DEVER DE PROTEÇÃO SUFICIENTE AOS DIREITOS … · tinha esse plano para minha vida. Suas orações...

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO DEVER DE PROTEÇÃO SUFICIENTE AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS CAMILA SAVARIS CORNELIUS Itajaí-SC Agosto de 2017

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA – CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO

DEVER DE PROTEÇÃO SUFICIENTE AOS DIREITOS

FUNDAMENTAIS

CAMILA SAVARIS CORNELIUS

Itajaí-SC Agosto de 2017

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA – CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO

DEVER DE PROTEÇÃO SUFICIENTE AOS DIREITOS

FUNDAMENTAIS

CAMILA SAVARIS CORNELIUS

Dissertação submetida ao Curso de Mestrado em

Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do título

de Mestre em Ciência Jurídica.

Orientador: Professor Doutor José Antônio Savaris

Co-orientador: Professor Doutor Gabriel Real Ferrer

Itajaí-SC Agosto de 2017

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus, por ter me acompanhado

em toda essa jornada, concedendo-me forças nos momentos em que eu me sentia

tão incapaz de concluir o presente trabalho.

À minha mãe e ao Alcides, por terem me incentivado, num primeiro

momento, a ter feito o mestrado, terem acreditado em mim e, principalmente, por

sempre colocarem na minha cabeça de que todo esse investimento será gratificante

no final. Amo vocês!

Agradeço ao meu noivo, Luis Guilherme Fuchs, por ter me apoiado a

realizar o mestrado e a fazer a dupla titulação. Obrigada por todo o companheirismo

nessa trajetória, especialmente nos dias difíceis, em que você teve paciência para

me ouvir, repreender e dar bons conselhos. Amo demais você!

À minha vó, que sempre acreditou em mim e me fez acreditar que Deus

tinha esse plano para minha vida. Suas orações e seu amor sempre fizeram

diferença para mim em toda a minha trajetória. Sei que a minha ansiedade não é

fácil de ser controlada.

Ao meu orientador, mestre e tio, José Antonio Savaris. Saiba que você é

uma inspiração para mim. Você me mostrou como ter garra e determinação para

tudo na minha vida. Obrigada pelas palavras sábias que sempre me deram

animação nos momentos em que eu mais me sentia incapaz. Obrigada pela

paciência, deixando tudo mais simples do que eu pensava. Ter tido você como

orientador foi essencial e tornou essa etapa mais especial ainda! Muito obrigada!

Amo você.

Ao meu co-orientador Dr. Gabriel Real Ferrer e ao Prof. Dr. German

Valencia Martin, por toda a atenção concedida em Alicante, viabilizando que a dupla

titulação fosse concluída com muita alegria.

Abro um espaço aqui para agradecer a minha grande amiga Rafaela

Schmitt Garcia, a quem eu tive o grande prazer de conhecer nessa minha trajetória.

Muito obrigada pela companhia, experiência e alegrias concedidas em Alicante.

Também não poderia deixar de citar as outras grandes amizades que

pude fazer nessa etapa, pela ajuda e incentivo.

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A todos os professores do Programa de Mestrado da Univali por todos os

ensinamentos e conselhos para que a minha dissertação fosse concluída com

sucesso.

E, por fim, agradeço de antemão à banca examinadora por toda

contribuição que darão ao meu trabalho!

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a Coordenação do Curso de Mestrado em Ciência Jurídica, a Banca

Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí-SC, 31 de julho de 2017

Camila Savaris Cornelius

Mestranda

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADI Ação Declaratória de Inconstitucionalidade

CE Ceará

CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente

CP Código Penal

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e

emendas constitucionais posteriores

HC Habeas Corpus

ONU Organização das Nações Unidas

RE Recurso Extraordinário

STC Supremo Tribunal Constitucional

STF Supremo Tribunal Federal

TCF Tribunal Constitucional Federal Alemão

EU União Europeia

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ROL DE CATEGORIAS

CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO: Concepção da dogmática

constititucional, no sentido da eficácia normativa das normas constitucionais, e de

como o sistema normativo infraconstitucional é impactado justamente pela eficácia

dessas normas constitucionais. O sistema normativo como um todo deve guardar

uma compatibilidade formal e substancial quanto ao fiel atendimento e promoção

das normas constitucionais. Ao longo do presente trabalho também pode-se

visualizar a expressão “novo constitucionalismo”.

PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE: Em se tratando de princípio vivo, elástico,

prestante, ele protege o cidadão contra os excessos do Estado e serve de escudo à

defesa dos direitos e liberdades constitucionais. De tal sorte que urge, quanto antes,

extraí-lo da doutrina, da reflexão, dos próprios fundamentos da Constituição, em

ordem a introduzi-lo, com todo o vigor, no uso jurisprudencial.1

PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE: A ideia de

proporcionalidade como proibição da proteção deficiente dos direitos fundamentais.

O Estado só atuará legitimamente se oferecer, em favor dos direitos fundamentais

do cidadão, uma proteção que observe as exigências do princípio da

proporcionalidade. A finalidade é coibir a inação ou a atuação deficiente do Estado,

exigindo-lhe a adoção de medidas normativas suficientes para alcançar uma

proteção adequada e eficaz dos direitos fundamentais.2

ATIVISMO JUDICIAL: O Judiciário “deixou de ser um departamento técnico-

especializado e se transformou em um verdadeiro poder político, capaz de fazer

valer a Constituição e as leis, inclusive em confronto com os outros Poderes”.3

1 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 434.

2 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 85.

3 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n. 13, Madri, 2009, p. 18.

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JUDICIALIZAÇÃO: Significa que algumas questões de larga repercussão política ou

social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias

políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo em cujo âmbito se

encontram o Presidente da República, seus ministérios e a administração pública em

geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para

juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no

modo de participação da sociedade.4

MEIO AMBIENTE: Meio ambiente é a “integração e a interação do conjunto de

elementos naturais, artificiais, culturais e do trabalho que propiciem o

desenvolvimento equilibrado de todas as formas, sem exceções. Logo, não haverá

um ambiente sadio quando não se elevar, ao mais alto grau de excelência, a

qualidade da integração e da interação desse conjunto”.5 Cabe ainda mencionar a

definição trazida pela lei nº 6938 de 31 de agosto de 1981, em seu art. 3º: “Para os

fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - Meio ambiente, o conjunto de condições,

leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,

abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

4 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, o ativismo judicial e legitimidade democrática.

Disponível em: <http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Selecao.pdf>. Acesso em: 15 maio 2017.

5 FARIAS, Talden Queiroz. O conceito jurídico de meio ambiente. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, IX, n. 35, dez 2006. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1546>. Acesso em: 10 ago. 2017.

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SUMÁRIO

RESUMO p. 11

ABSTRACT p. 12

INTRODUÇÃO p. 13

1 A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO CONSTITUCIONALISMO

CONTEMPORÂNEO p. 16

1.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS - ASCENDÊNCIA E JUSTIFICAÇÃO p. 28

1.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO NÚCLEO DO SISTEMA NORMATIVO p. 35

1.3 A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - CONTRAPONTOS p. 43

2 PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE: PROIBIÇÃO DO

EXCESSO E INSUFICIÊNCIA p. 55

2.1 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO NORMA DE ÍNDOLE

CONSTITUCIONAL p. 58

2.2 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE p. 67

2.2.1. Princípio da proibição do excesso p. 73

2.3 PRINCIPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE p. 75

3 JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E O PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA

PROTEÇÃO INSUFICIENTE p. 86

3.1 ASCENSÃO DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E

O PROTAGONISMO DO JUDICIÁRIO NO NOVO CONSTITUCIONALISMO p. 87

3.2 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E OMISSÕES

INCONSTITUCIONAIS NA ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

p. 98

3.3 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E SUA

ESSENCIALIDADE NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE E BUSCA DO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL p.

108

CONSIDERAÇÕES FINAIS p. 117

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS p. 120

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RESUMO

A presente Dissertação está inserida na linha de pesquisa Direito Ambiental,

Transnacionalidade e Sustentabilidade. Ela analisa, no atual contexto metodológico,

o princípio constitucional da proibição da proteção insuficiente. Trata da eficácia dos

direitos fundamentais numa perspectiva que passou a ser denominada

constitucionalismo contemporâneo, identificando aspectos quanto a sua ascensão e

as justificativas de natureza moral e jurídica para sua efetivação. O texto percebe os

direitos fundamentais como núcleo do sistema normativo e, nessa linha de ideias,

apura pontos e contrapontos no sentido de sua efetivação pelas instâncias políticas

e judiciária para, nesse objetivo, examinar o princípio constitucional da

proporcionalidade em sua dupla face: a que proíbe o excesso da ação invasiva aos

direitos fundamentais e a que proíbe insuficência de proteção aos direitos

fundamentais. O princípio da proporcionalidade é identificado como norma de status

constitucional, e daí que emana sua eficácia protetiva dos direitos fundamentais

concebidos destacadamente em sua dimensão objetiva. O trabalho, por fim, enfrenta

o tema do argumento da proibição da proteção insuficiente na jurisdição

constitucional brasileira, identificando relação entre o atual protagonismo do Poder

Judiciário neste constitucionalismo pós Segunda Guerra e o maior campo de

aplicação do princípio constitucional da proibição da proteção insuficiente

notadamente no trato das omissões constitucionais, tal como opera a Suprema

Corte, bem como a importância de sua observação e aplicação na seara do direito

ambiental, seja ele tratado como bem jurídico, seja ele tratado como direito

fundamental.

Palavras-chave: Princípio da proibição da proteção insuficiente. Judiciário. Direitos

fundamentais. Ativismo judicial. Judicialização. Meio ambiente.

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ABSTRACT

This dissertation is part of the line of research Environmental Law, Transnationality

and Sustainability. It analyzes, in the current methodological context, the

constitutional principle of the prohibition of insufficient protection. It deals with the

efficacy of fundamental rights, from a perspective that has come to be called

contemporary constitutionalism, identifying aspects of its rise, and justifications of a

moral and juridical nature for its effectiveness. The text perceives fundamental rights

as being at the heart of the normative system, and in this line of thought, it

establishes points and counterpoints in the sense of their effectiveness by the

political and judicial instances. This study therefore examines the constitutional

principle of proportionality in its twofold role: prohibiting excessive invasion of

fundamental rights, and prohibiting insufficient protection of fundamental rights. The

principle of proportionality is identified as a norm of constitutional status, hence its

protective efficacy emanates from fundamental rights, conceived specifically in their

objective dimension. Finally, the paper addresses the theme of the argument of the

prohibition of insufficient protection in the Brazilian constitutional jurisdiction,

identifying the relationship between the current role of the Judiciary in this

constitutionalism after the Second World War, and the wider scope of application of

the constitutional principle of prohibition of insufficient protection in the treatment of

constitutional omissions, as the Supreme Court operates, as well as the importance

of its observation and application in the area of environmental law, whether it is

treated as a legal right, or as a fundamental right.

Keywords: Principle of the prohibition of insufficient protection. Judiciary.

Fundamental Rights. Judicial activism. Judiciary. Environment.

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INTRODUÇÃO

O objetivo institucional da presente dissertação é a obtenção do título de

Mestre em Ciência Jurídica pelo Curso de Mestrado em Ciência Jurídica da Univali.

O seu objetivo científico é analisar de que forma o princípio da proibição

da proteção insuficiente é uma ferramenta eficaz para efetivar a proteção dos

direitos fundamentais, reconhecidos como núcleo do sistema normativo, e essenciais

para proporcionar a dignidade da pessoa humana, bem como ser uma justificativa

para essa atividade mais ativa do Poder Judiciário, reconhecida no presente trabalho

como ativismo judicial. Outrossim, o objetivo também é aprofundar de que forma o

referido princípio poderia dar uma maior atenção ao direito fundamental ao meio

ambiente saudável, proporcionando, consequentemente, a busca ao

desenvolvimento sustentável.

Para a pesquisa foram levantadas as seguintes hipóteses:

a) Os direitos fundamentais exigem proteção suficiente em face do seu

caráter vinculante?

b) O princípio da proporcionalidade é uma norma de natureza

constitucional, que se desdobra no princípio da proibição da proteção insuficiente?

c) O poder judiciário no exercício da jurisdição constitucional que emprega

o princípio da proibição da proteção insuficiente, reconhece a invalidade da ação ou

omissão estatal para a proteção dos direitos fundamentais?

Os resultados do trabalho de exame das hipóteses estão expostos na

presente dissertação, de forma sintetizada, como segue.

Principia-se, no Capítulo 1, falando sobre os direitos fundamentais. Trata-

se num primeiro momento de falar de sua origem e importância, visto que esses

direitos não surgiram todos de uma vez só, mas sim caracterizam vitórias da

sociedade em cada fase histórica, tratando-se, portanto, de uma evolução. No final,

expõe-se sobre como se dá a efetividade desses direitos no dia a dia da sociedade,

bem como de que forma o Judiciário lida com essa efetividade.

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O Capítulo 2 disserta sobre o princípio da proporcionalidade, ponto central

da presente pesquisa, uma vez que originalmente sempre foi entendido pela faceta

da proibição do excesso, ou seja, de que o Estado não pode se exceder, a ponto de

violar a esfera individual e liberdades do cidadão. Ocorre que, passou-se a ser

entendido que o Estado deve atuar no sentido de dar efetividade aos direitos

fundamentais, sob pena desses direitos não produzirem os efeitos desejados pela

Carta Magna. Sendo assim, ficou reconhecida a outra faceta do princípio da

proporcionalidade, o princípio da proibição da proteção insuficiente.

Neste capítulo ainda, será abordada a diferença entre o princípio da

proporcionalidade e o da razoabilidade, ainda que no ordenamento jurídico brasileiro

eles sejam tratados como sinônimos, originalmente eles são tratados distintamente,

conforme será abordado.

O Capítulo 3 dedica-se a falar do tema central da presente pesquisa, o

princípio da proibição da proteção insuficiente, analisando sua origem, bem como

seu significado pela doutrina e para jurisprudência. Para tanto, realizou-se uma

pesquisa de julgados do Supremo Tribunal Federal que possuíam como fundamento

principal em sua fundamentação a utilização do princípio.

E, para finalizar o capítulo, buscou-se analisar de que forma a utilização

do princípio da proibição da proteção insuficiente é importante para dar efetividade

ao direito fundamental a um meio ambiente saudável, mostrando as implicâncias que

o assunto possui no tocante a outros direitos fundamentais importantes ligados ao

núcleo da Constituição Federal de 88, a busca da dignidade da pessoa humana.

Nas considerações finais, demonstra-se que o princípio da proibição da

proteção insuficiente trata-se de uma ferramenta muito útil utilizada pelo Poder

Judiciário, por possibilitar que omissões inconstitucionais sejam evitadas,

possibilitando uma maior proteção dos direitos fundamentais, bem como sua

efetividade, tornando possível o acesso a uma vida digna.

Ainda, em atendimento à linha de pesquisa escolhida, foram feitas

considerações em relação ao emprego do princípio da proibição da proteção

insuficiente na seara do meio ambiente, também considerado um direito

fundamental, demonstrando que o princípio irá também possibilitar que os objetivos

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buscados pela “sustentabilidade” dêem um passo à frente, visto sua ligação com um

desenvolvimento digno das gerações atuais e das gerações futuras.

O método utilizado na fase de Investigação foi o dedutivo; na fase de

Tratamento dos Dados foi o cartesiano, e no Relatório da Pesquisa o método

utilizado foi o dedutivo.

As técnicas de investigação utilizadas foram a coleta documental e

bibliográfica, realizada por meio de materiais como artigos, livros, dissertações,

teses de doutorado e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Nesta dissertação, as categorias principais estão grafadas com a letra

inicial em maiúscula e os seus conceitos operacionais são apresentados no texto ou

em rodapé quando mencionados pela primeira vez. O rol de categorias básicas foi

composto por constitucionalismo contemporâneo, princípio da proporcionalidade,

princípio da proibição da proteção insuficiente, ativismo judicial e judicialização.

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CAPÍTULO 1

A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO6

Após a Segunda Guerra Mundial e como uma forma de reação aos

regimes jurídicos autoritários, diversos países sentiram a necessidade de um novo

direito constitucional com a inserção de valores morais. Dentre esses países, estão a

Alemanha e os de cultura italiana e espanhola, bem como diversos países da

América Latina, entre eles o Brasil.7

Assim, novas linhas de pensamento8 passaram a ser desenvolvidas, em

que todo e qualquer instituto deveria passar sob as lentes das normas

constitucionais, reconhecendo a primazia da Constituição e, principalmente, o poder

normativo que os princípios constitucionais expressos ou não possuem.

Trata-se, segundo Luigi Ferrajoli9, de um momento histórico em que os

direitos fundamentais estabelecidos nas constituições e cartas internacionais devem

ser garantidos e satisfeitos no sentido de dar efetividade.

Boldrini cita algumas mudanças que ocorreram, tais como o implemento

de uma legalidade substancial, em que a validade da lei já não era mais aferida

somente pelo processo de elaboração, mas também pelo respeito aos princípios e

6 Este capítulo contém parte do artigo SAVARIS, Camila. Neoconstitucionalismo, Argumentação

Jurídica e a Sustentabilidade como Equação para a Preservação Ambiental frente ao Desenvolvimento Econômico. In: ROSA, Alexandre Morais da; BONISSONI, Natammy Luana de Aguiar (orgs.). Argumentação Jurídica e o Direito Contemporâneo. Itajaí: Univali, 2016. p. 89- 111.

7 Os juízes constitucionais aprenderam a realizar sua função a contar dos novos parâmetros interpretativos, a partir dos quais a razoabilidade judicial é mais complexa. Entram em jogo as técnicas interpretativas próprias dos princípios constitucionais, a ponderação, a proporcionalidade, a razoabilidade, a maximização dos efeitos normativos dos direitos fundamentais (tradução livre). CARBONELL, Miguel; JARAMILLO, Leonardo García. El canon neoconstitucional. Madri: Trotta, 2010. p. 154-5.

8 Há atualmente na dogmática constitucional todo um rol de pensadores, de diversas perspectivas, ora de uma perspectiva neoconstitucional, ora de uma perspectiva de uma metodologia de efetividade das normas constitucionais, ora de uma perspectiva do constitucionalismo contemporâneo sustentada por Lenio Streck em suas obras Verdade e Consenso ou Hermenêutica Jurídica e(m) Crise. O que há de comum nessas diferentes perspectivas está no fato de que os direitos fundamentais gozam de um papel proeminente na ordem jurídica.

9 REYES, Manuel Aragón. La Constitución como paradigma. In: CARBONELL, Miguel (org.). Teoría del neoconstitucionalismo: Ensayos escogidos. Madri: Trotta - UNAM, Instituto de Investigaciones Jurídicas, 2007. p. 72.

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direitos consagrados na Constituição.10

Cite-se nesse cenário, a perspectiva justeórica denominada

“neoconstitucionalismo”11, que mudou a forma de aplicação e interpretação do direito

pelos julgadores, ampliando as possibilidades metodológicas no campo da aplicação

judicial para além da subsunção, inserindo um cunho valorativo, conforme Miguel

Carbonell destaca em sua obra “El canon neoconstitucional”:

Los jueces constitucionales han tenido que aprender a realizar su función bajo parámetros interpretativos nuevos, a partir de los cuales el razonamiento judicial se hace más complejo. Entran em juego las técnicas interpretativas propias de los principios constitucionales, la ponderación, la proporcionalidad, la razonabilidad, la maximización de los efectos normativos de los derechos fundamentales.12

Trata-se, portanto, de uma teoria do direito caracterizada pela

impregnação da Constituição Federal no ordenamento jurídico, denominada

segundo Riccardo Guastini de “constitucionalização do ordenamento jurídico”13, que

além das características mencionadas, o doutrinador Prieto Sanchis14 acrescenta:

Mais princípios em vez de regras; mais ponderação do que subsunção; mais análise individual e concreta do que análise geral e abstrata; mais poder judiciário e menos poder executivo e legislativo; mais aplicação da Constituição em vez de aplicação de leis ordinárias, e por último, coexistência de uma constelação plural de valores, que podem às vezes tendencialmente ser contraditórios, em vez de homogeneidade ideológica

10 BOLDRINI, Rodrigo Pires da Cunha. Garantia de direitos e separação dos Poderes. Dissertação

de Mestrado. São Paulo: FADUSP, 2012. p. 207-208. 11 O neoconstitucionalismo é um dos movimentos de efetividade das normas constitucionais e de

centralização dos direitos fundamentais, podendo ser percebido mesmo fora dos que se percebem filiados à perspectiva neoconstitucional. Trata-se, com efeito, da ascenção de uma perspectiva de efetividade das normas constitucionais que pode ser percebida em diversos autores, tais como em CLÈVE, Clémerson Merlin. A eficácia dos direitos fundamentais sociais. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, v. 14, n. 54, p. 28-39, jan./mar. 2006; HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Tradutor: Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris,1991; BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas - limites e possibilidades da constituição brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar,1993; SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 4ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004; BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional.14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

12 Os juízes constitucionais tiveram que aprender a realizar sua função de acordo com os novos parâmetros interpretativos, pelos quais a razoabilidade judicial se faz mais complexa. Entraram em jogo as técnicas interpretativas próprias dos princípios constitucionais, a ponderação, a proporcionalidade, a razoabilidade e a maximização dos efeitos normativos dos direitos fundamentais. (Tradução Livre) In: CARBONELL, Miguel; JARAMILLO, Leonardo García. El canon neoconstitucional. p. 154-5.

13 GUASTINI, Riccardo. La “constitucionalización” del ordenamento jurídico: el caso italiano. In: CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo(s). Madri: Trotta, 2003.

14 PIETRO SANCHIS, Luis. Neoconstitucionalismo y ponderación judicial. In: CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo(s). Madri: Trotta, 2003. p.131.

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em torno de um conjunto de princípios coerentes entre si.

Nesse contexto, a hermenêutica assume um papel de grande

importância, possibilitando que o Direito seja mais autônomo e mais realista que

centrado no dia a dia da sociedade, nos conflitos sociais que surgem, possibilitando

o alcance do real sentido da norma/lei, demonstrando a força normativa da

Constituição.15

Ocorre que é preciso reconhecer que o neoconstitucionalismo não segue

sem críticas de diversas matizes da teoria jurídica. Na medida em que confere

elevada proeminência ao poder judiciário, comprometendo, por outro lado, a

segurança jurídica, contribuindo quiçá, para uma “corrupção do próprio texto da

Constituição”16.

Nessa perspectiva de força normativa das disposições constitucionais ou

de efetividade das normas constitucionais, sustenta-se, de qualquer modo, que a

realização dos direitos fundamentais nem sempre carecerá de intervenção

parlamentar. Com efeito, os princípios constitucionais formam uma ampla proteção

aos direitos fundamentais, que dotados de eficácia normativa, abrem espaço para

maior ou mais ampla atuação do poder judiciário.

É justamente nessa perspectiva de normas constitucionais que se têm o

constitucionalismo contemporâneo assegurando um ambiente de efetividade das

normas constitucionais e uma atuação mais acentuada do poder judiciário com

respeito às instâncias políticas e à democracia. De acordo com o ensinamento de

Lenio Streck17:

[...] o Constitucionalismo Contemporâneo representa um

15 STRECK, Lenio Luiz. A hermenêutica jurídica nos vinte anos da Constituição do Brasil. In:

MOURA, Lenice S. Moreira de (org.). O novo constitucionalismo na era pós-positivista. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 65-66.

16 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto: o constitucionalismo contemporâneo. Revista do CEJUR/TJSC: Prestação Jurisdicional, Florianópolis, v. 1, n. 2, p. 27-41, out. 2014. ISSN 2319-0884. Disponível em: <https://revistadocejur.tjsc.jus.br/cejur/article/view/64>. Acesso em: 14 ago. 2017.

17 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – o constitucionalismo contemporâneo. Revista do CEJUR/TJSC: Prestação Jurisdicional, Florianópolis, v. 1, n. 2, p. 27-41, out. 2014. ISSN 2319-0884. Disponível em: <https://revistadocejur.tjsc.jus.br/cejur/article/view/64>. Acesso em: 14 ago. 2017.

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redimensionamento na práxis político-jurídica, que se dá em dois níveis: no plano da Teoria do Estado e da Constituição, com o advento do Estado Democrático de Direito, e no plano da Teoria do Direito, no interior da qual acontece a reformulação da teoria das fontes (a supremacia da lei cede lugar à onipresença da Constituição), da teoria da norma (devido à normatividade dos princípios) e da teoria da interpretação (que, nos termos que proponho, representa uma blindagem às discricionariedades e aos ativismos).

Esse movimento é uma perspectiva que reflete essa ideia de

centralização dos direitos fundamentais de efetividade das normas constitucionais.

Em complemento, se reconhece que a Constituição é substância que possui não

somente uma supremacia formal, mas também uma supremacia

material/axiológica18.

Para os fins do presente trabalho, deve-se compreender como

constitucionalismo contemporâneo, não limitando-se na específica direção em que

empreende Lenio Streck, mas mais no sentido de um contexto justeórico que

percebe a importância e a necessidade da efetividade das normas constitucionais,

bem como a centralidade dos direitos fundamentais para um Estado Democrático

Constitucional.

Na perspectiva do Constitucionalismo Contemporâneo que defendo — portanto, para além das diferentes formas de positivismo —, a juridicidade não se dá nem subsuntivamente, nem dedutivamente. Ela se dá na applicatio, em que interpretar e aplicar não são atos possíveis de cisão.19

Em outras palavras, a partir dessa perspectiva, os direitos fundamentais

têm reconhecido o seu papel proeminente, ostentando estatura jurídica máxima,

reclamando proteção, mesmo que ausente a intervenção das instâncias políticas

originariamente responsáveis pela formulação de políticas públicas.

Essa posição de destaque adquirida pela Constituição é determinante

para todo o ordenamento jurídico, visto que toda e qualquer norma do ordenamento

18 BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos

fundamentais e a construção do novo modelo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p.84. 19 STRECK, Lenio Luiz. Porque a ponderação e a subsunção são inconsistentes. In: Revista

Consultor Jurídico, 26 abr. 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-abr-26/observatorio-constitucional-porque-ponderacao-subsuncao-sao-inconsistentes>. Acesso em: 21 ago. 2017.

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jurídico deve passar pelo filtro da Constituição, devido à imperatividade de todos os

seus ditames.

Os ensinamentos de Hans Kelsen expunham que a estrutura de todas as

normas possuía um “dever-ser”, ou seja, possuía condições para que houvesse a

aplicação de uma medida repressiva, caso uma norma não fosse respeitada. Assim,

toda vez que uma norma é recepcionada pela Constituição, ela adquire essa

imperatividade, bem como as normas de cunho infraconstitucional.

Nesse diapasão, é importante destacar os ensinamentos de Luís Roberto

Barroso sobre essa imperatividade, visto que “a sua inobservância há de deflagrar

um mecanismo próprio de coação, de cumprimento forçado, apto a garantir-lhe a

imperatividade, inclusive pelo estabelecimento de consequências da insubmissão ao

seu comando.” 20

Partindo dessa premissa, a Constituição Federal, sendo o topo do

ordenamento jurídico e, consequentemente, por servir de fundamento de validade

para outras normas infraconstitucionais devido a sua posição central, já tem

embutido em sua estrutura um caráter obrigacional, cuja desobediência de seu

enunciado acarreta em uma sanção.

Luís Roberto Barroso e Ingo W. Sarlet, antes de adentrarem na eficácia

das normas, sejam elas direitos fundamentais ou atos jurídicos em geral, fazem a

distinção entre existência, validade e eficácia, visto que são termos correlacionados

e que resultam na efetividade das normas e da aplicabilidade dos direitos

fundamentais.

A eficácia dos direitos fundamentais, prevista no art. 5º, §1º da

Constituição, sendo em especial uma inovação trazida pela ordem de 1988, dispõe

que: “ [...] as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação

imediata”. Esse dispositivo gera muitas dúvidas por parte da doutrina, pois a

realidade mostra que, apesar desse dispositivo implicar na aplicabilidade imediata

das normas que dispõe sobre direitos e garantias fundamentais, isso não quer dizer

20 BARROSO, Luís Roberto. Temas de direito constitucional. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar,

2002. p. 83.

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que a eficácia é aquela desejável por todos.21

Essa problemática, na visão de Ingo W. Sarlet é justificável, visto que

essas normas possuem uma estrutura complexa, bem como funções diversificadas e

âmbito de aplicação heterogêneo, o que implica a observação da intervenção do

legislador infraconstitucional, que muitas vezes impõe limites e condições para a

aplicabilidade dessas normas.

Como exemplo, dispõe André Pucinnelli Júnior22:

[...] as normas que consagram direitos fundamentais individuais e políticos são de aplicação imediata, enquanto muitas outras que veiculam direitos sociais e econômicos são de eficácia limitada, exigindo, no mais das vezes, integração normativa (regulamentação) para se aperfeiçoarem e surtirem todos os efeitos desejados.

Nessa mesma linha de raciocínio, para explicar tal complexidade, de

acordo com Luís Roberto Barroso, dependendo da técnica de positivação, as

normas podem ser de três tipos: as normas de organização, as normas definidoras

de direitos (direitos fundamentais) e as normas programáticas. Dessa forma, como

esclarece Sarlet23, “[...] a forma de positivação e a função exercida pelos direitos

fundamentais se encontram umbilicalmente ligadas à sua eficácia e aplicabilidade”.

No entanto, apesar de todas essas constatações, é importante destacar

que os direitos fundamentais como previstos no rol de enunciados normativos da

Constituição Federal, sendo essa localizada no ápice do ordenamento jurídico,

implica necessariamente a observância das normas infraconstitucionais aos ditames

e valores defendidos na Constituição, sob pena de serem consideradas

inconstitucionais. Ou seja, “[...]é a lei que se move no âmbito dos direitos

fundamentais e não o oposto”.24

21 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito

constitucional. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 327. 22 PUCCINELLI JÚNIOR, André. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

p. 211. 23 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional.

11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 274. 24 CANOTILHO, J. J. Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para

a compreensão das normas constitucionais programáticas, p. 363, citando a obra de Herbert

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Outra dúvida quanto à interpretação do art. 5º, §1º da Constituição se

refere à identificação dos direitos fundamentais que se aplicam a tal artigo, ou seja,

se há a exclusão de quaisquer categorias de direitos fundamentais dessa regra. Em

relação a isso, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a

Constituição “[...] não estabeleceu distinção desta natureza entre os direitos de

liberdade e os direitos sociais, encontrando-se todas as categorias de direitos

fundamentais sujeitas, em princípio, ao mesmo regime jurídico”.25

Na prática, contudo, não é isso que ocorre, pois são os direitos sociais de

caráter prestacional os que possuem maior problema de eficácia do rol de direitos

fundamentais previstos na Constituição, diferentemente do que ocorre com os

direitos sociais de defesa. Como sustenta Sarlet26, a intervenção do legislador pode

até ser relevante nesses casos, mas não impede que haja efeitos da norma por si

só, apesar de esse não ser o entendimento majoritário do Supremo Tribunal Federal,

que defende a essencialidade da atuação do legislador para a devida eficácia

dessas normas.

Ainda que, em relação a alguns direitos sociais de cunho prestacional, se

exija, em regra, uma maior intervenção do legislador para que esses direitos sejam

satisfeitos, a partir do entendimento da efetividade das normas constitucionais, é

possível compreender que são eles dotados de um mínimo de eficácia, de modo a

suficientemente assegurar autênticos direitos subjetivos.

Nesse ponto, dá razão Humberto B. Ávila ao definir “a garantia do núcleo

essencial dos direitos fundamentais”, ou seja, a mínima eficácia que esse direito

deve ter para ser considerado um direito fundamental. Ou, de acordo com suas

palavras, “a parcela do conteúdo de um direito sem a qual ele perde a sua mínima

eficácia, deixando, com isso, de ser reconhecível como um direito fundamental”.27

Krüger, Grundgesetz und Kartellgesetzgebung; SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 328.

25 SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo W. Direitos fundamentais no Supremo Tribunal Federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 307; SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 263.

26 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 277.

27 ÁVILA, Humberto Bergmann. Conteúdo, limites e intensidade dos controles de

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Dessa ideia, pode-se ainda extrair os limites que são impostos ao

legislador no momento de definir o alcance da aplicação dos direitos fundamentais,

especialmente esses de cunho prestacional, que exigem uma maior intervenção. Ou

seja, até mesmo o legislador, ou qualquer órgão público deve respeitar o “núcleo

essencial dos direitos fundamentais”.

No que tange à eficácia dos direitos fundamentais, cumpre destacar a

finalidade primordial dos mesmos, que desde o início do presente estudo vem sendo

destacado, qual seja, a de proteção do indivíduo e da sociedade contra as

ingerências do Estado, tal como destaca José Carlos Vieira Andrade “[...] os direitos

fundamentais eram vistos, deste modo, como um instituto específico das relações

entre o indivíduo e o Estado, consagrado com um fim determinado: a salvaguarda da

liberdade individual e social.” 28

Posteriormente, essa finalidade acabou se estendendo. Ou seja, os

direitos fundamentais passaram a proteger os indivíduos de terceiros particulares,

sendo denominado por André Puccinelli Júnior e outros doutrinadores como “eficácia

horizontal” para apontar a relação de eficácia desses direitos nas relações entre

particulares.

Em relação à eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre

particulares, a discussão inicial sobre o assunto ocorreu na Alemanha com a decisão

proferida no caso Luth pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha em 195829

razoabilidade, de proporcionalidade e de excessividade das leis. Revista de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2004. p. 263-374; SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 356.

28 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos, liberdades e garantias no âmbito das relações entre particulares. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 273.

29 O caso Luth é considerado o mais importante da história do constitucionalismo alemão pós-guerra, na seara dos direitos fundamentais. Trata-se de ação ingressada por Veit Harlan – produtor de cinema que no auge do nazismo foi o principal responsável pelos filmes de divulgação das ideias nazistas – em face de Eric Luth, que antes do lançamento do filme “Amada Imortal”, ele e vários judeus resolveram boicotar o produtor. Esse sustentou que Eric Luth violava o Código Civil alemão, visto que todo aquele que causa prejuízo deve cessar o ato danoso e reparar os danos causados. A princípio a ação foi julgada procedente pelo Tribunal Estadual de Hamburgo. Mas, em recurso de apelação, Eric Luth invocou a garantia à liberdade de expressão da Lei Fundamental Alemã, Art. 5 I 1 GG, fazendo com que o Tribunal Superior de Hamburgo julgasse a reclamação procedente. Nessa decisão, “foram lançadas as bases, não somente da dogmática do direito fundamental da liberdade de expressão e seus limites, como também de uma dogmática geral (Parte Geral) dos direitos fundamentais […]. Também foram lançadas as bases dogmáticas

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(BVerfGE 7, 198-230), que além de reconhecer o efeito irradiante dos direitos

fundamentais, provou que os direitos fundamentais não existiam somente para

defender os indivíduos contra os atos do poder do Estado, mas também contra os

atos abusivos dos próprios particulares30.

Soma-se a isso o fato de ser reconhecida ao Estado a função de proteger

a parcela mais fraca e desfavorecida da sociedade, bem como promover medidas

para que haja mudanças na sociedade de “progresso, de justiça e de bem-estar”.31

Sobre a eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, ela

surgiu quando fora percebida que a opressão e violência não advinha somente dos

poderes do Estado, mas também de outro particular, quando os interesses eram

divergentes. É tal como Cristiane Paglione Alves32 destaca:

A eficácia horizontal dos direitos fundamentais, também chamada de eficácia dos direitos fundamentais entre terceiros ou de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, decorre do reconhecimento de que as desigualdades não se situam apenas na relação Estado/particular, como também entre os próprios particulares, nas relações privadas.

André Puccinelli Júnior ainda acrescenta que “os efeitos que os direitos

fundamentais irradiam são diversos e, de certa maneira, menos enérgicos do que os

produzidos verticalmente nas relações com o Poder Público”.33

Em seguida, Cristiane Paglione Alves fala da “eficácia horizontal direta ou

imediata”, defendendo que a aplicabilidade dos direitos fundamentais nas relações

das figuras da Drittwirkung e Ausstrahlungswirkung (eficácia horizontal) dos direitos fundamentais, do efeito limitador dos direitos fundamentais em face de seus limites (Wechselwirkung), da exigência de ponderação no caso concreto e da questão processual do alcance da competência do TCF no julgamento de uma Reclamação Constitucional contra uma decisão judicial civil”. Para mais informações verificar em: LIMA, George Marmelstein. 50 anos do Caso Luth: o caso mais importante da história do constitucionalismo alemão pós-guerra. Disponível em: <https://direitosfundamentais.net/2008/05/13/50-anos-do-caso-luth-o-caso-mais-importante-da-historia-do-constitucionalismo-alemao-pos-guerra/>. Acesso em: 26 set. 2016.

30 SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre proibição de excesso e de insuficiência. In: Revista de Estudos Criminais. n. 12, ano 3. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2003. p. 86.

31 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos, liberdades e garantias no âmbito das relações entre particulares. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 273.

32 ALVES, Cristiane Paglione. A eficácia horizontal dos direitos fundamentais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11648>. Acesso em: 29 jun. 2017.

33 PUCCINELI JÚNIOR, André. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva. 2013. p. 212.

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entre particulares se dá de maneira direta. Acrescenta que tal teoria surgiu na

Alemanha, por um magistrado do Tribunal Federal do Trabalho chamado Hans Carl

Nipperdey, na década de 50.

Gurría complementa o entendimento sobre a eficácia horizontal imediata,

destacando a teoria da unmittelbare Drittwirkung nos seus estudos, que assim é

definido:

[...] la unmittelbare Drittwirkung defiende que los derechos fundamentales no son valores sino verdaderos derechos subjetivos contenidos en la Constitución y, como tales, exigibles directamente por el individuo que los ostenta frente a sus semejantes, sin que sea necesaria la mediación de un órgano estatal.34

Trata-se de uma teoria que defende que um direito existe independente

que haja lei o regulamentando, pois o simples fato de estar na Constituição já gera

direito e deveres para todos.

De acordo com Ingo W. Sarlet, a teoria da eficácia horizontal imediata

pode ser aplicada, porém deve-se respeitar o princípio da liberdade de ambas as

partes, “somente se admitindo eficácia direta dos direitos fundamentais na hipótese

de lesão ou ameaça ao princípio da dignidade da pessoa humana ou aos direitos da

personalidade”.35

Esse mesmo autor destaca ainda a eficácia horizontal mediata,

representada pela teoria de mittelbare Drittwirkung, ligado à dimensão objetiva36 dos

34 A unmittelbare Drittwirkung defende que os direitos fundamentais não são valores, senão

verdadeiros direitos subjetivos contidos na Constituição e, como tais, exigíveis diretamente pelo indivíduo que os possui frente a seus semelhantes, sem que seja necessária a mediação de um órgão estatal. In: GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest. Const., México, n. 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 21 fev. 2017.

35 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 392-400. In: ALVES, Cristiane Paglione. A eficácia horizontal dos direitos fundamentais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11648>. Acesso em: 29 jun. 2017.

36 A dimensão objetiva será tratada com mais detalhes no item 3 da presente pesquisa, porém, para fins de instrução, a dimensão objetiva trata-se de uma das faces dos direitos fundamentais, juntamente com a dimensão subjetiva. Em linhas gerais, a dimensão objetiva se refere aos valores consagrados nos direitos fundamentais, valores estes conquistados ao longo da história, que

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direitos fundamentais, definido da seguinte forma:

La mittelbare Drittwirkung es producto de la dimensión objetiva de los derechos fundamentales, lo que significa, como ya dijimos, que el Estado tiene la obligación ya no sólo de abstenerse en la intromisión de la esfera jurídica de los particulares, sino también de garantizar su efectividad en las relaciones privadas, en tanto que los derechos fundamentales son ahora valores objetivos del ordenamiento jurídico.37

Além das teorias acima destacadas, Cristiane Paglione Alves38 evidencia

ainda a teoria da ineficácia horizontal dos direitos fundamentais, aplicada pela

doutrina norte-americana. Como o próprio nome indica, não existe eficácia dos

direitos fundamentais nas relações entre particulares.

José Carlos Vieira de Andrade destaca ainda outra teoria, defendida por

alguns autores, denominada teoria da validade absoluta (erga omnes) dos direitos

fundamentais.39 Aqui ganha destaque a violação dos direitos fundamentais por

grupos sociais que possuem maior poder social e econômico. Trata-se, como o

próprio autor destaca, de:

[...] os direitos fundamentais deveriam valer como direitos objetivos contra entidades privadas que constituam verdadeiros poderes sociais ou mesmo perante individuos que disponham, na relação com outros, de uma situação real de poder, que possa equiparar-se, nesse ponto concreto, à supremacia do Estado.40

Demonstra-se, dessa forma, que a aplicabilidade dos direitos

caracterizam determinada sociedade e, consequentemente, geram efeitos no ordenamento jurídico no momento de aplicação e interpretação de determinada norma jurídica.

37 A mittelbare Drittwirkung é produto da dimensão objetiva dos direitos fundamentais, o que significa, como já dissemos, que o Estado tem a obrigação não somente de abster-se de intrometer-se na esfera jurídica dos particulares, mas também de garantir sua efetividade nas relações privadas, principalmente nesse momento em que os direitos fundamentais são valores objetivos do ordenamento jurídico. (Tradução livre). In: GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest. Const., México, n. 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 21 fev. 2017.

38 ALVES, Cristiane Paglione. A eficácia horizontal dos direitos fundamentais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11648>. Acesso em: 29 jun. 2017.

39 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos, liberdades e garantias no âmbito das relações entre particulares. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 276.

40 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos, liberdades e garantias no âmbito das relações entre particulares. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 277.

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fundamentais cabe a todos, ou seja, “estabelece a vinculação de todos os órgãos

públicos e particulares aos direitos fundamentais, no sentido de que os primeiros

estão obrigados a aplicá-los, e os particulares a cumpri-los”41 e respeitá-los.

Nessa seara, cabe destacar que dentre todos os Poderes Públicos, no

que tange à aplicabilidade dos direitos fundamentais no interesse dos particulares e

seus litígios, o Poder Judiciário é o que possui o destaque maior, visto que muitos

dos direitos fundamentais, especialmente os sociais, não são regulados pelo

legislador, havendo portanto questionamentos quanto até que ponto o Judiciário

pode intervir na concessão desses direitos aos jurisdicionados.

Por um lado, tal questão é sanada pelo art. 5º, XXXV da CRFB, que

determina que o Judiciário é o guardião da Constituição. Bem como, analisando sua

atuação juntamente com o controle de constitucionalidade, pode-se concluir a

importância desse órgão na efetivação dos direitos fundamentais, pois, como

destaca Alexandre de Moraes42:

[...] o controle de constitucionalidade configura-se como verdadeira primordial garantia de supremacia dos direitos humanos fundamentais previstos na Constituição Federal, que, além de configurarem, conforme já analisado, limites ao poder do Estado, são também parcela da legitimação do próprio Estado, determinando seus deveres e tornando possível o processo democrático em um Estado de direito.

Além disso, sabe-se que para a consagração do Estado Democrático de

Direto é de extrema importância a existência de um Poder Judiciário, visto que ele é

o principal Poder do Estado que está diretamente ligado à sociedade, por lidar

continuamente com suas pretensões.

Assim, o objetivo desta sessão foi destacar que desde de diferentes

bases e de distintos modos de se compreender o papel do Judiciário na produção do

Direito, há uma comunidade que demonstra a necessidade de se conceder efeitos

às normas constitucionais, e de que a Constituição seja uma garantia real na

41 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional.

11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 269. 42 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º

a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 38.

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efetividade de direitos fundamentais.

1.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS: ASCENDÊNCIA E JUSTIFICAÇÃO

Foi com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789, na

França, que a expressão “direitos fundamentais” foi utilizada pela primeira vez.43

Mas sua ideia nos remete à um contexto histórico muito mais antigo, tal

como o Código de Hamurabi, com o objetivo de estabelecer os ideários de justiça,

igualdade e dignidade que todo homem deveria ter.44

Na Inglaterra, foi a Magna Carta de João sem Terra que trazia em seu

texto inúmeros direitos que atualmente são consagrados como direitos

fundamentais, como por exemplo, o princípio da legalidade e da irretroatividade das

leis.45

Notadamente, a referência a eles nem sempre foi a de direitos

fundamentais, sendo utilizados rótulos distintos para o mesmo conteúdo. Como

exemplo, tem-se “direitos humanos”, “direitos do homem”, “direitos subjetivos

públicos”, “liberdades públicas”, “direitos individuais”, “liberdades fundamentais” e

“direitos humanos fundamentais”.46

Em relação ao significado desses direitos, os direitos fundamentais são

conhecidos atualmente como essenciais ao homem, e que, uma vez reconhecidos

pelo ordenamento jurídico, possuem “[...] prioridade sobre todos os escalões do

sistema jurídico”47, vinculando consequentemente todos os poderes do Estado.

43 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do

possível. Curitiba: Juruá, p. 31. 44 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 29. 45 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 16. 46 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de

sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 maio 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial>. Acesso em: 16 fev. 2017.

47 ALEXY, Robert. Direitos fundamentais no Estado Constitucional Democrático. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 217, p. 61, mar. 2015. Disponível em:

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Marmelstein explica que essa essencialidade decorre especialmente

porque eles são “valores básicos para uma vida digna em sociedade”48, sendo a

dignidade humana, portanto, a base axiológica desses direitos.

Eles foram resultado de diversas transformações ao longo da história,

conforme o surgimento de novas necessidades49, demonstrando principalmente que,

em cada época da história, a realidade social necessitava de mudanças que

somente ocorriam através do povo, conforme relata Mastrodi50:

[…] a racionalização dos interesses e necessidades da burguesia revolucionária consolidaram os direitos individuais de modo a estruturar o Estado moderno; a racionalização dos interesses e necessidades da classe trabalhadora desafiou o entendimento liberal dos direitos individuais e os relativizou diante da evidente desigualdade social. Necessidades e interesses difusos decorrentes do desenvolvimento de uma sociedade industrial e de massa têm imposto modificações na compreensão dos direitos e causado o desenvolvimento de novos direitos fundamentais.

Bobbio expõe que o surgimento desses direitos ocorre quando o aumento

de poder de um homem ameaça a liberdade de outros homens51. Conforme já

mencionado no item anterior, os direitos fundamentais são uma forma de proteção

do homem contra o poder abusivo do Estado e, do próprio homem nas relações

entre particulares.

Doutrinadores explicam essas transformações através das dimensões ou

gerações de direito têm o fim de tornar mais didática e clara essa evolução.

O entendimento é de que o uso do termo “gerações” não é o mais

apropriado, vez que pode produzir uma ideia de “substituição” dos direitos de uma

geração para outra, o que é errado, uma vez que eles se complementam, razão pela

qual é preferível o termo “dimensão”, como confirma o doutrinador Ingo Wolfgang

<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/47413/45319>. Acesso em: 20 jan. 2017.

48 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 16. 49 KUNRATH, Yasmine Coelho. Os direitos de personalidade enquanto direitos fundamentais.

Ambito Jurídico. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17637&revista_caderno=7. Acesso em: 9 jan. 2017.

50 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de Direito Público, vol. 1, nº 1, 2012, p. 177. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 9 jan. 2017.

51 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de: Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 6.

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Sarlet que “[...] não há como negar que o reconhecimento progressivo de novos

direitos fundamentais tem o caráter de um processo cumulativo, de

complementaridade, e não de alternância”.52

Também compartilha desse entendimento Dimitri Dimoulis, que enfatiza

na sua obra a problemática da utilização de “geração”, pois tal como se visualiza na

Constituição de 1988, todas as gerações de direito são aplicadas simultaneamente.

Para Norberto Bobbio53, essas dimensões ou gerações dos direitos

fundamentais (o autor utiliza direitos do homem) são marcadas por três fases: A

primeira fase, ocorrida com o surgimento do Estado Liberal, foi marcada pelo

surgimento dos direitos de liberdade individuais como uma forma de reação contra o

Estado absolutista, caracterizados por representar a liberdade do homem e limitar o

poder do Estado, são direitos inerentes ao indivíduo e individuais, de natureza civil e

política.

Com a segunda fase, surgiram os direitos sociais, culturais e econômicos,

originários com o surgimento do Estado do Bem-Estar Social. Foi neste mesmo

período que surgiram o direito dos trabalhadores, consumidores, inquilinos e idosos.

Com a terceira geração, surgiram os direitos sociais, conhecidos como direitos

difusos, com o fim de garantir o bem-estar e igualdade (formal e material) que

segundo o doutrinador denomina-se “liberdade através ou por meio do Estado”.54

Segundo Sérgio Resende de Barros55, os direitos da terceira geração são

os seguintes:

[...]o direito à paz, o direito ao desenvolvimento, o direito ao patrimônio comum da humanidade, o direito à comunicação, o direito à autodeterminação dos povos e o direito ao meio ambiente sadio ou ecologicamente equilibrado.

52 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito

constitucional. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 45. 53 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro:

Elsevier, 2004. p. 32. 54 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro:

Elsevier, 2004. p. 32. 55 BARROS, Sérgio Resende de. Três gerações de direitos. Disponível em:

<http://www.srbarros.com.br/pt/tres-geracoes-de-direitos.cont>. Acesso em: 09 out. 2017. p. 06.

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E, por fim, tem-se a 4ª geração de direitos, que se refere à biotecnologia e

à bioengenharia. Essa geração estabelece “limites em relação à intervenção acerca

do patrimônio genético do ser humano”56. Como destaque dessa geração, tem-se a

Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos.

Outros doutrinadores tais como Paulo Bonavides e José Alcebíades de

Oliveira Junior, descrevem a existência de quatro gerações ou mais, haja vista que

outros valores foram desenvolvidos e declarados relevantes para a sociedade até a

atualidade.

Isto porque, como Paulo Bonavides fundamenta, os direitos fundamentais

consistem em manter os pressupostos elementares de uma vida na liberdade e na

dignidade humana.

E, quanto aos direitos que surgirem em uma sociedade globalizada de

risco, denominam-se “novos direitos”.57

No Brasil, os direitos fundamentais possuem essencialmente três

características: Possuem aplicação imediata (art. 5º, §1º da CF), são cláusulas

pétreas (art.60, §4º, inc. IV), e, por fim, possuem hierarquia constitucional.

Quanto à hierarquia constitucional, a Constituição Federal de 1988

enumera os direitos fundamentais no Título I do documento, possibilitando a

inserção de outros direitos, conforme determinado pelo art. 5º, §2º da CF, “[...]

admitindo como direitos fundamentais os direitos decorrentes de princípios e do

regime constitucional, bem como aqueles previstos em tratados internacionais”.58

Há que se registrar que os direitos fundamentais são entendidos como

“aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na ordem constitucional

interna de determinado Estado”59. Diferente dos direitos humanos que possuem

56 UNESCO. Declaração universal sobre o genoma humano e direitos humanos. Disponível em:

<http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001229/122990por.pdf>. Acesso em: 09 out. 2017, p. 07. 57 CRUZ, Paulo Márcio; Salles, Alice Francisco da Cruz. Considerações sobre os direitos

fundamentais sociais prestacionais e a sua concretização pelo Poder Judiciário. Revista Eletrônica Direito e Política. Programa de Pós-Graduação Stricto Sensum Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v. 6, nº 3, 3º quadrimestre de 2011, p. 1097. Disponível em: <www.Univali.br/direitoepolitica>. Acesso em: 09 out. 2017.

58 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, p. 24.

59 CRUZ, Paulo Márcio; Salles, Alice Francisco da Cruz. Considerações sobre os direitos

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legitimidade independente de positivação60, pois são assegurados a qualquer

pessoa.

Ocorre que esse entendimento já pode ser mudado, visto que com o

contínuo reconhecimento e recepção dos direitos humanos por um Estado,

mecanismos de coerção são desenvolvidos, resultando “[...] em comandos capazes

de alterar até mesmo as normas fundamentais [...]”.61

Tal mudança ocorreu especialmente em função do neoconstitucionalismo

e seu caráter universal: A Constituição passou a ser valorizada em outros países.

Dallari corrobora com esse entendimento ao destacar que o

neoconstitucionalismo possui seu alicerce nos direitos humanos, que segundo o

doutrinador é definido como62:

[...] atributos naturais, essenciais e inalienáveis da pessoa humana, que esta pode opor a qualquer ação ou omissão que ofenda ou ameace sua integridade física e mental e sua dignidade, ou que impeça a satisfação de suas necessidades essenciais, físicas, intelectuais, afetivas e espirituais e o livre desenvolvimento de sua personalidade.

Na Constituição Federal de 1988, essa aproximação dos direitos

fundamentais e direitos humanos ocorre no seu art. 5, §3º, que estipula um rito

especial para integrar tratados internacionais no ordenamento jurídico interno, como

emendas constitucionais, se aprovados em cada casa do Congresso, em dois

turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros.

Em relação às características dos direitos humanos, eles são aqueles

direitos encontrados em tratados internacionais. Eles foram tratados pela primeira

vez nas declarações americana e francesa, porém sua importância só foi

fundamentais sociais prestacionais e a sua concretização pelo Poder Judiciário. Revista Eletrônica Direito e Política. Programa de Pós-Graduação Stricto Sensum Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v. 6, nº 3, 3º quadrimestre de 2011, p. 1096. Disponível em: <www.Univali.br/direitoepolitica>. Acesso em: 09 out. 2017.

60 JUNIOR, Osvaldo Canela. A efetivação dos direitos fundamentais no processo coletivo: o âmbito de cognição das políticas públicas pelo Poder Judiciário. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 18.

61 JUNIOR, Osvaldo Canela. A efetivação dos direitos fundamentais no processo coletivo: o âmbito de cognição das políticas públicas pelo Poder Judiciário. Tese de Doutorado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo: USP, 2009, p. 20-21.

62 DALLARI, Dalmo de Abreu. A Constituição na vida dos povos: da Idade Média ao século XXI. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 208.

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devidamente reconhecida com a Declaração Universal de Direitos do Homem de

1948, quando esses direitos sofreram uma “restauração ética intensa”63, sendo por

fim vinculados juridicamente ao plano internacional com o Pacto Internacional sobre

Direitos Civis e Políticos em 19 de dezembro de 196664.

Osvaldo Canela define os direitos humanos como “[...] o produto do

reconhecimento expresso da existência de bens soberanos de toda a humanidade,

cuja proteção é condição para a sua sobrevivência e para o seu aperfeiçoamento

ético”.65

E, Mastrodi conclui que: “Direitos fundamentais são, grosso modo, a

positivação dos chamados direitos humanos no âmbito do ordenamento jurídico de

um Estado”66. Essa definição é criticada por Marmelstein, visto que os direitos

humanos, a partir do momento que definidos por um tratado ou pacto internacional,

devem passar por vários trâmites, para posteriormente serem inseridos num

documento jurídico tal como a Constituição e serem, por fim, consagrados direitos

fundamentais, conforme já destacado ao analisar o art. 5º, §3º da CF.

Nesse contexto, Sarlet faz referência ao magistério de Otfried Höffe,

filósofo este que explica que antes de os direitos humanos serem recepcionados

pelas Constituições, eles representavam uma moral jurídica universal, visto que os

titulares são todos os seres humanos, enquanto os titulares dos direitos

fundamentais somente são aqueles que fazem parte de um determinado Estado.67

63 JUNIOR, Osvaldo Canela. A efetivação dos direitos fundamentais no processo coletivo: o

âmbito de cognição das políticas públicas pelo Poder Judiciário. Tese de Doutorado em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo: USP, 2009. p. 22.

64 ALEXY, Robert. Colisão de direitos fundamentais e realização dos direitos fundamentais no Estado Democrático de Direito. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 217, p. 67, mar. 2015. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/47413/45319>. Acesso em: 20 jan. 2017.

65 JUNIOR, Osvaldo Canela. A efetivação dos direitos fundamentais no processo coletivo: o âmbito de cognição das políticas públicas pelo Poder Judiciário. Tese de Doutorado em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo: USP, 2009. p. 18.

66 LUÑO, Antonio Enrique Perez. Los Derechos Fundamentales. 7ª edição. Madri: Tecnos, 1998, p. 20. In: MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de Direito Público, vol. 1, nº 1, 2012, p. 150. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

67 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 maio 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial>. Acesso em: 17 fev. 2017.

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Para evidenciar ainda mais a importância da observar e proteger estes

direitos, é possível fundamentá-los de dois modos: formalmente e materialmente.

A fundamentação formal explica que a validade é conferida a partir da

positivação, protegendo um direito não porque ele é justo, mas sim porque uma

norma jurídica anuncia tal obrigação.68

Por outro lado, a justificação material demonstra que a validez dos direitos

fundamentais se dá pelo conteúdo de justiça que carregam. Por isso, esses direitos

possuem um padrão ético que aponta as razões pelas quais uma conduta deve ser

seguida ou reprimida.69

Olsen70 define essa fundamentalidade material como a relação entre os

direitos fundamentais e os principais valores que a Constituição carrega e que estão

expressos no Título I.

É diante disso que Marmelstein71 defende que, para os direitos

fundamentais serem considerados como tais, eles devem possuir ou uma ligação

com o princípio da dignidade da pessoa humana ou com a limitação do poder.

Percebe-se, portanto, que os direitos fundamentais não são apenas normas jurídicas

desvinculadas de um apelo moral ou de uma exigência ética ou moral. Os direitos

fundamentais são direitos de conteúdo valioso para o ser humano em termos

axiológicos. Isso se justifica porque é odioso desconsiderar as exigências mínimas

para a dignidade humana.

Eles vão ser resultado de uma luta constante contra a opressão do

Estado, pois essa já não é mais aceitável moralmente, uma vez que o Estado

Democrático de Direito possui valores que colocam o indivíduo em primeiro plano.

Sendo essa a razão da atenção à observância e proteção dos direitos humanos e

fundamentais.

68 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de

Direito Público, vol. 1, n. 1, 2012, p. 161. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

69 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de Direito Público, vol. 1, n. 1, 2012, p. 161. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

70 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. 1ª ed. Curitiba: Juruá, p. 23.

71 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 19.

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1.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO NÚCLEO DO SISTEMA NORMATIVO

Conforme destacado na seção anterior, os direitos fundamentais

carregam em seu conteúdo valores e objetivos que são fundamentais para o ser

humano. Mas não é somente isso, eles são considerados o alicerce de todo o

ordenamento jurídico de um determinado Estado e, principalmente, o alicerce de

uma sociedade democrática e do Estado de Direito.72

Mas foi com a Constituição de 1988 que grandes mudanças na seara dos

direitos fundamentais passaram a ocorrer. Esses direitos passaram a ter aplicação

imediata, passaram a conter um regime jurídico-constitucional próprio, bem como,

conforme já mencionado, foram inseridos no rol de cláusulas pétreas, em que “[...]

foram erigidos à condição de limites materiais ao poder de reforma constitucional, o

que também integra o regime jurídico reforçado dos direitos fundamentais”.73

Sarlet acrescenta que o fato de os direitos fundamentais serem inseridos

no rol de cláusulas pétreas é de grande relevância, uma vez que é um mecanismo

para reforçar a proteção e observância desses direitos, seja por garantias ou

construção jurisprudencial.74

É por isso que eles devem ser sempre observados, respeitados e

protegidos, dando a eles um caráter vinculante a todas as atividades praticadas por

entre particulares e pelo Estado. E isto ocorre porque os direitos fundamentais e

todas as suas características geram um efeito irradiante em todo o ordenamento

jurídico.75

Dessa forma, a partir do momento que os direitos fundamentais são

72 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de

Direito Público, vol. 1, n. 1, 2012, p. 183. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

73 SARLET, Ingo Wolfgang. O conceito de direitos fundamentais na Constituição de 1988. Revista Consultor Jurídico. 27 de fevereiro de 2015. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-fev-27/direitos-fundamentais-conceito-direitos-fundamentais-constituicao-federal-1988#top>. Acesso em: 17 fev. 2017.

74 SARLET, Ingo Wolfgang. O conceito de direitos fundamentais na Constituição de 1988. Revista Consultor Jurídico. 27 fev. 2015. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-fev-27/direitos-fundamentais-conceito-direitos-fundamentais-constituicao-federal-1988#top>. Acesso em: 17 fev. 2017.

75 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, p. 25.

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positivados de maneira específica na Constituição de determinado Estado, eles vão

vincular todas as relações, gerando consequências jurídicas para todos. Isso ocorre

porque eles são disposições que possuem caráter declaratório e que imprimem

existência jurídica à proteção, pois são normas que estabelecem direitos.

Esse reconhecimento não é atual, podendo ser demonstrado na STC

25/1981, prolatada em 14 de julho, quando o tribunal afirmou76:

Los derechos fundamentales son derechos subjetivos, derechos de los individuos no sólo como derechos de los ciudadanos en sentido estricto, sino en cuanto garantizan un estatus jurídico o la libertad en un ámbito de la existencia. Pero al propio tiempo, son elementos esenciales de un ordenamiento creativo de la comunidad nacional, en cuanto ésta se configura como marco de una convivencia humana justa y pacífica, plasmada históricamente en el Estado de derecho y, más tarde, en el Estado social de derecho o Estado social y democrático de derecho, según la fórmula de nuestra Constitución (artículo 1.1).

Podendo-se concluir a partir disso que estes direitos assumem uma

posição de destaque, visto que são considerados a “coluna vertebral” de todo

ordenamento jurídico, são legitimadores do Estado de Direito77 e, por fim, “[...]

funcionam como estrutura hermenêutica para qualquer abordagem dogmática do

sistema constitucional”.78

Alexandre de Moraes ainda acrescenta: os direitos fundamentais

possuem “[...] um universal reconhecimento pela maioria dos Estados, seja em nível

constitucional, infraconstitucional, seja em nível de direito consuetudinário ou mesmo

por tratados e convenções internacionais”.79

O principal fundamento de promoção dos direitos fundamentais visa à

76 GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest.

Const., México, nº 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 17 fev. 2017.

77 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de Direito Público, vol. 1, n. 1, 2012, p. 158. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

78 SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A colisão dos direitos fundamentais de reunião e de locomoção a partir das manifestações de rua. Dissertação de Mestrado em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC/SP, 2016. p. 64.

79 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 20.

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busca dos principais valores consagrados pela Constituição – a liberdade, a vida

digna e a igualdade –, limitar o poder do Estado, fazendo com que este os observe e

os proteja de todas as formas, seja numa interpretação formal da lei ou numa

proteção material.80

Porém, essa não é a única função desses direitos, conforme já

demonstrado. Historicamente, as razões pelas quais os direitos fundamentais

surgiram, como destaca Juan Anzures Gurría81, não foram unicamente para limitar o

Estado, mas também para regular as relações entre particulares.82

Exemplo disso é o direito à igualdade, que formalmente dispõe que “todos

são iguais perante a lei”, ou seja, como entende Ingo W. Sarlet, “uma igualdade

absoluta em termos jurídicos” e, materialmente, se mostra ao “tratar os iguais de

maneira igual e os desiguais de forma desigual na medida de sua desigualdade”, ou

como o mesmo autor dispõe “significa proibição de tratamento arbitrário”.83

Entretanto, não é somente o porquê da criação dos direitos fundamentais

que demonstra sua relevância para a sociedade. E, corroborando com o

entendimento, Robert Alexy explica o significado dos direitos fundamentais no

sistema jurídico alemão, a partir de sua fundamentalidade formal e material, sendo

muito pertinente para analisar o caso da ordenamento jurídico brasileiro.

A fundamentalidade formal decorre da posição dos direitos fundamentais

no ordenamento jurídico. E, como eles se encontram na Constituição Federal,

considerada o ápice segundo a pirâmide de Kelsen, eles irão vincular todos os

poderes do Estado: Executivo, Legislativo e Judiciário.84

80 MASTRODI, Josué. Sobre o real fundamento dos direitos fundamentais. Revista Digital de

Direito Público, vol. 1, n. 1, 2012, p. 183. Disponível em: <www.direitorp.usp.br/periodicos>. Acesso em: 20 jan. 2017.

81 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 323; SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005; SARLET, Ingo Wolfgang. A constituição concretizada: construindo pontes entre o público e o privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p.138.

82 GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest. Const., México, n. 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 19 fev. 2017.

83 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 356.

84 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. 5ª ed. São

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Acrescenta o pensador alemão que essa fundamentalidade pode ser

deparada em dois modelos constitucionais: o puramente procedimental e o

puramente material. Em relação ao primeiro, Alexy85 destaca:

A esse modelo corresponde uma teoria dos direitos fundamentais segundo a qual os direitos fundamentais não têm nenhuma força vinculante em face do legislador; o legislador teria, portanto, a competência para restringi-los conforme sua vontade, por mais que a forma dessa restrição esteja previamente definida.

Nessa perspectiva, pode-se concluir que não é o caso dos direitos

fundamentais dispostos na Constituição Federal de 1988. Esses direitos possuem

características já solidificadas pela doutrina, que são vinculantes, são cláusulas

pétreas e, estão no ápice do ordenamento jurídico.

A fundamentalidade puramente material, por outro lado, caracteriza-se por

conter “[...] apenas normas materiais, a partir das quais pode ser derivado o

conteúdo de qualquer norma do sistema jurídico”86, cabendo ao legislador o trabalho

de declarar o que está disposto na constituição.

Esse último se aproxima do ordenamento jurídico brasileiro, já que

nenhuma norma pode ser recepcionada pela Constituição se tiver um conteúdo que

contrarie seus valores ou os direitos fundamentais que a formam.

São todos esses fundamentos que explicam o papel nuclear que os

direitos fundamentais possuem, bem como o porquê de o Estado já não estar mais

em posição de abstenção, mas de agente ativo que “deve fornecer os meios

instrumentais necessários à implementação”87 desses direitos.

Sobre isso sustenta Azevedo e Silva que “[...] o Estado, de potencial

inimigo dos direitos fundamentais, passa a ocupar a posição de instrumento de

promoção, por meio do qual os direitos fundamentais são instituídos e garantidos”.88

Paulo: Malheiros, 2011. p. 520.

85 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 521.

86 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 521.

87 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial – teoria e prática. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 99

88 AZEVEDO, Flavio Alexandre Luciano de; SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. A

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Nesse mesmo sentido, Locke sustenta que “La finalidad máxima y

principal que buscan los hombres al reunirse en Estado o comunidades,

sometiéndose a un gobierno, es la de salvaguardar sus bienes”.89

Para o Estado Democrático de Direito, os direitos fundamentais irão servir

como estabilizadores, visto que como Flávia Piovesan destaca, eles “[...] são um

elemento básico para a realização do princípio democrático, tendo em vista que

exercem uma função democratizadora”.90

Sobre esta relação entre os direitos fundamentais e o Estado Democrático

de Direito, Pérez Luño91 explica:

[...] existe um estreito nexo de interdependência genético e funcional entre o Estado de Direito e os direitos fundamentais, uma vez que o Estado de Direito exige e implica, para sê-lo, a garantia dos direitos fundamentais, ao passo que estes exigem e implicam, para sua realização, o reconhecimento e a garantia do Estado de Direito.

É a partir dessa relação que se pode concluir que os direitos

fundamentais, além de vincular o Estado, vão servir para nortear a atuação dele,

para assegurar a proteção e eficácia dos direitos fundamentais.

Assim, ante essa face valorativa dos direitos fundamentais exposta, bem

como essa proteção que vai dar ao particular diante das ingerências do Estado e de

dimensao objetiva dos direitos fundamentais e sua relevancia para a efetivacao da cidadania em paises perifericos. In: CONPENDI/UFS. Eficacia dos direitos fundamentais e seus reflexos nas relacoes sociais e empresariais. Florianopolis: CONPEDI, 2015. p. 47. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/220z0z30/6p453HGFY7d5FLLD.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2017.

89 A finalidade máxima e principal para os homens se reunirem para formar um Estado ou comunidades, ou de se submeter a um governo é a de proteger seus bens. (tradução livre) In: LOCKE, John. Ensayo sobre el gobierno civil (segundo tratado, 1690). Tradução de: A. Lázaro Ros. Madri: Aguilar, 1969, epígrafe 124. In: GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest. Const., México, nº 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em 19 fev. 2017.

90 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 26. In: SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A colisão dos direitos fundamentais de reunião e de locomoção a partir das manifestações de rua. Mestrado em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC/SP, 2016. p. 60.

91 PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. Los derechos fundamentales. 9ª ed. Madri: Tecnos, 2007. p.19.

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terceiros, que doutrinadores têm reconhecido que os direitos fundamentais possuem

dupla dimensão: uma dimensão objetiva e uma dimensão subjetiva.

É o que também confirma o Tribunal Constitucional Espanhol92 ao

declarar que, “[…] las normas iusfundamentales contienen no sólo los derechos

subjetivos de defensa del individuo frente al Estado, sino que representan, al mismo

tempo, un orden valorativo objetivo [...]”.

Diante disso, a dimensão objetiva vai se referir como esses valores

trazidos pelos direitos fundamentais em conjuntura com a sociedade, e que,

conforme Julio Estrada93, traz consequências ao ordenamento jurídico, tais como o

efeito irradiante dos direitos fundamentais, o dever de proteção e eficácia perante

terceiros.

Esses valores são demonstrados pelas gerações de direito, visto que

cada geração trazia um novo valor a ser acrescentado no conteúdo dos direitos

fundamentais, sendo por esta razão de grande relevância as conquistas realizadas

no passado. São elas que determinam a dimensão objetiva dos direitos

fundamentais.

Nos dizeres de Marmelstein, essa dimensão mostra esses direitos como

um “sistema de valores”, que vai dar validade ao ordenamento jurídico e realizar

uma vinculação para que toda a interpretação jurídica leve em consideração o

conteúdo desses direitos fundamentais.94

Em relação à dimensão objetiva, Flavio Alexandre Luciano de Azevedo e

92 As normas fundamentais contêm não somente direitos subjetivos de defesa do indivíduo frente ao

Estado, mas também representam, ao mesmo tempo, uma ordem valorativa objetiva (tradução livre). In: Böckenförde, E. W. Escritos sobre derechos fundamentales. Tradução de: J. L. Requejo e I. Villaverde, Baden–Baden: Nomos, 1993. p. 95. In: GURRIA, José Juan Anzures. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuest. Const., México, nº 22, p. 3-51, jun. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1405-91932010000100001&lng=es&nrm=iso>. Acesso: 19 fev. 2017.

93 ESTRADA, Alexei Julio, La eficacia de los derechos fundamentales entre particulares. Universidad Externado de Colombia, 2000. p. 31.

94 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2016. p. 19.

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Luciana Aboim Machado Goncalves da Silva95 apontam:

O reconhecimento da dimensao objetiva dos direitos fundamentais exige do Estado um comportamento positivo no sentido da promocao e da protecao desses direitos e coloca os direitos fundamentais na posicao de sistema valorativo e de fundamento material de todo o ordenamento juridico.

É por meio dessa perspectiva que se pode saber o funcionamento de uma

sociedade, possibilitando visualizar de que forma cada norma deve ser interpretada

e aplicada.96

Essa dimensão vai mostrar que não basta a norma ser plenamente

cumprida, mas sim que a norma seja aplicada, e os objetivos pelos quais ela foi

criada sejam alcançados, visto que a sua origem está intimamente ligada com a

finalidade pretendida pelo legislador.

Acrescenta-se a essa ideia, o fato de a dimensão objetiva também auxiliar

a atividade legislativa, com a criação das leis. Ou seja, essa dimensão não está

restringida tão somente à interpretação e aplicação das normas.

Nesse contexto, Sarmento trata do desdobramento da dimensão objetiva

na teoria dos deveres de proteção, visto que o Estado, além de não violar esses

direitos, tem o dever de promovê-los e de impedir a violação deles por particulares.

Dessa forma, conclui-se que a dimensão objetiva é uma importante parte

dos direitos fundamentais. Conforme Bielschowsky e Mello, atribui-se a esses

direitos uma estrutura diferente, conforme os teóricos expõem97:

95 AZEVEDO, Flavio Alexandre Luciano de; SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. A

dimensao objetiva dos direitos fundamentais e sua relevancia para a efetivacao da cidadania em paises perifericos. In: CONPENDI/UFS. Eficacia dos direitos fundamentais e seus reflexos nas relacoes sociais e empresariais. Florianopolis: CONPEDI, 2015, p. 47. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/220z0z30/6p453HGFY7d5FLLD.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2017.

96 LUÑO, Antonio Enrique Perez. Los derechos fundamentales. 7ª ed. Madri: Tecnos, 1998. p. 21. In: CONPENDI/UFS. Eficacia dos direitos fundamentais e seus reflexos nas relacoes sociais e empresariais. Florianopolis: CONPEDI, 2015, p. 47. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/220z0z30/6p453HGFY7d5FLLD.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2017.

97 Este ponto de vista implica uma estrutura totalmente diferente, particularmente em três pontos: a) os direitos fundamentais serem obrigações normativas às autoridade que se constituem; b) é necessário para reconhecer a imediaticidade dos direitos fundamentais e eficácia (aplicação) norteando as ações do Estado; c) bem como é determinante para identificar uma eficácia horizontal nas interações entre particulares (tradução livre). In: BIELSCHOWSKI, Raoni Macedo;

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This point of view implies a whole different structure, particularly on three issues: a) the Fundamental Rights as normative obligations to constituted authorities; b) it is necessary to recognize an immediate Fundamental Rights efficacy (application), objectively binding the State action; c) as well, it is mandatory to identify an horizontal efficacy to the private interactions.

Em relação à dimensão subjetiva dos direitos fundamentais,

classicamente, ela é conhecida como aqueles direitos subjetivos oponíveis contra as

ingerências abusivas do Estado. Como apresenta Duque98:

Esses direitos podem ser compreendidos, portanto, como direitos de defesa do cidadão contra o Estado, os quais tornam possível ao particular defender-se contra intervenções não autorizadas em seu status jurídico-constitucional praticadas pelos poderes públicos.

É a partir dessa dimensão que pode-se aferir a força normativa dos

direitos fundamentais, pelo fato de todas as leis estarem submetidas ao conteúdo e

valores dos direitos fundamentais; vai dar um maior reconhecimento ao papel do

Judiciário na efetivação desses direitos; e, ainda, vai demonstrar a possibilidade de

concretização dos direitos fundamentais independente de previsão legal99.

Dessa forma, essa dimensão vai possibilitar que os cidadão submetidos a

um determinado Estado possam pleitear na justiça a efetivação e concretização de

determinado direito fundamental. Isso ocorre especialmente se o Estado “[...] deixa

de cumprir com os deveres de respeito, proteção e promoção”100.

Ressalta-se que ambas as dimensões estão interligadas e trabalham

juntas quando consideradas no ordenamento jurídico e no seu emprego no dia a dia.

Outrossim, o princípio da proibição da proteção insuficiente tem relação

direta com a dimensão objetiva dos direitos fundamentais, conforme será exposto

em capítulo próprio sobre o assunto.

MELLO, Rodrigo Antonio Calixto de Pina Gomes. Communitarianist perspective of fundamental rights issues about the objective dimension. In: Human rights, rule of law and the contemporary social challenges in complex societies: Proceedings of the XXVI World Congress of Philosophy of Law and Social Philosophy of the Internationale Vereinigunf für Rechts - und Sozialphilosophie. Editores: Marcelo Galuppo, Mônica Sette Lopes, Lucas Gontijo, Karine Salgado, Thomas Bustamanete. Belo Horizonte: Initia Via, 2015. p. 2464.

98 DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de direitos fundamentais: teoria e prática. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p.121.

99 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 298-299.

100 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2016. p. 304.

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Diante de todo o exposto, pode-se visualizar o papel central que os

direitos fundamentais possuem para o ordenamento jurídico, visto que carregam em

seu conteúdo os valores pregados por determinada sociedade, bem como o que

cada um espera da vida em sociedade e do Estado. Isso ocorre porque, conforme já

foi provado, não é somente o Estado que comete abusos de poder e deve respeitar

os direitos fundamentais, mas também os próprios particulares na relações jurídicas

que firmam com outros particulares, devendo, portanto, ocorrer um respeito

multilateral ao que prevê a Constituição.

1.3 A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - CONTRAPONTOS

É diante de todo o conteúdo, valoração e importância até agora expostos

que pode-se justificar o caráter vinculante que esses direitos possuem, em que

todas as atividades têm que se submeter aos direitos fundamentais, sob pena de

sua invalidação, ou sob pena de sua inconstitucionalidade por algum comportamento

ativo ou omissivo.

Ocorre que, apesar de toda essa importância que gira entorno dos direitos

fundamentais, existem categorias jurídicas que podem limitá-los, tais como a reserva

do possível.

Essas restrições ocorrem muitas vezes devido ao conteúdo muito aberto

de muitos direitos, necessitando intervenção legislativa para regulamentar de que

forma deve se dar esse exercício. E é essa atividade que gera, nos titulares de

direitos, questionamentos acerca da legitimidade de muitas dessas

regulamentações.

Por restrição, entende-se como a diminuição do núcleo protegido pelo

dispositivo da Constituição. Corroborando o entendimento, Robert Alexy ensina a

partir da sua teoria externa que, se existe limitação, então existe um direito

fundamental pleno e um direito com restrição. Esse doutrinador ressalta que101:

Embora a teoria externa possa admitir que, em um ordenamento jurídico, os direitos apresentam-se sobretudo ou exclusivamente como direitos

101 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. 5ª ed. São

Paulo: Malheiros, 2011. p. 277.

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restringidos, ela tem que insistir que eles são também concebíveis sem restrição.

Complementa sobre o assunto Schafer102:

Ou seja, prima facie os direitos fundamentais são dotados de cláusula de maximização, não lhe sendo intrínseca a possibilidade restritiva, a qual somente ocorrerá a posteriori, quando da compatibilização concreta dos diferentes direitos individuais e coletivos agasalhados pela Constituição.

Segundo Olsen103, essa teoria externa surgiu a partir dessa preocupação

quanto à legitimidade de ingerência dos poderes do Estado nos direitos dos

indivíduos.

Mas o doutrinador também visualiza de outra forma, destacando que, ao

invés de trabalhar com a “restrição”, pode-se utilizar o conceito de limite, trabalhando

com o conteúdo que o direito fundamental carrega. Isso é, o que ele defende na sua

teoria interna.

Em relação à teoria interna, sabe-se que ela envolve os doutrinadores

que não admitem a restrição dos direitos fundamentais, mas, tão somente, a

delimitação do seu conteúdo104.

O jurista alemão Friedrich Muller, uma das referências sobre a teoria

interna, defende que “nenhum direito fundamental está garantido ilimitadamente”105,

sendo por essa razão a necessidade de delimitação do conteúdo desses direitos.

As posições jurídicas da sociedade, ou seja, os atos, têm que estar

abrangidos pela norma jurídica de direito fundamental. Caso essa posição exceda

seus contornos, esse ato não poderá ser abrangido por ela:

Assim, a aplicação de um determinado direito fundamental ao caso concreto demanda a averiguação de correspondência entre o conteúdo aparente do direito e seu conteúdo verdadeiro, ou seja, a identidade entre âmbito normativo e suposto de fato106.

102 SCHAFER, Jairo Gilberto. Restrições a direitos fundamentais. Dissertação de Mestrado

em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis: UFSC, 2000. p. 54. 103 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais socias: efetividade frente à reserva do

possível. Curitiba: Juruá, 2012. p. 123. 104 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais socias: efetividade frente à reserva do

possível. Curitiba: Juruá, 2012. p. 118. 105 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais socias: efetividade frente à reserva do

possível. Curitiba: Juruá, 2012. p. 119. 106 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais socias: efetividade frente à reserva do

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Na Constituição Federal, esse controle pode ser visualizado de diversas

formas. Uma delas diz respeito ao rol de direitos fundamentais que ultrapassam o

art. 5º da CF e, apesar de cada um deles carregar em seu conteúdo valores distintos

e por isso colidentes, formam uma unidade que possui como núcleo a dignidade da

pessoa humana107.

De maneira alguma isso significa que os direitos dispostos no art. 5º são

ilimitados, mas sim que para todos os direitos fundamentais terem seu mínimo de

eficácia garantido, chamado núcleo fundamental por Alexy, eles devem, muitas

vezes, deixar outro direito fundamental em colisão se sobressair, visto que numa

determinada posição jurídica ele é mais importante.

O fato de os direitos fundamentais estarem esparsos representa,

inclusive, o ordenamento jurídico complexo e pluralista que o Estado brasileiro

demanda e, igualmente, corresponde com os valores pregados pelo preâmbulo da

Constituição de 88, que assim estabelece:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL108.

Sobre isso, Silva complementa “os próprios direitos fundamentais

carregam em si uma limitação de ação para que outro direito fundamental possa

coexistir”109.

Mas não são em todas as relações jurídicas da sociedade que ocorre

essa contenção de um direito fundamental para que outro possa se efetivar. E, para

possível. Curitiba: Juruá, 2012. p. 120.

107 SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A colisão dos direitos fundamentais de reunião e de locomoção a partir das manifestações de rua. Dissertação de Mestrado em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC/SP, 2016. p. 64.

108 CONSTITUIÇAO FEDERAL. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 19 fev. 2017.

109 SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A colisão dos direitos fundamentais de reunião e de locomoção a partir das manifestações de rua. Dissertação de Mestrado em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC/SP, 2016. p. 64.

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explicar isso, basta pensar no porquê os direitos fundamentais surgiram, ou seja,

eles surgiram como forma de proteger o indivíduo contra as ingerências ilimitadas do

Estado na sua esfera particular.

Portanto, diante dessa relação vertical, Estado-indivíduo, os direitos

fundamentais não irão conter a sua atuação para se sobressair outro direito, pois o

Estado não possui direitos fundamentais.

Normalmente, essa situação de ponderação que ocorre entre os direitos

fundamentais se observa nas relações horizontais, particular-particular, visto que

ambos possuem direitos fundamentais e que, por conseguinte, devem ser

ponderados para que um se sobressaia mais do que o outro.

As limitações também ocorrem diante da contínua necessidade de a

maioria dos direitos fundamentais necessitar de intervenção legislativa para serem

efetivados, sendo, portanto, a própria lei a estabelecer as condições em que podem

ser satisfeitos. Essa restrição é denominada reserva legal, que apesar de sua

utilização contínua em delimitar os contornos dos direitos fundamentais, jamais

poderá romper o seu núcleo essencial110.

Outra restrição que pode ocorrer na fruição de certos direitos

fundamentais tem relação com o investimento econômico de que necessitam. A

princípio, esse tipo de limitação ocorre porque alguns direitos sobrecarregavam o

Estado para serem concretizados, pois necessitavam de um maior investimento

financeiro por parte do Estado, além de serem entendidos como ofensores da

iniciativa privada e da autonomia do ser humano111.

Essa crítica é direcionada especialmente aos direitos fundamentais

sociais, como saúde, educação, previdência, gerando discussões quanto a

autenticidade desses direitos como fundamentais.112 Visto que não se pode ignorar o

110 SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A colisão dos direitos fundamentais de reunião e

de locomoção a partir das manifestações de rua. Dissertação de Mestrado em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC/SP, 2016. p. 65.

111 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, p. 18.

112 SARLET, Ingo Wolfgang. Reserva do possível, mínimo existencial e direito à saúde: algumas aproximações. In: Direitos fundamentais: orçamento e reserva do possível. Org.: Ingo Wolfgang

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fato de que existe um conflito no Estado quanto à administração dos recursos e o

direito a essas prestações.

Por um lado, são direitos essenciais para possibilitar uma vida digna e,

principalmente, alcançar a sociedade justa e igualitária pregada pelo Estado

Democrático de Direito. Sendo, por isso, dever último do Estado Democrático de

Direito possibilitar a concretização de direitos fundamentais, seja com a atividade

legislativa regulando-os, seja implementando políticas públicas.

Nessa perspectiva, seguem as considerações de Beldrini113.

Portanto, nas principais democracias do mundo, há de fato uma forte tendência a que o Judiciário seja reconhecido como um poder independente, expressão da soberania una do Estado, capaz de fiscalizar a ação e a omissão dos demais poderes, em relação à constitucionalidade das leis e à constitucionalidade do governo, especialmente quanto à realização dos direitos sociais.

Esses direitos surgiram no Brasil, principalmente, porque grande parcela

da população não possui condições de se inserir no mercado a fim de garantir uma

vida digna, pois a desigualdade social aumenta a cada ano, diminuindo a

possibilidade dessa parcela da população de honrar com esse conceito de iniciativa

privada pregado.

É como se refere Luiz Fernando Calil de Freitas114:

[...] é inevitável reconhecer que uma das maiores, senão a maior, dificuldade do respectivo implemento é a circunstância de que alguns direitos fundamentais, em especial os direitos a prestações positivas só efetivamente existem na exata medida em que a lei e as políticas sociais os garantam (...) a medida de sua implementação com maior ou menor intensidade varia na razão direta da existência de recursos disponíveis para tais utilizações.

A partir disso, foi formulado o conceito de “reserva do possível”. Esse

conceito se refere ao “custo” na implementação dos direitos fundamentais, bem

como a efetivação do Estado, se houver recursos para tal.

Sarlet. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. p. 180

113 OLDRINI, Rodrigo Pires da Cunha. Garantia de direitos e separação dos poderes. Dissertação de Mestrado em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo: FADUSP, 2012. p. 209.

114 FREITAS, Luiz Fernando Calil de. Direitos Fundamentais: limites e restrições. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 173.

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Nessa perspectiva, é elucidativa a lição de Paulo Caliendo, que destaca

que a “reserva do possível” (“Volbert des Moglichen”) é entendida como limite ao

poder do Estado de concretizar efetivamente direitos fundamentais a prestações”115.

A cláusula da reserva do possível foi utilizada pela primeira vez pelo

Tribunal Constitucional Alemão, no caso denominado “Numerus Clausus das Vagas

em Universidade”, onde conforme George Marmelstein Lima116 explica que o TCF

interpretou que:

[...] o direito à educação não implicaria no dever do Estado de custear os serviços educacionais para todos os cidadãos, mas tão somente que o Poder Público deveria demonstrar que estaria dando a maior efetividade possível ao direito social, em face dos recursos financeiros disponíveis.

A princípio, a ideia era ter recursos para concretizar todos os direitos

fundamentais mas, como isso não foi possível, a cláusula da reserva foi aplicada,

fazendo com que o Estado seja obrigado a demonstrar que está tentando concretizar

determinado direito o máximo possível.

É por esta razão que o ativismo judicial na matéria, em se tratando de

exigir do Estado a realização de prestações na seara dos direitos fundamentais

(apesar de concentrar essa preocupação na categoria dos direitos socais), é tão

preocupante. O fato de haver um orçamento limitado, faz com que o Estado destine

esses recursos à concretização de alguns direitos em detrimento de outros.

Nessa seara, é importante destacar o posicionamento do Tribunal

Constitucional alemão de que podem tais direitos serem pleiteados ao Judiciário,

cabendo a esse, a partir do princípio da proporcionalidade, impor ao Poder Público a

concretização de determinado direito, desde que observados os recursos financeiros

disponíveis117.

O grande problema surge quando outros direitos fundamentais são

suscitados perante o Judiciário a serem cumpridos, e ele se vê obrigado a cumprir,

115 CALIENDO, Paulo. Reserva do possível, direitos fundamentais e tributação. In: SARLET,

Ingo Wolfgang; TIMM, Luciano Benetti. Direitos fundamentais: orçamento e “reserva do possível”. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. p. 180.

116 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2016. p. 131. 117 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2016. p. 131.

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visto que existe uma legislação que regulamente seu exercício118.

Ingo W. Sarlet entende que a “[...] reserva do possível não impede o

Poder Judiciário de zelar pela efetivação dos direitos sociais”119. Mas existem

controvérsias sobre o assunto, especialmente porque o Judiciário não está a par do

plano orçamentário do país.

Scaff, ao contemplar sobre a matéria, destaca que a “reserva do possível”

não vem sendo utilizada de forma correta pelo Brasil, sendo vista como “uma

tentativa de refúgio das ordens judiciais”120.

Essa discussão se torna ainda mais complexa se considerar o “mínimo

existencial” que, apesar de não expresso na Constituição e não possuir uma

definição precisa, é sempre considerado e carrega em uma de suas inúmeras

possíveis formas de explicação, a ideia de que todo ser humano necessita de

condições mínimas de existência digna121.

Ele foi citado pela primeira vez na Declaração da ONU de 1948, não com

a nominação de “mínimo existencial”, mas trazendo a mesma ideia. Trata-se de seu

118 Duas hipóteses de análise podem ser levantadas em relação à justiciabilidade dos direitos

sociais: a primeira se refere às normas constitucionais programáticas e sua exigência direta sem a intermediação do legislador infraconstitucional, e a segunda se refere à exigência dos direitos sociais já regulados infraconstitucionalmente. Em relação à segunda hipótese, o autor ressalta que não há duvidas que quando regulada por lei ordinária a norma prevista na constituição, esta pode ser exigida judicialmente, sem maiores controvérsias, e ainda assinala que, no caso do Brasil, boa parte dos direitos sociais já foi objeto de concretização pelo legislador. Afirma que apesar de algumas normas programáticas necessitarem de intervenção legislativa, elas sempre geram algum tipo de posição jurídico-subjetivo e nesse sentido a doutrina nacional em sua maioria tem sustentado que esses direitos fundamentais geram no mínimo um direito subjetivo no sentido negativo, ou seja, pode-se exigir do Estado que este direito não seja violado e pelo fato de que se pode declarar a inconstitucionalidade de atos que contrariem estas normas. Citando Canotilho, ressalta ainda que a posição mais frágil neste sentido é a que se baseia em princípios objetivos, em que se acredita que existem obrigações a serem cumpridas pelo Estado e que este apenas tem colocada em sua atuação um dever prima facie no sentido de sua concretização, “sem que a isto corresponda um direito subjetivo individual à prestação que constitui o objeto precípuo do direito fundamental”. In: GOTTI, Alessandra Passos, MARTINS, Janaína Senne, PIOVESAN, Flávia. Proteção internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais. In: LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (orgs.). Direitos humanos econômicos, sociais e culturais. 2004.

119 SARLET, Ingo Wolfgang. TIMM, Luciano Benetti (orgs.). Direitos fundamentais: orçamento e reserva do possível. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 30.

120 SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível pressupõe escolhas trágicas. Revista Consultor Jurídico, 26 fev. 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-fev-26/contas-vista-reserva-possivel-pressupoe-escolhas-tragicas>. Acesso em: 01 mar. 2017.

121 TORRES, Ricardo Lobo. O mínimo existencial e os direitos fundamentais. In: Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro. Jul./set. 1989, p. 29. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/download/46113/44271>. Acesso em: 13 fev. 2017.

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artigo XXV122, que transcreve:

Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

Na seara constitucional, foi com a Constituição de Weimar de 1919, no

seu art. 151, que o mínimo existencial foi expressamente previsto, sendo inclusive a

definição utilizada mais tarde pela constituição brasileira de 1934 e sucessivas,

sendo hoje prevista no seu art. 171 no capítulo denominado da ordem econômica

e/ou social123.

É Importante mencionar o conteúdo desenvolvido na Alemanha desse

direito, que é compartilhado pela Constituição Brasileira124:

[...] o mínimo existencial não se reduz a uma mera garantia de sobrevivência física, ou seja, o que se costuma chamar de mínimo vital, mas abarca a garantia mínima de acesso a bens culturais, a inserção na vida social e a participação política, ou seja, aquilo que se tem denominado de um mínimo sociocultural.

No entendimento de Ingo W. Sarlet, o “mínimo existencial” é um direito

implícito na Constituição Federal, entendido como “[...] um direito a um conjunto de

prestações estatais que assegure a cada um (a cada pessoa) uma vida condigna”125.

Explica o doutrinador que, ainda que não haja concordância por parte de muitos na

sociedade, esse direito traz a ideia de que a exclusão e a pobreza são assuntos que

devem ser considerados e devem ser buscadas soluções pelo Estado para tentar

122 DECLARAÇAO DA ONU DE 1948. Disponível em:

<http://www.onu.org.br/img/2014/09/DUDH.pdf>. Acesso em: 16 fev. 2017. 123 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de

sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 maio 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial>. Acesso em: 16 fev. 2017.

124 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 maio 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial>. Acesso em: 16 fev. 2017.

125 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 de maio de 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial> . Acesso em: 16 de fevereiro de 2017.

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amenizar a gravidade da situação.

Notadamente, o entendimento que se solidificou é de que somente para

os direitos fundamentais sociais o mínimo existencial deveria ser observado, e que

esse não poderia sofrer intervenções estatais.

Mas, atualmente, tal pensamento já esta sendo reformulado, visto que

todos os direitos fundamentais necessitam de certo investimento para serem

concretizados, bem como de intervenção legislativa para regulá-los.

Deve-se considerar ainda que todos os direitos fundamentais são

interdependentes, bem como importantes por si só, não devendo ocorrer o

investimento financeiro para uma categoria em prol de outra categoria.

Corrobora com esse entendimento Ingo W. Sarlet126:

É nessa perspectiva que — para espancar qualquer dúvida a respeito — comungamos do entendimento de que todos os direitos fundamentais possuem um núcleo essencial, núcleo este que, por outro lado, não se confunde com seu conteúdo em dignidade da pessoa humana (ou, no caso dos direitos sociais, com o mínimo existencial), embora em maior ou menor medida, como regra, um conteúdo em dignidade humana e/ou uma conexão com o mínimo existencial se faça presente, do que devem ser extraídas consequências para a proteção e promoção dos direitos fundamentais.

Soma-se a isso os ensinamentos de Dallari127, ao destacar que “[...] A

Constituição deve consagrar, com o mesmo valor e em normas dotadas da mesma

eficácia jurídica, os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, sociais e

culturais.”

É importante observar que esse investimento não está limitado

somente à disponibilização de recursos financeiros, mas também abrange a

disponibilização de pessoas especializadas que, ao exercerem determinada função,

irão assegurar direitos fundamentais da sociedade, bem como investimento em

126 SARLET, Ingo Wolfgang. O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de

sobrevivência. Revista Consultor Jurídico. 8 de maio de 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial> . Acesso em: 16 de fevereiro de 2017.

127 DALLARI, Dalmo de Abreu. A Constituição na vida dos povos: da Idade Média ao século XXI. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 352.

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equipamentos.

Soma-se a isso a existência de muitos direitos fundamentais que

necessitam de mais de uma ação governamental para serem efetivados, dentre eles

o direito à segurança pública, que como José Mauricio Conti ressalta, necessita de

uma “[...] multiplicidade de comandos, órgãos e orçamentos, cuja cooperação é

fundamental para atingir o objetivo maior de atender a necessidade pública de mais

segurança e menos violência”128.

Outro fator a ser considerado é quanto à extensão e qualidade da

proteção dos direitos, que também vão depender de um maior gasto, não

importando a categoria de direitos fundamentais que está se analisando. Sobre isso,

Holmes e Sunstein129 afirmam que tanto os direitos de liberdade, quanto o direito à

saúde possuem custos, necessitando, consequentemente, de recursos financeiros

que advêm especialmente dos particulares, cabendo ao governo tão somente

administrar e direcioná-los, para que tais direitos sejam efetivados.

Essa administração consiste num orçamento, que é o centro para que

todo e qualquer direito fundamental seja efetivado, não se limitando aos direitos

sociais. E é a partir do orçamento que o Poder Legislativo vai analisar quais são as

prioridades da sociedade a partir da disponibilização dos recursos.

Entendimento esse de Fernando Facury Scaff130, ao afirmar que, para que

haja a possibilidade de efetivação harmônica dos direitos fundamentais, devem

haver constantes escolhas políticas em prol do que está disponível nos cofres

públicos.

Ocorre que essa liberdade que o legislador possui de afirmar quais são as

prioridades da sociedade e destinar recursos para que essas prioridades sejam

efetivadas não é tão ampla. Scaff aponta as “vinculações e referibilidades”131 da

128 CONTI, José Maurício. Financiamento da segurança pública precisa de atenção. Revista

Consultor Jurídico, 6 maio 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-mai-06/contas-vista-financiamento-seguranca-publica-atencao>. Acesso em: 01 mar. 2017.

129 HOLMES, Stephen; SUSTEIN, Cass R. The cost of rights: why liberty depends on taxes. W. W. New York: Norton and Company. p.15.

130 SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível pressupõe escolhas trágicas. Revista Consultor Jurídico, 26 fev. 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-fev-26/contas-vista-reserva-possivel-pressupoe-escolhas-tragicas>. Acesso em: 01 mar. 2017.

131 SCAFF, Fernando Facury. Orçamento mínimo social garante a execução de políticas

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Constituição, que o próprio autor denomina como “orçamento mínimo social”, que

são determinações vinculantes que direcionam parte dos recursos para finalidades

fixas. Exemplo disso são os art. 198, § 2° e 3° c/c ADCT, art. 77; art. 212; art. 239,

entre outros.

Diante disso, sabe-se que para a efetivação dos direitos fundamentais

existem muitas variáveis a serem contempladas, sejam elas mínimo existencial,

reserva do possível, ou ainda as vinculações e referibilidades da Constituição

Federal. A grande questão centra-se em o Estado cumprir o determinado no contrato

social e garantir a vida digna à sociedade, que é legítima na determinação das

prioridade, bem como em conceder os recursos para que essas prioridades sejam

observadas e efetivadas, seja a longo ou curto prazo.

A questão é que o Estado é representante do povo, e não pode ele se abster

de buscar a efetivação dos direitos fundamentais, justamente porque é o povo que

alimenta a máquina estatal. Cabe assim ao Estado gerenciar e destinar os recursos,

e ao legislador regulamentar o conteúdo dos direitos fundamentais, bem como a

forma de efetivá-los, para permitir sua efetividade.

públicas. Revista Consultor Jurídico, 20 maio 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-fev-26/contas-vista-reserva-possivel-pressupoe-escolhas-tragicas>. Acesso em: 01 mar. 2017.

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CAPÍTULO 2

PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE: DO

EXCESSO À INSUFICIÊNCIA

O estado absolutista e seus resultados desastrosos geraram ao longo da

história da humanidade uma grande preocupação, qual seja, a de buscar maneiras

de controlar a atuação estatal para que não fosse abusiva, não realizando

ingerências desnecessárias nas liberdades e direitos individuais dos cidadãos.

Porém, apesar de a doutrina majoritária preconizar esse período como o

de maior observância do princípio da proporcionalidade, sua origem ocorreu no

século XIX, no Direito Administrativo de polícia prussiano, que regulava as

ingerências nas liberdades individuais, aumentando sua aplicabilidade

progressivamente, primeiro para todo o Direito Administrativo e, depois, para todo o

Direito Público132.

Com o segundo pós-guerra, em decorrência da doutrina e jurisprudência

alemãs, houve o desenvolvimento do conteúdo e aplicação do princípio da

proporcionalidade, conforme destaca Steinmetz, visto que esse princípio passou a

ser reconhecido expressamente na Lei Fundamental de Bonn de 1949 como

princípio constitucional133.

Sua aplicação na jurisprudência alemã estava essencialmente vinculada à

proteção dos direitos fundamentais e liberdades individuais, ganhando espaço

contínuo como fundamento nas decisões proferidas pelo TCF, conforme destaca

Arnold e Martinez Estay134:

132 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 145.

133 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 146.

134 Em 1952, na decisão de proibir o partido SRP (extrema direita), o TCF aplicou este princípio, e mostrou presente a obrigação da polícia de executar a sentenca que declarou inconstitucional com medidas “adequadas” [...] dois anos depois, o TCF, ao analizar a constitucionalidade de uma lei eleitoral, estendeu ao legislador o princípio da “proporcionalidade da finalidade da ação da medida usada”. [...] Mais tarde, em 1958, o Tribunal explica dogmaticamente o significado deste princípio na famosa sentença sobre admissão limitada de farmácias, conhecida como Apothekenurteil (de 11 de junho de 1958) (tradução livre). In: ARNOLD, Rainer; ESTAY, José

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Ya en 1952, en la decisión de prohibir el partido SRP (extrema derecha), el TCF aplicó este principio, e hizo presente la obligación de la policía de ejecutar con medidas "adecuadas" la sentencia mediante la cual lo había declarado inconstitucional [...] dos años después el TCF, al analizar la constitucionalidad de una ley electoral, extendió al legislador el principio de "proporcionalidad de la finalidad de la acción y la medida usada" [...] Más tarde, en 1958, el Tribunal explica dogmáticamente el significado de este principio en la famosa sentencia sobre admisión limitada de farmacias, conocida como Apothekenurteil (de 11 de junio de 1958).

Mas, na Alemanha, esse princípio, além de proteger os direitos

fundamentais e liberdades individuais, também era visto como complementar de

diversos princípios que fundamentavam o Estado de Direito, tais como o princípio da

determinação e claridade normativa135.

Foi a partir desse momento que o princípio da proporcionalidade passou a

ser reconhecido e aplicado por diversos países e pelo Tribunal Europeu dos Direitos

Humanos.136

Tal fato demonstra a importância desse princípio, visto que, atualmente,

ele é encontrado nos mais diversos sistemas jurídicos mundiais, apesar das

diferenças encontradas entre eles137, sendo utilizado, especialmente, no que

concerne aos direitos humanos fundamentais na seara internacional.

No sistema jurídico pátrio, o princípio da proporcionalidade possui raízes

da doutrina portuguesa e o conteúdo originário da Alemanha, com a Constituição de

Weimar138.

Em relação a seu significado, tradicionalmente, ele foi percebido como

uma ferramenta a ser observada principalmente pelo Estado face os cidadãos,

Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales. 2012, vol. 10, n. 1, p. 65-116. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4067/S0718-52002012000100003>. Acesso em: 07 mar. 2017.

135 ARNOLD, Rainer; ESTAY, José Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales, Santiago, v. 10, n. 1, p. 65-116, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0718-52002012000100003&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 07 mar. 2017.

136 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 146.

137 FLORES, Imer. Proportionality in constitutional and human rights interpretation (2013). Georgetown Law Faculty Publications and Other Works. Paper 1168, p. 86.

138 PANCOTTI, Luiz Gustavo Boiam. Os conflitos de princípios constitucionais na tutela de benefícios. São Paulo: LTR, 2009. p.159.

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proibindo-o de realizar ingerências desnecessárias nos direitos fundamentais e

liberdades dos particulares, passando, com a evolução da matéria, a ser

consideradas como um limite as ingerências também advindas da esfera particular,

evidenciando a faceta de princípio da proibição do excesso.

Em referência ao princípio da proporcionalidade e o conteúdo de

proibição de excesso, Bonavides139 destaca:

Em se tratando de princípio vivo, elástico, prestante, protege ele o cidadão contra os excessos do Estado e serve de escudo à defesa dos direitos e liberdades constitucionais. De tal sorte que urge, quanto antes, extraí-lo da doutrina, da reflexão, dos próprios fundamentos da Constituição, em ordem a introduzi-lo, com todo o vigor, no uso jurisprudencial.

Esse princípio é suscitado para a resolução de conflitos entre princípios e

direitos fundamentais. Sendo por essa razão que, conforme destaca Luiz Gustavo

Boiam Pancotti, o princípio da proporcionalidade é considerado “[...] um verdadeiro

topos argumentativo, exteriorizado através de um mandamento de otimização”140.

Soma-se a isso o fato de ele ser considerado um princípio sui generis,

visto que, diferente de outros princípios, ele é aplicado de maneira constante, sem

variações141.

Porém, com o aumento da importância dada aos direitos fundamentais,

em se tratando de seu reconhecimento, observância e efetividade, passou-se a

perceber que o princípio da proporcionalidade deveria ultrapassar o entendimento

limitado de proibição de excesso, visto que todos os direitos fundamentais exigem

para sua efetividade uma intervenção estatal mínima, para que possam ser

devidamente exercidos pelos cidadãos.

139 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

p. 434. 140 PANCOTTI, Luiz Gustavo Boiam. Os conflitos de princípios constitucionais na tutela de

benefícios. São Paulo: LTR, 2009. p.159. 141 Alexy divide as normas jurídicas em duas categorias, as regras e os princípios. Essa divisão

não se baseia em critérios como generalidade e especialidade da norma, mas em sua estrutura e forma de aplicação. Regras expressam deveres definitivos e são aplicadas por meio de subsunção. Princípios expressam deveres prima facie, cujo conteúdo definitivo somente é fixado após sopesamento com princípios colidentes. Princípios são, portanto, "normas que obrigam que algo seja realizado na maior medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas". In: SILVA, Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. In: Revista dos Tribunais. n. 798, ano 91, abr. 2002.

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Surge assim uma nova faceta ao princípio da proporcionalidade, também

desenvolvida pelo Direito Alemão, denominada princípio da proibição da proteção

insuficiente dos direitos fundamentais.

Esse entendimento extraído do princípio da proporcionalidade desde sua

origem, implica o dever do legislador de proteger os valores assegurados pelos

direitos fundamentais, conforme explicita Arnold142:

El legislador es obligado a cumplir este deber estableciendo reglas sustanciales, procedimentales y de organización que presten una protección suficiente a los derechos. La proporcionalidad se vincula con este deber porque es el medio para proteger al individuo de intervenciones excesivas.

Diante dessas considerações iniciais, o presente capítulo vai analisar a

construção do princípio da proporcionalidade desde sua faceta de proibição de

excesso até no que diz respeito à exigência dessa atuação suficiente para a

efetivação dos direitos fundamentais, faceta essa denominada proibição da proteção

insuficiente dos direitos fundamentais.

2.1 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO NORMA DE ÍNDOLE

CONSTITUCIONAL

No direito contemporâneo, o princípio da proporcionalidade passou a

exercer um papel fundamental na proteção dos direitos fundamentais, pois controla o

poder do Estado e de particulares na restrição dos direitos fundamentais. Em outras

palavras, conforme Prieto, esse princípio vai ser o responsável por verificar a

legitimidade das ingerências realizadas na seara dos direitos fundamentais143.

Ante esse aspecto, o princípio da proporcionalidade se mostrou estar

diretamente relacionado à eficácia dos direitos fundamentais, pois exerce a função

142 O legislador está obrigado a cumprir este dever estabelecendo regras substanciais,

procedimentais e de organização que prestem uma proteção suficiente aos direitos. A proporcionalidade se vincula com este dever, porque é o meio para proteger o indivíduo de intervenções excessivas. In: ARNOLD, Rainer; ESTAY, José Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales, Santiago, v. 10, n. 1, p. 65-116, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0718-52002012000100003&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 07 mar. 2017.

143 PRIETO, Esther Carrizosa. El principio da proporcionalidad como mecanismo de control de las injerencias en el derecho de huelga. Temas laborales. N.77/2004, p. 85.

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de possibilitar que os direitos fundamentais sejam devidamente observados e

exercidos pelos cidadãos.

Mas não se limita somente a isso, conforme já mencionado na introdução

do presente capítulo. O princípio da proporcionalidade também será um dos

fundamentos do Estado de Direito, da mesma forma que no ordenamento jurídico

alemão, espanhol e peruano e, ainda pode-se acrescentar o conteúdo de justiça,

conforme destaca Luís Castillo - Córdova144 em relação ao Tribunal Constitucional

peruano:

Así, tiene manifestado el TC que “[e]n la medida que el principio de proporcionalidad se deriva de la cláusula del Estado de Derecho, él no sólo comporta una garantía de seguridad jurídica, sino también concretas exigencias de justicia material’.

A utilização desse princípio pelos juízes na fundamentação de suas

decisões foi influenciada especialmente pelo direito germânico, como forma de

demonstrar a preocupação com a devida proteção dos direitos fundamentais, e

especialmente demonstrar que nenhum direito fundamental é absoluto face a outro,

tendo em vista a correlação do emprego do princípio da proporcionalidade na técnica

de ponderação pelos juízes.

Seu reconhecimento é expresso na minoria das constituições mundiais,

como na União Europeia. Além de ser utilizado nas jurisprudências, o princípio está

previsto desde 2000, no artigo 52.1 da Carta de Direitos Fundamentais da UE,

carrega em seu conteúdo a proteção de direitos e liberdades e verifica se as

medidas adotadas pela União Europeia e seus estados-membros são adequadas

aos fins que foram determinados145.

144 CORDOVA. Castillo, L. (2005). El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del

Tribunal Constitucional peruano. Revista Peruana de Derecho Público. Jul.-dez. 2005. Repositorio Institucional Pirhua, 2005, p. 6. Disponível em: <https://pirhua.udep.edu.pe/bitstream/handle/11042/1908/Principio_proporcionalidad_jurisprudencia_Tribunal_Constitucional_peruano.pdf?sequence=1>. Acesso em: 16 mar. 2017.

145 ARNOLD, Rainer; ESTAY, José Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales, Santiago, v. 10, n. 1, p. 65-116, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0718-52002012000100003&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 7 mar. 2017.

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Como exemplo de constituição que não prevê expressamente esse

princípio, tem-se a Constituição brasileira, sendo o princípio da proporcionalidade

entendido como derivado do princípio do devido processo legal e do princípio da

igualdade146. Na mesma situação tem-se a Colômbia, que vem definindo os

contornos do princípio em sua jurisprudência, como ocorre no direito alemão.

Ocorre que a não previsão no texto constitucional gera grande dificuldade

na concessão de poder normativo ao princípio da proporcionalidade, ou seja,

justificação a partir da Constituição, pois “[...] a fundamentação constitucional do

princípio é conditio sine qua non para a justificação de sua aplicação e

resultados”147.

Dessa forma, é importante expor primeiramente os fundamentos dessa

força normativa. Para tanto, Steinmetz destaca em sua obra os principais caminhos

utilizados para justificar a força normativa do princípio da proporcionalidade. O

primeiro deles, extraído do direito alemão e seu Tribunal Constitucional Federal,

entende que “[...] o princípio da proporcionalidade é um princípio concretizador da

ideia de justiça presente no princípio do Estado de Direito”148.

Outra possibilidade destacada pelo doutrinador é a partir da análise do

conteúdo essencial dos direitos fundamentais, segundo o qual todo o direito

fundamental possui um núcleo essencial que não pode ser afetado, havendo, a partir

daqui, uma ligação umbilical do princípio da proporcionalidade com os direitos

fundamentais.

Nas palavras de Steinmetz, nessa teoria “[...] o princípio da

proporcionalidade fundamenta-se no conteúdo essencial dos direitos fundamentais

que não pode ser afetado”149. Porém, destaca-se que existem dificuldades que

146 ARNOLD, Rainer; ESTAY, José Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de

proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales, Santiago, v. 10, n. 1, p. 65-116, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0718-52002012000100003&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 7 mar. 2017.

147 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 146

148 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 160.

149 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 161.

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impedem que essa teoria seja amplamente utilizada diante da dificuldade em

delimitar o núcleo essencial dos direitos fundamentais.

Uma terceira hipótese abordada pelo doutrinador seria a partir da análise

do princípio da dignidade da pessoa humana, considerado o valor nuclear dos

direitos fundamentais. Da mesma forma que a hipótese anterior, segundo Gonzalez-

Cuellar, “[...] não é conveniente fundamentar o princípio da proporcionalidade

unicamente em conceitos como dignidade do homem, dado o alto grau de abstração

e imprecisão”150.

Por fim, Steinmetz expõe duas teses para explicar a força normativa do

princípio da proporcionalidade adotadas pelo constitucionalismo brasileiro.

A primeira delas, também utilizada para explicar o status de princípio

constitucional do princípio da proporcionalidade, é a partir da “cláusula do due

process of law”, extraída do art. 5º, LIV, da Constituição Federal151.

Segundo o doutrinador, essa tese sustenta que há equivalência entre o

princípio da proporcionalidade e da razoabilidade e, como exemplo, ele menciona os

doutrinadores Mendes e Barroso, explicando que segundo esses autores há

“intercambialidade ou fungibilidade entre os princípios da proporcionalidade (de

origem germânica) e da razoabilidade (de origem norte-americana)”152.

Ocorre que essa afirmação, para outros doutrinadores, não é verídica,

pois ainda há dúvida sobre essa similaridade entre o princípio da proporcionalidade

e da razoabilidade, tema que será abordado com mais profundidade no tópico

seguinte.

A outra tese explicada é a da pluralidade de fundamentos normativos, que

“[...] evidencia que inúmeras são as bases normativas utilizadas para justificar o

princípio da proporcionalidade”153.

150 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da

proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 165. 151 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da

proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 165. 152 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da

proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 166. 153 STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão dos direitos fundamentais e princípio da

proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 166.

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Ela demonstra que o princípio da proporcionalidade é visto como

fundamento do Estado de Direito, podendo ser identificado em outros dispositivos

normativos da Constituição, tais como os art. 5º, V, X; art. 7º, IV, V e XXI, art. 98 do

ADCT, entre outros.

Assim, é diante de todas essas previsões que Ribeiro154 defende a

suficiente justificação de reconhecimento da efetividade do princípio da

proporcionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, ainda que não expresso na

Constituição Federal.

Guerra Filho155 não aborda sobre teorias a respeito da força normativa do

princípio da proporcionalidade, mas demonstra que ainda que não haja previsão

expressa em relação a isso na CF, tal ideia está implícita, conforme pode-se verificar

no art. 5º, em seus dois parágrafos, no inciso II, que assim transcreve:

[...] a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitarem-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

Segundo Medeiros Dias destaca, para Valeschka e Silva Braga, o

princípio da proporcionalidade independe de previsão expressa “[...] devido à

necessidade que se tem de ponderar todos os interesses contrapostos que existem

no ordenamento jurídico, necessidade esta que advém do próprio Estado de

Direito”156. Extraindo-se a ideia de que o princípio da proporcionalidade é uma

consequência da essência dos valores que o próprio do Estado de Direito defende.

Assim, pode ser concebido ao princípio da proporcionalidade o status de

princípio dos princípios, representando a essência do Estado Democrático de Direito,

154 RIBEIRO, Ricardo Silveira. Princípio da proporcionalidade e meio ambiente: anotações

críticas a partir do hard case meio ambiente x vida humana. In: Direito penal, processo penal, criminologia e vitimologia. Bureau jurídico - Complexo educacional de ensino e pesquisa. Brasília, 2002. p. 323.

155 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo:Celso Bastos Editor - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2003. p. 63.

156 BRAGA, Valeschka e Silva. Princípio da proporcionalidade e da razoabilidade. Curitiba: Juruá. 2004. p. 94. In: DIAS, Everaldo Medeiros. As cotas para negros em universidades e o princípio da proporcionalidade: uma política de afirmação da função do Estado social do Estado Contemporâneo. Universidade do Vale do Itajaí (Mestrado em Ciência Jurídica). 2010, p.125.

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sendo, portanto, uma garantia fundamental para que outros direitos fundamentais

sejam devidamente exercidos.

Humberto Ávila realiza a explicação do fundamento jurídico-positivo de

validade do princípio da proporcionalidade de maneira diversa. Ele destaca que esse

princípio é, na realidade, um postulado normativo aplicativo, sendo essa a razão de

não poder sua justificativa ser reduzida a normas ou mais textos normativos, mas

sim, como o próprio autor157 acrescenta:

[...] por implicação lógica, da estrutura das próprias normas jurídicas estabelecidas pela Constituição brasileira e da própria atributividade do Direito, que estabelece proporções entre bens jurídicos exteriores e divisíveis.

Em relação ao emprego do princípio da proporcionalidade no

ordenamento jurídico brasileiro, ele será a base da chamada técnica da ponderação

nas situações em que ocorre contradição entre direitos fundamentais, e nos

chamados casos difíceis, em que a técnica de subsunção se mostra insuficiente para

preservar os valores defendidos pelo Estado Democrático de Direito.

Nessa seara, a atuação do princípio da proporcionalidade vai estar

voltada à harmonização dos interesses conflitantes, “[...] solucionando-se de forma

que maximize o respeito a todos os envolvidos no conflito”158.

Toda essa lógica está voltada especialmente para evitar limitações

desnecessárias aos direitos fundamentais, ou seja, para que a ingerência do poder

público ou particular seja legítima159.

Para cumprir esse objetivo, Gilmar Mendes sustenta em seus estudos que

a tridimensionalidade do princípio da proporcionalidade160 está representada pelos

157 AVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever

de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo. Jan./mar. 1999. Rio de Janeiro, 215. p. 153.

158 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: Celso Bastos Editor - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2003. p. 69.

159 PRIETO, Esther Carrizosa. El principio de proporcionalidad como mecanismo de control de las injerencias en el derecho huelga. Temas laborales. Nº 77/2004. Universidad Pablo de Olavide, p. 84.

160 FROTA, Himdemberg Alves. Reflexões sobre o princípio tridimensional da proporcionalidade. Revista Española de Derecho Constitucional. Nº 76, jan.-abr. 2006. p. 286.

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seguintes subprincípios: “princípio da adequação”, “princípio da necessidade” e

“princípio da proporcionalidade em sentido estrito” ou “máxima do sopesamento”161.

Nessa perspectiva, são elucidativas as lições de Prieto sobre essas três

dimensões. Primeiramente, a ingerência tem que ocorrer a partir de um bem ou

direito garantidos pela Constituição; a medida restritiva deve ser adequada para

proteção do outro bem que faça parte do conflito; dentre todas as medidas possíveis,

a medida adotada é imprescindível e eficaz, sendo a menos lesiva para o direito

fundamental; e, que exista equilíbrio entre os benefícios e prejuízos dos direitos que

exigiram a restrição e direitos que sofreram a restrição162.

Assim, pode-se concluir que a aplicação do princípio da proporcionalidade

e a análise de seus subprincípios remetem a esse foco especial dado à proteção dos

direitos fundamentais dos cidadãos no Estado de Direito, limitar as ingerências e

proteger as liberdades.

Isso ocorre especialmente por causa do histórico já citado dos direitos

fundamentais, que antes eram limitados e submetidos à lei. Com a ascensão do

neoconstitucionalismo, essa lógica mudou, sendo portanto os direitos fundamentais

limites para a lei e, consequentemente para o legislador. E, posteriormente, essa

lógica passou a ser difundida para toda a Administração Pública.

Ou seja, a atuação do Poder Público deve ser voltada a cumprir os

interesses públicos de maneira proporcional a não limitar de maneira desnecessária

os direitos fundamentais.

Outras possíveis aplicações do princípio da proporcionalidade será na

fundamentação do recurso extraordinário, na seara do direito penal, bem como no

controle de atos administrativos discricionários163.

161 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São

Paulo: Celso Bastos Editor - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2003. p. 70. 162 PRIETO, Esther Carrizosa. El principio de proporcionalidad como mecanismo de control de

las injerencias en el derecho huelga. Temas laborales. Nº 77/2004. Universidad Pablo de Olavide, p. 85.

163 RIBEIRO, Ricardo Silveira. Princípio da proporcionalidade e meio ambiente: anotações críticas a partir do hard case meio ambiente x vida humana. In: Direito penal, processo penal, criminologia e vitimologia. Bureau jurídico - Complexo educacional de ensino e pesquisa. Brasília, 2002. p. 327.

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Rainer164 corrobora com esse entendimento ao destacar:

Por último, el Tribunal Constitucional alemán ha hecho también extensivo el principio de proporcionalidad a las relaciones entre el gobierno central y la administración local. En tal sentido, las potestades de esta última sólo pueden restringirse siempre que el objetivo sea legítimo, que la medida sea idónea y adecuada para alcanzarlo, y que de entre varias posibles medidas se adopte la menos restrictiva.

Nas decisões do STF, o princípio da proporcionalidade é empregado

nos mais diversos casos de natureza jurídica distinta. Sua utilização nas palavras de

Ávila é um dever jurídico-positivo e demonstra a racionalidade das decisões

judiciais.

É a partir dessas decisões do Supremo e de todos os graus do

judiciário que se pode ver que o emprego desse princípio é cada vez mais

recorrente, especialmente, na faceta do princípio da proporcionalidade denominada

de proibição do excesso, percebido como o princípio de não exigir demais do

cidadão. A origem do princípio da proporcionalidade poderia se confundir com o da

faceta da “proibição do excesso”, tendo em vista a sua função inicial de proteção do

cidadão contra os excessos do poder estatal165.

Para exemplificar, Ávila expõe algumas decisões do STF

demonstrando seu emprego. O primeiro caso apresentado se refere à

impossibilidade, “[...] por pretensão de terceiro, constranger o pai presumido ao

fornecimento de sangue para a pesquisa de DNA”166. Sendo o princípio da

proporcionalidade interpretado, nesse caso, como uma limitação individual à

violação do direito fundamental à dignidade humana.

164 Por ultimo, o Tribunal Constitucional alemão estendeu a aplicação do princípio da

proporcionalidade às relações entre o governo central e a administração local. Nesse sentido, as potestações dessa última somente podem se restringir sempre que o objetivo seja legítimo, que a medida seja idônea e adequada para alcançá-lo, e que dentre as medidas possíveis se adote a menos restritiva. (Tradução livre). In: ARNOLD, Rainer; ESTAY, José Ignacio Martinez; URBINA, Francisco Zuniga. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del tribunal constitucional. Estudios constitucionales. Santiago, v. 10, n. 1, p. 65-116, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0718-52002012000100003&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 7 mar. 2017.

165 RUDOLFO, Fernanda Mambrini. Proibição de proteção deficiente e de excesso de proibição: restrição de liberdades constitucionais no processo penal e a lei 12.403/11. Espaço Jurídico. V. 13, n. 2, p. 257. Joaçaba, jul./dez. 2012.

166 AVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo. Jan./mar.1999. Rio de Janeiro, 215. p. 151.

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Outra decisão destacada, se refere ao fato de “[...] a isenção do

importo de competência da União ser parcial implicaria o afastamento das regras

pertinentes constantes da Constituição anterior”167. Aqui, o princípio da

proporcionalidade demonstra a necessidade de racionalidade da decisão judicial.

Na seara do Direito Penal, a proporcionalidade vai trabalhar com a

relação entre pena, agravante e a análise do disposto em lei no que diz respeito a

prescrições legais.

Com uma maior evolução do entendimento do direito e de sua

aplicação, o princípio da proporcionalidade passou a ser entendido e aplicado como

além da proibição de excesso, especialmente após o neoconstitucionalismo, em que

foi dada maior relevância à Constituição e direitos fundamentais nela explícitos e

implícitos.

E, como já tratado anteriormente, não são somente os direitos

classificados como direitos fundamentais, sendo abrangidos nesse entendimento os

princípios implícitos e explícitos nela.

2.2 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE

Diante de todas as questões até agora suscitadas, a questão da

proporcionalidade e da razoabilidade é a que gera mais controvérsias no mundo

jurídico. Isso ocorre porque, por muitas vezes, são tratadas como expressões

sinônimas, possuindo as mesmas funções; e, outras vezes, doutrinadores

reconhecem suas distinções, demonstrando que o princípio da proporcionalidade e

da razoabilidade possui aplicações diversas no ordenamento vigente.

E, para iniciar os esclarecimentos, Guerra Filho168 destaca que essa

confusão entre os dois princípios possui origem anglo-saxônica e influência da

doutrina argentina. Mas, defende que tais princípios são diferentes, explicando tal

diferenciação da seguinte forma:

167 AVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de

proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo. Jan./mar. 1999. Rio de Janeiro, 215. p. 151.

168 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: Celso Bastos Editor - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2003, p. 69.

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O princípio da proporcionalidade tem um conteúdo, não sendo como aquele dito da razoabilidade um princípio negativo, capaz tão-somente de evidenciar que dado ato administrativo não cumpre com sua finalidade, por absurdo ou arbitrário.

Ou seja, o princípio da razoabilidade vai ser empregado na seara

administrativa, enquanto, consequentemente, o princípio da proporcionalidade tem a

função limitada à seara judicial.

Corroborando com o entendimento, Roberto e Finotti Silva também

entendem que esses princípios não devem ser tratados como sinônimos, pois,

apesar de terem objetivos semelhantes, “[...] a estrutura e o critério com que cada

uma é aplicada são diferentes, sendo a proporcionalidade muito mais do que apenas

a adequação dos meios ao fim”169.

No mesmo sentido, Ingo Sarlet170 também sustenta que não pode haver

confusão entre eles visto que, apesar de possuírem pontos em comum:

[...] a estrutura metodológica de aplicação da proporcionalidade em três níveis (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), [...] não se confunde com o raciocínio utilizado quando da aplicação da razoabilidade.

Na visão de Humberto Ávila, há diferença entre esses dois princípios,

destacando o dever de razoabilidade, ou seja, quando determinada medida “[...] não

é considerada inconstitucional por causa da limitação advinda da ponderação entre

princípios, mas devido à concreta aplicação relativamente a determinado sujeito”171,

concluindo que a razoabilidade foca em condições pessoais.

Oliveira e Malinowski172 distinguem esses princípios de outra forma, ou

seja, enquanto o princípio da proporcionalidade exige a colisão entre direitos

169 ROBERTO, Karina; SILVA, Nelson Finotti. A regra da proporcionalidade e o princípio da

razoabilidade. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v. 7, n. 2, 2º quadrimestre de 2012. Disponível em: <www.Univali.br/direitoepolitica>. Acesso em: 7 mar. 2017.

170 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 213-214.

171 AVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo. Jan./mar.1999. Rio de Janeiro, 215, p. 174.

172 OLIVEIRA, Diego Bianchi de; MALINOWSKI, Carlos Eduardo. A aplicação de critérios de proporcionalidade e razoabilidade na ponderação de princípios constitucionais. Revista de Ciências Jurídicas e Sociais da UNIPAR, v. 16, n. 1, jan./jun., 2013. p.121.

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fundamentais, o princípio da razoabilidade estará focado na seara do direito

administrativo.

Outro aspecto que pode ser utilizado para diferenciar esses dois

princípios é quanto à sua origem. Conforme já mencionado, o princípio da

proporcionalidade teve origem no século XIX, com o Tribunal Constitucional

Administrativo, restringido ao Direito de Polícia a princípio, propagando sua

utilização posteriormente para todo o direito administrativo.

Enquanto isso, o princípio da razoabilidade teve sua origem com o

desenvolvimento da garantia do devido processo legal, com a promulgação das

emendas 5ª e 14ª introduzidas nas constituições norte-americanas em 1789 e

1868173, respectivamente.

Mas, apesar dessas considerações, é importante demonstrar a posição da

jurisprudência pátria, que trata esses dois princípios como sinônimos, podendo-se

citar como defensores desse pensamento Gilmar Ferreira Mendes, Celso Ribeiro

Bastos, Paulo Gustavo Gonet174. Eles entendem que, assim como na Europa, o

princípio da proporcionalidade possui uma “relação de fungibilidade com o princípio

da razoabilidade”175.

Inclusive, o STF vêm empregando esses dois princípios em sua

jurisprudência de maneira indistinta. Como asseverou Gilmar Mendes176:

[...] o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade consubstancia uma pauta de natureza axiológica que emana diretamente das ideias de justiça, equidade, bom senso, prudência, moderação, justa medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins; precede e condiciona a positivação jurídica, inclusive a de nível constitucional; e, ainda, enquanto princípio geral do direito, serve de regra de interpretação para todo o ordenamento jurídico.

173 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de

uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 218. 174 Nota de rodapé In: PERUCHIN, Marcelo Caetano Guazzelli. O princípio da proporcionalidade

como ferramenta eficaz para a aferição da ilegitimidade da indevida restrição a direitos fundamentais, no âmbito do processo penal. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 1, n. 1, p. 220, 2015. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.22197/ rbdpp.v1i1.11>. Acesso em: 16 mar. 2017.

175 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 224.

176 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4ª ed. São Paulo, 2009. p. 143.

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Na seara internacional, Luis Castillo Córdova, utilizando o

entendimento do Tribunal Constitucional peruano, explica que existem duas linhas

de jurisprudência. A primeira que trata a proporcionalidade como sinônimo da

razoabilidade e outra que defende que a razoabilidade é utilizada de modo distinto

da proporcionalidade177.

De acordo com esse mesmo doutrinador, a linha que define a

razoabilidade como algo distinto da proporcionalidade no TC peruano destaca que a

razoabilidade possui “[...] una adecuada relación lógico-axiológica entre la

circunstancia motivante, el objeto buscado y el medio empleado”178. Ou seja, a

razoabilidade deve analisar se a medida restritiva possui o objetivo de preservar ou

proteger um fim constitucional.

Em relação ao aspecto estrutural desses princípios, o princípio da

proporcionalidade vai buscar a satisfação de seus três subprincípios: a idoneidade,

necessidade e proporcionalidade em sentido estrito179.

De outra seara, a razoabilidade vai se restringir a analisar se houve

compatibilidade entre o meio e o fim visado pelo Estado, para analisar se houve

abuso de poder ou limitação desnecessária.

No Brasil, Luís Roberto Barroso180 explica a aplicação da razoabilidade

como a adequação de diversos elementos, conforme expõe:

A atuação do Estado na produção de normas jurídicas normalmente far-se-á diante de certas circunstâncias concretas; será destinada à realização de determinados fins, a serem atingidos pelo emprego de determinados meios. Desse modo, são fatores invariavelmente presentes em toda ação relevante

177 CORDOVA. Castillo, L. El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del Tribunal

Constitucional peruano. Revista Peruana de Derecho Público. Jul.-dez. 2005. Repositorio Institucional Pirhua, 2005, p. 7. Disponível em: <https://pirhua.udep.edu.pe/bitstream/handle/11042/1908/Principio_proporcionalidad_jurisprudencia_Tribunal_Constitucional_peruano.pdf?sequence=1>. Acesso em: 16 mar. 2017.

178 Definição destacada da EXP. N.º 0090–2004–AA/TC, de 05 de julho de 2004, que defende que a razoabilidade comporta uma adequada relação lógico-axiológico entre a circunstância motivante, o objeto buscado e o meio empregado.

179 CORDOVA. Castillo, L. (2005). El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del Tribunal Constitucional peruano. Revista Peruana de Derecho Público. Jul.-dez. 2005. Repositorio Institucional Pirhua, 2005, p. 7. Disponível em: <https://pirhua.udep.edu.pe/bitstream/handle/11042/1908/Principio_proporcionalidad_jurisprudencia_Tribunal_Constitucional_peruano.pdf?sequence=1>. Acesso em: 16 mar. 2017.

180 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 220.

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para a criação do direito: os motivos (circunstâncias de fato), os fins e os meios. Além disso, há de se tomar em conta, também, os valores fundamentais da organização estatal, explícitos ou implícitos, como a ordem, a segurança, a paz, a solidariedade; em última análise, a justiça. A razoabilidade é, precisamente, a adequação de sentido que deve haver entre esses elementos.

O doutrinador ainda destaca dois tipos de razoabilidade: a interna e a

externa. A primeira é aferida dentro da lei, enquanto a segunda é a “adequação aos

meios e fins admitidos e preconizados pelo texto da Constituição”181.

Assim, esclarecidas as distinções estruturais entre esses dois princípios,

é importante destacar a unidade essencial existente entre eles, de acordo com

Córdova. Ou seja, existe uma similaridade entre estes princípios, sendo entendidos

como algo contrário de arbitrariedade, que assim é definida:

[…] como “el reverso de la justicia y el derecho”, y como “lo carente de fundamentación objetiva; como lo incongruente y contradictorio con la realidad que ha de servir de base a toda decisión. Es decir, como aquello desprendido o ajeno a toda razón de explicarlo”182.

É por esta razão que os doutrinadores dão tratamento jurídico similar ao

princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, visto seu trabalho conjunto no

controle das arbitrariedades realizadas nos direitos fundamentais, violando seu

conteúdo de justiça e liberdade.

Inclusive Peruchin, ao falar dos subprincípios da proporcionalidade,

destaca a proporcionalidade em sentido estrito como razoabilidade, entendido como

“[...] aquilo que seja conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o

que não seja arbitrário ou caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos

valores vigentes em dado momento”183.

181 ROBERTO, Karina; SILVA, Nelson Finotti. A regra da proporcionalidade e o princípio da

razoabilidade. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v. 7, n. 2, 2º quadrimestre de 2012. Disponível em: <www.Univali.br/direitoepolitica>. Acesso em: 7 mar. 2017.

182 CORDOVA. Castillo, L. (2005). El principio de proporcionalidad en la jurisprudencia del Tribunal Constitucional peruano. Revista Peruana de Derecho Público. Jul.-dez. 2005. Repositorio Institucional Pirhua, 2005, p. 7. Disponível em: <https://pirhua.udep.edu.pe/bitstream/handle/11042/1908/Principio_proporcionalidad_jurisprudencia_Tribunal_Constitucional_peruano.pdf?sequence=1>. Acesso em: 16 mar. 2017.

183 PERUCHIN, Marcelo Caetano Guazzelli. O princípio da proporcionalidade como ferramenta eficaz para a aferição da ilegitimidade da indevida restrição a direitos fundamentais, no âmbito do

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Diante disso, pode-se concluir que a proporcionalidade e a razoabilidade

estão atrelados, demonstrando assim que ambos os princípios possuem uma

relação, devendo trabalhar juntos para que haja a devida eficácia dos direitos

fundamentais.

Ou seja, o princípio da proporcionalidade e o da razoabilidade chegam a

um mesmo fim, o de limitar o poder estatal, permitindo que o Judiciário possa

demandar contra os outros poderes do Estado quando qualquer medida for

desproporcional ou desarrazoada184.

Na seara administrativa, o Judiciário não possui a mesma liberdade para

intervir, sendo essa somente possível nos atos discricionários, resultando em

violação do princípio da razoabilidade aferida quando o juiz verificar que a escolha

do legislador não segue os critérios estabelecidos pela norma, bem como quando

não há juízo de conveniência e oportunidade.

E, da mesma forma que o princípio da proporcionalidade, apesar de o

princípio da razoabilidade não estar previsto expressamente na Constituição pátria

vigente, ele vem sendo utilizado com cada vez mais força pelos tribunais, evitando

os possíveis atos arbitrários.

Sobre essa atuação conjunta, Oliveira e Malinowski185 destacam:

O princípio da proporcionalidade é profundamente ligado ao princípio da razoabilidade do direito, sendo que tanto a proporcionalidade como a razoabilidade têm por escopo oferecer critérios à limitação da atuação do Poder Público, suporte jurídico à salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos.

No mesmo sentido, Barroso compartilha do mesmo entendimento, visto

que o princípio da razoabilidade-proporcionalidade é para ele um instrumento de

grande importância para a proteção dos direitos fundamentais e, “[...] por funcionar

processo penal. Revista Brasileira de Direito Processual Penal. Porto Alegre, vol. 1, n. 1, p. 226, 2015. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.22197/ rbdpp.v1i1.11>. Acesso em: 20 mar. 2017.

184 SLERCA, Eduardo. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 31.

185 OLIVEIRA, Diego Bianchi de; MALINOWSKI, Carlos Eduardo. A aplicação de critérios de proporcionalidade e razoabilidade na ponderação de princípios constitucionais. Revista de Ciências Jurídicas e Sociais da UNIPAR, v. 16, n. 1, jan./jun., 2013. p.121.

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como a medida com que uma norma deve ser interpretada no caso concreto para a

melhor realização do fim constitucional”186.

Assim sendo, é imprescindível que esses princípios sejam observados

pelos atos emanados pelo Poder Público, pois, conforme destacado no presente

capítulo, os arbitrariedades possuem efeitos nos direitos fundamentais de toda a

sociedade, sendo portanto uma violação aos valores do Estado Democrático de

Direito e da cidadania, sendo essa entendida como o status de uma sociedade em

que todos possuem direitos que devem ser observados e respeitados pelo Estado e

por terceiros.

Ocorre que a preocupação já não se limita somente à atuação em

excesso do Estado, mas também em como a omissão por parte do Estado, ou

melhor dizendo, a atuação insuficiente do Estado pode vir a causar danos ao

cidadão no momento de exercer seus direitos fundamentais. Tal problemática será

esclarecida no item seguinte, em que será abordada esta outra faceta do princípio

da proporcionalidade, denominada princípio da proibição da proteção insuficiente.

2.2.1 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO EXCESSO

Tal como exposto na introdução do presente capítulo, o princípio da

proibição do excesso (Verhältnismässigkeitspronzip) é desdobramento do princípio

da proporcionalidade e, inclusive, a face mais conhecida do mesmo, qual seja, a

probição do poder estatal de realizar ingerências desnecessárias nos direitos

fundamentais e liberdades dos particulares, passando, posteriormente, a ser

consideradas como um limite as ingerências também advindas da esfera particular,

evidenciando a faceta de princípio da proibição do excesso.

Segundo a Corte Alemã, tal princípio é implícito, e é reconhecido quando

se diante de uma medida lesiva a um direito fundamental possa-se constatar outras

medidas menos lesivas187.

186 BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos

fundamentais e a construção do novo modelo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 329. 187 MEDEIROS, Marcelo Farina de. A proibição de excesso como instrumento de

desenvolvimento sustentável. II Congresso Jurídico e II Encontro Técnico-Científico em Direito no Mato Grosso do Sul. Campo Grande, 1º e 2 de julho de 2012. Realização:

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Trata-se de uma face que trabalha com a conciliação entre direitos

fundamentais, proibindo o excesso nas restrições ou limitações desses direitos188.

Sobre esse ponto, o ministro Gilmar Mendes189 destaca:

Princípio da proibição do excesso constitui uma exigência positiva e material relacionada ao conteúdo de atos restritivos de direitos fundamentais, de modo a estabelecer um ‘limite do limite’ ou uma ‘proibição de excesso’ na restrição de tais direitos.

Assim, diante do histórico do Estado opressor da sociedade, o princípio

da proibição do excesso vai garantir que haja um respeito à coexistência dos direitos

fundamentais, para que o Estado não faça limitações abusivas sem justificativa aos

mesmos.

Como exemplo, Marcelo Farina de Medeiros destaca a atividade

legislativa, em que a observação do princípio da proibição do excesso ocorre

quando há observância dos objetivos da norma, e os meios necessários para atingi-

los, a partir da necessidade e adequação, visando interferir o mínimo necessário na

esfera de outros direitos fundamentais190. Ou seja, é um princípio que vai ressaltar o

valor do justo.

Assim, ainda que o âmbito de proteção de determinada norma de direito

fundamental possa colidir com outros direitos fundamentais, todas merecem uma

devida proteção, sendo portanto essa a razão para que a restrição seja proporcional,

a fim de que elas possam estar em sintonia com o sistema jurídico e outros direitos e

bens jurídicos protegidos.

FADIR/UFMS. Apoio: FUNDECT.

188 MEDEIROS, Marcelo Farina de. A proibição de excesso no direito ambiental: em prol do desenvolvimento sustentável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4020, 4 jul. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/30007>. Acesso em: 3 jul. 2017.

189 BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Suspensão de Tutela Antecipada – STA 233/RS, Decisão da Presidência Ministro Gilmar Mendes, DJe de 30.04.2009.

190 MEDEIROS, Marcelo Farina de. A proibição de excesso no direito ambiental: em prol do desenvolvimento sustentável. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 4020, 4 jul. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/30007>. Acesso em: 3 jul. 2017.

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Dessa forma, qualquer restrição que venha a ocorrer deve respeitar os

fins almejados pela lei e pela Constituição Federal. Assim, Gabriel Wedy191

complementa tal asserção da seguinte forma:

Os meios utilizados pelo Estado não podem ser ínfimos a ponto de nada tutelar e a nenhum fim atingir e nem excessivos a ponto de violar direitos fundamentais. Deve haver, portanto, adequação nos atos da Administração Pública para que haja respeito ao princípio da proporcionalidade.

De acordo com Marcelo Medeiros, citando o ilustre estudioso Eros Graus,

o princípio da proibição do excesso será uma ferramente essencial para uma “[...]

adequação dos atos das três esferas do Poder Público (...) e está estritamente

relacionado aos igualmente princípios constitucionais da proporcionalidade e da

isonomia”192.

Sua principal função no direito comparado está no controle de

constitucionalidade das normas, uma vez que no sistema jurídico existem direitos

individuis e direitos coletivos, não devendo ocorrer restrições desnecessárias de uns

em prol de outros.

Dessa forma, esta faceta do princípio da proporcionalidade se mostra

essencial, visto que também concede uma proteção dos direitos fundamentais,

permitindo que os mesmos não sejam anulados por atos do Poder Público,

garantindo um mínimo de efetividade desses direitos constitucionais.

191 WEDY, Gabriel. O princípio da precaução e a responsabilidade civil do Estado. Revista da

AJURIS. V. 41, n. 134, jun. 2014. Disponível em: <www.ajuris.org.br/OJS2/index.php/REVAJURIS/article/download/203/139>. Acesso em: 03 jul. 2017.

192 MEDEIROS, Marcelo Farina de. A proibição de excesso como instrumento de desenvolvimento sustentável. II Congresso Jurídico e II Encontro Técnico-Científico em Direito no Mato Grosso do Sul. Campo Grande, 1º e 2 de julho de 2012. Realização: FADIR/UFMS. Apoio: FUNDECT.

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2.3 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE193 194

Nos séculos XVIII e XIX195, o cenário não era muito favorável aos direitos

fundamentais, que, apesar de estarem expressos, não eram observados com tanta

relevância, sendo sua função restringida a limitar o poder do Estado, que era visto

como um grande vilão por interferir negativamente na liberdade dos cidadãos.

O papel do Direito também se encontrava limitado, visto o extremo

formalismo, além da ausência da compreensão do mesmo como um todo,

dificultando ainda mais a possível concretização dos ditames constitucionais196.

Porém, após a Segunda Guerra Mundial, houve a necessidade de um

novo modelo constitucional, desencadeando o fenômeno denominado, segundo

Riccardo Guastini, de “constitucionalização do ordenamento jurídico”197, ou ainda

neoconstitucionalismo, que, conforme a mestranda Cornelius198, trata-se de:

[…] uma nova linha de pensamento passou a ser colocada em prática, onde todo e qualquer instituto deveria passar sob as lentes das normas constitucionais, reconhecendo a primazia da Constituição e, principalmente o poder normativo que os princípios constitucionais expressos ou não possuem.

Foi a partir daí que o entendimento do princípio da proporcionalidade

passou a evoluir, afim de adequar seu conteúdo com esses novos contornos dados

193 Esse capítulo contém partes do artigo CORNELIUS, Camila Savaris; GARCIA, Rafaela

Schmitt. O princípio da proibição da proteção insuficiente e o direito fundamental ao desenvolvimento sustentável apresentado no 7º Seminário Internacional de Governança e Sustentabilidade na Universidade de Alicante, Espanha.

194 Ao longo do presente trabalho, será utilizada a expressão “proteção insuficiente”, uma locução relativa ao princípio, em vez de “proibição da proteção deficiente”. A proteção insuficiente é o outro lado do princípio da proporcionalidade, qual seja, proibição do excesso. Neste sentido, o legislador não poderia ir além para proteger um direito fundamental, como não pode realizar menos para protegê-lo. Todavia, pode-se entender que uma proteção insuficiente dos direitos fundamentais, condiz com uma proteção deficiente, no sentido de que é inadequada.

195 STRECK, Maria Luiza Schafer. O Direito Penal e o princípio da proibição de proteção deficiente: a face oculta da proteção dos direitos fundamentais. Dissertação de Mestrado da Universidade do Vale dos Sinos. São Leopoldo: Unisinos, 2008. pp. 21. Disponível em: <http://bdtd.unisinos.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=721>. Acesso em: 19 set. 2016.

196 GAVIÃO, Juliana Venturella Nahas. A proibição de proteção deficiente. Revista do Ministério Público do RS. Porto Alegre, n. 61, maio/out. 2008. p. 94.

197 GUASTINI, Riccardo. La “constitucionalización” del ordenamento jurídico: el caso italiano. In: CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo(s). Madri: Trotta. 2003.

198 CORNELIUS, Camila Savaris. Neoconstitucionalismo. Argumentação jurídica e a sustentabilidade como equação para a preservação ambiental frente ao desenvolvimento econômico. In: Argumentação jurídica e o direito contemporâneo [recurso eletrônico] (orgs.: Alexandre Morais da Rosa, Natammy Luana de Aguiar Bonissoni; coords. Luciene Dal Ri, Rafael Padilha dos Santos, Orlando Luiz Zanon Junior). Dados eletrônicos. Itajaí: Univali, 2016. p. 89.

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ao Estado, sendo utilizado especialmente para controlar as limitações aos direitos

fundamentais advindas das atuações do mesmo199.

Mas, foi com o surgimento do Estado Democrático (Social) de Direito, que

o Estado passou a ser cobrado por uma posição mais ativa em relação a proteção

dos direitos fundamentais, não limitando sua atuação a abstenção, mas sim a

“guardião dos direitos fundamentais de todas as gerações”200.

Corrobora com esse entendimento Ingo W. Sarlet, pois o Estado

Democrático de Direito é visto como um Estado garantista “[...] no sentido de os

direitos fundamentais serem simultaneamente fundamento, finalidade e tarefa do

Estado e da própria sociedade”201.

Diante de todo esse contexto, o princípio da proporcionalidade passou a

ser entendido como possuidor de duas facetas, o princípio da proibição de excesso e

o princípio da proibição da proteção insuficiente. O primeiro proibindo o excesso por

parte do Estado, violando a liberdade individual do sujeito de direitos, e o segundo

exigindo uma atuação suficiente na proteção dos direitos fundamentais de todas as

gerações conforme a determinação da Constituição.

Sobre esse duplo viés do princípio da proporcionalidade, leciona

Streck202:

Trata-se de entender, assim, que a proporcionalidade possui uma dupla face: de proteção positiva e de proteção de omissões estatais. Ou seja, a inconstitucionalidade pode ser decorrente de excesso do Estado, caso em que determinado ato é desarrazoado, resultando desproporcional o resultado do sopesamento (Abwägung) entre fins e meios; de outro, a inconstitucionalidade pode advir de proteção insuficiente de um direito fundamental-social, como ocorre quando o Estado abre mão do uso de determinadas sanções penais ou administrativas para proteger determinados bens jurídicos.

199 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13ª ed. Sao Paulo: Malheiros, 2003. 200 GAVIÃO, Juliana Venturella Nahas. A proibição de proteção deficiente. Revista do

Ministério Público do RS. Porto Alegre, n. 61, maio-out./2008, p. 94. 201 SARLET, Ingo W. Constituição, proporcionalidade e direitos fundamentais: o direito penal

entre proibição de excesso e de insuficiência. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n. 10, Madri, 2006. p. 304.

202 STRECK, Lenio Luiz. A dupla face do princípio da proporcionalidade: da proibição de excesso (Übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (Untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais. Revista da Ajuris, Ano XXXII, nº 97, mar. 2005, p.180.

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Em relação a origem do princípio da proibição da proteção deficiente ou

insuficiente (Untermassverbot), segundo a doutrina, essa foi uma expressão criada

por Claus-Wilhelm Canaris, na obra “Direitos Fundamentais e Direito Privado”

(“Grundreche und Privatrecht”)203, sendo tratado expressamente pela primeira vez

pelo Tribunal Constitucional Alemão, em sua segunda decisão sobre o aborto

(BVERFGE 88, 203 [SCHWANGERSCHAFTSABBRUCH II]) prolatada em

28/05/1993, em que o Tribunal se manifesta da seguinte forma:

O Estado deve adotar medidas normativas e fáticas suficientes para cumprir seu dever de tutela, que levem – considerando os bens conflitantes – ao alcance de uma proteção adequada e, como tal, efetiva (proibição de insuficiência). Para tanto, é necessário um projeto de proteção que combine elementos de proteção preventiva e repressiva204.

Trata-se de uma decisão que analisou o dever do Estado de proteger a

vida, expressa na Lei Básica da Alemanha em seu artigo 1º, parágrafo 1º, ou mais

precisamente, a função estatal de proteger a vida do nascituro, exigindo uma

atuação positiva por parte do Estado nesse sentido, e que essa proteção independe

da proteção da vida da mãe205.

Segue o trecho da decisão nesse sentido206:

O dever do Estado, de proteger a vida humana, pode ser derivado já diretamente do Art. 2 II 1 GG. Ele também resulta de norma expressa do Art. 1 2 GG, pois a vida em desenvolvimento desfruta também da proteção do Art. 1 I GG, que garante a dignidade humana. Onde houver vida humana, caberá a dignidade humana. Não importa se o titular desta dignidade tem [ou não] dela consciência, sabendo como preservá-la por si mesmo. As potenciais capacidades inerentes ao ser humano são suficientes para fundamentar a dignidade humana.

203 SANTIAGO, Paulo Roberto Sampaio. A proteção deficiente da lei de abuso de autoridade:

desproporcionalidade por deficiência da proteção penal do Estado Democrático de Direito. Dissertação (Mestrado em Direito Público). Faculdade de Direito. Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2012, p. 79.

204 MARTINS, Leonardo. Cinquenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão. Coletânea original: JÜRGEN SCHWABE. Trad: Beatriz Hennig, Leonardo Martins, Mariana Bigelli de Carvalho, Tereza Maria de Castro, Vivianne Geraldes Ferreira. República Federal da Alemanha: Konrad-Adenauer-Stiftung. 2005, p. 277.

205 SCHWABE, Jüngen. Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão. Montevidéu: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2005, p. 270.

206 SCHWABE, Jüngen. Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão. Montevidéu: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2005, p. 270.

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Da decisão, também pode-se extrair o entendimento de que a partir do

momento que a Constituição impõe um dever de prestação, o legislador está

automaticamente vinculado ao princípio da proibição da proteção insuficiente ao

implementar esse dever, visto que, conforme entendimento de Ingo Sarlet207, “[...] Os

níveis de proteção (portanto, as medidas estabelecidades pelo legislador), deveriam

ser suficientes para assegurar um padrão mínimo (adequado e eficaz) de proteção

constitucionalmente exigidos.”

Assim, pode-se concluir que o legislador está vinculado ao princípio da

proibição da proteção insuficiente, pois deve proteger segundo padrões mínimos

(adequado e eficaz) constitucionalmente previsto.

Ou seja, há o reconhecimento na decisão pelo Tribunal Constitucional

Alemão, desse dever do legislador de estar vinculado a limites mínimos e máximos,

representados pelas duas facetas do princípio da proporcionalidade, definindo-se a

extensão de como se daria a proteção dos bens jurídicos/direitos fundamentais.208

Enquanto que a Constituição somente determinaria o que deveria ser protegido, não

determinando como.

Nesse sentido, conforme destaca Broocke209:

[…] o legislador deve atuar segundo prescreve a Constituição, criando os meios normativos necessários à salvaguarda dos direitos previstos na Lei Maior, os quais guardam estreita correlação com os valores mais caros à sociedade. É pela Constituição e na lei que se desvela o rosto do Estado. É pela norma que ele age, fala e, principalmente, transforma o contexto social. Diante disso, é imprescindível que o legislador tenha a habilidade de seguir os mandamentos constitucionais na condução do seu mister.

Com isso, chegou-se a conclusão definitiva de que não existe somente o

viés garantista negativo do Estado, visto que, com esse compromisso constitucional

assumido por ele, de efetivar garantias e direitos fundamentais, passou-se a

207 SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e Proporcionalidade: o direito penal e os direitos

fundamentais entre proibição de excesso e de insuficiência. In: Revista de Estudos Criminais. N. 12, ano 3. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2003, pp. 86 e segs. Acesso em: 23 ago. 2016.

208 ALEMANHA. Tribunal Constitucional Alemão. Nos. 2 BvF 2/90, 2 BvF 4/92, and 2 BvF 5/92 Decided May 28, 1993. Disponível em:

<http://www.bundesverfassungsgericht.de/SharedDocs/Entscheidungen/EN/1993/05/fs19930528_2bvf000290en.html>. Acesso em: 26 ago. 2016.

209 BROOCKE, Alexandre Moreira van der. A proibição da proteção deficiente e a inconstitucionalidade do artigo 20, da Lei nº 8429/1991. Revista da AJURIS, v. 40. n. 129, mar. 2013. p. 16.

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reconhecer uma atuação positiva pelo Estado, caracterizando seu viés garantista

positivo. Em relação ao garantismo positivo e negativo, extrai-se da obra de

Streck210:

Há que se ter claro, portanto, que a estrutura do princípio da proporcionalidade não aponta apenas para a perspectiva de um garantismo negativo (proteção contra os excessos do Estado), e, sim, também para uma espécie de garantismo positivo, momento em que a preocupação do sistema jurídico será com o fato de o Estado não proteger suficientemente determinado direito fundamental, caso em que estar-se-á em face do que, a partir da doutrina alemã, passou-se a denominar de "proibição de proteção deficiente" (Untermassverbot).

Portanto, a compreensão de que as normas constitucionais são dotadas

de eficácia, devendo vincular todos os poderes, fez com que o princípio da proibição

da proteção insuficiente fosse empregado de forma mais habitual, provando que a

Constituição é um documento com valores embutidos e objetivos a serem

cumpridos.

Assim, o principio da proibição da proteção insuficiente pode ser

vislumbrado de duas formas: diante de uma omissão, ou uma atuação insuficiente

por parte do órgão Público.

E, apesar de a decisão BVERFGE 88, 203 ter sido um marco no

entendimento concedido ao princípio da proibição da deficiente dos direitos

fundamentais, seus contornos já estavam sendo definidos nos estudos sobre a

perspectiva objetiva dos direitos fundamentais211, que obtiveram um grande avanço

com o surgimento da Lei Fundamental de 1949 na Alemanha.

210 STRECK, Lenio Luiz. Bem jurídico e Constituição: da proibição de excesso

(übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais. Disponível em: <http://leniostreck.com.br/index.php?option=com_docman&Itemid=40>. Acesso em: 21 set. 2016. p. 8.

211 Em relação à dimensão objetiva dos direitos fundametais, Flavio Alexandre Luciano de Azevedo e Luciana Aboim Machado Goncalves da Silva apontam: “O reconhecimento da dimensao objetiva dos direitos fundamentais exige do Estado um comportamento positivo no sentido da promocao e da protecao desses direitos e coloca os direitos fundamentais na posicao de sistema valorativo e de fundamento material de todo o ordenamento juridico” In: AZEVEDO, Flavio Alexandre Luciano de; SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. A dimensao objetiva dos direitos fundamentais e sua relevancia para a efetivacao da cidadania em paises perifericos. In: CONPENDI/UFS. Eficacia dos direitos fundamentais e seus reflexos nas relacoes sociais e empresariais. Florianopolis: CONPEDI, 2015, p. 47. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/220z0z30/6p453HGFY7d5FLLD.pdf>. Acesso em: 26 set. 2016.

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Em relação à doutrina e jurisprudência, pode-se destacar a decisão

proferida pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha em 1958, já mencionada

no presente estudo, denominada caso “Luth”212 (BVerfGE 7, 198-230), que além de

reconhecer o efeito irradiante dos direitos fundamentais, provou que os direitos

fundamentais não existiam somente para defender os indivíduos contra os atos do

poder do Estado, mas que também “[...] constituem decisões valorativas de natureza

jurídico-objetiva da Constituição, com eficácia em todo o ordenamento jurídico e que

fornecem diretrizes para os órgãos legislativos, judiciários e executivos”213.

Há, assim, a necessidade de atuações positivas por parte do Estado para

que os direitos fundamentais sejam garantidos, a fim de buscar a dignidade da

pessoa humana, ultrapassando a função de mera proteção do indivíduo contra

ingerências do Estado, mas também contra violações que possuem como agentes

terceiros.

Desta forma, surgem na Alemanha dois modos de proteção de direitos

fundamentais: princípio de proibição de excesso (Übermassverbot); e princípio de

proteção insuficiente (Untermassverbot), que garante que não haja omissões

estatais, ocorrendo a inconstitucionalidade se “[...] o grau de satisfação do fim

legislativo for inferior ao grau em que não se realiza o direito fundamental de

proteção”214. Tais modos de proteção vão caracterizar a dupla face do princípio da

proporcionalidade.

Ou seja, ficou reconhecida a perspectiva objetiva dos direitos

fundamentais e, consequentemente, os deveres de proteção do Estado em relação a

esses direitos, sendo portanto um dos indícios que fundamentam o surgimento do

princípio objetivo do presente item.

212 Para mais informações, verificar em: LIMA, George Marmelstein. 50 anos do Caso Luth: o

caso mais importante da história do constitucionalismo alemão pós-guerra. Disponível em: <https://direitosfundamentais.net/2008/05/13/50-anos-do-caso-luth-o-caso-mais-importante-da-historia-do-constitucionalismo-alemao-pos-guerra/>. Acesso em: 26 set. 2016.

213 SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e Proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre proibição de excesso e de insuficiência. In: Revista de Estudos Criminais n. 12, ano 3. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2003, p. 86 e segs. Acesso em: 24 ago. 2016.

214 STRECK, Lenio Luiz. O dever de proteção do Estado (Schutzpflicht). Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1840, 15 jul. 2008. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/11493>. Acesso em: 23 ago. 2016.

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Ganha ênfase, nessa seara, a decisão do Tribunal Constitucional Alemão

em relação à essa dimensão objetiva dos direitos fundamentais, visto que “[...]

vincular as ações de todas as esferas de poder - a criação, a interpretação e a

aplicação de todo o ordenamento jurídico exigindo-lhe prestações positivas – fáticas

e normativas – em favor dos titulares de direitos fundamentais”215.

Ainda sobre essa ligação com os deveres de proteção, conforme

destacado por Maria Luíza Schafer Streck, o princípio da proibição da proteção

insuficiente é analisado quando “[...] é invocado como direito positivo ou dever de

proteção (Schutzpflicht); a questão é saber se ele fez muito pouco para proteger o

direito ameaçado”216, podendo-se constatar que o dever de proteção de direitos

fundamentais deve ser exercido, em primeiro lugar, pelo legislador.

Nesse mesmo sentido, destaca o ministro Gilmar Mendes em seu voto na

HC 96.759/CE que “[...] os direitos fundamentais não podem ser considerados

apenas como proibições de intervenção (Eingriffsverbote), expressando também um

postulado de proteção (Schutzgebote)”217. Ou seja, não apenas uma proibição do

excesso, mas também um proibição de proteção insuficiente ou imperativos de

tutela.

Em se tratando da utilização desses subprincípios na Alemanha, segundo

Dieter Grimm, ambos são utilizados através do princípio da proporcionalidade como

técnica para decidir casos que envolvam direitos fundamentais, visto não haver

distinção entre eles na Lei Fundamental da Alemanha, como pode se depreender218:

Com exceção da dignidade humana (Art. 1 da Grundgesetz [Lei Fundamental]), que é considerada uma fonte para todas as garantias que se

215 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm, 2016. p. 77. 216 STRECK, Maria Luiza Schafer. O Direito Penal e o princípio da proibição de proteção

deficiente: a face oculta da proteção dos direitos fundamentais. São Leopoldo: UNISINOS (trabalho monográfico – mestrado), 2008. pp. 80-81. Disponível em: <http://bdtd.unisinos.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=721>. Acesso em: 10 ago. 2016.

217 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - HC 96.759/CE. P.32. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629956>. Acesso em: 05 abr. 2017.

218 GRIMM, Dieter. A Função Protetiva do Estado - A Constitucionalização do Direito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 162. In: CHINELATO, João Marcelo Torres. O princípio da proporcionalidade proibindo a omissão estatal. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1414, 16 maio 2007. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/9889>. Acesso em: 30 ago. 2016.

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seguem na Declaração de Direitos, a Corte Constitucional alemã não reconhece uma hierarquia de direitos fundamentais. Na ausência de tal hierarquia é difícil imaginar outro meio de resolver conflitos entre direitos diferentes senão com recurso à proporcionalidade e à ponderação. Se isso é verdade, a proibição de ir longe demais (Übermaβverbot) e a proibição de fazer muito pouco (Untermaβverbot) são o mesmo mecanismo, visto por diferentes ângulos.

Dessa forma, o Estado passa a ter uma nova função, qual seja, de

protetor e garantidor da cidadania. E, como colocado por Streck, tal transformação

acaba também por alterar consequentemente o direito, não sendo mais ordenador

ou simplesmente promovedor, mas sim transformador, a partir dos ditames da

Constituição219.

É a partir da compreensão dessa efetividade da Constituição, bem como a

necessidade dos direitos fundamentais serem realizados, e não apenas

contemplados de maneira simbólica, que ocorreu o reconhecimento constitucional

do princípio da proibição da proteção insuficiente como norma impositiva.

Ocorre que alguns acontecimentos não podem ser ignorados e acabam

por afetar essa função garantista de proteção nuclear que compete ao Estado

Democrático (Social) de Direito em relação aos direitos fundamentais. É o fenômeno

da globalização. Sendo esse caracterizado especialmente por acabar com as

principais bases do Estado – território, soberania e cidadania.

Para Ingo W. Sarlet, a globalização vai resultar numa crise de efetividade

dos direitos fundamentais, bem como “[...] uma crise de identidade e confiança nos

Direitos Fundamentais”220, ou seja, o Estado acaba perdendo forças se vislumbrado

como principal garantista dos direitos fundamentais de seus cidadãos, bem como a

Constituição, que frusta as expectativas em relação aos direitos fundamentais, fato

esse denominado por Marcelo Neves de “constitucionalização simbólica”221.

219 STRECK, Lenio Luiz (org.). Direito Penal em tempos de crise. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2007. p. 102. 220 SARLET, Ingo W. Constituição, Proporcionalidade e direitos fundamentais: o direito penal

entre proibição de excesso e de insuficiência. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. ISSN 1138-4824, núm. 10, Madri (2006), pág. 309.

221 SARLET, Ingo W. Constituição, Proporcionalidade e direitos fundamentais: o direito penal entre proibição de excesso e de insuficiência. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. ISSN 1138-4824, núm. 10, Madri (2006), pág. 315.

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Com isso, muitas das conquistas sociais até então acabam por ser

destruídas, tendo em vista o principal objetivo e preocupação vinda com o Estado

Democrático de Direito, a diminuição da exclusão social. A globalização acaba por

priorizar tão somente as sociedades desenvolvidas economicamente e socialmente,

gerando nas sociedades em desenvolvimento ou baixo poder aquisitivo um

ofuscamento de atenção, sendo vislumbradas como um empecilho para o

desenvolvimento da sociedade. Tal fato é o principal fator de risco para a

democracia.

Corroborando para o entendimento, Ingo W. Sarlet explica que tais

acontecimentos ocorrem primeiramente a partir da perda de poder do Estado,

resultando em “[...] desnacionalização, desestatização, desregulação e redução

gradativa da intervenção estatal no domínio econômico e social”222.

Soma-se a isso a descrença que todo esse contexto gera aos próprios

direitos fundamentais, visto que já não são mais considerados direitos de todos, mas

sim de uma pequena parte privilegiada da população, com maior aparato econômico,

acabando com qualquer entendimento de cidadania existente.

Dessa forma, o Estado deve se valer de suas obrigações, para que essas

consequências trazidas com a globalização sejam amenizadas, bem como para

honrar as obrigações trazidas pela Constituição Federal como principal garantidora

de uma sociedade democrática.

Para tanto, o Estado vai utilizar a ferramenta do princípio da

proporcionalidade, especialmente na sua face de proibição da proteção insuficiente,

para garantir que esses deveres de proteção derivados da dimensão objetiva dos

direitos fundamentais sejam devidamente observados, possibilitando que os valores

advindos com a cidadania sejam mantidos, bem como a ideia de Democracia seja

preservada.

Tal ação vai proporcionar maior inclusão social, demonstrando a

importância disso nos ordenamentos alienígenas, gerando responsabilidades de

caráter transnacional da importância de preservar os valores e direitos conquistados

222 SARLET, Ingo W. Constituição, Proporcionalidade e direitos fundamentais: o direito penal

entre proibição de excesso e de insuficiência. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. ISSN 1138-4824, núm. 10, Madri (2006), pág. 309.

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pela sociedade, independente do lapso temporal de conquista entre uma sociedade

e outra.

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CAPÍTULO 3

JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E O PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA

PROTEÇÃO INSUFICIENTE

A realidade das pretensões da sociedade brasileira passa por uma fase

um tanto quanto conturbada. Depara-se com um grande número de leis, todas com

certa relevância se considerados os deveres de proteção dos direitos fundamentais.

Soma-se a isso, as diversas variáveis que o Poder Público está

submetido, dentre elas a reserva do possível e o mínimo existencial, que acabam

por impedir a atuação desejada por grande parcela da população, que apesar de

titular de direitos fundamentais, não os usufrui de maneira devida, a resultar numa

inserção social.

Diante dessa realidade, o Poder Judiciário acaba sendo nomeado pela

sociedade como concretizador de direitos fundamentais, gerando obrigações ao

Poder Público, no que diz respeito às suas omissões ou ainda diante da sua atuação

insuficiente, no que diz à proteção e efetivação dos direitos fundamentais.

Assim, os direitos fundamentais passaram a ser vistos como um

conjunto de “valores objetivos básicos e fins diretivos da ação positiva dos poderes

públicos”223, sendo esses entendidos como poder executivo, legislativo e judiciário.

O presente capítulo possui como objetivo analisar a atuação do Poder

Judiciário diante dessa nova perspectiva, considerando o mínimo existencial e a

reserva do possível, bem como analisa essa atuação inovadora do Poder Judiciário,

justificada a partir do entendimento do princípio da proporcionalidade, especialmente

(no que diz respeito a presente pesquisa) no seu viés de proibição de proteção

insuficiente dos direitos fundamentais.

223 SARLET, Ingo W. Constituição, proporcionalidade e direitos fundamentais: o direito penal entre proibição de excesso e de insuficiência. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n. 10, Madri, 2006. p. 321.

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3.1 ASCENSÃO DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E

O PROTAGONISMO DO JUDICIÁRIO NO NOVO CONSTITUCIONALISMO

Não é de hoje a discussão quanto ao ativismo judicial ser pertinente ou

não224. A doutrina se mostra bem dividida em relação a sua possibilidade, visto que

esse fenômeno pode ser visto de diversas maneiras, conforme este subcapítulo se

propõe a demonstrar.

É tal como destaca Carlos Alexandre de Azevedo Campos em relação a

essa atuação do Judiciário, indicando tal tema como um dos “mais importantes e

fundamentais na dinâmica de concretização das constituições contemporâneas”225.

Primeiramente, analisando o contexto histórico, foi com o

constitucionalismo contemporâneo que o reconhecimento da importância da

efetivação dos direitos fundamentais aumentou, principalmente pelo fato de serem

reconhecidos como normas impositivas e vinculantes ao Estado e à sociedade. A

partir dessa ideia, o Poder Judiciário passou a ter uma atuação como fiscal e

garantidor desses direitos fundamentais.

De acordo com Barroso, houve um “avanço da justiça constitucional”,

fenômeno que irradiou-se pelos diversos países, tais como Canadá, Turquia,

Hungria, Argentina, entre outros. Foi nesse período também que percebeu-se “a

fluidez entre política e justiça no mundo contemporâneo”226.

Assim, o Poder Judiciário passou a ter um olhar mais crítico à postura

estatal, passando de um mero poder do Estado para um garantidor dos direitos

fundamentais, em que a atuação já não se limitaria somente a apenas invalidar

normas que traduziriam um agir do Estado, mas admitindo um crescimento de

competências do mesmo, com decisões suis generis.

224 Há de se observar que não há mesmo discenso quanto ao significado de ativismo judicial.

Vários autores discorrem sobre o que é ativismo judicial, entre eles, Elival da Silva Ramos, ao tratar do plurisignificado do termo. Para o presente trabalho, será adotado o ativismo judicial como o Judiciário adota, atuando para garantir direitos fundamentais, definindo e intervindo em políticas públicas, tais como ocorre com o direito à saúde.

225 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 26.

226 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n. 13, Madri, 2009. p. 18.

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E, como primeiro evento probatório dessa expansão do Poder Judiciário,

Roberto Barroso destaca a redemocratização, ocorrida com a Constituição de 1988,

em que o Judiciário “[...] deixou de ser um departamento técnico-especializado e se

transformou em um verdadeiro poder político, capaz de fazer valer a Constituição e

as leis, inclusive em confronto com os outros Poderes”227.

A essa posição mais ativa, doutrinadores denominaram de ativismo

judicial, em que as decisões possuíam “[...] largo alcance político, implementação de

políticas públicas ou escolhas morais em temas controvertidos na sociedade”228.

Elival da Silva Ramos, em sua tese “Parâmentros Dogmáticos do Ativismo

Judicial em Matéria Constitucional”, discorre sobre o ativismo judicial praticado pelo

Supremo Tribunal Federal, demonstrando os resultados que esse fenômeno pode

ensejar, visto que viola a separação dos poderes, prejudicando o sistema

democrático. Ou seja, o ativismo judicial acaba ultrapassando os limites da

Constituição, visto que rompe com o equilíbrio existente entre a norma e a

interpretação 229.

Ocorre que ora é empregado o termo “ativismo jurídico”, e em outros

momentos o termo “judicialização”, sendo, nesse ponto, importante destacar as

diferenças existentes entre eles, uma vez que, apesar de caminharem de forma

parecida, são distintos quanto suas origens, conforme se abordará a seguir.

Diante disso, a judicialização é definida como uma consequência do modelo

adotado pela Constituição pátria, cabendo ao Judiciário analisar determinada

matéria e definir a partir da Constituição e ordenamento jurídico como um todo quais

os preceitos normativos cabíveis para o caso. Ou seja, o Judiciário simplesmente

cumpre sua função sem conotações políticas230.

227 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. N. 13, Madri, 2009. p. 18. 228 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. N. 13, Madri, 2009. p. 18. 229 MILICIO, Gláucia. “O ativismo judicial é ruim independente do resultado”. In: Revista

Consultor Jurídico, 01 ago. 2009. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2009-ago-01/entrevista-elival-silva-ramos-procurador-estado-sao-paulo>. Acesso em: 21 ago. 2017.

230 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. N. 13, Madri, 2009. p. 18.

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Segundo Oliveira231, a judicialização ocorre de acordo com o aumento das

demandas da sociedade, ou como o autor destaca – da crise da democracia –,

sendo considerado um fenômeno político.

Silva e Junior232 explicam resumidamente que a judicialização ocorre

especialmente com a crescente criação de leis, possibilitando uma maior atuação do

Judiciário a fim de concretizá-las, estando portanto de acordo com o que espera o

Estado Democrático de Direito.

Ou seja, algumas questões que deveriam estar sendo decididas por

instâncias tradicionais administrativas, estão sendo decididas pelo Poder Judiciário.

Outro aspecto que deu margem à judicialização foi o controle de

constitucionalidade, principal meio de controle que o Poder Judiciário se utiliza para

controlar os outros poderes do Estado, que consiste em verificar se os ditames da

Constituição são realmente seguidos e cumpridos.

Outros fatores destacados que contribuíram para o surgimento da

judicialização dizem respeito aos casos crescentes de agentes públicos envolvidos

em casos de corrupção, sendo o Judiciário colocado nesse pedestal para discutir e

achar uma solução para casos que antes eram discutidos no âmbito político,

representados pelos poderes Legislativo e Executivo.

E, como principal exemplo do fenômeno da judicialização, está na área da

saúde entendida, de acordo com Ramos e Gomes233, como:

[...] a reivindicação da saúde como um direito que ocorre quando o Poder Judiciário passa a ter o papel de tomada de decisões coletivamente vinculantes, sobrepondo as decisões judiciais ao arcabouço normativo elaborado pelo sistema.

231 OLIVEIRA, Rafael Tomaz; FARIA, Bruno Costa de; CURTOLO, Cristiane Maria e Lima;

TEODORO, Leandro; VELUDO, Michele Seixas; PEREIRA, Joaquim Eduardo. A jurisdição constitucional entre a judicialização e o ativismo: percursos para uma necessária diferenciação. Anais do X Simpósio Nacional de Direito Constitucional, p. 271.

232 JUNIOR, Dernacy Souza e Silva. Judicialização da política e ativismo judicial: uma necessária distinção. Empório do Direito. Maio 2016. Disponível em: <http://emporiododireito.com.br/judicializacao-da-politica-e-ativismo-judicial/>. Acesso em: 24 mar. 2017.

233 RAMOS, Raquel de Souza; GOMES, Antonio Marcos Tosoli. Judicialização da saúde pública no Brasil: Um estudo de representações sociais. Rev. Cuidarte. 2014; 5(2): p. 828. <http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v5i2.124>. Acesso em: 24 mar. 2017.

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Por outro lado, o ativismo judicial contempla essa posição mais ativa do

Judiciário, ligado a um “ato de vontade do órgão judicante”234. Ou, como Barroso235

ressalta, o ativismo judicial vai ocorrer quando o Judiciário interferir de maneira mais

intensa na atividade dos outros poderes do Estado, definido como um problema de

interpretação.

Para exemplificar, Barroso236 destaca as formas de manifestação do

ativismo judicial, quais sejam: o emprego da Constituição em situações não

determinadas por ela ou pela legislação ordinária; com a declaração de

inconstitucionalidade com o fundamento em violações da Constituição sem muita

importância; e, por fim, a partir da determinação de condutas na seara das políticas

públicas onde há omissão do Estado.

Assim, conclui-se que, na verdade, o ativismo judicial será uma atuação

discricionária do juiz, a fim de buscar a concretização de direitos fundamentais.

Sendo, portanto, visto como algo necessário, tal como revela Carlos Alexandre de

Azevedo Campos, visto que muitas vezes há uma violação massiva de direitos

fundamentais, havendo necessidade urgente de transformações, conforme

demonstra em passagem de sua obra que fala sobre os acontecimentos da

Colômbia, ao destacar237:

O juiz constitucional depara-se com uma realidade social que necessitada de transformação urgente e, ao mesmo tempo, com falhas estruturais e impasses políticos que implicam, além do estado inconstitucional em si mesmo, a improbabilidade de o governo superar esse estágio de coisas contrárias ao sistema de direitos fundamentais, sem que o seja a partir de uma forte e ampla intervenção judicial.

Ou, em contrapartida, tal postura do Judiciário pode ser vista também

como um risco ao próprio Estado Democrático, visto que pode gerar decisões

234 OLIVEIRA, Rafael Tomaz; FARIA, Bruno Costa de; CURTOLO, Cristiane Maria e Lima;

TEODORO, Leandro; VELUDO, Michele Seixas; PEREIRA, Joaquim Eduardo. A jurisdição constitucional entre a judicialização e o ativismo: percursos para uma necessária diferenciação. Anais do X Simpósio Nacional de Direito Constitucional, p. 271.

235 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n 13, Madri, 2009. p. 22.

236 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. n 13, Madri, 2009. p. 22.

237 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 96.

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arbitrárias. Exemplo disso é relacionado à fidelidade partidária, matéria essa que não

está prevista na Constituição, e que o STF decidiu sem esperar que o legislador

regulamentasse sobre a matéria238.

Outro caso que pode ser destacado, e com maior conotação social, é

quanto à determinação de tratamentos ou distribuição de medicamentos.

Caracterizando um ativismo que impõe condutas ao Poder Público, qual seja, a de

“[...] a custear medicamentos e terapias que não constam das listas e protocolos do

Ministério da Saúde ou das secretarias estaduais e municipais”239.

Em se tratando dessa atuação do Judiciário na área da Saúde, sabe-se

que o direito à saúde é considerado assunto de relevância pública e, que, segundo

voto proferido pelo ministro Celso de Mello, é legítima a atuação do Poder Judiciário

se ficar constatada omissão pelo órgão público de realizar políticas públicas que são

de sua competência240.

Diante desses esclarecimentos, é importante destacar que a doutrina é

muito dividida se considerar essa posição do Judiciário algo positivo ou negativo. E

Barroso241 destaca três objeções: Riscos à legitimidade democrática; Risco de

politização da Justiça e, por fim, os limites à capacidade institucional do Judiciário.

Por outro lado, há uma parte de doutrinadores que demonstram a

importância do protagonismo do Judiciário, tais como Manuel Aragón Reyes242

destaca: “[...] Las constituciones precisan de garantias políticas, por supuesto, pero

también, e inexorablemente, de garantias jurídicas, sólo posibles, es decir, efectivas,

cuando están asseguradas por controles jurisdiccionales”.

238 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. ISSN 1138-4824, n. 13, Madri (2009). p. 23. 239 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. ISSN 1138-4824, n. 13, Madri (2009). p. 24. 240 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 745745 AgR. p. 4. Disponível em:

<redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7516923>. Acesso em: 19 abr. 2017.

241 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. N. 13, Madri, 2009. pp. 26-29.

242 As constituições precisam de garantias políticas, obviamente, mas também, e impreterivelmente, de garantias jurídicas. Somente é possível dizer “efetivas”, quando estão asseguradas por controles jurisdicionais (tradução livre). REYES, Manuel Aragón Reyes. La Constitución como paradigma. In: CARBONELL, Miguel (ed.). Teoría del neoconstitucionalismo: ensayos escogidos. Madri: Trotta-UNAM, Instituto de Investigaciones Jurídicas, 2007. p. 36.

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Outro aspecto destacado por Barroso é em relação à própria

constitucionalização do ordenamento jurídico, trazida com o neoconstitucionalismo,

contagiando diversas matérias que antes eram foco de processo político e legislação

ordinária243, sendo essa forma de atuação estatal totalmente admissível se com

objetivo de preservar e concretizar os valores e objetivos da Constituição.

E a questão aqui não se limita à matéria de direitos fundamentais, mas

também ao local em que eles possuem maior concentração, ou seja, na Constituição

e na interpretação que se faz dela.

Isso ocorre especialmente porque a Constituição é a principal prova de

que vivemos numa sociedade democrática, sendo, por isso, um espelho das suas

necessidades e problemas.

E, diante de uma sociedade que está em constante evolução, não teria

sentido a Constituição não acompanhar essa evolução, visto que ela é um “texto

vivo”, que deve conter respostas às demandas da sociedade.

Além disso, atualmente, sabe-se que estamos lidando com sociedades

pluralistas, composta por grupos sociais com interesses e crenças diferentes,

ansiando ainda mais uma postura diferenciada do Judiciário.

Sobre esta questão Zagrebelsky244 destaca:

[...] las sociedades dotadas en su conjunto de un cierto grado de relativismo, asignan a la Constitución no la tarea de establecer directamente un proyecto predeterminado de vida en común, sino la de realizar las condiciones de posibilidad de la misma.

Ainda que para grande parte da sociedade jurídica se mostre

preocupante, o mais indicado para interpretar, bem como demonstrar os problemas e

limites da Constituição em relação à evolução da sociedade seria o juiz, visto estar

em contato diário com as demandas da sociedade e, portanto, conhecer de que

modo se dá a aplicação das normas jurídicas.

243 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional. N. 13, Madri, 2009. p. 20. 244 ZAGREBELSKY, Gustavo. El derecho dúctil: ley, derechos, justicia. Madri: Trotta, 2009.

p,13.

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E, como forma de solucionar o problema quanto a pensada “liberdade

ilimitada” e impossibilidade de reformas da Constituição a cada mudança de valores

da sociedade pelo Judiciário, o doutrinador Roberto Gargarella destaca a leitura

moral da Constituição de Dworkin, que consiste:

[…] en encontrar respuestas para las preguntas que formula la Constitución, determinar cuál es la mejor concepción de los distintos conceptos fundamentales que la Constitución fija en su texto245.

Apesar de o referido doutrinador defender que os juízes não devem ser

livres para interpretar a Constituição, ele destaca que isso na realidade só pode

acontecer se as decisões demonstrarem e justificarem, por meio de seus

fundamentos, que estão de acordo com as tradições e práticas da sociedade, não

evitando sua evolução. Acrescenta ainda sobre esta atividade que “[…] lo que el juez

debe hacer es construir la mejor concepción moral que encaje con la historia

constitucional de la comunidad”246.

Ainda pode-se contar com o princípio da proporcionalidade, uma vez que,

conforme já exposto no item anterior, o Estado deve constantemente observá-lo e,

consequentemente, o Poder Judiciário também deve fazê-lo.

Outro ponto que cumpre ser esclarecido e que também influencia na

possibilidade desse protagonismo do Judiciário é em relação ao mínimo existencial e

reserva do possível, diretamente ligados à dignidade da pessoa humana, princípio

basilar do Estado, conforme está previsto no art. 1º, III da Constituição Federal.

Para iniciar os esclarecimentos, em relação ao mínimo existencial, sabe-

se que ele surgiu na Alemanha, com a Lei Fundamental de 1949, sendo um assunto

de extrema relevância para o direito germânico na seara doutrinária, bem como no

processo de elaboração e entrada em vigor da Lei Fundamental de 1949247.

245 [...] em encontrar respostas para as perguntas que formula a Constituição, determinar qual é

a melhor concepção dos distintos conceitos fundamentais que a Constituição fixa em seu texto (tradução livre). GARGARELLA, Roberto. Derecho constitucional. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2008. V. 1. p. 133.

246 [...] o que o juiz deve fazer é construir a melhor concepção motal que encaixe com a história constitucional da comunidade (tradução livre). GARGARELLA, Roberto. Derecho constitucional. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2008. V. 1. p. 133.

247 SARLET, Ingo Wolfgang; ROSA, Taís Hemann. Breves notas sobre a dogmática do mínimo

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Somente em 1975 que o Tribunal Constitucional Federal alemão reconheceu um “[...]

direito fundamental à garantia das condições mínimas para a existência digna”248.

Frisa-se que o entendimento de mínimo existencial foi trazido do direito

germânico, onde teve seus primeiros contornos definidos. Segundo Otto Bachof,

doutrinador de destaque do direito germânico, “[...] a dignidade da pessoa humana

não reclamaria apenas a garantia da liberdade, como também um mínimo de

segurança social, já que sem tais recursos, a própria dignidade restaria

comprometida”249.

No Brasil, a existência de um mínimo existencial pode ser percebida com

o rol de direitos fundamentais sociais encontrados na Carta Magna Brasileira, além

de pregar como valor básico a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III e art. 170,

caput, CF), ou, em outras palavras, “o dever de viabilização de uma sociedade de

bem-estar”250, sendo entendido que a vida vai além da mera sobrevivência física,

assim como é pregado na Alemanha.

Outro aspecto a ser considerado está relacionado à ligação entre o núcleo

essencial dos direitos sociais e o mínimo existencial, linha de entendimento que

prevalece no STF, mas devendo sempre analisar as peculiaridades de cada caso,

conforme explica Ingo W. Sarlet251:

[…] visto que se cuida de direitos que assumem uma dimensão individual e coletiva, que não se excluem reciprocamente, cabendo ao poder público assegurar, pena de violação da proibição de proteção insuficiente, pelo menos as prestações sociais que dizem respeito ao mínimo existencial.

Segundo Ingo W. Sarlet, pode-se complementar esse entendimento com o

fato de que o mínimo existencial deve estar em sintonia com a “[...] compreensão

constitucionalmente adequada do direito à vida e da dignidade da pessoa humana

existencias no direito brasileiro. R. Dir. Gar. Fund., Vitória, v. 16, n. 1, p. 219, jan./jun. 2015.

248 SARLET, Ingo Wolfgang; ROSA, Taís Hemann. Breves notas sobre a dogmática do mínimo existencias no direito brasileiro. R. Dir. Gar. Fund., Vitória, v. 16, n. 1, p. 220, jan./jun. 2015.

249 BITENCOURT NETO, Eurico. O direito ao mínimo para uma existência digna. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 54-55.

250 BITENCOURT NETO, Eurico. O direito ao mínimo para uma existência digna. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 56-57.

251 SARLET, Ingo W.; ZOCKUN, Carolina Zancaner. Notas sobre o mínimo existencial e sua interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais. Revista de Investigações Constitucionais. Curitiba, vol. 3, n. 2, p. 128, maio/ago. 2016.

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como princípio constitucional fundamental”252.

Ocorre que esse não é o único entendimento dado ao mínimo existencial,

conforme meciona Torres253:

Carece o mínimo existencial de conteúdo específico. Abrange qualquer direito, ainda que originariamente não-fundamental (direito à saúde, à alimentação, etc.), considerado em sua dimensão essencial e inalienável. Não é mensurável, por envolver mais os aspectos de qualidade que de quantidade, o que torna difícil extremá-lo, em sua região periférica, do máximo de utilidade (maximum welfare, Nutzenmaximierung), que é princípio ligado à ideia de justiça e de redistribuição de riqueza social. Certamente esse mínimo existencial, “se o quisermos determinar precisamente, é uma incógnita muito variável”.

Prova disso está nas considerações de Olsen, em que defende que nem

todo direito fundamental social terá o mínimo existencial equivalente ao núcleo

essencial, tal como o direito à participação dos lucros254.

Diante dessas premissas, conclui-se que o mínimo existencial trata-se de

um aspecto relevante a ser considerado pelo Estado, especialmente porque “[...] a

garantia das condições mínimas para uma existência digna integra o conteúdo

essencial do princípio do Estado Social de Direito, constituindo uma de suas

principais tarefas e obrigações”255.

Por outro lado, há que se considerar também a “reserva do possível”, que

é compreendida de forma resumida, com a possibilidade econômica que o Estado

possui para possibilitar a concretização dos direitos sociais256. Historicamente, sabe-

se que a “reserva do possível” foi criada pelo Tribunal Constitucional Federal alemão

252 SARLTET, Ingo W.; ZOCKUN, Carolina Zancaner. Notas sobre o mínimo existencial e sua

interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais. Revista de Investigações Constitucionais. Curitiba, vol. 3, n. 2, p. 125, maio/ago. 2016.

253 TORRES, Ricardo Lobo. O mínimo existencial como conteúdo essencial dos direitos fundamentais. In: SOUZA NETO, Claudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (orgs.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 313-339.

254 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008, p. 319.

255 SARLTET, Ingo W; ZOCKUN, Carolina Zancaner. Notas sobre o mínimo existencial e sua interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais. Revista de Investigações Constitucionais. Curitiba, vol. 3, n. 2, p. 121, maio/ago. 2016.

256 VARGAS, Diego Rafael Slim. A reserva do possível versus mínimo existencial e sua aplicabilidade no Brasil. Âmbito Jurídico. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9507&revista_caderno=9>. Acesso em: 02 maio 2017.

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de 1973, na BVerfGE 33, 303, de 197, onde se impugnava a limitação de vagas para

se garantir o acesso universal ao ensino superior por não haver recursos suficientes

para tanto257, sendo posteriormente utilizado em outras decisões de forma

progressiva.

Na seara nacional, a reserva do possível é suscitada como fundamento

nas demandas que possuem como conteúdo políticas públicas que se direcionam a

concretização de direitos sociais.

Sobre isso, Ana Carolina Lopes complementa explicando que essa

utilização da reserva do possível como impedimento de implementação de políticas

públicas deve ser investigado, pois caso seja ilegítima, o Judiciário poderá agir se

utilizando da proporcionalidade em sua face de proibição de insuficiência, “[...] de

modo que somente por uma razão extremamente grave a efetividade do direito

jusfundamental poderá ser temporariamente afastada”258.

Ou seja, o instituto da “reserva do possível” não prevalece sobre o mínimo

existencial, justamente pela razão de que ele possui como pilares o direito à vida e a

dignidade da pessoa humana, princípios basilares do Estado Democrático de Direito.

É a partir disso que se vê necessária uma postura mais ativa do

Judiciário, visto que, como possuidor de um papel de fiscal, deve buscar a

preservação dos valores pregados na Constituição pátria, bem como a observância

do princípio da proporcionalidade. Provas disso estão nas decisões crescentes

empregando a faceta do princípio da proporcionalidade denominada princípio da

proibição da proteção insuficiente, já não se pode mais admitir que a sociedade fique

sem respostas às suas demandas, ou ainda, que o Estado se omita em matérias

ligadas diretamente à dignidade da pessoa humana, especialmente na seara dos

direitos sociais, devendo a reserva do possível ser devidamente fundamentada para

legitimar a omissão estatal em matéria de direitos fundamentais sociais.

257 MATSUDA, Juliana Tiemi Maruyama; PEREIRA, Helida Maria; SOUZA, Luciana Camila de. O

mínimo existencial como limite à aplicação da reserva do possível aos direitos fundamentais sociais. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/%207306306>. Acesso em: 02 maio 2017.

258 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008. p. 326.

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Para além do princípio da proibição da proteção insuficiente, está o

princípio da proporcionalidade e seu conteúdo de um modo geral, que vão servir

como limitadores ao Poder Judiciário no momento de proferir suas decisões, que

também devem ser bem fundamentadas para legitimar o seu protagonismo, bem

como possibilitar uma maior interpretação da norma.

É tal como Denarcy Souza e Silva Junior259 declara:

Uma sociedade democrática deve sempre pautar pela integridade (que é uma das suas principais virtudes), a evitar que a interpretação do direito seja resultante de concepções de justiça subjetivas ou contraditórias, pois a decisão judicial deve ser fundamentada em princípios e não em argumentos outros (argumentos de política) dissociados da autonomia do direito, tampouco com lastro numa vontade solipsista.

Essa possibilidade de maior interpretação é trazida especialmente com o

que se entende por princípios. Para o direito, princípio pode ser algo que

fundamenta, que dá base.

Desta forma, verifica-se que o emprego do princípio da proibição da

proteção insuficiente dos direitos fundamentais pelo poder Judiciário é suficiente

para justificar seu papel fiscalizador perante outros poderes do Estado, bem como,

em outras situações, justificar as decisões que ensejam uma obrigação de fazer ao

Estado.

Diante disso, o próximo subcapítulo terá como objetivo analisar algumas

decisões proferidas pelo STF, sem o objetivo de esgotá-las, demonstrando o

emprego do princípio da proibição da proteção insuficiente pelos juízes.

259 SILVA JUNIOR, Dernacy Souza e. Judicialização da política e ativismo judicial: uma

necessária distinção. Empório do Direito. Maio 2016. Disponível em: <http://emporiododireito.com.br/judicializacao-da-politica-e-ativismo-judicial/>. Acesso em: 24 mar. 2017.

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3.2 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E OMISSÕES

INCONSTITUCIONAIS NA ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Em relação ao Brasil, a aplicação do princípio da proporcionalidade

consiste em elemento básico nas decisões proferidas pelo Judiciário, em um

primeiro momento reconhecido como proibição de excessos por parte do Estado,

violando a liberdade individual.

Porém, o reconhecimento de que a omissão do Estado violava direitos

fundamentais deu margem à construção de que ele não poderia se omitir por

completo, devendo sempre ter uma atuação a fim de dar o mínimo de eficácia

exigida pela Constituição aos direitos fundamentais. Foi diante desta lógica que o

princípio da proibição da proteção insuficiente passou a ser empregado no Poder

Judiciário brasileiro de forma progressiva, não se restringindo à seara do Direito

Penal, mas sim às mais diversas áreas jurídicas, como poderá ser visualizado a

seguir nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal.

Merece destaque, nesse diapasão, as principais características do

Supremo Tribunal Federal, visto este ser o ator principal em se tratando de omissões

constitucionais. Isso porque, com a Constituição de 88, ele foi consagrado o

guardião da Constituição, ganhando destaque e força em relação ao sistema de

controle de constitucionalidade260.

E, para iniciar a análise, pode-se destacar o pioneiro a utilizar o princípio

da proibição deficiente, o ministro do STF Gilmar Mendes, no julgamento do RE nº.

418.376-5, ocorrido em 09.02.06, em que o tutor mantinha relações sexuais com sua

tutelada, uma menina de doze anos, e que, com o fim de extinguir sua punibilidade,

alegava que possuía união estável com a mesma (art. 107, VII, do CP).

De acordo com voto proferido pelo ministro em questão e posição

vencedora no acórdão, tal situação é tratada como repugnada pela sociedade,

caracterizando-se como proteção insuficiente por parte do Estado conferir a essa

situação o status de união estável para extinguir a punibilidade.

260 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm, 2016. p. 46.

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Acrescenta ainda o fato de todos os poderes do Estado possuírem como

obrigação a proteção da dignidade das pessoas, sendo esse mais um motivo para

acompanhar a divergência inaugurada pelo ministro Joaquim Barbosa.

A mesma linha de argumentação foi posteriormente assumida pelo

ministro Gilmar Mendes para decidir a ADI 3510 envolvendo a Lei de Biossegurança

(Lei 11.105/2005), pois, segundo o ilustre constitucionalista, a Lei não seria

inconstitucional se o art. 5º da mesma fosse interpretado no sentido de que a

pesquisa de células-tronco fosse precedida de autorização e aprovação por comitê

específico do Ministério da Saúde. Isso porque o fato de a lei não possuir

regulamentação trata-se de violação ao princípio da proteção deficiente.

Dessa forma, a determinação de órgão específico que autorize a

pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias é uma forma de atender ao

conteúdo do princípio da proporcionalidade, bem como o princípio da

responsabilidade que trata o caso261, não sendo portanto necessária a declaração de

inconstitucionalidade total no presente caso262.

Em relação ao emprego do princípio da proibição deficiente, Eduardo

Faria Fernandes acrescenta que o princípio será empregado como mecanismo de

controle de constitucionalidade, além de limitar a discricionariedade do legislador,

que deve atuar sempre buscando a proteção efetiva que a Constituição busca263.

Esse princípio também vai possibilitar que o intérprete da lei possa exigir

do Estado uma atuação mais efetiva e rigorosa dos direitos fundamentais envolvidos

num caso concreto, conforme destacado por João Marcelo Torres Chinelato264.

Merece destaque também o julgamento da ADI nº 3112/DF, que tratou do

“Estatuto do Desarmamento”, em que o ministro Gilmar Mendes se manifestou por

meio de seu voto “[...] que a proteção dos direitos fundamentais deve se dar, entre

261 BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. ADIn n.° 3.510. Tribunal Pleno. Relator Ministro Carlos

Britto. Julgado em 29 maio 2008. Disponível em: <www.stf.gov.br>. Acesso em: 31 ago. 2016. 262 BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. ADIn n.° 3.510. Tribunal Pleno. Relator Ministro Carlos

Britto. Julgado em 29 maio 2008. Disponível em <www.stf.gov.br>. Acesso em: 31 ago. 2016. 263 FERNANDES, Eduardo Faria. Principio da vedacao a protecao deficiente. Artigo Cientifico

apresentado a Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2011. p.17-18. 264 CHINELATO, João Marcelo Torres. O princípio da proporcionalidade proibindo a omissão

estatal. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1414, 16 maio 2007. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/9889>. Acesso em: 05 set. 2016.

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outros, por meio da criminalização de condutas através de um sistema de proteção

penal adequado, o que justifica as restrições [...]”265.

Nesse mesmo sentido, foi o voto proferido pelo ministro Ricardo

Lewandowski no julgamento da ADI nº1800/DF, que discutia a validade da lei que

exime as custas às pessoas pobres nos registros de nascimento e de óbito. Para o

relator, o benefício é constitucional, visto que concede uma proteção adequada para

essas pessoas carentes, em relação ao exercício da cidadania266.

Da mesma forma, o princípio em questão foi adotado em manifestação do

ministro Marco Aurélio, quando do julgamento da ADI 4422, onde focou no dever de

proteção que o Estado deve dar às mulheres, em relação aos artigos 12 (inciso I), 16

e 41, da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e nos crimes de lesão corporal leve

contra a mulher, que deverá ocorrer sempre mediante ação penal pública

incondicionada, não sendo cabível em nenhuma hipótese a aplicação da Lei 9099/95

dos Juizados Especiais.

Trata-se de decisão que buscou fundamentação no princípio da proibição

de proteção insuficiente dos direitos fundamentais e, além disso267:

Sublinhou-se que a lei em comento representaria movimento legislativo claro no sentido de assegurar às mulheres agredidas o acesso efetivo à reparação, à proteção e à justiça. Discorreu-se que, com o objetivo de proteger direitos fundamentais, à luz do princípio da igualdade, o legislador editara microssistemas próprios, a fim de conferir tratamento distinto e proteção especial a outros sujeitos de direito em situação de hipossuficiência, como a Lei Maria da Penha e o Estatuto do Idoso.

No direito previdenciário, o princípio vem sendo empregado com bastante

frequência, conforme destacado pelos professores José Antonio Savaris e Daniel

Machado da Rocha268:

265 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm, 2016. p. 87. 266 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm, 2016. p. 87. 267 CAIXETA, Nayara Firmes; NUNES, Joamar Gomes Vieira. Garantismo positivo: a dupla face

do princípio da proporcionalidade. Revista Perquirere, 11(1):29-48, jul. 2014, p. 45. 268 ROCHA, Daniel Machado da; SAVARIS, José Antônio. Curso de direito previdenciário:

fundamentos de interpretação e aplicação do direito previdenciário. Curitiba: Alteridade, 2014. p. 128.

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[…] o princípio da proibição de proteção de ciente assegura que o direito fundamental social prestacional não pode ser iludido pelo Poder Público, quer mediante a omissão do dever de implementar as políticas públicas necessárias à satisfação desses direitos, quer mediante a adoção de política pública inadequada ou insuficiente.

Fica dessa forma evidenciado que o princípio da proibição da proteção

deficiente acaba por se tornar um núcleo do Estado Democrático de Direito, em que

todos os direitos fundamentais são importantes, acabando com a lenda de que este

princípio foca somente em um tipo de direito, mas sim em todas as dimensões, visto

que todos eles são interdependentes e têm como objetivo alcançar a vida digna,

como bem asseveram Nayara Firmes Caixeta e Joamar Gomes Vieira Nunes269:

(...) a tarefa do novo modelo de Estado, prevista na CF/88, é a de dar

resposta para as necessidades de segurança de todos os direitos, incluindo-se nesse rol também os prestacionais por parte do Estado, direitos econômicos, sociais e culturais, e não somente daquela parte de direitos denominados de prestação de proteção, em particular contra agressões provenientes de comportamentos delitivos de determinadas pessoas.

Ainda mais recentemente, o princípio da proibição da proteção deficiente

dos direitos fundamentais foi empregado como fundamento em parecer proferido

pelo Procurador Rodrigo Janot para defender a interrupção da gravidez nos casos

de grávidas infectadas pelo vírus da zika, afirmando tratar-se de “justificação

genérica de estado de necessidade”. Tal parecer foi incluído em ação direta de

inconstitucionalidade apresentada ao Supremo pela Associação Nacional dos

Defensores Públicos (Anadep).

O procurador utiliza como fundamentação o fato de que o Estado deve ser

responsável pela proteção da saúde das mulheres, evitando qualquer sofrimento que

a mesma possa passar. A imposição da gravidez foi tratada pelo procurador como

uma forma de tortura, afirmando que “O Direito Penal é forma de recuperação e

reafirmação da autoridade do estado por violação de direitos, não meio de

tortura”270.

269 CAIXETA, Nayara Firmes; NUNES, Joamar Gomes Vieira. Garantismo positivo: a dupla face

do princípio da proporcionalidade. Revista Perquirere, 11(1):29-48, jul. 2014. p. 36. 270 Janot defende aborto para grávidas infectadas pelo vírus da Zika. Globo G1. Disponível em:

<http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/09/janot-defende-aborto-para-gravidas-infectadas-pelo-zika-virus.html>. Acesso em: 8 set. 2016.

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Ele ainda acrescenta271 que a autorização para interromper a gravidez em

casos de estupro visa proteger a mulher de sofrimento e desamparo, tal como ocorre

nos casos de infecção pelo vírus da zika. E que, por ser uma permissão, e não

interrupção, nesses casos não há desvalor à vida humana ou das pessoas com

deficiência.

Segundo Janot, “Trata-se simplesmente do reconhecimento de que tomar

a reprodução humana como dever, nessas condições, é impor às mulheres autêntico

estado de tortura, imenso sofrimento mental”272.

Por fim, e como forma de expressar o princípio da proibição da proteção

deficiente dos direitos fundamentais, Rodrigo Janot sugeriu que o Supremo realize

audiências públicas e determine que o Governo Federal apresente planos de ação

com o fim de “assegurar proteção suficiente dos direitos constitucionais violados

pela negligência estatal”273.

No direito ambiental também pode-se visualizar ações diretas de

inconstitucionalidade utilizando como fundamento o princípio da proibição da

proteção insuficiente do direito fundamental ao meio ambiente saudável. Dentre eles,

pode-se destacar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4529 ajuizada pelo

Procurador-geral da República Roberto Gurgel Santos, que solicitou a suspensão

em caráter liminar dos efeitos do Código de Meio Ambiente do Mato Grosso, cujo

qual considerava dispensável a realização de estudo prévio de impacto ambiental

para o licenciamento ambiental de empreendimentos hidrelétricos com potencial

entre 10 e 30 Megawatt (MW)274, violando a Resolução nº01/86 do Conselho

Nacional do Meio Ambiental (Conama) e o art. 225, §1º, inciso IV da Constituição

Federal.

271 Janot defende aborto para grávidas infectadas pelo vírus da Zika. Globo G1. Disponível em:

<http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/09/janot-defende-aborto-para-gravidas-infectadas-pelo-zika-virus.html>. Acesso em: 8 set. 2016.

272 Janot defende aborto para grávidas infectadas pelo vírus da Zika. Globo G1. Disponível em: <http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/09/janot-defende-aborto-para-gravidas-infectadas-pelo-zika-virus.html>. Acesso em: 8 set. 2016.

273 Janot defende aborto para grávidas infectadas pelo vírus da Zika. Globo G1. Disponível em: < http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/09/janot-defende-aborto-para-gravidas-infectadas-pelo-zika-virus.html>. Acesso em: 8 set. 2016.

274 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Código do Meio Ambiente de Mato Grosso é questionado no Supremo por violar regras da CF e do Conama. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=168891&caixaBusca=N>. Acesso em: 09 nov. 2016.

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Sustenta o ilustre procurador que, em se tratando de licenciamento e

estudo de impacto ambiental, a Constituição Federal determina tratar-se de

competências da União em ditar as regras gerais sobre a matéria, cabendo aos

estados apenas a competência suplementar. Partindo disso, somente a União

poderia legislar em relação às exceções das regras gerais.

Para fundamentar, o procurador-geral declara que275:

[...] a redução da proteção ambiental por meio de dispensa de licenciamento ambiental em hipóteses em que já era previsto, implica proteção insuficiente do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a consequente ofensa ao artigo 225, caput (cabeça) e parágrafo 1º, inciso IV, da CF.

Ainda pode-se destacar a ADI 4988, que questiona a constitucionalidade

do art. 3º, inciso III, alínea “I” da lei 1939/2008 de Tocantins, que segundo a

procuradoria-geral trata-se de uma “proteção deficitária” a áreas de preservação do

estado, visto que prevê 276:

[...] intervenção ou supressão de vegetação em áreas de preservação ambiental mediante procedimento administrativo autônomo e prévio nos casos de pequenas construções com área máxima de 190 metros quadrados, utilizadas exclusivamente para lazer e que não contenham fossas sépticas ou outras fontes poluidoras.

Trata-se de acordo com a procuradoria-geral de violação à

proporcionalidade, na face de proibição à proteção insuficiente, visto que pode “[...]

comprometer o direito ao meio ambiente e a correta gestão do patrimônio público,

além da supressão indevida de áreas de preservação permanente, cujas

consequências podem ser irreversíveis”277.

Pode-se ainda ressaltar o julgamento da ADI 4066 que discutiu sobre a

validade do artigo 2º da Lei 9.055/1995, que “[...] autorizava e disciplinava a

275 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Código do Meio Ambiente de Mato Grosso é

questionado no Supremo por violar regras da CF e do Conama. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=168891&caixaBusca=N>. Acesso em: 09 nov. 2016.

276 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Questionada lei do TO sob o argumento de colocar em risco áreas de preservação. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=242947&caixaBusca=N>. Acesso em: 09 nov. 2016.

277 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Questionada lei do TO sob o argumento de colocar em risco áreas de preservação. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=242947&caixaBusca=N>. Acesso em: 09 nov. 2016.

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extração, industrialização, utilização e comercialização do amianto crisotila (asbesto

branco) e dos produtos que o continham”278.

Sobre essa questão, o Dr. Eduardo Algranti, chefe do Serviço de Medicina

e pesquisador da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do

Trabalho (FUNDACENTRO), explica que através experiências em laboratório foi

concluído que o amianto é uma matéria inextinguível. Ou seja, o risco é cumulativo

na população, quanto mais usar, maiores as consequências, podendo causar

doença de pulmão, câncer, entre outras doenças graves.

Em julgamento, o ministro Celso de Mello enfatiza que “[...] a lesividade

do amianto crisotila, que está comprovadamente relacionado a diversos tipos de

câncer, significa que as regras atuais são insuficientes, revelando o descumprimento

pelo Estado dos deveres constitucionais de proteção à saúde humana, ao meio

ambiente, ao trabalho e qualidade de vida digna”279.

Ocorre que, segundo o voto de Alexandre de Moraes, não existe

inconstitucionalidade por omissão ou proteção insuficientente. Na sua opinião, “[...] a

declaração de inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei 9.055/1995 levaria a uma

situação de anomia, com a total desregulamentação da atividade, trazendo de volta

a legislação anterior, que considera menos eficaz para a proteção do meio ambiente

e a tutela da saúde humana”280.

Em contraposição, Edson Fachin defendeu que tolerar o uso do amianto

“[...] não oferece proteção suficiente aos direitos fundamentais de proteção ao meio

ambiente e à saúde”281. E acrescentou que a não observância da lei que prevê o uso

278 CORREIO BRAZILIENSE. Jornal online. Sessão Política e Brasil. Supremo Tribunal

Federal conclui julgamento do amianto. 24 ago. 2017. Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2017/08/24/internas_polbraeco,620577/supremo-tribunal-federal-conclui-julgamento-do-amianto.shtml>. Acesso em: 26 ago. 2017.

279 CORREIO BRAZILIENSE. Jornal online. Sessão Política e Brasil. Supremo Tribunal Federal conclui julgamento do amianto. 24 ago. 2017. Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2017/08/24/internas_polbraeco,620577/supremo-tribunal-federal-conclui-julgamento-do-amianto.shtml>. Acesso em: 26 ago. 2017.

280 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Suspenso julgamento de ADI sobre proibição de amianto. 23 ago. 2017. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=353465>. Acesso em: 26 ago. 2017.

281 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Suspenso julgamento de ADI sobre proibição de amianto. 23 ago. 2017. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=353465>. Acesso em: 26 ago.

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periódico dos critérios de utilização há 22 anos já demonstra uma omissão legislativa

e consequente proteção insuficiente à saúde e ao meio ambiente.

Assim, diante dos argumentos destacados, ficou decidido pela não

declaração de inconstitucionalidade do dispositivo, por não se ter atingido o quórum

exigido pelo art. 97 da Constituição282.

Além das decisões acima mencionadas, a partir de pesquisa no site do

STF, utilizando como referência de pesquisa “proibição proteção insuficiente”, pode-

se deparar ainda outros julgados em que o “princípio da proibição insuficiente” foi

utilizado como fundamento. Sendo que em todas as decisões foi o voto do Ministro

Gilmar Mendes que menciona o dito princípio.

A começar com o Habeas Corpus HC 96759 - Ceará, relativo à tipicidade

ou não do porte ilegal de arma de fogo sem munição. Ao proferir o voto, o Ministro

Gilmar Mendes explica em um primeiro momento o dever do Estado de não somente

observar os direitos fundamentais face as ações do Poder Público, mas também o

dever de garantir que os direitos fundamentais não sejam agredidos por terceiros,

configurando essa função do Estado de guardião dos direitos fundamentais,

traduzido como proibição de proteção insuficiente ou “imperativos de tutela”283.

Diante disso, o ilustre ministro destaca em seu voto que as normas

constitucionais brasileiras “[...] explicitam o dever de proteção identificado pelo

constituinte e traduzido em mandatos de criminalização expressos dirigidos ao

legislador”284. Ou seja, esses mandatos de criminalização impõem um sistema de

proteção pelas normas penais.

Assim, “[...] levando-se em conta o dever de proteção e a proibição da

proteção deficiente ou insuficiente (Untermassverbot), cumpriria ao legislador

2017.

282 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 4066- Ação Direta de Inconstitucionalidade. 24 ago. 2017. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=4066&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M>. Acesso em: 26 ago. 2017.

283 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 96.759. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629956>. Acesso em: 05 abr. 2017.

284 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 96.759. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629956>. Acesso em: 05 abr. 2017.

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estatuir o sistema de proteção constitucional-penal adequado”285. Decidiu-se que,

após o texto normativo aprovado, “[..] a política estabelecida para a segurança

pública é a da vedação ao uso ao porte de arma e à venda”286.

Outra decisão que pode ser destacada é a ARE 745745 AgR, com o

ministro Gilmar Mendes como relator. Trata-se de um recurso que tem como objeto a

manutenção de rede de assistência à saúde da criança e do adolescente, e a

possibilidade de o Judiciário determinar a execução de políticas públicas quando o

Município se mostrar omisso quanto a essa sua atribuição.

E, para demonstrar que essa atuação do Judiciário é legítima, o ilustre

ministro iniciou seu voto abordando a essencialidade do direito à saúde, prevista no

art. 197 da CF, sendo o tema tratado pelo legislador como “[...] prestações de

relevância pública”287, configurando um desrespeito à Constituição a inércia de

atuação, seja ela governamental ou judicial.

No referido voto, o ilustre ministro menciona o princípio da proibição da

proteção insuficiente no sentido de que os casos de omissão inconstitucional

derivam da “insuficiente concretização, pelo Poder Público, do conteúdo material de

norma impositiva na Carta Magna”, tratando-se de um gesto de desprezo à

Constituição, bem como um insulto aos direitos básicos assegurados por ela,

caracterizando “o fenômeno da erosão da consciência constitucional”288.

O relator ainda mencionou outra violação importante que ocorre com

essas omissões inconstitucionais, tais como a violação do princípio da proibição do

retrocesso, segundo o qual todas as conquistas na seara dos direitos sociais não

devem ser desconstituídas, vistos serem conquistas dos cidadãos289.

285 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 96.759. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629956>. Acesso em: 05 abr. 2017.

286 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 96.759. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629956>. Acesso em: 05 abr. 2017

287 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 745745 AgR. P. 4. Disponível em: <redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7516923>. Acesso em: 19 abr. 2017

288 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 745745 AgR. P. 15. Disponível em: <redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7516923>. Acesso em: 19 abr. 2017

289 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 745745 AgR. P. 17. Disponível em:

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Outro voto proferido pelo ministro Celso de Cello, no mesmo sentido, é

em relação à ARE 727864 AgR, ou seja, o voto ressalta esse dever estatal de

assistência à saúde e proteção à vida, sendo um desrespeito à Constituição

qualquer inércia do Estado290.

Mas não é tão somente na seara da saúde que pode-se contemplar o

emprego do princípio da proibição da proteção insuficiente pelo Judiciário. Prova

disso está no Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento nº 598.212, que

trata do reconhecimento em favor das populações carentes e desassistidas ao

direito à orientação jurídica integral e à assistência judiciária gratuita, direitos estes

previsto na CF no seu art. 5º, LXXIV e art. 134291.

Ou seja, no mesmo sentido que anteriormente quaisquer omissão por

parte do Poder Público no sentido de não possibilitar o acesso à Justiça trata de

violação a normas impositivas da Constituição, tornando tal direito mera expectativa,

além de configurar um desrespeito à Constituição.

Assim, ainda que não expressos na Constituição, o princípio da

proporcionalidade se mostra de extrema importância ao mundo jurídico,

especialmente se analisado a partir de sua dupla face, proibição de excesso e

proibição da proteção insuficiente, visto que se mostram a base de importantes

decisões proferidas pelo Judiciário brasileiro.

É essa dupla face que possibilita a percepção da importância dos direitos

fundamentais, demonstrando sua interdependência e vinculação, exigindo que o

Estado tenha uma atuação adequada, sem se exceder, mas também sem se omitir,

dando a efetividade a esses tão importantes direitos formalizados na Constituição.

<redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7516923>. Acesso em: 19 abr. 2017.

290 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 727864 AgR. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7218726>. Acesso em: 25 abr. 2017.

291 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 727864 AgR. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7218726>. Acesso em 25 abr. 2017.

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3.3 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E SUA

ESSENCIALIDADE NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE E BUSCA DO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Este último item vai se direcionar a analisar de que forma o princípio da

proibição da proteção insuficiente pode ser vislumbrado na seara da proteção do

meio ambiente, tratado como direito fundamental, e encontrado na Constituição

Federal de 88 no capítulo IV, art. 225, onde transcreve que “Todos têm direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado […]”, bem como analisar de que forma

ele contribui para a busca de um desenvolvimento sustentável.

Ainda que sejam poucos os julgados destacados no item anterior que se

refiram à questão do direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, o princípio

da proibição da proteção insuficiente deve ser observado e aplicado para este

direito, uma vez que ele é coletivo, e possui relação direta com diversos outros

direitos fundamentais importantes e está totalmente interligado com a dignidade

humana de todos, conforme já esclarecido no primeiro capítulo do presente trabalho.

Além disso, por tratar-se de um direito fundamental, ele deve ser

respeitado, bem como deve ser buscada sua efetividade, pois conforme já

destacado, ele gera uma obrigação, independente de qualquer atividade legislativa.

E, se este se mostra omisso ou insuficiente, o Poder Judiciário tem o dever e

aparato Constitucional de proteger este direito.

Para haver maior compreensão dessa fundamentalidade do direito ao

meio ambiente saudável, importante mencionar a evolução dos meios de proteção

do meio ambiente no Brasil e no mundo.

Primeiramente, é importante destacar que não são todas as constituições

que tratam o meio ambiente como direito fundamental. Ele também pode ser

considerado um bem jurídico, conforme pode-se perceber na Espanha. Essa

diferenciação ocorre especialmente a partir da forma que os poderes políticos de

cada nação entendem se dar a melhor proteção, tendo em vista a essencialidade e

importância que o meio ambiente adquiriu, a ponto de contar com a solidariedade de

toda a comunidade para uma devida atenção e proteção, por meio de instrumentos

de caráter transnacional.

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Essa essencialidade e importância podem ser explicadas a partir do

reconhecimento do meio ambiente como fator de extrema importância para tornar

efetivos outros direitos fundamentais essenciais, podendo ao final garantir uma vida

digna à toda comunidade, tendo em vista a característica de interdependência dos

direitos fundamentais, visto que a efetividade de uns contribuem indiretamente (ou

diretamente) para a efetividade de outros.

Em relação a essa interdependência, destacam-se as considerações de

José Rubens Morato Leite, em que “[...] o direito fundamental ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado se insere ao lado do direito à vida, à igualdade, à

liberdade, caracterizando-se pelo cunho social amplo e não meramente

individual”292.

Além disso, ficou constatada a necessidade e a dependência do ser

humano de usufruir os recursos da natureza para o desenvolvimento de suas

atividades diárias, gerando a necessidade de maior consciência, tendo em vista que

muitos desses recursos já eram escassos, ficando constatada que essa

disponibilidade não era infinita.

Pode-se destacar como grande causa dessa escassez o consumo

desenfreado da sociedade, advindo de seu modelo de produção, que pode resultar

num colapso ambiental, bem como comprometer o desenvolvimento e a qualidade

de vida das gerações futuras.

Esse comprometimento do desenvolvimento está ligado com a noção de

sociedade de risco trazida por Ulrich Beck, uma vez que essa degradação ambiental

em alta escala trazida para satisfação consumista desenfreada da sociedade gerava,

consequentemente, grandes desastres ambientais que a princípio eram localizados,

mas passaram a demonstrar seus resultados em locais mais distantes,

demonstrando essa ligação da fauna e flora mundial, ou seja, ocorriam impactos

ambientais transfronteiriços. Trata-se, segundo Beck, de consequências inerentes à

uma sociedade globalizada. Sobre isso, Jacques Demajorovic293 destaca:

292 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao

coletivo extrapatrimonial - teoria e prática. p. 99. 293 DEMAJOROVIC, Jacques. Sociedade de risco e responsabilidade socioambiental:

perspectivas para a educação corporativa. Tese para obtenção do Título de Doutor em Educação.

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O agravamento dos problemas ambientais está ligado a escolhas feitas no que diz respeito à forma como o conhecimento técnico-científico vem sendo aplicado no processo produtivo. Portanto, as catástrofes e danos ao meio ambiente não são surpresas ou acontecimentos inesperados, e sim uma característica inerente à modernidade, que mostra, acima de tudo, a incapacidade do conhecimento construído neste século de controlar os efeitos gerados exatamente pelo desenvolvimento industrial.

Assim, a proteção do meio ambiental adquiriu importância em escala

mundial. E, em relação à sua evolução, o Professor Doutor Gabriel Real a explica a

partir do que ele intitula de “as ondas”, sendo a primeira onda ocorrida em

Estocolmo, denominada Declaração de 1972; a segunda onda ocorreu no Rio de

Janeiro, resultando na Agenda XXI; a terceira onda ocorreu em Johannesburgo no

ano de 2002, resultando na Declaração de Johannesburgo. A quarta e última onda

ocorreu no Rio de Janeiro em 2002, resultando na chamada Rio +20.

É diante de todos esses apontamentos que o meio ambiente adquiriu uma

preocupação de caráter transnacional, tornando a busca de um desenvolvimento

sustentável uma meta, visando garantir que as sociedade atuais e futurais possuam

uma vida digna.

Ou seja, a busca pela sustentabilidade passou a ser “meta e caminho”294,

sendo, portanto, um objetivo do Estado Democrático de Direito, que conforme já

mencionado diversas vezes ao longo desse trabalho, possui como princípios

basilares o direito à vida e a dignidade da pessoa humana.

Porém, a ideia que gira em torno de sustentabilidade é muito maior do

que isso, ou seja, ela vai ser considerada um princípio flexível que vai buscar uma

sociedade justa ou, nas palavras de Gabriel Real Ferrer, “a busca de uma sociedade

global, capaz de perpetuar-se indefinidamente no tempo e que permite a todos ter

uma vida digna”295, não estando ligada necessariamente à ideia de crescimento.

Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000. p. 22.

294 REAL FERRER, Gabriel. Del derecho ambiental al derecho de la sostenibilidad. PNUMA, Programa regional de capacitación en derecho y políticas ambientales, 2008. Disponível em: <http://www.pnuma.org/deram/documentos>. Acesso em: 25 abr. 2017.

295 CENTRO DOM HELDER DE CONVENÇÕES. Gabriel Real Ferrer apresenta palestra sobre as dimensões da sustentabilidade. Disponível em: <http://www.institutosocioambientaldhc.com.br/artigos/n-a/>. Acesso em: 28 set. 2015.

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Segundo Juarez Freitas, o conceito de sustentabilidade é:

[…] trata-se do princípio constitucional que determina, com eficácia direta e imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretização solidária do desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equânime, ambiente limpo, inovador, ético e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar296.

Nesse ponto, conforme destacam Cornelius e Pickcius297:

[...] que sustentável não se limita somente à problemática ambiental, visto que a doutrina já ampliou os conhecimentos sobre o assunto defendendo o aspecto multidimensional da sustentabilidade, que de acordo com o professor Gabriel Real podem ser destacadas quatro dimensões: social, ambiental, econômica e tecnológica298.

Porém, mantendo o foco na seara ambiental, estudos comprovam que,

sendo o meio ambiente um bem jurídico que possibilita que outros direitos

fundamentais possam ser assegurados de maneira direta e indireta e que o direito à

vida e a dignidade da pessoa humana possam ser vislumbrados pela sociedade

mundial, cabe a cada nação assegurar que meios de proteção e preservação sejam

buscados e devidamente seguidos.

Esse aspecto está diretamente ligado com a ideia de que a sociedade

vive submetida por um sistema jurídico harmônico, em que direitos fundamentais

296 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.

41. 297 CORNELIUS, Camila Savaris; PICKCIUS, Raul Denis. A urbanização inclusiva e sustentável

voltada aos deslocados ambientais. In: GARCIA, Denise Schmitt Siqueira; DANTAS, Mercelo Buzaglo; SOUZA, Maria Cláudia da Silva Antunes de (orgs.). Governança transnacional e sustentabilidade. 2ª ed. Umuarama: Unipar, 2016, v. 2, p. 496-516.

298 Breves notas em relação às dimensões da sustentabilidade a partir do artigo. CORNELIUS, Camila Savaris. Neoconstitucionalismo, argumentação jurídica e a sustentabilidade como equação para a preservação ambiental frente ao desenvolvimento econômico. In: ROSA, Alexandre Morais da; BONISSONI, Natammy Luana de Aguiar (orgs.). Argumentação Jurídica e o Direito Contemporâneo. 1ª ed. Itajaí: Univali, 2016. “Em relação à dimensão econômica segundo Gabriel Real é “aumentar la generación de riqueza, de un modo ambientalmente sostenible, y de encontrar los mecanismos para una más justa y homogénea distribución”. Trata-se de buscar uma igualdade, e uma forma racional de crescimento respeitando os recursos naturais. Trata-se, portanto, de uma dimensão que possui nítida ligação com a dimensão social.(…) Em relação à dimensão social, essa vai se preocupar com a busca da igualdade das pessoas, tendo como pressuposto a distribuição de renda. E, além disso, busca a concretização de direitos, visto estar ligada especialmente aos direitos sociais. (…) A dimensão tecnológica, introduzida pelo professor Gabriel Ferrer, diz respeito à ciência e à técnica serem utilizadas em beneficio do homem e da sustentabilidade, segundo o professor. Ou seja, tendo em vista os avanços tecnológicos, tem-se que ter certeza de que isso vai se tornar um benefício e não um malefício para o futuro da humanidade.

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coletivos e individuais devem possuir uma relação de proteção harmônica, não

podendo haver restrições excessivas e desnecessárias para a devida proteção.

Em se tratando da atuação do Judiciário utilizando-se como ferramenta

argumentativa o “princípio da proibição da proteção insuficiente”, cabe destacar

primeiramente o seu papel principal, qual seja, a tutela da dimensão objetiva dos

direitos fundamentais. E essa atuação vai ocorrer especialmente quando o legislador

for omisso, ou ainda, apesar de regulamentar quaisquer meio de proteção, fará isso

de forma insuficiente ou deficiente, visto que não esta cumprindo com a forma de

proteção visada pela Constituição.

No caso do meio ambiente, sua tutela adequada pelo Estado está

diretamente ligada ao núcleo da Constituição Brasileira. Diante disso, quaisquer

negligências ou imprudências quanto à sua devida proteção, ou ainda, omissão ou

deficiência constatada, estar-se-á “[...] lesionando de maneira grave, permanente e

contínua numerosos direitos inerentes ao ser humano”299.

A título de curiosidade, com relação à importância da proteção do meio

ambiente para, consequentemente, dar efetividade a outros direitos fundamentais,

pode-se destacar a Sentença T-622 de 2016300, proferida na Colômbia, onde o rio

Atrato foi reconhecido como sujeito de direitos, bem como ser responsabilidade do

Estado manter o rio em perfeito estado de conservação e em condições para uso

dos moradores ao seu redor.

Isso ocorreu, especialmente, porque constatou-se uma massiva violação

de direitos fundamentais dos moradores daquela região, tais como o direito à vida, à

saúde, à água, à cultura, ao meio ambiente são, pois o Estado permaneceu omisso

em relação aos seus deveres para com aquele rio.

Dessa forma, torna-se evidente a necessária participação eficiente do

Estado, desenvolvendo políticas públicas relacionadas ao assunto, mas também

possibilitando que a legislação sobre o meio ambiente seja devidamente observada

299 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm, 2016. p. 96. 300 RED POR LA JUSTICIA AMBIENTAL EN COLOMBIA. Sentencia T-622 de 2016 que

reconoce al río Atrato como sujeto de derechos. Disponível em: <https://justiciaambientalcolombia.org/2017/05/07/sentencia-rio-atrato/>. Acesso em: 10 maio 2017.

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e aplicada, o que tornará possível esse desenvolvimento sustentável tão cobiçado

por todas as nações do mundo.

Nesse sentido, pontua Cutanda301:

Cuando los conflitos entre los intereses ambientales y los vinculados al desarrollo económico se judicializan, los Tribunales se esfuerzan por encontrar un punto de equilíbrio entre ambos. En los casos de incompatibilidad, la jurisprudencia se ha pronunciado, como hemos señalado, a favor de una ponderación en el caso concreto de los dos interesses em juego mediante la aplicación del principio de proporcionalidad, con el que se trata de avaluar la relación entre las medidas adoptadas y el fin perseguido para ver si las primeras resultan proporcionadas de acuerdo com las circunstancias concurrentes.

É a partir dessa lógica que o princípio da proibição da proteção

insuficiente vai ser empregado, demonstrando que o Poder Público e outros órgãos

nacionais e internacionais devem ser responsáveis pelo meio ambiente,

especialmente quando não há a correta observância da legislação desenvolvida

sobre o assunto.

Essa preocupação quanto à ligação entre meio ambiente e outros direitos

fundamentais, permitiu que fosse pensada uma dimensão ambiental aos direitos

fundamentais, conforme explica Cutanda302:

La protección otorgada por nuestro ordenamiento a los derechos subjetivos eventualmente afectados por daños ambientales se ve hoy reforzada por la dimensión ambiental que han adquirido algunos derechos fundamentales, por la vía de interpretar que ciertos daños al médio ambiente (emisiones contaminantes, ruídos, olores...) pueden o bien poner en peligro la salud de

301 Quando há conflito entre interesses ambientais e os do desenvolvimento econômino, e estes

chegam aos tribunais, estes se esforçam para encontrar um ponto de equilíbro entre ambos. Nos casos de incompatibilidade, a doutrina do nosso Tribunal Constitucional se pronunciou a favor de uma ponderação dos interesses em jogo, mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade, para avaliar a relação entre as medidas adotadas e o fim perseguido, para ver si as primeiras resultam proporcionais de acordo com as circunstâncias concorrentes (tradução livre). CUTANDA, Blanca Lozano. Medio Ambiente, regulación interna y competências. In: CAMPOS, Tomás Cano (coord.). Tomo VI - Lecciones y materiales para el estudio del derecho administrativo. Madri: Iustel, 2009. p. 266.

302 A proteção outorgada pelo nosso ordenamento aos direitos subjetivos eventualmente afetados por danos ambientais, se vê hoje reforçada pela dimensão ambiental que alguns direitos fundamentais adquiriram, visto que alguns danos ambientais (emissões contaminantes, ruídos, odores etc.) podem colocar em perigo a saúde das pessoas, e causar danos ao direito fundamental à vida e a integridade física (art. 15 CE), ou privar-lhes do disfrute de seu domicílio, e vulnerar, consequentemente, os direitos à intimidade pessoal e familiar, e violar a intimidade do domicílio. (Tradução Livre). CUTANDA, Blanca Lozano. Medio Ambiente, regulación interna y competências. In: CAMPOS, Tomás Cano (coord.). Tomo VI - Lecciones y materiales para el estudio del derecho administrativo. Madri: Iustel, 2009. p. 265.

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las personas, y atentar por ello contra el derecho fundamental a la vida y la integridade física (art.15 CE), o bien prevarles del disfrute de su domicilio y vulnerar por ello los derechos a la intimidad personal y familiar y a la inviolabilidade del domicilio (art. 18 CE).

Ocorre que, ainda que o Estado seja demandado e perceba que existam

falhas na sua atuação, ainda ocorrem omissões, sendo portanto importante a

atuação da esfera judicial, com aparato argumentativo do conteúdo do princípio, a

fim de que haja a correta observância da lei e especialmente da Constituição,

evitando lesões futuras ao meio ambiente. É a partir dessa atuação que pode-se

vislumbrar o caráter preventivo do princípio da proibição da proteção insuficiente.

A proteção do meio ambiente é de interesse coletivo, além de possibilitar

que interesses individuais possam ser resguardados, ideia esta que pode ser

vislumbrada no próprio art. 225 da Constituição Federal.

Em relação aos questionamentos da legitimidade do Poder Judiciário,

basta destacar o art. 5º, XLI da Constituição Federal de 88, que determina que “a lei

punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”, ou

seja, o Estado tem o dever de proteger os indivíduos contra quaisquer violações aos

direitos fundamentais, e isso se refere a seus poderes constitutivos – Executivo,

Legislativo e Judiciário –, que possuem esse dever independente de norma

específica303.

Dessa forma, diante do princípio da proibição da proteção insuficiente dos

direitos fundamentais, o Poder Judiciário poderá se valer de atuações para

possibilitar que o meio ambiente seja devidamente resguardado, sob pena de muitos

outros direitos fundamentais serem violados.

A proteção dos deveres fundamentais são a razão de existência do

Estado Democrático de Direito, sejam eles individuais e coletivos. Mas, por outro

lado, deve existir a conscientização da sociedade especialmente quando se trata do

meio ambiente e este objetivo último de alcançar a sustentabilidade. Há imbutido

aqui um dever de cooperação e solidariedade, pois caso contrário todos os esforços

do Estado como um todo serão inúteis.

303 CAMPOS, Carlos Alexandre Azevedo. Estado de coisas inconstitucional. Salvador:

JusPodivm. 2016, p. 82.

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Existe uma responsabilidade coletiva quando se aborda sobre a

sustentabilidade, pois ela não depende somente da atuação estatal, mas também da

sociedade.

Primeiramente, diante dessa intercambialidade de informações advindas

dos mais diversos Estados, respeitar o nível cultural de cada sociedade, visto que

umas são mais desenvolvidas que outras, não havendo portanto respostas similares

diante de uma alternativa a ser desenvolvida.

E isto não envolve somente uma questão cultural, mas também uma

questão financeira. Ou seja, a utilização de tecnologias ou até mesmo de outros

métodos devem ser bem avaliados, uma vez que a não correspondência pode ser

interpretada como desleixo, sendo que, na realidade e infelizmente, a mentalidade

de muitas sociedades esta ainda em investir onde há menos necessidade,

pensando-se sempre no “agora” e não no futuro da sociedade, como prega a

sustentabilidade.

Além disso, a falta de correspondência quanto as expectativas de

proteção ambiental podem gerar um desestímulo generalizado, fazendo com que

especialmente países subdesenvolvidos deixem de buscar a aplicação de meios

alternativos para a proteção do meio ambiente.

Diante de todo o exposto, pode-se concluir que o princípio da proibição

da proteção insuficiente irá possibilitar que a proteção do direito fundamental ao

meio ambiente saudável seja devidamente buscado, visto que vai sanar omissões e

defeitos quanto a sua proteção, mas que, por outro lado, depende de toda uma

comunidade seguir esses meios de proteção desenvolvidos, possibilitando

consequentemente que a busca por uma sociedade sustentável ocorra.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da presente pesquisa, cumpre primeiramente retomar as hipóteses

destacadas, quais sejam: a) Os direitos fundamentais exigem proteção suficiente ou,

em face do caráter vinculante dos direitos fundamentais, esses exigem proteção

suficiente?; b) O princípio da proporcionalidade é uma norma de natureza

constitucional, que se desdobra no princípio da proibição da proteção insuficiente?;

c) O poder judiciário no exercício da jurisdição constitucional que emprega o

princípio da proibição da proteção insuficiente, reconhece a invalidade da ação ou

omissão estatal para a proteção dos direitos fundamentais e do meio ambiente?

E, para respondê-las, o presente trabalho foi dividido em três capítulos.

No primeiro, buscou-se analisar o surgimento e e justificativas dos direitos

fundamentais, trazendo a tona o porquê de serem considerados núcleo do sistema

normativo, para, por fim, analisar como se dá a efetividade desses direitos, e

verificar as limitações dos mesmos, tais como a reserva do possível e o mínimo

existencial. O segundo capítulo passou a falar do princípio da proporcionalidade,

bem como sua dupla face, qual seja, o princípio da proibição do excesso e princípio

da proibição da proteção insuficiente. E, por fim, no terceiro capítulo há uma análise

mais aprofundada do princípio da proibição da proteção insuficiente, analisando-se

de que forma esse princípio é utilizado nas decisões do STF, bem como a natureza

dessas decisões, para no fim analisar de que forma este princípio se comporta para

efetivar direitos fundamentais e, especialmente, bem como ao meio ambiente e,

consequentemente, a sustentabilidade.

No tocante à primeira hipótese, cumpre destacar o que foi abordado no

primeiro capítulo, onde ficou bem claro que os direitos fundamentais são

reconhecidos como núcleo de todo o sistema normativo, vinculando todo e qualquer

ato, seja ele advindo do particular ou do próprio Estado. No que diz respeito ao

Estado, sua origem está diretamente vinculada com essa proteção dos direitos

fundamentais, especialmente com o neoconstitucionalismo e constitucionalismo

contemporâneo, em que a Constituição foi colocada em posição de destaque no

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ordenamento jurídico.

As consequências de todas essas mudanças se deram especialmente na

aplicação do Direito, onde antes predominava a técnica de subsunção, passando a

se desenvolver a hermenêutica por trás da aplicação dos direitos fundamentais e

normas aos casos concretos. Isso decorre especialmente com a maior aplicação de

princípios, e o reconhecimento desses como normas. Nesse ponto, já se pode

vislumbrar o papel do Judiciário sendo ampliado, pois já não era mais suficiente a

simples aplicação da norma à situação fática, visto que as demandas da sociedade

mudavam muito, devendo a norma ser interpretada, evitando as constantes

emendas na Constituição e no próprio ordenamento jurídico.

Além disso, com o reconhecimento da primazia da Constituição e dos

Direitos Fundamentais, reconheceu-se que todos os direitos fundamentais devem

possuir uma eficácia minima ou, como abordado pela hipótese, uma proteção

suficiente.

É a partir dessa proteção suficiente aos direitos fundamentais que o

princípio da proporcionalidade em sua face do princípio da proibição da proteção

insuficiente vai atuar, para garantir que os direitos fundamentais sejam

suficientemente protegidos e observados, seja pelo Estado ou pelo próprio particular.

A segunda hipótese trata, mais especificamente, do princípio da

proporcionalidade e, logo pode-se lançar, desde o primeiro capítulo, que, a partir do

momento em que os princípios constitucionais foram reconhecidos como

possuidores de poder normativo, eles já foram reconhecidos como normas de poder

constitucional.

Com especial atenção ao princípio da proporcionalidade, ele é

considerado o principal artifício de argumentação do Poder Judiciário, vista sua

ligação com a técnica de ponderação realizada pelo Poder Judiciário nos casos

difíceis. E, ainda, pode-se acrescentar a sua aplicação nos momentos de avaliação

das atuações do Poder Público, extendendo-se às atuações dos particulares.

É fundamental dar ênfase nas duas facetas do princípio da

proporcionalidade, também abordadas no presente estudo, especialmente no que

diz respeito ao princípio da proibição da proteção insuficiente. A começar pelo

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princípio da proibição do excesso, faceta esta originalmente reconhecida a partir do

princípio da proporcionalidade, que impedia os excessos advindos do Estado no

momento de limitar qualquer direito fundamental. Essa face surgiu especialmente

diante do histórico da sociedade, onde o Estado era muito opressor.

Por outro lado, o princípio da proibição da proteção insuficiente dos

direitos fundamentais, vai impedir que a proteção concedida aos direitos

fundamentais seja insuficiente ou ainda omissa, visto que essa é considerada

insuficiente analisando-se os casos concretos. Tais situações, assim, possibilitam

uma atuação suis generis, ou melhor dizendo, para além da conhecida pelo Poder

Judiciário. Isso ocorre especialmente quando o poder executivo e legislativo não

cumprem com suas funções no prazo determinado em lei, resultando em lacunas

nas principais demandas da sociedade, ligadas especialmente com os direitos

sociais.

Assim, o princípio da proibição da proteção insuficiente possibilitará, em

último caso, que o Poder Judiciário tome decisões que seriam originalmente dos

outros poderes, tendo em vista ser essa a principal esfera de poder que possui

atuação direta com as necessidades dos cidadãos, ligadas a possibilitar a dignidade

da pessoa humana, núcleo da Constituição Federal.

Porém, conforme pode-se vislumbrar no presente trabalho, o emprego do

princípio da proibição da proteção insuficiente não é ainda amplamente utilizado na

argumentação do Poder Judiciário, mas vem ganhando espaço, proporcionando a

proteção dos direitos fundamentais conforme a Constituição Federal requer, essa

proteção suficiente, que não ultrapassa o previsto pela Carta Magna.

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