Farpas do Coração completo

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Farpas do Corao Apresentao. Prefcio. NDICE GERAL: 1. Opo preferencial de moradia 2. Recordaes familiares 3. Jogos de lazer nos perodos de frias. 4. Coco: O saudoso amigo trapalho. 5. O episdio Z da Boa Vereda. 6. Outras recordaes das divertidas frias. 7. A casa paterna. 8. Perdas de entes queridos enlutam a famlia. 9. Amor e Poesia so faces da mesma moeda. 10. Rancores da Poltica de outrora. 11. A grande epopia religiosa dos bordamatenses. 12. Figuras folclricas bordamatenses. 13. O Carnaval de Borda o melhor que h.... 14. Poo: piscina improvisada A Morofaia

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15. Do poo ao Clube de Campo Tiradentes. 16. Frango no Mato. 17. Passeios na fazenda dos tios Jordino e Vidoca. 18. Estudos primrios no Colgio Nossa Senhora do Carmo. 19. O Santo Cruzeiro no Antigo Buraco. 20. Adolescncia: dificuldades nos estudos e orientaes dos pais. 21. Curiosidades da personalidade paterna. 22. A encomenda. 23. A Cura. 24. O engraxate. 25. Tempos de Internato no Colgio So Jos. 26. O mestre Agostinho do Simeo. 27. Tempos de coroinha da velha matriz. 28. Amrica Futebol Clube: o melhor time da regio. 29. O teatro bordamatense em dias de glria. 30. Festas familiares O cantor e o poeta da famlia. 31. O ET de Borda da Mata

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32. Juiz de Fora: Penso da Dona Juracy Servio Militar e Curso de Direito. . 33. Advocacia, Noivado e Casamento. 34. Posse na Carreira de Promotor de Justia. 35. Cursilho de Cristandade da Diocese de Taubat 36. Promoes para Cruzeiro e Mogi da Cruzes. 37. Atividades de Professor Universitrio. 38. Atuao como Presidente da APAC. 39. Topo da Carreira: Procuradoria de Justia. 40. Do sonho realidade. 41. Fatos curiosos colhidos na Promotoria de Justia Apetite Sexual sem medidas 42. Direito e Justia 43. Vocao jurdica: uma constante familiar. 44. Aposentadoria e volta para a terra natal. 45. Advocacia e presidncia da Subseo da OAB/MG 46. O que ser advogado? 47. Trabalho voluntrio na Guarda Mirim.

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48. Direo do jornal A Cidade 49. LIONS CLUBE de Borda da Mata. 50. A chegada dos netos. 51. A lio poltica que Borda deu ao Brasil. Palavras finais. APRESENTAO Dentre tantos outros momentos especiais em minha vida, este um dos mais caros. sempre gratificante percebermos que mais um objetivo foi alcanado. Tambm muito bom deixarmos gravadas, para sempre, experincias vividas. Por isso, sinto intensa felicidade a inundar o meu ser e quero expressar a alegria de ter concludo minhas Farpas do Corao. Considero-me um homem privilegiado por vrios motivos. Sou grato a Deus pelo dom da vida e pelo que pude realizar at hoje! Grato, sobretudo, pela graa dos pais que me concedeu. Criaturas maravilhosas que me forjaram o carter, me ensinaram a ter f, amar e querer bem a todos sem distino! Grato pelos irmos dignos e preciosos que me enchem de orgulho e admirao! Grato pela esposa, filhos, netos, genro e nora, famlia bendita, que consegui formar e me sentir realizado pela vivncia de amor! Grato pela satisfao de, ao longo da vida, ter convivido com tantos parentes e amigos, verdadeiros e leais! Grato, porque a despeito de limitaes e falhas prprias do ser humano, consegui superar obstculos, realizar sonhos e ideais, sempre ao lado daqueles que amo! A felicidade, como sabido, se resume em amar. Amar, filosoficamente, querer o bem dos outros. Quem planta colhe;

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assim quem sabe amar recebe amor em troca. E sentir-se amado o segredo para ser feliz. Orgulho-me de dizer que me sinto amado, porque tambm amo intensamente. Por isso, sou muito feliz. O amor uma fonte inesgotvel de querer bem. No meu livro Reflexes, abordei muito o velho tema, analisando esse sentimento divino que a motivao da vida. Orgulho-me tambm de ser o autor do pensamento, citado naquela obra, que, ouso dizer, sintetiza esse tema inesgotvel: O amor a moeda, de valor mais elevado e que nunca sofre queda, por mais que se gaste no mercado. Quanto mais se ama, mais amor se tem para dar. A moeda do amor no se esgota, por mais que se gaste no convvio humano. No diminui; muito pelo contrrio, se multiplica. Como no milagre dos dois pes e cinco peixes, ainda sobraro doze cestos de carinho no corao para distribuir aos que no tm amor. Falando em corao, a razo do ttulo deste singelo opsculo o desejo de abri-lo e expressar os sentimentos que habitam meu mago. Como sabem, corao s se abre por dentro e, se decidi escancar-lo, foi para saciar a vontade imensa de falar de tantas coisas vividas que foram marcantes para mim e, por isso, ficaram bem guardadas na memria. Espero que essa deciso no venha a caracterizar abuso pacincia dos que me honrarem com sua leitura. Acredito que essas farpas possam ser teis a muitos, porque so idias, situaes do cotidiano da vida e fatos comuns s existncias daqueles que constituram famlia e procuram lutar por um mundo melhor. Para prefaciar este meu segundo livro, escolhi o amigo, bancrio e escritor, Fernando Fidelis Vasconcelos. Nasceu em Pirassununga/SP, cidade que conheceu aps sua mudana para Borda da Mata. Foi criado no Vale do Ao, em Coronel

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Fabriciano/MG e viveu a maior parte de sua vida adulta em Belo Horizonte, onde conheceu sua esposa Tnia Cristina Bretz Vasconcelos. pai de Felipe, Lucas e Tamires, todos nascidos na capital mineira. Viveu alguns anos nos Estados Unidos, foi empresrio e diretor de empresas, escreveu o livro CLARA A Histria de Uma Vida, obra indita que conta a saga de uma mulher e seu algoz, que dedicaram as vidas aos necessitados. gerente da Caixa Econmica Federal, desde 2007 em Borda da Mata, onde se instalou com a famlia e pretende viver, tendo comprado o imvel residencial de Jos Amadeu Bertolaccini. Estudou Cincias Econmicas nos anos 80, na PUC de So Paulo. atualmente estudante de Processos Gerenciais e Gesto Empresarial na Fundao Getlio Vargas em So Paulo e considera-se eterno aprendiz. Fernando um homem simples, fidalgo e amigo, sempre atencioso e educado. Um verdadeiro gentleman. Obrigado Fernando, por ter atendido ao meu convite. Obrigado pelos seus elogios e generosidade de seus comentrios, prefaciando esta obra. Sua participao enriquece e honra este trabalho. PREFCIO: AMOROSAS FARPAS Integridade, paixo pelo Direito e pela tica, alta Conscincia Moral so imprescindveis ao exerccio da Promotoria de Justia. A lapidao ntima destas propriedades de carter a razo para se chegar Procuradoria de Justia. Hoje sou testemunha e vejo, com clareza, porque nosso autor galgou o topo da carreira do Ministrio Pblico de So Paulo. Segundo o Professor Severo Hryniewicz, da Fundao Getlio Vargas, Direito um conjunto de normas condicionadas pelo poder pblico, que se impem coercitivamente. Enquanto este implica obedincia ao que obrigatrio, a tica nos indica o caminho da felicidade. Como ser livre, o homem se aproxima de sua plenitude atravs de uma vida eticamente reta.

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Aristteles utilizou o termo ethik com o sentido de reflexo sobre as propriedades de carter. Assim, segundo o Professor Severo, perceber os valores morais, sentir o chamado do dever, ter a satisfao do dever cumprido, tm como ponto de referncia nossa conscincia moral. Como bancrio recm-chegado, no demorei a conhecer o Dr. Gustavo Dantas de Melo, o Dr. Gustavinho, como carinhosamente chamado pela populao da nossa querida Borda da Mata. Chamou-me a ateno aquele senhor com preocupaes no obrigatrias, no fosse seu carter, seu senso tico, sua conscincia moral. Poucos tomam o caminho do auxlio fraterno, pessoas muitssimo distintas da sociedade por ele se enredam, continuando a servio do prximo. Prova de probidade, honradez, decncia. Assim reconheo nosso autor e no poderia falar de sua obra, sem cit-lo em suas virtudes. Neste seu novo livro, alm de nas entrelinhas demonstrar suas virtudes pessoais, seu forte vnculo famlia e suas razes terra natal, nos proporciona conhecer histrias tpicas de sua cidade, resgatando momentos que certamente muitos nativos que nunca a deixaram se lembram mais. E a ns, estrangeiros que a adotamos, quer por sua singeleza, por sua simplicidade de valores perptuos, por seus habitantes felizes e sinceros amigos que nos abraam carinhosos, podemos mergulhar em sua histria, como nascidos e criados fssemos entre suas belas montanhas, sentindo-nos tambm filhos. Podemos viajar atravs de sua biografia caridosamente exposta, numa oportunidade de refletirmos acerca das nossas prprias, revendo valores, atitudes do passado, caminhos tomados. O amor filial, que tantas vezes testemunhamos faltar nos lares da modernidade, profusamente destacado nas pginas de Farpas do Corao. Amor famlia que formou e seu carinho me e ao pai, que tanta falta nos fazem e que somente damos conta ao busclos na memria, por sab-los recolhidos ao Seio Divino, na imensido da eternidade, onde nos reuniremos novamente quem sabe um dia!

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H que se destacar ainda, neste rebuscado de memrias do autor, seu senso de Filho de Deus, tantas vezes entrelinhado nestas agora compartilhadas recordaes. Senso este que, verificamos, repassado sua dedicada esposa, aos queridos e cantados filhos, gotas do amor de Deus confiados a sua herdada ternura. Um repassar de amores de avs a netos atravs deste homem que aprendemos a admirar. Suas farpas ainda nos permitem conhecer uma infncia saudvel e cheia de gozos, atravs de suas lembranas dos amigos, uns que j se foram, outros que permanecem presentes, mas todos ainda amigos. Quanta virtude e beleza a ser apreciada nesta obra! Parabns Senhor Agenor, parabns Dona Maria Dantas, pelo filho especial! Parabns Borda da Mata pelo filho ilustre! Borda da Mata, 15 de fevereiro de 2.009. Fernando Fidelis Vasconcelos 1. Opo preferencial de moradia Existem dois estilos de vida nas grandes e pequenas cidades. Difcil dizer qual deles o melhor. Depende da individualidade de cada pessoa. Talvez a preferncia venha a ser o resultado da vivncia peculiar a cada um de ns. A escolha sempre uma opo que se faz segundo critrios e valores de cunho estritamente particular. A grande cidade se caracteriza pelo anonimato. Como diz antigo ditado popular: Cada um para si e Deus para ns todos. Ningum conhece ningum. At o morador de um prdio de apartamentos muitas vezes ignora os seus vizinhos, exceto o sndico e o porteiro, por fora de suas profisses. Como ningum conhece ningum, a pessoa se sente menos policiada e, conseqentemente, imune maledicncia das lnguas

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soltas. Experimenta uma sensao de maior liberdade de suas aes. Isso muito bom e positivo, pois a liberdade um dos mais preciosos dons do ser humano. A outra face da moeda, porm, sombria e dolorosa, a priso em que, infelizmente, se transformou a grande cidade. A sensao de insegurana uma realidade decorrente da violncia assustadora e criminosa, prpria das metrpoles. A convivncia de medo e desconfiana. Por isso mesmo, se algum cai na rua, enfartado, corre o risco de no ser socorrido, em virtude do receio popular de que talvez seja alguma armadilha arquitetada por esperto bandido. Esse o lado mau e tristemente negativo! J a pequena cidade, como Borda da Mata, terra em que nasci, com aproximadamente 18.000 habitantes, se caracteriza pela pessoalidade e conhecimento prprio. Todos so chamados pelo nome e se sentem valorizados como algum considerado, ao invs de simples nmeros. Isso muito bom e faz bem ao ego! O sentido de unio acentuado pela convivncia das pessoas em torno de ideais comuns e campanhas participativas. At as dores e sofrimentos so amenizados pela solidariedade fraterna, como nos momentos difceis em que a enfermidade nos atormenta, ou quando perdemos algum ente querido. Da ser potico, mas, sobretudo, verdadeiro, o verso revelado pela sensibilidade do poeta que externou esse sentimento: Na terra natal, a prpria dor di menos.... Contudo, h que se reconhecer aspectos negativos, prprios da pequena comuna: o disse-me-disse, o falatrio dos detratores da honra alheia; o leva e traz daqueles que, sadicamente, sentem prazer em tecer comentrios maldosos a respeito de questes que no lhe dizem respeito; o veneno destilado pelos invejosos, que, incompetentes, sofrem com o sucesso dos empreendimentos alheios. Alguns cidados chegam a sofrer perseguies pelo simples fato de serem bem sucedidos. A inveja algo muito srio que faz cegar a muitos invejosos que insistem em no enxergar mritos e virtudes em quem os possui de sobra. Em sua mediocridade, no se conformam com o xito e valor dos outros.

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Os rancores polticos, ento, revelam personalidades mrbidas, que, infelizmente, vem como inimigos simples adversrios. Ofensas e ataques pessoais, gratuitos e absurdos, pelo simples fato de algum abraar idias e posies contrrias ao agressor. Como se a Democracia no assegurasse o direito liberdade de escolha dos partidos e candidatos! Como se a oposio no fosse necessria e imprescindvel defesa dos interesses da sociedade! Em qual desses tipos de cidade prefervel algum morar? A resposta estritamente pessoal e vai depender do tipo de vida de cada um, pois, cada cabea, cada sentena. Eu passei pela experincia dos dois modelos de convivncia e minha opo foi para a pequena cidade. Como algum j disse, e muito bem, ningum escolhe lugar para nascer, mas desde que possvel, creio que toda pessoa gostaria de escolher o lugar para viver. o meu caso. Embora goste muito da inesquecvel cidade de Mogi das Cruzes/SP, onde vivi boa parte de minha vida (16 anos), aps minha aposentadoria, decidi retornar para minha modesta terra natal, onde conheo praticamente a todos e a recproca verdadeira. Tenho adversrios, mas no inimigos; felizmente, incontvel o nmero dos meus amigos. Todo rosto me parece familiar e me sinto perfeitamente integrado em nossa comunidade paroquial e social. Por esse motivo, aqui minhas alegrias so sempre multiplicadas e as tristezas suavizadas. Borda da Mata, eu te amo! Em tuas terras, onde nasci e sou feliz, quero que um dia repousem os meus restos mortais! Este o desejo que peo a meus descendentes seja concretizado 2. Recordaes familiares . A vida de cada ser humano rica de experincias, pois nosso aprendizado jamais termina. Acompanha-nos at a morte. Em nossa memria alguns fatos, bons e maus, permanecem para sempre. Diramos so as marcas do que ficou dentro de nossos coraes. Alguns desses momentos de minha vida meu desejo deix-los aqui registrados para todo o sempre. O importante ressaltar que meu

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corao sempre esteve e continua cheio de amor. exatamente por amar e ser amado que me considero uma pessoa extremamente feliz e realizada. Como j enfatizado, acredito ser esta a chave da prpria felicidade humanamente possvel neste mundo. Nasci em Borda da Mata, em 03 de outubro de 1939. Sou descendente de duas grandes famlias: os Dantas e Melos. Foi da unio de Agenor de Melo e Maria Dantas de Melo que essas queridas famlias se entrelaaram e meus pais tiveram sete filhos: Narcy (o primognito) Mariinha, Zezinho, Waldir, Waldemar, Agenorzinho e mais a rapa do tacho, que sou eu, o caula. Meus genitores eram pessoas humildes e de cultura primria, mas conquistaram conhecimentos regulares, como autnticos autodidatas da escola da vida. Papai fez o primeiro grau, at a quarta srie; primeiro, l no Cervo, com o modesto Professor Jos Juca, que ensinou papai a redigir seu nome com J; JENOR, ao invs de AGENOR. Parece lorota, mas aconteceu, conforme ele prprio confessou em depoimento gravado por seu neto, Jos Lucas Bueno de Mello; mais tarde, teve aulas com o saudoso Professor Afonso Florenciano; depois foi para Muzambinho, mas fugiu da escola. Papai era bom na matemtica; sabia fazer contas de cabea como ningum, porque dominava a tabuada. Era comerciante nato. Tratava a todos com igualdade e tinha um corao bondoso e solidrio. Granjeou por isso grandes amizades. Mas foi, sobretudo, por sua honestidade que desfrutava da confiana de todos com quem se relacionava. Era adepto da filosofia de que a palavra do homem deve valer como escritura. Para ele, palavra empenhada era questo de honra e vergonha na cara. Da a minha inspirao no artigo A palavra est em crise, publicado no jornal A Cidade e que tambm faz parte do meu livro Reflexes. Essas qualidades de papai acabaram promovendo-o de comerciante de sunos, um dos maiores e mais conhecidos da nossa regio, em primeiro gerente da Minas Caixa de Borda da Mata, cargo que exerceu durante 17 anos, at sua aposentadoria compulsria.

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Mame no parecia ter concludo apenas o curso primrio. Tinha excelente redao, pois lia muito. Em certa ocasio, atendendo pedido de meu amigo, ainda estudante, Sidney Pires Ribeiro, ento balconista da Fera da Esquina, fez uma redao primorosa sobre o mar. Orgulhava-se ela de conseguir decifrar suas palavras cruzadas de nvel mdio, com relativa facilidade. Se ainda estivesse viva, apreciaria muito o show do milho de Slvio Santos, programa do SBT que alcanou grande sucesso. Com certeza, acertaria a maioria das perguntas, anotando aquelas que porventura no soubesse responder. Curiosa, pesquisava sempre at encontrar respostas para suas dvidas e incertezas. 3. JOGOS DE LAZER NOS PERODOS DE FRIAS Em nossas frias, muitas vezes tive a oportunidade de passar horas de lazer ao lado de minha me e de nossos irmos, sobrinhos e amigos, no jogo da descoberta de palavras em que os participantes as escreviam num papelzinho colocado por todos sobre a mesa. Em seguida, cada um na sua vez, escolhia uma vogal ou consoante, que eram anotadas numa folha com os nomes dos participantes. Assim, a palavra de 5 ou mais letras (conforme previamente combinado), aos poucos era identificada e as vogais e consoantes que nela no constavam, eram anotadas fora, na linha correspondente ao nome de cada jogador. Venceria aquele que ficasse com seu vocbulo no totalmente desvendado. Nesse jogo, somente poderiam ser usadas palavras simples e conhecidas, que constassem do dicionrio. Verbos somente no infinitivo. Palavras compostas e marcas de qualquer espcie estavam proibidas. Mame era uma parada dura nessa brincadeira. Costumava vencer e no gostava de ser derrotada. Certo dia em que jogvamos no alpendre da casa paterna, algo estranho acontecia. Nosso primo Jos Roberto da Silva (hoje meu compadre, filho dos saudosos e carssimos tios Messias e Luprcia), ento adolescente e principiante naquele jogo, curiosamente estava vencendo uma das partidas em que disputvamos palavras de 5 letras. Seria uma zebra grande

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demais e mame estava inconformada e furiosa mesmo, por adivinhar que Jos Roberto deveria estar aprontando. Mas s no final da disputa poder-se-ia constatar alguma irregularidade. Ningum estava conseguindo descobrir a misteriosa palavra que ele usara e, desse modo, Jos Roberto acabou vencendo. Todavia, aps a apurao com a abertura dos papis comprobatrios dos vocbulos dos participantes, depositados sobre a mesa (o que era de lei), confirmou-se a previso de mame: Jos Roberto colocara XABEM; na poca, seria uma marca de ch. Alm da violao das regras, pelo fato de ser proibido o uso de marca de produto, o infrator grafou xa com x. Resultado: meu compadre foi banido do jogo e quase apanhou da turma. Sua vitria foi anulada pelo equvoco e mame, segunda colocada, acabou sendo a vencedora, abrindo mais um grande sorriso. Alm desse divertido episdio, outro fato sucedido ainda no jogo de palavras foi no menos marcante. Participava da brincadeira o querido primo Tato, filho dos meus saudosos tios, Marcelo e Vidinha, moradores da casa ao lado da nossa. Tato, um ano mais novo, foi meu contemporneo dos tempos do Colgio So Jos de Pouso Alegre e tambm meu colega da famosa Turma do 49, que viveu na penso de Dona Juracy, na Rua Padre Matias, bairro da Glria, Juiz de Fora/MG, poca memorvel em que fizemos nossos cursos universitrios; ele Odontologia e eu, Direito, juntamente com meu mano Agenorzinho. Alm disso, Tato, hoje profissional bem sucedido e ainda funcionrio pblico municipal aposentado, casado com a prendada Slvia Brando, mais conhecida por Quiba, meu compadre (padrinho de minha filha primognita Regina) e meu particular amigo. O casal fantstico e em seu lar, osis de bondade, atualmente costumamos passar horas agradveis de lazer, jogando bilhar, ocasio em que aprendemos lies de hospitalidade. Naquela tarde da nossa juventude, a disputa estava acirrada e ningum conseguia descobrir a palavra de 07 letras que Tato escolhera. E todos iam sendo vencidos, at que ficamos ns dois disputando a parada. Ningum de fora podia dar palpites. Fiquei deveras encabulado com a palavra de meu compadre que tinha trs

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is, na segunda, quarta e sexta letras. Todas as demais vogais estavam fora. E pensava comigo: de onde esse danado tirou essa palavra, que mais parece grego? E ele brincava, sorrindo, enquanto dizia: minha palavra no fcil, difcil, vocs no vo descobrir! E, de fato, no conseguimos desvend-la e ele acabou vencendo, ficando o esqueleto de sua palavra praticamente intacto. Terminado o lance, a maior surpresa foi constatar que Tato jogara com o vocbulo difcil. O mais interessante que ningum percebeu seu grande senso de humor; quando dizia, a todo momento, minha palavra no fcil, difcil, a estava revelando. Outra diverso das frias de julho e janeiro, alm da jogatina de baralho, em sesses vespertinas e noturnas, era o jogo de palavras cruzadas. No se trata daquela revista, divertida e instrutiva, comprada na banca de jornal, de que mame tanto gostava. Era outra modalidade de palavras cruzadas, um entretenimento cultural contendo um saco de pequenos recortes de madeira, desenhados com 120 letras do alfabeto; vogais e consoantes, ou seja, de a at z e mais ainda 03 recortes em branco, utilizados como coringas. Esses recortes eram bem semelhantes s pedras do antigo jogo de vspora, hoje chamado bingo. Neles estavam desenhadas as letras e o valor de cada uma delas (de 01 a 20). As letras deveriam ser colocadas sobre a grande cartela, uma espcie de tabuleiro, onde tambm estavam fixados, em cada espao, os valores correspondentes ao lance do jogador, como duplo ou triplo da letra e duplo ou triplo da palavra. Logicamente, colocar uma letra de valor 10, por exemplo, no espao onde valeria o triplo, seria uma excelente jogada de 30 pontos com uma s pedra. Melhor ainda se o lance fosse de uso das 07 letras na jogada, o que capitalizava mais 50 pontos, alm da contagem dos pontos da palavra. Ao incio do jogo, cada um retirava do saco sete daquelas pedras ou letras e as colocava sobre uma tabuinha que servia de apoio a elas. Assim, o jogador mexia vontade nas letras, usando do seu raciocnio para formar as palavras. Fazia parte do combinado o emprego de palavras de nvel mdio. O dicionrio ficava ao lado dos

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jogadores, pronto para dissipar qualquer dvida. S era permitido o emprego de verbos no infinitivo. Mas, como jogo conveno, muitas vezes convencionamos que valiam as formas verbais em todas as pessoas, tempos e modos, o que acabava tornando a brincadeira um importante jogo cultural. O dicionrio s deveria ser solicitado, no caso de dvida da grafia ou da prpria existncia do vocbulo. Eram tambm vlidos os smbolos qumicos, bastante usados, pois, ao se fazer o lance, necessariamente se aproveitava alguma letra de palavras usadas nas jogadas anteriores. Passar a vez, trocando parcial ou totalmente as letras, era uma jogada arriscada, porm permitida. Nessa hiptese, o jogador deveria, antes da troca, jogar no saco as pedras que estava dispensando. Mame sempre gostou tambm da revista de palavras cruzadas, lazer que praticou at nas ltimas semanas de sua preciosa vida. deveras impressionante, porm, isso aconteceu tambm em setembro de 1.989, mesmo depois do retorno dos exames de Campinas/SP, quando fora diagnosticado seu cncer mortal. Com sade, ento, apreciava demais o jogo de palavras cruzadas de que estou falando. Alis, era campe absoluta dessa modalidade e escolhia os parceiros. A quem fosse lerdo de raciocnio, pedia que ficasse de fora, at aprender melhor. De fato, demorar demais para fazer o lance causava irritao aos participantes e acabava tornando o jogo desinteressante. Por essa razo, passamos a usar uma ampulheta que marcava o tempo para a jogada, sob pena de perda da vez do jogador moroso. Foi a soluo prtica mais acertada. 4. COCO: O SAUDOSO AMIGO TRAPALHO Ficou bem gravada na minha memria uma tarde em que jogava conosco nosso saudoso e grande amigo de juventude, Jos Carlos Cobra, mais conhecido pelo apelido de Coco, filho dos estimados tabelies Benedito Cobra e Maria Pres Cobra. Era uma pessoa alegre e divertida, nosso contemporneo de Colgio So Jos

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em Pouso Alegre, companheiro das farras da mocidade, inclusive como motorista em viagens a muitos bailes na regio. Surpreendentemente, passou a liderar o placar com uma bela e clssica jogada em que, usando as sete letras, dentre elas um coringa (pedra em branco de ambos os lados), fez quase 100 pontos de uma s vez. Na seqncia de lances, porm, de forma suspeita, ele passou a ficar risonho demais. Da, logo descobrimos a razo: Coco havia utilizado um coringa falso, ou seja, uma letra qualquer que, virada ao avesso, deu a enganosa impresso de ser coringa verdadeiro. Resultado: acabou melando a partida que no teve como ser reiniciada. Ele levou tudo na gozao e quase morreu de rir da sua brincadeira; s que teve de ouvir boas dos mais exaltados. Ficou, todavia, a lio: a partir daquele dia quem usasse um coringa primeiro tinha que provar ser ele verdadeiro. Quando, recm formado, iniciei na advocacia, Coco era escrevente do magistrado Dr. Paulo Sebastio Guimares. Ento admirava no conterrneo o exmio datilgrafo, talvez o melhor dentre tantos outros serventurios da justia que vim a conhecer, ao longo de minha carreira. Ao grande amigo, precocemente falecido, deixo gravada a gratido pelos seus muitos gestos de bondade e considerao durante os anos em que conviveu conosco. Que Deus o tenha acolhido na Casa do Pai onde est feliz e risonho como sempre foi por aqui! 5. O episdio Z da Boa Vereda Ainda outras lembranas de nosso saudoso Coco esto bem guardadas na memria. Como j mencionei, foi nosso motorista e companheiro de bailes nas cidades da regio durante nossa mocidade. Nessas ocasies, Coco gostava de se apresentar s garotas, ora como acadmico de medicina, ora como oficial da Aeronutica, quando arrastava ss e rr, moda carioca. Numa dessas noitadas ele estava conquistando uma bela morena e foi com a moa at o hotel onde estvamos hospedados, em Ouro Fino. Ao entrar, no saguo, outro colega nosso, Z da Boa Vereda, que no

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s tinha jeito como era realmente caipira, o recebeu e foi logo lhe dizendo: Coco, oc vai agora pra riba , ou vai fic aqui? Depois disso, evidentemente, a decepo da garota foi grande. Esse dilogo revelador acabou prejudicando os planos de conquista do Coco, que no mais conseguiu namorar a linda morena... Outro episdio hilariante contou-nos o prprio Coco. Ele teve uma namorada da roa, bonita e bem dotada, porm, burra, sem sal e ruim de prosa. Ficara com ela sentado, durante toda a tarde. Coco tentava puxar alguns assuntos, mas ela sempre permanecia calada. Foi ento que, em dado momento, olhando para as nvens que se fechavam, ele arriscou perguntar garota: Ser que vai chover hoje? Para surpresa sua, desta vez ela abriu a boca e lhe respondeu, na bucha: - Vai chover teu c...! 6. Outras recordaes das frias divertidas Nossas tias Anita e Gustavina, irms de mame, muitas vezes participaram dos jogos de palavras e, principalmente, das partidas de buraco e truco, que eram disputadssimas. Algumas vezes, como nos tempos da chcara de papai, na continuao da Rua Capito Cipriano de Castro (antiga Rua da Faxina), hoje propriedade do casal amigo, Joo e Aparecida Bertolaccini, jogamos buraco de forma indita; ao invs de duplas eram trios, jogando seis participantes ao mesmo tempo, ou seja, trs parceiros contra trs. Lembro-me tambm da participao dos primos Roberto e Edvaldo Ribeiro e de meu sobrinho Narcyzinho, nessas partidas l na chcara. Era uma guerra, visto que ningum gostava de perder. Quando as tias Anita e Gustavina, inclusive mame, se achavam em desvantagem, ficavam desesperadas. O jeito era apelar e, assim, subrepticiamente, passavam a esconder coringas sobre o colo. Julgavam que ningum as observava, mas, jogando sempre com muita ateno, muitas vezes as surpreendia com 12 cartas ao incio da nova rodada. Em outras, at canastras sujas

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viravam reais, pois, magicamente, o coringa desaparecia da mesa... Logicamente, como o jogo no era a dinheiro, mas uma simples brincadeira, fazia de conta que no via aquela apelao da mame e de minhas queridas tias; evidentemente, desculpava o gesto de quem no se conformava de estar perdendo. Na verdade, ningum gosta de ser derrotado, pois em toda disputa vencer sempre muito mais saboroso! 7. A CASA PATERNA Desde que me conheo por gente, ou seja, at onde a memria me permite recuar na minha histria pessoal, lembro-me com carinho da casa paterna onde nasci. Bem no corao de Borda, Praa Monsenhor Cintra, 12, localiza-se muito prximo tanto da velha Igreja Matriz, como da atual Baslica de Nossa Senhora do Carmo. Sempre foi uma casa muito movimentada. Meus avs maternos, Lbia e Gustavo, foram donos praticamente de todo o quarteiro. Com a morte de vov Gustavo (infelizmente no cheguei a conheclo), alguns dos seus filhos ali se fixaram, construindo suas moradias, como mame, tia Vidinha, tia Gustavina e tia Luprcia. Anos depois, se ergueram as casas dos primos Marcelinho, Edmia e dos saudosos Dr. Paulo Guimares, Almir e Diva. A proximidade de todas as residncias facilitava o convvio dos nossos familiares que foi sempre intenso, harmonioso e muito gratificante. Nossos tios e tias maternos, como Marcelo e Vidinha, Messias e Luprcia, Sanico e Leonor, Anita e Salvador, Gustavina e Jos Moreira, Juquita e Helena, Waldemar e Geni, Antnio e Clara, sempre dispensaram especial carinho a seus sobrinhos e, por isso, deixaram muitas e doces recordaes. Outra peculiaridade consistiu no fato de que vov Lbia ficou morando com nossos pais, at sua morte em 16 de janeiro de 1949. Conseqentemente, nossa casa paterna passou a ser o ponto de convergncia de nossos tios e sobrinhos maternos. Principalmente nossos tios, Leonor e Sanico, Anita e Gustavina que ali vinham todas as noites. Houve poca em que praticamente todos os tios,

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sobrinhos, primos, alguns vizinhos e amigos mais chegados, como Nena da madrinha Isaura de Freitas, Tio Martins, Maria Antonia, Maria de Moura Pres e Mrio Sobreiro tambm compareciam para jogar vspora. Lembro-me bem de detalhes desse jogo to divertido, no qual fazamos aquela algazarra, quando eram cantados certos nmeros como: 24 ( ele, o tal), 69 (um cagando outro espiando), 20 (papudo do Cervo), 22 (dois patinhos na lagoa), 07 (pito do Guinelo), 08 (biscoito da Quita), etc... Nossos pais praticaram como ningum a virtude da hospitalidade e nossa casa viveu o milagre da multiplicao dos pes. um detalhe que registro com muito orgulho, respeito, admirao e reconhecimento. Nela sempre houve muita fartura e disposio para acolher nossos parentes, amigos e servir a todos. certo que mame contava sempre com a ajuda de uma auxiliar, que se adaptava muito bem ao servio da casa. Praticamente todas elas, como Isabel Costusura, Rosa de Lima, Maria da Palmira, Rosria, Maria Rita e Marisa, foram tratadas como filhas e somente saram de nosso lar, depois de casadas; portanto, para constiturem suas novas famlias. Minha gratido a todas elas que nos serviram, por longos anos, com dedicao e muito carinho. Um dia desses uma das filhas da Rosa de Lima, que hoje mora em Campinas/SP, nos visitou, trazendo notcias; infelizmente Rosa, por complicaes de sade, est cega. Mas, segundo depoimento de sua filha, jamais se esqueceu da gente, lembrando-se da data de nascimento de cada um de ns. Obrigado Rosa, pelo seu carinho! , com grande respeito e imensa saudade, que tenho a honra e o prazer de falar das pessoas de meus saudosos pais. Papai nasceu no Distrito do Cervo, Borda da Mata, em 01 de dezembro de 1907. Filho de Francisco Martinho de Mello (Chicuta) e Ana do Couto Mello (Donana). Vov Chicuta teve vrios filhos de trs casamentos, sendo papai o nico da segunda esposa de meu av (v Donana), que era tambm viva e tinha uma filha de seu primeiro casamento. J meu av Chicuta teve um filho (Benedito Elpdio de Mello) de seu primeiro matrimnio. Assim, meus avs Chicuta e Donana, com sua unio, passaram a cuidar de um casal de

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filhos que tinham pais e mes distintos. Da, aconteceu um fato curiosssimo: com o nascimento de papai, acabou tendo um irmo paterno e uma irm materna, que no eram parentes entre si. A convivncia entre esses irmos de papai fez nascer uma simpatia recproca que acabou virando namoro, pois no havia qualquer impedimento entre ambos. Esse fato que, a princpio, parece inacreditvel, papai gostava de contar, dizendo aos amigos que tinha dois irmos que por muito pouco no se casaram, o que seria perfeitamente possvel, pois no eram parentes. De seu terceiro casamento com Dona Emlia, meu av Chicuta teve mais 06 (seis filhos): Antnio (Tonico), j falecido em Umuarama/PR, onde vivia; Jos, casado com Francisca Marques, tambm morto em acidente de veculo na BR-290; Maria, professora e artista, casada com o advogado e meu grande amigo Tato Nogueira; Sebastio (Tiozinho), professor que mora em BH; Francisco (Xikito), professor, contador e advogado, homem religioso e notvel poltico, consagrado prefeito bordamatense em trs mandatos e Lzaro, juiz de direito aposentado. Mame tambm nasceu em Borda, no dia 28 de fevereiro de 1.910. Era filha de Gustavo Dantas e Lbia Sobreiro Dantas. Meu av paterno era agricultor e o materno, carpinteiro. Ambos constituram famlias numerosas, o que lhes trouxe descendncia farta, o que pudemos sentir ao enviar os convites de casamento de nossa primognita Regina a mais de 200 (duzentos) parentes. Foi inevitvel a realizao de uma festa no Clube Literrio e Recreativo, local para 600 (seiscentos) convidados, o que foi muito gratificante. E, esgotada a capacidade de recepcionar mais gente, ficamos em falta com muitos amigos aos quais gostaramos tambm participassem conosco daquele importante evento. Ao longo da minha vida, j tive a oportunidade de dizer a amigos e conhecidos que a minha maior riqueza o patrimnio moral legado de meu pais e o Amor que souberam me dispensar e a meus irmos. Esse patrimnio foi ampliado, aps o meu casamento com Mariinha Jia, minha amada esposa, e a chegada de meus

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queridos filhos: Regina, Luiz Gustavo, Rosana e Renata; presentes que Deus nos concedeu. Anos depois, com os casamentos de Regina e Fabiano, Luiz Gustavo e Adriana, Rosana e Darnei Jnior, a riqueza se multiplicou com a vinda de nossos maravilhosos netos: Gabriel, Gustavo, Mariana, Ana Jlia e Joo Victor. Esses laos de amor familiar so, sem dvida, os fundamentos para a felicidade que tanto buscamos. Meus pais souberam como ningum deixar-se consumir suas vidas em nosso favor. Sua doao e desprendimento foram totais. Sua maior luta e preocupao, sem qualquer dvida, sempre foi o futuro, a felicidade e o bem estar de seus 07 filhos e, depois, dos 29 netos, 35 bisnetos e trineta que chegaram como coroamento de suas existncias fecundas. Ao mesmo tempo em que nos dispensavam seus cuidados e atenes, sua generosidade se voltava a tudo o que acontecia com os membros das famlias de ambos, ou seja, com nossos avs, tios, sobrinhos e primos. Sempre foram super solidrios e dispostos a ajudar a todos; por isso mesmo, sempre foram convocados nas dificuldades. Nas doenas de familiares, ento, principalmente mame era requisitada por seu excepcional carisma e jamais faltou com sua invulgar capacidade de doao. Soube servir com amor, seguindo as pegadas do Mestre Jesus. De um modo especial, isso aconteceu nas enfermidades de meus manos Waldemar e Waldir, como tambm nos dolorosos transes dos bitos de nossas tias Leonor e Luprcia. Waldemar s no morreu em plena adolescncia, porque ela, em viglia permanente ao seu lado, no Hospital Godi Moreira de So Paulo, percebeu a tempo que o mesmo estava com forte hemorragia, aps delicada cirurgia na perna. Convocou enfermeiros e mdicos que, imediata e prontamente, prestaram os devidos socorros, evitando o pior. Waldemar, aps sua cirurgia, ficou cerca de seis meses na cama, engessado do peito at a ponta dos ps e mame, qual Cirineu, o ajudou a suportar to pesada cruz. Por sua extrema dedicao, quando o gesso foi tirado, aps 6 meses, a pele do corpo de meu

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mano estava s e perfeita. Prova indiscutvel de que o amor capaz de fazer milagres! Quando em seu cncer mortal, que to prematuramente a levou para a eternidade, tia Leonor teve permanente assistncia de mame, sua companheira de todos os dias. Ela assumiu os cuidados da sua irm caula e, bravamente como sempre, a tudo enfrentou e a confortou at o fim, com muita coragem e valentia. A morte de tia Leonor at hoje est gravada em minha memria, por determinadas circunstncias que demonstram ter recebido uma graa toda especial. Ela era vizinha do Colgio Nossa Senhora do Carmo e tinha grande amizade com as freiras; assim, a sua ltima hora de vida foi preenchida pelo coro das Irms Dominicanas que, no quarto de minha tia moribunda, entoavam hinos sacros e rezavam o tero. Nesse momento, ela se despediu de seu esposo, o querido tio Sanico, que a beijou nas mos e na face. Uma cena comovente de que jamais me esquecerei! ... Tio Sanico era uma pessoa maravilhosa e santa, aquele alfaiate que fez os nossos primeiros ternos, na adolescncia. Adorava seus sobrinhos, aos quais dispensava carinho como se fossem os filhos que no teve. Tinha forte diabetes, o que exigia injeo de insulina, diariamente. Aps a morte de tia Leonor, tio Sanico foi dominado por uma tristeza que o levou a se descuidar do tratamento. Assim, trs meses depois, veio a falecer. Tambm tia Luprcia, que foi minha segunda me, dedicandome especial carinho por vrios anos, quando a enfermidade a afligiu nos seus ltimos dias de vida, fez questo da presena de mame (irm a quem muito amou), essa mulher maravilhosa e bendita, sempre disposta a se deixar consumir em favor daqueles a quem soube amar como ningum! Infelizmente, quando da morte de tia Luprcia, no estava em Borda. Na poca era Promotor de Justia em Mogi das Cruzes/SP, de onde vim para o sepultamento. Em meu corao, ficou a marca da saudade da querida tia Luprcia, essa mulher simples que encheu de alegria a minha infncia e juventude. Muitas e muitas vezes fiquei em sua casa e de seu esposo, tio Messias. Ela cuidava

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de minha roupa e fazia tudo para me alegrar, como se fosse seu prprio filho. E s no me tornei o provvel herdeiro do casal, porque, com a morte de minha tia Clara Dantas, ento residente em Paraispolis/MG, quando do nascimento de meu compadre Jos Roberto, assumiram sua guarda. Anos depois, como advogado, coube a mim a grata satisfao de requerer sua legitimao adotiva. Tio Messias, de quem voltarei a falar, era um homem simples e trabalhador; um profissional excelente, seleiro dos bons, cujas selas no capricho eram disputadas pelos boiadeiros da regio. Tios Messias e Luprcia sempre ocuparam e ocuparo um lugar especial em meu corao agradecido. Que Deus tenha reservado para eles um cantinho de paz e felicidade, onde espero reencontr-los, junto de tantos outros entes queridos, l na Casa de Nosso Pai do Cu! 8. Perdas de entes queridos enlutam a famlia Sabemos que durante a existncia no s vivemos momentos de alegria e felicidade. As dificuldades fazem parte de nossa caminhada e precisamos enfrentar instantes de grande aflio, quando s Deus mesmo pode nos dar consolo. Assim, um acontecimento extremamente triste se abateu sobre nossa casa com a morte do mano Waldir, em 16 de janeiro de 1966, com apenas 33 anos. Aqui chegou de frias, s vsperas do Natal de 1.965, em seu novo veculo, com a alegria costumeira (como todos ns sempre adorou Borda, sua terrinha), juntamente com Cia, Jos Agenor e Waldirzinho, ento recm nascido. Trouxe presentes para todos ns, seus irmos; comemorou as festas natalinas e de Ano Novo, tendo danado a noite toda no Baile de Reveillon do Clube Literrio e Recreativo. Depois, foi passear na casa de seu cunhado Lapenha, em Bom Repouso, de onde chegou, no dia 06 de janeiro. Passou pelo meu escritrio de advocacia, ento instalado em cmodo anexo ao bar de meu sogro, na Praa Antnio Megale. Queixou-se de estar sentindo forte dor, na altura da barriga. Disseme que j havia tomado vrios remdios, sem qualquer resultado.

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Sugeri a ele procurasse o Dr. Tefilo Silveira, mdico de confiana e amigo da famlia. Algumas horas depois, o encontrei se contorcendo de dores, na casa de papai, onde se hospedava. Daquela tarde at a manh do dia seguinte, apesar dos cuidados mdicos, Waldir no teve melhoras, sentia fortes dores abdominais e suava muito. Segundo parecer do Dr. Tefilo, mdico de confiana e amigo de nossa famlia, amanhecera ele em estado de choque e foi imediatamente levado para a Santa Casa de Ouro Fino, onde ficaria aos cuidados tambm do Dr. Maximino, mdico cirurgio afamado na regio. Foi submetido a vrios exames, acusando nveis superiores a 450 de acar no sangue e o triste diagnstico foi pancreatite aguda (hemorragia no pncreas). No pode ser operado e a doena foi se agravando, at que, por volta das 11:00 horas do dia 16 de janeiro de 1966, veio a falecer. Por coincidncia, justamente eu, com Lapenha e o saudoso Otvio Oriolo, fizemos companhia a meu mano Waldir na ltima noite de sua vida. Havia aparentado uma falsa melhora, no dia anterior, o que levou minha me e Maria Eunice (Cia), esposa de Waldir, a virem para casa descansar. Mame, como sempre, fora incansvel ao lado de seu filho e muito se lamentou por no ter ficado ali mais aquela noite derradeira! Logo pela manh daquele dia fatdico, Waldir estava em prcoma, quando perguntei a uma religiosa que entrara no quarto a respeito do estado de sade do paciente. Foi, ento, que ela falou da gravidade daquele momento, o que me fez, imediatamente, telefonar para meus pais, notcia que mal consegui repassar. Em seguida, a religiosa me indagou se no queria que chamasse um sacerdote para dar a Waldir uno dos enfermos. Evidentemente, concordei, pois aquela sugesto era um presente irrecusvel que meu irmo fez por merecer, por sua extrema bondade. Instantes depois, chegava Cia, a esposa de Waldir, que ainda no estava sabendo que ele praticamente agonizava. Fazia a sua visita diria. Sugeri a ela que fosse capela rezar, enquanto tambm chegava o padre que ungiu meu mano com os santos leos. Entendi como a presena de Jesus, estendendo Sua Mo ao moribundo.

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Passados mais alguns minutos, foram chegando, um a um, todos de casa, tios, sobrinhos e primos, num quadro de dolorosa despedida ao mano querido que, com apenas 33 anos, Deus, em seus desgnios insondveis, quis lev-lo para Sua Casa. Meu falecido irmo morava na cidade de Bela Vista do Paraso/PR, onde tinha consultrio odontolgico. Era dentista formado em Alfenas/MG. Deixou sua esposa Cia e dois meninos, Jos Agenor, com 04 anos e Waldir Jnior, com apenas 02 a 03 meses de existncia. Waldir era um lder nato, o mais alegre e comunicativo dos irmos. Sem desfazer dos outros, tambm muito bons, ele era o melhor de nossos irmos; o mais querido na cidade, esportista, idealista, brincalho, amoroso e solidrio e que soube viver intensamente os poucos anos em que esteve entre ns neste mundo. Deixou por isso muitas saudades... Rogamos a Deus possa estar desfrutando de um lugar especial de grande alegria e paz! Que ele possa interceder por ns junto ao Pai, at que um dia, com absoluta certeza, estejamos todos juntos, unidos no amor, no lugar que acreditamos estar sendo preparado para ns, apesar de nossas falhas! A meus pais fora reservada tambm outra importante misso. Em 19 de maro de 1955, Terezinha de Jesus Bueno de Mello, que foi casada com meu mano, Narcy de Mello, faleceu no Hospital Slvio Franchi daqui de Borda, no parto de nosso sobrinho, Jos Lucas Bueno de Mello. Terezinha era um encanto de pessoa que, por sua bondade e reconhecidas virtudes, conquistara a estima de todos os parentes e tambm dos bordamatenses que se enlutaram com sua perda. Ela deixou ainda outros trs filhos: Maria Tereza, Tnia Maria e Narcyzinho, respectivamente com 5, 3 e 2 anos, que, com Jos Lucas, foram criados conosco; portanto nossos sobrinhos irmos. Esta misso meus pais a cumpriram, com muito amor e redobrado carinho, conseguindo fazer de Tnia e Narcyzinho dois mdicos; Maria Tereza, uma professora e de Jos Lucas, um comunicador e diretor de TV, atualmente trabalhando no SBT.

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desnecessrio dizer que dava para perceber que tinham justificado orgulho dessa tarefa cumprida. Por outro lado, Tnia e Narcyzinho, como mdicos, muito puderam contribuir para confortar o cncer mortal que abateu nossos queridos pais. certo que Deus foi generoso e, aps curtos dias de sofrimento purificador, os levou para sua morada celestial. Com certeza, l reencontraram todos os seus parentes e amigos, que tanto amaram aqui na terra. Agora, sanados seus defeitos, como est revelado na palavra de Deus, j podem desfrutar, sem dores e sem tristezas, da paz e da felicidade eterna a que fizeram jus, por seus muitos mritos e sua f inabalvel. Meus pais tiveram um final em tudo muito semelhante. Ambos morreram de cncer e aps trs semanas em que este se manifestou. Portanto, devemos reconhecer que Deus foi muito generoso e misericordioso com eles e conosco. Tive a oportunidade e a felicidade de acompanh-los em seus dias derradeiros e, por isso, posso testemunhar que ambos receberam a uno dos enfermos, como tambm a visita de Jesus Eucarstico. Assim, alm do carinho de seus familiares, mereceram este presente to especial e o mais importante deste mundo, ou seja, a graa de falecerem confortados pela graa e presena do Senhor! Rejubilemo-nos por tanta bondade e copiosas bnos: Aleluia! 9. AMOR E POESIA SO FACES DA MESMA MOEDA Quem ama capaz de fazer poesia. Como prova, gostaria de incluir aqui os versos de meu sobrinho-irmo, Narcy de Mello Filho, o Narcyzinho, como assim o chamamos carinhosamente. Ele filho de meu carssimo irmo mais velho, Narcy de Mello que, em primeiro matrimnio, desposara nossa saudosa cunhada, Terezinha de Jesus, com quem tivera quatro filhos. Terezinha, como j relatado, faleceu no parto do filho derradeiro, Jos Lucas, deixando Maria Tereza (05 anos), Tnia (03) e Narcyzinho com apenas 02 anos. Aps to doloroso transe, Narcy voltou a morar conosco, na

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casa paterna, trazendo evidentemente aquelas lindas crianas. Assim, mame assumiu os seus netos, criando-os como filhos, tarefa que cumpriu com desvelo e deu continuidade mesmo depois do segundo casamento de seu primognito Narcy com Salom. Por tudo isso, quando mame se encontrava no leito de morte, desenganada, em Campinas/SP, o corao despedaado do netofilho entoou um verdadeiro hino de louvor e agradecimento sua av-me, em versos que s o AMOR capaz de compor. Confirmem o que estou dizendo, saboreando a beleza de to lindos e poticos sentimentos: DESPEDIDA Do nosso caos fizeste o ego, Do nosso labirinto, o mapa, o caminho, Foste a vela, o leme, a bssola, o abrigo, Um roseiral inteiro nesta vida espinho! No era teu o fardo e o carregaste, altaneira, No era tua a conta e a saldaste, de pronto; No era tua a cruz, mas, Cirineu, a tomaste De nossas mos crianas e evitaste o desencontro! Infundiste a luz nestes caminhos acanhados, Alargando-os muitas vezes com teu prprio sofrimento; Enfeitaste de alegria a vida e nos moldaste Fortes, bravos, dispostos a todo contratempo! Sondaste-nos a alma, atravs dos olhos e dos gestos, Estiveste atenta como quem asculta o universo, E percebeste, com sapincia e compreenso, os sentimentos, E os acudiste a todos, como me e com respeito! pena, terna e amada criatura, Que estejas de partida e eu no possa Em troca do tesouro que, graciosamente, me deste,

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Alongar-te os dias e dar-te foras! pena que, mesmo que eu passe muitas noites, Velando-te o sono, afagando-te a cabea, No te transfunda mais vida quanto quero, E, aos poucos, o teu corpo desfalea... (Com o carinho do teu neto e filho, Narcyzinho). Como que adivinhando a morte de mame, o que ocorreu em 06 de setembro, meu carssimo mano Narcy, o primognito dos nossos irmos, no dia 14 de maio de 1989 (Dia das Mes), comps e entregou para ela, em vida, os lindos versos que assim denominou: QUADRAS PARA MAME Eras filha exemplar, Irm sincera e fiel, s tia espetacular, s av feita de mel! Mas ser me foi o teu brilho, Mais sublime e dileto, Foste me no s de filho, Foste me tambm de neto! No te esqueo um s dia, Nem dos teus grandes favores; Minha me, tu s Maria, E s Maria das Dores! Em tua mo to macia, Meu beijo sempre depus, Para mim lembras Maria, A Santa Me de Jesus!

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Da mesma forma que aconteceu com o mano Narcy e meu sobrinho-irmo, Narcyzinho, consegui tambm fazer versos para homenagear meus queridos pais. Estas farpas do corao aqui transcrevo, para registro dos sentimentos que me invadiram a alma, como filho extremamente grato por ser descendente dessas criaturas to maravilhosas, presentes preciosos que Deus nos concedeu. Poucos dias depois do falecimento de mame, em 06 de setembro de 1.989, angustiado por to doloroso acontecimento, prestei-lhe uma homenagem de filho. Trata-se de poesia que, ousei afirmar, com justificado orgulho, ser o retrato fiel de nossa querida genitora e que foi publicado no Jornal A Cidade, de Borda da Mata, em 30 de abril de 1.990, nas proximidades do que seria o primeiro Dia das Mes sem ela. RETRATO DE MINHA ME Do nosso lar foi o centro, Figura sempre presente. Disposta em todo momento, A servir qualquer parente! Na doena ou na alegria, Ela foi sempre a primeira Com amor e valentia, Batalhou sem ver canseira! Do esposo a companheira, Bondosa, fiel e amiga, Ao seu lado a vida inteira, Sem reclamar a fadiga. Acolheu a me idosa, Com carinho em seu lar, Aos irmos foi amorosa, Incansvel e exemplar!

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A seus filhos adorava, Com um amor invulgar, O que lhes comunicava Uma riqueza sem par! Corao de amor to repleto Que Deus lhe deu outra misso: Criar como filhos quatro netos, O que fez com distino! Essa mulher to prendada Essa criatura do cu, Foi minha ME adorada, Presente que Deus me deu. Neste dia importante, Esses versos lhe oferto, mame, doce semblante, Embora longe, sempre perto! Quando meu pai ainda vivia (faleceu em 21/01/2001), em poca que exercia as funes de diretor-chefe do Jornal A Cidade, aproximando-se o Dia dos Pais, decidi homenage-lo com este acrstico que fiz publicar na edio de 30 de julho de 1.995:

ACRSTICO PARA MEU PAI

A migo de todas as horas G eneroso, simples, incomparvel E steio de nossa famlia... N as lutas do dia a dia, O peroso e sempre vencedor,

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R evelou-se como PAI,

D e invulgar sabedoria E dedicao exemplar! M erece neste Dia dos Pais, E sta homenagem sincera, L embrado por seus filhos, L embrado por seus netos, O ntem, hoje e sempre. Aps o bito de papai em 21/01/2001, no foi nada fcil passar o Dia dos Pais. Procurei colocar nos versos o que representara papai em minha vida; da, a exploso de carinho, naquele segundo domingo de agosto/2001, que fez brotar mais esta poesia. So versos inspirados naqueles de Narcyzinho, j transcritos, com preciosos retoques de Narcy, meu querido irmo e poeta nato. Homenagem a um pai imortal Foste alicerce, guia e companheiro, A luz, a rota, o leme e o caminho, Amigo certo, leal, verdadeiro, Exemplo de um pai, todo carinho... Que pena tenhas ido deste mundo! Seria prefervel tu voltares, Ainda que um mal, forte e profundo, Persistisse em manter os teus penares! Porm, Jesus cortou teu sofrimento, A pedido da Me Aparecida, Madrinha invocada a cada momento, E a quem foste fiel por toda a vida...

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Foi Ela que a mo te estendeu, Conduzindo-te casa preparada, A, mame, que te antecedeu, Muito alegre, brindou tua chegada! Por certo, feliz ests na eternidade! meu consolo neste Dia dos Pais; Isto ameniza a imensa saudade De no poder te abraar, nunca mais! triste suportar a tua morte, Mas sou feliz por te amar assim! Ser teu filho foi minha grande sorte! Inda vives aqui, dentro de mim... Com a chegada do primeiro aniversrio de morte de papai, sem dvida meu melhor amigo (21/01/2002), nova homenagem surgiu daquela imensa saudade que dominava e domina o meu ntimo. Tentei retratar a sua marcante personalidade, sobretudo, de homem simples, honrado e solidrio. Sem dvida, a ele se aplica o belo e conhecido pensamento: MUITO BOM SER IMPORTANTE SER BOM! IMPORTANTE, MAS O MAIS

Dilogo de ausentes presentes O tempo gira sua roda, rpido e fugaz, Hoje um ano faz que se foi o pai querido... Porm, como se inda conosco estivesse, em paz, A nos revelar que foi muito bom ter vivido. Que foi melhor ter buscado, nesta to curta viagem, Fazer o bem e a todos procurar servir, com grande amor, Sem pensar em recompensa ou qualquer outra vantagem,

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Mas s pelo prazer de ter amigos, tesouro de maior valor... Papai mostrou que possvel ser feliz na simplicidade! Que o homem nem precisa realizar um grande feito; Que o mais importante na vida amar, de verdade, E no correr em busca do poder, de qualquer jeito. Ele provou que vale a pena exercitar a bondade, Seja o semelhante rico ou pobre, preto ou branco, Despertando em ns o desejo de servir a humanidade E desejar ver em cada rosto amigo um sorriso franco. Papai deixou-nos seu exemplo, seu maior legado: Vale a pena ajudar e respeitar nosso semelhante, Pois a vida to breve como um sonho acordado Em que tudo passa como a rapidez de um s instante. Daqui levamos to somente o bem na bagagem... De nada valem ttulos ou patrimnio sem igual, Se dio e egosmo forem marcas de nossa passagem; Se nossa vida for sem sentido, sem luz, sem ideal! Que Deus o recompense por tudo, amado pai, Agenor! Obrigado pelo apoio, carinho e to grande bondade! Pelas lies que nos transmitiu, com muito amor, Possa no cu encontrar toda a paz, na maior felicidade!... Quando chegou o Dia das Mes, em 12 de maio de 2002, novamente tive o prazer de relembrar a minha querida, imaginando o que tinha para lhe dizer, no reencontro daquele dia em que senti, como nunca, a sua maternal presena. Um verso veio de emprstimo do mano Narcy, que mais do que um amigo verdadeiro.

AGRADECENDO MINHA ME

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Quando maio se aproxima, tempo de emoo e saudade, Ante a doce lembrana da amada criatura, to querida, Que a morte, cruel e implacvel, levou pra eternidade... Luz que o nosso lar iluminou durante to preciosa vida! O Dia das Mes, para mim, j no tem mais o mesmo brilho, Porque, infelizmente, hoje no posso abra-la como outrora, Nem, com a costumeira alegria, vir beij-la novamente como filho; Mas sempre grato ME to bondosa, dir-lhe-ei enternecido, agora: Obrigado, querida, por tudo o que, com tanto amor, nos fez, Obrigado pelos dias to felizes que jamais esqueceremos! Sempre disposta a nos receber, inda que fosse todo um ms, Nas frias divertidas que, em casa, ao seu lado vivemos... ME, voc soube fazer da sua vida uma doao como ningum! E, porque assim agiu, no foi em vo seu trabalho de cada momento. Nosso bom Deus, que a tudo v, com certeza, a observou tambm, Reconhecendo ter cumprido, com fidelidade, Seu maior mandamento. E, porque mereceu, certamente a recebeu como Sua filha querida, Na morada onde est feliz pra sempre, na posse de tudo o que desejou. No cu que voc, me, imaginou conquistar no final da sua vida, Vivenciando a f e a esperana de encontrar a paz que Jesus mostrou.

Embora mais de doze anos se passaram, desde sua morte sentida,

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Saiba, mame, que jamais se apagou em ns sua doce lembrana, Pois jamais poderemos esquecer da mulher que nos deu a vida, Daquela que tudo fez por ns desde os bons tempos de criana...

Por isso, neste Dia das Mes, aos cus enviamos este recado: Por mais que o tempo, insacivel, escoe seus dias sem parar, Voc jamais ser esquecida e, para sempre, lembrado o seu legado: Ser ME conjugar, em todos os tempos e modos, o verbo amar! 10. RANCORES DA POLTICA DE OUTRORA A poltica sempre foi apaixonante. O homem um ser poltico por excelncia, porque no pode ficar indiferente ao que acontece em sua volta. Se o salrio insuficiente, falta trabalho, a gua anda suja, as ruas esburacadas no seu bairro; se o ar est poludo, a sua sade ameaada, com tudo isso lhe impossvel cruzar os braos. Da a necessidade de participao na vida poltica, apesar de muitas decepes, abusos e desonestidade de tantos polticos que somente lutam por interesses pessoais e de grupos, indiferentes ao bem comum da sociedade. Nos ltimos tempos, os brasileiros acompanham, estarrecidos, as denncias pela imprensa falada e escrita a respeito da corrupo que est arraigada nas engrenagens da poltica, em todos os nveis: federal, estadual e municipal. Por todos os lados, h quadrilhas de polticos assaltando os cofres pblicos, valendo-se das artimanhas de superfaturamento de obras e outros meios escusos de amplo conhecimento pblico. No corao de cada cidado, infelizmente, fica uma sensao de impotncia ante um quadro to sinistro. A poltica sempre gerou rancores e inimizades, mais ainda no passado. Ainda esto bem vivas em minha memria as lembranas de fatos da vida poltica, na poca de minha infncia e adolescncia.

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So flagrantes do tempo em que os adversrios eram apaixonados pelos partidos da UDN e PSD. A separao chegou a ponto de dividir as pessoas que escolhiam para freqentar determinados lugares e at estabelecimentos comerciais onde no iriam encontrar seus inimigos polticos. O preconceito era total e absurdo: bastava ser adversrio para no prestar. A campanha poltica se desenrolava em clima de muita hostilidade e muitos at andavam armados. O perigo rondava por todos os lados. Como meu irmo Narcy participou de duas eleies municipais, em 1954 e 1958, como candidato a prefeito, vencendo a ltima, pude sentir mais de perto o que se passava. Certa vez, ele e sua comitiva, no puderam chegar num dos bairros onde pretendiam participar de um comcio. Como foram ameaados por jagunos, portadores de armas de fogo, acharam mais prudente voltar para casa, seguindo os conselhos de meu pai. Atualmente, embora no tenhamos chegado a um estgio ideal de politizao em nossa cidade, houve grande avano nesse campo. Os princpios da Democracia acabaram ensinando a muitos ser fundamental a diversidade dos partidos polticos. Mostraram ser tambm indispensvel o respeito ao adversrio, que simplesmente, por ser oposio, no pode ser tratado como inimigo. Aprendemos ainda que todos temos igualdade de direitos e devemos participar livremente, pois o debate faz parte do jogo poltico. A liberdade de opo sagrada e todos devemos respeitla, se quisermos que os outros tambm respeitem a nossa escolha. necessrio que haja idias e propostas diferentes para a administrao pblica. Exatamente por isso, com a participao e ajuda de todos, que os erros do passado servem de exemplo e possibilitam encontrar novos caminhos para garantir o sucesso dos atos de governo. A tarefa da oposio muito importante, tanto na fiscalizao dos homens pblicos, como tambm para impedir abusos e evitar a sangria dos recursos do povo pelo ralo da corrupo. Sem o direito de crtica, de oposio e de debate dos problemas sociais, impossvel encontrarmos as melhores solues que todos desejamos. Somente assim um dia, atravs da educao

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das novas geraes, a longo prazo, conseguir-se- fazer prevalecer os legtimos e superiores anseios da sociedade. Oxal um dia, graas ao trabalho dos educadores de nosso pas, possamos concretizar uma verdadeira revoluo cultural, gerando como fruto VERDADEIRA MUDANA DE MENTALIDADE. Essa mania do brasileiro de adotar a famosa lei de Gerson, de querer levar vantagem em tudo e de mamar nas tetas do governo, h de acabar! E, quando esse dia chegar, cada um vai pensar no que poder fazer para colaborar na construo de uma nao brasileira mais fraterna e justa. a lio do saudoso Presidente Kenedy, prematuramente assassinado em Dalas (Texas), em discurso que teria pronunciado, ao assumir a presidncia dos Estados Unidos da Amrica: Estadunidenses, no pergunteis o que os Estados Unidos da Amrica podem fazer por vs, mas fazei cada um de vs o que puderdes pela grandeza dos Estados Unidos!.. 11. A grande epopia religiosa dos bordamatenses. Com a chegada em nossa cidade do novo proco, ento Padre Pedro Samuel Gonalves Cintra, de saudosa memria, um fato concentrou todo o esforo da comunidade paroquial. Foi a construo da nova Igreja Matriz da Padroeira Nossa Senhora do Carmo, um projeto arrojado no estilo romano lombardo, que o valente sacerdote decidiu enfrentar, tendo como construtor Mrio Gissoni, como chefe de obras, Jos Firmo Wernech e verdadeiras obras de arte esculpidas pelas mos do artista Celestino Artigas. A edificao era deveras monumental e parecia impossvel para uma cidade pequena como Borda da Mata. Mas acabou sendo lanada a pedra fundamental, por ocasio da festa da padroeira, em 16 de julho de 1.951, com a presena de Dom Otvio Chagas de Miranda, ento Bispo da Diocese de Pouso Alegre, conforme registrou o amigo e conterrneo, Joo Bertolaccini, em seu precioso livro Borda da Mata e sua Histria, na pgina 128.

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O arrojado projeto tornou necessria a unio de todo o povo catlico, que demonstrou sua f e despojamento dos bens materiais. Com certeza, todos os membros das comunidades do centro, bairros e distritos participaram, com entusiasmo, dessa campanha memorvel. Meu pai, nessa poca, nos dizia que precisava trabalhar, meio a meio, ou seja, metade para sustentar nossa casa e metade para auxiliar na construo da Igreja. O mesmo deve ter acontecido com as outras famlias catlicas bordamatenses. Defronte a casa de meus pais, na atual Praa Monsenhor Cintra, foram montadas barracas e vrias diverses para uma grande quermesse. Tiro ao alvo, bolas ao alvo, barquinhas, casa do coelhinho, barraca bar e uma aparelhagem de som, sob o comando do meu primo e locutor, Almir Ribeiro, eram algumas das atraes dessas noitadas. Como eram lindas as msicas tocadas no alto falante da quermesse, graas ao bom gosto do saudoso Almir! Como eram divertidos os oferecimentos que fazamos s namoradas e, muitas vezes, de forma annima para provocar a reconciliao de alguns casais de namorados que estavam brigados! E os bilhetinhos que rolavam na quermesse, pelo correio elegante, tambm era uma forma de comunicao extraordinria e muito agradvel! Em todos os fins de semana, as comisses formadas trabalhavam e o povo comparecia em massa, prestigiando os eventos. Quem promovia hoje, trazia seus convidados; amanh, era tambm convidado e no podia faltar. Por essa razo, em apenas 07 anos, aps a bno de sua pedra fundamental, em 16 de julho de 1958, foi sagrada, solenemente, a majestosa Igreja Matriz de Nossa Senhora do Carmo, pelo sacerdote mais ilustre, filho de Borda da Mata, Dom Joo de Rezende Costa, Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, recentemente falecido. Esse monumento de f e coragem, por si s, prova indiscutvel da capacidade do povo bordamatense e confirma, uma vez mais, a verdade contida no refro: a unio faz a fora. Em 16 de dezembro de 2005, a bela Matriz, por deciso do Papa Bento XVI, foi elevada categoria de BASLICA MENOR,

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tornando-se, ento, um monumento turstico, atraindo romeiros e peregrinos da Virgem do Carmo. Borda da Mata, assim, projetou-se no cenrio de Minas, do Brasil e at mesmo da comunidade catlica internacional. Se hoje temos a Baslica consagrada Nossa Senhora do Carmo, essa epopia religiosa que os bordamatenses, com justificado orgulho, escreveram ao longo de sua histria recente, imprescindvel salientarmos o mrito do santo sacerdote que foi MONSENHOR PEDRO CINTRA. Mais importante do que o monumento de pedra, ele construiu um verdadeiro santurio nos coraes dos bordamatenses, ensinando-os a amar Jesus e a venerar sua Me Santssima. Monsenhor foi notvel orador sacro, porm, mais relevante do que sua brilhante oratria foi seu legado de aes. Muitos foram seus testemunhos concretos de amor fraterno, solidariedade e carinho. Somos testemunhas do quanto confortava seus paroquianos, com seu apoio em todos os momentos difceis de suas vidas. Foi ele a presena de Jesus, principalmente nas visitas aos doentes e quando trazia o seu abrao amigo nos bitos de nossas pessoas queridas. Tenho a honra de ter sido seu coroinha e tambm de outro grande sacerdote, o saudoso Monsenhor Antnio Tibrcio, que foi vigrio de nossa parquia. Notvel orador sacro e que sempre celebrou, deixando transparecer o seu entusiasmo sacerdotal, mesmo em idade avanada. Envaidece-me tambm o privilgio de ter testemunhado a bno da pedra fundamental daquela majestosa Igreja, que deveria um dia se tornar Baslica e, assim, por vontade de Deus, cumprir o seu destino histrico. 12. Figuras folclricas bordamatenses Algumas personagens marcaram poca em nossa cidade e sero sempre lembradas. Na minha infncia, recordo-me da pessoa de Pai Joo, um velho negro de braos fortes e porte vigoroso, que conhecera os rigores da escravido e gostava de contar fatos dos

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tempos que antecederam sua alforria. Com sua barba comprida e seus cabelos brancos, ao contar suas estrias, era uma figura simptica e que infundia respeito. Acredito que vrias cidades brasileiras, a exemplo de Borda da Mata, conheceram outros negros semelhantes a Pai Joo, narrando os horrores de uma poca em que o ser humano foi tratado e negociado como objeto de propriedade do seu senhor. Felizmente esse tempo de barbrie e humilhao, que nos envergonha, est terminado... Outra personagem, que coincide com a poca urea do cinema bordamatense, foi Dito Capito. Papai era dono do prdio do cinema. Iniciou suas atividades ainda na fase do cinema mudo e, quando os primeiros filmes sonoros comearam, fazia questo de exibir aqui os melhores daquela poca, com ou sem prejuzo financeiro. Os filmes eram contratados em Cruzeiro; tio Sanico era o responsvel pela projeo, enquanto tio Juquita ficava na bilheteria e mame na portaria; Chatola, mais tarde um dos melhores jogadores de futebol da histria do esporte bordamatense, quando ainda adolescente, foi vendedor de pipocas e amendoim torrado. Um detalhe: papai, mo aberta que sempre foi, deixava a crianada entrar na metade da exibio. Justamente nesse perodo de minha meninice, lembro-me da figura popular de Dito Capito, um preto de pequeno porte, com um papo saliente e sempre com um sorriso nos lbios. Era ele famoso, porque embora pequeno fisicamente, havia comentrios de que seria bem dotado, particularidade que o tornou objeto da curiosidade popular. Sabedores de que era f de cinema, todos gostavam tambm de indagar-lhe a respeito de nomes de filmes, dos quais sabia informar detalhes, inclusive os nomes de artistas e conversar, principalmente, sobre captulos de seriados e fitas estreladas por Tyrone Power, Maria Montez, Tarzan, Roy Rogers, Ton Tyler e Buck Jones. Aprendera tambm usar algumas expresses em ingls como very god e god night, que todos gostvamos de v-lo pronunciar, em

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suas respostas. Enfim, na sua simplicidade, Dito Capito foi uma dessas peas raras e inesquecveis do folclore bordamatense. Mais uma personagem fantstica povoa a minha lembrana. Trata-se de Dorica. Ela viveu muitos anos na casa da famlia do Sr. Augusto Cobra, casado com a professora Isaura Megale Cobra, respeitvel anci (recentemente falecida) que por muitos anos morou na Rua Herculano Cobra. Ali Dorica trabalhava como domstica e os ajudou a criar filhos e netos. Quem no se lembra dessa mulher, em trajes ciganos, sempre com saias bem rodadas, adornos chamativos, com o rosto bem pintado, falante, cantando e danando em nossas praas ou defronte a Igreja Matriz! ... Era uma espcie de embaixatriz da alegria, que trazia na face a pureza das almas inocentes e, em seu sorriso, a simplicidade, a riqueza da bondade e magia que a todos ns encantava! Dorica uma dessas figuras que acabam se transformando em mitos. Uma espcie de anjo bom que Deus nos enviou em seus desgnios insondveis, para cumprir quem sabe uma grande misso. Talvez mostrar que a felicidade est nas almas de pessoas simples como esta personagem, sendo o prmio merecido dos muitos gestos concretos de amor, nica fonte inesgotvel de paz e de alegria... Um certo dia, minha querida sobrinha Mrcia rica, filha do carssimo mano Agenor, que sempre aqui passava frias em sua primeira infncia, sumiu a tarde toda; depois de exaustiva busca, s foi encontrada, j no cair da noite, na entrada do cemitrio. que, embevecida, estava acompanhando a Dorica que atraa a crianada com seu verdadeiro show, cantando e danando com a costumeira graa e alegria. Foi ento que minha estimada cunhada Leda, estressada pela preocupao, ao chegar em casa sua filha Mrcia, recebeu-a com boas chineladas, sobrando uma delas para sua sobrinha, Regina, que, inseparvel da sua amiga, fora a primeira a entrar no quarto. Mrcia rica, confirmando a ocorrncia, em telefonema recente, contou-me que, curiosa, de fato acompanhara Dorica, naquela tarde. Ento, num verdadeiro ritual, Dorica colhia flores no jardim da praa, que depois

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levava ao cemitrio, colocando-as em diversos tmulos, onde rezava em voz alta, com Mrcia rica e outras crianas. Outra personagem popular que conheci, foi Z Janeiro, cujo nome verdadeiro desconheo. O ms de janeiro, poca de chuvas fartas, o ms mais propcio para a colheita de abobrinhas, que nele nascem com abundncia. Sabendo que ficava bravo, ao ser chamado pelo apelido, a crianada, por tabela, mexia com o Z, perguntandolhe qual o ms das abobrinhas. E como, aps a pergunta, sua reao imediata era lanar mo de um porrete, logo saam correndo em desabalada carreira, enquanto o pobre homem, indignado, tentava alcan-los, proferindo os mais variados palavres... Recordo-me ainda da personagem Orestes, famoso pela resposta cinco a tudo que lhe era indagado. Quantos anos voc tem, Orestes? Cinco, respondia ele, embora com boa idade nas costas. Quantos irmos? Cinco. Quantos pares de sapato? Cinco. Quantas casas? Cinco. Enfim, cinco era a resposta que sempre trazia nos lbios para qualquer pergunta. Somente mudava, quando lhe indagavam: Com quem voc vai se casar? - Com a Nice do Amadeu, prontamente respondia. Nice era a jovem mais linda e formosa da cidade, o que prova que de bobo no tinha nada. Orestes era pobre e morava no bairro do buraco, atual Bairro So Francisco, assim batizado pelo governo do Dr. Vav, onde se localiza tambm a Vila Vicentina. Era lambo e andava sujo, com as unhas compridas. Corria na cidade um boato de que se alimentava com merda de galinha e virava lobisomem nas noites de lua cheia. Por isso, a crianada morria de medo dele, como se isso fosse realmente verdade. Outra personagem folclrica foi um roceiro, homem trabalhador e honesto, vendedor de laranjas, que costumava vir at a cidade com seus jacs sobre o lombo da mula. De idade avanada, ele era completamente surdo e, por essa razo, suas respostas no

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tinham nexo algum com as perguntas que lhe eram feitas. Da a imaginao popular inventou um dos seus possveis dilogos com um fregus que lhe comprava laranjas: Como vai sua mulher?, disse-lhe o fregus. - Pode chupar que boa; se no gostar no precisa pagar nada..., respondeu o vendedor, convencido de que seu produto era de tima qualidade. Finalmente, a personagem Joaquim Pacuera, que exercia a profisso de barbeiro para a gente mais simples da cidade, ficou clebre pela excelncia do portugus com que tabelou os preos de seu estabelecimento: - Cortume e penteio de cabelo - 10 mil reis; - Faume de barba 05 mil reis. Fregueis, fassa o favor de no pedir fiado. 13. O Carnaval de Borda o melhor que h... Durante a minha mocidade, por volta dos anos de 1954 a 1970, o Carnaval de Borda era muitssimo animado. As msicas eram agradveis, de bom gosto e as letras bem sugestivas. A mocidade gostava de cantar as marchas e sambas carnavalescos, que decorava com facilidade pela simplicidade das letras. Confete e serpentina faziam parte da festa, com um salo muito bem decorado com motivaes daquela poca. E ainda no estava proibido o uso de lana-perfume, que, por essa razo, inconscientes de que poderia ser prejudicial sade, era muito apreciado pelos folies para dar mais nimo e entusiasmo na participao dos bailes de Carnaval. Foi nessa ocasio dos anos 50, que surgiu o famoso Bloco ESTAMOS A, reunindo grande nmero de jovens. A direo do bloco estava a cargo do grande folio Geraldo Juventino, mais conhecido por Geraldo, que alguns anos depois, aps seu falecimento, em homenagem pstuma que lhe foi prestada, com justia, pela direo do Clube Literrio e Recreativo de Borda da Mata, foi cognominado O Rei do Carnaval. De fato, era destaque

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de folio, sempre trajando fantasias luxuosas e chamativas. Entrava com seu bloco, triunfalmente, nos sales e danava de modo caracterstico, como um verdadeiro Mestre Sala dos dias de hoje. Os preparativos e ensaios do Estamos A aconteciam com muita antecedncia, no prdio do antigo e improvisado clube social, que, mais tarde, fora adaptado para cinema sob responsabilidade da Sra. Adlia Lopes. O imvel situava-se na Praa Antnio Megale, exatamente na esquina da Rua Salvador Orlandi, local onde hoje acabou de ser construdo o maior edifcio da nossa cidade, onde se instalou no trreo a Caixa Econmica Federal. Aps o desfile nas ruas e praas principais, o bloco, com suas evolues e fantasias, ao som da batuta comandada pelo saudoso msico Otvio Oriolo, adentrava o salo, apoteoticamente, cantando o seu hino oficial, na voz de meu mano, Zezinho de Mello, o popular Chico, que teve importante papel como cantor, animando durante vrios anos todas as noitadas carnavalescas: Morena, morena, o Carnaval de Borda o maior que h, e quando passa pelas ruas, que chu, estamos a o que que h! Borda da Mata com seu povo hospitaleiro, que tem conversa, tambm dinheiro, pois este ano o carnaval de abafar, estamos a o que que h! Tempos depois, as novas geraes criaram outros blocos, como Bordela, Trombadinhas e Chacoalha Bambuzeiro; os dois primeiros tiveram anos dourados, com muito sucesso. Principalmente a BORDELA teve especial destaque, com seus carros alegricos e fantasias mais sofisticadas, algumas delas de notvel qualidade. O Carnaval tinha sempre sucesso garantido e o clube era freqentado por inmeros visitantes e filhos de Borda que, por motivos variados, foram construir suas famlias e trabalhar fora

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daqui. Mas, na poca das frias escolares sempre regressavam terra natal, fazendo questo absoluta de participar dos bailes e festas aqui realizados. Os anos 50 e 60 foram os melhores vividos em nossa querida mocidade e dos quais guardamos as mais carinhosas recordaes. 14. POO: PISCINA IMPROVISADA - A MOROFAIA Os tempos de criana e adolescncia so como um filme em tecnicolor, deslumbrantes e mgicos. Tudo era muito bom, apesar de que em nossa terra ainda no havia piscina; o clube de campo somente surgiu por volta do ano de 1.967, com um grande churrasco de confraternizao dos scios proprietrios, do qual participei. O poo se localizava no Rio Mandu, a uma distncia aproximadamente de 300 metros da Estao Ferroviria. Meu pai, na poca comerciante de sunos, era proprietrio de um mangueiro de porcos, ao lado de Estao; o poo ficava muito prximo desse mangueiro e a rapaziada fazia a limpeza do local, de modo a ficar mais agradvel a prtica da natao. A gua era de boa qualidade e ainda no chegara a poluio da rede de esgotos, nem as dragas para retirada de areia. No vero, levantvamos muitas vezes ao amanhecer do dia e amos curtir o sol do alvorecer, saboreando gua aquecida em contraste com a temperatura ambiente. Foi l no poo que aprendi a nadar. A turma era numerosa e costumava vir at a venda do Sr. Luiz, para comer broas e outros quitutes de excelente qualidade. Numa dessas manhs, descamos a atual Avenida Magalhes Pinto, rumo ao poo. Naquela poca, a Borda terminava na esquina do sobrado do nosso amigo Zico de Freitas. A rua, em direo estao ferroviria, era de terra e, no meio, ficavam os postes de iluminao. Vnhamos conversando e nosso saudoso amigo Coco, todo cheio de pose, usando um culos ray-ban, se distraiu e trombou com um desses postes. Seu ray-ban quebrou-se no incidente, ocasio em que observou: Macacada, isso um lapso que acontece sempre...

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A trombada foi motivo de conversa e gozao o ms inteiro, principalmente porque Coco no pode usar o ray-ban nas fotos que tiramos no poo. No sei at que ponto verdade, mas, naquela poca, o poo era objeto de comentrios curiosos. Soubemos que algum teria se queixado ao meu pai dos moleques que ali costumavam nadar pelados. Teria comentado que algumas moas, inclusive filhas do queixoso, estariam usando binculos para enxergar a molecada. Evidentemente, a reclamao, por sua flagrante improcedncia, no merecia acolhimento e apenas serviu para aumentar a curiosidade de conhecer o j ento famoso Poo... Uma das atraes da era ferroviria bordamatense era a chegada e partida da Maria Fumaa, trem de passageiros da Rede Mineira de Viao; diariamente, aqui passava pela manh, rumo a Ouro Fino e voltava, por volta das 05 da tarde, na direo de Pouso Alegre. A estao era bem freqentada por gente de todas as idades; porm, era visitada principalmente pelos jovens que, curiosos, gostavam de andar pelos vages, interessados em conhecer pessoas de outras cidades e arranjar novas namoradas. Na poca do carnaval, os batuques eram presenas indispensveis a desfilar pelos vages, cantando alegremente as marchas tradicionais. Foi, ento, que meu mano Waldir teve a idia de criar a banda MOROFAIA, que viria a ser talvez a maior atrao do carnaval bordamatense, pela sua originalidade. Tratava-se de uma banda em que os vrios instrumentos eram tocados por pessoas que nada sabiam de msica. Eram simples curiosos que, por mera diverso, sopravam aqueles instrumentos e soavam taris e caixas ruidosas, numa desorganizao coletiva. Da estao subiam at as ruas e praas do centro de Borda, uniformizados e com cara de srios, como se tocassem de verdade. Numa dessas apresentaes, um saudoso amigo que a tudo assistia, ao lado de papai, na sua simplicidade de roceiro, fez-lhe um comentrio que o deixou surpreso: S Agenor, o senhor no acha que eles esto um pouco desafinados?

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Foi ento que papai o esclareceu que aquilo nada mais era do que uma simples brincadeira, uma farra daquela turma... Assim, sob a batuta do meu mano Waldir, a banda Morofaia fez histria de tempos bons de uma mocidade, que se divertiu e marcou poca, curtindo a juventude, de forma sadia. Esses jovens provaram que possvel viver momentos de alegria e diverso, sem apelar para o vcio criminoso e mortal das drogas... 15. DO POO AO CLUBE DE CAMPO TIRADENTES Em nossa adolescncia, sem piscina, tivemos que improvisar o poo do rio Mandu, que ficou famoso, marcando poca em nossa memria. Anos depois, por volta do ano de 1.967, um grande sonho da mocidade bordamatense acabou se tornando realidade. inaugurado o Clube de Campo Tiradentes, com um grande churrasco comemorativo, que reuniu os scios fundadores. Dentre tantos bordamatenses, que foram baluartes nesse empreendimento social, como o saudoso ex-presidente Luiz Silveira, merece tambm destaque especial o saudoso amigo Dr. Jos Janurio de Carvalho. Foi ele o presidente fundador e o clube s existe, graas a seu trabalho herico. Homem de grande valor e esprito pblico, em seu mandato, colocou todo o seu empenho. Sei perfeitamente que chegou ao ponto de empregar recursos prprios para que a obra fosse concluda. Z Carvalho, como era conhecido, funcionrio pblico da antiga Coletoria Estadual, competente e dedicado, viera de Belo Horizonte, a formosa capital mineira. Aqui fez grandes amigos e elegeu nossa terra como sua cidade, constituindo sua estimada famlia com nossa conterrnea urea Silveira. Exerceu com dignidade a cidadania, participando ativamente da vida poltica local, tendo sido eleito vereador Cmara Municipal e dos mais capazes, destacando-se na presidncia do Legislativo. Apoiou a tudo que fosse de real interesse da comunidade. Pena que tenha falecido to prematuramente, pois amou Borda da Mata,

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intensamente, como autntico cidado benemrito bordamatense, ttulo que lhe foi outorgado por mritos prprios. Nessas farpas do corao, quando relembro e homenageio a sua figura memorvel, percebo que ocorre feliz coincidncia. Homenageado e lembrado ser tambm seu inseparvel amigo Dr. Paulo Sebastio Guimares, com quem era visto diariamente caminhando na praa. Ambos expoentes da recente histria bordamatense, que, pelos muitos servios prestados comunidade, conquistaram a estima, a admirao e o respeito de todos ns. 16. FRANGO NO MATO A proximidade das residncias das irms de mame e o fato de vov Lbia ter morado conosco foram fatores de grande unio entre os descendentes da nossa carssima av materna, como j comentei. Nossas reunies familiares eram freqentes e concorridas. Nas frias, inclusive, era tradicional um passeio na roa, oportunidade em que fazia parte do cardpio o que denominamos frango no mato. Era um almoo simples: um panelo de arroz com batata e frango caipira, cozido ao molho de tomate, cebola e salsa. Os mestres cucas foram se sucedendo, ao longo dos anos: o saudoso Geraldo e, depois, os manos Zezinho e Waldemar. O passeio era bem organizado e os locais escolhidos sempre agradveis. Os trabalhos de compra dos alimentos, refrigerantes, cerveja, frutas e verduras eram divididos. lgico que sempre houve algum a liderar e coordenar os trabalhos, como meu saudoso mano Waldir, enquanto viveu. A presena do primo Almir Ribeiro, com seu violo e voz maravilhosa que Deus lhe deu, j era a garantia de sucesso do passeio. Alm dos nossos irmos, sobrinhos e primos, muitos amigos tambm participavam, como meu cunhado Wilson Jia, o saudoso Zez da Lpia, Lapenha, Genival, Otelo Freitas e outros. Alguns fatos pitorescos ocorreram nesses eventos e que ficaram gravados na memria. Nosso primo Roberto Ribeiro, acidentalmente, ao retirar um pedao de frango, virou o panelo que

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ficava apoiado em tijolos, em fogo improvisado. Caldo de galinha e pedaos foram ao cho, misturando-se com areia e outros ingredientes, causando um rebolio geral. No me lembro de como foi contornado esse incidente, mas com certeza tudo acabou bem. Em outro passeio, meu cunhado e compadre Wilson Jia encheu a cara e ficou aprontando das suas, ocasio em que colocou um punhado de terra no prato do Coco, que, como todo bom garfo, estava saboreando o seu prato recheado. A brincadeira abominvel foi alvo de crtica feroz, mas um caf amargo e banho frio bastaram para amansar a fera... A marcha implacvel do tempo embraqueceu nossos cabelos e a sentida ausncia de entes queridos que se foram, talvez seja o motivo pelo qual o tradicional frango no mato j no tem o mesmo encanto. No mais acontece todos os anos. J se arrefeceu aquele nimo que nos empolgava os dias de frias, como se nota na fita gravada pelo sobrinho Rogerinho, com depoimentos histricos e a voz inigualvel do primo Almir na interpretao fantstica de Detalhes, famosa cano de Roberto Carlos. Ficou no peito a saudade desse tempo bom e as lembranas que tm um valor imenso. Elas constituem um tesouro precioso que nos motiva a viver bem e agradecer a Deus, pela bondade de nos ter permitido vivenciar tantos momentos alegres e felizes. 17. PASSEIOS NA FAZENDA DOS TIOS JORDINO e VIDOCA Os anos passam celeremente, sendo impossvel conter sua marcha implacvel. De repente, percebemos que nossos cabelos ficaram brancos. Tudo passa, porm, so inesquecveis os momentos felizes de nossa infncia; dentre esses, recordo-me de nossas caminhadas matinais, nas frias, at o stio do tio Jordino e Vidoca. Tia Vidoca era irm de nossa av Lbia; portanto, tia de mame e nossa tia em segundo grau. Tio Jordino era da numerosa e tradicional famlia Marques.

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O caminho para chegar ao stio era pela antiga estrada de Borda a Ouro Fino; descamos pela Rua Francisco Marques da Costa e seguamos sempre em frente. Mame comandava nossa caminhada de 5 quilmetros, bem cedinho; chegando ao stio, tia Vidoca nos esperava com um almoo saboroso, em que no podia faltar frango caipira, couve e batata frita. Sobremesa: melado com queijo fresco. Tio Jordino cuidava bem do seu canavial e fabricava rapaduras; por isso, sempre tinha melado a oferecer aos visitantes. Num desses passeios, ele nos contou que, certo dia, hospedara um amigo; aps o jantar, serviu-lhe a sobremesa, colocando inicialmente uma travessa de melado sobre a mesa; enquanto voltara cozinha para pegar os talheres e pratinhos de sobremesa, o visitante no se fez de rogado e, com uma colher, passou a saborear o melado da travessa inteira. Ao voltar, tio Jordino constatou que o guloso comera todo o melado; todavia, por educao, perguntou-lhe: O amigo aceita mais um pouco? Seguiu-se a resposta do visitante: - Obrigado, S Jordino, gosto de melado, porm, pouco... Eram muito divertidos os dias que passamos no stio da tia Vidoca; passeios a cavalo, futebol e brincadeiras, no terreiro de caf; arapucas para caar passarinhos, vontade. Havia espao de sobra para tudo, vivenciando as alegrias desse tempo to bom e ainda um cenrio maravilhoso tendo a cidade de Borda como pano de fundo. 18. ESTUDOS PRIMRIOS NO COLGIO N. S. DO CARMO. Muito cedo, com 06 anos de idade, meus pais me matricularam no Colgio Nossa Senhora do Carmo, para fazer o primeiro ano do ento denominado Curso Primrio. O colgio se localizava na atual Praa Monsenhor Pedro Cintra, exatamente onde hoje se apresenta, majestoso, o atual Frum Mrio Martins, um dos melhores do sul de Minas. Era um casaro com vrias salas, corredores e ampla rea de cho batido para a prtica de esportes. Aprendi as primeiras letras com a saudosa Professora Nilza Caponi, aquela que me alfabetizou; depois me recordo da Professora

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Maria Anchieta, mais conhecida por Palma, que em suas aulas nos ensinava tantos cnticos interessantes como aquele do melado e da rapadura; das amadas mestras guardo as melhores lembranas e imensa gratido. Ficaram tambm na lembrana os diletos colegas de turma e as queridas Religiosas Dominicanas, como as Irms Martha, ngela e Madre Santo Alberto, que participaram desse perodo to bom e divertido de nossa infncia. Recordo-me nitidamente do dia em que a diretora apresentou aos alunos o Reverendssimo Padre Pedro Samuel Gonalves Cintra, que acabara de assumir a Parquia de Nossa Senhora do Carmo; meses depois, com sua ajuda, em pouco tempo foi construda a atual sede do Colgio Nossa Senhora do Carmo. Participei das solenidades de sua inaugurao e ali encerrei o curso primrio, recebendo o meu primeiro diploma. Borda da Mata muito deve a esta notvel Escola Dominicana, parte de sua histria e hoje Colgio de Primeiro Mundo, um dos cartes de visita e orgulho de nossa cidade, ao lado de nossa Baslica da Virgem do Carmo e do Hospital Geritrico Irm Maria Augusta. O visitante que aqui chega para compras em nossa Capital dos Pijamas, alm de conhecer as belas instalaes do florescente parque industrial bordamatense, no pode deixar de visitar esses verdadeiros monumentos de nossa amada Borda da Mata. 19. SANTO CRUZEIRO NO ANTIGO BURACO. A religiosidade dos bordamatenses fato indiscutvel e fartamente comprovado ao longo da histria de nossa gente. Ainda na minha infncia, em poca de Misses, o povo levou em seus ombros, em procisso, at o alto do antigo Buraco uma pesada cruz. A emoo tomou conta do povo, no instante em que naquela colina ergueu-se, sobranceiro, o SANTO CRUZEIRO, como que abenoando a nossa cidade. Foi o marco daquele tempo de evangelizao, que ficou plantado no alto do morro, ao lado do Buraco, que, aos nossos olhos de crianas, parecia aumentar dia a

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dia. Ali fazamos, habitualmente, caminhadas e passeios, local onde podamos encontrar pedras brilhantes e de cores variadas. Tempos depois, esse mesmo local se transformou pela ao de pesados tratores em terraplenagem, surgindo a obra gigantesca do Lar Irm Maria Augusta Hospital Geritrico, graas generosidade da famlia dos benemritos e saudosos, Lauro e Afonsina Reis Megale, de seus filhos, netos e da grande Empresa de Transportes Atlas que dirigiam, na capital de So Paulo, com vrias filiais em outras capitais de estados brasileiros. Esta a grande e modelar obra, espelho do carinho e amor desta famlia sua cidade e ao seu povo. O Lar dos Velhinhos e o Hospital Geritrico, com suas instalaes magnficas, continuaro sempre a espargir o bem, atravs dos sculos, cumprindo o destino histrico traado pelos seus dignos idealizadores. Meu caro irmo primognito, Narcy de Mello, h quase meio sculo funcionrio da Atlas, decantou em versos poticos o papel dessa obra monumental, inaugurada em 22 de fevereiro de 1.976 e que transformou o alto do velho buraco: Foste o buraco primeiro Onde a criana brincou, Depois o Santo Cruzeiro Em que a cidade orou. A seguir foste o projeto Com que Afonsina sonhou, Mais tarde o lar de concreto Que Lauro edificou. Hoje abrigas a tantos Velhos, pobres e doentes, A praticar sempre o bem. Que Deus, os anjos, os santos Em ti estejam presentes Para todo sempre AMM! Borda, 11/09/1979.

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20. ADOLESCNCIA: DIFICULDADES NOS ESTUDOS E ORIENTAES DOS PAIS. No foi nada fcil enfrentar os estudos, ento denominados cursos ginasial e colegial. Com apenas 11 anos de idade, em maro de 1951, aps ser aprovado nos exames de admisso ao ginsio, fui para o internato do Colgio So Jos de Pouso Alegre, em histrica viagem de trem, s 17:00 horas, nos tempos em que ainda existia a Rede Mineira de Viao. importante salientar que, nessa poca, em Borda havia apenas os cursos ginasial e magistrio (ento denominado Normal) do Colgio Nossa Senhora do Carmo, porm com exclusividade para mulheres. Os homens eram, ento, discriminados. Assim, nos anos 50, estudo masculino era privilgio das famlias bordamatenses mais abonadas, que tivessem dinheiro para manter seus