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Daiana Aparecida da Silva
Efeitos da ayahuasca na memória emocional de ratos
Orientador: Profa. Dra. Maria Gabriela Menezes de Oliveira
São Paulo
2012
Dissertação apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do título de Mestre em Ciências.
ii
FICHA CATALOGRÁFICA
(preparada segundo Rother, E.T.; Braga, M.E.R. Como elaborar sua tese: estrutura e referências. 2ª. Ed. São Paulo, 2005)
Aparecida da Silva, Daiana
Efeitos da ayahuasca na memória emocional de ratos/ Daiana Aparecida da Silva. São Paulo, 2012.
xv, 65 f.
Dissertação (Mestrado)- Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-graduação em Psicobiologia.
Título em inglês: Effects of ayahuasca on emotional memory in rats.
1.Ayahuasca. 2. Dimetiltriptamina. 3. Psychotria viridis. 4.Banisteriopsis caapi. 5. Condicionamento clássico de medo. 6. Ratos
iii
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PSICOBIOLOGIA
Chefe de Departamento
Profa. Dra. Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni
Coordenadora do Curso de Pós-graduação:
Prof. Dra. Vânia D’Almeida
iv
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PSICOBIOLOGIA
Banca examinadora
_____________________________________
Prof. Dr. Fulvio Rieli Mendes
_____________________________________ Profa. Dra. Vanessa Costhek Abílio
____________________________________ Prof. Dr. Reinaldo Nóbrega de Almeida
_____________________________________ Profa. Dra. Mirtes Costa (suplente)
v
Dedicatória
Dedico este trabalho às pessoas que lutam
ao meu lado, transmitindo fé, amor,
alegria, perseverança, paciência e coragem.
Essas pessoas tornam os meus dias mais belos e felizes. Aos
meus pais, Maria e José Francisco, à minha amiga Rosangela, à
minha avó Nina, e ao meu namorado, Diego.
vi
Agradecimentos
A Deus por sempre estar me dando forças e iluminando meu caminho
para que eu poder concluir mais uma etapa da minha vida;
À minha mãe Maria, por todo amor e dedicação, meu eterno
agradecimento pelo seu apoio constante, uma mãe dedicada, amiga,
batalhadora, que abriu mão de muitas coisas para me tornar a pessoa que
hoje sou;
Ao meu namorado e companheiro, Diego, por toda caminhada que
fizemos juntos até o dia de hoje, e as pelas próximas que virão. Pelo amor,
carinho, paciência, por me aturar, me ajudar e me fazer feliz;
À minha amiga Rosangela, por todo incentivo, carinho, compreensão e
fé em meu potencial;
A minha avó Nina, por estar sempre torcendo para que meus objetivos
sejam alcançados;
A todos os familiares que torceram por mim;
À minha orientadora, profª Maria Gabriela Menezes de Oliveira, pessoa
que muito admiro e agradeço imensamente pela oportunidade, pelos
ensinamentos, dedicação e muita paciência dispensados para a concretização
dessa dissertação;
Ao amigo e grande profissional Bruno de Brito Antônio, pela atenção e
comprometimento com meu trabalho, pelas valiosas correções e
contribuições para este trabalho;
À colega de trabalho, profª Dra Juliana Carlota Kramer Soares, com
suas importantes correções e sugestões;
À minha amiga Andréia Gomes Bezerra, pelo seu trabalho e atenção,
mas principalmente pelas atenção, apoio e suas sugestões;
A todos os integrantes do “grupo Gabi”, pelas entusiamadas
discussões sobre ciência;
Ao Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São
Paulo, local de meu trabalho e de grande parte de minha aprendizagem;
Aos professores do Departamento de Psicobiologia, pelos
ensinamentos e pela vivência, cada um de forma especial contribuiu para
vii
a conclusão desse trabalho e consequentemente para minha formação
profissional;
Aos amigos pós-graduandos, que devem contribuir para a construção
do conhecimento e crescimento de seus colegas, em especial Bruno;
Aos amigos funcionários da Psicobiologia, da secretaria, da biblioteca,
da limpeza, manutenção, tornando nosso departamento um ambiente
agradável e salutar para o trabalho;
À querida bibliotecária Maria Cristina Jorge, pela atenção e competência
em seu trabalho;
Aos amigos do Biotério, pela atenção e cuidados com os animais
utilizados, e especial ao querido bioterista José Bernardo, pelo trabalho
eficiente que esteve presente durante todas as etapas de experimentação
deste trabalho;
Aos membros da banca de qualificação e defesa, por terem aceitado o
convite e sobretudo pelas valiosas contribuições;
À Associação Fundo de Incentivo à Psicofarmacologia (AFIP), à
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP);
Obrigada
viii
“Que sua colheita seja abundante e eterna e o sorriso da felicidade e do sucesso enfeite seus lábios.”
(Lauro Trevisan)
ix
Lista de Figuras:
Figura 1: cozimento do chá de ayahuasca.................................................................3
Figura 2: Plantas comumente utilizadas no preparo do chá de
ayahuasca...................................................................................................................5
Figura 3: Estruturas químicas dos principais alcaloides do chá e sua semelhança
estrutural com o neurotransmissor
serotonina....................................................................................................................6
Figura 4: Esquema geral da aquisição das tarefas de CMC ou CMS......................18
Figura 5: Esquema geral da consolidação das tarefas de CMC ou CMS...............19
Figura 6: Esquema geral da evocação das tarefas de CMC ou CMS.....................20
Figura 7: Efeito da administração pós-treino de ayahuasca nas doses 250 ou 750
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC.......................22
Figura 8: Efeito da administração pré-treino de ayahuasca na dose 500 mg/kg
sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC..................................23
Figura 9: Efeito da administração pré-treino de ayahuasca nas doses 250 ou 750
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS.......................24
Figura 10: Efeito da administração pré-treino de ayahuasca 500 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS...............................................25
Figura 11: Efeito da administração pós-treino de ayahuasca nas doses 50 ou 500
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC.......................26
Figura 12: Efeito da administração pós-treino de ayahuasca nas doses 50 ou 500
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS.......................27
Figura 13: Efeito da administração pré-teste de ayahuasca nas doses 50 ou 500
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC.......................28
Figura 14: Efeito da ayahuasca administrada pré-teste 1 sobre o teste 2 de
evocação na tarefa de CMC......................................................................................29
Figura 15: Comparação do tempo de congelamento entre os testes 1 e 2 da
evocação na tarefa de CMC......................................................................................30
Figura 16: Diferença do tempo médio de congelamento dos ratos entre os testes 2
e 1 na tarefa de CMC................................................................................................31
Figura 17: Efeito da administração pré-teste de ayahuasca nas doses 50 ou 500
mg/kg sobre o desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS.......................32
Figura 18: Efeito da ayahuasca pré-teste 1 sobre o teste 2 de evocação na tarefa
de CMS......................................................................................................................33
x
Figura 19: Comparação do tempo de congelamento entre os teste 1 e 2 da
evocação na tarefa de CMS......................................................................................34
Figura 20: Diferença do tempo médio de congelamento dos ratos entre os testes 2
e 1 na tarefa de CMS.................................................................................................35
Lista de Quadros:
Quadro 1: Quantificação dos alcaloides presentes no extrato liofilizado chá de
ayahuasca.................................................................................................................21
xi
ABSTRACT
Ayahuasca is a word from the Quechua Native American language commonly translated as "vine of souls." It is a hallucinogenic decoction prepared with psychoactive plants. The tea contains N, N-dimethyltryptamine (DMT), a potent psychedelic agent from the Psychotria viridis and also the β-carboline alkaloids contained in Banisteriopsis caapi. These β-carbolines inhibit monoamine oxidase and in this manner they protect DMT from being degraded. Thus, DMT is able to cross blood-brain barrier by binding to 5-HT2 receptors, then exerting its effect. Studies show that volunteers reported a highly emotional state and, correspondingly, the ingestion of ayahuasca caused greater brain activity in the amygdala and parahippocampal gyrus, structures involved in emotional learning and memory.
Using models of fear conditioning to context and tone, we tested whether the oral administration of ayahuasca before or immediately after training as well the pre-test pharmacological manipulation could interfere with mnemonic processes.
Our results showed that administration of the doses 250, 500 or 750 mg/kg did not affect acquisition of contextual fear conditioning (CFC) nor tone fear conditioning (TFC). Different doses of ayahuasca (50 or 500 mg/kg) given immediately after training did not affect the consolidation of CFC. Moreover, the doses 50 and 500 mg/kg did not alter the consolidation of TFC. Pre-test ayahuasca (50 and 500 mg/kg) did not alter retrieval test 1 in both CFC/TFC tasks, nor retrieval test 2 for TFC. However, the pre-test ayahuasca 500 mg/kg caused a significant decrease in the freezing behavior of rats from test 1 to test 2, in the contextual fear conditioning task. These results suggest that ayahuasca may facilitate the extinction of aversive memory especially dependent on the hippocampus and possibly on the amigdala.
xii
RESUMO
A ayahuasca é uma palavra da língua nativa americana Quechua comumente traduzida
como "cipó das almas". É uma decocção alucinógena preparada com plantas psicoativas. O chá
contém N, N-dimetiltriptamina (DMT), um potente agente psicodélico proveniente da Psychotria viridis
e também contém os alcalóides β-carbolínicos contidos na Banisteriopsis caapi. Estas carbolinas β-
carbolinas inibem a enzima monoaminaoxidase e, desta maneira as β-carbolinas protegem DMT de
ser degradada. Assim, DMT é capaz de atravessar a barreira hematoencefálica, se liga a receptores
5-HT2, exercendo o seu efeito. Estudos mostram que os voluntários relataram um estado altamente
emocional e, correspondentemente, a ingestão da ayahuasca causou uma elevada atividade cerebral
na amígdala e giro parahipocampal, estruturas envolvidas na aprendizagem emocional e memória.
Utilizando os modelos de condicionamento de medo ao contexto e ao som, nós verificamos
se a administração oral de ayahuasca antes, imediatamente após a o treino, e a manipulação
farmacológica pré-teste poderia interferir com os processos mnemônicos.
Os nossos resultados mostraram que as administrações das doses 250, 500 ou 750 mg/kg
não afetaram a aquisição das tarefas de CMC e CMS. Diferentes doses de ayahuasca (50 ou 500
mg/kg) administradas imediatamente após o treino não afetaram a consolidação do CMC. Além
disso, as doses 50 e 500 mg/kg não alteraram a consolidação do CMS. A administração pré-teste
de ayahuasca (50 e 500 mg/kg) não alterou o teste de evocação 1 em ambas as tarefas (CMC/CMS),
e nem o teste de evocação 2 para o CMS. No entanto, a administração pré-teste de ayahuasca 500
mg/kg causou um decréscimo significativo no comportamento de congelamento dos ratos do teste de
evocação 1 para o teste 2, na tarefa de condicionamento de medo ao contexto. Estes resultados
sugerem que a ayahuasca pode facilitar a extinção da memória aversiva dependente principalmente
do hipocampo e possivelmente da amígdala.
xiii
Sumário
I - Introdução..........................................................................................................1
1.1 - Histórico........................................................................................................1
1.2 - Aspectos farmacológicos da ayahuasca.......................................................3
1.3 - Estudos com ayahuasca...............................................................................6
1.4 - Aprendizagem e Memória Emocional...........................................................8
II- Justificativa......................................................................................................12
III - Objetivos........................................................................................................14
3.1 - Etapa I – Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da memória emocional
de ratos...............................................................................................................14
3.2 - Etapa II – Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da memória
emocional de ratos..............................................................................................14
3.3 - Etapa III – Efeitos da ayahuasca sobre a evocação da memória emocional
de ratos...............................................................................................................14
IV – Material e Métodos....................................................................................15
4.1 – Animais.......................................................................................................15
4.2 - Drogas.........................................................................................................15
4.3 - Material botânico.........................................................................................15
4.4 - Preparo do liofilizado do chá de ayahuasca......................................................16
4.5 - Dosagem da dimetiltriptamina (DMT), harmina e harmalina a partir do extrato
seco de ayahuasca.............................................................................................16
4.6 - Aparelhos.........................................................................................................16
4.6.1 - Caixa de condicionamento de medo........................................................16
4.6.2 - Câmara de Teste Cilíndrica.....................................................................17
4.7 - Procedimentos Comportamentais.....................................................................17
4.7.1 - Treino de condicionamento de medo ao contexto e ao
som......................................................................................................................17
xiv
4.7.2 - Teste de condicionamento de medo ao contexto....................................17
4.7.3 - Teste de condicionamento de medo ao som...........................................17
4.8 - Delineamento Experimental..............................................................................18
4.8.1 - Etapa I - Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da memória emocional
de ratos...............................................................................................................18
4.8.2 - Etapa II - Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da memória
emocional de ratos..............................................................................................19
4.8.3 - Etapa III - Efeitos da ayahuasca sobre a evocação da memória
emocional de ratos..............................................................................................19
V- Análise Estatística........................................................................................20
VI – Resultados....................................................................................................21
6.1 - Dosagem da dimetiltriptamina, tetrahidroharmina, harmina e harmalina
presentes no extrato liofilizado do chá de ayahuasca.........................................21
6.2 – Resultados obtidos dos testes comportamentais......................................21
6.2.1 – Resultados da Etapa I - Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da
memória emocional de ratos...............................................................................21
6.2.1.1 – Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca (250 ou 750
mg/kg) sobre a tarefa de condicionamento de medo ao contexto......................21
6.2.1.2 – Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca 500 mg/kg sobre
a tarefa de condicionamento de medo ao
contexto...............................................................................................................22
6.2.1.3 – Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca (250 ou
750 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao som...........................23
6.2.1.4 – Efeito da administração pré-treino de ayahuasca 500 mg/kg
sobre a tarefa de condicionamento de medo ao som......................................24
xv
6.3 – Resultados da etapa II - Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da
memória emocional de
ratos....................................................................................................................25
6.3.1 – Efeito da administração pós-treino de ayahuasca (50 ou 500 mg/kg)
na tarefa de condicionamento de medo ao contexto .......................................25
6.3.2 – Efeito da administração pós-treino de ayahuasca (50 ou 500 mg/kg)
na tarefa de condicionamento de medo ao som...............................................26
6.4 – Resultados da etapa III - Efeitos da ayahuasca sobre a evocação e a extinção
da memória emocional de ratos..........................................................................27
6.4.1 – Efeito da administração pré-teste de ayahuasca (50 ou 500 mg/kg) na
tarefa de condicionamento de medo ao contexto.............................................27
6.4.2 – Efeito da administração pré-teste 1 de ayahuasca sobre o teste 2 de
evocação dos ratos na tarefa de condicionamento de medo ao
contexto...............................................................................................................28
6.4.3 – Efeito da administração pré-teste de ayahuasca (50 ou 500 mg/kg) na
tarefa de condicionamento de medo ao som....................................................33
6.4.4 – Efeito da administração pré-teste 1 de ayahuasca sobre o teste 2 de
evocação dos ratos na tarefa de condicionamento de medo ao
som.....................................................................................................................32
VII – Discussão....................................................................................................36
VIII– Anexos..........................................................................................................41
IX- Referências ...............................................................................................44
1
I. Introdução
1.1 Histórico
A ayahuasca é uma decocção alucinógena preparada com plantas
psicoativas (Grob et al., 1996) (Figura 1). A palavra advém da língua nativa
americana Quechua, constituída da justaposição dos termos Aya – alma ou espírito
morto; Waska - corda ou vinho, e é comumente traduzida como “videira das almas”
(Luna, 1986). A bebida é amplamente usada na Amazônia, onde é conhecida como
Caapi, Santo Daime ou Daime; Ayahuasca no Peru e Yagb na Colômbia (Ott, 1994
apud Callaway et al., 1996). Hoasca é uma tradução para o português de
ayahuasca e um termo aceito em todo o Brasil (Grob et al., 1996).
O uso da ayahuasca é uma prática disseminada entre diversas tribos
indígenas aborígenes da Bacia Amazônica (Schultes, 1957). É provável que tal
prática já era cultivada na era pré-colombiana, visto que representações
iconográficas em cerâmica do Equador fornecem evidências de que o consumo do
chá já existia por volta do ano 2000 a.C (Naranjo, 1986 apud McKenna, 2004).
Assim, antes da colonização europeia na América do Sul, a bebida já era utilizada
para fins de divindade, feitiçaria e rituais religiosos por habitantes primórdios
(Dobkin de Rios, 1972 apud McKenna, 2004).
Nas últimas décadas, o uso da ayahuasca expandiu-se para além da cultura
indígena e passou a ser adotada por movimentos religiosos sincréticos tais como
União do Vegetal (UDV), Barquinha e Santo Daime (McKenna, 2004). Para tais
religiões, o decocto é considerado sagrado por permitir o contato com o divino
(Labate & Araújo, 2002). Através de seu consumo, esses grupos normalmente
buscam o alcance de autoconhecimento, introspecção (Yritia et al., 2002; Carlini,
2003), bem como cura emocional, propósito de vida, e não raro, buscam o
abandono de consumo de drogas de abuso (Winkelman, 2005).
O surgimento desses grupos religiosos relacionam-se com as diferentes
fases do ciclo da borracha, as quais criaram um período de urbanização da região
norte-brasileira, caracterizada pela elevada interação entre seringueiros e indígenas
de tribos de práticas xamânicas. A religião do Santo Daime surgiu durante o
2
primeiro ciclo da Borracha, em 1930, por Raimundo Irineu Serra, um migrante
nordestino que trabalhava na extração de látex, na região fronteiriça do Acre com a
Bolívia. O seringueiro estabeleceu contato com a cultura indígena, e aprendeu o
processo de utilização da ayahuasca. Em certa ocasião, ao experimentar o decocto,
Irineu relatou ter tido visões de uma mulher que se apresentou como Nossa
Senhora da Conceição, a qual lhe deu instruções e os preceitos do uso da bebida
(Fróes, 1986).
Em 1945, também no Acre foi fundada a Barquinha, que foi criada por Daniel
Pereira Mattos, conhecido popularmente como Mestre Daniel. Além de influências
de práticas católicas e do xamanismo indígena, este segmento religioso também
apresenta elementos da crença afro-brasileira (Labate & Araujo, 2008). Na década
de 1960, em Porto Velho – Rondônia, José Gabriel da Costa, conhecido como
Mestre Gabriel, fundou a União do Vegetal (UDV), a maior doutrina e mais
institucionalmente organizada do Brasil. A UDV contém elementos do cristianismo
permeados pelo espiritismo kardecista (Labate et al., 2008). De modo geral, os
frequentadores da UDV parecem pertencer a uma classe socioeconômica mais
instruída, e acredita-se que cinco a dez por cento dos adeptos sejam profissionais
da área médica (Grob et al., 1996).
O uso contemporâneo da ayahuasca no contexto dos diferentes movimentos
religiosos sincréticos brasileiros apresenta certos denominadores comuns: as três
principais religiões ayahuasqueiras ingerem o chá em suas cerimônias, e seus
doutrinários constituem-se pela fusão de práticas religiosas indígenas com
elementos do cristianismo (McKenna, 2004; Labate & Araujo., 2008).
Em 1997, estimava-se que o número de pessoas no continente sul-americano
que fazia o uso regular da ayahuasca (uma vez ao mês) - excluindo a população
indígena - ultrapassasse 15 mil (Callaway et al., 1999 apud Luna, 1997). Nos
últimos anos, grupos dessas religiões ayahuasqueiras têm se estabelecido
internacionalmente, com núcleos nos Estados Unidos e em diversos países
europeus, como na Alemanha, Inglaterra, França e Espanha (Riba et al., 2003;
Tupper, 2008). Além disso, o Brasil é um dos poucos países que tem o uso da
ayahuasca em contexto religioso legitimado (Conselho Nacional sobre Drogas,
3
2004), a exemplo do que ocorre com o uso do peyote (cacto que contém mescalina)
pela Native American Church nos Estados Unidos (Riba et al., 2001).
Figura 1: cozimento do chá de ayahuasca. Fonte:
http://www.helplink.com.br/noticias/wp-content/uploads/2011/12/Santo-daime.jpg
1.2 Aspectos farmacológicos da ayahuasca
A ayahuasca consiste, geralmente, na cocção de duas plantas: as cascas e
caules da Banisteriopsis caapi (Spruce ex Griseb.) Morton com as folhas do arbusto
da Psychotria viridis (Ruiz & Pavon) (Figura 2). Entretanto, outras plantas
também podem ser utilizadas no preparo do chá, tais como Diplopterys cabrerana
ou Psychotria cartagenensis (Mckenna et al., 1984).
A N,N-dimetiltriptamina (DMT) é proveniente da Psychotria viridis, enquanto
que os alcaloides β-carbolínicos, que inibem a enzima monoaminoxidase, estão
4
contidos no cipó Banisteriopsis caapi (McKenna et al., 1984). Estudos analíticos da
B. caapi mostraram que as amostras contêm β-carbolinas, sendo harmina,
tetrahidroharmina (THH) e harmalina seus alcaloides majoritários (Callaway et al.,
1996). Os principais constituintes químicos da ayahuasca - DMT e β-carbolinas -
são estruturalmente similares a serotonina (McKenna et al., 1998; Callaway et al.,
1999; Figura 3) , exibindo afinidade pelas subunidades dos receptores 5-HT2
(Pierce & Peroutka, 1989), especialmente pelo subtipo 5-HT2A (Smith et al., 1998).
A DMT possui ação alucinógena quando administrada parenteralmente, mas
é inativa se administrada de forma oral (Ott, 1999), devido a degradação pela
enzima monoaminoxidase A (MAO-A) do fígado e intestino (Suzuki et al., 1981;
McKenna et al., 1984; Ott, 1999). Entretanto, as β-carbolinas protegem a DMT de
sofrer deaminação oxidativa por atuarem como inibidores da MAO-A periférica
(McKenna, 2004). Com isso, DMT se torna oralmente ativa e atravessa a barreira
hemato-encefálica (McKenna et al., 1984), se liga a receptores 5-HT2, onde atua
como agonista (Pierce & Peroutka, 1989; McKenna et al., 1990) e promove o efeito
alucinógeno do decocto. Entre as principais ações da DMT estão modificações
perceptivas, afetivas e cognitivas (Strassman et al., 1994).
Em animais, as β-carbolinas harmina e harmalina são conhecidas por
produzirem efeitos característicos na temperatura corporal e função motora. Por
exemplo, harmina dose-dependente aumenta o tremor em ratos (Kawanishi et al.,
1994), um efeito que permite sugerir o possível envolvimento de mecanismos
serotonérgicos (Kelly & Nayler, 1974), noradrenérgico (Yamazaki et al., 1979) e
GABAérgicos (Costa et al., 1975).
Existem evidências de que THH, a segunda mais abundante β-carbolina na
bebida, também aja como um inibidor seletivo da recaptação de serotonina nas
plaquetas e neurônios pré-sinápticos, bem como inibidor da MAO (McKenna et al.,
1998; Frecska et al., 2004). A inibição de ambos os sistemas, da MAO e recaptação
de serotonina, elevam os níveis desse neurotransmissor na fenda sináptica
(Airaksinen et al., 1980; McKenna et al., 1998; Luna, 2005).
De acordo com a dose, a ayahuasca pode provocar alucinações sensoriais, e
fisiologicamente, são frequentes náuseas, vertigens, nervosismo, arrepios, calafrios,
frio e por vezes vômitos (Callaway et al., 1999; Labate & Araújo, 2008).(A)
5
(B)
Figura 2: Plantas comumente utilizadas no preparo do chá de ayahuasca: (A)
Banisteriopsis caapi e (B) Psychotria viridis. Fonte: http://www.neip.info/f_aya7.htm
www.neip.info/http://plantasenteogenas.org/community/threads/alb%C3%BAm-
psychotria-viridis.1866/.
6
Figura 3: Estruturas químicas dos principais alcaloides do chá e sua semelhança estrutural com o
neurotransmissor serotonina. Fonte: http://naturezadivina.org/ciencia/a-interacao-da-ayahuasca-
com-o-organismo/
1.3 Estudos com ayahuasca
Inicialmente, o que se tinha de informação acerca dos efeitos causados pela
ingestão da ayahuasca eram sobretudo relatos de viajantes sobre suas experiências
com a ayahuasca (Weil, 1980 apud Grob et al., 1996) ou narrativas antropológicas
informais e formais (Luna e Amaringo, 1991 apud Grob et al.,1996).
Apenas a partir da década de 1990 surgiram estudos preliminares tendo por
finalidade investigar os efeitos fisiológicos e psicológicos da ayahuasca em
humanos. Assim, em 1993, iniciou-se o Projeto Hoasca, uma empreitada biomédica
que reuniu uma equipe de pesquisadores internacionais de instituições brasileiras,
norte-americanas e finlandesas. A partir desse projeto passaram a ser
desenvolvidos diversos estudos farmacológicos, quantitativos, psicológicos e
fisiológicos.
Riba et al. (2001) mostraram que a administração oral de ayahuasca (0,75 e
1 mg DMT/kg) em voluntários saudáveis levou ao aumento dos escores nas sub-
7
escalas cognitivas, afetivas e perceptivas, medidos pelo Hallucinogen Rating Scale
(HRS). Os sujeitos reportaram a experiência de um estado altamente emocional no
qual as sensações corporais foram modificadas ou intensificadas e imagens visuais
frequentemente apareciam, por vezes associadas com contextos pessoais.
Posteriormente, Riba e col. (2006) utilizaram voluntários sadios (com
experiência prévia para o uso de psicodélicos) que receberam cápsulas de extrato
de ayahuasca e após 100 a 110 minutos foram submetidos à tomografia
computadorizada de emissão de fóton único (SPECT). Nesse estudo verificou-se
que a ayahuasca provocou um aumento de fluxo sanguíneo (i.e, atividade cerebral)
principalmente na amígdala e giro parahipocampal, estruturas sabidamente
envolvidas com aprendizagem e memória emocional (Phillips & LeDoux, 1992).
No primeiro semestre de 2012, em websites de bases de dados como
PUBMED® ou PERIÓDICOS DA CAPES® foram encontrados um total de três
estudos pré-clínicos com a ayahuasca.
Em 1999, Freeland & Mansbach analisaram o perfil comportamental dos
constituintes da ayahuasca em camundongos. Através de diferentes grupos
experimentais, DMT e harmina sintéticos (sozinhos ou em combinação com extrato
seco da planta B. caapi) tiveram seus efeitos analisados em uma bateria de testes
funcionais observacionais (Functional observational battery, FOB). Os dados obtidos
mostraram que em todos os grupos (DMT, harmina, DMT/harmina, B.caapi e
B.caapi/DMT) houve diminuição de mobilidade, e com exceção da DMT, as demais
administrações provocaram aumento dos movimentos motores clônicos; além disso,
DMT combinada com harmina ou com B.caapi produziu aumento de movimentos
tônicos. Dados esses, que em conjunto, parecem estar relacionados com alguns
aspectos da síndrome serotoninérgica.
Até a presente data não há registros na literatura que tenham avaliado
ayahuasca e memória. Entretanto, outros aspectos foram avaliados. A saber, Lima
et al. (2007) investigaram os efeitos da administração oral de ayahuasca nos testes
de nado forçado e campo aberto em ratos. Os dados obtidos mostram que a
ayahuasca reduziu o tempo de imobilidade no nado forçado e também diminuiu a
atividade locomotora no campo aberto, o que sugere uma possível ação depressiva
e anxiolítica.
8
Em 2010, Oliveira e colaboradores investigaram efeitos toxicológicos da
ayahuasca através de sua administração oral crônica durante o período gestacional
de ratas. Os resultados revelaram uma diminuição de ingestão alimentar e
decréscimo de ganho de peso maternal; também houve aumento de incidência para
anormalidades viscerais e no esqueleto dos fetos. Esse estudo sugere que a
exposição a ayahuasca ao longo do período gestacional pode produzir toxicidade
maternal e efeitos teratogênicos.
Em entrevistas de história de vida, frequentadores de longo prazo da UDV
relataram de forma veemente que a ayahuasca trouxe melhoras de memória e
concentração (Grob et al., 1996). Nesse mesmo estudo, os voluntários foram
testados pelo WHO-UCLA (Auditory Verbal Learning Test), um teste de
aprendizagem verbal- auditória no qual ouviam uma lista de 15 palavras e depois
recitavam o maior número de palavras que podiam lembrar. Este teste revelou que
os frequentadores de longo prazo tiveram melhor desempenho na lembrança de
palavras do que o grupo controle.
Um outro estudo mostrou que a ingestão de ayahuasca levou à ativação da
amígdala (Riba et al., 2006), uma região envolvida com emoção e/ou memória
emocional (Phillips & LeDoux, 1992). Assim como estudos com a DMT já haviam
mostrado (Strassman et al., 1994), a ayahuasca também é capaz de produzir
alterações afetivas e cognitivas (Riba et al., 2001). Esses achados sugerem que a
circuitaria relacionada a memória emocional pode estar alterada. Nota-se que,
nenhum dentre os diversos estudos clínicos e tampouco os pré-clínicos presentes
na literatura avaliaram memória emocional. Assim, consideramos relevante
investigar os efeitos da ayahuasca sobre a memória emocional em modelos
animais.
1.4 Aprendizagem e Memória Emocional
A aprendizagem emocional é atualmente muito estudada e a maior parte
dos conhecimentos sobre as associações entre memória e emoção advém de
estudos do condicionamento clássico de medo em animais, pois este paradigma
comportamental é uma forma de aprendizagem associativa simples, que pode ser
9
adquirida em uma única sessão de treino, e que se mantêm relativamente estável
ao longo do tempo. Tais características facilitam a análise dos mecanismos por
meio dos quais as memórias emocionais são estabelecidas, armazenadas e
recuperadas, além de auxiliar a compreensão dos mecanismos subjacentes ao
medo, uma vez que problemas, como ansiedade, fobias, estresse pós-traumático
ou crises de pânico, resultam de uma resposta nociva do cérebro ao medo (LeDoux,
1993; Fendt & Fanselow, 1999).
O condicionamento clássico de medo se baseia na existência de um estímulo
neutro, como um som, que é pareado com um estímulo aversivo, em geral um
choque. A partir de um ou mais pareamentos, o som por si só é capaz de predizer a
ocorrência do choque, acarretando respostas de medo. Assim, o estímulo neutro é
chamado de estímulo condicionado (CS-do inglês, conditional stimulus), o estímulo
aversivo, de estímulo incondicionado (US- do inglês, unconditional stimulus) e as
respostas, de respostas condicionadas. Nos ratos, essas respostas condicionadas
incluem a completa imobilidade do animal com ausência de movimentos de
vibrissas e farejamentos, comportamento esse conhecido como congelamento ou
freezing, em que o animal apresenta apenas movimentos cardio-respiratórios
(Blanchard & Blanchard, 1969).
As respostas condicionadas de medo podem ocorrer após a apresentação de
um CS, que foi anteriormente pareado com um US, mesmo que o CS seja
apresentado em um ambiente diferente daquele em que houve o pareamento. Esse
condicionamento é conhecido como condicionamento clássico de medo a um
estímulo discreto ou ao som. No entanto, as respostas condicionadas também
podem ser observadas colocando-se o animal no mesmo ambiente onde tenha
existido um estímulo incondicionado prévio. Em tal situação, as respostas não são
ocasionadas por um estímulo explicitamente pareado com o US, mantendo com
este uma relação temporal específica, e sim pela combinação dos vários estímulos
ditos “contextuais” que estavam presentes no local de ocorrência do choque nas
patas e continuam presentes no momento em que o animal retorna a esse
ambiente. Esse é o condicionamento de medo ao contexto (Phillips & LeDoux,
1992).
10
De acordo com Phillips e LeDoux (1992), os dois estímulos condicionados,
som e contexto desencadeiam respostas emocionais idênticas – congelamento,
defecação, micção, piloereção – mas esses estímulos também apresentam
diferenças: no condicionamento contextual as respostas condicionadas são
provocadas por uma combinação de diversos estímulos “contextuais’, presentes no
momento do choque, e também presentes quando o animal retorna ao ambiente;
como estes CS contextuais estão continuamente no local, não são apresentados de
modo preciso ao animal.
As tarefas de condicionamento de medo ao estímulo discreto e
condicionamento de medo ao contexto constituem um par de tarefas que dependem
de diferentes estruturas cerebrais e que são utilizadas para o estudo de variados
tipos de memória, ou seja, memórias que dependem de regiões distintas do cérebro.
Atualmente, já se sabe do papel crucial da amígdala para as reações de medo,
tanto inatas quanto aprendidas (Blanchard & Blanchard, 1969, 1972) e os dois tipos
de condicionamento de medo dependem da integridade dessa região (Phillips &
LeDoux, 1992). Já o hipocampo está envolvido apenas com o condicionamento ao
contexto (Kim & Fanselow, 1992; Phillips & LeDoux, 1992) não interferindo nas
respostas condicionadas ao som ou a outro estímulo discreto.
No condicionamento de medo, a aquisição da memória ocorre no momento
da apresentação do estímulo condicionado em conjunto ao estímulo incondicionado.
Acredita-se que nos segundos posteriores se inicie o processo de consolidação,
dependente de síntese proteica (Maren et al., 2003). Já a evocação pode se dar na
apresentação posterior do estímulo condicionado, tendo-se acesso à memória
associada ao estímulo incondicionado (Abel & Lattal, 2001). Entretanto se após o
aprendizado inicial, este estímulo condicionado for apresentado repetidamente na
ausência do estímulo incondicionado, a resposta condicionada diminui (McAllister &
McAllister, 1971), o que configura o processo de extinção. Considera-se que este
processo represente um novo aprendizado, formando-se uma nova memória
separada que se sobrepõe à resposta condicionada (Bouton & King, 1983; Rescorla,
2001). Como toda nova aprendizagem, a extinção possui sua fase de aquisição e
também de consolidação, sendo assim um processo dependente de síntese protéica
(Berman & Dudai, 2001; Vianna et al., 2001).
11
Desta forma, os experimentos comportamentais são comumente divididos
nas fases de treino e teste e assim, é possível realizar intervenções farmacológicas
antes (pré-treino) ou após o treino (pós-treino) e/ou também antes do teste (pré-
teste). Tais manipulações permitem o estudo dos diferentes componentes dos
processos de aprendizagem e memória, como a aquisição, consolidação e
evocação.
Sabe-se que manipulações farmacológicas pré-treino podem afetar os
processos de aquisição e consolidação; se a intervenção ocorrer logo após o treino,
a consolidação da informação poderá ser afetada; caso a administração da droga
aconteça antes do teste, pode-se intervir com a evocação ou até mesmo com a
expressão da resposta aprendida (White & Salinas, 1998). As manipulações
farmacológicas pós-treino que contam com a reexposição do animal ao ambiente
com a apresentação do CS sem o US, podem interferir também com a extinção de
uma memória já formada. Além disso, em relação à forma de administração pré-
treino, a forma pós-treino confere a vantagem dos animais já não estarem sob efeito
da droga durante a fase teste (McGaugh, 1989).
12
II. Justificativa
Uma análise histórica sobre o uso tradicional e religioso da ayahuasca por
diversas populações, em momentos históricos distintos mostra que o chá carrega
uma grande importância cultural, sendo a legitimação de seu uso religioso uma
evidência disso. Adicionalmente, é notável o processo de disseminação e expansão
dos movimentos religiosos sincréticos, tanto nacional quanto internacionalmente.
Cabe mencionar que há evidências de que também já ocorra o uso do chá para fins
recreativos, como parte de viagens turísticas.
Além do aspecto cultural e condição legal vigente, há uma real necessidade
de investigação científica sobre os efeitos da ayahuasca, conforme está
preconizado pela resolução de 2004 do Conselho Nacional de Políticas sobre
Drogas (CONAD).
Consultando a literatura da ayahuasca, se observa que, de forma majoritária,
os estudos são de natureza clínica, ao passo que, atualmente são encontrados
muito poucos trabalhos de avaliações pré-clínicas com o chá. Um desses estudos
utiliza compostos sintéticos associados ou não com extrato de B. caapi (Freeland &
Mansbach, 1999) e outros dois utilizam a ayahuasca propriamente dita, feita a
partir de B. caapi e P. viridis (Lima et al., 2007; Oliveira et al., 2010).
É importante ter em vista ainda as informações obtidas por meio de estudos
clínicos, os quais verificaram que ayahuasca, assim como DMT (Strassman et al.,
1994) provocou modificações cognitivas, perceptivas e afetivas, de acordo com a
HRS (Hallucinogen Rating Scale) (Riba et al., 2001); e ainda ativou algumas
regiões cerebrais como a amígdala e giro parahipocampal (Riba et al., 2006), áreas
envolvidas com memória emocional.
Ainda, a falta de dados experimentais na literatura que mostrem a
possibilidade do decocto intervir com processos de aprendizado através de
associações entre eventos neutros e estímulos aversivos torna relevante se
considerar uma possível interferência deste chá nos processos de memória
emocional em modelo animal. Em tal circunstância, a utilização de animais
possibilita avaliar sujeitos sem a experiência prévia do uso da ayahuasca, e também
13
permite o isolamento do contexto religioso, dois componentes comumente presentes
em voluntários disponibilizados pela ética que rege os estudos clínicos.
Assim, considerando os elementos culturais, legais e científicos apontados
anteriormente, este estudo teve como finalidade investigar os efeitos da ayahuasca
nos processos de memória emocional em ratos. O estudo deste tipo de memória
pôde ser feito através do paradigma de condicionamento clássico de medo ao
contexto e ao som.
14
III. Objetivos
O objetivo geral do presente estudo foi verificar os efeitos da administração
aguda de ayahuasca na aquisição, consolidação e evocação da memória emocional
de ratos, avaliada pelas tarefas de condicionamento de medo ao contexto e ao som.
Para tanto, este estudo foi organizado em três etapas, com os seguintes objetivos
específicos:
3.1 Etapa I – Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da memória
emocional de ratos
Verificar os efeitos da administração oral de ayahuasca, realizada 30 minutos
antes do treino das tarefas de condicionamento de medo ao contexto e ao som, em
diferentes grupos de animais.
3.2 Etapa II – Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da memória
emocional de ratos
Verificar os efeitos da administração oral de ayahuasca imediatamente após
o treino das tarefas de condicionamento de medo ao contexto e ao som, em
diferentes grupos de animais.
3.3 Etapa III – Efeitos da ayahuasca sobre a evocação da memória
emocional de ratos
3.3.1. Verificar os efeitos da administração oral de ayahuasca 30 minutos
antes do teste das tarefas de condicionamento de medo ao contexto e ao som, em
diferentes grupos de animais.
3.3.2. Verificar o efeito da administração de ayahuasca pré-teste 1 sobre o
teste 2, 24 horas após teste 1 de evocação, nas tarefas de condicionamento de
medo ao contexto e ao som, nos grupos de animais utilizados na parte 3.3.1 desta
etapa.
15
IV. Material e Métodos
4.1 Animais
Foram utilizados ratos Wistar, machos, de três meses de idade provenientes
do biotério do Centro de Desenvolvimento de Modelos Experimentais para Medicina
e Biologia (CEDEME). Os animais foram alojados em gaiolas de polipropileno
opacas contendo serragem, numa sala com temperatura controlada (23 ± 2ºC) e
ciclo claro-escuro de 12 horas (início do ciclo claro às 7:00 horas). Comida e água
estavam disponíveis ad libitum. Todos os procedimentos realizados descritos a
seguir foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP de número
1083/10 (anexo I).
4.2 Droga
Foi utilizado extrato seco do chá de ayahuasca. As doses utilizadas foram:
50, 250, 500 e 750 mg/kg. A droga foi diluída em água e administrada via oral,
através de gavagem. Os animais do grupo controle receberam água.
Todo o procedimento, desde a manipulação farmacológica ou a medição do
tempo de congelamento dos ratos nas tarefas comportamentais ocorreram de
maneira cega, pois o experimentador que realizou a medição do tempo de
congelamento não teve conhecimento prévio sobre qual grupo o pertencia o animal.
4.3 Material botânico
O chá de ayahuasca foi cultivado pelo Núcleo Senhora Santana, no Mato
Grosso do Sul (MS). Em seguida, este chá foi preparado e fornecido, já pronto para
consumo pela Igreja Céu de Fátima, em MS. Nosso trabalho possui perante o
Comitê de ética em pesquisa da Unifesp (CEP, número de protocolo 1083/10) a
aprovação do termo de consentimento livre e esclarecido por parte do vice-
presidente da instituição religiosa supracitada (anexo II).
16
4.4 Preparo do liofilizado do chá de ayahuasca
O chá foi liofilizado para obtenção de um extrato seco, conforme descrito a
seguir:
Primeiramente, o chá foi concentrado com o auxílio de um rotavapor modelo
FISATOM, até que o chá atingisse um volume de cerca de 10 a 20% de seu volume
inicial. O chá concentrado foi colocado em frascos adequados e congelado a – 40ºC
em banho de gelo seco e acetona, e então colocado em um liofilizador, a 4 ATM de
pressão por cerca de 48 horas para a obtenção do extrato seco (liofilizado). O
liofilizado obtido foi armazenado em frasco âmbar, dentro de um dessecador em
geladeira.
4.5 Dosagem da dimetiltriptamina (DMT), harmina e harmalina a partir
do extrato seco de ayahuasca
A análise por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) para a
quantificação de DMT e das principais β-carbolinas foi realizada em colaboração
com o Prof. Dr. Maurício Yonamine do laboratório de Análises Toxicológicas –
Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. A metodologia empregada para a
análise quantitativa dos alcaloides foi a cromatografia líquida de alta eficiência
(CLAE), segundo Pires et al. (2009).
4.6 Aparelhos
4.6.1 Caixa de condicionamento de medo – Para o treino das tarefas
comportamentais foi utilizada uma caixa acrílica, medindo 22x21x22 cm. A caixa
onde os animais receberam o choque é formada por paredes pretas, compondo um
ambiente escuro. A tampa do aparelho consiste de uma placa de acrílico
transparente onde há uma câmera filmadora conectada a um DVD e um aparelho de
televisão. O chão é formado de grades metálicas conectadas a uma fonte geradora
de choques elétricos. Os esquemas de liberação do som e do choque podem ser
programados de acordo com o procedimento adotado (som de 60 dB e choque de
17
0,6 mA). O teste de condicionamento de medo ao contexto foi realizado na mesma
caixa do treino do condicionamento.
4.6.2 Câmara de Teste Cilíndrica – Para o teste de condicionamento de
medo ao som foi utilizada uma câmara de teste cilíndrica, branca, medindo 35 cm
de diâmetro x 60 cm de altura, e uma tampa transparente com orifícios circulares.
Os aparelhos foram mantidos em salas diferentes, e a ambos foi acoplado um
gerador de som (60dB), utilizado como estímulo condicionado.
4.7 Procedimentos Comportamentais
4.7.1 Treino de condicionamento de medo ao contexto e ao som - Na
sessão de treino, cada animal foi colocado individualmente por dois minutos na
caixa de condicionamento e, após este período, recebeu cinco pareamentos som-
choque, estímulos condicionado e incondicionado, respectivamente. O som teve
duração de cinco segundos e intensidade de 60 dB. Concomitantemente ao último
segundo de liberação do som foi aplicado um choque nas patas do animal (0,6 mA
de intensidade, 1 segundo de duração). O intervalo entre cada pareamento foi de
30 segundos. Trinta segundos após o último pareamento, o animal era retirado do
aparelho e colocado de volta em sua gaiola moradia.
4.7.2 Teste de condicionamento de medo ao contexto – Cada animal foi
colocado no mesmo contexto do treino, isto é, diretamente na caixa de
condicionamento, na ausência de som e choque. O tempo de congelamento foi
registrado continuamente durante cinco minutos, sendo o tempo de congelamento
por minuto utilizado como medida de condicionamento.
4.7.3 Teste de condicionamento de medo ao som – Cada animal foi
colocado na câmara cilíndrica de teste (novo contexto), onde permaneceu por seis
minutos. Durante o quarto e quinto minutos de permanência na câmara, apenas o
estímulo condicionado (som) foi apresentado cinco vezes ao animal, com o mesmo
padrão do dia do treino, isto é com intervalo de 30 segundos, mas na ausência do
US. O tempo de congelamento foi registrado continuamente durante os seis minutos
do teste comportamental com um cronômetro, minuto a minuto, antes e depois da
apresentação do som, sendo o tempo de congelamento por minuto utilizado como
medida de condicionamento.
18
4.8 Delineamento Experimental
A seguir estão descritos os experimentos realizados em cada etapa deste
estudo.
4.8.1 Etapa I - Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da memória
emocional de ratos
De modo a avaliar a aquisição de memória emocional em ratos, a
administração oral de água ou ayahuasca foi realizada 30 minutos antes da sessão
treino de condicionamento. Após 48 horas, diferentes grupos de animais (n= 9 a
15 animais/grupo) foram submetidos ao condicionamento de medo ao contexto
(experimentos 1 e 2) ou ao condicionamento de medo ao som (experimentos 3 e
4).
As doses da droga (250, 500, 750) foram adotadas com base em um estudo
anterior desenvolvido em nosso departamento (Gianfratti, B., 2009) no qual
ayahuasca via oral na dose 500 mg/kg promoveu comportamento de preferência
pelo compartimento pareado com a droga (ayahuasca), em relação ao
compartimento não pareado.
O esquema abaixo representa a etapa I:
Figura 4. Esquema geral da aquisição das tarefas de CMC ou CMS.
Treino Teste
CMC ou CMS
48 hs
Dia 1
Ayahuasca ou
água 30 min antes
Dia 2
19
4.8.2 Etapa II - Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da memória
emocional de ratos
De modo a verificar os efeitos da administração da ayahuasca sobre a
consolidação da memória, através das tarefas de CMC (Experimento 6) e de CMS
(Experimento 7), diferentes grupos de animais (n= 7 a 12 por grupo) receberam
ayahuasca (50 ou 500 mg/kg) ou água por via oral imediatamente após a sessão
treino.
O esquema abaixo representa a etapa II:
Figura 5. Esquema geral da consolidação das tarefas de CMC ou CMS.
4.8.3 Etapa III - Efeitos da ayahuasca sobre a evocação da memória
emocional de ratos
A finalidade deste passo foi determinar o efeito da administração pré-teste de
ayahuasca (50 e 500 mg/kg) sobre na evocação de CMC e CMS, e também sobre
um segundo teste (teste 2) conduzido 24 horas após o teste 1. O procedimento
utilizou diferentes grupos de animais (n= 7 a 12 por grupo) que foram treinados no
Dia 1. No Dia 2 (48 horas após o treino) foi realizado o teste 1 (CMC ou CMS), e
30 minutos antes deste teste 1 os animais receberam água ou ayahuasca (50 ou
500 mg/kg). No Dia 3 (72 horas após treino) os mesmos animais foram submetidos
ao teste 2 (CMC ou CMS). Além da análise do tempo de congelamento dos animais
nos testes 1 e 2, esta etapa foi analisada pela comparação do tempo de
congelamento entre os testes 2 e 1 de evocação e também pela variação do tempo
de congelamento de animais entre estes testes.
Treino Teste
CMC ou CMS
48 hs
Ayahuasca ou
água após treino
Dia 1 Dia 2
20
Os resultados deste segundo teste estão apresentados como Experimentos
8a, 8b, 9a e 9b.
O esquema abaixo representa a etapa III:
Figura 6. Esquema geral da evocação das tarefas de CMC ou CMS.
V Análise Estatística
Os testes comportamentais foram analisados pela análise de variância
(ANOVA) de uma ou duas vias, com medidas repetidas para o fator tempo. Os
testes de CMC foram analisados pela ANOVA de uma via [Fator 1: Tratamento
(Controle x Ayahuasca); Fator 2: Minutos (média dos cinco minutos)]. Os testes de
CMS foram analisados por uma ANOVA de duas vias com medida repetida para o
fator 2. Para a comparação entre os testes 1 e 2 de evocação das tarefas de CMC e
CMS, os dados foram analisados pela ANOVA de duas vias com medidas repetidas
para o fator tempo. O valor de delta foi calculado através da diferença de tempo de
congelamento entre os testes 2 e 1. O delta foi analisado pela ANOVA de uma via.
Quando necessário, foi utilizado o teste a posteriori Duncan. Para todos os testes, o
nível de significância foi estabelecido em p <0,05.
Dia 2
Teste 1
Dia 1
Treino
Dia 3
Teste 2
(Extinção)
24hs 48hs
Ayahuasca ou água
30 min antes
21
VI. RESULTADOS
6.1 Dosagem da dimetiltriptamina, tetrahidroharmina, harmina e
harmalina presentes no extrato seco do chá de ayahuasca diluído em 10 ml de
água destilada:
A análise quantitativa revelou a presença das β-carbolinas harmina,
harmalina, tetrahidroarmina e da N, N-dimetiltriptamina (DMT), nas seguintes
concentrações:
Quadro 1: Quantificação dos alcaloides presentes no extrato liofilizado chá de
ayahuasca.
Alcaloide Concentração
(mg/mL)
DMT – N,N-dimetiltriptamina 0,16
Harmina 0,25
Harmalina 0,18
Tetrahidroarmina 0,58
6.2 Resultados obtidos dos testes comportamentais
6.2.1 Resultados da Etapa I - Efeitos da ayahuasca sobre a aquisição da
memória emocional de ratos
6.2.1.1 Experimento 1: Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca
(250 ou 750 mg/kg) sobre a tarefa de condicionamento de medo ao contexto
A ANOVA de uma via indicou não significativo o fator tratamento [F(2,
32)=,52521, p=,59644].
22
Figura 7. Efeito da administração pré-treino de ayahuasca nas doses 250 ou 750 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC, em média dos 5 minutos. Não houve diferença
estatisticamente significante na comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento
(em segundos) dos animais dos grupos controle, aya 250 (ayahuasca 250 mg/kg), aya 750
(ayahuasca 750 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado entre parênteses.
6.2.1.2 Experimento 2: Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca
500 mg/kg sobre a tarefa de condicionamento de medo ao contexto:
A ANOVA de uma via revelou que o fator tratamento não é significativo [F(1,
16)=,15958, p=,69483].
0
10
20
30
40
50
60
controle (11) aya 250 mg/kg (12)
aya 750 mg/kg (12)
Tem
po
méd
io d
e co
nge
lam
ento
(se
g ±
EP
M)
23
Figura 8. Efeito da administração pré-treino de ayahuasca na dose 500 mg/kg sobre o desempenho
dos animais no teste da tarefa de CMC, em média dos cinco minutos de teste. Não houve diferença
estatisticamente significante na comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento
(em segundos) dos animais dos grupos controle, aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de
animais por grupo é mostrado entre parênteses.
6.2.1.3 Experimento 3: Efeitos da administração pré-treino de ayahuasca
(250 ou 750 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao som:
A ANOVA de duas vias com medidas repetidas mostrou não significativo o
fator tratamento [F(2, 31)=1,6820, p=,20254], mas significativo o fator tempo [F(1,
31)=119,78, p=,00000] e não significativo a interação tratamentoXtempo [F(2,
31)=,65510, p=,52643].
0
10
20
30
40
50
60
controle (9) aya 500 mg/kg (10)
Tem
po
méd
io d
e co
nge
lam
ento
(se
g ±
EPM
)
24
Figura 9. Efeito da administração pré-treino de ayahuasca nas doses 250 ou 750 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS, em média dos 6 minutos. Não houve diferença
estatisticamente significante na comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento
(em segundos) dos animais de todos os grupos, controle, aya 250 (ayahuasca 250 mg/kg, e grupo
aya 750 (ayahuasca 750 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado entre parênteses.
6.2.1.4. Experimento 4: Efeito da administração pré-treino de ayahuasca
500 mg/kg sobre a tarefa de condicionamento de medo ao som:
A ANOVA de duas vias com medidas repetidas indicou não significativo o
fator tratamento [F(1, 27)=1,2052, p=,28198], mas significativo o efeito tempo [ F(1,
27)=151,71, p˂,0001] e não significativa a interação tratamentoXtempo [F(1,
27)=,11907, p=,73272].
0
10
20
30
40
50
60
antes som depois som
Tem
po
méd
io d
e co
nge
lam
net
o (
seg
± EP
M)
controle (10)
aya 250 mg/kg (12)
aya 750 mg/kg (12)
25
Figura 10. Efeito da administração pré-treino de ayahuasca 500 mg/kg sobre o desempenho dos
animais no teste da tarefa de CMS, em média dos 3 minutos antes e 3 minutos após a apresentação
do som (tempo total de 6 minutos). Não houve diferença estatisticamente significante na comparação
das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento (em segundos) dos animais de ambos os
grupos, controle e aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado
entre parênteses.
6.3 Resultados da etapa II - Efeitos da ayahuasca sobre a consolidação da
memória emocional de ratos
6.3.1 Experimento 6: Efeito da administração pós-treino de ayahuasca
(50 ou 500 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao contexto:
A figura 11 mostra os efeitos da administração oral pós-treino de ayahuasca
nas doses 50 ou 500 mg/kg no desempenho de animais na tarefa de
condicionamento de medo ao contexto. A ANOVA de uma via indicou efeito
tratamento não significativo [F(2, 19)= 2,5879; p= ,10140].
0
10
20
30
40
50
60
antes som depois som
Tem
po
méd
io d
e co
nge
lam
ento
(se
g ±
EP
M)
controle (14)
aya 500 mg/kg (15)
26
Figura 11. Efeito da administração pós-treino de ayahuasca nas doses 50 ou 500 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC, em média ( E.P.M.) do tempo de
congelamento (em segundos) durante cinco minutos. Não houve diferença estatisticamente
significante na comparação das médias dos tempos de congelamento dos animais dos grupos
controle, aya 50 (ayahuasca 50 mg/kg), aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por
grupo é mostrado entre parênteses.
6.3.2 Experimento 7: Efeito da administração pós-treino de ayahuasca
(50 ou 500 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao som:
A figura 12 mostra os efeitos da administração oral pós-treino de ayahuasca
(50 ou 500 mg/kg) no desempenho de animais na tarefa de condicionamento de
medo ao som. A ANOVA de duas vias com medida repetida indicou efeito
tratamento não significativo [F(2, 31)= 1,2972, p=,28771], mas significativo o efeito
tempo [F(1, 31)= 182,73, p< ,0001], com todos os grupos expressando mais
comportamento de congelamento após a apresentação de som quando comparado
com antes da apresentação. Além disso, a análise ANOVA indicou não significativa
a interação entre os fatores tempo e tratamento [F(2, 31)= ,06284, p= ,93922].
0
10
20
30
40
50
60
controle (7) aya 50 mg/kg (8) aya 500 mg/kg (8)
Tem
po
méd
io d
e co
nge
lam
ento
(se
g ±
EPM
)
27
Figura 12. Efeito da administração pós-treino de ayahuasca nas doses 50 ou 500 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS, em média ( E.P.M.) do tempo de
congelamento (em segundos) antes e após apresentação do som. Todos os grupos de animais
apresentaram maior tempo de congelamento após a apresentação do som. Grupos: controle, aya 50
(ayahuasca 50 mg/kg), aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado
entre parênteses.
6.4 Resultados da etapa III - Efeitos da ayahuasca sobre a evocação e a
extinção da memória emocional de ratos
6.4.1 Experimento 8A: Efeito da administração pré-teste de ayahuasca
(50 ou 500 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao contexto:
Ayahuasca (50 ou 500 mg/kg) administrada pré-teste não afetou o
desempenho dos animais na evocação da tarefa de CMC. A ANOVA de uma via
indicou que não houve efeito tratamento significante [F(2, 31)= ,28075; p= ,75712].
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controle (11)
aya 50 mg/kg (12)
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Figura 13. Efeito da administração pré-teste de ayahuasca nas doses 50 ou 500 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMC, na comparação das médias ( E.P.M.) dos
tempos de congelamento (em segundos) durante cinco minutos. Não houve diferença
estatisticamente significante entre os animais dos grupos controle, aya 50 (ayahuasca 50 mg/kg), aya
500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado entre parênteses.
6.4.2 Experimento 8B: Efeito da administração pré-teste 1 de ayahuasca
sobre o teste 2 de evocação dos ratos na tarefa de condicionamento de medo
ao contexto:
A figura 14 mostra o efeito da administração pré-teste 1 de ayahuasca sobre
o teste 2 de evocação, 24 horas após o teste de evocação 1 na tarefa de CMC. A
ANOVA de uma via indicou que não houve efeito grupo estatisticamente significativo
[F(2, 31)=2,2018, p=,12761].
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controle (11) aya 50 mg/kg (11)
aya 500 mg/kg (12)
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EP
M)
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Figura 14. Efeito da ayahuasca administrada pré-teste 1 sobre o teste 2 de evocação na tarefa de
CMC, na comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento (em segundos) durante
cinco minutos. Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos. Grupos: controle,
aya 50: (ayahuasca 50 mg/kg), aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por grupo é
mostrado entre parênteses.
Na comparação entre os testes de evocação 2 e 1 para a tarefa de CMC, a
ANOVA de duas vias com medidas repetidas mostrou efeito tratamento não
significante [F(2, 31)=,64558, p=,53126], mas indicou efeito teste significante [F(1,
31)=92,599, p<,0001], com todos os grupos expressando mais comportamento de
congelamento no teste 1 (Fig. 15). Além disso, a ANOVA indicou uma interação
significante entre os fatores tratamento e tempo [F(2, 31)=4,5976, p=,01784]. O teste a
posteriori Duncan para interação mostrou que o grupo controle do teste evocação 1
é diferente de todos os grupos do teste 2; o grupo controle do teste 2 difere de
ambos os tratamentos do teste 1; o grupo ayahuasca 500 mg/kg do teste 1 é
diferente de todos os grupos do teste 2.
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controle (11) aya 50 mg/kg (11)
aya 500 mg/kg (12)
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EP
M)
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Figura 15. Comparação do tempo de congelamento entre os testes 1 e 2 da evocação na tarefa de CMC, na
comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento (em segundos) durante cinco minutos. Não
houve efeito tratamento significativo, mas um efeito teste significativo, indicando que todos os grupos
expressaram maior comportamento de congelamento no teste 1 do que no teste 2. Grupos: controle, aya 50
(ayahuasca 50 mg/kg), aya 500 (ayahuasca 500 mg/kg). O número de animais por grupo é mostrado entre
parênteses.* p˂ ,05 comparado ao controle.
A variação do tempo de congelamento dos ratos entre os testes de evocação
2 e 1 (também denominado aqui como delta do tempo de congelamento) indicou
efeito tratamento significativo [F(2, 31)=4,5976, p=,01784]. O teste a posteriori
Duncan para tratamento indicou que a ayahuasca 50 mg/kg não difere do grupo
controle (p=,529421) mas o grupo ayahuasca 500 mg/kg apresenta queda no
tempo de congelamento estatisticamente diferente tanto do controle (p=,034419) e
do grupo ayahuasca 50 mg/kg (p= ,010326) (Fig. 16).
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teste 1 teste 2
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controle (11)
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*
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Figura 16. Diferença do tempo médio de congelamento (em segundos) dos ratos entre os testes 2 e
1 na tarefa de condicionamento de medo ao contexto. Os dados são expressos como média ( ±
E.P.M.). O número de animais por grupo é mostrado em parênteses após o nome dos grupos. * p˂
,05 comparado ao controle.
6.4.3 Experimento 9A: Efeito da administração pré-teste de ayahuasca
(50 ou 500 mg/kg) na tarefa de condicionamento de medo ao som:
O teste 1 de evocação da tarefa de CMS não foi afetado pelo tratamento
com ayahuasca (50 ou 500 mg/kg) quando a droga foi administrada 30 minutos
antes do teste 1. A análise ANOVA de duas vias com medida repetida indicou como
não significativo o fator tratamento [F(2, 23)=,38150, p=,68708] mas indicou efeito
tempo significativo [F(1, 23)=58,664, p<, 0001], com todos os grupos expressando
maior comportamento de congelamento após a apresentação de som. A ANOVA de
duas vias com medida repetida mostrou não significativo o fator interação entre
tempo e tratamento [F(2, 23)=2,3562, p=,11725] (Fig. 17).
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controle (11)
aya 50 mg/kg (10)
aya 500 mg/kg (12) *
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Figura 17. Efeito da administração pré-teste de ayahuasca nas doses 50 ou 500 mg/kg sobre o
desempenho dos animais no teste da tarefa de CMS. Não houve diferença estatisticamente
significante na comparação das médias ( E.P.M.) dos tempos de congelamento (em segundos) dos
animais, antes e após a apresentação do som. Grupos de animais: controle, aya 50: ayahuasca 50
mg/kg, aya 500: ayahuasca 500 mg/kg. O número de animais por grupo é mostrado entre
parênteses.
6.4.4 Experimento 9B: Efeito da administração pré-teste 1 de ayahuasca
sobre o teste 2 de evocação dos ratos na tarefa de condicionamento de medo
ao som:
Para o teste 2 de evocação, a ANOVA de duas vias com medida repetida
indicou como não significativo o fator tratamento [F(2, 23)=,31624, p=,73200] mas
significativo o efeito tempo [F(1, 23)=56,001, p< ,0001], com todos os grupos
expressando maior comportamento de congelamento após a apresentação de som.
A análise também mostrou não ser significante o fator interação entre tratamento e
tempo [F(2, 23)=,62276, p=,54526] (Fig. 18).
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Figura 18. Efeito da ayahuasca pré-teste 1 sobre o teste 2 de evocação na tarefa de CMS, na
comparação das médias ( E.P.M) dos tempos de congelamento (em segundos) dos grupos de
animais, antes e após a apresentação do som. Não houve diferença efeito tratamento significativo,
apenas efeito tempo, com todos os grupos exibindo maior tempo de congelamento após a
apresentação do som. Grupos: controle, aya 50: ayahuasca 50 mg/kg, aya 500: ayahuasca 500
mg/kg. O número de animais por grupo é mostrado entre parênteses.
Na comparação entre os testes de evocação 2 e 1 para CMS, a ANOVA de
duas vias com medidas repetidas revelou que o fator tratamento não é significativo
[F(2, 46)=,64579, p=,52893]. O teste 1 não difere do teste 2 já que a ANOVA mostrou
não significativo o efeito teste [F(1, 46)=,16200, p=,68918]. Além disso, não é
estatisticamente significativa a interação entre tratamento e teste [F(2, 46)=,05132,
p=,95003]. O fator tempo é significativo [F(1, 46)=114,66, p<,0001], com todos os
grupos exibindo maior comportamento de congelamento após a apresentação do
som; a interação tratamentoXtempo não é significativa [F(2, 46)=2,6124, p=,08421];
as interações tempoXteste [F(1,46)=,07339, p=,78768] e tempoXtratamentoXteste
[F(2, 46)=,41400, p=,66344] não são significativas (Fig. 19).
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Figura 19. Comparação do tempo de congelamento entre os teste 1 e 2 da evocação na tarefa de CMS, na
comparação das médias (± E.P.M.) dos tempos de congelamento (em segundos) dos animais, nos testes 1 e 2,
antes e após a apresentação do som. Não houve efeito tratamento, apenas teste, indicando que todos os
grupos expressaram maior comportamento de congelamento no teste 1 do que no teste 2. Grupos: controle, aya
50: ayahuasca 50 mg/kg, aya 500: ayahuasca 500 mg/kg. O número de animais por grupo é mostrado entre
parênteses.
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controle (7)
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aya 500 mg/kg (9)
35
A ANOVA de uma via para o delta do tempo de congelamento entre os testes
2 e 1 mostrou que o efeito tratamento não é significativo nem para antes do som [F
(2, 23)= ,12365, p=,88427] e nem após a apresentação do som [F(2, 23)= 1,6213,
p=,21942], (Fig 20).
Figura 20. Diferença do tempo médio de congelamento (em segundos) dos ratos entre os testes 2 e 1 na tarefa de condicionamento de medo ao contexto. Os dados são expressos como média (± E.P.M). O número de animais por grupo é mostrado em parênteses após o nome dos grupos.
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controle (7)
aya 50 mg/kg (10)
aya 500 mg/kg (9)
36
VII. Discussão
Uma breve análise histórica sobre os diversos tipos de usos da ayahuasca
explica a importância cultural do uso deste chá. O uso da ayahuasca se encontra
em franco processo de expansão, o que em grande parte se deve à disseminação
de movimentos religiosos sincréticos, tanto nacional quanto internacionalmente.
Adicionalmente, a legitimação do uso religioso deste chá no Brasil é uma evidência
clara da crescente importância cultural que o chá conquistou. Além disso, também já
existem indícios na literatura e na mídia de que o uso do chá já tenha ultrapassado
as barreiras do contexto religioso para o recreativo.
O status atual de legalidade para o uso religioso do chá, vigente desde 2004,
preconizou a necessidade de investigações científicas acerca dos efeitos do chá.
Até a presente data, na literatura da ayahuasca prevalecem os estudos clínicos, ao
passo que, pouco enfoque foi dado à pesquisa básica, utilizando modelos pré -
clínicos.Tendo em vista tais circunstâncias, consideramos válido averiguar a
possibilidade da ayahuasca intervir com processos de aprendizagem e memória,
através de associações entre eventos neutros e estímulos aversivos em animais.
Como mostrado por Riba e col. (2006), o giro parahipocampal e a amígdala estão
ativados em seres humanos que ingeriram ayahuasca. Estas estruturas cerebrais
são responsáveis pelo comportamento emocional e memória (Phillips & Ledoux,
1992), e estes dados nos serviram de base para o levantar a hipótese de que o
desempenho dos animais no condicionamento de medo ao contexto e ao som
poderiam ser alterados pela ayahuasca. Dessa forma, este estudo investigou
possíveis efeitos da ayahuasca nos processos de aquisição, consolidação e
evocação de memória emocional em ratos, nas tarefas de CMC e CMS. Também se
investigou os efeitos da administração pré-teste de ayahuasca em um teste de
evocação subsequente livre da droga.
Sabe-se que a ayahuasca é capaz de produzir alucinações, bem como
alterações afetivas e cognitivas. Muito provavelmente, o uso de modelo animal
apresentaria limitações acrescidas às suas inerentes se a abordagem de estudo se
37
tratasse de avaliar o fenômeno de alucinação per se. Porém, o objetivo desse
trabalho foi avaliar unicamente o aspecto cognitivo, e assim, o emprego de animais
submetidos a tarefas de condicionamento clássico constitui uma metodologia
confiável e eficiente para os estudos de neurobiologia da memória e aprendizagem.
Embora poucos estudos indiretamente tenham sugerido que a ayahuasca
possa influenciar a memória (Grob et al., 1996; Riba et al., 2001, 2006), até onde
sabemos, nenhum estudo anterior examinou os efeitos da ayahuasca em processos
de memória emocional em modelos pré-clínicos. Embora Grob et al. (1996) tenha
mostrado um melhor desempenho em consumidores de longo prazo da ayahuasca
para um teste de memória (Auditory Learning Verbal Memory Test), a falta de dados
retrospectivos não permitiu que esses estudiosos estabelecessem uma conexão
entre ayahuasca e uma melhora no desempenho cognitivo. Riba et al. (2006)
observaram a ativação da amígdala e giro parahipocampal, duas áreas criticamente
envolvidas com a emoção e/ou memória emocional, respectivamente. Em nosso
estudo, utilizamos animais sem exposição prévia a qualquer droga, diferentemente
da maioria dos estudos em humanos que os voluntários ou eram consumidores de
longo prazo da ayahuasca ou tinham normalmente consumido drogas psicodélicas
várias vezes em suas vidas (Grob et al., 1996;. Riba et al., 2001, 2003, 2006).
Neste estudo optou-se por utilizar o decocto sob a forma liofilizada de modo
a assegurar a estabilidade dos componentes e também como forma de controle da
quantidade administrada aos animais. Assim, o decocto teve sua concentração de
alcaloides determinada. A análise quantitativa dos constituintes presentes na
amostra do extrato seco de ayahuasca (Quadro 1) detectou a presença de DMT,
harmina, harmalina e THH como os principais alcaloides, consoante com a literatura
(Mckenna et al., 1984; Callaway et al., 1996). Com exceção da quantidade de
harmina, que foi mais baixa neste presente estudo, a quantidade dos demais
alcaloides está de acordo com dados prévios na literatura (Callaway et al., 2005).
As diferenças nas concentrações dos alcaloides encontrados entre este estudo e o
de Callaway e col. (2005) podem dever-se a diferenças quanto ao método de
preparação, quantidade e proporção das partes das plantas utilizadas no preparo
do chá.
38
Além disso, análises fitoquímicas de Callaway e col. (2005) com amostras
das espécies secas de B. caapi e P. viridis coletadas em um mesmo dia, mostraram
ampla variação da concentração de alcaloides. Nesse trabalho, DMT variou desde
0,00 a 17,75 mg/g; e as concentrações mínimas e máximas para harmina, harmalina
e THH foram 0,31-8,43, 0,03-0,83 e 0,04-2,94 mg/g, respectivamente. Assim, pode-
se notar que diversos fatores poderiam ser responsáveis pela ampla variação entre
as análises quantitativas encontradas na literatura. Callaway (2005) também
verificou que esta variação de alcaloides encontrados no chá ocorre não só entre as
diferentes fontes religiosas bem como dentro delas. Neste estudo em questão,
embora todas as amostras analisadas contivessem β-carbolinas, não houve níveis
detectáveis de DMT em chás oriundos de dois movimentos religiosos diferentes,
sugerindo que o consumo do chá nem sempre está associado à obtenção de
alucinações, eliciadas apenas pela DMT (Freedland & Mansbach, 1999).
As doses de droga empregadas em nosso estudo basearam-se no estudo de
Gianfratti (2009). Ayahuasca liofilizada nas doses orais de 250, 500 e 750 mg/kg
correspondem a duas, quatro, e seis vezes a dose calculada em humanos.
Os resultados obtidos em nosso estudo mostraram que as administrações
pré-treino de ayahuasca nas doses 250, 500 ou 750 mg/kg não afetaram a
aquisição da tarefa de CMC, e nem as doses 250, 500 ou 750 mg/kg interferiram
com a aquisição da tarefas de CMS. Além disso, ayahuasca (50 e 500 mg/kg)
administrada imediatamente após o treino, não afetou a consolidação do CMC. O
tratamento com ayahuasca 500 mg/kg também não interferiu com a consolidação da
tarefa de CMS. Estudos anteriores indicaram diferentes agonistas serotonérgicos
que prejudicaram (Carli et al., 1992) ou que não alteraram a consolidação na tarefa
de esquiva passiva (Carli et al., 1993; Misane et al.,1998), uma outra tarefa
aversiva. Nosso estudo mostrou que a ayahuasca administrada logo após o treino
não afeta o CMC e nem o CMS. Nós preferimos ser cautelosos quando
comparamos nossos achados sobre consolidação com dados anteriores, e sendo
assim cabe ressaltar que o chá é uma mistura complexa de vários elementos
químicos que, em combinação poderiam apresentar um perfil de ação diferente em
comparação com agonistas 5-HT seletivos. De modo que na consolidação a
administração da droga ocorreu logo após o treino, podemos excluir qualquer
39
interferência na percepção animal do estímulo dos aparatos. Como os testes de
consolidação foram realizados 48 horas após o treino, também sabemos que não
houve influência da ayahuasca em fatores como motivação para exploração ou
sobre atividade sensório-motora dos animais.
A administração pré-teste de ayahuasca 50 ou 500 mg/kg não exerceu efeito
sobre os testes 1 de evocação, em nenhuma das tarefas de condicionamento. Com
os parâmetros utilizados no presente estudo, a extinção foi observada para o
condicionamento de medo ao contexto mas não para o condicionamento de medo
ao som. Pela análise do delta do tempo de congelamento entre os testes de
evocação 2 e 1, para a tarefa de CMC, é notável que os animais tratados com
ayahuasca 500 mg/kg exibiram uma queda no tempo de congelamento
significativamente maior do que os grupos controle e ayahuasca 50 mg/kg. Este
dado sugere que a ayahuasca pode facilitar ou acelerar a extinção da aprendizagem
aversiva em roedores. Nossos resultados estão de acordo com estudos anteriores
que mostraram que um agonista serotonérgico (TCB-2) facilitou a extinção de
memória na tarefa de condicionamento de medo ao contexto em camundongos
(Zhang et al., 2012).
Sendo a extinção um novo aprendizado que suprime a expressão de
associações aversivas (Pavlov, 1927 apud Fiorenza et al., 2012), podemos sugerir
que a ayahuasca tenha acelerado a formação de uma nova memória inibitória que
suprimiu a memória aversiva inicial de roedores. Este achado nos permite avistar
perspectivas de estudos que averiguem o mecanismo de ação do chá envolvido na
extinção de memórias aversivas, podendo ter como ponto de partida a hipótese de
que ayahuasca recrute receptores serotonérgicos em seu mecanismo de ação. Tal
hipótese seria aceitável visto que a DMT atua como agonista de receptores 5-HT
(McKenna et al., 1990; Smith et al., 1998), os quais também estão ricamente
distribuídos no hipocampo e amígdala, áreas do cérebro envolvidas em diferentes
processos mnemônicos (Cornea-Hebert et al., 1999), tais como a extinção (Szapiro
et al., 2003; Vianna et al., 2004; Berlau & McGaugh, 2006; Bevilaqua et al., 2006).
Verificamos que a ayahuasca facilitou a extinção do condicionamento contextual,
mas não o condicionamento ao som, ambas as tarefas amígdala-dependentes, mas
sendo a primeira hipocampo-dependente e a última, hipocampo-independente.
40
Assim, inferimos que o efeito acelerador na extinção da ayahuasca, aparentemente,
utilize principalmente a formação hipocampal, embora não possamos descartar uma
possível influência da amígdala.
A possível atividade facilitadora de extinção exercida pela ayahuasca parece
ser robusta já que uma dose aguda significativamente acelerou a aprendizagem
inibitória em um único teste, com uma reexposição de cinco minutos (teste 2) numa
condição livre de drogas.
Em resumo, este estudo indica que a ayahuasca não afeta a aquisição,
consolidação e nem a expressão de aprendizagem aversiva, mas facilitou a extinção
de memórias aversivas. Os presentes dados suportam a ideia de que agentes
serotonérgicos desempenham um papel importante na regulação da extinção da
memória emocional. Mais importante, o possível efeito facilitador de extinção de
aprendizagem aversiva promovida pela ayahuasca em roedores poderia
eventualmente constituir intervenções clínicas para alguns tipos de distúrbios
relacionados ao medo, tais como fobias e estresse pós-traumático.
41
VIII. Anexos
42
44
VIII. Referências
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