Empresas feitas para Vencer - Itarget

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Empresas feitas para Vencer Por que apenas algumas empresas brilham A primeira etapa do levantamento que resultou no livro Empresas Feitas para Vencer consistiu em definir os requisitos que uma empresa deveria satisfazer para pertencer à categoria daquelas que passaram de “boas” a “grandiosas”. Depois de longo debate, o pesquisador James Collins e sua equipe estabeleceram o seguinte parâmetro de empresa que passou de boa a grandiosa: desde sua criação até determinado “ponto de inflexão”, ela deveria ter lucros acumulados sobre ações que ficassem na média do se- tor de atividade ou abaixo dela. Depois disso e durante os 15 anos se- guintes, seus lucros deveriam superar pelo menos três vezes a média do mercado. A escolha de um período de 15 anos se fundamentou na necessida- de de descartar empresas que tivessem tido um golpe de sorte – afinal, parece impossível que uma maré boa se mantenha por tanto tempo. A- lém disso, como esse período vai além da média dos mandatos dos pre- sidentes de empresa, serviu para diferenciar as empresas grandiosas daquelas que são apenas boas, mas com líderes excepcionais.

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Empresas feitas para Vencer

Por que apenas algumas empresas brilham

A primeira etapa do levantamento que resultou no

livro Empresas Feitas para Vencer consistiu em definir os requisitos que

uma empresa deveria satisfazer para pertencer à categoria daquelas que

passaram de “boas” a “grandiosas”.

Depois de longo debate, o pesquisador James Collins e sua equipe

estabeleceram o seguinte parâmetro de empresa que passou de boa a

grandiosa: desde sua criação até determinado “ponto de inflexão”, ela

deveria ter lucros acumulados sobre ações que ficassem na média do se-

tor de atividade ou abaixo dela. Depois disso e durante os 15 anos se-

guintes, seus lucros deveriam superar pelo menos três vezes a média do

mercado.

A escolha de um período de 15 anos se fundamentou na necessida-

de de descartar empresas que tivessem tido um golpe de sorte – afinal,

parece impossível que uma maré boa se mantenha por tanto tempo. A-

lém disso, como esse período vai além da média dos mandatos dos pre-

sidentes de empresa, serviu para diferenciar as empresas grandiosas

daquelas que são apenas boas, mas com líderes excepcionais.

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A definição do índice “três vezes superior ao retorno do mercado” es-

tá ligada ao fato de isso ficar acima do desempenho de empresas indis-

cutivelmente grandes – entre 1985 e 2000, algumas das que cresceram

2,5 vezes mais do que o mercado foram 3M, Coca-Cola, General Electric,

Hewlett-Packard, Intel, Johnson & Johnson, Wal-Mart e Walt Disney.

Vale destacar que as empresas deveriam demonstrar um desempenho

superior ao de seu setor de atividade específico: se todo o setor houves-

se registrado um crescimento extraordinário, a empresa não se qualifica-

va para o estudo.

O passo seguinte foi detectar quais empresas nos Estados Unidos

satisfaziam o padrão descrito. Para isso, a equipe analisou o desempe-

nho das empresas do ranking. Fortune 500 entre 1965 e 1995. A eleição

fina incluiu: a Abbott Laboratories (a partir do ponto de inflexão, seu de-

sempenho superou em 3,98 vezes o crescimento do mercado); a rede de

loja de produtos eletrônicos Circuit City (18,5); a empresa de serviços fi-

nanceiros Fannie Mae (7,56); a Gillette (7,39); a fábrica de produtos de

papel Kimberly-Clark (3,42); a rede de minimercados Kroger (4,17); a si-

derúrgica Nucor (5,16); a fabricante de cigarros Philip Morris (7,06); a

empresa de serviços de correio e mensagens Pitney Bowes (7,16); a re-

de de farmácias Walgreens (7,34); e o banco Wells Fargo (3,99).

Na segunda etapa, Collins e sua equipe trataram de identificar; em-

presas que comparariam às grandiosas. Foi um passo crucial, porque o

mais difícil não é descobrir as características compartilhadas por todos os

integrantes de um grupo, mas sim os atributos que os diferenciam de ou-

tros. Dessa forma, foram dois os grupos escolhidos:

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• Empresas que podiam ser comparadas de forma direta: eram per-

tencentes ao mesmo setor e tinham tempo de existência e tamanho

semelhantes, mas não haviam conseguido decolar.

• Empresas que se transformaram em grandiosas, mas não conse-

guiram sustentar o crescimento por muito tempo.

Foram escolhidas 11 empresas do grupo formado pêlos concorrentes

diretos e seis do grupo das que não conseguiram manter o crescimento.

Para a terceira etapa, que consistiu em analisar detalhadamente ca-

da caso, a equipe de pesquisa realizou as seguintes tarefas:

• Reuniu artigos sobre as 28 empresas e classificou o material em

diversas categorias, como liderança, estratégia, tecnologia e outras.

• Entrevistou os executivos que ocupavam posições-chave quan-

do; aconteceu o ponto de inflexão.

• Fez análises qualitativas e quantitativas para estudar as aquisições,

a remuneração dos executivos, as estratégias de negócio, a cultura

corporativa, o estilo de liderança, os índices financeiros e a rotativi-

dade da diretoria.

Collins destaca que os resultados da pesquisa são deduções empíri-

cas, baseadas nos dados analisados. Em outras palavras, em nenhum

caso se tratou da constatação de hipóteses previamente concebidas. A

equipe de investigação não partiu de uma idéia ou de um conjunto de hi-

póteses a serem verificadas. Em vez disso, foi construindo sua teoria à

medida que comparava as diferentes empresas e descobria aquilo que as

diferenciava das demais.

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SAIBA QUAIS FORAM AS EMPRESAS DO ESTUDO

Empresas boas-a-gradiosas Concorrentes diretos compara-dos

• Kimberly-Clark

• Kroger

• Nucor

• Upjohn

• Silo

• A&P

• Addressograph

• Eckerd

Abbott Laboratories

Circuit City

Fannie Mae

Gillette

Philip Morris

Pitney Bowes

Walgreens

Wells Fargo

Great Western

Warner Lambert

Scott Paper

Bethlehem Steel

R.J. Reynolds

Bank of America

Empresas que deram o salto para a grandiosidade, mas não conse-guiram manter o alto desempenho

• • Hasbro Burroughs

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• Harris

• Rubbermaid

• Teledyne

Chysler

A quarta etapa foi passar “do caos à ordem”. Durante o estudo dos dados

e das entrevistas, assim como na análise de ambos, a equipe chegava a

conclusões que comparava com as informações coletadas. Em todos os

casos, os resultados obtidos revelaram os atributos das empresas gran-

diosas:

1. Contam com líderes de nível 5 – discretos e com grande força de

vontade –, que primeiro escolhem os integrantes de sua equipe de

trabalho e em seguida elaboram a estratégia da empresa.

2. Apesar de terem enfrentado situações adversas, destacaram-se

por uma fé inabalável para seguir em frente.

3. Conseguiram identificar uma idéia de negócio simples (o “concei-

to do ouriço”, explicado com detalhes mais adiante), que responde

a três perguntas fundamentais: em que área podiam ser os melho-

res? Qual era a maneira mais eficaz de gerar fluxos de caixa positi-

vos e rentabilidade contínua? Quais eram as atividades que desper-

tavam paixão nos funcionários da empresa?

4. Têm uma cultura de disciplina.

5. Utilizam tecnologias cuidadosamente selecionadas para melhorar

seus processos (aceleradores tecnológicos), em lugar de basear-se

em avanços tecnológicos para promover uma transformação.

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6. Conseguem o chamado “efeito acelerador”. A transformação de

boa em grandiosa é um processo que se inicia com um período de

acúmulo de decisões acertadas (etapa de construção), até produzir

um ponto de inflexão que leva a empresa a decolar. Esse mesmo

processo envolve três condições: pessoas disciplinadas, pensa-

mento disciplinado e ação disciplinada. Quando as empresas deco-

lam, o processo de transformação toma impulso e se acelera. Tra-

ta-se do “efeito acelerador” (ou “flywheer”, como o autor o chama

em inglês).

OS ATRIBUTOS

Liderança de nível

Na hierarquia de classificação de executivos definida pela equipe de

Collins, o nível 5 é o degrau mais alto. Os cinco níveis são:

1. Indivíduo com grande capacidade

Graças a seus conhecimentos, talento, habilidades e hábitos de tra-

balho, sua contribuição à empresa é produtiva.

2. Membro de vima equipe que dá contribuições valiosas

Põe em jogo suas capacidades a fim de conseguir alcançar metas

coletivas e trabalha de forma eficaz em equipe.

3. Gerente competente

Sabe organizar as pessoas e administra os recursos de maneira efe-

tiva e eficiente para conseguir chegar às metas estabelecidas.

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4. Líder eficaz

Empenha-se vigorosamente para tornar realidade uma visão clara e

atraente, estimulando padrões de alto desempenho. Alinha o compromis-

so das pessoas em função dos objetivos da empresa.

5. Executivo de nível 5

Constrói uma empresa excelente e duradoura, graças a um misto de

humildade pessoal e determinação profissional. Aqueles que integram

esse nível atendem aos requisitos dos quatro níveis anteriores.

Outra característica dos executivos de nível 5 é dar prioridade ao

crescimento da empresa, em lugar dos interesses pessoais – qualidade

perceptível, por exemplo, em Colman Mockler, presidente da Gillette en-

tre 1975 e 1991.

Em 1986, Ronald Perelman, então presidente da Revlon, tentou

comprar a Gillette e lhe ofereceu um preço 44% superior ao valor de

mercado por suas ações. Como acionista, Mockler teria se beneficiado

com a operação. No entanto, como presidente, apostou no crescimento

da empresa.

Sua equipe executiva confiava nos aparelhos de barbear de tecnolo-

gia avançada, nos quais a empresa havia investido (conhecidos mais

tarde como Sensor e Mach3), e sabia que o grande potencial do Sensor,

por exemplo, por se tratar de um projeto secreto, não estava refletido no

preço das ações da Gillette. Em virtude disso, Mockler calculou que o va-

lor futuro das ações da empresa superaria amplamente o da oferta de

compra.

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O tempo mostrou que ele tinha razão: se houvesse aceitado a pro-

posta e se o dinheiro obtido com a venda tivesse sido investido, os ex-

acionistas da Gillette teriam recebido, em dez anos, três vezes menos do

que o valor das ações da empresa.

Os executivos de nível 5 também se caracterizam por desejar a con-

tinuidade da empresa, razão pela qual dedicam grandes esforços à esco-

lha de seus sucessores. Como demonstrou a pesquisa, nas empresas do

grupo de concorrentes diretos o quadro é diferente: os líderes, preocupa-

dos com sua reputação, muitas vezes se enganam na escolha do suces-

sor – na verdade, esse grupo de empresas fracassou em mais ou menos

75% dos processos de sucessão.

Entre outros atributos dos líderes de nível 5, eles se destacam pela:

• Humildade: não costumam falar de si mesmos. Durante as entrevis-

tas, os líderes das empresas grandiosas se referiram à colaboração dos

outros executivos, em lugar de falar de seus próprios méritos.

• Força de vontade: diferenciam-se por produzir resultados e estão

dispostos a fazer tudo o que for necessário para que a empresa cresça.

Finalmente, os executivos de nível 5 atribuem o êxito de sua gestão

à sorte ou a fatores externos e assumem a responsabilidade pelos resul-

tados desfavoráveis. Diferentemente, os que não chegam a esse nível

costumam culpar o azar pelos fracassos, mas atribuem a si próprios o

crédito pêlos triunfos.

As siderúrgicas Bethlehem Steel e Nucor, por exemplo, tiveram de

enfrentar a dura concorrência do aço importado, mais barato, mas a vi-

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são de seus altos executivos sobre o mesmo assunto era diametralmente

oposta. Enquanto os da Bethlehem Steel amaldiçoavam as importações,

os da Nucor consideravam-nas uma bênção. Avaliavam que o verdadeiro

problema estava nas equipes de direção das empresas norte-

americanas, que não acompanharam as inovações.

“Ao começar a pesquisa, nossa suposição era de que o primeiro

passo na transição de boa a grandiosa era estabelecer uma nova visão e

uma estratégia para a empresa e depois conseguir pessoas comprometi-

das nessa direção. Porém, à medida que avançamos no estudo, desco-

brimos que acontecia o oposto”, afirma Collins.

Os executivos responsáveis pela transformação das empresas ana-

lisadas começaram por contratar as pessoas adequadas – e demitir as

que não eram. Depois pensaram na direção a seguir. Qual a razão dis-

so?

Começando pelas pessoas, a adaptação às mudanças é mais fácil;

quando se parte de um objetivo, pode acabar sendo mais difícil modificar

o rumo. Além disso, resolve-se o problema da motivação, já que pesso-

as adequadas estão dispostas a produzir resultados e a fazer parte de

uma empresa grandiosa.

Muitas das empresas do grupo de concorrentes diretos, por sua

vez, seguiram o modelo de “um gênio com mil auxiliares”. Para o líder

gênio a empresa é mera plataforma a partir da qual pode pôr em prática

seu talento: em vez de formar uma boa equipe executiva, contrata uma

legião de auxiliares capazes de implementar suas fantásticas idéias.

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Porém, quando esses líderes se afastam da empresa, as pessoas não

sabem o que fazer, e o desempenho desmorona.

Outra constatação importante foi o fato de não haver um padrão uni-

forme no sistema de remuneração dos executivos das empresas que

passaram de boas a grandiosas: alguns recebiam grandes salários; ou-

tros, incentivos adicionais, como ações.

Tal disparidade evidencia que a qualidade do trabalho dos bons exe-

cutivos é sempre excepcional: sua ética de trabalho os impele a buscar a

excelência por si mesma, sem dar ao sistema de incentivos importância

maior do que a merecida.

Outro traço essencial é o rigor. Em 1986, quando o Wells adquiriu o

Crocker Bank, era fácil notar as diferenças entre as duas presas: o Wells

Fargo tinha uma cultura espartana; o pessoal do Crocker estava acostu-

mado ao luxo. A cúpula do Wells Fargo chegou à conclusão de que a in-

tegração seria impossível, de modo que a primeira medida após a fusão

foi demitir l ,6 mil gerentes do Crocker.

Nesse ponto, salienta Collins, é importante distinguir entre crueldade

e rigor: é cruel despedir pessoas sem motivo ou consideração. As em-

presas rigorosas, ao contrário, baseiam-se em padrões que aplicam de

maneira uniforme em todos os níveis da organização e em qualquer épo-

ca. À primeira vista, a decisão do Wells Fargo parece cruel, mas os ge-

rentes do Crocker certamente não estavam à altura de seus pares do

Wells Fargo e, de qualquer forma, acabariam deixando a empresa. Os

executivos entrevistados afirmaram que era melhor evitar a agonia e de-

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miti-los de imediato, para que pudessem iniciar outra etapa profissional

quanto antes.

De fato, os dados coletados demonstraram que, durante os períodos

pesquisados, as empresas do grupo de concorrentes diretos demitiram

cinco vezes mais. Quando houve a desregulamentação bancária, por e-

xemplo, o Wells Fargo demitiu a metade do número de funcionários dis-

pensados pelo Bank of America.

Enfrentar a realidade, sem perder a fé

Um dos principais resultados da pesquisa mostra que os avanços i-

novadores surgem do acúmulo de boas decisões corretamente executa-

das. As empresas analisadas não são infalíveis, mas tomaram mais deci-

sões correias do que as empresas que pertencem ao grupo de concor-

rentes diretos. Apesar disso, cabe perguntar: tiveram sorte ou havia algo

específico em seu processo de decisão que aumentava as probabilida-

des de acerto?

As empresas grandiosas se caracterizam por enfrentar os fatos tais

como são, sem disfarçar as circunstâncias desfavoráveis. Um exemplo é

o que ocorreu com a rede de minimercados Kroger e com sua rival A&P

(Great Atlantic and Pacific Tea Corporation).

Na década de 1950, a A&P era uma das maiores empresas dos EU-

A: a segunda, logo atrás da General Motors, em volume de vendas. Entre

1959 e 1973, a A&P e a Kroger registraram sempre faturamento inferior à

média do mercado. Mas, nos 25 anos seguintes, a Kroger teve retornos

sobre ações acumulados dez vezes maiores que os do mercado em geral

e 80 vezes superiores aos da A&P.

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Para entender esse fenômeno, explica Collins, é importante recordar

que durante a primeira metade do século passado as duas guerras mun-

diais e a depressão impuseram aos lares norte-americanos um estilo de

vida frugal. Nas décadas posteriores, o aumento do poder aquisitivo oca-

sionou uma mudança no gosto dos consumidores: em lugar de fazer as

compras nos minimercados tradicionais, preferiam as grandes lojas, atra-

entes e com ampla variedade de produtos.

No início dos anos 70, quase todos os ativos da A&P e da Kroger es-

tavam investidos em minimercados. Ao perceber a queda de suas ven-

das, as duas empresas realizaram experiências para avaliar a situação. A

A&P, por exemplo, abriu uma megastore (The Golden Key), onde experi-

mentava marcas e métodos de venda, inovadores, a fim de detectar as

preferências dos consumidores.

No entanto, diante das evidências de mudanças no comportamento

dos clientes, as respostas da A&P e da Kroger foram diametralmente o-

postas: a A&P se agarrou ao modelo tradicional, fechou a The Golden

Key e estabeleceu uma série de estratégias para baixar os preços, A

Kroger, em vez disso, reestruturou ou substituiu todos seus pontos-de-

venda, abandonando as regiões em que certamente não conseguiria o-

cupar o primeiro ou o segundo lugar do mercado.

No início de 1990 a Kroger havia terminado o processo de reestrutu-

ração de suas lojas e, em 1999, tornou-se a cadeia de minimercados

mais importante dos EUA. Enquanto isso, a metade dos pontos-de-venda

A&P tinha a mesma configuração que na década de 1950.

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Ao descobrir que as empresas boas-a-grandiosas nunca negavam a

realidade, a equipe de Collins fez a seguinte pergunta: como motivavam

as pessoas quando os acontecimentos eram desalentadores? A pesquisa

mostrou que as pessoas adequadas não precisam de motivações exter-

nas. O importante é gerar um ambiente no qual a verdade venha à tona e

as pessoas sejam ouvidas.

Tão importante quanto saber enfrentar circunstâncias desfavoráveis

é acreditar que o êxito virá, cedo ou tarde. Collins chama essa atitude de

“Paradoxo de Stockdale”, em homenagem a Jim Stockdale, o oficial do

exército norte-americano que se destacou por sua dignidade em um

campo de prisioneiros durante a guerra do Vietnã. Nos oito ano de reclu-

são, Stockdale encorajou seus soldados a resistir às torturas, convencido

de que sairiam dali e poderiam transformar aquela experiência em algo

transcendental.

No entanto, segundo Stockdale, manter a fé não é a mesma coisa

que ser otimista. “Os otimistas não sobreviveram. ‘Sairemos no Natal’,

diziam, mas o Natal passava e continuávamos na prisão. Não se deve

nunca confundir a fé na realização dos objetivos com a disciplina para

enfrentar os fatos mais cruéis da realidade”, conclui o sobrevivente.

Conceito do ouriço

As empresas que passaram de boas a grandiosas conseguiram de-

tectar um princípio simples – o conceito do ouriço – e o transformaram no

eixo de sua estratégia. “Segundo uma parábola grega, a raposa sabe

muitas coisa, enquanto o ouriço sabe apenas uma, de enorme importân-

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cia. A raposa é astuta, capaz de maquinar complexas estratégias para

atacar o ouriço, que é um animalzinho inofensivo, alimenta-se de insetos

e se limita a cuidar de sua casa. Mas, quando a raposa o ataca, instinti-

vamente ele se enrola sobre si mesmo, transformando-se numa bola de

espinhos”, conta Collins.

Partindo dessa idéia, as pessoas podem ser divididas em dois gru-

pos: as que perseguem vários interesses ao mesmo tempo (como a ra-

posa) e as que simplificam conceitos complexos em uma idéia básica

(como o ouriço).

Para a rede de farmácias Walgreens, por exemplo, o conceito do ou-

riço é se transformar em um lugar “confortável e conveniente” para o cli-

ente: lojas nas esquinas – com várias entradas e saídas –, estaciona-

mento e serviços adicionais, como revelação de fotos em uma hora.

O conceito do ouriço surge do profundo entendimento da interseção

de três círculos (veja gráfico na página ao lado):

1. Em que área podemos ser os melhores? Essa noção não é equi-

valente à da competência essencial: uma empresa pode, mesmo sendo

competente em algo, não ter potencial para ser a melhor.

A Philip Morris, por exemplo, descobriu que podia gerar fidelidade a

suas marcas de cigarros melhor do que seus rivais. Mais tarde, se diver-

sificou partindo para outras áreas (uma medida defensiva que todas as

empresas do setor tomaram), mas se manteve fiel a sua solidez na cons-

trução de marcas quando penetrou nos ramos de café, cerveja e chocola-

te.

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2. O que impulsiona o motor da economia da empresa? As empresas

grandiosas descobriram a maneira mais eficiente de gerar fluxos de caixa

positivos e rentabilidade contínua. Identificaram, em particular, o “deno-

minador” (lucros por fator “x”) que tinha maior impacto sobre seus resul-

tados.

Durante a época da desregulamentação bancária, por exemplo, al-

guns bancos utilizaram os denominadores “lucros por empréstimo” e “lu-

cros por depósito”. O Wells Fargo, em vez disso, baseou-se nos “lucros

por funcionário” e mudou seu sistema de distribuição para apoiar-se em

sucursais com pouco pessoal e caixas automáticos.

3. O que desperta a paixão dos funcionários de uma empresa? As

empresas que deram o grande salto concentraram o foco em atividades

que despertavam paixão em seus integrantes.

Para não ir muito longe: os funcionários da Philip Morris se vêem

como o cowboy solitário e independente dos anúncios publicitários do

Marlboro.

O conceito do ouriço, de acordo com Collins, é um ponto de inflexão na

vida de uma empresa que quer passar de boa a grandiosa. Em muitos

casos, essa noção só é descoberta após um longo processo de debate e

reflexão: as empresas observadas levaram, em média, quatro anos para

formulá-la.

Cultura da disciplina

As empresas que passaram de boas a grandiosas, segundo revelou

a pesquisa, empenham-se em fomentar uma cultura da disciplina. Têm

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como primordial a autodisciplina das pessoas com as quais trabalham;

estimulam o pensamento disciplinado – que permite enfrentar a realidade

sem perder a fé; para descobrir o conceito do ouriço, apoiam-se em pes-

soas de pensamento disciplinado; e, por último, adotam uma ação disci-

plinada.

Um exemplo: durante o processo de desregulamentação bancária

nos Estados Unidos, o Wells Fargo aplicou um rígido programa de redu-

ção de despesas. Entre outras coisas, congelou os salários dos executivo

durante dois anos, fechou seu restaurante e vendeu os aviões da corpo-

ração. Os executivos do Bank of America, por sua vez, reconheceram

imprescindível executar medidas semelhantes, mas não tiveram discipli-

na para fazer isso. Após três anos consecutivos de prejuízo, em meados

da década de 1980, o Bank of America se viu obrigado a cortar gastos.

Nesse ponto, Collins adverte sobre os riscos de impor a disciplina

em lugar de fomentá-la como cultura da organização. Como revelou a

pesquisa, as empresas que tiveram um crescimento fabuloso durante a

gestão de um líder tirânico não conseguiram mante-lo após seu afasta-

mento e muitas sofreram uma queda estrondosa.

Nos 13 anos de Ray MacDonald à frente da Burroughs, por exemplo,

a empresa registrou um crescimento notável (6,6 vezes a média do mer-

cado). MacDonald, brilhante e agressivo, monopolizava as reuniões pres-

sionava as pessoas a fazer o que ele queria, mas não foi capaz de incen-

tivar uma cultura da disciplina. Após seu afastamento, a Burroughs ficou

praticamente paralisada.

Aceleradores tecnológicos

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Nas empresas que passaram de boas a grandiosas, a tecnologia não

gera o crescimento, mas o acelera. Os fatores cruciais do desempenho

excelente, em vez disso, são a liderança de nível 5, a seleção de pesso-

as adequadas e uma idéia de negócio simples (o conceito do ouriço).

Uma vez definido esse conceito, entretanto, as empresas estuda-

das foram pioneiras em aplicações tecnológicas.

No início dos anos 80, a Walgreens implementou um sistema de re-

des chamado Intercom, que conectava eletronicamente todas suas lojas

e armazenava os dados dos clientes em uma base central. A Gillette a-

postou nos aceleradores tecnológicos na área de produção e investiu

mais de US$ 200 milhões no desenvolvimento do Sensor; por outro lado,

apelou para a tecnologia laser (similar à utilizada em produtos de tecno-

logia a cada, como os marca-passos coronários) para a produção em

grande escala de seus aparelhos de barbear. A Philip Morris foi uma das

primeiras empresas a automatizar o processo de empacotamento de ci-

garros. E o Wells Fargo se antecipou aos outros bancos na implantação

dos serviços telefônicos, caixas automáticos e bancos eletrônicos.

Efeito acelerador

Para ilustrar a experiência das empresas que passaram de boas a

grandiosas, Collins propõe imaginar “uma roda de metal de 10 metros de

diâmetro, 60 centímetros de espessura e 2,5 mil quilos, montada na posi-

ção horizontal”.

O objetivo, explica ele, “é fazê-la girar o mais rápido possível, du-

rante muito tempo”. A primeira volta exigirá grande esforço; na segunda

volta ganhará alguma velocidade, até que, em certo momento, o impulso

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fará com que se mova rapidamente, embora a força aplicada seja a

mesma que a do princípio – trata-se do “efeito acelerador”.

“Se alguém perguntasse qual foi o movimento que fez com que a ro-

da girasse tão rápido, não haveria uma resposta concreta. Na realidade,

não foi um movimento em particular, mas sim o acúmulo de esforços a-

plicados uniformemente”, afirma Collins.

O salto para a grandiosidade também é um processo cumulativo: não

há programa, inovação ou golpe de sorte capaz de produzi-lo. Ken Iver-

son e Sam Siegel começaram a empurrar a roda da Nucor em 1965. Po-

rém ninguém prestou atenção neles por dez anos. Em 1975, a Nucor já

havia construído sua terceira planta industrial, tinha uma cultura da pro-

dutividade firmemente implantada e logo se tornaria a produtora de aço

mais rentável dos EUA.

Para quem observa o processo de fora, o ponto de inflexão é incrí-

vel, quase revolucionário. No entanto, as pessoas que trabalharam nas

empresas que passaram de boas a grandiosas sentem que isso é parte

de um processo de desenvolvimento orgânico. Mais do que isso: muitos

executivos nem sequer perceberam a grande transformação que estavam

realizando até terem percorrido boa parte do caminho.

Além disso, ao ganhar impulso e obter resultados concretos, as pes-

soas se empolgam e se comprometem com o objetivo do negócio: as em-

presas estudadas alcançaram altos níveis de comprometimento de forma

praticamente espontânea, sem ter de dedicar grandes esforços à tarefa

de que os funcionários se engajassem na busca das metas.

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Por exemplo: Jim Herring, o líder que iniciou a transformação na

Kroger, rede de minimercados com mais de 50 mil funcionários, admite

que evitou enfatizar as iniciativas de motivação. Ele e sua equipe fizeram

girar a roda para produzir evidências tangíveis de que seus planos fazi-

am sentido.

Outras empresas, em vez de gerar um efeito acelerador por meio da

soma de decisões e ações corretas, entram numa espécie de círculo vi-

cioso só. O estudo de Collins demonstrou que empresas do grupo de

concorrentes diretos, ao implementar programas de incentivos, não obti-

nham resultados contínuos. Outras apostavam em descobrir inovações

revolucionárias que as fizessem saltar milagrosamente para outro nível,

mas também não tinham sucesso. Qual era o erro? Empurravam a roda

em uma direção, paravam, mudavam o sentido, começavam novamente,

e assim acabavam entrando em uma espécie de “espiral descendente”.

Algumas das que não conseguiram se transformar buscaram, como

aquisições, uma via rápida para chegar ao ponto de inflexão e acelerar

seu crescimento, mas nunca conseguiram dar o salto até o desempenho

de alto nível. As empresas que passaram de boas a grandiosas, em vez

disso, fizeram aquisições somente depois de ter desenvolvido seu próprio

conceito do ouriço e de ter tomado impulso.

BOA-A-GRANDIOSA E FEITA-PARA-DURAR

Ao encarar o projeto de pesquisa para escrever Empresas Feitas pa-

ra Vencer, Collins quis saber se as idéias expostas em Feitas para Durar,

seu livro anterior, podiam servir de base. Em princípio, optou por não fa-

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zer ligações de nenhum tipo. Porém, ao terminar o segundo estudo, rea-

lizou uma comparação e chegou às seguintes conclusões:

1. À luz dos resultados expostos em Empresas Feitas para Vencer,

observa que as grandes empresas analisadas em Feitas para Durar

contaram, desde sua criação, com líderes de nível 5, com uma idéia

de negócio simples (o conceito do ouriço) e com uma equipe de tra-

balho brilhante. Por outro lado, as principais personagens de Empre-

sas Feitas para Vencer tiver uma trajetória convencional e somente a

partir de um ponto de inflexão iniciaram seu percurso rumo à grandi-

osidade.

2. Embora do ponto de vista cronológico Feitas para Durar preceda

Empresas Feitas para Vencer, é aconselhável aplicar inicialmente as

idéias desenvolvidas no segundo livro – tanto para alcançar resulta-

dos excelentes em um novo empreendimento como em uma empre-

sa já estabelecida no mercado – e, em seguida, seguir os conselhos

do primeiro livro, a fim de sustentar o alto desempenho ao longo do

tempo.

3. Com a pesquisa de Feitas para Durar, descobriu-se que o motor

das empresas duradouras são seus valores essenciais, que trans-

cendem o mero objetivo de ganhar dinheiro. No caso da Walt Disney,

por exemplo, suas competências principais são, entre outras, a feli-

cidade das crianças, a imaginação criativa e o cuidado com os deta-

lhes. Para durar, as empresas que alcançaram a grandiosidade de-

vem definir seus valores essenciais e combiná-los com a dinâmica

de seu crescimento.

Page 21: Empresas feitas para Vencer - Itarget

O SENTIDO DA GRANDIOSIDADE

No final de Empresas Feitas para Vencer, Collins surpreende com

uma inesperada pergunta dupla: faz sentido esforçar-se para alcançar a

excelência? Não basta ser uma boa empresa?

Sua resposta também é dupla: “Primeiro, acredito que não seja mais

difícil criar algo grandioso do que algo bom. É provável que, estatistica-

mente, seja menos freqüente, mas não exige mais sofrimento que a per-

petuação da mediocridade. Em segundo lugar, se a pessoa tem uma ati-

vidade apaixonante e acredita no objetivo que a impulsiona, é impossível

que não aspire à grandiosidade”.