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ARP 57 Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XVII, nº 66, pág. 57-61, Abr.-Jun., 2005 Casos Clínicos / Radiological Case Reports Recebido a 16/06/2005 Aceite a 18/07/2005 Estenose Isquémica do Intestino Delgado Ischemic Small Bowel Stenosis Pedro Belo Oliveira, Henrique Rodrigues, Olga Vaz, Pedro Belo Soares, Filipe Caseiro Alves Clínica Universitária de Imagiologia, Hospitais da Universidade de Coimbra Director: Prof. Doutor Filipe Caseiro Alves Resumo Os autores descrevem um caso de estenose isquémica do intestino delgado diagnosticada por enteroclise convencional, numa doente de 71 anos. A este propósito procedeu-se a uma revisão da literatura. Palavras-chave Estenose Isquémica do Intestino Delgado. Abstract We report a case of small bowel stenosis on a 71 years old female patient. A review of the literature on this regard is performed. Key-words Ischemic Small Bowel Stenosis. Introdução A doença isquémica do intestino delgado apresenta-se com uma grande variedade de manifestações clínicas e radiológicas indo desde um processo isquémico localizado até uma necrose catastrófica do intestino. São várias as causas da insuficiente circulação sanguínea, incluindo: tromboembolia, obstrucção intestinal, neoplasias, vasculites, patologia inflamatória abdominal, traumatismos, quimioterapia e radioterapia. A conduta terapêutica, que pouco tem mudado nas últimas décadas, consiste em primeira intenção na ressecção cirúrgica. No entanto, houve uma mudança apreciável na capacidade diagnóstica desde a introdução da angiografia em 1960 e com o advento das técnicas seccionais. A TC mostra espessamento da parede intestinal, com ou sem o sinal do alvo, pneumatose intramural, aeroportia, tromboembolia arterial ou venosa mesentérica, engurgitamento dos vasos mesentéricos, edema mesentérico e ausência de realce da parede das ansas afectadas. Os autores apresentam um caso de estenose isquémica dos segmentos distais do íleon cursando com marcada hipertrofia adiposa do mesentério. Caso Clínico Z.J.M., sexo feminino, raça caucasiana, 71 anos de idade, recorre ao Serviço de Urgência com queixas de dores abdominais, tipo moedouro, mais acentuadas na região hipogástrica e FID, com cerca de uma semana de evolução, acompanhadas de várias dejecções líquidas e distensão abdominal. Verificava-se também emagrecimento, astenia e anorexia nos últimos seis meses. Não havia história de vómitos nem queixas urinárias. Como antecedentes pessoais havia a salientar episódios frequentes de dôr abdominal com vários anos de evolução assim como insuficiência cardíaca congestiva e uma fibrilhação auricular. Os antecedentes familiares eram irrelevantes. Ao exame físico realçava-se uma temperatura axilar de 38º Celsius, pele e mucosas coradas e hidratadas, estando hemodinamicamente estável. À auscultação pulmonar o murmúrio vesicular estava mantido, simétrico e sem ruídos adventícios. A auscultação cardíaca era rítmica e o abdómen apresentava-se distendido, mole e depressível, doloroso à palpação profunda nos quadrantes inferiores com massa palpável na fossa ilíaca direita e flanco direito. Peristaltismo mantido. Toque rectal sem massas palpáveis e luva com restos de fezes acastanhadas. Entre os exames laboratoriais o hemograma não mostrava alterações, de realçar apenas um valor de PCR de 11,8.

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Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XVII, nº 66, pág. 57-61, Abr.-Jun., 2005

Casos Clínicos / Radiological Case Reports

Recebido a 16/06/2005Aceite a 18/07/2005

Estenose Isquémica do Intestino Delgado

Ischemic Small Bowel Stenosis

Pedro Belo Oliveira, Henrique Rodrigues, Olga Vaz, Pedro Belo Soares, Filipe Caseiro Alves

Clínica Universitária de Imagiologia, Hospitais da Universidade de CoimbraDirector: Prof. Doutor Filipe Caseiro Alves

Resumo

Os autores descrevem um caso de estenose isquémica do intestino delgado diagnosticada por enteroclise convencional, numadoente de 71 anos. A este propósito procedeu-se a uma revisão da literatura.

Palavras-chave

Estenose Isquémica do Intestino Delgado.

Abstract

We report a case of small bowel stenosis on a 71 years old female patient. A review of the literature on this regard is performed.

Key-words

Ischemic Small Bowel Stenosis.

Introdução

A doença isquémica do intestino delgado apresenta-se comuma grande variedade de manifestações clínicas eradiológicas indo desde um processo isquémico localizadoaté uma necrose catastrófica do intestino. São várias ascausas da insuficiente circulação sanguínea, incluindo:tromboembolia, obstrucção intestinal, neoplasias,vasculites, patologia inflamatória abdominal,traumatismos, quimioterapia e radioterapia. A condutaterapêutica, que pouco tem mudado nas últimas décadas,consiste em primeira intenção na ressecção cirúrgica. Noentanto, houve uma mudança apreciável na capacidadediagnóstica desde a introdução da angiografia em 1960 ecom o advento das técnicas seccionais. A TC mostraespessamento da parede intestinal, com ou sem o sinal doalvo, pneumatose intramural, aeroportia, tromboemboliaarterial ou venosa mesentérica, engurgitamento dos vasosmesentéricos, edema mesentérico e ausência de realce daparede das ansas afectadas. Os autores apresentam um casode estenose isquémica dos segmentos distais do íleoncursando com marcada hipertrofia adiposa do mesentério.

Caso Clínico

Z.J.M., sexo feminino, raça caucasiana, 71 anos de idade,recorre ao Serviço de Urgência com queixas de doresabdominais, tipo moedouro, mais acentuadas na regiãohipogástrica e FID, com cerca de uma semana de evolução,acompanhadas de várias dejecções líquidas e distensãoabdominal. Verificava-se também emagrecimento, asteniae anorexia nos últimos seis meses. Não havia história devómitos nem queixas urinárias.Como antecedentes pessoais havia a salientar episódiosfrequentes de dôr abdominal com vários anos de evoluçãoassim como insuficiência cardíaca congestiva e umafibrilhação auricular. Os antecedentes familiares eramirrelevantes.Ao exame físico realçava-se uma temperatura axilar de38º Celsius, pele e mucosas coradas e hidratadas, estandohemodinamicamente estável. À auscultação pulmonar omurmúrio vesicular estava mantido, simétrico e sem ruídosadventícios. A auscultação cardíaca era rítmica e oabdómen apresentava-se distendido, mole e depressível,doloroso à palpação profunda nos quadrantes inferiorescom massa palpável na fossa ilíaca direita e flanco direito.Peristaltismo mantido. Toque rectal sem massas palpáveise luva com restos de fezes acastanhadas. Entre os exameslaboratoriais o hemograma não mostrava alterações, derealçar apenas um valor de PCR de 11,8.

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A radiografia simples do abdómen, efectuada emortostatismo, mostrava níveis hidroaéreos projectados aoflanco esquerdo, sem outras alterações (Figs. 1 e 2).A doente realizou uma Tomografia Computorizada deurgência em que se observou aumento da densidade dagordura do mesentério, engurgitamento vascular e ansasileais de parede espessada (Fig. 3).Após a administração de contraste intravenoso podíamosconstatar a ausência de realce dos segmentos ileais

espessados e confirmar o engurgitamento vascularmesentérico.Perante a estabilidade do quadro clínico a doente realizano dia seguinte uma enteroclise convencional (Figs. 4 e 5)que mostra na fossa ilíaca direita três segmentos ileaisestenosados, permitindo opacificação do cólon, semcondicionar atraso na progressão do contraste até à zonade transicção, com irregularidade do relevo mucoso, semdilatação a montante, associado a aumento do espaçointeransas (obstrucção intestinal de baixo grau).A doente é submetida a uma laparotomia mediana supra einfra-umbilical observando-se um segmento com cercade 70 cm de ansas de intestino delgado espessadas edilatadas, associado a espessamento do respectivo mesoe lesões vasculares. Não se observaram tumorações.Procedeu-se a ressecção íleo-cecal com anastomose latero-lateral (Figs. 6 e 7).Enviou-se para estudo anatomo-patológico uma peça deressecção íleo-cecal com 65 cm, compreendendo 5cm decolon e 60cm de íleon terminal, incluindo o apêndice ileo-cecal. O segmento ileal mostrava três áreas de estenose,distando respectivamente 15cm, 18cm e 40cm da linha deressecção cirúrgica proximal, onde a parede atingia umaespessura de máxima de 3 cm à custa de um espessamento

Fig 1 - Radiografia simples do abdómen: níveis hidroaéreos projectadosao flanco esquerdo.

Fig 2a - A ecografia realizada no serviço de urgência evidenciou a nívelda fossa ilíaca e flanco direitos, aumento da espessura e ecogenicidadeda gordura do mesentério (seta).

Fig 2b - Ecografia: fina lâmina de derrame peritoneal (seta).

Fig 3 - TC sem CIV: ansas de parede espessada (seta) e engurgitamentovascular mesentérico (cabeça de seta), com evidente hipertrofia adiposaque condiciona afastamento de ansas.

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de todas as túnicas da parede, por vezes, tornando o lúmeninfranqueável. O espessamento da parede dava-se à custasobretudo de edema da submucosa onde se identificavamvasos com trombos organizados.O diagnóstico foi o de estenoses do íleon terminal comlesões vasculares de natureza isquémica.

Discussão

A isquémia mesentérica ocorre como consequência docompromisso da vascularização intestinal, arterial ou

venosa, tendo na sua etiologia várias causas, a saber:tromboembolia, obstrucção intestinal, neoplasia, vasculite,doença inflamatória, traumatismo, quimioterapia eradioterapia. A sua incidência tem vindo a aumentar,estimando-se que 1% dos doentes que recorrem à urgênciapor dor abdominal aguda têm na realidade doençaisquémica intestinal. As taxas de mortalidade e morbilidadetêm permanecido altas nos últimos 30 anos, atingindo ataxa de mortalidade da isquémia aguda os 60%, comoconsequência sobretudo da ausência de um meioimagiológico preciso para o seu diagnóstico [1]. Podeenvolver o intestino delgado ou cólon, ser segmentar oudifusa e envolver apenas a mucosa ou submucosa ou sertransmural. Apesar da sua gravidade, a isquémiamesentérica constitui uma das patologias mais interessantesdevido à sua grande diversidade de manifestações clínicase radiológicas e à sua elevada taxa de mortalidade (50-90%, dependendo da causa e da extensão do envolvimento)[2-4].Clinicamente o sintoma mais constante é a dor abdominalsevera, que não cede aos narcóticos opiáceos. Podemocorrer náuseas e vómitos. No entanto, a dor pode serligeira a moderada, apenas evocando o diagnóstico deisquémia mesentérica quando se desenvolve toxicidade

Fig 4 - Enteroclise: aumento do espaço interansas (asterisco).

Fig 5 - Enteroclise: segmentos estenosados com irregularidade do relevomucoso (setas).

Fig 6 - Laparotomia: ansas de intestino delgado com parede espessada(seta) e ansas com aspecto macroscópico normal (cabeça de seta).

Fig 7 - Laparotomia: engurgitamento vascular mesentérico.

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secundária. Mais tardiamente pode surgir distensãoabdominal, choque e peritonite generalizada. A leucocitoseé uma alteração laboratorial frequente. Em metade doscasos há amilase e creatinina cinase elevadas [5].Em radiologia convencional as alterações radiológicas daisquémia intestinal são semelhantes independentemente dasua etiologia. A radiografia simples do abdómen podeevidenciar ansas dilatadas, espessamento focal parietal(aspecto em dedada ou impressão em dedo de luva),pneumatose parietal e aeroportia [6]. A enteroclise mostraansas estenosadas, espessamento de pregas, irregularidadedo relevo mucoso e estase [6]. Contudo, a importânciadesta caso reside na existência concomitante de marcadahipertrofia adiposa (“creeping fat sign”) a qual se sabeestar geralmente associado à doença de Crohn de longaevolução sendo responsável pelo aumento do espaçointeransas em radiologia convencional [8]. Este sinal nãotem sido contudo descrito na isquémia mesentérica.Desde a década de 1980 que vários autores têm vindo achamar a atenção para o papel da TC no diagnóstico deisquémia mesentérica [ 1-13]. Os avanços desta técnicatêm sido impressionantes: a sensibilidade aumentoudurante os últimos anos de 39% para 82% (comparável àsensibilidade da angiografia) [14]. A técnica correcta requercontraste oral e intra-venoso. Em casos de suspeita deisquémia intestinal, deve ser realizada a administração oralde 600-750ml de contraste, ou água, 30 a 120 min antesdo exame. Na suspeita de isquémia cólica deve ser feita aadministração rectal de 400-800ml de contraste ou água,dado que quando os segmentos cólicos estão colapsados émuito dificil avaliar a espessura parietal. A administraçãointravenosa de contraste é necessária para demonstrar apresença de trombos nos vasos mesentéricos, emborainformação adicional seja fornecida pelo exame semcontraste: calcificações vasculares, trombos hiperdensose/ou hemorragia submucosa ou intramural. A TC multi-corte permite a demonstração da fase arterial (25-30s apósinjecção contraste) e da fase portal (60s), permitindo aindao pós processamento das imagens obtidas. A capacidadede reformatação multiplanar é uma tecnologia cominteresse crescente no diagnóstico da isquémia mesentérica[15].A alteração mais frequente na TC , embora menosespecífica, é o espessamento parietal que resulta de edemaparietal por vezes com hemorragia e infecção. Estaalteração associa-se frequentemente ao sinal do alvo(resultante da alternância de camadas de baixa e elevadaatenuação) como consequência do edema ou hemorragiana submucosa. A maior incidência do espessamento parietalé observado nos casos de isquémia cólica (94%) ereversível (80%), sendo muito menos comum em doentescom enfarte mesentérico (26-38%) [15,16]. No entanto,este sinal é o menos especifico de isquémia dado que podeser observado em muitas outras condições não isquémicas.De salientar que o espessamento parietal será mais evidentenos casos de isquémia provocada por trombose venosa doque nos casos de oclusão arterial. Isto deve-se ao facto dea hemorragia e infecção subsequente estarem apenaspresente nos primeiros casos [17]. O grau de espessamentoparietal não se correlaciona com a severidade da isquémia.

A dilatação de ansas é muito comum nos casos de enfarteagudo (56%-91%), sendo menos comum na isquémiareversível (40%).As alterações mesentéricas são não especificas e incluem:aspecto em cordão da gordura mesentérica, engurgitamentovascular e aumento da densidade do mesentério. Oengurgitamento venoso reflecte a congestão venosasecundária à estase. Devido ao edema que acompanha oprocesso isquémico a gordura mesentérica pode apresentarvalores elevados de atenuação. Contudo, a presença dehipertrofia da gordura mesentérica, como no caso presente,não tem sido reportada e poderá mimetizar outrosdiagnósticos em particular a doença de Crohn.A ausência de realce da parede das ansas envolvidas égeralmente homogénea, sendo provocada pelo edemaparietal, portanto mais frequente na trombose venosamesentérica.. Este aspecto tem sido reportado em 61% doscasos de colite isquémica [18].A pneumatose intestinal e a aeroportia são dois sinaismenos comuns mas mais especificos de isquémia aguda,estando presente em 6-28% e em 3-14% dos casosrespectivamente [18,19]. A pneumatose intestinal pode-semanifestar por pequenas bolhas de gás isoladas parietaisou por uma separação da parede da ansa em duas camadasprovocada pela dissecção do ar. A aeroportia, emboraconsiderada um sinal sensível, pode também estarrelacionado com cirurgia gastrointesinal, biópsiasendoscópicas ou percutâneas, drenagem de abcessosabdominais, infecções abdominais anaeróbias e doença deCrohn. As causas de pneumatose intestinal são muitovariadas, variando de infecciosas, inflamatórias,neoplásicas ou iatrogénicas.A TC pode ainda mostraroclusão da artéria ou veia mesentérica ou da veia porta eenfarte em outros orgãos abdominais [19].Uma breve referência á isquémia mesentérica crónica quese caracteriza por ocorrer tipicamente em doentes com maisde 50 anos, com doença aterosclerótica provocandoestenose ou oclusão dos grandes vasos esplâncnicos.Manifesta-se por um síndrome bem definido, anginaintestinal, consistindo em dor abdominal recorrente pós-prandial com a duração de cerca de duas horas, aversãoaos alimentos e emagrecimento. Apesar da patofisiologianão ser ainda bem conhecida, é muito provavel que resultede uma discrepância entre as exigências aumentadas deoxigénio do intestino delgado e a incapacidade defornecimento inadequado de sangue. Trata-se no entantode uma patologia rara dadas as múltiplas colaterais queentretanto se vão desenvolvendo [20,21].Perante as alterações radiológicas e tendo sobretudo ematenção as estenoses de ansas do intestino delgadodeveríamos considerar, neste caso, as seguintes hipótesesde diagnóstico: doença de Crohn, linfoma, tumorcarcinóide, metástases, tuberculose e paniculitemesentérica. A doença de Crohn seria a entidade com aqual o diagnóstico diferencial seria mais dificil.A favor da doença de Crohn havia a considerar a clínicade diarreia e de dores abdominais, as alteraçõesevidenciadas pela enteroclise: os segmentos ileaisestenosados, com irregularidade do relevo mucoso,associando aumento do espaço interansas resultante dahipertrofia adiposa [22]. Na TC podiamos observar

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alterações também típicas da doença de Crohn: oespessamento parietal (embora sem estratificação), ahipertrofia da gordura mesentérica e a hipervascularizaçãodo mesentério, sem no entanto identificarmos o sinal dopente correspondente à hipertrofia dos vasos rectos [23].Contra esta hipótese tinhamos a ausência de evidente realceparietal após a administração de CIV e a ausência de outrasalterações inflamatórias como abcessos mesentéricos, dopsoas ou da parede abdominal. Não objectivavamostambém qualquer trajecto fistuloso, nem adenopatiasmesentéricas. Do ponto de vista patológico havia algumasalterações caracteríticas da doença de Crohn que estavamausentes. Macroscopicamente, não se observava umaseparação nítida e muito bem delimitada entre ossegmentos afectados e os são, nem ulcerações da mucosa,ou trajectos fistulosos. Histologicamente nãoidentificavamos infiltrações focais de neutrófilos, formaçãode abcessos, ulcerações ou fissuras da mucosa [24]. Asalterações deste caso limitavam-se à submucosa e nãoafectavam todas as camadas da parede da ansa comoacontece no Crohn. Não havia ainda granulomas nãocaseosos típicos da doença inflamatória intestinal.

Conclusão

Um dos objectivos da Medicina Moderna é o diagnósticopreciso e precoce e a determinação da terapêutica óptimaalcançando assim uma mortalidade baixa em doentes comisquémia mesentérica aguda. Objectivo dificil de alcançardevido à variabilidade clínica, laboratorial e radiológica.Assim, é essencial uma correlação clinico-radiológica nodiagnóstico desta patologia. Apesar de o diagnóstico deisquémia mesentérica por TC poder ainda ser dificil naausência de sinais radiológicos ou clínicos especificos, asensibilidade da TC - 82% - para o diagnóstico destapatologia quase que alcança a sensibilidade da angiografia- 87,5%. [4]. A TC é ainda capaz de demonstrar alteraçõesparietais e confirmação ou exclusão de de outrosdiagnósticos diferenciais.A hipertrofia da gordura mesentérica pode ocorrer e nãodeverá inviabilizar o diagnóstico.

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Correspondência

Pedro Belo OliveiraClínica Universitária de ImagiologiaHospitais da Universidade de CoimbraAv. Prof. Mota Pinto3000 Coimbra