quando se tratar de crime militar, ou encaminhará à
Delegacia de Polícia da área, no caso de crime comum.
• Interrogante/Relator é o Oficial que segue o presidente em antigui-
dade. Durante as sessões, é quem dirige o interrogatório do Acusado e
as inquirições de testemunhas. Por seu intermédio, também os demais
membros do Conselho ou Comissão reinquirem as testemunhas. A defe-
sa também faz sua reinquirição por intermédio do interrogante/relator.
• Escrivão/Secretário é quem autua o processo, numerando-o e rubri-
cando-o, folha a folha. Deve cumprir os despachos do presidente e é
quem reduz os depoimentos a termo. Encarregado também da lavratura
da ata, a cada sessão, juntando cópia autêntica aos autos onde cons-
tarão requerimentos, decisões e os incidentes ocorridos nas diversas
sessões. (ASSIS, 2011, p. 288-289).
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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São proibidos de compor o Conselho de Justificação: o oficial que formulou
a acusação, para que haja imparcialidade no processo; o oficial com algum
grau de parentesco com o acusado, para que não haja motivo de nulidade por
suspeição; e o oficial subalterno, por motivo de pouca experiência para julgar.
Ademais, é de bom procedimento não admitir amigo ou inimigo pessoal do
justificante na composição do Conselho; caso isto seja suscitado pelo Justi-
ficante, a procedência ou não da alegação deve ser objeto de apreciação do
Conselho e sua decisão constar da ata respectiva. No caso de substituição de
membro do CJ impedido, sua substituição, em caráter excepcional, deve ser
solicitada à autoridade nomeante.
Quando o oficial a ser julgado tratar-se de oficial general, o Conselho será
composto por oficiais da ativa ou da inatividade com maior grau hierárquico
que o oficial acusado. E quando tratar-se de oficial que esteja na inatividade,
poderá compor o Conselho um oficial da reserva remunerada.
O Conselho sempre funcionará com a presença de todos os seus membros em
local indicado pela autoridade que o instaurou, normalmente, onde se enten-
da venha a facilitar a apuração decorrente, conforme prevê o artigo 6º da Lei
nº 5.836/72. A ausência de algum dos membros do Conselho pode ensejar sua
nulidade, desde que comprovado nos autos.
4.6.4 Dos procedimentos na fase administrativa do CJ
A fase essencialmente administrativa do CJ é a que ocorre no âmbito da orga-
nização militar. Destaque-se que são poucos os militares com experiência nessa
espécie de procedimento, eis que o instituto não é comumente utilizado no
seio das forças militares federais. A Lei nº 5.836/72 prevê o procedimento do
CJ nos artigos 7º-12, ao qual Assis (2011) dá mais profundidade, destacando a
função subsidiária do CPPM.
A proposta de submissão de um oficial ao Conselho deve seguir o canal de co-
mando. O grande comando a que estiver subordinado o oficial encaminhará ao
Comandante da Força, que julgará sua conveniência, segundo o artigo 2º da Lei
nº 5.836. A autoridade competente, apreciando os fatos imputados ao oficial
como factíveis, instaurará o CJ e nomeará seus membros através de Portaria, que
será remetida ao Presidente, assim como os documentos que lhe deram origem.
Recebida a Portaria pelo seu Presidente, este deverá se reunir com os seus
membros para que possam tomar conhecimento da Portaria e de toda a docu-
mentação que a acompanhou, a seguir:
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
40
Determinará ao escrivão, para que este a) autue os docu-
mentos, devendo o prazo dos trabalhos correr a partir da
autuação; b) noticie ao Comandante do acusado, requisi-
tando-o a comparecer perante o órgão processante, onde
será citado, devendo lhe ser entregue o Libelo Acusatório
onde constem o ato e fato pelos quais está sendo proces-
sado, e as testemunhas arroladas inicialmente para depor;
c) faça juntar aos autos os documentos que interessem ao
processo, dentre eles as alterações funcionais e os antece-
dentes criminais do justificante (ASSIS, 2011, p. 257).
O justificante e o seu defensor deverão estar presentes a todas as sessões do
Conselho, em cumprimento ao princípio da ampla defesa e sob pena de nuli-
dade do processo. A ausência do justificante somente será admitida quando
tenha sido declarado [revel], após ser regularmente intimado para comparecer
ao ato processual.
Uma eventual sindicância ou Inquérito Policial ou Militar (IPM) que o tenham
precedido, por serem processos autônomos, não podem simplesmente ser
juntadas aos autos sem que as provas ali constantes sejam refeitas pelo CJ, sob
pena de nulidade processual.
O Código de Processo Penal Militar (CPPM) – criado pelo Decreto-Lei Nº
1.002/69 – informa que antes da realização da qualificação e interrogatório
(CPPM, artigos 302-306) do acusado, os membros do Conselho podem prestar
o compromisso legal do artigo 400 do CPPM, no que couber, certificando nos
autos, embora não haja previsão específica nesse sentido na Lei nº 5.836/72.
Todavia, Assis (2011) recomenda pela aplicação subsidiária do CPPM e devido
à solenidade de que é revestido o processo, o que irá facultar mais uma garan-
tia de um julgamento justo e imparcial.
A seguir, conforme o artigo 7º da Lei nº 8.536/72 e de acordo com os artigos
302-306 do CPPM, o acusado deve ser qualificado e interrogado por quem
exercer as funções de interrogante, que fará as perguntas necessárias à eluci-
dação dos fatos, as quais não poderão ter cunho genérico. Esse mesmo oficial
será responsável por colher os depoimentos das testemunhas. É facultado aos
componentes do Conselho, para melhor esclarecimento do objeto do proces-
so, além de requerer as diligências que entenderem cabíveis, perguntar nova-
mente ao justificante e às testemunhas (artigo 8º da Lei nº 8.536/72).
O Libelo acusatório é a ex-posição articulada do fato ou dos fatos que são imputados ao justificante. deve conter a descrição detalhada dos fa-tos que envolvem a acusação, com as respectivas qualifica-ções jurídico-administrativas. Constitui-se em elemento im-prescindível para o exercício do contraditório e da ampla defesa, pois o acusado so-mente poderá se defender, se souber, com clareza, o que lhe estão imputando.
Revel: quando a parte, sendo citada em uma
ação, não comparece em juízo, nem por si nem por
outrem, ou que declarou que não iria à audiência, ainda que citada para esse fim. É aquele que não responde a
uma ordem judicial, citação ou mandato legítimo.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
41
O Conselho de Justificação deverá assegurar ao justificante a ampla defesa e o
contraditório, como prescreve o artigo 9º da Lei nº 5.836/72, consubstancian-
do o artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal de 1988: “Aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados
o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes”.
No prazo de até 5 (cinco) dias após o interrogatório, o acusado apresentará a
sua defesa prévia, arrolará testemunhas e solicitará às diligências que entenda
necessárias, bem como requererá a produção de provas. Note-se, em con-
formidade com os ditames constitucionais da ampla defesa que “no proces-
so especial do Conselho de Justificação, fica assegurada a ampla defesa do
Justificante, tanto na fase administrativa quanto na fase judicial (se houver) [no
STM], podendo na primeira, e devendo na segunda, ser exercida por Advoga-
do” (ASSIS, 2011, p. 272).
O artigo 10 da Lei nº 5.836/72 possibilita ao Conselho inquirir o acusador ou
receber por escrito seus esclarecimentos, ouvindo, posteriormente, o justifican-
te a esse respeito.
A ampla defesa e o contraditório facultam ao justificante os
seguintes direitos, entre outros: contar com a presença de
advogado em todas as sessões; ao ser inquirido e no curso do
processo, prestar esclarecimentos sobre os fatos que lhe são
imputados e seus fatos geradores; requerer todas as provas
permitidas no Código de Processo Penal Militar, inclusive arrolar
testemunhas, e requerer diligências; formular quesitos para os
exames periciais; ter vista dos autos; arguir prescrição; e apre-
sentar razões de defesa.
Tomando o CPPM como norma subsidiária, as testemunhas deverão ser ouvi-
das na seguinte ordem:
a. As testemunhas constantes do Libelo e as referidas por estas;
b. As testemunhas de defesa e aquelas que por elas forem referidas ou
informantes.
O acusado que, após ter sido citado (intimado) regularmente, quer esteja na
ativa, quer na inatividade, não se apresentar para ser interrogado, deve ser
declarado revel, mediante certificação nos autos, não sem que antes se efetue
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
42
uma citação editalícia, publicada em órgão de divulgação na área de seu domi-
cílio. O processo corre à revelia, devendo a autoridade que instaurou o processo
designar defensor dativo mediante pedido do Conselho.
Assis (2011) sugere que nessa fase o Conselho se reúna para sanear o proces-
so, identificando eventual conveniência de complementar os esclarecimentos
até essa fase, coligidos na instrução, com outras diligências.
Após terem sido cumpridas as diligências julgadas complementares para a elu-
cidação dos fatos objeto do Conselho, com base no artigo 427 do CPPM, será
facultado o prazo de cinco dias ao Justificante para requerer o que lhe for de
direito com o fim de exercitar a sua ampla defesa. Cumpridas as eventuais dili-
gências requeridas pelo Justificante, se julgadas pertinentes, ou se não houver
outras diligências, deve ser dada vista à defesa no prazo de cinco dias para que
apresente sua razões finais de defesa (artigo 428 do CPPM).
Existe no artigo 10 da Lei nº 5.836/72 a possibilidade do Conselho inquirir o
acusador ou receber por escrito seus esclarecimentos, ouvindo, posteriormen-
te, o justificante a esse respeito.
O prazo de conclusão do CJ é de 30 dias, contados a partir da sua nomea-
ção. Nele estão inclusos todos os procedimentos que lhe são pertinentes, até
remessa dos autos à autoridade nomeante. Esta, mediante solicitação funda-
mentada, pode prorrogar por até 20 dias o prazo de conclusão dos trabalhos,
conforme prevê o artigo 11 e seu parágrafo único da Lei nº 5.836/72.
O artigo 12 da Lei nº 5.836/72 prescreve que após todas as diligências, o
Conselho de Justificação reúne-se em sessão secreta para deliberar sobre a
decisão que irá ser transcrita no relatório final do processo. A lei prevê que a
sessão secreta seja realizada sem a presença do justificante, entretanto, caso
seja solicitado, sugere-se, em atenção ao princípio da ampla defesa, que seja
facultada a presença do justificante e de seu defensor na sessão de julgamento
do Conselho. Nos termos desse artigo, a deliberação do Conselho é tomada
por maioria de votos e se houver voto vencido, este pode ser justificado por
escrito, o que se sugere, apesar de não ser obrigatório, para dar melhores con-
dições à decisão da autoridade nomeante. O relatório deve chegar a uma das
seguintes conclusões:
§ 1º O relatório, elaborado pelo escrivão e assinado
por todos os membros do Conselho de Justificação,
deve julgar se o justificante:
Citação editalícia ou citação por edital é uma forma de citação feita quando o réu é desconhecido ou incerto; quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar e nos casos ex-pressos em lei. a parte que requerer citação por edital, alegando dolosamente que o réu é desconhecido ou in-certo; ou que se encontra em lugar ignorado, incerto ou inacessível, deverá pagar uma multa no valor de cinco vezes o salário mínimo, revertido em benefício do citando.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
43
a) É, ou não, culpado da acusação que lhe foi feita; ou
b) No caso de item II, do artigo 2º está ou não sem
habilitação para o acesso, em caráter definitivo; ou
c) No caso do item IV, do artigo 2º, levados em con-
sideração os preceitos de aplicação da pena previstos
no Código Penal Militar, está, ou não, incapaz de per-
manecer na ativa ou na situação em que se encontra
na inatividade.
Pelo que se infere do comando da Lei, é possível concluir que o Conselho de
Justificação decidirá se o justificante é ou não culpado das acusações que lhe
estão sendo imputadas. No caso da habilitação para a promoção, o Conselho
decidirá somente se o oficial está ou não habilitado a ser promovido em cará-
ter definitivo. E, no caso de ser apenado com restrição de liberdade por menos
de dois anos, decidirá se o oficial está ou não incapaz de permanecer na ativa
ou de perder o posto e a patente na inatividade.
Assis (2011, p. 258) orienta que o Relatório se assemelha a uma sentença, pois
adentra no mérito da culpa ou não do Justificante em relação aos fatos que
lhe são imputados, “dando condições à autoridade que instaurou o processo
de aceitar ou não o julgamento”. Sugere-se que o corpo do Relatório apresen-
te uma parte expositiva, a fundamentação e a parte dispositiva (ou conclusão).
• Parte expositiva: “é o desenvolvimento cronológico do processo, sendo
indício certo de que o Conselho viu e examinou atentamente os autos”.
• Fundamentação: “as provas produzidas nos autos são analisadas, levan-
do o Conselho a julgar com base nelas”.
• Parte Dispositiva: “o colegiado conclui o raciocínio desenvolvido durante
a motivação”, procedendo “a adequação do fato concreto à lei, julgan-
do procedente ou improcedente a acusação”.
Após a elaboração do relatório e dentro do prazo para a conclusão, o processo
será remetido ao Comandante da Força, concluindo, assim, os trabalhos ine-
rentes ao CJ, como orienta o § 4º do artigo 12 da Lei nº 5.836/72.
4.6.5 Decisão do Comandante da Força
É possível perceber, a partir do artigo 13 da Lei nº 5.836/72 que a função do
CJ é de assessoramento para a solução a ser dada pela autoridade nomeante,
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
44
que pode ou não aceitar o julgamento dos membros do Conselho. O prazo é
de 20 (vinte) dias, contados do recebimento dos autos.
Nos termos do comando legal, vê-se que a solução a ser dada pelo Coman-
dante da Força pode:
• Considerar o oficial justificado, mesmo contrariando o julgamento
do Conselho;
• Punir o oficial, caso conclua que o acusado cometeu transgressão disci-
plinar relativa aos fatos imputados pela acusação geradora do Conselho;
• Reformar o oficial, caso conclua que definitivamente ele não reúne con-
dições de ser promovido;
• Encaminhar o processo ao juiz competente, caso conclua que as acusa-
ções se tratam de crime;
• Remeter o processo ao STM, caso conclua que, fruto das acusações, o
oficial deva perder o posto e a patente e, em consequência, ser demitido
do serviço público.
Se a solução foi a de remeter o processo ao STM, pela admissibilidade das acu-
sações imputadas ao Justificante com consequente perda do posto ou patente,
deverá o processo ser remetido ao STM, nos termos do artigo 14 da Lei nº
8.5836/72; no caso da solução julgar procedente a justificação do oficial deve
ser publicada no Diário Oficial da União e, consequentemente, transcrita nas
alterações do oficial, quando na ativa.
4.6.6 O CJ no Superior Tribunal Militar
É de competência originária do STM, em tempo de paz, o julgamento da
indignidade para o oficialato ou sua incompatibilidade (CF, artigo 142, VI).
Assim, somente ao STM é atribuída competência para julgar oficial cuja solu-
ção de CJ lhe tenha imputado culpa pelos fatos apurados ou incapacidade de
permanecer na ativa ou na inatividade.
Na instância do STM, o processo especial segue o rito processual previsto no CPPM:
• O STM recebe o processo, autua-o e distribui;
• O Relator abre prazo de cinco dias ao justificante para manifestar-se, por es-
crito, acerca da decisão do CJ e da Solução dada pelo Comandante da Força;
• Se o acusado não se manifestar, o relator solicitará que seja designado
um defensor público para que conduza a defesa;
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
45
• Após a manifestação do justificante, o Procurador-Geral da Justiça Mili-
tar manifesta-se como fiscal da lei;
• O processo é então relatado pelo revisor (um dos ministros), como pres-
creve o artigo 15 da Lei nº 5.836/72;
• Nessa fase, o processo é submetido a julgamento.
O artigo 16 da Lei nº 5.836/72 regula que se o acusado tiver sido considerado
culpado por estar incurso nos incisos I, III e V do artigo 2º ou inciso IV do mesmo
artigo, é incapaz de permanecer na ativa ou na inatividade. Nestes casos, poderá
perder o posto ou patente, com a consequente demissão ex officio (artigo 16,
I ), ou reforma (artigo 16, II). O E1 também regula a perda do posto e patente
e a declaração de indignidade de oficial decorrentes de condenação em CJ, nos
artigos 118-120 e no artigo 106, V, a reforma ex officio ao condenado em CJ.
No caso da demissão, a autoridade com competência para executá-la é a do
Presidente da República, a quem o STM deve encaminhar o acórdão respectivo. O
artigo 119 do Estatuto dos Militares prevê ainda que “o oficial que houver perdido
o posto e a patente será demitido ex officio, sem direito a qualquer remuneração
ou indenização e receberá a certidão de situação militar prevista na legislação que
trata do serviço militar”. Embora esta competência não conste do rol das atribui-
ções do Presidente da República, listadas no artigo 84 da CF, por simetria do artigo
142, I, que confere ao Presidente a prerrogativa de nomear, somente esta autori-
dade pode demitir. Todavia, o inciso III, do artigo 1º, do Decreto nº 2.790, de 29
de setembro de 1998, delegou aos Comandantes das Forças Singulares, dentre
outras, a competência para demitir ex officio oficiais superiores intermediários e
subalternos. Já a reforma do oficial é atribuição do Comandante da Força.
Assim, se o julgamento do oficial for pela reforma ou por demissão, o acórdão
será remetido ao Comandante da Força, que a determinará. No caso da refor-
ma, o acusado manterá o posto que possui na ativa, com os proventos propor-
cionais ao tempo de serviço; se demitido, não fará jus a quaisquer proventos
ou indenizações e receberá a certidão de situação militar prevista na legislação
que regula o serviço militar.
Os recursos cabíveis em sede de decisão do STM sobre Conselho de Justificação
são aqueles que podem ser interpostos no próprio Tribunal. A competência
do Supremo Tribunal Federal se estende a recursos que versem sobre matéria
constitucional. Das decisões do STM cabe recurso dirigido ao próprio Tribunal
(Embargos de Nulidade e Infringentes do julgado) ou Recurso Extraordinário ao
STF, nos casos em que for arguida inconstitucionalidade nas decisões do STM.
Saiba mais sobre o processo oriundo de Conselho de Jus-tificação lendo os artigos 157 e subsequentes do Regimento do STM. disponível em:
<http://www.lex.com.br/le-gis_5930365_ReGiMenTO_inTeRnO_dO_SUPeRiOR_TRiBUnaL_MiLiTaR.aspx>
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
46
A instalação do CJ independe da ação penal, mas se o justificante estiver sendo
processado criminalmente pelo mesmo fato que o levou a Conselho, o feito no
STM é suspenso até o trânsito em julgado da sentença proferida na ação penal.
O [instituto da prescrição] também se aplica aos fatos que levam um oficial
a ser submetido a CJ que não podem ser objeto de deliberação pelo CJ, sob
pena de nulidade. O artigo 18 da Lei nº 5.836/72 estabelece que os fatos ou
atos atribuídos ao justificante prescrevem em 6 (seis) anos. Entretanto, se estes
fatos forem tipificados como crime pelo CPM, sua prescrição ocorrerá nos pra-
zos a estes estabelecidos pela codificação penal especial.
4.7 CONSELHO DE DISCIPLINA (CD)
O Conselho de Disciplina (CD) está regulado no Decreto 71.500, de 5 de de-
zembro de 1972. Também fazem alusão a esse Conselho o E1, o RDE, a Portaria
Ministerial 1.193, de 16 de agosto de 1976 (Instruções Gerais para o Funciona-
mento do Conselho/IG 10-04), que estabelece modelos de formulários para a rea-
lização do Conselho, e a Portaria Ministerial 315, de 29 de março de 1982 (altera
as IG 10-04), que acrescenta formulários para os esclarecimentos do acusador.
À semelhança do CJ, o CD é uma espécie de processo administrativo disciplinar
“destinado a verificar a incapacidade” do Guarda-Marinha, do Aspirante-a-
-Oficial e das demais praças das Forças Armadas com estabilidade assegurada,
“em permanecer na ativa ou situação de inatividade em que se encontrem,
sendo-lhes garantida ampla defesa” (Assis, 2011, p. 273).
O CD também é uma das duas espécies de tribunais de honra do EB, somente
com a singularidade de se referir à conduta das praças que possam suscitar
incompatibilidade para o exercício de sua função militar.
O Conselho de Disciplina incide sobre os Guardas-Marinha e os Aspirantes-a-
-Oficial de carreira e sobre as demais praças com estabilidade das Forças Arma-
das, da ativa, reserva ou reformadas, como prescreve o artigo 1º do Decreto
71.500/72. Os Guardas-Marinha e os Aspirantes-a-Oficial de carreira possuem
estabilidade presumida. Julga a incapacidade das praças de permanecer na
ativa, podendo propor a sua reforma, a exclusão a bem da disciplina, ou até
mesmo a perda da graduação. No caso das praças da reserva remunerada ou
reformadas, pode propor a perda da graduação.
Instituto da prescrição: perda do direito de punir pelo não exercício desse
direito no determinado lapso de tempo previsto.
Leia o artigo Conselho de Disci-plina – Forças Armadas, de Paulo Rodrigues Tadeu Rosa, dis-ponível em:
<http://www.advogado.adv.br/direitomilitar/ano2006/pthadeu/conselhodisciplina.htm>
Leia na íntegra o decreto 71.500, de 5 de dezembro de 1972, que instituiu o Conselho de disciplina das Forças armadas, acessando o link <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d71500.htm>.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
47
4.7.1 Causas de submissão ao CD
As causas de submissão ao CD estão previstas no artigo 2º do Decreto
71.500/72, e em regra, são congruentes com as de submissão ao CJ, com a
singularidade com que se detalhará a seguir.
O texto do inciso I do artigo 2º do Decreto 71.500/72 define que a praça deve
ser submetida a CD quando:
I - Acusada oficialmente ou por qualquer meio lícito de
comunicação social de ter:
a) Procedido incorretamente no desempenho do cargo;
b) Tido conduta irregular; ou
c) Praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor
militar ou decoro da classe;
A análise dessas condições são as mesmas propostas anteriormente em relação
às alíneas, inciso e artigo semelhantes às causas de submissão de um oficial ao
CJ da Lei nº 5.836/72 por absoluta similitude do texto jurídico.
O Decreto 71.500/72 não contempla comando semelhante ao do inciso II da
Lei nº 8.536/72. O conteúdo do inciso II do artigo 2º do Decreto 71.500/72,
contudo, é idêntico ao inciso III do CJ: “II - afastado do cargo, na forma do
Estatuto dos Militares, por se tornar incompatível com o mesmo ou demons-
trar incapacidade no exercício de funções militares a ele inerentes, salvo se o
afastamento é decorrência de fatos que motivem sua submissão a processo”.
Por conseguinte, aplicam-se a ele os comentários afeitos ao artigo 2º, III, da
norma que regula o CJ.
O artigo 2º, III do Decreto 71.500/72 e o artigo 2º, IV, da Lei nº 8.536/72 apre-
sentam o mesmo texto: “III - condenado por crime de natureza dolosa, não pre-
visto na legislação especial concernente à segurança do Estado, em tribunal civil
ou militar, a pena restritiva de liberdade individual até 2 (dois) anos, tão logo
transite em julgado a sentença”. Os comentários afeitos ao CJ aplicam-se ao CD.
É importante ressaltar que a praça condenada na justiça comum ou militar à
pena privativa de liberdade superior a dois anos, por sentença transitada em
julgado, não será submetida a julgamento no Superior Tribunal Militar, pois a
previsão constitucional do artigo 142, inciso VII, da CF, somente se aplica aos
oficiais. O artigo 9º, inciso IV do CPM, classifica como uma das penas acessó-
rias a exclusão a bem da disciplina. Esse Código ainda prescreve no seu artigo
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
48
102 que “a condenação da praça à pena privativa de liberdade, por tempo
superior a 2 (dois) anos, importa sua exclusão das Forças Armadas”. Da mesma
forma, há essa previsão legal no artigo 125, inciso I, do E1. Desse modo, a
praça que for condenada por crime doloso à pena principal privativa de liber-
dade superior a 2 (dois) anos receberá a pena acessória de exclusão das Forças
Armadas, não cabendo a instalação do Conselho de Disciplina. O juiz deverá,
ainda, encaminhar cópia da sentença ao Comandante da Força a que pertence
a praça, para que seja providenciado o ato administrativo de exclusão.
A praça sem estabilidade, incursa em crime de natureza dolosa e condenada a
essa mesma pena, deverá ser licenciada a bem da disciplina, conforme prevê o
artigo 32, parágrafo 2º do RDE.
O texto do inciso IV, do artigo 2º, do Decreto Lei nº 71.500/72, que estabe-
lece como causa de submissão à CD o fato de pertencer a partido político ou
associação suspensos ou dissolvidos legalmente, ou que exerçam atividades
prejudiciais à segurança nacional, é em tudo similar ao do inciso V da Lei que
trata do CJ:
IV - pertencente a partido político ou associação, sus-
pensos ou dissolvidos por força de disposição legal ou
decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou
perigosas à segurança nacional.
Parágrafo único. É considerada entre os outros, para os
efeitos deste decreto, pertencente a partido ou associa-
ção a que se refere este artigo a praça das Forças Arma-
das que, ostensiva ou clandestinamente:
a) estiver inscrita como seu membro;
b) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício;
c) realizar propaganda de suas doutrinas; ou
d) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo
inequívoco ou doloso, em suas atividades.
Da mesma forma e pelo mesmo motivo são pertinentes a ele e suas alíneas os
mesmos comentários do artigo, inciso e alíneas congruentes relativas ao CJ.
O caput do artigo 49 do Estatuto dos Militares estabelece que “o Guarda-
-Marinha, o Aspirante-a-Oficial e as praças com estabilidade assegurada,
presumivelmente incapazes de permanecerem como militares da ativa, serão
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
49
submetidos a Conselho de Disciplina e afastados das atividades que estiverem
exercendo, na forma da regulamentação específica”. No Conselho de Justifica-
ção, os oficias podem ser afastados das suas funções, a critério do Comandan-
te da Força, já no caso do CD, as praças, obrigatoriamente, o serão, conforme
preceitua o artigo 3º do Decreto 71.500/72.
4.7.2 Competência para a nomeação, composição e funcionamento
do CD (artigos 4º, 5º e 7º do Decreto nº 71.500/72)
No caso dos Guardas-Marinha, Aspirantes-a-Oficial, Suboficial e dos Subtenen-
tes da ativa, a competência para a nomeação do Conselho de Disciplina é do
Oficial-General em função de comando, direção ou chefia mais próximo a que
a praça estiver subordinada (artigo 4º, I).
Para as praças da reserva remunerada ou reformadas, a nomeação do Conse-
lho de Disciplina é de competência do Comandante do Distrito Naval, Região
Militar ou Zona Aérea enquadrante da praça (artigo 4º, II).
Em relação às demais praças da ativa estabilizadas, a autoridade que tem com-
petência para a nomeação do CD é a que tem atribuições disciplinares sobre
essas praças, de acordo com o artigo 4º, III:
As praças de carreira não estabilizadas, no serviço ativo, não são submetidas a
CD. Caso tenham praticado algum ato que transgrida os preceitos disciplina-
res, serão licenciadas segundo o artigo 121, II, § 3º, b) e c) do E1:
Do Licenciamento
Art. 121. O licenciamento do serviço ativo se efetua:
........................................................................................
II - ex officio.
........................................................................................
§ 3º O licenciamento ex officio será feito na forma da
legislação que trata do serviço militar e dos regulamentos
específicos de cada Força Armada:
b) por conveniência do serviço; e
c) a bem da disciplina.
Também, na forma do RDE, serão licenciadas, ex officio, por conveniência do
serviço ou a bem da disciplina.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
50
O artigo 5º do Decreto discorre quanto à composição do CD: três oficiais da ativa
da Força Armada da praça a ele submetida – o presidente, que deve ser pelo me-
nos um oficial intermediário (os demais podem ser oficiais subalternos); o seguin-
te em antiguidade será o interrogante/relator e o mais moderno será o escrivão.
As atribuições dos componentes do CD apresentam simetria com as dos nomea-
dos para o CJ, cuja análise doutrinária, retro, é pertinente para os dois institutos.
Os demais comentários referentes à composição do CD, quanto a quem é
vedado fazer parte do Conselho e ao seu funcionamento com a presença de
todo o Conselho (artigo 6º, do Decreto 71.500/72), sob pena de nulidade, são
os mesmos já expressados em relação ao CJ.
4.7.3 Dos procedimentos do CD
O CD tem todo o seu curso em sede administrativa. A proposta da sua instau-
ração deve seguir através do canal de comando até a autoridade com compe-
tência para fazê-lo, que apreciará da sua conveniência, em conformidade com
o artigo 2º, do Decreto.
Julgado conveniente, a autoridade nomeante instaura o CD, nomeia os seus
membros através de Portaria e a encaminha ao Presidente, que se reúne com
os membros (artigo 7º, do Decreto 71.500/72), tudo à semelhança do CJ:
compromisso legal dos membros com o respectivo termo, autuação, requisição
da presença do acusado ao seu comandante, entrega do Libelo Acusatório,
juntada aos autos da documentação de interesse ao Conselho. À revelia do
acusado tem tratamento procedimental igual ao do CJ. O mesmo se aplica às
perguntas tratadas no artigo 8º.
O exercício da ampla defesa é tratado no artigo 9º do Decreto 71.500/72 que,
pela sua similitude com a Lei 8.536/72 faz com que se remeta aos mesmos
comentários do CJ. Entretanto, deve ser destacado o § 4º do artigo 9º do De-
creto 71.500/72, pela sua distinção:
Art. 9º Ao acusado é assegurada ampla defesa, [...].
........................................................................................
§ 4º O processo é acompanhado por um oficial:
a) indicado pelo acusado, quando este o desejar para
orientação de sua defesa; ou
b) designado pela autoridade que nomeou o Conselho de
Disciplina, nos casos de revelia.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
51
Desse modo, para o exercício da ampla defesa, o acusado tem o direito a ter
um oficial para orientá-lo, se assim o quiser, ou constituir advogado. É preciso
lembrar que, no caso de revelia, ainda assim, o Conselho funciona, devendo
a autoridade nomeante designar oficial para acompanhar o processo de sorte
que sejam observados os direitos da praça acusada.
A inquirição do acusador ou o recebimento de seus esclarecimentos por escrito,
com a ouvida do acusado a respeito, como no CJ, estão previstos no artigo 10.
Da mesma forma, segue-se a orientação do CJ para a sequência da ouvida das
testemunhas, subsidiariamente orientada pelo CPPM: primeiro as testemunhas
referidas no Libelo ou indicadas neste e depois as de defesa ou por ela suscitadas.
O prazo para o termo do CD é o previsto no artigo 11 do Decreto 71.500/72,
o mesmo do CJ, de 30 (trinta dias) e com as mesmas recomendações. Nele
devem ser cumpridos todos os passos previstos para o Conselho, aí incluído a
remessa dos autos à autoridade nomeante.
Após a realização de todas as diligências, o Conselho de Disciplina toma a sua
decisão, em sessão secreta, nos moldes do CJ, ao que se remete, de acordo
com o previsto no caput do artigo 12 do Decreto 71.500/72.
A decisão consubstanciada no relatório assinado pelos membros do Conselho, e
em conformidade com o artigo 12, § 1º, alíneas a) e b), deve julgar se a praça:
a) é, ou não, culpada da acusação que lhe foi feita; ou
b) nos casos do inciso III do Art. 2º [condenação por
crime de natureza dolosa à pena restritiva de liberdade
até dois anos], levados em consideração os preceitos de
aplicação da pena previstos no Código Penal Militar, está,
ou não, incapaz de permanecer na ativa ou na situação
em que se encontra na inatividade.
Essa decisão deve constar do relatório que, depois de ser elaborado juntamen-
te com o termo de encerramento, são remetidos pelo Conselho, juntamente
com todas as peças do processo, à autoridade nomeante.
4.7.4 Solução da autoridade nomeante do Conselho
A função do Conselho de Disciplina é de assessoramento para a decisão da
autoridade nomeante, entretanto, esta, na solução, pode acatar a conclusão
contida no Relatório ou contrariá-la.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
52
O artigo 13 da Lei 5.836/72 disciplina que o Comandante da Força, após o
recebimento do relatório oriundo do Conselho de Justificação, dentro do prazo
de 20 (vinte) dias, acatando ou não o julgamento naquela instância, justifica-
damente, determina:
I - o arquivamento do processo, se não julga a praça cul-
pada ou incapaz de permanecer na ativa ou na inatividade;
II - a aplicação de pena disciplinar, se considera contra-
venção ou transgressão disciplinar a razão pela qual a
praça foi julgada culpada;
III - a remessa do processo ao auditor competente, se
considera crime a razão pela qual a praça foi julgada
culpada, ou
IV - a remessa do processo ao Ministro Militar respectivo
ou autoridade a quem tenha sido delegada competência
para efetivar reforma ou exclusão a bem da disciplina, com
a indicação de uma destas medidas, se considera que:
a) a razão pela qual a praça foi julgada culpada está pre-
vista nos itens I, II ou IV, do artigo 2º; ou
b) se, pelo crime cometido, previsto no item III do artigo
2º, a praça foi julgada incapaz de permanecer na ativa ou
na inatividade.
Se o despacho for o de arquivamento, deve ser publicado no Diário Oficial da
União e devidamente transcrito nas alterações do militar da ativa; se for pela
reforma, é efetuado “no grau hierárquico que possui na ativa, com proventos
proporcionais ao tempo de serviço”.
4.7.5 O recurso da decisão do CD
No caso do CD, cabe a interposição de recurso, de natureza administrativa, da
decisão do Conselho ou da publicação da solução da autoridade nomeante.
Podem interpor recurso tanto a praça acusada quanto o oficial que acompa-
nhou o processo, no caso de ter sido julgado à revelia, como assevera o artigo
14 do Decreto 71.500/72. O prazo para a sua interposição é de 10 (dez) dias
contados da data de ciência da decisão do Conselho ou de publicação da solu-
ção da autoridade nomeante.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
53
O artigo 15 desse decreto prescreve que cabe ao Comandante do Exército, em
última instância, no prazo de 20 (vinte) dias, contados da data do recebimento
do processo, julgar os recursos que forem interpostos nos processos oriundos
dos CD. Vale ressaltar que se trata de um recurso administrativo.
Cabe aos Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica efetivar a reforma
ou a exclusão a bem da disciplina em processos oriundos do CD, conforme o
inciso IV, do artigo 13 do Decreto 71.500/72.
Para o Exército, entretanto, pela Portaria 727, de 8 de outubro de 2007, para a
exclusão a bem da disciplina, o seu Comandante delegou esta competência:
Art. 1º [...]:
........................................................................................
I - aos chefes dos órgãos de direção geral e setorial, aos
comandantes militares de área e aos chefes dos órgãos
de assistência direta e imediata ao Comandante do Exér-
cito, no que diz respeito a:
........................................................................................
4. exclusão, a bem da disciplina, dos subtenentes,
primeiros-sargentos, segundos sargentos, tercei-
ros-sargentos, taifeiros, cabos e soldados condena-
dos, em sentença passada em julgado por tribunal militar
ou civil, a pena restritiva de liberdade individual superior
a dois anos ou a pena de qualquer duração nos
crimes previstos na legislação especial concernente
à segurança do Estado, quando as referidas praças
tiverem estabilidade assegurada; [...].
........................................................................................
xIV - aos comandantes de região militar, no que diz
respeito a:
........................................................................................
d) exclusão, a bem da disciplina, dos segundos-
-sargentos, terceiros-sargentos, taifeiros, cabos e
soldados, quando estes militares forem inativos
(reformados ou da reserva remunerada) e estiverem
vinculados à RM para efeito de remuneração;
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
54
e) exclusão, a bem da disciplina, dos subtenentes, pri-
meiros-sargentos, segundos sargentos, terceiros-
-sargentos, taifeiros, cabos e soldados condenados,
em sentença transitada em julgado, por tribunal
militar ou civil, a pena restritiva de liberdade indi-
vidual superior a dois anos, ou a pena de qualquer
duração, nos crimes previstos na legislação espe-
cial concernente à segurança do Estado, quando os
militares citados forem inativos (reformados ou da
reserva remunerada) e estiverem vinculados à RM
para efeito de remuneração; (grifo nosso).
........................................................................................
Podemos deduzir, a partir do texto dessa Portaria, que o Aspirante-a-Oficial,
emqualquersituação,eoSubtenente−excetonoscasosdecondenação
à “pena restritiva de liberdade individual superior a dois anos, ou a pena de
qualquer duração, nos crimes previstos na legislação especial concernente à se-
gurança do Estado”, referidos na Portaria 727, somente poderão ser excluídos
por ato do Comandante do Exército.
Note-se, por sua importância, no caso do Conselho de Disciplina decidir pela
exclusão da praça a bem da disciplina, que os atos para esse feito, inclusive
os recursos, correm tão somente na via administrativa, sendo o Comandante
do Exército a autoridade suprema. Cabe ressaltar, todavia, que a Constituição
Federal de 1988 faculta a possibilidade da discussão da legalidade da decisão
ser objeto de discussão no âmbito do Judiciário, por iniciativa do prejudicado.
Quanto à prescrição, o artigo 17 do Decreto 71.500/72 estabelece que os fa-
tos ou atos atribuídos à praça prescrevem em 6 (seis) anos. Os casos previstos
no Código Penal Militar como crime prescrevem nos prazos nele estabelecidos.
Fatos ou atos prescritos não podem ser objeto de deliberação pelo Conselho
de Disciplina, sob pena de nulidade.
A nomeação e o processo do Conselho de Disciplina independem da ação
penal que esteja em curso na justiça militar ou comum. Assim, havendo indí-
cios de crime, é importante que a instrução provisória e a consequente ação
penal sejam iniciadas imediatamente, para evitar a prescrição dos fatos pelo
Conselho de Disciplina.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
55
Objetivos específicos
• Conhecer o direito de defesa nos processos disciplinares.
DIREITO DE DEFESA NOS PROCESSOS DISCIPLINARES5
O constitucionalismo moderno apresenta a Constituição como um repositório
de normas superiores ao restante do ordenamento jurídico, com força vincu-
lante em relação a todo o sistema jurídico nacional. É uma tendência identifi-
cada na evolução do Direito denominada de neoconstitucionalismo, destaca-
damente, a partir de dois importantes marcos: a Carta Fundamental de Bönn
(Constituição da República Federal da Alemanha), de 1949, e a criação, logo
após, do Tribunal Constitucional Federal Alemão.
A Carta Fundamental de Bönn apresentou em seu texto direitos funda-
mentais de tutela do cidadão contra os abusos do Estado, que se impunham
sobre o ordenamento jurídico infraconstitucional e o Tribunal Constitucional
Federal Alemão constituiu um instrumento garantidor e ampliador desses
direitos, impedindo manifestações contrárias à Carta (VIEIRA et al, 2008).
Adotando essa tendência contemporânea de supremacia constitucional, no Bra-
sil, a Constituição Federal de 1988 albergou em seu texto princípios e precei-
tos básicos de elevada ordem. Dada a sua posição hierárquica máxima no sistema
jurídico pátrio, tais normas informam toda a estrutura legal infraconstitucional:
[...] a Constituição passa a ser a lente através da qual se leem e se interpre-
tam todas as normas infraconstitucionais. A Lei Fundamental e seus princípios
deram novo sentido e alcance ao direito civil, ao direito processual, ao direito
penal – enfim a todos os demais ramos jurídicos (BARROSO, 2008, p. 327).
Dentre os princípios garantidores da elevada ordem estão os incisos LIV e LV
do artigo 5º da CF, que estabelecem o devido processo legal, contraditório e
ampla defesa, respectivamente:
Para saber mais sobre a Car-ta Fundamental de Bönn, de 1949, consulte o link a seguir: <http://www.dw.de/lei-fun-damental-marcou-nascimen-to-da-rep%C3%Bablica-fede-ral-da-alemanha/a-4272523>
a Constituição Federal é con-junto de normas fundamen-tais e supremas de uma nação, também é chamada de lei das leis, magna carta, carta magna, carta mãe, carta da república ou texto magno.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
56
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens
sem o devido processo legal;
LV - os litigantes, em processo judicial ou administrativo,
e aos acusados em geral são assegurados o contraditório
e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
O princípio do devido processo legal, além de proteger, individual e coletiva-
mente, a liberdade e os bens dos cidadãos, submete a validade e eficácia das
etapas de um ato praticado pelo Estado a sua previsão normativa.
O princípio do contraditório e da ampla defesa se destina a
todos os litigantes, seja em processo judicial, criminal e civil,
administrativo ou disciplinar. Faculta ao acusado a ampla de-
fesa - a possibilidade de “trazer para o processo todos os ele-
mentos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de calar-
-se, se entender necessário” – e o contraditório – a faculdade
de dar-lhe a versão que lhe convenha, ou ainda, de fornecer
uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor”.
(MORAES, 2002, p. 360-371).
5.1 O DIREITO DE DEFESA NOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS EM gERAL
Como visto, já a partir da Norma Maior, na elevada hierarquia constitucional,
a defesa do acusado em processo administrativo ou disciplinar está garantida.
Cabe, portanto, discriminá-la.
A Lei nº 9.784/99, reguladora do “processo administrativo no âmbito da Ad-
ministração Pública Federal”, é norma subsidiária do regramento de processos
do tipo processo administrativo. Seu artigo 2º, em absoluta congruência com
a CF, estabelece os princípios denominados “referidos” da(o):
• Legalidade;
• Finalidade;
• Motivação;
• Razoabilidade;
• Proporcionalidade;
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
57
• Moralidade;
• Ampla defesa;
• Contraditório;
• Segurança jurídica;
• Interesse público;
• Eficiência.
Além de estabelecer, no inciso I, do parágrafo único desse mesmo artigo, o
critério processual da “atuação conforme a lei e o Direito”, também é ex-
pressão da garantia constitucional do devido processo legal.
O direito de defesa nos processos administrativos está previsto no Capítulo
xV – Do Recurso Administrativo e da Revisão, artigos 56-65 da Lei do processo
administrativo e garante a possibilidade de que todas as decisões em processo
administrativo possam ser submetidas a recurso (MAZZA, 2011).
5.2 O DIREITO DE DEFESA NOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES
O direito de defesa nos processos administrativos disciplinares está garantido a
partir de preceito constitucional. É possível identificá-lo nos CJ e CD, na Sindi-
cância e no RDE.
Em seu sentido mais amplo, no CJ, pode ser exercido tanto na fase essencial-
mente administrativa, na OM, como na sua fase mais judicial, no STM. Na
OM, a defesa pode ser conduzida por oficial designado como defensor dativo
ou por advogado constituído. A possibilidade dessa defesa ser exercida por
advogado está garantida no artigo 133 da CF e a sua ausência não afronta o
princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, como se infere da
súmula vinculante nº 5, do STF: “A falta de defesa técnica por advogado no
processo administrativo não ofende a Constituição Federal”.
A súmula é a uniformização da jurisprudência através de peque-
no texto elucidativo aprovado por Tribunal; atende ao princí-
pio de celeridade processual. Indica decisões reiteradas de um
Tribunal em relação a um mesmo objeto julgado em processos
distintos, simplificando o labor dos magistrados (SILVA, 2002).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
58
A Emenda Constitucional nº 45 regulou a aprovação de súmulas vinculantes:
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício
ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos
seus membros, após reiteradas decisões sobre maté-
ria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua
publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em
relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à admi-
nistração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão
ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
Quando em curso na OM, o exercício de defesa em CJ está presente na defesa
prévia do justificante:
Art. 9º, da lei nº 5.836/72
Art. 9º - Ao justificante é assegurada ampla defesa, tendo
ele, após o interrogatório, prazo de 5 (cinco) dias para
oferecer suas razões por escrito, devendo o Conselho
de Justificação fornecer-lhe o libelo acusatório, onde se
contenham com minúcias o relato dos fatos e a descrição
dos atos que lhe são imputados.
§ 1º O justificante deve estar presente a todas as sessões
do Conselho de Justificação, exceto à sessão secreta de
deliberação do relatório.
§ 2º Em sua defesa, pode o justificante requerer a pro-
dução, perante o Conselho de Justificação, de todas as
provas permitidas no Código de Processo Penal Militar.
§ 3º As provas a serem realizadas mediante Carta Preca-
tória são efetuadas por intermédio da autoridade militar
ou, na falta desta, da autoridade judiciária local.
A inquirição de testemunhas (artigo 351 - 353, do CPPM, subsidiariamente),
no exercício probatório (§ 2º, do artigo 9º, da Lei 5.836/72) e na elaboração
das razões finais de defesa, antes do Relatório).
No STM, a presença de uma defesa técnica, por advogado ou
defensor público é processualmente obrigatória.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
59
Após distribuído o processo, o defensor tem 5 (cinco) dias para contraditar o
que foi imputado ao justificante, conforme previsão do artigo 15 da mesma lei:
No Superior Tribunal Militar, distribuído o processo, é o
mesmo relatado por um dos Ministros que, antes, deve
abrir prazo de 5 (cinco) dias para a defesa se manifestar
por escrito sobre a decisão do Conselho de Justificação.
Em sede de CD, a defesa do acusado é exercida no âmbito da Força a que
pertence o militar, haja vista que não há previsão procedimental de submissão
do processo ao STM. Pode, igualmente, ser conduzida por oficial designado
como defensor dativo (artigo 9º, § 4º, do Decreto 71.500/72) ou por advoga-
do. Também, o exercício da defesa, lato sensu, no curso procedimental desta
espécie de processo administrativo disciplinar, se dará na defesa prévia do
acusado (artigo 9º do Decreto 71.500/72), na inquirição de testemunhas e nas
razões finais de defesa.
A autoridade nomeante, após ter recebido o relatório e [exarada] a solução,
o acusado, para o exercício do contraditório, ainda tem o direito de dirigir, ao
Comandante da Força, recurso, no prazo de 10 dias, contado da data em que
tomou conhecimento da solução dada.
Não se deve esquecer a possibilidade do ajuizamento de mandato de
segurança, tanto no CJ como no CD, com previsão constitucional do artigo
5º, LxIx e Lxx, que pode ser manejado para proteger direito individual ou
coletivo próprio, líquido e certo, não amparado por habeas corpus.
No âmbito do EB, resta tratar do direito de defesa na sindicância. É regulado
nas Instruções Gerais para a Elaboração de Sindicância no âmbito do Exército
Brasileiro (EB10-IG-09.001), nos artigos 15 - 18, do Capítulo IV, que tem como
título Do Contraditório e da Ampla Defesa. O artigo 15 estatui que a sindicân-
cia obedece aos princípios do contraditório e da ampla defesa, com a “utili-
zação dos meios e recursos a ela inerentes”. O parágrafo único do artigo 15
faculta o emprego de “qualquer espécie de prova admitida em direito, desde
que não atente contra a moral, a saúde ou a segurança individual ou coletiva,
ou contra a hierarquia, ou contra disciplina”.
O direito de acompanhar todo o processo, de apresentar defesa prévia e
alegações finais, arrolar testemunhas, assistir os depoimentos, solicitar reinqui-
rições, requerer provas periciais e documentais, tirar as cópias dos autos que
Exarada: consignada ou registrada por escrito; lavrada.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
60
lhe interessarem, formular quesitos em cartas precatórias e em prova pericial e
requerer o que mais entender que possa auxiliá-lo, tudo no exercício de defesa
do sindicado, consta do artigo 16.
Mesmo em sindicância, o sindicado pode nomear um advoga-
do para a sua defesa, como previsto no artigo 17. Com essa
delegação de poderes, ele poderá acompanhar a inquirição
do sindicado, das testemunhas, reinquiri-las, por meio do
sindicante, e praticar todos os demais atos da sindicância de
interesse de seu cliente.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
61
Objetivo específico
• Refletir sobre a competência da Justiça Militar no controle judicial dos
atos administrativos disciplinares.
Este assunto pretende levar à reflexão do papel da Justiça no controle dos atos
administrativos disciplinares. Se esta espécie de ato é praticada na seara admi-
nistrativa, como pode o Judiciário controlá-lo, se for o caso, e em que circuns-
tâncias isto é permitido.
6.1 SISTEMAS ADMINISTRATIVOS
Para uma reflexão quanto à competência da Justiça Militar no controle dos
atos administrativos, é importante que se esclareça a que conjunto de normas
sistematizadas as atividades administrativas, aí incluídos os atos administrati-
vos disciplinares, se subordinam.
Um bom começo é entender o que é um sistema: trata-se de um conjunto
normativo, constituído de regras e princípios sobre uma matéria, que se rela-
cionam entre si, de forma sistematizada, formando um conjunto de doutrinas
para um determinado fim (SILVA, 2002, p. 761). As atividades administrativas
podem se submeter a duas espécies de sistemas:
• O sistema da jurisdição una (modelo inglês); ou
• O sistema do contencioso administrativo (modelo francês).
CONTROLE JUDICIAL COMPETêNCIA DO STM6
No modelo inglês, “todas as causas, mesmo aquelas que en-
volvem interesse da Administração Pública”, podem ser julga-
das pelo Poder Judiciário. É o controle que vige no Brasil.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
62
O Poder Judiciário tem o “monopólio da função jurisdicional”, independente
da demanda abranger ou não interesses da Administração Pública. A CF sinali-
zou essa opção no artigo 5º, xxxV: “A lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Contrapondo-se ao modelo inglês, o sistema do contencioso administrativo,
ou francês, apresenta dois subsistemas independentes: o administrativo e o
judiciário. As causas comuns são julgadas pelo Poder Judiciário e as deman-
das que envolvem os interesses da Administração Pública são julgadas pelo
Conselho de Estado, órgão máximo do contencioso administrativo. Assim,
as decisões exaradas no sistema administrativo dos países que adotam o
contencioso administrativo não podem ser submetidas ao crivo do judiciário
(MAZZA, 2012, p. 53-55).
6.2 O CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
Montesquieu foi um filósofo francês que, preocupado com o excesso de poder
nas mãos dos governantes, desenvolveu a conhecida separação dos poderes
políticos – Executivo, Legislativo e Judiciário – por não entender factível
que nas mãos de uma mesma pessoa fossem concentrados os poderes de
fazer as leis, executar as resoluções públicas e julgar os crimes ou demandas
particulares (MONTESQUIEU, 1987).
O sistema político brasileiro adota essa tripartição limitadora dos poderes, por
distingui-los, possibilitando que exerçam um controle recíproco de seus atos. É
o que se [infere] do artigo 2º da CF: “São poderes da União independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.
Os órgãos do Poder Judiciário estão estabelecidos no artigo 92 da CF:
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A - o Conselho Nacional de Justiça;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
Inferir: infere, conclui; entende; deduz.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
63
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito
Federal e Territórios.
§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de
Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal.
§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores
têm jurisdição em todo o território nacional (grifo nosso).
........................................................................................
No Brasil, como já assinalado, pela adoção da jurisdição una prevista no artigo
5º, inciso xxxV, os atos da Administração Pública podem ser revistos pelo
Poder Judiciário, na esfera de sua competência jurisdicional.
Em outras palavras, se a Administração Pública, no exercício
de sua competência, comete ilicitudes, além da possibilidade
de, por seus atos próprios, anulá-los, o Poder Judiciário tem o
poder de revê-los.
6.3 COMPETêNCIA DA JUSTIÇA MILITAR NO CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES
A Justiça Militar apresenta a organização que se segue, estatuída no
artigo 122 da CF:
DOS TRIBUNAIS E JUíZES MILITARES
Art. 122. São órgãos da Justiça Militar:
Doutrina Vinculada
I - o Superior Tribunal Militar;
II - os Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei.
Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de
quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da
República, depois de aprovada a indicação pelo Senado
Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha,
quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre
oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do pos-
to mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
64
Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo
Presidente da República dentre brasileiros maiores de
trinta e cinco anos, sendo:
I - três dentre advogados de notório saber jurídico e
conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva
atividade profissional;
II - dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e
membros do Ministério Público da Justiça Militar.
Art. 124. À Justiça Militar compete processar e jul-
gar os crimes militares definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o
funcionamento e a competência da Justiça Militar
(grifo nosso).
A par da competência estampada no artigo 124 e seu parágrafo único da CF,
tem-se a Lei nº 8.457, de 4 de setembro de 1992, que “Organiza a Justiça Mi-
litar da União e regula o funcionamento de seus Serviços Auxiliares”. O artigo
1º expressa quais são os órgãos da Justiça Militar:
Art. 1º. São órgãos da Justiça Militar:
I - o Superior Tribunal Militar;
II - a Auditoria de Correição;
III - os Conselhos de Justiça;
IV - os Juízes-Auditores e os Juízes-Auditores Substitutos.
A lei estabelece a competência de cada um desses órgãos da Justiça Militar. Assim:
• Na Seção I, do Capítulo II, do Título III, estipula-se a competência do STM;
• Na Seção Única, do Capítulo II, do Título IV, a da Auditoria de Correição;
• Na Seção III, do Capítulo III, do Título IV, a dos Conselhos de Justiça;
• Na Seção V, do Capítulo III, do Título IV, dos Juízes Auditores.
Não se identifica, no texto da lei, qualquer competência da Justiça Militar fe-
deral no controle judicial dos atos administrativos disciplinares, entendimento
que já se encontra pacificado na jurisprudência.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
65
O que a jurisprudência vem consolidando, entretanto, é que a vedação não é
absoluta, pois o Judiciário pode aferir alguns requisitos próprios do ato admi-
nistrativo disciplinar [eivado] de ilicitude, como, por exemplo, o praticado por
quem não tem competência, ou aquele praticado sem que tenha sido faculta-
da a ampla defesa ou o contraditório ao militar punido. Mas, cabe esclarecer
que, quando isto ocorrer em âmbito militar federal, a competência não é do
STM e sim da Justiça Federal.
Por outro lado, em sede de justiça militar estadual, em razão da Emenda
Constitucional nº 45, que deu a redação ao § 4º do artigo 125, da CF, tal com-
petência é admitida. À Justiça Militar estadual foi atribuída a competência de
apreciar o [habeas corpus] em relação a punições disciplinares (ASSIS, 2011).
Art. 125, § 4º, da CF: “Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os
militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais
contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a
vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto
e da patente dos oficiais e da graduação das praças.”
Cabe esclarecer, ademais, que em relação a esse remédio consti-
tucional em face de punições disciplinares, há vedação a sua utili-
zação no texto da Carta Magna, no artigo 142, § 2º: “não caberá
habeas corpus em relação a punições disciplinares militares”.
Eivado: contaminado; infectado.
Habeas corpus: do latim, “que tenhas o teu corpo”. É um instituto jurídico que dá garantia constitucional a quem sofra violência ou ameaça de constrangimento ilegal por parte de autoridade legítima que impeça a sua liberdade de ir e vir.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
67
Objetivo específico
• Conhecer o regulamento disciplinar do Exército e a competência para
legislar sobre o tema.
Pelo Decreto nº 4.346, de 26 de agosto de 2002 – Regulamento Disciplinar
do Exército (RDE ou R4), o Presidente da República especifica as transgressões
disciplinares e estabelece normas relativas a punições militares, comportamen-
to militar das praças, recursos e recompensas. Tal norma regula o artigo 47 da
Lei 6.880/80 – o Estatuto dos Militares – que estabelece:
Art. 47. Os regulamentos disciplinares das Forças Ar-
madas especificarão e classificarão as contravenções ou
transgressões disciplinares e estabelecerão as normas
relativas à amplitude e aplicação das penas disciplinares,
à classificação do comportamento militar e à interposição
de recursos contra as penas disciplinares.
Contudo, acirrada discussão doutrinária surgiu, envolvendo a constitucionalida-
de do RDE, em virtude da reserva legal do artigo 5º, LxI, que expressa: “ninguém
será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar
ou crime propriamente militar, definidos em lei” (grifo nosso). A falta de
consenso jurídico quanto à constitucionalidade do R4 envolveu a ação direta de
inconstitucionalidade (ADI) nº 3.340-9, que, muito resumidamente, discutia:
• O RDE anterior à CF/88 era estabelecido pelo Decreto nº 90.608/1984,
que foi recepcionado como lei pela Norma Maior;
• Para revogar lei, somente outra lei poderia fazê-lo;
• O Decreto 4.346/2002 – o RDE vigente - revogou o anterior, pelo artigo
74, contrariando a reserva de lei estatuída pelo artigo 5º, LxI.
O REgULAMENTO DISCIPLINAR DO ExéRCITO (RDE OU R4)7
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
68
Embora não tenha sido expressamente declarada constitucional, em que rema-
nesça alguma discussão no campo doutrinário, a doutrina e a jurisprudência
não têm, até agora, suscitada nova discussão quanto a sua constitucionalidade.
O Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) tem por finalidade, segundo o
Decreto nº 4.346/02, especificar as transgressões disciplinares e estabelecer
normas relativas a punições disciplinares, comportamento militar das praças, re-
cursos e recompensas. Trata-se de uma base de valores, que tutela a hierarquia e
a disciplina, norteadora da atividade da Força Terrestre e dos seus componentes.
Estão sujeitos ao R-4 os militares da ativa, da reserva e reformados do Exército.
Os ministros militares do STM são regidos por legislação própria. Os militares
agregados sujeitam-se “às obrigações disciplinares concernentes às suas rela-
ções com militares e autoridades civis” (artigo 2º, §2º).
O RDE apresenta-se estruturado em 6 (seis) capítulos e 6 (seis) anexos, a saber:
Capítulo I – Das Disposições Gerais.
Capítulo II – Das Transgressões Disciplinares.
Capítulo III – Punições Disciplinares.
Capítulo IV – Do Comportamento Militar.
Capítulo V - Recursos e Recompensas.
Capítulo VI - Das Disposições Finais.
Anexo I - Relação de Transgressões.
Anexo II - Modelo de Nota de Punição.
Anexo III – Quadro de Punições Máximas, referidas no
artigo 40, que podem aplicar as autoridades definidas
nos itens I, II e § 1º do artigo 10 e a que estão sujeitos os
transgressores.
Anexo IV – Instruções para Padronização do Contraditó-
rio e da Ampla Defesa nas Transgressões Disciplinares.
Anexo V - Modelo do Formulário de Apuração de Trans-
gressão Disciplinar.
Anexo VI – Ficha disciplinar Individual.
Os assuntos mais importantes e suscetíveis de dúvida de interpretação de cada
capítulo serão destacados a seguir.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
69
O regulamento apresenta, nos artigos 3º - 5º, da Seção II, do Capítulo I, seus
Princípios Gerais, dos quais se destacam: a indispensabilidade da camarada-
gem entre si, a civilidade, o dever de tratar com interesse e bondade o subor-
dinado e com deferência os superiores hierárquicos. Também padroniza a pala-
vra comandante, como gênero, quando usada genericamente, para significar,
também, chefe ou diretor.
Entre os deveres militares estão os de preservar a honra pessoal, pundonor mili-
tar e decoro da classe, apresentados no artigo 6º e incisos, da seguinte forma:
I - Honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o
apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor
o militar, perante seus superiores, pares e subordinados;
II - Pundonor militar: dever do militar de pautar a sua
conduta como a de um profissional correto. Exige dele,
em qualquer ocasião, alto padrão de comportamento éti-
co que refletirá no seu desempenho perante a Instituição
a que serve e no grau de respeito que lhe é devido; e
III - Decoro da classe: valor moral e social da Instituição.
Representa o conceito social dos militares que a com-
põem e não subsiste sem esse.
A Seção II, do Capítulo I – Dos Princípios Gerais do Regulamento, nos
artigos 7º - 9º, inicia esclarecendo o significado de hierarquia: “Art. 7º - A
hierarquia é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, em postos e
graduações.” Continua o regulamento, nos artigos 8º e 9º, externando que a
disciplina militar é a obediência, a rigorosa observância e o acatamen-
to integral das leis, regulamentos e ordens.
O exercício do comando envolve, entre outros deveres, o de apurar (ato vin-
culado) e aplicar punições disciplinares (ato discricionário). De acordo com o
artigo 10, a competência para a aplicação da punição é do exercício do
cargo militar e não do grau hierárquico. Assim, o Comandante do Exérci-
to pode aplicar punições a todos os que estão sujeitos ao RDE e às autoridades
elencadas nas alíneas a), b), c) e d), do inciso II.
A competência para punir “os militares da reserva remunerada, reformados
ou agregados, que residam ou exercem atividades” nas áreas de jurisdição dos
comandantes militares de área, é destes, desde que respeitada a precedência
hierárquica e observado o disposto no artigo 40 do R4 (§1º, do inciso II).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
70
No que se refere à competência dos chefes de divisão, seção, escalão regio-
nal, ajudante-geral, serviço e assessoria, tratada no §2º, do inciso II, esta
“limita-se às ocorrências relacionadas com as atividades inerentes ao serviço
de suas repartições”.
Os militares em trânsito estão sujeitos à jurisdição disciplinar do respectivo
comandante de guarnição onde se encontrarem (§4º, do inciso II). Por fim, o
§4º, do inciso II explicita que “o cumprimento da punição dar-se-á na forma
do caput do Art. 47”.
O artigo 11 regula as questões disciplinares do pessoal militar que serve no
Ministério da Defesa e o artigo 12 estabelece o dever jurídico ao militar que
tomar conhecimento de fato que agrida a disciplina de participá-lo a quem o
comanda. Os seus parágrafos 2º e 4º retratam a situação em que uma trans-
gressão é cometida na presença de militar mais moderno. Para a preservação
da disciplina e do decoro da classe, quando um militar mais antigo comete
uma transgressão na presença de mais moderno, entre esses mais modernos,
o de maior precedência deve tomar as medidas cabíveis, conforme dita o § 2º.
Por exemplo, pode chamar a atenção do transgressor, em nome da autoridade
a que estiver subordinado. Se for o caso de prisão, sua conduta será orientada
com o que determinam os parágrafos 3º e 4º:
§ 3º No caso de prisão, como pronta intervenção
para preservar a disciplina e o decoro da Insti-
tuição, a autoridade competente em cujo nome
for efetuada é aquela à qual está disciplinarmente
subordinado o transgressor.
§ 4º Esquivando-se o transgressor de esclarecer em
que OM serve, a prisão será efetuada em nome do
Comandante do Exército e, neste caso, a recusa cons-
titui transgressão disciplinar em conexão com a principal
(grifo nosso).
Quando uma parte é dada, relatando conduta de indisciplina de militar de outra
OM, que não a do seu signatário, este deverá ser notificado da solução que a
autoridade tiver dado, no prazo de 8 (oito) dias. Dentro desse prazo, a auto-
ridade deve apurar o fato e dar a solução e, no caso de sua impossibilidade,
deve mandar publicar em boletim o motivo que o levou a postergar a apuração,
havendo, então, uma prorrogação de mais 30 (trinta) dias (parágrafos 6º e 7º).
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
71
Em uma guarnição, se houver mais de uma organização militar, a coordenação
das ações que envolvem a ação disciplinar, conforme o artigo 13, é do seu
comandante. O parágrafo único deste artigo versa quanto ao caso do fato en-
volver indisciplina de militares de mais de uma OM: a apuração será procedida
pelo comandante da guarnição.
7.1. DAS TRANSgRESSõES DISCIPLINARES
O artigo 14, em seu caput, conceitua transgressão disciplinar (ou trans-
gressão militar):
[...] é toda ação praticada pelo militar contrária aos precei-
tos estatuídos no ordenamento jurídico pátrio ofensiva à
ética, aos deveres e às obrigações militares, mesmo na sua
manifestação elementar e simples, ou, ainda, que afete a
honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe.
As transgressões disciplinares estão tipificadas no rol do Anexo I do RDE, em
113 (cento e treze) tipos, mais quaisquer outras condutas que afetem a honra
pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe, conforme acenam o artigo
15 e o caput do artigo 14.
Embora apresentem razoável similitude, observe-se, na conformidade dos pará-
grafos 1º e 4º, do artigo 14, do RDE, que a transgressão disciplinar sempre será
um ilícito menor em relação ao crime. É por isso que no caso de uma conduta
que agrida a hierarquia e/ou a disciplina puder ser tipificada como transgressão
militar e crime, este absorve aquela, e, em havendo a apuração no âmbito cri-
minal, seja por ação judicial, seja por Inquérito Policial Militar, eventual apura-
ção da transgressão deve ser suspensa até a sua perfeita caracterização.
Art. 14 [...].
§ 1º Quando a conduta praticada estiver tipificada em lei
como crime ou contravenção penal, não se caracterizará
transgressão disciplinar.
........................................................................................
§ 4º No concurso de crime e transgressão disciplinar,
quando forem da mesma natureza, esta é absorvida por
aquele e aplica-se somente a pena relativa ao crime.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
72
§ 5º Na hipótese do § 4º, a autoridade competente para
aplicar a pena disciplinar deve aguardar o pronuncia-
mento da Justiça, para posterior avaliação da questão no
âmbito administrativo.
§ 6º Quando, por ocasião do julgamento do crime, este
for descaracterizado para transgressão ou a denúncia
for rejeitada, a falta cometida deverá ser apreciada, para
efeito de punição, pela autoridade a que estiver
subordinado o faltoso.
A responsabilização do transgressor não se limita à esfera disciplinar,
estende-se à administrativa e à criminal, podendo ser apuradas individualmen-
te. Entretanto, no caso de absolvição em processo crime por não comprovação
do cometimento do ato ou pela sua imputação a outrem que não o acusado,
as responsabilidades cível e criminal do acusado serão afastadas, de acordo
com o artigo 14, parágrafos 2º e 3º:
§ 2º As responsabilidades nas esferas cível, criminal e
administrativa são independentes entre si e podem ser
apuradas concomitantemente.
§ 3º As responsabilidades cível e administrativa do militar
serão afastadas no caso de absolvição criminal, com sen-
tença transitada em julgado, que negue a existência do
fato ou da sua autoria.
........................................................................................
No julgamento de transgressão, a autoridade deve levar a efeito uma análi-
se que considere as circunstâncias previstas no artigo 16:
Art. 16. O julgamento da transgressão deve ser precedido
de análise que considere:
I - a pessoa do transgressor;
II - as causas que a determinaram;
III - a natureza dos fatos ou atos que a envolveram; e
IV - as consequências que dela possam advir.
Ademais, o artigo 17 do RDE, ao seu turno, prevê que “no julgamento da
transgressão, podem ser levantadas causas que justifiquem a falta ou
circunstâncias que a atenuem ou a agravem”.
a nota 008/a2 – Circular, do Gabinete do Comandante do exército, recomenda: “4. [...]que a punição referente a uma transgressão discipli-nar apurada em um inquérito Policial Militar seja aplicada somente após a apreciação do referido iPM pela Justiça Militar”. a nota evidencia a preocupação do Comando do exército em evitar, ao máxi-mo, a possibilidade do bis in idem; em outras palavras, que o militar transgressor seja punido mais de uma vez por uma mesma infração.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
73
As circunstâncias que justificam uma conduta tipificada como transgressão
disciplinar estão estabelecidas no artigo 18, e são:
Art. 18. Haverá causa de justificação quando a trans-
gressão for cometida:
I - na prática de ação meritória ou no interesse do serviço,
da ordem ou do sossego público;
II - em legítima defesa, própria ou de outrem;
III - em obediência a ordem superior;
IV - para compelir o subordinado a cumprir rigorosamente
o seu dever, em caso de perigo, necessidade urgente, cala-
midade pública, manutenção da ordem e da disciplina;
V - por motivo de força maior, plenamente comprovado; e
VI - por ignorância, plenamente comprovada, desde que
não atente contra os sentimentos normais de patriotismo,
humanidade e probidade.
Parágrafo único. Não haverá punição quando for reco-
nhecida qualquer causa de justificação.
Por outro lado, uma determinada conduta, mesmo lesando deveres militares,
pode apresentar circunstâncias que permitem atenuá-la. Estão previstas no
artigo 19:
Art. 19. São circunstâncias atenuantes:
I - o bom comportamento;
II - a relevância de serviços prestados;
III - ter sido a transgressão cometida para evitar mal maior;
IV - ter sido a transgressão cometida em defesa própria,
de seus direitos ou de outrem, não se configurando causa
de justificação; e
V - a falta de prática do serviço.
Ademais, em vez de ser atenuada, uma conduta pode ser agravada, desde que
presentes as causas estabelecidas pelo artigo 20:
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
74
Art. 20. São circunstâncias agravantes:
I - o mau comportamento;
II - a prática simultânea ou conexão de duas ou mais
transgressões;
III - a reincidência de transgressão, mesmo que a punição
anterior tenha sido uma advertência;
IV - o conluio de duas ou mais pessoas;
V - ter o transgressor abusado de sua autoridade hierár-
quica ou funcional; e
VI - ter praticado a transgressão:
a) durante a execução de serviço;
b) em presença de subordinado;
c) com premeditação;
d) em presença de tropa; e
e) em presença de público.
Em relação à classificação, uma transgressão pode ser leve, média e grave,
cujos parâmetros definidores estão formulados nos artigos 16-17 e 19-20. A
competência para esta classificação é a da mesma autoridade que a tem para
aplicá-la (artigo 21). Ressalta o artigo 22 que: “será sempre classificada como
‘grave’ a transgressão da disciplina que constituir ato que afete a honra pessoal,
o pundonor militar ou o decoro da classe”.
7.2 PUNIÇõES DISCIPLINARES
As sanções disciplinares previstas no Regulamento Disciplinar do Exército
(R-4) têm como escopo a preservação da disciplina e um fim educativo (artigo
23). O seu rol, em enumeração exaustiva, e os limites máximos da detenção e
prisão disciplinares e do impedimento disciplinar estão presentes no artigo 24
do RDE, a seguir:
Art. 24. Segundo a classificação resultante do julgamento
da transgressão, as punições disciplinares a que estão su-
jeitos os militares são, em ordem de gravidade crescente:
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
75
I - a advertência;
II - o impedimento disciplinar;
III - a repreensão;
IV - a detenção disciplinar;
V - a prisão disciplinar; e
VI - o licenciamento e a exclusão a bem da disciplina.
Parágrafo único. As punições disciplinares de detenção e
prisão disciplinar não podem ultrapassar trinta dias e a de
impedimento disciplinar, dez dias.
A seguir ver-se-á, em mais detalhe, cada punição disciplinar:
a. Advertência é uma reprimenda verbal e é a mais leve das punições; pode
ser reservada (publicada em Boletim Reservado da Organização Militar) ou
ostensiva, na presença de superiores ou no meio dos pares do transgressor:
Art. 25. Advertência é a forma mais branda de punir, con-
sistindo em admoestação feita verbalmente ao transgres-
sor, em caráter reservado ou ostensivo.
§ 1º Quando em caráter ostensivo, a advertência poderá
ser na presença de superiores ou no círculo de seus pares.
§ 2º A advertência não constará das alterações do pu-
nido, devendo, entretanto, ser registrada, para fins de
referência, na ficha disciplinar individual (grifo nosso).
b. Impedimento disciplinar limita o exercício de ir e vir do punido às
instalações da OM, não o impedindo de prestar os serviços normais de
sua responsabilidade ou os eventuais que lhe forem determinados:
Art. 26 - Impedimento disciplinar é a obrigação de o
transgressor não se afastar da OM, sem prejuízo de
qualquer serviço que lhe competir dentro da unidade em
que serve.
Parágrafo único. O impedimento disciplinar será pu-
blicado em boletim interno e registrado, para fins de
referência, na ficha disciplinar individual, sem constar das
alterações do punido (grifo nosso).
c. Repreensão se compõe de uma firme reprimenda publicada em bole-
tim interno da OM: “Art. 27. Repreensão é a censura enérgica ao trans-
gressor, feita por escrito e publicada em boletim interno” (grifo nosso).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
76
d. Detenção disciplinar limita o deslocamento e a permanência do punido
à subunidade ou a outro lugar, desde que assim seja determinado. Não há
restrição ao detido às atividades de instrução e de serviços internos à OM:
Art. 28. Detenção disciplinar é o cerceamento da
liberdade do punido disciplinarmente, o qual deve
permanecer no alojamento da subunidade a que
pertencer ou em local que lhe for determinado pela auto-
ridade que aplicar a punição disciplinar.
§ 1º O detido disciplinarmente não ficará no mesmo local
destinado aos presos disciplinares.
§ 2º O detido disciplinarmente comparece a todos os
atos de instrução e serviço, exceto ao serviço de escala
externo.
§ 3º Em casos especiais, a critério da autoridade que apli-
car a punição, o oficial ou aspirante-a-oficial pode ficar
detido disciplinarmente em sua residência (grifo nosso).
e. Prisão disciplinar limita fisicamente o transgressor ao local designado
para o seu cumprimento, inclusive para as refeições. O militar, nessa
situação, está impedido de executar as atividades de instrução e dos
serviços internos à organização militar a que serve, “salvo comprovada
necessidade do serviço” (artigos 29, caput e 30, parágrafos 1º e 2º).
Em regra, as organizações militares (OM) têm instalações destinadas
à prisão, contudo deve-se atentar para que os militares de um círculo
hierárquico não sejam presos juntamente com os de outros círculos
(parágrafos 1º e 2º, do artigo 29). Da mesma forma, “os presos que já es-
tiverem passíveis de serem licenciados ou excluídos a bem da disciplina, os
que estiverem à disposição da justiça e os condenados pela Justiça Militar
deverão ficar em prisão separada dos demais presos disciplinares” (artigo
29, § 3º). Excepcionalmente, e a critério da autoridade que aplicar a pu-
nição, “o oficial ou Aspirante-a-Oficial pode ter sua residência como local
de cumprimento da punição, quando a prisão disciplinar não for superior
a quarenta e oito horas” (§ 4º, do Artigo 29). Se a OM não dispuser de
instalações próprias para o cumprimento da prisão disciplinar, deverá ser
solicitado ao escalão superior local para tanto (§ 5º, do artigo 29).
Note-se que o regulamento impõe um requisito formal que deve antece-
der o recolhimento do transgressor à prisão: a publicação da respectiva
nota em boletim interno da OM. Como exceção, admite o recolhimento
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
77
sem nota nas seguintes circunstâncias: por determinação das autorida-
des relacionadas nos incisos I e II, do artigo 10; para preservar a disci-
plina e o decoro da instituição, em conformidade com o § 2º, do artigo
12; e quando houver presunção ou indício de crime, embriaguez e uso
de drogas ilícitas.
f. Licenciamento e exclusão a bem da disciplina são as punições mais
graves encontradas no artigo 32 do RDE. Consistem no afastamento, ex
officio, do militar das fileiras do Exército. Devem ser adotadas na esfera
disciplinar quando a situação for extrema e o transgressor demonstrar
incompatibilidade com os rigores da hierarquia e disciplina castrenses.
Ressalte-se que o licenciamento a bem da disciplina é uma licenciamento ex
officio e pode ser aplicado às praças sem estabilidade e aos oficiais da reserva,
quando convocados. As hipóteses de sua aplicação são as dos incisos I, II e III
do parágrafo 1º, do artigo 32:
• Transgressão que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro
da classe;
• Ingresso no comportamento mal, sem expectativa de melhoria de com-
portamento;
• Trânsito em julgado de condenação por crime doloso, comum ou militar.
Essas transgressões consistem no afastamento do militar das fileiras do Exér-
cito. O licenciado deixa de receber a remuneração e não é incluído na reserva;
recebe o certificado de isenção do serviço militar. As circunstâncias que envol-
vem o licenciamento a bem da disciplina assim como sua motivação devem
ser apuradas em sindicância. Além da previsão normativa do RDE, encontra-se
regulada nos artigos 121 do E1, no artigo 31, § 3º, a), b) e c), da Lei nº 4.375
de 1964 – Lei do Serviço Militar e no Decreto nº 57.654 de 1966 – Decreto
que regulamenta a Lei do Serviço Militar.
A exclusão a bem da disciplina pode ser aplicada aos Guardas-
-Marinha, aos Aspirantes-a-Oficial ou às praças com estabilidade
assegurada; igualmente, afasta o militar das fileiras do EB. Os
artigos 49, 125-127, do E1, descrevem as circunstâncias de sua
aplicação e o Decreto 71.500 de 1972, que trata do Conselho de
Disciplina, configura-se em outra norma, apresentando especial
circunstância que pode levar à exclusão desses militares.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
78
O instituto da reabilitação, empregado na [seara criminal], também se aplica à
disciplinar, aos licenciados ou excluídos a bem da disciplina. Deve obedecer ao
prescrito no E1 e está previsto no artigo 33, do RDE, onde consta a competên-
cia e a forma para sua concessão.
A aplicação da punição compreende uma sucessão de atos que lhe empres-
tam a forma e permitem a sua elaboração, publicação e registro, o que atende
o princípio constitucional da publicidade. Está regulada no artigo 34:
Art. 34. A aplicação da punição disciplinar compreende:
I - elaboração de nota de punição, de acordo com o
modelo do Anexo II;
II - publicação no boletim interno da OM, exceto no caso
de advertência; e
III - registro na ficha disciplinar individual.
........................................................................................
O Regulamento Disciplinar do Exército recomenda, no seu artigo 35, à
autoridade que vai julgar e aplicar a punição disciplinar “justiça, serenidade
e imparcialidade”, para que a finalidade da sanção se cumpra, qual seja, que
“o punido fique consciente e convicto de que ela se inspira no cumprimento
exclusivo do dever, na preservação da disciplina e que tem em vista o bene-
fício educativo do punido e da coletividade”. Tal orientação do Regulamento
norteia-se pelo princípio constitucional explícito da Administração Pública da
impessoalidade. O próprio artigo 35, em seu primeiro parágrafo, refere-se ao
inafastável e constitucional direito do contraditório e da ampla defesa. Para
tanto, prescreve expressamente no parágrafo 2º:
§ 2º Para fins de ampla defesa e contraditório, são direi-
tos do militar:
I - ter conhecimento e acompanhar todos os atos de apu-
ração, julgamento, aplicação e cumprimento da punição
disciplinar, de acordo com os procedimentos adequados
para cada situação;
II - ser ouvido;
III - produzir provas;
IV - obter cópias de documentos necessários à defesa;
O Regulamento da Lei do Ser-viço Militar também discorre sobre a reabilitação, em seu artigo 110, §6º.
Seara: expressão latina que significa “campo semea-do” e, por associação, usado para definir qualquer campo
de atividade humana.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
79
V - ter oportunidade, no momento adequado, de contra-
por-se às acusações que lhe são imputadas;
VI - utilizar-se dos recursos cabíveis, segundo a legislação;
VII - adotar outras medidas necessárias ao esclarecimento
dos fatos; e
VIII - ser informado de decisão que fundamente, de
forma objetiva e direta, o eventual não-acolhimento de
alegações formuladas ou de provas apresentadas.
O§3º,estabelece−emnomedeumdessespilaresimprescindíveisàexistência
eempregodeumaForçaArmada−amedidaexcepcionaldaprisãodisciplinar
sem o rito estatuído no R-4. O prazo máximo de sua aplicação é de 72 ho-
ras, desde que “necessário para a preservação do decoro da classe ou houver
necessidade de pronta intervenção”. A excepcionalidade da medida se justifica
em razão de grave violação das obrigações e deveres militares.
O artigo 36 recomenda que a punição de Oficial ou de Aspirante-a-Oficial deva
ser publicada em boletim reservado, podendo sê-lo em ostensivo, “se as cir-
cunstâncias ou a natureza da transgressão assim o recomendarem”. A prudên-
cia em providenciar a publicação em boletim reservado refere-se tão somente
à preocupação em atingir a publicidade entre os superiores e aos militares
do mesmo círculo, evitando a propagação do conhecimento da punição aos
subordinados deste, o que poderia acabar afetando, inclusive, a hierarquia.
A conduta disciplinadora da autoridade militar não pode ser pautada pelo
arbítrio, o que provocaria a sua nulidade. Desse modo, o artigo 37 regulou a
aplicação da punição por normas que a situam sob a [égide] de dois dos prin-
cípios contidos no rol do artigo 2º, da Lei 9.874/99 – Lei do processo Adminis-
trativo Federal: da razoabilidade e da proporcionalidade:
Assim, o regramento do artigo 37 estipula que a punição seja “proporcional
à gravidade da transgressão”: se leve, “de advertência até dez dias de impedi-
mento disciplinar, inclusive”; se média, “de repreensão até a detenção discipli-
nar”; e se grave, “de prisão disciplinar até o licenciamento ou exclusão a bem
da disciplina” (artigo 37, caput, inciso I, e suas alíneas).
Ademais, quando ocorrerem somente circunstâncias atenuantes, a punição
não pode atingir os respectivos limites máximos aplicáveis às transgressões
leves, médias e graves (artigo 37, inciso II). Por outro lado, em se identificando
tanto circunstâncias atenuantes como agravantes, a punição será aplicada em
É possível traçar um paralelo doutrinário entre a prisão em flagrante por cometimento de crime, em que se inverte a imposição da pena de pri-são, antecedendo a completa instrução e julgamento, com a transgressão disciplinar em flagrante, na qual se impõe a punição de prisão por 72 ho-ras, antes mesmo da instrução e julgamento disciplinares.
a razoabilidade é o princí-pio da administração Pública que, aplicado aos atos que en-volvem a punição disciplinar, orienta para que estes sejam pautados segundo os padrões normais de aceitabilidade, dentro do que prescreve a norma reguladora. Já o prin-cípio da proporcionalidade, no caso da sanção disciplinar, trata da sua dosagem, impe-dindo que a sanção seja supe-rior à estritamente necessária à sua finalidade.
égide: termo derivado do grego que significa “escu-do, amparo ou proteção”.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
80
conformidade com a que se sobrepor (artigo 3, inciso III). Ainda, de acordo
com o artigo 37, inciso IV: “por uma única transgressão não deve ser aplicada
mais de uma punição disciplinar”.
Quanto à responsabilidade civil decorrente da prática de uma transgressão
disciplinar, a punição não isenta o punido de eventual condenação judicial
indenizatória (artigo 37, inciso V).
Se houver, ainda, o cometimento de mais de uma transgressão e se estas não
apresentarem conexão entre si, o transgressor será objeto de uma sanção por
transgressão. De outra feita, se houver conexão, a “de menor gravidade será
considerada como circunstância agravante da transgressão principal (artigo 37,
incisos VI e VII).
Quando a punição for prisão disciplinar, a sua aplicação só pode ser efetuada
pelo Comandante do Exército, comandante, chefe ou diretor de OM (artigo 38).
O transgressor não deve ser interrogado ou punido em “estado de embriaguez
ou sob a ação de psicotrópicos” (artigo 39) para que a apuração e aplicação
da punição disciplinar sejam absolutamente isentas de vícios.
Para evitar conflitos de competências na aplicação de sanções disciplinares e li-
mitar as penalidades máximas de cada autoridade, o RDE dispôs o conteúdo do
artigo 40 do Anexo III, que explicita um quadro de punições máximas que cada
uma das autoridades definidas nos incisos I, II e § 1º do artigo 10 pode aplicar.
O Comandante do Exército, como autoridade máxima da Força
Terrestre, “na área de sua competência, poderá aplicar toda e
qualquer punição disciplinar a que estão sujeitos os militares
na ativa ou na inatividade”.
Os atos disciplinares, como espécie de ato administrativo, podem conter vícios.
A autoridade militar, como qualquer agente administrativo, pode exercitar o
[pincípio da autotutela]. Assim, a punição pode ser anulada, relevada ou ate-
nuada pela mesma autoridade que a aplicou, nos termos do artigo 41.
A anulação de uma punição “deverá ocorrer quando for comprovado ter
havido injustiça ou ilegalidade na sua aplicação” e “produz efeitos retroativos
à data de aplicação da punição disciplinar” (artigo 42, caput, § 1º e §4º). Os
prazos para a anulação estão previstos no artigo 42, § 2º:
Princípio da autotutela: define a possibilidade do
agente administrativo anular seus próprios atos, quando são identificados vícios que
os tornem ilegais.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
81
§ 2º A anulação poderá ocorrer nos seguintes prazos:
I - em qualquer tempo e em qualquer circunstância, pelo
Comandante do Exército; ou
II - até cinco anos, a contar do término do cumprimento
da punição disciplinar, pela autoridade que a aplicou, nos
termos do art. 10 deste Regulamento, ou por autoridade
superior a esta, na cadeia de comando.
§ 3º Ocorrendo a anulação, durante o cumprimento de
punição disciplinar, será o punido posto em liberdade
imediatamente.
§ 4º A anulação produz efeitos retroativos à data de apli-
cação da punição disciplinar.
A anulação de uma punição produz efeitos administrati-
vos e estão regulados no artigo 43:
Art. 43. A anulação de punição disciplinar deve eliminar,
nas alterações do militar e na ficha disciplinar individual,
prevista no § 6º do art. 34 deste Regulamento, toda e
qualquer anotação ou registro referente à sua aplicação.
§ 1º A eliminação de anotação ou registro de punição
disciplinar anulada deverá ocorrer mediante substituição
da folha de alterações que o consubstancia, fazendo
constar no espaço correspondente o número e a data do
boletim que publicou a anulação, seguidos do nome e
rubrica da autoridade expedidora deste boletim.
§ 2º A autoridade que anular punição disciplinar comunica-
rá o ato ao Órgão de Direção Setorial de Pessoal do Exército.
A atenuação da punição disciplinar consiste na transformação
da punição proposta ou aplicada em outra menos rigorosa, se
assim recomendar o interesse da disciplina e da ação educativa
do punido, ou mesmo por critério de justiça, quando verificada
a inadequação da punição aplicada. A atenuação da punição dis-
ciplinar poderá ocorrer, a pedido ou de ofício, mediante decisão
das autoridades competentes para anulação (RDE, artigo 46).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
82
Após a aplicação da sanção, tem-se o seu cumprimento. O início deve se dar
por ocasião da publicação do Boletim Interno da OM e, só então, o “militar
deve ser recolhido ao local de cumprimento da punição disciplinar”. O termo
inicial da contagem do tempo de aplicação da punição, quando houver, se dá
a partir do momento do impedimento, da detenção ou recolhimento à prisão;
seu termo final ocorre quando o punido é posto em liberdade (artigo 47).
No caso da sanção ter sido imposta a um subordinado posto à disposição de
outra autoridade, o seu aplicador deve requisitar a essa autoridade “que deter-
mine o recolhimento do punido diretamente ao local designado” (artigo 49).
Quando a punição tiver sido imposta a um militar pronto para o serviço, não
haverá maiores dificuldades para a sua aplicação. Todavia, se o transgressor
se encontrar afastado totalmente do serviço, em caráter provisório, somente
poderá dar início ao cumprimento da sanção quando estiver pronto em sua
OM. Excetua-se o cumprimento imediato da punição quando envolver a tutela
da preservação da disciplina e do decoro da classe, quando a publicação da
nota de punição ocorrerá, “tão logo seja possível” (§1 º do artigo 49). Os casos
de punição aplicada a militares afastados temporariamente estão regrados nos
parágrafos 2º - 6º do artigo 49:
§ 2º A Licença Especial - LE, e a Licença para Tratar
de Interesse Particular - LTIP, serão interrompidas
para cumprimento de punição disciplinar de detenção ou
prisão disciplinar.
§ 3º A interrupção ou o adiamento de LE, LTIP ou puni-
ção disciplinar é atribuição do comandante do punido,
cabendo-lhe fixar as datas de seu início e término.
§ 4º Quando a punição disciplinar anteceder a entrada
em gozo de LE ou LTIP e o seu cumprimento estender-
-se além da data prevista para início da licença, fica esta
adiada até que o transgressor seja colocado em liberdade.
§ 5º O cumprimento de punição disciplinar imposta a
militar em gozo de Licença para Tratamento de Saúde
Própria (LTSP) ou Licença para Tratamento de Saúde de
Pessoa da Família (LTSPF) somente ocorrerá após a sua
apresentação por término de licença.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
83
§ 6º Comprovada a necessidade de LTSP, LTSPF, baixa a
enfermaria ou a hospital, ou afastamento inadiável da
organização, por parte do militar cumprindo punição dis-
ciplinar de impedimento, detenção ou prisão disciplinar,
será esta sustada pelo seu comandante, até que cesse a
causa da interrupção (grifo nosso).
O RDE, ao regulamentar o cumprimento da sanção no artigo 50, determinou
que o início da suspensão da contagem do tempo de cumprimento da punição
disciplinar ocorra no momento em que o punido for retirado do local do cum-
primento da punição disciplinar e termine no retorno a esse mesmo local.
7.3 DO COMPORTAMENTO MILITAR
Os regulamentos militares admitem, desde há muito, que o comportamento
militar da praça inclui o seu procedimento civil e militar sob o ponto de vista
disciplinar.
A análise da “pessoa do transgressor”, segundo o artigo 16 do RDE, expressa
um primeiro e importante indicador do perfil da praça. Esse é, portanto, um
dos elementos que, obrigatoriamente, deve a autoridade se socorrer quando
do julgamento de uma transgressão. O comportamento da praça pode ser
considerado, conforme o caso, em circunstância atenuante ou agravante de
uma transgressão.
O comportamento militar da praça deve levar em conta a gravidade de trans-
gressões ou crimes cometidos em um lapso de tempo. Dentro do período
estabelecido pelo Regulamento deve-se verificar a existência ou inexistência de
cometimento de transgressões ou crimes para a sua classificação.
O comportamento militar da praça pode ser excepcional, ótimo, bom, insufi-
ciente e mau. De acordo com o artigo 51 do RDE, a classificação e os parâme-
tros estabelecidos com relação a cada um são:
I - excepcional:
a) quando no período de nove anos de efetivo serviço,
mantendo os comportamentos “bom”, ou “ótimo”, não
tenha sofrido qualquer punição disciplinar;
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
84
b) quando, tendo sido condenada por crime culpo-
so, após transitada em julgado a sentença, passe
dez anos de efetivo serviço sem sofrer qualquer
punição disciplinar, mesmo que lhe tenha sido con-
cedida a reabilitação judicial, em cujo período somente
serão computados os anos em que a praça estiver classifi-
cada nos comportamentos “bom” ou “ótimo”; e
c) quando, tendo sido condenada por crime doloso,
após transitada em julgado a sentença, passe doze
anos de efetivo serviço sem sofrer qualquer puni-
ção disciplinar, mesmo que lhe tenha sido concedida a
reabilitação judicial. Neste período somente serão compu-
tados os anos em que a praça estiver classificada nos
comportamentos “bom” ou “ótimo” (grifo nosso).
II - ótimo:
a) quando, no período de cinco anos de efetivo serviço,
contados a partir do comportamento “bom”, tenha sido
punida com a pena de até uma detenção disciplinar;
b) quando, tendo sido condenada por crime culposo, após
transitada em julgado a sentença, passe seis anos de efeti-
vo serviço, punida, no máximo, com uma detenção discipli-
nar, contados a partir do comportamento “bom”, mesmo
que lhe tenha sido concedida a reabilitação judicial; e
c) quando, tendo sido condenada por crime doloso, após
transitada em julgado a sentença, passe oito anos de
efetivo serviço, punida, no máximo, com uma detenção
disciplinar, contados a partir do comportamento “bom”,
mesmo que lhe tenha sido concedida a reabilitação judi-
cial (grifo nosso).
III - bom:
a) quando, no período de dois anos de efetivo serviço,
tenha sido punida com a pena de até duas prisões disci-
plinares; e
b) quando, tendo sido condenada criminalmente, após
transitada em julgado a sentença, houver cumprido os
prazos previstos para a melhoria de comportamento de
que trata o § 7º deste artigo, mesmo que lhe tenha sido
concedida a reabilitação judicial.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
85
IV - insuficiente:
a) quando, no período de um ano de efetivo serviço, te-
nha sido punida com duas prisões disciplinares ou, ainda,
quando no período de dois anos tenha sido punida com
mais de duas prisões disciplinares; e
b) quando, tendo sido condenada criminalmente, após
transitada em julgado a sentença, houver cumprido os
prazos previstos para a melhoria de comportamento de
que trata o § 7º deste artigo, mesmo que lhe tenha sido
concedida a reabilitação judicial.
V - mau:
a) quando, no período de um ano de efetivo serviço te-
nha sido punida com mais de duas prisões disciplinares; e
b) quando condenada por crime culposo ou doloso, a
contar do trânsito em julgado da sentença ou acórdão,
até que satisfaça as condições para a mudança de com-
portamento de que trata o § 7º deste artigo (grifo nosso).
A classificação, reclassificação e melhoria de comportamento
são de competência das autoridades discriminadas no artigo
10, I e II (artigo 51, § 2º).
Para a mensuração do comportamento e tendo em vista que se pode imputar
penas variadas, mais de uma das espécies que o R4 prevê, houve por bem, o
decreto, estabelecer equivalências entre elas:
Art. 51. [...].
........................................................................................
§ 4º Para os efeitos deste artigo, é estabelecida a seguinte
equivalência de punição:
I - uma prisão disciplinar equipara-se a duas detenções
disciplinares; e
II - uma detenção disciplinar equivale a duas repreensões.
Ainda, para fins de classificação de comportamento, a condenação por contra-
venção penal equipara-se à prisão (artigo 51, § 10).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
86
A praça pode ter seu comportamento reclassificado, por ter melhorado,
conforme a progressão estabelecida pelo § 7º:
Art. 51. [...].
........................................................................................
§ 7º A melhoria de comportamento é progressiva,
devendo observar o disposto no art. 63 deste Regulamen-
to e obedecer aos seguintes prazos e condições:
I - do “mau” para o “insuficiente”:
a) punição disciplinar: dois anos de efetivo serviço, sem
punição;
b) crime culposo: dois anos e seis meses de efetivo servi-
ço, sem punição; e
c) crime doloso: três anos de efetivo serviço, sem punição.
II - do “insuficiente” para o “bom”:
a) punição disciplinar: um ano de efetivo serviço sem pu-
nição, contado a partir do comportamento “insuficiente”;
b) crime culposo: dois anos de efetivo serviço sem puni-
ção, contados a partir do comportamento “insuficiente”;
c) crime doloso: três anos de efetivo serviço sem punição,
contados a partir do comportamento “insuficiente”.
III - do “bom” para o “ótimo”, deverá ser observada a
prescrição constante do inciso II do § 1º deste artigo; e
IV - do “ótimo” para o “excepcional”, deverá ser
observada a prescrição constante do inciso I do § 1º deste
artigo (grifo nosso).
Atingidos os requisitos objetivos da reclassificação, ela se dará mediante requeri-
mento do interessado, conforme os termos dos incisos I e II do § 8º, do artigo 51.
Toda vez que um comportamento tiver sido reclassificado, deve
haver a publicação correspondente em boletim interno, por
meio de “nota de reclassificação”, cuja eficácia “dar-se-á na
data da publicação do despacho da autoridade responsável”
(parágrafos 8º e 9º).
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
87
7.4 RECURSOS E RECOMPENSAS
A verticalização da organização da Força Terrestre, própria e imprescindível à
sua missão constitucional, não impede que “aquele que se julgue, ou julgue um
subordinado seu, prejudicado, ofendido ou injustiçado por superior hierárquico
tenha o direito de recorrer na esfera disciplinar”. O RDE admite duas espécies
de recursos: pedido de reconsideração de ato e recurso disciplinar (artigo 52)
e a eles a tramitação deve ser objeto de urgência (§ único do artigo 57).
O pedido de reconsideração de ato deve ser endereçado à autoridade que
primeiro proferiu a decisão contra a qual se [irresigna] aquele que a requer. Se
esta autoridade for o Comandante do Exército, a ele deve ser encaminhado o
pedido (artigo 53, § 1º).
O prazo para que se requeira tal pedido é de cinco dias úteis, contados “a par-
tir do dia imediato ao que tomar conhecimento, oficialmente, da publicação
da decisão da autoridade em boletim interno, para requerer a reconsideração
de ato”. Já o prazo para que a autoridade destinatária decida é de dez dias,
“iniciado a partir do dia imediato ao do seu protocolo na OM de destino”, cujo
conteúdo deve ser publicado em boletim interno (artigo 53, §§ 2º - 4º §).
No caso de indeferimento do pedido de reconsideração de ato cabe requeri-
mento do recurso disciplinar à autoridade imediatamente superior que o
[denegou], conforme previsão do artigo 54. O prazo para tanto é de cinco
dias, contados a partir do dia imediato à tomada de conhecimento da decisão
oficial recorrida. Além do requerimento do recurso disciplinar, o § 3º do artigo
54 detalha que o recurso disciplinar deverá:
I - ser feito individualmente;
II - tratar de caso específico;
III - cingir-se aos fatos que o motivaram; e
IV- fundamentar-se em argumentos, provas ou documen-
tos comprobatórios e elucidativos.
De acordo com o §5º do artigo 54, a autoridade a quem for dirigido o recurso
(a que estiver imediatamente subordinado o requerente) tem “três dias úteis a
contar do dia seguinte ao do seu protocolo na OM” para dar o seu encaminha-
mento. Além disso, ela não pode deixar de encaminhá-lo sob o pretexto de:
Irresignar: significa não se conformar.
Denegar: negar; dizer que não é verdade; recusar.
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
88
§ 4º [...]:
I - não atendimento a formalidades previstas em instru-
ções baixadas pelo Comandante do Exército; e
II - inobservância dos incisos II, III e IV do § 3º.
A autoridade a quem cabe solucionar o recurso tem o “prazo máximo de
dez dias úteis a contar do dia seguinte ao do seu recebimento no protocolo,
procedendo ou mandando proceder às averiguações necessárias para decidir a
questão”. A decisão sobre o recurso deve ser publicada por boletim da OM
(§ 5º, artigo 54).
Caso o recurso seja julgado procedente, a sanção será anulada com todas as
consequências desta nulidade; se apenas em parte for procedente, “a punição
aplicada poderá ser atenuada, cancelada em caráter excepcional ou relevada”
(artigo 55). Se o recurso disciplinar contrariar as prescrições constantes do R4
será considerado prejudicado e mandado arquivar (artigo 57, caput).
Se houver necessidade, com o objetivo de preservar a hierarquia e a disciplina,
de o requerente ser afastado da subordinação direta daquele contra quem
requereu o recurso, isso deverá ser feito em conformidade com o artigo 56:
Art. 56. O militar que requerer reconsideração de ato, se
necessário para preservação da hierarquia e disciplina,
poderá ser afastado da subordinação direta da autorida-
de contra quem formulou o recurso disciplinar, até que
seja ele julgado.
§ 1º O militar de que trata o caput permanecerá na
guarnição onde serve, salvo a existência de fato que nela
contraindique sua permanência.
§ 2º O afastamento será efetivado pela autoridade
imediatamente superior à recorrida, mediante solicitação
desta ou do militar recorrente.
O Regulamento Disciplinar do Exército (R-4) vigente foi estabe-
lecido pelo Decreto nº 4.346, de 26 de agosto de 2002, e está
disponível no link: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decre-
to/2002/D4346.htm>.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
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Após terem sido estudados a transgressão disciplinar, seu julgamento, a sanção
disciplinar e os recursos cabíveis, o RDE regula o cancelamento de Registro de
Punições, com previsão no artigo 58 e seguintes. Seu pedido, assim como a so-
lução que lhe for dada, deverá ser objeto de publicação em boletim interno da
OM (artigo 60). Ao requerimento de cancelamento deve ser juntada a folha de
alterações que contenha a punição ou o registro por cancelar (artigo 62). Seus
requisitos de concessão, mediante requerimento, estão previstos no artigo 59:
Art. 59. O cancelamento dos registros de punição
disciplinar pode ser concedido ao militar que o requerer,
desde que satisfaça a todas as condições abaixo:
I - não ser a transgressão, objeto da punição, atentatória à
honra pessoal, ao pundonor militar ou ao decoro da classe;
II - ter o requerente bons serviços prestados, comprova-
dos pela análise de suas alterações;
III - ter o requerente conceito favorável de seu comandante; e
IV - ter o requerente completado, sem qualquer punição:
a. seis anos de efetivo serviço, a contar do cumprimen-
to da punição de prisão disciplinar a cancelar; e
b. quatro anos de efetivo serviço, a contar do cum-
primento da punição de repreensão ou detenção
disciplinar a cancelar.
O comportamento da praça poderá sofrer alterações como consequência do
cancelamento da punição, cujas contagens de prazos se darão conforme o
artigo 63:
Art. 63. As contagens dos prazos estipulados para a
mudança de comportamento e o cancelamento de regis-
tros começa a partir da data:
I - da publicação, nos casos de repreensão; e
II - do cumprimento do último dia de cada detenção disci-
plinar, prisão disciplinar, ou pena criminal, a ser cancelada.
O seu deferimento é atribuição da mesma autoridade que tem competência para
anular e na medida em que foi efetivado o cancelamento, deve-se informar o
Órgão de Direção Setorial de Pessoal do EB. Os efeitos do cancelamento se darão
para o futuro, não retroagindo. Quando as punições se referirem àquelas sofri-
das em estabelecimento de ensino escolar, por ocasião da conclusão do curso e
a critério do seu comandante, seu cancelamento pode se dar ex officio ou inde-
pendente de tempo decorrido sem punição (parágrafos 1º e 5º do artigo 59).
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
90
Quando o cancelamento se referir a registros criminais:
Art. 59. [...].
§ 6º O cancelamento dos registros criminais será efetua-
do mediante a apresentação da competente reabilitação
judicial:
I - ao Comandante da OM, quando se tratar de crime
culposo; ou
II - ao comando enquadrante da OM, exercido por oficial-
-general, quando se tratar de crime doloso.
O cancelamento do impedimento se dá “independentemente de requerimento,
decorridos dois anos de sua aplicação”; o cancelamento da advertência, por
ser verbal, prescinde de requerimento, ocorrido após um ano de sua aplicação
(parágrafos 7º e 8º do artigo 59).
A delegação de competência para cancelar punições, por vedação normativa,
é vedada, como se infere do § 9º do artigo 59. Ao Comandante do Exército,
ao seu turno, nos termos do artigo 61, é atribuída a competência de “cancelar
um ou todos os registros de punições disciplinares de militares sujeitos a este
Regulamento, independentemente das condições enunciadas no artigo 59
deste Regulamento”.
Nem só de sanções disciplinares vive uma Força Armada. O exercício da lide-
rança e a disciplina, parte do perfil do soldado brasileiro, fazem com que seja
objeto, também, de recompensas. Duarte (1998, p. 86) assim as define:
Como forma de reconhecimento pelos serviços prestados
pelo servidor militar, são previstas várias recompensas,
entre as quais, os prêmios de Honra ao Mérito, as con-
decorações por serviços prestados na paz e na guerra,
os elogios, louvores e referências elogiosas, além das
dispensas de serviço.
As recompensas constituem importante instrumento de [emulação] à tropa e
àqueles militares que se destacam, favoravelmente. Um bom comandante sabe
utilizá-las judiciosamente. O RDE se refere às competências no caput do artigo
64, dizendo que “constituem reconhecimento aos bons serviços prestados
por militares”. Os incisos I e II do parágrafo único deste mesmo artigo listam
duas de suas modalidades – “I - o elogio e a referência elogiosa” e “II - as
dispensas do serviço” – além de referir existirem outras.
Emulação: motivação.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
91
O elogio é individual e “somente deverá ser formulado a militares que se
tenham destacado em ação meritória ou quando regulado em legislação espe-
cífica”. A referência elogiosa, por outro lado, pode ser individual ou coletiva.
Quando tais recompensas se tratarem de fatos que as motivaram devem “pre-
cisar a atuação do militar em linguagem sucinta, sóbria, sem generalizações
e adjetivações desprovidas de real significado, como convém ao estilo cas-
trense”. Devem ser publicadas em boletim da OM, respeitada a publicação no
da autoridade a que estiver subordinado, se não dispuser de boletim interno
(artigo 68) e registrados nos assentamentos dos militares.
As mesmas autoridades que têm a competência para punir, vide
artigo 10 do RDE, a têm para conceder recompensas (artigo 6º).
No que se referem às concessões de dispensa do serviço, de acordo com o
artigo 66, podem ser:
I - dispensa total do serviço, que isenta o militar de todos
os trabalhos da OM, inclusive os de instrução; ou
II - dispensa parcial do serviço, quando isenta de alguns
trabalhos, que devem ser especificados na concessão.
O artigo 67 estabelece que “a concessão de dispensa do serviço, como recom-
pensa, no decorrer de um ano civil, deve obedecer à seguinte gradação”:
I - o Chefe do Estado-Maior do Exército, os chefes dos
órgãos de direção setorial e de assessoramento e os co-
mandantes militares de área: até vinte dias, consecutivos
ou não;
II - os oficiais-generais, exceto os especificados no inciso I,
e demais militares que exerçam funções de oficiais-gene-
rais: até quinze dias, consecutivos ou não;
III - o chefe de estado-maior, o chefe de gabinete, o co-
mandante de unidade, os comandantes das demais OM
com autonomia administrativa e os daquelas cujos cargos
sejam privativos de oficial superior: até oito dias, consecu-
tivos ou não; e
IV - as demais autoridades competentes para aplicar pu-
nições: até quatro dias, consecutivos ou não.
Para que a dispensa total do serviço possa ser gozada fora da guarnição, deve ser seme-lhante à concessão de férias, quanto às normas de afasta-mento da guarnição. Seu pe-ríodo de concessão é de 24 horas, iniciada a contagem de boletim a boletim, devendo ser antecedida sua publica-ção, em regra, de pelo menos 24 horas antes do seu termo inicial, salvo motivo de força maior (parágrafos 1º e 2º do artigo 66).
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§ 1º A competência de que trata este artigo não vai além
dos subordinados que se acham inteiramente sob a juris-
dição da autoridade que conceda a recompensa.
§ 2º O Comandante do Exército tem competência para
conceder dispensa do serviço aos militares do Exército,
como recompensa, até o máximo de trinta dias, consecu-
tivos ou não, por ano civil.
7.5 DAS DISPOSIÇõES FINAIS
O Capítulo VI – Das Disposições Finais – apresenta as determinações finais
deste decreto, aludindo que:
• Os CJ e CD devem obedecer à legislação específica (artigo 70);
• “As autoridades com competência para aplicar punições, julgar recursos
ou conceder recompensas, devem difundir prontamente a informação
dos seus atos aos órgãos interessados, considerando as normas, os pra-
zos estabelecidos e os reflexos que tais atos têm na situação e acesso do
pessoal militar” (artigo 71);
• O Comandante do Exército está autorizado a complementar o conteúdo
do presente decreto com instruções que entender necessárias (artigo 72);
• O decreto apresentava um interregno de sessenta dias após a publicação
para a sua entrada em vigor e revogava as normas que conflitavam com
o mesmo.
7.6 ANExOS AO RDE
O RDE possui anexos com importância fundamental para a padronização dos
procedimentos e documentação de interesse da aplicação do RDE. A seguir,
relacionamos e descrevemos alguns deles.
Anexo I: Relação de Transgressões
O Anexo I tipifica 113 (centro e treze) transgressões disciplinares que, somadas
à honra pessoal, ao pundonor militar e ao decoro da classe (incisos I, II e III do
artigo 6º), configuram as lesões aos deveres de hierarquia e disciplina militares.
Os incisos i e ii do artigo 10 e o artigo 68 preveem que as recompensas, mediante pu-blicação em boletim no prazo de quatro dias úteis, também podem sofrer anulações, res-trições ou ampliações. a com-petência para tal é a mesma de quem as concede, ou seja, a de quem pode impor sanções.
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93
Anexo II: Modelo de Nota de Punição
O anexo II apresenta modelos de notas de punição para facilitar e padronizar
tais publicações.
Anexo III: Quadro de Punições Máximas, referidas no artigo 40, que
podem aplicar as autoridades definidas nos itens I, II e § 1º do artigo
10 e a que estão sujeitos os transgressores
No Anexo III estão estampadas as competências das autoridades para apli-
car as sanções disciplinares. Constitui-se em um quadro de dupla entrada: à
esquerda, os postos e graduações dos militares a serem punidos; acima, as
autoridades que podem sancionar disciplinarmente e seus limites; o seu cruza-
mento estabelece os limites das punições.
Anexo IV: Instruções para Padronização do Contraditório e da Ampla
Defesa nas Transgressões Disciplinares
O anexo regula “no âmbito do Exército Brasileiro, os procedimentos para
padronizar a concessão do contraditório e da ampla defesa nas transgressões
disciplinares”. Tem como objetivos: “a) Regular as normas para padronizar a
concessão do contraditório e da ampla defesa nas transgressões disciplinares;
b) Auxiliar a autoridade competente na tomada de decisão referente à aplica-
ção de punição disciplinar”.
O procedimento a ser seguido pela autoridade é o do item “4. Do Procedimen-
to”, do Anexo IV, do RDE, como se segue:
a) Recebida e processada a parte, será entregue o For-
mulário de Apuração de Transgressão Disciplinar
ao militar arrolado como autor do(s) fato(s) que aporá o
seu ciente na 1ª via e permanecerá com a 2ª via, tendo,
a partir de então, três dias úteis, para apresentar, por
escrito (de próprio punho ou impresso) e assinado, suas
alegações de defesa, no verso do formulário;
b) Em caráter excepcional, sem comprometer a eficácia e
a oportunidade da ação disciplinar, o prazo para apre-
sentar as alegações de defesa poderá ser prorrogado,
justificadamente, pelo período que se fizer necessário, a
critério da autoridade competente, podendo ser conce-
dido, ainda, pela mesma autoridade, prazo para que o
Curso de Habilitação ao Quadro auxiliar de ofiCiais
94
interessado possa produzir as provas que julgar necessá-
rias à sua defesa.
c) Caso não deseje apresentar defesa, o militar deverá
manifestar esta intenção, de próprio punho, no verso do
Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar.
d) Se o militar não apresentar, dentro do prazo, as razões
de defesa e não manifestar a renúncia à apresentação da
defesa, nos termos do item c, a autoridade que estiver
conduzindo a apuração do fato certificará no Formulário
de Apuração de Transgressão Disciplinar, juntamente
com duas testemunhas, que o prazo para apresentação de
defesa foi concedido, mas o militar permaneceu inerte.
e) Cumpridas as etapas anteriores, a autoridade compe-
tente para aplicar a punição emitirá conclusão escrita,
quanto à procedência ou não das acusações e das alega-
ções de defesa, que subsidiará a análise para o julgamen-
to da transgressão.
f) Finalizando, a autoridade competente para aplicar a
punição emitirá a decisão, encerrando o processo de
apuração (grifos nossos).
Certamente, o militar a quem se imputa uma transgressão e que está sendo
objeto de apuração, pode fazer-se acompanhar de advogado.
A forma, requisito deste ato administrativo, está estabelecida no item “5. Forma
e da Escrituração”. O processo se inicia “com o recebimento da comunicação
da ocorrência” e é processado pelo comando que detém a competência para
apurar e punir o transgressor. O Formulário de Apuração de Transgressão Disci-
plinar é preenchido, sem emendas ou rasuras. Quaisquer textos a serem escritos
de próprio punho devem ser feitos “com tinta azul ou preta e em letra legível”.
O militar arrolado como autor deve ser identificado adequadamente através de
seu “grau hierárquico, nome completo, seu número (se for o caso), identidade,
subunidade ou organização em que serve, etc.”.
Há ainda, neste procedimento, a necessidade da descrição precisa, detalhada,
mas ao mesmo tempo, sucinta, do fato ou dos fatos que estão sendo imputa-
dos ao suposto transgressor, sob pena de macular a efetividade do contraditó-
rio e ampla defesa. De fato, não se pode negar a sumariedade deste processo
administrativo disciplinar (FATD), todavia, esse aspecto não pode afrontar a
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referida garantia constitucional. Portanto, a autoridade competente deve, ao
preencher o relato do fato, por prudência, relembrar o ensinamento contido
no artigo 12, §1º do RDE, no tocante à clareza, precisão e concisão. Obvia-
mente, não se falará em testemunhas, descrição de bens e valores, mas o local,
data e hora, bem como circunstâncias relevantes que envolverem os fatos
devem ser registrados.
Nessa altura, o alegado transgressor tem o direito de apresentar suas justifica-
tivas ou razões de defesa no verso do Formulário de Apuração de Transgressão
Disciplinar, no espaço intitulado de “Justificativas/Razões de Defesa, acostando,
se assim o desejar, outras provas que entender cabíveis.
Aqui, admite-se, inclusive, a possibilidade de sobrestamento do Formulário e
instauração de sindicância, caso seja necessária a dilação probatória, até então
indesejada no procedimento.
O militar, então, é ouvido pela autoridade competente, que passa a julgar com
base nas provas constantes do processo. Em seguida, lavra sua decisão de pró-
prio punho. O Formulário, ao final, deverá ter registrado o número do boletim
interno que publicou a decisão.
Anexo V: Modelo do Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar
No modelo do formulário estão presentes os itens que devem constar no
documento:
• Encimando o documento, o brasão do EB com a identificação do esca-
lão considerado e aquele a quem está subordinado;
• Nº do processo e data;
• Identificação do militar;
• Identificação do participante;
• O relato do fato;
• O ciente do militar arrolado;
• As Justificativas/Razões de Defesa;
• A decisão da autoridade competente para aplicar a punição;
• O fechamento do documento.
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Anexo VI: Ficha Disciplinar Individual
A ficha contém:
• A identificação do militar;
• As relações de punições disciplinares sofridas pelo militar;
• As anulações ou cancelamentos de punições;
• Os recursos disciplinares;
• As recompensas;
• As prescrições diversas, com a orientação da cor da tinta e a recomenda-
ção que a ficha acompanha.
FUNDAMENTOS DO DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - U2
97
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