Entrevista Com Fiorin Sobre Saussure
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7/18/2019 Entrevista Com Fiorin Sobre Saussure
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Outubro/2013
Entrevista
Os caminhos da ciência da língua
José Luiz Fiorin homenageia o linguista Ferdinand Saussure no centenário do pai da
linguística moderna
Por Luiz Costa Pereira Junior
2
É um autor incansável, de estilo direto tanto
quanto erudito, que criou obras obrigatórias.
Aos 66 anos, José Luiz Fiorin é um dosnomes máximos dos estudos de linguagem no
rasil. !as, quando a vida era "esita#$o e
temor do %uturo, lá, bem no in&cio da vida
adulta, ele queria mesmo era ser advogado.
Fiorin %oi um adolescente do interior 'irigui,
()*, +aci%icado +ela ideia de %azer o curso de
direito na ca+ital. )or circunstncias da vida,
ele se viu obrigado a adiar o +ro-eto.
im+rovisou. )ara n$o +erder o ritmo, %ez o
curso de letras na vizin"a )ená+olis, a /0
quil1metros dali.
2a 3s aulas sem ex+ectativas, contando as "oras +ara ingressar em direito. Até o dia em que,
ao sair de uma aula de José Fulanetti de 4adai, se viu em c"oque. Fora %isgado +elo universo
da linguagem. 5Até aquele momento, nunca me +assara +ela cabe#a ser +ro%essor.5
onstruiu carreira de +ensador a+licado, elegante e rigoroso. conquistou o res+eito e a
liberdade que mestres convictos de sua %un#$o tendem a ins+irar em seu ramo. olunista de
L&ngua, é +ro%essor associado do de+artamento de lingu&stica da 7(), com +ós8doutorado na
École des 9autes Études en (ciences (ociales ')aris, :;</8<=* e na 7niversidade de
ucareste ':;;:8;>*. Foi membro do consel"o deliberativo do 4)q '>0008>00=* e
re+resentante da área de letras e lingu&stica na a+es ':;;?8:;;;*.
s+ecialista em análise de discurso, +ragmática e semiótica %rancesa, natural que, no
centenário do +ai da lingu&stica moderna, Fiorin deixasse sua "omenagem. )ois acaba de
organizar, +ara a editora ontexto, (aussure, a 2nven#$o da Lingu&stica, ao lado de @aldir do
4ascimento Flores e Leci orges arbisan.
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)ro-etos como esse o tomam como a um mergul"o, +ois Fiorin gosta de escrever, de %azer
cincia e ainda vibra +elo mais remoto +ro-eto na +ranc"eta. 7m dia, +romete a si mesmo, "á
de escrever sobre os mitos de origem da linguagem de culturas di%erentes. 7m dia, %ará livro
sobre esquemas argumentativos. nquanto isso, busca seduzir as +essoas +ara o encantado
reino da linguagem, aquele que trans%ormou sua vida quarenta anos antes.
Saussure não foi o primeiro a cunhar o termo e o conceito de signo !or "ue sua teoria
fe# tanta diferen$a%
Be %ato, a quest$o do signo vem desde os gregos. !as o que é novo em (aussure, antes de
tudo, é a no#$o de valor, quando ele diz que um signo tem seu valor dado +ela rela#$o com
outros. (igni%ica que o valor n$o é o signi%icado +ositivo do signo, mas é dado negativamente
+ela rela#$o de um signo com outros. 2sso introduz o conceito de sistema na lingu&stica, o que
era novo na é+oca. vai +ermitir uma cincia coerente, n$o atomizada, como eram os
estudos de gramática de ent$o. 2sso, +or outro lado, terá consequncias. C que (aussure querres+onder é 5como é que um %alante comum %alaD5. Fala +orque tem um sistema
internalizado, res+onde ele. 2sso leva a estudar n$o só a l&ngua em sua evolu#$o, mas o
sistema da l&ngua num dado momento.
Em "ue Saussure deveria ser superado%
A vis$o sistmica que %undou a lingu&stica moderna n$o %oi su+erada. 7m clássico é o que
gan"a inter+reta#Ees. (aussure é assim. le é acusado de n$o levar em conta a dimens$o
"istórica da l&ngua. uando diz que um signo une um nome a uma coisa, sim+lesmente
a%irma que a ordem da l&ngua é di%erente da ordem do mundo, que é uma constru#$o "umana.le n$o esvazia a dimens$o "istórica da l&ngua, mas se mostra interessado em ex+lica#Ees
buscadas dentro do idioma. É claro que se +ode dar outras ex+lica#Ees, econ1micas, sociais,
"istóricas, mas n$o é esse o seu interesse. le +ensa a l&ngua considerada em si e +or si
mesma. ra um +onto de vista com que se +oderia res+onder a quest$o de como o %alante
+roduz mensagens. Cutro seria o da evolu#$o dos %en1menos lingu&sticos.
&' um limite de a$ão para a ciência de Saussure%
Alguns dizem que dever&amos abandonar a ideia de sistema e trabal"ar com a l&ngua como
um con-unto de +ráticas sociais. Godas essas +osi#Ees rendem %rutos +ara a cincia. 4$oacredito que nas cincias "umanas "a-a obsolescncia do con"ecimento. 4um dado momento,
+osso retomar uma no#$o que +arecia su+erada. C século :< tin"a uma conce+#$o de que
"avia estruturas lingu&sticas universais. C século :; abandona essa no#$o +ara mostrar a
existncia de %am&lias de l&nguas.
Ac"ou8se que o universalismo estava su+erado, mas "omsHI retoma a ideia de outra %orma.
A cincia n$o +ode ter verdades absolutas. (ó a religi$o. A cincia estabelece modelos,
a+roxima#Ees da realidade. C que a lingu&stica do sistema res+onde, res+onde bem. !odelos
n$o s$o 5errados5 ou 5certos5, +ois n$o res+ondem outras +erguntas que n$o as +ró+rias.
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(ivemos uma mudan$a na forma de fa#er ciência%
(im. Gemos novas +erguntas que exigem novas res+ostas. A lingu&stica ao longo da "istória
criou di%erentes ob-etos teóricos. (eu ob-eto em+&rico é a linguagem. !as ela +recisa
delimitar uma regi$o na qual vai se movimentar, um ob-eto observacional +ara estabelecer
uma teoria.
"omsHI, +or exem+lo, busca os +rinc&+ios universais da linguagem "umana e encontra sua
base na biologia. (aussure, quando +ensa a l&ngua como constru#$o "umana, está interessado
no sistema +ró+rio de cada idioma, o que o a+roxima da antro+ologia. A quest$o das +ráticas
lingu&sticas n$o está contem+lada +ela lingu&stica da com+etncia, de "omsHI, nem +ela do
sistema, no sentido que l"e deu o estruturalismo mais radical. (aussure se +ergunta como
%alamos.
Agora, é algo a se +erguntar se %alar bem de+ende de uma +rática da l&ngua materna. (eria%ácil trabal"ar com tal ideia em +a&ses com uma só l&ngua. 2sso é raro e mesmo o rasil n$o
tem uma só l&ngua. m +a&ses a%ricanos e &ndicos, é normal a+render trs, quatro idiomas,
cada um usado em +ráticas sociais, momentos e locais distintos, +elo mesmo %alante. 4essa
"ora, +recisamos de uma re%lex$o mais a+ro%undada das questEes relativas 3s +ráticas sociais.
)onsidera um e"uívoco a ideia de uma língua corresponder a uma na$ão%
A ideia de que a uma na#$o corres+ondia uma dada l&ngua surge no +er&odo da constitui#$o
dos estados nacionais e da consequente cria#$o de identidades nacionais. A l&ngua era um dos
elementos constitutivos da nacionalidade. Biz8se que a globaliza#$o +ro+Ee novas questEes.om a 7ni$o uro+eia e os estados transnacionais, acreditou8se que se su+eraria a ideia de
+a&ses e l&nguas +uras. !as o estado8na#$o e as questEes que ele coloca n$o %oram su+erados.
A +ersistncia dos nacionalismos é %orte. 4$o "á identidade euro+eia e ressurge um
nacionalismo que se ac"ava morto, além do rea+arecimento de %ascismos na uro+a.
9á +esquisadores que +ensam a l&ngua enraizada em +ráticas e n$o uma coisa com vida
+ró+ria %ora e acima dos %alantes.
A lingu&stica sem+re se +ensou como uma cincia social. 4o entanto, "o-e "á re%lexEes maisalentadas sobre a quest$o do contato com suas a+ro+ria#Ees, "eterogeneidades, misturas, que
de+endem das +ráticas sociais. A l&ngua é um %azer regulado tanto +elo contexto social como
+or um sistema sub-acente. !as, a+esar de +ráticas muito diversas, temos comunidade
lingu&stica. (aussure vai dizer que a l&ngua é a soma de con"ecimentos internalizados +or
todos os %alantes de uma dada comunidade. 9á +ontos de contato de con"ecimento lingu&stico
em sociedades mesmo muito desiguais. É ignorar a realidade dizer que n$o temos
comunidade lingu&stica no rasil.
O *rasil criou solu$+es "ue não h' em outros idiomas%Gemos uma +rática lingu&stica derivada da %orte "ierarquiza#$o social, que é di%erente das
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+ráticas do +ortugus euro+eu. 4$o sei se isso é uma solu#$o. C drible caracter&stico do
%utebol brasileiro deriva da é+oca da incor+ora#$o do negro ao es+orte, quando n$o +odia
"aver o contato, o toque com -ogadores brancos. 4a nossa +rática lingu&stica, temos uma
série de %ormula#Ees que s$o derivadas de uma "ierarquiza#$o social.
!or "ue a dificuldade para a pes"uisa de ponta chegar ao ensino m,dio e b'sico%
A quest$o come#a no que se c"ama o+ini$o +blica. )or exem+lo, no debate sobre o que se
deve ensinar. 4en"um linguista disse que n$o é +reciso a+render a norma culta. 4em "á
linguista que negue que todas as sociedades "umanas estabelecem normas adequadas +ara as
di%erentes es%eras de comunica#$o. !as a lingu&stica n$o transmite de modo adequado o que
é a lingu&stica. 2sso demanda um %orte trabal"o de divulga#$o. C curioso é que +or muito
tem+o a divulga#$o %oi malvista na universidade. Kramsci dizia que intelectuais tin"am n$o
só res+onsabilidade de +ensar as questEes, mas divulgar o saber. !as, %ora da universidade,
com o ensino é di%erente.
Em "ue sentido%
Cs +ro%essores tm uma conce+#$o bem adequada sobre as questEes. C que %alta é material
didático +ara o+erar. É uto+ia ac"ar que o +ro%essor que dá aula o dia todo +roduza o +ró+rio
material. nsinar a escrever é com+licado, +ois é +reciso +riorizar as questEes discursivas e
textuais, como coerncia, coes$o. Longe de de%ender aqui os erros de gra%ia, mas a ortogra%ia
é a +arte menos im+ortante e signi%icativa de um texto. 2ndica baixa %requncia de escrita e
leitura, o que n$o é +ouco. em mais com+lexo é %azer um texto articulado sintaticamente. É
coisa sobre a qual a escola deveria se debru#ar. !as isso é muito di%&cil.
-ual o e"uívoco a evitar ao se ensinar português%
4$o %azer o aluno +erceber que aquela l&ngua de que trata a escola tem a ver com a que ele
usa no dia a dia. 7m +ro%essor +recisa encantar os alunos +ara o mistério, a beleza, a e+i%ania
da linguagem.
uando %az isso, quando o ensino n$o está se+arado da l&ngua do dia a dia, o +ro%essor está
ensinando o aluno a am+liar suas +ráticas lingu&sticas. Até quando se ensina um sim+les caso
de concordncia é +reciso am+liar a +rática social.
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