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JUSSARA AYRES BOURGUIGNON A PARTICULARIDADE HISTÓRICA DA PESQUISA NO SERVIÇO SOCIAL DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO SÃO PAULO – 2005

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JUSSARA AYRES BOURGUIGNON

A PARTICULARIDADE HISTÓRICA DA PESQUISA NO SERVIÇO SOCIAL

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO – 2005

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JUSSARA AYRES BOURGUIGNON

A PARTICULARIDADE HISTÓRICA DA PESQUISA NO SERVIÇO SOCIAL

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial à obtenção do Título de Doutora em Serviço Social, Curso de Pós - Graduação em Serviço Social sob orientação da Prof. Dra. Maria Lúcia Martinelli

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO - 2005

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DEDICATÓRIA:

- À Categoria Profissional dos Assistentes Sociais, pelo conhecimento que sustenta sua prática profissional, fruto de uma incansável luta pelo reconhecimento da profissão no meio acadêmico e pelo seu projeto ético – político compromissado com a democracia e justiça social. - À minha Família (Edilson, Ana Maria e Camila), pelo amor e apoio incondicional.

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AGRADECIMENTOS:

- À Professora Maria Lúcia Martinelli, pelo rico processo de orientação: prazeroso, instigante, tranqüilo, generoso e permeado por ensinamentos que extrapolam os limites desta tese, e que estarão sempre presentes em minha prática profissional. - Às participantes desta tese – Aldaíza Sposati, Aglair Alencar Setúbal, Ana Elizabete Mota, Elaine Rossetti Behring, Eunice Teresinha Fávero, Jussara Maria Rosa Mendes e Lúcia Cortes da Costa, pelos brilhantes depoimentos que fundamentaram as análises desenvolvidas. - À Professora Dilséa Adeodata Bonetti, pelo apoio recebido e orientações partilhadas em momentos decisivos desta tese. - À Danuta e Lenir pela amizade, presença constante e socialização de conhecimentos que iluminaram muitas reflexões presentes nesta tese. - À Universidade Estadual de Ponta Grossa, Pró – Reitoria de Pós – Graduação, Departamento de Serviço Social e CAPES pelo apoio institucional recebido. - Ao Programa de Pós – Graduação em Serviço Social, pelo acolhimento afetuoso dos alunos que vêm de longe – característica marcante dos seus Professores. - À todos os colegas do Departamento de Serviço Social e aos amigos, em especial Felipe Pontes, Márcia (PROPESP) e Sandrinha que, afetuosamente se fizeram presentes nesta caminhada.

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RESUMO

Esta tese tem por objetivo refletir sobre a particularidade histórica da pesquisa no Serviço Social, bem como sobre os desafios, decorrentes desta particularidade, que se apresentam ao Serviço Social no contexto contemporâneo.

Três pilares essenciais orientaram o processo da investigação. São eles: - a particularidade da pesquisa para o Serviço Social; a centralidade ocupada pelos sujeitos que participam das pesquisas do Serviço Social; o retorno e alcance social das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social.

O processo de investigação desenvolveu-se sustentado em recursos metodológicos que possibilitaram a construção de referencial teórico, a aproximação aos sujeitos que participaram da pesquisa através de entrevistas e depoimentos eletrônicos, e o desenvolvimento da sistematização e análise crítica do conjunto do material teórico e empírico, que na sua síntese constitui a tese defendida.

Participaram da pesquisa sujeitos considerados representativos da categoria profissional do Assistente Social pela densidade de experiências que possuem sobre pesquisa, possibilitando reflexões que evidenciam preocupações latentes e pertinentes à produção de conhecimento em Serviço Social.

A exposição da tese ficou organizada em dois momentos. O primeiro momento trata da produção do conhecimento como expressão do trabalho humano. Para tanto contextualiza os avanços alcançados pelo Serviço Social, principalmente durante as décadas de 80 e 90 e apresenta a compreensão do processo de produção do conhecimento como uma das expressões do trabalho humano, numa perspectiva histórico – crítica.

O segundo momento trabalha os elementos que constituem a particularidade da pesquisa para os sujeitos participantes, considerando os pilares orientadores da tese. Este momento expressa, na sua íntegra, as sínteses construídas de forma a articular os fundamentos teóricos aos depoimentos colhidos, buscando compreender como a particularidade da pesquisa ganha expressão e materialidade no Serviço Social.

Reafirmamos, através do processo de investigação, a tese de que a pesquisa é constitutiva e constituinte da prática profissional do Serviço Social, sendo determinada pela sua natureza interventiva e pela sua inserção histórica na divisão sócio - técnica do trabalho.

Palavras – Chave: produção de conhecimento, pesquisa em Serviço Social, prática profissional

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ABSTRACT

This thesis aims at reflecting on the historical particularity of research into Social Work, as well as on the resultant challenges of such particularity presented to Social Work in the contemporary context.

Three essential pillars oriented the investigation process. They are: the particularity of research for Social Work; the centrality occupied by persons that participate of Social Work researches; the return and the social reach of researches developed for Social Work.

The investigation process was developed supported in methodological resources that made possible the construction of theoretical referential, the approach to the persons that participated of the research through interviews and electronic declarations, and the development of systematization and critical analysis of the set of empirical and theoretical material, that in its synthesis constitutes the defended thesis.

The participants of the research were persons considered representative of the Social Worker professional category because the density of experiences they have on research, making possible reflections that evidence latent worries and that are pertinent to the production of knowledge in Social Work.

The thesis presentation was organized in two moments. The first moment deals with the production of knowledge as human work expression. In this purpose, it contextualizes the advancements reached for Social Work mainly during the 80’s and 90’s and presents the comprehension of the knowledge production process as one of the human labor expressions, in a historical–critical perspective.

The second moment deals with the elements that constitute the particularity of research for the participant persons, considering the orienting pillars of the thesis. Such moment express, in its totality, the syntheses constructed in order to articulate the theoretical fundamentals to the collected declarations, searching for comprehending how the particularity of the research takes expression and materiality in Social Work.

We reaffirm, through the investigation process, the proposition that the research is constitutive and constituent of the Social Work professional practice, being determined for its interventive nature and for its historical insertion in sociotechnical labor sharing.

Keywords: knowlegde production, research in Social Work, professional practice

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..............................................................................................10 I CAPÍTULO: A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO COMO EXPRESSÃO DO TRABALHO HUMANO...............................................32

1- A OBJETIVAÇÃO DO TRABALHO HUMANO ATRAVÉS DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO..................................................56

2- A PARTICULARIDADE DA PESQUISA EM SUA EXPRESSÃO DO

TRABALHO HUMANO.......................................................................84 II CAPÍTULO: PESQUISA EM SERVIÇO SOCIAL: EXPRESSÕES DA SUA PARTICULARIDADE................................................................102

1- A COMPREENSÃO DA REALIDADE SOCIAL E O ENFRENTAMENTO DAS DEMANDAS POSTAS À PRÁTICA PROFISSIONAL ATRAVÉS DA PESQUISA...................................119

2- A CENTRALIDADE OCUPADA PELOS SUJEITOS QUE

PARTICIPAM DAS PESQUISAS DO SERVIÇO SOCIAL..............164

3- O RETORNO E ALCANCE SOCIAL DAS PESQUISAS DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL................................213

4- A PARTICULARIDADE DA PESQUISA PARA O SERVIÇO

SOCIAL...............................................................................................248

REFERÊNCIAS...........................................................................................299

APÊNDICE...................................................................................................314 -Quadro 1- Demonstrativo de artigos, teses e dissertações sobre pesquisa e Serviço Social...........................................................................................315 -Quadro 2- Sistematização dos depoimentos dos sujeitos participantes da pesquisa.....................................................................................................325

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“Compreende-se agora porque, fora de todo julgamento subjetivo, só podemos ver, por razões epistemológicas, no presente trabalho, uma etapa no estudo de um problema, uma contribuição a uma investigação que não pode nem ser nem se pretender individual ou definitiva.” (GOLDMANN, 1979)

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INTRODUÇÃO

“A rigor, cada viajante abre seu caminho, não só quando desbrava o desconhecido, mas inclusive quando redesenha o conhecido.”

(IANNI, 2000)

Acreditamos que o processo de pesquisa exige do pesquisador – sujeito

deste processo – se perguntar pelo desconhecido, pelo que não se sabe, pelo

que é obscuro em determinado momento histórico, pelas possibilidades que se

colocam ao sujeito em sua relação com a realidade e pela validade e alcance

social do conhecimento produzido perante as demandas concretas da

humanidade. Neste sentido pesquisar faz parte da natureza humana e como

condição ontológica está presente nas intenções e ações humanas.

Pesquisar é exercício sistemático de indagação da realidade observada,

buscando conhecimento que ultrapasse nosso entendimento imediato, com um

fim determinado e que fundamenta e instrumentaliza o profissional a

desenvolver práticas comprometidas com mudanças significativas no contexto

em que se insere e em relação a qualidade de vida do cidadão.1 O Serviço

Social como profissão sócio - histórica tem em sua natureza a pesquisa como

meio de construção de um conhecimento comprometido com as demandas

específicas da profissão e com as possibilidades de seu enfrentamento. Ao

mesmo tempo em que se coloca como uma possibilidade de objetivação da

prática profissional é desafio permanente para os profissionais que

pretendam ser críticos e propositivos no atual cenário nacional e em

relação ao processo de formação profissional.

Reconhecendo a atualidade da problemática da pesquisa, esta tese tem

por objetivo refletir sobre a particularidade histórica da pesquisa no Serviço

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Social, bem como sobre os desafios, decorrentes desta particularidade, que se

apresentam ao Serviço Social no contexto brasileiro contemporâneo.

A opção por essa temática de investigação tem suas raízes no conjunto da

nossa experiência profissional como docente do curso de Serviço Social da

Universidade Estadual de Ponta Grossa – Pr junto ao ensino, pesquisa e

extensão.

O exercício da docência exige domínio dos fundamentos teórico –

metodológicos construídos pela profissão; acompanhamento e posicionamento

frente as discussões contemporâneas que a sustentam; envolvimento teórico –

prático com o projeto ético – político defendido pela categoria profissional e

exercício da pesquisa não só como meio de re – alimentação do ensino e

estimulação da extensão universitária mas, sobretudo, como meio de

contribuir com o processo de conhecimento profissional, respondendo às

demandas societárias num momento sócio – histórico em que a universidade

precisa reafirmar o seu compromisso com a socialização do que produz em

seu contexto.

Em se tratando do processo da pesquisa, desde a identificação do objeto

até o desenvolvimento do processo de investigação e de exposição do mesmo

QUEIROZ (1992, p. 13), oportunamente, nos lembra: A concentração do interesse do pesquisador em determinados problemas, a perspectiva em que se coloca para formulá-los, a escolha dos instrumentos de coleta e análise do material não são nunca fortuitos; todo estudioso está sempre engajado nas questões que lhe atraíram a atenção, está sempre engajado, de forma profunda e muitas vezes inconsciente, naquilo que executa. Além de sua posição diante do objeto a estudar, urge considerar também o momento histórico - científico em que se encontra, a maneira de compreender as ciências no mundo intelectual de que faz parte. Duas perspectivas se reúnem sempre: o ser pensante é sempre único, sua individualidade é patente; seu modo de conhecer e, portanto, sua imaginação, sua interpretação, seu julgamento de valor são sem dúvida inteiramente pessoais. ... (grifo nosso)

1 Fundamentado em: GATTI, Bernadete Angelina. A construção da pesquisa em educação no Brasil. Brasília: Plano Editora,2002 ( Série Pesquisa em Educação, v. 1)

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As questões motivadoras da investigação estão, portanto, relacionadas

aos interesses do pesquisador e a contextos socialmente determinados. É fruto

da inserção do pesquisador no real, que dado a sua complexidade instiga a

busca, o novo, a superação, o original, a possibilidade de recriação. No

entanto, é preciso esclarecermos que no âmbito do Serviço Social a busca por

novas possibilidades de conhecimento e de intervenção não decorre somente

de uma intenção pessoal ou da exigência que a categoria profissional, através

de suas instâncias formais, possa fazer. Decorre da natureza interventiva da

profissão, do envolvimento crítico do profissional com o processo

permanente de compreensão das determinações históricas, políticas,

econômicas e culturais das demandas sociais e, principalmente, da experiência

social acumulada pela profissão e especificamente pelo profissional quanto ao

enfrentamento das expressões da questão social.

Não é casual, portanto, a preocupação que revelamos com a pesquisa no

contexto da profissão, emerge como resultado do exercício de nossa prática

profissional docente nas três instâncias do ensino superior, ou seja, no

ensino, pesquisa e extensão.

Desta experiência2 tem sido relevante o trabalho com a disciplina

Pesquisa em Serviço Social e Orientação de Trabalhos de Conclusão de Curso

(TCC) na graduação, visto que nos instiga a preparar o aluno para analisar

criticamente a realidade em que se situa o Serviço Social, a prática

profissional desencadeada pelo profissional, as demandas sociais concretas e

2 Outras experiências profissionais foram relevantes, como: Supervisão de Estágio; coordenação e participação no Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Infância e Adolescência ( 2001 – 2002); coordenação e docência na Capacitação de Conselheiros Municipais de Assistência Social (2000); docente nos Cursos de Capacitação de Coselheiros Municipais da Criança e Adolescente (2000 – 2002); participação no Projeto de Extensão intitulado “Serviço Extensionista de Cooperação Técnica, Apoio e Fortalecimento das Organizações não Governamentais de Ponta Grossa (1997 – 1999); realização de pesquisa institucional denominada: Representações Sociais: possibilidades e limites para o estudo do simbólico no âmbito do Serviço Social (1999 – 2001).

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apontar alternativas metodológicas para intervenção profissional,

contribuindo, assim, para um processo de formação profissional que

possibilite o desenvolvimento de uma atitude crítica, investigativa e

propositiva. No contexto destas disciplinas enfrentamos o desafio de ancorar

este momento da formação profissional num exercício em que a pesquisa se

sustentasse na relação dinâmica que o aluno estabelecia com seu campo de

estágio – espaço de intervenção profissional em que as demandas sociais

concretas da população beneficiária das políticas sociais se expressam em suas

dimensões objetiva e subjetiva.

Igualmente foi importante a experiência junto aos Cursos de

Especialização em Saúde Pública com a disciplina Pesquisa Qualitativa em

Saúde. Neste espaço de atuação docente as demandas são de caráter

interdisciplinar e se constituem em superar a dicotomia pesquisa

qualitativa/pesquisa quantitativa, refletir sobre a concepção de pesquisa

social e as dimensões da responsabilidade social do pesquisador que, nestes

cursos, são profissionais atuantes no âmbito da gestão e operacionalização da

política da saúde.

Importante mencionar a experiência de reformulação curricular junto ao

Colegiado de Curso de Serviço Social da UEPG. Desde 1997 o Colegiado

discutia uma proposta de reformulação curricular que foi efetivada em 2002.

A proposta segue as orientações da ABEPSS e respeita as particularidades

regionais, bem como a história do curso em Ponta Grossa e ainda centra-se na

relação entre investigação/intervenção como processos constituintes de uma

profissão de natureza interventiva. O mais importante é que participar do

Colegiado nos possibilitou ter uma visão do curso em sua totalidade, ou seja,

perceber o curso em todos os aspectos ( disciplinas, estágio, TCC, eventos de

formação, campos de estágio e relação com os Assistentes Sociais

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supervisores, pesquisa, extensão....) que, de forma articulada, concorrem para

a formação profissional.

Podemos afirmar, com tranqüilidade, que o objeto desta tese não é

acidental, foi cunhado e cultivado no cotidiano da nossa experiência docente,

sendo constitutivo da nossa prática profissional.

Através da mediação desta prática docente temos nos aproximado da

temática: a particularidade da pesquisa em Serviço Social. Neste processo

identificamos relevantes produções acadêmicas (teses e dissertações de

mestrado), no âmbito da pós - graduação e artigos publicados nas revistas

Serviço Social e Sociedade, Temporalis e Cadernos ABESS,3 as quais

discutem a problemática da pesquisa em relação às demandas contemporâneas

e em relação ao processo de formação profissional. Queremos destacar a obra

de Aglair Alencar Setubal “Pesquisa em Serviço Social: utopia e realidade”

(1995) que sempre nos inspirou a repensar a importância da pesquisa para a

profissão. É possível que diante destas produções nossas inquietações não

sejam inéditas, mas com certeza, apresentam outras facetas de uma

problemática ainda desafiadora para uma profissão que busca acompanhar as

vicissitudes do mundo contemporâneo sem perder de vista o acúmulo de

conhecimento historicamente construído e o seu compromisso em produzir

conhecimentos que atendam as demandas concretas postas pela realidade e

apresentadas pelos sujeitos demandatários de sua prática, nos diferentes

campos da ação profissional.

Conforme colocado por IANNI (2000), na epígrafe desta introdução,

cada pesquisador, considerando sua experiência profissional, pessoal e suas

intenções de pesquisa estabelece novas relações com as temáticas de pesquisa,

abrindo outras possibilidades ao investigar aspectos ainda obscuros. Ao

3 Encontra-se no apêndice - quadro 1 - demonstrativo sobre as produções citadas e que tivemos acesso no período de levantamento de informações para uma primeira aproximação da temática de pesquisa.

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pesquisar não só “abre seu caminho”, como “desbrava o desconhecido”,

sobretudo “redesenha o conhecido”.

Desde o primeiro momento, o objeto de estudo foi sendo delineado e

consubstanciado através de um processo de investigação que tem como

referência a perspectiva teórico – crítica, cujos fundamentos estão no método

dialético. O método que permite fazer o caminho de ascensão do abstrato ao

concreto é o caminho do conhecimento.

O método da ascensão do abstrato ao concreto é o método do pensamento; em outras palavras, é um movimento que atua nos conceitos, no elemento da abstração. A ascensão do abstrato ao concreto não é uma passagem de um plano (sensível) para outro plano (racional); é um movimento no pensamento e do pensamento. Para que o pensamento possa progredir do abstrato ao concreto, tem de mover-se no seu próprio elemento, isto é, no plano abstrato, que é negação da imediaticidade, da evidência e da concreticidade sensível. A ascensão do abstrato ao concreto é um movimento para o qual todo início é abstrato e cuja dialética consiste na superação desta abstratividade. O progresso da abstratividade à concreticidade é, por conseguinte, em geral movimento da parte para o todo e do todo para a parte; do fenômeno para a essência e da essência para fenômeno; da totalidade para a contradição e da contradição para a totalidade; do objeto para o sujeito e do sujeito para o objeto. O processo do abstrato ao concreto, como método materialista do conhecimento da realidade, é a dialética da totalidade concreta, na qual se reproduz idealmente a realidade em todos os seus planos e dimensões. O processo do pensamento não se limita a transformar o todo caótico das representações no todo transparente dos conceitos; no curso do processo o próprio todo é concomitante delineado, determinado e compreendido. (KOSIK, 1976, p. 36 – 37) (grifo nosso) O conhecimento é sempre processo que envolve um esforço de

reconstrução da realidade em nossa mente. Parte-se da realidade concreta,

tendo como referência um objeto determinado, e através de processos de

abstrações e aproximações às suas determinações, relações e processualidade

histórica, volta-se à realidade após desvendá- la em sua totalidade complexa.

O método dialético é o caminho pelo qual se pode desvendar a constituição

do todo através de aproximações sucessivas sem a pretensão de esgotar a

complexidade e dinamicidade do real.

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Enfatizamos, ainda, que, para KOSIK (1976, p. 49 ) cada fenômeno é

particular , devido a sua constituição específica, mas só ganha significado

histórico se sua essência for compreendida em uma totalidade complexa – o

contexto social, econômico, político e cultural em que se insere.

...Um fenômeno social é um fato histórico na medida em que é examinado como um momento de um determinado todo; desempenha, portanto, uma função dupla, a única capaz de dele fazer efetivamente um fato histórico: de um lado, definir a si mesmo, e de outro, definir o todo; ser ao mesmo tempo produtor e produto; ser revelador e ao mesmo tempo determinado; ser revelador e ao mesmo tempo decifrar a si mesmo; conquistar o próprio significado autêntico e ao mesmo tempo conferir um sentido a algo mais. Esta recíproca conexão e mediação da parte e do todo significam a um só tempo: os fatos isolados são abstrações, são momentos artificiosamente separados do todo, os quais só quando inseridos no todo correspondente adquirem verdade e concreticidade. Do mesmo modo, o todo de que não foram diferenciados e determinados os momentos é um todo abstrato e vazio. Nesta perspectiva a categoria4 totalidade foi crucial para orientar as

reflexões que possibilitaram compreender a particularidade da pesquisa para

o Serviço Social em sua dimensão histórica.

Assim o pressuposto que orientou este processo de investigação é de que

a pesquisa é constitutiva e constituinte da prática profissional do Serviço

Social, sendo determinada pela sua natureza interventiva e pela sua inserção

histórica na divisão sócio – técnica do trabalho.

Esta tese apresenta três pontos de ancoragem que foram explorados

através da pesquisa e que constituem os pilares fundamentais da mesma:

1-A particularidade da pesquisa para o Serviço Social: a categoria

particularidade vem contribuir para nos aproximarmos do processo sócio –

4 As categorias possibilitam a expressão das relações contraditórias existentes numa dada formação sócio – histórica da sociedade. São “formas de ser, determinações da existência” e não meros conceitos. As categorias expressam relações e compreender as relações é o segredo de um processo de investigação. (LUKÁCS, 1979, p.28)

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histórico em que a pesquisa ganha expressão e força no âmbito do Serviço

Social, em especial, considerando as décadas de 80 e 90.5

Para LUKÁCS (1970, p. 103 e 104) a particularidade se constitui “um

campo de mediações”, a partir do qual podemos apreender o movimento

dialético do universal ao singular. “O movimento do singular ao universal e

vice – versa é sempre mediatizado pelo particular; é um membro intermediário

real, tanto na realidade objetiva quanto no pensamento que a reflete de um

modo aproximativamente adequado. ...”

Ao nos questionarmos sobre a particularidade da pesquisa em Serviço

Social reconhecemos a necessidade de inserir esta discussão no contexto

sócio – econômico, político e cultural contemporâneo, buscando apreender as

determinações mais gerais e sua repercussão/ incidência no âmbito da prática

singular do Serviço Social, principalmente quando enfrenta as demandas

sociais e as exigências de seu equacionamento.

Entendemos que na trajetória histórica da profissão a atitude investigativa

se faz presente sendo constitutiva e constituinte da prática profissional.

Constitutiva porque a prática profissional está fundamentada na relação

dinâmica teoria/prática, fazendo parte da natureza da profissão buscar

compreender criticamente os fenômenos sociais para fundamentar sua

intervenção. Constituinte porque, inegavelmente, os avanços observados na

esfera da produção de conhecimento, da prática profissional no âmbito das

políticas públicas e da formação profissional mobilizam a reconstrução crítica

da própria natureza profissional. Neste processo a profissão sofre

5 Devemos esclarecer que identificamos que a literatura que trata da pesquisa em Serviço Social privilegia a discussão desta temática a partir da compreensão de sua especificidade. Reconhecemos a importância desta abordagem, no entanto, em nossa tese, reafirmamos a necessidade de sustentar nossas reflexões sobre pesquisa a partir da compreensão da categoria particularidade. A categoria particularidade, em sua complexidade e riqueza ontológica ( fundado em Lukács), nos possibilita compreender a pesquisa em sua vinculação orgânica com a prática profissional , que se constrói no movimento histórico da própria profissão e que se constitui como possibilidade de avanço teórico- prático coerente com o projeto ético – político do Serviço Social.

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determinações estruturais que, contraditoriamente, tanto a desafiam, como ,

por vezes, lhe criam barreiras, impedindo que na singularidade da prática

profissional, muitos profissionais ainda não percebam a vinculação orgânica

entre intervenção/ investigação.

2- A centralidade ocupada pelos sujeitos que participam das

pesquisas do Serviço Social: através de observação empírica e fundamentada

no processo de revisão bibliográfica, percebemos que há uma lacuna nas

produções sobre a pesquisa em Serviço Social, que é justamente a questão da

centralidade do sujeito e sua preservação no processo metodológico de

investigação do real e conseqüente produção de conhecimento profissional.

Neste caso, estamos nos referindo ao sujeito demandatário da prática

profissional, beneficiário/usuário das políticas públicas, que enquanto cidadão

deve ser considerado protagonista de sua própria história e não dado ou fonte

de informação. Preocupar-se com o sujeito implica em não perder de vista o

contexto sócio – histórico em que se insere e em que se dão as relações entre

o profissional Assistente Social e o cidadão.

Relembramos que a preocupação com o reconhecimento do sujeito –

cidadão – está presente no projeto ético – político da profissão e necessita

ganhar maior relevância tanto no âmbito da prática profissional em

organizações sociais, como no desenvolvimento de pesquisas científicas.

A pesquisa deve destinar-se não só a compreender as questões

estruturais, mas numa perspectiva de totalidade o processo de reprodução

material e espiritual da existência do ser social. Por isso não pode passar

despercebido nas pesquisas da área, as diferentes formas como o sujeito se

relaciona com a realidade social.

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O grande desafio para o pesquisador Assistente Social que se preocupa

com a centralidade do sujeito – enquanto condição ontológica e não como

estratégia metodológica de pesquisa - é possibilitar através da pesquisa maior

visibilidade ao sujeito, à sua experiência e ao seu conhecimento, cuja natureza

se desvendada, poderá permitir aos profissionais desenvolver práticas cada vez

mais comprometidas ética e politicamente com a realidade dos mesmos,

buscando no coletivo e na troca de saberes alternativas de superação das

condições de privação e exclusão social.

3- O retorno e alcance social das pesquisas desenvolvidas pelo

Serviço Social : BAPTISTA (1992, p. 88 – 89) nos lembra que:

A especificidade que particulariza o conhecimento produzido pelo Serviço Social é a inserção de seus profissionais em práticas concretas. O assistente social se detém frente às mesmas questões que outros cientistas sociais, porém o que o diferencia é o fato de ter sempre em seu horizonte um certo tipo de intervenção: a intervenção profissional. Sua preocupação é com a incidência do saber produzido sobre a sua prática: em serviço social, o saber crítico aponta para o saber fazer crítico. (grifo nosso) Orientado pelo compromisso ético – político profissional, o

conhecimento construído pelos profissionais precisa ganhar força social e

romper com os muros da academia e do próprio Serviço Social, sendo, através

de uma prática crítica e propositiva, capaz de interferir nas condições de vida

do cidadão.

A compreensão destes pilares foi trabalhada ao longo da pesquisa

sustentada em recursos metodológicos que possibilitaram a construção de um

referencial teórico, a aproximação aos sujeitos que participaram da pesquisa

para realização das entrevistas e coleta de depoimentos e o desenvolvimento

da sistematização e análise do conjunto do material teórico e empírico, que na

sua síntese constitui a tese aqui defendida.

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A revisão bibliográfica constituiu-se de processo contínuo de revisão de

literatura pertinente ao tema proposto e isto implicou em aproximação às

discussões travadas pelos autores que sustentaram nossas reflexões e que,

principalmente, possibilitaram estabelecer as mediações teóricas necessárias à

compreensão do objeto de estudo.

Enfatizamos que nos apoiamos, também, na observação sistemática.

Articulada aos demais procedimentos metodológicos a observação garantiu

maior concretude à análise do tema proposto e como procedimento

metodológico esteve orientada pelos objetivos da pesquisa e pelas questões

que problematizaram o objeto de estudo, portanto foi sistemática e contínua.

Podemos entendê-la, também, como participante, visto que somos partícipes

da profissão em sua dimensão formativa. Somos protagonista das questões que

atravessam a profissão e co-responsáveis pelo seu encaminhamento, assim o

diálogo que estabelecemos com referenciais teóricos em processo de

reconstrução nesta tese se fez mediado pela nossa prática docente.

Para compreendermos os pilares que constituem a base de nossa tese

percorremos um caminho que nos levou ao encontro de alguns sujeitos

representativos da categoria profissional do Assistente Social. Estes foram

selecionados de forma intencional e atenderam aos seguintes critérios:

• profissionais vinculados à prática profissional em organizações

governamentais ou não – governamentais;

• profissionais vinculados à prática profissional docente (graduação e pós –

graduação);

• profissionais com experiência em pesquisa;

• profissionais vinculados a órgão representativos da categoria e/ou do

ensino.

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Oportuno, neste momento, ressaltarmos a decisiva contribuição da Profa.

Dra. Dilséa Adeodata Bonetti em orientações compartilhadas com a Profa.

Dra. Maria Lúcia Martinelli para definição dos critérios de seleção e

identificação dos sujeitos da pesquisa e reflexões sobre as questões que

constituíram o roteiro da entrevista.

Apresentamos no quadro que segue uma caracterização dos sujeitos 6

identificados como significativos, por sua reconhecida experiência e

conhecimento no meio profissional, por serem, em seus espaços de ação

profissional, protagonistas no enfrentamento dos desafios que o contexto sócio

– econômico e político brasileiro coloca à profissão em relação ao

equacionamento das expressões da questão social, portanto qualificados para

contribuir com as discussões desta tese.

Esclarecemos que em relação à caracterização dos sujeitos não

detalharemos as suas publicações (livros, artigos, conferências, etc.)

considerando que os mesmos têm um currículo vasto, difícil de contemplar e

valorizar em tão pequeno espaço. Reconhecemos, porém que a produção

acadêmica destes profissionais circula no meio profissional, fomentando as

reflexões que dizem respeito às áreas da Seguridade Social (saúde/

assistência social/ previdência social), Serviço Social no campo Sócio –

Jurídico, Trabalho e Formação Profissional.

6 Inicialmente prevíamos participação de Maria Inês Souza Bravo, no entanto, embora tenhamos feito vários contatos buscando agendar entrevista, não tivemos êxito. Entendemos que, embora em um primeiro momento a professora tenha se disponibilizado a participar, o excesso de atividades profissionais impediu sua participação durante o período que planejamos para realização da coleta do material (maio/outubro/2004). Assim em novembro de 2004 enviamos correspondência agradecendo e explicando a impossibilidade de aguardarmos por mais tempo.

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Quadro I – CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA7

SUJEITO

(ordem alfabética) CARACTERIZAÇÃO

Aldaíza Sposati - Assistente Social - Pós – Doutora em Serviço Social pela

Universidade de Coimbra - Portugal - Doutora em Serviço Social pela PUC/SP - Professora Titular da PUC/SP - Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas

de Seguridade e Assistência Social – PUC/SP - Professora Visitante do Instituto Superior de

Serviço Social – ISSP - Portugal - Vereadora – Município de São Paulo (1997/2000

– 2001/2002) - Secretária Municipal de Assistência Social –

Prefeitura Municipal de São Paulo – (2002/2004) Aglair Alencar Setúbal - Assistente Social

- Doutora pela PUC/SP - Professora Aposentada da Universidade Federal

do Piauí - Coordenadora do Núcleo de Extensão e Pesquisa

da Pessoa Idosa da Universidade Federal do Piauí - Coordenadora do Programa - Terceira Idade e

Ação - Universidade Federal do Piauí – 1998-2003

- Coordenadora até 2003 e Professora do Curso de Especialização em Gerontologia Social – Universidade Federal do Piauí

- Coordenadora do Curso de Serviço Social do Instituto Camilo Filho / Piauí desde 2003

- Coordenadora do Núcleo de Extensão e Pesquisa da Pessoa Idosa do Instituto Camilo Filho.

7Org.: a autora, 2004 Fonte: Os dados, aqui considerados como caracterização, foram obtidos em fontes de natureza bibliográfica e eletrônica, e alguns elementos foram revisados no momento das entrevistas e acrescentados por algumas das próprias entrevistadas. Esclarecemos que estes dados não esgotam as atividades desenvolvidas pelas participantes no âmbito da pesquisa e da prática profissional. As fontes são: -Política de Assistência Social: uma trajetória de avanços e desafios. Subsídios à III Conferência Nacional de Assistência Social. ABONG/CFESS/CNTSS/CUT, São Paulo, 2001 -FÁVERO, Eunice T. Mães (e pais) em situação de abandono: quando a pobreza é fator condicionante do rompimento dos vínculos do pátrio poder. Tese de Doutorado. PUC – São Paulo, 2001. -PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL. http://www.pucrs.br consultado em 11/02/2004 - Curriculum Vitae - Sistema de Currículos Lattes - www.cnpq.br, consultado em 25 de janeiro de 2005.

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Ana Elizabete Mota - Assistente Social - Doutora em Serviço Social pela PUC/SP - Doutora em Ciências Sociais pela UNICAMP - Professora Adjunta do Departamento de Serviço

Social da Universidade Federal de Pernambuco - Coordenadora do Programa de Pós – Graduação

em Serviço Social da UFPe - Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa do

Trabalho (GET) – UFPe - Presidente da ABEPSS (atual gestão)

Elaine Rossetti Behring - Assistente Social - Doutora em Serviço Social pela UFRJ - Professora Adjunta da FSS/UERJ - Presidente do Conselho Federal de Serviço Social

(CFESS) – gestão 1999/2002 - Diretora da Faculdade de Serviço Social da UERJ- Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas

do Orçamento Público e da Seguridade Social – UERJ

Eunice Teresinha Fávero

- Assistente Social - Doutora em Serviço Social –PUC/SP - Trabalhou por 8 anos na Vara da Infância e

Juventude e Varas de Família e na seleção e Acompanhamento de Juizes– Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

- Coordenou pesquisas sobre “Perda do Pátrio poder: aproximações a um estudo sócioeconômico” (2000) e sobre “Serviço Social, práticas judiciárias, poder – implantação e implementação do Serviço Social no juizado de menores de São Paulo (1999) – publicadas pela Editora Veras

- Coordenou Grupo de estudos “O cotidiano da prática profissional” junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Jussara Maria Rosa Mendes - Assistente Social - Doutora pela PUC/SP - Professora Titular da PUC/RS - Coordenadora do Programa de Pós – Graduação

da PUC/RS - Diretora do Curso de Serviço Social da PUC/RS - Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas

em Saúde e Trabalho – NEST – PUC/RS - Presidente da ABEPSS – gestão 2003/2004

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Lúcia Cortes da Costa - Assistente Social - Doutora pela PUC/SP - Professora Adjunta da Universidade Estadual da

Ponta Grossa – Pr - Coordenadora do Curso de Pós – graduação em

Ciências Sociais Aplicadas da UEPG-Pr – gestão 2002/2004

- Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Desigualdade e Exclusão Social no Espaço Local – UEPG-Pr

- Líder de grupo de Pesquisa junto ao CNPQ pelo curso de Serviço Social da UEPG/Pr e de Canoinhas/SC

O roteiro utilizado para a coleta dos depoimentos decorreu do processo de

problematização do objeto de estudo, constituindo-se em desdobramentos dos

pilares da tese e em questões centrais desta pesquisa, as quais são:

• Como as pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social tratam as

determinações objetivas da existência dos sujeitos, que demandam sua

prática e conhecimento profissional?

• Que posição a experiência e o conhecimento dos sujeitos ocupam nas

pesquisas do Serviço Social?

• Qual o impacto das pesquisas do Serviço Social junto as organizações

sociais em que trabalha e nas condições de vida dos sujeitos que

requisitam sua prática profissional?

• Que desafios isto traz à profissão considerando a complexidade sócio –

histórica da realidade geradora do objeto de atenção profissional?

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• Qual a particularidade das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social?

O roteiro apresentado teve por objetivo orientar o processo da entrevista

sem engessar o diálogo estabelecido. Tivemos como referência que a

entrevista devia sempre partir da experiência concreta de cada sujeito em

torno da temática de estudo. Ao ser relatada, num primeiro momento, esta

experiência oportunizou que as questões colocadas como roteiro ganhassem

dinâmica diferenciada, valorizando o que é singular em cada relato. Portanto,

nos coube estar atento à riqueza e complexidade dos relatos sem perder de

vista os propósitos desta tese.

Amparados pelos princípios éticos que orientam a pesquisa científica

utilizamos o termo de consentimento informado para assegurar ao sujeito e ao

pesquisador a adequada utilização dos depoimentos orais em seu processo de

coleta, transcrição e análise. Como referência tivemos o modelo de “cessão

gratuita de direitos de depoimento oral” fornecido pelo CEDIC ( Centro de

Documentação e Informação Científica “Prof. Casemiro dos Reis Filho”-

PUC/SP), que foi adaptado aos objetivos de nossa pesquisa.8 Este foi assinado

por todos as participantes da pesquisa.

Estes sujeitos, em nossa tese, têm o estatuto de sujeito coletivo9 pela

densidade de experiências que possuem sobre pesquisa, possibilitando

reflexões que evidenciam preocupações latentes e pertinentes à produção de

conhecimento em Serviço Social.

Segundo MARTINELLI (1994, p.14) quando trabalhamos com a

pesquisa de caráter qualitativo um recurso metodológico é o da ...

8 Temos como referência também a obra: FONTINELLI JÚNIOR, Klinger. Pesquisa em Saúde: ética, bioética e legislação. Goiânia: AB, 2003 9 Sobre a concepção de sujeito coletivo consultamos também: SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. Os sujeitos sociais em questão. Serviço Social e Sociedade, ano XIII, n. 40, São Paulo: Cortez, 1992.

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“...concepção de sujeito coletivo, no sentido de que aquela pessoa que está sendo convidada para participar da pesquisa tem uma referência grupal, expressando de forma típica o conjunto de vivências de seu grupo. O importante, nesse contexto, não é o número de pessoas que vai prestar a informação, mas o significado que esses sujeitos têm, em função do que estamos buscando com a pesquisa.” (grifo da autora) Os depoimentos foram coletados através de entrevista e de

correspondência eletrônica, respeitando as opções de cada participante da

pesquisa. Estes procedimentos objetivaram o estabelecimento de diálogo entre

a pesquisadora e as participantes da pesquisa.10

Qualificamos estas modalidades de coleta de depoimentos como

“orientadas”, visto que tanto a conversação, como depoimento eletrônico

foram guiados pelo conjunto, já citado, de questões que problematizaram o

objeto de estudo. Conforme já afirmamos, o objetivo destas questões não foi

cercear os sujeitos entrevistados, mas situá-los em relação aos propósitos da

pesquisa e facilitar o diálogo, respeitando sua lógica discursiva.

Assim no quadro abaixo explicitamos como e quando se deu o contato

e coleta de material empírico junto às participantes desta pesquisa:

10No projeto inicial desta pesquisa pensamos em utilizar como recurso para coleta dos depoimentos a vídeo– conferência,visto que a Universidade Estadual de Ponta Grossa possui este sistema. No entanto, dificuldades de ordem operacional, como por exemplo localizar o mesmo sistema para recepção da conferências nas instituições de origem das participantes da pesquisa, impediu o desenvolvimento das entrevista através desta tecnologia.

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QUADRO II - DEMONSTRAÇÃO DAS FORMAS DE COLETA DE DEPOIMENTOS

JUNTO ÀS PARTICIPANTES DA PESQUISA

PARTICIPANTE PROCEDI MENTO LOCAL/DATA 1-Lúcia Cortes da Costa Entrevista Ponta Grossa/Pr – residência -

13/05/2005 2-Jussara Maria Rosa Mendes

Entrevista Porto Alegre/RS – PUC - 28/06/2004

3-Ana Elizabete Mota Depoimento Eletrônico

02/07/2004 - e-mail

4-Eunice Teresinha Fávero

Entrevista São Paulo/SP – residência - 10/08/2004

5-Elaine Rossetti Behring

Entrevista Curitiba/Pr- Encontro Nacional Sócio – Jurídico - 03/09/2004

6-Aglair Alencar Setúbal Depoimento Eletrônico

20/09/2004 – e-mail

7-Aldaíza Sposati Entrevista São Paulo/SP - PUC - 26/10/2004 Org.: a autora - 2005

Em todos os casos enviamos correspondência explicativa dos objetivos

da tese e do roteiro estabelecido para as reflexões das participantes. Os

contatos para nossa apresentação pessoal e agendamento das entrevistas

foram realizados através de telefonemas aos locais de trabalho de cada

participante. São exceções Lúcia Cortes da Costa que reside em Ponta Grossa

e com a qual fizemos contato pessoal e Ana Elizabete Mota que

estabelecemos contato durante sua participação em evento promovido pelo

CRESS – 11ª Região em 14/05/2004 com o tema “ Garantir Direitos – dever

do Assistente Social, oportunidade em que proferiu palestra sobre “Seguridade

Social no Brasil e a construção do Sistema Único de Assistência Social”.

Os depoimentos mediados pela entrevista foram muito mais ricos do que

os eletrônicos, pois o contato direto com o sujeito permitiu a problematização

do depoimento enquanto ele estava acontecendo. No entanto, no conjunto, os

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depoimentos nos dão pistas muito ricas em relação à articulação

pesquisa/intervenção profissional e em relação aos pilares desta tese.

Quando elaboramos as questões orientadoras das entrevistas previmos

algumas respostas com o objetivo de sustentar nossa tese e pressuposto de

pesquisa. No entanto, cada diálogo estabelecido com as participantes nos

surpreendeu, ampliando as possibilidades de discussão da tese e apontando

outras problemáticas fundamentais à profissão.

Em relação ao processo da entrevista e mesmo aos depoimentos

eletrônicos, partimos da experiência das participantes em torno da pesquisa

em Serviço Social. Esta foi uma primeira questão, mais informal e serviu

para aquecer o diálogo e gerar os desdobramentos necessários para que as

demais questões previstas no roteiro pudessem ser trabalhadas.

Colhidos os depoimentos passamos à fase da sua transcrição e revisão.

As versões finais das entrevistas transcritas foram encaminhadas às

participantes, sendo que revisaram seus depoimentos: Lúcia Cortes da Costa e

Eunice Teresinha Fávero. No entanto, Jussara Maria Rosa Mendes, Aldaíza

Sposati e Elaine Rossetti Berhing não revisaram seus depoimentos em tempo

hábil para conclusão desta tese. Contamos, portanto, para análise do material

colhido, com a autorização expressa pelas participantes no termo de cessão

gratuita de direitos de depoimentos oral e eletrônico.

Após a revisão procuramos sistematizar os depoimentos tendo por

referência os três pilares da tese: a particularidade da pesquisa para o

Serviço Social; a centralidade ocupada pelos sujeitos que participam das

pesquisas do Serviço Social ; o retorno e alcance social das pesquisas

desenvolvidas pelo Serviço Social. No entanto, a riqueza dos depoimentos em

torno da experiência profissional das participantes nos levou a construir um

quarto eixo: a compreensão da realidade social e o enfrentamento das

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demandas postas à prática profissional através da pesquisa. Os depoimentos

foram sistematizados em quadro demonstrativo (apêndice – quadro 2),

considerando a estrutura das questões formuladas às participantes da pesquisa.

Este quadro foi fundamental, pois além de possibilitar uma perspectiva

ampliada dos depoimentos, permitiu estabelecer um perfil de cada

participante, reconhecendo as suas contribuições singulares. Através do

quadro apreendemos os elementos essenciais à análise dos depoimentos e

visualizamos a estrutura final desta tese.

Esse processo - entre a sistematização e a análise dos depoimentos – nos

fez perceber que havia necessidade de inverter a exposição dos resultados. A

discussão da particularidade da pesquisa para o Serviço Social,que a princípio

planejamos ser o primeiro pilar, passa a ser o último, justamente por constituir-

se em síntese construída através das reflexões decorrentes dos demais pilares.

Avançando do processo da sistematização ao processo da análise do

material empírico, objetivado no conjunto dos depoimentos, buscamos

estabelecer as articulações necessárias com a revisão bibliográfica já realizada

e necessitada de novas aproximações. Neste momento retomamos nosso

principal pilar: a particularidade histórica da pesquisa no Serviço Social e

considerando as contribuições presentes nos depoimentos buscamos construir

sínteses que expressassem a particularidade histórica da pesquisa no Serviço

Social.

Esta tese não esgota a complexidade do tema, apontando para um

horizonte cheio de possibilidades. Buscando no Dicionário identificamos que

o termo horizonte significa “linha circular que limita o campo de

observação...”, ou “perspectiva, probabilidade de desenvolvimento...”

(FERREIRA, 1988, p. 346) Entendemos, portanto, que o horizonte se

constitui na possibilidade que a pesquisa nos traz em termos de reconstrução

teórica da realidade concreta - reconstrução que se fez através de um esforço

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de investigação em torno do objeto de pesquisa “A particularidade histórica da

pesquisa em Serviço Social”. Sendo possibilidade, “o horizonte se põe e se

repõe no processo de investigação”11, acompanhando a dinâmica da realidade,

o avanço e amadurecimento das reflexões, a interação entre os sujeitos da

pesquisa e o diálogo com os autores que iluminaram as re - construções

teóricas, que aqui buscamos explicitar e principalmente extrapolando o

esforço desta pesquisa o empenho cotidiano dos profissionais de Serviço

Social que, enquanto categoria, insistem em garantir à sua intervenção um

cariz teórico – crítico.

Finalizando, vale esclarecer que nosso desejo era burilar esta tese, assim

como um artesão faz com sua obra, buscando exaurir as possibilidades que a

matéria – prima lhe oferece a cada momento em que ele aprecia, avalia, revisa

e principalmente, duvida do que está produzindo. Como o tempo acadêmico

impõe limites, tivemos que encerrar este trabalho e o nosso desejo, agora, é

que o diálogo que possa ser estabelecido com este trabalho o supere.

Nesta perspectiva, organizamos a exposição desta tese em dois capítulos,

precedidos desta introdução que objetivou explicitar o caminho teórico –

metodológico percorrido durante o processo de investigação.12

No primeiro capítulo – A produção do conhecimento como expressão do

trabalho humano - nos preocupamos em contextualizar os avanços alcançados

pelo Serviço Social, principalmente durante as décadas de 80 e 90 e em

compreender o processo de produção do conhecimento como uma das

expressões do trabalho humano, numa perspectiva histórico – crítica.

11 Afirmação da Professora Maria Lúcia Martinelli em processo de orientação de tese. 12 As normas para apresentação de documentos científicos utilizadas como referência nesta tese seguem as orientações da ABNT adaptadas pela Universidade Federal do Paraná. Sistema de Bibliotecas, Curitiba: Ed. da UFPR, 2000.

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No segundo Capítulo – Pesquisa em Serviço Social: expressões da sua

particularidade – trabalhamos os elementos que constituem a particularidade

da pesquisa para os sujeitos participantes, considerando os pilares

orientadores da tese. Este capítulo expressa, na sua íntegra, as sínteses

construídas de forma a articular os fundamentos presentes no I Capítulo aos

depoimentos colhidos, buscando compreender como a particularidade da

pesquisa ganha expressão e materialidade no Serviço Social.

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I CAPÍTULO

“O conhecimento não é contemplação. A contemplação do mundo se baseia nos resultados da praxis humana. O homem só conhece a realidade na medida em que ele cria a realidade humana e se comporta antes de tudo como ser prático.” ( KOSIK - 1976)

A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO COMO EXPRESSÃO DO TRABALHO HUMANO

Analisando a trajetória do Serviço Social, como profissão reconhecida e

inscrita na divisão sócio – técnica do trabalho, podemos afirmar que a mesma

tem uma história de avanços e conquistas no sentido de consolidar uma

produção de conhecimento que lhe dá sustentação teórica e metodológica para

intervir na realidade social de forma crítica e criativa, e que este processo de

intervenção se faz respaldado em projeto ético e político comprometido com

os interesses coletivos dos cidadãos e com a construção de uma sociedade

justa.

Há que se considerar que as pesquisas em Serviço Social têm contribuído

para avanços significativos em diferentes campos da ação profissional, no

âmbito das políticas públicas, no enfrentamento das expressões da questão

social em diferentes momentos históricos, na construção da proposta

curricular e definição dos seus fundamentos teóricos e metodológicos, na

consolidação do projeto ético - político profissional, entre outros aspectos que

poderíamos citar.

Interessa-nos demarcar que o contexto de nossas inquietações e reflexões

refere-se às décadas de 80 e 90. Os anos 80 marcam uma etapa de

amadurecimento da produção teórica da profissão e a Universidade foi a

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grande protagonista deste processo. Já os anos 90 representam avanços

quanto a consolidação do projeto ético - político profissional, o que repercutiu

nas proposições destinadas a formação profissional e na direção social da

profissão, aspectos essenciais à reconstrução crítica e à consolidação da

própria natureza da profissão.

YAZBEK (2000, p.24) nos lembra que “Até o final da década de 70, o

pensamento de autores latino – americanos ainda orienta, ao lado da iniciante

produção brasileira (particularmente divulgada pelo CBCISS), a formação e o

exercício profissional no País. Situação que, aos poucos vai-se modificando

com o desenvolvimento do debate e da produção intelectual do Serviço Social

brasileiro...” 13

Todavia, não podemos ignorar que os avanços são decorrentes de um

processo histórico do qual destacamos as contribuições e impasses herdados

da década de 6014, especificamente da segunda metade, momento em que se

13 Destacamos, deste contexto, algumas publicações do CBCISS ( Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais), através da Revista Debates Sociais, como artigos de Simone Crapuchet que tratam da relação pesquisa e Serviço Social, tais como: “ As profissões Sociais – novas perspectivas” ( 1972, ano VIII, n. 14); “ A pesquisa no Serviço Social e na ação social” (1976, ano XII, n. 23). Identificamos, também, a publicação de material referente ao I e II Seminários de Mensuração de Dados Sociais ( Temas Sociais,1978, n. 131, ano XI), realizado em 1977- Rio de Janeiro. As publicações retratam uma perspectiva clássica de pesquisa, centrada no tratamento estatístico dos dados e apontam para a necessidade da profissão investir na pós – graduação em Ciências Sociais e Humanas. Ainda, observamos , na década de 80, o investimento do CELATS ( Centro Latinoamericano de Trabajo Social) no “ II Curso de Capacitación a Distancia : “La investigacion social” , cujo material foi organizado por Carlos Urrutia Boloña. Neste documento Boloña discute a pesquisa em sua relação com a prática profissional, reduzindo a compreensão da pesquisa a instrumentação da prática profissional. Esta perspectiva desqualifica a relação dinâmica entre a pesquisa e a pratica profissional, capaz de gerar um processo de produção de conhecimento. Reflexões que aprofundam esta discussão encontramos em BAPTISTA (2001, p. 31 – 48) 14Parece haver consenso entre os estudiosos da matéria ao reconhecerem que a preocupação com a teorização no Serviço Social emerge explicitamente na segunda metade dos anos 60. “Data de então – (...) um esforço, cujos resultados ainda reclamam uma avaliação cuidadosa, para pensar o Serviço Social (como conjunto de práticas profissionais e como articulação de saberes) recorrendo a parâmetros, balizas e critérios gestados no seu exterior, seja no âmbito das chamadas Ciências Sociais, seja no da tradição marxista.” (NETTO, 1989, p.146)

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engendra, através do movimento de reconceituação, um processo de

renovação do Serviço Social15 .

NETTO (1998, p.131) considera renovação como ... o conjunto de características novas que, no marco das constrições da autocracia burguesa, o Serviço Social articulou, à base do rearranjo de suas tradições e de assunção do contributo de tendência do pensamento social contemporâneo, procurando investir-se como instituição de natureza profissional dotada de legitimação prática, através de respostas a demandas sociais e de sua sistematização, e de validação teórica, mediante a remissão às teorias e disciplinas sociais.

NETTO (1998, p.154 - 159) aponta três direções16 principais para o

processo de renovação do Serviço Social: a perspectiva modernizadora, que se

desenvolve no período pós – 64 até meados da década de setenta, no qual se

dá a modernização das concepções profissionais, buscando adequar a

profissão às estratégias de desenvolvimento capitalista; reatualização do

conservadorismo, que se dá em meados da década de setenta, como uma

vertente que busca romper com a tradição positivista presente na profissão e

rejeita a perspectiva marxiana, voltando-se para a inspiração fenomenológica;

intenção de ruptura com o Serviço Social tradicional que atravessa os fins dos

anos 70 e início dos anos 80, que efetivamente contribui para a renovação

cultural da profissão.

É a partir da década de 8017 que se institui de modo mais sistemático o

debate acadêmico do Serviço Social, marcando um processo de ruptura com o

15 Contribuições essenciais sobre o Movimento de Reconceituação em Serviço Social podemos encontrar em IAMAMOTO, M. V. Renovação e Conservadorismo no Serviço Social: ensaios críticos (1992) e em MARTINELLI, M. L. Serviço Social: identidade e alienação (1993). 16 NETTO em seu livro Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós- 64 (1998), analisa cada uma destas direções apontando contradições e repercussões no interior da profissão. 17 Não ignoramos que a década de 80 apresenta traços fundamentais ao cenário brasileiro em que se movimenta o Serviço Social. Destes, podemos destacar: - de um lado caracteriza-se pela chamada “crise brasileira dos anos 80” , que é expressão de uma crise geral do capitalismo internacional, devido a forma como o Brasil se insere na ordem capitalista mundial e que no Brasil ganha particularidade. (MOTA, 1995) MOTA (1995) e RAICHELIS(1998) apresentam como aspectos centrais deste período: crise fiscal do Estado, baixas taxas de crescimento do PIB, compressão dos salários e conseqüente aumento da concentração de

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conservadorismo presente na constituição da profissão, sendo que esta

intenção de ruptura apresenta alguns significados históricos.

Conforme NETTO (1996, p. 111) A década de oitenta consolidou, no plano ídeo – político , a ruptura com o histórico conservadorismo do Serviço Social. Entendamo-nos: essa ruptura não significa que o conservadorismo ( e, com ele, o reacionarismo) foi superado no interior da categoria profissional; significa, apenas, que – graças a esforços que vinham, pelo menos, de finais dos anos setenta, e no rebatimento do movimento da sociedade brasileira – posicionamentos ideológicos e políticos de natureza crítica e/ou contestadora em face da ordem burguesa conquistaram legitimidade para se expressarem abertamente. É correto afirmar-se que, ao final dos anos oitenta, a categoria profissional refletia o largo espectro das tendências ídeo – políticas que tencionam e animam a vida social brasileira. Numa palavra, democratizou-se a relação no interior da categoria e legitimou-se o direito à diferença ídeo – política.

Durante a década de 80, este processo de rompimento com o

conservadorismo gerou no interior da profissão uma cultura que reconhece a

pluralidade teórico – metodológica, no entanto fortalece a orientação marxista

como direção hegemônica para o projeto ético – político profissional. Esta

orientação coloca como valor central os princípios de democracia, liberdade,

justiça social e dignidade humana, definidos e explicitados no Código de

Ética de 1993, marco significativo para a profissão nos anos 9018.

riqueza, agravamento da questão social, deterioração das condições de vida e de trabalho da maioria da população brasileira; - de outro lado, a década de 80 traz à tona um movimento sócio – político de redefinição das relações entre Estado/ sociedade civil, através da organização dos movimentos sociais em diferentes setores que passam a dar visibilidade às demandas populares, dos sindicatos que fortalecem suas lutas pelos direitos dos trabalhadores e no conjunto destas mobilizações desencadeamento de um processo de reconstrução das instituições democráticas, culminando com a elaboração da Constituição Federal de 1988, marco legal da democracia e conquista dos direitos fundamentais do cidadão brasileiro. 18 O contexto sócio – econômico da década de 90 é marcada pela vigência do neoliberalismo no Brasil. Adotam-se medidas voltadas para “...uma política industrial centrada na abertura comercial, e pelo novo impulso no processo de privatização, desregulamentação e flexibilização das relações trabalhistas, austeridade no gasto público, reestruturação das políticas sociais...” (ALVES, 1996, p. 131) Tais medidas caracterizadas como “ajuste neoliberal” fazem parte de uma estratégia para saída da crise do Estado e do capitalismo agravada nos anos 80. Avançam, também, neste contexto, as relações de parceria entre Estado e sociedade civil como mecanismo de enfrentamento da questão social e de viabilização das políticas públicas.

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As análises de NETTO (1998, p. 135 - 136) sintetizam quatro aspectos

que indicam as decorrências deste processo de renovação para o Serviço

Social, os quais são:

a) pluralismo teórico, ideológico e político no contexto da profissão;

b) rompimento com concepção homogênea da profissão e utilização de

diferentes recursos teórico - metodológicos;

c) articulação com as discussões presentes nas Ciências Sociais,

colocando a profissão como interlocutora sintonizada com as polêmicas

teórico - metodológicas e rompendo com a condição de subalternidade

intelectual, limitada a execução de práticas;

d) constituição de vanguarda intelectual, dedicadas à pesquisa e à vida

acadêmica.

Isto posto, as décadas de 80 e 90 marcam historicamente avanços e

conquistas para o Serviço Social nos seus diferentes campos de ação, bem

como em seu processo de constituir - se e de consolidar - se como espaço de

produção de conhecimento em seu próprio âmbito e frente as demais áreas de

conhecimento.

É neste contexto que a própria profissão se define como objeto de

atenção, buscando compreender a sua natureza, seus procedimentos e sua

relação com outras áreas de conhecimento.

A década de 80 marca o reencontro do Serviço Social consigo mesmo no

que se refere a busca de estabelecimento de novas bases para compreensão do

seu passado histórico, das particularidades de sua prática na sociedade

marcada por relações de classe, da sua relação com o Estado e com as forças

da sociedade civil e de sua posição quanto as demandas sociais, cada vez mais

complexas, situando - se no âmbito da divisão sócio - técnica do trabalho.

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“É interessante observar que nesse trajeto de auto – reconhecimento as

interpretações são múltiplas. Instaura-se um debate, a partir da literatura, entre

distintas visões do Serviço Social, inclusive no interior do campo progressista.

...”( IAMAMOTO,1993, p.106)

Esta autora afirma que houve avanços referentes à crítica teórico –

metodológica no interior do Serviço Social, tanto no que se refere à

perspectiva marxista, quanto à tradição conservadora de cunho positivista, ou

seja: ... Avançamos da mera denúncia do tradicionalismo profissional ao enfrentamento efetivo de seus dilemas, tanto na construção da crítica teórica, como na elucidação de seus limites sócio – culturais e políticos na condução da prática profissional; avançamos no esforço de ultrapassar os “metodologismos” na direção de uma maior proximidade do Serviço Social com as grandes matrizes do pensamento social contemporâneo, delas extraindo os fundamentos teórico – metodológicos para a explicação da profissão e para iluminar suas possibilidades de intervenção. Avançamos do ecletismo no trato das teorias para a busca de uma convivência plural de idéias no universo profissional, o que não deve eliminar a luta pela hegemonia travada entre os representantes de distintas vertentes analíticas e suas matrizes na arena acadêmico - profissional. (IAMAMOTO, 1993, p. 107) Esta década marca o debate profissional em relação a dois grandes eixos

temáticos:

1- crítica teórico – metodológica ao conservadorismo e à vulgarização

do marxismo, colocando a polêmica em relação à história, teoria e

método;

2- resgate da historicidade de sua trajetória histórica brasileira para

explicitação e compreensão de suas particularidades históricas e

inserção na divisão sócio – técnica do trabalho. (IAMAMOTO, 1993,

p. 106)

NETTO (1996, p.109) afirma que tais avanços “...remetem, direta mas

não exclusivamente, à pesquisa, à produção de conhecimentos e às

alternativas de sua instrumentalização – e, no caso do Serviço Social, isso

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quer dizer conhecimento sobre a realidade social.” Especificamente,

conhecimento sobre a dinâmica das transformações societárias que

pressionam a profissão para reconstrução de alternativas teórico –

metodológicas que sustentam a sua intervenção na realidade.

Na década de 80, o Serviço Social enfrenta questões sobre as políticas

sociais, em especial quanto a consolidação de políticas públicas na área da

seguridade social (abarcando o tripé saúde , assistência e previdência social),

família, criança e adolescente, terceira idade e trabalho. Estas, entre outras

instâncias das políticas públicas, passam a ser pauta do debate da profissão,

gerando produções acadêmicas que dão visibilidade a estas temáticas, bem

como à ação profissional desencadeada nestas áreas. Isto se dá numa

conjuntura da construção da Constituição Federal de 1988 e, desde então, de

permanente luta pela consolidação dos direitos sociais já assegurados, de

forma articulada às organizações da sociedade civil.

Tais preocupações contribuiram para que o Serviço Social enfrentasse e

continue enfrentando junto com a sociedade civil organizada os impasses,

desafios e dilemas que a democracia, a cidadania e os direitos sociais colocam

à prática social e neste âmbito, em especial, à pratica do profissional do

Serviço Social.

Na década de oitenta a preocupação com as políticas sociais voltava-se

especialmente para o Estado “....no bojo da expansão monopolista, mediada

pelas políticas sociais públicas, como estratégias do bloco do poder no

enfrentamento da ‘questão social’. A ótica é a de que através dessas políticas

viabilizam-se direitos sociais implicados no estatuto de cidadania.....”

(IAMAMOTO,1993, p.110)

Já de acordo com ABREU E SIMIONATO (1997, p.134)

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Este eixo temático é revitalizado nos anos 90, com o redimensionamento das questões referentes aos direitos sociais, cidadania, democratização e universalização das políticas públicas. Essas questões estão hoje profundamente tencionadas pelas estratégias de controle social da nova ordem burguesa. Elas ganham relevância no vasto campo político – ideológico da formulação e consolidação de uma nova cultura política posta pelo capital nos marcos das estratégias da “acumulação flexível” em que as relações entre Estado e sociedade civil constituem locus privilegiado. Ainda estas autoras colocam que a maior parte dos temas de pesquisa dos

anos 80 e que prosseguem abordadas nos anos 90 referem-se às políticas

públicas na sua interface com o Estado. Exemplo disto é a temática

Seguridade Social, a partir de seu marco histórico que é a Constituição Federal

de 1988. Mais recentemente vem avançando as investigações sobre a

sociedade civil, os processos de gestão e controle das políticas públicas e o

papel dos Conselhos de Direitos. Também ganha ênfase o campo de

preocupação relativo aos usuários do Serviço Social, muito embora na sua

relação com as políticas públicas.

Marcos históricos recentes e relevantes são os 10 anos da Lei Orgânica

de Assistência Social (LOAS - Lei 8742/93), comemorado em 2003 e os 10

anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – LEI 8.069/90), em

2000. Eventos que retratam conquistas no campo dos direitos sociais,

principalmente em relação à proteção social destinadas aos segmentos vítimas

do processo de exclusão social, como famílias, crianças, adolescentes, idosos e

portadores de necessidades especiais.

A Constituição Federal de 1988 introduziu no Brasil o conceito de

Seguridade Social19 e neste contexto a Assistência Social passa a

ser reconhecida como política pública no mesmo patamar da saúde e

previdência social. 19 A Constituição Federal de 1988 em seu Capítulo II, art. 194 define que Seguridade Social “compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”

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Em 1993 a regulamentação da LOAS (Lei Orgânica de

Assistência Social) garante maioridade jurídica à assistência social, trazendo-a

para o campo do direito com responsabilização do Estado e expressa a recusa

da tradição clientelista, assistencialista e tutelar presente, ainda, em suas ações.

A Assistência Social adquire estatuto de política pública e enfrenta alguns

desafios: - superar o caldo cultural marcado por estas características que

muitas vezes norteiam as ações do Estado e das entidades sem fins lucrativos,

atuantes nesta esfera da política pública; avançar em relação ao processo de

avaliação da gestão da política em suas diferentes instâncias; consolidar um

processo de controle social, com efetiva participação da sociedade civil e

assegurar financiamento adequado à complexidade das ações de

enfrentamento à pobreza, de garantia dos mínimos sociais, de

desenvolvimento de ações de prevenção, proteção e inclusão social e repensar

as ações destinadas à família de baixa renda, preconizando ações de caráter

intersetorial e de rompimento com a segmentação da família em suas

unidades. A família brasileira, devido as suas transformações em termos de

composição e significados, especialmente a família de baixa renda, reclama

por respostas coerentes às suas demandas. O lugar da família no âmbito das

políticas públicas é uma questão que merece aprofundamento e está em debate

no contexto da profissão.

Merece destaque o esforço de construção do Sistema Único de

Assistência Social (SUAS), viabilizado pela Secretaria Nacional de

Assistência Social e pelo Conselho Nacional de Assistência Social em 2004.

O SUAS responde às deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência

Social realizada em 2003 e materializa as diretrizes da LOAS, no entanto,

conforme BOSCHETTI (2004, p. 117) seu resultado “... como estratégia de

resgate da Loas e de fortalecimento do sistema descentralizado e participativo,

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ainda está por ser avaliado....” o que certamente exigirá processo de

acompanhamento e investigação por parte dos núcleos de estudos, dos

profissionais e dos pesquisadores da área.20

Em 10 anos muitas pesquisas21 foram desenvolvidas sobre a Assistência

Social, contribuindo para avanços de ordem conceitual e construindo

referências importantes sobre as temáticas que constituem a natureza desta

política pública. Neste campo, imprescindível tem sido a contribuição da PUC

de São Paulo, com a interlocução de seus professores, na construção de

espaços de discussão sobre a Assistência Social através de núcleos de

pesquisa e na fomentação da produção acadêmica através das teses de

doutorado, dissertações de mestrado, artigos científicos e livros de referência

nacional.

Em especial, precisamos destacar o Núcleo de Seguridade e Assistência

Social (NEPSAS)22 , núcleo de estudos e pesquisas coordenado pela Prof.

20 Detalhamentos sobre o SUAS ver na Revista Serviço Social e Sociedade n. 78 de julho de 2004 e na Versão Oficial da Política Nacional de Assistência Social - 2004, publicadas pela Ed. Cortez. 21 Trabalhos de pesquisa que desenvolvem discussões amplas e de fundo sobre a concepção e gestão da política pública de Assistência Social, bem como análises das expressões particulares desta política em realidades estaduais e municipais. No Paraná lembramos a pesquisa intitulada “Descentralização político-jurídico-administrativa na implementação da LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social: reconstrução de conceitos ou manutenção de saberes e práticas? Sob a coordenação da Prof. Dra. Odária Battini, criada em 1994 como estratégia adotada no processo de implementação da LOAS no Paraná (1996/1998). Em 1998 foi criado o Centro Interinstitucional de Pesquisa e Consultoria em Políticas Públicas. Em 2000 a pesquisa vinculou-se ao Curso de Serviço Social da PUC/Pr, ao Diretório Nacional de Grupos de Pesquisa do CNPQ e à Fundação Araucária. Atualmente o grupo de pesquisa tem contribuído com o processo de implantação do Sistema de Informação da Política de Assistência Social e na gestão do SUAS e estebelece articulações com UFPr, CELEPAR, Secretaria do Estado do Emprego e Promoção Social, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. (Informações fornecidas por Jucimeri Isolda Silveira – Presidente do CRESS/11ª Região em fevereiro de 2005) Destacamos, também, a contribuição de Selma Maria Schons com sua obra: “ Assistência Social entre a ordem e a ‘des-ordem....’ ” de1999, Cortez Editora. Neste contexto desenvolvemos Dissertação de Mestrado, junto a PUC/SP, sobre “O processo de configuração da Assistência Social no município de Ponta Grossa – Pr.” (1997) 22 NEPSAS apresenta as seguintes características: “a) como núcleo de pesquisa, reúne docentes e discentes, mestrandos e doutorandos, e articula-se com diferentes centros de investigação no campo da Seguridade e Assistência Social; b) como consultoria e intervenção compõe – se de uma equipe de profissionais, de alunos de Pós – Graduação e pesquisadores, vinculando-se (...) ao Instituto de Estudos Especiais (IEE), Instituto Pólis e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE.” (PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS GRADUADOS EM SERVIÇO SOCIAL, 2002, p. 22)

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Aldaíza Sposati junto ao Programa de Estudos pós – Graduados da PUC/São

Paulo que tem trabalhado os elementos necessários à efetivação dos preceitos

da LOAS, dentre os quais podemos destacar: - o reordenamento institucional e a efetivação em municípios e estados dos instrumentos democráticos de gestão dessa política social como Conselhos, Fundos, Planos etc. - a consolidação do conteúdo da assistência social como política pública de seguridade e, portanto, asseguradora de direito. - a construção de informações sobre esse campo de política social, de modo a permitir o desenvolvimento de serviços, programas e projetos. ( SPOSATI, 1997, s/p) Podemos destacar que, como referência aos profissionais e pesquisadores

que atuam no âmbito da Assistência Social, temos do NEPSAS três

documentos essenciais: Assistência Social na Trajetória das Políticas Sociais

Brasileiras de 1985, Carta – Tema de 1990 e o Mapa da Exclusão/Inclusão

Social da Cidade de São Paulo de 2000, entre outros estudos que tematizaram

questões centrais desta política pública.

A política de Assistência Social ganha um espaço relevante de reflexão e

pesquisa na profissão devido ser campo privilegiado de intervenção

profissional e ter vinculação histórica com a natureza e constituição da

profissão.

Igualmente ganham maior visibilidade as diversas formas de expressão

da questão social, havendo um grande esforço teórico - crítico no sentido de

apreendê-la no movimento contraditório da sociedade, possibilitando maior

consistência à prática profissional no enfrentamento destas expressões. “ A

perspectiva é, então, aprofundar a compreensão da questão social como

elemento que dá concretude à profissão, ou seja, que é ‘sua base de fundação

histórico – social na realidade’, e que nesta qualidade, portanto, deve

constituir o eixo ordenador do currículo. ...” ( CARDOSO et al., 1997, p. 20-

21)

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...a questão social se apresenta como um eixo central capaz de articular a gênese das seqüelas inerentes ao modo de produzir-se e reproduzir-se do capitalismo contemporâneo, o que envolve as mudanças no mundo do trabalho; suas manifestações e expressões concretas na realidade social, particularmente a exclusão social; as estratégias de seu enfrentamento articuladas pelas classes sociais e o papel do Estado neste processo; e, por fim, os desafios teóricos, políticos e técnico – operativos postos ao Serviço Social para seu desvelamento e processo de trabalho. (CARDOSO et al., 1997, p.26) No movimento das transformações societárias e de forma inerente, no

movimento de repensar a profissão há um processo de construção e afirmação

de um projeto ético – político comprometido com a cidadania e renovador da

direção social da formação profissional. A esse respeito, evidencia-se no debate no interior da profissão e no processo de revisão curricular, coordenado pela ABESS, uma diversidade de posições quanto aos vínculos do projeto profissional com os projetos societários, mas reafirma-se a dimensão política da prática profissional, em consonância com as diretrizes curriculares da década de 80 e o Código de Ética de 1986, considerando referência do processo de renovação profissional e cuja direção social defendida vincula-se aos interesses das classes subalternas. Essa direção também é reafirmada pelo Código de Ética Profissional de 1993, no qual o tratamento da dimensão ético – política da profissão se expressa pelo compromisso com valores e princípios colocados no horizonte de superação da ordem burguesa. ( CARDOSO, 1998, p. 29) Não menos relevante, este movimento repercute na elaboração de uma

proposta curricular em que a formação profissional direciona - se para o

desenvolvimento de competência teórico – metodológica de natureza

pluralista orientada pela tradição marxista. Nesta perspectiva a formação

profissional funda-se na interlocução com o conjunto de conhecimentos

científicos acumulados pelas diversas áreas das ciências humanas e sociais,

especialmente dialogando com as vertentes clássicas.

A discussão da Reforma Curricular preocupa-se em aprofundar a

reflexão sobre a dimensão técnica - operativa do Serviço Social de forma

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coerente com a dinâmica societária e capaz de apreender esta dinâmica em sua

totalidade e processualidade histórica.

Neste contexto a pesquisa surge como uma preocupação formativa.

Trata-se de um desafio a ser enfrentado e proposto pelas novas diretrizes

curriculares, ou seja “...garantir uma formação profissional à base da pesquisa

e sob a ótica pluralista, considerando que a dimensão investigativa se constitui

um princípio e condição de formação e das práticas profissionais e que a

postura pluralista supõe relações democráticas construídas na interlocução

crítica entre portadores de perspectivas político – ideológicas diferenciadas.”

(CARDOSO, 2000, p. 16)

Em sua trajetória histórica, a profissão, ao construir e reconstruir um

legado teórico23, estabelece diálogo crítico com outras áreas do conhecimento,

sendo importante interlocutora no campo das reflexões sobre a questão social

e seu enfrentamento através da política pública.

Creio que um ponto é pacifico: a década de oitenta assinalou a maioridade do Serviço Social no Brasil no domínio da elaboração teórica. Nesse decênio, desenvolveu-se, no interior da categoria, uma “divisão do trabalho” (uma especialização) que é própria das profissões amadurecidas: a criação de um segmento diretamente vinculado à pesquisa e à produção de conhecimentos. Constitui-se uma intelectualidade no Serviço Social no Brasil, que passou a ser o vetor elementar a subsidiar o “mercado de bens simbólicos” da profissão. Foi característica desse mercado a circulação de produções brasileiras – não é de menor importância, no período, a diminuta difusão de literatura profissional estrangeira. (NETTO, 1996, p.112)

Importante lembrar que embora os avanços tenham sido muitos até os

anos noventa, e aqui pontuamos uns poucos, muito há que se trilhar em termos

de consolidação e socialização de tais avanços. “...Além disso, a categoria

profissional não dispõe de suficientes canais e circuitos que operem uma

23José Paulo Netto no Prefácio do livro “A instrumentalidade do Serviço Social” de Yolanda Guerra (1995) faz referência ao “acervo teórico no campo do Serviço Social”, construído por importante grupo de intelectuais e que vem contribuindo para o reconhecimento da profissão.

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efetiva socialização da tais avanços – o que tem contribuído para alargar,

numa escala preocupante, a distância entre as vanguardas acadêmicas e a

massa de profissionais ‘de campo.’ ” (NETTO, 1996, p.109)

A pesquisa tem sido privilegiada, em alguns contextos, no âmbito da

profissão, estimulando a atitude investigativa na postura e exercício

profissional24. Porém, ao mesmo tempo em que muito já se fez e se

conquistou, nas duas últimas décadas do século XX (80/90) a pesquisa

continua sendo uma exigência que as vicissitudes do mundo contemporâneo

colocam à profissão, o que carece de maiores investimentos e uma postura do

profissional de permanente crítica e indignação com as manifestações sociais

do modelo de desenvolvimento econômico que sujeita a maioria da população

ao processo de exclusão social.

Conforme já verificamos, não podemos negar que a tradição da pesquisa

está restrita à Universidade, mais especificamente circunscrita ao nível da pós

– graduação. Existe uma tendência em se aceitar que produzir conhecimento é

competência apenas de docentes, de especialistas e que deve ocorrer no espaço

acadêmico. KAMEYAMA (1998, p. 34), lembra isto:

De fato, os cursos de pós – graduação constituem-se em espaços privilegiados para a produção de conhecimentos, mas não são suficientes, na medida em que grande parte dos projetos de pesquisa é realizada individualmente, e também na medida em que o ensino na pós – graduação (nível mestrado) é concebido antes de tudo para formar recursos humanos para a docência (ensino) e, subsidiariamente, para a

24 Destacamos as ações, discussões e produções dos profissionais do campo sociojurídico, que nos últimos anos vêm ganhando expressão ao promover o debate sobre as particularidades da prática profissional neste campo. Como exemplo temos: - a sessão temática “ Serviço Social e Sistema Sociojurídico” , inaugurada no X CBAS – 2001 e mantido no XI CBAS - 2004; a publicação da Revista Serviço Social e Sociedade – 67 (2001) sobre o Tema Sociojurídico; a realização do Encontro Nacional Sóciojurídico: o Serviço Social e a garantia de direitos nos sistemas de justiça e penitenciário, realizado em setembro de 2004 – Curitiba/PR; a apresentação de oficina temática denominada “Serviço Social sociojurídico em novembro de 2003 no II Congresso Parananense de Assistentes Sociais; as publicações “Perda do Pátrio Poder: aproximações a um estudo socioeconômico, coordenado por Eunice T. Fávero e publicado pela Veras Editora em 2000 , “ O estudo social em perícias, laudos e pareceres técnicos: contribuição ao debate no Judiciário, penitenciário e na previdência social” organizado pelo CFESS e publicado em conjunto com a Cortez Editora em 2003 e “O Serviço Social sociojurídico”, publicação do CRESS – 7 Região/Rio de Janeiro na Revista Em Foco, em maio de 2004.

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pesquisa. No entanto, as atividades de pós – graduação estão intrinsecamente ligadas à produção e reprodução da comunidade cientifica e técnica, que têm nas universidades o seu espaço privilegiado, uma vez que no Brasil as instituições de pesquisa são ainda reduzidas.

Práticas e representações da pesquisa restrita ao meio acadêmico

favorecem a falta de iniciativas e investimentos profissionais na sua

preparação como pesquisador. Reconhecemos que a própria inserção da

profissão na divisão sócio – técnica do trabalho impõe à profissão limites

quanto aos investimentos institucionais para fomento à pesquisa e quanto ao

reconhecimento da sua produção, bem como quanto a incorporação da prática

investigativa pelos profissionais. Romper com a dicotomia prática

profissional/pesquisa científica é o desafio que se coloca à profissão. Aqui é

importante afirmar que o rompimento se fará através de um processo mediado

pelo movimento da própria realidade.

A relação do Serviço Social com a pesquisa surge em função de um

processo histórico de amadurecimento intelectual e de demandas societárias, o

qual vai revelando uma profissão capaz de gestar conhecimentos que lhe

acrescentam subsídios teórico - metodológicos coerentes com sua natureza e

com as exigências societárias, mas é no contexto acadêmico que a pesquisa se

revela como potencialidade para o Serviço Social.

Em poucas palavras, é relevante situarmos, que contexto é este, ou seja o

contexto universitário, embora seja espaço privilegiado de se fazer pesquisa,

sofre interferências na sua relação com a sociedade.

CHAUÍ (2001,p.34-41) contextualiza a situação da universidade

brasileira no âmbito do neoliberalismo25 apontando algumas temáticas

25“A economia capitalista mundial, conhecida como neoliberalismo, constitui-se como aquilo que alguns chamam ‘acumulação flexível do capital’, isto é, o fim do modelo industrial fordista e do modelo político – econômico keynesiano. Ao modelo fordista, a economia responde com a terceirização, a desregulação, o predomínio de capital financeiro, a dispersão e fragmentação da produção e a centralização/velocidade da

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presentes, hoje, quando se discute a relação universidade/sociedade, pois a seu

ver “a universidade é uma instituição social. Isso significa que ela realiza e

exprime de modo determinado a sociedade de que é e faz parte. Não é uma

realidade separada e sim uma expressão historicamente determinada de uma

sociedade determinada.” Assim argumenta que se sedimenta uma tendência,

cada vez maior, em se aceitar a separação entre ensino e pesquisa, entre

graduação e pós – graduação, em lugar de pensar e trabalhar estes elementos de

forma articulada e integralmente. Há, também aceitação da privatização do

ensino e da pesquisa, desobrigando o Estado para com a estrutura universitária

necessária à formação profissional de qualidade e crítica, bem como para com o

financiamento de pesquisas comprometidas com os interesses coletivos e à

serviço da população. O que se vê é o crescente financiamento de pesquisas

relevantes aos interesses de mercado. As interferências do mercado e a

fragilização do Estado no cumprimento de seu papel retiram da instituições de

ensino superior, principalmente das públicas, a autonomia para definir suas

prioridades, projeto pedagógico e direção social de sua produção acadêmica.

ABREU e SIMIONATTO (1997) apontam uma série de limites à

pesquisa em Serviço Social, devido as condições institucionais da pesquisa,

que no contexto do Serviço Social ganham relevância devido a falta de

tradição de pesquisa nesta área, como baixos investimentos financeiros e

poucos pesquisadores em condições de atender aos requisitos das agências de

fomento. ...Apesar do reconhecimento institucional da produção intelectual no âmbito dessa profissão, pelas agências oficiais de fomento à pesquisa (CNPq, CAPES e outras), e da sua classificação como área de conhecimento, credenciada a receber recursos, ainda são limitadas as condições de acesso aos mesmos. São poucos, (...), os pesquisadores em Serviço Social que atendem às exigências das referidas agências, sobretudo no que se refere à titulação – doutor e livre – docente – e à inserção em

informação e a velocidade das mudanças tecnológicas. Ao modelo keynesiano do Estado de Bem – Estar, a política neoliberal responde com a idéia de Estado mínimo, a desregulação do mercado, a competitividade e a privatização da esfera pública.” (CHAUÍ, 2001, p. 129 – 130)

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programas de pós - graduação já consolidados. ... (ABREU e SIMIONATTO, 1997, p. 133)

É neste contexto de fragilização da pesquisa e da universidade

comprometida socialmente que a pesquisa se coloca como base do processo de

formação profissional, como elemento constituinte da prática profissional e

capaz de produzir estudos rigorosos com o objetivo de responder criticamente

aos impasses derivados da conjuntura social, econômica e política assentada

na perspectiva neoliberal.

SETUBAL (1995, p. 17) alerta “...que é nos momentos de maior tensão

social que as questões sociais se tornam mais visíveis, e que ocorre o maior

chamamento do Serviço Social para a pesquisa. ...” Podemos acrescentar que

é nos momentos de tensão que as contradições sociais e as próprias à natureza

da profissão se acirram, alimentando a pesquisa na busca de apreender os

processos de constituição da natureza da profissão, apontando possibilidades

de superação aos seus limites e impasses.

Atenta aos desafios que no contexto contemporâneo se colocam à

profissão, a ABEPSS realizou entre 30 de novembro e 03 de dezembro de

2004, na Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre/RS, o IX Encontro

Nacional de Pesquisadores em Serviço Social (ENPESS). Este evento

apresentou como temática central “Os desafios da pesquisa e produção do

conhecimento em Serviço Social”, buscando “...subsidiar a construção de

alternativas críticas para o enfrentamento da questão social, que fujam à

mistificação neoliberal e que formulem propostas profissionais que fortaleçam

a ruptura com o conservadorismo e afirmem o compromisso com o trabalho,

os direitos e a democracia. ...” (ABEPSS, Apresentação, IX ENPESS, 2004)

Concordamos, então, com IAMAMOTO (1998), MARTINELLI (1994)

SETUBAL (1995) e com as orientações da ABEPSS, presentes nos Cadernos

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ABESS, Revista Temporalis26 e nas discussões travadas durante o IX

ENPESS, que reivindicam que a pesquisa se afirme como constituinte do

exercício profissional para conhecimento da realidade e construção de

propostas que dêem materialidade aos princípios ético – políticos que

orientam o projeto profissional do Serviço Social.

Estamos propondo discutir esta problemática e portanto reafirmamos que

temos como pressuposto orientador desta tese que a pesquisa é constitutiva e

constituinte da prática profissional do Serviço Social , sendo determinada

pela sua natureza interventiva e pela sua inserção histórica na divisão sócio

– técnica do trabalho. É constitutiva e constituinte porque faz parte da

natureza da profissão e aparece e se desenvolve socialmente ao desvendar a

complexidade do real e nele buscar as possibilidades de intervenção.

Articulada a este pressuposto e na sua interface, esta tese se preocupa

com a centralidade que as pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social

garantem aos sujeitos que delas são participantes, bem como com o alcance

social destas pesquisas, considerando a sua repercussão nas organizações

sociais em que trabalha o Assistente Social e nas condições de vida dos

sujeitos que requisitam sua prática profissional.

Vinculada à prática profissional e com o desafio de fundamentá-la,

reanimá-la e renová-la, a pesquisa em Serviço Social trabalha com objetos

plenos de significados atribuídos pelos diversos sujeitos que se constituem

participantes da prática profissional do Assistente Social. Os objetos de

atenção profissional, no âmbito da pesquisa e no âmbito da intervenção trazem

à tona a experiência e o conhecimento destes sujeitos, os quais precisam ser

26 IAMAMOTO, M. O Serviço Social na Contemporaneidade (1998); MARTINELLI, M. L. O ensino teórico – prático do Serviço Social: demandas e alternativas (1994);SETUBAL, Aglair A. Pesquisa em Serviço Social: utopia e realidade (1995); Cadernos ABESS 3, 4,5, 6, 7 e 8 (1989 – 1998); Revista Temporalis 2 e 8 (2000 - 2004).

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compartilhados, compreendidos e traduzidos à luz de um diálogo crítico com

o corpo de conhecimentos já acumulados pelo Serviço Social. Um dos

aspectos que configura tanto a pesquisa como a intervenção em Serviço

Social, com certeza, é a preocupação com o sujeito.

A preocupação com a centralidade que o sujeito ocupa nas pesquisas do

Serviço Social não é ocasional, mas revela uma profissão que tem suas ações e

preocupações pautadas nas demandas dos usuários dos serviços sociais, que se

expressam através das histórias de vida que trazem às organizações sociais,

nas relações que movimentam no seio da família, do trabalho e da sociedade,

nas raízes e expressões culturais que demonstram, nas carências sócio –

econômicas e políticas que exigem posicionamento do Assistente Social.

A pesquisa se destina não só a compreender as questões estruturais, mas

numa perspectiva de totalidade o processo de reprodução material e espiritual

da existência do ser social. Isto quer dizer que além das determinações

estruturais é preciso resgatar as formas como o sujeito, a partir de suas

relações, constrói referências próprias para posicionar-se e compreender o

mundo em que se insere. É preciso acompanhar, registrar e refletir

sistematicamente sobre as alternativas construídas pelos próprios sujeitos para

enfrentar e superar os entraves determinados pela estrutura sócio – econômica

ao longo de sua vida cotidiana e experiência social.

FREIRE (1985, p. 40), a exemplo de suas contribuições às práticas

educativas, nos lembra que

Um dos inúmeros aspectos positivos de um trabalho como este é, sem dúvida, fundamentalmente, o reconhecimento do direito que o povo tem de ser sujeito da pesquisa que procura conhecê-lo melhor. E não objeto da pesquisa que os especialistas fazem em torno dele. Nesta segunda hipótese, os especialistas falam sobre ele; quando muito, falam a ele, mas não com ele, pois só o escutam enquanto ele responde às perguntas que lhe fazem.

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A pesquisa para o Serviço Social deve gerar um conhecimento que

reconheça os usuários dos serviços públicos como sujeitos políticos que são,

também capazes de conhecer e intervir em sua própria realidade com

autonomia, desvencilhando-se das estratégias de assistencialismo, clientelismo

e subalternidade, tão presentes nas ações governamentais e políticas públicas.

Além disto a pesquisa deve localizar o sujeito como protagonista de sua

história pessoal e social, resgatando sua condição de sujeito, muitas vezes

subtraída no processo de investigação, que acaba por enfatizar a sua condição

no mesmo patamar do objeto de estudo.

As pesquisas em Serviço Social têm como possibilidade latente a

valorização do povo, da riqueza de suas histórias, de suas experiências

coletivas mobilizadoras de novas formas de sociabilidade. Apreender estes

elementos contribuirá para o desenvolvimento de uma prática capaz de

possibilitar aos usuários e destinatários das políticas públicas e dos serviços

sociais a experiência de “Assumir-se como ser social e histórico...”27, ou seja

assumir-se como “...ser pensante, comunicante, transformador, criador,

realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se

como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. ...”(FREIRE,1996,

p. 41)

IAMAMOTO (1993, p.114)) ao analisar os rumos ético - políticos do

trabalho profissional afirma que

...Os Assistentes Sociais têm uma possibilidade de contato direto extremamente privilegiada, com a vida cotidiana das classes subalternas, na sua diferencialidade. Mas esta possibilidade pouco tem se revertido em provocação para a pesquisa, que atente para as diferenças internas dos vários segmentos das classes trabalhadoras e para a apreensão das formas distintas de subalternidade; formas estas que vão implicar em encaminhamentos também distintos das ações profissionais. Faz-se necessário, no meu entender, estimular as investigações sobre as condições e situação de vida e de trabalho dos múltiplos segmentos sociais com os quais atuamos,

27 FREIRE ( 1996, p.41) afirma que práticas educativas e críticas exigem reconhecimento e assunção da identidade cultural de um povo.

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resgatando suas vivências e práticas, suas representações, enfim, como vivenciam e enfrentam as relações de exploração e dominação, no interior das quais vão se forjando como sujeitos individuais e coletivos. É nesse processo que constroem suas consciências não só como alienação, mas como mediação crítica da história. (grifo nosso)

Como constitutiva e constituinte da prática profissional, a pesquisa se

coloca como uma necessidade imperativa ao Serviço Social à medida em que

o profissional faz a crítica ao real, localiza seu objeto de intervenção, projeta,

desenvolve a sua ação, a avalia e se compromete com o reconhecimento das

potencialidades dos sujeitos individuais ou coletivos que alimentam sua

prática profissional com demandas concretas.

Pelo exposto, a perspectiva que nos orienta remete à articulação

teoria/prática, ou seja a necessidade de ter como referência uma perspectiva

crítica sobre o conhecimento e sua expressão no âmbito da prática social

humana.

Este pressuposto tem fundamentos que remontam a teoria social de Marx,

especialmente à compreensão da praxis como categoria central desta vertente

crítica, que tem no trabalho seu elemento de mediação e objetivação das

finalidades que o homem coloca à sua existência histórica.

MINAYO (1996, p.73) nos lembra que “...A categoria mediadora das

relações sociais é o trabalho, a atividade prática.(...) Por isso a teoria marxista

é a teoria da ação humana que ao mesmo tempo faz história e é determinada

por ela: busca as transformações do sujeito da ação, isto é, as transformações

da sociedade humana. Do ponto de vista do processo de conhecimento, a

atividade humana é seu critério decisivo. ...”

Este trabalho trata do processo de construção do conhecimento como

uma das expressões da atividade humana, através da qual o homem atende

suas necessidades, busca conhecer e intervir no mundo de forma crítica e

criativa, bem como possibilita a construção de novas formas de se estabelecer

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relações e enfrentar as determinações sócio - históricas presentes na

sociedade.

Numa perspectiva crítica, fundado em Karl Marx e Friedrich Engels e

em autores como : Alvaro Vieira Pinto , Adolfo Sánches Vázquez, Karel

Kosik, Henri Lefebvre, Octávio Ianni e Florestan Fernandes28, buscamos

trilhar um caminho de reflexão sobre o conhecimento humano a partir de suas

obras. Estes autores foram definidos por serem importantes representantes do

pensamento marxista, cuja literatura discute produção do conhecimento

como elemento de transformação da realidade social pela mediação do

trabalho humano, chamando o profissional a um maior comprometimento

ético - político com os resultados de sua prática, frente a uma realidade social

complexa e histórica que precisa ser desvelada e transformada.

A praxis é constitutiva do ser social e o ser social configura a praxis

através do trabalho. O trabalho é praxis fundamental, expressão da condição

do ser social que se objetiva, se materializa através do resultado do seu

trabalho, que pode ser material ou espiritual. É no processo de trabalho que o

homem, para atender suas necessidades, transforma a matéria prima, o

contexto em que se insere, suas relações e a si mesmo, gerando um saber que

re – alimenta a práxis humana. Assim o conhecimento é uma das expressões

da praxis humana, é uma das objetivações possíveis do trabalho humano

frente aos desafios colocados pela relação entre o homem, a natureza e a

sociedade.

28 MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã (1989); Marx, Karl. Contribuição à crítica da economia política (1983), O Capital (1988) e Manuscritos econômicos filosóficos e outros textos escolhidos (1991); PINTO, Àlvaro Vieira. Ciência e existência: problemas filosóficos (1979); VÁZQUEZ, Adolfo Sánches. Filosofia da Praxis (1977); KOSIK, Karel. Dialética do Concreto (1976); LEFEBVRE, Henri. Lógica Formal/Lógica Dialética (1991) e Sociologia de Marx (1968); IANNI, Octávio. Dialética e Capitalismo (1985) e Dialética e Ciências Sociais (1984); FERNANDES, Florestan. A Sociologia numa era de revolução social (1976)

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Em uma perspectiva teórico – crítica é fundamental para o profissional de

Serviço Social, que pretenda se colocar como sujeito ativo do processo de

produção de conhecimento, acompanhar o movimento contraditório do real e

dialogar com diferentes possibilidades de intervenção. Com esta referência o

profissional mobiliza-se a gerar práticas efetivamente capazes de contribuir

para a produção do novo, responsabilizando-se para com o alcance social

daquilo que produziu teórica e praticamente.

É neste sentido que consideramos relevantes as contribuições de

LEFEBVRE (1991, p.49 – 50) ao sintetizar as características gerais do

conhecimento, sendo elas:

1- O conhecimento humano é prático: “...Antes de elevar-se ao nível

teórico, todo conhecimento começa pela experiência, pela prática. Tão

somente a prática nos põe em contato com as realidades objetivas...”;

2- O conhecimento humano é social: “...na vida social, descobrimos

outros seres semelhantes a nós, nós agimos sobre eles e com eles.”

Estabelecemos relações cada vez mais ricas e complexas ao

desenvolvermos nossa vida individual e conhecermos aos outros. Além

disso, nestas relações e na prática social desencadeadas a partir delas,

reproduzimos o conhecimento acumulado pela humanidade.

3- O conhecimento humano tem caráter histórico: Todo conhecimento é

adquirido e conquistado. “...O imenso labor do conhecimento humano

consiste num esforço secular para passar da ignorância ao

conhecimento.” Trata-se de um processo incessante e metódico,

mobilizado pelas necessidades concretas humanas.

A produção de conhecimento via pesquisa é condição ontológica da

existência humana, isto é, faz parte da natureza humana produzir

conhecimento para responder às suas necessidades através da pesquisa. A

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pesquisa, portanto se coloca como uma das possibilidades de objetivação das

intenções humanas que se processa através do trabalho. Conforme IANNI

(1984, p. 102) “... O ser humano é trabalho. O que constitui o ser humano é

trabalho. Não fiquem estranhados, porque a idéia de trabalho não significa só

trabalho econômico, o trabalho que se realiza na fábrica, no escritório ou no

campo. Trabalho é atividade material e espiritual.”

A elaboração de fundamentos teórico - críticos serviram de base para

refletir sobre as inquietações centrais desta pesquisa.

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1- A OBJETIVAÇÃO DO TRABALHO HUMANO ATRAVÉS DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

Como ser social e histórico, o homem ao satisfazer suas necessidades,

transforma a natureza, a si mesmo e a sociedade em que vive.

Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião e por tudo o que se queira. Mas eles próprios começam a se distinguir dos animais logo que começam a produzir seus meios de existência, e esse passo à frente é a própria conseqüência de sua organização corporal. Ao produzirem seus meios de existência, os homens produzem imediatamente sua própria vida material. (MARX e ENGELS, 1989, p. 13)

O homem se constitui como ser social porque se manifesta como ser

humano objetivando-se através da praxis produtiva e a objetivação só é

possível na medida em que o homem atende a sua condição de ser gregário,

isto é, na medida em que estabelece relações com os demais homens. Cada

homem na sua singularidade expressa a totalidade das relações sociais do seu

tempo histórico de forma prática e ativa. VÁZQUEZ (1977, p. 139), afirma

que “O homem, para ser homem, não pode ficar em sua subjetividade; tem

que objetivar- se. Mas ele está presente nessa objetivação como ser social.”

Ainda o próprio MARX (1991, p. 169) nos Manuscritos econômicos e

filosóficos anuncia: ...A essência humana da natureza não existe senão para o homem social, pois apenas assim existe para ele como vínculo com o homem, como modo de existência sua para o outro e modo de existência do outro para ele, como elemento vital da efetividade humana; só assim existe como fundamento de seu próprio modo de existência humano. Só então se converte para ele seu modo de existência natural em seu modo de existência humano, e a natureza torna-se para ele o homem. A sociedade é, pois, a plena unidade essencial do homem com a natureza, a verdadeira ressurreição da natureza, o naturalismo acabado do homem e o humanismo acabado da natureza.

O homem é um ser da praxis porque o homem é ser prático, ativo, que

age sobre a natureza em função de atender suas necessidades de sobrevivência

como espécie; porque orienta a satisfação de suas necessidades pela sua

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vontade e intenção de dominar a natureza, desvendar seus mistérios e superar

obstáculos à sua existência; porque é um ser de relações, ou seja o homem

constrói a si mesmo e a sua existência através das relações que estabelece em

condições sócio – históricas determinadas e porque é histórico, ou seja se

movimenta no contexto das transformações societárias, reproduzindo o

conhecimento acumulado pela humanidade.

KOSIK (1976) reafirma que o caráter social do homem implica em que

ele expresse a realidade através de atividades objetivas. Objetivando-se,

produz e reproduz a vida social e a si mesmo como ser histórico – social.

Neste processo o homem produz: os bens materiais através do trabalho, as

relações e as instituições sociais e, sustentados nestes elementos complexos, as

idéias, concepções de mundo, emoções e os sentidos humanos atribuídos ao

mundo objetivo. O homem adquire experiência, produz conhecimento e o

transmite e renova suas ações num mundo que carrega marcas do humano. Ao

intervir no mundo, a natureza, a sociedade, as relações que se processam entre

os homens e o próprio homem se humanizam.

O homem se constrói como ser social e histórico no próprio processo

de produção da existência humana, cuja substância essencial é a prática.

SEVERINO (1995, p.48-49), com propriedade lembra que

...É a ação que delineia, circunscreve e determina a essência dos homens. É na e pela prática que as coisas humanas efetivamente acontecem, que a história se faz. ...A prática tipicamente humana, que delineia seu modo de ser, não é a prática mecânica, transitiva; ao contrário, é uma prática intencionalizada, marcada desde suas origens pela simbolização. É que, instaurando-se como prolongamento das forças energéticas instintivas, a subjetividade se constitui como um novo equipamento, próprio da nova espécie, transformando-se num instrumento de ação dos homens.

Trata-se de um processo histórico em que o homem ao produzir os meios

necessários para satisfazer suas necessidades vai criando novas necessidades,

cada vez mais complexas, as quais exigem o domínio de conhecimentos,

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meios e instrumentos, também, cada vez mais complexos. Podemos dizer que

a construção do conhecimento refere-se ao processo de busca de satisfação de

uma destas necessidades e que é uma das expressões e objetivações mais

complexas da prática social humana. ...O homem é um ser de necessidades, e exatamente por isso produz para satisfazê-las. (...) No homem, essa relação é mediata, já que só satisfaz a necessidade na medida em que, esta já perdeu seu caráter físico, imediato. Para que o homem satisfaça propriamente suas necessidades, ele tem que libertar-se delas superando –as, ou seja, fazendo com que percam seu caráter meramente natural, instintivo, e se tornem especificamente humanas. Isso quer dizer que a necessidade propriamente humana tem que ser inventada ou criada. O homem, portanto, não é apenas um ser de necessidades, mas sim um ser que inventa ou cria suas próprias necessidades. (VÁZQUEZ, 1977, p.141 – 142) As necessidades podem ser materiais ou espirituais. Ao produzir e

reproduzir sua existência o homem cria todo tipo de artefato, instrumentos e

recursos necessários para se relacionar com a natureza, com a sociedade.

Assim desenvolve também as idéias, uma das possíveis mediações que se

constrói entre homem e natureza. Ao produzir idéias o homem também está

respondendo às suas necessidades e reconhecendo a necessidade do outro.

LEFEBVRE (1968, p. 27) afirma que o homem é antes de mais nada um ser

de necessidades. ...E o é muito mais do que os animais, que encontram, quase todos desde o nascimento, em seus corpos ou em derredor, os recursos que lhes permitem sobreviver. Na falta desses recursos, desaparecem espécies e indivíduos. Em todo o humano, em todas suas atividades, a necessidade em geral (genérica) aparece e reaparece como fundamento. Nada existe que não corresponda a uma necessidade ou que não suscite necessidade (...) Se existem necessidades individuais ( que só se satisfazem socialmente), existem também necessidades sociais propriamente ditas e necessidades políticas, necessidades imediatas e necessidades cultivadas, necessidades naturais e artificiais, reais e alienadas. ...

O processo de produção da existência humana envolve uma realidade

sempre em transformação cuja característica central é dada pelas relações

sociais, ou seja, o ser humano não vive isoladamente, vive em relação com

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outros seres humanos, dependendo deles para sobreviver. É neste contexto, o

das relações sociais que o homem se constitui como ser social.

...na produção social da sua existência, os homens estabelecem relações determinadas, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção, que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto destas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e a qual correspondem determinadas formas de consciência social. ... (MARX,1983, p.24)

É também neste contexto que o conhecimento é produzido. O

conhecimento é uma das formas do homem se expressar no decorrer da

história, sendo construído na relação entre os homens e destes com os objetos

da natureza e é uma das formas de apropriação do mundo pelo homem, através

da prática social. KOSIK (1976, p.13) afirma que

...A atitude primordial e imediata do homem, em face da realidade, não é a de um abstrato sujeito cognoscente, de uma mente pensante que examina a realidade especulativamente, porém, a de um ser que age objetiva e praticamente, de um indivíduo histórico que exerce a sua atividade prática no trato com a natureza e com os outros homens, tendo em vista a consecução dos próprios fins e interesses, dentro de um determinado conjunto de relações sociais. ...

Para compreendermos a produção de conhecimento como resultado

crítico, histórico e processual da ação humana e para não restringirmos esta

compreensão à mera reprodução intelectual do real, precisamos recorrer à

categoria praxis, no contexto da perspectiva social de Marx – perspectiva que

possibilita compreender o processo de objetivação da vontade humana frente

aos desafios que a história, as relações sociais, as necessidades humanas e a

natureza colocam ao homem em seu cotidiano e existência.

O termo praxis sintetiza uma trajetória histórico - filosófica de

construção de significado que nos remete à filosofia clássica:

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“...Praxis, em grego antigo, significa ação para levar a cabo algo, mas

uma ação que tem seu fim em si mesma e que não cria ou produz um objeto

alheio ao agente ou a sua atividade. ...”(VAZQUEZ, 1977, p.4)

Na filosofia grega antiga é Aristóteles que busca dar sentido rigoroso à

praxis como atividade do ser humano. Considerava a praxis como uma das

três atividades básicas do homem, além da “theoria e da poiésis”. Estas

atividades se distinguem pela sua finalidade, ou seja, para o conhecimento

teórico a finalidade é a verdade; para o conhecimento da poiésis a finalidade é

a produção de alguma coisa e para o conhecimento prático, a finalidade é a

ação. O conhecimento prático ainda se dividia em econômico, ético e político.

(BOTTOMORE,1993)

No entanto é em Marx que a concepção de praxis torna-se central, não

separando a teoria da ação. Praxis é uma categoria filosófica que na

perspectiva marxista expressa a articulação entre a ação e o conhecimento,

constituindo-se de um processo da transformação de ação, do conhecimento e

do próprio sujeito. A expressão práxis refere-se, em geral, a ação, atividade, e, no sentido que lhe atribui Marx, à atividade livre, universal, criativa e auto – criativa, por meio da qual o homem cria (faz, produz), e transforma (conforma) seu mundo humano e histórico e a si mesmo; atividade específica ao homem, que o torna basicamente diferente de todos os outros seres. Nesse sentido, o homem pode ser considerado como um ser da práxis, entendida a expressão como o conceito central do marxismo, e este como a “filosofia” (ou melhor, o “pensamento”) da “práxis”. ... (BOTTOMORE, 1993, p. 292)

O marxismo é concebido como filosofia da praxis, o que implica afirmar

uma filosofia que não só possibilita interpretar o mundo mas, também, guia da

sua transformação, através de uma ação crítica e criativa.

Um dos marcos histórico da concepção de praxis na perspectiva marxista

são as Teses sobre Feuerbach que revelam as bases do pensamento marxiano,

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ou seja as condições materiais de existência dos indivíduos, definindo assim a

sua concepção materialista de história. Para Marx o que determina a

consciência é a base material de existência do ser social. “...O modo de

produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e

intelectual em geral. Não é a consciência dos homens que determina seu ser; é

o seu ser social que, inversamente, determina sua consciência.”...

(MARX,1983, p.24)

Igualmente em “A Ideologia Alemã” Marx deixa claro os pressupostos

de seu pensamento, os quais são:

“....os homens, não os homens isolados e definidos de algum modo

imaginário, mas envolvidos em seu processo de desenvolvimento real em

determinadas condições, desenvolvimento esse empiricamente visível. Desde

que se represente esse processo de atividade vital, a história deixa de ser uma

coleção de fatos sem vida,...”( MARX e ENGELS, 1989, p. 21/22)

No entanto este homem para fazer a história carece de condições

adequadas e materiais ao seu desenvolvimento, ou seja precisa beber, comer,

morar, vestir-se. “...O primeiro fato histórico é, portanto, a produção dos

meios que permitem satisfazer essas necessidades, a produção da própria vida

material; e isso mesmo constitui um fato histórico, uma condição fundamental

de toda a história...”( MARX e ENGELS, 1989,p.23)

Satisfeitas as necessidades fundamentais, e desenvolvido os instrumentos

necessários para satisfazê-las criam-se novas necessidades, “...e essa

produção de novas necessidades é o primeiro ato histórico. ...”(MARX e

ENGELS, 1989, p. 23)

Outro pressuposto refere-se ao fato de que o homem renova a cada dia

sua própria vida. Reproduz-se, enquanto espécie e como ser social através da

família e do trabalho. O modo de produção determina as relações sociais e o

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processo de satisfação das necessidades humanas. E finalmente Marx refere-

se à importância da consciência. “...A consciência é portanto, de início, um

produto social e o será enquanto existirem homens. ...” Desenvolve-se do

intercâmbio entre os homens, em função de buscarem respostas concretas às

suas necessidades. (MARX e ENGELS, 1989. p.26)

Podemos afirmar que a existência humana é histórica, real e concreta e se

dá através de uma prática que é social e capaz de, nas relações entre

homem/natureza/sociedade, construir e reconstruir os meios necessários à

garantia desta existência.

Por tudo isto concordamos que...“A categoria de praxis passa a ser no

marxismo a categoria central. À sua luz é que se devem abordar os

problemas do conhecimento, da história, da sociedade e do próprio ser. ...

(VÁZQUEZ, 1977, p. 36). É em Marx, a partir deste marco de sua produção,

que encontramos referências para compreender a praxis.

“A práxis é reconstruída por Marx como atividade objetivo – criadora do

ser social – e o trabalho é a sua forma, repita-se, ontológico – primária. É a

práxis que expressa a especificidade do ser social. Seu desenvolvimento e

complexidade crescente é o indicador do desenvolvimento e da complexidade

crescente do ser social. ...”(NETTO, 1994, p. 36 – 37)

A praxis é constitutiva do ser social e como categoria filosófica permite

compreender as possibilidades de objetivação, desencadeadas pelo homem no

processo de satisfação de suas necessidades e de construção das relações

sociais em contexto sócio – histórico determinado.

Com Marx, o problema da praxis, como atitude humana, crítica, criativa

e transformadora da natureza e da sociedade, passa para o primeiro plano. A

filosofia se torna consciência, fundamento teórico e seu instrumento. É o que

nos revela na Tese II :

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A questão de atribuir ao pensamento humano uma verdade objetiva não é uma questão teórica, mas sim uma questão prática. É na práxis que o homem precisa provar a verdade, isto é, a realidade e a força, a terrenalidade do seu pensamento. A discussão sobre a realidade ou a irrealidade do pensamento – isolado da práxis – é uma questão puramente escolástica. (MARX e ENGELS, 1989, p.94)

Marx recusa a possibilidade da teoria limitar-se a interpretação,

conformando o homem a uma situação de contemplação da realidade e

coloca a prática como condição do conhecimento produzido pelo homem.

Ainda, reafirma a necessidade dos filósofos, ancorados em seus

conhecimentos, comprometerem-se com a transformação da sua realidade

através da Tese XI: “Os filósofos só interpretaram o mundo de diferentes

maneiras; do que se trata é de transformá-lo.” (MARX e ENGELS, 1989, p.

97)

“A relação entre teoria e praxis é para Marx teórica e prática; prática na

medida em que teoria, como guia da ação, molda a atividade do homem,

particularmente a atividade revolucionária; teórica, na medida em que essa

relação é consciente.”(VÁZQUEZ, 1977, p. 117)

A praxis supõe e mobiliza uma ação transformadora de uma dada matéria

- prima orientada pela finalidade que um sujeito histórico imprime a esta sua

ação. Uma atividade para se configurar como praxis carece de um sujeito, que

se posicione como protagonista, consciente de sua ação sobre uma matéria –

prima determinada, cuja intenção é transformar esta matéria – prima em

determinados produtos. Há, portanto uma intenção ao se realizar determinadas

atividades.

O que caracteriza a atividade humana é justamente a finalidade que

imprime às suas atividades, finalidade esta que é uma projeção futura do que

se pretende alcançar, cuja dimensão é sempre social e conforme o autor é isto

que difere a atividade humana da atividade natural. A atividade humana é a

única que se dirige a determinados objetos para transformá-los. A intenção de

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transformação inicia-se idealizada no pensamento e se materializa nos

resultados da ação humana. “A praxis no seu mais alto grau (criador,

revolucionário) inclui a teoria que ela vivifica e verifica. Ela compreende a

decisão teórica como a decisão de ação. Supõe tática e estratégia. Não existe

atividade sem projeto; ato sem programa, praxis política sem exploração do

possível e do futuro.”(LEFEBVRE, 1968, p. 38 – 39)

...Essa atividade implica na intervenção da consciência, graças à qual o resultado existe duas vezes – e em tempos diferentes - : como resultado ideal e como produto real. O resultado ideal, que se pretende obter, existe primeiro idealmente, como mero produto da consciência, e os diversos atos do processo se articulam ou estruturam de acordo com o resultado que se dá primeiro no tempo, isto é, o resultado ideal. Em virtude dessa antecipação do resultado que se deseja obter, a atividade propriamente humana tem um caráter consciente. ...(VÁZQUEZ, 1977, p.187)

Sendo atividade consciente o resultado ou produto final traz incorporado

uma finalidade. Porém esta finalidade vai se modificando à medida que o

sujeito desenvolve atividades e enfrenta as interferências do contexto, isto é,

sujeita-se ao curso da própria ação do homem sobre a realidade em constante

processo de transformação. Ao projetar conscientemente sua ação e os

resultados que pretende alcançar os homens se revelam como seres portadores

de uma teleologia – orientado por um fim – determinado pelas suas

necessidades fundamentais e cuja dimensão é sócio – histórica e que se

revela através das finalidades.

A finalidade, por sua vez, é a expressão de certa atitude do sujeito em face da realidade. Pelo fato de traçar-me um objetivo, adoto certa posição diante da realidade.(...) Se o homem vivesse em plena harmonia com a realidade, ou absolutamente conciliado com seu presente, não sentiria necessidade de negá-los idealmente nem de configurar em sua consciência uma realidade ainda inexistente. Na verdade, carece de sentido propor-se um fim já alcançado, ou um resultado obtido. O fim prefigura idealmente o que ainda não se conseguiu alcançar. Pelo fato de propor-se objetivos, o homem nega uma realidade efetiva, e afirma outra que ainda não existe. Mas os fins são produtos da consciência, e, por isso, a atividade que eles governam é consciente. ... (VÁZQUEZ, 1977, p.189)

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A finalidade garante à atividade humana uma relação de interioridade

entre o homem, seus atos e seus produtos, ou seja, ao buscar reproduzir

intelectualmente a realidade em seus diversos aspectos, o homem desencadeia

uma série de atos que lhe possibilitam incorporar dimensões da realidade,

tomar consciência dela e produzir atos, produtos e conhecimentos que

estreitam sua relação com o mundo real e social. PINTO (1979, p. 229) alerta

para o fato de que trabalho humano “é sempre apropriador”, ou seja, “torna

próprio do humano” aqueles processos e produtos que engendra em função de

seus objetivos. A finalidade, portanto, prefigura, aqui o resultado de uma atividade real, prática, que já não é pura atividade da consciência. Graças a isso, o homem não se encontra numa relação de exterioridade com seus diversos atos e com seu produto, como acontece quando se trata de um agente físico ou animal, mas sim numa relação de interioridade com eles, porquanto sua consciência estabelece o objetivo como lei de seus atos, lei a que se subordinam, e que governa, de certo modo, o produto. Esse domínio nunca pode ser absoluto, já que se encontra limitado pelo objeto da ação e pelos meios com que se leva a cabo a materialização dos objetivos. (VÁZQUEZ, 1977, p.190) Neste ponto enfatizamos que no processo de objetivação das intenções

humanas há um processo de reconstrução do próprio homem – de subjetivação –

processo que se dá através da apropriação do mundo pelo homem. As formas de

apropriação podem ser prático – espiritual, teórico, científico, religioso,

matemático, físico e outras formas semelhantes. (KOSIK, 1976)

Ao se apropriar do conhecimento produzido, através da mediação do

trabalho, o homem é capaz de gerar novas práticas sociais, as quais darão

mobilidade ao conhecimento e ganharão expressão particular através dos

resultados concretos gerados no cotidiano do homem e nas suas relações. O

conhecimento se objetiva através da sua circulação e alcance social, ou seja

através dos meios criados pelo homem para socialização dos mesmos e das

mudanças concretas que é capaz de operar nas condições de vida do homem,

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tanto em sua expressão subjetiva, quanto em sua expressão objetiva,

determinada pelo momento histórico em que se encontra situado.

Para KOSIK (1976, p. 29 – 30) o conhecimento é um dos modos de

apropriação do mundo realizado pelo homem. Para apropriar – se do mundo o

homem conta com dois elementos fundamentais e constituintes deste

processo: o sentido subjetivo e o sentido objetivo. “...Estes mesmos sentidos,

por meio dos quais o homem descobre a realidade e o sentido dela, coisa, são

um produto histórico - social.” Para conhecer as coisas, o homem precisa

transformá-las em coisas para si, ou seja submetê-las à própria praxis. “Cada

grau do conhecimento humano sensível ou racional, cada modo de

apropriação da realidade, é uma atividade baseada na praxis objetiva da

humanidade e, portanto, ligada a todos os outros vários modos, em medida

maior ou menor. ...”

KOSIK (1976) afirma que a praxis compreende o momento laborativo e

momento existencial, pois a praxis se manifesta tanto na atividade pratica

objetiva, quanto na formação da subjetividade humana. A praxis é tanto objetivação do homem e domínio da natureza quanto realização da liberdade humana. A praxis tem ainda uma outra dimensão: no seu processo, no qual se cria a específica realidade humana, ao mesmo tempo se cria de certo modo uma realidade que existe independentemente do homem. Na praxis se realiza a abertura do homem para a realidade em geral. No processo ontocriativo da praxis se baseiam as possibilidades de uma ontologia, isto é, de uma compreensão do ser. A criação da realidade (humano – social) constitui pressuposto da abertura e da compreensão da realidade em geral. A praxis como criação da realidade humana é ao mesmo tempo o processo no qual se revelaram em sua essência, o universo e a realidade. A praxis não é o encerramento do homem no ídolo da socialidade e da subjetividade social: é a abertura do homem diante da realidade do ser. (KOSIK, 1976, p. 225/226) Para VÁZQUEZ (1977) a atividade de produzir conhecimento apresenta

dupla finalidade: a de transformar o objeto de sua atenção (a natureza/a

sociedade/as relações sociais) e o próprio homem. Esse processo de

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transformação não se dá imediatamente, através de atividades práticas, mas

através da mediação das finalidades a que o homem se propõem. Porém não

bastam as finalidades, é preciso vontade, conhecimento do objeto, domínio

dos meios e instrumentos para conhecer e atuar e desencadear um produto

final. Neste sentido a atividade cognoscitiva depende intrinsecamente da

atividade teleológica, sendo, portanto unidade indissolúvel. Desta articulação

temos sempre novos produtos, com novas características e possibilidades.

Como toda atividade propriamente humana, a atividade prática que se manifesta no trabalho humano, na criação artística ou na praxis revolucionária, é uma atividade adequada a objetivos, cujo cumprimento exige – como dissemos – certa atividade cognoscitiva. Mas o que caracteriza atividade prática é o caráter real, objetivo, da matéria – prima sobre a qual se atua, dos meios e instrumentos com que se exerce a ação, e de seu resultado ou produto. Na atividade prática, o sujeito age sobre uma matéria que existe independente de sua consciência e das diversas operações ou manipulações exigidas para sua transformação. A transformação dessa matéria – sobretudo no trabalho humano – exige uma série de atos físicos, corpóreos, sem os quais não se poderia levar a cabo a alteração ou destruição de certas propriedades para tornar possível o aparecimento de um novo objeto, com novas propriedades...(VÁZQUEZ, 1977, p.193)

A partir daqui já vamos configurando melhor o que seja praxis, atividade

objetiva, orientada por uma finalidade de transformar matérias- primas

presentes no mundo natural e social, na medida em que se transformam em

objetos de atenção de um ser que é social e históricamente determinado.

Através da praxis o homem se transforma, pois atua, objetiva-se, expressa-se

de forma crítica e criativa e abre-se, enquanto potencialidade, ao responder às

possibilidades e desafios que o movimento da realidade natural, social e

histórica lhe coloca.

Nesse sentido, podemos dizer que a atividade prática é real, objetiva ou material (....) Marx ressalta o caráter real, objetivo, da praxis na medida em que transforma o mundo exterior que é independente de sua consciência e de sua existência. O objeto da atividade prática é a natureza, a sociedade ou os homens reais. A finalidade dessa atividade é a transformação real, objetiva, do mundo natural ou social para satisfazer

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determinada necessidade humana. E o resultado é uma nova realidade, que subsiste independentemente do sujeito ou dos sujeitos concretos que a engendraram com sua atividade subjetiva, mas que, sem dúvida, só existe pelo homem e para o homem, como ser social. Sem essa ação real, objetiva, sobre uma realidade – natural ou humana - que existe independente do sujeito prático, não se pode falar propriamente de praxis como atividade material consciente e objetivante; portanto, a simples atividade subjetiva – psíquica -, ou meramente espiritual que não se objetiva materialmente não pode ser considerada como praxis. (VÁZQUEZ, 1977, p.194) A matéria – prima da atividade prática pode mudar, dando lugar a

diversas formas de praxis. O objeto sobre o qual o sujeito exerce sua

atividade pode se apresentar de diferentes formas, ou seja: a) o fornecido naturalmente, ou entes naturais; b) produtos de uma praxis anterior que se convertem, por sua vez, em matéria de uma nova praxis, como os materiais já preparados com que trabalha o operário ou com que cria o artista plástico; c) o humano mesmo, quer se trate da sociedade como matéria ou objeto da praxis política ou revolucionária, quer se trate de indivíduos concretos. (VÁZQUEZ, 1977, p.194 –195) Segundo VÁZQUEZ (1977, p.198 – 201) entre as formas de praxis

temos: atividade prática produtiva, artística, social, política e científica.

A atividade prática produtiva se configura através do trabalho. Pelo

trabalho o homem estabelece relação transformadora com a matéria – prima

presente na natureza, criando bens necessários à sua sobrevivência material e

reprodução enquanto ser social. Enquanto ser social o homem exercita esta

atividade em condições sócio – historicamente determinada e no contexto de

relações de produção. Também imprime finalidade à sua atividade

transformadora da natureza, objetivando-se nos produtos desta atividade. Para

tanto apoia - se em meios e instrumentos de trabalho.

Trata-se da praxis humana fundamental, porque através do trabalho o

homem não só produz o mundo humano e humanizado, como também produz

e transforma a si mesmo como ser social. É nesta atividade material que a

praxis se revela como fundante do ser social

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A atividade de produção ou criação artística “...permite a criação de

objetos humanos ou humanizados que elevam a um grau superior a capacidade

de expressão e objetivação humanas, que já se revela nos produtos do

trabalho. ...” (VÁZQUEZ, 1977, p.198)

Trata-se da criação de uma nova realidade, que mobiliza a sensibilidade e

emoção do homem e representação artística do que observa no contexto

humano, social e histórico e cujo valor não se limita a utilidade material dos

seus resultados mas está no valor que a humanidade lhe atribui, pois

demonstra o homem em suas relações, seus valores, seu modo de vida, suas

emoções, sua capacidade de criar para além do empiricamente visível, enfim

demonstra sua cultura.

A atividade científica envolve a produção de conhecimento através da

investigação. O processo de investigação permite ao pesquisador reproduzir

teoricamente os fenômenos sociais ou naturais. Nesta modalidade de praxis a

finalidade imediata é teórica, porém mediada pela prática investigativa.

Portanto a pesquisa possibilita, numa perspectiva crítica, a reprodução teórica

de expressões concretas da realidade, envolvendo o domínio do conhecimento

acumulado pela humanidade e o exercício metódico da investigação.

Cabe destacarmos que a atividade teórica em si não é praxis, ou seja, ela

possibilita produzir o conhecimento necessário para o homem agir sobre o

mundo real e objetivo , mas não é capaz de transformá-lo, já que faltam os

meios necessários e a vontade política do sujeito para engendrar este processo.

A teoria em si – nesse como em qualquer outro caso – não transforma o mundo. Pode contribuir para sua transformação, mas para isso tem que sair de si mesma, e, em primeiro lugar, tem que ser assimilada pelos que vão ocasionar, com seus atos reais, efetivos, tal transformação. Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um trabalho de educação das consciências, de organização dos meios materiais e planos concretos de ação; tudo isso como passagem indispensável para desenvolver ações reais, efetivas. Nesse sentido, uma teoria é prática na medida em que materializa, através de uma série de mediações, o que antes só existia idealmente,

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como conhecimento da realidade ou antecipação ideal de sua transformação. (VÁZQUEZ, 1977, p.206 – 207)

A praxis social é atividade prática do homem orientada para

transformação do ser social, e , por isso, constitui– se de atos “...destinados a

mudar suas relações econômicas, políticas e sociais...”(VÁZQUEZ, 1977,

p.200)

Envolve a intervenção do homem nas relações sociais ( relações de

produção na praxis produtiva), mobiliza ações de caráter coletivo, acionando

forças sociais capazes de gerar transformações no homem como ser social e

no contexto em que ele se insere.

A praxis política pressupõe a social, pois abrange a atividade político –

ideológica das classes sociais que intencionam transformar a organização e

direção da sociedade, bem como interferir nas ações do Estado e na sua

relação com a sociedade civil. (VÁZQUEZ, 1977)

Supõe a posição de classe que o homem ocupa na sociedade e exige

posicionamentos, expressando a diversidade de interesses sócio – políticos

presentes numa dada realidade. Coloca propósitos políticos contraditórios em

choque (de conservação ou de transformação de relações sociais) e resulta da

mobilização e participação social de diferentes grupos sociais.

A praxis política pressupõe a participação de amplos setores da sociedade. Mas não se trata de uma atividade espontânea, ainda que nela se dêem atos espontâneos de determinados indivíduos ou grupos. Persegue determinados objetivos que correspondem a interesses radicais das classes sociais, e em cada situação concreta a realização desses objetivos está condicionada pelas possibilidades objetivas inscritas na própria realidade.(...) A praxis política, enquanto atividade prática transformadora, alcança sua forma mais alta na praxis revolucionária como etapa superior de transformação prática da sociedade. ... (VÁZQUEZ, 1977, p.201)

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As práticas social e política impregnam as demais formas de praxis, pois

toda a ação humana tem dimensão social e expressa o posicionamento político

do sujeito.

Finalizando, temos que a praxis é constituída por diferentes dimensões

da atividade humana. Enquanto categoria filosófica dá conta da totalidade da

prática social desenvolvida pelos homens na construção da sociedade e das

relações que a compõem e lhe dão movimento. Em resumo, a praxis se nos apresenta como uma atividade material, transformadora e ajustada a objetivos. Fora dela, fica a atividade teórica que não se materializa, na medida em que é atividade espiritual pura. Mas, por outro lado, não há praxis como atividade puramente material, isto é, sem a produção de finalidades e conhecimentos que caracteriza a atividade teórica. Isso significa que o problema de determinar o que é a praxis requer delimitar mais profundamente as relações entre teoria e prática...(VÁZQUEZ, 1977, p.208)

Reafirmamos, a questão central da Teoria Social de Marx, que se propõe

transformadora e totalizante, no que se refere a compreensão do ser social a

partir da concretização da ordem capitalista, é a categoria práxis –

peculiaridade exclusiva do ser humano e engendradora de transformações na

natureza, na sociedade e nas relações sociais .

É a teoria social de Marx que fornece os elementos categoriais para

debater e analisar a composição da sociedade burguesa de forma crítica e

histórica. Permite perceber o desenvolvimento da sociedade burguesa a partir

da compreensão do ser social e das formas como este ser produz e se

reproduz no contexto das relações sociais.

“O pensamento de Marx funda uma teoria social: toda a sua pesquisa

está centrada na análise radicalmente crítica da emergência, do

desenvolvimento, da consolidação e dos vetores de crise da sociedade

burguesa e do ordenamento capitalista. Nesta teoria social, o traço peculiar,

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mais pertinente e decisivo refere-se ao seu cariz histórico - ontológico. ...”

(NETTO, 1989, p. 92)

Questão fundamental na obra de Marx é a de que sua preocupação com o

conhecimento não era de ordem epistemológica, isto é, do como conhecer, e

sim de ordem ontológica. Ou seja, Marx subordina o conhecimento à natureza

do objeto que procura conhecer: o ser social historicamente situado na

sociedade burguesa. É na investigação do que é o ser social, que Marx faz a

discussão e construção metodológica. Em Marx se encontra uma articulação

necessária entre teoria e metodologia, que resulta em orientações essenciais

para compreensão da realidade social e do contexto em que se produz as

relações sociais. Neste processo a teoria assume papel fundamental, - o de

reproduzir idealmente o movimento do real apreendido, seus processos

constitutivos, sua lógica de estruturação, de forma processual e continuada, já

que a teoria não esgota a complexidade do real, apenas busca compreendê – la

através de aproximações sucessivas.

Em termos breves e necessariamente toscos, o resultado da inflexão promovida por Marx é uma teoria que enfoca a sociedade burguesa como produto extremamente complexo de um processo histórico plurissecular, no qual certas possibilidades, do gênero humano não só se explicitam como, ainda, servem para iluminar etapas históricas precedentes.(...) O traço distintivo dessa teoria é que ela toma a sociedade (burguesa) como uma totalidade concreta: não como um conjunto de partes que se integram funcionalmente, mas como um sistema dinâmico e contraditório de relações articuladas que se implicam e se explicam estruturalmente. Seu objetivo é reproduzir idealmente o movimento constitutivo da realidade (social), que se expressa sob formas econômicas, políticas e culturais, mas que extravasa todas elas. (...)” (NETTO, 2004, p. 57 – 58)

Marx, busca construir uma teoria explicativa da ordem burguesa com

caráter revolucionário, pois ao compreender o movimento da capital

fundamenta a ação revolucionária do proletariado do seu tempo. É importante

destacar que Marx era comprometido com as experiências do movimento

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operário e por ser científicas suas formulações teóricas têm uma essência

revolucionária.

Nesta perspectiva a teoria representa a reprodução ideal do mundo

concreto. Que só tem sentido se acompanha a processualidade do real e se

não cristaliza conceitos e categorias ali presentes.

O procedimento metodológico próprio a essa teoria consiste em partir do empírico (os “fatos”), apanhar as suas relações com outros conjuntos empíricos, investigar a sua gênese histórica e o seu desenvolvimento interno e reconstruir, no plano do pensamento, todo esse processo. O circuito investigativo, recorrendo compulsoriamente à abstração, retorna sempre ao seu ponto de partida – e, a cada retorno, compreende-o de modo cada vez mais inclusivo e abrangente. Os “fatos”, a cada nova abordagem, se apresentam como produtos de relações históricas crescentemente complexas e mediatizadas, podendo ser contextualizados de modo concreto e inseridos no movimento maior que os engendra. A pesquisa, portanto, procede por aproximações sucessivas ao real, agarrando a história dos processos simultaneamente às suas particularidades internas.(NETTO, 2004, p. 58)

O método histórico – dialético é o caminho pelo qual se pode desvendar a

constituição do todo através de aproximações contínuas sem a pretensão de

esgotar as possibilidades de compreensão das determinações presentes na

realidade.

Precisamos, então refletir sobre a relação teoria/prática – núcleo fundante

da práxis e essencial ao processo de construção de conhecimento na

perspectiva da teoria social de Marx.

VÁZQUEZ (1977) aponta para uma relativa contraposição entre teoria e

prática, visto que a atividade prática envolve ação concreta no real e a teoria

em si, isolada da prática não se efetiva, apenas gera conhecimentos e muda

consciências e idéias sobre as coisas. No entanto essa oposição é relativa, ou

seja, só há oposições quando a relação teoria/prática sustenta-se numa

concepção de senso comum e/ou utilitarista, que concebe a prática como

suficiente e eficaz para atender as necessidades humanas. A relação

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teoria/prática é muito complexa. Assim, temos que há uma particularidade que

caracteriza cada uma destas atividades, porém para manter tal particularidade

nutrem-se uma da outra.

O problema das relações entre teoria e a prática – e, portanto, o de sua autonomia e dependência mútuas – pode ser formulado em dois planos: a) num plano histórico - social como formas peculiares de comportamento do homem, enquanto ser histórico – social, com referência à natureza e à sociedade; b) em determinadas atividades práticas (produzir um objeto útil, criar uma obra de arte, transformar o Estado ou instaurar novas relações sociais). (VÁZQUEZ, 1977, p.214 – 215)

Este autor lembra da afirmação de Lênin sobre a teoria que é

revolucionária... Quando Lênin afirma que sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário, o conceito de teoria tem a abrigar não só a consciência teórica de uma determinada praxis revolucionária, a análise de suas experiências e seu balanço, como também o estudo das condições objetivas que, numa ou noutra escala histórica, determinam a necessidade e a possibilidade dessa praxis. (...) Mas é evidente que a teoria da revolução não pode limitar-se ao estudo da formação econômico – social ou condições objetivas em sentido amplo que explicam a necessidade da mudança revolucionária, e sim tem que nutrir-se constantemente da análise da atividade prática humana condicionada por ela e, particularmente, da praxis revolucionária. Nesse sentido, a teoria encontra sua fundamentação inesgotável na prática. ...(VÁZQUEZ, 1977, p.228)

Podemos dizer que a teoria é determinada por uma prática ainda em

processo de realização, pois foi projetada idealmente, retrata a possibilidade

de alcance de uma finalidade. A prática determina a necessidade de

fundamentos teóricos que a orientem, a clarifiquem e a aperfeiçoem e por

outro lado a teoria se renova permanentemente acompanhando a dinâmica do

processo histórico em que o homem exercita sua prática social.

O fato de que a prática determine a teoria não apenas com sua fonte – prática que amplia com suas exigências o horizonte de problemas e soluções da teoria -, como também como finalidade – como antecipação ideal de uma prática que ainda não existe -, demonstra, por sua vez, que as relações entre teoria e prática não podem ser encaradas de maneira simplista ou mecânica, isto é, como se toda teoria se baseasse

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de modo direto e imediato na prática. (...) Mas não nos esqueçamos de que estamos falando nesse momento das relações entre teoria e praxis no transcurso de um processo histórico – social que tem seu lado teórico e seu lado prático. Na verdade, a história da teoria (do saber humano em seu conjunto) e da praxis (das atividades práticas do homem) são abstrações de uma só e verdadeira história: a história humana. (...) A atividade prática que hoje é fonte da teoria exige, a seu turno, uma prática que ainda não existe e, desse modo, a teoria ( projeto de uma prática inexistente) determina a prática real e efetiva. ... (VÁZQUEZ, 1977, p. 233)

A relação teoria/prática e o entendimento de que a prática é fundamento e

finalidade da teoria, devem ser apreendidos a partir dos seguintes aspectos:

a) que não se trata de uma relação direta e imediata, já que uma teoria pode surgir – e isso é bastante freqüente na história da ciência – para satisfazer direta e imediatamente exigências teóricas, isto é, para resolver dificuldades ou contradições de outra teoria; b) que, portanto, só em última instância e como parte de um processo histórico – social – não através de segmentos isolados e rigidamente paralelos a outros segmentos da prática -, a teoria corresponde a necessidades práticas e tem sua fonte na prática. (VÁZQUEZ, 1977, p. 233 - 234)

A primazia da prática sobre a teoria é ontológica, não implica em

superioridade ou contraposição em relação a teoria mas ter clareza de que a

prática aqui é concebida no contexto da “praxis humana e total”.

A prática mantém sua primazia com relação à teoria, sem que tal primazia dissolva a teoria na prática nem a prática na teoria. Por manterem uma e outra relações de unidade, e não de identidade, a teoria pode gozar de certa autonomia em relação às necessidades práticas, mas de uma autonomia relativa, porquanto, como vimos insistindo, o papel determinante corresponde à prática como fundamento, critério de verdade e finalidade da teoria. (VÁZQUEZ, 1977, p.238)

Podemos destacar das contribuições de VÁZQUEZ (1977, P. 240) que a

prática crítica não se faz sem alguns cuidados teóricos, sendo estas:

a) um conhecimento da realidade que é objeto da transformação; b) um conhecimento dos meios e de sua utilização – da técnica exigida em cada prática –, com que se leva a cabo essa transformação; c) um conhecimento da prática acumulada, em forma de teoria que sintetiza ou generaliza a atividade prática na esfera em que ela se realize, posto que o homem só pode transformar o mundo a partir de determinado nível teórico, ou seja, inserindo sua praxis atual na história teórico – prática correspondente;

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d) uma atividade finalista, ou antecipação dos resultados objetivos que se pretende atingir sob a forma de finalidades ou resultados prévios, ideais, com a particularidade de que essas finalidades, para que possam cumprir sua função prática, têm de corresponder a necessidades e condições reais, têm de tomar conta da consciência dos homens e contar com os meios adequados para sua realização.

A teoria possibilita uma compreensão inteligível da realidade, que o ser

humano adquire através de sua confrontação com essa mesma realidade.

Porém, o conhecimento daí resultante, não se processa de forma individual e

isolada, mas de forma social e histórica, sendo assim não tem caráter apenas

científico ou filosófico é prático também.

A unidade da teoria e da prática é possível pela consciência que se tem da

realidade, o que implica em tomada de posição frente ao real histórico e em

intervenção efetiva no processo social da transformação das relações

determinadas pelo contexto em que se insere o sujeito social. A teoria não

trata apenas de pensar o real como uma atitude contemplativa, mas dirige o

pensamento do sujeito a uma mudança concreta. A teoria não se representa

como mera expressão da prática, mas projeta a ação de forma decisiva e

crítica. A prática, assim supera o existente e o pensado, como resultado

material e como criação e desenvolvimento da realidade humana.

IANNI ( 1985, p. 09 – 10 e 16) demonstra, que a compreensão crítica da

realidade “...adere destrutivamente ao objeto. Para Marx , o pensamento –

explicação científica, sistema filosófico ou doutrina religiosa – pode

transformar-se em elemento ativo das relações entre pessoas, grupos ou

classes sociais. Sabia que sua interpretação – no instante mesmo em que se

produzia – transformava-se em força social. ...” Trata-se de interpretação

radical da realidade , isto é, busca desvendar as contradições que

movimentam as relações sociais no real. Para tanto é preciso apreender de

forma articulada as determinações passadas que se expressam no presente e

determinam as possibilidades de transformações que possam ser engendradas

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pelo homem. “...Ser radical é atacar o problema pela raiz. E a raiz, para o

homem, é o próprio homem.”

Temos que a praxis é condição humana que se objetiva através do

trabalho. Estas reflexões nos levam a pensar a produção de conhecimento

através da pesquisa como uma das modalidades da praxis humana, em que a

relação de unidade teoria/prática pode efetivamente ser trabalhada,

dependendo da perspectiva filosófica e visão de mundo que orienta o

pesquisador e profissional em sua concepção de pesquisa.

A praxis é sempre movida por uma visão de homem – mundo e isto

implica em ter presente no processo de produção de conhecimento um

conjunto de valores, de intenções, de idéias, e de sentimentos que referem -

se ao posicionamento que o sujeito possui em relação à direção social de suas

ações. Nenhum sujeito é isento de valores, suas posições são determinadas

pela sua condição de classe, pela ideologia e pela consciência que possui

destes aspectos29.

“Uma visão de mundo é precisamente esse conjunto de aspirações, de

sentimentos e de idéias que reúne os membros de um grupo (mais

freqüentemente, de uma classe social) e os opõem aos outros grupos.”

(GOLDMANN, 1979, p. 20)

LÖWY ( 1986, p.74 – 75) explica que, na perspectiva de Goldmann, a

visão de mundo30 é condicionada pela inserção das classes sociais no processo

29 “...A Ideologia, forma específica do imaginário social moderno, é a maneira necessária pela qual os agentes sociais representam para si mesmos o aparecer social, econômico e político, de tal sorte que essa aparência (que não devemos simplesmente tomar como sinônimo de ilusão ou falsidade), por ser o modo imediato e abstrato de manifestação do processo histórico, é o ocultamento ou a dissimulação do real. Fundamentalmente, a ideologia é um corpo sistemático de representações e de normas que nos ‘ensinam’ a conhecer e a agir. ...”( CHAUÍ, 1989, p. 3) 30 GOLDMANN em sua obra Dialética em Cultura (1979, p. 17) deixa claro a importância de nos determos na concepção de visão de mundo: “ O que é uma visão de mundo ? Já o escrevemos anteriormente: não é um dado empírico imediato, mas, ao contrário, um instrumento conceitual de trabalho, indispensável para compreender as expressões imediatas do pensamento dos indivíduos. Sua importância e sua realidade se manifestam mesmo no plano empírico, desde que a ultrapasse o pensamento de um só escritor. ...”

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produtivo e pela sua função na estrutura social. No entanto outros elementos

constituem a visão de mundo, tais como os da esfera religiosa, cultural,

filosófica, dando a ela dinâmica particular e relativa em relação às

determinações de classe. A visão de mundo “...corresponde ao máximo de

consciência possível de uma classe, que determina o limite de sua visão de

mundo. ...” Ou seja, consciência possível “... significa, portanto, os limites

que correspondem à posição estrutural de classe.”

Só é possível compreender a consciência possível de uma classe social

em sua vinculação ao momento e contexto histórico de seu processo de

constituição. “...A consciência possível refere-se ao máximo de possibilidade

histórica que a consciência de um grupo possa ter num determinado momento.

O seu conteúdo, ainda que inexistente, é uma possibilidade histórica, por ser

de interesse do grupo. O seu conteúdo não é verificável directamente, mas

num máximo de vinculação com a realidade.” (BAPTISTA, 2001, p. 64)

É a partir da consciência possível que se elabora a visão de mundo,

presente nas várias manifestações objetivas de uma determinada classe social

em sua relação com a sociedade. Deste modo é a partir da classe social, da consciência possível de classe, que vai se desenvolver a visão de mundo de uma classe, e essa visão de mundo vai se manifestar em seu comportamento social. Isto é importante porque a visão de mundo não é só um fenômeno espiritual, é algo que se manifesta tanto na prática, no comportamento econômico, social, político, real da classe, quanto ao nível conceitual, através de doutrinas, teorias filosóficas, ou no terreno da imaginação, através de obras culturais, literárias, artísticas e outras. (LÖWY, 1986, p. 75)

E é linguagem a forma através da qual o homem expressa seu

conhecimento, seu nível de consciência e as representações que possui sobre

o mundo. Já afirmavam MARX e ENGELS ( 1989, p. 26) “...A linguagem é

tão antiga quanto a consciência – a linguagem é a consciência real, prática,

que existe também para os outros homens, que existe, portanto, também

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primeiro para mim mesmo e, exatamente como consciência, a linguagem só

aparece com a carência, com a necessidade dos intercâmbios com os outros

homens. ...”

Reconhecemos que a linguagem, enquanto produto e condição da praxis

social “...expressa, sintetiza, decanta, constitui e desenvolve as mais diversas

realizações materiais e espirituais, sem as quais a sociedade não se constitui

enquanto formas de sociabilidades e jogos de forças sociais, no âmbito de

configurações histórico – sociais de vida, trabalho e cultura.” (IANNI, 2000,

p.212 – 213) Portanto a linguagem se constitui como mediação principal por

intermédio da qual as outras criações e objetivações humanas se expressam e

se revelam possibilitando ao homem mover-se na trama das relações sociais e

posicionar – se frente a elas.

Não podemos ignorar a linguagem, em sua versão científica, como

expressão do conhecimento social acumulado processado, construído e

reconstruído através do trabalho. Precisamos refletir, então sobre a produção

do conhecimento através da pesquisa como condição ontológica da existência

humana. Para isto temos como pressuposto que a base de sustentação e

mobilização de todas as relações humanas é o trabalho, ou seja “...atividade

orientada a um fim para produzir valores de uso, apropriação do natural para

satisfazer as necessidades humanas, condição universal do metabolismo entre

homem e a Natureza, condição natural eterna da vida humana...” (MARX,

1988, p. 146)

Produzir conhecimento através da pesquisa é uma das dimensões da

praxis humana e sendo assim é uma forma de trabalho cuja finalidade última é

desvendar o processo de constituição da realidade natural e social,

possibilitando ao homem enfrentar os desafios presentes no seu cotidiano e

existência.

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...Marx, assim, atribui uma prioridade ontológica do trabalho humano, atividade material nascida com a invenção dos instrumentos de trabalho que medeiam o intercâmbio dos homens entre si. E como esses instrumentos não se encontram prontos na natureza, o homem se vê obrigado a, cada vez mais, fabricá-los: inicia-se, assim o, interminável processo de transformação do ambiente natural e humano, a incessante criação de mediações postas pelo processo de trabalho. (FREDERICO, 1995, p. 174)

A categoria que permite entender a prática social humana em suas

diversas possibilidades de objetivação é trabalho. É pelo trabalho que o

homem supera a sua condição de ser natural e se realiza como ser social. Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo em que o homem por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo, se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo sua própria natureza. ... (MARX ,1988, p.142) O trabalho é fundamental à vida social, determina a constituição do ser

humano, seja como indivíduo, seja como ser social. O trabalho, enquanto

categoria que expressa uma forma de ser do homem, possibilita compreender

o desenvolvimento do ser social, da sociedade, das relações sociais e da

história.

A mediação material possibilita ao homem introduzir finalidades face a

natureza, mobilizando a transformação desta natureza, que deixa de ser

indiferente, passiva e passa a ser extensão do mundo humano; a

transformação do homem que em processo contínuo modifica-se, modificando

a sua realidade. Segundo IANNI (1984, p. 102) “...trabalhar significa atividade

mas também significa realizar, objetivar, cristalizar, alienar-se ( no sentido de

alheiar-se em outra coisa).Isso significa praxis, significa trabalho, significa

objetivar-se em outra coisa.”

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Para MARX (1988, p.143) os elementos que compõem o processo de

trabalho são “...a atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seu

objeto e seus meios.” Esclarecendo o que significa cada um desses elementos

Marx afirma: “...Toda matéria - prima é objeto de trabalho, mas nem todo

objeto de trabalho é matéria – prima. O objeto de trabalho apenas é matéria –

prima depois de já ter experimentado uma modificação mediada pelo

trabalho.” A matéria – prima se transforma em objeto na medida em que se

humaniza, isto é, sofre as interferências da ação e intenções humanas. Quanto

aos meios de trabalho, tratam-se de elementos complexos que se colocam

entre o homem e seu objeto de trabalho e que conduz a atividade humana

sobre o objeto. Para isto, o homem “...utiliza as propriedades mecânicas,

físicas, químicas das coisas para fazê-las atuar como meios de poder sobre

outras coisas, conforme seu objetivo.”

O processo de transformação do objeto de trabalho intencionada pelo

homem resulta em produtos, que assume a configuração de valor de uso para o

homem. “...O processo extingue-se no produto. Seu produto é um valor de

uso; uma matéria natural adaptada às necessidades humanas mediante

transformação da forma. O trabalho se uniu com seu objetivo. O trabalho está

objetivado e o objeto trabalhado. ...”(MARX, 1988, p.144)

Não podemos pensar o produto da atividade humana descolado do

próprio homem, ao contrário constituem o próprio homem, tanto em seu

aspecto material, como espiritual. Ou seja, “...O produto da atividade humana

passa a constituir um ou vários elementos do espaço social, do ambiente social

(que é social, cultural, econômico, religioso, artístico) que o indivíduo, o

grupo, a sociedade constituem. Nesse sentido, estes elementos passam a ser

não só ilustrações, imagens plásticas, sonoras, ou o que seja, mas também a

ser elementos constitutivos das pessoas. (IANNI, 1984, p. 103).

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É constitutivo porque ao objetivar-se através do trabalho, como atividade

material e espiritual, o homem constitui a sua subjetividade e afirma sua

condição de humano nas relações que estabelece com o mundo natural e

social.

Através do trabalho o homem vive a contradição fundamental da sua

existência - liberdade/ alienação. Mantém – se como ser social – prático

aquele que se objetiva, que responde à dinâmica das suas relações sociais. As

objetivações são a base para o desenvolvimento do ser social, e nelas o

homem se realiza. Porém, na ordem social capitalista ao mesmo tempo em que

o homem pode se realizar como ser social, sofre o processo de alienação

determinado pelas relações econômicas de produção.

...A realização do trabalho é a sua objetivação. No mundo da economia política, esta realização do trabalho aparece como a perda para o trabalhador de sua realidade, a objetivação como perda do objeto e escravização a ele, a apropriação como alienação, como estranhamento. O trabalho humano aparece, assim, em duas dimensões: é antes de mais nada, a determinação ontológica fundamental; mas, no mundo da propriedade privada e da divisão do trabalho, torna-se o fundamento de toda a alienação. ... (MARX apud FREDERICO, 1995, p. 179)

Alienação envolve um processo social em que o homem se torna alheio

aos resultados de sua ação, não se reconhecendo como sujeito de seu trabalho

e como capaz de agir criticamente sobre o mundo que o cerca. O processo de

trabalho determinado pelas relações de produção impõem ao homem uma

condição de subordinação, que se expressa no plano material e espiritual.

LANE (1997, p.42) complementa, afirmando que a alienação se

caracteriza, ontologicamente, pela atribuição de naturalidade aos fatos sociais,

invertendo a compreensão daquilo que é humano, social e histórico, como

manifestação da natureza. Como conseqüência o conhecimento passa a ser

“...avaliado em termos de verdadeiro ou falso e de universal; neste processo a

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‘consciência’ é reificada, negando-se como processo, ou seja, mantendo a

alienação em relação ao que ele é como pessoa e, consequentemente, ao que

ele é socialmente.”

No sentido que lhe é dado por Marx, ação pela qual (ou estado no qual) um indivíduo, um grupo, uma instituição se tornam (ou permanecem) alheios, estranhos, enfim, alienados aos resultados ou produtos de sua atividade (e à atividade ela mesma), e/ou à natureza na qual vivem, e/ou a outros seres humanos, e – além de, e através de, - também a si mesmos (às suas possibilidades humanas constituídas historicamente). Assim concebida, a alienação é sempre alienação de si próprio ou auto – alienação, isto é, alienação do homem ( ou de seu ser próprio) em relação a si mesmo (às suas possibilidades humanas, através dele próprio (pela sua própria atividade) (BOTTOMORE, 1993, p.5) A alienação, devido a sua natureza contraditória, reclama a sua

superação. LEFEBVRE (1968, p. 05) afirma que “...Para Marx, os homens se

recuperam das alienações no curso de lutas reais, isto é, práticas, não passando

a teoria de meio (um elemento, uma etapa, um intermediário) necessário e

insuficiente nessas lutas múltiplas e multiformes. Uma alienação só se define

claramente para Marx em relação à sua possível desalienação: pela

possibilidade prática, efetiva, da desalienação. A pior alienação é a barreira

que impede o desenvolvimento.”

O conhecimento científico é um dos caminhos que abre a possibilidade

de desenvolver o pensamento crítico, capaz de atacar na raiz os determinantes

da alienação e recuperar ao homem a condição de sujeito, capaz de romper

com estes determinantes. É preciso que este conhecimento esteja vinculado à

ação, ou seja se transforme em força social capaz de mobilizar ações de

caráter transformador. “...A objetivação da essência humana, tanto no aspecto

teórico como no aspecto prático, é, pois, necessária, tanto para tornar humano

o sentido do homem, como para criar o sentido humano correspondente à

riqueza plena da essência humana e natural.” (MARX, 1991, p. 172)

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2-A PARTICULARIDADE DA PESQUISA EM SUA EXPRESSÃO DO TRABALHO HUMANO

Nenhum fenômeno natural, humano e/ou social pode ser compreendido

isoladamente, mas nas suas relações recíprocas e contraditórias, ou seja numa

perspectiva de totalidade. Nada é isolado. Isolar é privar um fenômeno de

sentido. Buscar conexões é considerar cada fenômeno no conjunto dos

aspectos e manifestações da realidade em que se insere o fenômeno.

A totalidade, enquanto categoria da teoria social de Marx, conduz ao

conhecimento da unidade do real que representa uma compreensão mais

específica de cada campo ou particularidade do real. A totalidade não quer

dizer todos os fatos ou a soma das partes. Implica uma complexidade em que

cada fenômeno só pode ser reconhecido e compreendido como um momento

definido e em relação com outros fenômenos. O ser social se caracteriza por

ser totalidade, visto que se relaciona e interage com os demais elementos

constitutivos do real e é determinado pela sua dinâmica histórica.

“...O próprio da estrutura do ser social é o seu caráter de totalidade: não

é um ‘todo’ ou um ‘organismo’, que integra funcionalmente partes que se

complementam, mas um sistema histórico – concreto de relações entre

totalidades que se estruturam segundo o seu grau de complexidade. ...”

(NETTO, 1994, p. 37 – 38)

A concepção de totalidade permite apreender a dinâmica do próprio real,

pois não há totalidade sem se compreender a realidade nas suas íntimas leis e

conexões internas. KOSIK (1976, p. 44) alerta que “...Totalidade significa:

realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato

qualquer (classes de fatos, conjuntos de fatos) pode vir a ser racionalmente

compreendido.”

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Para KOSIK (1976) cada fenômeno deve ser entendido como um todo

parcial e histórico, pertencente a uma totalidade complexa. Ao mesmo tempo

em que é particular, devido à sua especificidade, só tem sentido se sua

essência for buscada a partir da totalidade em que se insere.

É na perspectiva da totalidade que a produção de conhecimento pode ser

entendida, como expressão particular do trabalho humano que se processa e se

objetiva através da pesquisa. Neste contexto, a pesquisa ganha significado

ontológico, ou seja, existencial e laborativo, pois faz parte da natureza humana

se perguntar pelo desconhecido e através das possibilidades de respostas

atender as necessidades do homem em suas dimensões individual e coletiva,

produzindo e reproduzindo sua própria existência, não de forma mecânica,

mas de forma complexa, processual, contraditória e histórica.

PINTO (1979, p. 235) situa a pesquisa científica como expressão do

trabalho humano e em sentido epistemológico busca definir que “...todo

trabalho é por definição científico, no duplo sentido de que : a) em qualquer

de seus tipos, graus ou modos, é ele o único gerador da ciência; b) de que se

não fosse científico não seria produtivo e útil, pois não se efetuaria de acordo

com as leis objetivas que regem a transformação das coisas. ...”

Esta forma de trabalho tem um caráter histórico, pois agrega na sua

essência os avanços do conhecimento, cultura e o domínio cada vez mais

complexo dos instrumentos que viabilizam o trabalho humano. É histórico,

também porque o pesquisador incorpora-se ao movimento sócio-cultural da

sociedade, reconstruindo o conjunto dos conhecimentos e idéias que a

humanidade produziu de forma a promover o desenvolvimento social, político

e cultural da sociedade e a transformar os meios necessários à reprodução da

existência humana.

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É nesta perspectiva que o trabalho científico deve ser considerado como

manifestação de uma realidade concreta, ou seja, como manifestação das

“...condições gerais da sociedade a que pertence e ao trabalho que em comum

aí se realiza. ...”(PINTO, 1979, p. 327)

O pesquisador é um trabalhador já que através de suas ações de caráter

crítico e criativo transforma a realidade e constrói novas possibilidades de

modos de vida para o homem. Suas ações e criações correspondem a

finalidades determinadas pelo modo de existência de um ser que pertence a

um contexto social e histórico, portanto correspondem a etapa concreta em

que se encontra o processo de evolução humana. “....Assim o cientista

necessita estar dotado basicamente da justa concepção do processo histórico –

social para apreender a sua sociedade na condição em que figura no curso

desse processo. ...”(PINTO, 1979, p.327 - 328) A produção científica não constitui um fim absoluto, mas relativo, no sentido em que faz parte do fim geral que a sociedade se propõe. A ciência participa por essência desta ambigüidade dialética: por um lado, enquanto setor particular do trabalho geral da comunidade, só pode ser promovida com a melhoria do trabalho comum, mas, por outro lado, é ela própria um dos instrumentos mais poderosos para levar a cabo essa melhoria. (...) Cabe ao cientista a avaliação do alcance de suas idéias e programas, examinando-os com espírito crítico pelo ângulo da contribuição que tragam ao progresso geral da comunidade e à transformação das condições da existência das massas. ...(PINTO, 1979, p.335)

É importante especificar os elementos constituintes da pesquisa científica

em sua relação com o trabalho humano. Trata-se de trabalho porque envolve

um processo complexo em que alguns elementos se fazem presentes:

- tem uma teleologia, isto é , é orientado por um fim, imprimindo-lhe

um significado e mobilizando o interesse, a motivação, os objetivos, o

conhecimento, a ética, as habilidades e a ação humana;

- tem um objeto de atenção a ser trabalhado e reconstruído teoricamente

e este objeto expressa sempre determinadas relações concretas e

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contraditórias, que precisam ser apreendidas em sua complexidade e

reconstruídas teoricamente;

- mobiliza conhecimentos de diferentes natureza para sua realização;

- necessita de meios e instrumentos capazes de apreender a natureza do

objeto em todas as suas dimensões;

- apresenta um produto final – materializado nos resultados alcançados

com a investigação e objetivado na prática social humana.

Constituindo-se enquanto trabalho, a pesquisa científica apresenta um

significado mais profundo que o econômico. Configura-se pela sua natureza

existencial, pois através do trabalho o homem reconquista as finalidades de

suas ações, toma posse da direção dada às suas ações e mobiliza seu potencial

criativo ao desenvolver os meios necessários ao seu desenvolvimento

biológico, social, etc. “O homem não tem outra fonte de ajuda para melhorar a

existência e expandir-se na plenitude do seu ser senão pelo trabalho que for

capaz de executar. ...”(PINTO, 1979, p. 343)

Entretanto, na constituição histórica da ordem social burguesa as relações

sociais são reguladas pelos interesses do mercado e pelo processo de produção

de mercadorias. Neste processo o homem deixa de trabalhar para si, isto é,

deixa de – através do trabalho enquanto esforço coletivo- fazer-se a si mesmo

homem. Deixa de humanizar a si mesmo, aos outros em suas relações e ao

produto de seu trabalho. O seu trabalho e o produto de seu trabalho deixam de

lhe pertencer e o próprio homem transforma-se em mercadoria.

Conforme PONTES (1997, p.62) as relações sociais de produção são

atravessadas pelo fetichismo da mercadoria, “...mecanismo responsável pela

inversão da estrutura da sociedade capitalista na representação humana,

gerando a alienação. Através deste mecanismo, dá-se a aparição da objetivação

do ser social de forma invertida: o que é resultado de relações entre homens

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aparece como relações entre coisas. ...” O trabalho alienado desumaniza, retira

do homem a sua natureza social e a sua condição de sujeito.

...Em tais condições o papel existencial que o trabalho por natureza possui, de ser o princípio da criação de si do homem, está impedido de cumprir-se, porque o indivíduo tem de aceitá-lo passivamente por toda a vida, vindo de uma força exterior que o manieta e contra a qual, não tem possibilidades de reagir. Em vez de contribuir para formar o ser do homem, este se torna destruído no seu ser, isto é, na sua liberdade (de que decorreria o poder de fazer-se a si mesmo), para se tornar o ser produzido pelo trabalho que lhe é imposto. Neste caso, o trabalho inverte o papel a que está destinado. Em vez de ser para o homem, este é que é para o trabalho. O atributo converte-se em substância, o instrumento em origem absoluta. Tal é a essência da escravidão, da servitude, da alienação do trabalho. (PINTO, 1979, p. 344)

Romper com a alienação em que vive o homem e uma dada sociedade

exige discutir o modelo de sociedade em que vive, seus determinantes, a

constituição das relações sociais e criar mecanismos de socialização do

conhecimento construído. Assim, o trabalho científico tem papel fundamental

e uma natureza social. A qualificação de social não é circunstancial, mas

resultante de uma necessidade material e objetiva, que é tomada/ apreendida

subjetivamente pelo pesquisador e transformada em objeto de atenção

científica.

...A pesquisa científica é e sempre foi social, porque possui esse atributo não por acidente, por circunstâncias de época, mas por essência, por natureza, e portanto já o manifestava, embora por aspectos diferentes dos atuais, mesmo quando se exercia em forma de trabalho ou de meditação solitária de um sábio, que se consagrava a indagar o segredo das propriedades dos corpos e a descobrir as leis que ligavam os fenômenos então conhecidos... A pesquisa é social porque o pesquisador, isolado ou em grupo, a empreende em razão de uma exigência, sem dúvida sentida subjetivamente, mas de origem e justificação objetivas, ou seja procedente de uma necessidade social. Deve distinguir-se entre o lado subjetivo, aquele que aparece à consciência do pesquisador com caráter de motivação imediata, e o lado objetivo, que, embora quase sempre não sendo claramente apreendido, estabelece de fato a razão última que explica a dedicação do sábio ao trabalho, à especialidade a que se consagra, e mesmo o tipo de problema particular que lhe desperta a atenção. ...(PINTO, 1979, p.480)

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MARX (1991, p. 170) já afirmava ser social o trabalho científico ao

analisar seu próprio trabalho “Mas mesmo quando eu atuo cientificamente ,

etc., uma atividade que raramente posso levar a cabo em comunidade imediata

com outros, também sou social, porque atuo enquanto homem. Não só o

material de minha atividade - (...) - me é dado como produto social, como

também meu próprio modo de existência é atividade social, porque o que eu

faço de mim, o faço para a sociedade e com a consciência de mim enquanto

ser social.”

O pesquisador é, na verdade, um trabalhador especializado que em

relação ao seu grupo social está sujeito às contradições sociais, às

desigualdades quanto a distribuição de renda e conhecimento na sociedade e

enquanto tal ocupa um espaço significativo no modo de produção.

A ocupação do homem com o trabalho de investigação da realidade, que socialmente aparece com caráter de profissão, ontológicamente representa uma condição existencial do ser humano, uma forma de viver, que se poderia definir como o viver em função do desconhecido.(...) Não se trata do saber pelo saber, do conhecer para “ficar sabendo”, mas diríamos paradoxalmente, do conhecer para “não ficar sabendo”. Com efeito, o pesquisador busca situar-se na fronteira do conhecimento e habilitar-se assim para transpô-la, tendo como objeto do seu cuidado ao mesmo tempo o conhecido e o desconhecido. ... (PINTO, 1979, p.496 - 497)

Dito isto, surge a necessidade de refletir sobre a formação do

pesquisador e seu papel frente ao contexto social, o que lhe dará consciência

da sua dimensão de trabalhador do campo das Ciências, portanto pertencente a

um segmento social e com responsabilidade para além do campo restrito da

pesquisa científica.

A concepção que se tem de pesquisa, e a formação dos pesquisadores,

com certeza, interferem nos resultados e no seu alcance social, pois a

atividade científica é atravessada pela relação sociedade , teoria e história.

FERNANDES (1976) nos alerta sobre a importância do pesquisador se

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reconhecer como cidadão, ou seja, portador de uma posição frente a realidade

em que se insere, não podendo ficar alheio a esta realidade e ao seu tempo

histórico, preocupado em valorizar o destino social que possa ser dado às

descobertas e aos conhecimentos científicos em geral.

Assim, o conhecimento produzido por este pesquisador, localizado social

e historicamente deve estar a serviço das necessidades da população brasileira

e propiciar condições de superação dos entraves ao desenvolvimento social e

humano. Portanto é um conhecimento teórico – prático.

“...as universidades e as ciências deviam constituir o fulcro de nossas

preocupações na medida em que permitissem equacionar e resolver os dilemas

econômicos, sociais e políticos da massa da população

brasileira.”(FERNANDES, 1976, p. 10)

Para isto FERNANDES (1976, p. 16) conclama os pesquisadores a

saírem de suas salas, de seus escritórios para participarem ativamente da

realidade social brasileira, caso contrário as pesquisas não passarão de

inspirações teóricas. Por incrível que pareça, o cientista precisa desprender-se do intelectualismo para enfrentar suas responsabilidades intelectuais. A menos que se prenda ao tronco sem seiva do passado, vê-se imerso no tumulto chamado para “construir” com os outros o mundo que nasce. Sua mente tem de abrir-se a todos os dilemas desde os que afetam o seu mister, até os que afligem a coletividade. Se ele for sociólogo, não poderá cuidar apenas do que traria proveito para o desenvolvimento das teorias sociológicas; terá de preocupar-se com questões que transcendem à sua especialidade, para situar a si próprio e à ciência no inesgotável burburinho de uma civilização que se enriqueceu e se revitaliza pela transplantação.

PINTO (1979, p. 334 e 415), também, discute as possibilidades que as

pesquisas podem trazer para países em situação de dependência econômica,

social e cultural, sem possibilidades de conquistar autonomia frente as

determinações de países que dominam o cenário internacional. A pesquisa se

coloca como uma das possibilidades de rompimento e superação desta

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situação, bem como de construção de uma identidade nacional própria, em

que o homem/cidadão seja capaz de buscar no seu próprio contexto cultural,

nas suas potencialidades econômicas e na acumulação do conhecimento

humano socializado as alternativas de rompimento dos entraves para seu

desenvolvimento. Aprendendo, assim, a buscar respostas para enfrentamento

da questão social na sua própria realidade, nas suas experiências cotidianas de

vivência na pobreza e falta de acesso a recursos, bens e serviços condizentes

com suas necessidades.

Para tanto os pesquisadores precisam ter uma formação coerente com sua

responsabilidade social. ...A ciência só pode tornar-se um instrumento de libertação do homem e do seu mundo nacional se for compreendido por uma teoria filosófica que a explique como atividade do ser humano pensante e revele o pleno significado da atitude de indagação em face da realidade natural e social. Uma filosofia da pesquisa científica, que incorporará naturalmente toda a reflexão sobre a metodologia da investigação, a lógica do raciocínio científico e a sociologia da ciência, é o pressuposto indispensável à formação do trabalhador neste campo da cultura, tão indispensável quanto aos conhecimentos particulares técnicos de que deve estar munido para empreender sua atividade. ...(PINTO, 1979, p. 4 - 5)

Para o autor este preparo é exigência fundamental para que o pesquisador

desenvolva espírito crítico, compreendendo sua posição num determinado

contexto sócio - histórico. Mas é evidente que a sociedade não é homogênea e

não apresenta um mesmo projeto social e político, o que incide no processo de

formação de pesquisadores e profissionais comprometidos com estruturas,

financiamentos e mecanismos de pesquisas que privilegiam as construções

teóricas distanciadas da realidade social ou comprometidos com processos de

transformação social, processos que não se dão sem a mediação dos

conhecimentos, dos instrumentos e da cultura produzidos ao longo da história

da humanidade e da própria posição sócio – política ocupada pelo pesquisador

em seu contexto de classe social.

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PONTES (1997, p. 78 – 79) afirma que as mediações são expressões

históricas e concretas das relações que o homem construiu com a sociedade e

com a natureza, constituindo-se em “indicadores seguros e fecundos” do

processo de evolução e enriquecimento humano. É neste processo que o

homem, através do trabalho, busca e deve buscar “edificar mediações” que

rompam com os mecanismos de degradação das relações entre

homem/natureza e homem/ sociedade, construindo relações humanas e dignas.

“...Ou seja, a construção de mediações entre as várias instâncias do existir

humano que conduzissem estas relações para o progresso econômico – social -

cultural – espiritual da espécie, com a plena superação da alienação, da

exploração, etc.”

A categoria mediação31 expressa as relações, conexões estabelecidas

entre os fenômenos na sua constituição, bem como entre os sujeito

pesquisador/indagador da realidade e a própria realidade. Expressa, ainda,

as possibilidades de relações que poderão se constituir no movimento sócio –

histórico das objetivações humanas. Apreender, através da pesquisa, as

mediações é fundamental para projetar e objetivar ações transformadoras.

Podemos entender que a própria pesquisa científica, enquanto uma

expressão do trabalho humano, é mediação entre o homem e a natureza e/ou

entre o homem e a sociedade. Compreensão que remete à discussão sobre

responsabilidade social do trabalho do pesquisador, que deve se perguntar

pelo destino de suas investigações.

....Não se admite que o pesquisador se comporte como autômato, não se inquietando pelo seu destino a não ser no que respeita a questões materiais ou ao problema da posição social. Sua consciência deve expandir-se a ponto de abranger a totalidade da realidade. Seu interesse deve dirigir-se a tudo o que lhe diz respeito, particularmente o destino humano do trabalho, ao qual não pode ficar indiferente, porquanto o uso da

31 Concordamos com PONTES (1997, p. 81) ao afirmar que “Na teoria social marxiana, a mediação tanto se manifesta como uma categoria que compõe o ser social (ontológica) – (...) -, quanto se constitui num construto que a razão elabora logicamente para possibilitar a apreensão do movimento do objeto.”

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sua produção vem a ser um dos traços que revertem sobre a personalidade do criador para criá-lo como tal, fazendo dele aquele que criou esses produtos, que terão essa destinação.(...) ...Abrangendo o conceito de produção tanto os bens materiais de consumo quanto as idéias, torna-se necessário que, neste último caso, o estudioso ou pesquisador esteja consciente do destino que terão as criações do seu pensamento. O uso que delas vem a ser feito, e que em grande parte não está ao seu alcance controlar, representa uma característica do seu ser, mesmo que a recuse ou disso não tenha conhecimento. Nessa característica consiste a responsabilidade histórica e existencial da produção (...) Sua criação específica no terreno do saber não pertence apenas à história das idéias ou da ciência; pertence igualmente à história da humanidade, porque, realizando-se no campo da cultura, se projeta na evolução de todo processo histórico. O homem de ciência ingressa na história por dupla dimensão: enquanto criador de determinado conteúdo de saber, que se incorpora à ciência de que a sociedade dispõe, e como responsável pelas conseqüências humanas que essa criação, especialmente no campo das idéias, venha a ter. ...(PINTO, 1979, p. 350 – 351) Cabe ao pesquisador manter-se vigilante quanto à sua produção e quanto

as repercussões de seu trabalho no contexto em que se insere, avaliando suas

contribuições tanto para o seu desenvolvimento pessoal e profissional quanto

para a emancipação humana. Além disto é preciso ter clareza do fato de que

uma certa dimensão de trabalho científico e suas repercussões fogem ao

controle do pesquisador, passando a ser incorporada pela realidade,

constituindo parte do conhecimento já acumulado. Ao pesquisador cabe uma

“atitude ativa”, revisando constantemente sua relação com a realidade que

fundamenta suas pesquisas e que está permanentemente em processo de

renovação . A razão profunda determinante da atitude ativa de pesquisa encontra-se na concepção global da realidade do ser humano no mundo, na interpretação que o revela como aquele que, de um lado torna-se capaz de ultrapassar as barreiras da percepção natural, mediante a invenção de dispositivos que prolongam e diversificam a capacidade de apreensão das qualidades das coisas; e, de outro lado, está num mundo em si inesgotável no conteúdo de aspectos inteligíveis. São estes dois conceitos, o de devassabilidade infinita do mundo pela consciência e o da infinitude do conteúdo cognoscível do universo, que dão fundamento filosófico à teoria da pesquisa científica. Esta funda-se no encontro da consciência com o mundo. ...(PINTO, 1979,p. 424 - 425)

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A pesquisa é constitutiva da essência humana, visto que responde a

inquietação própria do homem em perguntar pela sua condição de existência,

pelas suas possibilidades de evolução e de superação de entraves ao

exercício da sua humanidade, entraves que podem ser de naturezas diferentes

(social, econômica, natural, política, biológica...).

“...A capacidade de pesquisar revela ser constitutiva da essência do

homem, não por uma determinação abstrata, um privilégio inexplicável, mas

porque exprime a forma que o ser resultante da diferenciação evolutiva de

um ramo do mundo animal adotou para lograr a sobrevivência. ...”(PINTO,

1979, p. 430)

Portanto está vinculado fundamentalmente à condição social do homem,

que PINTO (1979, p. 530 - 533) classifica da seguinte forma:

1- Não se trata do homem individual, mas do homem na condição de

ser social: ou seja o homem é movido pelas finalidades determinadas pelo

contexto em que vive. Para enfrentar os desafios do meio cria cultura,

estabelece relações sociais e busca instrumentos necessários para dominar a

natureza;

2- O homem que comanda a natureza é sempre um indivíduo

histórico, o existente em determinado momento do processo de evolução

social;

3- Aqui não se trata de qualquer homem, mas o homem na função de

pesquisador “...que, por situação existencial, vive na fronteira do

desconhecido, e cuja consciência funciona como o órgão social especializado

no processo contínuo de conversão do desconhecido em conhecido. ...”

O homem só consegue objetivar esta sua natureza através da mediação da

sociedade a que pertence, vivendo e expressando as contradições sociais,

provenientes do modo de produção e das relações de classe social. Neste

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contexto deve posicionar-se e desenvolver princípios éticos que retratem sua

forma de ver o mundo em que vive. ....A ética da pesquisa científica identifica-se com a ética geral, de base existencial e de suporte histórico social, que não podemos desenvolver neste ensaio, mas nos permitimos resumir num único preceito, o da formação pelo pesquisador da autêntica consciência de si, em virtude da qual adquire a noção da sua realidade existencial. Essa consciência implica o saber do porquê age da maneira em que age, não apenas em função de uma tabela subjetiva de valores, mas sobretudo em função da situação objetiva onde vive, como homem obrigado a vencer constantemente a contradição da ignorância, que também se pode chamar, indiferentemente, a contradição do conhecimento. (PINTO, 1979, p. 512) Articuladamente à consciência ética, o pesquisador deve desenvolver a

consciência de sua responsabilidade social, reconhecendo sua posição de

classe, identificando-se como trabalhador social, portanto trabalho também

determinado pelas condições materiais que a sociedade desenvolve no

processo histórico e percebendo seu trabalho permeado pelas contradições

sociais. Ou seja desenvolver a consciência crítica, fundamentada numa

formação que o prepare teórica e metodologicamente para o exercício de uma

pesquisa responsável para com seus resultados.

Não há pensar crítico e conhecimento coerente com as necessidades de

desenvolvimento humano que não se sustente e se desenvolva numa prática

social, e sendo sua base de construção é também seu critério de verdade, numa

perspectiva dialética . Passaremos a refletir sobre isto na seqüência.

Precisamos romper com a perspectiva pragmatista que concebe o

alcance ou veracidade do conhecimento produzido pelo seu êxito, sua eficácia

e resultados alcançados pela ação eficiente do homem tomado

individualmente. Deste ponto de vista o verdadeiro se reduz ao útil, o prático

se reduz ao utilitário, acabando por dissolver o teórico no útil. Já a

perspectiva teórico – crítica entende o critério de verdade vinculada à prática

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- prática entendida como atividade material, transformadora, e social,

estabelecendo relação dialética entre pensamento e ação, teoria e prática.

Segundo PINTO (1979, p. 219-227) devemos considerar quatro aspectos

para compreensão do papel da prática em relação a pesquisa científica, sendo

estes:

1- A intencionalidade como critério de verdade: toda prática é motivada

por uma finalidade que retrata a necessidade do homem, engajado

racionalmente ao seu contexto, de produzir tudo o que precisa para sua

sobrevivência e processo de emancipação. Portanto trata-se de uma finalidade

tanto subjetiva, quanto material e existencial. No entanto na pesquisa

científica a prática coloca-se de forma superior, visto que gera novas idéias,

novos conhecimentos, possibilitando ao homem conhecer com maior

profundidade a sua realidade;

2- A natureza social da prática: a qualidade social da prática é o

fundamento da construção do conhecimento, bem como de sua validação.

Caracteriza também a prática social, o fato de que o pesquisador representa

uma coletividade, seus fins e a cultura de seu tempo, que resulta do processo

de acumulação sócio - histórica do saber humano;

3- A pesquisa como esforço coletivo: o que para o autor em questão,

retrata o estado atual da pesquisa e da ciência, que não pode ser mais

desenvolvida por indivíduos isolados e sem um mínimo de articulação entre as

diversas áreas do conhecimento. A complexidade dos objetos, tanto das

ciências sociais, como ciências exatas e naturais exigem ação/investigação

interdisciplinar e esforço coletivo – resultando, portanto em produtos

coletivos. SEVERINO (1995, p. 54) traz uma contribuição importante, sobre

isto, ao afirmar que o essencial em relação ao conhecimento é percebê-lo não

como produto final, mas como processo interdisciplinar, resultante de uma

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construção histórica, empreendida por um sujeito coletivo. “Tanto quanto o

agir, também o saber não pode se dar na fragmentação: precisa acontecer sob a

perspectiva de totalidade. ...”

4- A pesquisa como realização do trabalho humano: “...Efetivamente, a

pesquisa científica constitui-se em ação do homem sobre a natureza para fins

criativos, que se resumem no intuito de conhecê-la, não pelo prazer de

conquistar verdades eternas, abstratas, em cuja contemplação o espírito

repouse e se satisfaça, mas para produzir bens indispensáveis à existência e

adquirir instrumentos de transformação do mundo em proveito do homem. ...”

(PINTO, 1979, p.226)

O trabalho humano ao mesmo tempo em que é meio de plena realização

humana, contraditoriamente pode ser, também, determinante da condição de

alienação a que se sujeita. Reconhecendo este caráter contraditório o trabalho

científico constitui a possibilidade de se colocar em prática o conhecimento

produzido socialmente e de se romper com as teias da opressão e alienação,

visto que a investigação científica de cunho dialético se ocupa de desvendar a

constituição da sociedade.

Avalia-se o saber científico, também, pelas suas repercussões na vida

cotidiana e nos desdobramentos que possa gerar em termos de incorporação ao

comportamento, atividades, experiências e outros conhecimentos já adquiridos

pelas pessoas. “...Não há saber verdadeiro que não seja fecundo. ...”(PINTO,

1979, p.487) Não há saber que não seja capaz de gerar ações e mobilizar o

interesse por novos conhecimentos e novas formas de se viver em sociedade.

Para ser assim o investigador precisa debruçar-se sobre um objeto

específico e apoiar-se em meios e instrumentos de investigação. De uma

maneira geral podemos compreender os instrumentos de pesquisa na

perspectiva em que Alvaro Vieira Pinto coloca:

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“...Com efeito, a instrumentalidade dos aparelhos e artefatos de que se

vale a pesquisa científica não significa outra coisa senão a concretização, em

um determinado objeto, o instrumento científico, de forças da natureza que o

homem vai utilizar para vencer outras forças da natureza, aquelas contra as

quais está lutando, está trabalhando. ...”(PINTO, 1979, p. 463 - 464)

Os instrumentos de pesquisa não se limitam apenas aos recursos

manejáveis conforme os objetivos do pesquisador e a natureza do objeto de

estudo, podem ser consideradas as idéias (leis da natureza, propriedade dos

corpos, processos de abstrações...) também como instrumentos:

....A dialética ensina-nos que as idéias não surgem divorciadas da experiência da realidade e que a essa origem, reflexo que é das propriedades reais das coisas e fenômenos, devem a capacidade de representar subjetivamente as possíveis vias de intervenção no mundo, prefigurando as operações plausíveis permitidas pela natureza dos corpos e das forças que os movem. As idéias são pois instrumentos de ação, na verdade são os primeiros e mais essenciais instrumentos, aqueles pelos quais se inicia toda ação racional. Seria um grave engano restringir o papel das idéias e, conseqüentemente, o da metodologia que a elas se liga, à função teleológica, vendo nelas exclusivamente as finalidades que determinam a operação racional sobre o mundo. São mais que isso. As idéias são um dos instrumentos manejados na atividade investigadora, sem dúvida distintos dos de ordem material, mas, não menos eficientes e indispensáveis, pois operam sobre a realidade, e se comportam como forças que se opõem ao desconhecimento das propriedades das coisas, e por fim vencem as resistências do objeto a conhecer. (PINTO, 1979, p.465)

O instrumento material retrata uma idéia objetivada, materializada e o

resultado do trabalho do investigador na busca de apreender as diversas

dimensões do seu objeto, gerando novos conhecimentos.

...Todo aparelho científico, na verdade, assinala um momento do processo histórico do conhecimento, tal como as idéias que conduziram a construí-lo e aquelas que seu emprego fará surgir. Só nesta perspectiva o cientista exercerá uma atividade não apenas fecunda, no sentido banal da expressão, pelo fato de aplicar bem a aparelhagem possuída, mas ainda criadora, pois, do uso dela terá um resultado inventivo. ...(PINTO, 1979, p.468)

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Os recursos instrumentais utilizados para desenvolver a pesquisa devem

manter uma unidade com o método de estudo. O método, no processo

investigativo é fundamento, alicerce e emerge da relação dialética

sujeito/objeto. Na introdução de “A Ideologia Alemã” de Marx e Engels,

Gorender faz referência ao caráter ontológico do processo de apreensão crítica

dos fenômenos sociais, ou seja, método que implica em “...Severa disciplina do

pensar que objetiva reproduzir conceitualmente o real na totalidade inacabada

dos seus elementos e processos.”(apud MARX e ENGELS,1989, p.XXXII)

A definição dos instrumentos de investigação se faz em função do objeto

de estudo, sendo que este é identificado em função da intencionalidade da

consciência e da compreensão que o pesquisador tenha do mundo em que vive :

...Assim o objeto se relaciona com a consciência por uma multiplicidade de vias. Não

se trata de admitir que a objetividade se componha desses múltiplos aspectos, derivados todos da atitude tomada pela consciência, como quer o idealismo fenomenológico, mas o que se deve aceitar é a existência de uma ação recíproca, uma correlação dialética, segundo a qual, se por um lado a consciência, pela sua “visada” configura o objeto em “tal coisa”, e escolhe no conjunto das suas propriedades certos dados concretos, aqueles que irão representar para ela nessa linha de percepção, por outro lado, o objeto, pelo fato de ser globalmente, o termo de uma “preocupação” da consciência, atua sobre esta e se torna um dos seus elementos constitutivos.(...)

Ao contrário, a consciência se dirige ao objeto e o constitui com determinado sentido pela maneira segundo a qual o apreende, ou melhor, pelo modo em que dele retira certos dados. Mas ao mesmo tempo esse contato com o real tem efeito reversível, isto é, a consciência passa a ser determinada pelo objeto a que se dirige. ...

(PINTO, 1979, p.498 - 499)

Assim o objeto possui duplo significado para a consciência: por um lado

tem aspectos e dimensões conhecidos; por outro lado aquilo que é conhecido

cumpre o papel de mediação, possibilitando ao pesquisador estabelecer

relações com o desconhecido, e reconstruir o objeto em todas as suas

dimensões. “...Trata-se, portanto, de um processo dialético que se trava no

íntimo do objeto, que se vai constituindo em conhecido pela redução do

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infinito de virtualidades cognoscíveis à condição efetiva de conhecidas.

...”(PINTO, 1979, p.500).

Então, a particularidade da pesquisa científica está em apreender o “não

dado”, “o desconhecido”, justamente através da mediação “do dado”, do que

“é conhecido”, revelando uma dinâmica dialética capaz de gerar conhecimento

novo, apoiado em instrumentos de pesquisa que propiciem a apreensão desta

dinâmica na forma como o objeto se constitui no real/concreto. Portanto, os

instrumentos de pesquisa, embora algumas vezes já estejam dados

teoricamente, acabam sendo reconstruídos de acordo com o método e o

processo de investigação, elementos definidos a partir da relação que o sujeito

investigador estabelece com seu objeto de pesquisa.

Importante, neste momento, reafirmarmos questões centrais que

sustentam nossas reflexões e que são balizas para avançarmos no processo de

construção do nosso objeto de estudo.

Podemos compreender a relação dinâmica entre teoria/prática somente

no contexto da praxis humana criativa, produtiva e transformadora das

relações sociais. A produção de conhecimento através da pesquisa é uma das

dimensões da praxis humana e sendo assim é uma forma de trabalho cuja

finalidade última é desvendar o processo de constituição da realidade natural

e social, possibilitando ao homem enfrentar os desafios presentes no seu

cotidiano e existência e se constituir como sujeito deste processo.

O conhecimento – resultado do processo de investigação permanente da

realidade deve ter como critério de verdade os seus frutos, materializados na

prática social humana e nas alterações que geram nas condições de vida do

homem, nos seus comportamentos, nas suas atitudes e relações que

estabelecem entre si e com a natureza e nas determinações sociais que

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impedem processos de rompimento com as condições de subalternidade em

que se encontram.

O objeto de atenção de profissionais/pesquisadores são reconstruções

teóricas que se processam vinculados aos objetivos do profissional, à sua

experiência pessoal e social, e retratam o nível de engajamento ao seu tempo

histórico e ao acúmulo de conhecimentos produzidos socialmente. A

apreensão do objeto de pesquisa se faz sustentada em instrumentos adequados

à sua natureza. A pesquisa é, portanto, trabalho humano objetivado.

Estas reflexões nos servem como balizas importantes para enfrentarmos

a pergunta sobre a particularidade da pesquisa no Serviço Social e em especial

sobre como a produção de conhecimento, em sua perspectiva crítica, ganha

expressão e materialidade no âmbito do Serviço Social.

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II CAPÍTULO “ Hoje, mais do que nunca, os homens precisam esclarecer teoricamente sua prática social, e regular conscientemente suas ações como sujeitos da história. E para que essas ações se revistam de um caráter criador, é necessário, também hoje mais do que nunca, uma elevada consciência das possibilidades objetivas e subjetivas do homem como ser prático, ou seja, uma autêntica consciência da praxis.” (VÁZQUEZ – 1977)

PESQUISA EM SERVIÇO SOCIAL: EXPRESSÕES DA SUA

PARTICULARIDADE

A categoria particularidade, em sua complexidade e riqueza ontológica

nos possibilita compreender a pesquisa em sua vinculação orgânica com a

prática profissional. Esta vinculação se constrói no movimento histórico da

própria profissão e se constitui como possibilidade de avanço teórico –

prático coerente com o projeto ético - político do Serviço Social.

“...O particular, porém, é mais do que um momento da mediação apenas

formalmente necessário. Vimos que estão em jogo conexões reais da

realidade, da natureza e da sociedade, que recebem na lógica seu mais abstrato

reflexo, mas um reflexo que corresponde tendencialmente à realidade.(...)”

(LUKÁCS, 1970, p.66)

Não se trata, portanto, de ilustração teórica, mas de apreendermos a

pesquisa em sua íntima relação com a prática profissional e no contexto sócio

– histórico em que a profissão se constrói, se consolida e se reconstrói, num

movimento em que as contradições e desafios presentes neste contexto

instigam a profissão permanentemente à sua superação. Segundo BATTINI

(1991, p.52) O movimento entre o singular e o universal é mediatizado pelo

particular....

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... A união que a particularidade realiza entre uma determinada singularidade e uma determinada universalidade, mediante uma série de determinações mediadoras resgatadas na tensão dos polos, constantemente em ato, expressa as contradições, fazendo existir uma autêntica e verdadeira aproximação à compreensão adequada da realidade. O particular, entretanto, não se configura como um simples elo de ligação entre o universal e o singular. Possui um caráter posicional, apresentando-se com relação ao singular como universalidade relativa e ao universal, como singularidade relativa. Mesmo assim, essa relatividade posicional deve ser concebida como um processo que engendra uma base crítica que se obtém no movimento permanente de “...descoberta das reais mediações para cima e para baixo na relação dialética do universal e particular.” É na particularidade que devemos ver, tanto um princípio de movimento do conhecimento, quanto uma etapa, um momento do caminho dialético.32

Como campo de mediações a particularidade manifesta a possibilidade

de compreensão do movimento e das relações presentes nos fenômenos. Ao

se pensar pesquisa enquanto particularidade estamos refletindo sobre os

processos e elementos que mobilizam, inspiram e sustentam a atitude

investigativa e a prática da pesquisa no âmbito do Serviço Social.

Concordamos com BATTINI (1991, p. 53) ao afirmar que a atitude

investigativa é manifestação de um processo que envolve o questionamento

permanente dos fatos , buscando sempre novas explicações, superando os

limites impostos pela realidade social e pelo conhecimento acumulado pelas

ciências. Constitui-se em “...posição viva, ativa e aberta para o emergente,

podendo, na prática, serem levantadas questões ou problemáticas que possam

vir a se constituir em objetos de pesquisa científica.”

A prática da pesquisa no Serviço Social se põe como construção histórica

que se processa na medida em que a profissão enfrenta as demandas sociais

decorrentes do agravamento da questão social em suas múltiplas

manifestações, tendo como referência perspectiva teórico – metodológica

crítica que sustenta a produção de conhecimento e a intervenção na profissão.

32 Citação entre aspas utilizada por BATTINI (1991) refere-se a LUKÁCS, G. Introdução a uma estética marxista. Tradução Carlos Nelson Coutinho e Leandro Konder, 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

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Consolida - se no processo de construção e afirmação do projeto ético –

político profissional comprometido com a democracia e justiça social,

materializado no Código de Ética de 1993 e no processo de Revisão Curricular

que fundamenta a formação profissional. Também se constitui na medida em

que a profissão alcança maturidade intelectual, evidenciado pela sua produção

teórica e capacidade de diálogo crítico com diferentes áreas de conhecimento

das Ciências Sociais e Humanas.

É notório o protagonismo dos Assistentes Sociais nesta construção, que

através das suas organizações representativas (CFESS,CRESS,ABEPSS), e

dos espaços de socialização de conhecimentos (congressos, conferências,

encontros, seminários, cursos, publicações, entre outros) têm se mobilizado e

se feito presente como sujeito político diante das questões que afetam o

exercício profissional e a garantia dos direitos sociais no campo das políticas

públicas, bem como têm mantido importante interlocução com os

movimentos sociais da sociedade civil, ampliando seu potencial de

enfrentamento das crises e transformações do mundo contemporâneo.

Acreditamos, como IAMAMOTO (2002, p.18) que “O ponto de partida

para análise do Serviço Social é o de que a profissão é tanto um dado

histórico, indissociável das particularidades assumidas pela formação e

desenvolvimento da sociedade brasileira no âmbito da divisão internacional

do trabalho, quanto resultante dos sujeitos sociais que constroem sua

trajetória e redirecionam seus rumos. ...”

Neste processo histórico em que a produção de conhecimento se

materializa via pesquisa no Serviço Social muitos elementos se colocam

como mediações possíveis. Retomaremos neste capítulo, em função dos

objetivos desta tese, os eixos que orientam a nossa investigação e que em

decorrência do processo de coleta e sistematização dos depoimentos

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expressam as possibilidades de se compreender a particularidade da pesquisa

no Serviço Social. São eles:

1- A compreensão da realidade social e o enfrentamento das demandas postas à prática profissional através da pesquisa;

2- A centralidade ocupada pelos sujeitos que participam das pesquisas do Serviço Social;

3- O retorno e alcance social das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social;

4- A particularidade da pesquisa para o Serviço Social.

Subjacente a estes eixos temos a experiência profissional de cada sujeito

participante da pesquisa. A compreensão que cada um revelou sobre a

pesquisa tem uma vinculação direta com sua prática profissional no espaço

das organizações sociais e da docência ocupados pelo Serviço Social e

possibilitou traçar um perfil de cada sujeito em relação à temática da

pesquisa. Buscando demonstrar este aspecto temos as epígrafes.33

Mais do que um caráter ilustrativo a epígrafe, selecionada do contexto

dos depoimentos dos sujeitos, demonstra um perfil deste sujeito em relação à

temática da pesquisa, assegurando a perspectiva de que estes sujeitos

representam um sujeito coletivo. Com as epígrafes temos nuanças das relações

entre pesquisa e Serviço Social.

Como perfil, a epígrafe traz à tona relações orgânicas entre o sujeito e a

possibilidade que a pesquisa traz à profissão no enfrentamento dos dilemas

presentes na sua realidade de intervenção. Dilemas que se colocam no

cotidiano da prática profissional – campo empírico das inquietações

profissionais e estimulador da atitude investigativa. Relações orgânicas que

33 Epígrafe: ... Título ou frase que serve de tema a um assunto; mote.(...) Sentença ou divisa posta no frontispício de livro, capítulo, princípio de discurso,conto, composição poética, etc. (FERREIRA, 1988, p. 256)

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permitem compreender o que seja pesquisa para os profissionais do Serviço

Social.

Neste momento é imperativo resgatar a pesquisa enquanto concepção

teórica no contexto da profissão, enquanto uma das possibilidades de

objetivação da prática profissional e como consolidação de seus avanços

recentes em relação às discussões sobre formação profissional e exercício da

prática profissional.

Poderíamos nos perguntar que implicações, então, a pesquisa traz

enquanto concepção ao Serviço Social?

“E acho que eu fui bastante estimulada, talvez seja uma curiosidade minha, a ter esta noção da totalidade das coisas. Eu não sei, talvez um traço de personalidade, eu não sei desenvolver um pensamento se eu não consigo compreender o título, certo? Quero dizer, o conceito subjacente. Então eu tenho sempre essa necessidade de compreender a totalidade de alguma coisa, seja até a totalidade do aparecer ou até mesmo ir desdobrando o objeto em múltiplas faces pra poder compreendê-lo um pouco melhor. Então eu gosto muito da pesquisa, eu gosto muito do mergulho na realidade, eu não sou uma teórica, eu não tenho um raciocínio dedutivista. Eu trabalho muito mais do real pra cima e eu acho que isso são partes do compromisso de pesquisa.” (Aldaíza Sposati)

Alguns aspectos devem ser observados. Indagar-se, questionar-se,

perguntar-se pelo desconhecido constitui parte da natureza humana. O que

aparece no discurso como “ traço de personalidade”, através do processo de

formação acadêmica é estimulado e culmina com o desenvolvimento de uma

atitude de inquietação frente ao aparente, que busca a compreensão da

natureza e determinantes mais gerais dos fenômenos sociais, isto é o “conceito

subjacente”.

FREIRE (1996, p. 32) considera que

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A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizadora ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos. Este processo deve-se dar com uma direção teórico – crítica que busca

compreender a realidade em suas manifestações múltiplas. No âmbito

profissional o Assistente Social hegemonicamente tem uma orientação crítica

para mergulhar na realidade, buscando compreendê-la a partir de uma

perspectiva de totalidade. A atitude investigativa tem que ser estimulada desde

a formação na graduação e compõe, ao longo do processo de inserção do

profissional na realidade, um dos pilares para construção e investigação dos

objetos de atenção do Serviço Social.

Do ponto de vista teórico – metodológico, sob o abrigo da teoria social crítica, torna-se fundamental imprimir a atitude investigativa no trabalho profissional cotidiano, como um dos significativos espaços geradores de condições transformadoras. A dimensão investigativa na prática dos sujeitos cria suporte para o conhecimento, que também produz condições para a capacidade de expressão e objetivações humanas. Essa dimensão é entendida como produto real e objetivo, pois considera o ato de conhecer, exercido sobre a matéria mediatizada ou imediata, destinado a criar novo objeto para nova ação, visando a transformação do real. O exercício permanente da pesquisa, impulsionado pela atitude investigativa, como expressão do inconformismo, da crítica reiterada à realidade, do questionamento rico e vivo sobre os fatos, cria possibilidades de novas explicações permitindo ir além do limite dado. (BATTINI, 2003, p. 17)

A atitude crítica precisa ser trabalhada, desenvolvida , embora seja

constitutiva da natureza humana, não se desenvolve sem estímulos

apropriados e em um contexto sócio – educacional. FREIRE (1996, p. 32 e

85) identifica que “...uma das tarefas precípuas da prática educativo -

progressista é exatamente o desenvolvimento da curiosidade crítica,

insatisfeita, indócil. ...” O processo de produção de conhecimento em torno de

um objeto determinado não se dá sem o exercício da curiosidade e da

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capacidade crítica de “ ... ‘tomar distância’ do objeto, de observá-lo, de

delimitá-lo, de cindi-lo, de ‘cercar’ o objeto ou fazer sua aproximação

metódica...”

Nesta perspectiva em que a pesquisa implica em desenvolvimento da

atitude investigativa, a tomamos como princípio educativo e científico.

Conforme análise de DEMO (1997, p. 33) “ Na condição de princípio

científico, pesquisa apresenta-se como a instrumentação teórico –

metodológica para construir conhecimento. Como princípio educativo,

pesquisa perfaz um dos esteios essenciais da educação emancipatória, que é o

questionamento sistemático crítico e criativo.”

Como questionamento sistemático a pesquisa sinaliza para o

estabelecimento de diálogo crítico e criativo permanente com a realidade.

Concepção que rompe com a imagem de que pesquisa é processo restrito a

alguns privilegiados acadêmicos e que requer domínio de técnicas

sofisticadas, aproximando-a das requisições da prática profissional cotidiana.

Entendemos que ...Trata-se de atitude cotidiana, não de hora marcada, lugar específico, instrumento especial, e é isto que se espera da cidadania moderna: um cidadão sempre alerta, bem informado crítico e criativo, capaz de avaliar sua condição sócio – econômica, dimensionar sua participação histórica, visualizar seu horizonte de atuação, reconstruir suas práticas, participar decisivamente na construção da sociedade e da economia. (DEMO, 1997, p. 34)

Assim reconhecemos que a pesquisa articula o processo educativo,

estimulação da atitude crítica e investigativa, ao comprometimento com uma

prática interventiva capaz de inovar. “Neste sentido, pesquisar é, lidimamente,

saber pensar, aprender a aprender (DEMO, 1997, p. 35)

“Pesquisa poderia servir, em nosso caso, como conceito maior,

abrangendo todo o processo de construção de caminhos científicos e de

resultados inovadores, incluindo-se também sua ilação educativa, na condição

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de estratégia de questionamentos crítico e criativo, teórico e prático.” (DEMO,

1997, p. 39)

Como disse a participante da pesquisa trata-se de um “mergulho na

realidade”, buscando apreender os elementos constitutivos em suas mútuas

relações, dinâmicas e contraditórias, orientado por um compromisso ético de

desvelamento do real para poder transformar. “...A realidade social é

complexa, contraditória, constituída por nexos, relações, processos, estruturas

que não se deixam conhecer pela observação empírica, convencional. O

pesquisador precisa refletir, demoradamente sobre o real. ...” (IANNI, 1984,

p.97)

“...Sou daquelas que defende que precisamos sempre pesquisar tendo em vistas as determinações macro-sociais do real com o aporte da teoria crítica, seguindo a velha lição marxiana de que “o concreto é síntese das múltiplas determinações do real” . Contudo é fundamental – e aí é que reside o desafio – é necessário a apropriação de outras categorias mediadoras para podermos trabalhar as particularidades e singularidades presentes na realidade. Me explico com um exemplo: trabalhar com programas de trabalho e renda, por exemplo, é uma requisição objetiva para o serviço social. Subjacente a esta atividade concreta está o desemprego e as possibilidades da economia brasileira. Claro que o desemprego e o crescimento da economia são questões que invocam determinações macro-sociais, mas para construir um programa, outras questões que informam sobre a particularidade brasileira e as singularidades regionais, locais, etc., necessitam ser apropriadas.”(Ana Elizabete Mota)

O processo da pesquisa não se faz sem nenhum esforço e orientação

teórico – metodológica. O depoimento define e assume a orientação

profissional de que o sustentáculo deste processo é a perspectiva crítica,

fundada na teoria social de Marx.

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...a teoria social de Marx informa a pesquisa na perspectiva prático - crítica. Esse movimento do pensar/agir coloca em discussão o compromisso da pesquisa que é o de pôr em crise o universo de certezas, instigando a sociedade a repensar, ontologicamente, acontecimentos e teorias na busca de novas civilidades. É essa a via através da qual entendemos a pesquisa como importante ferramenta para a reconstrução das relações sociais. (BATTINI, 2003, p. 11) O depoimento retoma uma das importantes afirmações de Marx quanto

ao método dialético: “...O concreto é concreto por ser a síntese de múltiplas

determinações, logo, unidade da diversidade. É por isso que ele é para o

pensamento um processo de síntese, um resultado, e não um ponto de partida,

apesar de ser o verdadeiro e portanto igualmente o ponto de partida da

observação imediata e da representação. ...” (MARX, 1983, p. 218 – 219)

Devido a complexidade do real e de sua processualidade histórica, o

processo de investigação de um objeto determinado se dá de forma

aproximativa e continuada. O processo de construção de conhecimento deve

fazer um caminho em que parte-se da realidade concreta, através de processos

de abstrações e aproximações às suas determinações, relações e

processualidade e volta-se à ela após desvendá-la em sua totalidade complexa.

O método histórico – dialético é o caminho pelo qual se pode desvendar a

constituição dos fenômenos através de aproximações contínuas sem a

pretensão de esgotar a realidade. O conhecimento é sempre uma reconstrução

da realidade em nosso pensamento e o movimento de elevar-se do abstrato ao

concreto – enquanto método de apreensão do real – restitui, recupera o

movimento do real.

Conforme IANNI (1985) o esforço de desvendar o real através do

método histórico – dialético supõe desvendar as contradições que

movimentam as relações sociais no real. Para tanto é preciso apreender de

forma articulada as determinações passadas que se expressam no presente e

determinam as possibilidades de transformações que possam ser engendradas

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por um sujeito que é político e coletivo. Assim, o método tem caráter histórico

– pois contextualiza as relações sociais numa dada estrutura social e

econômica de produção – e caráter universal, na medida em que determina a

natureza das relações humanas e o processo em que se reproduzem material e

espiritualmente.

Trata-se de um processo em que as mediações ganham relevância para

apreender, no movimento de constituição da realidade social, os elementos

que dão complexidade e expressão concreta aos objetos de investigação. “ A

categoria de mediação tanto possui a dimensão ontológica quanto reflexiva. É

ontológica porque está presente em qualquer realidade independente do

conhecimento do sujeito; é reflexiva porque a razão, para ultrapassar o plano

da imediaticidade (aparência) em busca da essência, necessita construir

intelectualmente mediações para reconstruir o próprio movimento do objeto.”

(PONTES, 2000, p. 41) O processo de ir da aparência à essência se opera pelas mediações que auxiliam na construção da síntese (sempre provisória porque historicamente determinada) dos fenômenos, expressando sua imediaticidade e mediaticidade. É o processo pelo qual se plasmam instâncias e passagens que se forjam no cerne das relações sociais, implicando a subsunção do universal, do singular e do particular. Pelas mediações assim postas, particularizam-se significados dos fenômenos nos evidenciando novos sentidos e descobertas, proporcionando aprofundamento e avanço do conhecimento.(...) Assim, a pesquisa é a ferramenta através da qual o investigador mergulha nas mediações (e também as produz) que revelam as particularidades e, municiado pelo seu compromisso político – ideológico, forja novo sentido às explicações do mundo, contribuindo para uma nova civilidade. (BATTINI, 2003, p.11 - 12)

Ainda retomando o depoimento acima “... é necessário a apropriação de

outras categorias mediadoras para podermos trabalhar as particularidades e

singularidades presentes na realidade...” , ou seja sustentado num arcabouço

teórico - metodológico crítico é preciso que o profissional de Serviço Social

conheça a realidade em sua complexidade e através de diálogo permanente

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com ela apreenda e construa as categorias explicativas capazes de orientar e

mobilizar as ações profissionais em consonância com o projeto sócio -

profissional.

Para IAMAMOTO (1998,p. 273 ) Sendo o Serviço Social uma profissão – e, como tal, dotado de uma dimensão prático- interventiva – supõe uma bagagem teórico – metodológica como recurso para a explicação da vida social, que permita vislumbrar possibilidades de interferência nos processos sociais. Para isso a apropriação do acervo teórico – metodológico legado pelas ciências sociais e humanas e pela teoria social crítica, como pressuposto para iluminar a leitura da realidade, afigura-se como requisito indispensável, mas insuficiente. A dinamicidade dos processos históricos requer a permanente pesquisa de suas expressões concretas informando a elaboração de propostas de trabalho que sejam factíveis, isto é, capazes de impulsionar a realização das mudanças pretendidas. Em outros termos, o domínio teórico - metodológico só se atualiza e adquire eficácia quando aliado à pesquisa da realidade, isto é, dos fenômenos históricos particulares que são objetos do conhecimento e da ação do assistente social. Enfrentar os desafios que as transformações societárias colocam ao

Serviço Social em seu cotidiano e nos diferentes espaços que ocupa

profissionalmente requer do Serviço Social a percepção de que o processo de

produção de conhecimento tem uma natureza teórico – prática. Ao Assistente

Social cabe, além de interpretar criticamente a numa perspectiva de totalidade

a realidade social, imprimir a esse conhecimento concretude através das ações

profissionais que respondam as demandas sociais.

A construção do conhecimento no Serviço Social se faz, também, na

relação com outras áreas de conhecimento.

“...Eu fiz uma caminhada para fora...Eu me formei e fui pra dentro da saúde pública e depois eu fiz uma caminhada da saúde pública pra dentro, pra o Serviço Social... Eu acho que isso foi super importante pra mim, sabe essa caminhada. Eu até brincava dizendo que eu botei meu sapatinho de chumbo e voltei.(...) Quando eu voltei fazer o mestrado, quando eu vim trabalhar aqui, na verdade eu vim carregada de uma experiência concreta.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

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MARTINELLI ( 1998, p. 136) nos lembra que vivemos num momento

em que as profissões ganham dimensão social. “...Mais do que nunca, estamos

diante de uma nova forma de conceber o saber, não um saber como posse, não

um saber apenas como aquele campo de conhecimento que se tem domínio,

mas um saber como algo que se exerce, o saber como encontro heteredoxo de

signos.”

Neste encontro o Serviço Social estabelece interlocução com outras áreas

do conhecimento e outras práticas profissionais e numa perspectiva

interdisciplinar reconstrói seu objeto de intervenção/investigação. Assim

recorremos à concepção de interdisciplinaridade enquanto atitude pertinente

ao processo da pesquisa.

“Interdisciplinaridade é uma nova atitude diante da questão do

conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de

aprender e dos aparentemente expressos, colocando-os em questão.

Exige, portanto, na prática uma profunda imersão no trabalho cotidiano.”

(FAZENDA, 2001, p.11)

E da relação desafiadora e inquietante com outras áreas de conhecimento

e que se dá no cotidiano que emerge uma “experiência concreta” capaz de

ampliar os horizontes profissionais e de redefinir objetos de atenção

profissional no âmbito da pesquisa e da intervenção – sempre aspectos

articulados, sem perder de vista que o ponto de partida desta relação é o

próprio Serviço Social. “Conhecer o lugar de onde se fala é condição

fundamental para quem necessita investigar como proceder ou desenvolver

uma atitude interdisciplinar na prática cotidiana.” (FAZENDA, 2001, p. 14)

O processo da pesquisa implica em compreender um objeto que se institui

a partir das relações que a profissão estabelece com as chamadas áreas afins

nos diferentes espaços sociais que ocupa e orientado por um horizonte

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teleológico, o qual imprime ao processo investigativo significado ético e

político.

“Eu não consigo falar muito separadamente da organização política, da intervenção e da pesquisa, porque pra mim isto está muito imbricado. Faz parte da minha pessoa, da minha forma de ser e de agir. Não consigo ver uma sem a relação direta com a outra.” (Eunice Teresinha Fávero)

Há uma ética orientando a profissão, que remete para a desmistificação

da neutralidade profissional e para o comprometimento da categoria para com

a liberdade, democracia, garantia dos direitos sociais, civis e políticos e justiça

social. Merece destaque ainda a perspectiva pluralista que deve orientar o

exercício profissional em relação às correntes teóricas que sustentam a

profissão.

“ Como ator social, o pesquisador é fenômeno político que, na pesquisa, o

traduz sobretudo pelos interesses que mobilizam os confrontos e pelos

interesses aos quais serve. Donde segue: pesquisa é sempre também fenômeno

político por mais que seja dotada de sofisticação técnica e se mascare de

neutra. ...” (DEMO, 1999, p. 14)

Portanto a produção de conhecimento no Serviço Social está orientado

por estes pressupostos éticos e demarcam que enquanto construção coletiva

implica a articulação entre “intervenção”, “investigação” e prática “política”

nas instâncias organizadas e representativas da categoria profissional.

“Eu acho assim, que quando o exercício profissional não incorpora a dimensão investigativa como um elemento interno ao processo de trabalho a tendência é se ter uma prática reiterativa, pouco criativa e de não realizar aquilo que o Marx chamou de praxis, que é a ação pensada. O grande desafio para o exercício profissional é não se deixar subsumir na rotina institucional, exercer aquela autonomia relativa profissional que nós temos e assegurar o espaço da reflexão e da investigação, que é o que pode permitir a formulação de novas

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estratégias no projeto de trabalho e no processo mesmo do trabalho, e na forma como o trabalho acontece. Então, eu acho que isso, talvez, seja o maior desafio.... traduzir o projeto ético – político profissional no trabalho é o grande desafio.” (Elaine Rossetti Behring)

A base da pesquisa para o Serviço Social é a prática profissional e a

possibilidade que a pesquisa coloca à profissão é a de superar os entraves que

o cotidiano desta prática impõe à ela. SETUBAL (1996, p. 25) lembra que a

pesquisa possibilita a “...saída da obscuridade científica, da periferia social,

cultural e intelectual...”, pois se faz pelo esforço permanente de repensar a

prática profissional enquanto espaço de trabalho “...prático – intelectivo –

prático, onde as contradições sociais são desvendadas...” e as alternativas de

intervenção repensadas.

Para DEMO (1999, p. 34) “ Esta discussão pode mostrar o quanto a

pesquisa é fundamental para descobrir e criar. É o processo de pesquisa que,

na descoberta, questionando o saber vigente, acerta relações novas no dado e

estabelece conhecimento novo. É a pesquisa que, na criação, questionando a

situação vigente sugere, pede, força, o surgimento de alternativas.”

Constitutiva da prática profissional a pesquisa não se confunde com ela,

tem a sua forma de expressão própria, mas para o Serviço Social só ganha

sentido, significado, relevância e amplitude na medida em que se articula à

prática possibilitando um processo de construção do conhecimento que

parte da prática, da construção de objetos que decorrem da problematização da

intervenção do Serviço Social numa dada realidade sócio – histórica e retorna

a ela , mas de forma propositiva.

Assim concordamos com IAMAMOTO (2002, p. 41) ao afirmar que

“...O desafio é o assistente social ultrapassar a perplexidade e apropriar-se dos

novos espaços profissionais, orientando a atuação segundo os princípios ético

– políticos da profissão. Requer incluir a investigação enquanto um

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componente fundamental do exercício, condição para o desvendamento da

realidade e para propor alternativas de ação compatíveis com as necessidades

e interesses dos usuários. ...”

A riqueza da pesquisa, enquanto potencial mobilizador da criação, está

nesta possibilidade de buscar os caminhos concretos para que o projeto ético –

político profissional ganhe concretude no cotidiano do exercício da prática

profissional e ao mesmo tempo renove a profissão.

“O Serviço Social como uma área de conhecimento histórico tem se reconstruído permanentemente à medida que, ao intervir numa dada realidade, tem procurado contribuir com o seu processo de transformação social. Essa relação entre o Serviço Social e a realidade faz com que ele também se transforme.” (Aglair Alencar Setubal)

Segundo SEVERINO (1995, p. 53) “ O fundamental no conhecimento

não é a sua condição de produto, mas o seu processo. Com efeito, o saber é

resultante de uma construção histórica, realizada por um sujeito coletivo. Daí

a importância da pesquisa, entendida como processo de construção de objetos

do conhecimento e a relevância que a ciência assume em nossa sociedade. ...”

Daí a sua importância ao viabilizar a transformação da própria profissão

que ao longo de um processo histórico de afirmação de seu estatuto acadêmico

e profissional vêm construindo conhecimento e através dele sedimentando as

bases para a sua própria transformação. O Serviço Social, como as demais profissões, na medida em que se refazem e se reconstroem as relações na sociedade, vai-se reconstruindo e refazendo, muito embora nesse processo não supere os limites das relações postas pelo capitalismo, uma vez que a própria sociedade não os supera. Nesse processo de re-construção, as acções individuais dos profissionais podem, assumir, ao mesmo tempo, as dimensões de síntese resultante do processo colectivo de elaboração de conhecimentos e práticas desenvolvidos pela categoria – e de criação de novas propostas e de novos conhecimentos. ... (BAPTISTA, 2001, p. 15)

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O conhecimento acumulado pela profissão retrata o seu nível de

engajamento com a realidade em processo de transformação e ao acúmulo de

conhecimentos produzidos socialmente no contexto das Ciências Sociais e da

tradição marxista. Reflete, também, os impasses profissionais, suas

dificuldades de ordem teórica e metodológica, considerando que a profissão é

um campo plural de produção de conhecimento, portanto permeada por

conflitos e contradições, bem como as potencialidades de produzir

conhecimento tendo como referência o diálogo incessante com as

transformações societárias.

“...eu acho assim que uma das coisas que a gente tem que reconhecer até pra poder mudar é que a gente está aprendendo a fazer pesquisa. Isso eu tenho claro. Eu estou aprendendo a pesquisar. E a gente tem que ter até essa humildade teórica pra (...) não achar que o nosso saber é o mais correto. É um saber e ele vai se tornar ou mais ou menos relevante se (...) souber apreender a realidade. Então a gente está aprendendo, agora (...) tem que melhorar muito....” (Lúcia Cortes da Costa) A “humildade” de que trata a participante desta pesquisa refere-se ao

reconhecimento dos limites da profissão quanto ao seu acervo de

conhecimento e quanto ao domínio do processo da pesquisa “...não é

depreciação de si nem falsa apreciação.Não é ignorância do que somos, mas

conhecimento, ou reconhecimento, do que não somos.(...) Humildade é

conhecer os próprios limites. Aceitar que sabe algo de modo imperfeito,

incompleto, que, a qualquer momento, pode ser questionado, reformulado e

mesmo superado.(...) A pesquisa, a aprendizagem sempre apontam para todos

os lados, no espaço e no tempo. ...” (ALVES, 2001, p. 61 e 64) É também o

reconhecimento de que há possibilidades de se aprender sobre o processo da

pesquisa, considerando que os rumos da profissão caminham para o exercício

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da pesquisa de forma articulada ao exercício da prática profissional na

perspectiva de superar seus entraves.

Que nuanças nos revelam as epígrafes?

Uma profissão que está aprendendo a fazer pesquisa e que sustenta este

processo na experiência concreta, no enfrentamento das demandas concretas,

tendo como referência uma perspectiva teórico - crítica, de totalidade; que

alimenta a sua relação com a realidade através de uma atitude investigativa e

interdisciplinar, buscando a compreensão dos objetos de atenção profissional

no movimento sócio – histórico de sua constituição; que busca articular

organização política , intervenção e pesquisa como elementos de um mesmo

processo interventivo, buscando romper com práticas reiterativas, pouco

criativas, avançando para o delineamento de um novo perfil profissional.

Reafirmamos com IAMAMOTO (1998, p. 49) Alimentado por uma atitude investigativa, o exercício profissional cotidiano tem ampliadas as possibilidades de vislumbrar novas alternativas de trabalho nesse momento de profundas alterações na vida em sociedade. O novo perfil que se busca construir é de um profissional afinado com a análise dos processos sociais, tanto em suas dimensões macroscópicas quanto em suas manifestações quotidianas; um profissional criativo e inventivo, capaz de entender o “tempo presente, os homens presentes, a vida presente” e nela atuar, contribuindo, também para moldar os rumos da sua história.

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1-A COMPREENSÃO DA REALIDADE SOCIAL E O ENFRENTAMENTO DAS DEMANDAS POSTAS À PRÁTICA PROFISSIONAL ATRAVÉS DA PESQUISA

Já afirmamos que o campo empírico das inquietações profissionais e

estimulador da atitude investigativa, capaz de mobilizar um processo de

investigação, é a prática profissional.

Os depoimentos em seu conjunto nos trazem alertas em relação à prática

profissional, que problematizada, constitui-se fonte de reflexão e construção

de conhecimento sobre o seu objeto de intervenção e as suas expressões

particulares no contexto sócio – ocupacional em que o profissional está

inserido, bem como é fonte de questionamento da própria prática profissional,

buscando alternativas de repensá-la e redefini-la conforme as exigências

contemporâneas para o exercício profissional.

Em nosso trabalho estamos compreendendo a prática profissional34 como

uma dimensão da pratica social, portanto situada no contexto das relações

sociais concretas, assim concordamos com BAPTISTA ( 2001, p. 13) A prática profissional deve ser situada no contexto das relações sociais concretas de cada sociedade, abrigando na sua configuração os “resultados” do movimento histórico, da dinâmica da sociedade – num determinado momento, numa dada conjuntura. Não se confunde com outras práticas, mas é uma dimensão da prática social e, como tal expressão das relações sociais de classe. Nesse sentido, a prática profissional é um produto humano, uma objectivação produzida e construída historicamente pelo homem num processo dialéctico contínuo no qual o homem (o produtor) e o seu mundo social reagem reciprocamente um sobre

34 Identificamos que IAMAMOTO (1998, em especial nas páginas 94-97) faz crítica à compreensão da prática profissional no âmbito da praxis. Reconhece que essa compreensão possibilitou ao Serviço Social superar uma visão focalista de prática profissional e inseri-lo no âmbito das relações sociais, no entanto registra que o termo prática profissional restringe a mesma à compreensão do fazer cotidiano profissional , ou seja à compreensão das atividades que são desempenhadas pelo profissional e aponta para a transição do foco da prática para o foco do exercício profissional, ou seja “... focar o trabalho profissional como partícipe de processos de trabalho que se organizam conforme as exigências econômicas e sociopolíticas do processo de acumulação, moldando-se em função das condições e relações sociais específicas em que se realiza, as quais não são idênticas em todos contextos em que se desenvolve o trabalho do assistente social.” Assim considera que o que regularmente se chama de prática profissional “... corresponde a um dos elementos constitutivos do processo de trabalho que é o próprio trabalho....” Esta crítica, entretanto, não é conclusiva quanto a relação entre exercício e prática profissional. Assim nossa compreensão é de que a prática profissional é uma dimensão da práxis e objetivação do que se chama de exercício profissional.

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o outro gestando a chamada divisão sócio – técnica do trabalho da sociedade burguesa. ... Entendemos que o exercício profissional – que não se trata, somente, de

uma terminologia muito presente na produção científica e no discurso dos

profissionais na atualidade 35- refere-se a um conjunto complexo de elementos

que abarca o: desencadeamento de um processo de formação profissional;

atendimento das competências e atribuições previstas na regulamentação da

profissão (Lei 8662/93); comprometimento para com o Código de Ética de

1993 que orienta as ações profissionais; comprometimento dos profissionais

para com um processo de capacitação continuada; ocupação de espaços

interventivos; desenvolvimento de um processo de produção de conhecimento

centrado nas particularidades da profissão. Podemos afirmar que estes

constituem-se em elementos inerentes ao trabalho do Assistente Social

construídos na relação com os processos históricos de constituição da

profissão e expressivos quanto a possibilidade de garantir efetividade ao seu

projeto ético – político.

Em relação ao próprio processo de trabalho, numa perspectiva ampliada,

rompendo com uma visão endógena e focalista do Serviço Social e buscando

determinações gerais – no âmbito das relações de trabalho - os elementos

constituintes são: a finalidade que imprime direção à atividade do

profissional, “... os meios de trabalho e a matéria – prima ou objeto sobre o

que incide a ação transformadora do trabalho. ...”(IAMAMOTO, 1998, p.95)

35 Um dos marcos referente às mudanças de análise do exercício profissional , inserindo-o no contexto dos processos e relações de trabalho é a construção das diretrizes curriculares que engendraram o processo de reformulação curricular, orientado pela ABEPSS desde 1996. No entanto esta questão não é tranqüila no Serviço Social, apresentando polêmicas e posições diferenciadas conforme podemos verificar nos artigos da Revista Temporalis, número 02, publicação da ABEPSS em 2000.

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É no exercício da prática profissional cotidiana que estes elementos

ganham materialidade, são construídos e reconstruídos e é neste exercício que

o objeto da ação profissional se expressa em suas múltiplas facetas.

O objeto de atenção profissional é a questão social. “... Questão social

apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade

capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez

mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a

apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte

da sociedade. ...” (IAMAMOTO, 1998, p.27)

Os depoimentos tratam do resgate da experiência profissional em torno

do equacionamento das expressões da questão social36 nos espaços de trabalho

ocupados pelos profissionais participantes desta pesquisa, tendo como eixo a

relação com a pesquisa no Serviço Social. Assim destacamos relevâncias.

Vejamos:

“Bom se eu fosse pensar bem do começo eu ia pensar porque eu fui fazer mestrado. Então, quando eu me formei eu tinha uma preocupação de atuar como Assistente Social na prática. Eu queria trabalhar na prática (...) Então, quando eu fui trabalhar na Prefeitura a primeira atuação foi numa Unidade de Saúde. Logo que eu cheguei na Unidade de Saúde, assim a primeira questão que eu já de cara percebi é que eu tinha que conhecer o entorno, quer dizer quem é esse povo. (...)Aí fiquei um tempo na saúde , mas me transferiram pra criança e adolescente, na Casa do Menor.

36 YAZBEK (1999, p.96) traz sobre este aspecto importante esclarecimento: “ Na atual conjuntura de precarização e subalternização do trabalho à ordem do mercado, de erosão das bases da ação social do Estado e de desmontagem dos direitos sociais, civis e econômicos, a questão social, matéria prima da intervenção profissional dos assistentes sociais, assume novas configurações e expressões entre as quais destacamos a insegurança e vulnerabilidade do trabalho e a penalização dos trabalhadores, o desemprego, o achatamento salarial, o aumento da exploração do trabalho feminino, a desregulamentação geral dos mercados. E outras tantas questões com as quais os assistentes sociais convivem cotidianamente são: questões de saúde pública, de violência, da droga, do trabalho da criança e do adolescente, da moradia na rua ou da casa precária e insalubre, da alimentação insuficiente, da ignorância, da fadiga, do envelhecimento sem recursos, etc. Situações que representam para os que as vivem, experiências de desqualificação e de exclusão social ( e que expressam também o quanto a sociedade pode tolerar e banalizar a pobreza sem fazer nada para minimizá-la ou erradicá-la).”

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(...) Daí quando eu entrei na Casa do Menor a dinâmica, a rotina institucional era muito pesada.(...) E num primeiro momento você começa naquele atendimento individual, até pra ver o que aquelas pessoas querem. E a primeira questão que me chamou a atenção é que a maioria das pessoas que estavam ali eram mães de adolescentes que iam na Casa do Menor procurar trabalho pros adolescentes. Isto foi em 89 antes do ECA e a Casa do Menor tinha pra essa população uma representação de que era uma intermediação de mão de obra, tipo a Guarda Mirim. E isto me chamava muito a atenção porque não tinha emprego pra essa população. E a situação, e por mais que eu olhasse as famílias e você pode até pensar que as famílias ficam explorando o trabalho das crianças, mas era uma necessidade concreta e também tinha o entendimento que era melhor o menino trabalhar do que ficar na rua. Então a primeira questão que me chamou pra pesquisa foi pensar: mas que lugar tem pra este povo nesta sociedade?” (Lúcia Cortes da Costa) O depoimento acima traz à tona uma questão crucial à pesquisa que é a

definição do objeto de atenção do profissional no âmbito da sua intervenção.

Objeto este que alimentado pelo processo de problematização da realidade e

dos elementos que o constituem como determinantes aos poucos vai sendo

repensado como objeto também de investigação. Não podemos esquecer,

conforme já afirmamos no capítulo anterior, que este objeto expressa

determinadas relações concretas e contraditórias, que precisam ser

apreendidas em sua complexidade e reconstruídas teoricamente. Um primeiro

momento de aproximação a este objeto é o processo de problematização que

se faz em um contexto determinado. Que contexto determina a configuração

deste objeto e como ele se apresenta ao Assistente Social que se insere em

instituições estatais e privadas? O Serviço Social tem ocupado espaços de trabalho junto às instituições

sociais estatais e privadas, junto às organizações governamentais, não –

governamentais e empresariais, respondendo às demandas que em sua

singularidade expressam aspectos concretos da questão social. Tais respostas

se constituem em prestação de serviços assistenciais e de caráter sócio –

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educativo, que em seu conjunto viabilizam as ações previstas no âmbito das

políticas públicas.

Em especial e historicamente o Assistente Social tem sido requisitado

para trabalhar no serviço público nas esferas federal, estadual e municipal. No

contexto municipal, principalmente nas prefeituras, tem contato privilegiado

com uma população que demanda por serviços imediatos.

...Este tipo de prática faz do Assistente Social um “ profissional da Assistência” , já que ele opera com recursos institucionais para a prestação de serviços, racionalizando e administrando sua distribuição, controlando o acesso e o uso desses serviços pela “clientela”. Ele intermedia as relações entre instituição e “clientela”, articula a população aos órgãos em que trabalha. A prestação de serviços imediatos em que interfere o Assistente Social contribui para que sejam atendidas as necessidades básicas e urgentes de sobrevivência das classes trabalhadoras, especialmente de seus segmentos mais pauperizados, contribuindo com sua reprodução material. É aclopado a esses serviços buscados pela população que o profissional desempenha suas funções tipicamente intelectuais. (IAMAMOTO, 1992, 40 – 41) O depoimento acima revela uma preocupação central com a própria

prática profissional nestas instâncias, que tem em sua natureza uma

contradição fundamental, ou seja a de atender as demandas da população

usuária ao mesmo tempo em que sofre pressão institucional em função de suas

requisições e ordenamento coerentes com a ordem burguesa. “... Desde suas

origens, o serviço social defronta-se com esta contradição que lhe é inerente e

se refere à legitimidade da demanda de seus serviços profissionais: construído

e legitimado pelas instâncias mandatárias da sociedade, desenvolve sua

prática através de um conjunto de ações burocráticas e pedagógicas voltadas à

prestação de serviços às classes subalternas.” (YAZBEK ,1993, p.57)

No entanto a prática referida no depoimento não se configura por ser

imediatista, mas orientada por uma teleologia, dotada de uma finalidade

compromissada com os interesses da classe trabalhadora. Uma prática

preocupada em conhecer o contexto sócio – econômico em que as

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necessidades da população são gestadas, buscando compreender “quem é

esse povo” que chega ao Serviço Social através de demandas aparentemente

individuais.

Para os assistentes sociais, não é a compreensão e a ação sobre a realidade interna e subjetiva dos indivíduos que constitui o objeto da profissão, mas a compreensão e a ação sobre a realidade social – o cotidiano e sua história – objetivando expressar a existência, não só como relações sociais interindividuais, mas como relações sociais de classes, que envolvem interesses divergentes, campos adversários e projetos societários alternativos. Isso implica em processo que não é linear, mas de luta, com avanços e recuos. ... (VASCONCELOS, 2000, p. 132 – 133) O Serviço Social intervém na trama das relações sociais. E estabelecer os

vínculos entre as demandas individuais e o seu caráter coletivo, enquanto

expressão da questão social, supõe a apreensão das mediações presentes nas

relações, como também a construção de mediações que explicite o caráter

coletivo destas demandas. É o desvelamento dessa mediação que vai permitir compreender as políticas sócio –assistenciais como espaços contraditórios onde, se ocorre o controle, o enquadramento dos subalternos, também ocorre a luta por direitos de cidadania e também, embora de modo precário, o acesso real a serviços e recursos que essa população não consegue alcançar. Dessa forma, o Serviço Social participa tanto da criação de condições para a sobrevivência material das classes subalternas, como de uma ação sócio educativa tensionada pela dinâmica contraditória dos interesses em confronto no espaço em que se movimenta. (YAZBEK, 1999, p. 95) A compreensão destas mediações depende de rigorosa leitura da realidade

social que possibilite o reconhecimento das demandas e através delas as

possibilidades de intervenção. Responder a tais requerimentos, exige uma ruptura com a atividade burocrática e rotineira, que reduz o trabalho ao cumprimento de atividades preestabelecidas. O exercício da profissão envolve a ação de um sujeito profissional que tem competência para propor, para negociar com a instituição os seus projetos, defender o seu campo de trabalho, suas qualificações e funções profissionais. Exige, pois, ir além das rotinas institucionais e buscar apreender o movimento da realidade, para detectar tendências e possibilidades nela presentes passíveis de serem impulsionadas pelo

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profissional, desenvolvê-las transformando-as em projetos e frentes de trabalho. (IAMAMOTO, 1999, p. 113)

Buscando compreender as demandas desta população surge outro

embate: “mas que lugar tem pra este povo nesta sociedade?” Buscava-se

compreender as necessidades concretas das famílias empobrecidas e as

alternativas que esta família mobilizava para fazer frente às

imposições/restrições cotidianas que a sociedade lhes colocava. Este embate

foi enfrentado através da pesquisa engajada com as necessidades desta

população. ...Para tanto a pesquisa da realidade social torna-se um recurso fundamental para a formulação de propostas de trabalho e para a ultrapassagem de um discurso genérico, que não dá conta das situações particulares. Essa pode ser uma trilha fértil para se pensar as relações entre indivíduo e sociedade, entre a vida material e a subjetividade, envolvendo a cultura, o imaginário e a consciência. É seguramente um caminho fecundo para a superação de algumas das dificuldades anteriormente mencionadas. (IAMAMOTO, 1998, p. 56)

O lugar social, referido no depoimento, é configurado pelo processo de

exclusão social e empobrecimento crescente da população, gerando um

segmento subalterno em relação às classes sociais e ao conjunto das relações

sociais que demarcam o contexto em que se insere. O Assistente Social

trabalha com um sujeito, que em sua individualidade expressa um sujeito

coletivo, pobre, destituído de bens e do acesso aos serviços que poderiam lhe

garantir qualidade de vida e trabalho. “...Nessa relação, este homem não

aparece como um ser genérico, mas como um ser concreto, vivendo

quotidianamente situações objectivas, com as suas possibilidades e limites.”

(BAPTISTA, 2001, p. 18)

A preocupação com o lugar social ocupado pelo segmento subalterno

traz ao Serviço Social, como motivação inicial, a possibilidade de desvendar

os determinantes sociais, econômicos, culturais e políticos que traçam o

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destino dessa classe, bem como na análise das contradições sociais as

potencialidades da sua transformação.

A categoria subalternidade é fundamental para esclarecer este aspecto e

“... contempla uma diversidade de situações e não expressa apenas a

exploração, mas também a dominação e a exclusão econômica, política, social

e cultural. Como categoria analítica a subalternidade é aqui entendida como

resultante direta das relações de poder na sociedade e se expressa em

diferentes circunstâncias e condições de vida social, além da exploração do

trabalho. ...” .(YAZBEK, 1999, p. 95)

Junto com a subalternidade a pobreza e a exclusão social compõem um

contexto opressivo aos demandatários da prática profissional do Serviço

Social. Pobreza, exclusão e subalternidade configuram-se, pois como indicadores de uma forma de inserção na vida social, de uma condição de classe e de outras condições reiteradoras da desigualdade (como gênero, etnia, procedência etc), expressando relações vigentes na sociedade. São produtos dessas relações, que produzem e reproduzem a desigualdade no plano social, político, econômico e cultural, definindo para os pobres um lugar na sociedade. Um lugar onde são desqualificados por suas crenças, seu modo de expressar-se e seu comportamento social, sinais de “qualidades negativas” e indesejáveis que lhes são conferidas por sua procedência de classe, por sua condição social. Este lugar tem contornos ligados à própria trama social que gera a desigualdade e que se expressa não apenas em circunstâncias econômicas, sociais e políticas, mas também nos valores culturais das classes subalternas e de seus interlocutores na vida social. (...) É bom lembrar ainda, que a pobreza é uma face do descarte de mão de obra barata, que faz parte da expansão capitalista. Expansão que cria uma população sobrante, gente que se tornou empregável, parcelas crescentes de trabalhadores que não encontram um lugar reconhecido na sociedade, que transitam à margem do trabalho e das formas de troca socialmente reconhecidas (...) Expansão que cria o necessitado, o desamparado e a tensão permanente da instabilidade no trabalho. Implica a disseminação do desemprego de longa duração, do trabalho precário, instável e intermitente, dos biscates e de outras , modalidades de relacionamento da força de trabalho com o capital, que em sua essência representam uma mesma ordenação da vida social. (YAZBEK, 2001, p. 34 – 35) (grifo nosso) Pobreza e exclusão são outras concepções que carecem de investigação

permanente, pois tem suas especificidades e dão uma dimensão ampliada das

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várias facetas deste lugar social ocupado pelo povo, principalmente quando

problematizada em sua expressão mais singular.

Pensar a pobreza exige abordar aspectos múltiplos (objetivos e

subjetivos): econômicos, sociais, culturais, históricos, políticos e suas

expressões nas condições de vida de um povo, em um determinado contexto

sócio – histórico. E para nós da área social requer apreender como o próprio

povo pensa e vive concretamente a pobreza. Portanto a pesquisa não se

direciona apenas para a compreensão de um objeto específico em um

contexto recortado da realidade, mais do que isso, está preocupada em

responder objetivamente à complexidade dos problemas sociais que afetam

sujeitos concretos.

As expressões da questão social se dão em diferentes instâncias da

prática profissional, como, por exemplo, no campo da política de saúde – um

dos tradicionais espaços de intervenção profissional.

“Pois é, a minha história de pesquisa ... no Serviço Social ... tem uma interface muito grande com o meu trabalho na área de Saúde Pública... Meu primeiro trabalho foi em uma unidade sanitária, ... e de imediato .... era uma área que eu não tinha grande familiaridade, então eu comecei a buscar conhecer o que era isso, o que essa área de fato me exigia, exigia do trabalho do Assistente Social e foi um período de muita (...) A saúde pública é um terreno muito fértil (...) Bom ali,... eu tive a minha, acho que o primeiro exercício de interdisciplinaridade com aquela equipe e já com um objeto se desenhando que era exatamente como que se dava a prestação da assistência na área de saúde nos postos avançados.” (...) (Jussara Maria Rosa Mendes)

O depoimento de Jussara Maria Rosa Mendes faz importante destaque

quanto a interface com a saúde pública em seu caráter de

interdisciplinaridade.

A política de saúde é espaço “fértil” de delineamento do objeto de

pesquisa. Embora este campo tenha um objeto específico dado pela relação

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saúde/doença, o “objeto” de intervenção e investigação do profissional vai se

“desenhando” através do enfrentamento de suas demandas e desafios

específicos. Por ser um espaço relacional - em que se estabelecem relações

entre profissões/profissionais e destes com as demandas sociais, buscando

respostas orientadas pelas diretrizes da saúde pública – constitui-se em um “terreno muito fértil” de trabalho. Sabemos que a interdisciplinaridade

envolve também a intersubjetividade, muito bem lembrada por MUNHOZ

(1996, p. 167)

Falar em interdisciplinaridade supõe conceber – se, subjacente a essa temática, a intersubjetividade, o que remete à necessidade de relação entre sujeitos; isso porque as diferentes disciplinas/profissões se expressam no real, na prática, como singularidades, através dos sujeitos. E embora no plano teórico a relação interdisciplinar seja, em tese, perfeitamente aceita e viável quanto à sua exeqüibilidade prática, são os sujeitos singulares que podem fazer com que a relação entre as diferentes profissões ultrapasse o terreno da simples vizinhança pacífica, e mesmo da tolerância – expressas, essa simples vizinhança e essa tolerância, pela multidisciplinaridade, que em geral não ultrapassa o plano do solipsismo – para ascender ao plano do “inter” , que supõe mais que o ladear, implicando troca, reciprocidade, discussão, conhecer o outro profissional e a outra profissão na sua alteridade para trocas e complementações. A interdisciplinaridade se alicerça no entendimento do outro como consciência que tem percepções e visões de mundo compatíveis ou não com as nossas, mas com quem podemos discutir. ...

A realidade de trabalho e o espaço interdisciplinar mobilizam o

Assistente Social a sair da não “familiaridade” para o conhecimento e isto se

faz mediado pela pesquisa, buscando definir ou compreender o que se “exige

do trabalho do assistente social”. Evidentemente a resposta não é imediata, se

constrói mediada pelas exigências decorrentes das demandas respondidas pelo

profissional em seu cotidiano profissional, pela atitude investigativa, de

inconformismo frente às determinações de uma lógica e racionalidade

instrumental e pela busca de alternativas à prática profissional, que leva ao

caminho da pesquisa. Conforme MELO E ALMEIDA (2000, p. 235) “...Da

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oscilação do pêndulo, o profissional volta fertilizado; como a margem de um

rio, periodicamente inundada, torna-se boa para novos plantios, significando

aquele exercício de uma abertura ao debate plural e com o diferente. ...”

“Aí fiz um curso de saúde pública, eu sou sanitarista... e quando eu retornei do curso de saúde pública eu fui convidada então a trabalhar na materno – infantil. E na materno infantil eu me dediquei a um tipo de pesquisa, na época nós tínhamos uma mortalidade infantil muito elevada em Porto Alegre. (...) Então o que acontecia? E aí foi quando eu comecei (...) um trabalho buscando a partir da declaração de óbito, do dado negativo, buscar identificar o que que acontecia, fazendo aquilo que eu trabalhei já, inclusive na minha tese, com a necrópsia verbal. Então ver o que que acontecia, remontando a história de vida daquele bebê que perdeu a sua vida ainda no primeiro ano de vida. E eu acho que assim ... que foi um período bastante fértil pra mim, bastante importante em que eu começo ali a estabelecer as inter – relações com a pesquisa na área de saúde, com os dados epidemiológicos, com a pesquisa epidemiológica, cruzando com pesquisa qualitativa, buscando conhecer um pouco mais das histórias de vida dessas famílias que tinham esse problema...” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Na sua continuidade, o depoimento traz à tona a importância dos cursos

de pós - graduação, como um primeiro momento, após a graduação de

preparação para a pesquisa e no espaço da Saúde Pública.

“ ...A pós – graduação foi instituída com o objetivo de criar condições

para a pesquisa rigorosa nas várias áreas do saber, desenvolvendo a

fundamentação teórica, a reflexão, o levantamento rigoroso de dados

empíricos da realidade, objetivo das várias ciências, assim como o melhor

conhecimento desta realidade. Enfim, a ciência se faz em todas as frentes e

não apenas se transmite. ...(SEVERINO, 1996, p.111)

Neste âmbito, os cursos de especialização, considerados lato sensu, têm

“... um objetivo técnico – profissional específico, não abrangendo o campo

total do saber em que se insere a especialidade. ...” (CURSOS DE

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ESPECIALIZAÇÃO (...) ,http://www.mec.gov.br/sesu, consultado em

13/03/2005)

Já os cursos de mestrado e doutorado – stricto sensu – tem por objetivo

formar intelectuais, professores de ensino superior e pesquisadores, que em

muitos casos atuam nas instituições públicas e privadas, viabilizadoras das

políticas sociais. Assim exigem... ... além do cumprimento de determinada escolaridade, a realização de uma pesquisa que se traduza, respectivamente, na dissertação e na tese. Trata-se de concretizar os objetivos justificadores deste nível de ensino: abordar determinada problemática mediante exigente trabalho de pesquisa e reflexão, apoiado num esforço de pesquisa de fundamentação teórica a ser assegurada através dos instrumentos fornecidos pela escolaridade. (SEVERINO, 1996, p.112) Neste caso o destaque aos cursos de Saúde Pública37 que abarcaram

profissionais de diferentes áreas de conhecimento e que atuavam no campo da

saúde, como assistentes sociais, enfermeiros, médicos, dentistas,

farmacêuticos e bioquímicos, psicólogos entre outros.

O depoimento revela também que o objeto de atenção tinha por

requisição o domínio da metodologia de pesquisa coerente com o objeto de

estudo, a exemplo da metodologia utilizada – “necropsia verbal”38 - e o

37 Segundo CANESQUI (1997, p.11) “ A emergência da presença das ciências sociais na pesquisa social em saúde, na formação de profissionais dos campo biomédico, sanitário e na Saúde Coletiva, não é nova no Brasil. Sua institucionalização deu-se, em nossa sociedade, principalmente a partir da década de 70. Sofreu, dentre outros fatores, os efeitos da intervenção estatal, através das políticas de reformulação e expansão do ensino – médico, da construção de sistema de pós – graduação e de ciência e tecnologia pertinentes à Saúde Coletiva e das modificações da organização da assistência médica e da Saúde Pública engendradas pela intervenção do Estado. Além disso, a expressão dos distintos movimentos reformadores (medicina integral, preventivismo e medicina comunitária) e posteriormente do próprio movimento sanitário favoreceu a valorização da incorporação das ciências sociais à Medicina e à Saúde Coletiva, como também não devem ser minimizadas as distintas influências internacionais que, em diferentes momentos históricos, portaram redefinições dos saberes e práticas médicos ou sanitários, envolvendo a estreita interlocução com as ciências sociais.” 38 Necropsia Verbal: “...Essa técnica consiste em se efetuarem visitas domiciliares e entrevistas orientadas por um questionário padrão, estruturado a partir das informações constantes nas Dos. Ela tem por finalidade a validação dessas informações junto aos familiares ou amigos que tenham acompanhado a vítima , permitindo confirmar-se ou refazer-se o diagnóstico da causa da morte, bem como acrescentarem-se outras informações pertinentes.” (MENDES: 1999, p.164) - (Esclarecendo: “DOs” são Declarações de Óbitos)

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estabelecimento de articulações entre a pesquisa qualitativa e quantitativa –

demanda concreta da realidade de pesquisa na área de saúde.

“ ...A pesquisa é uma criação que mobiliza a acuidade inventiva do

pesquisador, sua habilidade artesanal e sua perspicácia para elaborar a

metodologia adequada ao campo da pesquisa, aos problemas que ele enfrenta

com as pessoas que participam da investigação. ...” (CHIZZOTTI, 1991.p. 85)

A coerência entre os procedimentos metodológicos de pesquisa e o objeto

investigável não é dado à priori pelo referencial teórico- metodológico, mas

pela constituição do objeto em sua expressão concreta no real.

A delimitação do problema não resulta de uma afirmação prévia e individual, formulada pelo pesquisador e para a qual recolhe dados comprobatórios. O problema afigura-se como um obstáculo, percebido pelos sujeitos de modo parcial e fragmentado, e analisado assistematicamente. A identificação do problema e sua delimitação pressupõem uma imersão do pesquisador na vida e no contexto, no passado e nas circunstâncias presentes que condicionam o problema. Pressupõem, também, uma partilha prática nas experiências e percepções que os sujeitos possuem desses problemas, para descobrir os fenômenos além de suas aparências imediatas. A delimitação é feita, pois, em campo onde a questão inicial é explicitada, revista e reorientada a partir do contexto e das informações das pessoas ou grupos envolvidos na pesquisa. (CHIZZOTTI, 1991, p.81) A realidade apresenta domínios quantificáveis e qualificáveis, portanto

apreender o objeto em seus elementos constitutivos exige trabalhar as

dimensões “qualitativa” e quantitativa em um mesmo processo de pesquisa. No

caso da Saúde Pública a “epidemiologia” tem espaço relevante, tratando-se do

“... estudo da distribuição e dos determinantes de estados ou eventos

relacionados à saúde em populações específicas e suas aplicações no controle

de problemas de saúde.” (LAST apud ANGELO, 2005, s/p)

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A epidemiologia 39tem como um de suas ferramentas a estatística. Neste

caso os estudos de dados epidemiológicos “orientam decisões de saúde

pública e contribuem para o desenvolvimento e avaliação de intervenções para

o controle e prevenção de problemas de saúde.” (ANGELO, 2005, s/p).

A perspectiva que articula os estudos de natureza quantitativa e os

estudos de natureza qualitativa ampliam as possibilidades de compreensão das

problemáticas no campo da saúde.

“ Assim o mínimo que podemos dizer é que há horizontes não - empíricos

, que fazem parte da realidade. É fundamental que a ciência os capte,

principalmente é essencial que não reduza a realidade ao tamanho do que

consegue captar. ...” (DEMO, 1999, p. 20)

...A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito – observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. O objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações. (CHIZZOTTI, 1991, p. 79)

Captar esses significados e relações exige ir para além do dado

quantificável, como para as “histórias de vida”. A história de vida faz parte da

metodologia que prioriza as fontes orais e ... se define como um relato de um narrador sobre sua existência através do tempo, tentando reconstituir os acontecimentos que vivenciou e transmitir a experiência que adquiriu. Narrativa linear e individual dos acontecimentos que ele considera significativos, através dela se delineiam as relações com os membros de seu grupo, de sua profissão, de sua camada social, de sua sociedade global, que cabe ao pesquisador desvendar. Desta forma o interesse deste último está em captar algo que ultrapassa o caráter individual do que é transmitido e que se insere nas coletividades a que o narrador pertence. ...(QUEIROZ, 1987, p.275)

39 Discussões sobre as polêmicas teóricas acerca do objeto da espistemologia ver em COSTA, Dina C. (org.) Epidemiologia: teoria e objeto. São Paulo: HUCITEC – ABRASCO, 1994.

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O exercício da pesquisa traz ao profissional inúmeras possibilidades de

aprendizagem. Sobretudo, possibilita aprender a trabalhar com as diferentes

dimensões da realidade, construindo recursos para captar estas dimensões e

estabelecer as relações necessárias à compreensão do objeto de estudo.

“Eu desde da minha formação, graduação, interessante que eu fiz uma pesquisa de campo, eu fiz entrevistas, eu dei tratamento estatístico aos resultados e uma conclusão no meu trabalho de conclusão de curso é que nós deveríamos ter maior formação em Sociologia na formação em Serviço Social, porque nós tínhamos àquele período maior formação em Psicologia e eu, então, termino reivindicando maior informação sociológica, porque pra interpretação dos dados da pesquisa eu precisava ter maior conhecimento da sociedade e relacional, naquele momento em que eu estava estudando. E acho que eu fui bastante estimulada, talvez seja uma curiosidade minha, a ter esta noção da totalidade das coisas.” (...) (Aldaíza Sposati) (...) “iniciei minha experiência de pesquisa na graduação, ainda estudante, por ocasião do meu TCC. Considero que todas as pesquisas que desenvolvi foram relevantes para a minha experiência. Contudo, há uma particularidade: meus objetos de pesquisa sempre foram - deste 1975 – vinculados a questão do trabalho. Então, para mim o relevante foi desenvolver pesquisas que ao longo da minha trajetória permitiram cada vez mais uma aproximação ao meu objeto: o trabalho sob o capital e as refrações e conexões com o Serviço Social. Iniciei com a discussão do serviço social nas empresas e em seguida ampliei a questão para trabalho e proteção social, aprofundando em cada momento a questão do trabalho e dela extraindo as demais problemáticas pesquisadas. Também relevante foi ter tido oportunidade de publicar meus trabalhos de pesquisa e de ter discutido muito com os profissionais da área.” (Ana Elizabete Mota)

Os depoimentos acima trazem alguns elementos essenciais para se

compreender que a pesquisa envolve um processo que decorre do

investimento em formação profissional. A “graduação” abre o processo de

pesquisa. Neste processo a graduação e nele o “Trabalho de Conclusão de

Curso” ganha destaque. A graduação não só é espaço essencial para o

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desenvolvimento da atitude investigativa, como nele o aluno tem a

oportunidade de construir sínteses e de estabelecer ricas relações entre a

realidade da prática profissional em campos de estágio e o conhecimento

acumulado pela profissão no âmbito das Ciências Sociais e da tradição

marxista. O TCC constitui momento singular de sistematização de

conhecimento. “ ...a sistematização de dados (ou aspectos, traços, facetas) pertinentes a um fenômeno, grupo ou fenômenos ou processo(s) constitui um procedimento prévio e necessário à reflexão teórica. Vale dizer, os procedimentos sistematizadores, especialmente fundados na atividade analítica da intelecção configuram um passo preliminar e compulsório da elaboração teórica – sem, entretanto, confundir-se com ela.” (NETTO, 1989, p. 141 – 142)

O TCC, embora seja uma exigência curricular para obtenção da

graduação no curso de Serviço Social, “...Deve ser entendido como um

momento de síntese e expressão da totalidade da formação profissional. É o

trabalho no qual o aluno sistematiza o conhecimento resultante de um

processo investigativo, originário de uma indagação teórica, preferencialmente

gerada a partir da prática de estágio no decorrer do curso.”

(ABESS/CEDEPSS, 1997, p. 72)

Quanto mais as temáticas da pesquisa desenvolvida na graduação

estiverem vinculadas ao processo de problematização da realidade vivenciadas

nos campos de estágio, maiores as possibilidades de contribuições efetivas

serem formuladas, contribuindo para o amadurecimento do aluno, enquanto

futuro profissional.

No entanto este primeiro momento por vezes sofre fracionamentos, ou

seja, nem todos os profissionais conseguem manter viva a atitude

investigativa e trabalhar a pesquisa em seu espaço de intervenção profissional

visto que as exigências do mercado de trabalho ou as próprias exigências

institucionais impedem uma prática em que a pesquisa esteja vinculada,

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voltando –se para uma prática centrada no atendimento das requisições

instituicionais.

Verificamos na exposição de Aldaíza Sposati mais uma vez a graduação

como elemento formador da atitude investigativa e mobilizador do interesse

profissional em manter viva a relação pesquisa/prática profissional, tendo

como referência uma perspectiva crítica de compreensão da realidade em sua

dimensão de “totalidade” sócio – histórica. Aponta que uma pesquisa com

essa preocupação e orientação não se limita à descrição do real através de um

objeto determinado, mas através deste elemento supera a sua aparência

fenomênica e avança para compreensão dos elementos determinantes e

constituintes de sua natureza contraditória e do princípio da dependência

recíproca, ou seja, “...não há fato social assim como não há pessoa que seja

autônoma, auto – suficiente , que se explique por si. Na verdade, todos os

fatos econômicos, sociais, culturais, psicológicos, são explicáveis na medida

em que se compreende a trama das relações nas quais estes fatos se inserem.”

IANNI, 1984, p. 98 - 99)

O depoimento de Ana Elizabete Mota deixa claro ainda que a pesquisa

deve ser entendida como processo de aproximação sucessiva ao objeto de

estudo: “ o trabalho sob o capital e as refrações e conexões com o Serviço

Social” . Neste processo há um traço de “particularidade”: o objeto de pesquisa

sempre voltado à questão do “trabalho”.

Grande valor concebe à oportunidade de publicação e de discussão com

“profissionais da área”. “ A pesquisa é enfatizada e incentivada, não como

atividade em si, mas como recurso de desenvolvimento da ciência, da

tecnologia, da difusão da cultura e, desse modo, do desenvolvimento do

homem e do ambiente em que vive. A produção do conhecimento tem como

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interface a sua divulgação, sem a qual ele fica inócua. ...” (WANDERLEY,

1998, p. 13 – 14)

Quanto a publicação devemos destacar as dificuldades de se fazê-lo,

devido a pouca tradição na área e aos parcos veículos próprios que poderiam

proporcionar ao Serviço Social este alcance. Normalmente esta possibilidade

está vinculada à pós – graduação e aos meios acadêmicos. Portanto a

socialização de conhecimento na área sempre encontrou nestes canais os

meios e recursos necessários, mas nem sempre suficientes. (discutiremos isso

oportunamente).

“Bom eu estou fazendo todo este preâmbulo para te dizer porque que eu acabei me voltando para pesquisa e buscando sistematizar o conhecimento. Eu cheguei num impasse, eu cheguei à conclusão de que não podia ficar somente naquele espaço do Judiciário, ou eu saía de lá – e na época prestei outros concursos, passei e depois acabei não assumindo - ou eu ia conhecer melhor essa realidade de trabalho para buscar dar uma outra direção para o trabalho. Na ocasião realizei concursos para outras instituições, fiz algumas outras atividades fora da área, foi um período um pouco difícil, mas acabei concluindo que para que eu pudesse compreender melhor aquela realidade e buscar uma outra forma de intervenção eu precisava conhecer melhor aquela realidade - e não existia praticamente nada sistematizado a respeito do trabalho do Assistente Social no espaço do Judiciário. Existia alguns textos, às vezes - na época mimeografados - alguns trabalhos isolados, mas nenhum que avançasse na sistematização, que tivesse uma visão mais crítica daquela realidade. Eu fiz uma pesquisa ampla e não localizei realmente nada numa perspectiva crítica, e mesmo numa visão mais tradicional não existia praticamente nada a respeito dessa área.” ( Eunice Teresinha Fávero)

O depoimento faz referência ao nível da sistematização do conhecimento

e o temos como um primeiro e importante nível de aproximação à realidade e

muito utilizado para que o profissional organize seus conhecimentos,

específicos da sua área de atuação, seus instrumentos de trabalho e as

demandas da população usuária. Deixa claro também os propósitos da ação

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profissional. O nível da sistematização pode facilitar e estimular o

profissional a problematizar sua realidade de trabalho, forçando-o a reflexões

que o impulsione para um nível mais elevado – o da busca de construção de

conhecimento em torno de um objeto específico. Este nível pode dar

visibilidade para os impasses e angústias profissionais.

É o que percebemos neste depoimento – enquanto indicativo para

estabelecermos relações entre pesquisa e prática profissional, pois a

experiência no Judiciário: atendimento individualizado, ambiente hierárquico,

rígido, autoritário e formação acadêmica mais crítica da profissional levou a

um “impasse: “ ou eu saía de lá (...) ou eu ia conhecer melhor essa realidade de

trabalho para buscar dar outra direção para o trabalho.”

A dura realidade social que se apresenta aos nossos olhos inquietos é desafiante , seja pela sua crescente complexidade, seja pelas amargas contradições que se traduzem, em síntese, na desigualdade que a desumaniza.. Diante disso, duas grandes veredas se apresentam aos sujeitos sociais (profissionais ou não): o enfrentamento ou a indiferença (tão em voga sob a capa da liberdade individual). No caso dos assistentes sociais esse dilema parece soar mais contundente, pois que não podem pretextar ignorância, já que a realidade com que cotidianamente trabalham os está pressionando a tomar um posicionamento. (PONTES, 2000, p.49)

Esta busca leva à descoberta da inexistência de material crítico,

sistematizado sobre o judiciário, o que, por sua vez, força a construção de

referenciais baseados na própria história do Serviço Social neste espaço.

Processo em que se descobre a realidade e as potencialidades profissionais.

Na prática profissional dos assistentes sociais, as mediações entre a elaboração teórica e a intervenção se dão de maneira complexa: os sujeitos se põem diante de problemas muito específicos, têm que responder a questões muito concretas, numa sociedade extremamente diversificada. Nesse espaço, o profissional não tem apenas que analisar o que acontece, mas tem que estabelecer uma crítica, tomar uma posição e decidir por um determinado tipo de intervenção. Na sua forma particular de construção de conhecimento – que se volta para a prática emerge uma maneira peculiar de ver problemas e construir soluções e aplicações tecnológicas. No mesmo

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movimento em que procura conhecer a realidade, vai construindo no pensamento um projecto para a acção. ... (BAPTISTA, 2001, p. 20) A prática da pesquisa vinculada ao exercício da prática profissional, com

certeza, e o depoimento demonstra isto, pode não só proporcionar a descoberta

das lacunas na própria história do Serviço Social, nos mecanismos de

interdição à uma prática crítica e comprometida, como também, as

contradições presentes nos contextos em que o profissional intervém.

Compreendidas estas contradições podem gerar/mobilizar ações conscientes

da força e potencial da profissão.

“Olha, eu comecei a fazer pesquisa quando eu ingressei na pós – graduação. É claro que na época que eu fiz graduação na UERJ, a UERJ ainda não tinha um avanço, compreensão, não tinha um grupo de pesquisa constituído. As experiências de iniciação científica ainda eram muito restritas, muito pontuais. Então eu fiz, claro, uma pesquisa mais de natureza bibliográfica para um trabalho de conclusão de curso. Mas eu não consigo considerar aquilo, exatamente, como um processo de pesquisa. Então, assim, a minha relação com a pesquisa inicia quando eu entro na universidade num concurso público na UERJ e com 40 horas, portanto existia uma demanda institucional de que eu tivesse um projeto de pesquisa ou de extensão e isso combinado ao ingresso no Mestrado, foi ao mesmo tempo. É, bom, aí inicia minha trajetória de pesquisa. Eu apresentei um projeto na UERJ, que, assim, como eu tive uma trajetória de sair do movimento estudantil praticamente direto para o mestrado e para a docência, eu trazia algumas preocupações, ainda do meu passado recente, com a questão da formação profissional. Dentre essas preocupações, uma das questões que me incomodavam era uma certa falta – no contexto da formação profissional – da discussão da realidade brasileira. Eu achava a nossa formação.... isso depois a própria ABEPSS vai amadurecer e isso vai resultar no currículo, nas diretrizes curriculares de 96. A gente estava com uma formação originária do currículo de 82 muito teoricista. Então, tanto o exercício profissional quanto a realidade brasileira estavam subsumidas no debate, necessário que nós fizemos nos anos 80, teórico, mas que acabou gerando uma espécie de via teoricista na formação profissional. Esse balanço vai ser feito pela própria ABEPSS, isso vai resultar nas diretrizes curriculares. E, assim, a reflexão que eu fazia na época, eu apresentei um projeto de pesquisa para a

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analisar os programas de disciplina de política social nas Universidades do Rio de Janeiro. Então, essa foi a minha primeira pesquisa. Então aí tem uma discussão sobre o próprio conceito de política social. Eu queria observar como é que, do ponto de vista teórico, estava sendo feita a abordagem sobre política social. E, como é que estava sendo isso na organização curricular. Essa pesquisa foi a base inicialzinha para o que depois vai ser a minha dissertação no mestrado e, que depois, cinco anos depois que eu defendi.... Foi uma dissertação sobre as abordagens teóricas da política social e o debate, no campo da tradição marxista, sobre política social, o quanto esse debate estava incorporado ou não na discussão profissional. Então, foi uma pesquisa teórica e documental, os programas, as disciplinas... foi uma pesquisa basicamente teórica e documental, na dissertação de mestrado. Bom, então foi isso, o início da minha trajetória de pesquisadora é com esse trabalho.”( Elaine Rossetti Behring)

O depoimento relata e aponta para o fato de que há diferenças em termos

de oportunidade de se fazer pesquisa. O espaço tradicional de intervenção

profissional - como nas instituições públicas e privadas pouco oferece em

termos de oportunidade ao profissional de exercitar a pesquisa vinculada à sua

prática. Já o espaço acadêmico, onde o Assistente Social atua como docente,

tem por natureza e constituição a pesquisa como um de seus esteios.

Neste caso o marco é a pós – graduação e a “demanda institucional” por

pesquisa. Articulada à extensão e ao ensino a pesquisa alimenta o processo

ensino – aprendizagem e dá vida à academia, vinculando este espaço

institucional às demandas concretas da realidade. Não podemos acreditar que

em todas as universidades esta articulação ensino, pesquisa e extensão se faça,

pelo contrário, há uma ênfase no ensino, como espaço de reprodução de

conhecimento e não de sua construção. No entanto o depoimento é claro ao

afirmar que a pesquisa era “ uma demanda institucional”.

Junto ao processo de pesquisa, enquanto demanda institucional faz-se o

mestrado. Neste processo observamos que os objetos de pesquisa retratam

também o nível de amadurecimento da própria profissão e as suas demandas

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enquanto profissão inscrita na divisão social e técnica de trabalho que requer

um processo específico de formação profissional. Como exemplo a

preocupação com a “ política social” e o seu “debate no campo da tradição

marxista”. No conjunto estas produções contribuíram para o amadurecimento

da profissão.40

“Tenho procurado acompanhar o movimento da pesquisa nas Ciências Sociais de uma maneira geral e particularmente no serviço Social nos últimos anos. A minha experiência transita por aí. Tenho realizado estudos onde procuro demonstrar a interface da pesquisa com o estágio supervisionado; a possibilidade da utilização da metodologia da história oral no desenvolvimento da prática profissional aproximando, com isso, o profissional de uma prática crítica, contextualizada, com possibilidades de construção de conhecimentos rigorosos, sistemáticos e representativos da estreita e inseparável relação teoria/prática. Nos últimos anos tenho me dedicado à pesquisa gerontológica. Em síntese, apesar de tudo faço pesquisas, pois não acredito numa docência sem pesquisa, numa academia onde a produção do conhecimento não alimente permanentemente a prática docência – ensino.” (Aglair Alencar Setubal)

Verificamos no depoimento de Aglair Alencar Setubal uma preocupação

em estar atenta às transformações societárias e sua incidência no conjunto de 40 -KAMEYAMA ( 1998, p.33-76) faz importante levantamento sobre as temáticas de pesquisa entre 1975 – 1997. Dentre elas refere-se à política social, lembrando que: “ Embora política social constitua um tema central da área e tenha sido colocada como campo prioritário de atuação e pesquisa, principalmente a partir de 1978, as primeiras dissertações sobre o tema surgem em 1983, no Programa de Pós – Graduação da UFPB, que tem como área de concentração ‘Política Social e Fundamentos Teórico – Práticos do Serviço Social’. Posteriormente foram feitas dissertações sobre o tema na PUC/SP em 1984, na UFPE em 1986, na PUC/RJ em 1987, na PUC/RS em 1988 e UnB em 1993. Este fato nos mostra que os temas emergentes na área de Ciências Sociais têm um rebatimento tardio na área de Serviço Social.” A disciplina de Política Social passa a fazer parte da graduação e pós – graduação nos anos 80. -Durante o IX ENPESS ( realizado em 2004 – PUC/RS) SILVA (2004) apresentou em mesa coordenada trabalho referente à distribuição das áreas de concentração e linhas de pesquisa pelos Programas de Pós – Graduação em Serviço Social no Brasil, observando que Política Social, Políticas Públicas, Avaliação e Gestão de Políticas Sociais têm 41 indicações, passando a ser esta temática prevalente na produção acadêmica do Serviço Social. -Também IAMAMOTO (2005), em palestra sobre “Os caminhos para a pesquisa no Serviço Social”, apresentou quadro atual da produção acadêmica do Serviço Social, tendo por base o Relatório Anual da CAPES de 2004 referente ao ano de 2003. Identificou 55 linhas de pesquisa, congregando 581 projetos de pesquisa. A predominância dos eixos temáticos voltam-se para Políticas Sociais, Estado e Sociedade Civil, correspondendo a 34,5% das linhas de pesquisa. (Palestra Gravada - Aula Inaugural – Programa de Pós – Graduação em Serviço Social – PUC/São Paulo – 2005).

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conhecimentos produzidos pelas “Ciências Sociais” e que alimentam o debate

profissional. Há também uma preocupação com a vinculação à formação

profissional, em especial com o “estágio”. Na proposta Curricular da ABEPSS,

o Estágio “...é uma atividade curricular obrigatória que se configura a partir

da inserção do aluno em espaço sócio – institucional objetivando capacitá-lo

para o exercício do trabalho profissional, o que pressupões supervisão

sistemática.” (ABEPSS/CEDEPSS, 1997, p. 71)

O estágio é espaço rico na medida em que propicia o desenvolvimento da

capacidade técnico – operativa, fundamentado em pressupostos teórico –

metodológicos e éticos do Serviço Social. É através da inserção do aluno em

campos de atuação profissional que o mesmo tem a oportunidade de vivenciar

a complexidade das expressões da questão social. É também neste espaço que

- de forma fértil – desenvolve a capacidade criativa e a atitude investigativa,

problematizando a realidade de intervenção profissional, buscando com os

profissionais e de forma coerente com as demandas sociais, alternativas

metodológicas de intervenção. Vinculado à prática de estágio, a pesquisa

desenvolvida pelo acadêmico ganha relevância social e materialidade.

A universidade – enquanto responsável por promover a produção de

conhecimento - ao estabelecer uma relação crítica, criativa e responsável

socialmente com os espaços de intervenção profissional mantém ativa a

relação “teoria/prática” mencionada no depoimento acima.

No entanto, mesmo no espaço acadêmico muito das pesquisas que se

fazem dependem de um esforço pessoal do professor em função de um

compromisso em alimentar “permanentemente a prática docência – ensino.”

Na realidade, em grande parte das universidades brasileiras, ainda hoje, a

pesquisa quando é feita, é fruto da iniciativa pessoal do pesquisador. Ele

mobiliza recursos financeiros e materiais, ele agrega pesquisadores iniciantes

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e compõem equipes de trabalho e quando não dispõe de recursos financeiros, e

organiza com recursos próprios para alcançar seus objetivos, enfrentando a

burocracia institucional e compondo, em sua carga horária fechada de

trabalho, espaços para a pesquisa. Talvez isto não seja realidade em grandes

instituições universitárias de tradição em pesquisa, constituindo-se em

referência nacional, mas com certeza é realidade para universidades de médio

porte, onde a tônica é o ensino e a formação de mão de obra para o mercado

de trabalho.

“...A maior parte dos investigadores precisa dedicar suas energias a fins e

a condições instrumentais – como obtenção de verbas, contrato pessoal,

meios técnicos de pesquisa, etc., como se a pesquisa científica não estivesse

institucionalizada e como se certos esforços devessem ser eternamente

repetidos. ...” (FERNANDES, 1979, p. 252)

Considerando as dificuldades para se movimentar os esforços de um

pesquisador podemos refletir sobre as dimensões da pesquisa e sobre seu

significado, quando extrapola o nível da sistematização de dados e

informações e as imposições burocráticas ao seu exercício.

“Aí, eu não sei como você vê isso, mas, assim, você tem dimensões... eu estou considerando aqui como pesquisa um processo de investigação, que tem um componente, uma clara articulação teórica, empírica... e é um processo de longa duração, longa eu não diria, de média duração. Na verdade um projeto intelectual de longa duração.... Que não é a investigação, levantamento de dados, ou a dimensão investigativa que necessariamente existe no trabalho profissional. Então, eu estou falando aqui de pesquisa como um projeto intelectual de largo prazo. Eu acho até que tem um certo início na graduação, mas ele se consolida de forma madura no mestrado e depois no doutorado.“ (...) (Elaine Rossetti Behring)

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O diferencial neste depoimento é uma concepção de pesquisa . Primeiro:

“pesquisa supõe um processo de investigação, que tem um componente, uma

clara articulação teórica, empírica...”

Segundo: Pesquisa é “um processo de longa duração.(...) Na verdade um

projeto intelectual de longa duração...”

Este depoimento põe em evidência que além de exercício sistemático de

indagação da realidade observada, pesquisa implica em uma teleologia, ou

seja, uma consciência da finalidade que imprime significado ao processo de

investigação e o desenvolvimento de um esforço pessoal e profissional. Este

requer investimento, formação continuada e amadurecimento quanto ao

domínio teórico – metodológico necessário ao processo de contínua

aproximação ao objeto delineado para pesquisa.

SEVERINO (1996, p. 113 – 116) alerta que independente de estarmos no

âmbito do mestrado ou do doutorado todo trabalho de pesquisa caracteriza-se

por ser “...pessoal, autônomo, criativo e rigoroso.”

Trabalho pessoal no sentido em que “qualquer pesquisa, em qualquer nível, exige do pesquisador um envolvimento tal que seu objeto de investigação passa a fazer parte de sua vida”, a temática deve ser realmente uma problemática vivenciada pelo pesquisador, ela deve lhe dizer respeito. Não obviamente, num nível puramente sentimental, mas no nível da avaliação da relevância e de significação dos problemas para o próprio pesquisador, em vista de sua relação com o universo que o envolve. A escolha de um tema de pesquisa, bem como a sua realização necessariamente é um ato político. Também neste âmbito não existe neutralidade. (SEVERINO, 1996, p. 113) Neste sentido tem uma dimensão social, pois posiciona o pesquisador em

relação aos fenômenos sociais, deixando claro qual a direção de sua pesquisa e

o que pretende alcançar com seus resultados, bem como a sua sensibilidade

para com as exigências das transformações do mundo contemporâneo e que

afetam diretamente o exercício profissional.

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Trabalho autônomo quer dizer que ele é fruto de um esforço do próprio pesquisador. Autonomia esta que não significa desconhecimento ou desprezo da contribuição alheia, mas ao contrário, capacidade de um inter – relacionamento enriquecedor, portanto dialético, com outros pesquisadores, com os resultados de outras pesquisas, e até mesmo com os fatos. Este inter – relacionamento é dialético na medida em que ele nega, ao mesmo tempo em que afirma, a relevância da contribuição alheia. Esta só é válida quando incrementa a instauração da autonomia de pensamento do pesquisador. É reconhecendo e assumindo, mas simultaneamente negando e superando o legado do outro, que o pensamento autônomo se constitui. (SEVERINO, 1996, p. 114) Uma característica essencial do trabalho científico é a criatividade.

Enquanto potencial do pesquisador a criatividade possibilita duvidar do

arsenal técnico e das respostas prontas, na medida em que as relações

presentes na realidade, apreendidas pelo movimento da pesquisa, exigem

posicionamentos e construções que possam estabelecer as articulações

necessárias entre o suporte teórico – metodológico e a processualidade

pertinente à natureza do objeto.

...Não se trata mais de apenas aprender, de apropriar-se da ciência acumulada mas de colaborar no desenvolvimento da ciência, de fazer avançar este conhecimento aplicando-se o instrumental da ciência aos objetos e situações, buscando-se seu desvendamento e sua explicação. Embora não se possa falar de criatividade sem um rigoroso domínio do instrumental científico, uma vez que o conhecimento humano não se dá por espontaneidade ou por acaso, é bem verdade também que não basta conhecer técnicas e métodos. É preciso uma prática e uma vivência que façam convergir estes dois vetores, de modo que os resultados possam ser portadores de descobertas e de enriquecimentos. ...(SEVERINO, 1996, p. 115 – 116) Não podemos, no entanto cair no espontaneísmo, pois trabalho científico

supõe exercício de rigor quanto ao tratamento teórico – metodológico

dispensado ao tema. “...Esta exigência não se põe à exigência da criatividade,

antes a pressupõe. (...) Além da disciplina imposta pela metodologia geral do

conhecimento e pelas metodologias particulares das várias ciências, exige-se

ainda a disciplina do compromisso assumido pela decisão da vontade. Não se

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faz ciência sem esforço, perseverança e obstinação. ...” (SEVERINO, 1996, p.

116)

O ponto de partida pode se encontrar na graduação, ser fundamentado e

exercitado neste primeiro momento mas deve encontrar na pós – graduação os

meios necessários para seu amadurecimento. Precisamos deixar claro,

amadurecimento vinculado a particularidade da profissão, que tem na

intervenção sua razão de ser.

Elaine Rossetti Berhring alerta que – enquanto “projeto intelectual de

largo prazo” - o objeto do pesquisador o acompanha em sua trajetória

acadêmica e profissional. Vejamos como esta realidade comparece nos

depoimentos que seguem:

“Aí eu fui pro mestrado e no mestrado eu queria pesquisar a questão social no Brasil... (...) Aí então que eu comecei a entender que não era a questão social em si, mas era a estruturação do capitalismo no Brasil. E como que então no Brasil se colocava a questão social mas não como uma questão isolada, mas como uma questão decorrente da própria particularidade histórica do capitalismo aqui, que foi minha primeira pesquisa, que eu digo assim pesquisa. Agora o que me motivou entender isto? Era sempre aquela situação bem concreta que eu tinha vivido na casa do menor. Aquele primeiro levantamento que eu fiz das fichas das pessoas que a procuravam. (...) A grande demanda era de pessoas que não tinham renda e que não tinham inserção no mercado de trabalho. E a grande questão na pesquisa do mestrado foi entender como o Brasil se modernizou, foi transformando toda sua estrutura produtiva, sem inserir essa população e qual seria então a perspectiva ... como a gente podia, pelo Serviço Social, entender qual a perspectiva de trabalho pra essa população? Será que era uma coisa assim: nós não estamos sabendo fazer? Ou é um limite estrutural? Porque eu achava que também, muitas vezes, podia ser um limite da prática profissional. E nós não..... E aí essa pesquisa me deu , eu penso, um entendimento sobre o quadro social. Até pra poder entender aquela realidade ... e até pra acalmar, enquanto profissional ... porque eu saí com aquela sensação de que eu não tinha conseguido fazer nada, quando na verdade pela pesquisa você entende (...)

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É você entende que não, que não é que você em si não conseguiu fazer. É que existe um quadro estrutural, que embora os sujeitos possam fazer coisas, que embora você tenha um espaço de atuação, mas o quadro estrutural pesa e daí então que eu fui trabalhar com a particularidade do capitalismo no Brasil. (...) Então essa foi a primeira experiência de pesquisa e ela nasce dessa preocupação de entender esse campo de atuação do Serviço Social. O que a gente faz com essa população. Como que a gente pode tratar. Primeira coisa é entender porque que essa população vive assim. Então foi isso.” (Lúcia Cortes da Costa)

Pesquisa é possibilidade de catarse, ou seja, forma de enfrentamento dos

impasses e limites da profissão e compreensão do campo de atuação do

Serviço Social, oportunizando ao profissional posicionar-se e localizar-se

como sujeito do processo de intervenção e de conhecimento sobre a dinâmica

do contexto em que se movimenta.

O Serviço Social - enquanto profissão que trabalha com as seqüelas do

desenvolvimento do capitalismo e opera com políticas públicas que em sua

natureza contraditória nem sempre respondem concretamente às demandas

sociais – carrega em seu processo de constituição da identidade profissional –

em seu modo de ser e de aparecer – uma grande responsabilidade: eficácia no

processo de enfrentamento das demandas sociais em sua natureza objetiva e

subjetiva. No processo institucional por vezes não fica claro que há

determinações universais que impedem o equacionamento destas questões.

Assim o depoimento aponta para a pesquisa como um alternativa necessária

para o desvelamento da real identidade41 profissional, no âmbito da divisão

sócio – técnica do trabalho.

41Sobre Identidade, enquanto categoria de natureza dialética MARTINELLI (1993, p.35) esclarece: “...Como categoria histórica que é, a identidade se constrói no movimento da história, ao longo da caminhada da própria classe, que ao produzir sua existência, a sua vida material, produz a história humana. Esta é, portanto, uma história viva, candente, multidimensional, plena de movimento, pulsando com a própria vida. Seu ritmo relaciona-se diretamente com o amadurecimento das contradições internas dos diferentes períodos da vida da sociedade, o que lhe imprime um movimento contraditório e complexo, que se expressa tanto por momentos de lentidão como por outros de intensa atividade, capazes de determinar uma repentina mudança na direção do fluxo histórico, de promover a transição de uma época histórica e sua estrutura social para outra.”

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“ A rigor, a identidade nada mais é do que a forma social de aparecer da

profissão e estas formas, engendradas historicamente, são produtos coletivos

da categoria profissional, são respostas às demandas da realidade, são, como

venho enfatizando, construção permanente. ...” (MARTINELLI, 1997, p.23)

Assim, conforme a autora citada acima, romper com a identidade

atribuída ao Serviço Social requer rigorosa leitura da realidade e o próprio

profissional assumir-se como sujeito da sua prática e do processo de

conhecimento que tal leitura pressupõe. Reforçando a necessária condição de

sujeito aos profissionais do Serviço Social... “Temos de ter a coragem de

inverter a leitura que fazemos da realidade, ao invés de esperarmos por

práticas prontas para serem realizadas; temos de nos colocar como seus

efetivos construtores. ...” (MARTINELLI, 1997, p.23)

Desta forma a inserção na pós – graduação- através de cursos de

mestrado e doutorado - vem concretizar a potencialidade dos profissionais em

colocar-se como construtores da sua realidade.

“Então fui buscar a academia - eu já havia cursado algumas disciplinas como aluna ouvinte – eu fui buscar a academia para poder conhecer melhor essa realidade e com vistas a alcançar alguma mudança, nesse âmbito de intervenção. Então eu realizei esse processo ... fui da intervenção para a pesquisa. O processo de intervenção é que me levou a ter consciência da necessidade da pesquisa, para conhecer e até provocar alterações nessa realidade de trabalho e, consequentemente, contribuir com alterações na realidade dos sujeitos com os quais a gente trabalha. (...) Como não existia praticamente nada a respeito do Serviço Social no Judiciário, em São Paulo, o primeiro passo foi buscar a história, foi buscar o conhecimento da história da institucionalização dessa profissão no judiciário para poder compreender como ela foi se construindo lá dentro, para, a partir desse conhecimento da história projetar outras possibilidades de intervenção. Então, a minha descoberta e a minha paixão pela pesquisa se deu nesse processo. (...)

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Então a minha descoberta da pesquisa foi por meio da história oral na sua faceta de depoimentos e com pesquisa documental e bibliográfica. Eu reconstrui a fase inicial da implantação do serviço buscando os determinantes daquela forma de inserção do Serviço Social no Judiciário e a partir daí eu não consegui parar mais. Nem quero parar e nem me propus a isso.” (Eunice Teresinha Fávero)

Neste depoimento evidenciamos que a profissional fez o caminho da

“intervenção” para a “academia” através da pós – graduação, buscando alterar a

realidade de trabalho e dos sujeitos demandatários da prática profissional.

Esse caminho possibilitou a descoberta da pesquisa por meio da história

oral, como forma de reconstituição da história do Serviço Social no judiciário.

A história oral tem se constituído em importante metodologia para a pesquisa

no Serviço Social, pois possibilita trabalhar com a memória sustentada na

experiência social dos sujeitos que constroem a prática do Serviço Social e a

identidade profissional em determinados campos de intervenção. No contexto

das Ciências Sociais e Humanas a metodologia da história oral permite ao

pesquisador desvelar...

(...) a riqueza inesgotável do depoimento oral em si mesmo, como fonte não apenas informativa, mas sobretudo, como instrumento de compreensão mais ampla e globalizante do significado da ação humana; de suas relações com a sociedade organizada, com as redes de sociabilidade, com o poder e o contrapoder existentes, e com os processos macroculturais que constituem o ambiente dentro do qual se movem os atores e os personagens deste grande drama ininterrupto – sempre mal decifrado – que é a História Humana. (ALBERTI 1989, p. 4 - 8)

É neste processo - o da própria pesquisa - que se faz “ descoberta “ e a

“paixão pela pesquisa.” A paixão é elemento fundamental ao exercício da

pesquisa, pois mobiliza o interesse do pesquisador mantendo viva e ativa as

vinculações deste exercício à prática profissional.

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(...) “Aí eu fiz uma pesquisa, esse projeto, ele se desenvolve, dessa vez, na perspectiva de tomar um banho de realidade brasileira, que é o “Brasil em contra –reforma” que é o livro que a editora... da tese, ali a tese de doutorado inteira. Eu fui estudar o processo de mudança que o Brasil viveu nos anos 90, que foi auto – intitulado pelos seus formuladores como uma reforma, que eu vou caracterizar como uma contra – reforma. E, aí tem toda uma articulação... é isso, é uma pesquisa teórica empírica, mas ainda assim não é uma pesquisa que trabalhou com depoimentos de sujeitos, trabalhou principalmente com análise documental – documentos governamentais, leis, legislação, muitas matérias de jornal, a imprensa como uma fonte importante do acompanhamento cotidiano da conjuntura. Então os sujeitos apareciam pelas matérias de jornal.” (Elaine Rossetti Behring)

Destacamos neste depoimento a necessidade da profissional “tomar um

banho de realidade” . Banho que se fez através de estudo documental. Os

“documentos”, neste caso, além de se constituírem em instrumentos capazes

de esclarecer dimensões do objeto de pesquisa, possibilitam estabelecer

mediações necessárias entre os fenômeno pesquisado e os sujeitos da pesquisa

e neste caso os sujeitos da pesquisa são políticos e retratam uma expressão do

coletivo, isto é dos segmentos organizados da sociedade, seus interesses e a

orientação política que seguem.

Chegamos a um momento crucial que, talvez, expresse porque se faz

pesquisa no Serviço Social, ou melhor o que estimula os profissionais a

fazerem pesquisa - quando por sua tradição intelectual vinculado aos veios do

positivismo e pela falta de investimento dos órgãos de fomento e à baixa

tradição em pesquisa - poderia colocar-se numa posição de simples

consumidor de conhecimentos trabalhados nas áreas afins?

“É, eu acho que o que me estimula a fazer pesquisa é um projeto intelectual de largo prazo. O que é? É primeiro assim... aí tem um componente político na minha pesquisa muito... não é uma pesquisa neutra, é uma pesquisa engajada na direção de uma mudança na sociedade brasileira. Então, tanto no momento que essa pesquisa se voltou para o debate profissional sobre política social quanto

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nesse segundo momento, que foi o doutorado, eu acho que a idéia é aquilo que eu falei ontem lá na palestra: “morder a realidade”, no sentido de traçar estratégias para superação da realidade brasileira, da desigualdade.... Tem um mirante teórico – metodológico radicalmente crítico, anti – capitalista. A idéia é fornecer elementos para os sujeitos, inclusive tentar identificar quem são esses sujeitos na realidade brasileira hoje, nesse período reacionário que a gente está vivendo, para a superação dessa condição geral de desigualdade, superação dessa condição geral de desigualdade, superação, etc. Então esse é o projeto.” (...) ( Elaine Rossetti Behring)

“... Ninguém hoje ousaria negar a evidência de que toda ciência é

comprometida. Ela veicula interesses e visões de mundo historicamente

construídas e submete e resiste aos limites dados pelos esquemas de

dominação vigentes. ...” (MINAYO, 1996, p.21)

Neste projeto intelectual tem um “componente político” e a pesquisa não é

“neutra”, é “engajada” em direção a mudanças sociais na realidade brasileira. O

horizonte teórico – metodológico é radicalmente “crítico e anti – capitalista” e

busca alimentar o debate sobre a realidade brasileira. Esse projeto alimenta a

atitude investigativa do pesquisador, movimenta-o a fazer pesquisa.

...Na investigação social, porém, essa relação é muito mais crucial. A visão de mundo do pesquisador e dos atores sociais estão implicadas em todo o processo de conhecimento, desde a concepção do objeto até o resultado do trabalho. É uma condição da pesquisa, que uma vez conhecida e assumida pode ter como fruto a tentativa de objetivação do conhecimento. Isto é, usando-se todo o instrumental teórico e metodológico que ajuda uma aproximação mais cabal da realidade, mantém-se a crítica não só sobre as condições de compreensão do objeto como do próprio pesquisador. Conforme nos adverte Lévy Strauss: “Numa ciência onde o observador é da mesma natureza que o objeto, o observador é, ele mesmo, uma parte de sua observação. ...” (MINAYO, 1996, p. 21)

... “é com esse projeto que eu vou identificando momentos de contribuição em que , como professora, pesquisadora posso estar alimentando o debate sobre a realidade brasileira.“ (...) ( Elaine Rossetti Behring)

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O depoimento, ainda, reforça o papel da Universidade em relação a

sociedade que no seu conjunto se alimenta da produção de conhecimento

científico tanto em espaços onde o consumo é objetivado por interesses de

inovações tecnológicas, como em espaços em que se busca mais do que um

produto imediato – busca -se o diálogo alimentador de práticas comprometidas

com a transformação social. Alimenta assim as profissões, no seu processo de

se reconstruir historicamente e acompanhar as exigências do tempo presente.

As pesquisas geram desdobramentos, não só como forma de contribuição

social, mas também como forma de realimentar o processo de produção de

conhecimento.

“Aí depois, da pesquisa do mestrado, eu voltei pra,... já não estava mais na Prefeitura, eu voltei pra Universidade e de novo aquela idéia de pensar a prática do Serviço Social, aquela, sabe, aquela coisa assim de não ficar só acadêmico. Aí eu fui fazer uma pesquisa junto com os Assistentes Sociais da Prefeitura, que eu queria discutir a prática profissional do Serviço Social e a idéia de qualidade dos serviços, porque na dissertação de mestrado eu já me deparei com o tema da reforma do Estado e me deparei com todo o tema da discussão da reestruturação produtiva, da qualidade total e de outros critérios para medir eficiência e eficácia dos serviços. (...) Aí fui pra Prefeitura, fiz um contato com as Assistentes Sociais de lá, foram ao todo 13 Assistentes Sociais, mas que de fato participaram foram 11 e uma acadêmica do Serviço Social e aí nós discutimos primeiro o que é qualidade; o que é qualidade na área de serviços; porque no serviço público o tema da qualidade é diferente; qual é o retorno que o serviço público espera, não é um retorno monetário, econômico, como no setor privado. (...) Se não me engano foram oito projetos que nós avaliamos junto com os profissionais. Então foi uma pesquisa participante, porque não fui eu que avaliei os projetos, eles avaliaram junto comigo. (...) E esta pesquisa ela gerou um relatório que foi entregue pra Prefeitura e que foi entregue também na Universidade.“ (Lúcia Cortes da Costa)

A articulação entre mestrado/docência/doutorado se faz através de um

eixo único de pesquisa. Destaca-se a preocupação com a prática profissional,

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novamente como uma alternativa de que aquele conhecimento produzido

nestas instâncias não ficassem em um nível meramente “acadêmico”. A

“pesquisa participante” foi o recurso para alcançar esta intenção e trata-se de

“... uma estratégia de pesquisa, concebida a partir de problemas vividos pela

população pesquisada, com a participação dos grupos sociais diretamente

envolvidos na problemática e em todo o processo de conhecer e transformar a

realidade.” (RIZZINI et al, 1999, p. 39) Supõe uma forma de investigação,

cujo processo e resultado têm uma dimensão social, educacional e técnico.

Exige rigoroso diagnóstico da realidade fundamentado à luz de referencial

teórico – metodológico.

Objetiva-se, portanto, produzir um conhecimento, um saber que possa ser um instrumento imediato para melhorar a vida das pessoas. A idéia básica é a de que quem está vivendo a situação focalizada deve participar desde a construção do problema, ao planejamento da pesquisa e à implementação e avaliação das soluções alternativas a sua resolução. A PP, portanto, reconhece que em todo e qualquer setor social existe um saber que deve ser valorizado e instrumentalizado a seu próprio favor. (RIZZINI et al, 1999, p. 40) O fato de envolver os profissionais cria oportunidades de reflexão sobre

a prática profissional, a qualidade dos serviços ofertados à população, o

alcance e impacto social dos mesmos e das ações desenvolvidas pelos

profissionais. Também renova as motivações ou estabelece novas para o

desempenho de práticas comprometidas e críticas. Quanto ao pesquisador,

mantém viva a atitude investigativa.

“Daí no Doutorado eu fui trabalhar o reforma do Estado, que era um eixo que já vinha do mestrado mesmo. Então foi uma continuidade naquele processo de pesquisa, de entender daí a reforma do Estado que se punha como uma realidade mais abrangente, mas qual era a particularidade dela aqui no Brasil. ... E nesse sentido a idéia inicial era trabalhar o impacto da reforma do Estado nas políticas sociais. Mas... delimitar isso é muito complexo. Então como estava

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no contexto das reformas constitucionais da administração pública e da previdência, eu acabei delimitando como objeto de estudo analisar a direção da reforma do Estado no Brasil sob a perspectiva de perdas de direitos pra classe trabalhadora. Tendo como ponto de referência a reforma da administração e a reforma da previdência. Mas tentando entender a reforma num sentido amplo, mas assim delimitando nesse enfoque. Porque é muito complexo o tema da reforma do Estado, que passa pela privatização, que passa pela abertura comercial. Então que eixo? Eu peguei esse eixo, que é analisar a direção dela com referência a perda de direitos pra classe trabalhadora. Foi isso. (...) Aí terminando o doutorado, voltando pra graduação, eu já fui inserida no mestrado. (...) Mas mesmo assim eu acabei fazendo algumas pesquisas, criei um núcleo de pesquisa ... Pois é o Núcleo era assim. Eu terminei o doutorado achando que eu ia virar pesquisadora... Não, agora eu vou ter tempo pra pesquisa, eu vou dar aula na graduação, posso dar até uma contribuição... e vou virar pesquisadora. Aí fiz uma proposta bem com a minha cara, de um projetão. ... Qual era a minha idéia? Reproduzir numa escala local uma coleta de dados tal qual eu tinha feito a nível nacional no Doutorado. Isso, no doutorado, que eu fiz com fonte secundária, IBGE, IPEA. Eu falei bom, agora eu pego o IPARDES, mesmo IBGE, vou tratar com dados locais, vou nas Secretarias de governo aqui do Município e vou levantar os dados da educação, que existem só que não estão organizados, eles não são relacionados e aí eu posso fazer isso junto com mais alguns professores, pesquisadores e a gente cria um Núcleo pra estar pesquisando como é que essa desigualdade e exclusão acontecem aqui no município. A hipótese dada é que tem fatores estruturais, mas o município tem um momento que é particular, uma autonomia, uma maneira de tratar. Então vamos pegar os dados macro e vamos analisar com relação aos dados do município. ...” (Lúcia Cortes da Costa)

O retorno do doutorado e as demandas crescentes de trabalho no meio

acadêmico vão consumindo as energias do profissional que busca alternativas

de socialização do seu conhecimento e de disseminação das discussões

pertinentes ao seu objeto de estudo.

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O “Núcleo” de estudo42 surge como desdobramento dos compromissos

decorrentes do doutorado e como estratégia para o profissional continuar

pesquisando, como forma de estudar as particularidades/singularidades locais

e como espaço de aprendizagem para alunos de graduação e de pós

graduação, bem como de articulação com segmentos da comunidade.

O Núcleo de estudos é importante “recurso pedagógico” para a

Formação Profissional. Constitui-se em espaço privilegiado de construção

coletiva de conhecimentos destinados a realimentar a prática profissional e a

prática de ensino/aprendizagem. Propicia o estudo sistemático e continuado

de temas que emergem do enfrentamento profissional em relação às

expressões da questão social na realidade local, sem perder de vista suas

determinações gerais. Neste sentido provoca a indissociabilidade

Ensino/Pesquisa/Extensão tão relevante para a Universidade.

Os Núcleos de Estudos podem e devem ser estimuladores da pesquisa, bem

como realimentadores do processo de pesquisa articulando diferentes níveis

formação (graduação e pós – graduação), diferentes áreas profissionais,

provocando a interdisciplinaridade e promovendo a socialização de saberes

entre profissionais, acadêmicos e docentes.

“Aí a gente ficou entendendo assim, bom o que a gente faz? Primeiro (...) descobriu que tem que aprender. Aí (...) foi entendendo a pesquisa como um recurso pedagógico. Então o Núcleo acabou tendo assim uma função não só de produzir conhecimento, de publicar, mas de formação.(...) Isso é pra gente aprender a fazer. Isso eu vi muito dos alunos, que os nossos alunos ... primeiro uma coisa que eu tenho que registrar, foi através do Núcleo de pesquisa, quando eu terminei o doutorado que o Curso de Serviço Social da UEPG teve pela primeira vez um aluno do PIBIC. Porque ninguém tinha ido lá

42 NUPES – Núcleo de Pesquisa em Desigualdade e Exclusão Social no Espaço Local (Universidade Estadual de Ponta Grossa/Pr).Idealizado em 1999 e viabilizado em 2000 tem por meta “... tornar-se um espaço permanente de debates, construção coletiva de reflexões e de sistematização teórica, bem como, de coleta e análise de dados sobre a realidade social.”, particularmente preocupa-se em compreender “...os fenômenos da exclusão e desigualdade social no espaço local”.( http://www.uepg.br/nupes, consultado em 18/02/2005)

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pedir aluno do PIBIC. Porque? Porque nós da graduação, nós somos muito auto – centrados em nós mesmos. A gente nem sabia o que era o PIBIC. ...” (Lúcia Cortes da Costa)

Importante referência Lúcia Cortes da Costa faz ao PIBIC. Primeira

experiência no Curso de Serviço Social da UEPG, mobilizada pela sua

experiência em pesquisa e inserção no curso de mestrado da instituição.

O PIBIC (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) é

“...um programa voltado para a iniciação à pesquisa de alunos de graduação

universitária.” Tem como um de seus objetivos “ contribuir para a formação

de recursos humanos para a pesquisa.” Em relação às instituições públicas,

comunitárias ou privadas de ensino superior busca “ incentivar a formulação

de uma política de iniciação científica; possibilitar maior interação entre

graduação e a pós – graduação, e qualificar alunos para os programas de pós –

graduação.” Objetiva, ainda, em relação os orientadores “estimular

pesquisadores produtivos” que busquem envolver alunos em atividades de

natureza científica, tecnológica e artística – cultural. A iniciação científica

conta com sistema de concessão de bolsas que facilita “... aprendizagem de

técnicas e métodos de pesquisa...”, bem como estimula “... o desenvolvimento

do pensar cientificamente e da criatividade, decorrentes das condições criadas

pelo confronto direto com os problemas de pesquisa...”, orientados por

pesquisadores qualificados. (CNPQ.BOLSAS E AUXÍLIOS,

http://www.cnpq.br, consultado em 16/02/2005)

O processo de desdobramento das pesquisas ocorre dentro da própria

instituição de origem dos profissionais conforme verificamos abaixo:

“A partir daí eu fui dentro da própria instituição já levando alguma coisa que eu estava conhecendo, foi daí que eu passei a coordenar esse grupo de estudos, dentro do tribunal, já com a minha experiência de profissional dentro da instituição e a minha experiência de pesquisadora. Comecei a organizar

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estudos a respeito do cotidiano de trabalho nas diversas formas como isso se dá no interior da instituição e continuei a pesquisa por meio do doutorado. Aí já tendo a possibilidade de discutir um pouco mais a realidade social dos sujeitos com os quais a gente trabalha. Eu resgatei por meio da minha pesquisa de doutorado os condicionantes sociais, econômicos, familiares que acabam levando determinadas pessoas a entregarem filhos, a abandonarem filhos, a terem os filhos retirados dos seus cuidados. Enfim eu fui buscar as expressões da questão social que contribuem para que as pessoas sejam separadas de seus filhos. Fui já tentando trazer mais a realidade social da população com a qual a gente trabalha, sobre a qual penso que se tem um conhecimento amplo e vasto; e quem está mais diretamente na intervenção nem sempre tem a consciência da riqueza de informações e de contribuições que pode dar no avanço da profissão e na provocação de alterações na realidade a partir desse conhecimento. Então eu busquei sistematizar o conhecimento da realidade dessa população com a qual eu havia trabalhado na Vara da Infância e da Juventude. Nesse momento não estava mais trabalhando diretamente com essa população, mas tinha oito anos de experiência - e foi essa experiência de intervenção com essas situações é que me motivou a pesquisar. Eu fiz, então, a pesquisa, a partir de documentos, que são os relatórios de Assistentes Sociais, de Psicólogos, as manifestações de promotores, as sentenças de juizes, enfim, os autos processuais que encerram um conjunto de documentos que culmina na sentença final. Eu recuperei as informações a respeito da realidade da população com a qual trabalhava por meio dos documentos registrados dos autos, dos relatórios dos Assistentes Sociais, dos relatórios de Psicólogos, do estudo social realizado, enfim dos diversos documentos que compõem os autos processuais. Nesse momento do doutorado eu consegui envolver um grupo de Assistentes Sociais que já estava começando a participar do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Criança e Adolescente. Esse núcleo de estudos tem uma peculiaridade, ele abre as portas para profissionais que estão na intervenção. Ele não se limita apenas aos profissionais que estão na academia. E ele acaba sendo uma porta de entrada para os profissionais que estão somente na intervenção e que as vezes têm uma certa dificuldade de adentrar ao mundo acadêmico. Então, acaba sendo uma porta de entrada de certa forma.” (Eunice Teresinha Fávero)

Aqui observamos os seguintes desdobramentos referentes a inserção de

Eunice Teresinha Fávero no curso de Mestrado: coordenação de um grupo

de pesquisa no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre o cotidiano

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do trabalho do Assistente Social e sobre a realidade dos sujeitos. Este Grupo

de pesquisa é compreendido como espaço de formação em pesquisa para os

profissionais e de avaliação da prática profissional. É porta de entrada para os

profissionais que tem dificuldade de adentrar o meio acadêmico, constituindo-

se em um fértil espaço intermediário entre a academia e os profissionais.

Outro destaque é em relação a pesquisa documental que aqui revela o

quanto este recurso pode acumular informações substanciais à prática da

pesquisa para o Serviço Social, pois encerram histórias de vida de uma

população usuária e as decisões de ordem judicial que podem definir o

destino de uma família, de um grupo social, de um cidadão. Trata-se do

“estudo social”.

O estudo social se apresenta, atualmente, como suporte fundamental para aplicação de medidas judiciais dispostas no Estatuto da Criança e do Adolescente e na legislação civil referente à família. A solicitação ou determinação para que seja realizado, via de regra, se dá diretamente a assistentes sociais servidores do Poder Judiciário ou a assistentes sociais nomeados como peritos, ou por meio de profissionais que atuam em organizações que têm seu objeto de trabalho de alguma forma vinculado à instituição judiciária. ( FÁVERO, 2003, p.27) O estudo social registra a realidade social dos sujeitos – usuários dos

serviços judiciários - em um documento, que trabalhado pelos profissionais

da área define os destinos destes usuários e de suas famílias.

“Então, no meu estágio de pesquisa do doutorado, envolvi um grupo de 09 Assistentes Sociais do judiciário que estavam na intervenção, para trabalhar comigo numa pesquisa quantitativa, para fazer a caracterização sócio – econômica dos sujeitos (que foi essa primeira publicação - Perda do Pátrio Poder - aproximações a um estudo sócioeconômico). Então nós fizemos essa pesquisa, houve um processo também de formação desse grupo no processo de pesquisa. Nós estudávamos e nos organizávamos para desenvolver a pesquisa, que foi realizada em autos processuais também. Então nós organizamos o roteiro, fizemos o pré teste por meio dos documentos existentes nos

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processos, organizamos as informações conjuntamente e depois elaboramos o texto final. Esta parte do trabalho acho que teve alguns resultados bastante significativos. Porque? Nós conseguimos que esse material fosse publicado, conseguimos um financiamento e houve uma distribuição gratuita para todos os profissionais do Judiciário.” ...(Eunice Teresinha Fávero)

O Doutorado possibilitou a articulação da pesquisa qualitativa e

quantitativa para compreensão da realidade social dos sujeitos e a descoberta

da importância pesquisa para análise da prática profissional em suas

fragilidades e potencialidades.

Como desdobramentos da tese tem –se a sistematização teórico-prática

sobre estudo social numa dimensão crítica e comprometida com o projeto

ético – político profissional -com apoio do CRESS e publicações sobre a

prática do S.S. no Judiciário; o grupo de pesquisa de A.S. no espaço sócio –

jurídico, como uma alternativa de multiplicar esta produção.

“Eu trabalhei na minha tese, a partir das informações registradas nos processos, com as pesquisas quantitativa e qualitativa. Foi um processo muito rico e eu acho que foi fundamental para que eu descobrisse, não descobrisse, para que eu tivesse a certeza da importância da pesquisa, do quanto é fundamental a pesquisa para a nossa intervenção. Porque nesse processo de pesquisa nos autos, o contato principal foi com os relatórios – o trabalho realizado pelos Assistentes Sociais registrados em relatórios, as informações sobre a realidade social dos sujeitos - e é impossível trabalhar com aquele material sem você fazer a análise do trabalho do profissional. De quanto com esse trabalho você contribui para garantir direitos ou você contribui para o controle e o controle num sentido mesmo de disciplinarização de comportamentos, de adequação a essa realidade que a gente vive. A partir dessa coleta de informações concluímos - porque boa parte do tempo eu trabalhei com um grupo - quanto que nossa intervenção era frágil. O quanto era falha no sentido de não dar conta de um conhecimento da realidade. Os relatórios, o estudo social que apresentávamos não dava conta de trazer a realidade dos sujeitos de uma forma mais completa para, efetivamente, subsidiar a decisão de um juiz na direção da garantia dos direitos, que é foco central da nossa intervenção enquanto Assistente Social.

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Então, nesse processo de pesquisa, além de caracterizar a realidade social dos sujeitos, que eu centrei na questão do trabalho, da família e da cidade, e dentro da cidade as políticas sociais, eu comecei a trabalhar de forma mais aprofundada o estudo social, enquanto subsídio à decisão judicial, que compôs parte de um dos capítulos da tese (além de avançar um pouco na análise da intervenção). De certa forma é uma continuidade do que eu comecei no Mestrado, porém mais direcionado para o estudo social e é a partir daí que eu acabei fazendo aquele outro trabalho sobre o qual eu te falei, que depois o CFESS me convidou para estar sistematizando, para estar recuperando a discussão e a sistematização do estudo social, com base no projeto da nossa profissão na contemporaneidade, tentando superar aquela antiga visão do Serviço Social de Casos.(...) Com a minha tese eu avancei na descoberta e na afirmação do processo de pesquisa enquanto parte fundamental, senão a principal, da intervenção. Eu hoje eu não concebo mais a intervenção profissional sem a pesquisa. Eu acho que a gente tem um âmbito de pesquisa que acaba se restringindo mais à academia, que é necessário, que é fundamental, mas tem um âmbito de pesquisa que temos que avançar mais que é o da formação, que é da pesquisa enquanto subsídio fundamental para o processo de intervenção profissional.” (Eunice Teresinha Fávero)

A tese possibilitou a “...afirmação da pesquisa enquanto parte

fundamental, senão a principal, da intervenção.” A descoberta da importância

da pesquisa tem subjacente a análise da realidade profissional em suas

potencialidades e fragilidades. E no processo investigativo se depara com o

fato de que o Assistente Social tem um contato privilegiado com a realidade

social dos usuários, colhendo permanentemente informações que são

documentadas. No entanto o profissional nem sempre tem consciência do

potencial dessas informações. Articulada à pesquisa o processo interventivo

pode redimensionar as relações que o profissional estabelece com os

documentos que derivam de sua prática, percebendo-os como fontes de

experiências concretas. Ao serem compreendidas esta experiências podem

requisitar o redimensionamento das práticas reiterativas e disciplinadoras em

práticas comprometidas com os direitos sociais

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...O que importa salientar é que o acompanhamento dos processos sociais e a pesquisa da realidade social passam a ser encarados como componentes indissociáveis do exercício profissional, e não como atividades “complementares” , que podem ser eventualmente realizadas, quando se dispõe de tempo e condições favoráveis. Isso porque o conhecimento da realidade social sobre a qual irá incidir a ação transformadora do trabalho, segundo propósitos preestabelecidos, é pressuposto daquela ação, no sentido, de tornar possível guiá-la na consecução das metas definidas. ... (IAMAMOTO, 1998, p. 101)

“Agora eu estou pesquisando... Bom uma das coisas que eu fui trabalhando já no doutorado, foi a questão do orçamento público e da seguridade social. Então, nesse momento eu desenvolvo uma pesquisa que chama-se Seguridade Social Pública, é possível? É uma pergunta à contra – reforma do Estado, desfinanciamento das políticas sociais. Então eu venho estudando a evolução do orçamento público, da seguridade mas pegando a seguridade como um todo no Brasil, nos últimos anos, eu pego quatro anos: 97,99,2001,2004. Inclusive para fazer uma comparação entre a era Fernando Henrique e o contexto hoje do governo Lula. A gente pega desde o plano plurianual até a execução orçamentária, desde a destinação de recursos, a autorização de recursos até a execução, para tentar fazer uma série histórica que permita vislumbrar a condição geral da Seguridade do ponto de vista , é claro, dos recursos. Essa não é a única forma de analisar a eficácia, a eficiência de uma política, mas é um elemento fundamental até o recurso público, a locação de recurso público e a gente faz um paralelo disso com a política macro – econômica, o plano real. É isso que eu estou estudando agora. Quer dizer é outro momento. A gente está pegando um aspecto mais particular mesmo. E agora, assim, a pesquisa ela continua sendo uma pesquisa de análise documental, mas dos documentos: a legislação, os planos, as leis de diretrizes orçamentárias, lei orçamentária anual, balanço geral da união, relatório do TCU, é isso que a gente está estudando. Eu até recebi os dados do relatório do TCU sobre a questão carcerária no Brasil, esses relatórios são muito interessantes, são fontes de dados super interessante. (...) Então nós formamos o Grupo de Estudos e Pesquisas de Orçamento Público e da Seguridade Social. Informalmente o GOPSS.” (Elaine Rossetti Behring)

Uma questão no conjunto dos depoimentos que nos chamou a atenção é

o comprometimento político em relação à compreensão da questão social, à

qualidade de vida, dignidade e respeito à condição de cidadão do usuário, aos

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investimentos crescentes em pesquisas que buscam avaliar as políticas

públicas através de seus projetos e programas sociais e à própria prática

profissional. Destacamos essa preocupação com o “orçamento público” –

aspecto tão nebuloso no âmbito das ações e responsabilidades governamentais

e desafiante ao Serviço Social, pois carece de conhecimentos específicos e

articulações com outras áreas de conhecimento.

Desafios como este, entre tantos outros derivados da inserção

profissional na realidade social, econômica, política e cultural desse país,

imbricado ao projeto ético – político da profissão, motiva temáticas de

pesquisas tão ricas e complexas.

A grande questão é saber se estes elementos mobilizam os profissionais

em geral a se envolverem com a pesquisa.

“Eu acho que o que pode mobilizar para a pesquisa, acho que isso é muito variado entre os pesquisadores. Você pode ser mobilizado por uma questão prática mesmo, algo que te chamou a atenção, que despertou seu interesse , por um tesão eminentemente intelectual, independente se você quer transformar o mundo ou não e se isso compõe um projeto intelectual de largo prazo ou não. Acho que isso varia muito entre os pesquisadores. Como nós do Serviço Social construímos esse projeto ético – político profissional e o incremento da pesquisa, inclusive o crescimento da pós – graduação foi elemento fundamental dessa construção, eu acho que existem muitos pesquisadores do Serviço Social que têm esse olhar sobre a realidade, essa perspectiva analítica e política. Mas não acho que isso valha para todos e que isso seja um projeto de todos. Até porque a categoria é plural, (....) se existe a hegemonia de uma determinada perspectiva, isso não significa que não existam outras. Então você tem pesquisas que não têm essa dimensão, essa preocupação, que querem iluminar em aspecto bem particular da realidade, singular mesmo. Isso significa que são pesquisas irrelevantes? Não necessariamente. Podem ser muito importantes, inclusive para compor o processo global de conhecimento da realidade.” (Elaine Rossetti Behring)

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A profissão é plural em relação aos referenciais que fomentam tanto a

prática como a pesquisa. Não podemos dizer que há motivações diferentes

para cada dimensão do exercício profissional, o que movimenta o profissional

a fazer pesquisa é o mesmo que o movimenta a intervir. Concordamos com o

depoimento que há motivações podem ser de cunho individual, uma paixão

pessoal em relação a uma temática específica de pesquisa, ou uma

preocupação de ordem teórica, mas de maneira geral as motivações estão no

próprio processo de enfrentamento das expressões da questão social que ganha

visibilidade em função de um processo de problematização permanente deste

profissional quando enfrenta as contradições sociais que rebatem na forma

como ele responde a estas demandas bem concretas.

Como avaliar essas pesquisas, que se voltam mais para aspectos da

prática profissional? No Serviço Social temos essas pesquisas que têm uma

preocupação macro – estrutural e que têm uma relevância grande para a

profissão, porque fundamentam a profissão, dão uma direção para a formação

profissional e inclusive para a intervenção e temos pesquisa que estão

vinculadas às inquietações do cotidiano da prática profissional e que têm

ressonância na medida em que responde à angústias específicas dos

profissionais.

“....Acho que elas são importantíssimas. Elas são tão importantes quanto a pesquisa que eu faço, elas só são diferentes. E tem objetivos, níveis de análise diferentes, mas elas são muito importantes. Assim, eu acho que a relevância social, a relevância de uma pesquisa, tem a ver com a sua capacidade de dizer coisas sobre a realidade, seja o exercício profissional na defensoria pública - já que nós estamos aqui – seja o orçamento público da União. Eu acho que são níveis diferentes, são objetos de complexidade diferentes, mas são objetos importantíssimos.” (Elaine Rossetti Behring)

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Se observarmos isoladamente estas pesquisas podem não traduzir a

complexidade do objeto de atenção profissional, no entanto em sua

singularidade e se a colocarmos no contexto da produção do conhecimento do

Serviço Social, certamente verificaremos que ganham “relevância”, pois

revelam a particularidade do Serviço Social ao enfrentar os limites de ordem

estrutural que se expressam no cotidiano profissional. E mais revelam quem

são os sujeitos que demandam nossa prática profissional e o que estes sujeitos

trazem em sua trajetória como experiência de luta e de resistência ao modo de

produção capitalista que exclui e subalterniza.

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2-A CENTRALIDADE OCUPADA PELOS SUJEITOS QUE PARTICIPAM DAS PESQUISAS DO SERVIÇO SOCIAL

Precisamos esclarecer de que sujeito estamos tratando. Trata-se do

sujeito que antes de ser participante de nossas pesquisas é

usuário,beneficiário e/ou destinatário das políticas públicas e dos serviços

sociais, através de nossa intervenção nos diferentes campos que ocupamos.

Sujeito saturado, pela experiência, de valores e demandas autênticas. Sujeito

que tem uma natureza objetiva e subjetiva. Assim entendemos o “... termo

sujeito, como aquele que faz a ação ou a dirige, ou, num sentido mais

filosófico, o homem como sujeito livre e igual, dono de si mesmo e da

natureza, construtor do seu mundo, defensor de direitos e da subjetividade. ...”

(WANDERLEY, 1992, p. 142)

Naturalmente estamos nos referindo a um sujeito que é coletivo, pois em

sua singularidade e relações particulares expressa vinculações de classe. O que

não pode ocorrer - e este é um cuidado metodológico que precisamos

desenvolver - é subtrairmos, no processo da pesquisa a condição de sujeito a

este cidadão e enfatizar a sua condição de objeto.

Cabe então recuperarmos o sentido que já demos a esta questão em nossa

introdução.

A preocupação com a centralidade do sujeito refere-se a sua condição

ontológica e não a uma condição metodológica pertinente à pesquisa.Ou seja

trata-se de possibilitar através da pesquisa maior visibilidade ao sujeito, à sua

experiência e ao seu conhecimento, cuja natureza se desvendada, poderá

permitir aos profissionais desenvolver práticas cada vez mais comprometidas

ética e politicamente com a realidade dos mesmos, buscando no coletivo e na

troca de saberes alternativas de superação das condições de privação e

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exclusão social. Ainda esta condição ontológica reconhece ao sujeito este

potencial, portanto sua autonomia.

A aproximação ao sujeito que participa de nossas pesquisas se faz

através da busca da compreensão da sua experiência, do conhecimento gerado

a partir desta experiência e da sua vivência cotidiana, que tomados em

relação ao nosso objeto de estudo, compõe um dos elementos a serem

apreendidos na sua relação com as múltiplas determinações de natureza

econômica, social, política e cultural.

Para tanto construímos uma metodologia de investigação que busca

estabelecer um tipo de relação com estes sujeitos, que pode ter diferentes

facetas teóricas – fundamentada pela teoria social que nos alimenta -

naturalmente orientado por nossos objetivos de investigação e pela natureza de

nosso objeto de estudo. Portanto a relação com o sujeito eleito para participar

de nossa pesquisa não é ocasional, ingênua, é definida pelo que se pretende

elaborar cientificamente.

Em nosso trabalho consideramos que a relação com o sujeito se faz

através da pesquisa de natureza quantitativa e /ou qualitativa. Não deve ser

mérito apenas das pesquisas qualitativas a busca de compreender o sujeito, em

uma perspectiva crítica, pois não podemos descartar que o sujeito também se

revela através dos dados quantitativos, pois estes trazem à tona expressões

concretas de sua realidade, quando trabalha condições de vida, renda,

ocupação, etc. O diferencial está na forma como tratamos estes dados,

buscando revelar o quê e para que e porque enfatizamos o quantitativo. São

as determinações objetivas expressas através da pesquisa e que podem

fundamentar análises sobre a riqueza da realidade, avaliar projetos e

programas sociais e redirecionar ações que garantam a dignidade deste sujeito

e os seus direitos sociais, civis e políticos. Precisamos evidenciar que os

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dados quantitativos não expressam apenas o desenvolvimento econômico de

um país, mas como este desenvolvimento incide sobre as condições de vida do

cidadão.

A subjetividade se revela através das fontes orais e oportuniza ao sujeito

dar a sua versão dos fatos – como entende, como vive, sente e enfrenta em seu

cotidiano as seqüelas do desenvolvimento sócio – econômico capitalista.

Segundo MARTINS (1989, p. 113) “ Pesquisadores atentos têm mostrado que

a cultura popular não é constituída apenas de concepções, mas também de

sujeitos e de concepções desses sujeitos. ... ”

A dicotomia quantitativo/qualitativo – em uma perspectiva dialética – é

falsa, sendo que a dinâmica das relações sociais pode ser captada em suas

dimensões quantificáveis e qualificáveis. Esta articulação é necessária à uma

pesquisa comprometida ética e politicamente com as demandas sociais. O

sujeito está presente - ou pela sua história ou pelos dados que expressam as

barbáries do mundo contemporâneo - em qualquer processo de pesquisa.

Nossa pergunta refere-se ao tratamento teórico – metodológico do

material empírico coletado junto a este sujeito e se isto lhe garante

centralidade e visibilidade à sua real situação e condições de vida.

Posto isso e considerando esta prévia reflexão podemos nos perguntar

que centralidade podemos dar a este sujeito participante?

Nesta perspectiva, em um primeiro momento, na busca de refletir com os

participantes desta pesquisa sobre a centralidade dos sujeitos, nos

preocupamos em indagar sobre como as pesquisas desenvolvidas pelo Serviço

Social tratam as determinações objetivas da existência dos sujeitos que

demandam a prática profissional do Assistente Social. Assim, destacamos:

“Eu acho que um traço que é muito, é muito forte é que a gente tem um respeito muito grande pelos sujeitos entrevistados e a gente tem uma postura

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muito democrática na pesquisa, nós não temos um saber arrogante. O nosso saber é um saber de ouvir o outro, de analisar a experiência do outro, (...) mas é sempre uma postura muito respeitosa na fala do sujeito. De não criticar de cara, de não pegar aquilo com ranço, de um preconceito. De interpretar aquilo. De procurar entender aquilo no contexto da teoria. De ter uma coerência teórica, de não por o dado isolado. Então isso aí é uma característica muito marcante. A gente tem uma postura democrática na pesquisa e um respeito ao sujeito. Acho que isso aí... é um projeto ético na pesquisa, a gente só faz pesquisa num projeto ético que é favorável a democracia, cidadania, a valores humanos emancipatórios. Eu acho que esse é o eixo. Se fosse pra dizer assim qual é a particularidade da nossa pesquisa é trabalhar o conhecimento numa perspectiva de mudar uma realidade que é desigual e que é uma realidade perversa.” (Lúcia Cortes da Costa)

O depoimento acima preocupa-se em demonstrar que em nossa

profissão um “ traço” “forte” é o “respeito” ao “sujeito” sustentado numa

“postura” “democrática” , ou seja “O nosso saber é um saber de ouvir o

outro...”

Trata-se de uma postura ética que conforme BARROCO (2003, p. 19)

“...é definida como uma capacidade humana posta pela atividade vital do ser

social; a capacidade de agir conscientemente com base em escolhas de valor,

projetar finalidades de valor e objetivá-las concretamente na vida social, isto

é, ser livre. ...”

Esta postura sustenta as escolhas pessoais e profissionais em relação ao

sujeito, mas sobretudo é o projeto ético- político profissional que fundamenta

uma pesquisa “favorável à democracia, cidadania e valores humanos

emancipatórios”. Assim um traço de particularidade já se coloca nesta

exposição que é “trabalhar o conhecimento numa perspectiva de mudar uma

realidade que é desigual e que é uma realidade perversa.”

Esquematicamente, este projeto ético – político tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor central – a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre alternativas concretas; daí um compromisso com a

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autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais. Consequentemente, o projeto profissional vincula-se a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero. A partir destas escolhas que o fundam, tal projeto afirma a defesa intransigente dos direitos humanos e a recusa do arbítrio e dos preconceitos, contemplando positivamente o pluralismo – tanto na sociedade como no exercício profissional. (NETTO, 1999, p. 104 – 105) Precisamos avaliar se as pesquisas do Serviço Social estão dando conta

de trazer a tona estas determinações mais estruturais, econômicas e políticas

que interferem na constituição da realidade destes sujeitos que chegam ao

Serviço Social.

“Acho que em dois níveis a gente pode analisar. As pesquisas de pós – graduação eu acho que sim. Nós temos trabalho que enfrentam temáticas muito importantes. A temática da previdência social , o texto da Elizabete Mota , o trabalho da Marilda Iamamoto, o da Lúcia Freire, são trabalhos que eles pesquisam, a Maria Luiza Mestriner, que eles pegam esta questão macro. A minha tese mesmo da questão da reforma do Estado, e o centro dela é uma questão macro societária, mas e na graduação a gente ainda tem e é claro é um processo que eu diria assim inerente à formação, a gente ainda tem o foco muito centrado nos sujeitos. Mas eu acho que um não está desarticulado do outro, porque mesmo quando se trata dos sujeitos os nossos alunos sempre tem uma perspectiva teórica ampla. Eles não tem uma perspectiva fragmentária, localizada, só de descrever o objeto. A gente é muito ambicioso, a gente quer interpretar o real e isso é uma característica. Eu não sei se a gente tem sucesso em tudo. Mas pelo menos empenho a gente tem. (...)” (Lúcia Cortes da Costa)

O depoimento revela que são vários os níveis de pesquisa: os gerados e

desencadeados no nível da pós – graduação e os que decorrem das exigências

da graduação. Naturalmente os da pós – graduação têm preocupações em pôr

em discussão elementos constituintes da profissão numa perspectiva macro –

estrutural, como por exemplo as citadas por Lúcia Cortes da Costa – que

tratam-se de pesquisas que discutem as questões econômicas, políticas

determinantes da questão social, as formas de enfrentamento através das

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políticas sociais, e a própria profissão em suas diversas facetas (teórico,

histórico e metodológico, etc) Já a graduação, por limitar-se ao nível de

sistematização, estabelece relações entre estas temáticas a um nível mais

particular, buscando singularidades da prática profissional. Tanto em uma

como em outra o sujeito pode ganhar relevância (que pode ser usuário, o

próprio Assistente Social, e/ou profissionais de outras áreas). O diferencial

esta em nosso projeto ético – político, e na perspectiva crítica que orienta

nossas análises.

“Eu acho que a ABEPSS ajuda muito nisso. Essa, a discussão da categoria profissional ajuda muito e principalmente a pós - graduação, o eixo Rio/São Paulo. Porque o eixo Rio/ São Paulo ditou um eixo teórico pro curso, isso aí é evidente. (...) Mas eu acho que o Brasil tem uma característica, o Brasil tem esse eixo definido. Claro que não é toda a categoria que comunga, mas o eixo da produção teórica mostra.” (Lúcia Cortes da Costa) “Olha eu diria assim, bem aquilo que a gente falava antes, quando tu falavas na tua tese, eu acho que o Serviço Social dos anos 80 pra cá teve muitos avanços, teve significativos avanços. Eu acho que esses avanços são, muitos deles foram altamente impulsionados pelo desenvolvimento da pós – graduação. Eu acho que a pós – graduação e aí claro , tem o desenvolvimento da pós – graduação, têm as próprias iniciativas nos órgãos de fomento, que colaboraram, que deram força para que os pós – graduações se desenvolvessem e os pós – graduações em Serviço Social. Tanto é que historicamente a gente tinha a PUC de São Paulo, mais tarde a UFRJ.... Era referência nacional. Quando a gente estava em São Paulo a gente tinha colega de toda a América Latina, praticamente, tinha colega de todo o Brasil. Então, digamos assim, com esse impulso da pós – graduação e com esse impulso na pesquisa eu acho que o Serviço Social andou muito. Acho que conseguiu romper, ou propor romper com o conservadorismo, então dá uma virada importante,...” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Contribuições da ABEPSS e CFESS, órgãos representativos da categoria

e das unidades de ensino, e do eixo da pós – graduação Rio/ São Paulo são

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destaques nestes depoimentos, principalmente em relação ao rompimento com

o “conservadorismo”.

Conforme já explicitamos no primeiro capítulo e reafirmamos, neste

momento apoiados em NETTO (1999, p. 101-102)

É no âmbito da pós – graduação, cujos primeiros frutos se colhem na passagem da década de 70 à de 80, que vai iniciar-se e, nos anos seguintes, consolidar-se a produção de conhecimentos do Serviço Social brasileiro, num processo em que pela primeira vez, a categoria principiou a sua acumulação teórica. (...) O notável nesta acumulação teórica e que, naquilo que teve e tem de mais expressivo, ela assinala a incorporação de matrizes teóricas e metodológicas compatíveis com a ruptura do conservadorismo político: data de então a aberta utilização de vertentes críticas (com destaque para as inspiradas na tradição marxista).

Lúcia Cortes da Costa ainda lembra que este “eixo” não é comungado

pela “categoria” como um todo, pois há correntes teórico – metodológicas

contrárias presentes e que orientam não só a intervenção como a pesquisa no

Serviço Social. No entanto a direção social da profissão, expressão

hegemônica da categoria, defende o pluralismo.

Para COUTINHO (1991, p. 14) no processo de produção de

conhecimento no campo das ciências sociais ou naturais, pluralismo não é

sinônimo de ecletismo ou de relativismo. Implica no debate consistente entre

diferentes correntes teóricas, promovendo a troca de idéias e discussões que

possibilitem afirmar nossas posições de forma a fortalecer os referenciais que

alimentam o conhecimento sobre a realidade, derivando deste processo

intervenções consistentes e críticas. Assim entendemos pluralismo como

“...sinônimo de abertura para o diferente, de respeito pela posição alheia,

considerando que essa posição, ao nos advertir para os nossos erros e limites,

e ao fornecer sugestões, é necessária ao próprio desenvolvimento da nossa

posição e, de modo geral, da ciência.”

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Considerando que há uma referência teórico – crítica orientando a

profissão, esta a perspectiva é promissora, pois pressupõe o exercício do

diálogo entre as matrizes teóricas que sustentam a profissão. No entanto,

conforme afirma NETTO (1996) trata-se de um diálogo que tem uma direção

social estratégica que consagra valores democráticos. Essa direção social é

hegemônica e, enquanto vontade de uma categoria profissional, materializa-se

nos posicionamentos defendidos pela categoria em todas as instâncias de sua

ação profissional.

“Muitas destas questões são extremamente difíceis, eu diria assim, eu falei da morte , mas eu diria assim, não na pesquisa propriamente dita , acho que na própria intervenção profissional. Como é que é isso? Como é que um aluno vai desenvolver seu trabalho hoje, por exemplo, dentro de um presídio, dentro de um hospital com pacientes terminais... É bastante difícil, isso exige, além de tudo isso que eu disse anteriormente, muita maturidade. (...) Tu acabas fazendo um enfrentamento das tuas coisas. Porque tu não és um sujeito isolado... Na verdade tu entras junto naquela história e pra isso, isso de fato vai exigir que tu tenhas um bom suporte teórico, maturidade e que tu conheças o que que é o fazer profissional do Assistente Social. ... E eu acho que a grande marca do Serviço Social é exatamente aquilo que o Zé Paulo fala sempre, que , lá no livro dele quando ele escreve sobre o Serviço Social na virada do século. Que ele diz isso, quando a gente faz uma opção pela direção social da profissão aquele é o nosso marco e por ali a gente vai encaminhar. E aí obviamente nós vamos estar sempre tentando buscar, tentando nos aproximar, considerando as questões de autonomia do sujeito, de liberdade e o nosso pano de fundo ele sempre se dirige nessa direção, buscando exatamente por onde a gente vai caminhar, (...). A gente nunca vai acabar , eu acho, com as injustiças sociais, mas que a gente consiga dar alguma visibilidade que possa estar alterando essa situação.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Muito importante é nos darmos conta que, conforme alerta Jussara Maria

Rosa Mendes, as questões que são objeto de pesquisa, antes são objetos da

intervenção profissional.

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E no processo de intervenção algumas questões que mobilizam a prática

profissional muitas vezes dizem respeito a individualidade do próprio

profissional. Para enfrentá-las é preciso ter um “bom suporte” teórico –

metodológico e conhecer “o que é o fazer profissional do Assistente Social”.

É no cotidiano da intervenção que o profissional tem a oportunidade de

contribuir para avançarmos na afirmação da profissão e para reafirmarmos a

“opção pela direção social da profissão”, dando visibilidade à questão social

em suas várias dimensões, respeitando os princípios fundamentais expressos

no Código de Ética Profissional. Destacamos destes princípios:

-Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes – autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais;(...) -Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras; ... (apud BONETTI et.al., 2000, p. 217 – 218) O reconhecimento do fazer profissional em consonância com os valores e

princípios legitimados em nosso Código de Ética e sobretudo no

enfrentamento das demandas concretas dos cidadãos supõe um processo

permanente de capacitação ético – política e teórico – metodológica.

“...eu acho que também por outro lado nós estamos diante de muitas mudanças, muitas transformações que exige esse constante olhar do Serviço Social pra realidade. Esse olhar interventivo, sabe, de estar sempre atento: o que está acontecendo e o que está mudando nos processos sociais, quais são as outras questões que entram em jogo hoje no cenário atual. Então assim, ao mesmo tempo em que é importante essa pesquisa, que é o que tu perguntas, as pesquisas que buscam identificar, isto que tu trazes, que tratam as determinações objetivas e subjetivas, isto é de extrema importância, mas eu também tenho que ter um olhar pra realidade social mais ampla que está aí e quais são as alterações e no que isto está influenciando. Então, eu ainda acho que nós temos muito a caminhar aqui, acho que a própria pesquisa qualitativa é muito nova, muito recente. (...) Então, assim, a própria pesquisa qualitativa é muito nova e a pesquisa no Serviço Social também é muito nova. Se a gente

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pegar desses anos pra cá. Mas acho que a gente vem produzindo e a gente vem de fato trazendo questões importantes pra dentro, pesquisando e contribuindo pra esse desenvolvimento da área. E aí eu vejo assim, têm pesquisas importantes do Serviço Social, contribuições, como tu mesmo disses, hoje, que a gente é referência. Não só os grandes mestres, que a gente sempre bebeu nessas fontes, mas hoje têm pesquisas nas mais diferentes áreas. O Serviço Social vem participando na área do judiciário, uma produção extremamente importante, então eu acho que de fato ela está dando conta das determinações objetivas. Na área de saúde pública, é uma das áreas onde a gente pesquisa mais, e tem dado este retorno. O meu trabalho e na área de saúde e trabalho hoje. Da assistência – toda uma tradição e uma tradição que agora tem pesquisadores na nossa região, mesmo. A nossa região tem se destacado em pesquisa na área de assistência, de políticas sociais. Então, não sei se consegui te responder...”(Jussara Maria Rosa Mendes)

Hoje o cenário de transformações societárias exige olhar constante do

Serviço Social para os processos sociais, um “olhar interventivo” que não

desconsidera as questões macro – estruturais.

Como conseqüência das profundas transformações do capitalismo em

nível mundial temos, segundo CHAUÍ (2001, p. 18-22):

1- o desemprego tornou-se estrutural, deixando de ser acidental ou expressão de uma crise conjuntural, porque a forma contemporânea do capitalismo, ao contrário de sua forma clássica, não opera por inclusão de toda a sociedade no mercado de trabalho e de consumo, mas por exclusão. Essa exclusão se faz não só pela introdução da automação, mas também pela velocidade da rotatividade da mão – de – obra, que se torna desqualificada e obsoleta muito rapidamente em decorrência da velocidade das mudanças tecnológicas. Como conseqüência os sindicatos perdem o poder e a pobreza aumenta. (...); 2- o monetarismo e o capital financeiro tornaram-se o coração e o centro nervoso do capitalismo, ampliando a desvalorização do trabalho produtivo e privilegiando a mais abstrata e fetichizada das mercadorias, o dinheiro. (...); 3- a terceirização, isto é, o aumento do setor de serviços, tornou-se estrutural, (...); 4- a ciência e a tecnologia tornaram-se forças produtivas, deixando de ser mero suporte do capital para se converter em agentes de sua acumulação. (...); 5- (...) o capitalismo dispensa e rejeita a presença estatal não só no mercado, mas também nas políticas sociais, de sorte que a privatização tanto de empresas quanto de serviços públicos também se tornou estrutural. (...);

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6- a transnacionalização da economia reduz o Estado nacional a um órgão de negociação e barganha nas operações do capital, não se definindo mais como soberano e como enclave territorial para o capital. (...); 7- a distinção entre países de Primeiro e Terceiro Mundos tende a ser substituída pela existência, em cada país, de uma divisão entre bolsões de riqueza absoluta e de miséria absoluta, isto é, a polarização de classes aparece como polarização entre a opulência absoluta e a indigência absoluta. (...) Tratam-se de condições materiais de uma era em que a economia

encontra-se globalizada e justificada pela lógica neoliberal, interferindo

drasticamente nas relações entre Estado/Sociedade Civil e nos processos que

garantem os direitos fundamentais ao cidadão. Afeta profundamente a

profissão, que remando contra essa ordem econômica, insiste em consolidar

seu ideário ético – político a partir de princípios e práticas democráticas.

....ninguém pode ter dúvidas de que o período histórico em que estamos situados marca-se por transformações societárias que afetam diretamente o conjunto da vida social e incidem fortemente sobre as profissões, suas áreas de intervenção, seus suportes de conhecimento e de implementação, suas funcionalidades etc. E porque, por outro lado, tal reflexão é imprescindível para estabelecer, em face dessas transformações, estratégias sócio - profissionais minimamente adequadas para responder às problemáticas emergentes. (NETTO, 1996, p. 87 – 88) A pesquisa emerge neste contexto como mediação necessária, pois

através dela poderemos decifrar a realidade contemporânea através da

apreensão de seus nexos constitutivos, sua incidência nas condições de vida do

cidadão, nas exigências que o mercado de trabalho faz ao Serviço Social, bem

como construir alternativas teórico – metodológicas sustentada no movimento

contraditório do próprio real.

Não podemos esquecer, conforme o depoimento acima, que a “pesquisa”,

exercitada de forma articulada à prática profissional é “nova” para o Serviço

Social. Em especial a “pesquisa qualitativa” também é preocupação recente à

profissão. Podemos afirmar que em relação ao acúmulo de conhecimentos que

se processa no campo das Ciências Sociais e Humanas estamos em um

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processo de aprendizagem muito rico e fértil, pois “...nós, que somos

profissionais do social, temos uma riqueza de prática, uma riqueza de vida que

poucas profissões têm, temos uma atividade que se constrói na trama do

cotidiano, que se constrói nas tramas do real. ...”( MARTINELLI, 1994, p. 6)

“Olha eu acho que temos vários níveis de pesquisa no Serviço Social. Nós temos pesquisas importantíssimas, pesquisas que são bastante valorizadas. Eu penso que vêm demonstrando a capacidade dos Assistentes Sociais de produzirem conhecimentos. Embora muitas delas, numa dimensão mais teórica, no sentido de estar buscando resgatar e analisar aspectos da nossa prática, mas a partir de uma análise mais ampla, mais geral e isso é fundamental para chegarmos em nosso cotidiano, e nós temos outro âmbito que eu acho que é esse em que as pessoas, ou que já vêm desenvolvendo seu trabalho na academia ou que estão na intervenção direta, buscam resgatar estas determinações - que você coloca na sua primeira questão - a partir da vivência mesmo do trabalho com a população. .... Essas determinações objetivas, que você chama da existência dos sujeitos, a gente está ainda num momento da pesquisa, até por causa da fragilidade (que eu apontei antes) metodológica, pela falta de um conhecimento e de uma experiência maior com pesquisa, o que eu percebo (posso até estar enganada por não ter uma visão, um conhecimento de tudo o que está acontecendo em pesquisa hoje no Serviço Social no país todo) até aonde eu conheço, essas determinações acabam não sendo devidamente exploradas. Acaba ficando mais no âmbito da descrição. O que já é importante. Eu não estou negando a descrição, mas a gente percebe que existe ainda uma dificuldade de conseguir fazer uma interlocução ou uma análise mais abrangente a respeito dessas questões postas no dia a dia. ... Eu penso que ainda existe uma fragilidade, embora estamos avançando muito, mas no que diz respeito a análise das determinações objetivas, temos muito a avançar. Muitas vezes percebe-se algo não devidamente conectado na análise. Percebemos uma certa dificuldade nessa análise. O que eu percebo, também, principalmente quando o pesquisador vem para a academia tentando analisar a sua intervenção ou aspectos relacionados ao seu cotidiano de trabalho, é que o fato dele ter uma vinculação com o trabalho direto e com uma determinada intervenção, às vezes pode limitar. Se por um lado facilita a coleta de informações, facilita esse conhecimento, por outro lado pode até limitar um pouco uma análise mais crítica dessa realidade. Eu já pude perceber um pouco disso em alguns trabalhos.” (Eunice Teresinha Fávero)

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Os diversos “níveis de pesquisa”, desencadeados no Serviço Social devem

ser valorizados, pois em sua totalidade dispensam o mesmo rigor teórico e

metodológico. As pesquisa que tem como objeto problemas de ordem macro

– estrutural – tem demonstrado a “capacidade” dos pesquisadores em

“produzirem conhecimentos” valorizando a área no campo das Ciências Sociais

e Humanas. Já as vinculadas às demandas da intervenção profissional

localizadas em espaços institucionais também são importantes porque

possibilitam ao profissional reavaliar a prática profissional e analisar

determinações concretas presentes no cotidiano profissional.

Em relação ao conjunto da produção de conhecimento sobre o processo

de compreensão das determinações objetivas das condições de vida dos

sujeitos a participante da pesquisa Eunice Teresinha Fávero afirma que está

em processo de construção até por conta de uma “fragilidade” teórico –

metodológica dos profissionais em avançar da “descrição” para análises

“críticas” mais consistentes desta “realidade”. Muitas vezes a própria

vinculação dos profissionais às suas instituições de origem dificulta análises

mais consistentes e críticas, embora facilite a coleta de dados.

Sobre este aspecto KAMEYAMA (1998, p. 72-75) aponta as deficiências

mais freqüentes, devido a pouca tradição em pesquisa, as quais são:

1) Dificuldade de identificar e/ou delimitar o objeto de pesquisa e construí-lo

com base em sucessivas abstrações, que, a partir da realidade, permitem ir gradualmente precisando, delimitando e particularizando o objeto. (...)

2) Na medida em que o objeto não é delimitado, o pesquisador revela dificuldades para elaborar ou construir seu quadro conceitual, necessário para orientar a análise do seu objeto de estudo, escolher os instrumentos de investigação, realizar sistematização, analisar os dados para elaboração de novos conceitos (...)

3) Dificuldade em realizar a mediação entre a universalidade, singularidade e particularidade, ou seja, dificuldade de passar de categorias abstratas para objetos reais e também de construir novas categorias particulares a partir de genéricas. (...)

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4) Muitas pesquisas teóricas ficam no nível de sistematização bibliográfica, que pode ser considerado um momento pré – teórico. (...)

5) Tendência ao pragmatismo (...) 6) Pesquisas de caráter isolado e que abordam universos muito limitados e

particulares, cujos resultados não podem ser generalizados, não contribuindo para o aprofundamento e complementação de conhecimentos sobre o tema.

7) Rebatimento tardio de temas na área do Serviço Social, o que leva os pesquisadores a utilizarem a bibliografia dos autores das áreas de Ciências Sociais, sem a preocupação de buscar as fontes em que se basearam estes autores.(...)

8) Tendência à utilização de métodos qualitativos, considerando, falsamente, que o método quantitativo é de caráter positivista, ou porque tem pouco domínio sobre os conhecimentos de estatística.

9) Amplitude das áreas temáticas, ocasionando dispersão e fragmentação dos conhecimentos. (...)

10) A inexistência de uma política coerente de pesquisa no sentido de definição de prioridades e objetivos, tendo como referência as necessidades da área, acarreta falta de relevância dos temas. É preciso mencionar ainda os “modismos”, que caracterizaram as flutuações dos enfoques de pesquisa na área.

Embora concordemos com estas considerações, devemos lembrar que

tais dificuldades estão sendo enfrentadas com o aprimoramento do processo de

investigação nos cursos de pós – graduação. Enfrentamento que se faz no

próprio processo, na experiência concreta de “fazer a pesquisa” e na medida

em que os canais de socialização dos resultados se ampliam junto à categoria

profissional tanto através de eventos científicos e revistas apropriadas, como

no diálogo com as demais áreas de conhecimento.

Considerando o acesso privilegiado dos profissionais à realidade social

dos sujeitos a produção é pequena e recente, é preciso avançar e investir nesta

pesquisa que potencializa o contato do profissional com sua realidade de

trabalho, pois é lá que encontramos os sujeito de que tratamos neste momento

da tese.

“Enfim, eu avalio que temos que avançar muito ainda na sistematização e no conhecimento das determinações objetivas da vida dos sujeitos a partir das nossas pesquisas. Não que não estejamos fazendo isso, mas eu acho que é muito

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recente a nossa entrada nesse espaço e temos que sistematizar mais a respeito - talvez o seu trabalho poderá contribuir muito para isso: como que o assistente social pode estar desenvolvendo pesquisas acerca da realidade social dos sujeitos com os quais trabalha, e numa visão crítica, poder analisar de uma forma mais aprofundada essas determinações objetivas. Nós temos trabalhos hoje muito ricos. Se você buscar os trabalhos, por exemplo, na área da Assistência, o mapa da exclusão social feito aqui em São Paulo, etc., é um avanço muito grande. Mas ainda isso é muito pouco perto do vasto material que nós Assistentes Sociais temos contato no nosso dia-a-dia. Nesse sentido, somos privilegiados. É diferente dos outros profissionais. A forma de relação com os sujeitos e a forma de trabalho que possibilita esse acesso a dados fundamentais da realidade é muito grande na nossa área. Por isso falta avançarmos muito para conseguirmos ter consciência das possibilidades que esse trabalho pode colocar em termos de pesquisa. ... Você vai poder desenvolver uma pesquisa muito mais bem fundamentada e conseqüente, se isso se voltar para sua realidade de trabalho, você vai ter um fundamento muito mais consistente se fizer essa articulação, mas eu penso que isso ainda é bastante frágil. Avançamos muito. Para quem começou há duas décadas a investir em pesquisa, nós temos um avanço fenomenal. Mas é muito pouco perto das possibilidades que podem se colocar. Agora isso só pode ser revertido se houver um investimento muito grande na formação dos profissionais, no sentido das pessoas descobrirem a importância da pesquisa, descobrirem o real significado da pesquisa.” (Eunice Teresinha Fávero)

O depoimento de Eunice Teresinha Fávero demonstra que há uma ênfase

maior em discussões teóricas nas produções acadêmicas, embora isso seja

necessário, a seu ver, a dificuldade está em articular referenciais teóricos às

questões que emergem do cotidiano da prática profissional. Mais uma vez

precisamos reconhecer que ainda estamos aprendendo, pois a tradição da

pesquisa sistemática no Serviço Social é recente e as requisições da pesquisa

não são domínio do conjunto dos profissionais.

“Olha, ... é uma pergunta muito ampla. Eu acho até que a gente tem desenvolvido mais pesquisas sobre essas condições objetivas e talvez nós precisássemos desenvolver mais pesquisas sobre a constituição do sujeito. A

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minha preocupação é que acaba ficando uma tensão que tem a ver com as abordagens teórico – metodológicas e uma dicotomia entre objetividade e subjetividade que eu acho que não é pertinente. Então, por exemplo, eu que tenho uma referência na tradição marxista, bom, eu acho que a produção do valor é impregnada de subjetividade. O capital só consegue extrair valor do trabalho, se o trabalho está numa posição subjetiva, além de optar objetivamente subsumido ao capital, ele estiver numa condição subjetiva, defensiva, de não estar lutando, de não estar brigando, medindo forças com o capital para ser menos explorado. Então a luta de classes, a organização política dos trabalhadores está diretamente... é interna à lei do valor, não é um elemento externo. Não está lá o valor e aqui está a subjetividade, não. Está ali impregnado de subjetividade. Então, assim, eu acho que durante algum tempo, até pelas apropriações enviesadas que nós tivemos da tradição marxista, uma certa interlocução com o estruturalismo, etc, essa coisa foi vista de forma muito dicotômica. Eu acho que precisa de pesquisas que valorizem o sujeito sem recair num certo subjetivismo e, pesquisas que valorizem também a objetividade da vida social como constituição, como elemento que constitui o sujeito de forma a não recair num objetivismo, num certo economicismo. Quando a gente consegue encontrar essa adequação eu acho que a tendência é a gente fazer coisas muito mais profícuas, profundas, interessantes. (...) É eu acho até que o Serviço Social amadureceu nessas coisas, rompeu com o estruturalismo, a gente tem um código de ética tão interessante, que bebe do melhor do marxismo. Eu acho até que a gente avançou nisso, mas essa tensão, ela ainda é uma tensão presente. E o ambiente desse início de século XX acaba propiciando, também, uma preponderância do econômico sobre os sujeitos, uma certa impotência dos sujeitos. Eu acho que o ambiente também favorece a que essa tensão se reponha, se recoloque no cenário, mas eu acho que a gente avançou com a contribuição de Gramsci, acho que ajuda...”(Elaine Rossetti Behring)

Este depoimento suscita uma problemática essencial ao Serviço Social:

há uma tensão entre “subjetividade e objetividade” devido a dificuldades de

ordem teórico – metodológica e de formação que gera uma equivocada

dicotomia na relação entre esses dois aspectos.

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SAFFIOTTI (1997, p.62 - 63) coloca que a subjetividade envolve as

relações entre o indivíduo e as estruturas culturais, nesta relação dois aspectos

devem ser considerados:

1-Há uma dialética entre o ser singular e o ser genérico, um somente se realizando por intermédio do outro. Esta concepção, retendo a complexidade do processo da construção do sujeito – objeto, permite afastar qualquer a priori situado no indivíduo, assim como superar a “ determinação social dos destinos pessoais (...); 2- Nas relações coisificadas, ocorre a alienação do sujeito, o que pode ser concebido como ruptura entre o ser singular e o ser genérico. A rigor, há um movimento permanente de encontro e de desencontro entre o ser singular e o ser genérico. Esta oscilação própria da dinâmica contraditória existente entre estas duas objetivações do ser humano constitui em sério indicador de que nem uma nem outra pertence à natureza do ser social. Isto posto, a base ontológica desta discussão não pode ser senão relacional.(...) Nesta linha de raciocínio, a história das pessoas consiste na história de suas relações sociais. A subjetivação, enquanto movimento inseparável da objetivação, ganha novo estatuto na história biográfica e na história social. ...

Elaine Rossetti Behring nos lembra que o contexto do século XX tem

como preponderância o econômico em detrimento da compreensão do sujeito

e que este fenômeno se repõe ainda hoje.

-Há que se dimensionar com muita acuidade as relações entre estrutura e sujeito, sopesando o peso estrutural (síntese de múltiplas determinações) e as práticas dos sujeitos (identidade, cotidiano, subjetividade), para evitar os riscos/erros do economicismo, estatismo, totalização, por um lado, e voluntarismo, basismo, psicologismo, por outro lado. A análise global é imperativa. (...) -Os sujeitos individuais, sem olvidar as determinações maiores, merecem análises mais rigorosas que escrutinem suas história de vida, aspectos da vida familiar, profissional, política, afetiva, atributos de carisma e liderança, atitudes e comportamentos. (WANDERLEY, 1992, p. 154 – 155) O depoimento indica a relevância das contribuições de Gramsci aos

avanços desencadeados pela profissão em seus referenciais teóricos e ético –

políticos, constituindo-se elemento essencial ao processo de ruptura histórica

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do Serviço Social com a tradição conservadora43. Assim, conforme

SIMIONATO (1995, p. 260)

Esse enriquecimento teórico se reflete nas ações prático – operativas, permitindo a compreensão do Serviço Social na divisão sócio – técnica do trabalho e no encaminhamento de ações voltadas à ultrapassagem do discurso da denúncia e no encaminhamento de propostas efetivas no âmbito das políticas sociais e práticas institucionais. Permite compreender as questões culturais, os modos como se forma a identidade social, o senso comum, a função das ideologias e dos mitos, ou seja, aquilo que Gramsci chama de conformismo. A compreensão dessa esfera da cultura é fundamental para os assistentes sociais, na medida em que as suas ações profissionais são travadas numa relação direta com as formas de vivência cotidiana dos sujeitos sociais. Sobretudo traz a importante contribuição ao fundamentar a compreensão

da clientela e de sua condição de subalternidade numa perspectiva ampliada

de classe social, comprometendo a prática profissional a uma dimensão

política.

“O avanço ocorrido nos últimos anos no Serviço Social decorrente do debate crítico interno, principalmente após a criação dos cursos de pós-graduação stricto sensu e da criação das entidades representativas da categoria, é demonstrado pela centralização das preocupações do Serviço Social nas diferentes manifestações da questão social e das respostas governamentais formalizadas em forma de Políticas Públicas para minimização dos problemas sociais advindos dessa questão. (...) A reconstrução permanentemente do Serviço Social tem provocado mudanças profundas observáveis a partir do seu processo histórico.Com essas mudanças 43 SIMIONATO (1995, p. 185) faz importante reflexão sobre a teoria gramsciana e sua incidência no Serviço Social, das quais para este momento destacamos: “No final dos anos 70, quando se observa um relativo distanciamento do pensamento althusseriano, Gramsci passa a ser um marco teórico significativo nas elaborações do Serviço Social. O referencial gramsciano é buscado inicialmente como possibilidade para pensar a atuação do assistente social enquanto intelectual orgânico, marcando o seu compromisso com as classes subalternas. Este eixo de reflexão, nem sempre inspirado numa leitura correta da obra gramsciana, foi muitas vezes utilizado para reeditar certas tendências da visão missionária do assistente social em face dos segmentos pauperizados da população. No entanto, as idéias de Gramsci passaram progressivamente a ser incorporadas pelo Serviço Social, abrindo novas possibilidades para pensar seus referenciais teóricos e suas ações interventivas. (...) De uma forma ou de outra, as elaborações teóricas de Gramsci repercutiram fortemente na produção do Serviço Social em toda a década de 80, extrapolando para os anos 90, seja em forma de livros derivados de teses acadêmicas, seja na forma de ensaios diversos publicados nas revistas específicas da profissão.”

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um novo perfil profissional é construído uma vez que esse passa de mero consumidor acrítico de conhecimentos produzidos em outras áreas de saber, para o de construtor, também, de conhecimentos pela via da pesquisa. Não queremos dizer com isso que todo assistente social, obrigatoriamente, tenha que ser pesquisador, mas sim que a sua postura profissional deve se afastar, eliminar do seu agir ações fundamentadas na opinião, no saber cotidiano por serem desprovidos de conhecimento científico. No agir profissional esse saber deve ser visto, apenas como aspectos empíricos a serem considerados no momento da reflexão-ação ou da investigação. Por não construírem essas mudanças um bloco monolítico é que vemos aliadas a elas, no interior do Serviço Social, a existência de vertentes teóricas e posturas metodológicas diferentes, que, dependendo da posição assumida pelo pesquisador, as “determinações objetivas da existência dos sujeitos” recebem tratamentos diferenciados. Em síntese podemos dizer que nossas observações têm nos levado a identificar uma forte tendência em tratar essas objetivações como decorrentes da ampliação e aprofundamento das questões sociais e da não eficácia das políticas públicas.” ( Aglair Alencar Setubal)

O depoimento acima traz à tona que os avanços presentes no Serviço

Social em função dos investimentos em cursos de pós – graduação e da

renovação da profissão frente às exigências decorrentes das transformações

societárias têm gerado uma produção de conhecimento centrada na

compreensão das expressões da “questão social” e das respostas dadas pelo

Estado, através das “políticas públicas”. Nesta produção o sujeito demandatário

das políticas aparece com menos relevância. Acreditamos que esta produção

tem sido fundamental ao Serviço Social, pois tem alicerçado a compreensão

dos espaços contraditórios em que o profissional intervém. No entanto a

preocupação com o sujeito parece constituir-se em uma lacuna que precisa

ser refletida e mesmo instigada no âmbito das produções científicas no

Serviço Social, principalmente aquelas que rompem com a tradição

conservadora que desloca o sujeito do seu contexto sócio – histórico.

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A preocupação com o sujeito decorre, então da inquietação profissional

com as derivações da questão social em relação às estratégias definidas pela

política pública. Ainda permeada por estas políticas há uma preocupação com

este sujeito inserido em movimentos sociais e neste contexto nas organizações

não governamentais e representações nas diferentes instâncias da sociedade

civil, como nos conselhos de direitos.

Não podemos desconsiderar que as diferentes “vertentes” teórica –

metodológicas presentes no Serviço Social impõem “tratamentos

diferenciados” às expressões objetivas da existência dos sujeitos, pois,

conforme já refletimos não somos um “bloco monolítico”.

Em relação a este aspecto destacamos as influências da tradição

Positivista nas Ciências Sociais e Humanas e da Teoria Social de Marx que

presentes através de suas derivações na profissão alimentam as polêmicas que

cercam a relação sujeito/objeto no processo de produção de conhecimento e na

relação com as fontes de apreensão da realidade estudada. O Positivismo...

... apenas reconhece como ciência a atividade “objetiva”, capaz de traçar as leis que regem os fenômenos, menosprezando os aspectos chamados “subjetivos”, impossíveis de serem sintetizados em dados estatísticos. No entanto, o próprio positivismo tenta trabalhar a “qualidade do social” seja buscando substantivá-lo em variáveis, seja, através do estrutural – funcionalismo, focalizando os produtos da interação social como componentes funcionais da realidade, e tratando-os como entidades passíveis de estudo, independentemente de sua constituição pelos indivíduos. (MINAYO,1996, p.10 -11)

Já a perspectiva marxista , oposição à abordagem positivista, “...abarca

não somente o sistema de relações que constrói o modo de conhecimento

exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que constituem a

vivência das relações objetivas pelos atores sociais, que lhe atribuem

significados. ...” (MINAYO, 1996, p.11) Considera, portanto que uma das

dimensões da totalidade é a interpretação que os sujeitos dão às suas ações em

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dada realidade e contexto sócio, econômico, político e cultural, portanto

histórico.

Há algo de significativo na prática da pesquisa histórico - crítica que

envolve o sujeito participante e que revela o comprometimento profissional,

expresso na atitude do pesquisador em relação ao sujeito participante.

“ É quando estou dialogando com os sujeitos da minha pesquisa. É quando as suas respostas me revelam algo não explicitado verbalmente em suas falas. É quando eu percebo que apesar do rigor do método científico, tenho que adotar certa flexibilidade teórico – metodológica para que o público alvo do meu estudo (amostra) seja,verdadeiramente, sujeitos dessa co-produção.” (Aglair Alencar Setubal)

As metodologias que privilegiam as fontes orais na pesquisa social têm

como marca essencial o diálogo estabelecido entre o pesquisador e os

participantes eleitos para a pesquisa. Neste caso a entrevista tem sido o

procedimento utilizado com mais freqüência e “...implicitamente, realça a

autoridade e autoconsciência do narrador e pode levantar questões sobre

aspectos da experiência do relator a respeito dos quais ele nunca falou ou

pensou seriamente.” (PORTELLI, 2001, p. 12)

A relação com o sujeito não é tranqüila, exige atenção e uma

metodologia que se constrói na relação, pois nem sempre se ouve o que se

busca através dos recursos metodológicos. Na relação construída com o

sujeito trabalha-se também o “indizível”, revelador, mas difícil de captar. O

indizível – termo utilizado por Maria Isaura Pereira de Queiroz em discussões

sobre relatos orais ...

...é o não – explícito das vivências dos indivíduos que vivem em um meio social determinado. É o conjunto de vivências, emoções e experiências das pessoas que não está nos documentos e que tem um conteúdo e um valor inestimável na transmissão, conservação e difusão dos conhecimentos. Esses conteúdos formam parte do acervo

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dos grupos sociais e são esses mesmos conteúdos que têm permitido a integração e identificação do indivíduo no seu meio, no seu contexto, em um determinado período de tempo. (ROJAS, 1994, p. 61)

A riqueza de pesquisas que se preocupam com a experiência dos sujeitos

possibilitam revelar uma história que é construída pelos próprios homens –

concretos - , portanto nesta perspectiva, não são pensados “...como uma

abstração , ou como um conceito, mas como pessoas vivas, que se fazem

histórica e culturalmente, num processo em que as dimensões individual e

social são e estão intrinsecamente imbricadas. ...” (KHOURY, 2001, p. 80)

“Então, esta questão tem muito a ver com o que nós estávamos agora discutindo, porque tratar as determinações objetivas da existência supõe uma dimensão espaço/tempo, isso significa, se eu estou tratando de determinações objetivas, eu não tenho uma construção generalista, eu vou ter uma construção histórica, ainda que eu possa ter elementos que persistam e eu acho que nós estamos, exatamente, caindo nessa questão em que significa que a pesquisa tem que fazer esta busca da descoberta do que particulariza, do que se anuncia. E muitas vezes eu percebo e não só eu, muitos, que as pesquisas terminam quase que sendo ilustrações de um pensamento já por uma derivação teórica estruturada, não uma busca, mas simplesmente uma ilustração. Eu só quero dizer assim, antes de começar a pesquisa já se sabia o resultado, que ela é tão direcionada àquele conteúdo pré – construído que independe de olhar o real, ele só vai ilustrar. Como as vezes você dizer assim: qual é a gravura que pode ilustrar esse meu cartaz, esta minha frase? Mas eu já a tenho. Não é efetivamente a pesquisa como uma construção e busca da particularidade das relações que constroem aquela realidade. É isso que eu estou chamando muito mais ilustrativas, certo? Então eu creio que quanto mais no seu atendimento o Assistente Social, nos seus serviços, ele não enxerga aquilo que eu disse, esses referenciais maiores, mais ele se perde. Agora o referencial maior, volto a dizer, não é uma ilustração do pensamento, ele tem que, até pra entender a particularidade, ele tem que entender a totalidade, construir a particularidade, mas com a coragem da descoberta do real. Uma das coisas freqüentes que as vezes a gente ouve dizer de um profissional é que a realidade atrapalha. Eu ia fazer isso, mas daí aconteceu não sei o que lá... quer dizer não é a realidade entendida como um desafio com os elementos que a

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compõem, parece que a realidade precisaria sofrer de uma assepsia, dela ser liberada de alguns elementos que a compõem , pra daí ela poder ser trabalhada. Então, vamos dizer assim, o conjunto dos elementos da realidade, as vezes, é visto mais como algo que dificulta, o que me atrapalha é a realidade, quer dizer eu tenho a certeza na cabeça, agora a realidade é que me atrapalha. Então eu acho que tem muitas questões deste tipo.” (Aldaíza Sposati)

Compreender o sujeito supõe situá-lo em “uma dimensão espaço/ tempo”,

ou seja situá-lo em um contexto sócio – histórico, cuja materialidade está na

própria realidade em que se insere. ...Esses sujeitos são moradores da cidade, pequenos agricultores do campo, artesãos, pescadores, trabalhadores assalariados, grupos de imigrantes, de mulheres, de jovens, velhos, crianças, membros de movimentos específicos, vivendo experiências de trabalho, construindo modos de viver de se organizar , ou sobrevivendo em becos e ruas, com bagagens culturais diferentes, com perspectivas futuras diversificadas, enfrentando, ou não, processos de exclusão, marginalização e segregação social. (KHOURY, 2001, p. 80) No entanto, muitas vezes as pesquisas não dão conta de enraizar este

sujeito à sua cultura, à sua realidade social, às formas pelas quais estes sujeitos

buscam se expressar e criar alternativas de sobrevivência. Muitas vezes as

pesquisas acabam sendo “ilustrações de um pensamento” ou fundamentação

“teórica”. Esta contribuição é essencial, pois nos leva a refletir que a

arquitetura teórico – metodológica de uma pesquisa pode minar as

possibilidades de descoberta do real, limitando-se a levantar dados

quantitativos ou informações de fonte oral que servem para comprovar

hipóteses ou afirmar certezas prévias, ou seja “... antes de começar a pesquisa

já se sabia o resultado, que ela é tão direcionada àquele conteúdo pré –

construído que independe de olhar o real, ele só vai ilustrar.”

As vezes as pré – determinações de nossa pesquisa impedem olhar a

dinâmica da realidade, “quer dizer eu tenho a certeza na cabeça, agora a

realidade é que me atrapalha.”

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Urge o exercício do pensar crítico “ Este é um pensar que percebe a

realidade como processo, que a capta em constante devenir e não como algo

estático. Não se dicotomiza a si mesmo na ação. ‘Banha-se’ permanentemente

de temporalidade cujos riscos não teme.” ( FREIRE, 1982, p.97)

Citando Fernando Pessoa MARTINELLI (1994, p. 75) faz a seguinte

reflexão que nos alimenta em relação à necessidade de rompermos com as

estruturas fixas de se pensar a realidade.

“Uma aprendizagem de desaprender”, essa é a coragem que precisamos ter, esse é o desafio que temos que enfrentar no Serviço Social. É indispensável que saibamos nos despojar de antigos mitos e ritos, de práticas sacralizadas, visualizando a prática social como uma construção permanentemente histórica, instituinte, que se processa numa relação transdisciplinar com as demais áreas do saber. Não alimentemos mais a nostalgia do uno, pois não vamos encontrar um saber que nos unifique. Ao contrário, temos que pensar no saber como globalidade, como pluralidade, como espaço de encontro de signos. E, sem dúvida, pensar a profissão nessa perspectiva traz uma conseqüência fundamentalmente importante: o saber deixa de ter apenas nexos lógicos para ter também nexos políticos. É pelo saber e com o saber que nós vamos desvendar a trama do real. É com esse saber politizado que vamos conseguir produzir novas propostas de prática, construídas coletivamente numa relação transdisciplinar, e que concorram efetivamente para o atingimento daquilo que buscamos : uma sociedade nova, justa, democrática, humana. Essa dificuldade, enquanto profissão, de se relacionar com a realidade

em seu movimento histórico e com os desafios que a realidade coloca à

profissão tem como um dos elementos determinantes o próprio processo de

formação profissional.

“Eu acho que tem a ver, claro, com a questão que você diz de um processo de baixa investigação, de baixo desenvolvimento da descoberta. Talvez porque essa atitude de descoberta está um pouco mais adstrita às Ciências Biológicas ou Matemáticas ou coisas assim, mas talvez porque este conceito, as vezes, vigente de que essa área é Ciência Aplicada, ela só tem que beber dos conhecimentos, ela não produz conhecimentos, então ela não tem porque se indagar. Eu acho que essa atitude, eu acho que o que eu tentei passar na aula hoje foi muito esse desejo de busca, esse desejo de descoberta. E eu creio

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que as vezes o processo de formação não leva a isso, ao desejo da descoberta. Então parece que as coisas já são dadas, que o modelo já está de modo apriorístico traçado, que o pensamento já enquadra toda a realidade e que você não tem algo a descobrir, entendeu?” (Aldaíza Sposati)

Em relação a pesquisa o projeto de formação articula intervenção e

investigação, colocando estes processos como seu eixo de qualificação

profissional. Assim a proposta de reforma curricular propõe:

- o desenvolvimento de pesquisas acerca do processo histórico real que tanto

articule suas determinações gerais como suas expressões particulares;

- a realização de pesquisas sobre os fenômenos com os quais lida o Serviço

Social, tanto para compreendê-los como para formular respostas profissionais

enraizadas na realidade e capazes de acionar as possibilidades nela contidas.

(ABESS/CEDEPSS, 1996, p.152)

Esta proposta ainda coloca como trilha fértil para o Serviço Social a

formação em pesquisa que se volte para objetos que expressem realidades

particulares – alvos e contextos da intervenção profissional, buscando

construir um discurso sustentado na própria dinâmica do real, na articulação

teoria/prática e garantindo à profissão uma ação qualificada que na relação

com as demandas sociais e de mercado preservem sua legitimidade. Além

disto a pesquisa propicia a compreensão do sujeito no contexto das suas

relações sociais. Essa trilha é fértil também para viabilizar a apreensão das relações entre indivíduo e sociedade, a partir das situações vivenciadas pelos sujeitos e que se apresentam aos profissionais do Serviço Social como desafios. Sua compreensão - seja em nível particular, seja no nível das suas determinações sociais – é requisito para apreender tanto a objetividade quanto a subjetividade dos sujeitos, superando as tendências prescritivas, tutelares, e que não raras vezes atravessam a ação profissional. (ABESS/CEDEPSS, 1996, p.152)

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Para tanto é preciso uma formação orientada na perspectiva histórico –

crítica, cuja herança fundamental é o método dialético que permite apreender a

o processo de constituição da realidade social na sua totalidade e é essa

perspectiva que tem contribuído para os avanços na produção de

conhecimento na área do Serviço Social, pois desenvolve uma atitude

investigativa atenta as demandas próprias do real. Neste sentido o depoimento

de Aldaíza Sposati reforça que as temáticas de pesquisa da profissão, a

exemplo da Assistência Social, antes de serem objetos de investigação são

demandas do real e não criação abstrata: “Mas ele começou da pesquisa do

real. Não foi uma derivação da teoria....”

Trataremos agora da posição que a experiência e o conhecimento dos

sujeitos ocupam nas pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social e de como

ela é pensada pelos participantes da pesquisa.

“...a gente tem uma, um respeito muito grande e (...) uma atitude muito ética com o saber do sujeito. Que não é uma atitude de contemplação do saber. Não é do tipo ah! o sujeito sabe. Mas é uma atitude de analisar que saber ele sabe e de respeitar esse saber que ele sabe. E acho aí que tem muita a influência do Gramsci, daquela idéia de todo homem é um filósofo, ele também tem uma filosofia, mesmo que ele seja de senso comum, mesmo que seja uma filosofia que ainda não saiu pra um campo da reflexão teórica.” (Lúcia Cortes da Costa)

Deste depoimento destacamos que atitude ética que orienta a relação com

o sujeito da pesquisa não é de “contemplação”, mas está sustentada em

objetivos que levam a uma análise “crítica” do “saber do outro”.

Retoma Gramsci em uma de suas contribuições ao Serviço Social em

relação à compreensão do senso comum como patamar para o

desenvolvimento de ações conscientes pela classe subalterna e principalmente

pelo reconhecimento “de que todos os homens são ‘filósofos’ ” (GRAMSCI,

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1991, p. 34) Com esta afirmação valoriza o sujeito ao reconhecer sua

concepção de mundo que sustenta suas ações e relações sociais. ...O senso comum não pode, para Gramsci, ser excluído da filosofia. Ao contrário, ao enfatizar que “todos são filósofos”, Gramsci procura mostrar que o senso comum já é filosofia, mesmo incipiente e fragmentária. É filosofia porque opina sobre o mundo, formula juízos de valor de caráter geral, os quais, tomados em conjunto, apresentam uma certa organização intelectual e moral da experiência individual e coletiva. ... (SIMIONATTO, 1995, p. 82)

Nesta perspectiva e através de ações educativas, exercendo suas funções

sócio – pedagógicas, o Serviço Social pode contribuir com a construção de

uma nova cultura, sustentada em um processo de crítica ao senso comum e

em ações concretas que digam respeito às lutas necessárias para superação da

condição de subalternidade dos demandatários da prática profissional. “A

passagem do senso comum, do modo de pensar desorganizado folclórico, a

um pensar crítico e histórico se faz através da luta concreta, a partir dos

problemas práticos vividos pelas classes subalternas, as quais, mediante a

discussão dos seus problemas, chegarão a um nível de cultura sempre mais

crítico das situações impostas pelo modo capitalista de produção.”

(SIMIONATTO, 1995, p.83)

Assim a relação que o Serviço Social deve estabelecer com o

conhecimento do sujeito participante de sua investigação/intervenção deve

sustentar-se numa relação de diálogo crítico, capaz de gerar conhecimentos

novos e propiciar a elevação do nível de consciência deste sujeito. A sua

experiência e conhecimento alicerçam-se em dinâmicas concretas da

realidade, dinâmicas que precisam ser transformadas através de ações

políticas, ações que sejam, também capazes de resgatar a condição de sujeito

de direitos, capazes de romper com as tramas da condição de subalternidade.

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Nessa adversidade, a questão é saber como a História irrompe na vida de todo dia e trava aí o embate a que se propõe, o de realizar no tempo miúdo da vida cotidiana as conquistas fundamentais do gênero humano, aquilo que liberta o homem das múltiplas misérias que o fazem pobre de tudo: de condições adequadas de vida, de tempo para si e para os seus, de liberdade, de imaginação, de prazer no trabalho, de criatividade, de alegria e de festa, de compreensão ativa de seu lugar na construção social da realidade. ... (MARTINS, 2000, p. 11 - 12)

“...Quando eu digo que são os sujeitos, na perspectiva de sujeito já pressupõe uma forma de tratamento. Quando eu digo que eu trabalho com sujeitos subentende uma relação de igualdade e de participação nos diferentes momentos da pesquisa , não só quando eu vou lá e entrevisto. (...) Então o que eu dizia é exatamente isso, quando a gente trabalha na perspectiva dos sujeitos, a gente já pressupõe um tipo de relação. Aquilo que a Martinelli fala, eu não me preocupo só com o dado. Quando nós trabalhamos na perspectiva de sujeitos nós interagimos com os nossos entrevistados, nós somos parte importante da pesquisa e isso, então, pressupõe que o sujeito tenha a devolução, que ele participe e que ele possa também se afastar no momento que ele queira; pressupõe que ele tenha um envolvimento, uma vivência profunda sobre aquilo que está sendo pesquisado, que de fato o depoimento dele, a participação dele, a experiência dele possa contribuir para os avanços naquela área. E com isso também, pressupõe, então, esse retorno. Como que eu vou devolver, como é que eu vou trazer o que foi tratado? Como é que isso foi de fato encaminhado? Então, e aí vai de novo naquela direção social da própria formação do Assistente Social, de respeito à dignidade humana, de consideração à pessoa que está ali contribuindo, naquele momento. (...) Mas essa busca pela integralidade, de olhar essa pessoa que vai buscar um serviço integral e não como uma pessoa que faz vacina ou que busca medicação, sabe, mas que ela é um sujeito. Por isso que eu dizia, na verdade quanto tu olhas pro sujeito e tu denominas sujeito já mostra que tipo de relação tu tens com ele. E a relação é de parceiros. A relação não é cada um desenvolvendo o seu lado, como diria. Ele buscando um serviço e eu prestando um serviço, um de cada lado. Não, mas de parceria, de juntos tentar encontrar uma alternativa pra aquele problema.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

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Trabalhar numa perspectiva que envolve o sujeito supõe uma forma de

tratamento, uma postura que subentende que a “relação” estará baseada em

princípios de “participação”.

Pressupõe ética, interação, “devolução”, respeito à “dignidade” e à

experiência do outro.

E ainda em relação ao desencadeamento da proposta da pesquisa exige

que o pesquisador selecione um sujeito que tenha uma “vivência profunda”

sobre a problemática a ser trabalhada, que realmente os depoimentos e

informações decorram da vivência do sujeito.

Nossa relação com os sujeitos e com as informações que podemos colher

com eles é contextualizada, ou seja

...Nós as pensamos em sua própria historicidade, como expressões das relações sociais, assim como elementos constitutivos dessas relações. Escolhê-las e analisá-las implica identificá-las e compreendê-las no contexto social em que se engendram e, igualmente, dentro de nossas perspectivas de investigação. Nesse sentido, mais do que buscar dados e informações nas fontes, nós as observamos práticas e/ou expressões de práticas sociais através das quais os sujeitos se constituem historicamente. (KHOURY, 2001, p. 81)

Além disso requer uma certa flexibilidade teórico – metodológica, por

parte do pesquisador que possibilite reconstruir meios de coleta e de análise do

material em função do que efetivamente o sujeito tem a contribuir com as

discussões e problemáticas de pesquisas impostas pelo pesquisador.

“Eu avalio que os sujeitos não têm ainda um protagonismo. A experiência dos sujeitos não ocupa uma centralidade, ainda, como deveria ocupar nas nossas pesquisas. Acho que vem ocupando mais, mas ainda não ocupa essa centralidade. Eu penso que se nós nos dermos conta do conhecimento amplo que temos, seja pela nossa intervenção direta, seja pela possibilidade de acesso a espaços de intervenção de outros colegas Assistentes Sociais, nós temos uma grande possibilidade de colocar o sujeito, a população com a qual trabalhamos, como protagonista desse processo de pesquisa, no sentido de que

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nós possamos efetivamente trazer informações dessa realidade social e contribuir para alavancar alterações na realidade, pelo nosso acesso. Penso que a nossa peculiaridade é essa, é a facilidade de acesso que temos a essa população. Pelas peculiaridades de nosso trabalho. Nós trabalhamos majoritariamente com uma população que vem sendo excluída do mercado de trabalho, do acesso a bens e serviços os mais diversos. Uma realidade que nós temos claro que precisa ser transformada. Para transformar essa realidade nós temos que ter um conhecimento mais amplo a respeito dela, para que possamos propor alterações - sejam alterações em projetos mais localizados, sejam alterações políticas, como nós temos feito em alguns ângulos, sobretudo na área da assistência. Agora, para isso, nós temos que trazer essa população como protagonista das nossas pesquisas e isso tem que ser incentivado. Acho que nós temos possibilidade - se conseguíssemos uma maior sistematização da realidade dos sujeitos nos diversos espaços que nós ocupamos - temos a possibilidade até de criar formas de sistematizar indicadores. Não sei, não tenho isso muito claro, mas indicadores sócio – econômicos a partir dessa realidade, que possam subsidiar políticas, subsidiar projetos, acho que isso contribuiria com uma valorização da nossa profissão e da importância do Serviço Social em diversos espaços da nossa sociedade. Nós vivemos um momento hoje de desvalorização de algumas áreas, sobretudo as áreas que lidam mais diretamente com a população empobrecida, até por conta do avanço do desmonte das políticas e a diminuição do Estado. Eu percebo muitos profissionais desesperançados mesmo, que não vêem possibilidade de mudanças nessa realidade.” (Eunice Teresinha Fávero)

Ao contrário dos demais depoimentos, neste momento, percebemos as

reflexões sobre o questão do sujeito tomam posições mais claras. Neste caso

Eunice Teresinha Fávero avalia “que os sujeitos não têm ainda um

protagonismo”. Esta avaliação decorre do fato do Assistente Social ter na

realidade do sujeito a matéria prima de seu trabalho. Cotidianamente o

profissional é elo de ligação entre as demandas dos usuários e as políticas

públicas. Em seu processo de trabalho, nos espaços em que desenvolve sua

intervenção, através de seus instrumentos (reuniões, entrevistas,

aconselhamentos, encaminhamentos, etc.) colhe informações sobre

necessidades pessoais, organização e relações familiares, condições de

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trabalho, situação de renda, estados de saúde, condições de moradia,

demandas judiciais, organização comunitária, religiosidade, nível educacional,

entre tantas outras situações que possam indicar carências materiais, como

também colhe informações de ordem cultural e defronta-se com expectativas

de vida muitas vezes atrofiadas diante da perversa realidade material em que

se encontram estes usuários. Neste processo de trabalho nem sempre o usuário

tem sua centralidade garantida, pois já chega em uma condição vinculada a

uma identidade subalterna.

Neste sentido o depoimento é rico, pois alerta que nesses “espaços de

intervenção” , que são também nossos espaços de pesquisa, “nós temos uma

grande possibilidade de colocar o sujeito, a população com a qual trabalhamos,

como protagonista desse processo”. Precisamos potencializar o acesso que

temos às informações sobre a realidade social desta população e através da

pesquisa sistemática buscar alternativas que rompam com os padrões sócio –

econômicos que geram relações de exclusão social, pobreza e subalternidade.

Tratam-se de alterações de natureza “política”, ou seja exigem vinculação

do profissional aos movimentos organizados da sociedade e o

desenvolvimento de práticas sócio – educativas que recuperem o

protagonismo destes usuários na luta pela garantia de seus direitos

fundamentais. A sistematização e a divulgação do conhecimento construído sobre as condições de vida da população e dos recursos disponíveis para a garantia de direitos é papel crucial a ser desempenhado pelo Serviço Social como requisito necessário para a tomada de consciência da qualidade de vida pela própria população, mobilização acerca de direitos sociais e, fundamentalmente, para democratização das relações socioinstitucionais. Isto também quer dizer que a prática investigativa está intimamente articulada com as praticas de avaliação e planejamento das políticas sociais, no fundo definidoras das conquistas e/ou garantias de direitos sociais, das quais os levantamentos socieconômicos e o cadastramento de recursos são inerentes. (SARMENTO, 2000, p.108)

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Garantir o protagonismo destes sujeitos depende, também, de uma

pesquisa comprometida ética e politicamente com mudanças sociais, e um

conhecimento que em seu processo de construção subsidie políticas públicas.

Para tanto o profissional precisa posicionar-se e reconhecer na sua prática

oportunidades de não só colher informações junto aos sujeitos – cujo

armazenamento muitas vezes gera documentos estéreis, incapazes de suscitar

mudanças – mas também transformar as informações através de diálogo e

problematização sistemáticos com a realidade, com os seus protagonistas e

sustentados no suporte teórico – metodológico construído pela profissão.

...Considero, isto sim, que temos que valorizar mais a nossa prática. Somos profissionais com uma enorme capacidade operativa. É indispensável, porém, que saibamos desenvolver também a nossa consciência argumentativa. A construção coletiva da prática, juntamente com a população usuária, nos ajuda muito nesse sentido, pois nos leva a confrontar o nosso saber, a balizar nosso discurso e relativizar o nosso papel, buscando na teoria e no conhecimento pleno do real os elementos fundantes da prática. (MARTINELLI, 1994, p. 71)

Poderíamos acrescentar que é na própria relação que estabelecemos com

estes usuários, através de nossa prática profissional, que poderemos garantir-

lhe centralidade tanto no processo de investigação como no processo de

intervenção.

“... Então colocar os sujeitos com os quais a gente trabalha como protagonistas no processo de pesquisa seria um salto muito grande. A gente poderia avançar no sentido de construir um conhecimento mais amplo a respeito da realidade da população excluída.... Excluída, acho que a respeito deste termo exclusão, temos que tomar um certo cuidado, porque tudo cabe nele, mas é no sentido de pessoas que estão fora do mercado de trabalho ou que nunca foram incluídas, que não têm acesso a bens sociais em razão das desigualdades do país. É você trazer mais concretamente esses dados da realidade, é você, ao mesmo tempo, valorizar a profissão enquanto uma profissão que produz conhecimentos e que propõe ações possibilitadoras de alterações nessa

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realidade. Para isso a gente teria que ter um investimento, talvez, mais organizado por parte das academias, nessa direção. Sabemos que no mestrado e doutorado as pesquisas acabam sendo projetos mais individuais. Embora eles sejam vinculados a uma determinada linha de pesquisa dentro da Universidade, mas é uma decisão individual pesquisar acerca de determinado objeto. Isso é feito, vai continuar sendo feito. Mas eu penso que a Universidade tinha que incentivar mais a produção de conhecimento a partir de seus Núcleos de Estudos e Pesquisas com grandes linhas de pesquisa. Por exemplo: porque não fazemos, não desenvolvemos uma grande pesquisa envolvendo vários pesquisadores até com dissertações de mestrado ou teses de doutorado num determinado Núcleo de Estudos, a respeito da realidade da população que é atendida no Judiciário, a respeito da população que é atendida na Secretaria Municipal de Assistência Social. Você ter linhas, focos mais amplos dessa pesquisa, com a participação de diversos profissionais. Aí você consegue dar uma outra dimensão. E aí eu acho que você consegue dar um protagonismo maior para os sujeitos, que ainda é muito pouco perto do que a gente teria possibilidade e capacidade de fazer. Mas penso que é um processo que estamos vivendo. É uma etapa, e eu acho que caminha para isso. Eu acho que cada vez mais estamos vendo, a partir sobretudo da década de noventa com o projeto que se colocou para profissão, a busca mesmo de trazer o conhecimento, a sistematização a respeito da realidade e o protagonismo dos sujeitos, o protagonismo do Serviço Social que sabemos que ocupa, queira ou não queira, ocupa ainda uma área subalterna aí no meio de outras profissões na área de humanas. Eu penso que os nossos passos - de profissão eu digo - acabam sendo ou mais lentos ou com muito maior dificuldade de mostrar o seu conhecimento, a sua capacidade e consequentemente valorizar a profissão.”(Eunice Teresinha Fávero)

Outra questão emerge como essencial neste depoimento: o próprio

Assistente Social se colocar como protagonista neste processo, também como

sujeito, produtor de conhecimento neste campo de ação, reconhecendo esta

competência e rompendo com o imobilismo frente a dificuldade de

compreender o lugar social da profissão na complexidade das relações

societárias.

Em seu processo de trabalho e nas relações que estabelece com as

demais áreas de conhecimento e por uma cultura profissional impregnada

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pela tradição de consumir conhecimentos no âmbito das Ciências Sociais e

Humanas, o próprio profissional não se reconhece como capaz de produzir

conhecimento e propor alternativas de intervenção criativas e inovadoras.

Como alternativa de superação desta problemática a participante da

pesquisa propõe que as “academias” estabeleçam uma relação mais afinada

com as demandas do trabalho do Assistente Social. Os “Núcleos de Estudos e

Pesquisas”, por estabelecerem relações de troca de conhecimentos entre a

academia e os profissionais, poderiam ter esse papel de captar tais demandas e

estabelecer “linhas de pesquisa” que fomentassem o desenvolvimento de

pesquisas coerentes com tais demandas. Embora os projetos de pesquisa

tenham as marcas e opções individuais do pesquisador, podem vincular-se ao

projeto ético – político profissional, sedimentando as conquistas coletivas da

profissão. Cabe à própria Universidade, através de seus níveis de graduação e

pós – graduação e de forma articulada promover o estreitamento entre o

processo de investigação e o processo da intervenção. Concordamos com

IAMAMOTO ( 1998, p. 146) quando afirma:

Um horizonte é incorporar a pesquisa como atividade constitutiva do trabalho profissional, acumulando dados sobre as múltiplas expressões da questão social, campo em que incide o trabalho do assistente social. É fundamental , ainda, que os projetos de trabalho elaborados estejam calçados em dados e estatísticas disponíveis, munidos de informações atualizadas e fidedignas, que respaldem a capacidade de argumentação e negociação dos profissionais na defesa de suas propostas de trabalho junto às instâncias demandatárias ou competentes. A pesquisa é ainda um recurso importante no acompanhamento da implementação e avaliação de políticas, subsidiando a (re)formulação de propostas de trabalho capazes de ampliar o espaço ocupacional dos profissionais envolvidos. A consolidação acadêmica da área supõe o reforço da produção acadêmica, do investimento na pesquisa, e estímulos à publicação dos resultados alcançados. Em relação aos processos de investigação que buscam garantir

centralidade ao sujeito é muito comum trabalhar as orientações

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características da pesquisa qualitativa, ou seja, sujeito ganha espaço através

de estratégias metodológicas, como a entrevistas, que valorizam o

depoimento oral. Nossa pergunta refere-se aos limites destas estratégias

metodológicas de pesquisa em realmente garantir protagonismo a estes

sujeitos.

“...Eu penso que não. Eu acho que só isso não é suficiente. Nós temos que recuperar dentro do social, eu estou falando dentro do Serviço Social, mas eu acho que dentro da área de Humanas em geral, meios de realizar a pesquisa para fazê-la de uma forma mais ampliada, para ter o seu resultado de uma forma mais consistente. Por exemplo, é importante conseguirmos articular a pesquisa quantitativa e a pesquisa qualitativa. Uma não exclui a outra. A complementação das duas por meio de diversos instrumentos de coleta de informações pode contribuir para um avanço muito maior em termos de conhecimento.(...) Os indicadores sócio – econômicos são fundamentais para nortear a proposição de projetos e de políticas. Têm mais impacto e são necessários. É claro, existe e até existiu em determinado momento um certo preconceito com a visão da pesquisa experimental, da pesquisa quantitativa, no sentido de que tem determinadas questões que o número em si acaba não dando conta de certas questões, de todas as dimensões da realidade, e não dá, mas pode complementar. ... Aí, na qualitativa, eu vou buscar a experiência mais concreta, como eles vêem a situação de vida, quais as experiências que eles viveram, os significados que eles atribuem às situações que viveram, ...enfim isso vai ser muito mais completo, muito mais rico e nós temos possibilidades de fazer. Então eu acho que a gente não tem que desvalorizar uma ou outra. Em muitas situações eu vou, necessariamente, ter que trabalhar e vai ser muito mais útil, no sentido de ser muito mais necessária para determinada ação que eu ou outros sujeitos irão desenvolver, a informação predominantemente quantitativa; em outra, a experiência, a vivência dos sujeitos coletadas por meio de depoimentos, poderá vir muito mais de encontro ao que eu estou buscando propor, buscando conhecer. Mas se conseguirmos, nessa busca do conhecimento dos sujeitos, do protagonismo dos sujeitos, reunir a pesquisa quantitativa e a pesquisa qualitativa eu acho que iremos avançar muito mais, tanto quanto no que se refere em trazer um conhecimento, como na direção de proposições, de projetos e de políticas. Eu acho que a pesquisa só tem significado, só tem importância se, de alguma forma, ela contribuir para alguma alteração, seja na

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intervenção do profissional, seja na vida concreta da população com a qual a gente trabalha, seja no nível mais amplo de assessorar a formulação de políticas, e sabemos que hoje existem vários trabalhos do Serviço Social contribuindo para isso. Então nós temos uma possibilidade grande de ampliar ... e talvez teria que ter um rigor maior por parte das academias em exigir um pouco mais no âmbito das pesquisas, porque às vezes a gente, enquanto Assistente Social, se apaixona por determinadas formas de realização de pesquisa. De repente você ouviu a história de um sujeito por meio de um depoimento, é uma coisa tão rica, às vezes até emocionante, tão bonita e que por si só já revela tanto da realidade, e pode haver o risco de passar por cima de um certo rigor necessário à pesquisa, e aquela determinada pesquisa pode acabar não trazendo uma contribuição devida. Eu penso que precisamos continuar insistindo no rigor da pesquisa, seja quantitativa ou qualitativa e, preferencialmente, as duas. Eu acho que se deixa, se negligencia um pouco a quantitativa. Se você vai hoje tanto na graduação como no pós – graduação, existe muito pouco de formação para uma pesquisa quantitativa. Geralmente temos dificuldades de lidar com números, de lidar com mensurações, de analisar dados estatísticos. É claro que não é necessário a gente analisar, podemos contar com profissionais que auxiliem nisso. Mas penso que tem que se recuperar isso como um procedimento essencial e complementar a uma pesquisa. A gente pode unir as duas e fazer uso delas com a população com a qual trabalhamos.”(Eunice Teresinha Fávero)

É preciso avançar para produção de pesquisas com alcance social

ampliado, capazes de produzir indicadores sociais que fundamentem

programas e políticas sociais.

Indicadores Sociais podem ser conceituados, de acordo com Varelli,

como “... parâmetros qualificados e/ou quantificados, que servem para

detalhar em que medida os objetos de um projeto foram alcançados, dentro de

um prazo delimitado de tempo e numa localidade específica. Como o próprio

nome sugere são uma espécie de ‘marca’ ou ‘sinalizador’, que busca expressar

algum aspecto da realidade sob uma forma que possamos observá-lo ou

mensurá-lo.” (apud PAIVA, 2000, p.82)

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Dados de natureza quantitativa têm maior “impacto” na orientação e

“proposição de projetos sociais”. Já os depoimentos, por sua natureza

qualitativa, revelam a experiência concreta dos sujeitos e contribuem para

redimensionar práticas. Articular pesquisa qualitativa e pesquisa quantitativa

garantiria protagonismo ao sujeito através das dimensões da sua existência

(subjetiva/objetiva)

LEFÉVRE (2000, p. 11-15) alerta para o fato de que existem motivações

que facilitam opções ou rejeições por parte do pesquisador ou pela pesquisa

qualitativa ou pela pesquisa quantitativa. Em relação à pesquisa quantitativa

fala-se em uma dificuldade em trabalhar com a estatística, com os números ou

com a matemática, sedimentando uma crença de que é mais fácil a utilização

da pesquisa qualitativa. Quanto a pesquisa qualitativa enfatiza-se o gosto pelo

subjetivo, pelos significados entre outros argumentos. Segundo o autor citado,

tais argumentos desmerecem o trabalho do pesquisador e depõe contra o rigor

necessário a qualquer metodologia de pesquisa.

A oposição pesquisa qualitativa/pesquisa quantitativa é equivocada e

decorre de uma tradição científica, herdada dos fundamentos clássicos do

positivismo e das pesquisas experimentais que reconhecem como válidos os

conhecimentos considerados objetivos e generalizáveis. Dados, gráficos,

tabelas, percentuais e amostragens estatísticas garantem este nível de

conhecimento. Romper com esta tradição requer articular os níveis

qualitativos e quantitativos em um mesmo processo de pesquisa, conforme já

afirmamos anteriormente.

A relação qualitativo/quantitativo pressupõe uma construção

metodológica que considera a requisições concretas do objeto delimitado para

o estudo; o potencial dos sujeitos envolvidos em socializar suas experiências e

conhecimentos em torno deste objeto; os instrumentos possíveis de serem

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trabalhados, pois estes darão dinâmica aos objetivos propostos pelo

pesquisador e uma abertura do pesquisador para trabalhar as possibilidades

novas que as informações ou dados qualitativos/quantitativos trazem à tona

em um processo investigativo.

Assim articular as dimensões qualitativa e quantitativa nas pesquisas que

desenvolvemos trará avanços “nessa busca do conhecimento do protagonismo

dos sujeitos” e “na direção de proposições, de projetos e de políticas”

inovadores.

“Primeiro assim, o que eu acho é que precisa de mais atenção a isso, que essa centralidade não está assegurada, acho que a gente tem muitos pesquisas sobre instituições, as políticas... Aí eu faço a minha meia culpa , que a minha pesquisa também não privilegia os sujeitos, como fonte primária de pesquisa. Então, eu acho que a gente precisa fazer mais pesquisas como aquela da Carmelita lá nas “Classes Subalternas...”, eu acho que tem pouco e conhecer mais o universo cultural e as condições de vida da população, os usuários do serviço que a gente presta, das políticas que a gente conhece. Então, me parece assim que precisa avançar nesse sentido. Acho que o sujeito não tem tido a centralidade que poderia ter. Inclusive, assim, porque o sujeito aí não pode ser visto apenas numa relação onde ele se transforma em objeto, eu acho que ele tem que ser fonte de dados e ao mesmo tempo tem que viver o retorno, conhecer o conhecimento que foi produzido a partir do seu próprio depoimento. Eu não tenho como te dizer, até porque eu não tenho essa visão de como é que está a pesquisa, não estou nesse momento com uma visão tão ampla de se as pesquisas estão tendo esse compromisso ético, de retornar e de que a pesquisa tem uma dimensão de devolução, no sentido inclusive de provocação de uma nova postura nos próprios sujeitos/objetos da pesquisa, sujeitos sociais e objetos de pesquisa.” (Elaine Rossetti Behring)

O depoimento acima traz uma questão crucial na pesquisa social, ou seja

o “compromisso ético” de construir uma “relação” em que o participante da

pesquisa não se transforme em “objeto”. Desta forma toma, como exemplo e

pela sua repercussão no meio profissional, a pesquisa desenvolvida por Maria

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Carmelita Yazbek: Classes subalternas e Assistência Social que objetivava:

“...compreender as marcas que a ação assistencial deixa sobre o segmento das

classes subalternas que a ela recorre para obter serviços e reconhecimento. Ao

mesmo tempo, busca situar alguns aspectos de sua cosmologia e de sua

interpretação acerca das condições concretas em que vive como ‘assistida’.”

Nesta pesquisa “...os subalternizados falam...” e são compreendidos a partir

das relações de classe em determinada estrutura sócio - econômica (YAZBEK,

1993, p. 17 e 84)

O reconhecimento do sujeito e a garantia de sua centralidade nas

pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social, conforme MARTINELLI (1994,

p. 13) exige “ ...contato direto com o sujeito da pesquisa. Trata-se, portanto,

de uma outra ambiência, onde vamos privilegiar instrumentos que superam o

questionário, o formulário e que vão incidir na narrativa oral, na oralidade. Se

queremos conhecer modos de vida, temos que conhecer as pessoas. ...”

Há ainda um compromisso ético o da “devolução”. Este aspecto também

favorece a centralidade do sujeito.

“Se chegou até ele como objeto não significa que já existe um canal constituído. Eu acho que a gente tem que ser mais criativo. Criativo é gerar espaços de socialização, chamar as pessoas, reuni-las e apresentar a pesquisa, submeter a pesquisa ao crivo crítico. Ainda que sejam pessoas supostamente, até porque nós lidamos... quem são os sujeitos? Nós lidamos com o público alvo das políticas, bastante precarizado, cheio de necessidades e muitas vezes com imensa dificuldade de receber uma informação dos doutores e ter um olhar crítico sobre isso. Mas a gente também não pode subestimar a população e a sua vivência como mediação para observar o que nós estamos dizendo. Então, o que eu fico pensando é que o interessante seria a gente não ter uma relação - eu vou usar essa palavra, mas não é exatamente isso – uma relação meio oportunista, da população ser a fonte de dados e tratar apenas como fonte de dados. (...) De uma forma geral ... Embora nosso Código de Ética seja muito claro em relação a isso. Ele é claríssimo. Tem que devolver. Está lá... E isso não vale só

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para a pesquisa em serviço, para a investigação com dimensões do serviço. Isso vale pra toda e qualquer pesquisa. O problema é que também que os professores acham que são professores, que não são Assistentes Sociais. mesmo que estejam fazendo pesquisa sobre as expressões da questão social, objetivas ou subjetivas, que não têm obrigação de devolver para a população o produto do seu trabalho.(...) Eu acho que sim. Eu acho que nem todo mundo tem essa clareza de que tem que devolver... É, mais ainda. Se o Serviço Social tem essa dificuldade, eu acho que nas Ciências Sociais e Humanas de uma forma geral essa dificuldade é ainda maior.” (Elaine Rossetti Behring)

A problemática levantada pelo depoimento deixa claro que as

dificuldades de devolução não se restringe ao Serviço Social, ela está presente

na academia e é um desafio para as Ciências Sociais e Humanas. Isto remete

à própria estrutura universitária comprometida com o saber das classes

dominantes. É o que nos coloca (CHAUÍ, 2001, p. 72) Se, por outro lado, examinarmos o campo de nossas investigações, também não encontraremos grandes motivos de júbilo. Estamos comprometidos até o âmago com o saber das classes dominantes. Se, nas áreas das ciências exatas, esse compromisso aparece mediado, isto é, o teor das pesquisas está condicionado aos financiamentos, no caso das ciências humanas o compromisso não possui sequer o álibi da submissão financeira. A sociedade brasileira, tanto em sua estrutura quanto em sua história, tanto na política quanto nas idéias, é descrita, narrada, interpretada e periodizada segundo cortes e visões próprios da classe dominante. Esse aspecto se torna verdadeiramente dramático naqueles casos em que o “objeto de pesquisa” é a classe dominada. Além de roubar-lhe a condição de sujeito, as pesquisas tratam sua história, seus anseios, suas revoltas, seus costumes, suas produções, sua cultura no continuum de uma história que, além de não ser a dela, muitas vezes é justamente aquela história que o dominado, implícita ou explicitamente, está recusando. Em outras palavras, os dominados penetram nas pesquisas universitárias sob as lentes dos conceitos dominantes, são incluídos numa sociedade que os exclui, numa história que os vence periodicamente e numa cultura que os diminui sistematicamente. Comparsas involuntários dos dominantes, os “objetos” de pesquisa não têm hora e vez no recinto da universidade. Se não pensarmos nesses compromissos que determinam a própria produção universitária, nossas discussões sobre a democratização se convertem num voto piedoso e sem porvir.

É preciso garantir um processo de socialização do conhecimento

construído, de forma a provocar uma nova postura e novos conhecimentos

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que sustentem novas formas de agir dos segmentos subalternos em relação às

suas condições de vida.

Em relação aos deveres do Assistente Social nas relações com os usuários

nosso Código de Ética prevê: a) (...) b) garantir a plena informação e discussão sobre as possibilidades e conseqüências das situações apresentadas, respeitando democraticamente as decisões dos usuários, mesmo que sejam contrárias aos valores e às crenças individuais dos profissionais, resguardados os princípios deste código; c) (...) d) devolver as informações colhidas nos estudos e pesquisas aos usuários, no sentido de que estes possam usá-los para o fortalecimento dos seus interesses; (...) (apud, BONETTI, 2000, p. 221 – 222)

Além destes aspectos as condições em que se fazem pesquisa hoje nas

Universidades dificultam um processo sério de devolução e um processo de

amadurecimento intelectual em relação ao referencial analítico e o material

coletado

“Eu acho que ainda tem um problema, que é um problema de outra natureza: são as condições reais em que se faz pesquisa na Universidade. Então, essa questão do aligeiramento, isso eu acho que é uma questão muito preocupante, que eu acho que atinge em cheio a qualidade das pesquisas. Então a pesquisa como uma coisa de curtíssimo prazo. Como é o caso dos dois anos para o mestrado, quatro anos para o doutorado, três anos para uma bolsa do CNPQ. É claro que você tem a possibilidade de renovar, mas ainda assim você tem uma pressão para uma produtividade que para a área social eu acho extremamente nefasta. E isso aligeira e tira um pouco da preocupação desses mecanismos importantes de socialização sobretudo em pesquisas qualitativas que envolvem depoimento de pessoas, etc. A socialização e esse compromisso ético da devolução, da discussão com os próprios pesquisados. Então, assim, tem um problema sério aí que é a própria base... com uma pesquisa muita rápida, a base da pesquisa às vezes.... O que eu estou querendo dizer pra você é que tem gente que diz que está fazendo pesquisa, mas não está. (...) Por causa desse aligeiramento. Então, são levantamentos muito rápidos e o tratamento mais rápido ainda e isso eu acho que gera muitos problemas, de qualidade de pesquisa que está se fazendo nessas condições. Porque, eu

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comecei dizendo assim: que eu acho que a pesquisa ela é um... com esse nome, digna desse nome, eu acho que ela é uma coisa de pelo menos médio prazo. Então, eu acho que os mestrados estão se tornando iniciações em pesquisa. (...) Então, a riqueza você não constrói dentro de um processo como este, nem a riqueza.... porque assim quanto mais rico for o processo , mais determinações você vai conseguir extrair da realidade. A realidade lá, Marx, como síntese de múltiplas determinações. Quanto mais rico for, inclusive o teu acúmulo analítico mais condições você vai ter de extrair daquela entrevista, daquele dado, mais elementos, problematizar mais. Então, assim, nas condições em que se está fazendo pesquisa social hoje na Universidade eu acho que tem um empobrecimento. (...)” (Elaine Rossetti Behring)

O que este depoimento nos traz é fundamental, pois os prazos definidos

para a formação de pesquisadores e para o desenvolvimento das pesquisas

colide com às exigências de rigor teórico – metodológico e com o processo de

pesquisa que inclui o sujeito participante como protagonista.

Ao avaliar a universidade contemporânea, CHAUÍ (2001, p. 191 - 192)

a classifica como operacional. Esta universidade está voltada para sua própria

estrutura organizacional e preocupada com índices de produtividade através

do controle de horas-aulas, avaliação pela quantidade de publicações de seus

pesquisadores, bem como de suas participações em congressos e eventos

científicos. A docência restringe-se à transmissão rápida de conhecimentos e

sua marca essencial que é a formação fica fragilizada. Neste contexto a

pesquisa transforma-se em “...estratégia de intervenção e de controle de

meios ou instrumentos para a consecução de um objetivo delimitado. (...) Por

isso mesmo, numa organização não há tempo para a reflexão, a crítica, o

exame de conhecimentos instituídos, sua mudança ou sua superação.”

Sendo assim, aquele trabalho denso, processual, de aproximação

sucessiva às “múltiplas determinações” dos fenômenos estudados fica restrito

às imposições e normas institucionais. Mais ainda o processo de reflexão

sobre material empírico coletado junto aos sujeitos sofre as seqüelas deste

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“aligeiramento.” Concordamos, então com Elaine Rossetti Behring sobre o

“empobrecimento” que corremos o risco de vivenciar nas pesquisas

desenvolvidas no contexto desta universidade operacional.

No entanto, não podemos deixar de enfatizar que o esforço dos

pesquisadores, no plano individual ou no plano das organizações coletivas e

vemos isso claramente no contexto do Serviço Social, tanto na graduação,

como na pós – graduação, têm buscado um compromisso com uma

universidade social e politicamente responsável. Principalmente, em função

de seu projeto ético –político uma preocupação em sedimentar suas pesquisas

numa perspectiva histórico – crítica.

“Aqui me surge uma dúvida. Está também o pesquisador compreendido como sujeito nesse processo de construção de conhecimento? Considero tanto o pesquisador como os pesquisados sujeitos que têm que ter considerado as suas experiências, os seus conhecimentos. Não é negando a existência desses que garantimos a cientificidade do conhecimento, o rigor teórico-metodológico. Pelo contrário, é no desacreditar da neutralidade científica que a pesquisa poderá desvendar a realidade na sua riqueza e complexidade. Poderá perceber a multiplicidade de determinações que se entrelaçam, determinam e são determinadas pelas situações novas ou permanentes que povoam o mundo dos homens no seu fazer-se histórico. Somente reconhecendo a força da experiência e dos conhecimentos dos sujeitos é que podemos trabalhar no sentido de garantir o rigor teórico e metodológico. Ressalto aqui a importância da compreensão do exposto na pergunta anterior quando afirmo da necessidade do assistente social desenvolver uma prática que não se fundamente no saber cotidiano, já que o considero válido apenas como fonte, dados empíricos, para um conhecimento sistemático, problematizado que dê conta das múltiplas determinações existentes na realidade.” (Aglair Alencar Setubal)

Reforçamos, neste momento, a necessidade de considerar e atribuir a

condição de sujeito tanto ao pesquisador, como ao “pesquisado”, aqui colocado

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como participante das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social. Enquanto

“sujeitos” – Assistente Social e participante da pesquisa são portadores de

experiências e conhecimentos. “...Uma consideração importante nesse sentido

é que a pesquisa qualitativa é, de modo geral, participante, nós também somos

sujeitos da pesquisa. Não podemos pensar que chegamos a uma pesquisa

como ‘um saco vazio’. Não! Temos vida, temos história, temos emoção! ...”

(MARTINELLI, 1994, p.15)

Aglair Alencar Setúbal enfatiza que não é negando a existência dos

conhecimentos e experiências destes sujeitos que garantimos cientificidade à

pesquisa, pelo contrário é preciso reconhecer “a força da experiência e do

conhecimento dos sujeitos” e tratá-los com “rigor teórico – metodológico” e

diálogo crítico.

Ao Assistente Social cabe tratar o seu cotidiano como fonte de

conhecimento, que precisa ser sistematizado, “problematizado” para dar conta

das “múltiplas determinações presentes na realidade.” Não podemos esquecer

que neste cotidiano se faz presente o sujeito/usuário dos serviços prestados

pelo Assistente Social, sendo assim pode ser revelador...

Para as profissões sociais, e para o Serviço Social especialmente, esta é uma característica de maior importância, sobretudo se considerarmos que somos profissionais que chegamos o mais próximo possível do cenário da vida cotidiana das pessoas com as quais trabalhamos. O que para muitas profissões é relato, para nós é vivência, o que para muitos profissionais é informação para nós são fatos, plenos de vida, saturados de história. E isto é inteiramente crucial, reforçando a concepção de que as profissões são configurações eminentemente dinâmicas, sociais, históricas, que se transformam ao se transformarem as circunstâncias materiais, históricas, concretas em que se produzem. (MARTINELLI, 1997, p. 22) E é neste cotidiano que se constrói a relação do Assistente

Social/pesquisador com o usuário, potencial participante de suas pesquisas.

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“Ela é fundamental até porque, aquela coisa que eu dizia, nós Assistentes Sociais trabalhamos mais intensamente ou temos mais oportunidade de trabalhar - nem vou dizer do que outras categorias, podem ter outras que são a mesma coisa ou similar - com segmentos sociais invisíveis sobre os quais os conhecimentos que se tem são genéricos e preconceituosos. Certo? Então eu creio que trazer, dar voz aos sujeitos, tratar objeto como sujeito é uma das formas democráticas e éticas, inclusive de nós conseguirmos fazer outra leitura dessa realidade, não só pela vertente mais comum, tecnocrática e tal, mas talvez você botar luz, trazer outros elementos sobre a realidade. Eu lembro que uma vez eu fazia uma entrevista com um morador de uma favela, que ele discutia o modo pelo qual foi feito uma pesquisa para investigar que tipo de casa eles queriam naquela favela. E ele disse uma coisa: olha pesquisa é que nem eleição, na hora que ganha o negócio, parece que aquilo já ganhou tudo, que aquilo é o todo. Mas não é assim a vida. Quando me perguntam, ele me dizia assim, você quer uma casa? Lógico que eu vou dizer sim eu quero. Só que é preciso perguntar que casa é essa. Isso está numa das primeiras revistas Serviço Social e Sociedade. Que casa é essa, certo? Porque se, na verdade, o modo pelo qual ele é indagado não é capaz de captar essa possibilidade dele ter opinião, isto fica numa generalidade que não responde ao desejo dele. Ele diz: claro que eu quero uma casa, mas eu não quero casa pronta. Eu quero uma casa em que eu partilhe da construção, eu sou pedreiro, eu quero construir as minhas coisas. Então é muito interessante esta visão que esse cidadão me deu, isso faz muitos anos... ...E muito interessante porque eu creio que a gente tem chance de trabalhar, de dar voz, de incluir na academia, de trazer vozes desconhecidas, entendeu? Eu acho que o modo de trabalhar o sujeito abre novos caminhos, você traz novas formas de ver. E eu estou trabalhando o conceito de sujeito, que muitos consideram como objeto. Eu estou trabalhando o sujeito, exatamente, como aquele que é o co-protagonista do processo de investigação e que você está discutindo e vai sistematizar.”(Aldaíza Sposati)

Aldaiza Sposati traz à tona um aspecto relevante, o fato de que o

Assistente Social trabalha com “segmentos sociais invisíveis”, ou seja pela sua

condição de subalternidade esse segmento é desqualificado em relação a sua

cultura e ao seu conhecimento. Nas reflexões de MARTINS (1989, p.111)... O conhecimento de que são portadoras as classes subalternas é mais do que ideologia, é mais do que interpretação necessariamente deformada e incompleta da

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realidade do subalterno. É neste sentido, também, que a cultura popular deve ser pensada como cultura, como conhecimento acumulado, sistematizado, interpretativo e explicativo, e não como cultura barbarizada, forma decaída da cultura hegemônica, mera e pobre expressão do particular. Desqualificado politicamente estes segmentos invisíveis transformam-se

em “objetos” de pesquisa, destituídos de conhecimento e de história. Um dos

caminhos de rompimento com esta lógica de perpetuação da subalternidade,

pode ser a pesquisa, orientada pelos princípios ético – políticos da profissão e

compromissada com a busca de alternativas teórico – práticas que garantam

centralidade ao sujeito.

O depoimento acima retoma entrevista realizada com o Presidente de

uma Associação de moradores de uma favela chamada Funerária em São

Paulo44 - Sr. Júlio José dos Santos. Nesta entrevista o Presidente evidencia que

embora a população viva uma situação concreta de pobreza e destituição de

direitos, as pesquisas destinadas a cadastramento da população ignoram o

conhecimento que possuem sobre essas condições e rejeitam suas sugestões e

reflexões, resultando que o encaminhamento das alternativas de solução de

problemas, como no exemplo, da moradia, fica nas mãos dos técnicos e do

poder público. Sobre isto oportuno resgatar a reflexão do próprio Sr. Júlio José

dos Santos: “A gente esperava que eles deixassem o povo trabalhar por eles.

Porque eu acho que a idéia deve ser essa. Deixá o povo, cada um no seu

trabalho: fazê o que ele entende. O que ele tem na cabeça. Porque, todo

mundo que mora num lugar pior, tem sempre um trabalho bolado na cabeça

dele: como ele vai melhorar a situação dele. ...” (DA FAVELA

FUNERÁRIA À CIDADE PARQUE NOVO MUNDO, 1982, p.16)

44Entrevista realizada com o Sr. Júlio José dos Santos, presidente da União de Moradores da Cidade Nova Parque Novo Mundo, pela Assistente Social Aldaíza de Oliveira Sposati e pelo Arquiteto José Ferreira, em fevereiro de 1982, intitulada da Favela Funerária à Cidade Parque Novo Mundo, publicada pela revista Serviço Social e Sociedade, n. 8, ano III, março de 1982, São Paulo: Cortez.

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Há um alerta neste depoimento no sentido de que podemos trabalhar as

pesquisas de forma a fortalecer as intenções de luta da população. Na

perspectiva em que Aldaíza Sposati nos traz é uma oportunidade “ de incluir na

academia” conhecimentos e experiências – “ vozes desconhecidas”.

Evidentemente não estamos advogando práticas voluntárias nem

messiânicas, que supervalorizem o sujeito em detrimento do conhecimento da

estrutura sócio – econômica, mas sim uma leitura e diálogo crítico e que seja

capaz de construir novas relações entre o conhecimento acadêmico e o

conhecimento acumulado por este sujeito – “co – protagonista” de nossas

intervenções.

Assim, concordamos com MARTINELLI (1994, p. 70 - 71)

...O viver histórico desse homem é importante para nós. Temos que ter presente que não somos nós, da academia que produzimos mediações. Estas se constroem no cotidiano, são produtos do viver histórico dos homens, mulheres, jovens e crianças na construção de sua vida material. Temos que aprender a aprender com as classes populares, pois elas têm o exercício político cotidiano que freqüentemente nós negamos, porque operamos com um discurso pronto e negamos ao outro a possibilidade de construí-lo. ...

Por último e não menos relevante, refletimos sobre os recursos

metodológicos que nós profissionais do Serviço Social construímos para

estabelecer aproximações à realidade deste sujeito e trazer à tona seu

conhecimento e experiência e Aldaíza Sposati nos lembra:

“Dão. Quanto a isso dão, não tenho dúvida nenhuma. Não vejo aí que o Assistente Social, acho que o chamado “ approach” , abordagem , o Assistente Social, inclusive, tem mais condições que muitos outros profissionais. Quanto a isso eu não tenho dúvida nenhuma, acho que nós somos treinados pra aproximação. O problema é o ir além da aproximação. Então eu acho que desse ponto de vista, dificilmente, o Assistente Social não é bem sucedido na forma

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de abordagem. Ele é trabalhado neste sentido, ele tem esse “approach” . Quanto a isso não vejo problema, tanto nos processos de avaliação. Existem, hoje, eu acho que algumas riquezas de investigação, talvez, muitas vezes o Assistente Social possa usar muito mais formulários, questionários ou pesquisas de opinião sem um outro tratamento estatístico, talvez ele não saiba lidar com aquela informação. Ele não tem propriamente esta qualidade de trabalhar as coisas, da análise de conteúdo e tal, acho que daí é um rigor de pesquisador que ele também precisa aprender, difundir, trabalhar. Agora, realmente nas pesquisas, pesquisa – ação, ação – participativa, eu acho que o Assistente Social sempre se deu muito bem com isso, eu nunca vi restrição.” (Aldaíza Sposati)

O Serviço Social tem uma rica experiência e conhecimento acumulado

sobre as formas de aproximação ao sujeito e academicamente ele é preparado

para isso. A questão que se coloca hoje é até que ponto os procedimentos

metodológicos garantem a possibilidade do usuário se colocar como sujeito e

como o Assistente Social trabalha com o conjunto das informações colhidas

na realidade de forma a potencializar em seu trabalho as alternativas que

garantam consolidação dos direitos fundamentais do cidadão.

O Assistente Social também precisa “aprender”, investir em um processo

de capacitação continuada para renovar seus fundamentos teórico –

metodológicos de forma a dar conta de apreender as mediações que se

manifestam em seu cotidiano de trabalho e nas relações que estabelece com os

usuários das políticas públicas. E precisa criar mecanismos de socializar,

“difundir” seus conhecimentos ao ponto de ampliar os horizontes de sua

intervenção e dos resultados de suas pesquisas. Principalmente, no contexto de

sua práticas, potencializar conhecimentos, meios e recursos que garantam

visibilidade ao sujeito que, pelo seu protagonismo individual ou coletivo tem,

no seu cotidiano, construído alternativas de luta e resistência social e política.

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Compartilhamos das preocupações de Florestan Fernandes em relação a

uma questão central que tem implicações para a produção de conhecimentos

nas Ciências Sociais e Humanas: “...como as idéias, produzidas pelos

intelectuais, transformam-se em conhecimento crítico (ou não) e, por sua

radicalidade, engendram forças sociais...” mobilizadoras de práticas

inconformadas com a lógica perversa do capitalismo contemporâneo e

capazes de interferir na dinâmica das relações sociais. (FERNANDES, 1995,

p. 9-10)

Esta preocupação é crucial para o Serviço Social, pois diz respeito à

direção ética e política do conhecimento produzido pelos seus profissionais.

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3-O RETORNO E ALCANCE SOCIAL DAS PESQUISAS DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL

Inicialmente retomamos que nossa concepção sobre o retorno e alcance

social das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social está orientado pelo

princípio de que o conhecimento construído pelo conjunto dos profissionais

precisa ganhar força social e romper com os muros da academia e do próprio

Serviço Social, sendo, através de uma prática crítica e propositiva, capaz de

interferir nas dinâmicas societárias e nas condições de vida do cidadão.

A preocupação com o retorno social e alcance social45 de nossas

produções refere-se a uma intenção de fazer o caminho de volta, isto é

retornar à realidade que sustentou a produção de conhecimento e mobilizar

ações que transformem esta realidade, seus sujeitos e a própria profissão,

alargando seus horizontes e potencializando seus objetivos, suas

competências e habilidades profissionais.

Já o impacto, no contexto desta pesquisa, refere-se a dimensões das

transformações e mudanças operadas na profissão, nas condições materiais de

existência dos sujeitos/usuários, nas ações dos profissionais de Serviço Social,

nas organizações em que o profissional atua, tendo como mediação o acúmulo

de conhecimentos produzidos pela profissão.

Evidenciamos uma dimensão essencialmente política neste aspecto, no

sentido de que o conhecimento produzido deve ter uma estratégica direção

para uma intervenção profissional comprometida com processos concretos

que garantam materialidade ao projeto ético – político profissional.

45Buscando nos aproximar das discussões pertinentes a este pilar de nossa tese procuramos conceituar os termos do enunciado presente no subtítulo deste ítem em discussão. Assim temos: Retorno: “...Voltar (para o ponto de onde partiu);...fazer voltar; tornar...” ; Alcance: “....Limite dentro do qual se consegue tocar ou atingir alguma coisa;...”(FERREIRA,1988, p.27 e 569)

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Com esta perspectiva nos preocupamos em refletir com as participantes

sobre as dimensões do impacto das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço

Social junto às organizações sociais nas quais os Assistentes Sociais trabalham

e nas condições de vida dos sujeitos que requisitam sua prática profissional.

Nos preocupamos, também, com as repercussões do conhecimento produzido

no seio da própria profissão.

“Não acredito que haja um “impacto” direto das pesquisas nem nas organizações nem nas condições de vida dos sujeitos. Acho que (...) se referem ao conhecimento da realidade e, através de algumas mediações elas podem incidir sobre as orientações e formulações institucionais voltadas para as formas e os conteúdo das intervenções que afetam ou modificam as condições de vida dos sujeitos. A pesquisa não se transforma automaticamente num instrumento operativo visto ser um processo intelectivo, de reprodução mental de processos reais, através de aproximações sucessivas à realidade. O produto destas aproximações se transforma em sistematizações, reveladoras de conhecimento, informações, reflexões que orientam tanto conteúdos, como direções e estratégias de ação. No caso serviço social ela é fundamental para o ensino da profissão, assim como para elaboração da crítica e das proposições. Em se tratando de uma profissão de intervenção cabe, inclusive, qualificar quais pesquisas conseguem ter uma relação mediata ou imediata sobre a atividade profissional. Isso não significa restringir as pesquisas às analises de situações concretas baseadas em levantamento de dados empíricos. Também aqui incluo a necessidade de pesquisas teóricas.” (Ana Elizabete Mota)

Este depoimento traz uma reflexão que nos instiga a dimensionar os

limites do conhecimento científico e a sua relação com a prática profissional.

Assim, Ana Elizabete Mota afirma e concordamos com ela, que não há um

“impacto direto” do conhecimento produzido pela profissão através das

pesquisa nas diferentes instâncias da ação profissional e nas “condições de

vida” dos cidadãos. Na verdade, o conhecimento através de seus “produtos”

possibilita “sistematizações” e construções teórico - metodológicas que

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orientam a direção e as estratégias da ação e da formação profissional, bem

como atualizações dos fundamentos teóricos que sustentam as intervenções

profissionais.

As articulações entre o conhecimento produzido pelo conjunto da

categoria profissional e as demandas profissionais se fazem através de

“mediações”. Afirmamos, em nosso primeiro capítulo, que a categoria

mediação expressa relações e conexões estabelecidas entre os fenômenos na

sua constituição e entre os sujeitos e a sua realidade de intervenção e

investigação. Com esta perspectiva “...a categoria mediação aporta uma

enorme contribuição ao desvendamento dos fenômenos reais e à intervenção

do assistente social...” (PONTES, 2000, p. 43)

A intervenção profissional, através de suas intenções, seus projetos e

ações cotidianas, estabelece as mediações entre conhecimentos e as

demandas sociais. Desta forma acreditamos que estas mediações são

apreendidas no real e re-construídas teoricamente, na medida em que o

profissional passa da intenção à intervenção profissional, se apóia em pesquisa

sistemática e crítica dos fenômenos sociais e defina estratégias, meios e

recursos necessários para o alcance de seus fins. Por isso concordamos com

SETUBAL (1995, p.66) quando afirma “...As mediações são, então, ações

dinâmicas que, por serem abstratamente construídas, só são percebidas a

partir de procedimentos sistemáticos, estimuladores do ato reflexivo e

originário desses, no movimento permanente do sujeito cognoscível em

direção ao objeto na sua manifestação real.”

“Eu acho assim: nós temos produzido muito na área da assistência social, na área da criança e do adolescente, (...) na área da saúde e essas produções têm tido impacto. Eu vejo assim a própria capacitação, que a gente faz na área da criança, do adolescente e da assistência, elas são uma forma de levar um conhecimento que é elaborado pela academia pra um contato direto com a

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população. E é um conhecimento que procura instrumentalizar a população, pra mudanças. Mudanças na gestão da política pública, mudanças. Então eu acho que tem sim, a gente tem visto pelo Departamento que muitos TCCs são usados como referência até pra fazer projetos de intervenção. Então isso é fundamental. Quando eu digo que a gente não tem impacto acadêmico, a gente não tem meios eficientes de divulgação. Quer dizer a gente poderia ampliar muito isso. E como a gente não tem revistas indexadas, como não tem, principalmente o hábito de que toda a pesquisa tem que ser publicada, isso é uma regra, nós temos que trabalhar com isso. E dá trabalho,(...). Então o que acontece? O uso é muito restrito naquele ambiente, naquela região em que ele se insere. Ele tem um impacto, mas é um impacto limitado. Mas agora é claro que quando você tem a Universidade produzindo conhecimento nessa região ela eleva, sim, o entendimento dos sujeitos sobre aquela realidade. (...) Você tem que produzir academicamente. Universidade tem que produzir conhecimento. Universidade tem uma responsabilidade diante da formação. A gente não pode só ler livro pro aluno. A gente tem que produzir conhecimento. Isto é, alem de ler livro.” (Lúcia Cortes da Costa)

Os depoimentos de Lúcia Cortes da Costa, acima, e o de Elaine Rossetti

Behring, abaixo, têm algo em comum. Trata-se do reconhecimento da

produção de conhecimento do Serviço Social no campo das políticas públicas,

especificamente sobre Seguridade Social. Destacam, neste caso, que o impacto

refere-se a instrumentalizar os sujeitos envolvidos (cidadãos, profissionais,

gestores), organizações e movimentos sociais para acompanhar o processo de

implementação desta política.

“Olha, assim, eu vejo que o Serviço Social está produzindo. E isso tem repercussão na formulação de políticas, na formação de quadros. Eu penso, por exemplo, no campo da Assistência Social, muitas pesquisas desenvolvidas tanto na PUC/SP, quanto na UERJ, na UNB, penso lá na pesquisa da Ivonete, que é uma super pesquisa. São pesquisas que tem impacto na problematização da implementação de uma determinada política pública concretamente. Por exemplo, a pesquisa da Maria Inês Bravo,(...), é uma pesquisa que tem um componente inclusive extensionista, que é de formação de conselheiros, do campo da sociedade civil, então tem um impacto direto. Essa pesquisa que eu estou fazendo, por exemplo, a idéia é de subsidiar as organizações do

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movimento combativo da sociedade civil organizada em defesa da seguridade, mostrar caminhos, estratégias. E a gente já está começando a desdobrar da pesquisa um projeto de assessoria orçamentária para a capacitação. Isso, inclusive, tem uma certa articulação com a Maria Inês, da capacitação de conselheiros, abrir a caixa preta do orçamento para a população, no sentido que ela possa fazer um controle social do orçamento público. Então, assim, eu acho que as pesquisas podem ter uma repercussão importante tanto na capacitação dos sujeitos envolvidos, tanto dos profissionais, tanto quanto os usuários de serviços, quanto na formulação de política pública.” (...) (Elaine Rossetti Behring)

O Serviço Social, através das Universidades, tem sido requisitado para

planejar e operacionalizar propostas de “Capacitações” para gestores,

profissionais e conselheiros nas áreas da Assistência Social, Trabalho, Criança

e Adolescente e Saúde.

Este tem sido um espaço fértil de intervenção profissional, visto que

possui uma dimensão formativa e destina-se a um segmento que define a

direção da política pública nos municípios. Nestas capacitações se coloca em

processo de discussão e avaliação a “gestão” das políticas públicas, que deve

ter por prioridade o atendimento das necessidades dos cidadãos e a garantia

de seus direitos.

Segundo CARVALHO (1999, p. 19) quando refletimos sobre gestão

social “... estamos nos referindo à gestão das ações sociais públicas. A gestão

do social é, em realidade, a gestão das demandas e necessidades dos cidadãos.

A política social, os programas sociais, os projetos são canais e respostas a

estas necessidades e demandas.”

Desta forma o Serviço Social tem levado a Universidade a cumprir o

seu papel de produzir conhecimento e de criar espaços para mobilizá - lo

junto à comunidade, às organizações sociais e ao poder público de forma a

“instrumentalizar“ e capacitar os sujeitos envolvidos com a gestão da política

pública, nas suas dimensões de planejamento, operacionalização e avaliação.

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Queremos enfatizar que esse envolvimento do Serviço Social com

espaços de capacitação dos segmentos organizados e representativos da esfera

pública não é ocasional, resulta de seu amadurecimento intelectual e

mobilização permanente, enquanto categoria profissional, em instâncias de

luta pela garantia dos direitos sociais.

De acordo CARDOSO et al (1997, p. 52 - 53) merece destaque o avanço

em relação à produção de conhecimentos sobre a realidade brasileira , Estado,

políticas sociais, movimentos sociais, cultura, entre outras temáticas, cujas

bases estão na tradição marxista e tem cumprido importante papel de oxigenar

tanto as relações entre Universidade e sociedade quanto os próprios

fundamentos dos processos formativos que envolvem os segmentos

representativos da sociedade civil.

Mais especificamente em relação ao Serviço Social, estes processos devem ser observados a partir do acúmulo e da tradição intelectual que a profissão vem construindo ao longo dos últimos anos. Ainda que não configure uma área científica autônoma, no campo das chamadas ciências sociais e humanas, o Serviço Social desfruta hoje de um reconhecimento no cenário acadêmico que lhe confere maior legitimidade e maiores desafios. A maturidade intelectual da profissão implica certas responsabilidades e cuidados. Essa maturidade é expressa, sobretudo, na extensão e profundidade das suas produções bibliográficas, nas dissertações e teses dos cursos de pós – graduação, na sedimentação da pesquisa, nos avanços teóricos que vêm orientando a formação profissional, no fortalecimento do papel acadêmico e organizativo de suas principais entidades nacionais que atuam num País de dimensão continental, na interlocução e atuação com as demais profissões e no trânsito teórica e politicamente mais sedimentado no campo do pensamento social contemporâneo. (grifo nosso) Esta legitimidade tem sido construída através de produções que dão

conta da complexidade das temáticas que envolvem a compreensão das

políticas públicas. De forma imbricada, o Serviço Social tem enfrentado novos

desafios, que não são tradicionais à pesquisa em Serviço Social, como é o

exemplo citado por Elaine Rossetti Behring que desenvolve pesquisa sobre

“orçamento público”. Neste caso, alerta que a mesma deve contribuir para

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instrumentalizar os conselhos a desvendar esta problemática, a cumprir seu

papel de “controle social” e para acompanhar os processos de definição do

orçamento público. As pesquisas acadêmicas, se articuladas às demandas da

sociedade civil, ganham uma dimensão “extensionista” fortalecendo os

processos e lutas sociais tão necessários à garantia de visibilidade social para o

uso dos recursos públicos e ampliação dos espaços de consolidação da

democracia.

Percebemos que o impacto se dá em relação aos profissionais do Serviço

Social, o que também assume uma dimensão importante, a qual se evidencia

pela necessidade de atualização permanente.

“Eu acho assim, eu acho que a gente incomoda os profissionais. Incomoda mesmo. A gente diz assim você tem que se atualizar, você tem que ler. Isso agora com as capacitações fica mais evidente. Porque se ele não se atualizar, o Conselheiro se atualiza e como é que ele vai fazer. Então eu acho que outra questão que a gente faz também são as especializações. (... ) é uma maneira de você levar o conhecimento pro profissional da prática, porque tem que melhorar, o profissional da prática. O que eu acho que a gente tem feito é trabalhar o profissional que está saindo hoje. Ele já sai com a idéia de que ele tem que ir pra pós – graduação, não só pra ganhar aumento de salário, mas pra manter-se atualizado.” (Lúcia Cortes da Costa)

O acúmulo de reflexões em torno do processo de formação profissional

tem levado as Universidades e seus docentes a direcionar este processo para

investimentos em formação continuada principalmente através da “pós –

graduação”.

...A nossa tradição nesta área tem sido a de compreender a formação profissional como um processo que não se reduz aos semestres previstos na grade curricular e, sim, como um processo permanente que envolve ciclos bem demarcados. Esta leitura vem conferindo especial significação aos cursos de extensão e pós – graduação, lato e stricto sensu, assim como à responsabilidade social da universidade para com os

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profissionais e as questões que compõem o universo que é o nosso mercado de trabalho. (CARDOSO et al, 1997, p. 53) O que observamos é que o contato direto com as expressões da questão

social e o seu enfrentamento cotidiano obrigam os profissionais a manterem-

se “atualizados”, inserindo-se em cursos que reciclem seus referenciais teórico

– metodológicos. A própria relação com outras áreas profissionais e com os

segmentos organizados da sociedade civil exigem respostas cada vez mais

complexas e qualificadas por parte do Serviço Social. “O momento presente

desafia os assistentes sociais a se qualificarem para acompanhar, atualizar e

explicar as particularidades da questão social nos níveis nacional, regional e

municipal, diante das estratégias de descentralização das políticas públicas. ...”

(IAMAMOTO, 1998, p. 41)

“Eu acho que as pesquisas do Serviço Social elas têm condições de ter algum impacto, exatamente porque nós lidamos com questões extremamente importantes, graves, que é exatamente nosso objeto de trabalho, nosso dia a dia, e aí nós poderíamos ir pra um lado discutir o que isso significa? Qual a localização dos nossos objetos de estudo na nossa realidade brasileira , mundial? Trazendo um pouco do cenário o debate da questão social, que os alunos têm sempre trazido, que a gente sempre traz. O que isso significa? E se nós lidamos com esse agravamento, com essa agudização dos problemas sociais hoje, eu acho que é uma responsabilidade nossa dar esse retorno pras instituições, pras organizações e sem pensar obviamente nas condições de vida, acho que esse é o objetivo principal. Que isso possa trazer alguma contribuição importante pras condições de vida dos sujeitos que buscam o Serviço Social, que buscam a atenção, que buscam o atendimento. Eu diria: acho que sim, mas tem muito o que caminhar. Acho que temos uma estrada longa pela frente, sabe. Eu acho que todos os objetos ... se a gente pegasse agora ali, vamos ali e vamos ver o que eles estão pesquisando, o que os nossos alunos de Serviço Social aqui pesquisam no Pós – Graduação , um discute gênero, outro ,sabe, com temáticas, mas quais são os objetos ? Todos têm relevância ... e eu acho que tem uma contribuição importante sim, na medida em que 90% dos nossos alunos são docentes de unidades de ensino. Então quando eles vêm em busca de um doutorado eles estão dando

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continuidade nas pesquisas que eles já fazem lá. Então vêm aqui se instrumentalizar , não só se instrumentalizar na pesquisa, mas teoricamente, se debruçar, fazer todo seu estudo pra retornar na sua realidade lá. E eles retornam não ficam, continuam trabalhando. Isso tem um impacto na realidade local, eu não tenho a menor dúvida. Mas eu ainda acho que nós temos que, como diz a nossa mestra Maria Lúcia, acho que a gente tem que ser mais criativo pra poder ter um impacto maior. (...) Talvez o que não tenha, uma coisa que eu sempre acho que seja necessário e não tem, um marketing maior, sabe. Que a gente possa falar mais do que a gente faz. A gente trabalha muito, mas divulga pouco o que foi feito.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Há um impacto significativo da produção da pós – graduação em relação

à graduação, visto que “os alunos” dos programas de pós – graduação são em

sua maioria “docentes” e estão vinculados às “unidades de ensino” em Serviço

Social da região de abrangência das Universidades, o que supõe que estes

docentes estabelecem articulações entre os níveis de formação profissional de

forma orgânica e produtiva.

No conjunto os programas de pós – graduação têm conseguido mobilizar

esse retorno, esse alcance social das pesquisas, visto que estes alunos da pós

– graduação, quando retornam às suas instituições de origem acabam sendo

multiplicadores e através do ensino, pesquisa e extensão geram influências

que extrapolam os muros da academia.

....Se tivermos uma pós – graduação avançada e consolidada, conseguiremos puxar a graduação, por isso é importante fortalecer a pós – graduação em Serviço Social no Brasil. Esse papel da pós – graduação na qualificação desse projeto ético – político profissional passa pela qualificação do corpo docente e pelo papel da pesquisa no Serviço Social, no sentido da indissociabilidade entre conhecimento e intervenção e, no caso do Serviço Social, o desafio maior seria a construção de conhecimentos comprometidos com as demandas sociais em tempo histórico determinado. No caso da pós – graduação nesse desafio, nesse espaço, na criação, construção e consolidação desse espaço de qualificação do projeto ético – político, a importância da qualidade da produção de conhecimentos que nós produzimos em termos de graduação e pós – graduação, visando a uma intervenção qualificada do profissional no enfrentamento

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das manifestações da questão social. A observação é importante no sentido de que essa qualificação das produções de conhecimento tenham inserções na sociedade. (CARVALHO, 2004, p.165-166)

O grande problema, observado no depoimento, encontra-se no processo

de divulgação do que se produz em Serviço Social. A divulgação dos

resultados das pesquisas é restrita, considerando que a capacidade de produzir

conhecimento da área é ampla, principalmente se observarmos que as

temáticas trabalhadas retratam realidades carentes de estudos.

No entanto, temos que reconhecer que através da pós – graduação o

Serviço Social tem consolidado um diálogo crítico com as demais áreas de

conhecimento, constituindo-se em referência sobre temáticas de pesquisa em

que a dimensão do social é trabalhada em uma perspectiva critica, histórica e

de totalidade.

O depoimento faz um alerta em relação à necessidade de criar estratégias

de divulgar a produção acadêmica do Serviço Social, garantindo meios e

espaços de reconhecimento profissional. Precisamos investir em “marketing”46

da profissão, especialmente naquilo que ela tem a oferecer como diferencial

em relação às demais áreas de conhecimento sobre a compreensão da

realidade social.

“Eu tenho, também, uma outra questão que eu vejo, hoje, um reconhecimento, uma busca do Serviço Social muito grande e uma busca pelo conhecimento do Serviço Social. Então tu vês todas as áreas que vêm buscar a pós – graduação em Serviço Social. Porque? (...) Uma forma de lidar com o conhecimento, uma forma de tratar o social diferenciada e que os outros profissionais vêm em busca disso. Então eu vejo

46 Marketing: “...Conjunto de estratégias e ações que provêem o desenvolvimento, o lançamento e a sustentação de um produto ou serviço no mercado consumidor.(...) Conjunto de estratégias e ações que visam aumentar a aceitação e fortalecer a imagem de pessoas, idéia, empresa, produto, serviço, etc., pelo público em geral, ou por determinado segmento desse público. (FERREIRA, 1999, p. 1289)

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como mais uma... eu não diria que fica nos muros da academia. Eu ouso dizer que hoje é muito difícil manter um trabalho dentro dos muros da academia. Tem uma exigência externa muito grande... e exatamente que se dê essa visibilidade, das agências de fomento. Então se tu tiveres produção, se tiveres... uma série de condicionantes que acabam exigindo que tu tenhas uma visibilidade maior. E eu ainda te trago mais um exemplo. Se nós pegarmos hoje , todos os programas de pós – graduação no país têm uma revista. Bom, uma outra questão é como é que se dá a distribuição e a circulação das revistas. É outro problema. Mas existe hoje uma preocupação com os programas de pós – graduação, de dar essa visibilidade. No nosso caso a gente fez uma revista eletrônica. E aí tem uma outra inserção, são outras pessoas que buscam. Então eu não diria, hoje, que está nos muros da academia. Eu diria que está fora. Até porque a própria academia está precisando fazer alianças com a sociedade. A academia está buscando parceiros na sociedade. Então empresas, instituições. Coisa que o Serviço Social sempre fez. O Serviço Social sempre teve essas parcerias com as instituições. ...” (Jussara Maria Rosa Mendes)

O depoimento de Jussara Maria Rosa Mendes coloca em questão que o

Serviço Social tem “uma forma de lidar com o conhecimento” que é

“diferenciada” das outras áreas, consubstanciado pela natureza interventiva da

profissão.

A produção teórica em Serviço social tem essa marca: vinculação orgânica ao fazer profissional, isto é, define-se a partir e em função da prática profissional. O Serviço Social como profissão, ou seja, como uma especialização do trabalho coletivo, supõe, como função primeira, uma intervenção direta na realidade social referenciada em uma base de explicação dessa realidade e da própria intervenção. Participa, assim, da produção de conhecimentos que embasam sua intervenção, inserindo-se no processo mais amplo de desvendamento do social enquanto totalidade. (ABREU E SIMIONATTO, 1997, p. 133 – 134)

Inclusive esta “forma de lidar com o conhecimento” permite ampliar os

horizontes temáticos de discussão e construção de conhecimento para o

Serviço Social, de forma a acompanhar a compreensão de objetos que

emergem dos desafios pertinentes à realidade contemporânea.

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Em relação ao processo de socialização dos conhecimentos Jussara

Maria Rosa Mendes relata a alternativa da “revista eletrônica”, que tem sido

um recurso utilizado pela academia com o objetivo de dar “visibilidade” para as

produções discentes e docentes e garantir um maior acesso da comunidade

científica a estas produções. O Programa de Pós – Graduação em Serviço

Social da PUC – RS, com este objetivo, oferece a Revista eletrônica “Textos

& Contextos”, que trata de “questões substantivas” ao Serviço Social,

ampliando as “possibilidades de reflexão, debates e trocas instigadoras de

novas produções” em nossa área e afins. (APRESENTAÇÃO,

http://www.pucrs.br/textos - consultado em 08/03/2005)

A socialização e publicação das pesquisas e o tratamento desigual

recebido das agências de fomento têm sido o grande desafio a ser enfrentado

pelos Programas de pós – graduação em Serviço Social para a consolidação

da área como científica.

“Eu fui descobrir que o que vale é produção em artigo, em revista indexada, que tem critérios. Aí eu comecei a me tocar o quanto nós não éramos. (...) Aí eu fui ver que as outras áreas estavam muito longe e a nossa pontuação na área de pesquisa é muito baixa. Porque nós trabalhamos muito, mas trabalhamos de maneira muito equivocada. O nosso trabalho não tem impacto acadêmico. Porque nós fazemos TCC de 100 páginas, nos matamos de trabalhar com os alunos e deixamos guardado na prateleira. Isso não é pesquisa segundo os critérios do CNPQ e da CAPES. Pesquisa boa, é pesquisa publicada. Aí eu comecei , no Departamento a brigar pra que as pessoas produzissem e pesquisassem. (...) Então a publicação da revista do Departamento, ela é um suporte. Mas a idéia é que o aluno publique fora. Publicação conjunta aluno e professor, porque é isso que as outras áreas fazem. Por isso eles tem uma pontuação no PIBIC enorme e nós não temos. E nós trabalhamos muito mais que outras áreas. As nossas orientações de TCC são muito mais sistematizadas.” (Lúcia Cortes da Costa)

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“Acho que nós somos menos reconhecidos do que poderíamos ser. A gente, na cota geral de bolsas, recebe poucas, menos bolsas que as outras áreas. O Serviço Social ainda é visto com muito preconceito, como área que produz pouco conhecimento. Então, a gente tem menos bolsas do que deveria ter, menos bolsa de iniciação científica, menos bolsas de aproveitamento de estudo. Eu acho que a gente precisava desencadear uma reação mais dura e fazer mais propaganda de nós mesmos.” (Elaine Rossetti Behring) “Ainda somos tratados com muita desigualdade. Hoje.... eu vejo assim o número de bolsas reduzido, isso tudo tem muito a ver com essa história recente do Serviço Social na área das Ciências mesmo. Acho que é uma coisa bastante recente. Eu me lembro que a gente dizia que o cientista era só o que fazia as pesquisas de cunho quantitativo. Cientista era o que trabalhava com as medicações, laboratórios, experimentos. E hoje, não. Cientistas sociais são cientistas. Esse lugar de cientistas ainda nós temos que caminhar muito. Por exemplo e aí eu posso falar tranqüilamente. Existe na CAPES a qualificação das revistas, das produções – se chama o qualis. Então lá esse qualis é onde o representante de área vai fazer um levantamento das produções dos Assistentes Sociais, dos Professores obviamente, dos pós – graduações, na área do serviço Social. E aí a gente se depara com o que? Hoje, agora, nós temos duas revistas indexadas do Serviço Social. A KATÁLYSIS, lá de Santa Catarina e a SERVIÇO SOCIAL E SOCIEDADE,....” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Os depoimentos acima levantam a problemática do reconhecimento

acadêmico do Serviço Social, dificultado pela falta de revistas indexadas para

publicação, o que em relação às tradicionais áreas das Ciências Exatas e

Biológicas, coloca a nossa área em situação de desvantagem. No caso de

publicações, como as revistas científicas de circulação periódica, avalia-se o

fator de impacto, ou seja o número de citações que artigos daquela revista

recebe, garantindo a disseminação de informações científicas em um

determinado meio e contexto acadêmico.

O contexto acadêmico hoje é tomado por exigências de produção e

divulgação de conhecimento. O reconhecimento do impacto das produções

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científicas se faz através de sua publicação. Uma pesquisa só ganha

reconhecimento no meio científico se é publicada em revistas indexadas. Uma valorização cada vez maior do fator de impacto das publicações tem sido dada, tanto pela comunidade científica como pelas agências de fomento, na análise da produtividade científica de pesquisadores, grupos temáticos, departamentos, universidades, etc. Esses dados sinalizam para o fato de que a ciência brasileira está ingressando definitivamente numa era onde a qualidade das publicações, aferida pelo fator de impacto, será cada vez mais utilizada como “moeda de troca” na análise de financiamentos à pesquisa, concessão de bolsas de estudo e outras solicitações do gênero. Agências de fomento, como o CNPq e Capes, estão valorizando mais estes indicadores, seguindo uma tendência observada nos EUA e Europa a partir da década de 80. (BOLETIM, 2001 - http;//www.sbfis.org.br)

Publicações em revistas indexadas garantem maior credibilidade à

produção acadêmica da área. Jussara Maria Rosa Mendes, em seu depoimento,

cita as Revistas Katálysis e Serviço Social e Sociedade como revistas

indexadas. As revistas indexadas são as publicações cujos artigos publicados são inseridos (indexados) em bases e banco de dados nacionais ou internacionais permitindo uma divulgação do trabalho, do assunto e principalmente do nome do autor. Esse processo é feito por instituições, organismos e associações que compilam artigos em áreas gerais ou específicas e disponibilizam em banco de dados pagos ou gratuitos, permitindo assim a recuperação por autor e assunto quando realizam pesquisas nesses bancos. ... (BERTHOLINO e INOUE, 2002, p.1) A Revista Katálysis47, está indexada, “é um periódico científico,

semestral, produzido e editorado pelo Curso de Serviço Social, Graduação e

Pós – Graduação da Universidade Federal de Santa Catarina. Seu objetivo é

divulgar assuntos atuais e relevantes na área do Serviço Social e das suas

relações com os demais campos do saber. ...” (http:www.katalysis.ufsc.br –

consultado em 8/03/05)

47 A Revista katálysis tem como fontes de indexação: EDUBASE - Faculdade de Educação/UNICAMP (Campinas, SP); OEI – CREDI – Organización de Estados para la Educación, la Ciência y la Cultura – Espanha; IRESE – Índice de Revistas de Educación superior e Investigación Educativa (UNAM – México); REDUC – Fundação Carlos Chagas ( São Paulo – SP) – Biblioteca Ana Maria Poppovic. (http://www.katalysis.ufsc.br/fontes.htm - consultado em 07/03/2005)

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Já a Revista Serviço Social e Sociedade, de acordo com informações

eletrônicas buscadas na Editora Cortez em fevereiro de 2005, e esclarecendo

o depoimento acima, encontra-se em processo de indexação. No entanto trata-

se de uma revista com ampla circulação entre a categoria profissional, fazendo

parte de nosso universo cultural.

Lúcia Cortes da Costa cita outro exemplo a “revista do Departamento” de

Serviço Social da Universidade Estadual de Ponta Grossa/Pr –

EMANCIPAÇÃO48 que tem caráter interdisciplinar. Enquanto “suporte”

acadêmico esta revista é importante veículo de publicação e de exercício de

construção de artigos científicos que sejam resultados de investimentos em

pesquisas no âmbito da graduação e pós – graduação no campo das Ciências

Sociais.

Um dos meios de avaliação da produção intelectual, desenvolvido pela

CAPES e que conta com a inserção do Serviço Social é o QUALIS. Qualis é o resultado do processo de classificação dos veículos utilizados pelos programas de pós graduação para a divulgação da produção intelectual de seus docentes e alunos. Tal processo foi concebido pela Capes para atender a necessidades específicas do sistema de avaliação e baseia-se nas informações fornecidas pelos programas pelo Coleta de Dados. (...) A classificação é feita ou coordenada pelo representante de cada área e passa por processo anual de atualização. Os veículos de divulgação citados pelos programas de pós graduação são enquadrados em categoria indicativas de qualidade – A, B ou C e do âmbito de circulação dos mesmos – local, nacional ou internacional. ...(QUALIS, http://qualis. capes.gov.br, consultado em 03/03/05)

Denise Bomtempo Birche de Carvalho, membro do Comitê Técnico –

científico da CAPES e representante, naquele momento, da área de

conhecimento do Serviço Social na CAPES em exposição realizada na Oficina

Nacional da ABEPSS, que tratou da temática “ O Ensino do trabalho

48 Revista EMANCIPAÇÂO está indexada na base Geodados – www.geodados.uem.br e no QUALIS, em que é classificada como C nacional.

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profissional: desafio para afirmação das diretrizes curriculares e do projeto

ético – político” (UFSC – 2004), esclarece o nível de participação do Serviço

Social neste sistema de avaliação:

...E a área de conhecimento do Serviço Social, na CAPES, tem cada vez mais galgado um espaço importante em relação às demais áreas de conhecimento. Atualmente fazemos parte do comitê técnico científico da CAPES, que é um espaço de 19 pessoas de todo o país. Nós temos um assento nesse conselho. Esse conselho, inclusive, é responsável pela formulação da política nacional de pós – graduação. É espaço importantíssimo e o Serviço Social está lá e é importante colocar que esta inserção do Serviço Social neste Conselho faz parte de uma construção coletiva que vimos fazendo há muito tempo na CAPES, com os coordenadores de pós e nas comissões de avaliação no sentido de qualificar o Serviço Social dentro da agência de fomentos, com critérios de avaliação claros e precisos em relação aos quesitos que são avaliados. Essas foram construções coletivas feitas com a ABEPSS e os coordenadores de pós, de 2002 para cá. (...) Nós participamos dessa agenda de discussão na CAPES: quais são os critérios, de corpo docente, atividades de pesquisa e publicações relevantes, a qualificação das nossas produções em termos do que é chamado de qualis, o que é importante para nossa área ser um qualis A, B ou C. Ou seja, o qualis A é aquela produção que tem diretamente relação com a nossa produção do Serviço Social, que seja importante para a visibilidade e a circulação da produção do conhecimento do Serviço Social entre nós e também para as áreas afins. ... (CARVALHO, 2004, p. 168 – 169)

No entanto estes recursos são recentes para o Serviço Social, que não

possui uma tradição em publicações. Bom esclarecer que não se trata de

competência, apenas de falta de tradição e de acesso aos meios para

publicação, ampliando o impacto destas produções para além de limites

institucionais, locais, regionais, nacionais e disciplinares.

Em relação aos financiamentos Aglair Alencar Setúbal levanta uma

indagação relevante. Vejamos:

“Tenho procurado acompanhar o movimento da pesquisa nas Ciências Sociais de uma maneira geral e particularmente no Serviço Social nos últimos anos. É com pesar que percebo o pouco apoio dos órgãos financiadores de pesquisa para essa área, bem como a limitada possibilidade de novos pesquisadores terem acesso a algum tipo de financiamento do CNPq.

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É comum a justificativa que a restrita cota de bolsas para o Serviço Social decorre da baixa demanda. Sabemos, entretanto, que alguns profissionais com qualificação para pesquisa têm procurado esse apoio, sendo com raras exceções contemplados já que as cotas existentes sempre atendem os mesmos pesquisadores. Será que os cursos de pós – graduação não têm formado devidamente os seus alunos para exercerem a prática da pesquisa? Confesso que tenho as minhas dúvidas, já que vivenciei o dia–a–dia de um Programa de Doutorado em Serviço Social onde constatei a seriedade com que esse aspecto da formação era tratado. Acredito acontecer o mesmo com os demais. Qualquer pesquisa por menor que seja, requer gasto. Nem sempre os profissionais que têm paixão pela pesquisa e compromisso com a produção do conhecimento podem se autofinanciar restringindo a sua produção a estudos muitas vezes localizados e que por isso nem sempre despertam interesse as editoras de reconhecimento nacional, a sua publicação.” (Aglair Alencar Setubal)

As restrições sofridas pela área em termos de bolsas ou financiamentos

de pesquisa limitam a inserção de “novos pesquisadores” no campo da

produção de conhecimento, bem como o avanço desta produção de forma a

consolidar a prática sistemática da pesquisa e que tenham ressonância no

avanço das discussões de problemáticas que permeiam a prática profissional

no contexto das políticas públicas e em processos de enfrentamento das

expressões da questão social.

Estes limites sustentam-se nos critérios de concessão de financiamentos

e não à qualidade dos “cursos de pós – graduação”, que têm demonstrado rigor

e “seriedade” no processo de formação de “pesquisadores”.

Reconhecemos que os esforços para romper com os limites institucionais

de investimentos em pesquisas são grandes, no entanto esbarram na herança

cultural que cerceia o avanço do reconhecimento da área do Serviço Social

como portadora de uma identidade científica...

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....Apesar do reconhecimento institucional da produção intelectual no âmbito dessa profissão, pelas agências de fomento à pesquisa (CNPq, CAPEs e outras), e da sua classificação como área de conhecimento credenciada a receber recursos, ainda são limitadas as condições de acesso aos mesmos. São poucos (...) os pesquisadores em Serviço Social que atendem às exigências das referidas agências, sobretudo no que se refere à titulação – doutor e livre – docente – e à inserção em programas de pós – graduação já consolidados. Em face da redução dos recursos públicos para custeio das atividades de pesquisa e da política de estímulo aos centros de excelência, esses órgãos vêm priorizando as IES’s e áreas de conhecimento com tradição no campo da produção científica e tecnológica, dificultando ou mesmo inviabilizando o desenvolvimento de novos centros de pesquisa em universidades periféricas, aprofundando os limites das áreas sem essa tradição, entre as quais ainda se encontra o Serviço Social. (ABREU e SIMIONATTO, ,1997, p. 133)

“.....Como que tu vais competir em outras áreas, das Ciências Exatas, quando as produções têm revista, artigos internacionais. Nós temos pouca produção internacional e nós temos pouca produção em revista indexada, que tenha circulação, penetração internacional. Estes seriam fatores que contribuem pra não permitir esse reconhecimento nosso maior. Pra que se tenha pouca bolsa e ainda assim, às vezes, têm recursos que são disponibilizados para o Serviço Social e que não são utilizados. Por exemplo pedidos de bolsa sanduíche são poucas as que chegam na CAPES, no CNPQ, vindos da área do Serviço Social. (...) E de fato entrar nesse mundo novo, entre aspas, entrar nesse novo patamar, exige que tu quase que diariamente estejas na internet, que tu estejas buscando estes espaços... e isso exige tempo. (...) E o tempo é o que nos consome. É aquilo que o David Harvey fala, o problema do homem moderno é a questão do tempo. Eu vejo que de fato tem várias questões que contribuem, ainda, e que nós temos que andar bastante para que possa, não reverter, mas melhorar nossa condição como pesquisadores. Tem uma longa caminhada aí.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

YAZBEK (2000, p.146) traz uma contribuição essencial ao questionar os

parâmetros de avaliação da produção acadêmica. Vejamos:

...É claro que a publicação é indicativa da produção do conhecimento na área, mas não se pode simplificar avaliando a produção apenas pelo número de publicações. Outros indicadores devem ser incorporados para avaliar a qualidade e relevância do reconhecimento produzido e seu impacto, político e científico. Estes indicadores

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precisam ser construídos de forma mais democrática possível, permitindo à Capes atuar “como classificador, mas fundamentalmente, como órgão de acompanhamento, mais próximo das IESs e ‘menos punitivo’ a fim de ouvir a comunidade acadêmica” (Targino,1999:17), trazendo a qualidade como objeto e centro das preocupações, superando o formalismo das regras, as hierarquizações geradoras de disputas estéreis e duvidosas na perspectiva do fortalecimento da área e de qualificá-la em seu conjunto. Nossa preocupação, nesta tese, não é restringir a reflexão sobre o retorno

e alcance social das pesquisas produzidas pelo Serviço Social a fatores de

impacto ou parâmetros quantitativos que dimensionem a validade científica

destas produções. Consideramos relevante para o meio acadêmico processos

de avaliação que se preocupem com o nível de excelência das pesquisas

acadêmicas e dos veículos de divulgação, no entanto, nosso questionamento

está na potencialidade dos conhecimentos, gerados por pesquisas, em

mobilizar novas práticas profissionais, na medida em que são incorporadas

como sustentadores em processos de enfrentamento das expressões concretas

da questão social.

Sobre isto, precisamos reconhecer que nem todas as publicações

indexadas ou não, na forma de livros ou periódicos, chega ao conjunto da

categoria profissional. Então nos perguntamos: como repercutem os avanços

da produção de conhecimento na realidade em que o Assistente Social

enfrenta desafios à sua prática profissional?

“O impacto ainda é muito pequeno, pelo menos no meu ponto de vista. O retorno ainda é muito menor do que poderia ser. E penso que temos um agravante de que quando a pesquisa é realizada por profissionais na própria instituição, nem sempre ela recebe o devido valor por parte dos próprios colegas de profissão e da própria instituição, sobretudo com as características autoritárias e hierárquicas que têm os tribunais. Não sei se está dando para compreender. Eu considero que acaba demorando um pouco mais para que se alcance uma valorização mais ampla desse trabalho. É mais fácil você conseguir impactar com uma pesquisa realizada por sujeitos historicamente considerados como

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detentores de saberes "maiores", ou mais valorizados no meio social, isso quando eu falo de profissionais da própria instituição. Pela nossa histórica subalternização e valorização do conhecimento do outro em detrimento da valorização do seu conhecimento. O que eu percebo é que existem duas posições no meio institucional: existe aqueles que, às vezes, ignoram por um bom tempo o trabalho realizado por colegas , no sentido de acreditar que o que vem de fora, pronto, construído por outros profissionais, acaba tendo uma valorização maior e, por outro lado, existem outros grupos que dão uma valorização ou criam uma expectativa extremamente grande em relação a possíveis resultados imediatos. E sabemos que não se consegue resultados imediatos. Existe um processo de conhecimento que caminha junto com o processo de mudança de mentalidade. No caso específico dos profissionais do Serviço Social darem um valor maior a esse processo de conhecimento e o retorno disso para dentro da instituição, eles necessitam aprender a dar valor ao processo de pesquisa.” (Eunice Teresinha Fávero) “Pergunta semelhante já foi feita por vários pesquisadores. Infelizmente a resposta permanece, com raras exceções diferente. O produto das pesquisas em Serviço Social pouco impacto tem provocado nas organizações em que o pesquisador atua e nas condições de vida dos envolvidos pelas práticas institucionais. No primeiro caso, constata-se um desinteresse dos próprios colegas em conhecer a produção, principalmente quando ela desvenda, retrata de forma crítica as práticas profissionais assistencialistas, anistóricas e até clientelistas. Do lado dos sujeitos demandatários da prática profissional do pesquisador, ela só os atinge quando da utilização da pesquisa-ação, da utilização da história oral ou quando o pesquisador tem uma postura política e profissional fortalecida pela ideologia que o faz romper com o “discurso instituído” assimilado por alguns profissionais.” (Aglair Alencar Setubal)

Os depoimentos acima revelam uma preocupação que passa pelo interior

da profissão, pois questionam os posicionamentos dos próprios Assistentes

Sociais frente aos avanços decorrentes de pesquisas que muitas vezes dizem

respeito à sua realidade interventiva. Neste sentido “duas posições” são

identificadas por Eunice Teresinha Fávero: 1) desvalorização das pesquisas

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desenvolvidas pelos profissionais do Serviço Social e supervalorização das

pesquisas de outras áreas de conhecimento; 2) expectativa de resultados

imediatos. Em relação à desvalorização percebida, Aglair Alencar Setubal

identifica que refere-se às pesquisas que fazem críticas à prática profissional

em casos de intervenções assentadas em tradição conservadora, portanto

deslocadas dos princípios ético – políticos que regem o exercício profissional.

Quanto as condições de vida dos sujeitos/usuários da prática profissional

Aglair Alencar Setubal acredita que pesquisas de caráter participante e que se

sustentam em metodologias que privilegiam a história oral têm maior

possibilidade de gerar impacto, pois por sua natureza estabelecem vínculos e

processos reflexivos que não se limitam aos objetivos mais imediatos da

pesquisa. Avançam para o rompimento com “o discurso instituído” e para

construção de novas formas de sociabilidade.

Para que os profissionais valorizem o conhecimento produzido na área e,

além disto, repensem suas relações com o conhecimento que possuem, com as

transformações e atualizações decorrentes do acúmulo do conhecimento

profissional, Eunice Teresinha Fávero afirma que é preciso que valorizem o

processo da pesquisa e para isso precisam vivenciar o processo da pesquisa.

“Existe um processo de conhecimento que caminha junto com o processo de

mudança de mentalidade.” E para tanto é necessário investimentos em cursos

de atualizações e de pós – graduações que alcancem as demandas dos

próprios profissionais do Serviço Social.

O impacto depende, também, da “organização política” que mobiliza os

profissionais a discutirem suas práticas, condições de trabalho, a realidade

social, motivando a busca de conhecimento. É isto que gera necessidade de

qualificar a intervenção. “A Intervenção, a organização política e a pesquisa”

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têm que “caminhar juntas” para o fortalecimento da categoria e alcançar

avanços na concretização do projeto ético – político profissional

...Enquanto categoria profissional, temos a responsabilidade cívica e política de nos somarmos a outras entidades da sociedade civil, a outros profissionais na direção indicada, de maneira que o anúncio de valores éticos que regem a prática profissional não se transforme apenas em declaração de belas intenções. Sendo aqueles valores fundamentais, eles devem se traduzir em propostas e ações acadêmico – profissionais e políticas voltadas para o conhecimento e enfrentamento da “questão social” hoje, tal como se mostra em suas particularidades na sociedade brasileira do presente, construindo, aí, as perspectivas do futuro. (IAMAMOTO, 2000, p.104)

“Agora a gente tem feito um trabalho aqui, um processo... o grupo que tem se dedicado à pesquisa, paralelamente está se dedicando também à organização política da categoria. Então eu penso que esse processo tem que ser conjunto. Porque à medida em que você participa da organização política, necessariamente, você vai ter que discutir a sua condição de trabalho, a sua intervenção. Necessariamente você vai discutir a necessidade do processo de conhecimento dessa realidade para qualificar a intervenção. O que eu percebo é que a pesquisa a respeito da realidade social da população com a qual a gente trabalha, no âmbito do Judiciário, a partir do pouco que já avançamos aqui em São Paulo, mas que é um começo, está tendo uma repercussão bastante significativa. Não digo que diretamente na instituição Judiciário em São Paulo. Mas percebemos que começou a existir uma busca dessas informações sistematizadas no âmbito de várias outras organizações sociais do país. A gente se deu conta de que as primeiras pesquisas que se desenvolveram aqui no Estado de São Paulo a respeito dessa realidade dos sujeitos começaram a despertar a atenção de profissionais de outros Estados e não só da área do Serviço Social. Então, a pesquisa, a partir da realidade dos sujeitos com os quais a gente trabalha e de toda a realidade que permeia o nosso trabalho, pode sim causar impacto, pode reverter em alterações na realidade de trabalho, mas é um processo um pouco lento e inicial. Vai depender de como a gente conseguir avançar nessa direção...” (Eunice Teresinha Fávero)

Percebemos que o depoimento de Eunice Teresinha Fávero enfatiza que

os avanços no processo de produção e socialização do conhecimento

dependem do nível de organização política dos profissionais. Esta organização

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mobiliza reflexões sobre a prática profissional e impulsiona para produção de

conhecimento que respondam às inquietações profissionais.

As pesquisas do campo sóciojurídico tem sido um exemplo quanto a

capacidade de avançar em relação a construção de uma identidade profissional

neste campo de intervenção. Esta identidade está assentada no aprimoramento

profissional, na defesa intransigente dos direitos humanos, na qualidade dos

serviços prestados, na ampliação e consolidação da cidadania. Neste contexto

a pesquisa vem articulada à organização política da categoria, consolidando

uma forma de fortalecer a profissão. “Não podemos abrir mão de conhecer

nossos espaços sócio – profissionais, nosso fazer, nossas competências. Essa

profissão diferente requer investimento árduo em pesquisa. (...) não se constrói

uma profissão diferente sem os nossos órgãos, sem o fortalecimento dos

órgãos da categoria profissional.” (GUERRA, 2004, p. 29)

”...porque essa organização política é essencial para as pessoas valorizarem o seu trabalho e buscarem formas de valorização e de qualificação desse trabalho. Eu penso que a intervenção, a organização política e a pesquisa têm que caminhar juntas , não dá para separar. Quer dizer, às vezes separamos, mas é essencial que caminhe junto, para você conseguir avançar no fortalecimento da intervenção, no fortalecimento do trabalho, no fortalecimento do Serviço Social enquanto uma profissão, hoje, que tem que avançar na direção da luta, da garantia de acesso e ampliação de direitos sociais. Você não participa de um processo de busca de garantia de direitos se você não tiver uma consciência política, se você não participar dessa organização política. E isso tudo é muito difícil. Nós trabalhamos uma realidade em constante transformação, nós precisamos – não só nós, mas estamos falando aqui do Serviço Social – estar permanentemente antenado com o tempo em que vivemos, porque se não acompanharmos minimamente as transformações da realidade e não tivermos, como a própria Professora Marilda fala, nós temos que tomar um banho de realidade e exercermos cotidianamente a criatividade em proposições, nós vamos perder espaços e a profissão vai ser desvalorizada. Então esse processo tem que ser constante, senão eu não vejo muita possibilidade de sobrevivermos até enquanto Serviço

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Social, se nós não colocarmos efetivamente em prática o nosso projeto profissional, ético, político, teórico e metodológico.“(Eunice Teresinha Fávero)

O “fortalecimento da intervenção” profissional é processo que se dá no

cotidiano e passa pela consolidação do projeto ético – político profissional.

Este processo requer o exercício permanente de alguns pressupostos: -

rigoroso trato teórico – metodológico das expressões da questão social;

consideração dos valores e princípios presentes no Código de Ética como

referência para a prática profissional cotidiana; engajamento político nos

movimentos sociais e nas instâncias organizadas e representativas da

categoria; desenvolvimento da “criatividade” sustentada em acompanhamento

criterioso das “transformações” societárias e para apreensão das mediações

que possam viabilizar práticas comprometidas com processos de emancipação.

Tais requisições impulsionam o desencadeamento de pesquisas como fonte

de qualificação profissional e busca de alternativas que permitem colocar em

prática nosso “projeto profissional, ético, político, teórico e metodológico.”

“ (...) Isso quando a pesquisa é voltada para isso... Agora, tem um certo ... não são todas as pesquisas que tem esse tipo de preocupação. Veja bem, eu acho que hoje a Universidade está rasgada aí pelo pós – modernismo, pelo individualismo, então tem muita gente fazendo pesquisa apenas para satisfazer a sua curiosidade intelectual, individual, que não tem preocupação com o impacto social que a sua pesquisa pode ter. Acho que no Serviço Social isso não é tanto assim, até pela natureza da nossa profissão, pela sua trajetória histórica, pela sua perspectiva interventiva, pelo projeto ético – político profissional. Isso aí dá uma direção geral para a produção do conhecimento, isto, também, não significa que não exista individualismo, esse pós – modernismo entre nós. Eu acho que isso é menor, mas nas Ciências Sociais tem muita pesquisa que é apenas, extremamente pontual. Têm pesquisas que não lidam bem com essa questão da relação entre objetividade e subjetividade, que geram distorções importantes na análise da realidade, que privilegiam ... aí há um super privilégio do sujeito, as representações, como se o sujeito viesse

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antes da história. Até Freud sabe que a formação da subjetividade tem a ver com as condições gerais da existência. Então, esse privilégio... aí o estudo das representações, a representação aparece como realidade, quando na verdade é importante entender as representações que os sujeitos fazem da sua realidade. Claro que é. Inclusive para traçar estratégias para lidar com elas. E saber o quanto eles percebem essa realidade, acho que é elemento para a formação de política pública, desde que não se confunda a representação da realidade com a própria realidade. E isso tem acontecido muito. Aí são pesquisas que acabam apresentando uma interpretação da realidade equivocada, distorcida em função do que? Das suas referências analíticas.” (Elaine Rossetti Behring)

O depoimento de Elaine Rossetti Behring traz uma reflexão sobre os

avanços das temáticas de pesquisa que se desenvolvem no contexto das

proposições da pós – modernidade.

A pós – modernidade é expressão das transformações contemporâneas

do capitalismo. “As transformações na esfera produtiva, nas relações Estado/

sociedade/mercado, no âmbito da cultura e da política, articulam o capitalismo

contemporâneo e indicam, segundo Jameson (1996), o próprio projeto da pós

– modernidade.” (SIMIONATO, 1999, p. 83)

A pós – modernidade49 é um movimento que, a partir da segunda metade

do século XX, advoga o esgotamento dos valores e princípios decorrentes da

modernidade, o “...que implicaria na anacronização dos padrões de análise (e

das suas categorias teóricas) dos objetos socioculturais e dos projetos sociais a

ele vinculados; ou seja : de uma parte teríamos uma ‘ crise de paradigmas’,

49 EVANGELISTA ( 1997, p. 31-32) em sua obra “Crise do Marxismo e irracionalismo pós – moderno”, qualifica a crise pela qual passa o pensamento contemporâneo como uma “onda irracionalista” , que “...precisa ser denunciada e combatida, demonstrando-se o seu efetivo significado. ...” e ainda diz que: “ Toda essa crise do pensamento contemporâneo traduz, em grande medida a própria crise da modernidade. O mundo contemporâneo está dilacerado por uma dupla crise de âmbito global: a crise mundial do capitalismo e a do ‘socialismo real’. É a confluência dessas crises que produz os impasses e as contradições, e , inclusive, as perplexidades, que atravessam de ponta a ponta a sociedade contemporânea explicam esse novo surto irracionalista, que é a sua expressão ideológica. É essa dupla crise que reforça a fetichização do mundo social, com a entificação generalizada das relações e dos processos sociais, desfazendo, continuamente os seus nexos e produzindo a aparência do sem – sentido histórico – social. ...”

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com a superação das metanarrativas e das abordagens teóricas calçadas na

categoria de totalidade;...” (NETTO, 1996, p. 97)

“No campo das ciências sociais desencadeiam-se polêmicas

metodológicas, buscando convencer que as abordagens individualistas e

culturalistas permitem aproximação maior com a realidade dos sujeitos

sociais. Prioriza –se a esfera da cultura como chave das análises dos

fenômenos contemporâneos. ...”(SIMIONATO,1999, p.85) Neste contexto

surgem as pesquisas com ênfases nas representações sociais que os sujeitos

fazem da realidade, estudos voltados para o cotidiano, para os fragmentos de

realidades, entre outros que valorizam o dado, o singular.

No interior da profissão, face as transformações societárias em relação ao

processo de produção e reprodução da sociedade as polêmicas da pós –

modernidade também ganham espaço, mas não sem a vigilância da orientação

marxista, hegemônica nas produções acadêmicas em Serviço Social. Como

nos informa NETTO (1996, p.89) é necessário reconhecermos que a profissão

possui tendências e orientações diferenciadas, resultando que o complexo

teórico, prático, político e cultural que conforma a profissão sofre as

implicações destas transformações, que são reproduzidas no âmbito da

produção do conhecimento.

Há uma crítica às representações sociais pelo fato de aparecer como meio

de compreender os significados atribuídos pelos sujeitos às suas condições de

vida, às suas demandas individuais ou coletivas, deslocando este sujeito das

suas relações sociais e dos processos históricas que determinam suas

representações.

No entanto, entendemos que representação social “...é a expressão do

conhecimento reconstruído pelo sujeito a respeito de sua realidade cotidiana,

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considerando as determinações sociais, históricas e culturais presentes no

contexto em que se insere.” (BOURGUIGNON, 2001, p. 82)

Pesquisas sobre representações sociais podem revelar como os sujeitos se

apropriam e dão significado à sua realidade e que potencial este

conhecimento tem tanto para cristalizar, como para transformar relações

sociais. “As representações sociais não são só explicam tais significados,

como também demonstram o grau de pertencimento de um sujeito ao seu

grupo social, fato que denota a necessidade de apreendê-las sempre de forma

vinculada ao contexto sócio – histórico e cultural que as engendrou.”

(BOURGUIGNON, 2001, p. 86)

Nesta perspectiva conhecer “as representações que os sujeitos fazem da

sua realidade” é fundamental para estabelecermos diálogos mais consistentes

com estes sujeitos e para traçarmos “estratégias” de trabalho com as

dimensões objetiva e subjetiva de existência dos sujeitos. Neste caso

concordamos com o depoimento acima, no aspecto em que o problema

encontra-se não nas representações sociais, mas nas “referências analíticas”

que sustentam pesquisas nesta área e reduzem sua compreensão.

Observe-se que a complexidade da questão não está na abordagem de temas microssociais, locais ou que envolvam dimensões dos valores, afetos e da subjetividade humana ( questões de necessário enfrentamento), mas está na recusa da razão e na descontextualização, na ausência de referentes históricos, estruturais, no não – reconhecimento de que os sujeitos históricos encarnam processos sociais, expressam visões de mundo e têm suas identidades sociais construídas na tessitura das relações sociais mais amplas. Relações que se explicam em teorias sociais abrangentes, que configuram visões de mundo onde o particular ganha sentido referido ao genérico. (YAZBEK, 2000, p. 31-32)

“Eu acho assim: que quando eu fiz a minha dissertação de mestrado, eu analisei a Revista Serviço Social e Sociedade do número 1 ao (...) último número do ano de 89, ou seja, toda a década de 80 e, assim, eu acho que foi muito importante o Serviço Social se abrir para uma interlocução com as Ciências Sociais –

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Economia, História – com as Ciências Humanas de uma forma geral. E isso aparece na própria evolução da Revista Serviço Social e Sociedade. Essa ruptura com o estruturalismo, pegando especificamente a abordagem sobre política social, tem um divisor de águas que é 1985, publicação de um artigo do Lúcio Kowarick na Revista Serviço Social e Sociedade que apresenta uma outra visão de Estado, menos instrumental. Em fim, uma interlocução dele com o Poulantzas na questão das contradições. Então, de 85 para frente isso está muito sintonizado com o livro da Carmelita, da turma de lá da PUC/SP – sobre a assistência que já traz também esse amadurecimento, embora ainda com muitas debilidades, mas traz esse amadurecimento. Então eu acho que vai avançando, sem volta, para uma qualificação teórico – metodológica muito grande. E, ao lado disso, a gente tem, no campo das Ciências Sociais, o crescimento das perspectivas pós – modernas, neo – funcionalistas, pesquisas muito descritivas, muito pontuais ou esse crescimento da questão das representações. De forma que os segmentos mais críticos, mais à esquerda do pensamento social brasileiro vão se aproximar muito do Serviço Social. Outro dia eu ouvi uma frase engraçada de um cara de São Paulo, dizendo assim: “O Serviço Social é um simpático exílio.” Nessa situação é um simpático exílio. Não é a toa que o Carlos Nelson Coutinho, que é o cara que introduziu Lukács e Gramsci no Brasil, vai dar aula em Serviço Social na UFRJ.O Chico de Oliveira vai ser Professor visitante na UERJ. Que Emir Sader vai ser Professor na Faculdade de Serviço Social da UERJ. Estou pegando aí três pessoas que são referências para o pensamento social brasileiro. Então nós passamos a ser isso: “ um simpático exílio” no contexto em que as Ciências Sociais estão muito polarizadas pelo individualismo metodológico , pela pós – modernidade (...) (Elaine Rossetti Behring)

A relevância social de uma pesquisa está em sua capacidade de

apreender a realidade e ser referência para os profissionais da categoria e de

outras áreas de conhecimento, bem como alimentadoras de práticas críticas.

Sobre isto CHAUÍ (2001, p. 151- 152) define alguns critérios qualitativos

para dimensionar o nível de excelência das pesquisas acadêmicas. Embora

essa citação seja longa, merece destaque por tratar o processo da pesquisa em

uma perspectiva ampliada: 1-a inovação: seja pelo tema, seja pela metodologia, seja pela descoberta de dificuldades novas, seja por levar a uma reformulação do saber anterior sobre a questão;

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2-a durabilidade: a pesquisa não é servil a modismos e seu sentido não termina quando a moda acadêmica acabar porque não nasceu de uma moda; 3- a obra: a pesquisa não é um fragmento isolado de idéias que não terão seqüência, mas cria passos para trabalhos seguintes, do próprio pesquisador ou de outros, sejam seus orientandos, sejam os participantes do mesmo grupo ou setor de pesquisa; há obra quando há continuidade de preocupações e investigações, quando há retomada do trabalho de alguém por um outro, e quando se forma uma tradição de pensamento na área; 4- dar a pensar: a pesquisa faz que novas questões conexas, paralelas ou do mesmo campo possam ser pensadas, mesmo que não tenham sido trabalhadas pelo próprio pesquisador; ou que questões existentes, conexas, paralelas ou do mesmo campo possam ser percebidas de maneira diferente, suscitando um novo trabalho de pensamento por parte de outros pesquisadores; 5- impacto ou efeito social, político ou econômico: a pesquisa alcança receptores extra – acadêmicos para os quais o trabalho passa a ser referência de ação (...); 6- autonomia: a pesquisa suscita efeitos para além do que pensara ou previra o pesquisador, mas o essencial é que tenha nascido, de exigências próprias e internas ao pesquisador e ao seu campo de atividades, da necessidade intelectual e científica de pensar sobre um determinado problema, e não por determinação externa ao pesquisador (...); 7-articulação de duas lógicas diferentes, a lógica acadêmica e a lógica histórica ( social, econômica ,política): ... a qualidade de uma pesquisa se mede pela capacidade de enfrentar os problemas científicos, humanísticos e filosóficos postos pelas dificuldades da experiência de seu próprio tempo; quanto mais uma pesquisa é reflexão, investigação e resposta ao seu tempo, menos perecível e mais significativa ela é; 8- articulação entre o universal e o particular: a pesquisa excelente é aquela que, tratando de algo particular, o faz de maneira que seu alcance, seu sentido e seus efeitos tendam a ser universalizáveis – quanto menos genérica e quanto mais particular, maior possibilidade de possuir aspectos ou dimensões universais (...).

O Serviço Social tem avançado em relação a perspectiva analítica crítica,

tornando-se “simpático exílio” para pesquisadores das Ciências Sociais.

Precisamos afirmar que tem, o Serviço Social, se tornado um simpático

exílio, porque enquanto espaço acadêmico jovem é fértil e profícuo para o

estabelecimento de diálogos capazes de gerar abordagens críticas e originais

em relação aos objetos de pesquisa que transitam no cenário que conforma o

pensamento social contemporâneo.

Desta forma encontramos grandes nomes das Ciências Sociais e Humanas

trabalhando como docentes na esfera da pós – graduação em Serviço Social,

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como os citados pelo depoimento de Elaine Rossetti Behring (“Carlos Nelson

Coutinho, Francisco de Oliveira”), como também escrevendo prefácios50, o que

garante credibilidade às produções do Serviço Social.

O Serviço Social ao enfrentar os desafios contemporâneos, na perspectiva

de NETTO(1996, p. 119) tem demonstrado uma coragem cívica e

intelectual...

...Coragem cívica, em primeiro lugar: “não ter nenhum medo de estar absolutamente contra a corrente política do nosso tempo”(Anderson, in Sader e Gentili,orgs.,1995:197). Coragem intelectual: não se trata de conduzir o debate com princípios ou alusões a objetivos generosos, mas de assumi-lo com a análise das transformações societárias, compreendendo-as nas suas tendências de fundo e não vacilando em reconhecer as dificuldades teóricas que, nesse esforço, expressam a inconclusividade dos nossos conhecimentos; trata-se de não capitular diante de qualquer tentação neo – irracionalista ou agnóstica e de insistir em que desenvolvendo as potencialidades inesgotadas da teoria social moderna (nomeadamente com a inspiração marxiana), é possível tornar intelegíveis e apreender o sentido das transformações societárias em curso. ...

Os avanços da profissão no campo do conhecimento científico e da

compreensão das transformações societárias precisam enfrentar o desafio de

alcançar a realidade social e modo de vida dos sujeitos que requisitam nossa

prática, bem como as estruturas organizacionais em que desenvolvemos esta

prática profissional.

“Então acho que o impacto, desse ponto de vista, ele vem pra mim na direção, (...), de duas vertentes: uma vertente que eu chamaria da democratização do resultado, no sentido de que os usuários possam ter acesso aos resultados, discuti-los, o que supõem, na verdade, uma tradução dos resultados pra que eles sejam apossados, incorporados, apropriados por aqueles sujeitos. O que

50 Citaremos alguns exemplos ( com o risco de não nominarmos todos os casos merecedores) de prefácios escritos por autores de renome nacional e que garantem ao Serviço Social uma legitimidade acadêmica em função do nível de excelência da pesquisa desenvolvida. Assim temos: Francisco de Oliveira no livro de Raquel Raichelis “ Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social: caminhos da construção democrática” – São Paulo:Cortez, 1998; Carlos Nelson Coutinho no livro de Ivete Simionato “Gramsci: sua teoria, incidência no Brasil, influência no Serviço Social” – São Paulo/Florianópolis: Cortez/ Ed. UFSC, 1995; Antônio Joaquim Severino no livro de Maria Lúcia Martinelli “ Serviço Social: identidade e alienação” – São Paulo: Cortez, 1993.

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me parece é que, as vezes, isto eu estou chamando desde a democratização da linguagem e tal, é que existe uma passagem daquele conhecimento empírico para uma outra, um “ gap”, entre ele e a sua expressão e a forma com que ele, sofisticado, é introduzido na academia, que distancia da própria apreensão das pessoas. Pra mim isto ficou muito patente na nossa pesquisa do mapa da exclusão/inclusão social e que nós vimos que a linguagem dos mapas com cores ela era muito apropriada para as pessoas, muito claramente, do que se nós tivéssemos apresentado uma tabela e que a compreensão ficava muito objetiva. Então o modo pelo qual (...) a linguagem que você(...), poderá ser um dos fatores do ponto de vista dos sujeitos. Do ponto de vista do impacto institucional eu creio que tenha a ver, claro, com essa democratização, mas tem a ver num outro sentido: qual é o grau de suportabilidade que a instituição tem da crítica? Porque nem toda instituição suporta a crítica, acha que a crítica é uma transgressão. Então eu creio que o impacto ele vai decorrer, inclusive disto, de não existir esta noção do segredo, de existir uma instituição aberta que suporte a crítica, que a crítica é uma alavanca da construção. Mas claro que isso depende da sutileza de apresentação do resultado, porque é evidente, se aquela pesquisa é apresentada de um modo a destruir por completo, então,também, o impacto é a destruição. Então, sabe, acho que tudo isso tem um grau de linguagem, mas tem um patamar pelo qual aquela relação está posta e existe essa necessidade da disseminação. Agora umas das coisas que tem ficado patente pra mim também é que quando você quer mostrar a mudança de alguma coisa , você tem que interessar as pessoas em querer ter vontade de mudar e discutir a mudança. Porque às vezes você pode apresentar um resultado de uma investigação que as pessoas, absolutamente, sentiram, de saída, um envolvimento com a problematização da questão, pra querer saber dela, pra depois você dizer o que é ela. Então, eu creio quando a gente fala no resultado da pesquisa, eu creio que nós não podemos esquecer que o processo da problematização também tem que ser democratizado, porque se eu, na verdade, não divido este estímulo de saber o quê de quê, porque as pessoas também se põem essa interrogação, aquela descoberta se não tiver uma factualidade muito grande, não vai bater o significado. Quer dizer eu tenho que construir um significado pra que isso possa bater e possa fazer um sentido pras pessoas.” (Aldaíza Sposati)

Neste depoimento o impacto é observado em “duas vertentes”: 1)

“democratização” dos resultados, de forma que os mesmos sejam “apossados,

incorporados, apropriados” pelos “sujeitos”, o que implica em democratização

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da linguagem; 2) Impacto institucional: também depende da “democratização”

da “linguagem”, mas sobretudo depende do grau de “suportabilidade”

institucional quanto a “crítica” gerada pelo conhecimento produzido através de

pesquisa junto à instituição.

A linguagem, segundo IANNI (2000, p. 212) é “...mediação principal, por

intermédio da qual as outras criações se expressam, movem, transformam.”

Através da linguagem – comprometida com os interesses dos segmentos

subalternos – o profissional e pesquisador pode encontrar possibilidades

potenciais de mobilização de processos de democratização e socialização do

conhecimento científico.

O depoimento alerta para que haja construções de “vínculos” entre o

pesquisador, sua pesquisa e a realidade concreta daquele sujeito e

organização social envolvidos com o objeto em questão de forma que os

elementos constituintes deste objeto sejam problematizados conjuntamente.

“É. Mas não é somente um vínculo porque existe, mas é um vínculo com o desejo, que é mais do que um vínculo do existir. Entendeu? É um vínculo com o desejo de se indagar sobre aquilo. Exatamente. Se não o impacto, se você me pergunta do impacto, o impacto não produz. Então eu estou te dizendo que, claro, o impacto vai depender do resultado obtido, da linguagem utilizada nesse resultado, mas da capacidade, da abertura, pra mudança, pra entender a crítica e também para o estímulo que se cria pra compreender aquele resultado. Eu estou dando várias nuances aqui, eu acho que não dá pra ser somado com um exemplo só e a intensidade desses fatores poderá ser diferenciada conforme a situação.“ (Aldaíza Sposati)

Estes vínculos não são aleatórios ou espontâneos, são estimulados e

estabelecidos em função de necessidades concretas, de lutas e interesses

comuns que se consolidam através do conjunto da prática profissional no

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cotidiano das instituições sociais.E em relação à categoria profissional, o

impacto apresenta os mesmos elementos.

“Vai depender disso mesmo que eu estou dizendo. É a mesma coisa. Entendeu? Depende de que pesquisa. Eu acho que isso não é uma forma genérica, acho que não. Acho que não dá pra ser. Primeiro porque as pesquisas não são disseminadas. É isso que eu digo, acho que seriam saberes. Nós não temos uma prática de sistematização do conhecimento do ponto de vista, por exemplo, uma linha de pesquisa que esteja aclarando isso, aquilo outro. Entendeu? Então, eu acho que o Assistente Social, por todas estas fragilidades, ele tem uma sede de conhecimento.Ele tem. Mas nessa sede de conhecimento, quase que um pouco, um tanto conjuntural, no sentido de dizer assim : bom e agora como é que eu olho isso, como é que eu aceito olhar isso? Do que propriamente uma nova construção histórica. Talvez eu esteja um pouco deformada nessa minha afirmação, mas eu diria que esta indagação científica não é tão comum entre os profissionais...” (Aldaíza Sposati)

O outro aspecto, importante, é em relação ao nível de envolvimento e de

pertencimento dos sujeitos em relação à pesquisa e seus resultados. Deve-se

considerar que o “vínculo” entre os sujeito e a pesquisa e seus resultados deve

estar sustentado no “desejo de se indagar sobre aquilo.” Se não há o vínculo

com a problemática da pesquisa não há impacto.

Presente no depoimento acima encontramos a preocupação de que

algumas vezes os profissionais de nossa área têm necessidades conjunturais

em relação ao conhecimento produzido no meio acadêmico. Isto pode ser um

indicativo de que muitas vezes, em função de situações emergentes na

realidade profissional, o Assistente Social é obrigado a buscar fontes de

informação que oriente sua intervenção. Consideramos que trata-se de uma

um alerta aos órgãos responsáveis pela formação profissional, que podem ter

nesse momento – de “sede de conhecimento” - um desencadeador de

processos de formação e atualização profissional que venham gerar pesquisas

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articuladas às práticas profissionais, sem perder de vista a necessária

coerência teórico- metodológica e o desenvolvimento da atitude investigativa.

Aldaíza Sposati afirma, ainda, que “O impacto vai depender do resultado

obtido, da linguagem utilizada nesse resultado, mas da capacidade, da abertura

pra mudança, pra entender a crítica e também para o estímulo que se cria pra

compreender aquele resultado...” Neste sentido é preciso pensar estratégias que

possam fortalecer vínculos entre profissionais/pesquisadores, suas temáticas

de pesquisa e as demandas concretas da população. Cremos que em relação

aos profissionais o processo é o mesmo. Se não existe uma vinculação entre as

pesquisas e as demandas concretas da prática profissional, o impacto é restrito.

Sobretudo o processo de formação profissional, que não se restringe ao nível

da graduação, deve criar estímulos que levem a incorporar a pesquisa em sua

prática profissional, buscando nela os sustentáculo para compreensão da

realidade, de temáticas emergenciais, sem abandonar a perspectiva de

totalidade e numa direção em que haja proposições de intervenções críticas e

criativas, reforçando os avanços já alcançados pela profissão.

“... Eu não sei se você chegou a ler o Prefácio que o Chico de Oliveira fez no meu livro, onde ele faz um grande elogio, não para mim, mas para a categoria. É um presente para a categoria. Eu acho que isso vir de um cara como o Chico de Oliveira é muito significativo. O pessoal do CFESS até botou a fala dele na agenda. Então , assim, que foi, um imenso reconhecimento da relevância social, do papel combativo que essa categoria tem no processo de democratização da sociedade brasileira. Eu acho isso significativo.” (Elaine Rossetti Behring)

A referência que Elaine Rossetti Behring faz à Francisco de Oliveira

encontra-se em seu livro “Brasil em Contra – Reforma: desestruturação do

Estado e perda de direitos” publicado pela Cortez em 2003 e traz um

“significativo” reconhecimento da categoria profissional em suas lutas pela

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consolidação dos direitos fundamentais do cidadão e desta forma reconhece

também o potencial da profissão em realizar pesquisas que têm materialidade

histórica e “relevância social”, porque estabelecem um compromisso radical

com os processos de transformação social.

O Serviço Social há muito foi retirado do registro assistencialista pelos seus estudiosos e militantes, que o colocaram, acertadamente, no terreno da política. Aliás, esse foi um movimento teórico–prático da maior importância: os que ainda são chamados de assistentes sociais constituem-se numa das categorias mais combativas e, por isso criativas, na política brasileira do último quartel de século. A categoria está em todos os conselhos de defesa e promoção de direitos sociais, numa incessante atividade. Deve-se dizer que sem os assistentes sociais a criação e a invenção de direitos no Brasil não teria conhecido os avanços que registra. ...

Avançando, podemos afirmar que esta tendência em produzir

conhecimentos fundamentados em uma experiência combativa no contexto

da luta pelos direitos sociais é um traço da particularidade da pesquisa em

Serviço Social.

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4- A PARTICULARIDADE DA PESQUISA PARA O SERVIÇO SOCIAL

Importante retomarmos que nossa indagação em torno da particularidade

da pesquisa em Serviço Social se faz considerando o contexto sócio –

econômico, político e cultural contemporâneo de forma a apreender as

determinações mais gerais e sua repercussão e incidência na singularidade da

prática do profissional do Assistente Social, principalmente quando em face

das demandas sociais e das exigências de seu enfrentamento.

Tendo esta perspectiva como referência, nossa preocupação não foi

necessariamente definir características, engessando a compreensão da

pesquisa aos limites do próprio Serviço Social, ao contrário, buscamos, junto

com as participantes desta tese, compreender nuanças que pudessem retratar a

complexidade do processo de produção de conhecimento objetivado através

de uma forma de fazer pesquisa que tem no equacionamento das expressões

da questão social e, por conseqüência, nas demandas sociais concretas que

chegam cotidianamente à profissão sua razão de ser.

Os sujeitos participantes desta pesquisa apresentam reflexões

fundamentais sobre a particularidade da pesquisa para o Serviço Social,

revelando sua complexidade e por isto mesmo seus desafios, ou seja, sobre

como a profissão se movimenta através da pesquisa, impulsionada pelas

demandas da prática profissional. Consideramos que a vinculação orgânica da

pesquisa com a prática profissional, faz da pesquisa uma construção histórica,

que se consolida à medida em que a própria profissão conquista

reconhecimento e estatuto acadêmico, sendo que neste processo impasses

precisam ser superados e novos horizontes alcançados. Desta forma constitui a

particularidade da pesquisa em Serviço Social a dinâmica que se dá entre os

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avanços já conquistados e os desafios a serem enfrentados. É sobre esta

particularidade que nos propomos a refletir.

“...Eu acho, bom, vamos pensar... A particularidade dela, desenvolvida pelo Serviço Social, eu acho que tem uma primeira questão que é o repensar a prática. A nossa pesquisa tem isso, ela é um meio pra repensar o que fazemos. E ela não pensa só prática em si, mas ela pensa o contexto aonde essa prática acontece. Então a nossa pesquisa não é uma pesquisa especulativa, ela é uma pesquisa muito centrada numa visão operacional do saber. Saber pra poder mudar o que se faz. Então eu acho que a gente pesquisa muito pra repensar as práticas sociais, tanto aquelas que são específicas do profissional do Serviço Social, como aquelas que se dão na sociedade, no contexto aonde também o Serviço Social atua. Por exemplo os movimentos sociais. Ele não é um campo restrito ao Serviço Social. As políticas sociais, elas são campos interdisciplinares. Mas quando nós pesquisamos isso, pesquisamos pra repensar as práticas. Essas práticas que são práticas sociais. Então a nossa, ... característica, do nosso campo de pesquisa, é um conhecimento que seja capaz de operar transformações. Não toda a transformação, mas níveis de transformação. Transformação no saber, na maneira de compreender aquela realidade, pensar estratégias de intervenção. Eu acho que cada vez mais nós temos que pensar a prática profissional como um campo fecundo pra pesquisas. Mas não naquele sentido (...), da prática em si, mas dela inserida em seu contexto. Eu acho que essa é a particularidade. Nós não inventamos tecnologias. A nossa pesquisa não é pra inventar softwares. Não que a gente até não possa fazer, nós até podemos. Inventar software pra gerenciar políticas sociais, pra ter avaliação, até podemos. Mas esse não é o nosso forte. O nosso forte é repensar as práticas. Eu acho que essa é a contribuição que o Serviço Social tem que dar. E repensar as práticas com um eixo muito claro, que é o eixo da democracia. Aí está dado. Essa é a nossa cara. Se a gente tem que ter cara que seja essa. Acho que é isso.” (Lúcia Cortes da Costa)

O depoimento de Lúcia Cortes da Costa já nos aponta um traço de

particularidade: o de “repensar a prática” no “contexto” em que “acontece”.

Preocupada com processos de transformação social, a pesquisa em Serviço

Social não é “especulativa”, pelo contrário está vinculada a necessidade de

gerar conhecimento que seja capaz de “operar” transformações nas ações

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cotidianas, no “saber” que sustenta tais ações, permitindo “compreender” a

“realidade” e estabelecer “estratégias” de intervenção no campo das políticas

sociais. “Saber pra poder mudar o que se faz”. Trata-se de uma pesquisa que

ao repensar a prática profissional do Serviço Social amplia as reflexões para a

totalidade das “práticas sociais”, principalmente considerando que as políticas

sociais são campos “interdisciplinares” em que as intervenções têm uma

natureza social.

Mais do que isto as políticas sociais são campos em que o confronto

entre Estado e sociedade civil ganham uma expressão contraditória e

mobilizam ações de profissionais e de movimentos organizados da sociedade.

Neste contexto o projeto ético – político profissional define o “eixo” do

processo de intervenção e de investigação no seio da profissão, ou seja,

intervenção e investigação tem uma orientação fundada na defesa da

democracia e dos direitos sociais, civis e políticos do cidadão. Assim a prática

profissional, orientada por uma ética democrática, é “um campo fecundo” para

a pesquisa em Serviço Social.

“A particularidade ... primeiro que uma das coisas que eu observo e constato com os nossos doutorandos e mestrandos é a própria inquietação... Ele tem um pouco de inconformismo e esse inconformismo ele acaba mobilizando na hora em que vai definir o trabalho. Esse inconformismo com as dificuldades, com os problemas, com as questões todas postas na realidade hoje faz com que seja o meu ponta pé inicial. E depois elas estão diretamente relacionadas com os processos sociais todos que estão aí, processos sociais, com as articulações políticas, econômicas, culturais, sociais. Na verdade a particularidade dela é estar nessa trama toda, é buscar nessa trama de relações aquilo que é o que me inquieta. Aquilo que inquieta o doutorando, que inquieta o pesquisador e que pode estar trazendo uma contribuição importante pra conhecer melhor essa realidade e pra mudar essa realidade. O horizonte é esse, é me debruçar pra conhecer, pra poder influenciar os rumos ... Não sei se isso é pensar grande, talvez?....” (Jussara Maria Rosa Mendes)

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Nossa pesquisa retrata uma “inquietação” própria de profissionais que

estão inconformados com as relações sociais no contexto do capitalismo

contemporâneo. Relações sociais que são geradoras de processos de

empobrecimento, desigualdades e exclusão social. Esse “inconformismo” é o

ponto de partida para construções de objetos de investigação que tratam de

compreender as expressões da questão social na “trama” destas “relações

sociais”. O conhecimento produzido através desta pesquisa tem por

“horizonte” não só conhecer a realidade em sua processualidade histórica, mas

sobretudo “influenciar” os “rumos” da profissão neste contexto.

Conforme Jussara Maria Rosa Mendes trata-se de uma profissão que tem

em seu processo formativo uma preparação para o contato direto com a

realidade.

“Eu acho que a perspectiva diferente é que , na verdade, quem aplicava a pesquisa, quem fazia a pesquisa, quem ia à campo era o Assistente Social. Então ela reconfirmava aquilo que a gente sempre disse..., aquilo que a Carmelita fala do miúdo, do cotidiano, quem faz, quem chega mais próximo ...então era isso: primeiro esse contato fértil com a realidade... Embora uma realidade triste, mas quem fazia esse contato de fato era o Assistente Social. Uma outra questão era esse conhecimento.... essa, eu não diria instrumentalidade, mas eu acho que faz parte das habilidades, das competências do Assistente Social pra essa aproximação com a realidade... Então ela te dava o suporte pra que tu pudesses de fato realizar essa história de vida, sabe, que tu pudesse desencadear essa história de vida. Até assim, pegando um pouco também, eu vou pegar um outro ângulo, que hoje se discute muito – a ética na pesquisa e eu acho que o Assistente Social ele já traz isto por dentro... porque tu já tem o próprio Código de Ética, a tua ação profissional ela é toda... ela já vem estruturada numa perspectiva ética, então ... já existe um pré – preparo quando tu chega pra realizar uma entrevista, pra realizar algum tipo de intervenção. (...) ...Não é só formação (...) Então eu acho que são questões que exigem... que estão para além da formação. Têm as questões que são de competência, que são

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de habilidades e que tu vais, durante o teu processo de formação profissional vai compondo, mas eu acho que é para além disso...”(Jussara Maria Rosa Mendes)

A formação do Assistente Social está voltada para desenvolver

competências e “habilidades” que possibilitam a “aproximação” e a imersão do

profissional nos problemas sociais, através das demandas dos usuários dos

serviços sociais e das políticas públicas. É no cotidiano, “...no tempo miúdo da

ação profissional...” (YAZBEK, 2001, p. 38), intervindo sobre demandas de

um homem penalizado pelas seqüelas do processo de empobrecimento a que é

submetido no capitalismo contemporâneo, que o Serviço Social encontra as

motivações para fazer pesquisa. Portanto motivações enraizadas numa

realidade saturada de contradições e enriquecida por mediações que

apreendidas e construídas através da pesquisa possibilitam visualizar e definir

estratégias de intervenção.

Outro “ângulo” do processo de formação é o da “ética” profissional, que

orienta a intervenção e as relações com o sujeito numa perspectiva direcionada

pelos princípios presentes em nosso Código de Ética. Vinculada

organicamente à prática profissional, a pesquisa tem presente estes mesmos

princípios.

No entanto o depoimento deixa claro: não se trata de restringir a

particularidade da pesquisa à formação profissional e sim de ter nela suas

bases fundamentais. Apoiada nesta, no desenvolvimento de competências,

atitudes e habilidades e nos valores essenciais à profissão, avançaremos para

o exercício de pesquisa que contribua para desvendar as tramas das relações

sociais, extremamente complexas, o que requer um profissional atento,

criterioso e crítico.

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“Como o Serviço Social atua diretamente na ponta, tem oportunidade de descobrir em primeira mão os conflitos, os problemas sociais ainda em sua fase embrionária. Por isso as pesquisas na área abrangem um leque de temáticas, muitas das quais ainda desconhecidas por outras profissões.” (Aglair Alencar Setubal)

Valorizar a riqueza da prática profissional, que enfrenta problemáticas

sociais tão complexas é um traço importante a ser consolidado nas pesquisas

do Serviço Social. Para isto é preciso reconhecer que nesta prática está a

possibilidade de desvendar “os problemas sociais” em sua “fase embrionária”,

ou então em sua manifestação mais imediata. Problemas que tratados teórica e

metodologicamente com mais cuidado resultam em pesquisas que tratam de

“temáticas” pouco exploradas ou “desconhecidas” por outras áreas de

conhecimento.

“Sempre tenho dificuldade em responder esta questão e por vezes me pergunto qual a importância dela, especialmente nesta conjuntura atual, quando as fronteiras entre as especializações e profissões são muito tênues. Mesmo assim, vou arriscar: acho que a particularidade reside em pesquisar as situações e questões que envolvem os objetos de intervenção, seja através de estudos empíricos seja de pesquisas teóricas.

Não tenho uma reflexão acumulada sobre isso,(...)” ( Ana Elizabete Mota)

O depoimento de Ana Elizabete Mota nos instiga a levantar algumas

questões que são relevantes: - o fato da produção de conhecimento exigir dos

pesquisadores diálogos interdisciplinares, principalmente quando se refere às

questões que dizem respeito ao social – contexto complexo com possibilidades

de apropriações múltiplas - restringe a configuração de traços particulares à

pesquisa em Serviço Social? ; - reconhecendo que as “fronteiras” entre as

“especializações” e “profissões” são tênues, caberia ao Serviço Social demarcar

peculiaridades para sua pesquisa? ; - não será através da relação dinâmica que

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estabelecemos com outras áreas de conhecimento que constituímos nossa

particularidade em produzir conhecimento?

Reforçamos que a preocupação com a particularidade não deve

restringir a compreensão da pesquisa, nem limitar diálogos entre áreas de

conhecimento ou cercear potencialidades presentes no processo de produção

de conhecimento da profissão ao investigar realidades e temáticas de natureza

social. Pelo contrário nossa intenção é afirmar que a pesquisa que se faz na

profissão tem subjacente a própria prática profissional e seus “objetos de

intervenção”. Reconhecemos que tal afirmação é um ganho, pois através

desta particularidade a profissão poderá contribuir com avanços quanto às

estratégias de enfrentamento das demandas sociais. E com certeza estas

estratégias não se restringem ao Serviço Social, mas ampliam-se para o

conjunto articulado das práticas sociais comprometidas com a democracia e

consolidação dos direitos sociais.

No entanto reconhecemos que temos que ter o cuidado de não cairmos

em compreensões reducionistas sobre o processo de produção de

conhecimento que se consolida através da pesquisa em Serviço Social. Sobre

isto SETUBAL (1995, p. 30-31) traz uma importante contribuição:

...convém que explicitemos que, entre os diferentes entendimentos de conhecimento que perpassam o modo de ser e de se constituir do Serviço Social, duas vertentes nos parecem fundamentais, pois refletem-se diretamente no entendimento de pesquisa: uma que atribui ao conhecimento valor apenas instrumental, generalista e útil ao desenvolvimento de uma prática considerada eficaz e outra que coloca o conhecimento no patamar constituído pelas diferentes formas de ação e percepção do Serviço Social no seu construir –se e reconstruir-se histórico. A visão instrumental parte do princípio de que o conhecimento origina-se e sustenta-se na própria prática profissional com o auxílio de teorias generalizadoras que viabilizam certa compreensão do objeto para intervenção imediata. Tal conhecimento conduz-nos a uma percepção empirista, compreensão distanciada e consequentemente insuficiente do objeto na sua manifestação abstratamente elaborada. A segunda vertente defende o conhecimento como um produto dialético que apreende, em um só momento, a forma de se expressar do Serviço Social num determinado espaço e tempo, bem como as alternativas viáveis de intervenção. Não é um conhecimento apriorístico,

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sensível, mas organiza-se a partir da correlação de forças políticas e ideológicas contidas nas relações sociais.

Concordamos com a autora citada (1995, p. 31) que compreende “...o

conhecimento como produto de um processo metodologicamente

construído...” que se processa através de pesquisa sistemática e crítica da

realidade em que o objeto de atenção do Serviço Social se constitui

historicamente.

Discutirmos a particularidade da pesquisa para o Serviço Social, em uma

perspectiva dialética, nos obriga a mergulharmos na complexa trama que

envolve a intervenção profissional.

“É muito difícil falar em particularidade da pesquisa em Serviço Social. Como Assistentes Sociais, sabemos que é impossível trabalhar particularmente, no sentido de você só ver um fragmento do sujeito. Um sujeito é um ser completo e várias profissões poderiam estar trabalhando e desenvolvendo uma série de atividades com o mesmo sujeito de uma forma integral. Obviamente a questão não trata de particularidades nesse sentido, mas eu acho que, não sei se seria particularidade, temos um acesso privilegiado a essa população, à população mais subalternizada com a qual a quase totalidade dos profissionais trabalha. O acesso é fundamental para que a gente possa contribuir para o conhecimento da realidade sócio – econômica dessa população, das expressões da questão social que vivenciam, e da experiência dos sujeitos a partir de suas falas, da suas vozes, de suas expressões. Eu não sei te dizer se isso é particular do Serviço Social. Acho que não é. Se você for trabalhar em Ciências Sociais, em História Social, em Psicologia Social você também vai ter acesso a esse sujeito e com óticas muito semelhantes. Mas o conhecimento da realidade sócio – econômica desse sujeito, a experiência desse sujeito inserido numa realidade social, um sujeito que está vivendo uma situação social ou, o que a gente chama, uma expressão da questão social de maneira mais concreta, eu acho que a gente tem um acesso privilegiado a isso pelas próprias peculiaridades da nossa profissão. Então, eu penso que temos um vasto campo de informação por meio da nossa intervenção, por meio de pesquisas que venhamos a realizar, que podem efetivamente dar uma grande contribuição no conhecimento cotidiano das pessoas, que outras pesquisas de caráter mais

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amplo e por profissionais que não tenham essa possibilidade de acesso podem não dar conta de perceber estas particularidades do cotidiano dos sujeitos, dos seus sentimentos, das suas vivências, das suas experiências, da sua cultura. Nós temos essa possibilidade desse contato pelo nosso acesso privilegiado a essa população. O privilégio do acesso é uma particularidade que pode contribuir para que a gente construa pesquisas de grande envergadura, de grande amplitude na direção de contribuições com alterações na realidade. Quando eu falo alterações na realidade, eu acho que não temos que só pensar nas grandes transformações societárias pelas quais a gente tem que lutar, mas também em questões mais localizadas: se a gente puder transformar aquela intervenção do Assistente Social ou de grupos de profissionais, ou executar um projeto localizado, seja numa prefeitura, seja numa instituição “x”, aquele projeto poderá ser exemplar para estar subsidiando outros projetos e até políticas mais amplas. Existem diversas possibilidades aí. É bastante difícil dizer o que é particular , não sei se você saberia dizer o que é particular. O acesso privilegiado à informação é que pode fazer com que o conhecimento da realidade sócio – econômica e até a construção de indicadores a partir desse nosso conhecimento pode trazer uma particularidade mais específica do Serviço Social.” (Eunice Teresinha Fávero)

Cariz da particularidade é o “acesso privilegiado” à realidade social da

classe subalterna, em especial à sua forma de ver e compreender esta

realidade. No contato diário com a população usuária dos serviços sociais o

Assistente Social colhe “experiências” sociais (individuais e/ou coletivas)

sobre a condição de subalternidade e sobre as formas de resistência, muitas

vezes silenciosas e invisíveis, que se gestam no cotidiano dessa classe social.

Fundamentados no conhecimento destas experiências que são documentadas

através diversos recursos instrumentais (diagnósticos, perfis sócio –

econômicos, relatórios, pareceres sociais, entre outros) o acesso privilegiado

pode transformar –se em caminho profícuo de pesquisa, gerando reflexões “de

grande envergadura”, pelo alcance social dos seus resultados. Principalmente

se estes resultados culminarem com transformações na própria intervenção

profissional.

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O fato de trabalhar com demandas concretas e considerando a relação

profissional com estas demandas temos a possibilidade de realizar uma

pesquisa que garante maior centralidade ao sujeito, dando maior visibilidade

para suas condições de existência e potencializando a elaboração de

alternativas de intervenção no contexto das políticas públicas.

Aqui destacamos a importância de observar este segmento em uma

perspectiva de totalidade e não restrito às suas demandas individuais,

condicionadas pela situação de pobreza e carências materiais, afetivas,

culturais e que, na maioria das vezes, são tratadas de forma fragmentada pelas

ações das políticas públicas.

Desta forma observamos que são múltiplas as facetas que compõem a

particularidade da pesquisa em Serviço Social. Importante esclarecermos que

não são facetas desarticuladas, pelo contrário, tendo como eixo a prática

profissional, articulam-se dinamicamente.

“Então eu penso que o nosso acesso ao conhecimento é muito grande. O que nós precisamos é ter um investimento mais organizado na sistematização desse conhecimento e já com vistas a contribuições às políticas sociais, que já fazemos em algumas áreas, e também a projetos localizados, isso contribuiria para dar uma visibilidade à profissão, uma valorização da profissão, que penso ser uma profissão essencial num Estado Democrático de Direito. Você busca por meio dela garantir possibilidade de acesso a direitos, seja o direito até à cesta básica que o usuário vai receber no plantão, mas você tem que no seu trabalho contribuir para que as pessoas percebam que é um direito, não é uma doação, uma esmola que ele está recebendo, como a projetos mais amplos de garantia de distribuição de renda, de políticas redistributivas e mesmo compensatórias. Essa possibilidade do nosso conhecimento, na medida em que tivermos consciência disso enquanto categoria, eu penso que a gente pode estar garantindo um visibilidade, um espaço e uma valorização maior da nossa profissão, do nosso projeto profissional. (...) O que a gente conseguiu de avanço em termos de contribuição para política de assistência, da discussão da exclusão, foi um passo grandioso no âmbito das

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nossas produções e ainda temos muito a avançar e muitas possibilidades de estar avançando. Eu acho que a forma de abordar essas questões, pelo fato de termos esse conhecimento mais concreto das vivências, do dia-a-dia, da realidade social dos sujeitos, acaba tendo uma análise mais fundamentada e mais consistente no sentido de trazer efetivamente esses dados a partir da realidade tal como ela se coloca. Isso é algo particular do Serviço Social mesmo e que a gente tem que valorizar e mostrar essa possibilidade, não mostrar para garantir, não numa visão corporativista ou de privilégio da profissão, mas enquanto uma possibilidade mesmo de contribuição que essa profissão, devido as suas características de ser uma profissão que lida diretamente com essa população pode estar oferecendo. Isso é essencial.”(Eunice Teresinha Fávero)

Constitui compromisso das pesquisas no Serviço Social dar visibilidade

aos usuários das políticas públicas, no contexto de um Estado democrático de

direito, que tem como fundamento garantia dos direitos e liberdades

fundamentais do cidadão.

VIEIRA (1992, p.14) afirma que “...Só a sociedade democrática tem

condições de proteger e de conservar o Estado de Direito. Sem a sociedade

democrática, tal Estado desaparecerá fatalmente no horizonte humano.” A

sociedade democrática exige a participação dos cidadãos em todas as suas

instâncias, ou seja, nos mecanismos de controle e de decisões políticas,

econômicas e sociais e na riqueza socialmente gerada através do processo

produtivo. No entanto, o cidadão tem visto e vivenciado situações em que

seus direitos são vilipendiados pelo processo de empobrecimento e exclusão

social.

Comprometida politicamente com a consolidação da cidadania e

ampliação dos espaços democráticos na sociedade, as pesquisas em Serviço

Social devem fundamentar ações e conhecimentos profissionais que

construam indicadores sociais, de forma a direcionar programas sociais que

tenham capacidade de alterar as condições objetivas de existência destes

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cidadãos. Neste processo deve ganhar “visibilidade” um profissional, que por

suas competências e habilidades não se limita a ser operador terminal das

políticas públicas, ao contrário participa em todas as fases de sua

implementação, sendo co-responsável pela sua gestão.

“A investigação, por exemplo, ela é uma dimensão do próprio exercício profissional, ela não é exterior. Agora, a turma às vezes esquece isso. Eu acho que tem que ter aí um processo de capacitação continuada, no sentido de chamar a atenção para a riqueza do objeto com o qual o Serviço Social lida. E do quanto bons relatórios, bons levantamentos de dados podem estar oferecendo, podem se constituir como material importante para a análise da realidade, para a formulação de políticas e tal. Eu acho, assim, que a turma que está saindo da Universidade agora, no final dos anos 90, já sai com uma consciência maior dessa dimensão investigativa. Mas também tem uma outra coisa, que são as próprias condições objetivas de realização do trabalho, que nem sempre permitem a criatividade profissional, a realização de bons levantamentos, de bons relatórios. Até porque, muitas vezes as instituições não têm interesse de socializar, de se auto conhecer e em fim...”(Elaine Rossetti Behring)

Mesmo que os avanços concretos da profissão no campo do

conhecimento sobre as políticas públicas e sobre formação profissional

coloque em evidência o reconhecimento da pesquisa como essencial à prática

profissional, nem sempre esse reconhecimento tem ressonância e

materialidade para os profissionais que muitas vezes nas instâncias do

“exercício profissional”, devido as “condições objetivas” de sua realização não

encontram as condições adequadas para dar vazão à atitude investigativa e à

criatividade, como elementos mobilizadores da pesquisa.

Além disso o exercício comprometido da profissão impõe a construção

de “bons relatórios” e de “bons levantamentos” e a operacionalização de

instrumentos que garantam qualidade às informações colhidas na realidade

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social, junto aos usuários, pois sistematizados são potenciais fontes de

pesquisa.

Investir em formação continuada tendo como baliza a articulação

investigação/intervenção é o caminho para que os profissionais pensem a

pesquisa como “dimensão do próprio exercício profissional.”

“Olha eu acho que é a relevância social e o engajamento político da pesquisa, que tem a ver com as referências teóricas que vêm orientando as análises. Essa relação com a tradição Marxista eu acho que é, no contexto da chamada crise do marxismo, depois vem o Perry Anderson e diz a crise da crise..., mas o fato é que você tem hoje um projeto societário de esquerda na defensiva. Apesar disso, os Assistentes Sociais têm feito pesquisas com fundamento nessa perspectiva analítica, eu acho que isso é uma coisa que particulariza . A própria visão de questão social que é diferente da anomia de Durkheim, ou como situação social problema, a questão social como algo que se origina na relação capital – trabalho e na forma com que se organiza na relação capital/trabalho e na forma com que se organiza o processo de produção e reprodução na sociedade capitalista, eu acho que isso caba sendo um diferencial das pesquisas no campo do Serviço Social em relação às Ciências Humanas em geral. Porque não é exatamente o objeto, embora a gente possa se dedicar um pouco mais nas políticas sociais do que outras áreas certamente. Isso talvez também seja uma diferença. A questão social não. Não exatamente, mas as políticas sim, até pelo espaço ocupacional que elas são para os Assistentes Sociais. Acho que as Ciências Sociais se preocupam menos com as políticas sociais exceto um grupo de pesquisa aqui, outro acolá, as vezes na Economia, as vezes na Ciência Política, mas ainda assim eu acho que nós temos um campo que eu não vou dizer que é próprio, porque não é, mas é um campo importante da pesquisa no âmbito do Serviço Social. (...) Acumulamos muito. Acho que a gente tem que capitalizar, disputar outros objetos mais para nós, a discussão da pobreza. Mas a gente está avançando nisso e isso tem a ver com a história dos sujeitos, as condições de vida. Então, assim, o que eu acho que faz a diferença mesmo é a referência analítica, essa idéia de que nós fazemos uma pesquisa engajada para iluminar aspectos da realidade , no sentido de produzir transformações.” (Elaine Rossetti Behring)

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Outro traço marcante da pesquisa em nossa área é o “engajamento

político”. Uma pesquisa que não é neutra, mas comprometida com o “projeto

societário” defendido pela categoria que hegemonicamente se sustenta na

tradição marxista. Os valores defendidos pela categoria, que priorizam defesa

da democracia, do pluralismo teórico – metodológico e da justiça social dão

relevância social às nossas pesquisas.

O acúmulo do conhecimento sobre as políticas públicas lhe permite

“disputar outros objetos” no campo das Ciências Sociais, inaugurando

discussões e debates que têm sua originalidade não no objeto em si – a

questão social - , mas no tratamento teórico – metodológico dado a um objeto

que pode ser comum à várias áreas de conhecimento. Nos aproximamos deste

objeto de forma gradual e processual, acompanhando as transformações

societárias, através da intervenção cotidiana e da pesquisa sistemática.

“Acho que eu não sou capaz de dizer. Eu não sou capaz de dizer, eu acho que aí, na verdade, nós temos muitas modalidades. Nós estamos acabando de fazer pelo Núcleo de Seguridade Social um levantamento de toda produção na área de Assistência Social e aí tem de tudo. Nós pegamos todos os arquivos, toda a produção, da primeira até 2004, são cerca de 200 teses e dissertações. E estamos terminando este trabalho pelo Núcleo de ver, exatamente este elenco de produção, desde seu objeto empírico, seu objetivo e eu acho que é muito difícil a gente dizer esta particularidade. Eu seria tentada a dizer, não como particularidade, mas como uma característica que são pesquisas mais qualitativas do que quantitativas. Mas não porque eu acho que no Serviço Social a particularidade é o qualitativo, eu acho que é muito mais por um não domínio do quantitativo do que propriamente que a particularidade seja o qualitativo, deste ponto de vista. Então, eu diria que do ponto de vista do método, é claro que como nós estamos falando em relações sociais, em relações humanas, digamos elas são pesquisas relacionais, elas são estudos sobre vínculos, elas têm inserção históricas, elas não se localizam num laboratório, numa proveta, elas não trabalham com elementos químicos, elas não trabalham com equações matemáticas pré – definidas, elas são construções históricas, elas têm valores. Então, se eu pudesse dizer, eu diria muito mais por este campo, se eu tivesse

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que dizer numa distinção de outras investigações, mas muito mais pelo caráter complexo e de uma construção desde o cotidiano, com variáveis que não são, absolutamente, todas seguras e determinadas como eu poderia ter, digamos, numa pesquisa química num laboratório. Então, não creio, embora no DNA você até consiga separar os genes e as moléculas, não sei, se isto um dia, se poderá dizer o mesmo das relações sociais. Eu não sei se elas são passíveis de uma redução no processo de compreensão a este grau. Não sei.” (Aldaíza Sposati)

Em relação ao processo de exposição das pesquisas desenvolvidas pelo

Serviço Social, é difícil afirmar qual a sua particularidade. Tem sido

recorrente o apoio em metodologias que privilegiam a pesquisa de natureza

“qualitativa”. No entanto, muitas vezes por problemas relacionados à formação

acadêmica, isto pode indicar dificuldade quanto ao “domínio” da pesquisa

quantitativa. Não podemos esquecer que a complexidade dos fenômenos

sociais podem requerer tratamentos quantitativos e qualitativos e que devemos

“... perceber com clareza e afirmar com convicção que a relação entre

pesquisa quantitativa e qualitativa não é de oposição, mas de

complementaridade e de articulação.” (MARTINELLI, 1994, p. 17)

Em se tratando do objeto de atenção profissional, a exemplo da

Assistência Social, citada por Aldaíza Sposati, as pesquisas revelam múltiplos

desdobramentos, o que na verdade revela a complexidade desta questão no

contexto das Políticas Públicas.

A particularidade da pesquisa pode estar justamente no fato de que um

fenômeno, cuja natureza é social, exige para sua compreensão a inserção no

contexto das “relações sociais” e históricas. Relações impossíveis de serem

isoladas a partir de suas “variáveis”. Para compreendê-las somente em suas

relações dinâmicas e como “construções históricas” decorrentes do

capitalismo.

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“É, mas, por isso que eu estou te dizendo, este estudo que nós fizemos aqui da pesquisa no campo da política de Assistência Social tem de tudo, de tudo, desde o exame de um benefício “x” não sei onde até sei lá, tem de tudo, uma mudança institucional, a formação dos conselhos, tem de tudo. Então, conseguir reduzir, a chave heurística, eu vejo difícil, até porque eu acho que a pesquisa, hoje, no Serviço Social está , ainda, muito amarrada aos cursos de pós - graduação e às exigências do ensino do Serviço Social de acordo com a Universidade ou com a faculdade, ou com a Escola em que ele ocorra. Desse ponto de vista eu não entendo que exista uma disseminação, propriamente, da pesquisa em Serviço Social fora das relações da academia e dentro das relações da academia ela vai ficar muito subordinada ao objeto de estudo que o pesquisador elege pra sua titulação, que em geral sai muito mais de uma reflexão que lhe é mais próxima, do que uma relação de decodificação de algo numa compreensão mais genérica. Eu creio que, quando, inclusive, estava discutindo com algumas pessoas - eu não estive – mas ao comentário de que o último Congresso lá em Fortaleza discutiu muito pouco do Serviço Social e muito mais generalidade, talvez você saia de um Congresso dizendo: bem, e qual é o grande mote que está posto em questão a investigar? Eu até perguntei a alguns profissionais, mas qual é a palavra de ordem desse Congresso? Ah! É a questão do direito. Mas essa é uma palavra de ordem um pouco velha, mas o quê no direito? Ainda é muito genérico. Então, se a particularidade se põem pelo objeto e pelas formas de abordá-lo, acho que estas múltiplas expressões as questão, das políticas, sei lá, é muita coisa e muito dos objetos que o Assistente Social, como pesquisador, vai analisar, são também, analisados por outros pesquisadores, por outras áreas profissionais e até nós temos profissionais de outras áreas que vêm fazer o pós no Serviço Social e desenvolver pesquisas em Serviço Social de objetos que têm a ver, até, com a sua inter-relação daquela área com o Serviço Social, do que seja um nascimento unívoco do Serviço Social. E eu diria, diante da complexidade do social se a gente pode ter um objeto puro no social que seja de uma área específica. Eu creio que nós estamos com muitas poucas demandas claras, assertivas de investigação pra orientar a pesquisa em Serviço Social. Eu acho que nós temos tido muito pouco debate sobre o Serviço Social pra ter uma agenda de questões a orientar as investigações. Elas estão, extremamente, eu diria, fragmentadas nos vários interesses.” (Aldaíza Sposati)

Qual a “chave heurística”, que permitiria desvendar a particularidade da

pesquisa em Serviço Social?

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O depoimento de Aldaíza Sposati revela uma preocupação merecedora de

reflexão pelo conjunto da categoria profissional: “estamos com poucas

demandas claras, assertivas de investigação pra orientar as pesquisas em

Serviço Social.” Consideramos que isto se deve, em primeiro lugar, às

múltiplas manifestações da questão social e que em realidades singulares é

apreendida em dimensões que nem sempre dão conta da sua totalidade. Outro

aspecto é que esse nosso objeto de atenção, tanto no âmbito da prática como

no da investigação, é multifacetado, complexo e fruto de determinações

históricas.

Aldaíza Sposati levanta, como exemplo da pouca visibilidade à prática

profissional como sustentadoras de nossas investigações, o XI Congresso

Brasileiro de Assistentes Sociais – CBAS – realizado em Fortaleza, Ceará

entre os dias 17 e 22 de outubro de 2004. Este “Congresso” reuniu 3.180 51

Assistentes Sociais de todo o país e teve como tema “ O Serviço Social e a

Esfera pública: o desafio de construir, afirmar e consolidar direitos.”

Destinou-se a todos os profissionais da área, propondo as seguintes reflexões:

O acirramento da questão social e o redimensionamento do papel do Estado na garantia de um padrão de proteção social para os cidadãos brasileiros ampliam e colocam novos desafios no cotidiano profissional de milhares de assistentes sociais em todo o país. As novas demandas, geradas a partir da racionalidade do capitalismo contemporâneo, sem a superação de antigas contradições, aprofundam as desigualdades sociais. Esse cenário exige dos profissionais um processo permanente de reflexão teórico – crítica sobre sua intervenção na realidade, seja no aprofundamento de seus conhecimentos para uma melhor compreensão da dinâmica societária, seja na avaliação das possibilidades de implementação de ações inovadoras e resolutivas na busca e na garantia dos direitos. (XI CONGRESSO BRASILEIRO DE ASSISTENTES SOCIAIS, 2004)

51 IAMAMOTO (2005) traz os seguintes dados em relação ao XI Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais: participaram do Congresso 3.180 profissionais. Destes 2.434 são Assistentes Sociais e pesquisadores docentes; 618 são alunos da graduação e 128 da pós – graduação.; 1500 comunicações foram analisadas e aprovadas criteriosamente.

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A capacidade que o CBAS tem de mobilizar a participação de um número

significativo da categoria profissional em torno de uma temática tão ampla

como a dos direitos sociais, dificulta maior visibilidade da profissão através

de suas experiências em práticas profissionais que inovam em estratégias de

garantia de direitos. Talvez eventos de caráter local, regional ou mesmo

estadual, motivassem reflexões em torno do próprio exercício profissional, das

pesquisas decorrentes deste exercício. Enfim precisamos criar estratégias de

socialização de conhecimentos e experiências que aproximem discussões de

natureza macro – estrutural às realidades particulares dos Assistentes Sociais.

Mas não podemos negar que a participação expressiva da categoria no evento

demonstra avanços em relação à compreensão da pesquisa como uma

dimensão essencial ao exercício profissional.

Ainda caracteriza a pesquisa em nossa área a sua vinculação aos “cursos

de pós – graduação” e às “exigências do ensino” da profissão. A “disseminação”

dos resultados destas pesquisas ainda carece de maiores investimentos, tanto

através de publicações que alcance a categoria, quanto através de eventos e

processos formativos que extrapolem a academia. Ainda exige investimentos

em linhas de pesquisa que atendam as demandas concretas do exercício

profissional.

É neste contexto que se põem os desafios, que em nossa compreensão

contemplam aspectos da particularidade, pois movimentam novas buscas na

profissão e a superação de entraves ao exercício profissional. Enfrentar os

desafios é uma exigência da prática profissional, da academia e das

inquietações dos profissionais presentes nestes espaços.

“É eu acho que um desafio que eu vejo que é assim uma coisa muito clara, como categoria profissional, a gente diz muito que é a favor da cidadania, dos direitos sociais. Mas nem sempre se tem uma leitura teórica concreta da

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realidade social. Discurso ético – político é muito bom, mas tem que ter conhecimento, você tem que saber qual é o fundamento da desigualdade desse país, você tem que politizar a discussão da pobreza, politizar a discussão da assistência. Então eu acho que aí um dos grandes desafios é a profissão ser capaz de ser reconhecida como produtora de conhecimento (...) Porque o nosso argumento não é pra ser um argumento chinfrim, fraco. Tem que ser um argumento teórico. Isso é desafio. Eu acho que a categoria vai ter que ainda enfrentar isso. Porque a gente entende como, ainda, em algumas pesquisas, como parte teórica fazer o histórico. Histórico é histórico, não é debate teórico. Debate teórico é saber quais os conceitos, qual é a teoria de base dessa análise. Então eu acho que um dos desafios, pra gente se reconhecer, como produção de conhecimento, é a gente enfrentar um debate teórico. Eu acho que isso aí vai ter que ter. Formação teórica. É, eu acho assim, nós trabalhamos num quadro muito duro, muito perverso. Nós temos uma ética democrática, nós temos um projeto político voltado pra cidadania. Mas nem sempre a gente entende a natureza dos problemas. Não entende teoricamente, concretamente. Então isso dá uma fragilidade de argumento.” (Lúcia Cortes da Costa) Um desafio que se coloca à profissão é a formação consistente que

possibilite “leitura” crítica “da realidade social”. E construção de “argumentos”

que possibilite “enfrentar debate teórico” sobre questão social, políticas

públicas e prática profissional.

O projeto de formação profissional define como necessário à sustentação

do desenvolvimento de capacitação teórico – metodológica, ético – política e

técnico – operativa as seguintes diretrizes: 1- apreensão crítica do processo histórico como totalidade; 2- investigação sobre a formação histórica e os processos sociais contemporâneos que conformam a sociedade brasileira, no sentido de apreender as particularidades da constituição e desenvolvimento do capitalismo e do Serviço Social no País; 3- apreensão do significado social da profissão desvelando as possibilidades de ação contidas na realidade; 4- apreensão das demandas – consolidadas e emergentes – postas ao Serviço Social via mercado de trabalho, visando a formular respostas profissionais que potenciem o enfrentamento da questão social, considerando as novas articulações entre público e privado;

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5- exercício profissional cumprindo as competências e atribuições previstas na legislação profissional em vigor.(ABESS/CEDEPSS, 1997, p. 62)

Percebemos por estas diretrizes que competência teórica caminha junto

com princípios éticos e desenvolvimento da competências técnico –

operativas. Esta articulação imprime à profissão sustentação necessária para

superar fragilidades de argumentos e dificuldades de compreensão da

dinâmica societária. Portanto é desafio consolidar o projeto de formação

profissional e investir em renovação dos quadros que compõem a categoria em

diferentes campos de intervenção. Precisamos ter em mente que o

engajamento dos profissionais, que estão há muito tempo fora da academia,

ao projeto ético – político requer renovação de sua formação.

Neste caso o objetivo não é homogeneizar a formação dos profissionais,

mas possibilitar o acesso a um processo formativo continuado que instaure o

debate crítico da realidade profissional, tendo como eixo o pluralismo teórico

– metodológico.

“Olha eu acho que os desafios são vários . O primeiro, a formação teórica consistente para que se tenha um pesquisador preparado para morder a realidade. Então eu acho que isso aí é um processo diferente do que pensam as agências de fomento, é um processo de larga duração, que exige um processo de amadurecimento. Hoje com as diretrizes curriculares e etc, e, principalmente, nas Universidades Públicas com carga horária destinada para a pesquisa e constituição de grupos de pesquisa, esse processo está se iniciando na graduação, diferente da formação que eu tive. ... Eu vejo as minhas meninas lá e fico pensando nelas com 40 anos, elas vão arrasar, porque elas já são boas hoje. Então, assim, nesse sentido eu acho que um desafio é inclusive o próprio fortalecimento da Universidade Pública, esse crescimento indiscriminado das escolas particulares, aonde não vai acontecer uma formação profissional que garanta a pesquisa num lugar de destaque, até porque os professores vão ser horista, não vão ter carga horária para isso, isso me preocupa muitíssimo. É como um elemento que no futuro vai derruindo esse projeto de qualidade, que é o projeto ético – político profissional no Serviço

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Social brasileiro. Então eu acho que um grande desafio é a Universidade Pública....” (Elaine Rossetti Behring)

Novamente a “formação teórica” emerge como fundamental à

consolidação do status acadêmico do Serviço Social. Para tanto os rumos da

Universidade pública precisam ser discutidos. É neste contexto que o

ensino/extensão e pesquisa têm possibilidades de acontecer de forma

articulada e comprometida com a ampliação dos espaços públicos e de

socialização do saber.

“...A sociologia tem um status acadêmico muito grande. Porque eles produzem conhecimento. Eles tem um debate teórico forte. Nós já temos isso começado, já tem um... quer dizer o Serviço Social, hoje, já tem isso. Mas a gente ainda precisa amadurecer essa questão. Eu acho que ainda é um desafio até pra gente poder estar se inserindo de fato no debate acadêmico. E aí com reconhecimento de uma área de conhecimento e de saber. A gente produz conhecimento. Mas é um desafio isso. E aí a formação acadêmica é fundamental e os professores têm que fazer pesquisa. Dar aula faz parte, mas não é tudo. Você tem que fazer pesquisa. Pesquisa não é opção, é condição da prática acadêmica. Ou você faz pesquisa e essa pesquisa se volta pros objetos do Serviço Social ou você não pode ser docente. Não dá. Mesmo que você faça tua pesquisa via extensão, via.., mas você tem que ter prática investigativa. Porque senão você só reproduz conhecimento, vai ler livro pra aluno. Isso não é ser docente. Prática docente tem que ter pesquisa.” (Lúcia Cortes da Costa)

É no próprio contexto universitário que se criam mecanismos para que os

professores e alunos (graduação e pós – graduação) vivenciem o processo da

“pesquisa” como condição para o ensino. E no caso dos cursos de Serviço

Social, os objetos de investigação precisam trazer à tona a realidade da prática

profissional. Sejam pesquisas teóricas e/ou empíricas, precisam apreender os

impasses vividos pelos profissionais no contexto contemporâneo e colocá-los

em discussão. Nestes espaços as pesquisas, com dimensão extensionista e

participante, podem articular acadêmicos, profissionais e professores e

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otimizar o espaço acadêmico e o compromisso da categoria com a

consolidação de seu projeto ético – político.

“.... é a briga contra o aligeiramente da formação profissional, nesse sentido, é muito nefasta esse produtivismo que assola, que a Marilena Chauí chamou de Universidade operacional. Isso aí é muito complicado. Eu acho que a gente tem que agendar, aí principalmente no âmbito da ABEPSS, a defesa da Universidade Pública e contra esse produtivismo desenfreado e também botar um freio nessa... parece que Universidade privada agora está dando em árvore, uma loucura isso! E isso, no futuro, pode ser um obstáculo para essa qualidade que a gente vem conquistando, eu acho. Se não cuidar, inclusive, para que as escolas que já existem tenham qualidade, pelo menos um padrão mínimo de qualidade. Então, eu acho que esse é um campo de desafios. A qualificação teórica é outro desafio e aí tem uma disputa política – acadêmica a ser feita, em relação as abordagens descritivas, pós – modernas, que eu acho que acabam oferecendo análises da realidade que muitas vezes distorcem a própria realidade. Então esse tipo de pesquisa também, a que tem um diálogo crítico aí, que não significa, veja bem, uma relação sectária com outras perspectivas analíticas, porque elas produzem coisas. (...) Então, não estou aqui defendendo uma relação vertical, sectária, mas há que se fazer uma disputa política acadêmica, aí nesse campo das referências teóricas que orientam o processo de pesquisa. Então eu acho que esse é um campo de desafios também. Acho que pesquisas que tragam à luz os sujeitos, eu acho que a gente faz ainda poucas pesquisas nesse sentido, sei lá, eu me lembro de poucas. Tem a pesquisa da Marlise Vinagre também sobre a questão da violência contra a mulher, trabalhou com histórias de vidas. Mas são poucas pesquisas se a gente for mapear é o menos que poderia e deveria ser. Então eu acho que essa também é uma dificuldade e a outra dificuldade é de socializar na própria categoria essa produção de conhecimento, embora, assim, a gente tenha constituído um espaço interessante para isso, o Congresso Brasileiro agora está com 1.500 trabalhos, são todos da Universidade? Não. O Congresso tem uma natureza um pouco diferente do ENPESS, que é bem da Universidade. Eu não sei como é que está a qualidade desses trabalhos, mas é uma produção nunca dantes vista. Então, assim, eu acho que os Assistentes Sociais vêm sendo provocados pelo projeto ético – político profissional, provocados à reflexão, inclusive, às vezes, até para se contrapor ao próprio projeto e defender uma outra visão de profissão. Mas estão sendo provocados. Eu acho que isso já é um resultado desse crescimento.” (Elaine Rossetti Behring)

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Este depoimento levanta a necessidade da categoria, de forma organizada,

através de seus órgãos representativos combater o avanço da precarização do

ensino nas Universidades públicas e expansão do setor privado.

BOSCHETTI (2004, p. 19 – 20) apresenta dados significativos sobre o

crescimento do ensino privado no Brasil entre 1998 e 2003, período referente

ao encerramento do governo Fernando Henrique Cardoso e início do governo

Lula... ... Em 1998, existiam 6.950 cursos de graduação e, em 2003 já totalizavam 15.006. Neste período, foram criados em média 1.490 cursos por ano, 124 por mês e 4 novos cursos a cada dia. Num país onde apenas 9% da população entre 18 e 24 anos têm acesso ao ensino superior, esta expansão poderia significar uma importante medida de ampliação do acesso dos jovens ao ensino superior. O problema é que a aceleração na abertura de cursos, induzida governamentalmente, é uma tendência de crescimento forçado e orientado por uma tendência claramente neoliberal que prioriza o ensino superior privado e não a expansão do ensino público. Quanto aos cursos de Serviço Social, ainda a mesma autora levanta que

em abril de 2004, conforme dados do cadastro MEC/INEP, existiam 147

cursos autorizados e em funcionamento, sendo que destes 30 (20,4%) são de

instituições públicas e 117 (79,6%) são de instituições privadas. Destas 147

escolas é preocupante que “... apenas 87 estão filiadas à ABEPSS, conforme

foi sinalizado pela diretoria. Isso assinala para o grande número de cursos que

estão ausentes do debate sobre a formação profissional, organizado,

conduzido e socializado pela ABEPSS. ...” (BOSCHETTI, 2004, p.21)

Temos por tradição que é no espaço da universidade pública que

ensino, pesquisa e extensão tem bases para sua sustentação. O que não

significa ignorar que instituições particulares, não tenham compromisso com

o desenvolvimento de ensino de qualidade articulado à extensão e à pesquisa.

No entanto o desenfreado processo de criação de escolas particulares,

destinado a atender as demandas de mercado, e as dificuldades de controle e

avaliação sistemática dos projetos pedagógicos implantados por estas

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unidades de ensino, alertam para necessidade dos organismos competentes

avançarem em mecanismos de avaliação permanente do processo de formação

e sua necessária coerência com a orientação definida pela ABEPSS e

referendada pelo conjunto organizado e representativo da categoria

profissional.

Enquanto espaço plural e democrático de construção de conhecimento, é

no seio da universidade que deve ocorrer debates consistentes sobre as

perspectivas teóricas que sustentam a profissão. Dar visibilidade a este debate

é promissor. Só através do debate que o enfrentamento das divergências

teóricas que alimentam as pesquisas no Serviço Social vai acontecer.

Apesar dos desafios referentes à qualificação teórica dos profissionais,

observamos que em função dos avanços da produção de conhecimento da

profissão os alunos que são formados mais recentemente pela academia

possuem maiores possibilidades de sair da universidade com a perspectiva

teórico - crítica incorporado ao seu projeto pessoal e profissional, respaldando

suas práticas profissionais e fundamentando o exercício de suas atribuições e

competências, de forma a contribuir com o reconhecimento social e

acadêmico da profissão.

O depoimento em tela, também, traz à tona a importância do Congresso

Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS) e do Encontro Nacional de

Pesquisadores Serviço Social (ENPESS), como espaços de socialização do

saber. O CBAS abarca os profissionais, docentes e acadêmicos da graduação

e pós – graduação suas pesquisas e experiências. O ENPESS destina-se a

apresentar a produção científica da área. Independente da sua abrangência,

estes espaços possibilitam provocar reflexões sobre as perspectivas teórico –

metodológicas que sustentam as produções de pesquisa e as experiências

profissionais, bem como demonstram que a pesquisa tem sido colocada

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pelos profissionais como possibilidade efetiva de repensar práticas

profissionais e de amadurecimento intelectual da categoria através do

enfrentamento de questões que dizem respeito à natureza da profissão, seus

fundamentos históricos, teóricos e metodológicos.

“...Os entraves à pesquisa e os seus desafios revelam muito mais os limites da educação brasileira, sem recursos para a pesquisa, e as condições de trabalho dos pesquisadores – sem tempo disponível – do que a capacidade/incapacidade de desvelamento dos objetos da profissão, ou mesmo, um problema teórico-metodológico. Se de fato a pesquisa se realiza, se a política editorial se amplia e se a formação nos níveis de graduação e pós, colocam a relação entre profissão e realidade como prioritária, esta questão seria muito mais satisfatória. (...) (Ana Elisabete Mota)

Assim os “entraves” observados na pesquisa em Serviço Social referem-

se muito mais à realidade da Universidade brasileira, às restrições quanto aos

financiamentos para pesquisa e às dificuldades de publicação do que

propriamente à “capacidade” de produzir da área.

É fundamental trazer para o processo de formação profissional a relação

intervenção/pesquisa como “prioritária”, para que se sedimente esta

articulação e para que os desafios que estão presentes na prática profissional e

atravessam a realidade cotidiana do Assistente Social, possam encontrar

ressonância, mobilizando investimentos tanto na formação vinculada às

demandas profissionais, quanto em pesquisas que sejam propositivas e

alimentem a atitude investigativa do profissional. É preciso que o profissional

encontre nas pesquisas produzidas no meio acadêmico respostas às suas

indagações e sobre os limites que assolam a sua intervenção.Ou seja, o

conhecimento produzido precisa alimentar práticas concretas e profissionais

concretos que muitas vezes distanciados da academia demonstram uma

incapacidade de articular os fundamentos teóricos presentes em sua formação

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ao processo de compreensão da realidade, articulação necessária à construção

de propostas metodológicas que possam dar conta de enfrentar os desafios

contemporâneos que se colocam cotidianamente à prática profissional.

“Vivemos ainda hoje num ambiente de trabalho - e quem está mais diretamente na intervenção, eu pelo menos me deparo com muitos profissionais que estão insatisfeitos - em que os profissionais estão descontentes, e mais numa posição, ainda, daquele discurso de queixas sem ter claro a necessidade de estar desvendando a realidade para poder alterar a forma de trabalho. Você sempre coloca no outro, ou na instituição, ou na sua formação, no usuário e até pelo fato também da gente trabalhar com uma realidade social bastante bárbara, às vezes e isso acaba tendo um peso muito grande no nosso dia a dia, até no nosso emocional. Então acaba, por vezes, acontecendo uma reprodução desse discurso que chamamos de "discurso queixoso", mas que muitas vezes fica por aí, não produz um avanço. Muito pelo contrário, muitas vezes desmobiliza. Ou desmobiliza, ou induz a uma intervenção que se baseia mais no senso comum e até muitas vezes permeada de preconceitos.” (Eunice Teresinha Fávero)

Em relação à postura do profissional, Eunice Teresinha Fávero aponta

uma questão relevante. Trata-se do “discurso queixoso”, gerado por

insatisfação frente às condições de trabalho ou em relação às defasagens

decorrentes da formação profissional. Este discurso, muitas vezes, transfere

para a instituição, para a realidade social e para o próprio usuário as

responsabilidades dos entraves profissionais. Neste discurso o profissional

encontra razões para o imobilismo profissional ou para ações pautadas no

senso comum ou em valores pessoais.

Criar meios para que este profissional passe do discurso queixoso para

intervenções críticas nesta realidade é desafio para o conjunto da categoria

profissional, para seus órgãos representativos e para a academia.

“Mas eu penso que, por outro lado, eu estou percebendo que – eu falo de uma realidade mais limitada aqui em São Paulo, não tenho a visão do país todo –, eu

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percebo aqui que existe um número cada vez maior de profissionais que estão na intervenção e que estão buscando a pesquisa, a sistematização de conhecimentos a partir de questões postas no cotidiano de trabalho. A partir de impasses, a partir da descoberta da falta de sistematizações dentro da nossa área de formação a respeito daquela realidade ou de áreas afins. (...) Eu tenho percebido esse processo. Mas eu acho que ao mesmo tempo que isso é uma sinalização bastante positiva, por outro lado isso é novo ainda, até porque é muito recente a pesquisa no Serviço Social e a pesquisa por parte de profissionais que estão diretamente na intervenção é mais recente ainda. O que se percebe é que pelo fato das pessoas estarem durante muito tempo voltadas para intervenção, mas buscam a academia no sentido de aprofundar conhecimentos, sistematizar conhecimentos, se percebe uma certa fragilidade metodológica no tratamento das informações. O que eu acho que acaba, não prejudicando, mas acaba limitando um pouco esse conhecimento que poderia avançar muito mais. Mas eu penso que é um processo. Eu acho que a gente tem etapas num processo e a tendência talvez seja de que conseguiremos avançar. (...) Porque isso não é devidamente trabalhado na nossa formação. Pode estar sendo mais recentemente por algumas unidades de ensino, mas isso não é geral. Eu acho que grande parte das unidades de ensino não descobriu e não valoriza a pesquisa como um componente essencial do processo de trabalho, ou então transmite uma visão de que a pesquisa é algo amplo, grande, só acontecendo dentro da academia e não a pesquisa enquanto processo que pode ser incorporado no cotidiano de trabalho. Claro que com as limitações que isso pode colocar, mas é essencial.” (Eunice Teresinha Fávero)

O profissional inquieto com a sua intervenção tem buscado na pesquisa

alternativas para sistematizar conhecimentos que lhe faz falta no “cotidiano de

trabalho”. Como um primeiro passo, o processo de “sistematização” de

conhecimentos pode levar a buscas mais profundas de compreensão da

realidade e de meios para superar “impasses” profissionais. Então a pesquisa

tem sido requisição da prática profissional.

O caminho que se faz da intervenção à prática profissional exige rever o

próprio processo de formação e este caminho é recente para o profissional.

Em se tratando de pesquisa, a formação recebida está sustentada no modelo

clássico de investigação e num distanciamento entre pesquisa e prática

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profissional. No entanto o esforço individual do Assistente Social e o próprio

exercício da pesquisa tem renovado as relações entre pesquisa e intervenção.

Nesta relação o exercício da pesquisa vai superando o nível da sistematização

para o de construção de conhecimento, por uma exigência do exercício

profissional e por uma inquietação do próprio profissional.

“...Então esse processo de descoberta da pesquisa como essencial à intervenção, a gente percebe que isso é possível e que as pessoas ao descobrirem isso, começam a qualificar a intervenção. Então eu penso, não sei como, que temos que ter um investimento maior por meio de ABEPSS, dos Conselhos, de incorporar o que já é uma proposta do projeto contemporâneo da profissão. Mas criar mecanismo que possibilitem a pesquisa mais presente no cotidiano da intervenção. Penso que existe o espaço da academia, quer dizer são os profissionais que vão buscar a academia para avançar na sistematização de conhecimentos e qualificar sua intervenção, não só, mas com um desses objetivos, e existem espaços do próprio cotidiano da intervenção - temos que avançar no processo de incentivo à pesquisa como fundamental à intervenção. Eu não vejo outro caminho, ou um melhor caminho, para podermos qualificar o nosso trabalho enquanto profissional. Quer dizer nós temos um trabalho de intervenção, temos um trabalho de pesquisa que podem se complementar...” (Eunice Teresinha Fávero)

O “processo” da pesquisa envolve descoberta e criação, o que se faz

fazendo pesquisa e neste processo a qualificação da prática profissional se dá

de forma articulada. Não se trata de conseqüência imediata, pelo contrário se

trata de esforço que resulta em amadurecimento da capacidade intelectual e

das competências e habilidades necessárias ao domínio teórico e construção

metodológica coerente com a natureza do objeto de estudo. Processo que

exige grande investimento pessoal e formação adequada. Experiência rica

como esta, no caso do Serviço Social, precisa estar vinculada ao “cotidiano da

intervenção”. Reforçamos que a prática profissional é o campo empírico fértil

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para a pesquisa, enquanto a academia precisa fomentar a formação de

pesquisadores comprometidos com esta prática.

“...Eu penso que temos alguns desafios, que é esse investimento na pesquisa como parte fundamental da intervenção – fundamental no sentido mesmo de fundamentar a intervenção - , a possibilidade de criação e de acesso à formação, seja em aperfeiçoamento, seja em especialização, a essa formação continuada. Bom a pós – graduação, não só em nível de mestrado e de doutorado, e acho que mesmo em mestrado e doutorado, precisaria ter um investimento maior na formação de pesquisadores. Porque a ênfase foi durante muito tempo a formação mais de docentes, do que de pesquisadores. Não sei se eu estou falando besteira. Mas de repente é um pouco isso, você faz mestrado e doutorado para poder lecionar ou continuar dando aula na Universidade ou ter possibilidades de ingressar numa Universidade. Obviamente na Universidade você poderá trabalhar com pesquisa, mas não necessariamente, principalmente nas particulares que proliferam aí e que, geralmente, não se preocupam com investimento em pesquisa, com raras exceções. Não é o caso da PUC-SP, que tem um diferencial, mas grande parte das particulares não tem essa preocupação. Então eu penso que esse espaço da academia tinha que ter uma ênfase maior na formação de pesquisadores. Eu sei que é intrínseco ao processo de um mestrado e do doutorado a formação em pesquisa, mas muitas vezes o profissional sai mais direcionado para a docência do que para a pesquisa. Eu considero que são desafios, não que isso não esteja acontecendo. Estão acontecendo algumas experiências, mas isto precisaria ser absorvido e ser encampado pela ABEPSS, por diversos órgãos, pelo Conselho Federal, no sentido de estar enfatizando mais a importância... Então a pesquisa, a formação continuada e o retorno disso, é fazer com que efetivamente a realidade social dos sujeitos venha à tona por meio das nossas pesquisas e que isso contribua para a formulação de projetos, de políticas públicas, é fazer com que esse conhecimento através da formulação de projetos ou de outras formas as mais diversas retorne qualitativamente para a intervenção, e investir na formação e na capacitação. E a pesquisa ser realmente incorporada como essencial à intervenção. Posso estar querendo muito. Mas acho que nós temos que descobrir que não podemos trabalhar sem fazer pesquisa, e desvincular essa visão de pesquisa como algo externo ao trabalho, como algo específico da academia; tem que ser algo inerente ao trabalho. Está posto no nosso projeto profissional, mas nós temos que concretizar, que operacionalizar isso. Penso

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que para isso a academia tem um papel fundamental, os cursos de graduação têm que ter essa consciência ...” (Eunice Teresinha Fávero)

Em função da particularidade da pesquisa no Serviço Social, a pós –

graduação hoje não se constitui apenas espaço de formação de docentes e de

intelectuais, amplia-se para formar profissionais com perfil de “pesquisador”.

Um profissional que ocupe diferentes espaços interventivos e nestes espaços

comprometa-se com a realização de pesquisas que fundamente o

reconhecimento das demandas sociais e possibilite a “formulação” de

“políticas” e “projetos sociais”. Desta forma, a pesquisa deixa de ser externa à

prática profissional ou restrita ao meio acadêmico.

“E isso passa pelos campos de estágio, pelo TCC, como você já lembrou, e pelo conjunto das disciplinas da graduação. Eu valorizo bastante a nossa profissão, sabe, eu acho que temos um potencial e uma possibilidade de construção de conhecimento muito grande e que, de maneira geral, nem sempre temos essa consciência. Isso tinha que ser incorporado no cotidiano mesmo dos profissionais que estão na intervenção, e que são a grande maioria, que estão no dia-a-dia lidando diretamente, seja fazendo estudo social de determinada situação, seja lidando com medidas sócio – educativas, trabalhando com crianças, com adolescentes, com famílias, com populações. Você está cotidianamente em contato com dados essenciais que poderiam ser propulsores, poderiam alavancar – na medida em que fossem sistematizados , poderiam contribuir para alterações da realidade. Acho que isso tem que ser descoberto. Tenho que descobrir que, de repente, a minha pesquisa por pequena, pequena no sentido de ser mais localizada no meu espaço de trabalho, vai contribuir para uma qualificação daquele trabalho.”(Eunice Teresinha Fávero)

Articular pesquisa e prática profissional ainda é desafio a ser conquistado,

e isso passa pelo processo de formação profissional que tem suas raízes na

graduação, nas primeiras experiências em monografias acadêmicas, em

especial nos trabalhos de conclusão de curso e na vinculação deste com a

experiência de estágio acadêmico. É neste período que formamos

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profissionais envolvidos com a profissão e conscientes de sua participação no

reconhecimento do Serviço Social. É no cotidiano que esse reconhecimento

acontece, nas diferentes possibilidades de intervenção junto ao usuário e é

neste cotidiano que a matéria prima das pesquisas emerge e impulsiona

conhecimentos capazes de alterar a realidade.

“Eu acho que esse momento é importantíssimo. Eu lamento que eu não tenha vivido essa provocação desde a graduação. Assim, eu vejo lá na UERJ a formação dos nossos alunos, a gente tem muitos alunos envolvidos com pesquisa. E a qualidade desses alunos é indiscutível, eles rapidamente se inserem no mercado de trabalho. E onde estão trabalhando são inquietos, porque quando você planta o espírito da pesquisa no coração, porque é isso, para gente fazer coisas interessantes a gente tem que estar apaixonado, isso é o Gramsci que falou com muita propriedade. Quando você planta aquela curiosidade, aquela inquietude, porque a pesquisa é uma inquietação, ela pode ser uma inquietação pela questão “x”ou “y” que te mobiliza, mas ela é uma inquietação. Quando a gente bota a turma para fazer pesquisa e cria esse espírito inquieto, isso é muito importante, para que ele seja um inquieto, um profissional inquieto e aí consiga, inclusive, resistir à rotina institucional que é muito massacrante e realizar bons projetos de trabalho. Eu vejo, assim, com otimismo o que está acontecendo nas Universidades Públicas, mesmo com todos os limites que são muitos: não tem bolsas suficientes para todos os alunos, nem todo mundo consegue se inserir em pesquisas, tem os limites materiais, na universidade pública está sufocada, materialmente sufocada. Agora, nesse âmbito, está acontecendo uma formação de um profissional inquieto, inclusive, ele está em contato com as diferenças, com as divergências da própria visão de profissão. (...) (Elaine Rossetti Behring)

É na “graduação” que os alunos são provocados e desenvolvem uma certa

paixão pela pesquisa ou um certo distanciamento da mesma, pela dificuldade

de articular a dinâmica da pesquisa à dinâmica da prática profissional. Um

aluno que tem a possibilidade de desenvolver o espírito investigativo e de

exercitar a pesquisa de forma a articulada à experiência concreta de práticas

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profissionais tem possibilidades de manter viva a inquietação como um

recurso necessário para enfrentar desafios da profissão, “resistir à rotina

institucional” e propor “projetos” de qualidade e com consistência.

As diretrizes curriculares proposta pela ABEPSS preconizam ...que a atitude investigativa e interpretativa dos discentes e docentes deve ser estimulada e estruturar todo o processo de formação, não devendo ser vista apenas como um momento específico do currículo, em uma única disciplina de pesquisa, por exemplo. Esse princípio deve se materializar através da articulação do ensino, pesquisa e extensão, que deve ser eixo estruturador das disciplinas e dos núcleos de estudo. Nesse sentido, a pesquisa deve ser entendida como estratégia contínua de formação, de modo a permitir ao aluno exercitar a dimensão investigativa durante todo seu processo formativo e não apenas ter contato com a pesquisa em uma única disciplina. (BOSCHETTI, 2004, p. 29) Nesta perspectiva ... O caráter interventivo da profissão deve estar presente em todo o currículo, isto é, todos os conteúdos do currículo devem ser a base para formar um profissional que vai intervir na realidade. Assim, os conteúdos de todas as disciplinas devem ter a preocupação de mostrar a vinculação entre teoria, realidade e as possibilidades de intervenção profissional em diferentes contextos e momentos históricos. Há uma intenção, com esse princípio, tanto de articulação entre estágio, disciplinas, preparação para o TCC e a vida profissional, quanto de articulação entre graduação e pós – graduação naqueles cursos que possuem estes dois níveis de formação. (BOSCHETTI, 2004, p. 29 - 30) Preocupadas com a formação profissional as participantes da pesquisa

levantaram as interferências do MEC nas diretrizes curriculares...

“... Aí a tendência não é formar profissionais inquietos. O que o MEC fez com as nossas diretrizes? Tirou a dimensão ética para botar informática. Se a ABEPSS não tem a força institucional e política de legitimidade que tem, as diretrizes estavam perdidas, porque em 2001 o MEC foi lá acabou com as matérias e com toda a direção social e ética que estava presente nas diretrizes. Quando uma escolinha dessas está sendo criada vai lá e procura o documento do MEC vai criar o curso à sua imagem e semelhança daquilo que está lá, esvaziado de conteúdo e de direção sócio – política e dimensão ético – política.” (Elaine Rossetti Berhing)

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A partir das (e por causa das) tendências que vêm orientando a política nacional de educação superior, no momento de aprovação das diretrizes curriculares pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), em 2001, estas foram esvaziadas da concepção original de formação crítica presente nas diretrizes curriculares aprovadas pela ABEPSS e pelas unidades de ensino em 1996. Os pareceres e a resolução do CNE aprovando o currículo do Serviço Social, emitidos em 2001 e 2002, após anos de análise ( a ABEPSS encaminhou as diretrizes curriculares ao MEC no início de 1997), reduziram drasticamente o projeto pedagógico que constava nas diretrizes curriculares da própria ABEPSS. Não devemos entender essa redução drástica como mera simplificação e mera formatação padrão de todos os currículos. Considero que, por trás dessa simplificação, está um projeto de formação conflitante com a proposta de formação do Serviço Social, construído coletivamente pelas entidades a partir da ação da ABEPSS. ... (BOSCHETTI, 2004, p. 22 – 23) IAMAMOTO (2002) avalia que as restrições sofridas pelas diretrizes

curriculares interfere nos conteúdos básicos e descaracteriza a proposta

naquilo que ela tem de essencial, ou seja, a direção social da formação

profissional, que materializa os valores presentes no projeto ético – político

profissional e a base de conhecimentos e habilidades necessários ao

desempenho da profissão. Desta forma o conteúdo essencial à formação

profissional fica submetido à livre iniciativa das unidades de ensino públicas

ou privadas.

O grande desafio que se coloca às entidades representativas da categoria é

a recuperação dos conteúdos necessários à formação profissional, preservando

a proposta original e acompanhamento rigoroso da implementação da

proposta nas unidades de ensino.

Estar atento ao processo de formação é essencial, pois deste processo

continuado teremos profissionais preparados para enfrentar as requisições da

prática profissional.

“O principal desafio é vencer a prática descomprometida com a transformação social. É romper com a prática acrítica; é conceber a pesquisa como fundamental a prática profissional que transcende o imediato e identifica mediações que possibilitam o entendimento da complexidade sócio-histórica da

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realidade geradora das questões sociais e indica caminhos para a solução dos problemas.” (Aglair Alencar Setubal)

FALEIROS (2000, p. 170) alerta que a compreensão das profundas

transformações pelas quais passa a realidade exige investimento em pesquisa e

aprendizagem como processos permanentes. Pesquisa e aprendizado são

condições para o desenvolvimento da perspectiva crítica tão necessária a uma

“prática comprometida”.

A perspectiva crítica, de fato, pressupõe desafios, e o principal é, justamente, o de desenvolver a prática crítica, ou seja, as estratégias de ação adequadas ao pensamento crítico. Alguns obstáculos a esta construção podem advir da própria fraqueza da formação crítica, da força ou do poder das instituições que engole os profissionais na sua lógica, da falta de articulação dos profissionais, da própria inserção subordinada do Serviço Social na divisão social e técnica do trabalho, assim como dos conflitos entre esta concepção e os ditames do capital e dos conflitos entre saberes, mas precisam ser superados conceitual e estrategicamente. A pesquisa nesta perspectiva é elemento central de formação, pois

possibilita não reproduzir conhecimentos já acumulados pela profissão, mas

sobretudo reconstruí-los tendo como base material a própria dinâmica da

profissão e as relações estabelecidas com os objetos de intervenção. Para

tanto o próprio processo de pesquisa precisa ser criativo, ampliando as

possibilidades do exercício da autonomia. “...Por isso mesmo, seguindo as

orientações da ABEPSS, é preciso formar pessoas que saibam intervir,

pensar e pesquisar. ...” ( FALEIROS, 2000, p. 173)

“...Não dá pra trabalhar só naquela idéia de pesquisa documental, bibliográfica, a gente tem que ter inserções mais ousadas. Eu vejo essa parte de territorialização, de softwares, de dados estatísticos, a economia trabalha muito com a questão de modelagens, de modelos econômicos. Nós temos que trabalhar muito com contato direto com a realidade. E aí ousar usar instrumentos que hoje estão disponíveis pra isso. Que a gente tem um pouco de medo de.. a gente ficar meio alheio. Nunca fiz, tem que fazer. É vai, vai

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fazendo e errando até fazer direito. É porque os outros também fazem assim. Então eu acho que é isso, a gente tem que saber que está aprendendo.” (Lúcia Cortes da Costa)

O profissional requisitado no contexto contemporâneo precisa dominar

o conjunto dos instrumentais necessários ao desenvolvimento das pesquisas e

que estejam articulados aos avanços obtidos pela ciência em relação ao

arcabouço teórico – metodológico que orienta a formação e o processo de

construção de conhecimento na área. Precisa demonstrar habilidades, talento

e capacidade crítica para reconstruir instrumentos de investigação e não,

simplesmente reproduzi-los, conforme orientação dos manuais de pesquisa.

Para isto é preciso que a pesquisa, no âmbito da formação profissional,

em nível de graduação e pós – graduação receba tratamento rigoroso.

Tendo como base essa formação, o profissional pode “ter inserções mais

ousadas” e contribuir com o conjunto do processo de acúmulo de

conhecimento no Serviço Social através de processos de investigação que

possam dar conta da dinâmica relação sujeito/objeto em contextos que

requisitam alternativas mais criativas e articuladas aos avanços tecnológicos.

Desta forma colocando instrumentos e tecnologias à serviço de uma pesquisa

comprometida socialmente.

“Eu acredito que, claro, nem todos os profissionais estão na academia ou dando aula ou sendo pesquisadores. Existiu um dado momento na categoria profissional que uma das formas que se entendia que era resolver, era você ser planejador. Uma segunda onda foi você ser pesquisador. Tanto que nós tivemos um momento de muita fluência, de criação, de um boom, de institutos de pesquisas e coisas do gênero, de encontros de pesquisa. Até de uma derivação da idéia de que uma boa prática exigia um bom diagnóstico e que um bom diagnóstico exigia um conhecimento da realidade. Claro que é uma construção correta essa que foi disseminada. Todavia, eu acho que esta questão que eu dizia desse boom, esse estímulo contínuo do conhecimento da

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realidade não está presente, em geral, na dinâmica das várias instituições que absorvem a prática do profissional. Nos parece que muitas vezes o profissional fica em ações pontuais, na porta de entrada de alguns serviços e onde ele, na verdade, apesar de estar na porta de entrada, não chega a fazer as inter-relações, os vínculos, não sei. Eu acho que quando você diz que desafios isto traz à profissão considerando a complexidade sócio – histórica da realidade geradora do objeto de atenção profissional, isto é, se eu for entender como o objeto de atenção profissional as manifestações da questão social, as manifestações, além de múltiplas, são históricas e elas também são espaciais e elas têm expressões conjunturais. Então, eu penso que, exatamente, o desafio é decodificar essa complexidade, não na sua simplificação, mas na sua compreensão, de entender porque vínculos passam, ainda que as manifestações sejam múltiplas, existem raízes fundantes dessas manifestações, como existem rupturas. Eu acho que o que eu tenho tentado dizer é isso aqui, eu acho que não dá pra gente pensar que todas as coisas sofrem um determinismo e que as vezes quando a gente fala em manifestação da questão social todos então... então o denominador da equação é questão social, logo se é questão social tudo chega a isso, é de um simplismo muito grande que não apanha essa complexidade..... ...... o principal o desafio da pesquisa é dar conta da realidade, é produzir conhecimento sobre a realidade, mas numa pauta ético – política, essa coisa toda, entendeu? “(Aldaíza Sposati)

Precisamos reconhecer que a pesquisa, embora seja uma demanda da

profissão, ela se desenvolve e com maior intensidade e freqüência no contexto

da academia ou através do desempenho profissional de docentes nas unidades

de ensino, ou como exigência do processo de formação na pós – graduação.

Muitos profissionais, por problemas referentes à sua formação acadêmica, ou

por restrições presentes nas instituições em que trabalham, acabam limitando-

se à execução de “ações pontuais” e à sistematização de rotinas e informações

cotidianas coletadas junto aos usuários dos seus serviços.

Então do conjunto da categoria profissional nem todos são

“pesquisadores”. Nem essa é a intenção. O desafio que se coloca é criar

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processos de capacitação continuada e de permanente reflexão sobre a

prática profissional de forma a gerar a necessidade de se fazer pesquisa.

Neste caso a pesquisa deixa de ser apenas instrumento de intervenção, e,

sim, passa a ser constituinte da prática profissional, pois é ela que possibilita a

“decodificação” da “complexidade” das expressões da questão social. Então o

objetivo não é apenas sistematizar conhecimento. Embora esse seja um nível

relevante ao processo investigativo. O objetivo da pesquisa é gerar

conhecimento, reconstruir práticas profissionais, renovar referenciais teórico –

metodológicos, ou seja “dar conta da realidade, produzir conhecimento sobre a

realidade, mas numa pauta ético – política...”

“É porque isso exige a passagem do imediatismo. É aquilo que eu digo, eu acho que aquilo, as situações que são objeto de investigação no Serviço Social não tem, primeiro, um estatuto diferenciado na academia; elas são do departamento da divisão, não da multiplicação; elas são, sobretudo, do campo do valor e da ética. E isto, nem sempre trabalha no mesmo padrão, nem do dinheiro das pesquisas, a pesquisa que rende dinheiro, portanto que multiplica tem sempre mais recursos e condições do que a pesquisa que divide, que redistribui. Então eu acho que existe uma conjugação de coisas, tem uma estimulação toda que precisa ser feita.” (Aldaíza Sposati)

Importante refletirmos sobre dois aspectos presentes no depoimento

acima. Este conhecimento almejado pelo Serviço Social e que se faz com

investimento em formação e pesquisa sistemática da realidade que abarca o

profissional implica em desenvolvimento de crítica radical à realidade e ao

cotidiano da prática profissional. Precisamente, pelas suas propriedades constitutivas, vemos que à crítica radical subjaz o conhecimento que supera a imediatez em dois níveis: 1) um conhecimento que vá além da aparência imediata; 2) um conhecimento que vá além da sua utilização imediata, que não seja meramente instrumental, operatório, mas ao contrário, que seja mediatizado por uma racionalidade dialética; conhecimento que parta do empírico, da faticidade, visando apanhar a sua lógica imanente e reproduzi-la a nível do pensamento, visando capturar o movimento de constituição,

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desenvolvimentos e tendências dos fatos, fenômenos e processos reais, da maneira mais aproximada possível. ...(GUERRA, 1997, p.20) Nesta perspectiva em que se produz conhecimento no Serviço Social a

busca da compreensão do objeto de atenção profissional adquire “estatuto

diferenciado” para a profissão. Embora no campo das Ciências Sociais e

Humanas dedicar-se ao estudo da questão social - compreendê-la em suas

múltiplas expressões, respeitando particularidades e singularidades em

contextos da intervenção profissional - não tenha expressão significativa, no

que se refere ao Serviço Social aponta para um horizonte de desvelamento

das estratégias necessárias para romper com a lógica do empobrecimento, dos

processos de exclusão social e agravamento da condição de subalternidade

cultural, econômica e social da população. Assim, concordamos com Aldaíza

Sposati que a pesquisa em Serviço Social é do “departamento da divisão”,

portanto tem compromisso com “ redistribuição” de renda, dos bens, serviços

e conhecimentos, acumulados socialmente através do trabalho.

Compreender essa dimensão da pesquisa para o Serviço Social é

desafiante para a categoria. Não basta termos esta perspectiva ética enquanto

discurso é preciso incorporá-la ao processo da formação e prática

profissional.

(...) A gente não tem uma tradição de estudos mais organizados no nosso meio profissional. Estudos mais organizados no sentido de grupos localizados, espalhados em diversos espaços que possam acompanhar. Acho que o espaço que a gente tem hoje e que poderia facilitar a divulgação do conhecimento são os Conselhos, nós não temos outros. Nós não temos uma sindicalização da categoria, nem por ramo de atividade que é o que hoje se coloca no meio profissional e nem por categoria. Nós temos muito pouco em termos de organização político-sindical na nossa categoria. A nossa organização se dá por meio dos Conselhos e no caso da academia por meio da ABEPSS e outras organizações. Eu acho que ainda que tenham ocorrido muitos avanços, é ainda muito frágil essa organização, no que poderia ser um espaço de divulgação.

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Então eu penso que os Conselhos teriam que investir mais nesse processo de divulgação de conhecimento. Seria uma possibilidade de acesso mais próximo dos profissionais. Porque a academia, enquanto um espaço de produção de conhecimento no Mestrado e Doutorado, acaba ficando distante mesmo da grande parte dos profissionais. E às vezes acaba até sendo construída uma imagem de que a academia está aqui, a intervenção está lá e uma coisa não tem relação com a outra, que infelizmente a gente ouve. Como se a produção de conhecimento não fosse fundamental para o exercício profissional. Agora não sei, temos que pensar em mecanismos para fazer as produções chegarem aos profissionais. O que percebemos é um distanciamento muito grande de grande parte dos profissionais que estão na intervenção do que está sendo produzido. A gente vê hoje o que? Se tem acesso à Revista, por exemplo, Serviço Social e Sociedade, que acho que é um canal que chega aos profissionais. Mas penso que é o único, hoje, que tem uma abrangência maior. Por vezes nem quem está mais próximo da academia não tem conhecimento do que está sendo produzido nos outros cantos do país, devida à imensidão deste país, que dirá o profissional que está mais distante. Então, dar este salto para que a produção tenha um retorno efetivo para o profissional que está na intervenção e, consequentemente, para os sujeitos com os quais os profissionais trabalham é um desafio que temos que buscar superar. Eu penso que a organização política é fundamental. No nosso caso específico do Tribunal, com a nossa organização em Associação, temos conseguido criar um espaço de divulgação da produção de conhecimento. E isso tem sido feito através de Jornal, através de site, através de e-mail e, mais recentemente, através de alguns encontros regionais que estamos começando a organizar. São formas que a gente tem que criar. Eu acho que o Conselho Regional ... o Rio tem uma experiência bastante interessante nesse sentido: além da criação de grupos de estudos de determinadas áreas - que existem aqui em São Paulo também, não sei como é no Paraná -, ele investe no que chama de mini – cursos. Então ele realiza periodicamente cursos rápidos, em várias regiões do Estado, em que aglutina os profissionais e, a partir daí, se tem uma discussão mais teórica e relacionada a temas específicos da intervenção. Esse conhecimento pode não chegar, ainda, como deveria chegar. Mas eu acho que nós temos que buscar mais canais para isso. (Eunice Teresinha Fávero)

Observamos neste depoimento a importância dos órgãos representativos

da categoria profissional e das unidades de ensino, como CFESS e CRESS e

da ABEPSS, no sentido de articular profissionais, docentes e discentes num

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processo de construção coletiva de espaços de reflexão da prática profissional.

Eunice Teresinha Fávero sugere a construção de “grupos de estudos” ou de

“mini - cursos”, tendo o CRESS como articulador, devido ao nível de

proximidade que tem com os profissionais.Seriam alternativas de socialização

do conhecimento produzido no âmbito acadêmico, extrapolando aqueles

restritos a este meio - como é o caso das revistas científicas. Como exemplo,

podemos lembrar do “Curso Ética em Movimento”, proposição do conjunto

CFESS/CRESS, que tem ocorrido frequentemente nos diferentes Estados

brasileiros, com o objetivo de “...discutir a ética profissional e fortalecer a

direção social da profissão.” (BOLETIM INFORMATIVO, CRESS/Pr, 2004)

Estas estratégias poderiam contribuir para aproximar academia (graduação e

pós – graduação) dos profissionais que estão intervindo nas organizações

sociais estatais ou privadas, possibilitando processo de rompimento dos

tradicionais mecanismos de distanciamento entre estes segmentos que

compõem a mesma categoria de profissionais.

Trata-se da “organização política” como “fundamental” para a

materialização do projeto ético político profissional em consonância com o

projeto de formação profissional.

Neste aspecto destaca-se no depoimento abaixo o papel do CFESS:

“Bom, o CFESS não faz até como tarefa precípua, ele não tem esse debate sobre a pesquisa. Onde eu acho que o CFESS interfere, nessa discussão é, primeiro, na defesa das diretrizes curriculares aonde a pesquisa é o eixo fundamental e a dimensão investigativa, ela não é uma matéria, ela é uma dimensão que atravessa o currículo inteiro. E o CFESS, inclusive, participou como assesssor da construção das diretrizes. Eu participava não como Professora da UERJ. Eu participei da construção das diretrizes como assessora do CFESS. Então eu acho que essa é uma dimensão. Uma outra, onde comparece a questão da pesquisa, foi o curso de capacitação à distância, que tem inclusive um módulo, que é o último, que é sobre a pesquisa, projeto de pesquisa, projeto de intervenção. Então, eu acho que aí a gente traduziu num

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projeto de capacitação continuada as preocupações gerais das diretrizes curriculares. E sempre em articulação com a ABEPSS, que é a entidade que reúne os pesquisadores. Esse é um tipo de dimensão de relação do CFESS, do conjunto CFESS/CRESS com a questão da pesquisa. Um outro, é exatamente a interlocução com os pesquisadores no sentido de que? Porque o CFESS, antes da mais nada, é uma organização política que valoriza a profissão e etc, mas que fez uma escolha de uma ação para fora. E daí entra toda a ação no campo das políticas de seguridade, no campo dos direitos humanos, na área da criança e da adolescência, nas relações internacionais. Então, o CFESS é uma entidade que tem buscado uma interlocução com os pesquisadores. Então, desde as atividades internas, mais de capacitação dos próprios conselheiros, de realização de discussões de ponta, para a gente poder interferir em algumas questões específicas, então, mais de uma vez nós convidamos pessoas para irem lá para Brasília para participar do pleno e fazer um debate sobre.... nós uma vez fizemos um Congresso interno sobre Seguridade, chamamos várias pessoas, pesquisadores do campo da Assistência, da Saúde, da Previdência Social, ou, eventualmente, participando de uma comissão – do Conselho Nacional de Saúde. Então, tem uma pesquisa interessante na Universidade de Brasília sobre Saúde Mental, chamamos o pesquisador para conversar, para ler... para ajudar a contribuir com o CFESS na produção do texto. Essa é uma outra dimensão, é a pesquisa que se realiza no Serviço Social subsidiando a ação política das entidades. É uma outra forma...” (Elaine Rossetti Behring)

“A Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social

(ABEPSS) e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) – articulados com

o Centro de Educação Aberta, Continuada, a Distância (CEAD), da

Universidade de Brasília...” ofereceu “...Curso de Capacitação em Serviço

Social e Política Social, na modalidade de educação à distância, dentro do

Programa de Capacitação Continuada para os Assistentes Sociais do país,

proposto pela categoria.” (A COORDENAÇÃO E AS CONSULTORAS,

Apresentação, 1999)

Este curso teve seu primeiro módulo lançado em 1999 e apresentou

como objetivo ...capacitar os assistentes sociais para uma compreensão da realidade brasileira e seus impactos no trabalho profissional – demandas, respostas e peculiaridades diante da

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questão social – objetivando a ampliação da competência teórica, política e técnica desses profissionais e do seu compromisso com a consolidação do projeto ético -político do Serviço Social na atualidade. (A COORDENAÇÃO E AS CONSULTORAS, Apresentação,1999) Como meio de socialização de conhecimento, este curso teve alcance

social muito grande, contribuindo para renovação da profissão, considerando o

número de profissionais envolvidos....

“...o Conselho envolveu 1.600, aproximadamente 1.600 Assistentes Sociais no Brasil inteiro, foi um curso de especialização. E ao final do curso, os alunos produziram um projeto de intervenção ou de pesquisa. O objetivo do curso é uma atualização geral dos Assistentes Sociais, mas , ao mesmo tempo, a tentativa de traduzir essa atualização em impactos concretos no trabalho, no projeto de trabalho. Então, assim, tem indicadores variados. Primeiro, assim, projetos muito interessantes que foram produzidos nesse processo, muita gente que se preparou para fazer mestrado, para aprofundar a pós – graduação. Então vários alunos do curso entraram lá no Rio, isso é visível, entraram para a UFRJ, para a UERJ, para a PUC e a base de formação foi o curso de capacitação. Então, assim, eu acho que foi uma experiência.... O CFESS vai relançar agora no Congresso, mas não é o mesmo curso, é um curso diferente, mas com o mesmo espírito. Eu acho que é uma experiência lindíssima. Tinha gente que estudava à luz de velas em acampamento de sem – terra na fronteira entre o Piauí e o Ceará. Tinha uma estudante do curso, uma Assistente Social, que trabalhava no Xingú. Então coisas assim, como é à distância, conseguiu atingir rincões. Então, foi uma estratégia, uma estratégia de que? De atualização dos profissionais, de avançar na homogeneização na compreensão do significado social da profissão, porque atinge gerações diferentes da formação profissional e de socialização do que é o projeto ético – político profissional, inclusive, a sua dimensão de pesquisa, investigativa. (...) É por isso que o curso teve essa repercussão tão importante porque ele propunha exatamente fazer o pulo do gato. O pulo do gato eu acho que a gente está dando devagar. Bom quando essa turma sócio – jurídica resolve se reunir é porque se sentiu provocada, provocada pela própria realidade, mas provocada, também, tipo “aqui viemos”, o que que nós estamos fazendo aqui? Eu acho que isso é um dado novo. Mas dar esse salto de qualidade é um desafio grande ainda. Vai ser ainda durante muito tempo.” (Elaine Rossetti Behring)

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A repercussão do curso envolve diferentes dimensões: em relação aos

profissionais temos o exercício de elaboração de projetos de pesquisa

vinculados à prática profissional;a elaboração de projetos de intervenção

coerentes com as demandas desta prática; o estímulo à formação continuada

com inserções de alunos em cursos de mestrado; a superação de limites

materiais para a realização do curso. Em relação aos propósitos do curso

destacamos a “socialização do projeto ético – político”, a ênfase na “pesquisa”

e a atualização da formação de profissionais de “gerações diferentes” .

Com o propósito de dar continuidade a este processo formativo da

categoria CFESS e ABEPSS lançam o curso novamente para o ano de 2005.

Trata-se do II Curso de Especialização a Distância, com a temática: Serviço

Social: direitos sociais e competências profissionais, que tem como

consultoras Profª Drª Marilda Vilella Iamamoto e Profª Drª Potyara A. P.

Pereira. “O curso tem como objetivo qualificar o exercício profissional e

contribuir para a análise crítica do Serviço Social no âmbito das relações entre

capital e trabalho e o Estado e sociedade, no contexto da crise capitalista

contemporânea.” (FOLDER de divulgação, CFESS/ABEPSS, 2004)

Em relação à pesquisa, este curso apresenta um módulo específico

(módulo IV), que tem como objetivo geral: “ Instrumentalizar o assistente

social para a elaboração de projeto de pesquisa como parte constitutiva do

exercício profissional e subsídio fundamental para elaboração da monografia

ou trabalho de conclusão de curso.” (FOLDER de divulgação,

CFESS/ABEPSS, 2004)

O investimento em cursos como este garante legitimidade à profissão e a

afirmação de uma identidade centrada na particularidade da profissão – a de

ter uma natureza interventiva. Para exercer esta profissão o desafio é ter

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profissionais qualificados para decifrar a dinâmica das relações sociais no

contexto contemporâneo.

“...Eu acho que o desafio, não sei se é simplificar, mas o desafio é que cada vez mais nós estejamos inteirados, informados sobre a realidade social, sobre o que está acontecendo e tendo competência sim, habilidades, mas também buscando no dia a dia informados sobre o que está acontecendo. Aquilo que, acho que foi Hegel que falou que é questão do lugar dos jornais na vida do homem moderno. Então informado de tudo que é jeito. Informado não só debruçado nas questões, nos referenciais teóricos nossos, dando conta da interdisciplinariedade, da transdisciplinariedade da área, mas também informado dos fatos sociais. Porque os fatos sociais são geradores, exatamente eles são geradores do objeto de nossa atenção. Então o que que adianta, eu posso estar debruçada, mas se eu desconheço a realidade como que eu vou poder aplicar... Aí acaba ficando aquele distanciamento que o pessoal fala, que tu te distancias, a distância da realidade das bases teóricas porque eu não consigo fazer essa sistematização, essa aproximação.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

Decifrar esses novos tempos e neles re-situar o Serviço Social, com olhos voltados para o futuro, é o desafio maior do Assistente Social. Desafio para a sobrevivência da categoria profissional e para sua qualificação acadêmica, ética, política e técnica, reafirmando a importância e a necessidade social da profissão, em uma conjuntura marcada pelas seguintes: desmonte das políticas sociais públicas, em nome da idolatria do mercado e da esfera privada; desrespeito aos direitos humanos e sociais; precarização das condições de vida e trabalho da grande maioria da população; e uma ampla regressão das conquistas sociais, agravando a questão social em suas múltiplas facetas e dimensões. (A COORDENAÇÃO E AS CONSULTORAS, Apresentação, 1999) Neste contexto o Serviço Social é colocado à prova permanentemente e

enfrentar tais desafios não é tarefa que se cumpra isoladamente. Requer

organização política da categoria e o comprometimento de cada profissional.

“Eu acho que os desafios são imensos. Eu acho que são desafios coletivos e individuais. Os coletivos e por isso eu falava da importância das organizações, do protagonismo. Tem questões que só podem ser desenvolvidas, que a gente possa realmente mudar esse cenário dentro das organizações. Com apoio das organizações. E aí eu acho a própria questão da nossa participação efetiva

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hoje nos órgãos de fomento. (...) E aí toda uma briga nossa. Só que no Conselho Técnico - Científico da CAPES, que é o conselho superior, o Assistente Social não tinha assento. O Assistente Social não participava. Bom se conseguiu colocar um Assistente Social lá, que é o nosso representante de área, hoje é a Denise Bomtempo (...). Então eu acho que a gente precisa é de fato, quando tu dizes que desafios, considerando a complexidade sócio – histórica , eu acho que cada vez mais e usando a nossa mestre, temos que ser criativos e saber identificar o espaço que nós trabalhamos e nesse espaço que mediações são necessárias pra que a gente possa de fato dar toda a atenção... que volte para a formação profissional e que nos dê esse lugar de destaque, que eu acho, hoje, que o Serviço Social tem condições. Eu vejo assim, hoje também, não só mais ... nós sempre trabalhamos com nossos grandes mestres, a gente tem aí toda uma respeitabilidade , mas a gente vê hoje vários outros profissionais, outros Assistentes Sociais também nessa luta e produzindo. Basta ver a produção da área e o ingresso de outros doutores, outros docentes com uma produção importante aqui. E aí tem a Ana Vasconcelos, a Inês Bravo, a Elaine Behring – sujeitos da pesquisa. A gente vê a Regina Mioto, a Divanir, a Lúcia que estão lá contigo. Eu acho que tem vários outros despontando. Vários outros despontando nesse Brasil afora. No Rio de Janeiro, São Paulo que sempre foi o eixo, mas agora tu vês que tem em outros locais. Aqui a gente tem a Berenice Couto, a Beatriz .... tem várias pessoas que... o desafio é saber estabelecer as mediações não necessárias, mas as mediações pra que se possa de fato influenciar nesse processo todo, se possa de fato romper com esse aparente e contribuir.” (Jussara Maria Rosa Mendes) 52

O depoimento de Jussara Maria Rosa Mendes afirma que “os desafios são

coletivos e individuais.”

“Os desafios coletivos” referem-se à organização da categoria e a

ocupação de diferentes espaços que envolva financiamento, produção e

circulação do conhecimento. Nestes espaços estabelecer as mediações

necessárias para romper com obstáculos à produção do conhecimento na área

e concretizar o projeto ético - político profissional. NETTO (1999, p.95)

52 Esclarecemos que Denise Bomtempo Birche de Carvalho, no período em que realizamos as entrevistas com os sujeitos participantes desta tese, era representante da área de conhecimento do Serviço Social na CAPES e membro do Comitê Técnico – Científico. Atualmente quem ocupa esta posição é a Profa. Dra. Maria Carmelita Yazbek.

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afirma que “...para um projeto profissional se afirmar na sociedade, ganhar

solidez e respeitabilidade frente às outras profissões, às instituições privadas e

públicas e, ainda, frente aos usuários dos serviços oferecidos pela profissão, é

necessário que ele tenha em sua base uma categoria fortemente organizada.”

Desafios dessa ordem devem ser enfrentados por um sujeito que é

coletivo. SADER (1988, p. 55) define este sujeito como “...uma coletividade

onde se elabora uma identidade e se organizam práticas através das quais seus

membros pretendem defender seus interesses e expressar suas vontades,

constituindo-se nessas lutas.”

Em relação ao Serviço Social, o sujeito coletivo está representado pela

categoria profissional

...que inclui não apenas os profissionais de campo, mas que deve ser pensada como o conjunto dos intervenientes que dão efetividade à profissão. É através de sua organização (organização que envolve os profissionais em atividade, as instituições que os formam, os pesquisadores, docentes e estudantes da área, seus organismos corporativos e sindicais etc.) que uma categoria elabora o seu projeto profissional. Se pensamos no Serviço Social brasileiro, a organização da categoria compreende o sistema CFESS/CRESS, a ABEPSS, a ENESSO, os sindicatos e demais associações dos assistentes sociais. (NETTO, 1999, p.95)

Nesta perspectiva e como propósito concernente ao projeto ético político

ABEPSS, CFESS, CRESS e ENESSO53 têm o importante papel de

-53A ABEPSS: A Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social foi fundada em 10 de outubro de 1946 sob denominação Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social. Em dezembro de 1998 o estatuto sofreu reformulações, passando a designar-se ABEPSS. Com sede atual em Recife, é uma entidade covil de natureza científica, de âmbito nacional, sem fins lucrativos, constituída pelas Unidades de Ensino de Serviço Social, por sócios institucionais colaboradores e por sócios individuais. (www.abepss.org.br, consultado em 01/04/2005) -O conjunto CFESS/CRESS:O Conselho Federal de Serviço Social- CFESS e os Conselhos Regionais de Serviço Social – CRESS, regulamentados pela Lei 8.662 de 07 de junho de 1993, constituem uma entidade de personalidade jurídica de direito privado, com poder delegado pela União, e forma federativa, com o objetivo básico de fiscalizar , disciplinar e defender o exercício da profissão de Assistente Social, conforme os princípios e normas estabelecidas pelo Encontro Nacional CFESS/CRESS, e na forma prevista pela Lei 9649 no DOU de 28/05/98. (ESTATUTO DO CONJUNTO CFESS/CRESS, http://www.cfess.org.br/Estatuto, consultado em 01/04/2005) -A ENESSO: A Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social – ENESSO, é a entidade máxima de representação dos estudantes de Serviço Social do país, eleita anualmente no Encontro Nacional dos

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mobilizadores de alternativas que possibilitem incorporar a pesquisa como

parte constitutiva e constituinte da intervenção profissional e de socialização

de conhecimentos produzidos no meio acadêmico, de forma que cada

profissional possa incorporar no seu projeto individual os propósitos e valores

defendidos pela categoria profissional.

O exercício profissional exige a ação de um profissional comprometido

com a competência, cuja base é o aprimoramento intelectual. “...Daí a ênfase

numa formação acadêmica qualificada, alicerçada em concepções teórico –

metodológicas críticas e sólidas, capazes de viabilizar uma análise concreta

da realidade social – formação que deve abrir o passo à preocupação com

auto(formação) permanente e estimular uma constante postura investigativa.”

(NETTO, 1999, p. 105)

“Os individuais dizem respeito aos pesquisadores , aos assistentes sociais como um todo. De fato, como que eu posso ser esse profissional que atenda essa direção social da profissão, como é que eu posso no meu cotidiano de trabalho ter ações que aceitem esse desafio. Como é que eu posso romper , de novo te trazendo exemplo, como é que eu posso romper quando na instituição, o dia a dia da instituição ela é de busca da mais valia. O dia a dia, cada vez aumenta mais as suas tarefas, elas se ampliam, esse prolongamento cada vez maior – o Marx já falava - e nesse prolongamento como que eu faço pra poder não me tornar apenas um reprodutor das idéias da instituição, mas ser um crítico e saber olhar o que está nesse... que o Kosik fala nesses claros e escuros do cotidiano, do meu trabalho. Como que eu posso romper quando, a história do exemplo, quando eu estou lá dentro do presídio e exigem que eu diga se o preso é bom ou mau. E aí eu dizendo só marcando na folhinha bom ou mau e isso vá fazer parte de um laudo que vai dar liberdade ou não aquele presidiário. Então que eu não permita essa simplificação das ações profissionais. É pra além de simplificação essa ruptura com o fazer profissional, essa negação do fazer profissional. Eu quero o Assistente Social mas ele vai botar isso ou aquilo. Então como que eu vou romper com isso. Eu acho que o desafio individual é

Estudantes de Serviço Social – ENESS. (ESTATUTO DA ENESSO, http://www.enessomess.hpg.ig.com.br, consultado em 01/04/2005)

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imenso e o desafio coletivo muito grande, muito, muito grande que é isso, vai nos exigir participar, vai nos exigir ter essa clareza toda desse contexto todo e o que de fato vem se construindo nessa malha, nesse tecido social o que se constrói e que exige ações das associações, então. Exige ações coletivas e outras que exige do profissional. É de muita responsabilidade.” (Jussara Maria Rosa Mendes)

“Os individuais” implicam em que o profissional posicionem-se frente aos

desafios contemporâneos e suas expressões concretas nas instituições em que

trabalha, enfrentando criticamente os “desafios” profissionais, de forma a não

permitir a “simplificação” e/ou “negação do fazer profissional”.

Como nos lembra BAPTISTA (2001, p. 16), não podemos ignorar que

este profissional “...é ao mesmo tempo, um ser singular que tem um projeto

próprio de profissão e de sociedade (que tanto pode ser expressão de sua

reflexão crítica, posicionamento e comprometimento, quanto produto de sua

alienação), e um ser genérico, é um elemento activo da praxis social.” Desta

forma o enfrentamento cotidiano dos desafios profissionais se dá mediado

pelas posições ideológicas e políticas assumidas pelo Assistente Social nos

diferentes espaços que ocupa.

No entanto, os profissionais têm respondido aos desafios colocados pela

profissão de forma a consolidar os avanços já conquistados pela categoria. “O

protagonismo individual e coletivo dos Assistentes Sociais brasileiros tem

dado densidade política e oportunizado uma imagem de profissionais com a

capacidade de traduzir a realidade social e apresentar respostas técnicas –

políticas capazes de ampliar e preservar direitos sociais. ...” (BOLETIM

INFORMATIVO, CRESS/PR, 2004)

O conjunto das reflexões presentes nesta tese aponta para a valorização

do esforço histórico do Serviço Social em afirmar suas lutas, conquistas em

torno do amadurecimento intelectual da profissão. Esforço coletivo,

trabalhado pelo conjunto da categoria em todas as instâncias do exercício

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profissional e que, direta ou indiretamente, rebate na ação cotidiana do

Assistente Social, mas não sem o reconhecimento das dificuldades de ordem

macro – estrutural e das polêmicas de ordem teórica – metodológica.

Superar a perspectiva, tão presente no âmbito profissional, de que

pesquisa é apenas instrumento da prática profissional é uma delas. Sobre isto,

reconhecemos que um dos momentos do processo de produção de

conhecimento é o da sistematização de dados, aspectos, elementos teóricos

e/ou empíricos que fazem parte da realidade de intervenção profissional e da

realidade do usuário que demanda a prática profissional. Na busca de

sistematizar e organizar estes elementos o profissional recorre à pesquisa

como um momento necessário à sua intervenção e encontra na sua particular

processualidade os recursos necessários. No entanto, nossas reflexões

encaminham para avançarmos em direção a compreendermos a pesquisa como

meio de construção de conhecimento e constitutiva e constituinte da prática

profissional.

A própria ABEPSS, quando refere-se à pesquisa no contexto dos

propósitos da formação profissional, aponta para esse avanço em relação à

concepção de pesquisa ao afirmar: As diretrizes curriculares reconhecem a investigação como elemento constitutivo e não apenas complementar – tanto da formação, quanto do exercício profissional. A pesquisa de situações concretas, aliadas às suas determinações macro sociais, é condição necessária tanto para superar a defasagem entre o discurso genérico sobre a realidade social e os fenômenos singulares com os quais o assistente social se defronta no seu cotidiano, quanto para desvelar as possibilidades contidas na realidade. (ABEPSS, IX ENPESS, 2004) (grifo nosso) Encampar a concepção de pesquisa anunciada pela ABEPSS e incorporá-

la no exercício profissional exige que avancemos nas discussões e

fundamentos que sustentam nossa compreensão do que seja produção de

conhecimento e como condição necessária, do que seja pesquisa.

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Neste ponto retomamos que deve balizar nossas reflexões a compreensão

de que o processo de produção de conhecimento que se faz através da

pesquisa científica é uma das expressões da praxis humana, é uma das

objetivações possíveis do trabalho humano frente aos desafios colocados pela

relação entre o homem, a natureza e a sociedade.

Observamos, em sua trajetória histórica, que o Serviço Social avançou

quanto ao acúmulo de conhecimentos sobre o seu objeto de intervenção e

sobre a natureza da própria profissão. Deixou de ser consumidor do saber

produzido por outras áreas conhecimento das Ciências Sociais e Humanas e

passou a ser protagonista de um processo que exige o acompanhamento

sistemático e crítico das transformações societárias que concretamente

rebatem no exercício profissional cotidiano.

Consolidar os avanços já conquistados pela profissão em relação à

produção de conhecimento requer que o conhecimento produzido extrapole os

muros da academia. Reconhecemos que a pesquisa está restrita ao meio

acadêmico, em especial à pós-graduação em Serviço Social. Esta marca

precisa ser superada e o caminho para isso está na própria prática

profissional, e nas necessidades de dar ao projeto ético – político profissional

materialidade sócio – histórica. Ou seja, precisamos ter uma política de

formação profissional que articule graduação, pós- graduação e processos de

capacitação e atualização permanentes. Neste conjunto o eixo de sustentação

deve assentar-se nas demandas e nos impasses vivenciados pelos

profissionais no contexto do exercício da profissão, considerando as

determinações sociais, econômicas, políticas e culturais que expressam as

realidade contemporânea e o projeto ético – político profissional.

Neste processo histórico em que a produção de conhecimento se

materializa via pesquisa no Serviço Social alguns elementos podem se

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colocar como mediações possíveis ao exercício da pesquisa, constituindo cariz

da sua particularidade, destes destacamos a necessária vinculação orgânica

com a prática profissional; a garantia de centralidade ao sujeito participante

como condição ontológica a ser recuperada pelas pesquisas e o compromisso

com o retorno e alcance social das mesmas de forma a mobilizar ações que

potencializem processos de transformação nas condições materiais de

existência dos sujeitos, nas ações dos profissionais de Serviço Social, nas

organizações sociais em que trabalham e no próprio conhecimento acumulado

pela profissão.

Entendemos que, em se tratando da particularidade histórica da pesquisa

em Serviço Social, consolidá-la como constitutiva e constituinte da prática

profissional é tarefa que não se cumpre, apenas, individualmente, pelo

contrário, é desafio coletivo que deve ser enfrentado pelo conjunto da

categoria em todas as dimensões do exercício profissional e inclusive na

perspectiva da formação profissional.

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APÊNDICE:

QUADRO 1- DEMONSTRATIVO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS, TESES E DISSERTAÇÕES SOBRE PESQUISA E SERVIÇO SOCIAL

QUADRO 2- SISTEMATIZAÇÃO DOS DEPOIMENTOS DOS SUJEITOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

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QUADRO 1- DEMONSTRATIVO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS, TESES E DISSERTAÇÕES SOBRE PESQUISA E SERVIÇO SOCIAL

REVISTA/CA-DERNO/TESE/

DM∗

TÍTULO/AUTOR OBSERVAÇÃO∗

Serviço Social e Sociedade n. 14 – 1984

1- A produção científica do Serviço Social no Brasil – Safira Bezerra Ammann – p.144

-Trabalho desenvolvido para o CNPq que avalia a produção científica do Serviço Social e suas perspectivas até o início da década de 80. Situa os principais eventos científicos nacionais e internacionais que sustentaram a produção do saber em Serviço Social neste período, historiciza o surgimento da pós – graduação no Brasil, linhas de pesquisa e apresenta os principais problemas em relação aos centros de formação e pesquisa, bem como faz recomendações para o desenvolvimento da produção científica na área.

Serviço Social e Sociedade n. 21 – 1986

1-Alternativas metodológicas da pesquisa em Serviço Social – Vicente de Paula Faleiros – p. 05 2-A interdisciplinariedade na pesquisa – André Laino – p. 18 3-Abordagem da pesquisa em Serviço Social – Potyara A P. Pereira – p. 37 4-A pesquisa e a construção da teoria do Serviço Social – João Bosco Pinto – p. 47

-Expõe a situação da pesquisa em Serviço Social quanto aos centros de fomento e quanto a orientação teórico- metodológica presentes nas investigações. -Discute a problemática do exercício interdisciplinar da pesquisa.

-Discute os paradigmas teóricos orientadores da pesquisa social. Questiona a ausência da pesquisa como parte integrante da prática profissional, dificultando o processo de conhecimento específico do Serviço Social. -Apresenta a polêmica quanto a existência ou não de uma teoria do Serviço Social. Na busca de respostas problematiza o que é teoria a partir dos referenciais clássicos

- Org.: pela autora- 2004 * Revista Serviço Social e Sociedade: números 01 à 80; Cadernos ABESS: números 01 à 08 – publicadas pela Cortez/São Paulo; Revista Temporalis: números 01 à 08 – publicação da ABEPSS. * Teses e DM (Dissertações de Mestrado) sobre pesquisa e Serviço Social identificadas na Biblioteca Nadir Gouvêa Kfouri – PUC/SP – em 2002/2003. ∗ Observações referentes a aspectos mais expressivos nos textos, o que não desconsidera que os textos são mais complexos. - Estes materiais foram selecionados em função de sua relevância em relação à temática tratada nesta tese.

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(positivismo/dialética), defende a pesquisa como um instrumento para a construção de uma teoria do Serviço Social (p. 54)

Serviço Social e Sociedade n. 28 – 1988

1-A produção acadêmica do Assistente Social: alguns pontos de vista sobre pesquisa – Ursula M. Simon Karsch – p. 121

-Aponta para a falta de tradição de investigação na profissão e para a necessidade de definir quais as características das pesquisas dos Assistentes Sociais, bem como os desafios que se colocam à profissão neste campo. Propõe os seguintes pontos para o debate: o assistente social deve pesquisar o que conhece; o assistente social trabalha com instrumentos de pesquisa; o objeto de trabalho profissional do assistente social deve ser conceituado e reconceituado criticamente; o marco teórico é um processo de construção do pesquisador; a investigação do assistente social assim realizada se inscreve na concepção dialética.

Serviço Social e Sociedade n. 31- 1989

1- Pesquisa participante e Serviço Social – Maria Ozanira da Silva e Silva – p. 85

- Problematiza a pesquisa participante a partir das concepções teóricas e metodológicas que tem orientado esta modalidade de pesquisa, demonstrando as imprecisões conceituais que a cercam. Questiona a parca contribuição do Serviço Social em relação à sistematização de experiências sobre pesquisa – ação ou pesquisa – participante.

Serviço Social e Sociedade n. 33 – 1990

1-Pesquisa para graduados em Serviço Social: gerar conhecimentos ou intervir? – Francisco Ary F. de Medeiros – p. 97

-Reconhece a investigação como parte constituitiva da profissão e elemento básico da intervenção. Destaca a importância de instrumentalizar o acadêmico de Serviço Social para o exercício da pesquisa e geração de conhecimento. Resgata as contribuições históricas de Mary Richmond quanto a presença da pesquisa na profissão.

Serviço Social e Sociedade n. 34 – 1990

1-A práxis do Serviço Social nas instituições – Mario da Costa Barbosa – p. 05 2-Gramsci e as Ciências

-Traz a discussão sobre o homem enquanto ser social que se objetiva através do trabalho, com a intenção de satisfazer suas necessidades. Apresenta a práxis como atividade consciente, criativa e transformadora do homem sobre a natureza, relações sociais e sobre o próprio homem, cujo produto final é o objeto transformado. Salienta a práxis científica como possibilidade de recriar o conhecimento orientador da ação profissional. -Retoma as contribuições de Gramsci para as

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Sociais – Carlos Nelson Coutinho – p. 21 3- A construção de uma alternativa metodológica de pesquisa qualitativa em Serviço Social – Bernadete de Lourdes F. de Almeida – p. 135

Ciências Sociais. Em especial trabalha a categoria totalidade para compreender a sociedade criticamente. Tendo em vista a perspectiva da totalidade problematiza a divisão científica do trabalho, apresentado prós e contras quanto aos avanços conquistados pelas ciências particulares. - Recupera os antecedentes históricos e teórico – metodológicos que sustentam a pesquisa qualitativa e sua apropriação pelo Serviço Social. Propõe como referencial para compreensão da cultura - “enquanto elemento que expressa as relações políticas e de produção econômica de uma dada realidade social ou objeto de pesquisa.” (p. 141) – a perspectiva teórica – metodológica sustentada em Gramsci.

Serviço Social e Sociedade n. 38 – 1992

1-Relatório avaliativo da área de pós – graduação em Serviço Social (período: 1987/1989) – Marilda V. Iamamoto, Ursula M. S. Karsch e Jairo Mello de Araújo – p.141 2-A lógica da pesquisa: uma proposta didática para definição do objeto – José Rogério Lopes – p. 30

-Avalia os programas de pós – graduação em Serviço Social no Brasil, referente ao triênio 1987/1989. Apresenta um balanço das tendências na área, estabelecendo as particularidades da pós – graduação. Levanta os principais eventos científicos que possibilitaram a “afirmação científica” do Serviço Social. Traça perfil da pós – graduação em Serviço Social no país e levanta recomendações em relação aos programas avaliados. -Apresenta modelo didático para definição do objeto de pesquisa e para sua problematização conforme o contexto em que o pesquisador está inserido.

Serviço Social e Sociedade n. 39 – 1990

1-Introdução à reflexão sobre problemas da pesquisa histórica no Serviço Social- Myriam Veras Baptista – p. 117

-Faz um balanço da pesquisa em Serviço Social e enfatiza a importância da pesquisa histórica, considerando que a profissão “...tem uma dinâmica interna, uma vida histórica e social, que está diretamente relacionada à dinâmica da constelação das relações sociais dos grupos com os quais opera, com os problemas que se colocam aos seus profissionais na época estudada e com as transformações que sofrem as próprias estruturas desses problemas.”(p.118) Assim indica caminhos de ordem metodológica para estudos históricos.

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Serviço Social e Sociedade n. 43 – 1993

1-Do sincretismo da prática à prática sem sincretismo – Aglair Alencar Setubal – p. 93

-Reconhece a pesquisa como parte integrante da intervenção profissional na realidade e aponta a história oral como possibilidade de construção de saber crítico e comprometido com os interesses dos usuários, valorizando sua fala, a expressão de seus sofrimentos, a reflexão sobre sua experiência social e a busca de novas alternativas de ação coletiva.

Serviço Social e Sociedade n. 44 – 1994

1-O ensino teórico – prático do serviço social: demandas e alternativas – Maria Lúcia Martinelli - p. 61

-Analisa o processo de formação profissional profissional, enfatizando a natureza de uma profissão voltada para o social, cuja prática deve ser pensada tendo como referência a praxis. Discute os primados da praxis : consciência, história, ser social e totalidade.

Serviço Social e Sociedade n. 45 – 1994

1-Atitude investigativa e formação profissional: a falsa dicotomia – Odária Battini – p. 142

-“Embora haja no Serviço Social uma tendência a privilegiar a investigação tanto na formação quanto na base do exercício profissional, e, na divisão sócio-técnica do trabalho, a dimensão científica da prática seja ainda um privilégio de quem constrói saber, a investigação toma o caráter instrumental, sendo algo incorporado ao que a profissão vem desempenhando desde a sua gênese: a prática” (p.142). Propõe para superação da dicotomia intervenção/investigação a unidade teoria/prática – condição para transformação concreta do mundo. A articulação teoria/prática decorre do exercício da atitude investigativa, o qual deve estar presente em todas as etapas da formação profissional.

Serviço Social e Sociedade n. 50 – 1996

1-Transformações societárias e Serviço Social: notas para uma análise prospectiva da profissão no Brasil – José Paulo Netto – p. 87

- Faz uma reflexão sobre as possibilidades que se colocam à profissão nos final do século XX e início do século XXI. Faz importante balanço crítico das transformações do capitalismo contemporâneo e suas repercussões nas demandas profissionais.

Serviço Social e Sociedade n. 51 – 1996

1-Pesquisa – ação e pesquisa participante: uma atualização no confronto – Sandra Helena Moreira Santiago – p. 134

-Desenvolve estudo comparativo entre pesquisa - ação e pesquisa – participante, considerando os pressupostos que fundamentam estas alternativas metodológicas de pesquisa.

Serviço Social e Sociedade – n.

1-O Serviço Social na transição para o próximo

- Apresenta o contexto sócio – histórico dos anos 90 e suas repercussões na configuração

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57 – 1998 milênio: desafios e perspectivas – Maria Lúcia Martinelli – p. 133

da prática profissional em termos de demandas e perspectivas para o século XXI. Chama a atenção para a dimensão social e política da prática profissional, destacando que: “Não existe construção coletiva sem troca, sem parceria, assim como não existe Universidade sem pesquisa, ou bom profissional sem investimento em leitura, em qualificação profissional.”(p.147)

Serviço Social e Social e Sociedade – n. 64 – 2000

1- Metodologia de pesquisa para populações de rua: alternativas de enfrentamento pelo poder local – Jane Cruz Prates, Carlos Nelson Reis, Paulo Belmonte de Abreu – p. 135

-Apresenta de forma detalhada e fundamentada teoricamente o processo metodológico de pesquisas desenvolvidas com população adulta de rua em Porto Alegre/RS. São pesquisas interdisciplinares e interinstitucionais, orientada pela perspectiva dialética e com uma preocupação em garantir ao sujeito participante centralidade. Apresenta também os resultados alcançados.

Serviço Social e Sociedade – n. 77 – 2004

1-A produção de conhecimento no Serviço Social e sua relação com os princípios éticos – Maria Dalva Casimiro da Silva – p. 121

-Apresenta “.. pesquisa empírica em torno da produção de conhecimento dos assistentes sociais e sua relação com a prática profissional.” (cf. resumo) Para tanto analisa os trabalhos apresentados nos Congressos Brasileiros de Assistentes Sociais – CBAS das décadas de 1980 e 1990.

ABESS - 2 – 1988

1- A produção de conhecimento na educação popular – João Francisco de Souza – p. 68

-Trata da pesquisa - ação e pesquisa participante como busca de alternativa para problemas identificados junto à classe trabalhadora, bem como de suas implicações teóricas, metodológicas e ético - políticas.

ABESS – 3 – 1989

1-Notas para a discussão da sistematização da prática e teoria em Serviço Social – José Paulo Netto – p. 141

-Estabelece importante discussão sobre a compreensão de sistematização e teoria em Serviço Social e apresenta uma pauta de cuidados em relação a esta temática, tais como: - explicitação rigorosa da referência teórica a que se pretende aderir; elaboração dos pressupostos e decorrências implicados na opção contida na relação teoria – método; clarificação da concepção que sustenta os procedimentos pertinentes à prática profissional do Serviço Social; tratamento cuidadoso do processo de investigação; determinação clara das relações entre o saber produzido em relação à prática profissional e os próprios das Ciências Sociais e da tradição marxista; estabelecimento dos traços

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2- Metodologia do Serviço Social – a práxis como base conceitual – Marina Maciel e Franci Gomes Cardoso – p. 162

distintivos entre os procedimentos de sistematização empregados pelas Ciências Sociais e na tradição marxista; levantamento dos recursos culturais necessários à qualquer projeto de sistematização e elaboração teórica no Serviço Social. (p.152-153) - Recupera a práxis na concepção gramsciana e seu rebatimento no Serviço Social. Compreende “... o Serviço Social como parte da totalidade da práxis, expressando especificidades, determinadas pelas condições concretas que viabilizam esta profissão na sociedade em diferentes momentos históricos.”(p. 169) Discute a concepção de metodologia como o conjunto de relações estabelecidas entre o sujeito e o objeto de conhecimento e de intervenção. Assim reconhece a necessária articulação entre o processo de intervenção e o processo de investigação, embora reconheça suas particularidades.

ABESS – 5 - 1992

1-A controvérsia paradigmática nas Ciências Sociais – José Paulo Netto – p. 07 2-A produção de conhecimento em Marx - Prof. João Antonio de Paula – p. 17 3-A pesquisa no Debate Contemporâneo e o Serviço Social – Alba Naria Pinho de Carvalho e Irlys Barreira – p. 43

-Configura a polêmica sobre os paradigmas que orientam a construção do conhecimento nas Ciências Sociais. Esta polêmica passa por duas vias: questionamento do paradigma positivista, que defende como pertinente; e questionamento quanto a perspectiva marxista e sua “vocação” totalizadora, que considera ambíguo, pois “abre caminho para o neo-irracionalismo”. Propõe o caminho de Lukács – “que apanha na arquitetura marxiana uma ontologia do ser social – fiel à herança de Marx. (p.15) -Recupera o método construído por Marx, as categorias essenciais e enfatiza que a investigação exige do investigador “mergulhar no seu objeto de forma radical.” (p.36) -Entende que todo o esforço do Serviço Social é estabelecer uma interlocução com as Ciências Sociais, no entanto afirma que neste contexto o Serviço Social ao discutir teoria e construir conhecimento , está colocando em discussão sua prática.

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4-A produção do conhecimento social contemporâneo e sua ênfase no Serviço Social – Myriam Veras Baptista – p. 84

-Discute a especificidade do conhecimento produzido pelo Serviço Social determinada pela sua inserção em práticas concretas. “O assistente social se detém frente às mesmas questões que outros cientistas sociais, porém o que o diferencia é o fato de ter sempre em seu horizonte um certo tipo de intervenção: a intervenção profissional. Sua preocupação é com a incidência do saber produzido sobre sua prática: em serviço social, o saber crítico aponta para o saber fazer crítico.” (p.88/89). Aponta os desafios presentes a uma profissão que carece investir mais em pesquisa.

ABESS – 6 - 1993

1-Buscando uma metodologia de pesquisa para o Serviço Social: reflexões de um professor de pesquisa à margem dos paradigmas – João Bosco Pinto – p. 29 2-Os paradigmas do conhecimento e seus rebatimentos no cotidiano do ensino, da pesquisa e do exercício profissional – Ademir Alves da Silva – p.46 3- Ensino e pesquisa no Serviço Social: desafios na construção de um projeto de formação profissional – Marilda Vilela Iamamoto - p. 101 4- A construção do conhecimento profissional e o Serviço Social – Lídia Maria Monteiro

-Discute a dimensão educativa da prática profissional e a importância de preparar o profissional de Serviço Social para construir conhecimento, a partir de uma prática que incorpore alguns hábitos fundamentais, como: registro sistemático do fazer cotidiano; exercício consciente da crítica à teoria que fundamenta sua prática; elaboração de instrumentos educativos – pedagógicos coerentes com as demandas sociais e com o projeto profissional de transformar o real. - Problematiza em que medida o mercado de trabalho, a formação profissional e o exercício profissional estão rebatendo e inquietando a profissão e colocando questões referente aos paradigmas que se constituem referenciais de análise ao Serviço Social. Aponta que o reconhecimento social da profissão depende de sua capacidade de responder às questões concretas decorrentes do contexto contemporâneo. - Realiza balanço da produção acadêmica do serviço Social na década de 80, procurando detectar avanços e impasses. Para tanto resgata as preocupações e polêmicas que tematizaram as produções e debates no Serviço Social. -Discute a natureza do conhecimento profissional, tendo como eixo a perspectiva teórico – crítica. “...o conhecimento profissional se faz pela mediação de sujeitos

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Rodrigues da Silva – p. 157

históricos, ele é também a expressão do nível de consciência possível desses agentes em um específico momento histórico.” (p.160) A partir desta referência discute as perspectivas da formação para o exercício profissional.

ABESS – 7 - 1997

1-Proposta básica para o projeto de formação profissional – novos subsídios para o debate – Isabel Cristina da Costa Cardoso et al - p. 15

- Configura um bom panorama sobre o Serviço Social nos marcos das transformações societárias recentes, bem como define a direção do projeto pedagógico da formação profissional. Neste contexto a investigação é entendida “...como uma atividade vital para a própria atualização e reprodução do Serviço Social...” considerando seu caráter interventivo (p.19)

ABESS – 8 - 1998

1-A pesquisa na formação profissional do Assistente Social: algumas exigências e desafios – Franci Gomes Cardoso – p. 27 2-A trajetória da produção de conhecimentos em Serviço Social: avanços e tendências (1975 – 1997)- Nobuko Kameyama – p. 33

-Reafirma a necessidade da pesquisa no processo de formação profissional, garantido nas diretrizes gerais do Curso de Serviço Social: “ rigoroso trato teórico, histórico e metodológico da realidade e do Serviço Social, que possibilite a compreensão dos problemas e desafios com os quais o profissional se defronta no universo da produção e reprodução da vida social; adoção de uma teoria social crítica que possibilite a apreensão da totalidade social em suas dimensões de universalidade, particularidade e singularidade; estabelecimento das dimensões investigativa e interventiva como princípios formativos e condições da formação profissional. (p. 29/30) -Faz um balanço da produção de conhecimento do Serviço Social no Brasil e aponta paras as principais dificuldades, as quais são: identificar objeto de pesquisa; elaborar quadro conceitual; realizar a mediação entre a universalidade, singularidade e particularidade; limitar-se a sistematização bibliográfica; tendência ao pragmatismo; pesquisas com temáticas restritas; rebatimento tardio de temas pertinentes ao serviço social; dicotomia pesquisa qualitativa/pesquisa quantitativa; dificuldades quanto aos investimentos em pesquisas; inexistência de linhas de pesquisa.

Revista Temporalis n. 2

1- As novas diretrizes curriculares para a

- Apresenta as principais polêmicas em relação ao processo de revisão curricular

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– 2000 formação profissional do Assistente Social: principais polêmicas e desafios – Franci Gomes Cardoso – p.07 2- Ensino da Prática profissional no Serviço Social: subsídios para uma reflexão – Yolanda Guerra – p. 153

desenvolvido nos anos 90 pelas unidades de ensino de Serviço Social e pela ABESS. Aponta os principais desafios para implementação das diretrizes curriculares pelas escolas, considerando a necessidade de garantir coerência com o projeto ético – político da profissão. -Situa a problemática do ensino da prática no âmbito do currículo que dá sustentação à formação profissional. Faz discussão sobre a concepção de prática social e sua expressão na particularidade da profissão.

Revista Temporalis n. 7 – 2003

1- O planejamento da pesquisa social – Jane Cruz Prates – p. 123

Explicita os passos para elaboração de um projeto tendo como referência os cuidados necessários quando se trabalha na perspectiva da teoria crítica.

Tese de Doutorado – 1991

- O Estado das Artes no Serviço Social: estudo sobre a construção do conhecimento na prática profissional do Assistente Social – Odária Battini -

-A tese se propõe a “indicar algumas categorias viabilizadoras da compreensão do Serviço Social, do ponto de vista da produção de conhecimento.” Entende o conhecimento “como uma perspectiva teórica de desvendamento da sociedade burguesa que tem, no horizonte a ultrapassagem dessa sociedade, evidenciando um potencial prático – crítico.” (p.01) A tese indica o modo como os Assistentes Sociais, fundamentados na perspectiva marxista, reconstroem categorias teórico – metodológicas que lhes permitem compreender a dinâmica do real e nele intervir criticamente.

Tese de Doutorado – 1992

- Produção do mestrado em Serviço Social da PUCSP: uma análise – Dilséa Adeodata Bonetti

- “O estudo trata da produção do mestrado em Serviço Social da PUCSP, buscando na construção de suas dissertações, os temas trabalhados e o modo como o investigador se relaciona com seu objeto de estudo no desenvolvimento de sua intervenção, dentro dos parâmetros teórico – metodológicos assumidos. “(cf. resumo) Apresenta importante contextualização histórica da pós – graduação em Serviço Social no Brasil, em especial analisa a PUC/SP.

Dissertação de Mestrado – 1992

-Pesquisa em Serviço Social: análise das implicações metodológicas na técnica estudo de caso – Tânia

- Analisa o estudo de caso que enquanto técnica de pesquisa é muito utilizado pelo Serviço Social. Propõe-se a refletir sobre a pesquisa em Serviço Social numa dimensão epistemológica, “compreendendo que o

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Maria Ramos de Godoi Diniz

conhecimento não é definitivo e que as verdades são historicamente construídas.”(p.11)

Dissertação de Mestrado – 1994

- As tendências do ensino de pesquisa na graduação do curso de Serviço Social – o caso da grande São Paulo – Maria da Consolação Viana

- Objetiva traçar quadro das tendências do ensino da pesquisa na graduação do curso de Serviço Social na grande São Paulo. A partir do material empírico coletado busca caracterizar a disciplina de pesquisa no curso de Serviço Social, analisando o conteúdo e a forma como é ministrada.

Dissertação de Mestrado – 1997

-Serviço Social e o mundo do trabalho: balanço da produção dos cursos de mestrado – 1990/1995 – Sandra de Faria

- Analisa “a produção acadêmica dos cursos de mestrado em Serviço Social referente ao período de 1990/1995 com concentração temática sobre o “mundo do trabalho” . Teve por objetivo “proceder um balanço na produção discente, recorrendo às referências teóricas e empíricas que permitiram apreender e nuclear as principais tendências nas análises dos vários objetos problematizados, que são: relações de poder disciplinar no mundo do trabalho, serviços e gestão social no mundo do trabalho e reestruturação produtiva e relações sociais no mundo do trabalho.”(cf. resumo)

Tese de Doutorado – 1998

- Método e Serviço Social do nosso tempo: desafios do conhecimento para a intervenção profissional – Tânia Maria Ramos de Godoi Diniz

- “Problematiza a produção do conhecimento no Serviço Social a partir de meados da década de 80. Tendo como suporte, entrevistas realizadas com profissionais representativos do serviço social, nesse período histórico, a análise sustentou-se nas suas representações sócio – culturais.”( cf. resumo)

Tese de Doutorado – 2003

-Os autores e seus pensamentos: um estudo das concepções de Serviço Social na produção da pós – graduação da PUCSP – Denise Cristina Guelfi

- “Analisa a produção discente do programa de pós – graduação da PUC-SP de 1971 à 2001, priorizando no período 1985 – 2001 o nível de doutorado.” (cf. resumo) A análise preocupa-se com a concepção de Serviço Social e com os conhecimentos que fundamentam sua prática profissional.

Tese de Doutorado -2003

- Produção de Conhecimento e agenda sócio – profissional no Serviço Social brasileiro – Sandra de Faria

- Analisa as relações entre produção de conhecimento e a agenda sócio – profissional no Serviço Social brasileiro, tendo como sustentação a trajetória da profissão a partir da década de 70 e o seu processo histórico de renovação.

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QUADRO 2 : SISTEMATIZAÇÃO DOS DEPOIMENTOS DOS SUJEITOS PARTICIPANTES DA PESQUISA*

Questões/ Sujeitos

1- Relato da Experiência Profissional em relação à Pesquisa em Serviço Social/Motivações

1- Lúcia Cortes da Costa

-Prática profissional. -O lugar do povo na sociedade, as necessidades concretas das famílias empobrecidas e a necessidade de buscar alternativas de intervenção profissional. -Mestrado: a questão social no Brasil decorrente da particularidade histórica do capitalismo no Brasil. -Pesquisa: enfrentamento dos impasses e limites da profissão e compreensão do campo de atuação do Serviço Social . -Doutorado: Reforma do Estado e seu impacto nas políticas sociais sob a perspectiva da perda dos direitos da classe trabalhadora. -Há um eixo de pesquisa em relação ao Mestrado e Doutorado. -Desdobramentos: pesquisa institucional, Núcleo de Pesquisa em Desigualdade e Exclusão no Espaço Local, Líder de Grupo de Pesquisa junto ao CNPQ, publicações, PIBIC. -Núcleo de Pesquisa: espaço de aprendizagem para alunos da graduação e pós – graduação e de articulação com segmentos da comunidade -Descoberta das dificuldades para publicação, restrições quanto ao tempo de dedicação à pesquisa no espaço acadêmico, financiamento, domínio dos recursos eletrônicos.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-Interface com o trabalho na área da Saúde – espaço fértil de indagações e de delineamento do objeto de pesquisa. -A realidade de trabalho e o espaço da interdisciplinaridade exige do Assistente Social sair da não familiaridade para o conhecimento. -Exigência da capacitação continuada: sanitarista. -Domínio de metodologia de pesquisa coerente com o objeto de estudo: necropsia verbal/articulação da pesquisa quantitativa e pesquisa qualitativa.

3- Ana Elizabete Mota

-Graduação/TCC abre o processo de envolvimento com a pesquisa -Particularidade: objetos de pesquisa sempre foram vinculados a questão do trabalho. -A pesquisa como processo de aproximação sucessiva ao objeto de estudo: “o trabalho sob o capital e as refrações e conexões com o Serviço Social. -Oportunidade de publicação e de discussão com os profissionais da área foi relevante.

4-Eunice Teresinha Fávero

-Contexto da graduação em Serviço Social (70/80): fim da ditadura, retomada do movimento estudantil, influências do Movimento de Reconceituação do Serviço Social. -Estágio na graduação: contribuiu para o despertar da capacitação continuada. -Experiência no Judiciário: atendimento individualizado, ambiente hierárquico, rígido, autoritário e formação acadêmica mais crítica levou a um impasse: ou mudar de atividade ou conhecer melhor essa realidade

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pra redirecionar sua ação profissional. -Descoberta da inexistência de material crítico sistematizado sobre o Judiciário. -Fez o caminho da intervenção para a academia através da pós – graduação. “... eu fui da intervenção para a pesquisa...”, buscando alterar a realidade de trabalho e a realidade dos sujeitos demandatários da prática profissional. -Núcleo de Estudos e Pesquisas da Criança e do Adolescente –PUC/SP: espaço motivador da pesquisa para os profissionais. -Descoberta da pesquisa: por meio da história oral – reconstrução da implantação do Serviço Social no Judiciário. -Desdobramento do Mestrado: coordenação de um grupo de pesquisa no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre o cotidiano do trabalho do Assistente Social e sobre a realidade dos sujeitos. -Grupo de pesquisa como espaço de formação em pesquisa para os profissionais, de avaliação da prática profissional. -Doutorado: articulação da pesquisa qualitativa e quantitativa para compreensão da realidade social dos sujeitos, descoberta da importância pesquisa para análise da prática profissional em suas fragilidades e potencialidades. -Desdobramentos da Tese: sistematização teórico-prática sobre estudo social numa dimensão crítica e comprometida com o projeto ético – político profissional -com apoio do CRESS e publicações sobre a prática do S.S. no Judiciário. -Tese: “...afirmação da pesquisa enquanto parte fundamental, senão a principal, da intervenção.” -Coordenação de curso de especialização para profissionais do campo sócio – jurídico.

5-Elaine Rossetti Behring

-Experiência com pesquisa de forma sistemática se inicia quando entra na UERJ como docente e no mestrado. -Considera pesquisa como “um processo de investigação, que tem ...uma clara articulação teórica/empírica... É um projeto intelectual de longa duração”. -Como projeto intelectual se consolida no Mestrado e Doutorado. -Neste projeto intelectual tem um componente político, e a pesquisa não é neutra, é engajada em direção à mudanças sociais na realidade brasileira. -O horizonte teórico – metodológico é radicalmente crítico e anti – capitalista e busca alimentar o debate sobre a realidade brasileira -Atualmente pesquisa sobre o orçamento da Seguridade Social brasileira, baseada em análise documental e bibliográfica.

6-Aglair Alencar Setubal

-Tem procurado acompanhar o movimento da pesquisa nas Ciências Sociais e no Serviço Social. -Observa pouco apoio dos órgãos financiadores de pesquisa, apesar da qualidade e seriedade dos programas de pós – graduação. -Tem realizado estudos que buscam articular pesquisa e estágio supervisionado, sobre história oral e sua utilização com a prática profissional e sobre a área gerontológica.

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- Não acredita numa docência desvinculada da pesquisa. -É significativo em sua experiência o diálogo com os sujeitos participantes das pesquisas que faz.

7-Aldaíza Sposati

-Desde a graduação fez pesquisa de campo, com entrevistas e tratamento estatístico ao objeto de estudo. Na época concluiu que o Serviço Social precisava de maior formação em Sociologia, visto que para interpretação dos dados era preciso conhecimento da sociedade. - Foi bastante estimulada a conhecer a partir da perspectiva de totalidade, talvez esta atitude curiosa fosse de sua própria natureza – traço de personalidade. -Tem uma necessidade de compreender os fenômenos em seus múltiplos aspectos, sempre tendo o real como ponto de referência.

Questões/ Sujeitos

2-Como as pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social tratam as determinações objetivas da existência dos sujeitos que demandam sua prática e conhecimento profissional?

1- Lúcia Cortes da Costa

-Respeito ao sujeito. -Postura democrática em relação ao outro: “O nosso saber é um saber de ouvir o outro...” -Projeto ético na pesquisa “favorável à democracia, cidadania e valores humanos emancipatórios” e com perspectiva de mudança da realidade. -Dois níveis na pesquisa: Graduação – o centro ainda é o sujeito, porém numa perspectiva de totalidade e na Pós – Graduação há o enfrentamento de questões macro – estruturais. -Eixo teórico no Serviço Social bem definido pelo projeto ético – político profissional. -Contribuições da ABEPSS e da Pós – Graduação (eixo Rio/São Paulo)

2-Jussara Maria Rosa Mendes

-As questões que são objeto de pesquisa, antes são objetos da intervenção profissional. -As questões que mobilizam a prática profissional muitas vezes dizem respeito a individualidade do próprio profissional. Para enfrentá-las é preciso ter um bom suporte teórico – metodológico e conhecer “o que é o fazer profissional do Assistente Social.” -Fazer opção pela direção social da profissão e dar visibilidade à questão social em suas várias dimensões. -Década de 80 é marco histórico: processo de rompimento com o conservadorismo, avanço da pós – graduação, influência do eixo Rio/São Paulo. -Hoje: cenário de transformações societárias que exige olhar constante do Serviço Social para os processos sociais /olhar interventivo. -Pesquisa qualitativa é recente e a própria pesquisa para o Serviço Social é nova.

3- Ana Elizabete Mota

Não respondeu.

4-Eunice Teresinha Fávero

-Vários níveis de pesquisa: Teóricas, com objetos de natureza macro – estrutural – tem demonstrado a capacidade do S.S. produzir conhecimento; Vinculadas às demandas da intervenção junto ao

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cidadão, importantes porque reavaliam a prática profissional e analisam determinações concretas presentes no cotidiano profissional. -O processo de compreensão das determinações objetivas está em processo de construção até por conta de uma fragilidade teórica – metodológica dos profissionais em avançar da descrição para análises críticas mais consistentes. -A vinculação dos profissionais às suas instituições de origem facilita a coleta de dados e dificulta análises mais críticas. -Considerando o acesso privilegiado dos profissionais à realidade social dos sujeitos a produção é pequena e recente, é preciso avançar. -Carece maiores investimentos na formação dos profissionais como pesquisadores para que estabeleçam diálogo crítico com os processos interventivos. -Na graduação, o momento do TCC é fundamental. A direção social de sua formação em pesquisa possibilitará maior diálogo entre investigação/intervenção ou o que já temos a separação entre pesquisa/intervenção.

5-Elaine Rossetti Behring

-É preciso desenvolver mais pesquisas sobre a realidade dos sujeitos. - Há uma tensão entre subjetividade/objetividade devido a dificuldades de ordem teórico – metodológica e de formação que gera uma equivocada dicotomia na relação entre esses dois aspectos. -Contexto do século XX: preponderância do econômico em detrimento da compreensão do sujeito e que se repõe ainda hoje. -Gramsci e suas contribuições para o Serviço Social compreender o sujeito em contexto determinado.

6-Aglair Alencar Setubal

-Avanço quanto ao debate crítico no Serviço Social devido aos cursos de pós - graduação stricto - sensu e a criação das entidades representativas da categoria, tem centralizado a produção de conhecimento na compreensão das manifestações da questão social e das respostas dadas pelas políticas públicas. -A relação do S.S. com a realidade através de sua intervenção tem forçado a profissão a se reconstruir e contribuir com o processo de transformação social. -As diferentes vertentes teórica – metodológicas presentes no S.S. levam a tratamentos diferentes das expressões objetivas da existência dos sujeitos – não somos um bloco monolítico.

7-Aldaíza Sposati

- Supõe uma dimensão espaço/tempo. - A construção não é generalista, é construção histórica. - A pesquisa tem que “ fazer esta busca da descoberta, do que particulariza, do que se anuncia.” - Muitas vezes as pesquisas acabam sendo ilustrações de um pensamento ou fundamentação teórica. “ Eu só quero dizer assim, antes de começar a pesquisa já se sabia o resultado, que ela é tão direcionada àquele conteúdo pré – construído que independe de olhar o real, ele só vai ilustrar.” - O pesquisador tem que entender a totalidade, construir a particularidade, com a coragem da descoberta do real. - Muitas vezes o profissional vê os elementos que constituem a

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realidade como um problema, que dificulta a execução de suas ações e não como um desafio... “ quer dizer eu tenho a certeza na cabeça, agora a realidade é que me atrapalha.” -A dificuldade do profissional relacionar-se com a realidade e com os seus desafios, também, deve-se ao processo de formação profissional: baixa investigação; baixo investimento na pesquisa como descoberta. “ O processo de formação não leva a isso, ao desejo da descoberta.” Ficamos restritos à idéia de que somos Ciência Aplicada – reprodutores de conhecimento. - Os avanços na produção de conhecimento na área do Serviço Social deve-se as demandas próprias do real . “Não foi uma derivação da teoria.” - Há uma distância entre o que é avanço para a profissão e o que é assimilado pelos profissionais em seu cotidiano.

Questões/ Sujeitos

3-Que posição a experiência e o conhecimento dos Sujeitos ocupam nas pesquisas do Serviço Social?

1- Lúcia Cortes da Costa

-Atitude ética em relação ao saber do outro - não é de contemplação mas de análise crítica. -Influência de Gramsci. -A importância dos trabalhos de pesquisa com relatos orais.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-Trabalhar numa perspectiva que envolve o sujeito supõem uma forma de tratamento/postura, subentende relação de participação. -Pressupõem ética, interação, devolução, respeito à dignidade e à experiência do outro. -Por parte do pesquisador “vivência profunda” quanto ao processo da pesquisa. -Projeto ético - político profissional informa um processo de pesquisa com a participação do sujeito e fundamenta as diretrizes curriculares.

3- Ana Elizabete Mota

Não respondeu.

4-Eunice Teresinha Fávero

-O Assistente Social tem amplo conhecimento da realidade social e acesso privilegiado às informações, mas não tem consciência do potencial desse conhecimento – falha de formação. -A realidade social está registrado em documentos, relatórios, autos processuais e isso não é trabalhado como fonte de pesquisa. -Os sujeitos ainda não têm o protagonismo que deveriam ter. Garantir esse protagonismo depende: otimização das informações sobre a realidade social; pesquisa comprometida ética e politicamente com mudanças sociais; sistematização de conhecimento para subsidiar políticas públicas. -O próprio Assistente Social não se reconhece como sujeito em algumas situações e precisa romper com sua posição de subalternidade em relação as outras áreas de conhecimento. -O projeto ético – político profissional (dec. de 90) é um avanço em relação a isto, pois coloca o sujeito na condição de protagonista e a necessidade da pesquisa vinculada à intervenção. -Trabalhar com recursos metodológicos que priorizem o sujeito através

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de depoimentos orais não é suficiente pra garantir-lhe protagonismo, é preciso avançar para produção de pesquisas de alcance social ampliado, capaz de produzir indicadores sociais que fundamentem programas e políticas sociais. -Dados de natureza quantitativa têm maior impacto na orientação e proposição de projetos sociais; depoimentos, aspectos qualitativos revelam a experiência concreta dos sujeitos e contribuem para redimensionar práticas: articular pesquisa qualitativa e pesquisa quantitativa garantiria protagonismo ao sujeito através das muitas dimensões da sua existência (subjetiva/objetiva).

5-Elaine Rossetti Behring

-Ainda há muitas pesquisas sobre instituições, políticas públicas e não está assegurada a centralidade ao sujeito. -O sujeito não pode ser visto como objeto e ser trabalhado em função dos dados que pode fornecer. -É preciso garantir um processo de socialização do conhecimento construído, provocando nova postura, novos conhecimentos, conforme prevê nosso Código de Ética. -As condições em que se fazem pesquisa hoje nas Universidades dificultam um processo sério de devolução e um processo de amadurecimento intelectual em relação ao referencial analítico e o material coletado.

6-Aglair Alencar Setubal

-Pesquisador e pesquisado são sujeitos – devem ser considerados suas experiências e seus conhecimentos. -Não é negando a existência dos conhecimentos e experiências destes sujeitos que garantimos cientificidade à pesquisa. -O “desacreditar da neutralidade científica” possibilita apreensão da complexidade da realidade. -É preciso reconhecer a força da experiência e do conhecimento dos sujeitos – rigor teórico – metodológico. -Ao Assistente Social cabe tratar o seu cotidiano como fonte de conhecimento, que precisa ser sistematizado, problematizado para dar conta das múltiplas determinações presentes na realidade.

7-Aldaíza Sposati

- Os Assistentes Sociais trabalham mais intensamente com “segmentos invisíveis sobre os quais os conhecimentos que se tem são genéricos e preconceituosos.” - Dar voz ao sujeito e não tratá-lo como objeto faz parte de compromissos éticos e democráticos presentes na profissão. Também é meio de fazermos outras leituras e trazer à luz outros conhecimentos sobre a realidade. - Deve-se levar em conta que muitas vezes o modo como o sujeito é indagado não garante “ a possibilidade dele ter opinião” . Acaba-se em generalizações que não corresponde a forma como o sujeito se coloca frente a realidade. - “ E muito interessante porque eu creio que a gente tem chance de trabalhar, de dar voz, de incluir na academia, de trazer vozes desconhecidas, entendeu? Eu acho que o modo de trabalhar o sujeito abre novos caminhos, você traz novas formas de ver. E eu estou trabalhando o conceito de sujeito, que muitos consideram como objeto.

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Eu estou trabalhando o sujeito, exatamente, como aquele que é o co-protagonista do processo de investigação e que você está discutindo e vai sistematizar.” - O Assistente Social é preparado para realizar a aproximação ao sujeito, a dificuldade é ir além disso. Talvez ele não saiba lidar com as informações que tem acesso – falta-lhe o rigor de um pesquisador “ ... que ele também precisa aprender, difundir, trabalhar.”

Questões/ Sujeitos

4- Qual o impacto das Pesquisas do Serviço Social junto às organizações sociais em que trabalha e nas Condições de vida dos Sujeitos que requisitam sua prática profissional?

1- Lúcia Cortes da Costa

-Grande produção na área da criança e adolescente, assistência social, saúde e impacto nas Capacitações de Conselheiros para gestão das políticas públicas e para instrumentalizar a população em processos de mudanças. -Impacto ampliado restrito devido a pouca tradição em publicação e dificuldades em publicar em revistas indexadas. -Em relação aos profissionais o impacto se evidencia pela necessidade de atualização permanente (pós – graduação). -Papel da Universidade em produzir conhecimento e criar espaços para mobiliza - lo junto à categoria, junto à comunidade em diversos espaços de formação.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-Inquietação do pesquisador com as demandas profissionais leva à construção do objeto de estudo num processo continuado de pesquisa. -O retorno e alcance social exige mobilização dos segmentos da sociedade relacionados ao objeto de estudo/movimentar os resultados da pesquisa socializando-os e atualizando-os com novas demandas. -É responsabilidade do Serviço Social dar retorno de suas pesquisas às organizações, aos sujeitos, à categoria, pois seu objeto é constituído por questões graves e complexas. -Em relação à pós – graduação (M/D): os alunos dão continuidade às pesquisas que realizam em suas unidades de ensino, buscam instrumentalizar-se e fundamentar –se teóricamente e quando retornam são multiplicadores através da docência, da própria pesquisa ou de trabalhos extensionistas, gerando uma influência para além da academia-“...acho que precisamos ser mais criativo pra poder ter um impacto maior.” E investir em marketing para divulgar a produção de conhecimento da área. -Há um reconhecimento e busca do conhecimento do S.S. pelas outras áreas de conhecimento. -A própria academia e agências de fomento têm exigido publicação e essa necessidade tem gerado alternativas de veiculação, como as revistas eletrônicas.

3- Ana Elizabete Mota

-“Não acredito que haja um “impacto” direto das pesquisas nem nas organizações nem nas condições de vida dos sujeitos...” Porque as pesquisas se referem ao conhecimento da realidade através de processo intelectivo de aproximação sucessiva à realidade e algumas mediações possibilitam intervenções que interfiram nas condições de vida dos sujeitos.

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-O conhecimento através de seus produtos possibilita sistematizações que orientam a direção e as estratégias da ação profissional. -Há necessidade de pesquisas empíricas e pesquisas teóricas.

4-Eunice Teresinha Fávero

-Impacto pequeno. -Duas posições: 1) desvalorização das pesquisas desenvolvidas pelos profissionais do S.S. e supervalorização das pesquisas de outras áreas; 2) expectativa de resultados imediatos. -“Existe um processo de conhecimento que caminha junto com o processo de mudança de mentalidade.” Para que os profissionais valorizem o conhecimento produzido na área é preciso que valorizem o processo da pesquisa e para isso precisam vivenciar o processo da pesquisa. -Impacto depende da organização política que mobiliza os profissionais a discutirem suas práticas, condições de trabalho, a realidade social, motivando a busca de conhecimento = gera necessidade de qualificar a intervenção. -Intervenção/organização política/pesquisa têm que caminhar juntas = fortalecimento da categoria, avanços na concretização do projeto ético – político profissional.

5-Elaine Rossetti Behring

-A relevância social de uma pesquisa está em sua capacidade de apreender a realidade e em “dizer coisas sobre a realidade.” -Repercussões na formulação e implementação das políticas e na formação de quadros profissionais, principalmente as que tem caráter extensionistas nas Universidades. -Tem buscado mostrar caminhos, estratégias de enfrentamento das demandas sociais. -Capacitação de Conselheiros, de Profissionais, de Usuários. -Nosso projeto ético – político dá uma direção às pesquisas da área, embora haja pesquisas que estão centradas em questões colocadas pelo pós – modernismo (a profissão é plural) Ex.: pesquisas no campo das representações sociais. -O Serviço Social tem avançado em relação a perspectiva analítica crítica, tornando-se “simpático exílio” para pesquisadores das Ciências Sociais. -“A investigação é uma dimensão do próprio exercício profissional, ela não é exterior...” -Relatórios, levantamentos de dados bem feitos podem se constituir material para analise da realidade e formulação de políticas, mas as condições objetivas de trabalho do AS. Nem sempre propiciam isso.

6-Aglair Alencar Setubal

-Impacto social comprometido pelo desinteresse dos profissionais em conhecer a produção do Serviço Social, principalmente quando faz crítica ao próprio profissional em casos de intervenção de caráter conservador. -Quanto às condições de vida dos sujeitos o impacto é possível quando se trata de pesquisa – ação, pesquisa que trabalha com história oral ou quando o profissional assume postura política que busca romper com o “discurso instituído” e práticas reiterativas.

7-Aldaíza -Impacto em duas vertentes: 1) democratização dos resultados, acesso

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Sposati dos usuários aos resultados de forma que os mesmos sejam apossados, incorporados, apropriados pelos sujeitos – democratização da linguagem. -Há um gap entre o nível acadêmico do conhecimento e o nível que permite a apreensão pelos sujeitos. -O modo como é trabalhado esse conhecimento faz diferença em relação ao seu impacto junto aos sujeitos. 2) Impacto institucional: também depende da democratização da linguagem, mas sobretudo depende do grau de suportabilidade da crítica. Nem toda instituição suporta a crítica ou a enxerga como alavanca da construção. –O impacto institucional depende da sutileza da apresentação dos resultados. O outro aspecto, importante, é em relação ao nível de envolvimento dos sujeitos em relação à pesquisa e seus resultados: “...creio que nós não podemos esquecer que o processo da problematização também tem que ser democratizado, porque se eu, na verdade, não divido este estímulo de saber o quê de quê, porque as pessoas também se põem essa interrogação, aquela descoberta se não tiver uma factualidade muito grande, não vai bater o significado. Quer dizer eu tenho que construir um significado pra que isso possa bater e possa fazer um sentido pras pessoas.” - O vínculo entre os sujeitos e a pesquisa e seus resultados deve estar sustentado no “desejo de se indagar sobre aquilo.” Se não há o vínculo com a problemática da pesquisa não há impacto. - “O impacto vai depender do resultado obtido, da linguagem utilizada nesse resultado, mas da capacidade, da abertura pra mudança, pra entender a crítica e também para o estímulo que se cria pra compreender aquele resultado...” São nuances de um mesmo processo. Não dá pra reduzir a um único aspecto. -Em relação aos profissionais: depende do conjunto dos aspectos já citados. No entanto, em relação aos profissionais há fragilidades, como: não há uma linha de pesquisa que esteja aclarando aspectos centrais da profissão; o profissional tem sede de conhecimento de caráter conjuntural, ou seja ligado a demandas emergenciais; ; a pesquisa em Serviço Social tem outro estatuto acadêmico, se volta para a redistribuição social, tem valores, ética comprometidos com o social.

Questões/ Sujeitos

5- Que desafios isto traz à profissão considerando a complexidade sócio – histórica da realidade geradora do objeto de atenção profissional?

1- Lúcia Cortes da Costa

-Leitura crítica da realidade social/compreensão dos fundamentos das desigualdades sociais articulada ao projeto ético – político. -A profissão ser reconhecida como produtora de conhecimento. -“Debate teórico forte”: formação fundada nos clássicos.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-Desafios são coletivos e individuais. -Desafios coletivos: organização da categoria e ocupação de diferentes espaços que envolva financiamento, produção e circulação do conhecimento. Estabelecer as mediações necessárias para romper com obstáculos à produção do conhecimento na área. Fortalecimento do

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CFESS, CRESS, ABEPSS. Desafios individuais: “...como eu posso ser esse profissional que atenda essa direção social da profissão...” e que no cotidiano, nas instituições enfrente criticamente os desafios profissionais, que não permita a simplificação e/ou negação do fazer profissional. - Estar inteirado, informado sobre o movimento de transformação da realidade social e intervir com competência e habilidade, sem perder de vista a perspectiva da totalidade.

3- Ana Elizabete Mota

-Limites relacionados mais à educação brasileira, aos recursos disponíveis à pesquisa, condições de trabalho dos pesquisadores do que à potencialidade e ao domínio teórico – metodológico dos profissionais em fazer pesquisa. -Ampliação da política editorial, formação na graduação e pós – graduação fundada na relação profissão/realidade. -Os limites à pesquisa referem-se mais às determinações externas do que às próprias da profissão.

4-Eunice Teresinha Fávero

-Investimento em pesquisa como parte da intervenção. -Acesso à formação continuada. -Mestrados e Doutorados com maiores investimentos em formação de pesquisadores. -Criar mecanismos das pesquisas contribuírem para formulação de políticas públicas e/ou projetos sociais. -Interlocução com outras áreas de conhecimento = trabalho conjunto, resultados adequados às necessidades e à realidade da população.

5-Elaine Rossetti Behring

-Formação teórica consistente ao pesquisador = pesquisa como processo de larga duração. -Fortalecimento da Universidade Pública. -Luta contra o aligeiramento da formação profissional. -Qualificação teórica – enfrentamento político – acadêmico das abordagens descritivas, pós – modernas que estão presentes no meio acadêmico. -Trazer à luz os sujeitos através das pesquisas. -Socializar com a própria categoria o conhecimento produzido. -O maior desafio: traduzir o projeto ético político no trabalho do profissional.

6-Aglair Alencar Setubal

-“Vencer a prática descomprometida com a transformação social.” -“Conceber a pesquisa como fundamental à prática profissional” – o que transcende o imediato e identifica mediações que possibilitam compreender a complexidade da realidade sócio – histórica. -Indicar caminhos para solução de problemas.

7-Aldaíza Sposati

- O estímulo à pesquisa não está presente na dinâmica institucional. O Assistente Social está nas ações pontuais, na porta de entrada dos serviços e neste contexto não chega a fazer as inter-relações necessárias. - Se entendemos como objeto de atenção profissional as manifestações da questão social, que são múltiplas, históricas, conjunturais, “...o desafio é decodificar essa complexidade, não na sua simplificação, mas

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na sua compreensão, de entender porque vínculos passam, ainda que as manifestações sejam múltiplas, existem raízes fundantes dessas manifestações , como existem rupturas.” - Não podemos cair no determinismo e nem numa simplificação da compreensão da problemática da questão social. - “ o principal desafio é dar conta da realidade, é produzir conhecimento sobre a realidade, mas numa pauta ético – política...”

Questões/ Sujeitos

6- Qual a particularidade das pesquisas desenvolvidas pelo Serviço Social?

1- Lúcia Cortes da Costa

-Repensar a prática: não se trata de pesquisa especulativa, mas centrada numa perspectiva interventiva. -O conhecimento deve ser capaz de operar transformações em diferentes níveis. -Compreender a realidade e pensar estratégias de intervenção fundado no eixo da democracia.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-Assistente Social tem um contato fértil com a realidade. -Assistente Social tem conhecimento, habilidades e competência para essa aproximação com a realidade e para desencadear histórias de vida. -Traz princípios éticos vinculados à sua formação profissional e que ficam presentes na pesquisa social ao se buscar compreender questões complexas. -A inquietação, o inconformismo que mobiliza a intervenção e pesquisa no S.S. -“A particularidade dela é estar nessa trama toda, é buscar na trama das relações aquilo que é o que me inquieta.” -Horizonte da pesquisa: conhecer pra mudar a realidade social, pra influenciar novos rumos.

3- Ana Elizabete Mota

-“Sempre tenho dificuldade em responder esta questão e por vezes me pergunto qual a importância dela, especialmente nesta conjuntura atual, quando as fronteiras entre as especializações e profissões são muito tênues. Mesmo assim, vou arriscar: acho que a particularidade reside em pesquisar as situações e questões que envolvem os objetos de intervenção, seja através de estudos empíricos seja de pesquisas teóricas.”

4-Eunice Teresinha Fávero

-Acesso privilegiado ao sujeito em uma perspectiva de totalidade e não a fragmentos de sua realidade. -Esse conhecimento da realidade fundamenta as ações profissionais e pode gerar conhecimento que mobilize ações que contribuam com transformações societárias e produzir indicadores sociais que sustentem e direcionem a definição de projetos sociais, dando maior visibilidade a capacidade profissional em produzir conhecimento.

5-Elaine Rossetti Behring

-Relevância social e engajamento político da pesquisa. -Referência teórica de tradição marxista como uma tendência hegemônica na profissão com respeito às demais tendências teórico – metodológicas – perspectiva pluralista. -“...faz diferença mesmo é a referência analítica, essa idéia de que nós fazemos pesquisa engajada para iluminar aspectos da realidade, no

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sentido de produzir transformações.” 6-Aglair Alencar Setubal

-O Serviço Social atua na ponta e tem oportunidade de descobrir os conflitos e problemas sociais em sua fase embrionária. -As temáticas de pesquisa são amplas, muitas desconhecidas por outras profissões.

7-Aldaíza Sposati

- “Eu não sou capaz de dizer, eu acho que aí, na verdade, nós temos muitas modalidades...” Exemplo na área da Assistência o elenco de objetos é amplo e multifacetado ( pesquisa do Núcleo de Seguridade Social). - Não se tratando de particularidade, mas de característica: as pesquisas são mais qualitativas do que quantitativas , não porque o Serviço Social tem como particularidade o qualitativo, muito mais por não saber trabalhar o quantitativo. -Quanto ao método: as pesquisas falam de relações sociais, relações humanas – são pesquisas relacionais, estudam vínculos, têm inserções históricas. -“....elas são construções históricas, elas têm valores.” - Em relação as áreas das Ciências Naturais ou Exatas, as pesquisas em Serviço Social têm um caráter complexo, com construções que observam o cotidiano, com variáveis que não são seguras e determinada. - Achar a chave heurística é difícil porque a pesquisa no Serviço Social está amarrada aos cursos de pós-graduação e às exigências do ensino. “Desse ponto de vista eu não entendo que exista uma disseminação, propriamente, da pesquisa em Serviço Social fora das relações da academia e dentro das relações da academia ela vais ficar subordinada ao objeto de estudo que o pesquisador elege para sua titulação, que em geral sai muito mais de uma reflexão que lhe é mais próxima, do que uma relação de decodificação de algo numa compreensão mais genérica.” - Muitos dos objetos do Serviço Social são de outras áreas também, o que dificulta demarcar que a particularidade se ponha pelo objeto de atenção e pela forma de abordá-lo. - “ ...Eu creio que nós estamos com muitas poucas demandas claras, assertivas de investigação pra orientar a pesquisa em Serviço Social. Eu acho que nós temos tido muito pouco debate sobre o Serviço Social pra ter uma agenda de questões a orientar as investigações. Elas estão, extremamente, eu diria, fragmentadas nos vários interesses.”

Questões/ Sujeitos

7- Epígrafe/ Perfil Do Sujeito

1- Dra. Lúcia Cortes da Costa

“...Eu acho assim que uma das coisas que a gente tem que reconhecer até pra poder mudar é que a gente está aprendendo a fazer pesquisa. Isso eu tenho claro. Eu estou aprendendo a pesquisar. E a gente tem que Ter até essa humildade teórica pra gente não achar que o nosso saber é o mais correto. É um saber e ele vai se tornar ou mais ou menos relevante se a gente souber apreender a realidade. Então a gente está aprendendo , agora a gente tem que melhorar muito....”

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2- Jussara Maria Rosa Mendes

“...Eu fiz uma caminhada para fora...Eu me formei e fui pra dentro da saúde pública e depois eu fiz uma caminhada da saúde pública pra dentro, pra o Serviço Social... Eu acho que isso foi super importante pra mim, sabe essa caminhada. Eu até brincava dizendo que eu botei meu sapatinho de chumbo e voltei...Quando eu voltei fazer o mestrado, quando eu vim trabalhar aqui, na verdade eu vim carregada de uma experiência concreta...”

3- Ana Elizabete Mota

-“...Sou daquelas que defende que precisamos sempre pesquisar tendo em vistas as determinações macro-sociais do real com o aporte da teoria crítica, seguindo a velha lição marxiana de que “o concreto é síntese das múltiplas determinações do real” . Contudo é fundamental – e aí é que reside o desafio – é necessário a apropriação de outras categorias mediadoras para podermos trabalhar as particularidades e singularidades presentes na realidade. Me explico com um exemplo: trabalhar com programas de trabalho e renda, por exemplo, é uma requisição objetiva para o serviço social. Subjacente a esta atividade concreta está o desemprego e as possibilidades da economia brasileira. Claro que o desemprego e o crescimento da economia são questões que invocam determinações macro-sociais, mas para construir um programa, outras questões que informam sobre a particularidade brasileira e as singularidades regionais, locais, etc. necessitam ser apropriadas.”

4-Eunice Teresinha Fávero

-“Eu não consigo falar muito separadamente da organização política, da intervenção e da pesquisa, porque pra mim isto está muito imbricado. Faz parte da minha pessoa, da minha forma de ser e de agir. Não consigo ver uma sem a relação direta com a outra.”

5-Elaine Rossetti Behring

Eu acho assim, que quando o exercício profissional não incorpora a dimensão investigativa como um elemento interno ao processo de trabalho a tendência é se ter uma prática reiterativa, pouco criativa e de não realizar aquilo que o Marx chamou de praxis, que é a ação pensada. O grande desafio para o exercício profissional é não se deixar subsumir na rotina institucional, exercer aquela autonomia relativa profissional que nós temos e assegurar o espaço da reflexão e da investigação, que é o que pode permitir a formulação de novas estratégias no projeto de trabalho e no processo mesmo do trabalho, e na forma como o trabalho acontece. Então, eu acho que isso, talvez, seja o maior desafio.... traduzir o projeto ético – político profissional no trabalho é o grande desafio.”

6-Aglair Alencar Setubal

-“O Serviço Social como uma área de conhecimento histórico tem se reconstruído permanentemente à medida que, ao intervir numa dada realidade, tem procurado contribuir com o seu processo de transformação social. Essa relação entre o Serviço Social e a realidade faz com que ele também se transforme.”

7-Aldaíza Sposati

-“ E acho que eu fui bastante estimulada, talvez seja uma curiosidade minha, a ter esta noção da totalidade das coisas. Eu não sei, talvez um traço de personalidade, eu não sei desenvolver um pensamento se eu não consigo compreender o título, certo? Quero dizer, o conceito

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subjacente. Então eu tenho sempre essa necessidade de compreender a totalidade de alguma coisa, seja até a totalidade do aparecer ou até mesmo ir desdobrando o objeto em múltiplas faces pra poder compreendê-lo um pouco melhor. Então eu gosto muito da pesquisa, eu gosto muito do mergulho na realidade, eu não sou uma teórica, eu não tenho um raciocínio dedutivista. Eu trabalho muito mais do real pra cima e eu acho que isso são partes do compromisso de pesquisa.”

Questões/ Sujeitos

8- Reflexões Emergentes

1- Lúcia Cortes da Costa

-Avançar em relação ao domínio das metodologias de pesquisa e em relação ao domínio de recursos eletrônicos como os softwares de organização de dados quantitativos e depoimentos. -Ocupar e desenvolver os espaços acadêmicos de iniciação científica e núcleos de pesquisa - enquanto espaços de aprendizagem.

2- Jussara Maria Rosa Mendes

-O papel da ABEPSS, do CFESS em relação a organização da categoria e à produção de conhecimento. -CBASS e ENPESS e suas contribuições às discussões da profissão -A participação das agências de fomento: CAPES/CNPQ e órgãos estaduais/regionais. -A pós – graduação em Serviço Social no Brasil e suas áreas e linhas de pesquisa. -Avanços na área sócio – jurídica, saúde, assistência social. -Influência da PUC/SP na Pós Graduação PUC/RS. -Distanciamento entre a proposta original da ABEPSS e as diretrizes curriculares aprovadas pelo MEC- perdas para a formação profissional -Criação de Unidades de Ensino – qualidade. -Estatuto acadêmico do Serviço Social em relação as outras áreas deve-se a recente produção acadêmica da área, ao reconhecimento frágil desta produção com pouca tradição em publicações nacionais e internacionais.

3- Ana Elizabete Mota

-Limites entre as profissões e especializações do trabalho são muito difíceis de definir. O que é particular a cada área? -Pesquisas com preocupações macro – estruturais precisam informar a compreensão das expressões particulares da questão social no Brasil , bem como das singularidades regionais e locais.

4-Eunice Teresinha Fávero

-Contexto contemporâneo: processo de desqualificação da intervenção profissional em diversos espaços articulada a um processo de fragilização da formação profissional. -A pesquisa está mais restrita à academia e é preciso avançar num processo de formação que coloque a “....pesquisa enquanto subsídio fundamental para o processo de intervenção profissional.” -Há muitos profissionais insatisfeitos com a prática profissional – portadores de um discurso queixoso – gerando ou desmobilização ou uma intervenção sustentada em bom senso. Porém há muitos profissionais que buscam na pesquisa a superação de impasses profissionais e para sistematizar conhecimento a partir de seu cotidiano de trabalho.

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-Há uma fragilidade quanto ao domínio teórico – metodológico necessário à pesquisa e à intervenção – falhas de formação. -Papel da ABEPSS, do CFESS e dos Conselhos como mobilizadores de alternativas para se incorporar a pesquisa como parte da intervenção e para socialização do conhecimento já produzido, principalmente o CRESS que está mais próximo do profissional. -Profissionais com formação clássica em pesquisa ou de currículos antigos tem visão negativa da pesquisa: vinculada à pesquisa quantitativa, muito complexa ou só destinada à academia. -Núcleos de Estudos e Pesquisas podem ser espaços de articulação entre a academia e a realidade dos profissionais e de estimulação à pesquisa e à inserção na pós – graduação. -As agências de fomento precisam abrir espaço para as pesquisas que acontecem ou podem acontecer fora do espaço acadêmico, mas ocorrem em espaços de intervenção profissional. -Maior rigor das academias quanto a articulação entre a pesquisa quantitativa e qualitativa no que se refere à formação de pesquisadores e aos resultados alcançados com as pesquisas. -O uso de dados quantitativos não é uma exigência só da pesquisa é, também exigência da prática profissional. -Distanciamento dos cursos de doutorado e mestrado dos profissionais vinculados à intervenção. -Avanço de cursos de aperfeiçoamento ou especialização em áreas afins como terapia familiar – questão da qualidade. -A academia devia estar atenta as demandas da prática profissional e criar espaços de formação continuada.

5-Elaine Rossetti Behring

-Pesquisas direcionadas ao estudos de aspectos particulares da realidade profissional são importantes e contribuem para “...compor o processo global de conhecimento da realidade.” -O que mobiliza o Assistente Social a fazer pesquisa pode ser determinado por interesse intelectual ou pelo projeto ético – político profissional que preconiza comprometimento social , numa perspectiva analítica crítica. -A Universidade enfrenta hoje condições objetivas que implicam em processo de “aligeiramento” das pesquisas, que afeta a qualidade dos referenciais teóricos, do processo de coleta de material empírico e análise. -Curso de Capacitação Continuada – CFESS- 1.600 profissionais do Brasil todo- traduzir no processo de formação continuada o projeto ético político profissional e homogeneizar a compreensão do significado social da profissão. -Papel do CFESS: defesa das diretrizes curriculares; capacitação continuada; interlocução com pesquisadores e socialização do conhecimento junto à categoria. -O papel da graduação na formação de pesquisadores: despertar a inquietação no aluno: o aluno inquieto será um profissional inquieto, capaz de resistir à rotina e buscar alternativas criativas de prática profissional.

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-A interferência do MEC nas diretrizes curriculares. 6-Aglair Alencar Setubal

-A história oral não deve ser usada apenas como metodologia de pesquisa, mas também como parte da intervenção profissional. -As mediações : possibilitam conhecer a complexidade sócio – histórica da realidade geradora do objeto de atenção profissional.

7-Aldaíza Sposati

- “ O conteúdo da Sociologia ou das Ciências Sociais aumentou muito bastante na formação do Assistente Social. ... mas não que tenha aumentado a capacidade de análise do real. Isso é outra coisa, certo?” - Argumenta que cresceu o tipo de raciocínio dedutivo do que o raciocínio indutivo, chegando ao silogismo. Reduzindo a compreensão dos fenômenos à lógica do silogismo, das comparações, do que propriamente buscando a compreensão do real através de um processo de sua decifração. - Nem todos os profissionais estão na academia, dando aulas ou sendo pesquisadores. Na profissão existiu um momento em que se valorizava o planejamento, noutro houve um boom voltado para a pesquisa.

*Fonte: Entrevistas realizadas com sujeitos participantes da pesquisa no período de maio/outubro de 2004 Org.: a autora, 2004