Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Livro do curso Ecologia da Floresta Amazônica 2011 Foto: Lucas Navarro Paolucci

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Livro do curso de campo ecologia da amazônia do ano de 2011

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Livro do curso

Ecologia da Floresta Amazônica 2011

Foto: Lucas Navarro Paolucci

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Coordenadores e monitores

José Luiz Campana Camargo

Paulo Estefano Dineli Bobrowiec

Paulo Enrique Cardoso Peixoto

Manoela Borges

Laura Leal

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Índice

Floresta fragmentada - Dimona

Projetos orientados

Eficiência de forrageio de formigas é afetada pela complexidade de habitat?

Carla Madelaire, Fernanda de Oliveira, Lucas Paolucci e Rodrigo Zucaratto........................................................................................9

Hemíptero especialista em Maieta spp. (Melastomatacea): a associação com formigas

explicaria essa exclusividade?

Talita C. dos S. Bezerra, Maria Laura F. Ternes, Thiago B. d’A. Couto e Daniele B. C. Puída.........................................................17

O recrutamento de plântulas em um fragmento é afetado pela presença de floresta

secundária em seu entorno?

Camilla P. Pagotto, Daniel I. de S. Dainezi, Guilherme H. A. Pereira e Inácio J. de M. T. Gomes....................................................23

A presença de um consumidor no recurso diminui a ocorrência de outros visitantes?

Mauro B. Monteiro-Junior, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes e Karla M. Campião................................................................30

Efeito de borda no teor de água foliar e sua influência na herbivoria

Raul C. Pereira, Fernando M. Resende, Franciele P. Peixoto e João Paulo C. de Menezes.................................................................36

Projetos livres

O nível de dano foliar por herbívoros e patógenos em Heliconia acuminata é

dependente do tamanho das plantas?

Thiago B. d’Araújo, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião e Raul C. Pereira.................................................42

Pteridófitas inibem o recrutamento de plântulas lenhosas em florestas secundárias

Lucas N. Paolucci, Daniel I. de S. Dainezi, Fernanda M. P. de Oliveira e Inácio J. M. T. Gomes......................................................43

Variação da riqueza de fungos numa floresta com diferentes gradientes sucessionais

Franciele P. Peixoto, Daniele B. C. Puida, Camilla P. Pagotto e Carla Madelaire...............................................................................44

Existe relação entre umidade do ambiente e distribuição de briófitas em forófitos?

Guilherme H. A. Pereira, João P. C. de Menezes, Maria L. Ternes e Rodrigo Zucaratto....................................................................45

Fragmentos florestais são fontes de espécies vegetais para as áreas de floresta

secundária do seu entorno?

Fernando Resende, Talita Câmara e Mauro Brum................................................................................................................................46

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Várzea – Catalão

Projetos orientados

Ir mais longe é garantia de persistir? Hipótese de Janzen-Connell testada em diferentes

locais de áreas alagadas

Daniele Cury, Camilla Pagotto, Franciele P. Peixoto, Lucas Paolucci e Raul C. Pereira....................................................................47

A correnteza pode afetar a diversidade beta de herbáceas entre bancos de macrófitas?

Karla M.Campião, Fernanda de Oliveira, João P. C. de Menezes, Mauro Brum e Rodrigo Zucaratto................................................55

De ladinho não é melhor: a proximidade entre árvores de munguba não aumenta o

sucesso de polinização

Ana Y. Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Daniel I. S. Dainezi, Fernando M. Resende e Inácio J. M. T. Gomes....................................62

O forrageio de vespas é influenciado pela produtividade de ambientes aquáticos?

Gregórios dos R. Menezes, Guilherme H. Pereira, Maria Laura F. Ternes, Talita C. dos S. Bezerra e Thiago B. d’A. Couto...........69

Projetos livres

O modelo de biogeografia de ilhas se aplica à comunidade de macroinvertebrados em

bancos de macrófitas?

Lucas N. Paolucci, Ana Y.Y. Meiga, Fernando M. Resende, Talita C. dos S. Bezerra e Thiago B. d’A. Couto.................................74

Relação entre disponibilidade de nutrientes e investimento heterotrófico da planta

carnívora Utricularia foliosa

Inácio J. M. T. Gomes, Camilla P. Pagotto, Carla B. Madelaire, Franciele P. Peixoto e Guilherme H. Pereira..................................75

A seleção do local de forrageio de Jacana jacana (Aves: Jacanidae) está relacionada à

riqueza de macrófitas?

Maria Laura Ternes, Daniel Dainezi, Daniele Cury, Gregório Menezes e Mauro Brum.....................................................................76

Os maiores não são mais sexies: fêmeas de Acanthagrion sp. não selecionam machos

maiores

Fernanda M. de Oliveira, João P. C. de Menezes, Karla M. Campião, Raul C. Pereira e Rodrigo Zucaratto.....................................77

Igapó – Anavilhanas

Projetos orientados

Os menores chegam primeiro em copas recém-emergidas colonizadas por aranhas?

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João P. C. de Menezes, Fernanda de Oliveira, Karla M. Campião, Mauro Brum e Rodrigo Zucaratto...............................................78

Rota de colisão ou de fuga: o que estrutura atributos foliares de árvores de florestas

inundáveis?

Daniel I.S. Dainezi, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Fernando M. Resende e Inácio J. M.T. Gomes.......................................85

Os últimos serão os primeiros? A colonização de ilhas formadas por copas de árvores

em sistemas inundáveis ocorre de maneira aleatória

Thiago B. d’A. Couto, Gregório R. Menezes, Guilherme H. A. Pereira, Maria L. Ternes e Talita Câmara........................................91

Seleção sexual na quela de machos do camarão Macrobrachium cf. amazonicum :

tamanho é documento?

Franciele P. Peixoto, Daniele Cury, Camilla Pagotto, Lucas Paolucci e Raul C. Pereira..................................................................100

Floresta contínua – Km41

Projetos orientados

Se a comida morde, eu fujo: resposta das aranhas a presas de diferentes níveis de

periculosidade

Camilla Pagotto, Daniele Cury, Daniel Dainezi, Fernanda de Oliveira e Gregório dos Reis Menezes.............................................106

Apertado, mas nem tanto: rugosidade do ambiente não influencia no tamanho de

formigas e dominância

Talita C. dos S. Bezerra, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Mauro Brum Monteiro-Junior e Raul C. Pereira..........................113

Formigas em ilhas de néctar: tamanho e isolamento importam?

Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. M. T. Gomes, Maria L. Ternes, Karla M. Campião e Rodrigo Zucaratto..................................119

A grama do vizinho é mais verde: a proximidade entre ninhos determina a composição

de plantas epífitas em jardins de formigas

João P. C. Menezes, Fernando M. Resende, Franciele Parreira, Lucas N. Paolucci e Thiago B. d’A. Couto...................................126

Projetos individuais

Formigas cortadeiras não alteram o recrutamento de plantas ao redor do ninho em uma

área de vegetação secundária na Amazônia Central

Ana Yoko Ykeuti Meiga...................................................................................................................................................................135

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Teias com maior quantidade de recurso podem fazer com que aranhas evitem fugir

quando são ameaçadas por um estímulo do predador?

Camilla Pagotto.................................................................................................................................................................................145

Preto no branco: Por que camarões (Crustacea) de água doce apresentam diferentes

colorações?

Carla Bonetti Madelaire.....................................................................................................................................................................153

Aranhas “vermelhas” se agrupam para comer mais?

Daniel Irineu de Souza Dainezi..........................................................................................................................................................162

Quem são, quantos são e quanto se parecem: composição, riqueza e similaridade da

assembléia de formigas em clareiras e mata primária em uma floresta de terra firme na

Amazônia Central

Daniele Bilate Cury Puida..................................................................................................................................................................168

Efeito do tipo de nectário extrafloral sobre a riqueza e composição de espécies de

formigas visitantes

Fernanda Maria Pereira de Oliveira...................................................................................................................................................181

Bordas florestais alteram o porte e a estratégia de crescimento de lianas?

Fernando M. Resende.........................................................................................................................................................................190

Pernas longas para que te quero? Pulso de inundação de riachos de pequena ordem não

determina a estrutura morfológica da comunidade de formigas

Franciele Parreira Peixoto..................................................................................................................................................................199

A presença de dossel desconectado em uma estrada é limitante para a movimentação de

Glyphorynchus spirurus (Passeriformes, Dendrocolaptidae)?

Gregório dos Reis Menezes................................................................................................................................................................208

Quem tem fome tem pressa? O dano a epífitas em jardins de formigas reduz o tempo de

remoção de herbívoros em potencial

Guilherme Henrique Almeida Pereira................................................................................................................................................215

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Quanto mais, melhor: aranhas ajudam a reduzir a herbivoria em Tococa bullifera

(Melastomataceae)

Inácio José de Melo Teles e Gomes...................................................................................................................................................225

A aranha associada à Tococa bulifera é protegida pelas formigas?

João Paulo Cunha de Menezes...........................................................................................................................................................236

Heróis, figurantes e vilões: como o recrutamento das formigas e a presença de

homópteros afetam a defesa contra herbívoros?

Karla M. Campião..............................................................................................................................................................................245

A serrapilheira atua como um filtro para formigas dispersoras de sementes?

Lucas Navarro Paolucci.....................................................................................................................................................................252

Conexões ocultas: associação entre aranhas e formigas em arbustos de Tococa bullifera

(Melastomataceae)

Maria Laura Fontelles Ternes............................................................................................................................................................259

Plantas herbáceas e ambientes heterogêneos: há lugar para a variação funcional?

Mauro Brum Monteiro Junior............................................................................................................................................................270

Porque abelhas selecionam substrato para coletar argila?

Raul Costa Pereira..............................................................................................................................................................................280

Se for pequeno ou grande eu pego, mas se balança muito eu fujo: comportamento de

forrageio em uma espécie de aranha em resposta ao custo de aquisição e ao nível de

ameaça da presa

Rodrigo Zucaratto..............................................................................................................................................................................291

Associação de formigas e da planta Palicourea corymbifera Müller Arg (Rubiaceae):

qual o efeito das formigas nas inflorescências?

Talita Câmara.....................................................................................................................................................................................301

O que determina a escolha de locais de caça por aranhas pescadoras (Trechaleidae)?

Thiago Belisário d’Araújo Couto.......................................................................................................................................................312

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Dimona – projetos orientados

Eficiência de forrageio de formigas é afetada pela complexidade de habitat?

Carla Madelaire, Fernanda de Oliveira, Lucas Paolucci, Rodrigo Zucaratto

Introdução

O número de espécies presentes nos ambientes pode ser determinado pela capacidade do

habitat em fornecer recursos e condições ambientais favoráveis para que as espécies se

estabeleçam (Detrain & Deneubourg 2009). Variações na quantidade de recursos

disponíveis em um habitat podem ser causadas por uma série de fatores, dentre os quais

podemos destacar a estrutura do habitat. Ambientes estruturalmente mais complexos

provêem uma maior diversidade de nichos e conseqüentemente uma maior diversidade

de recursos (Begon et al. 2006). Como conseqüência, estes habitats conseguem abrigar

maior número de espécies que possuem estratégias distintas de uso dos recursos.

De maneira geral, os organismos utilizam recursos do habitat procurando

maximizar seu ganho energético líquido. Para isso, eles utilizam diversas estratégias de

forrageamento, levando em consideração a relação entre o custo e o benefício na

obtenção de recursos (Stephens 2007). Quando um habitat possui baixa disponibilidade

de recursos alimentares, indivíduos devem investir em estratégias que maximizem o

ganho energético e reduzam os gastos envolvidos na captura do alimento. Nesses

ambientes, indivíduos competem pelos recursos disponíveis e as espécies que exploram

os recursos de forma mais eficiente devem ser favorecidas.

Diferentes estratégias de forrageamento são adotadas pelas formigas para

maximizar a sua eficiência na busca por recursos (Adams 2001). Essas estratégias

podem variar em função do recurso alimentar utilizado, sendo determinadas

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principalmente pela disponibilidade e qualidade do recurso (Blüthgen 2000). Em locais

onde a disponibilidade de recursos é baixa, formigas devem adotar estratégias que

aumentem sua eficiência no encontro e remoção dos recursos para as colônias. Nesses

locais, formigas que recrutem um grande número de operárias e dominem os recursos de

forma a torná-los indisponíveis a outras espécies de formigas podem ser favorecidas.

Nosso objetivo é investigar como a estrutura do habitat pode afetar o

comportamento de forrageio de formigas em uma floresta de terra firme na Amazônia

Central. Nossa hipótese é que a eficiência de forrageio de formigas será maior em

ambientes menos complexos estruturalmente.

Métodos

Área de estudo

Desenvolvemos este estudo na Fazenda Dimona (2º 20’S/60º 06’O), pertencente ao

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais. A área é composta por floresta de

terra firme, com fragmentos florestais circundados por floresta secundária de diferentes

idades de regeneração. Utilizamos duas áreas de floresta secundária com 10 e 20 anos

de idade, que sofreram queimadas antes do início do processo de regeneração.

Consideramos a área de floresta secundária de 20 anos o habitat mais complexo

estruturalmente e a de 10 anos o menos complexo. Dessa forma, esperamos que (i) o

recurso seja encontrado mais rapidamente e (ii) que haja maior dominância numérica de

formigas nas iscas localizadas em áreas com 10 anos de regeneração.

Coleta de dados

Utilizamos um transecto de 100 m e a cada 10 m colocamos iscas compostas por

ovo, goiabada e farinha, colocadas sobre um papel filtro na serrapilheira.

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Cronometramos os segundos decorridos entre o momento em que colocamos a isca e o

momento em que a primeira formiga a encontrou, a fim de investigar o tempo de

encontro das iscas pelas formigas. Consideramos o encontro como o contato da formiga

com a isca. Estabelecemos 15 min como tempo máximo de observação para cada isca,

de maneira que o tempo de encontro poderia variar de 0 a 15 min. Após 30 minutos

recolhemos todas as iscas em sacos plásticos individualizados.

Separamos as formigas coletadas em morfoespécies e as identificamos até o

nível de gênero quando possível. Utilizamos o compartilhamento da isca pelas espécies

como indicadores de dominância, número de espécies por isca, a abundância relativa

(número de indivíduos por número de espécies) de formigas em cada isca.

Consideramos iscas compartilhadas aquelas que apresentaram mais de uma espécie de

formiga utilizando o recurso.

Análises estatísticas

Para testar se havia diferença entre o tempo de encontro das iscas pelas

formigas,o número de espécies e a abundância relativa de formigas nas iscas nos dois

ambientes, utilizamos o teste t de Student. Utilizamos o teste qui-quadrado para analisar

se existem diferenças no compartilhamento das iscas entre os dois tipos de hábitat.

Excluímos da análise as iscas que não foram encontradas pelas formigas dentro dos 15

min de observação já que o tempo de encontro poderia variar muito além do tempo

estabelecido.

Resultados

Observamos 13 morfoespécies de formigas nos dois locais amostrados.

Encontramos seis espécies exclusivas na capoeira de 10 anos e quatro espécies

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exclusivas na capoeira de 20 anos. Apenas três morfoespécies co-ocoreram em ambos

os habitats, sendo elas Crematogaster sp1, Crematogaster sp 2 e Pheidole sp1 (Tabela

1).

Tabela 1. Composição da comunidade de formigas que visitaram iscas nas florestas

secundárias com 10 e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.

Tempo de regeneração da Floresta Secundária (Anos) Taxa

10 20

Acromyrmex sp1 X

Crematogaster sp1 X X

Crematogaster sp2 X X

Camponotus sp1 X

Camponotus sp2 X

Ectatomma sp1 X

Brachymyrmex sp1 X

Solenopsis sp1 X

Pheidole sp1 X X

Pheidole sp2 X

Não identificada 1 X

Não identificada 2 X

Não identificada 3 X

Não encontramos diferença no tempo de encontro das iscas pelas formigas entre

os dois ambientes (t = 0,29; gl = 12; p = 0,78). O tempo de encontro médio foi de 193 ±

126 s na capoeira com menor complexidade e de 174 ± 104 s na capoeira com maior

complexidade estrutural (Figura 1). Não encontramos diferenças na dominância das

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13

iscas pelas formigas,no número de espécies (t = -0,36; gl = 18; p = 0,72) (Figura 2), na

abundância relativa (t = -1,50; gl = 18; p = 0,15) (Figura 3) e nem no compartilhamento

da isca (χ2= 0,22; gl = 1; p = 0,64).

Idade de regeneração

Tem

po d

e en

cont

ro (

s)

0

100

200

300

400

500

10 anos 20 anos

Figura 1. Tempo médio de encontro das iscas pelas formigas em área de floresta

secundária com 10 e 20 anos de regeneração, Amazônia Central.

Idade de regeneração

Núm

ero

de e

spéc

ies

de f

orm

igas

0

1

2

3

4

5

6

10 anos 20 anos

Figura 2. Número médio de espécies de formigas em área de floresta secundária com 10

e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.

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Idade de regeneração

Abu

ndân

cia

rela

tiva

0

10

20

30

40

50

60

10 anos 20 anos

Figura 3. Abundância relativa média de formigas em área de floresta secundária com 10

e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.

Discussão

A semelhança no tempo de encontro entre as áreas mostra que as formigas tem a mesma

habilidade de encontrar recursos em habitats com estruturas diferentes. O padrão de

dominância similar entre os ambientes reforça a possibilidade de que os recursos são

encontrados com a mesma eficiência em habitats distintos.

A composição de espécies de formigas das florestas secundárias de 10 e 20 anos

de regeneração foi diferente. Além disso, as espécies presentes nos dois tipos de habitat

podem utilizar os recursos de maneira similar. Nesse caso, não é possível afirmar se

houve ajuste comportamental das espécies de formigas que visitaram as iscas.

Diferentes espécies de formigas podem explorar o ambiente de formas similares

(Phillpott et al. 2010). Com base nessas similaridades, foram propostas diferentes

classificações de espécies de formigas baseadas em grupos funcionais. Um dos

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parâmetros utilizados para tais classificações é o hábito alimentar (Andersen 1995;

Brandão et al. 2009) Portanto, é razoável supor que espécies de formigas que pertençam

ao mesmo grupo funcional ajustem seu comportamento de forrageio de forma similar

em habitats com diferentes estruturas. Sendo assim, características inerentes à espécie

ou grupo funcional de formigas podem ser mais importantes do que as do habitat na

determinação da habilidade de encontro do recurso e sua dominância.

Como as áreas amostradas são de florestas em regeneração e sofreram o mesmo

distúrbio, uma recolonização dos dois locais por grupos funcionais similares pode ter

ocorrido. Das 13 espécies encontradas no nosso estudo, nove delas são consideradas

generalistas (Brandão et al. 2009). Estas espécies exploram e dominam recursos

independentemente da concentração ou distribuição destes no espaço (Philpott et al.

2010). Por isso, espécies de formigas generalistas localizadas nos dois tipos de habitats

estudados possuíram a mesma eficiência no uso dos recursos alimentares.

As formigas desempenham funções chave nos ecossistemas tais como dispersão

de sementes e quebra de matéria orgânica. Ambientes em regeneração são mais

dependentes de funções exercidas por colonizadores iniciais, tais como as formigas.

Portanto, os papéis ecológicos exercidos por esses organismos podem ser semelhantes

em ambientes com diferentes idades de regeneração.

Agradecimentos

Agradecemos ao PDBFF pela oportunidade de participar do EFA, assim como aos

coordenadores, professores, monitores e colegas do curso. Em especial agradecemos à

monitora Laura e ao Professor Lorenzo, pelas valiosas dicas e paciência na revisão.

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Referências

Adams, E.S. 2001. Approaches to the study of territory size and shape. Annual Review

of Ecology and Systematics, 32:277-303.

Andersen, A.N. 1995. A classification of Australian communities based on functional

groups which parallel plant life-forms in relation to stress and disturbance.

Journal of Biogeography 22: 15-29.

Begon, M., C.R. Townsend & J.L. Harper, J.L. 2006. Ecology: from individual to

ecosystems. Oxford: Blackwell Publishing.

Blütgen, N. M., W. Verhaagh, W. Goitía, K. Jaffé, W. Morawetz & W. Barthlott.

2000. How plants shape the ant community in the Amazonian rainforest canopy:

the key role of extrafloral nectarines and homopteran honeydew. Oecologia

125:229-240.

Brandão, C.R., R.R. Silva & J.H.C. Delabie. 2009. Formigas (Hymenoptera). In:

Bioecologia e nutrição de insetos: Base para o manejo integrado de pragas. (A.R.

Panizzi & J.R.P. Parra, eds.). Brasília, DF: Embrapa.

Detrain, C. & J. Deneuborg. 2009. Social cues and adaptative foraging strategies in

ants, pp. 29-52. In: Food explotation by social insects, Ecological, Behavioral, and

Theoretical Approaches (T.A. Miller ed.). Taylor & Francis Group: CRC Press.

Phillpott, S.M., I. Perfecto & C.L. Parr. 2010. Ant diversity and function in disturbed

and changin habitats, pp. 137-156. In: Ant ecology. (L. Lach., C. Parr & K.

Abbott eds.) Oxford, UK: Oxford University Press.

Stephens, D.W. 2007. Foraging: Behavior and Ecology. (D.W. Stephens, J.S. Brown,

& R.C. Ydenberg eds.). Chicago & London:The University of Chicago Press.

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Hemíptero especialista em Maieta spp. (Melastomatacea): a associação com

formigas explicaria essa exclusividade?

Talita C. dos S. Bezerra, Maria Laura F. Ternes, Thiago B. d’A. Couto, Daniele B. C.

Puida

Introdução

O padrão de seleção dos organismos por hábitats favoráveis depende de diversos fatores

que envolvem disponibilidade de recursos, condições específicas e a presença de

competidores e predadores (Scott 2005). A presença de predadores e a disponibilidade

de recursos podem ser particularmente determinantes para o estabelecimento de presas

em certas áreas (Wooster & Sih 1995). Em locais com elevada pressão de predação e

pouca disponibilidade de recursos alimentares, os organismos podem restringir a sua

distribuição a habitats específicos que reduzam os efeitos negativos dessas pressões

(Ricklefs & Schluter 1993).

Quando os efeitos negativos das pressões de predação e alimentação variam no

mesmo hábitat, os indivíduos não deveriam ser encontrados em nenhum local particular.

No entanto, existem situações nas quais habitats específicos consistentemente

apresentam menor pressão de predação e/ou maior disponibilidade de alimento (e.g.

Vasconcelos 1991, Schoonhoven et al. 2005). Nesse caso, os organismos deveriam ser

encontrados recorrentemente no mesmo tipo de hábitat, o que poderia levar a padrões de

ocorrência exclusiva dos organismos em determinados locais.

Plantas do gênero Maieta apresentam uma interação mutualística obrigatória

com a formiga Pheidole minutula (Vasconcelos 1991). Em algumas de suas folhas essa

planta possui estruturas ocas que fornecem sítios de nidificação e abrigo para as

formigas, conhecidas como domáceas (Hölldobler & Wilson 1990). As formigas

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normalmente atacam e predam insetos que pousem sobre a planta, patrulhando com

maior freqüência as folhas com domácea. Além disso, as formigas respondem a danos

causados na planta, ao aumentar o recrutamento nas folhas e evitar eventuais danos a

mesma. Entretanto, além das formigas, indivíduos de Maieta spp. são ocupados por um

hemíptero predador da família Reduviidae, que ocorre restrito a essa planta (Osses

2008). Apesar das formigas não atacarem o hemíptero, não se sabe por que ele ocorre

exclusivamente em Maieta spp. Nesse sentido, nos propomos a avaliar os motivos que

podem explicar essa exclusividade. Nossas hipóteses são i) o hemíptero é defendido

indiretamente contra inimigos naturais devido à presença das formigas mirmecófilas ou

ii) o hemíptero é predador das formigas mirmecófilas. Caso alguma das hipóteses que

postulam a existência de interação do hemíptero com formigas seja verdadeira,

esperamos que haja ocorrência preferencial do hemíptero em folhas com domáceas. Se a

hipótese i for verdadeira, esperamos uma maior freqüência de ocorrência do hemíptero

nas folhas com domáceas. Se a hipótese ii for verdadeira, esperamos que as formigas

interpretem a presença do hemíptero como ameaça e apresentem um tempo de resposta

maior a danos provocados nas folhas onde ele ocorre quando comparado com folhas

onde o hemíptero está ausente.

Métodos

Desenvolvemos o estudo na Fazenda Dimona, localizada a 80 km de Manaus (2º20’ S -

60º06’ O), Amazônia Central. Para avaliar se os hemípteros preferem se estabelecer em

folhas com formigas, nós realizamos buscas ativas da presença do hemíptero em 25

indivíduos de Maieta spp. Em cada planta, registramos a folha em que o hemíptero

estava presente e se nessa folha havia a presença de domáceas. Medimos o comprimento

(C) e a largura (L) das folhas analisadas e utilizamos a fórmula da área de uma elipse

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( ) para determinar a área foliar. Calculamos a área foliar de todas as plantas

avaliadas e a dividimos na proporção de área de folhas com domáceas e folhas sem

domáceas. Utilizamos essa proporção para calcular a probabilidade esperada de

ocupação por hemípteros na ausência de seleção de hábitat. Posteriormente, nós

comparamos as proporções observadas e esperadas da freqüência de ocorrência dos

hemípteros em folhas com e sem domáceas.

Para investigar se os hemípteros são predadores potenciais das formigas

mirmecófilas, nós escolhemos folhas com domáceas com e sem hemípteros em cada

planta. Para cada folha escolhida, provocamos um dano mecânico (corte triangular a 2

cm da domácea) e registramos o tempo de reação das formigas ao dano. Consideramos

como tempo de reação o tempo entre a formiga encostar no corte e a saída da próxima

formiga após a primeira ter entrado na domácea. Como diferenças de idade das folhas

podem influenciar na intensidade da reação das formigas (Fiala et al 1989), escolhemos

folhas em posições semelhantes de ramos vizinhos, contadas a partir do ápice, como

representantes de folhas sem hemípteros. Utilizamos o teste t pareado para comparar o

tempo de reação das formigas entre as folhas com e sem os hemípteros.

Resultados

A freqüência de ocorrência de hemípteros em folhas com domáceas foi de 84% e em

folhas sem domáceas 16%. Esse padrão foi muito semelhante a proporção de área foliar.

Folhas com domáceas representaram 86,4% da área foliar total e folhas sem domáceas

13,5%. Portanto, não houve ocorrência preferencial do hemíptero em folhas com

domáceas. Quanto ao tempo de reação, as formigas apresentaram tempos semelhantes

em folhas com e sem o hemíptero (t = 0,74; gl = 19; p = 0,23; Figura 1).

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Figura 1. Tempo de reação (s) das formigas da espécie Pheidole minutula ao dano

provocado na folha de Maieta spp. em relação à ocorrência do hemíptero. Linhas

conectam pares de folhas com e sem o hemíptero na mesma planta.

Discussão

O fato dos hemípteros não ocorrerem com maior freqüência em folhas com domáceas

indica que a sua presença em Maieta sp. não é ocasionada pela associação com Pheidole

minutula. Essas formigas possivelmente não atuam como protetoras ou como presas dos

hemípteros, mesmo quando ambos os indivíduos compartilham a mesma região da

folha. Portanto, a ocorrência dos hemípteros em Maieta spp. pode ser uma relação

determinada pelas características da planta e não pela associação com as formigas.

Colpas e colaboradores (2004) sugeriram que a distribuição do hemíptero

restrita a Maieta está relacionada com a presença de tricomas na folha e não diretamente

com as formigas. Porém, como outras espécies de plantas da Amazônia Central também

possuem tricomas, a simples presença dessas estruturas não explica o padrão de

ocorrência do hemíptero. Para complementar, sugerimos que a grande quantidade de

tricomas pode selecionar herbívoros específicos capazes de consumir Maieta spp.

Consequentemente, esses hemípteros podem ocorrer em Maieta por apresentarem uma

Page 21: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

21

dieta especializada em herbívoros específicos dessa planta (e.g. Postali 2007). Outra

possibilidade para a especialização do hemíptero seria a escolha seletiva do sítio de

reprodução. A presença de tricomas nas folhas, ou até mesmo a presença das formigas,

pode auxiliar na proteção dos ovos contra possíveis predadores (e.g. Santos 2007).

Agradecimentos

Agradecemos a toda a equipe do PDBFF pela oportunidade do curso. Ao Prof. Paulo

Enrique pela orientação e sugestões para o desenvolvimento do trabalho. Aos colegas de

curso e professores.

Referências

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ecosystems. Oxford: Blackwell Publishing Inc.

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Machado, eds). Manaus:PDBFF/INPA.

Postali, T. C. 2007. Lobo em pele de cordeiro: um teste de eficiência da formiga

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Page 23: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

23

O recrutamento de plântulas em um fragmento é afetado pela presença de floresta

secundária em seu entorno?

Camilla P. Pagotto, Daniel I. de S. Dainezi, Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. de M. T.

Gomes

Introdução

Uma das principais consequências da fragmentação florestal é o surgimento de bordas.

Bordas são zonas de transição abruptas entre o fragmento florestal e o seu entorno. As

diferenças entre essas duas áreas fazem com que vários efeitos bióticos e abióticos

associados ao contato entre esses habitats adentrem para o interior do fragmento. Esse

processo é chamado de efeito de borda (Williamson & Laurance 2000).

Dentre as modificações ocorridas das bordas florestais em direção ao interior do

fragmento estão a diminuição da umidade, aumento da temperatura e luminosidade,

maior quantidade de serapilheira, invasão de espécies generalistas e maiores taxas de

predação de sementes (Harper et al. 2005, Laurance & Vasconcelos 2009). O efeito de

borda pode ter papel decisivo no desaparecimento de grandes árvores (Melo et al.

2006). Como consequência, há uma diminuição no recrutamento de plântulas quando

comparada ao interior do fragmento e a áreas de mata contínua (Benítez-Malvido 1998,

Nascimento et al. 2006, Melo et al. 2007).

Apesar dos prejuízos causados pelo efeito de borda para o fragmento, é possível

que a intensidade deles dependa da estrutura da vegetação que circunda os fragmentos

(e.g. Nascimento et al. 2006, Benítez-Malvido 1998). Por exemplo, áreas de entorno em

regeneração podem atenuar os fatores abióticos associados ao efeito de borda

aumentando a umidade e reduzindo a temperatura, a incidência luminosa (Camargo &

Kapos 1995, Didham & Lawton 1999) e a mortalidade de árvores (Mesquita et al. 1999,

Page 24: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

24

Gascon et al. 2000). Portanto, seria razoável esperar que uma floresta em regeneração

também facilitasse o estabelecimento de plântulas na borda florestal, especialmente

quando a área de entorno tiver em um estágio avançado de regeneração.

Nosso objetivo foi avaliar como o entorno composto por floresta secundaria afeta

o recrutamento de plântulas em um fragmento florestal. Nossa hipótese é que o

recrutamento de plântulas em fragmentos não é prejudicado quando eles estão

circundados por florestas secundárias. Nossa previsão é que a riqueza e a abundância de

plântulas não mudam em relação à distância da borda.

Métodos

Nós conduzimos o estudo em uma área de terra firme na Fazenda Dimona (2o 20’S e 60o

60’O), localizada a 80 km ao norte da cidade de Manaus, AM. De acordo com a

classificação de Köppen (Peel et al. 2007), o clima da região é do tipo tropical úmido,

com temperatura média de 26,7 °C e precipitação anual de 2600 mm (Bierregaard et al.

2001).

Na Fazenda Dimona, existem fragmentos de floresta amazônica primária de 1, 10

e 100 ha submetidos a efeitos de borda com diferentes intensidades. Para testar a

previsão de que a riqueza e a abundância de plântulas não mudam em relação a

distância da borda circundada por floresta secundária, selecionamos o fragmento de 100

ha circundado por um mata em regeneração há 10 anos. Decidimos usar o maior

fragmento, pois em fragmentos grandes a redução do efeito de borda em direção ao

interior é mais facilmente detectada.

No fragmento, delimitamos três transectos de aproximadamente 100 m cada,

distantes pelo menos 30 m um do outro. Em cada transecto, estabelecemos uma parcela

de 1 m² a cada 5 m a partir da borda do fragmento (n=51). No entanto, não

Page 25: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

25

delimitávamos a parcela quando ela coincidia com um local inacessível para coleta de

plântulas. Posicionamos os transectos a 0, 2 e 5 m de distância da borda (Figura 1). Em

cada parcela, quantificamos a abundância e o número de morfotipos de plântulas

arbóreas e palmeiras com até 50 cm de altura. Avaliamos o efeito da riqueza e

abundância de plântulas sobre a distância da borda do fragmento utilizando análise de

covariância. Consideramos os transectos como blocos.

Figura 1. Fragmento de 100 ha (em branco) circundado por floresta secundária (em

cinza). As barras representam os três transectos. O detalhe à direita evidencia o

transecto com as parcelas.

Resultados

O número de morfotipos de plântulas variou de um a 10 por parcela, enquanto a

abundância variou de um a 20 indivíduos. A riqueza aumentou em direção ao interior do

fragmento (F=8,71; gl = 3; p < 0,01; Figura 2). A abundância também aumentou em

direção ao interior do fragmento (F=9,00; gl =3; p < 0,01; Figura 3).

Page 26: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

26

Figura 2. Resíduos da ANOVA entre riqueza de plântulas e os transectos em relação ao

gradiente de distância (m) da borda em direção ao interior de um fragmento de 100 ha na

Fazenda Dimona, Amazônia central.

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Distância (m)

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Figura 3. Resíduos da ANOVA entre abundância de plântulas e os transectos em relação ao

gradiente de distância (m) borda-interior um fragmento de 100 ha na Fazenda Dimona,

Amazônia Central.

Page 27: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

27

Discussão

O fato de que a riqueza e abundância de plântulas aumentaram de forma contínua da

borda em direção ao interior do fragmento indica que o efeito de borda persiste mesmo

na presença da floresta secundária do entorno do fragmento. Provavelmente, mesmo que

haja uma certa redução da temperatura e incidência de luz na floresta secundária

próxima à borda (Camargo & Kapos 1995, Didham & Lawton 1999), esses fatores

ainda podem ser suficientes para inibir o recrutamento das plântulas.

Benítez-Malvido (1998) quantificou a abundância de plântulas nesse mesmo

fragmento em 1991, um ano após o seu isolamento completo. O fragmento ficou

cercado por uma vegetação semelhante a um pasto abandonado. Nessa circunstância, ela

não encontrou variação na abundância de plântulas no gradiente até 100 m no interior

do fragmento. Comparando com nossos dados, notamos que a abundância de plântulas

na borda foi menor que o encontrado por Benítez-Malvido (1998). Entretanto, a

abundância de plântulas nas parcelas do interior do fragmento (100 m) foi semelhante

entre os dois estudos. Nesse sentido, a redução da riqueza e a perda de indivíduos que

observamos na borda do fragmento indicaram que não há redução desses efeitos ao

longo de crescimento de uma floresta secundária a curto e médio prazo. Caso contrário,

o padrão de variação na abundância de plântulas observadas neste estudo deveria ter

sido semelhante ao dela.

Uma série de estratégias de manejo podem ser empregadas com o objetivo de

atenuar a degradação de fragmentos florestais associada ao efeito de borda. No entanto,

o fato de o recrutamento de plântulas ainda ser prejudicado quando há floresta

secundária no entorno indica que mesmo a presença dessa floresta pode ser uma

estratégia de preservação inadequada nesses casos.

Page 28: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

28

Agradecimentos

Agradecemos ao PDBFF, na pessoa do Zé Luis, e aos coordenadores, Paulo Enrique e

Paulo Estefano. Ao Marcelo Tabarelli pela orientação para o desenvolvimento deste

trabalho e pelos bons momentos de filosofia e aprendizado. À Dani e Fran, pelas

contribuições na revisão da primeira versão do manuscrito. Às monitoras, Mano e

Laura, e aos demais efanos pelas contribuições para melhoria do trabalho e, sobretudo,

pelos bons momentos de risada nessa primeira semana!

Referências

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tropical rain forest. Conservation Biology, 12:380–389.

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Didham, K.R. & J.H. Lawton. 1999. Edge structure determines the magnitude of

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Laurance W.F.& H.L. Vasconcelos. 2009. Conseqüências ecológicas da fragmentação

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Mesquita, R.C.G., P. Delamônica, & W.F. Laurance. 1999. Effect of surrounding

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Page 30: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

30

A presença de um consumidor no recurso diminui a ocorrência de outros

visitantes?

Mauro B. Monteiro-Junior, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião

Introdução

A disponibilidade de recurso varia de acordo com as condições estruturadoras dos

ecossistemas. Os recursos sustentam uma rede complexa de interações, que influenciam

na história de vida e nas estratégias de forrageio das espécies (Raine & Chittika 2009).

A teoria do forrageamento ótimo postula que existe um balanço entre a obtenção e o

gasto de energia despendido, na qual os organismos otimizam o retorno energético pelo

mínimo de esforço possível (Charmov 1976). Dessa forma, o sucesso do forrageio

depende da disponibilidade de recurso do ambiente e da presença de outros organismos

que utilizam a mesma classe de recurso (Charmov 1976). Avaliar as estratégias de uso

de recursos entre os organismos fornece um indicativo de como a utilização e

apropriação de uma determinada fonte por um organismo interfere nas estratégias de

uso do recurso por outros organismos.

Os insetos fazem parte de uma rede complexa de interações durante a atividade

de forrageio. Sempre que possível os indivíduos evitam conflitos durante o uso de um

recurso, já que a defesa do recurso é uma atividade custosa e demanda uma grande

quantidade de energia (Speight et al. 2008). Entre os insetos sociais, como vespas

formigas e abelhas, as estratégias de forrageamento são um ponto chave nas redes de

interações, uma vez que diferentes grupos de insetos podem compartilhar os mesmos

recursos (Raine & Chittika 2009). Vespas utilizam a visão como um dos principais

mecanismos em sua atividade de forrageio. Dessa forma, vespas podem evitar fontes de

recursos que já estejam ocupadas, evitando o custo energético envolvido na defesa do

Page 31: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

31

alimento (Speight et al. 2008). Desta maneira, a avaliação visual é usada

frequentemente por vespas durante a procura e escolha de uma fonte de recurso.

No presente estudo, avaliamos como a presença de um consumidor (uma vespa)

em uma determinada fonte de recurso influencia na freqüência de uso dessa fonte por

outros visitantes. Esperamos que a frequência de outros visitantes seja menor na fonte

alimentar que haja uma vespa presente e que esse padrão seja mais acentuado quando

outro visitante for uma vespa, visto que o estímulo visual é um importante componente

da sua estratégia de forrageio.

Métodos

Área de estudo

Desenvolvemos o estudo em uma região de floresta de terra firme localizada na Fazenda

Dimona (2º 20’S - 60º 06’O) do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais”

(INPA/Smiththsonian Institute), Amazônia Central. A coleta dos dados foi feita ao

longo da estrada de acesso ao acampamento da fazenda Dimona. A vegetação ao longo

da estrada é formada de uma floresta secundária com cerca de 20 anos de regeneração

dominada por espécies de Vismia.

Coleta de dados

Para avaliar como a fonte de recurso e a presença de um consumidor pode

influenciar a frequência de visitantes, estabelecemos 20 pontos amostrais ao longo da

estrada. Em cada ponto, usamos iscas feitas com uma solução de água e açúcar com

detergente armazenadas em placas de Petri. Cada placa foi colocada sobre pratos de

plástico amarelo para atrair visitantes, especialmente as vespas (L. Zanetti com. Pess.),

que são atraídas visualmente. Usamos dois tratamentos, um formado por iscas contendo

Page 32: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

32

uma vespa morta dentro da placa de petri, e outro sem vespa (controle). Os tratamentos

foram expostos por duas horas (9h30 – 11h30) e colocados a cada 50 metros, de forma

intercalada.

Avaliamos a diferença entre o número total de visitantes e o número de vespas

atraídas entre os tratamentos (sem vespa e com vespa) utilizando Teste t.

Resultados

O número máximo de visitantes no tratamento controle foi de 11 indivíduos e no

tratamento com vespa foi de seis indivíduos. Apenas uma isca de cada tratamento não

foi visitada. O máximo de vespas capturadas no tratamento controle foi cinco indivíduos

e no tratamento com vespa foi de dois indivíduos, sendo que três unidades amostrais do

tratamento com vespa e duas unidades amostrais do controle não foram visitadas por

vespas. Os tratamentos controle e com vespas não foram diferentes quanto ao número

total de visitantes (t=1,07; df=19, p=0,29, Figura 1) e vespas atraídas (t=0,85; df=19,

p=0,4, Figura 2).

Page 33: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

33

Figura 1. Distribuição do número total de visitantes registrados nos tratamentos sem

vespa e com vespa.

Figura 2. Distribuição do número de vespas registradas nos tratamentos sem vespa e

com vespa.

Page 34: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

34

Discussão

O sucesso na obtenção de recurso é mediado por uma série de decisões e estratégias

comportamentais dos indivíduos e são determinantes nas interações entre as espécies

(Speight et al. 2008, Raine & Chittka 2009). Nossos resultados indicaram que a

presença de uma vespa na fonte de recurso não inibiu a chegada de outros visitantes,

sejam eles vespas ou não. Esperávamos que dentre os visitantes, as vespas exibissem

um comportamento mais evidente de evitar as iscas com uma vespa previamente

presente no recurso. Isso poderia ter ocorrido porque o comportamento territorial é uma

característica marcante em vespas e o estímulo visual é um componente importante em

sua estratégia de forrageio. Porém o uso do recurso mesmo com a presença da vespa

indicou que a estratégia comportamental mais vantajosa foi a partilha de recursos.

Quando a fonte energética não é limitante, o comportamento territorial pode não

ser vantajoso e deixar de existir (Carpenter & Macmillan 1976). Um estudo sobre

dominância entre formigas mostrou que as relações agonísticas entre espécies foram

mais freqüentes em áreas com menor densidade de recursos. Nos locais com maior

densidade de recursos a abundância das espécies dominantes foi menor, facilitando o

acesso de outras espécies a fonte de alimento (Baccaro et al. 2010). De forma similar, é

possível que os recursos disponíveis na área deste estudo não foram limitantes,

favorecendo a co-ocorrencia de espécies e a partilha dos recursos por diferentes espécies

de vespas.

Agradecimentos

Somos gratos aos professores Paulo Bobrowiec, Lorenzo Zanette e Fabrício Baccaro

pelo auxilio no campo e dicas no manuscrito. A toda organização, colegas e monitores

do “EFA 2011” e Dona Eduarda e Seu Jorge pelo agradável convívio e apoio.

Page 35: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

35

Referências

Baccaro, F.B., S.M. Ketelhut & J.W. Morais. 2010. Resource distribution and soil

moisture content can regulate bait control in an ant assemblage in Central

Amazonian forest. Austral Ecology, 35:274-281.

Bierregaard, R.O., C. Gascon, T.E. Lovejoy & R.C.G. Mesquita. 2001. Lessons from

Amazonia: the Ecology and Conservation of a Fragmented Forest. London: Yale

University Press.

Carpenter, F.L. & R.E. MacMillen. 1976. Threshold Model of Feeding Territoriality

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Speight, M. R., M. D. Hunter & A. D. Watt, 2008. Resource limitation, pp. 103-134. In:

Ecology of Insects, Concepts and Applications (M. R. Speight, M. D. Hunter & A.

D. Watt, eds.). London: Wiley-Blackwell.

Page 36: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

36

Efeito de borda no teor de água foliar e sua influência na herbivoria

Raul C. Pereira, Fernando M. Resende, Franciele P. Peixoto e João Paulo C. de

Menezes

Introdução

Nas últimas décadas a fragmentação de florestas tropicais tem se intensificado (Ribeiro

et al. 2009, Laurance et al. 2011). Esse processo promove a perda, isolamento e

alteração estrutural de habitats naturais, exercendo impactos negativos na diversidade

biológica (Meffe& Carroll 1997, Laurance et al. 2011). Além disso, a fragmentação

leva à criação de bordas, que são áreas de contato entre ambientes naturais e alterados.

Hábitats de borda exercem um papel chave em paisagens fragmentadas, pois

nestas áreas as mudanças abióticas e bióticas decorrentes da supressão da vegetação

nativa são mais pronunciadas (Laurence et al. 2011). Mudanças abióticas, como o

aumento da incidência de luz e ventos, são mais severas nas bordas (Kapos 1989;

Camargo & Kapos 1995). Essas mudanças estão relacionadas a alterações na estrutura e

composição taxonômica e funcional de comunidades biológicas.

Alterações ambientais também podem afetar as interações biológicas (Santos et

al. 2008, Lopes et al. 2009, Laurance et al. 2011), como a herbivoria. Variações

microclimáticas no ambiente de borda podem modificar o metabolismo das plantas,

reduzindo, por exemplo, o teor de água no tecido foliar (Coley & Barone 1996). Uma

vez que o teor de água no tecido foliar é um indicativo de qualidade da folha, essa

modificação pode diminuir os níveis de herbivoria, sendo determinante para a

preferência e desempenho dos herbívoros (Coley & Barone 1996).

O objetivo deste trabalho foi testar se bordas de fragmentos afetam

negativamente o nível de herbivoria por reduzirem o conteúdo de água do tecido foliar.

Page 37: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

37

Esperamos que i) a área foliar danificada e o teor de água no tecido foliar sejam

menores nas bordas do que no interior do fragmento e ii) que exista uma relação

positiva entre o conteúdo de água no tecido foliar e a área foliar consumida.

Métodos Área de estudo

Desenvolvemos o estudo em um fragmento de 100 ha, circundado por uma matriz de

floresta secundária de cerca de 10 anos de idade. Este fragmento está localizado na

fazenda Dimona, aproximadamente 80 km ao Norte de Manaus, Amazonas (2°25’ S,

59°50’ O).

Coleta de dados

Como modelo de estudo, utilizamos a planta Duguetia trunciflora H. Gentry & Maas

(Anonnaceae). Selecionamos essa espécie por ser encontrada com freqüência tanto em

borda quanto no interior de fragmentos e por ser de fácil identificação. Consideramos

como plantas de borda aquelas localizadas nos primeiros 20 m em direção ao centro do

fragmento. Plantas de interior do fragmento foram amostradas a partir de 200 m da

borda.

Selecionamos 10 plantas em cada uma das áreas e coletamos ao acaso 10 folhas

de cerca de um mês de idade por planta, das quais três foram selecionadas ao acaso.

Escolhemos folhas jovens que, por emergirem sincronicamente, apresentam o conteúdo

de água mais uniforme em relação às folhas maduras (Coley & Barone 1996).

Para quantificar o teor de água foliar, retiramos uma amostra de 2 x 4 cm de

cada uma das folhas. Pesamos as três amostras de cada indivíduo numa balança de

precisão (três casas decimais) e determinamos o peso fresco médio (PF).

Posteriormente, secamos as amostras por 15 minutos em forno a uma temperatura em

Page 38: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

38

torno de 200 °C e as pesamos para obter o peso seco médio (PS) por indivíduo.

Medimos o teor de água no tecido foliar de cada indivíduo pela razão PS/PF.

Calculamos a área total da folha (AT) pela fórmula da elipse (AT =

π*Comprimento da folha*Largura da folha/4) e a área foliar consumida (AC) por

herbívoros com o uso de papel milimetrado. Estimamos o percentual de área consumida

pela razão AC/AT*100. Testamos a relação entre a área foliar consumida e o teor de

água do tecido foliar através de uma análise de covariância, utilizando o ambiente

(borda ou interior) como covariável.

Resultados

A porcentagem média de área foliar consumida pelos herbívoros foi de 0,61 ± 1,12 %

para o ambiente de borda e de 0,34 ± 0,91% para o interior do fragmento. O teor médio

de água no tecido foliar foi de 68,5 ± 3,1%.

O percentual de área danificada (F1,16=0,73; p=0,40) e o teor de água do tecido

foliar (F1,16=0,26; p=0,61) não variaram entre as plantas dos ambientes de borda e

interior do fragmento. Não houve também relação entre o conteúdo de água no tecido

foliar e a área foliar consumida pelos herbívoros e o (F1,16=0,31; p=0,58)( Figura 1).

Page 39: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

39

Figura 1. Relação entre o teor de água no tecido foliar de Duguetia trunciflora e a área

foliar consumida em plantas de borda (círculos preenchidos) e interior do fragmento

(círculos abertos).

Discussão

A pequena amplitude de variação no teor de água de D. truncifolia indica,

indiretamente, que não ocorre variação microclimática entre borda e interior do

fragmento. Estudos desenvolvidos no mesmo local do presente trabalho, nos primeiros

anos após o isolamento dos fragmentos, encontraram grande variação microclimática

entre a borda e o interior (e.g. Kapos 1989, Camargo & Kapos 1995). No entanto,

estudos posteriores demonstram que a sucessão vegetal da matriz ameniza o microclima

na borda de fragmentos (Didham & Lawton 1999, Laurance et al. 2011). A estrutura

secundária da vegetação da matriz, com sub-bosque e dossel bem estabelecidos, pode

atuar amenizando os efeitos dessecantes do vento e da luz. Provavelmente as condições

Page 40: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

40

microclimáticas das bordas se estabilizaram ou voltaram aos níveis pré-fragmentação

devido à regeneração da matriz.

Uma explicação para a pequena variação na área foliar consumida entre borda e

interior é que o teor de água no tecido foliar das plantas desses dois ambientes está

dentro do espectro de forrageio dos herbívoros. Assim, a pequena variação do teor de

água foliar observado entre borda-interior pode ser insuficiente para impor pressões na

escolha e uso de recursos por herbívoros.

Referências

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microclimate in Central Amazonian forest. Journal of Tropical Ecology, 2:205-

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Page 41: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Page 42: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

42

Dimona – projetos livres

O nível de dano foliar por herbívoros e patógenos em Heliconia acuminata é

dependente do tamanho das plantas?

Thiago B. d’Araújo, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião, Raul

C. Pereira

A seleção por hábitats geralmente leva ao uso de manchas maiores em decorrência da

maior detectabilidade e quantidade de recursos. Em manchas maiores é esperado

proporcionalmente mais consumidores. Herbívoros possuem maior capacidade de

selecionar habitats, pois exploram ativamente o ambiente. Por outro lado, patógenos são

dispersos pelo vento e por isso não selecionam habitats. Nós testamos se existe relação

entre o tamanho de manchas da monocotiledônea Heliconia acuminata e a intensidade

de dano foliar causado por patógenos e herbívoros. Esperamos que o dano causado por

herbívoros seja proporcionalmente maior em manchas maiores e que o dano causado

por patógenos não varie com o tamanho da mancha. Cada indivíduo de H. acuminata

representa uma mancha de habitat. Determinamos o tamanho de 15 manchas pela

contagem do número de folhas, que variou de quatro a 33 (15,1±9,6). A porcentagem do

dano foliar foi estimada a partir de três folhas selecionadas aleatoriamente em cada

planta. A porcentagem média de dano por herbivoria (2,0±1,8%) e por fungos (2,4±

2,6%) foi semelhante nos diferentes tamanhos de mancha. Herbívoros que consomem

H. acuminata são generalistas e podem forragear em outras espécies de plantas. Por

isso, estes herbívoros não selecionam o habitat em função da quantidade do recurso. A

ausência de seleção de habitat encontrada para patógenos confirma o padrão esperado

para organismos dispersos pelo vento.

Page 43: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

43

Pteridófitas inibem o recrutamento de plântulas lenhosas em florestas secundárias

Lucas N. Paolucci, Daniel I. de S. Dainezi, Fernanda M. P. de Oliveira e Inácio J. M. T.

Gomes

Algumas plantas se espalham rapidamente formando tapetes sobre o chão da floresta.

Esses tapetes podem inibir o estabelecimento de plântulas e causar um retardo no

processo de sucessão. O nosso objetivo foi investigar se a espessura da serrapilheira

afeta positivamente a cobertura da pteridófita Selagenella pedata e se essa cobertura

afeta negativamente o estabelecimento de plântulas lenhosas. Previmos que a

porcentagem de área ocupada pelo tapete de S. pedata aumenta com a profundidade da

serrapilheira.e que a porcentagem de área ocupada pela pteridófita diminua a riqueza e

abundância de plântulas. Usamos 30 parcelas de 1 m², onde medimos a profundidade da

serrapilheira e estimamos a proporção de cobertura de S. pedata. Quantificamos a

riqueza e abundância das plântulas de espécies lenhosas com até 50 cm de altura.

Encontramos que a profundidade da serrapilheira influenciou positivamente a cobertura

de S. pedata (R²=0,225; gl=1; p=0,005) e que a cobertura de S. pedata, influenciou

negativamente a riqueza (R²=0,139; gl=1; p=0,024) e abundância (R²=0,018; gl=1;

p=0,011) de plântulas. Pteridófitas são dependentes de altos níveis de umidade e a

serrapilheira retém umidade. Portanto, uma maior quantidade de serrapilheira propicia

melhores condições para o desenvolvimento de pteridófitas. O tapete formado por S.

pedata inibe o recrutamento de plântulas, modificando a estrutura do micro-habitat,

como disponibilidade de recursos, luz e temperatura. Assim tapetes de pteridófitas

podem afetar negativamente o processo de regeneração em áreas de floresta secundária.

Page 44: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

44

Existe relação entre umidade do ambiente e distribuição de briófitas em forófitos?

Guilherme H. A. Pereira, João P. C. de Menezes, Maria L. Ternes e Rodrigo Zucaratto

Recursos e condições ambientais influenciam a distribuição dos organismos nos

habitats. Nas florestas tropicais, áreas sujeitas à inundação, como os baixios, são mais

propícias à colonização por organismos que necessitam de umidade. No caso das

briófitas, a ausência de vasos condutores para transporte de água na planta as torna mais

sensíveis à dessecação Desta forma, a umidade do ambiente pode ser uma condição

limitante para sua ocorrência. Nosso objetivo foi avaliar como a umidade do ambiente

afeta a distribuição vertical de briófitas no forófito (vegetal suporte). Nossa hipótese é

que a distribuição vertical de briófitas em forófitos e a umidade do ambiente estão

diretamente relacionadas. Esperamos que o limiar máximo de distribuição das briófitas

no forófito será maior no baixio do que no platô. Conduzimos o estudo em áreas de

baixio e platô de floresta de terra firme na Amazônia Central. Selecionamos 100

forófitos em cada área de estudo. Para avaliar o limiar de ocorrência das briófitas,

dividimos cada forófito em cinco classes de altura com 0,5 m cada, até 2,5 m do solo.

Observamos que em 77% dos forófitos do baixio as briófitas tiveram limiar máximo a

2,5 m. No platô, as briófitas ocorreram até 0,5 m do solo em 51% dos forófitos

avaliados. Em ambientes mais úmidos, como os baixios, briófitas podem colonizar

zonas mais altas dos forófitos. No platô, a ocorrência das briófitas no forófito foi

limitada a regiões mais úmidas próximas ao solo.

Page 45: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

45

Variação da riqueza de fungos numa floresta com diferentes gradientes

sucessionais

Franciele P. Peixoto Daniele B. C. Puida, Camilla P. Pagotto, Carla Madelaire,

Sucessão é um processo no qual há mudanças na composição e estrutura de

comunidades ao longo do tempo. Essas mudanças promovem aumento da

complexidade, propiciando maior quantidade de recursos. A complexidade estrutural

possibilita um acréscimo da umidade, que é importante no estabelecimento de fungos

em florestas e que pode contribuir para o aumento da riqueza. Dessa forma, acreditamos

que haverá diferenças na riqueza de fungos em relação ao gradiente sucessional. Nossa

previsão é que haverá um aumento da riqueza no gradiente: capoeiras de 10 e 20 anos

de regeneração e floresta madura. Em cada ambiente escolhemos 15 troncos caídos,

onde amostramos a riqueza de fungos. Como o volume do substrato pode ter uma

relação positiva com a riqueza, dividimos o número de morfotipos pelo volume do

tronco. Encontramos um total de 17 morfotipos de fungos. Dez ocorreram no fragmento

de floresta madura, seis na capoeira com 20 anos e três na capoeira com 10 anos. Não

encontramos diferenças na riqueza entre os ambientes (F(2,41)=0,79; p>0,05). Contudo, a

composição variou, sendo que apenas as capoeiras compartilharam espécies. O fato da

riqueza não ter variado com relação ao gradiente sucessional, pode refletir a formação

das capoeiras, que se regeneraram a partir da supressão de uma floresta madura. Desse

modo, os troncos caídos que são os recursos para os fungos, persistiram nas capoeiras e

parecem ser equivalentes entre os ambientes.

Page 46: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

46

Fragmentos florestais são fontes de espécies vegetais para as áreas de floresta

secundária do seu entorno?

Fernando Resende, Talita Câmara, Mauro Brum

A fragmentação florestal rompe a conectividade de habitats naturais e promove

alterações de fatores bióticos e abióticos nos ambientes remanescentes. Tais ambientes

podem servir como fonte de espécies para as áreas circundantes. Nesse trabalho,

avaliamos se o recrutamento de plântulas em uma área de floresta secundária, que

ocorre no entorno de um fragmento de mata nativa, aumenta com a proximidade da

borda do fragmento. Para isso, selecionamos um fragmento de 10 ha na Amazônia

Central a partir do qual estabelecemos quatro transectos de 30 m da borda para a

floresta secundária que ocorre no seu entorno. Em cada transecto, estabelecemos seis

parcelas de 1 x 1 m separadas por 5 m. Contamos o número total de plântulas menores

que 50 cm de altura e as caracterizamos como morfo-espécies. Contabilizamos 695

plântulas. A riqueza e a densidade de plântulas não estiveram relacionadas com a

distância do fragmento florestal. Isso indica duas possibilidades: 1) as sementes

oriundas do fragmento florestal têm as mesmas probabilidades de dispersão ao longo do

gradiente ou 2) as sementes não estão sendo dispersas ao longo das distâncias avaliadas.

Para a primeira possibilidade, é possível que os mecanismos de dispersão não estejam

limitando a chegada de propágulos na área de floresta secundária. Para a segunda

possibilidade, é possível que as plântulas que estão recrutando sejam de origem da

vegetação do entorno e não do fragmento florestal.

Page 47: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

47

Catalão – projetos orientados

Ir mais longe é garantia de persistir? Hipótese de Janzen-Connell testada em

diferentes locais de áreas alagadas

Daniele Cury, Camilla Pagotto, Franciele P. Peixoto, Lucas Paolucci, Raul C. Pereira

Introdução

A dispersão e a predação de sementes são processos importantes para o recrutamento de

plântulas, pois vão definir o local onde a semente será depositada e onde os novos

indivíduos irão se estabelecer. Assim, esses processos exercem grande influência na

estruturação das comunidades vegetais (Jordano et al. 2005). A hipótese de Janzen

(1970) & Connell (1971) propõe que nas proximidades da planta parental os propágulos

estão adensados. Esse adensamento concentra um grande número de predadores que vão

consumir sementes e plântulas depositadas nesses locais. Dessa forma, as sementes

dispersas para longe da planta-mãe poderiam escapar da ação desses predadores e

aumentar suas chances de sobrevivência (Cousens et al. 2008).

A hipótese de Janzen-Connell prevê apenas uma relação entre a distância da

planta-mãe e a chance de sobrevivência dos propágulos (Cousens et al. 2008). Contudo,

características do local onde as sementes serão depositadas quando dispersas para longe

da planta parental também poderão influenciar no sucesso de dispersão dos propágulos

(Carson et al. 2008). Em ambientes com alta produtividade, pode haver grande

abundância de predadores generalistas (Lowe-McConnel 1999), que não

necessariamente estarão restritos às imediações da planta parental. Assim, mesmo os

ambientes distantes podem apresentar uma pressão de predação equivalente àquela

encontrada em sítios sobre a influência da planta parental.

Page 48: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

48

Ambientes aquáticos muito produtivos sustentam uma grande abundância de

peixes, que são importantes dispersores e predadores de várias espécies vegetais

(Araújo-Lima & Goulding 1997). Nesses ambientes muitas plantas podem utilizar a

água como um vetor de dispersão. Para essas espécies, o sucesso de dispersão pode

estar condicionado ao tempo que as sementes conseguem permanecer na lâmina d’água.

Assim, quanto mais tempo a semente permanecer na água sem ser predada, maior será a

chance dela ser levada pela água por maiores distâncias.

O tempo de permanência das sementes na lâmina d’água nesse tipo de ambiente

pode ser afetado pela composição de predadores. As comunidades de peixes próximas

às margens dos rios podem apresentar uma composição de espécies distinta em relação

à calha central. Dessa maneira, essas comunidades dos dois locais poderão ter

preferências alimentares diferentes. O adensamento de recursos nas margens do rio, por

exemplo, poderia levar a uma especialização na dieta dos peixes desse local. Desse

modo, a garantia de sobrevivência das sementes dispersas pela água pode não estar

apenas relacionada à distância em relação à planta-mãe, mas também ao tipo de

ambiente onde ela é depositada.

O objetivo do nosso trabalho foi avaliar como a distância em relação à planta-

mãe e o local de deposição podem influenciar a persistência de sementes de

Pseudobombax munguba (Malvaceae) em um ambiente de várzea na Amazônia Central.

Nossa hipótese é que não somente a distância em relação à planta-mãe, mas também o

local onde a semente é depositada influenciam em sua persistência no ambiente. Nossas

previsões são que i) sementes depositadas próximas da planta-mãe serão predadas em

menor intervalo de tempo quando comparadas com as sementes depositadas longe da

planta-mãe e ii) sementes depositadas distantes da planta-mãe em ambientes de margem

Page 49: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

49

serão predadas mais rapidamente quando comparado com ambientes distantes da planta-

mãe, na calha do rio.

Métodos

Área e modelo de estudo

Realizamos o estudo no lago do Catalão, situado na várzea do rio Solimões. Ambientes

de várzea são sistemas formados por florestas periodicamente inundadas por águas

brancas ricas em nutrientes e que apresentam uma grande variedade de habitats para a

fauna, como bancos de macrófitas, herbáceas e espécies arbóreas (Smith et al. 1998).

Nossa planta modelo foi a munguba (Pseudobombax munguba), uma árvore

comum em áreas de várzea. A munguba possui frutos deiscentes e de coloração rósea.

As sementes encontram-se envoltas por uma paina, que permite que as sementes sejam

carregadas pelo vento e flutuem na água até encontrar um sítio final de deposição. Essa

planta possui uma síndrome diplocórica de dispersão de sementes, onde as sementes são

dispersas primariamente pelo vento, sendo em seguida transportadas pela água. A

frutificação ocorre durante a época da cheia e grande parte das sementes é depositada no

rio que banha a planície. Nesses ambientes, as sementes são predadas por peixes da

família Characidae, como Triportheus angulatus, Chalceus macrolepidotus e Schizodon

fasciatus (Claro-Jr et al. 2004, Fáveri et al. 1998).

Oferta de sementes e tempo de predação

Selecionamos arbitrariamente nove indivíduos com frutos maduros para realizar

a simulação de deposição de sementes. Depositamos 10 sementes envoltas em paina em

cada um dos seguintes tratamentos: i) logo abaixo da copa da planta mãe, ii) a 25 m da

planta mãe na margem e iii) a 25 m da planta mãe na calha do rio. Observamos as

Page 50: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

50

sementes por no máximo 5 min e registramos o tempo até a primeira semente ser

consumida pelos peixes. Testamos a diferença entre o tempo de predação das sementes

nos três tratamentos com ANOVA em blocos.

Resultados

Metade das sementes foi predada em um intervalo de tempo que variou de dois a 249 s.

O tempo de predação das sementes não variou com relação à distância da planta-mãe,

nem com o local em que as sementes foram depositadas. (F = 0,98; gl = 1; p = 0,39)

(Figura 1).

Figura 1. Tempo médio de predação das sementes de Pseudobombax munguba na

várzea em três locais: próximo da planta parental (próximo), a 25 m distante da planta

parental, na margem do rio (distante margem) e a 25 m da planta parental, na calha do

rio (distante calha). Barras representam o desvio padrão.

Page 51: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

51

Discussão

Não observamos diferenças no tempo de remoção das sementes tanto em relação à

distância da planta-mãe, quanto em relação ao local de deposição da semente. A

hipótese de Janzen & Connell foi proposta para ambientes de terra firme, onde é bem

aceita (Carson et al. 2008). Entretanto, a hipótese deve ser aplicada com restrições em

ambientes aquáticos, pois o adensamento de predadores especialistas nas proximidades

da planta mãe em florestas de terra firme geralmente não é observado em várzeas, uma

vez que peixes desses ambientes são em sua maioria generalistas (Lucas et al. 2008).

A chance das sementes de P. munguba depositadas na margem do rio serem

predadas por peixes não depende da distância da planta-mãe. A floresta inundada

fornece um grande aporte de itens alimentares alóctones vindos principalmente da

vegetação ciliar (Goulding 1980, Claro–Jr et al. 2004). Como conseqüência, margens

dos rios podem reter maior quantidade de recursos alimentares, como insetos, frutos e

sementes, que podem ser consumidas pelos peixes que possuem hábito alimentar

generalista (Goulding 1980, Araújo-Lima & Goulding 1997, Claro-Jr et al. 2004, Lucas

2008). Logo, se recursos alóctones estão distribuídos de forma homogênea nas margens

dos rios, é possível que peixes que se alimentam desses recursos também estejam

distribuídos homogeneamente. Dessa maneira, a pressão de predação das sementes de

munguba não seria maior nas imediações da planta mãe, já que os predadores não

estariam adensados nesses locais.

Apesar das diferenças na composição de espécies de peixes entre margem e

calha do rio (Goulding 1980), o tempo de predação das sementes não diferiu entre esses

locais. Apesar de peixes de ambientes alagáveis serem bastante diversos em suas

características, eles são frequentemente generalistas (Lowe-McConnel 1999). Dessa

Page 52: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

52

maneira, mesmo com as variações na composição taxonômica, o grupo funcional de

generalistas pode estar presente nesses dois ambientes (Araújo-Lima & Goulding 1997).

Deste modo, espécies generalistas e potencialmente predadoras de sementes devem

ocorrer tanto na calha, quanto na margem do rio.

Metade das sementes de P. munguba foi predada em um curto intervalo de

tempo. Esse fato pode ser uma evidência de que sementes de P. munguba sofrem forte

pressão de predação por peixes. Contudo, a munguba apresenta características que

podem aumentar o sucesso na dispersão de suas sementes. Essas árvores produzem

grande quantidade de frutos, com grande número de sementes. Além disso, essas

sementes são dispersas primariamente pelo vento e quanto mais distante essas sementes

são transportadas por esse vetor, menos tempo elas ficarão disponíveis para predadores

na lâmina d’água. Nesse sentido, o grande número de sementes e a presença da paina,

que possibilita a dispersão pelo vento, parecem ser adaptações importantes para o

sucesso reprodutivo de P. munguba em ambientes inundados.

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Page 55: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

55

A correnteza pode afetar a diversidade beta de herbáceas entre bancos de

macrófitas?

Karla M.Campião, Fernanda de Oliveira, João P. C. de Menezes, Mauro Brum e

Rodrigo Zucaratto

Introdução

Diferentes fatores podem afetar a variabilidade na composição de espécies entre

assembléias (diversidade beta). Dois dos fatores mais comumente sugeridos como

determinantes dos padrões de diversidade beta são variações nas condições ambientais

relevantes para a sobrevivência dos organismos e a distância geográfica entre locais

(Legendre et al. 2005). Geralmente, quanto maior a diferença nas condições ambientais

e maior a distância geográfica, maior a dissimilaridade na composição de espécies entre

locais. No entanto, pouca atenção é dada ao efeito de fatores não associados à

sobrevivência ou à distribuição espacial das assembléias sobre os padrões de

diversidade beta.

Fatores que aceleram a entrada e saída de indivíduos em uma área podem

aumentar a troca de espécies entre locais e conseqüentemente aumentar a diversidade

beta sem que haja variações na sobrevivência dos indivíduos ou no padrão de distâncias

entre as assembléias (Schneck et al. 2010). Por exemplo, em locais com baixa taxa de

migração, a ocorrência de eventos estocásticos e de interações bióticas, como a

competição, podem levar a extinção local de algumas espécies. Isso é esperado porque o

tempo de permanência das espécies convivendo em um mesmo local é alto, o que faz

com que aquelas competitivamente superiores excluam outras com menor capacidade

competitiva do sistema (McCabe & Gotelli 2000). Por outro lado, onde a migração é

Page 56: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

56

freqüente, o fluxo de espécies é maior e a colonização e emigração aumentam a

variabilidade na composição de espécies (Cook & Quenn 1995).

O processo de migração de espécies pode ser expressivo em rios, onde a

velocidade do fluxo da água pode variar bastante em diferentes trechos. Em função da

correnteza contínua, há um processo constante de chegada e saída de espécies que são

dispersas pela água (Wooster & Sih 1995). Por outro lado, em ambientes lênticos

geralmente não há correnteza suficiente para causar dispersão das espécies. O processo

de substituição de espécies associado a maior migração causada pela correnteza deve ser

particularmente importante em macrófitas aquáticas, visto que muitas delas não são

enraizadas no leito (Neiff & Poi de Neiff 2003). Nesse estudo, avaliamos se a correnteza

do rio está associada a diferenças na diversidade beta de herbáceas entre bancos de

macrófitas. Nossa hipótese é que a diversidade beta de herbáceas entre bancos de

macrófitas é maior em áreas com maior correnteza em relação às áreas de água

estagnada.

Métodos

Área de estudo

Realizamos nosso estudo em duas áreas: uma ao longo do Rio Negro (ambiente lótico) e

a outra no lago Catalão (ambiente lêntico). Ambas as áreas são influenciadas pelos

ciclos de inundação anual e pelo encontro do Rio Negro e do Rio Solimões que trazem

sedimentos de duas regiões distintas da Bacia Amazônica (Junk 1997).

Page 57: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

57

Coleta de dados

Amostramos sete bancos no Rio Negro e sete bancos no lago Catalão. Escolhemos os

bancos de macrófitas à medida que os encontrávamos nas margens do lago e do rio,

sempre respeitando uma distância mínima de 30 m entre eles. Em cada banco de

macrófitas, paramos o barco e coletamos as herbáceas dentro do alcance de cada coletor

a partir da borda durante 3 min. Durante a amostragem, coletamos um exemplar de cada

morfoespécie de planta.

Análise de dados

Para estimar a variação na composição de espécies entre os bancos de macrófitas de

cada ambiente, fizemos uma análise de variabilidade baseada em uma Análise de

Coordenadas Principais (PCoA). Para isso, realizamos uma PCoA usando os bancos de

macrófitas como unidades amostrais em cada ambiente. Extraímos os dois eixos da

PCoA que explicaram a maior parte da variação na composição de espécies entre os

bancos de macrófitas e calculamos o centróide associado à disposição dos bancos de

macrófitas. Em seguida, calculamos a distância euclidiana de cada banco até o

centróide. Estas distâncias representam a dissimilaridade entre a composição de

espécies de cada banco em relação à composição média de cada ambiente. Por fim,

calculamos a média dessas distancias como uma estimativa da variabilidade na

composição de espécies entre pares de bancos para cada área amostrada.

Para analisar se a variabilidade na composição de espécies entre os bancos de

macrófitas do rio (ambiente lótico) é diferente da variabilidade entre os bancos de

macrófitas do lago (ambiente lêntico), utilizamos um teste de aleatorização. Para esse

teste comparamos a média da distância observada entre o centróide e as unidades

amostrais com uma distribuição das distâncias geradas pela aleatorização do conjunto

Page 58: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

58

total de dados. Realizamos 5000 aleatorizações para gerar a distribuição nula dos

valores da média das distancias dos pontos ao centróide. Utilizamos o programa R (The

R Development Core Team 2009) para fazer as análises, usando as funções vegadist e

betadisper do pacote Vegan.

Resultados

Registramos 27 morfoespécies de macrófitas, 22 no rio e 15 no lago. Apenas oito

espécies foram compartilhadas entre os dois ambientes. A média das distâncias ao

centróide foi duas vezes maior para o rio quando comparado com o lago (F(1,12)=28,88;

p<0,001; Figura 1).

Figura 1. Análise de Coordenadas Principais dos bancos de macrófitas nos ambientes

lótico e lêntico. Os círculos cheios representam o centróide dos dois eixos associados

aos bancos coletados em cada ambiente do rio. Círculos representam a área de rio e

triângulos o lago.

Page 59: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

59

Discussão

A maior variabilidade na composição de espécies de herbáceas entre os bancos de

macrófitas no ambiente lótico quando comparado ao ambiente lêntico indica que

diferenças no fluxo de água entre esses ambientes pode ser responsável pelo aumento da

diversidade beta no rio. Dado que as áreas são próximas, é improvável que as diferenças

observadas se devam a variações nas áreas que fornecem espécies para cada ambiente.

A alta substituição de espécies no ambiente lótico que levou a um aumento na

diversidade beta entre os bancos de macrófitas, pode também influenciar o padrão de

diversidade alfa nesses bancos. Como há um aumento da entrada e saída de espécies, é

possível que o ambiente lótico tenha um menor número de espécies nos bancos de

macrófitas, gerando uma diversidade local (alfa) pequena. Da mesma forma, o ambiente

lêntico, também pode apresentar uma baixa diversidade alfa, pois supostamente há um

efeito de dominância associado ao maior tempo de contato entre espécies em um mesmo

banco (McCabe & Gotelli 2000). Porém, visto que deve haver prevalência de uma

espécie, os bancos devem ser mais similares entre si em termo de composição. Nesse

sentido, enquanto ambos os ambientes podem apresentar diferenças na diversidade beta,

o padrão de diversidade alfa pode ser similar.

Nossos resultados demonstram que a variação na correnteza de rios pode atuar

na determinação dos padrões de diversidade beta de herbáceas entre bancos de

macrofitas em uma escala local. Macrofitas podem ser usadas como abrigo, alimento e

sítio de reprodução para muitas espécies de aves, peixes e insetos (Neiff & Poi de Neiff

2003). Portanto, alterações na intensidade da correnteza em ambientes lóticos podem

promover a homogeneização dos bancos e consequentemente comprometer algumas

dessas funções ecológicas exercidas por elas. Por outro lado, locais mais estáveis

(lênticos) também podem ser importantes para o sistema do rio devido à manutenção de

Page 60: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

60

espécies que podem apresentar baixa sobrevivência no rio ou ainda atuar como sítio

mais estável para reprodução.

Agradecimentos

Agradecemos ao PDBFF pela oportunidade de participar do EFA, assim como aos

coordenadores, professores, monitores e colegas do curso. Em especial agradecemos ao

Professor Adriano Melo, pelas valiosas informações.

Referências

Cook, R.R. & J.F. Quinn. 1995. The influence of colonization in nested species subsets.

Oecologia, 102:413-424.

Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to

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a pulsing system. (W.J. Junk, ed.). Berlin: Springer.

Legendre, L., D. Borcard & P. Peres-Neto. 2005. Analyzing Beta Diversity: Partitioning

the spatial variation of community composition data. Ecological Monographs,

75:435-450.

McCabe, D. J. & N. J. Gotelli. 2000. Effects of disturbance frequency, intensity, and

área on assemblages of stream macroinvertebrates. Oecologia, 124:270-279.

Neiff, J.J. & A.S.G. Poi de Neiff. 2003. Connectivity process as a basis for the

management of aquatic plants, pp 39–58. In: Ecologia e manejo de macrófitas

aquáticas (S.M. Thomaz & L.M. Bini, eds.). Maringá: Eduem.

Schneck, F., A. Schwarzbold, S.C. Rodrigues & A.S. Melo. 2010. Environmental

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reservoir. Austral Ecology, doi:10.1111/j.1442-9993.2010.02224.

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07-0. Disponível em: http://www.R-project.org.

Wooster, D. & A. Sih. 1995. A Review of the drift and activity responses of stream prey

to predator presence. Oikos, 73:3-8.

Page 62: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

62

De ladinho não é melhor: a proximidade entre árvores de munguba não aumenta o

sucesso de polinização

Ana Y. Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Daniel I. S. Dainezi, Fernando M. Resende,

Inácio J. M. T. Gomes

Introdução

Angiospermas podem produzir novos indivíduos tanto por meio de reprodução

assexuada quanto sexuada (Raven et al. 2001). Plantas que se reproduzem

sexuadamente podem apresentar autopolinização e/ou polinização cruzada. Plantas que

realizam a autopolinização podem ser polinizadas pelo pólen produzido na própria flor

hermafrodita ou pelo pólen vindo de outras flores do próprio indivíduo. Por outro lado,

plantas que dependem da polinização cruzada precisam ser polinizadas pelo pólen vindo

de flores de outros indivíduos coespecíficos. Com excessão de plantas que possuem

flores hermafroditas fecundadas pelo seu próprio pólen, as demais plantas dependem de

um vetor de polinização que pode ser abiótico ou biótico. Esses últimos são

considerados um dos vetores mais eficientes no transporte de pólen, pois o transportam

de uma maneira mais direcionada entre flores quando comparados aos vetores abióticos

(Baker & Baker 1983).

Vegetais desenvolveram uma série de características florais para atrair animais

polinizadores. Recursos como óleos, pólen e néctar podem atrair polinizadores

específicos que asseguram maior sucesso reprodutivo (Gorchov et al. 1993, Coelho et

al. 2002, Cariveau et al. 2004). Porém, apesar das estratégias intrínsecas de atração de

polinizadores, características ambientais também podem influenciar o sucesso de

polinização das plantas (Zimmerman 1988).

Page 63: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

63

Uma das características ambientais que pode afetar o sucesso de polinização é a

distribuição espacial das plantas (Kershaw & Looney 1985). Indivíduos coespecíficos

mais próximos entre si podem ter maior chance de compartilhar polinizadores quando

comparados a indivíduos isolados. Portanto, a polinização cruzada e a produção de

frutos oriunda dela pode ser mais freqüente entre indivíduos próximos. Essa relação

pode ser particularmente importante em espécies auto-incompatíveis, cuja produção de

frutos depende do pólen originado de outro indivíduo coespecífico.

Nesse estudo usamos a espécie de planta auto-incompatível Pseudobombax

munguba (Malvaceae) para avaliar como a distância entre indivíduos co-específicos

influencia o sucesso de polinização. Nossa hipótese é que a proximidade entre árvores

dessa espécie aumenta o sucesso de polinização da planta. Nossa previsão é que quanto

menor a distância entre um indivíduo e seu co-específico reprodutivo mais próximo,

maior será a produção de frutos.

Métodos

Área de estudo

Realizamos este estudo no Lago do Catalão (3°9’S - 59°54’O), localizado próximo à

confluência dos rios Negro e Solimões no município de Manaus, Amazonas, Brasil. A

vegetação do local passa por um regime de cheias e vazante do rio, comum da Bacia do

Rio Solimões.

Modelo de estudo

Pseudobombax munguba é uma planta auto-incompatível que ocorre na Amazônia

Central. Essa espécie possui flores grandes, de cor branca ou creme, com antese

Page 64: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

64

noturna, sem néctar e com uma grande quantidade de pólen. Essas características atraem

o morcego Phyllostomus hastatos, que é o único polinizador de P. munguba (Gentry

1993). Portanto, o sucesso reprodutivo de P. munguba é totalmente dependente da

polinização cruzada realizada por P. hastatus.

Estimativas de distância e de produção de frutos

Para avaliar se o sucesso de polinização de P. munguba tem relação com a distância ao

indivíduo co-específico reprodutivo mais próximo, selecionamos 30 indivíduos à

medida que os encontrávamos na margem do lago. Para estimar o número total de frutos

produzido em cada planta, contamos e somamos o número total de frutos presentes e os

pedúnculos de frutos que já haviam dispersado suas sementes. Posteriormente, medimos

a altura da coluna de água próxima ao tronco e somamos à altura emersa da planta para

estimar sua altura total. Medimos altura da coluna de água com uma corda com metal na

sua ponta, que era lançada até tocar o solo. Em seguida, estimamos a distância

visualmente para indivíduos com frutos distantes até 30 m. Para distâncias maiores do

que 30 m, marcamos a coordenada geográfica de cada indivíduo usando um GPS e

posteriormente calculamos a distância entre eles.

Avaliamos a relação entre o número total de frutos e a distância usando uma

regressão linear múltipla. Como plantas mais altas tendem a produzir mais frutos apenas

por serem maiores, inserimos a altura da planta nessa análise como uma co-variável

para controlar o efeito do tamanho da planta sobre a produção de frutos.

Resultados

As árvores de P. munguba apresentaram distância média de 41,88 ±32,07 m

(média±desvio padrão) para o co-específico reprodutivo mais próximo. A produção

Page 65: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

65

média de frutos foi de 37,4 ±36,79 e a altura média dos indivíduos foi de 17,45 ±3,71 m.

O número de frutos produzidos por indivíduos de P. munguba não aumentou em função

da proximidade entre co-específicos reprodutivos (F(1,27)=0,53; p=0,82; Figura 1).

Figura 1. Relação entre resíduo da regressão entre o número de frutos de Pseudobombax

munguba e a sua altura e a distância entre indivíduos co-específicos reprodutivos,

localizados no lago do Catalão, Amazonas, Brasil.

Discussão

O fato da distância entre os indivíduos não estar relacionada ao número de frutos

produzidos em P. munguba indica que o sucesso de polinização nessa espécie é

independente do padrão de distribuição espacial dos indivíduos. Nesse sentido, é

provável que as áreas de forrageio de P. hastatos sejam grandes o suficiente para cobrir

diversas árvores durante o período reprodutivo de P. munguba.

Morcegos são animais que gastam muita energia para manter seu alto

metabolismo (Sibly & Brown 2007). Por isso, esses animais precisam percorrer grandes

distâncias para obter itens essenciais à sua dieta, como nitrogênio e carboidrato (Fischer

0 20 40 60 80 100 120 140 160

Distância entre indivíduos (m)

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Page 66: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

66

2000). Consequentemente, eles podem voar vários quilômetros em uma noite de

forrageio. Phyllostomus hastatos é atraído pelo valor nutritivo do pólen de P. munguba.

Entretanto, o pólen é uma recompensa de menor valor nutritivo quando comparado a

outros recursos disponibilizados por plantas para seus polinizadores, como o néctar

(Baker & Baker 1983). Assim, é possível que a grande área de forrageio e a necessidade

de percorrer várias árvores diferentes na busca de alimento, explique porque a distância

entre as árvores não afeta a produção de frutos de P. munguba.

Mesmo que a distância entre árvores não afete o sucesso de produção de frutos,

outros processos, como parasitismo, predação e competição podem variar de acordo

com a densidade populacional. Assim, visto que não há beneficio reprodutivo associado

à proximidade, se houver algum efeito decorrente da distribuição espacial de P.

munguba, é possível que ele seja negativo. Indivíduos mais próximos podem, por

exemplo, sofrer uma maior pressão de predação e/ou competição. Dessa forma,

acreditamos que é mais vantajoso para as plantas de P. munguba apresentarem

distribuição mais dispersa.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer à organização do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos

Florestais” (PDFF) e da “Ecologia da Floresta Amazônica” (EFA), pela oportunidade. A

todos os professores e em especial à Paulo Bobrowiec e Bráulio Santos pela orientação

e acompanhamento no campo. E por fim, aos monitores, funcionários e colegas do

“EFA 2011” pelo agradável convívio e apoio.

Page 67: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

67

Referências

Baker, G.H. & I. Baker. 1983. Evolution and diversity of floral rewards, pp. 142-159.

In: Handbook of experimental pollination (C.E. Jones & R.J. Little, eds.). New

York: Van Nostrand Reinhold Company Inc.

Cariveau, D., R.E. Irwin, A.K. Brody, L.S. Garcia-Mayeya & A. von der Ohe. 2004.

Direct and indirect effects of pollinators and seed predators to selection on plant

and floral traits. Oikos, 104:15–26.

Coelho, F.M., M.C.Vega, M. Hidalgo, R. Durães & R.M. Darigo. 2002. Inflorescências

maiores são mais atrativas? Relação entre tamanho da inflorescência e

freqüência de visitação em Isertia hypoleuca Benth. (Rubiaceae). In: Curso de

Campo da Floresta Amazônica (E., Venticinque & J., Zuazon, eds.). Manaus:

PDBFF/INPA.

Fischer, E.A. 2000. Polinizacão por morcegos Glossophaginae versus Phyllostominae

em floresta de terra firme na Amazônia Central. Universidade Estadual de

Campinas, Campinas.

Gorchov, D.L., F. Cornejo, C. Ascorra & M. Jaramillo. 1993. The role of seed dispersal

in the natural regeneration of rain forest after strip-cutting in Peruvian Amazon.

Vegetatio, 107/108:339-349.

Kershaw, K.A. & J.H.H. Looney. 1985. Qualitative and dynamic plant ecology.

Baltimore: Edward Arnold.

Raven, P.H., R.F. Evert & S.E. Eichhorn. 2001. Biologia vegetal. Rio de Janeiro:

Guanabara Koogan.

Sibly, A. & N. Brown. 2007. Effects of body size and lifestyle on evolution of mammal

life histories. PNAS. 104:17707-17712.

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Zimmerman M. 1988. Nectar production, flowering phenology, and strategies for

pollination, pp. 157-178. In: Plant reproductive ecology (Doust J.L. & L.L.

Doust, eds). New York: Oxford University Press.

Page 69: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

69

O forrageio de vespas é influenciado pela produtividade de ambientes aquáticos?

Gregórios dos R. Menezes, Guilherme H. Pereira, Maria Laura F. Ternes, Talita C. dos

S. Bezerra, Thiago B. d’A. Couto

Introdução

De acordo com a teoria de forrageamento ótimo, uma estratégia de forrageamento tende

a se estabelecer quando os benefícios energéticos de um recurso forem maiores que os

custos envolvidos na sua obtenção (Ricklefs 2001). Essas estratégias são mutáveis,

podendo variar de acordo com as variações ambientais nas quais os organismos estão

submetidos (Sterner & Elser 2002). Abelhas do gênero Bombus, por exemplo,

despendem um alto gasto energético para manterem a temperatura do corpo durante o

vôo. Quando a disponibilidade de recursos é baixa, essas espécies centram sua atividade

de forrageio nos momentos do dia onde a temperatura é mais elevada (Bell 1990).

Em ambientes com maior produtividade primária é esperado que haja uma maior

disponibilidade de recursos alimentares para organismos em diferentes níveis tróficos

(Townsend et al. 2003). Como conseqüência, esses níveis tróficos podem sustentar uma

grande diversidade de organismos explorando recursos diferentes (Rossi & Hunt 1988).

Desta forma, um determinado organismo pode variar a quantidade e qualidade dos

recursos consumidos de maneira a maximizar o custo e o benefício de seu forrageio

(Scott 2005).

Vespas adultas normalmente apresentam alta variabilidade nos mecanismos de

forrageamento (Ritcher 2000). Assim, é possível que haja um ajuste no comportamento

de forrageio das vespas de acordo com a produtividade do ambiente e a disponibilidade

dos recursos alimentares (Nakasuji et al. 1976). Nesse sentido, nosso objetivo foi

investigar como ambientes aquáticos com diferentes níveis de produtividade podem

Page 70: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

70

influenciar o forrageamento de vespas. Nossa hipótese é que vespas de ninhos próximos

à ambientes aquáticos pouco produtivos se desloquem mais durante o forrageamento.

Assim, esperamos que o fluxo de indivíduos (i.e. número de entradas e saídas) nos

ninhos seja maior em ninhos próximos a lagos mais produtivos em comparação com

lagos menos produtivos. Isso ocorreria porque é necessário menos tempo para retornar

ao ninho quando se desloca menos para encontrar o recurso alimentar.

Métodos

Nós realizamos o estudo nos lagos Catalão e Navio Velho, localizados próximos a

cidade de Manaus, Amazonas. O lago Catalão foi considerado como um ambiente mais

produtivo, pois é formado pela água branca rica em sedimentos proveniente do rio

Solimões. O lago Navio Velho foi considerado como um ambiente menos produtivo, já

que é formado pela água preta, pobre em nutrientes, proveniente do rio Negro.

Para comparar os dois sistemas, selecionamos 8 ninhos na margem de cada lago.

Em cada ninho estimamos a atividade das vespas com observações focais de cinco

minutos. Presumindo que quanto maior a disponibilidade e proximidade dos recursos,

mais rápido as vespas retornariam ao ninho, consideramos a atividade de forrageio das

vespas como a soma do número indivíduos que entravam e saíam dos ninhos.

Utilizamos teste t para comparar a atividade das vespas entre ninhos localizados em

água branca e água preta.

Resultados

Dentre os ninhos amostrados, houve uma prevalência do gênero Polistes (n = 7) no lago

de água preta e do gênero Polybia (n = 8) no lago de água branca. A atividade média

Page 71: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

71

das vespas não foi afetada pela produtividade do ambiente (t = 0,75; df = 14; p = 0,46;

Figura 1).

Figura 1. Distribuição da atividade média de forrageio das vespas, avaliada pelo número

de entrada e saída nos ninhos em lago de água branca (n = 8) e preta (n = 8), próximos

ao município de Manaus-AM.

Discussão

O padrão de fluxo de vespas na entrada dos ninhos não é afetado pela disponibilidade de

recursos oferecidos pelo ambiente. Provavelmente, a atividade de forrageio das vespas

nos diferentes lagos estudados está mais relacionada com os hábitos alimentares dos

gêneros Polybia e Polistes.

Vespas do gênero Polybia são caracterizadas por apresentar um hábito alimentar

mais especialista (Zanette, comunicação pessoal). No entanto, essas vespas especialistas

foram localizadas apenas em ambientes com alta disponibilidade de recurso, o que

aumenta a probabilidade de captura de suas presas. Em contrapartida, Polistes spp.

foram encontradas exclusivamente em ambientes com baixa produtividade. Essas

Page 72: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

72

vespas são diferenciadas por apresentar uma dieta mais generalista (Cervo et al. 2000),

sendo capazes de capturar uma ampla variedade de alimentos em um raio de até 650 m

do seu ninho (Prezoto & Gobbi 2005). Logo, a semelhança da atividade de forrageio de

Polistes spp. e Polybia spp. nos ambientes com diferente produtividade ocorreram,

provavelmente, pelo balanço da disponibilidade de recursos com o hábito alimentar de

cada gênero.

Agradecimentos

Somos gratos ao INPA e PDBFF, Lorenzo Zanette pela orientação, Manoela Borges,

Laura Leal e Inara Leal pelas sugestões no manuscrito.

Referências

Bell, W.J. 1990. Searching behavior patterns in insects. Annual Review of Entomology

35:447–467.

Cervo, R., F. Zacchi & S. Tullirazzi. 2000. Polistes dominulus (Hymenoptera,

Vespidae) invading North America: some hypotheses for its rapid spread.

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Nakasuji F., H. Yamanaka & K. Kiritani 1976. Predation of larvae of the tobacco

cutworm Spodoptera litura (Lepidoptera, Noctuidae) by Polistes wasps. Kontyu

44:205–13

Richter, M. R. 2000. Social wasp (Hymenoptera: Vespidae) foraging behavior. Annual

Review Entomology, 2000. 45:121–150.

Ricklefs, R.E. 2001. The economy of nature. New York: W.H. Freeman and Company.

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73

Rossi A.M. & J.H. Hunt. 1988. Honey supplementation and its developmental

consequences: evidence for food limitation in a paper wasp, Polistes metricus.

Ecol.Entomol. 13:437–42

Scott, G. 2005. Essential animal behavior. Blackwell Publishing Ltd.

Sterner, R.W. & J.J. Elser. 2002. Ecological Stoichiometry: the Biology of Elements

from Molecules to the Biosphere.Princeton:Princeton University Press.

Townsend, C.R., M. Begon & J.L. Harper 2003. Essentials of ecology. Blackwell

Publishing, Boston.

Prezoto, F. & N. Gobbi. 2005. Flight range extension in Polistes simillimus Zikán, 1951

(Hymenoptera, Vespidae). Brazilian Archieves of Biology and Technology,

48:947-950.

Page 74: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

74

Catalão – projetos livres

O modelo de biogeografia de ilhas se aplica à comunidade de macroinvertebrados

em bancos de macrófitas?

Lucas N. Paolucci, Ana Y.Y. Meiga, Fernando M. Resende, Talita C. dos S. Bezerra e

Thiago B. d’A. Couto

A teoria de biogeografia de ilhas postula que o aumento do número de espécies está

positivamente associado ao tamanho da ilha e negativamente à distância da ilha ao

continente. Supostamente essa teoria também se aplica a habitats dulcícolas que contêm

bancos de macrófitas. Esses bancos abrigam comunidades de macroinvertebrados e se

encontram dispersos na água a diferentes distancias dos bancos nas margens, que podem

atuar como áreas fonte de espécies. Para avaliar se os padrões de riqueza nos bancos de

macrófitas podem ser explicados pelo modelo de biogeografia de ilhas, selecionamos 12

bancos com diferentes tamanhos e distancias da margem localizados em um lago na

Amazônia Central. Coletamos os macroinvertebrados com o mesmo esforço em cada

banco, triamos cada amostra por 15 min e separamos os organismos em morfotipos.

Esperamos que a riqueza de macroinvertebrados aumente com a área do banco de

macrófitas e com a redução da distância do banco para a margem. Encontramos em

média 11,6 morfotipos por banco (min-max=9-16). O número de morfotipos não

apresentou relação com a área (r2=0,22; F(1,8)=3,03; p=0,22), distância da margem

(F(1,8)=0,02; p=0,11) ou com a interação entre esses dois fatores (F(1,8)=1,73; p=0,55).

Nossos resultados indicam que a teoria de biogeografia de ilhas não se aplica ao sistema

estudado. Talvez, devido à proximidade dos bancos, estes constituam um sistema

conectado para os macroinvertebrados, que os utilizam como pontos de passagem para

alcançar locais mais distantes da margem.

Page 75: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

75

Relação entre disponibilidade de nutrientes e investimento heterotrófico da planta

carnívora Utricularia foliosa

Inácio J. M. T. Gomes, Camilla P. Pagotto, Carla B. Madelaire, Franciele P. Peixoto,

Guilherme H. Pereira

Pressões ambientais podem desencadear diferentes respostas adaptativas nos

organismos. A carnivoria em plantas, por exemplo, parece ter sido favorecida em

ambientes com baixo teor nutricional por possibilitar uma forma adicional de adquirir

recursos. Entretanto, em resposta ao meio rico em nutrientes, plantas carnívoras podem

minimizar o investimento na estratégia heterotrófica se os custos energéticos envolvidos

na heterotrofia forem maiores que os custos associados ao investimento autotrófico.

Nesse trabalho avaliamos como a disponibilidade nutricional influencia no investimento

heterotrófico da macrófita carnívora Utricularia foliosa. Essa espécie ocorre na

Amazônia Central, em ambientes de água branca, com maior disponibilidade de

nutrientes e de água preta, com disponibilidade nutricional inferior. Nossa hipótese é

que indivíduos dessa espécie investem mais na estratégia heterotrófica em ambientes de

menor valor nutricional para maximizar a captação de recursos. Nossa previsão é que U.

foliosa terá maior densidade de utrículos (DU) (estruturas de captura de invertebrados)

em ambientes de água preta do que em água branca. Selecionamos 10 indivíduos de U.

foliosa em água branca e preta para quantificar a DU (razão entre o número de utrículos

e o comprimento da raiz). Indivíduos presentes na água branca tiveram maior DU

(18±17,2) que na água preta (3,5±5,1). Sugerimos que isso acontece porque a produção

dessa estrutura demanda grande investimento energético. Assim, em ambientes com

baixa disponibilidade de nutrientes a planta possui menor DU, pois os recursos não

compensam o gasto energético para sua produção.

Page 76: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

76

A seleção do local de forrageio de Jacana jacana (Aves: Jacanidae) está

relacionada à riqueza de macrófitas?

Maria Laura Ternes, Daniel Dainezi, Daniele Cury, Gregório Menezes, Mauro Brum

A disponibilidade e variedade de recursos alimentares são fatores importantes na

seleção de habitat por animais. Para as aves onívoras, a escolha do local de forrageio

pode estar relacionada à riqueza de espécies de plantas. Habitats que abrigam maior

número de espécies vegetais possuem maior disponibilidade de microhábitats e portanto

maior variedade de recursos alimentares para estes animais. Nossa hipótese é que a ave

aquática onívora Jaçanã (Jacana jacana) seleciona bancos de macrófitas com maior

variedade de recursos alimentares. Esperamos que a presença de Jaçanãs forrageando

esteja associada a bancos com maior riqueza de espécies de macrófitas. Para avaliar esta

hipótese selecionamos um ambiente de várzea no lago do Catalão, AM. Registramos a

riqueza de macrófitas amostrando durante três minutos todas as plantas no local onde

avistamos a ave em atividade de forrageio (n=15) e em pontos aleatoriamente

escolhidos onde as aves estavam ausentes (n=15). As Jaçanãs selecionam locais de

forrageio independente da riqueza dos bancos de macrófitas (R² = 0,06 p = 0,08). A

variedade de recursos alimentares pode não ser importante para a escolha do local de

forrageamento para uma ave onívora como a Jaçanã. Como os ambientes de várzea são

altamente produtivos, o forrageamento da Jaçanã poderia estar mais associado à

quantidade que a variedade dos recursos alimentares.

Page 77: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

77

Os maiores não são mais sexies: fêmeas de Acanthagrion sp. não selecionam

machos maiores

Fernanda M. de Oliveira, João P. C. de Menezes, Karla M. Campião, Raul C. Pereira e

Rodrigo Zucaratto

Em geral, fêmeas são o sexo mais seletivo por terem gametas energeticamente mais

custosos e em menor número. Selecionar machos de qualidade melhor pode determinar

grande parte do seu sucesso reprodutivo. Indivíduos em melhores condições usualmente

são maiores. Portanto, fêmeas que escolham machos maiores devem gerar prole de

melhor qualidade. Esperamos que na libélula Acanthagrion sp. machos com maior

comprimento em relação às fêmeas tenham maior chance de cópula. Para testar essa

previsão, amostramos três bancos de macrófitas no Rio Negro. Em cada banco,

selecionamos e fotografamos casais conectados e registramos se a conexão resultou em

cópula. Calculamos a razão comprimento do macho/comprimento da fêmea para cada

casal. Para testar a relação entre tamanho e sucesso de cópula fizemos uma regressão

logística. Amostramos 27 encontros, dos quais 16 resultaram em cópula. Machos

proporcionalmente maiores em relação às fêmeas não tiveram maior probabilidade de

cópula (χ2 = 0,39 ; gl = 1; p = 0,53). Machos de Acanthagrion sp. assediam as fêmeas

constantemente quando estas não estão em cópula. Selecionar apenas machos maiores

dispenderia muita energia para evitar agressões durante o assédio. Uma vez que machos

de libélulas retiram o esperma depositado anteriormente, a falta de preferência na

cópula pode não ser desvantajosa, pois a fêmea não sofreria agressões e não teria que

gerar prole de todos os machos com quem ela copulou.

Page 78: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

78

Anavilhanas – projetos orientados

Os menores chegam primeiro em copas recém-emergidas colonizadas por

aranhas?

João P. C. de Menezes, Fernanda de Oliveira, Karla M. Campião, Mauro Brum e

Rodrigo Zucaratto

Introdução

A ecologia de comunidades concentra-se em investigar padrões em conjuntos de

espécies e detectar processos que geram esses padrões (Chase 2005; Lewinsohn et al.

2006). Esses padrões ocorrem em diferentes escalas e variam de acordo com a escala de

observação (Leibold et al. 2004). Em escalas maiores, as comunidades podem ser

analisadas entre paisagens. Em escalas menores, as variações dos padrões estruturadores

das comunidades podem ser analisadas em gradientes ambientais ou em manchas

temporais de condições e recursos favoráveis para a sobrevivência das espécies (Chase

2005).

Uma abordagem que integra as escalas locais e regionais é a teoria de

metacomunidades. Uma metacomunidade é o conjunto de comunidades em uma região

que apresentam isolamento entre si e estão interligadas pela dispersão das espécies

(Leibold et al. 2004). Quando analisamos estas comunidades em uma escala local,

lugares com menor número de espécies tendem a ser subconjuntos de lugares com

maior número de espécies (Almeida-Neto et al. 2008). Dentro da metacomunidade,

comunidades mais isoladas ou menores são mais sensíveis a processos estocásticos.

Processos como a extinção local de espécies são freqüentes em locais sujeitos a eventos

estocásticos ou mudanças periódicas nas condições ambientais. Nessas áreas, a

Page 79: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

79

colonização se torna um processo importante na estruturação das metacomunidades,

pois os locais recentemente colonizados tendem a abrigar subconjuntos daqueles locais

colonizados há mais tempo (Lewinsohn et al. 2006).

A estrutura das metacomunidades também pode ser determinada pelas

características das espécies (Almeida-Neto et al. 2008). Nesse sentido, uma forma de

explicar a variação na composição e abundância dos organismos ao longo de gradientes

ambientais é a hipótese de Especialização por Escala de Tamanho (EET). Essa hipótese

presume que o tamanho do conjunto total de espécies, a taxa de crescimento da

população e o tempo de geração podem ser sumarizadas em uma única variável, o

tamanho corporal do individuo. Espécies de menor tamanho corporal tendem a ter uma

ampla distribuição e seriam as primeiras a colonizar novas áreas. (Kaspari et al. 2010).

A partir dessa hipótese, é razoável pensar que o tamanho corporal das espécies pode

gerar um padrão aninhado em metacomunidades de ambientes recém colonizados.

Consequentemente, locais onde ocorrem as espécies de maior tamanho corporal seriam

subconjuntos dos locais que abrigassem as espécies de menor tamanho.

Algumas árvores da vegetação ripária de rios sujeitos aos ciclos de inundação

ficam com as copas total ou parcialmente submersas no período da cheia (Junk, 1997).

Na vazante do rio, essas copas começam a emergir, atuando como pequenas ilhas livres

para colonização de uma ampla gama de organismos. Esse tipo de sistema, permite

investigar, se a hipótese de Especialização por Escala de Tamanho gera um padrão

aninhado em função do tamanho corporal em organismos que colonizam copas das

árvores. Nesse estudo, avaliamos se as metacomunidades de aranhas que ocorrem em

copas de árvores recém emersas apresentam um padrão aninhado em função do tamanho

corporal dos indivíduos, conforme prevê a hipótese de Especialização por Escala de

Tamanho.

Page 80: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

80

Métodos

Área de estudo

Desenvolvemos o estudo na Estação Ecológica do Arquipélago de Anavilhanas

(02º47’S; 60º48’O) localizadas no baixo Rio Negro, Amazônia Central. Essa área está

sujeita a inundação anual que pode durar até 270 dias com uma amplitude de até oito

metros, deixando algumas árvores com as copas total ou parcialmente submersas (Junk,

1997).

Coleta de dados

Para testar a previsão de que a especialização por escala de tamanho pode promover um

padrão aninhado em função do tamanho dos indivíduos em uma comunidade, utilizamos

como modelo de estudo a copa das árvores de Symmeria paniculata e a comunidade de

aranhas que ocorrem nessas copas.

Essas árvores ficam total ou parcialmente submersas no período da cheia do rio.

No tempo da vazante, as copas começam a emergir, atuando como pequenas ilhas livres

para colonização de diversos organismos. Utilizamos as aranhas como modelo de

estudo, pois é um grupo abundante, diverso e de fácil amostragem. Além disso, a matriz

de água pode limitar a dispersão destas espécies que não voam entre as copas das

árvores. Nesse sentido, esperamos que as metacomunidades de aranhas que colonizam

essas copas apresentem um padrão aninhado em função do tamanho corporal.

Para a coleta das aranhas escolhemos 19 indivíduos de S. paniculata, com altura

máxima de dois metros em relação à superfície do rio. Escolhemos quatro ramos que

estivessem fora da água em cada indivíduo. Batemos rapidamente cinco vezes em cada

ramo e coletamos todas as aranhas que caíram na bandeja de coleta, colocada logo

Page 81: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

81

abaixo do ramo. Em seguida, identificamos os morfotipos e medimos o comprimento do

cefalotórax. Essa medida foi usada como a medida de tamanho dos indivíduos.

Análise de dados

Consideramos os dados de presença e ausência dos morfotipos encontrados em cada

planta e fizemos a ordenação da nossa matriz de dados em função do tamanho dos

indivíduos. Verificamos o aninhamento dos resultados observados pelo teste de NODF

(nestedness measure based on overlap and decreasing fills). O método consiste em

comparar o NODF observado com os valores de NODF gerados por modelos nulos

aleatorizados (Ulrich et al. 2009). Usamos o modelo de randomização “fixo-fixo”, onde

o número de ocorrência por espécie (coluna da matriz de dados) e o número de espécies

por árvore (linha da matriz) foi mantido constante. As análises foram feitas no programa

R (The R Development Core Team 2009) usando as funções nestednodf e oecosimu do

pacote Vegan.

Resultados

Coletamos 39 morfoespécies de aranhas nas copas de S. paniculata. O tamanho corporal

das aranhas coletadas variou de um a 10 mm. Aranhas com tamanho corporal de 3 a 6

mm foram as mais freqüentes nas copas das árvores. As metacomunidades de aranhas

não estavam aninhadas em função do tamanho corporal (NODF observado = 7,458;

NODF nulo = 5,726; p = 0,19) (Figura 1).

Page 82: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

82

Figura 1. Ordenação das morfoespécies de aranhas em função do tamanho corporal.

Colunas representam morfoespécies de aranhas e as linhas representam as copas das

árvores de Symmeria paniculata em um ambiente de igapó na Estação Ecológica de

Anavilhanas, Amazônia Central.

Discussão

Neste estudo, nós investigamos se metacomunidades de aranhas estavam aninhadas em

função do tamanho das espécies. Era esperado que aranhas menores seriam as primeiras

colonizadoras das copas de árvores recém emersas, devido a sua ampla abundância e

distribuição. Dessa forma, as aranhas menores seriam as mais freqüentes e as maiores só

ocorreriam nas copas que abrigassem maior número de espécies, onde as menores

também ocorressem. Porém, as espécies maiores foram as mais freqüentes e isso pode

ocorrer devido a diferenças no potencial de dispersão das aranhas.

As taxas de dispersão dos organismos podem criar padrões regulares na

estruturação de comunidades. Espécies com maior potencial de dispersão teriam ampla

distribuição geográfica e as de baixo potencial de dispersão teriam distribuição restrita.

(Cook & Queen 1995). O potencial de dispersão está positivamente relacionado ao

tamanho da espécie, uma vez que organismos de maior tamanho corporal normalmente

podem se locomover por maiores distâncias. Assim, sugerimos que o potencial de

Page 83: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

83

dispersão de cada espécie pode ser mais importante que a EET para a estruturação das

comunidades de aranhas nas copas das árvores.

Agradecimentos

Agradecemos ao Fabrício Baccaro pela orientação, ajuda na coleta e elaboração do

manuscrito. Agradecemos também a Cíntia Cornelli, Guilherme, Gregório, Laura, Talita

e Thiago que nos ajudaram na coleta das aranhas. A toda organização do EFA e aos

colegas de turma.

Referências

Almeida-Neto, M., P. Guimarães, P.R. Guimarães Jr, R.D. Loyola & W. Ulrich. 2008.

A consistente metric for nestedness analysis in ecological systems: reconciling

concept and measurement. Oikos, 117:1227-1239.

Chase, J.M. 2005. Towards a really unified theory for metacommunities. Functional

Ecology, 19:182–6.

Cook, R.R. & J.T. Quim. 1995. The influence of colonization in nested species subsets.

Oceologia, 102:413-424.

Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to

Amazonian floodplains, pp.3-17. In: The central Amazon floodplain: ecology of a

pulsing system. (W.J.Junk, ed.). Berlin: Springer.

Kaspari, M., B.S. Stevenson, J. Shik & J.F. Kerekes. 2010. Scaling community

structure: how bacteria, fungi, and ant taxocenes differentiate along a tropical

forest floor. Ecology, 91: 2221-2226.

Leibold, M.A., M. Holyoak, N. Mouquet, P. Amarasekare, J. M. Chase, M.F. Hoopes,

R.D. Holt, J.B. Shurin, R. Law, D. Tilman, M. Loreau & A. Gonzalez. 2004. The

Page 84: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

84

metacommunity concept: a framework for multi-scale community ecology.

Ecology Letters, 7:601–613.

Lewinsohn, T.M., R.D. Loyola & P.I. Prado. 2006. Matrizes, redes e ordenações: a

detecção de estrutura em comunidades interativas. Oecololgia Brasiliensis, 10:90-

104.

The R Development Core Team. 2009. R: A language and environment for statistical

computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna. ISBN 3-900051-07-

0. Disponível em: http://www.R-project.org.

Ulrich, W., M. Almeida-Neto & N.J. Gotelli. 2009. A consumer’s guide to nestedness

analysis. Oikos, 118:3-17.

Page 85: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

85

Rota de colisão ou de fuga: o que estrutura atributos foliares de árvores de

florestas inundáveis?

Daniel I.S. Dainezi, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Fernando M. Resende, Inácio

J. M.T. Gomes

Introdução

Os atributos funcionais dos organismos são características morfológicas, fisiológicas ou

fenológicas que afetam o desempenho dos indivíduos em um determinado ambiente, e

que podem variar em função das interações entre os indivíduos (intra ou

interespecificamente) ou por pressões ambientais (Violle et al. 2007). Se a variação dos

atributos funcionais dos organismos é muito pequena, isso indica que os organismos

estão convergindo. Quando a variação é grande, significa que os organismos estão

divergindo (Pillar et al. 2009). Os organismos de uma comunidade tendem a ser mais

similares em seus requisitos ecológicos, podendo convergir em seus atributos funcionais

quando submetidos à forte pressão de filtros ambientais (Pillar et al. 2009).

Em um ambiente com características muito restritivas, somente organismos que

apresentem atributos funcionais similares conseguem superar as pressões do filtro

ambiental e permanecer no habitat (Weiher & Keddy 2004, Pillar et al. 2009). Quando a

similaridade dos organismos chega ao limite, eles podem começar a divergir quanto a

seus atributos funcionais. Essa divergência permite que indivíduos usem recursos de

maneiras diferentes, mediando à coexistência dos organismos (Pillar et al. 2009). Nesse

contexto, entender os padrões de convergência e divergência funcional é importante

para que se possa compreender as estratégias dos indivíduos na exploração de seu

habitat e, consequentemente, os processos estruturadores da comunidade.

Page 86: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

86

Áreas com características ambientais restritivas, onde as plantas podem ficar

totalmente submersas por meses, como nas áreas alagáveis da Bacia do Rio Negro, na

Amazônia, devem ter um forte efeito do filtro sobre as características das espécies do

local. Por isso, é razoável esperar que as comunidades de plantas desse local estejam

estruturadas pela convergência funcional. Entretanto, como essa área é caracterizada

pela baixa disponibilidade de nutrientes no solo, pode haver um aumento da competição

por esses recursos. Para minimizar os efeitos desse processo, a divergência funcional

também seria uma expectativa válida.

Nesse sentido, nosso objetivo é responder se a competição por recursos ou a

pressão de filtros ambientais estão atuando sobre os atributos funcionais de plantas em

áreas de florestas inundáveis. Se a competição está atuando sobre os atributos

funcionais, esperamos encontrar divergência nos atributos. Se o filtro ambiental é o que

determina, esperamos encontrar convergência nos atributos.

Métodos

Realizamos este estudo em uma floresta inundada (igapó) pelo Rio Negro, no Parque

Nacional de Anavilhanas (02˚07’S; 61˚02’O). Coletamos duas folhas maduras de oito

morfotipos de árvores em 14 pontos nas áreas alagadas do local, separados por pelo

menos 100 m um do outro. Medimos o comprimento e a largura das folhas para calcular

a média da razão comprimento/largura da folha para cada ponto. Também calculamos a

média da área foliar usando a equação da elipse (π*comprimento da folha*largura da

folha/4).

Testamos se a variabilidade da área foliar e da razão comprimento pela largura

das folhas é menor do que o esperado ao acaso. Caso isso ocorra, há evidência de que os

atributos das espécies da comunidade estão estruturados por filtros ambientais. Se essa

Page 87: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

87

variabilidade dos parâmetros escolhidos for maior do que o esperado ao acaso, os

atributos das espécies da comunidade devem ser estruturados por competição. Se não

houver diferença entre a variabilidade observada e a esperada, o padrão randômico dos

atributos dos indivíduos da comunidade deve ser o mais parcimonioso.

Para verificar a variabilidade das folhas dentro de cada ponto de coleta, plotamos em

um gráfico os dados da área foliar em função da razão comprimento/largura da folha.

Ligamos os pontos externos do gráfico para calcular a área do mínimo polígono

convexo. Os pontos externos representam os valores de maior variação dentro do

conjunto de dados. Desta forma, foram gerados 14 mínimos polígonos convexos, cuja

área indica a variação máxima das características foliares de cada ponto amostrado. Para

estimar a variabilidade das folhas esperadas ao acaso, aleatorizamos nossos dados e

obtivemos 1000 áreas de polígono convexo. Com essas 1000 áreas de polígono,

plotamos um gráfico de distribuição de freqüência e observamos onde a área do

polígono convexo dos nossos dados se encaixava nesta distribuição.

Resultados

A área foliar foi em média 77,84 ± 45,19 cm2 (média ± desvio padrão). A razão entre

comprimento e largura foliar foi em média 2,88 ± 0,64. Como a variabilidade média da

área foliar pela razão comprimento/largura das folhas foi menor do que o esperado ao

acaso (p=0,013; Figura 1), houve convergência nos atributos foliares das espécies

estudadas.

Page 88: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

88

Figura 1. Distribuição ao acaso da ocorrência da variabilidade da área do mínimo

polígono convexo gerado ao acaso dentro de um ponto de amostragem. A seta indica a

posição da média das áreas dos polígonos observados.

Discussão

Como a variabilidade dos atributos foliares foi menor do que o esperado ao acaso,

filtros ambientais devem estar atuando sobre as espécies da comunidade vegetal de

florestas inundáveis de igapó. Esses filtros selecionam espécies de árvores adaptadas a

condições especificas da região, como baixa disponibilidade de nutrientes no solo e

regimes sazonais de inundação com submersão parcial ou total das plantas por meses

(Keddy 1992).

Filtros ambientais podem estruturar as estratégias funcionais dos organismos que

ocorrem nas áreas com regimes periódicos de inundação. Tais organismos possuem

adaptações específicas para ocorrer nesse ambiente, como raízes aéreas, aerênquimas,

habilidade de fechar os estômatos e lenticelas e cessar o metabolismo por longos

períodos (Parolin 2001)

Dis

trib

uiçã

o da

oco

rrên

cia

Variabilidade

Page 89: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

89

As características das espécies que compõem as comunidades vegetais são

estruturadas tanto por fatores bióticos como abióticos. O mais comum é que em áreas

pouco restritivas ocorram muitas espécies e portanto, a competição estruture a

comunidade e ocorra divergência entre os atributos das espécies. Ao contrário, em áreas

muito restritivas, com escassez de recursos e condições muito específicas, como

florestas inundáveis de igapó, um menor número de espécies consegue se estabelecer e a

comunidade passa a ser estruturada por filtros, gerando um padrão de convergência dos

atributos das espécies (Weiher & Keddy 2004). Entretanto, ainda é preciso uma melhor

compreensão de quando fatores bióticos ou abióticos terão efeito decisivo sobre a

plasticidade das diferentes características das espécies que compõem as comunidades de

plantas.

Referências

Keddy, P.A. 1992. Assembly and response rules - 2 goals for predictive community

ecology. Journal of Vegetation Science, 3:157–164.

Parolin, P. 2001. Morphological and physiological adjustments to waterlogging and

drought in seedlings of Amazonian floodplain trees.Oecologia, 128:326-335.

Pillar, V.D., Duarte, L.S., Sosinski, E.E. & F. Joner. 2009. Discriminating trait-

convergence and trait-divergent assembly patterns in ecological community

gradients. Jounal of vegetation Science, 20: 334-348.

Violle C., M.L. Navas, D. Vile, E. Kazakou, C. Fortunel, I. Hummel & E. Garnier.

2007. Let the concept of trait be functional! Oikos, 116:882-892.

Weiher, E. & P. Keddy. 2004. Ecological assembly rules: Perspectives, advances,

retreats. UK: Cambridge University Press.

Page 90: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

90

Wilson, J.B. & S.H. Roxburgh. 1994. A demonstration of guild-based assembly rules

for a plant community, and determination of intrinsic guilds. Oikos, 69:267-276.

Page 91: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

91

Os últimos serão os primeiros? A colonização de ilhas formadas por copas de

árvores em sistemas inundáveis ocorre de maneira aleatória

Thiago B. d’A. Couto, Gregório R. Menezes, Guilherme H. A. Pereira, Maria L. Ternes,

Talita Câmara

Introdução

A colonização é um dos principais processos que estruturam comunidades em

ambientes insulares (MacArthur & Wilson 1963, Brown & Kodric-Brown 1977).

Nesses ambientes, a habilidade de dispersão das espécies que saem do continente é um

fator importante para o processo de colonização (Simberloff &Wilson 1969).

Dispersores menos eficientes tendem a ocupar ilhas maiores e mais próximas da fonte,

onde as taxas de extinção são menores (Cook & Quinn 1995). Por outro lado, interações

bióticas, como competição e predação, tendem a ficar mais freqüentes com a chegada de

mais espécies (McCabe & Gotelli 2000).

Durante a colonização, a combinação de dois processos pode determinar a

chegada de novas espécies: adição e substituição de espécies. Na adição, as espécies

novas que chegam são acumuladas, não havendo extinções. Já na substituição, algumas

espécies estabelecidas são excluídas com a chegada de novas espécies, não

apresentando sobreposição (Baselga 2010). Em ilhas, é esperado que a adição de novas

espécies seja mais freqüente que a substituição (Cook & Quinn 1995). Isso ocorre

devido à ordem relativamente determinística de colonização, de modo que espécies com

diferentes capacidades de dispersão tendem a colonizar o ambiente em momentos

distintos (Cook & Quinn 1995). Já em ambientes estruturados principalmente por

interações bióticas, é esperada maior importância da substituição de espécies. Isso

porque a competição e a predação podem excluir antigos colonizadores (Simberloff

Page 92: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

92

&Wilson 1969). Porém, ilhas que estão sendo colonizadas há mais tempo podem

acumular espécies e, conseqüentemente, interações biológicas podem se tornar mais

importantes nesses locais (Wooster & Sih 1995).

Uma maneira de mensurar o aninhamento e a substituição de espécies é a partir da

determinação da diversidade β. A diversidade β pode ser definida como a variabilidade

na composição de espécies entre locais (Magurran 2004, Anderson et al. 2006). Uma

propriedade interessante da diversidade β é que ela pode ser decomposta em um

componente associado à adição de espécies (βaninhamento) e outro (βsubstituição) à

substituição delas (Baselga 2010). Assim, ao decompor a diversidade beta nesses dois

componentes, é possível determinar qual dos processos predomina durante a

colonização.

Para testar se a colonização ao longo do tempo é determinada por adição de

espécies ou por interações biológicas, é preciso estudar um sistema que contenha ilhas

com diferentes idades e que, presumivelmente, recebam espécies por períodos distintos.

Um sistema adequado para esse estudo é o de áreas inundáveis da floresta amazônica,

como as áreas de Igapó. Nesse sistema, diferentemente de ilhas oceânicas, é possível

avaliar o processo de colonização de espécies desde a colonização inicial ao longo de

poucos meses. Isso é possível, porque nas áreas de Igapó, existem pulsos de inundação

previsíveis (Worbes 1997). Durante a cheia, a maior parte da vegetação permanece

submersa, enquanto que ao longo da vazante, a região da copa de algumas árvores se

torna gradualmente exposta. Essa região forma ilhas de vegetação que podem ser

colonizadas por organismos que permaneceram nas áreas que não sofrerem influencia

da cheia. Mesmo quando submersas, as árvores do Igapó permanecem com as folhas

verdes (Worbes 1997). Isso permite que ilhas recentes, supostamente ainda não

colonizadas, tenham características similares de colonização em relação às antigas.

Page 93: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

93

Portanto, a colonização desses locais deve depender somente da área, distância até a

fonte e tempo de exposição das copas.

O nosso objetivo é entender como ocorre a recolonização das copas de árvores

que ficam submersas durante o período de inundação. Nossas hipóteses são que i) o

padrão de colonização dessas ilhas ocorre pela adição de novas espécies (padrão de

distribuição aninhada) ou que ii) o padrão de colonização dessas ilhas ocorre por

substituição das espécies.

Métodos

Área de estudo

Desenvolvemos o estudo em um lago no arquipélago de Anavilhanas, no Rio Negro,

localizado no estado Amazonas, Brasil (02o 07’ S – 6 o 02’ O). A área é caracterizada

por florestas de igapó sazonalmente alagadas. Realizamos a coleta quando o nível do rio

Negro havia descido aproximadamente 140 cm. Nesse período, algumas árvores já se

encontravam parcialmente expostas acima da lamina d’água.

Como modelo de estudo, escolhemos as aranhas por pertencerem a um grupo

diverso, abundante e de fácil amostragem. Além disso, a matriz de água durante a

inundação é uma barreira menos permeável à dispersão das aranhas, já que elas não

voam.

Para avaliar se o tempo de emersão das copas de árvores está relacionado com a

riqueza e a composição da assembléia de aranhas, selecionamos copas de 17 árvores,

localizadas à mesma distância da margem do lago. As árvores possuíam diâmetros

semelhantes e diferentes alturas acima da lâmina da água. Presumimos que a diferença

de altura entre o ponto mais alto das copas emersas e a superfície da água, representa o

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tempo de exposição à colonização (utilizamos árvores com até 200 cm de altura em

relação à lâmina d’água). Em cada copa, sistematizamos a captura das aranhas

utilizando o método de cinco batidas com um bastão de madeira em quatro ramos

distintos, totalizando 20 batidas por copa. Desprezamos os ramos com folhas jovens

(coloração clara e textura tenra), visto que elas seriam sítios de colonização recente.

Coletamos as aranhas que caíam durante as batidas usando uma bandeja com álcool

70% para fixação dos organismos. Após a coleta, caracterizamos as aranhas em

morfotipos.

Utilizamos correlação de Spearman para testar se há relação entre a riqueza e a

altura da copa da árvore em relação à superfície. Para avaliar se há adição de espécies

durante a colonização, utilizamos o modelo de partição de diversidade β sugerido por

Baselga (2010). Como os padrões de substituição e aninhamento normalmente são

confundidos nas métricas de diversidade β tradicionais, decompomos os componentes

no de aninhamento (βaninhamento) e de substituição (βsubstituição). Para isso, calculamos o

índice de dissimilaridade de Simpson e de dissimilaridade de Sorensen entre todos os

pares de ilhas. Obtivemos o componente de β aninhamento ao subtrair a dissimilaridade

de Simpson da dissimilaridade de Sorensen, e o de substituição a partir da

dissimilaridade de Simpson.

Para avaliar qual componente da diversidade β foi mais importante para a

assembléia de aranhas, relacionamos as matrizes contendo os componentes βsubstituição e

βaninhamento entre todos os pares de copas com a matriz de diferença da altura da copa

entre os pares de árvores usando o teste de Mantel (999 permutações). Se a hipótese

associada à adição de espécies for verdadeira, esperamos que: i) dosséis mais altos em

relação à superfície da água possuam maior numero de espécies e ii) o componente de

aninhamento da diversidade β esteja positivamente associado á matriz de diferenças de

Page 95: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

95

altura entre as copas. Se a hipótese associada à substituição de espécies for verdadeira,

esperamos que: i) dosséis mais altos em relação à superfície da água possuem maior

numero de espécies; ii) o componente de substituição da diversidade β esteja

positivamente associado á matriz de diferenças de altura entre as copas.

Resultados

Coletamos um total de 39 morfotipos de aranhas nas copas das árvores emersas. A

altura das copas das árvores em relação à superfície da água variou de 31 a 190 cm. A

riqueza média de morfotipos por copa foi igual a 5,9±2,1 (média±desvio padrão). A

riqueza de morfotipos de aranhas aumentou com o aumento da altura da copa emersa

(Rs=0,62, p<0,01; Figura 1). No entanto, não houve relação dos componentes de

aninhamento (r=0,11; p=0,17) e substituição (r=0,03; p=0,36) com a diferença de altura

das copas (Figura 2).

Figura 1. Relação entre riqueza de morfotipos de aranhas e altura emersa da copa das

árvores em um lago do Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil.

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96

Figura 2. Relação entre a dissimilaridade da composição de espécies de aranhas entre

pares de copas emersas e a matriz de diferença de altura entre pares de copas emersas

das árvores em um lago do Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil. (A)

Dissimilaridade associada ao βsubstituição; (B) Dissimilaridade associada ao βaninhamento.

Discussão

O incremento do número de morfotipos em função do aumento da altura das copas

indica que existe um acúmulo de espécies em função da idade da ilha (i.e. o tempo de

emersão). Consequentemente, a entrada de novas espécies é maior que as extinções

locais. No entanto, a ausência de relação entre as diferenças de altura das copas e o

componente de aninhamento da diversidade β indica que não há uma sequência

determinística de chegada de espécies. Da mesma forma, a ausência de relação entre a

diferença de altura das copas e o componente β de substituição indica que a saída de

uma espécie independe da colonização de outra espécie em particular. Assim, é possível

que a colonização e a extinção em ilhas de dossel ocorram ao acaso.

Page 97: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

97

Alguns estudos têm demonstrado que o componente aninhado é importante para a

colonização de copas de árvores submetidas a pulsos de inundação (e.g. Gonçalves et al.

2008, Pacífico et al. 2009). Avaliando a assembléia de aranhas nas ilhas de dossel do

arquipélago de Anavilhanas, Pacífico et al. (2009) observaram que as espécies de

aranhas nas ilhas menores são subconjuntos das espécies que ocorrem nas ilhas maiores.

Este padrão indica que a área, ao contrário do tempo de exposição, é um fator

estruturante da assembléia de aranhas na colonização de ilhas de dossel (Arcoverde et

al. 2010). Talvez a maior disponibilidade de área permita a coexistência das espécies, ao

reduzir a intensidade das interações entre elas.

Aranhas normalmente têm hábito generalista e predam outras aranhas menores,

sem distinção de espécie (Venticinque 1995). Assim, na colonização por aranhas em

ilhas de dossel, as interações bióticas podem gerar uma exclusão não determinada de

espécies em função da baixa especialização na dieta. Por outro lado, é possível que em

grupos com dieta especializada, a ocorrência de determinados predadores esteja limitada

à presença das presas. Além disso, a competição entre as espécies com dieta semelhante

tenderá a ser maior, aumentando a chance de que a presença de uma espécie impeça a

entrada da sua competidora. Nesse sentido, talvez o padrão de colonização por

substituição seja dependente do grau de especialização alimentar no grupo de espécies

colonizadoras.

Referências

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Page 98: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

98

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Page 100: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

100

Seleção sexual na quela de machos do camarão Macrobrachium cf. amazonicum :

tamanho é documento?

Franciele P. Peixoto, Daniele Cury, Camilla Pagotto, Lucas Paolucci, Raul C. Pereira

Introdução

A teoria de seleção sexual foi proposta como uma forma de explicar o dimorfismo

sexual e a existência de caracteres que presumivelmente reduzem a chance de

sobrevivência de indivíduos de algumas espécies. De acordo com essa teoria, certos

indivíduos podem ter vantagens reprodutivas em relação a outros do mesmo sexo por

possuírem características que aumentem as suas chances de encontro e cópula (Futuyma

1986).

A seleção sexual pode ocorrer pela competição entre indivíduos do mesmo sexo

(seleção intra-sexual) ou pela escolha de parceiros do sexo oposto (seleção inter-sexual)

(Lailvaux & Irschick 2006). A seleção intra-sexual favorece o desenvolvimento de

características utilizadas em interações agonísticas entre indivíduos do mesmo sexo. Ela

pode favorecer, por exemplo, características que confiram vantagens em interações

agressivas entre rivais pelo acesso a parceiros sexuais. Já a seleção inter-sexual

promove o desenvolvimento de características atrativas para indivíduos do sexo oposto.

Essas características permitem que indivíduos do sexo seletivo avaliem a qualidade de

seus pretendentes (Irschick et al 2007).

Machos sexualmente receptivos geralmente são mais abundantes que as fêmeas

aptas para o acasalamento (Andersson 1994). Isso faz com que haja maior pressão de

seleção sexual sobre os machos (Emlen & Oring 1977). Os machos estarão sujeitos à

pressão de seleção sexual tanto em relação às características que serão selecionadas pela

fêmea, quanto em relação aos atributos necessários para vencer a disputa com seu

Page 101: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

101

oponente pelo acesso à ela. Nessas situações, características que indiquem a capacidade

de luta do macho para seus rivais ou a sua saúde para as fêmeas devem ser favorecidos

por seleção sexual. Fêmeas por outro lado, por não sofrerem uma pressão de seleção

sexual tão intensa quanto os machos, dificilmente apresentam características que

indiquem qualidade.

Várias características podem indicar a qualidade do indivíduo, o que pode

originar variações morfológicas nas espécies como, por exemplo, a presença de

estruturas desproporcionalmente maiores (Oliveira 2008). Dado que tais estruturas

indicam qualidade, elas devem ser mais expressivas em indivíduos que possuam

melhores condições. Além disso, se tais estruturas indicam a qualidade dos machos, elas

devem apresentar relações com características confiáveis de condição que são de

avaliação mais difícil, como o nível de simetria. Considerando que o desenvolvimento

de ambos os lados de um organismo bilateral estão sobre o controle dos mesmos genes,

o grau de assimetria de um organismo é um indicativo confiável das interferências

ocorridas durante o seu processo de desenvolvimento. Portanto, a assimetria representa

a qualidade geral do indivíduo (Palmer 1996).

Macrobrachium cf. amazonicum é um camarão de água doce que vive associado

a bancos de macrófitas (Melo 2003). Nessa espécie há um dimorfismo sexual associado

ao tamanho da quela, que é utilizada para captura de presas e para defesa (Melo 2003).

Os machos apresentam quelas maiores e mais espessas em relação às fêmeas. Apesar do

dimorfismo evidente associado a essa estrutura, a função sexual da quela ainda é

desconhecida. Dessa forma, o objetivo do nosso trabalho foi avaliar porque machos de

Macrobrachium cf. amazonicum têm quelas maiores em relação às fêmeas. Nossa

hipótese é que o tamanho das quelas é um indicativo da qualidade do macho, mas não

da fêmea.

Page 102: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

102

Métodos

Amostramos um banco de macrófitas em um lago do arquipélago de Anavilhanas

localizado no Rio Negro, Amazonas, Brasil. No banco de macrófitas, coletamos 10

machos e oito fêmeas do camarão usando um puçá. Fixamos os indivíduos em álcool

40% e os fotografamos. Utilizamos as fotografias para medir o comprimento do corpo,

distância do ponto medial do rostro até a margem dos olhos esquerdo e direito e

comprimento da quela dos camarões usando o programa Image Tool (Wilcox et al.

2002).

Medimos a qualidade dos machos utilizando a assimetria corporal. Usamos o

módulo da diferença entre as distâncias do ponto medial do rostro até a margem dos

olhos esquerdo e direito dos machos de M. cf. amazonicum como medida de assimetria.

Assim, valores altos de assimetria indicam machos com baixa qualidade.

Camarões maiores podem ter quelas maiores simplesmente por um efeito

alométrico. Dessa maneira, para retirar o efeito do tamanho do corpo dos camarões no

tamanho da quela, realizamos uma regressão linear com essas duas variáveis e usamos o

resíduo dessa análise como variável resposta. Testamos se machos e fêmeas com quelas

maiores eram mais simétricos utilizando uma ANCOVA. Se a hipótese de que machos

com quelas proporcionalmente maiores têm maior qualidade for verdadeira, esperamos

que o resíduo da regressão entre o tamanho da quela e o tamanho corporal dos machos

seja positivamente relacionado com a simetria corporal. Para fêmeas, esperamos que

não haja relação do resíduo da regressão entre o tamanho da quela e o tamanho corporal

com a simetria.

Page 103: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

103

Resultados

O tamanho proporcional da quela de machos e fêmeas não aumentou com a assimetria

corporal (F(1,14)<0,001; p=0,99; Figura 1).

Figura 1. Relação entre assimetria e os resíduos da regressão do tamanho da quela e

comprimento do corpo para machos e fêmeas do camarão Macrobrachium cf.

amazonicum, coletados no Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil.

Discussão

A ausência de relação entre o comprimento da quela e a simetria indica que essa

estrutura não demonstra qualidade do macho, seja para machos rivais ou para fêmeas

sexualmente receptivas. O dimorfismo sexual associado à quela pode ser produto da

competição direta entre machos e não da escolha das fêmeas (Lailvaux & Irschick

2006). Como a quela provavelmente não indica qualidade para machos rivais, é possível

que não haja avaliação entre eles antes dos confrontos (Arnott & Elwood 2009). Nesse

Page 104: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

104

sentido, a quela seria uma arma de luta para causar injúrias nos rivais. A falta de

avaliação visual da quela pode ser reforçada pelo fato de que há baixa luminosidade e

visibilidade no rio Negro (Oliveira, 2001), a qual deve ser ainda menor sob os bancos de

macrófitas onde esses camarões são encontrados. Nesse sentido, a seleção visual de

machos por fêmeas ficaria comprometida e o tamanho da quela não seria um critério

crucial para a escolha.

Disputas sexuais entre machos normalmente ocorrem quando há territorialidade

ou confronto direto por fêmeas sexualmente receptivas (Andersson & Iwasa 1996).

Entretanto, como os bancos de macrófitas são hábitats homogêneos, não devem existir

marcadores ambientais que possam ser utilizados para o estabelecimento de territórios

para esses camarões. Nesse sentido, o confronto direto entre machos, quando fêmeas

estão receptivas, pode ser o principal mecanismo atuando na seleção sexual do tamanho

de quela em M. cf. amazonicum.

Referências

Andersson, M. & Y. Iwasa. 1996. Sexual selection. TREE, 11:53-58.

Andersson, M. 1994. Sexual Selection. Princeton: Princeton University Press.

Arnott, G. & W. Elwood. 2009. Assessment of fighting ability in animal constests.

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Page 105: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Lailvaux, S.P. & D.J. Irschick. 2006. A functional perspective on sexual selection:

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Oliveira, R.F., Taborsky, M. & Brockmann, H.J. 2008. Alternative reproductive tactics:

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3.0. San Antonio: University of Texas health Science Center.

Page 106: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

106

Km 41 – projetos orientados

Se a comida morde, eu fujo: resposta das aranhas a presas de diferentes níveis de

periculosidade

Camilla Pagotto, Daniele Cury, Daniel Dainezi, Fernanda de Oliveira, Gregório dos

Reis Menezes

Introdução

A decisão acerca de obtenção de alimentos é um dos principais fatores que influenciam

a sobrevivência dos organismos (Begon et al. 2006). A teoria do forrageamento ótimo

postula que essa decisão leva em consideração os custos e os benefícios envolvidos no

forrageio, de maneira que o consumidor ajusta o seu comportamento a fim de

maximizar o ganho energético líquido (Pyke 1984). Entretanto, nem sempre o forrageio

vai obedecer à regra de maximizar a entrada de energia, pois em algumas situações isso

pode aumentar o risco de predação durante o forrageio. Em função disso, a hipótese do

forrageamento sensível ao risco prediz que a atividade de forrageamento dos

organismos é reduzida quando existe ameaça de predação (Sih 1986).

Embora a hipótese do forrageamento sensível ao risco presuma que o risco

imposto ao consumidor ocorra devido à presença do predador. Em muitos casos, a

própria presa pode apresentar um risco de injúria ou morte ao consumidor. Nessas

situações, é possível que o consumidor também ajuste seu comportamento de forrageio

em função do nível de ameaça oferecido pela presa (Del-Claro 2004). Portanto, presas

com mecanismos de defesa mais letais podem reduzir a chance de que o consumidor

invista energia no seu abate.

Page 107: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

107

O perigo potencial representado pelas presas pode ser detectado pelos

predadores através de estímulos mecânicos, visuais e/ou químicos (Gullan & Grascon

2005). Em particular, aranhas que constroem teias para captura de presas, geralmente

não possuem uma percepção visual acurada (Viera et al. 2007). Por conta disso, a

detecção da presa geralmente está associada à teia. Essa detecção ocorre por um órgão

sensorial, que permite o reconhecimento mecânico de vibrações produzidas pela presa

(Arango & Rico-Gray 2000). O padrão de vibração das presas é informativo e sua

transmissão pelos fios da teia permite que a aranha antecipe características da presa, tais

como sua massa ou grau de atividade (Viera et al. 2007). A avaliação dessas

características permite que a aranha avalie os custos associados à captura e manipulação

da presa e os benefícios obtidos com o seu consumo (Viera et al. 2007).

Se aranhas são capazes de avaliar o retorno associado ao tamanho da presa,então

é possível que elas também ajustem o comportamento de acordo com o nível de ameaça

oriundo das defesas contra predação. Nesse sentido, nosso estudo teve como objetivo

avaliar como aranhas que produzem teias tridimensionais respondem às presas com

diferentes níveis de periculosidade. Nossa hipótese é que as aranhas reconhecem

imediatamente as presas que oferecem maior perigo e apresentam menor preferência por

elas.

Métodos

Área de estudo

Nós realizamos este estudo na reserva do km 41, localizada a 80 km ao norte de

Manaus, Brasil. A reserva é formada por floresta contínua de terra firme e faz parte de

Page 108: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

108

uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) sob co-gestão do Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).

Organismo de estudo

A aranha usada como modelo de predador possui cefalotórax e abdome vermelhos e

pernas pretas e vermelhas. Essa aranha constrói teias tridimensionais no sub-bosque,

normalmente bem próximas ao solo. As teias, possuem uma superfície arredondada com

a parte convexa voltada para o dossel. Essa superfície é composta por fios traçados em

várias direções e a aranha se posiciona na parte côncava dela. Entre a aranha e o solo

existem vários fios solitários traçados a partir da borda da região arredondada da teia.

Coleta de dados

Coletamos indivíduos de duas espécies de formigas para serem utilizadas como modelos

de presas com diferentes níveis de ameaça para aranhas: Ectatomma brunneum

(Ectatominae) (n=15) e Dolichoderus sp. (Dolichoderinae) (n=17). Em comparação à

Dolichoderus sp., Ectatomma brunneum é uma formiga um pouco maior, com

comportamento agressivo, possui ferrão, mandíbulas maiores e exoesqueleto mais

esclerotizado (Hölldobler & Wilson 1990). Diante disso, consideramos essa espécie

como sendo a presa mais perigosa para a aranha. Dolichoderus sp. não possui ferrão,

suas mandíbulas são menores e o exoesqueleto é menos esclerotizado. Por isso a

consideramos como modelo de presa que representa menor periculosidade para a

aranha.

Oferecemos uma única espécie de formiga em cada teia, sempre à mesma

distância em relação às aranhas. Após a colocação da formiga na teia, cronometramos o

tempo em que a aranha levou para chegar à presa (tempo de resposta) e posteriormente

Page 109: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

109

registramos se a aranha atacou ou evitou a presa (tipo de reação). Consideramos que a

aranha atacou a presa quando (1) ela envolveu a presa com teia ou (2) tentou envolver a

presa sem sucesso. Consideramos que houve evitação da presa quando (1) a aranha

fugiu ou se afastou da presa, (2) removeu a presa da teia ou (3) permanceu na mesma

posição se balançando rapidamente.

Para avaliar o tempo de reação das aranhas em relação às duas espécies de

formigas usamos o teste Mann-Whitney. Utilizamos o teste de qui-quadrado para

analisar se o tipo de reação da aranha diferiu para as duas espécies de formiga

utilizadas. Se a hipótese de que as aranhas reconhecem imediatamente as presas que

oferecem maior perigo e apresentem maior preferência por elas for verdadeira,

esperamos que (1) o tempo de resposta das aranhas para Ectatomma brunneum seja

maior do que o tempo de resposta à Dolichoderus sp. e (2) após a detecção da presa na

teia, as aranhas evitarão Ectatomma brunneum e atacarão Dolichoderus sp.

Resultados

O tempo de resposta das aranhas foi semelhante para os dois tipos de formigas (U=93,5;

N=32; p=0,10, Figura 1). O tempo médio de resposta quando a presa foi E. brunneum

foi de 27,06 s (DP=59,5) e quando foi de Dolichoderus sp. 9,2 s (DP=8).

As aranhas atacaram mais freqüentemente quando a presa era representada por

Dolichoderus sp (χ²=17,9; gl= 1; p< 0,001). Houve ataque em 88% dos testes com

Dolichoderus sp. e apenas 12% dos testes com E. brunneum. Todos os indivíduos de

Dolichoderus sp. foram enrolados com teia. Com relação E. brunneum, sempre que a

aranha atacou essa formiga, ela tentou envolvê-la na teia, mas não obteve sucesso. Em

apenas uma ocasião a aranha removeu E. brunneum.

Page 110: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

110

Camponotus sp. Ecta tomma sp.0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Tem

po d

e de

tecç

ão (

s)

Dolichoderus sp. Ectatomma brunneum

Tem

po

de

re

spo

sta

(s)

Formiga

Figura 1. Tempo de resposta (s) das aranhas em relação à oferta das formigas E.

brunneum e Dolichoderus sp. na floresta contínua do Km 41 (ARIE-PDBFF),

Amazonas, Brasil

Discussão

O tempo de reação das aranhas na presença de Ectatomma brunneum e Dolichoderus sp.

foi semelhante, o que demonstra que a detecção do nível de periculosidade dessas presas

pela aranha não é imediata. Aranhas conseguem diferenciar moscas de formigas que

caem na teia por meio das diferenças nas vibrações produzidas por estes insetos (Viera

et al. 2007). Talvez, diferentes espécies de formigas produzam um padrão similar de

vibração nas teias, impedindo que a aranha seja capaz de detectar diferenças produzidas

por diferentes espécies de formigas.

Uma vez que a aranha não distingue as vibrações nas teias produzidas pelas duas

espécies de formiga, a avaliação do nível de periculosidade talvez só seja possível

quando a aranha se aproxima dessas formigas. Sendo assim, outros mecanismos devem

permitir que ela avalie os riscos associados à captura de presas mais perigosas. Talvez

Page 111: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

111

as aranhas usem a percepção tátil na detecção de diferenças quanto à dureza do

exoesqueleto. Além disso, outras formas de detecção associadas a pistas químicas ou o

comportamentais podem afetar a chance de predação (Viera et al. 2007).

Eventualmente o maior tamanho de E. brunneum em relação a Dolichoderus sp.

pode ter sido responsável pela menor freqüência de ataque. Presas maiores podem

oferecer maiores custos para captura ou eventualmente gerar danos mais sérios na teia, e

portanto, podem ser desvantajosas (Viera et al. 2007). No entanto, as aranhas raramente

removeram E. brunneum da teia, indicando que manter a formiga presa, mesmo sem

envolvê-la na teia pode ser vantajoso. Caso a presa permaneça na teia sem que a aranha

a envolva com seda, é possível que ela espere a formiga atingir a exaustão o que

facilitaria sua manipulação. Assim, apesar de haver maior chance de ocorrerem danos à

teia ou da presa se libertar, a aranha pode ajustar a captura para minimizar o risco de

injúrias e garantir um alto retorno energético devido ao maior tamanho da presa.

Concluímos que a percepção da aranha ao risco representado pela presa em

potencial não é determinado por vibrações na teia e que outros mecanismos permitem

que ela avalie os riscos associados à captura de presas mais perigosas. Dessa forma, não

apenas as presas podem ajustar sua atividade de forrageio de acordo com a ameaça

imposta pelo predador. O predador também pode ajustar o seu forrageio em função do

perigo associado à captura de presas, que lhe ofereçam maiores riscos durante a captura.

Referências

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use by the Green lynx spider Peucetia viridians (Oxyopidae) inhabiting

Cnidscolus aconitifolius (Euphorbiaceae). Journal of Arachnology, 28:185-194.

Page 112: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Editora Interciência

Page 113: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

113

Apertado, mas nem tanto: rugosidade do ambiente não influencia no tamanho de

formigas e dominância

Talita C. dos S. Bezerra, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Mauro B. Monteiro-

Junior e Raul C. Pereira

Introdução

As diferenças morfológicas dos organismos determinam como eles usam o hábitat e

exploram os recursos (MacArthur & Pianka 1966). Mesmo em grupos

morfologicamente similares, relações alométricas entre as espécies podem determinar o

uso diferencial do hábitat (Hutchinson 1959, Farji-Brener et al. 2004).

O tamanho, em particular, pode afetar a eficiência com que um organismo se

desloca em hábitats com diferentes estruturas (Thompson 1961, Morse et al. 1985,

Levin 1992). A hipótese do tamanho-grão (size-grain hypothesis) postula que o

ambiente impõe restrições aos organismos associadas ao tamanho corporal, de forma

que organismos menores são mais restritos a ambientes com mais rugosidade

(quantidade de interstícios entre as estruturas do ambiente) do que animais maiores

(Kaspari & Weiser 1999). Assim, espécies pequenas utilizam interstícios como

microhábitats, enquanto espécies grandes não têm acesso a esses ambientes, tendo que

se deslocar por cima de microhábitats de alta rugosidade.

A hipótese do tamanho-grão aparentemente explica diferenças na eficiência de

captação de recursos entre espécies de formigas (Farji-Brener et al. 2004). Formigas

maiores supostamente têm vantagem em ambientes com rugosidade baixa e média, pois

se movimentam mais rapidamente em superfícies mais planas (Bartholomew et al.

1988). No entanto, elas não conseguem se infiltrar em ambientes com alta rugosidade,

Page 114: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

114

como o interstício do folhiço em florestas, que é explorado por formigas menores (Farji-

Brener et al. 2004).

Se a rugosidade determina quando formigas pequenas ou grandes chegarão

primeiro ao recurso, isso pode determinar quando ele será monopolizado. Espécies

pequenas em geral recrutam em massa quando encontram o recurso (Lach et al. 2010).

Já espécies grandes forrageiam solitariamente e carregam grandes quantidades de

recursos (Hölldobler & Wilson 1990). Sendo assim, se a rugosidade é alta, espécies

pequenas tendem a chegar primeiro e conseqüentemente o recurso será monopolizado.

Quando as formigas grandes chegam primeiro, se espera o padrão contrário.

Formigas apresentam elevada riqueza e abundância no solo de florestas tropicais

onde o folhiço é um componente predominante (Hölldobler & Wilson 1990). A grande

quantidade de folhiço depositada nesses ambientes fornece variedade de microhábitats

que permitem a coexistência dessas espécies (Silva & Brandão 2010). No entanto, os

processos específicos que permitem essa coexistência ainda não foram esclarecidos.

Nesse sentido, nos propomos a avaliar a hipótese que em hábitats com maior rugosidade

proporcionada pelo folhiço, formigas menores são mais eficientes para encontrar o

recurso.

Métodos

Conduzimos o estudo em uma área de platô de floresta de terra firme contínua,

localizada na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Km 41 (02°24’S e

59°44’O) na Amazônia Central, Brasil. A área é administrada pelo “Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais” (INPA/Smiththsonian Institute).

Para avaliar se o aumento da rugosidade do ambiente limita o acesso de espécies

grandes de formigas ao recurso, simulamos a rugosidade com um experimento pareado

Page 115: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

115

com dois tratamentos: pouca serrapilheira (300 g, quantidade semelhante do que

encontrado na floresta estudada) e muita serrapilheira (600 g). Em cada amostra,

distribuímos a serrapilheira de cada tratamento em uma área de 50 cm x 50 cm com uma

distância de 10 cm entre eles. No centro de cada tratamento colocamos um plástico de 5

x 5 cm com uma isca composta por ovo e farinha. Montamos 15 pares experimentais

separados por 10 m de distância, a fim de evitar o acesso da mesma colônia de formigas

a mais de um par. Depois de dispor as iscas, esperamos por 1:30 h antes de coletarmos

as formigas presentes no recurso. Esse tempo é suficiente para que se estabeleça

dominância de espécies de formigas (Baccaro et al. 2009). Depois de coletar as

formigas, tiramos fotos delas e obtivemos as medidas de Weber (comprimento do tórax)

usando o programa ImageTool. Em seguida, identificamos as formigas e quantificamos

o número de indivíduos por espécie em cada isca para investigar se houve alguma

espécie dominante em cada tratamento. Consideramos uma espécie como dominante

quando ela ocorreu sozinha na isca com 10 ou mais indivíduos. Quando havia mais de

uma espécie, consideramos que a isca foi dominada quando a espécie mais abundante

apresentou mais de 10 indivíduos e mais que o dobro da abundancia em relação à

segunda espécie mais abundante na isca (adaptado de Bestelmeyer et al. 2000).

Se a hipótese de que o aumento da rugosidade do ambiente limita o acesso de

espécies de formigas maiores ao recurso for verdadeira, esperamos que no tratamento

com mais folhiço, o tamanho médio das formigas nas iscas seja menor. Além disso, o

tratamento com mais folhiço terá maior frequência de dominância nas iscas que o

tratamento com pouco folhiço. Para analisar o efeito da rugosidade do ambiente no

tamanho das formigas realizamos um teste t pareado. Para avaliar se a freqüência de

dominância das iscas diferiu entre os tratamentos realizamos um teste de qui-quadrado.

Page 116: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

116

Resultados

Encontramos formigas nos dois tratamentos do mesmo par em oito situações. O

tamanho de formigas foi similar entre os tratamentos com muito e pouco folhiço

(t=1,20; gl=7; p=0,13; Figura 1). Aproximadamente 40% das iscas foram dominadas.

Não houve variação na freqüência de dominância das formigas entre as diferentes

quantidades de folhiço (χ²=0,51; n=30; gl=1; p=0,47).

Figura 1. Tamanho médio das formigas de cada amostra para tratamentos pareados com

muito e pouco folhiço na ARIE do km 41, Amazonas, Brasil. Linhas pontilhadas ligam

amostras pareadas de cada réplica.

Discussão

O fato do tamanho médio das formigas ter sido similar entre os tratamentos indica que

variações no volume da serrapilheira não devem funcionar como um filtro que restrinja

a chegada de espécies de diferentes tamanhos ao recurso. Talvez todo o conjunto local

de espécies tenha conseguido chegar à isca. Sem restrições associadas ao tamanho das

espécies, as interações que determinam a dominância de recursos não variaram entre os

tratamentos, o que explicaria a mesma freqüência de dominância.

Page 117: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

117

Formigas possuem grande força física e por isso conseguem se deslocar em

ambientes complexos (Hölldobler & Wilson 1990). A grande força física deve permitir

que elas superem barreiras físicas impostas pela rugosidade do folhiço. Formigas

pequenas, por sua vez, mesmo sem a necessidade de deslocar barreiras físicas em

ambientes com maior rugosidade, devem ter que se deslocar por distâncias maiores. Isso

é esperado, pois a área de superfície deve ser maior em ambientes mais rugosos

(Bartholomew et al. 1988). Portanto, enquanto formigas grandes caminham distâncias

menores tendo que deslocar barreiras físicas, as pequenas podem contornar os

obstáculos, mas caminham distâncias maiores, resultando em um mesmo tempo de

encontro dos recursos. Nesse sentido, outras formas de partição do recurso, como

territorialidade ou partição temporal, devem explicar a coexistência de espécies de

formigas no solo de florestas tropicas.

Referências

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Page 119: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

119

Formigas em ilhas de néctar: tamanho e isolamento importam?

Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. M. T. Gomes, Maria L. Ternes, Karla M. Campião e

Rodrigo Zucaratto

Introdução

A Teoria de Biogeografia de Ilhas postula que a riqueza de espécies está correlacionada

positivamente ao tamanho da ilha e inversamente relacionada ao seu grau de isolamento

(MacArthur & Wilson 1967). Isso ocorre porque ilhas com áreas maiores podem abrigar

populações maiores e, consequentemente, apresentarem menores taxas de extinção.

Da perspectiva do isolamento, a riqueza de espécies é maior em ilhas mais próximas ao

continente porque o oceano funciona como uma barreira para a migração das espécies,

diminuindo suas taxas de colonização. Sendo assim, a riqueza de espécies da ilha resulta

do balanço entre as taxas de colonização e extinção.

A teoria de biogeografia de ilhas foi inicialmente proposta para ilhas oceânicas.

No entanto, vem sendo aplicada em diferentes ambientes descontínuos que apresentam

tamanhos e graus de isolamento diferentes, tais como ilhas em lagos, fragmentos

florestais, topos de montanha e árvores em agrossistemas (Gotelli & Graves, 1996).

Nesta perspectiva, plantas que crescem isoladamente podem ser consideradas ilhas

ecológicas em escala de microhabitat para invertebrados, como formigas.

Muitas espécies de plantas tropicais produzem nectários extraflorais que atraem

alguns grupos de insetos, principalmente formigas (Cogni et al. 2010). Ao andarem

sobre as plantas, as formigas atacam e removem outros insetos, normalmente

herbívoros. Dessa forma, as formigas favorecem o crescimento e sucesso reprodutivo da

planta (Almeida & Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). Várias espécies de formigas

podem visitar os nectários extraflorais de uma mesma planta (Almeida & Figueiredo

Page 120: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

120

2003, Leal et al. 2006). Sendo assim, é possível que em plantas grandes e/ou com outros

co-específicos nas suas proximidades, colônias localizadas em um raio grande ao redor

da planta tenham acesso aos nectários extraflorais. Isso resultaria em uma alta riqueza

de formigas visitantes. De forma contrária, em plantas pequenas e/ou isoladas, apenas

algumas colônias localizadas nas proximidades do tronco poderiam visitar os nectários

extraflorais, havendo baixa riqueza de formigas associadas a estas plantas.

Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi responder o que determina a

riqueza de espécies de formigas visitantes dos nectários extraflorais de Croton

lanjouwensis (Euphorbiaceae). Nossa hipótese é que o tamanho da planta e seu

isolamento em relação ao co-específico mais próximo, que funcionaria como fonte de

novos indivíduos, determinam a diversidade de espécies de formigas.

Métodos

Realizamos o estudo na estrada que dá acesso à Reserva Florestal do km 41, localizada

80 km ao norte de Manaus, AM. A vegetação na região é composta por floresta

contínua de terra firme. O clima é do tipo tropical úmido da classificação de Köppen

(Peel et al. 2007) com temperatura média de 26,7 º C e pluviosidade anual em torno de

2.186 mm. O solo dominante na área é o Latossolo Amarelo distrófico, pobre em

macronutrientes como P, K e Ca e altamente lixiviado (Chauvel et al. 1987).

Para a amostragem, adotamos a espécie Croton lanjouwensis Jabl.

(Euphorbiaceae) como modelo. A espécie tem um porte arbóreo, é pioneira e comum

em capoeiras de platô e vertente. Os indivíduos dessa espécie possuem um par de

nectários extraflorais na face abaxial da folha, próximos à inserção peciolar no limbo

foliar. Esses nectários exudam um néctar bastante atrativo para as formigas.

Page 121: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

121

Selecionamos 15 espécimes de C. lanjouwensis (indivíduos focais) de diferentes

tamanhos e distância em relação ao co-específico mais próximo ao longo da estrada.

Como medida de tamanho, utilizamos o volume da planta focal, obtido através da altura

e do diâmetro do tronco à altura da primeira ramificação (DAR). Obtivemos o volume

multiplicando a altura total da planta pela área da circunferência do tronco, determinada

a partir do DAR. Como medida de isolamento, utilizamos o sombreamento em relação

ao co-específico. Para determinar o sombreamento, dividimos a distância entre cada

indivíduo focal e seu co-específico pelo volume do co-específico, calculado da forma

descrita anteriormente para o indivíduo focal.

Para estimar a riqueza de formigas, analisamos o número de espécies em cada

indivíduo focal durante dois minutos. Coletamos as formigas e acondicionamos em

frascos plásticos identificados e contendo álcool 70% para fixação e posterior

identificação em laboratório.

Nossa previsão é que o número de espécies de formigas visitando os nectários

extraflorais de C. lanjouwensis será maior em indivíduos de maior volume e menor grau

de sombreamento dos indivíduos co-específicos.

Resultados

Encontramos 10 espécies de formigas (Azteca sp., Camponotus crassus, Camponotus

sp., Cephalotes sp., Crematogaster erecta, Dorymymex sp., Ectatomma sp., Pheidole

sp., Pseudomyrmex peruvianus e Pseudomyrmex sp.) nos 15 indivíduos de C.

lanjouwensis amostrados. O número de espécies de formigas por planta variou de um a

quatro (2,87±0,89). O volume das plantas variou de 0,001 a 2,33 m3 (0,38±0,58) e o

sombreamento do co-específico mais próximo variou de 0,92 a 1061 m2

(840,89±365,99).

Page 122: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

122

A riqueza de espécies de formigas não teve relação com seu volume e com o

sombreamento do co-especifico (F(14,1)=0,58451; p=0,46; Figuras 1 e 2).

Figura 1. Relação entre o resíduo da regressão entre riqueza de espécies de formigas e

sombreamento e o volume da planta C. lanjouwensis.

Figura 2. Relação entre o resíduo da regressão entre riqueza de espécies de formiga e

volume da planta C. lanjouwensis focal e o sombreamento do individuo co-especifico

mais próximo.

Page 123: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

123

Discussão

Nesse estudo, avaliamos se a Teoria de Biogeografia de Ilhas explicava a riqueza de

formigas visitantes dos nectários extraflorais em árvores de Croton lanjouwensis.

Porém, não encontramos relação entre a área e isolamento das árvores e a riqueza de

formigas.

A relação entre formigas e plantas com nectários extraflorais é considerada um

mutualismo facultativo, pois várias espécies de formigas podem visitar a mesma planta

(Leal et al. 2006). Nessas ocasiões, pode haver tanto partilha quanto competição pelo

recurso (Longino, 1989). Essas diferentes interações entre as espécies de formigas que

visitam os nectários extraflorais podem explicar o fato de que não houve diferença na

riqueza de formigas entre os indivíduos de C. lanjouwensis estudados em função do

tamanho e isolamento. Segundo a Teoria de Biogeografia de Ilhas, todas as espécies

teriam as mesmas chances de colonizar ou se extinguir em uma ilha, e a riqueza desta

resultaria apenas do balanço entre as taxas de imigração, determinadas pelo seu grau de

isolamento, e as de extinção, determinadas pelo seu tamanho. Assim, as diferentes

interações ocorrentes entre as espécies visitantes dos nectários extraflorais de C.

lanjouwensis podem influenciar a riqueza de espécies nas plantas.

Os locais de nidificação e tamanho das colônias são fatores que afetam a

habilidade competitiva das formigas (Longino, 1989). Nesse sentido, formigas de

ninhos mais próximos e colônias mais numerosas seriam beneficiadas em relação às

demais. Além disso, algumas espécies de formigas que visitam nectários extraflorais

podem exibir comportamento territorialista (Leal et al. 2006). Indivíduos de espécies

territorialistas podem limitar o número de espécies na árvore por meio de interações

agonísticas com outras espécies. Uma das espécies de formigas que encontramos nas

Page 124: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

124

árvores de C. lanjouwensis é Azteca sp. Indivíduos deste gênero geralmente são

dominantes numericamente e exibem comportamento territorialista (Hölldobler &

Wilson 1990). Talvez a presença de Azteca sp. tenha reduzido o número de espécies de

formigas nas árvores.

Concluímos que o tamanho e o isolamento das árvores de C. lanjouwensis não

determinam a riqueza de espécies de formigas visitantes dos seus nectários extra-florais,

e que outros fatores, como interações interespecíficas, poderiam influenciar a riqueza de

formigas nessa espécie de planta.

Referências

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Princeton University Press.

Peel, M.C., B.L. Finlayson & T.A. McMahon. 2007. Updated world map of the

Köppen-Geiger climate classification. Hydrology and Earth System Sciences,

11:1633–1644.

Page 126: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

126

A grama do vizinho é mais verde: a proximidade entre ninhos determina a

composição de plantas epífitas em jardins de formigas

João P. C. Menezes, Fernando M. Resende, Franciele Parreira, Lucas N. Paolucci e

Thiago B. d’A. Couto.

Introdução

Comunidades são delimitações arbitrárias de várias populações vivendo e interagindo

em um mesmo local e no mesmo intervalo de tempo (Emlen 1977, Ricklefs 1990). A

estrutura dessas comunidades pode ser influenciada por fatores bióticos e abióticos que

operam em várias escalas espaciais e temporais (Ribeiro et al. 2007). As influências

desses fatores resultam principalmente de propriedades intrínsecas de cada organismo e

das interações existentes entre eles. Dessa forma, a coexistência entre espécies vegetais

pode ser explicada por diferentes processos, dentre eles a sucessão ecológica, os filtros

ambientais ou a distribuição aleatória de espécies dentro da comunidade (Horn 1974,

Hubbell 2001, Silvertown 2004).

O processo de sucessão propõe que há adição e/ou substituição de espécies ao

longo de um gradiente temporal, de forma que haja mudança na composição e na

riqueza de espécies da comunidade ao longo do tempo (Horn 1974). Assim, pressupõe-

se que comunidades em um mesmo estágio sucessional tendem a ser mais similares em

relação à composição de espécies. Por outro lado, as comunidades podem ser

organizadas através da seleção por filtros ambientais. Assim, as características do

ambiente selecionam as espécies que vão ocorrer na comunidade devido à sua

capacidade de utilizar determinados recursos (Begon et al.1990). Nestes casos, as

comunidades teriam uma composição de espécies mais semelhante devido à

similaridade das condições e recursos.

Page 127: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

127

Há comunidades onde as espécies se distribuem de maneira aleatória no tempo e

no espaço. Essas comunidades são preditas pela teoria neutra, que considera que todas

as espécies possuem a mesma capacidade de utilizar os recursos e que sua ocorrência

depende de processos estocásticos. O pressuposto dessa teoria é de que as espécies são

ecologicamente equivalentes e que teriam chances iguais de sobreviver e reproduzir

(Hubbell 2001). Assim, o único processo que limitaria a ocorrência de uma espécie seria

a probabilidade de dispersão. Dessa forma, é esperado que comunidades mais próximas

geograficamente sejam mais similares simplesmente devido à menor probabilidade das

espécies colonizarem lugares distantes.

Os jardins de formigas são modelos de comunidades formados por um complexo

mutualismo, onde plantas epífitas são beneficiadas pela dispersão, nutrição e proteção

decorrente das associações com as formigas. Por outro lado, as raízes das epífitas

fornecem recursos alimentares e reforçam a estrutura do ninho (Hölldobler & Wilson

1990). Dentre as plantas epífitas conhecidas, apenas um pequeno número ocorre em

comunidades formadas nesses jardins. Estudos relataram que há uma seleção das

sementes pelas formigas devido a compostos atrativos, além de haver uma dinâmica de

facilitação no estabelecimento das epífitas (Lodi 2010). Dessa forma, não se sabe como

a comunidade de epífitas se organiza ao longo do tempo e do espaço.

Nosso objetivo foi avaliar qual processo estrutura as comunidades de epífitas dos

jardins de formigas. Nossas hipóteses são que i) as comunidades de epífitas são

estruturadas por sucessão, que ii) as comunidades de epífitas são estruturadas pelos

filtros ambientais e que iii) as comunidades de epífitas são estruturadas de forma

aleatória.

Page 128: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

128

Métodos

Área e modelo de estudo

Realizamos esse estudo em uma área de floresta de terra firme na Reserva Km 41, do

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (INPA/PDBFF), localizada a

cerca de 80 Km ao norte de Manaus (AM), na Amazônia Central (2o 24' S e 59o 44'). A

temperatura média anual da região é de 27 ºC e a precipitação é de cerca de 2.300 mm

por ano.

Os jardins de formiga consistem em agregados de epífitas reunidas por formigas

de diferentes espécies que vivem em parasimbiose (Davidson 1988). Na Amazônia

Central, os jardins são formados por duas espécies de formigas, Camponotus femuratus

(Formicinae) e Crematogaster levior (Myrmicinae) (Leal 2010). Indivíduos de

Crematogaster levior incorporam sementes de plantas epífitas às paredes dos seus

ninhos (Hölldobler & Wilson 1990). Quando essas sementes germinam, as raízes das

epífitas aumentam a estabilidade da colônia junto à planta suporte (Hölldobler &

Wilson 1990). Existem 16 espécies de plantas epífitas que ocorrem em associação a

esses ninhos (Jacovak 2006). Essas espécies apresentam sementes pequenas, frutos

suculentos e nectários florais e extraflorais.

Coleta de dados

Amostramos 18 jardins de formigas nas margens da estrada de acesso à Reserva Km 41.

Coletamos todas as espécies de epífitas presentes em cada jardim e classificamos em

morfotipos. Utilizamos a área dos jardins como um indicativo de sua idade, uma vez

que jardins de formigas recém formados são menores, aumentando sua área ao longo do

Page 129: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

129

tempo. Calculamos a área dos jardins (AJ) pela fórmula da elipse (AJ= π*comprimento

do jardim*largura do jardim/4) (Jacovak 2006).

Para caracterizar as condições ambientais dos locais em que se encontram os

jardins, avaliamos três variáveis ambientais: i) disponibilidade de luz, ii) número de

ramificações utilizados para a sustentação do jardim e iii) altura do jardim em relação ao

solo. A disponibilidade de luz pode influenciar o estabelecimento de epífitas (Huston,

1995). O número de ramificações do forófito pode influenciar o formato e na estrutura

do jardim, que pode determinar a disponibilidade de microhabitats para as epífitas. A

altura dos jardins, por sua vez, pode alterar as condições microclimáticas nas quais eles

estão submetidos. Assim, jardins localizados mais próximos do solo estão sujeitos a

temperatura e umidade mais elevadas que aqueles mais altos. Portanto, esses três fatores

ambientais podem influenciar a composição de epífitas associadas aos jardins de

formigas e atuarem como filtros ecológicos nesse sistema. Medimos a disponibilidade

de luz com um esfero-densiômetro convexo próximo ao tronco da árvore suporte.

Calculamos a altura dos jardins com auxilio de fita métrica e quantificamos o número de

ramificações do forófito utilizado para a sustentação do jardim.

Para saber se as comunidades de epífitas são estruturadas de forma aleatória,

sendo limitadas apenas pela dispersão das espécies, medimos a distância geográfica

entre os jardins. Para os jardins localizados até 10 m, calculamos a distância com

auxílio de fita métrica. Para aqueles localizados a distâncias superiores a 10 m,

marcamos a coordenada geográfica de cada jardim utilizando um GPS e,

posteriormente, calculamos a distância entre eles.

Page 130: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

130

Análise de dados

Para testar quais desses processos estruturam as comunidades de plantas epífitas

presentes nos jardins de formigas, calculamos uma matriz de similaridade de Sorensen

baseada na ocorrência de morfotipos das epífitas em cada jardim. Calculamos também

uma matriz para as diferenças das áreas entre jardins, uma para as diferenças das

variáveis ambientais padronizadas (i.e. os dados originais são divididos pelo maior valor

de cada variável ambiental) e outra para as diferenças das distâncias geográficas entre

os jardins de formigas. Relacionamos essas três matrizes, separadamente, com a matriz

de similaridade de morfotipos de epífitas. Testamos essas relações pelo teste de Mantel

com 999 permutações utilizando o pacote Vegan do software R (R Development Core

Team 2011).

Caso as comunidades de epífitas sejam estruturadas por sucessão, esperamos que

jardins com áreas similares apresentem composição florística similar. Caso sejam

estruturadas por pressão de filtros ambientais, esperamos que jardins com condições

ambientais similares apresentem composição florística similar. Por último, caso a

comunidade de epífitas dos jardins de formigas seja estruturada de forma aleatória,

esperamos que jardins mais próximos entre si sejam similares floristicamente.

Resultados

A área média dos jardins foi de 759,2 cm², variando de 42,5 a 2.409 cm². Em relação às

variáveis ambientais, a altura média dos jardins amostrados foi de 3,2±1,5 m

(média±desvio padrão), a luminosidade média foi de 87% ±0,09 e o número médio de

ramificações da árvore suporte utilizados para a sustentação do jardim foi de 2,3 (min-

máx=1-6). Quanto às relações entre as matrizes, não observamos relação entre a

similaridade de espécies de epífitas e as áreas dos jardins de formigas (r=-0,04; p=0,68;

Page 131: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

131

Figura 1) e nem entre a similaridade florística e as variáveis ambientais dos jardins

(r=0,12; p=0,19; Figura 1B). Contudo, observamos que jardins mais próximos entre si

possuem maior similaridade de espécies de epífitas quando comparados aos jardins mais

distantes (r=-0,36; p=0,01; Figura 1C).

Figura 1. Relação entre similaridade de espécies de plantas epífitas em jardins de

formigas e A) diferença de área (∆ Área do ninho), B) diferença entre as variáveis

ambientais (∆ Variáveis ambientais) e C) diferença da distância (∆ Distância entre

ninhos) entre jardins de formiga na Amazônia Central.

Page 132: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

132

Discussão

A idade dos jardins não é determinante na composição de epífitas associadas às

formigas. Assim, nossos resultados não suportam as conclusões de Davidson (1988), de

que há um processo de facilitação no estabelecimento de epífitas associadas aos jardins

de formigas ao longo do tempo. Da mesma maneira, variáveis ambientais não atuam

como filtros nas comunidades de epífitas, provavelmente devido à oferta não limitante

de recursos, como luminosidade e áreas para construção de ninho. Ambientes com

grande oferta de recursos possibilitam a co-ocorrência de mais espécies, o que não

limitou a distribuição de epífitas associadas aos jardins. Desse modo, neste sistema não

há um padrão recorrente de abundância de espécies no tempo e no espaço.

Por outro lado, a composição de morfotipos de epífitas foi mais similar entre

jardins próximos. Essa maior similaridade pode ser devido à maior chance de formigas

removerem sementes de epífitas de jardins próximos, simplesmente por questões

probabilísticas. As sementes de epífitas são levadas para os jardins por C. levior ao

longo da sua construção. Essas formigas apresentam área de forrageio restrita às

imediações dos jardins, havendo maior probabilidade de que coletem recursos em áreas

próximas aos seus ninhos. Dessa forma, jardins de formigas próximos atuam como

fonte de sementes de epífitas que podem ser incorporadas aos demais jardins pelas

formigas. Como as espécies de epífitas que ocorrem em jardins de formigas não são

encontradas fora deles (Lodi 2010), outros jardins mais próximos devem, de fato, ser as

únicas fontes de sementes disponíveis para a colonização de jardins.

Sendo assim, a proximidade entre jardins é um fator determinante na

composição de espécies de epífitas nessas comunidades. Formigas devem usar as

sementes de epífitas disponíveis nos jardins mais próximos, não havendo seleção de

espécies que serão incorporadas aos ninhos.

Page 133: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

133

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Page 135: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

135

Km 41 – projetos individuais

Formigas cortadeiras não alteram o recrutamento de plantas ao redor do ninho em

uma área de vegetação secundária na Amazônia Central

Ana Yoko Ykeuti Meiga

Introdução

Herbívoros são considerados espécies-chave para o ecossistema, pois podem alterar o

crescimento e sobrevivência de plantas (Fowler et al. 1989). A densidade de plantas

pode ser afetada por esses organismos de forma direta, através do consumo de tecidos

foliares por herbívoros, reduzindo o crescimento e a sobrevivência dessas plantas. De

forma indireta, os herbívoros modificam as condições abióticas do ambiente, pois ao

cortar as folhas das plantas criam pequenas aberturas no dossel que podem afetar a

germinação e o estabelecimento de plantas (Crawley 1983).

As formigas cortadeiras (Hymenoptera: Formicidae) são herbívoros generalistas

que incluem uma grande variedade de plantas em sua dieta. Essas formigas podem

remover até 50% das espécies de plantas dentro de sua área de forrageio (Fowler et al.

1989). Ao cortar as folhas, as formigas exercem uma forte pressão de herbivoria sobre

plantas que estão dentro de sua área de forrageio, o que leva à redução do recrutamento

de plantas nesses locais (Farji-Brener & Illes 2000, Bieber et al. 2010, Corrêa et al.

2010). Essa pressão pode ser maior em áreas próximas dos ninhos uma vez que as

formigas possuem forrageio do tipo central, sempre saindo dos ninhos para forragear e

retornando para este mesmo ponto em seguida (L.C. Leal com. pess.). Como

consequência, o recrutamento de plantas pode ser 40% menor em áreas próximas dos

ninhos que em locais aleatórios (Corrêa et al. 2010).

Page 136: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

136

Tecidos foliares são os principais itens coletados por formigas cortadeiras

(Wirth et al. 2003). As formigas utilizam tecidos foliares como substrato para o cultivo

de fungos dos quais se alimentam (Farji-Brener & Illes 2000). Plantas pioneiras, folhas

jovens e/ou com baixo teor de água são preferidas por estas formigas (Rockwood &

Glander 1979, Meyer et al. 2006). Plantas pioneiras possuem alto investimento em

crescimento vegetativo. Como consequência, alocam poucos recursos para defesa contra

herbívoros, o que faz com que essas plantas sejam mais palatáveis para formigas

(Hubbel & Wiemer 1983, Urbas 2004). Folhas jovens são menos espessas quando

comparadas com folhas maduras. Essas folhas possuem menores concentrações de

lignina e carboidratos, o que aumenta a qualidade nutricional da folha (Feeny 1970,

1976). Além disso, folhas jovens são mais finas o que facilita o corte pelas formigas

(Waller 1982 a, b). Folhas com baixo teor de água aumentam a concentração de solutos

nas folhas, e consequentemente, sua qualidade nutricional para herbívoros (Vasconcelos

& Cherrett 1996, Meyer et al. 2006). Plantas com essas características devem ser mais

consumidas pelas formigas cortadeiras, o que reduz a representatividade de plantas com

essas características em áreas próximas dos formigueiros.

Neste contexto, as perguntas deste trabalho foram: (1) qual a influência da

distância dos ninhos de formigas cortadeiras no recrutamento de plantas? (2) como

atributos foliares podem afetar o recrutamento de plantas nos ninhos de formigas

cortadeiras? Minhas hipóteses são que o recrutamento de plantas é maior em áreas mais

distantes do ninho e que plantas mais difíceis de serem cortadas recrutam em áreas mais

próximas do ninho.

Page 137: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

137

Métodos

Área de estudo

O estudo foi realizado na Fazenda Esteio (02º24’S e 59º44’O), na Área de Relevante

Interesse Ecológico (ARIE-PDBFF), co-gerida pelo “Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais” (INPA/Smiththsonian Institute), localizada na Amazônia

Central, Amazonas, Brasil. A reserva é composta por floresta primária de terra firme,

abrangendo aproximadamente 10.000 ha. A temperatura média anual é de 26,7 ºC, com

precipitação média anual de 2.186 mm.

Coleta de dados

Selecionei 15 ninhos de formigas cortadeiras do gênero Atta, próximos da borda da

capoeira com a estrada ZF3 (Zona Franca 3). Os ninhos distavam no mínimo 10 m entre

si e estavam entre 1 e 5 m da borda. Em cada ninho, amostrei três parcelas de 1 m2

distantes 0, 3 e 6 m do ninho. Coloquei as parcelas sempre paralelas à estrada para ter o

mesmo efeito da borda em todas as parcelas. Quantifiquei o número total de plantas

dentro de cada parcela. Gramíneas e plantas maiores de 1 m de altura não foram

incluídas na amostragem. Como atributo de espessura da folha, considerei a massa

foliar específica no qual quanto maior a massa foliar mais espessa é a folha. Para avaliar

a massa foliar específica das plantas, coletei uma folha de três plantas de cada parcela.

A massa foliar específica foi calculada através da média do peso (g)/ área foliar (cm2).

Análise estatística

Realizei um teste de ANOVA em blocos, onde cada ninho foi considerado um bloco e

as distâncias foram os tratamentos. Minhas previsões são que a densidade de plantas

Page 138: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

138

será maior em parcelas mais distantes do ninho das formigas cortadeiras e que plantas

com maior área foliar específica estarão recrutando mais próximas dos ninhos de

formigas cortadeiras.

Resultados

No total de 15 ninhos amostrados, coletei 45 indivíduos, com média de 4,4 ± 3,6 (±

desvio padrão) plantas por parcela. A densidade de plantas não aumentou em função da

distância do ninho de Atta spp. (F(2,28)=2,30; p=0,12; Figura 1).

Figura 1. Densidade de plantas recrutadas a diferentes distâncias de ninhos de formigas

cortadeiras, na Amazônia Central, Brasil. Os pontos indicam as médias e as barras

indicam o intervalo de confiança a 95%.

A massa foliar específica foi de 0,016 g/cm2 (min; máx = 0,0; 0,21 g/cm2). A

massa foliar específica das plantas não variou entre as diferentes distâncias para os

ninhos de formigas cortadeiras. (F(2, 18)=1,12; p=0,3; Figura 2).

Page 139: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

139

Figura 2. Massa foliar de plantas localizadas a diferentes distâncias dos ninhos de

formigas cortadeiras, Amazônia Central, Brasil. Os pontos indicam a média e as barras

indicam o intervalo de confiança a 95%.

Discussão

O recrutamento das plantas não aumenta de acordo com a distância dos ninhos,

provavelmente porque as formigas cortadeiras continuam exercendo a mesma pressão

de herbivoria mesmo em diferentes distâncias do ninho. Dentro da sua área de forrageio,

formigas estão consumindo folhas independente da sua espessura, uma vez que plantas

com folhas mais espessas não estão recrutando em áreas próximas ao ninho.

Como o trabalho foi desenvolvido em uma área de borda, onde há maior

predominância de plantas pioneiras, é possível que as formigas estejam utilizando todas

as espécies que elas encontram dentro da sua área de forrageio. Plantas pioneiras são

preferencialmente coletadas por formigas cortadeiras, por possuírem menor defesa

contra herbívoros (Hubbel & Wiemer 1983, Howard & Wiemer 1986, Urbas 2004).

Além disso, estas plantas apresentam baixa variabilidade nos atributos foliares, o que

faz com que as formigas não precisem selecionar plantas com atributos foliares

Page 140: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

140

específicos. Dessa forma, a área sob influência das formigas cortadeiras em bordas

florestais podem ser maiores que o encontrado em florestas maduras, reduzindo o

recrutamento de plantas, mesmo que estas estejam distantes dos ninhos.

Diferente do encontrado neste trabalho, Corrêa et al. (2010) observaram que em

áreas de floresta madura localizadas no interior de fragmentos de Mata Atlântica, os

ninhos de formigas cortadeiras e seus arredores apresentam baixa densidade de plantas.

Porém, eles observaram que a densidade de plantas aumenta gradualmente com a

distância dos ninhos. Em áreas de florestas maduras, plantas pioneiras reduzem sua

representatividade, dividindo espaço com plantas de estágio tardio de regeneração,

tolerantes a sombra. Estas plantas são menos palatáveis para as formigas, por

apresentarem grande quantidade de compostos secundários de defesa contra herbivoria,

como os taninos. Sendo assim, formigas devem concentrar seus esforços de coletas

sobre algumas espécies de plantas pioneiras de floresta madura, que são mais palatáveis.

Como consequência, plantas tolerantes a sombra, comuns em áreas de floresta madura,

conseguem escapar da pressão de consumo desses herbívoros e recrutar em áreas mais

distantes dos ninhos.

Desta forma, a área sob influência dos ninhos de formigas cortadeiras pode ser

mais ampla em áreas de borda, o que afeta o recrutamento de plantas em áreas mais

distantes dos ninhos. Como consequência, estas formigas podem atuar como agentes

amplificadores dos distúrbios causados pela abertura das bordas florestais, impedindo a

regeneração da vegetação em áreas sob influência dos seus ninhos.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer à organização do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos

Florestais” (PDBFF) e da “Ecologia da Floresta Amazônica” (EFA), pela oportunidade

Page 141: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

141

de participar do curso. A todos os coordenadores, professores e monitoras, em especial a

Paulo Enrique, pela discussão nas idéias iniciais. À Laura Leal e Manô Borges, por me

acompanharem na coleta de dados. Paulo Bobrowiec e Laura (novamente) pelas

correções e pela paciência no decorrer do projeto. À Talita Câmara e Tiago Belisário

pela ajuda na triagem do material coletado e as longas discussões sobre os resultados

deste trabalho, à Karlinha Campião e Carla Madelaire pelas revisões. E por fim, a todos

os funcionários e colegas do “EFA 2011” pelos momentos inesquecíveis e de agradável

convívio e apoio.

Referências

Barbosa, V.S. 2009. Influência da herbivoria de formigas-cortadeiras no sucesso

reprodutivo de espécies arbustivo-arbóreas da Floresta Atlântica Nordestina. Tese

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Page 145: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

145

Teias com maior quantidade de recurso podem fazer com que aranhas evitem

fugir quando são ameaçadas por um estímulo do predador?

Camilla Pagotto

Introdução

Os organismos possuem estratégias de defesa que variam de acordo com o contexto

ambiental em que vivem (Begon et al. 2006). Diferentes tipos de predadores, por

exemplo, induzem estratégias de defesa distintas em uma mesma presa (Gullan &

Grascon 2005), como alterações no uso de comportamentos crípticos em resposta a

presença de predadores com caça ativa ou com caça do tipo senta-e-espera (Blois-

Heulin et al. 1990).

A fuga, em particular, também pode ser considerada como uma forma de defesa.

No entanto, essa estratégia pode estar associada a um deslocamento por distâncias

relativamente longas e altas velocidades o que pode resultar num alto custo energético

(Krebs & Davies 1993). Isso pode ser agravado quando o organismo tem que abandonar

seu território ou recurso alimentar, visto que ele pode perdê-los para organismos

competidores (Krebs & Davies 1993). Nesse caso, os organismos podem ser mais

resistentes à fuga.

Uma das estratégias de fuga em aranhas que constroem teias é de se atirar da teia

(Vieira et al. 2007). Além disso, algumas espécies utilizam uma estratégia adicional que

consiste em se debater rapidamente. Isso parece ser um comportamento relacionado à

evitação de parasitóides (Resh & Cardé 2003). Assim, quando expostas a um predador

em potencial, indivíduos de algumas espécies de aranhas podem optar por adotar uma

estratégia de defesa que envolva a permanência na teia ou abandono temporário dela.

Page 146: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

146

Para as aranhas, o abandono da teia pode representar um comportamento mais

eficiente do que o comportamento de se debater já que a fuga impede que o parasitóide

se aproxime para capturá-las. Por outro lado, o abandono da teia demanda um alto custo

energético no seu deslocamento, além de aumentar as chances de perder a teia e o

recurso alimentar nela estocado (Vieira et al. 2007). Portanto, é razoável supor que teias

que possuem maior quantidade de presas devem reduzir a motivação de abandono pelas

aranhas frente a uma ameaça de predação. Diante disso, tenho como hipótese que o

aumento do valor da teia devido à quantidade de alimento reduz a propensão da aranha

fugir quando há ameaça de predação. As predições associadas a essa hipótese são de

que, com estímulo mecânico no dorso da aranha, simulando um predador (1) a

freqüência de abandono das teias pelas aranhas será menor quando as teias possuírem

recursos alimentares em relação a teias sem recurso e que (2) o tempo de abandono das

teias pelas aranhas será maior na presença do recurso alimentar do que nas teias sem

recurso.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo em uma floresta tropical úmida de terra firme, no km 41 que faz parte

de um conjunto de polígonos da Área de Relevante Interesse Ecológico PDBFF (Projeto

Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais) localizada a 80 km de Manaus, AM,

Brasil. De acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007), o clima da região é

do tipo tropical úmido, com temperatura média de 26,7 °C e precipitação anual média

de 2600 mm (Bierregaard et al. 2001).

Page 147: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

147

Organismo modelo

Utilizei como modelo de hospedeiro, uma espécie de aranha que constrói teias

tridimensionais e é muito comum próxima ao solo da floresta. Essas aranhas são

vermelhas com pernas de coloração vermelha e preta, sem espinhos aparentes. As teias

são construídas aproximadamente a 30 cm do solo. A parte da teia mais distante do solo

é composta por uma malha de fios de seda transpassados em várias direções e

interligados à vegetação. Essa região forma uma superfície curva, com a parte convexa

voltada para o dossel. Essas aranhas posicionam-se na parte inferior da superfície

convexa e podem ser encontradas em teias agrupadas ou solitárias.

Coleta de dados

Selecionei por inspeção visual 30 teias com aranhas solitárias. Em 15 teias ofereci

cupins como recurso, sendo que em cada teia coloquei quatro cupins. Nessas teias que

correspondem ao tratamento com recurso (CR), esperei que as aranhas envolvessem os

cupins nos fios de seda e antes de consumi-los, simulei um ataque do parasitóide usando

uma pinça. Para isso, encostei a ponta da pinça recorrentemente na parte dorsal da

aranha. Induzi esses estímulos ininterruptamente em cada indivíduo por 60 s. Durante a

simulação, tomei cuidado para que a teia não fosse danificada, o que poderia interferir

na resposta das aranhas. No tratamento sem recurso (SR), realizei o estímulo da mesma

maneira, como descrito anteriormente, no entanto sem a oferta prévia de cupins.

Para avaliar a freqüência de abandono das teias com e sem recurso pelas aranhas

usei o teste de qui-quadrado. Para investigar se houve diferença no tempo de abandono

da teia com e sem o recurso, utilizei o teste t.

Page 148: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

148

Resultados

Nos dois tratamentos, todas as aranhas adotaram o comportamento de se debater logo

após o início do estímulo, sendo que nenhuma aranha fugiu para a vegetação antes de

realizar esse comportamento. A freqüência de abandono da teia não diferiu entre as

aranhas. A porcentagem de abandono foi de 42% para as teias com recurso e 58% para

teias sem recurso. O tempo de abandono da teia na presença do recurso alimentar foi 15

vezes maior do que o tempo de abandono no tratamento (t=1,77; gl=28; p=0,04; Figura

1). O tempo médio de abandono no tratamento sem o recurso foi de 47 ±18,7 s

(média±desvio padrão) e no tratamento sem recurso foi de 33 ±26,2 s .

CR SR

Tratamento

0

10

20

30

40

50

60

70

Tem

po a

té o

aba

ndon

o da

tei

a (s

)

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

Figura 1. Tempo de abandono (s) da teia por indivíduos de uma espécie de aranha na

presença (CR) ou ausência (SR) do recurso alimentar na teia. Os indivíduos estavam

localizados na ARIE PDBFF, Manaus, Brasil

Page 149: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

149

Discussão

A semelhança na freqüência de abandono de teias, com ou sem recurso, indica que a

presença do recurso não afeta a chance da aranha abandonar a teia. No que diz respeito

aos resultados sobre o tempo de abandono da teia, o recurso parece ser um fator

relevante nessa decisão. O abandono da teia e conseqüentemente do recurso pode ter um

custo associado à sua perda justificando o maior tempo até o abandono da teia pela

aranha.

Uma vez que aranhas que constroem teias dependem exclusivamente de presas

interceptadas para se alimentar, é possível que elas passem por períodos longos de

inanição (Wise 1993, apud Vieira et al. 2007). Nesse sentido, a decisão de abandonar o

alimento pode estar relacionada a um custo excessivamente alto, justificando o maior

período de exposição a um possível predador.

Demorar mais para sair, necessariamente aumenta a exposição aos predadores.

Portanto deve haver algum mecanismo de compensação que tenha possibilitado a

evolução da maior permanência quando há mais alimento. Eventualmente o aumento do

risco de predação não seja tão alto quanto os benefícios associados à retenção de mais

recursos (Verbolin 2006). Por outro lado, a quantidade de recursos alimentares nas teias

poderia então, ser um indicativo ao parasitóide de que a chance de sucesso em parasitar

essas aranhas pode ser maior.

Os dois comportamentos de fuga parecem ser ajustáveis de acordo com o

contexto. Da mesma maneira que predadores diferentes induzem comportamentos

diferentes em uma mesma presa (Wellborn et al. 1996), o mesmo pode ocorrer na

presença de maior quantidade de recursos frente a um mesmo predador. A maior

quantidade de recursos torna o local de forrageio mais valioso, levando a presa a se

arriscar mais em função do ganho potencial caso ela sobreviva à predação.

Page 150: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

150

Agradecimentos

Gostaria de agradecer à coordenação do EFA, pela oportunidade única e indescritível de

participar de um curso como esse. A todas as pessoas envolvidas na logística desse

curso, incluindo à Adriane, que com prontidão atendia todas as minhas ligações e e-

mails. Ao Zé por me dar as boas vindas de coração aberto, apostando que essa chance

não seria perdida pra mim. Ao Paulinho “sempre” Rainbow pelo grande incentivo, por

me fazer aprender que com toda humildade, simplicidade, preocupação e carinho que

jamais vi em um professor. Ao Paulinho Mau (depois dos cachorros, entendi o pq do

mau... rs) pelas excelentes conversas, que me ensinou a curtir cada momento, sem cair

no vício de querer chegar logo lá, pela ajuda mais que valiosa para realizar o trabalho

individual e por me animar em todos os momentos que ficou pesado. À Bonitora Laura,

pelas boas conversas, por todo carinho, atenção, incentivo e abraços doces! À Bonitora

Ursinho, pelo montão de coisas que aprendi, por ensinar com as atitudes, pela paciência

e pelas excelentes conversas. Muito obrigada à todos EFAnos 2011, pelo aprendizado,

pela excelente convivência, pelas risadas incríveis e pelas piadas “sempre muito

apropriadas”. Á Formiga Atômica, pelas bons momentos de dança. Ao Ninfobaby e

Coceirinha pela paciência e bons momentos em campo. Ao Tio Sukita e Marilaqui, por

animar incessantemente esse curso. À Ana Fofa, super companheira em Manaus. Ao

Dionewalker, pelas boas histórias. Ao Drag, pelas danças, conversas e por nunca ficar

bravo com a zueira. Ao Daniel, pelo voto de confiança e pelo incentivo durante o

trabalho individual. A Fofucha, pelas palavras fofas e pelo cuidado com as pessoas. A

Maria Laura Golfinho, pelos abraços mais energizantes, pela calma e serenidade. Ao

Guilherme pelos excelentes momentos que compartilhamos, pelos segredos e pelo

carinho incrível. Ao Fernando, um bom par de dança, uma pessoa muito gentil de lidar.

A Dani, pela grande felicidade de trabalhar junto. Ao Matrix, pelos paieros que vinham

Page 151: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

151

junto com as conversas “mais trabalhadas” na metafísica possível. Ao Fred Mercury,

pela baita ajuda no projeto individual. A Skol, por além de me ensinar um monte, pela

felicidade em ganhar uma amiga incrível e mega companheira nas besteiras (tooodas

elas). Ao Inácio, por entrar na minha vida de uma maneira linda, deixando comigo

muitas lembranças boas. A Missfrega, pelo carinho, amizade, cumplicidade e incentivo

e pelos trabalhos deliciosos que fizemos juntas. Ao Seu Cardoso, pela ajuda e paciência.

A Dona Eduarda pelo rango delicioso e ao Bebezão por se preocupar e cuidar da gente.

Para finalizar, a todos os professores que contribuíram com o nosso avanço: Bráulio,

Fabrício, Ana, Rafael, Adriano, Jansen, Inara, Lorenzo, Elder, Cíntia e especialmente ao

Marcelo Taberelli, pelo incentivo, humildade e por me ensinar como um bom cientista

deve transitar entre genes e ecossistemas.

Referências

Begon, M., C.R. Townsend & J.L. Harper. 2006. Ecology: from individuals to

ecossystems. Victoria: Blackwell Publishing.

Bierregaard, R.O., C. Gascon, T.E. Lovejoy & R.C.G. Mesquita. 2001. Lessons from

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Systematics, 27:337-363.

Page 153: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

153

Preto no branco: Por que camarões (Crustacea) de água doce apresentam

diferentes colorações?

Carla Bonetti Madelaire

Introdução

O motivo dos organismos selecionarem os ambientes onde vivem envolve um conjunto

de fatores abióticos e bióticos. A teoria da seleção de habitat afirma que entre os

mecanismos envolvidos na escolha de um ambiente estão as restrições fisiológicas de

cada indivíduo, a distribuição dos recursos e as relações interespecíficas, como a

predação (Morris 2003). Tais mecanismos podem atuar como pressão seletiva sobre o

comportamento e, em alguns casos, sobre a morfologia dos animais (Endler 1991; Lima

1998). Por sua vez, esses dois atributos são importantes na determinação de ocupação

de microhabitat (Sih 1982).

A ocupação de microhabitats pelos macroinvertebrados em ambientes de lagos e

poças, por exemplo, pode ser afetada pela predação por peixes (Cook & Streams 1984).

Por outro lado, o sucesso desses predadores depende, dentre outros fatores, do tempo de

resposta da presa. Em ambientes aquáticos, tal tempo de resposta é frequentemente

determinado pelo tamanho, contraste no substrato e movimentação da presa (Ware

1973). A importância da camuflagem de presas no substrato já foi demonstrada para

vários grupos (Edmunds 1974; McFall-Ngai 1990). Um dos exemplos mais bem

documentados são os experimentos de predação realizados com hemípteros aquáticos do

gênero Notonecta. Estes organismos podem apresentar diferentes níveis de melanização,

que podem variar desde coloração esbranquiçada que contrastam no substrato escuro,

até indivíduos altamente melânicos, que são mais visíveis em um substrato claro (Cook

& Streams 1984). Quanto à movimentação da presa, já foi observado para

Page 154: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

154

macroinvertebrados que quanto mais o animal se movimenta, mais rápido o predador o

localiza (McPeek 1990). Além disso, a movimentação implica em um alto custo

energético. Portanto, a presa tende a não fugir imediatamente, e nem por longas

distâncias, após a detecção do predador (Healey 1984), principalmente se o animal

encontra-se bem camuflado no ambiente.

Camarões ou pitús (Crustacea) de ambientes dulcícolas apresentam diferentes

tipos de coloração que parecem estar relacionados a um padrão de camuflagem, visto

que podem ser predados por peixes (Vidalenc et al. 1999), ou até mesmo por aves (Sick

1997) e mamíferos (Emmons & Feer 1997). Tal padrão de coloração pode variar em

tonalidades desde translúcido até altamente melanizado (observação pessoal). Pode-se

ressaltar que o ambiente que esses animais ocupam na Amazônia Central (igarapés e

poças adjacentes) é dotado de grande variedade de habitats (Mortatti 2004). Dentre

estes, destacam-se as extensas áreas cobertas por areia branca e os densos bancos de

folhiço submersos (substrato caracteristicamente de coloração marrom escuro). Nesse

sentido, os padrões de coloração dos camarões de igarapés e poças devem estar

relacionados ao uso de diferentes substratos, supostamente adequados à camuflagem

contra predadores.

Considerando que a coloração dos animais pode estar relacionada com o tipo de

ambiente que esses organismos exploram, minha hipótese é que camarões de diferentes

colorações escolhem um substrato mais vantajoso quanto à camuflagem, mediante à

exposição de diferentes habitats. Além disso, esses animais teriam respostas

antipredatórias diferenciais de acordo com o ambiente. Minha expectativa é que

camarões claros, quando expostos aos dois ambientes, escolham o substrato de areia,

enquanto camarões escuros escolham substrato de folhiço. Também espero que, quando

submetidos à perturbação por um predador potencial, camarões claros se desloquem por

Page 155: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

155

distâncias menores em substrato de areia e por distâncias maiores em substrato de

folhiço. Por outro lado, camarões escuros se deslocariam por distâncias menores em

substrato de folhiço e por distâncias maiores em substrato de areia.

Métodos

A área de estudo é uma floresta de terra firme, localizada na Reserva do Km 41(2°26´S,

59°45´O) 80 km ao norte de Manaus, Amazonas, Brasil. A reserva é considerada uma

Área de Relevância e Interesse Ecológico (ARIE) e é co-gerida pelo Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). Coletei os camarões de diferentes

colorações, tamanhos e morfotipos com uma peneira, em áreas marginais de um

igarapé. Acondicionei os animais em um saco plástico com água e folhiço até o horário

do experimento.

Para realização do experimento de seleção de habitat utilizei sete bandejas

(30cm x 54cm x 10cm), onde simulei o ambiente natural dos igarapés. Cada bandeja foi

dividida em duas partes iguais e cada parte foi preenchida com um substrato diferente:

areia e folhiço. O volume das bandejas foi completado com água. Cada animal foi

colocado individualmente no meio da bandeja, entre os dois ambientes. Após 30

minutos de aclimatação, observei qual dos ambientes o animal escolheu permanecer.

Anotei a cor do indivíduo (claro ou escuro) e qual ambiente ele escolheu (areia ou

folhiço). Este experimento foi feito com 44 indivíduos, classificados visualmente

quanto à coloração em claro (N = 24) e escuro (N = 20).

Realizei um segundo experimento para estimar a distância de fuga. Para isso,

utilizei duas bandejas (30cm x 54cm x 10cm): uma preenchida totalmente com areia e

outra com substrato de folhiço. Os animais eram colocados individualmente na bandeja

com areia, depois eram trocados para a bandeja com folhiço. Em cada bandeja, eu

Page 156: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

156

aproximava meu dedo da parte posterior do animal, simulando a aproximação de um

predador. Em seguida, medi com uma trena a distância que cada indivíduo se deslocava.

Este experimento foi feito com 30 indivíduos, classificados visualmente quanto à

coloração em claro (N = 15) e escuro (N = 15). Os dois experimentos foram realizados

em ambiente sombreado, com animais recém coletados e no mesmo período do dia

(tarde). Não houve variação na coloração de cada animal ao longo dos experimentos.

Para testar se houve escolha de ambiente pelos camarões de diferentes

colorações, utilizei o teste qui-quadrado. Para testar se os animais apresentavam

distâncias de fuga diferentes de acordo com sua coloração e substrato em que estavam

expostos, utilizei uma análise de variância (ANOVA) de dois fatores. Os valores de

distâncias de fuga não estavam distribuídos normalmente. Assim, transformei os dados

em log10 antes de realizar a análise estatística. Todos os testes foram realizados no

programa STATISTICA 7.0 Stat Soft, Inc. 2004, e o nível de significância adotado foi

de 5%.

Resultados

Camarões claros e escuros utilizaram o ambiente de forma diferente (χ² = 9,47; gl = 1; p

= 0,003). Indivíduos de coloração clara apresentaram freqüências de escolha muito

parecidas entre os substratos, selecionando 46 % das vezes o folhiço, e 54% a areia. Por

outro lado, dos 20 camarões escuros observados, 90% selecionaram o substrato de

folhiço. Quanto ao experimento de distância de fuga frente ao estímulo de predação, não

houve diferença no deslocamento para ambos os tipos de camarão, nos dois habitats

(F(1,28)=1,46; p=0,23; Figura 1).

Page 157: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

157

AREIA FOLHIÇO0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1,0

1,1

1,2

1,3

Log

10 d

a di

stân

cia

de f

uga

(cm

)

Figura 1. Distância de fuga de camarões claros e escuros em ambientes de areia e

folhiço. Legenda: média da distância de fuga do camarão claro; média da

distância de fuga do camarão escuro; as barras verticais representam o intervalo de

confiança de 95%.

Discussão

Os camarões claros não apresentaram preferência na escolha de substrato,

provavelmente porque tanto no fundo claro, quanto no escuro os indivíduos não

apresentam contraste pronunciado. E é justamente por não apresentar contraste em

nenhum dos substratos, que os animais podem escolher tanto a areia como o folhiço

como habitat e abrigo. A coloração translúcida associada à camuflagem já foi observada

para outros camarões e peixes em igarapés da Amazônia (Carvalho et al. 2006), sendo

tal registro interpretado como um padrão morfológico de convergência evolutiva entre

esses dois grupos. Essa característica possibilita o uso eficiente de um amplo espectro

de habitats dentro do igarapé (Carvalho et al. 2006). O pitú melanizado, por outro lado,

ocupou quase exclusivamente o substrato de folhiço. Isso porque o animal melanizado

Page 158: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

158

apresenta um contraste muito mais pronunciado no substrato de areia do que no

substrato de folhiço. Assim, os camarões escuros provavelmente ficam limitados a

explorar as margens do igarapé e poças adjacentes, onde os bancos de folhiço são

abundantes.

Não foram observadas diferenças na distância de fuga dos camarões em função

da coloração do animal. Isso parece indicar que mesmo possuindo padrões de

camuflagem, a fuga deve ser a solução mais vantajosa a partir de determinado ponto de

aproximação de estímulo predatório. No ambiente aquático, a taxa de movimentação de

um organismo é um indicador do risco de predação. Assim, animais que habitam locais

com menor pressão predatória podem ter maiores taxas de movimentação, tanto para

fuga quanto na busca por recursos. Por outro lado, animais expostos a ambientes com

forte pressão predatória têm vantagem ao adotarem a estratégia de menor taxa de

movimentação (Wellborn et al. 1996). Vidalenc et al. (1999) estudou a dieta de duas

espécies de peixes de igarapé no mesmo local deste estudo e descreveu que os camarões

integram apenas 10% da dieta desses animais. Nesse sentido, os resultados

experimentais de distância de fuga encontrados no presente estudo podem indicar que a

pressão de predação no ambiente natural não seja intensa o suficiente para alterar o

comportamento de resposta antipredatória.

Os diferentes usos de habitats por camarões de diferentes colorações pode

indicar que esses organismos detectam e ajustam sua localização espacial de forma a

evitar que predadores orientados visualmente os encontrem. Além disso, padrões de

camuflagem que abrangem maior número substratos, como o padrão translúcido,

poderiam ser mais vantajosas em termos de exploração de uma ampla gama de habitat.

Abordagens experimentais, como a realizada neste estudo, geram interessantes

questionamentos a serem testados em ambiente natural. Futuros estudos contemplando o

Page 159: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

159

uso de microhabitat in situ por camarões com diferentes padrões de coloração podem

corroborar o presente experimento e esclarecerem questões ainda mais amplas sobre a

distribuição espacial desses organismos.

Agradecimentos

À coordenação do EFA, por me dar essa oportunidade única e inesquecível de

aprendizado e troca de experiências em plena Floresta Amazônica Central.

Aos meus mais novos amigos de infância, os EFAnos guerreiros que durante esta longa

jornada me fizeram crescer e amadurecer em sentido acadêmico e pessoal. Espero

também ter contribuído na formação de vocês.

Aos professores e monitoras, que também contribuíram sobremaneira para minha

formação.

Ao seu Jorge e Dona Eduarda pelos comes e bebes memoráveis.

Ao Rafael Leitão e Manô, pelas contribuições excelentes para este manuscrito.

Especialmente, sou grata a Misstrago (Camilla), Garota fantástico (Inácio), Paulinho

bom, Paulinho mau e Manô por nossas conversas sérias e de bobagens que foram

sempre encorajadoras e muito divertidas. Guardarei vocês para sempre na mente e

coração.

Referências

Carvalho, L.N., J. Zuanon & I. Sazima. 2006. The almost invisible league: crypsis and

association between minute fishes and shrimps as a possible defence against

visually hunting predators Neotropical Ichthyology, 4(2):219-224.

Page 160: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Page 162: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

162

Aranhas “vermelhas” se agrupam para comer mais?

Daniel Irineu de Souza Dainezi

Introdução

Artrópodes como abelhas, cupins, afídeos, besouros, camarões e aranhas podem

apresentar algum nível de organização social com o objetivo de aumentar a proteção dos

indivíduos, melhorar as chances de forrageamento ou aumentar o sucesso reprodutivo

(Wilson 1971, Alexander 1974, Gullan & Cranston 2005, Whitehouse & Lubin 2005,

D’Ettorre 2007). Para atingir um desses objetivos, os indivíduos podem cooperar uns

com os outros e em alguns casos se especializar em diferentes tarefas dentro da sua

sociedade. Nesses casos, atingir o objetivo do grupo é mais importante do que o

aumento da aptidão dos indivíduos (Whitehouse & Lubin 2005). Por outro lado, quando

uma sociedade é formada sem que haja cooperação entre os indivíduos, como na

maioria das espécies de aranhas sociais, o aumento da aptidão dos indivíduos é o mais

importante (Gullan & Cranston 2005, Whitehouse & Lubin 2005).

Em aranhas que constroem teias, formar sociedades com teias agrupadas pode

aumentar a área de captura de presas (Whitehouse & Lubin 2005). Essa estratégia pode

ser vantajosa, pois o aumento na área de captura acontece sem que indivíduo precise

gastar mais energia na construção de uma teia maior (Viera 2007).

Como o agrupamento de teias pode aumentar a chance de captura de presas, meu

objetivo é avaliar se o agrupamento de teias aumenta o sucesso das aranhas em adquirir

alimento. Aranhas que formam grupos unindo suas teias provavelmente comem mais

frequentemente do que as aranhas que constroem teias solitárias. Com isso espero

encontrar com maior frequência aranhas com o abdômen maior nas teias agrupadas do

Page 163: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

163

que com teias solitárias, uma vez que o tamanho do abdômen pode indicar que a aranha

ingeriu uma presa.

Métodos

Área de estudo

Realizei este estudo na ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) do km 41 (02º

24’ S, 59º 52’ O), localizada a 80 km ao norte de Manaus, Brasil. A reserva está sob co-

gestão do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). A área é

formada por floresta tropical úmida de terra firme, possui temperatura média anual de

26 ºC e precipitação anual variando entre 1900 e 2300 mm.

Organismo de estudo

A aranha ainda não identificada, denominada “vermelha”, possui teia tridimensional,

construída no sub-bosque a uma distância de no máximo 1 m do solo. A porção superior

da teia, geralmente está voltada para o dossel e tem uma malha mais densa de fios

traçados em várias direções do que as laterais da teia. A aranha se posiciona no centro

da teia, na parte abaxial. Muitas vezes, aranhas dessa espécie constroem teias uma ao

lado da outra, podendo compartilhar os fios de suporte, formando uma teia contínua

com várias aranhas. Nestes agrupamentos cada aranha permanece em sua teia, podendo

ocasionalmente andar na teia das outras aranhas.

Coleta e análise dos dados

Coletei 50 aranhas “vermelhas” em um transecto de 1000 m. Destas, 25 aranhas

estavam em teias solitárias e outras 25 aranhas foram coletadas em teias com duas ou

mais aranhas da mesma espécie. Em cada agrupamento de teias coletei aleatoriamente

apenas uma aranha. Como o abdômen das aranhas expande quando elas comem, assumi

Page 164: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

164

que a área superficial do abdômen é um bom indicativo da frequência com que elas se

alimentam. Para medir a área do abdômen usei fotografias digitais das aranhas dispostas

em papel milimetrado, medidas no programa Image Tool. Como aranhas maiores

também podem ter o abdômen proporcionalmente maior, removi esse efeito da análise

usando uma regressão linear da área do abdômen, que aumenta conforme a quantidade

de alimento ingerida pela aranha, pela largura máxima do cefalotórax de cada aranha,

que é uma região que não varia de tamanho com quantidade de alimentos ingeridos.

Comparei o resíduo da regressão entre a área do abdômen e a largura do cefalotórax de

aranhas que formam grupo e aranhas solitárias usando o teste t.

Resultados

A área média do abdômen das aranhas “vermelhas” que vivem agrupadas (0,75 mm² ±

0,22) (média ± desvio padrão) foi semelhante à área média do abdômen das aranhas

solitárias (0,71 mm² ± 0,22), assim como a largura média do cefalotórax das aranhas

“vermelhas” que vivem agrupadas (0,55 mm ±0,08) e solitárias (0,54 mm ± 0,08). Não

houve diferença no tamanho relativo dos abdomens entre as aranhas “vermelhas” que

constroem teias solitárias e as aranhas “vermelhas” que se agruparam em teias

comunitárias (t=0,9; gl=49; p=0,64) (Figura 1).

Page 165: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

165

grupo solitária

Agrupamento das aranhas

-0,08

-0,06

-0,04

-0,02

0,00

0,02

0,04

0,06

0,08

Res

íduo

da

regr

essã

o en

tre

área

do

abdô

men

e la

rgur

a do

cef

alot

órax

(cm

2 )

Discussão

Muitas espécies de aranhas utilizam o agrupamento de teias como forma de aumentar a

captura de presas (Whitehouse & Lubin 2005). Porém, nesse estudo o agrupamento das

teias das aranhas “vermelhas” não aumentou a quantidade de alimentos consumidos por

essas aranhas. Possivelmente porque algumas aranhas poderiam dominar o agrupamento

de teias e consumir primeiro as presas capturadas. Assim, apenas alguns poucos

indivíduos dentro do grupo ficariam constantemente alimentados. Isso faria com que a

chance de encontrar um indivíduo do agrupamento de teias com o abdômen cheio fosse

a mesma que encontrar uma aranha solitária com o abdômen cheio. Por este motivo a

Grupo Solitárias

Organização espacial das aranhas nas teias teias

Res

íduo

da

regr

essã

o en

tre

área

do

abdô

men

e

larg

ura

do c

efal

otór

ax (

mm

²)

Figura 1. Tamanho do abdômen das aranhas que agrupam teias e das aranhas que

permanecem sozinhas nas teias, estimado pelo resíduo da regressão entre a área do abdômen

e a largura do cefalotórax das aranhas. Os quadrados vazios representam a média e as barras

verticais o erro padrão.

Page 166: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

166

variação do tamanho dos abdomens das aranhas que constroem teias em grupo e as

aranhas solitárias é muito parecida.

Como essa aranha não possui comportamento agônístico quando outra aranha

compartilha a sua teia, alguns indivíduos conseguem pegar as presas das teias de outras

aranhas (observação pessoal). Isso também beneficiaria os indivíduos não dominantes,

que teriam acesso a presas capturadas nas teias dos indivíduos dominantes quando estes

estivessem alimentados (Whitehouse & Lubin 2005, Viera 2007). Aranhas que

permanecem solitárias, por outro lado, teriam que investir energia na captura de mais

presas que ficassem aderidas na sua teia (Viera 2007).

A aranha “vermelha” poderia ser considerada uma aranha colonial, pois pode

construir suas teias unidas e formar agrupamentos com várias aranhas que não

cooperam diretamente umas com as outras (Whitehouse & Lubin 2005). Indivíduos

coloniais costumam se agrupar ao redor de locais com grande disponibilidade de

alimento (Whitehouse & Lubin 2005). Essas aranhas permanecem nas suas próprias

teias, mas podem retirar comida das teias de outras aranhas (Wilson 1971). Esse tipo de

organização social pode ser vantajosa porque faz com que os indivíduos economizem

energia na manipulação da presa e na construção e manutenção das teias (Gullan &

Cranston 2005).

Agradecimentos

Agradeço ao PDBFF e aos coordenadores, Paulo Enrique e Paulo Estefano pela

oportunidade que mudou minha forma de enxergar como se fazer ciência. A Franciele

Parreira pela ajuda a um aracnofóbico, como eu, na manipulação das aranhas em

laboratório. À Karla Magalhães Campião e Carla B. Madelaire, pela paciência e

contribuições na revisão das primeiras versões deste manuscrito. A Camilla Presente

Page 167: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

167

Pagotto por todo o apoio e incentivo. Às monitoras, Mano e Laura, e a todos os amigos

efanos pelas contribuições para melhoria do trabalho e, sobretudo, pelos momentos

incríveis que passamos juntos aqui na Amazônia!

Referências

Alexander R.D. 1974. The evolution of social behavior. Annual Review of Ecology and

Systematics, 325-383.

D’Ettorre P. 2007. Evolution of Sociality: You are what you learn. Current Biology,

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Page 168: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

168

Quem são, quantos são e quanto se parecem: composição, riqueza e similaridade

da assembléia de formigas em clareiras e mata primária em uma floresta de terra

firme na Amazônia Central

Daniele Bilate Cury Puida

Introdução

Os processos que determinam a abundância local e a distribuição das espécies em uma

área representam uma das grandes questões da ecologia de comunidades. Uma das

teorias propostas para explicar a estruturação das comunidades é a teoria da sucessão ou

facilitação. Essa teoria postula que a colonização de áreas perturbadas ocorre

primeiramente pelos organismos colonizadores, adaptados às condições adversas que

surgem com a alteração do hábitat original. Os colonizadores promovem modificações

no hábitat, tornando a área adequada para a colonização por outras espécies que são

capazes de se estabelecer na área somente após a chegada das espécies iniciais (Hairston

1989). Se a facilitação ocorre, espera-se que haja uma sequência de substituição de

espécies ao longo de um gradiente temporal. Essa substituição de espécies ao longo do

tempo é chamada de sucessão ecológica e tem início a partir de perturbações ou de

transformações que ocorrem no ambiente (Townsend et al.2003).

Alguns tipos de perturbações são inerentes à dinâmica do ecossistema e

constituem mecanismos de geração e manutenção da diversidade local. Em florestas

tropicais, a formação de clareiras é um dos processos responsáveis pela criação de

novos hábitats e pelo aumento da heterogeneidade do ambiente. As clareiras são

formadas pela queda de árvores, o que promove alterações na estrutura da vegetação e

nas condições microclimáticas locais. Essas modificações possibilitam que certas

espécies vegetais (espécies pioneiras) colonizem a área e se estabeleçam no ambiente

Page 169: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

169

(Rose 2000). As clareiras exercem uma forte influência na demografia e na estrutura

populacional de espécies pioneiras em florestas tropicais (Melo & Tabarelli 2003;

Álvarez-Buylla & Martinéz-Ramos 1992), pois permitem que essas espécies, adaptadas

a alta luminosidade, possam persistir nesses ambientes tipicamente sombreados.

A sucessão em clareiras para as espécies vegetais é relativamente bem

representada na literatura (Rose 2000). Entretanto, para as espécies animais, pouco se

conhecesse a respeito do processo sucessional em clareiras de florestas tropicais

(Rodrigues 2009, Vasconcelos 1999). Se a estrutura da vegetação é alterada pela

formação de uma clareira, provavelmente a comunidade animal, principalmente aqueles

que apresentam uma forte relação com a vegetação, também deve acompanhar o

processo sucessional. A comunidade de formigas, por exemplo, responde as

modificações na vegetação ocorridas durante a sucessão. Florestas secundárias, em

estágio sucessional avançado, possuem maior riqueza de espécies do que áreas de

pastagem e florestas em estágio inicial de sucessão (Vasconcelos 1999). Florestas

secundárias em estágios sucessionais mais avançados possuem uma composição de

espécies de formiga mais semelhante às florestas não perturbadas, comparado às

florestas em estágios iniciais de sucessão (Vasconcelos 1999). É razoável supor que

perturbações naturais em menor escala, como as promovidas pela formação de clareiras,

também podem provocar mudanças na comunidade de formigas.

As formigas cortadeiras, por exemplo, podem ser sensíveis às modificações no

microclima promovidas pela alteração da vegetação dominante (Lach et al. 2010). A

disponibilidade de alimento ou de recursos para os ninhos também pode ser maior em

clareiras. Devido ao aumento da abundância de plantas pioneiras nesses ambientes,

várias espécies de formigas podem ser beneficiadas, uma vez que essas plantas possuem

maior palatabilidade e presença de nectários extra-florais (Urbas et al. 2007). Formigas

Page 170: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

170

especialistas e predadoras também poderiam ser beneficiadas pelas clareiras. A maior

incidência de luz nesses ambientes, associada ao aumento da heterogeneidade de

hábitats decorrente das alterações na estrutura da vegetação, podem promover o

aumento da diversidade de artrópodes, disponibilizando mais presas para formigas

predadoras (Torres 1984). Dessa forma, as clareiras podem representar uma mancha de

alta qualidade para as formigas, oferecendo alta quantidade e concentração de recursos.

O objetivo desse estudo foi avaliar as modificações que ocorrem na estrutura da

assembléia de formigas decorrentes da formação de clareiras. Minhas hipóteses são que

as alterações provocadas por esse distúrbio promovem mudanças na assembléia de

formigas e que essas modificações seguem um gradiente sucessional. Dessa forma,

espero encontrar uma baixa similaridade da composição das assembléias de formigas

entre as clareiras e mata primária e, ainda, uma relação negativa da riqueza de espécies

de formigas com a idade das clareiras.

Métodos

Área de estudo

Realizei esse estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico PDBFF do km 41, co-

gerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF/INPA),

localizada a 80 km ao norte da cidade de Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação na

área é formada por uma floresta tropical úmida de terra firme. A altura do dossel é de 30

a 37 metros de altura, com árvores emergentes de até 50 metros (Bernard 1997).

Page 171: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

171

Coleta de dados

Amostrei as formigas em 11 clareiras e 11 áreas de mata primária, separadas por

uma distância de 20 metros. Para amostrar as formigas, usei iscas compostas por uma

mistura de ovo, farinha, goiabada e laranja. Em cada ambiente (clareira e mata), cinco

iscas foram distribuídas, mantendo certa distância (± 0,5 m) entre elas para evitar a

dominância da isca. Posicionei as iscas diretamente na serrapilheira, na parte mais

central de cada clareira e na mata adjacente. As iscas foram oferecidas por um período

de 1 h e, após esse período, as formigas foram recolhidas, acondicionadas em sacos

plásticos e levadas ao laboratório para classificação. As formigas foram identificadas até

o gênero, quando possível, ou em morfotipos.

Para classificar o estágio sucessional de cada clareira (idade), assumi que o

diâmetro das plântulas presentes nas clareiras mais recentes seria menor do que o

diâmetro das plântulas encontradas em clareiras em estágio sucessional mais avançado.

Uma parcela de 1 m2 foi estabelecida no centro de cada clareira, onde o diâmetro de

todas as plântulas presentes foi registrado com o auxílio de um paquímetro. O diâmetro

médio das plântulas de cada parcela representa, dessa forma, minha medida do estágio

sucessional da clareira.

Análise de dados

Comparei a similaridade da composição da assembléia de formigas presente nas

clareiras e na mata adjacente por meio do índice de similaridade de Jaccard (CJ). Avaliei

a relação entre o estágio sucessional da clareira e a riqueza de espécies com uma

regressão linear simples. Para investigar se a semelhança da composição de espécies

entre as clareiras e a mata aumentava com a idade da clareira, realizei uma regressão

entre o índice de similaridade de Jaccard e o estágio sucessional da clareira.

Page 172: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

172

Resultados

No total, amostrei 34 morfotipos de formigas e a riqueza de morfotipos foi

semelhante entre os dois ambientes. Registrei nas clareiras e na mata 22 e 25

morfotipos, respectivamente. As clareiras e as matas adjacentes compartilharam 13

morfotipos. Encontrei nove morfotipos de formiga exclusivas nas clareiras, enquanto

que na mata registrei 12 morfotipos restritos a esse ambiente. Os morfotipos mais

comuns em clareiras foram Crematogaster sp.1, Solenopsis sp.2, Solenopsis sp.3 e

Pheidole sp.11, que representaram 43% dos morfotipos amostrados (Tabela 1). Na

mata, os morfotipos mais comuns foram Pheidole sp.12; Solenopsis sp.2 , Solenopsis

sp.3, Pachycondyla sp. e Crematogaster sp.1, que representaram 43% do total dos

morfotipos amostrados (Tabela 1).

Tabela 1. Frequência relativa de ocorrência dos morfotipos de formiga registrados em

clareiras e na mata primária em uma floresta de terra firme na Amazônia Central.

Ambiente

Espécie Clareira (%)

(N= 11 sítios) Mata (%)

(N= 11 sítios) Ectatoma sp. 18 Pachycondyla sp. 27 36 Crematogaster sp.1 45 36 Crematogaster sp.2 9 Crematogaster sp.3 9 Crematogaster sp.4 27 Crematogaster sp.5 9 9 Crematogaster sp.6 27 18 Tapinoma sp. 9 Solenopsis sp.1 9 9 Solenopsis sp.2 45 45 Solenopsis sp.3 45 45 Solenopsis sp.4 9 18 Solenopsis sp.5 18 18 Pheidole sp.1 9 9 Pheidole sp.2 9 18 Pheidole sp.3 18 Pheidole sp.4 9 Pheidole sp.5 9

Page 173: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

173

Pheidole sp.6 9 Pheidole sp.7 27 Pheidole sp.8 9 Pheidole sp.9 9 9 Pheidole sp.10 9 Pheidole sp.11 45 Pheidole sp.12 54 Pheidole sp.13 9 Morfo 1 9 Morfo 2 18 Morfo 3 9 Morfo 4 9 Morfo 5 9 18 Morfo 6 9 Morfo 7 9

Os ambientes de clareira e mata apresentaram, em média, uma baixa

similaridade (CJ = 0,20±0,21, Figura 1). A similaridade média dentro de cada ambiente

também foi baixa (CJ clareiras = 0,15±0,13; CJ mata = 0,13±0,11; Figura 3). A riqueza

de espécies não aumentou com a idade da clareira (R2 = 0,222; F(1,9) = 0,222; p = 0,661)

e similaridade da composição de espécies entre os dois ambientes não foi relacionada

com o estágio sucessional da clareira (R2 = 0,321; F(1,9) = 1,06; p = 0,321, Figura 3,

Tabela 2).

Page 174: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

1

74

C

1 C

2 C

3 C

4 C

5 C

6 C

7 C

8 C

9 C

10

C11

M

1 M

2 M

3 M

4 M

5 M

6 M

7 M

8 M

9 M

10

M11

C

1 1

C

2 0

1

C

3 0.

1 0

1

C4

0.1

0 0.

1 1

C5

0 0

0.1

0 1

C

6 0.

2 0

0 0

0.1

1

C

7 0.

1 0

0.2

0 0.

2 0.

1 1

C

8 0.

1 0

0 0.

1 0.

2 0.

2 0.

1 1

C9

0 0

0.1

0 0.

5 0.

1 0.

1 0.

1 1

C

10

0.1

0 0

0.1

0.3

0.2

0.2

0.5

0.2

1

C

11

0.1

0 0.

1 0

0.2

0 0.

1 0.

0 0.

4 0.

1 1

M

1 0

0 0

0.1

0 0

0 0.

1 0

0.1

0 1

M2

0.2

0 0

0 0.

2 0.

1 0

0.2

0.2

0.2

0.2

0.0

1

M3

0.1

0 0

0 0

0.2

0 0

0 0

0.1

0.0

0.0

1

M

4 0

0 0.

5 0

0.2

0 0.

3 0

0.1

0 0.

1 0

0 0

1

M5

0 0

0.2

0 0.

2 0

0 0.

1 0.

1 0.

2 0.

1 0

0.1

0 0.

3 1

M6

0 0

0.1

0.1

0.1

0.1

0.2

0.0

0.1

0.1

0.1

0.2

0 0.

1 0.

2 0

1

M7

0.1

0 0

0.1

0.1

0.2

0.2

0.5

0.1

0.6

0 0.

2 0.

1 0

0 0

0.1

1

M

8 0.

1 0

0 0

0.1

0.1

0 0.

3 0.

1 0.

1 0.

1 0

0.2

0.1

0 0.

2 0

0 1

M

9 0.

1 0

0.1

0 0.

4 0.

2 0.

3 0.

2 0.

3 0.

4 0.

2 0

0.1

0 0.

1 0.

1 0.

1 0.

2 0.

1 1

M10

0

0 0

0.1

0.3

0.1

0 0.

5 0.

2 0.

6 0.

1 0.

1 0.

2 0

0 0.

2 0.

1 0.

3 0.

3 0.

2 1

M

11

0 0

0.1

0 0.

2 0

0.1

0.0

0.2

0.1

0.4

0 0.

0 0

0.1

0.1

0.1

0 0.

1 0.

3 0.

1 1

Fig

ura

1. M

atri

z de

sim

ilari

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da

com

posi

ção

de m

orfo

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Núm

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em.

Page 175: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

1 2 3 4 5 6 7 8 9

Riqueza

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

Diâmetro médio plântulas (mm)

Figura 2. Relação entre a riqueza de morfotipos de formigas em clareiras e o diâmetro médio

das plântulas (estágio sucessional da clareira) em uma floresta de terra firme na Amazônia

Central.

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5

Diâmetro médio plântulas (mm)

0.0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

Similaridade (CJ)

Figura 3. Relação entre a similaridade dos morfotipos de formiga entre clareiras e mata

primária em função do diâmetro médio das plântulas (estágio sucessional da clareira) em uma

floresta de terra firme na Amazônia Central.

Page 176: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

176

Os morfotipos Crematogaster sp.1, Solenopsis sp.3 e Solenopsis sp.4 foram

registrados na maioria dos estágios sucessionais das clareiras (Tabela 2). Encontrei os

morfotipos do gênero Pheidole apenas nas clareiras de estágios mais intermediários e

avançados de sucessão (diâmetro médio das plântulas entre 1,96 e 3,37 mm) (Tabela 2). Cada

morfotipo desse gênero esteve presente em apenas uma clareira e nenhum deles co-ocorreu

em uma mesma clareira (Tabela 2).

Tabela 2. Morfotipos de formiga registrados em clareiras. Números entre parênteses

representam o diâmetro médio das plântulas (mm), usado como estimativa do estágio

sucessional de cada clareira.

Clareira

Espécie C2

(0,42) C1

(0,48) C3

(1,36) C10

(1,71) C9

(1,82) C7

(1,94) C8

(1,96) C5

(2,23) C4

(2,39) C11

(2,92) C6

(3,37) Pachycondyla sp. X X Crematogaster sp.1 X X X X X Crematogaster sp.3 X Crematogaster sp.4 X X X Crematogaster sp.5 X Crematogaster sp.6 X X X Tapinoma sp. X Solenopsis sp.1 X Solenopsis sp.2 X X Solenopsis sp.3 X X X X X Solenopsis sp.4 X X X X X Solenopsis sp.5 X X Pheidole sp.1 X Pheidole sp.2 X Pheidole sp.9 X Pheidole sp.10 X Pheidole sp.11 X Morfo 2 X X Morfo 4 X Morfo 5 X Morfo 6 X Morfo 7 X

Discussão

Diversas espécies de formiga podem ser beneficiadas por perturbações no hábitat. Vários

estudos mostram que ambientes perturbados, como as bordas de fragmentos florestais,

possuem maior riqueza de espécies de formiga (e.g. Carvalho & Vasconcelos 1999; Leal

Page 177: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

177

2003; Sobrinho & Schoereder 2007). Entretanto, as perturbações naturais geradas pela

abertura de uma clareira na floresta não representam um fator capaz de alterar o número de

espécies de formigas que pode se estabelecer nesses locais. A quantidade de recursos

alimentares para as formigas em clareiras pode ser equivalente àquela oferecida na mata

adjacente. Dessa forma, os dois ambientes podem sustentar uma riqueza semelhante de

espécies de formigas.

A assembléia de formigas é sensível à perturbação gerada pela formação de uma

clareira. As clareiras e a mata adjacente diferem quanto à composição da assembléia de

formigas e essa diferença tende a ser mantida em clareiras com diferentes estágios

sucessionais. Formigas predadoras especialistas são negativamente afetadas pelas

perturbações no hábitat (Andersen 2000). A espécies predadora encontrada nesse estudo,

Pachyccondyla sp., pode não encontrar nas clareiras a mesma disponibilidade de alimento

oferecido na mata, restringindo sua distribuição à esse ambiente ou ocorrendo apenas em

clareiras mais antigas.

O gênero Pheidole é outro gênero de formiga que parece ser sensível à formação de

clareiras. As espécies desse gênero são tolerantes à sombra (Andersen 2000) e também

parecem responder ao gradiente sucessional. Encontrei morfotipos de Pheidole sp. apenas em

clareiras em estágios sucessionais intermediário e avançado. Além disso, na mata primária

capturei mais de um morfotipo de Pheidole por local de amostragem, enquanto nas clareiras

somente um morfotipo foi registrado por local. No ambiente mais restritivo das clareiras, o

comportamento dominante dessa formiga provavelmente não permite a coexistência de mais

de um morfotipo desse gênero.

A assembléia de formigas não segue uma sequência sucessional de substituição de

espécies em clareiras. Clareiras e mata adjacente são divergentes quanto à composição de

espécies e essa diferença tendem a ser mantida ao longo do gradiente sucessional. As

Page 178: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

178

alterações nas condições ambientais promovidas pelas clareiras podem estabelecer nichos que

só podem ser ocupados por determinados grupos de formigas. Entretanto, o mesmo tipo de

ambiente também não apresentou uma convergência na composição das espécies de formiga.

Dessa forma, as regras de montagem da composição de espécies dentro de cada um desses

locais seria um processo aleatório, ligado à história de colonização e extinção local (Hérault

2007). Entretanto, as espécies que podem se estabelecer no mesmo tipo de ambiente seriam

ecologicamente equivalentes e a ocupação de um sítio dependeria apenas das restrições da

capacidade dispersiva das espécies (Hubbel 2001)

Agradecimentos

Agradeço a todos que me ajudaram na realização do PI: Paulinho Enrique pelas orientações

no delineamento e ajuda nas análises, Laura, Fernanda e Lucas pela identificação das

formigas, Sr. Cardoso pelas dicas das localizações das clareiras e a Ana e ao Paulo Estéfano

pelas sugestões no manuscrito.

A parte isso, quero agradecer imensamente ao Zé Luís, ao Paulinho Enrique e ao Paulo

Estéfano pela oportunidade de vivenciar esses 30 dias incríveis na floresta Amazônica, no

melhor lugar do mundo para aprender ecologia! Participar do EFA foi, sem dúvida, uma das

experiências mais intensas que tive, pessoal e profissionalmente. Agradeço também às

monitoras e aos professores pelas inúmeras correções dos relatórios, pelas críticas e puxões de

orelha, mas buscando sempre extrair o melhor de nós. E por fim, agradeço a todos os Efanos,

meus mais novos amigos de infância, pela convivência, discussões, risos, festinhas e afins.

Vocês são inesquecíveis !!

Page 179: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

179

Referências

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environmental stress and disturbance. In Ants: standard methods for measuring and

monitoring biodiversity (Agosti, D., J.D. Majer et al. eds). Washington, DC;

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matas de terra firme da Amazônia Central. Dissertação de mestrado, Instituto Nacional

de Pesquisas da Amazônia, Manaus, AM.

Hairston, N.G. 1989. Ecological experiments: purpose, design and execution. Cambridge:

Cambridge University Press.

Hérault, B. 2007. Reconciling niche and neutrality through the emergent group approach.

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Hubbel, S.P.2001. The unified neutral theory of biodiversity and biogeography. Princeton and

Oxford: Princeton University Press.

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Lach, L., C. L. Parr & K. L. Abbott. 2010. Ant Ecology. Oxford: Oxford University Press

Leal, I. R. 2003. Diversidade de formigas em diferentes unidades de paisagem da Caatinga. In

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Recife, PE; Editora universitária da UFPE.

Page 180: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

180

Melo, F.P.L & M. Tabarelli. 2003. Seed dispersal and demography of pioneer trees: the case

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Vasconcelos, H.L. 1999. Effects of forest disturbance on the structure of ground-foraging ant

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Page 181: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

181

Efeito do tipo de nectário extrafloral sobre a riqueza e composição de espécies de

formigas visitantes

Fernanda Maria Pereira de Oliveira

Introdução

As formigas são organismos dominantes em todo o mundo com cerca de 12.500 espécies

descritas (Bolton 2006). Em ecossistemas terrestres, elas possuem uma grande importância

funcional, estando envolvidas em diversos tipos de interações com outros organismos em

todos os níveis tróficos (Oliveira 1997). Na literatura são descritas várias associações

mutualísticas de formigas com plantas (Folgarait 1998). Entre essas associações temos as

interações obrigatórias e especialistas e as interações facultativas e generalistas. Como

exemplo das interações obrigatórias e especialistas há o sistema mirmecófita-formiga, onde a

planta oferece abrigo para a colônia de formigas, que por sua vez defende a planta contra

herbívoros (Huxley & Cutler, 1991). As interações facultativas e generalistas incluem as

associações com os nectários extraflorais onde as formigas se alimentam de néctar e, em

troca, fornecem defesa para a planta contra possíveis predadores (Elias 1983).

Os nectários extraflorais são glândulas secretoras de néctar que não estão relacionadas

diretamente com a polinização. Eles podem ocorrer em várias partes da planta como folhas,

frutos e na parte externa das flores (Elias 1983). Em algumas regiões do mundo, o néctar

produzido por essas glândulas pode ser o principal recurso alimentar para as formigas (Rico-

Gray & Oliveira 2007). No entanto, por ser uma interação facultativa e não específica, a

composição da assembléia de formigas que utiliza os nectários pode ser muito variável (Rico-

Gray & Oliveira 2007).

A disponibilidade do recurso oferecido pelo nectário extrafloral pode variar de acordo

com a sua morfologia e a sua localização na planta (Elias 1983). Nectários localizados entre

Page 182: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

182

os folíolos, por exemplo, parecem ser mais visíveis e disponíveis para os visitantes do que os

nectários localizados na parte abaxial da folha. Além disso, nectários variam em relação ao

tamanho, existindo nectários mais proeminentes do que outros, o que pode resultar em uma

diferença na disponibilidade de néctar secretado (Elias 1983).

A morfologia e a localização do nectário associado ao comportamento de forrageio

diferenciado entre as espécies de formigas podem possibilitar que alguns grupos de formigas

visitem e se beneficiem mais de um tipo de nectário do que de outro. Em função disso, o meu

objetivo foi investigar se a assembléia de formigas que utilizam nectários extraflorais como

recurso varia em função do nectário. Minha hipótese é que nectários extraflorais com recurso

mais acessível serão compartilhados por um número maior de espécies de formigas quando

comparado a nectários extraflorais menos acessíveis na planta.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (ARIE PDBFF) (2°24’ S-59°44’ O), localizada a 80 km ao norte de

Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação é caracterizada como uma floresta tropical úmida

(Pires & Prance 1985). A área de estudo é cortada por uma estrada responsável pela criação

de uma borda florestal, onde coletei os dados para este estudo.

Modelos de estudo

Para este estudo escolhi duas espécies de árvores de pequeno porte que possuem diferentes

tipos de nectários extraflorais. Utilizei indivíduos pertencentes ao gênero Inga spp.

(Fabaceae) e indivíduos da espécie Croton lanjouwensis (Euphorbiaceae). Inga spp. possui

Page 183: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

183

nectários interfoliolares que são proeminentes e com uma depressão na parte central (formato

panela) onde ocorre acúmulo de néctar. Croton lanjouwensis possui um par de nectários

pequenos sem cavidade na parte abaxial da folha próxima ao pecíolo, e não acumula néctar.

Dessa maneira, eu espero que os nectários de Inga spp. sejam visitados por um maior número

de espécies de formigas e que a composição de espécies de visitantes varie mais do que nos

nectários extraflorais de C. lanjouwensis.

Coleta de dados

Observei 30 indivíduos de Inga spp. e 30 indivíduos de C. lanjouwensis que possuíam

formigas em seus nectários extraflorais. Esses indivíduos apresentavam aproximadamente 2

m de altura, para que eu pudesse observar toda a planta. Observei as formigas que estavam

visitando os nectários por toda a planta e as coletei. Identifiquei as formigas até o nível de

gênero com auxílio da chave de identificação de Bolton (1994) e depois as separei em

morfoespécies.

Análise de dados

Avaliei se o número de espécies de formigas visitando os nectários foi maior em Inga spp. do

que em C. lanjouwensis utilizando um teste qui-quadrado. Para isso, criei quatro categorias

que representavam o número de espécies que visitavam os nectários no momento da

observação. As categoria 1 representou os indivíduos que possuíam apenas uma espécie de

formiga visitando seus nectários. A categoria 2, 3 e 4 representou os indivíduos que possuíam

duas, três e quatro espécies de formigas visitando seus nectários, respectivamente.

Avaliei se a composição de espécies de formigas que visitavam os nectários

extraflorais variava mais entre os indivíduos de Inga spp. em relação ao de C. lanjouwensis.

Para isso, ordenei os indivíduos por meio de escalonamento multidimensional não-métrico

Page 184: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

184

(NMDS). A ordenação foi baseada em matrizes de similaridade calculadas utilizando o índice

de Bray-Curtis a partir de dados de presença e ausência das espécies de formigas. Utilizei os

escores dos dois primeiros eixos do NMDS porque eles explicaram melhor a variação na

composição de espécies de formigas que estavam visitando os indivíduos observados.

Calculei a distância de cada ponto ao centróide, extraí a média dessas distâncias e fiz um teste

Mann-Whitney.

Resultados

Encontrei um total de 18 espécies pertencentes a oito gêneros de formigas visitando os

indivíduos de C. lanjouwensis e Inga spp. Em Inga spp. foram registradas 10 espécies de

formigas pertencentes a seis gêneros, e as espécies mais frequentes foram as dos gêneros

Pheidole e Crematogaster. Em C. lanjouwensis foram registradas 15 espécies de formigas

pertencentes a oito gêneros, e as espécies de formigas que mais frenquentes pertencem aos

gêneros Ectatomma e Camponotus (Tabela 1).

Tabela 1. Espécies de formigas que visitaram os nectários extraflorais de Croton lanjouwensis

e Inga spp. e número de indivíduos onde cada espécie de formiga ocorreu.

Espécies de formigas

C. lanjouwensis

Inga spp.

Azteca sp. 3 1

Camponotus sp.1 1 0

Camponotus sp.2 7 1

Camponotus sp.3 1 0

Cephalotes sp. 2 0

Crematogaster sp.1 7 6

Crematogaster sp.2 2 5

Crematogaster sp.3 0 3

Dolichoderus sp. 4 2

Page 185: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

185

Ectatomma sp.1 0 3

Ectatomma sp.2 11 3

Pheidole sp.1 9 12

Pheidole sp.2 1 0

Pheidole sp.3 2 0

Pseudomyrmex sp.1 4 0

Pseudomyrmex sp.2 2 0

Não identificada 1 0 1

Não identificada 2 1 0

O número de espécies de formigas observadas visitando os nectários extraflorais de C.

lanjouwensis foi maior do que o de Inga spp. (χ2=12,10; gl=3; p=0,007). Dentre os 30

indivíduos de Inga spp., 87% foram visitados por uma única espécie de formiga e 23% foram

visitados por mais de uma espécie de formiga. Já em C. lanjouwensis 53% foram visitados

por mais de uma espécie de formiga, enquanto 47% dos indivíduos foram visitados por uma

única espécie de formiga (Figura 1). A variação na composição de espécies de formigas em

Inga spp. foi maior do que em C. lanjouwensis (U=217,00; p=0,0005, Figura 2).

Page 186: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

186

Fre

quên

cia

da r

ique

za d

e fo

rmig

as (

%)

0

20

40

60

80

100

120

categoria 1categoria 2categoria 3categoria 4

Inga spp.C. lanjouwensis

Figura 1. Frequência das categorias de riqueza de formigas que visitaram os NEFs de Inga

spp. e de Croton lanjouwensis. A categoria 1 representa as plantas que foram visitadas por

uma única espécie de formiga, a categoria 2, 3 e 4 representam as plantas que foram visitadas

por duas, três e quatro espécies de formigas, respectivamente.

NMDS Eixo 1

-5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3

NMDS Eixo 2

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

1,5

2,0stress: 0,01

Figura 2. Ordenação por meio de escalonamento multidimensional não-métrico (NMDS) dos

indivíduos de Croton lanjouwensis e Inga spp. A ordenação foi baseada em matrizes de

similaridade de Bray-Curtis utilizando dados de presença e ausência das espécies de formigas

visitando os nectários extraflorais. Círculos preenchidos correspondem aos indivíduos de

Croton lanjouwensis e círculos vazios correspondem aos indivíduos de Inga spp.

Page 187: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

187

Discussão

As características dos nectários podem influenciar a assembléia de formigas que dependem

desse recurso, modificando a riqueza e a composição de espécies das formigas que visitam

esses nectários. Entretanto, as estratégias de forrageio utilizadas pelas formigas são

importantes nessa interação e refletem na própria assembléia de formigas que conseguem

explorar esse recurso.

O nectário extrafloral de Inga spp. oferece uma acessibilidade maior ao recurso devido

à sua morfologia e localização (Oliveira & Del-Claro 2005). Entretanto, esse fácil acesso pode

fazer com que o néctar seja utilizado por outros invertebrados além das formigas, aumentando

assim a competição por esse recurso. Em função disso, a utilização do recurso por outros

grupos não formicídeos pode fazer com que um menor número de espécies de formigas visite

esse tipo de nectário extrafloral.

Os nectários extraflorais de Inga spp. estavam geralmente dominados por uma única

espécie de formiga pertecente aos gêneros Crematogaster ou Pheidole. Esses gêneros são

compostos por formigas com comportamento agressivo, com alta taxa de recrutamento e que

dominam o recurso rapidamente (Hölldobler & Wilson 1990). Isso pode explicar uma maior

variação na composição de espécies entre os indivíduos de Inga spp., ainda que, de maneira

geral, um menor número de espécies estivesse os visitando. Essas formigas provavelmente

encontram o recurso e não permitem o compartilhamento com outras espécies. Assim a

maioria dos indivíduos de Inga spp. acaba por ter uma única espécie de formiga visitante,

porém a espécie dominante pode variar de indivíduo para indivíduo.

A morfologia e a localização do nectário extrafloral podem fazer com que algumas

espécies de formigas se beneficiem mais do que outras. Somado a isso, algumas espécies de

formigas tendem a dominar o recurso, impedindo o compartilhamento do mesmo (Parr &

Gibb 2010). Dessa maneira, embora a interação entre nectários e formigas seja considerada

Page 188: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

188

facultativa e não específica, essa interação pode ser determinada pelo tipo de nectário e pelo

comportamento de forrageio das formigas.

Agradecimentos

Agradeço a todos que organizaram o EFA 2011. Aos Coordenadores Paulo Enrique e

Paulo Estéfano, e às Bonitoras Laura e Manô pela paciência, ensinamentos e por tocarem esse

curso de maneira tão especial. A Ana e Manô (again!) pelas correções desse relatório. Aos

colegas de curso pela companhia em todos os momentos. Ao meu alter ego, Marilaqui, por ter

me tornado uma pessoa mais agradável e divertida durante o curso. Em especial, gostaria de

agradecer a Talita e Rodrigo Sukita. A primeira por aguentar a Fernanda e o segundo pelo

combustível emprestado à Marilaqui.

Referências

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1758–2005. Harvard University Press, Cambridge, Massachusetts. 2006. CD-ROM.

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Bentley, B. & Elias, T. (Ed.). The Biology of Nectaries. Columbia University Press,

New York.

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Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The ants. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag.

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Press.

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Oliveira, P.S. 1997. The ecological function of extrafloral nectaries: herbivore deterrence by

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Oliveira, P.S. & K. Del-Claro. 2005. Multitrophic interactions in a neotropical savanna: Ant-

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Chicago: University of Chicago Press.

Page 190: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

190

Bordas florestais alteram o porte e a estratégia de crescimento de lianas?

Fernando M. Resende

Introdução

A modificação de florestas tropicais pela atividade antrópica leva à criação de bordas

florestais. As bordas são áreas de contato entre ambientes nativos e alterados, onde mudanças

decorrentes da supressão da vegetação são mais pronunciadas (Laurance et al. 2011). Essas

mudanças levam a formação de ambientes diferenciados nas áreas florestais próximas à borda.

Nesses ambientes, muitos fatores abióticos como temperatura, incidência luminosa,

intensidade de ventos e umidade são alterados. Essas alterações resultam em grandes

modificações na estrutura de comunidades vegetais.

Ambientes de borda de florestas apresentam grande variação de temperatura em

decorrência do aumento na incidência luminosa nessas áreas (Camargo & Kapos 1995). O

aumento dessa incidência luminosa favorece a proliferação de plantas pioneiras e reduz a

capacidade de germinação e estabelecimento de espécies vegetais tolerantes à sombra,

características do interior de floresta (Bruna 1999, Benítez-Malvido & Martinez-Ramos 2003,

Uriarte et al. 2010). Nos hábitat de borda, também ocorre o aumento da incidência e

intensidade de ventos (Laurance 1997). O aumento da turbulência na vegetação das bordas de

florestas, associadas à redução da disponibilidade hídrica, levam ao aumento da taxa de

mortalidade de árvores (Kapos et al. 1993, Ferreira & Laurance 1997, Malcolm 1998,

Didham & Lawton, 1999). Como árvores grandes e emergentes têm copas expostas a intensa

radiação solar e evaporação, a mortalidade dessas árvores é maior em relação à mortalidade

de árvores de pequeno e médio porte (Laurance et al. 2000).

Taxas elevadas de mortalidade de árvores de maior porte nos ambientes de borda

podem acarretar em alterações na estrutura da vegetação (Laurance et al. 2000). Um dos

Page 191: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

191

grupos vegetais influenciados por essas alterações é a comunidade de lianas (Hegarty &

Caballé 1991, Laurance et al. 2001). Lianas são trepadeiras lenhosas que germinam no solo e

dependem de árvores como suporte (forófito) para atingir o dossel e se desenvolverem

(Ribeiro et al. 1999). Dessa forma, é possível que a redução no número de árvores de maior

porte nos ambientes de borda acarrete também na redução de lianas de maior porte. Além

disso, espera-se que bordas florestais, por apresentarem maior incidência de ventos,

selecionem espécies de lianas com estruturas preênsis, como gavinhas e espinhos. Essas

estruturas oferecem suporte mecânico e permitem o crescimento sobre o forófito.

Dessa forma, meu objetivo foi avaliar como ambientes de borda alteram a estrutura da

comunidade de lianas. Minhas hipóteses são que ambientes de borda i) diminuem o porte das

lianas devido a redução do porte do forófito e ii) selecionam estratégias de fixação das lianas.

Espero que ambientes de borda apresentem lianas de menor diâmetro e que exista relação

entre o diâmetro das lianas e o diâmetro das árvores suporte. Espero também que a proporção

de lianas com estruturas preênsis seja maior próximo às bordas da floresta.

Métodos

Área de estudo

Esse estudo foi desenvolvido na Reserva Km 41, que integra a Área de Relevante Interesse

Ecológico (ARIE) Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). A área é

uma unidade de conservação federal co-gerida pelo Instituto Nacional de Pesquisas da

Amazônia.A Reserva localiza-se a cerca de 80 Km ao norte de Manaus, Amazonas, Brasil

(02º 24’ S e 59º 22’ O). A vegetação da Reserva é caracterizada por Floresta Tropical

Ombrófila Densa e apresenta dossel de cerca de 35 m de altura, com árvores emergentes que

Page 192: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

192

podem alcançar 55 m. A coleta de dados foi realizada ao longo da borda entre a estrada de

acesso e a mata adjacente que compõe a Reserva.

Coleta de dados

Estabeleci 22 pontos de amostragem, sendo 11 pontos distribuídos na borda da floresta e 11

pontos no interior da floresta. Em cada ambiente, os pontos distavam 20 m entre si.

Para evitar que a coleta de dados fosse feita em uma vegetação que foi suprimida durante a

construção da estrada, os pontos na borda da floresta foram dispostos a uma distância de 5 m

da borda da floresta. Alterações microclimáticas advindas da criação da borda podem atingir

até os 300 m iniciais da área florestada (Laurance et al. 2002). Devido a isso, os pontos do

interior da floresta foram estabelecidos a uma distância superior a 500 m da estrada, para

garantir a ausência de influência da borda.

Amostrei as cinco lianas enraizadas mais próximas de cada ponto de amostragem.

Considerei apenas os indivíduos lianescentes que usavam uma árvore como suporte e que

apresentavam diâmetro superior a 0,5 cm. Medi o diâmetro de cada liana a uma altura de 1,3

m a partir da base do caule. Para avaliar se existe relação entre o diâmetro das lianas e o das

árvores suporte, medi também os diâmetros das árvores utilizadas pelas lianas como apoio.

Registrei a estratégia de sustentação vertical (i.e., presença ou ausência de estrutura preênsil)

de cada indivíduo lianescente. As lianas com estruturas de fixação na gema apical não foram

incluídas nesse estudo.

Comparei os valores dos diâmetros das lianas de cada ambiente usando o teste de

Mann-Whitney. Testei a relação entre os diâmetros das lianas e das árvores suporte através de

uma análise de covariância, utilizando os pontos de amostragem como covariável. Comparei a

proporção de lianas com estrutura preênsil em cada ambiente utilizando o teste qui-quadradro.

Page 193: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

193

Resultados

Amostrei 110 lianas nos dois ambientes analisados. O diâmetro das lianas variou de 0,6 a 15,3

cm, sendo que a maioria (87,27%) foi inferior a 5 cm. No ambiente de borda o diâmetro

médio das lianas foi de 1,81 cm e variou de 0,7 a 13,69 cm, enquanto que no interior da área

florestada foi de 3,24 cm e variou entre 0,6 e 15,3 cm. A porcentagem de lianas com diâmetro

menor que 2,5 cm na borda florestal foi de 87,27% (48 indivíduos lianescentes), enquanto no

interior da área florestada a porcentagem de indivíduos desse porte foi de 56,36% (31

indivíduos). Houve diferenças também no número de lianas de grande porte (diâmetro ≥ 10

cm) encontrado nos diferentes ambientes. A borda florestal tinha apenas uma liana desse

porte, enquanto no interior da floresta registrei três indivíduos. Assim, as lianas no habitat de

borda apresentam diâmetro maior que no interior da floresta (n=22; U=24; p=0,016; Figura

1).

Mediana

25%-75%

Borda Interior

Ambiente

0

1

2

3

4

5

Diâ

met

ro d

as li

anas

(cm

)

Figura 1. Relação entre diâmetro das lianas em dois ambientes (borda e interior de floresta)

em uma área de floresta de terra firme. As barras representam os percentis (25 - 75%) e os

quadrados vazios a mediana.

Page 194: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

194

O diâmetro das árvores suporte amostradas variou de 0,7 a 88,3 cm. A maioria delas

(80,9%) foi inferior a 15 cm de diâmetro. No ambiente de borda, o diâmetro médio foi de

12,01 cm, variando de 1,3 a 101 cm. Já no interior da floresta o diâmetro médio foi de 24,10

cm, o qual variou entre 0,7 e 88,3 cm. Houve relação entre o diâmetro das lianas e o das

árvores suporte (F=26,87; P<0,001; Figura 2).

0 20 40 60 80 100

Diâmetro das árvores (cm)

0

2

4

6

8

10

12

14

16

Diâ

met

ro d

as li

anas

(cm

)

Figura 2. Relação entre diâmetro das lianas e o diâmetro das árvores suporte em uma área de

floresta de terra firme. Foram consideradas as lianas estabelecidas nos dois ambientes

avaliados nesse estudo (borda e interior de floresta).

Em relação à estratégia de fixação, 42% das lianas presentes no ambiente de borda e

38,18% das encontrados no interior da floresta apresentaram estruturas especializadas em

fixação. Dentre as estrutura de fixação, foram identificadas gavinhas de origem caulinar e/ou

foliar e espinhos recurvados, que são utilizados como ganchos. Não houve relação entre a

estratégia de fixação das lianas e o ambiente (χ=0,16; df=1; p=0,69).

Page 195: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

195

Discussão

Os resultados demonstram que existe efeito da borda da floresta no diâmetro dos indivíduos

lianescentes, sendo que lianas estabelecidas na borda da floresta apresentam diâmetro menor

que aquelas estabelecidas no interior da floresta. Isso pode ser explicado devido à redução de

árvores suportes altas nas áreas adjacentes às bordas. A redução de árvores de maior porte

limita o crescimento e a sobrevivência de lianas de grande porte, já que as lianas dependem da

estrutura do forófito para se desenvolverem.

Em relação às estruturas utilizadas pelas lianas para o crescimento, os resultados

demonstram que ambientes de borda não selecionam espécies de lianas com estruturas de

fixação específicas para auxiliar na sustentação. Portanto, espécies de lianas que apresentam

estruturas preênsis especializadas para ascensão no forófito não são beneficiadas nos

ambientes de borda. Lianas que não apresentam estruturas especializadas em sustentação

podem apresentar outras estratégias de fixação como: 1) troncos flexíveis (lianas rasteiras),

que se enrolam em outras plantas, ou 2) caule espirado (volúvel), que cresce em volta de outro

tronco (Ribeiro et al. 1999). Lianas que apresentam essas estratégias, também são aptas a

crescerem em ambientes que recebem alta incidência de ventos, como as bordas florestais.

Como áreas sob influência de bordas florestais têm sido criadas em ritmo acelerado

nos últimos anos (Broadbent et al. 2008) e lianas podem ter importantes impactos na

dinâmica de florestas e áreas impactadas (Laurance et al. 2001), um maior entendimento

sobre os fatores relacionados à estruturação de comunidades de lianas tem importantes

aplicações para o manejo de florestas.

Agradecimentos

Primeiramente agradeço ao INPA e ao PDBFF pela oportunidade única de participar do EFA

2011. Com certeza esse curso trará ótimas conseqüências em minha vida acadêmica e pessoal.

Page 196: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

196

Agradeço aos competentes coordenadores Rainbow Master e New Marilaqui pelos

conhecimentos transmitidos e pela dedicação total ao bom andamento do curso. Aos demais

professores que contribuíram para a qualidade do curso. Às monitoras Ursinho Carinho e

Laura Pezinho de Ouro pelos ensinamentos, amizade e afrontas escritas nos relatórios. À

Dona Eduarda e Seu Jorge pela dedicação no preparo da comida e pelas brincadeiras na hora

do almoço. A todos os colegas do curso pela amizade e pelos momentos de risada e

descontração vividos nos 30 dias de convivência na magnífica Selva Amazônica. Sem vocês o

curso não seria especial como foi. Sentirei saudades!

Referências

Benítez-Malvido & J.M. Martinez-Ramos. 2003. Influence of edge exposure on tree seedling

species recruitment in tropical rain forest fragments. Biotropica 35:530–541.

Broadbent E., G.P. Asner, M. Keller, D. Knapp, P. Oliveira & J. Silva. 2008. Forest

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Brazilian Amazon. Biol. Conserv, 140:142–155.

Bruna, E.M. 1999. Seed germination in rainforest fragments. Nature 402:139.

Camargo, J.L.C. & Kapos, V. 1995. Complex edges effects on soil moisture and microclimate

in Central Amazonian forest. Journal of Tropical Ecology, 2:205-221.

Didham R.K. & J.H. Lawton. 1999. Edge structure determines the magnitude of changes in

microclimate and vegetation structure in tropical forest fragments. Biotropica, 31:17–

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Ferreira, L.V. & W.F. Laurance. 1997. Effects of forest fragmentation on mortality and

damage of selected trees in central Amazonia. Conservation Biology, 11:797–801.

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Cambridge University Press.

Kapos, V., G.M. Ganade, E. Matsui & R.L. Victoria. 1993. 13C as indicator of edge effects in

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Uriarte, M., E.M. Bruna, P. Rubim, M. Anciães & I. Jonckheere. 2010. Effects of forest

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Page 199: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

199

Pernas longas para que te quero? Pulso de inundação de riachos de pequena ordem não

determina a estrutura morfológica da comunidade de formigas

Franciele Parreira Peixoto

Introdução

O estudo da estrutura de comunidades trata dos processos que influenciam os padrões de

distribuição das espécies, no tempo e no espaço, e que determinam várias características das

assembleias, como abundância relativa, riqueza e composição de espécies (Schamp et al.

2008). Dentre esses processos, competição e predação são frequentemente utilizados para

explicar variações tanto na abundância quanto na riqueza de espécies. A riqueza de espécies

também pode mudar nas comunidades ao longo do tempo em resposta a fatores abióticos, o

que é conhecido como processo de sucessão (Horn 1974). Além disso, o histórico evolutivo

das espécies pode determinar os padrões de composição em cada comunidade (Pillar et al.

2009).

Além de usar variações na abundância relativa, riqueza e composição, é possível

avaliar também a organização de atributos funcionais das espécies, dentro e entre assembleias

para detectar os processos responsáveis pela estruturação de comunidades (Schamp et al.

2008). Atributos funcionais são características morfológicas, fisiológicas ou fenológicas que

afetam o desempenho dos indivíduos em relação às pressões do ambiente (Violle et al. 2007).

Assim, sob a pressão de um filtro ambiental, apenas as espécies que possuem os atributos que

lhes conferem capacidade de suportar tais condições estarão aptas a sobreviver nesse local

(Keddy 1992). Dessa forma, a existência de um filtro ambiental seleciona espécies com

características similares levando a convergência de determinados atributos funcionais dentro

de uma comunidade (Pillar et al. 2009).

Page 200: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

200

Em florestas de terra firme na Amazônia Central há pulsos de inundação imprevisíveis

que estão associados aos rios de primeira ordem. As inundações ocorrem com frequência e

são de curta duração (Ribeiro et al. 1999). Porém, apesar da curta duração, esses pulsos

podem representar alterações drásticas nas características físicas do ambiente e podem

influenciar no estabelecimento de invertebrados terrestres no gradiente de inundação (Adis &

Junk 2002). Assim, esses organismos serão selecionados por esse filtro ambiental de acordo

com suas adaptações, como a tolerância a inundação ou comportamento migratório (Adis &

Junk 2002).

Um grupo de invertebrados que pode ser afetado pelas inundações são as formigas de

solo, que dependem desse ambiente para forrageio e reprodução (Hölldobler & Wilson 1990).

Como os pulsos de inundação podem representar um filtro, é possível que grupos com uma

morfologia que favoreça a locomoção sobre a lâmina d’água sejam selecionados. Em

particular, um maior tamanho das pernas em relação ao corpo possibilita melhor distribuição

do peso corpóreo. Essa característica possibilita que o organismo utilize a tensão superficial

da água para permanecer na superfície e assim possa se deslocar durante os eventos de

inundação (Adis & Junk 2002). Portanto, se o pulso de inundação representar um filtro

ambiental que restringe a morfologia das formigas, as espécies presentes em áreas sujeitas aos

pulsos de inundação dos igarapés devem ser morfologicamente mais semelhantes entre si e

apresentar patas mais longas em relação ao corpo do que formigas presentes em áreas que não

estão sujeitas aos pulsos de inundação. Assim, o objetivo desse trabalho foi avaliar qual o

efeito da inundação sobre a estruturação funcional das comunidades de formigas de solo.

Minha hipótese é de que há um filtro ambiental associado ao pulso de inundação

influenciando a estrutura morfológica das formigas de solo.

Page 201: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

201

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na ARIE PDBFF (Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus.

Realizei as coletas no Km 41 (2°24’S; 59°44’O), um dos polígonos que compõem essa

unidade de conservação. A vegetação da área é de floresta tropical úmida de terra firme e

possui formações de relevo definidas como platô, vertente e baixio. As áreas de platô são as

mais altas, com solos argilosos e bem drenados. As vertentes são faixas de transição entre

essas áreas mais altas e áreas com menor altitude, chamadas baixio. As vertentes podem

eventualmente ser afetadas pelos pulsos de inundação, apenas em eventos de grande

magnitude. Já os baixios são planícies aluviais que são fortemente afetadas pelos pulsos de

inundação, de curta duração, com solos em geral encharcados por chuvas e com acúmulo de

sedimentos (Ribeiro et al. 1999).

Delineamento amostral

Para este estudo utilizei os ambientes de platô e baixio. Amostrei 15 pontos em cada

ambiente. A distância entre os pontos foi de no mínimo 10 m para evitar dependência entre as

amostras. Para a captura das formigas em cada ponto, utilizei uma isca composta por proteína,

carboidrato e açúcar (ovo, farinha de milho e goiabada). Ofereci quatro iscas por ponto,

dispostas nos vértices de um quadrado de 40 cm de lado, para evitar a dominância de uma

espécie. Oferecer mais de uma isca por ponto pode prevenir que uma espécie dominante

impeça o acesso ao recurso por outras presentes no local. Nos dois ambientes realizei as

coletas a partir das 9:00 h e mantive as iscas nos pontos durante 1h.

Page 202: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

202

Triagem e medidas corporais

Morfotipei as formigas utilizando critérios associados à cor, tamanho e forma do corpo,

tamanho e forma da mandíbula e formato do gaster (parte posterior do corpo). Separei um

indivíduo de cada morfotipo para cada ponto amostrado. Fotografei esses indivíduos

separados para medir o tamanho da perna posterior esquerda e o tamanho lateral da cabeça até

a mandíbula. Fiz as medidas utilizando o programa Image Tool. Calculei a proporção do

tamanho da perna pelo tamanho da cabeça de cada indivíduo e a chamei de tamanho

padronizado da perna (TPP).

Para avaliar se as pernas mais longas estavam relacionadas aos ambientes de baixio,

realizei um teste t para a medida de TPP das formigas entre os ambientes de platô e baixio.

Em seguida calculei a variância do valor de TPP entre os morfotipos para cada ponto. Quando

a comunidade continha apenas um morfotipo, utilizei dois indivíduos para realizar o cálculo

da variância. Com os valores de variância por ponto realizei um teste Mann-Whitney para

comparar a variância no TPP entre os ambientes, baixio e platô. Assim, se a hipótese de que

há um filtro ambiental associado ao pulso de inundação influenciando a estrutura morfológica

de comunidades de formigas for verdadeira, espero que i) o tamanho médio de TPP seja maior

em ambiente de baixio em relação a ambiente de platô e que ii) haja menor variância na

medida de TPP dentro das comunidades de baixio em relação às comunidades de platô.

Resultados

O ponto com o maior riqueza pertencia ao ambiente de baixio, com seis morfotipos

registrados. Houve uma média de dois morfotipos para cada comunidade de platô (DP=0,64)

e uma média de três morfotipos para cada comunidade de baixio (DP=1,08). Não houve

diferença nas médias das medidas de TPP entre os ambientes de platô e baixio (t=0,23; gl=27;

p=0,40; Figura 1). Também não houve diferença, entre os ambientes de platô e baixio, com

Page 203: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

203

relação às variâncias de TPP dos morfotipos de formigas em cada ponto (n=29; U=99;

p=0,39; Figura 2).

Baixio Platô

Ambiente

2.4

2,5

2,6

2,7

2,8

2,9

3,0

3,1

Méd

ia d

e T

PP

Figura 1. Médias da proporção do tamanho da perna pelo tamanho da cabeça das formigas

(TPP) nos ambientes de platô e baixio em floresta de terra firme na Amazônia Central. O

ponto central representa a média, as caixas o erro padrão e as barras indicam o intervalo de

95% de confiança.

Baixio Platô

Ambiente

-0,2

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

1,2

1,4

Var

iânc

ias

das

med

idas

de

TP

P e

ntre

pon

tos

Figura 2. Mediana das variâncias da medida de proporção do tamanho da perna pelo tamanho

da cabeça (TPP) em cada ponto nos ambientes de platô e baixio em floresta de terra firme na

Amazônia Central. Os pontos centrais representam as medianas, as caixas os quartis de 25% e

75% e as barras a amplitude de variação sem os pontos extremos.

Page 204: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

204

Discussão

Pernas maiores em relação ao corpo não são selecionadas nas comunidades de formigas de

solo em ambiente de baixio. Além disso, não houve menor variação no tamanho das pernas,

em relação ao corpo, relacionado a esse ambiente. Isso indica que esse tipo de morfologia não

é favorecida pelos pulsos de inundação a que o baixio está submetido. Dessa forma, o pulso

de inundação nessas áreas não representa um filtro ambiental para características

morfológicas funcionais do grupo das formigas de solo.

Em sistemas sujeitos a períodos prolongados de inundação parece haver um filtro

ambiental para invertebrados terrestres, que representa um importante fator na estruturação

das comunidades (Adis & Junk 2002). Isso é demostrado, por exemplo, pela menor

diversidade de invertebrados terrestres em ambientes periodicamente alagados, em

comparação com ambientes que não estão sujeitos aos pulsos de inundação na Amazônia

Central (Adis & Junk 2002). No entanto, as áreas de baixio apresentam pulsos de inundação

curtos que podem não representar pressão suficiente para que haja convergência morfológica

nesse grupo.

Outros tipos de adaptação a pulsos de inundação são reconhecidas para invertebrados

terrestres, além das morfológicas (Adis & Junk 2002). Características fisiológicas, como por

exemplo, capacidade de permanecer submerso, estão entre as várias possibilidades de

adaptações às regiões alagáveis (Adis & Junk 2002). Também é possível que a sobrevivência

do grupo às inundações seja devido à características comportamentais, como a migração. A

migração vertical de invertebrados terrícolas é menos comum e geralmente ocorre em lugares

com pulsos mais intensos de inundação (Adis & Schubart 1984). A migração horizontal é

mais comum e poderia ocorrer com facilidade no baixio, devido à proximidade das áreas de

vertente. Essas áreas estão quase sempre fora da influência das inundações e poderiam ser um

refúgio durante esses eventos. Assim, o comportamento migratório durante as inundações

Page 205: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

205

pode fazer com que o pulso de inundação não represente um filtro ambiental sobre

características morfológicas das formigas.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer às pessoas que me ajudaram no desenvolvimento de meu trabalho.

Primeiramente a professora Inara, que me ajudou com a ideia, o Paulinho Rainbow Master,

por TUDO e a professora Ana pelas correções e pela paciência. Obrigada Daniel por me

ajudar com as fotos e Mauro por cuidar de mim no campo. Lucas, Inácio, Fer e Talita, valeu

pela ajuda com as formigas!

Gostaria de agradecer a oportunidade do caralho de participar dessa loucura que é o EFA!!!

Agradeço aos coordenadores, Paulinho mau e Paulinho bom e às monitoras Luizão Manô e

pela ajuda. Manôoo adorei te conhecer, você é uma fofa! Obrigada a todos os professores que

compartilharam da nossa loucura e que ao longo do curso nos ensinaram muito!! Obrigada

Seu Jorge por todos os porras de cada dia e a dona Eduarda pela comida deliciosa.

Em especial gostaria de agradecer às pessoas, que a partir de agora, são muito

importantes em minha vida e que me ensinaram muito!!!! Valeu por todos o momentos

inesquecíveis meus amigos da turma EFA 2011!!!!! Meu clã, obrigada pelas “conversas”.

Meus queridos sentirei saudades!!! Miss trago (Camila), você é tuuuudo de bom gata,

divertida e maluca! Adorooo!!! Skol (Carla), você é uma fofa e tem o dom de ser doce! Dani

bananinha (Dani), minha companheirona!!! Te Adoro! Viva os fungos!! (haha) Garota

Fantástica (Inácio), você é uma delícia (haha). Obrigada por cuidar de mim e me fazer rir

muito. Vai la em casa que vai ter bolo!! (Kkkkk). Monange (Gui), não há como explicar o

quanto te adoro! Obrigada por tudo lindão do axé. Jone (João), você é a pessoa mais meiga

que eu conheço, vou sentir sua falta. Aí Danô! Avatar estranho (Maria Laura), a pessoa mais

transcendental do EFA (KKK). Matrix (Mauro), um cara muito sangue bom! Que brisaaa!!!

Page 206: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

206

Dê um beijo na Suelen! Gato Beluga (Rodrigo), obrigada por fazer todos rirem muito!!

Coceirinha (Lucas), sempre disposto a ajudar! Você é 10. Formiga atômica (Talita), você é

muito linda e meiga! Obrigada pelas conversas!! Gata Marilaqui (Fernanda), você é

inexplicavelmente divertida!! Fofuxa pantaneira (Karla), a mais fofa de todas, mas que depois

foi mal influenciada! (KKK) Dregue (Gregório), você é dos meus mano! Ta ligado?

Japoneusa (Ana), a mais linda do EFA 2011!!! Inveja! Mister partoba (Daniel), obrigada pela

ajuda no trabalho, vou te visitar no pantanal! Miojo (Fernando), adorei te conhecer mineiro!!!

Fraga?? Chupa cabra (Thiago), o primeiro candango gente boa que eu conheço!! (haha) e

Ninfo bebê (Raul), companheiro de vários trabalhos, aprendi muito com você!!!

Um imenso obrigada!!!!!!!!!

Ps: Quem quer que seja meu anjo, muito obrigada!!!!

Referências

Adis, J. & H.O.R. Schubart. 1984. Ecological research on arthropods in Central Amazonian

forest ecosystems with recommendations for study procedures, pp. 111–144. In:

Trends in ecological research for the 1980s (J.H. Cooley & F.B. Golley, eds). New

York: Plenum Press.

Adis, J. & W.J. Junk. 2002. Terrestrial invertebrates inhabiting lowland river floodplains of

Central Amazonia and Central Europe: a review. Freshwater Biology, 47:711-731.

Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The ants. Oxford: Haward University Press.

Horn, H.S. 1974.The ecology of secondary succession. Annual Review of Ecology and

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Keddy, P.A. 1992. Assembly and response rules - 2 goals for predictive community ecology.

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Page 207: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

207

Pillar, V.D., L.S. Duarte, E.E. Sosinski & F. Joner. 2009. Discriminating trait-convergence

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Vegetation Science, 20:334-348.

Ribeiro, J.E.L.S., J.G. Hopkins, C.A. Sothers, M.A.S. Costa, J.M. Brito, M.A.D. Sousa,

L.H.P. Martins, L.G. Lohmann, P.A.C.L. Assunção, E.C. Pereira, C.F. Silva, M.R.

Mesquita & L.C. Procópio. 1999. Flora da Reserva Ducke: guia de identificação das

plantas vasculares de uma floresta de terra firme na Amazônia Central. Manaus:

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Schamp, B.S., J. Chau & L.W. Aarssen. 2008. Dispersion of traits related to competitive

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the concept of trait be functional! Oikos, 116:882-892.

Page 208: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

208

A presença de dossel desconectado em uma estrada é limitante para a movimentação de

Glyphorynchus spirurus (Passeriformes, Dendrocolaptidae)?

Gregório dos Reis Menezes

Introdução

A abertura de estradas geram efeitos negativos sobre os organismos em florestas

tropicais (Laurance et al. 2009). Os impactos imediatos dessas vias incluem a perda de habitat

e mortalidade por colisões com os veículos (Forman 2002). Posteriormente, também ocorrem

mudanças associadas à estrutura e ao microclima nas bordas das matas adjacentes às estradas,

causando alterações na distribuição e na movimentação das espécies (Laurance et al. 2009).

As aves insetívoras de subosque estão entre as espécies mais sensíveis aos distúrbios

advindos da abertura de estradas (Stouffer & Bierregaard Jr. 1995, Stouffer et al. 2006).

Dentre essas aves, as guildas das espécies solitárias de subosque, dos seguidores de formigas

e dos formadores de bandos mistos contêm as aves que mais evitam os ambientes de borda e o

cruzamento de estradas (Develey & Stouffer 2001, Laurance et al. 2004, Laurance & Gomez

2005). A abrupta ruptura do habitat pelas estradas, o aumento da luminosidade, a queda de

umidade, a alta concentração de predadores e as mudanças na estrutura da vegetação desses

locais de borda são fatores que inibem a ocorrência dessas espécies (Laurance et al. 2004).

As alterações florestais associadas à criação de estradas são menos intensas em

pequenas estradas vicinais não-pavimentadas e com pouco tráfego de veículos (Laurance et

al. 2009). No geral, essas vias são mais estreitas, podendo haver conexão do dossel entre suas

margens. Esse aumento de conexão pode favorecer a formação de galerias e aumentar a

permeabilidade da estrada para as espécies de aves florestais (Laurance et al. 2004). Desta

forma, espécies associadas aos ambientes florestais, como as aves insetívoras de subosque

podem ser menos prejudicadas, pois ficam sujeitas a uma ruptura mais branda da floresta.

Page 209: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

209

O objetivo do presente estudo foi avaliar como o fechamento do dossel entre margens

de uma estrada pode influenciar na capacidade de uma espécie de ave insetívora de subosque

formadora de bando misto a cruzar essa via. Minha hipótese é que a conexão entre as copas

pode facilitar a movimentação desta ave. Assim espero que em trechos da estrada com dossel

fechado, os espécimes cruzem mais frequentemente a estrada que nos trechos de dossel

aberto.

Métodos

Área de estudo

Esse estudo foi realizado em uma estrada não pavimentada que passa por uma floresta

contínua de terra firme (60°00’O, 2°20’S), localizada a cerca 80 km ao Norte de Manaus,

Brasil. Essa estrada foi aberta na década de setenta para promover acesso a fazendas de gado.

Com a desativação das fazendas, houve o crescimento da vegetação na sua borda. Essa via

possui cerca de 6 m largura, tráfego de veículos reduzido e margens com vegetação em

diferentes estágios de regeneração. Ao longo da estrada é possível encontrar áreas com dois

diferentes níveis de estruturação da vegetação das margens: (1) Dossel fechado - quando as

copas das árvores entre as duas bordas se tocavam e (2) Dossel aberto - quando as copas das

árvores das bordas não se tocavam.

Espécie estudada

A espécie utilizada como modelo de estudo foi o Glyphorynchus spirurus (Dendrocolaptidae).

Esse arapaçu apresenta distribuição geográfica por todo o bioma Amazônico e em uma

pequena faixa de Mata Atlântica na costa leste do estado da Bahia (Ridgely & Tudor 1994). O

Glyphorynchus spirurus habita o interior e bordas de florestas, integra a guilda das aves

Page 210: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

210

insetívoras de subosque formadoras de bando misto, é capaz de cruzar estradas estreitas não-

pavimentadas (Laurance et al. 2004) e responde bem a simulação de invasão territorial com o

uso do playback (G. Ferraz, comunicação pessoal)

Técnica de playback e experimentos conduzidos na estrada

O playback tem sido uma técnica apropriada para testar a incidência de uma espécie de ave

em determinada área (Boscolo et al. 2006), bem como para acessar sua capacidade de

movimentação entre habitats descontínuos (Develey & Stouffer 2001, Awade & Metzger

2008). Esta técnica consiste em emitir a vocalização da espécie, simulando a invasão

territorial por um intruso co-específico e estimulando o indivíduo a responder em defesa de

seu território (Falls 1981).

As gravações utilizadas nas seções de playback eram compostas por três sequências de

1 min de vocalização da espécie alvo em intervalos de 30 s. Inicialmente foi realizado uma

seção de playback na estrada para estimular a aproximação do espécime até a borda da mata.

Quando o indivíduo era detectado visualmente ou auditivamente próximo a borda, uma nova

seção de playback era iniciada na borda oposta, para estimular a ave a cruzar a estrada. Nas

situações em que as aves não atravessaram a estrada, ela foi observada por mais 5 min sem

playback. Para evitar que a reprodução dos cantos fosse conduzida mais de uma vez dentro do

território de um mesmo indivíduo, os pontos amostrais foram espaçados no mínimo 200 m um

do outro. Os experimentos foram conduzidos durante as primeiras horas do dia entre 06:00 h e

10:00 h e no entardecer das 16:00 h às 17:30 h. Nesses horários a temperatura do dia é mais

amena e as aves são mais ativas.

Page 211: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

211

Resultados

Dos 25 pontos amostrais, em 20 deles G. spirurus respondeu a reprodução artificial do seu

canto. Em todos os casos, apenas um indivíduo se aproximou. A resposta de G. spirurus foi

sempre no primeiro minuto de cada seção. Após a reprodução do canto na margem oposta, os

indivíduos cruzavam a estrada logo nos primeiros segundos de simulação. A frequencia de

travessia de indivíduos de G. spirurus não diferiu entre os trechos de estrada com dossel

aberto e fechado (Tabela 1). Apenas 10% dos indivíduos não cruzaram a estrada.

Tabela 1. Número de indivíduos de G. spirurus que cruzaram a estrada com dossel aberto e

fechado, quando estimulados pela técnica de playback.

Movimentação de G. spirurus Tipo de dossel da estrada

Não cruzou Cruzou

Fechado 1 9

Aberto 2 8

Discussão

Como o arapaçu foi capaz de atravessar estradas em quase todas as amostragens, é provável

que pequenas estradas não sejam barreiras para movimentação dessa ave. Isso indica que

indivíduos dessa espécie podem incluir pequenas manchas de floresta descontínuas em seu

território e atravessar essas vias durantes processos dispersivos.

Ao contrário de diversas espécies de aves insetívoras de subosque que são

negativamente afetadas pela fragmentação do habitat, o G. spirurus consegue permanecer em

fragmentos florestais pequenos e isolados (Stouffer & Bierregard Jr. 1995). O

estabelecimento dessa ave nesses fragmentos está relacionado com a habilidade dos

Page 212: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

212

indivíduos de deslocar pela matriz de entorno. O fato dele cruzar a estrada independente da

cobertura do dossel pode explicar porque essa espécie é capaz de manter populações viáveis

em fragmentos florestais. Possivelmente a ausência de um dossel entre os fragmentos não

representa uma barreira dispersiva para indivíduos de G. spirurus.

Os estudos que propuseram avaliar a movimentação das aves em estradas centraram

suas análises em guildas de forrageio (Laurance et al. 2004). Aves de bando misto, no geral,

não se deslocam em áreas de borda de floresta e dificilmente atravessam áreas abertas

(Develey & Stouffer, 2001; Laurance et al. 2004). Por outro lado, G. spirurus apresenta

capacidade de se deslocar por habitat descontínuos, diferente de outras espécies do bando

misto. Assim, estratégias de manejo que visem a conectividade do habitat contemplando

apenas guildas podem ser ineficazes para a preservação das espécies, casos as características

específicas de cada uma sejam mais relevantes para a chance de cruzamento de áreas não

florestas do que as características que determinam a guilda.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer ao Paulo Estefano e ao Paulo Henrique pela oportunidade de participar

do curso e contribuírem de uma forma inestimável para minha formação de cientista. Rafael

Leitão pela revisão do manuscrito. Gonçalo Ferraz, Tatiane e Kahl pelas dicas e discussões

sobre as aves. A todos os colegas da turma do EFA pelas trocas de experiência, momentos

alcoólicos e amizade. Ao Seu Jorge, Dona Eduarda e Seu Cardoso pela amizade e

aprendizado ao longo de todo mês de Floresta Amazônica. Aos professores: Braulio,

Tabarelli, Fabrício, Elder, Cíntia, Lorenzo, Adriano, Inara, Jansen, Ana e Zé Luis. Não

poderia deixar de agradecer aos meus orientadores Alexander Christianini e Érica Hasui por

me incentivarem a participar do curso e pela confiança em toda jornada do mestrado.

Page 213: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

213

Agradeço também ao Programa de Pós Graduação em Diversidade Biológica e Conservação,

Ufscar-Sorocaba, pelo auxílio financeiro durante o curso e a CAPES pela bolsa de mestrado.

Referências

Awade, M. & J.P. Metzger. 2008. Using gap-crossing capacity to evaluate functional

connectivity of two Atlantic rainforest birds and their response to fragmentation.

Austral Ecology, 33: 863-871.

Boscolo, D., J. P. Metzger & J. M. E. Vielliard. 2006. Efficiency of playback for assessing the

occurrence of five bird species in Brazilian Atlantic Forest fragments. Anais Acadêmia

Brasileira de Ciência, 78: 629–644.

Develey, P. F. & P. C. Stouffer. 2001. Effects of roads on movements by understory birds in

mixed-species flocks in central Amazonian Brazil. Conservation Biology, 15: 1416–

1422.

Falls, J. B. 1981. Mapping territories with playback: an accurate census method for songbirds.

Studies in Avian Biology, 6: 86-91.

Forman, R.T.T. 2002. Road Ecology: Science and Solutions, Island Press.

Laurance, S. G. 2004. Responses of understory rain forest birds to road edges in Central

Amazonia. Ecological Applications,14: 1344-1357.

Laurance, S. G. W., P. C. Stouffer & W. F. Laurance. 2004. Effects of road clearings on

movement patterns of understory rainforest birds in Central Amazonia. Conservation

Biology, 18: 1099–1109.

Laurance, S. G. W. & M. S. Gomez. 2005. Clearing width and movements of understory

rainforest birds. Biotropica, 37: 149–152.

Laurance, W. F., M. Goosem, & S.G. W. Laurance. 2009. Impacts of roads and linear

clearings on tropical forests. Trends in Ecology and Evolution, 24: 659–669.

Page 214: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

214

Lima, S. L. & L. M. Dill. 1990. Behavioral decisions made under the risk of predation: a

review and prospectus. Canadian Journal of Zoology, 68: 619-640.

Ridgely, R. S. & G. Tudor. 1994. The birds of South America. Texas: University of Texas

Press.

Stouffer, P. C., & R. O. Bierregaard JR. 1995. Use of Amazonian Forest fragments by

understory insectivorous birds. Ecology, 76: 2429– 2445.

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change and bird abundance in Amazonian rainforest fragments. Conservation Biology,

20: 1212–1223.

Page 215: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

215

Quem tem fome tem pressa? O dano a epífitas em jardins de formigas reduz o tempo de

remoção de herbívoros em potencial

Guilherme Henrique Almeida Pereira

Introdução

Insetos sociais têm maior habilidade competitiva quando comparados a outros insetos

(Grimaldi & Engel 2005). Em geral, organismos sociais dividem tarefas dentro colônia. Os

machos e as rainhas são responsáveis pela reprodução e as outras fêmeas se dividem entre as

atividades de cuidado com a prole, manutenção do ninho, busca por alimento e defesa

(Wilson 1971, Hölldobler & Wilson 1990).

A divisão de tarefas entre os insetos sociais pode se modificar em função da integridade

das colônias. Em colônias de formigas, por exemplo, é possível que as operárias, responsáveis

pelo forrageio, sejam recrutadas para a proteção do ninho quando ele é submetido a danos

(Hölldobler & Wilson 1990). Da mesma forma, indivíduos relacionados à defesa podem sair

da colônia em busca de alimento para suprir suas reservas quando a quantidade de recursos

estocados é pequena (Hölldobler & Wilson 1990). Uma vez que o número de indivíduos em

uma colônia é relativamente constante em curtos intervalos de tempo, é possível que colônias

de formiga submetidas a danos que comprometam a integridade do ninho estejam sujeitas

uma demanda conflitante (Begon 2006). Nesse sentido, o maior investimento em defesa pode

estar relacionado ao decréscimo da atividade de forrageio.

Jardins de formigas são interações desenvolvidas entre duas espécies de formiga e

plantas epífitas, muito comuns em florestas tropicais da América do Sul e Ásia (Hölldobler &

Wilson 1990). Nesse tipo de interação, as formigas são atraídas por compostos nutritivos

presentes na parte externa de sementes de epífitas e após consumi-los incorporam as sementes

às paredes dos ninhos (Hölldobler & Wilson 1990). Ao germinarem, as epífitas conferem

Page 216: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

216

maior estabilidade ao ninho pelo desenvolvimento do sistema radicular e podem prover

recursos alimentares como nectários extra-florais, sementes e frutos ricos em nutrientes para

as formigas (Hölldobler & Wilson 1990, Shultz & McGlynn 2000). Em contrapartida, as

epífitas são favorecidas pela alta concentração de nutrientes nos ninhos e pela defesa das

formigas contra o ataque de herbívoros (Santos 1999). Uma vez que as epífitas de jardins

provêem abrigo e alimento para as formigas, a manutenção da integridade do ninho pode ser

dependente da integridade das epífitas. Nesse sentido, meu objetivo nesse trabalho foi

investigar como formigas de jardim respondem à integridade das epífitas em seus ninhos.

Minha hipótese é que as formigas investem mais na defesa das epífitas que no forrageio no

forófito em jardins cujas epífitas apresentam dano foliar.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Fazenda Esteio que está inserida na Área de Relevante Interesse

Ecológico PDBFF, localizada na Amazônia Central, cerca de 80 km ao norte de Manaus, AM,

Brasil. A vegetação da região é composta por floresta ombrófila densa contínua de terra firme.

O clima é do tipo tropical úmido de acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007)

com temperatura média anual de 26,7 ºC e pluviosidade anual variando entre 1900 e 2500 mm

(Lovejoy & Bierregaard 1990).

Os jardins de formigas da Amazônia Central são formados pela associação

parasimbiótica das espécies de formiga Camponotus femoratus (Formicinae) e Crematogaster

levior (Myrmicinae) (Omena 2009). Formigas C. levior iniciam a construção dos ninhos em

plantas lenhosas ou na base de epífitas (Leal 2010). Após a construção, formigas C. femoratus

colonizam os jardins ocupando câmaras adjacentes aos ninhos das fundadoras (Omena 2009).

Page 217: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

217

Até o momento, 16 espécies de epífitas foram descritas em associação com os ninhos dessas

espécies de formigas, das quais quatro estão sempre presentes nos jardins: Peperomia

macrostachya (Piperaceae), Codonanthes calcarata (Gesneriaceae), Anthurium trinerve e

Philodendron megalophyllum (Araceae) (Jacovack 2006).

Delineamento amostral

Amostrei 20 jardins situados a até 2 m do solo em forófitos (árvores suporte)

localizados ao longo da estrada que dá acesso à ARIE-PDBFF. Medi o maior e o menor

comprimento de cada jardim para estimar a sua área. Calculei a área de cada jardim (AJ)

usando a forma da elipse (AJ=π*comprimento maior*comprimento menor/ 2). Para testar o

efeito da integridade do jardim sobre o comportamento de defesa das formigas, dividi os

jardins em dois grupos: injuriado e íntegro. Como os jardins apresentaram dimensões

variadas, distribuí jardins grandes e pequenos equitativamente entre os grupos. Para o

tratamento injuriado, removi cerca de 10% das folhas das epífitas de 10 jardins. Para o

tratamento íntegro, mantive as epífitas intactas.

Um dia após a injúria, simulei a presença de herbívoro nos jardins dos dois grupos para

avaliar o comportamento de defesa das formigas. Utilizei cupins Nassutitermis sp. como

modelo de herbívoro. Coloquei dois cupins por grupo, um no tronco do forófito e o outro no

ramo das epífitas. Em cada jardim sorteei o local em que depositei primeiro cada cupim. Usei

cola branca para fixar os cupins a 10 cm do jardim nos dois locais (forófito e epífita).

Cronometrei o tempo de remoção do cupim pelas formigas após colocá-los em cada local.

Durante a realização do experimento, evitei tocar no forófito a fim de não provocar uma

reação de alarme nas formigas e influenciar no tempo de remoção dos cupins. Se as formigas

investem mais na defesa do jardim que no forrageio no forófito quando a integridade das

epífitas é ameaçada, espero que (i) nos jardins injuriados, o tempo de remoção do cupim seja

Page 218: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

218

menor na epífita e maior no forófito, (ii) nos jardins íntegros, espero que a localização do

cupim não influencie no tempo de remoção e (iii) entre os jardins, espero que o tempo de

remoção do cupim localizado na epífita seja menor nos jardins injuriados quando comparados

aos íntegros.

Transformei os dados em logaritmo para cumprir os pressupostos de normalidade e

homogeneidade de variâncias. Realizei uma análise de variância com medidas repetidas para

comparar o tempo de remoção entre os tratamentos e os locais de posição dos cupins.

Considerei os tratamentos dos jardins (injuriado e íntegro) como variável explicativa e os

locais de um mesmo jardim (forófito e epífita) como medida repetida.

Resultados

A área dos jardins variou entre 44 e 3141,6 cm2. Em 18 dos 20 jardins, Peperomia

macrostachya (Vahl) A. Dietr. (Piperaceae) foi a única epífita associada aos ninhos. Em

relação às espécies de formiga, observei a ocorrência de C. femoratus e C. levior em 16

jardins. No entanto, somente C. femoratus removeu os cupins. Nos outros quatro jardins (com

os menores tamanhos) apenas C. levior estava presente. Nesses jardins não houve remoção

dos cupins.

O tempo de remoção dos cupins no forófito e na epífita foi semelhante entre os jardins

injuriado e íntegro (FTratamento*Local (1,18)=0,0002; p=0,99, Figura 1). Não houve diferença no

tempo de remoção entre a epífita e o forófito (FLocal (1,18)=3,52; p=0,08), No entanto, nos

jardins injuriados as formigas removeram os cupins quatro vezes mais rápido quando

comparados aos jardins que não receberam injúria (FTratamento (1,18)=4,41; p=0,05).

Page 219: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

219

Figura 1. Tempo de remoção do herbívoro na epífita e no forófito de jardins de formiga,

íntegros e submetidos a injúrias físicas, em floresta ombrófila densa contínua de terra

firme na Amazônia Central, Amazonas, Brasil. Pontos indicam médias e barras verticais

indicam o intervalo de 95% de confiança.

Epífita Forófito

Localização do herbívoro

0

1

2

3

4

5

6

Tem

po d

e re

moç

ão (s)

Jardim injuriado Jardim íntegro

Discussão

O menor tempo de remoção do cupim nos jardins de formiga submetidos à injúria indica que

o dano nas epífitas estimula o recrutamento das formigas, principalmente operárias de C.

femoratus, mesmo 24 h após o dano. Contudo, a semelhança no tempo de remoção do cupim

no forófito e na epífita dos jardins injuriados indica que não há um maior investimento da

colônia na defesa em jardins submetidos à herbivoria.

Estudos relatam que a herbivoria estimula o recrutamento de formigas e reduz o tempo

de resposta à presença de herbívoros em plantas mimercófitas imediatamente após o dano nas

folhas (Emílio et al. 2005, Trevelin 2007, Gonçalves-Souza 2007, Capurucho 2010). Este

comportamento é observado também nos jardins de formiga, onde há recrutamento expressivo

Page 220: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

220

de indivíduos de C. femoratus (Vieira-Neto et al. 2006, Mundim et al. 2007, Leal 2010) uma

espécie eficiente na defesa do ninho e das epífitas do jardim (Leal 2010). No entanto, uma vez

que não foi observada diferença no tempo de remoção dos cupins entre a epífita e o forófito, o

maior recrutamento nos jardins injuriados deve estar associado a alguma atividade diferente

da defesa. A epífita mais freqüente nos jardins (P. macrostachya), além de proporcionar

sustentação aos ninhos, têm nectários extra-florais e é fonte de alimento para as formigas

(Jacovak 2006). Talvez o dano a que elas foram submetidas tenha alertado as formigas de que

houve uma redução no suprimento alimentar das colônias. Como consequência, o número de

formigas pode ter aumentado em toda a região próxima ao jardim. A maior atividade de

forrageio reduziria o tempo de encontro dos cupins tanto nas epífitas quanto no forófito.

Apesar de aparentemente haver maior recrutamento de indivíduos para busca de

alimento, a semelhança no tempo de remoção dos cupins na epífita e no forófito indica que o

aumento do investimento em forrageio não compromete a defesa proporcionada às epífitas

pelas formigas. Porém, se há um aumento no forrageio, isso pode indicar que o fornecimento

de alimento das epífitas é mais importante que a estabilidade que suas raízes proporcionam

aos ninhos. Caso contrário, a atividade de defesa deveria ter sido maior.

Agradecimentos

Lembrar de todas as coisas que aconteceram nestes dias é um momento muito especial e que,

apesar da nostalgia de tamanha felicidade, dá um apeeeerto no peito. Nóoo! Já é a saudade

batendo à porta...gritando, loucamente atrás de mim..rs. Mas vamos lá... Obrigado Zé Luis,

Paulinho Enrique (Rainbow Master) e Paulinho Estéfano (New Marilaqui) por me permitirem

voltar à Mazônhia e poder vivenciar estes 30 dias (in)teeeensos de EFA. E às monitoras

preferidas, Manô (Coração gelado) minha super bonitora (FRAG e EFA 2011) e Laura

(Pezão), por me deixar ir para o Céu nos 45’ do segundo tempo, adoooro! Vcs são demaaais!

Page 221: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

221

A todos vocês, obrigado pelos dias muito bons de puxões de orelha e aprendizado e outros

dias melhores ainda de amizade, conversas sobre vida, trabalho, e farra é claro,

gonorâaante..rs. Aos meus mais novos suuuperamigos, com os quais vivi quase 10 anos em 30

dias, muito obrigado pelos momentos de companheirismo, coleguismo, amizade, palhaçada e

putaria que passamos juntos em meio a prazos e noites sem dormir à entrega de relatórios

intermináveis, não eh mesmo Pezão? rs. Ao João Jony Walker por sua história inusitada de

vida, que me ensinou muita coisa. À Fernandinha Marilaqui pelos momentos que passamos

lindamente juntos e que ainda passaremos em Recife, no Rio e no mundo afora, vamos arrasar

gata! À Fran, pelo carinho sem fim e pelas massagens que me salvaram, delícia! Juro que

casaria contigo...rs, ano que vem vou p’ra Goiás . À Ca(mila), amor, pelo carinho infinito com

que me acolheu já na primeira semana...vamos nos ver em Sampa! Ao Rodrigo Tio Sukita

(bunitah!) que conheci no EFA..rs, pelas injeções de ânimo que nos deu, junto com Marilaqui

Roxeli, ao longo desses 30 dias. À Dani Bananinha, Karlinha Fofuxa Pantaneira e Ana

Japoneusa, que fofas meu Deusu..obrigado pelo carinho. Ao Maurão Matrix e à Lauracea

Avatar Estranha, cujos mundos foram uma ótima fulga nos momentos de tensão. Ào Inácio

Garota Fantástico, pelo intelecto e conversas jogadas fora. À Talitinha Formiga Atômica, pelo

exemplo de trabalho, linda! Ao Ninfobebê Raul pela inteligência precoce que muito me

ensinou. Ao Dreg Gregório, Lucas Coceirinha, ao Fernando Miojo, ao Thiago Lobisomem, à

Carla Skol e ao Daniel Mr. Partoba, obrigado pelas risadas e aprendizado. É isso galera!

Obrigado a todos por tuuudo! Além de São Paulo, Pernambuco e Goiás, aguardo convites

para encontrá-los nesse Brasilsão afora e espero todos no Rio...Ou onde eu estiver, nessa

louca vida acadêmico-científica! Tenho um carinho especial por cada um. Obrigaduuuuú!

Não poderia esquecer de agradecer à Adriane pelo carinho e atenção, ao seu Jorge (porra!) e

Dona Eduarda pelo frango nosso de cada dia, ao Seu Cardoso e a todos que não conheci mas

foram fundamentais para realização desta 20ª edição do EFA. Ah! Não poderia deixar de

Page 222: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

222

agradecer ao meu brother Tiago Amorim (Preto - EFA 2010), pessoa incrível que foi decisivo

para que eu participasse desse curso, obrigado camarada! Obrigado ao curso de Pós-

Graduação em Ciências Ambientais e Florestais da UFRRJ e à minha mãe..rs, pelo apoio. Te

amo, mãe! Vc tbm pai! E a todos aqueles que, pela emoção e nervosismo do momento, fui

impedido de lembrar, muito obrigado!

Referências

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measuring and monitoring biodiversity. Princeton: Smithsonian Institution.

Begon, M., C.R. Townsend & J.L. Harper. 2006. Ecology: from individuals to ecosystems.

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Capurucho, J.M.G. 2010. Pheidole minutula (Hymenoptera: Formicinae) captura presas

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uma planta mirmecófita. In: Ecologia da Floresta Amazônica (Machado, G. & H.

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Gonçalves-Souza, T. 2007. Resposta biótica induzida em três espécies mirmecófitas: formigas

respondem a pistas de herbivoria de acordo com a recompensa alimentar produzida

Page 223: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Leal L. 2010. Camponotus femuratus (Formicidae: Myrmicinae) recruta operárias em resposta

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Mundim F., G. Requena, L. Trevelin, M. Borges & W. Almeida. 2007. Resposta

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Page 225: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

225

Quanto mais, melhor: aranhas ajudam a reduzir a herbivoria em Tococa bullifera

(Melastomataceae)

Inácio José de Melo Teles e Gomes

Introdução

Em florestas tropicais, a herbivoria pode afetar importantes aspectos estruturais e funcionais

de comunidades vegetais, já que cerca de 50% das espécies de insetos dessas florestas são

herbívoros (Almeida-Cortez et al. 2004). Para diminuir as pressões exercidas por esses

herbívoros, as plantas apresentam estratégias de defesa variadas (Coley & Barone 1996).

Essas estratégias de defesa podem ser diretas ou indiretas. Na defesa direta, as plantas podem

produzir estruturas, como tricomas e espinhos e/ou investir em produção de compostos

químicos de defesa, como alcalóides e terpenóides (Schaller 2008). Por outro lado, a defesa

indireta ocorre quando plantas apresentam associações com predadores ou parasitóides de

herbívoros. Esses predadores e parasitóides são atraídos por recursos disponibilizados pelas

plantas e consomem os herbívoros, evitando que estes predem a planta (Bruinsma & Dicke

2008).

A estratégia de defesa indireta pode ser facultativa, quando os organismos envolvidos

podem persistir no ambiente na ausência dos seus parceiros (Boucher et al. 1982). Contudo, a

relação entre os organismos também pode ser obrigatória, quando nenhuma das partes

consegue persistir na ausência da outra (Moraes & Vasconcelos 2009). Exemplos clássicos de

defesas indiretas obrigatórias ocorrem entre formigas e plantas, chamadas mirmecófitas

(Beattie 1985, Benson 1985, Davidson & McKey 1993). Essas relações são espécie-

específicas e os parceiros dependem um do outro para sua sobrevivência (Beattie 1985).

Nesses sistemas, as colônias de formigas recebem abrigo e/ou alimento da mirmecófita e a

Page 226: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

226

protegem contra os herbívoros ao se alimentarem dos insetos que visitam a planta (Schaller

2008).

Além das formigas, outros artrópodes podem se associar de maneira específica com

plantas mirmecófitas (Venticinque & Fowler 1996). Dentre esses artrópodes, as aranhas são

os mais frequentemente encontrados (Letourneau & Dyer 1998, Rosado et al. 2004, Kasper

2006). Em algumas mirmecófitas, ocorrem algumas aranhas que se alimentam exclusivamente

das formigas que habitam a planta (e.g. Price et al. 1986, Letourneau & Dyer 1998). Por

exemplo, aranhas das espécies Dipoena banksii e D. bryantae são predadoras especialistas de

formigas associadas às plantas Piper obliquum e Hirtella myrmecophila, respectivamente

(Gastreich 1999, Rosa 2008). Como consequência, a presença dessas aranha diminui o

patrulhamento das formigas sobre as folhas em que elas estão presentes, aumentando a

herbivoria nessas partes da planta (Gastreich 1999, Rosa 2008). Faiditus subflavus é um outro

exemplo de aranha que ocorre em plantas mirmecófitas (Santos 2007). Essas aranhas são

associadas à mirmecófita Maieta guianensis, que é ocupada pela espécie de formiga Pheidole

minutula. Nesse sistema, as aranhas dependem da formiga que, ao protegerem sua colônia,

protegem a ooteca de F. subflavus, maximizando o sucesso reprodutivo da aranha (Santos

2007).

Em outra mirmecófita amazônica, Tococa bullifera (Melastomataceae), há a presença de

uma aranha (aqui chamada aranha amarela) associada ao sistema formado por essa planta e a

formiga Azteca spp. (Vasconcelos & Davidson 2000). Sabe-se que não há interações

agonísticas entre a aranha amarela e as formigas associadas a T. bullifera (Menezes 2011).

Essa espécie de aranha constrói teias orbiculares que são voltadas para fora do eixo central do

ramo da planta e seus pontos de inserção estão em duas ou três folhas (obs. pess.). Esse

formato de teia sugere que a aranha se alimenta dos insetos que vêm visitar a planta. Dessa

Page 227: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

227

forma, a aranha amarela estaria consumindo possíveis herbívoros de T. bullifera, reduzindo a

sua pressão de herbivoria.

O objetivo deste trabalho é analisar se há efeito da aranha amarela sobre T. bullifera.

Minha hipótese é que as aranhas amarelas protegem T. bullifera contra herbivoria. Minhas

previsões são (1) o índice de herbivoria foliar será menor em ramos de T. bullifera que

possuírem maior número de aranhas amarelas e (2) o índice de herbivoria foliar de T. bullifera

aumentará após a remoção das aranhas amarelas dos ramos.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Reserva do Km 41 (2° 24’ S; 59° 44’ O), a cerca de 80 km ao norte de

Manaus. A reserva é considerada uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) e é

gerida pelo ICMbio e pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).

Modelos de estudo

A planta Tococa bullifera é um arbusto de sub-bosque que atinge no máximo 3 m de

altura. Ela possui estruturas ocas nas bases de suas folhas, que são conhecidas como

domáceas. Essas estruturas são ocupadas principalmente pelas colônias de formigas do gênero

Azteca e eventualmente outras espécies de formigas, como Crematogaster laevis

(Vasconcelos & Davidson 2000). Essas espécies de formigas vivem nessas plantas e reduzem

a herbivoria de T. bullifera ao se alimentarem dos seus herbívoros. A aranha amarela, cuja

espécie ainda não foi possível identificar, se encontra associada a esse sistema. Não há

registros da ocorrência dessa espécie em T. bullifera. Entretanto, ela foi encontrada

Page 228: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

228

abundantemente em toda a área de estudo, sempre associada a essa planta (ver outros

trabalhos neste volume, em Menezes J.P.C e Ternes M.L.F).

Delineamento

Selecionei 25 indivíduos de T. bullifera ao longo das trilhas da área estudada. Em cada planta,

escolhi um ramo ao acaso e estimei a herbivoria média utilizando o índice proposto por Dirzo

& Domingues (1995). Esse índice atribui uma categoria de herbivoria para cada uma das

folhas de acordo com a porcentagem de área foliar consumida: 0% (categoria 0); 1-5%

(categoria 1); 6-12% (categoria 2); 13- 24% (categoria 3); 25-50% (categoria 4) e 51-99%

(categoria 5). Em seguida, contei o número total de indivíduos de aranhas amarelas presentes

em cada ramo.

Para testar a previsão 2, selecionei 19 dos 25 indivíduos de T. bullifera amostrados.

Após estimar a herbivoria de cada ramo, removi todas as aranhas amarelas do ramo focal e

ramos adjacentes, que poderiam funcionar como fonte para recolonização do ramo focal pela

aranha amarela. Voltei a estimar a média do índice de herbivoria de cada ramo depois de 48 h.

Análises estatísticas

Para a análise da relação entre o número de aranhas e a média do índice de herbivoria, utilizei

uma regressão linear simples. Transformei os dados usando log10, uma vez que a distribuição

dos dados não era normal. Para verificar se houve efeito da remoção das aranhas na herbivoria

foliar, comparei as médias dos índices de herbivoria antes e depois da remoção usando um

teste t-pareado.

Page 229: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

229

Resultados

O número médio (± desvio padrão) de aranhas encontradas por ramo foi de 4,48 (± 4,1). O

índice de herbivoria média encontrada foi de 1,96 (± 0,82). A herbivoria foi maior nos ramos

com menos aranhas amarelas quando comparada aos ramos com maior quantidade de aranhas

(F(23,2)=9,87; r2=0,30; p=0,005; Figura 1). Após 48 h da remoção das aranhas amarelas, o

índice de herbivoria aumentou em 0,19 (t=-2,19; gl=18; p=0,042; figura 2).

Figura 1. Relação do índice de herbivoria e do número de aranhas amarelas por ramo de

Tococa bullifera.

-0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4

Número de aranhas

-0,1

0,0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

Índ

ice

de

her

biv

ori

a

Número de aranhas (log10)

Índi

ce d

e he

rbiv

oria

(lo

g 10)

y= -0,3165x + 0,4615

Page 230: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

230

Discussão

A aranha amarela contribui para que T. bullifera seja menos consumida por

herbívoros. Ramos com maior número de aranhas apresentam menor consumo foliar por

herbívoros. O aumento da herbivoria das folhas de T. bullifera após a remoção das aranhas

amarelas reforça a importância da presença delas para a proteção da planta. Esse aumento da

herbivoria após a remoção das aranhas poderia ser o efeito do tempo. Entretanto, o fato de a

maior quantidade de aranhas nos ramos estar relacionada às baixas taxas de herbivoria reforça

que essa diferença não é meramente efeito do tempo. Em apenas 48 h, as taxas de herbivoria

não deveriam aumentar significativamente sem um processo biológico atuando sobre esse

sistema.

A grande concentração de aranhas amarelas em um mesmo ramo gera uma grande

quantidade de teias cobrindo parte da superfície aérea, impedindo ou inibindo que insetos

herbívoros se aproximem da planta. Uma vez que o herbívoro consiga alcançar a planta, T.

bullifera ainda conta com a defesa das formigas que vivem associadas às suas domáceas

(Vasconcelos & Davidson 2000). Dessa forma, existe um efeito sinérgico da aranha e da

Figura 2. Valores médios dos índices de herbivoria em cada um dos ramos de Tococa

bullifera antes e 48 h depois da remoção das aranhas amarelas.

Antes da remoção Após a remoção

Índi

ce d

e he

rbiv

oria

Page 231: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

231

formiga sobre a predação de herbívoros em T. bullifera. Caso haja algum efeito negativo da

aranha sobre a planta, ele seria associado ao consumo dos seus visitantes florais.

O fato de a aranha amarela estar associada ao sistema da mirmecófita T. bullifera e da

formiga Azteca e ajudar na defesa da planta sugere que se trata de uma terceira espécie

envolvida nesse mutualismo. A presença da aranha amarela nesse sistema é particularmente

curiosa, pois em outras mirmecófitas da família Melastomataceae, as aranhas associadas têm

papéis diferentes, como predação ou parasitismo das formigas. Uma vez que as diferentes

espécies de aranhas têm papéis diferentes em cada planta, os processos evolutivos que

levaram a esse mutualismo são distintos. A melhor compreensão da via evolutiva desses

sistemas pode ajudar a entender alguns processos que estruturam comunidades e os fatores

que agem sobre a manutenção das espécies nos ambientes naturais.

Agradecimentos

Concluir o EFA me remete à sensação do dever cumprido. Essa sensação é uma mistura de

êxtase e melancolia. Êxtase pela felicidade em fazer algo que já era um sonho antigo e

melancolia porque tudo o que é bom acaba em melancolia quando acaba. Tenho de agradecer

pelas ajudas oferecidas pelos meus orientadores, Dr. José Henrique Schoereder e Dr. Ricardo

Ildefonso de Campos. Devo profundos agradecimentos aos coordenadores do 20º EFA pela

oportunidade. Ao Dr. José Luis Camargo pela chance e por confiar em mim. Ao Paulinho do

mau (The new Marilaqui), pelas ótimas conversas profissionais e sobre a vida. Ao meu

querido Paulinho do bem (Master ultra mega aloka rainbow), que me ouviu, me orientou me

fez crescer muito e, com toda sua purpurina, tornou os dias negros do EFA em arco-íris. Meus

sinceros agradecimentos à monitora Laureth pezão pelas palavras, pelos conselhos e por me

chamar de gato nas festinhas. À monitora mais mãezona que já conheci, Manô do clã do meu

coração: obrigado pelas conversas e por ser uma grande amiga. Ao seu Jorge, dona Eduarda e

Page 232: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

232

seu Cardoso por trabalharem duro e fazer tudo acontecer. Como deveria agradecer à turma

que deixou de ser a turma de um curso de férias para ser a galera do mês mais intenso da

minha vida? Tenho de agradecer com todo meu coração aos 19 navegantes dessa aventura

selvagem. Devo agradecer ao Lucas coceirinha, meu companheiro laborecóide, que foi

sempre um forte seguro nesse mês. À Camila Cãmis, minha mais nova amiga de infância, que

me ouviu, me zelou, me aconselhou, me acrescentou e se tornou uma pessoa tão expressiva na

minha vida. À Carlinha Skol, por ser minha grande amiga de falar besteiras e planejar zoeiras

que alegraram nossos dias. Ao Daniel, por me ensinar muito no dia-a-dia com seu jeitão nerd.

À Dani Banininha, por dividir comigo todo o deslumbramento que este lugar causa na alma

de um biólogo. Ao Maurão, por ser tão diferente do convencional e por me mostrar os

caminhos alternativos das sensações e do pensamento. Ao Thiagão Lambisomem, por ser o

líder da matilha que varava as madrugadas. À Fran Missfrega, pelos carinhos, massagens e

meiguice irrepreensíveis de uma goiana nata. Ao Fernando, pela amizade que vou levar pras

minas gerais. Ao João Jhonny, por ser de um dos três “b”de Minas Gerais e relembrar comigo

da minha segunda terra natal. À Karlinha Fofuxa Pantaneira, pela calma e harmonia que

irradiava da sua presença. Ao Raul, pela alegria e sinceridade de cada papo. Ao Guilherme

Monange, por me fazer amadurecer em cada conversa e discussões de trabalho que tivemos.

À Ana Japoneuza, que se soltou e se tornou a linda Ana que me cativou. À Laurinha, por

aguentar minhas bizarrices rindo comigo e me fazer sorrir em cada abraço. Ao Greg Drag,

pela grande disposição e preocupação em ser um bom amigo. À Talita, por me surpreender

com a pessoa linda que ri, argumenta, compartilha e ensina. Não poderia deixar de agradecer

junta e lindamente ao casal mais espetacular deste curso: Marilac e seu apêndice, Sukita. Sua

relação alegrou meus dias, meus ralatórios, minhas noites, minhas festas e meu mês; parabéns

pela linda amizade que construíram. Meus caros, valeu pelas zueiras, ralações, ralatórios,

Page 233: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

233

festas, bebedeiras, viagens, papos, amizades, cumplicidades, aventuras, histórias e estórias.

Muito obrigado!

Referências

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Page 236: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

236

A aranha associada à Tococa bulifera é protegida pelas formigas?

João Paulo Cunha de Menezes

Introdução

A seleção de habitat pode ser definida como a escolha que os indivíduos fazem por locais

favoráveis à sua sobrevivência (Orians 1991). Em geral, os locais selecionados possuem

maior disponibilidade de recursos, maior facilidade para a captura de presas ou oferecem

abrigo contra predadores (Allan 1995).

A presença de predadores pode induzir mudanças na escolha do habitat em algumas

espécies (Lima 1998). Frequentemente, as presas selecionam novos habitats quando o

predador se aproxima dos habitats originalmente ocupados por elas (Welborn et al. 2006). Por

isso, é provável que as presas sejam capazes de detectar a presença de predadores e mudar de

lugar em resposta (Wooster & Sih 1995).

Em alguns casos, a associação entre espécies reduz a chance de predação (Wooster &

Sih 1995). Por exemplo, lagartas de algumas espécies de borboleta, da família Lycaenidae, se

beneficiam da proteção conferida por formigas. Nesta relação ambos são beneficiados: as

formigas recebem alimento (exudato) e, por sua vez, protegem as lagartas conta inimigos,

como parasitas, competidores e ou predadores (Pierce et al, 2002). Em aracnídeos, a seleção

por habitats associados à presença de outros organismos (Tallamy 1999) pode ocorrer como

uma forma de defesa contra parasitóides, que em geral, possuem habito de forrageamento

diurno.

Na Amazônia Central, associações entre plantas, formigas e aranhas são comuns. Por

exemplo, a aranha Faiditus subflavus, associa-se exclusivamente a plantas mirmecófitas das

espécies Maieta guianensis e Maieta poepigii (Fáveri 1998, Kasper 2006, Requena 2007).

Nessas plantas a aranha supostamente se apoveita das formigas para conseguir proteção

Page 237: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

237

adicional da ooteca contraoredacao (Requena 2007). Outra planta mirmecófita que possui

associação com uma espécie de aranha é Tococa bulifera, (Melastomataceae). Além da

presença da aranha, T. bulifera apresenta associação mutualística com formigas

Crematogaster laevis (Mayr) (Myrmicinae) ou Azteca sp. (Dolichoderinae) que colonizam

estruturas constituídas por um par de câmaras ocas localizadas na base das folhas, conhecidas

como domáceas (Vasconcelos & Davidson 2000). A aranha associada a T. bulifera possui teia

orbicular que fica tencionada em forma de funil. Durante o dia a aranha visivelmente

permanece muito próxima da domácea, mas se afasta sempre da domáceas quando é tocada

por alguma formiga. Apesar da ocorrência mais frequente da aranha na base das folhas

próximas às domáceas de T. bulifera (observação pessoal), não se sabe por que essa aranha

ocorre exclusivamente nessa planta. Predadores e parasitóides de aranhas de modo geral são

diurnos, podendo alterar o comportamento de forrageio das aranhas em relação ao período do

dia. Neste contexto, meu objetivo foi avaliar se as aranhas encontradas em T. bulifera se

estabelecem próximas às domáceas para utilizar as formigas como proteção contra predadores

ou parasitóides. Se isso ocorrer, espero que i) as aranhas fiquem mais próximas às domáceas

no período diurno, ii) que o tempo de captura de presa pela aranha seja maior durante o dia

que durante a noite e iii) que as aranhas se estabeleçam próximas as domáceas que possuem

maior número de formigas.

Métodos

Área de estudo

Realizei este estudo na Fazenda Esteio (Km 41), localizada cerca de 80 km ao norte de

Manaus, AM, Amazônia Central. A reserva esta inserida na Área de Relevante Interesse

Ecológico PDBFF. A vegetação é formada por floresta ombrófila densa contínua de terra

Page 238: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

238

firme (Ribeiro et al. 1999). O clima é do tipo tropical úmido de acordo com a classificação de

Köppen (Peel et al. 2007) com temperatura média anual de 26,7 ˚C e pluviosidade anual

variando entre 1900 e 2500 mm (Lovejoy & Bierregaard 1990).

Coleta e análise dos dados

Selecionei 19 indivíduos de T. bullifera localizados por busca ativa no interior da mata. Em

cada planta, avaliei o comportamento de apenas uma aranha associada a uma das domáceas.

Para evitar um eventual viés na resposta das aranhas causado por diferentes espécies de

formigas que ocorrem em T. bullifera, amostrei apenas plantas com colônias de

Crematogaster laevis. Evitei tocar nas plantas durante a amostragem para não estimular

reação de alarme nas formigas, que pudesse gerar alterações comportamentais nas aranhas.

Para testar se existe diferença entre a distância da aranha até a domácea por período do

dia, medi a distância da aranha em relação à domácea mais próxima, em cada período do dia

(dia e noite). Como medi as distâncias nos mesmos indivíduos nos dois períodos, realizei um

teste t pareado.

Com o objetivo de testar se o tempo de captura de uma presa pela aranha é maior

durante o dia em relação à noite, ofertei uma formiga para as aranhas (Pheidole minutula) em

cada período do dia. Escolhi a P. minutula, por ser menor que a aranha e por isso, dificilmente

representaria uma ameaça de predação a aranha e à integridade da teia. Em seguida,

cronometrei o tempo que a aranha levou para se aproximar da presa. Realizei um teste t para

comparar o tempo de reação das aranhas em resposta a deposição de P. minutula entre o dia e

a noite.

Para avaliar se as aranhas se estabelecem próximas às domáceas que possuem maior

número de formigas, coletei a domácea utilizada pela aranha como ponto de apoio para o

estabelecimento da teia e também a domácea mais próxima sem a presença da aranha no

Page 239: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

239

mesmo ramo. Para cada domácea quantifiquei o número total de formigas presentes. Para não

perder o pareamento dos dados das aranhas e formigas do mesmo ramo, transformei os dados

de abundancia de formigas em um valor binário (0, 1). Para isso, dividi os pares representados

pela domácea com aranha e pela domácea sem aranha de uma mesma planta em dois grupos

(selecionados ao acaso). Associei o valor 1 a cada par de um grupo e o valor 0 a cada par do

outro grupo. Para o valor 1 considerei a domácea próxima a aranha como sendo focal e para o

valor 0 considerei a domácea sem a aranha próxima como sendo a focal. Após separar os

grupos, subtraí o número de formigas das domáceas focais do das não focais para cada par.

Com os valores obtidos realizei uma regressão logística. Sendo assim, se as aranhas escolhem

domáceas com maior número de formigas, espero que pares com denominação 1 apresentem

valores positivos da diferença entre o número de formigas entre as domáceas focal e não

focal. Para o valor 0 espero valores negativos para a diferença entre o número de formigas

entre as domáceas focal e não focal.

Resultados

A distância entre a aranha e a domácea durante o dia (0,26±0,31 cm) foi 11 vezes menor do

que durante a noite (3,05±2,19 cm) (t=5,42, gl=18, p<0,001; Figura 1). O número de formigas

nas domáceas não determinou a ocorrência da aranha associada a T. bulifera (χ²=0,61, gl=1,

p=0,22). O tempo de reação da aranha na presença de uma presa não diferiu entre os períodos

do dia (t=0,38, gl=36, p=0,35, Figura 2). Embora tenha ocorrido aproximação da aranha nas

presas, as aranhas retiraram todas as formigas da teia sem as predar. Durante as observações,

o único evento de predação foi de um díptero.

Page 240: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

240

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

Dia Noite

Dis

tânc

ia (c

m)

Período do dia

Figura 3. Distâncias dos indivíduos de uma espécie de aranhas da domácea mais próxima em

Tococa bullifera durante o dia e noite, em uma área de floresta contínua de terra firme na

Amazônia Central.

Dia Noite

Período do dia

0

50

100

150

200

250

300

350

Tem

po (

s) d

e re

spos

ta d

a ar

anha

fren

te a

pre

sa

Figura 4. Tempo de resposta dos indivíduos de uma espécie de aranha frente à presença de

uma presa (Pheidole minutula), no período diurno e noturno em uma floresta contínua de terra

firme na Amazônia Central.

Page 241: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

241

Discussão

A proximidade da aranha às domáceas durante o dia pode indicar que as formigas fornecem

algum tido de proteção. Uma vez que as formigas protegem a planta contra ataques de

herbívoros e parasitas, as aranhas podem ser beneficiadas. Porém, essa proteção não está

associada com o número de formigas nas domáceas. Em relação ao tempo de resposta frente a

uma presa, não é possível avaliar se as aranhas mudam seu tempo de reação por período do

dia uma vez que elas não predaram as formigas.

A presença da aranha próxima à domácea no período da manhã possivelmente está

relacionada ao horário de forrageamento dos parasitóides. Se eles são mais ativos durante o

dia, as aranhas podem ganhar mais proteção ao se aproximarem das formigas nas domáceas.

Crematogaster laevis, apresenta uma defesa química, liberando acido fórmico pelo abdômen.

Desta forma, o potencial de defesa proporcionada por cada formiga pode ser mais importante

que o número de indivíduos presentes na domácea, uma vez que poucas formigas são

suficientes para oferecer proteção indireta às aranhas.

O fato das aranhas não escolherem domáceas com maior número de formigas, pode

estar relacionado ao comportamento desses himenópteros. As formigas ficam constantemente

forrageando ao longo da planta. Portanto, é possível que a aranhas estejam sempre próximas

de uma formiga caso o predador se aproxime. Assim o tempo de resposta de defesa da aranha

pela formiga pode ser independente da proximidade da aranha até a domácea.

As aranhas não predaram as formigas P. minutula ofertadas. Uma vez que a C. leavis é

maior e possui defesa química, possivelmente as aranhas também não predam as formigas

presentes em T. bulifera. Por outro lado, o fato da aranha ter predado uma mosca durante as

observações pode indicar que eventualmente as aranhas são especializadas em predar dípteros

parasitóides das formigas.

Page 242: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

242

Agradecimentos

Agradeço imensamente aos organizadores do EFA 2011 (20º edição, uhuuuu), pela

oportunidade de participar de um curso que foi enriquecedor sob todos os aspectos. Ganhei

experiência e inspiração para me tornar uma pessoa e um profissional bem melhor. Agradeço

ao Thiago Kloss (Fanfarrão) pelo apoio moral e pelo trabalho corrigido, valeu mesmo

brother. Agradeço a todos os professores e corretores que tivemos, em especial a Ursinho

coração gelado (Manú) e Luizão (Laura), nossas adoradas monitoras. Agradeço também a

toda equipe “técnica”, e a todo pessoal que soube mostrar que somos um grupo e não uma

cambada. Agradeço a companhia e o bom humor de todos os companheiros de curso:

Ninfobaby (Raulzito), Matrix (Mauro), Bom dia (Thiago), Garoto Fantástico (Inácio),

Marilaqui (Fernandinha), Skol (Carla), Formiga Atômica (Talitinha), Miss Frega (Fran), Miss

Trago (Camilinha), Japoneusa (Ana), Dani Bananinha (Daniela), Coceirinha (Lucas), Drag

(Gregório), Fofuxa Pantaneira (Karlinha), Mister Partoba (Daniel) e Miojo (Fernado) e

agradeço em especial meus vizinhos de rede, Avatar Estranho (Maria Laura), Tio Sukita

(Rodrigo) e Mr. Baudinho (Guilherme). Por fim agradeço de forma especial o Rainbown

master (popularmente conhecido como Paulo Enrique), por ter sido muito mais que um

coordenador. Bons conselhos, puxões de orelha e reflexões da vida (conversa de bêbado

mesmo) e New Marilaqui (Paulo Estevano) por todos os conselhos e dicas de estatistica...

Tenho certeza que sentirei saudades de todos.....

Referências

Allan, J.D. 1995. Stream ecology. Structure and function of running waters. London

:Chapman & Hall.

Page 243: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Page 245: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

245

Heróis, figurantes e vilões: como o recrutamento das formigas e a presença de

homópteros afetam a defesa contra herbívoros?

Karla M. Campião

Introdução

Mutualismo pode ser definido com uma interação inter-específica, em que os membros de

ambas as espécies envolvidas tem maior valor adaptativo quando ocorrem juntas do que

quando ocorrem separadamente. Esse tipo de interação é bem documentada para várias

espécies, principalmente em ambientes tropicais, onde muitas plantas oferecem algum tipo de

benefício, como abrigo ou néctar, aos animais que “prestam serviços” de polinização,

dispersão de sementes e proteção contra herbívoros (Bronstein 1998, Bronstein et al. 2006).

Muitas espécies de plantas tropicais produzem nectários extra-florais que atraem

alguns grupos de insetos, principalmente formigas (Cogni et al. 2003). Ao consumirem o

néctar, as formigas protegem a planta em que estão forrageando, patrulhando as folhas e

removendo outros insetos, geralmente herbívoros. Dessa forma, as formigas diminuem as

taxas de herbivoria e favorecem o crescimento e o sucesso reprodutivo da planta (Almeida &

Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). Esse tipo de interação é considerada um mutualismo

facultativo, porque várias espécies de formigas podem visitar os nectários extra-florais de

uma mesma planta e essas visitas podem ser eventuais ou recorrentes (Bronstein 1998,

Almeida & Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). O uso dos nectários extra-florais pelas

formigas também varia de acordo com o recrutamento. Algumas formigas forrageiam

solitárias e outras recrutam membros da colônia e forrageiam agrupadas (Hölldobler &

Wilson 1990, Bruna et al. 2004). Nesses casos, o nível de proteção pode variar de acordo com

a espécie e/ou abundância de formigas que visitam a planta (Bronstein 1998, Bruna et al.

2004, Bronstein et al. 2006).

Page 246: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

246

Outro fator que pode afetar as interações formiga-planta e formiga-herbívoro é a

presença de outras fontes de açúcar na planta, como pulgões (Homoptera) (Bronstein 1998).

Enquanto se alimentam da seiva da planta, os homópteros excretam um exudato açucarado de

qualidade nutricional superior ao dos nectários extra-florais, e assim também atraem

formigas. Uma vez que esse exudato é consumido pelas formigas, os homópteros se tornam

uma importante fonte de recurso para elas, que passam então a protegê-los de predadores e

parasitóides (Del-Claro & Oliveira 1993). O efeito da presença de homópteros sobre as

plantas hospedeiras ainda é controverso. Embora a infestação por homópteros seja,

geralmente, muito prejudicial à planta, o exudato liberado por esses insetos atraem formigas

que podem conferir proteção indireta a planta hospedeira. Dessa forma, o benefício da

proteção contra herbívoros seria maior que os custos da infestação (Del-Claro & Oliveira

1993). Por outro lado, a escolha preferencial das formigas pelo exudato do homóptero poderia

minimizar a proteção da planta contra herbivoria, já que este se tornou a principal fonte de

recurso.

Nesse estudo, eu avaliei como a resposta à herbivoria difere de acordo com o

recrutamento das formigas e quanto à presença de homópteros. Minha primeira previsão é que

formigas que recrutam e forrageiam em grupo vão responder mais rapidamente ao ataque de

herbívoros, já que estão em maior número do que formigas que não recrutam. Espero também

que a presença de homópteros diminua o patrulhamento nas folhas, aumentando o tempo de

resposta contra o ataque de herbívoros.

Métodos

Realizei o estudo na estrada que dá acesso à Reserva Florestal do km 41 (02°24’S e 59°44’O),

localizada na Amazônia Central, a cerca de 80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil. A reserva

Page 247: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

247

faz parte de uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) sob co-gestão do Projeto de

Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).

Utilizei como modelo de estudo a planta Vismia japurensis (Hypericaceae). Essa

espécie de porte arbóreo é comum em capoeiras no platô e na vertente. Seus indivíduos

possuem um par de nectários extraflorais próximos à inserção peciolar no limbo foliar

abaxial. Esses nectários exudam um néctar que é atrativo para as formigas. A composição de

espécies de formigas visitantes varia entre ramos e entre indivíduos de V. japurensis.

Amostrei 30 indivíduos de V. japurensis, 18 com homópteros e 12 sem homópteros. Escolhi

um ramo de cada planta no qual houvesse apenas uma morfoespécie de formiga. Considerei

formigas que recrutam as que forrageavam em grupo de 6 ou mais indivíduos da mesma

espécie. Dentre os ramos selecionados de cada indivíduo de V. japurensis, 13 foram visitados

por formigas que não recrutam e 17 por formigas que recrutam.

Para averiguar se o recrutamento de formigas e a presença de homópteros afetam o

mecanismo de defesa contra os herbívoros de V. japurensis, fixei um cupim vivo (simulando

um herbívoro externo) no meio da nervura central na folha mais apical do ramo. Registrei se o

cupim foi removido e cronometrei o tempo que as formigas levaram para removê-lo. O tempo

máximo estabelecido de observação foi de 8 min por planta. Se o cupim não fosse removido

nesse tempo era registrada a não remoção. Para avaliar se o recrutamento e a presença de

homópteros influenciavam na remoção de herbívoros fiz um teste de log-linear. Para avaliar

se essas variáveis afetavam o tempo de remoção do herbívoro utilizei uma análise de

variância (ANOVA) de dois fatores.

Resultados

Os cupins foram removidos em 77% dos indivíduos de V. japurensis. A proporção de cupins

removidos pelas formigas que recrutaram foi de 45,0% na presença e 66,6% na ausência de

Page 248: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

248

homópteros. Formigas que não recrutaram removeram os cupins todas as vezes, independente

da presença do homóptero. O tempo médio (em segundos, ± desvio padrão) de remoção do

cupim para formigas que recrutaram foi de 143 s (± 127,1) na presença e de 173 s (± 184,4)

na ausência de homópteros. Para formigas que não recrutaram, o tempo médio de remoção do

cupim foi de 142 s (± 99,4) na presença e de 161 s (± 161,1) na ausência de homópteros. Não

houve efeito do comportamento de recrutamento (χ2 =6,27 GL= 3 p= 0,09), presença de

homóptero (χ 2 =0,19 GL= 2 p= 0,91) ou da combinação dessas duas variáveis (χ 2 =0,06 GL=

1 p= 0,81) na remoção dos cupins. O comportamento de recrutamento (recrutam e não

recrutam) e a presença de homóptero também não afetaram o tempo de remoção dos cupins

pelas formigas (F(30, 1)= 0,252; p= 0,62; Figura 1).

Figura 1. Tempo de remoção do cupim em plantas com e sem homópteros por formigas que

não recrutam e que recrutam. Os pontos representam as médias e as barras o intervalo de

confiança (95%).

não sim

Recrutamento de formigas

0

50

100

150

200

250

300

350

400

Tem

po d

e re

moç

ão (

s)

Homóptero presente Homóptero ausente

Page 249: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

249

Discussão

A fonte de variação mais importante no mutualismo facultativo é que diferentes parceiros

oferecem diferentes magnitudes de benefício. A qualidade de proteção à planta apresenta

grande variação de acordo com a espécie de formiga (Bronstein 1998). Neste estudo, eu

avaliei se formigas que recrutavam conferiam a V.japurensis maior proteção contra

herbívoros do que formigas que não recrutavam. A resposta contra herbívoros não variou de

acordo com o recrutamento das formigas. Vários outros aspectos, além do número de

formigas por planta, podem determinar o nível de proteção, como distância até os ninhos de

formigas e número de nectários na planta hospedeira (Longino 1989, Bronstein 1998).

Formigas podem forragear agrupadas ou solitárias, e durante o forrageio podem exibir

comportamentos territoriais ofensivos e defensivos. A agressividade varia de acordo com a

espécie, sendo que as mais agressivas podem conferir maior proteção à planta (Hölldobler &

Wilson 1990, Bruna et al. 2004). Embora a remoção do cupim tenha ocorrido em 100% das

plantas visitadas por formigas que não recrutaram, o nível de agressividade não está

relacionado ao recrutamento, mas é um atributo da espécie (Hölldobler & Wilson 1990). É

possível que o nível de agressividade da espécie de formiga seja mais importante que o

recrutamento na proteção dos indivíduos de V.japurensis contra a herbivoria.

O nível de proteção conferido à planta também não variou com a presença do

homóptero. Embora as formigas só visitassem os nectários extra-florais quando não haviam

homópteros, quando presentes, esses não diminuíam a proteção das formigas contra

herbívoros externos. A interação entre formigas e plantas com nectários extra-florais é

bastante comum, mas apenas 7,3% das angiospermas que tem esses nectários também estão

associadas a homópteros (Rosumeck et al. 2009). As implicações da interação formiga-

planta-homóptero ainda são pouco conhecidas e algumas hipóteses foram propostas para

explicar a evolução dessa interação.

Page 250: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

250

Foi proposto que os nectários extra-florais evoluíram como um mecanismo para atrair

as formigas associadas a homópteros. Uma vez que as formigas deixassem de consumir o

exudato dos homópteros, deixariam também de protegê-los contra predadores e parasitóides e,

conseqüentemente, eles teriam menores taxas de sobrevivência e reprodução. Porém, muitas

observações têm demonstrado que as formigas preferem a seiva dos homópteros em relação a

dos nectários extra-florais (Del-Claro & Oliveira 1993, Bronstein et al. 2006). Uma outra

hipótese é que a presença de homópteros atrai um maior número de formigas e pode assim

aumentar a defesa indireta da planta (DelClaro & Oliveira 1993). Os resultados deste estudo

não indicam qualquer influência da presença de homópteros nos indivíduos de V.japurensis, e

o principal fator de variação na proteção pode ser a agressividade das formigas que visitam

essas plantas.

Agradecimentos

Agradeço ao PDBFF e a todos os parceiros que possibilitaram a realização desse curso, pela

oportunidade única de aprendizado. Agradeço a Manô e Rafa (que me ajudaram muito a

melhorar esse manuscrito) e também ao Daniel, Skol e Lucas pela revisão do texto. Ao

Paulinho Estefano e todos os professores, pelos ensinamentos e bons momentos durante o

curso. Às bonitoras Laura e Manô, pela ajuda, parceria e amizade nesses trinta dias.. vocês

são ótimas. À Dona Eduarda e Seu Jorge, pela goiabada e suco de caju de cada dia.. e

também ao Seu Cardoso e todos os motoristas. Agradeço de coração à todos os amigos de

curso, por fazerem esse mês tão inesquecível. E por fim, sou muitíssimo grata ao Paulinho

Enrique pela orientação nesse projeto e ensinamentos que são para vida toda, pela confiança,

pelo exemplo de profissionalismo e amabilidade e pelos momentos de diversão. Obrigada!

Page 251: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

251

Referências

Almeida, A.M. & R.A. Figueiredo. 2003. Ants visit nectaries of Epidendrum denticulatum

(Orchidaceae) in a Brazilian Rainforest: effects on herbivory and pollination.

Brazilian Journal of Biology, 63(4):551-558.

Bronstein, J. L. 1998. The Contribution of ant-plant protection studies to our understanding of

mutualism. Biotropica, 30:150-161.

Bronstein, J. L., R. Alarcón & M. Geber. 2006. The evolution of plant-insect mutualisms.

New Phytologist, 172: 412-428.

Bruna, E. M., D.M. Lapola & H.L. Vasconcelos. 2004. Interspecific variation in the defensive

responses of obligate plant-ants: experimental tests and consequences for herbivory.

Oecologia, 138: 558–565.

Cogni, R., A.V.L. Freitas & P.S. Oliveira. 2003. Interhabitat differences in ant activity on

plant foliage: ants at extrafloral nectaries of Hibiscus pernambucensis in sandy and

mangrove forest. Entomologia Experimentalis et Applicata, 107:125-131.

Del-Claro, K. & P.S. Oliveira. 1993. Ant-homoptera interaction: do alternative sugar sources

distract tennding ants? Oikos, 68: 202-206.

Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The Ants. Berlim: SpringerxVerlag.

Leal, I.R., E. Fischer, C. Kost, M. Tabarelli & R. Wirth. 2006. Ant protection against

herbivores and nectar thieves in Passiflora coccinea flowers. Ecoscience, 13:431-438.

Longino, J. T. 1989. Geographic variation and community structure in an ant-plant

mutualism: Azteca and Cecropia in Costa Rica. Biotropica, 21:126-132.

Rosumek, F. B., F.A.O. Silveira, F.S. Neves, N.P.U. Barbosa, L. Diniz, Y. Oki, F. Pezzini,

G.W. Fernandes & T. Cornelissen. 2009. Ants on plants: a meta-analasysisof the role

of ants as plant biotic defences. Oecologia, 160: 537-549.

Page 252: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

252

A serrapilheira atua como um filtro para formigas dispersoras de sementes?

Lucas Navarro Paolucci

Introdução

Em florestas tropicais, a zoocoria é responsável pela dispersão de 60 a 95% das espécies

vegetais (Howe & Smallwood 1982). Nesses ambientes, as formigas são um dos principais

grupos animais dispersores de sementes, devido à sua alta abundância e diversidade

(Hölldobler & Wilson 1990, Byrne 1994). Como dispersores secundários as formigas têm

importante papel por facilitar a germinação de sementes. Elas fazem isso ao limpar o fruto ou

semente e ao remover os diásporos para a região próxima do ninho (Leal & Oliveira 1998,

Leal et al. 2007). Nestes locais, o solo pode ser mais rico em nutrientes favorecendo o

estabelecimento das plântulas (Passos & Oliveira 2002, 2004). Além disso, nos ninhos há

menor pressão de predação (Janzen 1970, Connell 1971), o que aumenta a probabilidade de

sobrevivência das sementes e plântulas (Giladi 2006, Leal et al. 2007).

Um importante parâmetro para se avaliar a eficiência do serviço de dispersão é a

distância a que a semente é transportada. Quanto maior a distância que a semente é dispersa,

menor a competição entre a planta-mãe e as plântulas (Giladi 2006). A eficiência do dispersor

vai depender das condições ambientais do local ao redor da semente. Ambientes mais abertos

favorecem o forrageamento de formigas maiores, ao passo que uma serrapilheira mais densa

favorece o forrageamento de formigas menores (Kaspari & Weiser 1999, Farji-Brener et al.

2004). Em formigas, o tamanho das pernas é um fator que determina a habilidade de se mover

pela serrapilheira, de modo que pernas maiores permitem que a formiga passe sobre os

interstícios da serrapilheira. Por outro lado, pernas maiores dificultam a exploração entre

interstícios, que podem conter recursos alimentares e abrigos (Farji-Brener et al. 2004). Deste

modo, a percepção dos interstícios ambientais aumenta na medida em que o tamanho corporal

Page 253: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

253

diminui (Kaspari & Weiser 1999). Como formigas menores em geral dispersam sementes a

distâncias menores do que formigas maiores (Ness et al. 2004), a quantidade de interstícios

pode afetar indiretamente a eficiência de dispersão, atuando como filtro no tamanho das

espécies e consequentemente na eficiência de dispersão de sementes.

Meu objetivo foi avaliar como as características estruturais da serrapilheira

influenciam na eficiência de dispersão de sementes por formigas. Minha hipótese é que

serrapilheira mais densa diminui a eficiência de dispersão de sementes por formigas. Espero

que em locais onde a serrapilheira é mais profunda a semente seja dispersa por menores

distâncias.

Métodos

Área de estudo

Este estudo foi conduzido na Amazônia Central, em uma área de floresta de terra firme na

Reserva km 41 (2o24' S - 59o44' O). A reserva é gerenciada pelo Projeto Dinâmica Biológica

de Fragmentos Florestais (INPA/PDBFF) e está localizada a 80 km ao norte de Manaus

(AM).

Coleta de dados

Selecionei 30 estações de observação distantes entre si no mínimo 10 metros. A profundidade

da serrapilheira das estações variou entre 0 e 15 cm. A profundidade da serrapilheira foi

utilizada como medida para quantidade de interstícios ambientais, de modo que quanto maior

a profundidade, maior a quantidade de interstícios. Cada estação de observação foi formada

por 10 sementes de girassol comercial (Helianthus annuus) depositados sobre quadrados de

papel filtro. Os conjuntos de sementes foram colocados um pouco abaixo da camada

Page 254: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

254

superficial da serrapilheira. Cada estação foi observada por um período de 3:30 h. Quando

uma semente era removida, medi a distância de dispersão, que foi usada como medida de

eficiência de dispersão. Coletei as formigas que removeram as sementes de girassol para

identificação taxonômica.

Análise estatística

Para avaliar se a profundidade da serrapilheira influenciou a distância de dispersão das

sementes, fiz uma regressão linear. Quando mais de uma semente foi removida de uma

mesma estação de observação, utilizei a média das distâncias das sementes removidas. As

estações de observação que não foram acessadas por nenhuma formiga foram excluídos das

análises. Estações de observação com formigas mas sem remoção de sementes foram

considerados com distância de remoção igual a 0 metros.

Resultados

Observei 12 espécies de formigas de 4 subfamílias removendo sementes (Tabela 1). A

distância média de remoção foi de 12,6±11,15 cm (média±desvio padrão) (mínimo = 0 cm;

máximo = 80 cm). Das 300 sementes ofertadas, 21 delas foram observadas sendo removidas e

três estações de observação atraíram formigas, mas sem remoção. A quantidade de interstícios

ambientais não afetou a distância em que as formigas removeram as sementes de girassol

(F(1,25)=0,66; p=0,42, Figura 1).

Page 255: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

255

Tabela 1. Espécies de formigas que foram coletadas removendo as sementes de girassol

(Helianthus annuus), tamanho dos indivíduos, número de sementes dispersadas, distância

média, número de eventos de dispersão e profundidade média da serrapilheira.

Espécie Subfamília Tamanho Total de

sementes

dispersadas

Distância de

dispersão (cm)

(média±DP)

N. de

eventos

de

dispersão

Profundidade da

serrapilheira (cm)

(média±DP)

Acromyrmex sp1 Myrmicinae Grande 1 40 1 0

Crematogaster

sp1

Myrmicinae Pequena 1 11 1 15

Gnamptogenys

sp1

Odontomachus

sp1

Ectatomminae

Ponerinae

Grande

Grande

2

1

8

10

1

1

5

11

Pachycondyla

sp1

Ponerinae Grande 1 10 1 11

Pheidole sp1 Myrmicinae Pequena 1 9 1 5

Pheidole sp2 Myrmicinae Pequena 6 5,1±1,33 2 7,5±1,22

Pheidole sp3 Myrmicinae Pequena 5 6,8±1,64 2 14,75±1,78

Pheidole sp4 Myrmicinae Pequena 1 29 1 8

Pheidole sp5

Pheidole sp6

Myrmicinae

Myrmicinae

Pequena

Pequena

1

0

54

0

1

0

6

5,6±6,65

Pheidole sp8 Myrmicinae Pequena 1 60 1 3

Page 256: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

256

0 5 10 15

010

20

30

40

50

Profundidade da serapilheira (cm)

Distância de remoção das sementes (cm)

Figura 1. Relação entre a profundidade da serrapilheira (cm) e a distância de remoção (cm) de

sementes de girassol (Helianthus annuus) por formigas de serrapilheira em uma área de

floresta de terra firme na Amazônia Central.

Discussão

O número de interstícios gerados pelas diferenças na profundidade de serrapilheira não atua

como filtro que seleciona o tamanho das espécies de formigas. Isso se deve ao fato que tanto

as formigas maiores, quanto as formigas menores puderam acessar as sementes nas diferentes

profundidades avaliadas (Tabela 1). Assim, em solos onde há deposição variada de

serrapilheira, o tamanho das formigas dispersoras é mais importante para a eficiência de

dispersão das sementes do que as características da serrapilheira.

O fato de a serrapilheira não atuar como filtro para o tamanho de formigas pode ser

devido a características das espécies. As formigas maiores podem acessar o recurso por cima

da serrapilheira, enquanto as menores se deslocam entre os interstícios da serrapilheira. Ao

passar sobre a serrapilheira, formigas maiores precisam contornar ou transpor eventuais

barreiras físicas, ao passo que as menores caminham por entre as folhas e galhos. Como

Page 257: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

257

consequência, formigas pequenas percorrem maiores distâncias do que as formigas maiores

para acessar as sementes, já que a área de superfície percorrida deve ser maior em ambientes

com serrapilheira mais densa (Bartholomew et al. 1988). Mesmo que as maneiras de

exploração do ambiente difiram entre formigas grandes e pequenas, ambos os grupos

conseguem explorar os recursos da serrapilheira e transportar as sementes com mesma

eficiência.

Agradecimentos

Agradeço primeiramente ao PDBFF/INPA pela maravilhosa oportunidade de participar do

EFA, que foi uma experiência única e inesquecível. Ao Paulinho Enrique, pela descontração e

por compartilhar com todos seu vasto conhecimento sempre de maneira clara, atenciosa e

paciente. Ao Paulinho Estefano, pelos auxílios sempre que necessário e disposição e paciência

ao esclarecer dúvidas. Às monitoras Manô e Laura, pela ótima convivência e amizade, e por

aguentarem as besteiras escritas nos relatórios e ainda assim sugerirem ótimas ideias. A todos

os professores que passaram pelo curso, e que contribuíram enormemente para o meu

aprendizado e crescimento profissional. À D. Eduarda e ao Seu Jorge, pela convivência

agradável e por prepararem nossa comida de todo dia com muita dedicação. A todos os

colegas do EFA 2011, que fizeram com que esses 30 dias de ralação se transformassem em

momentos inesquecíveis e que com certeza vão deixar muitas saudades. À Floresta

Amazônica, por guardar diversos segredos que instigam nossa curiosidade de pesquisador e

por nos fazer sentir insignificantes perto das forças da natureza.

Referências

Bartholomew, G.A., J.R.B Lighton. & D.H. Feener Jr. 1988. Energetics of trail running, load

carriage, and emigration in the column-raiding army ant Eciton hamatum.

Physiological Zoology, 61:57–68.

Page 258: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

258

Connell, J.H. 1971. The role of natural enemies in prevent competitive exclusion in some

marine animals and rainforest trees, pp. 298-312. In: Dynamics of populations (P.J.

den Boer & G.R. Gradwell, eds.) Wageningen: Pudoc.

Farji-Brener, A.G., G. Barrantes & A. Ruggiero. 2004. Environmental rugosity, body size and

access to food: a test of the size-grain hypothesis in tropical litter ants. Oikos,

104:165–171.

Giladi I. 2006. Choosing benefits or partners: a review of the evidence for the evolution of

myrmecochory. Oikos, 112:481–492.

Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The ants. Cambridge: Harvard University Press.

Howe, H.F. & J. Smallwood. 1982. Ecology of seed dispersal. Annual review of Ecology and

Systematics, 13:201-228.

Janzen, D.H. 1970. Herbivores and the number of tree species in tropical forests. American

Naturalist, 104:501–529.

Kaspari, M. & M.D. Weiser. 1999. The size–grain hypothesis and interspecific scaling in ants.

Functional ecology, 13:530-538.

Ness, J.H., J.L. Bronstein, A.N. Andersen & J.N. Holland. 2004. Ant body size predicts

dispersal distance of ant-adapted seeds: implications of small ant invasions. Ecology,

85:1244–1250.

Passos, L. & Oliveira, P.S. 2002. Ants affect the distribution and performance of seedlings of

Clusia criuva, a primarily bird -dispersed rain forest tree. Journal of Ecology, 90:517-

528.

Passos, L. & P.S. Oliveira. 2004. Interactions between ants, fruits, and seeds in a restinga

forest in south-eastern Brazil. Journal of Tropical Ecology, 19:261–270.

Page 259: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

259

Conexões ocultas: associação entre aranhas e formigas em arbustos de

Tococa bullifera (Melastomataceae)

Maria Laura Fontelles Ternes

Introdução

A distribuição das espécies no ambiente está relacionada à seleção de habitats favoráveis ao

seu estabelecimento. Essa relação pode ocorrer de acordo com diversos fatores que envolvem

disponibilidade de recursos, presença de competidores e predadores (Scott 2005). A seleção

do habitat pode depender também da coexistência com outras espécies. Neste caso, os

organismos podem ocorrer associados por meio de uma série de interações, como

mutualismo, predação ou comensalismo (Begon 2006).

O mutualismo ocorre quando ambas as espécies interagem e se beneficiam com esta

interação (Begon 2006). Este é o caso de algumas plantas mirmecófitas, que exibem

associações mutualistas com formigas. Estas plantas exibem estruturas vegetais ocas

chamadas domáceas, onde formigas estabelecem sua colônia (Vasconcelos & Davidson

2000). Enquanto a planta oferece abrigo para as formigas, estas conferem proteção para a

planta por se alimentarem de herbívoros que podem predar a planta hospedeira (Beattie 1985).

O mutualismo entre formigas e plantas mirmecófitas é um sistema bem descrito na

literatura (De Albuquerque 2005, Capurucho et al 2010, Martins & Osses 2004, Osses 2004,

Postati 2007, Romero & Izzo 2004, Rosado et al. 2004, Silva et al. 2005, Vasconcelos 1991,

Vasconcelos 1993, Vasconcelos & Davidson 2000). Porém, outros organismos parecem se

beneficiar dessa associação, o que pode indicar um sistema com maior complexidade de

interações. Um exemplo desta situação é a Tococa (Tococa bullifera Melastomataceae), uma

planta mirmecófita de porte arbustivo, que possui uma espécie de aranha associada. Apesar

Page 260: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

260

desse artrópode predador ser encontrado frequentemente em Tococa, não se conhece o papel

dele neste sistema de interação.

Nesse sentido, me proponho a avaliar qual o tipo de interação que ocorre entre as

aranhas e formigas em Tococa bullifera. Minhas hipóteses são i) a aranha é predadora das

formigas mirmecófilas ou ii) a aranha compete com as formigas mirmecófilas por alimento.

Se a primeira hipótese for verdadeira, a aranha é uma ameaça para a formiga e por isso o

tempo de resposta das formigas a danos provocados nas folhas é maior onde a aranha ocorre

quando comparado com folhas onde não tem aranha. Se a segunda hipótese for verdadeira,

espero um número menor de formigas dentro das domáceas que possuem aranhas nas folhas

próximas, pois as aranhas podem competir por alimento com as formigas reduzindo o

tamanho da colônia na domácea.

Métodos

Desenvolvi este estudo na Reserva do km 41 (02º24’S, 59º52’O), uma área sob co-gestão do

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (INPA/Smithsonian Institution),

localizada a 80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil. A vegetação local é caracterizada por

uma floresta tropical úmida de terra firme. A precipitação média é de 2.186 mm/ano e

temperatura média anual é de 26,7 oC (Lovejoy & Bierregaard 1990).

Amostrei 18 indivíduos de T. bullifera com a presença de aranhas. A aranha posiciona

sua teia orbicular na inserção das folhas apoiando os fios-âncora na parte abaxial da folha,

próxima à entrada da domacea, porém sem contato com as formigas. Em cada planta,

selecionei um ramo onde registrei o número de domáceas e de aranhas em suas teias. Para

avaliar o tempo de resposta das formigas aos danos foliares, fiz um corte em uma folha a 2 cm

da entrada da domácea com e sem aranhas próximas. Considerei como tempo de resposta o

momento da detecção do dano pela formiga até o recrutamento das formigas na domácea.

Page 261: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

261

Utilizei um teste t-pareado para comparar o tempo de reação das formigas entre folhas com e

sem aranhas.

Para testar a competição por alimento entre formigas e aranhas, selecionei um ramo

em cada arbusto de T. bullifera e estimei a abundância de formigas e aranhas. Para obter a

estimativa da abundância de formigas desse ramo, coletei duas domáceas, uma com aranha

próxima à sua abertura e outra sem aranha. Obtive a média do número de formigas destas

duas domáceas e multipliquei pelo número total de domáceas do ramo para obter o valor de

abundância de formigas por ramo. No mesmo ramo, contei o número de teias com aranhas.

Fiz uma análise de Regressão Linear para avaliar a relação do número de teias com aranhas e

a abundância de formigas nos ramos.

Resultados

O tempo médio de resposta das formigas ao dano provocado nas folhas com aranhas foi de

21,9±19,3 segundos (média±DP), variando entre 4 e 80 segundos, enquanto a média do tempo

na ausência de aranhas foi 22,2±16,3 segundos, variando entre 5 e 72 segundos. O tempo de

resposta das formigas ao dano provocado na folha não foi diferente entre domáceas com e

sem aranhas próximas à sua abertura (t=0,16; gl=17; p=0,87; Figura 1).

Page 262: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

262

Figura 1. Tempo de resposta, em segundos, das formigas ao dano provocado na folha de

Tococa bullifera com e sem aranhas próximas a abertura das domáceas. As linhas conectam

pares de folhas com e sem a aranha na mesma planta.

Para cada aranha no ramo houve um incremento de 46 formigas. Entre os 18 ramos

amostrados, o número estimado de formigas encontradas nas domáceas com aranhas próximas

variou de 6 a 78, enquanto nas domáceas sem aranhas variou de 5 a 61 indivíduos. A

abundância estimada de formigas por ramo variou entre 18 até 858 formigas. A abundância de

aranhas variou entre 1 a 15 indivíduos por ramo. Ao contrário do esperado, houve uma

relação positiva entre a abundância de formigas e aranhas (F(1,16) = 29,38, gl = 17, p<0,01;

Figura 2).

Aranha

Page 263: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

263

0 2 4 6 8 10 12 14 16

Número de teias com aranhas

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

Est

imat

iva

do n

úmer

o to

tal d

e fo

rmig

as

Figura 2. Relação entre a abundância de formigas nas domáceas de Tococa bullifera e o

número de aranhas por ramo. A reta ascendente indica a direção da relação entre a abundância

de formigas e aranhas.

Discussão

O fato das formigas terem tempo de resposta semelhante aos danos foliares em ramos com e

sem aranha indica que as formigas não detectaram o aracnídeo como ameaça de predação. Por

serem mais abundantes na presença de aranhas, ambas devem coexistir sem competir por

recursos alimentares. A predação de formigas por aranhas pode ocorrer em algumas plantas

mirmecófitas (Letourneau & Dyer 1998, Rosado et al. 2004) como em Piper spp.

(Piperaceae) e Hirtella myrmecophila (Chrysobalanaceae). As aranhas do gênero Dipoena que

constroem suas teias nessas plantas mirmecófitas predam as formigas que vivem em suas

domáceas (Gastreich 1999, Rosado et al. 2004). Em Piper spp., a presença de aranhas

predadoras de formigas provavelmente não interfere na atividade de proteção das formigas

mirmecofilas contra herbívoros (Letourneau & Dyer 1998), pois a taxa de consumo de

Page 264: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

264

formigas é baixa, aproximadamente de uma formiga a cada três dias. Possivelmente, a taxa de

reposição de formigas contrabalanceie o consumo pela aranha predadora. Por outro lado,

Gastreich (1999) demonstrou que a presença de Dipoena. banskii diminui a eficiência das

formigas em proteger a planta contra herbívoros no sistema Piper spp..

A dieta das aranhas que constroem teias em T. bullifera provavelmente é composta por

insetos voadores que caem nas teias, já que as formigas patrulham todo o arbusto, impedindo

que outros insetos subam ao longo da planta mirmecófita para a aranha capturar. De fato, esta

aranha foi observada alimentando-se de uma pequena mosca enroscada em sua teia (J.P.

Menezes, comunicação pessoal).

Outra planta mirmecófita, Maieta (Maieta spp. Melastomataceae), mostra um sistema

similar ao observado em T. bullifera, onde existe interação planta – formiga – aranha

(DeOliveira, 1995). Em Maieta ocorre ainda um hemíptero predador associado (Osses 2004,

Santos 2007). A aranha Faiditus subflavus seleciona a Maieta para estabelecer sua teia na face

abaxial das folhas e próximo à entrada das domáceas, a aranha coloca sua ooteca (Kasper

2006). Santos (2007) demonstrou experimentalmente que o sucesso reprodutivo das aranhas

em Maieta está ligado ao posicionamento de sua ooteca próximo à entrada das domáceas.

Possivelmente, a ooteca recebe proteção indireta das formigas (Pheidole Minutula) contra

predação. O mesmo autor observou que a presença e a quantidade de formigas determinam a

colonização da planta por F. subflavus, que se fixa principalmente em folhas com mais

formigas. A associação que ocorre entre formiga e aranha na Maieta também pode ocorrer na

Tococa, uma vez que não houve evidência de competição e predação na associação entre

formigas e aranhas.

Em Tococa, o posicionamento das teias na parte abaxial das folhas, na entrada da

domácea pode ser estratégico para a aranha. A maior abundância de teias onde tem mais de

formigas nas domáceas pode sugerir que as formigas conferem proteção para as aranhas como

Page 265: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

265

em Maieta. A seleção de Tococa como habitat pelas aranhas implica na coexistência com

formigas e a evidência de associação entre estas espécies poderia seguir o modelo da Maieta,

como proposto por Santos (2007). Visto que não existem informações sobre esta espécie de

aranha, recomenda-se avaliar se as formigas protegem os sítios de oviposição das aranhas

para caracterizar a interação mutualística formiga-Tococa-aranha.

Agradecimentos

Agradeço ao INPA e PDBFF por fazerem a diferença na Amazônia Brasileira. À

Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC e ao Programa de Pós Graduação em Zoologia

por viabilizarem minha participação neste curso. À coordenação do EFA 2011 pela produção

e efeitos especiais. Afinal de contas, alegria não tira a competência do trabalho. Em especial

aos Paulos (Enrique e Estefano) e monitoras (Manoela e Laura) pela paciência e resiliência

humorística perante as intempéries dos nossos relatórios. A todos os professores/orientadores

que também corrigiram nossas pérolas, esclareceram dúvidas e nos mostraram o que é ciência.

A todos os colegas de turma por fazerem do EFA uma experiência incrível, com momentos

hilários que deixarão saudades. Ao Tim Maia por ter profetizado parte de nossas refeições

diárias “...suco de caju, goiabada para a sobremesa...”. Agradeço aos Céus por existir na

Terra um lugar como Anavilhanas. À Floresta Amazônica, que nos faz pequenos diante de sua

magnitude e nos lembra que somos só mais um organismo dentro de um grande sistema.

Assim, devemos respeito a todas as formas de vida ao nosso redor.

Referências

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Page 270: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

270

Plantas herbáceas e ambientes heterogêneos: há lugar para a variação funcional?

Mauro Brum Monteiro Junior

Introdução

Fatores que determinam os padrões de distribuição e abundância dos organismos

atuam como filtros ambientais. Esses filtros ambientais podem limitar a ocorrência de

espécies que não possuem mecanismos fisiológicos para tolerá-los (Lambers 1998). As

espécies que são selecionadas pelos filtros ambientais e compõem a mesma comunidade,

apresentam características similares. Dependendo do tipo de ambiente essa similaridade pode

influenciar de maneira diferenciada na intensidade de competição entre os organismos de uma

mesma comunidade (Keddy 1992). Em ambientes homogêneos, pode ocorrer uma limitação

na similaridade funcional dos organismos e espécies melhores competidoras devem excluir

outras espécies pelo princípio da exclusão competitiva (MacArthur & Levins 1967). Se o

ambiente for heterogêneo, diferentes padrões espaciais podem ser formados, como gradientes

ambientais ou microhabitat com características específicas (Wiens 2000). Assim, com uma

maior disponibilidade de nichos os organismos podem se estabelecer dentro do habitat de

maneira diferenciada (Wisheu 1998; Wiens 2000).

Uma abordagem que tenta explicar a coexistência de espécies vegetais em diferentes

ambientes, relaciona os atributos funcionais das plantas com seu nicho efetivo (McGill et al.

2006). Os atributos funcionais são características morfológicas ou fisiológicas das plantas que

respondem às variações nas disponibilidades de recursos e condições ambientais (Westoby &

Wright 2006). Mudanças nessas características desempenham um papel importante no

crescimento e sobrevivência das plantas que ocorrem ao longo de gradientes ambientais e

habitats heterogêneos (Garnier et al. 2001; Ackerly 2003). Características morfofisiológicas

das folhas como por exemplo, a massa foliar específica (massa seca da folha/área foliar) e a

Page 271: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

271

área foliar, são dois atributos funcionais que respondem a fatores ambientais como

disponibilidade de luz, uso de nutrientes e eficiência no uso de água . (Abrans et al. 1994;

Cornelissen et al 2003; Ackerly 2003). A categorização de espécies a partir dessas

características nos fornece indicativos da funcionalidade e das estratégias ecológicas

apresentadas pelas espécies da comunidade (Garnier et al., 2001; Ackerly, 2003).

Nas florestas tropicais de terra firme da Amazônia Central, as comunidades vegetais

distribuem-se ao longo de gradientes edafo-topográficos conhecidos como platô, vertente e

baixio (Laurance et al., 2010). A composição da comunidade vegetal encontrada ao longo

desse gradiente é determinada pela capacidade de ajuste das espécies às variações do tipo de

solo e topografia (Ribeiro et al. 1999, Carneiro 2004). Nas áreas de platô, os solos

encontrados possuem alto teor de argila e são pobres em nutrientes (Ribeiro et al 1999). Os

baixios são caracterizados por solos hidromórficos, sujeitos a inundações imprevisíveis e de

curta duração (Junk et al. 1989). As áreas de baixio são consideradas mais heterogêneas em

relação às áreas de platô, pois a amplitude de variação das características abióticas como

disponibilidade de nutriente, abertura do dossel e o teor de água é maior (Brum 2011). Essas

diferenças particulares entre o platô e o baixio podem atuar como filtro ambiental

selecionando as espécies capazes de sobreviver em cada ambiente.

Trabalhos recentes têm estudado plantas herbáceas para entender a estrutura de

comunidades tropicais e padrões de distribuição geográfica de biodiversidade (Drucker 2005).

Na floresta de terra firme, há uma diversidade de espécies herbáceas associadas as

fitofisionomias contrastantes do platô e do baixio (Drucker 2005). A capacidade dessas

espécies de ocuparem esses ambientes deve estar relacionado a variação funcional que esses

organismos desenvolvem. Nesse sentido, o objetivo desse trabalho foi verificar se plantas

herbáceas que ocorrem nos ambientes de baixio apresentam maior variação funcional do que

plantas herbáceas que ocorrem em áreas de platô. Minha hipótese é que em ambientes mais

Page 272: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

272

heterogêneos há uma maior variação funcional do que em ambientes menos heteregeneos.

Deste modo, espero que haja maior variação nos valores de área foliar e massa foliar

específica nas áreas de baixio do que nas áreas de platô.

Métodos

Área de Estudo

Realizei este estudo em uma Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais – ARIE PDBFF (02º 24’ S, 59º 43’ O), localizada 80 km

de Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação da área é classificada como floresta tropical

úmida de terra firme que apresenta variações de relevo definidas como platô,vertente e

baixio (Laurance et al., 2010). Platos são as áreas mais altas, que apresentam solos argilosos

bem drenados e pobres em nutrinetes. As vertentes estão localizadas na diferença de nível

entre as calhas dos igarapés e a superfície dos platôs. Podem variam de 70 a 80 metros, com

um solo mais argiloso nas partes mais altas e mais arenosos nas partes mais baixas (Laurance

et al., 2010). As áreas de baixio são influenciadas por pulsos de inundações imprevisíveis e de

curta duração dos igarapés. Os solos dos baixios possuem uma grande quantidade de areia e

recebem muito sedimentos oriundos do platô e da vertente (Junk et al.1989; Laurance et al.,

2010).

Coleta de Dados

Para investigar se a variação de atributos funcionais das comunidades de herbáceas nas áreas

de baixio é maior do que nas áreas de platô utilizei a área foliar (AF) e massa foliar específica

(MFA=massa seca da folha/área foliar) como atributos funcionais. Para reconhecer as plantas

herbáceas em campo, segui a descrição feito por Ribero e colaboradores (1999), que definem

Page 273: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

273

que ervas como plantas terrestres de caule não lenhoso que podem viver dentro da água ou em

solos muito encharcado.

Estabeleci 10 parcelas na área de platô e 10 parcelas na área do baixio, as parcelas tinham

tamanho de 4 x 4 m. Instalei uma parcelas após a outra como uma distancia de 20 m entre

elas. No de platô instalei as parcelas cerca de 20 m longe da trilha, pois plantas herbáceas

podem se beneficiar em ambientes alterados (McIntyre et al 1995). Na área de baixio, instalei

as parcelas as plantas ao longo da beira do igarapé.

Em cada parcela, coletei uma folha de cada espécies,Para obter dados da AF, coloquei

uma folha de cada espécies por parcela em uma placa com fundo branco ao lado de uma fita

métrica. Tirei uma fotografia da folha e posteriormente calculei a área foliar de cada foto no

programa ImageJ. Depois de fotografar todas as folhas, coloquei as folhas para secar durante

40 minutos no forno a gás. Em seguida, pesei cada folhas em uma balança de precisão para

obter a massa seca de cada folha. Calculei a MFA dividindo a massa seca da folha pela sua

área. Quando as folhas eram muito grandes, optei por obter a massa foliar especifica cortando

um quadrado de área conhecida de 2 x 2 cm, assim dividi a massa do quadrado pela sua área.

Analises estatísticas

Para avaliar se a variação nos atributos é maior no baixio quando comparado ao platô

Utilizei os seguintes procedimentos: calculei a média de AF e MFA das plantas em cada

parcela. Posteriormente calculei a média desses valores para cada ambiente. A média de MFA

e AF de cada ambiente determinam o centróide da distribuição desses dados. Uma vez

determinado o centróide, calculei a diferença de AF e MFA de cada parcela em relação ao

centróide. Utilizei esses valores das diferenças para calcular a distância euclidiana de cada

parcela até o centróide formado pelas parcelas de cada local. Quanto maior a distância

euclidiana em relação ao centróide formado pelas diferenças de MFA e AF, maior é a

Page 274: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

274

variação desses atributos no ambiente. Deste modo, espero que as distâncias euclidianas

sejam maiores nas áreas de baixio do que nas áreas de platô. Com os dados das distâncias

euclidiana, comparei esses valores entre os dois ambientes, platô e baixio, com um teste t.

Resultados

Nesse trabalho amostrei um total de 126 índivíduos de plantas herbáceas, sendo que 85

plantas estavam no baixio e 41 plantas estavam no platô. A AF das herbáceas no baixio teve

um valor médio de 118 cm² (DP=48,54), enquanto que a AF das plantas amostradas no platô

teve um valor médio de 119 cm² (DP=35,27). Para as herbáceas do baixio, o valor médio da

MFA das herbáceas foi de 5,04 g/m² (DP=1,5), enquanto que para o platô a média desse

atributo foi de 6,30 g/m² (DP=2,4). A média da distância euclidiana de cada parcela até o

centróide formado pelas parcelas de cada ambiente foi de 40,59 no baixio e 29,73 no platô

(Figura 1). Ao comparar a variação das distâncias euclidianas entre o platô e o baixio não

encontrei diferenças nas variações dos atributos analisados entre as ambientes (t=1,22; gl=18;

p=0,11).

Page 275: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

275

Baixio Platô

Ambiente

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

Distância euclidiana de cada parcela até o centróide formado pelas

parcelas de cada local.

Figura 1. Média da distância euclidiana de cada parcela até o centróide. A média de MFA e

AF de cada ambiente determinam o centróide da distribuição desses dados. O quadrado

preenchido significa os valores médios das distâncias euclidianas, e as barras correspondem

ao intervalo de confiança.

Discussão

Apesar do ambiente do baixio ser considerado um habitat heterogêneo (Drucker 2005; Brum

2011), a comunidade de herbáceas do baixio não apresentou maior variação nos valores de

MFA e da AF, em relação as herbáceas que ocorrem no platô. Isso significa que as diferenças

abióticas existentes entre platô e baixio não são suficientes para que a comunidade herbácea

do baixio apresente maior variação funcional que a comunidade no platô.

A área foliar é um atributo de importância funcional para a fotossíntese e para o

balanço hídrico das plantas (Cornelissen et al. 2003). Plantas tendem a minimizar as áreas

foliares em ambientes secos para diminuir as taxas de evapotranspiração (Chapin III et al.

2002). Em florestas tropicais úmidas á água tende a ser abundante, mesmo na estação seca,

Page 276: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

276

pois as elevadas taxas de evapotranspiração da floresta deixam a atmosfera com alta saturação

de vapor de água. A alta saturação pode manter um ciclo hidrológico florestal que garanta

disponibilidade homogênea de água em ambientes mais secos como o platô (Harrison 2010).

Se a água está disponível ao longo de todo o gradiente, variações na área foliar seriam

menores. Além disso, se a disponibilidade de água não é limitante, não haveria nenhuma outra

pressão que justificasse variações na área foliar, mesmo quando as características do solo e de

luminosidade são mais variáveis.

Também não encontrei diferença para os valores de MFA entre as comunidades de

plantas herbáceas do platô e baixio. No baixio, eu esperava que houvesse maior variação

desse parâmetro em função da variação dos tipos de solo. Por outro lado, plantas que ocorrem

em solos pobres, geralmente apresentam valores de MFA mais elevados, pois o custo de

construção de uma folha é alto nesses ambientes (Chapin III et al 2002). Os solos amazônicos

são extremamente pobres em nutrientes (Ribeiro et al. 1999). Talvez a semelhança na

variação dos valores de MFA no baixio e no platô ocorra porque há uma limitação nutricional

para plantas herbáceas em ambos os locais. Se a limitação for alta, ela poderia restringir

outras variações associadas a modificações ambientais em menor escala. Assim, as plantas

herbáceas em ambos os sistemas podem convergir em características funcionais independente

da heterogeneidade local, pois pode haver uma restrição mais importante para a morfologia

em menores escala.

Agradecimentos

Gostaria muito de agradecer ao Paulo Estefano e ao Paulo Henrique pela oportunidade de ter

participado do EFA e dizer que eu aprendi muito nesse mês. Posso dizer com certeza: “-O

EFA foi um divisor de águas na minha vida!”. Sem dúvida tenho um enorme prazer conhecê-

los. Ao Sr. Jorge e a D. Eduarda pela sagrada e deliciosa comida de todos os dias. Ao Zé Luis

Page 277: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

277

pelo grande carinho e pelas conversas filosóficas sobre os mistérios do mundo. Aos grandes

amigos que eu conheci nesse mês intenso e divertido. Os nomes de cada um estão dentro de

mim, vou leva-los para sempre em todos os lugares que eu estiver. Um carinho especial para

todos os professores Braulio, Tabarelli, Fabrício, Elder, Cíntia, Lorenzo, Adriano, Janzen,

Inara, Rafael e Ana. As monitoras Laura e Manô que foram nossas mãezinhas. Um abraço aos

Guaribas que ficavam “rezando” junto comigo e a Manô nessas noites de selva. Ao Clã que

ajudava espairecer as idéias. A Manô e a Ana Andrade que foram as corretoras do meu

relatório e me ensinaram a enxergar meus erros na hora de escrever. Ao Gregório, Inácio e

Camila que foram meus melhores amigos nessa jornada.

Também quero agradecer meu orientador Rafael S. Oliveira por sempre botar uma fé

em mim e me incentivar muito nas empreitadas biológicas. A Suellen minha namorada linda

que me fez sentir tantas saudades. Meus pais que me botaram no mundo e com isso foi

possível eu estar aqui.

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Wiens, J.A. 2000. Ecological heterogeneity: an ontogeny of concepts and approaches. In: The

ecological consequences of environmental heterogeneity (M.J. Hutchings, L.A. John

&. & A.J.A. Stewart, eds.). Cambridge: University Press.

Wisheu I.C. 1998. How organisms partition habitats: different types of community

organization can produce identical pattern. Oikos, 83:246-258.

Page 280: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

280

Porque abelhas selecionam substrato para coletar argila?

Raul Costa Pereira

Introdução

Indivíduos que maximizem o ganho energético líquido durante o forrageio devem ser

favorecidos por seleção natural (Smith 2006). Nesse sentido, foi proposta a teoria do forrageio

ótimo que postula que deve haver um balanço que minimize os gastos associados com a busca

e exploração de recursos e maximize o retorno energético fornecido por ele (Charnov 1976).

Para espécies que carregam o recurso antes de consumi-lo, os custos do transporte

também devem ser considerados. Pássaros que levam alimento para filhotes (Kacelnick

1984), abelhas que levam pólen para a colônia (Schmid-Hempel 1986) e vespas caçadoras que

armazenam presas no ninho (Araújo & Gonzaga 2007) são exemplos de organismos que tem

gastos energéticos associados ao transporte de recursos. Nesses casos, o peso e distância do

recurso até o ninho, a energia necessária para seu transporte, o número de deslocamentos

necessários e o tamanho corpóreo do indivíduo determinam o tamanho de carga que o

indivíduo é capaz de transportar (Charnov 1976, Krebs & Davies 1993). A quantidade ótima

de carga será aquela que maximize o ganho energético do indivíduo e minimize os custos

associados ao transporte (Charnov & Orians 1973).

Características do hábitat e a qualidade de recursos podem influenciar na carga ótima

(Robakiewicz & Daigle 2004). Por exemplo, em ambientes onde recursos de qualidade são

abundantes, os indivíduos tendem a diminuir a carga transportada e aumentar o número de

viagens (Krebs & Davies 1993). Além disso, independente das características do recurso e do

hábitat, o tamanho corpóreo individual também pode determinar a habilidade de explorar

recursos (Mittelbach 1981). Como indivíduos maiores em geral são mais fortes e experientes,

eles possuem maior capacidade de carregar e manipular recursos (Schoener 1971, Polis 1984).

Page 281: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

281

Grande parte da teoria de tamanho ótimo de carga foi criada para modelar o transporte

de alimento por animais (Charnov 1976, Krebs & Davies 1993). Entretanto, organismos não

transportam somente recursos alimentares. Por exemplo, algumas espécies de abelhas da

Amazônia Central podem procurar e remover argila de regiões específicas em barrancos

associados a riachos de pequena ordem (localmente conhecidos como igarapés). Essa argila

provavelmente é utilizada para a construção de ninhos. Os indivíduos removem pequenos

pedaços de argila com a mandíbula e os agregam no último par de patas. O fato das abelhas

ignorarem outras fontes de argila encontradas a poucos metros indica que alguma

característica do substrato deve atuar na escolha da argila por abelhas. A quantidade de água

na argila em particular varia ao longo do barranco. A argila molhada é mais densa. Argila

mais seca por outro lado deve ser mais dificilmente agregada nas patas devido à menor

umidade. Logo, a quantidade de água no substrato talvez influencie na seleção e na eficiência

de remoção de argila pelas abelhas.

Nesse trabalho me propus a avaliar as seguintes hipóteses: i) indivíduos maiores

transportam maiores quantidades de argila; ii) indivíduos selecionam argila com condições

intermediárias de umidade; e iii) abelhas tem menor eficiência de exploração de argila em

substratos com muita água. Se a hipótese i for verdadeira, espero que a) a distância antero-

posterior das abelhas tenha relação positiva com a área de argila agregada nas patas. De

acordo com a hipótese ii, espero que b) a argila do barranco não manipulada tenha maior

abundância de indivíduos coletando argila que substratos de argila mais seca e mais úmida.

Com relação a hipótese iii, espero que c) abelhas terão menor taxa de acumulo de argila nas

patas em substratos molhados; e d) abelhas transportarão menos argila quando a umidade da

argila for maior.

Page 282: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

282

Métodos

Área de estudo

Amostrei um trecho de 2 m de barranco de argila localizado em um igarapé na fazenda Esteio,

pertencente à Área de Relevante Interesse Ecológico do Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (PDBFF). Amostrei duas espécies de abelhas que removem argila

especificamente desse local. Ambas apresentam comportamento de coleta de argila bastante

similar, agregando grânulos de argila no último para de patas posteriores. As abelhas iniciam

a remoção de argila por volta das 6:00 h, permanecendo ativas até as 18:00 h.

Tamanho corpóreo x quantidade de carga

Para testar se o tamanho da agregação de argila transportada aumenta com o tamanho

corporal, usei uma câmera SONY HX1 para filmar indivíduos das duas espécies de abelha

removendo argila. Filmei as abelhas das 6:00 as 7:00 h e das 11:00 até 12:00 h por dois dias.

Durante as filmagens, coloquei escalas graduadas em 5 mm espalhadas ao longo das áreas de

coleta de argila, de forma a sempre manter uma escala próxima da abelha filmada. Retirei das

filmagens um “quadro” de cada indivíduo logo antes dele abandonar o barranco. Nessas

imagens, medi o comprimento linear antero-posterior da abelha e a largura e comprimento das

agregações de argila em uma das patas posteriores usando o programa ImageTool. Calculei a

área de argila removida usando a fórmula da área da elipse. Relacionei o comprimento das

abelhas e a raiz quadrada da área da agregação de argila em uma das patas anteriores. Utilizei

a raiz quadrada da área da agregação para remover o efeito de uma eventual relação

exponencial ter sido causada pela diferença no número de dimensões entre o comprimento

antero-posterior (linear) e a área de argila (bidimensional). Para testar essa relação fiz uma

Page 283: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

283

regressão linear com os dados de comprimento antero-posterior e área removida

transformados em logaritmo.

Preferência de substrato

Para testar se abelhas preferem a argila não manipulada do barranco, impedi o acesso das

abelhas ao barranco com um plástico e ofertei argila com diferentes quantidades de água. Fiz

seis blocos de amostragem, com três tratamentos cada: controle (argila do barranco não

manipulada), argila seca (seca no forno por 10 min) e molhada (com consistência semelhante

ao observado após chuvas). Coloquei a argila de cada tratamento em duas placas de Petri

(diâmetro de 9 cm). Assim, cada bloco consistia em seis placas com três tratamentos. Alterei a

ordem das placas no experimento a cada bloco. Contei o número de abelhas coletando argila

em cada placa a cada 2 min por 10 min em cada bloco. Esperei meia hora em cada bloco antes

de iniciar a contagem para que as abelhas se acostumassem com a nova disposição dos

substratos. Calculei a média de indivíduos em cada tratamento por cada bloco e testei se o

logaritmo da abundância média diferiu entre os tratamentos de tipo de substrato com uma

ANOVA em bloco.

Qualidade do substrato x eficiência de exploração do recurso

Para testar se abelhas têm menor taxa de remoção de argila no substrato molhado, filmei as

abelhas removendo argila no barranco sem alterações (n=21) e após molhar o barranco com

aproximadamente 1 l de água (n=17). Nas filmagens, selecionei dois “quadros” de um mesmo

indivíduo coletando areia em diferentes momentos (separados por no mínimo 30 s).

Considerei o intervalo de tempo entre os quadros como o tempo de acumulação de argila. Em

cada quadro, medi o comprimento linear antero-posterior dos indivíduos e a área de argila na

mesma pata posterior no primeiro e no segundo quadro. Calculei a diferença de área das

Page 284: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

284

agregações de argila nos dois quadros do mesmo indivíduo. Estimei a taxa de acúmulo de

argila ao dividir a quantidade acumulada de argila pelo tempo de acumulação. Transformei os

dados em logaritmo e testei se a taxa média de acumulação de argila diferiu entre o barranco

controle e molhado usando teste t.

Para avaliar se o tamanho final das agregações de argila varia entre o barranco sem

alterações e molhado, utilizei quadros das filmagens que registravam os indivíduos logo antes

deles abandonarem o barranco. Nessas imagens, medi o comprimento linear antero-posterior e

a área da agregação de argila em uma das patas posteriores para cada indivíduo (n=20 para

cada tratamento). Como indivíduos maiores devem transportar mais argila, o tamanho da

agregação de argila deve ser dependente do tamanho da abelha. Portanto, removi esse efeito

obtendo o resíduo da regressão entre o tamanho dos indivíduos e o tamanho final das

agregações de argila transformadas em logaritmo. Testei se os valores médios desse resíduo

diferiam entre o barranco controle e o barranco molhado usando teste t.

Resultados

Abelhas maiores levaram mais argila (F(1,38)=58,43; r=0,61; p<0.001), e essa relação foi

exponencial mesmo quando calculei a raiz quadrada da área de argila na pata da abelha

(Figura 1). Na presença dos três tratamentos associados à umidade do substrato, a abundância

média de abelhas foi 44% maior no tratamento de argila seca quando comparada a argila

controle, e 94% maior que na molhada (F(2,10)=27,8; p<0.001; Figura 2). Com relação à

remoção de argila, as abelhas removeram em média 0,008 mm2 (dp=0,07) de argila por

segundo e transportaram em média 6,5 mm2 (dp=4,56) de argila. A taxa de remoção (t=1,0;

df=36; p=0,31; Figura 3) e a quantidade de argila removida por indivíduo (t<0.01; df=38;

p=1; Figura 4) não foram menores na argila molhada quando comparada ao controle.

Page 285: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

285

y = 0.5605e0.1183x

0

1

2

3

4

5

7 9 11 13 15 17

Áre

a de

arg

ilare

mov

ida0,

5

Tamanho do indivíduo (mm)

Figura 1. Relação entre o tamanho das abelhas e a raiz quadrada da área de argila removida

em um barranco próximo a um igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.

Figura 2. Número médio de abelhas coletando argila em cada tratamento de umidade da argila

na Fazenda Esteio, Amazônia Central. As barras verticais representam o desvio padrão.

Page 286: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

286

Figura 3. Taxa de remoção de argila por abelhas de acordo com o nível relativo de umidade

da argila de um barranco de igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.

Figura 4. Resíduo da regressão entre os valores transformados em logaritmo de tamanho dos

indivíduos e área de argila removida em duas categorias de umidade do substrato de um

barranco próximo a um igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.

Page 287: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

287

Discussão

A relação positiva entre o comprimento antero-posterior das abelhas e a área de argila

acumulada nas patas posteriores indica que a carga ótima transportada depende do tamanho

do indivíduo. Ao contrário do esperado, abelhas preferem substratos mais secos para coletar

argila. No entanto, essa preferência não pode ser explicada pelo aumento da eficiência de

exploração do recurso, já que a taxa de remoção e a área de argila removida na pata traseira

foram similares entre a argila controle e a umidecida.

A relação exponencial entre tamanho e quantidade de argila transportada indica que

indivíduos maiores carregam quantidades desproporcionalmente maiores de argila. Isso

contraria a relação linear entre a quantidade de carga transportada e massa corpórea

encontrada para abelhas que carregam pólen (Schimid-Hempel 1986). Logo, é possível que

indivíduos grandes contribuam mais para o transporte de argila, pois os pequenos deveriam

fazer um número desproporcionalmente maior de viagens para levar a mesma quantidade de

argila que uma abelha grande.

A preferência pelo substrato seco pode estar associada às facilidades de coletar os

grânulos mais leves da argila com pouca água. Como o tratamento de argila seca não usava a

argila totalmente desidratada, a água presente na argila ainda pode ser suficiente para manter a

agregação dela nas patas. Porém, visto que as abelhas preferem a argila com menor umidade,

a coleta de argila do barranco observada em condições naturais seria sub-ótima quando

comparada a utilização da argila seca ofertada nos experimentos. Isso pode indicar que há

falta de recursos ótimos disponíveis no raio de captura dos indivíduos. Por outro lado, o

mecanismo envolvido na seleção da quantidade de água no substrato em pequena escala

espacial e temporal pode estar associado à habilidades cognitivas individuais. Abelhas têm

um sistema de tomada de decisões no qual a acurácia da escolha depende do tempo de

avaliação do recurso (Chittka et al. 2003). Em geral, essa avaliação e a aprendizagem são

Page 288: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

288

rápidas (Real 1991). Assim, é possível que as abelhas avaliem a qualidade da argila

disponível e selecionem aquela com menos água antes de iniciar a coleta dos grânulos.

A eficiência na exploração do recurso não explicou a preferência por substratos com

menos água. Entretanto, considerando que a argila molhada é mais densa, uma mesma

quantidade de argila seria mais pesada molhada do que seca. Nesse sentido, abelhas

carregariam a mesma quantidade de argila independente da quantidade de água no substrato,

mas gastariam mais energia transportando argila molhada devido ao maior peso.

A seleção de substratos com menos água pode influenciar na energia gasta para o

transporte da argila. No entanto, a semelhança na taxa de acumulo de argila indica que o custo

associado com a aquisição da argila não afeta essa preferência, da forma como é prevista pela

teoria do tamanho ótimo de carga (Krebs & Davies 1993). Por outro lado, o menor gasto

energético para obter uma mesma quantidade de recurso que é menos denso, pode ser o

mecanismo associado com a preferência pelo substrato com menos água.

Agradecimentos

Agradeço a todos que compartilharam esse intenso mês comigo. Sou grato a seu Cardoso, seu

Jorge e Dona Eduarda pelo trabalho silencioso na logística e na cozinha, que nos manteve

funcionando. Aos professores que sempre estiveram dispostos a ajudar. A Manú pelo bom

humor ácido que tanto me ajudou. A Paulo Estéfano pelas dicas. Ao Paulinho pela paciência e

pela montanha de conhecimento transmitido. A Laura pela paciência, risadas e boa vontade

sempre. Por fim, mas não menos importante, aos atores principais do EFA, meus colegas.

Satisfação imensa conhecê-los. Agradeço em especial ao Thiago pelo mau humor constante e

ao Greg pelo bom humor constante. E a Talita por sempre desligar meu computador nos

momentos mais oportunos.

Page 289: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

289

Referências

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Chittka, L., A.G. Dyer, F. Bock & A. Dornhaus. 2003. Bees trade off foraging speed for

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Krebs, J.R. & N.B. Davies. 1993. An introduction to behavioral ecology. Oxford: Blackwell

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Mittelbach, G.G. 1981. Foraging efficiency and body size: a study of optimical diet and

habitat use by Buegills. Ecology, 62:1370-1386.

Polis, G. 1984. Age structure component of niche width and intraspecific resource

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123:541–564.

Real, L. 1991. Animal choice behavior and the evolution of cognitive architecture. Science,

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Robakiewicz, P. & W. Daigle. 2004. Patch quality and foraging time in the crab spider

Misumenops asperatus Hentz (Araneae: Thomisidae). Northeastern Naturalist,

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Page 290: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

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Schmid-Hempel, P. 1986. Do honeybees get tired? The effect of load weight on patch

departure. Animal Behavioral, 34:1243-50.

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evolutionary biology (E. Sobber, ed.). London: Bradford Books.

Page 291: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

291

Se for pequeno ou grande eu pego, mas se balança muito eu fujo: comportamento de

forrageio em uma espécie de aranha em resposta ao custo de aquisição e ao nível de

ameaça da presa

Rodrigo Zucaratto

Introdução

A teoria do forrageamento ótimo prediz que aqueles organismos que conseguem maximizar

seu ganho energético com um mínimo de esforço despendido serão favorecidos pela seleção

natural (Krebs & Davies 1993). Dessa maneira, o comportamento de forrageio pode ser

determinado pelos custos e benefícios relacionados à obtenção de alimento. Este balanço é

influenciado por fatores como tamanho e conteúdo nutricional da presa, bem como pelo

tempo e energia gastos na sua obtenção (Ricklefs 2000). A energia é gasta durante a

subjugação e manipulação da presa, enquanto o tempo é gasto durante sua procura

(MacArthur & Pianka 1966).

Mesmo que a seleção natural possa favorecer os indivíduos que são capazes de

maximizar seus ganhos energéticos, em muitos casos a busca por recursos pode aumentar a

probabilidade de detecção desses indivíduos pelos seus predadores (Sih 1980). Nesse sentido,

a predação pode ser uma força seletiva que modela as estratégias de forrageio (Verdolin

2006). Quando a predação é alta, os forrageadores podem alterar seu comportamento de modo

a reduzir os riscos de predação e não necessariamente para maximizar o ganho energético

(Abrams 1992). Em função disso, foi proposta a teoria do forrageamento sensível ao risco,

que prediz que a atividade de forrageamento dos organismos é reduzida quando existe ameaça

de predação (Sih 1980).

Embora a teoria do forrageamento sensível ao risco presuma que muitos organismos

reduzam suas atividades de forrageio sob ameaça de predação, em muitos casos, a própria

Page 292: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

292

presa pode ser uma ameaça para seu predador (Del-Claro 2004). Tal ameaça pode ser

representada, por exemplo, por compostos químicos tóxicos ou por atributos físicos da presa,

potencialmente danosos ao predador (e.g. Ruxton et al. 2004). Sendo assim, o predador

também pode ajustar seu comportamento de forrageio em função do nível de ameaça imposto

pela presa.

Geralmente um predador pode detectar o perigo representado pelas presas usando

estímulos mecânicos, visuais e/ou químicos (Gullan & Grascon 2005). Algumas aranhas, por

exemplo, constroem teias de interceptação que as permitem aumentar a sua área de percepção

e captura das presas. Para isso, elas mantêm contato constante com alguns fios da teia.

Quando um organismo é interceptado pela teia, os fios de seda transmitem estímulos

vibratórios que permitem à aranha detectar algumas das características da presa capturada,

como por exemplo, sua massa corpórea (Viera 2007).

Em estudo realizado por Pagotto et al. (2011) sobre os fatores que afetam o

comportamento de forrageio em uma espécie de aranha, foram usadas duas espécies de

formigas (Ectatomma brunneum e Dolicoderus sp.) como modelos de presa. Nesse estudo,

eles concluíram que a aranha evitou a formiga mais agressiva. No entanto, quando comparada

à Dolicoderus sp., E. brunneum é maior e apresenta comportamento mais agressivo. Dessa

forma, não foi possível separar o efeito da massa do efeito da agressividade sobre o

comportamento de forrageio da aranha. Presas muito grandes, apesar de representarem um

benefício, podem ter um custo muito alto associado à dificuldade de manipulação pela aranha.

Além disso, elas podem gerar um dano muito grande à teia. Por isso, de acordo com o

forrageio ótimo, o custo dessas presas seria alto em relação ao benefício, justificando a

evitação de Ectatomma sp, independente da sua agressividade. Sendo assim, nesse estudo tive

como objetivo avaliar como uma espécie de aranha ajusta seu comportamento de forrageio em

relação ao nível de ameaça e ao custo de captura da presa. Se a teoria do forrageio ótimo

Page 293: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

293

explica o comportamento de forrageio da aranha, minha hipótese é essa aranha evitará presas

de tamanho corporal grande. Por outro lado, se o comportamento de forrageio for explicado

pela teoria do forrageio sensível ao risco, minha hipótese é que a aranha evitará presas mais

agressivas.

Métodos

Área de estudo

Conduzi este estudo na fazenda Esteio que pertence a Área de Relevante Interesse Ecológico

PDBFF. A fazenda está localizada a 80 km ao norte de Manaus, AM. A vegetação do local é

formada por uma floresta ombrófila densa de terra firme. O clima é do tipo tropical úmido de

acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007). A temperatura média anual é de 26,7

ºC e a pluviosidade anual é 2186 mm.

Organismo de estudo

Como modelo de predador, utilizei uma espécie de aranha não identificada que apresenta

cefalotórax e abdôme vermelhos e pernas pretas e vermelhas. Estas aranhas constroem suas

teias a aproximadamente 50 cm do solo. As teias são tridimensionais e apresentam uma

superfície arredondada com a parte convexa voltada para o dossel. Essa superfície é composta

por fios traçados em várias direções. A teia é presa ao solo ou nos troncos das árvores por

meio de fios solitários traçados a partir da região convexa.

Page 294: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

294

Coleta de dados

Utilizei quatro espécies de formigas com diferentes tamanhos corporais e níveis de ameaça

para aranhas: Dolichoderus sp. (n = 10), Ectatomma sp. (n = 10), Odontomachus sp. (n = 10)

e Pseudomyrmex sp. (n = 10). Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp. apresentam tamanho

corporal pequeno quando comparadas a Ectatomma sp. e Odontomachus sp. Pseudomyrmex

sp. é territorial e ocorre associada a diferentes espécies de plantas do gênero Tachigali,

atacando qualquer organismo que se aproxime da planta onde a colônia está estabelecida. Para

isso, ela usa mandíbulas e um ferrão que contém defesas químicas. Dolichoderus sp.

apresenta apenas defesa química, porém dificilmente a utiliza (Hölldobler & Wilson 1990). Já

Odontomachus sp. e Ectatomma sp. se defendem utilizando mandíbulas e um ferrão. Porém,

Odontomachus sp. possui mandíbula maior e utiliza tanto a mandíbula quanto o ferrão muito

mais freqüentemente que Ectatomma sp. (Holldobler & Wilson 1990).

Para avaliar o comportamento de forrageio da aranha, percorri algumas trilhas dentro

da área de estudo e escolhi 40 teias à medida que as encontrei. Para cada teia encontrada,

ofereci uma das espécies de formiga, sempre à mesma distância em relação às aranhas e

nunca colocando mais de uma espécie de formiga por teia. Após a colocação da formiga na

teia, cronometrei o tempo que a aranha levou para se aproximar da presa (tempo de resposta)

e posteriormente registrei se a aranha atacou ou evitou a presa (tipo de reação). Considerei

que a aranha atacou a presa quando ela a envolveu com seda ou tentou envolver mas não

obteve sucesso. Considerei que a presa foi evitada quando a aranha fugiu ou se afastou da

mesma depois da aproximação inicial. Observei cada teia por um período máximo de 10 min.

Para avaliar se houve diferença no tempo de resposta das aranhas em relação às quatro

espécies de formigas, utilizei uma análise de variância (ANOVA). Se a hipótese de que as

aranhas evitam presas de tamanho corporal grande for verdadeira, espero que o tempo de

resposta das aranhas quando ofereci Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp. seja menor do que

Page 295: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

295

o tempo de resposta à Ectatomma sp. e Odontomachus sp. Se a hipótese de que as aranhas

evitam presas mais agressivas for verdadeira, espero que o tempo de resposta das aranhas

frente a Odontomachus sp. e Pseudomyrmex sp. seja maior do que o tempo de resposta à

Dolichoderus sp. e Ectatomma sp.

Resultados

A aranha atacou e envolveu em seda todos os indivíduos de Dolichoderus sp., Pseudomyrmex

sp. e Odontomachus sp., que foram colocadas na teia. Porém, para Ectatomma sp., somente

quatro foram envolvidas em seda. Ao colocar os indivíduos de Ectatomma sp. na teia, eles

causavam vibrações na teia visivelmente maiores que os indivíduos das outras espécies. Em

geral a aranha fugia quando essas vibrações ocorriam. Quando a aranha não fugia, ela parava

e ficava na mesma posição se balançando rapidamente, fugindo em seguida. Quando coloquei

Dolichoderus sp., Pseudomyrmex sp. e Odontomachus sp. na teia, as aranhas se aproximaram

das formigas e começaram a envolvê-las com seda. Para envolver as formigas, as aranhas

mantinham-se a certa distância das mesmas. Para isso, elas liberavam seda pelas fiandeiras e

utilizavam as duas patas traseiras para envolver as presas. Apesar de não haver quantificação,

em alguns momentos, as aranhas paravam de envolver as formigas em seda e encostavam o

prossoma nas mesmas, voltando a envolvê-las em seguida. Porém, isso só foi observado para

Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp.

O tempo médio de resposta das aranhas quando a presa foi Dolichoderus sp. foi de 5 s

(DP=5,78), para Pseudomyrmex sp. foi de 89 s (DP=150,15), para Odontomachus sp. foi 23,5

s (DP=16,17) e para Ectatomma sp. foi de 407,5 s (DP=264,40). O tempo de resposta das

aranhas foi maior para Ectatomma sp. do que para Dolichoderus sp., Odontomachus sp. e

Pseudomyrmex sp. (F(3,36)=12,52; p<0,001; Figura 1).

Page 296: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

296

Dolichoderus sp. Ectatomma sp. Odontomachus sp. Pseudomyrmex sp.

Espécie de formiga

0

1

2

3

4

5

6

7

Log

do

tem

po d

e re

spos

ta (

s)

Figura 1. Tempo de resposta da aranha em relação às quatro espécies de formigas com

diferentes tamanhos corporais e níveis de agressividade, oferecidas em suas teias. Os círculos

representam as médias e as barras o intervalo de 95% de confiança.

Discussão

O fato da aranha ter atacado uma das presas de tamanho corporal grande indica que ela não

avalia os custos adicionais associado à captura dessas presas. Da mesma forma, o nível de

ameaça da presa aparentemente não afeta o comportamento de forrageio da aranha. Sendo

assim, as teorias de forrageamento ótimo e forrageamento sensível ao risco não explicam o

comportamento de forrageio nessa espécie de aranha.

As aranhas que fazem teia são predadoras que não buscam ativamente pelas suas

presas (estratégia do tipo senta-e-espera - Krebs & Davies 1993). Esse tempo de espera pode

fazer com que os animais passem por longos períodos de inanição, e portanto, se arrisquem

mais na captura de presas (Sih 1980). Isso pode explicar o fato da aranha ter selecionado

Page 297: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

297

presas de tamanho corporal grande. Quanto ao nível de ameaça, formigas mais agressivas

podem usar o seu ferrão ou a mandíbula para causar injúrias às aranhas. Porém, por manterem

certa distância das formigas enquanto as imobilizavam, isso reduzia a chance de serem

atingidas pelo ferrão ou pela mandíbula. Posteriormente, uma vez imóveis pela seda, essas

presas poderiam deixar de oferecer riscos às aranhas.

Se as aranhas não avaliam os custos associados à captura de presas, resta saber por que

elas evitaram Ectatomma sp. Uma possibilidade pode estar associada ao fato de que essas

formigas causaram vibrações maiores na teia do que as outras espécies. Como a vibração da

teia permite à aranha antecipar algumas das características da presa (Vieira 2007) é possível

que a intensidade do balanço causado por Ectatomma sp. seja muito forte e a aranha interprete

essa vibração como sendo algo que possa destruir sua teia. Isso levaria ao comportamento de

fuga da aranha.

Se a aranha realmente desiste de Ectatomma sp. ao confundí-la com algo que possa

destruir sua teia, é possível que talvez o comportamento de captura de presas seja determinado

por um limiar de custo. Ao invés de realizar uma avaliação linear dos custos e benefícios das

presas, a aranha pode desistir do ataque sempre que a presa ultrapassar um limite máximo de

custo, independentemente do benefício.

Agradecimentos

Poder participar do EFA foi algo que sempre desejei, pois acreditava que seria algo grandioso.

Hoje não acredito mais, TENHO CERTEZA! Agradeço imensamente ao PDBFF pela

oportunidade. Obrigado a toda a equipe que esteve por trás das cortinas fazendo a coisa

funcionar. Sou grato aos professores Paulo Estéfano (Paulinho Mau), Paulo Enrique (Paquita

Rainbow Master) e Zé Luiz, por permitirem que eu fizesse parte desse Big Brother da Floresta

e aprendesse muuuuuuuuuito! Ao Rainbow (hétero enrustido) gostaria de agradecer pelas

Page 298: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

298

conversas de bêbado, por acreditar no meu potencial, por me incentivar a seguir em frente,

por ter me ajudado com as coletas de campo do PI e por todo o carinho e dedicação a esse

bando de malucos (valeu paquita!!!!). Um obrigadão a todos os professores que por aqui

passaram compartilhando conosco suas experiências de vida. Agradeço às bonitoras Manô

“coração gelado” (que de gelado não tem nada) e Laura Luanny Luizão (Pezão). Manô, valeu

por suprir minha abstinência de chocolate, e, Pezão, valeu por me fazer perder noites de sono

corrigindo relatórios madrugada à fora, podendo contemplar o céu maravilhoso de

Anavilhanas, I love you!!! Aos meus 19 (quase finteee) novos amigos, por compartilharmos

experiências incríveis no meio da Amazoinhaaaa Central, por rirmos com a “ósguia” à noite,

por mergulharmos juntos no Rio Negro, pelas festinhas, pelas cachaças, pelos projetinhos e

momentos de desesperos em meio a tantos relatórios, e por me agüentarem 30 dias falando

besteira o tempo todo. Valeu Camilinha, Dani, Jonny, Raulzito, Maurão, Drag, Daniel,

Lauracea (gata você é zen!), Monange, Skol, Lucas Cocerinha, Inácio (tá ouvindo??), Fran,

Miojo, Japoneusa, Lambisomen, Talitinha e minhas duas gatas Fernandinha e Fofuxa, vocês

são uma cambada de gonorantes!!!!! Fernandinha Paquita Rochele do Sertão você é

10000000000...e quantos mais zeros existirem , obrigado por compartilhar esses “momentos

lindamente” e “tomar uns bons drinqui” comigo. Fofuxa você ensinou a todos nós que a

paciência é uma virtude!!! Muito obrigado por sentar comigo na hora que a coisa não andava

e me manter calmo. Não poderia deixar de agradecer à minha orientadora Alexandra Pires,

por todo apoio e carinho e por acreditar em mim sempre (valeu Lelê). Ao programa de Pós-

Graduação em Ciências Ambientais e Florestais da UFRRJ por custear minhas despesas com

as passagens aéreas. Aos amigos do Mestrado Ju, Patrícia, Renata, Israel e Arthur. À Dona

Eduarda e Seu Jorge (porrahhh) pelo frango nosso de cada dia. Ao seu Cardoso por ter me

abandonado embaixo de uma Tachi e por nos ajudar em campo! Enfim, a todos os que direta

ou indiretamente tornaram a minha vida melhor... Obrigaduuuuuuuuuuuuu!!!

Page 299: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

299

Referências

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Page 301: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

301

Associação de formigas e da planta Palicourea corymbifera Müller Arg (Rubiaceae):

qual o efeito das formigas nas inflorescências?

Talita Câmara

Introdução

Plantas polinizadas por vetores bióticos apresentam uma grande variedade de recursos, como

óleos, pólens e néctar para a atração dos animais (Bronstein et al. 2006). O néctar é

comumente produzido nas flores e é composto principalmente por água e carboidratos. Ainda

que o néctar ofertado pelas plantas atraia os polinizadores efetivos, ele pode atrair também

outros visitantes florais: os pilhadores. Os pilhadores (“ladrões de néctar”) consomem o

néctar produzido nas flores, mas não contribuem para a reprodução das plantas (Irwin &

Brody 1999). Plantas visitadas pelos “ladrões de néctar” muitas vezes têm suas flores

danificadas. Geralmente, os pilhadores acessam o néctar perfurando a corola da flor ou

reaproveitando perfurações feitas por outros pilhadores e/ou herbívoros de flores (Bronstein et

al. 2006). Como estratégia de defesa, algumas plantas desenvolveram, ao longo da evolução,

estruturas denominas de nectários extraflorais (NEFs) (Rosumeck et al. 2009).

Os NEFs são glândulas secretoras de néctar que não estão envolvidos diretamente com

a polinização (Elias 1983). Essas glândulas estão localizadas nos órgãos vegetativos e/ou ao

redor das flores e frutos. Uma das hipóteses para o desenvolvimento dos NEFs é para atração

dos pilhadores de néctar de flores. Dessa forma, o impacto da ação desses organismos nas

flores e no recurso disponível para atração dos polinizadores seria minimizado (Elias 1983).

Além de atrair os pilhadores, os NEFs atraem também insetos que indiretamente podem

conferir defesa as plantas contra seus inimigos naturais (Koptur 1992).

Associações entre plantas com NEFs e formigas são bastante comuns. Formigas são

atraídas pelo néctar e ao defendê-lo de outros visitantes, protegem as plantas contra os

Page 302: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

302

herbívoros (Heil & McKey 2003). Esse comportamento beneficia a planta, aumentando sua

aptidão (Oliveira et al. 1987, Leal et al. 2006, Rodrigues et al. 2004). Além de expulsar

herbívoros foliares da planta, a hipótese “Proteção de Pilhadores de Néctar” (Nectar-Thieve

Protection Hypothesis) postula que as formigas presentes nos NEFs (localizados ao redor das

flores) podem aumentar o sucesso da polinização, expulsando pilhadores de néctar das flores

(Der Pijl 1954). Diante desse contexto, meu objetivo é entender o papel das formigas em

inflorescências que apresentam NEFs. Minha hipótese é que as formigas protegem as

inflorescências de herbívoros de flores e os pilhadores. Espero que (1) inflorescências sem

formigas apresentem uma maior porcentagem de danos do que inflorescências com formigas,

(2) inflorescências sem formigas ocorra uma perda maior de botões florais e (3)

inflorescências sem formigas terão maior número de visitantes florais do que inflorescências

com formigas.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Projeto de Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), localizada a 80 km ao norte de Manaus -

Amazonas, Brasil (02º24’ S – 59º44’ O). A reserva encontra-se em uma floresta contínua de

terra firme, onde a vegetação da região é caracterizada como Floresta Ombrófila Densa.

Espécie estudada

Como modelo de estudo, utilizei a espécie Palicourea corymbifera MÜLL. ARG.

(Rubiaceae). Dentre as espécies locais que estavam no período de floração e que possuíam

NEFs, P. corymbifera era a mais abundante e fácil de reconhecer em campo.

Page 303: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

303

Palicourea corymbifera é uma árvore de pequeno porte com inflorescências em forma

de corimbo com flores amarelas e tubulares. Essa espécie pode ser encontrada no interior e

com muita freqüência em borda de florestas (Brito 2000). Selecionei apenas aqueles

indivíduos que se encontravam na borda da floresta ao longo da estrada, onde são comumente

encontrados (Brito 2000).

Coleta de dados

Para avaliar se a presença de formigas diminui os danos causados por pilhadores nas

inflorescências de Palicourea corymbifera, selecionei 10 indivíduos. Os indivíduos tinham

aproximadamente 2,5 m de altura e estavam na beira da estrada, distante pelo menos 10 m um

do outro. Em cada planta, escolhi duas inflorescências de ramos caulinares vizinhos.

Inicialmente (tempo inicial = T0), quantifiquei a porcentagem de botões florais e flores

danificados em cada inflorescência. Removi as formigas de umas das inflorescências. Depois

de remover as formigas, isolei as inflorescências passando graxa na base da inflorescência

para evitar o acesso das formigas nos botões florais e flores. Após 48 h do isolamento das

inflorescências (tempo final = T1), quantifiquei novamente a porcentagem de botões florais e

flores danificadas de cada inflorescências (isoladas e não isoladas).

Para avaliar se as formigas diminuem a perda de botões florais por predadores,

quantifiquei o número de botões florais no T0 e no T1 em inflorescências com formigas e sem

formigas nos 10 indivíduos selecionados de P. corymbifera. Calculei a diferença do número

de botões entre o T0 e T1 em cada inflorescência com e sem formiga. Os botões que se

transformaram em flores do T0 para o T1 foram excluídos da análise.

Para investigar se a presença de formigas altera o número de visitantes florais nas

inflorescências de P. corymbifera , realizei observações diretas nas inflorescências onde

excluí as formigas e nas inflorescências sem exclusão das formigas. Observei no mesmo dia

Page 304: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

304

todos os indivíduos selecionados (n=10). Para cada indivíduo, observei simultaneamente as

inflorescências com e sem formiga durante 20 min entre o horário das 6:00 h até 9:20 h da

manhã, visto que os visitantes florais da espécie focal são mais ativos nesse horário (Silva

2000).

Análise de dados

Para investigar se inflorescências isoladas das formigas apresentam uma maior porcentagem

de botões florais e flores danificadas no T1, utilizei o teste de Análise de Variância (ANOVA)

de Medidas Repetidas. As variáveis dependentes foram a porcentagem de botões florais e

flores danificadas e o tempo de isolamento, enquanto a variável independente foi a presença e

ausência de formigas nas inflorescências. Usei o teste-t pareado para avaliar se inflorescências

sem formigas apresentam uma maior diferença de botões florais perdidos no T1. A variável

dependente foi a diferença de botões florais perdidos e a variável independente a presença e

ausência de formigas nas inflorescências. Para avaliar se inflorescências sem formigas são

mais visitadas por pilhadores e herbívoros de flores, utilizei também o teste-t pareado. A

variável dependente foi número de visitantes florais e variável independente foi a presença e

ausência de formigas nas inflorescências.

Resultados

As inflorescências de Palicourea corymbifera foram visitadas por formigas pertencentes a

quatro gêneros: Azteca, Crematogaster, Dolichoderus e Ectatomma. No entanto, as formigas

encontradas em P. corymbifera não protegeram as inflorescências. No T1, inflorescências com

formigas apresentaram porcentagem de botões florais e flores danificadas (14% ± 24%; média

± DP) similares aquelas encontradas em inflorescências sem formigas (9% ± 12%; média ±

Page 305: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

305

DP; F(1,18)=1,51; p=0,23; Figura1). Adicionalmente, a presença de formigas não diminuiu o

número de botões florais perdidos no T1 (t=0,76, gl=9, p=0,47, Figura 2).

Com formiga Sem formiga-10

-5

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T0

Figura 1. Porcentagem de botões florais e flores danificadas por inflorescências de Palicourea

corymbifera (n=10) submetidas a experimento de remoção de formigas, em estudo

desenvolvido na ARIE do PDBFF, Amazônia Central, Brasil. Os quadrados representam a

porcentagem média de botões florais e flores danificadas e as barras representam o intervalo

de confiança (95%). Os quadrados não preenchidos representam a porcentagem de botões

florais e flores danificadas por inflorescência no T0 e os quadrados preenchidos no T1 para os

mesmos indivíduos de P. corymbifera.

Page 306: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

306

Figura 2. Número de botões florais perdidos após 48 h em inflorescências com e sem

formigas de Palicourea corymbifera (n=10), em estudo desenvolvido na ARIE do PDBFF,

Amazônia Central, Brasil. As linhas conectam os valores dos pares de inflorescências com e

sem formigas em cada indivíduo de P. corymbifera.

Ao investigar a influência das formigas nos visitantes florais de P. corymbifera,

observei no total 30 visitas. Os visitantes observados nas inflorescências estavam distribuídos

dentro das ordens Diptera, Hemyptera, Homoptera, e Hymenoptera. Apenas uma única visita

foi feita por uma ave. Contudo, as formigas não interferiram no número de visitantes florais

em P. corymbifera (t=1,92; gl=9; p=0,08; Figura 3). A média de visitantes em inflorescências

com formigas (1,8 ± 1,4; média ± DP) foi similar às inflorescências sem formiga (1±0,9;

média ± DP).

Page 307: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

307

Figura 3. Número de visitantes florais nas inflorescências com e sem formigas de Palicourea

corymbifera (n=10), em estudo desenvolvido na ARIE do PDBFF, Amazônia Central, Brasil.

A linha conecta os valores dos pares de inflorescências com e sem formigas em cada

indivíduo de P. corymbifera.

Discussão

O fato de Palicourea corymbifera apresentar nectários extraflorais (NEFs) nas inflorescências

e atrair as formigas, não implica em maior proteção contra herbívoros florais e pilhadores. É

provável que as formigas apenas utilizam o recurso oferecido pela planta, sem defendê-las dos

visitantes florais antagônicos. Tal fato pode estar associado com a riqueza de espécies de

formigas que visitam P. corymbifera.

Grupos de formigas apresentam eficiência distinta no recrutamento e na agressividade

quando expostas aos seus inimigos naturais (Ness et al. 2006). As espécies de formigas que

patrulharam as inflorescências de P. corymbifera eram todas de hábito alimentar onívoro, mas

com diferentes estratégias de forrageio. Formigas do gênero Ectatomma são caracterizadas

Page 308: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

308

por forragear solitariamente, enquanto os gêneros Azteca, Crematogaster e Dolichoderous.

forrageiam por recrutamento (Hölldobler & Wilson 1990). Essas espécies raramente ocorrem

no mesmo indivíduo e podem variar no número de indivíduos presentes nas inflorescências de

acordo com o dia (observações pessoais). Sendo assim, provavelmente, tanto a substituição de

espécies de formigas entre os indivíduos de P. corymbifera como a diferença de

comportamento e agressividade das formigas, pode resultar na variação de respostas aos

danos encontrados nas inflorescências.

Como a interação de plantas com NEFs e formigas é um evento que envolve muitos

indivíduos da mesma colônia de formigas, interagindo com a mesma planta, o benefício

adquirido pela planta depende da quantidade de formigas (Ness et al. 2006). A maioria das

espécies de formigas encontradas em P. corymbifera forrageia por recrutamento. A eficiência

dessa estratégia depende do número de indivíduos envolvidos (Ness et al. 2009). Nesse

sentido, uma das possíveis razões por não ter encontrado diferença no número de visitantes

florais em inflorescências com e sem formigas, pode estar associado a quantidade de formigas

patrulhando as inflorescências. Se formigas operárias ocorrem em baixa densidade nas

inflorescências, estas podem não se tornar ameaças aos herbívoros florais e/ou pilhadores.

Esses animais geralmente são maiores e apresentam uma fuga rápida em relação ao ataque das

formigas “guardiãs” quando em poucos indivíduos.

Apesar de vários trabalhos terem documentado os benefícios das formigas para as

plantas com NEFs em relação à produção de flores, frutos e sementes (Oliveira et al. 1987,

Rodrigues et al. 2004, Leal et al. 2006), estas podem não atuar como boas protetoras contra

herbívoros florais e pilhadores. Portanto, a defesa biótica conferida às plantas com NEFs pode

depender das espécies de formigas e também dos atributos reprodutivos da planta que elas

defendem.

Page 309: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

309

Agradecimentos

Agradeço aos organizadores do EFA, pela oportunidade de participar no curso e contribuir

para minha formação como futura pesquisadora. Aos coordenadores, Paulinho (Rainbow

Master) e Paulinho Mau, por todos os incentivos e conversas. Às bonitoras Laura (Luizão) e

Manô (Ursinho) pelos auxílios na correção dos relatórios e pela companhia durante os

trabalhos em campo. Sem vocês não seria a mesma coisa! Novamente, agradeço ao Paulinho

Mau, pela sua paciência em me ensinar. A Ana e a Manô pela revisão do meu relatório. Ao

seu Cardoso pela companhia durante o campo e pelas histórias aventureiras. Ao seu Jorge e

dona Eduarda pela preocupação constante com meu bem estar e pelas comidas deliciosas.

Agradeço em especial também, a Fofuxa Pantaneira (Karlinha), Marilaqui (Fernandinha) e

Ninfobaby (Raulzito) pelas contribuições para a realização do meu trabalho. E por fim, mas

não finalmente, agradeço aos meus colegas efanos, pelos bons momentos, conversas e risos

durante os 30 dias. Essa etapa com certeza será inesquecível em minha vida!

Referências

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em diferentes habitats de florestas de terra firme da Reserva do km 41, Amazônia

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Page 312: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

312

O que determina a escolha de locais de caça por aranhas pescadoras (Trechaleidae)?

Thiago Belisário d’Araújo Couto

Introdução

Indivíduos podem selecionar habitats específicos que aumentem sua eficiência de forrageio e,

conseqüentemente, sua aptidão (Morris 2003). Para predadores do tipo senta-e-espera, a

escolha do substrato pode ser um aspecto fundamental para determinar a eficiência de captura

de presas (Morse 2006). Como o sucesso da estratégia senta-e-espera depende da

aproximação da presa, organismos que utilizam esse tipo de estratégia necessitam de

mecanismos muito eficientes para escolher sítios de caça.

Além do tipo de substrato, a colonização de locais de caça também pode depender do

estabelecimento prévio de outros indivíduos. Portanto, a possibilidade de selecionar locais

mais eficientes de caça tende a se tornar menor com o aumento da densidade populacional

(Rosenzweig 1981). Ainda, a competição por melhores locais pode depender do tamanho dos

competidores. Competidores maiores e mais experientes tendem a ser mais eficientes na

escolha dos melhores locais, uma conseqüência do incremento da habilidade de procura e

manipulação de presas com a experiência adquirida (Mittelbach 1981). Além da capacidade

de escolha, indivíduos maiores tendem a ser mais competentes na defesa do território (Arnott

& Elwood 2009) e, conseqüentemente, possuem maior tendência de permanecer em locais

com mais recursos.

Aranhas da espécie Trechalea sp. (Trechaleidae) são predadoras que caçam usando

estratégia do tipo senta-e-espera e forrageiam preferencialmente em substratos próximos a

pequenos riachos como rochas, troncos e vegetação arbustiva (Silva et al. 2005). Indivíduos

dessa espécie utilizam as pernas posteriores para se ancorarem em substratos próximos aos

riachos e estendem as pernas anteriores sobre a superfície da água para caçar invertebrados,

Page 313: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

313

anfíbios e peixes (Silva et al. 2005, Costa-Pereira et al. 2010). Nesse sistema, é possível que

em superfícies pouco inclinadas em relação à lâmina d’água dificultem a visualização da

presa por refração e, assim, tenham influencia no sucesso de captura. Além disso, a inclinação

da superfície pode ser determinante para a estabilidade do local de caça, pois variações no

nível da água podem deixar os pontos de caça parcial ou totalmente submersos. Elevações

equivalentes do nível da água tendem a submergir maiores áreas foliares de ambientes menos

inclinados, considerando folhas da mesma forma. Além das possíveis vantagens do ângulo da

superfície utilizada para a caça, maiores velocidades de corrente podem aumentar o fluxo de

presas, aumentando a taxa de captura de determinados locais de caça.

Uma vez que indivíduos de Trechalea sp. são abundantes nas margens de riachos na

Amazônia, é possível que eles selecionem locais de caça e compitam por eles. Portanto, meu

objetivo nesse estudo é i) entender qual característica do hábitat que indivíduos de Trechalea

sp. utilizam para selecionar áreas de caça e ii) avaliar se há competição intraespecifica de

Trechalea sp. na escolha de áreas de caça. Tenho como hipóteses que i) as aranhas escolhem

locais com melhor posicionamento para a caça e que ii) indivíduos competem para se

estabelecer nos melhores locais de caça.

Métodos

Área de estudo

Realizei as coletas em um riacho de terra-firme de segunda ordem (localmente conhecido

como igarapé) localizado no km 41, Fazenda Esteio, pertencente à Área de Relevante

Interesse Ecológico do Projeto de Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (ARIE

PDBFF). A ARIE está localizada a 80 km ao norte de Manaus (2°24’S; 59°44’O) e abrange

uma área de aproximadamente 10.000 ha de floresta ombrófila densa (Bruna et al. 2004).

Page 314: Curso de campo ecologia da Amazonia 2011

314

Coleta de dados

Coletei 20 indivíduos de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae), entre 23:00 e 01:00 h, em

folhas nas margens do igarapé. Considerei como possíveis locais de caça, apenas as folhas

próximas à superfície da água. Mensurei a velocidade local de corrente (VLC) e o ângulo da

superfície foliar (ASF) em relação à superfície da água para cada local de caça utilizado pelas

aranhas. Calculei a VLC como o tempo médio percorrido por um objeto flutuante pela

distância de 23 cm por três vezes. Para medir o ASF, considerei a superfície da água como

ângulo zero e utilizei um transferidor. Como a aranha pode se posicionar tanto na face abaxial

quanto adaxial da folha, eu considerei a folha perpendicular a superfície da lâmina d’água

como ângulo máximo (i.e. 90°). Isso porque folhas com mais de 90°, pela possibilidade de

transitar entre as superfícies adaxial e abaxial, possuem a mesma funcionalidade como

superfície para caça para a aranha que folhas com o ângulo inferior correspondente (e.g. 60° e

120º).

Para comparar o ASF entre locais com e sem aranhas, também medi a angulação em

relação à superfície da folha sem aranha que se encontrava mais próxima da folha ocupada

pela aranha. Entre 22:30 e 00:00 h da noite posterior a noite de coleta, coletei as novas

aranhas colonizadoras nas mesmas folhas ocupadas pelas aranhas residentes removidas na

noite anterior. Em laboratório, pesei as aranhas residentes e as colonizadoras de cada folha

com a balança AWS® miniPRO.

Análise de dados

Para testar se aranhas selecionam habitats com ângulos mais próximos a 90°, utilizei uma

regressão logística. Porém, para manter o pareamento dos dados na análise, fiz uma

transformação com base na diferença de ângulos entre os pares de folhas da mesma planta.

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315

Dos 20 pares, sorteei 10 que receberam código 1 e 10 que receberam código 0. Considerei a

folha com aranha como folha focal para os pares 1 e a folha sem aranha como focal para os

pares 0. Para cada par, subtrai o valor do ângulo da folha focal do valor da folha não focal. Se

as aranhas selecionam folhas mais perpendiculares em relação à lâmina d’água, eu espero que

pares de folhas com denominação 1 apresentem diferenças positivas entre ângulos e pares de

folha 0 tenham diferenças negativas.

Utilizei regressão linear simples para testar a relação do peso da aranha com a VLC e

entre o peso da aranha com o ASF. Para testar a probabilidade da aranha colonizadora ser

menos pesada que a aranha residente, utilizei uma análise semelhante a utilizada para testar se

aranhas selecionam habitats com ângulos mais próximos a 90°. Da mesma maneira, sorteei

quais seriam os pares com denominação 1 e pares 0. Calculei a diferença de massa dos

residentes e colonizadores para pares 1 e a diferença de massa dos colonizadores e residentes

para os pares 0. Utilizei uma regressão logística para testar a probabilidade do indivíduo focal

ser residente em relação a diferença de peso para o individuo não focal. Se a competição

intraespecífica é importante na seleção de locais de caça, eu espero que I) aranhas mais

pesadas selecionem locais de caça com maior velocidade de correnteza, II) aranhas mais

pesadas ocupem superfícies mais perpendiculares à lâmina d’água e III) aranhas

colonizadoras tenham menor massa que as residentes removidas.

Resultados

O ângulo das superfícies utilizadas pelas aranhas foi de 63,2±23,2° (média±desvio padrão) e

das superfícies não utilizadas de 54,2 ±23,5°. A velocidade média de corrente foi de

0,13±0,07 cm/s. A massa das aranhas residentes foi de 0,09±0,05 g e das aranhas

colonizadoras de 0,09±0,06 g. Houve maior ocupação dentro do par por superfícies mais

verticais em relação à superfície da água que superfícies mais inclinadas (χ²=4,79; gl=1;

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p=0,03; Figura 1). Não houve relação do peso das aranhas com o VLC (r²=0,01; F(1, 18)=0,27;

p=0,61; Figura 2A) ou com o ASF (r²=0,02; F(1, 18)=0,31; p=0,58; Figura 2B). Aranhas

colonizadoras não foram menos pesadas que as residentes (χ ²=0,08; gl=1; p=0,78; Figura 3).

Durante a procura das aranhas, observei a presença da estrutura refletora, denominada

tapetum lucidum, nos olhos dos indivíduos de Trechalea sp.

Figura 1. Probabilidade da folha focal conter uma aranha da espécie Trechalea sp.

(Trechaleidae) em relação à diferença angular entre cada par de folha focal e folha não focal

nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.

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Figura 2. Relação da massa de indivíduos de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae) com A)

velocidade local de corrente (VLC) e com B) o ângulo da superfície foliar (ASF) do local de

caça nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.

Figura 3. Probabilidade do indivíduo focal de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae) ser

residente da folha em relação à diferença de massa (g) entre os indivíduos focal e não focal

nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.

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Discussão

A utilização de superfícies, incluindo as verticais, para caça por aranhas da família

Trechaleidae já foi descrita (Silva et al. 2005). Porém, este é o primeiro trabalho que relata a

preferência das aranhas dessa família por superfícies verticais para caça. Sugiro duas

possíveis explicações não excludentes para essa preferência. Primeiro, substratos mais

verticais podem ser mais eficientes para capturar presas que se movimentam abaixo da

superfície da água em decorrência da refração da luz. Isso porque quanto mais perpendicular o

observador estiver em relação à superfície da água, menor o desvio da imagem do objeto

submerso (F. Rezende, comunicação pessoal). Essa explicação pode ser válida mesmo

considerando que Trechalea sp. cace no período noturno, pois a presença de tapetum lucidum

nessas aranhas é uma evidência de que a visão é um sentido importante para a captura de

presas. Essa estrutura otimiza a visão durante a noite e é característica de organismos que

vivem em ambientes com escassez de luz. A segunda explicação seria que pequenas variações

naturais do nível dos igarapés podem favorecer o ancoramento das pernas posteriores em

superfícies perpendiculares em relação à água. Para uma mesma variação no nível da água, há

uma tendência de maior submersão de superfícies mais inclinadas. Logo, locais de caça mais

perpendiculares seriam preferencialmente selecionados por serem mais estáveis.

Os resultados das relações da massa das aranhas com o ASF e com o VLC e da massa

dos indivíduos residentes e colonizadores indicam que não existe competição intraespecífica

pelas áreas de caça. Considerando que as aranhas selecionam superfícies mais verticais, a

ausência de relação da massa das aranhas com o ASF é um forte indício de que a competição

não é um fator que exerça grande influência na escolha das áreas de caça. Assim, é provável

que locais de caça com superfícies verticais não sejam um recurso limitante. Quanto ao VLC,

é possível que a disponibilidade de presas não varie em relação às diferentes velocidades de

corrente observadas. Como aranhas caçadoras possuem, em geral, dieta generalista (Nyffeler

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1999), é possível que elas encontrem presas independentemente da velocidade de corrente.

Apesar de algumas variações no uso do ambiente, presas potenciais das aranhas podem ser

encontradas tanto em remansos, quanto em trechos com correnteza (Bűhrnheim & Cox-

Fernandes 2003, Nessimian et al. 2008).

Apesar da seleção por habitats mais favoráveis ter grande importância para aumentar a

aptidão dos organismos, a competição entre aranhas da espécie Trechalea sp. pelos melhores

locais de caça pode não ocorrer em ambientes onde o recurso não é limitante. Assim, mesmo

competidores ruins, como indivíduos menores e mais jovens, podem utilizar habitats mais

favoráveis para forragear quando sua disponibilidade é alta.

Agradecimentos

Agradeço ao PDBFF pela estrutura do curso EFA 2011, ao Paulo Enrique (Ofuscado) pela

sugestão de projeto, auxílio no delineamento amostral e revisão do manuscrito, ao Raul

Pereira (Zé Bonitinho) pelo auxílio nas coletas e pelas válidas sugestões para o trabalho, à

Ana Meiga (Japa) pelo auxílio nos procedimentos de laboratório, ao Paulo Estefano

(Marilaki) pelas sugestões, ao Fernando Rezende (Ortigossa) pelas aulas de física de 2° grau,

à Camila Pagotto (Misstrago) pela ajuda no antigo projeto frustrado e à Laura Leal (3/4) pela

revisão do manuscrito e auxílio no projeto anterior, frustrado.

Referências

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Behaviour, 77:991-1004.

Bruna, E.M., D.M. Lapola & H.L. Vasconcelos. 2004. Interspecific variation in the defensive

responses of obligate plant-ants: experimental tests and consequences for herbivory.

Oecologia, 138:558-565.

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320

Bűhrnheim, C.M. & C. Cox-Fernandes. 2003. Structure of fish assemblages in Amazonian

Rain-Forest streams: effects of habitats and locality. Copeia, 2:255-262.

Costa-Pereira, R., F.I. Martins, E.A. Sczesny-Moraes & A. Brascovit. 2010. Predation on

young treefrogs (Osteocephalus taurinus) by arthropods (Insecta, Mantodea and

Arachnida, Araneae) in Central Brazil. Biota Neotropica, 10:469-472.

Mittelbach, G.G. 1981.Efficiency and body size: a study of optimal diet and habitat use by

bluegills. Ecology, 62:1370-1386.

Morris, D.W. 2003. Toward an ecological synthesis: a case for habitat selection. Oecologia,

136:1-13.

Morse, D. 2006. Fine-scale substrate use by a small sit-and-wait predator. Behavioral

Ecology, 17:405-409.

Nessimian, J.L., E.M. Venticinque, J. Zuanon, P. De Marco Jr, M. Gordo, L. Fidelis, J. D’arc

Batista & L. Juen. 2008. Land use, habitat integrity, and aquatic insect assemblages in

Central Amazonian streams. Hydrobiologia, 614:117-131.

Nyffeler, M. 1999. Prey selection of spiders in the field. Journal of Arachnology, 27:317-324.

Rosenzweig, M.L. 1981. A theory of habitat selection. Ecology, 62:327-335.

Silva, E.L.C., J.B. Picanço & A.A. Lise. 2005. Notes on the predatory behavior and habitat of

Trechalea biocellata (Araneae, Lycosoidea, Trechaleidae). Biociências, 3:85-88.