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FACULDADE INTEGRADA DA GRANDE FORTALEZA

REVISTA PERSPECTIVA JURÍDICA FGF

Revista Científica do Curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza

Revista Perspectiva Jurídica FGF /Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. V. 1, N. 8, Jul.

/Dez. 2014.

Fortaleza – Ceará 2014

Publicação Semestral

ISSN 1809-9459

1. Periódico científico – Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. 2. Artigos diversos. 3.

Faculdade Integrada da Grande Fortaleza

Endereço:

REVISTA PERSPECTIVA JURÍDICA FGF

FACULDADE INTEGRADA DA GRANDE FORTALEZA

CEUDESP - Centro de Educação Universitário e Desenvolvimento Profissional LTDA

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Tel. +55 (85) 3299-9900 / Fax. +55 (85) 3496-4384 /

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Expediente

Mantenedora

Centro de Educação Universitária e Desenvolvimento Profissional – CEUDESP

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Eng. Julio Pinto Neto – Diretor de Infra-estrutura

Eng. Adolfo Marinho – Diretor de Expansão

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Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF

Eng. José Liberato Barrozo Filho - Diretor Geral

Prof. Ms. Paulo Roberto de C. Nogueira – Diretor Acadêmico

Marina Abifadel Barrozo - Diretora Administrativa

Paulo Roberto Melo de Castro Nogueira – Diretor Acadêmico

Editorial Milena Marcintha Alves Braz (FGF)

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Antonia Ieda de Souza Prado (FGF / UFC VIRTUAL)

Carlos César Rocha Mazza (FGF)

Casemiro de Medeiros Campos (FAP)

José Alexandre de Sousa Junior (FGF)

Milena Marcintha Alves Braz (FGF)

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Editora Maria Coeli Saraiva Rodrigues

José Rogério Viana de Oliveira

Revisão Técnica Damião Carlos Nobre Jucá

Projeto Gráfico

Capa

Márlon Silveira Oliveira

Diagramação

Maria Coeli Saraiva Rodrigues

Rogério Viana de Oliveira

� As ideias e opiniões emitidas nos artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo,

necessariamente, as opiniões do editor e, ou, da FGF – Faculdade Integrada da Grande Fortaleza.

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Seções Editorial....................................................................................................................

01

Artigos Prejuízos da proteção processual do estado a si próprio – Vinícius Paiva Martins e Layer Leorne Mendes Júnior................................................................................

04

Atuação de ofício do magistrado no sistema acusatório – Antônio Ivo Pereira Lima e Celso Cosme Salgado...................................................................................

26

A legitimidade na lavratura do termo circunstanciado de ocorrência pela polícia militar no estado do Ceará – José Armando Pereira Ferreira e Maria Lucia Falcão

46

Do concurso material de delitos: porte ilegal de arma de fogo e receptação – Antônio Evandro de Oliveira e João Celso de Castro Moura...................................

66

A utilização da parceria público-privada (PPP) no sistema prisional brasileiro – José Augusto Abreu Sousa e Luís Otávio Franco Martins.......................................

84

A redução da maioridade penal – Henrique Freitas Damasceno e Pedro Valter Leal...........................................................................................................................

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Revista Perspectiva Jurídica FGF – 2014.2 | ISSN 1809-9459

1

EDITORIAL

Dando continuidade a árdua e necessária tarefa de produção e divulgação do

conhecimento científico publicamos mais uma edição da Revista Perspectiva Jurídica do

Curso de Direito da FGF.

Os artigos aqui apresentados versam sobre variadas temáticas das Ciências

Jurídicas sempre na busca por uma reflexão sobre assuntos atuais e relevantes para a

sociedade. Nesta edição, 2014.2, apresentamos os seguintes trabalhos: na seara do Direito

Constitucional “Prejuízos da proteção processual do Estado a si próprio” dos autores

Vinícius Paiva Martins e Layer Leorne Mendes Júnior. O trabalho aborda o tema da

superproteção do Estado a si mesmo em suas relações processuais buscando um

entendimento sobre as prerrogativas processuais concedidas à Fazenda Pública quando

esta integra a lide, bem como suas razões e o possível ferimento ao princípio

constitucional da igualdade.

Na esfera do Direito Penal apresentamos o trabalho “Atuação de ofício do

magistrado no sistema acusatório” dos autores Antônio Ivo Pereira Lima e Celso Cosme

Salgado. O artigo versa sobre aspectos legais e constitucionais da atuação de ofício do

magistrado no sistema acusatório. Ainda nesta área de estudo temos “A legitimidade na

lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência pela Polícia Militar no Estado do

Ceará” de autoria de José Armando Pereira Ferreira e Maria Lucia Falcão Nascimento. O

texto trata sobre a discussão em torno das atribuições das polícias militar e civil que são

órgãos do Estado incumbidos constitucionalmente de preservar a ordem pública, de

proteger as pessoas e o patrimônio da Nação, bem como de realizar a investigação e

repressão dos crimes com vistas a conter a violência. Os autores evocam o §5º do art. 144

da Constituição Federal, de 1988 que trata das competências da polícia militar para

problematizar sobre a possibilidade desta corporação exercer outras atividades como, por

exemplo, a lavratura dos Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO’s).

Ainda na esfera do Direito Penal temos “Do concurso material de delitos: porte

ilegal de arma de fogo e receptação” de Antônio Evandro de Oliveira e João Celso de

Castro Moura. O trabalho problematiza acerca da aplicação ou não do concurso material

de delitos entre o porte ilegal de arma de fogo (artigo 14 da lei 10.826/2003) e a

receptação. A escolha do tema deu-se pela grande quantidade de indiciados por porte

ilegal de arma de fogo que não respondem, no mesmo processo, também pela receptação

da arma, ou seja, quando a aquisição da arma de fogo é feita de forma ilícita.

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“A utilização da Parceria Público-Privada (PPP) no sistema prisional brasileiro”

dos autores José Augusto Abreu Sousa e Luís Otávio Franco Martins faz uma reflexão na

área do Direito Administrativo. O trabalho aborda a Parceria Público-Privada (PPP) no

sistema prisional brasileiro e tem como premissa a afirmação de que o investimento em

infraestrutura no país encontra obstáculo na inércia da capacidade do Estado em

disponibilizar à população obras e equipamentos necessários ao bem-estar social. Diante

do exposto, o objetivo geral desta pesquisa é investigar a eficácia da parceria público-

privada no sistema prisional brasileiro.

O último artigo desta edição trata de um tema polêmico e de bastante publicidade

na atualidade, “A redução da maioridade penal” dos autores Henrique Freitas Damasceno

e Pedro Valter Leal. O trabalho analisa a ilegalidade da redução da maioridade penal

brasileira, no aspecto puramente jurídico-constitucional. Os autores apontam os principais

argumentos doutrinários acerca da redução da maioridade penal defendendo que a

inimputabilidade penal seja considerada cláusula pétrea, impossibilitando tal alteração.

Por fim, desejamos que as produções apresentadas nesta Revista, contribuam para o

desenvolvimento do debate sobre os temas jurídicos.

Profa Dra Milena Marcintha Alves Braz

Editora Científica Revista Perspectiva Jurídica da FGF

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ARTIGOS

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PREJUÍZOS DA PROTEÇÃO PROCESSUAL DO ESTADO A SI PRÓPRIO

Vinícius Paiva Martins Aluno do curso de Direito na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected] Layer Leorne Mendes Júnior Professor Especialista do curso de Direito na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected]

RESUMO: O presente artigo aborda o tema da superproteção do Estado a si mesmo em suas relações processuais. Objetiva-se avaliar as prerrogativas processuais concedidas à Fazenda Pública quando esta integra a lide, bem como suas razões e o possível ferimento ao princípio constitucional da igualdade. Obtendo-se como resultado, sérios prejuízos para os cidadãos que se aventuram na tentativa de receber a justa prestação jurisdicional em ações contra o Estado e os prejuízos financeiros gerados nos cofres públicos que afetam a coletividade. Assim, doutrinadores travam acirradas discussões sobre a constitucionalidade das diferenças de tratamento processual dispensado à Fazenda, principalmente pelo fato de a maioria das normas protetoras terem sido estabelecidas em governos ditatoriais. O novo CPC tenta trazer algumas soluções para esta problemática que se expressa de forma bastante complexa, visto que são várias as suas causas geradoras. Por isso, o tema precisa de um estudo crítico.

Palavras-chave: Superproteção, Processuais, Fazenda Pública, Igualdade, Prejuízos.

ABSTRACT: This research paper addresses the issue of overprotection of the State itself in its procedural relationships. Objective is to evaluate the procedural prerogatives granted to the Treasury when it integrates the deal, as well as their reasons and possible injury to the constitutional principle of equality. Obtaining as a result, serious damage to citizens who venture in an attempt to receive fair adjudication in actions against the state and the financial losses generated in the public coffers that affect the community. Thus, scholars waging heated arguments on the constitutionality of procedural differences in treatment accorded to the Treasury, mainly because most protective standards have been established in dictatorships. The new CPC tries to bring some solutions to this problem that is expressed in a very complex way, since they are generating their various causes. Therefore, the issue needs a critical study. Keywords: Overprotection, Procedural, Treasury, Equality, Damage.

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1 INTRODUÇÃO

Onde existir seres humanos se

relacionando, haverá conflitos, e é nesse

contexto que o direito ao longo dos

séculos vem tentando regra normas que

gerencie o comportamento das pessoas em

seu convívio em comunidade. O homem

abriu mão de sua “liberdade” dando ao

Estado o poder de tomar para si suas

dores, resolvendo da maneira mais justa.

O ordenamento jurídico brasileiro

garante que todos podem ter acesso à

tutela jurisdicional; que todos são iguais

perante a lei e que para o Estado agir em

defesa dos direitos e garantias individuais

deve ser provocado. Porem mesmo com

um normativo tão bem elaborado, a nossa

justiça é morosa e se agrava ainda mais

quando a parte reclamada é o próprio

Estado.

O Estado que era para defender os

direitos de seus cidadãos, muitas vezes

tem lesado tais direitos e na hora de

ressarci os danos, sempre se esquiva da

responsabilidade. Os prazos processuais

para o Estado são maiores em relação à de

uma pessoa comum; o Estado propaga a

conciliação de conflitos como solução

alternativa, mas ele mesmo não se

interessa em conciliar quando está como

réu; e sem falar da remessa necessária que

obriga automaticamente ações contra o

Estado o duplo grau de jurisdição mesmo

sem ser recorrido. Por isso, no senso

comum já se fala que “a pessoa morre e

não recebe o ressarcimento de seu direito

lesado”, o que leva a se pensar bastante

antes de entrar com uma ação contra o

Estado.

O objetivo geral deste trabalho é

investigar os danos causados ao povo

brasileiro pelo Estado devido sua proteção

exagerada a si mesmo em todas as formas

processuais, identificando seus

pressupostos e motivos.

Já os objetivos específicos são:

Analisar as causas dessa superproteção,

suas consequências materiais aos cidadãos

e ao próprio Estado, verificar se há

motivos em pleno século XXI dessas

barreiras jurídicas, estudar quem é o

verdadeiro hipossuficiente dessa relação e

o ferimento do princípio da igualdade.

A metodologia utilizada foi de

pesquisa bibliográfica e documental,

através da análise da literatura já publicada

em forma de livros, revistas, publicações

avulsas e imprensa escrita, bem como

pesquisa a leis, normas, pesquisas on-line,

dentre outros que tratam sobre o tema.

Finalmente, nas considerações

finais foram apresentadas as conclusões

correspondentes aos objetivos propostos

no inicio do trabalho.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A MOROSIDADE DA JUSTIÇA

BRASILEIRA

Todos os anos, milhares de pessoas

procuram a tutela jurisdicional por terem

sido lesadas em seus direitos e a maioria

reclama da morosidade do sistema

processual. Ações que possuem todos os

requisitos para terminarem rapidamente,

por causa de tantos recursos acabam se

prolongando por anos, causando desgaste

emocional e material tanto para o

particular como para o Estado.

Para tentar amenizar essa demora,

foram criados os juizados especiais pela

lei Federal n.º 9.099, de 26 de

setembro de 1995 para demandas cujo

valor não ultrapasse a 20 salários mínimos.

Outra vantagem é a gratuidade do primeiro

grau de jurisdição, ou seja, não precisar

desembolsar nenhum centavo de custas

judiciais e ainda a assistência de um

advogado é facultativa. Mesmo assim, a

justiça brasileira ainda é muito lenta e o

problema se agrava ainda mais quando a

parte reclamada é o próprio estado,

criando-se inclusive um provérbio popular

de que “a pessoa morre e não vê a justiça

sendo feita”.

Na maioria das vezes, o estrago é

maior exatamente para os cidadãos que

cumprem a lei. A morosidade favorece

quem está na ilegalidade, por exemplo,

podemos citar a venda de produtos piratas

e a adulteração de combustíveis que são

algumas das áreas que usam a chamada

‘indústria de liminares’ com a entrada

incessante de recursos na Justiça para

continuar operando à margem da lei.

É preciso desobstruir o Judiciário,

fazer valer as decisões tomadas por

tribunais inferiores e simplificar as leis.

(ZANELLA, 2002, p. 40) "Uma Justiça

morosa é uma Justiça que privilegia quem

não tem razão. Uma Justiça justa,

conforme estabelecido na Constituição

Federal, é uma Justiça que seja célere,

rápida e eficaz", constata o ministro do

STJ, João Otávio de Noronha.

José Renato Nalini comenta o

assunto da seguinte forma (LIMA, 2005,

p. 35): “[...] que havia um decreto de

Carlos Magno autorizando o litigante, a

quem o juiz não provesse logo com a

sentença, transportar-se para a casa do

magistrado, passando a viver à custa deste

até que o feito tivesse seguimento”.

Ironizando o tema em seu artigo ainda

completa (LIMA, 2005, p. 35): “se esse

decreto existisse hoje, certamente não

haveria cômodos nas casas dos juízes para

tanta gente. Não é incomum encontrar

processos com mais de dez anos de

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tramitação, às vezes sem qualquer decisão

de primeiro grau.”.

As frequentes alterações da

legislação infraconstitucional emperram a

máquina judiciária está centrada no

elevadíssimo número de recursos

disponíveis, sendo relevante ressaltar que

o Poder Público é quem mais se favorece

de tal fato. Grande parte dos recursos que

tramitam no Judiciário envolve interesses

da Administração Pública. Os supostos

benefícios decorrentes com a interposição

de recursos por parte da Administração

Pública são centrados notoriamente na

morosidade do Judiciário, uma vez que na

busca de adiar os pagamentos devidos aos

seus credores procura “empurrar o caso

com a barriga”.

Morosidade da justiça estimula a

autotutela para a solução dos conflitos

apresentados, promovendo a perda de

direitos e a desordem social. Seguindo a

mesma linha de raciocínio, não é demais

dizer que a demora na entrega da prestação

jurisdicional é fator responsável por

afastar as pessoas do Poder Judiciário,

indo, pois, em desencontro com o direito

do acesso à Justiça.

2.1.1 Ferimento de Princípios

No âmbito constitucional, o retardo

da prestação jurisdicional fere

abruptamente o princípio da igualdade, o

qual nos ensina que todos são iguais

perante a lei, e, em decorrência, o

princípio da isonomia, que consiste em

tratar igualmente os iguais e

desigualmente os desiguais (conforme

Aristóteles). Não raras vezes também

presenciamos “acordos” desvantajosos ou

indesejados pela parte mais desfavorecida.

Nos ensinamentos de Celso Antônio

Bandeira de Melo (1998, p. 9), o preceito

da igualdade é um mandamento voltado

para o aplicador da lei e também para o

próprio legislador, que registra seu

pensamento da seguinte forma (MELO

2005, p. 10):

A lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos. Este é o conteúdo político-ideológico absorvido pelo princípio da isonomia e juridicizado pelos textos constitucionais em geral, ou de todo modo assimilado pelos sistemas normativos vigentes.

Expressamente, não encontramos o

princípio da razoabilidade na Constituição,

entretanto este fato não nos permite inferir

esteja o mesmo ausente do nosso sistema

constitucional, ao contrário, podemos

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verificar sua existência implícita em

diversos textos de nossa Carta.

Sobre os precatórios onde pode

receber em 10 anos A Emenda

Constitucional nº 30, de 13/09/2000 agride

a moralidade pública e consagra a

ineficiência da Administração na solução

de seus débitos, em tempo razoável, com

afronta a princípios do artigo 37, caput, da

Carta Magna, anulando, assim, a garantia

individual do pleno acesso à justiça efetiva

(CF, art. 5º, XXXV) e, por isso, esbarra na

norma proibitiva do parágrafo 4º, inciso

IV, do artigo 60, da Constituição da

República Federativa do Brasil.

O Estado, por meio de seus órgãos

específicos para a aplicação do Direito,

não tem apenas o dever de prestar a

atividade jurisdicional, devendo executá-la

com eficiência e celeridade. O que na

prática não ocorre quando nos deparamos

com a precária estrutura do Poder

Judiciário.

2.1.2 Ineficiência da Justiça

Fazendo uma cosmovisão da

justiça brasileira, o TJRS é o mais

eficiente entre tribunais estaduais do país,

aponta pesquisa feita em 2012. O Tribunal

gaúcho destaca-se na gestão de despesas e

receitas, pessoal, litigiosidade e

produtividade conforme apontado pelo

IDJus, Índice de Desempenho da Justiça,

pois obteve 69 pontos, em uma escala de 0

a 100, ficando em primeiro lugar no

ranking. Vale lembrar que o acesso à

justiça pressupõe não apenas o ingresso,

mas também a utilidade deste.

O Ceará está entre os estados com

maior morosidade processual possuindo

um Número de processos por juiz que

supera a média nacional. Para se ter uma

ideia do problema, De acordo com o

presidente da ACM, a média de processos

por juiz de primeiro grau ao ano no Ceará

é similar à nacional e com casos

alarmantes, como a 3ª Vara de Maracanaú,

com 21.390 processos (junho/2014), mais

de três vezes a média nacional, que é de

5,6 mil processos por juiz de primeiro grau

ao ano, dado do Conselho Nacional de

Justiça (CNJ).

O Estado precisa aparelhar o

Judiciário para em tempo hábil dirimir as

questões decorrentes de tais mudanças.

Essa atualização tecnológica deve ser

abrangente e não apenas se concentrar nas

capitais e nos grandes fóruns. Ha falta de

gerenciamento do Poder Judiciário,

refletindo, principalmente, na elaboração

dos atos judiciais, onde simples equívocos

no nome das partes e nos seus respectivos

endereços fazem com que o processo se

atrase meses e meses.

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Não foi a toa que Amaral (2003, p.

34) escreveu:

Quanto à outra causa da morosidade da Justiça brasileira (estadual e federal, em todos os graus de jurisdição), a gerencial, temos que a gestão da máquina

judicial ainda é pouco profissional e pontuada por clientelismo e nepotismo (até concursado para porteiro é requisitado para gabinetes).É preciso uma nova e moderna cultura gerencial. Hospitais e escolas já dispõem de administradores profissionais de nível superior. Ora, magistrados não devem perder tempo com a gestão de meios. [...] O problema não se resume à reforma de leis e não há de melhorar o suficiente somente com o aumento de verbas. Não. Trata-se, isso sim, de reforma sistêmica, superação de certas concepções.

O processo judicial por sua

natureza é burocrático, porém há sem

duvidas, problemas estruturais que causam

a morosidade do aparelho judiciário.

2.2 O ESTADO COMO LITIGANTE

O Conselho Nacional de Justiça

(CNJ) realizou um estudo dos cem

maiores litigantes do Brasil, e chegou à

conclusão que o poder público é

responsável por mais de 20% dos

processos existentes no país. O campeão é

o Instituto Nacional do Seguro Social

(INSS), com 22,3% das ações dos cem

maiores litigantes nacionais. A Caixa

Econômica Federal ficou em segundo

lugar, com 8,5% e a Fazenda Nacional

ocupou a terceira posição, com 7,7% das

demandas. Na sequência está o Banco do

Brasil e o Banco Bradesco.

No que se refere aos Tribunais

Superiores, o setor público é responsável

por nada menos que 90% dos processos

em tramitação. O primeiro colocado é o

Poder Executivo Federal, que representa

67% das ações, e dentre os doze maiores

litigantes, dez são estatais. São eles: a

Caixa Econômica Federal (CEF), a União,

o Instituto Nacional do Seguro Social

(INSS), o Estado de São Paulo, o Banco

Central, o Estado do Rio Grande do Sul, o

município de São Paulo, a Telemar Norte

Leste S/A, o Banco do Brasil e o estado de

Minas Gerais. Há prejuízos ate no

crescimento econômico do país devido as

grandes perdas do erário publico e ainda

gera insegurança jurídica.

O Poder Público faz notadamente

uso indevido dos recursos do Poder

Executivo. Por exemplo, analisados os

recursos extraordinários e agravos de

instrumentos protocolados no STF entre 1º

de janeiro de 2002 e 30 de junho de 2004,

constatou-se que, de fato, o poder público

é o grande litigante. Os sete maiores

usuários do Supremo são órgãos do

Executivo. Quem deveria dar o exemplo é

o primeiro a emperrar a Justiça com

recursos e, como se não bastasse, a valer-

se, depois de transitada em julgado a

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sentença, da interminável fila dos

precatórios.

Antônio de Pádua Ribeiro há época

ministro do Superior Tribunal de Justiça,

em entrevista à revista Consulex (1998, p.

07), enfatizou:

[...] O Estado aposta nas deficiências e nos problemas do Poder Judiciário para postergar direitos e para negar benefícios aos cidadãos, principalmente os mais carentes e mais desprotegidos. [...] Os sucessivos pacotes econômicos, com sua imensa carga de antijuridicidade e de violenta subversão dos contratos e dos direitos dos cidadãos, respondem, também, por um número expressivo dessa carga.

A Advocacia-Geral da União é a

instituição que, diretamente ou através de

órgão vinculado, representa a União,

judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe,

nos termos da lei complementar que

dispuser sobre sua organização e

funcionamento, as atividades de

consultoria e assessoramento jurídico do

Poder Executivo, por isso Não há que se

falar em máquina despreparada para agir

em defesa dos interesses do Estado.

A Conclusão a que chegam todos

os que se indignam contra as normas

processuais protetoras é que fica difícil

argumentar em defesa da necessidade de

existência dos privilégios concedidos à

Fazenda Pública sob o fundamento da

burocracia própria das instituições estatais.

Assim, percebe-se que Fazenda Pública é

parte muito mais forte que qualquer

particular no processo.

2.3 ALGUMAS PRERROGATIVAS DO

ESTADO

O exagerado formalismo

processual é uma grande causa da

morosidade da Justiça. Os entraves

causados no andamento do processo fazem

com que o direito material seja visto como

algo secundário quando na verdade

deveria ter prioridade na solução dos

litígios.

De um lado, há aqueles que

defendem tais discrimines como meras e

necessárias prerrogativas, principalmente

em razão do interesse em disputa ser não

de um indivíduo, mas da coletividade.

Infelizmente nossos Tribunais têm se

manifestado reiteradamente sobre a

questão dos privilégios da Fazenda Pública

em Juízo. Mas vale ressaltar que a maioria

das normas protetoras, foram estabelecidas

na época de governos ditatoriais.

Por sua vez, entendimentos há, e

não são poucos, que veem os tratamentos

diferenciados como absurdos privilégios,

intoleráveis, frente ao princípio da

igualdade, como exemplo podemos citar

os seguintes doutrinadores: Cândido

Rangel Dinamarco, José Carlos de Araújo

Almeida Filho, Hermann-Josef Banke

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(Professor da Universität Erfurt da

Alemanha), Ricardo Perlingeiro Mendes

da Silva (Professor Titular da Faculdade

de Direito da UFF e Juiz Federal no Rio de

Janeiro), Roberto Rosas (Ex-Ministro do

Superior Tribunal Eleitoral e Professor da

UNIVERSIDADE de Brasília), Rogério

Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci,

Cassio Scarpinella Bueno, dentre outros.

2.3.1 A dilatação dos prazos

A União legislando em causa

própria sempre se beneficia quando é parte

em uma ação judicial, chegando a possuir

prazos ate quatro vezes maior de que uma

pessoa comum para praticar seus atos

processuais. “Computar-se-á em

quádruplo o prazo para contestar e em

dobro para recorrer quando a parte for a

Fazenda Pública ou o Ministério Público.”

(Art. 188 CPC) in verbis.

O que deveria na realidade ocorrer

é o que está previsto no artigo 125, inciso

I, que “o juiz dirigirá o processo conforme

as disposições deste Código, competindo-

lhe: I – assegurar às partes igualdade de

tratamento.

2.3.2 A prescrição e as pretensões

formuladas em face da Fazenda Pública

Sabemos que “o direito não socorre

aqueles que dormem”. Existem dois tipos

de prescrição: aquisitiva e extintiva. No

que se referem à Fazenda Pública, as

regras a serem aplicadas são as constantes

do Decreto nº 20.910 de 6 de janeiro de

1932 e Decreto-lei nº 4.597, de 19 de

agosto de 1942 onde: “as dívidas passivas

da União, dos Estados e dos Municípios,

bem assim todo e qualquer direito ou ação

contra a Fazenda Federal, Estadual ou

Municipal, seja qual for a sua natureza,

prescrevem em cinco anos contados da

data do ato ou fato do qual se originarem”

O fato é que, enquanto para as

demais pessoas há prazos bem mais

longos, conforme prescreve o Código

Civil de 2002, em seus Arts. 205 e 206,

chegando a 10 (dez) anos, quando se tratar

da Fazenda Pública, não importam do que

se trate, o prazo é de apenas 5 (cinco)

anos, o que constitui uma diferença

relevante.

2.3.3 Os Prazos do Estado-Juiz

No âmbito judicial tudo gira em

torno de prazos e ate o juiz como

funcionário do Estado também deve seguir

a risca os prazos. Porem não é o que

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normalmente ocorre, podendo nesses casos

qualquer uma das partes ou ate mesmo o

Ministério Publico representar ao

presidente do tribunal de justiça contra o

juiz ate para que outro decida o litígio

conforme o artigo 198 do código

processual civil (CPC).

Art. 198 Qualquer das partes ou o órgão do Ministério Público poderá representar ao presidente do Tribunal de Justiça contra o juiz que excedeu os prazos previstos em lei. Distribuída a representação ao órgão competente, instaurar-se-á procedimento para apuração da responsabilidade. O relator, conforme as circunstâncias, poderá avocar os autos em que ocorreu excesso de prazo, designando outro juiz para decidir a causa

Percebe-se que não há nenhuma

punição efetiva pelo desrespeito ao prazo

pelos juízes que podem alegar, por

exemplo, simplesmente o grande número

de processos para decidir, pois a lei é bem

subjetiva quanto ao motivo justo de não

cumprimento dos que “Em qualquer grau

de jurisdição, havendo motivo justificado,

pode o juiz exceder, por igual tempo, os

prazos que este Código lhe assina” (CPC

Art. 187) in verbis.

O próprio juiz, enquanto

administrador da justiça, é o principal

descumpridor do Estado, vez que, via de

regra, não obedece ao período que lhe é

estipulado para o andamento dos feitos.

Diniz (2005, on-line) assevera que “[...]

um juiz que não tem tempo substantivo

para resolver a legalidade de uma detenção

imediatamente, por exemplo, é porque não

tem tempo para ser juiz. O ideal seria

obedecer aos prazos previstos pela própria

lei [...]”.

O Código de Processo Civil, em

seu art. 133, prevê a responsabilidade

pessoal do magistrado por condutas

tipificadas como passíveis de acarretar

danos aos jurisdicionados. Senão vejamos:

Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando: I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude; II – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providências que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte. Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não lhe atender o pedido dentro de 10 (dez) dias. (Grifo nosso)

Apesar de este dispositivo prever a

responsabilidade pessoal do juiz, a

jurisprudência não exclui a

responsabilidade do Estado em reparar os

danos decorrentes dos atos daquele, haja

vista que o magistrado está agindo na

qualidade de agente público. (AVELINO,

2005).

Delgado (1998, p. 35) cita

oportunamente o julgamento do então

Ministro Aliomar Baleeiro, que, embora

vencido, se pronunciou com destaque:

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Dou provimento ao recurso, porque me parece subsistir, no caso, responsabilidade do Estado em não prover adequadamente o bom funcionamento da Justiça, ocasionando, por sua omissão de recursos materiais e pessoais adequados, os esforços ao pontual cumprimento dos deveres dos juízes. Nem poderia ignorar essas dificuldades, porque, como consta das duas decisões contrárias ao recorrente, estando uma das Comarcas acéfala, o que obrigou o juiz a atendê-la, sem prejuízo da sua própria – ambas constitucionais de serviço – a Comissão de Disciplina declarou- se em regime de exceção, ampliando os prazos.

É certo que, sendo lesiva ao

jurisdicionado, a demora da prestação

jurisdicional também é causa para

responsabilizar o Poder Público em

indenizar a vítima decorrente dos atos dos

seus agentes, conforme entendimento

consubstanciado no art. 37, § 6º da

Constituição Federal.

2.3.4 Remessa necessária

Retardando ainda mais o

ressarcimento pelo estado, existe a

remessa necessária que é o reexame das

decisões acima de 60 salários-mínimos

proferidas contra a União, o Estado, o

Distrito Federal, o Município e

suas respectivas autarquias e fundações.

Neste caso as decisões são submetidas a

novo julgamento, ainda que não tenha

havido recuso voluntário das partes, para

produzirem efeito. Nesse sentido,

transcreve o Código de Processo civil

(Brasil, 1973) da seguinte forma:

Art. 475 (CPC). Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I – proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público; II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI). (...) § 2o Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 salários-mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

A remessa necessária foi

introduzida originalmente no direito

português no ano de 1355 pelo Rei D.

Afonso IV, no direito processual penal. No

Brasil, foi introduzida em 04.10.1831

sendo mantida ate hoje no CPC e segundo

a Súmula 423 do STF não se transita em

julgado a sentença por haver omitido o

recurso ex officio, que se considera

interposto ex lege, ou seja, tem que passar

pela remessa necessária.

Pela história do surgimento da

remessa necessária, quando as

Procuradorias Gerais dos Estados não

estavam bem organizadas, fazia mais

sentido a superproteção do Erário; porém

hoje o poder público é representado por

procuradores bem gabaritados fazendo

com que tal procedimento seja

desnecessário e protelatório.

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2.3.5 Dispêndios da demanda processual

Quando a ré ou autora for a

Fazenda Pública, esses dispêndios ou não

existem ou se dão de forma diferenciada,

vejamos algumas delas:

Dispõe o art. 19 do CPC que “[...]

cabe às partes prover as despesas dos atos

que realizam ou requerem no processo,

antecipando-lhes o pagamento desde o

início até sentença final [...]”, porém o

artigo 27 do CPC dispõe que “as despesas

dos atos processuais, efetuados a

requerimento do Ministério Público ou da

Fazenda Pública, serão pagas a final pelo

vencido”. Isto inclui aquelas destinadas a

remunerar terceiras pessoas estranhas ao

aparato judicial, a exemplo do perito, das

despesas com a comunicação dos atos

processuais etc.

O mesmo não acontecerá quando

se tratar de causa perante as Justiças

Estaduais, apesar da regra do CPC (art.

1.212), assim como o disposto na Lei nº

9.028, de 12 de abril de 1995, que dispõe

sobre o exercício das atribuições

institucionais da Advocacia-Geral da

União, cujo art. 24-A reza in verbis: “A

União, suas autarquias e fundações, são

isentas de custas e emolumentos e demais

taxas judiciárias, bem como de depósito

prévio e multa em ação rescisória, em

quaisquer foros e instâncias”.

É que, conforme estabelecido pela

Constituição (art. 151, inciso III), a União

não poderá conceder isenção de tributos

estaduais e, sendo as custas e

emolumentos espécies de tributo,

conforme já dito acima, a norma do CPC

não foi recepcionada pela Carta Magna.

Reforça esse entendimento o fato de a Lei

nº 9.289 de 4 de julho de 1996 estabelecer

em seu art. 1º e § 1º que “rege-se pela

legislação estadual respectiva a cobrança

de custas nas causas ajuizadas perante a

Justiça Estadual, no exercício da jurisdição

federal”.

Isso também se reflete no recursos,

pois são dispensados do preparo e também

esta isenta do pagamento da importância

de 5%, previsto no art. 488, inciso II do

CPC, referente à Ação Rescisória, tendo

em vista que o parágrafo único do mesmo

artigo faz a ressalva de que tal dispositivo

não se aplica à União, ao Estado, ao

Município e ao Ministério Público.

Por fim a Lei n. 9.494, de 1997,

que dispõe: ‘os juros de mora, nas

condenações impostas à Fazenda Pública

para pagamento de verbas remuneratórias

devidas a servidores e empregados

públicos, não poderão ultrapassar o

percentual de seis por cento ao ano’.

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2.4 A RESPONSABILIDADE

OBJETIVA DO ESTADO

A lei é bem clara ao prevê a

responsabilidade civil do Estado, ou

melhor, das pessoas jurídicas de direito

publico nos casos de atos ilícitos

(comissivos ou omissivos) gerados por

seus agentes públicos. Isto reflete o

princípio da legalidade e isonomia; pois o

Estado como pessoa jurídica de direito

publico não foge a regra da

responsabilidade civil, mesmo que regido

por princípios próprios, incluindo-se

ainda, as pessoas jurídicas de direito

publico auxiliares do Estado, as de direito

privado que desempenha cometimentos

estatais sob concessão ou delegação

explícitas ou implícitas. Temos, pois,

como pressupostos da responsabilidade

civil: a ação, o dano e o nexo de

causalidade.

Por conta do comportamento de

seus agentes, a responsabilidade e o risco

do Estado é objetivo, havendo direito de

regresso contra o agente faltoso

condicionado a conduta culposa ou dolosa

deste (art. 37.§6 CF e art. 43 CC).

Art. 43CC. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.

art. 37§ 6º CF – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A lógica da responsabilidade do

Estado se baseia na questão de que o

Estado como criador das leis, também

deve se submeter a elas, e ate o

CDC(código de defesa do consumidor)

traz previsões sobre a responsabilidade do

Estado pelo funcionamento dos serviços

públicos, que não decorre da falta, mas do

fato do serviço publico, acolhendo assim o

legislador, a teoria do risco administrativo.

Art. 22 CDC. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código

A jurisprudência brasileira mais

recente já acolhe o dever do Estado

também responder por danos morais. A

objeção no atinente à impossibilidade de

quantificação não serve para liberar o

Estado. A reparação, ainda que possa

colocar como simbólica, será o desagravo

pelo dano sofrido. Demais disso, os danos

morais podem e devem ser cumulados

como os materiais.

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Tudo isto é fruto de uma conquista

lenta e decisiva do Estado de direito pois a

doutrina mais antiga defendia a

irresponsabilidade absoluta do Estado,

através de uma ideia absolutista que via o

Estado como um ente todo-poderoso que

sempre prevalecia sobre os direitos

individuais, valendo-se da célebre

expressão the king can do not wrong (o rei

não pode errar). Sendo assim, se um

funcionário no desempenho de sua função

lesasse direitos individuais, ele é que,

pessoalmente deveria reparar o dano e não

o Estado. Negar indenização pelo Estado

em qualquer de seus atos que causam

danos a terceiros é subtrair o poder publico

de sua função primordial de tutelar o

direito.

Já há decisões trazendo como

precedente, uma responsabilidade solidaria

entre o Estado e seu agente público, ou

seja, o lesado pode entrar contra o estado,

contra o funcionário ou contra ambos nos

casos de culpa e dolo, conforme o

Informativo n. 0532 Período: 19 de

dezembro de 2013:

Na hipótese de dano causado a particular por agente público no exercício de sua função, há de se conceder ao lesado a possibilidade de ajuizar ação diretamente contra o agente, contra o Estado ou contra ambos [...] A pessoa jurídica, que, em princípio, é mais solvente que o servidor, independentemente de demonstração de culpa do agente público [...] Dessa forma, a avaliação quanto ao ajuizamento da ação contra o agente público ou contra o Estado

deve ser decisão do suposto lesado. Se, por um lado, o particular abre mão do sistema de responsabilidade objetiva do Estado, por outro também não se sujeita ao regime de precatórios, os quais, como é de cursivo conhecimento, não são rigorosamente adimplidos em algumas unidades da Federação. Posto isso, o servidor público possui legitimidade passiva para responder, diretamente, pelo dano gerado por atos praticados no exercício de sua função pública, sendo que, evidentemente, o dolo ou culpa, a ilicitude ou a própria existência de dano indenizável são questões meritórias.

Teoricamente deveria ser melhor

entrar apenas contra o Estado, por sua

responsabilidade ser objetiva e possuir

melhores condições de arcar

financeiramente com o prejuízo, porém na

prática devido à demora não é o que

acontecesse, fazendo com que o STJ

decidisse dessa maneira, pois legitimidade

dos atos administrativos não é absoluta.

O poder público de regra não

responde por danos resultantes de atos

legislativos, mas há hipóteses em que se

admitem, tais como: o fato do próprio

legislador ter estabelecido a

responsabilidade do Estado fixando a

indenização na própria lei; ato que gerar

direta ou indiretamente lesão de ordem

patrimonial especial e anormal a um

cidadão ou grupo de cidadãos, pois a

norma constitucional no art. 37, § 6° não

distingue atos legislativos, administrativos

e jurisdicionais.

Ainda há responsabilidade no que

se refira aos atos do Judiciário, sendo

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reconhecido no CPP art. 630 e art. 05,

LXXV da CF em caso do condenado ficar

preso além do tempo fixado em sentença,

pois o magistrado na relação processual é

agente do Estatal. O art. 485 do CPC

também prevê ação de revisão ou de

rescisão de sentença, em matéria civil, por

sentença de mérito, transitada em julgado,

rescindida por ter sito dada por

prevaricação, concussão ou corrupção do

juiz, proferida por juiz impedido ou

absolutamente incompetente, ofender

coisa julgada, violar literal disposição da

lei; fundar-se em prova, cuja falsidade

tenha sido apurada em processo criminal,

ou seja, provada na própria ação

rescisória, ter havido fundamento para

invalidar confissão, desistência ou

transação em que se baseou a sentença,

haver sido fundada em erro de fato,

resultante de atos ou de documentos da

causa (CPC art. 485, I, II, IV, V, VI, VIII,

IX)

Por último há responsabilidade do

Estado também na ordem internacional

pelas normas que promulgar ofensivas aos

direitos internacionalmente reconhecidos

pelas nações aos estrangeiros baseando-se

na denegação da justiça ou esgotamento

dos recursos jurídicos proporcionados do

queixoso.

2.4.1 Prescrição do direito de regresso

contra o agente público

A ação regressiva contra o

funcionário nas hipóteses previstas é dever

do estado e não facultativo, como decorre

do art. 37, § 5º, da Constituição do País.

Merece destaque, no que diz respeito à

prescrição, o artigo 1º – C da Lei Nº 9.494,

de 10 de setembro de 1997, que foi a

Conversão da MP v nº 1.570-5, de 1997,

estabelecendo assim:

Art. 1º – C – Prescreverá em cinco anos o direito de obter a

Indenização dos danos causados por agentes de pessoas

jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito

privado prestadoras de serviços públicos.

Com efeito, haverá o direito de

regresso contra o agente ate cinco anos

após o transitado em julgado, mas maneira

como as ações contra o Estado são longas,

esse servidor talvez irá se aposentar ou ate

falecer antes de sofrer a ação regressiva.

2.4.2 Precatórios

Transitado em julgado e perdendo

o Estado a ação, o ressarcimento será pago

por meio de precatórios, que são as ordens

judiciais de débitos dos órgãos públicos

federais, estaduais, municipais ou distritais

segundo o art. 100 da constituição federal,

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pois não se processam pela penhora de

bens dos entes públicos ou expropriação,

mas pela expedição de uma ordem de

pagamento.

Realiza-se a requisição de

pagamento entre o poder judiciário e o

poder Executivo conforme dispõem os

artigos 730 e 731 do CPC. É chamada de

execução impropria, cujo procedimento na

teoria é longo e na prática mais ainda, que

tentando sintetizar, ficaria da seguinte

maneira: Seja judicial ou não o título

executivo, a citação da fazenda será feita

sem cominação de penhora, limitando-se à

convocação para opor embargos em 10

dias (Art.730, caput). Não havendo a

oposição de embargos, ou sendo estes

rejeitados, o juiz, através do Presidente do

Tribunal Superior, expedirá a requisição

de pagamento que tem por nome de

precatório. O juiz de primeiro grau não

requisita diretamente o pagamento, mas

dirige-se a requerimento do credor, ao

Tribunal que detém a competência recursal

ordinária, cabendo ao respectivo

presidente formular a requisição à Fazenda

Publica executada.

É obrigatória a inclusão no

orçamento da verba necessária ao

pagamento dos débitos constantes dos

precatórios, apresentados ate 1º de julho

do ano anterior (Art. 100, §1º CF). As

importâncias orçamentarias destinadas ao

cumprimento dos precatórios ficarão

consignados ao Poder Judiciário,

recolhidas nas repartições competentes

(Art. 100, §2º CF). O pagamento será feito

ao credor na ordem de apresentação do

precatório e a conta do respectivo credito

(art. 730, nº II CPC). Se o credor for

preterido no seu direito de preferência,

mediante pagamento direto pela Fazenda

ou outro exequente, poderá requerer ao

Presidente do Tribunal que expediu a

ordem de pagamento que, depois de

ouvido o chefe do Ministério Público,

ordene o sequestro da quantia necessária

para satisfazer o debito (art. 731CPC).

Dirige-se contra o credor que tenha

recebido pagamento fora da ordem legal,

atingindo as importâncias irregularmente

embolsadas. O supremo Tribunal Federal,

no entanto, em decisão de pleno, já

admitiu a possibilidade de que tal

sequestro pudesse recair diretamente sobre

as rendas da Fazenda Publica infratora, em

quantia suficiente para satisfazer o credito

exequendo.

E por último, quando houver

oposição de embargos pela Fazenda

Publica, o seu processamento será feito de

conformidade com o disposto no art. 740 e

seu paragrafo único. Se a sentença

desacolher a pretensão fazendária, enseja o

duplo grau necessário de jurisdição. (art.

475, III CPC).

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O problema que aflige partes e

juízes é a demora do cumprimento dos

precatórios pela administração, surgindo

uma diferença de acessórios (juros e

correção monetária) em detrimento do

credor. Admitem-se sucessivos precatórios

complementares quando houver

defasagem de juros e correção monetária

entre o requisitório e o efetivo

adimplemento da obrigação pelo poder

Publico, pois se a expedição do precatório

não produz o efeito de pagamento, os juros

moratórios continuaram incidindo

enquanto não solvida a obrigação.

O exequente receberá seu direito

durante dez (10) anos, conforme dispõe a

nova regra trazida pela EC nº 30/2000,

constante do art. 78 do ADCT. Somando-

se esse longo prazo concedido aos Entes

Públicos com o do trâmite da ação,

chegaremos ao mega prazo de quase vinte

(20) anos.

Apesar de todo o caminho

percorrido, tendo já sido incluído no

orçamento, não há garantia de que o débito

seja quitado, pois os pagamentos são feitos

na ordem cronológica de inscrição dos

precatórios e pode ser que não haja verba

suficiente para saldar o valor total

constante de todos os precatórios.

Nas palavras de Marcus Vinícius

Lima Franco (2006, p. 8): “diante de uma

disciplina tão especial, pergunta-se se,

realmente, existe execução contra a

Fazenda Pública”.

2.5 PREJUÍZOS AOS COFRES

PÚBLICOS E A ECONOMIA

Além do desgaste emocional e

financeiro da parte autor, quando enfim o

Estado vai pagar pelo dano que causou,

grande será o rombo nos cofres públicos,

pois devido a um processo tão longo será

pago com juros, correão monetária, além

dos honorários advocatícios e ainda

indenização suplementar conforme o art.

389 e 404 do código civil.

Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. Art. 404. Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.

O Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (IPEA) Constatou um prejuízo

de cerca de US$ 20 bilhões por ano.

Justificando Essa percepção, a pesquisa

publicada pela revista “Análise Justiça”,

em 2006, analisou as 250 principais

decisões dos Tribunais Superiores, durante

o período compreendido entre o ano de

1998 a 2006. Para a escolha das decisões

do STF e do STJ foram consultados vários

especialistas na área entre advogados,

promotores, procuradores, juízes, juristas,

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empresários, acadêmicos e os próprios

ministros.

O estudo mostrou que apenas as 10

maiores causas em tramitação no STF e no

STJ somavam cerca de R$ 250 bilhões. A

pesquisa também descobriu que o maior

cliente do Poder Judiciário é o próprio

poder público, ou seja, verificou-se que é o

Estado-Administração é o que contribui

consideravelmente para o excesso de

processos nas Cortes Superiores e,

consequentemente, para a morosidade.

Sobre o assunto, Rodrigues (2004,

p. 47) se manifesta:

[...] a ineficiência do Poder Judiciário está atrapalhando pesadamente o desenvolvimento do País. Os defeitos da Justiça inibem investimentos que poderiam fazer o PIB crescer cerca e 13,7%. Em decorrência, haveria um volume maior de investimentos e a oferta de empregos poderia ter um aumento substancial. [...] o Poder Judiciário é um dos principais responsáveis pela explosão das taxas de juros, pois sua atuação deficitária produz insegurança na hora de reaver o dinheiro e faz com que os bancos emprestem com taxas elevadas.

Percebemos que um funcionamento de

qualidade por parte do Poder Judiciário é o

caminho para dirimir todos esses

problemas advindos da morosidade que

repercute em todos os âmbitos da

sociedade

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

O Presente tema exigiu

investigação bibliográfica a fim de

levantar dados importantes para discutir o

paradoxo que envolve a segurança e

eficiência jurídica com a morosidade que

tanto assola o sistema processual

brasileiro, principalmente quando o Estado

é parte do processo.

O desafio de reverter tal situação

pesa sobre o novo Código de Processo

Civil, sendo necessário para realização

deste trabalho, consultar a doutrina

principalmente em livros, artigos,

periódicos, materiais disponibilizados em

sites especializados em Direito Processual

civil na internet, bem como jurisprudência

e matérias jornalísticas, para respaldar e

evidenciar os prejuízos causados ao

próprio Estado e a pessoas que vivenciam

longos processos contra a União, o Estado,

o Distrito Federal, e Municípios, através

de uma investigação descritiva sobre o

assunto.

4 ANÁLISE DOS DADOS E

RESULTADOS

Passadas as discussões

preliminares sobre a problemática dos

“privilégios” processuais que a Fazenda

Publica possui, propõe-se agora uma

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investigação sobre os reflexos dos

prejuízos causados dessa superproteção.

Não se pretende aqui esgotar todas

as formas de prejuízos causados pela

proteção processual ao Estado como

litigante, ate porque, só foram citadas as

principais prerrogativas, mas o assunto é

bastante vasto.

Mantendo-se a mesma

sistematização, serão abordados tópicos

onde serão avaliados pontos específicos

através da apreensão jurídica, que

exemplificará e confirmará os problemas

decorrentes deste tema. Posteriormente

será realizada uma análise geral e

conclusiva sobre a problemática.

4.1 CORRUPÇÃO NOS PRECATÓRIOS

A extrema morosidade e a extrema

burocratização no recebimento dos

precatórios tem alimentado a corrupção.

Segundo site do “museu da corrupção” em

matéria publicada este ano que faz uma

retrospectiva de vários casos de corrupção

envolvendo precatórios como o caso dos

Ex-prefeitos Paulo Maluf e Celso Pitta

(PP-SP), envolvidos no escândalo, no qual

foram acusados de improbidade

administrativa e denunciados por

corrupção passiva, evasão de divisas,

lavagem de dinheiro, formação de

quadrilha e organização criminosa. Às

vésperas da realização do 1º turno das

eleições municipais de 1996, cujo rombo

pode ter chegado a R$ 10 milhões.

O esquema ilegal também é

apontado em Santa Catarina e Pernambuco

e consistia na emissão de títulos públicos

lastreados em letras do Tesouro para o

pagamento de precatórios. A venda dos

títulos era feita sem licitação e o sistema

de compra e recompra causou prejuízos

aos cofres públicos estimados em R$ 3

bilhões. Só em Pernambuco, dos R$ 480

milhões emitidos, apenas R$ 234 mil

destinavam-se a precatórios alimentares. A

reportagem aponta outros diversos casos

em todo o país e afirma que a grande

dificuldade era provar o desvio, pois o

dinheiro entrava no caixa único da

Prefeitura, e não se sabia qual dinheiro

pagou o quê, conforme também tentou

explicar a revista Veja, de 12/03/1997.

Em dezembro de 1996, o Senado

instalou a CPI dos Precatórios, na qual em

março de 1998, o então prefeito Celso

Pitta e o ex-prefeito Paulo Maluf foram

condenados à perda dos direitos políticos

por acusação de improbidade

administrativa. A pena de Pitta ainda

somou o bloqueio de seus bens. Ambos

recorreram da sentença, e em novembro de

2001, foi decreta a prescrição dos crimes

de Maluf, pois ele completara 70 anos de

idade.

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4.2 FALTA DE PARTICIPAÇÃO DO

ESTADO COMO LITIGANTE, NOS

MEIOS ALTERNATIVOS DE

SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Nem mesmo como o CNJ

incentivando a política de conciliação no

âmbito do Judiciário por meio da

Resolução CNJ n. 125, de 29/11/10, que

instituiu a Política Judiciária Nacional de

Tratamento Adequado dos Conflitos de

Interesses, para concretizar o princípio

constitucional do acesso à Justiça, segundo

o qual “a lei não excluirá da apreciação do

Poder Judiciário lesão ou ameaça a

direito” (art. 5º, inciso XXXV da

Constituição da República) foi suficiente

para resolver o problema.

A União incentiva particulares a

resolverem seus conflitos por métodos

alternativos como a conciliação, a

mediação e a arbitragem regulamentada

com a promulgação da Lei n.º 9.307, de

23.09.96, mas guando ela é parte no

processo não há interesse em conciliar,

visto que a previsão da remessa necessária

já inibe a tentativa de um acordo que

poderia evitar o constrangimento de ter

que aguardar anos para o particular

contemplar seu direito ser assistido e um

enorme rombo nos cofres públicos.

Os Juizados Especiais Cíveis e

Criminais criados com o objetivo de tornar

mais célere o andamento dos processos

mais “simples” estão, na sua maioria,

abarrotados de causas e não estão

alcançando o fim almejado.

4.3 PROPOSTA DO NOVO CÓDIGO

PROCESSUAL CIVIL (CPC)

O anteprojeto do novo CPC que

deve estar próximo de ser aprovado tenta

reestabelecer a crença no judiciário, em

queda devido a morosidade, adotando ou

abolindo uma série de procedimentos,

visando emprestar maior agilidade ao

processo. Neste sentido, pode ser citada a

tentativa de extinguir o processo logo ao

seu início, por meio da obrigatória

audiência de conciliação (art. 333); o

efeito devolutivo em que, em regra, serão

recebidos todos os recursos (art.908);

unificará os prazos recursais, sendo 15

dias, com exceção para os embargos de

declaração. Também haverá a extinção dos

embargos infringentes e restrição do

agravo de instrumento a apenas certas

decisões interlocutórias; a substituição das

medidas cautelares e da antecipação da

tutela, pela

tutela de urgência e de evidência,(art.

929),fazendo assim, uma visível supressão

ou limitação de recursos.

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O projeto de Lei 8.046/10, como

também é chamada o novo CPC pretende

reverter a atual situação enxugando o

excesso de formalidade e casuísmo

conferido ao atual código para

impugnativos evitar casos meramente

impugnativos, que caso no atual CPC é

condenando a pagar uma multa de no

máximo 1% sobre o valor da causa, mas

que no novo, se pretende alterar para até

5%. As Demandas repetitivas tem a

possibilidade de reduzir os recursos, pois

possibilitará que o juiz, quando identifique

demanda idênticas, provoque os tribunais

superiores para a decisão, aplicando-se o

resultado a todas aquelas pendentes de

julgamento. Neste caso, a segurança

jurídica será maior, pois os processos de

massa terão seus resultados mais

previsíveis.

No art. 4° prevê que as partes terão

direito de obter em prazo razoável a

solução integral do mérito, incluída a

atividade satisfatória, pois o Juiz deverá

dirigir o processo velando por sua duração

razoável (art. 139 II). Com relação ao

comportamento do Estado Juiz, o novo

CPC também tenta amenizar a

morosidade, estipulando prazos para o

escrivão, chefe de secretaria e oficial de

justiça.

Art. 155. O escrivão, o chefe de secretaria e o oficial de justiça são responsáveis,

civil e regressivamente, quando: I – Sem justo motivo se recusarem a cumprir no prazo os atos impostos pela lei ou pelo Juiz a que estão subordinando […].

Até o Ministério Publico (art.179)

e o Juiz (art. 226) terão prazos para

cumprirem. Vejamos, “Art. 226. O juiz

proferirá: I – os despachos no prazo de 5

dias; II – as decisões interlocutórias no

prazo de 10 dias; III – as sentenças no

prazo de 30 dias.

Embora esses prazos possam ser

excedidos por iguais períodos em casos

justificáveis como previsto no art. 227,

qualquer parte, o Ministério publico ou a

defensoria, podem representar ao

corregedor do tribunal ou ao conselho

nacional de Justiça contra o Juiz ou relator

que injustificavelmente exceder os prazos

previstos em lei, regulamento ou

regimento interno, conforme art. 235.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme podemos observar no

decorrer desta pesquisa, não há que se

falar no fato de que o Estado é parte mais

fraca na relação e que, por isto, deve ser

tratado com regra desigual, muito pelo

contrário, Tanto economicamente como

funcionalmente, a Fazenda Pública tem

possibilidades de se mostrar mais forte no

conflito de interesses.

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A Constituição Federal dotou o

Estado de todo o aparato necessário para

que este aja com toda a desenvoltura nos

interesses maiores da sociedade, assim, ela

não apenas sugere, mas exige que o Estado

saia do comportamento de marasmo,

cabendo a responsabilidade de dar a

solução aos conflitos de interesses

surgidos na coletividade.

O processo sugere a ideia de

“seguir adiante” em direção a seu fim, isto

é, o Direito é dinâmico e não estático. É

necessário respeito ao tempo razoável de

duração dos processos, não podendo

permitir que cada ato seja realizado pela

parte ou pelo juiz quando bem

entenderem, sem que haja qualquer

consequência pela demora no

cumprimento de ônus processuais.

Os prejuízos são causados pela

morosidade e pelos privilégios do Estado

como litigante que a cada ano consagra a

ineficiência da prestação jurisdicional, a

incredulidade no Estado-juiz, a corrupção

nos precatórios, a autotutela, o desgaste

emocional e financeiro de ambas as partes

da ação, inclusive atingindo a coletividade,

pois os rombos nos cofres públicos

prejudicam a economia brasileira.

O novo CPC está na iminência de

entrar em nosso ordenamento jurídico,

com a missão de reverter a situação

processual precária com que temos que

conviver, desencorajando a impetração

leviana de processos, bem como

estipulando prazos para o comportamento

do Estado Juiz, para o escrivão, chefe de

secretaria, oficial de justiça e ate para o

Ministério Público. O que se espera é que

se coloque em pratica, pois o Estado

precisa assumir de maneira efetiva sua

responsabilidade objetiva nas demandas

contra a fazenda publica, conforme

estipula a legislação.

Cabe a nossos legisladores a

sensibilidade de percepção que essa

proteção exagerada ao Estado na verdade

traz resultados negativos com grandes

prejuízos a ele mesmo, a parte que propôs

a ação que muitas vezes é desmotivada a

não fazê-la e a sociedade em geral que

perde muito com as altas quantias pagas

nessas ações indenizatórias.

REFERÊNCIAS

AMARAL, Luiz Otávio de O. Como Agilizar a Justiça? Revista Jurídica Consulex, Brasília, ano VII, nº 167, 2003.

BRASIL. Código Civil de 10 de Janeiro de 2002. Arts. 389 e 404 .Dispõe sobre pagamento com juros, correão monetária, honorários advocatícios e indenização suplementar. Lex Coletânea de Legislação e Jurisprudência, São Paulo, v. 48, p. 3-4, jan./mar.,1. trim. 1984. Legislação Federal e marginália.

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_______. Código de Processo Civil de 11 de janeiro de 1973. Art. 198 Dispõe sobre representação ao presidente do tribunal de justiça contra o juiz. Lex Coletânea de Legislação e Jurisprudência, São Paulo, v. 60, p. 1260, maio/jun., 3. trim.1996. Legislação Federal e marginália.

_______. Código de Processo Civil de 11 de janeiro de 1973. Arts. 187 e 188.Dispõe sobre os prazos para juízes e Fazenda Pública ou o Ministério Público.. Lex: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. (Série Legislação Brasileira).

_______. Código de Processo Civil de 11 de janeiro de 1973. Art. 475. Dispõe sobre a remessa necessária. Lex: Coletânea de Legislação e Jurisprudência, São Paulo, v. 65, p. 10-17, jan./mar.,1. trim. 1984. Legislação Federal e marginália.

_______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988.Art. 05.Dispõe sobre o princípio da igualdade. Organização do texto: Juarez de Oliveira.4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 100 p. (Série Legislação Brasileira).

_______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988.Art. 100 § 5.Dispõe os precatórios. Organização do texto: Juarez de Oliveira.4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 241 p. (Série Legislação Brasileira).

DELGADO. José Augusto. Responsabilidade do Estado: ato Jurisdicional. Revista Jurídica Consulex, Brasília, ano II, nº 16, 1998.

DINIZ, Danielle Alheiros. Responsabilidade Civil do Estado pela Morosidade na Prestação Jurisdicional. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6205>. Acesso em: 07 nov. 2005.

LIMA, George Marmelstein. Técnicas de Aceleração de Processo. Fortaleza: Fórum Clóvis Beviláqua, 2005. Apostila. Centro de Treinamento Integrado e Comunicação.

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ATUAÇÃO DE OFÍCIO DO MAGISTRADO NO SISTEMA ACUSATÓR IO

Antônio Ivo Pereira Lima Aluno do curso de Direito da Faculdade integrada da Grande Fortaleza Celso Cosme Salgado Professor Mestre do curso de Direito na Falculdade Integrada da Grande Fortaleza – FGF [email protected]

RESUMO: Este trabalho aborda os aspectos legais e constitucionais da atuação de ofício do magistrado no sistema acusatório, conforme hipóteses trazidas pelo Código de Processo Penal de 1941 e alterações posteriores, a saber: primeira, no art. 156, I ao prevê a possibilidade de ordenar, de ofício, a produção antecipada de provas; segunda, art. 282, §2º, que concede o poder de determinar medidas cautelares de ofício; e por último, o art. 311, com a decretação da prisão preventiva de ofício na fase processual. Ademais, objetiva-se, também, apurar a efetiva conformação dessas hipóteses com o sistema adotado pela Constituição Federal de 1988, qual seja o sistema acusatório, porquanto, no sistema acusatório há a separação das funções de acusação e julgamento, a produção de provas na fase pré-processual deve ficar a cargo do órgão da acusação, que no Brasil é a regra, o Ministério Público, visando à preservação da imparcialidade do julgador e do direito do acusado. Palavras-chave:Acusatório, Magistrado, Imparcialidade, Constitucionalidade. ABSTRACT: This paper discusses the legal and constitutional aspects of the performance of office of magistrate in the adversarial system, as hypotheses brought by the Code of Criminal Procedure, 1941 and subsequent amendments, namely: first, in art. 156, I expected to be able to order, ex officio, the early production of evidence; second article. 282, §2, which grants the authority to order interim measures ex officio; and finally the art. 311, with the enactment of the probation office in the processing phase. Furthermore, the objective is also to ascertain the actual shaping of these hypotheses with the system adopted by the 1988 Federal Constitution, which is the adversarial system because, in the adversarial system there is a separation of prosecution and trial production of evidence in pre-processing phase should be left to the body of the indictment, which in Brazil is the rule, the prosecution, in order to preserve the impartiality of the judge and the right of the accused. Keyword: Libelous, Magistrate, Impartiality, Constitutionality.

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho debruçou-se

acerca da análise da atuação de ofício do

magistrado no sistema acusatório,

conforme o art. 156, I, bem como, o art.

282, §2º, e ainda, o previsto no art. 311,

todos do Código de Processo Penal,

Decreto-lei nº 3.689 de 03 de outubro de

1941.

Apresenta-se como justificativa a

problemática doutrinária e jurisprudencial,

a respeito da violação, ou não, do sistema

acusatório, quando o magistrado atua de

ofício, sob o argumento que lhe foi

conferido tal poder, através do princípio da

verdade real, com a finalidade de subsidiar

a persecução penal e a solução do litígio.

Além disso, justifica-se, também, em

razão das inovações legislativas, sobre o

tema, pois o juiz além da atribuição de

julgar, também é um garantidor dos

direitos e garantias fundamentais,

previstos no ordenamento jurídico.

Primeiramente, fizemos uma

análise da evolução histórica, destacando

os principais pontos relacionados aos

sistemas de processo penal, desde a

antiguidade à idade moderna.

Após a exposição do panorama

mundial, apresentamos os principais

acontecimentos históricos no Brasil, que

se propuseram a solução das lides penais,

inicialmente, sob a influência do direito

canônico, as Ordenações Afonsinas,

Manuelinas e Filipinas, até os tempos

atuais, sob os preceitos da dignidade da

pessoa humana, fundamento da

Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988.

Por conseguinte, apresentamos os

sistemas de processo penal, a saber: o

inquisitivo, de origem romana, em que as

funções de acusar e de julgar são

concentradas nas mãos de um só órgão do

Estado; o sistema acusatório, com origem

na Grécia e na Roma Antiga, caracterizado

pela nítida divisão das funções de acusar e

julgar, observando-se as liberdades

públicas; ademais, o sistema misto ou

acusatório formal, como uma fusão dos

dois sistemas supracitados.

No que se refere à base

principiológica do processo penal

brasileiro, foram descritos, de modo

sucinto, alguns princípios que norteiam o

nosso sistema, quais sejam: princípio da

presunção da inocência dispõe que o

estado natural dos indivíduos é o da não

culpabilidade, e esta somente deixará de

prevalecer por sentença transitada em

julgado; princípio da igualdade ou

paridade de armas; princípio da ampla

defesa, disponibilidade de uma ampla

gama de provas aos acusados; princípio do

contraditório, garantia de manifestação

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diante da alegação de direito que lhe seja

contrário; princípio do juiz natural e da

imparcialidade, direito de ser julgado por

autoridade previamente constituída, e que

desempenhe sua competência em

conformidade com a lei; princípio do

devido processo legal, garantia de

submissão do Estado a um procedimento

previamente estabelecido, e em respeito

aos direitos e garantias fundamentais;

princípio da publicidade, instrumento que

permite a realização do controle em

relação à legitimidade e eficiência durante

a prestação jurisdicional; e por último, o

princípio da verdade real que determina a

procura pela verdade mais próxima

possível do que, de fato, aconteceu.

Por fim, foi analisada a

possibilidade de o juiz atuar de ofício, a

luz da Constituição Federal e da legislação

infraconstitucional.

A metodologia utilizada foi a

análise bibliográfica sobre os sistemas de

processo penal, e a legalidade da atuação

de ofício do magistrado, demonstrando

sistematicamente o entendimento

doutrinário e jurisprudencial.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Para compreendermos melhor o

tema, é imprescindível conceituar o

sistema processual penal. A este propósito,

Guilherme de Sousa Nucci (2014, p.16)

descreve:

É o corpo de normas jurídicas cuja finalidade é regular o modo, os meios e os órgãos encarregados de punir do Estado, realizando-se por intermédio do Poder Judiciário, constitucionalmente incumbido de aplicar a lei ao caso concreto.

Na visão de Nucci (2014, p. 54) apud Rogério, correspondendo:

[...] à instrumentalização da jurisdição, ou seja, da ação judiciária, em que se insere ação das partes, presenta-se o processo penal como um conjunto de atos que se realizam sucessivamente, preordenados à solução de um conflito de interesses de alta relevância social. A regulamentação desses atos, integrantes do procedimento em que ele se materializa, encontra-se estabelecida nas leis processuais penais, aliás, com muita propriedade” (Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro).

Dando continuidade, após a

introdução ao sistema processual penal,

faremos uma incursão na evolução

histórica dos métodos utilizados pela

humanidade na solução dos conflitos,

considerando-se a realidade social, política

e econômica das civilizações.

2.1 BREVE HISTÓRICO DOS

SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

No início das civilizações, não

havia o direito positivado e nem um

desenvolvido nível social, o que prevalecia

na solução dos conflitos eram as tradições,

incorporadas através de influências

religiosas.

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Prevaleceu nessa época, após a

justiça divina, a supremacia da força,

exercida por quem detinha mais força em

face do mais fraco, denominada de justiça

privada ou autotutela.

Na Grécia havia uma diferenciação

no tratamento, tanto na natureza do crime

quanto na forma de punição. No que se

refere à natureza jurídica, existia o crime

privado e o crime público. Por outro lado,

em relação a punição, o crime privado,

dependia exclusivamente da iniciativa da

vítima, já nos crimes públicos, a parte

ofendida era a coletividade, dessa forma,

não se exigia representação da vítima

imediata.

Segundo Tourinho Filho (2006, p.

79): “Entre os atenienses, o Processo Penal

se caracterizava 'pela participação direta

dos cidadãos no exercício da acusação e da

jurisdição, e pela oralidade e publicidade

dos debates'.”

Fato importante, nesse período,

refere-se à imparcialidade da autoridade

judicial, pois não lhe cabia intervir no

processo de maneira direta, mas, tão

somente, quando acionado. Dessa forma, a

Antiga Grécia, aproximava-se,

notoriamente, do sistema processual penal

acusatório.

Ainda durante a Antiguidade e

Idade Média, Roma viveu também as fases

da vingança (privada e divina, até chegar

na vingança pública), separando-o, a

exemplo dos gregos, o Direito da Religião.

Existiam os crimes públicos e os privados,

e uma divisão, quanto à aplicação do

processo. Os crimes públicos o Estado

intervia com a finalidade de preservação

de sua própria existência e autoridade.

Diferentemente quanto os crimes privados,

onde desempenhava o papel de mero

mediador de conflitos.

Nesse período, existia um esboço

de apelação criminal, uma vez que o

acusado podia reclamar ao povo, a fim de

suspender a sentença condenatória,

iniciando um procedimento numa

instância superior, aonde o juiz prolator da

decisão condenatória tinha que

demonstrar, através de elementos

convincentes, que a sentença que proferira

estava embasada em provas e, com isso,

buscar uma nova condenação do acusado

perante o povo.

Ademais, podemos ressaltar que

nesse momento vigorava características

marcantes do sistema acusatório, pois

existia o dever da publicidade dos atos, e

predominava durante o processo o

contraditório e a oralidade.

Não obstante, decorrido algum

tempo os juízes foram ampliando as suas

funções e, além da função típica,

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adquiriram a função de acusação, podendo

investigar, acusar, recolher provas sem

qualquer restrição e depois disso tudo

presidir o processo e julgar, num

verdadeiro sistema inquisitivo, sendo tal

procedimento o início da Inquisição, que

perdurou durante toda a Idade Média até o

século XVIII.

O marco histórico do processo

penal, na idade moderna, foi, sem dúvida,

a Revolução Francesa, em 1789, embasada

nas ideias do iluminismo. Na inquisição,

modelo adotado na idade média, o delito

era reprimido com medidas sancionadoras,

que tinham na sua essência a crueldade, ou

seja, o total descompasso com os direitos

do homem. Entretanto, com o início da

idade moderna, esse modelo foi afastado,

mediante adoção de uma nova ordem

jurídica, com uma política criminal

pautado nas garantias e respeito aos

direitos humanos.

Em decorrência da política de

combate às arbitrariedades ocorridas, no

interim do sistema inquisitivo, fora

introduzido, na França em 1808, o Código

Napoleônico, o qual adiante seria

consolidado no Código de Processo Penal

de 1859. Fez surgir uma ideia de um

sistema misto, divididos em 3 (três) fases,

quais sejam: a primeira, afeta à polícia

judiciária; a segunda, inerente a instrução

processual; e por fim, a fase de

julgamento.

Além disso, não havia prevalência

de uma fase sobre a outra, mas sim, uma

divisão harmônica, onde todos agiam para

um objetivo comum e inato a sua função,

ou seja, uma melhor prestação

jurisdicional. Comungando com o

ensinamento, Nucci (2014, p. 94):

Surgido após a Revolução Francesa, uniu as virtudes dos dois anteriores, caracterizando-se pela divisão do processo em duas grandes fases: a instrução preliminar, com os elementos do sistema inquisitivo, e a fase de julgamento, com a predominância do sistema acusatório. Num primeiro estágio, há procedimento secreto, escrito e sem contraditório, enquanto, no segundo, presentes se fazem a oralidade, a publicidade, o contraditório, a concentração dos atos processuais, a intervenção de juízes populares e a livre apreciação das provas.

Também sob a égide das ideias

humanistas e iluministas, a Alemanha,

instituiu um modelo processual sob o

manto da publicidade e oralidade,

submetendo-o ao julgamento do povo.

Além disso, realizou uma repartição do

processo em fases, que seriam

desempenhados por indivíduos distintos, a

saber: acusação, defesa e julgamento.

A acusação competia ao

representante do Ministério Público, que

atuava num procedimento sigiloso e,

porém, respeitando os direitos do acusado.

Já na fase de instrução penal, prevalecia a

publicidade do processo. O juiz,

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responsável por seu andamento, detinha a

poder de impulsioná-lo, sob o manto do

princípio da verdade real, entretanto, não

podia dar início a persecução penal em

observância ao princípio da inércia.

Na Espanha, o desaparecimento do

sistema inquisitivo ocorreu em 1834, com

a alteração da competência da jurisdição

que até então pertencia ao Tribunal

denominado Santo Ofício. Num momento

posterior, em 1908, passara a ser chamado

de Sagrada Congregação do Santo Ofício,

que, ainda, a partir de 1965, fora atribuído

o nome de Doutrina da Fé.

A Lei de Processo Penal da

Espanha, de 1882, dividiu a investigação

em três fases, trazendo consigo fortes

características tanto do sistema inquisitivo

como do acusatório. Na primeira fase, do

sistema inquisitivo, denominado com

investigação sumário, aonde se

vislumbrava características como:

procedimento escrito, secreto e mínima

participação da defesa, ou seja, inexistia o

contraditório. Após a investigação

sumária, iniciava-se a fase intermediária,

que em suma, realizava o juízo de

admissibilidade da acusação. Por fim, a

investigação finalizava com a instrução,

efetivada com predominância do sistema

acusatório, porquanto, fazia-se presente a

oralidade, publicidade e o contraditório.

Por conseguinte, verifica-se que o

Processo Penal Espanhol, de fato,

atualmente, adota o sistema processual

penal misto, ou acusatório formal.

Na Itália, apesar das novidades

trazidas pelo Código Rocco, permaneceu

no ordenamento jurídico italiano, os

princípios do sistema inquisitivo, no

entanto, houve inovação no que diz a

atuação do juiz na fase preparatória, pois a

partir do supracitado dispositivo, passou a

incumbir, tão somente, o Ministério

Público com auxílio da polícia, atuar na

fase preliminar. O processo penal passou a

ser dividido em duas fases: a audiência

preliminar e audiência de julgamento.

Nesse cenário, o julgador assumia um

papel de mero observador, ocorrendo,

portanto, uma mitigação ao princípio da

verdade real. Tudo isso, haja vista a

adequação do sistema penal italiano ao

sistema acusatório.

No Brasil, antes da colonização,

em Portugal, no ano de 1446, foram

editadas as Ordenações Afonsinas,

influenciadas pelo direito romano, de

caráter eminentemente religioso.

Em 1514, durante o reinado de D.

Manuel, as supracitadas ordenações, foram

revogadas pelas Ordenações Manuelinas

que, entretanto, trazia consigo, também,

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uma base no direito canônico, onde

predominava o sistema inquisitorial.

A compilação dessas duas

ordenações, citadas acima, ocorreu no

ínterim do século XVII, e fez surgir as

Ordenações Filipinas, vigorando por mais

de dois séculos. Nessa época as penas,

eram cruéis e desumanas, buscava-se o

temor através do castigo.

Por conseguinte, enquanto a

vigência das Ordenações Afonsinas,

Manuelinas e Filipinas, o sistema

inquisitorial reinou, tendo em vista os

ideais predispostos no direito canônico.

Passado o tempo, com a

proclamação da independência e

promulgação da Constituição de 1824,

foram estabelecidos os fundamentos do

processo, em harmonia com as ideias, de

modo que, em 29 de novembro de 1932,

foi elaborado o Código de Processo

Criminal.

O processo, nessa época, era

iniciado mediante queixa ou denúncia, e

ainda, através da atuação de ofício do juiz.

Coexistiam a instituição do Júri Grande e

o Pequeno. O Primeiro, responsável pelo

juízo de admissibilidade, já o segundo,

também conhecido por Júri de Sentença,

incumbia-lhe, efetivamente, o julgamento.

Sob a vigência da ordem

constitucional de 1937, foi editado um

novo Código de Processo Penal brasileiro

através do Decreto-lei nº 3.689 de 03 de

outubro de 1941. Na vigência do novo

código, constatamos a presença, ainda, do

sistema inquisitivo, resquício do período

imperial, durante o inquérito policial.

Entretanto, houve uma efetiva separação

das funções acusatória e julgadora,

permanecendo a atuação de ofício,

somente nos casos excepcionais, tudo isso

em respeito ao sistema acusatório.

Ocorre que, o novo diploma de

processo penal, permaneceu vigente, mas

não na sua integralidade, e sim de modo

mitigado, sempre se adequando aos

direitos e garantias individuais.

São dignas de atenção as inovações

da Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988, dispondo, dentre os

dispositivos, o seguinte:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXVIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

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LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos tos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

Portanto, a Constituição “Cidadã”,

traz consigo direitos inerentes ao processo,

quais sejam: direito ao contraditório,

ampla defesa, devido processo legal,

publicidade dos atos, reconhecimento da

soberania do júri, ênfase a oralidade.

Então, podemos afirmar a luz da

Constituição, que adotou o sistema de

processo penal acusatório.

2.2 SISTEMAS PROCESSUAIS

PENAIS

2.2.1 SISTEMA INQUISITIVO

Tem origem, conforme a história

esplanada acima, em Roma e na Europa.

Foi adotado no período monárquico, sob

os fundamentos do direito canônico. É

amplamente utilizado, principalmente, nos

Estados totalitários, em razão da ausência

da liberdade e das garantias individuais, ou

seja, um Estado de Direito, e não um

Estado Democrático de Direito.

Além disso, podemos citar como

características do sistema inquisitivo: a

condenação como meio satisfatório do

processo criminal; o acúmulo num único

sujeito as funções de acusar, defender e de

julgar; a colheita de provas é realizada

pelo próprio juiz de ofício, sendo que, o

sistema de provas é o tarifado ou legal; o

acusado é tratado como objeto das

investigações, e não como sujeito de

direitos; há uma presunção de

culpabilidade; o procedimento é sigiloso; e

principalmente, não há o que se falar em

contraditório.

Nesse sentido, Capez (2014, p.61):

É sigiloso, sempre escrito, não é contraditório e reúne na mesma pessoa as funções de acusar, defender e julgar. O réu é visto nesse sistema como mero objeto da persecução, motivo pelo qual prática como tortura eram frequentemente admitidas como meio para se obter a prova mãe: a confissão.

Portanto, esse sistema se apresenta

em total desacordo como os princípios

constitucionais, presentes no Estado

Democrático de Direito.

2.2.2 SISTEMA ACUSATÓRIO

Conforme já exposto, evolução

teórica, o sistema acusatório tem origem

na Grécia e Roma, com base no postulado

que, ninguém poderá ser submetido a juízo

sem a devida acusação. É característica,

desse sistema, a separação das funções de

acusar, defender e julgar. Desta forma, há

o respeito a imparcialidade do juízo,

imprescindível a realização da justiça.

Ademais, garante-se o respeito ao

contraditório e a ampla defesa, a igualdade

das partes, a oralidade dos atos processuais

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e a publicidade do processo, admitindo-se,

neste último caso, a mitigação nos casos

previstos em lei. Nesse sentido leciona

Nucci (2014, p.94):

Possui nítida separação entre o órgão acusador e o julgador; há liberdade de acusação, reconhecido o direito ao ofendido e a qualquer cidadão; predomina a liberdade de defesa, e a isonomia entre as partes no processo; vigora a publicidade do procedimento; o contraditório está presente; existe a possibilidade de recusa do julgador; há livre sistema de produção de provas; predomina maior participação popular na justiça penal e a liberdade do réu é a regra.

No mesmo viés, mas de maneira

sucinta, CAPEZ (2014, p.61): É

contraditório, público, imparcial, assegura

ampla defesa; há distribuição de funções

de acusar, defender e julgar a órgãos

distintos.

2.2.3 SISTEMA MISTO OU

GARANTISTA

O seu nascedouro fora na França,

nele há duas fases processuais, a saber: a

inquisitiva, durante a investigação

preliminar; e a de julgamento, onde se

aplica todos os conceitos e princípios do

sistema acusatório. No primeiro momento,

há procedimento sigiloso, sem

contraditório e escrito, mas, logo em

seguida, vislumbramos, na fase seguinte, a

presença da oralidade, da publicidade, o

contraditório, a concentração dos atos

processuais e presunção de inocência, que

reza que ninguém será considerado

culpado até o transito em julgado da

sentença condenatória.

Conforme atesta Capez (2014, p.

62): “Há uma fase inicial inquisitiva, na

qual se procede a uma investigação

preliminar e a uma instrução probatória, e

uma fase final, em que se procede ao

julgamento com todas as garantias do

processo acusatório.”

Logo, nesse sistema, há uma

divisão do processo, na primeira fase com

traços inquisitivos e, o segundo com

predominância das peculiaridades

acusatória.

2.3 SISTEMA ADOTADO NO BRASIL

Por todo o exposto no referencial

teórico, podemos concluir, a partir das

premissas extraídas dos conceitos,

características, e ensinamentos e opiniões

doutrinárias sobre os três sistemas de

processo penal, que, primeiramente, a

codificação do processo penal atualmente

vigente, em razão do momento histórico

de sua elaboração, seguiu o sentido oposto

em relação aos preceitos constitucionais

no decorrer do tempo e consagrados pela

Constituição Federal de 1988, mas que

posteriormente vem sendo mitigado como

forma de adaptação ao ordenamento

pátrio. A legislação codificada preocupa-

se, eminentemente, com a segurança

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pública, quase sempre de modo autoritário,

com a presunção de culpabilidade e

periculosidade do infrator. Entretanto, o

modelo previsto na Constituição Federal,

vem caminhando num sentido diverso,

pois traz consigo um sistema com amplas

garantias, existência do contraditório e da

ampla defesa, o princípio da presunção da

inocência, a publicidade dos julgados e o

sistema de provas do livre convencimento

motivado. No mesmo sentido, a doutrina

majoritária, Tourinho Filho (2006, p. 94):

“No Direito pátrio, o sistema adotado é

o acusatório. A acusação, nos crimes de

ação pública está a cargo do Ministério

Público. Excepcionalmente, nos delitos de

ação privada, comete-se à própria vítima o

jus persequendi in judicio. (grifo nosso)”

Ademais, o art. 129, I da

Constituição Federal, confirma a adoção

do sistema acusatório haja vista as funções

de julgar, defender e acusar, serem

exercidas por indivíduos distintos. Nesse

sentido nos ensina Távora e Alencar

(2009, p. 38):

Separação entre as funções de acusar, defender e julgar, conferidas a personagens distintos. Os princípios do contraditório, da ampla defesa e da publicidade regem todo o processo; o órgão julgador é dotado de imparcialidade; o sistema de apreciação das provas é o livre convencimento motivado.

Portando, o sistema processual

adotado, no Brasil, é o acusatório,

conforme características já apresentadas,

desenvolvido em conformidade com o

respeito aos direitos e garantias

fundamentais, e os dispositivos previsto no

Código de Processo Penal de 1941,

concretizando, assim, um Estado

Democrático de Direito, numa sociedade

livre, sem opressão, sendo a liberdade à

regra.

2.4 PRINCIPIOS DO PROCESSO

PENAL BRASILEIRO

Os princípios constituem o

mandamento nuclear de um sistema,

possuem as funções: normativa, ou seja,

norma jurídica que tem força coercitiva

para solucionar, no plano concreto,

conflitos; a segunda função é a

interpretativa, em que, numa eventual

dúvida a respeito da aplicação de uma

norma, deverá ser solucionada através da

interpretação em conformidade com os

princípios basilares do sistema. A seguir

serão mencionados alguns princípios que

merecem destaque, haja vista, serem

considerados como caracterizadores do

sistema acusatório.

Princípio da presunção da

inocência esta explícito na Constituição

Federal de 1988 no art. 5º, inciso LVII¹,

reza que ninguém será considerado

culpado antes do transito em julgado da

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sentença penal condenatória. Ou seja,

partimos do estado natural de inocência, e

só mudaremos de estado, caso sejamos

comprovadamente, durante o processo, a

culpado, de modo que, não caiba mais

recurso. Ademais, por via de consequência

podemos citar: o ônus da prova, em regra,

cabe à acusação; excepcionalidade das

prisões cautelares; e que toda medida

constritiva de direitos individuais, somente

deverá ocorrer excepcionalmente.

No mesmo sentido, Nucci (2014, p.

60):

Tem por objetivo garantir, primordialmente, que o ônus da prova cabe à acusação e não à defesa. As pessoas nascem inocentes, sendo esse o seu estado natural, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável que o Estado-acusação evidencie, com provas suficientes, ao Estado-juiz, a culpa do réu.

Princípio da paridade das armas ou

da igualdade, expresso no art. 5º, caput, da

Constituição Federal de 1988, traz consigo

o requisito imprescindível ao sistema

acusatório, qual seja, o mandamento de

que vigorará a igualdade material, ou seja,

os iguais serão tratados igualmente, e os

desiguais, serão tratados desigualmente, de

acordo com suas desigualdades.

Também tem previsão na CF/88, o

princípio da ampla defesa, em suma,

dispõe que ao acusado será disponibilizada

a mais ampla gama de meios, e recursos

lícitos para tanto, que possibilite, desta

forma, provar o que lhe é de direito e o seu

estado de inocência quando exigido. Desta

maneira, opera-se a compensação no que

se referi a posição de hipossuficiência em

relação ao Estado, que desempenha as

funções de investigação, de acusação, e de

julgamento. Além disso, são

consequências desse princípio: a revisão

criminal, sempre a favor do réu; e o dever

do juiz de fiscalizar o desempenho da

defesa do réu.

Extraímos do art. 5º, LV da Carta

Política de 1988, o princípio do

contraditório, dispondo que as partes,

acusação e defesa, no processo, tem o

direito de se manifestar em relação às

alegações de direitos, ou a respeito de

apresentação de elementos probatórios.

Portanto, podemos resumir que somente

haverá respeito a este mandamento

constitucional, caso seja respeito, nessa

ordem, primeiro, intimação sobre fatos e

provas, segundo, quando houver

manifestação sobre fatos e provas, e por

fim, quando no exercício do contraditório,

houver possibilidade de ingerir-se com

efeito real na decisão do órgão julgador.

Em complemento ao raciocínio,

Nucci (2014, p. ):

Quer dizer que a toda alegação fática ou apresentação de prova, feita no processo por uma das partes, tem o adversário o direito de se manifestar, havendo um perfeito equilíbrio na relação estabelecida

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entre a pretensão punitiva do Estado e o direito à liberdade e à manutenção do estado de inocência do acusado (art. 5.°, LV, CF).

Os princípios do juiz natural e da

imparcialidade emanam do texto

constitucional, mas precisamente do art.

5º, LIII, representam uma garantia de não

ser processado e julgado, por um juiz

designado e parcial. Ou seja, o juiz natural

é aquele previamente constituído por meio

de lei, e o imparcial, o juiz que faz cumprir

os ditames legais, de modo equidistante

em relação às pastes parciais, cabendo

interferir somente quando houver

necessidade de proteção das liberdades

públicas.

O princípio do devido processo

legal é uma garantia constitucional, com

previsão no art. 5º, LIV, no Título dos

Direitos e Garantias Fundamentais,

concretizando nossa realidade, qual seja de

um Estado Democrático de Direito, e

assim, a lei define um devido processo,

possibilitando, desse modo, a aplicação

legal e moral da pena. Visa,

primordialmente, evita a adoção de

procedimentos, por parte do Estado,

diversos dos ritos procedimentais previstos

no ordenamento jurídico brasileiro.

Princípio da publicidade tem

previsão constitucional nos arts. 5º,

XXXIII e LX, e 93, IX, da Constituição

Federal de 1988. Há uma determinação no

sentido de que os julgamentos e outros

atos, em regra, sejam realizados e

produzidos, publicamente, atingindo sua

finalidade essencial de resguardar a

legitimidade e a eficiência, na prestação

jurisdicional.

Princípio da verdade material ou

real, mandamento próprio do processo

penal, pois nas outras searas o assunto tem

tratamento diferenciado, como por

exemplo, na civil, onde impera tão

somente a verdade trazida pelas partes.

Através desse princípio vislumbramos a

procura pela verdade (noção ideológica da

realidade) mais próxima possível do que,

de fato, aconteceu, gerando o dever das

partes e do juiz de buscar a prova, sem

posição inerte ou impassível. Além disso,

conforme o art. 156, I e II, do código de

processo penal brasileiro, é conferido ao

juiz o poder de iniciativa probatória, que

permite ao magistrado ordenar, mesmo

antes de iniciada a ação penal, a produção

antecipada de provas, urgentes e

relevantes, observando a necessidade, haja

vista, tratar-se de direito indisponível e de

sobremaneira, relacionado às liberdades

públicas.

Ocorre que, porém, há uma

discussão a respeito da sua conformidade

com os ditames do sistema processual

acusatório, previsto na Carta Política de

1988, pois segundo Capez (2014, p.54):

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“A colheita de prova pelo juiz

compromete-o psicologicamente em sua

imparcialidade, transformando-o quase em

integrante do polo ativo da lide penal,

colidindo frontalmente com diversas

normas constitucionais.”

Dessa forma, o juiz não atuar como

parte, sob o pretexto do princípio da

verdade real, pois este mandamento deve

ser usado, somente, na busca da

reprodução processual da verdade.

3 ATUAÇÃO DE OFÍCIO DO

MAGISTRADO, NA FASE PRÉ-

PROCESSUAL, E O SISTEMA

ACUSATÓRIO

No que diz respeita aos aspectos

legais, podemos extrair do Código de

Processo Penal, editado em 1941, outrora

exclamado, características eminentemente

inquisitoriais, em razão do momento de

sua edição, onde ocorriam constantes

violações aos direitos humanos, sob o

fundamento da manutenção da lei e da

ordem pública.

Esta codificação, em seu texto

original, previa, em seu art. 156, a

possibilidade do magistrado determinar de

ofício a produção de provas consideradas

necessárias ao julgamento. Ressalta-se que

essa determinação, ainda tem vigência,

porém, em outro dispositivo, qual seja no

art. 156, II do CPP/41, redação dada por

meio da lei 11.690/08.

É salutar que a grande inovação

girou em torno da novidade trazida pela

Lei 11.690/08, introduzindo no sistema,

através da redação do art. 156, I, a

possibilidade do magistrado, sem a

necessidade de provocação das partes,

determinar a produção probatória caso

considere-as urgentes e imprescindíveis

para, posteriormente, subsidiar a ação

penal. Noutras palavras, durante o

inquérito, havendo necessidade, adequação

e proporcionalidade, poderá o magistrado

agir de ofício.

Ressaltamos que a iniciativa

probatória do juiz deve limitar-se, então,

ao esclarecimento de questões ou pontos

duvidosos sobre o material já trazido pelas

partes, nos termos da nova redação do art.

156, II, do CPP, inserida, também, por

meio da Lei nº 11.690/08.

Além disso, foi introduzido através

da Lei 12.403, de 5 de maio de 2011, no

Código de Processo Penal, o art. 282, §2º,

trazendo uma importante e questionável

mudança ao possibilitar o magistrado, de

ofício, na fase processual, aplicar medidas

cautelares diversas da prisão, ou substituí-

la por outra, evidenciando seu objetivo,

qual seja, evitar o encarceramento

provisório, em respeito ao princípio da

presunção da inocência e, ainda,

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prestigiando o sistema acusatório. Logo, a

prisão provisória assumiu caráter

excepcional e, mesmo numa situação de

urgência, o juiz deverá valer-se da análise

das medidas diversas da prisão, desta

forma, busca-se dá maior efetividade a

prestação jurisdicional.

Ademais, com relação a prisão

preventiva de ofício pelo juiz, é previsto

no Código de Processo Penal, nos arts. 311

e 312, redações dadas pela Lei 12.411, de

2011, a possibilidade de sua decretação,

tão somente na fase processual, para

garantir a ordem pública, a ordem

econômica, por conveniência da instrução

criminal, ou para assegurar a aplicação da

lei penal, quando houver prova da

existência do crime e indício suficiente de

autoria, pois o julgador de hoje deve ser

visto como um garantidor de direitos

fundamentais.

O que diz respeita a possibilidade

de conversão da prisão em flagrante em

prisão preventiva, de ofício, os tribunais

superiores vêm se posicionando no sentido

da sua admissão, como podemos observar

em decisão do Superior Tribunal de

Justiça:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ROUBO MAJORADO. PRISÃO PREVENTIVA. ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. REITERAÇÃO DELITIVA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. CONVERSÃO DE OFÍCIO DO

FLAGRANTE EM PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE NULIDADE. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA [...] III - Não existe nenhuma nulidade em converter de ofício o flagrante em prisão preventiva quando presentes os requisitos autorizadores da segregação cautelar, nos termos dos arts. 310, inciso II, e 311 do Código de Processo Penal. Precedentes. IV - Recurso em habeas corpus improvido. (STJ - RHC: 45203 MG 2014/0026134-4, Relator: Ministra REGINA HELENA COSTA, Data de Julgamento: 13/05/2014, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/05/2014).

No que se refere aos aspectos

constitucionais, ante o exposto, podemos

afirmar que o sistema constitucional é o

acusatório, e traz consigo alguns

mandamentos a seguir exposto:

primeiramente, foi consagrada no art. 129,

I da Constituição Federal, a titularidade da

ação penal pública ao Ministério Público,

ressaltando as hipóteses de mitigação

previstas na própria Carta Política;

segundo, há uma nítida separação das

funções no processo, e, portanto, uma

exaltação a imparcialidade dos órgãos

jurisdicionais; ademais, o ordenamento

elevou a qualidade de direitos

fundamentais, os princípios do

contraditório, da imparcialidade, da ampla

defesa, da oralidade e da publicidade.

Podemos concluir que, o sistema

adotado pela Constituição Federal de 1988

é, portanto, constituído por amplas

garantias, vedando a rotulação de culpado

antes do transito em julgado da sentença

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condenatória, e, por conseguinte, uma

garantia do indivíduo em face do poder

punitivo do Estado.

Segundo a doutrina majoritária,

entende ser inconstitucional, a atuação do

magistrado, de ofício, em razão, deste

órgão, ter o dever de manter a

imparcialidade, porquanto não há como o

julgador escapar de um sentimento

inerente ao homem.

Ademais, ao participar exercer o

poder de iniciativa probatória, sob o

pretexte de buscar a verdade real, há um

comprometimento psicológico,

transformando-o em juiz inquisidor. Em

razão disso, deve-se incidir o impedimento

para proferir decisão nesse caso.

Nesse sentido, percebemos que o

conhecimento do juiz a respeito do

material probatório deve ser reservado a

fase em que é proferida a sentença, e de

modo geral, a atuação do magistrado deve

ser exclusivamente, o que estiver

relacionado com as liberdades públicas.

Segundo Rangel (2008, p. 461):

Ora, como imaginar um juiz isento que colhe a prova no inquérito, mas não a leva em consideração na hora de dar a sentença? A reforma pensa que o juiz é um ser não humano. Um extraterrestre que desce de seu planeta colhe a prova, preside o processo, julga e volta à sua galáxia, totalmente imparcial. A reforma, nesse caso, adota o princípio inquisitivo, colocando o juiz no centro da colheita da prova em total afronta à Constituição Federal, que adota o sistema acusatório. (grifo do autor).

Além do mais, quando o juiz atua

de ofício na fase de investigação

preliminar, há ofensa, inquestionável, a

imparcialidade, não somente referente às

hipóteses de incompatibilidade,

impedimento e suspeição, inseridas no

Código de Processo Penal, mais

principalmente ao sistema acusatório. No

mesmo sentido, Oliveira (2014, p.49):

[...] O juiz, a rigor, nem sequer deveria ter contato com a investigação, realizada que é em fase anterior à ação penal, quando não provocada, até então, a jurisdição. Somente quando em disputa, ou em risco, a lesão ou ameaça de lesão a direitos subjetivos ou à efetividade da jurisdição penal é que o Judiciário deveria – e deve – manifestar-se na fase investigatória, como juiz das garantias individuais, no exercício do controle judicial da legalidade dos atos administrativos. Por isso, inadmissível e inconstitucional, por violação ao sistema acusatório, a ‘novidade’ trazida com a Lei 11.690/08, que, dando nova redação ao art. 156 do CPP, prevê a possibilidade de o juiz determinar, de ofício, diligências probatórias no curso da investigação criminal.

Logo, o papel do magistrado é o de

órgão de controle da legalidade e garantidor

do respeito aos direitos fundamentais do

investigado, contrariando a figura do juiz

inquisidor ou instrutor. Dessa forma, atua em

conformidade com o sistema acusatório e a

própria forma inerente ao processo penal.

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

Em relação aos procedimentos

metodológicos, as hipóteses foram

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investigadas mediante pesquisa

bibliográfica, decompondo a problemática

da atuação de ofício do magistrado, na

fase pré-processual, e o sistema acusatório,

mediante a análise da literatura já

publicada em forma de livros, imprensa

oficial escrita e publicada na internet, e

documental, por meio de leis, pesquisas,

enfim, materiais relacionados ao tema.

Ao longo dos anos estudei

demasiadamente Leis, Artigo, Livros,

concernentes ao tema, Direito Penal e

Direito Processual Penal e dentre outros.

Desta feita, percebi que os meus

conhecimentos adquiridos não servirão

apenas para me principiar a entender sobre

o ordenamento jurídico brasileiro, mais

também despertou em mim um cidadão

com mais sede por conhecimento para

driblar as adversidades e é claro poder

repassar para outrem o que aprendi,

ajudando, em consequência, aquele que

queria ser auxiliado.

De toda sorte que, para a execução

deste trabalho busquei orientar-me pelo

procedimento de investigação, o método

bibliográfico que se configura na

elucidação de conhecimentos de obras

científicas, artigos e notícias de estudiosos

referenciais ao tema que explorei na

confecção deste artigo. Proporcionando-

me uma base teórica para que eu possa

expressar minuciosamente, de uma

maneira concisa, minhas ideologias sem

sair da realidade acadêmica e repassando

para a universidade informações verídicas

sobre o tema, e a parir Julho de 2014 fui ás

bibliotecas de Direito das Universidades

Públicas da Cidade de Fortaleza com o fito

de coletar bibliografias referentes ao tema.

Já com os resultados de minhas

análises à bibliografia lida, em Agosto,

consegui filtrá-las para uma direção mais

específica ao meu tema, chegando, assim,

ao meu objeto em estudo. Então, trabalhei

com arquivos que me possibilitassem

extrair informações precisas e específicas

a respeito do sistema adotado no Brasil e

suas características.

Nos meses subsequentes (Setembro

e Outubro) expressei para a realização

deste trabalho minhas interpretações sobre

a temática com o objetivo de analisar a

compatibilidade dos dispositivos

infraconstitucionais penais, entendimento

doutrinário e os posicionamentos da

jurisprudência a respeito do sistema

acusatório e sua violação, que é previsto e

consagrado na Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988,

principalmente, no aspecto da

constitucionalidade.

Somando-se a isso, o meu objetivo

específico foi buscar um novo paradigma

de atuação dos autores do processo penal,

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analisar os desdobramentos do sistema

acusatório e do inquisitivo e delimitar os

papéis dos autores do processo de acordo

com a legalidade. Em fim, no mês de

Novembro realizei junto a meu orientador

as últimas correções para lograr êxito na

apresentação deste trabalho.

5 ANÁLISE DOS DADOS E

RESULTADOS

Com o fomento da humanidade e

da tecnologia houve a necessidade da

gênese de diretrizes que orientassem as

condutas dos homens para o bem-estar

social (Karl Gunnar Myrdal, 1974) para

que todos vivam em harmonia respeitando,

assim, os limites e/ou espaços dos

indivíduos que vivem em sociedade.

A partir disto, O Brasil preocupou-

se em editar uma constituição cidadã em

1988 na qual expressa à competência da

União em legislar sobre matéria de direito

penal e direito processual penal. De toda

sorte que ao longo deste espaço temporal

até os dias atuais sucedeu no país a

explosão demográfica e junto a esta veio à

necessidade das legislações e

jurisprudência atenderem as necessidades

das novas realidades das quais convive a

população brasileira.

Por isso, com o crescimento

populacional e a falta de políticas públicas

que possam abastecer as carências das

famílias brasileiras como, por exemplo: o

investimento na educação, na

disponibilização de mais vagas para

emprego e ao pequeno agricultor, para que

este não fuja para a cidade alavancando,

assim, as desigualdades sociais e

aumentando a comunidade periférica.

Então o legislador cuidou-se de adequar o

ordenamento ao novo perfil da sociedade

brasileira, ou seja, prevendo novos

procedimentos e tipificando novas

condutas que não estavam descrita no

direito positivo.

Através dos estudos mais

elaborados no que tange as inovações e as

evoluções do processo penal brasileiro

pude confeccionar este trabalho. E ao

longo de sua construção pude chegar

alguns resultados de que o sistema

constitucional é o acusatório, e traz

consigo alguns mandamentos a seguir

exposto: primeiramente, foi consagrada no

art. 129, I da Constituição Federal, a

titularidade da ação penal pública ao

Ministério Público, ressaltando as

hipóteses de mitigação previstas na própria

Carta Política; segundo, há uma nítida

separação das funções no processo, e,

portanto, uma exaltação a imparcialidade

dos órgãos jurisdicionais; ademais, foi

levada a qualidade de direitos

fundamentais, os princípios do

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contraditório, da ampla defesa, da

oralidade e da publicidade.

Somando- se a isto, outro resultado

é o entendimento e esclarecimento para a

sociedade brasileira de que em algumas

situações em que se encontram como

vítimas seus direitos serão aparados pelo

ordenamento jurídico, conforme Lei

11.690/08, que permite ao magistrado,

designar a produção probatória em casos

julgados como urgentes e essenciais pelo

togado, para posteriormente, subsidiar a

ação penal. Isto podendo suceder sem que

as partes assumam uma posição favorável

ou desfavorável às execuções de seus

direitos.

Além disso, podemos observar

também como resultado desta pesquisa,

que estas inovações nos transcursos penais

foram permitidas pela edição da Lei

11.690/08, que deslocou a antiga redação

do art. 156 para o art. 156, II, além disso,

inovou no inciso I, ainda do art. 156,

possibilitando o início da produção

probatório de ofício.

Como último resultado podemos

apontar a evolução do processo penal no

que desrespeita as medidas cautelares e a

possibilidade da decretação da prisão

preventiva de ofício na fase da persecução

penal, inseridas pela Lei 12.403 de 05 de

maio de 2011, que com a preocupação de

preservar a integridade moral e física

(neste caso, resguardando o acusado dos

perigos que pode encontrar dentro das

penitenciarias) possibilitou na fase

processual aplicar medidas cautelares

diversas da prisão ou substituí-la ou outra,

resultando assim, no objetivo de se evitar

o encarceramento provisório. Porquanto,

emana do princípio da presunção da

inocência, que ninguém será considerado

culpado antes do transitado e julgado.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Depois da incursão na evolução

histórica dos sistemas de processo penal e,

sinteticamente, caracterizar os sistemas de

processo penal Inquisitivo, Acusatório e o

Misto, surgidos no decorrer do período

compreendido entre a Antiguidade e a

Idade Moderna, com a posterior

verificação do sistema adotado no Brasil,

em sintonia com o Código de Processo

Penal de 1941 e alterações, e a

Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988, podemos chegar às

seguintes conclusões:

Com a vigência da Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988,

conhecida por constituição “cidadã”, com

o fundamento, dentre outros, na dignidade

da pessoa humana, e da leitura de outros

dispositivos, como do art. 129, I,

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chegamos a conclusão que o sistema

adotado é o acusatório, com as seguintes

características: separação das funções de

acusar, defender e julgar; há contraditório

e ampla defesa; o acusado é tratado com

sujeito de direitos; os atos processuais

obedecem o princípio da publicidade; e

etc.

No que se refere ao princípio da

verdade real, o entendimento correto a ser

adotado é no sentido de que, ao juiz é

conferida a possibilidade, dentro dos

limites legais, promover ações que mais se

aproximem da realidade, respeitando,

sempre, o sistema acusatório;

Em relação à iniciativa probatória, nos

posicionamos no mesmo sentido da

doutrina majoritária, devemos obedecer a

vontade emanado pelo constituinte, ou

seja, o juiz não pode se comportar como

parte, e se assim o fizer, estará violando o

sistema acusatório e usurpando funções

que não lhes pertencem. Entretanto,

ressaltamos a possibilidade de diante de

situações que estejam em perigo às

liberdades públicas, o magistrado deve

agir sim, pois é também um garantidor dos

direitos fundamentais;

Quando o magistrado determina a

produção de provas de ofício na fase do

inquérito policial, está maculando o

sistema acusatório e substituindo a atuação

do órgão encarregado constitucionalmente

da acusação. Quando, por outro lado,

determina de ofício a produção de provas

no curso da ação penal já instaurada, em

nada modifica a usurpação da função do

Ministério Público, estando do mesmo

modo ferindo o sistema acusatório, sua

imparcialidade e o devido processo legal.

Quando o juiz atua de ofício, na fase

pré-processual, infringe dispositivos

constitucionais, pois o conhecimento do

material probatório deve ser reservado a

fase de julgamento, pois, antes, a coleta

probatória deve interessar, tão somente, o

sujeito responsável e titular da ação penal,

e não ao julgador, caso contrário ocorrerá

violação latente ao sistema acusatório, e

consequentemente a sua imparcialidade;

E em suma, a atuação judicial na fase

do inquérito, há de ser para fins,

exclusivamente, de proteção das

liberdades públicas. Por fim, ressaltamos

que, diante de todas as análises realizadas

durante o desenvolvimento desse trabalho,

à luz das considerações acima enunciadas,

podemos afirmar que, certamente que o

ordenamento processual penal brasileiro

vive hoje a realidade de possuir um

sistema acusatório com iniciativa da ação

penal preponderantemente pública, com

repartição de funções e imparcialidade do

julgador apenas de natureza formalmente

acusatória, mas mitigada pelos princípios

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da ampla defesa e do contraditório, diante

de uma publicidade potencialmente restrita

e oralidade manifestamente imperfeita.

REFERÊNCIAS

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Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de Outubro de

1941. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec

reto-lei/del3689compilado.htm> Acesso

em: 14 de Abril de 2014.

______. Constituição Federal Brasileira

de 5 de outubro de 1998. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con

stituicao/ConstituicaoCompilado.htm>

Acesso em 13 de Abril de 2014.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de

Processo Penal e Execução Penal. 11º

ed. Editora Forense, 2014.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de, Curso de

processo penal I Eugênio Pacelli de

Oliveira. - 18. ed. rev. e ampl. atual. de

acordo com as leis n"' 12.830, 12.850 e

12.878, todas de 2013. - São Paulo: Atlas,

2014.

RANGEL, Paulo. Direito Processual

Penal. 15. ed. Rio de Janeiro: Lúmen

Júris, 2008

TÁVORA, Nestor e ALENCAR, Rosmar

A.R.C. de. Curso de Direito Processual

Penal. 2.ed. Salvador: Jus Podivm, 2009.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 28. Ed. São Paulo: Saraiva 2006.

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A LEGITIMIDADE NA LAVRATURA DO TERMO CIRCUNSTANCIA DO DE OCORRÊNCIA PELA POLÍCIA MILITAR NO ESTADO DO CEARÁ

José Armando Pereira Ferreira Aluno do curso de Direito da Faculdade integrada da Grande Fortaleza [email protected] Maria Lucia Falcão Professora Especialista do curso de Direito na Falculdade Integrada da Grande Fortaleza – FGF [email protected]

RESUMO: Atualmente a Segurança Pública tem sido um dos temas mais discutidos na sociedade, já que diariamente temos que conviver com os mais diversos casos de violência. Mas se por um lado a violência cresce e a sociedade, consequentemente, sofre, por outro lado as polícias civis e militares vivem em constante discussão acerca de suas atribuições. Discussão essa que acaba por dificultar o trabalho dos policiais e, por conseguinte, favorecer a criminalidade. As polícias militar e civil, são órgãos do Estado incumbidos constitucionalmente de preservar a ordem pública, de proteger as pessoas e o patrimônio da Nação, bem como de realizar a investigação e repressão dos crimes com vistas a conter a violência. O §5º do art. 144 da Constituição Federal, de 1988, disciplina que às polícias militares caberá a função de polícia ostensiva e de preservação e manutenção da ordem pública, contudo, essa função deve ser interpretada de forma abrangente, até mesmo porque não se tem uma definição clara do que seja essa função de ‘manter a ordem pública’ do Estado. A competência da Polícia Militar deve ser entendida além do combate ostensivo e direto à criminalidade. Na amplitude do entendimento de suas funções outras atividades podem ser incluídas, a exemplo da lavratura dos Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO’s), e esse será o foco principal da pesquisa, voltado especificamente para o Estado do Ceará. Para o desenvolvimento do presente trabalho optamos pela pesquisa bibliográfica e documental por entender suficiente ao esclarecimento do tema.

Palavras-chave: Segurança Pública. Polícia Militar e Civil do Ceará. Termo Circunstanciado de Ocorrência. ABSTRACT: Currently public safety has been one of the most discussed issues in society, because every day we have to live with the various cases of violence. But if on one hand the violence grows and the company consequently suffers, on the other hand the civil and military police live in constant discussion about their assignments. Discussion which eventually hinder the work of the police and therefore foster crime. Police in Brazil are state organs charged constitutionally to maintain public order, to protect people and the heritage of the nation, as well as carry out the investigation and prosecution of crimes in order to contain the violence. The paragraph 5 of art. 144 of the Federal Constitution of 1988 discipline that the military police will be up to police and ostensible function of preserving and maintaining public order, however, this function should be interpreted broadly, even because they do not have a clear definition of what this function 'maintain public order' state. The jurisdiction of the Military Police should be understood beyond the overt and direct combat crime. Amplitude in understanding their functions other activities can be included, such as the drafting of the detailed Terms of Occurrence (TCO's), and this will be the main focus of research, aimed specifically at the state of Ceará. For the development of this work we chose bibliographic and documentary research to understand enough to clarify the issue.

Keywords: Public Security Police of Ceará, Robust Term Occurrence.

.

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1 INTRODUÇÃO

Atualmente a Segurança Pública

tem sido um dos temas mais discutidos na

sociedade, já que diariamente temos que

conviver com os mais diversos casos de

violência. Mas se por um lado a violência

cresce e a sociedade, consequentemente,

sofre, por outro lado as Polícias Civis e

Militares vivem em constante discussão

acerca de suas atribuições. Discussão essa

que acaba por dificultar o trabalho dos

policias e, por conseguinte, favorecer a

criminalidade.

A Polícia Militar e Civil são órgãos

do Estado incumbidos constitucionalmente

de preservar a ordem pública, de proteger

as pessoas e o patrimônio da Nação, bem

como de realizar a investigação e

repressão dos crimes com vistas a conter a

violência.

Nossa atual Carta Constitucional

estabelece em seu art. 144 que a

Segurança Pública, dever do Estado,

direito e responsabilidade de todos, será

exercida através dos seguintes órgãos:

Polícia Federal; Polícia Rodoviária

Federal; Polícia Ferroviária Federal;

Polícia Civil; Polícia Militar e Corpos de

Bombeiro Militar.

Mais precisamente no §5º do art.

144, a Constituição Federal de 1988,

disciplina que às Polícias Militares caberá

a função de polícia ostensiva e de

preservação e manutenção da ordem

pública, contudo, essa função deve ser

interpretada de forma abrangente, até

mesmo porque não se tem uma definição

clara do que seja essa função de ‘manter a

ordem pública’ do Estado e qual seria o

limite dessa atividade.

Este artigo científico terá como

foco principal a análise da legitimidade na

elaboração de Termos Circunstanciados de

Ocorrência (TCO’s) pelo Policial Militar,

bem como verificar as implicações dessa

lavratura, em consonância ao preceito

constitucional que outorga à Polícia

Militar o dever de preservar e manter a

ordem pública e nos moldes da Lei nº

9.099/95, delimitando a pesquisa para

alguns aspectos próprios do estado do

Ceará.

2 REFERENCIAL TEÓRICO: PAPEL

CONSTITUCIONAL DAS POLÍCIAS

CIVIL E MILITAR DO CEARÁ

Segundo disposto na Constituição

Federal de 1988, as Polícias Civis e

Militares enquanto órgãos do sistema de

segurança pública são incumbidos da

preservação da ordem pública e da

incolumidade das pessoas e do patrimônio,

como também na apuração, investigação e

elucidação de infrações penais. Vejamos

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os termos constitucionais de suas

atribuições:

Art. 144. [...] § 4º – Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. § 5º – Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; [...]

§ 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. (grifou-se)

A Constituição Estadual do Ceará,

ao tratar desse tema, deixa claro que todos

os órgãos que integram o sistema de

segurança pública têm o comum objetivo

de proteger a pessoa humana [...] adotando

as medidas legais adequadas [...]:

Art. 178. A segurança pública e a defesa civil são cumpridas pelo Estado do Ceará para proveito geral, com responsabilidade cívica de todos na preservação da ordem coletiva, e com direito que a cada pessoa assiste de receber legítima proteção para sua incolumidade e socorro, em casos de infortúnio ou de calamidade, e garantia ao patrimônio público ou privado e à tranqüilidade geral da sociedade, mediante sistema assim constituído: I - Polícia Civil; II - Organizações Militares: Polícia Militar; [...] Parágrafo único. Todos os órgãos que integram o sistema de segurança pública e defesa civil estão identificados pelo comum objetivo de proteger a pessoa humana e combater os atos atentatórios aos seus direitos, adotando as medidas legais adequadas à contenção de danos físicos e patrimoniais, velando pela paz social,

prestando recíproca colaboração à salvaguarda dos postulados do Estado Democrático de Direito.(grifou-se)

Em consonância aos preceitos

da Magna Carta, as funções outorgadas às

Polícias Civil e Militar são repetidas pela

Constituição do Ceará, como se vê a

seguir:

Art. 183. A Polícia Civil, instituição permanente orientada com base na hierarquia e disciplina, subordinada ao Governador do Estado, é organizada em carreira, sendo os órgãos de sua atividade fim dirigidos por delegados. [...] Art. 184.Compete à Polícia Civil exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto militares, realizando as investigações por sua própria iniciativa, ou mediante requisições emanadas das autoridades judiciárias ou do Ministério Público. [...] Art. 187. A Polícia Militar do Ceará é instituição permanente, orientada com base nos princípios da legalidade, hierarquia e disciplina, constituindo-se força auxiliar e reserva do Exército, subordinada ao Governador do Estado, tendo por missão fundamental exercer a polícia ostensiva, preservar a ordem pública e garantir os poderes constituídos no regular desempenho de suas competências, cumprindo as requisições emanadas de qualquer destes.(grifou-se)

No tocante à atividade policial

militar a Constituição Estadual ainda

complementa: “Art. 188. Incumbe à

Polícia Militar a atividade da

preservação da ordem pública em todas

as suas modalidades e proteção

individual, com desempenhos ostensivos

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para inibir os atos atentatórios a

pessoas e bens”. (grifou-se)

Nas palavras de Lazzarini (1996, p.

16) a Polícia Militar não se limita ao

exercício da polícia preventiva e ostensiva,

previsto nas Constituições, cabendo-lhe,

ainda, o exercício da atividade policial que

não for atribuída aos outros órgãos que

compõem o sistema de segurança pública,

bem como em se tratando de inoperância

desses órgãos.

A competência da Polícia Militar

deve ser entendida além do combate

ostensivo e direto à criminalidade. Na

amplitude do entendimento de suas

funções outras atividades podem ser

incluídas, desde que realizadas

harmoniosamente com os segmentos

comunitários e respeitada a legislação

vigente.

De acordo com Lazzarini (2003)

podem ser extraídos três elementos da

expressão ‘ordem pública’, a saber:

segurança, tranquilidade e salubridade

pública. Conceituando esses elementos o

autor assevera que:

Segurança Pública [...] é o estado antidelitual que resulta da inobservância dos preceitos tutelados pelos códigos penais comuns e pela lei das contravenções penais, com ações de polícia repressiva ou preventiva típicas, afastando, assim, por meio de organizações próprias, de todo o perigo, ou de todo mal que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade ou dos direitos de propriedade das pessoas, limitando as liberdades

individuais, estabelecendo que a liberdade de cada pessoa, mesmo em fazer aquilo que a lei não lhe veda, não pode ir além da liberdade assegurada aos demais, ofendendo-a. Tranquilidade pública vem do latim tranquilitas (calma, bonança, serenidade), exprime o estado de ânimo tranquilo, sossegado, sem preocupações nem incômodos, que traz às pessoas uma serenidade, ou uma paz de espírito. Salubridade pública refere-se ao que é saudável, conforme as condições favoráveis à vida, certo que se referindo às condições sanitárias de ordem pública, ou coletiva, a expressão salubridade pública designa também o estado de sanidade e de higiene de um lugar, em razão do qual se mostram propícias às condições de vida de seus habitantes. (LAZZARINI, 2003, p. 284-285, grifo nosso).

O Poder Executivo, dentre os

Poderes Orgânicos do Estado que utilizam

o poder de polícia, através das Secretarias

da Segurança Pública dos Estados-

membros ou do Ministério da Justiça, é

incumbido da defesa da coletividade e de

zelar pela ordem pública.

Quando esse poder de polícia é

utilizado pelos órgãos de segurança

pública é possível sua análise tanto no

aspecto preventivo (polícia ostensiva)

como no repressivo (polícia judiciária). O

referido poder condiz com uma faculdade

da Administração Pública, e assim é

conceituado segundo Lazzarini (1973)

como:

Um conjunto de atribuições da Administração Pública, indelegáveis aos particulares, tendentes ao controle dos direitos e liberdades das pessoas, naturais ou jurídicas, a ser inspirado nos ideais do bem comum, e incidentes não só sobre

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elas, como também em seus bens e atividades. (LAZZARINI, 1973, p. 45-52)

Com efeito, todos os conceitos que

pudessem ser trazidos à presente pesquisa

repousariam no sentido de que o papel

principal das polícias, tanto militar como

civil, ao exercer suas funções

conjuntamente, é levar tranquilidade e

sensação de segurança às pessoas como

também proteger seus patrimônios.

2.1 COMPETÊNCIA LEGAL PARA

SE LAVRAR O TERMO

CIRCUNSTANCIADO DE

OCORRÊNCIA (TCO)

Desde a promulgação da Lei nº

9.099/95, a qual dispõe sobre os Juizados

Especiais Cíveis e Criminais, a Polícia

Civil do Estado do Ceará vem

materializando o registro das infrações

penais de menor potencial ofensivo nos

denominados TCO’s. Isso vem

acontecendo independentemente da

ocorrência policial ter sido atendida pela

Polícia Militar do Ceará, uma vez que

aquela instituição realiza função

mediadora entre a autoridade policial que

tomou ciência do fato e o Juizado

respectivo para onde o caso será levado.

Hodiernamente, quando

vivenciamos a era da globalização e

notório avanço tecnológico, os órgãos

estatais devem ter consciência de que o

retardamento ou a negativa em atender de

forma eficiente os direitos individuais e

coletivos gera insatisfação social e,

consequentemente, acaba por resultar no

aumento da violência. Embora milenares,

ainda soam oportunas as palavras do

profeta bíblico Isaías quando faz a

seguinte afirmação: “A paz é fruto da

justiça” (ISAÍAS 32:17).

Embora a Lei nº 9.099/95 já esteja

em vigor há quase duas décadas no

ordenamento jurídico pátrio, ainda persiste

a discussão acerca da competência da

Polícia Militar para a lavratura dos TCO’s

em decorrência das infrações de menor

potencial ofensivo. Tal discussão se dá em

razão da interpretação literal do artigo 144,

em seus parágrafos 4º e 5º, da Constituição

Federa/1988, bem como do artigo 69 da

Lei dos Juizados Especiais,

desconsiderando-se a interpretação

sistêmica e teleológica da Carta Maior e,

com isso, ilidindo os prováveis benefícios

daí oriundos.

Em sentido oposto à mencionada

discussão é importante destacar que em

data de 23 de outubro de 2009, na

Secretaria Executiva dos Juizados

Especiais Cíveis e Criminais da capital do

Ceará, ligada à Procuradoria-Geral de

Justiça, o plenário dos Órgãos colegiados,

em unanimidade de votos consignados na

Ata de Reunião daquele dia, e em

consonância com a Lei nº 9.099/95,

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decidiu aceitar, como projeto-piloto, os

procedimentos lavrados por infrações

penais de menor potencial ofensivo pela

Companhia de Polícia Militar Ambiental

(CPMA). Assim, dispensou-se a

necessidade do registro do Termo

Circunstanciado de Ocorrência (TCO) ser

feito na Delegacia de Polícia, conforme

solicitado fundamentadamente pelo

Comandante da referida Companhia.

A Polícia Militar, enquanto órgão

integrante do Sistema de Política Criminal

do nosso país, não deve ser acionada

somente para intervir na repressão do

crime. O TCO não deve ser encarado

como ato exclusivo da Polícia Civil, uma

vez que não é necessária a investigação

criminal porquanto presentes os elementos

flagrâncias para tal lavratura. Nesse

sentido:

Há necessidade de mudança de mentalidade de todos os aplicadores do direito, em relação à Lei nº 9.099/95. No que concerne o campo penal e processual penal deve prevalecer os princípios consagrados no artigo 62 da citada lei. Em especial, devem-se aplicar, em primeiro lugar, os princípios que regem o novo sistema dos Juizados Especiais. (Titular da 17ª Promotoria dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Fortaleza, grifo nosso).

É certo que a Lei nº 9.099/95,

mais precisamente em seu artigo 62,

enumera os critérios orientadores de seus

procedimentos: “Art. 62. O processo

perante o Juizado Especial orientar-se-á

pelos critérios da oralidade,

informalidade, economia processual e

celeridade, objetivando, sempre que

possível, a reparação dos danos sofridos

pela vítima e a aplicação de pena não

privativa de liberdade”. (grifou-se)

Ora, em verdade, o TCO

consiste em simples relatório

administrativo de comunicação ao Poder

Judiciário, que deverá ter por vetores os

critérios acima indicados. Desse modo,

diante dos parâmetros estabelecidos pela

Lei dos Juizados, não pode prosperar a

exclusividade da Polícia Civil na lavratura

dos TCO’s, até porque, dentre outros

problemas, falta, inclusive, efetivo para

isso. O próprio ex-Secretário da Segurança

Pública e Defesa Social do Estado do

Ceará, Roberto das Chagas Monteiro,

reconheceu os problemas que a PC/CE

enfrenta e, tratando dos crimes de

execuções nesta capital, afirmou que a

Instituição está falida:

Eu fico constrangido em falar sobre isso. Na realidade, nós não temos efetivo. Um delegado tem o tempo dele todo ocupado resolvendo problemas imediatos. Ou seja, ele precisa ter uma equipe para investigar o homicídio. Se ele não tem efetivo para isso, fica difícil. Às vezes há 20 presos numa delegacia e apenas um inspetor. Cadê aquele homem que fica o dia todo nas ruas, investigando, conversando com as pessoas? Uma investigação é complexa. Às vezes um pequeno detalhe acaba sendo a solução. Enquanto tivermos uma estrutura de Polícia Civil falida como é hoje, não vamos ter uma maneira de investigar de forma eficiente essas execuções. A Polícia Civil está falida.

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(NÃO tem como investigar, a Polícia está falida. Jornal O POVO. 4 set. 2008. Caderno Fortaleza, p. 2, grifo nosso).

O governador do Ceará, Cid

Ferreira Gomes (2006-2014) também

reconheceu a crítica situação em que se

encontra a Polícia Civil do Estado, apenas

preferindo substituir a palavra‘falida’,

utilizada nas declarações do Secretário

Roberto das Chagas Monteiro, por

‘desatualizada’:

A Polícia Civil não está falida. Esse não é o melhor termo. Ela está desatualizada, desequipada, desprovida de recursos humanos, faltam delegacias, delegados, policiais civis e faltam equipamentos. [...] Os delegados não dão conta de cuidar de todos os delitos (CID: “Polícia Civil não está falida, mas desatualizada”. Jornal O POVO. 5 set. 2008. Caderno Fortaleza, p. 1, grifo nosso).

Reforçando a defesa de que a

lavratura dos TCO’s não pode ser

exclusiva da Polícia Civil, o Promotor de

Justiça titular da 17ª Promotoria dos

Juizados Especiais Cíveis e Criminais de

Fortaleza sustenta:

É preciso mudar a exclusividade dos registros de ocorrência pela Polícia Civil do Estado do Ceará. Vários Estados da Federação já adotaram o registro pela Polícia Militar. Se faz necessário uma capacitação dos policiais militares para que possam realizar os registros de ocorrência.Não vejo nenhum impedimento para tal medida. Não obstante, a grande resistência dos policiais civis do Estado do Ceará. A lei não faz restrição sobre o registro de TCO. É preciso que se tenha um mínimo de provas para tipificar a infração penal e a suposta autoria. A

autoridade policial declarada no artigo 69, não significa exclusividade da policia civil. A interpretação que se tem do sistema dos juizados especiais é atender à demanda reprimida dos pequenos delitos. (Titular da 17ª Promotoria dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Fortaleza, grifo nosso).

Ao tecer considerações sobre a

lavratura do TCO pela Polícia Militar/Ce,

Jorge (2002, p.2) cita Camargo, ex-

Comandante-Geral da Polícia Militar de

São Paulo (PMSP):

Apenas para se ter uma ideia do que essa medida representa em termos de economia de tempo das viaturas em atividades de registro e consequente disponibilização para trabalho preventivo, basta lembrar que o tempo médio de permanência num distrito policial para registro desses casos gira em torno de duas horas e meia e, a cada mês, a Polícia Militar atende em todo Estado algo próximo de 150 mil ocorrências. Vale dizer, a cada mês se deixam de realizar, aproximadamente, 350 mil horas de patrulhamento preventivo por conta da desnecessária atividade cartorial nas infrações menores.(CAMARGO apud JORGE, 2002, p.2, grifo nosso).

Não há dúvidas de que na

discussão que permeia a lavratura dos

TCO’s o maior prejudicado é o cidadão,

que poderia ser mais bem protegido se, no

lugar da burocracia administrativa, fosse

usado o bom senso na solução desse

impasse de atribuições das Polícias do

Ceará, tendo em vista, esta corporação está

presente em todos os municípios cearenses

e diuturnamente esta em contato com a

sociedade, procurando de qualquer forma,

encontrar uma solução para o conflito, e

muitas vezes, fazendo deslocamento de até

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100 quilômetros para lavrar um TCO, e

enquanto isso a sua cidade em que atua,

fica desprotegida a mercê da violência e da

bandidagem..

Em trabalho que averigua a

produtividade da polícia do Brasil, Secco

(1999) apud Silva Júnior (2007, p. 2)

chegou à conclusão de que a nossa é uma

das piores a nível mundial no que tange a

taxa de resolução dos delitos ocorridos. A

tabela abaixo indica o que isso significa

em números em relação a outros países.

TABELA 1 – Relação entre países e solução dos

crimes.

Fonte: Silva Júnior, 2007.

2.2 REFERÊNCIA LEGAL DO

TERMO CIRCUNSTANCIADO DE

OCORRÊNCIA (TCO)

O termo de natureza jurídica

‘TCO’ surgiu em nosso ordenamento pela

primeira vez após a publicação da Lei nº

9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais –,

consistindo numa alternativa formal à

lavratura do ‘auto de prisão em flagrante

delito’. Trata-se, pois, do registro de um

fato tipificado como sendo infração penal

de menor potencial ofensivo. Segundo

disposto na referida Lei:

Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciadoe o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima. (Redação dada pela Lei nº 10.455, de 13.5.2002, grifo nosso).

Por sua vez, o artigo 61 da Lei dos

Juizados Especiais define a infração penal

de menor potencial ofensivo como sendo o

crime ou a contravenção em que a lei

comina pena não superior a 02 (dois) anos,

cumulada ou não com pena de multa.

PAÍS SOLUÇÃO DOS

CRIMES (%)

Estados

Unidos da

América

22

(vinte e dois por cento)

Inglaterra 35

(trinta e cinco por cento)

Canadá 45

(quarenta e cinco por

cento)

Japão 58

(cinquenta e oito por

cento)

Brasil 2,5

(dois vírgula cinco por

cento)

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Dados obtidos pela Coordenadoria

de Tecnologia da Informação e

Comunicação (CTIC) da SSPDS apontam

que no ano de 2008 podem ser citadas

como exemplos de algumas das principais

infrações de menor potencial ofensivo

levadas a registro em TCO’s nas

delegacias de Fortaleza: lesão corporal,

ameaça, desobediência, desacato,

resistência, difamação, injúria, calúnia,

violação de domicílio, dano, alguns crimes

ambientais, alguns crimes previstos no

Estatuto da Criança e do Adolescente,

receptação e constrangimento ilegal.

Serão elementos do TCO, além da

qualificação dos envolvidos: a) um

relatório feito pela autoridade policial

descrevendo toda a ocorrência do fato

delituoso em questão, contendo a versão

do condutor do flagranteado (policial que

conduziu o autor do crime à delegacia),

bem como o relato das vítimas e

testemunhas, se houver, sendo dispensada

a formalidade do ‘termo de declaração ou

de depoimento’; e b) a eventual juntada

aos autos de possível exame pericial e,

quando existir, do objeto do crime.

2.3 DIFERENÇAS ENTRE TCO E

INQUÉRITO POLICIAL

Como já assinalado, o TCO surge

com a finalidade de substituir o inquérito

policial nas infrações de menor potencial

ofensivo. O TCO nada mais é do que um

procedimento similar ao Boletim de

Ocorrência (BO), que há muito tempo é

feito pela Polícia Militar, quando elabora

relatório de local de ocorrência. A pequena

diferença é que o TCO contém algumas

informações adicionais e servirá de peça

informativa ao Juizado Especial Criminal

competente.

Nos ensinos do saudoso ex-

ministro Luiz Vicente Cernicchiaro do

STJ, já falecido no ano de 2010, o mesmo

afirmava que a Lei nº 9.099/95 havia

introduzido um novo sistema processual-

penal no país, apontando diferenças entre

TCO e inquérito policial:

RHC - Processual Penal - Lei nº 9.099/95 - Termo Circunstanciado- Diligência Policial - A Lei nº 9.099/95 introduziu novo sistema processual-penal. Não se restringe a mais um procedimento especial. O inquérito policial foi substituído pelo termo circunstanciado. Aqui, o fato é narrado resumidamente, identificando-o e as pessoas envolvidas. O juiz pode solicitar a autoridade policial esclarecimentos quanto ao TCO. Inadmissível, contudo, determinar elaboração de inquérito policial. A distinção entre ambos é normativa, definida pela finalidade de cada um. Tomadas de depoimentos é próprio do inquérito, que visa a caracterizar infração penal. O TCO, ao contrario, é bastante para ensejar tentativa de conciliação. (Proc. RHC 6249/SP – Recurso Ordinário em Hábeas Corpus – 19997/0007939-2 – Relator: Min. Luiz Vicente Cernicchiaro; Órgão Julgador: 6ª. Turma; Data Julgamento: 24/11/1997, grifo nosso).

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Segundo Mirabete (1998, p. 60), o

inquérito policial é ‘pesado’ e exige

formalidades que são dispensadas no

TCO, a exemplo do indiciamento, das

qualificações, das audições em registro

escrito de testemunhas e do indiciado, da

coleta de provas técnicas, dentre outras. O

inquérito policial, nas esferas comum e

militar, necessita, para desenvolvê-lo,de

um delegado de polícia ou de um oficial,

respectivamente.

2.4 PONTOS POSITIVOS E

NEGATIVOS NA ELABORAÇÃO

DO TCO PELA POLÍCIA MILITAR

Nogueira (2012) destaca pontos

positivos na elaboração do TCO pelo

Policial Militar: a) redução das ocorrências

de infrações de menor potencial ofensivo

levada aos excessivamente lotados

distritos policias; b) melhor

aproveitamento do tempo, uma vez que a

elaboração do TCO pelo policial militar se

daria no mesmo lugar da ocorrência,

evitando-se o tempo que é desperdiçado ao

conduzir o flagranteado à delegacia e,

assim, mais rápido o policial militar

retornaria ao policiamento ostensivo e

preventivo nas ruas; c) mais agilidade na

solução dos conflitos e diminuição dos

gastos de responsabilidade estatal, já que

não haveria necessidade do deslocamento

das viaturas aos distritos policias; d) maior

semelhança com o BO, que já é realizado

há muito tempo pela Polícia Militar; e)

efetivação dos princípios que orientam a

Lei dos Juizados, vez que a elaboração do

TCO pelo policial militar se harmoniza

com os princípios da oralidade,

simplicidade, informalidade, economia

processual e celeridade, os quais são

vetores expressos desse diploma jurídico.

Nogueira (2012), por outro lado,

também elenca alguns argumentos que são

levantados contrariamente à elaboração do

TCO pela Polícia Militar. São eles: a) o

termo ‘autoridade policial’, previsto no

artigo 69 da Lei nº 9.099/95, designa

exclusivamente o cargo de delegado de

polícia. A doutrina de Fernanda da Costa

Tourinho Filho (2003), na redação de seu

Código de Processo Penal comentado

dispõe que cabe à Polícia Civil, que é

mantida pelos Estados e dirigida pelos

Delegados de Polícia, a função principal

de apuração das infrações penais e

respectivas autorias, ressalvando-se as de

competência da Polícia Federal e as

infrações de natureza militar. O autor

ainda sustenta incumbir à Polícia Civil não

só as funções de polícia judiciária

encontradas no artigo 13 do Código de

Processo Penal mas também as previstas

no artigo 69 da Lei dos Juizados Especiais;

b) não é possível a elaboração de TCO por

parte da Polícia Militar em virtude de, com

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isso, haver lesão ao Código de Processo

Penal Militar (CPPM), já que a mesma só

deve realizar atividade de Polícia

Judiciária quando se tratar de infrações

penais militares; c) o artigo 4º do CPP

deixa claro que a polícia judiciária será

exercida pelas autoridades policiais, tendo

por escopo apurar os crimes e sua autoria;

d) considerando-se o termo ‘autoridade

policial’ como sendo os delegados de

polícia há que se lembrar que se exige

destes um conhecimento técnico-jurídico

para o exercício da carreira, que, por sua

vez, são Bacharéis em Direito, o que não é

exigido dos policiais; e) a competência do

policial militar na lavratura do TCO

deveria ser definida por lei, o que não é; f)

segundo a Resolução em matéria criminal

do IX Encontro dos extintos Tribunais de

Alçada do Brasil, que ocorreu em agosto

de 1997, em São Paulo/SP, mais

precisamente no item 7 da mencionada

Resolução, resolveu-se que o termo

‘autoridade policial’ a que se refere a Lei

dos Juizados diz respeito aos delegados de

polícia; g) o BO confeccionado pelo

policial militar não é parâmetro para que

também seja possível a lavratura do TCO,

já que o primeiro é bem mais simples do

que o segundo, sendo necessário, para se

lavrar um TCO, no mínimo, de um

bacharel em Direito.

Logo, temos bons argumentos que

defendem a possibilidade de lavratura dos

TCO’s pelo Policial Militar como também

bons argumentos contrários a isso. O

ponto negativo principal dessa lavratura se

trata da eventual incapacitação dos

policiais para realizarem tal procedimento.

Dos pontos positivos o que mais se destaca

é a otimização do tempo, fazendo com que

o policial militar retornasse de forma bem

mais rápida ao policiamento nas ruas. Com

isso, seria afastada a necessidade de

deslocamento até a delegacia para registro

do TCO já que o atendimento aos

envolvidos se daria no local da infração e

em muitas cidades o expediente termina as

17h00min horas, sendo necessário o

deslocamento para outra cidade para a

elaboração deste termo; a sensação de

impunidade seria reduzida, bem como a

redução da impunidade objetiva; haveria

mais credibilidade das pessoas no trabalho

policial ao enfrentamento do crime; o

efetivo da Polícia Civil seria utilizados

para desempenhar outras atribuições,

investigação dos crimes e os gastos com

recursos públicos seriam reduzidos, e só

quem ganharia com tudo isso era a

sociedade cearense..

2.5 OBJETIVOS DA LEI DOS

JUIZADOS ESPECIAIS– Lei nº

9.099/95

Uma lei penal, seja ela qual for,

objetiva primordialmente fazer com que as

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condutas dos indivíduos estejam em

harmonia com o ordenamento jurídico,

respeitando-se os limites impostos. A fim

de que as condutas desejadas sejam

alcançadas são cominadas sanções a cada

tipo penal, já que a impunidade incentiva a

reincidência das práticas criminosas. Para

que o Estado combatesse a morosidade e

conseguisse alcançar punitivamente o

infrator foi criado um mecanismo especial,

no caso, a Lei nº 9.099/95.

Atualmente, o sistema

penitenciário pátrio não consegue

comportar a quantidade de presos, de

forma que a recuperação do infrator fica

totalmente prejudicada, num verdadeiro

atentado à dignidade humana. Esse fato

impossibilita a ressocialização que é o

principal objetivo da sentença penal e

muito necessária ao sadio convívio social,

nos moldes da Lei de Execução Penal (Lei

nº 7.210/84).A Lei dos Juizados Especiais

surge possibilitando inúmeros benefícios

aos envolvidos na infração penal, dos

quais podemos citar: a) a garantia de

ressarcimento à vítima pelo dano sofrido;

b) o Poder Judiciário atuando de forma

mais célere em suas decisões; e c)o fato da

sociedade poder entrar em consenso com o

Estado quanto à imposição de pena ao

infrator, sem que se exclua a autoridade

estatal.

Consigne-se que nos dias de hoje,

diante do aumento expressivo da

criminalidade, não se pode admitir a clara

‘guerra dos egos’ entre as Polícias Civis e

Militares, pois o que deve realmente

nortear as discussões é a segurança das

pessoas e o meio mais eficaz de se chegar

a isso. Os órgãos incumbidos pela

preservação da ordem pública devem lutar

por resultados mais eficientes e enérgicos

no combate ao crime e nisso todos

concordam.

No que pertine às finalidades que

busca a Lei dos Juizados. Vejamos

novamente o teor do seu artigo 62:

Art. 62. O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade.

O legislador, no texto da aludida

Lei, teve a nítida intenção de ‘desafogar’ o

Judiciário através de um mecanismo que

tratasse de forma diferenciada os crimes

de menor potencial ofensivo.

2.5.1 Definição do termo

‘autoridade policial’

Segundo Maia Júnior (1997, p.

177), ‘autoridade’ é o “poder de comando

conferido ao Estado pela Lei Maior.

Representante do poder público. Profundo

conhecedor de uma determinada matéria.

Poder exercido por uma pessoa sobre a

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58

outra, pela superioridade de sua posição”.

Quanto à palavra ‘policial’, esclarece “que

diz respeito ou que pertence àpolícia;

característico ou próprio da polícia.

Indivíduo que integra uma ordem

policial.” (Id. ibid., 1997, p. 710).

A palavra ’autoridade’ também

pode denotar o ‘poder moral’ que provém

da pessoa que exerce um poder público em

decorrência de suas condições pessoas de

sabedoria, experiência, integridade,

honestidade, discernimento, superioridade

qualitativa, capacidade e qualidades de

caráter. ‘Poder’ e ‘autoridade’ não são

palavras equivalentes. Poder, diferente de

autoridade, é o direito de se exigir

obediência de outrem, o qual decorre de

forma mecânica através do exercício de

um cargo, podendo não apresentar as

condições de responsabilidade moral e de

imparcialidade que deve ter um ofício

público. O governo ideal deve possuir

poder e autoridade (SOIBELMAN &

SOIBELMAN, 2005).

Ao tratar do abuso de autoridade, a

Lei nº 4.898/65 dispõe em seu artigo 5º

que “considera-se autoridade, para os

efeitos desta lei, quem exerce cargo,

emprego ou função pública, de natureza

civil, ou militar, ainda que

transitoriamente e sem remuneração”.

Porém, a Lei nº 9.099/95 não

deixou claro quem é a autoridade policial

competente para a lavratura do TCO, de

modo que surgiram posicionamentos

distintos com relação à expressão

‘autoridade policial’ prevista no artigo 69

da referida Lei, que dispõe: “Art. 69. A

autoridade policial que tomar

conhecimento da ocorrência lavrará termo

circunstanciado e o encaminhará

imediatamente ao Juizado, com o autor do

fato e a vítima, providenciando-se as

requisições dos exames periciais

necessários”.

Sem a definição de quais

autoridades estaria apta a lavrar os TCO’s,

a abrangência do artigo 69 da Lei dos

Juizados acabou criando uma disputa entre

as Polícias Civil e Militar em todo o País.

Todavia, a maior parte dos juristas entende

ser possível a confecção e o

encaminhamento do TCO pelas Polícias

Militares, objetivando atender aos

preceitos norteadores da Lei n.º 9.099/95.

Doutra parte a Constituição Federal

de 1988 assevera em seu artigo 144, §4º

que “às polícias civis, dirigidas por

delegados de polícia de carreira,

incumbem, ressalvada a competência da

União, as funções de polícia judiciária e a

apuração de infrações penais, exceto as

militares”.

A combinação precipitada desses

dois dispositivos poderia levar à conclusão

de que as funções de polícia judiciária são

exclusivas da Polícia Civil. Entretanto o

Código de Processo Penal, em seu artigo

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4º, afirma que “a polícia judiciária será

exercida pelas autoridades policiais no

território de suas respectivas

circunscrições e terá por fim a apuração

das infrações penais e da sua autoria”.

O parágrafo único desse dispositivo deixa

claro: “A competência definida neste

artigo não excluirá a de autoridades

administrativas, a quem por lei seja

cometida a mesma função”. (grifou-se)

Em verdade o que existe é uma

grande resistência por parte da Polícia

Civil em admitir que a Polícia Militar

também é competente para lavrar TCO’s

diante das infrações de menor potencial

ofensivo. Quando o artigo 69 da Lei dos

Juizados faz menção ao termo ‘autoridade

policial’ não está se referindo de forma

exclusiva à Polícia Civil. Muitos

doutrinadores reconhecem a expressão

‘autoridade policial’ como sendo

equivalente tanto ao policial civil como ao

militar. Cite-se como exemplo uma das

precursoras da Lei nº 9.099/99, a

reconhecida Drª. Ada Pellegrini Grinover,

que já se pronunciou de forma favorável à

confecção do TCO por parte da Polícia

Militar, já que dentre os objetivos da

aludida Lei se encontra o de esvaziar os

fóruns e delegacias, oferecendo-se a

oportunidade da mediação e da célere

solução das lides.

A Polícia Civil resiste a tais

posicionamentos alegando que a Policia

Militar não estaria capacitada para tal

finalidade. Contudo, Polícias Militares de

alguns estados como a de São Paulo e do

Rio Grande do Sul já demonstraram o

contrário quando conseguiram implantar

tal confecção, com a devida aquiescência

da Justiça. No caso do Estado do Ceará,

estudos já foram encaminhados, inclusive

pelo Comandante da Polícia Rodoviária

Estadual da PMCE, todavia, até hoje sem a

devida resposta.

Outrossim, a Lei n.º 9.099/95

introduziu novo sistema processual-penal

e a lavratura do TCO não é atividade de

polícia judiciária, haja vista a já

mencionada desnecessidade de

investigação, logo, não existe razão para o

policial militar não lavrar esse simples

procedimento administrativo.

Segundo a Comissão Nacional da

Escola Superior da Magistratura,

encarregada por formular as primeiras

conclusões sobre a interpretação da Lei

9.099/95, apresentou a seguinte redação de

sua nona conclusão: "A

expressão ‘autoridade policial’, referida no

art. 69, compreende quem se encontra

investido em função policial, podendo a

Secretaria de o Juizado proceder à

lavratura do termo de ocorrência e tomar

as providências previstas no referido

artigo". (Jornal da Associação dos

Magistrados das Justiças Militares

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Estaduais n.º 29, ano V, set/out, 2000,

p.13). (grifo do autor).

Finalmente, a Lei nº 12.553/95,

que dispõe sobre o Sistema de Juizados

Especiais Cíveis e Criminais do Estado do

Ceará, traz a seguinte redação em seu

artigo 37, §2º, in verbis:

Art. 37 – A Secretaria de unidade do Juizado Especial poderá proceder à lavratura de termo de ocorrência mencionado no Art. 69, da Lei Federal nº 9.099/95, e tomar as providências previstas no referido Artigo. [...] § 2º - Para os efeitos desta Lei, a autoridade policial é quem se encontra investido na função policial.

Na falta de uma definição do que

seja a expressão ‘autoridade policial’ pela

Lei dos Juizados, parece-nos coerente

acatar, numa interpretação sistemática, a

abrangência da citada expressão, de modo

que também se incluam nela os policiais

militares.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

O trabalho científico ora

apresentado teve como base uma pesquisa

bibliográfica e documental, onde

procuramos extrair das leis, doutrina e

jurisprudência as fontes das quais

precisávamos para uma correta

fundamentação teórica sobre o tema

abordado.

Em relação ao método,

utilizou-se o qualitativo, por meio de

consultas em doutrinas, jurisprudência,

livros, artigos acadêmicos, matérias

disponibilizadas na internet,

principalmente voltados para a análise da

competência da Polícia Militar em lavrar

TCO’S, delimitando-se a abordagem do

tema para o estado do Ceará.

4 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS

Não obstante existir uma Secretaria

de Estado. que integra as polícias

estaduais, que é a Secretaria de Segurança

Publica e Defesa Social, a lavratura por

parte dos integrantes das Polícias Militares

do Termo Circunstanciado ainda não é

unanimidade. O assunto tem sido objeto de

grandes discussões doutrinárias e tem

provocado controvérsias entre os

integrantes de ambas as instituições –

Polícia Civil e Polícia Militar –, máxime

por parte dos Delegados de Polícia Civil,

por sustentarem o entendimento de que tal

atribuição é privativa da categoria.

O Termo Circunstanciado,

conhecido por TCO, tem previsão

normativa no art. 69 da Lei 9.099/95,

substituindo o Inquérito Policial nas

infrações de menor potencial ofensivo,

que, segundo disposto no art. 61 da

referida Lei, são as contravenções penais e

os crimes a que a lei comine pena máxima

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não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou

não com multa.

É bem verdade que no dia-a-dia da

atividade da polícia militar a maioria das

ocorrências atendidas refere-se às

infrações de menor potencial ofensivo, tais

como: acidentes com lesões leves; vias de

fato; agressões (sejam verbais ou

fisicamente leves); perturbação do sossego

e outros, também de menor gravidade.

Também é inconteste o fato de que

em pelo menos metade do país – ou seja,

em cerca de 2.800 municípios brasileiros –

não existem delegacias de policia civil.

Desse modo, as ocorrências policiais são

atendidas e acompanhadas até o desfecho

de praxe por policiais militares. O

comparecimento in loco quando da prática

do delito favorece o policial militar, que

certamente contará com melhores

condições de descrever os fatos mais

precisamente, podendo, inclusive, ouvir as

testemunhas e fornecer informações

valiosas ao deslinde dos fatos.

As anotações levantadas na

pesquisa demonstram com clareza que a

lavratura do Termo Circunstanciado por

policial militar não perfaz qualquer

usurpação de função por parte deste e de

maneira alguma essa lavratura poderá ser

considerada invasão na esfera de

atribuições da Polícia Civil.

Não existe qualquer

inconstitucionalidade na lavratura dos

TCO’s pela Polícia Militar, uma vez que a

Magna Carta não assegura exclusividade

quando do registro da ocorrência de

delitos. Quando policiais militares lavram

os Termos (TCO’s) não estão investigando

crimes, mas apenas registrando fatos, e

isso no exercício da atividade

administrativa que lhes é própria.

Registrar não significa investigar e, por

isso mesmo, é dispensável formação

jurídica para a lavratura desses TCO’s.

Além de não existir qualquer óbice

legal à lavratura dos TCO’s pelas polícias

militares, há dois motivos bastante

vantajosos para que isso ocorra: o primeiro

deles repousa no sentido de que a lavratura

do Termo de forma imediata pelo policial

militar reduz significativamente o tempo

de retenção do autor da infração, da

possível vítima e das eventuais

testemunhas e, consequentemente, mais

rápido o militar voltará ao policiamento

naquela área. E o segundo diz respeito à

economia dos recursos que seriam gastos

na condução desnecessária do infrator ao

distrito policial para a lavratura do TCO.

Essa rotina tanto atenderia ao

interesse público como cumpriria o dever

de eficiência que deve ter a Administração

Pública, consagrado no artigo 37 da Carta

Constitucional/88.

Quanto à interpretação da norma

contida no artigo 69 da Lei n° 9.099/95 o

Supremo Tribunal Federal já se

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manifestou no sentido da impossibilidade

de se conhecer sobre o tema, em virtude de

se tratar de ato normativo secundário:

inconstitucionalidade indireta. Vejamos

um de seus julgados:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ATOS NORMATIVOS ESTADUAIS QUE ATRIBUEM À POLÍCIA MILITAR A POSSIBILIDADE DE ELABORAR TERMOS CIRCUNSTANCIADOS. PROVIMENTO 758/2001, CONSOLIDADO PELO PROVIMENTO N. 806/2003, DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO, E RESOLUÇÃO SSP N. 403/2001, PRORROGADA PELAS RESOLUÇÕES SSP NS. 517/2002, 177/2003, 196/2003, 264/2003 E 292/2003, DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ATOS NORMATIVOS SECUNDÁRIOS. AÇÃO NÃO CONHECIDA. 1. Os atos normativos impugnados são secundários e prestam-se a interpretar a norma contida no art. 69 da Lei n. 9.099/1995: inconstitucionalidade indireta. 2. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pacífica quanto à impossibilidade de se conhecer de ação direta de inconstitucionalidade contra ato normativo secundário. Precedentes. 3. Ação Direta de Inconstitucionalidade não conhecida. (STF - ADI: 2862 SP , Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 26/03/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-083 DIVULG 08-05-2008 PUBLIC 09-05-2008 EMENT VOL-02318-01 PP-00020 RTJ VOL-00205-03 PP-01125 LEXSTF v. 30, n. 356, 2008, p. 68-85, grifo nosso).

Portanto o STF não se

manifestou sobre a abrangência da

expressão ‘autoridade policial’ prevista no

artigo 69 da Lei dos Juizados.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa teve início

destacando o que a Constituição Federal

de 1988 prevê acerca de Segurança

Pública. De forma expressa a Carta Maior

incumbe às Polícias Civis e Militares,

enquanto órgãos do sistema nacional de

segurança pública, a preservação da ordem

pública e da incolumidade das pessoas e

do patrimônio. Mais precisamente, em seu

artigo 144, parágrafos 4º e 5º, se

encontram as funções cabíveis à Polícia

Civil e à Militar, dispondo que às polícias

civis caberão as funções de polícia

judiciária e a apuração de infrações penais,

e às polícias militares as funções de polícia

ostensiva e de preservação da ordem

pública.

Verificou-se que, no tocante à

atividade policial militar, a Constituição

Estadual do Ceará ainda complementa:

“Art. 188. Incumbe à Polícia Militar a

atividade da preservação da ordem

pública em todas as suas modalidades e

proteção individual, com desempenhos

ostensivos para inibir os atos

atentatórios a pessoas e bens”. (grifou-

se)

Vimos que a competência da

Polícia Militar deve ser entendida além do

combate ostensivo e direto à

criminalidade. Na amplitude do

entendimento de suas funções outras

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atividades podem ser incluídas, desde que

realizadas harmoniosamente com os

segmentos comunitários e respeitada a

legislação vigente.

Mais a frente quando tratamos da

Lei nº 9.099/95 (Lei dos Juizados

Especiais) destacamos os critérios

orientadores de seus procedimentos,

conforme se vê do seu artigo 62: “Art. 62.

O processo perante o Juizado Especial

orientar-se-á pelos critérios da oralidade,

informalidade, economia processual e

celeridade, objetivando, sempre que

possível, a reparação dos danos sofridos

pela vítima e a aplicação de pena não

privativa de liberdade”. (grifou-se).

Embora a Lei nº 9.099/95 já esteja

em vigor há quase duas décadas no

ordenamento jurídico pátrio, ainda persiste

a discussão acerca da competência da

Polícia Militar para a lavratura dos TCO’s

em decorrência das infrações de menor

potencial ofensivo. Tal discussão se dá em

razão da interpretação literal do artigo 144,

em seus parágrafos 4º e 5º, da Constituição

Federal/88, bem como do artigo 69 da Lei

dos Juizados Especiais, desconsiderando-

se a interpretação sistêmica e teleológica

da Carta Maior.

Na tentativa de dirimir a referida

discussão a Comissão Nacional da Escola

Superior da Magistratura, encarregada

por formular as primeiras conclusões

sobre a interpretação da Lei 9.099/95,

apresentou a seguinte redação de sua nona

conclusão: "A expressão ‘autoridade

policial’, referida no art. 69, compreende

quem se encontra investido em função

policial, podendo a Secretaria de o Juizado

proceder à lavratura do termo de

ocorrência e tomar as providências

previstas no referido artigo". (Jornal da

Associação dos Magistrados das Justiças

Militares Estaduais n.º 29, ano V, set/out,

2000, p.13). (grifo do autor).

Finalmente, a Lei nº 12.553/95,

que dispõe sobre o Sistema de Juizados

Especiais Cíveis e Criminais do Estado do

Ceará, traz a seguinte redação em seu

artigo 37, §2º, in verbis:

Art. 37 – A Secretaria de unidade do Juizado Especial poderá proceder à lavratura de termo de ocorrência mencionado no Art. 69, da Lei Federal nº 9.099/95, e tomar as providências previstas no referido Artigo. [...]

§ 2º - Para os efeitos desta Lei, a autoridade policial é quem se encontra investido na função policial.

Na falta de uma definição do que

seja a expressão ‘autoridade policial’ pela

Lei dos Juizados, parece-nos coerente

acatar, numa interpretação sistemática, a

abrangência da citada expressão, de modo

que também se incluam nela os policiais

militares. Levando-se em consideração

que nos dias atuais uma das maiores

preocupações da sociedade brasileira é a

Segurança Pública, e que a lavratura do

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TCO pelo Policial Militar é sinônima de

economia de gastos, tempo e celeridade

nos procedimentos, com esse

entendimento quem ganha é o cidadão e

não uma ou outra classe de policiais.

Então, entendo que os responsáveis pela

Segurança Pública, deveriam se

conscientizar de que a função precípua da

Polícia Militar, inserida em nossa Carta

Magna, é a função de prestar, antes de

tudo um serviço de boa qualidade e

eficiência e dentro da legalidade, realizar

procedimentos tendentes a garantir com

maior efetividade e segurança a

preservação e manutenção da ordem

pública, sempre como objetivo de levar da

forma mais célere mais tranquilidade e

segurança aos cidadãos cearenses.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.

______, Constituição do Estado do Ceará, 1989. ______, Decreto-Lei nº 3.689. Código de Processo Penal, 1941. ______, Lei nº 4.898. Regula o direito de representação e o processo de Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade, 1965. ______, Lei nº 9.099. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências, 1995.

______, Lei nº 12.553, Dispõe sobre o Sistema de Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado do Ceará, 1995.

LAZZARINI, Álvaro. Do poder de polícia. Justitia. São Paulo, 1973.

LIMA, Roberto Kant de. Políticas de segurança pública e seu impacto na formação policial: considerações teóricas e propostas práticas, In: ZAVERUCHA, Jorge, MARCÍLIO, Maria Luiza e PUSSOLI, Lafaiete (coordenadores), Cultura dos DireitosHumanos, São Paulo: LTR, 2002. MAIA JÚNIOR, Raul. Dicionário brasileiro da língua portuguesa. São Paulo: Difusão Cultural do Livro, 1997.

MIRABETE, Júlio Fabrini. Juizados Especiais Criminais. 3 ed., São Paulo, Atlas, 1998.

SILVA JÚNIOR, Azor Lopes da. A face oculta da segurança pública . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1486, 27 jul. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10203>. Acesso em: 21 ago. de 2014.

SOIBELMAN, Léa Hasson; SOIBELMAN, Félix. In. Enciclopédia do Advogado. Rio de Janeiro, 2005.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Criminais. 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2008.

Outras fontes:

ADI – 2862/SP. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/busca?q=ADI+2862. Acesso em: 12 de out. de 2014.

CID: “Polícia Civil não está falida, mas desatualizada”. Jornal O POVO, Fortaleza, Ceará, 5 set. de 2008. Caderno Fortaleza. Disponível em: http://www.opovo.com.br/opovo/fortaleza/

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817321.html. Acesso em: 07 de set. de 2014. Conclusão nº 09 da Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95.

HC n.º 7199/PR. Julgado pelo STJ. Disponível em <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/484493/habeas-corpus-hc-7199-pr-1998-0019625-0> acesso em: 15 de ago. de 2014.

HC n.º 0.002902-2. Julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

NÃO tem como investigar, a Polícia está falida. Jornal O POVO, Fortaleza, Ceará, 4 set. 2008. Caderno Fortaleza. Disponível em: <http://www.opovo.com.br/opovo/fortaleza/816935.html >. Acesso em: 5 de set. de 2014. Provimento nº 758/2001-09-14. Conselho de Procuradores do Estado de São Paulo.

RHC – 6249/SP. Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/518020/recurso-ordinario-em-habeas-corpus-rhc-6249-sp-1997-0007939-2. Acesso em: 10 de out. de 2014.

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DO CONCURSO MATERIAL DE DELITOS: PORTE ILEGAL DE A RMA DE FOGO E RECEPTAÇÁO

Antônio Evandro de Oliveira Aluno do curso de Direito na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected] João Celso de Castro Moura Professor Especialista do curso de Direito na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected]

RESUMO: O presente artigo trata da problematização acerca da aplicação ou não do concurso material de delitos entre o porte ilegal de arma de fogo (artigo 14 da lei 10.826/2003) e a receptação. A escolha do tema deu-se pela grande quantidade de indiciados por porte ilegal de arma de fogo que não respondem, no mesmo processo, também pela receptação da arma, ou seja, quando a aquisição da arma de fogo é feita de forma ilícita. O trabalho terá a natureza de análise qualitativa de processos criminais que tratam do porte ilegal de arma de fogo em que o orientando é testemunha. O tipo de pesquisa é documental e o método de análise é o indutivo, pois parte de uma premissa individual com o intuito de mudar a realidade genérica. O resultado é que de quatro processos analisados apenas em um o réu foi indiciado nos dois crimes em comento, o que evidencia a negligência do aparelho estatal de segurança pública frente ao cometimento de crimes dessa natureza, ou seja, a impunidade gerada pela má prestação jurisdicional da persecução criminal. Palavras-chave: Porte Ilegal de Arma; Receptação; Concurso Material. ABSTRACT: This scientific paper deals with the questioning about whether or not the offenses material competition between the illegal possession of a firearm (Article 14 of Law 10,826 / 2003) and the fencing. The choice of theme was due to the large amount of charged with illegal possession of a firearm which do not respond in the same case, also for receiving the gun, that is, when the acquisition of the firearm is made illegally. Work will analyze the qualitative nature of criminal cases concerning the illegal firearm possession in which the guiding is witness. The document type of search is the method of analysis and is inductive because of the premise of an individual with the intention of changing the generic reality. The result is that four cases examined only one defendant was indicted on two counts under discussion, which shows the negligence of the state apparatus of public safety front the commission of such crimes, i.e., impunity generated by poor adjudication criminal prosecution. Keywords: Illegal Gun Porte; Receiving; Contest Material.

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como

escopo central apresentar uma importante

discussão doutrinária e jurisprudencial

acerca da caracterização ou não do

concurso material entre os delitos de porte

ilegal de arma de fogo e receptação, que

vem dividindo opiniões quanto à aplicação

ou não do acúmulo de penas entre esses

dois delitos autônomos.

A primeira corrente de

doutrinadores e jurisconsultos defende que

não há de se falar em concurso material de

delitos entre o crime de porte ilegal de

armas de fogo e receptação,

principalmente pelos motivos seguintes

elencados: ambos os delitos têm como

verbo do tipo a conduta de adquirir,

levando a crê que a aplicação do concurso

caracterizaria o bis in idem, ou seja,

puniria o infrator duas vezes pelo mesmo

ato; a receptação é meio necessário para a

consumação do delito de porte ilegal de

arma de fogo, caracterizando, assim, a

aplicação do princípio da consunção em

que o crime meio é imediatamente

absorvido pelo crime fim.

Já a segunda corrente de

pensadores é incisiva em afirmar que resta

totalmente caracterizada a aplicação do

concurso material de delitos entre os

crimes de porte ilegal de arma de fogo e

receptação, situação jurídica em que as

penas são somadas e imputadas ao seu

autor, pois as condutas descritas nos tipos

penais são absolutamente autônomas, seus

verbos são independentes, a suas

consumações se dão em momentos

totalmente distintos, afastando

completamente a aplicação do princípio da

consunção, porque na construção do iter

criminis o delito de receptação não é meio

necessário para consumação do delito de

porte ilegal de arma de fogo. Dessa forma,

a maneira correta de se portar diante de tal

situação seria justamente a imputação de

ambas as penas ao autor do fato.

Ex positis, infere-se que o tema

supracitado é de extrema relevância para a

correta aplicação e exata punição ao

infrator que for surpreendido portando

uma arma de fogo, pois, além desse crime

ele também infringirá o art. 180 do Código

Penal que trata da receptação. No que se

refere à importância do tema para o

desenvolvimento das ciências criminais é

perceptível o grau de contribuição do

projeto, pois, de certa forma, tanto os

discentes da seara jurídica quanto os

operadores e curiosos do Direito irão se

identificar e se aprofundar nesse tema tão

excitante e atual, uma vez que divide

doutrinadores e juristas. No campo social

o projeto tem valia a partir do momento

em que duas situações de reprovabilidades

distintas se equiparam e sofre uma única

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reprimenda, resultando numa prestação

jurisdicional falha e passível de severas

críticas por parte da sociedade. O tema

proposto tem como propósito informar e

explicar uma situação jurídica controversa

a sociedade para que ela possa

posteriormente cobrar das autoridades

públicas a correta aplicação da pena

correspondente ao ato praticado pelo

infrator, a fim de que a nossa sociedade

siga na busca de um ideal tão distante que

é a paz social.

O objetivo geral desse trabalho é

analisar se o concurso material de delitos

entre o porte ilegal de arma de fogo e a

receptação está sendo aplicado nos

processos judiciais oriundos das varas

criminais da comarca de Fortaleza.

Já os objetivos específicos são:

estabelecer os limites do tipo penal

especial porte ilegal de arma de fogo;

lecionar sobre os limites do crime de

receptação e suas variantes; explicar o

instituto do concurso material de delitos e

trazer os argumentos pro e contra a

aplicação desse instituto aos crimes de

porte ilegal e receptação.

A metodologia utilizada para a

feitura do presente trabalho consiste na

análise critica de processos judicias

criminais em que o graduando é

testemunha, além de doutrina específica

do tema, leis, jurisprudências e artigos

publicados virtualmente. Para isso se

adotou o método qualitativo, que parte de

um caso especifico com a pretensão de

mudar a interpretação geral sobre o tema.

A natureza da pesquisa é

qualitativa, pois analisa os processos

específicos do tema ora proposto em que o

orientando é parte como testemunha de

acusação.

O corpus de pesquisa, como já foi

dito anteriormente, serão processos

criminais oriundos de variadas varas

criminais da comarca de Fortaleza, em que

o orientando é testemunha. Além disso,

como não poderia deixar de ser, será

analisada a doutrina que fala sobre o tema,

leis, jurisprudência e artigos virtuais.

Conforme o autor Antônio Carlos

Gil, as ideias apontadas estão relacionadas

à pesquisa documental:

A pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A diferença essencial entre ambas está na natureza das fontes: Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não recebem ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa. (GIL, 2002, p.45).

Com a pretensão de melhor

alcançar o objetivo proposto, foi analisado

via internet os processos judiciais

eletrônicos de algumas varas criminais da

comarca de Fortaleza com o objetivo de

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saber se neles estão sendo aplicados o

concurso material e o acúmulo de penas

imposto pela lei. Além disso, para

corroborar e endossar ainda mais o

trabalho buscou ainda base doutrinária em

renomados criminalistas como: Felício

Soares, Fernando Capez, Rogério Greco,

Roberto Bitencourt, o Promotor de Justiça

Gustavo Senna, o sociólogo Antônio

Carlos Gil, assim como leis,

jurisprudências e diversos artigos da

internet sobre o tema.

As partes que compõe o trabalho

são: referencial teórico, procedimentos

metodológicos, análise de dados e

resultados e considerações finais.

No referencial teórico focou-se no

tema ora proposto e seus objetivos geral e

específico, com a análise crítica de

processos criminais da comarca de

Fortaleza, além de pesquisa baseada em

autores renomados, leis, jurisprudências e

artigos virtuais.

Nos procedimentos metodológicos

procurou-se explicitar de forma detalhada

como se deu o caminho da pesquisa para

que se chegasse ao resultado desejado.

Explicando pare passo como se deu a

análise dos processos criminais que estão

tramitando ou que já transitaram em

julgado nas varas criminais da comarca de

Fortaleza, onde foi observado se nos

crimes de porte ilegal de arma de fogo o

acusado também era indiciado pelo crime

de receptação.

Na análise de dados e resultados,

por sua vez, foi feito a contextualização

entre o problema de pesquisa, o marco

teórico e os processos criminais

analisados, explicando, inclusive o

desdobramento de cada um deles.

Por fim, nas considerações finais

foram apresentadas as conclusões

correspondentes aos objetivos propostos

no inicio da pesquisa, respondendo as

perguntas relacionadas ao tema em

destaque e alertando toda a coletividade

sobre os impactos negativos de uma má

prestação jurisdicional no nosso Poder

Judiciário, que ao se deparar com um caso

de porte ilegal de arma de fogo não indicia

o acusado também pelo crime de

receptação.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 BREVE HISTÓRICO DO CRIME DE

PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO

NO BRASIL

A primeira referência na legislação

sobre o crime de posse e porte de arma de

fogo na verdade não era definido como

crime propriamente, mas sim como

contravenção, com redação na Lei das

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Contravenções Penais, no artigo 19, que

assim definia o crime:

Art. 19. Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta, sem licença da autoridade:

Pena – prisão simples, de quinze dias a seis meses, ou multa, de duzentos mil réis a três contos de réis, ou ambas cumulativamente.

Note-se que a pena imposta ao

cidadão que era flagrado portando uma

arma de fogo podia ser aplicada na

modalidade de multa, ou mesmo na prisão

simples, o qual era menor que o crime de

calúnia, descrito no Código Penal, no

artigo 138, que descreve pena de detenção

de seis meses a dois anos, e multa. A

proporção da pena era muito desigual

perante a gravidade da situação, pois

certamente a calúnia dificilmente

ameaçaria a vida de outras pessoas.

No ano de 1997, foi sancionada a

lei 9.437, o qual instituiu o atual sistema

de cadastro de armas, chamado Sistema

Nacional de Armas (SINARM), e elevou a

contravenção de porte ilegal de armas a

crime de porte ilegal de uso permitido,

descrevendo dezoito condutas que se

equiparam ao porte, e aumentando a pena

se a arma for de uso restrito.

Sancionada a lei 10.826/03, os

crimes relacionados a armas de fogo foram

separados em posse e porte, mantendo a

classificação em uso permitido e restrito,

porém aumentou a pena nos casos de

porte. Referida lei também visualizou a

proibição do comércio de armas e

munições, porém em referendo posterior a

população brasileira optou pela

continuação do comércio.

Após o referendo, restou ao

Estatuto do Desarmamento regularizar os

assuntos relativos a armas e munições,

pois o comércio não foi proibido. Diante

disto, o SINARM ficou responsável por

toda e qualquer transação envolvendo

armas de fogo, desde uma simples doação

a qualquer tipo de venda, seja com origem

de fábrica, lojas de armas e particulares.

2.2 DO PORTE ILEGAL DE ARMA DE

FOGO

Ab initio, é importante fazer

uma breve arguição sobre o crime de porte

ilegal de arma de fogo, uma das figuras

típicas da lei nº 10.826 de 22 de dezembro

de 2003, que diz in verbis:

Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.

O crime de “porte ilegal de arma

de fogo”, equivocadamente nominado pelo

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legislador, traz a previsão de treze

condutas, por conta disto é denominado

crime plurisubjetivo, não se restringindo

somente ao porte do artefato. São elas:

portar, deter, emprestar, fornecer, receber,

ter em depósito, transportar, ceder, ainda

que gratuitamente, emprestar, remeter,

manter sob sua guarda ou ocultar.

O tipo penal do art. 14 da Lei em

comento trata-se de tipo misto alternativo,

no qual a realização de mais de uma

conduta pelo mesmo agente implicará

somente a realização de um único delito

por conta do princípio da alternatividade

que obriga a observância de uma conduta

perante as demais do tipo, esta deve ser

prevalente, e deverá ser conexa com as

demais.

O primeiro verbo do tipo previsto

no art. 14, portar, acabou sendo a razão do

nomen iuris escolhido pelo legislador, que

significa segundo a doutrina, levar consigo

o objeto material em condições de pronta

utilização, não necessariamente deve haver

o contato físico para ser abrangido por

esse núcleo, devendo pelo menos haver a

possibilidade de acesso rápido a este

objeto.

O tipo penal em epígrafe possui

vários verbos, sendo que o mais

importante e também o mais comentado

pelos operadores do direito é o verbo

portar que para Felício Soares (2011,

p.93) “significa trazer consigo, junto ao

corpo, em trânsito”. Esse delito é cometido

de forma rotineira pelos mais variados

sujeitos, dos mais variáveis perfis sociais,

pois as armas de pequeno porte como os

revólveres e pistolas são de fácil

dissimulação, ou seja, pode ser escondido

facilmente entre as vestes, sem que se

perceba o porte da arma de fogo.

2.3 DA RECEPTAÇÃO E SUAS

MODALIDADES

Além disso, é de extrema

importância trilhar os limites legais do

crime de Receptação que encontra morada

no art. 180, parágrafos primeiro e terceiro,

do Código Penal Brasileiro, que diz de

forma literal:

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). Receptação qualificada (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). Pena – reclusão, de três a oito anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por

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meio criminoso: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996).

O autor Rogério Greco, explica

com perfeição o tipo penal em comento,

dizendo:

O crime de receptação encontra-se no rol dos delitos mais praticados pela nossa sociedade, variando desde a aquisição de pequenos produtos vendidos por camelôs e ambulantes até as mais impressionantes, cometidas por grandes empresas, que adquirem carregamentos inteiros de mercadorias, roubadas, quase sempre, durante o seu transporte rodoviário. (GRECO, 2012, p.330).

O crime em comento possui

variações em seus tipos, ou seja, o caput se

distingue dos parágrafos primeiro e

terceiro, de forma que ele comporta várias

modalidades de receptação.

É assim que nos ensina Rogério

Greco, verbis:

A modalidade fundamental de receptação, como não poderia deixar de ser, encontra-se no caput do art.180 do Código Penal. Em seu § 1º foi prevista a receptação qualificada. Houve, também, previsão da chamada receptação culposa, conforme se deduz do § 3º do mencionado art. 180. (GRECO, 2012, p.330).

A primeira modalidade é chamada

dolosa, quando o agente tem a intensão

clara de receptar um objeto que ele sabe

ser produto de crime (furto, roubo).

Sobre o caput do art. 180 do

Código Penal é preciso colacionar as

precisas lições do Promotor Rogério

Greco, que nos mostra as peculiaridades

do crime comentado. O autor nos

contempla dizendo:

Podemos visualizar no caput do art. 180 do Código Penal duas espécies de receptação, a saber: a) própria; e b) imprópria.

Diz-se própria a receptação quando a conduta do agente se amoldar a um dos comportamentos previstos na primeira parte do caput do art. 180 do Código Penal, vale dizer, quando o agente: adquire, recebe, transporta, conduz ou oculta, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime. Merece destacar que as condutas de transportar e conduzir foram inseridas no caput do art. 180 Código Penal pela Lei nº 9.426, de 24 de dezembro de 1996.

Denomina-se imprópria a receptação quando o agente leva a efeito o comportamento previsto na segunda parte do caput do art. 180 do Código Penal, ou seja, quando influi para que terceiro, de boa fé, a adquira, receba ou oculte. (GRECO, 2012, p.330).

A segunda modalidade de

receptação, que está disposta no parágrafo

primeiro, é a chamada receptação

cometida com dolo eventual, ou seja, o

comprador deve saber, pelas

características do produto ou de quem

ofereceu, que a coisa comprada é produto

de crime.

Já a terceira modalidade desse

crime é chamada receptação culposa, que

se encontra no parágrafo terceiro do art.

180 do Código Penal Brasileiro onde o

infrator pelas características da coisa deve

presumir-se obtido por meio criminoso.

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Sobre a receptação culposa,

Rogério Greco nos ensina com maestria,

dizendo:

Analisando o mencionado tipo penal, podemos destacar os núcleos adquirir e receber. Além disso, para que se possa concluir pela receptação culposa, a coisa adquirida ou recebida pelo agente deve presumir-se obtida por meio criminoso dadas: a) a sua natureza; b) a desproporção entre o valor e o preço; c) a condição de quem a oferece. (GRECO, 2012, p.343).

2.4 DO CONCURSO MATERIAL DE DELITOS

Já no que diz respeito ao concurso

material de delitos, instituto penal que

aplica a soma das penas, caso haja o

cometimento de dois crimes distintos e

autônomos, é preciso trazer a baila o art.

69, do Código Penal, que diz:

Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Segundo a inteligência do artigo

supracitado e em consonância com o tema

ora proposto há concurso material de

delitos quando o agente for flagrado

portando arma de fogo, pois mediante uma

ação (portar arma de fogo em desacordo

com determinação legal ou regulamentar)

pratica também o crime de receptação, ou

seja, que não é idêntico ao crime anterior

e, sendo assim, aplicam-se

cumulativamente as penas privavas de

liberdade.

Nessa esteira Cezar Roberto

Bitencourt, ensina que:

Ocorre o concurso material quando o agente, mediante mais de uma conduta (ação ou omissão), pratica dois ou mais delitos, idênticos ou não. No concurso material há pluralidade de condutas e pluralidade de crimes.

Quando os crimes praticados forem idênticos ocorre o concurso material homogêneo (dois homicídios) e quando os crimes praticados forem diferentes caracterizar-se-á o concurso material heterogêneo (estupro e homicídio). (BITENCOURT, 2006, p.718)

Assim sendo, diante das precisas

lições de Bitencourt, conclui-se que ocorre

o concurso material heterogêneo entre os

crimes de porte ilegal de arma de fogo e

receptação, visto que os delitos praticados

são diferentes.

2.5 APLICAÇÃO DO CONCURSO MATERIAL DE DELITOS NOS CRIMES DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E RECEPAÇÃO

Destarte e de acordo com a

inteligência do artigo 69 do Código Penal

Brasileiro, quando o agente for flagrado,

portanto uma arma de fogo sem

autorização para portá-la infringirá o

art.14 do estatuto do desarmamento em

concurso material com o delito insculpido

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no art. 180 do Código Penal, no mínimo

na forma culposa, variando de acordo com

o caso concreto.

Assim decidiu o STJ (Superior

Tribunal de Justiça):

RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA E RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. NÃO APLICAÇÃO. CONCURSO MATERIAL. 1. Quem adquire arma de fogo, cuja origem sabe ser criminosa, responde por delito contra o patrimônio, no momento em que se apodera da res. 2. Posteriormente, se vier a ser flagrado portando a arma, incorrerá na infração penal tipificada no art. 14 do Estatuto do Desarmamento (no qual se protege a incolumidade pública). 3. Portanto, tendo em vista que os crimes em questão possuem objetividade jurídica diversa e momentos consumativos diferentes, não há que se falar em consunção. 4. Recurso conhecido e provido para condenar o réu quanto ao delito previsto no art. 180, caput, do Código Penal, em concurso material com o tipificado no art. 14 da Lei n.º 10.826/2003, determinando-se o retorno dos autos à origem para a prolação de nova sentença.

Desta forma, as hipóteses

envolvendo concurso de crimes do

Estatuto do Desarmamento e do Código

Penal, exigem cuidado técnico do

Ministério Público no oferecimento da

denúncia, em especial da descrição do fato

in concretu, observando se outros verbos

do tipo penal se consumaram

anteriormente, tais como: adquirir, possuir,

receber, ilegalmente ou em desacordo com

regulamentação legal, a arma do crime,

fato esse que será de extrema importância

na análise da relação de crime-meio.

2.5.1 Argumentos contra a aplicação do

concurso material

A primeira corrente de

doutrinadores e jurisconsultos defende que

não há de se falar em concurso material de

delitos entre o crime de porte ilegal de

armas de fogo e receptação,

principalmente pelos motivos seguintes

elencados: ambos os delitos têm como

verbo do tipo a conduta de adquirir,

levando a crê que a aplicação do concurso

caracterizaria o bis in idem, ou seja,

puniria o infrator duas vezes pelo mesmo

ato; a receptação é meio necessário para a

consumação do delito de porte ilegal de

arma de fogo, caracterizando, assim, a

aplicação do princípio da consunção em

que o crime meio é imediatamente

absorvido pelo crime fim.

É nesse sentido que se posiciona o

renomado autor Fernando Capez, que em

sua obra Curso de Direito Penal traz suas

precisas lições lecionando que:

Na hipótese em que o agente adquire, recebe, transporta ou oculta arma de fogo (acessório ou munição), de uso permitido, de procedência ilícita, comete o delito mais grave previsto no art. 14 da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003, cuja pena varia de dois a quatro anos de reclusão, sem prejuízo da multa. Não incide, nesse caso, a norma do art. 180 do CP, que trata da receptação, tendo em

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vista especialidade do tipo penal do art.14 da Lei, bem como sua maior severidade (sua pena mínima é o dobro da pena da receptação), podendo-se falar também no princípio da subsidiariedade (a norma primária do art.14 da Lei prevalece sobre a subsidiária do art. 180 do CP)... (CAPEZ, 2014, p. 634).

Desta feita, o renomado autor

entende que trato de um processo em que

um suspeito for flagrado portando uma

arma de fogo em desacordo com

determinação legal ou regulamentar,

mesmo que este objeto material do delito

tenha procedência ilícita, não se pode

oferecer fazer a queixa-crime como

incurso nos tipos penais do art. 14, da Lei

10.826/03 e do art. 180 do CP, pois

defende que nesse caso específico às

normas não se conflitam, ou melhor,

dizendo, há um conflito aparente de

normas.

Nessa situação, com essa tese

sobredita, a maneira correta de proceder

com a ação penal seria aplicar o princípio

da especialidade ou o princípio da

subsidiariedade, para afastar a incidência

do crime de receptação, entendendo que

este guarda uma relação de gênero e

espécie com o crime de porte ilegal ou que

ambas as normas jurídicas protegem o

mesmo bem juridicamente tutelado.

Com a devida vênia, esse

entendimento não é o mais razoável do

ponto de vista da justiça material e em

relação à maioria da doutrina, além de ser

o contrário do que interpreta o Superior

Tribunal de Justiça e alguns Tribunais

Estaduais de Justiça.

2.5.2 Argumentos favoráveis a aplicação

do concurso material

Já a segunda corrente de

pensadores é incisiva em afirmar que resta

totalmente caracterizada a aplicação do

concurso material de delitos entre os

crimes de porte ilegal de arma de fogo e

receptação, situação jurídica em que as

penas são somadas e imputadas ao seu

autor, pois as condutas descritas nos tipos

penais são absolutamente autônomas, seus

verbos são independentes, a suas

consumações se dão em momentos

totalmente distintos, afastando

completamente a aplicação do princípio da

consunção, porque na construção do iter

criminis o delito de receptação não é meio

necessário para consumação do delito de

porte ilegal de arma de fogo. Dessa forma,

a maneira correta de se portar diante de tal

situação seria justamente a imputação de

ambas as penas ao autor do fato.

É assim que se posiciona Felício

Soares, que eu seu Manual Sobre Armas

De Fogo Para Operadores Do Direito

argumenta sua tese dizendo:

Numa análise afoita, o interprete poderia se ver tentado a sustentar a incidência do princípio da consunção entre os crimes, acreditando que a receptação seria

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consumida pelo porte ilegal por considerá-la entefactum impunível, além de que ambos os crimes preveem o núcleo ‘adquirir’. Ademais, nota-se que há diversidade entre as objetividades jurídicas dos crimes (contra o patrimônio e contra a incolumidade pública). (SOARES, 2011, p.107).

E continua o renomado autor

Felício Soares, defendendo a tese de é

perfeitamente possível a aplicação do

concurso material de delitos entre os

crimes de porte ilegal de arma de fogo e

receptação, quando leciona:

Analisando os preceitos primários dos tipos penais descritos no art. 180 (caput e seu § 3º) do Código Penal, percebe-se admissível o concurso entre receptação e porte ilegal de arma, dada a autonomia entre ambos. (SOARES, 2011, p.108).

Desta feita, são precisas as lições

no penalista Cezar Roberto Bitencourt,

que adiante leciona:

Pelo princípio da consunção, ou absorção, a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em termos bem esquemáticos, há consunção quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais abrangente, aplicando-se somente esta. Na relação consuntiva, os fatos não se apresentam em relação de gênero e espécie, mas de minus e plus, de continente e conteúdo, de inteiro e fração. (BITENCOURT, 2006, p. 250).

Dessa precisa explicação

depreende-se que não se pode falar em

conflito aparente de normas quando um

infrator for surpreendido portando uma

arma de fogo de procedência ilícita, pois o

crime de receptação não é espécie nem

tampouco meio para consumar o crime de

porte ilegal.

Ainda na esteira dos princípios que

regem o conflito aparente de normas, é

preciso continuar com Bitencourt, quando

faz referencia de forma precisa quanto ao

princípio da subsidiariedade, nestes

termos:

Há relação de primariedade e subsidiariedade entre duas normas quando descrevem graus de violação de um mesmo bem jurídico, de forma que a norma subsidiária é afastada pala aplicabilidade da norma principal. Frequentemente, se estabelece a punibilidade de determinado comportamento para ampliar ou reforçar a proteção jurídico-penal de certo bem jurídico, sancionando-se com graduações menos intensas diferentes níveis de desenvolvimentos de uma mesma ação delitiva. A rigor, a figura típica subsidiária está contida na principal. (BITENCOURT, 2006, p. 249).

De acordo com essa ilação exposta,

é razoável compreender de forma sapiente

que não há que se falar em

subsidiariedade, porque os bens jurídicos

tutelados são totalmente diferentes.

Enquanto o estatuto do desarmamento

tutela a incolumidade publica, o Código

Penal em seu art.180 protege o patrimônio.

É por tudo isso que não se pode afastar a

incidência do crime de receptação.

Nessa mesma linha de raciocínio

está o Promotor de Justiça do Estado do

Espirito Santo e membro do Centro de

Apoio Operacional Criminal, Gustavo

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Senna de Miranda, que em sua publicação

explicita e orienta os outros membros do

Ministério Público a ter cautela quando do

oferecimento da denúncia. E nos ensina,

dizendo:

Destarte, as hipóteses envolvendo concurso de crimes (do Estatuto e do CP) exigem cuidado do Ministério Público na elaboração da denúncia, em especial na descrição dos fatos, observando outras condutas típicas anteriormente consumadas, tais como: adquirir, possuir, receber, ilegalmente a arma utilizada no crime, que, em geral, são obstáculos à alegação de relação de crime-meio.

Não por outro sentido, o Superior

Tribunal de Justiça (STJ), também se

valendo da autonomia dos crimes, vem se

inclinando pela possibilidade de concurso

de crimes, conforme se observa pelo

julgado abaixo colacionado:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA E RECEPTAÇÃO. ARGUIÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA. CONCURSO APARENTE DE NORMAS. INEXISTÊNCIA. CRIMES AUTÔNOMOS. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ART. 89 DA LEI Nº 9.099/95. INAPLICABILIDADE. 1. A aquisição de uma arma de fogo na conhecida ‘feira do rolo’ com número de identificação do armamento totalmente raspado sugere, em princípio, a ocorrência do crime descrito no art. 180, caput, do Código Penal. Arguição de inépcia da denúncia afastada. 2. Não há falar em concurso aparente de normas, uma vez que se trata de crimes completamente autônomos, conforme precedentes desta Egrégia Corte. 3. (omissis). 4. Recurso desprovido.” (RHC 14814/SP; RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS 2003/0134186-3; Fonte DJ de 01/12/2003, p. 00370; Relator Min. Laurita Vaz; data da decisão

04/11/2003; Órgão Julgador T5 – Quinta Turma).

Por todo o exposto, conclui-se,

pois, que no momento em que houver um

flagrante delito de porte ilegal de arma de

fogo, desde já a Autoridade Policial, ou

seja, o Delegado de Polícia Civil deve ter

cautela e observar qual é a procedência do

objeto material do crime, a fim de saber se

aquela arma de fogo foi roubada ou

furtada e, a partir dessas informações, não

indiciar o suspeito apenas pela prática do

crime insculpido no art. 14 da Lei 10.826

de 23 de dezembro de 2003, e sim aplicar

o concurso material de delitos e também

indiciá-lo pelo crime de receptação.

Da mesma forma o Promotor de

Justiça ao receber a inicial acusatório não

pode se abster de observar se a Lei está

sendo cumprida na exata medida de sua

aplicabilidade e oferecer a denúncia

conforme o seu entendimento.

Se assim for, a quantidade de

pessoas que se atrevem a portar arma de

fogo ficariam temerosas, porque saberão

que se forem presas em flagrante delito

responderão por dois crimes, e não apenas

um.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

A metodologia utilizada para a

abordagem dessa temática consta da

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análise qualitativa de processos, que estão

em trâmite ou conclusos, provenientes das

varas criminais da comarca de Fortaleza

em que o orientando é testemunha/parte do

processo, na análise de livros, das

doutrinas, das leis, da jurisprudência e de

artigos virtuais. Evidenciou-se uma

discussão teórica sobre o crime de porte

ilegal de arma de fogo em concurso

material com o delito de receptação,

levando os doutrinadores, jurisconsultos e

demais operadores do direito a trilharem

uma visão idêntica sobre o tema, tentando

explicar embasado em autores e em

jurisprudência para que o Estado cumpra o

seu papel social de punir o infrator na justa

medida de sua culpabilidade.

São assim as precisas lições do

promotor Felício Soares, que em sua obra

Manual Sobre Armas De Fogo Para

Operadores Do Direito entende

perfeitamente possível a aplicação do

concurso material de delitos entre os

crimes de porte ilegal de arma de fogo e

receptação.

O desenvolvimento do estudo

procedeu-se da seguinte forma:

Primeiramente, foram definidos, com base

na lei, quais os limites do crime de porte

ilegal de arma de fogo. Depois, foi

estudado o tipo penal receptação, com suas

modalidades variadas. Finalmente, foi

analisado o instituto do concurso material

de delitos entre os dois crimes ora

expostos, com a opinião de doutrinadores

e jurisprudência dos tribunais. Aqui, de

maneira dedicada trabalhou-se o tema

escolhido, averiguando o assunto frente

aos fatos vigentes.

Para tanto o método de análise

utilizado foi o indutivo, ou seja, aquele

que parte de constatações particulares e

caminha para planos mais gerais, com o

intuito de mudar teorias e/ou leis, em

conexão ascendente.

A natureza da pesquisa foi

qualitativa, pois foram feitas análises de

processos específicos do tema ora

proposto em que o orientando é parte

como testemunha de acusação.

O corpus de pesquisa, como já foi

dito anteriormente, foram processos

criminais oriundos de variadas varas

criminais da comarca de Fortaleza, em que

o orientando é testemunha. Além disso,

como não poderia deixar de ser, foram

analisadas doutrinas que falam sobre o

tema, leis, jurisprudências e artigos

virtuais.

4 ANÁLISE DOS DADOS E

RESULTADOS

Diante dessa pesquisa e em relação

à problematização que foi exposta, qual

seja analisar se o concurso material de

delitos entre os crimes de porte ilegal de

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arma de fogo e receptação está sendo

aplicado nas varas criminais da comarca

de Fortaleza, verificou-se que dos quatro

processos eletrônicos que foram

observados, apenas em um deles

constatou-se que o promotor de justiça,

discordando do que fora proposto na

inicial acusatória, ofereceu a denúncia

também pelo crime de receptação, ou seja,

pede que o réu seja condenado com o

acúmulo de pena de ambos os crimes.

Além disso, existem diversos

julgados do STJ (Superior Tribunal de

Justiça) e de Tribunais de Justiça dos

Estados com decisões no sentido de

aplicar o instituto do concurso material

quando o acusado for flagrado portando

arma de fogo de procedência inidônea,

pois conforme entendimento dos

Promotores ou Magistrados o acusado

cometeu também o crime de receptação da

arma de fogo no mínimo na forma

culposa, devido à natureza peculiar do

objeto material do processo criminal.

Ainda convém lembrar que a

doutrina majoritária também segue o

mesmo entendimento desses Tribunais,

pois em várias citações no decorrer do

trabalho, vários autores comprovam a tese

de que os delitos em comento são

autônomos, suas consumações se dão em

momentos distintos e que, no

fracionamento do iter criminis a

receptação não é meio necessário para a

consumação do delito de porte ilegal de

arma de fogo, afastando completamente a

tese do princípio da consunção, em que o

crime-fim absorve o crime-meio fazendo

com que o réu responda apenas pelo crime

principal.

Assim, constatou-se a negligência

do aparelho estatal de segurança pública

quando da prestação jurisdicional da

persecução criminal, porque o réu é

flagrado portando uma arma de fogo de

procedência criminosa e acaba sendo

acusado apenas por porte ilegal de arma de

fogo, ficando impune em relação ao crime

de receptação.

4.1 ANÁLISE DOS PROCESSOS

CRIMINAIS DE PORTE ILEGAL DE

ARMA DE FOGO

É sabido que, como a pesquisa ora

produzida tem a natureza qualitativa e o

tipo de pesquisa é documental, é de

extrema relevância que se traga o corpus

de pesquisa, ou seja, a fonte de onde partiu

a tese que se defende neste trabalho.

Destarte, foram analisados quatro

processos, sendo um findo e três em

andamento, de diferentes varas criminais

da comarca de Fortaleza com o intuito

primordial de saber se os atores principais

da ação penal verificaram ou não a

possibilidade de aplicar o instituto do

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concurso material de delitos entre o porte

ilegal de arma de fogo e receptação,

porque desde o flagrante delito até o

recebimento da denúncia o Delegado, o

Promotor e o Juiz teriam a possibilidade

de verificar o caso concreto e ver que o

mais prudente seria aplicar o cúmulo de

penas entre os dois delitos sobreditos.

Ademais serão trazidos de forma

sucinta todos os processos, um a um, para

que se possa provar a existência concreta

da forma mais adequada de se portar

diante da análise de um flagrante delito no

crime de porte ilegal de arma de fogo.

4.1.1 Processo nº: 0732397-

41.2014.8.06.0001

O processo acima é do ano de 2014

e, dos dois acusados, foi imputado a um

deles o crime de porte ilegal de arma de

fogo, art. 14 da Lei nº 10.826/03, como

pode ser verificado abaixo, quando se

transcreve de forma literal, o recebimento

da denúncia pelo magistrado:

Recebida a denúncia: Vistos etc. 1 – O Ministério Público, por seu Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições, ofereceu DENÚNCIA contra os indiciados, atribuindo a eles a prática dos crimes de tráfico de entorpecente e associação para o tráfico, incorrendo ainda o réu nº1 (identidade preservada) nas tenazes do art. 14 da Lei nº 10.826/2003. (Grifou-se)

Nesse caso, o processo está em

andamento, mas, mesmo assim, a denúncia

já foi recebida e nenhuma das autoridades

competentes atentou para verificar se essa

arma de fogo foi produto de furto ou roubo

ou como o acusado adquiriu a arma.

Assim é muito provável que esse réu,

como muitos em Fortaleza, não sofrerá

uma sanção quanto ao crime de

receptação.

4.1.2 Processo nº 0050522-

35.2013.8.06.0001

Esse processo é o único que já

transitou em julgado e, como veremos, o

réu foi preso em flagrante portando uma

arma de fogo de calibre permitido, sem

registro e sem autorização para portá-la,

ficou impune no que diz respeito ao

cometimento do crime de receptação.

Vejamos:

Julgado procedente o pedido

Diante do exposto, pelos fundamentos acima alinhados, julgo procedente a denúncia de fls. 02/04, para condenar o acusado nº2 (identidade preservada), já qualificado nos autos, nas sanções do art. 14, da Lei 10.826/03. (Grifo nosso)

Dessa maneira, o crime foi

processado e julgado, ocorreu o transito

em julgado da sentença penal condenatória

e o réu não foi responsabilizado pelo

cometimento do crime de receptação.

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4.1.3 Processo nº 0209924-

89.2012.8.06.0001

Da mesma forma que os dois

processos anteriores, nesse caso concreto o

réu conseguiu se esquivar das penalidades

impostas pelo art. 180 do Código Penal,

pois, como deixa bem claro a

homologação da prisão em flagrante, ele

foi autuado apenas no art. 14 da Lei nº

10.826/2003. Senão, vejamos:

Homologada a Prisão em Flagrante Trata-se de auto de prisão em flagrante lavrado pela autoridade policial em desfavor do réu nº 3 (identidade preservada), referente ao fato ocorrido no dia 18 de novembro de 2012, por volta das 00h:45min, nesta cidade. Depreende-se do auto em questão que o(s) indiciado(s) foi(ram) preso(s) em estado de flagrância por ter(em) infringido o disposto no art. 14 do Estatuto do Desarmamento. (grifou-se)

Desta maneira, percebeu-se nesse

processo, uma má prestação jurisdicional

por parte do aparelho estatal da segurança

pública, pois quando uma pessoa é

flagrada portando uma arma de fogo, ela

cometeu também, no mínimo, um crime de

receptação culposa.

4.1.4 Processo nº 0136501-

96.2012.8.06.0001

O único processo encontrado que

coaduna com a tese defendida foi esse,

porque o membro do Ministério Público

inconformado com o simples

enquadramento do ato apenas ao crime de

porte ilegal de arma de fogo ofereceu a

denúncia também como incurso no crime

insculpido no art. 180 do Código Penal e

nos moldes do art. 69 da parte geral do

Código Penal, ou seja, aplicou o concurso

material de delitos entre o porte e a

receptação. Assim se pronunciou o

magistrado quando do recebimento da

denúncia:

Proferido despacho de mero expediente

Também, verifico que os fatos narrados na peça vestibular se amoldam ao tipo legal apontado (art. 180 do CPB e art. 14 do Estatuto do Desarmamento nos moldes do artigo 69 do CPB). O réu foi preso em flagrante, quando portava um revólver marca Taurus, calibre 32, municiado, sem possui registro nem autorização para porte de arma, revelando, assim, indícios sérios de autoria, suficientes para a deflagração da ação penal.

Destarte, cada vez mais se mostra

necessário e prudente, analisar de forma

dedicada cada processo de porte ilegal de

arma de fogo, pois na sua grande maioria o

acusado que cometeu o delito não tem o

registro nem tampouco a autorização para

portar o armamento, mostrando, assim,

que com uma só ação ele cometeu dois

crimes distintos e terá que ser

responsabilizado por ambos nos moldes do

art. 69, concurso material de delitos, do

Código Penal Brasileiro.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por tudo que foi exposto nessa

pesquisa, conclui-se que para se buscar

uma sociedade mais justa e pacífica é

necessária uma boa e eficiente prestação

jurisdicional por parte dos órgãos

responsáveis pela máquina estatal.

Os objetivos elencados nesse

trabalho, que foi analisar os processos

criminais oriundos das varas criminais da

comarca de Fortaleza, foram alcançados e

constataram de forma inequívoca que o

Poder Executivo, representado pelos

Delegados de Polícia Civil, e o Poder

Judiciário, na pessoa dos Promotores e

Magistrados responsáveis pelos processos

analisados, estão, no mínimo, sendo

negligentes na aplicação da reprimenda

penal aos acusados por crime de porte

ilegal de arma de fogo, pois estes

deveriam responder também pelo crime de

receptação, porque obtiveram o objeto

material de forma ilícita, em desacordo

com determinação legal ou regulamentar.

A sociedade em geral deve ter

consciência dessa má prestação

jurisdicional para que todos possam cobrar

do Poder Publico uma maior eficiência na

sua atuação, pois não se pode admitir a

concreta impunidade de quem cometeu

dois crimes autônomos e que ao final do

processo vai ser responsabilizado apenas

por um.

Como resultado geral dessa

pesquisa, notou-se que vários réus que são

processados pelo crime de porte ilegal de

arma de fogo desdenham do Poder Estatal,

pois além de não responder pelo crime de

receptação cometido, são agraciados com

o arbitramento de fiança ainda na

Delegacia de Polícia Civil, liberados antes

de seus condutores e preparados para

adquirir novamente de forma ilícita mais

uma arma de fogo para que tenham o

poder de ameaçar a segurança de toda uma

coletividade de pessoas honestas e

indefesas, que a cada dia que passa está

cada vez mais reféns de infratores que

estão dominando a 7ª capital mais violenta

do mundo, 2ª mais violenta do Brasil.

REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, volume 1. 10. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2006.

BRASIL. Código Penal. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10615757/artigo-180-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940>. Acesso em: 06/10/2014.

______. Estatuto do Desarmamento. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm>. Acesso em: 06/10/2014.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 2, parte especial: dos crimes contra a pessoa a dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos (arts. 121 a 212). – 14. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014.

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GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª ed. – São Paulo:

Atlas, 2002.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, volume III. 9. Ed. Niterói, RJ: Impetus, 2012.

MIRANDA, Gustavo Senna. Artigos: Breves notas sobre o Estatuto do Desarmamento. Disponível em: <www.conamp.org.br/Lists/artigos/Dispform.aspx?ID=160>. Acesso em 06/10/2014.

SOARES, Felício. Manual sobre armas de fogo para operadores de direito. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.

Outras Fontes:

STJ – REsp: 1133986 RS 2009/0133788-0, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 04/05/2010, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/05/2010.

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A UTILIZAÇÃO DA PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA (PPP)

NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

José Augusto Abreu Sousa Aluno do curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected] Luís Otávio Franco Martins Professor Mestre do curso de Direito na Falculdade Integrada da Grande Fortaleza – FGF [email protected]

RESUMO: Este trabalho aborda o tema da Parceria Público-Privada (PPP) no sistema prisional brasileiro e tem como premissa a afirmação de que o investimento em infraestrutura no país encontra obstáculo na inércia da capacidade do Estado em disponibilizar à população obras e equipamentos necessários ao bem-estar social. Diante do exposto, o objetivo geral desta pesquisa é investigar a eficácia da parceria público-privada no sistema prisional brasileiro. Com relação aos objetivos específicos, este trabalho tem o fito de: comparar a utilização da parceria público-privada com o modelo atual dos presídios brasileiros; demonstrar a aplicação viável da PPP, objetivando que o Estado e a iniciativa privada busquem apagar essa mancha de incompetência e descaso com o preso; analisar a questão cientificamente, sem emoções, e deixando de lado o senso comum, entendamos que cada indivíduo que comete um crime voltará um dia para o seio da sociedade, por isso, precisamos recuperá-lo. A metodologia utilizada neste estudo foi a da pesquisa documental (pesquisa bibliográfica). O desenvolvimento da investigação ocorreu a partir da leitura do tema em livros, leis, doutrinas, pesquisas, monografias, teses, artigos em revistas e artigos virtuais, os quais detalham o caos atualmente existente em nossos presídios. A implantação do modelo de parceria público-privada no sistema prisional brasileiro é perfeitamente viável. Não há nenhum impedimento ético ou legal. Com o surgimento da parceria público-privada no âmbito das prisões no país, a sociedade brasileira terá uma chance de bem-estar social. Palavras-chaves: Parceria público-privada. Detento. Ressocialização. Presídio. ABSTRACT: This article addresses the issue of Public-Private Partnership (PPP) in the Brazilian prison system and is premised on the assertion that the investment in the country's infrastructure is an obstacle in the inertia of the state's ability to make available to the works and equipment public necessary for social welfare. Given the above, the objective of this research is to investigate the effectiveness of public-private partnership in the Brazilian prison system. With regard to the specific objectives, this paper aims to: compare the use of public-private partnership with the current model of Brazilian prisons; demonstrate viable application of PPP in order that the state and the private sector seek to erase that stain of incompetence and negligence of the prisoner; examine the issue scientifically, without emotions, and leaving aside common sense, we understand that every individual who commits a crime, one day, return to the bosom of society, so we need to get it back. The methodology used in this study was to document research (literature). The development of the research was based on the theme of reading books, laws, doctrines, research, monographs, articles in journals and virtual items, detailing the existing chaos currently in our prisons. The implementation of public-private partnership model in the Brazilian prison system is perfectly viable. There is no ethical or legal impediment. With the emergence of public-private partnership in the country's prisons, Brazilian society will have the chance to welfare. Key-words: Public-private partnership. Detainee. Rehabilitation. Prison. .

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho aborda o tema da

Parceria Público-Privada (PPP) no sistema

prisional brasileiro e tem como premissa a

afirmação de que o investimento em

infraestrutura no país encontra obstáculo

na inércia da capacidade do Estado em

disponibilizar à população obras e

equipamentos necessários ao bem-estar

social.

Parceria Público-Privada é um

contrato administrativo de concessão, no

qual uma empresa privada tem a

responsabilidade de execução de obra ou

prestação de serviço público, remunerada

ou não, através de exploração da

infraestrutura, com uma garantia

específica do Estado, podendo, ainda,

obter recursos no mercado financeiro. As

PPP’s são uma nova forma de contratos de

concessão, a longo prazo, em que o Poder

Público indica o que quer, em termos de

serviços públicos, e o ente privado informa

como fazer e a que preço pode fornecer ao

Estado. Neste instante, surge uma parceria

entre o Poder Público e o ator privado,

com o intuito de proporcionar à população

obras ou serviços de qualidade, durante

muitos anos. As parcerias público-privadas

são muito importantes para a garantia de

investimentos em rodovias, ferrovias,

portos e outras áreas de infraestrutura.

As parcerias público-privadas

estão reguladas na Lei Federal n.º

11.079/2004, de 30 de dezembro de 2004.

Este tipo de parceria é um contrato

administrativo de concessão. As formas de

concessão podem ser patrocinada ou

administrativa. Na modalidade

patrocinada, a concessão de serviços

públicos ou de obras públicas envolve,

adicionalmente à tarifa cobrada dos

usuários, a contraprestação pecuniária do

parceiro público ao parceiro privado. Na

forma de concessão administrativa, a

Administração Pública é a usuária direta

ou indireta da prestação de serviços,

mesmo envolvendo execução de obra ou

fornecimento e instalação de bens.

Melhor conceituando, na

concessão patrocinada o ente privado

realiza o planejamento, a execução e a

operação de uma atividade de caráter

público. Estas atividades podem ser

precedidas ou não de obra pública, sendo

que o parceiro público paga parte da

remuneração do serviço entregue a

população, através de uma contraprestação

adicional. Os custos restantes do

investimento são pagos pelo usuário, por

meio de uma tarifa decorrente do uso do

equipamento público. Neste caso, a

Administração Pública poderá

complementar o custo da tarifa, buscando

um valor mais acessível à população.

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Exemplificando: concessão de uma linha

de metrô e estacionamento subterrâneo.

Na concessão administrativa, a

Administração Pública é a usuária direta

ou indireta do serviço público concedido,

mesmo envolvendo projeto, execução,

instalação e operação da obra ou do

serviço. A remuneração da empresa

privada será unicamente pelos recursos

públicos orçamentários, após a entrega

daquilo que foi contratado. Como

exemplos: construção de um centro

administrativo ou de um presídio, e

concessão para remoção de lixo.

Assim, a promulgação da Lei

Federal n.º 11.079/2004 veio no intuito de

diminuir a escassez do financiamento de

obras necessárias, desobrigando o Poder

Público de investir sozinho em

infraestrutura. Nessa estrutura estão

inclusos os presídios. Esta é uma forma

inovadora de contratação pelo Estado.

A partir da Lei n.º 11.079/2004,

que delineou regras gerais para a licitação

e contratação da parceria público-privada

no âmbito da administração pública,

vislumbrou-se uma perspectiva nessa

direção: a parceria para construção,

manutenção e administração de presídios

no país. Visando dar mais consistência à

legislação que ampara essa questão,

tramita nas várias comissões do Senado

Federal o Projeto de Lei n.º 513/2011, de

autoria do senador Vicente Alves de

Oliveira (PSD-TO), que tem o objetivo de

estabelecer normas gerais para a realização

da parceria público-privada no âmbito dos

estabelecimentos penais. Tal proposta

pretende regulamentar o uso das PPP’s

para estabelecimentos penais no âmbito da

União, dos Estados, do Distrito Federal e

dos Municípios.

Dois países se destacam no

mundo quanto à gestão e

operacionalização de presídios: Estados

Unidos e França. No modelo americano o

ente privado pode se envolver com o

serviço de carceragem, construção, ou até

mesmo, com o gerenciamento da unidade

prisional, com a cobrança de uma taxa

diária por vaga ocupada. Assim sendo, o

desempenho financeiro é proporcional à

quantidade de presos, podendo gerar

incentivos para que as prisões mantenham

a sua capacidade máxima. Isso dificulta o

acesso aos direitos legais dos detentos. No

modelo francês, no qual o Brasil se

inspirou, o Estado é o responsável pela

unidade prisional, por meio dos seus

agentes públicos, os quais são os

responsáveis por todas as atividades no

estabelecimento penal.

Na França, a partir de 1990, as

vagas existentes nos presídios foram todas

ocupadas através da gestão compartilhada.

Vale ressaltar que a administração da

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unidade prisional não se transfere para o

parceiro privado, continuando os detentos

sob a responsabilidade do Estado.

Nessa perspectiva, o Estado

necessita da parceria da comunidade,

visando recuperar o detento, para que este

volte ressocializado ao seio da sociedade.

Este ideal está previsto no art. 4º, da Lei

n.º 7.210/1984 – Lei de Execução Penal

(BRASIL, 1984), que expressa

textualmente: “O Estado deverá recorrer à

cooperação da comunidade nas atividades

de execução da pena e da medida de

segurança.”

É uma vitória para a sociedade

quando um detento consegue a sua

ressocialização. Contudo, a maioria da

população carcerária não se recupera, pois

não teve nem a oportunidade de se

socializar. O problema é complexo.

Vivemos sob o domínio do caos nos

presídios brasileiros. Penitenciárias lotadas

muito além de sua capacidade, presídios

sem infraestrutura adequada e digna,

assassinatos de detentos, constante tráfico

de drogas, facções atuando nos presídios,

além de abusos e subornos praticados

pelas autoridades responsáveis pela

administração. Enfim, sem perspectiva de

reinserção do detento, após o cumprimento

da pena, ao convívio social. O sistema

carcerário brasileiro convive com um

modelo falido.

Diante do exposto, o objetivo

geral desta pesquisa é investigar a eficácia

da parceria público-privada no sistema

prisional brasileiro.

Com relação aos objetivos

específicos, este trabalho tem o fito de:

comparar a utilização da parceria público-

privada com o modelo atual dos presídios

brasileiros; demonstrar a aplicação viável

da PPP, objetivando que o Estado e a

iniciativa privada busquem apagar essa

mancha de incompetência e descaso com o

preso; analisar a questão cientificamente,

sem emoções, e deixando de lado o senso

comum, entendamos que cada indivíduo

que comete um crime voltará um dia para

o seio da sociedade, por isso, precisamos

recuperá-lo.

Diante desse panorama caótico,

esta pesquisa propõe o seguinte problema:

os presídios brasileiros recuperam os seus

detentos?

Com base na questão tratada

neste estudo, a parceria com a iniciativa

privada é uma saída séria e corajosa no

fito de ressocialização do preso. Exemplos

em todo o país se multiplicam. No estado

de Santa Catarina, a Penitenciária

Industrial de Joinville é um bom exemplo,

pois há limpeza nos pavilhões e não existe

superlotação. Os presos cumprem

rigorosamente regras de comportamento,

inclusive, não podendo fumar. Do ganho

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obtido no trabalho deles, uma fração é

utilizada para melhorar as instalações da

penitenciária. Em Salvador, estado da

Bahia, uma das regras do Conjunto Penal

de Lauro de Freitas, por exemplo, é a

proibição de entrada de comida na unidade

prisional pelos familiares e amigos dos

presos.

Buscando saídas para o problema

exposto neste trabalho, no início do ano de

2013, na cidade mineira de Ribeirão da

Neves, foi inaugurada a primeira

experiência brasileira sob o modelo da

parceria público-privada, isto é, um

complexo penitenciário. Neste caso, o

consórcio GPA que ganhou a licitação

ficou encarregado da construção e

administração do presídio, enquanto o

governo mineiro com a obrigação

inafastável da administração da execução

da pena. O contrato prevê as atribuições

bem divididas. Todo o trabalho que

envolve a execução da pena, quais sejam,

monitoramento, sanções disciplinares,

movimentações dos detentos, escoltas,

intervenções especiais e vigilância serão

desempenhados pelos agentes prisionais,

estes servidores públicos de Minas Gerais.

Os serviços restantes serão gerenciados

pelos empregados da GPA, que

trabalharão armados e receberão salários a

partir de R$ 1.300,00 por mês.

Como uma nova experiência

nesse sentido, no estado do Pernambuco,

está sendo construído o Centro Integrado

de Ressocialização de Itaquitinga. Trata-se

de um complexo penal com capacidade

para 3.126 presos. Tal iniciativa tem o

mesmo formato do proposto em Minas

Gerais, isto é, a gestão compartilhada.

Em busca de uma solução

arrojada quanto à problematização citada

neste estudo, alguns estados estão

confiantes numa solução inovadora. Minas

Gerais, Pernambuco e Ceará, dentro de

suas possibilidades financeiras e atentando

para as limitações que a lei de

responsabilidade fiscal prevê, buscam

novas formas de transformar a triste

realidade nos presídios brasileiros. Nessa

mesma perspectiva, qual seja a parceria

com a iniciativa privada, os estados de

Santa Catarina, Espírito Santo e Bahia

mantêm convênios com entes privados.

Tais convênios apontam na direção do

sucesso, pois buscam soluções dentro de

cada estado, sem se descuidar da

participação da população local e da

supremacia do interesse público. Todos

esses estados apostam na parceria com a

iniciativa privada visando à dignidade no

cumprimento da pena e a plena

recuperação do detento. Dessa forma, o

apenado poderá retornar ao seio da

sociedade reeducado.

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Acreditando também no bom uso

da parceria público-privada a Secretaria da

Justiça e Cidadania do Ceará – SEJUS, do

estado do Ceará, publicou em dezembro de

2011 o Aviso de Solicitação de

Manifestação de Interesse n.º 2/2011,

objetivando estudos de viabilidade técnica,

econômica e financeira para projeto de

construção, operação e manutenção do

Complexo de Alta Segurança do Estado do

Ceará, em regime de Parceria Público-

Privada – PPP. O projeto envolve dois

presídios: um com 100 (cem) vagas e o

outro com 650 (seiscentos e cinquenta)

vagas.

Existe argumento contrário à

utilização da parceria público-privada no

âmbito dos presídios, afirmando ser

inconstitucional reservar à iniciativa

privada a aplicação da pena a um

condenado. Seria indevido contratar

agentes particulares para tal atribuição.

Todavia, não existe inconstitucionalidade,

desde que os agentes prisionais estejam

sob a égide do poder estatal, isto é, sejam

servidores públicos.

A justificativa desta pesquisa tem

como embasamento a atual situação dos

presídios brasileiros. Infelizmente, é tema

cotidiano em nossa mídia, pois, nos mostra

o estado degradante das nossas prisões.

O sistema prisional brasileiro é

ineficiente e descumpridor dos direitos e

garantias fundamentais dos presos.

Encontra-se inepto e sem perspectivas de

melhorias. Urge uma inovação nesse

sistema. Em 04 de junho de 2014, o

Conselho Nacional de Justiça – CNJ

divulgou que a população carcerária

brasileira é de 711.463, incluindo-se as

prisões domiciliares. Segundo o Centro

Internacional de Estudos Prisionais –

ICPS, do King’s College de Londres, o

Brasil tem hoje a terceira maior população

carcerária do mundo. Quando se computa

as prisões domiciliares, o Brasil ultrapassa

a Rússia, que tem 676.400 presos. Com os

novos dados do CNJ o deficit atual de

vagas no sistema é de 206 mil. Quando se

leva em conta as prisões domiciliares, o

deficit passa para 354 mil vagas.

Contando-se o número de mandados de

prisão em aberto, de acordo com o Banco

Nacional de Mandados de Prisão –

373.991, a nossa população carcerária

saltaria para mais de um milhão de

pessoas.

Diante desse quadro, uma nova

perspectiva surge. É hora de mudança. A

gestão compartilhada em estabelecimentos

penais é viável e tem retorno social. Neste

modelo é desnecessário fazer um grande

investimento inicial em infraestrutura. O

parceiro privado fica responsável pela

construção do equipamento prisional,

utilizando recursos financiados ou

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próprios. Os gastos da obra são ressarcidos

gradativamente à empresa, diluído nas

parcelas que o Estado desembolsa pela

gestão do presídio.

Nessa perspectiva, a estudante

Viviane Braga de Moura em sua

monografia de conclusão do Curso de Pós-

Graduação em Direito Penal e Processo

Penal, do Instituto Brasiliense de Direito

Público – IDP argumentou o seguinte:

Os resultados das experiências de co-gestão dos presídios em alguns estados brasileiros se mostraram positivos, pois aumentaram o número de vagas oferecidas, sem descuidar também das garantias constitucionais dos presos. Esse modelo de co-gestão, terceirizando alguns serviços nos presídios, nos mostra que é perfeitamente possível oferecer ao preso condições dignas para cumprir a pena, e assim alcançar a ressocialização. (MOURA, 2011, p. 05)

Como se vê nesse relato, os

resultados da gestão compartilhada são

promissores, não ferindo nenhum

dispositivo constitucional. Muito pelo

contrário, surge de uma alternativa

alvissareira.

Quanto à metodologia utilizada

nesta abordagem temática, esta pesquisa

optou pelo método comparativo. Este

método permitiu a comparação do modelo

atual de gestão prisional, isto é, o modelo

convencional estatal, com o modelo em

parceria público-privada.

A metodologia utilizada neste

estudo foi a da pesquisa documental

(pesquisa bibliográfica). O

desenvolvimento da investigação ocorreu

a partir da leitura do tema em livros, leis,

doutrinas, pesquisas, monografias, teses,

artigos em revistas e artigos virtuais, os

quais detalham o caos atualmente existente

em nossos presídios.

Esta pesquisa, além desta

introdução, compõe-se do referencial

teórico, dos procedimentos metodológicos,

da análise dos dados e resultados e das

considerações finais.

No referencial teórico,

discorreremos sobre a fundamentação

legal que dá suporte normativo a este

tema. Apresentaremos várias leituras de

renomados juristas a favor do assunto aqui

discutido. Teremos ainda divulgações de

órgãos oficiais informando a implantação

da parceria público-privada no âmbito do

ente federativo. Além disso, citaremos

matérias de alguns periódicos,

demonstrando a eficácia do novo modelo

de gestão prisional aqui proposto.

Quanto ao procedimento

metodológico definiremos os caminhos

percorridos para a realização deste

trabalho. Anunciaremos também a

natureza desta pesquisa, a utilização dos

resultados, os fins e os instrumentos

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utilizados no desenvolvimento desta

investigação.

Quanto à análise dos dados e

resultados faremos um aprofundamento da

viabilidade da implantação da parceria

público-privada. Debruçar-nos-emos sobre

a evolução histórica da gestão público-

privada. Por fim, discutiremos os

argumentos contrários sobre o tema.

Nas considerações finais serão

evidenciadas as conclusões sobre os

objetivos propostos neste estudo

investigativo.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Neste título discorreremos sobre a

base normativa que dá suporte legal a este

assunto, apresentando leituras de vários

juristas sobre o tema e divulgando

publicações de órgãos oficiais sobre a

implantação da parceria público-privada.

2.1 FUNDAMENTOS LEGAIS

Cabe ressaltar que a

Constituição Federal não proíbe que a

iniciativa privada participe da

administração de estabelecimentos penais.

A Constituição (BRASIL, 1988) prevê, no

título da Ordem Econômica e Financeira, o

modelo de economia descentralizada.

Neste sentido, a Carta Magna estabeleceu,

em seu artigo 174, que o Estado é quem

normatiza e regula a atividade econômica.

E, na forma da lei, tem as funções de

fiscalizar, incentivar e planejar a atividade

econômica, sendo este determinante para o

setor público e indicativo para o setor

privado.

A Constituição Federal (BRASIL,

1988) prevê, em seu art. 24, I, que a

União, os Estados e o Distrito Federal

possuem competência concorrente para

legislar sobre direito penitenciário. Isto é,

a atividade penitenciária é uma atividade

típica de estado, não permitindo a Carta

Maior que os serviços penitenciários sejam

privatizados.

Em seu artigo 5º, inciso III, a

Constituição (BRASIL, 1988) expressa

que: “ninguém será submetido à tortura

nem a tratamento desumano ou

degradante”, já o inciso XLVIII assegura

aos presos que: “a pena será cumprida em

estabelecimentos distintos, de acordo com

a natureza do delito, a idade e o sexo do

apenado”, e o inciso XLIX dispõe o

seguinte: “é assegurado aos presos o

respeito à integridade física e moral.”

Contudo, todos esses direitos assegurados

em nossa constituição são totalmente

desrespeitados no sistema carcerário

brasileiro. As condições em que os presos

brasileiros vivem são completamente

desumanas e degradantes.

Cabe ao Estado a gestão do

sistema carcerário no país. Apesar disso, a

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Lei de Execução Penal – LEP, Lei Federal

n.º 7.210/1984 (BRASIL, 1984), no seu

artigo 4º, dispõe o seguinte: “O Estado

deverá recorrer à cooperação da

comunidade nas atividades de execução da

pena e da medida de segurança”. Assim, a

sociedade como um todo pode colaborar

para que a execução penal seja justa.

Independente do sistema ser misto ou

público haverá sempre a supervisão do

Departamento Penitenciário Nacional.

Este departamento tem como uma de suas

atribuições a inspeção e fiscalização

periódicas dos estabelecimentos e serviços

penais.

Enfim, não há na Lei de

Execução Penal dispositivo que proíba o

gerenciamento e operacionalização dos

estabelecimentos penais por empresa

privada. Porém, o juiz da execução penal é

o responsável pelo controle e fiscalização

do cumprimento e das condições da pena.

Os demais órgãos da execução penal ficam

responsáveis pela atividade

administrativo-judiciária.

Com relação aos contratos

firmados com os entes privados, cabe

lembrar que existe previsão legal para

contratação com a Administração Pública.

Trata-se do art. 37, inciso XXI da

Constituição Federal (BRASIL, 1988).

Este dispositivo constitucional é

regulamentado pela Lei n.º 8.666/1993

(BRASIL, 1983), que instituiu

normatização para licitações e contratos da

Administração Pública, incluindo serviços,

compras, alienações e locações no âmbito

da União, dos Estados, do Distrito Federal

e dos Municípios. É claro identificar que a

gestão compartilhada obedece a esse

formato, pois o Estado realiza um único

contrato para produtos e serviços.

A garantia da gestão

compartilhada está inserta no artigo 4º da

Lei n.º 11.079/2004, que contempla

perfeitamente os princípios constitucionais

da eficiência, interesse público,

indelegabilidade, responsabilidade fiscal,

publicidade e obediência aos ditames

orçamentários, senão vejamos:

Art. 4º Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes: I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; V – transparência dos procedimentos e das decisões; VI – repartição objetiva de riscos entre as partes; VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria. (BRASIL, 2004)

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2.2 VISÃO DOS TEÓRICOS E

DOUTRINADORES

O professor e advogado

criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso é

favorável à privatização, no modelo

Parceria Público-Privada, pois em sua

opinião é um sucesso, não registrando uma

rebelião ou uma fuga, expressando assim

sua opinião:

Incontáveis resistências se levantam, pois são oriundas do desconhecimento, da ignorância do tema e da falta de experiência, ou até da má-fé, mas todas, absolutamente todas são “espancadas”, quando se discute o tema sem paixões, no plano técnico e racional. É lamentável que diante do desastre do sistema prisional no mundo e das mazelas gigantescas do sistema brasileiro, ainda existam pessoas que rejeitam até a observação de uma experiência brasileira, que é real e precisa ser estudada. Essas resistências partem de setores que pretendem manter a situação como está, vale dizer, investem na piora do sistema prisional, por interesses menores e até inconfessáveis, ressalvados aqueles que resistem por puro desconhecimento da matéria. Chegará o dia em que a realidade será inegável. Espero que não seja tarde demais. Não estou dando mero palpite, estudei e continuo a estudar essa modalidade de gerenciamento prisional observando seus resultados no mundo todo e obtive meu grau de Mestre em Direito Penal pela USP, com a tese da privatização de presídios. De minha parte, não me acomodo e continuo a defender essa experiência no Brasil, até porque não admito que a situação atual se perpetue, gerando mais criminalidade, sugando nossos preciosos recursos, para piorar o homem preso que retornará para nos dar o troco! (D’URSO, 2010, p. 137)

Segundo Sandro Cabral (2010, p.

408), professor e autor de uma tese de

doutorado sobre os aspectos econômicos

da terceirização prisional na Universidade

Federal da Bahia – UFBA, a eficiência da

gestão privada decorre do fato dos

empresários prestarem um serviço de

qualidade e, ao mesmo tempo, a

manutenção da disciplina no presídio,

protegendo o capital investido. Na

avaliação do professor: “Os prejuízos

causados por uma rebelião, por exemplo,

são pagos pela empresa – e comida boa e

assistência jurídica eficiente são alguns

dos elementos capazes de manter os

condenados tranquilos.”

Os atores que estudam esta

questão se debruçam sobre todos os

pormenores do problema e, por vezes,

fazem com que a sociedade desperte de

modo consciente sobre o assunto. Vejamos

o que diz Wilder Brito Sobreira, Delegado

da Polícia Civil:

Não é de hoje que o Sistema Carcerário Brasileiro está falido. Aliás, na história das prisões, do regime de cumprimento de penas, esta é uma realidade facilmente constatada. O problema é secular e é de origem estrutural. Criadas para punir e ressocializar condenados, não atende ao fim a que se propõe por incompetência ou por falta de decisão política, levando o Estado a não cumprir nem um dos objetivos, pois quando pune exagera na pena, desrespeita a condição humana e os direitos constitucionalmente assegurados aos detentos. (SOBREIRA, 2012, p. 120)

Na apreciação de alguns juristas,

a administração privada é constitucional,

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bastando que os agentes prisionais

trabalhem sob a égide do poder estatal.

Esta idéia é sustentada pela promotora de

Justiça de São Paulo, Déborah Kelly

Affonso (Veja, 2009, p. 85), em sua

dissertação de mestrado sobre o assunto:

“O agente privado pode até ter a chave do

cadeado, mas todas as decisões em relação

ao preso são tomadas por um juiz ou, em

menor escala, pelo diretor do presídio.”

O professor Vidal Senna,

Bacharel em Direito e Ciências

Econômicas, em seu artigo “Participação

da iniciativa privada”, publicado no sítio

eletrônico Netsaber, em 14/02/2008,

comunga com a ideia apresentada neste

estudo, expressando o seguinte:

Nenhuma função deixará de ser atribuição ou competência do Estado pelos seus respectivos poderes, ou por ambos, como no caso da execução penal. Julgar continuará sob a competência do Poder Judiciário, com a contribuição dos órgãos auxiliares, impondo ao cidadão a pena, não havendo nenhuma interferência do setor privado, como também no que diz respeito às atribuições da administração no que concernem às decisões referentes à execução da pena e a custódia. Esta visão rebate a crítica de que compete ao Estado o monopólio para custodiar e executar a pena, sendo a gestão compartilhada uma forma de transferir à titularidade deste dever a terceiro. (SENNA, 2008, p. 59)

Diante do relato do professor,

entendemos que a atuação do parceiro

privado não comprometerá a

responsabilidade do Poder Estatal na

execução da pena do detento.

O grande jurista e professor Júlio

Mirabete formula argumento favorável ao

modelo da gestão compartilhada, onde se

insere os contratos firmados em parceria

público-privada, senão vejamos:

Nada impede que a lei federal ou estadual, por instrumento hábil (delegação, concessão, permissão ou privatização), encarregue uma pessoa jurídica de direito privado de exercê-la para promover a execução material das penas (...). Mas em caráter geral, por força de norma complementar estadual, nada impede que os estabelecimentos penais sejam geridos e operados por empresa privada, ressalvadas as atividades jurisdicionais e administrativas judiciárias (...). Não há dispositivo que vede a possibilidade da gerência e operação material dos estabelecimentos penais serem exercidas por entidade privada. Em nenhum momento a lei federal dispõe que o diretor e os servidores devam ser obrigatoriamente servidores públicos. Embora se refira a ‘pessoal administrativo’, deve-se entender que essas funções podem ser exercidas por particulares, de entidade privada, quando se trata de atividades de mera execução material da pena (vigilância, instrução técnica, trabalho, assistência etc.). (MIRABETE, 1993, p. 101)

O jurista Mirabete tem a clareza

da perfeita atuação da iniciativa privada,

em parceria com o Estado, em fazer com

que o sistema prisional cumpra de forma

justa e legal o seu papel.

2.3 DIVULGAÇÕES DE ÓRGÃOS

OFICIAIS

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As estatísticas divulgadas pelo

Conselho Nacional de Justiça – CNJ, com

atualização até junho de 2014, confirmam

a problemática apresentada nesta pesquisa.

Contamos no sistema carcerário do país

com mais de 711 mil presos. Todavia,

existem atualmente somente 357 mil

vagas. Desse modo, um deficit na ordem

de 354 mil vagas.

Corroborando com o assunto

apresentado neste trabalho, foi publicado

em dezembro de 2011 no Diário Oficial do

Estado do Ceará, o edital de manifestação

de interesse para Parceria Público-Privada

– PPP nos seguintes termos:

O ESTADO DO CEARÁ, por meio da SECRETARIA DA JUSTIÇA E CIDADANIA – SEJUS, com fundamento na Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, Lei Estadual 14.391, de 07 de julho de 2009 e no Decreto nº 30.328, de 27 de setembro de 2010, alterado pelo Decreto nº 30.646, de 14 de setembro de 2011, torna público que, de 2 a 11 de janeiro de 2012, serão recebidas manifestações de interesse para elaboração dos estudos de viabilidade técnica, econômica e financeira de projeto para a construção, operação e manutenção do Complexo de Alta Segurança do Estado do Ceará, em regime de Parceria Público Privado – PPP. (CEARÁ, 2011)

São ações pontuais acontecendo

por todo o país, encabeçadas por entes

federativos, com o fito de mudar o

cotidiano dos presídios brasileiros.

Também em consonância com o

teor deste estudo a Secretaria de Estado do

Planejamento e do Desenvolvimento

Econômico do Estado de Alagoas publicou

em 23 de janeiro de 2012, no Diário

Oficial do Estado de Alagoas, o Edital de

Chamamento público nº 01/2012 para o

Programa de Parceria Público�Privada do

Estado de Alagoas – PPP/AL nos

seguintes termos:

O ESTADO DE ALAGOAS, por intermédio da SECRETARIA DE ESTADO DO PLANEJAMENTO E DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO – SEPLANDE/AL, nos termos do Decreto nº 16.879/2011, torna público que receberá dos interessados em participar ou prospectar oportunidades de Parcerias Público�Privadas solicitação de autorização para desenvolver, por sua conta e risco, Projeto Básico e Estudos de Viabilidade de empreendimento na área de SEGURANÇA PÚBLICA, visando à construção, manutenção, conservação, operação e gestão de um Centro Integrado de Ressocialização – CIR, compreendendo 03 (três) unidades penais, sendo duas em Regime Fechado e uma no Regime Semiaberto, contendo 600 (seiscentas) vagas cada, nos termos do Termo de Referência elaborado pela SUPERINTENDÊNCIA GERAL DE ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA – SGAP da SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL – SEDS/AL. (ALAGOAS, 2012)

Há uma perfeita compreensão por

parte dos estados brasileiros, neste caso

específico, do estado de Alagoas, da

necessidade de construção e manutenção

de unidades prisionais dentro dos

parâmetros dessa nova forma de gestão

prisional.

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2.4 MATÉRIAS EM PERIÓDICOS

O repórter Diogo Shelp em seu

artigo na Revista Veja, edição n.º 2101,

datada de 25/02/2009, com o título “Nem

parece presídio”, publicou o seguinte:

Os presídios brasileiros, [...], têm cheiro de creolina. O produto químico é usado para disfarçar outro odor, o de esgoto, que sai das celas imundas e impregna corredores e pátios. O exemplo mais repugnante é o Presídio Central de Porto Alegre, considerado o pior do país – o que convenhamos, é um feito e tanto. Num de seus pavilhões, as celas não têm sequer portas: elas caíram de podres. No extremo oposto, figura a Penitenciária Industrial de Joinville, em Santa Catarina. Ela não cheira à prisão brasileira. Os pavilhões são limpos, não há superlotação e o ar é salubre, pois os presos são proibidos até de fumar. Muitos deles trabalham, e um quarto de seu salário é usado para melhorar as instalações do estabelecimento. Nada que lembre o espetáculo de horrores que se vê nas outras carceragens, onde a maioria dos presos vive espremida em condições subumanas, boa parte faz o que quer e os chefões continuam a comandar o crime nas ruas a partir de seus celulares. (SHELP, 2009, p. 84)

Apesar de a publicação da

Revista ser de 2009, muito não mudou. Ao

contrário, em algumas situações piorou.

Lembremos do exemplo recente e

estarrecedor na Penitenciária de Pedrinhas,

em São Luís, no Maranhão. Ocorreram até

decapitações de detentos.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

A pesquisa desenvolvida nesta

investigação pode ser classificada como

bibliográfica. Isto porque a investigação se

dá a partir da leitura do tema em livros,

leis, doutrinas, pesquisas, monografias,

teses, artigos em revistas e artigos virtuais,

os quais detalham o caos atualmente

existente no sistema prisional brasileiro. E,

a partir daí, evidencia uma alternativa

concreta para o modelo atual: a parceria

público-privada.

Quanto à metodologia utilizada

neste assunto, esta pesquisa optou pelo

método comparativo. A opção justifica o

método escolhido, pois permite comparar

o modelo atual, isto é, o modelo

convencional estatal, com o modelo em

parceria público-privada.

As etapas da pesquisa serão:

inicialmente será relatada a caótica

situação do modelo prisional brasileiro,

fato sabido e de domínio público. Após,

serão relatados os vários exemplos que

proliferam pelo país da gestão

compartilhada Estado e iniciativa privada

na administração de unidades prisionais.

E, por fim, a aplicabilidade dessa gestão

nos presídios brasileiros com resultados

satisfatórios e eficientes.

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4 ANÁLISE DOS DADOS E

RESULTADOS

4.1 A VIABILIDADE DA PARCERIA

PÚBLICO-PRIVADA

O Estado brasileiro é ineficiente

para prover a infraestrutura que o país

necessita. Os investimentos para alavancar

o processo de desenvolvimento econômico

são ínfimos. Assim a Lei Federal n.º

11.079/04 (BRASIL, 2004) tem a

finalidade de reduzir as deficiências no

financiamento das obras necessárias, já

que desobriga o Poder Público de investir

sozinho em infraestrutura. Nesse

arcabouço estrutural estão incluídas as

unidades prisionais. A parceria público-

privada se trata da mais recente forma de

contratação pelo Estado no setor prisional.

Em última análise, esse modelo é

uma gestão compartilhada. Significa que o

ente privado compartilhará de forma

simultânea das atividades prisionais, sob o

comando estatal, através de seus agentes

públicos. A nossa constituição não permite

a privatização dos serviços penitenciários.

Parte do sistema americano é privatizada.

O poder público concede e delega toda a

atividade carcerária a um ente privado,

este explora a atividade como uma

empresa comum. Tal modelo no Brasil é

inconcebível do ponto de vista

constitucional, pois a atividade

penitenciária é uma atividade típica de

estado. A segurança e a disciplina ficam

sempre a cargo do poder estatal. A

Constituição Federal indica que isso é

indelegável.

A parceria público-privada não se

trata de privatização, nem tampouco de

terceirização. A privatização tem uma

abrangência mais ampla, transferindo a

titularidade ao ente privado. A

terceirização transfere o poder de decisão

como modalidade de reorganização sobre

o objeto do trabalho. Na gestão

compartilhada, no modelo público-

privado, os meios e serviços são

disponibilizados pelo ente privado, isto é,

há uma colaboração em tempo real, sob o

comando do agente público, representante

estatal, sem subordinação nenhuma ao

parceiro privado, pelo contrário, este sim,

está subordinado ao controle do Estado.

4.2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA

GESTÃO PÚBLICO-PRIVADA

A colaboração da iniciativa

privada com o Poder Público remonta o

período do império. Inúmeras parcerias,

nos moldes da gestão compartilhada,

foram realizadas desde a metade do século

XIX.

Durante o período do império

obras como portos e ferrovias foram

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construídos com a ajuda do parceiro

privado. A atuação nessas atividades

assegurava retorno do capital privado

investido, nacional ou estrangeiro. Tal

sistema ficou conhecido como “garantia de

juros”.

Na década de 1980, a ideia era

diminuir o tamanho do Estado no âmbito

da economia. Dessa forma, começaram as

privatizações. Tal política tinha o objetivo

de buscar uma maior competitividade e

eficiência para o estado brasileiro. Assim,

o Poder Público concentraria seus esforços

e investimentos em atividades fins.

A Administração Pública não

obteve o êxito necessário nas

privatizações. Na década de 1990, ainda

objetivando investir somente em

atividades fins, o estado brasileiro

permitiu que a iniciativa privada gerisse

setores mal explorados pela Administração

Pública. Então, entra em cena a política da

desestatização.

Neste século XXI, como

complemento da política iniciada nos anos

de 1980, surge a Lei Federal n.º

11.079/2004 (BRASIL, 2004). Esta

iniciativa, mesmo não se tratando de

inovação no campo da parceria entre os

setores públicos e privados, duas novas

formas de concessão foram criadas: a

patrocinada e a administrativa. Além

disso, novas garantias surgiram visando

uma maior atração de investimentos.

4.3 CONTROVÉRSIAS EXISTENTES

Encontramos durante a pesquisa

aqui apresentada várias leituras

divergentes ao modelo da parceria

público-privada. Passaremos a relatar

algumas dessas posições equivocadas.

Vale ressaltar que o argumento

desfavorável no que concerne ao lucro

obtido pelo ente privado contratado,

decorrente do cumprimento da pena, não

tem sustentação plausível. Inúmeros são os

segmentos que lucram, direta ou

indiretamente, com essa atividade de

custódia estatal. Senão vejamos: advocacia

criminal, empresas que prestam serviços

de alimentação e fardamento, empresas

concessionárias de serviços públicos de

medicamentos e material hospitalar, dentre

outras. Cabe lembrar que o nosso sistema

econômico é capitalista, ou seja, o lucro é

o objetivo da empresa privada, dentro das

limitações legais.

Entendimentos contrários dizem

que compete ao Estado o monopólio para

custódia e execução da pena, sendo a

gestão compartilhada uma forma de

transferir à titularidade deste dever a

terceiro. Ledo engano. A atividade

penitenciária é uma atividade típica de

estado. Nenhuma função deixará de ser

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atribuição ou competência do Estado pelos

seus respectivos poderes, ou por ambos,

como no caso da execução penal. Julgar

continuará sendo competência do Poder

Judiciário, com a contribuição dos órgãos

auxiliares, impondo ao cidadão a pena,

não havendo nenhuma interferência do

setor privado, como também, no que diz

respeito às atribuições da administração na

atividade da execução da pena e da

custódia.

Também se questiona a inserção

dos atores privados no que tange ao custo

elevado do modelo compartilhado. Essa

leitura é equivocada, estudos elaborados

nessa direção revelam dados em sentido

diverso, pois a administração estatal é

mais onerosa que com a parceria privada.

Com uma visão mais objetiva do assunto,

talvez o custo fosse o de menor

importância. Pois, para a sociedade

interessa que o detento cumpra a sua pena

da melhor forma possível, e, desse modo,

volte recuperado.

Outro argumento, é que com esse

modelo o ente privado teria sempre como

objetivo a manutenção da capacidade

máxima da população carcerária, haja

vista, a vinculação de a receita ser

proporcional ao número de internos sob

sua custódia. Todavia, no modelo utilizado

no Brasil o pagamento do parceiro privado

independe da quantidade de presos, sendo

o faturamento por preço global e não per

capita, modelo este adotado nos Estados

Unidos.

Alguns críticos da parceria

público-privada indagam que o ator

privado receberia o mesmo valor sem

levar em conta a população carcerária

existente. Entretanto, a nossa realidade

carcerária é penitenciária sempre

superlotada. Isto é, existindo sempre

demanda para essa possível oferta de vaga,

a consequência é de não haver perspectiva

de ganho sem a respectiva despesa/interno.

Outro entendimento contrário fala

da continuidade dos contratos nesse

modelo de gestão, haja vista, a

possibilidade de alternância no poder, pois

realizamos eleições para governadores de

estado a cada quatro anos. Isto poderia

ocasionar alterações na política

penitenciária, a depender do modelo

proposto pelo governador eleito. Nessa

direção, cabe a cada eleitor verificar as

propostas de cada candidato, votando

naquele com projetos concretos e

verdadeiros. Ressalte-se que os contratos

previstos na Lei Federal n.º 11.079/2004

(BRASIL, 2004) têm prazo não inferior a

cinco anos, nem superior a trinta e cinco

anos, incluindo eventual prorrogação.

Outros críticos alertam que a

empresa privada na gestão penitenciária

utilizaria os presos em trabalho escravo. O

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trabalho interno ou externo do detento está

previsto na Lei de Execução Penal – LEP,

que não permite a quebra das cláusulas

contratuais, independente do modelo

empregado, inclusive, podendo constar no

contrato cláusula penal para punição da

empresa em caso de infração. Além disso,

existem os órgãos fiscalizadores para que

cumpram o seu papel.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em suma, é de domínio público

que o modelo de gestão atual aplicado no

nosso sistema prisional não recupera o

detento. A sociedade brasileira assiste

perplexa ao caos instalado nos presídios

do nosso país. São penitenciárias lotadas,

com a quantidade de presos muito além da

capacidade, prédios sem infraestrutura

adequada e digna, assassinatos de

detentos, tráfico de drogas, várias facções,

além, dos abusos e corrupção praticados

por agentes públicos.

Enfim, a realidade carcerária

brasileira é preocupante, pois, em vez de

ressocializar o homem, torna-o revoltado,

desesperado e desesperançado. A volta

dessas pessoas ao nosso convívio é um

desafio de sobrevivência, porque se

deparam com o desemprego e descrédito

da sociedade, restando poucas perspectivas

que não seja o retorno ao crime.

Nessa perspectiva, a reformulação

do atual sistema urge. Assim, a aplicação

da parceria público-privada é uma saída

séria e corajosa no intuito da

ressocialização plena do preso. Essa nova

gestão é uma forma de ajudar o Estado na

falta de capital para investimentos nesse

setor. A adoção da parceria com o ente

privado nos presídios brasileiros é uma

realidade viável e concreta no Brasil. O

ator privado fica responsável pelo

investimento, construção, operação e

manutenção do sistema, enquanto o Estado

se responsabiliza pela segurança e

disciplina da unidade prisional.

Os benefícios do modelo em

parceria público-privada são o aumento do

número de vagas e a desoneração do

Estado em investimentos em curto prazo.

Também, proporciona um cumprimento de

pena mais digna ao presidiário. Outro

benefício é de estabelecer convênios com

segmentos da sociedade, facilitando ao

apenado o trabalho e a sua ressocialização.

Sem dúvidas, havendo o

compromisso concreto de ambos os lados

da parceria, esse novo modelo de gestão

prisional trará muitos benefícios à

sociedade brasileira.

Por fim, enquanto cidadãos, não

podemos mais deixar perdurar essa

situação, fazendo com que o crime se

transforme num ciclo vicioso, corroendo

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os recursos de nós contribuintes,

animalizando o homem preso, que

retornará um dia para o seio da sociedade.

REFERÊNCIAS

ALAGOAS. Edital de Chamamento Público nº 01/2012 para o Programa de Parceria Público�Privada do Estado de Alagoas – PPP/AL. Do objeto: Elaboração de projeto básico e estudos de viabilidade de empreendimento na área de Segurança Pública, visando à construção, manutenção, conservação, operação e gestão de um Centro Integrado de Ressocialização – CIR, compreendendo 03 (três) unidades penais, sendo duas em Regime Fechado e uma no Regime Semiaberto, contendo 600 (seiscentas) vagas cada. Disponível em: <http://www.seplande.al.gov.br/> Acesso em: 03 jan. 2014. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/> Acesso em: 06 fev.2014. ______. Lei n.º 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/> Acesso em: 14 fev.2014. ______. Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/> Acesso em: 14 fev.2014. ______. Lei n.º 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Institui normas gerais para licitação e contratação de Parceria

Público-Privada no âmbito da Administração Pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/> Acesso em: 06 fev.2014. ______. Projeto de Lei do Senado n.º 513, de 2011. Estabelece normas gerais para a contratação de parceria público-privada para a construção e administração de estabelecimentos penais. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/> Acesso em: 23 ago.2014. CABRAL, Sandro. Impactos da participação privada no sistema prisional: evidências a partir da terceirização de prisões no Paraná. Salvador, UFBA, 2010, 19p. Artigo. Universidade Federal da Bahia – UFBA, 2010. CEARÁ. Edital de Solicitação de Manifestação de Interesse n.º 002/2011 – SEJUS Procedimento de Manifestação de Interesse. Do objeto: Elaboração dos estudos de viabilidade e modelagem para a construção, operação e manutenção do Complexo de Alta Segurança do Estado do Ceará, em regime de Parceria Público-Privada – PPP. Disponível em: <http://www.sejus.ce.gov.br/> Acesso em: 03 jan. 2014. D’URSO, Luiz Flávio Borges. Privatização das prisões mais uma vez a polêmica. Disponível em: <http://www.oabms.org.br/notícias/> Acesso em: 16 mar.2014. MIRABETE, Júlio Fabbrini. A privatização dos estabelecimentos penais diante da lei de execução penal. Revista do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, Brasília, n.º 1, jan./jul. 1993. MOURA, Viviane Braga de. As parcerias Público-Privadas no Sistema Penitenciário Brasileiro. Brasília, IDP, 2011, 43p. Monografia (Curso de Pós-

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A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

Henrique Freitas Damasceno Aluno do curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza [email protected] Pedro Valter Leal Professor Mestre do curso de Direito na Falculdade Integrada da Grande Fortaleza – FGF [email protected]

RESUMO: O presente artigo científico tem a finalidade de analisar e defender a ilegalidade da redução da maioridade penal brasileira, no aspecto puramente jurídico-constitucional, tendo em conta o alto índice de criminalidade realizado por menores de 18 anos no Brasil. A atual legislação brasileira fixa a inimputabilidade penal abaixo dos 18 anos de idade, assim descrita no artigo 228 da Constituição Federal de 1988, Código penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente. O respectivo artigo procura inicialmente explanar a evolução histórica da maioridade penal brasileira, conceituando a imputabilidade penal conforme a doutrina e a legislação vigente. Posteriormente, aponta os principais argumentos doutrinários acerca da redução da maioridade penal defendendo que a inimputabilidade penal seja considerada cláusula pétrea, impossibilitando tal alteração. A realização deste trabalho científico foi através de pesquisa bibliográfica em livros, códigos, artigos e dentre outros recursos encontrados na internet. Conforme o estudo analisado, o presente artigo científico almeja comprovar que a redução da maioridade penal é inconstitucional, por se tratar um direito individual dos menores de 18 anos, definido como cláusula pétrea.

Palavras-chave: Imputabilidade penal. Maioridade penal. Cláusula pétrea.

ABSTRACT: The present research paper aims to analyze and defend the illegality of the reduction in the domestic criminal majority, the constitutional purely legal aspect, taking into account the high rate of crime carried out by children under 18 years in Brazil. Current Brazilian legislation sets criminal unimputability over 18 years of age, thus described in Article 228 of the Federal Constitution of 1988, Criminal Code and the Statute of Children and Adolescents. Its first article attempts to explain the historical evolution of the Brazilian legal age, conceptualizing the criminal responsibility according to the doctrine and current legislation. Subsequently, the report identifies key doctrinal arguments about reducing the age of criminal defending the criminal unimputability be considered entrenchment clause, precluding such change. The realization of this scientific work was through literature in books, codes, among other articles and resources found on the internet. As the study analyzed, this research paper aims to demonstrate that the reduction of criminal responsibility is unconstitutional because it is an individual right of persons under 18, defined as entrenchment clause.

Keywords: Criminal responsibility. Legal age. Entrenchment clause.

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por tema a

redução da maioridade penal, sendo

delimitado nas correntes favoráveis a este

tema tão delicado que ganha importância

cada vez maior, pois o agente ativo do

delito é um indivíduo menor de 18 anos.

Apresenta-se como problema

para o estudo a impossibilidade da redução

da maioridade penal, tendo por evidência

as diversas correntes doutrinárias acerca

do assunto, determinando a que se

prevalece dentro do ordenamento jurídico

atual, de acordo com o Supremo Tribunal

Federal – STF.

A pretensão que almejo com

este trabalho de pesquisa é explorar o tema

já citado possibilitando fazer uma

aproximação do tema explanado com a

realidade vivida e o ordenamento jurídico

posto como CF/88, ECA, Código Penal,

entre outros.

A sociedade brasileira

encontra-se titubeante quanto a punir mais

rigorosamente o menor infrator no

cometimento de infrações penais graves.

Dessa forma, estudar a

viabilidade da redução da maioridade

penal para combater a criminalidade se

mostra importante, tendo em vista que os

atos infracionais cometidos por pessoas

menores de 18 anos só aumentam.

Atualmente, vivemos numa

crise na segurança pública em que muitos

crimes ocorrem a qualquer hora do dia,

cada vez mais há a participação de

menores e muitas das vezes em crimes

brutais, hediondos, causando revolta e

clamor público por parte da sociedade. Por

conta disto, a sociedade com medo da

insegurança procura solução rápida para

poder resolver o problema da violência e

logo vem em mente querer diminuir a

maioridade penal, como se fosse

solucionar este problema de segurança,

que sempre fez parte da história brasileira,

do dia para o outro.

Sendo assim, o presente artigo

científico, inicialmente procura abordar a

evolução histórica, acerca da maioridade

penal, que vem desde o Brasil império até

o Brasil Republicano, dando ênfase na

forma como o Estado daquela época

analisava o critério para se conseguir a

maioridade penal.

No segundo tópico, encontra-

se o referencial teórico dividido em três

subtópicos. No primeiro subtópico, faz-se

uma análise sobre a inimputabilidade

penal, conceituando-a conforme os

conceitos doutrinários, nas leis postas do

ordenamento jurídico brasileiro e a forma

como o Brasil adotou o critério para

aferição da imputabilidade penal.

No segundo subtópico do

referencial teórico, aborda-se a

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Constituição Federal de 1988 que é a lei

maior, suprema e que todos os

ordenamentos jurídicos devem segui-la e

respeitá-la com o propósito de proteger a

segurança jurídica do Estado Democrático

de Direito. Foi explorado os principais

artigos da CF/88 de interesse deste projeto

como o art.228 que tratada

inimputabilidade penal do menor de 18

anos, o art. 60, inciso 4º responsável pelos

temas que não poderá sofrer objetos de

Emendas à Constituição.

O último subtópico fala sobre

a legislação específica descrita no artigo

228 da CF/88, que é o Estatuto da Criança

e do Adolescente em vigor desde 1990,

responsável pela aplicação das medidas

socioeducativas ao menor de 18 anos que

realizar algum ato infracional, com a

finalidade de reintegrar o infrator a

sociedade.

O terceiro tópico tem a função

de explicar o termo cláusula pétrea, que é

um dispositivo constitucional imutável

descrito no artigo 60, inciso 4° da CF/88,

principal capítulo do artigo científico. E

por fim, o último tópico que trata da

ilegalidade da redução da maioridade

penal, abordando argumentos de expressão

meramente jurídicos, principalmente os

constitucionais.

Com esta análise, almeja-se

com o respectivo artigo científico, com

aspecto jurídico-constitucional, defender a

impossibilidade da redução da maioridade

penal acreditando que tal direito seja uma

Cláusula Pétrea, insuscetível de alteração

constitucional.

Paralelamente, este artigo

destacará os métodos e os procedimentos

técnicos, em sua utilização com pesquisas

doutrinárias, artigos científicos,

jurisprudências, e a utilização de Leis, que

tratem da maioridade penal.

E por fim, foi analisado que o

presente tema tem indiscutível relevo

jurídico, pois adentra na seara das

garantias constitucionais tendo em vista o

disposto no art. 228, da CF/88, que prevê a

inimputabilidade penal do menor infrator,

submetendo-o à legislação especial,

instrumentalizada no atual Estatuto da

Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº.

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REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA

MAIORIDADE PENAL

O Brasil, desde época da sua

colonização, vem modificando as suas leis

com o objetivo de empregar uma

condenação mais correta e conciliável com

a idade do indivíduo que praticarem

delitos. Isto vem limitando na aplicação de

condenação mais rigorosas para alguns

infratores. Prova desse processo de

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modificação é a edição de várias

constituições federais. Tal moderação tem

por objetivo diminuir a aplicação de uma

condenação mais severa a pessoa imatura

e com a incapacidade de compreender a

ilicitude da conduta por ele realizada.

Dessa forma, a punição precisa ter a

proporcionalidade na capacidade que o

indivíduo infrator tem de compreender na

conduta por ele realizada e também na sua

aptidão de praticar conduta conforme este

entendimento.

As leis portuguesas, no início

do século XIX, tinham eficácia nas suas

colônias inclusive no Brasil e a sua

eficácia estendeu-se até meados de 1830:

Em outras palavras, as colônias deveriam se constituir no principal meio de desenvolvimento econômico da metrópole. Isto em teoria. Na prática, ocorrem inúmeras exceções. A colonização europeia na Idade Moderna ofereceu uma gama de situações que possibilitavam a aproximação ou o afastamento deste esquema básico. Mesmo assim, é inegável que a colonização teve por base e se processou segundo a ideia principal de que a colônia deveria complementar sua metrópole. (LAPA, 2009, p. 2)

Entende-se que a colônia era

submissa à metrópole em tudo. Naquele

século, a igreja oficial do Brasil colônia,

era a mesma de seu país colonizador, a

Igreja católica. Não existia naquele século

a divisão absoluta entre o Estado e a Igreja

Católica, ocasionando a manipulação do

Estado pela Igreja. Conforme a concepção

da Igreja Católica naquela época, um

indivíduo conseguia seu entendimento

ainda criança aos 7 anos de idade. O

Estado, dominado por esta mentalidade,

definiu que o indivíduo teria a

imputabilidade penal aos 7 anos de idade.

Aos indivíduos, que tivessem

idade menor que 7 anos, não estariam

sujeitos a condenação da pena de morte e,

ainda, teria o favorecimento da diminuição

da punição. Os indivíduos que atingissem

idade entre 17 e 21 anos, na medida da

gravidade do crime que cometessem

poderiam ser aplicadas punição mais

severa, tal como à pena de morte, ou

conforme a condição que o crime ocorreu

ser amparado com a diminuição da pena. E

o indivíduo teria a imputabilidade penal

absoluta quando completasse 21 anos de

idade, situação em que o indivíduo não

teria qualquer benefício da lei.

Logo depois da Proclamação

da Independência, em meados de 1830,

emana o Código Penal do Império, que

definiu a maioridade penal aos quatorze

anos completos. O citado Código penal

ainda definiu o critério biopsicológico aos

indivíduos que alcançassem a idade de

sete a quatorze anos. Caso o infrator

estivesse nesta faixa etária de idade

cometesse qualquer crime e se ficasse

provado que o indivíduo no momento da

conduta por ele realizada tivesse

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discernimento, da mesma forma seria

imputável.

Carvalho (1977, p. 312)

esclarece que nosso Código Criminal de

1830 distinguia os menores em quatro

classes, quanto à responsabilidade

criminal:

a) os menores de 14 anos seriam presumidamente irresponsáveis, salvo se provasse terem agido com discernimento; b) os menores de 14 anos que tivessem agido com discernimento seriam recolhidos a casas de correção pelo tempo que o juiz parecesse, contanto que o recolhimento não excedesse a idade de 17 anos; c) os maiores de 14 e menores de 17 anos estariam sujeitos às penas de cumplicidade (isto é, caberia dois terços da que caberia ao adulto) e se ao juiz parecesse justo; d) o maior de 17 e menor de 21 anos gozaria da atenuante da menoridade.

Observa-se que houve uma

espécie de redução da maioridade no

período imperial, ou seja, os menores que

agissem com consciência seriam punidos a

critério do juiz, sendo que os que

possuíssem idade maior de 14 anos e

menor de 17 anos seriam penalmente

imputados.

Já no Brasil Republicano, tem

a eficácia do Código Penal dos Estados

Unidos do Brasil que entra em vigor no

Decreto nº 847/1890. Neste período, o

Direito Penal da Republica brasileira

define como critério para aferição da

imputabilidade penal, o biopsicológico

para o indivíduo que estiver na faixa etária

de idade de 09 a 14 anos. No caso do

indivíduo menor de nove anos de idade

seria o único caso de irresponsabilidade

penal.

Art.27. Não são criminosos: § 1º Os menores de 9 anos completos; Art.30. Os maiores de 9 anos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda á idade de 17 anos (Decreto nº. 847, de 11 de outubro de 1890)

Em relação ao código imperial,

o código penal da república realizou

algumas alterações cito: definir o

indivíduo menor de 09 anos

completamente inimputável; reunir em

instalações industriais o indivíduo menor

que agir com discernimento e estivessem

na idade entre 09 a 14 anos; no prazo

definido pelo Juiz, não permitindo que este

prazo extrapole a idade de dezessete; e

também na continuidade da atenuante da

menoridade.

Na década de 1920, mais

precisamente no ano de 1921 e 1927,

emanou várias leis na ordem jurídica

brasileira, no qual tinha por objetivo

enfraquecer as medidas de repressão aos

menores, utilizando-se unicamente o seu

discernimento. Com o surgimento da lei

4.242/1921 foi abolido o critério

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biopsicológico no inciso 16 do art. 3 desta

mesma lei impede que qualquer indivíduo

menor de 14 anos seja processado

penalmente. Com isto, ampara o método

objetivo para imputar ao indivíduo

responsabilidade penalmente não seriam

aos 14 anos de idade. A eficácia desta lei

concedeu ao Estado brasileiro republicano

criar atividades de apoio e acolhimento à

criança desamparada, edificando guaritas e

abrigos, criação de moradia de

conservação, designação autônoma de

magistrados de direito próprio de menores

e vários cuidados para defender a criança e

o adolescente, isto porque os menores não

seriam mais passiveis de serem processado

penalmente, segundo descrito no art. 3

parágrafos 16 e 20 da citada lei.

Art. 3.º [...]§ 16.º O menor de 14 anos, indigitado autor ou cúmplice de crime ou contravenção, não será submetido a processo penal de nenhuma espécie; a autoridade competente tomará somente as informações precisas, registrando-as, sobre o facto punível e sua autoria, o estado psicológico, mental e moral do menor, e a sua situação social, moral e econômica dos pães, ou tutor, ou pessoa sob cuja guarda viva. [...] [...]§ 20.º O menor indigitado autor de crime ou contravenção, que contar mais de 14 anos e menos de18, será submetido a processo especial, tomando ao mesmo tempo, a autoridade competente, as precisas informações, a respeito do estado psico, mental e moral dele, e da situação social, moral e econômica dos pães, tutor ou pessoa encarregada de sua guarda [...]. (Lei nº 4242, 5 de janeiro de 1921).

O Código de Menores

instituído em 1927 pelo decreto 17.943-A

/27 (Código Melo de Martos), conforme

descrito, se por ventura o indivíduo

alcançasse a faixa etária de idade entre 14

e 18 anos, este indivíduo responderia

perante o Código de Menores.

No Código de menores artigo 1º cuidava-se de estabelecer que menores infratores se enquadravam em duas vertentes, os abandonados e os delinquentes. Wilson Liberati (2003, p.50), descreve “Duas eram as categorias de menores: os abandonados (vadios, mendigos e libertinos) e os delinquentes, independente da idade que tinham desde que fosse inferior a 18 anos. (OLIVEIRA, 2003, p. 02)

No ano de 1940 surgiu o

Código Penal brasileiro mais precisamente

em 7 de dezembro de 1940 com lei nº

3914/40, em que o critério admitido foi

exclusivamente o biológico, com a

finalidade de retirar imputabilidade penal

do individuo menor de 18 anos. Refere-se

a uma exceção as leis já estudadas em que

aplicava o critério biopsicológico para

conferir a imputabilidade criminal do

indivíduo. Desta forma, mesmo que um

indivíduo, menor de 18 anos, cometesse

um ato definido como crime ou

contravenção penal, a atual Legislação

Penal admitiu a pretensão integral da

ausência de discernimento do infrator

menor de 18 anos.

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Conforme escreve Oliveira

(2003, p. 03), a partir do Código Penal de

1940 qualquer que seja a idade do menor,

este não será submetido a processo

criminal, mas a procedimento previsto em

legislação especial.

No ano de 1969, surge um

novo Código Penal, trazendo em seu artigo

33, novamente, o critério do discernimento

ao determinar o retorno do sistema

biopsicológico, tornando possível aplicar

pena ao maior de 16 e menor de 18 anos,

com a redução de 1/3 até metade,

contando que o mesmo pudesse entender a

ilicitude de seu ato ou fosse capaz de se

conduzir conforme este entendimento.

Haveria, portanto, uma

presunção relativa de inimputabilidade. A

redação era a seguinte:

Na década de 70 durante o

regime militar, no ano de 1969 aparece

uma nova Legislação Penal, definindo no

artigo 33, mais uma vez, o método do

discernimento ao indicar a volta do

processo biopsicológico, sendo admissível

impor sanções a indivíduos de faixa etária

entre dezesseis e dezessete anos, na

diminuição de um terço até a metade,

quando o infrator conseguir compreender a

ilegalidade da sua conduta ou ter a

capacidade para reger de acordo com este

entendimento.

A redação era a seguinte:

Art. 33. O menor de dezoito anos é inimputável, salvo se, já tendo completado dezesseis anos, revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com este entendimento. Neste caso, a pena aplicável é diminuída de um terço até a metade. (Decreto-lei nº 1004, de 21 de outubro de 1964)

Esta legislação esteve suspensa

várias vezes que findou sendo abolida bem

antes de entrar em vigência.

Em 1984 foi criada uma nova

lei de nº 7209/84 modificando a parte

geral da Legislação Penal e preservando a

imputabilidade penal aos dezoito anos,

constatando desta maneira um método

direto e não criterioso.

Diz a exposição de motivos da

parte geral do Código Penal:

Manteve o Projeto a inimputabilidade penal ao menor de 18 (dezoito) anos. Trata-se de opção apoiada em critérios de Política Criminal. Os que preconizam a redução do limite, sob a justificativa da criminalidade crescente, que a cada dia recruta maior número de menores, não consideram a circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, é naturalmente antissocial na medida em que não socializado e instruído. O reajustamento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal. De resto, com a legislação de menores recentemente editada, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao afastamento do jovem delinquente, menor de 18 (dezoito anos), do convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinquente adulto, expondo-o à contaminação carcerária [...]". (Código Penal, 2000, p. 10)

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O ano de 1988 foi promulgada

a atual Constituição Federal, ratificando a

inimputabilidade penal aos 18 anos,

descrito no seu artigo 228 e no Código de

Menores, que ainda vigorava, nos seus

dois artigos; 1º, inciso II e 41, parágrafo

3º.

2.2 IMPUTABILIDADE PENAL

O respectivo trabalho

científico, na análise da imputabilidade

penal, encontra inicialmente base legal na

constituição federal de 1988 No art. 228

que traz o seguinte texto: “são penalmente

inimputáveis os menores de dezoito anos,

sujeito às normas da legislação especial.”.

O Código Penal de 1940

conservou a imputabilidade penal acima

dos 18 anos, descrito no seu artigo 27: “Os

menores de dezoito anos são penalmente

inimputáveis, ficando sujeitos às normas

estabelecidas na legislação especial.”.

Obedecendo a determinação

constitucional, sobre a realização de uma

legislação especial, foi sancionada a lei

Federal nº 8069/90 definindo no caput do

seu artigo 104 com o seguinte texto: “são

penalmente inimputáveis os menores de 18

(dezoito) anos, sujeitos às medidas

previstas nesta lei.”.

Dessa forma, confirma-se que

o preceito da imputabilidade penal tem

previsão constitucional, sendo em regra,

acontecer alteração somente por meio de

Emenda Constitucional, na forma da

Constituição Federal.

No conceito claro, a

imputabilidade é quando se atribui

responsabilidade a uma pessoa sobre

determinada conduta realizada por ele,

dessa forma, imputabilidade penal será

aptidão que a pessoa tem de a ela ser

concedida a execução de um crime.

A nossa legislação penal não

se importou em explicar a imputabilidade

penal, entretanto, ao analisarmos o Código

Penal no seu artigo 26, nos é admissível

conseguir na maneira mediata a definição

de imputabilidade, pois são apresentadas

condições para que possamos identificá-

las. No citado artigo, o legislador

interpreta inimputabilidade quanto a

incapacidade que a pessoa que realiza uma

conduta ilícita tem de perceber a

característica ilícita do fato ou de atuar de

acordo com este entendimento.

Segundo os ensinamentos de

Mirabete:

Há imputabilidade quando o sujeito é capaz de compreender a ilicitude de sua conduta e agir de acordo com esse entendimento. Só é reprovável a conduta se o sujeito tem certo grau de capacidade psíquica que lhe permita compreender a antijuridicidade do fato e também de adequar essa conduta a sua consciência. Quem não tem essa capacidade de entendimento e de determinação é inimputável, eliminando-se a culpabilidade. (MIRABETE, 2003, p. 210).

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Contudo, a sua análise deriva

de habilidade para perceber a ilegalidade

do ato e decide-se conforme Nucci (2011,

p. 287) neste entendimento: “[...] é o

conjunto das condições pessoais,

envolvendo inteligência e vontade, que

permite ao agente ter entendimento do

caráter ilícito do fato, comportando-se de

acordo com esse conhecimento.”.

O objetivo da imputabilidade é

desejado pelo homem de forma clara e

conhecedora. Sendo assim, o individuo

tendo discernimento é responsável pela

conduta que realiza. A imputabilidade

deverá existir no instante da realização do

ato ilícito.

2.2.1 Critérios para aferição da

imputabilidade penal

A doutrina costuma definir a

causa da inimputabilidade em três

critérios, a saber: o primeiro critério é o

biológico, que controla a imputabilidade

na força mental do ser humano, isto é, leva

em consideração o motivo, a razão ou a

causa e não as consequências ou os fatos

realizados. Existindo a doença mental, ou

o desenvolvimento psicológico não

eficiente ou o transtorno provisório da

mente, será o individuo, sem qualquer

outro problema psicológico, definido

como inimputável.

O segundo critério é o

psicológico, que é oposto ao critério

biológico, sendo o que interessa é o fato

realizado e não o motivo ou causa. Isto é,

acredita-se que o individuo no instante da

realização da conduta criminosa tinha

capacidade de entender o seu caráter

criminoso.

O terceiro critério é o

biopsicológico, que é a união do biológico

com o psicológico, isto é, dá-se

importância no motivo e o fato. Com isto,

o inimputável é o individuo que, em razão

de doença ou incapacidade mental, não

possuía, no momento da conduta,

entendimento e determinação do ato que

praticara.

O Código Penal brasileiro

adotou no caput do artigo 26, e 28, inciso

1º, o critério biopsicológico e no artigo 27

o critério biológico.

Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar de acordo com esse entendimento. Art. 27 – Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. Art. 28 – (...)§ 1º – É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar de acordo com esse entendimento.

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Contudo, estabelece, o art. 26

do CP, art.228 de CF e no art.104 do ECA,

a inimputabilidade à pessoa com

desenvolvimento incompleto, declaração

que envolve os adolescentes. Adotando

neste caso o critério biológico, “idade do

fato e não o desenvolvimento mental,” em

respeito a menoridade penal.

Determinando com isto, que o individuo

menor de 18 anos não possui capacidade

de entender ou se determinar de acordo

com esse entendimento, não realizando,

portanto crime ou contravenção penal.

Celso Delmanto (2006, p. 50) se manifesta:

O CP estabelece neste art. 27, a presunção absoluta de inimputabilidade para os menores e 18 anos. Tal presunção obedece a critério puramente biológico, nele não interferindo o maior ou menor grau de discernimento. Ela se justifica, pois o menor de 18 anos não tem personalidade já formada, ainda não alcançou a maturidade de caráter. Por isso, o CP presume sua incapacidade para compreender a ilicitude do comportamento e para receber sanção penal.

A legislação Penal brasileira

ao adotar o critério biológico definia neste

caso, que não é necessário que o

adolescente seja inteiramente incapaz de

compreender o caráter ilegal do fato ou de

se determinar conforme esse

entendimento, por conta que a menoridade

é suficiente para indicar a imputabilidade,

considerando de maneira integral, não

permitindo prova em oposição, ou seja,

mesmo que o adolescente tenha

capacidade intelectual ou vontade pura e

simples de praticar o ato, não responderá

por crime, pois é deficiente de idade

definindo-o em inimputável.

2.3 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

BRASILEIRA DE 1988

A Constituição Federal é a lei

suprema, sendo que todos devem respeitá-

la e qualquer norma deve segui-la, afim de

não comprometer a segurança jurídica do

Estado. Com ela, foi criado o Poder

Constituinte que é a forma soberana de se

manifestar a vontade política de uma

sociedade, social e juridicamente

organizada. O poder constituinte divide-se

em poder constituinte originário e poder

derivado. No qual o primeiro poder,

determina a Constituição de um novo

Estado organizado e criando os poderes

dedicados a administrar os interesses da

sociedade. Em que o seu fundamento

básico é Assembleia Nacional Constituinte

e Movimento Revolucionário,

caracterizando-se por ser incondicional,

inicial, ilimitado e autônomo. Já o Poder

Derivado, está fixado na própria

constituição, sendo que ela deriva de

regulamento jurídico-constitucional, tendo

propagadas limitações constitucionais,

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acarretando com isto possível controle de

constitucionalidade.

A atual Constituição iniciou-se

com as decisões conquistadas por Políticos

constituintes ao modificarem a legislação

constitucional endereçada a conveniência

Estadual, adequada ao diploma, no qual

quesitos pertinentes a amparar a Dignidade

da pessoa Humana, possibilitaram uma

ampla discussão e aprovação,

principalmente na matéria de se preservar

imputabilidade penal a partir dos dezoito

anos. O poder constituinte originário,

tendo o cuidado em amparar a criança e o

adolescente, definiu na Constituição

Federal de 1988 conforme o artigo 228:

“São penalmente inimputáveis os menores

de 18 anos, sujeitos às normas da

legislação especial.”.

O citado artigo define o direito

individual como fundamental, pois se

relaciona com a liberdade exclusiva dos

menores de 18 anos defronte ao poder

estatal, é imutável a mudança da

constituição por meio de emenda

constitucional, a fim de limitar tal direito,

sendo que este engloba o procedimento

privativo dos direitos fundamentais,

recaindo na restrição do artigo 60, inc. 4º,

IV da constituição Federal de 1988.

Procura definir que a pessoa menor de 18

anos não estará sujeito a processo penal,

caso esta pessoa pratique qualquer ato

infracional, que é definido como crime ou

contravenção, será responsabilizado por

uma legislação própria.

No entanto, o que precisamos

entender é que esta proteção cedida ao

menor, não é um estímulo para que ele

pratique mais infração na sociedade, que o

artigo 228 defende na realidade, é a

garantia da liberdade das pessoas menores

de 18 anos, impedindo com isto que a

liberdade do menor não seja impedida da

mesma forma como as dos adultos.

A Constituição Federal de

1988 disponibilizou amplos direitos

referentes ao menor inimputável, no seu

artigo 227, fundou-se nos objetivos da

Declaração Universal dos Direitos da

Criança, imposta por conta das Nações

Unidas, originando na criação de uma

moderna legislação, no caso o ECA no

qual abordava direitos da dignidade do ser

humano. Conforme o Estatuto da Criança

e do Adolescente, no artigo 227 traz:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

A mencionada seleção ocorreu

por conta de o poder constituinte

originário desejasse, no mínimo na ordem

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normativa, confirmar para as crianças e

adolescentes o crescimento de forma

absoluta, agradável e satisfatória,

ordenando ao Estado e a Sociedade

privilegiar e amparar as crianças e os

adolescentes direitos essenciais ao

crescimento, conforme verifica no artigo

acima citado.

Dessa forma, o Estatuto da

Criança e Adolescente, exclusivamente só

foi realizável por causa da Constituição

Federal de 1988, definindo o amparo total

ao menor de 18 anos de idade,

confirmando relações diplomáticas

internacionais, obedecendo-se o parágrafo

segundo do artigo quinto da Constituição

Federal.

2.3.1 Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA)

O Estatuto da Criança e do

Adolescente foi criado pela Lei 8.069 no

dia 13 de julho de 1990, no qual tem a

função de controlar os atos das crianças e

adolescentes infratores no Brasil. É

comum escutarmos no cotidiano da

sociedade que os menores infratores

quando realizam alguma violência, ficará

por isso mesmo, ficam sem sofrer

punições. No entanto, esta mentalidade

não é verídica, pois quando os menores ao

praticarem condutas ilícitas serão sim

penalizados, mas não como os adultos que

ao comerem qualquer crime terão que

prestar contas com código penal, porém,

responderam como menor de 18 anos

perante o ECA.

Dessa forma, o ECA não

legaliza a impunidade como a maioria das

pessoas afirma, esta legislação apresenta

uma estrutura exclusiva para

responsabilizar o adolescente conforme

circunstância de cada infrator. O menor

que realizar um ato infracional, não ficará

sem punição por conta de não ser

imputável, será processado perante o ECA,

sendo responsabilizado por meio de

avaliação socioeducativa e dependendo da

situação ter impedida sua liberdade

conforme descrita no artigo 122 do ECA.

As medidas socioeducativas

definida no ECA tem por finalidade

reintegrar o jovem, caso seja, estabelecidas

de forma correta analisando a

característica de cada infrator. Os autores

Oliveira e Sá trazem em sua monografia o

relato de um desembargador:

Várias autoridades, como o Desembargador Siro Darlan e o ex-juiz da Vara da Infância, Alyrio Cavallieri, este atuou por mais de 20 anos na Vara da Infância, condenam o rebaixamento da maioridade penal para 16 anos, para eles o ECA não está sendo aplicado na sua integridade, principalmente com referência as medidas socioeducativas, como diz Dalan: “a falta de aplicação da lei, no caso o ECA., aumenta o favorecimento a criminalidade”. (OLIVEIRA; SÁ, 2008, p. 21)

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Algumas colocações a favor

do Estatuto da Criança e do Adolescente,

afirmam que o ECA é avaliada como

modelo a ser seguido, e o seu erro,

constitui-se na falta da aplicabilidade de

suas leis de forma absoluta, dentre as

colocações temos a de José Heitor dos

Santos (2003, p. 2), quando diz no Boletim

do IBCCRIM que:

O ECA, ao adotar a teoria da proteção integral, que vê a criança e o adolescente (menores) como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, necessitando, em consequência, de proteção diferenciada, especializada e integral, não teve por objetivo manter a impunidade de jovens, autores de infrações penais, tanto que criou diversas medidas socioeducativas que, na realidade, são verdadeiras penas, iguais àquelas aplicadas aos adultos.

Para o Estatuto da Criança e

do Adolescente, criança é todo individuo

com idade menor de 12 anos e o

adolescente o individuo de idade entre 12

a 18 anos. Sendo que, quando o

adolescente realizar qualquer ato

infracional será responsabilizado por meio

de medidas socioeducativas e as crianças

por meio de medidas de proteção.

Comentário de Ivanéa Maria Pastorelli

(2001, p. 125), medida socioeducativa “é

uma medida jurídica aplicada aos

adolescentes autores de ato infracional.

Tendo o objetivo não só de punir o

infrator, mas também de reintegrá-lo a

sociedade”.

Tais medidas estão descritas

no artigo 112 do ECA (1988) a saber:

ART. 112 – Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I – advertência; II – obrigação de reparar o dano; III – pressão de serviços à comunidade; IV – liberdade assistida; V – inserção em regime de semiliberdade; VI – internação em estabelecimento educacional; VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º – A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º – Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. § 3º – Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.

Vale salientar, que o inciso IV

a “internação em estabelecimento

comercial” o menor não poderá ficar mais

que três anos internado, devendo ser

liberado aos vinte e um anos de idade.

2.3.2 Cláusulas Pétreas

Trata-se de uma determinação

imutável contida na constituição federal,

não permitindo qualquer alteração nem se

quer por emenda constitucional, ou seja,

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só os apontados de matéria constitucional

de direito fundamental, não estariam

sujeitos a mudanças e se caso quiserem

modificá-lo seria através de uma nova

Assembleia Constituinte, elaborando uma

nova constituição. Em respeito aos outros

direitos, ainda que, defendido pela

burocracia de mudança da constituição,

poderá acontecer a diminuição ou extinção

de tais direitos com alteração da

constituição, através do poder

constitucional derivado.

A intenção do poder

constituinte originário seria em dificultar

as mudanças de matérias importantes de

cidadania e direitos individuais e outros de

interesse especial do Estado como os

descritos no artigo 60, inciso 4º da

Constituição Federal.

No mesmo sentido, Alexandre

de Morais (2005, p. 40):

O atual texto constitucional determina que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais. Tais matérias formam o núcleo intangível da Constituição Federal, denominado tradicionalmente por “cláusula pétrea”.

Celso Bastos (1982, p. 45)

destacou que “a natureza jurídica das

Cláusulas Pétreas como ‘intocáveis’,

‘irreformáveis’ ou ‘eternas’.” Em relação

ao citado conceito, manifesta-se com

devido processo legislativo e cláusulas

pétreas:

STF: O Congresso Nacional, no exercício de sua atividade constituinte derivada e no desempenho de sua função reformadora, está juridicamente subordinado à decisão do poder constituinte originário que, a par de restrições de ordem circunstancial, inibitórias do poder reformado (cf, art. 60, par. 1.), identificou, em nosso sistema constitucional, um núcleo temático intangível e imune a ação revisora da instituição parlamentar. As limitações materiais explícitas, definidas no par. 4. do art. 60 da Constituição da República, incidem diretamente sobre o poder de reforma conferido ao poder legislativo da União, inibindo-lhe o exercício nos pontos ali discriminados. A irreformabilidade desse núcleo temático, acaso desrespeitada, pode legitimar o controle normativo abstrato, e mesmo a fiscalização jurisdicional concreta, de constitucionalidade (RTJ 136/25) (ALVES, 2006, p.30)

Sendo assim, cláusulas pétreas

são chamadas pela doutrina profissional

como estrutura descrita no parágrafo 4º do

artigo 60 da Constituição Federal de 1988:

Art.60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais.

Com isto, faz-se necessário

explicar que o artigo no qual as cláusulas

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pétreas estão inseridas trata da forma

como são elaboradas as propostas de

modificação à Constituição, sendo que as

quatro hipóteses elencadas não podem ser

modificadas, nem ao menos serem

discutidas em qualquer proposta de

modificação constitucional. Isso se deve

ao fato dos conceitos neles contidos serem

fundamentais na tradução das bases em

que se estabelece a República Federativa

do Brasil. Para modificá-las, só anulando a

atual Constituição.

Sendo assim, é fundamental

esclarecer que o artigo cujas cláusulas

pétreas estão impostas refere-se na

maneira como são criadas as sugestões de

mudança da Constituição, assim as quatro

suposições impostas não poderão ser

alteradas, nem mesmo debatida em

pretexto de mudar a constituição. Isso

acontece por conta das ideias nelas

inclusas serem de ordem fundamental na

explicação dos princípios determinados na

Constituição Federal. Sendo assim, caso

surja interesse em alterá-las, só

extinguindo a nossa constituição.

Dessa forma, o poder

constituinte estabeleceu que os incisos que

serão amparados incondicionalmente, são

os acima já citados, mas o inciso que

interessa ao presente trabalho científico.

Os direitos e garantias

individuais – interessante perceber que tal

inciso não pode se confundir com a

denominação concedida ao Título II da

constituição federal, em que começa o

artigo quinto. Naquele tem as garantias

fundamentais, este, as individuais. Sendo

assim, existirão garantias individuais

externas ao do artigo quinto, como na

maioria da matéria do artigo sétimo.

2.3.3 A inconstitucionalidade da

redução da maioridade penal

Inicialmente, vale destacar que

a Constituição Federal de 1988 prevalece

o procedimento rígido, com isto, qualquer

manifestação dos políticos federais com a

finalidade de modificá-la deverá ser de

forma complicada e burocrática. A

Constituição Federal determina um

processo especial no Congresso Nacional,

com a votação em 2 turnos, em cada casa,

no Senado e na Câmara dos Deputados

Federais, com 1 quórum de aprovação de

no mínimo três quintos da respectiva casa,

conforme estabelece o artigo 60, inciso 2º

da Constituição Federal de 1988.

Porém, permanecem temas que

não poderão ser objetos de Emendas à

Constituição, com o fim de manter a

segurança jurídica do Estado Democrático

de Direito, como define o supracitado

artigo 60, inciso 4º da atual Constituição

Brasileira.

Assim, como determina o

inciso 4º, matéria de apreciação do

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presente trabalho científico, não poderá ser

matéria de debate a proposta de emenda à

constituição com a finalidade de eliminar

ou diminuir os direitos e garantias

fundamentais. A dúvida em questão é

saber se os direitos e garantias

fundamentais seriam somente aqueles que

se encontram impresso no artigo quinto da

Constituição Federal de 1988?

A maior dificuldade é apontar

com precisão quais são realmente os

direitos e garantias individuais

estabelecidos no artigo 60, inciso 4º, IV

como cláusula pétrea, pois ao analisar

cuidadosamente o artigo 227 da

constituição verificaremos que há alguns

direitos semelhantes ou iguais descritos no

artigo 5º da CF/88:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade... Art.227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao laser, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O Supremo Tribunal Federal já

definiu decisão, relatando que os direitos e

garantias individuais não se encontram

somente impressos no artigo quinto, que se

encontram expandidos por toda a CF/88.

Existência de direitos e garantias individuais fora do rol do artigo 5": STF - "O Supremo Tribunal Federal considerou cláusula pétrea, e consequentemente imodificável, a garantia constitucional assegurada ao cidadão no art. 150, III, b, da Constituição Federal (princípio da anterioridade tributária), entendendo que ao visar subtraí-la de sua esfera protetiva, estaria a Emenda Constitucional n 3, de 1993, deparando-se com um obstáculo intransponível, contido no art. 60, § 4y, TV, da Constituição Federal (STF – Pleno – Adin na 939-7/DF – Rei. Min. Sydney Sanches – Medida cautelar – RTJ 150/68-69). Conforme ressaltou o Min. Celso de Mello: Admitir que a União, no exercício de sua competência residual, ainda que por emenda constitucional, pudesse excepcionar a aplicação desta garantia individual do contribuinte, implica em conceder ao ente tributante poder que o constituinte expressamente lhe subtraiu ao vedar a deliberação de proposta de emenda à constituição tendente a abolir os direitos e garantias individuais constitucionalmente assegurados. (Trecho do voto do Min. Celso de Mello, Serviço de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Ementário STJ, ne1730-1 O/STF). (ALVES, 2006, p. 31)

E ainda,

Importante também ressaltar que, na citada Adin n 939-07/DF, o Min. Carlos Velloso referiu-se aos direitos e garantias sociais, direitos atinentes à nacionalidade e direitos políticos como pertencentes a categoria de direitos e garantias individuais, logo,

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imodificáveis, enquanto o Min. Marco Aurélio afirmou a relação de continência dos direitos sociais entre os direitos individuais previstos no art. 60, § 4, da Constituição Federal, ressaltando que: "Tivemos, Senhor Presidente, o estabelecimento de direitos e garantias de uma forma geral. Refiro-me àqueles previstos no rol, que não é exaustivo, do art. 5° da Carta, os que estão contidos, sob a nomenclatura direita sociais, no art. 7°e, também, em outros dispositivos da Lei Básica Federal, isto sem considerar a regra do § 2-, do art. 5, segundo o qual os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados" (trecho dos votos, no já citado Ementário STJ, n1730-10). (ALVES, 2006, p. 31-32).

Na Carta Magna de 1988, os

direitos e as garantias fundamentais estão

impressos no Título II que engloba o

artigo quinto, no qual define os direitos e

deveres individuais e coletivos. A doutrina

dominante diz que os direitos e as

garantias individuais estão expandidos por

todo o texto constitucional, já outros

defendem que os direitos e garantias

individuais são somente aqueles impressos

no artigo quinto e protegidos pelo artigo

60, inciso 4º, IV da Constituição.

Logo, o parágrafo 2º do artigo

5º descreve que os direitos e garantias

individuais, são normas expandidas por

toda constituição federal, não somente

aquelas impressas no citado artigo.

Vejamos a seguir o art. 5º, § 2º, CF: "Os

direitos e garantias expressos nesta

Constituição. Não excluem outros

decorrentes do regime e dos princípios por

ela adotados, ou dos tratados

internacionais em que a República

Federativa do Brasil seja parte.".

Leda Pereira Mota e Celso

Spitzcovsky estabelecem no seu trabalho

de Direito Constitucional, a respeito do

tema em análise:

Com feito, no que se referem às chamadas cláusulas pétreas entendem alguns que abrangeriam somente as matérias elencadas no art. 5º do Texto Constitucional, eis que a nomenclatura adotada pelo constituinte no art. 60, § 4º, IV, aponta para Direitos e Garantias Individuais e não fundamentais. Assim sendo, os demais capítulos pertencentes ao Título II, não estariam relacionados como clausulo pétrea podendo, pois, ser objeto de emenda constitucional que tende a aboli-los. Sem controvérsias, entendem outros que incorre o constituinte em uma impropriedade, não fazendo o menor sentindo excluir desta conceituação as matérias previstas nos demais capítulos. Mesmo porque é regra comum de interpretação das normas constitucionais, em particular, no que se refere ao tema ora desenvolvido, ou procurar oferecer o sentido o mais amplo possível por tratar-se, como visto, de direitos a serem utilizados contra a ingerência do Estado com os quais nos parece estar a razão. (MOTA; SPITZCOVSKY, 2007, p. 40)

Com este raciocínio, o

Respeitável doutrinador Dalmo Dallari

defende a tese de não alterar o artigo 228

da Carta Magna de 1988, acreditando que

a norma seja Cláusula Pétrea, assim,

solicitando mandado de segurança ao

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Supremo Tribunal Federal, segundo

noticiado no jornal, O Estado de São

Paulo:

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) entrará com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar bloquear a tramitação no Congresso da Proposta de Emenda Constitucional que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, aprovada nesta quinta-feira pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. O instrumento será utilizado com base no entendimento de que a medida é inconstitucional, sob o argumento de que a maioridade penal é uma cláusula pétrea da Constituição. A ação tem o apoio da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude e será redigida pelo jurista Dalmo Dallari. De acordo com o jurista, Segundo a Constituição, não pode ser objeto de deliberação emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais. E não responder criminalmente é direito individual do menor." Para o jurista, a solução para a criminalidade é conhecida: Acesso dos jovens à educação e trabalho. (OLIVEIRA; SÁ, 2007, p. 50 apud DALLARI, 2005, p. 70)

Paralelamente a esta

concepção, também é defendida por outros

juristas como Olympio de Sá Sotto Maior

Neto, Luiz Flávio Gomes e o conceituado

Constitucionalista Alexandre de Moraes,

que no seu trabalho de Direito

Constitucional aborda:

Assim, o artigo 228 da Constituição Federal encerraria a

hipótese de garantia individual prevista fora do rol exemplificativo do art.5º, cuja possibilidade já foi declarada pelo STF em relação ao artigo 150, III, b (Adin 939-7 DF) e consequentemente, autentica cláusula pétrea prevista no artigo 60, § 4.º, IV. (...) Essa verdadeira cláusula de irresponsabilidade penal do menor de 18 anos enquanto garantia positiva de liberdade, igualmente transforma-se em garantia negativa em relação ao Estado, impedindo a persecução penal em Juízo. (MORAES, 2005, p. 2176)

Reforçando tal concepção,

o jurista Luiz Flávio Gomes estabelece

que a inimputabilidade penal brasileira faz

parte do elenco dos direitos e garantias

fundamentais, por ser considerada cláusula

pétrea, por meio da Convenção dos

Direitos da Criança pela ONU, onde cita:

(b) do ponto de vista jurídico é muito questionável que se possa alterar a Constituição brasileira para o fim de reduzir a maioridade penal. A inimputabilidade do menor de dezoito anos foi constitucionalizada (CF, art. 228). Há discussão sobre tratar-se (ou não) de cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4.º). Pensamos positivamente, tendo em vista o disposto no art. 5.º, § 2.º, da CF, c/c arts. 60, § 4.º e 228. O art. 60, § 4º, antes citado, veda a deliberação de qualquer emenda constitucional tendente a abolir direito ou garantia individual. Com o advento da Convenção da ONU sobre os direitos da criança (Convenção Sobre os Direitos da Criança, adotada pela Resolução I 44 (XLIV), da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20.11.1989. (GOMES, 2008, p. 3)

E continua,

Aprovada pelo Decreto Legislativo 28, de 14.09.1990, e promulgada

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pelo Decreto 99.710, de 21.11.1990. Ratificada pelo Brasil em 24.09.1990, que foi ratificada pelo Brasil em 1990, não há dúvida que a idade de 18 anos passou a ser referência mundial para a imputabilidade penal, salvo disposição em contrário adotada por algum país. Na data em que o Brasil ratificou essa Convenção a idade então fixada era de dezoito anos (isso consta tanto do Código Penal como da Constituição Federal – art. 228). Por força do § 2º do art. 5º da CF esse direito está incorporado na Constituição. Também por esse motivo é uma cláusula pétrea. Mas isso não pode ser interpretado, simplista e apressadamente, no sentido de que o menor não deva ser responsabilizado pelos seus atos infracionais. (GOMES, 2008, p. 3)

Esta é também a defesa do

jurista Olympio de Sá Sotto Maior Neto

em trecho extraído do artigo “Redução da

idade penal” escrito pelas promotoras de

justiça do Ministério Público do Distrito

Federal e Territórios, Cleonice Maria

Resende Varalda e Helena Rodrigues

Duarte, este discurso foi apresentado no

quarto Congresso da Associação dos

Magistrados e Promotores da Infância e

Juventude, em que foi recepcionada de

forma generalizada a concordância da

inconstitucionalidade de redução da

menoridade penal, assim cita:

O primeiro ponto que deve ser ressaltado – e que importa, na prática, fulminar com qualquer proposta de emenda constitucional direcionada à diminuição da imputabilidade penal – contempla a conclusão de que a imputabilidade penal somente a partir dos dezoito anos, trazida à condição de cânone

constitucional pela Assembleia Nacional Constituinte de 1988, corresponde a cláusula pétrea e, por isso mesmo, insuscetível de modificação por via de emenda, conforme comando do art. 60, § 4º, da Constituição Federal (assim: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir... IV – os direitos e garantias individuais”).

E continua,

Embora topograficamente distanciada do art. 5º, da Constituição Federal (pois, afinal, pela primeira vez em nossa história constitucional destinou-se um capítulo exclusivo para tratar da família, da criança, do adolescente e do idoso), não há dúvida de que a regra do art. 228, da Constituição Federal, apresenta natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (como anota Gomes Canotilho, “os direitos de natureza análoga são direitos que, embora não referidos no catálogo dos direitos, liberdades e garantias, beneficiam de um regime jurídico-constitucional idêntico aos destes” ou, na observação de Alexandre de Moraes, “a grande novidade do referido art. 60 está na inclusão, entre as limitações ao poder de reforma da Constituição, dos direitos inerentes ao exercício da democracia representativa e dos direitos e garantias individuais, que por não se encontrarem restritos ao rol do art. 5º, resguardam um conjunto mais amplo de direitos constitucionais de caráter individual dispersos no texto da Carta Magna”).

E por fim, conclui,

Vale dizer, os menores de dezoito anos a quem se atribua a prática de um comportamento previsto na legislação como crime ou contravenção têm o direito fundamental (que se traduz também em garantia decorrente do princípio constitucional da proteção especial) de estar sujeito às normas do Estatuto da Criança e do Adolescente (recebendo, se for o caso e como resposta à sua conduta ilícita, as medidas socioeducativas) e

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afastados, portanto, das sanções do Direito Penal. É este, inclusive, o pensamento do Fórum DCA (Fórum Nacional de Defesa da Criança e do Adolescente). [viii] (VARALDA; DUARTE, s/d, p. 1-2 apud MAIOR NETO, s/d)

Então não será possível alterar

a legislação, pois nem a própria

Constituição Federal pode ser emendada.

O menor de dezoito anos de idade tem o

direito fundamental de está submetido ao

ECA.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-

GICOS

Para a elaboração desse artigo

foi empregada a pesquisa bibliográfica e

documental. Ou seja, consultas e análises

em doutrinas, artigos científicos,

jurisprudências, e a legislação que trata da

maioridade penal.

A respeito do tipo de pesquisa,

consistiu em descritiva com a realização

de apontamentos bibliográficos para

coleta de referencial teórico sobre a

temática. Em seguida o referencial

estudado foi analisado, registrado,

organizado, classificado, avaliado e

interpretado com a intenção de refletir

sobre o tema. Para finalizar, para o

levantamento das abordagens das

informações, o trabalho se realiza

4 ANÁLISE DOS DADOS E

RESULTADOS

Foi analisado que o presente

tema tem indiscutível relevo jurídico, pois

adentra na seara das garantias

constitucionais tendo em vista o disposto

no art. 228, da CF/88, que prevê a

inimputabilidade penal do menor infrator,

submetendo-o à legislação especial,

instrumentalizada no atual Estatuto da

Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº.

8069/90. No qual são descritos as

garantias fundamentais, garantias que

estão e são tidas como princípio

fundamental contida como cláusula pétrea

em nossa Constituição Federal de 1988.

Observou-se ainda, que o tema

se deu em razão da grande polêmica que

surge perante acontecimentos recentes e de

grande violência envolvendo crianças e

adolescentes. A sociedade brasileira já não

aguenta mais tanta violência,

principalmente quando se trata de menores

infratores, que a sociedade influenciada

pela mídia acaba levantado a “bandeira”

dos que são a favor da redução da

maioridade penal sem se importar se tal

redução é possível no nosso ordenamento

jurídico e se suas consequências

diminuiriam realmente a criminalidade.

Conforme o resultado dos

dados foi constatado que atualmente, as

discussões acerca da redução da idade

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penal estão crescendo cada vez mais, com

um número elevado de participações de

juristas e, ainda, dos formadores de

opiniões através da mídia, bem como, de

políticos. Muitos juristas são defensores

da impossibilidade de reforma

constitucional, pois é uma cláusula pétrea

neste aspecto, não podendo ser

modificada, já que se trata de direito

individual que é imune à mudança por

Emenda Constitucional, nos termos do art.

60, §4º, inciso IV mudança do art. 228.

Foi observado ainda que o

sistema jurídico-penal não está preparado

para efetivar a diminuição da maioridade

penal, objetivando o combate à violência

realizada por menores de idade, pois todos

os presídios se encontram superlotados

aumentando ainda mais a criminalidade,

que em vez de recuperar o individuo para

o retorno à sociedade acaba inserindo-o

cada vez mais em atividades perigosas e

este é capaz ainda de cometer outros

crimes.

Com isto se conclui que o

anseio de punição almejado pela sociedade

na busca de penalizar os menores

infratores, a maioridade penal está mais

ligada a um meio de punir, os que o

Estado não consegue, portanto não sendo

este o meio mais eficaz para impor a estes

menores uma forma de coação ou de

prevenção deste contra a marginalidade e a

criminalidade.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história do Brasil sempre

esteve submetida a problemas sociais, em

que a maioria da população,

principalmente as crianças e os

adolescentes, jamais tiveram uma vida

digna, ou seja, sem o mínimo básico para

sobreviver como saúde, moradia e suporte

educacional capaz de enfrentar com

maturidade os desafios que a sociedade

oferece. E como solução rápida de se

resolver o problema da violência

infantojuvenil, aparecem pessoas que

defendem a redução da maioridade penal

como forma de conter a violência

praticada por menores infratores, toda via,

a solução para a problemática da

população amedrontada em relação aos

mesmos não está em diminuir a

maioridade penal dos adolescentes, mas

sim em fazer cumprir o que a Constituição

Federal de 1988 determina como no seu

artigo 227:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

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Todavia, o estudo do presente

artigo demonstra que a fundamental

particularidade são os direitos e as

garantias individuais que se apresentam

como direitos individuais em face do

poder estatal, que almeja assegurar, dentre

outros direitos, a liberdade individual,

atribuindo ao estado um comportamento

omissivo.

Além do mais, podemos

afirmar que os direitos acima citados estão

espalhados por toda a CF/88, não sendo

somente aqueles impressos no artigo

quinto, por isso, sendo inteiramente

aceitável que outras normas se encontrem

fora do artigo 5º da CF/88, como no que se

observa no artigo que trata da

inimputabilidade penal, 228 da C/88.

Conforme registro, o poder

constituinte originário instituiu o artigo

228 da CF/88 como uma garantia

individual fundamental de liberdade à

pessoa menor de 18 anos, insuscetível de

mudança, sendo com isto cláusula pétrea.

È fundamental observar os

limites de cada poder, o constituinte

originário e o reformador, em que os

limites devem, indiscutivelmente, ser

respeitados e ser conservados, a fim de

manter a segurança jurídica do Estado.

Encontrando-se entre estes limites a

impossibilidade da modificação, nem por

emenda à constituição, das cláusulas

pétreas, isto porque o poder originário quis

defendê-la de maneira a torná-la

insuscetível de mudança.

Deste modo, sendo o artigo

228 da CF/88 um dispositivo

constitucional definido como cláusula

pétrea, por ser um direito individual da

pessoa, será, portanto, impossível a

mudança de tal artigo na presente

legislação brasileira, isto porque, não se

permite na norma jurídica pátria qualquer

alteração que diminua ou que extingue

garantia ou direito individual.

Sendo assim, comprova-se que

para poder reduzir a maioridade penal no

país, será necessário, que fosse permitido

no Brasil, a realização de um novo texto

constitucional impondo um novo critério

de imputação de responsabilidade penal,

que é de 18 anos ou tirasse o respectivo

tema da natureza de cláusula pétrea.

Finalmente, a pesquisa aqui

estudada necessitará, de ser discutida pelo

órgão guardião da Constituição Federal,

no caso o Supremo Tribunal Federal que

definirá mais precisamente a natureza

jurídica de cláusula pétrea do artigo 228 da

CF/88, isto porque existem e haverá vários

projetos de emenda constitucional com o

objetivo de reduzir a maioridade penal.

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