Ensaios Pegagogicos Sobre Os Solos

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74 ARTIGO Práticas pedagógicas para ensino sobre solos: aplicação à preservação ambiental José Edézio da Cunha Prof. do Curso de Geografia, Campus Marechal Cândido Rondon, Universidade Estadual do Oeste do Paraná [email protected] Anderson Sandro da Rocha Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá [email protected] Greicy Jhenifer Tiz Doutoranda em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá [email protected] Vanda Moreira Martins Profa. do Curso de Geografia, Campus de Marechal Cândido Rondon, Universidade Estadual do Oeste do Paraná [email protected] ABSTRACT Although the soil is an important landscape element, considered essential to the development of human activities, it is usually little known by the population, explicitly, the one that is consisted of people who deal with the soil on a daily basis, in a direct or indirect manner, like the agriculturists, as well as the one consisted of people who build their residences and buildings on the surface of the ground. The current study, applied to ten 5 th grade Elementary School groups of students in three public schools in Marechal Cândido Rondon, West region of Paraná State, between the years of 2007 and 2008, shows and analyzes the results of pedagogical practices of essays on seeds germination, decomposition of different kinds of materials, and water infiltration into the soil, in order to investigate the possible progress in the understanding of soil properties and in the construction of environmental awareness. We conclude that the activities raised the understanding of the soil as a geographical landscape component and helped to apply theoretical knowledge learned in the classroom. Citation: Cunha J.E.da, Rocha A.S.da, Tiz G.J., Martins V.M. 2013. Práticas pedagógicas para ensino sobre solos: aplicação à preservação ambiental. Terræ Didatica, 9(2): 74-81. <http://www.ige.unicamp.br/terraedidatica/>. KEYWORDS: Systemic analysis, soil, water, essays. RESUMO Embora o solo seja um importante elemento da paisagem, considerado essencial para o desenvolvimento das atividades humanas, ele é pouco conhecido pela população, tanto aquela composta de pessoas que lidam com o solo no dia-a-dia, direta ou indiretamente, como é o caso dos agricultores, como aquela composta de pessoas que constroem suas moradias e edificações na superfície do terreno. O presente estudo, aplicado em 10 turmas de alunos de 5a série do ensino fundamental de três escolas públicas da cidade de Marechal Cândido Rondon, Oeste Paranaense, entre os anos de 2007 e 2008, relata e analisa resultados de práticas pedagógicas que focalizam ensaios de germinação de sementes, decomposição de diferentes tipos de materiais e de infiltração de água no solo, para investigar progressos na compreensão das propriedades dos solos e na construção de uma consciência ambiental. Conclui-se que as atividades suscitaram a compreensão do solo como componente da paisagem geográfica e ajudaram a aplicar conhecimentos teóricos apreendidos em sala de aula. PALAVRAS-CHAVE: Análise sistêmica, solo, água, ensaios.

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O objetivo do artigo é trazer a importância do solos para a escola básica através de oficinas

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    Prticas pedaggicas para ensino sobre solosARTIGO

    Prticas pedaggicas para ensino sobre solos: aplicao preservao ambiental

    Jos Edzio da CunhaProf. do Curso de Geografia, Campus Marechal Cndido Rondon, Universidade Estadual do Oeste do Paran [email protected] Sandro da RochaDoutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Maring [email protected] Jhenifer Tiz Doutoranda em Geografia pela Universidade Estadual de Maring [email protected] Moreira MartinsProfa. do Curso de Geografia, Campus de Marechal Cndido Rondon, Universidade Estadual do Oeste do Paran [email protected]

    ABSTRACT Although the soil is an important landscape element, considered essential to the development of human activities, it is usually little known by the population, explicitly, the one that is consisted of people who deal with the soil on a daily basis, in a direct or indirect manner, like the agriculturists, as well as the one consisted of people who build their residences and buildings on the surface of the ground. The current study, applied to ten 5th grade Elementary School groups of students in three public schools in Marechal Cndido Rondon, West region of Paran State, between the years of 2007 and 2008, shows and analyzes the results of pedagogical practices of essays on seeds germination, decomposition of different kinds of materials, and water infiltration into the soil, in order to investigate the possible progress in the understanding of soil properties and in the construction of environmental awareness. We conclude that the activities raised the understanding of the soil as a geographical landscape component and helped to apply theoretical knowledge learned in the classroom. Citation: Cunha J.E.da, Rocha A.S.da, Tiz G.J., Martins V.M. 2013. Prticas pedaggicas para ensino sobre solos: aplicao preservao ambiental. Terr Didatica, 9(2): 74-81. .

    KEYWORDS: Systemic analysis, soil, water, essays.

    RESUMO Embora o solo seja um importante elemento da paisagem, considerado essencial para o desenvolvimento das atividades humanas, ele pouco conhecido pela populao, tanto aquela composta de pessoas que lidam com o solo no dia-a-dia, direta ou indiretamente, como o caso dos agricultores, como aquela composta de pessoas que constroem suas moradias e edificaes na superfcie do terreno. O presente estudo, aplicado em 10 turmas de alunos de 5a srie do ensino fundamental de trs escolas pblicas da cidade de Marechal Cndido Rondon, Oeste Paranaense, entre os anos de 2007 e 2008, relata e analisa resultados de prticas pedaggicas que focalizam ensaios de germinao de sementes, decomposio de diferentes tipos de materiais e de infiltrao de gua no solo, para investigar progressos na compreenso das propriedades dos solos e na construo de uma conscincia ambiental. Conclui-se que as atividades suscitaram a compreenso do solo como componente da paisagem geogrfica e ajudaram a aplicar conhecimentos tericos apreendidos em sala de aula.

    PALAVRAS-CHAVE: Anlise sistmica, solo, gua, ensaios.

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    TERR DIDATICA 9(2):74-81, 2013 Cunha J.E., Rocha A.S., Tiz G.J., Martins V.M.

    Contribuindo para a discusso do solo como elemento da paisagem, Barros (2005) destaca a necessidade da realizao de trabalhos que bus-quem ampliar a percepo do solo como compo-nente essencial do meio natural e humano, como, por exemplo, aqueles que usam o solo como impor-tante instrumento na educao, em especial, aquela das sries iniciais, na qual os contedos voltados questo ambiental devem estar inseridos.

    As colocaes podem ser justificadas porque sobre os solos que as sociedades constroem suas moradias, retiram seus alimentos, trabalham e travam suas lutas, alm de ser por ele que passa boa parte dos resduos advindos das atividades humanas.

    Por esse motivo, necessrio compreender o solo como um elemento da paisagem, organizado, com vida prpria e com permanentes entradas e sadas de matria (Ruellan 1988; Ruellan e Dosso 1993).

    Essa concepo de solo, denominada de cober-tura pedolgica, definida por Soubis e Chauvel (1984) como um conjunto estruturado de horizon-tes pedolgicos, distribudos no espao e no tempo, dispostos entre si ao longo das vertentes do topo a jusante. Para Ruellan e Dosso (1993), a anlise estrutural da cobertura pedolgica, sistematizada por Boulet (1988), alm de contribuir com os estu-dos de gnese e de evoluo desse recurso natural, tambm auxiliam na compreenso da estrutura e do funcionamento da paisagem, em especial por-que favorecem a anlise sistmica do ambiente em diferentes escalas.

    De acordo com Camargo (1998), a falta de estudos integrados do conhecimento sobre o solo tem promovido a sua degradao, sobretudo, aquela ocorrida pelo uso e manejo (agrcola, industrial e urbano) inadequados s condies ambientais de cada local, tais como a poluio pelo acmulo de substncias qumicas e a eroso que retira, transpor-ta e deposita materiais finos, particularmente silte e argila, dos setores topogrficos mais altos para os mais baixos das vertentes.

    Diante dessa realidade, o autor ainda destaca que os atributos naturais dos solos (textura, estru-tura, porosidade, etc.) devem ser considerados no controle da qualidade ambiental, pois podem ajudar a determinar a sua capacidade produtiva. Por isso, para melhor ocupar e manejar os solos, necess-rio que as informaes tericas e prticas sobre a estrutura e o funcionamento dos solos na paisagem sejam repassadas populao.

    IntroduoA degradao ambiental vem sendo alvo de

    muitas pesquisas no meio acadmico universitrio em diferentes segmentos da cincia, como o caso da grande rea das cincias da Terra. Esta busca tem ocorrido com o intuito de sanar problemas ecolgi-cos, econmicos, sociais e polticos que remontam histria da ocupao das terras e que indicam a evi-dente necessidade de que esses estudos ocorram de maneira multidisciplinar, integrando a anlise sist-mica, como, por exemplo, aqueles difundidos nos trabalhos de Bertrand (1971) e Monteiro (2000).

    De acordo com Muggler et al. (2004), discus-ses relacionadas aos mais variados tipos de pro-blemas ambientais tm ocorrido no cotidiano da populao, sejam aquelas de pases desenvolvidos ou de pases em desenvolvimento, como o caso do Brasil. No entanto, quase sempre essas discus-ses tm partido dos meios de comunicao que, de maneira geral, apresentam uma viso simplista, restringindo a responsabilidade dos mais variados impactos ambientais populao. Nesta viso, pare-cem ignorar o fato de os rgos pblicos e privados no estarem cumprindo suas obrigaes quanto ao planejamento para a ocupao mais adequada das terras, em particular aquelas consideradas de mdia a alta fragilidade natural, como o caso, por exemplo, dos fundos de vales e dos setores de altas e baixas encostas, especialmente aqueles das reas litorneas.

    Neste contexto, Ruellan e Dosso (1993) afir-mam que o estudo dos solos pode ser indicado como um dos caminhos para atingir a anlise sistmica, particularmente porque o solo um dos elementos da natureza de maior complexidade no funciona-mento do ambiente. A complexidade acontece por-que o solo um corpo tridimensional e vivo, devido permanente entrada e sada de matria (em especial as fraes mais finas: silte e argila) e gua precipitada da atmosfera, o que significa dizer que, ao mesmo tempo em que condicionante, condicionado pelas formas de relevo, e que deve ser a base dos estudos que buscam a compreenso, tanto da estrutura, como do funcionamento das paisagens.

    Para melhor compreenso do assunto, vale lembrar o que ainda ressaltam Ruellan e Dosso (1993): o solo o resultado de diferentes for-maes geolgicas, de variados tipos de clima, de muitas formaes vegetais, de uma variedade de formas de relevo, do fator tempo e, ainda das mais variadas formas de uso e ocupao humana.

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    Cabe destacar que uma das formas de atingir essa realidade atravs do ensino sobre o solo, ou seja, promovendo estudos (projetos de ensi-no, pesquisa e de extenso) que integrem tanto a comunidade interna das universidades (professores e acadmicos), como a comunidade externa, com-posta por professores e alunos de escolas pblicas ou privadas e a sociedade em geral, em especial, os agricultores que lidam direta ou indiretamente com a terra (Ruellan, 1988).

    Nesse sentido, Barros (2005) refora a impor-tncia de o ensino da cincia do solo iniciar-se na educao bsica, sobretudo com o emprego de novas tecnologias de informao e de comunicao, como, por exemplo, a educao on-line ou distn-cia, por possibilitar acesso a uma maior clientela.

    Corroborando a ideia, e j sabendo que ensi-nar o contedo sobre solo nem sempre tarefa fcil, Hatum (2008) indica tambm a necessidade de utilizao de recursos didticos que facilitem a compreenso, tais como a elaborao de maque-tes, cartilhas sobre uso e conservao de solos, kits didticos, cartazes ilustrativos, representao de depsitos tecnognicos, elaborao de micro e macropedolitos (amostras retiradas de trincheiras ou barrancos, mantendo os perfis de solos em tama-nhos normais e sem modificar as caractersticas fsicas naturais dos solos) etc.

    Ressalta-se a importncia deste tipo de trabalho na regio Oeste do Estado do Paran devido forte potencialidade agrcola dos solos, o que infelizmen-te se traduz, no geral, em intensiva utilizao sem o devido planejamento de uso e ocupao do solo.

    Considerando os recursos didticos como instrumentos indispensveis compreenso do contedo solo e, por conseguinte, do meio ambiente, esse trabalho tem como principal obje-tivo relatar e analisar os resultados das prticas pedaggicas (ensaios de germinao de sementes, decomposio de diferentes tipos de materiais, infiltrao de gua no solo), de modo a investigar o possvel progresso na compreenso das proprie-dades dos solos e na construo de uma conscin-cia ambiental, de alunos de 10 turmas de 5 srie do ensino fundamental de colgios pblicos da cidade de Marechal Cndido Rondon-PR, entre os anos de 2007 e 2008, resultantes do projeto intitulado A questo ambiental em discusso: trabalhos tericos e prticos aplicados a turmas de 5 srie do ensino fundamental de Marechal Cndido Rondon-PR.

    Materiais e mtodosPara a aplicao das prticas pedaggicas

    enfocadas no presente artigo, foram selecionadas 10 turmas de 5 srie de trs colgios pblicos da cidade de Marechal Cndido Rondon - Paran, sendo eles: Colgio Estadual Emiliano Maximi-liano Ceretta, Colgio Estadual Frentino Sack-ser, Colgio Estadual Eron Domingues. Nestas turmas, foram trabalhados, em termos tericos e prticos, como e por que o contedo solo pode ajudar no ensino da Geografia e na preservao do ambiente.

    importante ressaltar que este estudo contou com o apoio tanto das direes como dos profes-sores das 10 turmas dos trs colgios envolvidos na pesquisa. Essa participao foi entendida como necessria porque partiu-se do princpio de que a discusso dos assuntos tratados pelos participan-tes do projeto teriam melhor aproveitamento se fossem inseridos nos contedos das aulas dos pro-fessores dos colgios. Isto porque tambm enten-dia-se que eram esses professores que poderiam avaliar de maneira mais adequada o aprendizado ou no dos contedos pelos alunos.

    Esse tema pode ser justificado pelo fato de o solo sofrer alteraes morfolgicas com o tipo de uso e manejo antrpico, devendo ser compreendi-do como um continuum na paisagem. Visando atin-gir os objetivos propostos na pesquisa, ocorreram exposies e discusses dos contedos tericos nas salas de aula, a partir de textos sobre a questo ambiental; em particular, aqueles que apresentam o solo como base para a compreenso do ambiente.

    Depois da compreenso pelos alunos de como e por que ocorrem os processos de germinao de sementes, de decomposio de matria e de infiltrao de gua em solos arenosos, argilosos e orgnicos, sempre com o cuidado de explicar a importncia desses processos na compreenso do ambiente, que foram realizados, nos prprios colgios, os ensaios prticos de germinao de sementes, decomposio de matria e de infiltrao de gua em trs solos de constituio e comporta-mento diferentes (arenosos, argilosos, orgnicos).

    Exposio tericaCom o objetivo de trazer subsdios para a

    realizao dos experimentos, os trabalhos foram iniciados a partir de discusses tericas realizadas por meio da utilizao de multimdia e de expla-

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    de da sua prpria resistncia e do ambiente no qual o mesmo se encontra, principalmente em termos de disponibilidade de gua e de ar, bem como do tipo de solo, possibilitou que os professores das 10 turmas avaliassem se ocorreu ou no melhora na aprendizagem dos alunos.

    Montagem e aplicao de ensaio de germinaoNos ensaios de germinao, cada integrante da

    dupla recebeu um tipo de solo (arenoso, orgnico e argiloso), os quais tambm foram colocados em potes plsticos. Posteriormente, os alunos acrescen-taram sementes (soja, milho e feijo) e gua (entre 10 e 25 ml), fazendo a opo por deixarem ou no a tampa no pote. Com o trmino da montagem dos experimentos, os alunos anotaram o nmero e as espcies de sementes, bem como as quantidades de gua colocadas nos potes. Aps uma semana do plantio, com as anotaes dos alunos, foram veri-ficadas a quantidade de sementes que germinaram e a velocidade de crescimento das plantas.

    Este ensaio, como no ensaio de decomposio, permitiu aos alunos perceberem a importncia das caractersticas do ambiente para o desenvolvimento das plantas, ou seja, que alm das caractersticas dos solos, o excesso ou a falta de umidade e de ar so condicionantes para o bom desenvolvimento das plantas. Este encaminhamento tambm teve o intuito de permitir aos professores das 10 turmas verificarem a ocorrncia ou no de melhoria da aprendizagem.

    Montagem e aplicao de ensaio de infiltrao e reteno de gua no solo:

    No terceiro retorno s escolas, foram levadas amostras de solos argilosos e arenosos alocados em funis (parte superior da garrafa pet), suspensos por um suporte de madeira. Foram adicionados 300 ml de gua para que fosse contabilizado o tempo necessrio para que toda a gua infiltrasse nos solos. Posteriormente, a gua que percolava o solo foi coletada e medida para que se percebesse como ocorria o processo de reteno da gua nos diferentes tipos de solos. Para que os constituintes slidos do solo no escoassem pela parte inferior dos funis, foi colocado nesses pontos um pedao de tecido. Os alunos cronometraram o tempo de infiltrao e a quantidade de gua resultante em ambas as amostras, fazendo comparaes entre os processos hdricos ocorridos nos dois tipos de solo.

    nao oral. Nesta etapa, foram tratados conceitos e processos importantes para o entendimento dos experimentos, tais como: o conceito de solo, o solo enquanto elemento da paisagem, os fatores de formao do solo, a degradao do solo e a importncia do entendimento do uso e manejo adequados dos solos.

    Primeiramente, foram discutidos textos sobre a questo ambiental, em particular aqueles que apresentam o solo como base para a compreenso do ambiente, tais como aqueles baseados na cincia do solo (Lepsch, 2002; Ruellan, 1988) e na cincia geogrfica (Bigarella e Mazuchowski, 1985; Ross, 2006; Monteiro, 2000). Posteriormente, foram analisados textos sobre a importncia do conheci-mento do solo para a conservao do ambiente e para a aplicao adequada das atividades antrpicas, como, por exemplo, o de Nbrega e Cunha (2001).

    Para contribuir com a aprendizagem dos alu-nos, os professores das 10 turmas dos trs colgios inseriram em seus contedos, sempre que possvel, os temas trabalhados pelo grupo do projeto. Este encaminhamento foi utilizado com o intuito de o professor verificar, em suas avaliaes, se os alunos estavam melhorando os seus conhecimentos, para que s ento ocorresse a fase seguinte do projeto, ou seja, as explicaes sobre como e por que montar e aplicar os ensaios.

    Montagem e aplicao de ensaio de decomposio

    Em cada turma de 5 srie, os alunos foram organizados em duplas, nas quais cada integrante recebeu trs potes de plstico: um com solo org-nico, outro com solo argiloso e outro com solo arenoso. Nesses potes, os alunos colocaram, na superfcie e no interior dos solos, diferentes tipos de materiais: cacos de telhas, flores, folhas e insetos mortos, alm de gua em quantidades que varia-ram entre 15 e 25 ml. Nas duas semanas seguintes, os mesmos deveriam acompanhar o processo de decomposio ocorrido em cada um dos potes e poderiam estabelecer comparaes entre os tipos de solos e as diferentes quantidades de gua acrescidas aos potes. Alm disso, foi solicitado que os alunos optassem por deixar ou no a tampa nos potes, para que percebessem a interferncia da circulao do ar na umidade do solo e na proliferao de organismos decompositores de materiais.

    Este ensaio, alm de permitir aos alunos perce-berem que a decomposio de cada material depen-

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    hidrogrficas possibilitou que os alunos percebes-sem esse recurso como corpo natural, tridimen-sional, poroso, composto por partculas minerais e orgnicas. Alm disso, compreenderam que cada tipo de solo se desenvolve em funo da integrao entre os fatores de formao.

    Os fatores de formao foram discutidos na seguinte ordem: o material de origem, que influi na composio mineralgica do solo e, consequen-temente, na sua resistncia mecnica, textura e estrutura; o relevo, que influi no condicionamento da circulao da gua no solo; o clima que, atravs da temperatura e da precipitao, regula o tipo e a intensidade de intemperismo das rochas e o cres-cimento dos organismos que so importantes para a distino entre os horizontes.

    Destaca-se, ainda, a ao antrpica enquan-to fator de alterao dos ambientes por meio do uso urbano, industrial e agrcola, que se reflete na degradao do recurso solo pelos processos de compactao (por pisoteio do gado e maquinrios agrcolas); de carreamento de partculas de solo pela eroso; de contaminao por substncias qumicas de origem industrial e agrcola; de modificaes na topografia atravs de cortes e aterros e de imper-meabilizao por estruturas urbanas.

    Foram tambm discutidas as funes do solo, ressaltando-o enquanto: (a) elemento para as ati-vidades antrpicas; (b) caminho (solo sobre o qual vivemos); (c) abrigo (o solo sobre o qual constru-mos nossas casas); e (d) po (o solo sobre o qual cultivamos nosso alimento), conforme Nbrega e Cunha (2001).

    Montagem e aplicao de ensaios de decomposio

    Atravs do ensaio de decomposio, que con-sistiu na alocao de diferentes materiais (cacos de telhas, flores, folhas e at mesmo insetos mortos) em contato com os solos (arenoso, argiloso e org-nico) e das correlaes, interpretaes e orientaes realizadas pelo grupo do projeto sobre os textos trabalhados nas aulas tericas, os alunos puderam perceber a importncia desse processo e dos orga-nismos decompositores para a manuteno do ciclo de nutrientes no ambiente.

    Foi possvel discutir como a decomposio de materiais orgnicos importante para a produo de nutrientes que, ao serem agregados ao solo, tornam-no mais frtil, mais poroso e, consequen-temente, com maior aerao, propiciando o desen-

    Neste ensaio, os alunos puderam entender que a quantidade e a organizao das partculas dos solos (argila, silte, areias) so fundamentais na avaliao do volume de gua e do ar que circulam nos espaos porosos dos solos em um determinado tempo, o que, por conseguinte, importante para ajudar a entender o ambiente em termos de uso agrcola e urbano. Fato que tambm permitiu aos professores das 10 turmas avaliarem se os contedos foram ou no apreendidos pelos alunos.

    Aps os encaminhamentos das aulas tericas realizadas pelo grupo do projeto e pelos professores das 10 turmas em sala de aula e da montagem e apli-cao dos ensaios, sempre com o acompanhamento de explicaes e correlaes entre as duas etapas (terica e prtica), foi realizada uma reunio final com os professores das turmas e com as direes dos colgios para averiguar se ocorreu melhoria na aprendizagem dos alunos e se era de interesse a continuidade do projeto em anos seguintes.

    Apresentao e discusso dos resultados Tendo em vista a importncia do solo como

    elemento do ambiente e da necessidade do conhe-cimento a respeito de sua dinmica, neste tpico sero apresentados e discutidos os resultados obtidos por meio da aplicao dos procedimentos apontados no item Materiais e mtodos.

    Exposio tericaEsta etapa, realizada antes da montagem e apli-

    cao dos experimentos, consistiu na exposio terica respaldada em textos que discutem a questo ambiental, em particular, aqueles que apresentam o solo como base para a compreenso do ambiente (Falconi et al., 2003; Yoshioka e Lima, 2004; Catazo-ni e Espindola, 2003; Catazoni e Espindola, 2005; Tiz e Cunha, 2005).

    A partir destes trabalhos, foram explora-das as correlaes entre os elementos naturais, ressaltando-se a importncia da disposio dos solos na paisagem, ou seja, sua distribuio em nveis topogrficos (topo, mdia, baixa vertente) e a circulao das guas pluviais na superfcie e subsuperfcie dos solos. Foi discutida, tambm, a importncia da cobertura vegetal, particularmente das APP (reas de Proteo Permanente), para a preservao do solo, do ar e da gua das bacias hidrogrficas.

    A viso do solo como componente das bacias

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    Os alunos entenderam que tanto a falta como o excesso de gua no solo foram determinantes para o desenvolvimento das plantas no perodo de uma semana, uma vez que a gua armazenada fonte de nutrientes, importantes para o desenvolvimento das mesmas.

    Nos potes com solos arenosos e saturados, perceberam que a gua foi absorvida e evaporada com maior rapidez, fazendo com que as sementes germinassem e se desenvolvessem. J nos potes com os solos argilosos, perceberam que a umidade excessiva se prolongou por mais tempo, causando, em alguns casos, o apodrecimento das sementes.

    Por meio desse procedimento, constataram que, em condies ideais de gua no solo, a ger-minao das sementes e o crescimento das plantas foram mais eficientes nos potes com solos argilo-sos e orgnicos. Alm da quantidade ideal de gua necessria para o desenvolvimento das plantas, foi possvel constatar que a frao argila e a matria orgnica, por fornecerem maior fertilidade aos solos, influenciam no maior ou menor desenvol-vimento das plantas. Ao escolher se o pote ficaria fechado ou aberto, os alunos visualizaram a impor-tncia da circulao do ar para que os solos ficassem mais secos ou se mantivessem midos (at mesmo saturados), o que tambm influi na germinao e no crescimento das plantas. Ao perceberem que as sementes germinadas e localizadas mais prximas s janelas tiveram um desenvolvimento bem maior do que aquelas que ficaram em locais mais escu-ros, os alunos compreenderam a necessidade que a maioria das plantas tem de luminosidade solar para o seu crescimento.

    O experimento evidenciou a maneira como a infiltrao e a reteno de gua ocorrem de forma diferente em solos arenosos e argilosos. Por isso, o ensaio de infiltrao e reteno de gua no solo foi aplicado na terceira semana aps o incio do experimento.

    Ensaios de infiltrao e de reteno de gua no solo

    Os ensaios de infiltrao e reteno de gua no solo, realizados a partir de amostras de solos argilosos e arenosos, permitiu que os alunos perce-bessem como a composio dos mesmos influencia na capacidade de infiltrao e reteno de gua.

    A partir desse ensaio, foi explicado aos alunos que a gua presente nos solos oriunda de chuvas ou de irrigao, podendo ser interceptada pelas

    volvendo mais eficiente das plantas e favorecendo a infiltrao e a reteno da gua no horizonte A do solo.

    Os fatores ambientais (luminosidade, calor, umidade...) envolvidos no processo de decom-posio tambm foram levados em considerao, uma vez que o desenvolvimento de organismos decompositores do solo se d, com maior expresso, nos ambientes com pouca luz, bastante umidade e temperatura ambiente elevada. A constatao foi possvel pois alguns alunos deixaram os potes abertos e outros no. Nos potes com tampa, onde o solo argiloso ou orgnico estava mido (porm, no saturado), o desenvolvimento de organismos decompositores foi maior, quando comparado aos solos sob as mesmas condies, porm, arenosos. Nos potes com excesso de gua, as folhas foram apodrecendo, mudando de cor e o processo de decomposio foi lento. Este resultado foi inten-sificado quando os potes estavam fechados e no havia a circulao de ar. Em contrapartida, nos expe-rimentos em que os potes ficaram abertos, ocorreu a falta dgua, as folhas secaram, no possibilitando o desenvolvimento evidente de organismos.

    Por meio desse ensaio, os alunos observaram a importncia da cobertura no solo para a manuten-o da umidade e para a quebra da energia das gotas de chuva na superfcie do solo, evitando o impacto direto, a formao de crostas, o revolvimento de materiais pedolgicos e a eroso. A constatao de que os materiais orgnicos (folhas e insetos) sofreram decomposio e que os inorgnicos (cacos de telha) no permitiu refletir sobre o tempo de decomposio de cada material no ambiente e a necessidade do cuidado com a produo de lixo inorgnico, sua disposio e destino na paisagem, evitando a degradao do recurso solo por meio da poluio.

    Ensaios de germinao de sementesConforme descrito no item Materiais e Mto-

    dos, depois de retomar discusses especficas sobre o tema germinao, realizadas durante as aulas tericas, os alunos receberam orientaes de como utilizar as diferentes quantidades e tipos de solos durante a realizao do ensaio. Esta orientao foi necessria para que as observaes e anotaes dos alunos fossem tratadas de maneira que os mesmos pudessem entender os processos de germinao e de crescimento sob condies de falta ou excesso de gua e de aerao nos solos dos potes.

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    alunos, fato que muito contribui para a formao profissional daqueles e para o crescimento inte-lectual destes. Sem contar, ainda, que o bom xito dessas atividades motivou o grupo do projeto, em conjunto com os professores dos colgios e suas respectivas direes, a assumirem o compromisso de continuidade do projeto.

    ConclusesA partir das atividades tericas e prticas apli-

    cadas nas 5 sries de trs escolas da cidade de Marechal Cndido Rondon Paran possvel concluir que elas:

    - configuram prticas pedaggicas eficientes para a compreenso do solo como recurso natural;

    - suscitaram a compreenso do solo como ele-mento componente da paisagem geogrfica, con-siderada por muitos como importante conceito da cincia geogrfica;- possibilitaram a aplicao dos conhecimentos tericos sobre os elementos que compem a paisagem apreendidos em sala de aula;

    - possibilitaram um melhor entrosamento entre alunos e professores tanto dos colgios como da universidade, resultando na possibilidade de con-tinuidade do projeto.

    Referncias Barros M.A.M. 2005. Recursos multisensoriais no

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    plantas e que, ao atingir a superfcie do solo, a gua pode infiltrar ou escorrer pela superfcie. Da gua interceptada e retida pelas plantas e da que se infil-tra no solo, uma parcela pode retornar atmosfera, pela evaporao ou pela transpirao das plantas.

    Por meio das observaes, seguidas de anota-es, os alunos perceberam que os solos argilosos possuem menor capacidade de infiltrao e maior de reteno de gua, enquanto que os arenosos possuem maior facilidade de infiltrao e menor de reteno.

    Essa constatao possibilitou o entendimento de que, nos solos com maior quantidade de argi-la, embora a infiltrao seja menor, a reteno de gua maior, em decorrncia do predomnio de microporos em sua constituio. E, ao contrrio, os alunos perceberam que, nos solos arenosos, a infiltrao mais rpida e ocorre baixa reteno de gua, o que se deve presena de macroporos.

    Esse experimento ainda permitiu discutir como as caractersticas do solo (textura, estrutura, poro-sidade, etc.), a sua localizao na paisagem (topo, mdia e baixa vertente) e o ciclo hidrolgico devem ser considerados quando a discusso envolve o planejamento, as fragilidades e as potencialidades do ambiente, trazendo a oportunidade de relacio-nar algumas caractersticas pedolgicas com pro-blemas ambientais, como: eroso, compactao e assoreamento.

    Nesse contexto, os experimentos de infiltra-o e reteno de gua no solo, assim como os de decomposio e germinao, mostraram-se como importantes atividades no que se refere possi-bilidade de correlacionar os processos de gnese e evoluo dos solos com os processos de uso e ocupao antrpica.

    Ao final do projeto, possvel avaliar que a somatria das atividades desenvolvidas conjunta-mente entre o grupo do projeto e os professores das turmas, em termos de aulas tericas, de montagem e aplicao dos ensaios e de reunies com os pro-fessores dos colgios foi considerada satisfatria, porque, embora no se possa afirmar que tenha ocorrido um aproveitamento integral por parte dos alunos, possvel considerar que houve interesse e participao, o que refletiu numa melhora signifi-cativa no aprendizado dos contedos pela maioria.

    Tambm possvel informar que as atividades realizadas nos colgios pblicos do municpio, alm de proporcionarem o ensino do solo como base para compreenso do ambiente, ainda trouxeram a possibilidade de interao entre os acadmicos e os

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