ESTUDO DE ASPECTOS SEMÂNTICO-LEXICAIS DO LEXEMA … · falada no Brasil é o resultado da junção...

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Web-Re vista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178- 1486 • Volume 2 • Número 1 • julho 2012 1 ESTUDO DE ASPECTOS SEMÂNTICO-LEXICAIS DO LEXEMA CORPO HUMANO E SUA VARIAÇÃO NO ATLAS LINGUÍSTICO DE MATO GROSSO DO SUL UMA CONTRIBUIÇÃO SOCIOLINGUÍSTICA Joseandre da Silva Almino (PG. UEMS) 1 [email protected] Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS/FUNDECT) 2 [email protected] RESUMO: Atualmente, com o processo de evolução das línguas vivas, é possível dizer que cada ser possui seu linguajar próprio e isso se deve ao modo como a língua é ensinada e passada de geração para geração. As formas linguísticas são símbolos ou variações que cada região tem e são utilizados pelas pessoas para facilitar a comunicação. Assim, surgem estudos científicos em todo o mundo e no Brasil, em que Os Atlas Linguísticos trazem as variações linguísticas das diferentes regiões do país. O estado de Mato Grosso do Sul também possui seu Atlas, que foi elaborado para pesquisar e estudar as interferências linguísticas da região. A partir dele, iniciamos uma pesquisa sobre as palavras utilizadas para designar o lexema ―corpo humano‖ em que são muitas as denominações cuja finalidade é conhecer as características da modalidade falada da língua local com relação a esse lexema. PALAVRAS-CHAVE: Variação léxico-semântica, corpo humano, significação. ABSTRACT: Currently, the process of evolution of modern languages, it is possible to say that every being has its own language and this is the way language is taught and passed on from generation to generation. The linguistic forms are symbols or variations that each region has and are used by people to facilitate communication. Thus, there are scientific studies worldwide and in Brazil, where the Linguistic Atlas bring the linguistic variations of the different regions of the country. The state of Mato Grosso do Sul also has his Atlas, which was designed to investigate and study the language of the interference region. From it, we started a search on the words used to describe the lexeme "human body" in which there are many denominations whose purpose is to know the characteristics of the local language spoken modality with respect to this lexeme. KEYWORDS: lexical-semantic variation, the human body, meaning. Introdução Esta pesquisa verificou, por meio da observação de uma situação concreta de fala, os aspectos referentes à variação semântico-lexical, das diferentes denominações do lexema corpo humano, para se referir às partes que compõem o corpo. 1 . Graduada em Letras habilitação Português/Inglês, pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Especialista em Letras, Área de Concentração Estudos Linguísticos pela UEMS/Dourados e professora na rede pública e privada de ensino na cidade de DouradosMS. 2 . Doutora em Letras pela UNESP/ASSIS - Docente da Graduação e da Pós-Graduação em Letras na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UEMS e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da UEMS e Pesquisadora da FUNDECT.

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Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e I SSN : 2178 -1 486 • Vol u m e 2 • N ú m ero 1 • j u l h o 201 2

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ESTUDO DE ASPECTOS SEMÂNTICO-LEXICAIS DO LEXEMA

CORPO HUMANO E SUA VARIAÇÃO NO ATLAS LINGUÍSTICO

DE MATO GROSSO DO SUL – UMA CONTRIBUIÇÃO

SOCIOLINGUÍSTICA

Joseandre da Silva Almino (PG. UEMS) 1

[email protected]

Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS/FUNDECT) 2

[email protected]

RESUMO: Atualmente, com o processo de evolução das línguas vivas, é possível dizer que cada ser

possui seu linguajar próprio e isso se deve ao modo como a língua é ensinada e passada de geração para

geração. As formas linguísticas são símbolos ou variações que cada região tem e são utilizados pelas

pessoas para facilitar a comunicação. Assim, surgem estudos científicos em todo o mundo e no Brasil, em

que Os Atlas Linguísticos trazem as variações linguísticas das diferentes regiões do país. O estado de

Mato Grosso do Sul também possui seu Atlas, que foi elaborado para pesquisar e estudar as interferências

linguísticas da região. A partir dele, iniciamos uma pesquisa sobre as palavras utilizadas para designar o

lexema ―corpo humano‖ em que são muitas as denominações cuja finalidade é conhecer as características

da modalidade falada da língua local com relação a esse lexema.

PALAVRAS-CHAVE: Variação léxico-semântica, corpo humano, significação.

ABSTRACT: Currently, the process of evolution of modern languages, it is possible to say that every

being has its own language and this is the way language is taught and passed on from generation to

generation. The linguistic forms are symbols or variations that each region has and are used by people to

facilitate communication. Thus, there are scientific studies worldwide and in Brazil, where the Linguistic

Atlas bring the linguistic variations of the different regions of the country. The state of Mato Grosso do

Sul also has his Atlas, which was designed to investigate and study the language of the interference

region. From it, we started a search on the words used to describe the lexeme "human body" in which

there are many denominations whose purpose is to know the characteristics of the local language spoken

modality with respect to this lexeme.

KEYWORDS: lexical-semantic variation, the human body, meaning.

Introdução

Esta pesquisa verificou, por meio da observação de uma situação concreta de

fala, os aspectos referentes à variação semântico-lexical, das diferentes denominações

do lexema corpo humano, para se referir às partes que compõem o corpo.

1. Graduada em Letras habilitação Português/Inglês, pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Especialista em Letras, Área de Concentração Estudos Linguísticos pela UEMS/Dourados e professora na rede

pública e privada de ensino na cidade de Dourados–MS.

2. Doutora em Letras pela UNESP/ASSIS - Docente da Graduação e da Pós-Graduação em Letras na

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Letras da UEMS e Pesquisadora da FUNDECT.

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O trabalho foi realizado com base no Atlas Linguístico de Mato Grosso do Sul

Oliveira (2007), em que buscamos as variadas formas de tratar as partes do corpo

humano na região de Dourados. O presente trabalho visa ao exercício prático de

metodologias adotadas tanto pela Sociolinguística como pela Semântica, refletidas em

algumas análises dos dados coletados. Os depoimentos dos entrevistados são de suma

importância, pois conservam características específicas de um vocabulário local. Nesse

vocabulário, busca-se a diferença de denominações para o referido lexema, uma vez que

cada indivíduo nomeia algo da maneira que lhe foi ensinada ou que lhe foi passada

pelas gerações anteriores.

Para realizar a pesquisa foi realizada uma consulta ao Atlas Linguístico de Mato

Grosso do Sul, nas páginas correspondentes ao lexema que define o corpo humano. Esse

livro trata-se de um projeto cujos objetivos foram de conhecer as características da

modalidade falada em Mato Grosso do Sul, oferecer aos estudiosos da língua

portuguesa e pesquisadores de áreas afins contribuições para o ensino/aprendizagem da

língua portuguesa, respeitando as variações regionais, sistematizar dados para futuras

descrições nas diversas áreas do conhecimento e elaborar o Atlas Linguístico de Mato

Grosso do Sul, Oliveira (2007). O segundo objetivo é buscar as diferentes

denominações usadas pelos informantes para nomear um mesmo referente, Tarallo

(2007).

Verifica-se que cada indivíduo possui acepções diferentes para nomear um

mesmo referente de acordo com a sua convivência e conhecimento de mundo. Nesse

sentido, nota-se a covariação estrutural e linguística das lexias pronunciadas por cada

informante em que há casos de neologismos e principalmente de variação, como muito

bem salienta Tarallo (2007) ao afirmar que existem duas ou mais maneiras de dizer a

mesma coisa (―variantes linguísticas‖) que se enfrentam em um duelo de

contemporização, uma vez que a língua falada é diversificada, heterogênea e reflete as

características específicas de cada falante.

1. Aporte teórico-metodológico

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O português falado no Brasil é uma das línguas românicas resultantes de

evoluções fonético-fonológica, morfológica, sintática e semântica, ocorridas no latim

vulgar, Williams (1975). Não só o português, mas todas as línguas vivas estão sujeitas a

mudanças, pois esta é uma de suas características. Neste contexto, as línguas variam

para atender às necessidades dos falantes no momento da interação verbal e, em Mato

grosso do Sul não é diferente, como veremos no decorrer deste estudo.

Partindo da premissa de variação, seja linguística, geográfica ou cultural, pode-

se dizer que a população brasileira é composta pela mistura de diferentes povos, com

isso o nosso linguajar recebeu influências distintas de línguas indígenas faladas no

Brasil colonial, de línguas/dialetos africanos e de línguas européias faladas por

imigrantes de diferentes partes do continente europeu. Portanto, a língua portuguesa

falada no Brasil é o resultado da junção de diferentes línguas e como toda língua teve

sua evolução caracterizada através dos tempos. Ela também foi criada por toda uma

comunidade e passada pelos mais velhos durante gerações, recebendo os traços

característicos das diferentes nações que se instalaram no território brasileiro e adotam o

português oficial, como língua ―materna‖.

Na análise, a Sociolinguística se aplica, pois ela é o ramo da linguística que

estuda a relação entre língua e sociedade, Mussalin e Bentes (2004, p. 49) em que o

trabalho do linguista suíço Ferdinand de Saussure, no século XX e William Labov, na

década de 1960 deram início a uma série de investigações importantes sobre a variação

linguística, que revolucionaram nossa compreensão e o modo como os falantes utilizam

a sua língua, correlacionada ao contexto de uso e ao momento da interação verbal.

Partindo de tal pressuposto, o presente estudo se propõe a estudar o uso do

lexema corpo humano, presente no Atlas Linguístico de Mato Grosso do Sul, uma vez

que todas as línguas sofrem algum tipo de influência, seja por meio de empréstimos

linguísticos ou variação ocorrida no tempo e no espaço geográfico, dentre outras,

Gurgel (2005). A língua sofre mudanças com o passar do tempo, mas não deixa de ser

útil a sociedade e a seus falantes, uma vez que ela é o meio de expressão, de

conhecimento e de transmissão da cultura entre as gerações.

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Segundo Alves (2007), ao conjunto de palavras que é transmitido às gerações,

por meio da língua, é que se denomina léxico. Porém nenhum falante tem o domínio

completo do léxico da língua que fala, porque ele é muito amplo, e a cada dia surgem

novas palavras que a ele se incorporam ou dele desaparecem/caem em desuso, são os

chamados arcaísmos.

Ressalta-ser que nosso objetivo não é apontar o jeito de falar de cada pessoa,

mostrando se está ―certo‖ ou ―errado‖, mas sim de mostrar o modo como as pessoas

expressam seu ponto de vista sobre um determinado assunto, já que cada pessoa tem

uma maneira de nomear determinado objeto, isso torna a pesquisa interessante, pois se

trata da cultura de cada povo e, fazer o registro desses fatos linguístico é de suma

importância para a caracterização da língua na sua modalidade oral dialogada, para que

as futuras gerações possam verificar como falavam seus antepassados, além de registrar

a cultura e os costumes de um povo que viveu em um determinado século.

No Atlas Linguístico de Mato Grosso do Sul, existem cinco mapas que tratam do

lexema corpo humano, nosso objeto de estudo. Neles encontramos diversas palavras

para denominar algumas partes do corpo. O propósito dessa pesquisa é conhecer o

costume e a cultura da nossa região. Pois nenhuma língua é um fato homogêneo, mas

um conjunto heterogêneo de variedades inclusive o português falado no Brasil, em que

nele não existe um fato linguístico único, mas variantes linguísticas reunidas por razões

históricas, culturais e políticas. Assim, as variedades de uma língua não são o resultado

de ―preguiça‖, ―falta de cultura‖, ou ―ignorância‖. Cada variedade é o resultado de

características e de experiências históricas do grupo que a utiliza, como ele se formou,

como é seu trabalho, como ele está socialmente organizado. Dessa diferença decorre o

fato de que cada um destes grupos fala de forma distinta e nomeia os fatos da língua

também de forma diferente, como pode se verificar nesta pesquisa.

2. Algumas considerações sobre a pesquisa – análise das acepções utilizadas pelos

informantes em referência ao lexema corpo humano.

A pesquisa foi realizada com base nos cinco mapas do Atlas Linguístico de Mato

Grosso do Sul, que dispõem sobre o lexema corpo humano. Buscou-se encontrar as

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diferentes acepções usadas por cada pessoa entrevistada para denominar algo que lhe foi

questionado. Devido à grande variação lexical que ocorre no Brasil, as pessoas dão

denominações diferentes às coisas, como nome de frutos, bichos, etc. Desta forma

surgem os denominados neologismos, ou seja, palavras novas ou antigas que adquirem

outros sentidos para facilitar a comunicação entre as pessoas.

O Atlas Linguístico de Mato Grosso do Sul tem como informantes, em cada

localidade pesquisada, quatro pessoas, estratificadas em gênero, grau de instrução

(rudimentar ou com escolaridade até 4ª série do ensino fundamental) e naturalidade

(nascido no município ou nele reside desde os 8 anos de idade). Conforme Mollica

(2003), com esse tempo residindo no local, a pessoa passa a integrar-se linguisticamente

à comunidade, portanto, não há diversidade uma vez que ela aprende as características

do falar local, porém, por outro lado, as variações ocorrem de acordo com as

experiências e as vivências de cada pessoa. Daí a necessidade de pesquisas linguísticas

que tratem a língua na sua modalidade oral, para se ter um registro desses fatos

linguísticos que, com o tempo, pode se perder por completo, Bueno (2009).

Trabalhamos com os cinco mapas que contém os dados de todas as cidades do

Mato Grosso do Sul, buscando seus significados em dicionários e destacando quais

palavras foram mais utilizadas na cidade de Dourados. O primeiro mapa trata do item

nádegas. Segundo o dicionário Aurélio (2003), nádegas significa o conjunto das duas

nádegas; assento, traseiro. Na pesquisa, as pessoas utilizaram diversas lexias para se

referir a essa parte do corpo, de acordo com seus conhecimentos de mundo e

experiências pessoais:

Bunda: s.f. Bras. Pop. As nádegas. / — Pop. Sem valor; de má qualidade; reles,

ordinário. O mesmo que bantu ou banto, como língua e etnia.

Bumbum: 1) Ruído de pancada, que se repete. 2) Vários estrondos sucessivos. 3)

Som de zabumba. 4) As nádegas; bunda.

Polpa: 1) Carne, sem osso nem gorduras. 2) A parte carnosa dos frutos, raízes, etc. 3)

Nos dentes, a parte interna central, polpa dentária.

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Popa: s.f. Parte posterior do navio, oposta à proa. // Ir de vento em popa, ir muito

bem, progredir. No dicionário de Gíria de Gurgel (2005) ela está dicionarizada

como nádegas.

Nádiga: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação linguística,

acepção dada pelo informante.

Popança: popança sf (popa+ança) gír Nádegas. Cf com poupança.

Nádega: s.f. Cada uma das duas partes carnudas que formam a parte posterior do

homem e de certos animais. S.f.pl. Assento. Pop. Bunda, traseiro.

Nádigas: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação linguística,

acepção dada pelo informante.

Nágua: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação linguística,

acepção dada pelo informante.

Polpa da bunda: definição de polpa e bunda acima;

Náguilas: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação linguística,

acepção dada pelo informante.

Náguidas: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação linguística,

acepção dada pelo informante.

Quartu: variação linguística da palavra quartos mudando o o pelo u, que está já

dicionarizada como nádegas (Gurgel, 2005).

Topa: topa sf (der regressiva de topar) 1 Jogo infantil, também chamado rapa. 2 V

pau-de-balsa. Provável derivação de tóba, dicionarizada como nádegas (Gurgel,

2005).

Nádegas: conjunto das duas nádegas; assento, traseiro

Quadrilhu: variação linguística que altera o por u, provavelmente derivação de

quadril.

Buscamos as definições das palavras acima nos dicionários Aurélio (2003) e

Houaiss (2001) e quando não as encontrávamos, buscávamos nos dicionários on-line,

nos dicionários de gírias, como o de Gurgel (2005) e notamos que algumas não foram

encontradas, por não estarem oficialmente dicionarizadas. Observamos também que

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algumas palavras, como é o caso de popança já se encontra dicionarizada com o sentido

de gíria (gir.). Em outras situações, acontece variação linguística.

No mapa 2, a parte do corpo humano pesquisada foi a rótula do joelho. Segundo

o dicionário Aurélio (2003), rótula significa 1. Gelosia. 2. Cada um dos ossos pares

situados adiante da articulação de fêmur com tíbia. E joelho parte do corpo onde a coxa

se articula com a perna. As palavras utilizadas na pesquisa foram:

Bolacha: em Aurélio (2003), biscoito achatado, bofetada.

Bulacha: variação linguística da palavra bolacha.

Pataca: s.f. Bras. Moeda antiga de prata, que valia 320 réis/dinheiro, riqueza. Coisa

de meia pataca, coisa sem valor, importância/ninharia. Segundo Silva (1973), relógio de

bolso.

Bolacha du joelho: variação linguística mudando o por u.

Pataca du joelhu: variação linguística mudando o por u.

Juelhu: variação linguística mudando o por u.

Pataca du jueiu: variação linguística muda o por u, e o encontro consonantal lh por

ei.

Pataca du juei: variação linguística muda o por u, e o encontro consonantal lh por

ei.

Batata: segundo Aurélio (2003), s.f. Botânica. Nome de várias plantas de tubérculos

subterrâneos e comestíveis, cuja espécie mais conhecida é a chamada batata-inglesa.

(Família das solanáceas.) / P. ext. O tubérculo ou bolbo de uma planta. / Ictiologia

Nome comum a vários peixes do mar. / Fam. Fig. Nariz muito grosso e muito chato.

Junta: v. Junção. Articulação, juntura. Parelha. Reunião de pessoas convocadas para

um dado fim. Conferencia de médicos junto a um enfermo.

Rótula du juelhu: variação linguística mudando o o pelo u.

Juei: variação linguística mudando o o pelo u, e o encontro consonantal lh por ei.

Bola du juelhu: variação linguística mudando o o pelo u.

Discu du juelhu: variação linguística mudando o o pelo u.

Rótua: variação linguística de rótula.

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Bola: Em Aurélio (2003), s.f. Objeto, geralmente esférico, para ser atirado, batido,

chutado, empurrado, carregado, rolado ou arremessado, dependendo do jogo em que

está sendo usada.

Bulacha du jueiu: variação linguística muda o o pelo u, e o encontro consonantal lh

por ei.

Bata du juelhu: variação linguística mudando o o pelo u.

Bata du juei: variação linguística muda o o pelo u, e o encontro consonantal lh por

ei.

Carapuça: em Aurélio (2003), barrete cônico.

Bolita: palavra não encontrada nos dicionários consultados, variação lingüística

influenciada pela língua espanhola falada na região fronteiriça.

Bolachinha: diminutivo de bolacha.

Minísculu: variação linguística de minísculo.

Catumí: palavra não encontrada, variação linguística.

Catuní: palavra não encontrada, variação linguística.

Outro item estudado no mapa 3 é Barriga da Perna. A definição, de acordo com

o dicionário, para a palavra barriga é cavidade abdominal onde se encontram o

estômago e os intestinos; ventre, pança. / Saliência, protuberância; e para perna é cada

um dos membros inferiores do corpo humano destinados à sustentação ou à locomoção,

em especial a parte entre o joelho e o tornozelo. As palavras encontradas para designar

essa parte do corpo humano foram usadas de forma variada:

Batata da perna: cf. definição acima

Batata: definida no item anterior.

Barriga da perna: definida acima.

Panturrilha: segundo Aurélio (2003), s.f. Saliência que fazem os músculos da parte

posterior da perna; barriga da perna.

Barriga: definida acima.

Músculu: variação linguística de músculo, mudando o o pelo u.

Peitu da perna: variação linguística de peito, mudando o o pelo u

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Pataca da perna: definida acima.

Largata da perna: em Aurélio (2003), S. f. O mesmo que lagarta. Primeira fase de

vida dos insetos. Esteira sem fim interposta entre as rodas de alguns veículos, para lhes

permitir deslocar-se em diversos terrenos. Lagartixa.

Carni das perna: variação linguística de carne, mudando o e pelo i.

Pantorrilha: variação linguística de panturrilha, mudando o u pelo o.

Largatu da perna: variação lingüística.

No mapa 4, a parte do corpo humano pesquisada foi o tornozelo. Segundo

Aurélio (2003), tornozelo é uma saliência óssea na articulação do pé com a perna. As

acepções usadas pela população dessa região para definir essa parte do corpo foram:

Tornozelu: variação linguística de tornozelo, mudando o o pelo u.

Tornuzelu: variação linguística de tornozelo, mudando o o pelo u.

Garrãu: O mesmo que garão. Espécie de gaivina.

Canela: s.f. Casca aromática da caneleira, planta originária do Ceilão. / A própria

planta. / Condimento obtido com a casca dessa planta, reduzida a pó ou a pequenos

fragmentos. / Parte da perna, entre o joelho e o pé. / Canudo em que se enrola o fio da

lançadeira e com que se faz a trama do tecido.

Junta: s.f. Articulação; lugar onde se tocam dois ossos.

Tonozelu: variação linguística de tornozelo, mudando o o pelo u e retirando o r.

Rejeti: palavra não encontrada.

Mocotó: s.m. Bras. Patas de animais bovinos ou suínos, desprovidas do casco,

usadas como alimento. / Fig. Perna. / Botânica. Planta da família das acantáceas.

Segundo Silva (1973), palavra dicionarizada como calcanhar.

Junta du pé: junta definida acima, pé significa s.m. parte terminal do membro

inferior que assenta no chão; pata (falando-se de animais), du variação linguística de do.

Carcanhá: variação linguística de calcanhar, s.m. parte posterior do pé do homem.

Cutuvelo: variação linguística de cotovelo, mudando o o pelo u.

Pendãu: variação linguística de pendão, que significa s.m. Na Idade Média, flâmula

usada por um gentil-homem no alto da lança, ao partir para a guerra. Bandeira,

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estandarte, lábaro. Provável derivação da palavra pendão, que segundo Gurgel (2005),

significa pênis.

Tornozelus: variação linguística de tornozelo, mudando o o pelo u.

Nuvelu da junta: variação linguística de novelo que significa s.m. Bola de fio

enrolado. Fig. Embrulhada, enredo.

Juntinha du pé: dimunitivo de junta, du variação.

Canelera: variação da palavra caneleira, s.f. Canela (árvore).

Peça acolchoada que protege a canela dos praticantes de certos esportes (futebol etc.).

Piador: palavra derivada de piar, v.i. Dar pio (diz-se de muitas aves).

Cotovelu: variação linguística de cotovelo trocando o o pelo u.

Garrõu da perna: definidos acima.

Tuvilhu: palavra não dicionarizada.

Carcanhar: variação linguística de calcanhar, s.m. parte posterior do pé do homem.

Tornezelu: variação linguística de tornozelo trocando o e pelo o, e o o pelo u.

Tornovelu: variação linguística de tornozelo trocando o z pelo v e o o pelo u.

Ossu da miséria: gíria para expressar essa parte do corpo.

O último mapa, de número 5, trata do item Axila, que de acordo com os

dicionários consultados significa cavidade exterior e inferior na junção do braço com o

ombro; sovaco. As palavras utilizadas para designá-la foram:

Subacu: variação linguística da palavra sovaco, que significa s.m. Anatomia. Axila,

cavidade inferior, sob a junta do braço com o ombro. Ant. Peça de borracha que as

mulheres colocavam nas axilas para evitar a transpiração.

Sucavu: variação linguística da palavra sovaco. Definido acima.

Axilas: definido acima.

Axila: definido acima.

Sovacu: variação linguística da palavra sovaco. Definido acima.

Quicilas: variação linguística da palavra axilas. Definido acima.

Suvaqueu: variação linguística da palavra sovaco. Definido acima.

Souvacu/ Sobacu: variação linguística da palavra sovaco. Definido acima.

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3. Os gráficos a seguir ilustram as diferentes acepções usadas pelos informantes

para se referir ao lexema corpo humano

Gráfico 1 – Das acepções para se referir às nádegas

BundaBumbumPolpaNádigaPopançaNádegaNádigasNáguaPolpa da BundaNáguilasQuartuTopaNádegasQuadrilhuRP

O gráfico 1 se refere ao item do corpo humano nádegas. Podemos notar que a

acepção mais utilizada na região do MS foi Bunda. Essa palavra já se encontra

dicionarizada como nádegas em diferentes dicionários, livros e manuais. As palavras

bumbum e popança também já se encontram dicionarizadas com essas mesmas

definições.

Gráfico 2 – Das acepções para se referir à rótula do joelho

Bolacha BulachaPataca Bolacha du joelhoPataca du joelhu JuelhuBulacha du juelhu RótulaJoelhu Pataca du jueiuPataca du juei BatataJunta Rótula du juelhuJuei Bola du juelhuDiscu du juelhu RótuaBola Bulacha du jueiuBatata du juelhu Batata du jueiCarapuça BolitaBolachinha MinísculuCatumí RNPRP

Nesse gráfico, que se refere ao item rótula do joelho, observamos que o maior

uso foi o RNP, trata-se de uma resposta não produtiva (resposta não conhecida, não

lembrada ou simplesmente não responde). Seguido de bolacha. A palavra bolacha não

esta dicionarizada com esse sentido. No dicionário online Michaelis, esse item é tratado

como: sf (de bolo) 1 Bolo chato e seco de farinha, de diversas formas e tamanhos. 2

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Lâmina fina de borracha. 3 fam Bofetada. 4 Tecn Porcelana isoladora, no fogareiro

elétrico. No dicionário Aurélio (2003), encontramos definição semelhante. Acontece que

várias pessoas tratam a rótula do joelho como bolacha¸ apesar de ocorrer mudança

semântica, o novo significado continua mantendo estreita relação com o anterior.

Gráfico 3 – Das acepções para se referir à panturrilha

Batata da perna Batata

Barriga da Perna Panturrilha

Barriga Músculu

Peitu da perna Pataca da perna

Largata da perna Carni das perna

Pantorrilha Largatu da perna

RNP

Esse gráfico mostra que para referir-se à barriga da perna, a maioria dos

entrevistados preferiu a acepção batata da perna. Ao pesquisar no dicionário as duas

palavras juntas, não as encontramos, mas ao verificá-las, separadamente, notamos que

batata significa planta, e perna, os membros do corpo, portanto, subentende-se planta

de um membro. Porém as pessoas a utilizam porque a barriga se assemelha a uma

batata.

Gráfico 4 – Das acepções para se referir ao tornozelo

Tornozelu Tornuzelu

Garrãu Canela

Junta Tonozelu

Rejeti Mocotó

Junta du pé Carcanhá

Cutuvelu Pendãu

Tornozelus Nuvelu da Junta

Juntinha du pé Batata da Perna

Canelera Piador

Cotovelu Garrõu da Perna

Tuvilhu Carcanhar

Tonezelu Tornovelu

Ossu da Miséria RNP

Gráfico acima trata da parte do corpo humano referente ao tornozelo. A palavra

mais falada foi tornozelu, trata-se de uma variação linguística da própria palavra, uma

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troca de o por u, mas aparece na fala dos informantes, uma acepção bastante curiosa que

é ossu da miséria. Buscamos essa expressão nos diversos sites e livros sobre gírias,

porém não encontramos definições. Em um site achamos um poema de autoria de

Rubênio Marcelo, com essa palavra se referindo a origem no sertão, o nome do poema é

Assim é que se fala no Sertão!... - (Enredo em dez Cantos Sextilhados). Mas como foi

citado acima para se referir a tornozelo não foi encontrada, uma vez que não se encontra

dicionarizada.

Por se tratar de um osso pequeno e frágil, as pessoas o chamaram de osso da

miséria. Em Nonato (1980), encontramos outra expressão para designar tornozelo: osso

do vintém, mas essa expressão não foi encontrada na fala de nossos informantes.

Gráfico 5 – Das acepções para se referir à axila

Subacu

Suvacu

Axilas

Axila

Sovacu

Quicilas

Suvaqueru

Souvacu

Sobacu

RNP

RP

O último gráfico relacionado neste estudo trata a lexia Axila, que no Atlas os

informantes destacam a palavra subacu como a mais falada no português local. Nesse

caso, o que mais aparece aqui é a variação da palavra sovaco. Esta, por sua vez, está

dicionarizada como axila. Ao procurarmos as palavras suvacu, sovacu, souvacu e

sobacu no dicionário, encontramos V sovaco. Portanto, trata-se de variações

linguísticas. As palavras quicilas e suvaqueru também não estão dicionarizadas. Porém,

pelos seus sons elas, muito provavelmente, têm origem na palavra sovaco.

4. Variações semântico-lexicais usadas em Dourados em referência ao lexema

corpo humano

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Conforme verificamos, as pessoas que residem na cidade de Dourados utilizaram

as seguintes acepções para se referir ao corpo humano:

Homem – 1ª faixa

etária

Homem – 2ª faixa

etária

mulher – 1ª

faixa etária

mulher – 2ª faixa

etária

Nádegas Popa Nádega Bunda Bunda

Rótula do joelho Joelhu Bulacha Bulacha RNP

Barriga da perna Panturrilha Batata da Perna Batata da Perna Barriga da Perna

Tornozelo Tornozelu Carcanha RNP Canela

Axila Suvacu Suvacu Suvacu suvacu

Os homens e mulheres pesquisados, como dito no início do artigo, são de

falantes de grau de instrução rudimentar ou com escolaridade até 4ª série do ensino

fundamental. A 1ª faixa etária são pessoas que possuem no máximo 36 anos. Já as

pessoas da 2ª faixa etária têm idade acima de 42 anos.

O primeiro item tratado por eles é nádegas, como podemos notar na tabela, em

que as mulheres da 1ª e 2ª faixa etária usaram a mesma lexia: bunda. Entretanto os

homens já utilizaram expressões diferentes, popa e nádega. Bunda e popa são palavras

que estão dicionarizadas como nádegas. Já a palavra nádega é apenas uma variação

linguística.

O segundo é a rótula do joelho. O homem da 2ª faixa e a mulher da 1ª faixa

etária utilizam a mesma palavra: bulacha. Essa palavra não está dicionarizada,

provavelmente a origem dela é bolacha. As pessoas usam essa lexia por conta do

formato de ambos, a rótula do joelho e a bolacha são circulares. Já o item RNP, trata-se

de uma resposta não produtiva (resposta não conhecida, não lembrada ou simplesmente

não responde).

O terceiro item é a barriga da perna, podemos encontrar batata da perna para o

homem da 2ª faixa e a mulher da 1ª faixa etária. O homem da 1ª faixa etária utiliza

Panturrilha e a mulher da 2ª faixa etária barriga da perna.

Notamos que as lexias para o homem da 2ª faixa e a mulher da 1ª faixa etária se

repetem algumas vezes. Provavelmente seja a convivência, pois na maioria dos casos, as

mulheres mais novas se casam com homens mais velhos.

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O próximo item encontrado foi tornozelu e carcanha para a 1 ª e 2 ª faixa etária

masculina, respectivamente. Para as mulheres, RNP e canela.

O último item é axila, expresso pelos falantes pela variação linguística suvacu.

Considerações finais

A análise semântico-lexical nos levou a concluir que a língua, por estar inserida

em um contexto sócio-cultural, imprime marcas dessa sociedade. Do ponto de vista

linguístico, o local de nascimento do informante e de seus pais e do conhecimento das

variações linguísticas utilizadas são de suma importância para a aquisição de linguagem.

Mas devido ao tempo de moradia dos entrevistados no local selecionado para a presente

pesquisa, eles já se adaptaram às referidas variações linguísticas. Em que percebe-se que

as palavras foram empregadas com o mesmo valor semântico, mas grafadas de forma

diferente: subacu>suvacu> sovacu> sobacu> souvacu; batata da perna>barriga da

perna>patata da pêra> largata da perna> carni das perna, entre outras.

Segundo o Atlas, as entrevistas foram feitas utilizando-se do método direto e

indireto, mediante questionário único com 557 perguntas, subdividido em aspectos

fonéticos e lexicais. Como o nosso interesse é estudar a variação semântico lexical do

lexema corpo humano, buscamos questões fonéticas e lexicais referentes ao lexema

corpo humano e as diferentes acepções utilizadas para defini-lo. Foi um resultado

satisfatório, pois as entrevistas nos trouxeram clareza e conhecimentos culturais do falar

local.

Segundo Bakhtin (1997), todo símbolo é ideológico e a ideologia é um reflexo

das estruturas sociais de uma determinada sociedade, uma vez que a modificação da

ideologia pode acarretar uma variação na língua. E ainda, a língua não existe fora de um

contexto social, pois o falante pensa e se expressa para um público definido em um dado

contexto e é nessa maneira de expressão que se espelha o saber linguístico e cultural de

um povo, como ocorreu em nosso estudo quando os informantes se referiam às partes

do corpo humano.

Geralmente, as pessoas com escolaridade incompleta fazem uso de neologismo e

gíria, para se expressar sobre um determinado assunto. Nas entrevistas, as pessoas

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responderam o questionário, usando um discurso coletivo, utilizam o que lhe ensinaram.

Em suas palavras há certa polifonia. O sujeito falante, é individualizado, tem capacidade

para a aquisição da língua e a utiliza em conformidade com o contexto sociocultural em

que está inserido. O sujeito falando, refere-se a um sujeito inserido em uma conjuntura

sócio-histórico-ideológica cuja voz é constituída de um conjunto de vozes sociais. Mas

apesar disso, o sujeito não é homogêneo, há diversas vozes em seu discurso. Trata-se da

polifonia (poli= muito; fonia= vozes), assim temos a noção de heterogeneidade, que

designa um objeto um ser, constituídos de elementos diversificados. A noção de

polifonia surgiu com Mikhail Bakhtin, a partir dos estudos desenvolvidos sobre o

romance de Dostoiévski, sobre o funcionamento do discurso e as diferentes vozes

presentes em uma obra literária.

Michel Bréal (1883) em um artigo intitulado Recursos Para Uma

Desambiguização Das “Frases” Veiculadas Pelas Revistas Veja E Isto É, diz que a

semântica é a ciência das significações e das leis que presidem a transformação dos

sentidos, tal qual, estudo de sentidos das palavras. Ela propõe o significado. A semântica

possui um conjunto de elementos para sua transmissão: linguagem - meio de

comunicação; língua – instrumento para a transmissão da ideia; ideia – pensamento,

imagem mental (psíquica); significação – substantivo verbal (valor ativo), processo

psicológico -que associa objeto, ser, noção, fato a um signo que evoca. Cada palavra

possui o seu campo associativo como a palavra axila > suvacu > subacu e outras

utilizadas pelos informantes.

Segundo Vilela (1994), o léxico é a parte da língua que configura a realidade

extralinguística e arquiva o saber linguístico da comunidade. Quase tudo, antes de

passar para a língua e para a cultura dos povos, tem um nome e esse nome faz parte do

léxico. Esses nomes foram expostos de forma distintas pelos informantes nos 5 mapas

que compõem as cartas linguísticas para se referir ao lexema corpo humano, no Atlas

Linguístico de Mato Grosso do Sul.

Referências

http://www.michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?

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http://www.overmundo.com.br/banco/assim-e-que-se-fala-no-sertao-enredo-em-dez-

cantossextilhados

http://www.filologia.org.br/vcnlf/anais%20v/civ11_04.htm

ALVES, Ieda Maria. Criação Lexical. SP: Ática. 2007.

BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

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Recebido Para Publicação em 13 de junho de 2012.

Aprovado Para Publicação em 15 de julho de 2012.