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8/10/2019 Contra o Calvinismo Roger Olson.pdf http://slidepdf.com/reader/full/contra-o-calvinismo-roger-olsonpdf 1/285 Roger Olson Contra o Calvinismo Prefácio de Michael Horton

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Contra o

Calvinismo

Prefácio de Michael Horton

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Contra ο 

Calvinismo

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Roger Olson

Contra o

Calvinismo

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Sumário

Prolusão (por Michael Horton) 9

Prefácio 15

1. Introdução: Por que este livro agora? 21

2. Calvinismo de quem? Qual teologia reformada? 39

3. Calvinismo puro e simples: O sistema TULIP 59

4. Sim para a soberania divina; não para 0 determinismo divino 109

5. Sim para a eleição; não para a dupla predestinação 159

6. Sim para a expiação; não para a expiação limitada/ redenção particular 211

7. Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo 241

8. Conclusão: Os enigmas do calvinismo 271

Apêndice 1. Tentativas calvinistas de resgatar a reputação de Deus 281

Apêndice 2. Respostas às alegações calvinistas 293

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Prolusão(por Michael Horton)

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O LIVRO DE ROGER OLSON Contra 0  Calvinismo  representa uma

apresentação e defesa contemporânea do arminianismo evangélico que

não apenas merece, mas que também exige uma leitura cuidadosa e

simpática da parte dos não arminianos.

O Roger está correto ao afirmar que atualmente está cada vez mais

difícil saber o significado do termo “reformado”. Principalmente nos EUA

onde todos gostam de selecionar e escolher os aspectos do credo de

alguém, soa arrogante dizer à outras pessoas que elas não são, na ver-

dade, reformadas caso sustentem visões que difiram substancialmente

de nossas confissões e catecismos. Entretanto, como outras tradições

confessionais, o ensino reformado é determinado por uma confissão

comum de cristãos em igrejas reais, não pelas ênfases de certos ensi-

nadores ou movimentos populares. Os credos e confissões não falam por nós; nós falamos como igrejas através deles e com  eles. Portanto, os

não calvinistas deveriam avaliar estas sínteses e os sistemas doutrinários

que são consistentes com eles em vez de depender de apresentações

idiossincráticas.

No que diz respeito às doutrinas da graça, nossas confissões rejei-

tam tanto o hipercalvinismo quanto o arminianismo. Além do mais, ateologia do pacto — incluindo 0 batismo de filhos do pacto e o governo

eclesiástico presbiterial [representativo] liderado por ministros e presbí

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Contra 0 Calvinismo

teros — pertencem à nossa confissão comum juntamente com o famoso

acróstico TULIP. A gloriosa graça de Deus é tão evidente quanto nossa

 visão de batismo e a Ceia do Senhor mais como meios de graça do que

como atos meramente humanos de comprometimento e lembrança.Para as igrejas Reformadas e Presbiterianas confessionais, a adoração

regulamentada, ministério, missões, e disciplina embasados na Escritura

é tão fundamental para glorificar e desfrutar de Deus quanto a doutrina

da eleição ou justificação.

Mas este desafio é uma faca de dois gumes. Embora a maioria dos ar-

minianos não possua uma confissão comum ou um conjunto de padrões

doutrinários, existem claramente representações padrões de, ao menos,

convicções arminianas evangélicas. Roger Olson lida efetivamente com

as caricaturas, desafiando as concepções errôneas. Se a crítica popular

contra 0 calvinismo frequentemente gira em torno de equívocos ou re-

presentações exageradas, então os calvinistas também deveriam sentir

empatia pelos arminianos por possuírem entendimento de causa quando

estes são, por exemplo, acusados de serem “pelagianos”, que negam a

graça em favor de obras de justiça.

Nenhum de nós está imune da tentação das acusações falsas, mas Roger

e eu concordamos que tem havido muito mais discussões improdutivas

do que avanços nos debates entre calvinismo e arminianismo. Nenhum

de nós sucumbe à ilusão de que ambos [sistemas soteriológicosj repre-

sentam verdades parciais que possam ser equilibradas em uma mesclaharmoniosa e sem contradições. “Calminianismo” não existe. Onde estas

duas posições clássicas colidem, o Roger é um arminiano genuíno e eu

estou muito convencido que a Escritura ensina 0 que é infelizmente ape-

lidado de “calvinismo”. Todavia, concordamos que nada se ganha — na

 verdade, muito se perde — ao representarmos erroneamente as visões

um do outro. Uma coisa é dizer que alguém defende certa visão sendo

que a mesma é explicitamente rejeitada e outra coisa é argumentar que

a visão leva, em termos lógicos, à determinada conclusão. É exatamente

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Contra o Calvinismo

Também partilho da avaliação do Roger da situação de muitas coisas

no evangelicalismo moderno. Muito além do arminianismo, ele sustenta,

as prem issas pelagianas parecem prevalecer de maneira espantosa. Ele

concorda que o “Cristianismo sem Cristo” está “simplesmente impreg-nado na vida eclesiástica estadunidense”. Quando amigos arminianos

como Tom Oden, William Willimon e Roger Olson desafiam este esta-

do geral das coisas ao passo que alguns pregadores que se professam

reformados vendem seu direito de primogenitura por um mortal prato

de lentilha de religião popular, nossas diferenças — embora importan-

tes — são colocadas na perspectiva correta. Não tenho dúvidas de que

 Jacó Armínio ou João Wesley ficariam tão ofendidos quanto 0 Roger em

relação ao que atualmente e com frequência é apresentado erroneamente

como “arminianismo” em muitos círculos.

Sou grato ao Roger pela imparcialidade, paixão e a argumentação

informada que este livro representa. No final das contas, Roger e eu

partilhamos da concordância mais importante: que as questões vitais

envolvidas aqui ou em outro debate devem ser trazidas ao escrutínio da

Escritura. Ambos acreditamos que a Escritura é clara e suficiente, mesmo

se formos confusos e fracos. Somos todos peregrinos no caminho, ainda

não fazemos parte daqueles que chegaram ao nosso glorioso destino.

 Apenas ao nos esforçarmos mais e mais para dialogarmos uns com os

outros como coerdeiros com Cristo em vez de tratarmos uns aos outros

como adversários é que poderemos lidar com sérias discordâncias — ecom 0 anseio de que também podem os nos surpreender com as praze-

rosas concordâncias durante 0  caminho.

MICHAEL HORTON

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Prefácio

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ESCREVO ESTE LIVRO com relutância; polêmica não é o meu estilo

preferido de assuntos acadêmicos. O que quero dizer é que preferiria

proclamar o que sou a favor   a denunciar o que eu sou contra.  Valorizo

a abordagem conciliadora à teologia e espero ser contra 0  calvinismo

o mais conciliador possível. Quero deixar claro “desde 0  início” que eu

não sou contra os calvinistas. Muitos de meus parentes são calvinistas

e eu os amo profundamente. Embora minha família imediata não fosse

teologicamente desta persuasão, sabíamos que nossos familiares eram

tão cristãos quanto nós éramos. Ainda acredito que este seja 0  caso;

uma pessoa pode ser maravilhosamente salva e tão dedicada quanto

um cristão possivelmente pode ser e ser calvinista. Deixe-me repetir:

não sou contra os calvinistas.

Estou bastante cônscio, entretanto, de quão difícil pode ser separar

a visão que alguém tem de sua auto-estima das crenças defendidas

apaixonadamente por alguém. Espero que minha tia Margaret não role

no túmulo quando este livro for lançado! E oro para que meus primos

e amigos calvinistas não se sintam ofendidos. Tento 0 máximo possível

fazer separação entre minha pessoa e minha teologia a fim de aceitarcríticas à minha teologia sem se tornar pessoalmente defensivo. Só posso

esperar e orar que meus amigos e familiares calvinistas façam 0 mesmo.

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Contra o Calvinismo

Esta esperança por uma audiência imparcial requer que eu seja

escrupulosamente justo em meu tratamento do calvinismo. Esta é a

intenção deste livro. Prometo oferecer meu melhor na representação do

calvinismo assim como os próprios calvinistas o representariam — semdistorção ou caricatura. Prometo não criar um espantalho que seja facil-

mente destroçado e queimado. Meu lema é: “Antes de dizer ‘eu discordo’ ,

certifique-se de que possa dizer ‘eu entendo”’. Outro princípio que tento

seguir é: “Sempre represente 0 ponto de vista alheio da maneira como

os melhores proponentes do mesmo 0 descreveriam”. É desta forma que

quero que eu o meu arminianismo seja tratado e prometo dar 0 melhorde mim para que este seja 0  tratamento dispensado ao calvinismo.

Considero os calvinistas meus irmãos e irmãs em Cristo e me en-

tristeço por ter que escrever contra a teologia destes meus irmãos, pois

ela possui uma história e tradição ricas. Confesso que 0  calvinismo,

que estudei a partir de suas fontes primárias-(de Calvino, passando por

 Jonathan Edwards e chegando a John Piper e inúmeros outros teólogos

reformados entre eles) possui muitos aspectos positivos. Como muitos

calvinistas gostam de enfatizar, o calvinismo (ou teologia reformada) não

está reduzido às doutrinas popularmente associadas a ele — depravação

total, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível e per-

severança dos santos (TULIP). Alguns destes pontos (principalmente os

três pontos do meio) são crenças que criticarei neste livro. Entretanto,

o pensamento reformado, no geral, transcende tais pontos e é parte deum todo maior do qual a TULIP é apenas uma parte. Quão essenciais

estes cinco pontos são para a teologia reformada é algo muito debatido

tanto pelos próprios calvinistas quanto por outros.

Meu objetivo aqui é simplesmente admitir que quando eu disser que

“sou contra o calvinismo” que estou apenas me referindo a determina-

dos aspectos da teologia reformada e não a tudo quanto ela representa.Em virtude da tradição reformada (talvez muito diferente de algumas

de suas doutrinas contestáveis) ser cristocêntrica, eu a considero parte

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Prefácio

da rica diversidade do cristianismo clássico. Posso e realmente adoro a

Deus ao lado de calvinistas sem me sentir incomodado.

Caso alguém precise de mais persuasão acerca desta questão, quero

enfatizar que trabalhei e adorei a Deus ao lado de calvinistas em trêsuniversidades cristãs e várias igrejas (Batista e Presbiteriana) durante os

últimos trinta anos sem dificuldade. Votei a favor da contratação de pro-

fessores calvinistas e também para que tivessem estabilidade acadêmica.

Não tenho problemas com calvinistas sendo cristãos genuínos, acadêmi-

cos e professores cristãos fiéis. Sei, de primeira mão, que geralmente eles

são fiéis. Admito que fico ofendido com alguns calvinistas. Estes são os

que consideram sua teologia o único cristianismo (ou evangelicalismo)

autêntico e que interpretam erroneamente outras teologias que não a

sua — principalmente o arminianismo. Infelizmente, especialmente

nos últimos anos, eu tenho encontrado estas características com muita

facilidade entre os “novos calvinistas”.

 Alguns leitores podem questionar minhas credenciais para escrever

acerca do calvinismo. Permita-me reafirmá-las. Por inúmeros motivos eu

me considero apto para escrever imparcial e precisamente sobre uma

teologia que eu discordo. Lecionei teologia histórica em três universida-

des cristãs por quase trinta anos. Estudei Calvino, Jonathan Edwards e

outros teólogos reformados no seminário e na pós-graduação e sempre

exigi que meus alunos os lessem como parte de sua formação nos cursos

de teologia histórica. Também me esforcei para convidar “calvinistasrígidos” (os comprometidos com todo o esquema da TULIP) para fala-

rem e interagirem em minhas aulas. Li as Institutas da Religião Cristã de

 João Calvino assim com o também li os tratados de Jonathan Edwards

cuidadosamente e com extrema atenção para que a leitura não fosse

preconceituosa.

Estou muito bem familiarizado com o maior proponente contempo-

râneo do calvinismo — John Piper — e li muitos de seus livros. Estudei

os escritos de vários outros calvinistas, incluindo Charles Hodge, Loraine

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Contra o Calvinismo

Boettner, Louis Berkhof, Anthony Hoekema, R. C. Sproul e Paul Helm.

Participei de conferências teológicas calvinistas, contribui com publi-

cações calvinistas, me ocupei com diálogos longos com pensadores

reformados e publiquei um importante livro-texto de teologia históricaque lida profundamente com a teologia reformada.

Meu conhecimento do calvinismo e da teologia reformada é mais

do que algo passageiro. Tornou-se uma paixão — e não apenas com a

intenção de refutá-lo. Meu estudo de fontes reformadas tem enriqueci-

do grandemente minha vida teológica e espiritual. Não reivindico ser

um especialista em calvinismo, mas defenderei minha habilidade de

descrevê-lo e avaliá-lo embasado em estudo meticuloso de suas fontes

primárias tanto arcaicas (século XVI) quanto contemporâneas. Espero e

anseio que calvinistas bem informados considerem minhas descrições

aqui justas, se não profundas.

Desejo agradecer inúmeras pessoas por suas ajudas inestimáveis

na realização desta publicação. Todos os calvinistas que me ajudaram

involuntariamente ao simplesmente responderem minhas indagações e

por participarem comigo em diálogos teológicos. Não havia subterfúgio

da minha parte; a ideia deste livro foi posterior a muitos destes eventos.

Primeiramente eu quero agradecer ao Michael Horton, editor da revista

 Modem Reformation   e um astuto acadêmico, que graciosamente con-

 versou (às vezes debateu) comigo acerca destes assuntos durante vários

anos. Aprendi muito com ele. Também quero agradecer meus amigoscalvinistas da igreja Redeemer Presbyterian Church  de Waco, Texas, e

da Reformed University Fellowship  local. Eles nobremente aguentaram

minhas despreocupadas interferências quando estes falavam com meus

alunos e sempre me corrigiram meus erros de maneira cordial. Por fim,

quero agradecer a muitos de meus alunos calvinistas que cursaram disci-

plinas comigo apesar de conhecerem muito bem acerca de meus receios

em relação à teologia reformada e que frequentemente contribuíram

com 0  meu entendimento concernente a sua tradição de fé.

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Introdução

Por que este 

livro agora?

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LOGO APÓS EU COMEÇAR a lecionar teologia, um jovem aluno an-

sioso me seguiu até minha sala e pediu para conversar comigo a sós.

Sem hesitar eu 0  convidei a sentar ao lado de minha mesa e pedi para

que ele dissesse o que se tratava. Ele se inclinou em minha direção e

com um semblante sério disse: “Professor Olson, não acredito que 0

senhor seja cristão”. Não é preciso dizer que eu fiquei, de certa forma,desconcertado.

“Por que está me dizendo isto?”, indaguei.

“Porque o senhor não é calvinista”, foi sua resposta.

Perguntei de onde ele havia tirado essa ideia de que apenas um

calvinista possa ser um cristão e ele me deu 0 nome de um pastor pre-

eminente e autor cuja igreja tornou-se famosa mundialmente por sua

promoção do calvinismo rígido. Encorajei meu aluno a conversar com

seu pastor acerca deste assunto e confirmei minha confiança em ser

cristão em virtude de minha fé em Jesus Cristo. O aluno jamais retirou

sua acusação de que eu não era cristão. Anos mais tarde, entretanto, o

pastor deveras negou ter alguma vez ensinado que apenas calvinistas

poderiam ser cristãos.

Este foi, por assim dizer, a primeira salva (de tiros) em meu longoembate com o “novo calvinismo” celebrado pela revista Time (12 de maio

de 2009) como uma das dez maiores ideias mudando 0  mundo “agora

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Contra o Calvinismo

mesmo”. Meu aluno acusador foi um dos primeiros de um movimento

de uma geração de cristãos denominado “jovem, incansável e reforma-

do”. Naquela época tudo 0 que eu sabia era que meus melhores e mais

inteligentes alunos de teologia estavam gravitando em direção ao calvi-nismo sob a influência do pastor que 0 aluno havia mencionado. Muitos

dos docentes em nossa instituição os chamavam de “crias do Piper”.

Mas esta tribo estava destinada a aumentar durante os anos sequentes.

O FENÔMENO JOVEM, INCANSÁVEL E REFORMADO

Em 2008 o jornalista cristão Collin Hansen publicou a primeira ex-ploração de proporções de livro de um fenômeno que a maioria dos

líderes cristãos evangélicos estavam discutindo: Young, Restless, Refor- 

med: A Journ alist ’s Journe y with the New Calvinists (Jovem, Incansável e 

Reformado: A Jornada de um Jornalista com os Novos Calvinistas   As

raízes deste movimento estão bem alicerçadas na história protestante.

O calvinismo, claro, oriunda seu'nome do reformador protestante João

Calvino (1509 - 1564), cujo aniversário de quinhentos anos [de nasci-

mentojfoi recentemente comemorado ao redor da América do Norte

com conferências e eventos de admiração dedicados a sua memória. Um

incentivador mais recente foi 0  pregador puritano, teólogo e educador

 Jonathan Edwards (1703 - 1758), da Nova Inglaterra, que notoriamente

defendeu uma versão da teologia de Calvino contra o que ele enxergava

como0

  crescente racionalismo do deísmo em seus dias. Um aspecto

aparente do movimento jovem neo-calvinista (não confinado apenas

aos jovens) é a popularidade de camisetas com estampas do rosto de

 Jonathan Edwards com 0  lema: Jonathan Edwards is my homeboy (Jo- 

nathan Edwards é meu parceiro).

Um catalisador contemporâneo do movimento é o pastor batista de

Mineápolis, autor e conferencista popular John Piper (η. 1946), cujos inú

 . Collin Hansen,Young , Restless, Reformed: A Journalist’sJourney with the New Calvinists  

(Wheaton, IL: Crossway, 2008).

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Por que este livro agora?

meros livros teológicos são excepcionalmente fáceis de ler e acadêm icos

— uma rara combinação. Seu livro Em Busca de Deus (Teologia da Alegria)2 

perde apenas para a Bíblia em termos de inspiração e autoridade para

muitos dos cristãos jovens, incansáveis e reformados que avidamentedevoram os livros e os sermões de Piper (facilmente encontrados online).

Piper fala para grandes públicos em conferências jovens nas “Passion

Conferences” e eventos “One Day” — às vezes atingindo um número

de quarenta mil pessoas com menos de vinte e seis anos. O que muitos

de seus seguidores desconhecem é algo que 0  Piper não esconde de

ninguém — que ele está simplesmente tornando mais atraente a teo-

logia calvinista de Jonathan Edwards para a juventude contemporânea.

(A leitura dos escritos de Edwards pode ser difícil!)

Para leitores não familiarizados com este “novo calvinismo” (ou tal-

 vez até mesmo com 0 próprio calvinismo), eu apresentarei a concisa e

hábil descrição do jornalista Hansen. (Uma explicação mais completa do

calvinismo e da teologia reformada será desenvolvida durante o curso

deste livro). De acordo com Hansen:

Calvinistas — que recebem 0  nome do teólogo reformador João

Calvino — enfatizam que a iniciativa, soberania e poder de Deus são a

única esperança inquestionável para os seres humanos pecam inosos,

instáveis e moralmente fracos. Além do mais, eles ensinam que a

glória de Deus é 0 tema último da pregação e a ênfase da adoração 3.

 Além disso, Hansen explica : “o calvinismo estim a muitíssimo atranscendência que extrai temas bíblicos tais como a santidade, glória

e majestade de Deus”4. Mas se estas fossem as únicas ênfases do novo

calvinismo (ou o velho calvinismo, tratando-se desta questão), poucos

cristãos protestantes evangélicos sinceros fariam questão de discutir com

2. PIPER, John. Em busca de Deus: a plenitude da alegria cristã. Tradução de Hans Udo 

Fuchs. 2. ed. São Paulo: Shedd, 2008.

3. Hansen, Young, Restless, Reformed,  5.

4. Ibid., 2 .

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Contra 0 Calvinismo

esse sistema. Quais cristãos evangélicos negam os atributos citados? Para

Hansen e as pessoas a quem ele estuda, todavia, tal pode ser uma questão

de destaque. De acordo com ele, os novos calvinistas estão reagindo ao

que ele considera um esm orecimento geral da teologia e, principalmente,da ênfase na glória de Deus na vida eclesiástica estadunidense contempo-

rânea. Seus objetos de estudo, ele diz, estão reagindo contra a “teologia

do bem-estar” de muitas igrejas evangélicas contemporâneas 5.

Hansen está se referindo a estudos sociológicos dos jovens cristãos

que classificam a visão padrão de Deus como “Deísmo Terapêutico

Moralista” 6 — um termo sofisticado para descrever uma visão de Deus

como uma figura de um avô no céu que exige perfeição, mas que, no

final, sempre perdoa. Este “Deus” é tanto um juiz quanto um coach  de

autoestima. Ele não pode ser agradado, mas sempre perdoa. Esta é

uma visão fraca e diluída de Deus pelos padrões cristãos históricos e

muitos jovens cristãos se deram conta disto e se voltaram para a única

alternativa que lhes estava disponível — as robustas e espessas doutrinas

do calvinismo.Como um professor experiente de faculdades cristãs e de univer-

sitários cristãos eu aceito esta crítica feita a muito da vida eclesiástica

evangélica contemporânea e pregação. É demasiado alto 0  número de

 jovens cristãos que crescem praticam ente sem nenhum conhecimento

bíblico ou teológico, pensando que Deus existe para dar-lhes conforto

e sucesso na vida ainda que ele estabeleça um padrão que ninguém

possa realmente atingir. Como um amável avô que demonstra ternura

excessiva para com seus descendentes pré-adolescentes, Deus pode até

5. Ibid., 20 - 2 . O que exatamente constitui a “teologia do bem estar” nem sempre 

é fácil de dizer, mas muitos dos novos calvinistas (e outros, incluindo este autor não 

calvinista!) veem isso manifesto na pregação e publicação populares que promovem 0

cristianismo como o caminho para a auto-realização e sucesso, se não a prosperidade  

material.

6. Ver Christian Smith e Melinda Lundquist Denton, “Summary Interpretation: 

Therapeutic Deism,” em Soul Searching: The Religious and Spiritual Lives of American  

Teenagers  (New York: Oxford Univ. Press, 2005), 02 - 7 .

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Por que este livro agora?

se desapontar conosco, mas Seu objetivo último, de qualquer forma, é

de nos trazer satisfação.

Isso pode ser uma espécie de caricatura; pouquíssimos pastores ou

professores evangélicos diriam tal coisa. Mas minha experiência corro-

bora com 0  que Hansen argumenta — que de alguma forma ou outra

a maioria dos jovens cristãos acaba por se apegar a tal visão de Deus e

fracassa plenamente na busca das riquezas da Bíblia ou da teologia cristã

de sorte que aprofundem o entendimento acerca de si e de Deus. Muitos

dos mais inteligentes e melhores jovens adquirem uma vaga percepção

de que falta algo em sua educação cristã, e quando ouvem a mensagemdo calvinismo, eles se apegam a ela como se fosse um bote salva-vidas

que os livra de uma espiritualidade culturalmente acomodada e rala.

Quem pode culpá-los? Todavia, 0  calvinismo não é a única alternativa,

a maioria deles sabe muito pouco ou nada acerca da fraqueza deste

sistema ou sobre teologias alternativas moderadas historicamente ricas

e biblicamente fiéis.

RAÍZES DO NOVO CALVINISMO

Nesta altura os leitores podem estar se perguntando se este fenôme-

no do novo calvinismo é um modismo de jovens que surgiu do nada.

 Já insinuei fortemente que não se trata disso. Mas algo novo está em

curso nele — o apelo de uma antiga teologia para uma platéia bastante

 jovem. O calvinismo e teologia reform ada (uma diferenciação e relação

destes termos será feita no capítulo 2) costumavam ser uma tradição

cristã grandemente atrelada principalmente a pessoas idosas. Anos atrás

até mesmo muitos cristãos evangélicos pensavam no calvinismo como

que quase restrito às regiões de Grand Rapids, Michigan e Pella, Iowa

(e comunidades semelhantes povoadas principalmente por imigrantes

holandeses). A Holanda era, afinal de contas, um país onde 0 calvinismoespecialmente pegou. Grand Rapids oferece uma gama de instituições

calvinistas influentes, tais como 0  Calvin College e Seminary, inúmeras

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Contra o Calvinismo

editoras de viés calvinista e várias igrejas calvinistas grandes. Em Pella,

Iowa, onde acontece um festival anual de tulipa bastante freqüentado,

podemos encontrar Primeira, Segunda e Terceiras igrejas reformadas

com poucas quadras de distância uma das outras. E a cidade se orgulhado excelente Central College — uma faculdade de artes liberal reformada.

 A descrição anterior em nada visa desmerecer as igrejas reform adas

ou a teologia calvinista; elas possuem uma rica tradição histórica e uma

grande presença dentro do cristianismo evangélico estadunidense. Mui-

tos líderes e pensadores preeminentes têm sido reformados desde os

dias dos puritanos (que eram calvinistas ingleses). Todavia, por várias

gerações durante 0  século XX a vitalidade do calvinismo parecia estar

se esvanecendo. Alguém pode perceber isso nos tons defensivos do

massivo tomo do nobre teólogo calvinista Loraine Boettner (1901 -

1990), The Reformed Doctrine o f Predestination.7, (o livro de Boettner foi

tratado a muito como uma fonte magistral acerca do calvinismo rígido

por inúmeros cristãos reformados, ainda que livros mais populares que

tratam da mesma teologia sejam melhores que este).Boettner, que declarou que “uma exposição plena e completa do sis-

tema cristão só pode ser dada com base na verdade conforme estipulada

no sistema calvinista” 8 e que “nossa doutrina é a doutrina claramente

revelada das Escrituras” 9, denunciou o declínio da forte crença calvinista

entre os evangélicos estadunidenses. Ele ficaria satisfeito em ver a atual

renascença do calvinismo. Mas ele estava certo. Entre a década de 40 até

a década de 80 o calvinismo enfrentou dificuldades com o público jovem;

na década de 70 o Je sus Movement  era qualquer coisa menos calvinista,

e os movimentos carismáticos e a Terceira Onda também foram, em sua

maioria, não calvinistas. Estes foram os movimentos populares de minha

7. Loraine Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination (Grand Rapids: Eerdmans, 

948).

8. Ibid., 7.

9. Ibid., 248.

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Por que este livro agora?

 juventude, muitos dos adolescentes cristãos de hoje e alunos universi-

tãrios (e pessoas mais velhas também) estão tão empolgados com essa

sua recém-encontrada fé na soberania absoluta de Deus como os jovens

cristãos de minha geração estavam em relação a “ ficar doidão em Jesu s”.Entretanto, o calvinismo jam ais desapareceu ou ficou obscurecido. Ele

sempre foi uma força robusta em certos segmentos da vida eclesiástica

estadunidense. E os cristãos jovens, incansáveis e reformados estão larga-

mente inconscientes de calvinistas anteriores ajohn Piper (e seus jovens

pregadores e escritores popularizantes) que prepararam 0 caminho para

a redescoberta desta mensagem e estilo de vida. Um desses calvinistas

foi Boettner — pouco conhecido, mas influente. Outro foi James Mon-

tgomery Boice (1938 - 2000), um de meus professores do seminário e

que pastoreou a Décima Igreja Presbiteriana em Filadélfia, Pensilvânia,

uma igreja evangélica e fortemente calvinista. Também foi pregador de

rádio, comentarista bíblico, editor de revista cristã (Eternity) e autor de

 vários livros principalmente acerca da teologia reformada. (Boice tirou

um período sabático de sua igreja na metade dos anos 70 durante 0 qual

ele lecionou um curso no North American Baptist Seminary em Sioux

Falls, Dakota do Sul; eu fui um de seus alunos durante aquele curso de

mini semestre sobre pregação). A maioria dos jovens novos calvinistas

 jamais ouviu falar de Boice, mas ele foi um pastor-autor-teólogo-orador

incrivelmente prolífico, quase que uma força da natureza na vida evan-

gélica estadunidense, o mesmo que o Piper representa atualmente.Outro precursor e pioneiro do novo calvinismo é o teólogo reforma-

do e apologista R. C. Sproul (n. 1939), fundador do influente Ligonier

Ministries, cuja especialidade é apologética cristã. (Nem todos os calvi-

nistas gostam tanto de apologética racional quanto 0  Sproul, mas não

há dúvidas acerca de suas credenciais calvinistas). Sproul atuou como

docente em vários seminários calvinistas conservadores preeminentes

e apareceu em pessoa e via mídia em inúmeras conferências cristãs e

eventos eclesiásticos. Entre suas amplamente lidas exposições e defe-

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Contra o CaK/inismo

provavelmente mais remota. Além disso, alguns pensadores reformados

estadunidenses associados a estas instituições expressaram certas reser-

 vas acerca do novo calvinismo que, interpretado de certa forma, poderia

ser visto como lançando dúvida sobre seus precursores já mencionados. A edição da revista Christian Magazine  de 1 de dezembro de 2009

continha um artigo do teólogo reformado Todd Billings do Western

Theological Seminary of Holland, Michigan (que, assim como o Calvin

College e Seminary, é um centro mais antigo da tradição reformada

estabelecido na Holanda). Em seu artigo “O Retorno de Calvino? O

Reformador Irresistível”, Billings dènunciou o foco unilateral do novo

calvinismo em algumas doutrinas reformadas mais incomuns e, prin-

cipalmente 0 esq uem a TULIP: depravaçáo total, eleição incondicional,

exp iação limitada, graça irresistível e perseverança dos santos. Ele

asseverou que os novos calvinistas utilizam a TULIP como um teste

decisivo no qual se testa a autenticidade de alguém como reformado.

Em resposta ele alega que 0  acróstico TULIP não fornece uma redução

à essência adequada ou acurada da teologia reformada 14 e critica os

neocalvinistas por colocar no centro 0  que é periférico à tradição.

Para Billings e para muitos outros “calvinistas litúrgicos” (um termo

para os que estão associados às denominações sacramentais e liturgias

holandesas, escocesas reformadas e presbiterianas mais antigas) os

novos calvinistas estão cometendo um erro. “Reformado” não designa

uma ênfase na predestinação e certamente também não na reprovação(predestinação de algumas pessoas ao inferno) — 0 que Calvino notoria-

mente chamou de “decreto horrível [de Deus]” — mas em certas visões

católicas (aqui, significando universal) e sacramentais do cristianismo

que realmente enfatizam a soberania de Deus, mas que não o esgota

em celebração do controle absoluto de Deus dos mais pormenorizados

acontecimentos, incluindo 0  mal.

  4. J. Todd Billings, “Calvin’s Comeback? The Irresistible Reformer,” Christian Century  

(December , 2009), 22 - 25.

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Por que este livro agora?

 A objeção de Billings irá, sem dúvida, ser debatida por outros autopro-

clamados cristãos reformados. Só a mencionei aqui porque ela expressa

bem um murmúrio contra o novo calvinismo que pode ser ouvido das

instituições estadunidenses e europeias reformadas mais antigas que,em certa extensão, minimizam o sistema TULIP da teologia reformada.

Eu explorarei mais acerca do assunto e outros aspectos da diversidade

reformada e calvinista nos próximos dois capítulos.

A NECESSIDADE DE UMA RESPOSTA AGORA

Esta introdução tem 0  título “Por quê Este Livro Agora?”. De fato, porquê um livro Contra o Calvinismo?  O aumento da reflexão teológica séria

e comprometim ento entre jovens cristãos não é uma coisa boa? Por quê

derramar água fria sobre as chamas de espiritualidade do avivamento

entre a juventude? Levo esta consideração muito a sério.

Todavia, creio que é chegado o tempo para que alguém aponte as fa-

lhas e fraquezas neste tipo específico de calvinismo — 0 tipo amplamente

abraçado e promovido por líderes e seguidores do movimento jovem,

incansável e reformado. Mas a promoção do que considero um sistema

falho não advêm apenas deles. A mesm a teologia da soberania absoluta

de Deus pode ser encontrada em Calvino (talvez sem 0 aspecto da expiação

limitada), Edwards (de maneira extrema, conforme explicarei), Boettner,

Boice, Sproul e inúmeros outros popularizadores do calvinismo. Mas então,

qual é o erro em acreditar e celebrar a soberania de Deus? Absolutamente

nenhum! Mas, a soberania pode e frequentemente é levada a excessos

— fazendo de Deus o autor do pecado e do mal — que é algo que poucos

calvinistas admitem, mas é o que se segue do que eles ensinam como a

“conseqüência lógica e necessária” (uma expressão técnica de certa forma

confusa geralmente utilizada pelos próprios calvinistas para salientar os

efeitos temerosos que enxergam nas teologias não calvinistas). Você pode acessar o fenômeno da Internet chamado Youtube e assis-

tir vários clipes de vídeos de proponentes do novo calvinismo fazendo

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Contra o Calvinismo

declarações chocantes acerca da soberania de Deus, incluindo que Deus

causa calamidades e horrores “para sua glória”. John Piper publicou um

sermão, hoje muito conhecido, poucos dias após os acontecimentos

terroristas nas Torres Gêmeas de 11 de setembro de 2001, declarandoque Deus não apenas permitiu tais eventos, mas que os causou '5. Ele

desde então tem publicado outras declarações sem elhantes em que atri-

bui a Deus desastres naturais e calamidades horrendas. Piper não está

sozinho; muitos dos novos calvinistas e seus mentores estão afirmando

agressivamente que esta visão de Deus é a única que é bíblica e razoável.

O calvinismo popular contemporâneo pode ser, no geral, consisten-

te com Calvino e muito de seus seguidores (embora eu pense que ele

seja ainda mais moldado por seu sucessor e 0 pastor chefe de Genebra,

Theodore Beza [1 5 19 - 160 5] e seus seguidores), mas ele não é a única

 versão da teologia reform ada e do calvinismo. Explicarei mais sobre

isso no capítulo seguinte. Por agora nos basta dizer que mesmo muitos

cristãos reformados estão chocados e horrorizados com as implicações

da ênfase extremada na soberania de Deus do novo calvinismo.

Claro, a definição de “reformado” depende grandemente da igreja e

do pensador que reivindica 0 termo. Na verdade, a organização mundial

chamada Comunhão Mundial de Igrejas Reformadas (CMIR) inclui muitas

denominações e igrejas que, de forma alguma, abraçam todo 0  sistema

da TULIP. (De fato, surpreendendo a muitos calvinistas, a CMIR inclui

algumas igrejas arminianas que acreditam no livre-arbítrio e que negam 0controle meticuloso e providencial de Deus de todos os acontecimentos!)

Eu me considero reformado no sentido amplo — não luterano inserido

na ampla corrente protestante que se estende da reforma suíça liderada

originalmente por Ulrico Zuínglio (1484 - 1531).

 5. John Piper, “Why I Do Not Say, ‘God Did Not Cause the Calamity, but He Can Use

 It for Good.’ ” www.desiringgod.org/ResourceLibrary/TasteAndSee/ByDate/200 / 8 _ 

Why_I_Do_Not_Say_God_Did_Not_Cause_the_Calamity_but_He_Can_Use_It_for_ 

Good/.

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Por que este livro agora?

 Acredito que alguém precise, por fim, se levantar e, em amor, dizer

um “Não!” com firmeza às afirmações ofensivas frequentemente feitas

por calvinistas acerca da soberania de Deus. Levadas a sua conclusão

lógica, até mesmo o inferno e os que sofrerão eternamente nele são

preordenados por Deus, Deus é, desse modo, retratado, no melhor

cenário, como moralmente ambíguo e, no pior cenário, um monstro

moral. Cheguei ao ponto de dizer que este tipo de calvinismo, que

atribui tudo à vontade e 0  controle de Deus, torna difícil (pelo menos

para mim) enxergar a diferença entre Deus e o diabo. Alguns de meus

amigos calvinistas se sentiram ofendido com essa afirmação, mas eucontinuo a acreditar que ela seja uma questão válida que valha a pena

ser acompanhada. Quando digo isso quero dizer que se  eu fosse   calvi-

nista e acreditasse no que estas pessoas ensinam, eu teria dificuldade

em dizer a diferença entre Deus e Satanás. Falarei mais a esse respeito

de maneira pormenorizada durante o curso deste livro.

 Alguns calvinistas acusam os não calvinistas de rejeitarem sua teologia

da soberania de Deus em razão do amor humanista latente pelo livre-

-arbítrio. Um colega calvinista, que se tornou um autor bem conhecido de

livros reformados, uma vez me indagou se eu considerava a possibilidade

de que minha crença no livre-arbítrio fosse uma prova de humanismo

não reconhecido em meu pensam ento. Não é necessário dizer que rejeito

essa suposição. A questão é que eu, assim como a maioria dos cristãos

não calvinistas, abraço 0  livre-arbítrio por dois motivos (além do fato deacreditarmos que 0  conceito esteja suposto na Bíblia): 0  livre-arbítrio é

necessário para conservar a responsabilidade humana pelo pecado e o

mal e também por ele ser necessário para eximir Deus da responsabili-

dade pelo pecado e o mal. Posso dizer com toda a sinceridade (como a

maioria dos evangélicos não calvinistas 0  faz) que eu não dou a mínima

para o livre-arbítrio a não ser por estes motivos.Não tenho o interesse em uma teologia centrada no homem; estou

intensamente interessado em adorar um Deus que é verdadeiramente

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Contra 0 Calvinismo

bom e acima da repreensão pelo Holocausto e todos os outros males

que são por demais numerosos para serem mencionados. Um elevado

número de autores calvinistas interpreta equivocadamente as teologias

não calvinistas como se elas fossem antropocêntricas, humanistas,desonrosas a Deus, e até mesmo não bíblicas sem jamais admitir os

problemas em sua própria teologia. Muitíssimos seguidores jovens e

impressionáveis ainda não se deram conta de quais sejam estes proble-

mas16. Escrevo isso para ajudá-los.

É chegada a hora de um “Não” conciliador e amável para a versão

extrem a do calvinismo sendo promovida pelos líderes da geração jovem ,

incansável e reformada e que é frequentemente abraçada sem análise

crítica por seus seguidores. Demonstrarei que o “Não” pode ser dito

dentro da própria teologia reformada e que ele tem sido dito por alguns

teólogos reformados e acadêm icos bíblicos preeminentes. Mostrarei que

este calvinismo extrem ado, que juntamente com 0 partidário Hansel eu

chamo de “ radical” 17 é inerentemente defeituoso bíblica e logicamente

e em termos da tradição cristã mais ampla.

Colocarei todas as minhas cartas na mesa aqui e confessarei que

opero com quatro critérios de verdade teológica: Escritura, tradição,

razão e experiência (o então chamado Quadrilátero Wesleyano). Es- 

critura  é a fonte e norma primária de teologia. Tradição  é a “norma

normatizada” — um respeitado mecanismo de orientação. Razão  é

uma ferramenta crítica para interpretar a Escritura e eliminar alegaçõesteológicas absolutamente inacreditáveis que são contraditórias entre si

  6. Escrevi um livro inteiro sobre a teologia arminiana, uma tradição que frequentemente 

representada equivocadamente pelos críticos calvinistas como uma teologia centrada no 

homem (entre outras coisas. OLSON, Roger E. Teologia Arminiana: Mitos e Realidades;  

tradução Wellington Carvalho Mariano. São Paulo: Editora Reflexão, 20 3. Nesta obra 

eu provo que a maioria das críticas feitas pelos calvinistas à teologia evangélica não

 calvinista (e talvez algumas outras) é falsa.

  7. Hansen, Young, Restless, Reformed,  9.

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Por que este livro agora?

ou que levem a conseqüências que são insustentáveis à luz do que mais

é crido. Experiência é   0  teste inevitável na qual a teologia é feita, mas

embora ela seja um critério para avaliação, ela não é uma autoridade,

portanto, dificilmente apelarei a ela. O que eu deveras acredito acerca

da experiência é que nenhuma teologia é criada ou adotada no vácuo;

experiência sempre afeta o que acreditamos e como acreditamos.

 Argumentarei no decorrer deste livro que o calvinismo rígido não é a

única e nem a melhor forma de se interpretar a Bíblia. Ele é uma inter-

pretação possível de textos isolados, mas à luz de todo o testemunho da

Escritura ele não é viável. Além do mais, argumentarei que o calvinismorígido permanece em tensão com a antiga fé da igreja cristã e muito da

herança da fé evangélica. Alguns de seus princípios fundamentais não

podem ser encontrados antes de Agostinho, pai da igreja, no século V,

e outros não podem ser encontrados antes de um herético chamado

Gottschalk (aproximadamente 867) ou a partir dele até o sucessor de

Calvino, Theodore Beza.

Por fim, argumentarei que 0 calvinismo rígido entra em contradições;

ele não pode ser feito inteligível — e o cristianismo deve ser inteligível.

Por “inteligível” eu não quero dizer filosoficamente racional; quero di-

zer capaz de ser entendido. Uma contradição pura é evidente sinal de

erro; até mesmo a maioria dos calvinistas concorda com isso. A maior

contradição é a de que Deus é confessado como perfeitamente bom ao

mesmo tempo em que é descrito como autor do pecado e do mal. Nãodigo que todos os calvinistas admitem que sua teologia torna Deus o

autor do pecado e do mal; muitos negam isso. Mas mostrarei que tal é

a “conseqüência lógica e necessária” do que dizem sobre Deus.

 Alguém disse que nenhum a teologia que não possa ser pregada na

frente dos portões de Auschwitz é digna de ser crida. Eu, sob meu ponto

de vista, não poderia ficar de pé na frente daqueles portões e pregar uma versão da soberania de Deus que faça do exterm ínio de seis milhões de

 judeus, incluindo muitas crianças, parte da vontade e plano de Deus de

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Contra o Calvinismo

maneira que Deus 0  tenha preordenado e o tornado certo18. Quero que

os jovens calvinistas (e outros) saibam e, ao menos passem a reconhe-

cer e lidar com as conseqüências inevitáveis e insuperáveis do que esta

forma radical de teologia reformada ensina. E quero dar a seus amigos,familiares e mentores espirituais a munição a ser utilizada para solapar

esta, por vezes, exagerada confiança na solidez de seu sistema de crença.

  8. Em todo esse livro eu utilizarei a frase “ tornado certo” para descrever o que os 

calvinistas rígidos acreditam acerca do papel de Deus em causar o pecado e o mal.  

Poucos calvinistas rígidos dizem que Deus causou o Holocausto, mas eles dirão que 

Deus

0 preordenou e (para fazer uso da terminologia de John Piper) garantiu que ele

 acontecesse. “Tornado certo” é uma forma de evitar a linguagem de causação, pois os 

calvinistas não se sentem à vontade com isso, mas essa linguagem, ao mesmo tempo,  

expressa 0 que deve ser crido dentro da visão calvinista rígida da providência.

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capítulo 2

Calvinismo de quem?

Qual teologia reformada?

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FREQÜENTEI UMA ASSOCIAÇÃO profissional de teólogos cristãos na

qual um acadêmico calvinista preeminente e teólogo reformado leu uma

dissertação acerca da teologia calvinista. Em nenhum lugar ele mencio-

nou as doutrinas da providência meticulosa (de que Deus controla todos

os acontecimentos incluindo 0  pecado e o mal) ou a predestinação. Na

 verdade, todo o esquema da TULIP estava com pletamente ausente desua descrição da teologia de Calvino. A ênfase estava preferivelmente

na gratidão para com Deus como o grande tema de Calvino. Durante 0

período de discussão que se seguiu eu perguntei ao acadêmico por que

ele não havia dito nada concernente à doutrina de Calvino da soberania

divina absoluta e toda abrangente. Ele respondeu quase que condescen-

dentemente que tal faceta não é parte essencial da teologia de Calvino

ou da teologia reformada.

Essa resposta surpreenderia a muitos calvinistas jovens, incansáveis

e reformados! Minha experiência é a de que a maioria deles se espe-

cializa nesta doutrina; ela é para eles a doutrina de grande conforto e

o motivo pelo qual eles, em primeiro lugar, abraçaram 0  calvinismo.

 Alguém me disse que ele teve um a segunda conversão — sendo esta

segunda conversão ao calvinismo em razão de uma repentina e im-pressionante experiência de conforto e de acreditar que a salvação é

um ato plenamente de Deus e que não tem nenhuma relação com suas

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Contra o Calvinismo

decisões, exceto 0  fato de Deus lhe conceder o dom da fé para crer em

 Jesu s Cristo. Para outros jovens calvinistas (e outros) a forte doutrina da

soberania de Deus permite ao mundo caótico fazer sentido — tudo faz

parte do desenrolar de um plano mestre divino.Em suma, a maioria dos participantes no movimento do novo cal-

 vinismo acredita firm emente que a soberania absoluta de Deus, que

exclui a contingência e 0  livre-arbítrio, é central a sua recém-descoberta

fé reformada. Será um choque para eles descobrir que “reformado” é

essencialmente um conceito contestado. O que eles estão chamando

de “reformado” não é a única versão da tradição reformada e é ainda

mais debatível se o que eles estão chamando de calvinismo  era acre-

ditado em sua totalidade por Calvino.

O QUE SÃO CALVINISMO E TEOLOGIA REFORMADA?

 Antes de mergulhar em minha crítica ao calvinism o, cabe a mim

explicar com a maior cautela e acurácia possíveis qual calvinismo estou

criticando e qual teologia reformada eu sou contra. Mas as próprias cate-

gorias são utilizadas de maneiras tão diferentes por diferentes teólogos

e historiadores que é difícil tratar estes termos como caixas (pacotes)

— categorias fechadas na qual cada crença ou se encaixa plenamente

ou não se encaixa. Há muita fluidez e ambigüidade nestes termos e os

fenômenos que eles descrevem.

Comparo a situação a tentar separar conceitos tais como “liberal”

e “conservador” na vida política estadunidense. Dizem que os repu-

blicanos são conservadores. Entretanto, historicamente, muitos dos

primeiros republicanos eram radicais. Abraham Lincoln foi um dos

primeiros republicanos dos Estados Unidos e foi um infame icono-

clasta e destruidor do status quo. Por conseguinte, ele foi tudo exceto 

conservador em qualquer sentido comum da palavra. Durante a dé-cada de 60 vários políticos republicanos preeminentes eram notáveis

liberais política e socialmente. Nelson Rockefeller (1908 - 1997) foi

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CaJvinismo de quem? Qual teologia reformada?

 vice-presiden te de Gerald R. Ford e foi famoso por ser, de certa form a,

liberal. Entretanto, ele foi 0  líder do partido republicano. Também

durante as décadas de 60 e 70 muitos democratas, principalmente do

sul, eram arquiconservadores política e socialmente. Eram chamadosde “Dixie Democrats”* e, às vezes, “Boll Weevil Democrats”** em

 virtude se suas tradições sulistas e recusa de votar a favor de reform as

sociais progressivas.

Categorias políticas não são nem de perto tão organizadas quanto

muitas pessoas pensam. Nem os termos calvinista  e reformado.  Quan-

do as pessoas me dizem que são teologicamente reformadas, eu tenhouma pequena ideia do que elas querem dizer. Entre os novos e jovens

calvinistas isso geralmente significa que a pessoa é calvinista no sentido

forte da crença em todo 0  sistema da TULIP de soteriologia (doutrina

da salvação). Entretanto, conheço pessoas que são robustamente re-

formadas em suas próprias mentes e que rejeitam aspectos cruciais da

TULIP. De maneira semelhante, conheço pessoas que orgulhosamente se

identificam como calvinistas que não seriam consideradas reformadas

por autoridades preeminentes acerca do que reformado significa. Em

alguns círculos batistas, calvinista indica apenas que a pessoa acredita

na doutrina da segurança eterna dos verdadeiros crentes — que uma

pessoa genuinamente salva não pode se apostatar e terminar no infer-

no independente do que façam ou deixem de fazer. Em alguns círculos

reformados (principalmente no que chamei de “reformados litúrgicos”)batistas não podem ser verdadeiramente reformados. A Comunhão

Mundial de Igrejas Reformadas (CMIR), um órgão ecumênico de 214 de-

nominações em 107 países — não inclui quaisquer grupos batistas ainda

que alguns batistas declarem a si mesmos e suas igrejas como “batistas

* Partido político segregacionista dos EUA de curta duração.

** Nome dado aos políticos estadunidenses na década de 920 em referência aos de- 

mocratas sulistas conservadores.

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Calvinismo de quem? Qual teologia reformada?

reformado e da teologia reformada. Muitos deles reivindicam que eles 

ou seus líderes  são os genuínos portadores do verdadeiro calvinismo

e da teologia reformada, e tendem a colocar o esquema da TULIP no

centro do que significa ser calvinista e reformado. Quero deixar claroque não me oponho a toda a teologia reformada, assim como também

não me oponho a todo o espectro da forma de vida cristã reformada.

Sou contra o esquema da TULIP do calvinismo e da teologia reformada

radical que 0 abraça e o força até o seu limite. Chamo isso de “teologia

reformada radical” em oposição à teologia reformada moderada, que é

mais inclusiva e menos enfática acerca da TULIP.

TEOLOGIA REFORMADA EM PERSPECTIVA HISTÓRICA

Uma maneira de lidar com a decisão de quem verdadeiramente é

reformado é olhar para a CMIR. Todos apresentam certas reivindicações

a ancestralidade espiritual e teológica na ala suíça da reforma do século

 XVI liderada por Zuínglio e Calvino. (Todavia, historicam ente falando, o

reformador de Estrasburgo, Martin Bucer [1491 - 1551], é comumente

considerado pelos teólogos históricos um líder antigo do movimento re-

formado igualmente importante). A CMIR sem dúvida e, de fato, celebra

a vida e pensamento de João Calvino; algo que ficou evidente durante

2009 — aniversário de quinhentos anos do nascimento de Calvino.

Todavia, sua membresia inclui denominações que não particularmente

exaltam Calvino ou sua teologia, mas cuja linhagem histórica, assim

por dizer, remontam da Reform a Suíça, da qual Calvino fez parte. A

 AM1R (Aliança Mundial de Igrejas Reformadas) fundiu-se com outra or-

ganização reformada para formar a CMIR em 2010; 0 website da CMIR

apresentava a seguinte descrição, que alguém pode presumir que esteja

mais ou menos correta acerca da CMIR;

 A AMIR é uma associação de mais de 200 igrejas com raízes na

Reforma do século XVI liderada por João Calvino, João Knox, UlricoZuínglio e muitos outros e os primeiros movimentos reformadores

de João Huss e Pedro Valdes. Nossas igrejas são Congregacionais,

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Contra 0 Calvinismo

Presbiterianas, Reformada e Unida. A maioria vive e testemunha

no hemisfério sul; muitas são minorias religiosas em seus países. A

 Aliança é uma rede interdependente de pessoas e igrejas trabalhan-

do e adorando juntos com fé na promessa de Deus de sempre estar

com sua criação2.

 A CMIR, como a AMIR antes dela, inclui a todos, desde a Igreja Pro-

testante da Algéria (primeira igreja mem bro listada em ordem alfabética

por país) à Igreja Presbiteriana da África do Sul3. Entre as denominações

membro estão a Igreja Evangélica Valdense do Rio da Prata, Uruguai,

uma ramificação do movimento valdense mais amplo que remonta ao

ministério do reformador italiano Pedro Waldo (1140 - 1218), que viveubem antes de Calvino, e a Irmandade Remonstrante da Holanda — a

mais antiga igreja arminiana no mundo. (Jacó Armínio [1560 - 1609] e

seus seguidores, os remonstrantes, eram opositores ferrenhos de, pelo

menos, os três pontos do meio do acróstico TULIP).

Notadamente ausentes da lista estão todas as igrejas batistas, e,

entretanto, conforme dito antes, muitos dos líderes dos jovens, incan-sáveis e reformados são batistas. A exclusão dos batistas da CMIR mais

do que sugere que os cristãos reformados do mundo não consideram

“batista reform ado” um termo historicamente preciso. Claro, os batistas

reformados (e outros) sempre podem dizer que a CMIR não possui auto-

ridade de decidir quem é e quem não é reformado — e isso é verdade.

Entretanto, é interessante que a CMIR exclui batistas, mas inclui muitas

[outras] igrejas, tais como as igrejas valdenses e remonstrantes, que

não  consideram a si mesmas calvinistas! Quais igrejas são ou podem

ser inclusas na CMIR? De acordo com sua constituição, pode se filiar

qualquer órgão (denominação) que:

• Aceita a Jesus Cristo como Senhor e Salvador;

2. www.warc.ch.

3. www.warc.ch/who/mc.html

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Contra 0 Calvinismo

 versus Arminianismo: The Great Debate: Calvinism, Arminianism, and  

Salvation. No livro ele criticou alguns aspectos do calvinismo tradicional

sem tomar partido do arminianismo. De acordo com ele, “o protesto

ético arminiano [contra a doutrina da dupla predestinação] não podeser facilmente colocada de lado”5 e “após consideração sentimos que

é preferível uma melhora do calvinismo a uma rendição a extremos

arm inian os” 6 O contexto deixa claro que ele não tanto se opõe ao ar-

minianismo comum (ex. conforme o ensinado pelo próprio Armínio)

quanto aos extremos racionais que foram adotados por alguns. Ele faz

distinção entre “arminianismo de coração”, que ele pensa ser muito

mais aceitável, e “arminianismo de cabeça” — uma espécie de religiãoracionalista e até mesmo deísta, que ele considera ser objetável.

Mas 0  comentário intrigante feito pelo Sell em The Great Debate  é a

citação acima acerca de uma “melhora do calvinismo”. Em outras palavras,

como muitos outros no movimento reformado moderno, Sell acredita

que alguns aspectos do “calvinismo rígido” clássico deve ser modificado.

Ele não deixa dúvida acerca de quem ele se refere quando cita o teólogo

escocês presbiteriano James Orr (1844 - 1913), que criticou a ideia de

Calvino da soberania de Deus porque nela “0  amor está subordinado à

soberania, em vez de a soberania ao am or” 7.  Como Orr e muitos outros

pensadores reformados, Sell acredita que Calvino estava, em se tratando

de teologia, parcialmente correto e parcialmente errado. Em um comen-

tário surpreendente Sell sugere que a doutrina de Calvino da eleição deva

ser reinterpretada de tal maneira que Deus chame não apenas pessoas,

mas um povo  para o seu louvor” (ex. eleição corporativa) 8. Isto é o que

 Armínio acreditava em relação a eleição; a maioria dos arminianos no

decorrer da história interpretaram a eleição desta maneira.

5. Alan P. F. Sell, The Great Debate: Calvinism, Arminianism,  and Salvation (Grand 

Rapids: Baker, 982), 2 .

6. Ibid., 23.

7. Ibid., 22.

8. Ibid., 23.

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Contra o Calvinismo

Outros além de Sell poderiam ser mencionados: C. Berkouwer (1903 -

1996), um dos teólogos reformados mais influentes do século XX, lutou

contra o que considerava um calvinismo rígido que insistia na soberania

de Deus até o limite de afirmar o decreto de reprovação contra certaspessoas (ou seja, que Deus preordenou para o inferno alguns seres hu-

manos em específico). Hendrikus Berkhof (1914 - 1995) (que não deve

ser confundido com 0  teólogo calvinista Louis Berkhof [1873 - 1957],

com quem ele não possuía parentesco) um teólogo reformado holandês

prolífico, rejeitava radicalmente a visão calvinista tradicional da soberania

de Deus, enfatizando, em seu lugar, a autolimitação de Deus e a parceria

pactuai humana com Deus no reino e salvação".

Outro teólogo reformado bastante conhecido que revisou a teologia

reformada afastando-a do calvinismo clássico foi James Daane, que atuou

como professor de teologia e ministério no Fuller Theological Seminary

por muitos anos. Sua publicação The Freedom o f God: A Study o f Election 

and Pulpit'2  é um ataque vigoroso no determinismo e, principalmente,

na doutrina do decreto de Deus da dupla predestinação. Para Daane a

eleição divina incondicional é somente de uma pessoa, Jesus Cristo, e,

por outro lado, do povo corporativo de Deus — Israel e a igreja. E Daane

rejeita absolutamente qualquer decreto de reprovação.

Conclusivamente, outro teólogo reformado revisionista influente

crítico do calvinismo rígido é 0  sulafricano Adrio Kónig, professor

aposentado na UNISA (University of South Africa), cuja obra Here Am I!   A Believer’s Reflection on God 13 atacou toda versão determinista da so-

  . Ver principalmente a magistral teologia sistemática de um volume de Berkhof, 

Christian Faith: An Introduction to the Study of the Faith  (Grand Rapids: Eerdmans, 99 ), 

onde ele expõe uma teologia reformada radicalmente revisada que praticamente 

qualquer arminiano poderia adotar.

  2. James Daane, The Freedom of God: A Study of Election and Pulpit   (Grand Rapids: 

Eerdmans, 973).

  3. Adrio Kõnig, Here Am I! A Believer's Refection on God   (Grand Rapids: Eerdmans, 

982).

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Calvinismo de quem? Qual teologia reformada?

berania de Deus e afirmou, em seu lugar, um Deus que se autolimita,

que sofre a rejeição humana e 0 mal e que convida as pessoas para um

relacionamento pactuai consigo mesmo sem preordenar ou determinar

suas escolhas. Novamente, assim como com Berkhof e outros teólogosreformados revisionistas aqui mencionados, a maioria dos arminianos,

se não todos, assinariam de bom grado em concordância com estas

 visões reform adas da soberania de Deus.

Estou bastante cônscio, claro, que os teólogos calvinistas reformados

mais tradicionalistas e seus seguidores tratarão estes revisionistas des-

controlados como desertores da tradição [reformada]. Os revisionistas

provavelmente responderiam que os tradicionalistas estão esquecendo o

lema reformado “reformado e sempre reformando”. Até mesmo a própria

tradição reformada precisa de reforma e, de acordo com os revisionistas,

ela nunca esteve tão frágil a ponto de ser incapaz de mudar. Contudo, é

preciso admitir que, especialmente nos EUA nos anos recentes, com a

ascensão do novo calvinismo, o termo “reformado” é mais comumente

utilizado nos círculos protestantes evangélicos para o sistema soterio-

lógico da TULIP (sem, naturalmente, excluir outros aspectos da crença

reformada). Mas tal utilização é necessariamente uma definição precisa

do termo reformado? Até mesmo entre os evangélicos nos EUA 0  termo

“reformado” é descrito de maneiras bastante distintas.

Como minha primeira testemunha eu chamo 0 conhecidíssimo e am-

piamente reconhecido teólogo e historiador reformado Donald McKim,editor de um livro de referência para a editora presbiteriana Westminster

 John Knox Press e ex-professor de teologia em vários seminários reforma-

dos e presbiterianos, incluindo 0 Memphis Theological Seminary (onde

ele também atuou como reitor) e a University of Dubuque Theological

Seminary. McKim formou-se bacharel pelo Westminster Theological Se-

minary (um baluarte de teologia reformada conservadora) e obteve PhD

pela University of Pittsburgh. Durante sua carreira ele editou e escreveu

inúmeros livros sobre a teologia reformada, incluindo The Encyclopedia

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Contra o Calvinismo

o f the Reform ed Faith, The Westminster Handbook to Reform ed Theology, 

and Introducing the Reformed Faith.'4. Praticamente por todos os aspec-

tos, McKim é uma autoridade confiável acerca da teologia reformada.

De acordo com McKim, “cada igreja ou grupo de igrejas... tem suaprópria definição do que significa ser “‘reformado’” 15 Em outras palavras,

de acordo com este perito, “ reform ado” não é uma categoria monolítica

ou fechada; 0 termo é, na verdade, um conceito essencialm ente contes-

tado. E ele afirma que 0 termo é uma tradição viva ainda em processo16.

Todavia, isso não significa que 0  termo seja vazio ou pertença a uma

categoria vazia. Antes, de acordo com McKim, devemos tratar 0  termo

como uma família diversificada — a “família reformada” que traça sua

ancestralidade à João Calvino de Genebra e a um período ainda mais

remoto. “A fé reformada...tem sua árvore genealógica”, declara McKim,

e como todas as árvores genealógicas, ela é repleta de diversidade17.

Um aspecto desta diversidade, de acordo com McKim, pode ser visto

nas diferenças entre a própria abordagem de Calvino para a teologia e

a de seus seguidores. “Embora Calvino tivesse uma mente sistemática

brilhante, seus sucessores no século XVII sistematizaram sua teologia

ainda mais. Ela tornou-se mais detalhada e fundiu-se ao modelo cha-

mado escolasticismo” '8. O restante do livro de McKim revela que não

considera este desenvolvimento como algo bom.

Como muitos outros acadêmicos da tradição reformada, McKim 0

descreve em termos de “semelhanças familiares” em vez de um sistema

  4. Donald K. McKim,The Encyclopedia of the Reformed Faith  (Louisville, KY: Westminster 

John Knox, 992); idem, The Westminster Handbook to Reformed Theology   (Louisville, 

KY: Westminster John Knox, 200 ); idem, Introducing the Reformed Faith  (Louisville, KY: 

Westminster John Knox, 200 ).

  5. McKim, Introducing the Reformed Faith, xiii.

  6. Ibid.,XV.

 7. Ibid., 2.

  8. Ibid.

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Calvinismo de quem? Qual teologia reformada?

fechado. Uma semelhança familiar é 0  confessionalismo — cristãos

reformados frequentemente confessam sua fé fazendo uso das dos

credos históricos do cristianismo (principalmente o Credo Niceno) e

as confissões reformadas históricas, tais como a Fórmula Helvética deConsenso de 16 7 5 19. Entretanto, de acordo com McKim, estas confis-

sões de fé são sempre “relativas”, “temporárias” e “provisionais” 20. Ele

percebe que nem todas as pessoas reformadas concordarão e dirão:

“Embora alguns órgãos reformados tenham uma tendência de se tor-

narem mais restritos e quase presumem que suas formulações sejam

os únicos meios de se expressar a verdade de Deus, este impulso está

na contramão da verdadeira força vital da fé reformada”21. Um exemplo

da abordagem “mais restrita” com as confissões reformadas pode ser

a obra de Sproul, cujos livros, tal como O Que é Teologia Reformada?  

que quase trata a Confissão de Westminster como em par de igualdade,

em termos de autoridade, com a própria Escritura. (Claro que Sproul

negaria isso, mas ele apela à confissão com tanta frequência como

se ela fosse uma autoridade incorrigível para 0  cristão e, em especial,

para o pensamento reformado).

O tratamento de McKim, da fé reformada ressalta seus pontos em

comuns com outras ramificações do cristianismo; ele inclui capítulos

acerca da Escritura como a Palavra de Deus, Trindade e a pessoa de

Cristo, onde nada particularmente calvinista é encontrado. Nos capítu-

los acerca da providência e salvação, onde alguém esperaria encontraruma forte ênfase nas particularidades calvinistas, McKim fornece relatos

modestos da doutrina reformada. Por exemplo, ao discutir a soberania

de Deus na história (providência), ele reconhece que os reformados tradi-

cionalmente enfatizam que 0 plano e os propósitos de Deus conduzem a

  9. Ibid., 7.

20. Ibid., 8.

2 . Ibid., 7.

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Contra o Calvinismo

criação, história humana e as vidas humanas. O Deus que conhece todas

as coisas também deseja  todas as coisas “22. Todavia, quando volta-se

para o problema de Deus e 0 mal, ele explicitamente nega 0 que muitos

consideram o ponto controverso central do calvinismo rígido — queDeus até mesmo preordena e torna certo (“envia”) 0  mal: “Não falamos

de Deus enviando 0  mal sobre nós ou causando tais coisas em nossas

 vidas que são contrários aos propósitos graciosos, am orosos e de justiça

de Deus conforme vemos tais aspectos em Jesus Cristo” 23.

Claro, a maioria dos teólogos reformados nega que Deus realmente

“causa” 0 mal em qualquer sentido direto, mas como mostrarei abaixo,muitos calvinistas de fato afirmam que até mesmo 0 pecado e o mal são

partes do plano divino preordenado e tornado certo por Deus para se

encaixar nos propósitos de Deus para a história. McKim parece querer

evitar qualquer implicação de que o mal seja parte do plano de Deus ou

que Deus 0  torne certo. Sua versão da soberania de Deus é uma versão

abrandada que provavelmente não deixaria muitos dos novos calvinistas

e seus teólogos mentores satisfeitos.

Mais surpreendente ainda, talvez, é que McKim sequer menciona

a expiação limitada (o “L” na TULIP), também chamada de “redenção

particular” por muitos calvinistas. Seu livro inclui um capítulo inteiro

acerca da “Obra de Cristo” na qual ele discute a doutrina reformada da

expiação. Mas podem procurar em vão pela expiação limitada — algo

que chocaria muitos calvinistas.Em seu capítulo acerca da “Salvação: Recebendo 0  Dom de Deus”,

McKim alega descrever “ênfases reformadas”, mas diz pouco acerca da

eleição ou graça irresistível. Ele coloca mais ênfase na eleição corpora-

tiva para serviço do que na eleição incondicional de indivíduos, apenas

mencionando resumidamente a última: “Alguns acreditam; outros não.

22. Ibid., 5 - 52.

23. Ibid., 52.

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Calvinismo de quem? Qual teologia reformada?

 A explicação para isso está na eterna eleição de Deus” 24. Por fim, pró-

ximo do final de seu livro, McKim explica de maneira clara: “Nem todos

os cristãos reformados aderem [aos] ‘Cinco Pontos do Calvinismo’”25.

O contraste entre esta descrição da fé reformada e a de Sproul em OQue é Teologia Reformada?   (e em outros livros semelhantes) é descon-

certante. No livro Sproul praticamente iguala a teologia reformada ao

calvinismo rígido da TULIP e com uma doutrina da soberania de Deus

tão forte e tão absoluta quanto possível: “Se Deus não é soberano, en-

tão ele não é Deus. Pertence a Deus como Deus ser soberano” 26. O

contexto deixa claro que por “soberano” Sproul quer dizer que Deus é o

determinador e controlador absoluto de tudo até os mínimos detalhes.

O restante do livro apresenta algo bem diferente da que é exposto por

McKim; mostra a fé reformada em termos de TULIP, incluindo a dupla

predestinação — o decreto de Deus de reprovação de alguns para o

tormento eterno no inferno 27.

Temos, portanto, dois acadêmicos renomados da tradição reformada,

Donald McKim e R. C. Sproul, definindo e descrevendo-a de maneiras

bem distintas. As únicas coisas que eles parecem ter em comum sáo

linhagem histórica da herança reformada, incluindo, mas não exclusi-

 vãmente determ inada por Calvino e um a ênfase na soberania divina

considerada como de alguma forma ausente em teologias não reforma-

das. Claro, até mesmo Sproul admitiria que “reformado” inclui mais do

que apenas a TULIP (como McKim incansavelmente argumenta), masque 0  sistema soteriológico lhe serve como a característica peculiar da

teologia reformada ao passo que este mesmo sistema soteriológico não

é peculiar para McKim.

24. Ibid., 24.

25. Ibid., 83.

26. SPROUL, R C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p 22.

27. Ibid., 4

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Contra o Calvinismo

Um teólogo reformado estadunidense que parece andar em uma linha

entre McKim e Sproul é Richard Mouw, presidente do Fuller Theological

Seminary, cujo livro Calvinism in the Las Vegas Airport28 é uma prazerosa

 viagem pela teologia reformada conforme entendida pelo autor. Mouwafirma a TULIP sem a colocar na dianteira ou centro como o “elemento

mais importante e supremo” da teologia reformada; para ele a visão

reformada de uma sociedade transformada parece mais importante do

que uma doutrina particular da soberania de Deus. Contudo, ele diz que

ele abraça as doutrinas da TULIP ao passo que admite que há um “gosto

ruim acerca destas doutrinas” 29 É fácil discernir que Mouw sente-se des-

confortável com a ênfase do calvinista clássico na TULIP e, em especial,

com as maneiras na qual a ênfase é geralmente expressada. “Devo...

dizer francamente que... vejo muitas calvinistas que carecem de man-

sidão e respeito. Até mesmo encontro essa ausência de qualidades nas

interações de calvinistas com outros cristãos.  De fato, os calvinistas não

são comumente muito gentis e respeitosos ao debater pontos delicados

da doutrina com colegas calvinistas”   30.

O desconforto de Mouw com alguns pontos da TULIP é aparente

em seu capítulo sobre 0  “L” da TULIP — expiação limitada ou redenção

particular, ou seja, a ideia de que a morte expiatória de Cristo na cruz

foi intencionada por Deus apenas para alguns pecadores (os eleitos). Ele

a chama de “doutrina de prateleira”, e que com essa expressão quer

dizer que ela é parte de seu sistema de crença, mas que não funcionaem sua vida no seu cotidiano31. Enquanto continua a afirmá-la (ainda

que de certa forma revisada), Mouw deseja que a doutrina fique “em

28. Richard J. Mouw, Calvinism in the Las Vegas Airport   (Grand Rapids: Zondervan, 

2004).

29. Ibid., 4.

30. Ibid., 5.

3 . Ibid., 39 - 40.

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Calvinismo de quem? Qual teologia reformada?

paz” e que só a “retire da prateleira” de vez em quando, e então, para

colocá-la de volta à prateleira. Pode-se imaginar porque alguém gostaria

de se apegar a uma “doutrina de prateleira”.

O que quero dizer é que Mouw representa um terceiro tipo de teólo-go reformado nos EUA (e talvez em todo o mundo). O primeiro tipo é

representado por McKim, cuja teologia reformada é flexível e aberta à

revisão e não considera 0 esquema da TULIP como essencial. O segundo

tipo é representado por Sproul, cuja teologia reformada parece um tanto

fechada e gira em torno de uma forte visão da soberania de Deus (que eu

chamo de determinismo humano) e0

 esquema da TULIP. O terceiro tipo

é representado por Mouw, que afirma todos os elementos históricos do

calvinismo, mas que fica, de certa forma, constrangido com, no mínimo,

alguns destes elementos e que não considera 0  esquema da TULIP ou a

soberania divina absoluta com os temas mais importantes da fé reformada.

Deste modo, 0 problema de definir “reformado” persiste e provável-

mente sempre persistirá. Como disse anteriormente (e espero agora ter

provado) o termo “reformado” é, em essência, um conceito contestado.

 Ainda assim , o termo não é vazio ou sem sentido. Abordando os recur-

sos que mencionei até 0  momento estas são as minhas teses acerca do

significado de “reformado”. Primeiro, ele é um tipo ideal de teologia pro-

testante atrelado à ramificação histórica da reforma protestante oriunda

principalmente dos esforços reformadores dos teólogos suíços Ulrico

Zuínglio e João Calvino (e seus companheiros), mas também do teólogoMartin Bucer, de Estrasburgo. Tais características podem ser encontradas

em denominações tão diversas quanto congregacionais e anglicanas.

Segundo, a ênfase na supremacia e soberania de Deus é comum em

todas as teologias reformadas, embora ela seja interpretada de maneiras

diferentes. “Reformado” não é sinônimo de TULIP, embora a TULIP esteja

presente dentro da tradição reformada e todos os reformados tendem a

lidar com ela de certa forma (ainda que seja apenas ao rejeitá-la como

a característica central de sua fé).

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capítulo 3

Calvinismo puro e simples:

O sistema TULIP

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Contra o Calvinismo

Entretanto, antes de adentrar nestas áreas de diversidade, quero

permitir que proeminentes calvinistas expliquem 0  que eu chamo de

“calvinismo geral” ou “calvinismo puro e simples” Surpreendentemente,

o calvinismo não  está atrelado precisamente ou exatamente a tudo oque Calvino veio a ensinar, embora 0 sistema tenha um débito histórico

e teológico para com Calvino. O que eu cham o de “calvinismo” hoje

inclui alguns elementos que 0  próprio Calvino não enfatizou, isso se

ele acreditou neles de alguma forma. Um exemplo disso é a “expiação

limitada”. Alguns teólogos históricos acreditam que Calvino ficaria des-

contente com a natureza extremamente sistemática e escolástica do

calvinismo desenvolvido por seus seguidores. Explicarei estas questões

mais a fundo neste capítulo.

Um teólogo calvinista preeminente e guia confiável para esse ponto

de vista geral calvinista acerca da soberania é Loraine Boettner. Embora

ele não seja conhecido, meio século após o cume de sua produtivida-

de como autor, sua influência sobre os calvinistas contemporâneos é

profunda. Ele é amplamente considerado pelos teólogos calvinistas nos

EUA uma grande “figura paterna” que lhes empacotou e entregou a fé

calvinista. Ele certamente não é considerado infalível, e alguns calvinistas

discordarão de alguns de seus ensinos, mas poucos teólogos calvinistas

do século XX podem permanecer ombro a ombro com ele em termos

de influência e respeito.

De acordo com Boettner, 0  calvinismo começa com uma visão deDeus derivada da Escritura que também é consistente com 0  teísmo

filosófico: “A própria essência do teísmo consistente é que Deus teria um

plano exato para 0 mundo, conheceria de antemão as ações de todas as

criaturas que Ele propôs criar e através de Sua providência toda-inclusiva

Ele controlaria todo 0  sistema” '. Boettner finaliza a questão adiante ao

afirmar que Deus “muito obviamente predeterminou todo evento que

  . Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 23. 

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Contra o Calvinismo

pois “o mundo como um todo, e em todas suas partes e movimentos e

mudanças, foi colocado como unidade pela atividade governante, toda-

-harmonizante e toda-dominante da vontade divina, e seu propósito foi

de manifestar a glória divina” 5. Poucos calvinistas verdadeiros, e isso sehouver algum, disputariam com qualquer parte desta definição. (Digo

calvinistas verdadeiros porque não é difícil encontrar pessoas que alegam

ser calvinistas, mas que não 0  são. Por exemplo, muitos batistas do sul

pensam que são calvinistas só porque acreditam na segurança eterna

do crente - 0  quinto ponto do sistema TULIP. Mas acreditar nisso, por

si só, dificilmente faz de alguém um calvinista!).

Explicarei e criticarei esta visão calvinista da soberania de Deus no

capítulo seguinte. Ela não é o que todos os cristãos acreditam. Todos os

cristãos sempre acreditaram que nada, de jeito algum, pode acontecer

sem a permissão de Deus, e quase todos os cristãos sempre acreditaram

que Deus conhece de antemão tudo o que acontecerá. Mas os calvinistas

normalmente vão além e alegam que tudo 0  que acontece é planejado

e tornado certo por Deus. Calvino negou explicitamente a simples pres-

ciência ou permissão de Deus - até mesmo para 0  mal 6.

 Alguns leitores podem imaginar se eu simplesm ente escolhi um cal-

 vinista extremado - Boettner - para representar 0 “calvinismo geral” ou

o calvinismo puro e simples. De forma alguma.Todas estas ideias acerca

da soberania de Deus na história e salvação podem ser encontradas em

calvinistas contemporâneos, tal como Sproul e Piper. Irei fazer citaçõesdestes calvinistas quando voltar para minha crítica no capítulo seguinte.

 Aqui eu sim plesmente estou utilizando 0 Boettner como um modelo para

apresentar 0  calvinismo dominante, geral.

De acordo com Boettner (e a maioria dos calvinistas), Deus não é

apenas supremo e absoluto em controle (e controlador) da história; ele

5. Ibid., 4.

6. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol.2, p. 78.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

também está no controle absoluto acerca de quem irá e quem não irá ser

salvo. É aqui que voltamos para o famoso (ou infame) acróstico TULIP

para descrever o sistema calvinista de soteriologia. Os leitores devem

saber a origem da TULIP. É um acróstico desenvolvido no século XIXpara ajudar os alunos a se lembrar dos então chamados “cinco pontos

do calvinismo” conforme eles foram afirmados nos Cânones do Sínodo

de Dort em 1618/1619.

Dort foi uma reunião de “clérigos” calvinistas (teólogos, eruditos,

pastores) na cidade holandesa de Dordrech para responder às crenças

dos Remonstrantes - seguidores de Jacó Armínio. Os Remonstran-

tes apresentaram aos líderes da Igreja Reformada da Holanda uma

“remonstrância” ou protesto contra certas ideias calvinistas comuns.

 Alguns historiadores (principalmente calvinistas) tiraram conclusões

equivocadas deste documento como se ele rejeitasse todos as cinco

crenças representadas pela TULIP (depravação total, eleição incondicio-

nal, expiação limitada, graça irresistível, perseverança dos santos). Na

 verdade, 0  documento só rejeitou os três pontos do meio, deixando a

depravação total e a perseverança dos santos abertas à discussão futura.

(Houve várias versões da “remonstrância” escritas e publicadas em toda

a década após 0 falecimento de Armínio e o Sínodo de Dort, e algumas

deixavam a perseverança aberta ao passo que outras pareciam fechar 0

caso como se a perseverança estivesse errada. Mas todos os documentos

da remonstrância afirmaram a depravação total).O Sínodo de Dort rejeitou a “remonstrância” dos Remonstrantes afirmou

os entào denominados cinco pontos do calvinismo que mais tarde vieram

a ser resumidos fazendo uso do heurístico dispositivo TULIP. Os Cânones

(decretos) de Dort incluíram muito mais que a TULIP, mas estas cinco crenças

foram as consideradas negadas pelos Remonstrantes de maneira que elas

foram tratadas como a essência dos pronunciamentos do Sínodo de Dort.

Desde Dort 0 calvinismo tem sido resumido pelos próprios calvinistas

pelo uso dos cinco pontos e Boettner os segue bem de perto em sua

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Contra o Calvinismo

exposição da fé calvinista. O mesmo faz um grande número de outros

autores calvinistas cujos títulos das obras revelam a centralidade da

TULIP. The Five Points of Calvinism (Os Cinco Pontos do Calvinismo)  do

pastor-teólogo cristão Edwin H. Palmer7 e The Five Points o f Calvinism: Defined, Defended and Documented (Os Cinco Pontos do Calvinismo: Defi- 

nido, Defendido e Documentado)  de David N. Steele e Curtis C. Thomas.8

Outros livros não apresentam os cinco pontos em seus títulos, mas,

entretanto, organizam suas exposições do calvinismo de acordo com a

TULIP. Um exemplo disso é a obra de Sproul O que é Teologia Reformada?  

(Uma notável exceção é a obra de H. Henry Meeter, The Basic Ideas of  

Calvinism,9 que mal menciona a TULIP. Este livro parece ser mais uma

exposição da teologia reformada e do pensamento social em geral do

que a soteriologia calvinista em particular).

Muitos calvinistas, se não todos, concordam com Boettner acerca dos

cinco pontos como um sistema. Eles são, ele escreveu, um “sistema

simples, harmonioso e autoconsistente” e “prove que qualquer um destes

pontos seja falso e 0 sistema como um todo precisa ser abandonado”10.

Uma questão que surgirá posteriormente é se este sistema pode ser

encontrado em Calvino. Argumentarei que ele não pode ser encontrado

e que pelo menos 0  “L” foi criado e inserido no sistema após Calvino.

Mas isso não incomoda a maioria dos calvinistas, pois estes não pensam

que seu calvinismo deva aderir submissamente a tudo 0 que Calvino

acreditava ou escreveu.

7. Edwin H. Palmer, The Five Points of Calvinism  (Grand Rapids: Baker, 972).

8. David N. Steele e Curtis C. Thomas, The Five Points of Calvinism: Defined, Defended  

and Documented  (Nutley, NJ: Presbyterian and Reformed, 963).

9. H. Henry Meeter, The Basic Ideas of Calvinism  (Grand Rapids: Baker, 990).

  0. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 59.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TUUP

“T” DE DEPRAVAÇÃO TOTAL 

O primeiro ponto do sistema calvinista é 0 T, que corresponde a

depravaçáo total. Este conceito é amplamente mal-entendido; ele não

significa que os seres humanos são tão maus quanto possivelmente

podem ser. O “total” é que faz com que as pessoas entendam erro-

neamente este ponto. Antes, no geral, ele significa que toda parte da

pessoa humana (exceto Jesus Cristo, claro) está infectado e tão afetado

pelo pecado que a pessoa é completamente incapaz de agradar a Deus

antes de ser regenerada (nascida de novo) pelo Espírito de Deus. De

acordo com Boettner, a pessoa natural, antes e separada da graça rege-neradora de Deus, peca sempre e livremente e se deleita no pecado ",

pois a pessoa “é estrangeira por nascimento e pecadora por escolha”12.

 As “virtudes naturais” das pessoas não contam como algo bom, pois

são realizadas pelos motivos errados; a depravaçáo jaz na condição

do coração herdado de Adão '3. Os seres humanos nascem com uma

natureza corrupta, mas são, entretanto, plenamente responsáveis pelospecados que não podem evitar em virtude de sua condição '4. Boettner

alega que “apenas os calvinistas parecem levar esta doutrina da queda

[pecado origina] a sério” '5.

Mais uma vez, esta visão fortemente pessimista da humanidade é

consistente com os próprios ensinos de Calvino? Sem sombra de dúvi-

da que é. Calvino escreveu que em razão da queda de Adão “o homem

inteiro, da cabeça aos pés, foi, como por um dilúvio, de tal modo asso-

lado, que nenhuma parte ficou isenta de pecado, e em conseqüência

  . Ibid., 63.

 2. Ibid., 62. Esta é uma citação da Confissão de Fé de Westminster.

  3. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 72.

  4. Ibid., 63.

  5. Ibid., 72. Contestei esta alegação em Teologia Arminiana: Mitos e Realidades; 

tradução Wellington Carvalho Mariano. São Paulo: Editora Reflexão, 20 3, 75 - 203.

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Contra o Calvinismo

tudo quanto dele procede deve ser imputado ao pecado. Como Paulo

diz [Rm 8.6, 7]: todos os afetos ou cogitações da carne são inimizades

contra Deus; e por isso, morte” 16.

Isso também é consistente com 0  ensino calvinista contemporâneo

após Boettner? Certamente é. Sproul o expressa de maneira sucinta:

“em nossa humanidade corrupta nunca fazemos uma só coisa boa” 17.

 Assim como Boetneer e Calvino antes dele, Sproul atribui essa condição

desesperançada e incapaz da pessoa natural separada da graça regene-

radora de Deus ã queda de Adão. Para todos os calvinistas - pelo menos

para a maioria, se não todos - todos os humanos, com exceção de Jesus

Cristo, herdam a natureza corrupta de Adão e são culpados pelo pecado

de Adão. Boettner escreve: “O pecado de Adão é imputado a seus des-

cendentes” '8. Sproul resume a severa visão calvinista da humanidade

em razão da queda desta forma: “O homem é incapaz de elevar a si

mesmo ao bem sem a obra da graça de Deus em seu interior. “Nós não

temos mais capacidade de retornar a Deus do que um vaso vazio tem

de ficar cheio de água novamente” 19.Muitos calvinistas explicam a condição humana após a queda e antes

da regeneração pelo Espírito Santo, de maneira literal, como uma morte

espiritual, e fazem isso tendo por base Efésios 2. Em outras palavras,

para o calvinismo típico, a pessoa humana caída é totalmente incapaz de

até mesmo desejar Deus ou as coisas de Deus. Não há habilidade moral

(em oposição a uma hipotética habilidade natural que não existe em

questões espirituais) para alcançar a Deus ou aceitar a oferta divina de

salvação. Tudo o que flui da pessoa morta é pútrido e sujo, ainda que tal

pareça ser virtuoso. A razão disso é que a verdadeira virtude é definida

 6. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol.2, p. 25.

  7. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 03.

 8. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 77.

  9. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009,p. 05.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

pelo motivo, e o coração do pecador, escurecido pelo pecado, tem uma

constante disposição para 0  eu em vez de para Deus ou o seu próximo.

Esta descrição da condição humana é importante ter em mente, pois é

 por causa dela  que muitos calvinistas argumentam que ninguém pode

ser salvo sem a eleição incondicional e a graça irresistível.

 Assim como Calvino, os calvinistas geralmente reconhecem a existên-

cia de “virtudes civis” na pessoa natural caída que está espiritualmente

morta. Calvino falou com eloqüência acerca dos “dons naturais” das

pessoas caídas, que são capazes, pela ajuda do Espírito de Deus, atra-

 vês da graça comum , de realizar grandes coisas nas artes e ciências20.

Claro, nenhuma destas habilidades ou realizações possui qualquer re-

lação com a salvação. Sproul comenta acerca da realidade da “virtude

civil” pela qual as pessoas externamente se conformam à lei de Deus

e realizam atos de caridade, mas ele nega que tais atos sejam sinais de

 vida espiritual, pois eles são todos feitos a partir do interesse próprio 21.

 A pessoa natural caída pode realizar coisas grandes, mas ela não pode

agradar a Deus porque seu coração ainda é corrupto e centrado em simesmo. O pecado jaz nos motivos, e eles são plenamente errados até

que 0  Espírito Santo regenere a pessoa.

“U”, DE ELEIÇÃO INCONDICIONAL 

O Segundo ponto da TULIP é a eleição incondicional. “Eleição” é outra

palavra bíblica para predestinação para salvação (ou serviço); elas sãosinônimas. Todos os cristãos acreditam na eleição; os calvinistas acredi-

tam nela de uma forma específica. Boettner a expressa claramente: “A

fé reformada tem defendido a existência de um decreto divino eterno

que, anterior a qualquer diferença ou deserção nos próprios homens,

separa a raça humana em duas porções e ordena uma para a vida eterna

20. CALVINO, Joâo. As Institutas: edição clássica, vol.2, pp. 42-45.

2 . SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 03.

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Contra o Calvinismo

e outra para a morte eterna [inferno]”22. Isto é, claro, 0 que é comumente

conhecido como “dupla predestinação”.

 Alguns calvinistas negarão este ensinamento em favor de uma “única

predestinação” frequentemente chamada de “calvinismo moderado” ou

ameno. (Estes termos também são, às vezes, utilizados para outras per-

mutações do calvinismo). A predestinação única é a crença de que Deus

escolhe algumas pessoas caídas para as salvar ao passo que simplesmente

“ignora” outras, “abandonando-as” a sua merecida condenação. Em outras

palavras, de acordo com esta ideia, não há decreto de Deus pela qual ele

ordene qualquer pessoa para 0  inferno. Ou seja, não há “decreto para

reprovação”, mas apenas um decreto de eleição para salvação.Boetnner e outros calvinistas zombam da ideia de uma única predes-

tinação. Ele enfatizou, corretamente julgo eu, que a predestinação de

alguns para a salvação, da parte de Deus, é a  predestinação de alguns

para a condenação. Ele escreveu acerca da reprovação que “ela, tam-

bém, é de Deus” 23. Ele explicou 0 caso desta maneira: “Nós [calvinistas]

acreditamos que desde toda a eternidade Deus planejou deixar alguns

da posteridade de Adão em seus pecados; e que o fator decisivo na vida

de cada um encontra-se apenas na vontade de Deus” 24. Isso pode ser

colocar as coisas de maneira um pouco mais forte do que a maioria

dos calvinistas deseja colocar, mas a descrição corajosamente adere de

maneira consistente à crença da soberania absoluta de Deus em todas

as coisas. Observe 0  que Boettner está dizendo aqui: 0  “fator decisivo”

na ida de algumas pessoas para 0  inferno é a vontade de Deus. Boettnerera impaciente, para dizer o mínimo, com calvinistas que defendem

a predestinação única: “Calvinismo brando é sinônimo de calvinismo

enfermo, e a enfermidade, se não curada, é o início do fim” 25.

22. Boettner, The Reformed Doctrine o f Predestination, 83.

23. Ibid., 02.

24. Ibid., 04.

25. Ibid., 05.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

O que Calvino disse? Ele acreditava nesta dupla predestinação, incluin-

do a reprovação soberana divina de certas pessoas para o inferno? Ele

escreveu: “que [Deus] designou de uma vez para sempre, em seu eterno

e imutável desígnio, àqueles que ele quer que se salvem, e também

àqueles que quer que se percam” 26. A fim de que ninguém 0  interprete

de maneira equivocada, Calvino enfatizou esta posição ao ridicularizar

os que aceitam a eleição, mas que rejeitam a reprovação, chamando tal

coisa de “notável desvario”: “Portanto, aqueles  a quem Deus pretere os 

reprova; não por outra causa, mas porque os quer excluir da herança

para a qual predestina a seus filhos”  27.  Calvino notoriamente reconhe-

ceu e afirmou 0  caráter altamente objetável desta dupla predestinação

e, em especial, o lado reprobatório da predestinação, chamando-o de

“decreto espantoso”. 28

O que dizer de outros calvinistas? Sproul afirma inequivocamente a

eleição incondicional de alguns para a salvação e a predestinação de

outros para a condenação:

Ensina [a visão calvinista da predestinação] que desde a eternidade

 

Deus escolheu intervir nas vidas de algumas pessoas e trazê-las à fé  

salvadora, e esco lheu não fazer isso para outras pessoas. Desde toda 

a eternidade, sem nenhuma visão prévia de nosso comportamento  

humano, Deus escolheu alguns para a eleição e outros para a repro- 

vação... A base para a escolha hum ana não está somente no homem, 

mas no beneplácito da vontade divina 29.

 Aos que dizem que Deus elege alguns para a salvação, mas que não

predestina ninguém para a condenação, Sproul responde: Se é que real-

mente existe uma coisa tal como predestinação, e se essa predestinação

26. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol.3, p. 393.

27. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol.3, p. 409,

28. Ibid., vol. 3, p. 4 6. As palavras exatas que Calvino utilizou no original foram

 “decretum horribile.” Ela foi traduzida, nesta versão, como “decreto espantoso”.

29. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 0 .

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Contra o Calvinismo

não inclui todas as pessoas, então não podemos escapar da necessária

influência de que há dois lados para a predestinação. Não é suficiente

falar sobre Jacó; precisamos também considerar Esaú [em referência à

Romanos 9]” 30.

Sproul explica cuidadosamente que estes dois decretos de Deus -

eleição e reprovação - não são iguais. Ele rejeita o que ele chama de

“hipercalvinismo”, que acredita na “ultimação igual” dos decretos da

eleição e reprovação. (Aqui há uma área de diversidade entre os calvi-

nistas, embora Sproul declare o que ele chama de “hipercalvinismo”

como sendo “anticalvinismo”! 3') Conforme ele explica, o decreto de

eleição é positivo ao passo que o decreto de reprovação é negativo. Em

outras palavras, Deus, de maneira positiva, coloca a fé nos corações dos

eleitos enquanto que, de maneira proposital, negligência fazer o mesmo

com os réprobos. A única diferença é que Deus não cria a descrença

nos corações dos réprobos; ele simplesmente os abandona em suas

condenações ao passo que Ele cria a crença nos corações dos eleitos 32.

 Alguém só pode se perguntar quão grande é esta diferença. Como é queDeus não torna estes dois decretos igualmente finais? Ambos são incondi-

cionais no sentido de que a escolha de Deus não está embasada em nada

que Deus veja nas pessoas escolhidas ou ignoradas. Conforme explicarei

no capítulo 5, chamar um decreto de “positivo” e 0 outro de “negativo” não

parece diminuir a atrocidade da reprovação. Sproul acusa 0 hipercalvinismo

de fazer “uma drástica violência à integridade de Deus”33. Um crítico do

calvinismo rígido de Sproul diria 0 mesmo acerca de sua visão.

 Alguns leitores que vieram a abraçar o calvinismo (ou estão consi-

derando isso) ao ouvirem ou lerem John Piper podem se perguntar se

30. Ibid., 03.

3 . Ibid., 04.

32. Ibid., 04 - 05.

33. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p 05.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

ele  abraça este “decreto horrível” de reprovação. Ou seja, o Piper acre-

dita que a predestinação é incondicional e dupla? Sem dúvida que ele

acredita. Em The Pleasures of God (Os Prazeres de Deus)  ele discute “O

Prazer de Deus na Eleição” e não deixa dúvida de que ele concorda comCaivino, Boettnner e Sproul. A eleição, ele diz, é incondicional porque

“ela não é embasada naquilo que alguém faz após nascer. Ela é livre e

incondicional” 34. Ele não trata muito dos não eleitos, mas afirma que

Deus escolhe alguns para não salvar, embora ele tenha compaixão deles”

35. Tratarei desta alegação no capítulo seguinte; tal alegação parece con-

traditória para mim e para a maioria dos não calvinistas, se não todos 36.

O ponto principal do “U” da TULIP, para os calvinistas, é a natureza

incondicional   da eleição para a salvação (que também seria verdadeiro

da reprovação). A predestinação de Deus dos destinos eternos de seres

humanos individuais não tem qualquer relação com a presciência do caráter 

ou escolhas.Todo autor calvinista enfatiza e destaca este ponto. Boettner

declara que a escolha de Deus náo é embasada em nada que Deus veja

em uma pessoa, incluindo sua presciência de sua fé ou arrependimento. Até mesm o a fé e o arrependimento são dons de Deus para o eleito e

não podem ser a base de sua eleição 37. Para os calvinistas isto é uma

doutrina de misericórdia e graça - que Deus soberanamente escolhe

salvar alguns pecadores imerecedores e ele mesmo realiza toda a sal-

 vação sem qualquer cooperação dos pecadores. Os críticos acreditam

que eles escolhem não dar a importância e ignoram o lado negro desta

34. John Piper, The Pleasures of Cod  (Portland, OR: Multnomah, 99 ), 32.

35. Ibid., 44.

36. Aqui eu gostaria de observar que alguns luteranos acreditam na eleição 

incondicional, mas a maioria não acredita em um decreto de reprovação. Isto é o que 

os calvinistas consistentes, de qualquer forma, acham que é logicamente impossível. 

Então, os calvinistas não são os únicos que acreditam na eleição incondicional, mas

 aparentemente apenas os calvinistas acreditam em um decreto de reprovação.

37. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 98 - 0 .

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Contra o Calvinismo

doutrina, que é a de que Deus  poderia  salvar a todos - uma vez que a

eleição para a salvação é incondicional - mas ele não o faz. Boettner

tenta explicar a razão disto:

A condenação dos não eleitos é projetada primariamente para 

fornecer uma exibição eterna, diante dos homens e anjos, do ódio  

de Deus ao pecado, em outras palavras, é para ser uma manifesta-  

ção eterna da justiça de Deus... Este decreto exibe um dos atributos  

divinos que, sem condenação [dos não eleitos], jamais poderia ser  

apreciado de m ane ira adequada 38

Muitos calvinistas, neste ponto, preferem apelar ao mistério e não

oferecem qualquer sugestão de a razão pela qual Deus não salva a todos.

Talvez este seja um elemento isolado na teologia de alguns calvinistas

que poderia corretamente ser chamada de extrema ou radical. A crença

de Boetnner (e respostas semelhantes de outros calvinistas) levanta esta

questão: A cruz de Cristo não foi uma manifestação suficiente da justiça

de Deus e de seu ódio para com o pecado? (Não que Jesus tenha sido

um pecador, mas que 0  pecado do mundo foi posto sobre ele, parcial-

mente, para exibir 0  quão sério Deus considera 0  pecado). O motivo

especulativo de Boettner e de outros calvinistas para a reprovação parece

diminuir a glória da cruz.

“L” DE EXPIAÇÃO LIMITADA

O terceiro elemento da TULIP é a “expiação limitada” - que também échamada de maneira preferível por muitos calvinistas de “redenção parti-

cular”. Este é 0  ponto da TULIP contestado por muitos que se auto-identi-

ficam como calvinistas e que talvez seja 0  ponto totalmente ausente no

pensamento de Calvino. Muitos calvinistas dizem que eles são de “quatro

pontos” ou “calvinistas de quatro pontos”. O que eles querem dizer é que

acreditam no “T”, “U”, “I” e “P”, mas que não acreditam no “L”. Todavia,

38. Ibid., 117.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

0 L - expiação limitada, redenção particular - é parte do sistema histórico

calvinista de soteriologia, e muitos calvinistas rígidos argumentam que

este ponto não pode ser retirado sem que faça violência a todo esquema

calvinista de salvação. Antes de expor este ponto da TULIP, eu devo pontuar que todos os

calvinistas aceitam a “teoria da substituição penal” da expiação. Ou

seja, eles acreditam juntamente com Calvino e os puritanos e a maio-

ria dos cristãos evangélicos, que Deus puniu Jesus pelos pecados das

pessoas que Deus queria salvar - ou 0  mundo inteiro incluindo todas

as pessoas (a visão arminiana típica) ou os eleitos (a visão calvinistatípica). Em outras palavras, Jesus Cristo satisfez a justiça de Deus ao

suportar a punição merecida de todas as pessoas que Deus queria

salvar. É isso que torna tais pessoas “salváveis”. Muitos não calvinistas

também afirmam esta doutrina da expiação, mas os calvinistas geral-

mente argúem que a crença de que Cristo suportou a punição pelos

pecados de todas as pessoas leva inevitavelmente ao universalismo -

crença na salvação de todos.

Boettner fortemente endossa a expiação limitada, defendendo que

ela está logicamente conectada à eleição incondicional. Juntamente

com a maioria dos calvinistas, ele enfaticamente afirma que 0  valor 

da morte de Cristo foi suficiente  para a salvação de todas as pessoas,

mas que é foi eficaz  para salvar apenas os eleitos 39. Outra forma de

expressar isso é que os benefícios da morte de Cristo na cruz, emborasuficiente para a salvação de todas as pessoas, foram intencionados por 

Deus  apenas para os eleitos. A natureza limitada da expiação, então,

foi em seu escopo  e não em seu valor.  É por esta razão que muitos

calvinistas preferem o termo “redenção particular” ou “expiação defi-

nitiva”. Ela foi particularmente intencionada por Deus para um povo

particular (em oposição à todos indiscriminadamente), e ela garantiu

39. Ibid., 152.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

se encontra no supremo propósito ou vontade de Deus. Esse propósito

ou intento não inclui a raça humana inteira. Se incluísse, a raça humana

inteira certamente seria redimida” 43.

 As respostas às acusações destes calvinistas contra a crença na expia-

ção universal (ex. que ela logicamente exige crença na salvação universal)

será respondida no capítulo 6. Em minha opinião, elas são simplesmente

erradas. Não existe conexão lógica entre expiação universal e salvação

universal mais do que existe uma conexão lógica entre 0 presidente dos

Estados Unidos declarando uma anistia incondicional para os protes-

tantes da Guerra do Vietnã que fugiram para 0  Canadá para escapar do

recrutamento e todos eles automaticamente se apropriando desta anistia

e voltando aos EUA (Isso na verdade aconteceu sob o Presidente Jimmy

Carter e muitos que poderiam ter voltado para casa, em razão de todos

terem sido perdoados, não voltaram). Isso é apenas um breve panorama

da TULIP Eu tratarei de assuntos com plexos em maior profundidade nos

capítulos subsequentes. Aqui, é importante observar, para o entendimento

do calvinismo por parte dos leitores, que a maioria dos calvinistas negaque Deus intencionou a cruz para todas as pessoas, 0 que significa, natu-

ralmente, que ele não ama a todos da mesma maneira.

Boettner e Piper realmente afirmam os benefícios da cruz para todos,

de alguma forma. Deste modo, é verdadeiro dizer (pelo menos para eles)

que Cristo morreu por todos. Boettner escreveu que “certos benefícios”

da cruz foram estendidos a toda humanidade em geral. Estes benefícios

são as “bênçãos temporais” apenas e não possuem nenhuma relação

com a salvação” 44. Piper ensina que Cristo realmente morreu “por to-

dos”, mas não no mesmo sentido. Ao tentar levar a sério as passagens

bíblicas que tratam de “todos” (que serão lidas de maneira pormenori-

zada posteriormente), ele diz:

43. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 5 .

44. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  60.

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Contra 0 Calvinismo

Nós não negamos que, em certo sentido, todos os homens são os  

beneficiários pretendidos da cruz. Timóteo 4. 0 diz que Cristo é 

“o Salvador de todos os homens, principalmente dos que creem”. O  

que negamos é que todos os homens são intencionados como bene- 

ficiários da morte de Cristo da mesm a m aneira. Toda a misericó rdia

 de Deus para com os descrentes - desde o nascer do sol (Mateus  

5.45) à pregação do evangelho a todo 0 mundo (João 3 . 6)- torna-se 

possível em razão da cruz 45.

Claro, como enfatizarei e discutirei em mais detalhes no capítulo 6,

alguém pode legitimamente imaginar quão benéfica a cruz realmente

é para aqueles aos quais Deus nega seu poder salvífico. Como a cruz

realiza qualquer coisa para os não eleitos? Como é que 0  raiar do sol é

realizado pela cruz de Cristo e qual é benefício da pregação do evangelho

para os não eleitos? Como é que a cruz realiza 0  raiar do sol e qual é 0

benefício da pregação para os não eleitos? Alguém só pode suspeitar que

tanto Piper quanto Boettner (e outros calvinistas que alegam que Cristo

morreu para os não eleitos “em algum sentido”) simplesmente querem

desviar as acusações que a visão que defendem da expiação limitada se

choca com as passagens bíblicas que Cristo morreu por todos.

 Ademais, principalmente o Piper (e indubitavelmente outros calvinis-

tas) deseja(m) dizer que Deus tem uma compaixão genuína com os não

eleitos para os quais Cristo não morreu como um sacrifício expiatório.

“Há um am or geral de Deus que ele concede a todas as suas criaturas”46

mas tal não  é 0  amor que Deus tem por seus eleitos. E, de acordo comPiper, Deus tem uma compaixão sincera até mesmo para com os não

eleitos de sorte que ele deseja a salvação destas pessoas, ainda que ele

se recuse a prover esta salvação na cruz 47. Parafraseando João Wesley,

este amor e esta compaixão são de gelar 0  sangue nas veias. Que amor

45. Piper, “For Whom Did Christ Die?”

46. Piper, The Pleasures of God,  48.

47. Ibid., 44 - 46.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

se recusa a salvar aqueles que poderiam ser salvos, uma vez que a sal-

 vação é incondicional? Que com paixão se recusa a prover pela salvação

quando ela poderia ser fornecida?

 A questão é que 0  “calvinismo geral” do calvinismo puro e simples,geralmente, mas nem sempre, restringe a intenção salvífica de Deus na

cruz de Cristo aos eleitos; Deus não planejou a salvação dos réprobos, os

não eleitos. Eles estão excluídos da expiação exceto  em algum sentido

atenuado de receber algum tipo de bênçãos temporais da cruz, sendo

que tais bênçãos ficam, geralmente, sem explicação. Assim sendo,

alguns calvinistas recusarão a dizer a um grupo de pessoas ou para

desconhecidos as seguintes frases: “Cristo morreu de sorte que você

possa ser salvo” ou “Cristo morreu por seus pecados”. Tais afirmações

seriam presunçosas; não há como saber isso. Todavia, astutamente,

Piper e alguns outros calvinistas que acreditam na expiação limitada

podem dizer a qualquer um e a todos: “Cristo morreu por você”, sem

querer dizer “Cristo morreu por seus pecados” ou “Porque Cristo morreu

por você, você pode ser salvo”. Alguns consideram isso um subterfúgio;uma insinceridade.

Com base em quais versículos bíblicos os calvinistas afirmam a

expiação limitada? Muitos críticos, incluindo alguns calvinistas que se

denom inam “de quatro pontos” , defendem que esta doutrina não possui

base escriturística. Todavia, Boettner, Sproul, Piper e outros apontam para

passagens tais como João 10 .15 ; 11 .5 1- 5 2 e 17 .6, 9, 19, na qual Jesusdiz frases como “dou a minha vida pelas ovelhas”. O ponto principal do

capítulo 6, dedicado à expiação limitada, será que 0  versículo aqui que

fala acerca de Cristo morrendo por seu povo, suas ovelhas, ou os que

lhe foram dados por seu Pai não necessariamente 0  exclui de morrer

pelos outros. Na verdade, 1 João 2.2 claramente afirma que ele, Jesus,

é a propiciação pelos pecados de todo 0 mundo. Piper e outros alegam

que esta passagem se refere aos filhos de Deus espalhados por todo o

mundo e que ela não se refere a todo mundo.

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Contra 0 Calvinismo

“I” DE GRAÇA IRRESISTÍVEL 

O quarto ponto da TULIP é, de maneira variada, chamado de graça

irresistível, graça eficaz (o termo favorito de Sproul para este ponto) ou

graça efetiva (0  termo favorito de Boettner para 0  ponto). Um termo

relacionado bastante próximo é 0  monergismo - crença de que Deus é

0 único agente ativo na salvação. Monergismo é 0 oposto de sinergismo

- a crença de que a salvação inclui a cooperação da pessoa sendo salva.

 A graça irresistível não significa que toda a graça sempre é irresistível

ou eficaz. Antes, apenas a graça salvífica dada aos eleitos para regenerá-

-los e dar a eles um novo nascimento é irresistível e eficaz. Uma pessoaescolhida por Deus para a salvação não irá, pelo fato dela não poder,

resistir à “chamada interior” de Deus porque Deus “verga a sua vontade”.

Não é uma questão de coerção; 0  Espírito Santo não esmaga e força a

pessoa a se arrepender e crer; antes, o Espírito Santo transforma o co-

ração da pessoa de maneira que ela quer se arrepender e crer. Boettner

e outros calvinistas conectam este aspecto de sua soteriologia bem de

perto com a depravação total:

Como calvinistas nós mantemos que a condição dos homensdesde a queda é tal que se o homem fosse deixado como está elecontinuaria em seu estado de rebelião e recusa ã todas as ofertas dasalvação. Cristo, então, teria morrido em vão. Mas uma vez que foiprometido... a obra de Deus na redenção foi tornada eficaz atravésda missão do Espírito Santo que opera de tal forma na pessoa que ela

é trazida ao arrependimento e fé, e, deste modo, feita participanteda vida eterna 48.

Eles embasam isto na doutrina da depravação total como morte espi-

ritual absoluta tal que nem mesmo uma pessoa eleita tem a habilidade

de responder a Deus, muito menos buscar a Deus, até que e a menos

que Deus sopre nova vida nela em regeneração e Escritura. A principal

48. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  63.

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Contra o Calvinismo

salvação universal. Na passagem em questão Jesu s diz: “ Mas eu, quando

for levantado da terra, atrairei todos a mim”. A palavra grega traduzida

por “atrair”, neste versículo, é a mesma utilizada em João 6.44. Deste

modo, se a palavra utilizada precisa ser interpretada como “compelir”

ou “arrastar”, então em João 12.32 Jesus estava dizendo que ele atrairia

ou traria todas as pessoas para si. Mas 0 versículo não é entendido assim

até mesmo pelos calvinistas!

Calvino acreditou e ensinou a graça irresistível? Embora ele não tenha

utilizado 0 termo, Calvino claramente ensinou o conceito no final de uma

longa discussão de com o Deus opera nos eleitos para trazê-los para si: “A

síntese é: Deus, por uma adoção graciosa, cria aqueles  a quem quer ter

 por filhos. A causa intrínseca disto, porém, está nele próprio, porque não

leva em conta nada mais além de seu secreto e singular beneplácito” 52.

Sproul expressa fortemente esta doutrina: “Deus, unilateralmente

e monergisticamente, faz para nós 0  que nós não podemos fazer para

nós mesmos” 53. À verdadeira moda calvinista ele coloca a regeneração

pelo Espírito Santo (ser nascido de novo) antes da conversão (na ordemlógica dos eventos da salvação). Ou seja, antes que uma pessoa seja até

mesmo capaz de receber os dons da fé e arrependimento, ela deve ser

feita nova criatura em Cristo Jesus através do “cham ado interno eficaz” ,

que é comparável à criação a partir do nada 54. Em outras palavras, Deus

não pega algum potencial existente e constrói sobre ele ou extrai dele

para operar a salvação na vida da pessoa. Antes, Deus pega uma pessoa

morta em delitos e pecados e a traz para a vida, em termos espirituais.

Sproul, assim como todos os calvinistas, faz distinção entre 0  “cha-

mado externo”, que é 0  evangelho pregado a todos, e o “chamado

interno”, pela qual o Espírito Santo regenera uma pessoa. Apenas os

52. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol.3, p. 402.

53. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 60.

54. Ibid., 63.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

eleitos recebem 0  “chamado interno” e ela sempre resulta na salvação

das pessoas e o resultado não pode ser 0  contrário 55. A regeneração,

então, deve preceder a conversão (arrependimento e fé), pois ninguém

 jamais responderia a Deus com arrependimento e fé a menos que apessoa tenha nascido de novo. A pessoa salva, geralmente, não está

cônscia da prioridade da regeneração, ela pode sentir que ser nascida

de novo vem após  a fé e o arrependimento, mas, teologicamente, o cal-

 vinista sabe que este não é 0  caso.

Esta é uma característica do esquema calvinista e, até onde sei, todos

os calvinistas aderem a ela. Outros podem aderir a ela também, mas

apenas se acreditarem que o batismo infantil regenera uma criança (re-

generação batismal), como nas teologias episcopal e luterana. Todavia,

muitos protestantes, tais como os batistas e pentecostais, acreditam que

a fé precede a regeneração na ordem lógica da salvação. A mensagem

simples do evangelho para a maioria dos cristãos evangélicos é “creia e

seja salvo” embasado nas passagens bíblicas tais como João 3.1 - 21,

na qual Jesus diz a Nicodemos que ele deve nascer de novo e que a fénele realizará isso (v. 14). Não há nenhuma form a de reconciliar esta

passagem com a crença de que a regeneração precede a fé.

“P” DE PERSEVERANÇA

O quinto aspecto da TULIP é a perseverança dos santos. Esta é talvez

0 aspecto menos controverso do calvinismo, pois muitos não calvinistasacreditam nele também, e isso embasado nas passagens bíblicas tais

como Romanos 8.35-39. Até mesmo Jacó Armínio (156 0-16 09), 0 grande

oponente do calvinismo, declarou que ele era incapaz de se decidir acerca

desta doutrina e a deixou para estudos subsequentes 56. Ele morreu antes

de, por hm, tomar uma posição. A primeira declaração de fé remonstrante

55. Ibid., 62.

56. Ver “Declaration of the Sentiments of Arminius” em The Works ofJames Arminius  

(trad., James Nichols; Grand Rapids: Baker, 996), :667.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

seguinte explorarei mais profundamente a diversidade entre calvinistas

ao examinar algumas variedades de “calvinismo puro e simples”.

VARIEDADES DA TULIP

 Já deveria estar claro, até 0  momento, que considero “reformado”

uma categoria mais flexível e com diversidade muito maior que “calvi-

nismo”. Claramente, pelos padrões mundiais contemporâneos, tais como

a AMIR, as duas categorias não são intrinsecamente ligadas exceto  no

sentido de que todas as pessoas reformadas alegam uma árvore gene-

alógica religiosa que remonta à reforma suíça do século XVI, incluindoa obra de João Calvino. Mas nem todos concordam com a TULIP ou até

mesm o muito do que Calvino disse acerca da soberania de Deus. O

calvinismo não é tanto uma família ou herança como é um sistema de

crenças teológicas. O calvinismo está firmemente inserido na tradição

reformada, mas não é a mesma coisa que reformado.

Muitos na tradição reformada estão incomodados com 0  calvinismo

(assim como estavam alguns reformadores suíços na época de Calvino!),

e o calvinismo se estende para fora da comunidade reformada de igrejas

para, por exemplo, a vida batista. Pode ser encontrado aqui e acolá entre as

denominadas Igrejas Livres (ex. Evangelical Free Church of America [Igreja

Evangélica Livre da América], que, recentemente, tem se inclinado cada vez

mais para o calvinismo) e, ocasionalmente, até mesmo entre pentecostais.

Eu recentemente conheci um pastor calvinista de uma grande igreja As-sembleia de Deus; isso era sem precedentes no passado e provavelmente

ainda abalaria a hierarquia da denominação Assembleia de Deus! O pastor

assistente do pastor titular é claramente um membro do movimento jovem,

incansável e reformado. Movimento reformado até mesmo para um assem-

bleiano, isto é um termo errôneo e definitivamente uma anomalia. Chamar

alguém tanto de “reformado” e pentecostal parece mais que esquisito.

Irei escrever aqui acerca da diversidade entre calvinistas concer- 

nente ao  calvinismo em vez de diversidade de  calvinismo. Por quê?

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Contra o Calvinismo

 A diversidade é sempre de pessoas; 0  calvinismo não é um grupo de

pessoas, mas uma construção teológica que é interpretada e vivida de

 várias form as por várias pessoas - alguns dentro da família reform ada

e alguns fora dela. O esboço do calvinismo geral ou calvinismo puroe simples apresentado acima está focado em um tipo ideal de calvi-

nismo compartilhado por muitos calvinistas, mas não todos. Todos os

 verdadeiros calvinistas olham para a TULIP com o um a descrição rela-

tivamente acurada de sua soteriologia, mas alguns rejeitam um ponto

(sempre o L) e alguns que aceitam todos os cinco pontos os aplicam

à práticas, tais como evangelismo, de formas diferentes. E então há 0

 velho argumento entre calvinistas “supralapsarianos” e “ infralapsaria-

nos”, que eu discutirei brevemente.

 Já mencionei 0  fato de que muitos cristãos rejeitam 0  “L” do acrósti-

co TULIP em favor de uma combinação de expiação universal, eleição

particular e graça eficaz. Estes calvinistas de “quatro pontos” destoam

do grupo e argumentam que apesar de eleger apenas algumas pessoas

para a salvação e apenas atrair algumas pessoas irresistivelmente para

a fé, Deus enviou Cristo para morrer pelos pecados de todo 0  mundo

e não apenas pelos pecados dos eleitos. A crítica à expiação limitada

 virá posteriormente, mas, no momento, me restringirei simplesm ente

a enfatizar que muitos calvinistas concordam com os arminianos e lute-

ranos (e talvez outros) que a morte substitutiva de Cristo na cruz foi, na

 verdade, projetada por Deus para todas as pessoas. Em outras palavras,ele suportou a punição pelos pecados de todo 0  mundo, sem exceção.

Um eminente teólogo calvinista de tradição batista que aceitou todos

os pontos da TULIP exceto o “L” foi August Hopkins Strong (18 36 - 19 21) ,

professor de teologia por muito tempo no Rochester Theological Semi-

nary e autor de inúmeros livros, incluindo um livro didático amplam ente

utilizado e influente, Systematic Theology.  Tendo por base passagens

bíblicas tais como 1 João 2.2, Strong argumentava que a “expiaçáo de

Cristo fez provisão objetiva para a salvação de todos, ao remover da

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

mente divina todo obstáculo ao perdão e restauração de pecadores,

exceto sua oposição obstinada à Deus e recusa à se voltar para Ele” 58.

Seguindo Strong ao verdadeiro estilo batista, Millard Erickson

(η. 1932), teólogo calvinista batista posterior, argumentava de maneira

semelhante: “Concluímos que a hipótese de expiação universal é capaz

de explicar um segmento maior de testemunho bíblico com menos

distorção do que a hipótese de expiação limitada” 59. Inúmeros outros.

Principalmente batistas e calvinistas de Igrejas Livres, concordam com

Strong e Erickson. Era provavelmente 0  calvinismo majoritário entre

os evangélicos não reformados por grande parte do século XX - até a

ascensão do movimento jovem , incansável e reformado sob a influênciade John Piper e outros que defendem fortemente a expiação limitada.

Mas o que dizer dos teólogos dentro de comunidades tradicionalmente

reformadas, tais como presbiterianos conservadores e cristãos reforma-

dos? Todos eles afirmam 0  “L” na TULIP? Dificilmente. Um eminente

exemplo é 0  teólogo James Daane, mencionado acima, um membro

da Igreja Cristã Reformada. Em The Freedom of God   este professor do

Fuller Seminary criticava veementemente o Sínodo de Dort por nãocitar nenhum versículo bíblico que prova a “expiação limitada” e por

 virtualmente eliminar o mistério da teologia reformada através de modos

de pensamento escolásticos que focam em um número  em vez de uma

comunidade.  Do calvinismo muito tradicional, ele escreveu:

Todas... as tentativas de empregar o número - a ideia de limi-  

tação - para entender a natureza da eleição, a eleição da igreja, a 

natureza da graça divina e não da exp iação de Cristo são, na verdade, 

tentativas de reduzir o mistério das verdades cristãs para limites que  

podemos racionalmente administrar. Por este caminho 0  mistério 

desaparece - 0  mistério da descrença e não menos 0  mistério de 

Cristo e da igreja 60.

58. Augustus Hopkins Strong, Systematic Theology  (Valley Forge, PA: Judson, 907), 772.

59. Millard Erickson, Christian Theology  (Grand Rapids: Baker, 984), 2:835.

60. Daane, The Freedom o f God,  38.

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Contra o Calvinismo

Os críticos rejeitam Daane como influenciado pelo teólogo reformado

revisionista suíço Karl Barth (1886 - 1968), mas sua principal influência foi

o teólogo reformado holandês Berkouwer, que é geralmente considerado

muito mais tradicional que Barth. De qualquer forma, Daane represen-

ta alguém não batista  e plenamente dentro da família reformada e um

evangélico (não liberal ou neo-ortodoxo) que rejeitava a expiação limitada.

Talvez a mais antiga e mais profunda divisão entre os calvinistas seja

acerca da ordem dos decretos divinos. O debate remonta, pelo menos,

a Theodore Beza, o sucessor de Calvino em Genebra. Esta é uma área

tênue de teologia que afasta muitos principiantes, portanto, devotarei

certo tempo e espaço aqui para explicar cuidadosamente do que isso setrata e a razão pela qual os calvinistas se dividem nesta área.

Logo após a morte de Calvino alguns de seus seguidores adotaram um

estilo de obra teológica desconhecida pelo próprio Calvino. Tal tem sido

geralmente rotulado de “escolástico”, remontando a tendência dos teólo-

gos m edievais de fazer uso da filosofia e lógica para especular acerca de

questões deixadas sem menção na Bíblia. (O exemplo comum, embora

de certa forma extremo, é: “Quantos anjos podem dançar sobre a ponta

de um alfinete?”) Uma manifestação desta abordagem escolástica para

0  calvinismo foi uma tentativa de discernir a ordem lógica (não tempo-

ral ou cronológica) dos decretos de Deus que expressam sua soberania

sobre a criação e redenção. O pano de fundo da pergunta era: “Deus

decretou a eleição e a reprovação de pessoas antes ou depois do decreto

de permitir a queda? Eis aqui outra pergunta, e talvez uma melhor formade expressá-la: “Deus decretou a eleição e reprovação de pessoas ã luz 

da queda  ou anterior a ela e não à luz dela?

Que tal trabalho parece um empenho totalmente especulativo, até

mesmo muitos calvinistas concordariam. Todavia, uma vez que alguns

calvinistas mais tarde chamaram de “supralapsarianos” - os que defen-

diam que Deus primeiro e principal decreto foi salvar algumas pessoas

ainda por serem criadas e condenar outras - apareceram com sua versão

de calvinismo, todos tiveram de participar. Os “infralapsarianos” eram

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

e são os que defendem que Deus decretou criar e permitir a queda

(que todos concordam que ele, na verdade, a preordenou!) primeiro e

somente então decretou eleger algumas pessoas caídas para a salvação

e predestinar outras para a condenação.

Quando 0  Sínodo de Dort se reuniu em 1618/1619, isto foi debatido

e a assembleía dos clérigos reformados por fim decidiu permitir ambas

as visões sem marginalizar qualquer uma como heresia. Havia alguns

presentes, todavia, que consideravam a visão supralapsariana herética,

pois ela parecia fazer de Deus 0  autor do pecado e do mal. Boettner

se coloca do lado do supralapsarianismo, chamando-o de “calvinismo

rígido” 61. (Deve ser observado, contudo, que isto de forma nenhumatorna sua descrição geral do calvinismo, que é a TULIP, diferente do in-

fralapsarianismo). Sproul, por contraste, condena 0 supralapsarianismo

chamando-o de “hipercalvinismo” e “anticalvinismo”. Esta visão, ele diz,

faz de Deus 0 autor do pecado ao “envolver Deus na coerção do pecado”

e, portanto, faz grande violência ao... caráter de Deus” 62.

Um supralapsariano poderia facilmente argumentar que Sproul é

culpado de viver em uma casa de vidro enquanto atira pedras. De que

maneira 0  supralapsarianismo faz de Deus mais autor do pecado do

que 0  infralapsarianismo? A diferença parece jazer em outro lugar. O

supralapsariano simplesmente deseja exaltar a supremacia de Deus ao

não fazer nada dele, incluindo seus decretos, dependente de algo que

acontece no mundo. O supralapsariano pensa que o infralapsariano

fez exatamente isso ao subordinar 0 decreto da eleição e reprovação aodecreto de permitir a queda. Se apenas à luz da queda é que Deus opera

seu plano de redenção, então, 0  supralapsariano diz que a redenção é

uma espécie de “Plano” B na mente de Deus. Isso chega a se parecer

muito com o arminianismo, assim diz 0  supralapsariano, pois faz Deus

depender indiretamente do mundo.

6 . Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  29.

62. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 05.

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Contra o Calvinismo

Todavia, como mostrarei, fazer Deus dependente do mundo pode ser

parte e parcela do calvinismo - principalmente o que chamo de calvinismo

radical ou extremo, seja o supra ou 0  infralapsarianismo. Isso se dá em

 virtude de que alguns em ambos os campos enfatizam que todo o programa

da criação e redenção (incluindo a reprovação e 0  inferno) foi feito “para

a glória de Deus”. Deus precisa do mundo para glorificar a si mesmo? Ou

antes é a criação o resultado do transbordante amor trinitariano de Deus?

Mais uma área de diversidade entre calvinistas tem a ver com se Deus

apenas “permite” o pecado e 0  mal ou, na verdade, em certo sentido

ele os causa. Todos os calvinistas concordam que Deus preordena o pe-

cado e 0 mal porque tudo é preordenado por Deus. (Reconhecidamentealgumas pessoas sem formação que pensam que são calvinistas podem

não acreditar nisso, mas todo teólogo calvinista, remontando ao próprio

Calvino, afirma essa preordenação). Sproul representa aqueles calvinistas

que insistentemente negam que Deus é, em qualquer sentido, o autor

do pecado e do mal. Calamidades, sim, mal moral, não.

 A situação problemática é estabelecida pela afirmação de Sproul (e de

outros calvinistas) da soberania divina absoluta (providência meticulosa

e o que chamo de determinismo divino ainda que ele não goste desta

terminologia): “Se há uma única molécula neste universo correndo sol-

ta, totalmente livre da soberania de Deus, então não temos nenhuma

garantia de que uma simples promessa de Deus jam ais seja cumprida...

Talvez essa única molécula seja a coisa que impede Cristo de voltar”63.

Então a questão inevitavelmente surge: “É Deus, então, 0  autor do male do pecado?” Sproul diz que não: “Uma coisa é absolutamente impen-

sável, que Deus possa ser 0  autor ou executor do pecado” 64. Ele afirma

que Deus  permitiu  a entrada do pecado e do mal em sua criação boa,

mas não 0 forçou” 65.

63. Ibid., 7- 8.

64. Ibid., 2 .

65. Ibid.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

Outro calvinista bastante conhecido que diz que Deus aquiesce ou

permite 0  pecado e o mal sem o causar ou ser seu autor é Paul Hem,

um filósofo e teólogo britânico que leciona no Regent College, Canadá.

Em seu livro The Providence o f God   este calvinista, assim como Sproul,

expressa uma elevada visâo da soberania de Deus: “Não somente todo

átomo e molécula, todo pensamento e desejo, é mantido em existência

por Deus, mas cada curva e cada volta de tudo isso está debaixo do

controle direto de Deus”66.

Mas, claro, tal entendimento promove a questão do relacionamento de

Deus com o pecado e o mal a outro nível. É Deus 0 autor deles? Helm diz

que não. Em virtude da “natureza impecável” de Deus, ele não pode ser o

autor do mal, m as em razão dele ser soberano, ele deve permitir 0 pecado

e 0 mal se eles forem existir. Mas Helm argumenta que esta permissão de

pecado e mal é “permissão específica” (semelhante ou idêntica ao que

Boettner chama de “permissão desejosa”). Ou seja, Deus jamais assume

a postura de espectador quando ele permite as coisas, incluindo 0 pecado

e 0 mal. Sem causá-los ele especificamente os deseja de tal forma a pontode garantir que eles acontecerão sem, na verdade, causá-los:

Deus ordena todas estas circunstâncias que são necessárias para a 

performance de uma pessoa de uma determinada ação moralmente  

má (digamos, uma ação de crueldade em determinado lugar e tem-  

po). O próprio Deus não realiza aquela ação, nem ele poderia, por 

razões já apresentadas [a saber, sua natureza impecável]. Contudo, ele 

 permite  que esta ação aconteça. Ele não a impede ou a para. Então, 

em circunstâncias ordenadas por Deus alguém faz uma ação má; as 

circunstâncias são ordenadas, mas 0  mal é perm itido” 67.

Muitos calvinistas diriam “amém” para esta descrição do relaciona-

mento de Deus com 0 pecado e o mal. Eles, assim como todos os demais,

não querem dizer que Deus é a causa ou 0  autor do pecado e do mal.

66. HELM, Paul. A providência de Deus. São Paulo; Cultura Cristã, 2007. p. 19.

67. Ibid., 72.

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Contra 0 Calvinismo

Boettner inclui um extenso capítulo em sua edição em The Reformed  

Doctrine o f Providence  e, como Helm, argumenta (mas de forma ainda

mais veemente) que embora Deus ordene tudo, ele não é a causa ou

autor do pecado ou do mal. Investigarei isso mais adiante, no capítulo

4, então, por agora, colocarei de lado qualquer discussão mais longa

dos problemas inerentes nesta visão. Que seja sabido agora que con-

cordo com a segunda visão mantida por alguns calvinistas de que sua

doutrina da soberania de Deus necessariamente implica ou ensina que

Deus é   o autor do pecado ou que pelo menos  ativamente 0  garante em

certo sentido causai de sorte que 0  termo “permissão” não é suficiente.

Não é nada difícil encontrar calvinistas na Internet (ex. blogueiros)

que corajosamente afirmam que 0  calvinismo exige a confissão de que

Deus é o  autor do pecado e do mal. Tal pessoa é Vincent Cheung, que

escreve acerca do calvinismo como calvinista  em seu website www.

 vincentcheung.com. (Sei muito pouco desta pessoa exceto que ele é

um comentarista prolífico em assuntos relacionados à teologia a partir

de uma perspectiva calvinista). Assim como muitos outros autores quepodem ser facilmente encontrados na web, Cheung ridiculariza seus

companheiros calvinistas que dizem que Deus não é 0 autor do pecado68.

Ele então diz que “quando alguém alega que minha visão da soberania

divina torna Deus o autor do pecado, minha primeira reação tende a ser

a seguinte Έ daí?’ ... não há problema bíblico ou racional no fato dele ser

0 autor do pecado” 69. Cheung prossegue argumentando que a descrição

calvinista típica da soberania absoluta de Deus necessariamente leva a

Deus a ser 0  autor do pecado em qualquer sentido comum de “autor”.

Outro calvinista que afirma que Deus mais do que meramente per-

mite 0  pecado e 0  mal, mas sem, na verdade, chamar Deus 0  “autor do

pecado” é John Frame (n. 1939). Frame lecionou por muitos anos no

68. Vincent Cheung, “The Author of Sin.” www.vincentcheung.c0m/2005/05/3 /the-

 author-of-sin/.

69. Ibid.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

 Westminster Theological Sem inary e agora é professor de teologia no

Reformed Theological Seminary. É autor de vários livros, muitos deles

acerca da teologia reformada (a partir de uma forte perspectiva calvi-

nista). Em uma entrevista com Andy Naselli publicada na Internet em

2009, Frame respondeu a uma pergunta acerca de Deus não causar, mas

permitir o mal. Embora ele demore e se recuse a dizer que Deus causa

ou é o autor do mal, Frame diz que a terminologia de permissão não é

forte 0 bastante e prefere dizer que Deus, na verdade, efetua 0  mal 70.

Outro calvinista que não acha que a linguagem de Deus meramente

permitir 0  pecado e 0  mal seja forte o bastante para fazer justiça à so-

berania de Deus é John Piper. Enquanto ele não rejeita a terminologia

de permissão, ele frequentemente vai além dela ao explicar o papel de

Deus em desastres, mal e até mesmo 0  pecado. Em um sermão publi-

cado em seu website logo após os ataques terroristas em Nova York

e Washington, D.C., no dia 11 de setembro de 2001, Piper rejeitou as

meras explicações de permissão do papel de Deus e afirmou que, em

certo sentido, Deus “planejou”, “ordenou” e “governou” tais eventos71.Durante um sermão pregado para uma conferência de jovens em 2005

ele enfatizou a soberania absoluta de Deus sobre todas as coisas e disse:

“Até mesmo uma ‘bomba com material radioativo’ que destrua Mineá-

polis seria de Deus” 72.

Muitos calvinistas ficam embaraçados com tais afirmações como a

de Cheung, Frame e de Piper, mas outros as consideram a dura verda-

de que necessariamente segue do próprio ensinamento da Bíblia. Por

exemplo, José disse a seus irmãos que 0 ato de vendê-lo como escravo

70. “Entrevista com John Frame acerca do problema do mal”. http://thegospelcoalition. 

org/blogs/justintaylor/2008/08/20/interview-with־john-frame־on-problem־of/.

7 . Tal afirmação encontra-se no sermão já mencionado anteriormente “Why I Do Not 

Say, ‘God Did Not Cause the Calamity’. . . . ”

72. John Piper, “God’s God-centeredness,” sermão pregado na Passion conference 

(Nashville, TN; Jan. 2 - 5, 2005).

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Contra o Calvinismo

para 0  Egito, que eles intentaram como mal, Deus tornou em bem

(Gn. 50.20). Então há 0  evento da cruz de Cristo, que foi preordenado

por Deus “desde a fundação do mundo”. Ambos os eventos envolveram

pecados. Deus não foi 0  autor destes pecados? Não importa como você

tente sair disso, alguns calvinistas dirão, não há como fugir do fato de

que Deus preordenou e tornou estes eventos certos, então ele é 0 autor

deles, se não a sua causa direta. Enquanto discorde que tais histórias

exijam a crença de que Deus tornou 0 pecado ou 0 mal certos, concordo

com os calvinistas que dizem que a visão calvinista comum de soberania

exige a confissão de Deus como o autor do pecado e do mal.

Há uma esfera final de diversidade no calvinismo a ser mencionada.

E é o debate acerca do verdadeiro “hipercalvinismo” - corretamente uti-

lizado (de acordo com a maioria dos teólogos reformados) da versão do

calvinismo de Herman Hoeksema (1886 - 1965) que rejeitava a prática

de apresentar, de maneira indiscriminada, o convite do evangelho para

a salvação de todas as pessoas. Hoeksema nasceu na Holanda, mas

imigrou para os EUA quando criança e se estabeleceu em Grand Rapidsonde ele, por fim, pastoreou uma grande Igreja Cristã Reformada. Entre

outras obras ele escreveu Reform ed Dogmatics.73 Hoeksema iniciou uma

controvérsia dentro das igrejas reformadas ao argumentar que 0  evan-

gelismo indiscriminado, com apelos abertos voltados para a salvação,

 viola a doutrina da soberania de Deus na salvação.

 A controvérsia foi descrita como concernente a “oferta sincera do

evangelho” por Anthony Hoekema (1913 - 1988), eminente teólogo e

professor do Calvin Theological Seminary (observe aqui a diferença de

grafia para o nome Hoeksema; eles não são parentes). De acordo com

Hoekema, Hoeksema ensinava que “a chamada do evangelho jamais

é uma oferta” de salvação 74. É antes uma proclamação do que Deus

73. Herman Hoeksema, Reformed Dogmatics   (Jenison, MI: Reformed Free Publishing 

Association, repr. 985).

74. Anthony Hoekema, Saved by Grace  (Grand Rapids: Eerdmans, 989), 72.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

tem feito; só Deus decidirá o que fazer com ela, e ele sempre decide

utilizá-la para atrair o eleito para si. Mas ela não  é uma oferta sincera

de salvação para todos, pois “Deus não deseja a salvação de todos aos

qual0

  evangelho chega; ele deseja a salvação apenas dos eleitos” 75.

 A Igreja Cristã Reformada expulsou Hoeksema por este motivo, sus-

tentando que “a pregação do evangelho é uma oferta sincera de salvação,

não apenas da parte do pregador, mas também da parte de Deus, para

todos os que a ouvem, e que Deus seria e sinceramente deseja a salvação

de todos ao qual a chamada do evangelho atinge” 76.

O teólogo reformado Daane atribui 0  calvinismo extreme de Ho-

eksema não a uma interpretação anômala do calvinismo rígido, mas

àquela própria teologia - uma teologia que ele chama de “teologia

decretai”, que inclui a reprovação como um decreto de Deus 77. Alguém

precisa imaginar qual lógica impede uma pessoa que acredita na TULIP

de mudar para a posição de Hoeksema. Por que Deus sinceramente

desejaria a salvação de todos e como pode a chamada do evangelho

ser chamada de uma oferta sincera de salvação para todos indiscri-minadamente, incluindo os não eleitos, se Deus decretou que apenas

alguns serão salvos?

TEOLOGIA REFORMADA /RADICAL 

Dada a evidente diversidade da comunidade reformada e entre cal-

 vinistas, quando digo que sou “contra 0  calvinismo” e quero resgatar areputação de Deus da “teologia reformada radical”, de qual calvinismo

e de qual teologia reformada estou falando? Existem tantos tipos! Isso é

 verdade. Bem, aqui eu quero explicar qual é 0  tipo que eu estou contra;

0  restante do livro explicará a razão em detalhes.

75. ibid., 73.

76. Ibid.

77. Daane, The Freedom of Cod, 24.

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Contra o Calvinismo

O “calvinism o” que sou contra e que me refiro é 0  “calvinismo rígido”

da TULIP, quer seja infralapsariano ou supralapsariano. Tais diferencia-

ções, se examinadas de perto, não fazem diferença: ambas as visões

farão que Deus seja, no melhor dos cenários, moralmente ambíguoe, no pior dos cenários, um monstro moral (apesar das alegações dos

calvinistas do contrário!). Mais uma vez desejo enfatizar que não é 0 livre-arbítrio que me preocupa,  exceto o livre-arbítrio que é necessário

para proteger 0 caráter de Deus de ser impugnado. O que me preocupa,

e eu deixarei explicitamente claro, é o ensino bíblico de que “Deus é

amor” (1 João 4.16).

Por favor, não rejeite isso como sendo superficial demais; irei des-

compactar minha alegação de que 0 calvinismo rígido, 0 calvinismo que

afirma a maioria ou todos os pontos da TULIP, contradiz diretamente que

Deus é  amor. Estou bastante consciente das objeções calvinistas de que

0 amor de Deus é diferente de nosso tipo de amor. Já ouvi isso inúmeras

 vezes. Enquanto há certa verdade nesta afirm ação, ela é exagerada pela

maioria dos calvinistas. Se 0  amor de Deus é absolutamente diferentede nossas mais elevadas e melhores noções de amor na medida em

que as extraímos da própria Escritura (principalmente de Jesus Cristo),

então 0  termo é simplesmente sem sentido quando em relação à Deus.

 Alguém pode também dizer que “Deus é creech-creech” - um a afirma-

ção vazia de sentido.

Conforme espero demonstrar, alguns calvinistas concordam comigo

acerca da analogia entre a bondade e amor de Deus e nossas melhores

e mais elevadas ideias de bondade e amor. Paul Hem, por exemplo,

rejeita qualquer ideia de que a bondade e ao amor de Deus seja qua-

litativamente diferente do nosso (uma vez que 0  nosso seja derivado

da Escritura, claro). Entretanto, argumentarei, que até mesmo os que

concordam comigo não podem explicar adequadamente como a des-

crição sua descrição da soberania de Deus, principalmente em relação

ao pecado, mal e reprovação, é consistente com a bondade ou amor.

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

Mais uma vez, eu sou contra o quê? Ao dizer “contra 0  calvinismo”

eu quero dizer que me oponho a toda e qualquer sistema de crença que

inclua 0 "U”, 0  “L ” e o “I” da TULIP. O “U” e ο “I” sempre aparecem juntos

mesmo quando o “L” é rejeitado. Eu me oponho mais energicamenteao “L”, mas penso que ele seja necessariamente conseqüência do “U” e

do “1”, então eu concordo com aqueles calvinistas que defendem que é

inconsistente deixar 0 “L” de fora. A “flor”, por assim dizer, é danificada

e fica irreconhecível ou irrecuperável ao tirar dela essa pétala!

 Acredito também que a afirmação da eleição incondicional neces-

sariamente implica na afirmação da reprovação, apesar da negação de

alguns calvinistas. A reprovação é a “conseqüência lógica e necessária”

da eleição incondicional a menos que alguém afirme a salvação universal. 

(Um exemplo disto é o grande teólogo reformado Karl Barth, que, acre-

dito eu, afirmava 0 universalismo). Como não posso afirmar a salvação

universal, julgo que a eleição incondicional seja, com sua necessária

correlata, a reprovação, inaceitável pelo fato de ela impugnar o caráter

de Deus como incondicionalmente bom. A graça irresistível faz a mesm a coisa. Ela impugna a bondade de

Deus. Se Deus chama e atrai pecadores irresistivelmente para si de ma-

neira que eles escapam do inferno por que ele os domina e os regenera

sem qualquer ato de livre-arbítrio da parte deles, então um Deus bom

faria o mesm o para todos! Não estou contente em deixar a pergunta do

“por quê” na esfera do mistério. Reconheço 0 mistério na revelação, masnão o que exige crença em uma vontade escondida ou secreta de Deus

que faz dele um monstro moral. Somente um monstro moral recusaria

salvar pessoas quando a salvação é absolutamente incondicional e uni-

camente um ato de Deus que não depende do livre-arbítrio.

Quando digo que sou contra 0 calvinismo, então, me refiro às crenças

principais do calvinismo geral, calvinismo puro e simples, na medida

em que tais crenças são levadas às suas conclusões lógicas. Percebo

que nem todos os calvinistas as levam a sua conclusão lógica; em

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Contra o Calvinismo

 vários estágios, no processo de raciocínio, certos calvinistas param e

apelam ao mistério e recusam ser logicamente consistentes ao afirmar

as conseqüências lógicas e necessárias de seu sistema de crença.  Não 

sou contra eles ou ao seu calvinismo altamente modificado e atenuado!  (Eisto é provavelmente o caso com a maioria das pessoas que eu conheço

que se consideram calvinistas).

Todavia, dentro do movimento jovem, incansável e reformado do ne-

ocalvinismo e entre seus mentores (as pessoas que eles leem e escutam

e os consideram seus heróis), a maioria deles, em minha experiência,

tem levado 0  calvinismo às suas conclusões lógicas - ou pelo menos

caminharam bastante nesta direção. Há uma ousadia e até mesmo

agressividade entre eles que eu não encontro entre a maioria dos cal-

 vinistas das gerações mais velhas. Eu sou contra qualquer calvinismo

(e qualquer teologia) que impugne a bondade de Deus em favor da

soberania absoluta, levando à conclusão que o mal, pecado e todos os

horrores da história humana são planejados e tornados certos por Deus.

E a “teologia reformada radical”? O que eu quero dizer com isso epor que a reputação de Deus precisa ser resgatada dela? Por teologia

reformada radical eu quero dizer o mesmo que o calvinismo consistente

descrito acima. Quero dizer 0  calvinismo extremado tão evidente em

alguns palestrantes e escritores calvinistas e seus ávidos seguidores que

inevitavelmente acabam por fazer de Deus o autor do pecado e do mal,

ainda que a linguagem (ex. “autor” ) seja ou não utilizada. O fato de JohnPiper preferir dizer que Deus “projeta” e “governa” 0  mal, não faz dife-

rença quando 0  contexto necessariamente implica que Deus quer que

tal aconteça e 0  torna certo - principalmente quando se diz que isso é

necessário para sua plena glorificação.

Para ser direto e sem rodeios, conforme diz 0 ditado, meu problema é

primeira e principalmente com o determinismo divino que leva a repro-

 vação incondicional de Deus de certas pessoas para o sofrimento eterno

no inferno para sua glória. Me oponho a qualquer ideia que, conforme

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

0  velho ditado calvinista diz: “aqueles que se encontram sofrendo no

inferno podem, ao menos, se confortar com 0  fato de que eles estão

lá para uma maior glória de Deus”. Eu reconheço e livremente admito

que poucos calvinistas diriam isso. Mas meu argumento é que eles deve-riam encontrar a coragem de dizer isso, pois isto está necessariamente

implícito pelo 0  que eles, de fato, falam. Explicarei e defenderei essa

alegação em todo esse livro.

 A teologia reform ada radical, então, é qualquer teologia que faz

afirmações acerca de Deus que necessária e logicamente implicam que

Deus é menos do que perfeitamente bom no mais elevado sentido de

bondade encontrado no Novo Testamento e, principalmente, em Jesus

Cristo, a mais completa revelação de Deus para nós. É o infralapsaria-

nismo ou supralapsarianismo consistente, quer seja hipercalvinista ou

0  calvinismo normal, puro e simples.

Então, qual é a teologia reformada a qual não  sou contra? Acho que

terei de dizer que a única teologia reformada que não sou contra é a

teologia reformada revisionista - o tipo que encontro em Sell, Berkhof,Daane e Kõnig (embora eu possa não concordar com tudo o que qualquer

um deles ensine). É a teologia reformada que explicitamente rejeita

um decreto divino de reprovação e que a usa de embasamento para

corajosamente rejeitar outras alegações calvinistas que necessariamente

exijam a reprovação divina. É a teologia reformada que explicitamente

rejeita 0  determinismo divino de cada evento único, sem exceção, nãodeixando espaço para 0  livre-arbítrio, e que utiliza isso como base para

afirmar uma autolimitação divina e amorosa tal que Deus não é, de ma-

neira alguma, responsável pelo sofrimento de inocentes no holocausto

ou horrores semelhantes da história.

Creio que seja possível encontrar teologia reformada náo radical

comumente entre pessoas reformadas e até mesmo entre alguns que

se consideram calvinistas. Eles apelam ao mistério e não para decretos

divinos que governam todos os eventos, incluindo a queda. Eles afirmam

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Contra o Calvinismo

a soberania de Deus sem estendê-la ao pecado e ao mal exceto à medida

em que Deus os permite (sem aquela permissão desejosa positiva falada

por calvinistas consistentes e o teólogo reformado radical que fala acer-

ca de Deus os tornado certos). Eles afirmam a eleição como a escolhagraciosa e incondicional de um povo para 0 serviço sem a determinação

incondicional dos destinos eternos das pessoas, incluindo algumas para

o inferno. Eles são pessoas reform adas que concordam com Adrio Kõnig,

ele próprio sendo de linhagem reformada, que escreveu:

Qualquer um que nivela em vagas generalizações ao tentar explicar

tudo e todas as possíveis circunstâncias como a vontade de Deus sempre

acaba na impossível situação de que há mais exceções do que regras, mais

coisas que são inexplicáveis e que tais colidirão com 0 retrato de Deus que

nos é dado em sua palavra, do que há confirmações confortantes de que

ele está dirigindo tudo... Qualquer um que tentar utilizar a onipotência e

providência de Deus para propor um plano divino preparado e meticuloso

que está se desenrolando na história do mundo (L. Boettner) será sempre

deixado com o problema que outros crentes podem não ser capazes dediscernir 0  Deus de amor no atual curso dos eventos do mundo... Deve

ser afirmado enfaticamente que... as Escrituras não apresentam 0  futu-

ro como algo que materializa [sic] de acordo com um “plano”, mas de

acordo com o pacto... Há muitas coisas angustiantes que acontecem na

terra que não são a vontade de Deus (Lucas 7.30 e todos outros pecados

mencionados na Bíblia), que são contra sua vontade, e que se originamdo pecado incompreensível e sem sentido no qual nós nascem os, no qual

a maior parte da humanidade vive, e no qual Israel persistiu e contra a

qual até mesmo ‘os mais santos homens’ lutaram todos os seus dias...

Tentar interpretar todas estas coisas por meios do conceito de um plano

de Deus, cria dificuldades intoleráveis e dá surgimento á mais exceções

do que a regularidades. Mas a objeção mais importante é que a ideia de

um plano é contra a mensagem da Bíblia uma vez que 0  próprio Deus

se torna implausível, se 0  que ele com poder combate, e pelo qual ele

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

sacrificou seu próprio Filho, foi, contudo, de algum jeito, parte e parcela

de seu conselho eterno 78.

ALTERNATIVAS A TEOLOGIA REFORMADA /RADICAL 

Um motivo pelo qual muitos jovens (e talvez outros) abracem 0 novo

calvinismo que é de longe a teologia reformada radical que acabou de

ser descrita é porque eles estão convencidos que ele seja a única teo-

logia bíblica e intelectualmente séria que esteja disponível. É verdade,

conforme alguns calvinistas defendem, que muitas igrejas evangélicas

estadunidenses estão quase que totalmente desprovidas de teologia.Tenho lecionado teologia para milhares de alunos em três universidades

cristãs há mais de 30 anos. Durante esta época eu percebi que há uma

tendência de baixa em termos da consciência bíblica e teológica nos

alunos cristãos.

Também percebi essa tendência nas igrejas que freqüentei. Consi-

derando que há 30 anos e antes disso a maioria das igrejas evangélicas

ensinava histórias bíblicas e realizava alguma espécie de catequese com

 jovens, a maioria das igrejas passou a adotar 0  mais insípido “estudo”

de questões éticas e morais - geralmente substituindo a discussão da

possível interpretação espiritual de filmes para 0  ensino bíblico e 0  es-

tudo de doutrinas 79.

78. Konig, Here Am Π   98 - 99.

79. Acredito que uma análise estatística não seja necessária, pois 0 fenômeno é visto 

universalmente como desta maneira pelas pessoas que ensinam estudos bíblicos 

e teológicos em faculdades e universidades cristãs. Poucos estudantes conhecem 

quaisquer hinos, e os hinos eram uma forma que a fé cristã era passada de geração 

à geração. A música cristã contemporânea é notoriamente rasa no que diz respeito à 

doutrina e à teologia (com algumas exceções, claro). Encontrei alunos que cresceram 

em lares e igrejas cristãs e até mesmo filhos de pastores e missionários que alegaram 

jamais ter ouvido acerca da ressurreição do corpo como uma fé cristã. Poucos sequer 

podem apresentar uma breve explicação da trindade ou deidade e humanidade de 

Jesus além de slogans da religião popular, tais como Jesus era “Deus em pele humana” 

- uma expressão popular da heresia antiga do apolinarianismo.

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Contra o Calvinismo

Muitas igrejas e organizações cristãs de jovens simplesmente abdi-

caram de sua responsabilidade de ensinar as crenças básicas cristãs de

sorte que o cristianismo, para muitos cristãos jovens, parece uma religião

raza de autorealização com o auxílio de Deus. Isso é o que 0  intelectual

calvinista Michael Horton chama de “Cristianismo sem Cristo” 80 e eu

concordo com ele. Isto está simplesmente difundido na vida eclesiástica

estadunidense. Então, quando jovens intelectualmente curiosos que estão

convencidos que de que deve haver algo a mais em sua fé do que a religião

popular que eles receberam, eles encontram o calvinismo pela primeira

 vez (geralmente sob o nome de teologia reformada), e eles geralmente

ficam tão impressionados e, ás vezes, totalmente arrebatados por ele. Emminha experiência, isto se dá parcialmente sob a influência de sermões

extremamente apaixonados pregados por popularizadores eruditos do

calvinismo que pregam em conferências de jovens (os sermões sendo

transmitidos via podcast para que possam ser ouvido outras vezes), como

se a teologia pregada fosse a única que verdadeiramente honra a Deus.

Descobri que muitos dos novos calvinistas simplesmente não es-

tão conscientes de que há outras alternativas viáveis para sua recémdescoberta fé doutrinai. Através da leitura de livros de seus pastores e

professores favoritos, muitos deles estão convencidos que todas as al-

ternativas - e, principalmente o temido “arminianismo” - são centradas

no homem, sem fundamentação bíblica ou intelectualmente débeis.

Quase todas as alternativas ao calvinismo são agrupadas juntas como

arminianismo ou semipelagianismo ou ambos (muitos calvinistas, tais

como Sproul, igualam as duas coisas). Em seu sermão acerca de “Porquem Cristo Morreu?”, Piper ataca o arminianismo como uma teologia da

salvação própria. Ele diz: “A fim de que Cristo tenha morrido por todos

os homens da mesma forma, o arminiano deve limitar a expiação para

uma oportunidade impotente para os homens de salvarem a si mesmos

da terrível má situação da depravação” 81.

80. O título de seu livro publicado em 20 0 pela Editora Cultura Cristã.

8 . Piper, “For Whom Did Christ Die?”

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

Isto é, claro, uma caricatura do arminianismo, como demonstrei em

Teologia Arminiana: Mitos e Realidades. Alguém precisa imaginar 0 que 0

Piper estava pensando quando ele tirou conclusões errôneas acerca do

arminianismo desta forma. A teologia arminiana não diz que as pessoassalvam a si m esm as ou que a expiação é impotente. A teologia arminia-

na tradicional diz que na cruz e através da cruz de Cristo o pecado de

 Adão herdado por todos foi perdoado (Romanos 5) de maneira que as

pessoas só são condenáveis por seus próprios pecados. A cruz remove

completamente todo obstáculo para a salvação de todo ser humano,

exceto sua resistência à graça de Deus livremente ofertada, que é dada

a todos em certa medida, mas principalmente através da pregação da

palavra. Acredito que o Piper saiba isso, pois nós nos comunicamos a

esse respeito e ele me disse que já foi arm inian o!82

O que Piper e quase todos os críticos calvinistas do arminianismo

(e outras teologias alternativas da soberania de Deus e salvação) geral-

mente deixam de mencionar duas coisas que são cruciais: (1) qualquer

limitação da soberania de Deus é uma autolimitação voluntária porqueDeus é soberano acerca de sua soberania, e (2) se alguém vem a Cristo

82. Quando entrei em contato com Piper acerca desta citação, ele enfatizou que no 

sermão ele não disse que os arminianos realmente   dizem isso sobre a expiação e 

salvação, mas apenas que eles devem dizer isso. Deixarei a decisão a cargo dos leitores 

e que a maioria de seus ouvintes e leitores pensou que ele quis dizer. Conheço algumas  

pessoas que pensaram que o que ele, de fato, quis dizer, foi a teologia arminiana. Em 

minha opinião, a declaração do Piper aqui e as muitas afirmações semelhantes feitas 

por calvinistas concernente 0 arminianismo violam a regra básica de debate civilizado 

que deveria reger não apenas os cristãos, mas todas as pessoas sérias: sempre descreva 

a visão de seu oponente conforme eles a descrevem, e se você for acusá-los de que 

a visão deles leva a uma conclusão que eles, na realidade, não adotam, diga que  

eles, na verdade, não a adotam. Me parece que o Piper, em seu sermão, faz 0  que 

muitos calvinistas fazem com o arminianismo - descrevem־no da forma mais infame 

ao atribuir a ele conclusões consideradas logicamente necessárias, mas que não são 

verdadeiramente abraçadas por seus adeptos. Não me oponho a discutir contra uma 

teologia pelo fato de ela levar necessariamente a algum lugar considerado ruim. É 

desta forma que atacarei 0 calvinismo. Mas me oponho a atribuir aos adeptos de uma 

teologia certas crenças que eles explicitamente rejeitam. Tal coisa é, em seu melhor  

cenário, injusta, e, desonesta, no seu pior cenário.

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Contra o Calvinismo

com arrependimento e fé, é apenas porque foram capacitados pela

graça “preveniente” de Deus para que assim agissem. Eu raramente

encontro calvinistas que descrevam a doutrina arminiana da graça

preveniente de maneira justa ainda que ela seja central e crucial àteologia arminiana.

Então, o que é o arminianismo ou a teologia arminiana? É a muito

caluniada, mas inocente, principal alternativa evangélica ao calvinismo.

Para dar suporte à apresentação do arminianismo que darei aqui quero

que os leitores leiam o livro Teologia Arminiana,  que contem centenas

de citações de apoio dos principais teólogos arminianos, remontando

do próprio Jacó Armínio, que atribuiu toda a salvação à graça de Deus

e que negou calorosamente que ele tenha atribuído qualquer parte da

obra da salvação ao “homem” (a pessoa humana que se arrepende e crê

para a salvação). Contrária às deturpações de muitos críticos calvinistas,

0  arminianismo não “limita a soberania de Deus” ou atribui mérito ao

“homem” na salvação.

 A teologia arm iniana clássica, tal como a de João Wesley (1703 -

1791), afirma a depravação total dos seres humanos e sua total inca-

pacidade de até mesmo exercer uma boa vontade para com Deus em

separado da graça sobrenatural e auxiliadora de Deus. Ela atribui a ha-

bilidade do pecador de responder ao evangelho com arrependimento e

fé à graça preveniente - o poder iluminador, convincente, capacitador e

convidativo do Espírito Santo na alma do pecador e tornando o pecadorlivre para escolher a graça salvífica (ou para rejeitá-la). Esta é a interpreta-

ção arminiana para as “atrações” de Deus mencionada no evangelho de

 João. Deus não atrai irresistivelmente, mas persuasivamente, deixando

os humanos capazes de dizer não.

 A teologia arminiana realmente afirma a eleição divina, mas ela

a interpreta como corporativa e não como individual. Romanos 9, a

passagem alicerce do calvinismo rígido, é interpretada, assim como os

primeiros pais da igreja fizeram - como se referindo ao serviço de Isra-

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

el e os crentes gentios no plano de Deus, não aos destinos eternos de

indivíduos. Arminianos afirmam a predestinação, interpretando-a com

Romanos 8 como a presciência de Deus da fé. Eles rejeitam a reprovação,

exceto na medida em que ela é livremente escolhida pelas pessoas que vivem contrariamente à vontade de Deus revelada em natureza e na lei

escrita em seus corações (Romanos 1 - 2)

 Acima de tudo os arminianos insistem que Deus é um Deus bom e

amável, que verdadeiramente deseja a salvação de todas as pessoas.

Observem 1 Timóteo 2.3-4: “ Isso é bom e agradável perante Deus, nos-

so Salvador, que deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem

ao conhecimento da verdade”; e 2 Pedro 3.9: “O Senhor não demora

em cumprir sua promessa, como julgam alguns. Pelo contrário, ele é

paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas que todos

cheguem ao arrependimento”. Os arminianos consideram estas e outras

passagens bíblicas semelhantes a estas como clara e inequivocamente

apontando para 0  desejo universal de Deus para a salvação de todas

as pessoas. O versículo de 1 Timóteo 2.4, na língua grega, não pode ser interpretado de qualquer outra forma além de se referir a todas as

pessoas, sem limite. Alguns calvinistas interpretam 2 Pedro 2.4 como

se referindo apenas aos eleitos, mas à luz de 1 Timóteo 2.4, tal inter-

pretação dificilmente funciona.

Os arminianos acreditam que qualquer limitação da intenção de Deus

para a salvação de todos, incluindo a “expiação limitada”, necessária eintrinsecamente impugna 0  caráter de Deus até mesmo onde os calvi-

nistas insistem 0 contrário. Os arminianos não alegam que os calvinistas

dizem  que Deus não é bom ou amável; eles dizem que 0  calvinismo

implica  isso necessariamente, então que os calvinistas deveriam dizer 

isso  a fim de serem consistentes com eles mesmos.

 A principal alternativa ao calvinism o é 0 arminianismo clássico (que

é diferente do que, às vezes, vai sob esse rótulo!) conforme descrito

brevemente acima. Mais uma vez, eu encorajo os leitores que estão

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Contra o Calvinismo

interessados em explorar o tema um pouco mais, que leiam o livro

Teologia Arminiana e outros livros escritos por arminianos acerca do

arminianismo - assim como eu e muitos arminianos lemos as Institutas 

de Calvino e muitos livros acerca do calvinismo escrito por calvinistas. Você não deve acreditar no que os calvinistas dizem acerca do arminia-

nismo sem averiguar 0  fato por si mesmo ao ler as fontes primárias 83.

 A teologia arminiana é bíblica e intelectualmente respeitável? É uma

séria concorrente do calvinismo? Claro que só poderão ter certeza disso

as pessoas que analisarem o arminianismo profunda e imparcialmente

a partir das fontes primárias. Mas meu argumento é que a única razão

que isto é levado em conta é em virtude das repetidas calúnias contra o

arminianismo que foram levantadas pelos calvinistas através dos anos; a

maioria do que os calvinistas dizem acerca do arminianismo é simples-

mente inverídico ou, no mínimo, apenas parcialmente verdadeiro. Um

dos principais ofensores é Sproul, que iguala o arminianismo à heresia

de semipelagianismo 84, heresia esta que foi condenada no Segundo Con-

cílio ou Sínodo de Orange em 529 dC (que também condenou qualquercrença que Deus predestinou 0 pecado). Praticamente todo livro de um

calvinista que expõe a teologia calvinista que eu li (e li dezenas deles)

acabam por disseminar uma forte crítica contra o arminianismo como

uma mensagem rasa de salvação própria, se não heresia real.

83. Duas exposições importantes da teologia arminiana que também são prazerosas

 de se ler sáo Thomas Oden, The Transforming Power of Grace  (Nashville, TN: Abingdon, 

993), e Robert E. Picirilli, Grace, Faith, Free Will  (Nashville, TN: Randall, 2002).

84. Esta equação pode ser encontrada em muitas páginas das obras publicadas do 

Sproul, tal como O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, 39, 

58 -60. Sproul, de fato, reconhece a crença arminiana na grace preveniente, mas ele 

então apresenta erroneamente a visão arminiana quando pergunta aos arminianos: 

“Se a carne pode, por si mesma, se inclinar à graça, qual é a necessidade da graça?” 

( 88). Nenhum arminiano verdadeiro diz que a carne (o ser humano caído, natural) 

pode se inclinar para a graça; tal inclinação sempre vem do Espírito Santo. A 

diferença entre isso e o calvinismo é que, de acordo com o arminianismo, esta obra  

do Espírito Santo chamada graça preveniente, é resistível (pois Deus escolhe permitir  

que a graça seja resistida!)

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Calvinismo puro e simples: o sistema TULIP

Eu conclamo aos jovens, incansáveis e novos calvinistas reformados

que pensem por eles mesmos acerca das alternativas ao calvinismo,

incluindo e, principalmente, o arminianismo. Mas eu também recomen-

do a investigação em teólogos reformados não calvinistas, tais como

Berkhof, Kõnig e Daane, mas talvez, acima de tudo, 0  grande teólogo

reformado holandês G. C. Berkouwer que publicou muitos volumes

de teologia sistemática nas décadas de 1950 e 1960. Alguns podem

considerá-lo um calvinista, mas ele definitivamente não era no sentido

de ser “calvinista rígido” e/ou que adota toda a TULIP, principalmente

pelo fato de rejeitar qualquer noção de reprovação divina como inclusa

na soberania de Deus 85. Outras alternativas protestantes são 0  lutera-

nismo, que rejeita a expiação limitada e a perseverança incondicional e

a teologia anabatista, que foca principalmente em discipulado em vez

da teologia sistemática, mas que claramente inclui a crença na liberda-

de da vontade concedida por Deus e que rejeita a TULIP quase em sua

totalidade. (Alguns anabatistas aceitam a depravação total).

Por fim, espero que as alternativas ao calvinismo justifiquem umaséria análise em virtude dos sérios enigmas apresentados pela extensão

lógica do calvinismo clássico, ao qual este livro agora se dedica.

85. Ver a obra de vários volumes de Berkouwer com 0 título abrangente “Estudos em 

Dogmática” publicado pela Eerdmans.

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capítulo 4

Sim para a soberania divina;

Não para o determinismo divino

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FUI OUVIR UM FAMOSO OFICIAL do governo, que também era um

cristão evangélico bastante conhecido, discursar na capela de nossa

faculdade. Eu esperava que ele abordasse os perigos do hábito de fumar

cigarros, porque era exatamente por isso que ele era principalmente

conhecido, ele era um guerreiro contra o tabaco. Mas não foi esse 0

tópico que ele abordou em sua fala na capela. Em vez disso, por cercade uma hora, ele discorreu acerca do seguinte assunto: “Deus matou

meu filho”. Eu não fiquei totalmente surpreso, pois eu sabia que ele

era membro de uma grande e influente igreja reformada. Entretanto,

eu jam ais havia ouvido nenhum calvinista apresentar 0 assunto de ma-

neira tão direta. O médico falou de maneira eloqüente e tocante acerca

da trágica morte de seu filho, um jovem adulto, em um acidente de

alpinismo e, em vários momentos ele parou, olhou intencionalmente

para 0  público jovem e afirmou: “Deus matou meu filho”.

O orador deixou extremamente claro o que ele quis dizer. Ele não 

quis dizer que Deus permitiu a morte de seu filho ou que simplesmente

permitiu que ela acontecesse. Pelo contrário, ele quis dizer que Deus pia-

nejou a morte e a tornou certa. Ele náo disse que Deus causou a morte,

mas a sua mais que freqüente repetição do título da palestra certamentedeixava isso implícito: “Deus matou meu filho”. Ele também deixou muito

claro de que 0  evento não foi uma ocorrência incomum da intervenção

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

por Deus?”. O que ele diria? Se ele fosse consistente consigo mesmo e

sua teologia, ele teria que dizer sim.

Certo dia estava trabalhando em meu escritório quando o telefone

tocou. Era um pastor que havia lido no jornal estudantil acerca de mi-

nha rejeição ao calvinismo. Ele exigiu saber: “Como você pode não

acreditar na soberania de Deus?” Eu lhe perguntei 0 que ele queria dizer

com soberania de Deus e ele respondeu: “Quero dizer, ao fato de Deus

controlar tudo 0  que acontece”

Eu lhe respondi com uma pergunta: “Essa soberania inclui 0 pecado

e 0  mal?”

Ele pausou: “Não”.Então, perguntei: “Você realmente  acredita na soberania de Deus?”

Ele pediu desculpas e desligou 0  telefone.

O que eu queria dizer ao pastor era que eu realmente acredito na so-

berania de Deus - de todo o meu coração, alma e mente. Eu acredito,

como a Bíblia ensina e todos os cristãos devem acreditar, que nada pode

acontecer sem a permissão de Deus. Isso é 0  que alguns chamam de

uma "visão fraca” da soberania de Deus (embora ela nada tenha a ver

com qualquer “fraqueza” de Deus), onde 0  calvinismo normalmente

afirma uma “visão forte” da soberania de Deus. Vamos analisar a dou-

trina calvinista da providência divina - a doutrina da soberania de Deus

sobre a natureza e história.

A DOUTRINA CALVINISTA DA PROVIDÊNCIA DE DEUS 

Ulrico Zuínglio e João Calvino

Muitos eruditos consideram que 0  verdadeiro fundador da tradição

reformada seja Ulrico Zuínglio, que escreveu um extenso ensaio intitulado

Da Providência. Este ensaio veio a influenciar Calvino e, através dele, toda

a tradição reformada (embora muitos reformados, principalmente os que

se autodenominam “revisionistas” vieram a rejeitar muito desse ensaio).Zuínglio definiu a providência como “0  domínio e direção de Deus de

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Contra o Calvinismo

todas as coisas no universo. Pois se qualquer coisa fosse guiada por seu

próprio poder ou insight,  assim também seria a sabedoria e poder de

nossa Deidade muito deficientes”1. Zuínglio continuou sua exposição ao

negar que nada neste mundo é “contingente, fortuito ou acidental”, pois

Deus sozinho é a “única causa” sobre tudo, de maneira que outras assim

chamadas causas são simplesmente “instrumentos do trabalhar divino” 2.

Zuínglio embasou muito de sua forte doutrina da soberania na filoso-

fia; ele começou com uma ideia pressuposta de Deus como a necessaria-

mente a realidade toda-determinante e tirou dela a conclusão que tudo

deve ser uma manifestação do poder de Deus ou, caso contrário, Deus

não seria Deus. Claro, Zuínglio também apelou para a Escritura, assim

como todos os defensores da forte doutrina da soberania de Deus. Será

útil analisar algumas supostamente passagens bíblicas de suporte antes

de mergulharmos na análise da doutrina de Calvino e das interpretações

de providência dos calvinistas posteriores.

No capítulo 3, vimos que os calvinistas apelam para as histórias de

 Jo sé e da crucificação de Jesus para dar suporte à visão da soberaniaprovidencial de Deus como detalhada e meticulosa, incluindo o mal.

Claro, nem todos os eruditos bíblicos ou interpretes deduzem essa

doutrina a partir destas histórias e eventos. Por exemplo, não é possível

que Deus tenha dito “o tornou em bem” no sentido de que  ele poderia

ter impedido os eventos, mas, antes, escolheu permití-los? A maioria

dos calvinistas alegará aqui que há pouca diferença, isso se não houver

nenhuma, entre essa visão e a que eles defendem, mas argumentarei

que a diferença é grande.

Os calvinistas apelam para afirmações de profetas do Antigo Tes-

tamento, tais como a já citada passagem de Amós 3.6. Mas há outras

passagens, tais como Provérbios 16.33; Isaías 14.27; 43.13; 45.7. Todas

  . Ulrich Zwingli,

On Providence and Other Essays,  eds. Samuel Jackson and William

 John Hinke (Durham, NC: Labyrinth, 983), 37.

2. Ibid., 57.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

estas passagens indicam a autoridade supervisora de Deus e domínio

até aos detalhes. Por exemplo, Provérbios 16.33: “A sorte é lançada no

colo, mas a decisão vem do Senhor”, enquanto que Isaías 45.7 diz: “Eu

formo a luz e crio as trevas, promovo a paz e causo a desgraça; eu, 0

Senhor, faço todas estas coisas”. Dificilmente há qualquer necessidade de

mais citações; estas duas passagens sozinhas parecem fornecer prova da

forte visão da providência de Deus. Mais adiante neste capítulo, natural-

mente, eu argumentarei que há interpretações alternativas que melhor

expressam a soberania de Deus que não fazem de Deus 0 autor do mal.

Calvino continuou com sua doutrina da soberania de Deus sobre a

história e a providência meticulosa de Deus de onde Zuínglio parou, em-bora ele não a tenha defendido a partir da filosofia, mas primariamente

a partir das Escrituras (o que não é dizer que ele não foi influenciado

pela filosofia!). Em uma vivida ilustração ele escreveu:

Imaginem os, por exemplo, um mercador que, havendo entrado em 

uma zona de mata com um grupo de homens de confiança, impru- 

dentemente se desgarre dos companheiros, em seu próprio divagar  

seja levado a um covil de salteadores, caia nas mãos dos ladrões,

 tenha o pescoço cortado. Sua morte fora não meramente antevista 

pelo olho de Deus, mas, além disso, é estabelecida por seu  decreto. 

Ora, não se diz haver ele   antevisto quanto se estenderia a vida de 

cada um; ao contrário, diz haver estabelecido e fixado os limites que 

não poderão ser ultrapassados [Jó 4.5].

Quanto, porém, 0 alcance de nossa mente apreende, tudo neste 

acontecimento parece acidental. Que pensará aqui o cristão? Provável- 

mente isto: tudo quanto ocorreu em morte desse gênero era casual por 

sua natureza; contudo não terá dúvida de que a providência de Deus 

esteve a presidir, a fim de dirigir a seu term o essa  contingencialidade 3.

Calvino resume toda a doutrina da providência de Deus desta ma-

neira: “vento algum jamais surge ou se desencadeia a não ser por de-

terminação especial de Deus” 4. Em outros lugares, ele argumenta que

3. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. , p. 209.

4. Ibid., Vol. . (p. 206).

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Contra o Calvinismo

0  governo providencial de Deus da história não pode ser expresso por

meios de permissão; Deus não simplesmente permite qualquer coisa,

mas ordena e mais que certamente as efetua. Para Calvino, isto é visto

mais claramente na queda de Adão, que foi preordenada por Deus. Casohaja qualquer picuinha acerca de quão forte era, para Calvino, a doutrina

da providência, eu citarei esta passagem de suas Institutas:

Seja esta a síntese: uma vez se diz que a vontade de Deus é a 

causa de todas as coisas, a providênc ia é estatuída com o m oderatriz 

em todos os planos e ações dos homens, de sorte que não apenas  

comprove sua eficiência nos eleitos, que são regidos pelo Espírito  

Santo, mas ainda obrigue os réprobos à obediência 5.

Como Calvino poderia se colocar de maneira mais direta e mais forte

do que essa? Deus compeli os réprobos, os ímpios, para obedecer sua

 vontade. Em outras palavras, até mesm o 0  mal feito pelas pessoas per-

 versas é preordenado e tornado certo por Deus. Calvinistas posteriores,

tais como Sproul, alegarão que 0 calvinismo não diz que Deus coage os

 ímpios para que façam atos malignos. Calvino parecia pensar que sim,

ele até mesmo argumenta que Deus permanece imaculado pelo mal

de tais pessoas, pois seus motivos são bons ao passo que os motivos

destes ímpios são maus. (Claro, isso simplesmente levanta a questão

dos motivos da origem do mal!)

Jonathan Edwards

 As visões dos calvinistas posteriores da providência de Deus são, em

grande parte, consistentes com a de Zuínglio e de Calvino. Em outras

palavras, no geral, 0 calvinismo rígido de Zuínglio a Calvino, de Calvino

a Edwards, de Edwards a Boettner, de Boettner a Sproul e de Sproul até 0

Piper, constitui determinismo divino, apesar das fortes objeções de alguns

calvinistas à essa terminologia. Começamos com Jonathan Edwards.

5. Ibid., Vol. 1, pp. 232, 33.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Edwards ensinou a doutrina mais forte possível do domínio de Deus.

Para ele Deus não é apenas a realidade totalmente determinante; ele

cria todo 0 mundo ex nihilo (a partir do nada) em todo momento e não

trabalha por meio de causas secundárias 6. Tudo, sem exceção, é direta e

imediatamente causado por Deus, incluindo o mal. Edwards insistia que

todas as coisas, incluindo 0  pecado e o mal, seguem de “uma prévia e

infalível fixidez da futuridade do evento [significando todos os eventos]” ,

de forma que tudo acontece de acordo com uma “providência deter-

minante universal” que impõe “algum tipo de necessidade de todos os

eventos” 7. Edwards fecha 0  assunto:

Deus, em sua providência, de fato e decisivamente ordena todas 

as volições dos agentes morais, seja por influência positiva ou per- 

missão: e sendo permitido universalmente, que 0  que Deus faz no 

assunto das volições virtuosas do homem, quer seja mais ou menos, 

é por alguma influência positiva, e não por mera permissão, como 

na questão da volição pecaminosa s.

Os leitores não devem se confundir com 0 uso do termo permissão por

Edwards, pois tal deve ser entendido no contexto de suas afirmações citadas

anteriormente acerca da “providência determinante” e a “necessidade de

todos os eventos”. Claramente, por “perm issão” Edwards apenas quer dizer

que, no caso do mal, Deus não força ou coage as pessoas para pecar, mas

ele 0  torna certo. Alguém pode se perguntar por que Edwards (e outros

calvinistas) recua(m) e faz(em) uso de “permissão” quando sua (e a deles)explicação geral da providência de Deus exige algo mais direto e ativo?

Não apenas Edward de fato afirmou a soberania determinante e

absoluta de Deus sobre todos os eventos no mundo, como ele também

6. Jonathan Edwards, The Great Christian Doctrine of Original Sin, ed. Clyde A. Holbrook 

(New Haven, CT: Yale Univ. Press, 970), 402.

7. Jonathan Edwards,

Freedom of the Will, in The Works of Jonathan Edwards   (New

 Haven, CT: Yale Univ. Press, 957), :43 .

8. Ibid., 434.

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Contra o Calvinismo

afirmou a necessidade das próprias decisões de Deus. Isso faz com que

sua crença seja 0 que chamo de determinismo divino. Para ele, tudo 0

que acontece, até mesmo na própria mente e volição de Deus, é neces-

sário. Para os que duvidam disso, considerem que Edwards afirmava “a

necessidade de atos da vontade de Deus” 9. Claro, Edwards não queria

dizer que alguma força fora de Deus ou até mesmo dentro de Deus coage

a Deus a decidir e agir como ele o faz. Antes, “a determinação necessária 

da vontade de Deus em todas as coisas, [é] pelo 0 que ele considera ser

0  melhor e mais apropriado”   10. Em outras palavras, “a vontade de Deus

é determinada por sua própria sabedoria infinita e totalmente suficiente

em tudo”". O resultado inexorável disto deve ser que a criação do mun-do, por Deus, é necessária e não contingente. Ou seja, ela não é livre.

 Alguns defensores de Edwards podem objetar que o teólogo puritano

reivindicava que as ações de Deus são livres. De fato ele reivindicava

isso. Mas como ele reconciliava estas coisas? Edwards argumentava que

0 livre-arbítrio apenas significa fazer o que está de acordo com ou motivo

ou disposição mais forte. Para ele, como para a maioria dos calvinistas

que desejam abraçar certo sentido de livre-arbítrio tanto em Deus quan-

to nas criaturas, 0  livre-arbítrio não  é ser capaz de fazer o contrário do

que alguém faz (poder da escolha contrária), que é 0  sentido libertário

do livre-arbítrio, mas apenas fazer 0  que alguém quer faz er mesmo se a 

 pessoa não pu der fazer o contrário. De acordo com Edwards, até mesmo

os desejos de alguém são sempre determinados por algo. O coração,

a sede das disposições, determina os atos da vontade humana tão cer-tamente quanto a sabedoria divina determina suas decisões e ações.

Isso é 0  que os filósofos vieram a chamar de “compatibilismo” -

crença de que 0  livre-arbítrio é compatível com 0  determinismo. Isto

9. Ibid., 395.

  0. Ibid., 377.

  . Ibid., 380. 

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

provavelmente nâo é o que a maioria das pessoas querem dizer por

livre-arbítrio, a habilidade de fazer 0  contrário do que alguém, de fato,

faz. Mas de acordo com o compatibilismo, a única vez que alguém não 

é livre é   quando a pessoa está sendo forçada a fazer algo que ela não

quer fazer. Neste sentido, então, a criação de Deus do mundo é “livre”

porque é o que Deus queria fazer. Mas isso não quer dizer que Deus

poderia ter feito 0  contrário.

 Alguém precisa questionar a visão ortodoxa de Edwards. Toda a

questão da ortodoxia cristã tradicionalmente afirmando a liberdade da

criação é para garantir que ela esteja dentro da esfera da graça, e não

da necessidade. Tudo 0  que é necessário não pode ser gracioso. Além

do mais, se a criação de Deus do mundo foi necessária, então 0 mundo

é, em certo sentido,  parte de Deus - um aspecto da própria existência

de Deus. Isso é conhecido como panenteísmo: a crença de que Deus

e 0  mundo são realidades interdependentes. A maioria dos cristãos

ortodoxos sempre considerou 0  pananteísmo uma heresia '2.

Não estou, na verdade, acusando Edwards de heresia; antes, estouacusando-o de inconsistência, pois ele claramente não tinha a intenção

de fazer Deus, de qualquer forma, dependente do mundo. A questão é

que suas reflexões especulativas acerca da soberania de Deus 0 levaram a

conclusões com as quais ele provavelmente não estava confortável e pro-

 vavelmente não mantinha da mesma maneira em todo 0 tempo. Contudo,

apesar das intenções de Edwards, sua forte doutrina da soberania - de-

terminismo divino - é um terreno escorregadio que leva ao panenteísmo.

Outra questão que Edwards tem de lidar é o problema de relaciona-

mento de Deus com 0 pecado e o mal. A sua forte doutrina da providência

não leva inevitavelmente a Deus ser o autor do pecado e do mal? Edwar-

ds estava claramente desconfortável com isso, mas, ao mesmo tempo,

  2. Ver John W. Cooper,Panentheism:  The Other God of the Philosophers (Grand Rapids: 

Baker, 2006). Cooper explica bem porque o panenteísmo é considerado herético pelos 

padrões doutrinários ortodoxos e defende que a visão de Edwards da relação entre 

Deus e o mundo é panenteísta (77).

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Contra o Calvinismo

ele admitiu isso em certo sentido.  Primeiro, sua explicação de como

Deus tornou a queda de Adão certa é que Deus reteve de Adão “aquelas

influências, sem as quais a natureza será corrupta”, mas isso não faz

de Deus o autor do pecado 13. Para deixar 0  ponto mais claro, Edwardsafirmou que “a primeira chegada ou existência daquela disposição má no

coração de Adão, foi por  perm issão de Deus; que poderia ter impedido

isso, se ele assim 0  quisesse, ao prover tais influências de seu Espírito,

como teriam sido absolutamente eficazes para impedir a disposição má,

que, na verdade, ele, de fato, reteve”14. Ainda que Deus tenha tornado

certo a primeira disposição que deu origem a todas as outras, Edwards

argumenta, Deus não é culpado. Apenas Adão foi culpado, pois suas

intenções eram más. As intenções de Deus em tornar 0 pecado e 0  mal

certos eram boas. “Ao desejar 0  mal Deus não faz o mal” '5.

Isso, de fato, inocenta a Deus, por assim dizer, de ser o autor do

pecado e do mal? Edwards, por fim, concluiu:

Se por “autor do pecado” queremos dizer o permissor ou 0  não

impossibilitador do pecado; e, ao mesmo tempo, um organizador doestado dos eventos, de tal maneira que, para fins e propósitos sábios,santos e mais que excelentes, aquele pecado, se permitido ou nãoimpedido, mais que certa e infalivelmente acontecerá: eu digo, seisso for tudo 0  que se entende por ser autor do mal, eu não negoque Deus é 0  autor do mal '6.

Sugiro que a maioria das pessoas consideraria isso como sendo 0

autor do mal. Mas muitos calvinistas, percebendo que, para a maioria

das pessoas “autor do mal” significa que Deus coagiu Adão a pecar

contra sua vontade, rejeitam esta linguagem enquanto que concordam

  3. Edwards,Original Sin, 384.

 4. Ibid., 393.

  5. Edwards,Freedom of the Will, 4 - 2.

  6. Ibid., 399.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

com Edwards. Nem Edwards e nem nenhum calvinista acredita que

Deus tenha forçado Adão a pecar contra sua vontade, mas a linguagem

simples dita que alguém é 0  “autor” de algo simplesmente por torná-lo

certo. Assim sendo, eu argumento, o calvinismo, de fato, faz de Deus 0

autor do mal no sentido de que, de acordo com sua descrição da soberaniade Deus, Deus tornou certo o pecado de Adão.

Minha questão aqui é simplesmente esta: quando os calvinistas negam

que sua doutrina faz de Deus 0 “autor do pecado” , 0 que eles geralmente

querem dizer é que Deus não coagiu Adão (ou ninguém) a pecar contra

sua vontade. Todavia, eles devem admitir, juntamente com Edwards,

que sua doutrina realmente faz de Deus 0  autor do pecado no sentido

de que Deus tornou certo que Adão (e toda sua posteridade) pecaria.

R. C. Sproul

De maneira semelhante a Edwards, Sproul rejeita 0  rótulo “determi-

nismo” para sua forte visão da soberania divina  porque ele entende que

“determinismo” quer dizer “força externa” '7. Ele admite, juntamente

com Edwards e todos os outros calvinistas rígidos, que Deus determi-

na todas as coisas, mas ele prefere não  chamar essa “determinação”

divina de “determinismo” 18. Podemos só nos perguntar que diferença

isso realmente faz. Continuarei a chamar esta visão de determinismo

divino seguindo a definição simples de “determinismo” (conforme dada

em vários dicionários e enciclopédias), de que “todo evento se torna

necessário por eventos e condições antecedentes” 19. Esse certamenteé 0  caso com a crença de Edwards e de Sproul e da maioria dos outros

calvinistas acerca da soberania de Deus.

 7. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 39-40.

  8. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 63.

  9. VerStanford Encyclopedia o f Philosophy  (http://plato.stanford.edu/).

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Contra o Calvinismo

 Vamos agora nos voltar para a descrição de Sproul da soberania provi-

dencial de Deus. Sproul é bem conhecido por fazer afirmações um tanto

quanto enfáticas e extremas acerca da doutrina calvinista. Por exemplo, em

Eleitos de Deus, ele escreve que qualquer pessoa que não concorde com suacrença (conforme expressa na Confissão de Fé de Westminster) acerca da

predestinação deve ser um “ateu convicto” 20. Para Sproul (e muitos outros

calvinistas) a predestinação é mais do que um conceito acerca da soberania

de Deus em decidir quem será salvo e quem não será salvo; ela também

é um conceito acerca da “soberania total” de Deus em todas as cosias. No

capítulo 3 eu citei a afirmação de Sproul que não pode haver uma única

molécula sequer no universo que não esteja sob 0  controle de Deus. Ele é

famoso por perguntar ao público se eles acreditam na soberania total de

Deus, no sentido de que eu aqui, chamo de determinismo divino. Então

ele pergunta quantos são ateus. As pessoas que não levantaram suas mãos

em resposta à sua primeira pergunta, ele diz, deveriam levantar suas mãos

na segunda pergunta. Sua conclusão, claro, é que “se Deus não é soberano,

então ele não é Deus. Pertence a Deus como Deus ser soberano”21.

O que é estranho acerca disto é que em Eleitos de Deus, Sproul afirma

que “eruditos e líderes cristãos” podem discordar acerca desta doutrina,

mas então ele diz que qualquer um que não concordar com ele deve ser

um ateu convicto. Ele não deveria se surpreender se alguns “eruditos

e líderes cristãos” se ofendessem com essa sugestão!22 Muitos cristãos

concordam com ele que a soberania de Deus é uma parte essencial danatureza de Deus sem concordar com sua interpretação dessa soberania.

20. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 6. A passagem da 

Confissão de Fé de Westminster referida por Sproul como exigindo concordância a 

fim de não ser um “ateu convicto" é que “Desde toda a eternidade. Deus, pelo muito  

sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalterável tudo quanto 

acontece”.

2 . SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 22.

22. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 9- 0, 6.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Então, qual é realmente a doutrina de Sproul da predestinação/pro-

 vidência? Obtem os uma forte dica em sua definição de predestinação:

“Ela inclui tudo 0 que vem a acontecer no tempo e espaço” 23. Em outras

palavras, a predestinação, em seu sentido mais amplo, é simplesmenteoutra palavra para a determinação de Deus de todos os eventos: provi-

dência meticulosa. Ele afirma que tudo o que acontece é a vontade de

Deus 24. Para concluir isso, ele escreve:

O movimento de cada molécula, as ações de cada planta, 0cair de cada estrela, as escolhas de cada criatura volitiva, todosestes estão sujeitos à sua vontade soberana. Não há moléculasindisciplinadas correndo soltas no universo fora do controle doCriador. Se tal molécula existisse, ela poderia ser a mosca críticano azeite eterno.25

Em outras palavras, “uma molécula indisciplinada poderia destruir

todas as promessas que Deus já fez acerca do desfecho da história” 26.

Sproul continua a fazer uma distinção entre os dois sentidos da vontade

de Deus: a vontade deeretiva de Deus e a vontade permissiva de Deus27. Tal

distinção pode aliviar alguma ansiedade acerca do papel de Deus no mal,

mas então ele tira com uma mão aquilo que ele deu com a outra: “o que

Deus permite, ele decreta  permitir” 28. Em outras palavras, a permissão

de Deus é disposta e até mesmo permissão determinante; ela meramente

reflete e promulga os decretos eternos de Deus. Assim, até mesmo 0

pecado jaz tanto dentro da vontade deeretiva de Deus quanto da vontadepermissiva de Deus. A última, não determina a primeira em nenhuma

23. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 2 .

24. Ibid., 47.

25. Ibid.

26. Ibid.

27. Ibid.

28. Ibid.

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Contra 0 Calvinismo

forma ou caso contrário Deus não seria soberano. O que Deus permite,

ele decretou permitir - incluindo o pecado. A forma como Sproul explica 0

relacionamento entre a vontade decretiva de Deus e a vontade permissiva

de Deus tende a desmoronar as duas juntas. O espectro de um Deus quedeseja o pecado e 0 mal ainda paira sobre ele.

 A fim de obter um entendimento mais completo da doutrina do

Sproul da soberania providencial de Deus, é útil olhar para sua visão de

livre-arbítrio. Por um lado, diferente de alguns calvinistas, Sproul afirma

que Adão e Eva caíram por seu próprio livre-arbítrio: “0  calvinismo vê

 Adão pecando por seu próprio livre-arbítrio, e não por coação divina.”29.

 Ademais, sobre a queda, ele diz:

“Adão lançou-se no poço [da depravação e morte espiritual]. Em

 Adão, nós todos nos lançam os no poço. Deus não nos atirou dentro do

poço” 30. Alguns dos leitores de Sproul são falsamente consolados por

isso - como se isso aliviasse 0  problema da escolha soberana de Deus

de que Adão pecaria. Mas isso não está claro de jeito algum.

É importante analisar mais atentamente 0 que Sproul quer dizer por“livre-arbítrio”. Lá ele se volta ao compatibilismo de Edwards, no qual

0  “livre-arbítrio” é simplesmente fazer 0  que você quer fazer mesmo

se você não puder fazer 0  contrário. Assim como Edwards (em muitas

formas, 0  mentor de Sproul), Sproul argumenta que “sempre escolhe-

mos de acordo com a inclinação que é mais forte no momento” 31. Isso

também seria verdadeiro para Adão, pois tanto Edwards quanto Sproul

estão simplesmente explicando 0  que “livre-arbítrio” sempre significa. Sproul explica ainda mais: “Há um motivo para toda escolha que fazemos.

Em um sentido limitado, toda escolha que fazemos é determinada”32.

Determinada pelo quê? Pelas nossas inclinações e motivos interiores.

29. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002. p. 7 .

30. Ibid., 72.

3 . SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009. p. 3.

32. Ibid.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

para resultar em seus pecados, isso não faz de Deus o autor dos pecados

deles? Se sim, como é que eles são responsáveis e Deus não é?

Paul Helm

 Agora analisaremos Paul Hem, outra testemunha calvinista para a forte

doutrina da providência que eu acredito que coloca 0 calvinismo em apuros

ao inexoravelmente levar a “conseqüência lógica e necessária” de que Deus

é 0 autor do pecado e do mal e até mesmo de todo 0 sofrimento inocente.

 A obra de Helm,  A Providência de Deus,  é amplamente considerada

um clássico contemporâneo do pensamento calvinista. Veja aqui comoele expressa a soberania de Deus em providência: “Não somente todo

átomo e molécula, todo pensamento e desejo, é mantido em existência

por Deus, mas cada curva e cada volta de tudo isso está debaixo do con-

trole direto de Deus” 36. Então, “a providência de Deus é ‘refinada’, ela

se estende à ocorrência de ações individuais e a cada aspecto de cada

ação”37. Claro, Helm reconhece que para muitos de seus leitores esta

forte visão da soberania de Deus irá promover ainda mais o debate do

problema do mal. É Deus, então, 0 autor do pecado e do mal? O que

dizer da bondade de Deus?

Este problema do mal e do papel de Deus nele torna-se ainda mais

problemático quando Helm volta-se para descrever como Deus rege 0

mal no mundo:

Pois, de acordo com a visão “isenta de risco” [a visão de Helm da

providência de Deus na qual Deus não se arrisca], Deus controla todos

os eventos e também dá mandamentos morais que são desobede-

cidos em alguns dos muitos eventos que ele controla. Por exemplo,

ele ordena que homens e mulheres amem seu próximo enquanto ao

mesmo tempo controla ações que são maliciosas e odiosas38.

36. HELM, Paul. A providência de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2007. p. 9.

37. Ibid., 91.

38. Ibid., 117.

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Contra o Calvinismo

De acordo com Helm, Deus tem duas vontades: “a que acontece” (a

que ele decreta e torna certa) e “a que deve acontecer” (que ele ordena

e que frequentemente vai contra o que ele decreta). Alguns calvinis-

tas referem-se a estas vontades como “vontade decretiva” e “vontadepreceptiva” de Deus. Em outras palavras, de acordo com esta visâo da

providência de Deus, Deus ordenou que Adão e Eva não comessem da

árvore do conhecimento do bem e mal (vontade preceptiva) ao passo

que ao mesmo tempo (ou desde toda a eternidade) decretou que eles

comeriam da árvore. A questáo crucial que é levantada é como Deus

pode ser bom e não estar em conflito consigo mesmo? Deus garante

que suas ordenanças morais serão desobedecidas. Como Deus pode

fazer isso sem coagir as pessoas a pecar? E como ele faz isso sem ser

responsável pelo pecado?

Nesta altura, Helm, assim como muitos calvinistas, voltam-se para a

retenção de Deus da influência divina de maneira que as pessoas pecam

naturalmente sem que Deus as faça pecar: “O que determina a ação [ex.

a queda] na medida em que ela é má é a negação  divina. Deus retém

sua bondade ou graça, e em seguida 0 agente forma uma motivação ou

razão moralmente deficiente e age de acordo com ela” 39.

Em outras palavras, Deus torna certo 0 mau sem que, ele mesmo,

faça 0 mal. O mal, afinal de contas, está no motivo com a qual a ação

preordenada é realizada pela criatura. O motivo do pecador é mal ao

passo que 0 motivo de Deus em preordenar e tornar certo o mai é bom.O pecador está pecando porque, a partir de um motivo mal (ex. de ego-

 ísmo) ele desobedece a vontade preceptiva de Deus ainda que ele não

faça o contrário porque Deus retém a provisão necessária para não pecar.

Isso suscita muitas perguntas acerca da bondade de Deus, responsa-

bilidade humana e a fonte do primeiro motivo mal. Helm afirma que,

apesar do envolvimento de Deus em tornar certo o mal, ele é um Deus

39. Ibid., 152.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

perfeitamente bom de maneira que “a bondade de Deus deve ter alguma

relação positiva com os tipos de ações humanas que consideramos boas.

Caso contrário, por que atribuir bondade a Deus? 40Lidarei com os problemas

inerentes a este relato de providência de Deus mais tarde neste capítulo. Por

agora nos basta dizer que, em seu melhor cenário, tal relato é incoerente.

 John Piper

E o influente John Piper - provavelmente o mentor mais importante do

novo calvinismo entre a geração de jovens, incansáveis e reformados? O

que ele diz acerca da soberania de Deus e providência, incluindo 0 mal? Ele

segue Edwards e é muito parecido a Helm. Conforme explicado anterior-

mente, Piper acredita que tudo, sem exceção, vem a acontecer de acordo

com o plano e propósito preordenados por Deus e que Deus torna tudo

isso certo sem que ele mesmo participe do mal: “De alguma maneira (que

nós não podemos entender plenamente) Deus é capaz, sem ser culpado de

“tentar”, de garantir que uma pessoa faça 0 que Deus ordena que ele faça

ainda que isso envolva o mal” 41. Com Helm, Piper afirma duas vontadesem Deus: “Deus decreta um estado das coisas [incluindo 0 mal] ao passo

que também deseja e ensina que um estado de coisas diferentes deva acon-

tecer” 42. Piper nega, em seu relato de providência, que Deus seja 0 autor

do pecado e do mal ainda que ele, de fato, certifique-se de que as coisas

que são contrárias as ordens de Deus venham a acontecer.

Cada um dos autores citados até aqui nesta seção em algum lugar dizque tudo 0 que Deus preordena e torna certo, incluindo 0 pecado e 0 mal,

glorifica a Deus. Boettner é quem diz de maneira mais sucinta: “Deus

tem um propósito definido na permissão [!] de todo pecado individual,

40. Ibid., 49.

4 . John Piper, “Are There Two Wills in God,” in Still Sovereign: Contemporary  

Perspectives on Election. Foreknowledge, and Grace, eds., Thomas R. Schreiner and Bruce

 Ware (Grand Rapids: Baker, 2000), 23.

42. Ibid., 09.

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Contra o Calvinismo

tendo o ordenado [!] ‘para sua própria glória’ ”43. Até mesmo as obras

de Satanás são preordenadas e controladas por Deus para sua glória! 44.

 Vamos resumir a típica visão do calvinismo rígido da soberania de Deus.

Enquanto possa haver nuances de diferença em cada relato, é seguro dizer

que há características comuns compartilhadas muito abrangentes de ma-neira que uma descrição geral possa ser oferecida. No calvinismo rígido a

soberania de Deus em sua providência significa que tudo, até os mínimos

detalhes da história e vidas individuais, incluindo 0 pensamento e ações das

pessoas, são preordenados e tornado certos por Deus. Até mesmo ações

más e pensamentos maus são planejados e efetivados de sorte que Deus

“garante” que eles aconteçam para realizar sua vontade. Nada, de jeito ne-

nhum, seja 0 que for, está fora do plano e destino predestinadores de Deus.

Contudo, Deus não é manchado pelo mal que as criaturas fazem ainda

que ele o torne certo, pois seus motivos são sempre bons, até mesmo em

efetivar o mal que ele proíbe. E o plano final de Deus é bom de tal sorte

que 0 mal serve seu propósito. “Deus deseja corretamente estas coisas que

os homens fazem impiamente” 45. Todavia, as criaturas são unicamente

responsáveis pelo mal que cometem 46. Deus torna 0 pecado e o mal certos

não por coagir ou forçar as pessoas para que os cometam, mas ao retirar

ou reter essa influência divina que eles precisariam para não pecar e não

fazer 0 mal. Tudo 0 que acontece, incluindo o pecado, é ordenado por Deus

para sua própria glória.

O PROBLEMA DA REPUTAÇÃO DE DEUS

Sproul afirma que “qualquer distorção do caráter de Deus envenena 0

restante de nossa teologia” 47. De fato, os cristãos não calvinistas concor

43. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 25 .

44. Ibid., 243.

45. Ibid., 229.

46. Craig R. Brown,

The Five Dilemmas of Calvinism  (Orlando, FL: Ligonier, 2007), 45 - 58.

47. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.33. 

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Contra o Calvinismo

 Alguém pode se perguntar como Deus poderia estar certo que tais

coisas aconteceriam. Deus conhece os corações das pessoas e pode

prever que, dadas certas circunstâncias previstas, eles farão coisas peca-

minosas. Deus não precisa manipular as coisas; ele pode simplesmenteprevê-las de maneira infalível. Os calvinistas zombarão disso, mas a

forma como os calvinistas lidam com o envolvimento de Deus suscita

problemas maiores que eles precisam enfrentar do que se deixassem a

questão sem solução.

Resumindo, o relato calvinista da soberania de Deus apresentado

anteriormente neste capítulo inevitavelmente faz de Deus o autor do

pecado, mal e do sofrimento inocente (tais como os das crianças do Ho-

locausto) e, desse modo, impugna a integridade o caráter de Deus como

bondoso e amoroso. O Deus deste calvinismo (em oposição, digamos, a

teologia reformada revisionista) é, em seu melhor cenário, moralmente

ambíguo e, no seu pior cenário, um monstro moral dificilmente de ser

distinto do diabo. Lembre, de acordo este relato da soberania de Deus

e providência, até mesmo o diabo está apenas fazendo as obras que lhe  fo ra m dadas por Deus para que ele as fizesse.  Isso, também, como todo

0 resto, foi preordenado, planejado, desejado por Deus e tornado certo

por Deus  para sua glória.  Só posso concordar de todo 0 coração com

o filósofo evangélico Jerry Walls que diz: “O calvinista deve sacrificar

uma clara noção da bondade de Deus a fim de manter sua visão dos

decretos soberanos de Deus” 50. Acerca da reivindicação calvinista de

que até mesmo 0 mal é desejado e tornado certo por Deus, Walls corre-

tamente diz: “Neste ponto a ideia de bondade, conforme a conhecem os,

simplesmente perde sua forma” 51.

Deixe-me ser extremamente claro que sejam lá quais forem as obje-

ções que Sproul e outros possam levantar, 0 relato calvinista da soberania

50. Jerry Walls, “The Free Will Defense, Calvinism, Wesley, and the Goodness of God,” 

Christian Scholar’s Review   3/ ( 983): 29.

5 . Ibid., 32.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

de Deus é  determinismo divino. Nenhuma quantidade de cavilação pode

resolver a questão. Afirmar que tudo 0 que acontece, até os mínimos

detalhes, incluindo até mesmo os próprios pensamentos e ações de Deus,

são determinados, é por definição,  afirmar 0 determinismo. Mesmo seSproul não seguisse Edwards em argumentar que os próprios pensa-

mentos e ações de Deus são determinados (que, dada sua concordância

com a ideia compatibilista de Edwards de livre-arbítrio, ele parece ter),

ele enfaticamente  afirma que tudo no mundo é determinado por Deus.

Todos os calvinistas citados acima, ás vezes, recuam e utilizam a

linguagem de permissão quando falam da soberania de Deus sobre 0

pecado e o mal, mas uma análise rigorosa do que eles querem dizer revela

que a ideia deles da permissão de Deus é diferente do que uma simples

permissão. É permissão desejosa [voluntária] e até mesmo determinante.

Lembre-se de que Deus permite a queda de Adão, mas que também a

torna certa, pois a queda está em sua vontade e propósito ao reter ou

retirar o poder moral que faria com Adão não precisasse ter de pecar.

De fato, esta permissão é esquisita. Quem acreditaria que um professor,que retém uma informação necessária para que os alunos sejam aprovados

em um curso, simplesmente tenha permitido que eles fossem reprovados?

E se esse professor, quando convocado pelos pais e oficiais da escola,

dissesse: “Eu náo fiz com que fossem reprovados. Eles mesmos é que se

reprovaram”. Alguém aceitaria essa explicação ou acusaria o professor de

meramente permitir que os alunos fossem reprovados e, ao mesmo tempo,

também de ter causado  a reprovação? E se 0 professor argumentasse que

ele planejou e tornou a reprovação de seus alunos certa por um bom moti-

 vo - para manter os padrões acadêmicos e mostrar o quão bom professor

ele é ao demonstrar quão necessário sua informação é para que os alunos

passem? Estas admissões não aprofundariam ainda mais as convicções de

que este professor está moral e profissionalmente errado?

Muitos críticos do calvinismo, talvez a maioria, ficam extrem amente

pasmados com 0 determinismo divino calvinista. Há muitas razões, mas

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Contra o Calvinismo

a primeira e mais importante é que ele faz com que Deus seja moral-

mente impuro, se não repugnante.

Um dia, no final de uma aula que tratava da doutrina calvinista da

soberania de Deus, um aluno me fez uma pergunta que eu havia adiado

sua consideração. Ele indagou: “Se te fosse revelado de uma maneira

que você não pudesse questionar ou negar que o verdadeiro Deus, na 

verdade, é   0 que 0 calvinismo diz e que domina como 0 calvinismo

afirma, ainda assim você 0 adoraria?” Sabia a única resposta possível,

sem pestanejar, ainda que soubesse que chocaria muitas pessoas. Eu

disse não, eu não adoraria, pois eu não conseguiria. Tal Deus seria um

monstro moral. Claro, eu percebo que os calvinistas não pensam quesua visão da soberania de Deus 0 torna em um monstro moral, mas eu

só posso concluir que eles não levaram 0 calvinismo à sua conclusão

lógica ou até mesmo pensaram seriamente o bastante nas coisas que

eles dizem acerca de Deus e do mal e do sofrimento inocente no mundo.

Talvez ninguém tenha uma postura mais forte contra a doutrina calvinista

da providência de Deus do que o teólogo David Bentley Hart, que examinou

0 papel de Deus no sofrimento inocente em The Doors o f the Sea: Where Was 

God in the Tsunami?52 Nesta obra ela chama a visão adotada pelos calvinistas

rígidos de “fatalismo teológico” e diz que as pessoas que mantém essa visão

“difamam 0 amor e a bondade de Deus em razão de uma fascinação servil

e doentia com sua ‘soberania medonha’”53. No livro, ele diz:

Se, de fato, houvesse um Deus cuja natureza verdadeira - cuja

 just iça ou soberania - fosse revelada na morte de uma criança ou no

abandono de uma alma ou um inferno predestinado, então não seria

uma grande transgressão pensar nele como uma espécie de demiurgo

malevolente ou desprezível, e de odiá-lo e de negá-lo adoração e de

buscar um Deus melhor que ele” 54,

52. David Bentley Hart, The Doors o f the Sea: Where Was God in the Tsunami?   (Grand 

Rapids: Eerdmans, 2005).

53. Ibid., 89.

54. Ibid., 9 .

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Considero útil citar Hart com certa extensão conforme ele expressa

meus sentimentos e os sentimentos da maioria dos não calvinistas acerca

do determinismo divino do calvinismo, incluindo 0 pecado, 0 mal e 0

sofrimento inocente, de maneira tão clara e corajosa:

 Alguém precisa considerar 0 preço no qual este conforto [a saber,

de que 0  orador calvinista que pregou “Deus matou meu filho”] foi

comprado: ele exige que acreditemos e que amemos um Deus cujos

fins bondosos serão realizados não apenas apesar de - mas totalmente

por forma de - toda crueldade, cada miséria fortuita, cada catástrofe,

cada traição, cada pecado que 0  mundo já conheceu, ela exige que

acreditemos na necessidade espiritual eterna de uma criança morrem

do uma morte agonizante de difteria, de uma jovem mãe devastadapelo câncer, de dezenas de milhares de Asiáticos engolidos em um

instante pelo mar, de milhões assassinados em campos de exter-

mínio e campos de trabalhos forçados [gulags] e fomes forçadas (e

assim por diante). De fato é uma coisa estranha buscar a paz em um

universo tornado m oralmente inteligível á custo de um Deus tornado

moralmente repugnante 55.

Com grande relutância, pois sei que isso pode ofender profundamente

alguns calvinistas, eu só posso dizer amém!

Sem dúvida, alguns calvinistas objetarão e dirão que Deus apenas  per- 

mite 0 pecado e 0 mal e 0 sofrimento inocente: ele, de fato, não os causa.

E ele os permite sem culpa, sem participar do próprio pecado e do mal. A

resposta para esta objeção à crítica devastadora de Hart deveria ser óbvia

a partir das citações de calvinistas fornecidas acima. Os pensadores evan-gélicos Jerry Walls e Joseph Dongell corretamente enfatizam em Why I Am 

 Not a Calvinist que a linguagem frequentemente utilizada de permissão “não

cai bem com o calvinismo sério”56, ainda que alguns calvinistas, tais como

Sproul e Helm, recuam e fazem uso dela para evitar qualquer implicação

de que Deus seja a causa do pecado, mal ou 0 sofrimento inocente.

55. Ibid., 99.

56. Jerry Walls and Joseph Dongell, Why I Am Not a Calvinist   (Downers Grove, IL; 

InterVarsity Press, 2004), 25.

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Contra o Calvinismo

 Walls e Dongell corretam ente enfatizam que o próprio Calvino rejei-

tava essa linguagem de permissão de Deus como inapropriada para a

soberania de Deus 57. É verdade, alguns calvinistas utilizam esta lingua 

gem, mas “se Deus apenas permite certas coisas sem especificamenteas causar, é difícil ver como isso se encaixaria com a reivindicação

calvinista de determinismo todo abrangente” 58(O filósofo Walls define

determinismo como “a visão de que todo evento deve acontecer exata-

mente como aconteceu em razão de condições prévias”59)

De acordo com Walls e Dungell e muitos outros críticos meticulosos

do calvinismo, uma profunda incoerência jaz no cerne da afirmação

calvinista de soberania divina exaustiva, determinismo divino e mera

permissão do mal: “Para um determinista - e esta é uma questão cru-

ciai - nenhum evento pode ser visto em isolamento a partir dos eventos

que 0 causam. Quando mantemos isso em mente, é difícil ver como os

calvinistas podem falar de quaisquer eventos ou escolhas como sendo

 permitidos"  60. Eles pegam a alegação de Sproul de que o mal se origina

do caráter mal feito de disposições más. Esta é a tentativa de Sproul (e

de outros calvinistas) de impedir fazer de Deus o autor do mal porque

é dito que Deus preordena e torna certo certas ações ao passo que 0

mal deles flui dos desejos pecaminosos dos atores finitos. O motivo de

Deus na preordenação e no ato de tornar certo o pecado é moralmente

puro, e ele não coage ninguém a pecar. Assim sendo, diz-se que Deus

meramente permite o pecado e a ação má ao passo que ao mesmotempo Ele 0 torna certo.

 Walls e Dungell corretam ente questionam a incoerência deste relato

do papel de Deus no mal, pois a questão inevitavelmente surge: De

57. Ibid., 126.

58. Ibid.

59. Ibid., 98 - 99.

60. Ibid., 129.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

onde vêm a disposição má e os desejos maus da criatura? Aqui está um

dos calcanhares de Aquiles do calvinismo ao fazer uso de Faraó como

éstudo de caso (pois Sproul culpa as más ações de Faraó como resultado

de seu caráter mau e não em Deus que as preordenou). Walls e Dungellenfatizam que “Faraó não se tornou a pessoa que ele era em um vá-

cuo. Antes, 0 caráter dele foi formado por uma longa série de eventos

e escolhas, sendo que todas as escolhas e eventos foram determinados

por Deus (de acordo com 0 calvinismo)”61. Em outras palavras, para ser

consistente, o calvinismo deve dizer  que até mesmo 0 caráter mal de

Faraó, no final das contas, vem de Deus. (Imagine um universo em queapenas Deus e a primeira criatura existem. De onde 0 primeiro impulso

mal vem, se não do livre-arbítrio da criatura, que 0 calvinismo nega,

exceto no sentido compatibilista, ou de Deus?

 Walls e Dongell, então, perguntam: “Qual é 0 sentido, então, de dizer

que Deus permitiu as ações de Faraó, dado este cenário” do papel de

Deus em tornar tudo certo, sem exceção? 62Eles ressaltam que “a noção

de permissão perde todo 0 significado importante em uma estrutura

calvinista. Portanto, não é de se surpreender que 0 próprio Calvino es-

tivesse duvidoso da ideia e que advertiu contra 0 uso dela” 63. Por fim,

 Walls e Dungel resumem todo o problema de maneira concisa e vigorosa:

“o calvinismo enfrenta problemas para descrever 0 pecado e 0 mal de

maneira que seja moralmente plausível. Pois se Deus determina tudo

que acontece, então é difícil entender por que há tanto pecado e mal nomundo e por que Deus não é responsável por isso”  M.

 Apelar, então, para a permissão de Deus do pecado e do mal não se

enquadra com a forte doutrina do calvinismo rígido da soberania de Deus.

61. Ibid., 130.

62. Ibid., 3 .

63. Ibid., 32.

64. Ibid.. 33.

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Contra 0 Calvinismo

Reconhecidamente, muitos calvinistas, de fato, apelam para a permissão,

mas isso não torna melhor as outras coisas que dizem do plano e ação

totalmente determinante de Deus em tornar tudo, sem exceção, certo.

 Alguns calvinistas defendem a bondade de Deus em basada no que échamada na teodiceia de “bem maior”. (Teodiceia é qualquer tentativa

teológica ou filosófica para justificar as ações de Deus em face do mal).

Na verdade, até onde posso dizer, todos  os calvinistas incorporam algu-

mas versões de defesa do bem maior da bondade de Deus em face do

pecado e do mal em suas doutrinas da providência. Walls e Dungell se

referem especificamente a Paul Helm. O problema, eles enfatizam (e eudiria outro calcanhar de Aquiles do calvinismo), é a crença na decisão

divina de reprovar muitas pessoas para 0 inferno ao soberanamente

“ignorá-los” ao passo que escolhe salvar alguns. Em qual sentido pode-

-se dizer que 0 inferno serve a um bem maior? Qual bem? Falarei mais

sobre isso no capítulo 5, que lida com a eleição incondicional.

Gostaria de fazer uma pausa aqui e de deixar algo claro. Se 0  calvi-

nismo rígido estiver dizendo qualquer coisa diferente em sua doutrina

da providência, é que Deus intencionalmente planeja e torna certo e

controla tudo sem exceção. Falar de Deus como meramente permitindo

0 pecado e 0 mal e 0 sofrimento inocente fica em contraste extremo

com sua forte doutrina da providência. Se fo r   lógico para os calvinistas

dizer que Deus permite ou concede 0 mal, eles só podem querer dizer

isso em um sentido altamente atenuado e incomum de “permitir” e“conceder” - um sentido que está fora da categoria de linguagem da

maioria das pessoas. Dizendo de maneira direta, mas clara, de acordo

com 0 calvinismo rígido, Deus quer 0 pecado, o mal e que 0 sofrimento

inocente aconteçam ainda que, como alguns calvinistas tal como John

Piper diz, que isto machuque a Deus. E ele quer que estas coisas acon-

teçam de maneira causai; ele as torna certas.

 Vamos exam inar um estudo de caso que a maioria dos calvinistas

fica relutante em lidar. Vejo que a maioria de seus estudos de caso da

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Contra o Calvinismo

o sofrimento daquela criança?” Eu queria correr pelo corredor e ver se

poderia ajudar, mas posso dizer que havia muitas pessoas ao redor da-

quela criança naquela sala. O que eu ouvi me assombra até hoje. Parece

que a criança estava possivelmente morrendo uma morte agonizante.Se 0 calvinismo for verdadeiro, Deus náo apenas planejou e ordenou,

mas também tornou certo aquele sofrimento horrível daquela pequena

criança. Ele náo apenas planejou e ordenou e tornou certa a doença da

criança, mas também a agonia resultante. Não vai funcionar responder

que Deus sofre com ela, como Piper diz. Em The Pleasures o f God  Piper

oferece seu próprio estudo de caso da soberania de Deus na tragédia. Ele

conta, com certos detalhes, acerca da morte de sua mãe em um terrível

acidente de carro. (Ele explica o fato de que ela sofreu pouco, mas e se

ela tivesse sofrido igual àquela criança que eu ouvi no hospital?) Piper faz

uso da morte de sua mãe para ilustrar como tudo o que acontece agrada

a Deus, mesmo se isso 0 entristecer 66. Deus, ele assegura, planejou e

garantiu que o acidente de carro de sua mãe e a morte dela aconteceriam

para a sua glória. Mas como esse evento torna Deus menos monstruosoao dizer que Deus planeja, ordena e torna certo a agonia de uma criança

moribunda, mas que ele se entristece? Piper diz que tudo na criação,

incluindo 0 pecado, mal e o sofrimento, é uma expressão da glória de

Deus67. Ele diz que Deus “ama ser reconhecido mundialmente” 68e que

faz tudo para fazer seu poderoso poder conhecido 69.

Em The Doors of the Sea o  teólogo Hart fala sobre um homem de Sri

Lanka de enorme força física cujos cinco filhos foram mortos pelo tsunami

asiático de 2004. O homem foi apresentado em um artigo no  New York  

Times.  Ele foi incapaz de impedir seus filhos de perecer e, conforme ele

recontava suas fúteis tentativas, ele está “completamente dominado por

66. John Piper, The Pleasures of Cod   (Portland, OR: Multnomah, 1991), 67 - 69.

67. Ibid., 89.

68. Ibid., 102.

69. Ibid., 108.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

seu próprio choro” 70 Então Hart escreve: “Só um cretino moral... teria

tentado amenizar a angústia dele ao garanti-lo que seus filhos morreram

como resultado de conselhos eternos, inescrutáveis e justos de Deus e que,

na verdade, suas mortes haviam misteriosamente servido aos propósitosde Deus na história” 71. Claro, a maioria dos calvinistas aconselharia seus

seguidores a não dizer tais coisas em tais momentos para tais pessoas.

Todavia, Hart reflete que “ se consideramos vergonhosamente tolo e cruel

dizer tais coisas no momento quando a tristeza de alguém é mais real e

irresistivelmente dolorosa, então não devemos dizer tais coisas jam ais” 72.

 Acom panhe comigo agora o segundo estudo de caso imaginário

(mas frequentemente verdadeiro) do sofrimento inocente. Este aqui

envolve o mal moral. Imagine uma menininha sendo seqüestrada por

um maníaco sexual vil que a coloca em seu carro e que se locomove

da vizinhança e vai até uma floresta isolada ás margens de um lago.

 Apesar do choro e do protesto da menina, ele a leva até a margem do

rio onde ele a estupra, a estrangula e lança seu corpo no rio. (Isso não é

simplesmente imaginário; é embasado em uma história verídica que viem um programa televisivo chamado Cold Case Files [Arquivo Morto])

Calvino nos oferece 0 caso de um mercador que, de maneira tola,

se afasta de seus companheiros e acidentalmente chega a um covil de

salteadores e é roubado e assassinado. Conforme citado anteriormente,

ele diz que este evento, como todos os eventos, não foi apenas previsto

e permitido por Deus, mas, na verdade, causado e governado pelo plano

secreto de Deus. Em lugar nenhum ele sugere ou permite que esta seja

uma exceção à soberania de Deus; antes, ele deixa claro que é uma ilus-

tração de como Deus trabalha todas as coisas que são sempre “dirigidas

pela mão sempre presente de Deus” 73. Lemos acerca desse mercador tolo

70. Hart, The Doors of the Sea, 99.

7 . Ibid., 00.

72. Ibid.

73. CALVINO, João. As Institutes: edição clássica, vol. , p. 200.

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Contra o Calvinismo

ou de um evento semelhante hoje e balançamos nossas cabeças e dizemos:

“Sim, posso ver Deus preordenando isso. Que homem tolo. E Deus poderia

facilmente ter uma boa razão para causar este acontecimento”. Mas se

Calvino estiver certo (e se os calvinistas rígidos tais como os que citamosacima estiverem certos), não é apenas a morte do mercador tolo que é

tornada certa por Deus; também o é 0 seqüestro, o estupro e 0 assassinato

da garotinha, tudo isso foi “dirigido pela mão sempre presente de Deus”.

Observe que este evento não foi um desastre excêntrico de natureza ou

resultado da estupidez de alguém. Foi puramente mal. Mas se podemos

pegar a ilustração de Calvino do mercador assassinado ou a ilustração

bem real da garotinha, de acordo com a visão calvinista da soberania de

Deus ambas  são idênticas no sentido de que Deus a planejou, ordenou,

governou e as tornou certo. Hart está certo que isso inexoravelmente faz

Deus “0 arquiteto secreto do mal”74.

Mas ainda pior, de acordo com Piper, isto faz com que Deus, por trás

de toda “providência carrancuda” esconda uma “face sorridente”. Em

O Sorriso Escondido de Deus,  ele cita 0 hino “Deus Trabalha de Maneira 

 Misteriosa” , escrito por um compositor calvinista do século XVIII, William

Cowper, com aprovação: “Não julgue 0 Senhor com débil entendimento,

mas confie nele por sua graça; por trás de uma providência carrancuda

ele oculta uma face sorridente” 75. Isso fica muito bem quando se fala

das aflições que Deus traz para as vidas de seus heróis para fazer deles

cristãos mais fortes. Mas e quando isso se aplica igualmente, como deveser se Piper estiver correto acerca da providência de Deus, a cena de um

maníaco sexual estuprando uma garotinha, depois a estrangulando e a

 jogando em um rio? Não vai dar para escapar da dificuldade ao dizer que

em tais casos Deus meramente permite 0 pecado e 0 mal e 0 sofrimento

inocente. Se 0 calvinismo estiver certo, Deus também aprova a ação do

74. Hart,

The Doors of the Sea,  0 .

75. PIPER, John. O Sorriso Escondido de Deus. Traduzido por Augustus Nicodemus. São  

Paulo: Shedd Publicações, 2002, p.25.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

maníaco sexual e torna a ação certa ainda que ele se entristeça com 0

caso. Que tipo de Deus é esse?

Piper e outros calvinistas falam muito do grande renome e reputação

de Deus. O que muitos de seus ouvintes e seguidores não conseguemperceber é que a descrição da soberania de Deus dos calvinistas torna

a reputação de Deus dúbia, no seu melhor - a menos que, claro, que

tudo que alguém queira dizer por reputação de Deus seja poder. Mas é

isso é realmente 0 que queremos dizer com reputação de Deus? Não se

trata mais de uma questão de seu caráter como bom? Como observado

anteriormente, Helm diz que a bondade de Deus não pode ser tão dife-rente de nossas mais elevadas e boas ideias de bondade, caso contrário

0 sentido de bondade seria totalmente perdido. Mas não é 0 que acon-

teceu aqui - com as ideias de Piper e ideias semelhantes de calvinistas

do papel de Deus no mal e sofrimento inocente? Penso que sim.

Quero registrar 0 fato de que alguns dentro da comunidade reformada

concordam com esta avaliação da doutrina do calvinismo rígido da so-

berania de Deus. James Daane, entre outros, critica severamente 0 que

ele chama de “teologia decretai” (que é o que chamo de determinismo

divino) por falhar em levar 0 mal a sério. Extraindo as conseqüências

lógicas e necessárias da explicação desta teologia acerca do papel de

Deus no pecado e no mal, Daane diz: “Com 0 olho da fé 0 teólogo de-

cretal pode olhar para uma humanidade sangrando e partida, para um

mundo em guerra consigo mesmo, e ver apenas beleza e paz” 76.

76. Daane, The Freedom of God, 8 . Claro, os calvinistas frequentemente usam passagens 

bíblicas que parecem retratar Deus como um ser monstruoso. Já citei algumas destas 

passagens veterotestamentárias próximas ao início desse livro. Daane e a maioria dos 

críticos do calvinismo acreditam que o caráter de Deus é perfeitamente revelado em  

Jesus Cristo e que devemos interpretar outras descrições de Deus à luz disto. Jesus se 

lamentou, de maneira genuína, em relação ao pecado e ao mal e buscou claramente  

aliviar o sofrimento. Os calvinistas geralmente acusam os não calvinistas de não levar

 a Bíblia a sério 0 bastante. O que querem dizer é que eles levam os “textos de terror” 

do Antigo Testamento mais a sério do que levam a Jesus! Pelo menos é desta maneira 

que a maioria dos calvinistas veem a questão.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Estas ideias de Deus nâo são exclusivas do calvinismo; pois em sua

maioria, elas são ideias comuns no que é chamado de “teísmo cristão

clássico” - uma figura de Deus desenvolvida através dos séculos, mas

principalmente na igreja primitiva e universidades medievais. No teísmocristão clássico diz-se que Deus é incapaz de qualquer tipo de mudança

ou dependência de qualquer coisa ou qualquer pessoa fora de si mesmo

para qualquer coisa. Deus é actus purus, para utilizar 0 termo de Tomás

de Aquino, o grande teólogo e filósofo escolástico medieval. Isso significa

que não existe potencialidade em Deus, apenas realidade.

 A pergunta é, todavia, se ao menos algumas versões do calvinism oinadvertidamente tornam Deus dependente do mundo para algo que

ele precise - sua própria autoglorificação através da manifestação de

todos os seus atributos de maneira igual. Este é um tema que perpassa

a maioria do calvinismo rígido - que tudo 0 que Deus faz na criação e

redenção é para sua glória. Esta ideia do propósito de Deus é traçada, ao

menos, a Edwards, mas Boettner a expressa melhor com sua resposta

ao motivo pelo qual Deus permitiu o pecado no mundo:

O pecado... é permitido a fim de que a misericórdia de Deus possa

ser mostrada em seu perdão, e que Sua justiça possa ser mostrada em

sua punição. Sua entrada é o resultado de um projeto estabelecido que

Deus formou na eternidade, e através do qual Ele planejou revelar-se

a Si mesmo para Sua criaturas racionais como completo e totalmente

iluminado em todas as perfeições concebíveis” 80.

Piper, assim como Edwards, defende que 0 propósito de Deus em tudo

0 que acontece é a exibição de sua glória. Edwards explicou claramente,

e Piper concorda, que 0 propósito em tudo, incluindo o mal, é a plena

manifestação de todos os seus atributos, incluindo a justiça e a ira”8'.

80. Boettner,

The Reformed Doctrine of Predestination, 234.

8 . John E. Smith, “God the Author of Sin,” introduction to Edwards’ The Great Christian  

Doctrine of Original Sin, 64.

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Contra o Calvinismo

Em uma reviravolta irônica, esta explicação do propósito de Deus na

criação e redenção, incluindo o pecado e 0 mal, volta para assombrar

Edwards e a maioria dos calvinistas após ele. (Sugestões disso também

podem ser encontradas em Calvino). Aparentemente, Deus  precisa  queo mundo seja como ele é, incluindo o pecado, mal, sofrimento inocente,

redenção e reprovação (inferno), a fim de manifestar seus atributos e,

assim, glorificar a si mesmo. Deus poderia ter se abstido disso? Não,

de acordo com Edwards, que afirmou a “a determinação necessária da

 vontade de Deus em todas as coisas pelas quais ele entende como mais 

apropriadas e melhores”   82. As negações de Edwards e de outros calvinistas da liberdade libertária

como incoerente e a adoção do compatibilismo, mesmo em Deus (ex. 0

livre-arbítrio de Deus é controlado por seus motivos mais fortes) levam

diretamente para a ideia de que a criação do mundo, por Deus, como

o “teatro de sua glória” era necessária e não verdadeiramente livre no

sentido de que tal não poderia ter sido de maneira contrária. Esta con-

clusão lógica a partir desta forte visão de soberania é contrária à forte

ênfase na transcendência de Deus e liberdade de condicionamento. Ela

também é contrária à ortodoxia cristã tradicional! E ela também mini-

miza toda a ideia de criação e redenção sendo apenas unicamente pela 

 graça,  pois 0 que é necessário não pode ser pela graça.

O filósofo evangélico Bruce A. Little corretamente critica Piper e outros

que pensam como ele. De acordo com Piper, ele corretamente observa,Deus ordena 0 mal (assim como todas as demais coisas) para glorificar

a si mesmo 83. Ele nota que “Piper cuidadosamente utiliza suas palavras

para dizer que Deus tem um propósito para todo 0 mal nesta terra: fazer

com que a glória de Cristo brilhe mais claramente... a morte tortuosa

82. Edwards, Freedom of the Will, 377.

83. Bruce A. Little, “ Evil and God’s Sovereignty,” em Whosoever Will: A Biblical-  

Theological Critique of Five-Point Calvinism,  eds. David L. Allen and Steve W. Lemke 

(Nashville, TN: Broadman &. Holman, 20 0), 283.

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Contra 0 Calvinismo

ele diz: fora com essa petulância canina, a qual na realidade pode

ladrar, à distância, contra a justiça de Deus, não, porém, tocá-laV’  87. Sua

explicação é que embora as pessoas não façam coisas más “a menos

que ele [Deus] as tenha desejado”, eles as fazem motivados por uma“inclinação má”. Portanto, ainda que eles não possam fazer 0 contrário

do que fazem, e ainda que “suas maldades sejam cometidas unicamente

pela dispensação de Deus” 88, Deus não é culpado e eles são.

O que Calvino claramente quer dizer é que 0 “mal” jaz nas intenções

do coração e que não nas próprias ações. Uma vez que Deus preordena

e torna certas as ações com um bom motivo (indubitavelmente para

sua glória!), ele não pode ser tido como responsável pelos males deles. Antes, a pessoa que faz 0 mal, o faz por não poder deixar de fazer (pois é

compelida por um motivo mau e, por fim, por Deus) 89, é a única culpada.

O que Edwards disse a esse respeito? Já vimos que Edwards acreditava

e argumentava que Deus “torna o pecado certo de maneira infalível”

ao “reter sua ação e energia”90. Acerca dos pecadores, ele escreveu que

“Deus os abandona para com eles mesmos  [de maneira que eles] neces-

sariamente pecam” 91. Mas, Edwards alegava, Deus não faz 0 mal por

desejar o m a l92. Isto porque a culpa  jaz inteiramente na disposição má

do coração que se formou em Adão e em nós, pela permissão de Deus,

tornando-a necessária. Aqui está a citação de Edwards mais clara acerca

do assunto: “Para Deus... ter a disposição [controle] deste assunto [a

queda], concernente a reter estas influências, sem as quais a natureza

será corrupta, não é ser 0 autor do pecado” 93

87. Ibid., p. 2 7.

88. Ibid.

89. Lembre-se da citação feita anteriormente das Institutas de que Deus “obriga os 

réprobos à obediência”.

90. Edwards, Freedom of the Will, 404.

9 . Ibid.

92. Ibid., 4 2 ־ .

93. Edwards, Original Sin, 384.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Observem algumas coisas aqui. Primeiro, Edwards acreditava

e ensinava que a natureza humana (e talvez a natureza criada em

geral, incluindo os anjos) se tornariam necessariamente corruptos e

pecariam sem a influência divina sobrenatural. Todos os calvinistasque seguem a linha Edwards nesse ponto (e a maioria segue) devem

estar fazendo a mesma suposição. O correlato necessário disso é que

a natureza humana não foi criada boa. Isso equipara a finitude a algo

que “não é bom”. Claro, ninguém jamais pensou que a natureza finita

é metafisicamente perfeita assim como Deus é perfeito. Ela é capaz

de corrupção. Mas dizer que ela necessariamente se tornará corruptasem a influência sobrenatural de Deus é colocar em xeque a bondade

da criação de Deus.

Segundo, Edwards está dizendo que Deus reteve a influência neces-

sária, e ele deve querer dizer que ele a retirou,  pois caso contrário a que-

da teria acontecido imediatamente. De qualquer forma, Deus poderia

ter preservado Adão de pecar; ele escolheu não preservá-la, sabendo

infalivelmente que Adão cairia se ele retirasse seu poder sobrenatural

preservador.

Terceiro, a queda de Adão e todas suas conseqüências (incluindo 0

seqüestro, estupro e morte da garotinha) foram desejados por Deus e

tornado certo por Deus. Quarto, Edwards em nenhum lugar explica a

origem da disposição má de Adão que o tornou culpado, e não Deus.

Mas sua doutrina da providência divina, que é soberania exaustiva atéos mínimos detalhes, parece exigir que tudo na criação, incluindo todos

os motivos e disposições, está sob 0 controle de Deus e é tornado certo

por Deus. Entretanto, neste argumento Edwards parece estar dizendo

que a disposição má de Adáo simplesmente veio a existir do nada. Mas

isso é proibido pela forte doutrina de Edwards da soberania de Deus e

por sua negação do livre-arbítrio libertário. Tudo vem de algum lugar! Se

a inclinação má que levou Adão a pecar veio dele mesmo, de maneira

autônoma, tal seria uma enorme concessão ao arminianismo!

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

são. Todos desde Adão herdaram essa natureza corrompida e também se

expressam pecaminosamente em razão dela.

 Assim, de acordo com Boettner, a única maneira de Deus ter sido

0 responsável pelo primeiro pecado de Adão é se ele 0 houvesse com-

pelido a pecar. Simplesmente tornar certo seu pecado ao reter “a graça

coerciva” de forma alguma faz de Deus 0 responsável por ele. Duas

perguntas surgem. Primeiro, quem acredita que uma pessoa que torna

certa que outra pessoa irá cometer um crime, de maneira que a pessoa

que, na verdade, comete 0 crime por não poder fazer 0 contrário, não é

cúmplice do crime? Qualquer um que assiste a série de televisão Law  & Order sabe que a pessoa ou a companhia que seduz uma pessoa para

cometer um crime, ainda que indiretamente, é tão culpada quando a

pessoa que comete 0 crime. E a pessoa que comete 0 crime é culpada

apenas na medida em que ela era capaz de evitar cometer tal crime.

Eu pergunto, se você estivesse em um júri e se tornasse convencido (a)

pelas provas que 0 réu não poderia ter feito senão cometer a ofensa,

 você votaria pela condenação ou pela absolvição? Eu me arrisco que 0

senso comum dita que os jurados, em tais casos, votam pela absolvição.

Segundo, Boettner acredita que Deus de forma alguma devia a Adão

a graça coerciva necessária para não pecar. Considero tal coisa debatível.

Mas a questão aqui não é se Deus devia a graça a ele, mas se 0 Deus que

é amor, revelado mais plenamente em Jesus Cristo, teria removido a

graça, e assim, portanto, tornando certo que Adão cairia e com todas as

conseqüências advindas da queda. O argumento de Boetnner que Deus de

forma alguma devia a graça coerciva a Adão certamente faz Deus parecer

indiferente, principalmente quando Deus então culpa a Adão por pecar

quando ele lhe criou com uma natureza tão fraca que 0 pecar era inevitável.

Parece que, neste relato, Deus configurou Adão para pecar. Me lembra 0

antigo poema humorístico acerca do teólogo holandês supralapsarianoFrancisco Gomaro, que atormentou Armínio por não aceitar este relato

rígido da soberania de Deus e de tudo que a acompanha:

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Muitos críticos do calvinismo rígido, incluindo este escritor, acreditam

que uma grave contradição jaz no cerne desta forte visão da soberania

de Deus que inclui 0 ato de Deus preordenar e tornar 0 mal certo - prin-

cipalmente quando ela é explicada pelo mecanism o de “ retenção” ou“retirada” da parte de Deus da graça necessária de sorte que Adão caiu

(e toda sua posteridade com ele) infalivelmente por desígnio de Deus.

Eu levo a sério 0 fato de que os calvinistas raramente atribuem a culpa

do pecado a Deus; eles quase sempre dizem que Deus é moralmente

puro e imaculado e que toda a culpa pelo pecado está com as criaturas

pecaminosas. Mas 0 problema é que isso contradiz sua forte visão da

soberania de Deus que inclui a determinação de Deus para o mal.

Quem pode culpar os que temem que isso inevitavelmente leve a

conseqüência lógica e necessária de que Deus seja 0 autor do pecado e

do mal e que Deus, portanto, assume a responsabilidade primária por

eles? Exceto por um simples ato de força de vontade para abraçar 0 que

é ininteligível, 0 que impede alguém que acredita nisso de ir adiante e

dizer que as criaturas não são responsáveis e que Deus é? O que alguémprecisa enfrentar é a pergunta concernente a qual lado desta doutrina

de dois lados; a saber, a soberania determinante e absoluta de Deus e a

responsabilidade única dos humanos pelo mal, a pessoa deva abraçar. A

pessoa não pode, de fato, abraçar as duas sem que caia em contradição.

 Apelar para o mistério não é apropriado; a contradição não é um mis-

tério, assim como Sproul enfaticamente argumenta em Eleitos de Deus, 

eu concordo com ele quando ele escreve que “para os cristãos, abraçar

ambos os pólos de uma clara contradição é cometer suicídio intelectu-

al”104. Lidarei mais com este problema da inteligibilidade na conclusão.

ALTERNATIVAS AO DETERMINISMO DIVINO

 A Bíblia exige aceitação da doutrina calvinista rígida do determinism o

divino? Ela não exige. O que dizer de todas as passagens bíblicas que os

 04. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 29.

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Contra o Calvinismo

calvinistas utilizam para argumentar a favor da preordenação exaustiva e

determinação de todos os eventos, incluindo 0 pecado e o mal? Algumas

destas passagens foram mencionadas anteriormente. Cada passagem

que supostamente ensina a determinação divina do mal, sofrimento ino-cente e o pecado pode ser interpretada como se referindo ã permissão

de Deus. Praticamente todos os cristãos concordam que nada acontece

sem a permissão de Deus. A pergunta é se o calvinismo está realmente

permitido a recuar e utilizar a linguagem de permissão quando já diz

que Deus deseja tudo 0 que acontece, incluindo 0 pecado e 0 mal, e

que a permissão de Deus é “permissão desejosa” que ativamente torna

tanto 0 pecado quanto 0 mal certos. A principal alternativa a esta forte

doutrina da soberania de Deus é a autolimitação divina.

Primeiro, que fique entendido de maneira clara que os que apelam

para a autolimitação divina e a permissão passiva como explicação para

0 pecado e 0 mal no mundo do Deus criador e onipotente não dizem que

Deus jam ais  manipula circunstâncias históricas para realizar sua vonta-

de. O que Deus nunca faz é causar 0 mal.  Deus pode e, sem dúvida, ás

 vezes, realiza algum evento ao colocar pessoas em circunstâncias onde

ele sabe o que eles farão livremente, pois ele precisa que elas façam tal

coisa para que seu plano seja realizado. Tal parece ser 0 caso com a cru-

cificação de Jesus. Mesmo nesta situação, entretanto, não foi Deus quem

tentou ou manipulou as pessoas para que pecassem. Antes, ele sabia

quais eventos, tal como a entrada triunfante, resultariam na crucificação.Mas 0 que não devemos dizer é que a queda de Adão, que deu ori-

gem a toda a história do pecado e do mal, foi desejada, planejada e

tornada certa por Deus. Deus não preordenou e nem tornou a queda

certa, e ela também não era parte de sua vontade, exceto no sentido de

relutantemente a permitir. Como sabemos disso? Sabemos disso porque

conhecemos 0 caráter de Deus através de Jesus Cristo. A doutrina da

encarnação prova que o caráter de Deus é plenamente revelado em Jesus

de sorte que “nenhuma interpretação  de qualquer passagem [na Bíblia]

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

que destrua as revelações da mente divina inculcadas por Jesus pode

ser aceita como válida. O que ele diz e faz é 0 que Deus diz e faz. Ele

não tem decretos escondidos para acobertar, nenhum lado obscuro de

seu Pai para proteger da exposição, nenhuma razão para ser defensivoacerca de [os caminhos de] Deus” 105.

 A doutrina calvinista rígida da soberania de Deus, incluindo 0 mal

como parte do plano, propósito e poder determinante de Deus, contradiz

evidentemente as passagens bíblicas que revelam que “Deus é amor”

(  João 4.8), que Deus não se deleita na morte do ímpio (Ez. 8.32),

quer que todos sejam salvos (Ez. 8.32; Tm. 2.4, 2  Pe. 3.9) e jamais

tenta a ninguém (Tg. .  3). De fato, os calvinistas possuem explicações

inteligentes, mas não convincentes, destas e inúmeras outras passagens

bíblicas. Por exemplo, John Piper argumenta que Deus tem “sentimen-

tos e motivos complexos” 06de sorte que genuinamente lamenta que

0 pecado e 0 mal façam parte deste mundo, deseja genuinamente que

todas as pessoas possam ser salvas e que se entristece quando os que

ele predestinou a morrer e até mesmo a sofrer no inferno pela eterni-

dade, para sua glória, experimentam esse destino. Mas estas não são

explicações convincentes destas passagens importantes que revelam o

coração de Deus. Elas fazem de Deus um ser de mente dividida.

Então como devemos lidar com a realidade do pecado e do mal no

mundo de Deus sem colocar limites indevidos ao poder e a soberania de

Deus? A única forma é postular aquilo que a Bíblia presume em todos oslugares - uma autolimitação divina em relação ao mundo da liberdade

moral, incluindo particularmente a liberdade libertária. Esta liberdade é

um maravilhoso e terrível dom de Deus para os seres humanos criados

a sua imagem e semelhança. Em outras palavras, Deus permite que sua

  05. William G. MacDonald, “The Biblical Doctrine of Election," em The Grace of  

God, Che Will of Man: A Case for Arminianism,  ed., Clark H. Pinnock (Grand Rapids:

 Zondervan, 989), 2 3.

  06. Piper, The Pleasures o f God,  46.

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Contra o Calvinismo

perfeita vontade seja frustrada por suas criaturas humanas aos quais ele

ama e as respeita 0 bastante a ponto para não controlá-las.

Desta forma, Deus realmente possui duas vontades, mas elas não

são as postuladas pelo calvinismo. Como resultado da escolha livre de Adão para cair em pecado (escolha livre aqui significa que ele poderia ter

feito o contrário), Deus tem uma vontade perfeita  - também conhecida

como sua vontade antecedente. (“Perfeito” aqui significa “0 que Deus ver-

dadeiramente deseja que aconteça”). A perfeita vontade de Deus é que

ninguém se perca; esta é a vontade antecedente de Deus (antecedente

à queda e a sua corrupção resultante no mundo). Deus também tem

uma vontade conseqüente -   conseqüente à rebelião das criaturas. É ela

que permite alguns a livremente escolher perecer. Mas sua permissão

é genuinamente relutante e não manipulativa.

O teólogo evangélico Stanley Grenz ( 950  - 2005) ofereceu uma útil

distinção na providência de Deus que corresponde às duas vontades -

perfeita/antecedente e conseqüente - mencionadas acima. É a distinção

entre “soberania de facto ”  e “soberania de ju re"   '07. De acordo com Grenz,

com quem concordo, devido a autolimitação voluntária de Deus, ele agora

é soberano de jure  (por direito), mas não é soberano de facto  (em realida-

de). Sua soberania de facto é futura. Isto reflete a narrativa bíblica na qual

Satanás é 0 “deus deste século” (2  Co 4.4) (onde “mundo” claramente

significa “este presente século mau”) e Deus irá derrotá-lo na era vindoura

para tornar-se “tudo em todos”(

Co.5

.28

). A totalidade de Coríntios5

 não pode ser interpretada de outra forma; ela presume a distinção entre

a regência soberana de Deus de jure  agora e de facto no futuro. Isto não é  

dizer, claro, que Deus não é agora, na verdade, soberano de forma nenhu-

ma; isto só diz que Deus está permitindo que sua soberania seja desafiada

e sua vontade seja parcialmente frustrada até então.

  07. Stanley J. Grenz, Theoloqy for the Community of God   (Nashville, TN: Broadman & 

Holman, 994), 40.

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Sim para a soberania divina; não para o determinismo divino

Isso não limita o poder e a soberania de Deus? Não, pois Deus perma-

nece onipotente, ele poderia controlar tudo e todos se assim o escolhesse.

Mas visando ter criaturas reais e pessoas que podem livremente escolher

amá-lo ou nâo, Deus limita seu controle. Ainda mais, Deus é soberanono sentido de que nada, de forma nenhuma, jam ais pode acontecer sem

que Deus permita. Nada cai fora de sua supervisão e governo interven-

tor. Mas nem tudo o que acontece é o que Deus quer que aconteça ou

determina que aconteça. Não há determinismo divino exaustivo.

Claro, Jesus, sendo Deus, poderia ter curado todos em Nazaré quan-

do esteve no local (Marcos 6.5), mas ele “não podia” realizar milagres

lá em razão de falta de fé que ali havia. Como Deus, ele tinha o poder

absoluto de realizar milagres. Mas ele havia limitado seu poder simples-

mente para realizar milagres na presença da fé. Ele não queria sair e

curar as pessoas aleatoriamente, sem certa medida de fé cooperante e

receptiva da parte dos moradores de Nazaré. Assim é com a soberania

de Deus. Ele poderia exercer 0 controle determinista, mas ele escolheu

não 0 fazer. Como o teólogo E. Frank Tupper diz, Deus não é um Deus

do tipo “faz tudo, a toda hora, em todo lugar”, pois ele escolheu não ser

este tipo de Deus '08. Ele escolheu se fazer parcialmente dependente de

seus parceiros humanos do pacto enquanto que preservando 0 “poder

pactuai superior do santo amor” 109. Este livro tem por intenção enfatizar

as fraquezas e até mesmo erros fatais do calvinismo rígido, ou seja, a

teologia reformada radical. Não tem por intenção ser uma defesa doarminianismo ou qualquer alternativa ao calvinismo. Tal faria com que

0 livro fosse muito mais extenso e, portanto, por esse motivo, alguém

poderia se recusar a lê-lo. O que está faltando nas prateleiras das livra-

rias e bibliotecas não são livros sobre o arminianismo ou até mesmo

108. E. Frank Tupper, A Scandalous Providence: The Jesus Story of the Compassion of God  

(Macon, GA: Mercer Univ. Press, 1995), 334 - 35.

109. Hendrikus Berkhof, The Christian Faith: An Introduction to the Study of the Faith  

(Grand Rapids: Eerdmans, 1991), 146.

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Contra 0 Calvinismo

sobre a soberania autolimitante de Deus em oposição ao calvinismo.

O que está faltando é um livro que demonstra o porquê o calvinismo

rígido não é sustentável bíblica, teológica e logicamente. Isso é tudo 0

que este livro almeja ser. Ocasionalmente eu mencionarei alternativasao calvinismo rígido, tal como os livros (acerca da soberania de Deus)

de E. Frank Tupper,  Λ Scandalous Providence ; Gregory Boyd, Is God to 

Blame?  Jack Cottrell, What the Bible Says about God the Ruler;n0 e prin-

cipalmente David Bentley Hart, The Doors of the Sea: Where Was God in 

the Tsunami?  Aqui eu oferecerei um gostinho do ultimo livro citado, que

bem expressa a minha alternativa (ao calvinismo) e de muitos outros

cristãos da visão da providência de Deus. Hart explica:

Quão radicalmente 0  evangelho está permeado por um sentido

de que a falência do mundo caído é a obra do livre-arbítrio racional

rebelde, que Deus permite reinar, e também por um sentido de que

Cristo vem genuinamente para salvar a criação, conquistar, resgatar,

derrotar o poder do mal em todas as coisas. Esta grande narrativa da

queda e redenção não é uma farsa, não é simplesmente uma lição

dramatúrgica concernente as prerrogativas absolutas de Deus prepa-radas para nós desde a eternidade, mas uma conseqüência real do

mistério da liberdade criada e da plenitude da graça 111.

  0. Frank E. Tupper, A Scandalous Providence  ,  Gregory A. Boyd, Is God to Blame?  

(Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2003); Jack Cottrell,

What the Bible Says about  God the Ruler  (Eugene, OR: Wipf & Stock, 200 ).

  . Hart, The Doors of the Sea, 97.

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NUNCA DESCOBRI O AUTOR DA FAÇANHA, mas devo dizer que foi

inteligente e intrigante, se não de certa forma bizarro. Minha esposa e

eu retornávamos à minha sala para que pegássemos nossos casacos

após um programa de noite de natal e banquete no campus. Afixado na

porta da minha sala estava um bilhete dobrado. Isso não é incomum;

eu geralmente recebo bilhetes dos alunos, colegas ou visitantes. Então

eu retirei o bilhete da porta, abri a porta e acendi a luz. Após isso li 0

bilhete: “Professor Olson, eu conversei com Deus; você está condenado.

 Achei que o senhor quisesse saber”. O bilhete não estava assinado. Claro,

eu encarei aquilo como uma piada; eu havia feito parte de um debate

tranqüilo sobre “predestinação versus livre-arbítrio” , então presumi que

0 bilhete era a tentativa de alguém de fazer piada. Por outro lado, jáconheci calvinistas que pensam que é possível saber, com certeza, quem

é predestinado ao céu e quem é predestinado ao inferno.

Isso pode não ser tão bizarro quanto alguns calvinistas pensam. Eles

deveriam estudar sua própria história. No capítulo anterior eu mencionei

0 livro de John Piper que inclui um capítulo sobre compositor calvinista

 William Cowper (pronuncia-se “Cooper”) ( 73 - 800), autor de “There

Is a Fountain Filled with Blood” (Há uma Fonte Cheia de Sangue) e “God

Moves in a Mysterious Way (Deus Trabalha de Maneira Misteriosa),” assim

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Contra o Calvinismo

como centenas de outros hinos. Cowper foi um calvinista que acreditava

fortemente na “dupla predestinação” - que Deus, desde a eternidade,

escolheu salvar algumas pessoas e condenar outras. Em grande parte

de sua vida adulta ele sofreu períodos de depressão extrema e até pas-sou um tempo em um asilo. Durante algumas destas fases ele estava

convencido de que de alguma forma ele sabia que estava predestinado

ao inferno. Se sua convicção de condenação 0 conduziu a depressão ou

 vice-versa é, claro, desconhecida.

Falei para uma sala de adultos da Escola Bíblica Dominical, cujo

tema era doutrina cristã, e em parte da aula eu falei sobre a doutrina

da eleição, explicando como os calvinistas a entendem como incondi-

cional e arminianos (e outros) a entendem como condicional (quando

se referindo a indivíduos e os destinos eternos dos mesmos). Falamos

sobre os pontos fortes e fracos desta doutrina e, particularmente, do

problema da bondade de Deus à luz de seu suposto decreto de “ ignorar”

ou até mesmo positivamente selecionar alguns para a perdição eterna.

Os alunos da classe debateram entre si se tal visão é consistente como amor de Deus mostrado em Jesus Cristo. Após a aula, um cavalheiro

de meia idade com um PhD em psicologia, que também era autor de

alguns livros bastante conhecidos sobre a área matrimonial veio até

mim para um “bate-papo a sós comigo”. Ele explicou que não consi-

derava a seleção de Deus de alguns para a condenação um problema,

pois ele veio a acreditar que os réprobos não são, de fato, pessoas, mas

autômatos (máquinas, robôs). Jam ais havia ouvido tal explicação e teria

suspeitado que isso fosse resultado da imaginação de uma mentalidade

de certa forma não sofisticada, caso a frase não fosse dita por quem,

de fato, a disse.

Sem dúvida a doutrina da eleição incondicional, 0 “U”, da TULIP, tem

sido objeto de muito debate e controvérsia entre os cristãos conservado-

res e evangélicos. Mas é crucial para todos os verdadeiros calvinistas; é

0 cerne de seu sistema de soteriologia. Para eles, é uma doutrina doce

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

e confortante, pois ela lhes diz que sua salvação não depende de nada

que eles façam, mas apenas da graça de Deus. Para os calvinistas ela

está intrinsecamente relacionada à doutrina basilar da reforma da justi-

ficação pela graça por meio da fé somente. Eles acreditam que qualquer visão exceto a deles leva inexoravelmente a um enfraquecimento dessa

doutrina da reforma. Para outros, entretanto, (assim como Calvinistas

iguais ao Cowper), ela é uma doutrina de terror, em virtude do inevitável

outro lado da moeda - que Deus escolheu alguns, a quem ele poderia

salvar, para que sofram eternamente no inferno (ainda que apenas por

ignorá-los quando seleciona outros para a salvação).

Enquanto os defensores da eleição incondicional a entendem como

uma expressão da grande bondade e misericórdia de Deus, os oponentes

(tal como João Wesley) a entendem como uma expressão de um Deus

obscuro e escondido (0 termo de Lutero para 0 lado de Deus que pre-

destina alguns para 0 inferno) que se preocupa mais com sua própria

glória do que o bem-estar de todas as pessoas. Os oponentes dizem que

a eleição incondicional não pode ser reconciliada com passagens bíbli-cos tais como “Deus é amor” e “Deus [não quer] que ninguém pereça”

(  João 4.8, 6, 2  Pe. 3.9). Acima de tudo, a eleição incondicional não

pode ser reconciliada com 0 caráter de Deus revelado em Jesus Cristo,

que chorou sobre Jerusalém quando seus habitantes não 0 aceitaram

como seu Messias (Lucas 9.4 -44).

Poucas pessoas que sabem acerca da doutrina calvinista da eleição

incondicional (geralmente expressa pelos não teólogos simplesmente

como “predestinação”) são indiferentes; a maioria ou é contra (assim

como João Wesley) ou insistentemente a favor (assim como Jonathan

Edwards). (Menciono Wesley e Edwards aqui porque eles nasceram no

mesmo ano [  703], tendo suas vidas sobrepostas de maneira significan-

te, durante o Grande Avivamento na Grã-Bretanha e América do Norte,

e eles geralmente são considerados os dois tataravôs do movimento

evangélico). Conforme explicarei mais plenamente neste capítulo, sou

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Contra 0 Calvinismo

a favor da eleição incondicional no que tange ao povo de Deus, mas não a 

 pessoas específicas,  e sou a favor eleição condicional de pessoas.  Mas me

oponho de maneira firme e inalterável à inevitável correlata da eleição

incondicional de pessoas - reprovação. Eu acredito a assim chamada

dupla predestinação de pessoas por Deus seja inconsistente com seu

amor e ao ensiná-la, fica difícil fazer distinção entre Deus e 0 diabo.

ELEIÇÃO INCONDICIONAL É  DUPLA PREDESTINAÇÃO

 Alguns calvinistas dizem que acreditam na “predestinação única”.

O que querem dizer é que não  acreditam que Deus escolha condenar

ninguém. Ele apenas seleciona alguns, dentre a humanidade caída

(“a massa da condenação” de Santo Agostinho) para salvar, e deixa 0

restante para seu destino no inferno, algo que é merecido e livremente

escolhido. Mas isso faz sentido?

Começo, como de costume, com Calvino, que escreveu nas Institutas 

“que Deus ordenou desde a eternidade a quem quer abraçar em amor,

exerce sua  ira contra quem quer” 1. O contexto ao redor da afirmação dei-

xa claro que ele concorda com o que foi dito. Seria difícil argumentar que

Calvino defendia qualquer coisa diferente do que a dupla predestinação.

Trechos das Institutas citados no capítulo 3 deixam isso claro; ele fala acerca

dos réprobos sendo compelidos à obediência por Deus. (Novamente, 0 con-

texto deixa claro que ele não quer dizer compelido à obediência à vontade 

 preceptiva  de Deus, ou seja, as ordens morais de Deus, mas compelidos àobediência à vontade decretiva de Deus, ou seja, os decretos de Deus do que

será incluindo a pecaminosidade dos réprobos). Calvino, eu acredito, ficaria

chocado ao ouvir que as pessoas que chamam a si mesmas de calvinistas,

mas que argumentam que a predestinação é apenas única, que ela se apli-

ca apenas à eleição e não à reprovação - como se as duas pudessem ser

separadas ou como se Deus pudesse ser soberano nesta situação.

 . CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 444.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

Boettner também afirmou a reprovação divina de algumas pessoas e

até mesmo que a vontade de Deus é o "fator decisivo” na condenação

dos mesmos. Primeiro, ele escreveu da reprovação que: “esta, tam bém”,

assim como a eleição para a salvação, “é de Deus” 2. Além do mais, “nós

acreditamos que desde a eternidade Deus intencionou deixar alguns da

posteridade de Adão em seus pecados e que 0 fator decisivo na vida de

cada um é ser encontrado na vontade de Deus” 3. É importante lembrar

que para Boettner, como aparentemente para outros autores calvinistas

que citei, “os escritores bíblicos não hesitaram em afirmar “a influên-

cia absoluta de Deus sobre os pensamentos e intenções do coração

[do homem ]” 4. Também, “Deus governa os sentimentos internos, o

ambiente externo, hábitos, desejos, motivos etc. dos homens que eles

são livres para fazer 0 que Ele designa”5Deus, ele confessou, “em um

sentido real” determina as escolhas das pessoas e não existe tal coisa

como “autodeterminação” 6. Assim sendo, 0 motivo é claro para a rei-

 vindicação de Boettner que de a reprovação é necessariamente parte

do plano e propósito soberano de Deus e que não é, no final das contas,condicionada por qualquer coisa fora do próprio Deus. A vontade de

Deus [obviamente sua “vontade deeretiva”] é 0 “fator decisivo” na vida

do réprobo e em sua reprovação.

Todavia, ao mesmo tempo, assim como todos os calvinistas que te-

nho conhecimento, Boettner alega que os réprobos merecem sua punição

(sofrimento eterno no inferno), pois eles “voluntariamente escolhem 0

pecado” 7. No fim das contas, ele deixa esta aparente contradição na esfera

2. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  04.

3. Ibid.

4. Ibid., 209.

5. Ibid., 2 4.

6. Ibid., 2 5, 2 7.

7. Ibid., 25.

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Contra o Calvinismo

do mistério: “A predestinação [incluindo a reprovação] e a livre agência

são duas colunas de um grande templo, e elas se encontram acima das

nuvens, onde o olhar humano não pode penetrar” 8. Parece-me, todavia,

que este mistério é uma completa contradição, algo que até mesmo o

Sproul excluiu como fora dos limites para o discurso cristão. Devemos

enfatizar aqui a diferença entre mistério e contradição; 0 mistério é algo

que não pode ser plenamente explicado ou compreendido pela mente

humana ao passo que a contradição é simplesmente algo sem sentido

- dois conceitos que se anulam e que juntos tornam-se um absurdo. A

teologia cristã jamais deve descansar confortavelmente com a contradição

ao passo que 0 mistério sempre estará presente na fala humana de Deus.

Boettner tem palavras duras para aqueles calvinistas que optam pela

predestinação única: ‘“ Calvinismo brando’ é sinônimo de calvinismo

enfermo, e a enfermidade, se não curada, é 0 início do fim” 9. Enquanto

admite que a reprovação é “admitidamente uma doutrina desagradá-

 vel” 10, Boettner tenta provar a necessidade dela. Para ele, sem ela a

 justiça de Deus não será plenamente exibida e, desta forma, Deus nãoserá plenamente glorificado no mundo e diante dos anjos.

Outra testemunha que a eleição incondicional necessariamente

inclui a reprovação como seu “outro lado da m oeda” é 0 pastor e teó-

logo calvinista Edwin Palmer, autor de The Five Points o f Calvinism,  no

qual ele expõe e defende “Doze Teses Sobre a Reprovação”. Primeiro,

ele define reprovação como 0 decreto eterno, soberano, incondicional,

imutável, sábio, santo e misterioso por meio do qual, ao eleger alguns

para á vida eterna, Ele ignora outros, e então justamente os condena

por seus próprios pecados - tudo para Sua própria glória” Assim

8. Ibid., 222.

9. Ibid., 05.

  0. Ibid., 08.

  . Palmer, The Five Points of Calvinism, 95.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

como Boettner e outros, ele admite que esta é uma doutrina difícil,

mas diz que “nosso Deus infinito nos apresenta algumas verdades im-

pressionantes - verdades estas à quais nossas mentes pecaminosas e

finitas se rebelam contra”12. Ele argumenta que 0 pecado acontece pela

“permissão eficaz de Deus” - algo que nós já observamos em outros

teólogos calvinistas que relutam em dizer que o pecado é causado por

Deus . Parece que a “permissão eficaz” deve significar, assim como a

permissão de Deus do pecado e 0 mal significa em Edwards, Boettner

e outros, que Deus 0 torna certo sem forçar as pessoas a pecar. Palmer

diz: “Todas as coisas, incluindo o pecado, são realizados por Deus - sem

Deus violar Sua santidade”3

Palmer defende que a predestinação de alguns necessariamente

implica na reprovação de outros: “Se Deus escolhe alguns, então Ele

necessariamente ignora outras”. Para cima sugere para baixo; atrás

sugere a frente; 0 molhado sugere 0 seco; 0 mais tarde sugere 0 mais

cedo, escolher sugere deixar outros sem que sejam escolhidos”14. Ele

então prossegue para argumentar que Deus não “efetua” o pecado e adescrença da mesm a forma que ele efetua a fé '5. “Deus deseja o pecado

e a descrença indesejosamente; ele não se deleita neles”16. Alguém pode

se perguntar o porquê disso se for verdade que Deus faz tudo “para a sua

glória”. Como Deus pode não se deleitar naquilo que 0 glorifica? Palmer

prossegue de maneira ousada e afirma que a reprovação de Deus é tanto

condicional quanto incondicional:

 A reprovação como condenação é condicional no sentido de que

uma vez que alguém é ignorado, então ele é condenado por Deus

 2. Ibid.. 97.

  3. Ibid., 0 .

  4. Ibid., 06.

  5. Ibid.

  6. Ibid., 07.

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Contra o Calvinismo

por seus pecados e descrença. Embora todas as coisas - descrença e

o pecado inclusos - procedam do decreto eterno de Deus, 0  homem

ainda é culpado por seus pecados. Ele é culpado; 0  erro é dele e não

de Deus '7.

Isto é 0 suficiente para deixar qualquer um confuso. E Palmer concorda

e se deleita nisso. “ Ele [0 calvinista] percebe que 0 que ele advoga é ridícu-

10... O calvinista livremente admite que sua posição é ilógica, ridícula, sem

sentido e tola” 8Todavia, “esta questão secreta pertence ao Senhor, nosso

Deus, e devemos deixar as coisas como estão. Não devemos investigar

este conselho secreto de Deus” 9. Aparentemente Palmer concorda com

Martinho Lutero que, quando pressionado contra a parede por Erasmo

em seu debate sobre livre-arbítrio, encorajou seus ouvintes a “adorarem

os mistérios” e não tentar usar a lógica. Palmer também ecoa o teólogo

cristão primitivo Tertuliano, que disse: “Acredito porque é absurdo!” Talvez

muitos calvinistas não concordem com Palmer, mas eles deveriam caso

queiram manter 0 ensinamento de que Deus reprova as pessoas incon-

dicionalmente (pois ele mesmo preordenou o pecado e o tornou certo) eainda assim os réprobos são os únicos responsáveis e merecem a punição

eterna, pois sua reprovação é “condicional”.

O que leva Palmer e outros calvinistas rígidos a tamanho sacrifício do

intelecto? Ele não faz segredo que é: Romanos 9  - a passagem bíblica

basilar para a crença calvinista na eleição e reprovação incondicionais:

Quando Deus fala - como ele claramente fez em Romanos 9 - então nós

devemos simplesmente seguir e crer, mesm o se não possam os entender,

e ainda que isso pareça contraditório para nossas mentes débeis” 20.

Romanos 9 diz que Deus escolheu Jacó em detrimento de Esaú e amou a

  7. Ibid., 05 - 6.

 8. Ibid., 85.

 9. Ibid., 87.

20. Ibid., 09.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

 Jacó e odiou a Esau antes que eles nascessem ou que fizessem qualquer

coisa boa ou má “ a fim de que 0 propósito de Deus, na eleição, ficasse

firme: não por obras, mas por aquele que chama” (Romanos 9.  -  2)

Então Paulo cita Êxodo onde Deus diz a Moisés: “Terei misericórdia de

quem eu quiser ter misericórdia e terei compaixão de quem eu quiser

ter compaixão” (9.  5). Então lemos: “Deus tem misericórdia de quem

ele quer, e endurece a quem ele quer” (9.  8)

Claro, Romanos 9  diz muito mais e eu encorajo os leitores para que

leiam e estudem todo 0 livro de Romanos e interpretem 0 capítulo 9  no

contexto de todo 0 livro. Assim como todos os calvinistas, Palmer interpreta

estas afirmações literalmente como se aplicando a salvação e reprovaçãode indivíduos. Todavia, conforme mostrarei mais tarde neste capítulo,

existem outras interpretações válidas que não acabam por exigir 0 sa-

crifício do intelecto ou considerar Deus como arbitrário ou monstruoso.

Sproul é outro calvinista que argumenta que não pode haver eleição

incondicional para a salvação sem reprovação, de maneira que a “predes-

tinação única” é um conceito impossível. Ele corajosamente promove a

dupla predestinação ao passo que faz algumas advertências importantes:

“Se é que realmente existe uma coisa tal como predestinação, e se essa

predestinação não inclui todas as pessoas, então não podemos escapar

da necessária influência de que há dois lados para a predestinação. Não

é suficiente falar sobre Jacó; precisamos também considerar Esaú” 21.

 A fim de am enizar 0 golpe (na bondade de Deus) Sproul defende que

estes dois decretos de Deus - 0 de salvar alguns e condenar outros - nãodevem ser levados como “igualmente últimos” ou ambos positivos. Ele

critica 0 que chama de hipercalvinismo por transformar a eleição e a

reprovação igualmente últimas - colocando-as no mesmo plano de Deus

e realização deste plano por Deus 22. Contra 0 hipercalvinismo Sproul

expressa o que ele acredita que seja a verdadeira doutrina reformada:

2 . SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 0 .

22. Ibid., 04.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

por retirar ou reter a graça suficiente. Deus escolhe certas pessoas para

endurecer seus corações de maneira que elas não se arrependerão e

não crerão. Então ele diz:

É assim que nós devemos entender a dupla predestinação. Deusdá misericórdia a seus eleitos operando fé em seus corações. Ele dá

 justiça aos reprovados deixando-os em seus próprios pecados. Não há

simetria aqui. Um grupo recebe misericórdia. O outro grupo recebe

 justiça. Ninguém recebe injustiça. Ninguém pode queixar-se de que

há injustiça em Deus 25.

Isto faz algum sentido? Não. Primeiro, como isto não é simétrico à

luz do fato de que a pecaminosidade dos pecadores é preordenada etornada certa por Deus de sorte que os réprobos não podem fazer 0

contrário? Como que 0 decreto divino da reprovação, de ignorar certos

indivíduos é meramente negativo e passivo se Deus endurece seus co-

rações? Como que 0 relato de Sproul realmente difere do que ele chama

de hipercalvinismo?

O teólogo reformado James Daane, um arquiinimigo da dupla predestina-

ção, chama este tipo de fala de “verbalismo” - “um jogo teatral na qual as

palavras, de fato, não carregam nenhum sentido averiguável”26. Para Daane,

conforme irei mencionar mais tarde neste capítulo, isso se aplica a muitas

palavras utilizadas para os predestinadores duplos, a quem ele chama de

“teólogos decretais”. Parece se aplicar bem com a fala de Sproul dos decretos

de Deus não sendo igualmente finais, pois um [decreto] é positivo e 0 outro

negativo e também se aplica à noção de justiça e imparcialidade de Sproul.

Todos os teólogos calvinistas que são favoráveis   a dupla predestina-

ção e contra a “predestinação única” abraçam e afirmam a ideia de que

Deus soberanamente predestina alguns dentre suas próprias criaturas

humanas, criados á sua imagem e semelhança, para 0 inferno, e que

isso é consistente com a bondade, justiça e amor de Deus. Eu concordo

com eles de todo o meu coração que não pode existir tal coisa como

25. Ibid., 08.

26. Daane, The Freedom of Cod, 7 .

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Contra o Calvinismo

predestinação única na medida em que a predestinação é a eleição

incondicional de certas pessoas,  de certo número  dentre 0 total, para

0 céu. O correlato automático e inevitável para essa predestinação é a

predestinação ao inferno. As duas coisas ou nada.

Onde eu discordo deles é que a dupla predestinação possa ser de-

fendida como boa ou que um Deus que faz isso possa ser considerado

bom, amável e justo em qualquer sentido análogo às estas virtudes

conform e as mesm as nos são reveladas em Jesu s Cristo e na Bíblia.

Se Deus faz desta maneira que eles descrevem, então a “bondade” de

Deus, 0 “amor” de Deus, a “justiça” de Deus são simples palavras com

nenhum sentido averiguável. Daane está certo; seria mero verbalismocontinuar a falar de Deus tendo estes atributos como aspectos de sua

natureza e caráter eternos - algo que quase todos os calvinistas fazem.

 Além do mais, ainda que Deus meramente ignorasse alguns a quem

ele poderia salvar, por que faria isso se ele é bom, amável e justo? Qual

significado estes atributos poderiam ter, mesmo quando aplicados a

Deus, se Deus faz 0 que o calvinismo reivindica? Em outras palavras,

isso não é apenas uma questão de reprovação, embora eu realmenteacredite que a reprovação esteja necessariamente implícita na doutrina

calvinista da eleição. Ainda que fosse possível manter a ideia de que Deus

não reprova ninguém positivamente, mas apenas escolhe, de maneira

misericordiosa, salvar alguns e deixar outros para sua “ merecida conde-

nação”, quais seriam os significados de “bondade”, “amor” e “justiça”

quando atribuídos a um Deus que poderia salvar a todos pelo fato de a

salvação ser absolutamente incondicional (a saber, não dependente dequalquer coisa que Deus veja ou acerca das pessoas sendo salvas)?”27.

27. Alguns calvinistas podem objetar à minha forma de expressão aqui e dizer que,  

enquanto a “eleição” é incondicional, a “salvação” não é. Em outras palavras, de acordo 

com a teologia calvinista. Deus escolhe salvar pessoas sem considerar nada acerca 

delas, mas ele salva tais pessoas apenas tendo por base a condição de arrependimento 

e fé (conversão) das mesmas. Todavia, parece certo e justo dizer que a própria salvação 

também é incondicional, pois Deus é quem dá até mesmo o arrependimento e a fé 

para eleger antes, não considerando quaisquer decisões ou ações que as pessoas 

façam. Em minha opinião, a distinção entre eleição para  salvação como incondicional 

e a própria salvação como condicional é uma distinção sem uma diferença.

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Contra o Calvinismo

resposta. Estranhamente, quase todos os calvinistas, entretanto, real-

mente tentam defender a bondade de Deus, então alguém se pergunta

0 quão sério devemos responder a esta crítica. Além do mais, não é a

Deus quem os críticos do calvinismo estão questionando. As crenças 

calvinistas acerca de Deus é que estão sendo questionadas! Há uma di-

ferença. A frequência com a qual alguém se depara com esta rejeição de

crítica leva a conclusão de que pelo menos alguns calvinistas enfrentam

problemas em distinguir entre sua própria doutrina de Deus e 0 próprio

Deus. Como todos os demais, os calvinistas deveriam estar dispostos

a, ao menos, considerar a possibilidade de que há deficiências e falhas

graves nas crenças doutrinárias calvinistas.Muitos teólogos calvinistas vão além da tentativa de colocar de lado

as críticas com afirmações acerca de “não questionar a Deus”. Muitos

oferecem estratégias para defender 0 caráter bom de Deus, a reputação

de Deus, em face de perguntas críticas de não calvinistas. A principal

questão que tratam é simplesmente essa: Como pode ser dito que Deus 

é bom, amável e justo em fa ce destas doutrinas do calvinismo rígido?  Como

Deus é bom, amável e justo com os réprobos? Como Deus não é arbi-

trário em sua escolha de alguns para a salvação incondicional enquanto

abandona outros para a perdição? E uma pergunta crítica relacionada

é: Como o evangelho pode ser oferecido como uma oferta sincera para

todos se alguns já foram escolhidos por Deus para a condenação e, desta

forma, não possuem nenhuma chance, de modo algum, de serem aceitos

por Deus? (Esta última pergunta geralmente alcança uma força maiorem relação ao próximo ponto da TULIP - expiação limitada).

Outra forma de fazer 0 mesmo conjunto de perguntas é apresentar

passagens bíblicas para calvinistas e perguntar como eles reconciliam

suas crenças na reprovação - predestinação com as mesmas? Por exem-

pio, João 3.  6: “Porque Deus tanto amou 0 mundo que deu seu Filho

Unigênito para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eter-

na”. Observe também os versículos citados anteriormente: Timóteo 2.4;

2  Pedro 3.9  e João 4.8. Como Deus é amor se ele preordena muitas

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Contra o Calvinismo

perfeitamente, pois, assim prometendo, outra coisa não pretende senão

que sua misericórdia seja oferecida somente a todos os que a buscam e

imploram, o que outros não fazem, a não ser aqueles a quem ilumina.

Entretanto, Deus  ilumina aqueles  a quem predestinou para a sal-

 vação . A estes, afirmo, patenteia-se a veracidade certa e inconcussadas promessas, de modo que não se pode dizer que houve alguma

discrepância entre a eterna eleição de Deus e 0  testemunho que

oferece aos fiéis de sua graça 31.

Isso só parece aprofundar 0 mistério. Se esta citação tinha por objetivo

responder a pergunta de como estas afirmações concordam perfeita-

mente uma com as outras, eu não vejo como isso alcança seu objetivo.

Como um grande pensador e comunicador que Calvino foi, eu, às vezes,

considero suas explicações obscuras, se não evasivas.

Calvino diz mais acerca do problema. Primeiro, ele defende que “nin-

guém perece sem que 0 mereça” 32. É por isso que Deus é justo em punir

os réprobos; eles merecem a punição. Por que eles merecem a punição?

Por causa de sua “malícia e perversidade” 33. Por que eles continuam

em sua malícia e perversidade e não se arrependem e creem como oseleitos o fazem? “Para que atinjam a seu fim, ora os priva da faculdade

de ouvir sua palavra, ora mais os cega e os endurece por meio de sua

pregação”34. Por que Deus age assim para com os réprobos? “ Em vão

se atormenta aquele  que aqui procure causa mais alta que o conselho

secreto e inescrutável de Deus” 35.

Calvino está chegando em algum lugar no sentido de resolver 0 pro-blema? Não vejo como esse possa ser 0 caso; ele parece simplesmente

estar aprofundando 0 dilema da bondade de Deus.

3 . CALVINO, Joáo. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 444.

32. Ibid., p. 438.

33 CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 440.

34. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 438.

35. Ibid.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

Como Calvino interpreta Timóteo 2.3-4, a revelação mais clara

de que Deus deseja a salvação de todos os homens? “Com isto Paulo

certamente quer dizer que Deus não fechou o caminho da salvação

para qualquer ordem de homens; antes, ele derramou tanto de sua

misericórdia que ele não quer ninguém fora dela”. Em outras palavras,

todos em Timóteo 2. 3-4  (e sem dúvida em 2  Pe. 3.9) significa que

Deus quer pessoas de toda tribo e nação sejam salvos, mas não todas

as pessoas. Isso dificilmente se encaixa na linguagem de Timóteo 2.4,

todavia, que especificamente diz “todos os homens”, significando “todas

as pessoas” - não todos os tipos de pessoas.

Então, porque Deus reprova alguns e não elege todos para a salvação?Em alguns lugares Calvino deixa esta questão na esfera do mistério, mas

em pelo menos em uma ocasião ele especula: “foram suscitados para

ilustrar sua glória através de sua própria condenação”36. Os que acusam

Deus de ser injusto (ou só acusam esta doutrina de fazer de Deus um

ser injusto!) são rejeitados por Calvino como “discípulo[s] de Porfírio

[que] corroem impunemente ajustiça de Deus” 37. Ele impacientem ente

declara que tudo o que Deus faz é certo e justo simplesmente porque

é Deus quem faz, e não há explicação nenhuma para o que Deus faz

além de “porque assim lhe apraz” 38. Em lugar algum ele sequer tenta

 justificar a Deus ou reconciliar sua doutrina com 0 amor de Deus. O

único amor de Deus que ele menciona é 0 amor de Deus pelos eleitos.

Felizmente, muitos calvinistas não se satisfizeram em deixar a questão

como está. Ao passo que alguém adentra a era moderna e para 0 mundopós-moderno do início do século XXI, encontramos muitos calvinistas,

cada vez mais, interessados em justificar os caminhos de Deus.

 Jonathan Edwards escreveu um ensaio completo sobre “Aju stiça de

Deus na Condenação de Pecadores”. No ensaio ele ficou bem perto da

36. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 440.

37. CALVINO, João. As Institutas: ediçào clássica, vol. 3, p. 438.

38. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 408.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

0 único propósito de Deus na reprovação é a sua glória; sem ela a justiça

de Deus não poderia ser exibida de maneira suficiente - e que é um dos

propósitos da criação e redenção 40. Claro, isto levanta a pergunta de por

que é justo para Deus punir os réprobos, e Boettner simplesmente asseguraque eles pecaram “voluntariamente” 41. A luz destas explicações, citadas

e discutidas no capítulo anterior, parece um uso estranho de “voluntaria-

mente”, uma vez que é Deus quem determinou. Para ele, obviamente,

“voluntariamente” não significa que eles poderiam fazer 0 contrário do

que fazem. Isso é um significado natural de “voluntário” e isto responde

ou suscita mais perguntas acerca da justiça de Deus? Boettner não parece

reconhecer este problema, ou ele prefere fazer vistas grossas. E ele não pa-

rece, de fato, lidar com o amor de Deus, exceto em dizer (estranhamente)

que “Deus em seu amor salva tantos homens da raça pecadora quanto Ele

pode obter 0 consentimento de Sua toda natureza para salvar”42. Alguém

pode apenas responder de maneira perplexa: “O quê?”

Pelo menos Boettner, contrastado com Calvino, Edwards e alguns

outros calvinistas, tenta responder a pergunta. Mas a resposta nãosuscita mais perguntas? Deus é, de alguma forma, limitado? Por que

ele não pode ter 0 consentimento de “toda sua natureza” para salvar a

todos? A implicação óbvia, considerando tudo mais 0 que Boettner diz,

é que Deus deve condenar alguns a fim de exibir seu atributo de justiça

e, desta forma, glorificar a si mesmo. Então a necessidade de Deus de

glorificar a si mesmo (e “necessidade” é a palavra correta, considerando

a linguagem utilizada por Boettner acerca da limitação divina em relação

à extensão da salvação) sobrepuja e controla seu amor.

Isto é exatamente 0 que os não calvinistas se preocupam concernente

ao calvinismo: que sua lógica interna e profunda leva inflexivelmente

40. Boettner, The Reformed Doctrine o f Predestination, 79, 7.

4 . Ibid., 25

42. Ibid., 306.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

na parede e ninguém além de você esteve no seu quarto desde a última

 vez que vi a parede limpa”. Seu filho (a) responde: “Tudo bem, eu não

escrevi, mas também não foi ninguém que escreveu”. Qual será a sua

resposta? Você acreditaria nesta explicação dada pela criança? Por que

não? Não poderia haver uma terceira possibilidade? A menos que você

acredite que a casa seja assombrada ou algo do tipo, você provavelmente

não levará a sério a explicação de seu filho (a). A pessoa que escreveu na

parede precisa ser o seu filho (a) ou outra pessoa; não há uma terceira

opção plausível. O mesmo se aplica com a “explicação” de Boettner (a

mesma explicação utilizada pela maioria dos calvinistas) de que Deus

não escolhe arbitrariamente, mas que também não escolhe embasado

em nada especial acerca das pessoas que ele escolhe. Não existe uma

terceira alternativa. A escolha precisa ser arbitrária para que seja abso-

lutamente incondicional.

Diferente de Boettner e outros calvinistas, Edwards parece ter aceita-

do, ao menos, que a escolha de Deus entre os eleitos e os não eleitos é

arbitrária. Isto pode ser um choque para muitos calvinistas posterioresque contestam veementem ente esta acusação acerca do Deus calvinista.

Em seu famoso (ou infame) sermão “Pecadores nas Mãos de um Deus

Irado”, Edwards apelou para a “vontade arbitrária de Deus” para explicar

0 tratamento de Deus com os não eleitos 46. Tal admissão é, ao menos,

honesta, corajosa e consistente, mas ela suscita sérios problemas para

o caráter e os caminhos de Deus.

Como Boettner lida com as passagens bíblicas que trazem a palavra

“todos”? Em relação a João 3. 6  e versículos semelhantes, ele diz que

este “mundo” não significa todas as pessoas. Significa todos os tipos

de pessoas 47. Uma vez que muitos calvinistas dão esta explicação, eu

46. Jonathan Edwards, “Sinners in the Hands of an Angry God,” in Jonathan Edwards:  

Representative Selections,  56.

47. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination, 293.

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Contra o Calvinismo

deixarei a maioria da minha critica contra ela para mais tarde neste

capítulo quando resumo os problemas com as explicações calvinistas

da reprovação de Deus. Por agora, basta dizer que esta interpretação de

“mundo” dificilmente funciona, pois isso exigiria que inúmeras referên-cias à todo o mundo como caído significasse apenas todos os tipos de

pessoas que são caídos.

Por exemplo, em João . 0  está escrito que 0 “mundo” (mesma pa-

lavra grega utilizada em João 3.  6) não reconheceu a Palavra quando

a Palavra veio. Se “mundo” em João 3. 6  significa “todos os tipos de

pessoas”, então João.

possivelmente significa que apenas algumaspessoas - de todos os tipos de pessoas, mas não todo mundo - não

reconheceu Jesus como 0 Filho de Deus. Nenhum calvinista interpreta

 João . desta forma! A interpretação de Boettner de João 3. 6  parece

forçada. Embora ele não tenha coragem de dizer: “Deus odeia os não

eleitos e este é 0 motivo pelo qual ele os reprova”, ele mais do que deixa

isso implícito. Portanto, julgo justo e seguro dizer que Boettner, como

muitos calvinistas, não pensa que Deus é  amor conforme João 4.8 diz,

ou  ele é, no mínimo, inconsistente ao lidar com a questão. Se a própria

natureza de Deus é amor, então ele ama a todos e não apenas algumas

pessoas de “todos os tipos”. (Claro, isso pressupõe mais uma vez que

“amor” em Deus é análogo e não totalmente diferente do melhor amor

conforme 0 conhecemos. Juntamente com Helm eu suponho isso, caso

contrário a palavra amor não significa nada.E em relação a Timóteo 2.4 que diz, que Deus quer que “todos os ho-

mens” se salvem? Boettner explica: “Versículos tais como Timóteo 2.4, ao

que parece, são melhores entendidos não como se referindo a homens

individualmente, mas como ensinando a verdade geral de que Deus é

benevolente que Ele não se deleita nos sofrimentos e morte de Suas

criaturas” 48. Alguém só pode se perguntar: como é possível extrair

essa interpretação desse versículo? E mais, como Deus não se deleita

48. Ibid., 295.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

naquilo que ele mesmo preordenou e tornou certo para a sua glória? Ele

não se deleita em ser glorificado? Este é, certamente, um enigma calvi-

nista. Mas Boettner acrescenta isso: “É verdade que alguns versículos,

interpretados por eles mesmos, realmente parecem sugerir a posição

arminiana [a saber, que Deus realmente deseja a salvação de todos e a

torna possível] Isto, entretanto, reduziria a Bíblia a uma massa de con-

tradições”49. Alguém poderia simplesmente inverter a afirmação acima

e substituir a “posição calvinista” pela “posição arminiana” e isso seria

mais verdadeiro.

Sproul se esforça admiravelmente, mas, no fim das contas, não tem

sucesso com 0 problema da bondade, amor e justiça de Deus em face de

sua reprovação de muitas pessoas a quem ele poderia salvar. Primeiro, ele

admite que Deus preordenou 0 pecado, e estou certo de que 0 citei 0 bas-

tante para deixar claro que ele também acredita que Deus tornou 0 pecado

certo 50. Entretanto, ele defende, Deus não é responsável pelo pecado; nós

somos 51. Deus é justo em condenar os réprobos porque eles 0 odeiam e

são maus: “Há alguma razão pela qual um Deus justo precise ser amorosopara com uma criatura que 0 odeia e que se rebela constantemente contra

sua divina autoridade e santidade?”52. Alguém só pode responder... sim.

Porque a sua natureza é amar1 (1 João 4.8) Além do mais, Romanos 5.8-10

diz que Deus amou os pecadores quando eles ainda eram pecadores e

entregou Cristo por Eles! Sproul tende a descrever a Deus não como ten-

do uma natureza amável; ele mais do que sugere que Deus ama alguns e

odeia outros quando todos 0 odiaram e rebelaram contra sua autoridade e

santidade 53. Isso nos traz de volta à questão da arbitrariedade.

49. Ibid.

50. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristá, 2002, p. 20-2 .

5 . Ibid.

52. Ibid., 23.

53. Na verdade, em O que é teologia reformada? 38, Sproul diz que Deus odeia o 

réprobo.

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Contra 0 Calvinismo

Sproul enfrenta 0 problema da aparente arbitrariedade e falta de im-

parcialidade de Deus (e eu acrescentaria a aparente ausência de amor)

na dupla predestinação: “ 0 desagradável problema para 0 calvinista [é]...

se Deus pode e realmente escolhe assegurar a salvação de alguns, porque então ele não assegura a salvação de todos?” 54 De fato, por que

não? Eis aqui a resposta de Sproul:

A única resposta que eu posso dar a esta pergunta é que eu não  

sei. Não tenho ideia por que Deus salva alguns e não todos. Não du- 

vido por um m om ento que Deus tenha o poder de salvar todos, mas 

eu sei que Ele não escolhe salvar todos. Realmente não sei por quê... 

Uma coisa sei. Se agrada a Deus salvar alguns e não todos, não há

 nada de errado com isso. Deus não está obrigado a salvar ninguém. 

Se Ele escolhe salvar alguns, isso de modo algum O obriga a salvar 

0 restante.55

Sproul então se opõe aos não calvinistas que levantam essa questão

como uma questão de tratamento igualitário e diz que Deus não preci-

sa atender a nossos padrões de justiça 56. Tudo bem. Mas a justiça não

é 0  cerne do problema. O cerne, que Sproul evita, é 0  amor.  Se Deus

pode(ria) salvar a todos pelo fato de a eleição para a salvação ser in-

condicional e se Deus, por natureza, é amor, por que ele não salva? As

únicas respostas que o Sproul pode oferecer são: (1) ele não ama a todos

e, (2) Deus pode fazer 0 que quiser fazer, pois ele não tem obrigação de

fazer nada para ninguém. Estas respostas degradam a Deus e impugna

sua bondade e causam dano a sua reputação, que é embasada em seu

caráter moralmente perfeito.

O que Sproul diz acerca de 1 Timóteo 2.4? Nada, não fui capaz de

encontrar nenhuma explicação da importante passagem bíblica nos

escritos de Sproul, mas ele escreveu tanta coisa que é possível que eu

54. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 26.

55. Ibid.

56. Ibid., 26-27.

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Sim para a eleição; nao para a dupla predestinação

não tenha encontrado seu comentário sobre a passagem em questão.

Todavia, em Eleitos de Deus, ele, de fato, lida com 2 Pedro 3.9, que diz

praticamente a mesma coisa, mas talvez não de maneira tão vigorosa.

 A medida em que Deus não quer que “ninguém pereça, mas que todoscheguem ao arrependimento”, Sproul diz que “ninguém” significa “os

eleitos” 57. Contudo, tal explicação não funciona à luz de 1 Timóteo 2.4,

que claramente se refere a todas as pessoas, sem exceções. (É por isso

que Sproul ignora esse versículo bíblico, deixando-o sem comentário

algum?).

Sproul também pega outra rota. Ele sugere que a Bíblia fala “mais

de uma maneira” acerca da vontade de Deus” 58. Primeiro, ele diz, há a

 vontade soberana eficaz” de Deus. Esta vontade é a que os calvinistas

chamam de “vontade decretiva” de Deus. Então há a “vontade precep-

tiva” de Deus (suas ordenanças). Por fim, há a disposição de Deus — o

que lhe agrada” 59. Assim, de acordo com esta interpretação de 2 Pedro 3.9

(e por extensão 1 Tm. 2.4), ela está dizendo que Deus deseja que todos

sejam salvos ainda que ele não tenha por intenção salvar a todos.Sproul diz que Deus se entristece em punir os ímpios 60. Ele faz uso

de uma analogia de um juiz que deve sentenciar seu amado filho a

prisão. Ele precisa sentenciar, mas aquilo o machuca. A analogia, claro,

se quebra inteiramente. O juiz na ilustração não preordenou e nem tor-

nou certo 0  crime de seu filho. Caso ele assim tivesse feito, ele estaria

errado em sentenciá-lo à prisão! E mais, 0  juiz na analogia é  obrigado

a sentenciar seu filho à prisão; de acordo com Sproul, Deus não é  obri-

gado a salvar ninguém e poderia salvar a todos. Por fim, e se 0  juiz de

Sproul que sentenciou seu próprio filho à prisão tivesse libertado outro

57. Ibid., 46.

58. Ibid., 44- 45.

59. Ibid., 45.

60. Ibid.

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Contra o Calvinismo

homem que cometeu 0 m esmo crime? Todos não questionariam 0 amor

do juiz por seu filho?

 Vamos mudar a analogia um pouquinho. Suponha que um juiz tenha

sentado em seu assento e chorado enquanto sentenciava seu próprio

filho ã prisão por roubo a mão armada. Então fosse descoberto que 0

 juiz fazia uso de condicionamento comportam ental para fazer seu filho

acreditar que roubo a mão armada é bom e correto e  que levou seu

filho, de carro, até 0  banco para que seu filho 0  roubasse. E que fosse

descoberto também que o juiz havia concedido clemência a outro jo-

 vem que também havia roubado o banco da mesm a maneira que seu

filho 0  fez. Quem pensaria que 0  juiz era bom? E esta analogia da dupla

predestinação é melhor do que a que foi utilizada pelo Sproul!

E concernente ao problema da aparente arbitrariedade de Deus a

eleição e reprovação? Sproul diz: “Deus não faz nada sem uma razão.

Ele não é caprichoso nem frívolo 61. Mas qual razão ele pode ter para

escolher 0  João para a salvação e o Roberto para a condenação? Ele

deixa claro por demais que a eleição e a reprovação são absolutamenteincondicionais. Então, sua palavra final sobre o assunto é que Deus

escolhe “segundo 0  beneplácito de sua vontade... Deus nos predestina

de acordo com o que lhe agrada... O que agrada Deus é bondade...

Embora a razão para nos escolher não esteja em nós, mas no divino

prazer soberano, devemos ficar certos de que 0 divino prazer soberano

é um beneplácito” 62 Mais uma vez, eu só posso responder de maneira

chocada ou perplexa com um “hã”?

De volta à analogia que ofereci acima em resposta a reivindicação de

Boettner de que a escolha de Deus não é arbitrária, mas que também

não tem por base nada acerca das pessoas a quem ele escolhe. O apelo

de Sproul para a “boa vontade” de Deus não diz nada acerca de como ele

6 . Ibid., 5.

62. Ibid., 6.

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Contra o Calvinismo

compaixão deles. Ele alega que Deus tem um “amor universal por todas

as criaturas” que não  é 0  amor que ele tem pelos eleitos. Então essa é

a sua explicação para João 3.16 e 1 João 4.8. “Existe um amor geral de

Deus que ele concede para todas as suas criaturas” 68. Mas apesar de

amar todas as pessoas de alguma maneira, Deus apenas ama algumas

pessoas da melhor maneira. Seu amor pelos não eleitos aparece nas

bênçãos temporais que ele lhes concede. (Não consigo resistir e aqui digo

que a visão do Piper eqüivale a dizer que Deus fornece aos não eleitos

um pouquinho do céu para que depois sejam lançados no inferno!)

E concernente ao amor e a compaixão de Deus pelos eleitos? Piper

assegura que Deus tem uma “compaixão verdadeira, que ainda estáreprimida, no caso dos não eleitos, por razões consistentes e santas, de

assumir a forma de uma volição para regenerar” 69. Além do mais, “afir-

mo que Deus ama o mundo com uma profunda compaixão que deseja

a salvação do mundo; todavia, também afirmo que ele escolheu desde

antes da fundação do mundo os que ele salvará do pecado. A eleição é

a boa nova que a salvação não apenas é uma oferta sincera para todos,mas um efeito certo na vida dos eleitos” 70.

Para ilustrar e defender esta ideia das duas vontades em Deus, Piper

conta a história de George Washington e certo Major Andre, que havia

cometido alguns atos de traição durante a Guerra Revolucionária71. Con-

forme a história se desenvolve, Washington sentenciou o Major Andre à

morte ainda que ele tivesse 0 poder de perdoá-lo. O futuro presidente e

comandante supremo do Exército Continental teve grande compaixão do

Major Andre enquanto assinava seu mandado de morte, que foi julgado

necessária para sustentar a responsabilidade de seu cargo e as regras.

68. Ibid., 48.

69. Ibid., 45.

70. Ibid., 46.

7 . Piper, “Are There Two Wills in God?” 28.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

Piper compara esta situação às emoções e sentimentos complexos de

Deus ao passo que ele condena os réprobos.

Mas esta analogia funciona melhor do que a analogia do Sproul em

que 0  juiz sentencia seu filho? A resposta é não, ela não funciona. Pri-meiro, se o Piper estiver certo, se Washington fosse verdadeiramente

comparável a Deus, ele teria projetado e governado 0  crime do Major

 Andre e garantido que ele cometesse 0  crime. Quem consideraria Wa-

shington bom por sentenciar o Major Andre à morte, se este fosse o

caso - independente de quão “necessário” isso fosse para sustentar a

responsabilidade de seu cargo e as regras?

Segundo, se 0  Major Andre fosse verdadeiramente comparável aos

réprobos na teologia de Piper, ele não teria sido capaz de fazer 0  con-

trário do que cometer o crime. Piper nega o livre-arbítrio libertário.

Quem consideraria 0  Major Andre merecedor de morte caso ele fosse

controlado por outra pessoa? (Lembre-se que, ainda que Piper acredite

que as pessoas sempre ajam de acordo com seus motivos mais fortes

- a visão de Edwards de “livre-arbítrio” - seu Deus também é a realida-de totalmente determinante e, desta forma, deve  ser a causa final dos

motivos controladores das criaturas)

Terceiro, a analogia sugere uma limitação de Deus - algo que certamen-

te Piper não quer admitir considerando seu poderoso engrandecimento

da supremacia de Deus em todas as coisas. Washington foi obrigado a

sentenciar 0  Major Andre a morte: ele sentiu que a responsabilidade de

sua posição lhe obrigava a fazer isso ao passo que ele devia satisfações ao

Congresso Continental, seus companheiros oficiais e soldados e os cida-

dáos das colônias. A quem Deus deve satisfações? Se ele sente tamanha

compaixão pelos réprobos, por que ele não simplesmente os perdoa?

Ele poderia, a menos que ele seja limitado e controlado por algo sobre

o qual ele não tenha nenhum poder. Afinal de contas, a eleição de Deus

para a salvação, no calvinismo, é absolutamente incondicional. Voltamos

ao problema de Edwards da dependência implícita de Deus do mundo!

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Contra o Calvinismo

Por fim, a analogia se desmonta, pois para ser uma analogia válida,

 Washington já teria de ter perdoado, pelo menos, outra pessoa que

tenha cometido exatamente 0  mesmo crime que 0  Major Andre. Afinal

de contas, de acordo com Piper, é isso 0  que Deus faz perdoa (elege

para a salvação incondicionalmente) muitas pessoas que não são em

nada melhores que as pessoas que ele reprova. Quem consideraria Wa-

shington “compassivo” neste caso? Ele não seria considerado arbitrário

e caprichoso e suspeito de só querer mostrar sua severidade? 72

E concernente ao problema da chamada e convite do evangelho se

Deus já tem escolhido alguns para a condenação? Muitos dos autores

calvinistas aqui pesquisados não lidam diretamente com 0  problema.

Como a chamada do evangelho poder ser oferecida de maneira since-

ra a todos (0  que a maioria dos calvinistas afirma) se alguns já foram

escolhidos por Deus para a condenação e não têm nenhuma chance

de serem aceitos por Deus? Piper responde a questão, de forma breve,

em “Are There Two Wills in God? (Existe Duas Vontades em Deus?)”

Ele diz: “A eleição incondicional [e por extensão, claro, a reprovação]...não anula as ofertas sinceras da salvação para todos que estão perdidos

entre todos os povos do mundo” 73 Claro, tal é apenas uma declaração;

ela carece de uma explicação.

Este é um problema enorme para qualquer um que acredite que seja

apropriado para 0 pregador do evangelho fazer uma oferta de salvação

a todos que estiverem ao alcance de sua voz. Todavia, a maioria dos

72. Alguns calvinistas, e suspeito que Piper seja um deles, sem dúvida responderiam  

às minhas reivindicações de que sua doutrina torna Deus em um ser arbitrário ao dizer  

que Deus tem “motivos consistentes e santos” para suas decisões, motivos estes que 

não podemos compreender. Todavia, isto é apenas uma frase, ela não nos informa de 

nada. Uma vez que Piper e outros calvinistas desqualificam tudo que Deus possa ver em 

nós ou acerca de nós como base para a sua escolha, a única alternativa que nos resta 

é a escolha arbitrária. Eu desafio os calvinistas a dizer quais “motivos consistentes e 

santos” de Deus para escolher uma pessoa em detrimento de outra uma vez que tudo 

acerca da pessoa escolhida é eliminado como uma causa da escolha de Deus.

73. John Piper, “Are There Two Wills in God?” 07.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

calvinistas evangélicos, de/ato,  acredita que seja legítimo, ainda que  0

pregador saiba que há muitas pessoas entre os presentes que não podem 

responder ao convite e para os quais o convite é impossível de ser aceito 

em razão de Deus ter fechado a porta da possibilidade de sua chegadaà fé e pelo fato de Jesus não ter morrido por eles! (Este é 0  assunto do

capítulo seguinte).

TESTEMUNHAS CONTRA A DUPLA PREDESTINAÇÃO

Embora eu já tenha tornado conhecido meus receios (para dizer 0

mínimo!) acerca da dupla predestinação e principalmente 0  lado da

reprovação da predestinação, agora quero convocar outras testemunhas

para que deem seus testemunhos de por que a dupla predestinação não

é bíblica e indigna do caráter de Deus conforme revelado na Escritura e

principalmente em Jesus Cristo, e também porque ela é simplesmente iló-

gica em termos de suas indesejadas “conseqüências lógicas e necessárias”.

Minha primeira testemunha é 0  teólogo G. C. Berkouwer - aquele

grande e influente pensador reformado do século XX. Em seu livro Divi- 

ne Election,  Berkouwer expressa grande incômodo com qualquer forma

de determinismo divino e, principalmente, qualquer preordenação de

indivíduos para a condenação eterna. Ele argumenta que a doutrina calvi-

nista de predestinação deve ser interpretada de forma não determinista:

“Por um lado, queremos manter a liberdade de Deus na eleição, e, por

outro, evitar qualquer conclusão que faça de Deus a causa do pecado eda descrença” 74. Ele expressa frustração com a abordagem de Calvino,

que diz, por um lado, que os seres humanos são a única causa de sua

rejeição, mas que também diz, por outro lado, que Deus é a fonte final

da “ruína e condenação” dos mesmos 75.

74. G. C. Berkouwer,

Studies in Dogmatics: Divine Election   (Grand Rapids: Eerdmans, 

I960), 8 .

75. Ibid., 87.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

do homem, ele alega que “toda forma de competição torna-se impossi-

 vel. Há relações aqui que não possuem analogias humanas” 80. A crítica

mordaz de Sproul da predestinação única pode se aplicar á explicação

de Berkouwer (se ela puder ser cham ada de explicação!), mas a questãoaqui é simplesmente que um dos teólogos reformados mais influentes

do século XX lutou veementemente contra a reprovação divina como

sendo inconcebível, considerando 0 caráter de Deus revelado em Jesus

e através de toda a Bíblia.

Uma das principais razões pela qual Berkouwer rejeita a dupla predes-

tinação ou qualquer forma de determinismo divino é que ela minimiza a

pregação do evangelho. Eu irei prosseguir e voltarei mais tarde com mais

detalhes para esse importante tópico quando for considerar as objeções

do principal discípulo estadunidense de Berkouwer, James Daane, que

escreveu um livro inteiro acerca do conflito entre 0 determinismo divino

e a pregação do evangelho.

Berkouwer leva as passagens bíblicas que apresentam a palavra “todos”

com extrema seriedade e afirma 0  amor de Deus pelo mundo inteiro,sem exceção. Ele rejeita a noção dualista de duas vontades em Deus 81.

Ele diz que os textos universalistas devem ser levados a sério sem que se

afirme 0  “universalismo objetivo” - a visão de que, por fim, não existem

condenados. Na análise final, a abordagem de Berkouwer só é útil em

criticar a dupla predestinação, mas não em oferecer uma alternativa viável,

pois, embora ele leve os textos que apresentam a palavra “todos” muito asério, ele se prende a ideia de predestinação única, que é, por fim, insus-

tentável. Não acredito que seja possível levar os textos que apresentem

a palavra “todos” a sério enquanto se possa abraçar qualquer forma de

eleição incondicional - mesma visão inconsistente de eleição única de

Berkouwer (a menos que alguém opte pelo universalismo).

193

80. Ibid., 2 6.

8 . Ibid., 238 - 39.

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Contra o Calvinismo

Um teólogo reformado que se afasta mais da eleição incondicional

que Berkouwer, mas pelas mesmas razões, é James Daane. Em The 

Freedom o f God   ele critica severamente todo o sistema de pensamento

do calvinismo rígido da eleição incondicional em termos de escolha de

Deus de indivíduos e, principalmente em termos de números. Ele chama

0  calvinismo rígido de “teologia decretai”, “teologia do decreto único”

e “escolasticismo reformado”, sendo que todos estes nomes significam

0  que chamo de “determinismo divino”. Esta teologia, ele diz, não

pregará, e é por isso que há tão pouca pregação da eleição nas igrejas

reformadas. (Ele escreveu isso bem antes da renascença do calvinismo

do movimento neocalvinista dos jovens, incansáveis e reformados).

Para ele, (como para mim) a eleição incondicional de indivíduos não é,

de fato, boas novas, pois ela necessariamente sugere a reprovação de

indivíduos: “Uma vez que alguém se compromete com 0 decreto da te-

ologia decretai, é teologicamente impossível para ele permitir, justificar

ou explicar a pregação do evangelho para todos os homens” 82.

Daane argumenta que os seguidores de Calvino, cada vez mais, de-finiram a eleição em separado da graça ao incorporar a reprovação em

suas teologias. Para ele: “A Escritura fala de predestinação para á vida,

mas não para a morte” 83. E ele reconhece que a predestinação para

a morte é automaticamente 0  outro lado da eleição incondicional de

indivíduos para a salvação. Daane rejeita toda a abordagem do calvinis-

mo tradicional ao passo que ele inevitavelmente torna Deus 0 autor do

pecado e condenação e que precisa apelar para duas ou três vontades

em Deus, incluindo uma vontade secreta (para condenar alguns apesar

de revelar sua vontade de salvar todos) 84. A abordagem do calvinism o

tradicional também se contradiz ao culpar os humanos por sua depra-

82. Daane, The Freedom of God, 33.

83. Ibid., 37.

84. Ibid., 39.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

 vação e condenação quando Deus decretou tudo isso desde 0  início 85.

 A análise de Daane do calvinismo rígido penetra bem em seu alicer-

ce básico: a doutrina de Deus. “A fraqueza básica da teologia decretai

parece ser precisamente seu entendimento do relacionamento de Deuscom o mundo” 86. Esta teologia escolástica, ele corretamente argumenta,

faz de Deus e 0  relacionamento de Deus com 0  mundo, não histórico,

onde a Bíblia retrata Deus como entrando na história de maneira livre.

“A possibilidade de levar a história a sério, como real e não meramente

aparente, é executada pela definição escolástica do decreto único” 87. Para

a teologia decretai escolástica, ele diz, nada no mundo pode realmente

afetar a Deus; tudo, incluindo 0  pecado e o mal e a condenação são

determinados por Deus. O resultado, ele diz, é que a “teologia decretai

é uma profunda racionalização de tudo 0  que há” 89.

E mais, nessa teologia, 0  amor de Deus é realmente seu amor para

ele mesmo e Cristo morreu para Deus em vez de pelo mundo 89. O pior

de tudo, de acordo com Daane, esta teologia acaba por privar Deus de

sua liberdade, tudo 0  que é, é o que deve ser - até mesmo para Deus.Para Daane, a teologia reformada precisa recuar e levar a narrativa

bíblica mais a sério que seu escolasticismo. O Deus da Bíblia realmente 

decreta algo; ele decreta “entrar na história ao sair de Si, de maneira

criativa, para e adentro tanto da criação quanto da redenção”90 Daane

diz que “ao criar o mundo, Deus condicionou a si mesmo, mas com esta

condição - que ele continuasse sendo Deus” 91. Essa é a liberdade de

85. Ibid.

86. Ibid., 63.

87. Ibid., 86.

88. Ibid.. 8 .

89. Ibid., 67. 92.

90. Ibid.. 49.

9 . Ibid., 63 - 64.

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Contra o Calvinismo

Deus; envolver a si mesmo no mundo, seu tempo e história, seu sofri-

mento e dor, a fim de tomar a responsabilidade para si e, deste modo,

redimir o mundo. O pecado, então, não é preordenado por Deus como

o calvinismo rígido diz. Daane rejeita essa noção: “A teologia decretai é

muito vulnerável em sua inabilidade em manter a gravidade do peca-

do”92. Ele quer dizer que ela faz do pecado, assim com o todas as demais

coisas, uma questão de curso; ele é decretado e preordenado necessaria-

mente por Deus e, portanto, não é algo, de fato, que se oponha a Deus.

Daane parece se mover em direção a uma teologia de Deus como

assumindo riscos, embora não chegue a se posicionar do lado arminia-

no nem do teísmo aberto (a visão de que Deus não conhece 0  futuro

de maneira absoluta). Por que ele caminha para essa direção? Porque

ele leva a história a sério - a história bíblica de redenção que inclui

Deus nela como muito envolvido em vez de pairando sobre ela como

seu autor. Além do mais, ele leva o amor de Deus em Jesus Cristo

muito a sério; ele leva a liberdade de Deus muito a sério não como

sua liberdade de  ser afetado pelo mundo, mas sua liberdade  para   serafetado pelo mundo.

E concernente à eleição? Se Daane é “reformado”, ele deve explicar a

eleição. E ele explica. Daane a chama de eleição incondicional. Mas ela

é a eleição incondicional de Deus de Jesus Cristo e seu povo, Israel e a

igreja. Não é a aceitação incondicional de Deus de algumas pessoas para

a salvação e a correspondente rejeição de outros para a condenação. “A

Bíblia nada fala de uma doutrina de eleição isolada e individualista”   93.

E ela nada tem a ver com 0 determinismo histórico.

Para Daane, a eleição não possui relação com números, transformá-la em

números é inevitavelmente fazer da reprovação uma parte da eleição, o

que torna a eleição impregável. “A eleição no pensamento bíblico jamais

é uma seleção, uma aceitação disto e uma rejeição daquilo dentro de

92. Ibid., 80.

93. Ibid., 4.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

múltiplas realidades”. Antes, “a eleição é uma chamada para o serviço,

uma convocação para ser colaborador com Deus na realização do pro-

pósito e objetivo eletivo de Deus”94. Este propósito e objetivo eletivo de

Deus gira em torno de Jesus Cristo como a missão de Deus no mundopara salvá-lo 95.

E Romanos 9-11 e Efésios 1 ? Dizem que estas duas passagens bíblicas

neotestamentárias são as provas da doutrina calvinista rígida da dupla

predestinação. Daane corretamente diz que Romanos 9- 11 não forma

um comentário bíblico sobre a verdade da eleição individual. Em vez

disso, é um comentário sobre 0  fato da inviolabilidade da eleição de

Deus de Israel como uma nação” 96. Eleição para o quê? Para serviço

de abençoar todas as nações ao apresentar Jesus Cristo - o verdadeiro

sujeito e objeto da graça eletiva de Deus. Efésios 1, que fala muito de

eleição, não trata-se de indivíduos e de seus destinos eternos, mas de

um povo de Deus. O “nós” repetido em todo 0  capítulo, em referência

ao povo de Deus, é plural: o novo povo de Deus, a igreja 97.

 A abordagem reform ada revisionista de Daane é muito mais prefe-rível ao determinismo divino do calvinismo e a dupla predestinação,

incluindo a reprovação. E ela vai consideravelmente além de Berkower

na anulação do escolasticismo calvinista. É correto focar na inabilida-

de de pregar essa teologia como boas novas, pois ela inevitavelmente

inclui o pecado, mal, sofrimento inocente e  0  inferno como a vontade

de Deus - tudo 0 que os seus defensores possam dizer. Além disso, sua“conseqüência lógica e necessária” faz de Deus menos do que amável,

menos do que livre e menos do que bom. Ela também faz com que a

história não seja real, pois nada, de fato, acontece; tudo é simplesmente

94. Ibid., 50.

95. Ibid., 09.

96. Ibid., 4.

97. Ibid., 39 - 40.

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Contra o Calvinismo

 Wesley continua em seu sermão “Predestinação Calmamente Considera 

da” (que talvez devesse ter sido mais bem chamada de “Predestinação  Não 

Tão Calmamente Considerada!) para argumentar que Deus não é exaltado

pela eleição incondicional, mas, em vez disso, é desonrado, e isso no mais

elevado nível, ao supor que Ele despreza as obras de suas próprias m ãos” 105.

Mas, mais uma vez, para os calvinistas rígidos que dizem que Deus ama os

não eleitos e é bom para com eles, ele, desdenhosamente, indaga:

O que a voz universal da humanidade pronunciaria a respeito do 

hom em que age desta man eira? Que, sendo capaz de libertar milhões 

de homens da morte com um único sopro de sua boca, se recuse a  

salvar mais do que um em um a centena e diga: “ Não salvarei porque 

não salvarei!” Como então você exalta a misericórdia de Deus, quan- 

do você atribui tal comportamento a ele? Que comentário estranho  

é esse ern sua própria palavra diz que “suas misericórdias são sobre 

todas as suas ob ras!” 06

Na conclusão de sua longa crítica, Wesley chama a dupla predesti-

nação (que é necessariamente 0 outro lado da moeda da eleição incon-

dicional) de “um erro tão pernicioso para as mentes dos homens” 107.

O que dizer de Romanos 9? Como Wesley lida com a passagem bíblica

crucial (para os calvinistas)? Ele a interpreta do jeito que praticamente

todos os não calvinistas a interpretam:

A passagem é inegavelmente clara, que ambas as escrituras 

[versículos 2 e 3] tratam, não das pessoas d e jacó e Esaú, mas de 

seus descendentes; os israelitas; descendentes dejacó e os edomitas; 

descendentes de Esaú. Somente neste sentido é que o “mais velho” 

(Esaú) “ serviu ao mais novo ” ; não em sua pessoa (pois Esaú jam ais 

serviu a Jacó ), mas em sua posteridade. A posteridade do irmão mais 

velho serviu a posteridade do irmão m ais novo 08.

 05. Ibid., 255.

 06. Ibid., 235.

  07. Ibid., 256.

 08. Ibid., 237.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

Em outras palavras, “Jacó” e “Esaú” são símbolos para Israel e Edom,

e para Paulo em Romanos 9 os dois nomes se referem a Israel e aos Gen-

tios, que é tudo 0 que Paulo trata na seção de Romanos! Wesley conclui:

“Então aqui também não temos um exemplo de qualquer homem sendo,em última instância, condenado pela mera vontade soberana de Deus” '09.

Para Wesley, a doutrina da dupla predestinação é “uma doutrina cheia

de blasfêmia”110 “tal que faz [ou deveria fazer] os ouvidos dos cristãos

formigarem” 111. Ela destrói todos os atributos de Deus (amor, justiça,

compaixão etc.) e representa 0 Deus santíssimo como “pior que o diabo,

mais falso, mais cruel e mais injusto” " 2. É por isso que Wesley, por fim,

conclui acerca de Romanos 9 e de passagens semelhantes reivindicadas

por calvinistas como prova de sua doutrina: “Seja lá o que a passagem

provar, ela jamais pode provar isso. Seja lá qual for seu verdadeiro signifi-

cado, isso não pode ser seu verdadeiro significado... Nenhuma passagem

bíblica pode provar que Deus não é amor ou que sua misericórdia não

está sobre toda a sua criação. Ou seja, seja lá 0 que ela provar além disso,

nenhuma passagem bíblica pode provar a predestinação” 1'3.

ALTERNATIVAS À ELEIÇÃO INCONDICIONAL/REPROVAÇÃO

Felizmente, Wesley não deixou 0  assunto apenas nisso; ele ofereceu

uma alternativa à doutrina que ele chamava de “blasfêm ia”. Sua alterna-

tiva é 0 arminianismo clássico, que não é  o que a maioria dos calvinistas

pensa. Geralmente a situação é apresentada como uma situação definidaentre ou isso ou aquilo: ou salvação por obras de justiça ou salvação por

eleição incondicional. Assim como todos os verdadeiros arminianos

  09. Ibid.

  0. Wesley, “Free Grace,” 554.

  . Ibid., 555.

  2. Ibid.

  3. Ibid., 556.

201

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Contra o Calvinismo

clássicos, Wesley afirmava como o início seu primeiro princípio: “Tudo

o que for bom no homem ou for feito pelo homem, Deus é o autor e

o realizador disso” 1'4. Contrário ao que muitos pensam, Wesley, como

um arminiano clássico, afirmava que a salvação é inteiramente da graça e que não possui nenhuma relação com 0 mérito do homem:

[A salvação] é livre em todos a quem ela é dada. Ela não depen-  

de de qualquer poder ou mérito no homem, não depende em nível 

nenhum, nem no todo, nem em parte. Ela não depende de modo  

nenhum nem das boas obras ou justiça do recebedor; nem de nada  

que ele tenha feito ou qualquer coisa que ele seja. Ela não depende  

de seus empenhos. Ela não depende de sua boa disposição, bons  

desejos ou boas intenções; pois todas estas coisas derivam da graça

 

livre de Deus " 5.

Todavia, Wesley não acreditava que essa posição de “graça livre”

acerca da salvação exigisse a eleição incondicional. Para ele, a salvação

é dada por Deus à pessoa que livremente responde ao evangelho com

arrependimento e fé, que não  são dons de Deus ou  “boas obras”, mas

respostas humanas ao dom de Deus da graça preveniente. Ele afirmava 0

pecado original, incluindo a depravação total no sentido de incapacidade

espiritual. Mas ele também afirmava 0  dom universal de Deus da graça

preveniente ou capacitadora que restaura a liberdade da vontade: “O

próprio poder de ‘trabalhar juntamente com Ele’ veio de Deus” " 6. Este

pode trabalhar juntamente com Deus para a salvação (que é inteiramente

obra de Deus) é simplesmente a graça convidativa, iluminadora e capa-citadora que Deus implanta em um coração humano em razão de seu

amor e em razão da obra de Cristo'"7. Mas esta graça é resistível, não

irresistível. Ela é dada em certa medida para todos. A eleição é simples

114. Ibid., 545.

115. Ibid.

  6. Wesley, “Predestination Calmly Considered,” 230.

  7. Ibid., 232 33 ־.

202

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

mente a presciência de Deus de quem livremente receberá esta graça

para a salvação (Rm. 8.29) " 8. A reprovação é simplesmente a rejeição

do homem desta graça e a presciência de Deus disso.

 Wesley pergunta aos calvinistas e aqueles tentados a se juntar a elespelo fato deles parecerem fazer de Deus mais glorioso: “De que maneira

Deus recebe mais glória ao salvar o homem irresistivelmente do que ao

salvá-lo como agente livre, através de uma graça que pode ser coope-

rada ou resistida?” 119 Para Wesley, a salvação do homem como agente

livre faz com que Deus seja mais glorioso, pois tal não exige que Deus

odeie ninguém ou que trate ninguém de maneira injusta. Para Wesley,

a glória de Deus jaz em seu caráter moralmente perfeito mais do que

em sua unicausalidade - algo que ele rejeita como impróprio para Deus,

considerando 0  mal no mundo.

 Alguém que trabalhou sobre o problema de Romanos 9 e outras pas-

sagens acerca da eleição sem concluir que elas exijam crença em uma

predestinação incondicional e individual é o erudito bíblico arminiano

 William Klein, autor de The New Chosen People.  Nesta obra ele realizaum estudo detalhado das línguas originais de passagens bíblicas que

são reivindicadas como dando suporte à predestinação individual para

0 céu ou para 0 inferno e conclui que “os escritores do Novo Testamento

lidam com a eleição salvífica, primeiramente, se não exclusivamente,

em termos cooperativos” '20. Sua conclusão teológica sistemática é que

“Deus escolheu a igreja como um corpo em vez de pessoas em específicoque populam 0  corpo” 121. Klein encontra base para esta visão em toda

a Bíblia, mas, principalmente, menciona 2 João 1 e 13.

  8. Ibid., 2 0.

  9. Ibid., 23 .

 20. William Klein, The New Chosen People  (Eugene, OR; Wipf & Stock, 200 ), 257.

  2 . Ibid., 259.

203

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Contra o Calvinismo

 Ainda mais básico que a eleição corporativa, todavia, de acordo

com Klein, é a eleição de Deus de Jesus Cristo: “Cristo é 0 Escolhido de

Deus, e a igreja é escolhida nele” '22. As duas coisas estão intrínseca-

mente ligadas. Ele faz uso de Romanos 5 onde Paulo fala sobre “Adão”

e “Cristo” como representantes e, em um sentido, como personalidades

corporativas '23. Romanos 9, então, pressupõe esta ideia de uma unida-

de corporativa, que Klein diz que está pressuposta em todos os lugares

no mundo do pensamento bíblico 124. Assim como 0  “primeiro Adão”

representa a humanidade caída em Romanos 5 e na mesma passagem

“Cristo, o novo Adão”, representa a nova humanidade, assim em Ro-

manos 9 “Jacó” representa 0  povo de Deus e “Esaú” não representa 0

povo de Deus. De acordo com Klein, então, como alguém se torna uma

das pessoas eleitas? “Assim como Israel tornou-se o povo escolhido de

Deus quando Deus escolheu Abraão e Abraão respondeu com fé, assim

a igreja encontra sua eleição em unidade com Cristo, ou seja, em sua

igreja e, assim, torna-se um eleito”. “Exercer a fé em Cristo é entrar em

seu corpo e tornar um dos ‘escolhidos’” '26. Aqui será útil, quase necessário, citar 0  Klein extensivamente, pois

 várias passagens em seu livro resumem muito bem a principal alternativa 

à visão calvinista rígida da eleição e salvação. É uma afirmação breve

da teologia arminiana clássica:

Quando se trata da provisão da salvação e a determinação de seus 

benefícios e bênçãos, a linguagem dos escritores neotestam entários é 

dominante. Deus decretou, em sua soberana vontade, prover a salva- 

ção e então ele estabeleceu Jesus para garantir a salvação através de 

sua vida hu mana e ressurreição (Hb. 0.9- 0). Ele planejou estender

  22. Ibid., 260.

  23. Ibid., 262.

  24. Ibid., 260-6 .

  25. Ibid., 264.

  26. Ibid., 265.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

sua misericórdia ao seu povo e de endurecer e punir os que não ere ·em. Ele predestinou ou predeterminou o que os que creem gozarãopor virtude da posição deles em Cristo. Podemos traçar a salvação etudo o que ela abarca unicamente ao beneplácito da vontade de Deus.

 A vontade de Deus não determina especificamente as pessoas que receberão a salvação.  A linguagem de “querer” abrange a todos, nãoum número seleto. A vontade de Deus não é restritiva; ele quer quetodos sejam salvos. Todavia, as pessoas só podem obter a salvação nostermos de Deus. Embora Jesus deseje revelar Deus a todos, apenas osque vêm até ele em fé encontram Deus e a salvação que ele oferece.O fato de que alguns falham em encontrar a salvação, tal só podeser atribuída a indisposição deles de acreditar - à preferência deles

por seus próprios caminhos ao caminho de Deus. Se Deus deseja asalvação para todos, ele quer (no sentido mais forte) dar vida aos queacreditam. Estas duas coisas não são incompatíveis. Elas colocam ainiciativa em Deus por prover a salvação e a obrigação das pessoasem recebê-la nos termos de Deus - fé em Cristo. Deus fez mais doque meramente prover a salvação; ele “atrai” as pessoas (Jo. 6.44)de sorte que elas vêm à Cristo. Na verdade, as pessoas vêm à Cristoporque Deus as capacita (Jo. 6.65). Entretanto, estas ações de atraire capacitar não são seletivas (apenas alguns são escolhidos para ela)e nem são irresistíveis. A crucificação de Jesus foi o meio de Deus deatrair todas as pessoas à Cristo (Jo. 12.32). Foi a provisão de Deuspara sua salvação. Todos podem responder a proposta de Deus, maseles devem fazer de maneira que depositem sua confiança em Cristo.Uma vez que Deus atrai a todos pela Cruz e ele deseja que todos searrependam de seus pecados e encontrem a salvação, não é a vontadede Deus que determina precisamente quais pessoas encontrarão asalvação. Embora Deus certamente saiba quem estes serão, e embo 

ra ele os escolheu como um corpo em Cristo, as pessoas devem searrepender e acreditar na vontade de Deus para que seja feito” 127.

 Alguém pode dizer: “Bem, tudo está bem, exceto  - que isso faz de

Deus menos glorioso!” A resposta certa é: “De que maneira?” O crítico

pode dizer: “Ela limita a Deus” A resposta é: “Deus não é soberano so״

bre sua soberania? Deus não pode limitar-se para dar livre-arbítrio para

as pessoas? Se Deus, ao tornar a salvação dependente das decisões das

127. Ibid., 281 82 .

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Contra o Calvinismo

pessoas for totalmente embasado na própria escolha voluntária de Deus,

como isso pode ser menos glorioso? A cruz foi menos gloriosa porque

ela não foi uma demonstração de poder e força ou majestade, mas de

servilidade sofredora? Talvez seja 0  caso que a visão da glória de Deus

do calvinista rígido seja embasada em uma noção humana de glória?”

Um teólogo que coloca a ideia da autolimitação de Deus em uso

para falar acerca da grandeza e bondade de Deus, incluindo a eleição

condicional  de pessoas, é Jack Cottrell, autor de muitos livros de teologia

arminiana. Como muitos outros críticos do calvinismo rígido, ele defende

que a eleição incondicional e reprovação levam ao determinismo e, desta

forma, distante do livre-arbítrio e de um Deus de amor e compaixão. ODeus do calvinismo, ele assevera, é um cuja soberania é marcada pela

unicausalidade e incondicionalidade128. À luz do pecado, mal e sofrimento

inocente da história e, principalmente à luz da realidade do inferno, tais

coisas são inconsistentes com a bondade de Deus. Um Deus soberano

unicausal e incondicional seria 0  autor do mal e de tudo isso. A única

forma de evitar isso, Cottrell corretamente argumenta, é acreditar na

autolimitação divina e uma tal além do que os calvinistas geralmente

permitem. De acordo com Cottrell:

Deus limita a si mesmo não apenas por criar um mundo como tal, 

mas também e ainda mais longe pelo tipo de mundo que escolheu criar. 

Ou seja, ele escolheu fazer um mundo que é relativamente independente 

dele... Isso significa que Deus criou os seres humanos como pessoas com 

um poder inato de iniciar ações. Quer dizer, 0 homem é livre para agir 

sem que seus atos precisem ser predeterminados por Deus e sem coa-

 ções simultâneas e eficazes de Deus. Em termos simples, é permitido ao 

homem exercer seu poder de livre escolha sem interferência, coerção ou 

preordenação. Ao não interferir em suas decisões a menos que  propósitos 

especiais exijam, Deus respeita tanto a integridade da liberdade que ele 

concedeu aos seres humanos quanto à integridade de sua própria escolha 

soberana de, em primeiro lugar, criar criaturas livres '29.

  28. Jack Cottrell, “The Nature of Divine Sovereignty” em The Grace of God,

The Will of  Man, ed. Clark H. Pinnock (Grand Rapids: Zondervan, 989), 06 - 7.

  29. Ibid., 08.

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

Claro, Cottrell não é 0 primeiro teólogo a pensar isso. Tal pensamento

pode ser encontrado, por exemplo, no teólogo reformado suíço Emil

Brunner (e Cottrell cita Brunner como fonte). Todavia, Cottrell explica

a ideia de autolimitação divina clara e concisamente e a defende bem

como necessária a fim de entender como Deus é soberano e, entretanto,

não está deterministicamente no controle de tudo, 0 que levaria direto

à dupla predestinação e, deste modo, minimizaria, isso se não destruir,

a bondade de Deus.

 Ao criar, em especial, este mundo com sua liberdade hum ana conce-

dida por Deus para se rebelar e pecar, Deus obrigou-se a reagir apenasem certas situações e não em outras. Isso não significa, de maneira

nenhuma, uma diminuição de sua soberania, pois ela é uma expressão 

de sua soberania! De acordo com Cottrell, e eu concordo com ele, en-

quanto isso pode não ser ensinado de maneira explícita nas Escrituras,

0  conceito está pressuposto em toda a Bíblia. Por exemplo, na narrati-

 va bíblica Deus se entristece, abranda, promete e reage, e todas estassão expressões de condicionalidade, 0  que sugere limitação voluntária.

Deus obviamente concedeu aos seres humanos um grau de liberdade

até mesmo para machucá-lo e frustrar sua vontade (apenas até certo

ponto, claro). Deus permanece onipotente e onisciente e ele é, portanto,

totalmente habilidoso e capaz de responder a quaisquer coisas que as

pessoas livres façam e da maneira mais sábia para preservar seu plano

e realizar os fins que ele decidiu.

Uma área que discordo levemente do Cottrell é que ele declara que

nesta autolimitação Deus retém o “controle soberano”. Ao passo que

rejeita o determinismo, ele diz que “Deus permanece completamente em 

controle de tudo”, pois “a menos que Deus esteja em total controle, ele

não é soberano” '30. Isso me parece, a priori, uma afirmação (totalmente

pressuposta) e não, de fato, assegurada por sua própria sugestão de au-tolimtação divina. Um Deus que náo exerce 0 poder determinista não está

130. Ibid., 111.

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Contra o Calvinismo

totalmente em controle. Prefiro dizer que Deus está “no comando, mas

não no controle”. Parece-me que “completamente em controle de tudo”

sugere algo que nem eu ou o Cottrell acreditamos - determinismo divino.

 Afinal de contas,0

 contexto da afirmação de Cottrell acerca da autoli-mitação divina é a doutrina de eleição (pelo menos na fonte em que cito

aqui). Se alguém disser que Deus está “completamente em controle de

tudo” e isso inclui quem será salvo e quem não será, este ensinamento

não é 0 que Cottrell ou qualquer outro não calvinista acredita. Se vamos

explorar a idéia de autolimitação divina para evitar a dupla predestinação,

devemos também descartar 0 conceito de controle total, caso contrário

estamos tirando com uma mão tudo o que demos com a outra.

Neste momento algum leitor calvinista (ou outro) pode estar se

descabelando e gritando (figurativamente falando): “E esse negócio de

livre-arbítrio? O que é livre-arbítrio? O Edwards já não provou que o

livre-arbítrio sequer existe, exceto no conceito de fazer de acordo com

0 motivo mais forte?”. Cottrell e outros críticos do calvinismo rígido ape-

Iam para 0  livre-arbítrio mesmo até ao ponto de dizer que ele limita aDeus (ou, melhor colocado, Deus permite que 0  livre-arbítrio limite suas

ações). Para Edwards e a maioria dos calvinistas, claro, o livre-arbítrio

não limita a Deus, pois Deus controla até mesmo as decisões e ações

de livre-arbítrio dos seres humanos.

Mas isso leva diretamente ao determinismo divino - algo que muitos

calvinistas negam, mas sem sem proveito nenhum. Afinal de contas,

como Deus pode controlar ou até mesmo governar as decisões e ações

humanas a menos que ele transmita os motivos? Eles são, afinal de

contas, os que controlam as decisões e ações. Isso faz de Deus a fonte

do pecado e do mal, pois estes se originam e jazem dentro dos motivos

(ou 0  que Edwards chamava de disposições).

Quero levantar a questão do livre-arbítrio em sua forma calvinista

(compatibilista) e sua forma não calvinista (não-compatibilista) no capítulo

7 (sobre a graça irresistível). Por agora nos basta dizer que eu admito que 0

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Sim para a eleição; não para a dupla predestinação

livre-arbítrio libertário (a vontade não totalmente governada por motivos e

capaz de agir de maneira contrária ao que age) é, de certa forma, misterioso,

mas eu não penso que ele seja impossível ou ilógico. Muitos filósofos pen-

sam o mesmo. E eu realmente penso que, juntamente com Cottrell, Wesleye outros não calvinistas citados aqui, que sem a liberdade libertária, que

pressupõe soberania divina autolimitadora, todos nós caímos de novo no

determinismo divino com todas as suas conseqüências lógicas e necessárias.

Portanto, qual mistério é melhor? Com qual a pessoa pode viver?

O mistério de como Deus é bom apesar de sua preordenação e deter-

minação do pecado, mal e sofrimento inocente assim como também 0

sofrimento eterno dos réprobos (que são réprobos pelo projeto e controle

de Deus), ou 0  mistério de onde vêm as escolhas livres libertárias? Eu

me preocupo mais em preservar e defender a reputação de Deus como

incondicionalmente bom do que resolver 0 problema do livre-arbítrio.

Quero terminar este capítulo acerca da eleição incondicional (e

sua correlata necessária, a reprovação) ao apelar para certos textos

específicos da Bíblia. Vamos olhar mais uma vez para João 3.16. Todomundo conhece o versículo de cor. Ele diz que Deus ama o “mundo”.

Os calvinistas ou não acreditam que o mundo se refira a todos, sem

exceção, ou eles dizem (assim como o Piper) que Deus ama até mesmo

os não eleitos em certos sentidos. Ambas as explicações de João 3.16

falham em fazer sentido. A melhor exegese crítica de João 3.16 significa

“toda a raça humana” 131. Até mesmo alguns calvinistas não conseguem

concordar com seus companheiros calvinistas que nesta passagem a

palavra “mundo” refere-se apenas aos eleitos. Todos eles reconhecem

muito bem 0 que a interpretação que limita “mundo” a apenas algumas

pessoas de todas as tribos e nações faria com os outros versículos no

evangelho de João que mencionam a palavra “mundo”.

 3 . Por exemplo, A. T. Robertson conforme citado por Jerry Vines, “Sermon on John 

3: 6,” em Whosoever Will: A Biblical-Theological Critique of Five-Point Calvinism , ed. 

David L. Allen and Steve W. Lemke (Nashville, TN: Broadman & Holman, 20 0), 7.

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Contra o Calvinismo

Quanto aos calvinistas que pensam que Deus ama “ 0 mundo todo”,

mas não do mesmo jeito, este amor é muito estranho e dificilmente se

encaixa no contexto de João 3 .16 . “Pois Deus enviou seu Filho ao mundo,

não para condenar 0  mundo, mas que este fosse salvo por meio dele”(3.17). Se “mundo” no versículo 16 significa todas as pessoas, então 0

 versículo 1 7 claram ente diz que Jesu s veio para salvar a todos (ou dar

a todos essa possibilidade). Tal entendimento contradiz a interpretação

de Piper e de outros que reivindicam que Deus ama os não eleitos (in-

clusos no “mundo” no versículo 16), pois ele certamente não enviaria

 Jesu s para salvar os não eleitos! Ambas as interpretações calvinistas de João 3 .16 acabam por ser impossíveis. O versículo perm anece como

um monumento contra a eleição incondicional e seu necessário lado

sombrio da reprovação.

Concluindo, 0  que dizer de 1 Timóteo 2.4, que diz que Deus quer

que “todos os homens” sejam salvos e onde o grego não pode ser inter-

pretado de nenhuma outra forma a não ser como se referindo a cada

pessoa sem exceção? Afinal de contas, a mesma palavra grega para

“todos” é utilizada em 2 Timóteo 3.16 para dizer que “toda” a Escritura

é inspirada. Se a palavra não significar literalmente “todos” em 1 Ti-

móteo 2.4, então ela também não significa “toda” em 2 Timóteo 3.16

(“toda a Escritura é inspirada”). 1 Timóteo 2.4 (que não está sozinho em

universalizar a vontade de Deus pela salvação, mas está, pelo menos,

aberta à qualquer outra interpretação) permanece lado a lado de João3.16 como um texto prova contra a eleição incondicional, que, exceto

no caso do universalismo, necessariamente inclui a reprovação.

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capítulo 6

Sim para a expiação;

Não para a expiação limitada/

redenção particular 

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Contra o Calvinismo

seriam eleitas incondicionalmente por Deus? Porque elas são totalmente

depravadas e não possuem outra esperança além da eleição de Deus

e a morte de Cristo por elas. E como Deus atrairá estas pessoas pelas

quais Cristo morreu para que elas se beneficiem de sua morte por elas? Ao atraí-las irresistivelmente para si. Como pode um eleito e atraído por

Deus, cujos pecados já estão pagos, se perder? É impossível.

Inteligente. Mas isso funciona? A expiação limitada, que a maioria

dos calvinistas prefere chamar de “ redenção particular” , é bíblica? Ela é

consistente com 0 am or de Deus demonstrado em Jesus Cristo e expres-

so no Novo Testamento muitas vezes de muitas formas (ex. João 3.16)?

Calvino acreditava na expiação limitada? Alguma pessoa na história cristã

antes dos seguidores escolásticos de Calvino acreditava nela? Ela é talvez

mais uma dedução feita a partir do T, U, 1 e 0  P do que uma verdadeira

revelação? Os calvinistas rígidos, na verdade, a abraçam por ela ser es-

criturística ou porque a lógica exige a crença nela e eles pensam que a

Escritura permite a expiação limitada? A rejeição da expiação limitada

exige 0  universalismo como uma “conseqüência lógica e necessária”,como 0 orador alegou? Estas e outras perguntas serão consideradas aqui

de maneira detalhada.

Minha conclusão será que a expiação limitada é outro calcanhar de

 Aquiles do calvinismo rígido. Ela não pode ser em basada pela Bíblia ou

a Grande Tradição da crença Cristã (fora do calvinismo escolástico após

Calvino). Ela contradiz 0  amor de Deus, fazendo de Deus não apenas

parcial, mas odioso (para com os não eleitos). Sua rejeição não exige

logicamente 0 universalismo, e os que a defendem assim 0 fazem porque

(pensam que) a lógica a exige e que a Escritura a permite, não porque

qualquer passagem bíblica, de maneira clara, a ensina.

Outra conclusão aqui será que o T, o U, ο I e o P da TULIP realmente 

exigem 0  L e que os calvinistas que alegam ser “de quatro pontos” e

que rejeitam o L estão sendo inconsistentes. Ironicamente, nesta ques-

tão, eu me posiciono em concordância com todos os calvinistas rígidos

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

da variedade TULIP! Também argumentarei que a crença na expiação

limitada, redenção particular, impossibilita, de maneira sensata, que

a oferta sincera do evangelho de salvação para todos, indiscriminada-

mente. Ironicamente, nesta questão, eu me posiciono em concordância

com os hipercalvinistas!

Por fim, o orador calvinista da minha aula dirigiu seu último argumen-

to calvinista comum a mim e aos alunos que concordam que a expiação

não pode ser limitada. “Talvez vocês não saibam, mas vocês também

limitam a expiação. Na verdade, vocês a limitam mais do que os calvi-

nistas 0  fazem. São vocês, na verdade, arminianos [e ele quis dizer são

todas as pessoas que dizem que Cristo morreu por todos] que acreditam

na expiação limitada”. Isso chamou a atenção dos alunos! Eu já tinha

ouvido esse argumento antes e sabia onde ele queria chegar. “Vocês

limitam a expiação ao roubar dela 0  poder de, de fato, salvar alguém;

para vocês a morte de Cristo na cruz só proporcionou uma oportunidade

para que as pessoas sejam salvas. Nós, calvinistas, acreditamos que a

expiação, na verdade, garantiu a salvação para os eleitos”. Aqui, como antes, objetarei a esta tentativa e utilizarei o feitiço contra

0  feiticeiro. Eu não concordo que os não calvinistas limitam a expiação.

Essa reclamação comumente ouvida simplesmente não se sustenta

mesmo porque até 0  próprio Calvino não acreditava que a expiação

salvasse alguém até que certas condições fossem atendidas - a saber,

arrependimento e fé. Ainda que estes sejam dons de Deus para os elei-

tos, 0  resultado é que a expiação não “salvou” mais pessoas do que os

arminianos (e outros não calvinistas) acreditam.

A DOUTRINA CALVINISTA DA EXPIAÇÃO

 Até onde pude ser capaz de averiguar, todos os verdadeiros calvinistas

(em oposição a alguns teólogos reformados revisionistas), abraçam a

então chamada “teoria da substituição penal” da expiação. Claro, eles

não pensam que ela seja “apenas uma teoria”. Com muitos não calvinis-

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Contra o Calvinismo

tas (tal como Wesley), eles a consideram como 0   ensinamento bíblico

acerca da morte salvífica de Cristo na cruz. De acordo com esta doutrina,

a morte de Jesus foi principalmente um sacrifício substitutivo oferecido

à Deus por Jesus (ou seja, para o Pai pelo Filho) como a “propiciação”pelos pecados. “Propiciação” significa apaziguamento [conciliação].

Nesta visão, 0 acontecimento da cruz é visto como o apaziguamento de

Cristo da ira de Deus. Ele sofreu 0  castigo pelos pecados dos que Deus

intencionou salvar de sua merecida condenação ao inferno. Calvino

resume a questão desta maneira:

Esta é nossa absolvição: que a culpa que nos mantinha sujeitosà pena foi transferida para a cabeça do Filho de Deus [Is 53.12].Pois se deve ter em mente, acima de tudo, esta permuta, para quenão tremamos e estejamos ansiosos por toda a vida, como se ainda pendesse sobre nós ajusta vingança de Deus, a qual 0 Filho de Deustransferiu para si 1.

Calvino e a maioria dos calvinistas acreditavam que a morte de

Cristo realizou mais (ex. a “transmutação de natureza das coisas” outransformação de nossa natureza pecam inosa 2 e cumprimento da lei

de Deus em nosso lugar)3, mas a conquista essencial de Cristo na cruz

foi 0  sofrimento de nosso castigo.

Outras teorias da expiação surgiram na história da cristandade e

algumas delas encontram ecos na teologia de Calvino. Por exemplo,

a visão da morte salvífica de Cristo chamada de “Christus Victor” é

popular principalmente a partir das publicações da clássica obra sobre

a expiação, Christus Victor4,  escrita pelo teólogo sueco Gustaf Aulén.

 . CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 2, p. 263.

2. Ibid., p. 269.

3. Ibid., p. 264.

4. Gustaf Aulén, Christus Victor: An Historical Study of the Three Main Types of the Idea of  

the Atonement  (New York: Macmillan, 969).

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

Calvino assente com esta imagem da morte expiatória de Cristo, que

ela dominou a Satanás e liberou os pecadores da escravidão5, mas seu

foco principal está na satisfação de Cristo da justiça de Deus ao sofrer a

punição merecida pelos pecadores de sorte que Deus pode, de maneira

 justa, perdoá-los. Contrário à muitos críticos desta teoria da substituição

penal, ela não se apóia em uma visão de Deus como sanguinário ou

molestador de crianças! Calvino corretamente ressalta 0  amor como 0

motivo de Deus para enviar seu Filho para morrer pelos pecadores 6.

Os calvinistas rígidos desde Calvino, quase sem exceção, defendem

firmemente esta visão da expiação e sua realização em prol de Deus

e os pecadores. Eles não rejeitam outras dimensões da expiação, masesta é central e essencial à toda a soteriologia calvinista. Muitos não

calvinistas concordam. Mas a questão em jogo aqui é se Cristo morreu

desta forma  para todas as pessoas  ou apenas por alguns - os eleitos.

Nenhum calvinista nega a suficiência  da morte de Cristo em termos

de valor  para salvar toda a raça humana. O que alguns vieram a negar

é que Cristo, na verdade, sofreu a punição merecida por todas as pes-

soas - algo claramente ensinado pela patrística grega e a maioria dos

teólogos medievais e até mesmo Lutero. O calvinismo rígido clássico

acredita e ensina que Deus apenas  planejou  a cruz para ser propiciação

para algumas pessoas e não para outras; Cristo não sofreu por todos

(pelo menos não da mesma forma, Piper gostaria de acrescentar), mas

apenas por aqueles a quem Deus escolheu salvar.

Esta é a doutrina da “expiação limitada” ou o que alguns calvinistaspreferem chamar de expiação “definitiva”, “particular” ou “eficaz”.

Boettner expressa bem a doutrina: “Enquanto 0  valor da expiação foi

suficiente para salvar toda a humanidade, ela foi eficaz para salvar apenas

os eleitos” 7. A fim de que ninguém entenda e pense que isso significa

5. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 2, p. 269.

6. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 2, p. 270.

7. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  52.

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Contra o Calvinismo

que Deus planejou a expiação para todos, mas que ela só efetua a sal-

 vação dos que a recebem com fé (a visão da maioria dos evangélicos

não calvinistas), Boettner diz que os não eleitos foram excluídos de sua

obra por Deus: “Não foi, portanto, um amor geral e indiscriminado de

que todos os homens são igualmente participantes [que enviou Jesusa cruz], mas um amor particular, misterioso e infinito pelos eleitos que

fez com que Deus enviasse Seu Filho ao mundo para sofrer e morrer”,

e ele morreu apenas por eles 8. Assim como muitos calvinistas, Boettner

alega que “certos benefícios” da cruz se estendem a todas as pessoas

em geral, mas estes benefícios são simplesmente “bênçãos temporais

e não quaisquer coisas salvíficas 9.Os não calvinistas olham para declarações como estas e tremem. Isto se-

ria, de fato, um “amor excêntrico” que exclui algumas das mesmas criaturas

que Deus criou à sua própria imagem e semelhança de qualquer esperança

de salvação. Além do mais, estas “bênçãos temporais”, que alegam que se

originam da cruz e das quais os não eleitos são participantes, dificilmente

 valem a pena ser mencionadas. Como enfatizei no capítulo anterior, tais

bênçãos, para os não eleitos, se eqüivalem a receber um pouquinho do céu

para que depois sejam lançados no inferno! Steele e Thomas, autores de

The Five Points of Calvinism, definem e descrevem a expiação limitada, que

eles preferem chamar de redenção particular, desta maneira:

O calvinismo histórico ou principal tem man tido, de maneira 

consistente, que a obra redentora de Cristo foi definitiva em  plano  e 

realização -  que ela teve por intenção executar plena satisfação para

 certos pecadores específicos e que ela verdadeiramente garantiu a 

salvação para estes indivíduos e para ninguém mais. A salvação que

 

Cristo ganhou para Seu povo inclui tudo 0  que está envolvido em 

trazê-los ao relacionamento correto com Deus, incluindo os dons da  

fé e do arrependimento '0.

8. Ibid., 57.

9. Ibid., 60.

 0. Steele and Thomas,The Five Points of Calvinism, 39.

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

 Assim como Boettner, estes teólogos asseguram que a expiação de

Cristo não foi limitada em valor,  mas apenas em  plano  [intenção], E eles

alegam que os arminianos (e outros não calvinistas) também limitam a

expiação da maneira mencionada acima ",Steele e Thomas reivindicam embasamento para a expiação limitada em

passagens bíblicas tais como João 10 .11 , 1 4 - 18 e Romanos 5.12 , 17-19 .

Todavia, mesmo uma análise superficial destas passagens revela que elas

não limitam a expiação, mas que apenas dizem que ela visa e foi aplicada

ao povo de Deus. Elas não negam que a expiação não é para os outros.

O que dizer das passagens bíblicas que mencionam as palavras “to-

dos” e “mundo”, tal como 1 João 2.22: “Ele é a propiciação pelos nossos

pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos pecados de

todo o mundo” Steele e Thomas explicam isto desta maneira:

Um motivo para o uso destas expressões era para corrigir a falsa  

noção de que a salvação era apenas para os judeus... Estas expressões 

têm por intenção mostrar que Cristo morreu por todos os homens sem 

distinção   (a saber, Ele morreu por judeus e, de mesmo modo, pelos

 gentios), mas elas não intencionam indicam que Cristo morreu por 

todos os homens sem exceção  (a saber, E le não morreu pelo propósito 

de salvar a cada e todo último pecador) '2.

Uma pergunta crucial que surge em resposta a estas alegações é a

distinção entre 0  valor  da morte expiatória de Cristo e seu  plano e  pro- 

 pósito.  Aparentemente, Boetnner, Steele e Thomas (e outros calvinistas

que citarei) acreditam que a morte de Cristo na cruz foi um sacrifício

suficiente   pelos pecados de todo 0  mundo. O que, então, eles querem

dizer ao dizer que Cristo não morreu por todas as pessoas? Se ela foi um

sacrifício suficiente pelos pecados de todo 0 mundo, incluindo todas as

pessoas, e teve valor 0 bastante para todos, como é que não é contradi-

tório então dizer que Cristo náo morreu por todos?

11. íbid.

12. Ibid., 46.

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

tanto amou o mundo que deu seu Filho Unigênito, para que todo 0  que

nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus enviou seu

Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que este fosse

salvo por meio dele”. De acordo com Palmer, “nesta passagem a palavra

‘mundo’ não significa todas as pessoas... mas... pessoas de todas as

tribos e nações” '4. Acerca das passagens que dizem que Cristo morreu

por “todos”, ele diz: “Todos não são todos” '5.

Palmer chama 0  fato de Cristo ter morrido apenas pelos eleitos, mas

que, todavia, “Deus, de maneira sincera e livre, oferece a salvação a

todos” de um “mistério fundamental” '6. Como mostrarei, entretanto,

os críticos da visão calvinista defendem que isto não é um mistério,mas uma contradição - uma distinção que R. C. Sproul descreve (e ele

rejeita contradições na teologia). Como que um calvinista, pregador do

evangelho, isso sem mencionar Deus, pode dizer a uma congregação

ou a outro ajuntamento de pessoas: “Deus te ama e Jesus morreu por

 você para que você possa ser salvo, isso se você se arrepender e crer no

Senhor Jesus Cristo”, sem acrescentar a advertência, “se você for um

dos eleitos de Deus”? O pregador calvinista não pode fazer isso com a

consciência limpa.

Sproul, um calvinista particularmente convicto na expiação limitada,

chama esta doutrina de “expiação intencional de Cristo” '7. Isto é, claro, um

pouco insincero na medida em que o termo visa expressar o que é nítido na

 visão calvinista, pois, claro, todos os cristãos acreditam que a expiação de

Cristo foi “intencional”. Logo de cara, no início de sua exposição desta dou-trina, Sproul interpreta de maneira errônea e até mesmo faz caricaturas das

 visões não calvinistas. A fim de embasar sua crença na expiação limitada,

14. Ibid., 45.

 5. Ibid., 53.

  6. Ibid., 5 .

  7. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 39.

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Sim para a expiação; não para a expiaçao limitada/redenção particular 

 verdadeiramente sofrido o castigo por todos? Não há, de fato, diferença

alguma; o primeiro ponto inclui 0  último!

Sproul lida com a passagem bíblica clássica da expiação universal

(2 Pe. 3.9), mas ignora passagens universais igualmente importantes,

1 Timóteo 2.5-6 e 1 João 2.2. De acordo com ele e muitos outros que

aderem à expiação limitada, 2 Pedro 3.9 deveria ser interpretado como

fazendo referência a “vontade de disposição”, que é diferente de sua

“vontade decretiva” 20. Em outras palavras, este versículo não expressa

0 que Deus decreta  ser o caso, mas o que Deus deseja  que fosse 0  caso.

Enquanto tal pode ser uma interpretação possível de 2 Pedro 3.9 (em-

bora eu duvide que seja essa a interpretação), não se pode interpretar

1 Timóteo 2.5-6 desta maneira nem muitas outras passagens universais

onde se diz que Cristo dá sua vida para “todos” ou 0 “mundo” ou “todo o

mundo”. Sproul também sugere que em 2 Pedro 3.9 a palavra “ninguém”

se refere aos eleitos de Deus 21. Mais uma vez, por mais forçada quanto

esta interpretação seja, ela pode ser concebivelm ente possível. Todavia,

ela não é possível como uma interpretação para as outras passagens queincluem a palavra “todos”, incluindo 1 Timóteo 2.5-6.

O estadista evangelico Vernon Grounds (1914 - 2010), que presidiu

por muito tempo 0 Denver Seminary e autor de muitos livros teológicos,

menciona as seguintes passagens universais acerca da expiação de Cris-

to: João 1.29; Romanos 5.1 7 - 21; 11.32, 1 Timóteo 2.6; Hebreus 2.9 e

 João 2.2 (além de, claro, 2 Pe. 3.9). Então ele diz da visão adotada por

Sproul e outros calvinistas de 5 pontos: “É necessária uma ingenuidade

exegética, que é algo senão uma virtuosidade aprendida para esvaziar

estes textos de seus significados óbvios: é preciso uma ingenuidade bei-

rando ao sofism a para negar a explícita universalidade destes textos” 22.

20. Ibid., 43- 44.

2 . Ibid., 45- 46.

22. Vernon C. Grounds, “God’s Universal Salvific Grace,” in Grace Unlimited,  ed. Clark 

H. Pinnock (Minneapolis: Bethany, 975), 27.

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Contra 0 Calvinismo

Esta observação é, talvez, o motivo pelo qual John Piper tem enfatizado

tanto a ideia de que Cristo morreu por todos, mas não da mesma ma-

neira. Duvido que tal explicação satisfaça a Grounds ou a qualquer outro

crítico da expiação limitada. Ela apenas suscita mais questões acerca doamor, sinceridade e bondade de Deus, assim como também em relação

ao valor das “bênçãos temporais” proporcionadas pela expiação para os

não eleitos quando melhor seria que eles não tivessem nascidos.

 John Piper defende arduam ente a expiação limitada enquanto que ao

mesmo tempo argumenta que também há certa universidade na expia-

ção. Esta é a forma dele, ao que parece, de resolver o dilema proposto

pelas passagens que apresentam a palavra “todos” diante da crença na

redenção particular e de resolver 0  problema de como a pessoa que

acredita na expiação limitada pode pregar para seu público que Cristo

morreu por todos. A doutrina de Piper do propósito da expiação é inte-

ressante porque ela vai além da teoria da substituição penal comum e

adentra em algo como a teoria governamental. Pensa-se, geralmente, que

a teoria governamental da expiação seja uma doutrina típica arminiana,embora nem Armínio e nem Wesley a tenham ensinado.

De acordo com a visão da teoria governamental, Cristo não sofreu a

punição exata merecida por cada ser humano, mas uma punição equi-

 valente a isso. Tal visão foi formulada pelo pensador arminiano Hugo

Grócio (1583 - 1645) para resolver 0 problema de como a expiação po-

deria ser universal e, entretanto, nem todos serem salvos. (Como muitos

arminianos, penso que há uma resposta mais fácil para este problema

do que desenvolver uma teoria nova de como a morte de Cristo satisfez

a ira de Deus). De acordo com Grócio e outros que defendem esta visão,

0 propósito principal da expiação era sustentar o governo moral de Deus

do universo diante de duas realidades: (1) nossa pecaminosidade, e (2)

0 perdão de Deus de nossa pecaminosidade. Como Deus pode ser reto,

governador moral do universo e fingir não ver o pecado ao perdoar os

pecadores? Ele não pode ser. Então Deus resolve este dilema interior ao

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

enviar Cristo para sofrer uma punição exatamente como a que os peca-

dores merecem - mas não a punição deles  (que Grócio acreditava que

seria injusto e resultaria em todos eles sendo salvos). Tal visão defende

a retidão de Deus quando ele perdoa os pecadores.Piper não rejeita a visão da substituição penal em favor da teoria do

governo moral, mas ele realmente enfatiza 0  intuito do governo moral.

Ele indaga: “Por que Deus feriu [a saber, matou] seu Filho e lhe trouxe

aflição?” e então responde: “para salvar pecadores e, ao mesmo tempo,

magnificar 0  valor de sua glória”23. Ao colocar “nossos pecados sobre

 Jesus e o abandoná-lo à vergonha e ao massacre da cruz” , “Deus desviou

sua própria ira” 24. Piper também deixa claro que a cruz é principalmente

uma vindicação da Retidão de Deus para perdoar os pecadores. Muitos

dos arminianos e outros evangélicos não calvinistas, se não a maioria,

podem dar um forte amém a isso. Os únicos problemas são (1) quando

Piper prossegue e diz, como ele ocasionalmente faz em seus sermões,

que Jesus morreu “para Deus” e (2) que o benefício salvífico de sua

morte foi intencionado apenas para os eleitos. Romanos 5.8 clara einequivocamente afirma que Cristo morreu “pelos pecadores” e muitos

 versículos já citados, incluindo e especialmente 1 João 2.2 , dizem que

sua morte foi um sacrifício propiciatório pelos pecados de todo 0 mundo.

Piper prega que Cristo morreu tal morte apenas para alguns - os elei-

tos. Para eles e apenas eles a morte garantiu a justificação por Deus. Ela

não apenas a tornou possível; ela, na verdade, a realizou. É por isso, ele

argumenta, se Cristo morreu por todos, todos seriam justificados e não

haveria inferno. Então como ele explica versículos tal como 1 João 2.2?

“A expressão ‘todo 0  mundo’ refere-se aos filhos de Deus espalhados

ao redor de todo 0 m undo” 25. Mas ele também reivindica que “nós não

23. Piper, The Pleasures of God,  65.

24. Ibid., 65, 67.

25. Piper, “For Whom Did Christ Die?"

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

utiliza a maioria de seus argumentos, juntamente com outros, em um

artigo chamado “Was Calvin a ‘Calvinist’? John Calvin on the Extent of

the Atonement.” (Calvino foi um Calvinista? João Calvino acerca da Ex-

tensão da Expiação). Seguindo Kendall, Kennedy admite que Calvino,em lugar nenhum, explicitamente aborda a questão; ele aparentemente

sequer pensou nela como uma questão ou ele teria ousadamente se

posicionado de um lado ou de outro (algo que Calvino era famoso por

fazer!). Mas ninguém consegue encontrar nos escritos de Calvino uma

afirmação tal como “Cristo padeceu a punição por cada pessoa”, um

fato de que os calvinistas que defendem que ele acreditava na redenção

particular usam em seu benefício.

Todavia, conforme Kennedy entusiasticamente ressalta, Calvino real· 

mente diz coisas que ninguém que acreditara na expiação limitada diria:

Por exemplo, se Calvino realmente professasse a expiação limi-tada, alguém não poderia esperar encontrá-lo universalizando, demaneira intencional, passagens escriturísticas que teólogos da tra-dição reformada posterior alegam que estão, a partir de uma leitura

simples do texto, claramente ensinando que Cristo morreu apenaspelos eleitos. Além do mais, se Calvino verdadeiramente acreditavaque Cristo morreu apenas pelos eleitos, então alguém não esperariaencontrar Calvino alegando que descrentes que rejeitam o evangelhoestão rejeitando uma provisão real que Cristo fez para eles na cruz.Nem alguém esperaria que Calvino, caso ele fosse um proponenteda expiação limitada, falhar em refutar fortes alegações de que Cris-to morreu por toda a humanidade quando ele estava engajado em

argumentos polêmicos com católicos romanos e outros. Todavia, a verdade é que, Calvino faz isso tudo e mais 30.

Mas Kennedy não precisa inferir a crença de Calvino na expiação

universal a partir do que ele não  diz; ele apresenta muitas citações de

Calvino, principalmente de seus comentários, que são afirmações univer

30. Kevin Kennedy, “Was Calvin a ‘Calvinist’? John Calvin on the extent of the atonement,” 

em Whosoever Will: A Biblical-Theological Critique of Five-Point Calvinism , ed. David L. 

Allen and Steven W. Lemke (Nashville, TN: Broadman & Holman, 20 0), 95.

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Sim para a expiação; não para a expiaçao limitada/redenção particular 

sagens que lidam com a extensão da expiação, dificilmente deveria

ser levada a contradizer as demais.

É realmente importante 0  fato de Calvino acreditar na expiação uni-

 versai ou expiação limitada? Não. Ninguém duvida que Calvino fossefortemente a favor dos outros quatro pontos da TULIP. Se ele tivesse

 vivido mais ele teria chegado ao “L” ? Talvez. Certamente alguns de seus

sucessores imediatos chegaram. Todavia, o fato de que Calvino aparem

temente não viu a expiação limitada ensinada de maneira explícita na

Escritura minimiza as reivindicações dos calvinistas rígidos que dizem

que ela é claramente ensinada na Bíblia.

Mais importante do que se Calvino acreditava na expiação limitada

é se Paulo acreditava. Há um versículo nas cartas de Paulo que clara e

inequivocamente contradiz a doutrina da redenção particular. Eu acredito

que há. Em todas as minhas leituras de literaturas calvinistas e antical-

 vinistas eu não me deparei com nenhuma menção de 1 Coríntios 8. 11 ,

ainda que este único versículo pareça contradizer a expiação limitada.

Nesta passagem Paulo escreve ao cristão que insiste em ostentar sualiberdade para comer carne em um templo pagão, mesmo em vista dos

cristãos que possuem uma consciência mais fraca e que podem, deste

modo, “tropeçar”: “Assim, esse irmão fraco, por quem Cristo morreu, é

destruído por causa do conhecimento que você tem”. Claramente, Paulo

está dando uma advertência aterrorizante aos que possuem uma “fé for-

te” para que evitem ofender as consciências de seus irmãos mais fracos.

Sua advertência é que ao exercer a liberdade cristã do legalismo muito

publicamente, um “cristão forte” pode, na verdade, fazer com que uma

pessoa amada por Deus, por quem Cristo morreu, seja “destruída” 36.

36. Alguns leitores podem se perguntar acerca da relevância desta passagem com o 

que às vezes é chamada de “segurança eterna” - a perseverança incondicional dos 

santos. Me parece ser possível interpretá-la das duas formas - como se referindo a 

alguém que já é um cristão e pode perder sua salvação em razão da ofensa do irmão

 

mais forte, ou como fazendo referência à pessoa que ainda não é cristã (mas por quem 

Cristo morreu) que pode ser afastada pela ofensa.

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Contra o Calvinismo

 Agora, se a expiação limitada for verdadeira, a advertência de Paulo é uma

ameaça vazia, pois ela não pode acontecer. Uma pessoa por quem Cristo

morreu não pode ser destruída. Cristo morreu apenas pelos eleitos, e os elei-

tos são atraídos irresistivelmente a Deus (0  assunto do próximo capítulo) eserão preservados por Deus (0 “P” na TULIP) independente do que acontecer.

Os crentes na expiação limitada levantam duas objeções. Primeiro, 0

que “destruído” significa; a palavra não pode significar apenas “danifica-

do” ou “ferido”? A palavra grega traduzida por “destruído” é apollytai, que

significa “destruir, perecer, morrer”. É improvável, isso se não impossível,

que a palavra pudesse significar qualquer outra coisa, principalmente neste

contexto. Segundo, eu ouvi calvinistas insistirem que ela apenas significa

“danificar” ou “ferir”. Mas por que a advertência de Paulo seria tão terrível

neste caso? “Por quem Cristo morreu” - soa como se Paulo estivesse dizendo

que esta ofensa é assunto sério. A conjunção de “por quem Cristo morreu”

com “danificar” simplesmente não carrega muito peso.

O sentido óbvio do texto é que Paulo está advertindo os cristãos

de consciência mais forte a tomarem cuidado para que não causema completa destruição e ruína, em termos espirituais, do cristão mais

fraco ou, pelo menos, de alguém por quem Cristo morreu. Se esse for 0

caso, eu estou firmemente convencido de que nenhuma outra exegese

é possível, este versículo destrói a doutrina da expiação limitada ao

demonstrar que Paulo não acreditava nela.

 Antes de continuar com outras objeções à expiação limitada, quero

eliminar 0 argumento de que a expiação universal necessariamente im-

plica em universalismo. Ela não leva ao universalismo. Primeiro, mesmo

Calvino sabia que há uma diferença entre a morte expiatória de Cristo

no lugar de alguém e os benefícios desta expiação sendo aplicados na

 vida da pessoa para o perdão. Perdão, para Calvino, é claramente con-

dicional; 0 perdão exige fé e arrependimento 37. Ou seja, a pessoa eleita

37. CALVINO, João. As Institutes: edição clássica, vol. 3, pp. 89-92.

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

não é salva no momento que Cristo morreu por ela; aquela salvação

pessoal é uma obra do Espírito Santo por meio da Palavra quando Deus

concede os dons de fé e arrependimento para 0  perdão. Até mesmo a

regeneração acontece simultaneamente com 0  arrependimento e não,naturalmente, quando Cristo morreu pela pessoa eleita 38. Praticamente

todo calvinista que conheço acredita que a “salvação” é a experiência

de uma pessoa apenas quando os benefícios da morte de Cristo são

aplicados na vida dela; as pessoas ainda não estão salvas no momento

em que Cristo morreu por elas.

 Assim sendo, o argumento de que a expiação universal necessaria-

mente implica em salvação universal falha em levar em conta a lacuna,

por assim dizer, entre a morte de Cristo por alguém e a aplicação de

seus benefícios à vida da pessoa. Todos por quem Cristo morreu já não

estavam salvos quando ele morreu. Até mesmo no calvinismo de cinco

pontos, a morte de Cristo não “realiza” a salvação das pessoas, mas a

“garante” , conform e Piper e outros dizem. Mas até mesmo Piper e outros

proponentes da expiação limitada concordam que as pessoas por quem

Cristo morreu, no sentido de padecer o castigo dessas,pessoas, devem

ter fé para que sejam salvas pela morte de Cristo.

 Acredito, assim como todos os arm inianos e outros protestantes

não calvinistas acreditam, que Cristo morreu por cada pessoa humana

de maneira a garantir a salvação destes sem exigir ou torná-la certa. A

apropriação subjetiva da salvação destas pessoas é uma condição da

dita salvação segura sendo posse de alguém. Isso significa que parte

do sangue de Cristo foi desperdiçado? Talvez. E é isso que faz da morte

espiritual e o inferno tão trágicos - eles são absolutamente desnecessá-

rios. Mas Deus, em seu amor, preferiu gastar parte do sangue de Cristo,

por assim dizer, a ser egoísta com o sangue.

Uma analogia ilustrará 0 que quero dizer. Apenas um dia após a posse

do presidente Jim my Carter, ele deu prosseguimento a sua promessa de

38. Ibid., pp. 77-8.

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Contra o Calvinismo

campanha e concedeu perdão total a todos os que resistiram ao recru-

tamento durante a Guerra do Vietnã ao fugir dos EUA para 0 Canadá e

outros países. O momento em que ele assinou aquela ordem executiva,

cada exilado estava livre para retornar aos EUA com a garantia legal deque ele não seria processado. “Todos estão perdoados, voltem para casa”

foi a mensagem para cada um deles.

Tal ação custou muito ao presidente Carter; alguns acreditam que

a lei foi tão controversa; principalmente entre os veteranos, que ela

contribuiu para a sua perda para Ronald Reagan na eleição seguinte.

 Ainda que houvesse uma anistia e perdão total, todavia, muitos exilados

escolheram permanecer no Canadá ou outros países para os quais elesfugiram. Alguns morrereram sem sequer fazer uso da oportunidade de

estar em casa com os familiares e amigos novamente. O custoso perdão

não lhes fez bem algum, pois ele precisava ser subjetivamente apropriado 

a fim de ser usufruído objetivamente. Colocando de outra forma, embora

0 perdão era objetivamente deles, para que pudessem se beneficiar dele,

eles precisavam tê-lo aceitado subjetivamente. Muitos não o fizeram.

 A reivindicação que a expiação objetiva necessariamente inclui ou

exige a salvação subjetiva e pessoal é falha. O argumento, feito com

muita frequência ao menos desde a obra The Death o f Death in the Death 

o f Christ [Por quem Cristo Morreu: A Morte da Morte na Morte de Cristo]39, 

escrita por John Owen, que diz que Cristo ou morreu por todos e, por-

tanto, todos são salvos ou que ele morreu por alguns e, portanto, alguns

são salvos, é logicamente absurdo. Este argumento simplesmente ignora

a real possibilidade que Cristo sofreu a punição por muitas pessoas que

 jamais usufruem desta liberação da punição. Por que Cristo sofreria a

punição por pessoas que jamais gozam de seus benefícios? Por causa

do amor de Deus por todos.

39. Muitas edições deste livro escrito por John Owen ( 6 6 - 683) estão disponíveis,

 tais como: The Death of Death in the Death of Christ, ed. J. I. Packer (London: Banner of 

Truth Trust, 963).

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

 Ainda há outra questão do argumento de Owen (e da maioria dos

calvinistas rígidos) que o mesmo pecado não pode ser punido duas ve-

zes. Mais uma vez, isso é simplesmente falso. Imagine uma pessoa que

é multada por uma corte em mil reais por um mau comportamento e

alguém entra e paga a multa. E se a pessoa multada se recusar a aceitar

aquele pagamento e insistir que ela mesma pague a multa? A corte irá

automaticamente restituir os primeiros mil reais? Provavelmente não. É

o risco que a primeira pessoa corre em pagar a multa de seu amigo (a)

por ele (a). Em uma situação como essa, a mesma punição poderia ser

paga duas vezes. Não é que Deus cobre a mesma punição duas vezes;

é 0 pecador que, à revelia, recusou a oferta livre de salvação, sujeitando

a si mesmo à punição que já foi sofrida por ele. E, conforme observado

acima é isso que torna 0  inferno tão terrivelmente trágico.

Então, há uma diferença entre a  provisão  de perdão de pecados e

a aplicação  de perdão de pecados. Calvino sabia disso. Suspeito que a

maioria dos calvinistas sabe disso, mas tal conhecimento assume uma

posição secundária em relação ao desejo de exercer 0 argumento de quea expiação universal exigiria salvação universal. O teólogo arminiano Ro-

bert Picirilli (η. 1932) está certo quando, em relação à 1 Timóteo 4.10, ele

diz: “Que ele [Jesus] é 0 salvador de todos os homens, fala de provisão;

que Ele é 0 salvador especialmente dos que creem, fala de aplicação” 40.

Muitos calvinistas argumentaram que a crença na expiação universal

leva ao universalismo. Eles apontam para certos arminianos dos sécu-

los XVIII e XIX que formaram a base do movimento Universalista (que

posteriormente se uniram a Igreja Unitária). Todavia, minha visão é a

de que o calvinismo,  com sua doutrina da expiação como  garantindo a 

salvação  em uma forma necessária de sorte que todos por quem Cris-

to morreu devam  ser salvos, é que leva ao universalismo. O motivo é

que para alguém que leva muito a sério 0  claro testemunho bíblico do

amor universal de Deus por todas as pessoas e acredita que a expiação

40. Picirilli, Grace, Faith, Free Will,  36.

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Contra 0 Calvinismo

necessariamente garante a salvação, o universalismo está apenas a um

passo. A única forma de se afastar do universalismo é negando 0 amor

de Deus em seu sentido mais pleno e verdadeiro ou  negando que a

expiação necessariamente garante a salvação para a pessoa expiada.

Um estudo de caso nesta trajetória do calvinismo ao universalismo

é Karl Barth, que, estou convencido, realmente veio a acreditar na dou-

trina do apokatastasis — que todos são ou serão salvos. Ele fez isso sem

sacrificar 0 T, 0  U, ο I e o P da TULIP. Mas ele reteve a noção errônea

calvinista de que a substituição penal necessariamente garante a salva-

ção subjetiva pessoal41. Uma vez que ele passou a acreditar que Cristo

morreu por todos sem exceção, pois Deus é “o que ama em liberdade”,

0  universalismo foi o que, logicamente, veio depois.

Me parece, e para muitos outros não calvinistas, que qualquer pes-

soa que tenha uma profunda compreensão do testemunho bíblico de

Deus como revelado especificamente em Jesus Cristo, mas também em

 versículos tais como João 3 . 1 6 e 1 João 4.8 terão que desistir da reden-

ção particular e, a fim de evitar 0  universalismo, de qualquer relaçãonecessária entre redenção realizada e redenção aplicada. Calvinistas de

quatro pontos, que tentam negar 0  “L”, mas que aderem ao restante da

TULIP, têm de explicar por que Cristo sofreria a punição pelos réprobos

- pecadores que Deus, de maneira intencional, recusa a possibilidade

de salvação.

 A maioria dos calvinistas rígidos, incluindo Boettner, Steele e Thomas,

Sproul e Piper, acreditam apaixonadamente no evangelismo universal;

eles rejeitam 0  hipercalvinismo, que diz que uma oferta sincera de sal-

 vação não pode ser feita a todos nem por Deus e nem pelos pregadores.

Como já sugeri, todavia, há tensão e até conflito entre expiação parti-

4 . Para uma análise detalhada e completa da mudança de Barth do calvinismo de 

cinco pontos para 0  universalismo, ver G. C. Berkouwer, The Triumph of Grace in the  

Theology of Karl Barth  (Grand Rapids: Eerdmans, 956). Embora Berkouwer não acuse

 

Barth de universalismo evidente, ele realmente indica que a salvação universal está 

implícita na doutrina de eleição de Barth. Concordo com esta avaliação.

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

cular e evangelismo indiscriminado. Entre outros críticos da expiação

limitada, Gary Schultz argumentou de maneira convincente que não há

sinceridade em uma pregação indiscriminada do evangelho e convite

ao arrependimento, crença e salvação, se a expiação limitada for ver-dadeira. “O x da questão”, ele corretamente enfatiza:

e como o evangelho pode ser genuinamente oferecido aos nãoeleitos se Deus não fez nenhum pagamento pelos seus pecados... SeCristo não pagou pelos pecados dos não eleitos, então é impossíveloferecer genuinamente a salvação aos não eleitos, uma vez que nãohá salvação disponível para que lhes sejam oferecidos. Em um sen-tido, quando o evangelho é oferecido, os não eleitos receberiam a

oferta de algo que nunca existiu para que eles para que, para iníciode conversa, pudessem receber 42.

Então Schultz deixa a questão extremamente clara e fácil de se en-

tender: “Se a expiação foi apenas para os eleitos, pregar esta mensagem

aos não eleitos seria, no seu melhor, dar a eles uma falsa esperança e,

no seu pior, falso” 43.

 Alguns calvinistas podem responder que um pregador jam ais sabe,

de maneira exata, quem dentre os seus ouvintes, são os eleitos e quem

são os não eleitos, portanto, ele ou ela devem oferecer a salvação a to-

dos enquanto que pensando consigo mesmo que apenas os eleitos irão

responder. Mas duas coisas impedem esta objeção. Primeira, a maioria

dos calvinistas não hipercalvinistas, isso se não todos, acredita que não

apenas 0  próprio Deus oferece salvação a todos como uma “oferta sin-cera” (conforme mencionado anteriormente como uma declaração da

Igreja Cristã Reformada contra 0 hipercalvinismo). Certamente Deus sabe

quem são os eleitos e os não eleitos. Por que Deus, tendo esse conhe-

cimento, ofereceria a salvação aos que ele não tem intenção de salvar

42. Gary L. Schultz, Jr., “Why a Genuine Universal Gospel Call Requires an Atonement  

That Paid for the Sins of All People,” Evangelical Quarterly  82:2 (20 0): 22.

43. Ibid., 5.

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

certos pontos do calvinismo, mas não a expiação limitada (por mais

inconsistente que isso possa ser).

 A maioria esm agadora dos cristãos através dos séculos, incluindo

todos os pais da igreja  dos primeiros quatro séculos (a saber, antes de

 Agostinho) acreditava na expiação universal. Atanásio, 0  grande pai da

igreja, altamente estimado por todos os cristãos, incluindo os ortodoxos

orientais, católicos romanos e protestantes, insistia de maneira determl·

nada que Cristo, por sua morte, trouxe salvação a todos sem exceção:

 A Palavra percebeu que a corrupção não poderia ser removidasenão através da morte; todavia Ele mesmo, como a Palavra, sendo

imortal e o Filho do Pai, era tal que não podia morrer. Por esta razão,portanto, Ele assumiu um corpo capaz de morte, a fim de que estecorpo, através do pertencimento à Palavra que é acima de todos, possase tornar na morte, uma troca suficiente para todos, e, ele mesmopermanecendo incorruptível através de Sua habitação, pudesse, de-pois disso, por um fim á corrupção para todos os outros também, pelagraça da ressurreição. Foi entregue à morte do corpo que ele haviaassumido, como uma oferta e sacrifício livre de qualquer mácula,que Ele em seguida aboliu a morte para seus irmãos humanos pela

oferta do equivalente. Pois, naturalmente, uma vez que a Palavra deDeus está acima de todos, quando Ele ofereceu Seu próprio templo e instrumento corpóreo como um substituto para a vida de todos, Elecumpriu em morte todo o que era exigido. Também fica claro que,através desta união do Filho de Deus imortal com nossa naturezahumana, todos os homens foram revestidos com incorrupção napromessa de ressurreição. Pois a solidariedade da humanidade é talque, por virtude da habitação do Verbo [Palavra] em um único corpo

humano, a corrupção que acompanha a morte perdeu seu poder sobretodos. Sabemos como isso se dá quando um grande rei entra em umagrande cidade e se hospeda em uma das casas daquela cidade; emrazão de sua presença em uma única casa, toda a cidade é honradae os inimigos e salteadores deixam de molestá-la. O mesmo sucedecom 0 Rei de todos; Ele veio ao nosso mundo e habitou em um corpono meio de muitos, e, como conseqüência, os desígnios do inimigocontra a humanidade foram frustrados e a corrupção da morte, que

anteriormente detinha poder sobre a humanidade, simplesmentedeixou de existir. Pois a raça humana teria perecido completamente

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Sim para a expiação; não para a expiação limitada/redenção particular 

mais altas e mais insistentes ganharam a batalha apesar de não estarem

em posse da verdade. Até hoje muitos reformados e muitos calvinistas

não suportam este ponto do sistema TULIP, o extraem e 0  rejeitam,

ainda que isso os coloque em conflito com 0  restante do que acreditame também com seus companheiros cristãos reformados e calvinistas.

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capítulo 7

Sim para a graça;

Não para a graça irresistível/

monergismo

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 AINDA QUE EU TENHA LHE PROVADO que minha teologia, armi-

nianismo clássico, não  diz que as pessoas salvam a si mesmas através

de suas boas obras ou que contribuam com qualquer coisa meritória

para sua salvação, meu interlocutor calvinista não estava convencido.

“Sua teologia”, ele acusou, “ainda é semipelagiana, se não plenamentepelagiana”.

Ligeiramente ofendido pelo fato de considerar 0 pelagianismo e o

semipelagianismo como heresias, eu lhe pedi para que explicasse mais

plenamente. Pensei que ele tivesse a consciência que os arminianos

não  acreditam em obras de retidão e que realmente acreditam que a

salvação é inteiramente da graça e que não possui nenhuma relação

com obras meritórias. Mas sua resposta foi a seguinte: “Pelo fato de

 vocês colocarem o fator decisivo na salvação em sua própria decisão

de livre-arbítrio”.

Na época, anos atrás, eu jamais havia ouvido essa acusação, mas eu

tinha certeza de que nenhum arminiano diz isso. Quando pressiona-

do, meu amigo calvinista disse: “Sabe, se a salvação não for uma obra

inteiramente de Deus e não tiver relação alguma com 0 que fizermos,ela não é inteiramente da graça e não é um dom”. Ao tornar a salvação

dependente da livre aceitação da pessoa da graça de Deus, você trans-

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

pretam “atrair” como “compelir”, mas sem a conotação de força externa

contra a vontade da pessoa. Em outras palavras, Deus verga a vontade da

pessoa eleita de maneira que ela quer vir a Jesus com arrependimento e fé.

Quanto à lógica, o argumento é que pelo fato de as pessoas serem to-talmente depravadas e mortas em pecados e delitos, a menos que Deus

elege a pessoa, essa pessoa jamais responderá à chamada interna do

Espírito Santo. Assim, o Espírito Santo precisa mudar a pessoa inter-

namente de uma maneira eficaz, que é a regeneração. Então a pessoa

nascida de novo deseja vir a Cristo, e, neste caso, a pessoa recebe

arrependimento e fé (conversão) e justificação (perdão e imputação da

 justiça de Cristo). Este processo é cham ado de “graça monergista” ou

simplesmente “monergismo”.

O teólogo reformado Henry Meeter, no livro The Basic Ideas of Calvi- 

nism,  define 0 monergismo desta maneira:

Alguém pode dizer, Deus planejou a salvação e ele a obteve em Cris-  

to. Agora, a escolha de aceitação ou rejeição é somente minha. Em 

certo sentido, isso é verdade. Mas quem é a causa que faz com que

 

0  Cristão aceite a Cristo? “Não há ninguém que entenda, ninguém 

que busque a Deus”. Então Cristo envia 0  Espírito Santo aos nossos 

corações obstinados, nos regenera, coloca a fé e 0  amor de Deus, 

assim como novas ambições e desejos. Isto ele faz com poder irre- 

sistível - não, como os arminianos dizem, se nós 0  deixarmos; nós 

jamais permitiríamos que isso acontecesse de maneira espontânea. 

Nós somente operamos nossa própria salvação porque é Deus quem  

opera em nós... Deste modo, toda a obra de redenção, em sua essên-

 cia, é obra de Deus. Deus, 0  Pai, a planejou. Deus, 0 Filho, a obteve. 

E Deus, 0 Espírito Santo, a aplicou, regenerando0 coração e a vida.

Se Meeter apresentou o arminianismo de maneira correta é debati-

 vel, e eu tenho desafiado descrições semelhantes a esta em meu livro

Teologia Arminiana: Mitos e Realidades.  Contudo, a descrição acima é

uma expressão clara e concisa do monergismo universalmente mantidoe defendido entre os calvinistas.

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1. Meeter, The Basic Ideas of Calvinism. 45.

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Contra o Calvinismo

 A questão é que, para o calvinista, qualquer contribuição que a pessoa

humana fizer à sua salvação é, na verdade, embora imperceptível, uma

obra de Deus nele ou nela. Meeter parcialmente cita Filipenses 2.12, que

diz: "De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não

só na minha presença, mas muito mais agora em minha ausência - assim

também operai a vossa salvação com temor e tremor”. O versículo 13, que

Meeter omite (possivelmente por engano), diz: “ Por que Deus é 0 que opera

em vós tanto o querer como 0 efetuar, segundo a sua boa vontade”. Para

ele e todos os calvinistas que encontrei, 0 que Paulo quer dizer é isto: “Se

 você estiver operando a sua salvação com temor e tremor, lembre-se de

que é Deus quem está fazendo tudo isso em e através de você” Somente

desta forma é que se pode atribuir toda a glória para Deus na salvação.

Será que Calvino acreditava na graça monergista? Que ele acreditava

está revelado em suas Institutas da Religião Cristã onde ele faz referência

ao “chamado interior”, ele declarou:

“A própria adm inistração da vocação eficaz ...evidencia ser ela obra 

da graça divina ” Ele continua: “Além disso, também a própria natureza

 e administração da vocação demonstram isto claramente, as quais não 

subsistem só pela pregação da Palavra, mas também da iluminação do 

Espírito... Quando Deus se mostra com a luz de sua Palavra aos que 

não 0 mereciam, nisso exibe evidência mui luminosa de sua graciosa 

bondade. Aqui, pois, já se manifesta a imensa bondade de Deus, mas 

não a todos para salvação, porque aos réprobos espera juízo mais grave, 

porquanto rejeitam o testemunho do amor de Deus [Claro, Ca lvino já 

havia anteriorm ente deixado claro que isto se dá em razão deles serem 

predestinados para tal] . E também Deus, a fim de realçar sua glória,  

subtrai deles a eficiência de seu Espírito. Portanto, esta vocação interior 

é 0 penhor da salvação, 0 qual não pode enganar. O que é pertinente 

essa afirmação de João: “ Daí sabemos que somos seus filhos: que nos 

deu de seu Espírito” [ J0 3.24; também 4. 3]. E para que a carne não 

se glorie de que ao menos lhe respondeu ao chamado e se ofereceu  

espontaneamente, afirma que não havia nenhum ouvido para ouvir, 

nem olhos para ver, senão aqueles  queele  próprio fez. E le os fez, porém, 

não segundo a gratidão de cada um, mas em função de sua eleição 2.

2. CALVINO, João. As Institutas: edição clássica, vol. 3, p. 427.  

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

Na citação anterior Calvino claramente expressa o monergismo ou

a graça irresistível. Deus “ faz” com que os ouvidos do pecador eleito

ouça e que os olhos vejam 0 evangelho e ele “retira” aquela “atuação

eficaz” (graça irresistível) dos não eleitos, os réprobos.Como explicarei posteriormente, a maioria dos calvinistas alegam

que os sinergistas querem ser capazes de se vangloriar, mesmo que

apenas por um pouquinho, dizendo que contribuíram com algo para

sua salvação e/ou estão tão enamorados com 0 livre-arbítrio que não

podem convencer a si mesmos em aceitar o fato de que Deus faz tudo

na salvação e que eles não contribuem com nada. Tal descrição, entre-tanto, não reflete as verdadeiras declarações feitas pelos sinergistas. A

questão é que a maioria dos sinergistas rejeita o monergismo em razão

da implicação necessária afirmada abertamente por Calvino de que ela

exige que Deus retenha ou retire a graça monergística de muitos das

inúmeras pessoas que ele criou à sua imagem e semelhança para a

condenação e sofrimento eterno “para sua glória”.

Este Calvino afirma claramente acerca dos réprobos: “são suscitados

para este fim, ou seja, para que através deles a glória de Deus resplan-

deça”3. A fim de que ninguém entenda mal a fonte de sua reprovação:

“Quando, pois, se diz ou que Deus endurece, ou cumula de misericórdia

a quem quis, com isso são os homens admoestados a não buscar ne-

nhuma outra causa que esteja fora de sua vontade” 4. A única razão pela

qual os cristãos evangélicos não calvinistas se opõem ao monergismo éporque 0 monergismo faz de Deus a causa última, ainda que de forma

indireta, da descrença e condenação dos réprobos. O monergismo fere

seriamente a reputação de Deus.

Lorraine Boettner segue Calvino bem de perto ao atribuir tudo na

salvação a Deus à exclusão de qualquer cooperação humana livre com a

3.. Ibid.. 3. p. 408.

4. Ibid.

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Contra o Calvinismo

graça. Ele em basa esta visão nas doutrinas da depravação total e eleição

incondicional. “Se 0 homem está morto em pecado, então nada menos

que... poder doador de vida do Espírito Santo irá fazer com que faça

aquilo que é espiritualmente bom” 5. Desta forma, a regeneração deve

preceder a conversão: “A regeneração é um dom soberano de Deus gra-

ciosamente concedido àqueles a quem Ele escolheu” 6. Ela envolve uma

mudança essencial de caráter de sorte que a pessoa regenerada quer se

arrepender, acreditar e servir a Deus. Boettner assegura que esta doutrina

da graça irresistível é a única  teologia evangélica porque somente ela

atribui toda a obra da salvação à Deus, portanto, dando a glória apenas

a Deus 7. O autor alega que o arminianismo não é evangélico porque ele

faz com que 0 homem, no final das contas, tenha “o fator de decisão”

e não Deus 8. É por isso que ele e outros calvinistas atacam a teologia

arminiana como “centrada no homem” em vez de “centrada em Deus”.

Entretanto, precisamos imaginar quem é 0 Deus no centro desta

teologia. Boettner admite que Deus poderia salvar a todos, pois a elei-

ção para a salvação é incondicional e a regeneração e a fé são donsunicamente de Deus dados apenas para os eleitos: “Mas por razões

que foram reveladas apenas parcialmente, Ele deixa muitos impeni-

tentes”9. Enquanto os não calvinistas estão dispostos a admitir que

o calvinismo rígido é centrado em Deus, eles tem bons motivos para

se indagar como exatamente fazer distinção entre o Deus que ele se

centra e entre Satanás - exceto no fato de que Satanás quer que todas

as pessoas vão para o inferno e Deus quer que apenas certo número

de pessoas seja condenado ao inferno. Isso pode parecer severo, mas é

5. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  63.

6. Ibid., 64.

7. Ibid., 73 - 74.

8. Ibid., 75.

9. Ibid., 69.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

esta a razão pela qual a maioria dos cristãos não é calvinista. E isso não

é menos severo do que a freqüente acusação feita pelos calvinistas de

que os arminianos (e outros não calvinistas) colocam 0 homem, e não

Deus, no centro de sua teologia, pois estes querem se gloriar e roubar

a merecida glória de Deus.

De maneira irônica e confusa, Boettner prossegue para alegar que 0

monergismo não exige nenhuma violação da livre agência do pecador.

“Esta mudança [isto é, regeneração] não é realizada por meio de qual-

quer compulsão externa, mas através de um novo princípio de vida que

foi criado dentro da alma e que busca pelo único alimento que pode

satisfazê-la [isto é, a Palavra de Deus]”10. Então ele aumenta a confusão

ainda mais ao dizer que “os eleitos são influenciados de tal maneira

pela força divina que sua chegada é um ato da escolha voluntária” 11.

 Alguém pode se indagar qual 0 significado de “escolha voluntária” nes-

te contexto; eu presumo que Boettner esteja se referindo à liberdade

compatibilista de Edwards e de outros calvinistas - liberdade compatível

com o determinismo.Steele e Thomas opinam sobre esta doutrina que eles chamam de

“a chamada eficaz do Espírito”. Explicada de maneira simples, esta

doutrina declara que 0 Espírito Santo jamais falha em trazer à salvação

os pecadores a quem Ele pessoalmente chama para Cristo. Ele inevita-

 velm ente aplica a salvação a todo pecador a quem Ele intenciona salvar

e é Sua intenção salvar todos os eleitos” 12. Assim como Calvino, Boet-

tner e a maioria dos calvinistas, eles fazem uma distinção entre uma

“chamada geral e externa” do evangelho, que é um convite universal

para a salvação a todas as pessoas e uma “chamada especial e interna”

que é enviada apenas aos eleitos e que afeta a regeneração dos eleitos

10. Ibid., 177.

11. Ibid., 178.

12. Steele and Thomas, The Five Points of Calvinism, 48.

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Contra o Calvinismo

antes que estes respondam com arrependimento e fé. Esta chamada

especial é irresistível: “A graça que o Espírito Santo estende aos eleitos

não pode ser frustrada ou recusada, ela jam ais falha em trazer os eleitos

à verdadeira fé em Cristo” '3.Como embasamento bíblico Sttele e Thomas fazem uso de Romanos

8 .30 : “E aos que predestinou a estes também chamou; e aos que chamou

a estes também justificou; e aos que justificou a estes também glorificou”

 A om issão de 8.29  é conveniente ao propósito deles de mostrar Deus

completa e unicamente responsável pela regeneração. O versículo diz:

“Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem

conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja 0 primogênito

entre muitos irmãos”. Aqui a eleição está embasada na presciência de

Deus - algo que os calvinistas rejeitam como erro. Isso sem contar

que 0 versículo 30  nada diz acerca da graça como sendo irresistível.

 Além do mais, Paulo pula a regeneração e vai para a justificação. Este

 verso, em seu contexto e não tratado eisegeticam ente (inserindo signi-

ficados no texto que não estão lá), não corroboram a graça irresistível.O calvinista Palmer concorda totalmente com Calvino, Boettner, Steele

e Thomas acerca da graça irresistível, e pelos mesmos motivos; mas

ele enfatiza mais a resposta ativa à graça que é necessária da parte da

pessoa eleita caso ela deva ser salva. Como já temos visto, assim como

alguns calvinistas, Palmer se deleita no paradoxo. Eis aqui outro caso:

Embora seja verdadeiro que ninguém poderia ser salvo se nãofosse pela graça irresistível de Deus, ninguém pode jamais cair na

armadilha racionalista de dizer que a pessoa não tem nenhum papel

a fazer. Não é possível raciocinar assim uma vez que tudo depende

do Espírito Santo, que a pessoa não precise crer ou que deva sim-

plesmente esperar pelo Espírito Santo para movê-lo e não há nada

que a pessoa possa fazer para ser salva '4.

13. Ibid., 49.

14. Palmer, The Five Points of Calvinism,  66.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

Esta advertência parece calvinista e arminiana ao mesmo tempo;

Palmer aparentemente quer ficar com o bolo intacto e ao mesmo tem-

po quer comer uma fatia dele. Observem especificamente as palavras

finais de sua afirmação onde ele adverte contra acreditar que não hajanada que uma pessoa possa fazer para ser salva. Após isso ele escreve:

Se você assim 0 fizer [acreditar] agradeça a Deus por fazer com que

aja assim” '5. Então, por um lado Deus “faz” com que o eleito creia, e

somos proibidos de sugerir que tal ação seja de qualquer forma um ato

do livre-arbítrio '6. Por outro lado, somos impedidos de sugerir que a

pessoa não precisa, de fato, fazer nada. Estas ideias são difíceis, se não

impossíveis, de serem reconciliadas.

R. C. Sproul também defende a graça irresistível: “Deus, unilateral-

mente e monergisticamente, faz para nós 0 que nós não podemos fazer

para nós mesmos” 17. Ele prefere chamar tal ação de “graça eficaz” a fim

de que ninguém seja levado a entender errado 0 conceito ao pensar que

Deus força alguém a ser salvo contra sua vontade. Antes, Deus graciosa-

mente comunica o dom da fé de maneira que a pessoa quer acreditar: “Afé pelo qual somos salvos [eleitos] é um dom. Quando o apóstolo diz [em

Ef.2.8-9] que não é por nós mesmos, ele não quer dizer que não seja nossa

fé. Novamente, Deus não crê por nós. É nossa fé, mas não se origina de

nós. É dada a nós. O dom não é merecido. É um dom de pura graça” 18.

 Além do mais, “ toda a questão da graça irresistível é que o renascimento

 vivifica a pessoa para a vida espiritual de tal maneira que Jesus agora é

 visto em sua irresistível doçura” '9.

Para Sproul, então, Deus “monergistica e unilateralmente” salva a

15. Ibid.

16. Ibid., 60.

17. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 160.

18. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, p. 88.

19. Ibid., 91.

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Contra o Calvinismo

pessoa eleita ao dar-lhe o dom da fé, que então é a própria fé da pessoa

e Deus regenera a pessoa de m aneira que ela, pela primeira vez, vê Jesus

“em sua doçura irresistível”. Tudo isso sem violar a vontade da pessoa.

 Assim como Boettner, Sproul considera a graça irresistível ou graça eficaz

como uma questão ainda mais essencial e básica da teologia protestante (e,

portanto, evangélica) do que a justificação só pela fé. Afinal de contas, ele

argumenta, se uma pessoa contribui com qualquer coisa para a salvação,

incluindo uma mera permissão para consentir que Deus trabalhe, então a

 justificação não é só pela graça. A questão da graciosidade da salvação é

mais importante, pois ela é mais elementar do que a questão da salvação

só pela fé. “Aqui chegamos ao ponto final entre semipelagianismo e agos-tinianismo, entre arminianismo e calvinismo, entre Roma e a Reforma” 20.

Observem como Sproul está colocando 0 arminianismo, no qual ele

quer dizer qualquer visão protestante que não seja o calvinismo rígido, está

do lado de “Roma” - e com isso quer dizer 0 catolicismo romano - em

contraste com a Reforma. O que ele está dizendo é que o arminianismo

(ou seja, qualquer visão além da sua) não é realmente protestante e, por-

tanto, também não é evangélica. Eu moro no Texas e aqui nós podemos

dizer: “Isso vai dar briga!” Sério, precisamos imaginar qual é o motivo que

leva Sproul a ser tão descaradamente ofensivo com seus companheiros

cristãos protestantes, incluindo todos dentro da tradição wesleyana, todos

os pentecostais, muitos, se não todos os batistas e muitos outros cristãos

evangélicos que, por boas razões, não aceitam seu ponto de vista.

Sproul continua:“Na visão da Reforma, a obra de regeneração é realizada por Deus

e por ele sozinho. O pecador é completamente passivo em receberesta ação. A regeneração é um exemplo da graça operativa. Qualquercooperação que demonstrarmos para com Deus ocorre apenas depois que a obra de regeneração tem sido completada” 21.

20. SPROUL, R. C. O que é teologia reformada? São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 58

2 . Ibid., p. 58-59

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

O único suporte que Sproul apresenta para esta alegação de que esta

seja a “visão reformada” é a dura resposta de Lutero dada a Desidério

Erasmo (1466-1536) intitulada “A Escravidão da Vontade”.  Neste docu-

mento Lutero reconhecidamente expressou essa visão. O fato de ele ter

expressado essa visão faz com que ela seja a “visão reformada”? Difícil-

mente, 0 braço direito de Lutero, Philip Melanchthon (1497 1560  ), era

mais um sinergista, concordando com Erasmo que a salvação envolve

alguma cooperação com a graça de Deus pela pessoa humana ainda que

ele tenha insistido energicamente que não existe mérito nesta coopera-

ção  22. Os anabatistas da reforma, tais como Balthasar Hubmaier (1480

1528  ) e Menno Simons (1496  - 1561) enfatizaram 0 livre-arbítrio em

detrimento da graça monergística. A apresentação de Sproul da visão de

salvação monergista em oposição a todas as outras como sendo visões

católicas romanas é, no melhor dos casos, enganoso e, no pior, hipócrita.

 John Piper pode ser contado entre os que concordam com Calvino,

Boettner, Steele e Thomas, Palmer e Sproul. Mergulhando no paradoxo

 juntam ente com eles, ele escreve: “Deus fará com que os eleitos ouçamo convite e que respondam de maneira apropriada... Mas ele não faz

isso de maneira que diminua nossa responsabilidade de ouvir e crer” 23.

Ele também argumenta que a graça irresistível, aliada à eleição incondi-

cional, formam 0 único motivo razoável para a oração intercessória e a

batalha espiritual. Isso se dá, ele defende, pois não faz sentido orar pela

salvação dos perdidos ou pela derrota de Satanás, a quem ele admite

que é 0 “0 deus deste mundo”, a menos que Deus intervenha poderosa

22. Ver a obra de Melanchthon Commentarius De Anima  ( 540) (Whitefish, MT: Kessinger 

Publishing, 2009) na qual ele identifica três “causas cooperantes [e simultâneas]” 

de justificação: palavra, Espírito e livre-arbítrio. Embora alguns monergistas rígidos 

desejem “resgatar” a reputação de Melanchthon da alegação de que ele adotava uma 

visão sinergista da salvação, a maioria dos eruditos em Melanchthon reconhece sua 

concordância essencial com Erasmo acerca desta questão, ainda que ele sempre tenha 

rejeitado qualquer noção de que a livre aceitação humana da graça seja equivalente a

 um ato de mérito.

23. Piper, The Pleasures of God, 202.

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Contra o Calvinismo

mente para que tais coisas aconteçam. Se as pessoas possuem o livre-

-arbítrio, Piper argumenta, não há motivos para orarmos pela salvação

destas pessoas ou que elas não suportam Satanás em sua “devastação”

do mundo. “Ou desistimos de orar para que Deus converta pecadores

ou desistimos da autodeterminação humana suprema” 24.

Claro, qualquer um pode enxergar a profunda ironia em tais alega-

ções. Em outro lugar desta obra Piper afirmou inequivocamente que

Deus ordena, governa e até causa tudo 0 que acontece 25. Seja lá qual

for o caso, foi quem Deus ordenou. Se ele responder a uma oração -

por exemplo, para a salvação de um ente querido perdido - é porque

ele a preordenou. A oração, na verdade, não muda coisa alguma; ela é

apenas um meio preordenado para um fim preordenado. Piper é um

determinista divino, quer ele goste do rótulo ou não. Então, qual papel

a oração ou a batalha espiritual têm em sua teologia? Certamente a

oração e a batalha espiritual não podem realmente fazer com que algo

aconteça diferente do que Deus, de uma forma ou de outra, já tenha

planejado agir e que necessariamente irá agir.

MAIS DANO A REPUTAÇÃO DE DEUS

Na próxima seção deste capítulo, “Alternativas à Graça Irresistível/

Monergismo”, eu mostrarei que muitas das acusações feitas pelos cal-

 vinistas, tal como a do Sproul contra todas as visões não calvinistas e,

em especial, a visão arminiana, todas estas acusações erram o alvo porcompleto. Nesta seção quero mais uma vez expor as falácias dos argu-

mentos calvinistas para 0 monergismo e demonstrar que 0 monergismo,

24. Ibid., 226.

25. Ver seu sermão (ou postagem no blog) com a data de 7 de setembro de 200 , 

logo após os ataques terroristas em Nova York e Washington, D.C., cujo o título é:  

“Why I do not say, ‘God did not cause the calamity, but he can use it for good.’ ” (www.  

desiringgod.org/ResourceLibrary/TasteAndSee/ByDate/200 / 8 _Why_l_D0_N0t_

 

Say_God_Did_Not_Cause_the_Calamity_but_He_Can_Use_It_for_Good/). Claramente, 

então, ele realmente  diz que Deus causa o pecado e o mal!

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

na verdade, traz danos a reputação de Deus ao necessariamente solapar

a bondade e 0 amor de Deus.

Inicio com refutações às interpretações de passagens bíblicas comu-

mente feitas por calvinistas que supostamente exigem 0 monergismo.

Tais versículos mais importantes se encontram em João 6.44-45  onde

 Jesus diz que ninguém pode vir a Ele a menos que o Pai o “traga” para

Ele. Sproul e outros calvinistas argumentam que o verbo grego aqui tra-

duzido por “atrair” sempre e unicamente significa “compelir” 26. Em uma

dissertação brilhante, mas não publicada, cujo título é The ‘Drawings’ of

God,” (“As Atrações’ de Deus”), 0 pastor e teólogo Steve Witzki prova

conclusivamente que Sproul está errado. Ele faz citações de vários léxicos

gregos dizendo que a palavra grega nem sempre significa “compelir”,

mas que frequentemente significa “trazer, atrair” 27.

Sproul cita uma obra de referência que muitos consideram autorida-

de em assuntos de interpretação do grego neotestamentário — Kittel’s

Theological Dictionary o f the New Testament (Dicionário Teológico do Novo 

Testamento de Kittel) — para corroborar sua definição do termo por todo0 Novo Testamento, incluindo João 6.44 e passagens cognatas. Todavia,

 Witzki cita Kittel como permitindo um a possibilidade mais am pla de

possíveis significados. Em referência a João 6.44  e 12.33, o autor do

artigo de Kittel (Albrecht Oepke) escreve:

Aqui não há o pensam ento de força ou mágica. O termo figurativa- 

mente expressa 0 poder sobrenatural do amor de Deus ou Cristo que 

é estendido a todos... mas sem 0 qual ninguém pode vir... A aparen te 

contradição mostra que tanto a eleição quanto a universalidade da 

graça devem ser levadas a sério; a compulsão não é automática 28.

26. SPROUL. R.C. Eleitos de Deus, Editora Cultura Cristã, 2002, pp. 51-52.

27. Steve Witzki, “The ‘Drawings’ of God” (unpub. paper, 2003), 2 - 3.

28. Ver Theological Dictionary o f the New Testament (Abridged Edition), ed. Gerhard Kittel 

and Gerhard Friedrich; trans., Geoffrey W. Bromiley (Grand Rapids: Eerdmans, 1985),227.

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Contra o Calvinismo

O argumento mais devastador contra 0 exemplo de Sproul como o

termo sempre significando “compelir” é João 12.32. Na passagem em

questão Jesus diz: “quando for levantado da terra, atrairei todos a mim”. O

 verbo grego aqui é 0 mesm o de João 6.44 e 65. Se Sproul estiver correto

e o verbo deva sempre significar “compelir”, então este verso ensina o

universalismo. Na verdade, a palavra  pode significar  simplesmente tra-

zer ou atrair em vez de compelir ou arrastar. A interpretação arminiana

destes versículos em João 6  e 12 é sensata: que ninguém pode vir a

 Jesu s Cristo a menos que a pessoa seja atraída pela graça preveniente

de Deus que chama e capacita, mas que não compele.

Existem versículos que contradizem a graça irresistível? Steve Lemke

compilou muitas passagens que a desaprovam. Por exemplo, Mateus 23

e Lucas 13 descrevem o lamento de Jesus sobre Jerusalém:

“Jerusalém, Jerusalém, você, que mata os profetas e apedreja os 

que lhe são enviados! Quantas vezes eu quis reunir os seus filhos, 

com o a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das suas asas, mas 

vocês não quiseram. Eis que a casa de vocês ficará deserta. Pois eu  

lhes digo que vocês não me verão desde agora, até que digam: ‘Ben-  

dito é 0 que vem em nom e do Senh or” ’(Mateus 23.37-39)

Lemke corretamente observa que se 0 calvinismo estiver correto, “o

lamento de Jesus deveria teria sido sobre a dureza do coração de Deus” 29.

Existem muitas passagens como esta na Bíblia onde Deus, Jesus ou um

profeta denuncia pesarosamente a dureza de coração do povo como se

o povo pudesse agir de maneira contrária. Se a graça irresistível fosse

 verdadeira, claro, Jesu s poderia simplesm ente ter atraído eficazmente

o povo de Jerusalém para Si. Por que ele assim não 0 fez se estava tão

pesaroso acerca de sua rejeição? E por que ele estaria triste acerca da

rejeição se ela, assim como tudo, foi preordenado por Deus?

29. Lemke, "A Biblical and Theological Critique of Irresistible Grace,” in Whosoever Will:  A Biblical-Theological Critique of Five-Point Calvinism,  ed. David L. Allen and Steve W. Lemke (Nashville, TN: Broadman & Holman, 2010), 120.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

 A resposta comum dos calvinistas para estas passagens é que Deus

está triste em relação ã dureza de coração do povo e a rejeição dEle.

Que Deus não faz nada a esse respeito só pode ser porque ele escolhe

não fazer e que ele escolhe não fazer só pode ser em razão de que seumotivo mais forte (definição de livre-arbítrio de Edwards) não quer.

Em suma, ele não quer, mas deseja que poderia. A única pista que os

calvinistas nos dão para explicar o motivo pelo qual Deus não faz 0 que

ele deseja é que isto é para “ sua glória”. Que tipo de Deus é glorificado

por pessoas que 0 rejeitam quando ele escolhe não vencer essa rejeição

quando ele poderia vencer tal rejeição? Além disso, por que Deus ficaria triste ou pesaroso acerca daquilo

que lhe glorifica? Que analogia possível poderia existir para tal em se

tratando de experiência humana? Imagine que um pai possui uma po-

ção do amor que faria com que todos os seus filhos 0 amassem e que

 jamais se rebelassem contra ele. Ele dá a poção à alguns de seus filhos,

mas não a dá a outros e então chora pelo fato de que alguns de seus

filhos 0 rejeitam e não o amam. Quem levaria esse pai a sério? Ou, se 0

levássemos a sério, quem não pensaria que ele é insincero ou um tanto

quanto louco? Lemke conclui a partir da história do lamento de Jesus

sobre Jerusalém:

Se Jesus acreditasse na graça irresistível, tanto na chamada exter- 

nas quanto na interna, seu lamento aparente sobre Jerusalém teria  

sido apenas um ato insincero, um show de dissimulação pelo fato

 dele saber que Deus não iria e que não daria a tais pessoas perdidas 

as condições necessárias para a salvação das m esmas” .30.

Outra passagem bíblica interessante mencionada por Lemke é Mateus

19.24, onde Jesus diz aos discípulos: “E lhes digo ainda: é mais fácil

passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no

Reino de Deus”. Qual é 0 sentido deste versículo à luz da graça irresis

30. Ibid.

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Contra o Calvinismo

tível? Jesus está dizendo que é mais difícil  para Deus  salvar um rico do

que um pobre? Como pode isso? Se todos, sem exceção, apenas entram

no reino de Deus pela obra de Deus apenas sem nenhuma cooperação

exigida da parte da pessoa, então a fala de Jesus não faz sentido algum.

Novamente, o comentário de Lemke é preciso:

Claro, se Jesus fosse calvinista Ele jamais teria sugerido que é 

mais difícil para os ricos serem salvos pela graça irresistível de Deus  

do que os pobres. Suas vontades teriam sido mudadas imediata e 

invencivelm ente no mom ento da cham ada eficaz de Deus. Não seria 

mais difícil para um rico ser salvo pela chamada monergista e irresis- 

tível de Deus do que seria para qualquer outro pecador. Mas o Jesus  

real estava sugerindo que a salvação das pessoas estava, em certa

 

medida, atrelada a sua resposta e compromisso com Sua ch am ad a3 .

Lemke também aponta para as inúmeras chamadas totalmente in-

clusivistas na Bíblia que pedem para que as pessoas venham a Deus e

a Cristo, principalmente as passagens já discutidas sobre 0 “todo” que

expressam o desejo de Deus para que todos sejam salvos e que ninguém

pereça (Mateus 18.14; 1 Timóteo 2;4; 2  Pedro 3.9  e 1 João 2.2). Como já demonstrei, estas passagens não podem ser interpretadas como se

referindo apenas a algumas pessoas.

Mais devastador de tudo, Lemke corretamente enfatiza que “os

calvinistas essencialmente culpam a Deus por aqueles que não vêm [à

salvaçãoj” 32. Afinal de contas, enquanto dizem que os que rejeitam 0

evangelho simplesmente recebem o abandono merecido quando são

condenados, “há muito mais nesta questão do que meramente isso.

Os calvinistas dizem que Deus elegeu alguns para a glória por motivos

pessoais próprios desde que o mundo começou, e que Ele concedeu

graça irresistível através de Seu Espírito de maneira que estes inevitável-

mente serão salvos” 33. Essa é a questão principal contra esta doutrina

31. Ibid., 121.

32. Ibid., 122.

33. Ibid., 122 - 23.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

do calvinismo (assim como é o ponto principal contra todas as doutrinas

calvinistas!). Tal entendimento retrata Deus como uma pessoa que faz

acepção de pessoas porque ele escolhe salvar alguns irresistivelmente e

escolhe que outros não recebam este dom crucial, que como resultadodisso, fará com que sejam condenados para sempre. O fato de merece-

rem a condenação não é a questão. A questão é que todos  merecem a

condenação, mas Deus é seletivo de forma a salvar alguns de maneira

irresistível e abandona outros para que sofram no inferno uma separação

eterna de Deus. Os calvinistas não apresentam nenhum motivo para isso

além do “para o Seu beneplácito” e/ou “para a glória Deus”

Todavia, todos os calvinistas alegam que Deus é bom e amável. Que

bondade e que amor é esses? Na verdade, para dizer sem rodeios, o

calvinismo necessariamente implica, quer qualquer calvinista diga ou

não, que Deus exige uma melhor qualidade de amor de nossa parte

do que o amor que ele mesmo exerce! Em Lucas 6.35  e em passagens

paralelas, Jesus pede para que amemos nossos inimigos; não há uma

única sugestão de qualquer exceção. Mas, de acordo com o calvinismo,Deus não faz isso. Claro, alguns calvinistas insistem que Deus realmente 

ama até mesmo seus inimigos réprobos. Mas não há nenhuma analogia

para este tipo  de amor na experiência humana. Seria um amor na qual

a pessoa poderia resgatar alguns de mortes terríveis, mas que escolhe

não salvá-las a fim de mostrar quão grande ele é. Há alguma analogia

para esta “bondade” e “amor” na experiência humana? Se não, então eu

sugiro, com Paul Hem, que este amor e esta bondade são insignificantes.

 Walls e Dongell oferecem um a analogia para testar se qualquer ser

humano poderia ser considerado amável ou bom caso ele agisse con-

forme o calvinismo diz que Deus age ao conceder a graça irresistível

apenas a algumas de suas criaturas humanas caídas. (Lembre-se, ele

criou tudo a sua imagem e semelhança). Na ilustração desses autores,

um médico descobre uma cura para uma doença mortal que está dizi-

mando um grupo de crianças de um acampamento e dá a cura ao diretor

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Contra o Calvinismo

do acampamento. O diretor aplica a cura em algumas das crianças de

maneira que elas são curadas e nega a cura para as outras crianças de

sorte que elas morrem de maneira terrível. Ele não está com 0 remédio

em falta; não há nada que impeça 0 diretor de curar todas as crianças.

 Ainda que algumas crianças tenham resistido à cura, 0 diretor tinha a

habilidade de persuadir a todas elas para que tomassem o remédio; ele

só persuadiu algumas das crianças. Quando os pais confrontarem 0 di-

retor, ele defende apaixonadamente que ele amava a todas as crianças

- até mesmo as que morreram. Ele cuidou delas quando elas estavam

doentes e as deixou da maneira mais confortável possível 34. Walls e

Dongell corretamente concluem:

 A alegação do diretor de amar todas as crianças é, no seu melhor, vazia e, no seu pior, enganadora. Se 0 amor não emprega todos osmeios disponíveis para resgatar alguém da sua perda definitiva, é di-fícil ouvir que tal seja amor de alguma forma. Em nosso julgamento,torna-se sem sentido alegar que Deus quer salvar a todos ao passo queinsistimos que Deus se abstém de tornar a salvar possível a todos. O

que devemos fazer com um Deus que pede para que façamos aquiloque ele mesmo não faz? 35

 A questão pura e simples é que a doutrina da graça irresistível, sem a 

salvação universal que a maioria dos calvinistas rejeita,  leva à “conseqüência

lógica e necessária” de que Deus não é bom e que não é amável. Agora,

claro, nenhum calvinista admitiria isso! Mas o ensinamento deles de-

 veria levar um a pessoa pensante a esta conclusão. E 0 que eles dizemé inconsistente e, portanto, altamente problemático, se não completa-

mente incoerente. Quando escuto ou leio um calvinista rígido dizendo

que Deus ama a todos e que é um Deus bom, eu não tenho a mínima

ideia do que isso significa.

34. Walls and Dongell, Why I Am Not a Calvinist, 54 - 55.

35. Ibid., 55.

260

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

Outro problema com a graça irresistível é que os relacionamentos

pessoais exigem mutualidade. O filósofo-teólogo holandês Vincent

Brümmer demosntrou isso conclusivamente em seu ensaio Speaking  

of a Personal God. (Falando de um Deus Pessoal),  onde ele apresenta um

argumento passo-a-passo que a mutualidade, no sentido de resposta

livre que é resistível, é parte de qualquer relacionamento pessoal. Sem

liberdade da vontade, que inclui a habilidade de resistir, os atos de uma

pessoa não são realmente “atos” de jeito algum, mas “eventos36 . Por״

definição, a realização de um relacionamento pessoal exige atos livres

de ambas as partes em relação de uma para com a outra:

Para a realização de um

relacionamento pessoal  a iniciativa de ambas

 

as partes no relacionamento é necessária. Dado que ambas as partes  

em tal relacionamento são pessoas, ambas possuem, por definição, a  

liberdade da vontade, na qual deve ser factualmente possível  para ambas 

as partes dizer “não” para a outra e assim impedir 0 relacionamento de 

entrar em existência. Apenas pelos meios do “s im ” de uma parte que a 

outra recebe a liberdade de habilidade para realizar o relacionamento. 

Neste aspecto, os relacionamentos pessoais são simétricos e diferem  

dos relacionamentos puramente causais, que são assimétricos, pois

 apenas uma parte (a causa) possa ser 0 iniciador. A outra parte em um 

relacionamento puramente causai é um objeto de manipulação causai  

e, portanto, carece de liberdade da vontade para ser capaz de dizer 

“ nã o” no que diz respeito ao que lhe acontece” 37.

Brümmer argumenta adiante que em nosso relacionamento com

Deus, Deus pode ser 0 iniciador e deve ser em virtude de nossa carência

de “liberdade de habilidade” devido a nossa pecaminosidade. Todavia,

“um relacionamento pessoal com Deus supõe que a parte humana

também permanece uma pessoa no relacionamento e que sua livre es-

colha é igualmente uma condição necessária para que o relacionamento

aconteça” 38. Por fim, Brümmer nega a ideia de graça irresistível ao dizer

36. Vincent Brümmer, Speaking o f a Personal God  (Cambridge, UK: Cambridge University  

Press, 1992), 75.37. Ibid.

38. Ibid.

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Contra 0 Calvinismo

que mesmo Deus não pode realizar nossa escolha sem fazer com que

ela deixe de ser nossa. Por definição, um relacionamento  pessoal   com

Deus não pode ser factualmente [realistamente] inevitável para parte

humana. Por esta razão a doutrina da irresistibilidade factual [real] exclui

um relacionamento pessoal entre Deus e as pessoas humanas 39.

Não é preciso ser filósofo para estabelecer estes fatos; eles são do sen-

so comum. Mas ajuda ter um filósofo que sustente tais fatos. E em nada

ajudará o fato de os calvinistas reclamarem com os críticos pelo fato de

apelarem à filosofia; eles são bons em usar a filosofia quando ela corrobora

seus argumentos 40. O senso comum apenas dita que um relacionamento

 verdadeiramente pessoal sempre envolve o livre-arbítrio; na medida em

que uma parte controla a outra de tal forma que a outra não tem uma

escolha real de estar ou não no relacionamento, não é um relacionamento

real. Não faz diferença se ambas as partes queiram  estar no relaciona-

mento. Imagine uma amizade onde uma pessoa manipula a outra para

que a outra seja sua amiga. Talvez a pessoa tenha dado dinheiro ou até

mesmo tenha drogado a outra pessoa para torná-la amigável. Qualquerobservador imparcial de tal “amizade” diria que ela não é uma amizade

legítima - pelo menos não é uma amizade saudável. O consentimento

mútuo e informado é um pré-requisito para qualquer bom relacionamento.

Mas Brümmer não abandona a questão neste ponto. Ele concentra

sua crítica bem na própria noção de salvação do calvinismo rígido.

Referindo-se ao calvinismo rígido com a metonímia de “Dordt” (fazendo

referência ao Sínodo de Dort), ele diz:

39. Ibid., 75 - 76.

40. Qualquer um que duvidar disso jamais estudou a teologia de Jonathan Edwards,  que viu no empirismo de Locke um aliado para estabelecer a soberania de Deus e 

a ausência de livre-arbítrio libertário. Um dos intérpretes mais célebres de Edwards 

diz: “ o tratamento de Locke das faculdades humanas e sua teoria da ‘ideia simples’ 

tornaram-se úteis para Edwards em uma descrição das dinâmicas internas do ato da 

fé”. Ver Conrad Cherry, T he Theology of Jonathan Edwards: A Reappraisal   (Bloomington, IN: Indiana Univ. Press, 1966), 15.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

Me surpreende que as dificuldades aqui tenham sua fonte no fato 

de que os teólogos de Dort não viram a salvação hu mana em termos 

de um relacionamento   pessoal com Deus, mas em termos de uma 

condição  renascida em nós. A única questão então diz respeito àcausa  

desta condição: é Deus ou nós, graça ou livre-arbítrio? 4 .

Mas quando a salvação é considerada não como uma condição me-

ramente causai, mas também e ainda mais uma relação pessoal, como

a maioria dos evangélicos de fato a consideram, a ideia que a salvação

pode ser fundada tanto  na graça quanto  na vontade humana (com a

graça tendo superioridade) é convincente.

Irei encorpar esta descrição e crítica da doutrina calvinista da graça

irresistível, monergismo, com uma citação apropriada de Vernon Groun-

ds, um teólogo evangélico que concorda completamente com Brümmer:

“Deus lida pessoalmente com seres pessoais... a graça que não  

deixa opção algum a não é graça, é outra coisa. Devemos dizer: ‘Pela

força fomos salvos e não de nós mesmos’”42.

ALTERNATIVAS À GRAÇA IRRESISTÍVEL/MONERGISMO

 Agora abordarei algumas das objeções ao “sinergism o evangélico”

feita por calvinistas. Por “sinergismo evangélico” eu me refiro, em termos

próximos, à teologia arminiana, embora muitos que mantém esta visão

de salvação não  desejam ser chamados de arminianos. Respeito essa

opção ao passo que respeitosamente peço para que estes considerem

que 0 rótulo pode ser mais apropriado do que pensam .

Há séculos que os teólogos calvinistas, pela mera repetiçãoedetur-

pação, criaram uma situação onde o termo “arminiano” é amplamente

 visto como a designação de um a heresia. Demonstrei conclusivamente

41. Brümmer, Speaking o f a Personal Cod,  75, 76 - 77.

42. Grounds, “God’s Universal Salvific Grace,” 28.

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Contra o Calvinismo

em meu livro Teologia Arminiana - Mitos e Realidades que 0 arminianismo

não  é o que eles dizem. Por exemplo, contrário ao que Sproul e outros

críticos calvinistas mal informados ou insinceros, o arminianismo não

é semipelagiano. Semipelagianismo é a heresia que diz que a iniciativa

na salvação é nossa, da parte pessoa humana, e não de Deus 43. O ar-

minianismo sempre insistiu que a iniciativa na salvação é de Deus, ela

se chama “graça preveniente” e é capacitadora, mas resistível. Seria um

choque para muitos calvinistas saber 0 quanto da salvação e o quanto

da vida cristã tanto Armínio quanto Wesley atribuíram à graça - exata- 

mente tudo.

Mas a teologia arminiana supõe, pelo fato de a Bíblia em sua totalidade

supor, que Deus, em razão do amor, se limita de maneira que sua graça

iniciadora e capacitadora seja resistível. Ela é poderosa e persuasiva, mas

não é compulsiva no sentido determinista. Ela deixa 0 pecador como

uma pessoa e não um objeto. O teólogo batista Robert E. Picirilli diz:

O que Arm ínio quis dizer com “graça preven iente ” é que é aquela 

graça que precede a real regeneração e que, exceto quando resistida

 em último estágio, inevitavelmente conduz à regeneração. Ele foi 

rápido em observar que esta “assistência do Espírito Santo” é de tal  

suficiência a ponto de se manter o mais distante possível do Pela- 

gianismo” 44.

Outro teólogo batista, Stanley J. Grenz, foi um arminiano sem rotular-

-se a si mesmo como tal. Em sua teologia sistemática, Theology fo r the 

Community of God (Teologia para a Comunidade de Deus),  ele descreve a

graça preveniente de três formas: iluminadora, convencedora e como

convidativa e capacitadora45. Ele deixa claro que ela é sempre resistível

43. Ver Rebecca Harden Weaver, Divine Grace and Human Agency: A Study of the Semi- Pelagian Controversy  (Macon, GA: Mercer Univ. Press, 1996), 110 - 11.

44. Picirilli, Grace, Faith, Free Will.  153.

45. Stanley J. Grenz, Theology for the Community of God   (Grand Rapids: Eerdmans, 2000).

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

porque ela é voltada para pessoas e não máquinas, por meio do ouvir a

Palavra de Deus. A questáo aqui é simplesmente esta: a teologia armi-

niana (e muitas outras teologias não calvinistas que não são rotuladas

assim )46colocam a iniciativa na salvação e toda a obra de salvação ime-diatamente do lado divino da equação. A graça de Deus é a causa eficaz

da salvação, mas a fé da pessoa humana em resposta à graça preveniente

é a causa instrumental da salvação. O que é esta fé? É simplesmente a

confiança em Deus; não é uma “boa obra” ou qualquer coisa meritória

da qual 0 pecador pode se gabar.

Mas e quanto aos ataques dos calvinistas contra a teologia arminiana

como uma forma de autosalvação e obras de retidão análogas a (eles

diriam) teologia católica romana? Calvinistas eruditos não dizem que os

arminianos acreditam que eles precisam trabalhar para sua salvação;

eles dizem que 0 arminianismo e outros não calvinistas tornam a decisão

humana da fé no “fator decisivo” na salvação e, portanto, trazem de

 volta, ainda que sem intenção, a salvação por boas obras.

Para os arminianos, entretanto, esta acusação é ridícula. Imagineum aluno que esteja passando fome e prestes a ser despejado de seu

dormitório por falta de dinheiro. Um professor bondoso dá a esse aluno

um cheque de R$ 1.000,00 - 0 suficiente para que ele pague seu aluguel

e coloque uma boa quantidade de comida em sua dispensa. Imagine,

pensando mais além, que o aluno que foi resgatado leve o cheque até

0 banco, assine e deposite 0 cheque em sua conta (o que faz com que

seu extrato fique com R$ 1.000,00  positivos). Imagine também que

0 aluno então começa a andar pelo campus se gabando de que ele

mereceu receber a quantia de R$ 1.000,00. Qual seria a resposta das

pessoas caso soubessem a verdade acerca da situação? Eles acusariam

0 aluno de ser miserável e ingrato. Mas suponha que o aluno diga: “Mas

46. Por exemplo, anabatistas, tais como os menonitas, não se intitulam arminianos, 

mas sua soteriologia também é sinergista. Quando utilizo os termos “arminiano” e 

“sinergismo evangélico”, eu tenho por intenção a inclusão destes.

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Contra o Calvinismo

0 fato de eu endossar o cheque e 0 depositar em minha conta é 0 fator

decisivo para que eu conseguisse o dinheiro, então eu fiz uma boa obra

que mereceu, ao menos, parte do dinheiro, não mereci?” Ele seria ridi-

cularizado e possivelmente ainda seria ignorado pelos demais por seruma pessoa insensata.

Em qual situação na experiência humana que o simples ato de aceitar 

um presente é o “fator decisivo” para recebê-lo? Isso é um  fator, sim -

mas dificilmente é 0 fator decisivo. A mera aceitação de um presente não

dá 0 direito ao presenteado de se gabar. Ah, mas o calvinista dirá que

ao aluno da ilustração acima  poderia  se gabar caso o professor tivesse

oferecido um presente de dinheiro semelhante ao dele a outros alunos

que estejam passando fome e estes alunos tenham rejeitado 0 presente.

Ele poderia se orgulhar que, de alguma forma, ele é melhor que os outros

alunos. Duvido. Ele pode tentar, mas quem acreditará nele? As pessoas

lhe dirão: “Pare de querer ganhar crédito por ter sido resgatado! O fato

de os outros não terem aceitado 0 dinheiro e terem sido despejados e

estarem mendigando por comida nas ruas não diz nada em relação à você. Dê todo 0 crédito a quem ele pertence - ao professor bondoso”.

Quem pode argumentar com isso?

Por que os arminianos e outros não calvinistas rejeitam a graça ir-

resistível? Porque eles amam o livre-arbítrio e não querem dar toda a

glória a Deus, com o sugerem alguns calvinistas? De jeito nenhum. Essa

é uma calúnia indigna de qualquer um que tenha se dado 0 trabalho de

estudar 0 assunto. Todo arminiano, de Armínio até hoje, sempre deixou

claro 0 verdadeiro motivo por trás da rejeição à doutrina da graça irre-

sistível: a preservação do caráter bondoso e amoroso de Deus. Claro, se 

uma pessoa pudesse ser universalista, náo haveria obstáculo necessário

para a graça irresistível exceto possivelmente a questão levantada acima

acerca da natureza dos relacionamentos pessoais. Todavia, se  a única

forma possível na qual as pessoas possam ser salvas é que Deus as

 vença e as arraste para aceitar sua misericórdia, eu náo teria nenhuma

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

objeção essencial em acreditar nela conquanto que Deus agisse assim para 

com todo mundo.  Felizmente, existe outra forma: a graça preveniente. E

uma vez que não posso acreditar na salvação universal, essa é a única

alternativa ao monergismo que preserva o caráter de amor perfeito deDeus, revelado em Jesus Cristo.

Outra objeção calvinista comum ao sinergismo evangélico / arminia-

nismo é que ele não leva a depravação total a sério o bastante. Afinal

de contas, os calvinistas afirmam, humanos caídos são literalmente

mortos em delitos e pecados. A única esperança desses caídos é que

Deus os ressuscite. Isso é verdade, mas esse ato de Deus, a ressurreição

dos caídos, não os deixa sem opção de aceitá-lo ou não. Na verdade, os

arminianos e outros sinergistas realmente  acreditam que a graça preve-

niente restaura vida à pessoa morta em delitos e pecados. Todavia, ela

não os força a aceitarem a misericórdia de Deus para a salvação, que

exige arrependimento e fé (conversão).

 Assim, na teologia arminiana, um a regeneração parcial realmente

precede a conversão, mas ela não é uma regeneração completa. É umdespertamento e uma capacitação, mas não uma força irresistível. É

assim que sinergistas evangélicos interpretam as “atrações” do evan-

gelho de João, incluindo as palavras de Jesus acerca de atrair todas as

pessoas para si quando fosse levantado da terra. Na verdade, apenas 

estas interpretações destas atrações mantêm-nas juntas significando a

mesma coisa - 0 poderoso poder de atração e persuasão de Deus quena realidade partilha livre-arbítrio para ser salvo ou não. Ser salvo não é

uma questão de fazer uma obra; é apenas uma questão de não resistência. 

Quando uma pessoa decide permitir que a graça de Deus a salve, ela se

arrepende e confia apenas e completamente em Cristo. Esse é um ato

passivo; poderia ser comparado a uma pessoa se afogando que decide

relaxar e permitir que 0 salva-vidas a salve do afogamento.

É assim que os arminianos/sinergistas evangélicos entendem Filipen-

ses 2.12-13  citado anteriormente. O apóstolo Paulo, sob a inspiração

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Contra o Calvinismo

do Espírito Santo, diz a seus leitores cristãos para que se lembrem de

“operar” sua salvação “com temor e tremor”. Os críticos pensam que os

arminianos e os sinergistas evangélicos geralmente param aqui e que

ignoram 0 verso seguinte. Mas eles não fazem isso. Eles percebem e

ensinam que se   as pessoas estiverem operando sua salvação, do início

ao fim, é apenas porque “Deus está trabalhando” nelas. Esta é a graça

preveniente e auxiliadora: preveniente que leva à conversão e auxiliadora

por toda a vida cristã. Mas não faria sentido algum para Paulo exortar

seus leitores para que operassem sua salvação com temor e tremor se

Deus estivesse fazendo tudo e eles sequer tivessem de cooperar permi-

tindo que a graça de Deus trabalhasse neles.Peço a tolerância do leitor no momento em que chego á conclusão

deste capítulo para apresentar duas ilustrações bem despretensiosas do

sinergismo evangélico que eu acredito que façam mais justiça ao texto

bíblico e a experiência cristã e ao caráter de Deus  do que as imagens e

analogias calvinistas. Primeiro, imagine um poço fundo com lados ín-

grem es e escorregadios. Várias pessoas estão deitadas débeis e feridas,

completamente impotentes, no fundo do poço.

• Semipelagianismo diz que Deus se aproxima e que joga uma corda

para 0 fundo do poço e espera que a pessoa comece a puxar a

corda. Quando a pessoa assim 0 faz, Deus responde gritando:

“Segure bem firme na corda e a amarre em seu corpo. Juntos,

nós te tiraremos daí”. O problema é que a pessoa está demasiada

machucada para fazer isso, a corda é fraca demais e Deus é bom

demais para esperar que a pessoa inicie o processo.

•  Monergismo  diz que Deus se aproxima, lança a corda para dentro

do poço e que desce até o fundo do poço, enrola a corda em al- 

 gumas   das pessoas e então sai do poço e puxa aquelas pessoas

para a segurança sem qualquer cooperação. O problema aqui é

que o Deus de Jesus Cristo é bom e amável demais para resgatar

apenas algumas das pessoas impotentes.

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Sim para a graça; não para a graça irresistível/ monergismo

• Sinergismo Evangélico diz que Deus se aproxima, lança uma corda

e grita: “Segurem na corda e puxem e juntos nós iremos tirar

 vocês daí”. Ninguém se mexe. Eles estão severamente feridos. Na

 verdade, para todos os propósitos práticos, eles estão “mortos” ,pois estão completamente incapazes. Então Deus derrama água

no poço e grita: “Relaxem e deixem que a água os faça boiar até

que saiam do poço!” Em outras palavras: “Boiem!”. Tudo que a

pessoa no poço precisa fazer para ser resgatada é deixar que a

água 0 faça subir e sair do poço. A ação exige uma decisão, mas

não um esforço. A água, claro, é a graça preveniente 47.

Segundo, aqui temos uma ilustração da graça e “operação da vossa sal-

 vação” por toda a vida cristã. Durante os verões quentes eu preciso regar

minhas plantas com frequência. Então vou até a torneira externa onde

a mangueira está acoplada, abro toda a torneira e então vou até a outra

extremidade da mangueira e arrasto a mangueira pela lateral da casa para

regar um arbusto. Invariavelmente, quando chego no arbusto e pressiono 0cabo da mangueira que está acoplado à ponta da mangueira, não sai nada.

 Volto até a torneira e descubro que não há nada de errado lá. A pressão da

água é forte; a água está fluindo na mangueira com toda a força. Ah, eu

me dou conta, há um nó na mangueira. Então eu encontro 0 nó que está

impedindo a água que está dentro da mangueira de fluir e de funcionar.

Nesta ilustração a água representa a graça auxiliadora de Deus; ela

sempre é “força total” na vida cristã. Não há “doses de reforço de gra-

ça”. A graça é plena e livre a partir da conversão e regeneração para a

 vida de santificação. Mas se eu não estou experim entando o fluxo da

graça de Deus em confiança e poder para 0 serviço, isso não se dá pela

ausência da graça; mas devido a nós na mangueira da minha vida. O

47. Outro aspecto desta ilustração que eu acho útil é que a água que visa à salvação das 

pessoas incapazes dentro do poço também se torna um meio de destruição, caso as 

pessoas queiram resistir a ela - uma imagem da ira de Deus?

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Contra o Calvinismo

que são nós? Atitudes, pecados que nos assediam, ausência de oração.

Tudo o que preciso fazer é decidir remover estes nós e a graça que já

está lá terá seu fluxo restabelecido.

Esta é uma ilustração imperfeita de Filipenses 2. 12-13  a partir de

uma perspectiva sinergista evangélica. A única alteração necessária para

fazer com que a ilustração realmente “funcione” é que mesmo minha

habilidade de remover estes “nós” é um dom de Deus. Mas eu preciso

fazer algo - não uma obra boa e meritória da qual eu possa me gabar,

mas simplesmente admitir minha incapacidade e total dependência da

graça de Deus e pedir a Deus para que me dê a habilidade e o desejo

de remover os nós.

 A melhor exposição desta soteriologia sinergista evangélica/ arminia-

na em língua moderna é 0 livro Transforming Power of Grace (O poder 

transformador da graça)  de Thomas Oden. De acordo com a opinião

geral, o ortodoxo e biblicamente sério teólogo Oden, de maneira encan-

tadora e bíblica articula a teologia brevemente esboçada acima, que eu

chamo de sinergismo evangélico 48. Da graça Oden diz: “Deus preparaa vontade e coopera com a vontade preparada. Na medida em que a

graça precede e prepara 0 livre-arbítrio, ela se chama preveniente. Na

medida em que a graça acompanha e capacita a vontade humana para

operar com a vontade divina, ela se chama graça cooperante” 49. “Ape-

nas quando os pecadores são auxiliados pela graça preveniente é que

eles podem começar a ceder seus corações para a cooperação com as

formas subsequentes de graça”. “A necessidade da graça ser preveniente

é grande, pois é precisamente quando ‘estando vós mortos em ofensas

e pecados’ (Ef. 2.1) que ‘pela graça sois salvos’ (Ef.2.8)” 50.

48. Quero deixar claro que minhas ilustrações simples não foram extraídas de Oden e 

que não sei 0  que ele pensaria acerca delas. A culpa pelas imperfeições da ilustração  

não deve ser atribuída a ele.

49. Oden, The Transforming Power of Grace,  47. 50. Ibid.

50. Ibid.

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conclusão

Os enigmas do 

Calvinismo

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 A LÓGICA É IMPORTANTE. A maioria dos calvinistas concorda. Sproul,

por exemplo, insiste que a teologia não deve possuir quaisquer contra-

dições. Mistérios - sim; contradições - não. Mais uma vez, um mistério

é algo além de nossa completa compreensão - como a trindade, por

exemplo. Uma contradição é algo impossível - um solteiro casado, umquadrado redondo, dois mais três é igual a quatro. Poucos calvinistas

querem adotar contradições. Qualquer um que adotar ou expressar uma

contradição está adentrando no absurdo. O que é um paradoxo? É uma

aparente contradição e, portanto, sempre uma tarefa que exige reflexão

mais aprofundada.

Mas eu gostaria de sugerir que há uma categoria entre o mistério e

a contradição ou entre 0 mistério e 0 paradoxo enigma. Um enigma

é um quebra-cabeça mental - algo que estremece a mente. Pode ser

uma contradição, mas é difícil de saber. Pode ser um sinal de mistério,

mas beira à insensatez. Em todos os lugares e para todo mundo, um

enigma é um sinal de algo errado, algo a ser examinado e refletido e,

esperançosamente, resolvido.

Um exemplo extraído da ciência é a luz. Ela manifesta tanto aspec-tos de partículas quanto de ondas. Como ela pode ser as duas coisas

até mesmo os melhores físicos não estão certos. Ela parece ser as

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Contra o Calvinismo

duas coisas, mas não há nenhuma forma conhecida de que ela possa

ser ambas as coisas. Assim sendo, a ciência continua a trabalhar na

resolução do problema. Simplesmente sentar e dizer: “Bem, isso não

é maravilhoso; a luz é um mistério, portanto, vamos deixar as coisascomo estão e vamos prosseguir” não satisfaria a ninguém com uma

mente sensata. Mentes investigadoras querem saber como um enigma

pode ser resolvido.

 Acredito que 0 calvinismo tenha muitíssimos en igmas e enigmas

profundos que não possuem soluções aparentes. Eles chegam, às vezes,

até mesmo a parecer contradições, embora não sejam contradições ló-

gicas, formais. O enigma mais óbvio e mencionado com frequência, até

mesmo por calvinistas, é a combinação de soberania absoluta divina e

a responsabilidade humana. Como já visto, até mesmo John Piper, um

erudito detentor de um doutorado em estudos do Novô Testamento de

uma das maiores universidades europeias, admite que ele não compre-

ende essa questão. Ele simplesmente aceita 0 enigma por pensar que

a Escritura 0 exige.

 A maioria dos calvinistas admite que isso seja um problema, um

enigma, pois como as pessoas podem ser ordenadas a pecar e o pecado

delas é tornado certo por Deus de tal maneira que elas não possam fazer

o contrário (ex. Adão) e, ainda assim, as pessoas sejam responsáveis pelo

pecado no sentido de culpa? Sob nenhuma circunstância em situações

humanas uma pessoa seria tida por responsável e seria punida por algoque ela não poderia evitar fazer. Entretanto, isso é o que o calvinismo

diz acerca de Deus e dos pecadores. Isto é, de fato, um enigma. Alguns

o chamam de “antinomia” , que é simplesmente mais uma palavra para

enigma. Não há nada estritamente ilógico no sentido formal acerca da

combinação de determinismo e responsabilidade, mas ele vai contra 0

caráter de toda experiência e pensamento humano.

Para muitos de nós este enigma está por demais repleto com ten-

são para que seja aceito. Ele precisa ser resolvido ao ser modificado e,

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Os enigmas do Calvinismo

felizmente, a Escritura permite isso Como? A preordenação de Deus

das decisões e ações das pessoas não é nada mais que sua decisão de

permiti-las. E ele as permite pela autolimitação, não “permissão dese-

 josa, específica” que as tornam certas. Os que pecam são responsáveise devem prestar contas porque eles poderiam ter agido de maneira

diferente com 0 livre-arbítrio que Deus lhes deu.

Outro enigma do calvinismo que está cheio de tensão: se 0 determi-

nismo divino for verdadeiro, nada é, de fato, mau. Pense a respeito. Se

0 Deus todo poderoso e bom desejou, de maneira específica, e tornou

certo cada evento da história, como algo pode ser realmente mau? Essenão deve ser o melhor de todos os mundos possíveis? Por que Deus

preordenaria e tornaria certo qualquer coisa que não fosse o melhor

de todos os mundos possíveis? E como qualquer coisa, no melhor dos

mundos possíveis, pode ser, de fato, ontologicamente (em oposição à

simplesmente nossa percepção) mau? Se eu fosse calvinista (no sentido

determinista divino e forte) eu teria dificuldade em ficar bravo ou afetado

em relação à qualquer coisa, pois eu tentaria ver tudo como a vontade

de Deus - planejada e intencionada por Deus por uma boa razão, ainda

que esta razão seja simplesmente “a maior glória de Deus”. Até mesmo

o próprio inferno deve ser bom, pois ele manifesta a justiça de Deus e,

consequentemente, glorifica a Deus. Então por que pensar que o inferno

é um lugar ruim? De mesma sorte, o abuso infantil, assassinato, estupro,

genocídio - todos desejados e tornados certos por Deus. Então por quepensar que tais coisas são ruins?

1. Em The Pleasures of Cod   John Piper critica o teólogo Clark Pinnock por adotar o 

teísmo aberto em razão da “lógica exigida e pelo fato de a Bíblia o permitir”. Mas 

considero a crítica como inválida. Todo cristão, até mesmo John Piper, acredita em 

certas coisas pelo fato de a razão exigi-las e a Bíblia as permitir. Talvez ele não esteja 

cônscio disto, mas me parece claro que ele acredita na expiação limitada da mesma 

forma que Pinnock acredita no teísmo aberto. Afinal de contas, em nenhum lugar a 

Bíblia explicitamente diz ou exige a crença de que Jesus tenha morrido apenas pelos 

eleitos; a expiação limitada é uma inferência feita a partir de algumas passagens 

bíblicas [do evangelho] de João. Por que as pessoas, tais como o Piper, gostam da 

expiação limitada? Penso que seja em razão da lógica que acróstico TU LIP exige.

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Contra o Calvinismo

 Aqui é onde os calvinistas respondem ao apelar para as duas vontades

de Deus - a decretiva e a preceptiva. Deus decreta tudo o que vem a

acontecer e, portanto, ela é, em certo sentido, para uma maior glória de

Deus. Mas ele também ordena que não façamos certas coisas e, portan-to, fazê-las, é mau. O resultado, claro, é que quando uma pessoa mata

outra, a pessoa está fazendo tanto algo mau quanto algo bom. Qual é

a realidade mais elevada? Bem, obviamente, o beneplácito de Deus é

a lente mais ampla pela qual o acontecimento deve ser visto. Portanto,

0 acontecimento não é totalmente mau, é? Então alguns calvinistas

responderão dizendo que 0 mal em um ato como assassinato jaz na

disposição, intenção e motivo do assassino e não no próprio ato em si.

Deus preordena e torna 0 ato certo (0 assassino levantando a faca e a

cravando no peito na vítima). Mas o motivo de Deus é bom ao passo

que 0 motivo do assassino é mau. Como que essa explicação nos ajuda?

 Afinal de contas, de onde veio a intenção e disposição do assassino?

Simplesmente dizer “nós não sabemos” só irá suscitar uma pergunta

ainda mais complicada: Como pode ser isso quando 0 calvinista já dis-se que Deus preordena e torna certo tudo, sem exceção, incluindo as

intenções e os pensamentos das criaturas? Como que isso não inclui o

motivo mau do coração do assassino? E mais, como Deus pode tornar o

assassinato certo sem garantir que 0 assassino tenha um motivo mau?

Então a maioria dos calvinistas dirá que 0 motivo ou intenção má surgiu

em razão de Deus retirar ou reter sua graça inibidora. Como que isso

ajuda? Deus ainda é 0 autor do motivo mau ao, de maneira intencional,

proposital e ativa, retirar ou reter aquilo que ele sabia que teria impedido

0 assassinato. E ele supostamente é 0 autor do assassinato com um mo-

tivo e um propósito bom - seja lá o que isso realmente signifique. Isso

também sugere um erro na criação, de maneira que ela não foi criada

inerentemente boa. Parece que a explicação calvinista está dando voltas,

andando em círculos, sem jamais conseguir explicar como alguma coisa

é verdadeiramente má. Penso que a maioria dos calvinistas ainda não

começou a aceitar e a lidar com este enigma.

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Os enigmas do Calvinismo

Outro enigma intimamente relacionado é que se 0 calvinismo for

 verdadeiro, nada, de jeito nenhum, pode ferir ou diminuir a glória de

Deus. Um amigo calvinista escreveu um livro acerca de uma suposta

heresia que diminui a glória de Deus 2. Mas como isso pode acontecer?Não pode. Cada heresia, como todas as demais coisas, é preordenada

por Deus para a sua glória. Assim, em termos lógicos, ela contribui para

uma maior glória de Deus. Mesmo que a heresia diga que Deus não é

glorioso, tal afirmação também glorifica a Deus - assim como todas as

demais coisas. Logicamente, parece que um calvinista consistente jamais

pode dizer que algo prejudica ou diminui a glória de Deus e isso no me-lhor sentido possível, pois caso contrário, Deus não teria preordenado

tal coisa para sua glória.

Neste exato momento alguns leitores podem estar dizendo: “Espera

um pouco. Eu não ligo para os enigmas. E daí? Não é espiritual aceitar

todas as verdades bíblicas ainda que elas sejam confusas e até mesmo

aparentemente contraditórias?”

Primeiro, ninguém está te dizendo para não aceitar as verdades

bíblicas. A questão é se a Palavra de Deus na verdade exige crença em

enigmas ou se os enigmas são sempre um sinal de algo errado em nos-

sa interpretação  da Palavra de Deus. Presume-se que Deus seja o autor

da lógica e da razão (tais, no seu melhor, como funções da imagem de

Deus). Todas as interpretações bíblicas sérias procuram resolver as in-

consistências presumindo que Deus apela tanto a nossas mentes quantoa nossos corações.

Segundo, até mesmo a maioria dos teólogos calvinistas quer evitar

ou resolver os enigmas enquanto que rara e relutantemente admitindo

que alguns parecem ser inevitáveis.

Terceiro, mesmo os calvinistas tentam diminuir outras teologias ao

apontar para os enigmas que elas possuem. Certamente seria utilizar dois

2. Bruce Ware, Gods Lesser Glory: The Diminished God of Open Theism  (Wheaton, IL: Crossway, 2000).

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Contra 0 Calvinismo

pesos e duas medidas ao adotar enigmas de maneira confortável enquan-

to que, ao mesmo tempo, utilizar enigmas contra 0 arminianismo. Por

exemplo, muitos calvinistas usam a crença dos arminianos de que Deus

conhece 0 futuro de maneira exaustiva e infalível como um enigma aocombinar a crença em livre-arbítrio e a habilidade de fazer 0 contrário do

que alguém faz. Como Deus pode saber 0 futuro sem preordená-lo. Uma

 vez que os calvinistas utilizam tal tática quando criticam outras teologias,

eles não podem adotar enigmas em suas teologias sem buscar resolvê-los.

Um enigma que eu já enfatizei anteriormente é a crença calvinista de que

Deus escolhe salvar algumas pessoas e “ignorar” outras, e que esta seleção

não tem nenhuma relação com qualquer coisa que ele veja nas pessoas ou

que seja acerca destas pessoas. Todavia, esta seleção não é arbitrária. Eu

 já argumentei anteriormente que não existe um meio termo entre arbitra-

riedade e algo acerca das pessoas que faz com que Deus as selecione (tal

como uma resposta livre para o convite de Deus para ser salvo). Apelar

para 0 mistério é incorreto; isto não é um mistério, mas um enigma.

Mas 0 maior enigma de todos tem a ver com 0 caráter de Deus. Prati-

camente todos os calvinistas confessam que Deus é 0 padrão de bondade

moral, a fonte de todos os valores, a fonte perfeitamente terna do amor.

Então eles também confessam que Deus ordena, planeja, controla e torna

certo os atos malignos mais ofensivos, tais como seqüestro, estupro e o

assassinato de uma criancinha e 0 massacre genocida de centenas de

milhares em Ruanda. Eles confessam que Deus “certifica-se” de que ohomem peque, como na queda de Adão e Eva. E confessam que toda

a salvação é um ato absolutamente de Deus e que não depende das

decisões do livre-arbítrio das pessoas (monergismo) e que Deus salva

apenas alguns, quando ele poderia salvar todos - garantindo que grande

parte da humanidade venha a passar a eternidade no inferno quando

Ele poderia salvar as pessoas do inferno.

Todas as teologias não possuem enigmas na medida em que tentam

ser abrangentes e sistemáticas? Provavelmente sim. Uma forma de

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Os enigmas do Calvinismo

analisar a escolha entre as teologias concorrentes (quando a Escritura

não é absolutamente clara)3é decidir à base de quais enigmas alguém

consegue viver. Para mim, e para a maioria dos não calvinistas, nada

é mais importante do que preservar, proteger e promover o bom nomede Deus - a reputação de Deus que tem por base 0 seu caráter bom.

Na medida em que o calvinismo minimiza isso, eu não posso viver com

seus enigmas porque eles, no final das contas, causam danos à reputação

de Deus - tornando difícil fazer uma distinção entre Deus e 0 diabo.

 Alguns leitores podem questionar a sinceridade de meu apelo ou

0 sucesso de meu esforço em escrever acerca do calvinismo com umespírito conciliador. Eu, todavia, peço que você tenha em mente uma

nítida diferença entre  pessoas  e crenças.  De forma alguma eu desejo

denegrir os calvinistas; 0 fato de eu defender que a crença calvinista,

em última estância, minimiza a reputação de Deus não causa nenhum

reflexo na integridade, sinceridade, espiritualidade ou sucesso como

ministros e evangelistas. Eu não possuo hostilidade contra nenhum dos

meus irmãos e irmãs calvinistas em virtude de suas crenças equivocadas.

Eu enfrento dificuldades com algumas de suas interpretações errôneas

acerca de minha própria teologia, mas tento não ficar ressentido com

eles, apesar disso.

Claro que eu gostaria de persuadir os cristãos para que evitem 0 cal-

 vinismo, não porque penso que ele irá matar a fé ou a espiritualidade

dos cristãos, mas porque quero que as pessoas pensem melhor acercade Deus do que o calvinismo permite. Acredito que Deus se importa com

3. Claro, algumas pessoas de ambos os lados da divisão monergismo/sinergismo 

argumentarão que a Escritura é   absolutamente clara acerca destes assuntos em 

disputa. Mas como pode ser tal coisa, se, de maneira igual, cristãos sinceros, tementes  

a Deus, que amam a Jesus e acreditam na Bíblia têm discordado há centenas de anos 

e continuam discordando, apesar de análises igualmente profundas de textos bíblicos? 

Um orador calvinista declarou publicamente que os não calvinistas não “honram” a 

Bíblia. Declarações semelhantes podem ser ouvidas de não calvinistas em relação aos 

calvinistas. Eu não penso que os calvinistas, até mesmo calvinistas rígidos do tipo 

de “cinco pontos", desonram a Bíblia. O que penso é que eles estão cegos para as 

"conseqüências lógicas e necessárias” resultantes de seu sistema teológico.

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Contra 0 Calvinismo

o que pensamos acerca dele, e, pelo fato de eu amar a Deus, eu quero

que todas as pessoas pensem corretamente acerca dele.

Como busquei deixar claro em todo esse livro, acredito que o calvinis-

mo rígido, inadvertida, mas inescapavelmente, impugna o bom caráterde Deus. Que eu quero persuadir as pessoas a evitarem 0 calvinismo não

significa que eu quero que eles evitem os calvinistas. Para ser honesto,

penso que os evangélicos calvinistas são alguns dos melhores cristãos do

mundo. Eu só acho que eles são terrivelmente inconsistentes e ensinam

e acreditam em doutrinas que contradizem à Bíblia, a maioria da tradi-

ção cristã e a razão. E penso que algumas destas doutrinas desonram a

Deus ainda que esta não seja a intenção dos calvinistas. Também penso

que algumas destas doutrinas levarão ao menos alguns jovens cristãos

a impasses teológicos e espirituais.

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apêndice 1

Tentativas Calvinistas de

resgatar a reputação de Deus

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EM TODAS AS ÉPOCAS, mas principalmente na época em que vive-

mos, certos calvinistas reconheceram os problemas que sua visão da

soberania de Deus apresenta para a reputação de Deus e ofereceram

soluções que supostamente abrandam a situação de Deus ser o autor do

pecado e do mal. Em outras palavras, estas são tentativas de resgatar a

bondade de Deus à luz da preordenação divina absoluta e 0 ato de Deus

tornar certo todas as coisas, até seus mínimos detalhes, mas, principal-

mente, as decisões e ações más das pessoas. Se Deus é absolutamente

soberano sobre tudo, sem autolimitação que visa o livre-arbítrio das

criaturas (habilidade de fazer 0 contrário, incluindo a habilidade de frus-

trar a vontade de Deus), como é que Deus não é 0 autor do pecado e do

mal? E como é que as criaturas são responsáveis pelo mal e não Deus?

 Vamos com eçar com um precedente legal que será utilizado por

completo para examinar se estas estratégias funcionam para abrandar

0 problema: a queda de Adão no jardim do Éden. Todos os calvinistas

concordam que Deus preordenou e tornou certa a queda com suas con-

seqüências. Já vimos algumas das formas em que os calvinistas tentam

tirar a culpa de Deus, assim por dizer, de ser culpado pelo pecado de

 Adão. Como é que Deus não é culpado e Adão foi? A primeira estratégia comumente utilizada é a de apelar para causas se- 

cundárias.  Este é um conceito filosófico oriundo da filosofia de Aristóteles;

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Contra o Calvinismo

o teólogo medieval Tomás de Aquino (1225 - 1274) 0 utilizou para explicar

como Deus garante que tudo aconteça, mas que não é culpado do pecado

e do mal. Calvino fez uso deste conceito para distanciar 0 poder soberano

de Deus operando todas as coisas de acordo com seu propósito das deci-sões e ações más das criaturas. O calvinista contemporâneo Paul Hem diz:

Há um a longa e honorável tradição segundo a qual existem causas 

primárias e secundárias. A causa (ou causas) prim ária é 0 sustento 

divino; as causa secundárias são os poderes causais das coisas criadas: 

o poder da semente germinar, de uma pessoa sentir fome ou descer 

a rua, e assim por diante '.

Poucos cristãos (ou teístas em geral) discordariam deste uso dos con-

ceitos de causas prim árias e secundárias. Deus é, naturalmente, o criador

e sustentador de tudo fora de si mesmo e, portanto, precisa sustentar e

até mesmo cooperar (mesmo que se apenas pela mera permissão) com

qualquer coisa que aconteça na esfera das criaturas. As criaturas não

possuem poder absoluto ou autônomo de si mesmas em contraste com

Deus de forma que possam ser e agir totalmente à parte dele.

Todavia, os problemas surgem quando esta distinção entre causas

primárias e secundárias é aplicada à providência divina para resolver

0 problema da bondade de Deus e o mal das criaturas. Por exemplo, 0

calvinista Loraine Boettner argumenta que Satanás foi a “causa [mais]

próxima” (0 mesmo que causa secundária) da queda de Adão. Isto, ele

diz, remove toda a culpa de Deus ainda que Deus seja a causa final (omesmo que causa primária) 2. Entretanto anteriormente, ele admite

que Satanás era o “instrumento” de Deus 3. Ele também diz que Deus

 jam ais é a “causa eficaz” do pecado 4. Este em aranhado de causas surge

1. HELM, Paul. A providência de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 76.

2. Boettner, The Reformed Doctrine of Predestination,  251.

3. Ibid., 241.

4. Ibid.

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Contra o Calvinismo

ordena o mal, mas ele náo planeja 0 mal como mal, como o agente hu-

mano 0 faz. No caso de Deus há outra descrição da ação moralmente

má que ele quer que a ação má preencha. Deus tem em vista outros

fins e propósitos” 6.Então, Deus planejou, preordenou, tornou certo e controlou a queda,

mas Deus não é culpado e Adão é em razão das intenções diferentes de

 Adão e de Deus como causas primárias e secundárias. Mas Deus não

age como 0 instigador último da intenção má de Adão? De onde mais

a intenção poderia vir? Se traçamos toda a origem à Deus, como Meeter

insiste que devemos fazer, Deus ainda não é o iniciador e 0 instigador

e a causa última da vontade má de Adão? O ato de simplesmente dizer

que Deus planejou a queda para 0 bem é 0 suficiente para isentar Deus

da responsabilidade neste caso? Penso que não.

Há uma analogia para esta explicação calvinista do papel inocente

de Deus no pecado e no mal na experiência humana? Penso que não.

Lembre-se da analogia que ofereci anteriormente do pai que manipulava

seu filho para roubar dinheiro. Não consigo pensar em um único exemplo

onde uma pessoa que torna certo que outra pessoa faça algo mau seja

considerada inocente - mesmo que a intenção seja para o bem. Em

minha analogia este pai manipulador planejou utilizar o dinheiro que seu

filho roubou para ajudar 0 pobre, 0 que não diminui sua responsabilidade

legal no assalto. Como Evans (citou anteriormente): “A responsabilidade

última... reside onde a causa última está” 7.Parece que o apelo para a distinção entre causas primárias e secun-

dárias fracassa em ajudar o calvinista a resolver 0 problema de Deus e

o mal. Deus ainda é a causa última do mal em mais do que no sentido

simples de ser 0 criador e sustentador do universo e 0 ser poderoso que

deve cooperar com a ação do praticante do mal.

6. HELM, Paul. A providência de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 169

7. Evans, “Reflections on Determinism and Freedom,” 263.

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Tentativas Calvinistas de resgatar a reputação de Deus

Outra estratégia empregada por alguns calvinistas para resgatar a re-

putação de Deus apesar do determinismo divino do pecado e do mal, é

apelar para o que é chamado de “ molinismo” ou “conhecimento médio”.

O teólogo calvinista Bruce Ware utiliza esse método para explicar comoDeus preordena e torna certo até mesmo as ações más das pessoas, tal

como Adão em sua rebelião, e, entretanto, não é culpado e não carrega

nenhuma culpa 8. O molinismo (que recebeu o nome do teólogo jesuíta

do século XVI Luis de Molina [1535  - 1600]) é a crença de que Deus

possui “conhecimento médio” - conhecimento de que qualquer criatura

poderia fazer livremente em qualquer conjunto de circunstâncias. A cria-tura pode possuir liberdade libertária - liberdade não compatível com

o determinismo e capaz de fazer o contrário do que ela faz - mas Deus

sabe 0 que a criatura faria com aquela habilidade em qualquer situação

concebível (a saber, logicamente possível). Um calvinista molinista, tal

como Ware, deve alterar a visão molinista tradicional de conhecimento

médio, pois ele não acredita em liberdade libertária - 0 poder da escolha

contrária. Então Ware tenta construir uma versão de molinismo que não

utilize a liberdade libertária, mas que utilize a liberdade compatibilista

com o conhecimento médio.

 Ware emprega esta ideia de conhecimento médio para explicar a

soberania imaculada de Deus sobre 0 mal. De acordo com Ware, Deus

tem a habilidade

de prever, pelo conhecimento médio, um conjunto de situações 

no qual suas criaturas morais (angélicas e humanas) escolheriam e 

agiriam conform e escolheriam e agiriam. Mais especificamente, Deus

8. A visão discutida aqui também é a sugerida pelo teólogo evangélico Millard Erickson  

em Christian Theology (Grand Rapids, Mich.: Baker, 1983), 1:356 - 62. Erickson a chama 

de “modelo moderadamente calvinista”. É difícil enxergar o que há de “moderado” nesta visão ao passo que Erickson termina onde todos os calvinistas terminam  

- com o determinismo divino. Mas, mais tarde, assim como Ware, Erickson usa o 

conhecimento médio para tentar reconciliar o determinismo divino com a liberdade 

humana (compatibilista) e resgatar a reputação de Deus ao isentar Deus de causar o 

pecado e o mal.

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Contra 0 Calvinismo

[é] capaz de saber exatamente o que um agente moral faria em uma 

situação, com seus fatores complexos particulares, em oposição ao 

que o agente faria em uma situação levemente diferente, com um  

conjunto de fatores levemente diferentes 9.

 A fim de garantir que o pecado que Deus quer que aconteça não

aconteça sem que ele seja a sua causa direta ou responsável por ele

(no sentido de culpa), Deus simplesmente coloca a criatura (ex. Adão)

em uma situação onde ele sabe que a criatura, de maneira voluntária,

desenvolverá um motivo controlador e que agirá pecaminosamente a

partir deste motivo. Ware chama tal coisa de uma “agência divina pas-

siva indireta”, que controla as escolhas pecaminosas humanas sem as

causar. Ware fornece mais explicações:

Quando Deus prevê vários conjuntos de fatores dentro do que 

um agente desenvolverá uma inclinação mais forte para fazer uma 

coisa ou outra, a inclinação mais forte que emerge destes fatores  

não é causada pelos fatores e nem é causada por Deus. Antes, à luz  

da natureza da pessoa, quando certos fatores estão presentes, sua 

natureza responderá a estes fatores e buscará fazer 0  que ele, por 

natureza, ma is quer fazer. Em suma, a causa da inclinação mais forte 

e a escolha resultante é a natureza da pessoa em resposta aos fatores 

que lhe foram apresentados 0.

 Ware pen sa que tal abordagem inocenta Deus do mal enquanto que,

ao mesmo tempo, deixa Deus com soberania absoluta até mesmo sobre

0 mal. Ele sugere que, nesta descrição, nós devemos pensar em Deus

como “ocasionando” as ações e decisões pecaminosas de uma pessoa

ao mesmo tempo em que Ele não as “causa”.

Em razão de Deus conhecer, de maneira perfeita, a natureza de cada

pessoa, ele sabe como estas naturezas responderão a conjuntos específi-

9. Bruce Ware, God's Greater Glory: The Exalted God of Scripture and the Christian Faith (Wheaton, IL.: Crossway, 2004), 120.

10. Ibid., 122.

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Tentativas Calvinistas de resgatar a reputação de Deus

cos de fatores que lhe são apresentados. Assim sendo, sem causar uma

pessoa a fazer 0 mal, ele, todavia, controla 0 mal que as pessoas fazem.

Ele controla se 0 mal é feito, qual mal é feito e em qual (is) e todo(s)

0(s) caso(s) ele poderia impedir 0 mal de ser feito. Desta forma, Deus

mantém 0 controle meticuloso sobre o mal enquanto que suas criaturas

morais, unicamente, são os agentes que cometem o mal, e apenas elas

carregam a responsabilidade moral pelo mal que livremente cometem. "

 Várias perguntas surgem a partir da explicação de Ware (e de outros

calvinistas) do envolvimento de Deus no pecado e no mal. Primeiro, dada

a forte visão da soberania de Deus, como é possível para uma criaturater uma natureza que deseja e então automaticamente desenvolve uma

inclinação maligna dominante independente da causalidade final divina?

De onde tal natureza se origina? Qual é a fonte do mal nela que a causa

a desenvolver uma inclinação ou motivo mal controlador e então a agir

de acordo com esta inclinação ou motivo? Esta explicação da natureza

humana não apresenta um elemento de autonomia das criaturas quenão é permitido no calvinismo tradicional?

Para ser específico, qual erro na natureza de Adão tornou inevitável

que ele pecasse que, caso ele fosse colocado em certas circunstâncias

(a saber, 0 jardim do Éden com a serpente etc.), ele poderia pecar? E

de onde este falha veio senão de Deus? A explicação de Ware parece

apresentar um defeito na existência humana dada por Deus ou um

nível de autonomia de Deus que não é consistente com a própria visão

calvinista rígida de Ware acerca da soberania.

Segundo, e talvez mais óbvio, como esta descrição da soberania de

Deus sobre o mal, de fato, isenta Deus, por assim dizer? Afinal de contas,

Deus ainda é o ser que manipula as decisões e ações que acontecem.

Por exemplo, de acordo com Ware, Deus conhecia Adão tão bem que ele

sabia que ele desenvolveria um motivo mal controlador e, conseqüente-mente, pecaria, caso fosse colocado no jardim com a serpente e a árvore.

11. Ibid., 124.

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Contra 0 Calvinismo

Em qual experiência humana tal pessoa manipuladora e controladora

não seria, ao menos, igualmente culpada juntamente com a pessoa que

pecou (ou cometeu o crime)? Ware oferece algumas ilustrações de tal

experiência, mas elas falham em pontos essenciais. Por exemplo, ele

pede a seus leitores que imaginem uma operação policial à paisana em

que 0 policial sabe, com certeza, que certo criminoso irá infringir a lei,

caso seja atraído para certa situação.

Tal cenário não é difícil de ser imaginado; qualquer telespectador do

programa Dateline  já viu várias vezes algo do gênero na série To Catch 

a Predator  (Prendendo Aliciadores de Menores). No programa, oficiais

(ou pessoas orientadas por eles) utilizam salas de bate-papo para atrairpredadores sexuais para uma casa para ter relações sexuais com um

menor de idade. Quando 0 predador aparece, a polícia está lá para

cumprimentá-lo e prendê-lo. A polícia, claro, é inocente, ainda que ela

tenha manipulado 0 predador a tentar cometer um crime. Ware oferece

um exemplo assim (sem ser tão específico). Mas isso funciona? Isto é

realmente uma analogia do uso divino do conhecimento médio para

controlar 0 mau em sua visão da soberania de Deus?

Digo que esta explicação não funciona. Primeiro, a polícia que seduz

os predadores não tem relação nenhuma com o fato de eles terem se

tornado pervertidos sexuais. A polícia não é criadora de pessoas e não

é regente soberana do universo dos predadores. Aqui há autonomia

genuína; os predadores, assim como suas naturezas, não dependem da

polícia de forma alguma para que existam. Ware parece se esquecer,por um instante, que, de acordo com o calvinismo, sistema este que ele

plenamente adota, Deus é 0 criador de tudo, incluindo cada natureza.

O calvinismo rejeita radicalmente a autonomia das criaturas. Ele pare-

ce pensar que é compatível com o calvinismo dizer que certa natureza

inclinada para 0 mal pode existir sem que Deus seja sua fonte. (Apenas

0 livre-arbítrio libertário pode realmente explicar como uma natureza

boa torna-se má sem que Deus seja responsável por essa mudança. Mas

0 calvinismo de Ware rejeita o livre-arbítrio libertário)

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Tentativas Calvinistas de resgatar a reputação de Deus

Segundo, e intimamente ligado à primeira objeção, para que a ana-

logia funcione, você teria que imaginar a polícia não apenas atraindo

uma pessoa desconhecida, conhecida pela Internet, para uma casa,

 Você precisaria imaginar a polícia também estabelecendo que a pessoaentre na Internet e que busque um menor de idade para que tenha

relações sexuais. E precisaríam os continuar a retroceder [na analogia]

para fazer com que a analogia entre Deus e a polícia funcione. A po-

lícia teria que, de alguma forma, manipular 0 predador em potencial

a ter pensamentos, sentimentos e desejos anormais. Afinal de contas,

 Ware não acredita que Deus simplesm ente “encontra” um a pessoa, tal

como Adão, e então faz uso de sua natureza deturpada, que já existe

de maneira independente, e que fará surgir inevitavelmente uma incli-

nação rebelde. Deus é 0 Criador de Adão; tudo acerca de Adão é criação

de Deus. Dizer o contrário é introduzir um elemento de autonomia das

criaturas que é excluído pelo forte entendimento calvinista concernente

a soberania de Deus.

Terceiro, em uma operação policial à paisana, tal como To Catch a Preda- tor, o policial, na relidade, jam ais permite que 0 predador prejudique alguém. 

Os policiais apenas permitem que os predadores cheguem até determinado

ponto da situação. Se 0 policial ou até mesmo os agentes do programa te-

levisivo que estão sob 0 olhar vigilante da polícia alguma vez permitissem

que um menor fosse prejudicado, eles mesmos seriam responsáveis pelas

acusações criminais das quais os predadores serão indiciados. A principal objeção à utilização de Ware do conhecimento médio

como ferramenta para explicar a soberania de Deus sobre 0 mal é que

ele faz de Deus o manipulador mestre que torna o pecado e o mal cer-

tos. Em sua visão, Adão foi colocado em uma situação precária onde

Deus sabia que Adão indubitavelmente cairia. Não importa 0 fato de ele

ter caído voluntariamente ou não; ele não teria caído caso Deus não o

tivesse colocado naquela situação específica com o propósito de garantir 

que ele pecasse.

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Contra o Calvinismo

Não importa 0 quanto ele insistentemente assegure 0 contrário, Ware

ainda faz de Deus o autor do pecado e do mal. Ainda que ele pudesse

nos explicar como, de alguma forma e em um sentido puramente legal,

Deus não era responsável pelo pecado real e que Adão fosse 0 único

responsável pelo pecado (que eu duvido que seja possível), ainda have-

ria 0 problema da intenção de Deus em tornar o pecado certo. Por que

um Deus bom, um Deus de amor perfeito, iria querer tornar 0 pecado

certo mesmo de uma maneira indireta (mas manipulativa)? A explicação

que a intenção de Deus em tornar 0 pecado certo é boa simplesmente

não é convincente pelas razões já explicadas, principalmente quando 0

sofrimento eterno no inferno espera aqueles a quem Deus manipulou

para que pecassem.

Em suma, muitas das defesas padrões do calvinismo, quando colo-

cadas seriamente à prova, revelam uma confiança chocante em noções

da soberania de Deus que O tornam o autor final do pecado e do mal.

 Apesar de suas intenções, eles não são bem sucedidos em isentar a

Deus, por assim dizer, do mal. Ou seja, eles não resgatam a reputaçãode Deus dos efeitos corrosivos do determinismo divino.

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1. Qualquer outra visão da soberania de Deus que não seja a visão 

calvinista diminui a glória de Deus; apenas “as doutrinas da graça” 

honram e sustentam plenamente a glória de Deus.

Tudo depende do significado de “Glória de Deus”. Se ele significa po-

der, então talvez a afirmação esteja correta. Mas o poder não é glorioso

exceto quando guiado pela bondade e amor. Hitler era poderoso, mas

obviamente, não glorioso. Jesus Cristo revelou Deus como “nosso Pai”

e, portanto, como bondoso e amoroso. Na verdade, o calvinismo rígido

(TULIP), erroneamente rotulado como “as doutrinas da graça” pelos

calvinistas, diminui a glória de Deus ao representá-lo como perverso

e arbitrário. Além do mais, se o calvinismo estiver correto, nada pode“diminuir a glória de Deus”, pois Deus preordenou tudo para a sua glória.

2. As teologias não calvinistas da salvação, tal como o arminianismo, 

tornam a salvação dependente das boas obras, pois a decisão do pe- 

cador de aceitar a Cristo torna-se o fator decisivo em sua salvação.

Parece mais o caso que o calvinismo torna a salvação dependente dasboas obras ou de algo bom acerca das pessoas eleitas para a salvação,

senão, como é que Deus as escolhe dentre a massa de pessoas destinadas

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Contra o Calvinismo

ao inferno? Ou é algo que Deus vê nessas pessoas senão a escolha de

Deus destas pessoas é arbitrária e caprichosa. Além do mais, a teologia

arminiana náo torna a salvação dependente das boas obras; toda a

“obra” de salvação é de Deus. O pecador é capacitado a se arrependere a crer pela graça preveniente de Deus e a mera decisão de aceitar a

salvação de Deus não é uma boa obra; ela é simplesmente a aceitação

de um dom da graça. Em caso nenhum a aceitação de um presente é

considerada 0 “fator decisivo” para que o presente seja usufruído.

3. Apenas o calvinismo pode explicar como Deus garantiu que Cris- 

to morreria sua morte expiatória na cruz. A menos que Deus tenha 

preordenado que certos homens pecadores 0 crucificariam, Deus nâo 

poderia ter assegurado a crucificação.

Supor isso é totalmente desnecessário. Certamente que Deus, em sua

sabedoria e poder, pode garantir que certo evento aconteça sem precisar

manipular certas pessoas para que pequem. Sim, Deus preordenou a

cruz de Cristo, mas ele não fez com que certos homens (ou “garantiu”

que eles) pecassem. Uma alternativa é a de que, no momento certo,

 Jesus Cristo entrou em Jerusalém em sua “entrada triunfal” , sabendo que

isso provocaria sua crucificação. Não havia necessidade de manipular

certos indivíduos para que pecassem.

4. A menos que o calvinismo seja verdadeiro, não podemos confiar que a Bíblia seja inerrante. A Bíblia só pode ser a Palavra de Deus 

caso Deus tenha anulado o livre-arbítrio do autor.

Nem o arminianismo ou quaisquer teologias não calvinistas dizem

que Deus jamais anula o livre-arbítrio de uma pessoa. O que elas dizem

é que Deus jamais preordena ou torna certo 0 pecado ou a escolha de

aceitar a graça de Deus. Deus faz pressão nas pessoas para que façam0 bem, incluindo receber a Cristo, mas jamais as influencia para que

façam 0 mal ou anula 0 livre-arbítrio na questão da salvação.

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Respostas às alegações Calvinistas

5. Só o calvinismo pode explicar a soberania de Deus sobre a natureza 

e história; a menos que Deus preordene e controle cada evento, até 

os mínimos detalhes da existência e até cada pensamento e intenção 

da mente e coração, Deus não pode ser soberano.

Este não é 0 significado de “soberania” em nenhum contexto huma-

no. Uma pessoa soberana está no comando, mas não no controle do

que acontece em seu domínio. Deus pode guiar o curso da natureza e

história para seu objetivo planejado e garantir que a natureza e história

cheguem ao fim desejado sem controlar tudo. Deus é como 0 mestre

de xadrez que sabe como responder a cada jogada que seu oponentefaz. Não há perigo de que a vontade final divina não seja feita. Na ver-

dade, 0 calvinismo não consegue explicar a Oração do Pai Nosso que

nos ensina a orar “seja feita sua vontade, assim na terra como no céu”,

que sugere que a vontade de Deus não é sempre realizada na terra. De

acordo com 0 calvinismo, ela é!

6. Só o calvinismo pode explicar passagens tais como Romanos 9, que 

diz que Deus tem misericórdia de quem ele quer ter misericórdia.

 Vista de maneira descontextualizada de todo o livro de Romanos,

0 capítulo 9  pode parecer apresentar um problema para a crença no

livre-arbítrio. Todavia, a interpretação calvinista, que ensina a escolha

incondicional e até arbitrária de pessoas, por parte de Deus, de sorteque algumas são salvas e outras condenadas, jamais foi ouvida antes

de Agostinho, e isso no século V. Toda a patrística grega interpretava

Romanos 9 de maneira diferente. Uma interpretação alternativa perfei-

tamente sensata diz que a passagem de Romano 9 não está se referindo

à indivíduos ou à salvação pessoal, mas à grupos e ao serviço. Deus é

soberano em escolher Israel e então a igreja gentia para que cumpram

seus respectivos papeis em seu plano de redenção.

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Contra o Calvinismo

7. A teologia reformada, calvinismo, é a única base para a teologia 

cristã bíblica ortodoxa. Todas as demais abordagens, tal como o armi- 

nianismo, uma teologia centrada no homem, levam inevitavelmente 

à teologia liberal.

O arminianismo não é uma “teologia centrada no hom em ” , mas uma

teologia centrada em Deus. Ele é movido total e exclusivamente por uma

 visão da bondade e am or incondicionais de Deus. A principal razão pela

qual os arminianos e outros não calvinistas acreditam no livre-arbítrio é

para preservar e proteger a bondade de Deus de maneira a não fazer dele

0 autor do pecado e do mal. O calvinismo dificulta traçar uma diferençaentre Deus e 0 diabo, exceto no sentido de que 0 diabo quer que todos

 vão para 0 inferno e Deus quer que alguns vão para 0 inferno. A teologia

arminiana não leva à teologia liberal. Na verdade, 0 calvinismo leva. Frie-

drich Schleiermacher, o pai da teologia liberal moderna, era calvinista!

Ele jamais sequer considerou 0 arminianismo; ele foi do calvinismo rígi-

do e conservador direto para 0 universalismo enquanto que manteve a

providência meticulosa divina até mesmo sobre 0 pecado. A maioria dos

teólogos liberais do século XIX eram ex-calvinistas que vieram a abominar

sua visão de Deus e desenvolveram a teologia liberal sem qualquer ajuda

do arminianismo clássico. O arminianismo clássico foi preservado por

muitos fundamentalistas, cristãos pentecostais, de movimentos de santida-

de e batistas livres, nenhum dos quais podendo ser considerados liberais.

8. Deus tem o direito de fazer o que quiser com suas criaturas e, princi- 

palmente, com os pecadores que merecem a condenação. Sua bondade 

é mostrada em seu resgate misericordioso de alguns pecadores; ele não 

deve nada a ninguém. As pessoas que Ele ignora merecem o inferno.

Enquanto pode ser verdadeiro que todos mereçam 0 inferno, embora

até mesmo muitos calvinistas hesitem em dizer isso acerca das crianças,

Deus é um Deus de amor que genuinamente deseja que todas as pessoas

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Respostas às alegações Calvinistas

sejam salvas, conforme o Novo Testamento claramente testifica em 1

Timóteo 2 .4 : “que deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem

ao conhecimento da verdade”. Não há como fugir do fato de que “todos

os homens” signifique todas as pessoas, sem exceção. A questão não éimparcialidade, mas amor. Um Deus que poderia salvar a todos porque

ele sempre salva incondicionalmente, mas escolhe salvar apenas alguns

não seria um Deus bom ou amável. Ele certamente não seria 0 Deus de

1 Timóteo 2.4  e de passagens semelhantes.

9. Se Deus conhece de antemão o que acontecerá no mundo que ele 

irá criar, incluindo a queda e todas as suas conseqüências, isto é o 

mesmo que preordenar tudo, incluindo o pecado e o mal.

Deus conhece previamente porque algo vai acontecer; ele não conhe-

ce previamente porque ele preordena. Em outras palavras, de acordo com

a Escritura, tradição e a razão, 0 pecado de Adão é 0 que fez com que

Deus 0 conhecesse. Deus não previu o pecado de Adão e então decidiucriar 0 mundo no qual Adão pecaria. A diferença jaz na intenção de Deus.

O calvinista deve acreditar que Deus teve por intenção que Adão pecasse

e tornou 0 pecado certo, fazendo de Deus 0 autor do pecado. Arminianos

e outros não calvinistas acreditam que Deus jamais teve por intenção

que Adão pecasse ainda que soubesse que isso aconteceria. O pecado

não foi sua vontade. O calvinismo faz do pecado a vontade de Deus.

10. Teologias não calvinistas minimizam a segurança e a confiança 

da salvação porque elas tornam a salvação dependente das decisões 

humanas. Só o calvinismo proporciona conforto e segurança, pois ele 

diz que tudo é de Deus, incluindo os dons de arrependimento e fé.

Na verdade, o calvinismo enfraquece 0 conforto e a segurança ao tornar

Deus arbitrário e moralmente ambíguo. Um Deus que predestinaria muitas

pessoas ao inferno quando poderia salvá-las, uma vez que sua escolha

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Contra o Calvinismo

sempre é incondicional, não é confiável. E mais, como que as pessoas

podem saber, com certeza, que são eleitas? Muitos calvinistas duvidaram

de suas eleições. Os calvinistas falam de “sinais de graça” que provam

que alguém é eleito, mas e se a pessoa não tiver certeza ou não mostrar

sinais de graça suficientes? O calvinismo não proporciona mais conforto

e segurança do que 0 arminianismo ou teologias não calvinistas que ga-

rantem que as pessoas são salvas se confiarem unicamente em Cristo.

11. As teologias não calvinistas, tal como o arminianismo, acreditam 

que o livre-arbítrio libertário, crença de que decisões e ações livres 

simplesmente não vêm de lugar nenhum, seja impossível. O calvi- nismo e outras teologias, assim como muitos filósofos, sabem que o 

“livre-arbítrio” simplesmente significa fazer o que você quer fazer e as 

pessoas sempre são controladas por seus motivos mais fortes, então, 

ser capaz de fazer o contrário - livre-arbítrio libertário, é uma ilusão.

Se “livre-arbítrio” só significa fazer 0 que você quer fazer ainda que

não possa fazer 0 contrário, como é que alguém é responsável por aqui-10 que faz? Se um assassino, por exemplo, não pode fazer outra coisa

senão matar, então um juiz ou um júri deve declará-lo inocente - talvez

por razão de insanidade. A responsabilidade moral, prestação de con-

tas e a culpa dependem da habilidade de fazer o contrário - liberdade

libertária. A visão calvinista de “livre-arbítrio” não é, de fato, livre, de

maneira nenhuma.

Outrossim, se não existe tal coisa como 0 livre-arbítrio libertário,

então Deus também não o tem, e isso faz com que criação de Deus do

mundo seja necessária e não escolhida livremente, neste caso, não pela

graça, mas pela necessidade. A visão calvinista de “livre-arbítrio” rouba

tanto a habilidade de Deus quanto a das pessoas de fazerem 0 contrário

e, consequentemente, suas ações e decisões não são louváveis e nem

culpáveis. O que é, é, e 0 que será, será. Isso caminha na contramão

de nossos instintos e intuições acerca da responsabilidade moral e a

liberdade transcendente de Deus de criar ou não criar.

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“Nenhum de nós está imune da tentação das acusações falsas, mas