EFEITOS DA MIGRAÇÃO NO PATRIMÔNIO … · development and cultural identity in the town of...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA ANÍBAL FÉLIX BARBOSA EFEITOS DA MIGRAÇÃO NO PATRIMÔNIO HISTÓRICO/CULTURAL DO MUNICÍPIO DE SABARÁ/MG. BELO HORIZONTE 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

ANÍBAL FÉLIX BARBOSA

EFEITOS DA MIGRAÇÃO NO PATRIMÔNIO HISTÓRICO/CULTURAL DO MUNICÍPIO DE SABARÁ/MG.

BELO HORIZONTE

2013

ANÍBAL FÉLIX BARBOSA

EFEITOS DA MIGRAÇÃO NO PATRIMÔNIO HISTÓRICO/CULTURAL DO MUNICÍPIO DE SABARÁ/MG.

Trabalho de conclusão de curso apresentado á

Universidade Federal de Minas Gerais – IGC, como

requisito para obtenção de Titulo de Bacharel em

Geografia.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Lobo.

BELO HORIZONTE

2013

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos que por algum motivo se enquadram no contexto

desta pesquisa; bem como aqueles que contribuíram de maneira significativa para a

realização do mesmo.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que colaboraram para a realização desse trabalho,

principalmente minha esposa e meus filhos pelo apoio e incentivo que foram de

fundamental importância neste momento de enriquecimento de meus conhecimentos

acadêmicos.

BARBOSA, Aníbal F. Efeitos da Migração no Patrimônio Histórico/ Cultural do Município de Sabará/ MG. P. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação –

Geografia) – Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Geociências,

Departamento de Geografia, Belo Horizonte, 2013.

RESUMO

A importância do tema, no aspecto social, consiste em observar e conscientizar a

sociedade acerca da dinâmica migratória, freqüente no município de Sabará-MG,

considerando a conurbação evidenciada frente à metrópole Belo Horizonte, capital

do Estado de minas Gerais. Sob o aspecto profissional e acadêmico, o tema assume

relevância, tendo em vista a deficiência de planejamento para a ocupação do solo e

políticas públicas mais concretas para a preservação das tradições e revitalização

do sítio histórico. O estudo tem por objetivo analisar os efeitos da migração, no que

se refere ao desenvolvimento econômico e social e à identidade cultural no

município de Sabará-MG. A pesquisa será desenvolvida mediante estudos

bibliográficos, análise de acervos fotográficos históricos, cartas cartográficas antigas

e atuais, entrevistas, gráficos e dados censitários.

Palavras chaves: Produção Sócio-espacial, Migração, Patrimônio, Cultura,

Identidade.

ABSTRACT

The importance of the subject, the social aspect is to observe and educate society

about the dynamics of migration, often in the town of Sabara-MG, considering the

conurbation evidenced across the metropolis Belo Horizonte, capital of Minas Gerais

state. Under the professional and academic aspect, the issue assumes significance

in view of the deficiency of planning for land use and public policy more concrete for

the preservation of traditions and revitalization of the historic site.

The study aims to analyze the effects of migration in relation to economic and social

development and cultural identity in the town of Sabara-MG.

The research will be developed by bibliographic studies, analysis of historical

photographic collections, old and current cartographic charts, interviews, graphs and

censusdata.

Keywords: Production Socioespacial, Migration, Patrimony, Culture, Identity.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 1

CAPITULO 1 ............................................................................................................... 6

EFEITOS DA MIGRAÇÃO NO PATRIMÔNIO HISTÓRICO/CULTURAL DO

MUNICÍPIO DE SABARÁ/MG. .................................................................................... 6

1.1 - O SISTEMA MIGRATÓRIO ............................................................................. 8

1.2 – A INDÚSTRIA E NOVOS MIGRANTES .......................................................... 9

1.3 – CARACTERÍSTICAS SOCIAIS E ECONÔMICAS DO MUNICÍPIO .............. 11

CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 21

A PRODUÇÃO DO ESPAÇO .................................................................................... 21

CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 29

O PATRIMÔNIO CULTURAL SABARENSE ............................................................. 29

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 31

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 32

1

INTRODUÇÃO

Ao considerarmos que o espaço urbano é o resultado de uma dinâmica

complexa e ampla do modo de produção, as relações sociais de classes e seus

conflitos são objetos de análise para um melhor entendimento a respeito dos

processos de expansão e desconstrução, observados no município de Sabará/MG.

Como bem sugere Ribeiro da Silva (2006), há a necessidade de se chamar à

reflexão os variados contextos econômicos, sociais e políticos, deflagrados e

resultantes na produção do espaço. Nesse aspecto, a situação atual do município de

Sabará não difere da maioria dos municípios das periferias metropolitanas

brasileiras marcadas pelo forte crescimento populacional nas últimas décadas do

século passado, bem como pelas implementações de novas dinâmicas e

características espaciais construídas nas relações indissociáveis com o

desenvolvimento do modo capitalista de produção, (SILVA, 2006).

Nessa configuração, é possível observar e analisar as diversas

transformações pelas quais passaram e ainda continuam se processando, como no

caso do município de Sabará, que podem ser evidenciadas por sinais de perdas de

valores tradicionais culturais, sociais e econômicos.

A posição geográfica do município, limítrofe com a metrópole Belo Horizonte,

ao mesmo tempo benéfica, em termos de acessibilidade a bens e serviços, também

atrai para seu território as problemáticas complexas da metropolização, tais como

transportes, segurança publica, moradia, periferização etc.

Estes problemas são identificáveis nos aglomerados periféricos ao sítio

histórico, que abrigam migrantes oriundos das mais diversas regiões e cidades do

país, que se fixam no município. Em geral, esses migrantes possuem vínculos

culturais menos intensos que aqueles naturais do município, ou com mais tempo de

residência, tendo em vista que, em sua maioria, desenvolvem suas atividades na

capital e, portanto, suprem suas necessidades naquela metrópole.

A cidade que atualmente possui apenas uma empresa de extração mineral e

algumas pequenas agregadas à Anglo Gold, multinacional africana, não é capaz de

2

absorver o contingente de mão de obra excedente em sua mina e nas de seus

agregados.

Aliado a esse problema, ao final da década de 90, a desconstrução da Mina

Córrego do Meio, localizada no bairro Pompéu/Sabará/MG, pertencente à Cia. Vale

do Rio Doce, que extraía minério de ferro, devolveu à sociedade os mineradores que

ali trabalhavam, aumentando a massa de pessoas que procuraram a reinserção no

mercado de trabalho na capital e em outras cidades.

As mudanças sociais provocadas pelo adensamento urbano culminaram em

perdas significativas, do pondo de vista cultural, refletindo no sentimento de

pertencimento e nos valores tradicionais e suas alterações, numa queda constante

desses conceitos.

Seus monumentos históricos e símbolos da materialidade constituída e que

expressam a opressão de uma sociedade anterior, como mostra Ribeiro da Silva

(2006), se perdem em meio ao abandono e avanço da urbanização, bem como das

modificações da paisagem natural, ofuscada pela ocupação desordenada de suas

encostas.

O desenvolvimento do turismo na cidade, em que pese os esforços da

iniciativa privada e de gestores públicos, é precário face às descaracterizações de

seu casario histórico e poucos projetos capazes de materializar ações de

revitalização do sítio histórico e fomento às iniciativas hoteleiras e do “algo

diferente”, que atraiam visitantes e que ensejam a permanência destes na cidade

por mais tempo, e não de um dia, sem muitos atrativos.

A proximidade à capital e os fluxos migratórios, bem como a própria

conurbação urbana verificada no município, fazem com que os indicadores da

violência, saúde, transportes, educação, mobilidade apontem para índices

preocupantes.

Da pacata cidade, berço da historicidade mineira e brasileira, de tempos em

que a extração aurífera e do minério de ferro, prenunciavam o desenvolvimento

econômico e social, capaz de promover a sociedade, através da geração de

emprego e renda, além da manutenção de seus valores arraigados a terra, ao

3

sentimento de pertencimento, à religiosidade, à comunhão entre seus cidadãos, se

perdem em lembranças na história.

Atualmente, a miscigenação de culturas variáveis, provenientes das

migrações, acaba por fragmentar e dissolver os elementos culturais capazes de dar

a coesão necessária às tradições de Sabará.

Assim, este trabalho tem como objetivo avaliar os impactos no patrimônio

histórico/cultural do espaço urbano de Sabará/MG decorrentes da migração, com

ênfase no que ocorreu no arraial de Tapanhuacanga, atual Vila Nossa Senhora do

Ó.

Considerando que o arraial supra citado acolheu habitantes que exploraram

seu território, alterando a economia, a cultura e a história de Sabará, durante os três

momentos históricos que marcaram este município.

Necessário se faz ponderar alguns pesquisadores que culminaram seus

estudos de forma esclarecedora sobre o tema abordado.

Segundo Passos (1929, p.23-24), os baianos chegaram aos sertões de

Sabará, em 1555, portanto bem antes dos bandeirantes paulistas. Mas

historicamente Manuel de Borba Gato é considerado o primeiro povoador do

município.

Em referência as teorias propostas por (Stark e Bloom,1985; Taylor,1986,

Stark e Taylor,1989) é bom lembrar que a decisão de migrar não é tomada por

indivíduos isolados, mas por um conjunto maior de pessoas que estão de alguma

forma ligadas.

Singer (1976) salienta que o processo de migração está diretamente

relacionado com o desenvolvimento do capitalismo, principalmente com o processo

de industrialização provocado por este.

Ao se tratar da produção do espaço, a cidade, segundo Corrêa (1989), é

fragmentada, articulada, reflexo e condicionante social, onde as diferentes classes

sociais vivem e se reproduzem.

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Moraes (2000) afirma que a produção do espaço é um processo que resulta

do trabalho humano, sendo um ato de incorporação e criação de valor.

Para Santos (1986, p.05), a economia está no espaço, assim como o espaço

está na economia. O mesmo ocorre com o político-institucional e com o cultural -

ideológico.

Segundo Passos (1929 p.24) a Belgo Mineira promoveu transformações no

ambiente do antigo arraial de Tapanhuacanga.

Neste sentido Moraes e Costa (1996, p.121), reconhecem o território como

processo histórico e social, isto é, dotado de sentido pela ação dos homens, o que

não pode ser confundido com a concepção de espaço natural e definem o valor no

espaço como aquele criado pelo trabalho, onde o espaço torna-se o receptáculo da

produção material, de forma que a diferenciação do trabalho acumulado sobre áreas

distintas define o valor real.

Em uma abordagem sobre patrimônio histórico é conveniente citar a definição

de tradição, que segundo Leonardo Castriota (2009, p.21) refere-se aos aspectos da

vida cotidiana que são herdados de gerações passadas, como ritos, técnicas, arte,

costumes, linguagem, ou seja, no sentido mais imediato e abrangente da palavra, a

cultura, transmitida através das gerações ao longo do tempo. ”...Logo, a tradição

teria então, uma dimensão necessariamente conservadora: o presente repetiria o

passado através daquilo que ele herdou...” (CASTRIOTA 2009, p.21).

Ortiz (1985) defende a tese de que cultura e identidade são construídas e

legitimadas por um viés essencialista que muitas vezes destaca seu caráter estático,

original e pouco inovador.

Adicionalmente, de acordo com Sahlins, (1997); Kuper, (2002), os sistemas

culturais por mais tradicionais que pareçam, também são caracterizados por

processos de incessantes transformações, ou seja, nenhuma cultura é estática,

imóvel ou essencialmente tradicional.

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Choay (2006) trata do conceito de patrimônio, demonstrando como ocorre

gradativamente sua extensão nos seguintes aspectos: tipológico, cronológico e

geográfico.

Ribeiro e Zarinato, (2006p. 254) em uma idéia ampliada de patrimônio,

envolve diversas categorias: a arquitetura, a imaterialidade, os caminhos naturais, o

meio ambiente, o espaço urbano e as expressões artísticas, criativas e culturais.

Para HOBSBAWM (1995, p.13) a destruição do passado, ou dos mecanismos

sociais que vinculam nossa experiência pessoal á das gerações passadas é um

fenômeno mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os

jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação

orgânica com o passado público da época em que vivem.

Segundo os historiadores Bouzas, Pyramo e Magalhães (2013) em entrevista

realizada, como conseqüência a cultura e tradição indígenas, foram mescladas com

as do conquistador europeu, quando do início da exploração do ouro na região;

outra cultura influente foi à africana, representada pelos negros africanos tornados

escravos.

Ao elencar os autores acima, a proposta foi utilizar os referenciais teóricos

para o desenvolvimento deste trabalho pela importância de suas contribuições sobre

o tema apresentado.

Portanto a utilização ou não de um dos autores listados não nega o rigor

metodológico delineado para este trabalho.

6

CAPITULO 1

EFEITOS DA MIGRAÇÃO NA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO/CULTURAL NO MUNICÍPIO DE SABARÁ/MG.

A abordagem desse capítulo se norteia no contexto Migratório e as influências

na cultura e identidade dos habitantes do município de Sabará. Pesquisas foram

realizadas no sentido de investigar e encontrar subsídios para se tecer

considerações sobre o tema.

Localizado na região metropolitana de Belo Horizonte, e tendo grande parte

do seu território integrando o complexo do Quadrilátero Ferrífero, Sabará faz limite

com municípios de Nova Lima, Raposos, Caeté, Taquaraçú de Minas, Santa Luzia e

Belo Horizonte.

Em uma breve trajetória pela história dos povos que viveram em Sabará antes

da chegada dos colonizadores, até o surgimento do Arraial de Tapanhuacanga, é

conveniente ressaltar que, em Minas Gerais, foram realizadas pesquisas

arqueológicas, constatando que no séc. XVII toda a vasta região apresentaram

registros de ocupação humana, sendo mais pesquisados os municípios de Lagoa

Santa, Confins, Sete Lagoas, Matozinhos, Prudente de Moraes, Funilandia,

Vespasiano e Pedro Leopoldo. Em todos esses casos há indícios datados de até 12

mil anos demonstrando a subordinação á comarca de Sabará.

Além de uma exclusiva população denominada “Homens de Lagoa Santa”

que há 8/12 mil anos ocupou esta região, foram descobertas evidências de

ocupação contínua de diferentes povos, até a chegada dos bandeirantes.

Segundo Passos (1929, p.23-24), os baianos chegaram aos sertões de

Sabará, em 1555, portanto bem antes dos bandeirantes paulistas.

Com a chegada dos colonizadores, os indígenas que habitavam uma das

primeiras e mais rica área da Minas colonial foram eliminados ou obrigados a

migrarem para outras localidades, abrindo espaço para novo povoamento de

colonizadores paulistas, integrantes das bandeiras que vinham em busca de

riquezas minerais.

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No entanto há registros do período de 1707/1709 que citam indígenas

incorporados à vida social de Sabará relacionado à Guerra dos Emboabas em que

índios combateram ao lado dos “brancos”.

Historicamente Manuel de Borba Gato é considerado o primeiro povoador de

Sabará. Chefiado por Fernão Dias Pais, Borba Gato que era seu genro e integrante

da principal bandeira, seria o responsável por cultivar um roçado na região de roça

grande e pela descoberta das minas do rio das velhas, em Sabará.

Com a grande quantidade de migrantes, atraídos pelo rico mineral,

numerosos arraiais surgiram nos locais onde havia atividades de mineração. Às

margens do rio Sabará e seus córregos. Dentre muitos surgiu o Arraial de

Tapanhuacanga.

Em 1700 desencadeou todo tipo de crise, principalmente o abastecimento de

gêneros alimentícios e material de trabalho. Passou a acontecer a pratica do jogo de

azar; crimes de roubo e morte se tornaram freqüentes.

Os povoados eram itinerantes conforme a variação da produção do ouro de

lavagem nos ribeiros. Os povos não fixavam definitivamente, continuavam a viver em

acampamentos.

Toda a mão de obra disponível estava direcionada para a exploração

gananciosa do ouro. Por esse motivo descuidaram do abastecimento de alimentos, a

conseqüência dessa imprevidência se manifestou com a grande fome de 1700/1701.

Em 1702 quando intensificou a exploração aurífera, impôs condições de vida

nos arraiais mineiros.

Durante a exploração aurífera em Sabará a região em que situa a capela

Nossa Senhora do Ó, foi a que proporcionou maior rendimento, devido o deposito de

lama ferrifera. O arraial de Tapanhuacanga retinha o ouro em grânulos e pepitas.

Outros arraiais se formaram na direção do ribeirão do Gaia. Dali prosseguia a

estrada proibida da Bahia por onde era contrabandeado o ouro, fugindo da

fiscalização do Caminho Novo.

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Com a redução do ouro nas lavagens, deu se inicio a exploração das cristas

dos morros, ou seja, as grupiaras. Era um trabalho volumoso, por esse motivo fez se

necessário à fixação do homem á terra, construindo suas moradias juntas ás catas

(escavações para mineração). Desta forma surgiram os primeiros povoados e estes,

agrupados, foram constituindo os arraiais.

Os senhores de lavras, passaram a organizar-se socialmente, tendo suas

moradias fixas, junto às minerações, deixam a vida desregrada dos concubinatos

com escravas, índias e mulatas, para constituírem as primeiras famílias regulares. A

concepção quanto às mulheres nesta época era: brancas para casar, negra para

trabalhar e mulata para copular.

1.1 - O SISTEMA MIGRATÓRIO

Em reverência as teorias propostas por (Stark e Bloom,1985; Stark e

Taylor,1989; Stark e Taylor, 1991; Taylor,1986) é bom lembrar, de que a decisão de

migrar não é tomada por indivíduos isolados, mas por um conjunto maior de pessoas

que estão de alguma forma ligadas. Muda-se o foco da análise, centrada não mais

no indivíduo, mas no domicílio ou outra unidade de produção e consumo,

culturalmente definida. Stark e Bloom (1985) apontam que a decisão de migrar

freqüentemente é tomada conjuntamente com um grupo de não migrantes, sendo os

custos e os retornos divididos de uma forma prevista em um arranjo contratual que

refletirá no poder de barganha das partes envolvidas. Vale considerar que os

indivíduos agiriam coletivamente visando não apenas maximizar os ganhos, mas

também minimizar os riscos. (TAYLOR, 1986).

Stark e Taylor (1989) pontuam que os domicílios tenderão a enviar seus

membros para locais onde o retorno do movimento migratório seja grande o

suficiente para que possa alterar a posição relativa do domicílio na escala de

distribuição de renda e onde o risco de substituição do grupo de referência seja o

menor possível.

Segundo Singer (1976) as migrações são sempre historicamente

condicionadas, sendo resultado de um processo global de mudanças, no qual elas

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não devem ser separadas. O processo de migração está diretamente relacionado

com o desenvolvimento do capitalismo, principalmente com o processo de

industrialização provocado por este.

Consequentemente o surgimento de uma cultura migratória, resultante do

contato com a estrutura social e econômica das regiões escolhidas como destino,

que levaria os migrantes a mudarem seus hábitos de consumo e a adquirir estilos de

vida não encontrados nos locais de origem. E com o tempo a cultura migratória

passaria a fazer parte dos valores da comunidade.

1.2 – A INDÚSTRIA E NOVOS MIGRANTES

Em 1920, Minas recebeu a visita de reis belgas, e, em 11 de dezembro de

1921 acontecia a implantação da Companhia Siderúrgica Belgo Mineira que deu

novos rumos a região do arraial de Tapanhuacanga, e conseqüentemente a

formação do município de Sabará. Surgiram novas oportunidades de trabalho e

sustento, desta vez com o minério de ferro, atraindo assim novos migrantes.

A Companhia Siderúrgica Belgo Mineira construiu casas para alojar seus

funcionários colocando-os mais próximos de parque industrial. As habitações eram

destinadas as diferentes categorias profissionais, como engenheiros, técnicos e

operários menos qualificados. Com o passar do tempo muitos conseguiram refazer

suas casas trocando a madeira por alvenaria. A Companhia siderúrgica vendia

material mais barato e assim contribuía para cada um melhorar sua moradia. Na

época existia carência de rede de esgoto e falta de privacidade, pois as casas

davam fundos umas com as outras. Em 1932 foi inaugurado o primeiro conjunto

habitacional, constituído num total de 500 casas residenciais. Nas décadas de 1970

e 1980 foram criados novos bairros dotados de infra-estrutura, neste período a

participação da empresa foi bem menor, em alguns casos ela apenas concedia os

terrenos.

Para suprir a demanda por educação foi construída em 1929 o Grupo Escolar

Christiano Guimarães. Porém na década de 1980 o mesmo foi demolido, para

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possibilitar a expansão da usina. A escola foi transferida para o bairro Esplanada

onde possibilitou sua ampliação.

Para atender as necessidades de subsistência dos funcionários, na década

de 1950 foi criado pela companhia, o serviço de subsistência com vendas de

gêneros alimentícios a baixo custo e oferta de pequenos empréstimos.

A necessidade de lazer dos funcionários foi contemplada pela construção em

frente à Usina, em área própria, do Sport Clube Siderúrgica, proporcionando a

prática de diversas modalidades esportivas.

A companhia siderúrgica participou também na criação do clube Cravo

Vermelho, inclusive economicamente, o mesmo era o suporte da elite, ficaram

famosos pelos desfiles de seus blocos carnavalescos em Belo Horizonte.

Outra opção de lazer também com influência da Companhia Siderúrgica

Belgo Mineira foi o clube Caça e Pesca.

Sendo a área da saúde um fator de suma importância, a companhia equipou

a Santa Casa com aparelhos, laboratórios, salas de cirurgias e ampliou o número de

leitos. Na década de 1940, construiu e inaugurou a Maternidade e Puericultura no

centro de Sabará.

Ainda como influência das atividades da Companhia Siderúrgica na região, foi

criada uma unidade de Serviço Nacional da Aprendizagem Industrial, em 1945,

proporcionando ensino profissionalizante para a população.

Esse serviço capacitava os jovens para ingressarem na indústria como

operários.

A participação da Companhia Siderúrgica Belgo Mineira na vida social e

cultural da população tornou-se expressa também nos eventos cívicos e religiosos.

O transporte que outrora era realizado através de navegações no Rio das

Velhas, também sofreu mudanças, passou a ser feito através da ferrovia.

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Com ela, o arraial integrado á Vila Siderúrgica, pode contar com os benefícios

do novo meio de transporte. Uma “parada de trem” foi colocada, bem próximo de

Tapanhuacanga, passando a interagir mais rapidamente com a capital, além das

inúmeras cidades de dentro e fora do Estado servidas pela ferrovia.

Por muito tempo a companhia foi considerada pela a população sabarense

como benfeitora protetora e maior empregadora do município, devido suas

iniciativas.

Segundo (IBGE, 1959:97) em 1955, a Companhia Siderúrgica Belgo Mineira

respondia por 300 milhões de cruzeiros resultantes da produção industrial de

Sabará. Restando as demais indústrias 95 milhões. Sendo as principais indústrias

de Sabará nesta época a CSBM, a S.A. Mineração Trindade (minério de ferro), a

Cia. Fiação de Tecidos Minas Gerais (fabrica de Marzagânia), a Produtos

Alimentícios Sabará Limitada (fabrica de macarrão) e outras que produziam

ferraduras, jóias, vassouras e escovas de piaçava, além da indústria de extração de

mármore bruto e de reparação da E.F. Central do Brasil.

1.3 – CARACTERÍSTICAS SOCIAIS E ECONOMICAS DO MUNICÍPIO

Atualmente as características sociais e econômicas do município de Sabará

se apresentam de formas subdivididas como demografia, saúde, condições de

moradia, educação, renda e emprego.

De acordo com o IBGE, Sabará apresenta um crescimento contínuo da sua

população residente, apresentando uma taxa de crescimento anual total de 2,8% de

1991 a 2000, observando queda na taxa de crescimento médio anual para área rural

e taxa positiva para área urbana, sendo que a mesma apresentou acréscimo de

14,4% em seu grau de urbanização.

Pode-se observar o aumento da população urbana e a queda da população

rural, apesar da área municipal ser caracterizada como maior para uso rural, do que

para urbano.

A contagem da população feita pelo IBGE no ano de 2007, mostra que

Sabará não conservou o ritmo de crescimento populacional dos anos anteriores,

12

permaneceu com pouco mais de 120.000 habitantes. Já no ano de 2009, a

estimativa da população era de 125.000 habitantes.

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TABELA 1

População residente nos municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte –

1950 a 2010

1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010Belo Horizonte 352.724 683.908 1.235.030 1.780.855 2.020.161 2.238.526 2.375.151

Contagem 6.022 27.914 111.235 280.477 449.588 538.017 603.442

Betim 16.376 26.409 37.815 84.183 170.934 306.675 378.089

Ribeirão das Neves 4.267 6.387 9.707 67.257 143.853 246.846 296.317

Santa Luzia 8.437 12.573 25.301 59.892 137.825 184.903 202.942

Ibirité 2.253 3.952 13.946 31.939 78.090 133.044 158.954

Sabará 15.748 23.081 45.149 64.204 89.740 115.352 126.269

Vespasiano 5.610 8.331 12.429 17.924 48.012 76.422 104.527

Nova Lima 21.932 27.825 33.992 41.223 52.400 64.387 80.998

Esmeraldas 14.311 15.117 15.698 16.206 24.298 47.090 60.271

Pedro Leopoldo 11.462 16.020 20.670 29.999 41.594 53.957 58.740

Lagoa Santa 7.738 11.450 12.060 17.163 26.641 37.872 52.520

Caeté 21.911 27.987 25.166 30.634 33.251 36.299 40.750

Igarapé 3.869 2.356 4.330 10.253 15.957 24.838 34.851

Brumadinho 13.018 14.297 17.874 17.964 19.308 26.614 33.973

Matozinhos 6.890 9.109 8.674 16.198 23.606 30.164 33.955

Mateus Leme 11.676 13.185 9.169 13.334 17.597 24.144 27.856

Sarzedo 2.627 3.765 5.562 8.031 9.504 17.274 25.814São Joaquim de Bicas - 2.225 3.345 6.310 11.443 18.152 25.537

Juatuba 1.781 1.946 2.760 5.323 9.436 16.389 22.202

São José da Lapa - - - 7.125 6.856 15.000 19.799

Jaboticatubas 16.357 16.522 8.479 11.570 12.716 13.530 17.134

Raposos 6.411 8.356 10.133 11.810 14.242 14.289 15.342

Mário Campos - - - - 5.081 10.535 13.192

Itaguara 7.107 8.325 9.030 9.765 10.671 11.302 12.372

Itatiaiuçu 4.653 4.544 5.330 5.426 7.366 8.517 9.928

Rio Acima 5.276 5.040 5.118 5.069 7.066 7.658 9.090

Capim Branco 2.878 3.119 4.147 4.930 6.344 7.900 8.881

Baldim 9.819 10.210 5.313 7.570 8.393 8.155 7.913

Florestal 4.065 3.764 4.431 4.796 5.053 5.647 6.600

Confins - 1.783 1.993 2.345 3.183 4.880 5.936

Nova União 3.551 3.588 3.958 4.074 4.865 5.427 5.555

Rio Manso 5.289 5.060 5.214 4.448 4.461 4.646 5.276

Taquaraçu de Minas 5.680 4.816 4.158 3.457 - 3.491 3.794

Total 599.738 1.012.964 1.717.216 2.681.754 3.519.535 4.357.942 4.883.970

Municípios População Residente

Fonte: IBGE, Censos Demográficos.

Estes resultados revelam que de 1950 a 2010 Sabará apresentou um

crescimento populacional gradual, de 15.748 habitantes na década de1950 até

atingir 126.269 habitantes no ultimo censo de 2010/IBGE ficando em sétimo lugar

entre os municípios da região metropolitana de Belo Horizonte mais populosos.

14

FIGURA 1

Participação relativa de Belo Horizonte e Sabará na população total da Região

Metropolitana de Belo Horizonte – 1950 a 2010

0

10

20

30

40

50

60

70

80

1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010

%

Belo Horizonte Sabará

Fonte: IBGE, Censos Demográficos.

A figura 1 demonstra que a participação do município de Sabará/MG na

população total da RMBH ficou estabilizada na ordem de 1 a 3 % desde a década de

1950 até o último censo/IBGE de 2010. Ao contrário de Belo Horizonte, cuja

contribuição oscilou de 60% com picos de até 70%, verificado na década de 1970,

permanecendo atualmente, segundo dados deste mesmo Instituto, nos 50%.

15

FIGURA 2

Taxa Geométrica Média de Crescimento Anual da população de Belo Horizonte,

Sabará e da Região Metropolitana de Belo Horizonte – 1950 a 2010.

0

1

2

3

4

5

6

7

8

1950/1960 1960/1970 1970/1980 1980/1991 1991/2000 2000/2010

%

Belo Horizonte Sabará RMBH

Fonte: IBGE, Censos Demográficos.

É possível observar através dos dados apresentados, na tabela 2 acima, que

nas décadas de 1960/1970 houve elevação na taxa média de crescimento do

município comparado a Belo Horizonte e Região Metropolitana e que a partir da

década de 1980 passou a declinar, de 7% a cerca de 1% em 2000/2010.

16

FIGURA 3

Setores censitários urbanos do município de Sabará/MG

Censo Demográfico de 2010

Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2010.

Conforme indicador da figura 3 acima, observa-se que a população do

município de Sabará-MG encontra-se aglomerada em pequenos setores urbanos,

demonstrando que grande parte de seu território predomina extensas áreas rurais.

17

TABELA 2

Naturalidade e Migração na década da população residente em Sabará/MG

2010

Naturalidade Nº %Naturais do Município 67.533 53,48Naturais dos demais municípios de Minas Gerais (exceto Sabará) 53.178 42,11População total 126.269 xxx

Migração da década Nº %Imigrantes procedente de Belo Horizonte 11.815 51,96Imigrantes procedentes da RMBH (exceto BH) 2.877 12,65Imigrantes procedente de Minas Gerais (exceto RMBH) 4.717 20,74

Total de imigrantes da década 22.740 xxx Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010 (dados da amostra).

A tabela 2 demonstra que na década quase metade da população é

constituída por migrantes e que tal contingente em sua maioria é procedente da

capital, ou seja, 51.96% e 12,65% procedentes de outras cidades da Região

Metropolitana de Belo Horizonte. Salientando ainda que 20,74%são de origem de

outras cidades não pertencentes à RMBH. Os naturais de cidade representam

53.48% e os não naturais 42,11% demonstrando que quase metade da população

são migrantes.

A tabela 3 evidencia que a maior parte dos residentes no município é oriunda

de Belo Horizonte, Contagem, Santa Luzia, Betim, Ribeirão das Neves, sendo que

os demais municípios contribuem em menor numero.

Considerando o numero total de 14.692 migrantes residentes e o total de

habitantes 126.269, segundo o ultimo censo 2010 IBGE, a representatividade de

residentes no ano de 2010 é da ordem de 11%.

18

TABELA 3

Total de imigrantes residentes em Sabará, procedente dos municípios da Região

Metropolitana de Belo Horizonte - 2010.

Município Nº %Belo Horizonte 11.815 80,42Santa Luzia 494 3,36Contagem 487 3,32Betim 273 1,85Ribeirão das Neves 234 1,60Caeté 178 1,21Vespasiano 156 1,06Nova Lima 141 0,96Sete Lagoas 96 0,66Pedro Leopoldo 93 0,63Esmeraldas 70 0,47Raposos 69 0,47Ibirité 67 0,46Barão de Cocais 56 0,38Igarapé 53 0,36Demais municípios da RMBH 411 2,80Total 14.692 100,00

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010 (dados da amostra).

Denotam-se nesses dados as interações dos agentes produtores do espaço

urbano em suas ações e dinâmicas, alternando entre si o domínio de interesses,

mas sempre tendo o Estado, em especial o municipal, norteando as ações e

garantindo sua função de regulador dessas ações.

Segundo dados do IBGE a saúde está muito debilitada em Sabará,

necessitando de maiores investimentos, para auxiliar no desenvolvimento com

qualidade de vida, do município. O número de enfermeiros residentes com curso

superior por mil habitantes, que em 1991 era de 0 (zero) e em 2000 passou para

5,59, mesmo com esse aumento, os números ainda são muito baixos para atender

as necessidades.

19

Torna-se ainda mais crítica a situação dos médicos, que além de serem

poucos, ainda apresentou queda no percentual de médicos residentes por mil

habitantes, que caiu de 0,19% em 1991 para 0,15% em 2000.

Nos aspectos referentes às condições de moradia no município, está à coleta

de lixo, abastecimento de água e instalações sanitárias.

Quanto ao saneamento básico, o IBGE indica que cerca de 77,41% dos

moradores tem acesso a coleta de lixo, 90,01% ao abastecimento de água e 77,12%

a instalações sanitárias.

Quanto à educação, cerca de 80,20% da população, segundo o IBGE, são

considerados alfabetizados.

Considerando a população analfabeta total cerca de 61% tem mais de 25

anos. Outra faixa de maior destaque refere-se a faixa etária de 10 a 14 anos, com

15% de analfabetos. Dentro da população jovem (07 a 24 anos) a maioria dos

analfabetos encontra-se na faixa etária de 7 a 14 anos, em seguida pelos de 15 a 17

anos.

Devido à elevada taxa de freqüência escolar, o IDH na educação em Sabará

é alto.

O Índice de desenvolvimento humano é obtido a partir dos seguintes

parâmetros: educação (anos médios de estudos), longevidade (expectativa de vida

da população) e Produto Interno Bruto per capita.

Em se tratando de renda e emprego, a população economicamente ativa do

município, 66% trabalha com carteira assinada, 34% possui ocupação informal.

Dentre os trabalhadores formais, cerca de 57% está empregado na indústria e 43%

no terceiro setor ou de serviços.

Vale ressaltar que não há oferta de emprego para todos com idade ativa, por

esse motivo a taxa de desemprego em Sabará, segundo pesquisas, realizadas pelo

IBGE, é de 76,38%.

20

Ao avaliarmos o índice Gini, que mede o grau de desigualdade existente na

distribuição de indivíduos, segundo a renda domiciliar per capita, este apresentou

uma melhora, mas foi devido ao aumento de R$178,10 para R$214,30 da renda

média per capita, o que não significa melhora na condição de vida, já que o índice

de indigência e o de pobreza aumentou, o que demonstra que houve piora

significativa na condição de vida da população como um todo, evidenciando as

diferenças entre as classes no município.

O município de Sabará/MG vem apresentando nas últimas décadas um

declínio na produção industrial, deixando o status de fornecedor de matéria prima

mineral (principalmente a extração de minério de ferro), e originando um novo vetor

sócio-econômico, com base no turismo.

Nesse novo vetor econômico é possível perceber a ação direta do Estado,

principalmente pelo governo municipal, se sobrepor aos demais agentes produtores

do espaço urbano. Porém, essa ação não tem sido capaz de absorver a mão de

obra ociosa advinda da desconstrução das minas de extração mineral e da redução

da mão de obra operária observada na Companhia Siderúrgica Belgo Mineira,

motivada pela desativação do setor de mecânica e desligamento dos altos fornos

que causaram grande impacto econômico social. Em geral, esta mão de obra busca

na capital, Belo Horizonte e em outras regiões do Estado e do País, novas formas de

inserção no mercado de trabalho.

21

CAPÍTULO 2

A PRODUÇÃO DO ESPAÇO

A cidade, segundo Corrêa (1989), é fragmentada, articulada, reflexo e

condicionante social, onde as diferentes classes sociais vivem e se reproduzem.

Assim, a produção do espaço urbano pode ser entendida a partir do uso da

terra e suas diversas formas de ocupação espacial.

Considerando a geografia humana como uma ciência social comprometida

com a análise de apropriação produção do espaço pelo homem, foi possível

observar as transformações do espaço urbano do arraial de Tapanhuacanga, que

durante o ciclo do ouro fixou-se como um dos mais importantes centros de

mineração da região.

Quando veio a escassez do ouro, o arraial sofreu o impacto de seu principal

meio de sustentação. Embora o intercâmbio comercial tenha se mantido em certo

nível, alguns saíram em busca de outro meio de subsistência.

No século XX, a implantação da siderurgia provocou novos rumos a toda

região. Surgiram novas oportunidades de trabalho e sustento, desta vez com a

exploração do minério de ferro. E no ápice da siderurgia local, integrou-se ás novas

vilas siderúrgicas, mantendo-se de forma sustentável ás modificações e inovações.

Segundo Passos (1929 p.24) a Belgo Mineira promoveu transformações no

ambiente do antigo arraial de Tapanhuacanga, que ia morrendo, dia a dia, de um

mal reputado incurável, se povoa de novo! De novo a ele volve o febril a vida de

1717! E que vê a noite, demandar o céu das altas chaminés, com o fumo da nova

indústria, fagulhas que incendeiam o espaço [...] (Passos, 1929:24).

Vale lembrar que segundo Moraes (2000) a produção do espaço é um

processo que resulta do trabalho humano, que é um ato de incorporação e criação

de valor.

Para Santos (1986, p.05), a economia está no espaço, assim como o espaço

está na economia. O mesmo ocorre com o político-institucional e com o cultural -

22

ideológico. Isso quer dizer que a essência do espaço é social. Nesse caso o espaço

não pode ser formado unicamente pelas coisas, os objetos geográficos, naturais ou

artificiais, cujo conjunto nos oferece a natureza. O espaço é tudo isso mais a

sociedade: cada fração da natureza abriga uma fração da sociedade atual.

Com a operação da usina siderúrgica, os resíduos industriais lançados sem

tratamento no rio deram-lhe uma coloração negra que se manteve por todo o século.

Ao longo de décadas fuligem desprendida da usina, provocou sérios

problemas de saúde nas pessoas que residiam em seu entorno.

Com o pioneirismo na siderurgia á base de carvão vegetal, iniciava na

transição dos séculos XVII e XVIII, a devastação de grandes áreas.

A usina siderúrgica prosperou e trouxe á região uma grande expansão, em

vários aspectos. O arraial, situado em meio ás vilas operárias construídas, integrou-

se a vida da siderurgia ao elemento local, proporcionando uma diversidade de

trabalhadores, técnicos e engenheiros estrangeiros. Praticamente, o antigo arraial

compunha agora a Vila Siderúrgica, um conglomerado que, aos poucos, alcançou

sua própria identidade, porém entremeada dos vestígios do passado histórico da

região. Desta forma, a partir da década de 1970, Sabará evidenciava mudanças,

que o tornava crescentemente povoado, urbanizado, a caminho da consolidação da

globalização.

Moraes e Costa (1996, p.121), reconhecem o território como processo

histórico e social, isto é, dotado de sentido pela ação dos homens, o que não pode

ser confundido com a concepção de espaço natural e definem o valor no espaço

como aquele criado pelo trabalho, onde o espaço torna-se o receptáculo da

produção material, de forma que a diferenciação do trabalho acumulado sobre áreas

distintas define o valor real.

Desta forma, quando um sistema de produção instala-se no espaço, dentre

outros aspectos, há a valorização do imóvel. Ainda de acordo com a definição dos

autores o valor do espaço é transferido aos objetos durante sua criação ou enquanto

um valor que é atribuído a objetos pré-existentes; o valor do espaço é transferido no

processo de trabalho para o produto através das características próprias de cada

23

lugar. Moraes e Costa (1996, p.122). Em suma, trata-se de um processo que

ocasiona uma heterogeneidade na produção e apropriação dos lugares, onde

singularidades são estabelecidas através do trabalho humano; o que identifica é a

atribuição de valores distintos a estruturas socioespaciais distintas, em nome do

desenvolvimento.

Entretanto, para que se produza o espaço urbano é necessária à ação dos

agentes sociais interagindo entre si e capazes de levar, segundo Corrêa (1989), a

constantes processos de reorganização espacial do conteúdo social e econômico da

cidade.

Esses agentes são de acordo com Corrêa (1989) os proprietários dos meios

de produção, em especial os industriais; os proprietários fundiários; os promotores

imobiliários; o estado e os grupos sociais excluídos.

A atuação desses agentes é regulada por um marco jurídico intrínseco às

suas ações, ainda segundo Corrêa (1989), esse marco não é neutro, reflete o

interesse dominante de um dos agentes e constitui-se, em muitos casos, em

retórica, permitindo que aconteçam transgressões conforme os interesses desse

agente dominante.

Sendo assim, os proprietários dos meios de produção necessitam de maiores

espaços a custos reduzidos e próximos a equipamentos e infra-estruturas que

atendam às suas demandas, nesses casos o espaço urbano, segundo o autor, tem

duplo papel: o suporte físico e a expressão diferencial da especificidade locacional

de suas atividades.

Os proprietários fundiários visam a maior renda de suas propriedades,

preferindo o uso comercial ou residencial, que lhes rendem maior remuneração.

A estes convém à transformação do espaço rural em espaço urbano, para

isso pressionam o Estado, em especial o municipal, nos processos de definição das

Leis de uso e ocupação do solo e de zoneamento urbano.

Corrêa (1989) define os promotores imobiliários como um conjunto de

agentes que realizam, parcial ou totalmente, as operações de incorporação,

24

financiamento, estudo técnico, construção ou produção física do imóvel e a

comercialização, originando diferentes tipos de agentes concretos.

Em relação aos proprietários de grandes extensões de terra e aos promotores

imobiliários, cabe expor alguns dados, através das tabelas 4, 5 e 6 que evidenciam

as disparidades na distribuição da terra neste município.

TABELA 4

ESTRUTURA RURAL DO MUNICÍPIO DE SABARÁ-MG – 1995-1996

Classe de área

(Hectares)

Números de

estabelecimentos

(Rurais)

%

Área (há)

%

Menos 1 6 7,22 2 0,05

1 a menos 2 4 4,81 5 0,14

2 a menos 5 12 14,45 33 0,95

5 a menos 10 17 20,5 113 3,21

10 a menos 20 17 20,5 214 6,09

20 a menos 50 12 14,45 238 6,77

50 a menos 100 5 6,02 405 11,55

100 a menos

200

8 9,65 1263 35,98

200 a menos

500

- - - -

500 a menos

1000

2 2,40 1238 35,26

1000 a menos

2000

- - - -

2000 a menos

5000

- - - -

5000 a menos

10000

- - - -

10000 a menos

100000

- - - -

100000 e mais - - - -

TOTAL 83 100,0 3511 100,0

Fonte: IBGE, 2006

25

TABELA 5

CÁLCULO DA PERCENTAGEM ACUMULADA DO MUNICÍPIO DE SABARÁ-MG –

1995-1996

Classes de

área (ha)

Estabelecimentos

Área (há)

Classe de área

(há)

Total

%

% acumulada

total

%

% acumulada

Menos 1 6 7,22 7,22 2 0,05 0,05

1 a menos 2 4 4,81 12,03 5 0,14 0,19

2 a menos 5 12 14,45 26,48 33 0,95 1,14

5 a menos 10 17 20,5 46,98 113 3,21 4,35

10 a menos 20 17 20,5 67,48 241 6,09 10,44

20 a menos 50 12 14,45 81,93 238 6,77 17,21

50 a menos

100

5 6,02 87,95 405 11,55 28,76

100 a menos

200

8 9,65 97,6 1263 35,98 64,74

200 a menos

500

- - - - - -

500 a menos

1000

2 2,4 100,0 1238 35,26 100,0

1000 a menos

2000

- - - - - -

2000 a menos

5000

- - - - - -

5000 a menos

10000

- - - - - -

10000 a

menos 100000

- - - - - -

100000 e mais - - - - - -

Fonte: IBGE, 2006

26

TABELA 6

CÁLCULO DO COEFICIENTE DE GINI PARA A DISTRIBUIÇÃO DA TERRA NO

MUNICÍPIO DE SABARÁ-MG 1995-1995

1 2 3 4 5 6

7,22 0,05 100,0 722 0,05 0,36

4,81 0,14 99,95 480759 0,19 0,91

14,45 0,95 99,81 1442254 1,14 16,47

20,5 3,21 98,86 2026,63 4,35 89,17

20,5 6,09 95,65 1960825 10,44 214,02

14,45 6,77 89,56 1294142 17,21 243,52

6,02 11,55 82,79 498395 28,76 173,13

9,65 35,98 71,24 687466 64,74 624,74

2,4 35,26 35,26 84624 100,0 240

9197095 1602,32

Índice de GINI

1602,32 – 9197095 = 7594,77 / 100 = 75,94 / 100 = 0,76

Ao se aplicar esses cálculos ficou constatado o índice de 0,76 para a

distribuição da terra, segundo o índice de GINI, para o município de Sabará-MG,

significando uma elevada concentração da terra, ou seja, neste município temos

uma estrutura fundiária altamente concentrada.

Em Sabará, as classes de até dois hectares apresentam significativo número

de estabelecimentos ocupando áreas menores. Nas classes até 50 há percebe-se

uma homogeneidade em números de estabelecimentos e áreas.

27

Porém, nas classes de 50 até 1000 há temos um número pouco significativo

de estabelecimentos ocupando áreas imensas, atingindo maior percentual de área

abrangida.

A predominância de vastas extensões de terras, em detrimento dos poucos

estabelecimentos, são os maiores responsáveis pela elevada concentração da terra

em grandes propriedades no município de Sabará.

Conclui-se que o município de Sabará-MG, com o índice de GINI alcançando

os 0,76 evidencia o latifúndio com 71,24% das terras ocupadas e minifúndios na

ordem de 28,76% das terras restantes.

Portanto, a distribuição da terra no município de Sabará está muito distante

de ser eqüitativa, privilegiando o Estado, os proprietários fundiários e os promotores

imobiliários e suas ações.

O Estado atua de maneira complexa na organização espacial, ainda segundo

Corrêa, tanto no tempo quanto no espaço, e reflete a dinâmica da sociedade da qual

faz parte.

O Estado prossegue Corrêa (1989) possui um conjunto de instrumentos

capazes de garantir sua ação, com agente regulador, em relação ao espaço urbano,

sendo eles: regulamentação do uso do solo; controle e limitação dos preços da terra;

limitação da superfície da terra em que cada um pode apropriar-se; impostos

fundiários e imobiliários; taxação de terrenos livres; mobilização de reservas

fundiárias públicas, interferindo no preço da terra; investimento público na produção

do espaço urbano; organização de mecanismos de crédito à habitação e pesquisas

sobre materiais e procedimentos de construção e controle de produção e mercado

destes.

Em relação aos grupos sociais excluídos, Corrêa (1989) expõe que na

sociedade de classes, observam-se diferenças sociais referentes ao acesso aos

bens e serviços produzidos socialmente.

Como no capitalismo evidenciam-se grandes diferenças sociais, elevado

contingente da população não tem acesso ou renda para aluguel de moradias

28

dignas, este é segundo Corrêa (1989), o principal sintoma de exclusão não ocorre

isoladamente, a este se vinculam a desnutrição, as doenças, baixos níveis de

escolaridade, desemprego, subemprego ou emprego mal remunerado.

Os grupos sociais excluídos vão se valer, para morar, de cortiços, próximos

ao centro da cidade, densamente povoados, de velhas e degradadas residências

mal divididas, como aponta Corrêa (1989) a casa produzida pelo sistema de auto

construção nos loteamentos periféricos, conjuntos habitacionais produzidos pelo

Estado, distantes do centro e as favelas.

As favelas têm sua produção em terrenos públicos e ou privados invadidos;

assim, os grupos sociais excluídos, tornam-se os agentes modeladores, produzindo

seu próprio espaço, independentes, na maioria das vezes, de outros agentes.

Na contemporaneidade, apesar de grandes transformações o antigo arraial é

considerado o “cartão postal” da cidade, em função de manter bem conservada a

importante capela barroca da Senhora do Ó. O templo atrai o maior número de

visitantes, em comparação a outras atrações turísticas locais.

O sítio histórico do município de Sabará ainda abriga casarões, e

monumentos históricos, porém envoltos pelas conseqüências do “progresso” que

contrastam o seu rico acervo, com o espaço produzido de forma estratégica de

sobrevivência por grupos sociais excluídos e conjuntos habitacionais em áreas

cedidas pela poder público municipal.

29

CAPÍTULO 3

O PATRIMÔNIO CULTURAL SABARENSE

Em Sabará, como nas demais cidades históricas de Minas Gerais, é possível

observar que por seus atrativos culturais, vem transformando seu patrimônio em

atrativos turísticos.

Nesse contexto o patrimônio cultural se transforma em produto econômico.

Nesse sentido vale analisar as dinâmicas que envolvem os núcleos turísticos.

Para tanto é conveniente citar a definição de tradição, segundo Leonardo

Castriota (2009, p.21), que se refere aos aspectos da vida cotidiana que são

herdados de gerações passadas, como ritos, técnicas, arte, costumes, linguagem,

ou seja, no sentido mais imediato e abrangente da palavra, a cultura, transmitida

através das gerações ao longo do tempo. ”Logo, a tradição teria então, uma

dimensão necessariamente conservadora: o presente repetiria o passado através

daquilo que ele herdou.” (CASTRIOTA 2009, p.21).

Ortiz (1985) defende a tese de que cultura e identidade são construídas e

legitimadas por um viés essencialista que muitas vezes destaca seu caráter estático,

original e pouco inovador.

Adicionalmente, de acordo com Sahlins, (1997); Kuper, (2002), os sistemas

culturais por mais tradicionais que pareçam, também são caracterizados por

processos de incessantes transformações, ou seja, nenhuma cultura é estática,

imóvel ou essencialmente tradicional. Por mais lento que possa parecer haverá

sempre um processo de transformação, seja através do desenvolvimento interno da

própria cultura ou através de influências promovidas por contatos interculturais.

Castriota (2009) explica que isso torna mais expressivo devido á expansão

visível do fenômeno da globalização e do sistema capitalista que, segundo o autor,

aceleram a dinâmica de transformação da cultura nas sociedades e modificam os

vínculos existentes entre diferentes gerações levando a um processo cada vez mais

veloz entre as mesmas. Será diante desta suposta “crise das tradições” que surgirá

30

a necessidade de se desenvolver mecanismo de conservação da memória pública,

coletiva, nacional e ética.

As perdas de referenciais históricos estão ativamente associadas ao

capitalismo industrial; a produção de bens de consumo não duráveis; as novas

tecnologias; os ideais de progresso; os estímulos da propaganda, dentre outros

fatores que motivam a perda de referenciais históricos, tornando assim menor o

espaço temporal relacionado entre presente e passado na sociedade.

Choay (2006) trata do conceito de patrimônio, demonstrando como ocorre

gradativamente sua extensão nos seguintes aspectos: tipológico, cronológico e

geográfico.

O conceito de patrimônio passa por uma divisão entre o global e o local.

Considerando o avanço do fenômeno da globalização e do sistema capitalista nas

cidades como uma exposição estritamente ligada à forma em que valores e modos

de vida ameaçaram as culturas e tradições locais.

Ribeiro e Zarinato, (2006p. 254) em uma idéia ampliada de patrimônio,

envolve diversas categorias: a arquitetura, a imaterialidade, os caminhos naturais, o

meio ambiente, o espaço urbano e as expressões artísticas, criativas e culturais.

Deste modo, apropria-se do conceito de patrimônio cultural a partir de sua

concepção ampliada e processual visando à necessidade de pensá-lo através de

uma perspectiva multidisciplinar, considerando sua dinâmica própria de

transformação e de reprodução da vida. O valor cultural, a dimensão simbólica que

envolve a produção e a reprodução das culturas, expressas nos modos de uso dos

bens, foi incorporada á definição de patrimônio.

Neste contexto ressaltaremos a cultura religiosa no arraial de

Tapanhuacanga, que pela grande devoção a Nossa Senhora da Expectação do

Parto as senhoras devotas requerem da câmara 70 braços de terra em quadra no

Arraial de Tapanhuacanga, para incorporarem ao patrimônio da pequena capela que

estavam construindo com doações dos fiéis. Após dois anos, o capitão-mor da Vila

Nossa Senhora da Conceição de Sabará, Lucas Ribeiro de Almeida, por ter

escapado milagrosamente de uma queda de cavalo, resolveu erguer uma nova

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capela com maior extensão, sua arquitetura externa e decoração interna têm

influencia chinesas. E vale lembrar que se trata de uma devoção mariana de origem

espanhola. E no altar mor aparece uma das virgens mais delicadas que Portugal

produziu no séc.XVII. Atualmente é conhecida como Igreja de Nossa Senhora do Ó.

Nome originado dos sete versículos cantados na semana que antecede o natal em

culto a Nossa Senhora da Expectação, as quais se iniciam pela interjeição Ó, é uma

invocação ao cristo, a cada dia, por um título messiânico diferente tirado do antigo

testamento. Em função de manter bem conservada a importante capela barroca da

Senhora do Ó, em 1938 se tornou o primeiro bem tombado como patrimônio

material. O templo atrai o maior número de visitantes, em comparação com outras

atrações turísticas locais.

Segundo Vasconcellos (1974) “...a capela é o próprio ouro das Minas. Por

fora, cascalho rude; por dentro o mais valioso metal. Por fora posta em modéstia;

por dentro esplendendo em belezas...”

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na segunda metade do século XVII, quando as primeiras expedições

desbravadoras do sertão chegaram à região onde situa o arraial de Tapanhuacanga,

o local era habitado por tribos e nações indígenas, em sua maioria antropófaga,

nômades, guerreiras, provenientes de antigas nações que atravessaram o estreito

de Bhering, vindos, principalmente, da Ásia, segundo estudos e publicações feitas

sobre o assunto. Posteriormente, chegaram os portugueses, quando também vieram

aventureiros de todas as partes do Brasil, povoando rapidamente a região.

A tradição e a cultura local sofreram mais uma vez grande influência com a

implantação de uma usina siderúrgica, que deu novo impulso á região e, com isso, a

necessidade de readaptação á realidade. Aos remanescentes costumes coloniais

juntou-se a modernidade trazida pela siderurgia, implantada com primazia do capital

estrangeiro (belgo-luxemburguês). Embora tivesse ocorrido grande impacto,

algumas manifestações culturais se mantiveram vivas.

É valioso ressaltar a herança religiosa cultural, expressa na novena de Nossa

Senhora da Expectação do Parto, por exemplo, levada todo mês de dezembro na

capelinha devocional existente até hoje no local, onde se cantam, em pequenas

estrofes, singelos e graciosos versículos, pedindo graças á Mãe de Jesus, Nossa

Senhora do Ó. Oh! No inicio das frases, dando origem a seu nome popular.

Outra manifestação que acabou permanecendo foi à comemoração de São

João, depositária de algumas tradições, mais para a cultura rural, do que urbana e

mineradora, mas mesmo assim, fixada no local.

Devido à migração diversa, para a região, algumas alterações ocorreram nas

manifestações acima citadas. A novena do Ó, por exemplo, hoje não é mais cantada

(parece que se perdeu a raiz da melodia), e costuma não cumprir o calendário,

ocorrendo ás vezes apenas um tríduo.

A festa junina de São João ainda permanece, apesar de muito modificada,

tanto nas músicas, quanto nas brincadeiras, nas danças, na decoração, nas orações

e nas comidas típicas. Até mesmo no relacionamento e convivência social entre os

freqüentadores e os vizinhos.

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Compreende-se que as referências á identidade do povo do arraial

deTapanhuacanga e em extensão por todo o município de Sabará de maneira geral

contam com elementos determinantes: o ouro que proporcionou característica

especifica á sociedade; a navegação que possibilitou a Sabará contar com três

estaleiros onde foram construídos barcaças e vapores; a ferrovia que possibilitou a

circulação de pessoas e transporte de cargas; e a industria local, capitaneada pela

siderurgia.

Em visita a comunidade local, para adquirir mais informações sobre a

identidade de seus habitantes, foi possível constatar que muitos ainda

remanescentes coadjuvantes do processo do arraial de Tapanhuacanga em bairro

siderúrgico e mais precisamente Nossa Senhora do Ó, através do desenvolvimento

advindo da indústria e da ferrovia, criou um paradoxo entre a sensação de progresso

e as limitações das manifestações culturais e religiosas, que foram reduzidas ao

longo do tempo, por exemplo, a redução considerável de participantes em eventos

religiosos e também a falta de interatividade entre vizinhos, podendo ser constatado

através de muros erguidos visando segurança e privacidade em detrimento do que

antes eram áreas comuns de socialização.

Mas, ainda que transformações trazidas pela modernidade possam ser

predominantes, é possível perceber que ficam adormecidas lembranças de suas

origens; e pela presença de momentos nostálgicos, que mesmo em meio ao

progresso e aos avanços tecnológicos, surge o desejo de estar e criar um ambiente

bucólico. Alguns tentam saciar este anseio, nos momentos de lazer em sítios ou

locais diversos que ainda retratam suas tradições.

As transformações são contínuas, influenciadas por contatos interculturais.

Isso se revela devido à expansão do fenômeno da globalização e do sistema

capitalista.

O avanço tecnológico, o capitalismo industrial, os estímulos do marketing e

propagandas, os ideais de progresso em geral, são entre muitos outros fatores

percebidos, que contribuem para a perda de referenciais históricos, provocando a

redução no espaço-temporal entre presente e passado na sociedade atual. Diante a

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esta crise, necessário se faz desenvolver mecanismos de conservação da memória

pública, coletiva, étnica e nacional.

É conveniente lembrar que não se pode deixar de pensar sobre a importância

das experiências e conquistas de uma sociedade, mas, o caráter conservador das

tradições, através do qual a cultura é transmitida e preservada ao longo do tempo

por meio de discursos e narrativas, também exerce influencia significativa na

construção da identidade de um povo.

Portanto, a cultura do município de Sabará-MG continuará sendo

transformada, acompanhando os avanços tecnológicos e interculturais provocados

pelo sistema capitalista. Sendo necessário o fomento a novos projetos de

conservação e transmissão de sua memória pública, considerando a importância de

sua história e seu valioso acervo cultural.

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QUADRO COMPARATIVO REFERENTE ÀS TRANSFORMAÇÕES OCORRIDAS

NO MUNICÍPIO ENTRE O PERÍODO DE OCUPAÇÃO E O ATUAL

SABARÁ, NO PERÍODO DE OCUPAÇÃO

SABARÁ ATUAL

Atividades de extração do ouro

artesanal pelos bandeirantes

As jazidas auríferas de Sabará são

exploradas por algumas empresas, dentre as

quais, destaca-se a Anglo Gold.

A indústria de metalurgia era a

grande empregadora

O Setor Público passa a ser o maior

empregador

Meio de transporte fluvial, ferroviário

e tropas de animais.

Permanece a malha ferroviária e predomina

o transporte rodoviário extinto o fluvial.

As áreas de moradia se deram de

forma mais dispersa, com traçados

nada geométricos e em áreas de

topografia, sobretudo privilegiando

as margens dos rios.

Denota-se um processo de periferização em

relação à metrópole, evidenciada pela

conurbação urbana existente, devido à

proximidade da capital.

A paisagem era de um núcleo

urbano constituído de conjunto

arquitetônico barroco, com formato

de fortificação.

Permanecem monumentos, casarões, igrejas

e capelas no estilo barroco. Em virtude da

expansão demográfica, houve uma

transposição desses limites, com a criação

de novos bairros e loteamentos, preservando

o sítio histórico, embora se observe

significativas alterações em seu casario. Fonte: Aníbal Félix Barbosa, 2013.

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