Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

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DIREITO DAS SUCESSÕES DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP Maria Luísa Lobo 2012/2013 Página 1 INTRODUÇÃO Remete-se para o Lições de Direito das Sucessões, do Prof. Luís Carvalho Fernandes página 15 a 51. DA SUCESSÃO EM GERAL I NOÇÃO E ÂMBITO DE SUCESSÃO 1. NOÇÃO DE SUCESSÃO DIVERSOS SENTIDOS DE SUCESSÃO É necessário distinguir entre: Sucessão Lato Sensu : significa o mesmo que transmissão, qualquer que seja a sua modalidade Sucessão Stricto Sensu : sucessão identifica a transmissão/aquisição mortis causa Ou seja, em sentido amplo, pode definir-se sucessão enquanto fenómeno pelo qual uma pessoa se substitui a outra, ou toma o seu lugar, ficando investida num direito ou numa vinculação, ou num conjunto de direitos e vinculações, que antes existiam na esfera jurídica do substituído, sendo que as situações jurídicas adquiridas pelo novo titular são consideradas as mesmas, antes existentes, e tratadas como tais. Esta noção permite distinguir, no fenómeno, três modalidades: (1) sucessão activa; (2) sucessão passiva; (3) conjunto, consoante a situação ou situações jurídicas transmitidas. Tais modalidades podem reduzir-se a duas: Sucessão Singular ou a Título Singular Activa Passiva Sucessão Universal ou a Título Universal: a sucessão verifica-se a título global e respeita a vários direitos e vinculações, enquanto conjunto. Adquire-se um património ou, pelo menos, uma quota ideal dele, ou várias situações jurídicas activas e passivas, em qualquer dos casos como conjunto. LIÇÕES DE DIREITO DAS SUCESSÕES - PROF. LUÍS CARVALHO FERNANDES

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

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INTRODUÇÃO

Remete-se para o Lições de Direito das Sucessões, do Prof. Luís Carvalho Fernandes –

página 15 a 51.

DA SUCESSÃO EM GERAL

I – NOÇÃO E ÂMBITO DE SUCESSÃO

1. NOÇÃO DE SUCESSÃO

DIVERSOS SENTIDOS DE SUCESSÃO

É necessário distinguir entre:

Sucessão Lato Sensu: significa o mesmo que transmissão, qualquer que seja a

sua modalidade

Sucessão Stricto Sensu: sucessão identifica a transmissão/aquisição mortis

causa

Ou seja, em sentido amplo, pode definir-se sucessão enquanto fenómeno pelo qual

uma pessoa se substitui a outra, ou toma o seu lugar, ficando investida num direito ou

numa vinculação, ou num conjunto de direitos e vinculações, que antes existiam na

esfera jurídica do substituído, sendo que as situações jurídicas adquiridas pelo novo

titular são consideradas as mesmas, antes existentes, e tratadas como tais. Esta noção

permite distinguir, no fenómeno, três modalidades: (1) sucessão activa; (2) sucessão

passiva; (3) conjunto, consoante a situação ou situações jurídicas transmitidas. Tais

modalidades podem reduzir-se a duas:

Sucessão Singular ou a Título Singular

Activa

Passiva

Sucessão Universal ou a Título Universal: a sucessão verifica-se a título global e

respeita a vários direitos e vinculações, enquanto conjunto. Adquire-se um

património ou, pelo menos, uma quota ideal dele, ou várias situações jurídicas

activas e passivas, em qualquer dos casos como conjunto.

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Sucessão Inter Vivos Sucessão Mortis Causa

A sucessão consiste num acto jurídico

voluntário ou não (exemplo: sub-rogação

legal, art. 592º)

A causa de aquisição é a morte, por si só,

ou em articulação com um acto jurídico

praticado pelo autor da sucessão.

A sucessão a título singular é, em geral, a

título singular. Mas existem desvios: por

exemplo, certos casos de transmissão

global do património de uma pessoa

colectiva ou nos actos que têm por

objecto o estabelecimento comercial

A sucessão a título universal é típica da

sucessão mortis causa. Mas existem

desvios: por exemplo, o legado na

sucessão é a título singular.

A IDENTIDADE DA SITUAÇÃO JURÍDICA COMO ELEMENTO ESSENCIAL DO CONCEITO DE

TRANSMISSÃO

O fenómeno da sucessão/transmissão implica a manutenção do direito, em relação

ao qual se verifica a referida substituição da pessoa do seu titular. Ao transmitir-se, o

direito não se extingue; mantém-se o mesmo.

SUCESSÃO, TRANSMISSÃO E AQUISIÇÃO SUCESSÓRIA

Na sucessão como na transmissão ocorre, do ponto de vista do novo sujeito, uma

aquisição derivada translativa. Contudo a doutrina nem sempre segue esta posição

podendo identificar-se duas concepções:

Uma dela transforma o critério distintivo o que não passa de uma coincidência

normal. Assim, a sucessão implicaria uma aquisição a título universal, o que

faria da sucessão mortis causa o seu domínio característico. Em contrapartida,

na transmissão, a aquisição seria a titulo singular e dai, a sua aplicação

dominante, verificar-se-ia na aquisição inter vivos. Como consequência desta

concepção excluíam-se os legatários da qualidade de sucessores – art. 2030º/1

consagra que são sucessores tantos os herdeiros como os legatários

Outra delas liga a sucessão à aquisição mortis causa (independentemente de

ser universal ou não) e a transmissão à aquisição inter vivos – o CC vigente

também não adopta tal concepção em diversas normas.

PROF. PEREIRA COELHO: a sucessão e a aquisição derivada translativa exprimem a

mesma realidade, mas segundo perspectivas diferentes

Transmissão ou Aquisição Derivada Translativa: é vista como se o direito se

deslocasse de um sujeito para o outro, que se manteriam estáticos, sendo

dinâmico o direito.

Sucessão Stricto Sensu: considera-se o direito estático e tratam-se como

dinâmicos os sujeitos; é o novo sujeito que se desloca e subingressa no direito

do antigo sujeito.

PROF. LUÍS CARVALHO FERNANDES: a posição anterior hoje não pode ser tomada em

termos absolutos.

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NOÇAO LEGAL DE SUCESSÃO E SUA CRÍTICA

Nos termos do art. 2024º define-se sucessão sendo ‘’o chamamento de uma ou mais

pessoas à titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a

consequente devolução dos bens que a esta pertenciam’’ notas:

Intenção de afastar a ideia de sucessão em vida ou de transmissão por morte

para além de discutível em si mesma, por estar ligada a uma construção

jurídica controvertida, esta ideia não tem sequer correspondência no CC que

em mais de um local fala em sucessão em vida (art. 1057º, 1058º, 1256º e 2128º)

e em transmissão por morte (art. 412º, 420º, 976º/2, 1059º/1 e 2058º)

Não pode aceitar-se a identificação da sucessão com o chamamento à

titularidade das relações jurídicas e a consequente devolução dos bens

Para haver aquisição sucessórias é pelo menos necessária a aceitação

do chamado

Não se refere quanto à abertura da sucessão e a sua aquisição.

2. ÂMBITO DA SUCESSÃO

NOÇÃO E ÂMBITO DE SUCESSÃO

Âmbito de Sucessão: direitos e vinculações que podem ser adquiridos pelos

sucessores. Está em causa apurar se esses direitos e vinculações se extinguem com a

morte de quem deles era titular ou de quem a eles estava adstrito ou se subsistem,

para além dela, podendo ser adquiridos pelos seus sucessores.

DIREITOS PATRIMONIAIS INTRANSMISSÍVEIS

A regra da transmissibilidade das situações jurídicas patrimoniais pode ser

complementada com a regra de que em geral quando transmissíveis as situações

patrimoniais são no tanto por acto inter vivos como por acto mortis causa. Daqui

resulta que a sua intransmissibilidade excepção se pode dirigir a essas duas

modalidades ou apenas a uma delas:

Absoluta (intransmissibilidade excepcional dirige-se a ambas as modalidades):

direitos reais de uso e habitação – art. 1485º e 1488º.

Relativa (intransmissibilidade excepcional dirige-se a apenas uma das

modalidades):

Há direitos patrimoniais que admitem a transmissão por acto inter vivos

mas não mortis causa: usufruto – art. 1444º, 1443º, 1476º/1 al. a)

Há direitos cuja transmissão por negócio inter vivos é significativamente

restringida: arrendamento para habitação – art. 1038º al. f) e art.

1105º/1 – mas admitem transmissão por morte embora sujeita a regime

especial – art. 1106º.

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Exemplos mais significativos de situações jurídicas patrimoniais não transmissíveis mortis

causa (para além dos referidos anteriormente):

O direito e a obrigação de preferência convencional – art. 420º

O direito de dispor de bens doados, quando o doador tenha reservado para si

esta faculdade – art. 959º/2

O direito do beneficiário da renda vitalícia – art. 1238º

O direito e alimentos e correspondente obrigação – art. 2013º/1 al. a)

DIREITOS NÃO PATRIMONIAS TRANSMISSÍVEIS

A regra da intransmissibilidade dos direitos não patrimoniais, pessoais, à semelhança

da transmissibilidade dos patrimoniais, assume, normalmente, caracter absoluto: não

é, consequentemente, admitida a sua transmissão, quer por acto inter vivos, quer

mortis causa.

Excepções – casos de transmissibilidade relativa, por morte:

O direito potestativo de invalidação de um negócio jurídico (seja por nulidade

seja por anulabilidade), que, em si mesmo, não tem conteúdo patrimonial, não

admite transmissão por acto ente vivos, mas é transmissível mortis causa – art.

125º/1 al. c)

Direitos morais de autor e direito de revogar a doação por ingratidão, que em

certos casos são transmissível por morte – art. 976º/3

Direitos de investigar a maternidade e a paternidade é apenas transmissível por

morte – art. 1818º e 1873º

Transmissão de direitos de personalidade em geral (?)

Alguma doutrina defende tal com fundamento no art. 71º/1

PROF. CARVALHO FERNANDES: não entende que tal seja possível. O

entendimento correcto do art. 71º/1 consiste na atribuição e protecção

jurídica ao interesse que certas pessoas vivas têm na integridade mora

da pessoa falecida. Contudo, tal não significa que em certos casos não

se verifique a transmissão de certas faculdades ligadas à tutela dos

direitos da personalidade – art. 73º, 75º/2, 76º/2 e 79º/1 – mas não dos

direitos da personalidade em si mesmos.

Note-se que em geral a atribuição do direito não patrimonial por morte dá-se ex lege,

o que em primeiro lugar traduz o regime definido, em segundo lugar significa que a

aquisição não depende de aceitação, correspondentemente, não é também

admitido o repúdio.

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TRANSMISSIBILIDADE DAS OBRIGAÇÕES

A transmissibilidade das vinculações patrimoniais pode fundar-se na noção do art.

2024º uma vez que tais integram o conteúdo das relações jurídicas patrimoniais. deste

modo, dir-se-á que as obrigações do de cuius se transmitem enquanto elementos do

património global e como tal integram a herança. Daqui resulta que em regra são os

herdeiros quem por elas responde, embora tal responsabilidade caiba por vezes aos

legatários.

É preciso analisar alguns aspectos quanto à transmissibilidade mortis causa das

situações jurídicas passivas:

As situações jurídicas passivas não se reconduzem apenas às obrigações em

sentido técnico; ora se mesmo estas não têm, necessariamente, conteúdo

patrimonial, ainda que devam corresponder a um interesse serio do credor,

que merece protecção jurídica (art. 398º/2) muitas situações jurídicas passivas

de outra natureza não são patrimoniais

Nem todas as situações jurídicas passivas patrimoniais se transmitem mortis

causa (casos da obrigação emergente do pacto de preferência, da

obrigação de alimentos e situações jurídicas patrimoniais que se constituem

intuito personae e cuja prestação seja infungível – art. 767º/2)

Na situação dos sucessores relativamente a situações jurídicas passivas existe uma

verdadeira transmissão ou mera responsabilidade?

É manifesto que em certos casos é de verdadeira transmissão da obrigação a

que estava adstrito o autor da sucessão (relação jurídica complexa

correspondente à posição contratual que se transmite mortis causa). O

sucessor do promitente comprador ou do arrendatário sucede próprio sensu

nas obrigações emergentes do contrato promessa ou do contrato de

arrendamento

Contudo, não é assim nos casos de encargos da herança nomeadamente nas

suas dividas, ou seja, créditos autónomos de que o autor da sucessão era

devedor.

TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO DE INDEMNIZAÇÃO EM GERAL

Quando estejam em causa danos patrimoniais, mesmo que o bem vilado seja não

patrimonial, não pode haver duvidas quanto à natureza patrimonial daquele direito.

Como funciona a transmissibilidade mortis causa do direito de indemnização de danos

não patrimoniais?

A questão coloca-se quando o credor do direito de indemnização morra sem ter

exercido o seu direito.

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Se já o exerceu e o direito à indemnização está reconhecido pelo devedor ou por

decisão judicial transitada em julgado, das duas uma:

Ou a indemnização já foi paga e os valores pecuniários correspondentes

entraram no seu património e nele subsistem, transmitindo-se aos seus

sucessores

Ou a indemnização ainda não foi paga e é o correspondente crédito de que o

de cuius era titular a transmitir-se.

Se à data da morte está em causa a acção em que o direito de indemnização é

exercido, a posição de parte na correspondente acção transmite-se aos seus

herdeiros.

As objecções levantadas à transmissão do direito de indemnização do dano não

patrimonial funda-se em considerações de duas ordens:

Caracter não patrimonial (pessoal) do dano

É o lesado quem está em melhores condições para determinar se os

sentiu e em que medida os sentiu

Deixar aos seus sucessores o direito de exigir a sua reparação e de

decidir sobre o critério da sua fixação seria inadequado.

PROF. PEREIRA COELHO: critica tal argumento afirmando que o regime

do art. 496º/3 primeira parte afasta tais riscos uma vez que por remissão

para o art. 494º manda fixar o dano equitativamente segundo as

circunstancias do caso.

A acção não deve ser proposta pelo legado, mas pelos seus

herdeiros

Os poderes aqui reconhecidos ao tribunal revelam que o critério

dos sucessores na determinação dos danos e da sua avaliação

não é muito significativo

O direito de indemnizar, ainda quando estão em causa danos

não patrimoniais, não deixa em si mesmo de ter natureza

patrimonial – art. 2024º

Não existe em direito português qualquer norma que em geral

reserve ao lesado a faculdade de demandar a indemnização

por danos dessa natureza.

Em suma, não se pode entender que não estando eles ainda

reparados, à data da sua morte, o correspondente direito à

indemnização existe na sua esfera jurídica e transmite. Quando

esse direito exista no momento da morte do seu titular ele segue

o regime geral dos direitos patrimoniais.

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Valoração do comportamento abstencionista do credor várias críticas a

este argumento:

O art. 863º/1 configura a remissão como um contrato

A razão mais significativa que determinada a rejeição da hipótese de

ver no caso aquela forma de extinção do direito de indemnização

assenta no não preenchimento dos requisitos de que depende a

declaração tácita – art. 217º

Se à data da morte do credor não se mostrava esgotado o

prazo de caducidade da propositura da correspondente

acção, o simples facto de ela ainda não ter sido proposta não

permite deduzir com o grau de probabilidade que o art. 217º/1

in fine exige a vontade de remitir o credito.

TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO DE INDEMNIZAÇÃO DO DANO DE MORTE

Exemplo: no caso de atropelamento, a vítima vem a morrer algum tempo depois de

ele ter ocorrido, por causa das lesões sofridas, ou tem morte imediata

A morte da vítima causa também danos autónomos – patrimoniais e não

patrimoniais – em relação a certas pessoas que com o lesado mantem uma

relação especial – art. 495º/3 e 496º/2 não se configura nenhuma questão

sucessória, uma vez que esses direitos são adquiridos autonoma e

originariamente. Questão de Direito das Obrigações – Responsabilidade Civil

Têm de ser considerados os danos patrimoniais e não patrimoniais causados ao

lesado, ou seja as despesas feitas com o seu tratamento ou as retribuições que

deixou de receber e a dor, sofrimento e angustia por ele suportadas por efeito

do acto violador da sua integridade física. Direito à indemnização, que nasce

da lesão, e transmite-se com a morte deste aos seus herdeiros

O próprio dano de morte do lesado é indemnizável e sendo-o ele constitui-se

ainda na sua esfera jurídica, transmitindo-se de imediato aos seus herdeiros?

Art. 496º/3: a letra da lei parece demarcar dois tipos de danos não

patrimoniais indemnizáveis – os do lesado e os das pessoas

mencionadas no nº2. O direito de indemnização dos primeiros danos

constitui-se na esfera jurídica do lesado e é transmissível mortis causa.

Contudo não é razoável atribuir este direito aos sucessores segundo as

regras normais da sucessão e além disso nos termos do art. 496º/2 e 3

existem elementos suficientes para afirmar que é intenção do legislador

atender à posição particular de certos familiares do lesado. O direito à

indemnização do lesado por dano de morte, que sobrevenha à lesão

transmite-se às pessoas indicadas no art. 496º/2.

Para mais desenvolvimentos: página 75º e ss. de Lições de Direito das Sucessões.

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FUNDAMENTOS E CAUSAS DA INSTRANSMISSIBILIDADE; ANÁLISE CRÍTICA DO ART. 2025º

Remete-se para a página 76º e ss de Lições de Direito das Sucessões.

SITUAÇÕES JURÍDICAS NÃO HEREDITÁRIAS ABRANGIDAS PELA SUCESSÃO

A sucessão envolve um fenómeno se aquisição derivada cuja legitimidade funda-se

em situações jurídicas existentes na esfera jurídica do falecido no momento da sua

morte e que não se extinguem por efeito dela. Ou seja, estão em causa situações

jurídicas que existiam no momento da morte do de cuius e podem perdurar para além

dela.

Contudo, a sucessão acaba por alargar o seu campo de aplicação a situações

jurídicas, activas e passivas, de que o de cuius não era titular ou a que não estava

adstrito no momento da sua morte:

Situações Activas

Abrangem-se na sucessão os frutos dos bens hereditários percebidos

até à partilha – art. 2069º al. d)

Na sucessão situam-se os bens doados, quando, por estarem sujeitos à

colação, são restituídos em espécie à herança – art. 1108º/1

Por força da redução por inoficiosidade, de doações feitas em vida ou

de despesas a favor do herdeiro legitimário, podem integrar a herança

bens que não pertenciam ao autor da sucessão no momento da sua

morte – art. 2174º

Situações Passivas

Dívidas do falecido e em certos casos dos legados

Todos os encargos enumerados no art. 2068º, constituem-se ou com a

morte do de cuius ou por efeito do próprio fenómeno sucessório, logo

após a abertura da sucessão

II – MODALIDADES DA SUCESSÃO

1. QUANTO À FONTE E À VOCAÇÃO

ENUMERAÇÃO DAS MODALIDADES DA SUCESSÃO

Existem duas fontes de vocação – art. 2026º:

Lei: ocorrida a morte do de cuius, a identificação das pessoas chamadas a

suceder resulta directamente de certas normas jurídicas, independentemente

da vontade do falecido, ou até contra ela Sucessão Legal

Legítima

Legitimária

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Vontade do Autor da Sucessão: a eficácia jurídica da morte, como causa da

sucessão, é conformada mediante um acto jurídico (secundário) da autorida

do de cuius, que é um verdadeiro negócio jurídico Sucessão Voluntária

Testamentária (Unilateral)

Contratual/Pactícia (bilateral)

A SUCESSÃO LEGAL E SUAS MODALIDADES

SUCESSÃO LEGÍTIMA SUCESSÃO LEGITIMÁRIA

Pode ser afastada pela vontade do autor

da sucessão (através de testamento ou

de pacto sucessório)

Normas de natureza supletiva

É afastada pela existência de sucessores

legitimários quanto a uma parte da

herança

Não pode ser afastada pela vontade do

autor da sucessão.

Normas de natureza injuntiva – sucessão

necessária ou forçada para o de cuius no

sentido de ele não poder, em principio –

salvo deserdação – afastar os sucessores

que dela beneficiam.

Respeita à quota

indisponível/legítima/legitimária:

Legítima Objectiva: valor da

quota indisponível

Legítima Subjectiva: parte aque

na quota indisponível é atribuída

a cada herdeiro legitimário

A SUCESSÃO VOLUNTÁRIA E SUAS MODALIDADES

Remete-se para a Parte II – Da Sucessão em Particular, página 39 e ss.

POSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA DAS VÁRIAS MODALIDADES DA SUCESSÃO

Remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página 87 e ss.

2. QUANTO AO OBJECTO

NOÇÃO DE HERDEIRO E DE LEGATÁRIO

Nos termos do art. 2030º/2 estabelece-se a diferença entre herdeiro e legatário. A

referida norma deve ser contudo complementada com o nº3 e 4.

Podem identificar-se três situações típicas da disposição a titulo de herança, ou seja

da instituição de um herdeiro:

Sucessão na totalidade do património do falecido

Sucessão em quota desse património

Sucessão no remanescente dos bens do falecido, sem especificação dos

mesmos.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 10

Na instituição de herdeiro verifica-se sempre a atribuição de bens indeterminados,

como um conjunto, constituindo uma unidade existe uma universalidade de direito.

Prof. Galvão Telles: quando no artigo 2030º/2 se diz ‘’totalidade’’ do património devia

antes dizer-se universalidade.

Interpretação da expressão ‘’quota do património’’: a ideia que domina é a de uma

relaçao algébrica entre a parte da universalidade que se deixa e essa mesma

universalidade (pode ser um numero certo, uma fracção ou mesmo uma

percentagem). Não é necessário que a quota seja expressamente estabelecida – ou

pré-estabelecida – pelo autor da sucessão, bastando que da interpretação do

testamento se apure que a atribuição é feita a título de quota.

Há regras que presidem ao valor das quotas?

Sucessão Legal: a relação entre os herdeiros da mesma classe de sucessíveis

(filhos ou irmãos do de cuius) é em regra de igualdade. Contudo, há casos em

que as quotas são desiguais (relações entre o cônjuge sobrevivo e os

ascendentes ou entre o cônjuge e os descendentes; sucessão dos irmãos do

falecido quando alguns sejam germanos e outros consanguíneos ou uterinos)

Sucessão Voluntária: o valor das quotas hereditárias é uma das matérias

deixadas na livre disponibilidade do testador.

Legatário (art. 2030º/2, 2ªparte): a este são atribuídos bens determinados e não um

conjunto indeterminado de bens a título de quota. É um sucessor particular ou singular

devido à manifesta ligação à chamada transmissão singular ou a título singular.

Nos termos do art. 2030º/4, atribui-se sempre ao usufrutuário, independentemente dos

bens que o seu direito tenha por objecto, a qualidade de legatário.

Nota: o regime sucessório do usufrutuário não se identifica plenamente com o de um

legatário havendo neste um tratamento jurídico próprio do herdeiro.

Interpretação da expressão ‘’bens ou valores determinados’’ (chave da distinção

entre herdeiro e legatário):

Bem Determinado: Basta que a coisa atribuída seja determinável, pelo que não

significa o mesmo que bem especificado, designado ou individualizado. Por

isso há:

Legado de coisa genérica quando o testador deixa a certa pessoa um

dos seus cavalos – art. 2253º

Legado Alternativo quando o testador deixa a certa pessoa o seu carro

ou o seu cavalo – art. 2267º

A coisa determinada não significa uma só coisa. O essencial é que se trate de

atribuir apenas esses bens (ou seja, certos bens) com exclusão dos demais que

compõem a herança.

Podem ser várias coisas (móveis de sua casa)

Pode ser uma coisa composta de vários elementos (universalidade de

facto)

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Até onde vai a exigência de determinação dos bens?

Essencial, em todo o caso, é que o bem ou os bens não integrem uma quota, ou seja

que não haja uma atribuição a titulo universal.

A hipótese limite de determinação verifica-se quando estão em causa uma ou mais

coisas especificamente indicadas, pertencentes ao falecido, como o prédio tal, o

rebanho que existe no prédio rustico X, a herança ou a quota hereditária, em

qualquer dos casos não partilhada, que ao falecido caiba na herança de outra

pessoa, os moveis da casa Y, todos os prédios urbanos localizados na localidade Z

há um conjunto de bens, mas, por definição, não referidos a certa quota da herança,

antes tratados como um só bem determinado.

É importante não esquecer que ao legado pode ser de coisa genérica ou alternativa,

havendo apenas que proceder à especificação ou escolha da coisa concreta que o

legatário vai receber.

Instituição Ex Re Certa: pode o testador atribuir a um sucessor bens cetos e

determinados e fazê-lo, todavia, a título de herança, ou seja instituindo-o como

herdeiro? Exemplo: A, no seu testamento, atribui todos os seus móveis a B e todos os

seus imóveis a C. Devem B e C ser tidos como legatários ou herdeiros? esta questão

será analisada mais à frente.

DIFERENÇAS DE REGIME JURÍDICO DO HERDEIRO E DO LEGATÁRIO

O autor da sucessão goza de alguma autonomia, podendo afastar o regime que, a

título supletivo, a lei estabelece. Deste modo, as diferenças que serão enumeradas e

analisadas devem ser vistas como aspectos normais do regime da herança e do

legado.

As notas mais significativas que demarcam o regime dos herdeiros e dos legatários

respeitam:

Responsabilidade pelos encargos da herança

Direito à partilha

Direito de acrescer

Admissão de cláusulas acidentais no acto jurídico de instituição de herdeiro ou

de nomeação do legatário

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RESPONSABILIDADE PELOS ENCARGOS DA HERANÇA (art. 2068º)

A herança, enquanto conjunto de bens deixados pelo autor da sucessão, constitui

uma universalidade de direito que compreende elementos activos e passivos. Da

morte do de cuius e do próprio desenvolvimento do fenómeno sucessório resultam

encargos que, no seu conjunto, constituem encargos da herança.

HERDEIROS LEGATÁRIOS

Regra Geral: os herdeiros respondem

pelos encargos da herança, não os

legatários (art. 268º e 2097º)

Enquanto os bens não são partilhados

entre os herdeiros, existe a

responsabilidade colectiva dos bens da

herança pelos repectivos encargos.

Após a partilha atribui-se a cada herdeiro

responsabilidade pelos encargos da

herança na porção da sua quota – art.

2098º.

À responsabilidade dos herdeiros pelos

encargos da herança esta é limitada aos

bens hereditários, embora na

determinação destes se projecte a

modalidade de aceitação da herança,

pura e simples ou a benefício de

inventário – art. 2071º.

Entre os encargos da herança contam-se

os próprios legados, sendo regra, imposta

aos herdeiros, o seu cumprimento – art.

2265º. Contudo, a lei reconhece alguma

relevância à vontade do testador: o

testador pode indicar para o efeito um

ou mais herdeiros ou mais legatários

corre a derrogação da regra supletiva

que os poe a cargo dos herdeiros (art.

2265º/1) – art. 2265º/2

Só respondem, em regra, pelos encargos

do próprio legado – art. 2276º

Caso em que a responsabilidade da

herança é atribuída aos legatários é

aquele que sucede quando toda a

herança é distribuída em legados – art.

2277º

PARTILHA

Constitui o acto através do qual são atribuídos, a cada um dos herdeiros, os bens

(concretos) que hão-de integrar a sua quota. Mantém uma relação intima com a

natureza da herança ou da quota (indivisa) atribuída ao herdeiro como uma

universalidade.

Art. 2101º - o direito à partilha tem caracter irrenunciável, sendo que o máximo que os

herdeiros podem fazer é convencionar a indivisibilidade da herança em termos

limitados (a herança indivisa configura não uma situação de compropriedade mas

de património colectivo, contudo o regime da indivisibilidade convencional referido

na noma mantém manifesta proximidade do homólogo da divisão da

compropriedade (art. 1412º/1 e 2)

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 13

HERDEIROS LEGATÁRIOS

A partilha justifica-se sempre que vários

herdeiros concorram a toda a herança

ou a uma quota dela. Se houver um só

interessado não tem de haver partilha,

mas pode proceder-se a inventário – art.

2103º.

A instituição do legatário, respeitando

sempre a bens determinados, dispensa

partilha. Pode contudo haver

necessidade de proceder a operações

de especificação ou escolha dos bens

específicos a ser adquiridos pelo

legatário.

Quando uma mesma coisa é atribuída

conjuntamente a vários legatários

constitui-se uma situação de

contitularidade que os legatários podem

fazer cessar, através da divisão da coisa

comum, meio que a lei prevê para a

compropriedade (art. 1412º e 1413º)

DIREITO DE ACRESCER

Art. 2301º: no direito de acrescer está em causa a instituição de vários herdeiros na

universalidade da herança ou numa quota dela. Existe uma situação e vocação

plural. Se um dos instituídos, por qualquer razão não quer ou não poder aceitar a

herança, a parte do não aceitante acresce em geral à dos demais na proporção das

quotas destes.

HERDEIROS LEGATÁRIOS

Regra Geral: direito de acrescer é um

direito reconhecido aos herdeiros,

qualquer que seja a fonte da sua

vocação, legal ou testamentária,

bastando portanto que exista vocação

plural.

Direito de Acrescer Para os Herdeiros: o

acrescer permite a expansão da sua

posição hereditária em relação a bens

que, não lhe estando em princípio

atribuídos, potencialmente lhe podiam

caber, pis a sua posição não é limitada a

bens determinados.

Art. 2302º/1: confere um direito

correspondente aos legatários, desde

que vários tenham sido nomeados em

relação ao mesmo objecto.

Direito de Acrescer para os Legatários: o

acrescer não significa a atribuição de

outros bens, pois respeita apenas a bens

determinados que, juntamento com

outros legatários, lhe estava reservado.

APONIBILIDADE DE CLÁUSULAS NEGOCIAIS ACESSÓRIAS À INSTITUIÇÃO DE HERDEIRO E

À NOMEAÇÃO DE LEGATÁRIO

Art. 2229º: tanto a instituição de herdeiro como a nomeação de legatário podem ser

sujeitas a condição.

HERDEIROS LEGATÁRIOS

O termo inicial é aponível à nomeação

de legatário – art. 2243º.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 14

O termo inicial não é aponível à

instituição de herdeiro, sendo que sendo

aposto à instituição de tal é nulo mas não

afecta a instituição em si mesma – art.

2243º.

O termo final não é aponível à instituição

de herdeiro, sendo que se for aposto o

termo é nulo, mas a sua invalidade não

afecta a instituiçao – art. 2243º/2, 2ª parte

O termo inicial aposto à nomeação de

legatário não segue o regime comum

dessa cláusula acessória, apenas a

execução da disposição é suspensa pelo

que o direito ao legado é desde logo

adquirido pelo legatário.

O termo final não é aponível à

nomeação de legatário, sendo que se for

aposto o termo é nulo mas a sua

invalidade não afecta a instituição – art.

2243º/2, 2ª parte. Excepção: quando o

direito atribuído tenha caracter

temporário, a aposição de termo final é

válida.

Outras diferenças, menos significativas, entre o estatuto de herdeiro e de legatário:

Alienação do Quinhão Hereditário (art. 2124º): se revestir a modalidade de

venda ou dação em cumprimento e o adquirente seja um estranho (art.

2130º/1) existe um direito de preferência aos co-herdeiros (não inclui os

legatários).

Funções de cabeça-de-casal, para cujo exercício os herdeiros são, em certos

casos, qualificados, só cabem aos legatários quando toda a herança for

distribuída em legados (art. 2080º e 2081º).

SENTIDO DA DISTINÇÃO ENTRE HERDEITO E LEGATÁRIO

Nos termos do art. 2030º/5, a qualificação dada pelo testador aos sucessores por ele

instituídos, como herdeiro ou legatário, não é atendível, se for estabelecida ‘’em

contravenção do disposto nos números anteriores’’. Esta norma tem sentido

imperativo.

Existe a possibilidade de instituição de herdeiro de ex re certa?

Nos termos do art. 2030º, herdeiro é o sucessor a quem sejam atribuídos bens

indeterminados, a título universal, ou seja, toda a herança ou uma quota ela. Por outro

lado, ao legatário são reservados bens certos e determinados e só esses.

Deste modo, quando o art. 2030º se refere ‘’a contravenção do disposto’’ está se a

referir aos casos em que por parte do testador, ele designa como legatário o sucessor

a quem deixa uma quota da herança ou como herdeiro aquele a quem beneficia

com o prédio X.

O testador é livre (salvo as limitações decorrentes da sucessão legitimária) de deixar os

seus bens a quem quiser e como quiser, existindo um significativo campo para

exercício da sua vontade: tanto pode fazer herdeiro como nomear legatário. A

limitação constante do nº5 do art. 2030º assente em que para instituir herdeiro, ter de

lhe atribuir bens a título de quota, e, para nomear um legatário, ter de lhe atribuir bens

determinados.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 15

Exemplo1: A, falecido sem herdeiros legitimários, faz no seu testamento disposições de

bens nestes termos ‘’Deixo ao meu sobrinho B o prédio X; todos os meus restantes bens,

deixo-os, em partes iguais, aos meus sobrinhos C/D deixa em legado – B; deixa de

herança – C/D

Exemplo2: A, que à data da morte é dono e vários prédios urbanos, tendo, como

familiares mais próximos, dois sobrinhos, B/C, deixa ao primeiro todos os prédios

urbanos situados na localidade X, e ao segundo todos os prédios urbanos situados na

localidade Y; ou revelando agora no testamento a intenção de repartir todos os seus

bens em igualdade entre os dois sobrinhos deixa a um os bens móveis e a outro os

bens imóveis a determinação do conteúdo do testamento segundo os critérios que

presidem à interpretação do negocio jurídico (art. 2187º) permite afirmar que por via

indirecta o testador quis fixar para cada sucessor uma quota (1/2) e como tal quis

institui-lo herdeiro da sua herança preenchendo logo a quota hereditária com

determinados bens (legado por conta da quota).

Interpretação do art. 2030º/5: o autor da sucessão não pode qualificar como seu

herdeiro um sucessor a quem não atribua uma quota.

Questão diversa: saber se a intenção do testador foi a de dispor ou não de

uma quota dos seus bens, e consequentemente, de instituir ou não um

herdeiro. Esta quota não tem que estar prefixada no testamento podendo

apurar-se por via interpretativa em função do valor dos bens atribuídos em

relação ao conjunto da herança.

O testador não pode incluir no seu testamento uma disposição do seguinte

teor ‘’Deixo a B o meu prédio tal, mas quero que ele seja considerado meu

herdeiro’’

Colocado isto, pode ou não haver herdeiro ex re certa?

Em primeiro lugar é necessário ter em atenção que esta questão não veio a ser

especificamente regulada no Código Civil, ao contrário do que se previa no

respectivo Anteprojeto no qual se estabelecia nesta matéria resposta negativa.

Deve entender-se que, à luz da interpretação do art. 2030º/5, a resposta na pode

deixar de ser casuística, estando dependente do sentido a atribuir à vontade do

testador.

FUNDAMENTO E FUNÇÃO DA DISTINÇÃO ENTRE HERDEIRO E LEGATÁRIO

Remete-se para Lições do Direito das Sucessões, página 106 e ss.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 16

III – O FENÓMENO SUCESSÓRIO

1. GENERALIDADES

A SUCESSÃO COMO FACTO COMPLEXO

A aquisição sucessória depende de um conjunto de elementos que se verificam em

momentos diferentes. Ocorre um facto complexo de produção sucessiva. O conjunto

de elementos e de correspondentes efeitos designa-se como fenómeno sucessório.

DISTINÇÃO ENTRE VOCAÇÃO E DEVOLUÇÃO

Na opinião do PROF. CARVALHO FERNANDES é necessário distinguir, após a abertura

da sucessão, as seguintes fases:

Uma primeira fase que se poderá designar como chamamento ou vocação

em que está apenas em causa a selecção do sucessor ou sucessores

Uma segunda fase em que se dá a atribuição do direito de suceder, mediante

cujo exercício, se for no sentido de aceitação, se verifica a aquisição da

herança.

Com a atribuição do direito de suceder, os bens hereditários ficam

postos à disposição do chamado que os poderá adquirir mediante

aceitação poderia chamar-se devolução a este fenómeno de por os

bens à disposição do sucessível chamado, mas este não é mais do que

um efeito inerente à vocação, que acompanha a atribuição do direito

potestativo de suceder.

Deste modo, considera-se que a solução ideal seria não autonomizar a devolução

como uma fase do fenómeno sucessório.

FASES DO FENÓMENO SUCESSÓRIO, RAZÃO DE ORDEM

Fases do Fenómeno Sucessório

Momento Pré Sucessório (designação)

Abertura da Sucessão

Vocação

Aquisição

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2. PRESSUPOSTOS DA SUCESSÃO

A MORTE COMO PRESSUPOSTO TÍPICO DA SUCESSÃO

Nos termos do art. 68º, a morte, qualquer que seja a sua causa (natural ou voluntária)

constitui o pressuposto típico ou normal da sucessão. A morte precede o fenómeno

sucessório, tendo como efeito a abertura da sucessão.

É necessário atender a certas situações anómalas que por vezes acompanham a

morte, em particular, a justificação judicial do óbito e as presunções que

acompanham a morte conjunta de certas pessoas, traduzidas no regime da

comoriência – art. 68º/2.

EFEITOS PATRIMONIAIS NÃO SUCESSÓRIOS DA MORTE

Nos negócios onerosos, a morte pode interferir com a produção dos seus efeitos, seja a

título de condição, seja a t´tulo de termo, consoante as circunstâncias. Quando esteja

em causa a aquisição de um direito, a morte surge como facto secundário em

relação ao título dessa aquisição (o facto principal é o negócio a que a condição ou

o termo foi aposto), mas esta nada tem a ver com o fenómeno sucessório.

É necessário analisar os casos em que, verificando-se atribuições patrimoniais gratuitas,

não há, contudo, quanto a elas, aquisição sucessória.

Exemplo da aquisição por efeito da morte de certa pessoa fora do regime

sucessório: seguro de vida o beneficiário do seguro, que em regra (visa-se

prevenir o regime do seguro de sobrevivência – art. 198º/3 do Regime Jurídico

do Contrato de Seguro – DL 72/2008, de 16 de Abril) não é o autor do

respectivo contrato (tomador), recebe, por morte deste, o valor do seguro

pago pela companhia seguradora. A correspondente quantia nunca esteve

no património do segurado. A aquisição dá-se por morte mas fora do regime

sucessório – ainda que os beneficiários sejam herdeiros da pessoa segura e na

sua atribuição sejam aplicáveis regras do fenómeno sucessório – art. 198º/2 e

201º/1 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro.

Prof. Oliveira Ascensão: devem ser considerados numa perspectiva diferente os

prémios de seguros pagos pelo segurado, sendo que estes configuram para o

beneficiário uma doação indirecta, pelo que, se este concorrer à sucessão, o seu valor

está sujeito à colação.

Há casos em que determinadas pessoas adquirem direitos que decorrem da morte de

outra, mas por direito próprio e não por sucessão.

Alheios ao fenómeno sucessório são os efeitos que, no usufruto simultâneo ou

sucessivo, a morte de um dos usufrutuários produz na esfera jurídica dos demais – art.

1441º e 1442º.

Usufruto Sucessivo: a aquisição dos usufrutuários subsequentes tem por causa

jurídica o seu titulo constitutivo e não a morte do usufrutuário precedente,

mesmo quando o usufruto reverta a favor do subsequente por morte do

anterior. Pode ser fiado um período de duração para o direito de cada

usufrutuário.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 18

Usufruto Simultâneo: a morte de cada usufrutuário determina, segundo o

fenómeno da expansibilidade dos direitos reais (direito de acrescer) o

alargamento da posição dos outros usufrutuários.

Nestes casos está-se perante direitos que não integravam a esfera jurídica da pessoa

que morreu, ou que se extinguem com a sua morte razão determinada da sua

natureza não sucessória

Contudo, podem identificar-se casos de transmissão, por morte do seu titular, de

direitos que não se acomodam plenamente às regras comuns da sucessão mortis

causa.

Exemplo: transmissão, por morte do arrendatário, do direito de arrendamento

urbano para habitação e do direito de arrendamento rural e florestal a

aquisição de tais direitos ocorre, por mero efeito da lei, em favor de pessoas

que não integram as classes de sucessíveis legítimos ou legitimários e segundo

regras não inteiramente coincidentes com as da sucessão legítima e

legitimária. O direito adquirido não é transmissível mortis causa.

EFEITOS SUCESSÓRIOS DA AUSÊNCIA INJUSTIFICADA

Nos termos do art. 99º, a justificação da ausência desencadeia vários efeitos, alguns

dos quais apresentam manifesta similitude com os produzidos na sucessão mortis

causa. Deste modo, nos termos do art. 101º, 103º e 109º consagra-se que:

O tribunal da ausência requisitará certidões dos testamentos públicos do

ausente

O mesmo tribunal mandará proceder à abertura dos testamentos cerrados do

ausente

Os bens do ausente serão entregues as seus legatários e herdeiros e ainda às

pessoas que por morte daquele tenham direito a bens determinados

Havendo herdeiros, procede-se à partilha e, enquanto esta não for feita, os

bens em causa ficam sujeitos à administração do cabeça-de-casal

Pode haver repúdio da sucessão do ausente e disposição dos respectivos

direitos sucessórios

Qual o verdadeiro sentido dos referidos efeitos da justificação da ausência?

Prof. Oliveira Ascensão: este autor acentua o facto de a aceitação e o repúdio

da sucessão do ausente pressuporem a sua abertura, a ausência justificada

determina a abertura da sucessão.

Prof. Pereira Coelho: refere efeitos para-sucessórios da morte presumida.

Prof. Luís Carvalho Fernandes: os referidos efeitos, pela sua proximidade dos

que ocorrem no fenómeno sucessório, não deixam de impressionar no sentido

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 19

de se poder atribuir à justificação da ausência a eficácia de determinar a

abertura da sucessão e mesmo outros efeitos sucessórios. Contudo, os aspectos

que têm sido assinalados devem ser analisados no conjunto do regime da

curadoria definitiva do ausente. Deste modo vários argumentos conduzem a

afastar a justificação da ausência como causa de verdadeiros efeitos

sucessórios, nomeadamente quanto à abertura da sucessão.

Em qualquer caso a justificação da ausência produz efeitos

inteiramente alheios à matéria da sucessão mortis causa (art. 106º, 108º,

110º, 113º e 1913º/1 al. c)), neste caso se antes não tiver havido

declaração da ausência presumida.

Os vários efeitos aparentemente sucessórios da justificação da ausência

têm natureza meramente instrumental, ou seja são determinados por

razoes ligadas ao estabelecimento da curadoria definitiva e para

assegurar a aplicação do critério que o legislador entendeu que a ela

deve presidir.

A própria lei o determina quando a respeito dos actos previstos em

relação aos testamentos do ausente, afirma, na parte final do art. 101º,

que eles são determinados pelo ‘’fim de serem tomados em conta… no

deferimento da curadoria definitiva’’

O legislador entende que as pessoas mais aptas, por mais interessadas,

para tomar conta da administração dos bens do ausente, nesta fase

são aquelas a quem por sua morte caberiam os bens que lhe

pertencem razões ligadas à diferente ponderação dos interesses de

terceiro e do ausente nas diversas fases da ausência, segundo a menor

ou maior possibilidade da sua morte. Deste modo escolhidos pela lei

como curadores definitivos do ausente, não são apenas os seus

sucessíveis mas todos aquele que por morte dele teriam direito a certos

bens (art. 104º).

Deste modo os bens não são entregues a tais pessoas a título de

propriedade, mas para meros efeitos de administração e tem de se

entender que são por eles possuídos em nome do ausente. Os poderes

dos curadores definitivos são diferentes dos do curador provisório.

Por ser mero administrador, no caso de o curador definitivo não

prestar a caução que lhe seja exigida, ficará impedido de

receber os bens que lhe caberiam, sendo os mesmos entregues

a outro herdeiro, que actuará, quanto a eles, como curador

definitivo – art. 107º/2.

Conclusão: não há na justificação da ausência qualquer transmissão

mortis causa de bens, pelo que não cabe considerar a ausência

justificada como pressuposto da sucessão em sentido próprio.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 20

EFEITOS SUCESSÓRIOS DA DECLARAÇÃO DE MORTE PRESUMIDA

A favor do entendimento de que a declaração de morte presumida provoca a

abertura da sucessão e o desencadear do fenómeno sucessório pode invocar-se o

art. 115º consagra que a morte presumida produz ‘’os mesmos efeitos que a morte’’

física.

Prof. Oliveira Ascensão: a declaração de morte presumida determina a abertura da

sucessão verdadeira e própria conduzindo tal à atribuição do efeito de desencadear

um verdadeiro fenómeno sucessório. Contudo, reconhece a existência de

particularidades decorrentes dos efeitos da verificação ou não verificados da morte

natural do ausente direitos reconhecidos aos sucessores que tenham direito à

herança na data da morte física (art. 118º) ou os direitos do próprio ausente (art. 119º).

A sucessão aberta por efeito da declaração da morte presumida é resolúvel.

Prof. Pereira Coelho: a declaração de morte presumida opera, em princípio, a

abertura do fenómeno sucessório, mas a equiparação não é completa. Diferença: na

morte presumida, a vocação é resolúvel, dando-se, contudo, a resolução apenas ex

tunc e não ex nunc (regime do art. 118º e 119º).

Prof. Espinosa Gomes da Silva: com dúvidas, admite que se verifica, na morte

presumida ‘’uma sucessão de efeitos substancialmente idênticos aos da sucessão

mortis causa, mas não há em rigor uma sucessão mortis causa’’, argumentando que a

morte presumida não é a morte (art. 118º e 199º).

Prof. C. Pamplona Corte-Real: a lei aproxima a morte presumida da morte física,

originando aquela uma ‘’situação jurídica especifica de cariz sucessório’’. A

especificidade resulta da possibilidade de regresso do ausente.

Prof. R. Capelo de Sousa: vê na morte presumida uma situação diferente da que

ocorre na ausência justificada, sustentando que abre a sucessão, com consequente

vocação para a aceitação e repúdio.

Prof. Luís Carvalho Fernandes: tendo em consideração o conjunto de posições

doutrinais, e reconhecendo que a declaração da morte presumida, sobretudo no

plano patrimonial, tem efeitos muito próximos dos da morte física, não pode aqui falar-

se de sucessão por morte verdadeira e própria (solução próxima da do Prof. Espinosa

Gomes da Silva). O argumento do art. 115º não pode ser entendido em sentido literal,

mesmo quanto aos efeitos patrimoniais; fundamentalmente está em causa assinalar os

pontos de que resulta a prevalência da morte física, quanto à atribuição dos bens do

ausente, e a tutela do ausente, se, apesar da declaração da morte presumida, ele for

ainda vivo, regressar ou dele se souberem noticias.

Em suma, valora-se de modo diferente a circunstancia que o Prof. Oliveira Ascensão

não deixa de por em destaque, de, em qualquer destes casos, se a própria sucessão e

não apenas a posição dos sucessores que é resolúvel.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 21

No fundo releva a razão de ser do instituto da ausência nas suas várias fases. Na

declaração de morte presumida, por efeito do alongamento do período de ausência,

ou, em certos caso, da longevidade do ausente, considera a lei ser maior a

probabilidade de ele já não ser vido em detrimento dos interesses do ausente, a

maior atenção dada aos de quem, por morte dele, receberia os seus bens.

De qualquer modo, a ausência, em todo o tempo, assenta sempre na hipótese de o

ausente ser vivo: a declaração de morte presumida só tendencialmente produz os

mesmos efeitos que a morte.

A afirmação do art. 115º é manifestamente excessiva e desmentida logo no próprio

preceito quanto ao casamento do ausente os efeitos sucessórios da ausência estão

ao serviço do fim do instituto e por ele condicionados.

Para o regime dos efeitos patrimoniais da ausência se harmonizar com a maneira de

ser deste instituto, na morte presumida, do ponto de vista do património do ausente,

ocorre uma transmissão universal em vida.

Tal transmissão universal em vida segue o modelo da transmissão mortis causa, sendo

contudo resolúvel. A verdadeira transmissão mortis causa do património do ausente

dá-se por efeito da sua morte física e em função da data em que esta ocorrer.

Mesmo quanto, por morte do ausente, as pessoas a quem os bens foram atribuídos por

declaração da morte presumida sejam as pessoas que têm direito à herança só então

a sua atribuição ganha a consistência de uma aquisição mortis causa.

Próprio sensu, a declaração da morte presumida não tem, pois, mesmo no plano

patrimonial, os mesmos efeitos que a morte. No sentido primitivo da expressão, tais

efeitos são quase sucessórios (ou para sucessórios).

3. FASE PRÉ-SUCESSÓRIA: A DESIGNAÇÃO

NOÇÃO DE DESIGNAÇÃO

Designação: determinação ou fixação, em vida do autor da sucessão, das pessoas

que poem vir a suceder-lhe, por morte dele. As pessoas designadas são os sucessíveis.

Os sucessíveis têm apenas uma posição virtual que os qualifica para serem escolhidos

como sucessores, quando ocorrer a morte do autor da sucessão. A relevância de tal

posição virtual varia conforme os casos:

Nalguns casos beneficia de uma tutela mais ou menos consistente que permite

valer em verdadeira expectativa jurídica

Noutros casos não passa se mera esperança (situação mais frequente).

A qualidade de sucessível não é meramente abstracta, num sentido equivalente ao

da capacidade de gozo, sucessória e passiva, que afinal, cabe, em principio, a quem

tiver personalidade jurídica e mesmo a nascituros ou a pessoas colectivas a constituir

(art. 2033º) a qualidade do sucessível tem um alcance diferente que advém da

produção, em favor de determinada pessoa, de um facto designativo.

↳ Nota

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 22

Designação Abstracta Designação Concreta

Significa a que opera na sucessão legal:

os sucessíveis são designados por

categorias (ascendentes, cônjuge,

descendentes, irmão)

É a normal na sucessão voluntária uma

vez que aí estão em causa pessoas

determinadas, individualizadas (ou pelo

menos determináveis)

FACTOS DESIGNATIVOS; REMISSÃO

Fontes ou Títulos da Sucessão: nos termos do art. 2026º, tais são a lei e a vontade do de

cuius. Quando se fala em fonte ou título de sucessão pretende-se significar que esta se

defere, a favor de uma ou mais pessoas determinadas, ou por mero efeito da lei, ou

por vontade do de cuius dentro dos limites da autonomia privada, limites esses fixados

pelo Direito e que variam consoante se trate de testamento ou de pacto sucessório.

Sucessão Legal (Legítima e Legitimária): a sucessão que decorre directamente

da lei

Sucessão Voluntária (Testamentária e Pactícia): sucessão que têm por fonte a

vontade do autor da sucessão

Factos Designativos: eventos de diversa natureza que têm a relevância jurídica de

atribuir a certa pessoa a qualidade de sucessível, segundo uma das referidas

modalidades de sucessão. Não se configuram nos mesmos terma na sucessão legal e

voluntária:

Sucessão Legal: surgem como factos designativos os eventos que geram as

situações jurídicas relevantes para deferimento da sucessão ex lege

Relação familiar – parentesco, vínculo matrimonial e adopção. Nesta

relação os factos designativos vêm a ser a filiação (uma ou mais), o

casamento e o acto de adopção Ou seja, os factos designativos na

Relação Familiar são das fontes desta consagradas no art. 1576º.

A única relação familiar não atendida no fenómeno sucessório é a

afinidade uma vez que tem uma fonte complexa (uma ou mais

filiações e casamento)

Relação com o Estado: os factos designativos são aqueles que,

segundo a Lei da Nacionalidade e o respectivo Regulamento, são

relevantes para a aquisição da nacionalidade portuguesa.

Sucessão Voluntária: constituem factos designativos o testamento e o pacto

sucessório.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 23

PLURALIDADE DOS FACTOS DESIGNATIVOS E SUAS CONSEQUÊNCIAS

A multiplicidade dos factos designativos e o concurso entre eles assumem alguma

protecção jurídica, em particular quanto à sua relevância relativa e eventual

ordenação?

Ocorrida a morte do autor da sucessão e fixado, nesse momento, o elenco ou quadro

dos seus sucessíveis, quando, por força da lei o chamamento dos sucessores vem a

fazer-se é em função da relevância dos respectivos factos designativos que ele opera.

Nota: a vocação resulta sempre da lei, ou seja, ocorre segundo critérios nela

estabelecidos.

Mesmo em vida do de cuius, a circunstância de os efeitos dos factos designativos não

serem os mesmos, do ponto de vista da posição jurídica das várias categorias de

sucessíveis dá-se sentido ao regime estabelecido na sua ordenação. Estamos face à

hierarquia dos factos designativos, segundo os títulos de secessão.

Em que termos se estabelece a hierarquia dos factos designativos?

1. Sucessíveis Legitimários, quanto à porção da herança que lhes é reservada

(quota indisponível). Tal manifesta-se através da faculdade de redução (por

inoficiosidade) das disposições sucessórias voluntárias que ofendam a legítima

(art. 2168º sendo confirmada quanto aos pactos sucessórios pelo art. 1705º/3 e

art. 1759º)

2. Pacto sucessório, verdadeiro e próprio, nos casos em que é validamente

admitido, sendo irrevogável.

3. Testamento, as disposições testamentárias contidas em pactos sucessórios e os

pactos sucessórios revogáveis.

4. Factos designativos que ficam os sucessíveis legítimos

REGIME DA DESIGNAÇÃO

Efeito dos Factos Designativos: determinação de um ou mais sucessíveis.

Cada facto designativo cria os seus sucessíveis. Contudo, por efeito da experiencia de

uma hierarquia dos factos designativos ada um deles pode vir a projectar a sua

eficácia sobre sucessíveis oriundos de outra designação.

Em suma: o elenco dos sucessíveis, em vida do autor da sucessão, é instável, e altera-

se pela verificação de novos factos designativos, pela projecção reciproca dos seus

efeitos e até pela verificação de factos que, não sendo em si mesmos designativos,

interferem com a eficácia designativa de outros.

Exemplo:

A – solteiro e sem ascendentes faz um testamento nomeando como seu

herdeiros os sobrinhos B/C

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 24

A casa após a elaboração do testamento com D, mas manteve o testamento

feito.

Conclusão1: B/C não deixam de ser sucessíveis de A, somente por este se ter casado

com D, mas a sua posição sucessória alterou-se a superior hierarquia do novo facto

designativo (casamento de A) implica que B/C, de sucessíveis únicos de A, passaram

a sucessíveis de (futura) quota disponível da herança dele.

Conclusão2: se o matrimónio de A se extinguir por divórcio, ou se D morrer antes de A,

sem ter havido, em qualquer dos casos, descendentes nascidos do casamento, não só

este perde eficácia designativa, como a posição de B/C enquanto sucessíveis volta a

alterar-se ganhando o testamento – seu facto designativo – a eficácia que tinha

anteriormente ao casamento de A.

Exemplo2:

E/F casam-se

E/F têm três filhos: G/H/I

H têm 1filho: J

E morre

Conclusão1: Sucessíveis de E F/G/H/I/J

Conclusão2: hierarquia dos factos designativos da na sucessão legítima e legitimária:

Sucessíveis prioritários: F/G/H/I

J – posição menos relevante se H morrer antes de E, a posição de J altera-se

e através do direito de representação ele ocupa a posição que cabia a H.

Até se ficar com a morte do de cuius, o elenco dos sucessíveis pode sofrer

modificações muito diversas, podendo o numero de sucessíveis alterar-se:

Pela verificação de novos factos designativos

Pela perda de eficácia de designações anteriores, com a consequente

extinção da qualidade de sucessível da pessoa por elas designada. Pode ter

diversas causas:

Sucessão Voluntária: vicissitudes inerentes aos factos designativos,

enquanto negócios jurídicos

Sucessão Legal: a alteração pode ocorrer, sem a verificação de

qualquer facto novo, designativo ou não, por mero efeito de alteração

da lei.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 25

Exemplo: até à Reforma de 77, sendo A casado com B, mas sem

descendentes ou ascendentes vivos, o seu sucessível prioritário seria

C, sem único irmão, ainda que a B coubesse, a título de legado

legítimo o usufruto da herança. Após a Reforma de 77’, o cônjuge

subir na hierarquia dos sucessíveis, pelo que C, sem deixar de ser

sucessível, perdeu a qualidade de prioritário.

Além disso, a ocorrência de novos factos designativos sem por em

causa a qualidade dos sucessíveis já existentes pode alterar a sua

posição sucessória. Há ainda efeitos que decorrem de outros factos que

não são designativos: situação que ocorre no exemplo anterior quanto

ao divórcio de E e na morte de D e H Factos Extintivos de um facto

designativo anterior de que resulta a perda da correspondente

qualidade de sucessível da pessoa por ele designada. Ocorre ainda

uma modificação da posição de outros sucessíveis: os sobrinhos de A ou

J, neto de E a morte e H comporta-se como facto designativo em

relação a J.

É importante ter atenção às circunstâncias de as afirmações feitas anteriormente se

poderem generalizar a todos os factos extintivos de factos designativos:

Quanto à designação da fonte negocial, posteriormente surgem factos

supervenientes que se projectam na sua eficácia revogação do testamento

ou do pacto sucessório (quanto a este, por acordo ou unilateralmente,

consoante o regime). Mas é necessário analisar a possibilidade de provocarem

efeitos semelhantes os vícios de que decorra a sua invalidade.

Os factos verificados em vida do autor da sucessão que afectem a

designação por constituírem fonte de indignidade ou deserdação – art. 2034º e

2166º

A instabilidade do elenco dos sucessíveis só cessa com a morte do de cuius. Quando

este morre fixa-se a lista dos sucessíveis, de entre os quais se vai fazer a selecção dos

sucessores segundo a hierarquia que nesse mesmo momento entre eles existia (tal não

significa que factos ocorridos apos a abertura da sucessão não possam interferir com

o quadro dos sucessíveis: sentença que reconhece um filho do de cuius for proferida

apos a sua morte (art. 1819º) ou se, na indignidade, a condenação por crime que a

determina for posterior a esse momento (art. 2035º/1).

Com a abertura da sucessão e a consequente vocação dos sucessíveis prioritários

cessa a eficácia da designação quanto aos chamados, por terem adquirido a

qualidade de sucessores e quanto aos preteridos por efeito do seu afastamento?

Não, uma vez que podem ocorrer, após a morte do autor da sucessão, vários factos

que levem à vocação de sucessíveis primeiramente preteridos. Exemplo: o chamado

não quer aceitar, repudiando a herança nesse caso são chamados os sucessíveis

subsequentes até que um aceite – art. 2032º/2.

Ou seja, o entendimento correcto é o de afirmar que a relevância dos factos

designativos só cessa com a aquisição da herança pelo sucessor ou sucessores

chamados.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 26

O que acontece quando a existência do facto designativo só é apurada apos a

morte do autor da sucessão?

Exemplo: filiação não estiver estabelecida – B é efectivamente filho de A, mas:

A paternidade não esta estabelecida em vida do progenitor pelo que A só no

seu testamento perfilha B aberta a sucessão, a posição do filho perfilhado no

testamento será tomada em conta na vocação.

A paternidade só é estabelecida por sentença proferida, em acção de

investigação, apos a morte do pai nos termos do art. 1819º/2, para a

posição sucessória do filho poder ser invocado contra os herdeiros ou

legatários do pai que por ela sejam afectados, necessário é que estes tenham

sido também demandados na acção de investigação em que a paternidade

de A for estabelecida.

4. ABERTURA DA SUCESSÃO

FONTES DA ABERTURA DA SUCESSÃO

Em sentido próprio, o fenómeno sucessório inicia-se com a abertura da sucessão.

Abertura da Sucessão enquanto primeiro momento do fenómeno complexo que há-

de conduzir à atribuição do património do falecido a uma ou mais pessoas – art. 2031º.

Em si mesma, a abertura da sucessão é o efeito jurídico de um facto que constitui a

sua fonte ou causa jurídica. A verdadeira fonte da abertura da sucessão é a morte

física de certa pessoa.

MOMENTO DA ABERTURA DA SUCESSÃO

A abertura da sucessão ocorre ‘’no momento da morte do seu autor’’ – art. 2031º. É a

este o momento que, em geral, se reportam os efeitos da sucessão, ainda quando os

fenómenos que lhe correspondem se verifiquem apenas em momento ulterior; sendo

tal uma consequência normal que acompanha a realidade de o fenómeno sucessório

se analisar em vários elementos de produção temporal diferida.

Os malefícios decorrentes da inexistência do fenómeno sucessório não deixariam de

se manifestar se a generalidade dos seus efeitos se não considerassem produzidos

desde o momento da morte do autor da sucessão se assim não fosse, no período

que normalmente decorre entre a morte do titular dos bens e a efectiva atribuição

destes aos sucessores, ai estariam os bens ao abandono, a irresponsabilidade pelo

passivo…

É importante esclarecer que a aquisição dos bens hereditários não se dá no momento

da abertura da sucessão – art. 2050º/1. Contudo, do ponto de vista do Direito, por

virtude de uma ficção legal, tudo se passa como se os fenómenos que estão a ser

considerados tivessem ocorrido no momento da morte do de cuius alcance e

efeito principal da abertura da sucessão.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 27

A lei faz retroagir ao momento da abertura da sucessão os efeitos de factos que

integram o fenómeno sucessório e só ocorrem em tempo ulterior. Casos

exemplificativos em que se verifica a retroacção dos efeitos de factos ocorridos em

momento ulterior à morte do de cuius:

Vocação subsequente – art. 2032º/2

Aquisição da capacidade sucessória – art. 2033º

Aceitação e repúdio da sucessão – art. 2050º/2 e 2062º (herança) e art. 2249º

(legado)

Partilha – art. 2119º

Verificação da condição aposta à herança ou ao legado – art. 2242º/1

O momento da abertura da sucessão é ainda relevante para:

O apuramento do valor dos bens na colação – art. 2109º

Cálculo da legítima – art. 2162º/1

Redução da inoficiosidade (consequência do anterior)

É ainda ao momento da abertura da herança que se atende, em geral, em matéria

de aplicação da lei sucessória no tempo – art. 12º.

LUGAR DA ABERTURA DA SUCESSÃO

A abertura da sucessão considera-se verificada no lugar do último domicilio do de

cuius – art. 2031º. Na falta de indicação especial da lei deve atender-se para este

efeito ao domicilio voluntário geral – art. 82º.

O lugar da abertura da sucessão desempenha um papel na determinação do local

em que devem ser praticados vários actos relativos ao fenómeno sucessório:

Determinação da competência territorial do tribunal onde há-de ser proposto

o processo de inventário, quando o autor da sucessão tenha morrido em

Portugal

Art. 77º/1 CPC: esse tribunal é o do lugar da abertura da sucessão

(mesmo preceito para a habilitação judicial de uma pessoa por morte

de outra).

Art. 77º/2 CPC: se a morte for fora do País

Fixa-se a competência do tribunal no processo cominatório de aceitação e

repúdio – art. 2049º

Quanto a certos legados, o lugar da abertura da sucessão é determinante

para fixar o local onde deve ser feito o cumprimento – art. 2270º.

Fixação da competência de repartição de finanças onde corre o processo

fiscal de liquidação do imposto do selo que seja devido pelo beneficiário da

herança ou do legado – art. 25º/1 e 26º/3 CIS

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 28

5. A VOCAÇÃO

I - REGIME COMUM - NOÇÃO E MODALIDADES DA VOCAÇÃO

NOÇÃO DE VOCAÇÃO

Vocação: chamamento dos sucessíveis à herança de uma pessoa falecida com a

consequente atribuição do direito de suceder.

Com o chamamento, os bens da herança ficam à disposição dos sucessíveis – que os

podem adquirir mediante uma manifestação de vontade nesse sentido (aceitação)

dando origem à devolução.

A atribuição do direito de suceder e a devolução dos bens comportam-se como

efeitos da vocação dela decorrendo em regra automaticamente.

MODALIDADES DE VOCAÇÃO

A vocação é feita, em geral, em função de factos designativos ocorridos antes da

morte do autor da sucessão.

As modalidades de factos designativos acabam por se projetar na vocação, sendo

possível transpor para o domínio desta as modalidades da sucessão quanto à sua

fonte dando assim origem a:

Vocação legítima

Vocação legitimária

Vocação testamentária

Vocação contratual

Contudo, há diferenças a ter em conta consoante a vocação seja feita a título de

herança ou de legado, ou seja em benefício de um herdeiro ou de um legatário.

VOCAÇÃO ORIGINÁRIA, SUBSEQUENTE E SUCESSIVA

Vocação Originária: coincide com a morte do de cuius Regra Geral: a vocação

ocorre no momento da abertura da sucessão – art. 2032º/1. São chamados, segundo

a hierarquia dos factos designativos, aqueles que têm melhor qualidade: os sucessíveis

prioritários (só se verificarem os pressupostos da vocação).

Vocação Subsequente: vocação ocorre em momento posterior à abertura da

sucessão

Vocação do sucessível prioritário não se mantém por causas diversas – art.

2032º/2, sob a fórmula genérica de os primeiros sucessíveis não quererem ou

não puderem aceitar. Nestes casos chamam-se os sucessíveis subsequentes

(segundo a ordem hierárquica do respectivo título designativo).

De todo o modo, o facto de a vocação ser subsequente não impede que os seus

efeitos se produzam, retroactivamente, desde a data da abertura da herança.

Contudo existem várias dúvidas quanto à delimitação rigorosa entre a vocação

originária e a subsequente, nomeadamente com o facto de na subsequente se

poderem englobar situações diversas.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 29

Vocação Múltipla: vocação originária respeita a vários sucessíveis.

A vocação subsequente depende do afastamento de todos os

originariamente chamados ou pode-se verificar se tal ocorre apenas em

relação a um deles? A resposta não pode ser universal, verificando-se

situações em que a falta de apenas um dos sucessíveis chamados

originariamente pode determinar uma vocação subsequente (direito de

representação).

Em função do requisito da personalidade (situação dos nascituros e das pessoas

colectivas a instituir) coloca-se a questão de saber se existe uma vocação sujeita a

uma conditio iuris ou uma vocação subsequente, por vezes dita sucessiva? A doutrina

dominante considera que se trata e uma vocação subsequente, por vezes dita

sucessiva.

Na vocação condicional, quando a condição é suspensiva..

No entendimento do Prof. Galvão Telles trata-se uma vocação subsequente

pois o chamamento só se dá no momento da verificação da condição.

Segundo a doutrina dominante trata-se de uma vocação originária uma vez

que assenta necessidade de os requisitos da vocação ocorrerem tanto no

momento da abertura da sucessão, como no da verificação da condição –

art. 2035º/2 e 2238º.

Um caso particular de vocação não originária ocorre na substituição fideicomissária,

em relação à do fideicomissário: tanto ele como o fiduciário são herdeiros do

instituidor de fideicomissário, mas o fideicomissário só é chamado após a morte do

fiduciário – art. 2293º/1 – se quanto àquele se verificarem os pressupostos da vocação.

Os bens estiveram atribuídos ao fiduciário segundo um determinado título – art. 2290º.

Deste modo, não faz sentido atribuir à vocação do fideicomissário efeitos retroactivos

em relação à data da abertura da sucessão; eles só podem produzir-se a partir do

momento da morte do fiduciário – art. 2294º. Neste caso, a vocação para além de ser

subsequente é também sucessiva uma vez que pressupõe uma vocação anterior que

efectivamente substituiu e produziu os seus efeitos.

VOCAÇÃP PURA, CONDICIONAL E A TERMO: REMISSÃO

A distinção entre vocação pura e condicional ou a termo interessa à vocação

testamentária e prende-se com o regime de aposição de tais cláusulas acessórias às

disposições testamentárias.

Critério de distinção: apreensão imediata, estando em causa a oponibilidade de

condição ou termo ao testamento e a determinação do seu regime.

Nota: matéria a tratar a respeito do conteúdo do testamento.

VOCAÇÃO UNA E MÚLTIPLA

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 30

Em certos casos, um só sucessível é chamado seja por um só título seja por títulos

diferentes. Contudo, existem igualmente casos em que a vocação respeita a vários

sucessíveis, todos chamados simultaneamente, seja pelo mesmo título seja por títulos

diferentes.

Vocação una: situação de haver um só sucessível chamado por um só título

Vocação múltipla: todos os restantes casos

Consequências:

A vocação una, hoc sensu, só pode verificar-se quanto à sucessão do herdeiro,

vulgarmente dito único e universal, pis não pode haver um só legatário de toda

a massa hereditária. A vocação do legatário é sempre múltipla, pois pressupõe

pelo menos a existência de outro legatário ou de um herdeiro, ou o seu

chamamento por mais de um título: neste caso como herdeiro legítimo e como

legatário, por exemplo.

As vocações múltiplas podem revestir feições diversas:

Pode o mesmo sucessível ser chamado à sucessão por vários títulos:

como herdeiro legitimário e legítimo, como herdeiro legítimo e

testamentário, como herdeiro e legatário.

Podem vários sucessíveis ser chamados por vários títulos – vocação

múltipla mais complexa.

Podem várias pessoas ser chamadas por um só título. Exemplo: por

morte de A são seus sucessíveis os seus dois irmãos (B/C); A deixa o seu

prédio situado em Lisboa aos seus amigos (D/E); e o remanescente da

herança aos seus irmãos (B/C) em relação a B/C ou em relação a

D/E existe uma vocação plural.

Em suma:

Quando a sucessão é múltipla é plural, estando fundamentalmente em causa

situações de concurso entre sucessores, sejam eles da mesma qualidade ou de

qualidades diferentes. Com esta matéria prende-se o regime do direito de

acrescer; sendo chamados os co-herdeiros a vocação plural revela-se

também relativamente à partilha da herança.

na vocação múltipla, quando em relação a um mesmo sucessível ou a vários

sucessíveis concorram vários títulos ou qualidades diferentes, a sua relevância

manifesta-se sobretudo no regime da divisibilidade ou da indivisibilidade da

aceitação e do repúdio.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 31

VOCAÇÃO DIRECTA E INDIRECTA

Vocação Indirecta: quando um sucessível é chamado, atendendo, não apenas à

relação existente entre ele e o de cuius, mas também em função da sua posição

perante um terceiro, que não entra na sucessão mas serve de ponto de referencia

para a vocação. Molda-se relativamente a um sucessível prioritário que, em termos

gerais, não quer ou não pode aceitar a sucessão. Há o chamamento de um sucessível

subsequente, contudo a vocação deste, como que se molda sobre a do prioritário,

cuja posição o chamado subsequente vai ocupar. Modalidades:

Substituição directa

Direito de representação

Direito de acrescer

↳ em qualquer destes institutos o chamamento do sucessível a quem se dirige a

vocação depende de o prioritário não poder ou não querer aceitar a sucessão

– art. 2281º, 2039º e 2301º; além disso o chamado indirectamente, no essencial,

vai ocupar a posição do prioritário – art. 2284º, 2039º e 2307º.

Vocação Directa: por exclusão de partes, constitui a modalidade regra da vocação.

AS VOCAÇÕES ANÓMALADAS

Nas vocações anómalas ficam abrangidas as vocações indirectas (direito de

representação, substituição directa e direito de acrescer) e a vocação fideicomissária,

como vocação sucessiva.

Nota: tema desenvolvimento mais à frente

II - REGIME COMUM DA VOCAÇÃO

1. GENERALIDADES

O MOMENTO E O REGIME DA VOCAÇÃO

No regime normal, a vocação dá-se no momento da abertura da sucessão – art.

2032º/1. Contudo, este regime só vale plenamente para a vocação originária. As

vocações subsequentes ocorrem posteriormente, embora sejam juridicamente

referidas àquele mesmo momento.

Contudo, existem algumas questões divergentes na doutrina que importa analisar.

Nos termos do art. 2032º/1, o chamamento é dirigido aos sucessíveis ‘’que gozam de

prioridade na hierarquia dos sucessíveis’’ desde que preencham certos requisitos da

própria vocação. Este preceito refere-se especificamente à capacidade sucessória.

De acordo com esta norma, os demais sucessíveis (não prioritários) não são de

imediato chamados, mas apenas se os primeiros não quiserem ou não puderem

aceitar – art. 2032º/2 vocação subsequente?

Prof. Pereira Coelho, Luís Carvalho Fernandes: A favor dos sucessíveis

subsequentes não se verifica vocação de imediato, ou seja, no momento da

abertura da sucessão.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 32

Prof. Oliveira Ascensão (posição oposta à anterior): a vocação refere-se de

imediato a todos os sucessíveis, prioritários ou subsequentes, com excepção

daqueles em relação aos quais se verifica uma vocação suspensa (nascituros

lato sensu, pessoas colectivas a instituir, sucessível sob condição suspensiva,

fideicomissário). Em relação aos sucessíveis subsequentes há logo vocação,

mas sujeita na sua eficácia a um facto suspensivo: a resolução da vocação

(ou das vocações) prioritárias.

Prof. Galvão Telles (posição intermédia, mas mais próxima da primeira tese): em

relação aos sucessíveis subsequentes verifica-se uma vocação suspensa.

Posição adoptada pelo Prof. Luís Carvalho Fernandes:

é necessário ter atenção eu mesmo os defensores da teria do chamamento

simultâneo conjunto admitem que os sucessíveis subsequentes não têm uma

situação igual à do prioritário, embora lhes seja atribuído imediatamente o

direito de suceder.

Art. 2032º - aponta para um chamamento imediato limitado ao sucessível ou

sucessíveis prioritários.

Em matéria de sucessão legal, as normas relativas ao chamamento de

sucessíveis subsequentes vão declaradamente no mesmo sentido, ou seja, de a

sua vocação não ser imediata – art. 2141º, 2142º, 2145º, 2147º, 2152º sendo

normas que regem para sucessão legítima, mas são aplicáveis à legitimária por

força da remissão.

O Prof. Oliveira Ascensão assinalava a relevância das normas anteriores, dos

quais decorre, na opinião do Prof. Luís Carvalho Fernandes, que, se a tese por

ele defendida fosse aceite, dela não poderia deixar de ficar excluída a

sucessão legal.

O regime da caducidade do direito de suceder – art. 2059º/1 – não constitui

obstáculo à tese do chamamento conjunto. O nº2 da referida norma permite

resolver tal questão.

Tudo se resume a encontrar uma construção que explique a tutela que o

sucessível não prioritário recebe de certos preceitos, nomeadamente do art.

2048º, 2049º, 2236º/1, 2237º/2 e 2238º/3. Ou seja, trata-se de explicar o reforço

da posição ocupada pelos sucessíveis subsequentes, operado após a abertura

da sucessão.

Esse reforço recebe o devido enquadramento jurídico e as dúvidas que suscita

ficam resolvidas, a contento da letra da lei e da tutela assegura aos sucessíveis

subsequentes, vendo na sua situação, após a abertura da sucessão, uma

expectativa jurídica.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 33

Não faz obstáculo à construção defendida (expectativa jurídica) a

circunstância de o art. 2048º e 2049º consagrarem a legitimidade para

requerer as medidas nele previstas ser atribuída genericamente a

qualquer interessado.

Interessado: por um lado é o titular de um direito subjectivo (credor ou

sucessível chamado), como por outro lado é o de uma expectativa

jurídica, sendo que esta constitui também um meio de tutela de

interesses.

Concorrem no caso os elementos que qualificam esta situação jurídica activa:

um facto complexo, uma curso de produção, de que depende a aquisição de

um direito (o direito de suceder) e mediante o seu exercício (aceitação), a do

direito aos bens hereditários, mas em que se verifica já, medio tempore, a

tutela de interesses do futuro e eventual adquirente (o sucessível subsequente).

Nem se diga que esta construção é insatisfatória quanto aos sucessíveis

subsequentes que beneficiam já de uma expectativa jurídica (sucessíveis

legitimários e alguns pactícios). A expectativa que nesta tese lhes é atribuída

apos a abertura da sucessão é nova, em relação à que antes lhes cabia, a

qual, naquele momento perde alguma da sua eficácia. São diferentes os

interesses que nos casos se tutelam:

Em vida do autor da sucessão trata-se de acautelar os sucessíveis

contra actos que aquele pratique em detrimento do seu futuro direito

aos bens hereditários, em função destes direitos lhes é dada a tutela

que qualifica a expectativa jurídica.

Apos a abertura da herança, é em função do direito de suceder e

quanto a acções ou omissões dos sucessíveis prioritários que os

subsequentes carecem de tutela.

REQUISITOS DA VOCAÇÃO, ENUMERAÇÃO

A vocação pressupõe um facto designativo e dá-se a relação de sucessíveis, ou seja

pessoas que dele beneficiam em concreto, o chamamento só se dá em relação ao

sucessível se se verificarem certos requisitos/pressupostos.

A definição dos requisitos da vocação e do seu sentido não é isenta de dúvidas: se se

sustentar a tese segundo a qual o chamamento só ocorre em relação ao sucessível

prioritário o primeiro requisito da vocação é o da titularidade da posição

correspondente; este requisito deixa de ter sentido para quem defenda a tese do

chamamento simultâneo de todos os sucessíveis, sendo que só relevará, então, para

os efeitos que a vocação produz.

Requisitos Comuns da Vocação:

Personalidade

Sobrevivência

Capacidade

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 34

RESOLUÇÃO DA VOCAÇÃO

Os efeitos da vocação podem cessar mediante resolução por causas diversas:

Casos especificamente ligados a certos aspectos do regime do fenómeno

sucessório

Repúdio

Indignidade (posterior à abertura da sucessão)

Verificação da condição resolutiva

Caducidade do direito de suceder

Efeito Geral da Resolução da Vocação: considera-se a vocação como se não tivesse

sido feita, operando, então, a vocação dos sucessíveis subsequentes. A resolução da

vocação opera retroactivamente, dando-se os seus efeitos como produzidos à data

da abertura da sucessão – art. 2032º/2.

2. REQUISITOS COMUNS

I - PERSONALIDADE

COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

A lei não se refere explicitamente à personalidade jurídica como requisito da

vocação. Da lei pode, quanto muito, deduzir-se que, dependendo a vocação da

capacidade do sucessível, tal implica a existência de personalidade, uma vez que

não faz sentido atribuir capacidade a quem não seja pessoa jurídica.

A personalidade jurídica não pode deixar de constituir requisito da vocação, uma vez

que desta resulta a atribuição, ao sucessível, de situações jurídicas: direito de suceder,

e se houver aceitação os direitos e vinculações que integram o património do autor

da sucessão.

Questões a analisar nos próximos pontos

1. Qualquer pessoa pode adquirir por via sucessória?

Quanto às pessoas singulares, nos termos do art. 2033º/1, atribui-se capacidade

sucessória, na sucessão legal, além do Estado, a todas as pessoas nascidas ou

concebidas. Nos termos do art. 2033º/2 al. a) reconhece-se capacidade sucessória, na

sucessão voluntária, aos concepturos, desde que filhos de pessoa determinada, viva

ao tempo da abertura da sucessão.

Quanto às pessoas colectivas, a capacidade jurídica sucessória é reconhecida na

sucessão testamentária ou contratual às pessoas colectivas e às sociedades – art.

2033º/2 al. b).

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 35

2. Quando deve verificar-se a personalidade jurídica, como requisito da

vocação?

Deve-se afirmar o princípio segundo o qual, para ser chamado, o sucessível tem de ter,

em regra, personalidade jurídica no momento da abertura da sucessão – art. 2032º/1.

A SITUAÇÃO JURÍDICA DOS NASCITUROS

No sistema jurídico português, com base no regime consagrado no art. 66º, as pessoas

singulares adquirem personalidade jurídica no momento do nascimento completo e

com vida. Deste modo, o nascituro, enquanto tal, não é pessoa jurídica, sendo que

por maioria de razão deste modo o mesmo sucede com os concepturos.

Quanto à existência da figura dos direitos sem sujeito é necessário partir da

concepção de direito subjectivo, segundo a qual este é um poder jurídico, ou seja, um

conjunto de meios de actuação jurídica que permitem a satisfação de interesses

individuais, legítimos, mediante o aproveitamento de utilidades de um bem a eles

afecto. Nesta construção, a vontade individual e a pessoa dela portadora perdem a

relevância que não podia deixar de lhes ser reconhecida pela tese voluntarista

clássica ou, mesmo segundo a teoria dos interesses juridicamente protegidos.

Perante a concepção perfilhada não se vê razão dogmática para não permitir que, a

titulo temporário, o direito subjectivo, subsista sem estar efectivamente atribuído a

qualquer pessoa. Nesse tempo intermedio é necessário que se mostrem aparelhados

meios de assegurar a consistência jurídica e pratica do direito e de conservação do

bem que tem por objecto, em termos de a posição do seu futuro titular não vir a ser

afectada.

Nos termos do art. 2240º, a herança ou o legado a favor do nascituto lato sensu

implica sempre um regime de administração dos bens correspondentes.

Se o beneficiário da disposição estiver já concebido a administração cabe a

quem a administraria se ele já tivesse nascido – art. 2240º/2 está em causa o

exercício do poder paternal, e o seu suprimento, segundo as diversas situações

que dele podem ocorrem.

Se se tratar de concepturo, o art. 2240º/1 remete para o art. 2237º a 2239º,

equiparando-se a situação à da herança sob condição.

A pessoa viva de quem o concepturo vier a ser filho tem a

representação deste em tudo o que não seja inerente à administração

da herança ou do legado.

Se tal pessoa for incapaz, caberá ao seu representante legal a

representação do concepturo.

Independentemente de se ser nascituro ou concepturo ficam sempre ressalvados os

poderes de administração do cabeça-de-casal – art. 2241º.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 36

Deste modo, a atribuição ao nascituro lato sensu de direitos sobre os bens hereditários

explica-se com recurso à figura dos direitos sem sujeitos. Na verdade com a morte do

de cuius deixou de existir o titular desses direitos e não se vê qualquer outra pessoa a

quem, imediatamente, possam ser, e facto, atribuídos. Contudo trata-se de uma

situação temporária, resolvendo-se num de dois sentidos possíveis:

Ou o nascituro vem a adquirir personalidade e se torna titular dos direitos sobre

esses direitos

Ou o nascituro não chega a ser pessoa jurídica e os bens serão atribuídos a

outra pessoa, aquela a quem, segundo as regras da sucessão, devam caber.

O entendimento que deve ser seguido é o de a vocação não acompanhar aqui a

abertura da sucessão, antes depender de facto posterior – o nascimento – que tem

como efeito a aquisição da personalidade.

Adquirida a personalidade, os efeitos da vocação que então ocorre retroagem à

data da abertura da sucessão construção mais ajustada ao regime do art. 66º/2

segundo o qual os direitos reconhecidos aos nascituros dependem do seu nascimento.

É algo equivalente uma condição suspensiva legal.

A PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA (PMA)

Lei nº32/2006, de 26 de Julho e Decreto Regulamentar nº5/2008, de 11 de Fevereiro

Quanto à lei nº32/2006, de 26 de Julho é necessário analisar o art. 2º que consagra a

aplicação da lei a diversas técnicas de procriação medicamente assistida.

De entre as varias limitações impostas à utilização das técnicas de PMA merecem ser

salientadas:

A proibição da finalidade de clonagem reprodutiva, dirigida à criação de

seres humanos geneticamente idênticos a outros – art. 7º/1

Nulidade de negócios jurídicos, tanto gratuitos como onerosos, da

maternidade de substituição – art. 8º/2 se apesar da nulidade essa situação

se verificar, a mulher que suporta a gravidez é considerada, para todos os

efeitos legais, mãe da criança que vier a nascer.

Apos a morte do marido ou do homem com quem vivia em união do facto

não é licito à mulher ser inseminada com sémen do falecido, ainda que este

haja consentido no acto de inseminação – art. 22º/1 (analisar art. 23º -

consequências de violação de tal proibição).

As situações que importam considerar são as de inseminação artificial e da fertilização

in vitro post mortem quando em qualquer dos casos a paternidade seja atribuída ao

falecido. Ambos representam analogia com os nascituros lacto sensu. A diferença

assenta no facto de, na PMA, o nascimento ocorrer em condições diferentes das leis

naturais que estão pressupostas no regime sucessório dos nascituros, por o nascimento

poder verificar-se mais de 300dias apos a abertura da sucessão.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 37

Na sucessão legal, a lei reconhece capacidade sucessória passiva a nascituros já

concebidos no momento da abertura da sucessão – art. 2033º/1.

O facto de, ao contrário do que ocorre com a sucessão testamentária, não terem

capacidade os concepturos, leva a excluir do campo de aplicação do art. 2033º/1 o

caso de na origem do nascimento estar algumas das situações post mortem

consagradas na lei – entendimento do Prof. Oliveira Ascensão.

A situação é diferente se na origem da pessoa nascida estiver um embrião, se est

existia já na data do autor da sucessão, uma vez que neste caso a fecundação e a

concepção já tinham ocorrido. A diferença em relação à situação prevista na lei

reside no facto de o nascimento poder ocorrer muito para além do período de 300

dias apos a sua morte.

O afastamento dos concepturos, na sucessão legal, dá ao período legal da

concepção, como limite da relevância do nascimento apos a morte do autor da

sucessão, um significado que leva a excluir da sucessão os que nasçam para alem

dele, com ressalva, do disposto no art. 1800º.

No entendimento do Prof. Oliveira Ascensão, a estrutura actual da sucessão legal

assenta na ideia de que o mapa dos sucessíveis e a correspondente situação se

estabilizam e esclarecem a curto prazo.

Na sucessão voluntária, a capacidade sucessória de nascituros e de concepturos está

expressamente prevista no art. 2033º/2 al. a), desde que no segundo caso descendam

de pessoa determinada viva ao tempo da abertura da sucessão. Não há razoes para

não alargar este regime à sucessão contratual nos casos em que ela é admitida.

A analogia com a situação em análise é menos evidente pois o art. 2033º/2 al. a)

refere-se a filhos de outros pessoas e no caso em questão interessam os filhos do autor

da sucessão. Existe contudo proximidade suficiente entre os dois casos para ser

legítimo recorrer ao regime legal na resposta a dar à situação sucessória de filhos do

autor da sucessão, na inseminação artificial como na fertilização in vitro post mortem.

Exemplo (base: sucessão testamentária): o de cuius estipula no seu testamento que,

no caso de vir a nascer um filho seu, por recurso a qualquer dessas técnicas, lhe atribui

a quota disponível.

Para esta disposição valer é necessário indicar quem é ou será a mãe do

beneficiário

Para se verificar analogia com a situação do art. 2033º/2 al. a) e a disposição

testamentária valer é necessário que a mãe indicada pelo autor da sucessão

seja pessoa viva ao tempo da abertura da sucessão.

No entendimento do Prof. Oliveira Ascensão quanto a filhos nascidos de embriões

biopreservados não se pode aplicar analogicamente o regime dos nascituros lato

sensu decorrentes da não fixação do limite de tempo em que o nascimento poderia

ocorrer. Deste modo, considera insatisfatória a aplicação do regime do art. 2033º/2 al.

a) e sustenta estar-se perante situação a reclamar a intervenção legal.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 38

Impõe-se, segundo o Direito vigente, a fixação de um limite de tempo para o

nascimento ser atendido. Todavia, a exigência adicional referida satisfaz este requisito

que no limite será a morte da pessoa – viva ao tempo da abertura da sucessão –

indicada como mãe pelo autor da sucessão.

SITUAÇÃO SUCESSÓRIA DAS PESSOAS COLECTIVAS

As pessoas colectivas, por definição dotadas de personalidade jurídica, satisfazem o

requisito da vocação relativo a essa qualidade jurídica.

Contudo, o art. 2033º/2 al. b) (não inclui a situação do Estado que é tratada no seu

nº1) só lhes reconhece capacidade na sucessão voluntária.

Nota: o art. 2033º em qualquer dos seus números refere-se à capacidade de gozo.

Estão apenas em causa limitações negativas do Princípio da Especialidade

consagradas no art. 160º/2.

Sendo a restrição à capacidade de gozo das pessoas colectivas, em geral, relativas

apenas à sucessão legal, em que, ressalvando o caso muito particular do Estado, só

familiares – e não todos – do de cuius são chamados, sempre poderia pensar-se que

se está perante um direito – o de suceder – que, nessas modalidades de vocação é

inseparável da personalidade singular.

Em todo o caso, podendo ele ser atribuído, noutras circunstancias, a pessoas

colectivas, há-de entender-se que o direito de suceder, abstractamente considerado,

se ajusta, afinal, à capacidade de gozo das pessoas colectivas, segundo o Princípio

da Especialidade do Fim; deste modo, a sua negação em matéria de sucessão legal

representa apenas um exemplo de direito vedado por lei – art. 160º/2.

Em suma, a situação sucessória das pessoas colectivas só coloca uma questão a

merecer referência especial quanto a sociedades não dotadas de personalidade

jurídica.

Sendo hoje incontroversa a personalidade jurídica das sociedades comerciais e das

sociedades civis sob forma comercial (art. 2º/1 e art. 4º/1 do Código das Sociedades

Comerciais) o que está em causa é a situação sucessória das sociedades civis simples

de regime geral.

O art. 2033º/2 al. b) parece reconhecer a capacidade jurídica a entidades não

dotadas de personalidade: à generalidade das sociedades civis simples ou a algumas

delas. Feita a extrapolação deste regime para o requisito da personalidade tal

significaria a vocação sucessória de entidades a quem falta tal requisito.

Em face do sistema jurídico português, o Prof. Oliveira Ascensão ao ocupar-se da

matéria em sede de capacidade sucessória, nega-a a ‘’meros contratos de

sociedade’’ em relação aos quais falhe o pressuposto da capacidade jurídica. Ou

seja, quanto a tais sociedades, faltando o requisito da personalidade, está também

excluída a vocação.

Segundo esta interpretação, o art. 2033º/2 al. b) excluía também a possibilidade de a

essas sociedades serem feitas atribuições patrimoniais mortis causa na sucessão

voluntária crítica à posição do Prof. Oliveira Ascensão

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 39

Prof. Luís Carvalho Fernandes: sem dúvida a sociedade, qua tale, não sendo dotada

de personalidade, não pode ser sujeito de direito. Mas, corresponde-lhe um património

colectivo que pertence ao conjunto dos sócios, à semelhança do que se verifica

quanto ao fundo comum das associações sem personalidade, em relação aos

associados. Deste modo não se vê razão para não aplicar às sociedades sem

personalidade um regime equivalente ao que consagra o art. 197º quanto às

liberalidades feitas a associações sem personalidade, que abrangem tanto os

resultantes de negócios inter vivos como mortis causa.

Extrai-se do art. 197º/2, por aplicação analógica, em sede de aquisição sucessória,

que as liberalidades feitas às sociedades sem personalidade nesta qualidade, se

consideram atribuídas ao conjunto dos sócios e acrescem ao património colectivo.

Assim e só com este alcance a vocação é dirigida à sociedade, cabendo o exercício

do direto de suceder a quem legalmente a represente nos termos do art. 996º.

PESSOAS COLECTIVAS A CONSTITUIR

É possível fazerem-se atribuições sucessórias, na sucessão voluntária, a pessoas

colectivas a constituir?

Resposta Afirmativa: implica, como é manifesto, a necessidade de tomar

partido quanto ao regime da sua vocação, uma vez que por definição, no

momento da morte do de cuius não se verifica quando a elas o requisito da

personalidade.

Não pode deixar de se admitir, no sistema jurídico português, a validade de

disposições testamentárias (ou pactícias) com atribuições patrimoniais, a título de

herança ou de legado, em favor de pessoas colectivas ainda não constituídas, mas a

constituir.

Quanto às fundações, nos termos do art. 185º/1, estas só podem ser constituídas por

testamento, o que implica a existência, neste negocio, de disposição que, a titulo d

herança ou de legado, afecte à realização de determinado fim os bens que vão

constituir o subtracto dessa pessoa colectiva.

Como a fundação só adquire personalidade pelo acto de reconhecimento – art.

158º/2 – que vale como aceitação da atribuição patrimonial feita, no momento da

abertura da sucessão ela não tem, necessariamente, tal qualidade.

E pode nem vir, sequer, a adquiri-la, se:

se verificar uma insuficiência definitiva do património que lhe foi afectado para

a realização do seu fim na hipótese de a fundação ser constituída por

testamento, ela não chega a adquirir os bens que lhe foram atribuídos,

passando os mesmos, se o testador não tiver disposto de maneira diferente, a

uma associação ou fundação de fins análogos, designada pela entidade

competente para o reconhecimento.

ou por este não ser considerado de interesse social – art. 188º/1 e 2.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 40

Da conjugação deste regime com o da aceitação, que é inerente ao

reconhecimento (art. 185º/1) resulta que ele só pode compreender-se integralmente

se se admitir que a vocação só se verifica no momento do reconhecimento.

Se a fundação não for reconhecida, não chega a ser chamada. Mas a disposição dos

bens não caduca, salvo, deve acrescentar-se, se o testador assim o dispuser. No

silencio do testador é chamada uma associação ou fundação já instituída, segundo

um mecanismo sucessório designado como substituição directa legal.

A atribuição dos bens, a titulo sucessório, a uma associação a instituir levanta algumas

dúvidas. Além de a ele proceder, fica claro que se passam a referir as associações em

sentido amplo, ou seja, a pessoas colectivas de substracto pessoal, compreendo,

portanto as sociedades.

Está fora de causa a possibilidade de o testador impor aos seus sucessores, seja a título

de condição, seja a título de modo, a constituição da associação, seja a título de

modo, a constituição da associação, ainda que destine, para o efeito a alguns bens.

Uma cláusula acessória do testamento com esse conteúdo seria inidónea e como tal

nula por contraria à lei, sendo que violava o princípio da livre associação, numa das

suas manifestações, que consagra a Liberdade de se associais – art. 46º/1 e 3 CRP.

Deste modo compreende-se que a lei não preveja a constituição e associações por

testamento, mas só por contrato.

Prof. Antunes Varela e Pires de Lima: admitindo a atribuições sucessórias a

associações a constituir, configuravam a deixa que tenha por objecto a

criação da pessoa colectiva como um encargo imposto aos sucessores, para

todos os efeitos legais, mas não se pronunciavam expressamente sobre o seu

valor jurídico.

Diferente é o caso se o testador atribuir bens a uma associação cuja constituição se

prevê, que já está em curso, ou que existe mesmo, mas sem personalidade. Não

ocorre aqui o vício acima identificado, restando apenas averiguar se alguma razão

jurídica de outra maneira se opõe a uma tal liberalidade.

A resposta a tal questão vai no sentido da admissibilidade e da validade de

disposições feitas a associações a constituir, nos termos acabados de referir, mais uma

vez o regime das associações sem personalidade fornece elementos que permitem

encontrar suporte legal para tal entendimento.

Nos termos do art. 197º/1 admite-se as deixas feitas a associações sem personalidade.

Mas o regime estatuído nessa norma vai mais longe ao prever a possibilidade de o

autor da liberalidade ter condicionado a deixa ou a doação à aquisição da

personalidade jurídica. Se assim acontecer, e a aquisição da personalidade não se

der no prazo de um ano, nos termos do art. 197º/1, 2ªparte, fica a disposição sem

efeito.

Não existe razão para não se aplicar este regime a atribuições sucessórias feitas a

pessoas colectivas a instituir, em geral.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 41

Dele resulta que a deixa é válida e subsiste, se vier a verificar-se a aquisição da

personalidade. Adquirida esta, a vocação é feita. Se não vier a dar-se a aquisição da

personalidade dentro do prazo fixado que se compreende por razões da

personalidade dentro do prazo fixado, que se compreende por razões de certeza e de

celeridade do fenómeno sucessório, a deixa fica sem efeito e a pessoa colectiva a

constituir não é chamada, será então nos termos do art. 2032º/2 chamado o sucessível

subsequente.

No período de pendência, que vai da abertura da sucessão à vocação da nova

pessoa colectiva, deve entender-se que os bens ficam sujeitos a administração

aplicando-se directamente ou por analogia (quanto à sucessão contratual, quando

seja o caso) o regime dos art. 2237º e 2239º.

CONFIGURAÇÃO GERAL DA PERSONALIDADE COMO REQUISITO DA VOCAÇÃO

Só aparentemente a referência genérica a sociedades, mesmo englobando as não

dotadas de personalidade, poe em causa a exigência da personalidade como

requisito da vocação. Os verdadeiros chamados, nas sociedades não personificadas,

são os sócios, no seu conjunto enquanto titulares do património colectivo, à

semelhança das associações sem personalidade.

Quanto aos nascituros lato sensu e às pessoas colectivas a constituir, as atribuições

são-lhes feitas em vista da futura aquisição da personalidade, sendo deste modo que

a sua situação se desmarca da das sociedades sem personalidade, as quais são

consideradas, na sucessão, enquanto tais, isto é, como não pessoas a título definitivo.

Não se dispensa quanto aos nascituros e às pessoas colectivas a constituir o requisito

da personalidade, apenas se admitindo a relevância da sua verificação num

momento posterior à abertura da sucessão. Contudo como não pode ser chamado

quem não tenha personalidade, tem de se admitir que é então a vocação que se

não verifica imediatamente. O mesmo vale, na procriação medicamente assistida, na

sucessão voluntária.

Excepção à regra básica do fenómeno sucessório (a vocação acompanha a

abertura da sucessão) é que nos casos referidos a vocação ocorre posteriormente ao

momento de abertura da sucessão – é diferida.

II - A SOBREVIVÊNCIA

COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

Exige-se, como requisito da vocação, a sobrevivência do autor da sucessão, uma vez

que uma pessoa já falecida não pode ser chamada à titularidade dos bens deixados

por morte de outra. Este requisito encontra-se implícito no art. 2032º/1 e no art. 2317º al.

a) quanto à sucessão testamentária.

Se o sucessível prioritário está vivo no momento da abertura da sucessão tal manifesta-

se por si mesmo, e como tal não se suscita, dúvidas nesta matéria.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 42

Mesmo quando o problema da vocação só ganha consciência jurídica algum tempo

após a morte do de cuius e a evidência anteriormente referida se perca com o tempo

entretanto decorrido a questão não se altera substancialmente. Exemplo: A sem bens

patrimoniais significativos conhecidos, falece. Nenhum interessado aceitou a sua

sucessão. Vem a apurar-se, anos mais tarde, que ele era herdeiro de uma grande

fortuna e aparecem agora familiares de pessoas que ao tempo eram herdeiros de A,

mas já faleceram, para se habilitarem à sucessão de A. Há que provar que estes

herdeiros eram vivos quando A morreu.

Em regra, nas sociedades modernas, como sucede em Portugal, existem meios

expeditos de prova do nascimento e da morte. No sistema jurídico português esta faz-

se através de elementos inscritos no registo civil (art. 1º e 3º CRCivil) pelo que a

demonstração da factualidade corresponde se alcança sem dificuldade. A prova dos

factos sujeitos a registo civil é feita por recurso aos meios determinados no Código (art.

4º e 211º ss).

Nem por a matéria ser em regra pacífica e a prova correspondente se encontrar

facilitada, se deve, todavia, deixar de evidenciar, que segundo o regime comum do

art. 342º/1, a prova de sobrevivência cabe a quem se quer valer da qualidade de

sucessível de certa pessoa e da titularidade do correspondente direito de suceder.

Nesta base resolvem-se os problemas os problemas decorrentes de casos em que não

seja possível apurar quem morreu primeiro: se o autor da sucessão se o pretenso

sucessível. Constituindo a sobrevivência do sucessível ao de cuius um facto constitutivo

do direito de suceder, não sendo feita a sua prova, da aplicação das regras de

repartição do correspondente ónus resulta que se deve considerar o facto não

provado e inexistente o direito invocado.

A COMORIÊNCIA

Nos termos do art. 68º/2 estabelece-se uma presunção de comoriência (morte

simultânea). Ou seja, se ocorrer dúvida quando ao momento da morte de certas

pessoas, estando em causa, na sua relação recíproca, um efeito jurídico que

dependa da sobrevivência de uma à outra, estende-se que elas faleceram ao mesmo

tempo. Este regime aplica-se a casos em que não seja possível determinar a ordem

cronológica da morte de determinadas pessoas sem que se verifiquem os elementos

próprios da chamada morte conjunta.

Exemplo (morte conjunta de várias pessoas): A e B, pai e filho, morrem num mesmo

acidente de viação sem ser possível provar quem morreu primeiro. Presume-se que

morreram ao mesmo tempo.

DIREITOS EVENTUAIS DO AUSENTE

Que regime se aplica aos bens que, estando instaurado um regime de ausência,

sobrevierem ao ausente?

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 43

Enquanto, na destinação do património do ausente, tal como ele existia na data da

sua ausência, só quanto ao regime da curadoria definitiva, correspondente à

ausência declarada ou justificada, e à declaração de morte presumida, a possível

identificação de um fenómeno sucessório se colocava, em relação aos direitos

eventuais do ausente o problema existe mesmo quanto à ausência presumida e ao

respectivo regime da curadoria provisória.

Às diferentes fases da ausência anda ligada uma diversa avaliação, por parte do

legislador, da probabilidade de o ausente ser vivo ou morte.

Nos termos do art. 120º, se, após o início da ausência qualificada, sobrevierem ao

ausente direitos que dependam da sua existência (caso dos adquiridos mortis causa)

eles passam às pessoas que seriam chamadas à titularidade deles se o ausente fosse

falecido.

Exemplo: se o ausente A for o sucessível prioritário na sucessão de B, tudo se passa

como se ele não sobrevivesse ao autor da sucessão. São chamados os sucessíveis

subsequentes de B, segundo as regras comuns ou anómalas da vocação.

A que título são esses bens atribuídos a tais pessoas?

A doutrina dominante partilha do entendimento de haver chamamento do ausente

quando ocorram as fases de curadoria provisória ou definitiva. Por outro lado, o Prof.

Oliveira Ascensão defende que não há vocação do ausente desde a fase da

curadoria definitiva.

Se estiver instaurada a curadoria provisória, os bens ficam sujeitos à administração do

curador. Se já estiver instaurada a curadoria definitiva, ou quando o for, as pessoas a

quem sejam deferidos os bens recebê-los-ão a titulo de curadores definitivos, tal como

aqueles que recebem os bens que pertenciam ao ausente.

O art. 121º não se ocupa do regime dos direitos que advenham ao ausente apos a

declaração de morte presumida. Neste caso, as pessoas que a eles teriam direito, se o

ausente fosse falecido, os recebem a título equivalente àquele por que são atribuídos

os bens aos herdeiros do ausente. Não há chamamento do ausente (entendimento da

generalidade da doutrina).

Qual o regime aplicável se o ausente regressar ou dele houver notícias?

Nestes casos aplica-se o regime consagrado no art. 119º.

O Prof. Antunes Varela e o Prof. Pires de Lima defendiam contudo que o art.

119º regia apenas para os bens existentes no momento da ausência.

Como se resolve a situação de estando declarada a morte presumida e verificando-se

de facto a morte do ausente esta ser em data diferente da que foi fixada na

sentença?

Não pode aqui aplicar-se o regime do art. 118º uma vez que tal se refere à sucessão

do próprio ausente e não à do terceiro de quem ele seria sucessível.

Exemplo:

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 44

A está ausente e foi declarada a sua morte presumida com efeitos desde 20

de Janeiro de 2008

Em 15 de Março de 2008 morre B, de quem A era sucessível prioritário

Dá-se a vocação subsequente de B, que por hipótese é C

Apura-se posteriormente que A morrer, efectivamente, em Setembro de

2007 o que não altera em nada a situação do exemplo

Se se vier a saber que A morreu em Junho de 2008 verifica-se quanto a

A, à data da abertura da sucessão de B, o requisito da sobrevivência.

Aplica-se analogicamente o regime do art. 119º: a herança de B é

atribuída a A, cabendo os bens que a integram, por morte deste, aos

seus herdeiros.

III - CAPACIDADE

COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

A capacidade para suceder conforma-se como uma qualidade das pessoas para

adquirirem, mortis causa, direitos e vinculações. Está perante uma capacidade de

gozo.

Capacidade Sucessória (de gozo) passiva: trata-se manifestamente da capacidade

para receber atribuições patrimoniais sucessórias e não para as fazer (≠ activa – releva

na sucessão voluntária, como capacidade para testar ou para celebrar contratos

sucessórios).

A CAPACIDADE SUCESSÓRIA PASSIVA COMO REQUISITO DA VOCAÇÃO

Nos termos do art. 2032º/1 ao fazer depender-se a vocação da ‘’necessária

capacidade’’ tal envolve em si mesma várias consequências:

Capacidade enquanto requisito da vocação, uma vez que a sua falta exclui o

chamamento

A capacidade passiva é requisito da vocação.

A de a capacidade ter de existir no momento da abertura da sucessão

A grande regra vai no sentido de o apuramento da existência da

capacidade coincidir com o momento da abertura da sucessão, logo

e normalmente com a vocação.

Em determinadas situações (nascituros lato sensu, pessoas colectivas a

constituir) a verificação da capacidade ocorre em momento posterior

à abertura da sucessão, sendo que nestes casos a própria vocação é

deferida, deixando de coincidir com a data da morte do de cuius.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 45

É suficiente, em geral, que a capacidade exista no momento da

abertura da sucessão. Contudo, tal princípio não é absoluto: no caso

de a disposição testamentária ser sujeita a condição suspensiva, a

solução é adequada, visto que o regime do art. 2035º/2 e do art. 2317º

al. b) vai no sentido de exigir a existência da capacidade no momento

da abertura da sucessão e no da verificação da condição.

A doutrina assinala ainda casos de perda da capacidade sucessória

posteriormente à abertura da sucessão, estando nesta base a

qualificação da indignidade sucessória como incapacidade – art. 2317º

al. b).

Os sucessores poderem não ser dotados de capacidade haverá

personalidade jurídica sem capacidade sucessória passiva?

Nos termos do art. 2033º/1 afirma-se a regra da coincidência entre a

personalidade jurídica e a capacidade sucessória passiva, no campo

da personalidade singular, ou seja das pessoas físicas. Há contudo uma

ressalva consagrada no art. 1650º/2, que consagra que para certos

casos de violação do impedimento impediente de casamento (art.

1604º al. c) a e) estabelece-se em relação a determinadas pessoas

uma incapacidade de aquisição, por testamento, do outro consorte.

Quanto às pessoas colectivas – ressalvando o Estado – a sua

capacidade esta limitada à sucessão voluntária. Está se face a uma

delimitação da sua capacidade de gozo ajustada ao critério comum

fixado no art. 160º. De qualquer modo, não pode deixar de se

reconhecer, quanto às pessoas colectivas em geral, que tendo

capacidade de gozo sucessória, esta surge, como nelas é próprio,

limitada pelos critérios ajustados à conformação de tal instituto nesta

categorias de pessoas. Em suma, não ocorre nada que adequada

construção dogmática da personalidade colectiva segundo a teoria

da realidade jurídica não possa explicar.

Deste modo o art. 2032º e 2033º ocupam-se da capacidade de gozo sucessória

passiva ajustada à natureza das pessoas jurídicas.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 46

A INDIGNIDADE SUCESSÓRIA, CAUSAS

Nos termos do art. 2034º carece de capacidade sucessória quem for autor de uma

série de actos criminosos ou ilícitos identificados nas várias alíneas do preceito.

Enumeração constante do art. 2034º é enunciativa ou taxativa?

Doutrina Corrente: tipicidade das caudas de indignidade

Prof. Oliveira Ascensão: tipicidade delimitativa – as tipicidades normativas não

devem ser consideradas taxativas, mas atende-se às graves consequências

decorrentes da indignidade, que afasta a sucessão do autor dos actos

referidos no preceito. Deste modo exclui-se o recurso

à analogia iuris para atribuir relevância, como causa de indignidade, a actos

não referidos no art. 2034º mas admite-se o recurso à analogia legis.

Categorias dos casos de indignidade consagrados no art. 2034º:

Prática de certos actos criminosos contra a vida, a honra ou os bens do autor

da sucessão ou dos seus familiares próximos (cônjuge, ascendentes,

descendentes, adoptante ou adoptado) – al. a) b)

Actos ilícitos em que estão em causa a liberdade de testar ou o próprio

testamento já feito – al. c) d)

Os actos que geram indignidade não têm necessariamente de ser anteriores à

abertura da sucessão, salvo em casos particulares. Exemplo:

Actos anteriores pela sua natureza anteriores à abertura da sucessão são o

homicídio consumado, de que seja vítima o autor da sucessão e os ilícitos

contra a liberdade de testar referidas nas al. c)

Quanto a actos contra o testamento (al. d)) alguns são anteriores, mas outros

podem ser posteriores à abertura da sucessão.

Podendo os actos ser anteriores ou posteriores à morte do de cuius, eles relevam

igualmente como causa de indignidade ou só os anteriores é que são atendíveis?

Nos termos do art. 2035º/1, consagra-se como regra básica, que os crimes enumerados

nas al. b) e c) mesmo quando possam ser posteriores à abertura da sucessão, só

relevam quando sejam praticados antes desse momento. Tal sofre um desvio quanto à

disposição sucessória relativa à herança ou ao legado quando tal se encontra sujeia a

condição suspensiva podendo o crime ser posterior à morte do de cuius, ele releva

desde que ocorra até à verificação da condição – art. 2035º/2.

Deste modo, resulta do regime exposto, que as demais causas de indignidade,

quando possam ser anteriores ou posteriores à abertura da sucessão, tanto relevam

num caso como noutro.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 47

Problema diferente que se prende com o modo por que a indignidade opera, é o do

momento em que deve verificar a condenação pelos crimes enumerados na al. a) b)

sem prejuízo da relevância destes actos estar, em geral, condicionada pela sua

pratica antes da abertura da sucessão, a condenação, em si mesma, é atendida

ainda quando ocorra posteriormente a ela.

DECLARAÇÃO DA INDIGNIDADE E SEUS FEITOS

Nos termos do art. 2036º consagra-se a necessidade de uma acção destinada a obter

a declaração de indignidade. Esta acção é diferente da de condenação pelos

crimes previstos na al. a) e b) do art. 2034º.

No entendimento do Prof. Oliveira Ascensão é necessário distinguir se:

o indigno tenha a posse de bens hereditários só neste caso a declaração

judicial seria necessária.

Prof. Luís Carvalho Fernandes: a existência de posse de bens

hereditários apenas releva para o prazo de propositura da acção de

declaração de indignidade, não servindo para a dispensar.

O indigno não a posse de bens hereditários.

A acção de declaração de indignidade pode ser proposta em vida do autor da

sucessão ou após a sua morte – regime do art. 2036º e 2038º.

Uma vez que a lei não estabelece um regime particular quanto à legitimidade para

requerer a acção de declaração de indignidade, o Prof. Pereira Coelho, Pires de Lima

e Antunes Varela consideram que se deve aplicar as regras processuais gerais.

É necessário ter em consideração que a acção, sempre que as causas de indignidade

sejam anteriores à abertura da sucessão, pode ser proposta pelo autor da sucessão.

Uma vez que os efeitos se projectam também, no domínio da sucessão legitimária, e

gozando os respectivos sucessores em vida do autor da sucessão de uma expectativa

jurídica, entende-se que também estes a podem intentar.

Ocorrendo os factos após a morte do autor da sucessão e sendo tais relevantes como

causa de indignidade a legitimidade para a acção cabe aos interessados –

genericamente têm esta qualidade os sucessíveis (chamados ou não) que possam

beneficiar das consequências da indignidade. Podem também ter tal qualidade os

credores dos sucessíveis beneficiários da sucessão, por efeito da indignidade.

Prazo de Propositura da Acção

se a condenação pelos crimes das al. a) b) do art. 2034º ou a pratica dos

ilícitos previstos na al. c) d) ocorrerem antes da abertura da sucessão, a acção

pode ser proposta no prazo de dois anos a contar da morte do autor da

sucessão.

A acção pode também ser proposta dentro de um ano a contar, ou da

condenação pelos ditos crimes, ou do conhecimento dos ilícitos das al. c) e d)

do art. 2034º.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 48

Justificação dos prazos serem tão curtos: justifica-se pelas graves consequências da

indignidade e pela correspondente necessidade de, com brevidade, se estabelecer,

com certeza e segurança, o curso do fenómeno sucessório.

Quais as consequências decorrentes do preenchimento do prazo fixado no art. 2036º

sem ser proposta a acção declarativa de indignidade?

Segundo o regime próprio da caducidade, a resposta imediata vai no sentido de

extinguir o correspondente direito, que não mais pode ser invocado. Contudo é

chocante que o sucessível, tenha matado o autor da sucessão (eventualmente com o

propósito de beneficiar da sua sucessão) possa vir a herdar só por ter passado o prazo

de propositura da acção.

Prof. Oliveira Ascensão: defende uma solução que limita os efeitos da

caducidade da acção de indignidade aos casos em que o indigno tem em

seu poder bens hereditários. Partindo da relevância que a lei dá ao regime dos

bens quando regula os efeitos da indignidade, que quando os situa no domínio

da devolução quer quando faz a qualificação da posse – é a posse dos bens

pelo indigno que está em causa. Entende, deste modo, ser lícito recorrer, por

analogia, ao regime do prazo de invocação da anulabilidade, o qual

depende de o negócio anulável estar ou não cumprido nos termos do art.

287º/1 e 2.

Reserva quanto a esta tese: atribuição de caracter automático à

indignidade, não havendo posse do herdeiro. A analogia com o

regime da anulabilidade só justifica a dispensa de prazo da sua

invocação. Se o indigno não é possuidor de bens da herança, não se

impõe a propositura da acção declarativa da indignidade nos prazos

fixados no art. 20036º. A todo o tempo em que ele entenda valer-se da

sua qualidade de sucessível prioritário, podem os interessados opor-lhe,

consoante os casos, por via da acção ou de excepção, o facto de

que a indignidade deriva.

Qual o valor da sentença proferida na acção de indignidade: será declarativo ou

constitutivo?

Argumentos a favor de ser uma acção declarativa:

A lei usa a palavra ‘declaração’ no art. 2036º e no art. 2037º/1

Quando, ao fixar os efeitos da indignidade, a lei considera a devolução da

sucessão ao indigno como inexistente, e não como resolvida (art. 2037º/1)

estabelecendo um regime que se harmoniza cm o de uma acção declarativa.

O indigno é considerado como possuidor de má fé dos bens hereditários que

tenha na sua posse.

A indignidade uma vez declarada produz os seus efeitos com relevo no

desenvolvimento do fenómeno sucessório.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 49

Nos termos do art. 2037º/1, a vocação do indigno é tida por inexistente, havendo lugar

ao chamamento dos sucessíveis subsequentes. Contudo é necessário ter atenção ao

nº2 da referida norma que consagra que a indignidade não prejudica, na sucessão

legal, o direito de representação dos descendentes do indigno. Ou seja, na sucessão

testamentária a indignidade afasta o chamamento dos sucessíveis por direito de

representação.

Como segundo efeito da declaração de indignidade consagra-se que a posse de

vens hereditários que o sucessível declarado indigno tiver é considerada de má fé,

com todas as consequências que tal implicar.

REABILITAÇÃO DO INDIGNO

A eficácia dos actos constantes no art. 2034º, como causa da indignidade, não é

irremediável, podendo o autor da sucessão perdoar ao indigno reabilitando-o nos

termos do art. 2038º.

A reabilitação pode verificar-se mesmo apos a indignidade já ter sido judicialmente

declarada, mas tem de ser feita mediante declaração expressa. Além disso, o acto de

reabilitação é um negócio jurídico formal devendo ser feita em testamento ou por

escritura pública nos termos do art. 2038º/1.

Embora a lei imponha a modalidade expressa da declaração, nos termos do art.

2038º/2, reconhece-se alguma relevância à reabilitação tácita. Contudo tal regime

não isenta de dúvidas.

Exemplo: o autor da sucessão, tendo já conhecimento da causa de indignidade, faz

testamento em que, em reabilitar expressamente o indigno, o contempla com alguma

disposição o indigno é admitido a suceder ‘’dentro dos limites da disposição’’

testamentária, mas não a qualquer outro titulo sucessório. Em suma, a indignidade só

não opera quanto às disposições contidas no testamento.

Nestes casos está se face a uma declaração tácita em que o nexo lógico de

concludência é estabelecido por lei (declaração ficta). O sentido da declaração vem

a ser determinado pelo próprio facto concludente, mas também pela norma que lhe

dá valor declarativo. Ou seja, a delimitação decorrente do art. 2038º/2 não respeita

apenas ao título, afastando o direito de não decrescer:

O testador se pretendesse uma reabilitação plena teria meios para o fazer

Deve-se considerar se este mesmo pensamento que domina o art. 2038º/2

quando ressalva a inexistência de reabilitação expressa

Ou seja, a lei considera o indignado reabilitado para poder beneficiar da disposição

testamentária, mas s+ dela e nos precisos termos nela estipulados.

A DESERDAÇÃO: NOÇÃO E REGIME

Deserdação (art. 2166º e 2167º): o seu regime encontra-se regulado em sede de

sucessão legitimária uma vez que é nesta modalidade que os seus efeitos se

produzem. Constitui o meio jurídico específico através do qual o autor da sucessão

poe, por acto da sua vontade, privar um sucessível legitimário da sua legítima.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 50

Identificação das causas que deserdação (art. 2166º/1):

Na pratica de certos crimes dolosos contra a pessoa, honra ou bens do autor

da sucessão e de certos familiares seus (cônjuge, descendentes, ascendente,

adoptante ou adoptado) – a)

Na denúncia caluniosa ou no falso testemunho contra as mesmas pessoas – b)

Na recusa injustificada de alimentos ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge –

c)

Qual o sentido, na deserdação, da enumeração contida no art. 2166º/1?

Em matéria de deserdação não se pode fazer recurso à analogia, mesmos nos termos

limitados em que, por vezes, é admitida a indignidade devido ao facto de o papel

que a deserdação desempenha em sede de sucessão legitimária ir além das

consequências típicas da indignidade. Trata-se de privar sucessíveis de direitos

especiais que lhe são atribuídos.

Verificadas estas causas, se, nas duas primeiras o sucessível tiver sido condenado pelos

crimes cometidos, a deserdação não opera automaticamente, pois depende de uma

manifestação de vontade do autor da sucessão contida em testamento. Deve o de

cuius indicar expressamente a causa que determina a deserdação (art. 2166º/1).

A deserdação priva o sucessível legitimário da sua legítima, na sua totalidade, não

sendo de admitir uma deserdação apenas parcial, por a tal se opor o princípio da

intangibilidade consagrado no art. 2163º.

Havendo deserdação, só a legítima é afectada ou aquela estende também os seus

efeitos à porção que ao legitimário caiba na quota disponível?

Não se trata de saber se o testador pode privar o sucessível da quota disponível. O

que esta em causa é apenas apurar-se se limitando-se o autor da sucessão a deserdar

o sucessível legitimário (exemplo: o falecido faz constar do seu testamento o seguinte

‘’deserdo o meu filho A por ter cometido o crime X’’) ele fica também impedido de ser

chamado como sucessível legítimo.

Embora a questão não seja isenta de dúvidas, entende-se que a deserdação implica

o afastamento do sucessível quanto à sucessão legítima por se afigurar ser essa a

solução mais ajustada à vontade normal do testador.

A deserdação produz os mesmos efeitos que a indignidade, sendo que o art. 2166º/2

equipara o deserdado ao indigno. Entende-se que é admitida a reabilitação do

deserdado em termos equivalentes aos expostos para a indignidade.

Claro que, por virtude do modo com a deserdação opera, a primeira manifestação

de vontade do de cuius perdoar o sucessível, reabilitando-o encontra-se no simples

facto de não o deserdar.

A particular gravidade dos efeitos da deserdação justificam a atribuição ao

deserdado de meios de contra ela reagir:

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 51

O deserdado pode impugnar a deserdação nos termos do art. 2167º,

ocorrendo a invocação como fundamento da impugnação a inexistência de

causa nos termos do art. 2166º.

Por razões de certeza e de segurança no desenvolvimento do

fenómeno sucessório, o prazo de impugnação da deserdação é muito

curto. Nos termos do art. 2167º, o prazo assenta em dois anos, contados

da abertura do testamento.

Prof. Oliveira Ascensão: invocando a analogia com a situação

descrita no art. 2059º/1, adita ao prazo o conhecimento da

existência do testamento e da deserdação.

RELAÇÕES ENTRE A INDIGNIDADE E A DESARDAÇÃO

Na enumeração do art. 2166º (causas de deserdação) não constam os actos. Por

outro lado, é causa privativa de deserdação a

Causas de Indignidade – art. 2034º Causas de Deserdação – art. 2166º

Actos atentatórios da liberdade de testar

ou do próprio testamento -

- Recusa, por parte do sucessível, de

alimentos do autor da sucessão ou ao

seu cônjuge quando para tanto não

exista justa causa

Semelhança entre as causas consagradas no art. 2034º a) e b) e as causas

consagradas no art. 2166º/1 al. a) e b)

Podem ser atendidos, como causas de deserdação, actos relevantes para efeitos de

declaração da indignidade não contemplados no art. 2166º?

O alargamento dos efeitos da indignidade à sucessão legitimária depara-se com a

dificuldade emergente dos termos em que a deserdação opera. A deserdação exige

uma manifestação expressa da vontade do autor da sucessão, sujeita, além disso à

observância de certas formalidades.

Em contrapartida, a negação de relevância à indignidade na sucessão legitimaria

não deixa de conduzir a resultados inadmissíveis. Exemplo: o assassino do autor da

sucessão só tinha a ganhar com a eficácia do seu crime, ao eliminar qualquer

possibilidade de a vitima o deserdar.

Sempre que da causa da indignidade decorra a impossibilidade de, em

testamento, se fazer operar a deserdação, não pode deixar de se lhe atribuir

relevância na sucessão legitimaria, sob pena de beneficiar o infractor.

No fundo trata-se de saber se o instituto da indignidade sucessória abrange a sucessão

legitimária, na generalidade dos casos: embora por razões nem sempre coincidentes,

a doutrina dá resposta afirmativa a esta questão.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 52

Argumentos ligados à situação sistemática do regime da indignidade na parte

geral do Livro V, comum a todas as modalidades de sucessão o legislador

tinha em mente todas as modalidades de sucessão

Art. 2037º/2 referência genérica desta norma sem distinguir à sucessão legal.

Não releva invocar contra este entendimento razoes ligadas à tutela do

legitimário, pois elas conduziriam à conclusão desrazoável de dela beneficiar

mesmo quem para tanto não é digno, sendo que o próprio instituto da

deserdação desmente tal solução.

QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DA INDIGNIDADE E DA DESERDAÇÃO

Nos termos do art. 2034º, configura-se a indignidade como uma incapacidade

sucessória passiva. Esta qualificação legal não é utilizada em sede de deserdação,

mas a equiparação dos efeitos das suas situações não pode deixar de significar que,

para a lei, ela lhe é também aplicável.

Em geral, a doutrina não questiona a qualificação da indignidade e da deserdação

como incapacidade sucessória.

Prof. Pereira Coelho: a sua posição assenta na definição de capacidade sucessória

como ‘’idoneidade para ser chamado a suceder como herdeiro ou legatário’’ vendo

nela uma aplicação particular da noção genérica de capacidade jurídica. Deste

modo, as incapacidades de adquirir por sucessão não se filiam ‘’em qualquer

incapacidade natural, física ou psíquica, do herdeiro ou do legatário, mas numa ideia

de indignidade do sucessível’’.

Prof. Oliveira Ascensão/Prof. Luís Carvalho Fernandes: acentuando-se a maneira de ser

das incapacidades, que pressupõem uma deficiência natural da pessoa e se dirigem

à sua protecção. Não é esse o caso da indignidade sucessória, cujo caracter relativo

seria também inadequado e uma situação de incapacidade. A construção

dogmática concreta da indignidade é a de ilegitimidade.

Enquanto na capacidade a questão se coloca ‘’por referencia a qualidades da

pessoa’’, de que depende, segundo o Direito, a sua adequada e válida actuação

jurídica, na ilegitimidade o que está em causa é a inexistência de determinada

posição relativa entre uma pessoa e o direito, ou o bem sobre que esse direito incide

ou o interesse que por ele é tutelado.

Daqui decorre que a incapacidade de gozo, se esse fosse o caso, se referira à

possibilidade de ser titular de certo direito (o de suceder), em geral, não se

coadunando, em regra, com posições meramente relativas.

Se à indignidade e à deserdação correspondesse uma incapacidade, as suas

consequências, quanto às pessoas por ela atingidas, deviam referir-se à vocação em

geral, quanto a qualquer sucessão e não apenas à sucessão de quem é atingido ou

afectado pelo acto criminoso ou ilícito.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 53

É justamente este o regime da indignidade e da deserdação: o afastamento do

indigno ou do deserdado é claramente dirigido a certa sucessão. Nada na lei leva a

pensar que o sucessível declarado indigno ou deserdado não possa ser chamado à

herança de pessoas com as quais as causas de indignidade ou da deserdação não

tenham relação.

Em suma, a configuração adequada à indignidade e à deserdação não é a da

incapacidade mas sim a da ilegitimidade.

III - VOCAÇÕES ANÓMALAS

1. VOCAÇÕES INDIRECTAS

I - PONTOS COMUNS

A Vocação Indirecta pode ser:

Substituição Vulgar ou Directa

Direito de Representação

Direito de Acrescer

REQUISITOS

Todos os tipos de vocação indirecta derivam do facto de o sucessível não poder

(impossibilidade jurídica e não física) ou não querer aceitar (leia-se repúdio) a

sucessão.

Exemplo: sucessível chamado morrer após a vocação, sem chegar a ter

conhecimento dela ou sucessível, por qualquer razão física, como estar em coma, não

puder aceitar não existe uma vocação indirecta ocorrendo a transmissão do direito

de suceder.

Causas de Impossibilidade de Aceitação comuns às várias modalidades de vocação

indirecta dependem da posição do sucessível:

A não sobrevivência

A indignidade

A deserdação

A ausência, após a declaração da morte presumida

EFEITOS

Efeito Geral Comum: ao sucessível a quem é dirigida a vocação indirecta vão ser

atribuídos, em regra, os mesmos direitos e obrigações que caberiam ao sucessível que

não quer ou não pode aceitar.

Art. 2284º (substituição vulgar) e 2307º (acrescer): ‘’direitos e obrigações’’ que

seriam atribuídos ao sucessível afastado

Note-se que na substituição vulgar a assinalada identidade de direitos

e obrigações poderá ser afastada por disposição do autor da sucessão

(art. 2084º) – existe um reconhecimento da relevância da vontade do

testador

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 54

Por sua vez, no direito de acrescer, a mesma identidade só se verifica

quanto a direitos e obrigações ‘’de natureza não puramente pessoal

(art. 2304º)

Art. 2039º (direito de representação): ‘’ocupar a posição’’ do sucessível

afastado

II - DIREITO DE REPRESENTAÇÃO

NOÇÃO (art. 2039º e 2045º)

A noção de direito de representação encontra-se consagrada no art. 2039º sendo de

salientar que aos descendentes são equiparados os adoptados plenamente (art.

1986º/1).

Encontrando-se o art. 2039º localizado nas disposições relativas à sucessão está se

face a um instituto que cale para todas as suas modalidades: legal e voluntária.

O Direito de Representação é atribuído por força da lei, não tendo, como fonte a

vontade do autor da sucessão, mas, vista a diferente natureza das normas que regem

a sucessão legitimária, por um lado, e a legítima e a voluntária, por outro, a vontade

do testador pode vir a desempenhar um papel de afastamento da representação

(art. 2131º e 2041º), que naquelas está excluído.

O chamado sucede por direito de representação, ou seja, em função da posição de

um sucessível afastado.

Direito de Representação Transmissão do Direito a Suceder

O Sucessível afastado não entra na

sucessão do de cuius.

O Direito de Representação só cabe a

descendentes do sucessível afastado

Existe uma só transmissão: o

representante não tem de aceitar a

sucessão de que o representado era

sucessível e é em relação àquele que

devem verificar-se os requisitos da

vocação.

Exemplo: A (avô/morre), B (pai/pré

morte) e C (filho)

C pode ter repudiado a herança de B e

mesmo assim ser chamado a suceder a A

– art. 2043º

Houve uma vocação efectiva e que

substitui, mas que não teve o seu

seguimento normal mediante o exercício

daquele direito, antes do falecimento do

chamado. Existindo o direito de suceder

na esfera jurídica deste sucessível no

momento da sua morte, ele transmite-se

aos seus sucessores – quaisquer que eles

sejam – e não apenas aos descendentes.

Existem duas transmissões:

(1) O transmissário, para receber o

direito de suceder, tem de

preencher os pressupostos da

vocação quanto ao transmitente

(2) O transmissário tem de aceitar a

sucessão deste

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 55

ÂMBITO DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO

A representação sucessória, sem prejuízo de algumas diferenças, verifica-se em todas

as modalidades da sucessão.

Sucessão Legal e Testamentária – art 2040º

Sucessão Contratual – art. 1703º/2

Aplica-se tanto às heranças como aos legados

Na Sucessão Legal o direito de representação só se aplica na linha recta, em favor dos

descendentes dos filhos do autor da sucessão e, na linha colateral, em benefício dos

descendentes dos irmãos do falecido.

Ou seja, na falta de ascendentes ou do cônjuge sobrevivo, mesmo que estes tenham

descendentes, não há direito de representação, tal como não existe, na linha

colateral, para os descendentes dos demais parentes, além dos irmãos.

Deste modo os representantes tanto podem ser filhos, como netos ou bisnetos dos

filhos ou dos irmãos do falecido consoante a regra da Preferência do Grau de

Parentesco (art. 2135º)

Na Sucessão Testamentária, verificados certos requisitos, o direito de representação

funciona a favor dos descendentes do sucessível. Embora se esteja no domínio da

sucessão voluntária, a vocação por direito de representação é deferida ex lege, em

termos, portanto, análogos aos da sucessão legal (= regras quanto aos descendentes

que podem ser chamados e quanto à preferência de grau).

Note-se que no Código de Seabra, o Direito de Representação estava limitado à

sucessão legal e não se aplicava, por razoes de ordem histórica, ao repúdio.

Na versão original, embora segundo regime diferente do que vigorava no Código de

1867, o Código vigente dedicava ainda um tratamento diferenciado, e

consequentemente menos favorável, aos parentes ilegítimos. Em certos casos, o

direitos de representação estava excluído quanto a eles.

REQUISITOS DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO NA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

A admissibilidade da representação na sucessão testamentária não se verifica em

relação a todos os pressupostos comuns da vocação indirecta apenas abrange a

pré-morte do sucessível e o repúdio da sucessão, seja legado ou herança – art.

2041º/1.

Doutrina e Prof. Carvalho Fernandes: deve ainda estender-se a sua aplicação na

ausência do sucessível (entendimento que se harmoniza com o art. 120º,

nomeadamente quando nele se diz que são chamadas as pessoas a quem os direitos

caberiam se o ausente fosse falecido)

Importa ainda referir as restrições quanto ao direito de representação constantes do

art. 2041º/1, in fine e das várias alíneas do seu nº2:

Mesmo que exista pré-morte, repúdio ou ausência, o direito de representação

é afastado se, quanto à disposição sucessória a que ele respeita, se verificar

outra causa de caducidade (art. 2317º al. b) a d))

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 56

Afasta-se o direito de representação na sucessão testamentária em casos que

têm por fonte a vontade do testador – art. 2041º/2

a) Não há representação se o testador tiver designado substituto ao

herdeiro ou ao legatário previne-se o funcionamento da substituição

directa ou vulgar que, por respeito pela vontade do testador,

prevalece sobre o direito de representação

b) Não há representação quanto ao fideicomissário, sendo que o art.

2293º/2 consagra que se o fideicomissário não quiser ou não puder

aceitar os bens consideram-se adquiridos, definitivamente, pelo

fiduciário desde a morte do testador

c) Não há representação quanto ao legado de usufruto ou de outro

direito pessoal

Pessoal: o direito que mantenha uma ligação relevante à

pessoa do legatário, ou seja direitos em que domina o intuitos

personae (usufruto ou legado de alimentos)

DIREITO DE REPRESENTAÇÃO NA SUCESSÃO LEGAL

O campo de aplicação por excelência do direito de representação é na sucessão

legal, sendo admitido em todos os casos que constituem pressuposto comum da

vocação indirecta (art. 2042º e 2043º). A única restrição que se verifica assenta quanto

ao facto de não existir direito de representação quanto a todas as classes de

sucessíveis legais.

Importa salientar o regime particular da adopção restrita quanto aos seus efeitos

sucessórios: a representação sucessória é admitida quanto aos descendentes do

adoptado restritamente, quando esteja seja chamado a suceder na falta do cônjuge,

dos descendentes e dos ascendentes do adoptante – art. 1999º/2.

EFEITOS DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO

Quanto às relações do Direito de Representação com outras modalidades de

vocação anómala:

Sucessão Legal e Testamentária: o direito de acrescer cede face ao direito de

representação – art. 2138º e 2304º

Sucessão Testamentária: o direito de representação cede perante a

substituição vulgar – art. 2041º/2 al. a) – e também não prevalece na

substituição fideicomissária

Os efeitos mais relevantes do Direito de Representação surgem na Sucessão Legal

uma vez que afasta duas das regras gerais que dominam a sucessão legítima e a

legitimária.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 57

Note-se que à sucessão legitimária é aqui aplicável o regime da sucessão legítima –

art. 2157º.

Nestas modalidades, domina, a regra da preferência de grau de parentesco (art.

2135º). Contudo, o direito de representação ao atribuir o direito de sucede a

descendentes de certos sucessíveis pode fazer o chamamento, ao mesmo tempo, de

parentes de graus diferentes, sucedendo os de grau mais afastado justamente com

parentes de grau mais próximos.

Teoria Tradicional Teoria Moderna

Concebia o direito de representação

como sendo uma ficção legal, ou seja a

lei tratava a situação como se o

representado sucedesse efectivamente

ao de cuius

Considera o direito de representação

como uma substituição legal e como tal

reconhece que ele implica,

efectivamente, a excepção à regra da

sucessão legítima

Exemplos

(1) A – autor da sucessão; B e C – filhos; C morre antes de A, D – filho de C

Aplicando a regra do direito de representação, B, parente em primeiro grau da linha

recta, devia preferir a D, cujo parentesco é o do segundo grau. Contudo, D representa

C pelo que concorre com B na sucessão de A

(2) F – autor da sucessão; E – pai de F G H; H – irmão de F; E e F – pré morte; I – filho

de H

O sucessor de F deveria ser G, parente no segundo grau na linha colateral do autor da

sucessão, afastando I (sobrinho de F), cujo parentesco é de terceiro grau na mesma

linha. Contudo, o direito de representação faz com que I concorra com G na sucessão

de F.

O direito de representação projecta também os seus efeitos sobre a regra que, na

sucessão legal, manda dividir a herança em partes iguais – por cabeça – entre os

sucessores – art. 2136º. A derrogação desta regra assenta em a divisão passar-se a

fazer por estirpes e subestirpes, funcionando como cabeça de estirpe o sucessível

representado.

(3) A – autor da sucessão; A – pai de B C D; E e F – filhos de D; G e H – filhos de E; D

e E – pré morte

Na sucessão de A, sendo D e E pré mortos, o funcionamento da representação implica

o chamamento simultâneo de B C F G H.

A regra da divisão por cabeça mandaria dividir entre eles a herança de A em partes

iguais. Contudo, o direito de representação conduz a um resultado diferente: com B C

concorre apenas para efeito primário da partilha a estirpe de D pelo que a herança

começa por se dividir em três partes.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 58

Fenómeno análogo irá ocorrer com a estirpe de E: a terça parte que cabia a D

reparte-se em partes iguais entre F e a subestirpe de E, cabendo a cada 1/6. A sexta

parte de E será partilhada entre G H, a cada um dos quais cabe ½ da herança de A.

(4) I – autor da sucessão; I – pai de J L M N; M – pai de O e P; P – pai de Q e R; R –

pai de S e T; J M P R – pré morte

Regras equivalentes (à do exemplo 3) se passa quanto a S T em relação à herança de

J, tendo I M P R falecido antes daquele.

O funcionamento do direito de representação sem limitações de grau, em

conjugação com o regime de divisão por estirpes, implica duas consequências:

Os descendentes de filhos ou de irmãos do de cuius são sempre chamados a

suceder a este por direito de representação e não por direito próprio

Na sucessão de colaterais, o fenómeno da representação pode determinar o

chamamento de parentes de um grau mais afastado que aquele que, em

geral, é atendido na relevância jurídica deste parentesco. A limitação passa

apenas a ser, neste domínio a resultante das leis naturais relativas à duração

da vida humana.

Exemplo: considerando a situação 4, admita-se que também R era pré falecido. Se M

for muito mais novo do que o seu irmão J e este falecer em idade avançada, pode

dar-se o caso de, quando se abre a sucessão deste, serem já vivos S T, bisnetos de M.

Ora, estes são parentes (sobrinhos) de J no quinto grau da linha colateral. Ainda assim,

S T são chamados a suceder a J, por virtude do funcionamento do direito de

representação em duas subestirpes de M.

Âmbito da Representação Por Estripes

Há direito de representação, nos termos do art. 2044º e 2045º, mesmo quando:

Todos os membros da estirpe se encontram no mesmo grau

Existência de várias estirpes, sendo simultaneamente chamados

alguns sucessíveis por direito próprio e outros por direito de

representação (solução mais comum)

Havendo várias estirpes, todos os sucessíveis efectivamente

chamados encontram-se todos no mesmo grau

Exemplo1: A – autor da sucessão; A pai de B C D; D – faleceu antes de A; D tem dois

filhos - E F

Sucedem a A, uma vez que D faleceu antes dele, B C E F – que são parentes em grau

diferente – cabendo a B C, chamados por direito próprio, 1/3 da herança e a E F,

chamados por direito de representação, 1/6 da herança.

Exemplo2: G – autor da sucessão; G pai de H, I J; H tem um filho L; I tem dois filhos M N;

J tem três filhos O P Q.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 59

Tendo H I J, filhos de A, morrido antes dele, serão chamados, por direito de

representação os seis netos de G que têm todos o mesmo grau de parentesco em

relação ao autor da sucessão.

Se não funcionasse o direito de representação a sucessão de G repartia-se entre os

seus netos em partes iguais cabendo a cada um a sexta parte dos bens hereditários.

Nos termos do art. 2045º primeira parte consagra-se que mesmo nesse caso a sucessão

é representativa.

Deste modo, a herança reparte-se primariamente por três estirpes, cabendo a cada

uma delas 1/3. Este valor é depois partilhado em cada estirpe por cabeça: L tem

direito a 1/3, M N a 1/6 cada; O P Q a 1/9 cada.

Note-se que o direito de acrescer irá funcionar dentro de cada estirpe, por exemplo, a

favor de M, caso N repudie, e não em relação em simultâneo a todos os netos.

Existe uma só estirpe

Exemplo1: A autor da sucessão; tem um filho B, que morre antes de A, e que tem dois

filhos C D.

Quando A morre, o seu único filho B já tinha falecido, pelo que havendo ou não

representação seriam sempre chamados C D cabendo em qualquer dos casos ½ a

cada um deles da herança de A. Contudo, a lei diz que C D são chamados por direito

de representação e não por direito próprio.

Apesar de tal não levantar diferenças em princípios a verdade é que esta em causa o

regime da colação, art. 2105º e 2106º: a posição de C D não seria a mesma, quanto à

obrigação de trazerem à colação bens doados por A a eles próprios ou a B, se

sucedessem por direito próprio.

Importa ainda salientar que existe outro fenómeno sucessório que é influenciado pelo

regime do chamamento de C D. O valor da quota indisponível varia em função do

numero de sucessíveis chamados: se os netos de A sucedessem por direito próprio a

quota indisponível seria de 2/3 enquanto que havendo representação, como há uma

só estirpe, ou seja um filho, é de ½.

Exemplo2: A casado com B morre; do casamento resulta um filho C que falece antes

de A, tendo C como filho D

Neste caso, a herança defere-se a B D. Neste caso, é indiferente de D sucede

representativamente e não por direito próprio, não interferindo com o valor da quota

indisponível, nem havendo doações a B ou a D com a colação. Contudo nos termos

da lei na situação de estirpe única com a composição unitária há chamamento por

direto de representação e não por direito próprio.

FUNDAMENTO DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO

Nos domínios em que o direito de representação funciona tal permite que o

desenvolvimento do fenómeno sucessório opere como se o afastamento de certo

sucessível não tivesse ocorrido.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 60

PROF. PEREIRA COELHO: O fundamento do direito de representação traduz-se em

evitar que circunstâncias fortuitas e imprevistas venham a alterar a disciplina da

sucessão por não ser justo que tais circunstâncias resultem em beneficio ou prejuízo de

terceiros.

Deste modo, e por o direito de representação funcionar apenas em relação a

descendentes do sucessível afectado, pode dizer-se que, em particular na sucessão

legal, o direito de representação permite assegurar a tutela da família.

III - SUBSTITUIÇÃO DIRECTA

NOÇÃO E REQUISITOS

Substituição Directa/Substituição Vulgar ou Comum: nomeação, pelo testador, de

uma pessoa para suceder no lugar de outra (substituição) no caso de o sucessor

instituído não poder ou não querer aceitar a herança ou o legado.

Note-se que embora a noção legal deste fenómeno testamentário, consagrada no

art. 2281º/1, venha expressamente referida ao herdeiro, o alargamento genérico do

regime da substituição directa aos legatários encontra-se consagrado no art. 2285º/1

permite formular a noção ampla referida.

A substituição diz-se directa por o substituto suceder directamente ao autor da

sucessão, só existindo uma sucessão, e não ao substituído.

Exemplo: o testador A que institui B como seu herdeiro universal mas dispôs do bem X a

favor de C pode estipular no mesmo testamento que, se nenhum deles quiser ou

puder aceitar, sucederão no lugar deles respectivamente D E.

A substituição directa, ao contrario do que sucede na substituição fideicomissária, não

tem limite de grau pelo que o testador pode designar tantos substitutos

sucessivamente quantos entender.

Exemplo: para substituir A que não queira ou não possa suceder, pode designar B e se

também este não quiser ou não puder suceder indicar como substituto C, etc.

Note-se que nestes casos os sucessores serão chamados segundo a ordem fixada pelo

testador, ficando a designação de cada substituto sujeita a condição suspensiva de o

anterior não querer ou não poder aceitar.

Sendo que a substituição directa pode ocorrer no caso de o sucessor designado não

querer ou não puder aceitar, se o testador só ter, porém, previsto uma das duas

causas de afastamento do sucessível designado, a substituição abrange também a

outra – art. 2281º/2. Contudo, ressalva-se a hipótese de o testador afastando esta

presunção estabelecer que a substituição só irá ocorrer no caso por ele

expressamente previsto, por exemplo, no caso de repúdio. Consagra-se uma

presunção ilidível no art. 2281º/2.

ÂMBITO DE APLICAÇÃO

A substituição directa encontra-se regulada no CC no dominio da sucessão

testamentária mas não existe razão para a excluir na sucessão pactícia. E quanto à

sucessão legal?

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 61

Na sucessão legitima, dado o caracter dispositivo das normas que a regem,

não existe razão para não admitir que o testador estipule, no caso de um

herdeiro legitimo, A, repudiar, a sucessão que a sua parte seja atribuída a B.

Afasta-se o direito de representação e o direito de acrescer.

A substituição directa não poderá valer na sucessão legitimária, tanto

relativamente ao direito de representação como ao direito de acrescer, uma

vez que tais participam nesta modalidade sucessória da tutela própria da

legitima e da imperatividade das normas que a consagram. Contudo,

ressalvada tal hipótese, ou seja, para os casos de aqueles direitos não

funcionarem por não haver sucessíveis a chamar por representação ou a

quem a parte do faltoso acresça, não se vê razão para excluir a possibilidade

de instituição de um substituto.

MODALIDADES DA SUBSTITUIÇÃO DIRECTA

SUBSTITUIÇÃO SINGULAR SUBSTITUIÇÃO PLURAL

Consoante o número de substitutos e independentemente do número de substituídos.

Pode substituir-se uma só pessoa a outra

pessoa ou a várias.

Podem ser vários os substitutos de uma só

pessoa ou de várias

SUBSTITUIÇÃO RECÍPROCA

São substituídos vários co-herdeiros ou quanto vários legatários são nomeados,

conjuntamente ou não em relação ao mesmo objecto.

A substituição diz-se recíproca por os co-herdeiros ou os colegatários se substituírem

uns aos outros (reciprocamente) – art. 2283/1 e 2285º/2

CO-HERDEIROS LEGATÁRIOS

Se os co-herdeiros tiverem sido instituídos

em partes desiguais, a proporção

existente entre as suas quotas será

respeitada na substituição, a menos que

o testador tenha estabelecido regra

diferente. Este regime só se aplica

quando a substituição respeite a todos os

co-herdeiros e só a eles – art. 2283º/2 e 3.

A substituição vulgar recíproca poderá

não respeitar a todos os co-herdeiros ou

haver alem deles outras pessoas

designadas como substitutos. Neste caso,

na falta de estipulação diversa do

testamento, o quinhão do substituído será

divido em partes iguais pelos substitutos.

Quanto à substituição recíproca de vários

legatários, não tendo o testador

estabelecido regras quanto à

substituição, a parte do legatário

substituído será repartida pelos substitutos

na proporção em que estes hajam sido

nomeados no legado

Page 62: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 62

Note-se que em regra a substituição directa é expressa, nada impedindo, nos termos

do art. 217º, contudo, que ela seja tácita.

OS EFEITOS DA SUBSTITUIÇÃO DIRECTA

Os efeitos da substituição directa estão em larga medida dependentes da vontade

do testador que pode estabelecer regime diverso do que resulta a titulo supletivo da

lei. Efeitos Gerais resultantes da lei:

Afasta tanto o direito de acrescer como o direito de representação, na

sucessão testamentária e na sucessão legítima

No silêncio do testamento, os substitutos sucedem nos direitos e obrigações

que caberiam aos substituídos – art. 2284º

O substituto, que é sucessor directo do autor da sucessão, pois o substituído

não chega a suceder, recebe também os direitos que ao substituiítos foram

atribuídos intuitu personae?

Ao contrário do que sucede no direito de representação e no direito de

acrescer, onde tal questão recebe da lei resposta negativa, o legislador

não se ocupou de tal quanto à substituição directa.

Solução: os direitos e obrigações de natureza puramente pessoal não

são abrangidos pela substituição – art. 2284º

IV - DIREITO DE ACRESCER

NOÇÃO PRÉVIA

Sendo vários herdeiros instituídos em toda a herança ou numa quota dela, ou

nomeados vários legatários do mesmo bem, se se verificarem em relação a um deles,

certos requisitos comuns da vocação indirecta, a sua parte será devolvida aos demais.

Verificando-se a existência de situações de contitularidade de direitos, extinguindo-se

a situação jurídica de um dos contitulares, a sua parte acresce (ou pode acrescer) à

dos restantes.

REQUISITOS COMUNS DO DIREITO DE ACRESCER

A aplicação do direito de acrescer depende da designação, e consequente

vocação, múltipla, de dois ou mais sucessíveis

É necessário que os vários sucessíveis ocupem posições equivalentes, em

termos de hierarquia

Não se exige que a designação seja conjunta – art. 2301º/1 e 2302º.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 63

Exemplo: a designação pode resultar e dois testamentos sucessivos,

desde que ambos sejam eficazes, por o segundo não revogar o

primeiro. Será o caso de num testamento o autor da sucessão instituir A

herdeiro de ½ da sua herança e noutro testamento instituir B herdeiro

da outra metade.

Tem de existir um sucessível beneficiário do acrescer, ou seja, alguém com um

direito de suceder próprio

Note-se que o art. 2301º/1 quando estabelece o direito de acrescer entre herdeiros

refere-o a casos em que um deles não pode ou não quer aceitar a herança. A

remissão genérica contida no art. 2302º/2 torna esta disposição aplicável ao direito de

acrescer entre legatários.

Direito de Acrescer na Sucessão Testamentária e na Legal

Sucessão Testamentária: As dúvidas quanto aos requisitos do direito de

acrescer nesta sucessão decorrem de vicissitudes do testamento ou de

algumas das suas disposições e respeitam à configuração da impossibilidade

de aceitação. Ou seja estão em causa situações de ineficácia lato sensu,

decorrentes da invalidade, revogação ou caducidade.

Se o testamento for nulo ou anulado, a doutrina divide-se quanto aos

efeitos da invalidade em matéria de acrescer:

PROF. GALVÃO TELLES: o direito de acrescer funciona nestes

casos

PROF. OLIVEIRA ASCENSÃO: ocorre o afastamento do direito de

acrescer nestes casos

Ocorrendo a revogação do testamento em que se instituía ou nomeava

um sucessível não se admite o direito de acrescer

Havendo revogação, quando ocorre a morte do de cuius tudo

se passa como se o testamento não tivesse existido. Salvo se

houver vontade do testador no sentido de manter o direito de

acrescer, deve ele ter-se por excluído, pois não pode deixar de

ser este o alcance normal da revogação.

Caducidade das Disposições Testamentárias

O art. 2317º nunca ressalva o direito de acrescer quando o faz

em relação ao direito de representação.

É certo que entre as causas de caducidade contam-se a não

sobrevivência, a incapacidade e o repúdio que constituem

pressupostos comuns da vocação indirecta.

Page 64: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 64

Os demais casos que preencham o não poder aceitar

constituem também causas de caducidade, quando se referem

à sucessão testamentária.

Sucessão Legal

A questão dos requisitos do direito de acrescer coloca-se quanto à não

sobrevivência.

Considera-se que no art. 2137º, que remete para o art. 2157º,

estabelece o regime comum do acrescer na sucessão legal

Note-se que o art. 2137º/2 ressalva o disposto no art. 2143º pelo que se

conclui que o legislador ve o regime desta norma como excepcional.

A relevância da não sobrevivência ultrapassa o campo dos requisitos

do direito de acrescer na sucessão legal, projectando-se em particular

na sucessão legítima e a título subsidiário na legitimária nomeadamente

na fixação do valor da quota indisponível.

ÂMBITO DO DIREITO DE ACRESCER

O Direito de Acrescer verifica-se tanto na sucessão testamentária como na legal, e

mesmo, a título excepcional, na contratual.

O Acrescer opera tanto entre herdeiros como legatários.

Nos termos do art. 2304º, não se verifica direito de acrescer se:

O testador tiver disposto outra coisa

O testador pode estipular que não querendo ou não podendo o

beneficiário da disposição aceitá-la ela fica sem efeito

Os bens em causa reverterão normalmente neste caso para os

herdeiros legais não por direito de acrescer mas por abertura da

sucessão legítima – art. 2131º

O testador pode prever uma substituição directa passando os bens

para o substituto.

Se o legado tiver natureza puramente pessoal

O que se deve entender por ‘’legado puramente pessoal’’?

A existência de intuitu personae é com certa necessária traduzindo-se

na verificação de um interesse individual ou particular do legatário, que

tanto pode ser patrimonial como não patrimonial.

Page 65: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 65

Exemplo: legado de meios financeiros para o beneficiário frequentar

um curso de pós-graduação ou do legado de originais de cartas

escritas pelo pai do legatário do autor da sucessão

Caso Particular do Usufruto que também é constituído instuitu personae

– regime especial do art. 2305º:

Nos termos do art. 2305º aplicam-se ao usufruto, em matéria de

acrescer, os art. 1442º e 2302º quando seja constituído por

testamento

O art. 1442º regula o acrescer entre usufrutuários constituídos

conjuntamente, qualquer que seja a fonte da sua constituição.

Aplica-se directamente aos usufrutuários por morte de cada um

deles a sua parte acresce à dos demais.

O art. 2305º manda aplicar o art. 2302º que regula o acrescer

entre legatários: está em causa o regime aplicável a vários

legatários do usufruto sobre o mesmo bem, se um deles não

quiser ou não puder aceitar. Há acrescer entre os usufrutuários

enquanto legatários.

Se existir direito de representação

Nos termos do art. 2304º, o direito de acrescer é afastado na sucessão

testamentária se houver direito de representação. Igual regime vale

para a sucessão legal.

Existe contudo a ressalva de na sucessão testamentária como na

legítima o de cuius poder afastar o regime da representação e

estabelecer o direito de acrescer.

DIREITO DE ACRESCER ENTRE HERDEIROS

O funcionamento do direito de acrescer entre herdeiros deve ser atendido de duas

perspectivas: por um lado quanto à sucessão testamentária e por outro para a

sucessão legítima, sendo que quanto a esta última vale igualmente para a sucessão

legitimária por força do art. 2157º.

DIREITO DE ACRESCER ENTRE HERDEIROS NA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Nos termos do art. 2301º, havendo vários beneficiários da parte acrescida, se as quotas

forem iguais ela reparte-se entre eles em igualdade; se forem desiguais, a divisão far-

se-á atendendo à proporção das respectivas quotas.

Page 66: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 66

Note-se que não constitui requisito do acrescer a nomeação conjunta dos herdeiros.

Deste modo, há direito de acrescer mesmo que os herdeiros sejam instituídos em

testamentos diferentes, desde que todos sejam eficazes. Havendo vários herdeiros

testamentários se só um puder e quiser aceitar ele será chamado a receber a parte de

todos os demais.

DIREITO DE ACRESCER ENTRE HERDEIROS NA SUCESSÃO LEGAL

O Direito de Acrescer entre herdeiros legítimos encontra-se regulado no art. 2137º/2

que ressalva a regra especial aplicável à sucessão conjunta do cônjuge com

ascendentes – art. 2143º.

O problema do acrescer coloca-se em relação a sucessíveis chamados

conjuntamente na mesma classe sucessória. Estão em causa situações de concurso

entre descendentes, entre ascendentes, entre quaisquer destes e o cônjuge, entre

irmãos e entre outros colaterais até ao 4º grau.

A parte do sucessível que não puder ou não quiser aceitar acresce à dos outros – art.

2137º/2.

Se os sucessíveis chamados forem o cônjuge e os descendentes: ou seja, na falta de

algum descendente, a sua parte acresce à dos demais descendentes e à do cônjuge,

ou só aqueles sendo o cônjuge apenas beneficiado na falta de todos os

descendentes?

Está em causa a aplicação analógica do art. 2143º, sendo que o art. 2137º só ressalva

o caso particular da sucessão do cônjuge e dos ascendentes. Deste modo, não é

aceitável o alargamento do seu regime à sucessão conjunta do cônjuge e dos

descendentes. Da regra do art. 2137º afasta-se o regime do direito acrescer quando

ao cônjuge sobrevivo concorre com os ascendentes (art. 2143º). Nos termos desta

norma, se forem chamados o cônjuge sobrevivo e vários ascendentes e algum ou

alguns destes não puderem ou não quiserem aceitar, o direito de acrescer funciona

primariamente em relação a outros ascendentes do mesmo grau que concorram à

herança. Se não houver outros ascendentes a parte dos que sejam afastados acresce

à do cônjuge.

A lei não regula os termos concretos em que o direito de acrescer actua, não

havendo, na sucessão legal, nenhuma norma correspondente à que, no art. 2301º,

rege para a sucessão testamentária, consoante sejam iguais ou desiguais as quotas

dos herdeiros em presença. Contudo não há qualquer fundamento para não aplicar o

seu regime à sucessão legal, dada a paridade de razão que se verifica em ambos os

casos.

Exemplo1: A tem como herdeiros legais prioritários os seus filhos B C; em testamento

deixou toda a quota disponível (neste caso 1/3 da herança) em partes iguais, a D E.

Por seu turno, B C recebem cada um deles também 1/3 (metade de 2/3).

Se B C repudiarem a sua parte acresce a D E?

A solução correcta é no sentido que não, resultando claramente do art. 2137º. Se só

um dos herdeiros legais repudiasse, a sua parte acresceria ao outro (nº1). Sendo os

dois a repudiar chamam-se os herdeiros imediatos.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 67

Neste caso, não havendo cônjuge sobrevivo nem outros descendentes seriam

chamados os ascendentes o que afasta o acrescer dos herdeiros testamentários.

Exemplo2: imagine-se agora, que com base no exemplo anterior, quem repudia são os

herdeiros testamentários.

Se for só D a repudiar a sua parte acresce apenas a E e não a B C (art. 2301º).

Se o repúdio for dos dois herdeiros testamentários a questão resolve-se nos seguintes

termos:

Todos os herdeiros B C D E foram chamados em simultâneo, embora não

conjuntamente, pois na base da vocação são títulos diferentes. O titulo de

legítimos tem aptidão para se alargar à totalidade da herança

B C recebem, por acrescer, as partes de D E, com os correspondentes direitos e

encargos

E se só existirem herdeiros testamentários?

Exemplo3: F, deixando como sucessíveis prioritários os seus irmãos G H fez testamento

em que institui como beneficiários de toda a herança I J

Não importa se só um deles (I J) repudia, pois a sua parte acresce à do outro, mas se o

repudio for dos dois herdeiros testamentários, na falta de qualquer preceito que

imponha solução diversa, funciona plenamente a al. e) do art. 2137º e a disposição

testamentária caduca.

Consequência imediata deste regime é a abertura da sucessão legítima, sendo os

irmãos de F chamados a suceder nessa qualidade, por direito próprio e não por direito

de acrescer.

HIPOTESE PROF. OLIVEIRA ASCENSÃO: Há um herdeiro testamentário universal L, a

quem o testador impos, como encargo, um legado a favor de M. O que sucede se L

repudiar?

Para este autor não existe direito de acrescer pois o chamamento dos herdeiros legais

vai-se fazer por efeito da abertura da sucessão legítima. Nem por isso o encargo deixa

de subsistir cabendo a esses herdeiros cumpri-lo.

Devem-se considerar duas disposições distintas:

A que institui o herdeiro universal

A que nomeia o legatário, ainda que aquela seja a disposição principal e esta

mera cláusula acessória – cláusula modal

O repúdio de L faz caducar a disposição que o institui como herdeiro, mas nenhum

efeito pode ter quanto à nomeação de M como legatário sob pena de se verificar a

consequência duplamente absurda de com o seu repudio L para alem de frustrar a

vontade do testador ao nomear um legatário, M, afecta sem ter titulo legitimo os

interesses deste.

Page 68: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 68

Em suma, o testamento subsiste quanto a uma das suas disposições – o legado – e o

seu cumprimento vem a caber nos termos gerais aos herdeiros legais.

DIREITO DE ACRESCER ENTRE LEGATÁRIOS

Nos termos do art. 2302º e 2303º consagra-se os termos concretos em que esta

modalidade de vocação indirecta funciona.

Nos termos do art. 2302º, regime comum, apura-se que a nomeação dos legatários

em relação ao mesmo objecto é o único requisito específico do direito de acrescer.

Exemplo: o testador deixou certo estabelecimento comercial a A B C; se um deles

repudiar a sua parte acresce à dos demais.

À semelhança do que ocorre no acrescer entre herdeiros testamentários não se exige

que a nomeação dos legatários seja conjunta – art. 2302º/1 in fine.

Nos termos do art. 2302º/2 remete-se para o regime de acrescer entre herdeiros

testamentários. Tal implica o mesmo modo de atribuição da parte acrescida aos

legatários não afastados, atendendo, à igualdade ou desigualdade dos seus legados.

Exemplo: se o legatário afastado for C, por repúdio, havendo igualdade quanto ao

valor deixado a cada um deles, a parte do repudiante acresce aos restantes,

dividindo-se igualmente entre eles. Contudo, sendo a A atribuído ½ do

estabelecimento e a outra metade a B C, cabendo a cada ¼, não querendo ou não

pudendo aceitar B, a parte dele acresce a A e C, na proporção das suas quotas. Ou

seja, para além da parte a que já tem direito, A receberá 2/12 do estabelecimento e

C 1/12.

CASO PARTICULAR DO ART. 2303º: imagine-se um legado a favor de B cujo

cumprimento onera A, a quem foi atribuído outro legado.

Se B repudiar e não houver acrescer entre os legatários, o objecto do segundo legado

é atribuído a A, ou seja ao legatário onerado com o encargo de cumprir. Só não será

assim se o objecto do legado estiver genericamente compreendido noutro legado,

sendo que nesse caso, é ao correspondente legatário que o objecto será atribuído.

Exemplo: A, toureiro afamado, deixa a B a sua quinta no Ribatejo, a C a sua manada

de cavalos e a D o seu cavalo de lide preferido, impondo a B o cumprimento destes

legados. Acontece porém que este cavalo faz parte daquela manada. Se D repudiar,

o cavalo de lide reverte para C e não para B.

Ocorre aqui um verdadeiro direito de acrescer ou outro fenómeno jurídico

correspondente à desoneração do encargo?

A favor de se tratar do direito de acrescer existe o facto de por efeito do

afastamento de um sucessível chamado os bens assim deixados vagos serem

atribuídos a outro sucessível já chamado a sucessão. Além disso, o beneficiário

do legado deixado vago não é quem estava onerado com o cumprimento,

mas quem é legatário (ou herdeiro) da coisa em que genericamente o objecto

do legado vago se compreende.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 69

Contudo, não há aqui uma segunda vocação do beneficiário: ele fica apenas

desonerado do cumprimento do encargo.

ACRESCER ENTRE HERDEIROS E LEGATÁRIOS

Constitui entendimento corrente a não existência, em geral, de acrescer a favor de

legatários, havendo afastamento dos herdeiros.

Contudo, é necessário atender à posição do legatário em relação à quota deixada

vaga por herdeiro, por força do regime especial consagrado no art. 2306º in fine.

O beneficiário do acrescer não pode repudiar separadamente essa parte a menos

que ela esteja onerada com encargos. Se nesse caso o repudio acontecer e por seu

turno o herdeiro beneficiário do acrescer também repudiar, a parte acrescida reverte

para o beneficiário dos encargos que a oneravam.

Da situação consagrada no art. 2303º resulta que se o onerado com o cumprimento

do legado for um herdeiro, e o legatário na puder aceitar, o objecto legado será

atribuído ao herdeiro.

REGIME DO DIREITO DE ACRESCER

EFEITOS DO ACRESCER – art. 2307º

O beneficiário do direito de acrescer seja herdeiro ou legatário sucede nos

mesmos direitos e obrigações, de natureza não puramente pessoal, que

caberiam àquele que não pôde ou não quis receber a deixa.

Estando o sucessor faltoso sujeito a colação, a obrigação de conferir passa

para o beneficiário do acrescer?

Se Sim: atribui-se à formula do art. 2307º sentido equivalente à usada

para o direito de representação no art. 2039º que coloca o

representante na posição do representado.

Contudo, a resposta correcta é não: os direitos e obrigações em que o

beneficiário do acrescer sucede são os direitos e obrigações que este

recebeu do de cuius e não as obrigações particulares do faltoso.

Nem em matéria de colação há qualquer indicio no sentido de impor

ao beneficiário do acrescer a obrigação de conferir que incidia sobre o

faltoso.

REGIME DE AQUISIÇÃO DA PARTE ACRESCIDA

Nos termos do art. 2036º, consagra-se como princípio fundamental, que a

aquisição da parte acrescida se dá por força da lei. Deste modo prescinde-se

da aceitação do beneficiário.

Não pode haver repúdio separado da parte acrescida

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 70

Desvio (art. 2036º segunda parte): se a parte acrescida estiver onerada com

encargos especiais impostos pelo testador é possível ao beneficiário repudia-la

e exercer em sentido oposto – aceitando – o direito de suceder que lhe é

atribuído pela sua própria e directa vocação.

DISTINÇÃO ENTRE DIREITO DE NÃO DECRESCER E DIREITO DE ACRESCER

Quando se trata de estabelecer a presente distinção podemos ter em consideração a

elasticidade, já estudada em direito reais. Quando um direito real mais amplo, a

propriedade por exemplo, é limitada por um direito menor, como o usufruto por

exemplo, a extinção deste não determina a sua aquisição autónoma pelo proprietário

de raiz, mas a natural expansão do seu direito de propriedade, que retoma à feição

anterior à limitação criada pelo usufruto – aquisição derivada restitutiva.

Analogicamente, existem certos títulos de vocação sucessória que tendem para um

conteúdo mais vasto (toda a herança ou só uma quota desta) e só o concurso de

outros títulos os impedem de abarcar todo o seu objecto potencial. Deste modo,

cessando a eficácia do titulo limitativo, aquele expande-se naturalmente.

O beneficiário da parte acrescida adquire por força das virtualidades do seu próprio

titulo e não por um titulo novo. Há uma só vocação e não duas. Existe afinal um direito

de não decrescer e não uma verdadeira vocação indirecta, que é própria do direito

de acrescer.

No direito de acrescer não gozando o titulo primitivo do beneficiário daquela

faculdade expansiva e da consequente elasticidade, aa aquisição da parte

acrescida pressupõe a existência de um novo titulo.

DIREITO DE NÃO DECRESCER DIREITO DE ACRESCER

O titulo primitivo com a potencialidade

de não decrescer é inerente a uma

relação (directa) entre o sucessível o

autor da sucessão

Havendo um novo titulo, atende-se a

certa relação do sucessível com terceiro.

Havendo um só título, a aquisição do

acrescido dá-se ipso facto, não fazendo

sentido o seu repúdio separado, nem

sendo necessária aceitação.

Havendo títulos diferentes e dois direitos

de suceder, não se justificava um regime

de aquisição autónoma, sendo

necessária a aceitação da parte

acrescida, em contrapartida é também

admitido o seu repudio.

A aquisição funda-se em título próprio do

beneficiário e não de terceiro.

A aquisição do acrescido funda-se na

posição do sucessor faltoso, pelo que se

recebem os direitos e as obrigações que

a este competiam.

Note-se que em face do regime de aquisição da parte acrescida consagrado no art.

2036º havia quem entendesse que a lei portuguesa apontava para a existência de um

direito de não decrescer uma vez que a primeira parte da norma em análise não se

refere a qualquer distinção, reconhece-se que tal argumento prova que só haveria

casos de direito de não decrescer. Dificilmente se poderá identificar, em certas

hipóteses, a ideia central de expansibilidade de um título sucessório, que preside à

distinção.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 71

Importa ainda salientar que o art. 2037º atribui ao beneficiário do acrescer os mesmos

direitos e obrigações que caberiam ao sucessível faltoso, sem fazer qualquer distinção.

Tal aponta para um regime próprio do direito de acrescer.

Da conjugação do art. 2036º e 2037º resulta que só havendo encargos não há

aquisição automática, sendo então necessária nova aceitação, com a consequente

atribuição directa da faculdade de repúdio separado da parte autónoma, ou seja,

acrescida.

Esta matéria não levanta qualquer problema quando se esteja face a uma sucessão

legal, uma vez que nela cada um dos herdeiros só não tem direito a toda a herança,

ou a uma quota dela, por virtude do concurso dos demais.

Contudo, o requisito do art. 2301º/1 e o art. 2032º/2 fazem depender o direito de

acrescer de algo semelhante ao que se verifica em relação aos herdeiros

testamentários e mesmo legatários salvaguardas as diferenças inerentes a cada um

destas modalidades de sucessão.

Quanto aos Herdeiros: para haver acrescer, é necessário que dois ou mais

sejam instituídos, em concurso, na totalidade da herança ou numa quota

destas.

Quanto aos Legatários: para haver acrescer, a situação de concurso também

é necessária mas agora quanto a um mesmo objecto, em relação ao qual

todos foram nomeados.

É licito afirmar que, na generalidade das situações em que a lei configura o direito de

acrescer, é um direito de não decrescer que se verifica.

Contudo, há verdadeiros casos de acrescer, em que ocorre uma vocação indirecta:

Em relação à deixa onerada com encargos – art. 2306º primeira parte

Em relação à deixa onerada com encargos, se o beneficiário do acrescer

repudiar a parte acrescida – art. 2306º segunda parte (para quem entenda

haver aqui direito de acrescer e não outro fenómeno jurídico)

2. VOCAÇÃO SUCESSIVA: SUBSTITUIÇÃO FIDEICOMISSÁRIA

NOÇÃO (ART. 2286º)

Substituição Fideicomissária /Fideicomisso: é a disposição através da qual o testador

impõe a um sucessor o encargo de conservar a herança ou o legado, para

reverterem, por morte do onerado, a favor de outra pessoa.

Apesar do art. 2286º consagrar apenas esta situação quando aos herdeiros por força

da aplicação do art. 2296º considera-se que também se aplica aos legatários.

Enquanto que na substituição vulgar existe um só sucessor, no fideicomisso existem dois

sucessores efectivos e sucessivos:

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 72

Fiduciário: aquele que primariamente recebe a herança ou o legado e é

onerado com o encargo de conservar os bens

Fideicomissário: beneficiário da substituição que é chamado por morte do

primeiro

Note-se que nos termos do art. 2287º, tanto o fiduciário como o fideicomissário podem

ser um ou vários, sendo respectivamente a substituição fideicomissária singular ou

plural.

A substituição fideicomissária é um instituto próprio da sucessão voluntária tendo o seu

campo de aplicação por excelência no testamento, contudo é também admitida na

sucessão contratual (art. 1700º/2).

Iremos só analisar a substituição fideicomissária no testamento: a maneira de ser do

instituto reserva à vontade do testador um papel relevante na fixação do regime do

fideicomissário; a vontade do testador pode mesmo afastar a conversão legal

consagrada no art. 2393º/3 (o regime consagrado na norma só opera no silêncio do

testamento).

Note-se que as substituições fideicomissárias não são privativas da sucessão mortis

causa, embora tenham no testamento o seu campo de aplicação mais relevante. São

também admitidas nas doações, sujeitando-as, a lei, neste negócio ao regime fixado

em sede de testamento – art. 962º.

ÂMBITO DE APLICAÇÃO

A substituição fideicomissária implica um regime limitativo dos direitos do fiduciário

sobre os bens que lhe são atribuídos, por efeito do encargo da sua conservação, que

lhe é imposto:

Por um lado, a substituição fideicomissária permite ao testador assegurar uma

certa continuidade do destino dos bens que tem por objecto –

nomeadamente, mantendo-os numa mesma família;

Por outro lado, representa um factor anti económico no aproveitamento dos

bens onerados e pode converter-se mesmo num elemento de injustiça na

atribuição dos bens à família do de cuius.

Só são admitidas substituições fideicomissárias num grau, o que significa que o

fideicomissário não pode ser, por seu turno, fiduciário de outro fideicomissário.

Exemplo1: a lei admite que A institua B seu herdeiro, devendo por morte deste a

herança reverter para C. Contudo é nula a disposição fideicomissária, nos termos do

art. 2888º, se no testamento A tiver ainda estipulado que por morte de C os bens

passam para D.

Alcance da nulidade: nos termos do art. 2889º, as disposições a favor de B e C

não são afectadas, sendo só a disposição de D atingida pela nulidade, tendo-

se, quanto a ele, por não escrita a cláusula fideicomissária.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 73

Existe uma redução legal da disposição fideicomissária, tal como constava do

testamento

Contudo, o testador pode sempre estipular regime diverso – art. 2889º in fine

a relevância atribuída à vontade do testador não pode ser a de ele manter a

cláusula fideicomissária em dois grau, sob pena de esta parte do testamento

estar a reproduzir a instituição inválida de frustrar a proibição do art. 2888º.

O que o testador pode estipular é que a nulidade atinja toda a cláusula

ou seleccionar qual dos dois graus deve substituir. Assim pode estipular

que perante a nulidade da cláusula fideicomissária, prevaleça a

reversão a favor de D e se considere sem efeito a prevista para C.

No sentido de limitar fraudes, o art. 2288º proíbe também os casos em que a reversão

para o fideicomissário esteja subordinado a um acontecimento futuro e incerto

(condição).

Exemplo2: A institui B seu herdeiro fideicomissário, passando os bens por morte deste

para C, a título de fideicomissário. Suponha-se que no testamento se dispõe ainda

que, no caso de C morrer sem descendentes os bens passam para D.

A primeira questão que se coloca é quanto à interpretação do testamento a

fim de apurar a vontade do testador e de saber se existe pura instituição

condicional ou uma substituição fideicomissária condicional.

Caso seja uma substituição fideicomissária condicional, tal disposição

testamentária será nula nos termos do art. 2888º

Se a vontade A for a de D só ser chamado após a morte de C sem

descendentes, funcionando este facto como condição suspensiva de

reversão para D há dois graus de fideicomisso e a instituição é nula

Assentando a vontade A numa condição resolutiva do chamamento

de C, ou seja, morrendo sem descendentes, tal é considerado como se

nunca tivesse sido chamado. Como C não entra na sucessão de A, D

vem a comportar-se como primeiro fideicomissário, o fideicomisso é só

num grau e a disposição é válida.

REGIME DA CLÁUSULA FIDEICOMISSÁRIA

O funcionamento normal da cláusula fideicomissária implica a aceitação sucessiva da

herança por parte do fiduciário e do fideicomissário quando tal ocorre, o primeiro

recebe de imediato os bens da herança, revertendo os mesmos, por morte dele, para

o fideicomissário.

Note-se que este regime normal da disposição fiduciária sofre desvios quando o

fiduciário ou o fideicomissário não puderem ou não quiserem aceitar a sucessão.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 74

REGIME APLICÁVEL NO CASO E O FIDUCIÁRIO NÃO PODER OU NÃO QUISER ACEITAR A

HERANÇA

Tal situação ocorre quando se verifiquem requisitos comuns a respeito da vocação

indirecta: não sobrevivência, indignidade, deserdação e ausência, desde a

declaração de morte presumida ou repúdio.

Nos termos do art. 2293º/3 (norma com caracter dispositivo) ressalva-se a possibilidade

de o testador dispor coisa diversa.

Ocorre um caso de conversão legal de disposição fideicomissária, à qual é atribuída

ex lege a eficácia sucedânea de uma substituição directa a favor do fideicomissário.

O fideicomissário recebe em qualquer dos casos os bens, mas a título diferente, ou seja

como substituto.

O regime consagrado no art. 2293º deverá ser conjugado com o art. 2041º/2 al. a) que

afasta neste caso o direito de representação, uma vez que por efeito da conversão

legal, tudo se passa como se houvesse uma substituição directa.

Importa salientar que tal só sucede no silencio do testamento, uma vez que o autor da

sucessão pode prever solução diversa: nada impede que, pura e simplesmente,

ocorrendo o caso em análise, fica a disposição fideicomissária sem efeito.

Contudo não é este o comportamento mais conforme com a vontade que o levou a

instituir o fideicomissário: será mais razoável admitir que ele estabeleça estipulações

que visem tanto quanto possível a sua manutenção (possibilidade de determinar o

funcionamento do direito de representação ou de designar um substituto directo do

fiduciário, só revertendo a herança para o fideicomissário apos a morte do

representante ou do substituto).

REGIME APLICÁVEL NO CASO DE O FIDEICOMISSÁRIO NÃO PODER OU NÃO QUERER

ACEITAR A HERANÇA

Neste caso, nos termos do art. 2393º/2, fica sem efeito a substituição e os bens

hereditários são considerados como adquiridos, a título definitivo, pelo fiduciário desde

a morte do autor da sucessão.

SITUAÇÃO JURÍDICA DO FIDUCIÁRIO (art. 2290º a 2292º e 2293º)

Da conjugação do art. 2290º a 2292º e ainda do art. 2293º resulta que o fiduciário é

titular de um direito sobre os bens que são objecto do fideicomisso, que se aproxima

do usufruto, mas com ele não se identifica. Esse direito é limitado quanto às

faculdades de alienação e de oneração dos bens. Só assim se assegura a

efectivação do encargo de conservação dos bens e a sua subsequente reversão

para o fideicomissário.

Note-se que podem verificar-se situações jurídicas diferentes, em função da diversa

natureza dos bens que podem ser objecto do fideicomisso. Contudo, em qualquer dos

casos, a titularidade do direito que incide sobre esses bens a termo incerto mantém-se.

Quando esteja em causa o direito de propriedade ocorre, a título excepcional (art.

1307º/2), um caso valido de propriedade temporária.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 75

Nos termos do art. 2290º/1, o direito do fiduciário atribui-lhe o gozo e a administração

dos bens, segundo um regime moldado sobre o direito de usufruto, cujas disposições

aplicam-se ao fiduciário em tudo o que não seja incompatível com a natureza do

fideicomisso.

Deste modo, o fiduciário faz seus os frutos dos bens objecto do fideicomisso – art. 2292º

(nele limita-se aos frutos dos bens referidos o direito que os credores pessoa do

fiduciário têm para se pagar dos seus créditos).

A limitação quanto à disposição dos bens decorre do art. 2291º e é confirmada a

contrario pelo art. 2295º/3.

Em princípio o fiduciário não pode alienar ou onerar os bens que são objecto do

fideicomisso. Contudo, há casos especiais em que esta proibição em que esta

proibição é afastada, admitindo-se a alienação ou a oneração mediante a obtenção

de autorização judicial:

Quanto estão em causa interesses ligados ao próprios bens a que os actos a

autorizar se referem (art. 2291º/1): quanto a bens deterioráveis ou bens que

podem sofrer depreciação por efeito do simples decurso do tempo

Quando os interesses a considerar são do próprio fiduciário (art. 2292º/2): torna-

se necessário por razões de doença do fiduciário assegurar meios financeiros

para realizar certo tratamento de todo necessário para a preservação da sua

vida.

SITUAÇÃO JURÍDICA DO FIDEICOMISSÁRIO

Na substituição fideicomissária não existe vocação indirecta nem conjunta. O

fideicomissário é sucessor do autor do fideicomisso tal como o fiduciário – art. 2293º e

2294º.

Deste modo, em relação há vocação indirecta a substituição fideicomissária

autonomiza-se por o fideicomissário não suceder no lugar ou na posição do fiduciário-.

Este é o verdadeiro sucessor do de cuius, uma vez que recebeu os bens e exercer

sobre eles os direitos que se ajustam à sua qualidade de fiduciário.

Na sucessão fideicomissária não há vocação conjunta do fiduciário e do

fideicomissário pois a herança só reverte para este por morte daquele: art. 2293º/1 e

art. 2294º. Na verdade, o fideicomissário não pode aceitar ou repudiar a herança nem

dispor dos bens hereditários antes de ela lhe ser devolvida, fenómeno que só ocorre

com a morte do fiduciário.

Por morte do testador, o fiduciário é chamado imediatamente à herança, sendo a

vocação do fideicomissário diferida para o momento da morte do fiduciário. Deste

modo o fideicomissário não pode exercer o direito de suceder imediatamente, mas

apenas quando ocorrer a morte do fiduciário.

Deste modo, os requisitos da vocação, nomeadamente da capacidade sucessória do

fideicomissário coloca-se perante o autor da sucessão e não face ao fiduciário.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 76

Em vida do fiduciário, o fideicomissário não tem qualquer direito sobre os bens da

herança mas apenas um direito sucessório. Antes da devolução da herança em seu

favor, não poe o fideicomissário dispor dos bens do fideicomisso mesmo a titulo

oneroso – art. 2294º.

Em relação aos bens da herança em vida do fiduciário, a situação jurídica do

fideicomissário, que goza da tutela indirecta decorrente das limitações impostas aos

poderes do fiduciário configura-se como uma mera expectativa – art. 2291º.

Pode dar-se o caso de no momento da vocação não se verificarem os requisitos de

que ela depende, não podendo o fideicomissário aceitar a sucessão, mas não

podendo repudia-la também. A substituição fica sem efeito, caduca.

Por efeito do regime do art. 2293º/2, o fiduciário é tido como tendo adquirido a

titularidade dos bens, definitivamente, desde a morte do autor da sucessão. Embora a

lei não ressalve a vontade do testador como faz no art. 2293º/3, não se vê razão para

considerar o regime do nº2 como imperativo. Deve relevar a vontade do testador

tendo como limite a impossibilidade de ela implicar uma substituição em dois graus.

Deste modo, de acordo com o exposto anteriormente, não existe argumento que

afasta a possibilidade de o autor da sucessão, para a hipótese de ficar vago o lugar

do fideicomissário, estipular um regime de representação ou de substituição directa,

funcionando o representante ou o substituto como fideicomissários no lugar do que foi

afastado.

FIDEICOMISSOS IRREGULARES

Nos termos do art. 2295º, entende-se como fideicomissos irregulares certas disposições

de bens que participam de alguns dos elementos dos verdadeiros fideicomissos e que

deles se aproximam do aspecto estrutural e funcional mas que não preenchem

plenamente o tipo legal.

Tal qualificação implica em principio a sujeição dos fideicomissos irregulares ao

disposto sobre a substituição fideicomissária com os desvios consagrados no art. 2295ª:

a) Qualifica-se como sendo fideicomisso irregular a disposição sucessória pela

qual o testador proíba o herdeiro ou o legatário de dispor, em absoluto, aos

bens que lhe são atribuídos. A proibição tem de se referir tanto à disposição

por acto inter vivos como mortis causa.

O desvio em relação ao fideicomisso regular reside no facto de tal

disposição em rigor não conter uma substituição, uma vez que não

indica, por acto voluntario do autor da sucessão, o substituo. Deste

modo o nº2 do art. 2295º dispõe que ocorrendo esta hipótese a posição

do fideicomissário seja ocupada pelos herdeiros legítimos do

beneficiário da disposição, o qual se comporta como fiduciário.

Solução que mais se aproxima da vontade do testador.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 77

b) Consagra o chamado fideicomisso de resíduo: a disposição testamentária,

além de instituir um beneficiário de certos bens a título de herança ou de

legado – fiduciário – atribui a outrem – fideicomissário – o que por morte

daquele, restar desses bens.

A particularidade desta disposição, que dá caracter residual à

substituição, consiste no facto de o fiduciário poder dispor, por acto

inter vivos, dos bens que lhe são atribuídos, independentemente da

autorização judicial, desde que obtenha autorização do

fideicomissário. Falta em relação ao fideicomisso regular o encargo de

conservar. Continua a verificar-se a dupla instituição e ainda uma

limitação à disponibilidade dos bens. É certo que fica dispensada a

autorização judicial, mas tem de ser obtida a do fideicomissário.

Para a substituição ter sentido, o fiduciário não pode dispor dos bens do

fideicomisso de resíduo por negócio mortis causa – art. 2295º/3 a

contrario

c) O fiduciário é uma pessoa colectiva, verificando-se a substituição a favor de

quem o testador indicar, no caso de extinção do fiduciário.

Trata-se de um meio de assegurar a realização de fins que tenham

presidido, na intenção do testador, à atribuição dos bens à pessoa

colectiva e que ficariam frustrados com a sua extinção.

Nesta hipótese, não se coloca a questão da atribuição dos bens por

morte, mas deve entender-se que a existência do fideicomisso afasta as

disposições correspondentes à atribuição legal ou estatutária dos bens

por extinção da pessoa colectiva – art. 166º

Quanto a actos de disposições por negócios inter vivos, este

fideicomisso irregular segue o mesmo regime do que o consagrado na

al. b) – art. 2295º/3

IV - HERANÇA JACENTE

A vocação e o exercício do direito de suceder que dela emerge, em termos práticos,

só em casos não significativos ocorrem no mesmo momento ou até em momento

próximos um do outro. Na normalidade dos casos decorre um tempo mais ou menos

longo e relevante entre eles. Durante o espaço de tempo que separa a vocação do

exercício do direito de suceder o fenómeno sucessório com que se suspende designa-

se por herança jacente.

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Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 78

NOÇÃO DE HERANÇA JACENTE

Herança Jacente (art. 2046º): herança que ainda não foi aceite nem declarada vaga

para o Estado.

O período em que a herança se encontra jacente envolve o risco de os bens, não

tendo quem se ocupe da sua administração, virem a sofrer danos, já que mais não

seja pela deterioração inerente ao decurso do tempo ou à sua imobilização. Para

evitar tal a lei permite a adopção de providências relativas à administração dos bens

hereditários (art. 2047º) e na nomeação de curador da herança jacente (art. 2048º).

MEDIDAS CAUTELARES DA HERANÇA JACENTE; A ADMINISTRAÇÃO

A adopção de medidas dirigidas à administração dos bens hereditários traduz-se no

acautelamento dos interesses dos sucessíveis chamados. Tal funda-se no facto de ser a

eles que a lei reconhece legitimidade para adoptarem medidas dirigidas à

administração da herança e do seu retardamento poder resultar danos.

Embora o art. 2047º/1 se refira ao sucessível chamado a doutrina tem entendido que a

medida cautelar prevista nesta norma só esta aberta aos herdeiros. Os legatários só

são por ela tutelados poe as medidas de administração se referirem à herança na sua

globalidade, ou seja, compreendendo legados.

A interpretação do art. 2047º/1 conduz ao entendimento de os herdeiros chamados

poderem adoptar e tomar as providências que caibam no conceito de actos de

administração. Tendo em consideração o fim visado com a medida deve entender-se

que apenas são permitidos actos de administração ordinária e não extraordinária, e

muito menos são admitidos actos de disposição.

Só são permitidos os actos de administração quando do retardamento da sua pratica

possam resultar prejuízos (exemplo: há um prédio urbano da herança onde se regista a

infiltração de água das chuvas em termos de haver riscos de o telhado ruir).

Tal limitação deve ser conjugada com o caracter de urgência que o art. 1047º/2 exige

para os actos de administração. Contudo, o caracter de urgência dos actos de

administração ordinário, que os herdeiros são admitidos a praticar, ajuda a resolver o

problema de articulação desta medida cautelar com outras destinadas a assegurar a

administração da herança. Ou seja, por serem actos urgentes, justificados como meio

de evitar prejuízos, não é de excluir a possibilidade de os herdeiros chamados, mas

ainda não aceitantes, os praticarem mesmo que esteja em funções de cabeça-de-

casal. O mesmo vale se estiver nomeado um curador da herança jacente.

Havendo um só herdeiro chamado, a ele cabe naturalmente legitimidade para

providencial quanto à administração da herança – art. 2047º/1.

Sendo vários os chamados, qualquer dos herdeiros tem legitimidade, por só, para

praticar actos urgentes de administração. Tal regime visa assegurar um

acautelamento eficaz dos bens hereditários, pressupondo a inércia ou a

concordância dos demais, não podendo ir ao ponto de ignorar a existência de

eventuais divergência, inerentes a uma situação de pluralidade de interessados.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 79

Deste modo, nos termos do art. 2047º/2 segunda parte previne-se a hipótese de algum

dos interessados se opor à actuação de um deles. Neste caso prevalece a vontade

da maioria, apurada em função do numero de chamados.

MEDIDAS CAUTELARES DA HERANÇA JACENTE; O CURADOR DA HERANÇA

A adopção de medidas cautelares de administração dos bens hereditários pelos

sucessíveis não prejudica a possibilidade de nomeação de curados da herança – art.

2047º/3 e art. 2048º.

Uma vez que estão envolvidos interesses que não são apenas dos sucessíveis

chamados, a lei poderá reconhecer legitimidade para requerer a nomeação de

curador à herança ao Ministério Público e ainda a quaisquer interessados.

Deste modo, ao contrario da medida anterior, a nomeação do curador à herança

pode ser requerida pelos legatários, quando eles detenham um interesse próprio e

autónomo no acautelamento dos bens que lhes estão atribuídos.

REQUISITOS DA NOMEAÇÃO DE CURADOR À HERANÇA JACENTE (ART. 2048º/1)

Falta de pessoas que legalmente administre a herança

Há a administração legal que exclui a nomeação de curador à

herança jacente, se estiver instituído o cabeçalato. Tal não acontece

quando os herdeiros estejam a praticar actos urgentes de

administração.

Risco de perda ou deterioração dos bens

Quando aos poderes do curador da herança aplica-se o regime da curadoria

provisória dos bens do ausente – art. 2048º/2. Ou seja, ao curador da herança jacente

são atribuídos, em geral, poderes de administração ordinária – art. 94º.

A curadoria mantém-se enquanto subsistirem razões que a determinaram. Deste

modo, a superveniente cessação de qualquer dos requisitos implica o seu termo – art.

2048º/3.

NOTIFICAÇÃO DOS HERDEIROS

A causa determinante de a herança estar jacente reside no facto de o sucessível

chamado não aceitar nem repudiar. O art. 2049º estabelece a possibilidade de ele

(sucessível) ser notificado para, em determinado prazo, tomar uma decisão quanto ao

exercício do direito, sob pena de se entender que adopta das opções possíveis. Existe

um processo cominatório de aceitação ou repúdio: actio interrogatória

Nos termos do art. 2049º/1, limita-se o recurso ao meio judicial aos casos em que o

sucessível chamado seja conhecido. Deste modo, o primeiro requisito da chamada

notificação dos herdeiros respeita ao seu conhecimento.

Quando tal ocorra, a notificação cominatória dos herdeiros depende ainda de o

chamado não ser lesto a aceitar ou repudiar a herança, criando-se uma situação de

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 80

incerteza quanto à posição que ele vai adoptar. A notificação só se compreende se

tal situação se prolongar no tempo para além do razoável.

O legislador fixou um prazo para além do qual a inércia do titular do direito não se

considera razoável, fazendo-o em termos exigentes: prazo de 15 dias – art. 2049º/1 –

prazo que se conta a partir do momento em que o sucessível (sendo conhecido) é

chamado.

Conhecimento do Herdeiro: não existem quaisquer dúvidas os casos em que o

desconhecimento se refere à pessoa em si mesma, ou à qualidade de herdeiro. Mas o

que sucede se o herdeiro for conhecido mas não se souber a sua morada? Nos termos

do art. 1467º/2 CPC manda-se efectuar a notificação segundo o formalismo da

citação pessoal, limitando-se o recurso à actio interrogatória.

Preenchido o prazo de 15 dias sem que o direito de suceder seja exercido, permite ao

Ministério Público ou a qualquer interessado legitimidade para requerer ao tribunal que

o sucessível seja notificado para no prazo que o juiz fixar declare se aceita ou se

repudia a herança.

Integram a categoria dos interessados…

Outros sucessíveis chamados, sejam herdeiros ou legatários, mesmo que eles

próprios não tenham aceitado;

Os sucessíveis subsequentes;

Os credores sejam da herança, sejam os pessoais do sucessível.

O sucessível é livre de aceitar ou repudiar, mas para a sua vontade ser atendida tem

de a manifestar por meios adequados dentro do prazo que lhe for fixado pelo juiz, o

qual deve constar de notificação.

Da conjugação do art. 2049º/2 com o art. 1467º CPC consagra-se que a necessidade

de o sucessível adoptar um comportamento positivo só existe necessariamente se

pretende repudiar. O seu silêncio vale como aceitação (art. 218º). Para o repúdio ser

considerado válido o sucessível deve apresentar documento valido contendo a

correspondente declaração (art. 2063º e 2126º).

Havendo repúdio, segundo o princípio da economia processual, a notificação dos

sucessíveis subsequentes faz-se no processo de notificação do sucessível prioritário –

art. 2049º/3.

NATUREZA JURÍDICA DA HERANÇA JACENTE

Na opinião do PROF. CARVALHO FERNANDES no fenómeno jurídico que ocorre na

herança jacente existem direitos sem sujeito que, como é próprio destas situações, têm

caracter temporário – estando assegurada a resolução – e são acompanhadas de

meios técnicos de acautelamento dos bens em causa, em vista dos interesses dos

futuros adquirentes do direito: medidas de administração pelos herdeiros e curadoria

da herança.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 81

Para mais desenvolvimentos sobre esta questão remete-se para Lições de Direito das

Sucessões, página 264 e ss.

6. AQUISIÇÃO DA HERANÇA

I O DIREITO DE SUCEDER

GENERALIDADES

O Direito de Suceder é um direito potestativo instrumental, através de cujo exercício,

mediante a manifestação da sua vontade, o sucessível chamado à herança a pode

fazer sua ou afasta-la do seu património. Contém-se neste direito uma opção

conferida ao sucessível traduzida na escolha em alternativa de uma de duas

faculdade de sinal oposto, cujo exercício consubstancia um de dois actos jurídicos

que se designam por aceitação e repudio.

Note-se que no CC os dois capítulos que se ocupam da aceitação e do repudio só ao

direito dos herdeiros se referem, deixando de fora os legatários. Contudo, o direito dos

legatários não justifica nesta matéria tratamento substancialmente diverso do dos

herdeiros, pelo que nos termos do art. 2249º, a propósito dos legados, manda-se

aplicar aos legatários com as necessárias adaptações o regime de aceitação e do

repudio.

ASPECTOS COMUNS À ACEITAÇÃO E AO REPÚDIO

Tanto na aceitação como no repudio está se face a negócios jurídicos sucessórios –

características:

Por neles haver só uma parte, tanto a aceitação como repúdio são negócios

unilaterais

São negócios singulares, uma vez que se houver varias pessoas chamadas à

sucessão, cada uma delas aceita ou repudia o acto isolado

São negócios jurídicos pessoais, uma vez que não admitem exercício

representativo voluntário (ligação entre tais actos e o seu autor e garantia de

genuinidade da vontade neles manifestada)

Crítica: sendo o chamado à sucessão pessoa incapaz de exercício

(menor, interdito) funcionam as regras do respectivo suprimento

quanto ao exercício do direito de suceder. Já quanto aos inabilitados,

não sendo a aceitação acto de administração e constituindo o

repudio um acto que implica efeito análogo à disposição de bens

deve entender-se que eles estão sujeitos apenas à autorização do

curador, que actua, em qualquer dos casos, como assistente.

Quanto ao menor, os pais estão sempre dependentes da autorização

para o repúdio da sucessão; quanto à aceitação ela só é exigida se a

herança ou o legado estiverem sujeitos a encargos.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 82

Quanto o sucessível seja casado, a aceitação é livre mas o repudio

exige autorização do outro cônjuge, a menos que vigore o regime de

separação de bens – art. 1683º.

São negócios não recipiendo uma vez que a sua eficácia não depende de

serem levados ao conhecimento de terceiro ou de lhe serem comunicados.

São actos irrevogáveis – art. 2061º e 2066º - uma vez celebrados não pode o

seu autor por termo à sua eficácia por acto unilateral de sinal contrário (razões

de segurança e de celeridade)

Não se permite a aponibilidade, à aceitação e ao repúdio, de cláusulas

acessórias que afectem a sua eficácia. A sucessão não pode ser aceite ou

repudiada sob condição ou termo – art. 2054º/1 e art. 2064º/1.

Em princípio, tanto a aceitação como o repúdio, são actos indivisíveis – art.

2054º/2 e 2064º - a herança não pode ser aceite ou repudiada só em parte. A

mesma regra vale quanto aos legados – art. 2250º/1.

Excepção quanto à herança: art. 2055º

Nº1: casos em que o herdeiro é chamado à herança como

sucessível legitimo e testamentário, quer seja simultaneamente

quer seja sucessivamente. De acordo com esta norma, aplica-

se preliminarmente a regra da indivisibilidade ao consagrar-se

que se o sucessível aceitar ou repudiar a herança que lhe é

deferida por lei, aceita ou repudia também o que lhe é

deferido por testamento. Esta regra cede se o herdeiro ao

tempo em que aceitou ou repudiou a herança deferida por lei

ignorava a existência de testamento. Pode em relação ao

testamento praticar o acto de sinal contrario aquele por que

optou quanto à sucessão legítima. O facto de ter repudiado

como herdeiro legitimo não o impede de aceitar a herança

que lhe é deferida por testamento, e a inversa é igualmente

verdadeira.

Nº2: sendo o herdeiro chamado a titulo legitimário e

testamentário admite-se que ele repudie a quota disponível e

aceite a quota indisponível.

Excepção quanto aos legados: art. 2250º

Nº1: a regra da indivisibilidade não impede que o legatário

sendo beneficiário de mais de um legado aceite uns e repudie

outros. Contudo há uma limitação: não é admitido só o

repudio, no caso dos legados plurais, em relação aquele ou

aqueles que sejam onerados por encargos impostos pelo

testador. Havendo encargos tem de aceitar ou repudiar todos

os legados

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 83

Nº2: Casos em que o sucessível é a um tempo herdeiro e

legatário. Neste caso, o sucessível pode tomar atitudes opostas

quanto à herança e ao legado: aceitando ou repudiando uma

e repudiando ou aceitando outra. Contudo aqui funciona a

limitação em que não se admite só o repúdio da deixa onerada

com encargos, seja a titulo de herança seja de legado.

A aceitação e o repudio seguem o disposto para o comum dos negócios

jurídicos quanto à anulabilidade por erro qualificado por dolo e por medo

proveniente da coacção moral, não relevando como causa de anulabilidade

o simples erro – art. 2060º e 2065º.

ASPECTOS PARTICULARES DA ACEITAÇÃO E DO REPÚDIO

Nos termos do art. 2056º/1 a aceitação da sucessão pode ser expressa ou tácita. Uma

vez que não existe nenhuma norma semelhante quanto ao repudio considera-se que

terá de ser expresso. Contudo é necessário interpretar esta afirmação com cuidado.

Em matéria de aceitação, o CC não se limita a consagrar especificadamente a

admissibilidade das duas modalidades que em regra a declaração negocial poderá

revestir nos termos do art. 217º.

Em verdade, o art. 2056º/2 evidencia casos de aceitação expressa segundo o critério

geral do art. 217º/1 conjugado com um problema de interpretação da declaração.

Não pode deixar-se de entender-se como manifestação directa da sua vontade o

comportamento do sucessível que em algum documento escrito declara aceitá-la. O

mesmo se deve dizer quanto à assunção do titulo de herdeiro feita com a intenção de

adquirir a herança.

O problema coloca-se em sede de aceitação tácita sendo necessário atender ao

consagrado no art. 2056º/3 e art. 2057º:

Nos termos do art. 2056º/3, desconsidera-se para tal efeito esses mesmos

factos. Assim aos simples actos de administração da herança praticados pelo

sucessível em relação aos quais se podia discutir se tinham relevância como

manifestação indirecta da vontade de aceitar, retira o preceito em análise tal

significado.

Quanto aos actos de alienação gratuita da herança, é necessário distinguir

em função dos beneficiários da alienação – art. 2057º/1

Se esta for feita em beneficio de todos aqueles a quem a herança

caberia se o alienante a repudiasse, não há aceitação. Caso

contrario, a alienação gratuita da herança implica a sua aceitação.

O mesmo se deve dizer se a alienação for onerosa,

independentemente, e quem for o adquirente.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 84

Análise do art. 2057º/2: segundo a sua provisão o sucessível pratica efectivamente um

acto de repúdio, contudo ao repudiar esta a fazê-lo a favor apenas de algum ou

alguns dos sucessíveis que seriam chamados na sua falta. A lei desconsidera o acto

praticado pelo sucessível, qua tale, e atribui ao seu comportamento o duplo

significado de aceitação da herança e a sua subsequente alienação a favor dos

beneficiários do repudio. O entendimento correcto vai no sentido de não ser aqui

admitida, por parte do adquirente, prova de intenção contraria à declaração,

levando esta norma a ser uma declaração ficta. Note-se que o mesmo se deve dizer

quanto ao seu nº1 uma vez que tal envolve a verificação de um repudio tácito mas

apenas se se tomar esta qualificação em sentido amplo.

Note-se que quanto à aceitação da herança o silencio do sucessível tem valor

declarativo – art. 2049º/2 E art. 2165º/3.

Como já foi mencionado, uma vez que a lei não prevê expressamente a hipótese de o

repudio poder ser tácito pelo que não se admite em absoluto tal possibilidade.

Contudo, o legislador ao está impedido de em norma expressa consagrar situações de

repudio sob a modalidade de declaração presumia ou ficta.

FORMA

ACEITAÇÃO REPÚDIO

PROF. ANTUNES VARELA E PIRES DE

LIMA:Está sujeita a forma escrita, quando

expressa – interpretação do art. 2056º/2.

PROF. LUÍS CARVALHO FERNANDES E

OLIVEIRA ASCENSÃO: a aceitação

poderá ser verbal, não valendo nem

como expressa nem como tácita,

quando tal corresponda na pratica da

vida à conduta normal das pessoas.

O art. 2063º manda observar a forma que

é exigida para a alienação da herança

(art. 2126º).

O repúdio é sempre um negócio formal

embora a forma legal exigida dependa

da natureza dos bens que compõem a

herança: bens imóveis - repúdio por

escritura pública ou por documento

particular autenticado. Nos demais casos,

deve ser feito por documento particular.

ACEITAÇÃO PURA E SIMPLES E ACEITAÇÃO A BENEFICIO DE INVENTÁRIO

ACEITAÇÃO PURA E SIMPLES ACEITAÇÃO A BENEFÍCIO DE INVENTÁRIO

Determina-se por exclusão de partes.

Art. 2053º: pressupõe a existência de um

processo judicial de inventário. O

sucessível pode, para fazer a aceitação

segundo este regime, ou requerer ele

próprio o inventário ou intervir em

processo de inventário que esteja em

curso.

O recurso a uma destas duas modalidades de aceitação, fora dos casos em que a

aceitação a beneficio de inventário seja imposta por lei, é deixada na disponibilidade

do sucessível, não podendo o autor da sucessão determiná-la por forma directa ou

indirecta – art. 2052º/2 (considera não escritas as cláusulas testamentárias que

imponham uma ou outra das modalidades de aceitação).

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 85

Importa desde já salientar que a aceitação a benefício do inventário acarreta um

regime mais favorável em matéria de prova da solvabilidade ou insolvabilidade da

herança – art. 2071º. Deste modo, antigamente, para tutela de certas categorias de

sucessíveis, a lei impunham, em certos casos, que a aceitação se fizesse a benefício

de inventário – inventário obrigatório. Tal foi posteriormente modificado, devendo

então a partilha fazer-se judicialmente. Nos termos do art. 2102º/2 resulta que a

partilha é obrigatória quando:

Havendo interessado incapaz, o MP requeira inventário por entender que o

interesse daquele justifica a aceitação beneficiária;

Algum ou alguns dos herdeiros não possam intervir em partilha extrajudicial por

motivo de ausência em parte incerta ou incapacidade de facto permanente.

Note-se que este regime não opera no caso de estar declarada a morte

presumida do ausente, pois nele são chamados os sucessíveis subsequentes d

autor da sucessão.

CAUDICIDADE DO DIREITO DE ACEITAÇÃO

O Direito de Aceitação deve ser exercido dentro de certo prazo sob pena de

caducidade: art. 2059º (herança) e art. 2249º (legados)

O prazo para aceitar a sucessão é de 10anos contando-se, em geral, do

conhecimento que o sucessível tenha de haver sido chamado – art. 2059º/1.

Contudo, na vocação sob condição suspensiva e na substituição fideicomissária o

inicio do prazo, nos termos do art. 2059º/2, é diferente:

Vocação Sob Condição Suspensiva: o prazo de caducidade começa a

contar-se a partir do conhecimento da verificação da condição.

Substituição Fideicomissária: pelo que respeita ao direito de aceitar do

fideicomissário, o inicio da contagem do prazo de caducidade só se verifica

quando ele tem conhecimento da morte do fiduciário.

A SUB-ROGAÇÃO DE CREDORES

O repúdio da herança implica o afastamento de certos bens que, a ser aceite o

convite envolvido de vocação, viriam integrar o património do sucessível. Deste modo,

o repúdio pode implicar prejuízo para os credores do repudiante, que se vêem

impedidos de, à custa dos bens da herança, uma vez perdida a qualidade de

património autónomo que a caracteriza, realizar o seu crédito função externa do

património e garantia comum dos credores.

Nesta base, compreende-se a atribuição aos credores de meios de reação contra o

repúdio, uma vez que tal consubstancia ou pode consubstanciar uma afectação da

sua garantia.

Nos termos do art. 2067º consagra-se uma faculdade concedida aos credores pessoais

do sucessível, ou seja o fenómeno da sub-rogação.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 86

ANÁLISE DO ART. 2067º

Nos termos do nº1 resulta que a intervenção dos credores, aceitando a herança em

nome do sucessível, pressupõe o repúdio deste (‘’credores do repudiante’’). Note-se

que o repudiante pode ser um herdeiro legal ou testamentário ou ainda um legatário

(com base na remissão genérica para o art. 2249º). Os credores a quem o direito de

aceitação é reconhecido são os pessoais do repudiante. Pelo que respeita ao

repúdio, não é de admitir o recurso ao art. 2067º se ele for nulo, anulado ou ineficaz,

sendo que a lei não exige que o repudiante tenha agido com fraude, ou seja, com o

intuito de lesar os credores.

Nos termos do nº1, a aceitação deve fazer-se no prazo de seis meses, contados do

conhecimento do repúdio pelos credores. O meio judicial para os credores operarem

a faculdade que lhes é conferida é a acção em que deduzam o pedido de

pagamento dos seus créditos contra o repudiante e contra aqueles que receberam os

bens por efeito do repúdio – art. 1469º/1 CPC.

A sentença favorável que os credores obtenham na acção referida permite-lhes

executar a decisão contra a herança, ou seja pagar-se à custa dos bens que a

integram.

Um vez obtido o pagamento dos credores sub rogantes, o que restar da herança na

cabe ao repudiante mas aos sucessíveis a quem por efeito do repúdio a herança seja

deferida (nº3).

ANÁLISE DO ART. 606º E SS (remissão do art. 2067º/1 in fine)

Nos termos do nº2 do art. 606º limita-se a admissibilidade da acção sub rogatória aos

casos em que esta seja essencial à satisfação ou garantia do direito do credor. Tal

requisito projecta-se em dois sentidos diferentes:

Implica a Avaliação da Situação Patrimonial do Repudiante: pelo que respeita

ao património do devedor, o seu repúdio acarreta prejuízo para os credores

quando esteja insolvente, bastando a insolvência como situação de facto, não

se tornando necessária a sua verificação judicial, em processo de insolvência.

Ainda que ocorra uma situação de insuficiência patrimonial do devedor, o seu

repúdio só causa necessariamente prejuízo aos credores, se a herança, por seu

turno, for solvente. Note-se que o art. 2067º não envolve qualquer derrogação

do regime da satisfação dos encargos da herança, ou seja, os credores sub-

rogantes não adquirem melhor posição do que a que lhes conferiria o art.

2070º/1 não sendo pois prejudicada a preferência atribuída aos credores da

herança.

Implica a Avaliação da Situação Patrimonial da Própria Herança: se a herança

repudiada for insolvente nenhum prejuízo o repudio acarreta aos credores do

repudiante.

Há que ressalvar o benefício que a sub-rogação traz ao credor aceitante sobre os

credores pessoais do sucessor autor do repúdio.

A aceitação feita por certo credor só a este beneficia e não afasta os efeitos

decorrentes do repúdio do sucessível: art. 2067º/3 e art. 2049º/3.

Page 87: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 87

A aceitação feita pelos credores visa assegurar-lhes a satisfação dos seus créditos,

sendo que uma vez que estes sejam pagos, o remanescente não aproveita ao

repudiante, mas aos herdeiros imediatos a quem caiba o direito de suceder por efeito

do repúdio. Tal encontra-se em perfeita harmonia com o disposto no nº3 do art. 2049º,

sendo que tal dispõe que, se o sucessível, notificado para exercer o direito de suceder

e declarar se aceita ou repudia a herança, a repudiar, passam a notificar-se os

sucessíveis imediatos, segundo a ordem de preferência dos correspondentes factos

designativos. A aceitação que algum destes venha a fazer não prejudica o direito

atribuído pelo art. 2067º aos credores do repudiante.

EFEITOS DO EXERCÍCIO, PELOS CREDORES, DA FACULDADE CONSTANTE NO ART. 2067º

Quanto aos credores aceitantes eles podem executar os créditos sobre a

herança, logo, sobre os bens que não integram o património do seus devedor

nem nunca integraram – art. 1469º/3 CPC. São os bens da herança que

respondem, para além dos seus próprios encargos – art. 2068º. Os credores

aceitantes não adquirem, com a aceitação, a qualidade de herdeiros ou de

legatários.

Quanto ao repudiante, embora a lei não de uma resposta clara entende-se

que a aceitação dos seus credores não poe em causa o repúdio. Do art. 2067º

não resulta que o repúdio seja afectado nomeadamente por não configurar a

sua anulação ou impugnação. Além disso, o destino estabelecido para os bens

remanescentes da herança, ou seja a sua atribuição aos herdeiros imediatos,

só se concilia com uma solução de subsistência do repúdio, logo o repudiante

não será sucessor.

A aceitação da herança pelos credores do repudiante não afasta a vocação

dos sucessíveis subsequentes – art. 2067º/3. Contudo, tal produz um significativo

efeito na situação patrimonial do devedor e na dos herdeiros subsequentes:

O devedor, na medida da satisfação dos créditos pela herança, fica

liberto das correspondentes dívidas, sem que tal ocorra à custa do seu

património.

O sucessor imediato não recebe o património tal como em princípio o

repudio lho facultaria, mas sim desfalcado dos bens necessários para

pagar aos credores do repudiante.

A sub-rogação dos credores do repudiante faz surgir novos parceiros no

concurso de credores que podem obter a satisfação dos seus direitos à custa

dos bens da herança: os credores pessoais do sucessor subsequente. O art,

2067º não regula a articulação dos direitos destes credores com os dos do

repudiante, mas existem elementos relativos ao seu regime e ao fenómeno

sucessório em geral que habilitam a formular uma resposta com alguma

segurança:

O art. 2067º visa tutelar os credores pessoais do repudiante, afastando o

prejuízo de não poderem valer-se dos bens da herança para a

satisfação dos seus créditos. Deste modo, os credores do repudiante

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 88

suportam a preferência dos credores da herança, porquanto se

pudessem ser pagos antes deles ou em conjunto com eles, subvertia-se

a ratio legis da norma, ou seja não se evitava o prejuízo aos credores do

repudiante, concedia-se-lhes uma vantagens.

Na relação entre os credores do repudiante e os pessoais do herdeiro

subsequente, aqueles não podem ter pior posição do que estes, não

excluindo tal a hipótese de todos concorrem aos bens da herança em

paridade de situação. Todavia, o facto de a lei deixar claro que ao

herdeiro subsequente é apenas atribuído o remanescente da herança,

ou seja, o que resta depois de pagos os credores aceitantes, permite

afirmar que os seus diretos preferem aos dos credores pessoais do

herdeiro subsequente. São aqueles que chegam ao seu património e só

por eles os seus credores pessoais se podem pagar.

QUALIFICAÇÃO DO INSTITUTO DO ART. 2067º

ART. 2067º ART. 606º

O direito de suceder, em relação ao qual

a sub-rogação é admitida, já foi

exercido, mediante o repúdio.

A faculdade reconhecida aos credores

pressupõe a inércia do devedor no

exercício dos direitos de conteúdo

patrimonial que lhe sejam conferidos.

Tendo presente a distinção anterior, poder-se-ia pensar que o meio de conservação

da garantia patrimonial que se apresentaria mais adequado à intervenção dos

credores do repudiante seria a impugnação pauliana uma vez que tal configura um

ataque contra o acto praticado pelo devedor, o repúdio, de que a afectação da sua

garantia decorre.

Contudo, tal enquadramento não se ajusta ao instituto do art. 2067º. O credor do

herdeiro não vai propriamente atacar o repúdio, sendo apenas admitido a aceitar a

sucessão, em nome do repudiante, apesar de já ter havido o repúdio.

O repúdio não é afectado pois o repudiante não recebe o remanescente da herança

mantendo-se o chamamento do sucessível subsequente. Não se pode esquecer que

a remissão do art. 2067º para o art. 606º afasta a possibilidade de construir o instituto

consagrado naquela norma com base na impugnação pauliana.

Deste modo, a faculdade atribuída pelo art. 2067º aos credores do sucessível do

repudiante configura-se como uma figura a se, situada, se assim se pode dizer, a meio

caminho da sub-rogação e da impugnação pauliana. Razões:

No fundo o que legislador quis foi assegurar aos credores do repudiante um

meio de ver concretizada a sua razoável esperança de à custa do património

hereditário que ao devedor viesse a caber satisfazerem em tempo oportuno os

seus direitos.

O repúdio do devedor frusta tal esperança: os credores do repudiante através

deste meio que a lei qualifica de sub-rogação, são admitidos a pagar-se por

tais bens, como se eles tivessem entrado no património do seu devedor.

Page 89: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 89

Por força do art. 1469º/2 do CPC que resulta o meio processual através do qual

a sub-rogação opera, os credores aceitantes executam a sentença favorável

contra a herança. Deste modo, os seus créditos que comportam como se

fossem encargos da herança, para serem pagos após a satisfação daqueles

por que ela prioritariamente responde, mas antes dos dos credores pessoais do

sucessível subsequente que aceite a herança.

Em suma, o instituto funda-se em razões de Justiça, visando o desenvolvimento normal

do fenómeno sucessório em conexão com o princípio da garantia patrimonial das

obrigações, ou seja, domina nele uma preocupação análoga à que preside aos

meios de conservação da garantia patrimonial.

Tal como na acção sub-rogatória como na pauliana, a aceitação dos credores só é

admitida quando ocorra uma situação de deficit patrimonial do seu devedor e a

herança repudiada possa contribuir para a realização do crédito do aceitante.

Constitui um meio especifico, a se, concretização da garantia patrimonial, afim dos

meios de conservação.

TRANSMISSÃO DO DIREITO DE SUCEDER

A aquisição do direito de suceder mediante vocação significa que na titularidade do

sucessível passam a existir as faculdades alternativas de aceitar ou repudiar a

sucessão.

O exercício deste direito não se pode dar imediatamente após a vocação. Em geral

mesmo sendo o sucessível diligente decorre algum tempo entre a atribuição do direito

e o seu exercício sendo, de resto, longo o prazo legal de caducidade da faculdade

de aceitação da herança.

E se o sucessível, a quem o direito de suceder foi atribuído, falecer sem o ter exercido?

O conteúdo patrimonial do direito de suceder aponta na sua transmissibilidade mortis

causa – art. 2058º - ou seja, o direito de aceitar ou repudiar a sucessão, não exercida

antes da morte do sucessível a quem foi atribuído, transmite-se aos seus herdeiros.

Note-se que tal transmissão só se verifica se o herdeiro do sucessível, a quem foi

atribuído o direito de suceder, aceitar a sucessão do sucessível que faleceu sem ter

aceitado ou repudiado (nº2).

A aceitação da herança do titular do direito de suceder não exercido, comporta-se,

como um requisito da sua aquisição, mas confere, ao mesmo tempo, aos herdeiros do

falecido, o direito de suceder em todo o seu conteúdo; por isso adquirindo o direito

suceder eles tanto podem aceitar como repudiar a herança a que o falecido fora

chamado.

Exemplo: B, sucessível de A, morre sem ter exercido o direito de suceder e deixa, como

seu herdeiro C. Se C aceitar a herança de B, o direito de este suceder a A transmite-se

para C. Por seu turno, C é livre de em seguida aceitar ou repudiar a herança de A. Ou

seja, C é livre de aceitar ou repudiar a sucessão de B, mas se a repudiar não adquire o

direto de suceder a A, que integrava a herança de B.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 90

A transmissibilidade do direito de suceder tem como efeito imediato afastar o

chamamento de herdeiros subsequentes do autor da sucessão a que o direito de

suceder não exercido respeita.

Exemplo (anterior): Suponha-se que B (sem descendentes nem ascendentes) casado

com C era o único irmão de A e que o parente mais próximo deste, além de B, era o

seu tio avô D.

Se B tivesse repudiado a herança de A, seria chamado à sucessão de A, por vocação

subsequente F. Como B morreu sem aceitar ou repudiar a herança de A, o direito de

suceder a este transmite-se a C, cônjuge sobrevivo de B, seu sucessível prioritário,

desde que C aceite a sucessão de B. Mas ocorrendo esta aceitação C pode repudiar

a herança de A.

Será este um caso de afastamento do princípio que exclui a aceitação e o repúdio

parciais?

Não, uma vez que aqui estão em causa duas sucessões diferentes e o transmissário do

direito de suceder vem a ser sucessor de A.

Ou seja, no presente caso estamos perante as sucessões de A e B. O direito de

suceder de A é apenas um dos que C adquire por transmissão como qualquer outro

elemento da herança de B, por a ter aceite. De seguida C exerce livremente esse

direito. O que ele então aceita ou repudia é a sucessão de A e não a de B.

Em suma, em relação a cada uma dessas heranças, quando C aceita uma e repudia

outra estes actos envolvem uma aceitação e repúdio integrais e não parciais. Deste

modo, se C repudiar a herança de A, são os herdeiros imediatos deste – e não de B –

que vão ser chamados à herança de A, ou seja D seria chamado a suceder a A.

TRANSMISSÃO DO DIREITO DE SUCEDER DIREITO DE REPRESENTAÇÃO

Na sucessão legal verifica-se qualquer

que seja o sucessível que não chega a

exercer o direito de suceder.

Ocorre a favor dos herdeiros, em geral.

Não há qualquer vocação indirecta

Verifica-se apenas na sucessão dos

descendentes e dos irmãos do falecido.

Ocorre a favor dos descendentes.

Vocação Indirecta

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 91

II REGIME DA AQUISIÇÃO SUCESSÓRIA

COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

Nos termos do art. 2050º/1 consagra-se que o domínio e posse dos bens da herança

adquirem-se pela aceitação independentemente da sua apreensão material, sendo

que os efeitos da aceitação retroagem ao momento da abertura da sucessão (nº2).

Exclui-se tanto o sistema de aquisição automática da herança como o de investidura.

Exclusão do Sistema de Aquisição Automática da Herança

Exige-se a aceitação constituindo tal um negócio jurídico através do

qual o sucessível manifesta a vontade de receber os bens que lhe são

deferidos.

A retroação dos efeitos da aceitação visando tal operar desde a

abertura da sucessão traduz uma aquisição que só mais tarde de

verifica

Exclusão do Sistema de Investidura

No sistema de investidura, a aquisição depende de acto de uma

autoridade, sem o qual não se dá. Ora o art. 2050º/1 ao dispensar como

requisito da aceitação a apreensão material dos bens também não é

adequado a este sistema.

Só na aquisição da herança pelo Estado é que se pode identificar uma

situação de investidura.

AQUISIÇÃO DO DOMÍNIO. AQUSIÇÃO DA POSSE. AQUISIÇÃO DO ESTADO

Remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página 292 e ss.

IV – REGIME DA HERANÇA ADQUIRIDA

1. GENERALIDADES

A SITUAÇÃO DA HERANÇA ADQUIRIDA

A aquisição da herança não significa que os sucessores entrem de imediato na posse

efectiva dos bens que a cada um deles foram atribuídos. Se se tratar de herdeiros o

que eles adquirem num primeiro momento é uma universalidade de bens ou uma

quota deles. O seu preenchimento com bens determinados implica uma nova

operação jurídica, operação essa que se designa como partilha. Quando aos

legatários, fora das hipóteses de terem já a detenção dos bens que lhes cabem, esta

em causa o cumprimento do legado.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 92

PROVA DA QUALIDADE DE SUCESSOR

A invocação pratica da qualidade de sucessor implica com frequência a sua

demonstração ou prova. A titulo ilustrativo invoca-se nesta campo a inscrição, em

nome do sucessor, de coisas registáveis que lhe foram atribuídas.

A ordem jurídica poe ao dispor do sucessor meios de diversa natureza:

Extrajudicial

Notarial

Procedimento simplificado de sucessão hereditária

Judicial

Inventário (processo especial)

Habilitação judicial (incidente de um processo em curso)

Administrativo

Para mais desenvolvimentos remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página

306 e ss.

PETIÇÃO DA HERANÇA

A petição da herança encontra-se regulada no art. 2075º/1 e assenta num meio

judicial, que se aproxima da acção de reinvindicação mas que possui elementos

diferenciadores de tal.

O pedido, na acção de petição da herança é complexo, e visa:

Reconhecimento da qualidade de herdeiro do demandante

A restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, por quem

indevidamente os detenha

A petição da herança pressupõe logicamente a aceitação da sucessão no mínimo, se

ela não tiver já sido feita no momento da propositura da acção, este acto envolve

aceitação tacita: não faz sentido pedir o reconhecimento da qualidade de herdeiro

sem haver aceitação.

Note-se que o demandante tem de ser herdeiro.

Poder-se-ia levantar a duvida de saber se neste domínio havendo uma pluralidade de

herdeiro se tornava necessária a intervenção de todos. Mais concretamente saber se

sendo um só deles a agir, com legitimidade, pode ele pedir a restituição de toda a

herança ou só da sua parte?

Nos termos do art. 2078º/1 confere-se legitimidade a qualquer dos herdeiros para

pedir, só por si, a totalidade da herança. Afasta-se a possibilidade de o demandado

opor, na sua defesa, que ao demandante só pertence uma parte dos bens.

Nos termos do nº2 do art. 2078º consagra-se uma ressalva relacionada com o poder,

atribuído ao cabeça-de-casal, de pedir a entrega dos bens que lhe caiba administrar.

Page 93: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 93

Quanto à legitimidade passiva, nos termos do art. 2075º/1, ela cabe a quem

genericamente tenha os bens em seu poder (herdeiro aparente, detentor dos bens

por qualquer outro titulo ou quem não tenha qualquer titulo).

Quanto ao tempo em que a petição da herança pode ser proposta, é necessário

atender à relação que existe entre a petição da herança e a aceitação, uma vez que

na parte final do nº2 do art. 2075º é ressalvada a caducidade do direito de suceder

(remete-se para o art. 2059º). Deste modo, o facto de a acção de petição poder ser,

em princípio intentada a todo o tempo não implica que o direito de suceder não

caduque, se for excedido o prazo do art. 2059º. Ou seja:

Exercido, em devido tempo, o direito de suceder, mediante a aceitação da

herança, a acção de petição pode ser proposta dentro desse prazo. Neste

caso só o usucapião do direito relativo a cada uma das coisas possuídas por

terceiro impede a procedência dessa acção – art. 2075º/2.

Não havendo aceitação autónoma da herança, isto é, implicando a

propositura da acção de petição aceitação tácita, o prazo relativo à

aceitação acaba por se projectar no da acção de petição, que improcederá

se já tiver sido ultrapassado o período de tempo estipulado no art. 2059º.

O efeito da sentença que julgue procedente o pedido do herdeiro traduz-se quanto

aos bens da herança na obrigação de o demandado (e seu detentor) os entregar.

Este regime funciona plenamente se aquele que possuía os bens à data da abertura

da herança continuar a detê-los. Se, porém, ele os tiver alienado, surge de imediato a

questão de saber se o adquirente merece tutela e em que termos:

A regra é a de o direito de petição da herança ser oponível a terceiros

adquirentes dos bens hereditários - art. 2076º/1 – ou seja, consagra-se a

hipótese de a acção de petição ser dirigida contra o adquirente.

Todavia há casos em que a aquisição do terceiro é tutelada verificados certos

requisitos:

Para haver tutela é necessário que o possuidor e alienante dos bens

seja alguém que, por efeito de erro comum ou geral, seja reputado

como herdeiro: herdeiro aparente – art. 2076º/3

Se ocorrer uma situação de herdeiro aparente, se o terceiro tiver

adquirido a titulo oneroso bens determinados da herança ou quaisquer

direitos sobre eles e estiver de boa fé o seu direito prevalece sobre o do

herdeiro – art. 2076º/2

Independentemente das relações entre o herdeiro que intentou a acção de petição

da herança e o terceiro adquirente de bens que aquela acção tem por objecto é

necessário considerar a posição do possuidor que alienou os bens. Ou seja, está em

causa a sua responsabilidade pelo acto de alienação:

Em geral, ele responde pelo valor dos bens alienados – art. 2076º/1

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

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Se o alienante for herdeiro aparente, e a aquisição do terceiro prevalecer

contra o direito do verdadeiro herdeiro, a responsabilidade do herdeiro

aparente é determinada segundo as regras do enriquecimento sem causa, se

também ele estiver de boa fé.

ANÁLISE DO ART. 2077º - EFEITOS DECORRENTES DA NULIDADE OU DE ANULAÇÃO DE UM

TESTAMENTO, HAVENDO NOMEAÇÃO DE LEGATÁRIO

Pode a invalidade do testamento ocorrer num momento em que o herdeiro afectado

pela anulação – herdeiro suposto – tenha cumprido legados. Havendo boa fé do

herdeiro suposto o cumprimento do legado subsiste e aquele tem apenas de entregar

ao verdadeiro herdeiro o remanescente da herança – art. 2077º/1

Se o direito do legatário tiver sido atingido pela invalidade do testamento e

consequentemente o legatário tiver direito ao legado cumprido, cabe ao verdadeiro

agir contra o legatário suposto para obter a restituição do que tenha sido prestador.

Se houver má fé do herdeiro suposto, ele tem de indemnizar o verdadeiro herdeiro dos

danos decorrentes do cumprimento indevido do legado.

Nos termos do art. 2077º/2 alarga-se o regime do nº1 ao legatário a quem caiba o

cumprimento de legado ou de encargos que lhe estejam impostos.

REIVINDICAÇÃO DO LEGADO

Os legatários gozam da acção de reinvindicação que consta do art. 2279º enquanto

meio jurídico de tutela.

2. ADMINISTRAÇÃO DA HERANÇA

GENERALIDADES

A solução normal estabelecida pelo Código para a administração da herança é o

cabeçalto tendo como órgão o cabeça-de-casal – art. 2079º. Contudo o de cuius

tem a possibilidade de instituir, no seu testamento, um meio especifico da sucessão

mortis causa que consiste em definir um conjunto de tarefas – a testamentaria – a

desempenhar por uma ou mais pessoas – testamenteiros – por ele designados.

O CABEÇA-DE-CASAL; REGIME DE EXERCÍCIO E CESSAÇÃO DE FUNÇÕES

No art. 2080º e ss, a lei estabelece varias regras sobre a selecção da pessoa que vai

exercer as funções de cebeça de casal. Contudo, não tendo qualquer delas natureza

imperativa (art. 2084º) iremos começar por expor o regime da designação do cabeça

de casal por acordo dos interessados.

De facto, todos os interessados na administração da herança, incluindo o MP quando

tenha intervenção principal, podem escolher quem deles lhes aprouver para o

exercício do cargo, ainda que esta pessoa não seja nenhuma das indicadas no art.

2080º a 2082º.

Page 95: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 95

Na falta de acordo funcionam as regras supletivas, sendo que a ordem consagrada

no art. 2080º defere o cargo a certas pessoas:

a) Cônjuge sobrevivo, não separado judicialmente de pessoas ou bens, desde

que tenha a qualidade de herdeiro ou de meeiro dos bens do casal

b) Testamenteiro, se o testador não tiver disposto em contrario (art. 2325º e 2326º)

c) Parentes que sejam herdeiros legais, com preferência pelo grau mais próximo;

em igualdade de circunstancias preferem os que viviam com o autor da

sucessão há pelo menos um ano e de entre estes em igualdade o mais velho

d) Herdeiros testamentários, tendo preferência os que viviam com o autor da

sucessão há pelo menos uma ano; em caso de igualdade prefere entre estes o

mais velho

Prevenindo a hipótese de só existirem legatários, por quem tenha sido distribuída toda

a herança, o art. 2081º substitui-os no lugar dos herdeiros, dando a preferência ao mais

beneficiado, sendo que em igualdade de circunstancia a preferência cabe aos mais

velho.

Se a pessoa que nos termos do art. 2080º a 2081º tenha preferência na nomeação

para cabeça-de-casal for incapaz (menor, interdito ou inabilitado) de acordo com o

disposto no art. 2082º/1 e 2, as funções do cabeça-de-casal serão exercidas pelo seu

representante legal, tratando a lei, para este efeito, o curador do inabilitado como seu

representante ainda que não o seja (art. 153º).

Se as regras do art. 2080º a 2082º não puderem funcionar, por as pessoas que, nos

termos destas normas, são admitidas a exercer o cargo terem pedido exusa ou sido

removida, a nomeação cabe ao tribunal – art. 2083º.

O autor da sucessão pode, no testamento, afastar as regras do art. 2080º a 2084º?

PROF. OLIVEIRA ASCENSÃO: Sim

PROF. ANTUNES VARELA E PIRES DE LIMA: Não

PROF. LUÍS CARVALHO FERNANDES: O autor da sucessão pode intervir nesta

matéria mas só através da nomeação de um testamenteiro e anda assim por

via indirecta, uma vez que aquele pode ser deferido o cabeçalato.

O exercício do cargo de cabeça-de-casal é obrigatório, de exercício pessoal, não

admitindo a substituição por representante, salvo o legal e quanto o exercício deva

ser judicial relativamente aos actos que tenham de ser praticados por mandatário

judicial. É intransmissível, tanto em vida como por morte – art. 2095º.

O cabeça-de-casal tem direito a ser reembolsado das despesas decorrentes do

exercício do cabeçalato e dos juros de quantias que, à sua custa, tenham adiantado

para o efeito – art. 2093º/2.

O cabeça-de-casal tem obrigação de prestar periodicamente contas, sendo tal anual

– art. 2093º/1 – e o respectivo prazo começa a correr no inicio do exercício do cargo.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 96

Se as contas apresentarem saldo positivo deve ser entregue aos interessados, segundo

o seu direito, a parte do saldo que não seja necessária, em termos previsionais, para as

despesas do ano seguinte – art. 2093º/3.

As funções do cabeça-de-casal têm o seu termo normal ligado à cessação da própria

administração da herança, com a sua liquidação e partilha – art. 2079º. Contudo

pode cessar antes disso manifestamente no caso de morte do seu titular, por escusa

ou remoção.

Escusa (art. 2085º): acto de iniciativa do cabeça-de-casal, mas não

discricionário, porquanto depende da ocorrência de factos que a lei considera

justificativos, enumerados nas diversas al. do nº1 do art. 2085º todos os factos

ai consagrados respeitam à pessoa do cabeça-de-casal, referindo-se à sua

idade, estado de saúde, residência ou ao exercício de funções publicas em

relação as quais o desempenho do cabeçalto seja incompatível.

Remoção (art. 2086º): é imposta ao cabeça-de-casal podendo se requerida

por qualquer interessado e pelo MP, quando tenha intervenção principal. A

remoção constitui uma sanção imposta ao cabeça-de-casal fundada em

comportamentos inadequados ocorridos no desempenho do seu cargo, como

por exemplo:

Actos dolosos de ocultação da existência de bens (sonegação) ou de

doações feitas pelo autor da sucessão, ou de denúncia de doações ou

encargos inexistentes

Falta de zelo e prucedência na administração dos bens

Incumprimento de deveres legais no processo de inventário

Incompetência no exercício do seu cargo

PODERES DO CABEÇA-DE-CASAL

A função especifica do cabeça-de-casal é a de administração dos bens hereditários –

art. 2079º.

Para tanto o cabeça-de-casal tem o direito de obter a entrega dos bens que os

herdeiros ou outras pessoas tenham em seu poder e que ele deva administrar – art.

2088º/1 primeira parte – sendo que tal poder prevalece mesmo sobre a petição da

herança pelos herdeiros – art. 2078º/2 – desde que a entrega seja necessária para a

administração dos bens.

No caso de ter sido perturbado no exercício do poder sobre os bens sujeitos à sua

administração ou dela privado, tem também o cabeça-de-casal a possibilidade de

recorrer a meios judiciais para manutenção ou restituição da sua posse.

Page 97: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 97

Da conjugação do art. 2079º com o art. 2089º e 2091º decorrer que os poderes do

cabeça-de-casal são em geral de administração ordinária.

Actos de cobrança de dividas activas da herança, se o pagamento for

espontaneamente feito pelo devedor ou quando o retardamento da

cobrança possa pôr esta em perigo – art. 2089º

Venda de frutos ou outros bens deterioráveis, cuja pratica, o nº1 do art. 2090º

faculte ao cabeça-de-casal.

Aplicação do produto das vendas referido no ponto anterior ao pagamento

de despesas de funeral e sufrágio ou de encargos da própria administração,

pois todos eles constituem encargos da herança, a reclamar pronta satisfação

– art. 2068º

Caso das vendas de frutos não deterioráveis – art. 2090º/2 fronteira que

separa os actos de administração ordinária dos actos de administração

extraordinária

Tais vendas só são admitidas para fins muito específicos: pagamento de

despesas de funeral, de sufrágio e de encargos de administração.

Tais vendas só se devem considerar admitidas quando o produto da

venda de bens deterioráveis seja insuficiente para suportes esses

encargos, e na medida da sua insuficiência.

Em suma, em tudo o que ultrapasse o limite dos actos acima identificados, o exercício

de direitos relativos a bens hereditários só pode ser feito pelos herdeiros

conjuntamente, sendo que o art. 2091º/1 apenas ressalva a acção de petição da

herança por um só herdeiro.

O exercício de direitos contra a herança, em tudo o que exceda os poderes do

cabeça-de-casal, tem também de ser feito pelo interessado contra todos os herdeiros.

OBJECTO DA ADMINISTRAÇÃO DA HERANÇA

A administração do cabeça-de-casal tem por objecto todos os bens da herança – art.

2087º/1 (‘’bens próprios’’).

Contudo, se o autor da sucessão tiver sido casado em regime de comunhão, os

poderes do cabeça-de-casal estendem-se também aos bens comuns do casal.

Cabendo o desempenho do cargo de cabeça-de-casal, como é regra, ao cônjuge

sobrevivo, é naquela qualidade (no exercício de cabeçalto) e não na de conjugue

que administra a herança.

Não são considerados bens hereditários os que tenham sido doados em vida pelo

autor da sucessão, independentemente de as correspondentes doações estarem ou

não sujeitas a colação e mesmo que possam ser objecto de redução por

inoficiosidade – são sempre os donatários que os continuam a administrar (art.

2087º/2).

Page 98: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 98

O TESTAMENTEIRO: NOMEAÇÃO, REGIME DE EXERCÍCIO E CESSAÇÃO DE FUNÇÕES

Remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página 320 e ss.

PODERES DO TESTAMENTEIRO

O princípio da liberdade que domina o instituto da testamentaria explica que ao

testador seja reconhecida a faculdade de fixar as funções do testamenteiro, havendo

que ressalvar apenas os limites legais correspondentes – art. 2325º - que decorrem do

caracter pessoal do testamento.

Na falta de estipulação pelo de cuius e com caracter supletivo o art.2326º fixa as

atribuições do testamenteiro:

Funções que respeitam ao funeral e sufrágios do testador

Execução do testamento

Vigilância de execução do seu cumprimento

Complementarmente poderá ainda exercer funções de cabeça-de-casal

Nos termos do art. 2326º al. a), o testamenteiro tem poderes para:

Cuidar do funeral do testador e pagar as respectivas despesas

Cuidas dos sufrágios do testador

O testamenteiro deverá exercer estas funções de harmonia com o que no testamento

se estabeleça ou na falta de estipulação observando os usos da terra.

3. ALIENAÇÃO DA HERANÇA

A ALIENAÇÃO DA HERANÇA: NATUREZA E FORMA

A alienação da herança e da quota hereditária respeita sempre a um conjunto de

bens. Mas, para cair na previsão das normas que a partir do art. 2124º a regem, a

alienação da herança só pode ocorrer após a aceitação e antes da partilha.

Previamente àquele acto, só o direito de suceder pode estar em causa; após a

partilha, a alienação passa a referir-se aos bens determinados que tenham

preenchido a posição do herdeiro.

O art. 2124º ao consagrar a possibilidade de alienação da herança ou do quinhão

hereditário estatui que ela esta sujeita as disposições reguladoras do negocio jurídico

que lhe der causa. Existe então nesta matéria uma situação semelhante à que ocorre

na cessão de créditos. A cessão de créditos (art. 578º/1), tal como a alienação da

herança, admitem varias causas jurídicas, mas não são propriamente actos

abstractos. O seu regime depende da modalidade do acto que em cada caso a

cessão ou a alienação reveste.

Ou seja, a alienação da herança só pode fazer-se a título oneroso ou a título gratuito

sendo que no primeiro caso pode também revestir modalidades diferentes (compra e

venda, dação em cumprimento, troca, etc.).

A alienação, independentemente da modalidade do acto que lhe der causa, é

sempre um negócio formal, embora as formalidades a que está sujeita a sua validade

não sejam sempre as mesmas, dependendo da natureza dos bens que a integram.

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 99

Conjugando o art. 2126º/1 e o art. 875º resulta que a alienação da herança ou do

quinhão hereditário deve ser feita por escritura pública ou por documento particular

autenticado se deles fizerem parte bens imóveis, ressalvando-se contudo a existência

de lei especial. Nos demais casos a alienação tem de constar de documento

particular (nº2).

OBJECTO DO ACTO DE ALIENAÇÃO

A alienação da herança ou do quinhão hereditário, em qualquer das suas

modalidades, respeita sempre a um conjunto de bens, que são tomados no negócio

como unidade. Deste modo, à primeira vista poder-se-ia pensar que a determinação

do objecto negocial estava automaticamente feita: por definição, ele seria a

universalidade logo como os seus elementos activos e passivos (encargos) – art. 2128º

primeira parte e art. 2129º.

O que foi dito anteriormente configura uma situação normal do negocio de alienação

da herança. Contudo é necessário apurar qual o objecto deste negocio. Tal importa

sobretudo aos casos em que a alienação é onerosa, uma vez que sendo gratuita, a

própria natureza do negocio retira sentido aquele pressuposto natural da alienação

da herança.

Nos termos do art. 2129º/1 prevê-se a hipótese de o alienante, antes da alienação, ter

disposto dos bens da herança: neste caso, fica obrigado a entregar ao adquirente o

seu valor. Nos termos do nº2 do artigo em análise se o alienante despendeu, de sua

conta, algo para satisfazer encargos da herança o adquirente, seja a título gratuito ou

oneroso deve reembolsar o alienante do que ele tenha despedido e pagar-lhe o que

a herança lhe dever.

ENCARGOS DA HERANÇA

A regra é a de o adquirente assumir os encargos independentemente de a alienação

ser a título gratuito ou oneroso – art. 2128º primeira parte.

Contudo esta regra poderia acarretar prejuízo para terceiros nomeadamente para os

credores da herança. Deste modo, da segunda parte do art. 2128º resulta que a

responsabilidade será solidária do alienante pelos encargos da herança. Ocorre uma

tutela da posição de terceiros. Nas relações internas entre o alienante e o adquirente,

aquele tem o direito de haver deste, a titulo de regresso, o valor total dos encargos por

ele satisfeitos.

ANÁLISE DO ART. 2125º

Importa ainda salientar o regime do art. 2125º que regula várias matérias que

constituem pontos de dúvida relacionados com a própria composição da herança ou

do quinhão alienados e com algumas vicissitudes do fenómeno sucessório que sobre o

objecto da alienação e reflectem.

Certos elementos integradores da universalidade só se consideram abrangidos

na alienação se nesse sentido for a vontade real dos outorgantes. Na falta de

tal vontade, nos termos do art. 2125º/3 consagra-se uma presunção que exclui

da alienação os diplomas e a correspondência do falecido e as suas

recordações de família de diminuto valor. Ou seja, sendo em geral coisas sem

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DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 100

especial significado económico, o mesmo já não se verifica quanto ao seu

valor extrapatrimonial, de natureza moral ou afectiva sendo que em regra terá

o herdeiro alienante particular interesse em as conservar.

Quanto às vicissitudes do fenómeno sucessório, nos termos do art. 2125º/1 e 2,

quanto ao objecto da alienação consagram-se presunções ilidíveis, ou seja,

que podem ser afastadas por estatuição das partes em sentido contrario:

Nº1: Quando ao benefícios que venham ao alienante, apos a

alienação, por efeito da caducidade de um legado, de certo encargo

ou de um fideicomisso a presunção vai no sentido de o beneficio

inerente à caducidade se considerar abrangido no objecto da

alienação. A razão fundamental deste regime reside no facto de se

tratar de benefícios adquiridos por efeito de uma circunstancia

acidental e em que a verificação da caducidade de algum modo faz

parte integrante da ale da posição do herdeiro. O adquirente, que

assume a posição do herdeiro, deve beneficiar dessa álea.

Nº2: existe um presunção que tem por excluída da alienação a parte

hereditária que ao alienante venha a caber, apos a alienação, por

virtude de fideicomisso ou do direito de acrescer. A razão desta

diferença de regime consiste em o beneficio, neste caso, ter a sua

origem assente na herança mas apesar disso não se fazer menção nele

no contrato de alienação, o que razoavelmente revela que as partes

podendo contar com esse beneficio o quiseram excluir do seu negocio.

ANÁLISE DO ART. 2127º

Pode dar-se o caso de havendo alienação da herança ou de quota hereditária, sem

especificação de bens, o alienante não vir a ser reconhecido como herdeiro. Se tal

ocorrer aquele responde pela alienação de coisa alheia, consoante a natureza

gratuita ou onerosa do negócio (art. 956º e 892º).

Se for reconhecido como herdeiro, mesmo que na herança não se reconheçam

certos bens que as partes, ou uma delas, supunham integrar a herança, nenhuma

responsabilidade cabe ao alienante. Como resulta, a contrario da norma, não se

aplica o regime da alienação de coisa alheia. Deste modo não fica excluída a

hipótese de, segundo os casos, haver erro sobre a base do negócio ou erro sobre os

motivos (art. 252º/2 e 1) e de ser intocável o seu regime.

DIREITO DE PREFERÊNCIA

A alienação de uma quota hereditária da herança indivisa apresenta alguma

proximidade com a situação que ocorre na compropriedade, na alienação do direito

dos comproprietários, sem prejuízo de no caso a situação jurídica dos co-herdeiros ser

diferente.

Se se tratar da venda ou da dação em pagamento de uma quota hereditária a

terceiros, aos demais co-herdeiros é atribuído o direito de preferência – art. 2130º/1

preferência legal e real.

Page 101: Direito das Sucessões - Apontamentos sobre a Sucessão em Geral

DIREITO DAS SUCESSÕES – DA SUCESSÃO EM GERAL FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 101

A norma em análise submete este direito de preferência ao regime que é fixado em

situação correspondente para os comproprietários (art. 1409º). A única diferença

regulada no art. 2130º/2 respeita ao prazo de exercício do direito havendo

comunicação para a preferência o prazo para a exercer é de 2meses.

4. LIQUIDAÇÃO E PARTILHA DA HERANÇA

I – LIQUIDAÇÃO DA HERANÇA

Remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página 333 e ss.

II – PARTILHA DA HERANÇA

Remete-se para Lições de Direito das Sucessões, página 351 e ss.