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JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA
ÉTICA EM ASSUNTOS CONTROVERTIDOS
NO ENSINO DE CIÊNCIAS:
ATITUDES QUE CONFIGURAM AS CONTROVÉRSIAS ENTRE
EVOLUCIONISMO E CRIACIONISMO
BAURU
2000
JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA
ÉTICA EM ASSUNTOS CONTROVERTIDOS NO
ENSINO DE CIÊNCIAS:
ATITUDES QUE CONFIGURAM AS CONTROVÉRSIAS ENTRE
EVOLUCIONISMO E CRIACIONISMO
Dissertação apresentada à Faculdade de
Ciências da Universidade Estadual Paulista,
Câmpus de Bauru, para obtenção do título
de Mestre em Educação para a Ciência -
Área de Concentração “Ensino de
Ciências”.
Orientador: Prof. Dr. Roberto Nardi
BAURU
2000
JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA
ÉTICA EM ASSUNTOS CONTROVERTIDOS NO
ENSINO DE CIÊNCIAS:
ATITUDES QUE CONFIGURAM AS CONTROVÉRSIAS ENTRE
EVOLUCIONISMO E CRIACIONISMO
BANCA EXAMINADORA
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
Presidente e Orientador: Professor Doutor Roberto Nardi
2º Examinador: Professora Doutora Maria Aparecida Viggiani Bicudo
3º Examinador: Professor Doutor José Misael Ferreira do Vale
Bauru, março de 2000.
DADOS CURRICULARES
JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA
NASCIMENTO 04.12.1959 – BAURU/SP
FILIAÇÃO Hélio Razera
Maria Ivani Castilho Razera
1979/1986 Curso de Graduação – Ciências Biológicas
PUC/Campinas
USC/Bauru
Desde 1987 Professor efetivo de Biologia, da Secretaria de Educação
do Estado de São Paulo.
1988 Curso de Pós-Graduação em Saúde Pública, nível de
Especialização, na Faculdade de Saúde Pública – USP.
1995/1996 Curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, nível
de Especialização, na Faculdade de Ciências –
UNESP/Bauru.
AGRADECIMENTOS
Sou grato a todos que me apoiaram e colaboraram na realização
desta pesquisa, em especial:
aos meus familiares, pais, esposa e filhos, pela paciência e pelo
tempo que me cederam;
aos professores de biologia que aceitaram o convite para a
entrevista, tornando-se colaboradores fundamentais na execução deste trabalho;
ao Professor Doutor Roberto Nardi, pela orientação que me
prestou, demonstrando incentivo, dedicação e paciência, mas principalmente pela
amizade construída no convívio desses anos em que estivemos juntos;
aos colegas de turma, pelos momentos de alegrias e angústias, pelos
materiais bibliográficos, pelo espírito de coleguismo e coletividade, aos quais
sentirei saudades;
aos componentes do Grupo de Pesquisa em Ensino de Ciências, da
Faculdade de Ciências, UNESP, câmpus de Bauru, São Paulo, pelas sugestões e
trocas de experiência;
ao Professor Doutor Fernando Bastos, pela amizade e pelas
conversas, discussões e cessão de espaço em suas aulas de Prática de Ensino, que
muito me ajudaram no desenvolvimento do trabalho;
à Professora Doutora Sueli Terezinha Ferreira Martins, pelas
sugestões de bibliografia;
a todos os demais professores do Programa de Pós-Graduação, pelo
incentivo e dedicação mostrados em aula;
a sempre dedicada e prestativa Carla Cristina Ferrari, da Seção de
Pós-Graduação da Faculdade de Ciências.
“A escola não pode deixar de se
preocupar com a formação do
estudante como um ser moral, como
um ser que enfrenta dilemas morais
aos quais necessita dar respostas, que,
espera-se, sejam morais.”
Maria A. V. Bicudo
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS......................................................................................... 13
LISTA DE FIGURAS........................................................................................... 17
LISTA DE TABELAS.......................................................................................... 18
RESUMO.............................................................................................................. 19
ABSTRACT.......................................................................................................... 20
1.0 - INTRODUÇÃO............................................................................................ 21
1.1 – A organização do trabalho................................................................ 28
2.0 - ÉTICA E MORAL - DOS FUNDAMENTOS ÀS IMPLICAÇÕES AO
TEMA.................................................................................................................... 30
2.1 - Conceitos e definições....................................................................... 30
2.2 - Desenvolvimento histórico-filosófico das questões éticas – breve
recorte........................................................................................................ 32
2.3 – Componentes éticos – princípios e procedimentos.......................... 35
2.3.1 – O ato moral........................................................................ 38
2.4 - Ética nas diferentes áreas de conhecimento...................................... 38
2.5 - Ética na ciência................................................................................. 40
2.6 - Ética no ensino - das relações pedagógicas ao desenvolvimento moral
e cidadania................................................................................................. 43
2.6.1 - Um perfil ético procedimental para o ensino de
ciências.......................................................................................... 57
3.0 - EVOLUCIONISMO VERSUS CRIACIONISMO NAS DISCUSSÕES
SOBRE ÉTICA..................................................................................................... 59
3.1 - Abrangências científica e religiosa.................................................... 59
3.1.1 - Na perspectiva do criacionismo ........................................ 61
3.1.2 - Na perspectiva do evolucionismo....................................... 66
3.2 - A filosofia da ciência nas discussões sobre evolução dos seres
vivos.......................................................................................................... 67
4.0 - EVOLUCIONISMO VERSUS CRIACIONISMO NO ENSINO -
ATITUDES POSSÍVEIS E REAIS....................................................................... 74
4.1 - Simulação analógica de atitudes....................................................... 78
4.2 - A proposta curricular do Estado de São Paulo.................................. 81
4.3 - Evolucionismo versus cracionismo - inerências ético-pedagógicas ao
desenvolvimento moral............................................................................. 83
5.0 - A PESQUISA................................................................................................ 91
5.1 - A amostra.......................................................................................... 92
5.2 - Coleta de dados................................................................................. 93
5.3 - Tratamento dos dados....................................................................... 96
5.4- A análise de discurso utilizada como recurso metodológico nesta
pesquisa..................................................................................................... 96
5.4.1 - Semântica básica do discurso............................................. 97
5.4.2 - Análise de conteúdo........................................................... 99
5.4.3 - Análise de asserção avaliativa e a medida de
atitudes......................................................................................... 101
5.5 - Apresentação e discussão de resultados - configurando as atitudes nas
representações dos professores................................................................ 105
5.5.1 - Posicionamento inicial nas controvérsias entre
evolucionismo e criacionismo..................................................... 106
5.5.2 - Atitudes nas conjunções e disjunções.............................. 113
5.5.3 - A medida de atitudes para diferentes objetos................... 119
5.5.4 - Sobreposição comparativa nas atitudes de todos os sujeitos e
para cada objeto........................................................................... 141
5.5.5 - Conversão da medida de atitudes em graus de
convergência/divergência............................................................ 143
5.5.6 - Atitudes em ações semelhantes para professores de
diferentes componentes curriculares........................................... 146
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 149
PARA ALÉM DA PESQUISA.........................................................................156
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................158
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA..................................................................172
ANEXO............................................................................................................176
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Características dos sujeitos da amostra............................93
Quadro 2 - Qualificação para o papel narrativo do sujeito na categoria
semântica do nível fundamental........................................................109
Quadro 3 - Qualificação do locutor dada para o papel narrativo do
objeto na categoria semântica do nível fundamental....................... 111
Quadro 4 - Comparação de enunciado nas conjunções e disjunções
entre os papéis narrativos de sujeito e objeto...................................115
Quadro 5 - Codificação dos objetos de atitude avaliados pelos sujeitos
da pesquisa...................................................................................... 120
Quadro 6 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor
TKO para diferentes objetos de atitude............................................120
Quadro 7 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor TKO............... 121
Quadro 8 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor
CLT para diferentes objetos de atitude........................................... 123
Quadro 9 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor CLT................. 123
Quadro 10 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor JCF para diferentes objetos de atitude.............................. 126
Quadro 11 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor JCF................. 126
Quadro 12 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor ECF para diferentes objetos de atitude................................ 129
Quadro 13 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor ECF..................130
Quadro 14 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor LLM para diferentes objetos de atitude............................... 132
Quadro 15 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor LLM................ 133
Quadro 16 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor ALS para diferentes objetos de atitude................................ 135
Quadro 17 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor ALS................. 136
Quadro 18 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor CTR para diferentes objetos de atitude................................ 137
Quadro 19 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor CTR.................137
Quadro 20 - Normalização da análise de asserção avaliativa do
locutor AAV para diferentes objetos de atitude............................... 139
Quadro 21 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes
objetos de atitude, segundo enunciados do locutor AAV.................140
Quadro 22 - Sobreposição comparativa do nível de
favoritismo/desfavoritismo para cada objeto de atitude, em todos os
locutores.......................................................................................... 141
Quadro 23 - Graus de convergência para objetos em conjunção e
disjunção, segundo os seus locutores...............................................145
Quadro 24 - Enunciados comparativos para objetos de atitude
semelhantes (professor de qualquer componente e professor de
biologia), colocados em disjunção com o objeto..............................148
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Modelo de currículo proposto por Bicudo
(1982)................................................................................................52
Figura 2 - Ficha com alternativas fechadas utilizada na
entrevista...........................................................................................94
Figura 3 - Textos polêmicos utilizados na
entrevista...........................................................................................95
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Conversão do nível de favoritismo/desfavoritismo das
atitudes para graus de convergência.................................................143
Tabela 2 - Exemplos de conversão do nível de favoritismo /
desfavoritismo para os graus de convergência..................................144
RESUMO
O objetivo deste trabalho centrou-se na verificação das atitudes que configuram o
ensino de biologia nas controvérsias entre evolucionismo e criacionismo, com as
respectivas implicações pedagógicas inerentes ao processo de desenvolvimento
moral. Os discursos dos professores foram tratados com recursos metodológicos
da semiótica e da técnica de análise de asserção avaliativa. No aspecto geral, as
representações mostraram elementos sintáticos de atitudes benéficas à autonomia
moral. Mesmo quando os alunos foram virtualmente colocados em plano de
oposição aos professores e à ciência, os discursos denotaram desaprovação a
fatores que pudessem inibir ou perturbar o processo de desenvolvimento moral.
Todavia, a presença de elementos sintáticos nos enunciados dos professores,
somados à ausência de determinadas percepções éticas subjacentes a contextos
fora do eixo ciência-religião, mostrou-nos a existência de vestígios deixados por
linhas educacionais passadas, assim como falhas na formação docente,
contribuindo negativamente no processo de desenvolvimento moral dos alunos e
nos propósitos de uma educação mais progressista em relação à consolidação de
cidadania. O conjunto de atitudes observadas nas representações dos professores
possibilitou-nos projetar momentos de transição no ensino de biologia, com
tendências a um novo desenho, tanto em relação a sua matéria-prima quanto no
âmbito pedagógico.
ABSTRACT
The main purpose of this research was to verifys teacher’s attitudes related to the
controversals originated between evolutionism and creationism and the
pedagogical implications which could bring to the moral development of the
involved in the process. Using the semiotic as a resource to analyse High School
biology teachers’ discourses, subjects of research, were found an approval to
students autonomy, even when contrary to the teachers position. The attitudes
performed in the discourses still show disapproval to teachers that inhibit the
students moral development process. Data collected allow to project a moment of
transition in education, when the traditional line seems to be loosing space,
arriving at the end of its cycle. However, contradictory elements present in
teachers discourses added to the absence of some ethical perceptions, show traces
left by past educational lines and defects in teaching formation, contributing
negatively to the students moral development process.
1.0 – INTRODUÇÃO
“Assim como é inexorável o destino do ser humano na busca de novos conhecimentos (ciência), é também inexorável a reflexão sobre valores (ética). A característica do ser humano é a dupla angústia da indagação (ciência) e a angústia da reflexão crítica (ética).”
William Saad Hossne
Atualmente assistimos no mundo ocidental a uma inequívoca crise
na esfera da moral e da ética (La Taille, 1998). Vemos o mundo passar por
transformações freqüentes e cada vez mais rápidas. Discursos contemporâneos,
apresentando novos termos técnicos, indicando novas tendências e novos
costumes, emergem em vários campos do conhecimento humano. Temas
diversos como neoliberalismo, globalização, internet, clonagem, cientologia,
conectividade, bioética, entre outros, foram criados nos últimos anos e, “muitas
vezes, saltam do espaço mais técnico a que pertencem para algumas das
manifestações mais comuns do cotidiano” (Schwartz, 1997, p.3). Permeando a
existência humana, tais manifestações promovem, em determinados casos,
incertezas nas relações sociais. Incertezas que se ampliam quando, no encalço dos
discursos, surgem possibilidades do conhecimento científico gerar no campo da
genética, por exemplo, uma técnica teoricamente capaz de clonar o ser humano. A
transformação profunda e rápida das coisas, como assinalou Vier (1971), pede
com mais urgência que ninguém, desatento ao curso dos acontecimentos ou
entorpecido pela inércia, se contente com uma ética meramente individualista;
evidenciando a necessidade de um amplo debate em torno das questões éticas que
transpassam todos os propósitos intrinsecamente ligados às relações humanas.
A Educação, projetada como progressista ou de vanguarda, não
poderia ficar longe do debate, em função de seu importante papel institucional na
formação e instrumentalização dos princípios éticos que dão rumos a nossa
sociedade.
A Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional -
LDB), no artigo 32, inciso II, que trata sobre o Ensino Fundamental, cita que esse
nível de ensino “terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: a
compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das
artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; o desenvolvimento da
capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e
habilidades e a formação de atitudes e valores”. O artigo 35, inciso III, da mesma
Lei, determina que o Ensino Médio terá como uma de suas finalidades “o
aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o
desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico”.
Apesar de polêmicos, principalmente por causa de sua elaboração
vertical, ou seja, com inserção de propostas não discutidas amplamente pelas
bases interessadas, os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentam uma
perspectiva educacional positiva, com a inclusão da ética no processo de formação
do ser humano.
Assim, os Parâmetros Curriculares Nacionais, impulsionados ou
não por emergentes tipos de relações sociais, estabelecem que as capacidades
éticas, entre outras, deverão ser adquiridas pelos alunos no processo de
aprendizagem escolar. Nesse caso, há que ampliar no âmbito da educação formal a
noção de conteúdo para além de conceitos e fatos, incorporando neles valores,
normas, atitudes e procedimentos. Assume o documento do Ministério da
Educação e do Desporto (MEC) que a distinção entre fatos, conceitos, princípios,
procedimentos, valores, normas e atitudes é de fundamental importância para
esclarecer a abrangência do papel institucional da escola na formação do cidadão.
Entretanto, o que acontece é que, na maioria das vezes, os conteúdos não recebem
tratamento adequado para esse fim. “Em geral, o que a escola faz, ao discutir o
currículo, é se propor a atender, na melhor das hipóteses, ao desenvolvimento do
raciocínio lógico do estudante e, com isso, deixa-se de lado a formação moral da
pessoa do estudante” (Bicudo, 1982, p.14).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais propõem os seguintes temas
transversais: ética, meio ambiente e orientação sexual agrupados com o nome
Convívio Social e Ética, que deverão ser trabalhados articuladamente com as
respectivas áreas de conhecimento; por exemplo, trabalhar questões éticas
presentes em conteúdo de ciência (La Taille, 1997). Aparece no documento do
MEC a proposta de instituir “um trabalho pedagógico explícito, específico e
sistemático de análise de valores, de aprendizagem de conceitos e práticas e de
desenvolvimento de atitudes que favoreçam a vida democrática”, reforçando o
papel institucional da escola na discussão de questões éticas.
Ante o exposto, parece necessário que reflexões sejam feitas sobre
o atual desempenho da escola na formação e no desenvolvimento moral dos
alunos, dadas as dificuldades que podem passar pelo caminho de tais propósitos e
atentos ao fato de que não são poucos e simples os problemas da educação
brasileira.
Entre as dificuldades, Vasconcelos (1996) alerta especificamente
para o grande número de diversidade encontrada numa sala de aula, indicando a
existência de “tantos microcosmos quantos forem as pessoas lá presentes”, com
diversificado quadro de valores, expectativas e ansiedades; “cada um com sua
história, sua classe social, tipo físico, sua participação em grupos exclusivos - que
às vezes possuem até linguagem própria”(Vasconcelos, 1996, p. 53).
Para Piaget (1996), se a educação for baseada na autoridade e no
respeito apenas unilateral, apresentará sérios inconvenientes, tanto do ponto de
vista moral, como do ponto de vista intelectual, quando houver imposição de um
sistema de imperativos preestabelecidos e imediatamente categóricos. Ainda
seguindo esse referencial de pensamento, Piaget foi enfático quando disse que
seria “absurdo, e mesmo imoral, querer impor à criança uma disciplina
completamente elaborada e distante de seu estágio de desenvolvimento
psicossocial” (Piaget, 1994, p. 300).
Portanto, é importante que sejam verificadas e analisadas as
questões éticas que vêm sendo conduzidas em situações de ensino formal de sala
de aula.
Na trajetória desta pesquisa, abordamos e colocamos em discussão
algumas possibilidades nas relações éticas em sala de aula, incidindo mais
especificamente em atitudes inerentes aos assuntos ou temas polêmicos do ensino
de ciências e suas respectivas conseqüências ao desenvolvimento moral dos
envolvidos, principalmente estudantes.
Os temas polêmicos do ensino de ciências serviram como pano de
fundo para nossos propósitos. Seguimos, dessa forma, pressupostos de
semelhanças que podem existir no senso comum aos processos científico e
educacional, ou seja, de semelhanças ao espírito ideológico da neutralidade
cientificista que paralelamente também haveria na condução da aula pelo
professor.
De acordo com Chauí (1997), o senso comum social do passado
olhava o cientista como inventor e gênio, agora vê o cientista como engenheiro e
mago. Nas visões anterior e atual, o senso comum vê a ciência desligada do
contexto das condições de sua realização e de suas finalidades, na idéia de que o
único compromisso da ciência é o conhecimento verdadeiro e desinteressado e a
solução correta de nossos problemas. A autora destaca que “a ideologia
cientificista usa essa imagem para consolidar a da neutralidade científica,
dissimulando, com isso, a origem e a finalidade da maioria das pesquisas,
destinadas a controlar a Natureza e a sociedade segundo os interesses dos grupos
que controlam os financiamentos dos laboratórios” (Chauí, 1997, p. 282).
Assim como a ciência e a neutralidade de suas ações ou finalidades
não se justapõem, mas carregam influências que permitem contrariar e dissimular
tal aspecto, podemos também traçar paralelo semelhante no ensino de ciências,
cujo processo final de sala de aula fica nas mãos do professor que, enquanto ser
humano como os cientistas, apresenta formação ideológica configurada por
múltiplos fatores e, portanto, apropriada de valores e preceitos.
Temas ou assuntos controvertidos no ensino de Ciências, como
“Origem da Vida”, “Evolução dos Seres Vivos”, “Aborto”, “Eutanásia”,
“Clonagem”, “Educação Sexual”, entre outros, podem receber diferentes
tratamentos na escola. Influências ou interesses diversos a que o professor esteja
ligado podem alterar, interferir ou até mesmo direcionar uma estruturação
conceitual de vertentes ou valores múltiplos a um ponto de indesejável ou
inverossímil convergência. Essas influências podem ser várias, tangenciando em
maior ou menor grau os aspectos religiosos, científicos, psicológicos, legais,
culturais, políticos etc. e dependentes de atitudes e posturas tomadas nos diversos
momentos de aula.
Discussões sobre ética, incluindo questões de moralidade, parecem
emergir mais facilmente em pontos de controvérsias. Para Puig (1998), o conflito
é um dado da moralidade, a partir do reconhecimento de que supõe
necessariamente enfrentar fatos e acontecimentos que preocupam, inquietam e
questionam: fatos que provocam conflitos entre valores de alguma maneira.
Não há como duvidar da existência dos problemas éticos na
educação. Questões de ética e responsabilidade social inevitavelmente fazem parte
da educação em ciência, “deixando professores expostos constantemente ao
tratamento de valores globais firmemente ligados na cultura e civilização” (Frazer
& Kornhauser, 1986). A LDB e os PCN apenas referendaram uma tendência cada
vez mais presente na educação: trabalhar com os alunos temas sociais dentro da
diversidade cultural que compõe a sociedade brasileira (La Taille, 1997).
Neste ponto, delineava-se o projeto de pesquisa com alguns
questionamentos, por exemplo: Qual a postura do professor, em sala de aula,
frente a assuntos controvertidos? Como os professores trabalhariam diante das
questões éticas inerentes aos seus componentes curriculares? De que forma a ética
permearia as relações entre alunos e professores? Como a educação moral
contemplaria as atuais propostas educacionais?
Diante da abrangência e complexidade do tema, a nossa
preocupação limitou-se a assuntos polêmicos no ensino de biologia. Havendo em
ciências biológicas importantes temas que se apresentavam em concordância aos
nossos propósitos, o assunto “Evolução dos Seres Vivos” foi o escolhido porque é
gerador de polêmicas desde tempos passados até os dias de hoje, principalmente
na área do ensino. Reportamos ao famoso caso Scopes, sobre o drama de um
professor americano, na década de 20, que foi a julgamento por ensinar aos alunos
a teoria da evolução de Darwin. Mais recentemente, acompanhamos novas
discussões (Gould, 1999; Jornal da Ciência, 1999; Lemonick, 1999; Neto, 1999;
Veja, 1999a, 1999b) com a retirada da teoria evolucionista do currículo escolar de
Kansas, pela Suprema Corte Americana.
Assim, o enfoque da pesquisa ficou restrito ao seguinte problema:
“Que atitudes1 estariam configuradas nas representações2 dos professores de
biologia ao ensino de evolucionismo / criacionismo, diante de questões éticas
geradas pelas controvérsias do tema, e quais implicações ao desenvolvimento
moral dos alunos?”
Poderíamos esperar atitudes com representações múltiplas ou
unívocas? No plano didático-pedagógico, as atitudes dos professores estariam
próximas ou distantes da perspectiva ética? Favoráveis ou desfavoráveis ao
desenvolvimento moral dos alunos? Com presença ou ausência de percepções ao
respeito pleno de valores individuais entre os sujeitos envolvidos no processo?
Mais do que respostas a essas perguntas, buscamos a compreensão das atitudes
nas representações, ou seja, os processos subjacentes de sua construção e as
interações histórico-sociais correspondentes; com expectativa de apresentar-se, ao
final, como subsídio a novas práxis no ensino de ciências.
1.1 - A organização do trabalho
Este trabalho apresenta-se organizado com a seguinte estrutura:
O capítulo 1, introdutório, apresenta os nossos objetivos,
1 Atitude entendida como “uma predisposição, relativamente estável e organizada, para reagir sob forma de opiniões ou de atos em presença de objetos, como pessoas, idéias, acontecimentos, coisas etc.” (Bardin, 1977); ou ainda como “uma maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a pessoas, grupos, questões sociais ou a qualquer acontecimento” (Lambert & Lambert, 1966). 2 Representação entendida, segundo o léxico, como uma exposição oral ou escrita daquilo que se pensa.
delimitação e justificativas do problema investigado.
O capítulo 2 destina-se aos subsídios básicos voltados a uma
compreensão global acerca das discussões sobre ética e moral, com situações
teóricas direcionando-se de aspectos gerais até os mais pertinentes à pesquisa
realizada.
O capítulo 3 traz uma abordagem específica sobre o tema utilizado
como pano de fundo aos propósitos da pesquisa, ou seja, nas controvérsias que
envolvem as teorias do criacionismo e evolucionismo.
No capítulo 4 estão inseridas algumas associações, reais ou virtuais,
entre o ensino e as controvérsias das duas teorias, mostrando pontos de referência
ao processo de desenvolvimento moral.
No capítulo 5 a pesquisa realizada é sistematicamente apresentada,
com descrição metodológica, análise e discussão de resultados; tendo em vista os
propósitos de configuração das atitudes dos professores nas controvérsias em aula
e perspectivas ao desenvolvimento moral.
Para completar, tecemos algumas considerações a partir da
configuração das atitudes dos professores entrevistados, evidenciando perspectivas
ao desenvolvimento moral dos alunos e ao próprio ensino de biologia.
2.0 - ÉTICA E MORAL - DOS FUNDAMENTOS ÀS IMPLICAÇÕES AO
TEMA
“Não é possível pensar os seres humanos longe, sequer, da ética, quanto mais fora dela.”
Paulo Freire
2.1 - Conceitos e definições
Os conceitos de ética e moral algumas vezes são tratados como
sinônimos. Chauí (1997, p.340) aponta que “a palavra costume se diz, em grego,
ethos - donde, ética - e, em latim, mores - donde, moral”. Ética e moral estariam
ligadas, assim, ao conjunto de costumes e tradições de uma sociedade. Dessa
forma, são considerados valores e obrigações para a conduta de seus membros.
Entretanto, a autora faz a ressalva de que “a língua grega possui uma outra palavra
que, infelizmente, precisa ser escrita, em português, com as mesmas letras que a
palavra que significa costume: ethos. Em grego, existem duas vogais para
pronunciar e grafar nossa vogal e: uma vogal breve (episilon) e uma vogal longa
(eta). Ethos, escrita com a vogal longa significa costume; porém, escrita com a
vogal breve, significa caráter, índole natural, temperamento”. O segundo sentido
estaria ligado às características individuais determinantes das ações das pessoas,
incluindo os seus vícios e suas virtudes, ou seja, ao senso moral e à consciência
ética individuais.
Ambas as palavras, ética e moral, relacionam-se etimologicamente,
mas diferem no conceito. A ética seria a teoria; a moral, o objeto dessa teoria,
como uma ciência específica e seu objeto de estudo.
Ambas as palavras mantêm assim uma relação que não
tinham propriamente em suas origens etimológicas. Certamente
moral vem do latim mos ou mores, “costume” ou “costumes”,
no sentido de normas ou regras adquiridas por hábito. A moral
se refere, assim, ao comportamento adquirido ou modo de ser
conquistado pelo homem.
Ética vem do grego ethos, que significa analogamente
“modo de ser” ou “caráter”, enquanto forma de vida também
adquirida ou conquistada pelo homem (Vázquez, 1990, p.14).
Portanto, há algumas confusões no entendimento dos conceitos de
ética e de moral, mas “tradicionalmente a ética é entendida como um estudo ou
uma reflexão, científica ou filosófica, e eventualmente até teológica, sobre os
costumes ou sobre as ações humanas” (Valls, 1992, p.7).
Giacóia Jr. (1992) entende que também é tradicional conceber ética
como domínio normativo da filosofia, que recobre o universo do “dever/ser”,
integrado por valores como “bem e mal”, “justo e injusto”, “permitido e defeso”,
“lícito e ilícito”, expresso em normas morais e jurídicas, nas quais se determina e
julga o agir humano. Se a ética trata do “dever/ser” de uma atitude ou conduta
humana, ela não trata e nem pode tratar, segundo Giacóia Jr., da realidade, ou seja,
daquilo que é real; prescreve, portanto, um direcionamento de comportamentos
que permite a interação do ser humano - interação de seres racionais.
Sobre a moral, Palatnik (1992) a descreve como um conjunto de
normas ou regras que regulam as relações dos indivíduos numa comunidade
social; variando historicamente e dependente das diferenças sociais existentes.
2.2 - Desenvolvimento histórico-filosófico das questões éticas -
breve recorte
Nos fundamentos sobre as discussões que perpassam as questões
éticas e/ou morais, reportaremos a origem do sujeito moral, na filosofia. Em sua
abordagem, Valls (1992), cita Sócrates (470 a 399 a.C.) como o “fundador da
moral”, porque ele buscava, através de “um processo de consulta interior”, o
entendimento da justiça sobre as leis exteriores que, na época, regiam os homens.
As indagações de Sócrates aos atenienses sobre os costumes e as disposições de
caráter, que levavam alguém a respeitar ou transgredir os valores, inauguram a
ética, “porque definem o campo no qual valores e obrigações morais podem ser
estabelecidos, ao encontrar seu ponto de partida: a consciência do agente moral”
Chauí, 1997, p.341). Contudo, a discussão do tema parece culminar em Kant,
“que buscava uma ética de validade universal de apoio apenas na igualdade
fundamental entre os homens”(Valls, 1992, p.18). Vincenti (1994), em referência
à discussão do aparecimento da filosofia do sujeito, remete-se à filosofia que
coloca o homem como fundamento de sua existência, distanciando-se do
referencial cogito de Descartes; apesar de “o cogito ser apresentado como a
primeira figura do sujeito”, mas “o cogito é, antes, fundamento de meu saber” e “o
que eu penso cartesiano não é inteiramente sujeito”. Desse modo, Vincenti
entende que “o aparecimento de uma filosofia do sujeito requer que o sujeito seja,
por si só, fundamento; precisaríamos então poder inscrever Deus no próprio
âmago do saber e da razão do sujeito pensante. É por isso que tal aparecimento
não pertence ao século de Descartes, mas ao de Kant, com o surgimento do sujeito
moral” (Vincenti, 1994, p.9).
No retrato filosófico do ser como sujeito integral kantiano, situa-se
o surgimento de uma responsabilidade plena do sujeito, não unicamente diante do
conhecimento, mas também diante do mundo; adiantando ainda que ao definir a
essência humana pela liberdade total do sujeito, Kant eleva a noção de
responsabilidade ao mais alto grau, colocando a natureza humana em nossas mãos
(Vincenti, 1994). Para Kant, a obediência às regras seria o fator determinante à
moral autônoma ou heterônoma. A heteronomia seria a obediência ou aceitação
das regras através de um controle externo ao indivíduo. A autonomia, ao contrário,
seria a obediência ou aceitação das regras através de um princípio de escolha
interna. A autonomia kantiana significa “levar em consideração os fatores
relevantes para decidir agir da melhor forma para todos, não existindo moralidade
quando se considera apenas o próprio ponto de vista” (Menin, 1990, p.148). Nesse
recorte, parece ficar claro que a natureza humana não nos é dada, mas por nós
mesmos construída; o que nos compromete a dar maior importância nas reflexões
éticas sobre as condutas morais nos diferentes campos do conhecimento humano;
e delas depende o que seremos no futuro. Em Kant, os conteúdos da ética não têm
origem do exterior. O que cada um de nós tem, como assinala Valls (1992) na
leitura kantiana, “é a forma do dever, expressando-se em várias formulações do
chamado imperativo categórico”. Chauí (1997) completa o pensamento anterior
quando diz que o dever, ao revelar nossa verdadeira natureza, “é uma forma que
deve valer para toda e qualquer ação moral”; não sendo indicativa, mas imperativa
e expressa no imperativo categórico kantiano. A formulação clássica do
imperativo categórico de Kant é a seguinte: “devo proceder sempre de maneira
que eu possa querer também que a minha máxima se torne uma lei universal”. As
três máximas morais de Kant, que deram origem a essa síntese do imperativo
categórico, são:
1. “Age como se a máxima de tua ação devesse ser erigida por tua
vontade em lei universal da Natureza.”
2. “Age de tal maneira que trates a humanidade, tanto na tua
pessoa como na pessoa de outrem, sempre como um fim e nunca com um meio”.
3. “Age como se a máxima de tua ação devesse servir de lei
universal para todos os seres racionais”.
Kant não passou incólume às críticas. Uma delas é “a de que não
se pode ignorar a história, as tradições éticas de um povo etc., sem cair numa ética
totalmente abstrata”, como parece ser a ética kantiana. Contudo, “um mérito
definitivo do pensamento kantiano é ter colocado a consciência moral do
indivíduo no centro de toda a preocupação moral” (Valls, 1992, p.21). Contudo, se
Kant posicionou a liberdade no campo da abstração, Hegel imputava o ideal ético
na vida livre dentro de um Estado livre, com preservação de direitos e cobrança
de deveres, cuja “consciência moral e as leis do direito não estivessem nem
separados e nem em contradição”(Valls, 1992). No século XX, apesar de posições
diversas entre os pensadores da existência, o ideal ético centrou-se na liberdade,
privilegiando o aspecto personalista da ética. Enquanto isso, o pensamento social e
dialético buscou o ideal ético na significação de uma vida social mais justa, com
superação de injustiças econômicas mais gritantes. Assim, a primeira preocupação
da ética recairia sobre as relações sociais mais concretas, no intuito de apressar a
construção de um mundo justo.
2.3 - Componentes éticos - princípios e procedimentos
Em discussões complexas sobre ética, diferentes correntes
filosóficas, ao longo do tempo, dirigem-se às expressões bem, bom, aquilo que é
certo etc., como o conjunto de princípios que conferem um caráter moral ao
homem.
Na área educacional brasileira, os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) oficializam que “a questão central das preocupações éticas é a
da justiça compreendida pelos valores de igualdade e eqüidade. A proposta é que
a ética seja expressa nos princípios de respeito mútuo, justiça, diálogo e
solidariedade”. Fundamentados por esses princípios dentro do convívio escolar,
os Parâmetros Curriculares Nacionais pressupõem que “o aluno pode aprender a
resolver conflitos em situações de diálogo, pode aprender a ser solidário ao ajudar
e ao ser ajudado desinteressadamente, pode aprender a ser democrático quando
tem oportunidade de dizer o que pensa, submeter suas idéias ao juízo dos demais e
saber ouvir as idéias dos outros”. Não cabe nessas relações pedagógicas, portanto,
qualquer ato de violência que possa interceptar o desenvolvimento moral do
aluno. Violência aqui entendida como conceitua Chauí (1997, p.337), ou seja,
“qualquer força física ou coação psíquica que obrigue o indivíduo a fazer algo
contrário a si, aos seus interesses e desejos, à sua consciência”. Nesse caso, a
violência daria um tratamento de objeto ao aluno, mas somos pessoas e não
podemos ser tratados como coisas. A ética acaba sendo normativa, com a
finalidade de controle aos riscos desse propósito e “os valores éticos se oferecem,
portanto, como expressão e garantia de nossa condição de sujeitos, proibindo
moralmente o que nos transformem em coisa usada e manipulada por outros
(Chauí, 1997, p.337).”
O sujeito ético descrito por Chauí deve preencher os seguintes
requisitos:
* ser consciente de si e dos outros numa mesma proporção desse
reconhecimento, tanto de si quanto dos outros;
* ser dotado de vontade e de capacidade para decidir entre as várias
alternativas colocadas na sua frente:
* ser responsável e se sentir responsável nos efeitos e
conseqüências de sua ação;
* ser livre, ou seja, não estar submetido a poderes externos que o
subjuguem ou que o constranjam nas suas escolhas.
Chauí (1997, p.338) considera três os elementos constituintes do
campo ético: o sujeito; os valores morais ou virtudes éticas; e os meios para as
ações dos sujeitos.
O sujeito pode ser passivo ou ativo. Passivo é “aquele que se deixa
governar e arrastar por seus impulsos, inclinações e paixões, pelas circunstâncias,
pela boa ou má sorte, pela opinião alheia, pelo medo dos outros, pela vontade de
um outro, não exercendo a sua própria consciência, vontade, liberdade e
responsabilidade”. O sujeito ativo ou virtuoso é “aquele que controla
interiormente seus impulsos, suas inclinações, suas paixões, discute consigo
mesmo e com os outros o sentido dos valores e dos fins estabelecidos, indaga se
devem e como devem ser respeitados ou transgredidos por outros valores e fins
superiores aos existentes, avalia sua capacidade para dar a si mesmo as regras de
conduta, consulta sua razão e sua vontade antes de agir, tem consideração pelos
outros sem subordinar-se nem submeter-se cegamente a eles, responde pelo que
faz, julga suas próprias intenções e recusa a violência contra si e contra os outros”.
Do ponto de vista dos valores morais ou virtudes éticas, estes
elementos seriam dependentes do tempo e da história, por serem expressos e
definidos pelas culturas e sociedades, que definiriam para si mesmas o que
julgariam ser o bom. Os meios teriam a exigência de levar a fins éticos.
2.3.1 - O ato moral
Caracteriza-se por uma série de fatores, ou como afirma Vázquez
(1990, p.65) “o ato moral é uma totalidade ou unidade indissolúvel de diversos
aspectos ou elementos”. Implica em motivos, fins, meios e conseqüências
objetivas. Finalmente, não é certo dizer que existe moralidade em todos os atos
humanos, pois o ato moral supõe um sujeito real e dotado de consciência, capaz de
agir de acordo com as normas estabelecidas. Portanto, ao ato moral não cabem
ações impulsionadas somente pelos instintos; e como ato consciente e voluntário,
supõe-se uma participação livre do sujeito em sua realização.
2.4 - Ética nas diferentes áreas de conhecimento
Discussões que envolvem questões de ética e moral estão inseridas
nas mais diferentes áreas do conhecimento humano. Tende a compartimentar-se,
talvez, na busca de códigos morais mais restritos que transpassam os vários
aspectos correspondentes a cada área ou técnica. Valls (1992, p.8) afirma que,
“didaticamente, costuma-se separar os problemas teóricos da ética em dois
campos: no primeiro, abrangendo os problemas gerais e fundamentais (como
liberdade, consciência, bem, valor, lei e outros); e no segundo, os problemas
específicos, de aplicação concreta, como os problemas de ética profissional, de
ética política, de ética sexual, de ética matrimonial etc.”. Palatnik (1992, p.7)
aponta alguns termos que expressam a idéia de relação ética com áreas do
conhecimento: “o estudo dos códigos morais inerentes à tecnologia é função da
tecno-ética”, enquanto que “a situação dos problemas morais da pesquisa e da
práxis médica é analisada pela iatro-ética” e “a investigação em engenharia
genética ou biologia molecular é estabelecida pela bioética”.
Nos últimos anos, verificaram-se discussões éticas específicas em
diferentes áreas do conhecimento humano.
Na área sócio-econômica contemporânea, Chauí (1995, p.83)
apontou para alguns novos problemas que foram colocados perante a ética, com
introdução do neoliberalismo e novas ideologias do pós-modernismo, que
renunciam conceitos de liberdade, justiça, felicidade etc., remodelando a práxis
ética.
Na área das ciências biológicas, debates envolvendo ética surgiram
e foram veiculados pela mídia a partir do nascimento da ovelha Dolly, em julho de
1996, o primeiro mamífero obtido por meio de técnicas de clonagem. Ainda foram
verificados outros questionamentos éticos nesse meio científico, só para citar mais
um exemplo, nos estudos sobre a possível origem genética do homossexualismo
(Montes et al., 1997).
Na área médica, diversos temas convergiram para questões de ética,
como: compra e venda de órgãos humanos, patenteamento do genoma humano,
aluguel de útero, experiências de fármacos em humanos, erros médicos etc.
A área do direito apresentou muitos debates não menos
expressivos, com a participação de vários setores da sociedade, em assuntos como:
legalização do aborto, união entre pessoas do mesmo sexo, eutanásia e pena de
morte.
Os dilemas da breve exposição anterior, e muitos outros não
mencionados, envolvendo aspectos sociais, políticos, econômicos, científicos,
religiosos ou legais, convergem para as salas de aula, ampliando a importância da
área educacional nas questões éticas. No ensino de ciências, essa amplitude não é
menor, quando se trabalha com problemas que implicam ao mesmo tempo
dimensões da ética na ciência e na pedagogia.
2.5 - Ética na ciência
No decorrer dos últimos séculos, a ciência tornou-se instrumento
extremamente poderoso nas criticas às ideologias. Isso graças aos seus muitos
conhecimentos pontuais que, quando expostos, puseram em questão os abusos de
saber dos muitos discursos éticos, religiosos, políticos etc. Foi dessa forma que a
ciência obteve o reconhecimento de sua capacidade de luta contra muitos
obscurantismos. Hegenberg (1969) apresenta a ciência como uma “ortodoxia
dominante”, devido aos seus êxitos nas interpretações das coisas do mundo, que
até apagaram um pouco as contribuições da filosofia, da arte e da religião.
Relutante ou não, o homem coloca a ciência como “dado basilar” do mundo
contemporâneo, estando esse prestígio ligado aos fatores materiais que ela
proporcionou. Mas, apesar desse poder, de acordo com Fourez (1995), a ciência
ainda é incapaz de apresentar uma verdade global e universal em substituição aos
discursos ideológicos, ou ainda, “se conclua no futuro que o mundo só se
interpreta pelo amor e que a religião e a filosofia são pelo menos tão importantes
para o homem quanto a ciência” (Hegenberg, 1969, p.10).
Cercada de amplas discussões, desde seus conhecimentos básicos a
sua utilidade, a ciência tem seus próprios princípios éticos (Fullick & Ratcliffe,
1996). Esses princípios apresentam os valores como sendo cruciais para a
condução apropriada da ciência. Um provável consenso desses valores, descritos
pelos autores, são:
- ser correto em todas as operações, incluindo cálculo, observação e
relato;
- ser intelectualmente honesto, por exemplo, apegar-se aos fatos,
refutando os exageros e não fazer cópia do trabalho dos outros;
- ser de mente aberta, por exemplo, disposto a olhar e a considerar
novos fatos e teorias;
- não realizar julgamentos precipitados;
- ser auto-crítico e encorajar outros cientistas a também criticar os
seus trabalhos.
Assis (1992) é categórico ao afirmar que “de vez em quando, a
ciência sai dos trilhos”, mas que isso não a invalida. No entanto, é necessária a
identificação de dois tipos básicos de ciência: a bem comportada, rigorosa e afeita
a uma ética férrea, da qual deriva todo seu prestígio e uma outra ciência dos
fraudadores, da falta intencional de rigor. Para este autor, “a ciência é igual a
tantas outras atividades, cujas leis valem mais no papel que na prática e que a
corporação científica é, como tantas outras, ciosa de ostentar elevados princípios
que não pode cumprir”. A afirmação reportou-se aos quatro princípios
institucionais da ciência, elaborados pelo sociólogo americano Robert Merton, em
1942, que são: universalismo, comunismo, desinteresse e ceticismo organizado.
Universalismo, indicando que não deve haver no meio da comunidade científica
qualquer distinção ou preconceito, por exemplo, contra cientistas ou instituições
de menor prestígio; comunismo, no sentido de divulgação de todos os achados;
desinteresse, significando a busca do conhecimento sem motivos extracientíficos;
e ceticismo organizado, como prática de convalidar os resultados repetidas vezes.
A crítica do autor está no fato de que “ninguém pode provar que uma fidelidade
absoluta a tais imperativos criaria uma ciência melhor que a atual”. Além disso,
“os quatro imperativos só poderiam funcionar em situação ideal” e dentro de uma
comunidade homogênea. A sua tese aponta para uma conciliação intermediária, ou
seja, ao mesmo tempo que deve seguir os imperativos mertonianos, o cientista
“não pode ser estritamente universalista, comunista, desinteressado e cético, sob o
risco da paralisação de sua atividade”. “Nenhum desses compromissos, dessas
acomodações, nega que exista uma ética científica” (Assis, 1992, p.3).
Examinando as relações entre o comportamento moral e outras
formas fundamentais do comportamento humano, Vázquez (1990), ao referir-se ao
conteúdo moral da atividade do cientista, ou seja, à responsabilidade que ele
assume no exercício de sua atividade e nas conseqüências sociais da mesma,
entende que
no primeiro caso, o cientista deve apresentar uma série de
qualidades morais cuja posse garanta uma melhor realização
do objetivo fundamental que norteia a sua atividade, a saber: a
procura da verdade. Entre estas qualidades morais,
características de qualquer verdadeiro homem de ciência,
figuram sobretudo a honestidade intelectual, o desinteresse
pessoal, a decisão na defesa da verdade e na crítica da
falsidade etc. (Vázquez, 1990, p.88).
De acordo com Hossne (1997, p.6), “a ciência não é ética ou aética,
seu uso é que poderá ser”. Nesse caso, a ciência não poderia parar de produzir
novos conhecimentos somente pelo pretexto de evitar conflitos éticos. No entanto,
a busca de novos conhecimentos, através da ciência, deve ser acompanhada de
reflexões sobre os valores envolvidos, através da ética; explorando, segundo
Hossne, a dupla angústia do ser humano: da indagação e da reflexão crítica.
2.6 - Ética no ensino - das relações pedagógicas ao
desenvolvimento moral e cidadania
Não há referências que tragam, reduzidas numa única área de
estudo, todas as relações entre ensino e ética, ou seja, não é encontrada nos
campos da ética uma área consolidada e com identidade própria que trate de modo
específico a educação ou o ensino.
As discussões éticas aparecem dispersas na área educacional. Obras
de Kant (1980), Fitche (1984) e Piaget (1994, 1997), por exemplo, já traziam
discussões sobre ética nos processos de ensino e de aprendizagem.
Em época mais recente, diferentes trabalhos (Bicudo, 1982; Fourez,
1985; Puig, 1998; Busquets et al., 1998) trazem discussões sobre ética, que
incidem direta ou indiretamente na educação e, conseqüentemente, com reflexos
no ensino de ciências.
A escola é um lugar privilegiado para pensar e discutir os princípios
éticos de liberdade e responsabilidade, norteadores do bem-estar social. “A escola
deve ser um abridor de horizontes, deve ser a janela que se abre para a sociedade
onde vai atuar o estudante”(Meister, 1996, p.8). A discussão sobre ética deveria
partir de qualquer ponto, de qualquer componente curricular, privilegiando a
atuação do professor. Diante disso, o papel do professor iria além da decodificação
social ou interpretação de fatos, pois o professor “tem enorme responsabilidade na
formação do indivíduo e, em muitos casos, na sua forma de agir e também de ser”
(Meister, 1996, p.9). Em tal estado, a educação deveria ser solidária, com
professores pautando na mutualidade a postura docente.
Foi a partir da constatação de que a escola pode ter um papel
institucional de grande influência na transformação social que, em muitos países,
inclusive no Brasil, diversos grupos politicamente organizados - governamentais e
não-governamentais - reuniram-se para a preparação de projetos com vistas a uma
profunda modificação nos currículos escolares, a fim de possibilitar pelos meios
educativos as transformações sociais desejadas.
Araújo (1998) entende que até o momento o país que mais se
aprofundou nessa proposta foi a Espanha. A reestruturação do ensino espanhol
iniciou-se em 1989, com a inclusão dos assim chamados temas transversais,
sistematizados em um conjunto de conteúdos considerados fundamentais para
tentar, naquele país, diminuir a distância existente entre o desenvolvimento
tecnológico e o da cidadania. Os temas transversais da proposta espanhola foram
agrupados em: Educação Ambiental, Educação para a Saúde e Sexual, Educação
para a Paz, Educação para a Igualdade de Oportunidade, Educação do
Consumidor, Educação Multicultural, além de Educação Moral e Cívica, já
anteriormente presente nos currículos.
No Brasil, a partir de 1995, com a elaboração dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, o Ministério da Educação tomou os mesmos rumos da
proposta espanhola, mas com uma inovação: no conjunto dos temas transversais,
foi inserida a ética na proposta pedagógica formal das escolas. A proposta desse
documento é que “a ética - expressa nos princípios de respeito mútuo, justiça,
diálogo e solidariedade - seja objeto de reflexão sobre a atuação do homem e que a
escola trilhe o compasso entre o que diz e o que ela faz”. Juntamente com os
demais temas, os objetivos do MEC, segundo Araújo (1998, p.10), seriam “o
resgate da dignidade da pessoa humana, a participação ativa na sociedade e a co-
responsabilidade pela vida social”.
Dentro desses pressupostos, abriu-se um novo delineamento, ou
pelo menos uma nova preocupação, no campo do ensino e da aprendizagem de
ciência, na razão direta também das novas perspectivas dadas à sua matéria-prima,
ou seja, da própria ciência inserida no contexto da sociedade atual.
Nesse contexto, torna-se importante a desmistificação do
relacionamento da ciência com a verdade, pois nem tudo o que a ciência diz pode
estar certo e ser científico não é segurança de verdade (Freire-Maia, 1997).
Moreno (1998) afirma que a ciência, deixando “a ilusão de possuir verdades
absolutas”, passou a aceitar mais as dúvidas e as incertezas “como componentes
primordiais do pensamento científico”, abrindo, com isso, os limites de seu objeto.
Com essa nova postura, a própria ciência clássica não estaria preparada para “dar
conta de toda a realidade” a ela, agora, subjacente. Aceitando essa proposição,
Thom apud Woodock & Davis (1989), criador da Teoria das catástrofes, diz que
“em grande medida, a decisão daquilo que se considera cientificamente
interessante é, evidentemente, em grande parte arbitrária”. Quanto ao ensino de
ciências, face aos problemas detectados, Moreno (1998, p.23) destaca que tal
processo formal [de ensino] “não pode ficar alheio a essa nova forma de conceber
a ciência”. Segundo esse autor, “as mudanças a serem feitas na escola devem
seguir o mesmo sentido desta nova idéia de ciência, ou ela correrá o risco de
preparar os estudantes para um futuro inexistente, proporcionando-lhes uma
formação intelectual que não está de acordo com as necessidades da sociedade na
qual terão de viver”. Com isso, muito do espírito de uma ciência com a visão
arcaica, cujas batalhas no campo intelectual impunham a razão do mais forte,
chegando à eliminação física do adversário, ainda perdura na ciência atual e no
seu ensino nas escolas. Isso aparece claramente “quando o conhecimento é
utilizado como forma de submissão, quando se obriga o aluno a aceitar como ato
de fé aquilo que não entende, habituando-o a substituir a razão pela
crença”(Moreno, 1998, p.33).
A partir dessa discussão, deve ficar claro ao leitor a existência de
dois tipos de ciência, segundo Freire-Maia (1997b): a ciência-disciplina, que se
ensina nas escolas e a ciência-processo. Sobre as duas, o autor utiliza-se da citação
de Claude Bernard, fundador da fisiologia, quando diz que “o professor de
faculdade vê a ciência no seu passado. Ela é, para ele, como se fosse perfeita no
presente, e ele a vulgariza ao expor dogmaticamente o seu estado atual”. Então, a
ciência-disciplina olha para trás, enquanto a ciência-processo olha para frente. Na
ciência-disciplina, “o professor joga verdades em cima dos estudantes - e quanto
mais atrasado é o estudante, mais verdades recebe, e quanto mais adiantado,
menos verdades recebe. Seja como for, ele recebe muitas verdade como se fossem
verdadeiras” (Freire-Maia, 1997b, p. 54). Enfim, a imparcialidade passa longe da
ciência-processo e, conseqüentemente, da ciência-disciplina. Para Hegenberg
(1969, p.8) há uma “ciência-possuída” e uma “ciência-em-progresso”. A primeira
reuniria os resultados que integram o nosso modo de enxergar o mundo, com
dados insuspeitos e acima das críticas, ou seja, totalmente fidedignos. A segunda,
por outro lado, estaria “cheia de dados discutíveis, incertos e provisórios”.
A ciência, apesar de muito associada à verdade, não poderia buscá-
la de forma integral, pois a verdade apresenta dimensões diversas e depende dos
contextos sócio-culturais nos quais estaria inserida. Além disso, as teorias
científicas para serem aceitas resvalam nos fatores não-científicos, como a política
e a religião.
Além desses aspectos, somam-se outros nas relações pedagógicas,
como os diferentes tipos de preconceitos existentes. Sastre & Fernández (1998,
p.147) apontam para a existência de diferentes tipos de preconceitos ou
discriminações numa escola, muitas vezes falseadas ou omitidas por discursos
ideológicos que mascaram a realidade, pois “todos gostam de imaginar que, pelo
menos na escola, as crianças recebem um tratamento eqüitativo, e, a partir do
poderoso universo de desejos, esta fantasia é projetada sobre a realidade”. No
entanto, os desejos e utopias, ainda que distantes da realidade, “podem atuar como
faróis que iluminam o objetivo ao qual se quer chegar, apontando, ao mesmo
tempo, o rumo pelo qual convém navegar”(Sastre & Fernández, p.148). Todavia,
os desejos não transformados em ações sutilmente podem encobrir os múltiplos
preconceitos e valores existentes no mundo real.
Parece haver na Espanha uma preocupação maior nesse tipo de
problema; preocupação que também podemos absorver para o cotidiano
educacional brasileiro. Houve um desinteresse grande na Espanha, durante muito
tempo, em se detectar a presença de agentes educativos discriminadores;
associado a uma constância de um discurso que negava a existência desses fatores
intervenientes. A escassez de análises realizadas sobre este enunciado teórico e a
repetida e explícita sujeição teórica a uma ética baseada na igualdade de
oportunidades, segundo consta em Sastre & Fernández (1998), abriram o caminho
para uma interpretação errada da realidade, pois as bases sociopedagógicas não
teriam sido suficientemente estudadas. A igualdade difundida seria fantasiosa,
evitando-se ver fatos que repugnavam e que se desejariam profundamente
erradicar da escola. As autoras referiam-se mais especificamente aos problemas de
preconceito de gênero presente nas escolas espanholas, ou seja, a supervalorização
da concepção androcêntrica da sociedade espanhola, que por ser tão óbvia, não foi
analisada e nem questionada durante muito tempo. O exemplo, no entanto, pode
servir como ponto de reflexão e abstrações ao que também ocorre em outros tipos
de discriminação, preconceito ou outras influências de valores negativos e
contrários aos novos objetivos delineados para o processo educacional.
De forma consciente ou inconsciente, a omissão (ou ocultação) de
determinados fatores na educação, como no caso espanhol, pode trazer enormes
prejuízos aos objetivos mais voltados à consolidação de cidadania. No aspecto que
envolve os fatores “igualdade” e “desigualdade” na escola, em defesa da
transformação social, Saviani (1989, p.87) é enfático ao afirmar que o processo
educativo deve pressupor uma passagem da desigualdade à igualdade. Utilizando-
se de recursos da dialética e exemplos de pedagogias que apenas reproduzem o
status quo da sociedade e, por isso, não se ajustariam à transformação desejada, o
autor compreende que “assim como a afirmação das condições de igualdade como
uma realidade no ponto de partida torna inútil o processo educativo, também a
negação dessas condições como uma possibilidade no ponto de partida, inviabiliza
o trabalho pedagógico. Portanto, quando não se admite que a desigualdade inicial
existe e que pode ser convertida em igualdade através da educação, aniquilam-se
de imediato as ações pedagógicas voltadas à transformação social e,
conseqüentemente, à consolidação de verdadeira cidadania em ambiência
democrática.
A partir dos problemas arrolados, observa-se que há realmente
necessidade de mudanças para uma perspectiva de que os conteúdos tradicionais
do ensino “deixem de ser encarados como fim” e sejam vistos como “meio” para a
construção de uma sociedade mais justa. Assim, “esses conteúdos tradicionais só
farão sentido para a sociedade se estiverem integrados em um projeto educacional
que almeje o estabelecimento de relações interpessoais, sociais e éticas de respeito
às outras pessoas, à diversidade e ao meio ambiente”(Araújo, 1998, p.15).
Vasconcelos(1996) entende necessária a transformação da relação
social na sala de aula, sendo a participação coletiva o principal instrumento de
construção de individualidade, com respeito mútuo e relacionamento não
intermediado por preconceitos ou verdades acabadas.
Fourez (1995) aponta o professor como agente humano que na sala
de aula precisará decidir e que a sua decisão pode modificar a própria existência
dos outros e do mundo. Segundo Bicudo (1982), essa decisão não é algo que
ocorre sem sofrimento, pois exige a escolha numa situação repleta de
ambigüidades e dilemas, com diferentes respostas possíveis.
As nossas ações refletirão, portanto, as conseqüências dessas
decisões. Para Fourez (1995, p.271) , “o caráter de uma ação consiste no fato que
ela determina o futuro de maneira irreversível: o mundo será aquilo que os nossos
atos fizerem, com as nossas ações moldando o futuro [...], aí se situa a dimensão
ética incontornável de nossa ação”.
Transferindo tais pressupostos para as especificidades do ensino de
ciências, Lewis (1986) entende que o professor desse componente curricular deve
ter um esforço consciente e deliberado para ser imparcial o tanto quanto possível,
sendo educacionalmente desejável para os dois lados de qualquer argumento, num
tema evidenciado pela polêmica de extremismos, que aos alunos sejam permitidos
“fazer a mente deles próprios” à luz das evidências abordadas em classe.
Em pesquisa com enfoque centrado na problemática das
contradições e coexistência entre ciência e religião no ensino, Jorge (1995, p.6)
observou que também houve cobranças de alunos do magistério para uma atuação
de neutralidade da escola frente a idéias divergentes, no qual caberia ao professor
“abordar concepções diferentes sem se posicionar, permitindo aos alunos uma
escolha isenta de interferências”.
Contudo, tais argumentos de neutralidade não devem recair ao
simples significado de supressão ao posicionamento do professor perante um fato
polêmico, mas, sobretudo, devem recair às atitudes no tratamento desse fato, pois
de forma consciente ou inconsciente a opção pela neutralidade já seria uma
posição tomada.
Como se vê, implícita ou explicitamente, a educação moral coloca-
se presente, seja em componente curricular próprio ou inserida de maneira
dispersa nos outros componentes. Conforme o ponto de vista de Piaget (1994), a
educação para a moral não deve ficar restrita a uma disciplina específica, mas
marcar presença em todo o cotidiano escolar. Para Bicudo (1982, p.102), “a
educação moral deve se constituir num ponto de convergência das atividades
curriculares”, mas isso não descartaria a possibilidade de existir também como
disciplina isolada. Tendo como núcleo convergente de todo o processo educativo
o homem moralmente educado, o currículo proposto apresentaria o modelo da
figura3 a seguir:
FIGURA 1 - Modelo de currículo proposto por Bicudo (1982).
Educar moralmente significaria, portanto, abrir de todo a realidade,
a fim de subsidiar o conhecimento integral dos seus valores e ideologias. A
3 O modelo proposto é de 1982 e, segundo comunicação da autora, necessitaria de atualização nos componentes curriculares; não implicando mudanças na sua estrutura final. Como exemplo cita a possibilidade de inclusão da informática e alteração do componente matemática para ciências exatas.
educação moral com essa abordagem possibilitaria a percepção dos valores
individuais, do outro, do grupo, da comunidade e de como eles são gerados, além
da representatividade desses valores nos vínculos entre o individual e o social.
Esse processo permitiria ainda a distinção dos valores autênticos daqueles que são
impostos, ou seja, diferenciar os valores originados de experiências da pessoa, de
sua necessidade, daqueles originados por imposição ou manipulados por várias
instituições sociais, inclusive a escola (Bicudo, 1982).
Kohlberg (1992, 1999b) sugere que na educação moral sejam
apresentados dilemas conflituosos do cotidiano que despertem a atenção e
participação dos alunos, levando-os à alteração de suas estruturas cognitivas e
morais para níveis mais avançados. A educação é portadora desse poder, dado
que, direta ou indiretamente, os professores educam moralmente as crianças
(Shimizu, 1998), cabendo a eles dirigir esse processo na sala de aula, guiando-se
por parâmetros de coletividade, não sendo omissos, mas ativos e atentos às
diferenças de seus alunos, atento aos preconceitos, aos estereótipos que são fatores
de marginalização, frutos da ideologia dominante (Vier, 1996).
A teoria de Kohlberg (1982, 1999a) considera três níveis
hierárquicos de desenvolvimento moral, cada qual com dois estágios. No nível
Pré-Convencional estão as noções simples de bem e mal, certo e errado. No
estágio 1 deste nível, as ações são qualificadas como boas ou más, dependendo do
que tais ações vão acarretar para as pessoa. Respeita-se a uma autoridade, que
seria
inquestionável. No estágio 2 do Nível Pré-Convencional, as ações ditas corretas
satisfazem as necessidades próprias ou talvez as de outros. O segundo nível é o
Convencional, que consiste na moral voltada para manter a ordem convencionada
pela sociedade. O estágio 3, que faz parte deste nível, o moralmente bom liga-se à
aprovação dos outros. O estágio 4 é caracterizado pela manutenção das normas.
Respeitam-se as regras e às autoridades. O terceiro e último nível é Pós-
Convencional, caracterizado por distinguir valores e princípios válidos
independentemente da autoridade. No estágio 5, as leis não são mais válidas
apenas por que são leis, entrando o consenso e a consciência de relatividade entre
os valores e as regras. No último estágio, é moralmente correto seguir princípios
fundamentados em critérios universais de justiça.
Puig (1998), após discussão crítica e abrangente das principais
teorias que dão tratamento às questões éticas relacionadas com a moral, também
apresenta uma proposta de intervenção educativa de contribuição para o
desenvolvimento moral dos alunos.
Considerando os paradigmas da educação moral como
“socialização” (teoria de Durkheim), “clarificação de valores” (segundo Raths,
Harmin e Simon), “desenvolvimento” (baseada em Piaget e Kohlberg) e
“formação de hábitos virtuosos” (segundo Peters), Puig projeta a partir da
filosofia, da psicologia e da pedagogia “um modo de ver a educação moral
entendida como construção da personalidade”, mediante os quais os sujeitos
enfrentam as experiências da problematicidade moral e dos meios pelos quais os
educadores, formais e informais, ajudam os alunos a construir suas
personalidades.
A construção de uma educação moral nos moldes de Puig
fundamenta-se na formação de uma realidade humana complexa que ele denomina
personalidade moral, implicando o trabalho simultâneo “de formação da
consciência moral autônoma, no desenvolvimento de suas capacidades ou
procedimentos de reflexão e ação, e finalmente na aquisição dos elementos
substantivos que constituem a identidade moral de cada indivíduo”(p.149).
Para Bicudo (1982), as diferentes ideologias não podem ser
ignoradas na perspectiva da educação moral, mas discutidas e sempre desveladas.
Fundamentada em tais propósitos, a educação moral deve possibilitar no educando
a percepção dos diferentes tipos de valores, individuais ou coletivos, tornando
possível que ele entenda como os valores são gerados e como esses valores
chegam até ele. E para que o processo educativo enfatize os aspectos de totalidade
do ser humano, incluindo seu relacionamento e maneira de expressar-se diante do
mundo, a educação para a moral deve seguir seus próprios princípios norteadores,
que se sustentariam em princípios gerais de Justiça e Benevolência. De acordo
com Bicudo (1982, p.34):
Parece que Justiça e Benevolência podem ser assumidos
como suficientemente amplos para nortear a Educação
Moral. Eles possibilitam que se trabalhe tanto com
raciocínios necessários ao julgamento ético que envolvem
as noções de consistência, de universalidade, de
igualdade, de reciprocidade, como os sentimentos que
desencadeiam a percepção do outro como semelhante, a
qual se constitui no germe para a apreensão do
significado de Justiça.
Reportando-se aos princípios ou procedimentos da Educação
Moral, fica totalmente descartada a busca da moral através de punições ou
recompensas. Fato que pesa contra a pedagogia tradicional do ensino, por
caracterizar-se nas relações de autoridade absoluta, cujos mestres transmitem
conhecimentos prontos e inquestionáveis. Assim como também pesa contra a
pedagogia da Escola Nova, nas propostas de igualdade já como ponto de partida
nos seus projetos pedagógicos.
Toda essa discussão, no entanto, nos leva a pensar na formação
inicial dos professores. Todo processo educativo dependerá do desempenho do
professor, com este assumindo e se conscientizando de suas responsabilidades.
O atual momento da construção humano-social indica a
necessidade de processos formativos interativos e
reflexivos nos quais os professores assumem certo grau de
autonomia e apresentam um patamar de compreensão da
sua função profissional. A consciência profissional do
professor é a sua percepção do saber, saber fazer e saber-
ser-docente. A construção da profissionalidade docente é
um processo dialético em que as intencionalidades, com
desdobramento individual e coletivo, se inscrevem no
projeto ético-político da construção da humanidade
(Machado, 1999, p.122).
Envolve, portanto, a capacidade do professor “antever com uma
certa clareza a diferença entre o ponto de partida e o ponto de chegada sem o que
não será possível implementar os procedimentos necessários para se transformar a
possibilidade em realidade” (Saviani, 1989, p.87). Em termos morais, de
comprometimento à transformação social, e não apenas reprodução, isso pode
significar muito mais do que simplesmente “respeito aos alunos”, “tratamento em
igualdade” ou “benevolência” nas atitudes dos professores.
Diante da missão a ser desempenhada pelo professor, justificava-se
a preocupação de Piaget (1996) com a formação intelectual e moral do corpo
docente, na qual a preparação universitária “é sobretudo necessária para a
formação psicológica satisfatória, e isso para os futuros mestres tanto do nível
secundário quanto do primário” .
2.6.1 - Um perfil ético procedimental para o ensino de ciências
Um proposta de perfil ético, a partir de procedimentos práticos para
enfrentar os problemas morais, poderia fundamentar-se na característica funcional
da consciência moral defendida por Puig (1996), que considera o juízo moral, a
compreensão e a auto-regulação os instrumentos ou ferramentas para o
enfrentamento de aspectos controvertidos da realidade pessoal e social. Sobre
essas três ferramentas da consciência moral, o autor diz que “devemos entendê-las
como modos de refletir e atuar que permitem abordar as situações morais
problemáticas mediante a busca do correto, a sensibilidade ao contexto e a
orientação condutual adequada”.
Em resumo, temos:
- Juízo moral: entendido como faculdade que permite a formação
de opiniões racionais sobre o que deve ser. É prescritivo, pois “proporciona uma
opinião do correto e do que deveríamos realizar”. É um instrumento utilizado no
enfrentamento de situações difíceis, em controvérsias de difícil solução por causa
da presença de mais de um valor desejável.
- Compreensão: entendido como reflexão moral no auxílio ao juízo
e na contextualização da situação. A compreensão incide no reconhecimento das
particularidades de cada situação concreta a partir da razão, da consciência, do
sentimento de eqüidade, do espírito de conciliação, da benevolência e do amor.
- Auto-regulação: “tem a ver mais com o esforço que cada sujeito
realiza para dirigir por si mesmo sua própria conduta”, ou seja, um esforço de
autodireção. Requer auto-avaliação, auto-observação e predisposição para
autodeterminar-se.
No entanto, qualquer perfil proposto, que possa subsidiar de
maneira mais precisa os respectivos aspectos éticos do ensino de ciências,
incluindo as polêmicas entre evolucionismo e criacionismo, não elimina as críticas
e limitações dessa “ética procedimental”, que recaem principalmente no âmbito de
sua subjetividade por não ser capaz de abranger todos os aspectos possíveis da
personalidade moral do sujeito e nem o integralismo dos espaços sociais ocupados
por ele.
3.0 - EVOLUCIONISMO VERSUS CRIACIONISMO NAS DISCUSSÕES
SOBRE ÉTICA
“Não há nada de surpreendente que, a cada dia, novos dilemas éticos surjam. Grave seria o oposto, o que seria uma negação da liberdade e da análise crítica, com perda de significado dos valores humanos.”
William Saad Hossne
3.1 - Abrangências científica e religiosa
A confrontação entre evolucionismo e criacionismo gera
controvérsias e muitos debates. Mesmo no interior das duas teorias as
divergências ocorrem. Na teoria criacionista, há grupos dissidentes que defendem
idéias diferentes ou exclusivas. Como exemplos podemos citar o criacionismo
cosmológico, o criacionismo antropológico (Champlin & Bentes, 1991) e o
criacionismo progressista (Fernandes, 1999). Na teoria evolucionista, as
discrepâncias internas giram em torno de vários pontos. “Exatos 139 anos depois
da publicação de On the Origin of Species, o darwinismo sobrevive também como
polêmica, e das bravas. Não mais com adversários da seleção natural, [...] mas
entre os seus adeptos” (Leite, 1998, p.5). Divergências internas do evolucionismo
aparecem nos aspectos do ultradarwinismo social, da seleção natural, das micro e
mega evoluções, entre outros (Lima, 1993). Tais divergências separam os
evolucionistas em grupos denominados ultradarwinistas, gradualistas,
adaptacionistas, contingencialistas, catastrofistas, neutralistas e antideterministas
(Leite, 1998; Tuffani, 1998; Lima, 1993).
Entre os pesquisadores polêmicos no interior da teoria
evolucionista, podemos citar os ultradarwinistas Richard Dawkins (A escalada do
monte improvável e O gene egoísta) e Edward Wilson (Consiliência), o darwinista
Daniel Dennett (A perigosa idéia de Darwin - a evolução e os significados da
vida), os antidarwinistas não-criacionistas Michael Behe (A caixa preta de Darwin
- o desafio da bioquímica à teoria da evolução) e Michael Denton (Evolution: a
theory in crisis). Para Leite (1998), não é simples descrever o que os opõe, mas os
campos de cada um, apesar de todos defenderem a evolução, não são de forma
alguma convergentes.
No entanto, as maiores divergências acerca do tema ocorrem
mesmo entre ciência e religião. Os confrontos entre assuntos que permeiam áreas
bem distintas, como ciência e religião, segundo Freire-Maia (1997a, p.173), não
deveriam existir, mas quando ocorrem é porque há “uma espúria deturpação de
domínios por parte de pessoas incapazes de reconhecer os verdadeiros limites de
suas respectivas áreas”. Portanto, seriam confrontos originados por pessoas que,
de um lado ou de outro, passariam além de seus domínios de conhecimento,
extrapolando do que sabem para opinar. A religião não seria competente para
analisar os aspectos científicos do mundo e vice-versa. Para Freire-Maia (1997b,
p. 175), “uma religião não deve tomar posição nem a favor de teses
cientificamente corroboradas e muito menos adotar pontos de vista
anticientíficos”, cabendo somente aos seus adeptos, “estes sim”, aceitar aquilo que
desejarem e “sob sua responsabilidade pessoal”. No entanto, não faltam na
literatura exemplos a respeito desse embate de idéias nas controvérsias geradas
pelo tema, envolvendo ciência e religião, partindo de leigos ou de pesquisadores.
Na leitura cotidiana podemos, sem detença, encontrar amplas discussões que
trazem, de partida, manchetes convidativas ao debate, como no exemplo seguinte:
“Livros lançados no Brasil e no exterior reacendem discussão sobre as idéias
formuladas por Charles Darwin há 139 anos e fazem da teoria evolucionista tema
de um dos principais debates deste fim de século” (Folha de São Paulo, 1998).
Aparecem separadamente nos dois itens seguintes deste trabalho,
cada qual sob sua própria perspectiva, outros exemplos de contraposições geradas
pelas teorias criacionista e evolucionista, no campo científico ou não, e que
resultam possibilidades de alcance em sala de aula.
3.1.1- Na perspectiva do criacionismo
Em publicações diversas, editadas e divulgadas por algumas
igrejas, em alguns casos também mantenedoras de sistemas de ensino, não são
raras as citações pró-ciacionistas, como do exemplo a seguir:
Somos criacionistas. Isto é, cremos que os céus e a terra e tudo
o que neles há foram criados por Deus. [...] Esta posição
choca-se com a teoria científica atéia que diz haver sido o
universo originado de uma grande explosão espacial. Enquanto
a Bíblia nos mostra um surgimento ordenado do planeta, [...] a
equívoca ciência nos mostra um caos, que se ajeita aqui, se
esfria ali [...]. Sobretudo, não explicam a origem da vida e,
quando tentam fazê-lo, o fazem de forma ridícula. Para
entenderem a origem do homem, vão procurar indícios em
vestígios deixados no subsolo e, com a ajuda da Arqueologia e
da Antropologia, julgam encontrar aqui e acolá peças
“ossadas” de “símios evoluídos” para tendências “humanas”.
Só vale o que lhes passa pela óptica do microscópio. Propomo-
lhes, tão somente que, se querem ver “o princípio”, que
troquem de instrumento. Deixem de lado o laboratório [...] e
voltem humildemente para a Revelação bíblica (Igreja Batista,
Boletim Informativo, 1999, p.1).
Afora o material religioso, em diferentes áreas do meio científico
também são encontrados defensores do criacionismo e, conseqüentemente,
opositores da teoria evolucionista.
Thomas (1984), professor da Universidade Cristã de Abilene, no
Texas, E. U. A., é veemente nas críticas que faz contra o evolucionismo, ao dizer
que a evolução não é realmente um fato comprovado, não é uma lei científica
demonstrada, mas apenas uma interpretação de determinados fatos e, portanto, não
passa de uma crença por parte dos que a sustentam.
David H. Rhys, mestre em Educação pela Universidade Andrews e
doutor em Ciências da Terra pela Universidade da Califórnia, e Lloyd J. Gibson,
doutor em Biologia pela Universidade de Loma, Califórnia, são cientistas
criacionistas. Suas teses tentam dar sustentação ao criacionismo e,
conseqüentemente, derrubar a teoria evolucionista.
Ao apontar sobre as evidências que se opõem ao evolucionismo,
Gibson (1990) destaca duas:
A primeira delas é o fato de que na Natureza as espécies não
ocorrem numa série contínua com diferenças graduais de uma
para outra. Em vez disso, as espécies podem ser colocadas em
grupos distintos de organismos. As espécies de um grupo são
bastante diferentes das espécies de outro grupo. Se o
evolucionismo fosse correto, deveria ser encontrada uma série
contínua, o que não ocorre nem com os seres vivos nem com os
fósseis. A segunda evidência é o fato de que as espécies parecem
ser muito estáveis. Fazendo experiências com organismos em
laboratórios, os cientistas têm produzido muitas variedades,
mas dentro da mesma espécie. As moscas-de-frutas têm passado
por experiências de muitas gerações, mas ninguém jamais
produziu qualquer outra coisa além de moscas-de-frutas. Há
muitas raças diferentes de cães, mas ninguém jamais conseguiu
transformá-los em algo que não fosse um cão (Gibson, 1990,
p.46).
Diante dos vários estudos e observações realizados na sua área
científica, Rhys (1990) critica os evolucionistas, pois estes, segundo ele, já
deveriam reconsiderar e admitir que a vida surgiu de matéria inorgânica.
Para o evolucionismo é muito duro observar que não há vida
em nenhum planeta fora da Terra, pois a teoria supõe que com
a mesma possibilidade com que a vida começou aqui, deveria,
com elementos similares, ter-se iniciado em Marte. Mas nada
foi encontrado (Rhys, 1990, p.46).
Elaine Kennedy, doutora em Geologia pela Universidade de
Phillips, nos Estados Unidos também é uma cientista criacionista. Antes, porém,
segundo seus próprios relatos, dizia-se evolucionista teísta. A mudança de posição
ocorreu após estudos sobre dinossauros e a tese de que eles foram extintos a partir
de um dilúvio universal.
Como geóloga, quando vejo depósitos [de fósseis de
dinossauros] distribuídos pelo mundo inteiro associados com a
presença de água, já começo a associá-los com a ação de um
dilúvio universal (Kennedy, 1999, p.25).
As teses de Kennedy são evidências de sustentação ao
criacionismo, pois essa teoria acredita que a maioria dos fósseis foi formada
durante o dilúvio e transportada pelas águas para locais diferentes do original;
contrariando teses dos evolucionistas, que defendem a fossilização dos
dinossauros nos próprios locais onde eles viveram.
Segundo Fernandes (1999), Duane Gish, Ph.D em Bioquímica, é
um respeitado acadêmico criacionista que defende vários pontos de vista dessa
teoria, entre os quais o de que a evolução nunca aconteceu. Questionado sobre
uma de suas teses, de que o evolucionismo estaria em decadência, Gish justificou:
Os evolucionistas jamais foram capazes de encontrar a evidência científica que
Darwin afirmou que eles acabariam encontrando. Charles Darwin previu que
seriam encontradas muitas formas de transição no registro fóssil, mas os
vestígios descobertos até hoje não lograram comprovar estas formas de
transição. [...] Há uma grande variedade de criaturas invertebradas complexas
cujos restos aparecem subitamente no registro fóssil, aí incluídos moluscos,
caracóis, esponjas, águas-vivas, trilobitas e muitos outros invertebrados. Muitos
bilhões de fósseis destas criaturas têm sido encontrados, mas nunca ninguém
encontrou um único exemplo de ancestral fossilizado de qualquer um desses
seres. Os evolucionistas crêem que um destes invertebrados evoluiu para os
peixes, ou que teria ocorrido ao longo de 100 milhões de anos. Se isso é verdade,
nós teríamos de ter uma multidão de formas de transição mostrando que uma
dessas criaturas invertebradas de fato evoluiu para os peixes. Nenhuma jamais
foi encontrada. Essa evidência, por si só, já é suficiente para nos mostrar que a
evolução nunca ocorreu neste planeta (apud Fernandes, 1999, p.3).
3.1.2- Na perspectiva do evolucionismo
“Desde logo devemos ter presente ao espírito que a grande maioria
dos biólogos aceita como demonstrado o fato de que os organismos evoluíram”,
diz Stebbins (1974, p.5). Para grande parte da comunidade científica, apesar de
“divergências quanto a detalhes do processo” (Lima, 1993, p.9), não há muito o
que questionar na concordância da evolução biológica “como fato largamente
comprovado, uma realidade e não uma hipótese”; sendo o evolucionismo
considerado “conceito central na unificação da biologia” (Bizzo, 1988, p.32;
Futuyma, 1993, p.16; Lima, 1993, p.8; São Paulo/SE/CENP, 1992, p.22).
Da mesma forma que os criacionistas criticam os evolucionistas,
estes também o fazem àqueles. As críticas são diversas, mas acabam centradas na
ausência de argumentação científica da teoria criacionista. “Os oponentes atuais
da evolução, quase sem exceção, sustentam suas posições não com base em
argumentação lógica, mas em emoções e crenças religiosas”, diz Futuyma (1993,
p.16). Para a ciência, a teoria não se sustenta com uma simples interpretação
literal dos primeiros capítulos do livro bíblico Gênese, às vezes, apenas revestido
de linguagem da biologia, mas carente de lógica científica.
A distribuição geográfica das religiões no mundo fez centralizar
nos Estados Unidos, por causa da predominância do protestantismo, os maiores
oponentes da evolução biológica. No Brasil, a minoria protestante faz com que o
criacionismo não tenha relevância.
Na abordagem que faz sobre as diferentes controvérsias que ainda
persistem no campo da evolução biológica dos seres vivos, Lima (1993, p.27)
aponta que, diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos da América, “a
influência dos criacionistas no Brasil é praticamente nenhuma”. Aponta que os
católicos têm uma posição mais aberta a respeito da evolução. Baseia-se em
pesquisa do jornal Folha de São Paulo, realizada em 1987, revelando que 17%
dos católicos entrevistados acreditam no evolucionismo, em contraste com 3% dos
protestantes.
3.2 - A filosofia da ciência nas discussões sobre evolução dos
seres vivos
A filosofia da ciência, no “trabalho de reflexão, de ver um
conhecimento não do primeiro grau, mas do segundo, um conhecimento do
conhecimento, um saber do saber” (Huismann & Vergez, 1967), encontra no
processo biológico evolutivo alguns pontos de reflexão.
No seu estudo, Chauí especifica que:
a finalidade da evolução é a preservação da espécie. Surge,
então, a pergunta: O que leva a vida à finalidade evolutiva?
Essa pergunta é difícil de ser respondida, porque a idéia de
evolução se refere às espécies (não aos indivíduos) e pressupõe
a noção de hereditariedade[...]. Com a idéia de evolução das
espécies e hereditariedade[...], surgem novas indagações:
- se a evolução não é do indivíduo e sim da espécie, porém, se
são os indivíduos que são levados a se transformar para se
adaptar, o que é uma espécie?
- se a espécie evolui, mas se o faz transmitindo as estruturas
hereditárias, o que podem ser as leis da hereditariedade, já que
uma espécie pode mudar?
- se há leis da hereditariedade e se há mutações das espécies,
como se relacionam a finalidade hereditariedade e a finalidade
evolutiva?
- se o organismo vivo é, como dizem a bioquímica e a genética
contemporâneas, uma máquina que se constrói a si mesma e dá
a si mesma sua finalidade, o que significa a idéia de adaptação
ao meio, central na teoria da evolução? (Chauí, 1997, p.270).
A autora ressalta, entretanto, que tais questões não excluem o
caráter científico da biologia. Pelo contrário, indicam que esta não é um conjunto
de verdades acabadas e absolutas, mas um processo de conhecimento como
qualquer outra área das ciências.
Freire-Maia (1997a, p.113 - 116) apresenta uma série de
argumentos, fundamentados na filosofia da ciência, no sentido de explicar ou
posicionar sua visão perante as questões envolvendo controvérsias da evolução
biológica. Afirma que dentro do grande paradigma relacionado ao tema da
evolução dos seres vivos surgiram várias teorias, permanecendo atualmente
aquelas que foram testadas e confirmadas. Aquelas que não confirmaram a
expectativa, foram postas de lado, como ocorreu no século XVIII, através de
Lineu, quando surgiu a primeira grande anomalia do paradigma fixista. A segunda
anomalia foi revelada na paleontologia, com Georges Cuvier e seus discípulos, na
metade do século XIX, quando hipóteses ad hoc foram elaboradas para tentar
salvar o fixismo. Uma dessas hipóteses dizia que não teria havido uma única
criação, mas várias e sucessivas com o fim de substituir os seres vivos anteriores,
destruídos por descomunais catástrofes.
Sustentando-se no conceito popperiano de falseabilidade, o
fixismo, base das explicações criacionistas, caberia perfeitamente como teoria
científica. O fato de atualmente ser falseada, não retiraria dela a qualidade
científica. Isto porque, no passado, tal teoria representava um paradigma que
harmonizava a origem e a história dos seres vivos com a interpretação da Bíblia.
Atualmente, porém, “só um doido e/ou ignorante e/ou totalmente cego pela
interpretação fundamentalista da Bíblia pode ser antievolucionista”(Freire-Maia,
1997a, p.116).
A preocupação da área filosófica com a teoria evolucionista,
tangenciando o campo ético, também mostrou-se firmada em Jacques Maritain, na
obra “Filosofia moral - exame histórico e crítico dos grandes sistemas”.
Analisando e criticando os impactos dos, então, novos desafios surgidos no
decorrer do século XIX, “e de que se aproveitou primeiramente a mais vulgar
metafísica ou antimetafísica materialista”, Maritain apresentou a teoria da
evolução dos seres vivos como um dos três grandes choques intelectuais que
abalaram a confiança do homem em si mesmo.
O primeiro grande choque foi produzido pelo darwinismo,
com a teoria da origem animal do homem. Um choque dessa
espécie poderia ter um duplo resultado: um resultado ruinoso
para a vida moral, - e que desumaniza o homem, - se julgamos
que este é apenas um símio evoluído: chegamos então à ética
materialista da luta pela vida.
O mesmo choque, porém, pode ter um resultado salutar se
compreendermos as coisas de outro modo, - se compreendermos
que a matéria de que é feito o homem é uma matéria animal,
mas informada por uma alma espiritual, - de tal maneira que
existe uma continuidade biológica no sentido das ciências
naturais, entre o universo do animal e o universo do homem,
mas ao mesmo tempo uma irredutível descontinuidade
metafísica. O conceito científico da evolução pode, então, por
natureza, conduzir-nos a uma apreciação mais justa das
vicissitudes e dos progressos da história humana, e a uma ética
mais consciente das raízes materiais do animal racional, das
profundezas do dinamismo do elemento irracional nele
existente, mas também das mais profundas profundidades do
dinamismo do espírito que nele realiza sua grandeza (Maritain,
1973, p.430).
Em sua crítica, quando disse que “a mais vulgar metafísica ou
antimetafísica materialista” se aproveitou da teoria do evolucionismo, Maritain
apontava os exageros de determinadas idéias que, aproveitando a âncora da
evolução darwiniana, se prestariam de instrumentos, por exemplo, para conquista
ou confirmação de poder dos mais fortes perante os mais fracos. Fato que, aliás,
ainda pode ser observado atualmente em diferentes áreas de humanidades, como
na política que se respalda no Darwinismo para legitimar suas ações.
... [os postulados evolução das espécies e galileana da inércia],
desde que foram formuladas, oferecem ao pensamento um modo
tão satisfatório de representar os objetos e dotadas de um grau
tão elevado de simplicidade e de generalidade que, - em virtude
de seu eminente valor prático, - quase se impõem como se
fossem princípios por si mesmos evidentes.
Resta saber que a idéia da evolução só se impõe assim ao
espírito como idéia puramente histórica, ou na medida em que
significa que as espécies do mundo biológico provêm, de fato,
de formas mais primitivas e estão submetidas a um processo de
desenvolvimento e de diversificação no tempo. Como explicar
essa história? É tarefa que pertence às hipótese científicas,
nenhuma das quais até agora se mostrou plenamente
satisfatória. É o caso, particularmente, da hipótese darwinista, -
hoje ainda muito em voga, mas filosoficamente insustentável, -
segundo a qual, toda mudança fortuita, toda seleção natural e
toda sobrevivência do mais apto, bastam para explicar a
história e a formação do mundo dos organismos.
No entanto, para os vulgarizadores e para a opinião
corrente, a evolução como idéia histórica não se distingue da
evolução como teoria científica. E essa última se aproveita,
ilegitimamente, da autoridade que aquela exerce
espontaneamente sobre o espírito. Além disso, mal é formulada
uma teoria científica, o mundo intelectual logo se apodera, para
se beneficiar, extrapolando-a (Maritain, 1973, p.432).
Com posse desses argumentos, o filósofo cita algumas influências
do darwinismo, como por exemplo: “nas zonas da inteligência moderna”; “na
evolução da moralidade”(campo ético) e; na conquista ou manutenção do poder, a
partir da seleção natural. Ao abordar tais influências advindas dos estudos de
Darwin, Maritain ainda aproveita seus argumentos parta tecer duras críticas a
Nietzsche:
Só fiz alusão a essas perspectivas éticas excessivamente pobres,
- subprodutos do darwinismo dos quais o próprio Darwin não é
responsável, - porque forneceram a um Nietzsche uma base, ou
antes, um ambiente e uma figuração pseudocientífica, à qual
pôde ele recorrer para apelar (embora, na realidade, por muitos
outros motivos) para a vontade de poder como sendo a
autêntica moral dos senhores (Maritain, 1973, p.433).
4.0 - EVOLUCIONISMO VERSUS CRIACIONISMO NO ENSINO -
ATITUDES POSSÍVEIS E REAIS
“Se se respeita a natureza do ser humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando. Divinizar ou diabolizar a tecnologia ou a ciência é uma forma altamente negativa e perigosa de pensar errado. De testemunhar aos alunos, às vezes com ares de quem possui a verdade, um rotundo desacerto.”
Paulo Freire
Não são poucos os casos nos quais as controvérsias entre
evolucionismo e criacionismo fizeram penetrar suas discussões no âmbito
educacional formal, em interferências ou decisões - até com amparos legais -
sobre aquilo que os professores poderiam ou não “ensinar” e aquilo que os alunos
poderiam ou não “aprender” sobre o tema em questão.
Um dos primeiros e também mais famosos episódios ocorreu em
1925, no Tennesse, Estados Unidos, onde o professor John Scopes foi condenado
por ensinar a teoria da evolução. Desde 1920 havia se tornado ilegal o ensino
dessa teoria nas escolas americanas. Em 1960, a insólita história do professor
Scopes foi transformada em filme, originalmente chamado Inherit the Wind4.
4 O filme foi dirigido por David Greene e contou com a presença de atores como Spencer Tracy, Gene Kelly e Dick York. No Brasil, o nome do filme recebeu a tradução de “Herdeiros do Vento”.
Foi na década de 60 que professores e cientistas reviram o conteúdo
de biologia dos currículos escolares, reformulando-o com a elaboração de novos
textos e livros que incluíam a evolução.
Entretanto, as discussões judiciais ou extrajudiciais entre
criacionistas e evolucionistas não cessaram, continuaram ainda mais freqüentes da
década de 70 até os dias atuais. Lima (1993, p.26) cita o exemplo de um dos livros
didáticos de biologia mais vendidos nos Estados Unidos que tinha, em 1973, após
a reformulação curricular, 18.000 palavras relacionadas com a teoria da evolução.
Em 1981, esse número caiu para 13.000 por causa de pressões do órgão
responsável pela seleção e distribuição dos livros didáticos nas escolas públicas
americanas.
Nos anos 80 e 90 o ensino das teorias evolucionista e criacionista
passou muitas vezes por julgamentos nos tribunais americanos. O mais recente
episódio ocorreu em agosto de 1999, no qual o Conselho de Educação do Estado
de Kansas5 decidiu novamente pela retirada da teoria de Darwin do currículo
escolar, com a ressalva de que ela poderá ser mencionada nas escolas que
desejarem, mas por força de lei permanecerá fora das provas ou exames finais.
A repercussão no Brasil foi rápida, em destaque nos principais
jornais e revistas do cotidiano. O mesmo aconteceu em áreas da ciência e
educação. O Jornal da Ciência, publicado pela SBPC, por exemplo, reproduziu as
seguintes críticas que a Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos6 fez
5 Kansas Board of Education. 6 National Science Foundation.
ao Conselho de Educação de Kansas:
A Direção Nacional de Ciência7 considera com tristeza e
profunda preocupação a recente decisão do Conselho de
Educação de Kansas de retirar o tema da evolução como
questão de estudo e exame do currículo estadual de ciência.
Embora a decisão permita que as escolas continuem a
ensinar a evolução nas aulas de ciências, o ensino e
aprendizagem ficam prejudicados.
A evolução é processo bem documentado, e o rico debate
científico sobre sua exata natureza segue contribuindo para a
nossa base de conhecimentos.
Mas, a biologia, como toda a ciência, não existe isolada. A
decisão de Kansas retira um elemento-chave do corpo de
conhecimentos científicos que os escolares precisam aprender e,
assim, afeta a qualidade da educação que eles devem receber.
Numa hora de já profunda preocupação com relação à
qualidade do ensino de matemática e ciências nas escolas de
nosso país, a decisão de Kansas é um retrocesso em matéria de
responsabilidade.
Da direção escolar, eleita ou designada, espera-se que atue
7 A Direção Nacional de Ciência (National Science Board) preside a Fundação Nacional de Ciência, sendo órgão consultivo da Presidência e do Congresso dos Estados Unidos.
em benefício não apenas do melhor interesse da comunidade,
mas também do interesse nacional. As crianças dos EUA
deverão um dia pensar, votar e participar dos debates da
economia global e da comunidade local, muitos deles baseados
nas ciências da vida.
O estudo das tensões entre a observação, a explicação, a
teoria e o fato vai prepará-las para serem cidadãos efetivos e
dotados de conhecimentos.
Pais, educadores e formuladores de políticas devem olhar
com consternação os graves cortes realizados no currículo
escolar de Kansas.
A decisão pode ser local, mas, se não for enfrentada,
acabará afetando a qualidade de vida do país por muitos anos.
(Jornal da Ciência, 1999).
No Brasil, a influência criacionista no ensino mostra-se menor, mas
não é desprezível e parece ganhar cada vez mais espaço, principalmente na
disseminação de suas idéias através da mídia. Fato que pode indicar, no passar dos
anos, aumento nos debates também em nosso país. Não esqueçamos ainda que
determinadas igrejas com crenças criacionistas são mantenedoras de escolas e
editoras de livros didáticos, o que também ocorre com igrejas de crenças
evolucionistas.
O problema, a partir desse ponto de discussão, não está somente
centrado nas controvérsias científico-religiosas do embate entre evolução ou
criação dos seres vivos; mas, emanadas dessas controvérsias, o problema se
expande em perspectivas de omissão ou favorecimento nas atitudes ou posturas de
sala de aula, com possibilidades de criar sofrimentos, angústias ou
constrangimentos, mesmo que não exteriorizados, nos indivíduos participantes do
processo educacional.
Do ponto de vista pedagógico, é plenamente aceitável a proposta
de Vincenti (1994), na qual “nenhuma verdade pode ser aceita ou admitida, ela
deve ser construída e reconhecida”. Para condução a ações morais efetivamente
livres a educação formal não pode trilhar por caminhos que aniquilam a vontade
de escolha dos alunos. Age-se em toda essa polêmica como se os estudantes não
tivessem nenhum valor moral. Como assinala Puig (1998), a escola deve ter como
objetivo o estímulo que possa levar os alunos “à compreensão de quais são
realmente os seus valores, para se sentirem responsáveis e comprometidos com os
mesmos”; evitando-se, portanto, todo e qualquer tipo de “doutrinação ou
inculcação”.
4.1 - Simulação analógica de atitudes
Constatada certa preferência dos professores no ensino de
conteúdos que eles têm maior afinidade ou domínio (Razera, 1996, p.66),
suponhamos, dois professores de Biologia, de religiões diferentes, diante da teoria
evolucionista. Perante os dois, muitos alunos na iminência de ouvir os discursos
de ambos; alunos que trazem diferentes crenças sobre o assunto. Que tratamento
dariam ao tema? Que tratamento deveriam dar? As sugestões da proposta
curricular oficial são acolhidas?
O primeiro professor, no campo da suposição, discorreria o tema
dentro da visão evolucionista, cuja teoria é aceita no dogma da Igreja Católica.
Poderia, nas suas aulas, utilizar o seguinte pronunciamento do papa João Paulo II:
Na sua Encíclica Humani generis (1950), o meu predecessor
Pio XII já afirmara que não havia oposições entre a evolução e
a doutrina da fé sobre a sua vocação, com a condição de que
não perdessem de vista alguns pontos firmes. [...]A Encíclica
Humani generis considerava a doutrina do “evolucionismo”
como uma hipótese séria (Paulo II, 1996).
Poderia, ainda, utilizar este outro pronunciamento, no qual o papa
João Paulo II demonstra outra perspectiva em favor da teoria da evolução e da
própria Ciência:
Hoje, após meio século da publicação da Encíclica, novos
conhecimentos levam a reconhecer na teoria da evolução mais
do que uma hipótese. É com efeito notável que esta teoria se
tenha de maneira progressiva imposto ao espírito do
pesquisador, depois de uma série de descobertas feitas nas
diversas disciplinas do saber. [...]As ciências da observação
descrevem e medem, de modo cada vez mais preciso, as
múltiplas manifestações da vida e inscrevem-nas na linha do
tempo (Paulo II, 1996).
Por outro lado, o segundo professor discorreria o assunto sob a
óptica do Criacionismo, ao qual acredita sua religião; nada impedindo dele
utilizar-se de uma linha de pensamento claramente descrita no livro “A vida - qual
sua origem? A evolução ou a Criação?”, cuja pregação choca-se de frente com a
linha evolucionista:
Como vimos, a teoria da evolução é oposta à realidade, sim, é
efetivamente uma mentira. Trocar os fatos sobre Deus da
Criação por tal mentira é, segundo Romanos 1:20, inescusável,
em vista da evidência. [...]Não fique surpreso de a teoria da
evolução gozar de tão ampla divulgação nos tempos modernos,
apesar da evidência contrária. A real mensagem desta crença é
que Deus não existe, que ele é desnecessário. [...]Precisamos
encarar o fato de que a teoria da evolução serve ao propósito de
Satanás. [...]Assim, crer na evolução significaria promover os
interesses dele e ficar cego diante dos maravilhosos propósitos
do Criador. [...]Deveríamos sentir a mais forte indignação
diante da doutrina da evolução e de seu originador, uma vez
que a intenção é privar-nos da vida eterna (Watch Tower Bible
and Tract Society, 1985).
A oposição de idéias ou “verdades”, aqui descritas no campo
hipotético, constituem possibilidades no ensino de biologia que não se restringem
apenas a esse tema sob a óptica dos enfoques religioso, curricular e filosófico, mas
difunde-se na possibilidade de muitos outros, constituindo-se, portanto, em
representações diferentes a um mesmo objeto e que incidem em relações sociais
de processo de múltiplas características.
4.2 - A proposta curricular do Estado de São Paulo
Ao trazermos à tona o embate científico externo - entre
criacionismo e evolucionismo -, o embate científico interno - entre os
ultradarwinistas e seus críticos -, juntamente com os diferentes enfoques
filosóficos e pedagógicos para dentro do ensino atual de biologia, nos deparamos
com o firme posicionamento da Proposta Curricular de Biologia para a Rede
Pública do Estado de São Paulo.
A Proposta Curricular para o Ensino de Biologia - 2º grau (São
Paulo, SE/CENP, 1992) apresenta a “Evolução como linha unificadora dos
conteúdos” num dos princípios norteadores do ensino dessa ciência, e sem
qualquer pejo às oposições ou controvérsias. Baseando-se em conhecimentos
definidos cientificamente, justifica-se:
A Teoria da Evolução, segundo Ernst Mayr, é muito justamente
considerada a maior teoria unificadora em Biologia. A
diversidade dos organismos, as semelhanças e diferenças entre
tipos de organismos, os padrões de distribuição e de
comportamento, adaptação e interação, tudo isso era caótico
antes que recebesse sentido, dado pela Teoria da Evolução. Não
há campo, na Biologia, em que essa teoria não tenha servido
como princípio ordenador. Usar o enfoque evolutivo como
princípio metodológico pode ser especialmente útil no estudo
dos padrões de organização dos seres vivos, pois a filogenia é a
base de qualquer sistema moderno de classificação (p.22).
Posiciona-se, portanto, na visão anteriormente exposta, a uma
decisão ética cujo discurso ideológico deveríamos examinar precisamente para,
nesse debate sobre ética, tomarmos consciência daquilo que queremos e daquilo
que o currículo acaba representando no processo, nas evidências de seus
elementos constituintes. Isso exige reflexão permanente sobre os currículos
escolares que temos.
Antes de tudo, “é preciso conhecer e estudar o contexto do
currículo, pois ele é composto pelo ambiente circunstante, onde a escola atua,
pelos seus componentes sócio-econômicos e antropológico-culturais, pelos modos
de existir da comunidade escolar e pelos seus valores” (Pires et al., 1992, p.35).
Além disso, a exigência torna-se maior no que se refere ao lado não
muito explícito dos currículos, ou seja, naquilo que é manifestado nas relações
educativas e sociais, nas modalidades de decisões, na disponibilidade para
solicitações culturais, nas normas e valores implicitamente transmitidos pela
escola etc. O que acaba trazendo, segundo Pires et al. (1992, p.36), as expectativas
dos professores diante dos alunos e, portanto, a percepção e o conhecimento daí
decorrentes, variáveis úteis na elaboração do currículo explícito.
4.3 - Evolucionismo versus criacionismo - inerências ético-
pedagógicas ao desenvolvimento moral
Recentemente o criacionismo ressurgiu nos Estados Unidos e em
outros lugares, não como um fenômeno científico, mas como uma questão social,
parte de uma ideologia reacionária mais ampla que constitui uma ameaça real à
integridade e qualidade do ensino público (Futuyma, 1993, p.16).
Thomas (1984) demonstra em sua tese que o ensino exclusivo da
evolução dos seres vivos, por professores que assim o fazem, pode ser fator de
risco à perda de fé religiosa. Em trecho de sua obra, cita:
Mais grave, no entanto, é o destino dos milhares que
abandonaram por completo a sua fé por esse motivo, ou que
estão em risco de fazê-lo. Entre este último grupo figuram os
milhares de estudantes de nível universitário, ou até mesmo
secundário, que não têm condições para enfrentar o desafio
intelectual dos professores como um fato científico (Thomas,
1984, p.140).
Bizzo (1988), ao discutir a introdução da linha evolucionista como
um dos princípios norteadores do ensino de biologia, afirma que “o debate entre o
criacionismo e o evolucionismo não tem mais sentido hoje em dia”, justificando
que no contexto atual, diferente de épocas passadas, por exemplo, “a igreja
católica e a maioria das igrejas seculares convivem pacificamente com a idéia de
evolução”.
Stebbins (1974) expõe a presença de dois conceitos unificadores da
biologia moderna. Um deles é o conceito de organização, o outro é o da
continuidade da vida através da hereditariedade e da evolução. Referindo-se ao
conceito de organização, Stebbins diz que “de acordo com esse conceito, as
propriedades da vida dependem apenas em pequeno grau das substâncias de que a
matéria viva é composta, e isto em qualquer nível, desde a molécula, através dos
orgânulos supramoleculares, da célula, do tecido, do organismo, do indivíduo, até
às populações ou à sociedade. Os seres vivos devem na natureza em grau muito
maior à maneira pela qual os componentes se organizam em padrões ordenados,
bem mais permanentes do que as próprias substâncias”.
A proximidade da teoria evolucionista com a ciência poderia entrar
na discussão direta do problema, a partir de questões não menos complexas
envolvendo, por exemplo, as relações entre ciência e poder político. Mas o que se
poderia questionar, nesse momento, é a tomada de uma decisão oficial, no seio de
uma proposta curricular, prejudicial à escolha autônoma do aluno. Não podemos,
na discussão das questões éticas e do desenvolvimento moral dos estudantes,
colocar somente a ciência dentro da sala de aula, mesmo em aulas de ciências.
Ainda que ela esteja mais próxima da verdade, ao aluno caberia a decisão de sua
escolha dentre todas possibilidades. Nesse caso, estamos de acordo com
McInerney (1986, p.179) quando diz que “os estudantes têm o direito de expor sua
opinião em cada assunto, inclusive científico, e a educação para a ciência tem a
obrigação de oferecer essa exposição”. Nas opiniões, implicitamente
encontraremos expostos os valores de cada um.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais sustentam que “o
desenvolvimento de atitudes pressupõe conhecer diferentes valores, poder apreciá-
los criticamente e eleger livremente um sistema de valores para si (PCN).” Se a
discussão é sobre ética, ou seja, sobre a conduta de ação perante o outro, de
respeito à autonomia intelectual e multiplicidade de valores, vislumbramos
paradoxos entre os objetivos e ações estabelecidos nos diferentes documentos
oficiais do nosso ensino. Ao mesmo tempo que um solicita o tratamento ético no
ensino, o outro estabelece uma proposta única e aparentemente desvinculada da
polêmica que ela gera.
Puig (1998) reconhece que “a moralidade supõe necessariamente
enfrentar fatos e acontecimentos que preocupam, inquietam e questionam: fatos
que provocam conflitos entre valores”. Esses conflitos podem nascer de
“necessidades, interesses e pontos de vista diferentes”, refletindo “um desencontro
de valores”. O desencontro de valores, ocorrendo em sala de aula, preocupa
quando pode não ser percebido ou de ser dirigido de tal maneira a desconsiderar
e, por isso, interferir no desenvolvimento moral autônomo do aluno.
Sobre os fundamentos de uma decisão ética, Fourez (1995) nos
coloca à frente duas vertentes: a ética idealista e a ética decorrente do ponto de
vista histórico. O autor chama de ética idealista “quando se supõe que a moral
decorre de uma série de idéias eternas, que se tornam uma norma para a ação”. E
essa moral seria formada pelas idéias básicas dadas pelo exterior: por Deus, pela
Natureza, pela Razão, pela Ciência. A ética histórica seria aquela construída em
torno de conceitos flutuantes, ou seja de conceitos historicamente determinados.
Ou seja, o que é ético hoje pode não ter sido ontem, ou vice-versa. O debate ético
nasceria da necessidade, ou de um despertar individual ou de consenso social, que
segundo Fourez, carregaria sempre os interesse ligados às lutas ideológicas. Dessa
forma, uma decisão ética idealista estaria ligada à natureza das coisas, ou a valores
eternos (como Deus, por exemplo), enquanto que uma decisão ética sob o ponto
de vista histórico giraria em torno das ações assumidas em uma ou em outra
direção para a configuração do futuro almejado. Essa escolha, portanto,
influenciaria a própria história do mundo, fazendo-nos responsáveis pelo que ele
será no futuro. Exemplo desses dois tipos de decisões foram dados por Fourez. A
um professor foi solicitado que abandonasse o ensino público para se consagrar ao
ensino profissionalizante. De maneira idealista ele perguntaria a si “qual é a boa
decisão a ser tomada?” Nesse caso, o debate ético consistiria em procurar a boa
decisão. Contudo, do ponto de vista histórico, não existe resposta a ser encontrada.
A sua decisão de opção por uma ou por outra escola já designa ações que
moldarão o mundo futuro. A questão ética a ser enunciada, segundo Fourez, seria:
“Diante da história e do mal que existe nela, o que eu quero (ou nós queremos)
fazer?” Essa proposição nos remete novamente ao imperativo kantiano: “Pergunta
a ti mesmo se poderás considerar a ação que tendes em vista como um objeto
possível de teu querer caso esse objeto possa fazer parte, segundo as leis da
Natureza, de um mundo do qual tu mesmo serias parte”. Em outras palavras:
“Queres para ti o que desejas para o outro?”
A necessidade do debate ético no ensino dos assuntos
controvertidos em ciências, diante das próprias raízes de contraposições e
controvérsias que eles próprios carregam, é evidenciada a partir das discussões
específicas que poderíamos traçar no âmbito educacional. Não tanto pelas
controvérsias exportadas pelo conhecimento científico ou religioso, e que
continuam também nesse outro processo humano, mas porque incidem em
proposições generalizantes que podem afastar do processo educacional a
existência de tais conflitos ou utilizar mal tais conflitos de maneira a contrapor-se
ao desenvolvimento moral autônomo dos alunos, que porventura estejam, por
razões diversas, situados em posição divergente dessa “escolha”.
Para Fourez (1995), a escolha de uma definição ou de um conceito
não deixa de ser feita através de uma ideologia qualquer. O autor destaca que seria
útil, a partir dessa discussão, distinguir os dois tipos de véus ideológicos: um
denominado de normal e, portanto, inevitável, aceitável; e outro que mereceria ser
sempre, nas suas palavras, desmascarado. Fourez chama de discurso ideológico
normal ou inevitável de um “discurso ideológico de primeiro grau”, pelo qual as
representações de sua construção aparecem de forma mais nítida, são detectadas.
Seria nesse tipo de discurso que a prática científica construiria os seus conceitos.
Mas “quando os traços históricos dessa construção quase desaparecem e se
pretende, prática ou teoricamente, implícita ou explicitamente que a noção seja
objetiva e eterna”, Fourez chama de “uma ideologia do segundo grau”, uma
ideologia cujos traços de sua construção não aparecem, ou seja, “foram
suprimidos”. Para Fourez, este último tipo de discurso é “profundamente
manipulador”, pois apresenta como naturais as opções que são particulares.
Portanto, os discursos ideológicos do primeiro grau tornam-se aceitáveis, visto
que aparecem neles a consciência da parcialidade de sua construção. Em
contrapartida, os de segundo grau são inaceitáveis “do ponto de vista ético”, pois
apresentam-se omissos naquilo que seria discutível; restringindo, assim, a
liberdade das pessoas. Fourez coloca-nos alguns exemplos bem claros sobre os
dois tipos de discursos, ampliando concretamente a distância entre ambos. Quando
alguém diz: “A igreja católica é contra o aborto”, os elementos ideológicos
nitidamente estão expostos na proposição. Não são, por isso, manipuladores. Mas
se alguém diz “É preciso fazer sacrifícios para se sair da crise”, encontramos nessa
afirmação a omissão de sua construção, de sua parcialidade, dando o entendimento
de alguma lei geral. Seria, portanto, uma ideologia de segundo grau.
Porém, o autor alerta que os conceitos científicos básicos são
sempre ideológicos, “pelo menos de primeiro grau”, mas que em determinados
momentos, ocorrendo uma tradução generalizante, ocultando o seu caráter
particular, esta passa a ser de segundo grau. Deixa, nesse ponto de ser discurso
crítico para ser meramente ideológico. Segundo Fourez, é em geral de uma
maneira inconsciente que as pessoas veiculam ideologias. “No ensino, os relatos
que nossos estudantes têm à mão hoje, seja em revistas ou livros didáticos, trazem
a marca do discurso ideológico quando se difunde a idéia reducionista de que a
ciência e os cientistas são infalíveis” (Bizzo, 1991). Muitas vezes, portanto,
ocorrem praticas da redução de um conceito como se ele abrangesse a totalidade.
Ainda porque “as representações ideológicas por nós veiculadas existem
independentemente de nossas intenções”(Fourez, 1995). Seria necessário uma
“análise precisa a fim de discernir o que são os conteúdos ideológicos de nossos
discursos” para, então, “decidir se queremos ou não propagar as ideologias
veiculadas por nossos discursos”. Para Fourez, a partir do momento que todos nós
temos uma representação de mundo, influenciada por nossos critérios e nosso
meio social, não sendo, portanto, neutra, seria impossível a nossa não veiculação
de alguma ideologia, pelo menos de primeiro grau.
“A ação, com o motivo que a provocou, não é considerada senão
como um testemunho do caráter de seu autor; ela é, também o mais seguro
sintoma da sua moralidade, mostrando para sempre, de modo incontestável, qual a
natureza do seu caráter (Schopenhauer, s.d., p.101)”. Complementa o autor
dizendo que a liberdade moral reside no mesmo locus da responsabilidade, ou
seja, no caráter do homem. Schopenhauer vai buscar em Kant as explicações do
porquê de ser imputado a nós próprios as nossas ações, através da relação entre o
caráter inteligível e o caráter empírico, nos quais se conciliam a liberdade e a
necessidade.
Para Fourez, dependendo de nossas posições éticas, agiremos de
modo a recusar ou a assumir as diferentes ideologias. Contudo, questiona: “Até
que ponto é eticamente aceitável que as pessoas veiculem ideologias sem que elas
se dêem conta disso?” Fourez indaga que os antigos moralistas já falavam de
“ignorância crassa” a questão desse inconsciente.
No ensino de ciência, uma reflexão desse tipo torna-se útil, a partir
do momento que se pressupõe no processo a transmissão de toda uma visão -
necessariamente ideológica - de mundo (Fourez, 1995).
5.0 - A PESQUISA
“A diferença de pontos de vista em assuntos que envolvem valores não se extingue com o fornecimento de mais informações, porque a própria informação faz parte de um ponto de vista político e ideológico. A produção e a apresentação de informações científicas envolve, inevitavelmente, julgamentos políticos e morais”.
Sílvia L. F. Trivelato
As questões éticas que envolvem a educação são muitas, refletindo-
se sobremaneira nas relações de ensino e de aprendizagem em sala de aula. Com o
objetivo de dar suporte a emergentes discussões que se vislumbram no ensino de
ciências, esta pesquisa centralizou-se na verificação e análise de atitudes que
configuram as representações dos professores e as respectivas implicações ao
desenvolvimento moral dos alunos. Tomou-se como tema gerador, as questões
éticas envolvidas nas controvérsias entre evolucionismo e criacionismo.
5.1 - A amostra
Esta pesquisa foi realizada junto aos professores de biologia, do
ensino médio, atuantes em escolas públicas e/ou particulares ligadas à Diretoria
Regional de Ensino de Bauru, no Estado de São Paulo. Foram entrevistados oito
professores, de um total aproximado de 80, segundo comunicação oral da
Assistência Técnica Pedagógica, da Diretoria Regional, com ressalva de que o
número de professores de biologia, e também de outros componentes curriculares,
altera-se no decorrer do ano.
A escolha foi aleatória, mas dependente da disponibilidade e/ou
disposição de contribuição dos professores convidados a participar.
O entrevistador entrou em contato com os professores
pessoalmente ou através do telefone. Não houve uma lista prévia de nomes, mas
apenas de escolas de ensino médio onde os professores de biologia seriam
encontrados. Por diferentes motivos, houve algumas recusas. Assim, a pesquisa
foi realizada apenas com professores receptivos a ela.
Sobre os sujeitos da amostra, foram colhidas as seguintes
informações pessoais, dispostas no quadro a seguir:
Quadro 1 - Características dos sujeitos da amostra
SUJEITO
SEXO
ESTADO CIVIL
RELIGIÃO
DECLARADA
LOCAL DE TRABALHO
TEMPO DE MAGISTÉ-
masc fem Rede pública
Rede partic.
Ambas RIO
TKO
X
CASADO
CRISTÃ
X
23a2m
CLT
X
CASADA
CATÓLICA
X
35a
JCF
X
CASADO
CRISTÃ
X
24a10m
ECF
X
CASADA
PRESBITERIANA X
28a
LLM
X
SOLTEIRA
CATÓLICA
X
5a
ALS
X
SOLTEIRA
CATÓLICA
X
9a
CTR
X
CASADA
EVANGÉLICA
X
25a
AAV
X
SOLTEIRA
CATÓLICA
X
4a
5.2 - Coleta de dados
Os dados foram coletados através de entrevistas, gravadas em fita
de áudio e, posteriormente, transcritas. Foi utilizado um mini-gravador da marca
Sony, modelo TCM-359V. O roteiro foi formulado com uma mescla de questões
fechadas, apresentadas por escrito aos entrevistados, e também com questões
abertas, ditadas oralmente pelo entrevistador, possibilitando coleta de discursos e
depoimentos de interesse na investigação pretendida.
O roteiro constou basicamente das seguintes questões:
1. Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos
do ensino médio?
Para a resposta, o entrevistado recebeu uma ficha com as seguintes
alternativas fechadas, conforme consta na figura 2.
( ) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo.
( ) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo.
( ) Ambas as teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do
Ensino Médio.
( ) Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os
alunos do Ensino Médio.
FIGURA 2 - Ficha com alternativas fechadas utilizada na entrevista.
Em seguida, foi solicitado que o entrevistado justificasse e/ou
comentasse sua resposta.
2. O assunto “Evolução dos Seres Vivos”, em algum momento, já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
Justifique/Comente.
3. Comente o suposto caso: “Dois alunos discutem, porque um
deles acredita no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois
interfere, dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que
acreditar no criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na Teoria da
Evolução.”
4. Dois textos foram entregues ao professor, da mesma forma como
estão colocados a seguir, na figura 3, ou seja, lado a lado; sendo o texto nº 1 pró-
evolucionista e o texto nº 2 pró-criacionista, ambos contendo fortes argumentos de
cunho religioso.
TEXTO Nº 1 TEXTO Nº 2
“O Vaticano reconhece que o homem e o macaco têm o mesmo antepassado” (1). “A idéia de que a teoria da evolução contraria as escrituras é muito ignorante” (2). “Hoje, novos conhecimentos levam a reconhecer na teoria da evolução mais do que uma hipótese” (3). “João Paulo II declarou que a teoria da evolução – o processo de seleção natural dos seres vivos identificado por Charles Darwin em 1859 – é mais do que uma simples hipótese” (4).
“A teoria da evolução é baseada em evidências não confiáveis. Além das fraudes no campo dos fósseis, as últimas descobertas não têm contribuído para confirmar a evolução pregada por Darwin” (5). “Não fique surpreso de a teoria da evolução gozar de ampla divulgação, apesar de evidências contrárias. A real mensagem desta crença é que Deus não existe” (6) “Precisamos encarar o fato de que a teoria da evolução serve ao propósito de Satanás. Crer na evolução significa promover os interesses dele e ficar cego diante dos maravilhosos propósitos do Criador” (7).
Nota: Os parágrafos dos dois textos acima foram extraídos de diferentes fontes: (1)Revista Isto É (1997, p.34); (2)Revista Isto É (1997, p.31); (3)Jornal L’Osservatore Romano (1996, p.6); (4)Revista Isto É (1997, p.31); (5)Jornal Folhas de Vida (1995, p.1); (6)Livro intitulado A vida – qual sua origem? Evolução ou criação? (1985, p.248). FIGURA 3 - Textos polêmicos utilizados na entrevista.
4.1. O que você poderia dizer a respeito desses dois textos? (Qual a
sua idéia ou posicionamento sobre eles?)
4.2. O que você diria ao aluno se no meio de uma aula sobre
evolução dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2 ?
4.3. E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto nº 1?
5. Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor, não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer, defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato? E se o professor fosse de
biologia?
5.3 - Tratamento dos dados
O tratamento das respostas obtidas nos discursos dos oito sujeitos
da amostra foi realizado com recursos da semiótica. Para uma parte dos dados
foram utilizados elementos básicos de análise de discurso; para outra parte
utilizou-se da análise de conteúdo, centrando maior foco naquilo que se denomina,
na teoria da semiótica, análise de asserção avaliativa (em inglês: evaluative
assertion analysis).
5.4 - A análise de discurso utilizada como recurso metodológico
nesta pesquisa
Diferentes trabalhos que procuraram analisar qualitativamente os
seus dados, a partir de discursos ou depoimentos dos sujeitos, encontraram
importantes subsídios na semiótica e, dentro desta, na análise de elementos
semânticos básicos e de conteúdo. Pelas características e objetivos desta pesquisa,
também utilizamos de tais recursos.
5.4.1 - Semântica básica do discurso
Inicialmente os dados desta pesquisa foram trabalhados a partir de
elementos básicos da teoria do discurso, em análises de mecanismos sintáxicos e
semânticos que estruturaram a construção dos discursos, permitindo um melhor
entendimento desse processo.
Para tal fim, foi utilizada uma categorização semântica do nível
fundamental. De acordo com Fiorin (1996), a categoria semântica fundamenta-se
numa diferença, numa oposição que tenha algo em comum no interior do texto
discursivo. “Cada um dos elementos da categoria semântica de base de um texto
recebe a qualificação semântica /euforia/ versus /disforia/. O termo ao qual foi
aplicada a marca /euforia/ é considerado um valor positivo; aquele a que foi dada a
qualificação /disforia/ é visto como um valor negativo.” O autor afirma ainda que
tanto euforia como disforia “não são valores determinados pelo sistema axiológico
do leitor, mas aparecem inscritos no texto” (Fiorin, 1996, p.20).
Independente do discurso ser classificado como narração ou
dissertação, aparece no texto a narratividade, que também serviu de base para a
análise de alguns dados iniciais. “A narratividade é um componente da teoria do
discurso[...], é uma transformação situada entre dois estados sucessivos e
diferentes. Isso significa que ocorre uma narrativa mínima, quando se tem um
estado inicial, uma transformação e um estado final” (Fiorin, 1996, p. 21). Nessa
sintaxe narrativa, portanto, ocorrem dois tipos de enunciados:
- de estado: estabelecendo relação de junção entre sujeito e objeto, ou seja,
disjunção ou conjunção, aproximação ou separação, favorecimento ou
desfavorecimento do tipo é / não é;
- de fazer: mostrando as transformações, ou seja, a passagem de um estado a
outro, do tipo ficou.
Tais relações sempre ocorrem entre sujeito e objeto, que são papéis
narrativos representados por coisas, pessoas ou animais, sendo que a narrativa
será de estruturação complexa, segundo Fiorin (1996), quando num discurso
temos os dois tipos de enunciados. Nesse caso, o discurso pode trazer quatro
fases: manipulação, competência, performance e sanção.
Manipulação quando um sujeito age sobre outro para levá-lo a
querer e/ou dever fazer alguma coisa. Os tipos mais comuns de manipulação
compreendem: tentação, intimidação, sedução e provocação. Nas outras fases,
competência compreende o saber utilizado para a ação do sujeito, a performance
indica o ato ou momento que se dá a transformação pelo sujeito e a sanção é a
fase de premiação ou punição, após configurada a transformação.
Dessa forma, qualquer discurso não deixa de ter pontos de
articulação entre os processos ideológicos e os fenômenos lingüísticos. Como diz
Brandão, “a linguagem enquanto discurso é interação, é um modelo de produção
social, ela não é neutra, inocente (na medida em que está engajada numa
intencionalidade8) e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação
ideológica” (Brandão, 1991, p. 12).
Em vista disso, a linguagem traz conflitos e confrontos ideológicos,
não podendo ser estudada fora da sociedade porque ela faz parte do histórico-
social, assim com também o sujeito. “O sujeito é histórico. E porque sua fala é
produzida a partir de um determinado lugar e de um determinado tempo, à
concepção de um sujeito histórico articula-se a outra noção fundamental: a de um
sujeito ideológico. Sua fala é um recorte das representações de um tempo histórico
e de um espaço social. Dessa forma, o sujeito situa o seu discurso em relação ao
discurso do outro”. (Brandão, 1991, p. 49).
Entre outras formas daquilo que Brandão (1991) chama de
heterogeneidade, acusando a presença do outro no seu próprio discurso,
assinalamos:
- discurso indireto: o locutor, colocando-se enquanto tradutor, usa de suas próprias
palavras para remeter a uma outra fonte do sentido;
discurso direto: o locutor coloca-se como porta-voz, ou seja, recorta as palavras do
outro e cita-as.
8 Aqui, talvez o autor tenha utilizado a palavra no sentido de propósito, pois intencionalidade traz uma carga significativa bem mais complexa.
5.4.2 - Análise de conteúdo
Dos elementos básicos de semântica do discurso, a análise passou
para a especificidade do conteúdo.
A análise de conteúdo, segundo Bardin (1977), é um conjunto de
técnicas de análise de comunicações que explora significados ou significantes.
Possui duas funções: enriquece a tentativa exploratória, aumentando a propensão à
descoberta e também pode servir de prova em hipóteses anteriormente firmadas,
confirmando-as ou descartando-as.
A especificidade da análise de conteúdo está “na articulação entre a
superfície dos textos, descrita e analisada e os fatores que determinaram estas
características, deduzidos logicamente” (Bardin, 1977, p.41).
Tem-se, portanto, um conjunto de técnicas de análise das
comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens”, sendo que “o analista
possui a sua disposição (ou cria) todo um jogo de operações analíticas, mais ou
menos adaptadas à natureza do material e à questão que procura resolver. Pode
utilizar uma ou várias operações, em complementaridade, de modo a enriquecer os
resultados, ou aumentar a sua validade, aspirando assim a uma interpretação final
fundamentada” (Bardin, 1977, p. 43).
5.4.3 - Análise de asserção avaliativa9 e a medida de atitudes
Aos objetivos propostos nesta pesquisa, em conjunto com o tipo de
material trabalhado, optou-se pela análise de asserção avaliativa, uma das técnicas
da análise de conteúdo que mede as atitudes do locutor quanto aos objetos de que
ele fala e fundamentada na concepção representacional, pois considera que a
“linguagem representa e reflete diretamente aquele que a utiliza” (Bardin, 1977,
p.155).
A referida atitude apresentada pela técnica da análise de asserção
avaliativa “é uma pré-disposição, relativamente estável e organizada, para reagir
sob forma de opiniões (nível verbal), ou de atos (nível comportamental), em
presença de objetos (pessoas, idéias, acontecimentos, coisas etc) de maneira
determinada” (Bardin, 1977, p. 155). Ou ainda, de acordo com Lambert &
Lambert (1966, p.77), atitude pode ser conceituada como uma maneira organizada
e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a pessoas, grupos, questões sociais
ou, mais genericamente, a qualquer acontecimento ocorrido em nosso meio
circundante”. Quando uma pessoa se expressa em opiniões sobre coisas, seres ou
fenômenos está manifestando juízos de valor. A atitude seria, então, um núcleo,
muitas vezes inconsciente, que produz tais tomadas de posição, de qualificação, de
descrição. Os componentes essenciais das atitudes, citados por Lambert &
9 A palavra “avaliativa” (Bardin, 1977), não aparece no léxico da língua portuguesa, mas o seu significado é correspondente ao termo “avaliatória”. A opção neste trabalho foi de utilizar o termo original, a fim de não descaracterizar a técnica do autor.
Lambert (1966, p.78), são: os pensamentos, as crenças, os sentimentos ou
emoções e as tendências para reagir.
Em estudos de psicologia social, as atitudes ganharam ênfase desde
a década de 20, principalmente no que dizia respeito a sua mensuração
(Rodrigues, 1981, p.16).
Os primeiros estudos sobre medidas de atitude foram realizados por
Thurstone (1928) e Likert (1932), que desencadearam outros estudos posteriores
(Newcomb, 1943; Centers, 1949; Adorno et al., 1950) com a introdução de novos
elementos, como formação, desenvolvimento e mudanças de atitudes.
No desenvolvimento das pesquisas, as atitudes ganharam
características de intensidade e direção, como o método de Osgood (1959).
Como aponta Bardin (1977, p.156), o método de Osgood seria
muito parecido com a análise de conteúdo temática, pois também estaria
fundamentado em desdobramentos de texto em unidades de significação. Mas o
objetivo seria mais específico, “uma vez que se atém não somente à ocorrência de
tal ou tal tema (presença ou ausência), mas à carga avaliativa das unidades de
significação”. Aos segmentos semânticos são dados procedimentos de avaliação a
partir de direção e intensidade dos juízos selecionados, em etapa de normalização
dos enunciados. “A direção é o sentido de opinião segundo um par bi-polar. Entre
os dois pólos existe eventualmente um estado intermediário de neutralidade ou
ambivalência. A intensidade demarca a força ou grau de convicção expressa, por
exemplo: posição ou oposição ligeira ou veemente” (Bardin, 1977, p.156).
Aparecem como componentes da análise de asserção avaliativa:
- os objetos de atitude, que podem ser pessoas, grupos, coisas ou acontecimentos;
- os termos avaliativos com significação comum, ou seja, palavras que exprimem
qualidade aos objetos ou, ainda, o que se diz acerca deles, podendo ser adjetivos,
advérbios ou substantivos;
- os conectores verbais que ligam os objetos aos termos de qualificação.
Apesar da possibilidade de adaptações de acordo com as
características das pesquisas, Bardin (1977) organiza a técnica de análise de
asserção avaliativa da seguinte maneira:
- primeira etapa: identificação e extração dos objetos de atitude;
- segunda etapa: normalização dos enunciados, ou seja, edição dos enunciados,
transformando-os em forma canônica ator-ação-complemento ou objeto de
avaliação / conector verbal / material avaliativo;
- terceira etapa: codificação, imprimindo direção positiva ou negativa e
intensidade numa escala de -3 a +3 no conjunto de conectores e qualificadores.
Nessa escala, a intensidade +3 demarca contentamento pleno ou
favorecimento total, podendo aparecer os seguintes termos: é, está,
definitivamente, plenamente, totalmente. A intensidade +2 exprime favorecimento
com restrições, podendo aparecer os termos: mas, contudo, porém. A intensidade
+1 denota uma relação apenas esboçada ou uma leve tendência favorável,
exemplificada por alguns termos, como: ligeiramente, ocasionalmente, levemente.
A intensidade zero manifesta neutralidade, ambivalência, ou seja, nenhuma
tendência favorável ou desfavorável. A intensidade -1 revela ligeira ou ocasional
tendência desfavorável. A intensidade -2 caracteriza desfavorecimento parcial, ou
seja, com restrições. Finalmente a intensidade -3 é a marca do descontentamento
pleno ou desfavorecimento total, com termos como: não é não está, nunca,
jamais.
Evidente que a técnica de análise de asserção avaliativa possui
falhas e que o pesquisador deve trabalhar com consciência plena disso. Para
Konder (1988, p. 43), “nenhuma teoria pode ser tão boa a ponto de nos evitar
erros”.
Recai sobre a técnica de análise de asserção avaliativa, segundo
Bardin (1977), muitas restrições, pois não é método exaustivo, visto que considera
apenas a dimensão das atitudes, ou seja, somente os enunciados que exprimem
avaliação. Diferenças individuais e culturais dos locutores podem enviesar a
notação da carga avaliativa de certos termos. Além disso, o codificador nunca
estará totalmente seguro de não projetar o seu próprio toque lingüístico e o seu
sistema de valores pessoais naquilo que está examinando. Ainda podemos citar o
fato de que esta técnica não alcança as atitudes ou motivações que não se
exprimem diretamente, mesmo quando são conscientemente percebidas. Também
há ocorrência de manipulações pelo sujeito observado. Goffman (1989) diz que é
sempre possível tal manipulação, criando a possibilidade de falsa representação já
a partir da própria necessidade do observador confiar nas representações do
sujeito. Afirma que “às vezes as pessoas que são observadas empregam meios
adequados para influenciar o observador”, permitindo que surja, então, uma
impressão desejada sobre sua atitude.
Mesmo com tais restrições foi extremamente útil a utilização desta
técnica na pesquisa, pois proporcionou análise sistematizada a partir de extração e
sublevação de diferentes elementos de discurso, deixando mais expostas e nítidas
as relações de congruências e incongruências em casos de conjunção ou disjunção
entre locutor (sujeito da pesquisa) e os diversos objetos colocados a sua frente.
Finalizando, os conceitos utilizados no transcorrer da análise de
dados seguiram os sinônimos do glossário, segundo Brandão (1991, p.89-91).
Destacando-se, para melhor compreensão da análise que segue adiante, os
seguintes termos:
- Autor: É a função social que o sujeito falante assume enquanto produtor da
linguagem.
- Enunciador: É a figura da enunciação que representa a pessoa cujo ponto de
vista é apresentado. É a perspectiva que o locutor constrói e de cujo ponto de
vista narra, que identificando-se com ele quer distanciando-se dele.
- Locutor: É uma função enunciativa que o sujeito falante exerce e, através da
qual se apresenta como “eu” no discurso. É o responsável pelo dizer.
5.5 - Apresentação de resultados - configurando as atitudes nas
representações dos professores
Na trajetória de verificação das atitudes representadas pelos
professores de biologia nas controvérsias entre evolucionismo e criacionismo
estão sistematizados e disponíveis em quadros, a fim de facilitar a análise e
discussão dos resultados, os seguintes itens:
i - Posicionamento inicial nas controvérsias entre evolucionismo e criacionismo.
ii - Atitudes nas conjunções e disjunções.
iii - A medida de atitudes para diferentes objetos.
iv - Sobreposição comparativa nas atitudes de todos os sujeitos e para cada objeto.
v. Conversão da medida de atitudes em graus de convergência/divergência.
vi - Atitudes em ações semelhantes para professores de diferentes componentes
curriculares
5.5.1 - Posicionamento inicial nas controvérsias entre
evolucionismo e criacionismo
Na categoria semântica entre evolucionismo versus criacionismo
(oposição semântica), no qual o locutor fez o papel narrativo do sujeito (Quadro
2), o evolucionismo recebeu sete qualificações eufóricas; dos quais, três também
acompanhadas da categoria criacionismo. Nesses três casos, nos quais
evolucionismo e criacionismo apareceram juntos na qualificação eufórica, houve
enunciação conciliatória entre ambas:
“Deus criou o mundo e os seres vivos para evoluírem
gradativamente. Seria, então, possível conciliar as duas
idéias”(JCF).
“Não concordo com o texto 1 e também não concordo com
o texto 2. Eu creio na criação de Deus, mesmo em termos
de Evolução”(CTR).
Em princípio, o sujeito AAV apresentou o evolucionismo na
categoria eufórica, mas na seqüência de seu enunciado houve posicionamento de
conciliação:
“Eu concordo com o texto número 1, os seres vivos sofrem
evolução ao longo dos tempos. Eu, particularmente, acredito
que Deus existe, sendo o criacionismo a origem das espécies.
Num segundo momento, essas espécies sofreram evolução e se
modificaram” (AAV).
Na categoria disfórica, o evolucionismo apareceu numa vez, na
enunciação:
“Eu apresento a minha maneira de pensar, que é o
criacionismo. Eu sempre achei um absurdo quando,
fazendo escavações, alguém encontra lá um pedaço da
arcada de um animal de não sei quantos anos atrás e,
baseado só naquele pedacinho, já se imagina como é o
restante do animal”(ECF).
A disforia, ou seja, a visão de desfavorecimento do sujeito ECF
para o evolucionismo também atingiu o campo do ensino, especificamente ao
material didático:
“Os livros são unilaterais, defendem somente esse ponto
de vista [referiu-se ao evolucionismo]” (ECF).
Quadro 2 - Qualificação para o papel narrativo
do sujeito na categoria sem
ântica d
o nível fundamental
Qualificação semântica
Locutor
Euforia
Disforia
Enu
nciação
TKO
Evolucion
ismo
Criacionism
o “O texto 1 é o correto; o texto 2 nã
o merece ser considerad
o... Fala ap
enas bob
agens.”
CLT
Evolucion
ismo
Criacionism
o “Con
cordo plenam
ente com
o texto nú
mero 1.”
JC
F
Evolucion
ismo e
Criacionism
o ---
“Deus criou o mun
do e os seres vivos pa
ra evoluírem
grada
tivamente. S
eria, então
, possível, conciliar as
duas id
éias.”
ECF
Criacionism
o Evolucion
ismo
“Eu ap
resento a minha
man
eira de pensar, q
ue é o criacionism
o. Eu sempre achei u
m absurdo
qua
ndo,
fazend
o escavações, a
lguém encon
tra lá um pedaço da
arcad
a de um animal de nã
o sei q
uantos ano
s atrás
e, baseado
só na
quele peda
cinh
o, já
se imag
ina como é o restan
te do an
imal. O
s livros são
unilaterais,
defend
em som
ente esse po
nto de vista [do
evolucion
ismo].”
LLM
Evolucion
ismo
Criacionism
o “O texto nú
mero 1 mostra a aceitação qu
e ho
je a teoria da Evolução tem, a
té frente à Igreja Católica.”
ALS
Evolucion
ismo
Criacionism
o “As evidências da Evolução são confiáveis.”
CTR
Evolucion
ismo e
Criacionism
o ---
“Não
con
cordo com o texto 1 e também não
con
cordo com o texto 2. Eu creio na
Criação
de Deus, mesmo
em term
os de Evolução.”
AAV
Evolucion
ismo e
Criacionism
o ---
“Eu concordo
com
o texto nú
mero 1, os seres vivos sofrem
evolução ao
long
o do
s tempo
s. Eu,
particularmente, a
credito qu
e Deus existe, sendo
o criacionism
o a origem
das espécies. Num
segun
do
mom
ento, estas espécies sofreram
evolução e se mod
ificaram
.”
NOTA: C
ategoria sem
ântica fun
damentada n
a op
osição entre evolucion
ismo e criacion
ismo, a partir do
s textos 1 e 2 (Fig. 3
).
Houve nítida prevalência ao evolucionismo, mas os enunciados
conciliatórios dos sujeitos JCF, CTR e AAV, juntamente com o enunciado
eufórico pró-criacionista de ECF, indicam que os conhecimentos sobre o tema não
foram adquiridos somente com a influência científica, da formação acadêmica.
A ocorrência de diferentes influências na construção de conceitos,
ou em teorias polêmicas, dentre professores que passaram por formação científica
nas universidades, remete-nos a questões que devem ser discutidas no âmbito
educacional; nesse caso, contrariando Bizzo (1988) quando diz que “o debate
entre o criacionismo e o evolucionismo não tem mais sentido hoje em dia”.
Um intenso debate sobre o tema não deve ser descartado, pois abre
possibilidades de entendimentos, posicionamentos melhor fundamentados e mais
conhecimentos, úteis ao desempenho do professor nas discussões em sala de aula.
Outro aspecto que poderia ser discutido recai sobre a proposta
curricular, pois como se apresenta parece não contemplar tais debates, a partir de
seu implacável favorecimento científico ao tema. Lembrando que não se contesta
aqui o conteúdo científico sobre evolução dos seres vivos, mas sim a ausência de
perspectivas, dentro desses conteúdos, que vislumbrem preocupação ao processo
de desenvolvimento moral dos alunos.
Quadro 3 - Q
ualificação do
locutor dada para o papel n
arrativo
do ob
jeto na catego
ria semântica do nível fundamental
Locutor
Euforia
Disforia
Enu
nciação
TKO
Evolucion
ismo
Criacionism
o “Evolucion
ismo, porqu
e as apo
stilas e livros não
geram
ocasiões pa
ra discussão
.”
CLT
Evolucion
ismo
Criacionism
o “A maioria acredita no
evolucion
ismo. Na realidad
e, eles aceitam o evolucion
ismo
somente depois de resolvida
s as sua
s dú
vida
s.”
JCF
Evolucion
ismo
Criacionism
o “A maioria acredita no
evolucion
ismo. Os alun
os aceitam
tal idéia em fa
ce dos
fund
amentos e explicações convincentes dessa teoria.”
ECF
Criacionism
o Evolucion
ismo
“Eu penso qu
e a maioria acredita no
criacionism
o. Por cau
sa das reações dos aluno
s ap
ós a apresentação do
assun
to. A
primeira reação do
s alun
os é o do tipo
: Eu nã
o venh
o do
macaco.”
LLM
Criacionism
o Evolucion
ismo
“A maioria acredita no
criacionism
o. Os alun
os muitas vezes nã
o concorda
m com
as
teorias da
Evolução. Acham
que não
pod
em ser provada
s.”
ALS
Criacionism
o Evolucion
ismo
“A maioria dos aluno
s acredita no criacion
ismo. A maioria dos aluno
s nã
o acredita no
evolucionism
o. Qua
ndo inda
gado
s sobre origem
de um
ser, o
u da
sua
fisiolog
ia,
destacam
que Deus qu
is que fo
sse assim.”
CTR
Evolucion
ismo e Criacionism
o ---
“Amba
s as teorias têm aceitação
de man
eira sem
elha
nte. Atualmente os alun
os
resistentes, con
tra o evolucionism
o, são
aluno
s evan
gélicos, cujos pais os criaram
na
doutrina
evang
élica do
criacionism
o. Embo
ra algun
s evan
gélicos são ba
stan
te
question
adores, a
brindo
espaço pelo menos para conh
ecer o assun
to evolucion
ismo.”
AAV
Evolucion
ismo e Criacionism
o ---
“Amba
s as teorias têm aceitação
. Muitos acreditam que Deus criou tudo
o que existe e
algu
ns destes nã
o acreditam que o hom
em evoluiu do macaco. Outros defend
em o
evolucionism
o, principalmente o neoda
rwinismo qu
e incorpora a seleção na
tural à
genética. A
lgun
s destes acham
que Deus é um
mistério e a ciência po
ssui fa
lhas.
NOTAS: a.) Aluno
: papel narrativo do ob
jeto; b.) Qualificação de prevalência dada aos aluno
s entre evolucion
ismo e criacion
ismo (Fig. 2
).
Na solicitação da posição do sujeito da amostra quanto à
prevalência da maioria dos alunos do ensino médio perante a categoria semântica
evolucionismo versus criacionismo (Fig. 2), as respostas foram sistematizadas e
dispostas no quadro 3.
No quadro, mostrado anteriormente, aparece um nítido equilíbrio
nas qualificações dos sujeitos aos objetos, pois o evolucionismo apareceu três
vezes na categoria eufórica, mesmo número ocorrido com o criacionismo.
Dois sujeitos da amostra posicionaram ambas as categorias na
qualificação eufórica do objeto:
“Ambas as teorias têm aceitação de maneira semelhante.
Atualmente, os alunos resistentes, contra o evolucionismo,
são alunos evangélicos, cujos pais os criaram na doutrina
evangélica do criacionismo. Embora alguns evangélicos
são bastante questionadores, abrindo espaço pelo menos
para conhecer o assunto evolucionismo”(CTR).
“Ambas as teorias têm aceitação. Muitos acreditam que
Deus criou tudo o que existe e alguns destes não
acreditam que o homem evoluiu do macaco. Outros
defendem o evolucionismo, principalmente o
neodarwinismo que incorpora a seleção natural à
genética. Alguns destes acham que Deus é um mistério e a
ciência possui falhas” (AAV).
Comparando os dois quadros anteriores, verificam-se duas
divergências totais e uma parcial na qualificação semântica entre sujeito e objeto
(locutores JCF, LLM e ALS).
A relativa harmonia observada entre sujeito e objeto poderia, se
tivéssemos dados complementares acerca dos alunos (papel narrativo do objeto),
revelar ou não os graus de empatia dos professores entrevistados em relação aos
alunos, ou a possível consciência deles em fazer ou querer tal harmonização.
Afinal, o que essa relativa harmonia, partindo dos professores, em tema com tanta
controvérsia, poderia nos revelar?
5.5.2 - Atitudes nas conjunções e disjunções
O quadro 4, a seguir, foi montado a partir de enunciados que
provocaram respostas com enunciados de estado, pois apresentavam aos sujeitos
ocorrências de conjunções e disjunções com determinado objeto. Nesse caso, os
alunos são o objeto de atitude. O sujeito fez o papel do locutor, pois exerceu a
função enunciativa, ao mesmo tempo que também se colocou como autor, dada a
função social assumida no papel narrativo.
As conjunções e disjunções entre sujeito e objeto foram obtidas a
partir dos enunciados apresentados anteriormente (Quadro 2) em comparação com
as seguintes questões: “O que você diria a um aluno se no meio de uma aula
sobre evolução dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto
número 2? E se ele defendesse integralmente as idéias do texto número 1?”
Portanto, o papel narrativo do objeto estaria colocado obrigatoriamente em
conjunção ou em disjunção ao papel narrativo do sujeito.
Quadro 4 - C
omparação de enunciado
s nas conjunções e disjunções entre os papéis narrativos de sujeito e ob
jeto
Enunciação
Locutor
Quand
o há disjunção entre sujeito e objeto
Presença da fase de
manipulação (tipo
) Quand
o há con
junção entre sujeito e objeto
Presença da fase de
sanção (tipo
) TKO
“Diria para qu
e ele estuda
sse melho
r o evolucionism
o”.
Sim
(provocação)
“Diria que entendeu bem o espírito do
evolucionism
o, que é o correto.”
Sim
(prem
iação)
CLT
“Tentaria pa
cientemente fa
zê-lo entend
er os argu
mentos e as
evidências da Evolução. Se ele nã
o aceitar, eu diria: Se um
a crença
não perm
ite aceitar esta teoria, você deve rejeitá-la.Mas eu preciso
dizer a verdad
e. E para mim não
há contradição entre ciência e fé.
Mas se pa
ra você há
, eu respeito sua
s idéias.”
Sim
(provocação,
sedu
ção,
intimidação)
“Eu pa
rabenizaria suas id
éias corretas.”
Sim
(prem
iação)
JCF
“Faria o possível p
ara ele compreend
er a teoria com
nossos
argu
mentos e explicações atua
is. A
conselha
ria a respeitar o
evolucionism
o e ad
aptar-se aos con
ceitos atuais.”
Sim
(sedu
ção?)
“Con
cordaria com
ele. P
orém
, o aconselha
ria a
ter sua fé e ta
mbém ler a Bíblia.”
Sim
(prem
iação e
punição)
ECF
“Estam
os num
a democracia. Existe liberdad
e plena pa
ra tu
do.
Você tem to
do o direito de pensar do jeito qu
e pensa, mas deveria
raciocinar mais, ter mais equilíbrio, p
onderar mais pa
ra perceber
onde tem exagero ta
nto de um la
do qua
nto de outro.”
Sim
(sedu
ção)
Idem
disjunção
Não
LLM
“Diria para ele qu
e primeiro term
inasse de ou
vir a minha
aula e,
então, discutiríam
os o assun
to.”
Sim
(intimidação)
“No caso, o
aluno
estaria in
do ao encontro de
minha
aula. Seu depoimento seria de au
xílio.”
Sim
(prem
iação)
ALS
“As evidências da Evolução são confiáveis. E
u o orientaria que
pesquisasse sobre o assunto e só depois disso tirasse um
a conclusão fina
l.”
Sim
(intimidação,
provocação)
“Até mesmo o Pap
a aceita que a evolução é
mais qu
e um
a simples hipótese, devido ao
s no
vos conh
ecimentos científicos.”
Não
CTR
“Ele deveria con
tinu
ar pesqu
isan
do a id
éia defend
ida po
r ele. Eu
jamais iria in
fluenciá-lo. Auxiliaria, in
dicand
o livros, revistas, sites
na Internet e ainda
, com
o estímulo, solicitaria que se encontrasse
algo
muito in
teressan
te, g
ostaria de con
hecer.”
Sim
(sedu
ção)
Idem
disjunção
Sim
(prem
iação)
AAV
“Eu diria qu
e ele po
ssui livre arbítrio para fazer suas escolha
s e
que sua crença depende da sua religião
, da sua vivência, o
u seja,
do seu senso crítico
Sim
(sedu
ção)
Idem
disjunção
Não
NOTAS: a.) Professor: p
apel narrativo do sujeito; b.) Aluno
: papel narrativo do ob
jeto.
Pela leitura do quadro comparativo anterior (Quadro 4), as fases de
manipulação e sanção estiveram presentes na maioria dos discursos. A fase de
manipulação esteve presente em todos os enunciados nas relações de disjunção, ao
mesmo tempo que a sanção esteve presente em cinco enunciados nas conjunções.
A ressalva que se faz está no fato desta sistematização semântica
não indicar necessariamente uma relação real, vivida, mas apenas expressa em
momento único de questionamento que provocou situações de conjunção e
disjunção e, portanto pertinentes a situações ulteriores ao sujeito naquele exato
momento da entrevista. Também não se pode esquecer que uma leitura somente
realizada no plano horizontal das respostas traz o inconveniente de não revelar as
funções sociais em jogo, induzindo erroneamente o leitor à existência amplamente
desfavorável do objeto e provocada pura e simplesmente pelo sujeito, o que não
necessariamente corresponderia se a leitura acompanhasse os processos histórico-
sociais de construção dessas relações. Ao professor, por muito tempo coube a
função social de ensinar transmissivamente, até mesmo por meios coercitivos, na
consciência histórica construída, que agir assim era o seu dever, a sua função
correta para beneficiar o aluno. Vestígios desses momentos ainda poderiam ou não
estar presentes em alguns dos discursos abaixo?
“Diria para que ele estudasse melhor...” (TKO)
“Tentaria pacientemente fazê-lo entender os argumentos e
evidências...” (CLT)
“Faria o possível para ele compreender...” (JCF)
“Diria para que ele primeiro terminasse de ouvir a minha
aula...” (LLM)
Nesse caso, também não deveríamos esperar as mesmas
manipulações, pelo menos do tipo provocação, nos enunciados de conjunção? O
mais próximo disso, ou pelo menos com intencionalidade única tanto nas
conjunções como nas disjunções apareceram nos discursos seguintes:
“Estamos numa democracia. Existe liberdade plena para
tudo. Você tem todo o direito de pensar do jeito que
pensa...” (ECF)
“Ele deveria continuar pesquisando a idéia defendida por
ele.” (CTR)
Quanto aos discursos anteriores, porém, muitos questionamentos
podem aparecer em relação ao papel da escola, ou ainda, de maneira mais
específica, em relação ao papel do ensino de ciências. Afinal, nesses tipos de
discurso, qual seria o posicionameto correto da escola, ou do professor? O papel
do professor de ciências não passa pelo proceso de mudança conceitual? Ao ter
atitude sempre “democrática”, o professor não estaria contribuindo na manutenção
da concepção errada do aluno? Como integrar o ensino de concepções científicas e
as questões éticas de respeito aos valores individuais de cada um?
A simples leitura de tais elementos semânticos de manipulação e
sanção poderia, sem nenhuma dificuldade, ser considerada fator negativo ao
desenvolvimento moral do aluno se ocorresse na prática docente, pois é
impeditiva ou coloca obstáculos ao prosseguimento a níveis mais superiores no
processo de construção moral defendida principalmente por Piaget e Kohlberg. No
entanto, a intencionalidade e os limites entre os diferentes tipos de manipulação e
sanção com práticas coercitivas carecem de maiores estudos que impliquem o
processo histórico-social-formativo dessas relações educacionais.
Todos os discursos são inevitavelmente ideológicos. Do ponto de
vista ético, porém, é profundamente manipulador somente os discursos
ideológicos de segundo grau (Fourez, 1995), ou seja, aqueles que omitem os
traços de sua construção e dão o entendimento de lei geral, universal. Portanto, a
opinião contrária por causa disso ou daquilo apresenta-se como discurso
ideológico de primeiro grau, pois não omitiria a sua origem, não seria mostrado
como algo genérico, lei geral e eterna. Levando-se em conta a característica do
teor ideológico, não foram detectadas omissões de particularidade nos enunciados
dos sujeitos TKO, CLT, JCF, LLM, CTR e AAV, pois apareceram expressões
como: eu diria, para mim não há contradição, minha aula, aconselharia, eu faria
o possível.
Essas palavras denotam característica de opção particular, ou seja,
evidenciam que a opinião é do professor. Mesmo argumentando contrário ao
aluno, na tentativa de transformação, a ideologia veiculada nas representações é de
primeiro grau.
Em ECF e ALS, porém, não foram encontradas palavras com
denotação particular de opinião em parte nuclear dos discursos. Portanto, segundo
o ponto de vista ético apontado por Fourez, esses enunciados, por terem formato
genérico, deveriam ser evitados na prática pedagógica:
“Estamos numa democracia. Existe liberdade plena para tudo”
(ECF).
“As evidências da evolução são confiáveis” (ALS).
5.5.3 - A medida de atitudes para diferentes objetos
A partir desta segunda fase de discussão, com auxílio da análise de
asserção avaliativa, foram tratados e sistematizados diferentes enunciados que
apresentavam objetos de atitude. Os enunciados foram retirados de diferentes
unidades de significação nas representações transcorridas na entrevista.
A seguir, aparecem agrupados os enunciados (Quadros 6, 8, 10, 12,
14, 16, 18 e 20) para cada sujeito da amostra. Os objetos de atitude, avaliados
pelos sujeitos, receberam os seguintes códigos:
Quadro 5 - Codificação dos objetos de atitude avaliados pelos sujeitos da pesquisa
Código do Objeto Natureza do objeto de atitude
A Texto número 1 - pró-evolucionista (Figura 3). B Aluno que defende integralmente as idéias do texto número 1
(Vide questão 4.3, do roteiro de entrevista). C Texto número 2 - pró-criacionista (Figura 3). D Aluno que defende integralmente as idéias do texto número 2
(Vide questão 4.2, do roteiro de entrevista). E Professor que interfere na discussão entre dois alunos, dizendo
que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da Evolução (Vide questão 3, do roteiro de entrevista).
Quadro 6 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor TKO para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A “O texto 1 é o correto.” é correto +3 B
“Diria que entendeu bem o espírito do evolucionismo, que é o correto.”
entendeu bem
o espírito do evolucionismo
+3
é o correto C
“O texto 2 não merece ser considerado. Fala apenas bobagens.”
não merece ser
considerado
-3
fala apenas bobagens
“Aceitaria a sua opinião. Teria respeito por ela; porém, diria para que ele estudasse melhor o evolucionismo.”
aceitaria
sua opinião
D teria respeito por ela +2 porém, diria que estudasse
melhor o evolucionismo
E
“O professor deve expor o seu ponto de vista, mas deve respeitar a opinião dos seus alunos. Tá errado.”
deve expor ponto de vista -2
mas deve respeitar
a opinião do aluno
tá (está) errado
Quadro 7 - Nível de favoritismo/desfavoritismo10 para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor TKO
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 A/B D E C
O quadro 6 mostra que o enunciado para o objeto A, com as
presenças do conector “é” e da qualificação “correto”, refletiu pleno
favorecimento; o mesmo ocorrendo para o objeto B, com os conectores “é” e
“entendeu bem” e as qualificações respectivas “correto” e “o espírito do
evolucionismo”.
Na mesma intensidade de totalidade, mas de desfavorecimento
apareceu o enunciado para o objeto C.
Para o objeto D houve favorecimento parcial, com restrições
explícitas em “aceitaria, porém”.
Finalmente, o objeto E recebeu avaliação negativa, mas de
desfavorecimento parcial, pois houve restrições. Ao mesmo tempo que recebeu o
termo (conector e qualificação) “tá errado”, também apareceu a restrição de defesa
em “deve expor seu ponto de vista”.
Nas representações do sujeito TKO são observadas atitudes de
íntima correlação, em favorecimento pleno, ao texto evolucionista e ao virtual
aluno que defende a teoria a partir das idéias desse texto:
10 A palavra “desfavoritismo” (Bardin, 1977), não aparece no léxico da língua portuguesa, mas o seu significado é correspondente à contraposição do favoritismo. A opção neste trabalho foi de utilizar o termo original, a fim de não descaracterizar a técnica do autor.
“O texto 1 é o correto”.
“Diria [ao aluno] que entendeu bem o espírito do
evolucionismo, que é o correto”.
Em outra correlação, houve disjunção quanto aos objetos C e D,
com o sujeito apresentando pleno desfavorecimento ao texto pró-criacionista, mas
relativa aceitação ao aluno que defende o texto. Quanto ao texto, foi enfático:
“O texto 2 não merece ser considerado. Fala apenas
bobagens”.
Quanto ao aluno, foi brando e, mesmo não aceitando tal
posicionamento, procurou mostrar atitude de respeito à opinião contrária:
“Aceitaria a sua opinião. Teria respeito por ela; porém,
diria para que ele estudasse melhor o evolucionismo”.
A inclusão do termo “respeito” repetiu-se na atitude representada
junto ao objeto E, ou seja, ao professor que virtualmente interfere na polêmica
sem dar abertura aos alunos. Pronunciou defesa quanto ao professor expor o seu
ponto de vista, ou seja, quanto ao professor tomar um posicionamento, mas
desaprovou a forma de abordagem:
“O professor deve expor o seu ponto de vista, mas deve
respeitar a opinião dos seus alunos. Tá errado”.
Portanto, nas representações do sujeito TKO não foram notadas
atitudes que trouxessem prejuízos imediatos ao desenvolvimento moral dos
alunos.
Quadro 8 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor CLT para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A “Concordo plenamente com o texto nº 1. Felizmente as idéias foram revistas e a posição da Igreja [Católica] mudou.”
concordo plenamente
com o texto nº 1
+3 felizmente
foram revistas a posição da Igreja
B
“Eu parabenizaria suas idéias corretas. E tentaria exemplificar cientificamente que a Bíblia tinha razão.”
parabeniza-ria
idéias corretas
+3 tentaria
exemplificar cientificamente que a Bíblia tinha razão
C
[Há discordância plena explicitada pelo enunciado único de avaliação do objeto de atitude A]
---
---
-3
D
“Tentaria pacientemente fazê-lo entender os argumentos e as evidências da Evolução. Se ele não aceitar, eu diria: Se uma crença não permite aceitar esta teoria, você deveria rejeitá-la. Mas eu preciso dizer a verdade: Para mim, não há contradição entre ciência e fé, mas se para você há, eu respeito suas idéias.”
tentaria fazê-lo entender paciente-mente
argumentos e evidências da Evolução
-2
deveria rejeitá-la
[a crença que não permite aceitar a teoria
da evolução]
mas eu respeito
suas idéias [contrárias]
E
“Jamais diria que o criacionismo é tolice.”
jamais diria que o criacionismo é tolice
-3
Quadro 9 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor CLT
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 A/B D C/E
Os enunciados para os objetos A e B, conforme quadro 8, não
deixam dúvidas quanto ao favorecimento pleno. Quanto aos enunciados de C e E
também, mas pelo aspecto de desfavorecimento pleno. Para o objeto D o
desfavorecimento foi restritivo no conector “mas eu respeito”, por isso recebeu
pontuação de intensidade -2.
Assim, a mesma correlação íntima que apareceu na representação
do sujeito TKO, anteriormente citada, também está expressa no sujeito CLT para
os objetos A e B.
Comparando os enunciados para esses dois objetos de atitude, em
CLT, percebem-se termos de plenitude. No final do enunciado para o objeto B
aparecem, inclusive, argumentos religiosos como tentativa de compatibilização
com a ciência:
“Concordo plenamente com o texto nº 1. Felizmente as
idéias foram revistas e a posição da Igreja [Católica]
mudou”.
“Eu parabenizaria suas idéias corretas. E tentaria
exemplificar cientificamente que a Bíblia tinha razão”.
Quanto ao aluno pró-criacionista (objeto D), as atitudes
representadas foram de nítida desaprovação, incluindo-se unidades de significação
demonstrando insistente desejo de transformar a opinião. Ao final, entretanto,
denota “respeito” a essa opinião, mas se sobreviver aos argumentos de
transformação.
“Tentaria pacientemente fazê-lo entender os argumentos e
as evidências da evolução. Se ele não aceitar, eu diria: Se
uma crença não permite aceitar esta teoria, você deveria
rejeitá-la. Mas eu preciso dizer a verdade: Para mim, não
há contradição entre ciência e fé, mas se para você há, eu
respeito suas idéias.”
Quanto ao objeto E, parece que o sujeito CLT transportou-se a ele.
Nesse caso, sujeito e objeto fundiram-se num só, e o enunciado mostrou atitude
defensiva:
“Jamais diria que o criacionismo é tolice.”
Quadro 10 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor JCF para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A “A Igreja Católica do passado, sendo mais radical e conservadora, não aceitava o que se diz no texto 1. Hoje, suas idéias se adaptam mais aos nossos tempos.”
se adaptam mais aos nossos tempos
as idéias [da Igreja Católica]
+2
“Concordaria com ele. Porém, o aconselharia a ter sua fé e também a ler a Bíblia.”
concordaria
com ele
B
porém, o aconselha-
ria
a ter sua fé +2
e também a ler
a Bíblia
C [Ausência]
--- --- -2
D
“Primeiro, respeitaria suas convicções religiosas. Depois, faria o possível para ele compreender a teoria com nossos argumentos e explicações atuais. Aconselharia a respeitar o evolucionismo e adaptar-se aos conceitos atuais.”
respeitaria
suas convicções religiosas
-1
depois, faria o possível
para ele compreender a teoria com nossos
argumentos
aconselha-ria
a respeitar o evolucionismo
e adaptar-se aos conceitos atuais E
“Não é tolice, pois Deus criou o mundo e os seres vivos para evoluírem gradativamente. Seria, então, possível conciliar as duas idéias ao mesmo tempo.”
não é tolice -3
seria possível
conciliar as duas idéias ao mesmo tempo
Quadro 11 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor JCF
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 A/B D C E
O quadro de análise de asserção avaliativa do sujeito-locutor JCF
(Quadro 10) mostra que o enunciado para o objeto A não revelou favorecimento
pleno, restringindo-se a uma avaliação parcial desse objeto, com apenas um
aspecto dele sendo revelado pelo conector “se adaptam mais aos nossos tempos” e
a qualificação “as idéias [da igreja católica]”.
Em B também houve favorecimento parcial, entretanto, de mais
fácil detecção pela presença do conector “porém”.
Em C, apesar da ausência de enunciado direto, o valor -2 foi
contabilizado pela contrapartida realizada a partir da avaliação para o objeto A.
Portanto, a ausência de enunciado, nesse caso, não revelou neutralidade em razão
das avaliações de A e B encerrarem elementos comparativos no próprio
questionamento proposto pelo entrevistador.
Em D, houve dúvida na atribuição do valor de intensidade. No
enunciado, conectores e qualificações ora apontavam favorecimento, ora
desfavorecimento. O deslocamento final foi de desfavorecimento. Na dúvida entre
os valores -2 e -1, optou-se pelo último. Em C, o enunciado foi de reprovação
plena.
A construção do conjunto de representações para todos os objetos
mostrou-nos uma forte influência religiosa nos argumentos, como tentativa de dar
importância a ela nas discussões em suma. Isso nos remeteu novamente ao
fenômeno de coexistência pacífica entre ciência e religião (Jorge, 1995, entre
outros).
Para as atitudes em relação ao texto pró-evolucionista, o sujeito
JCF nos passa a idéia de que no passado a igreja católica estava errada, mas que
atualmente, após rever suas posições, está mais próxima do que a ciência diz.
Para o aluno que defende o texto pró-evolucionista (objeto B), há
ratificação da importância religiosa que o sujeito parece demonstrar nos seus
argumentos. Nas entrelinhas do enunciado a seguir parece dizer: “Olha, a ciência
está certa, mas não se esqueça da religião.”
“[...] Porém, o aconselharia a ter sua fé e também a ler a
Bíblia.”
Em E, entra em contradição com sua posição evolucionista inicial,
quando vê possibilidades de conciliação entre as duas teorias. Sobre a atitude da
interferência do professor não houve avaliação.
Quadro 12 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor ECF para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A
“Os dois textos são totalmente contrastantes.[...] Eu sempre achei um absurdo quando, fazendo escavações, alguém encontra lá um pedaço da arcada de um animal de não sei quantos anos atrás e, baseado só naquele pedacinho, já se imagina como é o restante do animal. Eu não consigo entender como isso é possível.[...] São dois textos bem extremos, radicais. Os dois são muito cá ou muito lá. Faltou equilíbrio.”
são totalmente contrastantes
os dois textos
-3
eu sempre achei um absurdo
quando, fazendo escavações...
se imagina como é o restante do animal
são bem extremos, radicais
os dois textos
faltou equilíbrio B
“Eu procuraria falar para o aluno sempre aquilo: Olha, nós estamos numa democracia. Existe liberdade plena para tudo. Você tem todo o direito de pensar do jeito que pensa. Tanto a favor de um, quanto do outro, mas deveria raciocinar mais, ter mais equilíbrio, ponderar mais para perceber onde tem exagero, tanto de um lado quanto do outro. Fazer o aluno não ficar só com aquela visão única. Mostrar que ele tem que enxergar mais além, que não existe só uma vertente. Diria para ele ter um horizonte mais amplo, do que ficar: Oh, é esse texto, é isso que eu acho e acabou.”
tem todo o direito
de pensar do jeito que pensa
-1
mas deveria raciocinar mais ter mais equilíbrio ponderar mais
para perceber onde tem
exagero, tanto de um lado,
quanto do outro
mostrar que ele tem que enxergar
mais além
ele ter um horizonte mais amplo
Quadro 12 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor ECF para diferentes objetos de atitude (continuação)
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
C
“Os dois são totalmente contrastantes.[...]Os dois textos são bem chocantes. [...]Falar que é satânico isso aqui [no texto 2]. São dois textos bem extremos, radicais. Os dois são muito cá ou muito lá. Faltou equilíbrio.”
são totalmente contrastantes
os dois textos -3
são bem chocantes são bem
extremos, radicais
os dois textos
faltou equilíbrio D “Diria a mesma coisa”. [avaliação do objeto
A] --- --- -1
E
“Eu vejo esse professor como autoritário, achando que ele é o dono da verdade. Que o que ele aceita tem que ser aceito pelos alunos. Eu não concordo com isso.”
vejo como professor autoritário
-3
não concordo
Quadro 13 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor ECF
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 B/D A/C/E
O quadro para o sujeito-locutor ECF mostrou reprovações plenas
para os objetos A, C e E, ou seja, aos dois textos e ao virtual professor que
interfere enfaticamente nas polêmicas provocadas pelo tema.
Em B e D, a primeira parte do enunciado indicou favorecimento.
Em seguida houve pendência para o desfavorecimento, com vários conectores e
qualificadores servindo de indicativos, como “mas deveria raciocinar mais”, “ter
mais equilíbrio”, “ponderar mais”. Na dúvida entre os valores -2 e -1, optou mais
uma vez pelo -1. Nas dúvidas surgidas, a opção foi de não valorar aos extremos.
Ao conjunto de representações voltados para os alunos (objetos B e
D) denotam-se enunciados com teor de sensibilidade a atitudes éticas e de
equilíbrio, dos quais destacamos:
“... nós estamos numa democracia.”
“Existe liberdade plena ...”
“Você tem todo o direito...”
“...ter mais equilíbrio...”
Ao mesmo tempo, as representações que se voltaram para os dois
textos (Figura 3) trazem críticas incisivas, com forte descontentamento ao
radicalismo de cada um deles. Em avaliação ao texto pró-evolucionista (texto nº1),
inclusive, o sujeito ECF tece comentários que se direcionam contrários aos
estudos científicos dos fósseis como evidências dessa teoria.
“Eu sempre achei um absurdo quando, fazendo
escavações, alguém encontra lá um pedaço da arcada de
um animal de não sei quantos anos atrás e, baseado só
naquele pedacinho, já se imagina como é o restante do
animal. Eu não consigo entender como isso é possível.”
Quadro 14 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor LLM para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A
“O texto nº 1 mostra a aceitação que hoje a teoria da evolução tem até frente a Igreja Católica.”
mostra aceitação até frente a
Igreja Católica
o texto nº 1 +2
B
“No caso, estaria indo ao encontro dos objetivos da minha aula. Seu depoimento seria de auxílio.”
estaria indo ao encontro de minha aula
+3 seria de auxílio C
“O texto nº 2 mostra a posição defendida por aqueles que defendem o criacionismo, normalmente tomada por evangélicos que trabalham muito com a figura de satanás, pecado, inferno.”
mostra posição defendida por aqueles que defendem o
criacionismo
-1
trabalha muito com
a figura de satanás, pecado, inferno
D
“Diria para ele que primeiro terminasse de ouvir a minha aula e, então, discutiríamos o assunto. Acho que o professor deve tratar a evolução como um misto das teorias e ao mesmo tempo acreditar que para tudo isso ocorrer deve existir um Deus superior.”
diria para que
primeiro terminasse
de ouvir a minha aula -2
e, então, discuti-ríamos
o assunto
E
“Acredito que o professor deva saber combinar as duas teorias e não julgar a posição do criacionismo como uma tolice. Acho que deve trabalhar de maneira a evidenciar a importância das duas teorias em conjunto.”
deve saber combinar as duas teorias
-2
não julgar a posição do criacionismo como tolice
deve trabalhar de maneira
a evidenciar a importância
das duas teorias
Quadro 15 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor LLM
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 B A C D/E
Em A, no quadro do sujeito-locutor LLM (Quadro 14), a
semelhança do enunciado com o encontrado anteriormente, no sujeito-locutor JCF
(Quadro 10), fez seguir o mesmo critério de valoração. O sujeito LLM, assim
como JCF também o fez, utilizou-se da aceitação que a igreja católica tem sobre a
teoria da evolução como argumento avaliativo.
Em B, o favorecimento foi de pleno aceite ao aluno que defende o
texto pró-evolucionista, em razão de auxílio e de convergência aos objetivos de
aula.
“No caso, estaria indo ao encontro dos objetivos da
minha aula. Seu depoimento seria de auxílio.”
Em C, levou-se em consideração a contrapartida de avaliação do
objeto A, com opção de valorar a intensidade em –1. Um desfavorecimento
pendendo quase à neutralidade, em razão de características de impessoalidade
contidas no enunciado:
“O texto nº 2 mostra a posição defendida por aqueles que
defendem o criacionismo, normalmente tomada por
evangélicos que trabalham muito com a figura de satanás,
pecado, inferno.”
Em D, o valor -2 deveu-se pela expressividade enfática de
desfavorecimento inicial, com a amenidade posterior (“e, então, discutiríamos o
assunto”).
Em E, não pareceu ocorrer desfavorecimento pleno, apesar de “não
julgar a posição do criacionismo como tolice”. A opção pela parcialidade deveu-se
à amenidade encontrada em termos como “deve saber combinar” e “deve trabalhar
de maneira a”.
No conjunto dos enunciados, apareceu novamente o fator
conciliatório entre ciência e religião, resumido na seguinte citação:
“Acredito que o professor deva saber combinar as duas
teorias e não julgar a posição do criacionismo como uma
tolice. Acho que [o professor] deve trabalhar de maneira a
evidenciar a importância das duas teorias em conjunto.”
Quadro 16 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor ALS para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A
“As evidências da Evolução são confiáveis, pois existem provas sobre isso, como os fósseis, estruturas homólogas e análogas. Porém, não se deve esquecer que as transformações que aconteceram nos organismos tiveram causa e conseqüência. Por que não de um Criador?”
são confiáveis
as evidências da Evolução
+2
existem provas
sobre isso [evolução]
porém, não se deve esquecer
as transformações que aconteceram nos organismos
vivos tiveram causa e conseqüência
B
“Até mesmo o papa aceita que a Evolução é mais que uma simples hipótese, devido aos novos conhecimentos científicos.”
até mesmo o papa aceita
+2
é mais que uma simples hipótese
a Evolução
C
“As evidências da Evolução são confiáveis, pois... [idem avaliação do objeto A]
--- --- -2
D
Eu o orientaria que pesquisasse sobre o assunto e só depois disso tirasse uma conclusão final.”
orientaria que
pesquisasse sobre
o assunto -1
e só depois disso tirasse
uma conclusão final
E
“O professor nunca deve dar uma resposta desse tipo. Isso é falta de ética, principalmente se os alunos não pediram sua opinião. O que deve fazer é orientá-los e apresentar os lados positivos e negativos de cada teoria e os alunos chegarem na melhor solução.”
nunca deve dar
uma resposta desse tipo -3
é falta de ética o que deve
fazer é orientá-los e apresentar
os lados positivos e negativos de cada teoria
Quadro 17 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor ALS
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 A/B D C E
O quadro do sujeito-locutor ALS, mostra favorecimentos parciais
para os objetos A e B. Em A apareceu o conectivo restritivo “porém”; em B
optou-se pela parcialidade em razão de ausência de termos de expressividade total
ou plena. Tanto em A quanto em B houve presença de fatores religiosos na
argumentação avaliativa.
Em C, a valoração foi resultado da contrapartida da avaliação do
objeto A. Em D, a direção negativa ficou evidente, mas a intensidade não. A
opção, como nos demais casos, foi para o valor menos extremo (-1).
Em E, o conjunto de conectores e qualificadores “nunca deve dar
uma resposta desse tipo” e “é falta de ética” respondeu pelo valor de intensidade
-3.
O conjunto de enunciados do sujeito ALS, como verificado em
casos anteriores, também apresentou argumentos não divergentes entre ciência e
religião, como a seguir:
“...Porém, não se deve esquecer que as transformações
que aconteceram tiveram causa e conseqüência. Por que
não de um Criador?”
Quadro 18 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor CTR para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
A “Não concordo com o texto 1.” não concordo -3 B
“Ele deveria continuar pesquisando a idéia defendida por ele. Jamais iria influenciá-lo. Auxiliaria, indicando livros, revistas, sites na Internet e, ainda, como estímulo, solicitaria, se encontrasse algo muito interessante, gostaria de conhecer.”
deveria continuar pesqui- sando
a idéia defendida por ele
+2
jamais iria influenciá-lo auxiliaria,
indicando livros, revistas, sites na internet
C
“[...]e também não concordo com o texto 2, pois acredito que o tempo de Deus é diferente do tempo humano. Eu creio na criação de Deus mesmo em termos de Evolução, sem encarar o fato que a teoria da Evolução serve ao propósito de satanás.”
não
concordo
-3
pois acredito
que o tempo de Deus é diferente do tempo humano
D “A mesma coisa [da avaliação enunciada ao objeto A].
--- --- +2
E
“Não concordo com a idéia, pois não gosto de imposição de idéias. Creio que impor é desrespeitar. O ideal é conduzir, estimular as pesquisas.”
não concordo
com a idéia
-3
não gosto de imposição creio que
impor é desrespeitar
conduzir, estimular as pesquisas é
ideal
Quadro 19 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor CTR
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 B/D A/C/E
Os enunciados do sujeito-locutor CTR (Quadro 18) para os objetos
de atitude A, C e E refletiram total reprovação. Assim como também ocorreu com
ECF (Quadro 12), o sujeito CTR reprovou os dois textos apresentados a ele.
Quanto ao texto pró-evolucionista, foi convicto na discordância. Junto ao texto
pró-criacionista, a reprovação veio acompanhada com justificativas que derivaram
para uma conciliação entre as duas teorias:
“...Eu creio na criação de Deus mesmo em termos de
evolução, sem encarar o fato que a teoria da evolução
serve ao propósito de satanás”.
Em B e D, houve avaliação positiva parcial, com restrição em
“auxiliaria, indicando”. Houve dúvidas no caso anterior; o pesquisador
inicialmente pendeu entre a totalidade (+3) e a parcialidade (+2). O aparecimento
dos termos “jamais iria influenciá-lo” e “auxiliaria, indicando” não representou
oposição, mas deixou de refletir a plenitude ou totalidade na aprovação. A opção
final, então, foi pela valoração +2.
Quadro 20 - Normalização da análise de asserção avaliativa do locutor AAV para diferentes objetos de atitude
Transformação
Objeto Enunciação
Conectores Qualificação Valor
concordo texto nº 1 A
“Eu concordo com o texto nº 1, os seres vivos sofrem evolução ao longo dos tempos. João Paulo II defendendo a evolução? E o criacionismo, como fica?. Dentro de cada texto há contradição.”
sofrem evolução
os seres vivos
+2
defendendo a evolução?
João Paulo II
como fica? o criacionismo B
“Eu diria que ele possui livre arbítrio para fazer suas escolhas e que sua crença depende da sua religião, da sua vivência, ou seja, do seu senso crítico.”
diria que ele possui
livre arbítrio para fazer
suas escolhas
+3
C
“Não concordo com o texto nº 2, segundo o qual a crença na teoria da evolução nega a presença de Deus e serve ao propósito de Satanás. Agora, o texto nº 2 relacionar Deus e Satanás com a evolução não faz sentido.”
não
concordo
texto nº 2
-3
não faz sentido
relacionar Deus e Satanás com
evolução
D
[Idem B]
+3
não deve assumir esta postura
o professor
E
“O professor não deve assumir esta postura, induzindo os alunos a acreditarem ou desacreditarem em determinadas teorias. Os alunos são diferentes e cada um tem sua crença.”
são diferentes
os alunos -3
cada um tem a sua
crença
Quadro 21 - Nível de favoritismo/desfavoritismo para os diferentes objetos de atitude, segundo enunciados do locutor AAV
POSITIVO ← NEUTRO → NEGATIVO +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 B/D A C/E
Os enunciados para os objetos B e D do sujeito-locutor AAV
(Quadro 20) receberam valoração de intensidade +3 por refletirem favorecimento
pleno. Em ambos os casos, não houve indicativos de restrição.
Para os objetos C e E a valoração de intensidade também foi
máxima, mas de desfavorecimento, nos termos “não concordo” e “não deve”.
O objeto A recebeu valor de intensidade +2 porque o enunciado
refletiu favorecimento parcial e restritivo. Ao mesmo tempo que houve
concordância, também houve dúvidas quando o sujeito questionou:
“João Paulo II defendendo a evolução? E o criacionismo,
como fica?”
Tais questionamentos apresentados pelo sujeito AAV nos dão conta
dos fatores conciliatórios já observados anteriormente. Ao mesmo tempo que á
defesa do evolucionismo, também há cuidados em não descartar as idéias do
criacionismo.
5.5.4 - Sobreposição comparativa nas atitudes de todos os
sujeitos e para cada objeto
Os objetos de atitude A e B predominaram nos níveis de
favoritismo, enquanto que os objetos D, C e E predominaram nos níveis de
desfavoritismo (Quadro 22). Dos oito sujeitos-locutores, seis apresentaram
favoritismo ao objeto A. Para o objeto B, o nível de favoritismo foi apresentado
em sete deles. O objeto D apareceu em dois enunciados de favoritismo parcial e
um pleno. Os objetos que apresentaram maiores reprovações ou desfavoritismos
foram os seguintes: E (para todos os sujeitos-locutores), C (também para todos os
sujeitos-locutores, porém com níveis menos extremos de rejeição), D (para cinco
sujeitos-locutores), A (para dois sujeitos-locutores), e B (para um sujeito-locutor).
Esse resultados permitem delinear parcialmente uma representação
das atitudes dos professores de biologia nas interações de sala de aula, quando há
tratamento de assuntos polêmicos.
Quadro 22 - Sobreposição comparativa do nível de favoritismo/desfavoritismo para cada objeto de atitude, em todos os locutores
Locutor +3 +2 +1 0 -1 -2 -3
TKO A/B D E C CLT A/B D C/E JCF A/B D C E ECF B/D A/C/E LLM B A C D/E ALS A/B D C E CTR B/D A/C/E AAV B/D A C/E
A simples visualização do quadro 22 expõe a aprovação
significativa tanto ao evolucionismo quanto aos alunos que defendem as idéias
dessa teoria, parecendo sobressaltar o valor científico sobre o religioso
fundamentalista nos casos das representações analisadas.
Ao mesmo tempo que o evolucionismo mostra-se em evidência
favorável no ensino, os enunciados também revelam alto grau de
desfavorecimento ao professor que interfere em favor do evolucionismo e
contrário ao criacionismo. Seria indícios de que o ciclo do ensino tradicional
estaria encerrado, em favor de uma linha construtivista de ensino? Numa primeira
leitura, mais superficial, parece haver uma perspectiva favorecendo essa trajetória.
Entretanto, podemos questionar se o discurso apresentado pelos
sujeitos da pesquisa, desfavorável ao posicionamento desse virtual professor, que
interfere enfaticamente na discussão dos alunos, mostra real tendência de respeito
à concepção prévia do aluno. O questionamento deve-se ao fato da detecção, nos
enunciados de alguns discursos, de maiores referências ao conteúdo polêmico,
entre evolucionismo e criacionismo, de que em relação ao respeito à concepção do
aluno. Destacamos, a seguir, os enunciados que permitiram tal abstração:
“Jamais diria que o criacionismo é tolice.” (CLT)
“Não é tolice, pois Deus criou o mundo e os seres vivos
para evoluírem gradativamente. Seria, então, possível
conciliar as duas idéias ao mesmo tempo”. (JCF)
“Acredito que o professor deva saber combinar as duas
teorias então julgar a posição do criacionismo como uma
tolice. Acho que deve trabalhar de maneira a evidenciar a
importância das duas teorias em conjunto”. (LLM)
5.5.5 - Conversão da medida de atitudes em graus de
convergência/divergência
Para melhor comparação e análise entre as avaliações dos diferentes
objetos de atitude foi elaborada uma tabela de conversão (Tabela 1), na qual as
intensidades de favoritismo/desfavoritismo receberam graus percentuais. Esta
adaptação permitiu melhor comparação e análise entre os vários pares de objetos
de atitude, quando em conjunção ou disjunção. Em razão dessa conversão, surgiu
uma nova variável denominada grau de convergência.
Tabela 1 - Conversão do nível de favoritismo/desfavoritismo das atitudes para graus de convergência:
100% 83% 67% 50% 33% 17% 0% positivo +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 negativo
0% 17% 33% 50% 67% 83% 100%
Exemplos de como ocorreram as conversões estão apresentadas na
tabela a seguir.
Tabela 2 - Exemplos de conversão do nível de favoritismo/desfavoritismo para graus de convergência
100% 83% 67% 50% 33% 17% 0% positivo +3 +2 +1 0 -1 -2 -3 negativo
0% 17% 33% 50% 67% 83% 100% A/B E F C D
a.) Convergência entre A/B = 100%, pois estão presentes na mesma casela; neste caso, o grau de divergência é 0% (nula). b.) Convergência entre A/E = 67%, pois estão duas caselas distantes.. c.) Convergência entre A/D = 0% (nula), pois estão nos dois extremos. d.) Convergência entre E/C = 50%, pois estão a 3 caselas de distância. e.) Convergência entre E/F = 83%, pois estão a uma casela de distância.
O quadro a seguir (Quadro 23) mostra diferentes pares de objetos
de atitude para cada sujeito-locutor com os respectivos graus de convergência, ou
seja, de aproximação nas intensidades de favoritismo/desfavoritismo.
Os pares aparecem separados por conjunção (aproximação mútua
de euforia ou disforia) e disjunção (euforia para um e disforia para outro, ou seja,
relação de contraposição, de contrariedade nas avaliações recebidas).
A ressalva que se faz necessária aparece em dois casos (sujeitos-
locutores ECF e CTR), pois todos os pares apareceram em conjunção disfórica, ou
seja, ambos aparecem em conjunção desfavorável. Nesse caso, deu-se o nome de
conjunção virtual para o grau de convergência entre eles, determinando
convergência disfórica. Ao contrário dos demais casos, de conjunção real, cuja
relação foi eufórica.
Quadro 23 - Graus de convergência para objetos em conjunção e disjunção, segundo os seus locutores TKO CLT Conjunção real (favorável): A ↔B = 100% Disjunção: A ↔C = 0% A ↔D = 83% A ↔E = 17%
Conjunção real (favorável): A ↔B = 100% Disjunção: A ↔C = 0% A ↔D = 17% A ↔E = 0%
JCF ECF Conjunção real (favorável): A ↔B = 100% Disjunção: A ↔C = 33% A ↔D = 50% A ↔E = 17%
Conjunção virtual (desfavorável): A ↔C = 100% A ↔B = 67% A ↔E = 100% A ↔D = 67%
LLM ALS Conjunção real (favorável): A ↔B = 83% Disjunção: A ↔C = 50% A ↔D = 33% A ↔E = 33%
Conjunção real (favorável): A ↔B = 100% Disjunção: A ↔C = 33% A ↔D = 50% A ↔E = 17%
CTR AAV Conjunção virtual (desfavorável): A ↔C = 100% A↔B = 17% A ↔E = 100% A ↔D = 17%
Conjunção real (favorável): A↔ B = 83% Disjunção: A↔ C = 17% A↔ D = 83% A↔ E = 17%
Ao mesmo tempo que os sujeitos aprovaram o texto pró-
evolucionista (objeto de atitude A), também demonstraram aprovação aos virtuais
alunos que defendem as idéias desse texto (objeto de atitude B), com amplo grau
de convergência (Quadro 23). Esse fato pôde ser observado em TKO, JCF, LLM,
CLT, ALS e AAV. Os sujeitos CTR e ECF também revelaram alto grau de
convergência nas relações A-C (os dois textos) e A-E (texto pró-evolucionista e
virtual professor que defende enfaticamente esse texto junto aos alunos), mas de
desfavorecimento (conjunção virtual desfavorável).
Levando-se em conta as disjunções, o grau de convergência na
relação A-D apareceu sempre maior do que na relação A-E, revelando tendência
favorável aos alunos nas suas atitudes em relação aos professores nas suas. Isso foi
verificado entre os sujeitos-locutores TKO, CLT, JCF, LLM, ALS e AAV. Os
sujeitos-locutores ECF e CTR também revelaram esse tipo de favorecimento, pois
o grau de convergência desfavorável foi menor na relação de disjunção A-B e
maior em A-E.
5.5.6 - Atitudes em ações semelhantes para professores de
diferentes componentes curriculares
Ao ser apresentada na entrevista a suposição do sujeito representar
o aluno, no qual seu professor defendesse enfaticamente as idéias pró-criacionistas
do texto nº 2 (em primeira instância se o professor fosse de um componente
curricular qualquer e, em segunda instância se o professor fosse de biologia), a
desaprovação apareceu mais nitidamente para o professor de biologia (Quadro
24). Seria uma cobrança maior sobre o professor de biologia em razão do tema ser
específico desse componente curricular? Mas, então, a cobrança sobre as atitudes
seriam ditadas pelos conteúdos específicos de cada componente curricular? Nesse
último caso, os professores de outros componentes curriculares estariam
desobrigados de determinadas ações, se elas não tivessem correspondência com a
sua disciplina? Por quê?
Quadro 24 - Enunciados comparativos para objetos de atitude semelhantes (professor de qualquer componente e professor de biologia), colocados em disjunção com o sujeito Locutor
Professor de qualquer outro
componente curricular
Professor de Biologia
TKO “Respeitaria a sua opinião, mas o faria ver do seu erro.”
“Diria que estava lecionando a matéria errada, que ele deveria virar pastor.”
CLT “É difícil raciocinar hipoteticamente. Acho que acharia [risos] o professor ignorante em Biologia e também que ele não era obrigado a saber outra matéria diferente da sua.”
“Se fosse professor de Biologia, eu eu acharia que ele deveria fazer um curso sobre Evolução. Não se admite um professor de Biologia ignorante nesse assunto.”
JCF “Eu aconselharia esse professor a trocar idéias com o de Biologia e também a ler um bom livro sobre Evolução.”
“Se fosse de Biologia, ele estaria completamente errado, equivocado, uma vez que não poderia ignorar a teoria da Evolução.”
ECF “Depende muito do professor. Se fosse um professor bom, muito capaz na matéria dele, bem equilibrado, eu até ia conversar com ele: Oh, professor, não é bem assim. Ia mostrar o meu ponto de vista. Agora, se fosse desses professores que falam por falar, uma coisa hoje e outra amanhã, entraria por um ouvido e sairia por outro.”
“Ah, se fosse um professor de Biologia, daí eu iria conversar. Como aluna, eu não conversaria na frente dos outros, pois sou tímida. Mas depois da aula, eu diria: Professor, quanto aquele assunto que o senhor falou... Se fosse professor de Biologia, eu conversaria.”
LLM “Pensaria o quanto ele seria arbitrário, na medida que só suas opiniões seriam válidas, desconsiderando as demais existentes.”
“Não falaria nada.”
ALS “Eu conversaria com ele. Debateria as idéias e juntos chegaríamos numa solução final.”
“Não interessa a disciplina, o que interessa é o resultado final.”
CTR “Comentaria o assunto com o professor de Biologia. Creio que ele teria melhores condições de conduzir o assunto.”
“Não poderia conduzir assim.”
AAV “Eu não sofreria influências, já tenho a opinião formada.”
“Criticaria este professor, pois ele pode influenciar a crença dos alunos, de maneira negativa, pois envolve a religiosidade.”
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Se a ética refere-se à recusa da violência, à idéia da igualdade e da justiça, à liberdade como criação do possível no tempo e à democracia como invenção, reconhecimento e garantia de direitos, baseados nos princípios da igualdade e da diferença, e se a forma contemporânea do capitalismo e da ideologia contraria valores e normas que constituem o campo ético, creio que nossa primeira tarefa, enquanto universitários, é o combate lúcido ao que impede a ética na sociedade contemporânea.”
Marilena Chauí
Amparados em nossos propósitos iniciais, e fundamentados pelas
análises e discussões desenvolvidas nesta pesquisa, pudemos verificar as atitudes
configuradas nas representações dos professores de biologia, em situação de
controvérsia entre evolucionismo e criacionismo. O conjunto das atitudes
representadas permitiu-nos traçar um desenho parcial, real ou perspectivo, da ética
no ensino de ciências, com implicações resultantes para o processo de
desenvolvimento moral.
O posicionamento inicial dos professores entrevistados revelou
tendências ao evolucionismo, assim como também mostrou a existência de
professores de biologia nitidamente ligados a idéias do criacionismo. No entanto,
as tendências para uma ou outra teoria não se mostraram construídas somente com
conhecimentos adquiridos através da ciência, na educação formal, mas também a
crença religiosa se destacou.
Houve relativa harmonia entre o posicionamento inicial dos
professores com o que eles indicaram em relação ao posicionamento dos alunos,
ou seja, o professor que se posicionou na categoria eufórica do evolucionismo
também posicionou o que ele acreditava do aluno na mesma categoria. O fato
repetiu-se nos demais casos, dando créditos de que esses professores e seus
respectivos alunos teriam um ponto de partida semelhante nas controvérsias. No
entanto, essas considerações ficaram vagas, pela impossibilidade de comparação
com dados não disponíveis dos alunos e professores na relativa harmonia que foi
representada.
Independente do posicionamento inicial dos professores na defesa
de uma ou de outra teoria, não foram detectadas representações que identificassem
atitudes de total heteronomia que pudessem causar grandes prejuízos ao
desenvolvimento moral dos alunos. Os discursos trouxeram elementos sintáticos
da ética, como respeito, justiça, liberdade, igualdade e benevolência, que
transferidos à prática docente atuariam em benefício da autonomia moral dos
alunos. Todavia, unidades de significação, extraídos de enunciados, revelaram que
traços de indesejáveis ideologias podem ser veiculadas, mesmo que de forma
inconsciente, aos alunos. Tais ideologias, por omitirem processos de construção
ou de origem, deram formato genérico ao que deveria ser particular. Partindo-se
da premissa que todos os discursos são ideológicos, tornar-se-ia eticamente
desejável que na prática pedagógica tal tipo de discurso não ocorresse. Opiniões
particulares sobre determinado assunto, ou mostrar-se diante de uma polêmica, ou
até mesmo argumentar na tentativa de conseguir transformações, desde que não
tragam omissões de origem e nem sejam fundamentadas em injustificadas
generalizações, devem ter livre trânsito nas práticas pedagógicas, com a ressalva
de que os espaços a contra-argumentos sejam preservados.
No conjunto de atitudes representadas, o ensino de biologia poderia
ser projetado em processo de transição, dentro do qual a sua matéria-prima e a
pedagogia de sala de aula já apresentariam um novo desenho hierárquico.
A rígida interferência do professor nas discussões polêmicas não foi
bem aceita, quando ela veio de forma a expressar-se em sentido contrário à
autonomia dos alunos.
Por outro lado, a ciência-disciplina parece avançar em termos mais
circunscritos da ética, talvez pelas características da ciência-processo, a sua
matéria-prima, ou exagero em forçar uma imagem positiva, ou ainda na vontade
de que se concretize uma educação com todas as potencialidades teoricamente
citadas como possíveis. Mas ainda seria necessário que as “verdades científicas”,
ou ideologias de segundo grau, deixassem de ser lançadas aos alunos, mesmo que
nas representações tais fatos fizessem aparecer brandamente.
Aos alunos foram dados maiores prestígios de favorecimento nas
atitudes representadas do que aos próprios professores, mesmo quando foram
colocados em situação de oposição nas controvérsias, e ainda que as idéias
defendidas fossem de total divergência.
Em mesma situação, as cobranças que ocorreram aos professores
de outros componentes curriculares foram menores do que as que ocorreram aos
professores de biologia. Professores de outros componentes curriculares foram
colocados em posição inferior, ou seja, de menores obrigações em circunstâncias
de controvérsias nos assuntos científicos. Cobranças excessivas recaíram sobre as
atitudes dos professores de biologia, talvez por causa da especificidade do
conteúdo vinculado a essa ciência.
Admite-se que o professor desceu do pedestal, mostrando
sensibilidade que aparece além dos conteúdos formais. Um professor mais
humano emergiu nas representações. Ficaram, porém, alguns questionamentos
desse aspecto em relação ao estado de realidade nos processos educacionais. Pelo
lado do relacionamento seria fator positivo e de avanço aos propósitos, mas
também poderia tornar-se mais problemático se o professor não tiver uma
preparação adequada para lidar com elementos da psicologia social nessa maior
proximidade com os alunos. Ações psico-pedagógicas incorretas podem trazer
prejuízos ao desenvolvimento moral dos alunos e aumentar a perda de
credibilidade dos professores.
Propostas curriculares que estipulam conteúdos, e que geralmente
se mostram úteis aos professores por esse motivo, ao invés de metodologias ou
princípios básicos norteadores do ensino, tornam-se entraves aos objetivos
projetados para a moralidade como processo em desenvolvimento, independente
dos conteúdos ou componentes curriculares. O tratamento que se dá nesses
documentos parece desprezar completamente a existência da moralidade nos
processos de ensino.
O desprezo ou ausência de fatores ligados à moralidade não foram
observados nas atitudes dos professores. Pareceu-nos, porém, que a moralidade
nas representações estava mais ligada à sensibilidade humana do que a um
conhecimento sistematizado acerca dos processos de construção e
desenvolvimento moral.
Mesmo com a presença dessa sensibilidade nos discursos, ainda
foram observadas atitudes presas a resquícios de linhas educacionais passadas. O
papel do professor, por exemplo, não se mostrou bem definido no momento das
tendências atuais sugeridas pelas representações, pois quando as atitudes pareciam
pender ao delineamento de um novo desenho de processo, ainda resvalavam em
processos pedagógicos pouco ou quase nada progressistas.
Ao traçarmos um paralelo entre os fatores de moralidade e
igualdade, nos parâmetros das teorias de Saviani sobre os pontos de partida e de
chegada da prática pedagógica, chegaremos à conclusão de que o posicionamento
da moralidade como ponto de partida também inutilizaria ações pedagógicas com
pretensões de favorecimento às transformações sociais, recaindo-se em mera
pedagogia reprodutiva e, portanto, de manutenção aos interesses minoritários da
atual sociedade “democrática”.
Assim como os textos desencadeadores apresentaram aspectos
predominantemente religiosos, também o conjunto de representações dos
professores mostrou a mesma tendência, ou seja, as atitudes representadas
apareceram circunscritas aos aspectos provocantes dos textos. Outros contextos -
histórico, social, econômico, cultural etc. - implicitamente presentes nas
polêmicas não foram utilizadas nas argumentações, o que nos permitiu pensar que
na realidade de sala de aula tais aspectos também podem permanecer ausentes. A
limitação das discussões aos enfoques da ciência e da religião, observada não
somente nos textos e nas representações dos professores, mas também em
diferentes trabalhos sobre o tema, traz prejuízos à disseminação de importantes
informações que poderiam subsidiar debates mais amplos, envolvendo, por
exemplo, as ideologias subjacentes nas manifestações políticas de tais polêmicas.
De acordo com a importância do tema e perspectivas que são
teorizadas para o papel da educação na formação voltada para a cidadania,
sugerimos que as questões inerentes à “ética no ensino” sejam inseridas
transversalmente no quadro curricular das licenciaturas.
O papel do professor parece ampliar-se para além dos conteúdos,
dirigindo-se a metodologias ou estratégias que requerem conhecimentos
específicos de ética e moral. Portanto, os projetos pedagógicos dos diferentes
cursos de graduação em licenciatura deveriam ser repensados e reestruturados com
a finalidade dessa garantia. O mínimo que se espera é um professor com formação
inicial, saído das universidades, que saiba discutir e aplicar os conhecimentos
teóricos básicos de ética no cotidiano escolar.
Finalmente, sugerimos transformar parte das 300 horas obrigatórias
de estágio num programa entre escolas e universidades com objetivos voltados de
maneira mais específica ao desenvolvimento moral dos alunos. Este programa
poderia contar com a participação de docentes universitários e estagiários em
Psicologia Educacional, Didática e Prática de Ensino interessados desde a
orientação teórica até a consecução de avaliação de julgamentos morais, análise e
estratégias para viabilizar o processo desenvolvimento moral em sala de aula,
seguindo-se paralelamente aos próprios conteúdos curriculares de cada professor.
Lembrando que a interação escola-universidade representa um ciclo que, por
consciência ética e dependência intrínseca, deve ser (e permanecer) efetivamente
fechado.
PARA ALÉM DA PESQUISA
Se não ficou claro ao leitor um posicionamento mais incisivo de
minha parte em relação à polêmica entre evolucionismo e criacionismo, devo
destacar que este foi meu propósito. Ao ser questionado por alguns leitores sobre
tal posicionamento, faço, neste adendo, algumas considerações.
No transcorrer da pesquisa, não achei necessário, e nem pertinente,
que minhas idéias sobre os assuntos discutidos se deixassem transparecer no corpo
estrutural do trabalho. Se bem que nada impedisse o contrário; foi apenas uma
opção.
Devo dizer que antes da execução desta pesquisa eu aceitava,
mesmo com algumas poucas lacunas não resolvidas pela ciência, a teoria da
evolução, ou mais especificamente a teoria moderna da evolução - o
neodarwinismo. Após a realização desta pesquisa, continuo aceitando a mesma
teoria. Defendo, como outros autores também defendem, a separação entre ciência
e dogma. Ambas, porém, coexistindo de modo não tão simples na construção do
conhecimento humano. Mas, então, que contribuições trouxe para mim a
pesquisa?
Reportando-me apenas ao plano individual, fez-me repensar sobre
uma postura de docência, em sala de aula, donde prevalecia a ciência como única
verdade nas minhas palavras, pensando que também seria a única verdade para os
meus alunos. Eu, inconscientemente, transmitia ideologias de 1º e 2º graus aos
meus alunos; tornava homogêneo o que é heterogêneo. Hoje, na minha prática
docente, como professor de biologia, continuo validando a verdade científica
como bastante consistente, mas não infalível e nem unânime a ponto de descartar
outras opções de conhecimentos que permeiam a realidade de cada aluno. No meu
ponto de vista, as questões éticas inerentes aos processos de ensino e
aprendizagem passam por discussões ainda mais amplas sobre o limiar tênue entre
o respeito ao conhecimento do aluno e o ensino de conhecimentos científicos.
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ANEXO
Transcrição parcial das entrevistas gravadas em fita cassete
Entrevista nº 1
Sujeito: TKO Tempo de magistério: 23 anos e 2 meses Sexo: Masculino
Disciplinas que leciona: Ciências e Biologia Religião declarada: Cristã
Leciona: Redes Públicas e Particular
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
TKO: Acho que a maioria acredita no evolucionismo.
Pesquisador: Por quê?
TKO: Porque as apostilas e livros não geram ocasiões para discussão. E também
pelo pequeno tempo direcionado para essa questão.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
TKO: Apenas no CEESUB, onde os alunos mais velhos, de religiões bem
definidas, não aceitam os dogmas da biologia.
Pesquisador: Por quê...
TKO: Porque ficam muito presos à palavra da Bíblia.
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
TKO: Não. Não deveria.
Pesquisador: Por quê?
TKO: Porque basta situarmos corretamente o que diz a biologia e o que diz a
Bíblia.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
TKO: O professor deve expor seu ponto de vista, já que defende o evolucionismo;
mas deve respeitar a opinião do seu aluno... Tá errado.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
TKO: [Não hesita] O texto 1 é o correto; o texto 2 não merece ser considerado...
fala apenas bobagens.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
TKO: Aceitaria a sua opinião. Teria respeito por ela; porém, diria para que ele
estudasse melhor o evolucionismo.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
TKO: Diria que entendeu bem o espírito do evolucionismo, que é o correto.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
TKO: Pensaria que o mesmo é contra a evolução.
Pesquisador: Como você agiria, como aluno dele?
TKO: Respeitaria a sua opinião, mas o faria ver do seu erro.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia...
TKO: Diria que estava lecionando a matéria errada, que ele deveria virar pastor.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
TKO: Sim, o professor é um exemplo. Seu gosto pela biologia pode gerar futuros
biólogos, médicos, dentistas.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
TKO: Fazer com que eles, os alunos, se respeitem mutuamente.
Entrevista nº 2
Sujeito: CLT Tempo de magistério: 35 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Biologia Religião declarada: Católica
Leciona: Redes Públicas e Particular
Formou-se em Universidade Católica Curso: Ciências Naturais
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.
CLT: A maioria acredita no evolucionismo.
Pesquisador: Por quê?
CLT: Na realidade, eles aceitam o evolucionismo somente depois de resolvidas
as suas dúvidas.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
CLT: Controvérsias sim, discussões não. Já lecionei para adventistas e um fato
chamou a minha atenção: Eles não aceitam a evolução na sua fé, mas aceitam
cientificamente essa teoria... e até a transmitem para seus alunos.
Pesquisador: Para você, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos ainda deveria
gerar dúvidas ou controvérsias?
CLT: Não.
Pesquisador: Por quê?
CLT: Porque a ciência e a Bíblia podem perfeitamente coexistir de maneira
harmônica. E, desde que o professor tenha segurança quando fala de ambas, as
dúvidas dos alunos serão perfeitamente sanadas.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
CLT: Jamais diria que o criacionismo é tolice. Eu sou criacionista evolucionista.
Ignorância é separar ambas. Não se trata de fé, mas de ciência. Eu aceito as
evidências científicas, mas sei, com segurança, que Deus criou o ser vivo e
também as leis que permitiram uma evolução. Por que Deus não poderia reger a
evolução? Por que Ele, Deus, deveria criar cada espécie separadamente? São
perguntas que eu faço.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (do roteiro). A seguir,
pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
CLT: Concordo plenamente com o texto nº 1. O teólogo Teilhard de Chardin foi
excomungado pela Igreja Católica por suas idéias evolucionistas. Isso quando ela
ainda era ignorante. Felizmente as idéias foram revistas e a posição da Igreja
mudou.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
CLT: Tentaria, pacientemente, fazê-lo entender os argumentos e as evidências da
Evolução. Se ele não aceitar, eu diria: Se uma crença não permite aceitar esta
teoria, você deverá rejeitá-la. Mas eu preciso dizer a verdade. Para mim, não há
contradição entre ciência e fé. Mas se para você há, eu respeito suas idéias.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
CLT: Eu parabenizaria suas idéias corretas. E tentaria exemplificar que,
cientificamente, “a Bíblia tinha razão”. Você conhece esse livro?
Pesquisador: Conheço, mas ainda não o li. Se você fosse aluno de ensino médio e
seu professor (não o de biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de
maneira enfática as idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
CLT: É difícil raciocinar hipoteticamente. Acho que acharia o professor
ignorante em biologia e também que ele não era obrigado a saber outra matéria
diferente da sua.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia?
CLT: Se fosse de biologia, eu acharia que ele deveria fazer um curso sobre
evolução. Não se admite um professor de biologia ignorante nesse assunto.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
CLT: Sim, o professor de biologia ou de qualquer outra disciplina é um grande
agente de transformações nos alunos. Ele precisa cuidar-se porque influencia as
atitudes e o pensamento dos alunos. Ele, por exemplo, é capaz de mudar os
hábitos de higiene dos alunos.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
CLT: Não há problemas. Os assuntos polêmicos são ótimos para despertar o
interesse e o raciocínio do aluno. A obrigação do professor de biologia é
despertar no aluno o espírito científico. Não há mais o “Magister dixis”, o ranço
medieval da escola. O importante não é acreditar no professor, mas sim no que
sua inteligência aponta como verdade. Mas uma coisa é certa. O professor não
pode aceitar opiniões fajutas. O aluno deve apresentar argumentos convincentes
e baseados nas pesquisas.
Entrevista nº 3
Sujeito: JCF Tempo de magistério: 24 anos e 10 meses Sexo: Masculino
Disciplinas que leciona: Ciências e Biologia Religião declarada: Cristã
Leciona: Redes Públicas e Particular
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
JCF: A maioria acredita no evolucionismo.
Pesquisador: Por quê?
JCF: Os alunos aceitam tal idéia em face dos fundamentos e explicações
convincentes dessa teoria.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
JCF: Algumas controvérsias com alguns alunos das religiões adventista e
testemunhas de Jeová.
Pesquisador: Por quê...
JCF: Porque eles divergem no aspecto de fé, mas cientificamente acabam
contemporizando a idéia.
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
JCF: Não.
Pesquisador: Por quê?
JCF: É possível que não. Entretanto, deveria ter maior divulgação na esfera de
ensino fundamental e depois no médio.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
JCF: Não é tolice, pois Deus criou o mundo e os seres vivos para evoluirem
gradativamente. Seria, então, possível conciliar as duas idéias ao mesmo tempo.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
JCF: A Igreja Católica do passado, sendo mais radical e conservadora, não
aceitava o que se diz no texto nº 1. Hoje, suas idéias se adaptam mais aos nossos
tempos.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
JCF: Primeiro, respeitaria suas convicções religiosas. Depois, faria o possível
para ele compreender a teoria com nossos argumentos e explicações atuais.
Aconselharia a respeitar o evolucionismo e adaptar-se aos conceitos atuais.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
JCF: Concordaria com ele. Porém, o aconselharia a ter sua fé e também a ler a
Bíblia.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
JCF: Eu aconselharia esse professor a trocar idéias com o de biologia e também
a ler um bom livro sobre evolução.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia?
JCF: Se fosse de biologia, ele estaria completamente errado, equivocado, uma
vez que não poderia ignorar a teoria da evolução.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
JCF: O professor pode, como agente multiplicador de idéias, mudar até os
hábitos e costumes dos alunos no tocante, por exemplo, à posição ecológica, de
higiene, científica...
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
JCF: O professor deve estar preparado para enfrentar todas as situações
polêmicas, mesmo porque elas servirão para despertar a curiosidade e o interesse
para um melhor desfecho dos casos. Assim, com os argumentos certos e precisos,
e até simples, porém com o rigor científico, chega-se a um denominador comum.
Entrevista nº 4
Sujeito: ECF Tempo de magistério: 28 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Ciências, Biologia e Matemática
Religião declarada: Evangélica Leciona: Rede Pública
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
ECF: Eu penso que a maioria acredita no criacionismo.
Pesquisador: Por quê?
ECF: Por causa das reações dos alunos, após a apresentação do assunto. A
primeira reação dos alunos é do tipo “Eu não venho do macaco, etc...”
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
ECF: Não, nunca chegou a criar esse clima.
Pesquisador: Por quê...
ECF: Porque eu apresento a minha maneira de pensar, que é o Criacionismo, e
deixo liberdade para os alunos a respeito do pensamento deles. Eu apresento o
assunto, mostro o meu ponto de vista e deixo liberdade para o aluno aceitar ou
não. Os livros apresentam o evolucionismo, que até vai fazer parte das provas. Eu
digo para eles: “Vocês precisam ter conhecimento disso aqui, pois foi trabalho de
muitos anos dos cientistas, coisa de muito tempo”. Daí, se algum aluno perguntar
“Como a senhora aceita o criacionismo se acontece tanta modificação? Por que é
que os seres não são iguaizinhos, atualmente?” Daí, eu sempre falo para eles: “O
criacionismo tem que se basear que foi um ser superior que fez. O que para ele
representa um certo período, para nós é um período muito diferente”. Tem até
aquela parte que fala que aquilo aconteceu num determinado período, mas pode
ser um período muito maior, mas não partiu do nada; teve alguém que criou. E
com relação aos livros, hoje em dia, eu não acho certo. São unilaterais, defendem
somente esse ponto de vista [do evolucionismo].
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
ECF: É normal gerar dúvidas. Tanto é que a gente dá liberdade para o aluno
escolher. Você não vai impor sua maneira de pensar. Então, aí gera dúvidas.
Vamos supor que um aluno tenha aula comigo nesse ano e no ano seguinte com
outro professor. Até no mesmo ano vem outro professor com outra maneira de
pensar. Como é que fica a cabeça do aluno? Então, ele tem que ter aquela
liberdade para escolher. Ver o que ele [aluno] aceita ou não.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
ECF: Eu vejo esse professor como autoritário, achando que ele é dono da
verdade. Que o que ele aceita tem que ser aceito pelos alunos. Eu não concordo
com isso.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
ECF: Os dois textos são totalmente contrastantes. Olha, aqui eu estou vendo uma
frase que eu nunca estudei, então eu não sei sobre ela. Será que hoje existe algo
atual a respeito disso? Essa teoria [do evolucionismo] é mais do que uma
hipótese? Eu sempre achei um absurdo quando, fazendo escavações, alguém
encontra lá um pedaço da arcada de um animal de não sei quantos anos atrás e,
baseado só naquele pedacinho, já se imagina como é o restante do animal. Eu
não consigo entender como isso é possível. Por isso é que acho que existe tanta
coisa que não é confiável numa montagem assim, a partir de um pedaço de fóssil.
Também não sei se a teoria da evolução é para provar que Deus não existe. Não
chega a tanto. Os dois textos são bem chocantes. As duas partes que mais me
chamaram a atenção foi isso: que existe alguma coisa provando que não é só uma
hipótese a teoria da evolução e que falar que é satânico isso aqui [sobre
evolução]. São dois textos bem extremos, radicais. Os dois são muito cá ou muito
lá. Faltou equilíbrio.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
ECF: [Pensa bastante] Eu procuraria falar para o aluno sempre aquilo: “Olha,
nós estamos numa democracia. Existe liberdade plena para tudo. Você tem todo o
direito de pensar do jeito que pensa. Tanto a favor de um, quanto do outro, mas
deveria raciocinar mais, ter mais equilíbrio, ponderar mais para perceber onde
tem exagero, tanto de um lado quanto do outro”. Fazer o aluno não ficar só com
aquela visão única. Mostrar que ele tem que enxergar mais além, que não existe
só uma vertente. Diria para ele ter um horizonte mais amplo, do que ficar “Oh, é
esse texto, é isso que eu acho e acabou”. Porque muitas vezes você pensa, hoje,
mas com o passar do tempo... Questão do equilíbrio.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
ECF: Diria a mesma coisa [da resposta anterior].
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
ECF: Depende muito do professor. Se fosse um professor bom, muito capaz na
matéria dele, bem equilibrado, eu até ia conversar com ele: “Oh, professor, não é
bem assim”. Ia mostrar o meu ponto de vista. Agora, se fosse esse professores que
falam por falar, uma coisa hoje e outra amanhã, entraria por um ouvido e sairia
por outro.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia...
ECF: Ah, se fosse um professor de biologia, daí eu iria conversar. Como aluna,
eu não conversaria na frente dos outros, pois sou tímida, mas depois da aula
diria: “Professor, quanto aquele assunto que o senhor falou...” Se fosse professor
de biologia, eu conversaria.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
ECF: Olha, pode. Depende da postura do professor.
Pesquisador: Da postura?
ECF: Se ele é uma pessoa bem equilibrada, falando as coisas com convicção e ele
chegar na classe e ele pregar a maneira dele pensar, ele convence.
Pesquisador: E se o professor não for assim?
ECF: Olha, pode até influenciar, mas não tanto. Eu tive professores do tempo de
ginásio que eu lembro do que eles falaram até hoje. Sabe aquela influência
marcante, de pessoas idôneas? Agora, os outros influenciam no momento, mas
não vai ficar tanto. A gente acaba esquecendo desses.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
ECF: Primeiro de tudo, o professor tem que estar com o assunto bem definido na
cabeça dele. Ele tem que estar seguro sobre o que pensa, para depois começar a
aula. Se eu entrar numa sala de aula em dúvida, eu não saberia transmitir. O
entrave maior seria se o professor não está seguro sobre a maneira dele aceitar o
assunto.
Entrevista nº 5
Sujeito: LLM Tempo de magistério: 5 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Ciências Religião declarada: Católica
Leciona: Rede Pública
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
LLM: A maioria dos alunos acredita no criacionismo.
Pesquisador: Por quê?
LLM: Quando o assunto evolução é apresentado existem muitas dúvidas e
questionamentos por parte dos alunos. Os alunos muitas vezes não concordam
com as teorias da evolução, acham que não podem ser provadas.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
LLM: Sim.
Pesquisador: Por quê?
LLM: Pelo fato de existirem alunos evangélicos em sala de aula que não
concordam com as teorias da evolução e sim somente na presença de um Deus
criador.
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
LLM: Sim.
Pesquisador: Por quê?
LLM: Considerando o nível de cultura do povo brasileiro, e pela falta de
exemplos mais evidentes de evolução no presente. As hipóteses são distantes da
maioria dos alunos.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
LLM: Acredito que o professor deva saber combinar as duas teorias e não julgar
a posição do criacionismo como uma tolice. Acho que deve trabalhar de maneira
a evidenciar a importância das duas teorias em conjunto.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
LLM: O texto nº 1 mostra a aceitação que hoje a teoria da evolução tem até
frente a Igreja Católica. O texto nº 2 mostra a posição defendida por aqueles que
defendem o criacionismo, normalmente tomada por evangélicos que trabalham
muito com a figura de satanás, pecado, inferno.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
LLM: Diria para ele que primeiro terminasse de ouvir a minha aula e, então,
discutiríamos o assunto. Acho que o professor deve tratar a evolução como um
misto das teorias e ao mesmo tempo acreditar que para tudo isso ocorrer deve
existir um Deus superior.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
LLM: No caso, o aluno estaria indo de [ao] encontro aos [dos] objetivos da
minha aula. Seu depoimento seria de auxílio.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
LLM: Pensaria o quanto ele seria arbitrário, na medida que só suas opiniões
seriam válidas, desconsiderando as demais existentes.
Pesquisador: Como você agiria, como aluna dele?
LLM: Não falaria nada.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia...
LLM: Mudaria muito, porque se ele já estudou isso, deveria já estar esclarecido
sobre o assunto.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
LLM: Sim.
Pesquisador: Um exemplo.
LLM: Quando o professor fala a respeito da importância de se preservar a
vegetação para nós seres humanos, não só pelo fato de preservar ser uma atitude
de amor à natureza, mas como maneira de nos preservarmos.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
LLM: A posição arbitrária que certos alunos carregam, trazidas da própria
sociedade, como religião, noção de família, sexo, cultura.
Entrevista nº 6
Sujeito: ALS Tempo de magistério: 9 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Biologia Religião declarada: Católica
Leciona: Rede Pública
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
ALS: A maioria dos alunos acredita no criacionismo.
Pesquisador: Por quê?
ALS: A maioria dos alunos não acredita no evolucionismo, quando indagados
sobre origem de um ser, ou da sua fisiologia, destacam que Deus quis que assim
fosse.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
ALS: Já.
Pesquisador: Por que isso acontece?
ALS: Porque a maioria acha que os seres vivos não evoluem; teriam sempre a
mesma forma, o mesmo agrupamento etc.
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
ALS: Um assunto como esse sempre deve gerar dúvidas.
Pesquisador: Por quê?
ALS: Apesar do avanço científico e tecnológico, uma idéia aceita por todos é
difícil de ser modificada ou aceita por todos. Isso é percebido em ciência em
todas as fases do conhecimento científico.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
ALS: O professor nunca deve dar uma resposta desse tipo. Isso é falta de ética,
principalmente se os alunos não pediram sua opinião. O que deve fazer (o
professor) é orientá-los e apresentar os lados positivos e negativos de cada teoria
e os alunos chegarem na melhor solução.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
ALS: As evidências da evolução são confiáveis, pois existem diversas provas
sobre isso, como os fósseis, estruturas homólogas e análogas. Porém, não se deve
esquecer que as transformações que aconteceram nos organismos tiveram causa e
conseqüência. Por que não de um criador?
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
ALS: Eu o orientaria que pesquisasse sobre o assunto e só depois disso tirasse
uma conclusão final.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
ALS: Até mesmo o papa aceita que a evolução é mais que uma simples hipótese,
devido aos novos conhecimentos científicos.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
ALS: Eu conversaria com ele, debateria as idéias e junto chegaríamos numa
solução final.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia...
ALS: Não interessa a disciplina, o que interessa é o resultado final.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
ALS: Sim, um professor sempre é um exemplo para o aluno.
Pesquisador: Um exemplo.
ALS: Qualquer atitude impensada, um conceito incorreto pode ter conseqüência
para a estruturação psicológica do aluno.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
ALS: Não aceitar que os alunos tenham uma visão diferente que a dele.
Entrevista nº 7
Sujeito: CTR Tempo de magistério: 25 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Biologia Religião declarada: Eangélica
Leciona: Rede Pública
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
CTR: Ambas as teorias têm aceitação de maneira semelhante.
Pesquisador: Como assim?
CTR: Atualmente os alunos resistentes, contra o evolucionismo, são alunos
evangélicos, cujos pais os criaram na doutrina evangélica do criacionismo.
Embora alguns evangélicos são bastante questionadores, abrindo espaço pelo
menos para conhecer o assunto Evolucionismo.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
CTR: Sim, pois alguns alunos que aceitam o evolucionismo acham que a
linguagem da criação na Bíblia é uma linguagem simbólica, para melhor
compreensão dos homens, principalmente dos tempos antigos.
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
CTR: Sim, a Ciência é dinâmica, ou seja, não é algo acabado, concluído. A
verdade de ontem não é a verdade de hoje, mas certamente nos trouxe as grandes
descobertas e ainda muitas dúvidas.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
CTR: Não concordo com a idéia, pois não gosto de imposição de idéias. Creio
que impor é desrespeitar. O ideal é conduzir, estimular as pesquisas.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
CTR: Não concordo com o texto 1 e também não concordo com o texto 2, pois
acredito que o tempo de Deus é diferente do tempo humano. Eu creio na criação
de Deus mesmo em termos de evolução, sem encarar o fato que a teoria da
evolução serve ao propósito de Satanás.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
CTR: Ele deveria continuar pesquisando a idéia defendida por ele. Eu jamais iria
influenciá-lo. Auxiliaria, indicando livros, revistas, sites na Internet e, ainda
como estímulo, solicitaria, se encontrasse algo muito interessante, gostaria de
conhecer.
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
CTR: A mesma coisa.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
CTR: Comentaria o assunto com o professor de biologia
Pesquisador: Por quê?
CTR: Creio que ele teria melhores condições de conduzir o assunto.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
CTR: Sim.
Pesquisador: Um exemplo.
CTR: O adolescente é influenciável. E aquele que a família segue uma doutrina
criacionista, temos que conduzi-lo de uma maneira que não entre em conflito com
a família, passando para ele uma ótica científica e não uma verdade
incontestável.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
CTR: É a preocupação com a formação familiar do aluno, pois conforme o tipo
de abordagem, a família do aluno não irá aceitar e possivelmente virá até a
escola falar do seu desagrado com a Direção da escola. Por este motivo, o
professor deve ser cuidadoso, procurando não impor sua visão sobre o assunto,
mas não deixando de dar oportunidade aos alunos de conhecê-lo.
Entrevista nº 8
Sujeito: AAV Tempo de magistério: 4 anos Sexo: Feminino
Disciplinas que leciona: Biologia e Matemática Religião declarada: Católica
Leciona: Rede Pública
Pesquisador: Para você, qual dessas relações deve prevalecer entre os alunos do
Ensino Médio? [ O pesquisador mostrou ao sujeito as seguintes alternativas
fechadas: a.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Evolucionismo;
b.) A maioria dos alunos do Ensino Médio acredita no Criacionismo; c.) Ambas as
teorias têm aceitação de maneira semelhante, entre os alunos do Ensino Médio; d.)
Não tenho nenhuma idéia de qual das duas teorias é a mais aceita entre os alunos
do Ensino Médio.]
AAV: Ambas as teorias têm aceitação.
Pesquisador: Por quê?
AAV: Muitos acreditam que Deus criou tudo o que existe e alguns destes não
acreditam que o homem evoluiu do macaco. Outros defendem o evolucionismo,
principalmente o neodarwinismo que incorpora a seleção natural à genética.
Alguns destes acham que Deus é um mistério e a ciência possui falhas.
Pesquisador: O assunto Evolução dos Seres Vivos, em algum momento já
provocou controvérsias ou discussões divergentes nas suas aulas?
AAV: Não.
Pesquisador: Por quê?
AAV: A forma como foi passado este conteúdo não estimulou discussões. Falhas
que eu pretendo corrigir.[Ressalta-se que este foi o primeiro ano que a
entrevistada trabalhou o tema evolução em sala de aula].
Pesquisador: Para você, atualmente, hoje, o assunto Evolução dos Seres Vivos
ainda deveria gerar dúvidas ou controvérsias?
AAV: Sim, sobre o criacionismo - origem dos seres vivos. Sobre evolução, eu
acredito na seleção natural de Darwin... neodarwinismo.
Pesquisador: É solicitado ao sujeito o seu posicionamento e um comentário geral
sobre o seguinte caso hipotético: “Dois alunos discutem, porque um deles acredita
no evolucionismo e o outro no criacionismo. O professor dos dois interfere,
dizendo que a evolução dos seres vivos realmente acontece e que acreditar no
criacionismo é tolice. Assim, ambos deveriam acreditar na teoria da evolução”.
AAV: Na minha opinião, o professor não deve assumir esta postura, induzindo os
alunos a acreditarem ou desacreditarem em determinadas teorias. Os alunos são
diferentes e cada um tem sua crença. Eu, particularmente, acredito que Deus
existe, sendo o criacionismo a origem das espécies. Num segundo momento, estas
espécies sofreram evolução e se modificaram, principalmente através da genética,
com as mutações, recombinações gênicas etc; tudo isso comprovado
cientificamente. Para mim, a origem dos seres vivos e da Terra ainda é um
grande mistério. A espiritualidade é um grande mistério. É um assunto polêmico.
Os cientistas só aceitam as teorias que foram comprovadas e negam o
criacionismo, porque é uma suposição bíblica, uma hipótese.
Pesquisador: É solicitado que o sujeito leia os textos 1 e 2 (item 5 do roteiro). A
seguir, pede-se que comente a respeito deles, com o seu posicionamento.
AAV: Eu concordo com o texto número 1. Os seres vivos sofrem evolução ao
longo dos tempos. Não concordo com o texto número 2, segundo o qual a crença
na teoria da evolução nega a presença de Deus e serve ao propósito de Satanás.
A espiritualidade existe para quem acredita, é uma hipótese. Já a evolução, uma
teoria. Agora, o texto número 2... relacionar Deus e Satanás com a evolução...
não faz sentido. [Volta-se ao texto número 1] João Paulo II defendendo a
evolução? E o criacionismo, como fica? Esses dois textos são contraditórios,
porque envolvem muito a espiritualidade com a ciência. Dentro de cada texto há
contradição.
Pesquisador: O que você diria a um aluno se no meio de uma aula sobre evolução
dos seres vivos ele defendesse integralmente as idéias do texto nº 2?
AAV: Eu diria que ele possui livre arbítrio para fazer suas escolhas e que sua
crença depende da sua religião, da sua vivência, ou seja, do seu senso crítico..
Pesquisador: E se o aluno defendesse integralmente as idéias do texto 1? O que
você faria?
AAV: Idem à resposta anterior.
Pesquisador: Se você fosse aluno de ensino médio e seu professor (não o de
biologia, mas de outra disciplina qualquer) defendesse de maneira enfática as
idéias do texto nº 2, o que pensaria sobre o fato?
AAV: Eu não sofreria influências, já tenho opinião formada sobre o assunto.
Pesquisador: E se o professor fosse de biologia...
AAV: Criticaria este professor, pois ele pode influenciar a crença dos alunos de
maneira negativa.
Pesquisador: Por quê?
AAV: Porque envolve a religiosidade, Deus, satanás, e a espiritualidade. As
crenças de cada um devem ser respeitadas.
Pesquisador: Para você, as ações, falas ou atitudes de um professor de biologia
podem influenciar a maneira de pensar ou de agir dos alunos?
AAV: Sim.
Pesquisador: Um exemplo qualquer...
AAV: O ser humano, os primeiros gestos, as primeiras palavras são ditas por
imitação. Estamos constantemente observando atos, palavras, buscando o nosso
aperfeiçoamento. Apesar que a faixa etária é muito importante e o
desenvolvimento do senso crítico também, que difere muito nos indivíduos.
Existem pessoas que durante a vida toda são muito influenciáveis e dependentes.
Pesquisador: Para você, quais são os possíveis entraves, dificuldades para um
professor de biologia quando ele trata sobre assuntos polêmicos em sala de aula?
AAV: Saber se posicionar sem causar influências, não induzindo o aluno a seguir
sua crença.
Autorizo a reprodução deste trabalho.
Bauru, março de 2000.
JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA