EMULSÕES CONTENDO GELANA ACILADA: EFEITO DO...
Transcript of EMULSÕES CONTENDO GELANA ACILADA: EFEITO DO...
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE ENGENHARIA DE ALIMENTOS
JOICE ALINE PIRES VILELA
EMULSÕES CONTENDO GELANA ACILADA: EFEITO DO
PROCESSAMENTO E DA ADIÇÃO DE SAIS NOS MECANISMOS DE
ESTABILIZAÇÃO
CAMPINAS
2016
JOICE ALINE PIRES VILELA
EMULSÕES CONTENDO GELANA ACILADA: EFEITO DO
PROCESSAMENTO E DA ADIÇÃO DE SAIS NOS MECANISMOS DE
ESTABILIZAÇÃO
Tese apresentada à Faculdade de Engenharia de Alimentos da
Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos
para a obtenção do Título de Doutora em Engenharia de Alimentos.
Profª Dra. Rosiane Lopes da Cunha
Orientadora
Este exemplar corresponde à versão
final da tese defendida pela aluna
Joice Aline Pires Vilela e orientada
pela Profª Dra. Rosiane Lopes da Cunha
CAMPINAS
2016
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________ Profa. Dra. Rosiane Lopes da Cunha (Orientadora)
Faculdade de Engenharia de Alimentos – Universidade Estadual de Campinas
_______________________________________ Prof. Dr. Edvaldo Sabadini (Membro)
Instituto de Química – Universidade Estadual de Campinas
_______________________________________ Prof. Dr. Paulo José do Amaral Sobral (Membro)
Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos – Universidade de São Paulo
_______________________________________ Prof. Dr. Pedro Esteves Duarte Augusto (Membro)
Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz"- Universidade de São Paulo
_______________________________________ Profa. Dra. Samantha Cristina de Pinho (Membro)
Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos – Universidade de São Paulo
_______________________________________ Prof. Dr. Guilherme Máximo (Suplente)
Faculdade de Engenharia de Alimentos – Universidade Estadual de Campinas
_______________________________________ Profa. Dra. Miriam Dupas Hubinger (Suplente)
Faculdade de Engenharia de Alimentos – Universidade Estadual de Campinas
_______________________________________ Profa. Dra. Izabel Cristina Freitas Moraes (Suplente)
Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos – Universidade de São Paulo
Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.
Agradecimentos
Agradeço, antes de tudo, à energia que existe, agradeço a essa rede, essa malha fina que
conecta todas as coisas que vibram. Ao que alguns chamam de energia divina. Para outros se trata do
consciente coletivo, a força do cosmo, a possibilidade de organização em meio ao caos. Agradeço a
esse ser que não é senão sendo. A esse olho que tudo vê e acompanha. A esse que para alguns é
criador, para outros, criatura. Agradeço àquele que para muitos é a força motriz desse intrincado
carrossel de planetas, estrelas e galáxias. A esse que é eterno, que tudo permeia, que tudo contém e
em tudo está contido. Agradeço a esse mistério, que não pode ser designado, nem explicado, muito
menos compreendido, mas que se faz presente, sem sombra de dúvidas, a cada sopro de vida e no
pulsar de tudo que há na natureza.
Agradeço à Professora Rosiane Lopes da Cunha pela orientação durante todo esse período e à
Faculdade de Engenharia de Alimentos, professores e funcionários, e às agências de fomento, CNPq,
Capes e, principalmente, à Fapesp, todos imprescindíveis para a realização desse trabalho. Também
gostaria de agradecer a todos do Laboratório de Engenharia de Processos (às técnicas Vanessa,
Zildene e Patrícia, às professoras Ana Carla, Carolina e Fabiana e aos alunos Luiz Henrique,
Fernanda, Raphaela, Raquel, Guilherme, David, Ana Letícia, Cristiane, Andresa, Mariano, Paula,
Thaís, Kátia e Rejane).
Meus agradecimentos à banca examinadora, pelas valiosas correções e sugestões que
contribuíram para a melhoria desse trabalho. Também ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
de Fotônica Aplicada a Biologia Celular (INFABIC), por disponibilizar o microscópio confocal. Ao
Laboratório de Extração, Termodinâmica Aplicada e Equilíbrio/FEA, pelo auxílio e uso de
equipamentos. Também ao professor Marcelo Menossi/IB por disponibilizar equipamentos para uso.
Igualmente, gostaria de agradecer a CP Kelco Brasil e a Companhia Cacique de Café solúvel
por terem disponibilizado as matérias-primas utilizadas nesse trabalho. Ao Cléo T. G. V. M. T. Pires
pelas análises de espectroscopia de infravermelho e microscopia eletrônica de varredura das amostras
de borra de café.
Agradeço imensamente aos meus pais Geraldo e Solange, e aos meus irmãos, Luana e
Giovanni, bem como a todos os meus familiares e agregados queridos, a todas as tias (em especial às
tias Iza, Betânia, Irene, Conceição, Vilda e Silca), aos tios, primos, primas e ao Vô Victor e Vô
Salatiel, todos são muito importantes na minha vida.
Por fim, agradeço a todos os amigos que estiveram junto comigo durante essa caminhada
(Cléo, André, Tida, Robson, Ediane, Mariana, Amanda, Glaudson, Walquíria, Henrique, Felipe,
Flávio, Pedro Paulo, Pedro C., Luzinha, Christian, Samuel, Paulinha, Chun, Petty, Fernando, Gui,
Julião, Vanessa, Bruno, Érika).
RESUMO
Emulsões estabilizadas por partículas sólidas, denominadas emulsões Pickering, apresentam-
se como uma alternativa frente às emulsões clássicas estabilizadas por surfactantes. Estas emulsões
são caracterizadas por uma elevada estabilidade à coalescência e menor sensibilidade às alterações
do meio. As gelanas acilada (HA) e desacilada (LA) foram os materiais estudados como potenciais
estabilizantes de emulsões de óleo de girassol disperso em água. Diferenças importantes foram
observadas nas propriedades das gelanas HA e LA, principalmente no comportamento reológico e
nos valores de potencial zeta, que auxiliaram a entender o mecanismo de atuação desses
polissacarídeos em emulsões óleo-água. Em dispersões contendo baixas concentrações de
polissacarídeo, foi observado que a capacidade espessante da gelana HA é muito superior e que esta
apresentou valores de potencial zeta duas vezes maior que o encontrado para a gelana LA. Além
disso, a gelana LA não mostrou capacidade emulsificante nas condições estudadas. Já em relação às
emulsões contendo gelana HA, baixas concentrações de polissacarídeo (a partir de 0,05% m/m)
foram capazes de estabilizar emulsões contendo 30% (m/m) de óleo de girassol. O efeito da força
iônica nas emulsões contendo gelana HA também foi determinado. As propriedades das emulsões
mostraram-se bastante dependentes da razão polissacarídeo/sal e também do tipo de sal utilizado. O
aumento da viscosidade da fase contínua, a repulsão eletrostática entre as gotas e a deposição de
partículas sólidas na interface (Pickering) foram os mecanismos que provavelmente contribuíram
para a estabilização, sendo o predomínio de um mecanismo sobre o outro dependente da composição
e condições utilizadas na preparação das emulsões. Independente do mecanismo de estabilização
atuando, é importante ressaltar as baixas concentrações de polissacarídeo utilizadas, mostrando que a
gelana HA tem potencial para ser utilizada como um ingrediente estabilizante/emulsificante. Esse
carboidrato é de uso “Generally Recognized as Safe” (GRAS) e, portanto, constitui-se como uma
interessante opção na estabilização de emulsões alimentícias, especialmente considerando o atual
interesse em reduzir a utilização de ingredientes sintéticos ou derivados de origem animal, como os
derivados do ovo ou do leite comumente usados como emulsificantes. Outra parte desse trabalho
(ANEXO I) envolveu o estudo das partículas de borra de café, um subproduto da indústria de
alimentos rico em carboidratos, cujas partículas podem ter aplicação em diversos segmentos. Na
caracterização da borra de café foi observado que se trata de um material constituído de partículas
com diâmetro médio variando numa faixa bastante abrangente (37 m a 10 mm), com morfologia
heterogênea e potencial zeta negativo no pH natural (5,0). Não foram observadas diferenças
significativas de composição entre as frações separadas por tamanho através de peneiras. Métodos
químicos e físicos foram utilizados para alcançar reduções no tamanho das partículas de borra de
café e concluiu-se que a utilização de rotor-estator seguida de separação através de filtragem pode
ser utilizada para a obtenção de micro/nanopartículas. Devido ao baixo rendimento na obtenção
dessas partículas, sua aplicação na estabilização de emulsões não foi realizada nesse trabalho.
ABSTRACT
Emulsions stabilized by solid particles, called Pickering emulsions, could be used as an
alternative emulsion type in comparison to classic emulsions stabilized by surfactants. These
emulsions are characterized by a high stability to coalescence and reduced sensitivity to
environmental changes. Acylated (HA) and deacylated (LA) gellan were the materials studied in this
work for stabilization of emulsions containing sunflower oil dispersed in water. Significant
differences were observed between the properties of HA and LA gellans, mainly on rheological
behavior and zeta potential, which allowed understanding the emulsion stabilization mechanism
performed by these polysaccharides. Dispersions containing low polysaccharide concentrations
showed that the thickening capacity and the zeta potential values of HA gellan was much higher than
LA gellan. Moreover, the LA gellan did not show emulsifying capacity in the studied conditions.
Regarding emulsions containing HA gellan, low concentrations of polysaccharide (from 0.05% w/w)
were able to stabilize emulsions containing 30% (w/w) of sunflower oil. The effect of ionic strength
in the emulsions containing gellan HA was also determined. Emulsions properties were quite
dependent of the polysaccharide/salt ratio and also of the type of salt used. The increased viscosity of
the continuous phase, the electrostatic repulsion between the charged droplets and deposition of solid
particles onto the interface (Pickering) were the suggested stabilization mechanisms, and the
predominance of each mechanism was dependent on the composition and conditions used to prepare
the emulsions. Regardless of the stabilization mechanism, it is important to highlight the low
polysaccharide concentrations used, showing that HA gellan can be potentially used as a
stabilizer/emulsifier ingredient. This carbohydrate is GRAS and therefore it is an interesting option
in the stabilization of food emulsions, especially considering the current interest in reducing the use
of synthetic ingredients or animal derivatives, as egg or milk derivatives commonly used as
emulsifiers. Another part of this work (Annex I) involved the study of coffee grounds particles, a
byproduct of the food industry rich in carbohydrates, which particles can be applied in several areas.
It was observed that the coffee grounds is a material consisting of particles with average size in a
wide range (37 m to 10 mm), with heterogeneous morphology, and negative zeta potential at the
natural pH (5.0). No significant differences in composition were observed among the fractions
separated by size using sieves. Chemical and physical methods have been used to achieve size
reduction of the coffee grounds particles. The use of rotor-stator followed by separation by filtration
allowed obtaining micro/nanoparticles. Because of the low yield in obtaining these particles, their
application in the stabilization of emulsions was not performed in this work.
Índice de Figuras
FIGURA 1. MECANISMOS DE DESESTABILIZAÇÃO DE EMULSÕES (MCCLEMENTS, 2007). .................................................. 29
FIGURA 2. (A) PARTÍCULA ESFÉRICA NA INTERFACE ÓLEO-ÁGUA COM ÂNGULO DE CONTATO NA JUNÇÃO DAS TRÊS FASES:
PARTÍCULA (P), ÓLEO (O) E ÁGUA (A). QUANTIDADES PO, PA E OA SÃO AS TENSÕES NAS INTERFACES. (B)
MONOCAMADA DE PARTÍCULAS NA SUPERFÍCIE DE UMA GOTA DE ÓLEO DISPERSA EM ÁGUA (FONTE: DICKINSON, 2012).
.................................................................................................................................................................. 31
FIGURA 3. UNIDADE REPETIDA DO TETRASSACARÍDEO QUE COMPÕEM A GOMA GELANA ACILADA (A) E DESACILADA (B). ........ 39
FIGURA 4. ILUSTRAÇÃO ESQUEMÁTICA DAS ETAPAS UTILIZADAS NO PREPARO DAS EMULSÕES 1, 2, 3 E 4. TODAS AS EMULSÕES
FINAIS APRESENTAM A MESMA CONCENTRAÇÃO DE GELANA HA E ÓLEO, 0,1% M/M E 30% M/M, RESPECTIVAMENTE. .. 45
FIGURA 5. CURVAS DE ESCOAMENTO A 25ºC DAS DISPERSÕES CONTENDO A) 0,07, B) 0,10, C) 0,14 OU D) 0,21% (M/M) DE
GELANA HA PREPARADAS ATRAVÉS DE AGITAÇÃO MAGNÉTICA EM TEMPERATURA AMBIENTE. “SUB1” = PRIMEIRA CURVA
DE SUBIDA; “DESC” = CURVA DE DESCIDA E “SUB2” = SEGUNDA CURVA DE SUBIDA. .................................................. 55
FIGURA 6. AJUSTE EXPONENCIAL E LINEAR DAS CURVAS REPRESENTANDO O COMPORTAMENTO DE K (A), N (B) E VISCOSIDADE
APARENTE A 100 S-1
(C) FRENTE AO AUMENTO DA CONCENTRAÇÃO DE GELANA. ...................................................... 56
FIGURA 7. VARREDURA DE FREQUÊNCIA DAS DISPERSÕES CONTENDO A) 0,07, B) 0,10, C) 0,14 OU D) 0,21% (M/M) DE HAG
A 25ºC. MÓDULO ELÁSTICO (G’) REPRESENTADO PELOS SÍMBOLOS CHEIOS E MÓDULO VISCOSO (G”) REPRESENTADO
PELOS SÍMBOLOS VAZIOS. ................................................................................................................................ 57
FIGURA 8. (A) CURVAS DE ESCOAMENTO A 25º C DAS SUSPENSÕES AQUOSAS DE GELANA HA E LA NA MESMA CONCENTRAÇÃO
PREPARADAS ATRAVÉS DE DIFERENTES CONDIÇÕES. AM: DISPERSÕES PREPARADAS ATRAVÉS DA AGITAÇÃO MAGNÉTICA.
RE: DISPERSÕES SUBMETIDAS A UMA PASSAGEM EM ROTOR-ESTATOR (14.000 RPM/ 4 MIN). UT: DISPERSÕES QUE
PASSARAM POR TRATAMENTO EM SONDA DE ULTRASSOM. (B) VISCOSIDADE APARENTE A 100 S-1
DAS SUSPENSÕES
AQUOSAS DE GELANA HA E LA NA MESMA CONCENTRAÇÃO PREPARADAS ATRAVÉS DE DIFERENTES CONDIÇÕES. LETRAS
DIFERENTES REPRESENTAM DIFERENÇA SIGNIFICATIVA (P < 0,05) ENTRE VALORES DA MESMA COLUNA. ....................... 58
FIGURA 9. EFEITO DO TRATAMENTO TÉRMICO (TT) NAS CURVAS DE ESCOAMENTO (A) E NOS VALORES DE VISCOSIDADE APARENTE
E POTENCIAL ZETA (B) DAS DISPERSÕES DE GELANA HA E LA. ................................................................................ 61
FIGURA 10. A) DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS E POTENCIAL ZETA DAS DISPERSÕES DE GELANA HA ANTES DO
TRATAMENTO EM ULTRASSOM. B) DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS E POTENCIAL ZETA DAS DISPERSÕES DE
GELANA HA APÓS O TRATAMENTO EM ULTRASSOM. O POTENCIAL ZETA FOI MEDIDO EM DILUIÇÕES CONTENDO 0,014%
(M/M) DE GELANA. ........................................................................................................................................ 63
FIGURA 11. CURVAS DE ESCOAMENTO DAS SUSPENSÕES CONTENDO GELANA ACILADA E KCL. A) 0,035% E B) 0,14% (M/M) DE
GELANA HA. ................................................................................................................................................. 64
FIGURA 12. A) DENSIDADE E B) TENSÃO INTERFACIAL DAS DISPERSÕES AQUOSAS DE GELANA HA (0,025% M/M) EM FUNÇÃO
DA QUANTIDADE DE KCL ADICIONADA. .............................................................................................................. 66
FIGURA 13. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA DESACILADA (LA). .................................... 68
FIGURA 14. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA HA PREPARADAS UTILIZANDO (A) ROTOR-
ESTATOR OU (B) ROTOR-ESTATOR SEGUIDO DE HOMOGENEIZAÇÃO A 300 BAR. ....................................................... 69
FIGURA 15. ESTABILIDADE POR TEMPO PROLONGADO DAS EMULSÕES COM GELANA HA PREPARADAS EM ROTOR-ESTATOR. A)
PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES E B) VALORES DE D43 APÓS 1, 30 OU 60 DIAS DE ARMAZENAMENTO A TEMPERATURA
AMBIENTE. LETRAS DIFERENTES SIGNIFICAM DIFERENÇA SIGNIFICATIVA ENTRE VALORES DA MESMA COLUNA (P < 0,05). 70
FIGURA 16. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES PREPARADAS USANDO ROTOR-ESTATOR
CONTENDO: A) 0,05%, B) 0,075%, C) 0,10%, D) 0,125%, E) 0,15% OU F) 0,20% (M/M) DE GELANA HA (BARRA:
200 M). .................................................................................................................................................... 72
FIGURA 17. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS, DIÂMETRO MÉDIO (D43, D32 E D50%) E SPAN DAS EMULSÕES
PREPARADAS USANDO ROTOR-ESTATOR CONTENDO: 0,05%, 0,075%, 0,10%, 0,125%, 0,15% OU 0,20% (M/M) DE
GELANA HA. LETRAS DIFERENTES SIGNIFICAM DIFERENÇA SIGNIFICATIVA ENTRE VALORES DA MESMA COLUNA (P < 0,05).
.................................................................................................................................................................. 73
FIGURA 18. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES PREPARADAS USANDO ROTOR-ESTATOR SEGUIDO
DE HOMOGENEIZAÇÃO A 300 BAR CONTENDO: A) 0,05%, B) 0,075%, C) 0,10%, D) 0,125%, E) 0,15% OU F) 0,20%
(M/M) DE GELANA HA (BARRA: 200 M). ........................................................................................................ 74
FIGURA 19. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS, DIÂMETRO MÉDIO (D43, D32 E D50%) E SPAN DAS EMULSÕES
PREPARADAS USANDO ROTOR-ESTATOR SEGUIDO DE HOMOGENEIZAÇÃO A 300 BAR CONTENDO: 0,05%, 0,075%,
0,10%, 0,125%, 0,15% OU 0,20% (M/M) DE GELANA HA. LETRAS DIFERENTES SIGNIFICAM DIFERENÇA SIGNIFICATIVA
ENTRE VALORES DA MESMA COLUNA (P < 0,05). ................................................................................................ 75
FIGURA 20. A) CURVAS DE ESCOAMENTO DAS EMULSÕES PREPARADAS SOMENTE COM ROTOR-ESTATOR. B) CURVAS DE
ESCOAMENTO DAS EMULSÕES PREPARADAS COM ROTOR-ESTATOR SEGUIDO DE HOMOGENEIZAÇÃO A 300 BAR. O
COMPORTAMENTO REOLÓGICO DAS AMOSTRAS FOI INDICADO POR “PP” PARA COMPORTAMENTO DE FLUIDO
PSEUDOPLÁSTICO OU “HB” PARA COMPORTAMENTO DO TIPO HERSCHEL-BULKLEY. ................................................. 77
FIGURA 21. PROPRIEDADES REOLÓGICAS DAS EMULSÕES PREPARADAS SOMENTE COM ROTOR-ESTATOR OU ROTOR-ESTATOR
SEGUIDO DE HOMOGENEIZAÇÃO A 300 BAR (HOMOG). A) ÍNDICE DE COMPORTAMENTO. B) ÍNDICE DE CONSISTÊNCIA. C)
VISCOSIDADE A 100 S-1. D) VISCOSIDADE A 3 S
-1. ............................................................................................... 78
FIGURA 22. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES CONTENDO 0,1% (M/M) DE GELANA HA E 30%
(M/M) DE ÓLEO DE GIRASSOL PREPARADAS COMO DESCRITO ANTERIORMENTE (SEÇÃO 4.4.3): (A) EMULSÃO 1 (E1), (B)
EMULSÃO 2 (E2), (C) EMULSÃO 3 (E3), (D) FASE CREME INFERIOR DA EMULSÃO 4 (E4) E (E) FASE CREME SUPERIOR DA
EMULSÃO 4 (BARRA = 200 M). (F) PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES. .................................................................. 80
FIGURA 23. A) CURVAS DE ESCOAMENTO, B) DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS GOTAS E C) SPAN E DIÂMETROS MÉDIOS DAS
EMULSÕES CONTENDO 0,1% (M/M) DE GELANA HA E 30% (M/M) DE ÓLEO DE GIRASSOL PREPARADAS COMO DESCRITO
ANTERIORMENTE (SEÇÃO 4.4.3): E1, E2, E3 E E4. ............................................................................................. 81
FIGURA 24. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES CONTENDO 1) 0,025% OU 2) 0,1% (M/M) DE
GELANA HA COM ADIÇÃO DE KCL NAS FORÇAS IÔNICAS DE A) 0,03, B) 0,3, C) 3 E D) 30 MM. BARRA: 200 M. ........ 86
FIGURA 25. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES CONTENDO 1) 0,025% OU 2) 0,1% (M/M) DE
GELANA HA COM ADIÇÃO DE CACL2 NAS FORÇAS IÔNICAS DE A) 0,03, B) 0,3, C) 3 E D) 30 MM. BARRA: 200 M. ..... 87
FIGURA 26. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA DAS EMULSÕES CONTENDO 1) 0,025% OU 2) 0,1% (M/M) DE
GELANA HA COM ADIÇÃO DE FECL3 NAS FORÇAS IÔNICAS DE A) 0,03, B) 0,3, C) 3 E D) 30 MM. BARRA: 200 M. ..... 88
FIGURA 27. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA HA (0,025 OU 0,1% M/M) E SAIS (KCL, CACL2
OU FECL3). PORÇÃO DE COR BRANCA DAS BARRAS REPRESENTA FASE SORO. PORÇÃO CINZA REPRESENTA A FASE CREME OU
A PRÓPRIA EMULSÃO (QUANDO NÃO HOUVE SEPARAÇÃO DE FASES). ...................................................................... 90
FIGURA 28. PROPRIEDADES REOLÓGICAS (ÍNDICE DE CONSISTÊNCIA, ÍNDICE DE COMPORTAMENTO E VISCOSIDADE APARENTE A
100 S-1) DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA HA (0,025 OU 0,1% M/M) E SAIS (KCL, CACL2 OU FECL3). ................... 92
FIGURA 29. D43 E SPAN DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA HA (0,025 OU 0,1% M/M) E SAIS (KCL, CACL2 OU FECL3). ....... 93
FIGURA 30. REGISTRO FOTOGRÁFICO DAS EMULSÕES CORADAS COM VERMELHO DO NILO (MARCADOR DO ÓLEO) E FITC
(MARCADOR DA GELANA HA) UTILIZADAS NA MICROSCOPIA CONFOCAL. A) EMULSÕES SEM ADIÇÃO DE SAIS COM 0,025,
0,075, 0,10, 0,125 OU 0,15% (M/M) DE GELANA HA. B) EMULSÕES CONTENDO 0,025% (M/M) DE GELANA HA SEM
ADIÇÃO DE SAL OU COM ADIÇÃO DE KCL, CACL2 OU FECL3 (FI=0,3 MM). C) EMULSÕES CONTENDO 0,10% (M/M) DE
GELANA HA SEM ADIÇÃO DE SAL OU COM ADIÇÃO DE KCL, CACL2 OU FECL3 (FI=0,3 MM). ...................................... 94
FIGURA 31. MICROSCOPIA CONFOCAL DAS EMULSÕES ESTABILIZADAS POR A) 0,025% (FASE SUPERIOR), B) 0,10% OU C)
0,15% (M/M) DE GELANA HA. O CANAL 1 APRESENTA A GELANA HA MARCADA COM FITC EM VERDE, O CANAL 2
APRESENTA A MICROSCOPIA ÓPTICA DO SISTEMA E O CANAL 3 APRESENTA O ÓLEO MARCADO COM VERMELHO DO NILO EM
VERMELHO. AS BARRAS REPRESENTAM 50 M. .................................................................................................. 95
FIGURA 32. COLOCALIZAÇÃO DOS COMPONENTES MARCADOS (GELANA HA E ÓLEO) NAS EMULSÕES CONTENDO A) 0,025%
(M/M) DE GELANA HA (FASE SUPERIOR), B) 0,15% (M/M) DE GELANA HA E C) 0,10% DE GELANA HA COM KCL (FI=0,3
MM). .......................................................................................................................................................... 96
FIGURA 33. DUAS DIFERENTES PERSPECTIVAS DAS MONTAGENS EM 3D ATRAVÉS DA VARREDURA EM PROFUNDIDADE DAS
EMULSÕES CONTENDO GELANA HA (0,10% M/M) SEM ADIÇÃO E COM ADIÇÃO DE KCL OU FECL3 (FI = 0,3 MM). ........ 97
FIGURA 34. EMULSÃO COM 0,025% (M/M) DE GELANA HA. A) PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES E DIÂMETRO MÉDIO D43. B)
PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES E VISCOSIDADE APARENTE A 100 S-1. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA
DAS EMULSÕES: C) SEM ADIÇÃO DE SAL, D) COM 62,6 MG DE KCL/G DE GELANA, E) 626 MG DE KCL/G DE GELANA E F)
15633 MG DE KCL/G DE GELANA. MICROSCOPIA FLUORESCENTE DAS EMULSÕES CONTENDO ÓLEO MARCADO COM
VERMELHO DO NILO: G) 1563 MG DE KCL/G DE GELANA (7,5 MM) OU H) 15633 MG DE KCL/G DE GELANA (75 MM).
BARRA = 200 M. ...................................................................................................................................... 100
FIGURA 35. EMULSÃO COM 0,10 % (M/M) DE GELANA HA. A) PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES E DIÂMETRO MÉDIO D43. B)
PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES E VISCOSIDADE APARENTE A 100 S-1. MICROGRAFIAS OBTIDAS POR MICROSCOPIA ÓPTICA
DAS EMULSÕES: C) SEM ADIÇÃO DE SAL, D) COM 62,6 MG DE KCL/G DE GELANA, E) 1563 MG DE KCL/G DE GELANA E F)
6260 MG DE KCL/G DE GELANA. G) IMAGEM AMPLIFICADA DA EMULSÃO CONTENDO 1563 MG DE KCL/G DE GELANA (30
MM). BARRA = 200 M. ............................................................................................................................. 102
FIGURA 36. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES DAS EMULSÕES CONTENDO 0,025% (M/M) DE GELANA HA COM ADIÇÃO DE: A) 0
MM, B) 0,75 MM, C) 3 MM OU D) 7,5 MM DE KCL. ...................................................................................... 104
FIGURA 37. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES DAS EMULSÕES CONTENDO 0,10% (M/M) DE GELANA HA COM ADIÇÃO DE: A) 0
MM, B) 3 MM, C) 12 MM OU D) 30 MM DE KCL. .......................................................................................... 105
FIGURA 38. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE GOTAS DAS EMULSÕES CONTENDO: A) 0,025% M/M OU B) 0,1% M/M DE GELANA
HA ANALISADAS 24H APÓS O PREPARO. .......................................................................................................... 108
FIGURA 39. CURVAS DE ESCOAMENTO DAS EMULSÕES ESTABILIZADAS POR GELANA HA (0,1% M/M) COM DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE KCL. ............................................................................................................................. 109
FIGURA 40. VARREDURA DE FREQUÊNCIA A 25ºC DAS EMULSÕES ESTABILIZADAS POR GELANA HA (0,1% M/M) COM DIFERENTES
CONCENTRAÇÕES DE KCL: A) 0, 0,3 E 3 MM; B) 0, 12 E 30 MM. ...................................................................... 110
FIGURA 41. A) DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS DA BORRA DE CAFÉ. B) FRAÇÕES SEPARADAS POR TAMANHO
ATRAVÉS DA UTILIZAÇÃO DE PENEIRAS COM MESH 3,5, 14, 30, 70, 100, 120 E 200. C) DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS
PARTÍCULAS DAS FRAÇÕES RETIRADAS DAS PENEIRAS COM MESH 400 E 100. ......................................................... 123
FIGURA 42. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA DAS FRAÇÕES 100 (DMÉDIO =179,5 M) E 400 (DMÉDIO = 49,5 M).
MAGNITUDE DE 100X. AS BARRAS REPRESENTAM 100 M. ............................................................................... 124
FIGURA 43. VARIAÇÃO DO POTENCIAL ZETA EM FUNÇÃO DO PH DA FRAÇÃO 400 (DMÉDIO = 49,5 M ) DA BORRA DE CAFÉ. ... 125
FIGURA 44. COMPOSIÇÃO ELEMENTAR CHN DAS FRAÇÕES DA BORRA DE CAFÉ. ............................................................. 126
FIGURA 45. A) ESPECTRO DE ABSORÇÃO NA REGIÃO DO INFRAVERMELHO DA FRAÇÃO 400 COM AS PRINCIPAIS BANDAS
INTERPRETADAS ATRAVÉS DA COMPARAÇÃO COM TRABALHOS SIMILARES. B) ESPECTROS DE ABSORÇÃO NA REGIÃO DO
INFRAVERMELHO DAS FRAÇÕES DE BORRA DE CAFÉ 70 (DMÉDIO = 385 M), 120 (DMÉDIO = 137 M), 230 (DMÉDIO = 68,5
M) E 400 (DMÉDIO = 49,5 M). .................................................................................................................... 128
FIGURA 46. EFEITO DA A) CONCENTRAÇÃO DE HCL, B) TEMPO, C) TEMPERATURA E D) UTILIZAÇÃO DE ULTRASSOM DURANTE A
HIDRÓLISE NA DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS DA BORRA DE CAFÉ. ..................................................... 129
FIGURA 47. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS DA FRAÇÃO 100 (DMÉDIO =179,5 M) EM FUNÇÃO DO NÚMERO DE
PASSAGENS EM HOMOGENEIZADOR A ALTA PRESSÃO. ........................................................................................ 131
FIGURA 48. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS DA FRAÇÃO 100 (DMÉDIO =179,5 M) EM FUNÇÃO DA PRESSÃO DE
HOMOGENEIZAÇÃO. ..................................................................................................................................... 131
FIGURA 49. DIÂMETRO MÉDIO (D43) E POLIDISPERSÃO DAS PARTÍCULAS EM FUNÇÃO DO NÚMERO DE PASSOS EM ROTOR-
ESTATOR DA FRAÇÃO 100 (DMÉDIO =179,5 M). ............................................................................................... 132
FIGURA 50. EFEITO DE 3 PASSAGENS EM ROTOR-ESTATOR NAS FRAÇÕES DE BORRA DE CAFÉ: F14 (3535 M), F30 (985 M),
F70 (385 M) E F100 (179 M). ................................................................................................................ 133
FIGURA 51. DIÂMETRO MÉDIO DAS PARTÍCULAS APÓS A PASSAGEM DA FRAÇÃO 100 (DMÉDIO =179,5 M) EM ROTOR-ESTATOR
UTILIZANDO DIFERENTES TEMPERATURAS DURANTE O PROCESSO (5, 25, 50 OU 70ºC). .......................................... 133
FIGURA 52. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS (QUINTUPLICATAS) DOS FILTRADOS OBTIDOS APÓS A) 2, B) 4, C) 7 E
D) 8 PASSAGENS EM ROTOR-ESTATOR. E) POTENCIAL ZETA DOS FILTRADOS EM FUNÇÃO DAS PASSAGENS NO ROTOR-
ESTATOR. F) MICROGRAFIA OBTIDA EM MICROSCÓPIO ELETRÔNICO DE VARREDURA DO FILTRADO OBTIDO APÓS 8
PASSAGENS EM ROTOR-ESTATOR COM MAGNITUDE DE 1000X. BARRA REPRESENTA 10 M. A FRAÇÃO 100 FOI A
AMOSTRA UTILIZADA PARA OBTENÇÃO DAS DISPERSÕES. .................................................................................... 135
Índice de Tabelas
TABELA 1. EXEMPLOS DE PARTÍCULAS BIOCOMPATÍVEIS UTILIZADAS NA ESTABILIZAÇÃO DE EMULSÕES O/A DO TIPO PICKERING.33
TABELA 2. RAZÕES MÁSSICAS DE KCL, CACL2 E FECL3 UTILIZADAS E SUAS CORRESPONDENTES FORÇAS IÔNICAS. .................... 46
TABELA 3. CONCENTRAÇÃO DE KCL UTILIZADA NAS EMULSÕES COM GELANA HA. ............................................................. 47
TABELA 4. PROPRIEDADES FÍSICAS E FÍSICO-QUÍMICAS DAS GELANAS LA E HA A 25ºC. ...................................................... 53
TABELA 5. PROPRIEDADES REOLÓGICAS DAS DISPERSÕES CONTENDO 0,07, 0,10, 0,14 OU 0,21% (M/M) DE GELANA HA A
25ºC. .......................................................................................................................................................... 56
TABELA 6. POTENCIAL ZETA DAS DISPERSÕES DE GELANA HA E LA ANTES E APÓS O TRATAMENTO EM SONDA DE ULTRASSOM (UT)
A 25ºC. ....................................................................................................................................................... 60
TABELA 7. PARÂMETROS REOLÓGICOS DAS SUSPENSÕES COM GELANA ACILADA E KCL. ...................................................... 64
TABELA 8. TENSÃO INTERFACIAL (FASE AQUOSA-ÓLEO DE GIRASSOL) A 25ºC. .................................................................. 65
TABELA 9. POTENCIAL ZETA DAS EMULSÕES PREPARADAS COM HOMOGENEIZAÇÃO (300 BAR). .......................................... 71
TABELA 10. AMOSTRAS SELECIONADAS COM A CORRESPONDÊNCIA ENTRE RAZÃO MÁSSICA E FORÇA IÔNICA........................ 103
TABELA 11. D43 (M) APÓS 1, 30 OU 60 DIAS DE ARMAZENAMENTO A TEMPERATURA AMBIENTE. ................................... 106
TABELA 12. POTENCIAL ZETA DAS EMULSÕES CONTENDO GELANA HA E KCL A 25ºC. ...................................................... 107
TABELA 13. PROPRIEDADES REOLÓGICAS DAS EMULSÕES CONTENDO 0,10% (M/M) DE GELANA HA A 25ºC. ..................... 109
TABELA 14. COMPOSIÇÃO APROXIMADA DA BORRA DE CAFÉ (BASE SECA). ..................................................................... 118
TABELA 15. CONDIÇÕES UTILIZADAS NOS EXPERIMENTOS DE HIDRÓLISE ÁCIDA DA BORRA DE CAFÉ. .................................... 119
TABELA 16. RENDIMENTO MÁSSICO DAS FRAÇÕES DE BORRA DE CAFÉ. .......................................................................... 124
TABELA 17. DIÂMETRO MÉDIO E SPAN DAS PARTÍCULAS OBTIDAS APÓS AS DIFERENTES CONDIÇÕES DE HIDRÓLISE. ............... 130
TABELA 18. DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS PRESENTES NAS FRAÇÕES 400 E 100 DA BORRA DE CAFÉ ANTES E APÓS
TRATAMENTO EM HOMOGENEIZADOR A ALTA PRESSÃO OU EM ROTOR-ESTATOR. ................................................... 134
Nomenclatura, abreviações e símbolos
HA Gelana acilada
LA Gelana desacilada
GRAS “Generally Recognized as Safe”
O/A Emulsão óleo em água
A/O Emulsão água em óleo
Ângulo de contato
Tensão na interface
ΔGd Energia livre de dessorção espontânea
r Raio da partícula
T Temperatura
H Hidrólise
E Emulsão
FI Força iônica
D32 “Sauter mean diameter”
D43 “De Brouckere mean diameter”
Tensão (Pa)
�̇� Taxa de deformação (s-1
)
F Força (N)
Viscosidade (Pa.s)
ap Viscosidade aparente (Pa.s)
k Índice de consistência (Pa.sn)
n Índice de comportamento
o Tensão residual (Pa)
G’ Módulo elástico ou de armazenamento (Pa)
G” Módulo viscoso ou de dissipação de energia (Pa)
C*
Concentração crítica de sobreposição
C**
Concentração crítica de agregação
UT Tratamento em sonda de ultrassom
TT Tratamento térmico
KCl Cloreto de potássio
CaCl2 Cloreto de cálcio
FeCl3 Cloreto férrico
FITC Isotiocianato de fluoresceína
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO 23
2. OBJETIVOS 26
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 28
3.1. EMULSÕES 28
3.1.1. EMULSÕES DO TIPO PICKERING 30
3.1.2 EMULSÕES ESTABILIZADAS POR POLISSACARÍDEOS 35
3.2 GELANA 38
4. MATERIAL E MÉTODOS 42
4.1 MATERIAL 42
4.2. CARACTERIZAÇÃO DAS GELANAS 42
4.2.1 EFEITO DA CONCENTRAÇÃO DE GELANA HA NAS PROPRIEDADES REOLÓGICAS DAS DISPERSÕES 42
4.2.2 EFEITO DO PROCESSO DE HOMOGENEIZAÇÃO NAS DISPERSÕES DE GELANA 42
4.2.3 EFEITO DO TRATAMENTO TÉRMICO NAS SUSPENSÕES DE GELANA 43
4.2.4 EFEITO DA FORÇA IÔNICA NAS SUSPENSÕES DE GELANA 43
4.2.5 DETERMINAÇÃO DA TENSÃO INTERFACIAL DAS SUSPENSÕES DE GELANA 43
4.3 EMULSÕES 44
4.3.1 PREPARAÇÃO DE EMULSÕES COM GELANA HA E LA EM ROTOR-ESTATOR 44
4.3.2 PREPARO DE EMULSÕES COM GELANA HA EM HOMOGENEIZADOR A ALTA PRESSÃO 44
4.3.3 EFEITO DO TRATAMENTO ULTRASSÔNICO NAS EMULSÕES DE GELANA HA 45
4.3.4 EFEITO DA ADIÇÃO DE KCL, CACL2 OU FECL3 NAS EMULSÕES COM GELANA HA 46
4.3.5 EFEITO DA ADIÇÃO DE KCL NAS EMULSÕES DE GELANA HA 46
4.4 METODOLOGIAS DE ANÁLISE 48
4.4.1. DETERMINAÇÃO DE POTENCIAL ZETA 48
4.4.2 DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS – DIFRAÇÃO A LASER 48
4.4.3. MEDIDAS REOLÓGICAS 49
4.4.4. PERFIL DE SEPARAÇÃO DE FASES 50
4.4.5. MICROSCOPIA ÓPTICA 50
4.4.6 TENSÃO INTERFACIAL 50
4.4.7 DENSIDADE 50
4.4.8 MICROSCOPIA CONFOCAL DE VARREDURA A LASER 50
4.4.9 TEOR DE CARBONO, HIDROGÊNIO E NITROGÊNIO (CHN) 51
4.5 ANÁLISE ESTATÍSTICA 51
5. RESULTADOS E DISCUSSÕES 53
5.1 CARACTERIZAÇÃO DAS GELANAS 53
5.1.1 PROPRIEDADES DAS GELANAS – CARACTERIZAÇÃO REOLÓGICA DA GELANA HA 54
5.1.2 PROPRIEDADES DAS GELANAS - EFEITO DO PROCESSO DE HOMOGENEIZAÇÃO 57
5.1.3 PROPRIEDADES DAS GELANAS - EFEITO DO TRATAMENTO TÉRMICO 61
5.1.4 PROPRIEDADES DAS GELANAS - EFEITO DA FORÇA IÔNICA 62
5.1.5 PROPRIEDADES DAS GELANAS – TENSÃO INTERFACIAL 64
5.2 EMULSÕES CONTENDO GELANA 68
5.2.1 EMULSÕES COM GELANA DESACILADA (LA) 68
5.2.2 EMULSÕES COM GELANA ACILADA (HA) – ROTOR-ESTATOR OU HOMOGENEIZAÇÃO 69
5.3. EFEITO DA FORÇA IÔNICA EM EMULSÕES COM GELANA HA 85
5.3.1 EFEITO DA ADIÇÃO DE KCL, CACL2 OU FECL3 NAS EMULSÕES COM GELANA HA 85
5.3.2 EFEITO DA ADIÇÃO DE KCL NAS EMULSÕES COM GELANA HA 98
6. CONCLUSÕES 114
7. ANEXO I - ESTUDO DAS PARTÍCULAS DA BORRA DE CAFÉ 117
7.1 INTRODUÇÃO 117
7.2 MATERIAL E MÉTODOS 118
7.2.1 MATERIAL 118
7.2.2. CARACTERIZAÇÃO DA BORRA DE CAFÉ 118
7.2.3 REDUÇÃO DE TAMANHO DA BORRA DE CAFÉ 119
7.2.4 METODOLOGIAS DE ANÁLISE 120
7.2.4.1 DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS – PENEIRAGEM 120
7.2.4.2 TEOR DE CARBONO, HIDROGÊNIO E NITROGÊNIO (CHN) 120
7.2.4.3 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA 120
7.2.4.4 DETERMINAÇÃO DE POTENCIAL ZETA 120
7.2.4.5 ESPECTROSCOPIA DE ABSORÇÃO NA REGIÃO DO INFRAVERMELHO 121
7.2.4.6 DISTRIBUIÇÃO DE TAMANHO DE PARTÍCULAS – DIFRAÇÃO A LASER 121
7.3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 122
7.3.1 CARACTERIZAÇÃO DA BORRA DE CAFÉ 122
7.3.2 REDUÇÃO DE TAMANHO DAS PARTÍCULAS DA BORRA DE CAFÉ 129
7.3.2.4 CARACTERIZAÇÃO DOS FILTRADOS 134
7.4 CONCLUSÃO 136
8. REFERÊNCIAS 138
23
1. INTRODUÇÃO
As emulsões, sistemas constituídos pela mistura de dois líquidos imiscíveis, encontram-se
presentes em uma ampla quantidade de produtos alimentícios, farmacêuticos e cosméticos. O
principal desafio encontrado na obtenção de produtos emulsionados está em alcançar a estabilidade
cinética do sistema com o uso de compostos que não ofereçam riscos à saúde do consumidor
(McCLEMENTS, 2005). Nesse sentido, as emulsões do tipo Pickering aparecem como uma
alternativa às emulsões estabilizadas por surfactantes sintéticos.
As emulsões denominadas Pickering são aquelas cuja estabilização é realizada através da
simples deposição de partículas sólidas de dimensões coloidais na interface óleo/água ou ar/água,
formando uma barreira estérica à coalescência das gotas ou bolhas. A deposição de partículas que
são parcialmente molháveis tanto pela fase polar quanto pela fase apolar na interface é um processo
praticamente irreversível (DICKINSON, 2012). Assim, essas emulsões possuem elevada estabilidade
à coalescência, mesmo quando gotas de tamanho milimétrico estão presentes. Além disso, as
emulsões formadas são menos sensíveis às alterações nas propriedades do meio, como pH,
temperatura e força iônica, e em muitos casos, as gotas envoltas pela camada de partículas sólidas
podem ser separadas da emulsão e redispersas novamente (CHEN et al., 2011). Assim, as emulsões
Pickering também podem ser utilizadas como uma via para a produção de cápsulas com tamanho e
permeabilidade controlados (DINSMORE et al., 2002).
Apesar do mecanismo de estabilização por partículas sólidas ter sido descrito pela primeira
vez na literatura há mais de 100 anos (PICKERING, 1907), a maioria dos estudos relacionados com
tal tipo de sistema foi realizada na última década. Nestes estudos o uso de materiais inorgânicos,
como partículas de sílica, de carbono e argilas, é predominante. Assim, pesquisas visando à obtenção
de partículas biocompatíveis para uso na estabilização de emulsões são de grande importância
(DICKINSON, 2012). Nesse sentido, os polissacarídeos são materiais de elevado potencial para este
tipo de aplicação, já que são provenientes de fontes naturais e seguros para o consumo humano. Em
geral, os polissacarídeos, devido ao seu caráter predominantemente hidrofílico, não são considerados
como bons emulsificantes, mas sim agentes estabilizantes que impedem a coalescência das gotas das
emulsões através do aumento da viscosidade da fase contínua (DICKINSON & STAINSBY, 1988;
DICKINSON, 2003; OZTURK & McCLEMENTS, 2016). Porém, estudos tem demonstrado que há
diversas maneiras de atuação dos polissacarídeos em uma emulsão, incluindo-se sua adsorção na
interface das gotas mesmo sem conter resíduos de proteína na cadeia (GARTI & LESSER, 2001).
Existem vários exemplos de polissacarídeos capazes de se depositar na interface óleo-água,
estabilizando as emulsões através do mecanismo Pickering (ZOPPE et al., 2012; TZOUMAKI et al.,
24
2011; RAYNER et al., 2012; JIA et al., 2015). A gelana, polissacarídeo aniônico produzido através
de fermentação, possui amplo uso na indústria de alimentos, principalmente na formação de sistemas
gelificados (SANDERSON, 1990). Porém, suas características como estabilizante/emulsificante
ainda foram pouco exploradas.
Outra estratégia para a produção de nanopartículas biocompatíveis para uso como
estabilizante em emulsões seria através do uso de subprodutos da indústria de alimentos. A borra de
café, resíduo insolúvel altamente disponível, rico em fibras e proteínas (SILVA et al., 1998;
MUSSATTO et al., 2011), constitui-se como uma boa alternativa.
26
2. OBJETIVOS
O objetivo principal deste trabalho foi estudar a capacidade de materiais ricos em
polissacarídeos (borra de café, gelana acilada e desacilada) de estabilizar emulsões e os mecanismos
associados a esta estabilização usando diferentes condições de processo de formação de emulsões e
força iônica.
Os objetivos específicos podem ser enumerados, como:
- Caracterização da borra de café e determinação de um método adequado para a obtenção de
partículas de tamanho nanométrico para posterior emprego na estabilização de emulsões.
- Estudo das diferentes propriedades (como comportamento reológico, potencial zeta e tensão
interfacial) da gelana em sua forma acilada (HA) e desacilada (LA).
- Estudo das propriedades e mecanismos de estabilização das emulsões utilizando a gelana
como emulsificante/estabilizante.
- Estudo da influência da força iônica e aplicação de ultrassom nas propriedades das emulsões
contendo gelana como emulsificante/estabilizante.
28
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1. Emulsões
É de amplo conhecimento que óleo e água não se misturam a não ser que se aplique força
mecânica e que agentes emulsificantes sejam adicionados ao sistema. Assim, as emulsões, sistemas
formados por dois líquidos imiscíveis, são termodinamicamente instáveis devido à energia livre
positiva necessária para aumentar a área entre as fases aquosa e oleosa, bem como pela diferença de
densidade entre as fases. Emulsões simples são sistemas presentes em muitos produtos alimentícios,
cosméticos e fármacos, podendo ser do tipo óleo em água (O/A), quando consistem de gotas de óleo
dispersas em uma fase contínua aquosa, ou água em óleo (A/O), quando a fase contínua é oleosa
(McCLEMENTS, 2005).
A emulsificação pode ser considerada, antes de qualquer outra definição, como um processo
natural, existente em vários sistemas biológicos. Um exemplo pode ser encontrado na digestão de
lipídeos. As lipases podem atuar somente na superfície das gotas de óleo, portanto se faz necessário
aumentar a área superficial dos lipídeos para torná-los mais acessíveis às enzimas do trato digestivo
humano, acelerando e melhorando a eficiência da digestão. Dessa forma, faz-se uso do processo de
emulsificação, que irá quebrar a fase oleosa em gotas menores. Os sais biliares (bile) produzidos pelo
fígado são compostos emulsificantes que, aliados à temperatura corporal e aos movimentos
peristálticos, viabilizam o processo de emulsificação e, consequentemente, da própria digestão dos
lipídeos (MALDONADO-VALDERRAMA et al., 2011).
Outra ocorrência natural de sistemas emulsionados é o leite, um alimento que existe
naturalmente como uma emulsão. Em seu estado natural, o leite é uma emulsão do tipo óleo-em-água
que contém glóbulos de gordura (fase dispersa que geralmente representa cerca de 4% (m/m) da
composição) suspensos em um meio contínuo aquoso que contém uma mistura complexa de
proteínas, açúcares e sais. A interface dos glóbulos de gordura encontra-se estabilizada
principalmente por proteínas e fosfolipídios do leite e esses glóbulos de gordura servem como
solvente para as vitaminas lipossolúveis naturalmente presentes, como as vitaminas A, D e E
(McCLEMENTS, 2005; WALSTRA et al., 1999).
Uma vez realizada a emulsificação, sabe-se que as emulsões tendem a se desestabilizar com o
tempo, resultando em duas fases líquidas macroscopicamente separadas, processo indesejado em
alimentos, bebidas, fármacos e cosméticos emulsionados. Particularmente para emulsões O/A
existem diversos mecanismos de desestabilização, sendo os principais a cremeação, sedimentação,
floculação e coalescência das gotas (Figura 1). A floculação é um processo no qual as gotas
29
emulsificadas se associam em flocos sem a destruição das gotas individuais. Quando a interface das
gotas é destruída e existe a formação de gotas maiores, trata-se do processo conhecido como
coalescência. A cremeação ocorre quando a fase dispersa é menos densa do que a fase contínua,
porém não existe coalescência. Já na sedimentação, as gotas são mais densas do que o meio contínuo
(McCLEMENTS, 2007; HILL, 1996).
Figura 1. Mecanismos de desestabilização de emulsões (McCLEMENTS, 2007).
Como todas as emulsões são termodinamicamente instáveis e, portanto, informações sobre a
estabilidade cinética são importantes para o desenvolvimento de produtos que apresentem
propriedades desejáveis por um período de tempo suficientemente longo. Emulsões cineticamente
estáveis podem ser alcançadas por diversas maneiras, porém a maioria das emulsões alimentícias
envolve a aplicação de força mecânica aliada à adição de emulsificantes e estabilizantes.
Emulsificantes são compostos anfifílicos de baixa massa molecular (surfactantes, como polissorbatos
e lecitina) ou de alta massa molecular (como proteínas do leite, proteínas de soja e do ovo) que
atuam reduzindo a tensão interfacial das gotas. Já os estabilizantes atuam aumentando a viscosidade
da fase contínua (ou até mesmo provocando a gelificação da fase contínua, com formação dos
sistemas denominados como “emulsion-filled gel”), prevenindo, assim, a agregação das gotas
(McCLEMENTS, 2005). Vários polissacarídeos podem ser utilizados como estabilizantes, como as
gomas xantana, carragena e outras (DICKINSON, 2003).
Os atributos sensoriais e físico-químicos de produtos alimentícios emulsionados são
fortemente influenciados pelas características das gotas presentes em sua composição. Essas
características incluem desde a concentração, tamanho e carga das gotas, até as possíveis interações
entre elas (FRIBERG et al., 2004; McCLEMENTS, 2005). A concentração das gotas pode
influenciar na textura, estabilidade, aparência, atributos sensoriais e qualidade nutricional de uma
30
emulsão. Essa concentração pode ser expressa através da fração mássica ou volumétrica da fase
dispersa (McCLEMENTS, 2005).
O tamanho da gota, por sua vez, pode ter efeito na estabilidade, propriedades ópticas (ex.:
opaca, translúcida), no comportamento reológico e nos atributos sensoriais. Na prática, as emulsões
alimentícias possuem gotas de tamanho variando dentro de uma faixa específica, representada
através das curvas de distribuição de tamanhos. Várias informações podem ser obtidas através dessas
curvas, incluindo o Índice de Polidispersão (PDI) das gotas ou polidispersidade. O PDI relaciona a
largura da curva de distribuição com o tamanho médio das gotas. Para uma amostra perfeitamente
uniforme, situação teórica, o PDI teria valor zero, indicando que todas as gotas tem exatamente o
mesmo tamanho. Na prática, valores menores que 0,05 são raramente encontrados. Amostras com
valores de PDI entre 0-0,1 indicam uma distribuição de tamanhos do tipo monodispersa estreita.
Enquanto que valores entre 0,1-0,4 indicam amostra polidispersa moderada e acima de 0,4 amostra
amplamente polidispersa (McCLEMENTS, 2005; ISO, 2008).
As gotas, em boa parte das emulsões em alimentos, possuem carga elétrica devido à adsorção
de espécies ionizadas ou ionizáveis (ex.: proteínas, alguns polissacarídeos, surfactantes iônicos,
fosfolipídios e íons) em sua superfície. As características elétricas da superfície das gotas dependem
do tipo e concentração das espécies ionizadas presentes, bem como da composição iônica e
propriedades físicas do meio líquido circundante. A carga das gotas em uma emulsão é importante,
pois determina a natureza das interações com outras espécies carregadas e o comportamento na
presença de campos elétricos. Gotas em vários alimentos emulsionados são estáveis à agregação
devido ao uso de emulsificantes iônicos que adsorvem na superfície e impedem que as gotas se
aproximem o suficiente devido à repulsão eletrostática (FRIBERG et al., 2004; McCLEMENTS,
2005; DICKINSON, 1992).
Já as interações coloidais determinam quando as gotas se agregam ou permanecem separadas,
bem como as características dos agregados formados, como seu tamanho, formato, porosidade e
deformabilidade. A estabilidade à cremeação e a reologia de muitas emulsões em alimentos
dependem da quantidade de gotas agregadas e da natureza desses agregados (FRIBERG et al., 2004;
McCLEMENTS, 2005).
3.1.1. Emulsões do tipo Pickering
O conceito de estabilização de emulsão do tipo Pickering, descrita pela primeira vez em 1907
pelo pesquisador homônimo (PICKERING, 1907), está relacionado à barreira mecânica formada na
interface através da deposição de partículas sólidas de dimensões coloidais, que podem evitar a
31
floculação e coalescência das gotas. Curiosamente, este conceito de estabilização através da
deposição de partículas na interface tem sido aplicado há séculos em alimentos, sem ser
cientificamente estudado. Por exemplo, no molho de mostarda (uma emulsão concentrada de óleo-
em-água que tem sido utilizada há muito tempo) as partículas finas de mostarda contribuem para a
estabilidade física e coloidal da emulsão, evitando a coalescência das gotas de óleo (BINKS, 2007).
A eficiência da proteção da barreira mecânica formada depende da dificuldade de remoção
das partículas adsorvidas na interface. A barreira estérica é mais efetiva no caso de partículas
adsorvidas que são preferencialmente molháveis pela fase contínua, as quais, consequentemente,
tendem a se posicionar predominantemente na superfície externa das gotas. Além disso, para uma
estabilização Pickering efetiva, o tamanho médio das partículas deve ser no mínimo uma ordem de
magnitude menor que o tamanho das gotas da emulsão. Assim, nanopartículas são necessárias para a
estabilização de gotas submicrométricas (DICKINSON, 2012; CHEVALIER & BOLZINGER,
2013).
A localização de uma partícula individual em relação à interface óleo/água é definida pelo
ângulo de contato (), como representado na Figura 2 para o caso idealizado da partícula esférica
hidratada preferencialmente pela água ( < 90°).
Figura 2. (A) Partícula esférica na interface óleo-água com ângulo de contato na junção das três fases:
partícula (p), óleo (o) e água (a). Quantidades po, pa e oa são as tensões nas interfaces. (B) Monocamada
de partículas na superfície de uma gota de óleo dispersa em água (Fonte: DICKINSON, 2012).
Na Figura 2 está apresentada a situação em que a estabilização de gotas de óleo em água é
favorecida. Em termos termodinâmicos, o ângulo de contato trifásico (partícula, óleo e água) está
relacionado ao balanço das energias livres nas interfaces partícula-água, partícula-óleo e óleo-água.
Em termos mecânicos, a resolução para as três forças paralelas à superfície do sólido na junção das
três fases é expressa pela clássica equação de Young (1):
32
cos = (po – pa) /oa (1)
em que po, pa e oa são as tensões interfaciais partícula-óleo, partícula-água e óleo-água,
respectivamente. Para as partículas igualmente molháveis por óleo e água, o ângulo será exatamente
= 90°, enquanto que para partículas mais hidrofílicas 0 ≤ < 90° e mais hidrofóbicas 90° < ≤
180° (BINKS, 2002; DICKINSON, 2012; CHEVALIER & BOLZINGER, 2013).
A grande estabilidade alcançada através do mecanismo Pickering, que torna estas emulsões
tão diferentes das estabilizadas por surfactantes, reside no fato de que para uma partícula de raio r a
adsorção na interface óleo-água pode ser vista como um processo irreversível quando não é muito
próximo de 0° ou 180°. A razão para esta irreversibilidade está na energia livre de dessorção
espontânea (ΔGd), que é extremamente alta quando comparada com a energia térmica:
ΔGd = r² oa (1 – cos)² (2)
Na equação 2 estão apresentados os fatores mais importantes relacionados à energia de
interação da partícula com a interface são o ângulo de contato e o tamanho da partícula. Assim,
partículas que possuem condições favoráveis de molhabilidade ( não próximo de 0° ou 180°) e
tamanhos acima de 10 nm, aproximadamente, irão adsorver irreversivelmente na interface, já que seu
ΔGd será muito maior que kT (nas condições próximas da ambiente), em que k é a constante de
Boltzmann (k = 1,38 . 10-23
J/K) e T é a temperatura absoluta. Em contraste a essa adsorção
irreversível está o comportamento das moléculas de surfactante, as quais permanecem em equilíbrio
dinâmico, adsorvendo e dessorvendo da interface em uma rápida escala de tempo. A alta força de
adsorção explica a elevada estabilidade encontrada nas emulsões Pickering, mesmo quando gotas de
tamanho elevado (da ordem de milímetros) estão presentes, o que não é observado em emulsões
estabilizadas por surfactantes (DICKINSON, 2012; RAYNER et al., 2012; BINKS, 2002;
CHEVALIER & BOLZINGER, 2013).
Ainda que muitos pesquisadores na última década venham se dedicando ao entendimento e
desenvolvimento de emulsões estabilizadas por partículas sólidas (EEPS ou emulsões Pickering), a
maioria dos trabalhos envolve sistemas coloidais-modelo contendo partículas inorgânicas, como
óxido de ferro, argilas, partículas de carbono e de sílica (BINKS & LUMSDON, 1999; HUNTER et
al., 2008;. STOCCO et al., 2011; YI et al., 2011). Porém, há alguns estudos realizados com partículas
que podem ter aplicação em alimentos e fármacos sem riscos à saúde do consumidor (DICKINSON,
33
2012; CHEVALIER & BOLZINGER, 2013). A Tabela 1 apresenta alguns trabalhos conduzidos com
partículas biocompatíveis em emulsões O/A.
Tabela 1. Exemplos de partículas biocompatíveis utilizadas na estabilização de emulsões O/A do tipo
Pickering.
Tipo de partícula Tamanho Referência
Nanocristais de quitina 240 nm x 20 nm TZOUMAKI et al., 2011.
Flavonoides ~ 100 nm LUO et al., 2011.
Nanocristais de celulose 50-250 nm x 3-15 nm ZOPPE et al., 2012.
Grânulos de amido de quinoa 1-3 m RAYNER et al., 2012.
Grânulos de amido de arroz,
milho, trigo e batata
5,2 a 52 m LI et al., 2013.
Agregados de nanopartículas de
proteína de soja
~ 100 nm LIU & TANG, 2013.
Microgéis de isolado proteico de
soro do leite
235 nm DESTRIBATS et al., 2014
Celulose amorfa Não especificado JIA et al., 2015.
A maioria dos materiais apresentados na Tabela 1 são altamente polidispersos e com ângulo
de contato favorecendo a adsorção na interface óleo-água, e muitos existem na forma de agregados.
Na maioria dos casos foram utilizadas partículas de proteína e polissacarídeos, os mesmos
ingredientes que já vêm sendo utilizados para estabilizar emulsões clássicas. Assim, o limiar entre
estabilização clássica e Pickering é bastante estreito em alguns casos, principalmente no caso das
proteínas, que geralmente possuem propriedades tensoativas.
Na prática, a maioria dos ingredientes ricos em proteína usados como agentes emulsificantes
na indústria de alimentos (leite em pó, concentrado proteico de soro de leite, proteínas do ovo, etc.)
contém vários tipos de agregados de proteína e partículas coloidais de proteínas que podem se
acumular na interface óleo-água durante a homogeneização. Mesmo diante desse fato, deposição de
34
partículas de proteína na interface, as referidas emulsões não são chamadas de emulsões tipo
Pickering por duas razões principais (DICKINSON, 2012). Primeiramente, muitas das partículas
dispersas nesses coloides alimentícios coexistem na fase aquosa com moléculas solúveis de proteína,
e essas pequenas espécies moleculares são predominantemente responsáveis pela rápida redução da
tensão interfacial durante a homogeneização. Segundo, uma vez que os agregados auto-organizados
de proteínas se tornam realmente adsorvidos na superfície das gotas, eles começam a se romper em
fragmentos menores, que gradualmente se redistribuem na interface para formar uma camada final
do tipo gel de proteína adsorvida. Então, para ser considerado um emulsificante/estabilizante do tipo
Pickering, as partículas dispersas devem permanecer insolúveis e intactas durante o tempo útil da
emulsão em questão (DICKINSON, 2001, 2012).
DESTRIBATS e colaboradores (2014) conseguiram contornar os problemas envolvidos na
fragmentação dos agregados de proteínas. É de amplo conhecimento que as proteínas globulares do
soro do leite são capazes de se auto-organizar em diferentes tipos de agregados dependendo das
condições existentes (de temperatura, pressão, força iônica e pH). No estudo conduzido por
DESTRIBATS e colaboradores (2014), os agregados de proteína do soro do leite foram
covalentemente reticulados e então denominados de microgéis, os quais foram utilizados com
sucesso na estabilização do tipo Pickering de emulsões óleo-em-água.
Na opinião dos autores dessa tese, algumas restrições quanto à classificação do tipo de
estabilização presente em uma emulsão podem levar a alguns enganos. Na maioria dos casos há mais
de um mecanismo de estabilização ocorrendo simultaneamente (aumento da viscosidade da fase
contínua, redução da tensão interfacial, impedimento estérico, repulsão eletrostática, etc.). O
exemplo dos ingredientes ricos em proteína mostra que em algum momento há agregados de proteína
na interface atuando como estabilizante do tipo Pickering. Mesmo que os agregados se rompam e
formem a camada gelificada de proteína na interface, não se pode ignorar que o mecanismo
Pickering ocorreu em algum momento da formação da emulsão. Assim, no presente trabalho haverá
sempre a tentativa de entender e identificar qualquer tipo de mecanismo que esteja contribuindo para
a estabilização das emulsões sem se restringir a uma única classificação.
Já o caso dos polissacarídeos em emulsões Pickering é menos controverso, pois a maioria dos
polissacarídeos não possui atividade interfacial ou propriedades tensoativas. Mesmo assim, afirmar
que uma emulsão é do tipo Pickering não é tarefa fácil. Em alguns trabalhos as maiores evidências
encontradas são microscopias que mostram as partículas na interface, mas isso nem sempre é
possível, pois a microscopia óptica não é suficiente quando se trata de tamanhos na escala
nanométrica, e outras técnicas de microscopia exigem preparos na amostra, como secagem da
35
emulsão e coloração/marcação de ingredientes, que podem modificar suas propriedades ou mesmo
inviabilizar a análise.
Mesmo diante dessas dificuldades considera-se importante estudar o mecanismo de
estabilização Pickering considerando os resultados promissores obtidos, como alta estabilidade à
coalescência, liberação mais controlada e prolongada de alguns fármacos ou ingredientes lipofílicos
encapsulados (FRELICHOWSKA et al., 2009), maior estabilidade em relação à oxidação lipídica
(KARGAR et al., 2011), e até mesmo redução na velocidade da digestão dos lipídeos (TZOUMAKI
et al., 2013), quando comparada com emulsões convencionais contendo surfactantes. Assim, este
tipo de emulsão pode se constituir como um potencial sistema de encapsulação e entrega controlada,
podendo ser utilizado para o desenvolvimento de novos alimentos funcionais (LIU & TANG, 2013;
CHEVALIER & BOLZINGER, 2013).
3.1.2 Emulsões estabilizadas por polissacarídeos
Um dos aspectos mais críticos na formação de produtos emulsionados bem sucedidos é a
seleção de um emulsificante adequado. Em geral, há inúmeros tipos de emulsificantes sintéticos e
naturais que podem ser utilizados na indústria de alimentos, incluindo proteínas, polissacarídeos,
fosfolipídios e tensoativos. No entanto, os consumidores estão cada vez mais exigentes e há uma
crescente demanda na indústria de alimentos por ingredientes naturais para fabricar os denominados
“produtos com rótulo limpo" (OZTURK & McCLEMENTS, 2016; TAVERNIER et al., 2016).
Nesse sentido, os polissacarídeos constituem-se como interessante alternativa, já que a maioria
desses compostos é proveniente de fontes naturais e são seguros para uso em alimentos (“generally
recognized as safe” - GRAS) (STEPHEN & CHURMS, 2006).
A maioria dos polissacarídeos são moléculas altamente hidrofílicas que não apresentam
atividade superficial significativa e, por conseguinte, não são bons emulsificantes (DICKINSON &
STAINSBY, 1988; DICKINSON, 2003; OZTURK & McCLEMENTS, 2016). Em vez disso, os
polissacarídeos podem ser considerados como bons agentes estabilizantes devido ao seu caráter
hidrofílico, sua alta massa molecular e capacidade gelificante, que leva à formação de barreiras
macromoleculares no meio aquoso entre as gotas dispersas, ou seja, eles tendem a estabilizar as
emulsões através do aumento da viscosidade da fase aquosa contínua, inibindo o movimento das
gotas (DICKINSON & STAINSBY, 1988).
Com frequência, os polissacarídeos são modificados para se transformarem em compostos
com atividade superficial (GAONKAR, 1991; DICKINSON, 2003). Em geral, são realizadas
modificações químicas ou enzimáticas, em que grupos hidrofóbicos ou resíduos de proteínas são
36
anexados às cadeias hidrofílicas, porém, o emulsificante obtido já não pode mais ser considerado
como um emulsificante natural. Os principais exemplos são os amidos e celuloses modificadas. Os
complexos formados através da reação de Maillard entre proteínas e polissacarídeos também são vias
interessantes para produção de emulsificantes à base de polissacarídeos, já que, em geral, os
complexos formados não necessitam de permissão de uso por parte das autoridades da área da saúde
(GAONKAR, 1991; GARTI, 1999; DICKINSON, 2003).
Alguns polissacarídeos naturais têm boas propriedades emulsificantes porque eles já têm
grupos não-polares ou proteínas ligados às suas cadeias. Os exemplos mais comuns são goma
arábica, pectina e galactomananas (DICKINSON, 2003; OZTURK & McCLEMENTS, 2016).
Atualmente, a goma arábica é o emulsificante à base de polissacarídeo natural mais amplamente
utilizado na indústria de alimentos (NAKAUMA et al., 2008; DICKINSON, 1993; GARTI, 1999).
No entanto, a grande desvantagem do uso da goma arábica é a proporção relativamente elevada de
emulsificante-óleo (1:1) necessária para formar emulsões estáveis (DICKINSON, 1993; GARTI,
1999). Estudos recentes têm mostrado que as pectinas cítricas também podem ser usadas como
emulsificantes (SCHMIDT et al., 2015). Outros estudos têm mostrado que polissacarídeos isolados a
partir de sementes de manjericão mostraram-se como bons emulsificantes, com atividade superficial
atribuída à presença de porções de proteína e grupos não-polares na cadeia do carboidrato
(HOSSEINI-PARVAR et al., 2016). A goma de fibra de milho também tem mostrado boas
propriedades emulsificantes, as quais também foram atribuídas à presença de porções proteicas
(YADAV et al., 2012).
No entanto, existem algumas indicações recentes de que certos hidrocolóides, principalmente
aqueles que pertencem à família das galactomananas, são capazes de se adsorver em interfaces óleo-
água e estabilizar emulsões através do mecanismo de estabilização estérica mesmo sem conter
resíduos de proteína em sua cadeia (OZTURK & McCLEMENTS, 2016). Gomas guar e de feno-
grego foram isoladas e purificadas até que a maior parte da matéria proteica fosse removida e, ainda
assim, apresentaram adsorção na interface. As emulsões preparadas com gomas guar e de feno-grego
purificadas foram altamente estáveis mesmo em condições diluídas e forte birrefringência foi
detectada na interface óleo-água indicando a presença de uma camada espessa e orientada de
polissacarídeos (GARTI, 1999; GARTI & LESSER, 2001).
O aumento da viscosidade da fase contínua e a estabilização estérica não são os únicos
mecanismos de estabilização desempenhados por polissacarídeos. Assim como citado anteriormente,
há também muitos estudos mostrando a capacidade de alguns polissacarídeos de estabilizar emulsões
37
através do mecanismo de deposição de partículas na interface, denominada estabilização do tipo
Pickering (ZOPPE et al., 2012; TZOUMAKI et al., 2011; RAYNER et al., 2012; JIA et al., 2015).
Um exemplo que pode ser citado é a estabilização de emulsões através da utilização de
grânulos de amido nativo (LI et al., 2013, RAYNER et al., 2012). Em estudo conduzido por LI e
colaboradores (2013), sobre a capacidade de grânulos de amido, provenientes de diferentes fontes
naturais, de estabilizar emulsões através do mecanismo Pickering, foi observado que quanto menor o
tamanho do grânulo maior era a capacidade de estabilizar emulsões. O grânulo de amido de menor
tamanho estudado, proveniente de arroz, mostrou bom desempenho emulsificante, evitando a
coalescência das gotas de emulsões armazenadas por vários meses. Com o aumento da concentração
dos grânulos de amido de arroz houve aumento da densidade de empacotamento dos grânulos na
interface e redução do tamanho das gotas. Os grânulos de amido de arroz apresentaram tamanho
médio (D43) de, aproximadamente, 5 m e foram capazes de formar emulsões em concentrações a
partir de 3% (m/m). Quando a concentração de grânulos passou de 3 para 45% (m/m) foi observada
uma redução no tamanho médio das gotas da emulsão de 802 m para 43 m, ou seja, o tamanho das
gotas das emulsões foi intensamente dependente da concentração de grânulos presente. Alterações no
pH e adição de sal não apresentaram efeito significativo sobre os sistemas.
Outro exemplo interessante de estabilização de emulsões através do uso de polissacarídeos
está descrita no trabalho de HOSSEINI-PARVAR e colaboradores (2016). Os autores exploraram a
capacidade emulsificante do polissacarídeo extraído da semente de manjericão. Mesmo em baixas
concentrações (0,3% m/m) esse polissacarídeo se mostrou capaz de estabilizar emulsões contendo
30% (m/m) de fase oleosa, prevenindo a coalescência das gotas por até 1 mês de armazenamento. A
goma de semente de manjericão apresentou adsorção na interface das gotas devido à presença de
segmentos hidrofóbicos em sua cadeia e conferiu altos valores de potencial zeta (cerca de -58 mV) às
gotas das emulsões em seu pH natural (~ 7,0). As propriedades das emulsões formadas foram
altamente dependentes do valor de pH e de força iônica. Os mecanismos de estabilização principais
apontados foram o impedimento estérico e a repulsão eletrostática, sendo que dependendo do pH e
da concentração de sal adicionado houve predominância de um mecanismo sobre o outro. Além
disso, uma microscopia existente na literatura mostrou que as dispersões da goma de semente de
manjericão apresentam uma estrutura fibrilar com presença de partículas globulares de,
aproximadamente, 1,5 m, mostrando que as dispersões desse polissacarídeo podem conter
microgéis (RAFE et al., 2013). A presença desses microgéis juntamente com outras evidências
apresentadas no trabalho, permitiu que os autores apontassem que a estabilização do tipo Pickering
também pudesse estar ocorrendo.
38
Já NAN e colaboradores (2014) descreveram uma estratégia diferente para formular emulsões
do tipo Pickering utilizando apenas polissacarídeos. Na primeira etapa do trabalho foram produzidas
partículas de gel de alginato (de tamanho nanométrico) recobertas com quitosana. A adsorção de
quitosana à superfície das partículas permitiu a obtenção de partículas com caráter menos hidrofílico
e, portanto, mais adequadas para a estabilização das emulsões. Na segunda etapa, essas partículas de
alginato recobertas com quitosana foram utilizadas para estabilizar emulsões. Quanto menor o
tamanho das partículas, menor foi a concentração necessária para alcançar emulsões estáveis à
coalescência. De modo geral, as emulsões obtidas se mostraram sensíveis às alterações de pH e de
força iônica. Por conter apenas ingredientes biocompatíveis, as emulsões Pickering obtidas no
trabalho foram citadas pelos autores como promissoras na encapsulação e veiculação de fármacos.
Assim, é possível que no futuro, muitos outros polissacarídeos sejam extraídos com o
propósito de serem utilizados como emulsificantes e não só como estabilizantes. Para tanto, há
necessidade de mais pesquisas para identificar, isolar e caracterizar as propriedades de emulsificantes
à base de polissacarídeos a partir de fontes naturais (GARTI, 1999; GARTI & LESSER, 2001;
OZTURK & MCCLEMENTS, 2016).
3.2 Gelana
A gelana é um polissacarídeo aniônico produzido por fermentação pela bactéria
Sphingomonas elodea que consiste de repetidas unidades de um tetrassacarídeo (-D-glicose, - D-
ácido glicurônico, -D-glicose e -L-ramnose) contendo dois substituintes: glicerato e acetato.
Ambos substituintes estão localizados no mesmo resíduo de glicose, e em média há um glicerato por
unidade repetida e um acetato a cada duas unidades (Figura 3A). Essa é sua forma altamente acilada
(gelana HA) ou natural. O tratamento com álcali é capaz de remover os grupos substituintes
resultando na gelana desacilada (gelana LA). A gelana em sua forma desacilada é composta pelo
mesmo tetrassacarídeo e cada unidade tetramérica repetida, assim como na gelana HA, possui um
grupo carboxílico lateral (Figura 3B) (O’NEIL et al., 1983; JANSSON et al., 1983; SANDERSON,
1990).
39
Figura 3. Unidade repetida do tetrassacarídeo que compõem a goma gelana acilada (A) e desacilada (B)
(SANDERSON, 1990).
A descoberta da goma gelana foi resultado de um esforço que existiu nos anos 70 para
produzir polissacarídeos microbianos com massa molecular e pureza controladas, eliminando, dessa
forma, as variações climáticas e geográficas que podem afetar as propriedades físicas e a
disponibilidade dos biopolímeros provenientes de fontes vegetais (WHITTAKER et al., 1997).
A gelana HA possui massa molar em torno de 1-2 x 106 Daltons. Já a massa molar da gelana
LA é menor, cerca de 2-3 x 105 Daltons. Geralmente, é necessário o aquecimento da água para a
hidratação completa desse polissacarídeo. A temperatura de hidratação da gelana LA é bastante
dependente das condições iônicas do meio aquoso e particularmente sensível à presença de íons
divalentes. Para uma completa hidratação, a gelana LA requer uma temperatura de aproximadamente
75 ºC caso não haja sequestrantes na água. Porém, a completa hidratação em temperatura ambiente é
possível através do uso de 0,3% de citrato de sódio como agente sequestrante (KANG et al., 1982;
O’NEIL et al., 1983; JANSSON et al., 1983).
A gelana HA irá intumescer quando dispersa em água deionizada resultando em solução com
consistência semelhante a soluções de amido. O uso de pequenas concentrações de cátions
monovalentes inibe esse intumescimento. Assim, a adição de íons como sódio e potássio pode ser
uma estratégia para melhorar a dispersão da goma e para reduzir a viscosidade da solução. O
aquecimento é indispensável para a completa hidratação da gelana HA. Enquanto a presença de íons
afeta a dispersão e intumescimento desse polissacarídeo, a temperatura de hidratação é praticamente
insensível à presença deles, e está em torno de 70 a 80 ºC. A hidratação de ambas gelanas, LA e HA,
40
pode ser inibida pela presença de sólidos solúveis ou por baixos valores de pH (KANG et al., 1982;
O’NEIL et al., 1983; JANSSON et al., 1983).
A principal aplicação da gelana tem sido na formação de géis. O mecanismo de gelificação da
gelana é considerado como um processo em duas etapas: primeiro há a formação de duplas-hélices
ordenadas (transição conformacional) durante o aquecimento, seguida pela interação entre as hélices
(transição sol – gel) durante o resfriamento. A temperatura em que se dá a formação do gel depende
do tipo de gelana, da concentração e do tipo de cátion presente na solução e da presença de outros
sólidos dissolvidos. Na ausência de cátions a gelana LA forma gel em torno de 25 ºC, enquanto que
na gelana HA a formação de gel se dá quando a temperatura no resfriamento alcança os 65 ºC. A
adição de cátions, como sódio e cálcio, causa um aumento nessa temperatura. Nos dois tipos de
gelana o gel é formado quase que instantaneamente, uma vez que a temperatura é atingida
(GRASDALEN & SMIDSROD, 1987; KANG et al., 1982; O’NEIL et al., 1983; JANSSON et al.,
1983).
A gelana HA forma gel através do simples resfriamento. Já a formação de gel com gelana LA
requer adição de cátions, ácidos, sólidos solúveis ou uma combinação destes aditivos. Cátions
divalentes são mais efetivos na formação de gel que os cátions monovalentes, sendo necessária maior
concentração de cátions monovalentes para formar géis com força semelhante aos géis com cátions
divalentes (NICKERSON et al., 2003; TANG et al., 1996; VILELA et al., 2011). A gelana HA
produz géis fracos e elásticos devido à presença dos grupos glicerato que ficam localizados dentro
das duplas-hélice, forçando uma rotação do grupo carboxílico e causando impedimento estérico no
momento da agregação das hélices para formar a rede tridimensional. Os géis de gelana HA vão
perdendo sua firmeza com o aumento da temperatura e podem ser desfeitos com o aquecimento
prolongado. Já a gelana LA produz géis firmes, não elásticos e estáveis frente ao aquecimento
(TANG et al., 1996; GRASDALEN & SMIDSROD, 1987; KANG et al., 1982; O’NEIL et al., 1983;
JANSSON et al., 1983).
Em relação às emulsões, nenhum trabalho foi conduzido visando estudar a possibilidade de
utilização da gelana como partícula coloidal na estabilização do tipo Pickering. Há poucos trabalhos
sobre a utilização da gelana em emulsões (LORENZO et al., 2013; HUANG et al., 2001) e a
referência existente, até essa data, sobre a utilização da gelana HA como único componente
estabilizante/emulsificante do sistema é o trabalho que foi gerado a partir dessa tese (VILELA &
CUNHA, 2016).
42
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1 Material
Os materiais utilizados foram as gomas gelanas acilada (HA) e desacilada (LA) (Kelco, San
Diego, EUA) e óleo de girassol (Liza, Cargill, EUA). Os demais reagentes utilizados foram de grau
analítico. O teor de nitrogênio das gelanas HA e LA em pó foi de 1,75 ± 0,14 e 0,32 ± 0,02% (m/m),
respectivamente (base úmida), o qual foi determinado por um analisador elementar Flash 2000
CHNS/O (Thermo Scientific, Waltham, USA). O conteúdo de íons das gomas gelana foi
determinado por Espectrometria de Emissão Óptica com Plasma Acoplado Indutivamente. A gelana
HA apresentou a seguinte composição (% m/m): cálcio (0,23 ± 0,04), magnésio (0,097 ± 0,01),
potássio (2,0 ± 0,20) e sódio (1,5 ± 0,2). Já o teor de íons da gelana LA foi (% m/m): cálcio (0,25 ±
0,03), magnésio (0,074 ± 0,01), potássio (3,60 ± 0,05) e sódio (0,9 ± 0,2).
4.2. Caracterização das gelanas
A maioria das caracterizações foi feita com a gelana HA, polissacarídeo que apresentou a
capacidade de estabilizar as emulsões nas condições estudadas. Porém, algumas determinações
também foram conduzidas utilizando-se a gelana LA para efeito de comparação. Primeiramente, as
gelanas HA e LA foram caracterizadas quanto a sua viscosidade aparente a 100 s-1
(seção 4.4.3),
potencial zeta (seção 4.4.1) e teor de nitrogênio (seção 4.4.9). A viscosidade foi determinada
utilizando dispersões contendo 0,1% de polissacarídeo preparadas através de agitação magnética a
temperatura ambiente. Para as medidas no potencial zeta, essas dispersões foram diluídas em água
Milli-Q (1:10) e analisadas em seu pH natural.
4.2.1 Efeito da concentração de gelana HA nas propriedades reológicas das dispersões
Dispersões de gelana HA nas concentrações de 0,07, 0,10, 0,14 ou 0,21% m/m foram
preparadas através da adição do polissacarídeo em água Milli-Q e posterior homogeneização em
agitador magnético. Essas dispersões tiveram suas propriedades reológicas determinadas conforme
descrito na seção 4.4.3. Curvas de escoamento e ensaios oscilatórios foram realizados.
4.2.2 Efeito do processo de homogeneização nas dispersões de gelana
O efeito do processo usado para preparar as emulsões (passagem em rotor-estator e
tratamento em sonda de ultrassom) sobre as propriedades das dispersões de gelana foi determinado.
Gelana HA ou LA (0,14% m/m) foram dispersas em água Milli-Q através de agitação magnética.
Uma parte das dispersões foi submetida a uma passagem em rotor-estator (14.000 rpm/4 min) e foi
43
posteriormente caracterizada quanto às suas propriedades reológicas (seção 4.4.3). A outra parte das
dispersões foi submetida a um tratamento em sonda de ultrassom, e teve suas propriedades avaliadas
antes e após esse tratamento. O tratamento ultrassônico foi realizado em processador ultrassônico
modelo QR750 (Ultronique, Campinas, Brazil) operando a 20 kHz de frequência com potência
nominal de 750 W com sonda de área superficial de 1,32 x 10-4
m². O tratamento ultrassônico foi
feito com o auxílio de béquer encamisado conectado a um banho térmico com temperatura fixa de
24ºC, e 100 g de cada dispersão foi processada por 15 min. O pH e potencial zeta (seção 4.4.1) e as
propriedades reológicas (seção 4.4.3) das dispersões foram determinados antes e após o tratamento
ultrassônico.
4.2.3 Efeito do tratamento térmico nas suspensões de gelana
A influência do tratamento térmico nas propriedades das suspensões de gelana acilada (HA)
ou desacilada (LA) em meio aquoso foi determinada. Para tal, suspensões contendo 0,1% (m/m) de
gelana HA ou LA foram analisadas antes e após o tratamento térmico de 90ºC/30 min. Todas as
análises foram realizadas a 25ºC após 24 h do preparo das suspensões. As propriedades avaliadas
foram o comportamento reológico (seção 4.4.3) e o potencial zeta (seção 4.4.1).
4.2.4 Efeito da força iônica nas suspensões de gelana
A influência da força iônica nas propriedades das suspensões de gelana acilada em meio
aquoso foi determinada. Para tal suspensões de gelana em soluções salinas de KCl foram preparadas.
As concentrações de polissacarídeo foram as mesmas utilizadas para preparar a fase aquosa das
emulsões. Assim, duas concentrações de gelana foram avaliadas: 0,035% m/m (que corresponde à
emulsão com 0,025% de gelana HA em relação ao total) e 0,14% m/m (correspondente à emulsão
com 0,1% de gelana HA). A adição de KCl foi analisada em diferentes valores de força iônica (0, 3,
12, 30 ou 300 mM). Todas as dispersões foram preparadas através da agitação magnética, porém a
influência do tratamento ultrassônico nessas dispersões também foi avaliada. O tratamento
ultrassônico foi realizado conforme descrito anteriormente (seção 4.2.2). As propriedades avaliadas
foram: distribuição de tamanho de partículas (seção 4.4.2), propriedades reológicas (seção 4.4.3) e
potencial zeta (seção 4.4.1).
4.2.5 Determinação da tensão interfacial das suspensões de gelana
Dispersões contendo gelana LA ou gelana HA (0,025% m/m) foram preparadas através da
adição do polissacarídeo em água Milli-Q e posterior homogeneização em agitador magnético para
44
determinação da tensão interfacial entre essas dispersões e óleo de girassol (seção 4.4.6). O efeito da
adição de KCl na densidade (seção 4.4.7) e na tensão interfacial das dispersões de gelana HA
também foi avaliado. Concentrações de KCl de 0,03 mM e 0,75 mM (ou 6,3 e 156,3 mg de KCl/g de
gelana) foram utilizadas.
4.3 Emulsões
4.3.1 Preparação de emulsões com gelana HA e LA em rotor-estator
Emulsões contendo gelana acilada ou desacilada foram preparadas através da mistura da fase
aquosa com a fase oleosa em um rotor-estator Ultra Turrax modelo T18 (IKA, Alemanha) a 14.000
rpm por 4 min. A fase aquosa (70% m/m) foi constituída pelas dispersões contendo goma gelana
(HA ou LA) e a fase oleosa utilizada foi o óleo de girassol, na proporção de 30% (m/m) do total da
emulsão. As concentrações de gelana nas emulsões finais foram de 0,01, 0,025, 0,05, 0,075, 0,1,
0,125, 0,15 ou 0,2% (m/m). As amostras foram caracterizadas após 24h quanto à reologia (seção
4.4.3), morfologia por microscopia óptica (seção 4.4.5), distribuição de tamanho das gotas (seção
4.4.2) e perfil de separação de fases (seção 4.4.4). A distribuição de tamanho das gotas foi
determinada após 24h e também após 7 dias para verificar a estabilidade das gotas à coalescência.
Em algumas amostras selecionadas também foi determinada a distribuição de tamanho das gotas
após armazenamento (em provetas seladas armazenadas em temperatura ambiente) por períodos
prolongados (30 e 60 dias).
4.3.2 Preparo de emulsões com gelana HA em homogeneizador a alta pressão
As emulsões contendo gelana HA preparadas conforme descrito anteriormente (seção 4.4.1)
foram processadas em homogeneizador a alta pressão após a passagem em rotor-estator (14.000
rpm/4 min). Foi utilizado um homogeneizador de dois estágios Panda 2K NS1001L (Niro Soavi,
Itália) a uma pressão de 300 bar no primeiro estágio e de 50 bar no segundo estágio. As amostras
foram caracterizadas após 24h quanto à reologia (seção 4.4.3), morfologia por microscopia óptica
(seção 4.4.5), distribuição de tamanho das gotas (seção 4.4.2), perfil de separação de fases (seção
4.4.4) e potencial zeta (seção 4.4.1). A distribuição de tamanho das gotas foi determinada após 24h e
também após 7 dias para verificar a estabilidade das gotas à coalescência.
45
4.3.3 Efeito do tratamento ultrassônico nas emulsões de gelana HA
Foram preparadas quatro emulsões com a mesma composição, mas diferentes combinações
de etapas de preparo, de modo a determinar o efeito do tratamento ultrassônico nas dispersões de
gelana HA nas emulsões formadas. A Figura 4 apresenta de forma esquemática as etapas utilizadas
para o preparo de cada emulsão. Uma dispersão aquosa de gelana HA preparada através de agitação
magnética (concentração fixa de 0,14% m/m) foi utilizada no preparo de emulsões contendo 0,1%
(m/m) de polissacarídeo e 30% (m/m) de óleo de girassol. A ‘Emulsão 1’ (controle) foi preparada
através da mistura da dispersão aquosa de gelana HA e do óleo utilizando apenas um passo em rotor-
estator Ultra Turrax modelo T18 (IKA, Alemanha) a 14.000 rpm por 4 min. A ‘Emulsão 2’ foi
preparada da mesma forma, porém a dispersão de gelana foi submetida a um passo adicional em
rotor-estator antes do preparo da emulsão. Na ‘Emulsão 3’ a dispersão de gelana foi submetida ao
tratamento ultrassônico (condições de processo descritas anteriormente na seção 4.2.2) antes da
mistura com óleo no rotor-estator. Já a ‘Emulsão 4’ foi preparada utilizando o tratamento
ultrassônico após uma pré-mistura em rotor-estator. A mesma quantidade de amostra foi processada
em cada etapa para manter constante a energia aplicada/massa. As emulsões foram caracterizadas
após 24h quanto à reologia (seção 4.4.3), morfologia por microscopia óptica (seção 4.4.5),
distribuição de tamanho das gotas (seção 4.4.2) e perfil de separação de fases (seção 4.4.4).
Figura 4. Ilustração esquemática das etapas utilizadas no preparo das Emulsões 1, 2, 3 e 4. Todas as emulsões
finais apresentam a mesma concentração de gelana HA e óleo, 0,1% m/m e 30% m/m, respectivamente.
46
4.3.4 Efeito da adição de KCl, CaCl2 ou FeCl3 nas emulsões com gelana HA
Foi determinado o efeito da adição de diferentes sais sob mesma força iônica nas emulsões
com gelana HA. Para tal, suspensões de gelana HA em soluções salinas (KCl, CaCl2 ou FeCl3) foram
utilizadas como fase aquosa para o preparo de emulsões óleo/água contendo 30% m/m de óleo de
girassol. A concentração de gelana nas emulsões foi de 0,025% ou 0,1% m/m. Quatro diferentes
forças iônicas foram avaliadas: 0,03, 0,3, 3 e 30 mM. As razões entre massa de sal e gelana
correspondente a cada força iônica estão apresentadas na Tabela 2. As emulsões foram preparadas
por mistura da fase aquosa com a fase oleosa em um rotor-estator Ultra Turrax modelo T18 (IKA,
Alemanha) a 14.000 rpm por 4 min. As amostras foram caracterizadas após 24h quanto à reologia
(seção 4.4.3), morfologia por microscopia óptica (seção 4.4.5) e por microscopia confocal (seção
4.4.8), distribuição de tamanho das gotas (seção 4.4.2) e perfil de separação de fases (seção 4.4.4). A
distribuição de tamanho das gotas foi determinada após 24h e também após 7 dias para verificar a
estabilidade das gotas à coalescência.
Tabela 2. Razões mássicas de KCl, CaCl2 e FeCl3 utilizadas e suas correspondentes forças iônicas.
KCl CaCl2 FeCl3
Força iônica Gelana mg de sal/ Força iônica Gelana mg de sal/ Força iônica Gelana mg de sal/
(mM) (% m/m) g gelana (mM) (% m/m) g gelana (mM) (% m/m) g gelana
0,03 0,025 6,3 0,03 0,025 3,1 0,03 0,025 2,3
0,3 0,025 62,6 0,3 0,025 31,1 0,3 0,025 22,7
3 0,025 626,0 3 0,025 310,6 3 0,025 227,0
30 0,025 6260,1 30 0,025 3106,3 30 0,025 2270,0
0,03 0,1 1,6 0,03 0,1 0,8 0,03 0,1 0,6
0,3 0,1 15,6 0,3 0,1 7,8 0,3 0,1 5,7
3 0,1 156,3 3 0,1 77,6 3 0,1 56,7
30 0,1 1563,3 30 0,1 775,8 30 0,1 566,9
4.3.5 Efeito da adição de KCl nas emulsões de gelana HA
O efeito da adição de KCl nas emulsões com gelana HA foi estudado de forma mais
detalhada, ampliando a faixa de concentrações de KCl estudada. A concentração de gelana nas
emulsões foi de 0,025% ou 0,1% m/m. Foram adicionadas quantidades de KCl variando entre 1,6 a
47
15633 mg de KCl/g de gelana. A força iônica (FI) das soluções utilizadas considerando a razão entre
a concentração de sal e gelana estão apresentadas na Tabela 3. As emulsões foram preparadas através
da mistura da fase aquosa (água, gelana e KCl) com a fase oleosa (30% m/m de óleo de girassol) em
um rotor-estator Ultra Turrax modelo T18 (IKA, Alemanha) a 14.000 rpm por 4 min. As amostras
foram caracterizadas após 24 h quanto à reologia (seção 4.4.3), morfologia por microscopia óptica
(seção 4.4.5), distribuição de tamanho das gotas (seção 4.4.2) e perfil de separação de fases (seção
4.4.4). A distribuição de tamanho das gotas foi determinada após 24h e também após 7 dias para
verificar a estabilidade das gotas à coalescência. Em algumas amostras selecionadas também foi
determinada a distribuição de tamanho das gotas após armazenamento por períodos mais
prolongados (30 e 60 dias).
Tabela 3. Concentração de KCl utilizada nas emulsões com gelana HA.
0,025 % m/m de gelana 0,1 % m/m de gelana
Amostra FI (mM) mg de KCl/g de gelana Amostra FI (mM) mg de KCl/g de gelana
0 sem KCl 0,0 0 sem KCl 0,0
1 0,007 1,6 1 0,03 1,6
2 0,03 6,3 2 0,12 6,3
3 0,07 15,6 3 0,30 15,6
4 0,30 62,6 4 1,20 62,6
5 0,75 156,3 5 3,00 156,3
6 3,00 626,0 6 12,01 626,0
7 7,49 1563,3 7 30,00 1563,3
8 30,00 6260,1 8 120,13 6260,1
9 74,92 15633,4 9 300,00 15633,4
48
4.4 Metodologias de análise
4.4.1. Determinação de Potencial Zeta
O potencial- foi determinado no equipamento Nanoseries ZS Instrument (Zetasizer Nano-
ZS, Malvern Instruments, Worcestershire, UK), a 25° C com análise em triplicata. A mobilidade
eletroforética, ou seja, a velocidade das partículas sob efeito de um campo elétrico, foi obtida através
da técnica de “Laser Doppler Velocimetry” (LDV), que faz uso da relação existente entre a
velocidade e o espalhamento de luz produzido pelas partículas dispersas no meio. A mobilidade
eletroforética foi automaticamente convertida em valores de potencial- pelo software do
equipamento utilizando a equação de Henry (3):
UE = 2ɛz f(ka)/ 3
em que UE é a mobilidade eletroforética, ɛ é a constante dielétrica, z é o potencial-, é a
viscosidade do meio e f (ka) é a função de Henry. A função de Henry pode assumir diferentes valores
conforme a aproximação utilizada. Na aproximação de Smoluchowski, adequada para medidas feitas
em meio aquoso com moderada concentração de eletrólitos, o valor de f (ka) é 1,5 (HUNTER, 1988).
O potencial- de algumas amostras também foi medido em dispersões que apresentavam diferentes
valores de pH, fazendo assim uma varredura da relação entre o potencial- e o pH da amostra, numa
titulação em que o ponto de potencial- de valor zero pode ser identificado. O potencial zeta das
emulsões foi medido após diluição das mesmas (1:10) em dispersante adequado (água Milli-Q ou
solução salina, conforme a fase aquosa utilizada para preparar a emulsão).
4.4.2 Distribuição de tamanho de partículas – Espalhamento de luz laser
A distribuição de tamanho de partículas (volumétrica e numérica) foi determinada através da
técnica de espalhamento de luz laser utilizando-se o equipamento Laser Scattering Spectrometer
Mastersizer 2000 (Malvern Instruments LTD., U.K). Utilizou-se água destilada como meio
dispersante e agitação de 1750 rpm. O tamanho médio das partículas foi determinado utilizando o
Sauter Mean Diameter (D32), que é definido como o diâmetro da esfera que possui a mesma relação
volume/área superficial que a partícula de interesse (Equação 4) e também pelo De Brouckere Mean
Diameter (D43), definido pela Equação 5.
2
3
32
ii
ii
dn
dnD (4)
3
4
43
ii
ii
dn
dnD (5)
49
onde ni é o número de partículas com diâmetro di. O “span”, parâmetro associado à polidispersão das
partículas, também foi determinado através da curva de distribuição de tamanhos e foi calculado de
acordo com a Equação 6.
)5,0(
)1,0()9,0(
d
ddSpan
(6)
em que d(0,1), d(0,5) e d(0,9) representam diâmetros de partículas tal que 10, 50 ou 90%,
respectivamente, da amostra analisada é constituída de partículas de tamanho menor que esse valor.
4.4.3. Medidas reológicas
Para a determinação das propriedades reológicas das dispersões aquosas de gelana e das
emulsões foi utilizado um reômetro rotacional Physica MCR 300 rheometer (Physica Messtechnik
GmbH, Stuttgart, Alemanha). As medidas foram feitas em triplicata em uma temperatura de 25°C.
Foi usada geometria de cone-placa com 50 mm de diâmetro, ângulo de 2º e truncamento de 208
m. Curvas de escoamento foram obtidas com um programa de passos múltiplos usando um
intervalo de taxa de deformação entre 0 - 300 s-1
. Os modelos para fluidos Newtoniano (7),
pseudoplástico (8) e de Herschel-Bulkley (9) foram utilizados para ajustar as curvas de
escoamento:
. (7)
nk ).( (8)
nk ).(0 (9)
onde é a taxa de deformação (s-1
), é a viscosidade (Pa.s), n é o índice de comportamento, 0
é a tensão residual (Pa), e k é o índice de consistência (Pa.sn).
Para a determinação das propriedades viscoelásticas, ensaios oscilatórios com varredura de
frequência entre 0,1 e 10 Hz (em deformação constante de 1%) foram realizados e os módulos
viscoso (G”) e elástico (G’) foram determinados. As medidas foram feitas em triplicata a 25ºC
utilizando geometria de placas paralelas rugosa com 50 mm de diâmetro e “gap” (distância entre as
placas) de 500 m.
50
4.4.4. Perfil de separação de fases
Imediatamente após o preparo das emulsões, alíquotas de 100 mL de amostra foram
transferidas para tubos cilíndricos graduados (provetas de 100 ml, com 2,5 cm de diâmetro interno e
25 cm de altura), os quais foram selados e armazenados por 7 dias à temperatura ambiente. O volume
da fase creme, da fase soro e do óleo livre foram quantificados diariamente e os volumes finais das
fases após 7 dias foram apresentados. Para as amostras que foram armazenadas por tempo
prolongado (até 60 dias) foi utilizada solução de formol na borda das provetas para evitar o
crescimento de fungos.
4.4.5. Microscopia óptica
As análises de microscopia óptica foram realizadas em microscópio Scope A1 (Carl Zeiss,
Alemanha) com um aumento de até 100 x. As amostras foram colocadas em lâminas de vidro e
cobertas com lamínulas. Foram obtidas cerca de 10 imagens de cada amostra, de modo a varrer a
lâmina inteira.
4.4.6 Tensão interfacial
As medidas de tensão interfacial foram feitas através do método da gota pendente utilizando
um tensiômetro Tracker-S Tensiometer 180 (Teclis, Longessaigne, France). As medidas foram
realizadas a 25ºC ± 0,5º C através da formação da gota de óleo de girassol (20 L) na fase aquosa.
As fases aquosas analisadas foram água pura, dispersão aquosa de gelana LA, dispersão aquosa de
gelana HA ou dispersão aquosa de gelana HA com adição de KCl. Os valores de tensão interfacial no
equilíbrio foram obtidos após 40 min de análise, dado que após esse intervalo de tempo as curvas não
apresentavam alterações significativas dessa propriedade.
4.4.7 Densidade
A densidade das dispersões aquosas de gelana com ou sem adição de KCl foram
determinadas utilizando um densímetro Density Meter modelo DMA 4500 (Anton Paar, Austria). As
medidas foram realizadas em triplicata a 25º C.
4.4.8 Microscopia confocal de varredura a laser
O isotiocianato de fluoresceína (FITC) foi usado para marcar a gelana através de ligação
covalente seguindo a metodologia descrita por HEILIG, GÖGGERLE, & HINRICHS (2009). Um
volume de 20 mL de dimetil sulfóxido (DMSO) e 80 L de piridina foram misturadas com 1 g de
51
gelana em agitação magnética a temperatura ambiente por 30 min. Após a adição de 0,1 g de FITC e
40 L de dibutil dilaurato de estanho, a mistura foi incubada a 95ºC em banho térmico de água e
após 3h foi resfriada até temperatura ambiente. O gel resultante foi macerado e lavado com etanol
99,6% e foi desidratado em estufa a 65ºC. O óleo foi corado com vermelho do Nilo através da adição
do corante ao óleo e posterior agitação em temperatura ambiente. O pó de gelana marcado
covalentemente e o óleo corado foram então utilizados para o preparo das emulsões utilizando a
metodologia descrita anteriormente. As amostras foram visualizadas em microscópio confocal Zeiss
LSM 780-NLO e Axio Observer Z.1 (CarlZeiss AG, Germany) com objetivas de 10x.
4.4.9 Teor de carbono, hidrogênio e nitrogênio (CHN)
A quantificação de nitrogênio presente nas gelanas foi realizada em um analisador elementar
Analyzer 2400, Série II (Perkin Elmer, USA). As determinações foram feitas em triplicata.
4.5 Análise estatística
A comparação entre as amostras em relação às diferentes propriedades determinadas foi feita
por análise de variância-ANOVA, em que diferenças estatísticas (p <0,05) foram determinadas pelo
teste de Tukey utilizando-se o software STATISTICA 7 (Statisoft Inc., Tulsa USA, 2000).
53
5. RESULTADOS E DISCUSSÕES
5.1 Caracterização das gelanas
A proposta inicial do projeto contemplava a preparação de nanocristais de gelana para a
obtenção de partículas sólidas insolúveis em água (com caráter hidrofílico reduzido). Porém, ao
iniciar o estudo foi verificado que a gelana pode permanecer parcialmente insolúvel em água caso
não seja dado o tratamento térmico necessário para a completa hidratação desse polissacarídeo. A
maioria dos trabalhos envolvendo o uso de gelana acilada e desacilada trabalham com dispersões do
polissacarídeo após o tratamento térmico, processo que promove uma transição conformacional das
cadeias de gelana. Com relação às propriedades emulsificantes desse polissacarídeo, um número
reduzido de pesquisas é encontrado na literatura (HUANG et al., 2001; LORENZO et al., 2013),
sendo que em todos os trabalhos a gelana é usada após tratamento térmico. Portanto, decidiu-se que
as dispersões de gelana sem hidratação completa (ou seja, sem tratamento térmico) seriam estudadas
quanto às suas propriedades emulsificantes e estabilizantes.
A Tabela 4 apresenta algumas propriedades dos dois tipos de gelana, HA e LA, para efeitos
de comparação.
Tabela 4. Propriedades físicas e físico-químicas das gelanas LA e HA a 25ºC.
Massa
molecular*
(kDa)
Potencial
Zeta**
(mV)
Viscosidade**
a
100 s-1
(mPa.s)
Nitrogênio
(% m/m)
Quantidade
de
proteína***
(% m/m)
Gelana HA 1 - 2x103 -62,15 ± 1,3 42,5 ± 0,7 1,75 ± 0,14 10,93 ± 0,86
Gelana LA 2 - 3x102 -31,19 ± 3,5 3,1 ± 0,1 0,32 ± 0,02 1,99 ± 0,14
*Fornecida pelo fabricante Kelco.
** Utilizando dispersões aquosas contendo 0,1% de polissacarídeo.
*** Utilizando fator de conversão 6,25.
A gelana HA tem massa molecular uma ordem de grandeza maior que a gelana LA, muito
provavelmente devido à presença dos grupos substituintes glicerato e acetato. Quando foi mensurado
o valor de potencial zeta das dispersões em água Milli-Q no pH natural, a dispersão aquosa de gelana
HA apresentou o dobro do valor encontrado para a gelana desacilada. A viscosidade aparente da
dispersão aquosa de gelana HA também foi bastante superior à encontrada na dispersão aquosa de
gelana LA mantendo a mesma concentração. O teor de nitrogênio da gelana em sua forma natural
54
(HA) é bastante superior ao encontrado para a gelana LA, dando indícios de que resíduos de proteína
estão presentes na gelana natural, e que estes resíduos são degradados/removidos durante o processo
de desacilação da gelana (TAYLOR et al., 2012). Esse resultado é importante, pois resíduos de
proteína podem conferir capacidade emulsificante, ou seja, ação interfacial ao polissacarídeo. Assim,
é possível concluir que as dispersões de gelana LA e HA apresentam propriedades bastante distintas,
que irão refletir nas emulsões formadas por cada uma delas.
5.1.1 Propriedades das gelanas – caracterização reológica da gelana HA
Na Figura 5 estão apresentadas as curvas de escoamento das dispersões de gelana HA (0,07 a
0,21% m/m) preparadas através de agitação magnética. As dispersões apresentaram comportamento
pseudoplástico, com redução da viscosidade com o aumento da taxa de cisalhamento. As dispersões
mais concentradas, com 0,14 ou 0,21% m/m de gelana HA, mostraram comportamento mais
complexo com tensão residual. Na Figura 5 foram apresentadas as rampas de subida (1), descida e
subida (2) de taxa de deformação para evidenciar a tixotropia das dispersões (comportamento
dependente do tempo de cisalhamento). O comportamento tixotrópico se tornou mais intenso
conforme houve aumento da concentração de HA. Já a Tabela 5 apresenta os parâmetros obtidos
através do ajuste das curvas de escoamento em estado estacionário (subida 2, após a retirada do
comportamento tixotrópico). Foi possível observar que houve redução no índice de comportamento
(n) e aumento no índice de consistência (k) e viscosidade aparente (ap) com o aumento da
concentração desse polissacarídeo.
55
Figura 5. Curvas de escoamento a 25ºC das dispersões contendo A) 0,07, B) 0,10, C) 0,14 ou D) 0,21% (m/m)
de gelana HA preparadas através de agitação magnética em temperatura ambiente. “Sub1” = primeira curva de
subida; “desc” = curva de descida e “sub2” = segunda curva de subida.
Na Figura 6A é possível verificar como ocorreu o aumento de k frente ao aumento da
concentração de polissacarídeo. O melhor ajuste obtido para k (com maior valor de R²) foi o ajuste
exponencial. Quanto à redução nos valores de n não foi possível determinar se este ocorreu de modo
linear ou exponencial, dado que os valores de R² obtidos foram semelhantes (Figura 6B). Já em
relação à viscosidade aparente em taxa de cisalhamento de 100 s-1
, o aumento observado ocorreu de
forma linear (Figura 6C).
56
Tabela 5. Propriedades reológicas das dispersões contendo 0,07, 0,10, 0,14 ou 0,21% (m/m) de gelana HA a
25ºC.
HA (% m/m) Comportamento
reológico o (Pa) k (mPa.s
n) n R²
Viscosidade aparente
a 100 s-1
(mPa.s)
0,07 Pseudoplástico ---- 0,44 ± 0,05 0,45 ± 0,01 0,996 34,2 ± 2,20
0,1 Pseudoplástico ---- 0,99 ± 0,04 0,39 ±0,01 0,995 58,2 ± 1,06
0,14 Herschel-Bulkley 1,35 ± 0,13 1,47 ± 0,12 0,38 ± 0,01 0,996 100,4 ± 6,64
0,21 Herschel-Bulkley 2,66 ± 0,06 4,33 ± 0,05 0,29 ± 0,01 0,990 190,0 ± 1,00
Figura 6. Ajuste exponencial e linear das curvas representando o comportamento de k (A), n (B) e viscosidade
aparente a 100 s-1
(C) frente ao aumento da concentração de gelana.
Na Figura 7 estão apresentados os ensaios oscilatórios das dispersões de gelana HA. Na
menor concentração de polissacarídeo (0,07% m/m) os valores dos módulos elástico (G’) e viscoso
57
(G”) forma semelhantes. Acima dessa concentração, em geral, o módulo elástico (G’) foi maior que
o módulo viscoso (G”) ao longo da varredura de frequência. Conforme aumentou a concentração de
gelana HA houve maior diferença entre os valores de G’ e G”, e o módulo elástico se tornou menos
dependente da frequência. Esse resultado indica um comportamento de fluido estruturado com
caráter de gel das dispersões de gelana acilada.
Figura 7. Varredura de frequência das dispersões contendo A) 0,07, B) 0,10, C) 0,14 ou D) 0,21% (m/m) de
HAG a 25ºC. Módulo elástico (G’) representado pelos símbolos cheios e módulo viscoso (G”) representado
pelos símbolos vazios.
5.1.2 Propriedades das gelanas - efeito do processo de homogeneização
O efeito do processo usado para preparar as emulsões (passagem em rotor-estator e
tratamento em sonda de ultrassom) sobre as propriedades reológicas das dispersões aquosas de
gelana foi determinado (Figura 8). Diferenças entre as propriedades reológicas das gelanas LA e HA
na mesma concentração também foram apresentadas. A gelana HA apresentou um comportamento
pseudoplástico, enquanto a gelana LA comportou-se como um fluido Newtoniano. Além disso, os
valores de viscosidade aparente em 100 s-1
da gelana HA foram consideravelmente maiores do que
os valores mostrados pela gelana LA sob as mesmas condições (Figura 8B). Esta diferença é
principalmente atribuída a maior massa molar da gelana HA, ocupando maior volume que a gelana
58
LA. Outra característica responsável pela maior viscosidade da gelana HA é a maior repulsão
eletrostática existente entre suas cadeias, propriedade confirmada pelos maiores valores absolutos de
potencial zeta obtidos na análise desse polissacarídeo.
Figura 8. (A) Curvas de escoamento a 25º C das suspensões aquosas de gelana HA e LA na mesma
concentração preparadas através de diferentes condições. AM: dispersões preparadas através da agitação
magnética. RE: dispersões submetidas a uma passagem em rotor-estator (14.000 rpm/ 4 min). UT: dispersões
que passaram por tratamento em sonda de ultrassom. (B) Viscosidade aparente a 100 s-1
das suspensões
aquosas de gelana HA e LA na mesma concentração preparadas através de diferentes condições. Letras
diferentes representam diferença significativa (p < 0,05) entre valores da mesma coluna.
O cisalhamento promovido pelo rotor-estator não causou alterações significativas no
comportamento reológico das suspensões quando comparado com o processo de preparação mais
simples, utilizando somente a agitação magnética. O tratamento ultrassônico provocou alterações
consideráveis no comportamento das dispersões de gelana HA, a qual apresentou comportamento
pseudoplástico antes do ultrassom e comportamento de fluido Newtoniano após esse processo. A
viscosidade aparente da dispersão de gelana LA também diminuiu após o processo de ultrassom, mas
o efeito deste processo na dispersão foi menos intensa do que o observado para a gelana HA, em
concordância com os resultados apresentados por TAYLOR e colaboradores (2012).
Após o tratamento em ultrassom, a curva de escoamento da dispersão de gelana HA tornou-se
muito semelhante à curva de escoamento da dispersão de gelana LA na mesma concentração.
TAYLOR e colaboradores sugerem que a diminuição da viscosidade da gelana LA após o tratamento
ultrassônico pode ser relacionada com uma degradação parcial das cadeias em oligômeros. Por outro
lado, os resultados destes autores mostraram a ausência de degradação significativa das cadeias do
polímero em oligômeros no caso da gelana HA. A gelana HA apresentou picos nos
59
electroferogramas que foram atribuídos a presença de agregados/microgéis de gelana HA (não
mostrados pela gelana LA) que desapareceram após a sonicação. Isto significa que a redução mais
intensa da viscosidade para a gelana HA após o tratamento ultrassônico não é causada por uma
diminuição da massa molecular das cadeias de goma gelana, mas sim por um decréscimo da massa
molecular aparente ou dissolução dos agregados/microgéis de gelana HA (TAYLOR et al. , 2012).
De acordo com o fabricante (Kelco Biopolymers, San Diego, CA), a massa molecular da
gelana HA (1000-2000 kDa) é uma ordem de grandeza maior que a massa da gelana LA (200-300
kDa), como um resultado do processo de desacilação, que implica em diferentes valores de
concentração crítica (C*). Uma solução polimérica pode se encontrar em três diferentes regimes de
concentração: diluído, semi-diluído e concentrado. A diferença entre os regimes está relacionada às
interações das macromoléculas em solução. Polissacarídeos em solução tendem a adotar uma
conformação espiral aleatória que oscila continuamente devido ao movimento browniano. Em baixas
concentrações, numa solução diluída, as cadeias dos biopolímeros encontram-se separadas umas das
outras e se movem independentemente. Com o aumento da concentração, a solução pode entrar no
regime semi-diluído, sendo essa transição marcada pela concentração crítica de sobreposição (C*).
Acima de C*, no regime semi-diluído, as moléculas estão em contato e se interpenetram e começam a
ocorrer interações físicas entre elas. O aumento de concentração associado ao regime semi-diluído
resulta em contração das moléculas em solução. A transição do regime semi-diluído para o regime
concentrado ocorre na concentração crítica de agregação (C**
), em que as moléculas não podem mais
contrair e aumentos na concentração podem levar a formação de agregados (YING & CHU, 1987).
De acordo com JAMPEN e colaboradores (2000), a C* para gelana LA foi 0,064% m/v (a
25ºC), enquanto a gelana HA mostrou C* na faixa de 0,0219-0,0230%, em temperaturas variando
entre 5 a 30°C (HUANG et al., 2008). As concentrações utilizadas nas dispersões de gelana HA e
também nas emulsões estão acima da C* para todas as condições estudadas nesse trabalho.
Não temos os dados referentes aos valores de concentrações críticas de agregação (C**
) para
os diferentes tipos de gelana, porém, a nossa hipótese é a de que os emaranhamentos existentes no
regime concentrado foram os responsáveis pela formação dos agregados/microgéis observados por
TAYLOR et al. (2012). O tratamento em ultrassom pode causar o desenlace destas estruturas e
assim, diminuir a viscosidade das dispersões. Ou seja, mesmo em concentrações acima de C*, é
possível evitar a presença dos agregados através da aplicação do ultrassom. Porém, como não foi
feito um estudo ao longo do tempo, não se sabe se as moléculas podem voltar a se entrelaçar algum
tempo após a quebra promovida pelo ultrassom. Nos resultados que seguem nesse trabalho, a
60
presença destes microgéis/agregados de gelana HA mostrou-se importante para a obtenção de
emulsões estáveis cineticamente.
A influência da quebra de agregados, promovida através de tratamento em sonda de
ultrassom, também foi determinada no potencial zeta. A Tabela 6 apresenta o potencial zeta de
dispersões aquosas contendo gelana HA ou LA, bem como os respectivos valores de pH de cada
dispersão, antes do tratamento em ultrassom (agitação magnética) ou após o tratamento em
ultrassom. A gelana HA quando dispersa em água resulta em dispersões com valores de pH menores
do que os valores encontrados após a dispersão da gelana LA. Os valores absolutos de potencial zeta
das dispersões de gelana HA também são maiores que os apresentados pelas dispersões de LA em
todas as condições estudadas.
Tabela 6. Potencial zeta das dispersões de gelana HA e LA antes e após o tratamento em sonda de ultrassom
(UT) a 25ºC.
Concentração Processo pHHA pHLA Potencial zetaHA Potencial zetaLA FI*HA FI*LA
(% m/m) (mV) (mV) (mM) (mM)
0,014 antes UT 5,54 ± 0,04 5,80 ± 0,05 -61,68 ± 5,30A -41,61 ± 5,49A 0,24 0,26
0,014 após UT 5,64 ± 0,03 5,63 ± 0,09 -55,03 ± 0,89AD -40,48 ± 5,26AB
0,028 antes UT 5,44 ± 0,02 5,72 ± 0,01 -77,27 ± 2,65B -39,03 ± 5,39AB 0,49 0,52
0,028 após UT 5,44 ± 0,04 5,55 ± 0,06 -52,65 ± 0,81DE -41,78 ± 3,5AB
0,07 antes UT 5,21 ± 0,04 5,58 ± 0,02 -85,35 ± 9,18C -35,56 ± 4,42B 1,22 1,30
0,07 após UT 5,35 ± 0,04 5,54 ± 0,02 -46,02 ± 1,37E -41,27 ± 1,67 AB
Letras diferentes indicam diferença significativa (p < 0,05) entre os valores da mesma coluna. * FI: força iônica,
calculada como a metade da soma da concentração de cada íon multiplicada pelo quadrado da carga. A concentração de
íons foi obtida usando a quantidade de íons presente nas gelanas em pó (seção 4.1) e a concentração de gelana usada para
preparar a dispersão.
Os valores de potencial zeta das dispersões de gelana HA se mostraram dependentes da
concentração de polissacarídeo e da aplicação de tratamento ultrassônico. Houve aumento dos
valores absolutos de potencial zeta com o aumento da concentração de gelana HA. A concentração
de polissacarídeo pode ser considerada como um fator importante nas medidas de potencial zeta, e
são comumente associadas à ocorrência de agregação das cadeias, alterando a disposição das cargas
superficiais (CARNEIRO-DA-CUNHA et. al., 2011). Após o tratamento ultrassônico foi observada a
61
redução dos valores absolutos de potencial zeta, e estes apresentaram ligeira diminuição com o
aumento da concentração. Este resultado também pode ser associado às alterações na disposição dos
resíduos aniônicos dos agregados de gelana HA após a quebra promovida pelo ultrassom. Por outro
lado, as dispersões de gelana LA apresentaram valores de potencial zeta muito similares,
independente da concentração de polissacarídeo ou aplicação de tratamento ultrassônico. É provável
que nas concentrações estudadas a gelana LA ainda esteja abaixo da concentração em que há
possibilidade de agregação desse polissacarídeo.
5.1.3 Propriedades das gelanas - efeito do tratamento térmico
A Figura 9 apresenta o efeito do tratamento térmico no perfil de escoamento das dispersões
de gelana LA e HA. O tratamento térmico não apresentou efeito significativo nas curvas de
escoamento de ambas gelanas.
Figura 9. Efeito do tratamento térmico (TT) nas curvas de escoamento (A) e nos valores de viscosidade
aparente e potencial zeta (B) das dispersões de gelana HA e LA.
A Figura 9B apresenta também o efeito do tratamento térmico nos valores de potencial zeta
das dispersões. Também não houve diferença significativa nos valores de potencial zeta antes e após
o TT. Foi possível observar que a gelana HA apresenta valor absoluto de potencial zeta superior ao
da gelana LA como mencionado anteriormente. Assim, a alta viscosidade apresentada pela gelana
acilada em comparação à gelana desacilada pode ser atribuída a sua maior massa molecular e
também à maior repulsão eletrostática existente entre as suas cadeias.
62
5.1.4 Propriedades das gelanas - efeito da força iônica
A Figura 10 apresenta o efeito da adição de diferentes concentrações de KCl na distribuição
de tamanho de partículas e no potencial zeta dos agregados de gelana HA presentes nas dispersões
aquosas (0,14% m/m de gelana HA). O efeito do tratamento ultrassônico nessas dispersões também
foi determinado. As concentrações de KCl avaliadas (0, 3, 12, 30 e 300 mM) foram escolhidas
através da análise de resultados anteriores, e representam concentrações em que foram observadas
alterações significativas nas propriedades das emulsões.
Nas dispersões sem tratamento ultrassônico, o deslocamento da curva de distribuição de
tamanho de partículas mostrou que os agregados possuem a tendência a aumentar de tamanho
conforme se aumenta a concentração de KCl na dispersão, confirmando que a adição de KCl
promove agregação. A partir da concentração de 30 mM aumentos mais significativos foram
observados. Quanto ao potencial zeta, foi possível observar a redução do valor absoluto do potencial
zeta através da adição de KCl, porém não houve diferença significativa no potencial zeta das
dispersões contendo 3, 12 ou 30 mM de KCl. Não foi possível mensurar o potencial zeta das
dispersões contendo 300 mM de KCl (com ou sem tratamento ultrassônico) devido a limitações do
equipamento utilizado em relação a força iônica das soluções. Antes do tratamento ultrassônico, as
soluções contendo 12, 30 e 300 mM de KCl apresentaram precipitação.
Já as dispersões que passaram pelo tratamento ultrassônico se apresentaram homogêneas, sem
precipitação, com exceção da dispersão contendo 300 mM. Também foi possível observar que estas
apresentaram curvas de distribuição de tamanho de partícula muito similares, independente da
concentração de KCl presente, mostrando que a quebra de agregados promovida por esse tratamento
é mais intensa que a agregação promovida pela adição de KCl. Na Figura 10B é possível observar
que após o tratamento em ultrassom as curvas de distribuição de tamanhos mostraram
comportamento multimodal (bimodal na maioria das amostras). A exceção foi a dispersão que
continha 300 mM de KCl, que continuou apresentando comportamento monomodal e a presença de
grandes agregados mesmo após a passagem em ultrassom. Quanto ao potencial zeta, foi possível
observar a redução gradual do valor absoluto conforme aumentava a concentração de KCl presente,
mostrando o efeito da homogeneização prévia em ultrassom e do tamanho dos agregados na carga
superficial.
63
Figura 10. A) Distribuição de tamanho de partículas e potencial zeta das dispersões de gelana HA antes do
tratamento em ultrassom. B) Distribuição de tamanho de partículas e potencial zeta das dispersões de gelana
HA após o tratamento em ultrassom. O potencial zeta foi medido em diluições contendo 0,014% (m/m) de
gelana.
A Figura 11 e Tabela 7 representam a influência da adição de KCl no comportamento
reológico das suspensões de gelana HA preparadas sob agitação magnética. Na suspensão com
menor concentração de gelana (0,035% m/m) a adição de KCl na força iônica de 3 mM não alterou
significativamente a curva de escoamento e os parâmetros reológicos da suspensão. Por outro lado, a
adição de 30 mM causou grande alteração do comportamento reológico, pois a suspensão passou do
comportamento pseudoplástico para Newtoniano e houve uma queda brusca na viscosidade aparente.
Na suspensão com maior quantidade de gelana (0,14% m/m) a adição de KCl mesmo na menor força
iônica (3 mM) já foi capaz de alterar o comportamento reológico, reduzindo o índice de consistência
(k) e a viscosidade aparente e aumentando o índice de comportamento. Com o aumento da força
iônica essas alterações se tornaram mais acentuadas e o fluido deixou de possuir tensão residual
(passando do comportamento HB para comportamento pseudoplástico).
64
Figura 11. Curvas de escoamento das suspensões contendo gelana acilada e KCl. A) 0,035% e B) 0,14%
(m/m) de gelana HA.
Tabela 7. Parâmetros reológicos das suspensões com gelana acilada e KCl.
Gelana (% m/m) Força iônica (mM) Comportamento o (Pa)
k (Pa.sn) ou
(Pa.s) n R²
Viscosidade a 100 s-1
(mPa.s)
0,035 0 Pseudoplástico --- 0,053 0,57 0,999 7,28
0,035 3 Pseudoplástico --- 0,045 0,60 0,999 7,17
0,035 30 Newtoniano --- 0,002 1,0 0,994 1,78
0,14 0 Herschel-Bulkley 0,82 1,753 0,28 0,999 72,47
0,14 3 Herschel-Bulkley 0,71 0,802 0,37 0,997 50,65
0,14 30 Pseudoplástico --- 0,061 0,60 0,999 9,54
Assim, é possível concluir que até a força iônica de 3 mM as alterações são pequenas nas
suspensões de gelana HA, e consequentemente na fase aquosa que foi utilizada para preparar as
emulsões. A adição de sal com força iônica 10 vezes maior provocou grandes alterações, com o
aumento dos agregados e redução da viscosidade. A adição de cátions como sódio e potássio reduz o
intumescimento da gelana HA (KANG et al., 1982; O’NEIL et al., 1983; JANSSON et al., 1983),
provocando encolhimento nas cadeias, o que poderia explicar a queda de viscosidade observada.
Além disso, esses cátions podem promover certa neutralização das cargas negativas favorecendo a
formação de agregados e reduzindo a interação com a água e formação de rede. A existência de
maiores agregados também favorece a redução da viscosidade.
5.1.5 Propriedades das gelanas – tensão interfacial
A Tabela 8 mostra a tensão interfacial entre as dispersões aquosas de gelana e óleo de
girassol. O teor de nitrogênio apresentada pelo gelana HA (1,75 ± 0,14% m/m) é consideravelmente
65
maior que o teor de nitrogênio apresentado pela gelana LA (0,32 ± 0,02% m/m). Esse valor
corresponde a, aproximadamente, 11% (m/m) de proteína da massa seca de gelana HA, ou um
conteúdo máximo de 0,022% (m/m) de proteína nas emulsões preparadas nesse trabalho. No entanto,
os resultados de tensão interfacial indicaram que a adição de gelana HA, bem como de gelana LA,
não causam redução significativa na tensão entre água-óleo, dado que os valores de tensão
apresentados na Tabela 8 não apresentaram diferença significativa entre si.
Tabela 8. Tensão interfacial (fase aquosa-óleo de girassol) a 25ºC.
Polissacarídeo Concentração (% m/m) Tensão interfacial (mN/m)
---- (controle) 0 20,3 ± 1,0A
Gelana HA 0,025 22,5 ± 0,6A
Gelana LA 0,025 21,1 ± 1,0A
Letras diferentes indicam diferença significativa (p < 0,05) entre os valores da mesma coluna.
O efeito da adição de cloreto de potássio na tensão interfacial das dispersões aquosas de
gelana HA também foi determinado. Na Figura 12A encontra-se o efeito do sal na densidade das
dispersões, pois conhecer os valores de densidade das dispersões é necessário para a determinação da
tensão interfacial. Foi possível verificar ligeiro aumento nos valores de densidade conforme se
aumentou a concentração de sal adicionada e também que a dependência da densidade em relação ao
conteúdo salino se dá de forma linear. Já na Figura 12B estão apresentados os valores de tensão
interfacial das dispersões. Foi possível determinar a tensão somente em dispersões contendo baixa
concentração de KCl, pois efeitos de turbidez e precipitação inviabilizaram a medida. Assim, foi
possível verificar que baixas concentrações de KCl não alteram significativamente os valores de
tensão interfacial.
66
Figura 12. A) Densidade e B) Tensão interfacial das dispersões aquosas de gelana HA (0,025% m/m) em
função da quantidade de KCl adicionada.
Assim, é possível concluir que, mesmo contendo resíduos de proteína, a gelana HA não
causou redução da tensão interfacial das gotas de óleo das emulsões. Os resultados sugerem que a
gelana é um polissacarídeo com ausência de atividade superficial, excluindo a possibilidade de esse
polissacarídeo estar atuando através da redução da tensão interfacial das gotas nas emulsões
estudadas.
68
5.2 Emulsões contendo gelana
5.2.1 Emulsões com gelana desacilada (LA)
A Figura 13 apresenta o perfil de separação de fases após 7 dias das emulsões contendo
gelana LA. A separação de fases foi visualizada em todas as concentrações avaliadas, e foi muito
similar em todas as amostras. Como a emulsão continha inicialmente 30% (m/m) de óleo, é possível
verificar uma separação de fases quase total. Assim, esse polissacarídeo pode ser considerado pouco
eficiente na estabilização de emulsões, dado o alto índice de cremeação alcançado e a posterior
separação de uma fase superior de óleo após períodos mais longos. Assim, dada a ineficiência desse
polissacarídeo na estabilização das emulsões, optou-se por não realizar estudos mais aprofundados
desse estabilizante. Como se observará na próxima seção (5.3.2), os resultados dos sistemas
contendo a gelana HA foram mais promissores, portanto, foram investigados com maior
profundidade.
Figura 13. Perfil de separação de fases das emulsões contendo gelana desacilada (LA).
Nos resultados anteriores foi observado que a gelana LA apresentava viscosidade muito
reduzida em comparação à gelana HA nas baixas concentrações utilizadas. O potencial zeta
apresentado pela gelana LA também foi menor que o potencial zeta obtido para a gelana HA. Outra
diferença importante foi a ausência de agregados/microgéis nas dispersões de gelana LA, como
demostrou TAYLOR e colaboradores (2012). Todas as características citadas podem estar
relacionadas à ineficiência desse polissacarídeo na estabilização das emulsões nas condições
estudadas.
0
20
40
60
80
100
0,025 0,050 0,075 0,100 0,125 0,150 0,200
Vo
lum
e (
ml)
Gelana LA (% m/m)
Óleo livre Fase creme ou emulsão Fase soro
69
5.2.2 Emulsões com gelana acilada (HA) – Rotor-estator ou Homogeneização
As propriedades das emulsões contendo gelana HA (0,025 a 0,2% m/m) e óleo de girassol
(30% m/m) sem adição de sais preparadas utilizando somente rotor-estator ou rotor-estator seguido
de homogeneização a 300 bar foram comparadas. A Figura 14 apresenta o volume das fases
separadas das emulsões, que permite verificar que, independente da utilização da homogeneização a
alta pressão, as emulsões com concentração de gelana a partir de 0,05% (m/m) foram estáveis à
separação macroscópica de fases. A separação de óleo livre só ocorreu quando foram utilizadas as
menores concentrações de gelana (0,01% e 0,025% m/m) em amostras preparadas apenas com rotor-
estator.
Figura 14. Perfil de separação de fases após 7 dias das emulsões contendo gelana HA preparadas utilizando
(A) Rotor-estator ou (B) Rotor-estator seguido de homogeneização a 300 bar.
HUANG e colaboradores (2001) estudaram a estabilidade de emulsões preparadas utilizando
apenas polissacarídeos como estabilizantes. Entre os hidrocolóides estudados (goma feno-grego,
alginato, metilcelulose, xantana, goma de aveia, guar, goma arábica, pectina, goma de linhaça e
jataí), apenas a goma feno-grego e a xantana não mostraram qualquer separação de fases após 1 dia
de armazenamento em sistemas contendo 40% (m/m) de óleo de canola e 0,5% (m/m) de
polissacarídeo. As emulsões contendo 0,025% ou 0,1% (m/m) de gelana HA preparadas utilizando
apenas um passo em rotor-estator também foram avaliadas durante 60 dias de armazenamento a
temperatura ambiente (Figura 15). A emulsão com 0,025% de gelana HA não foi estável à separação
de fases e mostrou coalescência das gotas após 30 dias de armazenamento. Consequentemente, foi
observada uma maior quantidade de óleo livre após dois meses de armazenamento. Por outro lado, a
emulsão que continha 0,1% de gelana HA permaneceu estável à separação de fases após dois meses
de armazenamento. Embora os valores de D43 tenham aumentado ligeiramente, não houve diferença
70
estatisticamente significativa entre os valores observados, mostrando que a coalescência das gotas
durante esse período também não foi significativa para a amostra contendo 0,1% (m/m) de gelana.
Figura 15. Estabilidade por tempo prolongado das emulsões com gelana HA preparadas em rotor-estator. A)
Perfil de separação de fases e B) Valores de D43 após 1, 30 ou 60 dias de armazenamento a temperatura
ambiente. Letras diferentes significam diferença significativa entre valores da mesma coluna (p < 0,05).
Os valores de potencial zeta das emulsões preparadas utilizando rotor-estator seguido de
homogeneização a alta pressão (300 bar) estão apresentados na Tabela 9. As emulsões apresentaram
valores de potencial zeta variando entre -50 até -59 mV. Estes valores de potencial zeta podem estar
contribuindo para a estabilidade das emulsões, uma vez que elevados valores de potencial zeta
evitam a agregação das gotas presentes na emulsão e aumentam a estabilidade por meio da repulsão
eletrostática. A agregação das gotas é, na maior parte dos casos, indesejável em emulsões
alimentícias, porque pode levar a um aumento da viscosidade da emulsão e uma diminuição na
estabilidade à cremeação (MCCLEMENTS & WEISS, 2004).
71
Tabela 9. Potencial zeta das emulsões preparadas com homogeneização (300 bar).
Gelana (% m/m) Potencial zeta (mV)*
0,05 -50,9 ± 1,27A
0,075 -59,8 ± 0,49B
0,1 -59,0 ± 3,08B
0,125 -55,8 ± 2,28B
0,15 -58,5 ± 0,94B
0,2 -58,6 ± 0,66B
*Letras diferentes significam diferença significativa entre valores da mesma coluna (p < 0,05).
As Figuras 16 e 18 mostram a microestrutura das emulsões preparadas com rotor-estator ou
com rotor-estator seguido por homogeneização a alta pressão, respectivamente. Já as Figuras 17 e 19
apresentam a distribuição do tamanho de partículas, os tamanhos médios e span das mesmas. A
Figura 16A mostra uma emulsão em processo de coalescência, mas não foram observadas diferenças
significativas entre as distribuições de tamanho das gotas obtidas em 1 ou 7 dias após o preparo da
emulsão (com concentração de gelana HA de 0,05% m/m). Portanto, o comportamento observado na
Figura 16A pode ter sido induzido pela perturbação causada na emulsão durante o recobrimento da
amostra com lamínulas de vidro, procedimento necessário para a realização da microscopia. Este
comportamento foi observado apenas nesta emulsão devido à combinação do pequeno teor de
estabilizante e condições brandas no processamento (somente passagem no rotor-estator) resultando
em uma emulsão mais susceptível a processos de desestabilização.
72
Figura 16. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões preparadas usando rotor-estator
contendo: A) 0,05%, B) 0,075%, C) 0,10%, D) 0,125%, E) 0,15% ou F) 0,20% (m/m) de gelana HA (Barra:
200 m).
Em geral, nas emulsões preparadas com rotor-estator, foi possível observar as partículas
recobrindo as gotas de óleo de forma parcial até a concentração de 0,1% (m/m) de gelana HA
(principalmente nas Figuras 16B e 16C). Acima dessa concentração, o aspecto da superfície das
gotas de óleo se altera, e não é mais possível visualizar as partículas, talvez por haver um
recobrimento completo e denso, tornando as gotas totalmente opacas à passagem de luz. A redução e
73
homogeneização dos sistemas provocados pelo uso do homogeneizador a altas pressões podem ser
vistas nas microscopias da Figura 18A-F.
Figura 17. Distribuição de tamanho de partículas, diâmetro médio (D43, D32 e D50%) e span das emulsões
preparadas usando rotor-estator contendo: 0,05%, 0,075%, 0,10%, 0,125%, 0,15% ou 0,20% (m/m) de gelana
HA. Letras diferentes significam diferença significativa entre valores da mesma coluna (p < 0,05).
Todas as curvas de distribuição de tamanho de partículas das emulsões mostraram mais de
um pico (Figura 17 e Figura 19). Após a homogeneização a alta pressão as emulsões mostraram
comportamento bimodal mais evidente. De fato, na microestrutura desses sistemas é possível
identificar duas classes de tamanho de gotas nas emulsões. HUANG e colaboradores (2001)
estudaram emulsões estabilizadas exclusivamente por polissacarídeos (tais como goma de feno-
grego, metilcelulose, goma de linhaça, goma guar, xantana e outros) e eles também observaram
distribuições bimodais para todas as emulsões estudadas. Apesar das diferenças na concentração e na
preparação, as emulsões com gelana HA mostraram distribuições de tamanho semelhante às obtidas
com metilcelulose e goma xantana, com 10-20% de partículas na faixa de diâmetro de 0-3,5 m e
80-90% de partículas na faixa de diâmetro de 3,5- 80 m, dependendo da concentração de gelana
utilizada. Em relação à largura das distribuições, representada pelos valores de span, foi possível
74
observar que, nas emulsões preparadas apenas com rotor-estator, houve a diminuição nos valores de
span conforme a concentração de gelana HA aumentou até 0,125% (m/m). Nas emulsões preparadas
com homogeneizador, os valores de span foram similares independentemente da quantidade de
gelana no sistema.
Figura 18. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões preparadas usando rotor-estator seguido
de homogeneização a 300 bar contendo: A) 0,05%, B) 0,075%, C) 0,10%, D) 0,125%, E) 0,15% ou F) 0,20%
(m/m) de gelana HA (Barra: 200 m).
75
De forma geral, o uso da homogeneização a alta pressão reduziu o diâmetro médio das gotas
das emulsões pela metade. Emulsões preparadas apenas com rotor-estator apresentaram tamanhos
médios (D43 e D50%) entre 40 a 50 m, enquanto que as emulsões submetidas à homogeneização a
alta pressão mostraram tamanhos médios entre 17 e 27 m.
Figura 19. Distribuição de tamanho de partículas, diâmetro médio (D43, D32 e D50%) e span das emulsões
preparadas usando rotor-estator seguido de homogeneização a 300 bar contendo: 0,05%, 0,075%, 0,10%,
0,125%, 0,15% ou 0,20% (m/m) de gelana HA. Letras diferentes significam diferença significativa entre
valores da mesma coluna (p < 0,05).
Foi possível observar uma ligeira tendência de deslocamento da curva de distribuição de
tamanho em direção a menores tamanhos de gotas com o aumento da concentração de gelana até
0,1% (m/m), independentemente do processo utilizado na preparação das emulsões. Emulsões com
teor de gelana superior a 0,1% (m/m) mostraram distribuição de tamanho de partículas e
microestrutura semelhantes. Isso indica que esta concentração (0,1% m/m) foi suficiente para
estabilizar essas emulsões contendo 30% (m/m) de fase oleosa e a adição de maiores teores de
polissacarídeo não causaram quaisquer alterações na distribuição de tamanhos obtida. Este
comportamento pode ser observado mais claramente nas emulsões submetidas à homogeneização a
alta pressão. Portanto, o tamanho das gotas foi dependente da quantidade de gelana (até 0,1% m/m) e
76
também foi determinado pela quantidade de energia envolvida no processo utilizado para a
preparação das emulsões.
As Figuras 20 e 21 apresentam o comportamento reológico das emulsões que se mantiveram
estáveis. Todas as emulsões apresentaram comportamento pseudoplástico, exceto as emulsões com
maior quantidade de gelana (0,2% m/m), que mostraram um comportamento de fluido Herschel-
Bulkley (comportamento pseudoplástico com tensão residual). O comportamento de fluido
pseudoplástico, caracterizado pela redução da viscosidade aparente com o aumento da taxa de
deformação aplicada, é o comportamento mais comum para a maioria das emulsões alimentícias.
Neste caso, a pseudoplasticidade pode ocorrer por uma variedade de razões como, por exemplo, a
alteração da distribuição espacial devido à aplicação de cisalhamento, alinhamento de gotas não
esféricas, remoção de moléculas de solventes ligados às gotas, ou deformação e rompimento de
flocos (HUNTER, 1993).
77
Figura 20. A) Curvas de escoamento das emulsões preparadas somente com rotor-estator. B) Curvas de
escoamento das emulsões preparadas com rotor-estator seguido de homogeneização a 300 bar. O
comportamento reológico das amostras foi indicado por “PP” para comportamento de fluido pseudoplástico
ou “HB” para comportamento do tipo Herschel-Bulkley.
Na Figura 21 é possível observar que o aumento do teor de gelana levou a um aumento no
índice de consistência e viscosidade aparente das emulsões, mas uma diminuição do índice de
comportamento ou aumento da pseudoplasticidade. Também na Figura 21 é possível observar os
valores de viscosidade aparente em duas diferentes taxas de cisalhamento (3 ou 100 s-1
). A
78
viscosidade aumenta de forma quase linear com o aumento da concentração de gelana HA na
emulsão.
Figura 21. Propriedades reológicas das emulsões preparadas somente com rotor-estator ou rotor-estator
seguido de homogeneização a 300 bar (Homog). A) Índice de comportamento. B) Índice de consistência. C)
Viscosidade a 100 s-1
. D) Viscosidade a 3 s-1
.
Quanto ao processo utilizado, a mesma tendência pode ser observada em ambas as taxas de
deformação, com menores valores de viscosidade após a passagem no homogeneizador. A passagem
no homogeneizador causou uma redução no tamanho médio das gotas, assim considerando que o
volume das gotas foi mantido, a homogeneização resultou em emulsão com maior número de gotas
de tamanho menor. Uma quantidade maior de gotas menores na emulsão tende a aumentar a
viscosidade da mesma, pois há aumento na interação entre as gotas. Porém, foi possível observar que
a polidispersão das gotas se tornou muito maior após a passagem no homogeneizador, explicando a
redução de viscosidade observada. Quando a polidispersão é maior, as gotas se encaixam melhor, e
esse empacotamento gera espaço livre e facilita o escoamento, reduzindo a viscosidade (BARNES,
1994).
79
Os resultados relacionados ao tamanho de gotas mostraram que, acima de 0,1% (m/m) de
gelana, a maioria das emulsões estudadas apresentaram curvas de distribuição de tamanho similares.
Contudo, os dados reológicos mostraram que o índice de consistência e a viscosidade aparente
aumentam conforme aumenta a concentração de gelana presente. Assim, as propriedades reológicas
das emulsões foram mais dependentes do teor de gelana na fase contínua do que do tamanho de
gotas. A viscosidade da fase contínua pode ser apontada como um dos mecanismos de estabilização
que atuam sobre as emulsões com gelana HA. Algumas experiências foram feitas usando as
dispersões de gelana HA após o tratamento ultrassônico, que reduziu intensamente a viscosidade da
dispersão (tal como demonstrado na seção 5.2.2), com o intuito de explicitar o papel da viscosidade
da fase contínua nas emulsões, bem como determinar o efeito do tratamento ultrassônico nas
mesmas. Nesse experimento quatro emulsões com a mesma composição, mas preparadas por
diferentes vias foram avaliadas.
As Figuras 22 e 23 mostram algumas características dessas emulsões. A Emulsão 1 (ou
controle), 2 e 3 foram preparadas através da mistura das dispersões de gelana HA com óleo usando
rotor-estator, porém as dispersões de polissacarídeo foram preparadas da seguinte forma: somente
agitação magnética (Emulsão 1); agitação magnética seguida de um passo em rotor-estator (Emulsão
2) e agitação magnética seguida de tratamento ultrassônico (Emulsão 3).
80
Figura 22. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões contendo 0,1% (m/m) de gelana HA e
30% (m/m) de óleo de girassol preparadas como descrito anteriormente (seção 4.4.3): (A) Emulsão 1 (E1), (B)
Emulsão 2 (E2), (C) Emulsão 3 (E3), (D) Fase creme inferior da Emulsão 4 (E4) e (E) Fase creme superior da
Emulsão 4 (barra = 200 m). (F) Perfil de separação de fases.
81
Figura 23. A) Curvas de escoamento, B) Distribuição de tamanho das gotas e C) span e diâmetros médios das
emulsões contendo 0,1% (m/m) de gelana HA e 30% (m/m) de óleo de girassol preparadas como descrito
anteriormente (seção 4.4.3): E1, E2, E3 e E4.
Foi possível observar que as Emulsões 1 e 2 apresentaram propriedades muito similares
(Figuras 22 e 23), sendo possível concluir que o tratamento adicional em rotor-estator não causou
alterações significativas nas emulsões. Por outro lado, a Emulsão 3, que foi preparada com a
dispersão de gelana HA de baixa viscosidade (pós tratamento ultrassônico) mostrou um
82
comportamento bastante diferente. Essa emulsão apresentou separação de fases com presença de
óleo livre, e sua fase creme era composta por grandes gotas de óleo. Esse resultado mostrou que a
alta viscosidade da dispersão de gelana HA é um fator crítico na obtenção de emulsões estáveis.
A Emulsão 4, que foi preparada através de uma pré-mistura em rotor-estator seguida por
tratamento ultrassônico, apresentou duas fases esbranquiçadas, uma fase creme superior e uma fase
creme inferior. A fase creme superior mostrou a presença de grandes gotas de óleo e seu
comportamento reológico foi similar ao da fase creme da Emulsão 3. Já a fase creme inferior era
composta por gotas de óleo menores e sua curva de escoamento apresentou comportamento
Newtoniano. Ou seja, continha pequenas gotas de óleo estabilizadas e suspensas em um meio
contínuo de baixa viscosidade. Assim, é possível supor que a alta viscosidade e comportamento
elástico do meio contínuo não são os únicos mecanismos de estabilização presente nessas emulsões.
A Tabela 8 da seção 5.1.5 apresentou a tensão interfacial entre a fase oleosa e as dispersões
aquosas de gelana. O teor de nitrogênio da gelana HA (1,75 ± 0,14% m/m) é consideravelmente
maior que o teor de nitrogênio presente na gelana LA (0,32 ± 0,02% m/m). Devido a isso, esperava-
se que a gelana HA poderia ter alguma atividade na interface. Seu teor de nitrogênio corresponde a
11% (m/m) de proteína no polissacarídeo em pó, aproximadamente, ou a um conteúdo de proteína
máximo de 0,022% (m/m) nas emulsões preparadas. No entanto, os resultados de tensão interfacial
indicaram que a gelana HA não alterou significativamente a tensão entre óleo-água, o que sugere que
uma redução da tensão interfacial não teve lugar durante a formação das emulsões de gelana HA.
Assim, o mecanismo de estabilização relacionado à redução da tensão interfacial entre óleo e água
não será considerado dentro dos mecanismos de estabilização que provavelmente estão atuando nas
emulsões estabilizadas por gelana HA.
A estabilização do tipo Pickering, no qual a deposição de partículas na interface óleo-água
forma uma barreira física contra a coalescência das gotas, ocorre com partículas que podem ser
parcialmente molháveis tanto pela fase polar quanto pela fase apolar (BINKS, 2002; DICKINSON,
2012; CHEVALIER & BOLZINGER, 2013). A gelana é reconhecida como um polissacarídeo
predominantemente hidrofílico, mas a gelana HA apresenta certa insolubilidade em água. Assim, é
possível supor que, além da viscosidade do meio contínuo, o mecanismo de estabilização do tipo
Pickering também pode estar ocorrendo nas emulsões apresentadas. Outros estudos têm demonstrado
a capacidade de alguns biopolímeros de estabilizar emulsões através de uma combinação de
diferentes mecanismos, exemplos que podem ser citados são emulsões estabilizadas por celulose e
quitina, em que a estabilização Pickering e a presença de uma rede na fase contínua foram os
83
mecanismos apontados como responsáveis pela estabilização dessas emulsões (TZOUMAKI et al.,
2011;. JIA et al., 2015).
Resumindo, a gelana HA parece se auto-organizar em microgéis/agregados nas dispersões
aquosas. A presença de microgéis/agregados de gelana HA exerce um intenso efeito sobre o
comportamento reológico da dispersão desse polissacarídeo. A quebra desses agregados através do
tratamento ultrassônico pode diminuir a viscosidade da dispersão e, consequentemente, alterar as
propriedades da emulsão preparada com esta fase aquosa. Por conseguinte, a alta viscosidade do
meio contínuo parece ser um fator importante na estabilização de emulsões realizada pela gelana
HA. As dispersões de gelana HA também mostraram G' > G", mesmo a baixas concentrações de
polissacarídeo, indicando a presença de uma rede de gel na fase contínua das emulsões, que pode
auxiliar na estabilidade dos sistemas. A alta repulsão eletrostática exibida pelas gotas (confirmada
através dos resultados de potencial zeta) também pode estar contribuindo para a estabilidade das
emulsões de gelana HA. No entanto, pode ser visto que a gelana HA também foi capaz de estabilizar
pequenas gotas de óleo em um meio de baixa viscosidade. Uma vez que este polissacarídeo não
apresentou propriedades tensoativas, pode-se supor que a deposição de microgéis/agregados de
gelana na interface óleo-água pode estar ocorrendo, ou seja, é possível que o mecanismo de
estabilização do tipo Pickering também tenha contribuído para a estabilização dos sistemas
avaliados.
Independente do processo utilizado e do mecanismo responsável pela estabilização das
emulsões, é importante ressaltar as baixas concentrações de polissacarídeo utilizadas e seu potencial
uso como estabilizante/emulsificante. A gelana HA é de uso GRAS para alimentos e, portanto,
constitui-se como uma interessante opção na estabilização de emulsões, especialmente considerando
o atual interesse em alguns segmentos em reduzir a utilização de derivados de origem animal em
produtos alimentícios.
85
5.3. Efeito da força iônica em emulsões com gelana HA
5.3.1 Efeito da adição de KCl, CaCl2 ou FeCl3 nas emulsões com gelana HA
O efeito da adição de diferentes sais (KCl, CaCl2 e FeCl3) nas emulsões contendo gelana HA
também foi determinado. Como as cadeias de gelana possuem carga negativa, considerou-se
importante avaliar a influência da valência do cátion presente no sal mantendo-se o valor de força
iônica do sistema. Duas diferentes concentrações de gelana foram escolhidas para este estudo, uma
concentração que originalmente apresentava separação de fases (0,025% m/m – HA0,025%) e outra
concentração que gerava emulsão estável à separação de fases (0,1% m/m – HA0,1%). A morfologia
das emulsões pode ser vista nas Figuras 24-26. As microscopias foram realizadas nas emulsões ou na
fase creme nos casos em que houve separação de fases.
Nas emulsões com adição de KCl (Figura 24) foi possível observar que somente na amostra
com menor concentração de gelana (0,025% m/m) e maior força iônica (30 mM) não houve
formação de emulsão. Nas amostras com concentração de gelana de 0,1% m/m foi possível observar
que a adição de KCl até a força iônica de 3 mM quase não altera a morfologia das emulsões. Porém
na maior força iônica (30 mM – Figura 24.2D) ocorre um aumento considerável no tamanho das
gotas e a superfície destas apresenta um aspecto bastante distinto com partículas visíveis na interface.
Nas análises posteriores será visto que a viscosidade dessa emulsão é bastante reduzida, o que dá
indícios de que a viscosidade não possui papel relevante na estabilização da emulsão em questão.
Assim, há uma possibilidade de que o mecanismo de estabilização por partículas sólidas (emulsão
Pickering) esteja predominando nessas condições.
Já nas emulsões com adição de CaCl2 (Figura 25) também foi possível observar que na
amostra com menor concentração de gelana (0,025% m/m) e maior força iônica (30 mM) não houve
formação de emulsão. Em geral, as morfologias foram bem parecidas às observadas nas emulsões
com KCl, porém na emulsão com 0,1% m/m de gelana e 30 mM de CaCl2 (Figura 25.2D) a emulsão
formada é bastante instável e em 3 mM já se observa um aumento no tamanho de gota quando
comparada a valores inferiores de força iônica.
Em relação às emulsões com adição de cloreto de ferro (Figura 26) foi possível observar que
na concentração de gelana de 0,025% m/m (Figura 26.1) emulsões bastante instáveis foram formadas
e foi considerado que não houve formação de emulsão nas amostras com força iônica de 3 e 30 mM.
Nas amostras com 0,1% m/m de gelana somente na maior força iônica não houve formação de
emulsão, e nesse caso foi possível observar a presença de estruturas rígidas com aspecto
cristalizado/gelificado.
86
Figura 24. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões contendo 1) 0,025% ou 2) 0,1% (m/m)
de gelana HA com adição de KCl nas forças iônicas de A) 0,03, B) 0,3, C) 3 e D) 30 mM. Barra: 200 m.
87
Figura 25. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões contendo 1) 0,025% ou 2) 0,1% (m/m)
de gelana HA com adição de CaCl2 nas forças iônicas de A) 0,03, B) 0,3, C) 3 e D) 30 mM. Barra: 200 m.
88
Figura 26. Micrografias obtidas por microscopia óptica das emulsões contendo 1) 0,025% ou 2) 0,1% (m/m)
de gelana HA com adição de FeCl3 nas forças iônicas de A) 0,03, B) 0,3, C) 3 e D) 30 mM. Barra: 200 m.
89
A Figura 27 apresenta os resultados de separação de fases das emulsões com adição de sal,
avaliadas 7 dias após o preparo. Foi possível observar que, sob a mesma força iônica, diferentes
resultados de separação de fases foram obtidos dependendo do sal utilizado. É possível observar, de
forma geral, um aumento na quantidade de soro separado conforme se aumenta a valência do cátion
presente no sal. As emulsões contendo cátion trivalente (FeCl3) foram as que apresentaram maiores
índices de separação de fases. Na menor concentração de gelana (0,025% m/m) a adição do cloreto
de ferro levou à formação de emulsões muito instáveis, sendo que em alguns casos (na força iônica
de 3 ou 30 mM) considerou-se que não houve formação de emulsão.
A adição de determinadas concentrações de KCl e CaCl2 à emulsão com menor concentração
de gelana (HA0,025%) possibilitou a redução da quantidade de soro separado em comparação com a
emulsão sem adição de sal. Importante notar que o KCl na força iônica de 3 mM resultou em uma
emulsão estável à separação de fases. A emulsão com maior concentração de gelana (HA0,1%) sem
adição de sais foi estável à separação de fases. Essa emulsão continuou estável frente à adição de
KCl ou CaCl2 até a concentração correspondente à força iônica de 3 mM. Em relação à adição de
FeCl3, as emulsões permaneceram estáveis somente até a força iônica de 0,3 mM.
É possível supor que a desestabilização causada pelos sais, quando estes estão presentes
acima de determinadas concentrações, está relacionada ao processo de neutralização das cargas do
polissacarídeo, que pode ter duas principais consequências. A primeira seria a formação de
agregados maiores que poderiam precipitar causando a desestabilização das emulsões. No entanto,
visualmente, não foram detectados sinais de precipitação nas amostras. A outra consequência da
neutralização seria na redução da viscosidade da fase contínua e redução da repulsão eletrostática
existente entre as gotas de óleo, caso a gelana esteja posicionada na interface.
Quanto maior a valência do cátion maior é sua capacidade de neutralizar as cargas do
polissacarídeo aniônico. É por isso que o cátion de ferro causou a desestabilização das emulsões
mesmo quando presente em concentrações menores em relação ao K+ e Ca
++.
90
0,025% (m/m) 0,1% (m/m)
KC
l
CaC
l 2
FeC
l 3
Figura 27. Perfil de separação de fases das emulsões contendo gelana HA (0,025 ou 0,1% m/m) e sais (KCl,
CaCl2 ou FeCl3). Porção de cor branca das barras representa fase soro. Porção cinza representa a fase creme
ou a própria emulsão (quando não houve separação de fases).
O comportamento reológico das emulsões com adição de sal pode ser visto na Figura 28. Os
resultados apresentados são referentes à emulsão ou a fase creme nos casos em que houve a
separação de fases. O índice de consistência (k) mostrou-se bastante dependente da concentração de
gelana presente na emulsão, apresentando valores maiores nas emulsões contendo 0,1% (m/m) de
gelana HA. Em relação aos sais é difícil verificar uma tendência clara, pois há influência da
quantidade de soro que foi separada de cada emulsão (alterando a concentração de gelana da fase
creme).
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30
Vo
lum
e (
ml)
Força Iônica (mM)
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30
Vo
lum
e (m
l)
Força Iônica (mM)
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30
Vo
lum
e (
ml)
Força Iônica (mM)
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30V
olu
me
(m
l)
Força Iônica (mM)
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30
Vo
lum
e (
ml)
Força Iônica (mM)
0
20
40
60
80
100
0 0,03 0,3 3 30
Vo
lum
e (
ml)
Força Iônica (mM)
91
Em relação ao índice de comportamento foi possível observar que a adição de sal teve
influência reduzida no valor desse índice, que permaneceu praticamente inalterado com exceção das
amostras com valor de força iônica elevado. Esse índice nos mostra que, em geral, as emulsões
apresentaram comportamento pseudoplástico (n<1), e que este comportamento se acentua com o
aumento da concentração de gelana presente no sistema. Nas emulsões com alta força iônica (30
mM) houve separação de fases em todos os casos. A separação total de fases foi observada nas
amostras com adição de FeCl3 (sendo assim, essas amostras não foram caracterizadas). Já nas
amostras com menor concentração de gelana (0,025% m/m) com adição de KCl e CaCl2, o índice de
comportamento da fase creme aproximou-se bastante da unidade (comportamento newtoniano),
devido à instabilidade desta emulsão e a predominante presença de óleo livre.
Os resultados referentes à viscosidade também estão diretamente relacionados à quantidade
de soro separada e consequente compactação e aumento de concentração de sólidos na fase creme.
Nas amostras com maior concentração de gelana (0,10% m/m) a viscosidade das emulsões mostrou
alterações significativas somente a partir da força iônica de 3 mM, com grande redução da
viscosidade das emulsões com adição de FeCl3.
92
0,025% (m/m) 0,1% (m/m)
Índ
ice
de
con
sist
ênci
a
Índ
ice
de
com
port
am
ento
Vis
cosi
dad
e
Figura 28. Propriedades reológicas (índice de consistência, índice de comportamento e viscosidade aparente a
100 s-1
) das emulsões contendo gelana HA (0,025 ou 0,1% m/m) e sais (KCl, CaCl2 ou FeCl3).
A Figura 29 apresenta os resultados obtidos através das curvas de distribuição de tamanhos de
gotas das emulsões. Quanto ao diâmetro médio é possível observar que quase não houve alterações
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
0 0,03 0,3 3 30
k (P
a.sn
)
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
0 0,03 0,3 3 30
k (P
a.sn
)
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
0 0,03 0,3 3 30
n
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
0 0,03 0,3 3 30
n
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
0,12
0 0,03 0,3 3 30
Vis
cosi
dad
e a
10
0 s
-1 (
Pa.
s)
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
0,12
0 0,03 0,3 3 30
Vis
cosi
dad
e a
10
0 s
-1 (
Pa.
s)
Força iônica (mM)
KCl CaCl2 FeCl3
93
significativas a não ser no maior valor de força iônica (30 mM), em que um aumento considerável do
tamanho das gotas pode ser visto. Já os valores de span não apresentaram uma tendência clara.
0,025% (m/m) 0,1% (m/m)
Diâ
met
ro m
édio
(D
43)
Span
Figura 29. D43 e span das emulsões contendo gelana HA (0,025 ou 0,1% m/m) e sais (KCl, CaCl2 ou FeCl3).
Para compreender melhor o papel de cada tipo de sal nas emulsões, foram realizadas análises
de microscopia confocal. A microscopia confocal foi utilizada para identificar a localização de cada
componente da emulsão. Para tal, se fez necessária a utilização de marcadores e nesse caso
específico foram utilizados os corantes vermelho do Nilo e o isotiocianato de fluoresceína (FITC)
para marcar, respectivamente, o óleo de girassol e a gelana HA. Foi observado que a utilização dos
marcadores alterou as propriedades (perfil de separação de fases e tamanho das gotas) das emulsões
em relação às emulsões sem adição de marcadores, porém os resultados serão aqui apresentados para
análise qualitativa e comparação entre as amostras estudadas.
A Figura 30 apresenta o registro fotográfico das amostras coradas. A Figura 30A apresenta as
emulsões sem adição de sais com diferentes concentrações de polissacarídeo (0,025, 0,075, 0,1, 0125
e 0,15% m/m). Somente a emulsão com 0,025% m/m de gelana HA apresentou separação de fases e,
94
portanto, teve sua fase superior avaliada durante as análises microscópicas. A Figura 30B e C
apresentam as emulsões com 0,025% ou 0,10% m/m de gelana, respectivamente, com adição de KCl
(cátion monovalente), CaCl2 (cátion divalente) ou FeCl3 (cátion trivalente). Os sais foram
adicionados em concentrações que resultaram em força iônica de 0,3 mM.
Figura 30. Registro fotográfico das emulsões coradas com vermelho do Nilo (marcador do óleo) e FITC
(marcador da gelana HA) utilizadas na microscopia confocal. A) Emulsões sem adição de sais com 0,025,
0,075, 0,10, 0,125 ou 0,15% (m/m) de gelana HA. B) Emulsões contendo 0,025% (m/m) de gelana HA sem
adição de sal ou com adição de KCl, CaCl2 ou FeCl3 (FI=0,3 mM). C) Emulsões contendo 0,10% (m/m) de
gelana HA sem adição de sal ou com adição de KCl, CaCl2 ou FeCl3 (FI=0,3 mM).
A Figura 31 apresenta as microscopias confocais das emulsões sem adição de sal. Foi
possível observar que a gelana HA (em verde) pode ser encontrada dispersa por toda a fase contínua
das emulsões e regiões mais destacadas (de brilho intenso) podem ser indícios da presença de
aglomerados desse polissacarídeo. Ao visualizar a fase oleosa dispersa (em vermelho), foi possível
observar pequenos pontos escuros na superfície das gotas que podem estar relacionados ao
posicionamento da gelana HA na interface.
95
Figura 31. Microscopia confocal das emulsões estabilizadas por A) 0,025% (fase superior), B) 0,10% ou C)
0,15% (m/m) de gelana HA. O canal 1 apresenta a gelana HA marcada com FITC em verde, o canal 2
apresenta a microscopia óptica do sistema e o canal 3 apresenta o óleo marcado com vermelho do Nilo em
vermelho. As barras representam 50 m.
A Figura 32 mostra o resultado da análise de co-localização em duas amostras sem adição de
sal (com 0,025% ou 0,15% m/m de gelana HA) e em uma amostra contendo KCl. A microscopia de
co-localização mostra a região da amostra em que houve sobreposição espacial e temporal dos
compostos marcados. Foi possível observar a co-localização do óleo e da gelana HA nas regiões do
entorno da gota, mais um indício de que pode haver gelana HA depositada na interface das gotas, o
que caracterizaria esta emulsão como uma emulsão do tipo Pickering. Porém, não foi possível
96
afirmar com certeza que houve a deposição do polissacarídeo na interface, pois pode ser que este
esteja somente muito próximo a ela (no entorno das gotas).
Figura 32. Colocalização dos componentes marcados (gelana HA e óleo) nas emulsões contendo A) 0,025%
(m/m) de gelana HA (fase superior), B) 0,15% (m/m) de gelana HA e C) 0,10% de gelana HA com KCl
(FI=0,3 mM).
Já a Figura 33 apresenta as imagens em 3D (resultado da varredura em profundidade feita nas
amostras) das emulsões com concentração fixa de gelana HA (0,10% m/m) sem adição de sal ou com
adição de KCl ou FeCl3. Foi possível observar que mesmo utilizando baixas concentrações de sal
(FI= 0,3 mM), alterações puderam ser verificadas na fase contínua das emulsões. Com a adição de
KCl foi observada maior heterogeneidade na distribuição da cor verde, com regiões mais
transparentes (menos gelana dispersa) e grande número de regiões de brilho intenso (aglomerados do
polissacarídeo). Essa característica do sal em promover aglomeração da gelana e reduzir a
homogeneidade da fase contínua foi mais intensa com a adição de FeCl3, que parece ter induzido à
formação de grandes aglomerados e heterogeneidade no perfil de espalhamento do polissacarídeo na
fase contínua. Como a gelana é um polissacarídeo de estrutura aniônica, é de se esperar que esta
interaja com íons positivos adicionados ao sistema, bem como, que cátions de maior carga tenham
efeitos mais pronunciados sobre esse polissacarídeo.
97
Figura 33. Duas diferentes perspectivas das montagens em 3D através da varredura em profundidade das
emulsões contendo gelana HA (0,10% m/m) sem adição e com adição de KCl ou FeCl3 (FI = 0,3 mM).
De modo geral é possível concluir que a adição de sais tem influência considerável nas
emulsões avaliadas. A razão polissacarídeo/sal presente pode induzir à separação de fases ou
melhorar a estabilidade da emulsão. Em geral, a viscosidade da fase contínua possui influência na
estabilização das emulsões, mas casos específicos foram observados em que o mecanismo de
estabilização predominante se assemelha ao mecanismo Pickering.
A adição de KCl ou CaCl2 resultaram em efeito muito semelhante sobre as emulsões,
diferente da adição de FeCl3, que teve efeito mais intenso sobre as propriedades dos sistemas
avaliados. A força iônica é calculada levando-se em consideração a concentração do sal e a carga de
seus íons. Assim, a quantidade de FeCl3 adicionada às emulsões, de modo a manter o mesmo valor
de força iônica nos sistemas, representa aproximadamente 1/3 da massa de KCl adicionada. Mesmo
em quantidades menores, a adição de FeCl3 resultou em uma fase creme muito semelhante à obtida
em concentrações elevadas de KCl, em que a desestabilização total da emulsão é evidente. Assim, a
valência do cátion teve grande influência na emulsão formada, e foi possível observar que a
98
quantidade de soro liberada aumenta com a valência do cátion presente no sal e que quanto maior a
valência do cátion, menor é a quantidade de sal capaz de induzir à quebra das emulsões. Esse
resultado está de acordo com a regra de Schulze-Hardy. A regra de Schulze-Hardy afirma que a
concentração de eletrólito necessária para induzir a coagulação em um sistema estabilizado de
partículas carregadas é inversamente proporcional à valência do contra-íon (HUNTER, 1993). Isso
explica o intenso efeito desestabilizante dos íons de ferro, que são capazes de induzir a coagulação
mesmo quando adicionados em pequenas quantidades.
5.3.2 Efeito da adição de KCl nas emulsões com gelana HA
Duas diferentes concentrações de gelana foram escolhidas para este estudo, uma concentração
que originalmente apresentava separação de fases (0,025% m/m) e outra concentração que produzia
emulsão estável à separação de fases (0,1% m/m). A Figura 34 apresenta o perfil de separação de
fases juntamente com os valores de D43 (Figura 34A) e de viscosidade aparente (Figura 34B) das
emulsões com menor concentração de gelana (0,025% m/m). Os valores de D43 e de viscosidade
aparente foram obtidos utilizando a fase creme ou a própria emulsão nos casos em que a separação
de fases não foi observada. A fim de simplificar a observação dos resultados, os gráficos foram
separados em quatro regiões principais.
A emulsão contendo 0,025% m/m de gelana HA sem adição de sal mostrou separação de
fases. Na ‘região 1' a adição de sal não causou diferenças significativas nas propriedades das
emulsões, uma vez que a quantidade de soro liberada permaneceu quase constante com o aumento do
teor de KCl até 15,6 mg de sal/g de gelana (ou 0,07 mM de KCl), e o tamanho médio mostrou uma
ligeira diminuição. Acima deste conteúdo de KCl, na ‘região 2', os valores de viscosidade aparente e
a quantidade de soro liberado pelas emulsões começou a diminuir. Na ‘região 3' não se observou
qualquer separação de fases e os baixos valores de viscosidade aparente foram mantidos. À medida
que o conteúdo de KCl continua a aumentar, maiores quantidades de soro, quase toda a quantidade
de água utilizada para preparar a emulsão, foram liberados, indicativo do colapso da emulsão,
impedindo a medição do tamanho médio das gotas apresentadas nesses sistemas (região 4 ). A Figura
34C-F apresenta a morfologia representativa das emulsões em cada região. Na micrografia da ‘região
4' (Figura 34F), foi possível observar que não há presença de gotas grandes. Esta fase creme mostrou
alto teor de óleo e os pontos que podem ser vistos na microestrutura podem estar relacionados à
presença de agregados de gelana ou água retida. A Figura 34G-H, com óleo de girassol marcado com
vermelho do Nilo e visualização através de microscopia fluorescente, confirmou a desestruturação da
emulsão, com grandes diferenças nos aspectos das fases creme visualizadas.
99
As emulsões contendo 0,025% (m/m) de gelana HA (Figura 34B) apresentaram valores de
viscosidade aparente relacionados à separação de fases. Foi possível observar que os maiores valores
de viscosidade foram obtidos em emulsões com fase creme mais concentrada e que os valores de
viscosidade foram reduzidos conforme a quantidade de soro separado diminuiu. Os valores de
viscosidade aparente dos sistemas com elevado teor de sal (6260 e 15633 mg de KCl/g de gel)
aproximaram-se da viscosidade do óleo de girassol puro. O mesmo foi observado nas emulsões
contendo 0,1% (m/m) de gelana HA com alto teor de KCl.
Portanto, diferentes alterações foram causadas pelo KCl dependendo da quantidade
adicionada às emulsões contendo 0,025% m/m de gelana. Baixas quantidades de KCl não causaram
alterações significativas nas propriedades das emulsões. Valores intermediários podem melhorar a
estabilidade à separação de fases, impedindo a liberação de soro. Grandes quantidades causaram a
quebra das emulsões.
100
Figura 34. Emulsão com 0,025% (m/m) de gelana HA. A) Perfil de separação de fases e diâmetro médio D43.
B) Perfil de separação de fases e viscosidade aparente a 100 s-1
. Micrografias obtidas por microscopia óptica
das emulsões: C) sem adição de sal, D) com 62,6 mg de KCl/g de gelana, E) 626 mg de KCl/g de gelana e F)
15633 mg de KCl/g de gelana. Microscopia fluorescente das emulsões contendo óleo marcado com vermelho
do Nilo: G) 1563 mg de KCl/g de gelana (7,5 mM) ou H) 15633 mg de KCl/g de gelana (75 mM). Barra =
200 m.
101
Em relação à emulsão contendo 0,1% (m/m) de gelana HA (Figura 35) foi possível observar
que não houve separação de fases sem adição de sal e que as propriedades das emulsões foram muito
semelhantes até o teor de 62,6 mg de sal/g de gelana (ou 1,2 mM de KCl). Acima dessa concentração
de KCl, na ‘região 3', os valores de D43 mostraram aumento enquanto que os valores de viscosidade
aparente foram reduzidos, estas mudanças ocorreram gradualmente com o aumento da quantidade de
sal adicionado. Na emulsão com 1563 mg de KCl/g de gelana (ou 30 mM de KCl), a separação de
fases pôde ser observada, e a fase creme continha gotas de maiores tamanhos e baixos valores de
viscosidade aparente foram observados (Figura 35E). A viscosidade mais baixa da emulsão pode
estar relacionada com o maior tamanho das gotas, uma vez que o aumento da gota conduz à
diminuição na razão de área/volume, reduzindo o atrito durante o fluxo, e consequentemente, a
viscosidade (BARNES, 1994). O encolhimento das cadeias de gelana devido à adição de KCl, que
tende a prevenir seu intumescimento, também pode ter sido responsável pela redução de viscosidade
nesse sistema. Novamente, na ‘região 4', o elevado teor de KCl induziu à separação de grandes
quantidades de soro e, consequentemente, o colapso das emulsões.
A emulsão mostrada na Figura 35E (0,1% de goma gelana e 30 mM de KCl) foi amplificada
na Figura 35G. Nesse razão específica de polissacarídeo-sal a presença de agregados/microgéis de
gelana recobrindo a interface das gotas da emulsão pode ser vista claramente nessa microscopia. É
possível que uma estabilização do tipo Pickering esteja predominando nestas condições, pois além da
evidente deposição de partículas na interface revelada pela microscopia, a viscosidade desse sistema
não é alta o suficiente para estar contribuindo com a estabilidade.
102
Figura 35. Emulsão com 0,10 % (m/m) de gelana HA. A) Perfil de separação de fases e diâmetro médio D43.
B) Perfil de separação de fases e viscosidade aparente a 100 s-1
. Micrografias obtidas por microscopia óptica
das emulsões: C) sem adição de sal, D) com 62,6 mg de KCl/g de gelana, E) 1563 mg de KCl/g de gelana e F)
6260 mg de KCl/g de gelana. G) Imagem amplificada da emulsão contendo 1563 mg de KCl/g de gelana (30
mM). Barra = 200 m.
De forma geral, foi possível concluir que nas emulsões contendo 0,10% (m/m) de gelana HA
a adição de baixas concentrações de KCl não acarretaram em alterações significativas nas
103
propriedades das emulsões. Já concentrações médias de KCl possuem a tendência de elevar o
tamanho médio das gotas e de reduzir a viscosidade. Altas concentrações de KCl, por sua vez,
podem causar a desestabilização total da emulsão. Quanto ao mecanismo responsável pela
estabilização das emulsões, pode-se concluir que dependendo das condições de força iônica um
mecanismo pode predominar sobre o outro. Em determinados sistemas há evidências suficientes para
afirmar que o mecanismo de estabilização Pickering está atuando.
Uma discussão mais detalhada sobre os mecanismos de estabilização realizados pela gelana
HA será apresentada mais adiante. Antes, algumas propriedades das emulsões com adição de KCl
serão tratadas com maiores detalhes. Para tal, um menor número de amostras foi selecionado. As
concentrações de KCl foram selecionadas através da análise dos resultados anteriores, e representam
concentrações em que foram observadas alterações significativas nas propriedades das emulsões
(Tabela 10). Novamente foram avaliadas emulsões com duas concentrações diferentes de
polissacarídeo (0,025 e 0,10% m/m), e embora as concentrações de KCl (ou força iônica) sejam
diferentes para cada concentração de gelana, a razão entre a massa de sal e de polissacarídeo foi
mantida. Dessa vez, foi utilizada a força iônica para a apresentação dos resultados para facilitar sua
visualização. A Tabela 10 apresenta novamente a correspondência entre força iônica e razão mássica
para facilitar a visualização e comparação dos resultados.
Tabela 10. Amostras selecionadas com a correspondência entre razão mássica e força iônica.
Gelana (% m/m) KCl (mM) mg KCl/ g gelana
0,025 0 ---
0,025 0,75 156
0,025 3 626
0,025 7,5 1563
0,1 0 ---
0,1 3 156
0,1 12 626
0,1 30 1563
As Figuras 36 e 37 apresentam os resultados referentes à análise de estabilidade por período
prolongado, em que foi determinado o volume das fases separadas após 1, 30 ou 60 dias de
104
armazenamento das emulsões. Na Figura 36 (0,025% de gelana HA) é possível observar que a
emulsão sem adição de KCl apresentou a menor estabilidade prolongada à separação de fases, pois
foi a emulsão que apresentou maior conteúdo de óleo livre após os 2 meses de armazenamento. As
emulsões com quantidade intermediária de KCl (0,75 e 3 mM) não apresentaram alterações na
separação de fases após um mês e somente uma pequena quantidade de soro separada pode ser vista
após 2 meses. Já a emulsão com quantidade elevada de KCl (7,5 mM) apresentou aumento gradual
da quantidade de soro liberado com o tempo de armazenamento. A Tabela 11A mostra os valores de
D43 ao longo do tempo de armazenamento das emulsões com menor teor de gelana HA. Somente as
emulsões sem adição de sal ou com maior teor de KCl (7,5 mM) apresentaram coalescência após os
60 dias de armazenamento, com aumento dos valores de D43. Apesar da emulsão com maior
quantidade de KCl ter apresentado aumento dos valores de D43, não houve diferença significativa
entre os valores de diâmetro médio após 1 ou 60 dias, devido ao grande desvio apresentado na
análise dessa amostra após 60 dias, provocado pela sua alta instabilidade.
Figura 36. Perfil de separação de fases das emulsões contendo 0,025% (m/m) de gelana HA com adição de:
A) 0 mM, B) 0,75 mM, C) 3 mM ou D) 7,5 mM de KCl.
105
Já a Figura 37 apresenta o perfil de separação de fases da emulsão com 0,10% (m/m) de
gelana HA em sua composição. Todas as emulsões mostraram-se estáveis à separação de fases
mesmo após 60 dias de armazenamento. Somente a emulsão com maior teor de KCl (30mM)
apresentou aumento na quantidade de soro liberada, porém não apresentou coalescência, já que não
houve aumento significativo dos valores de D43 ao longo do armazenamento (Tabela 11B). Os
valores de D43 mostraram que todas as emulsões com 0,10% (m/m) de gelana HA avaliadas não
apresentam coalescência significativa após 60 dias de armazenamento.
Figura 37. Perfil de separação de fases das emulsões contendo 0,10% (m/m) de gelana HA com adição de: A)
0 mM, B) 3 mM, C) 12 mM ou D) 30 mM de KCl.
106
Tabela 11. D43 (m) após 1, 30 ou 60 dias de armazenamento a temperatura ambiente.
A) 0,025% de Gelana HA
Armazenamento (dias) 0 mM de KCl 0,75 mM de KCl 3 mM de KCl 7,5 mM de KCl
1 73,1 ± 2,59A 56,1± 0,14
A 48,2 ± 0,14
A 62,4 ± 0,29
A
30 73,1 ± 1,12A 55,5 ± 0,11
A 48,5 ± 0,10
A 63,6 ± 0,12
A
60 123,8 ± 5,47B 55,3 ± 0,35
A 48,2 ± 0,34
A 80,1 ± 16,7
A
B) 0,100% de Gelana HA
Armazenamento (dias) 0 mM de KCl 3 mM de KCl 12 mM de KCl 30 mM de KCl
1 39,9 ± 8,64A 51,1 ± 0,92
A 73,3 ± 2,67
A 145,5 ± 5,61
A
30 43,3 ± 0,10A 52,8 ± 0,80
A 76,2 ± 1,20
A 141,2 ± 3,55
A
60 45,1 ± 0,18A 53,9 ± 0,91
A 73,4 ± 0,93
A 145,8 ± 4,03
A
* Letras diferentes significam diferença significativa entre valores da mesma coluna (p < 0,05).
A Tabela 12 apresenta o potencial zeta das emulsões contendo gelana HA e KCl. Os
resultados de potencial zeta das emulsões contendo 0,025% m/m de gelana HA não mostraram uma
tendência clara, e os valores obtidos foram muito similares independente da concentração de KCl
presente, e são muito próximos ao potencial zeta medido em dispersões de gelana HA pura. Já nas
emulsões com 0,10% m/m de gelana HA foram observadas ligeiras reduções da magnitude do
potencial zeta com o aumento do teor de KCl. Vale ressaltar que nas dispersões o potencial zeta se
mostrou sensível a alterações tanto na quantidade de polissacarídeo quanto na concentração de KCl.
107
Tabela 12. Potencial zeta das emulsões contendo gelana HA e KCl a 25ºC.
Gelana (% m/m) KCl (mM) Potencial zeta (mV)
0,025 0 -43,7 ± 3,4
0,025 0,75 -58,6 ± 1,0
0,025 3 -52,0 ± 1,5
0,025 7,5 -49,5 ± 3,9
Gelana (% m/m) KCl (mM) Potencial zeta (mV)
0,1 0 -55,6 ± 2,6
0,1 3 -55,0 ± 1,0
0,1 12 -51,6 ± 2,0
0,1 30 -46,1 ± 4,0
Já a Figura 38 apresenta as curvas de distribuição de tamanho de gotas referentes às emulsões
apresentadas anteriormente. Foi possível observar que na emulsão com menor concentração de
gelana (0,025% m/m) não há uma tendência clara, somente houve pequena redução de tamanho após
a adição de KCl. Já nas emulsões com concentração de gelana de 0,1% (m/m) foi observado um
aumento gradual do tamanho das gotas com o aumento na concentração de KCl. Todas as emulsões
apresentaram curvas de distribuição de tamanho de gotas multimodais, com presença de dois ou mais
picos.
108
Figura 38. Distribuição de tamanho de gotas das emulsões contendo: A) 0,025% m/m ou B) 0,1% m/m de
gelana HA analisadas 24h após o preparo.
A Figura 39 e Tabela 13 apresentam de forma mais detalhada o efeito da adição de diferentes
concentrações de KCl no comportamento reológico das emulsões com concentração fixa de gelana
HA de 0,10% m/m. É possível observar que a adição de KCl na concentração de 0,3 mM não alterou
significativamente as propriedades da emulsão formada, dado que curvas de escoamento semelhantes
e parâmetros reológicos estatisticamente iguais foram obtidos sem adição de sal ou com adição de
0,3 mM de KCl. Acima dessa concentração, a adição de KCl provocou alterações no comportamento
reológico e reduções no índice de consistência e viscosidade das emulsões foram observadas
conforme houve aumento na quantidade de sal adicionada. Todas as concentrações de sal analisadas
resultaram em emulsões com comportamento pseudoplástico, com redução da viscosidade frente ao
aumento da taxa de cisalhamento. Quanto maior a quantidade de sal presente na emulsão, maior foi o
valor do índice de comportamento (n), ou seja, menos pseudoplástico o comportamento da emulsão.
109
É importante ressaltar que a separação de fases só ocorreu na emulsão contendo 30 mM de KCl
(resultados já apresentados anteriormente) e portanto, a curva de escoamento apresentada foi obtida
através da caracterização da fase creme dessa emulsão.
Figura 39. Curvas de escoamento das emulsões estabilizadas por gelana HA (0,1% m/m) com diferentes
concentrações de KCl.
Tabela 13. Propriedades reológicas das emulsões contendo 0,10% (m/m) de gelana HA a 25ºC.
KCl Comportamento o (Pa) k (Pa.s
n) n R²
Viscosidade aparente
(mM) a 100 s-1
(mPa.s)
0 Herschel-Bulkley 1,81 ± 0,17A 2,89 ± 0,14A 0,32 ± 0,01A 0,992 139,9 ± 5,41A
0,3 Herschel-Bulkley 1,87 ± 0,01A 3,05 ± 0,17A 0,31 ±0,01A 0,991 140,1 ± 2,69A
3 Herschel-Bulkley 1,28 ± 0,01B 1,73 ± 0,10B 0,37 ± 0,01B 0,998 108,4 ± 1,63B
12 Pseudoplástico --- 0,74 ± 0,03c 0,48 ± 0,01C 0,998 65,4 ± 1,30C
30 Pseudoplástico --- 0,21 ± 0,03D 0,58 ± 0,02D 0,999 29,8 ± 2,05D
Já a Figura 40 apresenta os resultados dos ensaios oscilatórios das emulsões com
concentração fixa de gelana HA (0,1% m/m) com adição de KCl. Foi possível observar que os
valores de G’ e G” foram ligeiramente dependentes da frequência e que os valores de G’ são maiores
que os valores de G” em todo o intervalo de frequência para todas as emulsões analisadas
(comportamento característico de gel). A Figura 40A mostra o efeito da adição de 0,3 e 3 mM de
110
KCl e foi possível concluir que essas concentrações de KCl não foram capazes de causar alterações
significativas no comportamento viscoelástico das emulsões. Já a Figura 40B apresenta a
comparação da emulsão sem adição de KCl com emulsões contendo 12 ou 30 mM desse sal. A
adição dessas quantidades maiores de cloreto de potássio causaram redução nos valores de G’ e G” e
a emulsão com 30 mM apresentou os módulos elástico e viscoso com maior grau de dependência da
frequência ou seja, com comportamento de gel mais fraco. Esse resultado está de acordo com o
obtido através das curvas de escoamento, em que grande redução da consistência e viscosidade havia
sido observada para emulsões com maiores concentrações de sal em sua composição.
Figura 40. Varredura de frequência a 25ºC das emulsões estabilizadas por gelana HA (0,1% m/m) com
diferentes concentrações de KCl: A) 0, 0,3 e 3 mM; B) 0, 12 e 30 mM.
111
De acordo com os resultados apresentados nesse capítulo, algumas considerações podem ser
feitas sobre os tipos de mecanismos de estabilização realizados pela gelana HA e sobre a influência
da adição do cloreto de potássio nas emulsões. A gelana HA é usualmente reconhecida como um
agente espessante. Há poucos trabalhos que estudaram a capacidade da gelana HA de estabilizar
emulsões (LORENZO et al., 2013). Em geral, a estabilização de emulsões feita por polissacarídeos é
atribuída ao aumento de viscosidade da fase contínua (DICKINSON, 2003), reduzindo a velocidade
de movimento das gotas de óleo, evitando a coalescência. Nesse trabalho foi observada a capacidade
da gelana HA de estabilizar emulsões mesmo em sistemas que apresentaram baixa viscosidade
devido ao uso de tratamento ultrassônico ou devido à adição de sais. Um exemplo disto é a emulsão
contendo 0,1% de gelana HA e 1563 mg de KCl/g gelana (Figura 35E), que apresentou gotas de
tamanho elevado dispersas em um meio com viscosidade reduzida cuja análise miscroscópica
revelou de forma evidente o posicionamento dos agregados de gelana na interface óleo-água. Assim,
é possível concluir que a gelana possui a capacidade de estabilizar as emulsões por diferentes vias.
Na maioria das condições estudadas o aumento da viscosidade da fase contínua e a repulsão
eletrostática entre as gotas carregadas parecem ser os mecanismos mais prováveis. Porém, em certas
condições (por exemplo, na emulsão com 0,1% de gelana HA e 1563 mg de KCl/g gelana) a
estabilização Pickering, com deposição de partículas na interface, parece ser o principal mecanismo
atuando na estabilização da emulsão.
Por se tratar de um polissacarídeo carregado negativamente, a gelana pode ter suas cargas
neutralizadas através da adição de íons positivos, como o cátion K+. Assim, como visto
anteriormente na seção sobre o efeito do KCl na suspensão de gelana HA (seção 5.2.4), a adição de
determinadas concentrações de KCl pode reduzir a viscosidade da dispersão. Também foi visto que
determinados teores de gelana podem permanecer homogeneamente dispersos em água sem adição
de sais, porque a grande repulsão eletrostática entre as cadeias de gelana permite que a dispersão se
mantenha como uma fase estável. No entanto, a gelana tem tendência a precipitar quando o KCl é
adicionado acima de uma certa quantidade. A neutralização das cargas é responsável por maior
ocorrência de interações soluto-soluto, e como consequência, agregação e precipitação. Então, de
certa forma é possível dizer que a adição de KCl pode alterar a “solubilidade” dos agregados de
gelana HA.
A gelana é um biopolímero capaz de formar ligações de hidrogênio com as moléculas de água
apresentadas na fase contínua, dissolvendo-se na água. No entanto, com o aumento do teor de sal, as
moléculas de água são atraídas pelos íons de sal, o que reduz o número de moléculas de água
disponíveis para interagir com o polissacarídeo. Como resultado, as interações polissacarídeo-
112
polissacarídeo se tornam mais fortes do que as interações solvente-soluto. Este processo é conhecido
como salting-out. GARTI & LESER (2001) demonstraram que certos polissacarídeos hidrofílicos
(aniônicos ou não-iônicos), purificados até não conter mais traços de proteína em sua estrutura,
podem, ainda assim, exibir propriedades emulsificantes e de superfície apesar de seu caráter rígido e
hidrofílico. Eles concluíram que a adsorção ativa de polissacarídeos na interface pode ser induzida
por um efeito salting-out, resultando em camadas semi-sólidas em torno das gotas. A formação de
barreiras mecânicas espessas do tipo gel através da deposição de hidrocolóides na interface óleo-
água foi relatada. Em um capítulo anterior do presente trabalho (seção 5.2.5) foi mostrado que a
gelana HA é um polissacarídeo que não é capaz de alterar a tensão interfacial entre óleo e água,
porém, em razões específicas de polissacarídeo-KCl, pode ser observada a formação de uma barreira
mecânica em torno das gotas da emulsão, provavelmente devido ao efeito salting-out.
Portanto, é possível concluir que a gelana HA, reconhecida como um polissacarídeo
predominantemente hidrofílico que apresenta valores elevados de potencial zeta e possui alta
capacidade espessante, pode atuar de diferentes formas na estabilização de emulsões. Os principais
mecanismos de atuação que podem ser citados são: aumento da viscosidade da fase contínua, elevada
repulsão eletrostática entre as gotas e formação de barreira mecânica através da deposição do
polissacarídeo na interface. Dependendo das condições de preparo e da razão gelana/sal, a
predominância de alguns mecanismos de estabilização foi observada.
114
6. CONCLUSÕES
No estudo das gelanas foi observado que a maior massa molar e a presença dos grupos acetil
e glicerato nas cadeias de gelana HA conferem a esse polissacarídeo poder espessante elevado
quando comparado a gelana LA nas mesmas condições. Outra diferença importante entre as duas
formas da gelana é a presença de microgéis/agregados nas dispersões de gelana HA. Foi observado
que o rompimento desses agregados promovido por tratamento ultrassônico resulta em dispersões
com baixa viscosidade, perda do comportamento pseudoplástico e afeta a capacidade estabilizante
desse polissacarídeo. Também foi observado que, apesar de a gelana HA ter apresentado teor de
nitrogênio maior que o encontrado na gelana LA, ambos os polissacarídeos não possuem capacidade
de reduzir a tensão na interface água-óleo.
Quanto às emulsões contendo gelana, foi possível concluir que a gelana LA não possui
capacidade emulsificante nas condições estudadas. Em relação às emulsões contendo gelana HA, foi
observado que emulsões estáveis à separação de fases podem ser obtidas mesmo utilizando baixas
concentrações desse polissacarídeo. Algumas emulsões contendo gelana HA foram estáveis à
separação de fases e coalescência das gotas durante 2 meses de armazenamento. Quanto ao preparo,
foi observado que a passagem no homogeneizador reduziu a viscosidade das emulsões e reduziu o
tamanho médio das gotas em comparação com as emulsões preparadas somente em rotor-estator. A
alta viscosidade do meio contínuo e a presença de uma rede de gel foram consideradas como fatores
importantes na estabilização de emulsões realizada pela gelana HA. A alta repulsão eletrostática
exibida pelas gotas (confirmada através dos resultados de potencial zeta) também foi apontada como
um dos principais mecanismos de estabilização atuando nessas emulsões.
Em relação ao efeito da adição de diferentes sais, foi possível concluir que, em concentrações
específicas, a adição de sais pode evitar a separação de fases, aumentando a estabilidade do sistema,
ou induzir a completa desestabilização da emulsão. Propriedades similares foram observadas em
emulsões com adição de KCl ou CaCl2. Já o efeito do FeCl3 foi mais intenso, e esse sal se mostrou
capaz de desestabilizar completamente as emulsões mesmo quando adicionado em baixas
concentrações em relação aos sistemas com KCl ou CaCl2.
Para o caso específico da adição de KCl, foi observado que a adição de baixas concentrações
de KCl não acarretaram em alterações significativas nas propriedades das emulsões. Concentrações
médias de KCl possuem a tendência de elevar o tamanho médio das gotas e de reduzir a viscosidade.
Já as altas concentrações de KCl podem causar a desestabilização total da emulsão. Em determinados
sistemas foi possível sugerir que o mecanismo de estabilização predominante é o do tipo Pickering,
115
com agregados de gelana HA depositados na superfície de gotas grandes dispersas em meio contínuo
com baixa viscosidade.
De modo geral, foi possível concluir que emulsões com diferentes propriedades podem ser
obtidas dependendo da razão polissacarídeo/sal e que esta razão pode interferir nos mecanismos de
estabilização atuando nas emulsões. Mesmo sendo um polissacarídeo predominantemente
hidrofílico, foi observado que a gelana HA pode se posicionar na interface das gotas, formando uma
barreira mecânica que impede a coalescência das gotas, em razões polissacarídeo/sal específicas.
Porém, independente do mecanismo de estabilização atuando, é importante ressaltar as baixas
concentrações de polissacarídeo utilizadas, mostrando que a gelana HA tem potencial para ser
utilizada como um ingrediente estabilizante/emulsificante. Esse carboidrato é de uso GRAS para
alimentos e, portanto, constitui-se como uma interessante opção na estabilização de emulsões
alimentícias, especialmente considerando o atual interesse em reduzir a utilização de derivados de
origem animal, permitindo a obtenção de emulsões sem uso de derivados do ovo ou do leite.
117
7. ANEXO I - Estudo das partículas da borra de café
7.1 Introdução
O Brasil é o maior produtor e exportador de café do mundo, sendo que sua safra de 2015
alcançou 43 milhões de sacas de 60 kg de café beneficiado (ICO, 2015). A partir do café bruto vários
produtos podem ser obtidos, como o café torrado e moído, o extrato de café, o óleo de café e o café
solúvel. Aproximadamente 50% da produção mundial de café é destinada à fabricação de café
solúvel e, em média, 0,91 kg de borra de café são gerados para cada 1 kg de café solúvel produzido.
Assim, a quantidade gerada anualmente desse resíduo é bastante elevada, sendo estimada em cerca
de 6 milhões de toneladas/ano (SILVA et al., 1998; MUSSATTO et al., 2011).
A borra de café é um resíduo poluente devido a sua alta quantidade de matéria orgânica,
fazendo com que seu aproveitamento seja de fundamental importância para evitar impactos
ambientais. Assim, várias pesquisas relativas ao aproveitamento e agregação de valor a esse resíduo
tem sido conduzidas. Atualmente seu destino principal dentro da indústria é o uso como combustível,
através de queima em caldeiras devido ao seu alto poder calorífico de, aproximadamente, 5.000
kcal/kg (SILVA et al., 1998). No entanto, investigações já foram feitas considerando a utilização da
borra em enriquecimento de solos (CRUZ et al., 2012), remoção de corantes (FRANCA et al., 2009;
SAFARIK et al., 2012), adsorção de metais (AZOUAOU et al., 2010), na extração de compostos
fenólicos (ZUORRO & LAVECCHIA, 2012) entre outros.
A Tabela 14 apresenta a composição média da borra de café. Essa composição pode variar
bastante conforme a origem e processamentos prévios, mas, em geral, esse resíduo é rico em
polissacarídeos, lignina, proteínas e minerais. Os polissacarídeos são os componentes mais
abundantes na borra de café, sendo que os açúcares são polimerizados em estruturas de celulose e
hemicelulose, que quando somados correspondem à 40-50% em média de sua composição em massa
seca (MUSSATTO ET AL., 2011; BALLESTEROS et al., 2014).
A lignina também é uma fração presente em quantidade significativa nos resíduos de café. A
lignina é uma macromolécula constituída por uma grande variedade de grupos funcionais, como
hidroxila fenólica, hidroxila alifática, metoxil, carbonila e sulfonatos, sendo que sua estrutura e
composição podem variar de acordo com a matéria-prima de origem. Os ácidos clorogênico, caféico
e cumárico são os componentes mais relevantes da lignina do café e desempenham um papel
importante na saúde devido às suas propriedades antioxidantes (MAYDATA, 2002; STEWART
2008; MUSSATTO et al., 2011b; BALLESTEROS et al., 2014). Em um estudo recente, extratos
118
produzidos a partir de borra de café exibiram atividade anti-tumoral e anti-alérgica que foram
relacionadas com a presença de compostos fenólicos, tal como o ácido clorogênico, em sua
composição. De fato, tem sido relatado que o ácido clorogênico, o qual é um dos compostos
fenólicos mais abundantes na borra, possui inúmeras propriedades benéficas à saúde relacionadas
com a sua atividade antioxidante (MUSSATO et al., 2011b).
Em relação aos minerais, uma ampla variedade pode ser encontrada na borra de café, sendo o
potássio, magnésio e fósforo, micronutrientes essenciais à saúde humana, os minerais presentes em
maiores quantidades (BALLESTEROS et al., 2014).
Tabela 14. Composição aproximada da borra de café (base seca).
Componentes % (m/m)
Proteínas 10-15
Fibras 37-47
Óleo 10-15
Cinzas 0,27-1,14
Fonte: SILVA et al., 1998.
Atualmente, há uma grande pressão política e social para reduzir a poluição proveniente das
atividades industriais. Por essa razão, é necessário caracterizar e estudar formas de utilização
rentável da borra de café, agregando valor a esse material e diminuindo o seu impacto no meio
ambiente (BALLESTEROS et al., 2014).
7.2 Material e Métodos
7.2.1 Material
O material utilizado foi a borra de café coletada na Companhia Cacique de Café Solúvel,
Barueri, SP. Os demais reagentes utilizados foram de grau analítico.
7.2.2. Caracterização da borra de café
A borra de café foi seca em estufa a 60ºC por 48h. A distribuição de tamanho da borra de café
seca foi determinada através de método de peneiragem (seção 4.5.1). Após a peneiragem, as frações
de cada peneira foram separadas e caracterizadas quanto ao teor de nitrogênio, carbono e hidrogênio
(seção 4.5.2), microscopia eletrônica de varredura (seção 4.5.3), efeito do pH no potencial zeta
(seção 4.5.4) e através de espectroscopia de absorção na região do infravermelho (seção 4.5.5).
119
7.2.3 Redução de tamanho da borra de café
A redução de tamanho das partículas da borra de café foi realizada por três diferentes
processos. Como a borra de café é um material muito heterogêneo e de alta polidispersidade, optou-
se por partir de uma das frações obtida durante a peneiragem com peneira de mesh 100 (Fração 100,
com diâmetro médio de 179,5 m). No primeiro processo foi utilizado rotor-estator Ultra Turrax
modelo T18 (IKA, Alemanha), em que uma dispersão aquosa contendo 2% (m/m) de borra de café
foi submetida a sucessivos passos de 4 min. Duas diferentes velocidades de rotação (14.000 e 18.000
rpm) foram avaliadas. No segundo processo foi utilizado o homogeneizador a alta pressão Panda 2K
NS1001L (Niro Soavi, Itália), em que dispersões de borra de café em água (0,5% m/m) foram
homogeneizadas nas pressões de 200, 600 ou 1000 bar no primeiro estágio e 50 bar no segundo
estágio. O efeito de sucessivas passagens (3 no total) mantendo fixa a pressão (600 bar no primeiro
estágio e 50 bar no segundo estágio) também foi determinado. No terceiro processo, as dispersões de
borra de café (0,5% m/m) foram submetidas à hidrólise ácida utilizando HCl. Neste processo foram
determinados os efeitos do tempo de hidrólise (1,5 ou 3h), da temperatura (60, 80 ou 95ºC), da
concentração de HCl (3 ou 6M) e do uso de ultrassom durante a hidrólise (Tabela 15). A razão entre
a quantidade de solução ácida e quantidade de borra foi mantida fixa em 200:1 (m/m). As dispersões
contendo as partículas produzidas em ambos os processos foram caracterizadas quanto à distribuição
de tamanho (seção 4.5.6).
Tabela 15. Condições utilizadas nos experimentos de hidrólise ácida da borra de café.
Hidrólises T (ºC) Tempo (h) HCl (M) Ultrassom
Controle --- --- --- ---
H1 80 1,5 3 não
H2 80 1,5 6 não
H3 95 1,5 3 não
H4 95 1,5 6 não
H5 80 3 3 não
H6 80 3 6 não
H7 60 1,5 3 sim
H8 60 1,5 3 não
120
Após os processos mecânicos (rotor-estator e homogeneizador), a dispersão de borra
resultante foi filtrada (papel de filtro Whatman número 1 de 110 mm de diâmetro) com o objetivo de
isolar as partículas nanométricas. As nanopartículas obtidas após filtragem foram caracterizadas
quanto ao tamanho através de microscopia eletrônica de varredura (seção 4.5.3) e tiveram sua carga
superficial determinada através do potencial zeta (seção 4.5.4).
7.2.4 Metodologias de análise
7.2.4.1 Distribuição de tamanho de partículas – Peneiragem
O conjunto para peneiragem foi constituído por 9 peneiras com diferentes diâmetros de
abertura (mesh ABNT variando de 3,5 a 400). A peneiragem ocorreu em sistema vibratório (modelo
Magnet 100, fabricante Bertel Indústria Metalúrgica Ltda, Caieiras - SP) com frequência de 60 Hz
em duas bateladas, com tempo de 15 min para cada batelada. Para compor a distribuição de tamanho
foi considerada a fração mássica de borra de café retida em cada peneira.
7.2.4.2 Teor de carbono, hidrogênio e nitrogênio (CHN)
A quantificação da matéria orgânica em termos de carbono, hidrogênio e nitrogênio presente
na borra de café foi realizada em um analisador elementar Analyzer 2400, Série II (Perkin Elmer,
USA). As determinações foram feitas em triplicata.
7.2.4.3 Microscopia eletrônica de varredura
As amostras secas de borra de café foram montadas em “stubs” de alumínio, cobertas com
ouro em um Sputter Coater SCD 050-Balzers (Alzenau, Alemanha) e observadas em um microscópio
eletrônico de varredura Jeol JSM-6340F (Tóquio, Japão) (Instituto de Química da Unicamp) operado
a 10 kV. Foram feitas imagens em aumentos de magnitude 100 e 1000x.
7.2.4.4 Determinação de Potencial Zeta
O potencial- foi determinado no equipamento Nanoseries ZS Instrument (Zetasizer Nano-
ZS, Malvern Instruments, Worcestershire, UK), a 25° C com análise em triplicata. A mobilidade
eletroforética, ou seja, a velocidade das partículas sob efeito de um campo elétrico, foi obtida através
da técnica de “Laser Doppler Velocimetry” (LDV), que faz uso da relação existente entre a
velocidade e o espalhamento de luz produzido pelas partículas dispersas no meio. A mobilidade
121
eletroforética foi automaticamente convertida em valores de potencial- pelo software do
equipamento utilizando a equação de Henry (3):
UE = 2ɛz f(ka)/ 3
em que UE é a mobilidade eletroforética, ɛ é a constante dielétrica, z é o potencial-, é a
viscosidade do meio e f (ka) é a função de Henry. A função de Henry pode assumir diferentes valores
conforme a aproximação utilizada. Na aproximação de Smoluchowski, adequada para medidas feitas
em meio aquoso com moderada concentração de eletrólitos, o valor de f (ka) é 1,5 (HUNTER, 1988).
O potencial- foi medido em dispersões que apresentavam diferentes valores de pH, fazendo assim
uma varredura da relação entre o potencial- e o pH da amostra, numa titulação em que o ponto de
potencial- de valor zero pode ser identificado.
7.2.4.5 Espectroscopia de absorção na região do infravermelho
A técnica de espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) foi
aplicada para estudo da estrutura das amostras de borra de café. A análise de FTIR foi realizada em
um espectrofotômetro Perkin Elmer modelo Spectrum One (Waltham, Estados Unidos) com
transformada de Fourier. As amostras secas foram analisadas nas seguintes condições: região
espectral de número de onda de 4000 a 650 cm-1
, resolução de 4 cm-1
, com 16 varreduras.
7.2.4.6 Distribuição de tamanho de partículas – Difração a laser
A distribuição de tamanho de partículas (volumétrica e numérica) foi determinada através da
técnica de difração a laser utilizando-se um equipamento Laser Scattering Spectrometer Mastersizer
2000 (Malvern Instruments LTD., U.K). Utilizou-se água destilada como meio dispersante e agitação
de 1750 rpm. O tamanho médio das partículas foi determinado utilizando o Sauter Mean Diameter
(D32), que é definido como o diâmetro da esfera que possui a mesma relação volume/área superficial
que a partícula de interesse (Equação 4) e também pelo De Brouckere Mean Diameter (D43), definido
pela Equação 5.
2
3
32
ii
ii
dn
dnD (4)
3
4
43
ii
ii
dn
dnD (5)
onde ni é o número de partículas com diâmetro di. O “span”, parâmetro associado à polidispersão das
partículas, também foi determinado através da curva de distribuição de tamanhos e foi calculado de
acordo com a Equação 6.
122
)5,0(
)1,0()9,0(
d
ddSpan
(6)
em que d(0,1), d(0,5) e d(0,9) representam diâmetros de partículas tal que 10, 50 ou 90%,
respectivamente, da amostra analisada é constituída de partículas de tamanho menor que esse valor.
7.3 Resultados e discussão
7.3.1 Caracterização da borra de café
A borra de café proveniente de uma empresa produtora de café solúvel passou por processo
de secagem e foi caracterizada quanto a distribuição de tamanhos das partículas, potencial zeta das
partículas, morfologia das partículas, composição (carbono, nitrogênio e hidrogênio) e espectro na
região do infravermelho. A distribuição de tamanhos das partículas que compõem a borra de café
está apresentada na Figura 41A. É possível verificar que o resíduo da indústria de café solúvel
apresenta alta polidispersidade, com tamanhos variando entre 37 m até aproximadamente 10 mm. O
diâmetro médio obtido foi de 2,09 ± 0,33 mm. A distribuição de tamanho apresentada na Figura 41A
foi obtida através do método de separação em peneiras. Cada fração retida nas peneiras utilizadas foi
separada para posterior utilização (Figura 41B). Na Figura 41C está apresentada a distribuição de
tamanho de duas frações que foram separadas. A cada fração foi dado um nome conforme o mesh da
peneira correspondente. Essa distribuição de tamanhos da Figura 41C foi obtida por difração a laser e
esta técnica não pode ser utilizada em algumas frações devido ao limite máximo de tamanho
mensurável pelo equipamento. Ambas as distribuições mostradas na Figura 41C apresentaram mais
de um pico, que pode estar relacionado à aglomeração das partículas quando dispersas em água ou ao
inchamento das mesmas (a dispersão em água destilada é realizada durante as determinações feitas
no equipamento de difração a laser).
123
Figura 41. A) Distribuição de tamanho das partículas da borra de café. B) Frações separadas por tamanho
através da utilização de peneiras com mesh 3,5, 14, 30, 70, 100, 120 e 200. C) Distribuição de tamanho das
partículas das frações retiradas das peneiras com mesh 400 e 100.
Já a Tabela 16 apresenta o rendimento mássico de cada fração retida nas peneiras. O maior
rendimento foi da fração com tamanho médio de 3535 m (Mesh 14), seguida das frações obtidas
nas peneiras com mesh 30 (Dmédio = 985 m) e 70 (Dmédio = 385 m). Isso mostra que partículas de
tamanho micrométrico estão presentes na borra de café em quantidades consideráveis e podem ser
utilizadas após um processo simples de separação. A fração de menor tamanho foi obtida em peneira
de mesh 400, com diâmetro médio de 49,5 m. Essa fração apresentou o menor rendimento mássico
(0,03% m/m).
124
Tabela 16. Rendimento mássico das frações de borra de café.
Peneira Poro D médio Fração
(mesh) (m) (m) mássica (%)
400 37 49,5 0,03 ± 0,07
230 62 68,5 0,86 ± 0,20
200 75 100 0,78 ± 0,34
120 125 137 0,87 ± 0,30
100 149 179,5 2,32 ± 1,01
70 210 385 14,5 ± 3,51
30 560 985 34,72 ± 2,73
14 1410 3535 38,22 ± 5,53
3,5 5660 7000 7,69 ± 2,58
As frações de mesh 100 (Dmédio =179,5 m) e 400 (Dmédio = 49,5 m) foram caracterizadas
por microscopia eletrônica de varredura, como pode ser observado na Figura 42. Uma composição
heterogênea pode ser observada, destacando-se a presença de estruturas alongadas que é
característica de materiais fibrosos.
Figura 42. Microscopia eletrônica de varredura das frações 100 (Dmédio =179,5 m) e 400 (Dmédio = 49,5 m).
Magnitude de 100x. As barras representam 100 m.
125
Na Figura 43 está apresentada a variação do potencial zeta em função do pH da borra de café.
A variação da carga superficial das partículas frente ao pH pode influenciar na sua capacidade
emulsificante. Porém, o equipamento utilizado permite avaliar o potencial zeta em partículas de até
100 m. Assim, o potencial zeta foi avaliado apenas na fração com menor tamanho médio (fração
400, com diâmetro médio de 49,5 m). Foi possível verificar que a dispersão da borra em água tinha
um pH natural em torno de 5,0. Nessas condições, a borra apresenta potencial zeta negativo, próximo
de -25 mV. O ponto de carga zero corresponde aproximadamente ao pH de 3,3. Abaixo desse valor
de pH o potencial zeta é positivo.
Figura 43. Variação do potencial zeta em função do pH da fração 400 (Dmédio = 49,5 m ) da borra de café.
A borra de café apresenta composição similar ao grão de café, contendo majoritariamente
carboidratos, sendo hemicelulose o polissacarídeo encontrado em maior quantidade, seguido de
celulose. Também apresenta uma porção considerável de compostos nitrogenados, que podem incluir
proteínas, cafeína, trigonelina, aminas e aminoácidos livres (MUSSATTO et al., 2011).
Considerando a complexidade de sua composição, as frações de borra resultantes dos processos de
moagem e extração do café podem apresentar uma composição diferente para cada fração. Assim,
dependendo da fração escolhida, propriedades diferentes poderiam ser encontradas, e, portanto,
partículas com diferentes capacidades emulsificantes poderiam ser obtidas.
Sendo assim, o teor de hidrogênio, nitrogênio e carbono de cada fração foram determinados e
estão apresentados na Figura 44. É possível verificar que houve pequenas diferenças nos teores de
carbono, hidrogênio e nitrogênio conforme o tamanho da fração analisada. Além disso, ao se analisar
as razões de N/C e H/C de cada fração, resultados bastante semelhantes foram observados, indicando
que não há diferença significativa na composição das diferentes frações.
-30
-25
-20
-15
-10
-5
0
5
10
2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
Po
ten
cial
Zet
a (m
V)
pH
126
Figura 44. Composição elementar CHN das frações da borra de café.
Também foram analisados os espectros de absorção na região do infravermelho para algumas
frações (Figura 45). A espectroscopia no infravermelho se baseia no fato de que as ligações químicas
das substâncias possuem frequências de vibrações específicas, as quais correspondem aos níveis de
energia da molécula (chamados nesse caso de níveis vibracionais). Se a molécula receber radiação
eletromagnética com 'exatamente' a mesma energia de uma dessas vibrações, então a luz será
absorvida, desde que sejam atendidas determinadas condições (STUART, 2004). Nesse tipo de
espectroscopia um feixe de radiação infravermelha passa pela amostra e a quantidade de energia
transmitida é registrada e utilizada para a construção de um gráfico em função número de onda
utilizado (normalmente uma faixa entre 4000-400 cm-1
).
Na Figura 45A foram apontadas as principais informações que o espectro obtido possui. A
banda mais larga em aproximadamente 3400 cm-1
inclui diversos modos vibracionais atribuídos
principalmente aos grupos –OH e, com menor contribuição, aos grupos funcionais contendo -NH. A
presença dos grupos metil e metileno foi confirmada pelos dois picos agudos que aparecem em 2925
cm-1
e 2855 cm-1
, atribuídos ao estiramento assimétrico e simétrico de ligações C-H em cadeias
127
alifáticas. Estes picos foram previamente relacionados à presença de cafeína em café torrado
(CRAIG et al., 2012). Os mesmos picos também foram relacionados à presença de lipídeos em milho
e farinha de milho (CREMER & KALETUNC, 2003). Como a cafeína é altamente solúvel em água
quente, é mais provável que estes picos estejam relacionados à presença de lipídeos nas borras de
café avaliadas (PUJOL et al., 2013).
A banda que aparece em 1742 cm-1
está associada com a vibração de grupos carbonila (C=O)
em ésteres alifáticos ou em triglicerídeos. Portanto, esta banda também pode ser atribuída à presença
de lipídeos. As bandas de baixa intensidade entre 1665 a 1000 cm-1
indicam presença de ligações
C=C e C-H, e foram atribuídas por alguns autores à presença de lipídeos, carboidratos, como lignina,
e de ácidos clorogênicos (WANG & LIM, 2012; CLIFFORD et al., 2008). Ácidos clorogênicos são
compostos fenólicos que contribuem para o sabor do café e são de importância bio-farmacológica
potencial para os seres humanos (FARAH et al., 2006). No entanto, a espectroscopia de
infravermelho não é capaz de distinguir as bandas correspondentes aos ácidos clorogênicos e aos
polissacarídeos, e uma análise cromatográfica seria necessária para confirmar a presença de ácidos
clorogênicos na amostra (PUJOL et al., 2013).
Já a Figura 45B apresenta os perfis de absorção de diferentes frações de borra de café. Os
perfis das amostras analisadas foram semelhantes, mostrando que não há diferença significativa de
composição entre as diferentes frações da borra, confirmando o resultado obtido na análise de
composição CHN.
128
Figura 45. A) Espectro de absorção na região do infravermelho da fração 400 com as principais bandas
interpretadas através da comparação com trabalhos similares. B) Espectros de absorção na região do
infravermelho das frações de borra de café 70 (Dmédio = 385 m), 120 (Dmédio = 137 m), 230 (Dmédio = 68,5
m) e 400 (Dmédio = 49,5 m).
No geral foi possível verificar que a borra de café é um material constituído de partículas com
tamanho médio variando numa faixa bastante abrangente (37 m a 10 mm), que a morfologia dessas
partículas é bastante heterogênea, predominando o formato característico de material fibroso.
Quando dispersas em água, as partículas apresentam um potencial zeta negativo (-25 mV) no pH
natural (5,0). Essa carga pode contribuir para manter o equilíbrio das partículas em uma dispersão,
aumentando o tempo até que a sedimentação aconteça. Também se concluiu que não há diferenças
significativas de composição entre as diferentes frações.
129
7.3.2 Redução de tamanho das partículas da borra de café
Com o intuito de tornar as partículas mais adequadas para uso como emulsificantes em
emulsões é preciso reduzir o tamanho das mesmas. Assim alguns métodos foram utilizados e os
resultados encontram-se a seguir. A maioria dos ensaios foi feita utilizando como amostra a fração
100 (179,5 m).
7.3.2.1 Método químico: hidrólise ácida
Foram feitos 8 ensaios de hidrólise ácida em diferentes condições (descritas na Tabela 15 da
seção 7.2.3) partindo-se da fração de mesh 100 de borra de café (Figura 46). Os resultados de
diâmetro médio e span estão apresentados na Tabela 17. Todas as hidrólises efetuadas resultaram em
redução do tamanho das partículas, em que o diâmetro médio superficial (D32) original de
aproximadamente 180 m foi reduzido para a faixa de 47 a 84 m, dependendo das condições do
ensaio. A polidispersidade (span) aumentou após todas as hidrólises realizadas, o que pode ser
devido às partículas de menor tamanho que foram geradas. Dentre os fatores avaliados foi possível
verificar que a temperatura de hidrólise teve maior influência que os demais fatores (tempo de
hidrólise, concentração de HCl e uso de ultrassom). O aumento da concentração de HCl causou
redução de tamanho somente utilizando a temperatura de 80ºC.
Figura 46. Efeito da A) concentração de HCl, B) tempo, C) temperatura e D) utilização de ultrassom durante a
hidrólise na distribuição de tamanho de partículas da borra de café.
130
Tabela 17. Diâmetro médio e span das partículas obtidas após as diferentes condições de hidrólise.
Hidrólises D32 (m) D43 (m) Span
Controle 178,4 ± 23,2 268,2 ± 19,5 1,32 ± 0,08
H1 69,9 ± 4,6 178,6 ± 7,1 2,19 ± 0,03
H2 58,6 ± 3,4 155,8 ± 7,8 2,37 ± 0,10
H3 47,1 ± 2,3 133,0 ± 7,2 2,66 ± 0,05
H4 55,1 ± 2,3 143,2 ± 6,9 2,57 ± 0,04
H5 57,4 ± 1,9 155,7 ± 5,0 2,45 ± 0,04
H6 54,3 ± 2,6 157,8 ± 12,0 2,74 ± 0,07
H7 78,3 ± 3,4 213,0 ± 5,7 1,93 ± 0,02
H8 83,7 ± 14,7 211,6 ± 18,4 2,05 ± 0,11
Apesar da considerável redução de tamanho alcançada, esta ainda está aquém do objetivo
inicial do projeto, que visava a produção de partículas na escala nanométrica. Alternativas para
tornar a hidrólise ácida mais efetiva seriam o aumento de temperatura (acima da temperatura de
ebulição da água) ou o uso de ácido mais forte, como o ácido sulfúrico. Porém, essas alternativas
podem ter como consequência a síntese de compostos indesejáveis durante o processo de hidrólise, o
que não é interessante para materiais cuja aplicação principal seria em produtos alimentícios.
7.3.2.2 Método físico: Homogeneizador a altas pressões
Primeiramente foi determinado o efeito de sucessivas passagens no homogeneizador
utilizando uma pressão de 600 bar (Figura 47). A primeira passagem levou a uma redução
substancial do tamanho médio das partículas, porém as passagens adicionais causaram redução de
tamanho pouco significativa. Isso significa que todos os processos de ruptura e desagregação
possíveis para a quantidade de energia aplicada ocorreram de forma eficiente na primeira passagem.
131
Figura 47. Distribuição de tamanho das partículas da Fração 100 (Dmédio =179,5 m) em função do número de
passagens em homogeneizador a alta pressão.
Também foi determinado o efeito de diferentes pressões de homogeneização na distribuição
de tamanho e polidispersão das partículas (Figura 48). Maiores pressões permitiram a obtenção de
partículas com menor tamanho médio e polidispersão, porém a redução de tamanho frente ao
aumento de pressão utilizado (de 200 a 1000 bar) pode ser considerada modesta.
Figura 48. Distribuição de tamanho das partículas da Fração 100 (Dmédio =179,5 m) em função da pressão de
homogeneização.
7.3.2.3 Método físico: Rotor-estator
O efeito de sucessivos passos em rotor-estator sobre a distribuição de tamanho da fração de
mesh 100 (Dmédio =179,5 m) encontra-se na Figura 49. Duas diferentes velocidades foram usadas
132
(14000 e 18000 rpm). Observou-se que esse aumento na velocidade do rotor não causou alterações
significativas nos resultados obtidos. Pode-se considerar que a redução de tamanho ocorreu até o
sétimo passo, pois após esse ponto o tamanho permaneceu praticamente constante. Porém, as
maiores reduções ocorreram até 3 passagens no rotor-estator. Já a polidispersidade aumentou com a
aplicação de alto cisalhamento até a quarta passagem, sendo que após isso uma pequena redução foi
verificada. No entanto, o valor final da polidispersidade foi ainda maior que o valor inicial da fração
100.
Figura 49. Diâmetro médio (D43) e polidispersão das partículas em função do número de passos em rotor-
estator da Fração 100 (Dmédio =179,5 m).
Também foi determinado o efeito do rotor-estator em outras frações de borra de café além da
fração 100. A Figura 50 mostra as reduções de tamanho alcançadas nas frações 14, 30, 70 e 100. É
possível observar que o perfil de redução foi semelhante para todas as frações. Através dos
resultados de D43 apresentados na Figura 50 é possível observar que menores partículas são
alcançadas partindo-se de frações menores. No entanto os valores de D32 (resultados não
apresentados) mostram que após 3 passagens todas as amostras chegam a um tamanho parecido, com
valores de D32 na faixa de 26 a 37 m aproximadamente. Esse resultado nos mostra que parece haver
um limite para a redução de tamanho que pode ser alcançada através desse método. É possível que as
frações de tamanhos maiores só contenham aglomerados maiores e que a redução de tamanho feita
pelo rotor-estator pode estar associada à quebra desses aglomerados, resultando em tamanhos muito
parecidos mesmo partindo de frações diferentes. Esse resultado também pode estar associado ao
limite de rompimento de acordo com a força aplicada, e à medida que o diâmetro da partícula
decresce, a força necessária para a quebra dessa partícula se torna muito maior.
133
Figura 50. Efeito de 3 passagens em rotor-estator nas frações de borra de café: F14 (3535 m), F30 (985 m),
F70 (385 m) e F100 (179 m).
O efeito da temperatura da dispersão durante a aplicação do rotor-estator também foi
determinado. Os resultados da Figura 51 mostram que a temperatura não influenciou
significativamente a redução de tamanho, ou seja, que as propriedades mecânicas das partículas não
mostraram grandes alterações dentro da faixa de temperatura estudada.
Figura 51. Diâmetro médio das partículas após a passagem da Fração 100 (Dmédio =179,5 m) em rotor-estator
utilizando diferentes temperaturas durante o processo (5, 25, 50 ou 70ºC).
Assim, quanto aos processos físicos utilizados (homogeneizador e rotor-estator) foi possível
observar que o uso da pressão mais alta (1000 bar) no homogeneizador resultou em partículas com
distribuição de tamanho bastante similar à obtida após 7 etapas no rotor-estator. Já o uso da menor
pressão (200 bar) resultou em partículas com tamanho similar ao obtido após 4 passos no rotor-
estator. É importante ressaltar que o uso do homogeneizador tem certas limitações, pois a dispersão
134
submetida a esse processo deve ser diluída e não pode conter partículas muito grandes, dada a
possibilidade de entupimento e queda de eficiência do equipamento. Assim, para as próximas etapas
optou-se pelo uso do rotor-estator, um equipamento mais simples de operar que o homogeneizador e
que permitiu a obtenção de resultados equivalentes.
Além disso, observando-se as curvas de distribuição de tamanho, tanto após o rotor-estator
quanto após o homogeneizador, foi possível verificar a presença de partículas com tamanhos
menores que 1 m (Tabela 18). Assim, o isolamento dessas partículas também foi avaliado para a
obtenção das nanopartículas de borra de café. De fato, verificou-se que uma filtragem simples em
papel de filtro permitia a obtenção de dispersões contendo partículas de tamanho nanométrico. Os
resultados a seguir mostram as características das dispersões após a filtragem (denominadas como
filtrados).
Tabela 18. Distribuição de tamanho das partículas presentes nas frações 400 e 100 da borra de café antes e
após tratamento em homogeneizador a alta pressão ou em rotor-estator.
7.3.2.4 Caracterização dos filtrados
Na Figura 52 estão apresentadas as distribuições de tamanho, potencial zeta, e morfologia das
dispersões de borra de café filtradas após múltiplas passagens em rotor-estator. As curvas de
distribuição de tamanho mostraram sempre um pico ao redor do valor de 100 nm, independente do
número de passagens em rotor-estator. Quanto ao potencial zeta, foi possível verificar que as
partículas do filtrado apresentaram maiores valores absolutos de potencial zeta que o apresentado
135
pela fração 400 (seção 7.3.1, Figura 43). A microscopia mostra a presença das partículas de tamanho
reduzido (micrométricas) e também a presença de alguns grandes aglomerados.
Figura 52. Distribuição de tamanho das partículas (quintuplicatas) dos filtrados obtidos após A) 2, B) 4, C) 7 e
D) 8 passagens em rotor-estator. E) Potencial zeta dos filtrados em função das passagens no rotor-estator. F)
Micrografia obtida em microscópio eletrônico de varredura do filtrado obtido após 8 passagens em rotor-
estator com magnitude de 1000x. Barra representa 10 m. A fração 100 foi a amostra utilizada para obtenção
das dispersões.
As dispersões obtidas tiveram sua concentração de partículas determinada através do método
de secagem e avaliação da massa seca. Um valor de 0,02% m/m de partículas em solução foi obtido.
Para viabilizar o uso dessas dispersões na formação de emulsões é preciso concentrar essas
136
dispersões de modo a atingir concentrações de no mínimo 1% m/m de partículas. Porém, não foi
possível realizar esta etapa durante este trabalho, ficando como sugestão para possíveis trabalhos
futuros.
Assim, nesse capítulo foram apresentadas algumas propriedades da borra de café bem como
os resultados referentes à sua redução de tamanho, realizada por métodos físicos ou por hidrólise
ácida. Esse trabalho continha em seu início duas principais propostas de estudos, as emulsões
estabilizadas por borra de café ou por gelana acilada. Devido aos resultados interessantes obtidos no
estudo da gelana como agente emulsificante, optou-se por fazer deste o foco do trabalho. Assim, o
estudo envolvendo a borra de café não teve prosseguimento neste projeto.
7.4 Conclusão
Na caracterização da borra de café foi observado que se trata de um material constituído de
partículas com diâmetro médio variando numa faixa bastante abrangente (37 m a 10 mm), com
morfologia heterogênea e potencial zeta negativo no pH natural (5,0). Não foram observadas
diferenças significativas de composição entre as frações separadas por tamanho através de peneiras.
Os resultados envolvendo a redução de tamanho das partículas de borra de café mostraram
que os métodos físicos utilizados foram mais eficientes na redução de tamanho das partículas que o
método químico, além de se constituírem como métodos mais seguros, em que não há a formação de
compostos com potencial toxicidade durante o processo. A redução de tamanho utilizando o método
simples de cisalhamento em rotor-estator seguida de separação das partículas através de filtragem foi
a melhor estratégia encontrada para obter nanopartículas de borra de café. Também foi observado
que a viabilidade do processo de redução de tamanho através de rotor-estator pode ser melhorada
através do uso de frações com maiores tamanhos médios. Apesar de uma metodologia para a
obtenção de nanopartículas de café ter sido determinada, a aplicação dessas partículas em emulsões
não foi realizada nesse trabalho, pois o rendimento do processo era muito reduzido.
138
8. REFERÊNCIAS
AZOUAOU, N.; SADAOUI, Z.; DJAAFRI, A.; MOKADDEM, H. Adsorption of cadmium from
aqueous solution onto untreated coffee grounds: Equilibrium, kinetics and thermodynamics. Journal
of Hazardous Materials, v. 184, p. 126–134, 2010.
BALLESTEROS, L. F.; TEIXEIRA, J. A.; MUSSATTO, S. I. chemical, functional, and structural
properties of spent coffee grounds and coffee silverskin. Food Bioprocess Technology, v. 7, p.
3493–3503, 2014.
BARNES, H. A. Rheology of emulsions - a review. Colloids and Surfaces A: Physicochemical
and Engineering Aspects, v. 91, p. 89-95, 1994.
BINKS, B. P.; LUMSDON, S. O. Stability of oil-in-water emulsions stabilised by silica particles.
Physical Chemistry Chemical Physics, v. 1, p. 3007-3016, 1999.
BINKS, B, P. Particles as surfactants - similarities and differences. Current Opinion in Colloid &
Interface Science, v. 7, p. 21-41, 2002.
BINKS, B. P. Colloidal particles at liquid interfaces. Physical Chemistry Chemical Physics, v.
9(48), p. 6298-6299, 2007.
CARNEIRO-DA-CUNHA, M. G.; CERQUEIRA, M. A.; SOUZA, B. W. S.; TEIXEIRA, J. A.;
VICENTE, A. A. Influence of concentration, ionic strength and pH on zeta potential and mean
hydrodynamic diameter of edible polysaccharide solutions envisaged for multinanolayered films
production. Carbohydrate Polymers, v. 85, p. 522–528, 2011.
139
CHEN, J.; VOGEL, R.; WERNER, S.; HEINRICH, G.; CLAUSSE, D.; DUTSCHK, V. Influence of
the particle type on the rheological behavior of Pickering emulsions. Colloids and Surfaces A:
Physicochemical Engineering Aspects, v. 382, p. 238–245, 2011.
CHEVALIER, Y.; BOLZINGER, M. Emulsions stabilized with solid nanoparticles: Pickering
emulsions. Colloids and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v. 439, p. 23–34,
2013.
CLIFFORD, M. N.; KIRKPATRICK, J.; KUHNERT, N.; ROOZENDAAL, H.; SALGADO, P. R.
LCMSn analysis of the cis isomers of chlorogenic acids. Food Chemistry, v. 106, p. 379–385, 2008.
CRAIG, A. P.; FRANCA, A. S.; OLIVEIRA, L. S. Discrimination between defective and non-
defective roasted coffees by diffuse reflectance infrared Fourier transform spectroscopy. Food
Science and Technology, v. 47, p. 505–511, 2012.
CREMER, D. R.; KALETUNC, G. Fourier transform infrared microspectroscopic study of the
chemical microstructure of corn and oat flour-based extrudates. Carbohydrate Polymers, v. 52, p.
53–65, 2003.
CRUZ, R.; BAPTISTA, P.; CUNHA, S.; PEREIRA, J. A.; CASAL, S. Carotenoids of Lettuce
(Lactuca sativa L.) Grown on Soil Enriched with Spent Coffee Grounds. Molecules, v. 17, p. 1535-
1547, 2012.
DESTRIBATS, M.; ROUVET, M.; GEHIN-DELVAL, C.; SCHMITT, C.; BINKS, B. P. Emulsions
stabilised by whey protein microgel particles: towards food-grade Pickering emulsions. Soft Matter,
v.10, p. 6941–6954, 2014.
DICKINSON, E.; STAINSBY, G. Emulsion stability. In E. Dickinson & G. Stainsby, Advances in
Food Emulsion and foams, London: Elsevier Applied Science, p. 1-44, 1988.
140
DICKINSON, E. An Introduction to Food Colloids. Oxford: Oxford Science Publishers, 1992.
DICKINSON, E. Towards more natural emulsifiers. Trends in Food Science & Technology, v. 4,
p. 330-334, 1993.
DICKINSON, E. Milk protein interfacial layers and the relationship to emulsion stability and
rheology. Colloids and Surfaces B, v. 20, p. 197-210, 2001.
DICKINSON, E. Hydrocolloids at interfaces and the influence on the properties of dispersed
systems. Food Hydrocolloids, v. 17, p. 25-39, 2003.
DICKINSON, E. Use of nanoparticles and microparticles in the formation and stabilization of food
emulsions. Trends in Food Science & Technology, v. 24, p. 4-12, 2012.
DINSMORE, A. D.; HSU, M. F.; NIKOLAIDES, M. G.; MARQUEZ, M.; BAUSCH, A. R.;
WEITZ, D. A. Colloidosomes: Selectively Permeable Capsules Composed of Colloidal Particles.
Science, v. 298, p. 1006-1009, 2002.
FARAH, A.; PAULIS, T.; MOREIRA, D. P.; TRUGO, L. C.; MARTÍN, P. R. Chlorogenic acids and
lactones in regular and water-decaffeinated Arabica coffees. Journal of Agricultural and Food
Chemistry, v. 54, p. 374–381, 2006.
FRANCA, A. S.; OLIVEIRA, L. S.; FERREIRA, M. E. Kinetics and equilibrium studies of
methylene blue adsorption by spent coffee grounds. Desalination, v. 249, p. 267–272, 2009.
141
FRELICHOWSKA, J.; BOLZINGER, M.-A.; PELLETIER, J.; VALOUR, J.-P.; CHEVALIER, Y.
Topical delivery of lipothilic drugs from o/w Pickering emulsions. International Journal of
Pharmaceutics, v. 371, p. 56−63, 2009.
FRIBERG, S., LARSSON, K., AND SJOBLOM J. (2004). Food Emulsions. New York: Marcel
Dekker.
GAONKAR, A. G. Surface and interfacial activities and emulsion characteristics of some food
hydrocolloids. Food Hydrocolloids, v. 5, p. 329-337, 1991.
GARTI, N. Hydrocolloids as emulsifying agents for oil-in-water emulsions. Journal of Dispersion
Science and Technology, v. 20, p. 1-2, 1999.
GARTI, N.; LESER, M. E. Emulsification properties of hydrocolloids. Polymers for Advanced
Technologies, v. 12, p. 123-135, 2001.
GRASDALEN, H.; SMIDSROD, O. Gelation of gellan gum. Carbohydrate Polymers, v. 7, p. 371-
393, 1987.
HEILIG, A.; GÖGGERLE, A.; HINRICHS, J. Multiphase visualization of fat containing -
lactoglobulin– -carrageenan gels by confocal scanning laser microscopy, using a novel dye, V03-
01136, for fat staining. LWT—Food Science and Technology, v. 42, p. 646–653, 2009.
HILL, S.E. Emulsion. In: HALL, G.M. Methods of testing protein functionality. London: Blackie
Academic & Professional, Cap.6, p.153-185, 1996.
HOSSEINI-PARVAR, S. H.; OSANO, J. P.; MATIA-MERINO, L. Emulsifying properties of basil
seed gum: Effect of pH and ionic strength. Food Hydrocolloids, v. 52, p. 838-847, 2016.
142
HUANG, X; KAKUDA, Y; CUI, W. Hydrocolloids in emulsions: particle size distribution and
interfacial activity. Food Hydrocolloids, v. 15, p. 533-542, 2001.
HUANG, Y.; TAKHAR, P. S.; TANG, J.; SWANSON, B.G. Flow behaviors of high acyl gellan
aqueous solutions as affected by temperature, and calcium and gellan concentrations. International
Journal of Food Engineering, v. 4 (5), article 12, 2008.
HUNTER, R. J. Zeta potential in colloid science: principles and applications. London, UK:
Academic Press, 1988.
HUNTER, R. J. Introduction to Modern Colloid Science, Oxford University Press, Oxford, UK,
1993.
HUNTER, T. N.; PUGH, R. J.; FRANKS, G. V.; JAMESON, G. J. The role of particles in
stabilizing foams and emulsions. Advances in Colloid and Interface Science, v. 137, p. 57-81,
2008.
ICO, International Coffee Organization (2015). Disponível em: http://www.ico.org/. Acessado 11 de
Abril de 2016.
ISO, International Organisation for Standardisation (2008). International Standard ISO22412 -
Particle Size Analysis – Dynamic Light Scattering. Disponível em:
http://www.iso.org/iso/catalogue_detail.htm?csnumber=40942. Acessado 04 de Julho de 2016.
JAMPEN, S.; BRITT, I. J.; TUNG, M. A. Gellan polymer solution properties: dilute and
concentrated regimes. Food Research International, v. 33, p. 579-586, 2000.
143
JANSSON, P.E.; LINDBERG, B.; SANDFORD, P.A. Structural studies of gellan gum, an
extracellular polysaccharide elaborated by Pseudomonas elodea. Carbohydrate Research, v. 124, p.
135-139, 1983.
JIA, X.; XU, R.; SHEN, W.; XIE, M.; ABID, M.; JABBAR, S.; WANG, P.; ZENG, X.; WU, T.
Stabilizing oil-in-water emulsion with amorphous cellulose. Food Hydrocolloids, v. 43, p. 275-282,
2015.
KANG, K.S.; VEEDER, G.T.; MIRRASOUL, P.J.; KANEKO, T.; COTTRELL, I.W. Agar-like
polysaccharide produced by Pseudomonas species: production and basic properties. Applied and
Environmental Microbiology, v. 43, p. 1086-1091, 1982.
KARGAR, M.; SPYROPOULOS, F.; NORTON, I. T. Microstructural design to reduce lipid
oxidation in oil-in-water emulsions. Procedia Food Science, v. 1, p. 104−108, 2011.
KARBSTEIN, H.; SCHUBERT, H. Developments in the continuous mechanical production of oil-
in-water macro-emulsions. Chemical Engineering and Processing, v. 34, p. 205-211, 1995.
LI, C.; LI, Y.; SUN, P.; YANG, C. Pickering emulsions stabilized by native starch granules.
Colloids and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v. 431, p. 142– 149, 2013.
LIU, F.; TANG, C. Soy protein nanoparticle aggregates as pickering stabilizers for oil-in-water
emulsions. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 61, p. 8888−8898, 2013.
LORENZO, G.; ZARITZKY, N.; CALIFANO, A. Rheological analysis of emulsion-filled gels based
on high acyl gellan gum. Food Hydrocolloids, v. 30, p. 672-680, 2013.
144
LUO, Z.; MURRAY, B. S.; YUSOFF, A.;. MORGAN, M. R. A.; POVEY, M. J. W.; DAY, A. J.
Particle-Stabilizing Effects of Flavonoids at the Oil-Water Interface. Journal of Agriculture and
Food Chemistry, v. 59, p. 2636–2645, 2011.
MALDONADO-VALDERRAMA, J.; WILDE, P.; MACIERZANKA, A.; MACKIE, A. The role of
bile salts in digestion. Advances in Colloid and Interface Science, v. 165, p. 36–46, 2011.
MAYDATA, A. G. Café, antioxidantes y protección a la salud. Medisan, v. 6(4), p. 72–81, 2002.
MCCLEMENTS, D. J.; WEISS J. Lipid Emulsions. In: Shahidi F, editor. Bailey's Industrial Oil and
Fat Products, 6th ed, New York: John Wiley Publishers, 2004.
MCCLEMENTS, D.J. Food emulsions: principles, practice and techniques. Washington: CRC
Press, 2005.
MCCLEMENTS, D.J. Critical review of techniques and methodologies for characterization of
emulsion stability. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, v. 47, p. 611-649, 2007.
MUSSATTO, S. I.; MACHADO, E. M. S.; MARTINS, S.; TEIXEIRA, J. A. Production,
Composition, and Application of Coffee and Its Industrial Residues. Food Bioprocess
Technolology, v. 4, p. 661–672, 2011.
MUSSATTO, S. I.; BALLESTEROS, L. F.; MARTINS, S.; TEIXEIRA, J. A. Extraction of
antioxidant phenolic compounds from spent coffee grounds. Separation and Purification
Technology, v. 83, p. 173–179, 2011b.
NAKAUMA, M.; FUNAMI, T.; NODA, S.; ISHIHARA, S.; AL-ASSAF, S.; NISHINARI, K.; et al.
Comparison of sugar beet pectin, soybean soluble polysaccharide, and gum arabic as food
145
emulsifiers. 1. Effect of concentration, pH, and salts on the emulsifying properties. Food
Hydrocolloids, v. 22, p. 1254-1267, 2008.
NAN, F.; WU, J.; QI, F.; LIU, Y.; NGAI, T.; MA, G. Uniform chitosan-coated alginate particles as
emulsifiers for preparation of stable Pickering emulsions with stimulus dependence. Colloids and
Surfaces A: Physicochemical Engineering Aspects, v. 456, p. 246–252, 2014.
NICKERSON, M. T.; PAULSON, A. T.; SPEERS, R. A. Rheological properties of gellan solutions:
effect of calcium ions and temperature on pre – gel formation. Food Hydrocolloids, v. 17, p. 577 –
583, 2003.
O’NEILL, M.A.; SELVENDRAN, R.R.; MORRIS, V.J. Structure of the acidic extracellular gelling
polysaccharide produced by Pseudomonas elodea. Carbohydrate Research, v. 124, p. 123-133,
1983.
OZTURK, B.; MCCLEMENTS, D. J. Progress in natural emulsifiers for utilization in food
emulsions. Current Opinion in Food Science, v. 7, p. 1–6, 2016.
PICKERING, S. U. Emulsions. Journal of the Chemical Society, v. 91, p. 2001–2021, 1907.
PUJOL, D.; LIU, C.; GOMINHO, J.; OLIVELLA, M. À.; FIOL, N.; VILLAESCUSA, I.; PEREIRA,
H. The chemical composition of exhausted coffee waste. Industrial Crops and Products, v. 50, p.
423– 429, 2013.
RAFE, A.; RAZAVI, S. M. A.; FARHOOSH, R. Rheology and microstructure of basil seed gum and
b-lactoglobulin mixed gels. Food Hydrocolloids, v. 30(1), p. 134-142, 2013.
146
RAYNER, M.; TIMGREN, A.; SJOO, M.; DEJMEK, P. Quinoa starch granules: a candidate for
stabilising food-grade Pickering emulsions. Journal of the Science of Food and Agriculture, V.
92, p. 1841-1847, 2012.
SAFARIK, I.; HORSKA, K.; SVOBODOVA, B.; SAFARIKOVA, M. Magnetically modified spent
coffee grounds for dyes removal. European Food Research and Technology, v. 234, p. 345–350,
2012.
SANDERSON, G. R. Gellan Gum. In: Harris, P (Ed.). Food Gels. Elsevier Applied Science, 1990.
p. 201 – 231.
SCHMIDT, U. S.; KOCH, L.; RENTSCHLER, C.; KURZ, T.; ENDRESS, H. U.; SCHUCHMANN,
H. Effect of molecular weight reduction, acetylation and esterification on the emulsification
properties of citrus pectin. Food Biophysics, v. 10, p. 217-227, 2015.
SILVA, M. A.; NEBRA, S. A.; SILVA, M. J. M.; SANCHEZ, C. G. The use of biomass residues in
the brazilian soluble coffee industry. Biomass and Bioenergy, v. 14, p. 457-467, 1998.
STEPHEN, A. M.; CHURMS, S. C. Introduction. In Food polysaccharide and their applications,
edited by Stephen AM, Phillips GO and Williams PA, 2nd edition, CRC Press, Taylor & Francis,
Boca Raton, FL, chapter 1, p. 1-24, 2006.
STEWART, D. Lignin as a base material for materials applications: Chemistry, application and
economics. Industrial Crops and Products, v. 27(2), p. 202–207, 2008.
STOCCO, A.; RIO, E.; BINKS, B. P.; LANGEVIN, D. Aqueous foams stabilized solely by particles.
Soft Matter, v. 7, p. 1260, 2011.
147
STUART, B. H. Infrared Spectroscopy: Fundamentals and Applications. John Wiley & Sons,
Ltd, Chichester, 2004.
TANG, J.; TUNG, M. A.; ZENG, Y. Compression strength and deformation of gellan gels formed
with mono- and divalent cations. Carbohydrate Polymers, v. 29, p. 11-16, 1996.
TAVERNIER, I.; WIJAYA, W.; VAN DER MEEREN, P.; DEWETTINCK, K.; PATEL, A. R.
Food-grade particles for emulsion stabilization. Trends in Food Science & Technology, v. 50, p.
159-174, 2016.
TAYLOR, D. L.; FERRIS, C. J.; MANIEGO, A. R.; CASTIGNOLLES, P.; PANHUIS, M.;
GABORIEAU, M. Characterization of gellan gum by capillary electrophoresis. Australian Journal
of Chemistry, v. 65, p. 1156–1164, 2012.
TZOUMAKI, M. V.; MOSCHAKIS, T.; KIOSSEOGLOU, V.; BILIADERIS, C. G. Oil-in-water
emulsions stabilized by chitin nanocrystal particles. Food Hydrocolloids, v. 25, p. 1521-1529, 2011.
TZOUMAKI, M. V.; MOSCHAKIS, T.; SCHOLTEN, E.; BILIADERIS, C. G. In vitro lipid
digestion of chitin nanocrystal stabilized o/w emulsions. Food & Function, v. 4, p. 121−129, 2013.
VILELA, J. A. P.; CAVALLIERI, A. L. F.; CUNHA, R L. The influence of gelation rate on the
physical properties/structure of salt-induced gels of soy protein isolate-gellan gum. Food
Hydrocolloids, v. 25, n. 7, p. 1710-1718, 2011.
VILELA, J. A. P.; CUNHA, R. L. High acyl gellan as an emulsion stabilizer. Carbohydrate
Polymers, v. 139, p. 115–124, 2016.
148
WALSTRA, P., GEURTS, T.J., NOOMEN, A., JELLEMA, A., VAN BOEKEL, M. A. J. S. Dairy
Technology, In: Principles of Milk Properties and Processes. Marcel Dekker, New York, USA, p.
107–147, 1999.
WANG, N.; LIM, L. T. Fourier transform infrared and physicochemical analysesof roasted coffee.
Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 60, p. 5446–5453, 2012.
WHITTAKER, L. E.; AL – RUQAIE, I. M.; KASAPIS, S.; RICHARDSON, R. K. Development of
composite structures in the gellan polysaccharide/sugar system. Carbohydrate Polymers, v.33, p.
39-46, 1997.
YADAV, M. P.; MOREAU, R. A.; HOTCHKISS, A. T.; HICKS, K. B. A new corn fiber gum
polysaccharide isolation process that preserves functional components. Carbohydrate Polymers, v.
87, p. 1169-1175, 2012.
YI, C. L.; YANG, Y. Q.; JIANG, J. Q.; LIU, X. Y.; JIANG, M. Research and application of particle
emulsifiers. Progress in Chemistry, v. 23, p. 65-79, 2011.
YING, Q.; CHU, B. Overlap concentration of macromolecules in solution. Macromolecules, v. 20,
p. 362–366, 1987.
ZOPPE, J. O; VENDITTI, R. A.; ROJAS, O. J. Pickering emulsions stabilized by cellulose
nanocrystals grafted with thermo-responsive polymer brushes. Journal of Colloid and Interface
Science, v. 369, p. 202–209, 2012.
ZUORRO, A.; LAVECCHIA, R. Spent coffee grounds as a valuable source of phenolic compounds
and bioenergy. Journal of Cleaner Production, v. 34, p. 49-56, 2012.