Diversidade local x regional e Partição de diversidade

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS CURSO DE MESTRADO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE DISCIPLINA DE ECOLOGIA DE COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS Mestrandas: Leen S.F. Gillis Moratelli e Lorena da Siva Castilho Docente: Profª. Drª. Soraia Diniz “Diversidade Local x Diversidade Regional Partição de Diversidade” Cuiabá, MT 07 de Junho de 2011 1. Introdução 1

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

CURSO DE MESTRADO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DA  BIODIVERSIDADE

  DISCIPLINA DE ECOLOGIA DE COMUNIDADES E ECOSSISTEMAS

 

Mestrandas: Leen S.F. Gillis Moratelli e Lorena da Siva Castilho

Docente: Profª. Drª. Soraia Diniz

“Diversidade Local x Diversidade Regional

Partição de Diversidade”

Cuiabá, MT

07 de Junho de 2011

1. Introdução

1.1. Padrões de diversidade

Por que o número de espécies varia de um lugar para outro? De um tempo para outro? Estas são

questões que se apresentam, não só para os ecologistas, mas também para quem observa e pondera o

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mundo natural. Tentar entender estes padrões de diversidade tem sido um dos maiores focos dos

ecologistas desde o início da ecologia. Além disso, esse conhecimento é pré-requisito para esforços em

conservação em larga escala (prioridades globais) como em escalas regional e local (prioridades

nacionais) (Begon et al., 2006).

A biodiversidade ou diversidade biológica é um tema central de interesse dentro do campo da

ecologia e é mais freqüentemente expresso em termos de diversidade de espécies. Este termo tem

vários significados, sendo o mais simples a riqueza de espécies, ou seja, o número de espécies em uma

amostra. É importante distinguir a diferença entre riqueza e diversidade de espécies. Embora sejam

conceitos relacionados, não são sinônimos. O primeiro termo faz referência apenas ao número de

espécies presentes em uma comunidade, enquanto o segundo é uma medida que leva em conta tanto a

riqueza como a abundância relativa das espécies (Begon et al., 2006).

Como acontece com outras áreas da ecologia, a escala é um recurso fundamental nas discussões

da riqueza de espécies. Em geral, explicações sobre padrões ou gradientes de riqueza apresentam

componentes de escala, os quais podem ser maiores e menores. Para Cris et al. (2003), a detecção dos

padrões da diversidade varia conforme a escala de amostragem, ou seja, o padrão observado em uma

comunidade local pode ser diferente daquele encontrado em áreas mais amplas.

Assim, o número de espécies que vivem sobre uma rocha, por exemplo, refletirá as influências

locais, (micro-hábitats) e as conseqüências de interações das espécies (competição, predação e

parasitismo). A riqueza pode ser grande porque o pool regional por si só é grande (no rio como um todo

ou em escala maior). Ou por outras mudanças físicas (posição da rocha após uma cheia, ou após a

última glaciação na região).

1.2. Expressão da diversidade de uma comunidade

Para expressar a diversidade de uma comunidade, existem muitos índices de diversidade que

inclui tanto a riqueza quanto a equitabilidade (uniformidade de abundância) de espécies. Exemplos são

o Índice de Diversidade de Simpson e o Índice de Shannon-Weaver. Naturalmente, as tentativas de

descrever a comunidade, uma estrutura complexa por um único atributo, como riqueza, diversidade ou

equitabilidade podem ser criticadas pelo fato de que informações valiosas são perdidas.

Uma imagem mais completa da distribuição da abundância das espécies em uma comunidade

faz uso de um conjunto completo de índices, também chamado diagramas de classificação de

abundância (Begon et at., 2006). Os índices de diversidade devem ser vistos como abstrações da

complexa estrutura de comunidades, e podem ser úteis na descrição da estrutura da comunidade e na

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comparação de amostras ou de comunidades para monitoramento ambiental e fins conservacionistas

(Liu et al., 2007). Assim, a riqueza ou o número de espécies é insuficiente para representar a

biodiversidade de uma comunidade. Porém, no contexto deste trabalho vamos restringir a atenção para

a riqueza de espécies, em parte devido à sua natureza fundamental, mas principalmente porque muito

mais dados estão disponíveis para este atributo do que para qualquer outro aspecto da biodiversidade

(Begon et at., 2006).

2. Partição de diversidade

2.1. Definições e conceitos

R. J. Whittaker (1960; 1972) introduziu o conceito da relação entre escala e diversidade e definiu a

diversidade local como sendo a diversidade alfa (α), a diversidade regional, o pool de espécies disponíveis

na região, como diversidade gama (γ) e a diferença da composição de espécies entre as comunidades, ou

seja, a proporção em que a riqueza regional de espécies excede a média da riqueza em uma única

localidade, como diversidade beta (β).

A tabela a seguir foi elaborada com um exemplo hipotética, de como a diversidade é calculada

em diferentes escalas espaciais seguindo a terminologia de Whittaker (1960; 1972). A diversidade (aqui

a riqueza de espécies) dentro de uma determinada área ou de cada localidade é a diversidade alfa. A

riqueza das três áreas juntos (diversidade total) é a diversidade gama. Enquanto que a riqueza de

espécies exclusivas de cada localidade (riqueza entre as comunidades) é a diversidade beta.

Tabela 1: Exemplo hipotético de diversidade alfa, beta e gama de espécies de aves em três diferentes localidades.

Espécies hipotéticas Localidade 1 Localidade 2 Localidade 3A X    B X    C X    D X    E X    F X X  G X X  

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H X X  I X X  J X X  K   X  L   X XM     XN     X

Diversidade α 10 7 3Diversidade β Localidade 1 versus 2 = 7 Localidade 2 versus 3 = 8 Localidade 1 versus 3 = 13Diversidade γ   14  

2.2. Partição de diversidade como ferramenta para análise de padrões de diversidade

Quando a composição de espécies de um bioma ou região é homogênea, uma ou poucas

reservas será suficiente para conservar a biodiversidade regional, mas se pelo contrário existirem

diferenças consideráveis no espaço é necessário estabelecer um maior número de reservas. Nesse

sentido o conhecimento cuidadoso da diversidade β é vital para a seleção de áreas de conservação

(Bridgewater et al., 2004).

Os padrões espaciais de diversidade de espécies são conseqüências de distintos processos

ambientais atuando em diferentes escalas espaciais, como topografia, heterogeneidade climática e/ou

heterogeneidade da vegetação (Veech & Crist, 2007). Uma das aproximações mais influentes na

estimativa da contribuição dos diferentes tipos de habitat na diversidade total da paisagem envolve a

partição da diversidade (Veech et al., 2002). O que se dá em conseqüência da ligação de padrões de

biodiversidade com a heterogeneidade em nível da paisagem. Esta ligação emerge como uma

ferramenta promissória para identificar as escalas espaciais na qual a diversidade de espécies é maior

ou menor que as preditas por uma distribuição aleatória de espécies no espaço (Summerville et al.,

2002).

Existem dois modelos de partição de diversidade, o modelo de partição de diversidade

multiplicativa do Whittaker (1960), e o modelo aditivo de MacArthur et al. (1966). No modelo

multiplicativo γ = α x β e no modelo aditivo γ = α + β. O modelo aditivo fornece uma forma simples de

caracterizar uma região em termos de diversidade β (Gering et al., 2003). Diferentemente do modelo

multiplicativo, o modelo aditivo coloca a diversidade α e β na mesma unidade de medição, sendo α

uma média da diversidade das unidades amostrais e β uma média das diferenças entre as diversidades

dessas amostras. A diversidade gama é a somatória de α + β, que são expressas como porcentagem de γ

(Crist et al., 2003). A riqueza total de espécies (gama) encontrada em um conjunto total de unidades

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amostrais, em qualquer escala espacial, pode ser dividida em número médio de espécies que ocorrem

em uma unidade amostral (α) e o número médio de espécies adicionadas quando se aumenta a escala

espacial (β) (Veech et al., 2002).

Em seu trabalho Veech & Crist (2010), enfatizam que a diversidade alfa e gama são medidas

diretamente (estimadas) e que beta é determinado após estimar alfa e gama. Então a diversidade beta

não se observa diretamente, mas é interpretada ou determinada através da diversidade alfa (diversidade

local) e gama (diversidade regional). A diversidade beta, derivada de partição de diversidade, não

representa as diferenças na composição de espécies entre amostras individuais ou nas comunidades,

mas se trata de uma média geral de diversidade não encontrada em qualquer uma amostra (Veech et al.,

2002).

É possível distinguir dois grandes tipos de abordagem para estudar a beta diversidade: turnover

e variação (Anderson et al. 2010). A idéia do turnover é medir a mudança na estrutura da comunidade

de uma unidade amostral para outra, ao longo de um gradiente unidirecional, seja ele espacial, temporal

ou ambiental, implicando que o turnover possa ser expresso como uma taxa (Anderson et al., 2010). A

variação também expressa uma mudança na estrutura das comunidades, no espaço e/ou tempo, porém,

implica em mudança em relação a uma categoria, como um fator (ex. tipo de habitat), sem uma direção

(Anderson et al., 2010).

Assim, acredita-se que a popularidade da partição multiplicativa da diversidade de Whittaker (1960)

e subsequentemente a da partição aditiva da diversidade por MacArthur et al. (1966) se deu porque eles

fornecem um único conjunto de valores de alfa e da diversidade beta de uma escala de amostragem

específica e portanto, dá uma medida simples e intuitiva da diversidade e composição de espécies. Por esta

razão, acredita-se que os métodos de partição são uma ferramenta poderosa para quantificar a variação

espacial e temporal da biodiversidade de uma forma que seja acessível aos ecologistas, gestores e não-

cientistas (Crist & Veech, 2010). O custo da simplicidade, portanto, é que os métodos de partição de

diversidade descartam informações sobre composição num lugar especifico, e na ordenação, que pode ser

importante para os gradientes subjacentes de biofísica ou de uso do solo que produzem a beta diversidade

(Crist & Veech, 2010).

2.3. Exemplo ilustrativo de partição de diversidade aditiva em 3 escalas

A equação aditiva da diversidade γ = α + β é utilizada para dividir a diversidade total (riqueza

de espécies) da comunidade nos componentes alfa e beta, sendo alfa o numero médio de espécies

dentro das amostras e beta a quantidade média de diversidade não encontrada em uma amostra simples

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(Lande, 1996 Apud Veech et al., 2002). Neste exemplo foram estabelecidos dois níveis de medição da

diversidade. Sendo α1 a diversidade média dentro de uma parcela, e β1 a diferença média entre as 30

parcelas. Como a diversidade α a qualquer nível é a soma da diversidade α e β do nível inferior

(Wagner et al., 2000; Summerville et al., 2002) considera-se a seguinte equação para explicar a

diversidade nos três sítios; α2 (sítios) = α1(parcelas) + β1(parcelas). O nível maior de diversidade aqui

considerado é γ = α2 + β2 . Por substituição a formula final de partição aditiva da diversidade é γ = α1

+ β1 + β2. Assim, essa teoria melhor será explicada através do seguinte exemplo hipotético:

Considera-se o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães com uma diversidade regional (gama).

Neste parque duas localidades foram amostradas, o Vale do Rio Claro e o Complexo das Cachoeiras.

Cada um apresenta uma diversidade alfa. Ao estimar a diversidade de cada local foram amostras 10

parcelas em cada um. Cada parcela apresenta uma diversidade alfa e a média destas diversidades

somando-se à diversidade beta (a diferença média entre as parcelas), tem-se a diversidade alfa da

localidade Rio Claro. Da mesma forma tem-se a diversidade alfa da localidade Complexo das

Cachoeiras. Ao juntar estas diversidades com a diversidade beta (diferença entre as duas localidades)

obtém a diversidade gama. Assim ao calcular a diversidade pela fórmula de partição aditiva da

diversidade, temos: γ (Parque Nacional de Chapada dos Guimarães) = α(média de riqueza das 20

amostras = diversidade média dos dois locais) + β1 (média das espécies exclusivas de cada amostra) +

β2 (média das espécies exclusivas de cada localidade).

A relação entre diversidade local e regional 3.1. Um olhar na historia

O interesse na diversidade natural cresceu na consciência pública por volta da década de 80 com

uma preocupação à iminente extinção de milhares de espécies, como resultado da poluição e da

destruição de habitat (Soulé et al., 1980 Apud Ricklefs, 1987). Em seu trabalho, Ricklefs (1987)

salienta que precisamos entender os processos responsáveis pela geração e manutenção da diversidade

nas comunidades biológicas, para prever a mudança nas comunidades após empobrecimento. Ainda na

década de 80, as investigações ecológicas eram largamente fundadas sobre a premissa de que a

diversidade local, o número de espécies que vivem em uma pequena área ecologicamente homogênea é

o resultado determinístico de processos locais no âmbito da comunidade biológica (Ricklefs, 1987). No

entanto, uma mudança importante de paradigma em ecologia de comunidades ocorreu nos últimos 25

anos com o reconhecimento de que as comunidades locais não são regidas apenas por processos locais,

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mas que os processos regionais também são importantes (Loreau, 2000). As demonstrações para esta

relação é que a diversidade biológica de uma comunidade, muitas vezes, não consegue convergir em

condições físicas semelhantes. Outra indicação é que comunidades locais não são resistentes a invasões

de espécies (Ricklefs, 1987).

Certamente, os fatores locais como competição, predação, parasita-hospedeiro, influenciam a

diversidade local (Begon et al., 2006). O problema para os ecologistas é o grau a que pode explicar

diversidade local unicamente por processos locais, sem considerar a matriz de processos em maiores

escalas espaciais e temporais onde a comunidade está inserida. Sabe-se agora que os mecanismos que

estruturam as comunidades em escalas locais e regionais são diferentes, embora conectados (Ricklefs,

1987). Por estarem conectados, esses mecanismos (locais e regionais) afetam simultaneamente as

comunidades (Ricklefs, 1987). Essa idéia implica que não apenas as interações bióticas influenciam a

formação das comunidades, mas também processos que ocorrem em escalas de tempo e espaço muito

maiores, como dispersão, especiação e extinção (Hubbell, 2001). Também é implícito nesta

conceituação que as comunidades não são unidades fixas, mas variam ao longo do tempo e no espaço

(Begon et al., 2006).

Assim, pelo fato de os mecanismos locais e regionais estarem conectados observa-se que existe

uma relação entre diversidade local e diversidade regional.

3.2. Relação entre diversidade local e diversidade regional: o balanço entre processos locais e

regionais

Uma maneira popular de sugerir que os processos regionais são importantes para as

comunidades locais é plotar a riqueza de espécies regional (o número de espécies no pool regional que

poderia teoricamente colonizar a comunidade) versus riqueza de espécies local (avaliada em um espaço

escala em que todas as espécies possam encontrar-se em uma comunidade). Normalmente estes

gráficos mostram que a diversidade local aumenta com a diversidade regional, na maioria dos casos de

forma linear, dando a impressão que as comunidades foram obtidas por amostragem proporcional a

partir do pool regional correspondente (Loreau, 2000). Assim também podemos avaliar o grau em que

as comunidades estão saturadas de espécies (Begon et al., 2006).

Se as comunidades estão saturadas com espécies, significa que o espaço do nicho está

totalmente utilizado. Neste caso, a riqueza local alcançará uma assíntota na sua relação com a riqueza

regional (Figura 1a) (Begon et al., 2006). Numa comunidade saturada, espera-se aumentar a riqueza

local com a riqueza regional em níveis muito baixos da riqueza regional e chegar rapidamente a um

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limite máximo. Em uma comunidade insaturada, por outro lado, é esperado a riqueza local ser uma

proporção constante da riqueza regional (Srivastava, 1999 Apud Begon et al., 2006). Na figura 1b, é

representando a relação assintótica entre riqueza local de moradia das comunidades de formigas (em

parcelas de 1m²) em 10 remanescentes florestais no Brasil em relação ao tamanho do pool regional de

espécies (considerado o número total de espécies no remanescente florestal em questão) (Soares et al.,

2001 Apud Begon et al., 2006). Na figura 1c observa-se a relação não assintótica entre a riqueza de

espécies local e estoque de espécies regional.

Figura 1: Relação entre riqueza regional e riqueza local

Parcelas locais e regionais de riqueza fornecem uma ferramenta útil para abordar a questão da

saturação de comunidade, mas eles devem ser usados com cautela. Por exemplo, Loreau (2000) salienta

que a natureza da relação depende da forma com que a riqueza total (γ) está repartida entre riqueza

dentro da comunidade (α), e riqueza entre comunidades (β). E esta é uma questão de escala em que as

diferentes comunidades se diferenciam uma da outra. A partir da equação gama = alfa + beta quando a

diversidade local fica constante, como no caso de saturação em curvas de riqueza local-regional, e a

diversidade gama aumenta, a diversidade beta aumentará. Esta dependência mútua entre a diversidade

local e regional foi reconhecido na teoria, porém ignorado na prática de interpretação de curvas de

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riqueza local-regional (Loreau, 2000). Assumindo que a diversidade alfa é constante, a pergunta é: qual

é o mecanismo que faz aumentar a diversidade gama e beta? Loreau (2000) explica que esta resposta

depende fundamentalmente na maneira que gama está dividido entre componentes alfa e beta; e isso

em si é uma questão de escalas. Em outras palavras, os pesquisadores podem erroneamente incluir

dentro de uma única comunidade diversos habitats que devem ser consideradas como diferentes

comunidades, ou, alternativamente, podem estudar as comunidades locais em uma escala

inadequadamente pequena (Begon et al., 2006) .

Ricklefs (2004) enfatiza no seu trabalho que os mecanismos locais e regionais que influenciam

a diversidade interagem em um continuum de tempo e espaço, que juntos criam um efeito sobre a

diversidade regional e estabelece uma relação entre a diversidade regional e local (figura 2). A idéia

básica é que as interações entre os indivíduos coexistindo influenciam a mudança no tamanho da

população local. No entanto, devido à dispersão dos indivíduos nas populações, essas interações estão

presentes em grandes regiões ecologicamente heterogêneas ao invés de dentro de 'comunidades' locais

em habitats relativamente uniformes. Extinção de espécies apenas acontece quando há alterações

persistentes no clima e relevo ou com mudanças evolutivas em populações de recursos alimentares,

competidores, predadores e patógenos. Como essas mudanças são lentas, o tempo de espera para a

extinção é da mesma ordem de grandeza que a produção de novas espécies, levando a perda e produção

de espécies no mesmo intervalo de tempo. Assim, em grande escala processos regionais influenciam a

diversidade regional a qual está diretamente conectada à diversidade local.

Também, a competição regula populações a um estado estável dentro de uma região, a exclusão

competitiva, à medida que ela ocorre, é plausivelmente estendida à escala de tempo de produção de

espécies. Assim, a taxa de produção de espécies dentro de uma região influencia diretamente o número

de espécies na região. Diversidade regional e local são conectadas através de ajustes geográficos e

através da extensão ecológica das populações. Quanto mais espécies são adicionadas a uma região, a

intensidade da competição aumenta, o nível médio de distribuição de espécies diminui o que leva a um

aumento na diversidade beta. Como interações das populações não restringem diretamente o número de

espécies cuja distribuição inclui um ponto específico no espaço, a diversidade alfa também aumenta

com o aumento da diversidade regional. Consequentemente, a densidade média da população local

declina. Assim, a diversidade local (alfa) e diversidade beta são espacialmente referenciadas e viram

propriedades de amostragem das distribuições de populações de espécies que se sobrepõem dentro de

uma região, levando a conexão direta entre a diversidade local e regional (Ricklefs, 2004).

Em relação a essa “conexão”, Loreau (2000) afirma que diversidade local e regional não pode

ser entendida isoladamente. A figura 2 representa esta relação entre a diversidade local e regional.

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Figura 2. Relação entre diversidade local e regional.

No mesmo trabalho, Ricklefs (2004), questiona a idéia de saturação de comunidade. A idéia de

saturação é ligada ao “limite de similaridade” (MacArthur, 1967 Apud Ricklefs, 2004), determinando o

grau de sobreposição de nicho que pode ser tolerado de espécies que coexistem. Contudo, o limite de

similaridade não determina a saturação. Nichos não são fixos e espécies podem ser adicionadas em uma

comunidade reduzindo a amplitude média do nicho respondendo a invasão. Ricklefs (2004) ainda

sugere que ecologistas deveriam abandonar conceitos de comunidade local. O que os ecologistas

chamaram comunidades no passado deve ser pensando como estimativas pontuais de sobreposição de

distribuições de espécies regionais. A extensão destas distribuições pode ser entendida apenas

considerando as interações dentro da região como um todo.

Atualmente existe outra maneira de pensar sobre as relações entre as espécies e o

desenvolvimento de padrões de diversidade, que por sua vez, promoverá pesquisa sobre as diversas

implicações da perspectiva regional como a estrutura genética de populações e as relações entre a

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diversidade alfa, beta e regional. A montagem desses dados para uma ampla gama de espécies pode,

então, levar a generalizações sobre padrões de diversidade que são mais solidamente fundamentados

nos processos que os produzem (Ricklefs, 2004).

4. Conclusão

Uma comunidade conterá mais espécies quanto mais completamente saturadas estiver. O que

pode ser abordado como uma relação entre diversidade e regional (número de espécies que

teoricamente poderia colonizar). Além disso, uma gama de fatores espaciais e temporalmente variáveis

influencia a riqueza de espécies.

A popularidade da partição da diversidade se deu porque é uma ferramenta que fornece um

único conjunto de valores de alfa e da diversidade beta de uma escala de amostragem específica e,

portanto, dá uma medida simples e intuitiva da diversidade e composição de espécies. Porém a

simplicidade do método descarta informações do complexo que é a comunidade. Todavia, a partição de

diversidade é uma importante ferramenta para medir padrões de diversidade em diferentes escalas de

espaço e de tempo.

A diversidade local e regional não pode ser entendida isoladamente. Existe uma relação de

dependência entre elas, reconhecido na teoria, porém ignorado na prática de interpretação de curvas de

riqueza local-regional.

Os mecanismos locais e regionais interagem em um continuum de tempo e espaço e juntos

criam um efeito sobre a diversidade regional. Atualmente existe outra maneira de pensar sobre as

relações entre as espécies e desenvolvimento de padrões de diversidade, em que as comunidades locais

não são vistas como complexos fechados.

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