DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 - … · linguistica como na propaganda da Chevrolet “A...
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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
1
SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DO PARANÁ (SEED)PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL (PDE)
O letramento das 7ª séries do Ensino fundamental: O desafio de tornar o adolescente leitor
Artigo apresentado à Secretaria de Estado de Educação – Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), como requisito parcial para o avanço na carreira docente (QPM). Professor PDE, do Estado do Paraná. Orientadora: Profa. Dra. Pascoalina Bailon de Oliveira Saleh.
PONTA GROSSA2011
2
O letramento das 7ª séries do Ensino fundamental: O desafio de tornar o adolescente leitor
Autora: Maria Cristina Jarema
Orientadora: Pascoalina Bailon de Oliveira Saleh
Resumo
O presente artigo tem por objetivo apresentar os resultados de uma proposta de trabalho de letramento dos alunos de 7ª series obtidos a partir da implementação da proposta de intervenção na Escola Estadual Medalha Milagrosa. A partir de um Plano de Trabalho elaborado em 2009, como parte das atividades do PDE, levamos aos alunos a prática de leitura através de textos publicitários, principalmente. Com base na análise desses textos e reflexões iniciais sobre tema, objetivo, imagem e recursos linguísticos, os alunos trabalharam a leitura de modo que as ideias pertinentes aos temas propostos em sala fossem analisadas, discutidas e enfatizadas. Assim, para que fosse desenvolvida a competência comunicativa dos educandos, foi elaborado um material que propiciasse a exposição do estudante a diferentes textos publicitários para que ele pudesse apreender o que os caracteriza enquanto gênero. Com esta intervenção pedagógica procuramos intensificar a prática de leitura e, assim, contribuir, não somente motivando-os a essa prática, como também levando-os ao reconhecimento do valor dessa atividade intelectual, tão necessária para as suas vidas diárias. Assim, acreditamos que priorizar a leitura na escola é o melhor caminho para torná-la um lugar de desenvolvimento e formação de pessoas melhores preparadas para a vida.
Palavras-chave: Leitura. Propaganda. Ensino.
1 Introdução
O artigo tem por objetivo apresentar os resultados da intervenção
pedagógica na escola desenvolvida com 24 alunos, matriculados nas 7ª séries do
Ensino Fundamental II, da Escola Estadual Medalha Milagrosa, localizada em uma
região central do município de Ponta Grossa, Paraná, no ano de 2010, por ocasião
3
da nossa participação no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE),
desenvolvido pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná.
A escolha do tema do projeto se deu em função da nossa percepção de que
o desinteresse dos alunos adolescentes pela leitura está cada vez maior. Apesar
dos esforços do Estado em reverter o problema da falta de leitura dos jovens, esse
tem se intensificado a cada ano, como nos mostram os resultados das avaliações
feitas pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e pela Prova
Brasil. São avaliações para diagnóstico, em larga escala, desenvolvidas pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC),
que têm o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema
educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários
socioeconômicos.
Os levantamentos de dados do SAEB são realizados a cada dois anos para
alunos do Ensino Básico (da 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e da 3ª série do
Ensino Médio) nas disciplinas Língua Portuguesa, Matemática e Ciências, História e
Geografia. A análise dos resultados dos levantamentos desse sistema de avaliação
permite acompanhar a evolução do desempenho dos alunos e dos diversos fatores
incidentes na qualidade e na efetividade do ensino ministrado nas escolas,
possibilitando a definição de ações voltadas para a correção das distorções
identificadas e o aperfeiçoamento das práticas e dos resultados apresentados pelas
escolas e pelo sistema de ensino brasileiro.
Diante de tanta indiferença pela leitura por parte dos alunos e dos altos
índices de fracasso escolar demonstrados por esses sistemas de avaliação,
optamos por aplicar um projeto de leitura cujo foco foi trabalhar com textos do
gênero propaganda.
2 Fundamentação teórica
Inicialmente, vamos refletir um pouco sobre o que é uma língua. Para
Marcuschi (2008, p. 61), “a língua é um conjunto de práticas sociais e cognitivas
historicamente situadas”. É neste contexto que os gêneros textuais se constituem
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como ações sócio-discursivas para agir sobre o mundo e dizer o mundo,
constituindo-o de algum modo.
Segundo o autor, é impossível se comunicar verbalmente a não ser por um
gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por um texto,
Marcuschi (2008, p.22). O autor nos faz refletir sobre a relevância de se conceber a
língua como uma atividade social, histórica e cognitiva. Essa noção privilegia a
natureza funcional e interativa e não o aspecto formal e estrutural da língua.
Dessa maneira, gênero textual é definido pelo autor como:
uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. (MARCUSCHI, 2002, p.22-23).
Quando falamos de um gênero textual estamos falando de uma carta, de
uma entrevista, de uma aula expositiva, de um anúncio, de um classificado e de uma
propagando, por exemplo.
A palavra “gênero” sempre foi bastante utilizada pela retórica e pela
literatura com acepção designadamente literária. Segundo Todorov (1978, in LINS,
2007), essa palavra tem sido usada desde Platão, cujo objetivo era distinguir o
gênero lírico, em que apenas o autor falava; o épico, em que o autor e personagem
falam; o dramático, em que apenas a personagem falava.
Marcuschi (2008, p. 147) enfatiza que “hoje, o gênero é facilmente usado
para referir uma categoria distintiva de discurso de qualquer tipo, falado ou escrito,
com ou sem aspirações literárias”. Para ele “é assim que se usa a noção de gênero
textual em etnografia, sociologia, antropologia, retórica e na linguística. Conforme o
autor (p. 147), ‘foi com o filósofo grego Aristóteles que surgiu uma teoria mais
sistemática sobre os gêneros e sobre a natureza do discurso”. O filósofo elucida que
há três elementos compondo o discurso: a) aquele que fala; b) aquilo sobre o que se
fala e; c) aquele a quem se fala.
Para Bronckart (1999 apud MARCUSCHI, 2008, p. 154), “a apropriação dos
gêneros é um mecanismo fundamental de socialização, de inserção prática nas
atividades comunicativas humanas”. Mais adiante, ainda na mesma página,
Marcuschi prossegue dizendo que “os gêneros textuais operam, em certos
contextos, como formas de legitimação discursivas, já que se situam numa relação
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sócio-histórica com fontes de produção que lhes dão sustentação além da
justificativa individual”.
Marcuschi (2000, apud LINS, 2007) opta pela expressão Gêneros Textuais,
uma vez que enfoca aspectos que são constituídos da natureza empírica, sejam
inseparáveis ou extrínsecos da língua. Entretanto se a opção for por enfocar a
situação realizada no campo do discurso, isto é, a situação discursiva, na qual o
contexto alude a seu aspecto sócio-comunicativo, adota-se o conceito de gênero
discursivo.
Nessa perspectiva, vale ressaltar que Bakhtin (1995) define a enunciação
como um produto da relação social e completa que qualquer enunciado fará parte de
um gênero. Defende ainda que, em todas as esferas da atividade humana, a
utilização da língua realiza-se em formas de enunciado (orais e escritos), concretos
e únicos. Para ele há os gêneros primários – ligados às relações cotidianas, como
conversa face a face, linguagem familiar, cotidiana etc. Em um ângulo mais direto,
esses gêneros são os mais comuns no dia a dia do falante; e os gêneros
secundários – mais complexos (discurso científico, teatro, romance etc.), referem-se
a outras esferas de interação social, mais bem desenvolvida. Seguindo essa linha de
pensamento, Bakhtin (1995, p. 248) vê os gêneros discursivos como coerções
estabelecidas entre as diferentes atividades humanas e o uso da língua nessas
atividades, ou seja, as práticas discursivas.
Como afirma Bakhtin a riqueza e a diversidade dos gêneros discursivos são
ilimitadas, porque as possibilidades de atividade humana são também inesgotáveis e
porque cada esfera de atividade contém um repertorio inteiro de gêneros discursivos
que se diferenciam e se ampliam na mesma proporção que cada esfera particular se
desenvolve e se torna cada vez mais complexa (BAKHTIN, 1986, p.60).
Para Bakhtin (1979) todo enunciado refuta, confirma, complementa, retoma
e reavalia outros enunciados; baseia-se neles; enfim, leva-os em conta, de alguma
maneira. Dessa forma, para esse teórico, os gêneros são aprendidos no curso de
nossas vidas como participantes de determinado grupo social ou membro de alguma
comunidade. Logo, a partir da leitura que Marcuschi faz desse autor, tem-se que
gêneros são padrões comunicativos, que, socialmente utilizados, funcionam com
uma espécie de modelos comunicativos globais que representam em conhecimento
social localizado em situação concreta.
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Segundo Kress (1985), discurso é constituído por jogos sistematicamente
organizados de declarações que dão expressão aos significados e valores de uma
instituição. Um discurso provê um jogo de possíveis declarações sobre uma
determinada área. Nisso provê descrições, regras, permissões e proibições sociais e
ações individuais.
Nessa perspectiva, o discurso e gêneros são formados nas estruturas e
processos sociais - discurso deriva das instituições, e gênero das ocasiões sociais
convencionalizadas em que a vida social acontece. Os textos são, portanto,
duplamente determinados: pelos sentidos do discurso que aparecem no texto e
pelas formas, significados e construções de um gênero específico (MARCUSCHI,
2008).
Segundo Marcuschi (2008) os domínios discursivos designam uma esfera ou
instância de produção discursiva ou de atividade humana. Tais domínios não são
categoricamente textos, nem discursos, todavia proporcionam condições para
aparecimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista dos domínios,
produzimos discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso etc., visto que
tais discursos não abrangem um gênero específico, pois originam vários outros
gêneros; já os tipos textuais designam uma espécie de construção teórica definida
pela natureza linguística de sua composição. Os tipos textuais abrangem cerca de
meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição,
descrição e injunção.
Embora reconhecendo à importância de se considerar a situação discursiva
na abordagem didática da leitura e da produção textual, os que procuramos fazer na
implementação do projeto na escola, na continuidade deste artigo optarão pelo uso
do termo gênero textual pela influência das reflexões de Marcuschi em nosso
trabalho.
2.1 Explorando o gênero propaganda
Marcuschi (2008) defende que o ensino da língua portuguesa que focalize a
exploração dos gêneros textuais nas modalidades da língua falada e escrita será
presumivelmente mais bem-sucedido, visto que os alunos obtêm capacidade de se
expressar distintamente nas manifestações às quais sejam expostos.
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Cabe aqui explicitar, de forma sucinta, as características, os recursos
empregados nas propagandas que têm o poder de influenciar, de orientar as
percepções e os pensamentos, conciliando o princípio do prazer e da realidade,
apontando o que deve ser usado ou comprado. Por propaganda entendemos o
gênero textual, cuja finalidade está em persuadir o leitor a comprar uma determinada
marca de um produto ou de uma empresa, ou de promover uma ideia. É o gênero
em que predomina a tipologia ‘argumentar’. Apresenta de um modo específico
informação sobre um produto, marca, empresa ou política que visa influenciar a
atitude de uma audiência para uma causa, posição ou atuação. A fim de alcançar
seu objetivo, o publicitário utiliza inúmeros recursos de linguagem verbal e nao
verbal para atrair o leitor. Faz uso de recursos da língua portuguesa como: variacao
linguistica como na propaganda da Chevrolet “A escolha Celta”; empréstimo
lingüístico – uso de termos ou expressões estrangeiras no lugar de termos da língua
materna como Sopateen da Maggi; aspectos ortográficos - jogos com a grafia em
que se pretende causar efeitos expressionais, com a função de valorizar as letras
ou chocar com as palavras; aspectos fonológicos – brincadeiras com a rima, o ritmo,
a aliteração e a paronomásia , procurando salientar o aspecto poético do som
das palavras, como na propaganda da Nestlé “Encha seu filho de bolacha”;
aspectos morfológicos – emprego de cruzamentos vocabulares, prefixações,
sufixações, abreviações, etc., para compor uma nova palavra ou para realçar a
intensidade ou aumento do sentido como na propaganda da Knorr “O melhor sem
conservadores”, entre outros aspectos, (SILVA, 2011).
A linguagem da propaganda publicitária geralmente se adapta ao perfil do
público ao qual ela se destina e ao suporte ou veículo em que é publicado. Seu uso
primário advém de contexto político, referindo-se geralmente aos esforços de
persuasão patrocinados por governos e partidos políticos.
Dessa forma, a propaganda é um gênero textual presente, praticamente,
em todos os meios de comunicação. Ela cria valores, mitos e ideais. Segundo
Martins (1997), a propaganda atenta para os desejos do público e prima pelo teor de
informação e por apelos, a fim de persuadir o destinatário. Tanto é assim que tem
por missão atrair o consumidor, operando no sentido de atingir o seu subconsciente
com a penetração insistente do apelo, influenciando sua decisão de compra.
Enfatiza Martins (1997) que a propaganda é considerada uma das mais
eficientes formas de comunicação de massa que transmite, divulga, informa e troca
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idéias, atua sobre o indivíduo que, mesmo contra sua vontade, acaba tendo o desejo
de possuir e consumir cada vez mais. Ela funciona como uma forma de
comunicação que, ao transmitir informações, induz a outros comportamentos,
cumprindo, ainda, um papel de ativadora da economia através do aumento do
consumo. Dessa forma, segundo o autor, os diversos recursos empregados nas
propagandas têm o poder de influenciar e de orientar as percepções e o
pensamento, conciliando o princípio do prazer e da realidade, apontando o que deve
ser usado ou comprado.
Neste artigo, pretendemos apontar alguns encaminhamentos de letramento
que procuramos realizar para despertar o interesse dos alunos do Ensino
Fundamental II para a leitura e também para provocar neles questionamentos
acerca do papel da escola na formação do leitor. Para tanto, nos propusemos a,
juntamente com eles, repensar o que é a leitura e sua função, revendo posições
antigas sobre tempos, modos e sentidos de aprender a ler.
Estudos sobre a importância da leitura, como os de Copes, Benassi e Saveli
(2009), Benassi e Saveli (2009), Copes e Saveli (2010), vêm sendo realizados e
muito discutidos, não só no âmbito dos setores ligados à educação, mas por
diversos segmentos sociais, destacando-se a sua relevância para a aquisição do
conhecimento, ou seja, da cultura, do saber e da conscientização política, face aos
desafios do mundo atual.
Sabemos que a ausência da leitura entre os alunos tem contribuído para
fortalecer o fracasso escolar, tão marcado, como já foi mencionado anteriormente,
pelas diversas avaliações emanadas dos órgãos oficiais.
Formar leitores tornou-se, então, um desafio para os professores, visto que
ler, para os alunos, dá mais trabalho do que assistir aos programas de televisão,
ouvir música, ir ao shopping com os amigos ou qualquer outra atividade que o
adolescente gosta de fazer.
Podemos dizer que a leitura contribui para a comunicação do sujeito com o
restante da humanidade. Saber ler, portanto, tornou-se condição indispensável para
o acesso a qualquer área do conhecimento; ler é importante, no sentido de
possibilitar a transformação da sociedade.
De acordo com as Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Estado
do Paraná (2008), o trabalho na escola com a leitura, interpretação e a produção
escrita em Língua Portuguesa deve ter como meta primordial o desenvolvimento no
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aluno de habilidades que façam com que ele tenha capacidade de usar um número
sempre maior de recursos da língua para produzir efeitos de sentido de forma
adequada a cada situação específica de interação humana.
Como afirma Soares (1989, p. 11):
Uma escola transformadora é uma escola consciente de seu papel político na luta contra as desigualdades sociais e econômicas e, que, por isso, assume a função de proporcionar às camadas populares, através de um ensino eficiente, os instrumentos que lhes permitam conquistar mais amplas condições de participação cultural e política e de reivindicação social.
A partir da concepção de Soares, podemos afirmar que a educação é
chave que permite ao aluno entrar em contato com outros mundos, ampliar
horizontes, desenvolver a compreensão e a comunicação, mas isso só será
possível através de um trabalho adequado com a leitura.
Diante disso, esta intervenção pedagógica foi norteada pelas conceituações
de leitura propostas pelas DCEs e por autores como Kleiman (1998), Geraldi (1997),
Kato (1986, 1990), Soares (1989), Freire (1995), Foucambert (1994), Bamberger
(1995), Eco (2000), Orlandi (2003), Lajolo (2000), Pennac (1998), Silva (1991), Solé
(1998), dentre outros que discutem o ensino da leitura e a leitura como pratica
social, e na visão de Bronkart (1999) e Marcuschi (2008), que tratam dos gêneros
textuais e Bakhtin (2005), dos gêneros discursivos.
A partir desses autores, podemos afirmar que a leitura é de suma
importância para o aprendizado, pois leva o leitor ao desenvolvimento do
conhecimento científico e ao conhecimento de mundo e, consequentemente, ao
aumento de seu vocabulário e de suas possibilidades de expressão, ou seja, a
leitura é um dos principais instrumentos para que o indivíduo construa o seu
conhecimento e aprenda a exercer sua cidadania. Além disso, a leitura é uma
importante ferramenta que contribui para que os sujeitos produzam textos coerentes,
consonantes com o contexto. Podemos afirmar ainda que o ato de ler deva ir além
da leitura das letras, das palavras, deve levar o indivíduo à leitura de mundo, do
contexto cultural onde ele vive, possibilitando assim o desenvolvimento do senso
crítico.
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Porém, a leitura para o leitor iniciante não só deve ser significativa e
prazerosa, como também guiada por objetivos e metas. Assim, aos poucos o
educador conseguirá atrair o pequeno leitor para o mundo da linguagem escrita.
Para Kleiman (1998), o processo de letramento é mais amplo do que aquele
que a alfabetização possibilita, uma vez que o letramento apresenta e focaliza os
aspectos socioculturais na aquisição da linguagem escrita. Como afirma a autora, o
letramento procura referências e descreve fatos de uma sociedade na qual o leitor
aprendiz está inserido, ultrapassando em muito o processo de alfabetização.
Para que o processo de letramento esteja inserido no contexto escolar, se
faz necessário usar recursos materiais que venham ao encontro da realidade dos
alunos, das mais variadas formas presentes em seu cotidiano. Assim, a autora
conclui que um trabalho pedagógico realizado pela escola exige inúmeras formas de
mediação do educador de modo a estabelecer um maior conhecimento e interação
do aluno. Ou seja, durante o processo de ensino da leitura devem acontecer
negociações produtivas e construtivas para o desenvolvimento de atividades
relacionadas a uma proposta de trabalho, que não estejam baseadas numa simples
transferência de conhecimentos do professor para o aluno, com formas que apenas
diferenciam a oralidade da escrita.
Kleiman (1988) destaca ainda a importância da leitura em voz alta, pelo
professor, para que o leitor aprendiz se preocupe e aprenda, também, a pronúncia, o
ritmo e a entonação próprios da leitura de todo e qualquer texto.
Para Richard Bamberger (1995, p.10), a leitura “é um processo que se
adquire com o tempo e com hábito e, quanto mais lemos, mais adquirimos essa
capacidade de ler, de interpretar um contexto”. Quando lemos fazemos relação entre
o velho texto (texto lido) e o novo texto (interpretação individual) e vamos adquirindo
capacidade crítica que tende a evoluir para a criativa, a qual gera resultados
completamente novos.
Tanto Kleiman, quanto Bamberger defendem os conhecimentos prévios que
o aluno tem e a relação deles com o que lê. Entretanto, atualmente, os jovens têm
diante de si uma gama muito grande de tecnologia colocada a sua disposição,
consequentemente, a aptidão para a escrita e, para a leitura retrocedeu, ao passo
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que aumentou seu talento técnico (FREITAS, 2006). Os jovens acham que, com o
avanço da tecnologia, o velho livro deixa de ter sua importância na sociedade. É
importante fazer o aluno perceber que ler, interpretar, desenvolve o lado crítico, o
raciocínio. Sem leitura não há progresso tecnológico. Ler é adquirir a capacidade de
explorar, compreender o que foi lido. Conforme Kleiman (1988), “a boa leitura é uma
confrontação crítica com o texto e as ideias do autor”.
As Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná (DCEs) compreendem a
leitura como um ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais,
históricas, políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado
momento. Ao ler, o indivíduo busca as suas experiências, os seus conhecimentos
prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o
constituem.
As considerações desses autores sobre a leitura fazem-nos refletir que
através da leitura o homem é capaz de transformar-se, inserir-se na sociedade
com condições de exercer sua cidadania . No processo de aquisição da leitura, o
indivíduo traz à tona conhecimentos prévios que o auxiliarão na produção de
conhecimento e visão de mundo.
Como afirma Freire (1995, p.11), “A leitura do mundo precede a leitura da
palavra.” Portanto, não é somente a leitura e a escrita que nos fornecem a matéria
prima para a leitura e a produção de texto, mas a fala, a escuta, a nossa própria
visão do mundo, a nossa percepção das diversas realidades, que são fontes
utilizadas para o desenvolvimento da escrita.
Freire enfatiza que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura
do mundo, mas por certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”, quer dizer,
transformá-lo através de nossa prática consciente.
Foucambert (1994, p. 7) posiciona-se quanto ao conceito de leitura
afirmando que:
Ler significa ser questionado pelo mundo e por si mesmo, significa que certas respostas podem ser encontradas na escrita, significa poder ter acesso a essa escrita, significa construir uma resposta que integra parte das novas idéias na mente do leitor.
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O autor afirma também que “Ler é explorar a escrita de uma maneira não-
linear [...] jamais se chega ao significado de um texto pela soma do sentido das
sucessivas palavras que o compõem” (FOUCAMBERT, 1994, p.8). Ainda segundo o
autor, “Ler não consiste em encontrar o oral no escrito [...] a escrita é a linguagem
que se dirige aos olhos; funciona e evolui para a comodidade dessa comunicação
visual” (FOUCAMBERT, 1994, p.8).
A partir do exposto pelos autores acima citados, concluímos que estimular o
aluno à leitura não é propor um simples passar de olhos em cima das letras, das
palavras, dos textos, das figuras, etc., mas torná-lo capaz de relacionar a leitura ao
mundo a sua volta, valorizar e ampliar seu conhecimento. Para podermos estimular
essa capacidade é fundamental que o ser humano esteja predisposto a adquirir essa
habilidade de leitura e nada mais fundamental do que o professor despertar esse
potencial do aluno com projetos e aulas dinâmicas.
Nessa intervenção desenvolvemos com os alunos da 7.ª série uma prática
criteriosa de leitura de propaganda, o que propiciou o desenvolvimento de uma
compreensão responsiva, de reação ao texto, de posição, de autonomia e, portanto,
de cidadania, a fim de colaborar para que esses alunos construíssem imagens
culturais que edificam a sociedade.
Em consonância com a proposta de letramento, a intenção da intervenção
pedagógica foi contribuir com atividades que desenvolvessem a compreensão do
aluno leitor e que, em decorrência da aprendizagem, ele pudesse adquirir novos
hábitos de leitura, percebendo a função social da palavra escrita ou falada,
tornando-se capaz de se valer dela sempre que necessário.
Para tanto traçamos como objetivo geral garantir aos alunos situações de
aprendizagem de leitura voltadas para o caráter libertador próprio do ato de ler.
Como objetivos específicos, intentamos: a) oportunizar aos alunos a leitura de textos
do gênero propaganda com os quais se defrontam em diferentes situações de
participação social; b) levar os alunos à interpretação de textos e a inferir julgamento
quanto às intenções de quem os produz; d) contribuir para a formação de leitores
críticos; e) levar os alunos a confrontar opiniões e pontos de vista sobre as
diferentes linguagens e suas manifestações específicas; f) despertar nos alunos o
interesse pela leitura.
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Mas afinal, qual a importância da leitura do texto publicitário do gênero
anúncio, classificado e propaganda para o desenvolvimento da criticidade e da
autonomia do aluno?
Reflitamos a respeito do fato de que, nos últimos dois séculos, as novas
tecnologias, em destaque as ligadas à área de comunicação, proporcionaram o
surgimento de novos gêneros e novas formas de comunicação. De fato, “não são
propriamente as tecnologias per se que originaram os gêneros e sim a intensidade
dos usos dessas tecnologias e suas interferências nas atividades comunicativas
diárias” (MARCUSCHI, 2008, p. 20). Portanto, além de estar em consonância com
as orientações teórico-metodológicas das DCEs, um dos méritos do trabalho
didático-pedagógico com os gêneros textuais deve-se ao fato de proporcionar o
desenvolvimento da autonomia do aluno no processo de leitura e produção textual
como uma consequência no domínio do funcionamento da linguagem em situações
de comunicação, uma vez que é, por meio dos gêneros textuais, que as práticas de
linguagem incorporam-se nas atividades dos alunos.
Concordamos com Bezerra (2005), quando afirma reconhecer que a escola
sempre trabalhou com gêneros, até porque, na década de 80, com a divulgação de
algumas teorias linguísticas privilegiando o estudo do texto, os livros didáticos
diversificaram e ampliaram ainda mais a sua seleção textual, destacando-se a
presença de textos jornalísticos (notícias, reportagens, entrevistas, propagandas
etc.). No entanto, os seus ensinamentos eram restritos à observação e análise de
aspectos estruturais ou formais dos textos. Ou seja, os textos eram usados como
pretexto para o estudo da metalinguagem e classificação gramatical (identificação de
verbos, retirada de adjetivos, categorização dos substantivos e pronomes etc.).
Ainda concordamos com Bezerra (2005, p. 41), quanto à mudança de
perspectiva que pode ser propiciada pelo estudo dos gêneros:
O estudo de gêneros pode ter conseqüência positiva nas aulas de Português, pois leva em conta seus usos e funções numa situação comunicativa. Com isso, as aulas podem deixar de ter um caráter dogmático e/ou fossilizado, pois a língua a ser estudada se constitui de formas diferentes e específicas em cada situação e o aluno poderá construir seu conhecimento na interação com o objeto de estudo, mediado por parceiros mais experientes.
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Assim, a importância de se desenvolver uma proposta de intervenção
pedagógica voltada ao estudo do gênero propaganda pode ser defendida com o
argumento de que o discurso publicitário é proeminente nas sociedades atuais e
pode revelar muito sobre a nossa sociedade, além de se apresentar como parte
integrante da cultura moderna com um poder comunicativo de grande relevância.
Justificamos também a escolha do trabalho com esse gênero textual em sala
de aula, pelo fato de esse poder ser considerado uma espécie de crônica social,
uma vez que estabelece um diálogo com os acontecimentos do presente e com as
tendências de comportamento, expectativas, desejos e percepções do público, o que
torna possível considerar o discurso publicitário como uma vitrine privilegiada dessas
tendências.
3. Estratégias de ação
Tendo em vista que os alunos não têm adquirido a cultura da leitura em nível
satisfatório nos últimos anos e que esta é imprescindível para a formação do aluno e
para o exercício da cidadania, adotamos algumas estratégias de ensino para as
turmas de 7 ª séries do Ensino Fundamental II, na elaboração e execução do
referido projeto de intervenção pedagógica na escola, a fim de que a aprendizagem
da leitura se tornasse mais efetiva.
Coube-nos, como professora PDE, entender que o ensino da leitura se dá
em um processo constante, contínuo e é um dos papéis que a sociedade atribui à
escola para, a partir daí, tentar contribuir para a reversão dessa situação.
A análise linguística foi utilizada como ponto de partida para reflexão sobre
os gêneros publicitários. Através da leitura, análise e interpretação do gênero textual
propaganda, no qual são veiculados discursos ideológicos, esperava-se que o aluno
adquirisse paulatinamente mais argumentos, mais opinião a respeito do assunto
discutido no texto, pois ensinar a ler é levar o aluno a superar-se a si mesmo durante
as leituras que faz, uma vez que a cada leitura ele é transformado e transforma o
seu meio. (FREIRE, 1995).
As atividades de leitura elaboradas foram baseadas nas estratégias de
leitura de Solé (1988), a qual defende que o trabalho com a leitura precisa
compreender três etapas: o antes, o durante e o depois da leitura por elas estarem
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associadas à concepção construtivista de ensino e aprendizagem. Nessa
concepção, considera-se a situação educativa como um processo de construção
conjunta através do qual o professor e seus alunos possam compartilhar,
progressivamente, significados mais amplos e complexos e dominar procedimentos
com maior precisão e rigor, de modo que ambos também se tornem
progressivamente mais preparados para entender e agir sobre a realidade.
Por meio de aulas de leitura procuramos discutir o gênero propaganda para
que os alunos conhecessem as suas características, transformando a leitura em um
processo de interação entre o leitor e o texto; procuramos também mostrar os
objetivos de cada texto e guiar a leitura, levando os alunos a construírem um sentido
para o que está sendo lido.
Salientamos que esta intervenção seguiu os princípios de uma pesquisa
qualitativa que se aproxima da pesquisa ação, sob a orientação de uma professora
da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Paraná e que inicialmente foi feito um
plano de trabalho a ser aplicado na escola.
3. A implementação em si
3.1 A propaganda
Por meio de atividades aplicadas logo no início do período, a fim de
diagnosticar os níveis de letramento dos alunos, percebemos que a maioria deles
apresentava dificuldades de ler diferentes gêneros textuais e desconheciam as
características específicas desses gêneros. Levamos em consideração que "as
práticas de letramento mudam segundo o contexto" (KLEIMAN, 2001, p. 39). O
tempo todo estamos em contato com algum gênero textual, uma música, um poema,
uma placa (linguagem não verbal), bula, panfletos, lista de supermercado, mas os
textos que mais ficam gravados na nossa memória, certamente, são as
propagandas, porque elas são, quase sempre, curtas, sugestivas e de fácil leitura.
As propagandas são veiculadas em outdoors, televisão, rádio, jornal, revista e
internet. Elas se espalham diariamente entre nós tentando conseguir consumidores.
A criatividade na propaganda está cada vez mais presente, e os textos se tornam
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cada vez mais atraentes. Às vezes, nem sabemos ao certo para que serve o
produto, mas o slogan que o representa está encravado na nossa memória. Os
textos das propagandas são marcantes, convidativos, positivos e por isso quase
sempre nos induzem a comprar, provar, experimentar um novo produto ou serviço e
consumir mais e mais.
O propósito deste trabalho em sala de aula com a propaganda é oferecer
aos alunos a oportunidade de refletirem sobre esse gênero textual o qual possui
marcas discursivas ideológicas de acordo com: quem fala, o que fala e para quem
fala (BAKHTIN, 1999). Por ser simples e prazeroso de se trabalhar com ele,
corremos o risco de esquecer que, como qualquer gênero, a propaganda tem
estrutura, estilo próprio, objetivo a cumprir, no caso, atrair consumidores. Dessa
forma, através do contato e da análise e compreensão desse tipo de texto, nesta
intervenção os alunos tiveram a possibilidade de perceber o que está por detrás de
uma propaganda e analisar a sua verdadeira intenção; perceber que há uma
intertextualidade entre os textos; reconhecer que, justamente por ser um meio de
venda de produtos, é um rico recurso para conhecer diversas possibilidades da
língua portuguesa e que essas estão relacionadas aos diversos sentidos, em jogo,
no que à primeira vista pode parecer um simples texto publicitário.
4. As atividades realizadas com os alunos
Promovemos a ativação do conhecimento prévio dos estudantes; a
contextualização da propaganda; o desenvolvimento de uma leitura global, por meio
de questões gerais; e, em seguida, a elaboração de um rol de questões que
proporcionassem aos alunos uma leitura com riqueza de detalhes. Desta forma, para
a ativação do conhecimento prévio, construiu-se uma abordagem sobre as
características relativas a esse gênero textual: os suportes nos quais ele geralmente
circula, características de sua apresentação com o emprego de linguagem verbal e
não-verbal e o seu papel na sociedade moderna. Em relação à leitura global,
solicitamos aos alunos que respondessem: qual era a fonte, o público-alvo, a
autoria, o provável objetivo do autor, entre outras questões.
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Propiciamos uma reflexão sobre o que eles entendiam a respeito da
propaganda.
4.1 Propagandas, placas, letreiros, bulas... etc? Vamos analisar?
Para a leitura completa e detalhada dos textos, procuramos levar os alunos
a se darem conta de que estamos constantemente expostos a diferentes gêneros de
textos, pois nosso mundo é cercado de placas, letreiros, etiquetas, cartões, bulas,
logotipos... . As propagandas fazem parte desse nosso cotidiano letrado, mas será
que sabemos “ler” o que elas dizem? Essa foi uma indagação que possibilitou a
participação dos alunos na aula. Começaram a se posicionar, interagiam com os
colegas completando a fala do outro, explicando melhor o posicionamento do
colega, momento esse que participavam trazendo os conhecimentos prévios sobre o
assunto abordado. Conforme Koch e Elias (2008, p. 39), “na atividade de leitura e
produção de sentido, colocamos em ação várias estratégias sociocognitivas. Essas
estratégias por meio das quais se realiza o processamento textual mobilizam vários
tipos de conhecimento que temos armazenado na memória”.
Desse entendimento, começamos, por meio de perguntas, a incitá-los a
fazerem inferições a respeito da propaganda (figura 1) “Garoto propaganda”,
abordado em “Leitura: uma visão crítica em relação às propagandas”, de Lazuita
Goretti de Oliveira e Eliana Dias, disponível no Portal do Professor,
<http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=10444> Acesso em 20/05/2009.
18
Fig. 1 (http://domfernando.files.wordpress.com/2009/05/garoto_propaganda15.jpg)
Algumas das questões propostas foram: há relação entre a imagem, as
propagandas coladas no corpo do bebê, o leitor e a leitura? Qual a intenção do autor
ao criar essa propaganda?
Após observarem atentamente a imagem, começaram a falar sobre o que
estavam vendo e entendendo. Foram instigados através das perguntas: O “garoto
propaganda” é fruto de que situação? Como você interpreta essa propaganda?
Estabeleça uma relação entre a propaganda e os hábitos da sociedade consumista.
Para complementarmos a discussão sobre a influência da propaganda,
apresentamos o poema “Eu, etiqueta”, de Drummond, e iniciamos um
questionamento com os alunos sobre o poema e a propaganda, levando-os a
perceberem a infinidade de propagandas com que se deparam no trajeto que fazem
desde as suas casas até a escola, e a quantidade de marcas que carregam em suas
roupas.
Explicamos aos alunos que a palavra propaganda quer dizer propagar,
multiplicar, estender, difundir. Fazer propaganda é propagar ideias, crenças,
princípios e doutrinas. Assim, podemos conceituar a propaganda como o conjunto
de técnicas e atividades de informação e persuasão destinadas a influenciar, num
determinado sentido, as opiniões, os sentimentos e as atitudes do público receptor.
(KOCH; ELIAS, 2008).
Para darmos continuidade ao desenvolvimento da nossa proposta de
intervenção pedagógica, selecionamos e levamos para a sala de aula várias
propagandas, sempre levando os alunos a perceberem que elas estão presentes no
19
nosso dia a dia e que influenciam o comportamento das pessoas. As imagens que
levamos, como por exemplo, a imagem de um carrinho de supermercado, carregado
com vários objetos dentro serviram para desencadearmos uma série de reflexões:
A análise de tal imagem foi direcionada, através de questionamentos, tais
como: O que representa esse carrinho cheio de mercadorias? Qual a importância da
imagem em uma propaganda? A propaganda influencia o leitor na compra do
produto? O leitor percebe a influência do que a propaganda quer transmitir através
da imagem? Qual a mensagem que essa propaganda pode transmitir?
Diante da finalidade da linguagem não verbal, colocada para os alunos,
procuramos mostrar que a imagem atrai a leitura. Dessa propaganda os alunos
concluíram que as imagens tendem a ser mais chamativas, impactantes e,
consequentemente, contribuem para que se atinja os objetivos propostos.
Algumas questões sobre consumismo foram levantadas pelos próprios
alunos, como por exemplo: a desordem no carrinho; produtos sem necessidade
aparente e...
Nesse aspecto, os alunos interferiram de forma relevante na condução da
atividade, posicionaram-se mostrando ganho de consciência sobre o uso da imagem
na propaganda e seu reflexo em nosso comportamento.
20
Como essa propaganda era desprovida de texto escrito, levamos outras com
linguagem verbal e não verbal, para que os alunos percebessem a presença de
alguns recursos estilísticos.
A propaganda da Maggi, retirada do arquivo de imagens do portal Dia a Dia
da Educação, tem alguns recursos voltados para a conotação, o uso de neologismos
- Sopateen; de estrangeirismos - teen; gíria - antenados, e a intertextualidade do
filme “Mascara”, como podemos observar abaixo:
Fonte: www.diaadiaeducacão.pr.gov.br
Foi solicitado aos alunos que observassem a linguagem usada e os recursos
usados como: intertextualidade, neologismo, gírias.
Os alunos não entenderam o objetivo dessa propaganda e nem a quem ela
se dirigia. Tiveram dificuldades para entender a mensagem visual, isto é, não
perceberam que ela estabelecia uma intertextualidade com o filme “O Mascara”. Isso
se justifica porque a propaganda em questão, de acordo com Koch e Elias (2008, p.
42), apresenta elementos relacionados ao filme “Mascara”, filme não conhecido
pelos alunos. Para as autoras, os alunos só teriam condições de compreender o
enunciado se esse filme fizesse parte de seus conhecimentos gerais sobre o mundo,
isto é, um conhecimento enciclopédico (KOCH e ELIAS, 2008, p. 43).
Apesar de termos apresentado outros exemplos de neologismos, os alunos
não perceberam a presença desses no texto, nesse caso, foi preciso à intervenção
da professora.
21
Assim, a propaganda da Maggi permitiu que partíssemos para o estudo do
gênero e para a elaboração de uma propaganda atendendo para o estilo e a
linguagem.
Em outro momento, para que os alunos entendessem que a propaganda
utiliza-se além da imagem, de outros recursos linguísticos, como a ambigüidade,
levamos para a sala de aula a análise da propaganda do chocolate Garoto. Nessa
publicidade, foi possível observar o uso e o jogo de palavras Garoto-
chocolate/garoto-adolescente e as diversas interpretações proporcionadas pela
propaganda. Percebemos com essa atividade que os alunos responderam
satisfatoriamente aos questionamentos proporcionados em relação à imagem, ao
objetivo e aos sentidos da palavra garoto. Demonstraram entendimento quanto à
mensagem do anúncio e ao apelo visual que visa chamar a atenção e aguçar os
sentidos do interlocutor. Os alunos lembraram-se, também, de outras propagandas,
de outros textos publicitários contemporâneos (Sempre presente Ferracini
Calçados) que costumam jogar com as palavras de forma que um mesmo vocábulo
ou uma mesma expressão remeta a mais de um sentido, como nos mostra a
ilustração abaixo.
(http://www.motoca.net. Acesso em 05/05/2010)
Os alunos relacionaram os temas trabalhados nas propagandas da Maggi e
da Garoto, ao momento e ao apelo da sociedade. “A satisfação afetiva, tanto na
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propaganda da “Maggi”, como da “Garoto”, ficou evidente para os alunos, devido
alguns comentários que fizeram, tais como: “claro que as mães vão comprar as
sopas, elas querem filhos antenados”;” hum...deve ser um menino lindo” .
Foi apresentado aos alunos outro recurso linguístico empregado pelo texto
publicitário da sopa Maggi, o uso de pronomes possessivos usado para auxiliar na
sensibilização, aproximação e seduzir o público alvo. Os recursos linguísticos
apresentam, à primeira vista, um impacto menor do que o da linguagem não verbal.
Porém, ao lermos, percebemos a harmonia do conjunto da propaganda.
O posicionamento crítico dos alunos leitores dessas propagandas os levou a
concluírem que as propagandas, que utilizam bem os recursos verbais e os recursos
não-verbais, seduzem o público alvo para que esse aceite sua mensagem e
consuma o produto.
Para Barros (2002), o emprego de uma determinada palavra para o
destinatário produz os efeitos de cumplicidade e comprometimento com o cliente, de
interesse por ele, que é dessa forma, colocado como a finalidade primeira da
propaganda. Assim, conforme Santana (1998) para que o impacto da propaganda se
concretize, todos os tipos de apelo, tendências, variações e princípios são usados
com o poder de influenciar e de orientar as percepções e os pensamentos,
conciliando o princípio do prazer à realidade, apontando o que deve ser usado ou
comprado.
Em seguida, levamos a música 3ª do Plural para a sala de aula para mostrar
aos alunos à importância de se entender a mensagem do texto. O texto tem como
tema a alienação que a mídia tenta colocar nas pessoas. Através de perguntas
como: Qual é o tema principal dessa música? A quem se refere “3ª Pessoa do
Plural”? Essa terminologia é usada para descrever que classe gramatical? Quem
são “eles”? O que você entende por “eles querem nos comprar” e como “eles” fazem
isso? Como você explica o jogo das palavras “eles querem te vender, eles querem te
comprar”? “Querem te sedar”. De que forma “eles” fazem isso? Há no texto alguma
relação entre “sede”, “sedar” e “cerveja”? “Não querem nos deixar pensar”. Essa
ideia está presente em todo o texto? Como e onde ela se manifesta?
Essa atividade levou mais tempo do que o esperado, pois os alunos
sugeriram diversas respostas para a pergunta sobre quem seria “essa 3.ª Pessoa do
Plural”. Houve debates entre os alunos sobre o universo representado pelo mundo
da publicidade e do consumo.
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Marcuschi (2008, p. 167) afirma que a:
A publicidade opera de maneira particularmente produtiva na subversão da ordem instituída para chamar a atenção sobre um produto. Parece que desenquadrar o produto de seu enquadre normal é uma forma de reenquadrá-lo em novo enfoque para que vejamos de forma mais nítida no mar de ofertas de produtos. (MARCUSCHI, 2008, p. 167).
Com esta intervenção percebemos a importância de um trabalho em sala de
aula através de uma proposta de leitura que possibilite aos alunos atividades de
leitura dessa natureza, que orientam o leitor a perceber detalhes que no dia a dia
passam despercebidos.
Na continuidade intercalamos entre uma atividade e outra vídeos de curta
duração sobre propaganda e a influência da mídia, retirados do portal Dia a Dia
Educação - “A didatura da beleza”; “Ler devia ser proibido”, baseado no texto de
Guiomar de Grammon; “LER”, do escritor Luis Fernando Veríssimo - com o intuito de
estimular os alunos à leitura. Esses vídeos se encontram disponíveis no portal
WWW.diaadiaeducacao.pr.gov.br.
Após os alunos terem assistido aos vídeos, passamos a indagá-los: Qual
a temática explorada em cada um dos vídeos? A quem cada um dos vídeos se
dirige? Segundo o vídeo “A didatura da beleza”, o que induz os jovens a se
submeterem à ditadura da beleza? Para você com que objetivo geralmente as
propagandas são produzidas? De quais recursos as propagandas se utilizaram para
chamar a atenção do jovem consumidor? Gostaram do vídeo? Por quê? Você é
influenciado pela propaganda? Por que ler é importante? Você concorda com o
exposto no vídeo “Ler devia ser proibido”? Para você o que a leitura proporciona ao
leitor? Aproveitamos o vídeo “Ler devia ser proibido”, baseado no texto Guiomar de
Grammon para explorar os efeitos de ironia e de negação neles presentes.
Outra forma de trabalharmos com a compreensão dos textos foi por meio da
escrita. Orientamos os alunos para que escrevessem sobre o que diferencia o texto
publicitário de outros textos. Nessa atividade os alunos demonstraram o que
aprenderam sobre reconhecimento da linguagem e dos recursos usados em um
texto publicitário.
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Interferimos explicando que o texto publicitário se utiliza de recursos como: a
intertextualidade, personificação, pronomes de tratamento da segunda pessoa,
vocativo, imperativo.
Segundo Marcuschi (2002, p. 19), o gênero do discurso tem contribuído para
a ordenação das atividades comunicativas por ser uma entidade sócio-discursiva
incontornável em qualquer situação comunicativa, além de contribuir para “o poder
interpretativo das ações humanas em qualquer contexto discursivo”, ou seja, o
gênero se adapta a cada contexto situacional com um “propósito específico e segue
padrões linguísticos e culturais de uma comunidade discursiva” (OLIVEIRA, 1997,
23). Foi isso, portanto, que procuramos levar os alunos a perceberem em relação ao
funcionamento da propaganda.
5 Considerações finais
Neste trabalho a intenção foi trabalhar com a propaganda enquanto gênero
textual presente no cotidiano dos alunos. Podemos considerar que esta proposta de
intervenção pedagógica atingiu seu objetivo principal que era levar aos alunos à
compreensão da propaganda como um gênero textual que tem características
composicionais, de tema e estilo específicas e que é carregado de discursos
ideológicos, a qual visa essencialmente persuadir o leitor a comprar um produto ou
marca, mas também visões de mundo e estilos de vida.
Como resultados desta intervenção, podemos dizer que os alunos
demonstraram-se mais críticos em relação aos textos propostos, autônomos e
interessados em ler com mais atenção.
Consideramos que a nossa participação em um programa como esse –
PDE- Programa de Desenvolvimento de Educação foi de extrema importância para a
nossa formação continuada. Essa formação tão necessária a todos que prezam por
uma educação de qualidade foi rica e gratificante por proporcionar aos professores
da rede pública estadual do Paraná, à volta como aluno das universidades de forma
presencial. Esse contato direto com os professores das academias só pode ser
possível pelo afastamento da sala de aula.
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Podemos, assim, dizer que, ao concluirmos os estudos promovidos pelo
PDE, a nossa prática em sala de aula já não será mais a mesma, visto que nos foi
propiciado estarmos em contato com a teoria aliada à prática.
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O TEXTO PUBLICITÁRIO EM SALA DE AULA: UMA PROPOSTA DE LEITURA EANÁLISE DO SEU DISCURSO. Urbano Cavalcante da Silva Filho. UniversidadeEstadual de Santa Cruz (UESC) – BA. [email protected]