EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DO...
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE DE CURITIBA
1 Rua Marechal Deodoro, n. 1028, 10º andar, Centro Curitiba, CEP 80.060-010
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA __VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA- PARANÁ.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ,
através da PROMOTORIA DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE, por seu
Promotor de Justiça que ao final assina, no uso de suas atribuições, vem à
presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 129 da Constituição Federal e
com fundamento nas Leis Federais n. 6938/81 e 7347/85 e demais leis estaduais
e municipais pertinentes a espécie, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL,
com pedido de liminar
em face de FRIESEN & CIA LTDA, pessoa jurídica de direito privado, com nome
fantasia Bar e Lanchonete 3° Mundo, inscrito no CNPJ sob n. 82.571.282/0001-
41, com endereço na Rua Maestro Carlos Frank, n. 2050, bairro Boqueirão,
Curitiba – PR, CEP: 81.750-400 representado por seu representante legal, pelos
fatos e fundamentos jurídicos expostos a seguir:
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1) DOS FATOS
Em 11 de julho de 2014, foi protocolado na Promotoria de
Proteção ao Meio Ambiente Termo de Representação, denunciando a poluição
sonora produzida pelo estabelecimento FRIESEN & CIA LTDA, cujo nome fantasia é Lanchonete 3° Mundo, localizado na Rua Maestro Carlos Frank, n.
2050, bairro Boqueirão, nesta cidade, com Inscrição Imobiliária sob n.
56.5.0053.0398.00-3.
Alegaram os moradores da região que aguardavam a
providência do isolamento acústico pela empresa há mais de dez anos, entretanto,
nada foi feito no sentido de poupar os moradores, cujos problemas acarretados
incluem até mesmo problemas de ordem psicológica, em razão do barulho
produzido no estabelecimento.
Os reclamantes relataram que os eventos acontecem de
terça-feira até domingo, a partir das 22h até às 2h da manhã, com som alto e intenso e, por vezes, com música ao vivo. O som alto está causando trepidação
no prédio, sendo mais grave nas quintas, sextas e sábados.
Diante da denúncia efetuada pelos moradores, esta
Promotoria expediu ofícios ao Corpo de Bombeiros (n. 1120/2014), Secretaria
Municipal de Urbanismo (n. 1119/2014), Secretaria Municipal do Meio Ambiente
(n. 1118/2014) e Secretaria Municipal de Saúde (n. 1121/2014).
Em resposta ao ofício, o Corpo de Bombeiros informou, em
18 de agosto de 2014, que realizou vistoria no estabelecimento e, que a empresa não possui Certificado de Vistoria, uma vez que para a obtenção deste é
necessária a apresentação do Projeto de Prevenção de Incêndio aprovado pelo
órgão. Ou seja, o estabelecimento sequer possui documento regular referente
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à segurança e prevenção contra incêndios, o que coloca em risco tanto a vida
dos freqüentadores, como dos moradores da região.
A SMMA respondeu o ofício, informando ter vistoriado o
estabelecimento em 24 de julho de 2014 (quinta-feira), às 22h30min, ocasião em
que notificou o estabelecimento (Notificação de n. 41.882/B), determinando paralisação imediata das atividades sonoras. Na mesma data foi lavrado Auto
de infração (n. 13.310) pelo desenvolvimento de atividade poluidora (sonora) sem possuir Autorização ou Licença Ambiental em vigor com a imposição de multa
no valor de R$3.000,00. A SMMA não informou em seu parecer se fez medição
sonora no dia e quantos decibéis foram constatados.
A Lanchonete 3° Mundo foi inquerida por esta Promotoria através do ofício n. 1679/2014, para apresentar os seguintes
documentos: Contrato Social da empresa; Alvará de Funcionamento; Licenças
Ambientais; Licenças Sanitárias e Certificado do Corpo de Bombeiros. Em que
pese, a empresa ter recebido o ofício na data de 22 de outubro de 2014, conforme
AR devidamente assinado, o representante legal não se manifestou.
A SMU confirmou, em 07 de novembro de 2014, a
inexistência de Alvará de Localização e Funcionamento para o estabelecimento.
Em resposta ao ofício de n. 1119/2014, a Secretaria informou que no ano de 2014
todas as consultas prévias de localização para a empresa denunciada foram negadas em razão de tratar-se de obra irregular, a saber, edificação sobre o
recuo frontal, motivo pelo qual seria iniciada ação fiscal contra o estabelecimento.
O Serviço de Vigilância Sanitária do Distrito Sanitário do
Boqueirão, respondendo ao ofício de n. 1121/2014, comunicou que o estabelecimento não possui Licença Sanitária vigente, na medida em que é
imprescindível obter Alvará de Funcionamento para aquela concessão.
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Diante do exposto, faz-se necessária a paralisação imediata das atividades do réu, tendo em vista que, mesmo após autuações e
notificações realizadas por órgãos públicos o réu continua exercendo suas
atividades sem minimizar o barulho no local, restando aos moradores da região
apenas as reclamações perante esta Promotoria de Proteção ao Meio Ambiente
para o ingresso com a Ação Civil Pública.
Ao exercer atividade ruidosa e incômoda para o entorno, o
empreendedor infringe legislação federal, estadual e municipal e os princípios de
direito ambiental. Senão vejamos:
2) DO DIREITO
2.1) Da poluição sonora
Uma das formas graves de agressão ao homem e ao meio
ambiente é a poluição sonora, a qual está sendo continuamente agravada nos
centros urbanos merecendo grande atenção por parte da Administração Pública.
A poluição sonora é um problema social difuso que deve ser
combatido pelo Poder Público e pela sociedade mediante ação civil pública (Lei 7.347/85), a fim de garantir o direito ao sossego público, o qual está resguardado
pelas Constituições Federal e Estadual em seus artigos 225 e 207, respectivamente:
“Art. 225- Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
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“Art. 207- Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Estado, aos Municípios e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as gerações presentes e futuras,
garantindo-se a proteção dos ecossistemas e o uso racional dos
recursos ambientais.”
Segundo a Lei 6.938/81 – Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente – poluição é definida, no art. 3º, III, como a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que, direta ou indiretamente, prejudiquem a saúde, segurança e o bem estar da população; criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente a biota; afetem
as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; lancem matérias ou
energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
Os efeitos provocados por ruídos e sons acima do
suportável pelo ser humano causam sérios malefícios à saúde como insônia e
problemas nervosos, tanto assim que o autor ambientalista PAULO AFFONSO
LEME MACHADO, in Direito Ambiental Brasileiro, Ed. Malheiros Editores, 2013,
pág. 785, ao comentar os efeitos causados pelos ruídos, diz:
“Estudo publicado pela Organização Mundial de Saúde assinala como
efeitos do ruído: perda da audição; interferência com a comunicação;
dor; interferência do sono; efeitos clínicos sobre a saúde; efeitos sobre a
execução de tarefas; incômodo; efeitos não específicos.”
A Lei Municipal n. 10.625/02 que dispõe sobre ruídos
urbanos, proteção do bem estar e do sossego público sai em defesa do meio
ambiente e diz que:
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“Art. 1º É proibido perturbar o sossego e o bem estar público com ruídos, vibrações, sons excessivos de qualquer natureza,
produzidos por qualquer forma ou que contrariem os níveis máximos de
intensidade, fixados por esta lei.
Parágrafo único – As vibrações serão consideradas prejudiciais quando
ocasionarem ou puderem ocasionar danos materiais, à saúde e ao bem estar público.”
Nos termos do art. 4º da Lei Municipal acima mencionada
as medições efetuadas devem seguir as determinações da Associação Brasileira
de Normas Técnicas – ABNT, NBR 10151 e 10152, sobre acústica – avaliação do
ruído em áreas habitadas, visando o conforto da comunidade e níveis de ruído
para conforto acústico.
Considera-se para fins da Lei Municipal horário noturno aquele compreendido entre 22h1min e 7h00, sendo que em Zona residencial do tipo 2, caso do estabelecimento em questão, o índice de pressão sonora para tal horário é de 45 dB (A), conforme Anexo I da Lei Municipal n.
10.625/2002:
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Conforme o quadro acima exposto, o nível máximo de
pressão sonora permitido no local é o mais baixo da tabela, portanto, possível
depreender que o barulho produzido por um estabelecimento que realiza atividade
de música ao vivo e música mecânica estaria facilmente ultrapassando o índice
permitido.
Ainda, o artigo 8° caput da mesma da Lei Municipal
mencionada estabelece que a realização de apresentações musicais seja precedida de licenciamento ambiental pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente:
“Art. 8º - A realização de shows, concertos e apresentações musicais
de caráter cultural e artísticos, em áreas públicas ou particulares,
dependem de prévio licenciamento ambiental da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, independente de outras licenças exigíveis
(...)”
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Desta forma, deve ser proibida a continuidade de tal
atividade no local, com o objetivo de sanar a prática perturbadora, tendo em
vista que o estabelecimento está totalmente irregular. Nesse sentido, cabe
destacar o entendimento do E. Tribunal de Justiça do Paraná:
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO AMBIENTAL. PRETENSÃO DE QUE O RÉU, ORA APELANTE, SE ABSTENHA DE REALIZAR EVENTOS EM SEU ESTABELECIMENTO, DIANTE DO RUÍDO CAUSADO, COM PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO DA VIZINHANÇA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO
MINISTÉRIO PÚBLICO. INOCORRÊNCIA. O PARQUET TEM
LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA
DO MEIO AMBIENTE E DE OUTROS INTERESSES DIFUSOS E
COLETIVOS. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 129, III, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE
INTERESSE DE AGIR. INOCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DOS
DANOS AMBIENTAIS. MEDIÇÃO DE RUÍDOS QUE CONSTATOU
NÍVEIS ELEVADOS. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM MATÉRIA
AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO PRESSUPÕE A
INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO, COMPETINDO A QUEM
SUPOSTAMENTE PROMOVEU O DANO AMBIENTAL COMPROVAR
QUE NÃO O CAUSOU OU QUE O ATO PRATICADO AO MEIO
AMBIENTE NÃO LHE É POTENCIALMENTE LESIVO.
INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O
JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. DOCUMENTOS
CARREADOS AOS AUTOS QUE SE MOSTRAM SUFICIENTES PARA
A ENTREGA DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. MÉRITO. EMISSÃO DE RUÍDOS PELO ESTABELECIMENTO DO AGRAVANTE EM NÍVEL SUPERIOR AO PERMITIDO POLUIÇÃO SONORA. DANOS À VIZINHANÇA COM O EXCESSO DE RUÍDO E COM A ALGAZARRA OCASIONADA NOS ARREDORES POR SEUS FREQUENTADORES.
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CASSAÇÃO DO ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO DEVIDO. RECURSO DE APELÇÃO CÍVEL CONHECIDO E DESPROVIDO". (TJPR - 4ª C.Cível - AC - 1073878-2 - Medianeira - Rel.: Maria
Aparecida Blanco de Lima - Unânime - - J. 08.10.2013) (Grifo nosso).
Assim, a instalação de bar acarreta prejuízo para todos os
moradores de seus arredores, pois impossibilita uma noite tranquila de descanso,
devido aos sons altos e insuportáveis emitidos pelos frequentadores do bar no
período noturno, o que torna a noite desagradável.
2.2 Dos parâmetros de zoneamento e uso do solo
Considerando a poluição sonora produzida pelos
frequentadores do estabelecimento em questão, cabe ressaltar que,
consequentemente, o réu também se encontra em desacordo com a Lei Municipal
de Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo.
Conforme o artigo 34, da Lei 9.800 de 03 de janeiro de 2000:
“art. 34. Os usos do solo, segundo suas categorias classificam-se em:
(...)
III - comercial e de serviço – atividade caracterizada pela relação de
troca visando o lucro e estabelecendo-se a circulação de mercadorias, ou
atividade caracterizada pelo préstimo de mão-de-obra e assistência de
ordem intelectual ou espiritual; (...)”
O estabelecimento em questão situa-se em Zona
Residencial “2” – ZR-2- e desenvolve atividade classificada como Comércio Vicinal “2” para bar e lanchonete, conforme dispõe o art. 1º, itens III, III.1 e
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III.1.1.2 do Decreto Municipal nº183/00, que regulamenta o artigo 54, da Lei
9.800/00:
“art. 1º Ficam definidos os usos do solo para aplicação dos dispositivos
da Lei de Zoneamento no Município de Curitiba, relacionados a seguir:
I – USO HABITACIONAL
(...)
II – USOS COMUNITÁRIOS
(...)
III - USOS COMERCIAIS E DE SERVIÇOS
Atividades pelas quais fica definida uma relação de troca visando o lucro
e estabelecendo-se a circulação de mercadorias, ou atividades pelas
quais fica caracterizado o préstimo de mão de obra ou assistência de
ordem intelectual ou espiritual.
III.1 - COMÉRCIO E SERVIÇO VICINAL
III.1.1 - COMÉRCIO VICINAL
Atividade comercial varejista de pequeno porte, disseminada no interior
das zonas, de utilização imediata e cotidiana, entendida como um
prolongamento do uso residencial, subclassificando-se em: I
III.1.1.1 - (...)
III.1.1.2 - COMÉRCIO VICINAL 2 - Bar - Cafeteria, Cantina, Casa de Chá, Confeitaria
- Comércio de Refeições Embaladas
- Lanchonete (...)
Assim, a mesma Lei dispõe que esse tipo de atividade é
classificada como incômoda, tendo em vista a produção de ruído e trepidação,
causando incômodo à vizinhança. Nesse sentido:
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“Art. 36 As atividades urbanas constantes das categorias de uso
comercial, de serviços, e industrial, para efeito de aplicação desta lei
classificam-se:
I) (...)
II) quanto à natureza, em:
(...)
b) incômodas - as que possam produzir ruídos, trepidações, gases, poeiras, exalações ou conturbações no tráfego que possam causar incômodos à vizinhança;(...)”
Por esse motivo determinou-se, na mesma lei, a Licença
Ambiental como pressuposto para a atividade que pudesse causar incômodo aos
moradores:
Art. 38. De acordo com sua categoria, porte e natureza, em cada zona ou
setor as atividades urbanas serão consideradas como:
(...)
IV - proibidas - compreendem as atividades que, por sua categoria, porte ou natureza, são nocivas, perigosas, incômodas e incompatíveis com as finalidades urbanísticas da zona ou setor correspondente.
(...)
§ 2º. A permissão para a localização de qualquer atividade de natureza perigosa, incômoda ou nociva dependerá de licença ambiental expedida pelo órgão competente.
Entretanto, o réu, além de não possuir alvará de localização
e funcionamento, não possui também a licença ambiental específica para o exercício da atividade de música ao vivo e mecânica, na medida em que o
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documento é indispensável para o devido cumprimento da lei de zoneamento e
uso do solo, estando totalmente irregular.
Ressalte-se que o art. 50 dessa lei é claro ao dispor que os
alvarás devem ser concedidos a titulo precário, podendo ser cassado em razão de
atividade incômoda, tudo para preservar a vizinhança, de atividades consideradas
nocivas e que perturbem o sossego dos moradores. Senão vejamos:
“Art. 50. Os alvarás de localização de usos e atividades urbanas serão
concedidos sempre a título precário e em caráter temporário, quando
necessário, podendo ser cassados caso a atividade licenciada demonstre comprovadamente ser incômoda, perigosa ou nociva à vizinhança ou ao sistema viário.
(...)
§ 2º. A manifestação expressa da vizinhança, contra a permanência da
atividade no local licenciado, comprovando ser incômoda, perigosa ou
nociva, poderá constituir-se em motivo para a instauração do processo de cassação de alvará.”
Na medida em que o réu não segue os parâmetros
estabelecidos pela Lei de Zoneamento e Uso do Solo - com o fim de obter um bom
convívio – causando perturbação à vizinhança, deve ser cessada a atividade,
para devolver aos moradores as noites de sono tranquilas, o que converge em um
ambiente saudável e equilibrado.
2.3) Da irregularidade do estabelecimento
Conforme Auto de Infração de n. 13310, expedido pela
SMMA em 24 de julho de 2014, o réu sequer possui Licença Ambiental para
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desenvolver as atividades que vem exercendo no local, tampouco para
atividades de música ao vivo. Ressalta-se que a Lei Municipal n. 10.625/2002,
em seu art. 8° afirma a necessidade de licenciamento prévio pela Secretaria
Municipal do Meio Ambiente, infração esta classificada no anexo III da mesma Lei.
Ademais, a inadequação da atividade no local é de
conhecimento da Secretaria Municipal de Urbanismo de Curitiba, conforme
informações complementares extraídas da Guia Amarela onde se lê:
Ademais, oficiou-se à Lanchonete 3º Mundo (ofício de n.
1679/2014), com o intuito de que esta viesse a apresentar o Contrato Social da
empresa; Alvará de Funcionamento; Licenças Ambientais; Licenças Sanitárias e
Certificado de Vistoria do Corpo de Bombeiros, contudo, apesar do retorno
positivo do AR (assinado pela empresa em 22 de outubro de 2014), o representante legal não se manifestou.
Não obstante o descumprimento das exigências legais
mencionadas anteriormente por parte do réu, a Secretaria Municipal de Urbanismo
– SMU informou que o referido comércio não possui Alvará de Licença de Localização e Funcionamento, tendo em vista que todos os pedidos de consulta
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prévia foram negados em razão de tratar-se de obra irregular (edificação sobre o
recuo frontal), valendo dizer que, nem mesmo a obra atende aos requisitos prévios para funcionamento.
Consequentemente, o estabelecimento não possui Licença Sanitária, uma vez que para a obtenção desta, faz-se necessário os
alvarás já mencionados, conforme informou o Serviço de Vigilância Sanitária do
Distrito Sanitário do Boqueirão, em resposta ao ofício de n. 1678/2014.
José Afonso da Silva1 nos leciona sobre a importância da
autorização ou licenciamento para a preservação do meio ambiente:
“As normas de Direito Ambiental imprimem enorme condicionamento às
atividades humanas, visando a resguardar a qualidade do meio ambiente.
O cumprimento desse condicionamento nem sempre é espontâneo. Por
isso, a legislação prevê controles prévios, concomitantes e sucessivos,
por parte de autoridades públicas, a fim de verificar a regularidade do
exercício das atividades controladas. Permissões, autorizações e licenças são formas clássicas de controle prévio, porque atuam antes
do início da atividade controlada.” Grifo nosso.
Para adentrar na esfera do Alvará de Localização e
Funcionamento, necessário se faz uma rápida análise sobre este Ato
Administrativo e suas peculiaridades. Como é sabido, o Alvará é um tipo de
Licença Administrativa expedido pela Administração Pública. Nas palavras de
Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
“licença é o ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade.2” Grifo nosso.
1 SILVA, José Afonso da Direito Ambiental Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. 2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 220.
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Assim, pode-se denotar que a licença é, por excelência, um
ato declaratório de um direito preexistente do administrado. O Alvará, por sua vez,
é o instrumento, meio ou fórmula através do qual a Administração Pública expede
autorização ou licença. Em outras palavras, o alvará é a forma, o revestimento, o
continente dos atos administrativos da licença e da autorização.
Portanto, considerando que o demandado exerce sua atividade sem o competente e devido Alvará de Localização e Funcionamento, o qual é potencialmente poluidor (poluição sonora e
atmosférica), não há dúvidas da ilegalidade em que a demandada mantém a sua
atividade, devendo haver a imediata cessação de tais atividades por meio de ordem judicial.
Outrossim, o estabelecimento também não possui Certificado de Vistoria emitido pelo Corpo de Bombeiros, medida de
prevenção e combate ao incêndio, exigida no art. 2° da lei estadual de n. 16.567 de 2010, assumindo o réu os riscos pelos quais expõe a população, pois não há a
garantia de segurança e proteção à vida em caso de incêndio. Conforme se
observa no Relatório de Vistoria do órgão responsável, o estabelecimento não possui plano de prevenção e segurança contra incêndio e pânico (PSCIP).
Nesse sentido, eis o entendimento do Egrégio Tribunal de
Justiça do Paraná:
“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABI- LIDADE
POR DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE - ES-
TABELECIMENTO COMERCIAL QUE DESEMPENHA ATIVIDA- DES
NOTURNAS (SOCIEDADE VASCO DA GAMA) - POLUIÇÃO SONORA
NÃO CONFIGURADA - MEDIÇÃO REALIZADA QUE SE ENCONTRA
DENTRO DOS LIMITES PREVISTOS PELA LEI MUNICIPAL -
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DOCUMENTOS JUNTADOS EM SEDE RECURSAL QUE, POR SI SÓ,
NÃO DEMONSTRAM O DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO -
ESTABELECIMENTO FUNCIONANDO SEM ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO E AUTORIZAÇÃO DO CORPO DE BOMBEIROS - RISCO A INTEGRIDADE FÍSICA DE FUN- CIONÁRIOS E FREQUENTADORES - INTERDIÇÃO DETER- MINADA ATÉ QUE A REQUERIDA REGULARIZE SUA SITUAÇÃO COM O PODER PÚBLICO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJ-PR 7967860 PR 796786-0 (Acórdão), Relator: Astrid Maranhão de
Carvalho Ruthes, Data de Julgamento: 19/06/2012, 4ª Câmara Cível).
Grifos nossos.
Contudo, mesmo tendo sido notificado pela SMMA (com
determinação para a paralisação da atividade) e, lavrado auto de infração, verifica-
se que o réu continua a realizar os eventos de música ao vivo, anunciados na
sua página eletrônica (Facebook – disponível em:
https://www.facebook.com/BarTerceiroMundo?rf=272126726132195) como “o
melhor do sertanejo universitário” “banda acoustica rock’in roll”, ou “banda de
pagode pura elegância”, descumprindo reiteradamente o que é especificado pela
lei e colocando em risco a vida dos frequentadores do estabelecimento e dos moradores da região, uma vez que sequer possui regularidade junto ao Corpo de
Bombeiros.
Assim, sendo demonstradas as irregularidades por parte da
empresa-ré, por não possuir as Licenças necessárias, bem como o barulho que
perturba o sossego dos vizinhos do estabelecimento e o descumprimento da Lei
de Uso do Solo é que proclamo pela procedência da presente Ação Civil Pública.
2.4 Do dano moral
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O dano moral coletivo, hoje perfeitamente aceito pela nossa
doutrina e jurisprudência, tem como principal aplicação os casos de danos
ambientais.
Isso porque, pessoas como o ora requerido, que promovem
continuamente danos ambientais, banalizando a questão, violam os direitos
coletivos e transindividuais. Trata-se, na realidade, de danos ao meio ambiente
urbano, uma vez que infringe lei municipal, prejudicando todo o bem-estar e
qualidade de vida dos cidadãos que moram no entorno.
Em se tratando de direito ambiental a repercussão dos danos
se reflete no cível, no crime e administrativamente. Trata-se de esferas
independentes entre si, mas todas importantes quanto aos objetivos que visam.
É o que preceitua o artigo 225 da Constituição Federal, mais
especificamente em seu §3º:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Na realidade, a Constituição Federal, por meio do dispositivo
acima, veio afirmar o que já dizia a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei
6.938/81) em seu artigo 14 §1º, que assim diz:
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“Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal,
estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à
preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores.
(...)
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e
dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil
e criminal, por danos causados ao meio ambiente”.
Ademais, restou evidente ainda que quando se trata de
responsabilidade por dano ambiental, esta será tida como responsabilidade
objetiva, seja nos termos da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, ou na
confirmação de seus ditames por parte da Constituição Federal. Nesse sentido,
nas palavras de Vladimir Passos de Freitas3:
“a Constituição Federal de 1988, no art. 225, §3º, atribui ao poluidor, pessoa física ou jurídica, responsabilidade administrativa e penal, além do dever de reparar o dano causado. Sua redação não é explícita
como a da Lei 6.938, de 31.08.1981. Mas, induvidosamente, manteve a
responsabilidade objetiva, uma vez que houve recepção da lei da
política nacional ambiental, que não possui nenhuma incompatibilidade
com a Lei Fundamental”. Grifo nosso.
No cível a reparação pode ser não apenas dos danos
materiais, mas também morais, estes são compensáveis e aqueles indenizáveis.
3 FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 177.
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Diz-se indenizáveis aqueles danos em que a vítima pode ser
restituída ao estado anterior à ocorrência do dano. Já os compensáveis são
aqueles em que a vítima não tem como ser restituída ao estado em que se
encontrava antes, porém, lhe é entregue certa quantia em dinheiro ou coisa como
forma de amenizar o ocorrido.
Na aplicação do dano moral ambiental deve ser considerado
e interpretado de forma sistêmica o artigo 225 da Constituição Federal com o
ordenamento jurídico, pois ocorrendo lesão ao equilíbrio ecológico, este afetará a
sadia qualidade de vida e à saúde da população. Rompido o equilíbrio do
ecossistema todos correm risco.
Nesta seara é o ensinamento do ilustre jurista - Dr. Carlos
Alberto Bittar4:
“a nosso ver, um dos exemplos mais importantes de dano moral coletivo
é o dano ambiental, que consiste não apenas na lesão ao equilíbrio
ecológico, mas também na agressão à qualidade de vida e à saúde. É
que esses valores estão intimamente inter-relacionados, de modo que a
agressão ao ambiente afeta diretamente a saúde e a qualidade de vida
da comunidade (CF, art. 225).
O dano ambiental é particularmente perverso porque rompe o equilíbrio
do ecossistema, pondo em risco todos os elementos deste. Ora, o meio
ambiente é caracterizado pela interdependência e pela interação dos
vários seres que o formam (Lei Federal nº 6.938/81, art. 3º, I), de sorte
que os resultados de cada ação contra a Natureza são agregados a
todos os danos ecológicos já causados.
O instrumento processual que se presta por excelência à defesa dos
valores coletivos em geral, na hipótese de dano, é a ação civil pública,
em virtude da regra aberta acolhida pelo artigo 1º, IV, da Lei 7.347/85. 4 Procurador do Estado de São Paulo - Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Artigo extraído do site http://www.sitiopaineiravelha.com/2002/fev.
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Aliás, com a modificação realizada pela Lei Federal 8.884/94, o artigo 1º,
caput, da Lei 7.347/85 passou a prever, expressis verbis, a possibilidade
de propositura de ações de responsabilidade por danos morais de ordem
coletiva. A responsabilidade pela produção do dano ambiental é objetiva
– ou seja, independe da prova de culpa – por duas razões fundamentais:
a) esse dano tem um caráter moral, decorrendo da própria ação lesiva ao
ecossistema; b) no Direito Ambiental, há o princípio do poluidor-pagador,
consagrado em nosso ordenamento jurídico (Lei Federal nº 6.938/81, art.
14, § 3º), pelo qual é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”. Grifo nosso.
Carlo Castronovo5 preleciona:
“um dos mais importantes e significativos exemplos de dano moral
coletivo é o dano ambiental, pois o 'ambiente', como 'paisagem', como
'habitat', como 'belezas naturais', é categoria relacional que exprime a
mútua colocação de uma série de elementos que, em seu conjunto,
constituem um valor que transcende a sua mera soma, valor esse que
não pode ser traduzido mediante parâmetros econômicos. O dano
ambiental não consiste apenas na lesão ao equilíbrio ecológico,
prejudicando também outros valores fundamentais da coletividade a ele
vinculados: a qualidade de vida e a saúde. É que esses valores estão
profundamente unidos, de maneira que a agressão ao ambiente atinge
diretamente a saúde e a qualidade de vida da comunidade”.
A jurisprudência, por reiteradas vezes, aceita e concede a
compensação por danos morais em matéria ambiental.
Leia-se na Lei 7347/85 - Lei de Ação Civil Pública:
5 CASTRONOVO, Carlo. La Nuova Responsabilità Civile - Regola e Metafora, Milão, Giuffrè, 1991.
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“Art. 3º - A ação civil pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”.
Em comentários ao referido artigo dizem Nelson Nery Júnior
e Rosa Maria de Andrade Nery6:
1. Condenação em dinheiro. A aferição do quantum indenizatório nas
ações coletivas com a finalidade de reparação do dano difuso ou coletivo
é questão de difícil solução. Poderão ser utilizados os critérios de arbitramento ou de fixação da indenização com base no valor do lucro obtido pelo causador do dano com sua atividade. É possível a
cumulação da indenização por danos patrimoniais e morais (STJ 37; CDC
6º VI). Grifo nosso.
Neste sentido, verifica-se a possibilidade de se impor ao
requerido o pagamento pelos danos morais sofridos até então pela coletividade.
Os nossos Tribunais têm se manifestado neste sentido:
POLUIÇÃO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA FORMULADA PELO
MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. POLUIÇÃO CONSISTENTE EM
SUPRESSÃO DA VEGETAÇÃO DO IMÓVEL SEM A DEVIDA
AUTORIZAÇÃO MUNICIPAL. CORTES DE ÁRVORES E INÍCIO DE
CONSTRUÇÃO NÃO LICENCIADA, ENSEJANDO MULTAS E INTERDIÇÃO DO LOCAL. DANO À COLETIVIDADE COM A
DESTRUIÇÃO DO ECOSSISTEMA, TRAZENDO CONSEQÜÊNCIAS
NOCIVAS AO MEIO AMBIENTE, COM INFRINGÊNCIA, ÀS LEIS
AMBIENTAIS, LEI FEDERAL 4.771/65, DECRETO FEDERAL 750/93,
ARTIGO 2º, DECRETO FEDERAL 99.274/90, ARTIGO 34 E INCISO XI,
6 NERY JUNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado e legislação civil extravagante em vigor. 5ª ed. ver. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2001, p. 1529
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E A LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, ARTIGO
477. CONDENAÇÃO A REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS
CONSISTENTES NO PLANTIO DE 2.800 ÁRVORES, E AO
DESFAZIMENTO DAS OBRAS. REFORMA DA SENTENÇA PARA
INCLUSÃO DO DANO MORAL PERPETRADO A COLETIVIDADE.
QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL AMBIENTAL RAZOÁVEL E
PROPORCIONAL AO PREJUÍZO COLETIVO. A IMPOSSIBILIDADE DE
REPOSIÇÃO DO AMBIENTE AO ESTADO ANTERIOR JUSTIFICAM A
CONDENAÇÃO EM DANO MORAL PELA DEGRADAÇÃO AMBIENTAL
PREJUDICIAL A COLETIVIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO. (TJRJ
- 2.ª Câmara Cível - Apelação Cível n.º 2001.001.14586 - Rel.: Desa.
Maria Raimunda T. de Azevedo - J. 07/08/2002). Grifo nosso.
E mais:
DANO AO MEIO AMBIENTE. DERRAMAMENTO DE ÓLEO NA BAÍA DE
GUANABARA. RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. DANO EMERGENTE. LUCRO CESSANTE. DANO MORAL DE PESSOA JURÍDICA. POLUIÇÃO NAS PRAIAS. PREJUÍZO DO
COMÉRCIO LOCAL. DESVALORIZAÇÃO DO PONTO COMERCIAL. 1.
Comprovado o dano ao meio ambiente, decorrente do vazamento de óleo
na baía de Guanabara, proveniente das instalações da empresa, cabe o
pedido de reparação dos prejuízos individualmente causados. 2. É da
PETROBRÁS o dever de cuidar para que não ocorra qualquer dano ao
meio ambiente. 3. Dano é o gênero, do qual são espécies o dano material
e o dano moral. 4. No dano material, por seu turno, se subdivide em
danos emergentes e lucros cessantes. 5. Dano emergente é o que
importa em efetiva diminuição no patrimônio da vítima, em razão do ato
ilícito. 6. Lucro cessante é o reflexo futuro no patrimônio da vítima. 7. A
honra subjetiva é exclusiva do ser humano e se caracteriza pelo decoro e
auto-estima. 8. A honra objetiva é comum à pessoa natural e à pessoa
jurídica e se reflete na reputação, no bom nome e na imagem perante a
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sociedade. 9. Desprovimento dos recursos. (TJRJ - 8.ª Câmara Cível -
Apelação Cível n.º 2002.001.09351 - Rel.: Desa. Letícia Sardas - J.
17/12/2002). Grifo nosso.
É clara e evidente a importância para o meio ambiente
urbano a conservação do bem-estar e a qualidade de vida de todos os cidadãos.
Dessa forma, busca-se com a presente Ação Civil Pública a devida reparação e
compensação dos danos causados ao meio ambiente urbano.
3) CONCLUSÃO
Assim, fácil é de se verificar que:
a) não há, na atividade do estabelecimento Friesen & Cia
LTDA., nome fantasia Lanchonete 3° Mundo, qualquer indício de interesse ou
utilidade pública que justifique a sua continuidade;
b) a atividade é incômoda e nociva à vizinhança;
c) o estabelecimento não possui documentos essenciais
que demonstrem haver controle da municipalidade, tais como alvará de
localização e funcionamento, licença sanitária e, tampouco certificado de vistoria
do Corpo de Bombeiros;
d) o réu é reconhecidamente causador de poluição sonora e
perturbação do sossego alheio e oferece risco à população;
4. DOS PEDIDOS
4.1) Da liminar
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Como já mencionado acima, o Réu não possui Alvará de
Localização e Funcionamento, tampouco Certificado de Vistoria pelo Corpo de
Bombeiros, em total desrespeito à legislação pátria.
Conforme autorizado pelo artigo 12 da Lei n. 7347/85 o juiz
pode conceder liminar com ou sem justificação prévia.
O fumus boni iuris, que é a existência e ocorrência do
direito substancial invocado por quem pretende a segurança, está cabalmente
demonstrado pelos documentos que acompanham a presente e, pela legislação
citada.
Por outro lado, se for possibilitado ao requerido que
continue com sua atividade danosa enquanto perdurar o processo estar-se-á
permitindo a continuação de uma atividade comprovadamente ilegal e danosa, em
prejuízo da saúde e do bem-estar de um número indeterminado de pessoas que
vivem na vizinhança do estabelecimento e o freqüentam. Aí reside o periculum in mora.
Disso resulta a necessidade da concessão da medida
liminar, inaudita altera pars, sem necessidade de justificação prévia,
determinando-se que o estabelecimento Friesen & Cia LTDA., seja interditado totalmente, com base no Art. 11 da Lei 7.347/85, com a imposição de multa
diária de dez salários mínimos, pelo descumprimento do preceito; tendo em vista
que o réu não possui documentação regularizada e principalmente porque produz poluição sonora de forma direta, posto que em razão da atividade
noturna venha perturbando o horário de repouso noturno da vizinhança.
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Requer-se também a Vossa Excelência, em concedendo a
liminar, que determine para que a Secretaria Municipal do Meio Ambiente - SMMA e o Comando Geral da Polícia Militar do Paraná fiscalizem o cumprimento da ordem, apontando ao juízo eventuais violações para a apuração
de multa diária por descumprimento, em valor a ser arbitrado por Vossa
Excelência, e a requisição de força policial, se necessário.
Requer-se ainda, liminarmente, que o réu apresente cópia da escritura pública do imóvel ou contrato de locação deste, a fim de informar
o real proprietário do bem.
4.2) Da inversão do ônus da prova
A inversão do ônus da prova em sede de Ação Civil Pública
Ambiental se justifica pelo fato de o interesse público tutelado – reparação de
dano ambiental – exigir que as questões de prova sejam desde sempre definidas
sob pena da demora no trâmite implicar em agravamento da lesão.
O processamento na forma desse instrumento é
perfeitamente cabível no caso em questão. O artigo 21 da Lei 7.347/85 determina
que se apliquem à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais,
no que tenha cabimento, os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.
O artigo 6º, inciso VIII, da Lei 8.078/90, é expresso ao
admitir a inversão do ônus da prova em causa fulcrada no Código de Defesa do
Consumidor, na medida em que é hipossuficiente o demandante, segundo as
regras comuns da experiência como bem esclarece o texto legal, in verbis:
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“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do
ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz,
for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as
regras ordinárias de experiência; ”
Tal dispositivo, certamente, tem aplicação também ao
âmbito de proteção ao meio ambiente, tendo em vista que, o Ministério Público
ao ajuizamento de ações civis públicas está em franca desvantagem perante os
demandados.
Alude-se à jurisprudência a seguir: “AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL -
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - POSSIBILIDADE - ANTECIPAÇÃO
DE HONORÁRIOS PERICIAIS PELO RÉU DEVIDA - ART.18 DA LEI
7.347/85 - ISENÇÃO CONCEDIDA AO AUTOR - RECURSO
DESPROVIDO 1. É cabível a inversão do ônus da prova em Ação Civil Pública Ambiental. 2. O benefício de isenção de antecipação de
custas em Ação Civil Pública, é dado para a celeridade e efetividade da
ação, que visa proteger direitos da sociedade como um todo, contra
danos que afetam a todos cidadãos, não havendo qualquer lógica em
estender este benefício aos réus da ação, dando, de certa forma,
incentivo ao dano contra o meio ambiente”.
(TJPR - 4ª C.Cível - AI 0464903-8 - Londrina - Rel.: Desª Regina Afonso
Portes - Unânime - J. 14.04.2008). Grifo nosso.
Razão pela qual se requer desde já, com base nos
fundamentos acima expostos, a determinação e reconhecimento da inversão do ônus da prova no presente caso.
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4.3) Dos demais pedidos
Diante do exposto, requer-se:
I - a concessão da liminar nos moldes anteriormente
delineados e sua confirmação, com a imposição de multa diária por seu
descumprimento;
II - a citação do Réu, na pessoa do seu representante legal,
com o permissivo do artigo 172, parágrafo 2º, do CPC, para querendo, responder
e acompanhar os termos da presente, sob pena de serem considerados como
verdadeiros os fatos nesta alegados;
III – a condenação do Requerido em obrigação de não fazer, sob pena de multa diária em valor a ser arbitrado por Vossa Excelência e devidamente recolhido ao Fundo Municipal do Meio Ambiente consistente
em se abster de desenvolver a atividade nos moldes atuais ou similar que
provoque a perturbação do sossego público e poluição sonora, principalmente no
horário destinado ao repouso noturno compreendido entre 22h e 7h, posto que se
trate de zona residencial do tipo 2;
IV - a condenação do Requerido ao pagamento de danos morais coletivos, em valor a ser arbitrado por Vossa Excelência e devidamente
recolhido ao Fundo Municipal do Meio Ambiente;
V - protesta-se ainda por todos os meios de prova em direito admitidas, inclusive depoimento pessoal dos representantes legais do
requerido, prova pericial, documental e testemunhal;
VI - a procedência da ação em todos os seus termos,
condenando-se o réu ao pagamento de multa diária em caso de descumprimento
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da decisão final, das despesas processuais e verbas honorárias de sucumbência,
cujo recolhimento deste último deve ser feito ao Fundo Especial do Ministério
Público do Estado do Paraná, criado pela Lei Estadual n. 12.241, de 28 de julho
de 1998 (DOE) n. 5302, de 29 de julho de 1998), nos termos do artigo 118, inciso
II, alínea “a”, parte final, da Constituição do Estado do Paraná.
VII - a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, nos termos do artigo 18 da Lei n. 7.347/85;
VIII – a expedição de ofício ao Município de Curitiba, para
que proceda a anotação na guia amarela do imóvel, da informação da propositura
da presente Ação Civil Pública Ambiental, por poluição sonora, restringindo assim
o uso do imóvel para serviços de música mecânica;
Atribui-se à causa o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil
reais).
Termos em que,
Pede Deferimento.
Curitiba, 11 de junho de 2015.
Sérgio Luiz Cordoni Promotor de Justiça