Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

15

Click here to load reader

description

Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

Transcript of Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

Page 1: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 1/15

Ditadura militar, esquerdas e sociedade no Brasil

Daniel Aarão Reis Filho Especial para

*Gramsci e o Brasil 

A Ditadura Militar no Brasil: uma incômoda memória.

Quase ninguém quer se identificar com a Ditadura Militar no Brasil nos dias de hoje. Sobre o er!odo a mem"ria adquiriu uma arquitetura simlificada# de um lado$ a ditadura$ o reino dae%ce&ão$ os chamados anos de chumbo. De outro lado$ a nova república$ regida ela 'ei$ asociedade democr(tica.)mbora tenha desaarecido gradualmente$ em ordem e a*$ a ditadura militar foi e tem sidoobjeto de esc(rnio$ de desre*o$ ou de indiferen&a$ estabelecendo+se uma rutura dr(stica entre o

 assado e o resente$ quando não o sil,ncio e o esquecimento de um rocesso$ contudo$ tãorecente$ e tão imortante$ de nossa hist"ria.

)ntretanto$ se isto tudo corresonde - erdade$ como e%licar orque a ditadura não foisimlesmente derrotada/ 0omo comreender a erman,ncia de lideran&as e mecanismos de oder reserados e1ou constru!dos no er!odo da ditadura$ ela ditadura e ara a ditadura/ ) oque di*er da cultura ol!tica autorit(ria$ cuja italidade ninguém ode contestar/2ale* seja necess(rio refletir sobre as ra!*es e os fundamentos hist"ricos da ditadura militar$ ascomle%as rela&3es que se estabeleceram entre ela e a sociedade$ e$ num contraonto$ sobre o

 ael desemenhado elas esquerdas no er!odo.4 o que o resente te%to retende fa*er. 0ome&ando elo in!cio# o rocesso que desembocou nainstaura&ão da ditadura. )m seguida$ estudar o desenolimento dos goernos ditatoriais$ asoosi&3es de esquerda$ os rogramas alternatios aresentados$ o imacto que tieram$ semreno conte%to de uma sociedade que$ afinal$ nunca se rebelou de forma radical contra a 5rdem

igente. ) obserar$ finalmente$ como se foi e%tingindo a ditadura militar$ redefinindo+se$transformando+se$ transitando ara uma democracia sob formas h!bridas$ mudando de ele comoum camaleão muda de cores$ numa lenta metamorfose$ a onto de roocar ol,micas a reseitode quando$ efetiamente$ terminou. 6ossa escolha recai em 7898$ quando dei%ou de e%istir o)stado de e%ce&ão$ com a reoga&ão dos Atos :nstitucionais$ e foi aroada a Anistia$ ensejandoa olta do e%!lio dos rinciais l!deres das esquerdas brasileiras. Da! em diante$ abriu+se um

 er!odo de transi&ão$ até 78;;$ quando a aroa&ão de uma noa 0onstitui&ão restabeleceu ascondi&3es de um leno )stado de Direito em nosso a!s.) assim$ da ditadura fe*+se a democracia$ como um arto sem dor$ sem grandiloqu,ncia$cordialmente$ brasileiramente.

1. Abril, 1964: a !nese da ditadura ou a derrota do pro"eto nacional#estatista. 

A it"ria do moimento ciil+militar que derrubou <oão =oulart em abril de 78>?$ raticamentesem resist,ncia$ constituiu uma grande surresa. 0omo e%lic(+la/

 Brasil e América Latina no contexto da luta pela autonomia e pela afirmação de um projeto

nacional-estatista.

@ma rimeira chae$ mais amla$ engloba a América 'atina$ e$ a rigor$ o 2erceiro Mundo em seuconjunto. Remete - questão da iabilidade do rojeto de construção da autonomia no conte%todo mundo caitalista. 0om efeito$ desde a Segunda Reolu&ão :ndustrial$ de fins do século :$

frente -s grandes ot,ncias caitalistas$ colocou+se ara uma série de sociedades o desafio deconstruir uma inser&ão autnoma no mercado caitalista internacional. 6a rede armada elo

7

Page 2: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 2/15

 rocesso de internacionali*a&ão do caital Ccomércio de mercadorias e e%orta&ão de caitais$combinada com a e%ansão territorial$ sobretudo das ot,ncias euroéias$ la&os aertados dedeend,ncia foram tecidos$ dificultando$ -s e*es imedindo$ nas regi3es da Efrica$ Esia eAmérica 'atina$ a conquista de uma real autonomia ol!tica e econmica$ mesmo entre aqueles

 a!ses que não chegaram a ser transformados em colonias diretas Ccaso da 0hina$ ou que j(

tinham dei%ado de s,+lo Ccaso de quase todos os a!ses da América 'atina.A : =rande =uerra e as conuls3es subsequentes dos cr!ticos anos G e HG Cemerg,ncia dareolu&ão russa$ surgimento dos fascismos$ crise geral das economias liberais abriram brechasnestes la&os de deend,ncia$ ermitindo a estrutura&ão de rojetos autonomistas$ assumindo$quase semre$ um car(ter nacional-estatista. A roosta reublicana de Sun Iat+sen na 0hina$ amoderni*a&ão da 2urquia$ liderada or Mustaha Jemal$ o Kartido do 0ongresso na Lndia$ onacionalismo me%icano de )rnesto 0(rdenas$ o )stado 6oo arguista$ tinham este sentido#e%lorar os esa&os criados elo enfraquecimento das ot,ncias$ ou1e a rialidade entre elas$ aralograr margens de autonomia. Kara além de suas diersidades$ estas diferentes iniciatiasesbo&aram o rojeto ambicioso de construir um desenolimento nacional autnomo no conte%todo caitalismo internacional$ baseado nos seguintes elementos rinciais# um )stado fortalecido

e interencionista$ um lanejamento mais ou menos centrali*ado$ um moimento$ ou um artidonacional$ congregando as diferentes classes em torno de uma ideologia nacional e de lideran&ascarism(ticas$ baseadas numa !ntima associa&ão$ não aenas imosta$ mas também concertada$entre )stado$ Katr3es e 2rabalhadores. )ra a! disseminada a cr!tica aos rinc!ios do caitalismoliberal e - liberdade irrestrita dos caitais. )m oosi&ão$ defendia+se a l"gica dos interesses

nacionais e da justiça social $ que um )stado interencionista e regulador trataria de garantir. 6o transcurso da :: =uerra Mundial$ as circunstNncias obrigariam as grandes ot,ncias aconciliar com estes rojetos. Deois da conflagra&ão$ contudo$ noas circunstNncias imoriamredefini&3es de rumos.5 enfraquecimento das ot,ncias euroéias e do <aão$ e a estrutura&ão de oderososmoimentos de liberta&ão nacional areciam abrir um hori*onte faor(el$ inclusie orque asduas grandes suerot,ncias resultantes do conflito mundial + os )@A e a @RSS +$ embora cominten&3es diersas$ estaam também interessadas na fim dos elhos imérios coloniais. )steOltimo asecto$ contudo$ aresentaa ambiguidades$ orque tanto os )@A como a @RSScultiaam ambi&3es uniersais e$ na l"gica da biolaridade da =uerra Fria$ retendiam redu*iras margens de autonomia j( conquistadas ou a conquistar.Mas as coisas não se assaram da mesma forma nas (rias regi3es do mundo.

 6a Esia$ a derrota do <aão e a resen&a de fortes moimentos de liberta&ão nacional$ ensejarama conquista de margens consider(eis de autonomia$ e%ressas na indeend,ncia de uma série de

 oos e no triunfo da reolu&ão chinesa. 6o mundo mu&ulmano$ os moimentos autonomistas tornaram+se irreers!eis na rimeira

metade dos anos PG$ com o nasserismo$ e$ um ouco mais tarde$ atraés da reolu&ão argelina edo socialismo árabe. 6a Efrica negra$ a artir da indeend,ncia de =hana$ em 78P9$desencadeou+se uma grande onda de indeend,ncias.2odo este rocesso abriu hori*ontes + e grandes eseran&as + ara a constru&ão dos rojetosautonomistas. A confer,ncia de Bandung$ reali*ada em 78PP$ estabeleceria os marcos iniciaisdesta utopia terceiro-mundista$ um dos comonentes essenciais das rela&3es internacionais até osanos >G e arte dos anos 9G. )la se baseaa na cren&a de que seria oss!el alcan&ar o sonhadodesenolimento autnomo com base num projeto nacional-estatista.

 6a América 'atina$ entretanto$ as coisas tomaram outros rumos. )m irtude da maior resen&ados )@A$ do ouco eso da @RSS$ das o&3es definidas ela maior arte das elites dominantesda (rea$ de certas tradi&3es culturais$ os rojetos autonomistas constru!dos com algum ,%ito até

78?P tenderam a erder flego e igor.oue resist,ncias$ sem dOida.

Page 3: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 3/15

5 eronismo na Argentina$ a reolu&ão boliiana$ o arismo no Keru$ o moimento democr(tico+ oular na ene*uela$ o nacionalismo me%icano$ o arguismo e o trabalhismo no Brasil$ além deuma série de moimentos e e%erimentos na América 0entral$ como o liderado or <. Arben* na=uatemala$ atestam a for&a acumulada e as ra!*es sociais e hist"ricas$ em nosso continente$ do

 rograma nacional-estatista$ em luta ela conquista da autonomia.

)ntretanto$ a roosta de um desenolimento deendente e associado aos caitais internacionaisganhou for&a ao longo dos anos PG$ quando noas reestrutura&3es da diisão internacional dotrabalho ermitiram a alguns a!ses mais imortantes do continente + Brasil$ Argentina$ Mé%ico +disorem de condi&3es ara emrender surtos industriali*antes.As alian&as então constitu!das$ e as e%ectatias geradas$ elo menos em alguns a!ses que

 uderam registrar altos n!eis de crescimento econmico$ como$ or e%emlo$ o Brasil dos !

anos em  de <uscelino Jubitsche$ minaram$ mas não chegaram a destruir as bases constitu!das ela tradi&ão nacional+estatista.0om efeito$ nem todos os dados estaam ainda jogados.A it"ria da reolu&ão cubana$ em 78P8$ a da reolu&ão argelina$ em 78>$ o rocesso deindeend,ncias nacionais na Efrica negra e no mundo (rabe e mu&ulmano$ a luta reolucion(ria

no ietnã$ retomada a artir dos come&os dos anos >G$ entre muitos outros acontecimentos$conferiram noo alento aos moimentos nacional-estatistas latino+americanos.5 enfrentamento entre 0uba e os oderosos )stados @nidos da América emolgaam ascorrentes nacionalistas$ que se reconheciam como arte da nuestra América$ um sonho de <oséMart!$ que muito se assemelhaa$ nas condi&3es da América 'atina$ ao esp"rito afro+asi(ticoformulado em Bandung. Assim$ numa ersectia mais amla$ hist"rica$ a reolu&ão cubana

 ode ser aaliada como um elo a mais da longa luta dos moimentos nacional-estatistas latino+americanos ela conquista de margens de autonomia. 6esta mesma ersectia$ o car(tersocialista do regime ol!tico e social cubano deeria ser comrendido muito mais como umaimosi&ão da ressão e do cerco dos )@A + e da necess(ria alian&a de defesa com a @RSS + doque como uma eolu&ão consciente e estruturada da r"ria reolu&ão.

 6este conte%to internacional abriu+se uma conjuntura de grandes lutas sociais$ até então inéditana hist"ria da reOblica brasileira. 5 marco inicial foi a renOncia do residente <anio Quadros$em agosto de 78>7.

#$%#-#$%&' a derrota hist(rica do projeto nacional-estatista

<anio fora eleito$ em outubro de 78>G$ articulando um leque de for&as# oligarquias liberais$classes médias$ amlos contingentes de trabalhadores. )staam todos$ or diferentes ra*3es$descontentes com os rumos da sociedade. A euforia desenvolvimentista$ da segunda metade dosanos PG$ cedera lugar - areensão face -s contradi&3es que se acumulaam# o ritmo de

crescimento diminu!ra$ crescera a infla&ão$ intensificara+se o cortejo de desajustes r"rios deéocas de transforma&3es aceleradas.0omo resultado$ desgastaram+se as for&as e os artidos que haiam comandado até então o a!s$criando+se na sociedade uma atmosfera geral a faor de mudan&as. )ra reciso renoar a ida

 ol!tica do a!s. <anio$ l!der carism(tico or e%cel,ncia$ soube encarnar estes anseios elo novo$tão r"rios da cultura ol!tica brasileira.Mas o goerno$ iniciado em janeiro de 78>7$ cedo areceu uma ot,ncia que não se reali*aa. A

 ol!tica econmica$ na linha da ortodo%ia monetarista$ desagradaa o setor industrial. A ol!ticae%terna indeendente irritaa os setores conseradores sem angariar o aoio das esquerdas$desre*adas or <anio. Quanto aos trabalhadores$ frente - infla&ão crescente$ recebiam romessasde austeridade...

5 residente arecia aostar aenas no di(logo direto com a sociedade$ e%ercitando seu ineg(elcarisma. Reclamaa de restri&3es e alegaa carecer de lenos oderes$ e foi com a ersectia de

H

Page 4: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 4/15

obt,+los que renunciou$ em agosto de 78>7$ num gole bem urdido Csurreendeu a todos$ mas essimamente e%ecutado + não haia nenhum disositio organi*ado ara aroeitar+se dasitua&ão de caos e de quase guerra ciil em que o a!s mergulhou or quase duas semanas.5s ministros militares tentaram imedir a osse do ice+residente eleito$ <oão =oulart$ l!der doKartido 2rabalhista Brasileiro CK2B. 6o entanto$ frente ao moimento de resist,ncia$ houe um

acordo em que ambos os lados recuaram.Afinal$ <ango assumiu o goerno$ em 9 de setembro de 78>7$ mas no quadro de um arlamentarismo h!brido$ associando um residente enfraquecido e um arlamento fraco. Quantoaos golistas$ tieram as osi&3es reseradas$ não sendo unidos.Alguns asectos da crise merecem ser destacados. )rimo$ a imroisa&ão do eto - osse de<ango$ deida - r"ria surresa com que foram colhidos os ministros militares ela renOncia do

 residente <anio Quadros$ aliada - indecisão e -s diis3es das elites dominantes$ constitu!ramfatores fundamentais ara o fracasso da tentatia de gole. *ecundo$ o rotagonismo dosmoimentos oulares$ que entraram na cena ol!tica em defesa da osse de =oulart. 6asequ,ncia$ eles não se dei%ariam tão facilmente afastar do alco. +ertio$ o fato essencial de queestes moimentos haiam artido ara a luta em defesa da democracia$ da lei e da ordem

constitucional. )m outras alaras$ a luta se traara em defesa da ordem le,al .0om a osse de <oão =oulart$ tornou+se oss!el reatuali*ar a hi"tese do rojeto nacional+estatista. 0om efeito$ se o desenvolvimentismo de <J$ como j( referido$ abalara alguns de seusfundamentos$ não o suerara. Quanto a <anio Quadros não tee sequer temo$ ou condi&3es$ araelaborar alguma alternatia. Ressurgia assim uma ossibilidade que muitos imaginaamdefinitiamente enterrada.As agita&3es sociais amliaram+se$ num crescendo$ alcan&ando trabalhadores urbanos e rurais$assalariados e osseiros$ estudantes e graduados das for&as armadas$ configurando umaredefini&ão do rojeto nacional-estatista$ que assaria a incororar uma amla + e inédita +

 articia&ão oular. 2ale* e%atamente or causa disto$ mudaram o tom e o sentido do discurso#ao contr(rio de uma certa tradi&ão conciliat"ria$ t!ica do estilo de =etulio argas$ os obst(culosdeeriam agora ser remoidos$ e não eitados$ os alos$ abatidos$ e não contornados.) assim tomou coro o rograma das reformas de base.A reforma a,rária$ ara distribuir a terra$ com o objetio de criar uma numerosa classe de

 equenos roriet(rios no camo. A reforma urbana$ ara lanejar e regular o crescimento dascidades. A reforma bancária$ com o objetio de criar um sistema oltado ara o financiamentodas rioridades nacionais. A reforma tributária$ deslocando a ,nfase da arrecada&ão ara osimostos diretos$ sobretudo o imosto de renda rogressio. A reforma eleitoral $ liberando ooto ara os analfabetos$ que constitu!am$ então$ quase metade da oula&ão adulta do a!s. Areforma do estatuto do capital estran,eiro$ ara discilinar e regular os inestimentosestrangeiros no a!s e as remessas de lucros ara o e%terior. A reforma universitária$ ara que o

ensino e a esquisa se oltassem ara o atendimento das necessidades sociais e nacionais.:nstaurou+se um amlo debate na sociedade sobre o assunto. 6as ruas$ nas grees e nos camos$agitaam+se os moimentos sociais$ reiindicando$ radicali*ando+se.)ntretanto$ em sentido contr(rio$ mobili*aam+se resist,ncias e%ressias. A an(lise das elei&3esde 78>$ cerca de um ano a"s a osse de <ango$ que renoaram a 0Nmara Federal$ arte doSenado e mais um conjunto imortante de goernos estaduais$ eidenciou a for&a das direitas eda oinião conseradora.

 6o 0ongresso 6acional$ embora o Kartido 2rabalhista Brasileiro e outros artidos reformistasmenores houessem registrado aan&os releantes$ o KSD e a @D6 nucleaam amla maioriaconseradora. 6as elei&3es ara os goernos dos )stados$ se as esquerdas tinham conseguido,%ito em Kernambuco e no Rio de <aneiro$ elegendo Miguel Arraes e Badger da Sileira$ as

direitas haiam eleito :. Meneghetti no Rio =rande do Sul$ Ademar de Barros$ em São Kaulo$ e0arlos 'acerda$ no então recém+fundado )stado da =uanabara. Sem contar o fato de que outros

?

Page 5: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 5/15

imortantes )stados$ como Minas =erais e Karan($ j( eram goernados or lideran&asconseradoras CMagalhães Kinto e 6e Braga. A tradu&ão ol!tica destas elei&3es$ no que di*reseito -s reformas$ oderia ser assim resumida# elas não seriam aroadas legalmente elasinstitui&3es reresentatias.

 6as margens da 'ei$ restara a e%ectatia de iabili*ar as reformas atraés do restabelecimento

dos lenos oderes residenciais de <ango. 5 plebiscito sobre a questão$ anteciado ara janeirode 78>H$ resultara$ de fato$ numa it"ria consagradora ara <ango. Mas gerou$ em seguida$grandes frustra&3es orque o Klano 2rienal$ formulado or 0elso Furtado e aresentado or<ango não chegou a durar tr,s meses$ atolando o rojeto reformista num imasse hist"rico.A sociedade diidira+se.De um lado$ o moimento reformista$ tendo como nOcleo amlos contingentes de trabalhadoresurbanos e rurais$ além de estudantes e graduados das for&as armadas. 0om o temo$ assaram adefender o recurso - for&a$ sinteti*ado na agressia alara de ordem# reforma a,rária na lei ou

na marra.

De outro lado$ numa outra frente social $ aliaam+se as elites tradicionais$ gruos emresariaismoderniantes$ grande arte das classes médias e até mesmo setores oulares$ toda uma

constela&ão de rofiss3es e atiidades beneficiadas elo dinamismo da economia brasileira. 6este conjunto e%tremamente heterog,neo$ todos sentiam obscuramente que um rocesso radicalde redistribui&ão de rique*a e oder na sociedade brasileira$ em cuja dire&ão aontaa omoimento reformista$ iria atingir suas osi&3es$ rebai%ando+as. ) nutriam um grande Medo deque iria um temo de Desordem e de 0aos$ marcado ela subersão dos rinc!ios e dosalores$ inclusie dos religiosos. A idéia de que a ciili*a&ão ocidental e cristã estaa amea&adano Brasil elo esectro do comunismo ateu inadiu o rocesso ol!tico$ assombrando asconsci,ncias.

 6unca seria demais recordar a imortNncia da conjuntura internacional da guerra fria# a inasãofrustrada de 0uba or e%ilados financiados e armados elos norte+americanos$ o lan&amento daAlian&a ara o Krogresso$ com roostas reformistas moderadas ara conter a onda radical ecomuniante$ a crise dos foguetes$ leando o mundo - beira de uma guerra atmica$ a e%ulsãode 0uba da 5rgani*a&ão dos )stados Americanos no conte%to de uma grande ofensiaguerrilheira em todo o continente. 0omlementaam o quadro a it"ria da reolu&ão argelinaC78>$ a retomada da guerra do ietnã C78>G$ o rocesso das indeend,ncias na EfricaCrimeira metade dos anos >G.5 rojeto nacional+estatista brasileiro learia também$ como em 0uba$ - comuniação do Brasil/Foi então que ocorreu uma not(el inersão de tend,ncias.5s moimentos e lideran&as artid(rios das reformas$ que haiam originalmente constru!do suafor&a na luta ela osse de <ango$ na defesa da ordem constitu"da e da le,alidade$ tinhameolu!do ara uma linha ofensia. ) assim$ quem estaa em linhas de defesa$ assou ao ataque$

imaginando ter chegado a sua hora.)nquanto isto$ do outro lado$ not"rios consiradores de todos os goles$ desde que se fundaraaquela reOblica em 78?P$ encontraam+se agora defendendo a constitui&ão e a legalidade daordem igente. )ntretanto$ armaam o bote. ) assim$ quem semre atacara$ assara agora -defensia$ eserando a sua hora.) afinal a hora chegou$ ara todos$ em mar&o de 78>?.Deois de longos meses de indecisão$ <ango resoleu artir ara a ofensia. Diss+se a liderarum conjunto de grandes com!cios ara aumentar a ressão elas reformas. 5 rimeiro + foi oOnico + reali*ou+se em 7H de mar&o de 78>?. @m sucesso. Reuniram+se todas as esquerdas$ maisde HPG mil essoas$ na defesa e%altada das reformas.A rea&ão eio imediata. 6o dia 78$ em São Kaulo$ desenrolou+se uma rimeira Marcha da

Fam!lia com Deus ela 'iberdade. As direitas unidas$ alarmadas$ também foram -s ruas$ cerca dePGG mil essoas. 5utras marchas se seguiram em (rias cidades. As for&as da contra+reforma.

P

Page 6: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 6/15

Aonde aquilo tudo iria arar/Ao contr(rio do que se oderia imaginar$ -s grande palabras do com!cio do 7H de mar&o e das

 rimeiras Marchas da Fam!lia$ seguiu+se uma esécie de letargia$ uma esécie de ausa.Mas o barril de "lora e a mecha estaam l($ - esera de um f"sforo aceso.Quem o acendeu foi uma reunião roibida da Associa&ão dos Marinheiros e Fu*ileiros 6aais do

Brasil CAMF6B$ reali*ada na sede do Sindicato dos MetalOrgicos do Rio de <aneiro.A artir de então$ as coisas correram muito raidamente.A crise na Marinha mudou o foco do rocesso ol!tico. )m e* de um enfrentamento entre

 rojetos ol!ticos$ entre reforma e contra+reforma$ uma luta entre os defensores da hierarquia eda discilina nas For&as Armadas e os que desejaam suberter estes alores. @m desastre

 ol!tico ara <ango e ara as for&as reformistas$ cujo disositio militar come&ou a ruir.@m Oltimo discurso no Autom"el 0lube a uma assembléia radicali*ada de subalternos dasfor&as armadas emurrou de e* o carro ladeira abai%o. 0ondensaram+se todas as for&as anti+reformistas - esera de uma iniciatia que$ afinal$ eio de Minas =erais$ atraés do general5lmio Mourão. 5s demais disositios consirat"rios$ deois de alguma hesita&ão$acomanharam.

<ango foi fugindo do cen(rio aos solu&os# Bras!lia$ Korto Alegre$ Monteidéu. dei%ando atr(s desi um rastro de desorienta&ão e desagrega&ão. Aaorado com a hi"tese de uma guerra ciil quenão desejaa$ decidiu nada decidir e saiu da ist"ria ela fronteira com o @ruguai. As esquerdasnão ofereceram resist,ncia$ quedando+se aaralhadas$ desmorali*adas.As direitas saudaram nas ruas a it"ria imreista. @ma grandiosa Marcha da Fam!lia com Deuse ela 'iberdade$ com centenas de milhares de essoas$ no Rio de <aneiro$ comemorou aderrocada de <ango$ das reformas e do rojeto nacional+estatista que encarnaam.Sem ainda saber e%atamente o que iria acontecer$ o a!s ingressara na longa noite da DitaduraMilitar.

$. Entre ditadura e democracia: em busca de um identidade 

A rimeira grande dificuldade dos itoriosos foi definir uma identidade ol!tica ositia.0om efeito$ formara+se$ ara derrubar o goerno de <ango$ uma amla frente$ comdenominadores comuns muito genéricos# salar o a!s da subversão e do comunismo$ dacorrupção e do populismo. ) restabelecer a democracia. Funcionando como cimento$ unindo atodos$ o Medo de que um rocesso radical udesse lear o a!s - desordem e ao caos.Agora$ obtida a it"ria$ colocaa+se a questão# o que fa*er/

 6ão foi muito f(cil encontrar uma resosta comum. aia os que desejaam simlesmenteremoer <ango. 5utros$ no entanto$ queriam uma limpea mais funda. Assim$ as elei&3es

 reistas ara 78>P e 78>> não dariam chance ara os agora encidos recobrarem suas osi&3es.Assim ensaam os l!deres ciis do moimento. aia$ finalmente$ os que imaginaam ter um

 rojeto alternatio - situa&ão e%istente. Kretendiam destruir$ em seus fundamentos$ a ordem e astradi&3es nacional+estatistas que <ango reresentaa$ e r no lugar uma alternatiainternacionalista-liberal $ centrada na abertura econmica ara o mercado internacional$ noincentio aos caitais riados$ inclusie estrangeiros$ numa conce&ão diferente do ael do)stado na economia$ mais regulador do que interencionista. 2ais ersectias tinham sidoelaboradas no Nmbito do :nstituto de Kesquisa e )studos Sociais$ o :K)S$ uma organi*a&ão quereunia lideran&as ciis e militares e que desemenhara um imortante ael na it"ria do gole.

 6a desordem que se seguiu - derrocada de <ango$ houe uma esécie de disuta surda entrelideran&as e disositios alternatios. Raidamente o oder efetio assou ara uma <untaMilitar$ reunindo chefes militares das tr,s Armas$ o autodenominado 0omando Suremo da

Reolu&ão.Koucos dias deois$ em 8 de abril$ a <unta editou um Ato :nstitucional que instaurou o estado dee%ce&ão no a!s. Decretaram a cassa&ão de mandatos eletios e a susensão de direitos ol!ticos$

>

Page 7: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 7/15

atingindo centenas de essoas. Ao mesmo temo$ um rocesso de ca&a -s bru%as desencadeou+se elo a!s afora$ com ris3es$ censura a ublica&3es e intimida&3es de toda a ordem.Aquilo$ decididamente$ não arecia um ,olpe na tradi&ão latino+americana. 5s homens do0omando Suremo falaam em nome de uma revolução$ querendo e%licitar a ersectia deque não tinham romoido uma interen&ão de car(ter assageiro$ mas algo mais rofundo. 5

que$ e%atamente$ oucos$ tale* nem eles mesmos$ naquele momento$ saberiam di*er.5 roblema é que o rocesso todo fora consumado$ não em nome de uma reolu&ão$ mas no dosalores da ciili*a&ão cristã e da democracia. )ra necess(rio$ ortanto$ conferir legitimidade aonoo oder e definir alguém com qualifica&3es ara assumir a resid,ncia da reOblica. Foinestas circunstNncias que o nome do general 0astelo Branco aareceu. 2inha rest!gio entre seus

 ares e cone%3es com o :K)S$ o disositio organi*ado que$ inegaelmente$ naquele momento$era o mais articulado em termos ol!ticos.Afinal$ deois de comlicadas negocia&3es$ o general foi eleito elo 0ongresso 6acional$ j(deurado or de*enas de cassa&3es de direitos ol!ticos. A seu lado$ como ice+residente$ afigura de <osé Maria Almin$ elha raosa do KSD$ amigo e correligion(rio de <uscelinoJubitschec$ que articiou também da trama$ ensando estar assegurando seu futuro ol!tico.

Assim$ desde a r"ria g,nese$ aquele rocesso armou um imbr"glio maior que o marcaria até ofim de seus dias. De um lado$ em fun&ão da roosta de destruir ela rai* o antigo regimereresentado or <ango$ o Ato :nstitucional$ a e%ce&ão$ a revolução$ a ditadura. De outro$ emirtude da necessidade de considerar o conjunto de for&as que haiam se reunido ara aqueledesfecho$ o reseito ela democracia$ or seus alores e or suas formas e ritos.0astelo Branco areceu naquele momento sinteti*ar estes dois lados dificilmente comat!eis.Kor isso foi eleito elo 0ongresso$ mas não eram muitos os que sabiam com clare*a quais eramos seus lanos ara o a!s.

 As vicissitudes do projeto internacionalista-liberal 

)ntre os homens ol!ticos e na sociedade em geral é comum a erce&ão de que tudo é oss!elfa*er a artir do oder$ sobretudo de um oder centrali*ado e forte or tradi&ão. 6a ist"ria$muitos l!deres$ inclusie reolucion(rios$ arenderam - r"ria custa que não é bem assim. Sehouesse necessidade$ a trajet"ria do goerno 0astelo Branco seria uma boa ilustra&ão a reseitodos limites de um oder aarentemente incontrast(el.5 noo goerno logo definiu um erfil$ e um rograma.5 seu internacionalismo romia com o nacional-estatismo e defendia o alinhamento com os)@A$ num rojeto de integra&ão do Brasil no chamado mundo ocidental e de abertura do a!saos flu%os do caital internacional. 5 que se tradu*iu numa ol!tica econmica segundo os

 adr3es monetaristas ortodo%os$ na assinatura de um generoso acordo de inestimentos$ numa lei

de remessa de lucros conidatia$ e no reescalonamento das d!idas com os bancos riados e asinstitui&3es internacionais$ afastando o esectro da morat"ria. aia um rojeto ambicioso deestabili*ar a economia e as finan&as$ constituir um aut,ntico mercado de caitais no a!s$incentiar as e%orta&3es e atrair ultosos inestimentos de caitais riados.Aesar do aoio do goerno norte+americano e das institui&3es internacionais$ o flu%o$ eserado$de caitais internacionais não aareceu$ frustrando as e%ectatias de 0astelo Branco e de suaequie.)m certa medida$ or causa disto$ a ol!tica econmica não aresentou resultados conincentes.A infla&ão bai%aa$ mas não era domada# ;>T em 78>?$ ?PT em 78>P$ ?GT em 78>>. 5 crédito$escasso$ roocaa quebras no comércio e na indOstria$ ensejando cr!ticas de comerciantes eindustriais$ que mobili*aam suas oderosas organi*a&3es$ ressionando o goerno. Quanto aos

assalariados$ tinham reajustes bem inferiores aos !ndices inflacion(rios.Do onto de ista do ide(rio liberal$ o goerno ia muito mal das ernas.

9

Page 8: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 8/15

 6ão foi oss!el fa*er desaarecer as tradi&3es controladoras e interencionistas do )stado brasileiro$ ao contr(rio. A r"ria estrutura cororatiista$ de trabalhadores e atr3es$ ermaneceu intacta.Kor outro lado$ a reressão desatada unha em frangalhos os alores liberais e democr(ticos comos quais o goerno di*ia+se comrometido. As centenas de cassa&3es e as oera&3es desastradas

de censura causaam escNndalo e desgaste.Formou+se$ assim$ uma atmosfera de descontentamento# não somente entre os derrotados$ masmesmo em setores da grande frente que haia aoiado o gole. '!deres ciis do moimentoitorioso$ reocuados com a imoularidade do goerno$ come&aram a criticar a ol!ticaeconmica e a edir a cabe&a dos seus resons(eis.2ais dissonNncias geraam brechas or onde enetraram as cr!ticas de estudantes e intelectuais.5s humoristas e cartunistas e%rimiam a maré montante do desagrado da sociedade diante de umregime que se configuraa$ cada e* mais$ como uma ditadura militar. 6o teatro$ na mOsica de

 rotesto$ no cinema$ nas artes l(sticas$ também ecoaam as erle%idades e as amarguras deamlos setores sociais.)las também seriam agitadas elos estudantes uniersit(rios. De forma molecular formou+se uma

oosi&ão crescente$ indo da! as rimeiras manifesta&3es Oblicas de reulsa ao goerno.2ambém foram os estudantes uniersit(rios que constitu!ram a rincial base social do rocessode rearticula&ão das esquerdas organi*adas$ ostas$ todas$ na clandestinidade desde abril de 78>?.)ntretanto$ de modo geral$ todo este moimento cr!tico tinha duas grandes limita&3es.A rimeira era de ordem social. 5s trabalhadores urbanos e rurais não tinham e*$ nem o*$naquelas criticas. A maior arte simlesmente acomodou+se - noa situa&ão. 5utros setores$ mais

 articiantes nas lutas elas reformas de base$ encontraam+se desorientados$ enolidos naamargura das ilus3es erdidas.De outro lado$ do onto de ista do conteOdo$ as cr!ticas elaboradas concentraam+se nasincongru,ncias do regime$ roocando o riso. Aostaa+se numa esécie de beco+sem+sa!da. Aobtusidade daqueles gorilas seria incaa* de dirigir um a!s grande e comle%o como o Brasil.Seriam obrigados a recuar$ ela for&a das circunstNncias. 5u aquilo tudo e%lodiria$ reabrindohori*ontes ara a Onica alternatia oss!el# as reformas de estrutura. Formou+se uma utopia do

impasse$ numa linha de continuidade com o que haia de mais e%tremado na conjuntura anteriorao gole militar. 0om esta cren&a se organi*aria a autodenominada esquerda revolucionária$ ounova esquerda. Kara ela$ a ditadura era uma tragédia$ mas tinha uma irtude# a de limar oshori*ontes$ remoendo da cena ol!tica as tradi&3es moderadas$ soterradas sob os escombros daderrota ol!tica. Agora$ não mais seria oss!el cultiar ilus3es. As massas se transformariam emclasses$ e a reolu&ão$ a aut,ntica reolu&ão$ oderia desontar como hi"tese. 6estasconstru&3es$ distantes da dinNmica da sociedade$ era imoss!el erceber que$ no emaranhadocontradit"rio das ol!ticas da ditadura$ tomaa coro um rocesso de moderniação

conservadora.5 goerno 0astelo Branco encerrou+se em meio ao descrédito$ sobretudo deois de um noo Ato:nstitucional$ o A:+$ editado sob sua direta resonsabilidade deois da derrota eleitoral naselei&3es ara os goernos de Minas =erais e =uanabara em 78>P. 0om o noo Ato$ reinstaurou+se o estado de e%ce&ão$ a ditadura aberta. 0om ele na mão$ o ditador cometeu as arbitrariedadesque lhe areceram necess(rias# milhares de cassa&3es$ deosi&ão de goernantes legalmenteeleitos$ recesso do 0ongresso 6acional$ e%tin&ão dos artidos ol!ticos tradicionais$ imosi&ãode elei&3es indiretas ara goernadores e residente da reOblica$ entre muitas e muitas outrasdecis3es de car(ter ditatorial.Atroelando a tudo e a todos$ acumulando desgastes$ 0astelo Branco acabou erdendo o controleda r"ria sucessão$ obrigado a aceitar a candidatura do ministro do e%ército$ 0osta e Sila.

5 general+residente ainda tentou legar uma armadura jur!dico+constitucional ao a!s com umanoa 0onstitui&ão$ uma noa 'ei de :mrensa e uma noa 'ei de Seguran&a 6acional. Mas a

;

Page 9: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 9/15

aroa&ão a toque de cai%a or um 0ongresso encolhido não conseguiu legitimar seus ro"sitos. 4 certo que se reali*aram as elei&3es legislatias de 78>>$ quando estrearam os noos artidos$ criados - sombra do arb!trio$ a Alian&a Renoadora 6acional1AR)6A e o MoimentoDemocr(tico Brasileiro1MDB. Mas nem com muito boa ontade se oderia di*er que foramelei&3es lires e democr(ticas. 6ão gratuitamente os otos nulos e brancos alcan&ariam

 roor&3es inéditas.De sorte que$ em seu ocaso$ o goerno associou+se - reressão e - recessão$ tornando imoularum moimento que$ no nascedouro$ disunha de substancial aoio$ embora heterog,no.)ntretanto$ é imortante sublinhar que a maior arte das oosi&3es ao goerno era moderada$ nãoassumindo rogramas radicais. 5 que se desejaa era o restabelecimento da democracia$ massem embates iolentos ou o recurso - for&a que$ ali(s$ nos arraiais oosicionistas$ era ine%istente.5 rograma internacionalista-liberal $ aesar de coerente$ não encera os obst(culos. Fora maisf(cil derrubar homens do que transformar estruturas. 4 erdade que todos os anéis tinham sidosalos$ e ostas certas bases econmico+financeiras e institucionais que seririam aos goernosseguintes. 0ontudo$ mais de inte anos ainda se assariam ara que as lataformas defendidas

 or 0astelo Branco$ em sua inteire*a$ se reatuali*assem com chances de concreti*a&ão. 6este

sentido$ 0astelo Branco foi um recursor$ um neoliberal avant la lettre. 6o imediato$ as aten&3es agora oltaam+se ara o noo general+residente$ 0osta e Sila$inclusie orque o homem inha com romessas de reconcilia&ão democr(tica e dedesenolimento.

%. &epress'o e desen(ol(imento: a moderni)a*'o conser(adora 

 6o discurso de osse$ como 0astelo Branco$ e como os sucessores$ 0osta e Sila rometeudemocracia$ di(logo e desenolimento.)m 78>9$ o a!s j( registrou um ra*o(el crescimento# ?$;T. 6o ano seguinte$ em 78>;$ quase odobro# 8$HT$ tendo o conjunto da atiidade industrial alcan&ado o atamar de 7P$PT$ u%ado

 ela constru&ão ciil$ com 79T de crescimento. A decolagem era roduto da combina&ão dasmedidas do goerno com uma série de condi&3es faor(eis$ internas Cociosidade do arqueindustrial$ demanda rerimida$ saneamento financeiro e%ecutado elo goerno anterior ee%ternas Cin!cio de um boom esetacular no mercado internacional# entre 78>9 e 789H$ ocomércio mundial cresceu a uma ta%a de 7;T ao ano.)ntretanto$ a insatisfa&ão acumulada + e reresada + durante o goerno anterior$ tenderia agora adesaguar em rotestos e moimentos Oblicos.

 6a r"ria frente que rotagoni*ou o gole aareceram diis3es# a Frente Amla$ formada aolongo de 78>9$ a oosi&ão liberal de arte imortante da grande imrensa$ e a assagem desetores minorit(rios$ mas e%ressios$ da :greja 0at"lica ara osi&3es hostis ao Koder.

 6a (rea intelectual$ eram is!eis as manifesta&3es cr!ticas ao goerno$ embora também sefi*essem resentes e%ress3es$ senão faor(eis$ ao menos comlacentes$ com o sistema ol!ticoem igor ou com a ordem igente. Assim$ ao lado da mOsica de rotesto$ semre lembrada$ é

 reciso recordar outras roostas incomreens!eis a um g,nero de oosi&ão mais ortodo%a$como o troicalismo. Além disso$ haia todo um conjunto$ de grande sucesso$ de m!dia e de

 Oblico$ como a chamada <oem =uarda$ ara quem as lutas ol!ticas assaam literalmente

c/té. 6ão eram nem contra$ ou a faor delas$ muito elo contr(rio... e nem or isso recebiammenos aten&ão$ ou alausos. Do mesmo modo$ em rela&ão ao cinema$ h( uma constante ,nfaseem certos filmes e autores$ como 0s 1uis$ de Rui =uerra$ ou 2eus e o 2iabo na +erra do *ol $de =lauber Rocha$ uma cinematografia de resist3ncia$ como se di*ia na éoca$ com altaqualidade art!stica$ contudo$ redu*ido Oblico. 5s came3es de bilheteria eram Roberto Farias

com um filme sobre Roberto 0arlos$ melhor bilheteria de 78>;$ ou <osé Mojica Marins$ cujosfilmes de terror C 4sta noite encarnarei no teu cadáver  transformaam+se em grandes sucessos.Ambiguidades que merecem ser consideradas na aalia&ão dos moimentos da oinião Oblica$

8

Page 10: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 10/15

sobretudo orque as grandes massas oulares$ sem recursos ara ir -s salas de cinema$embalaam+se nas noelas + que então iniciaam sua trajet"ria de sucesso +$ nos shoUs deariedades e nos rogramas humor!sticos das 2s + que s" muito raramente$ e de forma indireta$ingressaam na seara das lutas ol!ticas.De sorte que$ a rigor$ aesar da agita&ão crescente$ o oder$ aoiado agora nos !ndices de

crescimento econmico$ arecia ter reseras areci(eis ara enfrentar o descontentamentoe%istente na sociedadeMas não foi o que ocorreu.<( em 78>9$ rimeiro ano do goerno 0osta e Sila$ o di(logo rometido não ocorreu$ mas$ sim$a reressão$ face -s ress3es do Onico moimento social atio + o estudantil.

 6o ano seguinte$ este moimento tomou um outro ulto$ sobretudo no rimeiro semestre$culminando o rocesso na chamada asseata dos 0em Mil$ no Rio de <aneiro$ que unificou aslutas estudantis com os rotestos dos intelectuais.

 6o conjunto$ o moimento social dos estudantes tinha um marcado car(ter sindical$ mas suasmanifesta&3es Oblicas$ agora$ se inseriam no conte%to do ano 5uente de 78>;. Kor outro lado$organi*a&3es reolucion(rias clandestinas$ que controlaam quase todas as entidades

reresentatias$ aareciam nas manifesta&3es com ro"sitos de enfrentamento$ inclusiearmado$ que ultraassaam o escoo r"rio do moimento. A ol!cia ol!tica e mesmo algunsanalistas$ mais tarde$ confundiram os dois rocessos que$ no entanto$ recisam ser deslindados +o moimento social estudantil$ em sua autonomia$ de car(ter basicamente sindical$ e asorgani*a&3es reolucion(rias clandestinas$ j( decididas$ em fun&ão de sua eolu&ão interna$ -luta armada com o sistema.São estas organi*a&3es$ da esquerda revolucionária$ que$ desde 78>P$ e ainda com mais for&a em78>9 e 78>;$ se lan&arão -s a&3es armadas. )ram equenas a&3es$ e minOsculas$ as organi*a&3esenolidas$ mas$ elo ineditismo e elo simbolismo do desafio$ roocaam uma imensareercussão medi(tica e na sociedade. 5 fenmeno se nutria de duas grandes refer,ncias j( aquiindicadas# a da utopia do impasse$ ou seja$ a idéia de que o goerno não tinha condi&3eshist"ricas de oferecer alternatias ol!ticas ao a!sV e a de que as grandes massas oulares$desiludidas com os rogramas reformistas$ tenderiam a assar ara e%ectatias e osi&3esradicais de enfrentamento armado$ reolucion(rio.5 goerno 0osta e Sila rerimiu tudo isto de forma desroorcional.<( no segundo semestre do r"rio ano de 78>;$ os estudantes daam sinais de recuo. Somenteos setores mais radicais$ alguns oucos milhares de joens$ mantinham o Nnimo$ frente -reressão. 5 canto de cisne ocorreu quando da dissolu&ão$ ela ol!cia$ do 0ongresso da@6)$ em :biOna$ interior de São Kaulo$ em outubro de 78>;$ tendo sido resas centenas delideran&as estudantis.

 6esta altura$ as oosi&3es liberais e moderadas j( estaam sem rumo$ riadas da Frente Amla$

 roibida desde o m,s de abril. Disunham ainda de um artido$ o MDB$ mas ele estaa ainda rofundamente desacreditado.Kois foi e%atamente neste momento que o goerno intensificou a ofensia. 2omando como

 rete%to a recusa do 0ongresso em autori*ar o rocesso do deutado M(rcio Moreira Ales$acusado de ter feito um discurso ultrajante -s For&as Armadas$ o general+residente decretou umnoo Ato :nstitucional$ o de n. P$ em de*embro de 78>;$ reinstaurando$ de modo inaudito$ oterror da ditadura.Foi um gole dentro do gole.

 6a erdade$ isando muito mais os comonentes insatisfeitos da grande e heterog,nea frente queaoiara o gole de 78>? do que os estudantes$ j( derrotados.A situa&ão criada faoreceu aarentemente as roostas radicais da es5uerda revolucionária. Sob

o A:+P$ era como se estiessem reali*ando as condi&3es da utopia do impasse. 5 adento do tudoou nada.

7G

Page 11: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 11/15

Assim$ entre 78>8 e 789$ desdobraram+se a&3es esetaculares de guerrilha urbana#e%roria&3es de armas e fundos$ ataques a quartéis$ sequestros de embai%adores. 5sreolucion(rios chegaram a ter momentos fulgurantes$ mas$ isolados$ foram cedo aniquilados. 6asequ,ncia$ entre 789 e 789P$ seria identificado$ ca&ado e também destru!do um foco guerrilheirona região do Araguaia$ na fronteira do Kar($ Maranhão e =oi(s$ reunindo algumas de*enas de

guerrilheiros$ na tentatia mais consistente da esquerda reolucion(ria.A sociedade assistiu medusada a todo este rocesso$ como se fosse uma latéia de um jogo defutebol. 5u esectadores de um filme$ ou de uma noela de 2. Ws e*es$ muitos areciamsimati*ar com o lado dos reolucion(rios. Mas não raramente$ outros tantos os denunciaam$aontando+os$ e a seus esconderijos$ - ol!cia.A rigor$ ara a grande maioria da oula&ão$ aquela ,uerra$ como a chamaam osreolucion(rios e a ol!cia ol!tica$ era algo que não conseguiam comreender$ quanto mais$

 articiar. Kor outro lado$ também não é certo que houesse simatias elos métodos brutaisemregados ela ol!cia ol!tica$ embora a sociedade brasileira j( tiesse então arendido + e atéhoje isto continua + a conier serenamente com a tortura$ mas desde que emregada contra oschamados mar,inais. Semre que este jo,o sujo se assasse fora das istas$ e longe dos ouidos$

seria oss!el sustentar que os e%cessos eram ignorados e a sociedade$ inocente.Aquela luta desigual acabou em massacre. 5s gruos e organi*a&3es reolucion(riasequiocaram+se de sociedade e de temo hist"rico + e agaram com a e%ist,ncia + f!sica e ol!tica+ elos erros cometidos.W sombra desta derrota$ e sob as asas de terror do A:+P$ construiu+se um a!s r"sero edinNmico.

 6um conte%to internacional e%traordinariamente faor(el$ que não se reetiria nas décadasseguintes$ e aoiado or um conjunto de medidas e incentios estatais$ o caitalismo brasileirodeu um gigantesco salto ara a frente.

0 mila,re brasileiro e o retorno do nacional-estatismo.

A sinfonia dos !ndices anuais de crescimento do Kroduto 6acional Bruto1K6B era doce mOsica ara todos os que se beneficiaam# 8$PT C789G$ 77$HT C7897$ 7G$?T C789$ 77$?T C789H. 6a onta$ a indOstria$ registrando ta%as de 7?T anuais$ com destaque ara as duas locomotivas do rocesso# a indOstria automobil!stica$ com ta%as anuais de P$PT$ e a de eletroeletrnicos$ de;T. Mesmo os setores menos dinNmicos$ como o de bens de consumo oular$ aresentaam!ndices inusitados# 8$7T$ em média$ ara o er!odo.As e%orta&3es registraram aumentos de HT ao ano$ o que ensejou um ritmo equialente decrescimento das imorta&3es.Mais do que aumentos quantitatios$ romoiam+se mudan&as qualitatias. 6a indOstria Ca

Ketroqu!mica$ na infraestrutura Ctelecomunica&3es$ rodoias$ comle%o hidrelétrico$ nasfinan&as$ na agricultura Csoja$ no comércio internacional Croor&ão crescente de manufaturadosna auta de e%orta&3es.Romendo com os ro"sitos internacionalistas-liberais do goerno 0astelo Branco$ o )stado$incentiaa$ regulaa$ financiaa$ rotegia e interinha atiamente nos mais ariados setores.0om base no )stado e nos caitais riados nacionais e estrangeiros$ formou+se uma alian&a deinteresses e de recursos que e%acerbaria os tra&os esbo&ados elo goerno de <J$ na segundametade dos anos PG.5 a!s$ comarado metaforicamente a um imenso canteiro de obras$ foi tomado or incontidaeuforia desenolimentista# Kra Frente$ BrasilV 6inguém mais segura este a!sV Brasil$ terra deoortunidades$ Brasil$ ot,ncia emergente. Kara os que discordaam$ a orta de sa!da# Brasil$

ame+o$ ou dei%e+o. A conquista do tricameonato mundial$ no Mé%ico$ em 789G$ foi uma ben&ão

77

Page 12: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 12/15

 ara estes ro"sitos$ inclusie orque foi a rimeira e* que um cameonato mundial de futebolfoi transmitido ao io ara todo o a!s.

 6este jardim de rosas$ orém$ haia esinhos também.A doen&a e o osterior afastamento do general 0osta e Sila$ em julho+agosto de 78>8$comlicada com a entroni*a&ão de uma <unta Militar$ em irtude do imedimento do ice+

 residente$ Kedro Alei%o$ legalmente eleito$ eidenciou mais uma e* o car(ter ditadorial doregime. 5s métodos atraés dos quais o noo general residente foi escolhido + or uma inéditaota&ão entre os oficiais+generais + também não conenceram. 6ão adiantou muito reconocar ocongresso$ fechado desde de*embro de 78>;$ ara eleger o general =arrasta*u Médici$ oisninguém tinha dOidas de que sua erdadeira un&ão tinha sido feita elo Alto 0omando dasFor&as Armadas. )le j( fora escolhido$ antes de ser eleito. 5 reju!*o que isto causaa - imageminternacional do a!s era agraado elas denOncias a reseito do emrego da tortura como

 ol!tica de )stado. 6um outro lano$ os ,%itos econmicos não conseguiam disfar&ar as desigualdades sociais quecome&aram$ no in!cio ainda dos anos 9G$ a serem denunciadas or insuseitos organismosinternacionais. 0omo disse o r"rio general+residente Médici$ embora a economia estiesse

 bem$ o oo$ ou elo menos grande arte dele$ ia mal.A roaganda oficial anunciaa eriodicamente rogramas sociais$ mas haia qualquer coisa alique não funcionaa. 5 Krograma de :ntegra&ão 6acional1K:6$ com base na constru&ão de maisuma gigantesca estrada$ a 2ransama*nica$ e a instala&ão de centenas de milhares de camonesessem+terra nordestinos em agroilas$ acabou transformado em mais um lano de atra&ão degrandes emresas ara inestimentos agro+ecu(rios. )m 789?$ quando o rograma foidefinitiamente cancelado$ em e* da romessa inicial de um milhão de fam!lias$ haia aenascerca de > mil instaladas. 5 ambicioso rojeto de erradicar o analfabetismo$ o Mobral$ cuja metaera alfabeti*ar ; milh3es de adultos entre 7897 e 789?$ acabou também sendo melancolicamenteabandonado$ muitos anos mais tarde. 5s alfabeti*ados do Mobral não sabiam ler$ nem sequerassinar o nome. 5 mesmo destino tieram o Klano 6acional de SaOde$ o K:S+KAS)K$ o KrojetoRondon$ e outros mais$ como a tentatia de estruturar um sistema nacional de instru&ão moral ec!ica que orientasse aquelas gentes nos bons caminhos da moral e dos bons costumes.

 6as elei&3es legislatias de 789G$ houe o troco# noamente$ uma enorme roor&ão de otosnulos e brancos$ cerca de HGT$ ainda em maior nOmero do que em 78>>. )ntretanto$ o regimeconfortaa+se em suas maiorias$ ganhas sobretudo no Brasil profundo$ e nos grot3es dosinteriores e das cidades menores.Mas seria um erro$ não raramente cultiado$ o de estabelecer olaridades entre um Brasil arcaico$faor(el - ditadura$ e um Brasil moderno$ artid(rio do rogresso e da democracia. :nclusie

 orque a ditadura transformara+se num dos mais oderosos fatores de moderni*a&ão.A erdade é que o mila,re$ embora gerando desigualdades de todo o tio$ sociais e regionais$

fora caa* de beneficiar$ de modo substantio$ muitos setores. 0onsider(eis estratos das classesmédias$ or e%emlo$ com acesso ao crédito farto e f(cil$ uderam aceder$ em massa$ - casa r"ria e ao rimeiro autom"el. 5s funcion(rios Oblicos$ rincialmente os das estatais$ieram também um er!odo faor(el$ aoiados em lanos assistenciais$ como se$ ara eles$ nãotiessem desaarecido as tradi&3es e as benesses t!icas da tradi&ão nacional+estatista. Domesmo modo$ imortantes setores de trabalhadores autnomos e de oer(rios qualificados$sobretudo os emregados em grandes emresas de caital internacional$ beneficiaam+se decondi&3es articulares$ de modo nenhum e%tensias a toda a sociedade.aia$ é claro$ enormes sombras na aisagem$ que os holofotes da ublicidade não conseguiamesconder. 5s equenos osseiros e roriet(rios de terra$ que erderam sua ouca terra$ ostrabalhadores sem qualifica&ão adatada - sede de lucro dos caitais$ que ficaam - margem$

constituindo astos contingentes$ mal+chamados de e%clu!dos$ orque eram leg!timo roduto do

7

Page 13: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 13/15

sistema e$ como tal$ estaam nele incluid!ssimos$ embora$ cada e* mais$ aarecessem comodescart(eis.)ntretanto$ ara além da contabilidade dos ganhos e erdas materiais$ haia um rocesso nãomensur(el em réguas ou em nOmeros$ o da integra&ão do a!s elas redes de 2$ rincialmente

 ela rede =lobo. A! estaa o la*er fundamental da oula&ão. 5 mundo das noelas$

 rincialmente. ) o das ariedades$ e o do telejornalismo. Aquela teia conseguiu estabelecer umanot(el interlocu&ão com a sociedade$ confortando$ integrando$ embalando$ anestesiando$estimulando$ moderni*ando.5s anos 9G$ considerados como anos de chumbo$ tendem a ficar esados como o metal damet(fora$ carregando ara as rofundas do esquecimento a mem"ria nacional. )les recisam serreisitados$ ois foram também anos de ouro$ descortinando hori*ontes$ abrindo fronteiras$geogr(ficas e econmicas$ moendo as essoas em todas as dire&3es dos ontos cardeais$ aracima e ara bai%o nas escalas sociais$ anos obscuros ara quem descia$ mas cintilantes$ ara osque ascendiam. 6aquelas areias moedi&as haia os que afundaam$ mas também os queemergiam$ em busca de refer,ncias$ querendo aderir. Anos renhes de fantasias esfu*iantes$transmitidas elas 2s a cores$ alucinados anos 9G$ dan&ados ao som dos frenéticos dancin,6

da7s. 6este a!s formou+se uma irNmide social cheia de distor&3es$ onde a concentra&ão de renda e de oder chamaa a aten&ão do obserador mais desatento. Mas a an(lise detida dos dados j( entãomostraa a constitui&ão de uma estrutura comle%a$ de forma nenhuma redut!el - olaridadee%tremada de um too milion(rio e de uma base miser(el. 4 certo que o too$ j( enriquecido$enriqueceu+se ainda mais. ) a base miser(el$ mais miser(el se tornou. Mas entre estese%tremos$ haia camadas de amortecimento$ e a e%ist,ncia delas conferiu saOde$ estabilidade eigor -quele coro$ cuja cabe&a estaa + e ainda est( + nas ricas aenidas de Miami$ enquando os

 és chafurdam nas mais miser(eis faelas.

 As contradiç8es do mila,re e o aprofundamento do nacional-estatismo.

5 Oltimo goerno da ditadura$ o do general =eisel$ iniciado em 789?$ tee que se haer com umaconjuntura e%terna distinta + e desfaor(el. )m 7897$ os )@A j( tinham irado a mesa do actode Bretton Xoods$ subertendo o sistema monet(rio internacional. )m 789H$ houe o rimeirochoque do etr"leo$ multilicando o re&o do barril or 7G. Mais tarde$ iria um segundo$ comconsequ,ncias dif!ceis ara o Brasil$ ainda muito deendente das imorta&3es etrol!feras. @mdesastre. Kor outro lado$ o mercado internacional entrou em fase de grande turbul,ncia. 5s

 rinciais a!ses caitalistas se retra!ram$ enolidos em rocessos de recessão$ rotegendo+seuns dos outros$ e%atamente o oosto do que ocorrera entre 78>9 e 789H.A ditadura brasileira$ contudo$ otou ela fu,a para a frente. 'an&ou o :: Klano 6acional de

Desenolimento1K6D$ com metas ambiciosas$ erfa*er uma autonomia semi+constru!da no rocesso do mila,re. aia que caminhar ara a frente$ comletar o ciclo iniciado nos anos HG$com o )stado$ e as emresas estatais$ como fatores roulsores de um desenolimento quehaeria de se dar segundo os interesses nacionais.)m rela&ão ao mundo intelectual e art!stico$ o goerno definiu uma grande ol!tica de est!muloaos cursos de K"s+=radua&ão$ isando o desenolimento autnomo cient!fico+tecnol"gico.Além disso$ atiou$ em (rios n!eis$ ag,ncias estatais de incentio e aoio C)mbrafilme$Funarte$ Seri&o 6acional de 2eatro1S62. <untamente com a Rede =lobo$ foi oss!elestabelecer cone%3es que atra!ram inOmeros intelectuais em adr3es semelhantes aos do )stado

 6oo. Kara alguns$ o Brasil j( era uma ot,ncia emergente. Kara outros$ mais otimistas$ umagrande ot,ncia$ o oitao roduto nacional bruto no mundo$ di*ia+se com orgulho.

)nquanto aquilo durou$ assistiu+se ao e%acerbamento da adesão da ditadura a asectos essenciaisdo rograma nacional-estatista. 6a ol!tica e%terna ouiam+se também acordes autonomistas.

7H

Page 14: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 14/15

Reconhecimento imediato da indeend,ncia de Angola$ aesar das inclina&3es esquerdistas do artido goernante$ o Moimento Koular de 'iberta&ão de Angola1MK'A$ abertura de rela&3escomerciais com a 0hina$ aro%ima&ão agressia com a 0omunidade )uroéia $ resultando noacordo nuclear com a Alemanha$ denOncia do acordo militar com os )@A$ firmado em 78P$ que

 j( não tinha tanta imortNncia r(tica$ mas nem or isso a rutura seria menos simb"lica$

inclusie ela maneira brusca como a decisão foi tomada$ como se houesse a ontade de eniarum recado$ e e%licitar uma ontade ol!tica r"ria. Kragmatismo resons(el$ alinhamento nãoautom(tico$ fosse como fosse chamada$ a ol!tica e%terna fa*ia recordar os elhos temos deargas$ de <anio e de <ango.

 6o lano ol!tico+institucional$ o goerno =eisel definiu a abertura lenta9 se,ura e ,radual . Karaisto$ =eisel contaa com a grande maioria dos ol!ticos em atiidade$ e também com o aoio dasociedade$ sobretudo dos grandes centros urbanos$ hostil - ditadura$ mas também aders(ria de

 ol!ticas radicais de enfrentamento.Mas foi necess(rio enfrentar resist,ncias.De um lado$ os chamados bols8es sinceros9 mas radicais$ ou seja$ a ol!cia ol!tica e osnumerosos setores que se haiam habituado a e%ercer o oder atraés dos disositios criados

 ela ditadura.De outro lado$ no outro e%tremo$ os remanescentes das esquerdas reolucion(rias. )staamdisersos$ mas mantinham alguma influ,ncia na m!dia$ nos meios acad,micos$ e naintelectualidade em geral. Reiindicaam o desmantelamento dos aarelhos reressios e umaanista amla$ geral e irrestrita.)ntre estes "los oostos$ haia esa&o ara os amlos setores das oosi&3es moderadas.Kraticamente desaarecidos - sombra da e%ce&ão instaurada elo A:+P$ recobraram igor naselei&3es de 789?$ sobretudo nos rinciais centros urbanos do a!s. Kassaram então a fa*er ouirsuas o*es. 5ra$ suas conce&3es sobre a abertura$ seu sentido e ritmos$ não seriam as mesmasdas do goerno militar.0om todas estas for&as tee que se haer o rojeto de abertura de =eisel. ) o faria - moda daditadura.Kermitiu a destrui&ão dos Oltimos focos clandestinos$ constitu!dos elo K0B e elo K0doB$ cujasdire&3es foram imiedosamente torturadas$ massacradas ou desaparecidas. Finalmente$ eio ahora do basta$ j( em 789>$ quando da demissão do general )dnardo DYEila$ comandante do ::)%ército. Foi um marco. A ol!cia ol!tica j( não estaa autori*ada a matar. 6a sequ,ncia$ eio ademissão do ministro do e%ército$ Slio Frota$ que se arestaa a fa*er com =eisel o que 0ostae Sila fi*era com 0astelo. 5utro marco# a abertura era ra aler.Mas nos termos do general =eisel e de sua equie. Assim$ ara conter a aalanche emedebista$ ogoerno diss de engenho e trucul,ncia# fe* aroar a chamada 'ei Falcão que$ na r(tica$acabaa com a roaganda eleitoral gratuita ela 2$ oderoso instrumento das oosi&3es ara

diulgar idéias e candidatos. Deois$ atraés do pacote de abril $ em 7899$ cassou mandatos del!deres moderados$ instituiu os senadores bi/nicos$ eleitos de forma indireta C71H do Senado$redimensionou os coeficientes eleitorais$ faorecendo os estados em que a AR)6A$ o artido dogoerno$ conseraa maioria$ e garantiu condi&3es ara uma sucessão tranquila$ na figura dogeneral <oão Batista Figueiredo$ escalado$ com mandato amliado$ ara ser o Oltimo general+

 residente.2odos estes disositios estabili*aram o oder e ermitiram a liberali*a&ão gradatia doscontroles sobre a m!dia$ com a susensão da censura aos jornais a artir de 789;. ) foi oss!eltambém amortecer$ e mesmo neutrali*ar$ os aan&os reistos do MDB nas elei&3es deste Oltimoano.

 6esta noa atmosfera$ desenoleram+se as rimeiras manifesta&3es Oblicas desde 78>;. 5

moimento estudantil e a luta ela anistia ocuaram esa&os a artir de 7899$ agitandoreiindica&3es democr(ticas. )m 789;$ entraria em cena$ ineseradamente$ o moimento

7?

Page 15: Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

7/18/2019 Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade No Brasil - Reis Filho

http://slidepdf.com/reader/full/ditadura-militar-esquerdas-e-sociedade-no-brasil-reis-filho 15/15

oer(rio$ com a gree de São Bernardo. 6ada ainda estaa muito claro$ como -s e*es seimagina hoje$ de forma retrosectia$ ao se di*er que a abertura caminhaa ineitaelmente arao fim da ditadura. Ao contr(rio# haia muitas dOidas no ar$ e também a reressão$ não sedeendo esquecer que os tem!eis aarelhos da ol!cia ol!tica ainda estaam intactos$ - esreita.5 A:+P$ or decisão da r"ria ditadura$ e%irou no Oltimo dia de 789;. Assim$ com o ano noo$

em 7898$ o a!s reingressou no )stado de Direito$ embora rec(rio$ orque aoiado numa0onstitui&ão imosta$ a de 78>9$ numa )menda 0onstitucional esOria$ arrancada$ sob amea&a$em 78>8$ e em toda uma constela&ão de leis e decretos que formaam$ como se chamou desdeentão$ um erdadeiro entulho autorit(rio. Mas a ditadura aberta j( não e%istia mais. 5 a!s e asociedade resiraam. A 'ei da Anista$ aroada em agosto de 7898$ consolidou este quadro$estendendo o manto do esquecimento sobre torturados e torturadores$ absolendo a todos na

 ersectia da reconcilia&ão nacional.

 Al,umas reflex8es sobre o le,ado da ditadura.

As sociedades t,m semre dificuldades em e%ercitar a mem"ria sobre as suas ditaduras$

sobretudo a artir do momento em que assumem c"digos de alores oostos aos rinc!ios doestado de e%ce&ão.

 6ão se trata de algo esec!fico de nosso a!s. 5s franceses t,m$ até hoje$ dificuldades em serelacionar com a Fran&a de ich. ) o mesmo ocorre com os alemães$ quando ensam em itler$ou com os russos$ quando recordam Stalin.Até que onto o e%erc!cio da mem"ria não assa de autoflagela&ão/ 6ão seria melhor e maissaud(el cultiar a a* das consci,ncias/ ) olhar ara a frente$ dei%ando o assado sossegado$ eas feridas$ cicatri*ando/)ntretanto$ h( alguns n"s que recisam ser desatados$ ou$ ao menos$ comreendidos. ) isto nãodi* reseito aenas ao assado$ mas ao resente e$ sobretudo$ ao futuro.A ditadura reatuali*ou e e%acerbou no Brasil a tradi&ão da cultura autorit(ria. 6ão bastou umaroua noa + a 0onstitui&ão de 78;;$ ara resoler este desafio. Que o digam os ata%"squeimados$ os resos de 0arandiru e toda a legião de subcidadãos$ agando nas margens dosistema. )ntretanto$ foi em lena e%ce&ão$ no mais fundo dos e%!lios$ que as esquerdasdescobriram os alores democr(ticos. eremos se não os esquecerão$ ou não terão deles umaabordagem meramente formalista$ erdendo a ersectia da mudan&a ara se tornaremadministradoras da 5rdem.A ditadura reatuali*ou e e%acerbou as tradi&3es e a cultura nacional+estatista. 4 curioso er comoas esquerdas brasileiras ainda fa*em acrobacias ara rejeitar aquela sem negar esta. ) como osliberais frequentemente emregam métodos daquela ara destruir esta.A ditadura $ finalmente$ instaurou+se sob o signo do Medo. Medo de que as desigualdades fossem

questionadas or um rocesso de redistribui&ão de renda e de oder. 5ra$ atraés dos anos$mantieram+se e se consolidaram estas desigualdades. 6ão ter( sido esta a maior obra daditadura/ )ntretanto$ o questionamento desta obra continua roocando Medo. ) o aor docaos.5 caos ou o retorno a formas autorit(rias. @ma refle%ão mais acurada e sistematica sobre ostemos da ditadura tale* seja um ant!doto ara escaar deste maldito dilema. Kronto aressuscitar tão logo aare&am noas amea&as - 5rdem.

 ZZZZZZZZZZZZZZZ

Daniel Aarão Reis é rofessor de ist"ria 0ontemorNnea da @niersidade Federal Fluminense.

7P