Efeitos letais e subletais da poluição por nitrogênio em ... · fertilizantes na agricultura, da...
Transcript of Efeitos letais e subletais da poluição por nitrogênio em ... · fertilizantes na agricultura, da...
-
Paulo Ricardo Ilha Jiquiri
Efeitos letais e subletais da poluio por nitrognio
em larvas de anuros
Lethal and sublethal effects of nitrogen pollution
on anuran larvae
So Paulo
2010
-
1
Paulo Ricardo Ilha Jiquiri
Efeitos letais e subletais da poluio por nitrognio
em larvas de anuros
Lethal and sublethal effects of nitrogen pollution
on anuran larvae
Dissertao apresentada ao Instituto de Biocincias da Universidade de So Paulo, para a obteno de Ttulo de Mestre em Cincias, na rea de Ecologia. Orientador: Luis Cesar Schiesari
So Paulo
2010
-
2
Ficha Catalogrfica
Ilha, Paulo
Efeitos letais e subletais da poluio por nitrognio em larvas de anuros
Nmero de pginas
Dissertao (Mestrado) - Instituto de Biocincias da Universidade de So Paulo. Departamento de Ecologia.
Palavras-chave: 1.Nitrato 2.Nitrito 3.Amnio 4.Toxicidade 5.Anfbios
Universidade de So Paulo
Instituto de Biocincias Departamento de Ecologia
Comisso Julgadora:
________________________ ________________________
Prof(a). Dr(a). Prof(a). Dr(a).
________________________
Prof. Dr. Luis Cesar Schiesari
Orientador
-
3
Maria Cludia, minha me,
por me ensinar a sonhar alto
com os ps no cho
-
4
Todas as doenas tm seu princpio em uma das trs substncias:
Sal, Enxofre ou Mercrio.
Isto quer dizer que podem ter sua origem no domnio da matria,
na esfera da alma, ou no reino do esprito.
Se o corpo, a alma e a mente esto em perfeita harmonia uns com os outros,
no existe nenhuma discordncia.
Mas se uma causa de discordncia em um destes trs planos se origina,
isto se comunica aos demais."
(Paracelso)
-
5
Agradecimentos
Sou profundamente grato ao Professor Luis Schiesari por todos os seus
ensinamentos e pela dedicada orientao; a Andr Gulfier, Antonio Carlos da
Silva, Mariana Fekete Moutinho e Arthur Ilha (meu irmo) pela enorme ajuda
prestada no laboratrio; aos Professores Britta Grillitsch, Glauco Machado e
Paulo Incio Prado pelas sugestes feitas no decorrer deste trabalho;
Escola de Artes, Cincias e Humanidades da Universidade de So Paulo, ao
Museu de Zoologia da Universidade de So Paulo e Estao Biolgica de
Boracia pelo apoio logstico; Coordenao de Aperfeioamento de
Pessoal de Nvel Superior (CAPES) pela bolsa de estudo concedida; ao
CNPq (Edital Universal Projeto 483801/2007-0) e FAPESP (Projeto
2008/57939-9) pelo financiamento; e a Deus pelas oportunidades e
condies que me foram confiadas.
-
6
ndice
Resumo........................................................................................07
Abstract........................................................................................09
Introduo....................................................................................11
Materiais e Mtodos.....................................................................22
BIOENSAIOS DE EXPOSIO AGUDA...........................................25
EXPERIMENTOS DE EXPOSIO CRNICA...................................28
Resultados
BIOENSAIOS DE EXPOSIO AGUDA..........................................35
EXPERIMENTOS DE EXPOSIO CRNICA...................................42
Discusso.....................................................................................59
Concluses..................................................................................73
Referncias Bibliogrficas............................................................74
-
7
Resumo
As atividades humanas vm aumentando dramaticamente a quantidade de
nitrognio inorgnico liberado nos ecossistemas, seja atravs da aplicao de
fertilizantes na agricultura, da descarga de dejetos humanos e de seus rebanhos,
ou da queima de combustveis fsseis. Os excessos de nitrognio so
eventualmente transportados para corpos dgua, onde podem, na forma de nitrato,
nitrito e amnio, atingir concentraes txicas para organismos aquticos. Nesta
pesquisa tive dois objetivos principais. O primeiro foi testar em laboratrio a
toxicidade relativa dos ons nitrato, nitrito e amnio, e a variao interespecfica na
sensibilidade a esses ons, em larvas de cinco espcies de anuros (Rhinella ornata,
Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis, Physalaemus cuvieri e Physalaemus olfersii).
Para isso utilizei bioensaios seguindo protocolos internacionalmente padronizados
para testes de ecotoxicidade com organismos aquticos, e que portanto permitem
mximas reprodutibilidade e comparabilidade de resultados entre compostos,
espcies, e laboratrios. No entanto, estes bioensaios carecem de realismo uma
vez que simulam um cenrio de exposio aguda a altas concentraes de
contaminantes quando na natureza o cenrio de exposio tende a ser crnico e
prolongado a baixas concentraes. Alm disso, bioensaios usam mortalidade como
principal varivel de resposta, quando tambm efeitos subletais podem influenciar a
persistncia de populaes ao modular o sucesso dos indivduos. Por isso, meu
segundo objetivo foi testar em laboratrio se concentraes relativamente baixas e
ecologicamente relevantes de nitrato, nitrito e amnio podem afetar a sobrevivncia,
o crescimento, o desenvolvimento e o comportamento das larvas de R. ornata, P.
cuvieri e H. faber. Demonstrei atravs dos bioensaios de exposio aguda que
nitrato, a forma mais abundante na natureza, de baixa toxicidade quando
comparada a nitrito e amnio. Demonstrei tambm que h significativa variao
interespecfica na sensibilidade ao nitrognio inorgnico, e que o ranqueamento de
-
8
sensibilidade das espcies ao nitrato e ao nitrito foram similares, possivelmente por
conta de mecanismos comuns de ao txica. Atravs de experimentos de
exposio crnica demonstrei que concentraes relativamente baixas de nitrognio
inorgnico podem causar efeitos letais e subletais s larvas de anuros se houver
exposio prolongada. O nitrato causou reduo no desenvolvimento larval de P.
cuvieri e o amnio na sobrevivncia e nas taxas de atividade nos girinos de H.
faber. A exposio crnica ao nitrito tambm reduziu significativamente a
sobrevivncia das trs espcies testadas, o crescimento de H. faber e as taxas de
atividade de R. ornata. Contudo, improvvel que as concentraes de nitrito que
manipulei em laboratrio sejam comuns na natureza, especialmente em condies
aerbicas. Esta pesquisa, alm de fornecer
importantes informaes sobre os possveis efeitos da poluio por nitrognio em
larvas de anuros, contribui para o avano da ecotoxicologia no Brasil ao estabelecer
as bases para o emprego de espcies nativas de anfbios como sistema-modelo
experimental. Estudos futuros que almejem avaliar o risco ambiental da
contaminao por nitrognio devero por um lado monitorar concentraes em
hbitats naturais e por outro avaliar as consequncias das interaes sinrgicas
entre nitrognio inorgnico e outros estressores fsicos, qumicos ou biolgicos para
larvas de anfbios.
-
9
Abstract
Human activities dramatically increased the amount of inorganic nitrogen released in
ecosystems through the application of fertilizers in agriculture, the generation of
human and livestock waste, and the combustion of fossil fuels. This nitrogen
eventually reaches water bodies where it can, in the form of nitrate, nitrite and
ammonium, be toxic to aquatic organisms. In this study I had two main objectives.
The first was to test the relative toxicity of nitrate, nitrite and ammonium, and the
interspecific variation in sensitivity to these ions, in tadpoles of five anuran species
(Rhinella ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis, Physalaemus cuvieri and
Physalaemus olfersii). This objective was accomplished by laboratory bioassays
following internationally standardized protocols for ecotoxicity tests with aquatic
organisms, therefore allowing maximum reproducibility and comparability of results
among compounds, species and laboratories. However, these bioassays lack
realism for simulating a scenario of acute exposure to high concentrations of
contaminants, while exposure in nature tends to be chronic and prolonged at low
concentrations. Furthermore, bioassays use mortality as the main response variable,
whereas sublethal effects may also influence the persistence of populations by
modulating individual success. My second objective was therefore to test in the
laboratory if low and environmentally relevant concentrations of nitrate, nitrite and
ammonium affect survival, growth, development and behavior of R. ornata, P. cuvieri
and H. faber larvae.
Through acute exposure bioassays I demonstrated that nitrate, the most abundant N
form in nature, has low toxicity when compared to nitrite and ammonium. I also
demonstrated that there is significant interspecific variation in the sensitivity to
inorganic nitrogen, and that the ranking of species sensitivity to nitrate and nitrite
were similar, possibly due to common mechanisms of toxic action. Through chronic
-
10
exposure I demonstrated that relatively low concentrations of inorganic nitrogen can
cause lethal and sublethal effects on anuran larvae if there is extended exposure.
Nitrate decreased developmental rate in P. cuvieri and ammonia decreased survival
and activity rates in H. faber tadpoles. Chronic exposure to nitrite also significantly
reduced survival of all three species tested, growth of H. faber and activity rates of
R. ornata. However, it is unlikely that the concentrations of nitrite manipulated in the
laboratory are common in nature, especially in aerobic conditions. This is the first
study to document deleterious effects of nitrogen pollution to Brazilian amphibian
species, and contributes to the development of ecotoxicology in Brazil by
establishing the basis for the employment of native amphibians as model
experimental system. Future studies that aim to assess the environmental risk of
nitrogen contamination should monitor concentrations in natural habitats and
evaluate the effects of synergistic interactions between inorganic nitrogen and other
physical, chemical or biological stressors to amphibian larvae.
-
11
Introduo
As atividades humanas vm dobrando a quantidade de nitrognio reativo
que produzido no mundo, e dessa forma alterando significativamente o ciclo
biogeoqumico de um dos elementos mais importantes para o metabolismo dos
ecossistemas (Vitousek et al., 1997; Esteves, 1998; Galloway et al., 1998; Kalff,
2002). A importncia do nitrognio deve-se ao fato dele integrar molculas
biolgicas envolvidas na estrutura, armazenamento, atividade, metabolismo, e
regulao de seres vivos (Sterner & Elser, 2002). Consequentemente, alteraes na
especiao molecular, disponibilidade, distribuio e abundncia relativa deste
elemento tm conseqncias determinantes para a performance dos indivduos,
para a dinmica das populaes e para a estrutura e composio das comunidades
biolgicas.
As alteraes antrpicas no ciclo do nitrognio vm sendo dramticas
desde o sculo passado (Filoso et al., 2006). Estas alteraes derivam
principalmente da fixao de nitrognio atmosfrico atravs do cultivo de espcies
vegetais fixadoras e de processos industriais de produo de fertilizantes para
propulsionar a produtividade agrcola; dos dejetos derivados do consumo
secundrio desta produtividade agrcola pelo homem e seus rebanhos em
atividades domsticas e industriais; e pela liberao do nitrognio armazenado na
biomassa atravs do desmatamento e da queima de combustveis fsseis
(Galloway, 1998; Rouse et al., 1999; Stoddard et al., 1999; Sterner & Elser, 2002).
Tais alteraes manifestam-se em mltiplas escalas espaciais: embora
descargas maiores de nitrognio concentrem-se em reas de agricultura intensiva e
em regies industrializadas (Matthews, 1994; Townsend et al., 1996), mecanismos
de transporte regionais como rios, e globais como correntes ocenicas e massas de
ar, tm o potencial de redistribuir o nitrognio de modo a atingir reas remotas e
-
12
aparentemente no perturbadas, onde mesmo baixas concentraes podem ter
consequncias biolgicas importantes (Blaustein et al., 2003). Por conseguinte, a
questo da alterao do ciclo do nitrognio um problema srio em potencialmente
qualquer rea ou ecossistema do planeta.
Das atividades antrpicas, a produo de alimento responsvel pelo
maior aporte absoluto de nitrognio em ecossistemas (Galloway, 1998). At
aproximadamente 1960, a maior contribuio vinha do cultivo de espcies fixadoras
de nitrognio (Young, 1992), e ainda hoje essa via contribui significativamente para
o oramento de nitrognio (Sterner & Elser, 2002; Filoso et al., 2006). Contudo, com
o desenvolvimento do processo Haber-Bosch de fixao industrial (converso de N2
para NH3) a utilizao de fertilizantes base de N aumentou rapidamente (cerca de
10 vezes at 1990) e este se tornou o processo dominante (Oldham et al., 1997;
Galloway, 1998; Rouse et al., 1999). A injeo macia de fertilizantes em
agroecossistemas no mundo todo despeja cerca de 80 bilhes de toneladas
mtricas de N por ano, o que corresponde a mais de 57% da descarga
antropognica total (Vitousek et al., 1997).
Nos pases industrializados da zona temperada, as aplicaes de
fertilizantes so a principal fonte de nitrognio reativo (Filoso et al. 2006). Contudo,
as aplicaes nesses pases estabilizaram nos ltimos anos, enquanto nos pases
em desenvolvimento elas vm aumentando drasticamente (Vitousek et al., 1997).
Hoje os trpicos e subtrpicos j so responsveis por 40% das aplicaes globais
de fertilizantes, e projees indicam que at 2020 mais de 60% das aplicaes de
fertilizantes ocorrero nas regies em desenvolvimento (Matthews, 1994). O Brasil
ilustra bem esta tendncia. Nos ltimos 50 anos, o consumo de fertilizantes no pas
aumentou 25 vezes - de 360 mil toneladas na dcada de 1960 para um consumo
mdio anual de 7 milhes de toneladas em 2000 (ANDA, 2003) e de quase 9
milhes de toneladas em 2007 (IFA, 2008). Esta demanda coloca o Brasil como o
-
13
quarto maior consumidor mundial de fertilizantes com 5,4% do total (IFA, 2008). E
uma vez que a agroindstria setor-chave no desempenho econmico brasileiro,
acredita-se que o consumo de fertilizantes nitrogenados ainda aumentar
consideravelmente no pas e, possivelmente, elevar as taxas de deposio de
nitrognio reativo nos sistemas aquticos (Filoso et al., 2006)
Os fertilizantes so utilizados na agricultura como fonte de nutrientes
limitantes para o crescimento de plantas, mas as aplicaes tendem a serem
maiores que o necessrio, e as culturas no so capazes de absorver todos os
nutrientes disponveis (Hecnar, 1995). O termo saturao de nitrognio (Agren &
Bosatta, 1988) aplicado s mudanas no funcionamento dos ecossistemas que
ocorrem quando os acrscimos de nitrognio suprem a limitao da atividade
biolgica causada por este elemento. Em geral, o paradigma da saturao de
nitrognio prediz que sistemas N-limitados inicialmente retm o N antropognico
acumulando-o na biomassa. Contudo, em algum momento a descarga de N excede
a demanda biolgica, e o sistema comea a perder sua capacidade de reter este
elemento. O N excedente ento perdido atravs do fluxo de gases e em soluo,
sendo frequentemente depositado, lixiviado ou carreado para ambientes aquticos
(Matson et al., 1999).
Nos ecossistemas aquticos o nitrognio pode ocorrer em diversas formas,
embora as predominantes sejam o nitrognio molecular (N2), A amnia no-ionizada
(NH3), o on amnio (NH4+
), nitrito (NO2_
)e o nitrato (NO3_
), alm de um grande
nmero de compostos orgnicos dissolvidos (peptdeos, purinas, aminas,
aminocidos, etc.) e particulados (bactrias, fitoplncton, zooplncton, detritos, etc.)
(Wetzel, 2001). A forma de nitrognio predominante em um ambiente dependente
de vrios fatores, incluindo pH, temperatura, disponibilidade de oxignio,
assimilao vegetal e taxa de mineralizao do nitrognio orgnico (Environment
Canada, 2003).
-
14
Em soluo, o nitrognio molecular (N2) ocorre naturalmente em
concentraes prximas ao nvel de saturao, o qual depende das condies
locais de temperatura e presso. Contudo, esta forma de N s tornar-se disponvel
para os organismos aps ser convertido a nitrognio reativo, que definido como N
ligado a carbono, oxignio ou hidrognio (Wetzel, 2001). Essa converso pode
ocorrer naturalmente devido a descargas eltricas na atmosfera e principalmente
por meio da fixao biolgica realizada por bactrias, a qual responsvel por mais
de 95% da converso natural de nitrognio molecular em amnia (NH3).
A amnia tambm formada como produto da decomposio da parte
nitrogenada da matria orgnica, no processo chamado de amonificao, que
tambm realizado por microorganismos. No meio aqutico a molcula da amnia
instvel, e convertida por hidratao no on amnio (NH4+
) segundo o equilbrio
qumico NH3 + H2O NH4+
+ OH-
. Esse equilbrio fortemente influenciado pela
temperatura e principalmente pelo pH da gua: o aumento dos valores de pH e/ou
temperatura causa o aumento da concentrao relativa de NH3, mas somente em
ambientes muito alcalinos a amnia predominante (Russo, 1985). Por exemplo,
em condies de temperatura de at 30C, o amnio representa mais de 98%
quando o pH for menor ou igual 7,4 e mais de 92% em pH 8.
Em sistemas com disponibilidade de oxignio ocorre o processo de
nitrificao, que tambm realizado por bactrias. Esse processo envolve a
oxidao das formas reduzidas de nitrognio, primeiro de amnio para nitrito
(NH4+
+ 3/2 O2 NO2_
+ H2O + 2 H+
), e depois de nitrito para nitrato
(NO2_
+ 1/2 O2 NO3_
). J em sistemas com baixas concentraes de oxignio,
bactrias utilizam o nitrato e o nitrito como receptor de eltrons durante a oxidao
da matria orgnica no processo chamado denitrificao:
NO3_
+ 1/3 CH3OH NO2_
+ 1/3 CO2
+ 2/3 H2O
-
15
NO2_
+ 1/2 CH3OH 1/2 N2
+ 1/2 CO2
+ 1/2 H2O + OH-
Esta reduo bioqumica do nitrognio produz a forma gasosa de
nitrognio molecular (N2), causando perda de N da circulao biolgica geral para a
atmosfera. Portanto, a denitrificao equilibra naturalmente o oramento global de N
devolvendo para o sistema o N2 que havia sido fixado. Sendo assim, a forma
intermediria de nitrito (NO2_
) raramente atinge elevadas concentraes na natureza
porque oxidada ou reduzida to rpido quanto formada (Halling-Sorensen &
Jorgensen, 1993). Da mesma forma, a amnio tambm no costuma ocorrer em
altas concentraes na natureza, porque rapidamente oxidado a nitrato ou
assimilado pelas algas (Horne & Goldman, 1994). Portanto, o nitrato constitui a
forma de nitrognio mais estvel e abundante em guas superficiais com condies
aerbicas, e costuma representar de dois teros a quatro quintos do total de
nitrognio disponvel nesses ambientes (Crouzet et al., 1999).
No entanto, estudos interessados nos efeitos das crescentes descargas de
nitrognio vm observando aumentos significativos no somente nas concentraes
de nitrato, as tambm nas de nitrito e amnio em ecossistemas aquticos afetados
pela agricultura e atividades urbanas no mundo todo (EIAFAC, 1984; Henriksen &
Brakke, 1988; Stoddard, 1994; Camargo & Alonso, 2006). Por exemplo, na Amrica
do Norte as concentraes de nitrato em alguns rios aumentaram de 3-10 vezes
desde 1900 (Turner & Rabalais, 1991; Justie et al., 1995). As mesmas tendncias
so sugeridas para muitos rios na Europa desde a virada do sculo XX (Paces,
1982; Larsson et al., 1985; Henriksen & Brakke, 1988) e alguns rios na Pennsula
Ibrica tiveram suas concentraes de nitrito e amnio aumentadas em mais de dez
vezes (Egea-Serrano et al., 2008). Similarmente, mais de 30% dos rios no Japo
excedem o nvel mximo de nitrato aceitvel (44 mg NO3_
/L) pelas regulamentaes
japonesas (Babiker et al., 2004).
-
16
Os principais efeitos negativos do aporte excessivo de nitrognio em
sistemas aquticos so: o aumento da concentrao de ons hidrognio e a
consequente acidificao do meio aqutico; o aumento da produtividade primria e
sua cascata de efeitos sobre a cadeia trfica; e os diversos impactos decorrentes
da toxicidade dos compostos nitrogenados sobre a biota aqutica (Camargo &
Alonso, 2006). A contribuio do N para a acidificao de rios e lagos ocorre
principalmente devido deposio atmosfrica do cido ntrico (HNO3) produzido a
partir de gases NOx liberados na queima de combustveis fsseis (Vitousek et al.,
1990). Porm, grandes descargas de amnio tambm podem ser importantes
porque a liberao de ons H+
no processo de nitrificao contribui para a
acidificao de ambientes aquticos (Wetzel, 2001). Como muitas espcies so
intolerantes a condies cidas, geralmente as comunidades de habitats
acidificados possuem menor diversidade que aqueles onde as condies de pH so
prximas a neutralidade (Camargo & Alonso, 2006).
O aumento da produtividade primria ocorre devido ao enriquecimento
nutritivo dos ecossistemas aquticos, e os efeitos desta adio so chamados de
eutrofizao (Thomann & Mueller, 1987). Uma vez que a produtividade nos
ambiente modulada principalmente pela disponibilidade de N e P (fsforo), o
excesso de um desses nutrientes leva ao aumento da produtividade primria, e
pode ter consequncias para toda a comunidade biolgica atravs de cascatas
trficas (Wootton & Power, 1993). O aumento na disponibilidade de nutrientes
tambm pode afetar a composio das comunidades por favorecer espcies
adaptadas abundncia de nutrientes em detrimento de espcies adaptadas a
condies de escassez de nutrientes (Grime, 1979; Schiesari, 2004). Alm disso, o
enriquecimento com N pode afetar os ecossistemas aquticos atravs da depleo
do oxignio pela proliferao de bactrias heterotrficas que se alimentam da
matria orgnica das algas e de outros microrganismos em decomposio
-
17
(Resende, 2002). Consequentemente, comunidades sujeitas a aportes excessivos
de nutrientes geralmente sofrem diminuio da biodiversidade (Schindler, 1990).
A poluio por compostos nitrogenados tambm pode prejudicar a biota
aqutica devido toxicidade direta das formas inorgnicas de N, causando reduo
das capacidades de sobrevivncia, crescimento e reproduo dos animais
(Camargo & Alonso, 2006). Estudos comprovam que a amnia, o nitrito e o nitrato
so txicos para diversos grupos animais, como os moluscos (Alonso & Camargo,
2003; Mummert et al., 2003), crustceos (Muir et al., 1990; Alonso & Camargo,
2004), insetos (Kelso et al., 1999; Camargo & Ward, 1992), anfbios (Hecnar, 1995;
Jofre & Karasov, 1999; Marco et al., 1999; Schuytema & Nebeker, 1999b) e peixes
(Westin, 1974; Rubin & Elmaraghy, 1977; Tomasso & Carmichael, 1986).
Dentre estes, merece especial ateno o grupo dos anfbios. Anfbios so
hoje reconhecidos como excelentes bioindicadores de estresse ambiental (Blaustein
& Wake, 1995) por possurem um conjunto de atributos morfolgicos, fisiolgicos e
de histria de vida que os tornam particularmente vulnerveis a alteraes
ambientais. Dentre estes pode-se mencionar a pele permevel, a presena de ovos
desprovidos de casca, e o ciclo de vida tipicamente bifsico que condiciona
exposio a estresses tanto no ambiente aqutico quanto terrestre (Barinaga, 1990;
Wake & Morowitz, 1991). Talvez por isso, os anfbios constituam atualmente a mais
ameaada classe de vertebrados do planeta: das quase seis mil espcies
conhecidas, pelo menos 43% esto declinando, aproximadamente 32% esto
ameaadas de extino e acredita-se que mais de 160 j tenham sido extintas
(IUCN, 2006). Alm disso, as larvas de anuros so sistema modelo em ecologia
experimental (Wilbur, 1997) e sua utilizao na pesquisa cientfica oferece diversas
vantagens. Por exemplo, a manuteno em cativeiro de muitos indivduos pode ser
feita com relativa facilidade e permite a conduo de experimentos bastante
complexos com diferentes graus de controle e realismo. Por isso, importantes
-
18
conceitos em ecologia foram desenvolvidos a partir de estudos com larvas de
anfbios (por exemplo Wilbur, 1976; Wilbur, 1987; Morin, 1983; Werner, 1992;
Werner & Peacor, 2003).
Muitas destas espcies declinaram e desapareceram por conta de perda e
degradao do habitat. No entanto, a observao de que diversos declnios
ocorreram em ambientes aparentemente intocados (Wake, 1991; Crump et al.,
1992; Lips, 2000) sugere que fatores difusos e globalmente distribudos , como a
poluio qumica, possam estar envolvidos. Recentemente, a poluio foi
considerada a segunda maior ameaa aos anfbios ao redor do mundo (IUCN,
2006). A susceptibilidade dos anfbios em paisagens rurais conhecida em diversas
localidades do mundo e h sugestes de severos declnios populacionais em
decorrncia da toxicidade de compostos nitrogenados (Cooke, 1972; Berger, 1987;
Berger, 1989; Hecnar, 1995, Marco et al., 1999, Rouse et al., 1999). No Brasil
sugere-se que a poluio industrial possa ter contribudo para o declnio de algumas
populaes de anfbios no Brasil (Verdade et al., no prelo), mas nenhum trabalho
relacionou a contaminao por agroqumicos com declnios de anfbios no pas.
Pesquisas demonstram que a amnia no-ioniza a forma de nitrognio
mais txica para os organismos aquticos, seguida pelo nitrito e pelo nitrato
(Camargo & Ward, 1992). Contudo, a dinmica destes poluentes, os mecanismos
que causam determinados efeitos e os fatores ambientais que influenciam a
toxicidade no so bem estudados para os anfbios (Marco & Ortiz-Santaliestra,
2009). Acredita-se que as molculas de NO3_
, NO2_
, NH3 e NH4+
presentes no
ambiente penetram o corpo dos anfbios por difuso atravs da pele, brnquias,
pulmes e/ou por ingesto (Hecnar, 1995). Porm, os mecanismos envolvidos na
toxicidade de cada uma dessas formas de nitrognio so diferentes.
Embora o nitrito seja consideravelmente mais txico que o nitrato, a ao
txica desses ons bastante similar, pois o nitrato reduzido a nitrito na cavidade
-
19
digestiva devido s condies corporais internas (Camargo & Alonso, 2006). Aps
entrar na corrente sangunea, o nitrito oxida as protenas responsveis pelo
transporte de oxignio (hemoglobina, hemocianina) convertendo-as em formas
incapazes de transportar oxignio para a respirao celular (metahemoglobina,
metahemocianina) (Huey & Beitinger, 1980; Eckert et al., 1988). Ambos os
compostos tambm favorecem a formao de N-nitrosaminas secundrias, as quais
so cancergenas e mutagnicas (Nugent et al., 2001), e promovem a depresso do
sistema imunolgico aumentando a susceptibilidade a doenas e parasitas
(Camargo & Alonso, 2006). Alm do mais, acredita-se que o nitrato e o nitrito
possam atuar como disruptores endcrinos, influenciando o funcionamento da
tireide e o equilbrio hormonal (Guillette & Edwards, 2005). O nitrito tambm pode
causar: depleo dos nveis intra e extracelulares de cloreto (Cl_
), causando severo
desequilbrio de eletrlitos, depleo de potssio (K+
) intracelular e elevao de K+
extracelular afetando os potenciais de membrana, neurotransmisso, contrao
muscular e funo cardaca; e danos s mitocndrias nas clulas do fgado
causando suprimento deficiente de oxignio ao tecido (Camargo & Alonso, 2006).
A ao txica da amnia sobre os organismos aquticos pode envolver os
seguintes mecanismos: destruio do epitlio branquial prejudicando respirao e
osmorregulao; estimulao da gliclise e inibio do ciclo de Krebs causando
progressiva acidose sangunea com conseqente reduo da capacidade
transportadora de oxignio; inibio da produo de ATP e depresso do ATP
cerebral; disrupo de vasos sanguneos e atividade osmorregulatria; e depresso
do sistema imunolgico aumentando a susceptibilidade a doenas e parasitas
(Camargo & Alonso, 2006). J o on amnio parece ser no txico ou
consideravelmente pouco txico, embora seja capaz de reduzir a concentrao
corporal interna de sdio (Na+) para nveis possivelmente fatais (Russo, 1985).
-
20
Por conseguinte, h fortes evidncias que esses efeitos fisiolgicos
negativos do nitrato, do nitrito e da amnia-total podem escalonar para efeitos sobre
a histria de vida dos indivduos, afetando atributos como comportamento,
crescimento, desenvolvimento e sobrevivncia das larvas de anfbios (Marco &
Ortiz-Santaliestra, no prelo). Tais efeitos subletais tambm tm grande relevncia
ecolgica porque, em longo prazo, podem indiretamente reduzir a sobrevivncia dos
girinos e dos estgios ps-metamrficos, alm de afetar o sucesso reprodutivo dos
adultos.
A reduo do crescimento larval, e portanto o tamanho corporal menor,
reduz a capacidade competitiva e locomotora dos girinos, tornando-os mais
vulnerveis predao (Berven, 1990; Newman & Dunham, 1994). A reduo do
desenvolvimento larval tambm pode afetar negativamente os anfbios devido
dessecao em hbitats efmeros e ao maior perodo de exposio aos predadores
aquticos (Griffis-Kyle, 2007). E tanto a reduo do crescimento quanto do
desenvolvimento podem resultar em metamrficos com menor tamanho, o que
tambm condiciona menor sobrevivncia predao (Xu & Oldham, 1997), menor
tolerncia desidratao, e menor sucesso reprodutivo, pois adultos menores
possuem menor fertilidade e sucesso na seleo de parceiros (Smith, 1987; Goater
et al., 1993). Da mesma forma, as alteraes comportamentais tambm tm grande
relevncia ecolgica, especialmente a reduo nos nveis de atividade (Marco &
Ortiz-Santaliestra, no prelo). Isso ocorre porque a atividade media o conflito que h
entre forrageamento e evitao de predadores (Werner & Anholt, 1993) e influencia
as habilidades competitivas dos girinos (Semlitsch, 1993; Dayton & Fitzgerald,
2001).
Pesquisas tambm demonstram que os efeitos txicos letais e subletais da
exposio aos compostos nitrogenados variam grandemente entre espcies de
anfbios (Hecnar 1995, Marco et al. 1999, Schuytema & Nebeker 1999a) e at
-
21
mesmo entre populaes de uma espcie (Johansson et al. 2001). Contudo,
nenhum dos mais de 2000 artigos sobre ecotoxicologia de anfbios publicados ao
longo de 40 anos no mundo todo lidou com a toxicidade de compostos nitrogenados
sobre espcies brasileiras (Luis Schiesari, Britta Grillitsch e Heinz Grillitsch, dados
no-publicados). E justamente no Brasil, o problema da poluio por nitrognio
particularmente importante, pois aqui se encontra a maior riqueza de anfbios do
mundo (aproximadamente 875 espcies segundo SBH, 2010), e ao mesmo tempo o
consumo de fertilizantes enorme e a expanso da fronteira agrcola agressiva.
Portanto, no sabemos de forma emprica o quanto as espcies brasileiras
de anfbios so sensveis a poluio por nitrognio. E na verdade, falta esse
conhecimento para as espcies neotropicais em geral (Schiesari et al., 2007). Essa
carncia de dados traz implicaes prticas para a conservao porque, por
exemplo, faz com que os critrios aplicados no controle de qualidade da gua das
regies tropicais sejam derivados de dados obtidos com espcies da zona
temperada (Kwok et al., 2007). Logo, para que os critrios regulatrios nas regies
tropicais fossem mais adequados conservao de seus ecossistemas, seria
necessrio ento que fossem realizados bioensaios ecotoxicolgicos com suas
espcies nativas.
Nesta pesquisa tive dois objetivos principais. O primeiro foi testar em
laboratrio a toxicidade relativa dos ons nitrato, nitrito e amnio, e a variao
interespecfica na sensibilidade a esses ons, em larvas de cinco espcies de
anuros (Rhinella ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis, Physalaemus cuvieri
e Physalaemus olfersii). Para isso utilizei bioensaios seguindo protocolos
internacionalmente padronizados para testes de ecotoxicidade com organismos
aquticos (ASTM, 2004), e que portanto permitem mximas reprodutibilidade e
comparabilidade de resultados entre compostos, espcies, e laboratrios. No
entanto, estes bioensaios carecem de realismo uma vez que simulam um cenrio
-
22
de exposio aguda a altas concentraes de contaminantes quando na natureza o
cenrio de exposio tende a ser crnico e a baixas concentraes. Alm disso,
bioensaios usam mortalidade como principal varivel de resposta, quando tambm
efeitos subletais podem influenciar a persistncia de populaes ao modular o
sucesso dos indivduos. Por isso, meu segundo objetivo foi testar em laboratrio se
concentraes relativamente baixas e ecologicamente relevantes de nitrato, nitrito e
amnio podem afetar a sobrevivncia, o crescimento, o desenvolvimento e o
comportamento das larvas de R. ornata, P. cuvieri e H. faber.
Materiais e Mtodos
Os experimentos que realizei foram conduzidos com embries e larvas
derivados de desovas provenientes de um stio de referncia no-contaminado, a
Estao Biolgica de Boracia (EBB), Salespolis, So Paulo (23 37 59 S e 45
31 59 W). A EBB compreende uma rea de 96 ha e est situada dentro de uma
reserva protetora de mananciais (Adutora do Rio Claro, SABESP) de 16450 ha
localizada a cerca de 110 km da cidade de So Paulo (Ferro & Diniz, 2007). A
identidade das espcies que utilizei foi definida pela abundncia e facilidade na
coleta das desovas no campo, pois s foram testadas aquelas espcies que
encontrei um numero de desovas igual ou maior a trs. Fiz isso para evitar que as
particularidades de uma determinada desova criassem vieses nos resultados
experimentais devido a efeitos parentais ou do ambiente. As espcies que eu utilizei
nesse trabalho foram: o bufondeo Rhinella ornata, os hildeos Hypsiboas faber e
Hypsiboas pardalis e os leiuperideos Physalaemus cuvieri e Physalaemus olfersii. A
coleta e transporte de material biolgico realizados nesta pesquisa foram
autorizados pelo IBAMA (Protocolo IBAMA 02027.0011085/06-48) e a conduo dos
-
23
experimentos aqui descritos foi autorizada pela Comisso de tica em
Experimentao do Instituto de Biocincias-USP (Protocolo 039/2007).
Rhinella ornata uma espcie terrestre de porte mdio (adultos possuem
comprimento rostro-cloacal de 63-95 mm) que ocorre em uma grande variedade de
hbitats, incluindo florestas primrias e secundrias, pastos e reas abertas (Heyer
et al., 1990). Seus ovos so depositados em cordes gelatinosos na gua de poas,
brejos e margens de lagos (Ramos & Gasparini, 2004) em eventos de exploso
reprodutiva que ocorrem no incio da estao chuvosa (Bertoluci, 1997). Uma nica
desova pode conter mais de 4500 ovos (Haddad, 1991). Seus girinos so negros,
tem o hbito de formao de cardumes (Heyer, 1990), e so impalatveis para
alguns vertebrados, como peixes, aves e mamferos (Wassersug, 1971; Heyer et
al., 1975). No h dados na literatura para a durao do perodo larval de R. ornata
na natureza, mas em laboratrio o desenvolvimento dos ovos at a metamorfose
demora aproximadamente 40 dias, embora haja grande plasticidade nessa
caracterstica (Simon M.N. comunicao pessoal). A distribuio geogrfica dessa
espcie se estende do sul do Esprito Santo at o norte do Paran, incluindo os
estados de Rio Janeiro e So Paulo e possivelmente reas no nordeste da
Argentina (IUCN, 2009).
Hypsiboas faber a espcie de anfbio arborcola de maior tamanho da
Mata Atlntica, atingindo cerca de 100 mm (Verdade et al., 2009). Sua reproduo
ocorre em lagoas, geralmente permanentes, localizadas em reas abertas e na
borda da mata, principalmente no perodo de outubro at maro (Bertoluci, 1997).
Suas desovas so depositadas em pequenas depresses no solo construdas pelos
machos nas margens de brejos e lagoas, e possuem em mdia 2270 ovos (Martins,
1993). O desenvolvimento larval se estende por quase 12 meses e os girinos
podem atingir at 90 mm de comprimento total (Bertoluci, 1997). A distribuio
-
24
geogrfica dessa espcie se estende da Bahia at o Rio Grande do Sul, e inclui a
provncia de Misiones na Argentina e a poro oriental do Paraguai (IUCN, 2009).
Hypsiboas pardalis uma espcie arborcola de mdio porte (comprimento
rostro-cloacal de at 70 mm) que ocorre em florestas de Mata Atlntica nos estados
de So Paulo, Rio de Janeiro, Esprito Santo e na poro leste de Minas Gerais
(IUCN, 2009). Seus ovos tambm so depositados em pequenas depresses no
solo construdas pelos machos, mas ocorrem preferencialmente em poas ou
charcos situados na borda da mata (Ramos & Gasparini, 2004). Os girinos atingem
comprimento total mximo de 37 mm e possuem colorao marrom-acinzentada
com marcas transversais escuras no dorso (Bertoluci, 1997).
Physalaemus cuvieri uma espcie terrestre de pequeno porte
(comprimento rostro-cloacal de at 30 mm) que ocorre em florestas, pastos e reas
abertas (Verdade et al., 2009). A reproduo dessa espcie ocorre de setembro at
maro em ambientes lnticos temporrios e permanentes (Heyer et al., 1990). As
desovas possuem em mdia 550 ovos e so depositadas em ninhos de espuma
que ficam ancorados vegetao (Haddad & Sazima 1992). Os girinos so
pequenos (comprimento total mximo de 26 mm) e a fase larval geralmente
inferior a dois meses (Bokerman, 1962). Sua ampla distribuio geogrfica abrange
praticamente todo o Brasil (exceto a regio norte), a provncia de Misiones na
Argentina e a poro oriental do Paraguai (IUCN, 2009).
Physalaemus olfersii uma espcie terrestre de pequeno porte
(comprimento rostro-cloacal de at 40 mm) que ocorre em florestas primrias e
secundrias das regies sul e sudeste do Brasil (IUCN, 2009). Seus ovos tambm
so depositados em ninhos de espuma, mas frequentemente em lagoas de
pequena dimenso na borda da mata (Bertoluci, 1997). Os girinos dessa espcie
so morfologicamente idnticos aos girinos de P. cuvieri. Contudo, segundo
Bertoluci (1997) a durao mnima da fase larval dessa espcie de cinco meses.
-
25
Aps coletar as desovas na EBB eu as transportei para o laboratrio da
Escola de Artes, Cincias e Humanidades da Universidade de So Paulo (EACH
USP). No laboratrio, os ovos eclodiram e os girinos foram mantidos em tanques
com 50 litros de gua filtrada e declorinada. A gua utilizada nas culturas e nos
experimentos foi analisada em 06/08/2009 por mtodos padronizados (APHA-
AWWA-WEF, 1995) e apresentou os valores de 56 mg/L para dureza total (SM
2340 C - EDTA Titrimetric Method), 24 mg/L para alcalinidade total (SM 2320 B -
Titration Method), 0,46 UT para turbidez (SM 2130 B - Turbidity Nephelometric
Method) e concentrao de Cloro total menor que 0,01 mg/L (SM 4500 Cl G
DPD Colorimetric Method). Nesta fase de cultura, as larvas foram alimentadas com
rao para coelhos (Purina Mills, LLC, USA; ~16% protena) ad libitum at o incio
dos experimentos.
Dos compostos qumicos usualmente utilizados para testar os efeitos
txicos do nitrato, do nitrito e do amnio sobre os organismos aquticos escolhi o
nitrato de sdio, o nitrito de sdio e o sulfato de amnio (Merck KGaA, Darmstadt,
Alemanha, pureza > 99%). O nitrato de sdio (NaNO3) e o nitrito de sdio (NaNO2)
foram escolhidos como fonte de nitrato e nitrito, respectivamente, porque estudos
que compararam a toxicidade de NaNO3 e NaCl (cloreto de sdio) a organismos
aquticos demonstraram que a toxicidade observada resultado da exposio ao
nion nitrato e no ao ction Na+ (Baker & Waights, 1994). Da mesma forma,
escolhi o sulfato de amnio ((NH4)2SO4) como fonte de amnio porque a toxicidade
desse composto atribuda essencialmente a sua frao nitrogenada (Schuytema &
Nebeker, 1999b).
Uma vez que este estudo teve por objetivo avaliar a toxicidade comparativa
dos ons nitrogenados, utilizei a massa de nitrognio como unidade de concentrao
dos sais manipulados. Isso permitiu que as comparaes entre as formas de
nitrognio fossem baseadas no mesmo nmero de mols das molculas de
-
26
interesse, embora as fraes de nitrognio presentes nas molculas dos sais
manipulados fossem consideravelmente diferentes. Todas as operaes que
envolveram pesagem de material neste trabalho foram realizadas em balana semi-
analtica com preciso de 1 mg (Ohaus Corporation, Pine Brook, NJ, USA). Os
experimentos foram realizados nas condies ambientes de temperatura e
fotoperodo, conforme protocolo descrito abaixo.
BIOENSAIOS DE EXPOSIO AGUDA
Para comparar a toxicidade do nitrato, nitrito e amnio para as larvas de
anuros e para testar a variao interespecfica na sensibilidade a estes ons eu
realizei bioensaios de exposio aguda (96 horas) baseados nas diretrizes da
ASTM (2004) com larvas das cinco espcies descritas anteriormente (Rhinella
ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis, Physalaemus cuvieri e Physalaemus
olfersii). Embora de forma ideal esses bioensaios devessem ter sido conduzidos
simultaneamente por questes de comparabilidade, a fenologia reprodutiva das
espcies e tambm questes de logstica, como restries de espao e material,
impediram que todas as espcies e compostos fossem testados ao mesmo tempo
(Tabela 1). Alm disso, alguns experimentos falharam em detectar mortalidade na
faixa de concentraes manipuladas e por isso tiveram que ser refeitos. Isso
aconteceu nos testes com P. cuvieri e P. olfersii em exposio ao nitrato de sdio
em dezembro de 2009, e com H. faber e H. pardalis em exposio ao sulfato de
amnio em janeiro de 2010. Portanto, fatores que no foram controlados, como a
temperatura por exemplo, foram diferentes em cada teste (Tabela 1).
Nestes bioensaios, cada unidade experimental consistiu em um pote de
vidro de 2.7 L contendo 1 litro de gua pura (controle) ou uma de cinco
concentraes de um dos compostos manipulados (Tabela 1). Em cada um dos
recipientes experimentais eu coloquei 10 girinos. Para os testes com Rhinella ornata
-
27
em cada rplica coloquei girinos provenientes de uma mesma desova, enquanto
que para as demais espcies testadas, em cada rplica coloquei girinos
Tabela 1. Sntese do delineamento dos bioensaios de exposio aguda realizados
com larvas de cinco espcies de anuros.
ESPCIE COMPOSTO DATA CONCENTRAO NOMINALTEMPERATURA
MDIA (C)
Rhinella ornata NaNO3 15-set-09 200, 355, 632, 1124 e 2000 mg N/L 19,65
NaNO2 15-set-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 19,65
(NH4)2SO4 15-set-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 19,65
Physalaemus cuvieri NaNO3 15-fev-10 200, 355, 632, 1124 e 2000 mg N/L 27,66
NaNO2 4-dez-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 21,88
(NH4)2SO4 4-dez-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 21,88
Physalaemus olfersii NaNO3 18-jan-10 200, 355, 632, 1124 e 2000 mg N/L 24,25
NaNO2 4-dez-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 21,88
(NH4)2SO4 4-dez-09 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L 21,88
Hypsiboas faber NaNO3 18-jan-10 200, 355, 632, 1124 e 2000 mg N/L 24,25
NaNO2 18-jan-10 15, 34, 77, 176 e 400 mg N/L 24,25
(NH4)2SO4 15-fev-10 15, 42, 122, 350 e 1000 mg N/L 27,66
Hypsiboas pardalis NaNO3 18-jan-10 200, 355, 632, 1124 e 2000 mg N/L 24,25
NaNO2 18-jan-10 15, 34, 77, 176 e 400 mg N/L 24,25
(NH4)2SO4 18-jan-10 15, 34, 77, 176 e 400 mg N/L 24,25
aleatoriamente retirados de todas as desovas disponveis para aquela espcie.
Selecionei para os experimentos indivduos em estgios iniciais de desenvolvimento
(por volta do estgio 25; Gosner, 1960) e dentro de uma faixa estreita de massas
corporais. Essa padronizao importante porque o tamanho e o estgio de
desenvolvimento do indivduo so atributos que influenciam fortemente sua
suscetibilidade aos compostos nitrogenados (Ortiz-Santaliestra et al., 2006). Alm
disso, girinos aparentemente no saudveis, com anormalidades morfolgicas e/ou
comportamentais visveis foram excludos. Dentro de cada experimento, todos os
potes foram identificados com relao espcie, composto e concentrao
manipulada, e suas posies nas estantes do laboratrio foram aleatorizadas para
evitar vieses nos resultados. No houve alimentao dos girinos durante os
experimentos. Aps 48 horas retirei os indivduos mortos e medi a temperatura de
10 potes (escolhidos aleatoriamente) para que a mdia desses valores
representasse a temperatura na qual o bioensaio foi conduzido. Decorridas 96
horas registrei a mortalidade total em cada pote e encerrei os testes.
-
28
Experimentos-piloto (range-finding tests) conduzidos com todas as
espcies e compostos permitiram refinar a metodologia experimental e aproximar,
para cada composto, (i) a maior concentrao onde nenhum indivduo foi afetado e
(ii) a menor concentrao onde todos os indivduos foram afetados. Estas
concentraes foram ento usadas para definir os extremos de um gradiente de 5
concentraes (logaritmicamente espaadas) manipuladas nos testes definitivos.
Assim, para o nitrato de sdio testei as concentraes nominais de 200, 355, 632,
1124 e 2000 mg N/L sobre as cinco espcies. Para o nitrito de sdio testei as
concentraes nominais de 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L para os girinos de R.
ornata, P. cuvieri e P. olfersii , e para os girinos de H. faber e H. pardalis testei as
concentraes nominais de 15, 34, 77, 176 e 400 mgN / L. Para o sulfato de
amnio testei as concentraes nominais de 15, 32, 67, 142 e 300 mg N/L para os
girinos de R. ornata, P. cuvieri e P. olfersii ; 15, 42, 122, 350 e 1000 mg N/L para os
girinos de H. faber e 15, 34, 77, 176 e 400 mg N/L para os girinos de H. pardalis.
Para cada tratamento e para os controles de todos os bioensaios utilizei quatro
rplicas.
Os valores de mortalidade registrados para as concentraes manipuladas
foram utilizados para identificar parmetros-padro, como a maior concentrao
sem efeito observado (CSEO), a menor concentrao com efeito observado
(MCEO) e a concentrao com efeito letal para 50% da populao experimental
(CL50). Os valores de CL50 foram estimados estatisticamente pelo Mtodo de
Interpolao Linear (USEPA/600/4-89-001).
Para testar diferenas de toxicidade entre nitrato, nitrito e amnio os
valores de CL50 obtidos para cada on foram comparados por Anlise de Varincia
e testados a posteriori para diferenas entre pares com ajuste de Bonferroni pelo
programa SPSS 11.5 (SPSS Inc., Chicago, IL). O efeito da temperatura sobre os
valores de CL50 foi testado por regresso linear tambm pelo programa SPSS 11.5.
-
29
Para testar diferenas de sensibilidade entre as espcies para um mesmo on, os
valores de CL50 obtidos foram comparados pelo teste Z (Zar, 1999). E finalmente, a
associao entre o ranqueamento de sensibilidade das espcies ao nitrato de sdio,
nitrito de sdio e sulfato de amnio foi medida atravs do ndice de correlao de
Spearman, tambm pelo programa SPSS 11.5. Todos os testes foram realizados
com nvel de significncia 5%.
EXPERIMENTOS DE EXPOSIO CRNICA
Para testar os efeitos letais e subletais de concentraes ecologicamente
realistas do nitrognio inorgnico expus os girinos de Rhinella ornata, Physalaemus
cuvieri e Hypsiboas faber a baixas concentraes dos compostos nitrato de sdio,
nitrito de sdio e sulfato de amnio. De forma a obter mximo de realismo no que
diz respeito durao da exposio, e melhor interpretao no que diz respeito s
conseqncias da exposio ao nitrognio inorgnico para a aptido darwiniana, a
meta inicial foi conduzir experimentos abrangendo todo o perodo embrio-larval at
a metamorfose. As variveis de resposta pr-metamrficas foram sobrevivncia (em
%), massa (em mg), estgio de desenvolvimento (conforme Gosner 1960) e taxas
de atividade (% de girinos ativos nadando ou se alimentando - em determinado
momento no tempo; Schiesari 2004); por sua vez, as variveis de resposta
metamrficas foram sucesso em atingir a metamorfose (em %), tempo para a
metamorfose (em dias) e massa na metamorfose (em mg). Os indivduos foram
considerados como tendo completado a metamorfose quando toda a cauda fora
absorvida.
Uma vez que a quantificao de algumas variveis pr-metamrficas
(massa e estgio de desenvolvimento) implica no manuseio dos indivduos, e que
este manuseio pode influenciar seu posterior desempenho, optei por dividir cada
experimento de forma a desmontar metade das rplicas (e preservar os girinos em
-
30
soluo 1:1 de etanol 70% e formaldedo 5%) aps 21 dias de exposio, e manter
a exposio na outra metade das rplicas at que a metamorfose fosse atingida.
Para isso selecionei duas espcies de desenvolvimento rpido (R. ornata e P.
cuvieri) (Bokermann 1962; M.N. Simon comunicao pessoal ) para avaliao de
efeitos pr-metamrficos e metamrficos, e complementei a investigao de efeitos
pr-metamrficos apenas com uma espcie adicional, Hypsiboas faber, que tem
desenvolvimento larval durando muitos meses (Martins 1993).
Os trs compostos foram testados simultaneamente sobre cada espcie
em experimentos de longa durao realizados nos perodos de 7 setembro a 17 de
novembro de 2009 com R. ornata (Tabelas 2), 14 de janeiro a 4 de fevereiro de
2010 com P. cuvieri, e 22 de fevereiro a 15 de maro de 2010 com H. faber (Tabela
3). Nestes experimentos, cada unidade experimental consistia em aqurios de vidro
de 40 X 30 X 50 cm contendo 20L de gua pura (controle) ou uma de duas
concentraes (2,5 ou 10 mg/L) de nitrognio na forma de nitrato de sdio, nitrito de
sdio ou sulfato de amnio (Tabelas 2 e 3). Essas concentraes esto dentro da
amplitude que ocorre na natureza em casos de poluio por nitrognio (veja por
exemplo em McCoy, 1972; Bogardi et al., 1991; Wetzel, 1983; Edwards & Daniel,
1994). Nos experimentos com R. ornata e H. faber eu coloquei 20 girinos em cada
aqurio, e no experimento com P. cuvieri coloquei 15 girinos. Todos os girinos
utilizados estavam em mesmo estgio de desenvolvimento (por volta do estgio 25;
Gosner, 1960), dentro de uma faixa estreita da massa corporal (massa mdia de 30
indivduos igual a 12,4 mg para R. ornata, 5,4 mg para P. cuvieri e 18,3 mg para H.
faber) e aparentando estar saudveis, sem anormalidades morfolgicas e/ou
comportamentais. Todos os aqurios foram identificados com relao ao composto
e concentrao manipulada, e suas posies nas estantes do laboratrio foram
aleatorizadas para evitar vieses nos resultados. A manuteno desses
experimentos (registro da sobrevivncia, retirada de indivduos mortos e
-
31
alimentao) foi feita toda segunda, quarta e sexta-feira. Os girinos foram
alimentados com uma mistura moda de rao de coelho (Purina Mills, LLC, USA;
~16% protena) e de peixe (TetraMin, Melle, Alemanha; 45% protena) na proporo
de 3:1, escalonada em uma dose diria per capita equivalente a 16% da massa
mdia individual no incio do experimento. Estudos anteriores demonstraram que
este valor excede a capacidade mxima de ingesto de alimento por espcies de
girinos, permitindo crescimento timo, e ao mesmo tempo minimiza os restos de
comida no aqurio, que poderiam prejudicar a qualidade da gua e alterao das
concentraes reais de nitrognio (Schiesari, 2004).
Semanalmente a soluo de todos os aqurios foi substituda por uma
nova para que as concentraes de nitrognio fossem mantidas. Trabalhos
realizados com metodologias similares indicam que desvios significativos (>25%) da
concentrao original no ocorrem em perodos de at sete dias (Marco et al.,
1999). As caractersticas fsico-qumicas das solues testadas a cada semana
foram medidas e registradas para efeitos de controle de qualidade. Utilizei eletrodos
para medir a concentrao de oxignio dissolvido (Oxmetro DM4P Digimed, So
Paulo, Brasil), o pH (pHscan Eutech Instruments Pte Ltd, Ayer Rajah Crescent,
Singapura) e tambm a temperatura e a condutividade (ECTestr Eutech
Instruments Pte Ltd, Ayer Rajah Crescent, Singapura) de todos os aqurios.
Amostras compostas de gua de cada tratamento (formadas por alquotas de
mesmo volume de cada rplica) foram analisadas para determinao das
concentraes reais de N com espectrofotmetro Hach DR2800 (USA Hach
Company, Loveland, USA) e kits de reagentes apropriados utilizando os mtodos de
reduo de cdmio para quantificao de nitrato (mtodo n 8171, Hach 2007, limite
de quantificao 0,1 mg/l NO3- -N), diazotizao para quantificao de nitrito
(mtodo n 8507, Hach 2007, limite de quantificao 0,002 mg/l NO2---N) e salicilato
para quantificao de N-amnia-total (mtodo n 8155, Hach 2007, limite de
-
32
quantificao 0,01 mg/l N-amnia-total). Como no meio aqutico a amnia no-
ionizada e o amnio sempre ocorrem juntos, geralmente as concentraes dessas
molculas tambm so analiticamente medidas juntas nas amostras de gua, e os
valores de concentrao so ento expressos como amnia-total, mas representam
a soma das concentraes dessas duas formas (Camargo e Alonso 2006). Sendo
assim, aps quantificar as concentraes de N-amnia-total presentes nas solues
de sulfato de amnio, calculei as concentraes de amnio e de amnia no-
ionizada conforme proposto por Emerson et al. (1975) utilizando os valores mdios
de pH e temperatura registrados durante cada experimento.
R. ornata foi testada ao longo de todo o desenvolvimento embrio-larval e
at a metamorfose em um experimento conduzido em duas fases: numa primeira
fase, um fragmento de desova com 50 ovos (estgio < 15; Gosner, 1960) foi
colocado em um vidro contendo 1L de gua filtrada (controle) ou de uma das
solues descritas acima. Cada tratamento foi replicado trs vezes, sendo cada
rplica representada por uma desova. O experimento comeou no dia 7 de
setembro e terminou aps 96h, quando o sucesso na ecloso foi estimado em 98%
independente do tratamento experimental. Neste momento iniciei a segunda fase do
experimento (11/setembro) transplantando parte dos girinos (estgio 22-23, Gosner,
1960; massa mdia 12,4 mg) para os aqurios de vidro de 40 X 30 X 50 cm
contendo 20L das mesmas solues. Cada combinao de desova*rplica da
primeira fase do experimento deu origem a duas rplicas na segunda fase do
experimento. Por exemplo, 40 embries da desova 1 e que eclodiram em vidros
contendo soluo-controle foram divididos em dois aqurios contendo soluo-
controle (20 girinos em cada aqurio). Como j foi dito, este delineamento foi
decidido porque uma das rplicas de cada desova*tratamento seria desmontada
aps 21 dias para estimativa da massa e desenvolvimento dos girinos enquanto a
outra rplica seria mantida at que a maior parte dos indivduos completasse a
-
33
metamorfose (que ocorreu em 17/novembro). Portanto houve 3 rplicas para
variveis metamrficas e 3 rplicas para variveis pr-metamrficas exceto para
taxas de sobrevivncia e taxas de atividade que puderam ser estimadas para todas
as seis rplicas at o 21. dia de experimento.
Devido grande variao nos dados que obtive para R. ornata, optei por
aumentar o nmero de rplicas de trs (3 pr-metamrficas + 3 metamrficas) para
quatro (4 pr-metamrficas + 4 metamrficas) no experimento com P. cuvieri
.Infelizmente, por conta da alta mortalidade ocorrida em todos os tratamentos e
inclusive nos controles (ver em Resultados) optei por encerrar o experimento aps
21 dias de exposio. Conforme explicado acima, o experimento com Hypsiboas
faber teve como objetivo a quantificao de variveis de resposta pr-metamrficas
apenas e por isso foi conduzido com 5 rplicas e encerrado aps 21 dias de
exposio.
Conduzi uma Anlise de Varincia (ANOVA) testanto o efeito da
concentrao de cada on (sendo que o controle representa a concentrao = 0
mgN/L) sobre as variveis dependentes sobrevivncia aps 7, 14 e 21 dias de
exposio; taxas de atividade (medidas em 20 ocasies); massa mdia e estgio de
desenvolvimento mdio aps 21 dias de exposio; e, no caso, de R. ornata,
tambm sobrevivncia at a metamorfose; tempo para completar a metamorfose; e
massa na metamorfose. Quando detectado efeito significativo, diferenas entre
controle e concentraes de 2,5 e 10 mg N/L foram testadas a posteriori com ajuste
de Bonferroni. Todos os testes de ANOVA foram realizados com nvel de
significncia 5% pelo programa SPSS 11.5 (SPSS Inc., Chicago, IL).
-
34
-
35
-
36
Resultados
BIOENSAIOS DE EXPOSIO AGUDA
Uma vez que a toxicidade dos sais de nitrato de sdio, nitrito de sdio e
sulfato de amnio expressam a toxicidade dos ons nitrato, nitrito e amnio, ento
nitrato foi a forma de nitrognio menos txica para as larvas das cinco espcies
testadas (Figura 1; ANOVA F2, 13 = 19,869; p < 0,001). O valor mdio de CL50 para
nitrato (1116,42 mg N/L; EP = 179,34) foi oito vezes e meia superior ao calculado
para nitrito (130,85 mg N/L; EP = 34,67), e quase trs vezes maior que o calculado
para amnio (376,25 mg N/L; EP = 124,75). Embora o valor mdio de CL50
calculado para nitrito tenha sido quase trs vezes menor que o calculado para
amnio, no houve diferena estatisticamente significativa na toxicidade destes dois
ons (Figura 1; p = 0,392). As anlises de regresso linear que realizei
demonstraram que a temperatura no influenciou significativamente os resultados
que obtive para nitrato (n = 5; p = 0,355; R = 0,2843; y= -0,0042x + 28,745), nitrito
(n = 5; p = 0,43; R = 0,0082; y= -0,004x + 23,585), embora aparente ter
influenciado de forma marginalmente significativa os resultados para amnio (n = 4;
p = 0,071; R = 0,6412; y= 0,006x + 19,645).
Para as larvas de Rhinella ornata nitrato foi cerca de sete vezes e meia
menos txico (CL50 = 1452,5 mg N/L) que nitrito (CL50 = 192,46 mg N/L), e cinco
vezes e meia menos txico que amnio (CL50 = 264,05 mg N/L; Figura 2). Por sua
vez, nitrito foi cerca de 70% mais txico que amnio. Das concentraes
manipuladas, a maior concentrao sem efeito observado e a menor concentrao
com efeito observado foram, respectivamente, 632,45 e 1124,68 mg N/L para
nitrato, 31,72 e 67,08 mg N/L para nitrito, e 67,08 e 141,86 mg N/L para amnio. Os
girinos de R. ornata foram pouco sensveis ao nitrato com relao a maioria das
espcies testadas (Tabela 4; Figura 2), mas apresentaram sensibilidade
intermediria ao nitrito e amnio.
-
37
NITRATO NITRITO AMNIO
CL
50 (
mg
N/L
)
0
200
400
600
800
1000
1200 a
b
b
Figura 1. Comparao entre a concentrao letal de nitrato, nitrito e amnio para
50% da populao experimental de Rhinella ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas
pardalis, Physalaemus cuvieri e Physalaemus olfersii em exposio aguda (96
horas). As barras representam mdia + 1 erro padro dos valores de CL50
calculados para as cinco espcies. Para amnio, mdia e erro padro foram
calculados com apenas quatro espcies porque no foi possvel calcular a CL50
desse on para H. pardalis.
Para as larvas de Hypsiboas faber o nitrato foi cerca de oito vezes e meia
menos txico (CL50 = 1546,63 mg N/L) que nitrito (CL50 = 181,6 mg N/L), e duas
vezes menos txico que amnio (CL50 = 264,05 mg N/L; Figura 2). Por sua vez,
nitrito foi quatro vezes mais txico que amnio. Das concentraes manipuladas, a
maior concentrao sem efeito observado e a menor concentrao com efeito
observado foram, respectivamente, 1124 e 2000 mg N/L para nitrato, 77 e 176 mg
N/L para nitrito, e 350 e 1000 mg N/L para amnio. Dentre as espcies testadas, H.
faber esteve entre as menos sensveis ao nitrato e nitrito e foi a mais resistente ao
amnio (Tabela 4; Figura 2).
-
38
R. o
rna
ta
H. fa
be
r
H. p
ard
alis
P. c
uv
ieri
P. o
lfe
rsii
0
100
200
300
400
500
600
700
800
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
0
25
50
75
100
125
150
175
200
225
CL
50
(m
g N
-nit
rito
/L)
CL
50
(m
g N
-am
n
io/L
)C
L5
0 (
mg
N-n
itra
to/L
)
A
B
C
a a
bb
c
a a
a
b
c
b
c
da
Figura 2. Comparao interespecfica na CL50 de nitrato (A), nitrito (B) e amnio
(C) para larvas de Rhinella ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis,
Physalaemus cuvieri e Physalaemus olfersii em exposio aguda (96 horas). As
barras representam mdia + 1 erro padro de 4 rplicas. Note que em C no foi
possvel estimar a CL50 para H. pardalis porque no houve mortalidade significativa
na faixa de concentraes de sulfato de amnio manipuladas (15-400 mgN / L).
-
39
Para Hypsiboas pardalis no foi possvel calcular a CL50 de amnio porque
nem mesmo a maior concentrao manipulada (400 mg N/L) causou mortalidade
(Figura 2). Portanto, a maior concentrao sem efeito observado para amnio foi
400 mg N/L. Presume-se ento que a CL50 seja superior a esse valor, e que H.
pardalis seja pouco sensvel ao amnio. Nitrato foi cerca de 27 vezes menos txico
(CL50 = 908,75 mg N/L) que nitrito (CL50 = 32,88 mg N/L). Das concentraes
manipuladas, a maior concentrao sem efeito observado e a menor concentrao
com efeito observado foram, respectivamente, 632 e 1124 mg N/L para nitrato, e 15
e 34 mg N/L para nitrito. Os girinos de H. pardalis apresentaram sensibilidade
intermediria ao nitrato, mas foram os maios sensveis ao nitrito dentre todas as
espcies testadas (Tabela 4; Figura 2).
Para as larvas de Physalaemus cuvieri o nitrato foi cerca de cinco vezes e
meia menos txico (CL50 = 930,39 mg N/L) que nitrito (CL50 = 163,42 mg N/L), e
quatro vezes e meia menos txico que amnio (CL50 = 198,34 mg N/L; Figura 2).
Por sua vez, nitrito foi ligeiramente mais txico (21%) que amnio. Das
concentraes manipuladas, a maior concentrao sem efeito observado e a menor
concentrao com efeito observado foram, respectivamente, 632 e 1124 mg N/L
para nitrato, 32 e 67 mg N/L para nitrito, e 67 e 141 mg N/L para amnio. Os girinos
de P. cuvieri apresentaram sensibilidade intermediria ao nitrato, foram pouco
sensveis ao nitrito e foram os mais sensveis ao amnio (Tabela 4; Figura 2).
Para as larvas de Physalaemus olfersii o nitrato foi quase nove vezes menos
txico (CL50 = 743,82 mg N/L) que nitrito (CL50 = 83,9 mg N/L), e duas vezes e
meia menos txico que amnio (CL50 = 297,17 mg N/L; Figura 2). Por sua vez,
nitrito foi trs vezes e meia mais txico que amnio. Das concentraes
manipuladas, a maior concentrao sem efeito observado e a menor concentrao
com efeito observado foram, respectivamente, 200 e 355 mg N/L para nitrato, 32 e
67 mg N/L para nitrito, e 67 e 141 mg N/L para amnio. Esta espcie foi a mais
-
40
sensvel ao nitrato e a segunda mais sensvel ao nitrito, embora tenha apresentado
sensibilidade intermediria ao amnio com relao s outras espcies testadas
(Tabela 4; Figura 2).
Dentre as formas de nitrognio que manipulei, observei menor variao
interespecfica de sensibilidade para o nitrato. R. ornata e H. faber foram as
espcies menos sensveis a esse on, enquato H. pardalis e P. cuvieri foram cerca
de 60% mais sensveis e P. olfersii foi quase duas vezes mais sensvel. J o nitrito
foi a forma de nitrognio que causou maior variao interespecfica de
sensibilidade. Para esse on R. ornata, H. faber e P. cuvieri foram cerca de cinco
vezes menos sensveis que H. pardalis e duas vezes menos sensveis que P.
olfersii. E por fim, a variao interespecfica de sensibilidade ao amnio foi
intermediria com relao ao nitrato e nitrito. A sensibilidade de H. faber ao amnio
foi cerca de trs vezes menor que a das demais espcies, enquanto R. ornata, P.
cuvieri e P. olfersii diferiram em sensibilidade em cerca de 10-50% entre si.
A anlise de correlao entre os valores de CL50 calculados para os trs
ons (Figura 3) demonstrou que os ranqueamentos de CL50 para nitrato e para o
nitrito so fortemente correlacionados (r = 0,8; p = 0,052). Ou seja, para esses dois
ons a ordenao de sensibilidade das espcies foi semelhante. J os valores de
CL50 calculados para o amnio no tiveram correlao com os valores calculados
para nitrito (r = 0; p = 0,5), e apresentaram correlao fraca e no-significativa com
os valores de CL50 para nitrato (r = 0,4; p = 0,3). Para nitrato P. olfersii foi a espcie
mais sensvel, seguida por H. pardalis e P. cuvieri, e depois por R. ornata e H.
faber. De forma similar, para o nitrito H. pardalis foi a espcie mais sensvel,
seguida por P. olfersii, e depois por P. cuvieri, H. faber e R. ornata. Diferentemente,
para o amnio P. cuvieri foi a espcie mais sensvel, seguida por P. olfersii, R.
ornata e depois por H. faber.
-
41
-
42
CL50 (mg N-nitrato/L)
600 800 1000 1200 1400 1600
CL
50 (
mg
N-n
itri
to/L
)
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
220
R. ornata
H. faber
P. cuvieri
P olfersii
H. pardalis
CL50 (mg N-nitrato/L)
600 800 1000 1200 1400 1600
CL
50 (
mg
N-a
m
nio
/L)
100
200
300
400
500
600
700
800
R. ornata
H. faber
P. cuvieri
P olfersii
A
B
CL50 (mg N-nitrito/L)
60 80 100 120 140 160 180 200
CL
50 (
mg
N-a
m
nio
/L)
100
200
300
400
500
600
700
800
R. ornata
H. faber
P. cuvieri
P olfersii
C
Figura 3. Correlao entre CL50 de nitrato e nitrito (A), nitrato e amnio (B) e nitrito
e amnio (C) para larvas de Rhinella ornata, Hypsiboas faber, Hypsiboas pardalis,
Physalaemus cuvieri e Physalaemus olfersii em exposio aguda (96 horas).
-
43
EXPERIMENTOS DE EXPOSIO CRNICA
As concentraes de N medidas para cada tratamento mantiveram-se
dentro da faixa de 20% das respectivas concentraes nominais (2,5 e 10 mg N/L)
durante todos os experimentos, exceto em dois momentos, quando erros de diluio
ocorreram (Figura 4). No experimento com P. cuvieri todas as solues-teste da
terceira semana de exposio tiveram a metade da concentrao desejada (Figuras
4B, 4E e 4H), e no experimento com H. faber a concentrao medida no tratamento
de 10 mg N/L como sulfato de amnio foi de 13,8 mg N/L na primeira semana (mas
foi corrigida nas trocas seguintes; Figura 4I). Os valores medidos de pH,
condutividade e oxignio dissolvido mantiveram-se dentro da amplitude esperada
para essas variveis, e tambm variaram pouco, tanto dentro de cada experimento
como entre eles, no influenciando portanto os resultados obtidos (Tabelas 5 e 6). A
temperatura mdia da gua no experimento com R. ornata (20,4 C) foi de dois a
trs graus inferior a temperatura mdia registrada nos experimentos com P. cuvieri
e H. faber (respectivamente 23,3 e 22,7 C). Nos tratamentos de manipulao de
sulfato de amnio, as concentraes estimadas de amnia no-ionizada (NH3)
correspondentes as concentraes de 2,5 e 10 mg N/L foram calculadas em
aproximadamente 0,025 e 0,109 mg N-NH3/L para R. ornata, 0,014 e 0,064 mg N-
NH3/L para P. cuvieri e em 0,011 e 0,053 mg N-NH3/L H. faber. Portanto as fraes
de amnia no-ionizada nunca excederam 1% da concentrao medida para
amnia total.
-
44
Figura 4. Concentraes medidas de nitrognio nas formas de nitrato (A, B, C),
nitrito (D, E, F) e amnia total (G, H, I) durante os experimentos de exposio
crnica com larvas de Rhinella ornata (A, D, G), Physalaemus cuvieri (B, E, H) e
Hypsiboas faber (C, F, I).
-
45
-
46
-
47
No experimento com Rhinella ornata (Figura 5), os controles apresentaram
sobrevivncia superior a 98% decorridos 21 dias de experimento. Nesse momento
as larvas dos controles tinham massa mdia de 141 mg e estavam no estgio 34
(Gosner 1960). Aps aproximadamente 55 dias, mais de 90% dos girinos
completaram a metamorfose nos controles, pesando em mdia 106 mg. Nenhum
efeito letal ou subletal foi causado pela exposio ao nitrato de sdio ou sulfato de
amnio nas duas concentraes manipuladas, nem pelo nitrito de sdio na
concentrao de 2,5 mgN / L (Tabela 7; Figuras 6, 7 e 8). J a exposio ao nitrito
de sdio na concentrao de 10 mgN / L reduziu drasticamente a sobrevivncia e
os nveis de atividade dos girinos. A sobrevivncia caiu para menos de 50% aps 7
dias, 1,6 % aps 14 dias, e 0,8% aps 21 dias. Por conseguinte, a sobrevivncia at
a metamorfose foi zero (todos os resultados significativamente diferentes do
controle; Tabela 4; Figura 7). Os girinos expostos soluo com 10 mgN-nitrito / L
permaneceram imveis no fundo dos aqurios desde o incio do teste, e a taxa de
atividade registrada para este tratamento foi inferior a 20%, quando comparada a
80% ou mais em todos os demais tratamentos e nos controles (Tabela 4; Figura 8;
ANOVA F2,17 = 407,256 ; p < 0,001). Neste experimento pude realizar apenas oito
observaes da atividade dos girinos devido elevada mortalidade que ocorreu no
tratamento de 10 mgN-nitrito / L.
-
48
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
0
20
40
60
80
100S
OB
RE
VIV
N
CIA
(%
)
0
20
40
60
80
100
TEMPO DE EXPOSIO (dias)
0 7 14 21
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
0
20
40
60
80
100
CONTROLE
2,5 mg N/L
10 mg N/L
A
B
C SULFATO DE AMNIO
NITRITO DE SDIO
NITRATO DE SDIO
Figura 5. Sobrevivncia de Rhinella ornata ao nitrato de sdio (A), nitrito de sdio
(B) e sulfato de amnio (C) ao longo do experimento de exposio crnica. Cada
ponto representa a mdia + 1 erro padro de seis rplicas.
-
49
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35C
0
20
40
60
80
100
120
140
160
0
20
40
60
80
100S
OB
RE
VIV
N
CIA
(%
)M
AS
SA
(m
g)
ES
T
GIO
DE
D
ES
EN
VO
LV
IME
NT
O
NITRATO DE SDIO
NITRITO DE SDIO
SULFATO DE AMNIO
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
A
B
CONTROLE
**
Figura 6. Sobrevivncia (A), massa (B) e estgio de desenvolvimento (C) de girinos
de Rhinella ornata em exposio crnica ao nitrato de sdio (cinza), nitrito de sdio
(preto) e sulfato de amnio (hachurado) decorridos 21 dias de experimentos. O
controle est representado pela barra branca. Cada barra representa a mdia + 1
erro padro de trs rplicas. Diferena em relao ao controle com p < 0,01 foi
representada por **. Note que o eixo X no est em escala linear, e que para efeitos
de visualizao as barras foram deslocadas ao redor da concentrao manipulada,
que foi igual para todos os trs compostos.
-
50
0
20
40
60
80
100
120
0
10
20
30
40
50
60
0
20
40
60
80
100S
OB
RE
VIV
N
CIA
AT
A
ME
TA
MO
RF
OS
E (
%)
MA
SS
A N
A
ME
TA
MO
RF
OS
E (
mg
)T
EM
PO
PA
RA
AM
ET
AM
OR
FO
SE
(d
ias
)
NITRATO DE SDIO
NITRITO DE SDIO
SULFATO DE AMNIO
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
A
B
C
CONTROLE
**
Figura 7. Sobrevivncia at a metamorfose (A), massa na metamorfose (B) e
tempo para completar a metamorfose (C) de girinos de Rhinella ornata em
exposio crnica ao nitrato de sdio (cinza), nitrito de sdio (preto) e sulfato de
amnio (hachurado). O controle est representado pela barra branca. Cada barra
representa a mdia + 1 erro padro de trs rplicas e ** representa diferena em
relao ao controle com p < 0,01. Note que o eixo X no est em escala linear, e
que para efeitos de visualizao as barras foram deslocadas ao redor da
concentrao manipulada, que foi igual para todos os trs compostos.
-
51
0
20
40
60
80
100
TA
XA
DE
AT
IVID
AD
E (
%)
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
** NITRATO DE SDIONITRITO DE SDIO
CONTROLE
SULFATO DE AMNIO
Figura 8. Taxa de atividade de girinos de Rhinella ornata em exposio crnica (21
dias) ao nitrato de sdio (cinza), nitrito de sdio (preto) e sulfato de amnio
(hachurado). O controle est representado pela barra branca. Cada barra
representa a mdia + 1 erro padro de 8 observaes realizadas em seis rplicas e
** representa diferena em relao ao controle com p menor que 0,01. Note que o
eixo X no esta em escala linear, e que para efeitos de visualizao as barras foram
deslocadas ao redor da concentrao manipulada, que foi igual para todos os trs
compostos.
-
52
No experimento com Physalaemus cuvieri os girinos apresentaram baixa
sobrevivncia em todos aqurios. Nos controles, a sobrevivncia manteve-se
superior a 95% at o final da primeira semana, mas aps 14 dias caiu para 56% e
decorridos 21 dias atingiu 32,5% (Figura 9). No final do experimento, as larvas dos
controles pesaram em mdia 24mg e estavam no estgio de desenvolvimento 27
(Gosner 1960). As larvas expostas ao nitrato de sdio, nas duas concentraes
manipuladas, apresentaram a mesma sobrevivncia que os controles durante todo
o experimento. Contudo, a sobrevivncia em 2,5 mgN / L foi significativamente
superior registrada em 10 mgN / L aps 14 (ANOVA F2,23 = 7,153 ; p = 0,004) e
21 dias (ANOVA F2,23 = 9,122 ; p = 0,001). Embora no tenha sido detectado
nenhum efeito do nitrato de sdio sobre a massa dos girinos (Tabela 4; Figura 10;
ANOVA F2,23 = 2,411 ; p = 0,115), os indivduos expostos a 10 mgN-nitrato / L
apresentaram em mdia estgios de desenvolvimento inferiores aos observados
nos controles (Tabela 4; Figura 10; ANOVA F2,23 = 4,768 ; p = 0,02). O nitrito de
sdio afetou a sobrevivncia dos girinos desde a primeira semana de exposio
(Tabela 4; Figura 9). A concentrao de 2,5 mgN / L no afetou a sobrevivncia dos
girinos na primeira semana, mas reduziu para 32,5% aps 14 dias e para 15,8%
aps trs semanas. Esses valores so a metade do registrado nos controles para
os mesmos perodos. J nitrito de sdio na concentrao de 10 mgN / L reduziu a
sobrevivncia das larvas de P. cuvieri para 25,8% logo na primeira semana e aps
14 e 21 dias atingiu respectivamente 2,5 % e 1,6 %. Nenhum efeito do nitrito de
sdio sobre a massa (Tabela 4; Figura 10; ANOVA F2,23 = 0,279 ; p = 0,761) ou
desenvolvimento dos girinos (Tabela 4; Figura 10; ANOVA F2,23 = 0,424 ; p = 0,663)
foi detectado. A exposio ao sulfato de amnio no causou qualquer efeito letal ou
subletal para as larvas de P. cuvieri nas duas concentraes testadas (Tabela 4;
Figura 10).
-
53
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
0
20
40
60
80
100
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
0
20
40
60
80
100
TEMPO DE EXPOSIO (dias)
0 7 14 21
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
0
20
40
60
80
100
CONTROLE
2,5 mg N/L
10 mg N/L
A
B
C SULFATO DE AMNIO
NITRITO DE SDIO
NITRATO DE SDIO
Figura 9. Sobrevivncia de Physalaemus cuvieri ao longo do experimento de
exposio crnica ao nitrato de sdio (A), nitrito de sdio (B) e sulfato de amnio
(C). Cada ponto representa a mdia + 1 erro padro de oito rplicas.
-
54
25
26
27
28
29
0
20
40
60
80
100
0
5
10
15
20
25
30
35
40
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
MA
SS
A (
mg
)E
ST
G
IO D
E
DE
SE
NV
OL
VIM
EN
TO
NITRATO DE SDIO
NITRITO DE SDIO
SULFATO DE AMNIO
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
A
B
C
CONTROLE
**
**
*
Figura 10. Sobrevivncia (A), massa (B) e estgio de desenvolvimento (C) de
girinos de Physalaemus cuvieri aps 21 dias de exposio ao nitrato de sdio
(cinza), nitrito de sdio (preto) e sulfato de amnio (hachurado). O controle est
representado pela barra branca. Cada barra representa a mdia + 1 erro padro de
oito rplicas, * e ** representam diferenas em relao ao controle com p menor
que 0,05 e 0,01, respectivamente. Note que o eixo X no esta em escala linear, e
que para efeitos de visualizao as barras foram deslocadas ao redor da
concentrao manipulada, que foi igual para todos os trs compostos.
-
55
No experimento com Hypsiboas faber os controles apresentaram 99% de
sobrevivncia ao trmino do experimento. Neste momento os girinos pesaram em
mdia 115mg e estavam no mesmo estgio de desenvolvimento de quando
comearam o experimento (estgio 25; Gosner 1960). O nitrato de sdio no
causou qualquer efeito letal ou subletal para as larvas de H. faber nas duas
concentraes testadas (Tabela 4; Figuras 12 e 13). O nitrito de sdio na
concentrao de 2,5 mgN / L tambm no afetou nenhuma das variveis medidas
(Tabela 4; Figuras 12 e 13), enquanto que a concentrao de 10 mgN / L afetou
negativamente a sobrevivncia e a massa dos girinos. Durante as duas primeiras
semanas, a sobrevivncia dos girinos expostos a 10 mgN-nitrito / L foi igual a dos
controles, mas no final da terceira semana caiu para 79% (Tabela 4; Figura 11;
ANOVA F2,14 = 34,636 ; p < 0,001). Alm disso, a massa dos girinos nesse
tratamento foi em mdia 11,9% menor que nos controles (Tabela 4; Figura 12;
ANOVA F2,14 = 7,817 ; p = 0,007). O sulfato de amnio na concentrao de 2,5 mgN
/ L no causou qualquer efeito letal ou subletal para as larvas de H. faber , mas 10
mgN / L causou reduo da sobrevivncia e atividade dos girinos. Apenas na
primeira semana a sobrevivncia dos girinos expostos a 10 mgN-amonia total / L foi
igual a dos controles (Tabela 4; Figura 11; ANOVA F2,14 = 1,2 ; p = 0,335). Aps 14
dias j foi registrado reduo para 92% (Tabela 4; Figura 11; ANOVA F2,14 = 6,615 ;
p = 0,012) e at o final da terceira semana caiu para 89% (Tabela 4; Figura 11;
ANOVA F2,14 = 15,167 ; p = 0,001). A exposio a 10 mgN-amonia total / L reduziu a
taxa de atividade dos girinos de H. faber em 22% com relao ao controle (Tabela
4; Figura 13; ANOVA F2,14 = 5,115 ; p = 0,025).
-
56
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
75
80
85
90
95
100
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
75
80
85
90
95
100
TEMPO DE EXPOSIO (dias)
0 7 14 21
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
75
80
85
90
95
100
CONTROLE
2,5 mg N/L
10 mg N/L
A
B
C SULFATO DE AMNIO
NITRITO DE SDIO
NITRATO DE SDIO
Figura 11. Sobrevivncia de Hypsiboas faber ao longo do experimento de
exposio crnica ao nitrato de sdio (A), nitrito de sdio (B) e sulfato de amnio
(C). Cada ponto representa a mdia + 1 erro padro de cinco rplicas.
-
57
24
25
26
27
28
29
0
20
40
60
80
100
0
20
40
60
80
100
120
140
160
SO
BR
EV
IV
NC
IA (
%)
MA
SS
A (
mg
)
ES
T
GIO
DE
D
ES
EN
VO
LV
IME
NT
O
NITRATO DE SDIO
NITRITO DE SDIO
SULFATO DE AMNIO
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
A
B
C
CONTROLE
***
**
Figura 12. Sobrevivncia (A), massa (B) e estgio de desenvolvimento (C) de
girinos de Hypsiboas faber decorridos 21 dias de exposio ao nitrato de sdio
(cinza), nitrito de sdio (preto) e sulfato de amnio (hachurado). O controle est
representado pela barra branca. Cada barra representa a mdia + 1 erro padro de
cinco rplicas, * e ** representam diferenas em relao ao controle com p menor
que 0,05 e 0,01 respectivamente. Note que o eixo X no esta em escala linear, e
que para efeitos de visualizao as barras foram deslocadas ao redor da
concentrao manipulada, que foi igual para todos os trs compostos.
-
58
0
10
20
30
40
50T
AX
A D
E A
TIV
IDA
DE
(%
)
0 2,5 10
CONCENTRAO (mg N/L)
*
NITRATO DE SDIO
NITRITO DE SDIO
CONTROLE
SULFATO DE AMNIO
Figura 13. Taxa de atividade de girinos de Hypsiboas faber em exposio crnica
(21 dias) ao nitrato de sdio (cinza), nitrito de sdio (preto) e sulfato de amnio
(hachurado). O controle est representado pela barra branca. Cada barra
representa a mdia + 1 erro padro de 20 observaes realizadas em cinco rplicas
e * representa diferena em relao ao controle com p menor que 0,05. Note que o
eixo X no esta em escala linear, e que para efeitos de visualizao as barras foram
deslocadas ao redor da concentrao manipulada, que foi igual para todos os trs
compostos.
-
59
-
60
Discusso
Nesse trabalho, demonstrei que as larvas de anuros brasileiros podem sofrer
efeitos letais e subletais se forem expostos de forma prolongada a concentraes
relativamente baixas e ecologicamente relevantes de nitrognio inorgnico.
Demonstrei tambm que nitrito mais txico que amnio, que esses dois ons so
consideravelmente mais txicos que nitrato, e que existe grande variao
interespecfica na sensibilidade a essas formas de nitrognio. Alm de avanar o
conhecimento geral dos efeitos do nitrognio inorgnico sobre larvas de anuros, que
apenas muito recentemente incorporaram a comparao entre compostos e a
investigao de efeitos subletais, esta , at onde podemos avaliar (Schiesari et al.
2005, Schiesari et al. 2007, e pesquisas bibliogrficas posteriores por mim
realizadas), a primeira pesquisa ecotoxicolgica no Brasil utilizando espcies
nativas de anfbios em bioensaios padronizados (ASTM, 2004). Portanto, a
relevncia desse trabalho vai alm dos resultados apresentados, e inclui o
estabelecimento das bases de uma metodologia e de um sistema experimental
modelo pioneiro no pas.
Com relao toxicidade relativa das formas de nitrognio, a observao
de que o nitrato pouco txico para as espcies testadas reflete o conhecimento
disponvel para an