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Espanha quer controlar espaço aéreo português Gestão do tráfego no Atlântico pode passar a ser feita a partir de Madrid. Além da soberania, está em causa um negócio de milhões e 2o

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Espanha quer controlarespaço aéreo português

Gestão do tráfego no Atlântico pode passar a ser feita a partirde Madrid. Além da soberania, está em causa um negócio de milhões e 2o

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¦¦«^ urante a cimeira ibéri-ca, que decorreu estasemana no Porto, este-ve em cima da mesauma proposta que visaa criação de um espaçocomum integrado para

y o tráfego aéreo, que se-S ria administrado emconjunto por Espanha e por Portugal. AEspanha tem insistido para que este es-

paço seja criado o mais breve possível e

os detalhes ainda estão a ser discutidos,mas prevê-se que os dois governos assi-

nem um acordo já em junho.Portugal tem mantido conversações nos

últimos anos com o país vizinho atravésdo INAC (Instituto Nacional de Aviação Ci-

vil), mas tem tardado a clarificar a sua posi-ção, devido à mudança de governo e aofacto de a administração da NAV Portugal(empresa estatal que presta serviços de na-

vegação aérea) ter estado há vários mesessem quorum. E também por ser um assun-to sensível que 'mexe' com a soberania na-cional e tem implicações para as próximasdécadas. As opiniões entre gestores do sec-

tor e políticos dividem-se entre os que de-fendem partilhar com Espanha a presta-ção de serviços de navegação aérea na re-gião de voo de Santa Maria e os que defen-dem que esta região oceânica, por se en-contrar sobre o alto mar, tem característi-cas operacionais e técnicas completamen-

Textos JOÃO RAMOSInfografia JAIME FIGUEIREDO

te distintas das regiões continentais.O interesse espanhol resulta do facto

de Portugal ser, em termos de controlode espaço aéreo, uma 'superpotência',por ter a seu cargo uma das maiores re-giões de voos do mundo, com mais de 6milhões de quilómetros quadrados (62vezes o território nacional).

Já o nosso vizinho é, neste aspeto, pre-dominantemente continental e interiore tem interesses no fornecimento de pro-dutos e serviços associados à área ae-roespacial.

Este processo já tem alguns anos devi-do à política comunitária de liberalizaçãodo espaço aéreo e à criação do chamadoCéu Único Europieu, permitindo aos Esta-dos implementar rotas aéreas mais efi-cientes para as companhias de aviação,melhorando os atuais níveis de seguran-

PORTUGAL É UMA'SUPERPOTÊNCIA'EM TERMOS DECONTROLO DOESPAÇO AÉREO

ça operacional e aglomerando as chama-das RIV (regiões de informação de voo),também conhecidas pelo acrónimo anglo--saxónico FIR (Flight Information Re-

gion). Na prática, as pretensões espanho-las passariam pela integração das RTV deLisboa e de Santa Maria com as RIV espa-nholas no âmbito do Bloco Funcional Aé-reo do sudoeste europeu.

A importância de Santa Maria

O nosso país presta serviços de navega-ção aérea em grande parte do tráfego doAtlântico Norte a partir de Santa Maria,uma vasta zona que confina a norte como Reino Unido (Prestwick) e o Canadá(Gander), a oeste com os Estados Unidos

(Nova lorque) e Trinidad e Tobago (Piar-co) e a sul com Cabo Verde (Sal) e Marro-cos (Casablanca), assegurando a gestãodo tráfego dos aviões que ligam a Europaàs Américas.

Já a ligação atlântica da Espanha estáconfinada ao corredor da região da Can-tábria e está 'bloqueada' pelas RIV deSanta Maria e Casablanca (Marrocos).

Por delegação da ICAO (Organizaçãode Aviação Civil Internacional), Portu-gal ficou a gerir este enorme espaço aé-reo do Atlântico Norte logo após a Se-

gunda Guerra Mundial, num processoque envolveu Humberto Delgado (foina altura uma vitória do Portugal de Sa-lazar sobre a Espanha de Franco).

Caso venha a partilhar com Espanhaa gestão deste espaço aéreo atlântico,a diplomacia portuguesa terá de co-

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municar essa mudança aos 'vizinhos'.A Irlanda viveu uma situação semelhan-

te. Partilha com o Reino Unido um espa-ço aéreo integrado mas continua a gerirde forma autónoma o espaço atlântico.

Além de abdicar da delegação do espa-ço aéreo, Portugal também iria eventual-mente partilhar com Espanha as recei-tas desta atividade (que ascende a pertode €180 milhões por ano).

Esta possível perda de influência de

Portugal na navegação aérea do Atlânti-co Norte tem sido uma das razões paraas greves intermitentes que os controla-dores aéreos portugueses têm vindo a fa-zer (e que deverão continuar nos próxi-mos dias). "Criticamos a falta de estraté-gia portuguesa para o sector", afirmaCarlos Felizardo, coordenador da Comis-são de Trabalhadores da NAV.

Além dos interesses corporativos, aeventual passagem da gestão do espaçoaéreo para Madrid tem o risco de esvaziar

algumas das competências portuguesasnesta matéria. A importância geopolíticada projeção atlântica portuguesa do espa-ço aéreo, segundo especialistas, tambémtem implicações noutras vertentes da so-

berania, como o posicionamento de por-tos portugueses e rotas marítimas, a ex-tensão da plataforma marítima e as esta-

ções terrenas para controlo de satélites.Também do ponto de vista da indústria

(ver página ao lado) a NAV vai ter defazer opções que podem favorecer (ounão) os interesses das empresas portu-guesas do sector.

[email protected]

NÚMEROS

62vezes a área do território português(6 milhões de quilómetros quadrados)é a dimensão da região de voo geridapor Portugal a partir de Lisboae Santa Maria

3vezes mais tráfego aéreo, reduziros atrasos e multiplicar por dezo desempenho da segurança são algunsdos objetivos para 2020 do programaSESAR do céu único europeu

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Chister português continua num impasse

Empresas portuguesas do sectoraeroespacial atuam de formaisolada e têm sofrido com aausência de uma estratégiagovernamental

Ao contrário de Portugal, o país vizinhocolocou em marcha há vários anos umaestratégia nacional (Plano Estratégico pa-ra o Sector Aeronáutico Espanhol 2008--2016), que visa criar um tecido indus-trial exportador que represente 1% doPEB (Produto Interno Bruto) em 2016.Foi neste contexto que surgiram várias

empresas (Indra, GMV, entre outras)que atuam de forma agressiva no merca-do internacional.

Ao invés, o sector aeroespacial portu-guês é disperso e de pequena dimensão

(no 4fi Fórum Espacial em 2010 foramidentificadas 30 empresas, sendo a maio-ria start-ups) e nunca beneficiou de umaestratégia governamental consistente pa-ra o sector.

Rogério Carapuça, presidente do TICE— polo de competitividade para as tecno-

logias de informação, comunicação e ele-

trónica, defende que Portugal deveria

aproveitar a modernização que o Céu Úni-co europeu irá proporcionar para aumen-tar as exportações. "As empresas portu-guesas podem ser rivais no mercado inter-no, mas devem unir-se para atacar merca-

dos externos", afirma. Dua& das princi-pais tecnológicas portuguesas, a Novaba-

se e a Criticai Software, já atuam no sec-tor aeroespacial a nível nacional e interna-cional e não têm escondido o interesse

em contribuir para a criação de um mode-lo que unisse o sector, que poderia incluir

algumas das participadas da Empordef(Edisoft e EID) que deverão ser privatiza-das nestas legislatura.

Rodrigo Adão da Fonseca, presidenteexecutivo da Edisoft, também considerafundamental que se estabeleçam alian-

ças entre as empresas do sector, porque"ninguém faz tudo sozinho" e é precisopossuir massa crítica para ter presençanos mercados externos.

Também é de salientar que Portugal es-tá cada vez mais dependente de tecnolo-

gia e empresas espanholas para contro-lar o seu espaço aéreo, marítimo e terres-tre. Por exemplo, a Indra é a empresa do

país vizinho que mais contratos conse-

guiu conquistar em áreas que mexemcom a soberania portuguesa (ver caixanesta página).

Algumas destas empresas do país vizi-nho também têm beneficiado de contra-tos através da quota que a ESA — Agên-cia Espacial Europeia atribui a Portugalcomo país membro. É o caso, por exem-plo, da GMV, que adquiriu a Skysoft em

Portugal.

OPÇÕES TECNOLÓGICAS

¦ Para a modernização da gestão de

espaço aéreo, NAV Portugal tem três

opções tecnológicas. A primeira seria a

adoção do sistema espanhol 'chave namão' (iTEC) que tem vindo a serdesenvolvido pela Indra em colaboraçãocom a AENA. Além da Espanha, estesistema foi o escolhido pelo Reino Unido

e pela Alemanha.

¦ A segunda opção seria a utilização da

tecnologia desenvolvida pelos francesesda Thales (CoFlight) e que será usada

pela França, Itália e Suíça.

¦ A terceira opção seria continuar a usara solução LISATM, que para o efeito terá

que sofrer algumas atualizações. Alémde permitir ter conhecimento em

Portugal, poderia ser exportada paraoutros países fora da União Europeia.

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Paulo Campos quisdesistir de tecnologiaportuguesa

Ex-secretário de Estado dosTransportes deu luz verdeà tecnologia espanholade controlo aéreo. Processovoltou à estaca zero

Além de pressionar Portugal nosentido de ser criado rapidamen-te um bloco aéreo — FAB (Func-tional Airspace Block) — comumno sudoeste europeu, a Espanhatem procurado impor a sua tecno-

logia iTEC — que será usada pelaAENA (empresa aérea de navega-ção aérea espanhola) e foi desen-volvida pela tecnológica Indra.Um sistema que iria substituir o

português LISATM que foi desen-volvido pela Edisoft para a NAV.

Paulo Campos, ex-secretário deEstado das Comunicações e

Transportes do anterior Gover-

no* liderado por José Sócrates,concordou, em 31 de maio de2011 (pouco antes das eleições de6 de junho), que Portugal adotas-se a tecnologia espanhola por "ra-zões técnicas e imperativos de or-dem económica", em detrimentoda promoção de "um procedimen-to autónomo de contratação deum sistema de processamento de

planos de voo". "A aliança entre a

AENA e a NAV é a opção estraté-

gica mais adequada. E garantia aparticipação de empresas tecnoló-

gicas portuguesas através dos

compromissos estabelecidos coma Indra", disse Paulo Campos estasemana ao Expresso.

Na prática, o Governo da épocadava luz verde a que o softwareda NAV (empresa portuguesaresponsável pela navegação aé-

rea) fosse incorporado no siste-ma iTEC da Indra, Segundo do-cumentos a que o Expresso teveacesso, além de fornecer o soft-

ware, a NAV teria que pagar, pe-la utilização do sistema iTEC, cer-ca de €30 milhões no prazo deseis anos. Especialistas em aero-navegação, que pedem para nãoser identificados, defendem quemesmo que Portugal venha a es-tabelecer um acordo com Espa-nha para a adoção de um blocoaéreo comum, nada obriga-eracto^'tar um fome^eflof^e^nojogico es-

panhol, sugerindo ate que "poruma questão de transparência e

independência tecnológica nacio-

nal", a tecnologia devia "ficar fo-ra do acordo".

Segundo esta visão, a capacida-de dos sistemas 'falarem' unscom os outros — a chamada inte-

roperabilidade — é asseguradaatravés de uma camada de soft-ware (middleware) comum a to-dos os sistemas de navegação,através de uma norma europeia.

Entretanto, com a entrada emfunções do Governo de Passos

Coelho, este processo de atribui-ção do sistema de controlo aéreoaos espanhóis ficou suspenso eterá voltado à estaca zero. Alémda tecnologia 'chave na mão'iTEC da AENA/Indra, que deve-rá ser adotada em Espanha e naAlemanha, há mais duas opçõespossíveis.

Uma passaria pela escolha da

tecnologia CoFlight proposta pe-los franceses da Thales (que é

acionista em 30% da Edisoft emconjunto com a NAV e com a

Empordef) e que deverá ser ado-tada pela França, Itália e Suíça.

A terceira opção seria o 'melho-ramento' e atualização da solu-

ção LISATM, em parceria comas tecnológicas portuguesas,com vista à sua exportação.

Rodrigo Adão da Fonseca, pre-sidente executivo da Edisoft,mostrou disponibilidade para a

empresa colaborar com o melho-ramento da tecnologia atualmen-te em uso pela NAV, tanto mais

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que a empresa esteve envolvidano seu desenvolvimento.

O responsável da Edisoft garan-tiu ao Expresso que este softwa-re de navegação usado pela NAVapenas "carece de melhoramen-tos para cumprir os requisitos docéu único europeu" que está aoalcance da engenharia portugue-sa. "Permitiria manter e desen-volver competências nacionais e

criar propriedade intelectual ex-

portável", acrescenta.A criação de um céu único euro-

peu (projeto SESAR) visa refor-çar a segurança e a eficiência do

transporte aéreo, nomeadamen-te através da diminuição doCO2. De acordo com a União Eu-ropeia, o atual sistema de gestãodo espaço aéreo não terá capaci-dade para lidar com o aumentoprevisível do tráfego até 2030.Segundo estimativas do Euro-control, organismo de supervi-são do controlo aéreo, o tráfegoaumentará para 16,9 milhões devoos em 2030 (1,8 vezes mais

que os atuais níveis de tráfego).O objetivo de Bruxelas é que os

blocos aéreos, criados no âmbitodo programa Céu Único, este-

jam a funcionar até fim de 2012.

NA MÃO DE ESPANHÓIS

Controlo e vigilância de costaIndra ganhou contrato defornecimento do SIVICC —Sistema Integrado de Vigilância,Comando e Controlo de Costa.Tem como missão monitorizarmais de 900 quilómetros dacosta portuguesa através de

radares e imagem. Está afuncionar a meio gás devidoa falhas que o Ministério da

Administração Interna imputaà empresa espanhola.

Janela única portuáriaIndra instalou Sistema de

Simplificação Administrativanos portos de Lisboa, Sines e

Leixões. Visa diminuir o tempode imobilização dos navios,decorrente do despachoaduaneiro.

Controlo do espaço aéreoda MadeiraIndra forneceu radar em trêsdimensões para controlo do

espaço aéreo da Madeira.

Projeto da responsabilidadeda Força Aérea Portuguesa.

Rede Cavalo MarinhoIndra forneceu a rede de satélite

para controlo de narcotráfico e

imigração ilegal, que funcionasob a responsabilidade doMinistério da AdministraçãoInterna.

Controlo de barcos nos Açorese MadeiraA GMV forneceu o sistemaMAÇAIS que faz o controlodesde 2006 das embarcaçõesaté 50 milhas marítimas nas

regiões da Madeira e Açores.

Informação tática aéreaGMV for/ieceu sistema de

informação tático à Força Aérea

..Portuguesa.

Sistema de vigilância videoA Deimos assegura a vigilânciaótica por vídeo do territórioportuguês, de três em três dias,através de satélite.

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