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MANUAL CONFESSORES 1.01 DO SACEiJO'rE SANTIFICADO PELA ADMINJS'fRA�:ÃO CAniTATIVA E DISCTA DO SACRENTO DA PEN!T:NCIA; 2.01 DA PRÁTICA DOS CONFESSORES DE S. LIOOIUO; 3.01 DAS ADVERTENCIAS AOS CONFESSORES E DO TRATADO DA CONI'ISSÃO E DO B. LEONARDO DE PORTO-MAURICIO; 4.0, DAS rNSTRUCÇÕES DE S. CAOS AOS CONFESSORES; 5.00 DOS ASOS DE S. FRANCISCO DE SLES AOS CONFESSORES; 6.•, DOS CONSELHOS DE S. FlPPE DE NERI; 7.01 DOS AISOS DE S. FRANCISCO VIER AOS CONESSOES PADRE J. GAUME Un ate idem spiritus. (I Cor., , 11.) TBADZrD EM PORTUGUEZ J. A. V. �EQUEIRA EEII EDIÇÃO PORTO E CASA DE A. R. DA CRUZ COUTINHO, EDITOR Rua dos Caldees, 18 e 20 1880 http://www.obrascatolicas.com

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MANUAL

CONFESSORES 1.01 DO SACEiliJO'rE SANTIFICADO PELA ADMINJS'fRA�:ÃO CAniTA.TIVA.

E DISCRETA DO SACRAMENTO DA PEN!TI::NCIA; 2.01 DA PRÁTICA DOS CONFESSORES DE S. LIOOIUO;

3.01 DAS ADVERTENCIAS AOS CONFESSORES E DO TRATADO DA CONI'ISSÃO G-ERAL DO B. LEONARDO DE PORTO-MAURICIO;

4.0, DAS rNSTRUCÇÕES DE S. CARLOS AOS CONFESSORES; 5.00 DOS AVISOS DE S. FRANCISCO DE SALLES AOS CONFESSORES;

6.•, DOS CONSELHOS DE S. FILlPPE DE NERI; 7.01 DOS A-VISOS DE S. FRANCISCO XAVIER AOS CONl•ESSO:R.ES

PADRE J. GAUME

Unus atque idem spiritus. (I. Cor., xn, 11.)

TBADllZrDI) EM POR.TUGUEZ

J. A.. V. �EQ.UEIRA

'fEII.<:EIIlA EDIÇÃO

PORTO

E.N CASA DE A. R. DA CRUZ COUTINHO, EDITOR Rua dos Caldeireiros, 18 e 20

1880

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APPROVAÇÕES

Lendo e examinando o Manual dos Confessohes, imos que as excellenles obras de que so compõe esta collecção eslão fielmente vertidas. Assim, recommendamos sua leitura aos sacerdotes de nossa diocese: acharão aqui as maximas e os sentimentos dos santos, e regras seguras para a direcção das consciências.

Dada em Perigueux, a 20 dc junho de 1837.

ijt THOMAZ, Bispo de Perigueux.

Na diUlcil arte da direcção das almas, não poderiam os con­fessores escolher melhores guias do que os doutores que no ex­ercicio do ministério da confissão se sanlificaram. Seguindo seu methodo, o.s pastores alimentarão seu rebanho com salutar dou­trina, produzirão abundantes fructos de salvação, e, caminhando por seus vestígios, chegarão como elles ao céo, precedidos de um grande numero de beinavenlurados que elles para ahi terão produzido.

Depois de Icrmos o Manual dos Confessores, no qual M. Pa­dre uaumc reuniu os conselhos dados aos ministros do Sacra­mento da Penitencia, pelo Beato Leonardo de Porto-Mauricio, S. Ligorio, S. Carlos, S. Francisco de Salles, S. Filippe de Neri,S. Francisco Xavier, ficamos convencidos que esta obra é um excellente guia na direcção das consciências. Julgamos porlanto dar uma prova dc nossa solicitude pela sautificação dos sacer­dotes de nossa diocese, por aquella dos fieis confiados aos seus e nossos cuidados, recommendando-lhes a leitura d'esla obra.

Gap, a 20 de março de 1838.* A. N., Dispo de Oap.

Convencido que de todos os remedios, cujo soccorro a alma ferida pelo peccado reclama, não ha algum mais necessário do que 0 Sacramento da Penitencia, sempre lemos julgado que era indispensável aos confessores afaslarem-se igualmente de nma severidade sem indulgência e de uma relaxação sem sabedoria e sem zelo.

E como é quasi impossivel que uma ou outra d’estas dnas tendencias não se manifeste entre os directores das almas, em

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razão mesmo dos espíritos e dos caracteres, e sobretudo por causa do predomínio das opiniões que presidiram a seus estados de theologia, devemos procurar n’esta matéria uma desejável uniformidade. Concorrer para realisar este pensamento de sal­vação, é uma obra que não póde ter sido inspirada senão do alto.

Appiaudimos portanto com verdadeira alegria a idéa que mo­veu M. Gaume a reunir em fórma de Manual dos Confessores os conselhos que uma sabedoria mais divina que humana havia dictado ao auctor do Sacerdote santificado, ao Beato Leonardo de Porto-Mauricio, a S. Ligorio, a S. Carlos, a S. Francisco de Sal­les, a S. Filippe de Neri, a S. Francisco Xavier.

0 Manual dos Confessours, traducção fiel da linguagem mi­sericordiosa que os Santos fallaram no tribunal da penitencia, contribnirà poderosamente, não duvidamos d’isto, para dilatar as entranhas dos confessores « a confiança dos penitentes.

De lodo 0 coração portanto lhe damos nossa approvação. Aconselhamos sua leitura aos sacerdotes de nossa diocese; for­mamos votos para que todo os directores das almas se persua­dam que é mais que prudente seguir, ua administração do Sa­cramento da Penitencia, guias tão santos e tão esclarecidos, como 0 tem sido homens por Deus suscitados para attrahir os peccadores ao arrependimento e à virtude pelo encanto irresis­tível da mansidão e da misericórdia,

fiordeaux, 20 de abril dc 1838.

í t FERNANDO. Bispo de üordeanx.

0 Manual dos Confessores, publicado por M. o Padre Gaume, e composto das melhores obras que tôem apparecido sobre a di­recção das almas, nos pareceu dever ser ulil a todos aquelles qne estão encarregados d’cslc tremendo e importante ministério. Julgamos portanto fazer um serviço a todos os sacerdotes Ae nossa diocese, recommendando-lhes a leitura d’elle. Aqui acha­rão reunidos os mais sabios conselhos, e poderão servir-se d’elle como de nm guia seguro no tribunal da penitencia.

Mcaux, 16 de junho de 1838.

* ROMÃO, Bispo de Ueaux.

FREDERICO GABRIEL SLiRIA FRANCISCO D E MARGUE- R ITE , por graça de Deus e auctoridade da Sanla Sé Apostolica, Bispo de Saint-Flour:

Temos lido o Manual dos Confessores, e achamos a doutrina d’esta excellente collecção dos auctores mais estimados, igual­mente afastada da relaxação que adormece as almas em uma falsa paz, e do rigorismo quo tende à ruina da religião e á ex- tincção da fé pelo abandono dos sacramentos.

De bom grado recommendamos a leitura séria c profunda de uma obra, na qual o confessor achará regras seguras para a prà-

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tica do santo ministério, e considerações tão tocantes, qnanto judiciosas sobre os títulos de juiz, de medico e dc pae, que o in­clinem ao santo tribunal, e que lhe recordem as virtudes de sciencia. de sabedoria e de caridade dc que deve sor revestido 0 guia das almas.

Dada em Saint-Flour, debaixo de nosso signal e sêllo de nos­sas armas, em 1 de agosto de 1840.

* FREDERICO, Bispo de Saint-Flour.

D. JERONYMO JO SÉ DA COSTA REÜELLO, por mercê deDeui, e da Santa Sé Aposlolica, Dispo do Porto, do Conselho deSua Magestade Fidelissima, e Par do reino:

Nada ha mais importante sobrc a terra, do que a boa direcção das almas pelo caminho da salvação no tribunal da penitencia — Nihil divinius quam coopcrari ad salutem animarum — é o bello pensamento de um Santo Padre. Para se avaliar devida­mente 0 elevado merecimento da obra — .Manuel dks Confes- sKURs —, publicada pelo abbade J. Gaume, e tão apropriada para se conseguir aquel|e importante (im, bastaria a solemne e pastoral aporovação, que unanimes lhe deram alguns dos vene- randos e sãbios Prelados da França, e as enérgicas exliorlações, que dirigiram ac clero das suas respectivas dioceses para que elle se empregasse na leitura das doutrinas, que a mesma obra contém sobre a conveniente administração do Sacramento da Penitencia. Porém agora que a dita obra se vae publicar pela imprensa d’esta cidade, traduzida em purluguez por um sacer­dote virtuoso, douto, e zeloso do bom da religião, seria omissão indesculpável no cumprimento dos deveres, que nos impõe o nosso ministério, se ficássemos silenciosos e deixássemos de re­commendar muito efiicazmente aos reverendos parocbos e sa­cerdotes, nossos diocesanos, o estudo, a meditação, a prática de maximas lão santas, de opiniões tão sólidas, c de conselhos tão judiciosos e prudentes, que esta collecção encerra, e que lhes poderão servir de guia seguro, e de pharol luminoso no tremendo e espinhoso exercicio dos quatro deveres e qualidades do seu ministério no tribunal da penitencia; exercicio em verdade pe­noso, mas de quo ainda n'esle mundo recebem, muitas vezes, justa recompensa na espiritual consolação que lhes ha de causar 0 ver, entre os penitentes que se apresentam no mesmo tribu­nal, grandes peccadores convertidos para o Senlior, reformas edificantes de vida e costumes, tranquillidade e paz em consciên­cias atormentadas de remorsos, perfeição progressiva na prálica das virtudes, e mortes de justos, seguidas da .salvação eterna.

Dada no Paço Episcopal do Porto, sob nosso signal e séllo das nossas armas, aos 14 de julho de 1849.

Logar do * sôllo. JERONYMO, Bispo do Porto.

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AO LEITOR

Âbi damos ao publico a Iraducção em portuguez do Manual dos Confessores. Para convencer do merito d’esta obra basla olbar para o frontispicio e attender que è ella uma compilação fiel das doutrinas dos me­lhores mestres da vida espiritual. Em França foi rece­bida com tal aceitação, que em poucos annos se exhau- riram seis numerosas edições.

Quanto á traducção, sinceramente confessamos a pe­quenez de nosso cabedal lilterario; (e como negar o que aliás se mostra?) o desejo, porém, de vulgarisar uma obra lão proveitosa prevaleceu á consciência de nosso pouco saber, e porlanto a emprehendemos. Podemos todavia afiançar que em nada alleramos a doutrina, e assim esperamos que serão julgados com indulgência alguns defeitos que Q’elia se encontrem.

(Do traductor portuguez.)

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PREFACIO

Seja-nos psrmitlido fazer conhecer o pensamento que pre­sidiu á traducção e redacção d’esta obra; a nós mesmos temos dito: «se todos os lieis fossem ainda hoje confessados e diri- «gidos por S. Carlos Borromeu, por S. Francisco dc Salles, «por S. Francisco Xavier, por S. Filippe de Neri, etc., nem «elles se confe.ssariam mal, nem seriam mal dirigidos; por «outra parte, se todos os confessores, principalmente os no- «viços, podessem dizer a si mesmos: eu confesso como S. Car- «los, como S. Francisco de Salles, como S. Francisco Xavier, «como S. Filippe de Neri, etc.; eu sigo as mesmas regras, «cuja appiicação os sanlilicou e a bastantes outros com elles; «não fariam de seu sanlo ministério um motivo de escrupulo «e de tormento.»

Ora, que meio para fazer reviver estes grandes directores das almas, e fazel-os substituir no tribunal da penitencia? que meio para fazer assim ura duplicado serviço aos sacerdo­tes e nos lieis? Um só em nossa mão está: aquelle dc pôr os escriptos d estes grandes Santos nas mãos dos confessores, sem augmcnlo, nem diminuição, nem mudança, nem commen- tario. Tal é a tarefa que temos satisfeito com a mais con­scienciosa fidelidade.

Assim, 0 Manual dos Confessores não é um methodo dire- ctivo segundo S. Carlos, segundo S. Francisco de Salles, etc.; é exactamente o methodo, o espirito, os conselhos, n prálica d’estes babeis mestres na sciencia das almas. Nem uma só palavra d’csla obra nos pertence; os esclarecimentos pouco numerosos, que nos pareceram uteis, são collocados cm nota; a unica cousa que é nossa é a traducção c o plano, ou a or­dem das matérias. As qualidades do confessor anles, durante e depois da conlissão, lal é a ordem que seguimos; esta é aquella que todos os dias seguimos na administração do sa­cramento.

Nenhum deve entrar no tribunal se não tiver as qualidades requeridas; ora o sacerdote alli é ao mesmo tempo pae, dou­tor, juiz e medico. Nós dizemos, ou anles, nossos auctores dizem o que exige cada uma d’eslas qualidades. Nós as mos­

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tramos em acção na prática dos grandes mestres, cujas obras compõem este Manual. Mas n’este ministério de reconcilia­ção, cm que o sacerdote tão visivelmente tem o logar de Deus, mais de um perigo se encontra. Que precauções deve o con­fessor tomar quanto a si mesmo, a lim de os evitar? Eis o que explicamos depois.

Com 0 sacerdote nós entramos no santo tribunal; elle ouve as confissões do penitente, depois o interroga segundo a ne­cessidade e prudência parecem cxigil-o. É pois natural o fal­lar aqui das interrogações, de sua necessidade, de seu obje­cto, da discrição que deve acompanhal-as. Segue-se uma mi­nuciosa relação de interrogações, que, sobre os mandamentos de Deus e da Igreja, e sobre os deveres particulares de cada estado, sc devem fazer. Conhecendo o confessor pela accu­sação e interrogações o estado do penitente, resta-lhe o de­terminar a conducta que deve ter a seu respeito, seja para o ligar ou desligar, seja para remediar o passado, seja para o fazer perseverar, seja para o elevar a uma virtude mais per­feita. Sohre todos estes importantes pontos nada deixam a desejar os grandes directores, cuja prática reproduzimos.

Algumas vezes tem necessidade o penitente de uma prom- pla absolvição; outras vezes uma confissão geral lhe é neces­saria: sohre isto as regras as mais sábias e um tratado com­pleto. Mas (admiravel espirito de nosso Senhor, que animava estes homens de Deus!) ha sobretudo tres classes de pessoas para cuja direcção elles multiplicaram as admoestações e os conselhos: os doentes, as almas privilegiadas, e linalmente as mais necessitadas, quero dizer, os occasionarios, os habi- tudinarios e rcincidivos. Em vão se procuraria sobre estas questões, as mais práticas e as mais embaraçadas do minis­tério, alguma cousa mais minuciosa, mais sábia c mais cari- tetiva. E ’ verdadeiramente, segundo a expressão de S. Paulo, a doce mãe que nutre, que consola, que anima o lilho com sua ternura, que emprega as mais engenhosas precauções para lhe fazer tomar o remedio que deve ciiral-o ( I . Tess., II, 7); é 0 bom pastor que se carrega com todo o peso, que toma mesmo entre seus braços a ovelha desgarrada, para a conduzir ao nprisco, e evitar-lhe a fadiga da volla. (Ezech., XXXIV, lü , 16.)

A imposição da penitencia, que exige ura conhecimento tão profundo do coração humano, pois que ella deve ser ao mes­mo tempo salisfactoria c medicinal, não é sómente tratada em theoria por estes haheis médicos das almas; elles mos­tram a sua prática; elles chegam a indicar as penitencias mais geralmente salutares nos dilTerentes casos. Mas seu zelo pela saude do doente e reparação da gloria dc Deus,

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sempre dirigido pela caridade do Salvador, não se deslembra do sabio e locante conselho do doutor angélico: Melius est quod sacerdos pmitenti indicet quanta pcenitentia sibi pro peccatis injungenda, et injungat nihilominus aliquid, quod pcenitens tolerabililer faciat. Para pôr o confessor em cslado de fazer notar ao penitenle a indulgência de que a Igreja lhe permilte usar a seu respeito, referimos os cânones penilen- ciaes. Elles podem tambem servir de regras na escolha das obras satisfactorias.

Eis aqui o penitente confessado, dirigido, absolvido; eis aqui uma ovelha conduzida ao aprisco; o confessor vae sair do sanlo tribunal: eslão cumpridos todos seus deveres? Não, ha um que elle leva comsigo, e cuja obrigação se dá em to­dos os iustanles: é a guarda do sigillo sacramental, dever sa­grado sobre o qual repousa todo o cdilicio do christianismo. Com elleito, não ha cbrislianismo sem communhão; commu- nbão sem conlissão; conlissão sem a guarda sagrada, inviolá­vel do sigillo sacramental. Nossos grandes santos o compre- henderam bem; assim suas instrucções terminam por um tratado, no qual elles expõem lanlo as cousas que debaixo do sigillo cáem, como as precauções neccssarias para nunca 0 compromeller. E assim que todos os deveres do confessor se acham o mais minuciosamente explicados, e de um mesmo modo por estes babeis mestres.

Ora, esta uniformidade de doutrina nos (izcra primeira­mente temer o inconveniente de repelir muilas vezes a mes­ma cousa; mas não tardamos em reconhecer que eslas voltas sobre os mesmos pontos formavam pelo contrario uma das grandes vantagens de nosso trabalho, c isto por duas razões:1.* a conformidade de sentimento entro estes homens lão ex­perimentados é uma excelleule prova de verdade, c um mo­tivo dc segurança para nós; 2.* eslas repetições não são pu­ras tautologias, mas sim o exposto da mesma queslão debaixo de uma face nova, com desenvolvimentos novos; o que um não faz senão indicar, o outro o explica dilTusameule, e faz a sua applicação; um trata a questão para o espirito, oulro para 0 coração; um falia como theologo, outro como ascético. D ’esle modo suas instrucções se esclarecem, mutuamente se fortilicam, e dão da verdade o mais completo conhecimento, apresenlando-a debaixo de diversos aspectos. Sómente cita­remos um exemplo escolhido enlre muitos outros; é aquelle das occasiões do peccado. 0 Sacerdote santificado expõe a

Jucslão e dá as regras geraes de conducta; S. Ligorio vem epois, 0 qual, examinando esta matéria como theologo, sin­

gelamente estabelece as dislincções essenciaes enlre as occa­siões voluntárias e necessárias, remotas e próximas; depois

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XII PREFACIO

d'clle 0 bemavenlurado Leonardo dc Porto-Mauricio nos dá todos os signaes, tanto interiores como exteriores da occasião próxima, e expõe a prálica e os remedios; finalmente, para completar este tratado das occasiões, cbega S. Carlos, cuja doutrina serve de texto e de regra a todos os outros.

Mas a grande vantagem d’esle Manual não é o ser elle o methodo direclivo o mais completo, é o ser o mais seguro. Nenhum oiRro oITerece as mesmas garantias intrínsecas e ex- trinsecas. E facil de demonstrar. 1.® Todas as obras de que 0 Manual é formado são approvadas pela Snula Sé, garantia que não apresenta algum de nossos melhodos directivos (•). 2.® Todos os auctores d’eslas obras léem encanccido no exer­cicio do sanlo ministério. 3.® Todos, exceptuando um só,são pela Igreja reconhecidos como santos. A obra d’nqiielle, que ella ainda não collocou sobre seus altares, tem recebido não sómenlc a approvação, mas os elogios dos mais dislinctos ho­mens que a Sanla Sé encarrega dc julgar da orlhodoxia da doutrina e da pureza da moral. Vamos ás provas.

Pois 0 Manual se compõe:1.® Do Sacerdote santificado pela administração caritativa,

prudente e discreta, do sacramento da Penitencia. .Não tra- nirenios o anonymo que o modesto auclor d’esta obra quiz guardar; mas sc" julgou a proposilo occultar-nos seu nome, elle não pódc occultar-nos a rara sabedoria e consumniada experiencia que o distinguem. Nós diremos sómente que o Padre Pal... passou sua vida no exercicio do sanlo tribunal; e acrescentaremos, que seu livro gosa de toda a conliança da sábia corporaeão a que elle pertence. Esta conlianca foi au- thenlicamenlcpisliíicada pela approvação e elogios os menos equivocos da censura romana. Eis aqui seu juizo: «Li a obra «intitulada: 0 Sacerdote santificado pela justa administração «do sacramento da Penitencia, etc., que se pretende rcimpri- «mir aqui em Itoma; c não sómente nada n’elle vi que possa «ollcnder os principios da sã e recta moral christã; mas, ao «contrario, nas advertências cheias de sabedoria, discrição e «caridade que n’ellc se dão aos ministros do sacramento da «penitencia, achei csla obra inteiramente conforme ás dire- «cções paternaes, prescriptas a este respeito pelo Soberano «Pontilice Leão X II, em sua encyclica para a extensão do Ju- «bileu. Julgo pois que reimprimindo csla obra aqui em Ro- «ma, sc fará um verdadeiro serviço aos confessores que de- «sejam conhecer os meios, as práticas, as precauções que se «devem empregar, administrando este sacramento lão impor-

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«tantc, para assegurar o successo e fructo d’elle, sem perigo «para a consciência d’aquelles q ue o administram.

• Padre Ventura, Theatino.»

As considerações seguintes podem fazer sentir toda a im­portância d’esta approvação e d’aquellns que são dadas pelas censuras romanas as obras do mesmo genero.

«Ha uma grande dilTcrença entre os censores romanos eos «dos outros logares. Sc acontecesse que um censor dioce- «sano approvasse e deixasse imprimir uma obra má, seria «uma grande desgraça sera dúvida, mas este mal de algum «modo seria sómente particular. Os censores romanos, não «se deve esquecer isto, são os agentes do Soberano Pontiiice, «nomeados por elle mesmo ou por seu representante irame- «diatamcDte; e póde dizer-se que o Papa é caução de suas «censuras. Sc pois um censor romano approvasse e princi- «palniente louvasse uma obra que contivesse uma palavra «contraria ao que Roma ensina, seria um grande mal para «toda a catbolicidade, e o Papa, condemnando o censor, se- «ria obrigado a publicar sua falta para atalhar suas conse- «quencias. Deve d’isto concluir-se que seria ao menos hem «imprudente o vitupcrar uma obra theologica approvada e so- «bretudo louvada eni Roma pelas auctoridades competentes.»

2.° Da Prática dos confessores de Sanlo Affonso de Ligo­rio. S. Ligorio, fundador da congregação do Santo Redem­ptor, Bispo de Santa Agatha dos Godos, nasceu em Nápoles, de uma antiga e nobre familia, a 6 de setembro de 1696. Desde sua estreia na carreira da sciencia, o joven Alfonso marcou seu posto enlre os homens superiores. Apenas tinha deze.seis annos quando por acclamar.ão foi recebido doutor da universidade de Nápoles. Pouco tempo dcpoi.s entrou na advocacia. Já diante d’elle sc abria uma brilhante perspecti­va; mas Dens, que o queria todo inteiro para a Igreja, lhe fez vivamente sentir, a vaidade das cousas do mundo. Docil á graça, Affonso de repente resolveu consagrar seus talentos e sua vida á salvação das almas. Quaulos obstáculos não teve elle a vencer! Filho mais velho de nma familia nobre, c sua mais hella esperança, elle deveu, como S. Luiz Gonzaga, triumphar de ludo o que a ternura paterna c as considera­ções humanas podem fortemente oppor a uma vocação. Elle o^conseguiu e foi ordenado presbylero a 21 de dezembro de

Animado do espirito, cuja plenitude acabava de receber, Alfonso consagrou as primicias dc seu zelo aos pobres habi­tantes dn aldeia. Para llics procurar com mais eflicacia os soccorros espirituaes é que elle estabeleceu uma congregação

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de missionários, debaixo do nome do'Santo Redemptor; lan­çou seus fundamentos em 1732, e foi nomeado superior d’ella: elle a dirigiu até 1762. N’esla época sua humildade foi posta a uma bem dura prova. Clemente X I I I o nomeou para o bispado de Santa Agatha dos Godos, no reino dc Ná­poles. AlTonso suppiicou ao Pontilice que não lhe impozesse umn carga que cllc considerava como superior a suas forças. 0 Papa, que ba muito conhecia seu merecimento e sua vir­tude, lhe enviou a ordem formal de aceitar. AlTonso obede­ceu; elle veio a Roma para se fazer sagrar. Foi n esta occa­sião que Clemente X I I I disse ao Arcebispo de Nazareth estas propheticas palavras: Em morrendo Mgr. de Ligorio teremos mats um santo.

Bispo, sem deixar de ser missionário, Affonso nutriu con­stantemente seu povo com o pão da palavra divina; pastor caritativo, elle se despojou de tudo para alliviar seus desgra­çados diocesanos em uma fome que desolou o paiz. Depois de treze annos de governo, enfraquecido pelos trabalhos, ma- cerações e doenças, obteve do Papa Pio VI, em 1776, a per­missão de sc demittir, e, na idade de setenta e nove annos, se retirou á sua congregação em Nocera dei Pagani, onde no estudo, oração e exercicios de penitencia passou o resto de sua vida. Morreu em 1 de agosto de 1787, tendo noventa e um annos de idade. Derogando em seu favor o decreto de Urbano V III, que exige um intervallo de cincoenta annos an­tes de proceder ao exame jurídico das virtudes. Pio V II la­vrou 0 decreto da beatificação do Servo de Deus a 6 de se­tembro de 1816. Aquelle de sua canonisação foi publicado por Pio V II I a 16 de maio de 1830.

Tal é em poucas palavras a vida d’este grande director das almas. Tão illustre por suas virtudes como por seu saber, e pelas grandes cousas que em favor da Igreja fez, é entre os santos um modelo digno de comparar-se aos mais celebres varões da historia ecclesiastica.

Passemos agora ás garantias que apresenta sua Theologia moral, por conseguinte sua Prálica dos confessores, segunda obra de que o Manual sc compõe.

Garantias intrinsecas. 1.® E um dos últimos auclores de moral, fez uso das luzes de todos seus predecessores (*). Ut

(') Tomamos o Ir.ihallio dc contar o numero dc lheologos e caiio- nistas citados pelo sanlo Bispo cm sua Theologia moral: nós adia­mos mais dc sclcccnlos c cincoenta! .N’csle numero sc contam Iodos os principcs da cscola, todos os doutores os mais celebres dos diver­sos iiaizcs. Sua moral porlaulo não dcvc chamar-.sc unia moral ita­liana, hoa sómente iiara um paiz e para um lempo, mas com muila razão uma moral calbolica.

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vero sententias veritati conformiores seligerem in qmcmique qucestione, non parutn laboris impendi; per plures enim an­nos quamplurima classicorum volumina evolvi tam rigidce quam benignce sententice, quce ultimo (ut arbitror) in publi- cum prodierunt. Prcesertim autem sedulam operam navavi in adnotandis doctrinis D. Thomce, quas in suis fontibus observare curavi; insuper in controversiis intricatioribus etiam doctos juniores consului (*). 2.® Elle examinou suas opiniões cora a maior altenção: por suas orações e por sua santidade obteve luzes que nem todos tôem recebido. 3.® Elle cita diílusaraenle as opiniões de todos os principaes moralis­tas, de sorte que elle póde supprir todos os outros. Concin- natas in hoc (opere) reperies omnes qucestiones, et res mora- les, quce magis ad praxirn deserviunt. 4.® Elle sómente es­creveu depois de muitos annos de exercicio habitual do santo ministério nas missões, cousa muito rara nos oulros auctores: Plurima hic exposui, quce magis missionum et confessionvm exercitio, quam librorum lectione didici. B.” Elle operou em grande numero as mais admiraveis conversões. Mirumest... quot devios ad rectum tramitem ac etiam ad clmstianam per- fectionem multiplicibus scriptis adduxerit. (Pio V II no dec. de beat.) 6.® Elle não se ligava a syslema algum de paiz: elle sómente se cingia á doutrina romana, e a tudo o que a ella mais se aproximava: elle cita opporlunamenle todas as decisões da Sanla Sé, que oulros auctores muitas vezes omit- tem: In deleclu autem sententiarum... priusquam meum fer­rem judicium, in eo, ni faltor, totus fut, ut in singulis quces- tionibus me indifferenter haberem, et ab omni passionis fuli- gine expoliarem: quod satis, benevole lector, ex eo cognoscere poteris qtiod ego non paucas sententias, quas in prioribus hu­jus operis editionibus tenueram, in hac postrema mulare non dubitavi... Prccterea hic invenies in suispropriis locis dili- genli studio adnotatos texlus lum canonicos, lum civiles ad rem pertinentes... decreta recentiora Summorum Ponltficum, et prcecipuas Bullas, sanctionesque nuper edilas a SS. D. N . Papa Benedicto X IV . (S. Lig., Theol. mor., tom. I, xxiii.) 7.® Elle nenhum interesse humano ou pessoal tinha: Propte- rea in lucem edere deliberavi hoc novum opus. quod inler opi- niones nimis benignas et nimis severas medium locum tene- ret, quodque non tam diffusum esset ut non facile legeretur, nee tam breve, ut in multts deficeret (=“). 8.® Sua moral é es­timada e seguida por ura grande numero de ecclesiaslicos zelosos, que, tendo-o estudado bem, exercem cora muilo fru-

'leol. mor., lom. I, xxi e .xxii.

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cto 0 sanlo ministério {*). 9." Praticando e ensinando a sua raoral, veio a ser sanlo. Que mais se pretende, e como se condemtiaria aquelle que o imitasse? 10.» Os outros santos moralistas não lôem escripto sobre a moral com lanla minu- dencia como elle. 11.® Roma, depois de um exame rigoroso, declarou nihil censura dignum. 12.® Em moralista algum se acharão reunidas todas estas vantagens.

Garantias extrinsecas. Os guardas da moral e da fé, os Soberanos Ponliíices, léem feilo todos grande apreço da Theo­logia moral de S. Ligorio, por consequencia da Prática dos confessores, que é uma parte essencial d’aquella. Bento X IV , tão hüui juiz n’csta maleria, aceitou a sua dedicação, e res­pondeu ao Sanlo em uma carta das mais lisonjeiras. Eis aqui 0 sen teor:

«Dileclo filio Alphonso de Ligorio, Presbvtero Congrega- lionis SS. Redemploris, Benedictus X IV .

«Dilecle lili, salulem et apostolicam henedictionem.«Abhiamo ricevuta una sua leltera degli ollo di giugno,

unitamentc col secundo tomo delia sua Morale, ed allri pure suoi lihri di minor mole, ma di gran prolillo per la salute delle anime. Noi la ringraziamo dei regalo, ed avendo data una .scoisa al libro delia sua Morale (ch’ò dedicalo a noi, dei chc rcndiamo parlicolari grazic), 1’ahhiamo ritrovalo pieno di buona notizie; ed cila può restar sicura dei gradimento uni- versalc ed delia publica utililã. Trallo randeremo leggendo, e speriamo, che, quanlo leggeremo, corrisponderã a quanlo abhiamo letto. Terminiamo col darle Taposlolica henedi- zione.

«Dalum Roma; apud S. Mariam Majorem, die 13 jiilii 1735, ponlilicatus nostri anno decimo quinto ( ).

É depois de ler lido, segundo promeltera, a Theologia do bemavenlurado, que esle mesmo Pontiiice dava cm resposta

=) A no. so "aro lilho Affonso dc Ligorio. l‘rcsl)vicro da Congrega­ção do Sanlissimo licdemplor. licnlo .XIV. Carissimo lilho, .saude e heneão a|)osiolira. liecchcmos vossa caria do 8 dc jiinlio com o se­gundo volume de vossa 2'hcoloffia moral, e algumas dc vossas obras dc menor cxlensão, inas dc uma mui grande uiilidade para a salvação das almas. .Nós vos agradecemos este prcseiUe: c depois dc termos corrido vossa olira dc Moral, (iiic nos liaveis dedicado, (pelo (pic vos damos narlicniarcs agradccimcnlo.s) a tomos achado clicia dc c.xcel- Icnlcs doiUrinas; c podeis seguramente conlar com áapprovação uni­versal c utilidade pública. Nós a leremos com vagar, c Icmos a con- flança dc que Indo o que lermos lia dc correspondér ao que temos liílo AWl

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« alguem, que o consultava, unicamente este celebre dito: Avele U voslro Ligm ri, consiglialevi con esso (‘).

As approvações e elogios de Bento X IV acrescem aquelles de Clemente X ll l . 0 systema moral, que é o fundamento e chave de toda a Theologia do Bcmaventurado, sendo atacado por um pseudonymo, Adelpho Dositheo, o snnlo Bispo fez logo sua apologia'que elle dedicou ao Soberano Pontilice cora seu livro da Verdade da fé. Clemente X I I I lhe testemunhou toda a sua satisfação na seguinte carta: Librum luum... li- bentissime accepimus, tum quod tuus esl, cujus probe novimus ex pluribus scriplis tuis et ingenium et doctrinam... tum quod confidimus ulilissimum fulurum. Esla carta é de 17ü7. Este mesmo Papa tinha a mais alta estima da virtude e sciencia do nosso Bemavenlurado. Desde a primeira audiência depois de sua nomeação para o episcopado, elle o cnlrelevc muito lempo, e quiz que lhe désse seu parecer sobre muitos nego­cios da ultima imporlancia para a Igreja. N ’esle enlrcleni- mento o Sanlo Padre foi o primeiro a fnllar-lbe das conlradi- cções que sc tinham levantado contra um livro qiic Alfonso linha publicado sobre a utilidade da freqüente coramunbão; elle disse ao Santo, em uma effusão de coração, que elle mesmo por sua própria experiencia tinha conhecido quanto esla prálica era vantajosa ao bem das almas, e o encarregou de refutar a opinião dos espiritos syslematicos que sustenta­vam 0 contrario. Voltando á sua residencia, AlTonso se pôz logo ao trabalho, c compôz uma sábia refutação, que foi ira- mcdialamentc impressa; elle mesmo a apresentou ao Sobe­rano Pontilice, que foi tão satisfeito d’este opusculo, como admirado da facilidade com que cm tão pouco lempo o tinha acabado. (Vida de S. Ligorio, 4." parte, cap. i, pag. 224.)

Pio VI conservou pelo santo Bispo os mesmos scnlimcntos que Clemeiilc X III. Em umn carta dc 19 dc novembro de 177S, elle Ibe agradeceu o,ter-lhe dedicado sua obra Sobre a Providencia, assim como* muitos outros tratados, in qui­bus, diz 0 Vigário de Cbrislo, prceclanm pielatis tuce slu- dium cum sacra doclrina elucet. Sabe-se que esle mesmo Papa tinha sempre sobre sua mesa as Visitas ao Sanlo Sa­cramento.

Pio V II approvou a 18 de maio de 1803 o decreto da Con­gregação dos Ritos relativo ás obras do Bemavenlurado. Este decreto, publicado a 28 de maio do mesmo anno, contém o seguinte: Docui sanclissimus hic anlistes, ac ita bene docuit ut omnibus ejus operibus, tum hjpis edilis, tum manuscriptis, ex Aposlolica; Sedis disciplina ad severam Irulinam revoca-

(') Tendes vosso Ligorio, consullac-o.

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tis, NIDIL IN IIS CENSURA DIGNCM FUISSE RBPERTOM S. ConQre- gatio decreverit die i i M aii iS03; cui decreto, die iS ejus- dem mensis, Sanctitate Vestra amuente, Apostolicw confir- mationis robur accessit. Na bulia da beaiilicação do Servo de Deus, ein data de 6 de setembro dc 1810, o mesmo Pio V II faz 0 mais bello elogio de sun doutrina; elle nos inculca como prodigio o grande numero de peccadores que este santo Dispo por seus differentes escriplos trouxe ao caminho da sal­vação, e mesmo conduziu á perfeição christã. Alirum est... quot devios ad rectum tramitem, ac etiam ad christianam perfeciionem multiplicibus scriptis adduxerit. Certamente, os Papas não se exprimem assim a respeito d’aquelles, cujas obras encerram opiniões contrarias aos principios da moral, ou ás regras que para a administração das cousas santas a Igreja nos tem traçado.

Leão X II dirigiu a M. Marielli, de Turin, editor das obras do Bemavcnlurndo, o seguinte Breve (nada mais significa­tivo, nem mais proprio para fazer comprehender as razões do favor especial que a Sanla Sé sempre Icsleniunhou á moral do sabio Bispo):

«Dilecto lilio nyacinlo Marielli, Leo Papa X II.«Dilccte lili, salutem et aposlolicam bcnedictioneni.«LT minus noceat malorum colluvies librorum, qua, nun-

quam satis deploranda íctatis nostra; calamilate, regiones omnes redundant, non exiguus facil scriptorum pielate ac doctrinn prícslanlium numerus, quos Deus ad religionis mo- rumque tutelam, misericordi Providenlim sua; consilio, nun- quani perdilorum non opponit audacia;. In quibus cum pra;- serlim vir sanctissimus idemque doclissimus bealus Alplionsus de Ligorio jure opliino numerelur, imo singulari quodam e.x- cellal tenera; pietalis alTeclu, al in eam potissimum curam scriptis suis incumbat, ut freqüentem suadeat sacraraenlorum usum, Christi Jesu amorem, el ejus misericórdia; mcritorum- que íiduciam, BcaUcque Virginis Deipanc, ac coelilum sen- ctorum cultum inculcet, qua; demum lirmissima sunt adver- sus omnem pravitalem pra»idia; oplime sana de religione meriliis cs, et sua si norit commoda, dc univcrsa bominum socielate, qui in scriptoris hujusmodi operibus coiligendis, et iu lucem edendis operam tuam induslriamque collocaveris; Nosquc potissimum babemus graliam, quibus pro pastorali noslro niunere nihil magis est cura;, quam ut omni ope pro- íligentur vitia, pielasque fovealur. Ejus rei lestimonium, gratique in te animi, qui etiam observauliam in Nos tuam professus sis misso Nobis editionis ejusdem cxemplari, iteqi- que incilamentum ad ejusdem generis libros, ut ante fecisti, quamplurimos possis evulgandos, aureum, quod tibi misi-

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PREFACIO XJX

mus, nuniisraa esse volumus, cum Apostolica benedictione, quam tibi amanter imperliraur.

«Dalum Romae apud S. Pclrura, die 19 Februarii anni 1825, pontificatus nostri anno secundo.

• Gaspar Gasparini,*.\b cpistolis latinis.»

Pio V III, sendo ainda Cardeal, escreveu ao Bispo de Mar­selha louvando-lhe sua grande devoção para com o hemaven- turado Affonso. 0 mesmo Bispo pelo mesmo tempo recebia um Breve analogo de Sua Santidade Leão X II; e na carta do Cardeal Casliglionc, elle linha a opinião anticipadn de Pio V III. Eis aqui as expressões notáveis de que este Pontiiice, de gloriosa memória, sc serve para louvar nosso Santo: Quem nedum virtulis splendore illustre Episcopali Ordini decus noslra cetale inluHsse, sed et sana secundum Deum do- ctrina prwfulsisse suscipimus, lot editis de re sacra volumi- nibus, 111 quibus nihil dignum censura, venerando judicio ad- monemur.

Gregorio XV I, marchando sobre os vcsligios dc seus pre- dccessorcs, corôa todas estas aucloridades, e Iranquillisa para sempre os uspirilos os mais difliceis, approvando a famosa resposta da Penitenciaria ás duas perguntas seguintes, apre­sentadas pelo Cardeal de Rohan, Arcebispo de Besançon.

COiNSULTATIO

Emincntissime,Ludovicus-Franciscds-Adoustos, Cardinalis de Rohan-

Chabot, Archiepiscopus Vesonlioncnsis, doctriníc sapienliam et unitatem fovere nitilur apud omnes dioecesis sum qui cu­ram gerunt animarum, quorum nonnullis impugnnntibus Theologiam moralem beati Alphonsi Marim a Ligorio, tan- quam laxam nimis, periculosani salull et sanm morali con­trariam, sacr® Pcenilenliari® oraculura requirit, ac ipsi unius Theologiro Professoris (Gousscl) sequenlia dubia pro- ponil solvenda.

1.® Utrum sacr® Theologi® Professor opiniones, quas in sua Theologia morali profitelur beatus Alphonsus a Ligorio, seoui tulo possit ac prolileri?

2.® An sit inquietandus Confessarius qui omnes beati Al- phonsí a Ligorio sequitur opiniones in praxi sacri poeniten-

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t is tribunalis, hac sola ralione quod a Saneia Sede Apostó­lica nihii in operibus censura dignum reperlum fueril? Con­fessarius, de quo in dubio, non Icgil opera beati üocloris nisi ad cognoscendum accurale ejus doclriuani, non pcrpendcns momenla ralionesve, quibus variae nilunlur opiniones; sed exisliinat se luto agere eo ipso quod doctrinam qu® nüü censura dignum conlinet, prudcnler judicare qucat sanam esse, tutam nec ullatenus sanclilali Evangelic® contrariam.

DECISÃOSacra Pcenitenliaria, perpensis exposilis: Reverendissimo

in Christo Patri S. R. E . Cardinali, Arcbicpiscopo Vesonlio- nensi, rcspondendum censuit:

Ad primum quffisilimi: AÍTirinative, quin tamen inde re- prehendi ccnseantur qui opiniones ab aliis probatis auctori- bus Iraditas sequunlur.

Ad secundum quacsitum: Negativc, habita ratione menlis Sanct® Sedis circa approbatioucm scriplorura Servorum Dei ad eífcclum canonizalionis.

Datum Rom®, in sacra Pranilenliaria, die 3 Julii 1831.A. F . de Retz, S. P. Regcns.F . Fricca, S. P. Secrelarius.

Concordai cum originali.A., Cardinalis, Archicpiscopus Vesonlionensis.

0 mesmo Cardeal dirigiu de Roma uma circular ao seu clero, exhortando-o a seguir na prática do sanlo tribunal a moral do bemavenlurado AlTonso: Omnes paterno horlamur aff'eclu ut eam ad praxim deducant veluli eam, quce Iam ri- goris nimii, quam taxilalis ceque noxios fines devitans, tuto tramite incedal; monemusque nostri simul gaudii, vestrique boni futurum, si quilibet cx animaram rccloribus Dicecesis nostrae huic responso Sacra; Pa:mlenliariai circa doctrinam beati Alphonsi a Ligorio sese conformare sludebit, illoque in gubernatione animarum utelur unanimi consensionc.

Algum tempo depois escrevia o mesmo Prelado ao senhor Bispo actual de Pcrigueux: «Tendo submellido ao Santo Pa- «dre, cm uma audiência dc 22 dc julho (1831) a resposta da «sagrada Penitenciaria sobre a Theologia do bemavenlu- «rado Ligorio, Sua Santidade a confirmou, approvando tanto «a resposta como o designio que cu linha de a publicar c de «a apoiar com esta carta pastoral.

«A grande vantagem da Theologia do bemavenlurado Li- «gorio, e 0 que me leva a preferir suas opiniões, e a desejar «que ellas se propaguem e estabeleçam em minha diocese, é:

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PREFACIO XXI

«1.® a longa experiencia d’este santo e sabio Bispo que exer- «cilou conslanlenienle o ministério alé aos novenla e um an- «nos; 2.® são os fructos abundantes que sua moral produziu, ■e que lodos os dias ella produz pelo ministério d’aquelles «que a põem eni prática; 3.® é que a lheologia dos sanlos «lem certa cousa piirticular que chega no coração, c nos edi- «íica ao mesmo tempo que nos instrue; 4.® linalmente, é que «sua doutrina fórma um curso de moral dos mais completos «e minuciosos que tinhamos; e, o que se não póde dizer com «a mesma segurança de nossos escolasticos modernos, ella «nada encerra reprehensivel, ao juizo da Santa Sé, nada, «absolutamente nada que seja digno de censura: Nihil cen- «sura digm m .»

Para hem comprebender a latitude e auctoridade d’eslas palavras : Nihil censura dignum, pronunciadas pela Congre­gação dos Bilos no decreto de heatilicação do hemavcnturado Allonso, devem recordar-se duas cousas essenciaes: 1.” quan­do se trata de proceder á heatilicação de algum servo de Deus, são escrupulosamente examinados todos seus escri- ptos, até os seus menores opusculos que podem dizer res­peito á regra dos costumes ou verdades da religião; 2.® sem­pre se abraça o partido mais rigido: «Assim uma opinião «pouco conforme á pureza dos preceitos evangélicos, e capaz «de ollender os bons costumes; um syslema suspeito por sua «novidade, principalmente sohre questões frivolas; um senli- «menlo que se encontre com aquelle dos Santos Padres, e do «commum dos chrislãos, são manchas indeleveis pelas quaes «se impõe um silencio eterno á causa proposta.» Bento X IV , no seu Tratado da beatificação e canonisação dos santos, ex­plica estas palavras, Nihil censura dignum, n’esle mesmo sentido (‘).

Foram pois examinadas, segundo todo o rigor d’eslas re­gras, as obras de AlTonso de Ligorio, antes de proceder á sua heatilicação; e se pôz n’eslc exame tanto mais cuidado, tanta mais diligencia, quanlo sua doutrina experimentava, sobre muitos pontos, grande.s conlradicções.

Ora, qual foi o resultado d’esle exame? 0 decreto da Sa­grada Congregação dos Ritos, confirmado pelo Papa Pio V II, 0 dirá; elle díz, que nada se descobriu nas dilTerentes obras do Servo de Deus que fosse digno dc censura, Nihil censura dignum. Ellas portanto não encerram alguma proposição, não digo impia, herclica, scismatica, escandalosa, mas errônea, perniciosa, tcmeraria. Não se póde pois censurar a moral

>• 2 c 5 (edição dc Dolonba,

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d’este santo Bispo, sem erigir-sc cm censor da auctoridade mesma, sem censurar a decisão da Santa Sé, que a declara ortiiodoxa, declarando que ella nada encerra, absolutamente nada rcprehensivel.

Assim vôde sete Papas que louvam, que approvam, que reconiinendam a Theologia do bemaventurado Ligorio; vôde a Igreja, que sobre seus altares colloca esle santo Bispo, re­conhecendo que sua doutrina operou prodigios de salvação nas almas. Mostrac ura auctor de moral que oITereça iguaes garantias.

E agora, qual é o homem no mundo christão, que ousaria alcunhar dc imprudência aquelle que a Igreja declara ler le­vado a prudência até ao heroismo? considerar como pouco esclarecido e pouco instruido aquelle que o Vigário de Jesus Christo declara muilo esclarecido e muilo instruido, doclissi­mus; perigoso aquelle que elle declara muilo util á salvação das almas e digno da approvação de lodo o mundo calbolico, ulilissimum... E lla puo restar sicura dei gradimenlo univer- sale e delia publica u lilità; relaxado aquelle que elle declara suscilado por Deus expressamente para oppor um dique á torrente de más doutrinas? Vl minus noceat malorum collu­vies librorum non exiguus facil scriptorum pielate ac do- clrina prwslantium nümerus, quos Deus ad religionis mo- rumque tutelam, misericordi Providenliw sum consilio, nun- quam perdilorum non opponit audacice. In quibus prwserlim v ir sanctissimus idemque doclissimus beatus Alphonsus de Ligorio jure oplimo numerelur.

De proposito havemos sido dilTuso a respeito do bemaven­turado Ligorio, porque ns approvações e elogios dados á sua doutrina rclleclera sobre todos os auctores de que o Manual se compõe, atlcndido que elles professara os mesmos princi­pios, c tôem a mesma prática: approvar a ura, é approvar a todos.

3.® 0 Manual se compõe dos Avisos aos confessores e do Tratado da confissão geral do bemaventurado Leonardo de Porto-Mauricio. Estas obras, que revelam o homem de Deus, 0 missionário experimentado no conhecimento do co­ração humano, foram impressas cm Roma á visla do Soberano Pontifice e cm niuila.« cidades da Ilnlia, especialmente em Bergamo era 1828, e em Turin em 1830, á visla dos Bispos e com as approvações ordinarias. Demais, basla conhecer um pouco 0 vida d’esle zeloso Servo de üeus, ao qual o bemavenlurado Ligorio cita com elogio e respeito, e a quem elle chama o grande missionário da nossa época, para julgar quanlo elle era sabio na conducla das almas, e por conse­guinte quanta confiança a lodo o Sacerdote animado de um

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verdadeiro zelo pela gloria de Deus merece sua Prática, a qual 0 santificou e a milhares de outros cora elle.

0 bcmaventurado Leonardo nasceu em Porlo-Mauricio, ci­dade do estado de Genova, a 20 de outubro de 1636. Na idade de doze annos foi enviado a Roma, onde fez brilhantes progressos no Collegio Romano, debaixo da direcção do Pa­dre Tolomei, depois Cardeal e uma das glorias do seu seculo. A medida que crescia era idade c em sciencia, o joven Leo­nardo crescia tambem era piedade. A voz de Deus tocou seu coração, e se resolveu a entrar em religião. Foi a 2 de outu­bro do anno de 1698 que elle professou na Ordem dos Me­nores reformados, no convento de Santa Maria, na província de Sabina. Devorado do zelo da salvação dns alma.s, o joven religioso sc apresentou ao Abbade, depois Cardeal de Tour- non, que partia para a China e que desejava levar comsigo certo numero de missionários. Obstáculos insuperáveis se oppozeram á execução do seu projecto: declarou-se-lhe uma doença que o conduziu ás portas do tumulo. Todos os soc­corros da arte foram em vão empregados; então Leonardo desesperado dos médicos se dirigiu á Rainha do Céo, e fez voto, se recuperasse a saude, dc se consagrar todo á obra das missões. Sua oração foi ouvida. Em pouco tempo elle se achou tão perfeitamente são c tão robusto, que pôde con­tinuar até á idade de setenta e cinco annos, tanto os penosos trabalhos áo apostolado, como as prodigiosas macerações que elle olTcrecia a Deus para o bom exito de seu ministério. Era de tal modo infatigável, que na idade de cincoenta e tres an­nos tinha já feito cento e tres missões.

Todos os desgraçados, todos os pobres abandonados nos hospicios, ou no fundo das aldeias, pareciam ter um direito particular a seus cuidados c á sua predilecção. Elle podia di­zer com 0 Divino Mestre: 0 espirito de Deus me enviou para evangelisar os pobres. Seus trabalhos não foram inúteis: se­riam precisos volumes inteiros para referir todas as conver­sões que elle operou. Bento X IV, penetrado dc estima e ve­neração por esle grande Servo de Deus, o encarregou de fa­zer missões nas montanhas da provincia de Bolonha. 0 Santo obedeceu promptamente; mas elle disse a seus companhei­ros, da maneira a mais precisa, que estas missões seriam para elle as ultimas. Escrevendo-lhe um religioso de sua con­gregação, que viesse a Roma para descansar e morrer tran- quillo no convento de S. Roaventura, o venerável velho lhe respondeu: Se for vontade de Deus, bem depressa serão vos­sos desejos cumpridos: eu sinto que a barca está velha, e que não póde navegar mais.

Foi a 23 dc novembro de 1731 que o beraavcnturado Leo­

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nardo sentiu os primeiros golpes de sua moléstia. Todavia quiz ainda celebrar a Sanla Missa. Um de seus missionários 0 exhortava a deixal-a n’esle dia: Vós não quereis pois que eu me enriqueça? lhe respondeu elle, uma missa vale mais que todos os lhesouros do mundo. Elle subiu ao santo altar; mas eram taes sua languidez e fraqueza, que a custo se sus­tentou c terminou o augusto sacrilicio. No dia seguinte se dispozeram a transporlal-o para Itoma ao convento de S. Boa- ventura. Apenas chegou, pediu e recebeu cora a mais terna piedade os últimos Sacramentos. Tendo-lhe o medico orde­nado um remedio proprio a reanimar suas forças exlinclas, o sanlo Missionário o tomou por obediencia, dizendo: Oh! se tanto se fizesse pela alma como se faz pelo corpo! Com ef­feito, seu corpo não conhecia outros Iralaraenlos senão ma­cerações e ahstiuencias. A lim de estar mais recolhido, elle pediu aos religiosos que o deixassem só, e o ouviram, pene­trado de um fervor extraordinário, entreter-se com Deus, e invocar sua poderosa proleclora, a augusta Maria. Final­mente pela meia noite, conservando todo o conhecimento e toda a serenidade de sua hella alma, adormeceu, sem alguma agonia, com o tranquillo somno dos justos. Foi islo a 24 de novembro de 1731.

Es(|uecemos-nos de dizer que foi elle o primeiro que es­tabeleceu a Via-Sacra no Colyseu. Elle quiz que o estandarte do Filho do Uomem fosse publicamente venerado pelos chris­tãos d’esles últimos tempos, no mesmo logar onde o paga­nismo prepotente quiz abolir sua memória, e onde nossos paes na fé alcançaram tão gloriosos Iriumphos.

Apenas foi conhecida a morte do Servo de Deus, um con­curso immenso de povo se reuniu diante do mosteiro para tributar uma ultima homenagem á santidade de seu grande Missionário. Foi tal a aílluencia, que foram obrigados a ler fechadas as portas com receio de algum accidenle. Um grande numero de milagres operados por sun intercessão, já durante sua vida. já depois de sua morte, alluslara que o braço do Senhor não é mesquinho, e que a voz do povo é sempre n’es- les casos o echo fiel da voz dc Deus. Elle foi bcatilicado por Pio V I a 14 de junho de 1796.

4.® Elle se compõe das Instrucçõcs de S. Carlos aos con­fessores. Fallar da vida d’eslc grande Arcebispo seria supér­fluo; todos os sacerdotes o conhecem. Diremos sómente duas palavras da opinião espalhada em França, ao menos em cer­tas dioceses, que S. Carlos é o patrono da moral severa; que elle professa uma doutrina dilTerenle d’aquella de S. Ligorio. Esta opinião não é mais que um prejuizo sem fundamento; nós 0 mostraremos logo. Esperando, eis aqui o que póde fa-

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zel-a nascer: 1.® Muitas pessoas em França faliam da moral do bemavenlurado Ligorio sem a conhecer perfeitamente, ousaremos quasi dizer, sem a terem lido. 2.® 0 bemavenlu­rado Ligorio sendo, segundo a expressão de Leão X II, muilo erudito e muilo sabio, desthronisou bom numero de opiniões moraes que tinham usurpado em nossas escolas o titulo de preceitos incontestáveis; esta pretendida temeridade foi para algumas pessoas occasião de escandalo. 3.® Nós conhecemos as Instrucções do illuslre Arcebispo de Milão, bem menos pela Iraducção liei do clero de França, do que pelos fragmen­tos da iniicl traducção latina, de que fez uso o auclor de ura Slethodo, clássico entre nós. Para reclilicar esle erro tão grave, e mostrar a conformidade da moral de S. Carlos e do bemavenlurado Ligorio sobre as regras geraes de direcção, reproduzimos no Manual a Iraducção do clero de França: ella ahi se acha conservada sem mudança de alguma especie.

B.® Elle se compõe dos Avisos de S. Francisco dc Salles aos confessores. Nomear S. Francisco de Salles, é rcrordar a doçura, a caridade, a paciência a toda a prova, o conheci­mento profundo do coração humano, de suas misérias, de suas enfermidades, e de seus recursos; é recordar o restau­rador da piedade nos tempos modernos: em uma palavra, é recordar um dos mais babeis directores das almas, um dos mais amaveis santos, e que tem melhor sabido fazer amar a religião. Podemos nós olVerecer um guia mais seguro? Que temos nós a receiar, seguindo o caminho que elle Irilboii, e que nos disse que trilhássemos com elle? Não o conduziu esle caminho ao céo e a tantos outros com elle?

Depois da primeira edição d’esla obra tivemos conheci­mento do depoimento de Sanla Chantal, no processo dc ca- nonisação dc S. Francisco de Salles. Esle depoimento, feito por uma santa, debaixo da fé do juramento, cm presença dos commissarios da Sanla Sé, contém lão bellos promenores so­bre 0 modo por que o nosso Bemavenlurado ouvia as conlis­sões, que tomamos como um dever o rcferil-os: acbar-sc-hão em logar competente com uma indicação precisa.

6.® Elle se compõe dos Conselhos e da prálica de S. F i­lippe de Neri. 0 que acabamos de dizer do sanlo Bispo de Genebra se appiica sem restricção ao illustre fundador do Oratorio dc Roma.

Com cfleilo, S. Filippe de Neri foi ura dos santos mais ce­lebres do decimo-scxlo seculo. Nasceu em Florcnça em IB IB . Desde sua infancia deu mostras de uma grande madurcza de espirito c sobretudo de uma pureza angélica. Pela idade de dezesete aunos renunciou a todas as esperanças do mundo, e se apresentou em Roma. Ainda que bem joven, passava

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uma vida comparavel pela austeridade aquella dos antigos anaclioretas. 0 estudo dn philosophia e da theologia formava sua principal occupação. Em sua velhice cilo discutia ainda os pontos mais difliceis d’cstas sciencias com uma tal frescura de memoria, que sc julgaria que em toda a sua vida tinha d'ellas feilo seu unico estudo. E a proposito referir aqui uma particularidade que bastantes pessoas ignoram; aos sabios conselhos d’esle homem superior 6 a Igreja devedora dos fa­mosos annacs do Cardeal Baronio. 0 illustre discipulo de Filippe de Neri confessa ingenuamente que toda a gloria d’esle bello trabalho pertence a seu mestre. {Vida de S. F i ­lippe de Neri, liv. I, cap. xni.)

Acabados seus estudos, Filippe se deu iuteiramenle ao zelo da salvação dns almas. Ainda não era sacerdote, e já contava um grande numero de conversões extraordinarias, operadas pqr seus cuidados. Todavia, julgando seu confessor que elle faria muilo mais fructo se fosse revestido do saccrdocio, lhe determinou que fosse ás santas ordens. 0 humilde Filippe julgou dever objeclar sua incapacidade, sua insufliciencia; foi necessário obedecer, c no mez dc maio do anno de la o l a Igreja contou um nresbytcro mais, segundo o coração de Deus. Era Filippe de trinta e seis annos dc idade.

Desde esle momento elle sc consagrou sem reserva ao mi­nistério do santo tribunal: foi esta sua vida, confessava de dia e de noite. Para ser mais assiduo no confessionário per­maneceu em Roma durante quarenta e quatro annos, sem querer sair uma só vez, apesar das inslancias reiteradas de seus numerosos amigos. Onde achar um confessor mais ex­perimentado, um confessor, por conseguinte, cujos conselhos mereçam mais confiança? Elle continuou seu util, mas labo­rioso ministério,.alé á sua morle, que aconteceu em 139B. Tinha oitenta annos de idade; vinte e sete annos mais tarde, quero dizer, a 12 de março de 1622 foi posto em o numero dos santos por Gregorio XV, no mesmo dia que Santo Igna­cio. S. Francisco Xavier c Santa Thereza. Seus avisos aos confessores, que nós damos no Manml, são tirados dc sua vida, escripla em italiano pelo Padre Bacci, presbylero dc sua congregação.

7.® Finalmente o Manual se compõe dos Avisos de S. Fran­cisco Xavier. No meio de seus trabalhos immensos, o grande apostolo das nações orienlaes achava ainda, como S. Paulo, momentos para escrever cartas c admoestações cheias de sa­bedoria aos sacerdotes que trabalhavam como elle na salva­ção das almas. Ora, se a sciencia, a santidade, a experien­cia, são titulos de recommcndação, que cousa mais digna de nosso respeito e de nossa confiança do que estes Avisos, em

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PREFACIO XXVn

que, além d’Í8lo, transparecem o zelo mais ardente e mais puro da gloria de Deus, e o conhecimento profundo do cora­ção humano? Estas admoestações são dirigidas ao Padre Bar- zée, direclor da missão de Ormuz.

Taes são os modelos e os guias que hoje olfereceraos a to­dos os nossos irmãos no saccrdocio. Admiráveis em si mes­mos, elles são talvez mais admiravcis ainda pela concordân­cia unanime que reina entre elles. Esla admiravel conformi­dade acaba de completar a prova de que o Alanual, inteira­mente composto de seus escriplos, é o methodo dc direcção 0 mais seguro. Quando se vé esles grandes santos, separa­dos dc tempo e de logar, pensarem todos do mesmo modo, póde-se deixar dc reconhecer que um só e o mesmo espirito os animava? 0 espirito d’Aquelle que disse: Eu estarei com­vosco lodos os dias; eu estou ao pé d’aquelles que me invocam em verdade?

Esla concordância perfeita não se dá sómente sobre os principios, sohre a suuslancia da doutrina, mas tambem so­bre 0 desenvolvimento. Todavia, devemos dizel-o, ha um ponto, um ponto unico, sobre o qual elles dilfcrem de senti­mento. Segundo n regra inviolável que nos temos imposto de nada dizermos de nossa cabeça, vamos fazer conhecer esta dilfercnça, deixando aos mais sábios o cuidado de decidir en­tre esles grandes mestres. Eis aqui a questão: é necessário accusar na confissão as circumstancias nolavelraenle açgra- vanles, mas que não mudara a cspecie do peccado? S. Fran­cisco de Salles e S. Carlos re.spondem afbrnialivaniente. 0 auctor do Sacerdote santificado, S. Liçorio, o bemavenlurado Leouardo suslentam o contrario; S.,Filippe c S. Francisco Xavier não faliam d’esta questão. E importante estudar a these estabelecida a esle respeito na Theologia grande deS. Ligorio. (Lib. VI, tract. i , de Sacr. Pcenit, n.® 408.)

0 Sacerdote santificado, depois de consultar o Papa Bento X II I , que deixa a questão indecisa, termina toda esta contro­vérsia pela regra seguinte: «Assim o Papa, diz elle, toma um termo medio, como se dissesse: A respeito da controver- aia, cu não vos obrigo, segundo o primeiro sentimento, a di­zer as circumstancias aggravantes, dc sorle que pequeis, se, não sendo interrogado, não as declaraes; mas por islo não vos dispenso de seguir o segundo, dc sorle que pos.saes dis­simular se fordes interrogados; porque o confessor póde ler necessidade d'esta noticia para hem conhecer o estado de vossa alma» (*).

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De tudo 0 que íica dito coucluimos que o Manual dos Con­fessores é 0 methodo de direcção o raais seguro; 1.®, porque é aquelle que seguiram os mais habeis directores da Igreja catbolica; 2.°, porque todas as obras de que se compõe são

•Conferências de Aw/ers (Gonfcr. iii, (lucstão 3). não sc dcvc entender «universalmcnle como se houvesse obrigação de confessar cm iodas

,s occasiões Iodas as circumslancias nolavelmcnlc aggravanlcs; se-

-------------- ------, ..JC não 6 facil discernir as circum-.stancias que augmenlam a malicia do iieccado, al6 ao ponto que seja «necessário coiifessal-as. Mém d'isto, as coiisequencias seriam mcs- «mo perigosas para o |)cnitenlc e para o confessor, quando sc tratasse «de peccados contra o sexto preceito.

«Julgamos pois que a obrigação de confessar as circumslancias .Qolavcimciilc aggravanlcs dcvc ser rcslricla ás occasiões seguintes:

«1.» Quando um confessor interroga um peniteiUc sobre as cir- «cumslancias aggravanlcs;

«2.'> Quando a circumstancia aggravanlc faz que um peccado seja «reservado, que o não seria, sc csla circumstancia se Ilie não jun- «tassc;. «3.° Quando lia uma censura annc.xa ao peccado por cansa dc uma

•circumstancia: por e.xemplo, quando sc feriu, deve cxj)licar-sc sc foi «a seu Parocho ou a seu Bispo, e sc a violência foi Icvc, grave ou •enorme;

«4.» Quando por um peccado sc conirahiu a obrigação dc restituir, •de satisfazer ou dc reparar um escandalo;

«5.« Quando uma circumstancia aggravanlc faz que o peccado de ■venial se torne mortal, como pódc acontecer pela má disposição do •peccador; por exemplo, sc roubando um soldo tivesse intenção de •roubar um luiz dc ouro;

•6.“ Quando os peccados se multiplicaram por uma mesma acção, «como quando por uma mesma dciracção sc calumniaram muilas pes- •soas, ou uma só pessoa na presença dc muitas outras;

■7.» Quando se trata de um roubo, 6 noccs.sario sempre explicar a •quantidade. Deve-se mesmo explicar a qualidade da pessoa a quem ■se fez 0 roubo; se cila ó rica ou nobre (').

■Os confessores devem acnulcfar-sc que os penitentes, debaixo do «pretexto dc explicar as circuinslaiicias aggravanlcs, não sc incitam •em miudezas inúteis c muilas vezes perigosas, particularmente «quando os peccados dizem respeito ao sexto mandamento. l’or esta «razão, (luando os confessores vOcm que os penitentes sc estendera ■demasiado solirc as circumslancias aggravanlcs, dizendo, evem. «pio, tudo 0 que se passou cm uma acção vergonliosa, cor «não fazerem uma inteira conlissão, devem advcrlil-os, q «obrigados a declarar as circumstancias aggravanlcs scní «sos (pic acabamos dc indicar.

0 litíual dc Toulon dá a mesma decisão.Terminemos esla nota pela judiciosa rellexão de Mgr. o

Perigueux, na Justificação do bemaventurado Ligorio. «Esla cp«diz elle, nos dá logar a fazer uma observação que não será....«para os confessores, sobretudo para aquelles que forem ainda no­ivos. Como não é cerlo que estejamos obrigados a fazer conlieccr na

(*) É nolavel que S. Ligorio admitte pouco mais ou menos as

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approvadas por quem lem esse direito; 3.®, porque seus au­clores sc sanlificarara, e muitos outros com elles, seguindo-o. De boa fé, que mais podemos nós exigir?

Segui pois, diremos nós aos confessores, finalisando, segui estas instrucções, e tereis a consoladora certeza dc ler por guia, não aquelle que vol-as apresenta, não um doutor iso­lado, não ura seminário, não uma corporação particular, mas directores, cuja doutrina a Igreja, juiza e depositaria infalli­vel da moral, assim como do dogma, approva, e cuja virtude 0 Céo coróa; directores, linalmente, que reúnem no mais alto gráu as tres qualidades essenciaes de um verdadeiro director das almas: a grande santidade, a grande sciencia, e a grande experiencia. Sigamol-os sem receio, penetremos-nos de seu espirito (>), e realisaremos este voto dc um grande Papa: Denlur idonei confessarii, ecce omnium christianorum plena reformado. (S. Pio V). Tal é o voto, o mais ardente voto de nosso coração. A graça de nosso Senhor Jesus Christo e a caridade de Deus Padre, e a comraunicação do Espirito Santo seja cora todos nós, e nos ajude n atlingil-al (//. Cor., xiii,

«relalivas a«nôíln, .sem |i('rigo d . .«la.s lulciTOgaçõus (|iic julgar iiccossarias para conhecer as circum- «slancias que mudam a especie do peccado. I-lle não deve esquecer, «que se c obrigado a procurar a iiilcgridade da coudssão, mais slri- «clamentc aiuda é obrigado a uão escandalisar os pcnilciilcs, c tudo o «que pódc enfratiucccr n’cllcs a idéa que devem ter da santidade e da «modcsiia sacerdotal.»

(') Para se peneirar dc seu espirito, a primeira condição 6 estudar suas ol)ras. e de todo o coração applaudimos a recommcndação feita por Mgr. 0 Dispo de Dellcy em seu ItUiial, tom. II, pag. m . .Mas diz alguem: é perigoso (luc .se abuse dc seus principios. h por ventura é 0 coufessor isctilo d’cstc perigo de abusar, dc fazer falsas applicações dcsde, 0 momento em que procura cm outros suas regras dc condu­cta? K impo.ssivcl abusar dc Collel, dc Uiiluart, dc lluillv, c dc lautos outros? Acaso tem estes lheologos o privilegio de torüar iufallivcis aquelles que os tomam por guias? Parecc-uos ao contrario, ccclcria paribus, que quantas menos garantias offercco uma doutrina llicolo- gica, mais perigoso é errar scguiiido-a. Ora nós temos mostrado no que dito ílca, quaes são os auctores de direcção e dc moral que mais garantias iiilrinsecas c e.xlrinsecas reuncm.

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MANÜAL DOS CONFESSORES

Deveres e qualidades de um bom confessor como pae, como medico, como doutor e como juiz

Que grande será, diz S. Ligorio, a recompensa dos bons confessores que na conversão das almas se empregam! Sua salvação está segura. 0 Apostolo S. Thiago nol-o ensina quando diz: Qui converti fecerit peccatorem ab errore via sua, satvabit animam ejus a morte, et operiet mutliludinem peccalorum ('). Sua alma, isto é, a alma d’aquelle (|ue con­verteu, como 0 texlo grego Iraz. Mas a Igreia está em lagri­mas, vendo um lão grande numero de seus filhos perdidos por causa dos máus confessores. Cora elfeilo, 6 principalmente da boa ou má direcção dos confessores que depende a salva­ção ou condemnação dos povos. Denlur idonei confessarii, dizia 0 Papa S. Pio V, ecce omnium cbrislianorum ptena re- formatio. É uma verdade; se cm lodos os confessores se achasse a sciencia e santidade que convem a um lão grande ministério, o mundo não estaria, como está, manchado de iniquidades, nem o iufcrno cheio dc tantas almas. Por santi­dade não entendo aqui a santidade habitual, quero dizer, o simples estado da graça; mas uma santidade positiva, lal co­mo é necessaria a um ministro da penitencia, cujo estado, como aquelle da ama, reclama duplicado alimento, não só para se alimentar a si própria, mas a seus filhos. É uecessa­rio, com elTeito, que o confessor dirija a consciência dos ou­tros sem errar, ou por demasiada condescendencia, ou por demasiado rigor; que sonde as chagas sera se sujar; que trate com mulheres e com pessoas novas, ouvindo a exposição de suas caídas as mais vergonhosas, sem receber algum damno; que use de firmeza com os grandes sem se deixar vencer de

m Ep. V, 20. Para se excitar na penosa funcção do tribunal, S. Li- gono dizia muitas vezes a si mesmo esla sentença dc Sanlo Agosti- nho: Ânimam salvaBíiy animam iuam lihcrasti.

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algura respeito humano; é necessário, em uma palavra, que seja cheio de caridade, de doçura e de prudência.

Para cumprir todos estes deveres, necessita de uma santi­dade mais que ordinaria, á qual jámais chegará se não for homem dc oração, (iel á prática da meditação diaria. Sem isto não terá jámais nem as luzes, nem as graças neccssarias ao exercicio d’este ministério formidável aos mesmos anjos.

ARTIGO ICAninADE DE PAE

Nomequc 1. (Sacerdote santificado, n.®" 1-13.) — Tende uma cari- áHílrnn P®®’ P°'® 1"® P®'' ®®® ®®® °®®’ ® *® P®® 1“ ® ® P®‘fessor. ' nilenle vos chama desde o principio, e, segundo a expressão

dc Santo Ambrosio, é n’este sacramento que Jesus Christo nos estabeleceu vigários de seu amor: Vicarios amoris Chris­ti. Ora, nada mais casto, nada mais honesto, nada mais for­te, mais infatígavel, mais desinteressado, mais solicito, mais liberal, mais prudente, mais paciente do que o amor de um pae. Tal dcvc ser o vosso a respeito do penitente, que é vosso lilho espiritual, e eis aqui o modo como deveis teste- munhar-lh’o.

Caridade 2.— Primeiramente a ninguém sc recusando. Semper tibi qmanin-pgfiãeat liamus, dizia em oulro tempo,um poeta ao pescador,

nitntme reris gurgite piseis erit. É assim que deveis sem­pre e a toda a hora estar dispostos a ouvir as coulissões das pessoas que vos procuram. Nenhuma cxcepltieis, embora se­jam pobres c dc baixa condição, sobretudo sc ellas se apre­sentam cm dias c horas desacostumadas. Com cfTeilo, vós não conheceis nem o estado, nem as disposições d’aquelles que vos procuram. No momento em que menos o pensaes, pode- rieis, por uma dencgação, scr occasião dc immensos damnos e dc ruina espiritual de uma alma. Tem muilas vezes acon­tecido, que, enlre as pessoas que assim se apresentavam cm dias c horas extraordinarias, algumas havia que não se ti­nham confessado ha seis mezes, ha um anno, ba sele annos, ha dez annos, e mesmo ha longo lempo. — Se fossem despe­didas, quanlo cra dc receiar, que, deixando expirar esle im-

Clso extraordinário da graça, que depois de Uio longo lempo :s linha inspirado a coragem de se apresentar ao confessor,

ellas partissem para nunca mais voltar, e para multiplicar suas dcsordeijs alé á morle? N’esle caso, que severa conta não terieis a dar no tribunal de Deus, sc por vossa falta de caridade, cm vez de serem conduzidos ao Pae celeste, estes filhos chegassem a perder-se,.ou sómente a continuar por muilo lempo ainda na carreira dc suas oílensas? Pelo con-

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trario, que felicidade para vós, se eslas almas acolhidas prom- plamenlc vos deverem sua volta ao aprisco! Ah! bem póde acontecer-vos que façaes assim alguma nobre conquista para 0 céo. S. Filippe de Neri asseverava que era devedor da con­versão de seus mais fervorosos penitentes ao habito de se mostrar assim disposto a toda a hora, mesmo de noite, a re­ceber toda a gente.

3.— A ningucm pois jámais vos recuseis, principalmente Continua- se for um desconhecido; não vos recuseis igualmente a peni- Ç®®- tentes que já conheceis, porque póde ter-lhe acontecido al­guma cousa de novo que aiuda ignoreis, d’onde, a não haver pronipto remedio, podem resultar grandes damnos para elles,e-grandes olfensas para Deus. Algumas vezes vos acontecerá ser procurados precisamente no dia em que menos o espe­raes, em que tendes menos vonlade, em que e.-=lareis mais occupado, ou mesmo indisposto; lembrae-vos então que foi Deus que procurou estes peccadores por sua graça, e que vol-os traz n’eslas circumstancias para procurar de um só golpe, por vossa caridade, a sanlilicação dc muitas almas,

3uero dizer, da vossa c da sua. Livrae-vos de privar a Deus ’esta honra, a vós de um tal merecimento, e a eslas almas

de ura tal soccorro. Se vos for todavia impossivel recebel-as, marcae-lhes dia e hora, mesmo as menos commodas para vós, e excilae-as a voltarem, pedindo-lhes que vos não recusem a consolação de as ajudar e de as ouvir.

4.— Acolhei pois e animae o penitente desde o principio; Caridado ao menos quando as circumstancias vos advertirem que tem que desde d’isto necessidade; como, por exemplo, se elle vos diz que “não se confessou ha muilo tempo. Para lhe tirar ou enfra-anime.

Succer-lhe a dilliculdade natural á inteira declaração dc suas iltas, animae sua coragem, dizendo-lhe: Dae graças ao Se­

nhor, que vos esperou até este momento, e que hoje vos con­duz; consotae-vos; a paciência de que litte usou alé aqui a vosso respeito é uma prova de que Etle vos quer salvar; assim, tomae animo; eu vos ajudarei; seja o que for que vos lenha acontecido, nós a tudo daremos remedio. Fallae portanto com uma santa confiança.

6.— Cuslar-vos-hia a acreditar quanlo é util ao penitente e Frucios a vós mesmo esle acolhimento paterno; ao penitente, que, surprendido dc vossa caridade, sente seu coração dilatar-se, anima-se a nada vos occultar, e se acha disposto a receber em grande parte tudo o que lhe disserdes; porque elle encon­tra em vós não sómente um juiz, mas tamhem um pae; a vós mesmo, que, testemunha da docilidade e da conliança do pe­nitente, sentis crescer vosso zelo por seu bem, e vos achaes dispensado da obrigação de fallar-me com uma salutar seve-

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ridade. Desde enlão vosso amor e sua conliança vos auclori- sara a mandar-lhe e a tudo esperar d’elle. Bem mais, vós sois livres do perigo de cair n’estas funestas condescendencias, ullimo e ordinário recurso de um confessor, que, por ter re­cebido com aspereza o penilenle, o acha rebelde a suas or­dens.

Perigo dc 6.— Seria de vossa parle um grande erro o receber com nenienie peccodorcs; esc, quando alguem se

accusa de não se ler confessado ha muito tempo, vós fosseis dizer-lhe: Sois clirislào, vós, que por tanto tempo tendes po­dido viver tão longe de Deus e dos sacramentos? Haveria cousa alguma menos dc admirar, do que sc, aterrado elle de uma lal linguagem, occtillasse em sua consciência tudo, ou, ao menos, algum dos peccados para cuja conlissão já tão grande diíEculdade experimenta; e assim, saindo dos vossos pés com mais um sacrilégio, quero dizer, simultaneamente com um obstáculo bem mais forle á conlissão, e uma especie de persuasão de que está perdido, elle se lançasse, fechando os olhos, a desordens sempre maiores? Não ha muito tempo que se lia a um criminoso a seulençn de sua morte. Uma pessoa que presente eslivera contou qiic as primeiras pala­vras d’este desgraçado, quando ouviu sua condemnação, fo­ram estas: Não me acharia neste estado, se não fosse um confessor que me recebeu e rcpelliu com a maior dureza. Sede pois sobre esle ponto da maior reserva a respeito dc toda e qualquer pessoa. Lembrae-vos que a vergonha de ac­cusar suas faltas não é sómente natural aos rapazes c rapari­gas, mas ainda aos adultos os mais adiantados era idade, nos sacerdotes mesmo c aos religiosos. As almas as mais piedo­sas a experimentam em declarar simplices peccados veniaes. Quanto mais avançada é a idade, quanlo mais a posição e condição são elevadas, tanto mais lambem muilas vezes a confissão se torna mais dillicil, caíudo-se cm alguma grande falta. D’aqui esla adverlencia de S. Paulo: Fratres, etsi prceoccupatus fuerit homn in aliquo delido, vos, qui spiritua- les estis, hujusmodi instruite in spiritu lenilatis, considerans teipsum, ne ct tu lenteris. [Ad Galat., vi.) Esta expressão do Apostolo: Considerans teipsum, ne et tu lenteris, vos previne do que poderia aconlecer-vos era castigo de vossa dureza. Ah! bem: o modo como quererieis ser tratados, se, do que nos livre Deus, caisseis era algum peccado vergonhoso, deve ensinar-vos como deveis tratar os oulros.

Caridade 7.— Não basla ler acolhido bem e animado o penitente, norienn?'leveis tambem supporlal-o durante sua conlissão. Aqui, eu nitente no convenho n’islo, frequentemente a multidão dos penitentes, decurso da ou mesmo um só, mas muito dilTuso, ou pouco inlelligivel, confissão.

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verboso, grosseiro, que vos traz uma confusão de cousas e de casos embrulhados, dá o maior trabalho ao confessor. 0 unico meio de reprimir a impaciência causada por tanto en­fado, é um amor de pae que nunca se cansa, e que adoça to­das as fadigas. Quereis nutrir em vós esta caridade? Gravae bem em vosso coração, e, segundo a necessidade, medilae nas maximas seguintes: 1.° Se Jesus Christo não hesitou em dar seu sangue e sua vida pcla salvação das almas, qual de nós, que somos seus ministros, poderá recusar de consagrar a isto ao menos seu tempo e seu trabalho ? Que uso mais no­bre e mais util poderíamos fazer de nossas forças, do que em­pregando-as em uma obra, á qual um Deus mesmo se dedi­cou todo inteiro? 2.® Qua mensura mensi fuerüis remetielur vobis. {Hat., vir, 2.) Como se nosso Senhor vos dissesse:Se vós usardcs de paciência para com esta alma, se a ajudar- des, se a inslruirdes, sc a consolardes, se a sanlilicardes, es­tae certos, eadem mensura remetielur tibi: cu vos supporta- rei, eu vos ajudarei, eu vos sanlilicarei; mas sc lhes recusar- des estes bons odicios, (desgraçados de vós!) tornacs-vos a meus olhos indigno dos mesmos bcnclicios; eu não serei mais indulgente em tolerar vossas faltas; eu vos concederei menos soccorro: eadem mensura. Assim vossos verdadeiros interes­ses vos fazem um dever dc supporlar o penitente.

Se no dia do juizo (inal, louvores públicos, acompanhados de uma pública e eterna recompensa, estão reservados para as menores obras de caridade inferior, quero dizer, da cari­dade corporal, que louvores e que recompensas não dará o Senhor ás obras da caridade espiritual, que lhe é superior; d’esta caridade que reveste as almas de graça celeste, que as alimenta, que as liberta das cadeias do demonio, e as cura de suas enfermidades? Não. não esperareis até ao dia do juizo fiual para receberdes do Pae celeste as graças e recompensas, vós, cuja paciente caridade conduz a seus braços seus lilhos

rilenles. Oh! quantas tentações perigosas arredará de vós! quantas outras vos fará vicloriosos! que abundancia dc soccorros espirituaes vos prodigalisará no decurso de vossa

vidal Nunca pois cesseis de manifestar a maior paciência para com todos os peccadores durante toda sua conlissão.Estae seguro, que no dia em que saírdes do sagrado tribunal com a cabeça fatigada e com o peito enfraquecido, se tiver­des sido pae por vossa caridade. Deus lambem se mostrará tal a vosso respeito, cumülando-vos de graças e consolações.

8.— Aqui eu vos recoraraendo especialmente aquelles a Cáridade quem certos defeitos corporaes, como a surdez ou i™pedi-2“ rte ane mento de lingua, ou de oulro genero, expõe um grande nu-^rdèseus mero a nunca receberem uma assisteucia proporcionada a defeitos.

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suas necessidades. Se a vós se dirigirem, não os recebaes em vosso confessionário publico, por causa do perigo dc ser ouvido; mas conduzi-os a algum logar opporluno, onde com ioda a segurança possaes ouvil-os e fazer-vos ouvir. Uma só conlissão remediará talvez os defeitos dc um grande numero de conlissões passadas. Não vos atormenteis, se fordes obri­gado a mandar-lhe fazer uma conlissão geral: neste caso, assim como cm muitos outros, uma conlissão geral quasi não é mais longa do que uma conlissão particular. Com cflcito, esles penitentes passam uma vida uniforme, e pouco mais ou menos a mesma em lodos os tempos; assim, quando conhe­cerdes a dilferença do maximo ao minino numero, sem oulra cousa especificar, tudo está sullicientemcnlc esclarecido. Não remctlacs facilmente esta especie de penitentes a outros con­fessores, por molivo de alguma dilliculdade que acheis era percehel-os ou fazer-vos perceber por elles. Se o defeito cor­poral do penilenle é dc nalureza que embarace tanto a qual­quer oulro coufessor como a vós, por exemplo, se é surdo ou mudo, podeis lão hem como outro dar-lhe os soccorros de que seu estado o torna susceptivel. Não vos desonereis so­bre oulro da fadiga, supportae-a, e tereis a recompensa. Se 0 obstáculo não for absoluto, mas relativo, por exemplo, se nâo pcrcehcis sua linguagem, que um outro comprehende, então, dispensando-vos de o ouvir, deve cnipregar-se vossa caridade em procurar-lhe um habil confessor, ao qual o re- commendareis: ao menos lhe indicarcis onde facilmente o poderá encontrar. Tenho vislo bastantes logares onde a cari­dade dos pastores reune em dias particulares, e em logares opporlunos, todas as pessoas surdas ou mudas, ou alfecladas de oulras enfermidades. Lô-se na Vida de S. Francisco de Salles, que passou boas quatro horas pnra fazer perceber al­gumas verdades da religião a um joven surdo-mudo.

Continua- <j.— Mas, em geral, é diílicil de se não deixar levar algu- mas vezes por um falso zelo: ou, para fallar mais exacla- mentc, uma bilis esquentada e uma impaciência coberta das apparencias do zelo vos impellirá a tratar com aspereza o pe­nitente que vos enfada. Vosso pretexto será de lhe fazer sen­tir a gravidade de suas faltas, mas na realidade será para exhalar vossa impaciência, e para o arrumar mais depressa. D’aqui que resultará? Ainda que, por principios, não sejaes nem rigorista, nera relaxado, correis o risco de cair em al­guma d’eslas duas extremidades, séja despedindo o penilenle debaixo do pretexto de que não está disposto, e eis aqui o rigorismo; seja absolvendo-o para vos desembaraçardes mais depressa, e eis aqui o laxismo. Não é muilo facil o conhecer as secretas illusões que produz então a impaciência. No con-

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fessor relaxado, cila se cobre com o dourado manto da cari­dade, que não quer fatigar o penitente com interrogações, ou que teme de lhe tornar odioso o sacramento, cercando a absolvição de difliculdades. No confe.ssor rigorista, ella toma 0 manto prateado da religião, que teme de expôr o sacra­mento, dando-o a um indigno. Preveni-vos; estes diversos juizos não são o fructo de uma moral sã, e não tem por causa mais do que uma vontade que sc impacienta á visla, ao só pensamento das precauções maiores que seria mister tomar para absolver sem relaxação, ou dos meios novos que seria necessário empregar a fim de melhor dispor o penitente a receber a absolvição instantaneamente, sem o despedir por um excesso de rigor. É assim que se cáe no laxismo ou no rigorismo prático; porque um e o outro são um meio dc se livrar mais promptamente do enfado que sc experimenta.

10.— Quereis um meio que, adoçando vossas fadigas, te- Remedio nha vosso espirito no socego e liberdade necessarins para f” "acicn- bcm iisar da sciencia dc juiz, um meio que vos preserve das cm e en- perlidias c illusões da impaciência e da jiressa de vosdescm- fada boraçardes? Tambem o achareis em uma caridade de pae.Tomae pois como regra desconfiar dc vosso zelo todas as ve­zes que não vier casado com a paciência c amor ao trabalho.Tal é com crfcito, diz S. Gregorio Magno, a dilleiença que existe entre o zelo paterno, como aquelle dc Jesus Christo, c 0 zelo pliarisaico, como aquelle de um padrasto: o primeiro, inspirado pelo amor, lodo compaixão pelo peccador, parece de alguma sorte não ter nem o sentimento, nem o horror do peccado; o outro, pelo contrario, mostra um lal odio do pec­cado, que, em vez dc ler compaixão, não lem senão desprezo pelo peccador: Vera justitia compassionem habet, falsa de- dignalionem. (lIom iL, xxxiv, in Jívang.)

11.— Não basla supporlar o pcnilcníc, vossa caridade dcvc Caridade sempre ajudal-o, sobretudo no fim, para o fazer passar do cs-R®® “ aa- lado do peccado para o estado dn graça. Eu digo u)u</a/-o jorajusti- sempre, com interrogações convenientes, a fim de tornar com-llcar-sc. plcla a accusação dc suas faltas, dc suas qualidades, de seu numero e das circumslancias que.são maleria necessaria do sacramento. Para islo não IcndeS; sómente necessidade de sciencia c de paciência, é necessário além d’islo que tenhaescerla aslucia, dc que logo fallarei, tratando da habilidade de medico. Mas ajudac, principalmenle no fim, pois o caracter dislinclivo de um bom pae é querer a lodo o preço salvar a vida de seu filho. Eu não vos digo por islo que o* alisolvnes de repente, não; isto não é procurar com sinceridade o ver­dadeiro bem do penitente. Digo-vos que deveis proporcionar vossos soccorros a suas necessidades para lhe procurar uma

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conlnção e um firme proposito verdadeiro; de sorte que vá justificado, embora viesse grande, e mesmo muito grande peccador. E tambem a caridade que saberá armar-vos de mansidão ou de rigor, segundo a necessidade. Vôdes o que se passa em uma familia: recusa um menino doente tomar remedios? Os crcados os mais alTeiçoados se cansam depressa de cuidar d’elle, e se muito tempo é necessário teimar com o doente para tomar os medicamentos necessários, e impedil-o de comer o que poderia scr-Ibe nocivo, vencidos pelo enfado, cedem a seus caprichos, dispensam-o dos remedios, e lhe pcrmitlcm as cousas probibidas. Por que islo? Porque lem um grande amor de si mesmos e de seu proprio interesse, mas nenhum ou quasi nenhum pelo doente. Não é assim que os paes condesocndem com os caprichos do meniiio. Por que tambem? Porque seu amor, independente dc lodo o interesse pessoal, leme a perda d’este lilbo e emprega milhares de meios para afastar o perigo, e adoçar a amargura do reme­dio. Se a doçura não basta, sabem levantar a voz, ameaçar, estender elles mesmos e ter immovel debaixo do ferro a mão do doente. E o amor que dá a seu coração a firmeza neces­saria; mas n’esle rigor se mistura e se mostra sempre o amor mesmo. Não é de oulro modo no tribunal da penitencia. 0 confessor, animado de uma caridade de pae, foge da relaxa­ção e do rigorismo, meios para elle muilo commodos de ter­minar promptamente, seja por uma despedida, seja por uma absolvição; porém meios nocivos ao pcnilente. Seu amor lhe faz cscogitar e lomar todos os meios que cslão cm seu poder para o sarar c restituir ao cslado de graça. Pelo conlrario, o confessor que não lem esta caridade, embora seja muilo in­struido, é pouco ulil ao penitenle, porque não se applica a fazer de sua sciencia um uso conveniente.

Caridade 12._ Para evitar esta relaxação, a que nos conduz o amor ^nieres-jg própria commodidade, e estas condesccndencias que

nascem do respeito humano, de atlenções ou iuclinação pelo penitenle, não vades concluir que vossa caridade necessita de ser enfraquecida, conclui anles que ella necessita de ser pu­rificada e augmentada. £ assim que, tornando-se pura, ce­leste e corajosa, ella não mirará mais do que ao bem espiri­tual do peniteole, ella saberá triumphar de ludo para o pro­curar. Que é este o meio de tirar bom resultado, acho eu a prova na dilTerença que existe entre o bom pastor e o mer­cenário. Esle, achando sua ovelha, conlenta-se de a chamar ao aprisco por um só assobio, sem tomar alguma precaução para a impedir de fugir novamente pelo caminho; tal me parece ser 0 confessor relaxado: ou lhe dá pauladas, e lhe atira com pedras para a obrigar a encorporar-se ao rebanho, sem

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advertir que a assusta, e a faz fugir ainda para mais longe do que da primeira vez, e a expõe de mais perto á guela do lobo; tal me parece ser o confessor demasiadamente severo.Nenhum dos dous é bom pastor, porque um e oulro, para evilar a fadiga, deixam perder a ovelha. Não é assim o bom pastor. Encontrou a ovelha? Não lhe bate, lambem a não deixa em liberdade, mas carrega com ella ás coslas, c pegan­do-lhe com ambas as mãos, se assegura de que lhe não fu­girá. Isto não é ludo: em vez de lhe deixar n fadiga do ca­minho, elle lhe procura um doce repouso sobre suas cspáduas.Assim 0 bom pastor transpõe toda a distancia, súa debaixo de sua predilecla carga, e, cheio de alegria, torna a pôr no cur­ral a ovelha sã c salva. Só o bom pastor é porlanlo o confes­sor cheio de um amor paternal. Com a sciencia de juiz e n ha­bilidade de medico, como com dois braços, elle pega no pe­nitente e 0 salva; elle não o aterra pela severidade, elle não o dispensa de seus deveres pela relaxação, mas poupa-lhe uma grande parte da fadiga, que elle toma sohre si, acarinhnndo-o, solTrendo-o, ajudando-o por lodos os modos, a (im de que, depois de o haver disposto hem, o possa juslilicar c consolar.

13.— Já vôdes que para ser muito hom confessor não Signaes basta ser grande lheologo, nem ascético experimentado, demais necessário ser cheio de caridade; não de uma caridade qualquer, mas de uma caridade de pae e de bom pastor, e não de mercenário. Ora, esta qualidade do confessor, a mais facil cm apparencia, é na realidade a mais diUicil. Com ef­feito, ella vos obriga a tres cousas: 1.*, á acquisição de uma sã moral como juiz, e a uma grande habilidade como medi­co; 2.”, ao hom uso de uma c da outra para assegurar o hera do penilenle; 3.", a tomar sobre vós uma grande parte da fadiga, dc maneira que a ovelha, recolhendo toda a vanta­gem, não seja tentada a tomar cm odio o curral e o pastor, c novamente fuja para não voltar mais; mas que, pelo contra­rio, altrahida por vossa caridade, que lhe muda em doçura a amargura da conlissão, ella volte frequenlemenlo, e assim se conserve fiel a Deus (').

(*) 0 espirito do confcs.sor, (jiiero dizer, a caridade a mais pater­nal, respira n’csla admiravel passagem dc S. llayimindo, dc quem Leão Xll diz em sua Kiicycliea: Quem imiyucm sacramenti Fanüenliat mi- nislrum appdlat Ecciesia: «Cogiiilis peccalis, coiircssoradsil... l)cnc- •volus, paralus crigcrc ct sccum omis porlare; liahcal duleedinem in .aircctionc, piclalcm iii allcriiis crimine, discrclioiiem in varietale;•adjuvct conlllciitem orando, clccmosynas el Ciclera bona pro oo fa- •ciendo; semper eum adjiivel Iciiiendô, consolando, spem promillen- •do, ct, cum opiis rncrit, eliam increpando; dolcal loi|ucndo, iuslruat «operando; sit narliccps laboris, qui vult flcri parliceps gaudii.» (S.Ralm. iSttTnma, lib. 111, 463.-Roiia!, 1C03.)

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Caridade 14 . _ Conservar o juslo cm eslado de graça (que digo eu?)® perfeição, tal é o ultimo dever de vossa carida-

feição. de. Quantas almas que, por falta de cuidados da parte do confessor, não sendo prevenidas dos perigos que devem evi­tar, nem instruidas dos meios que devem tomar para conser­var e nutrir a devoção, recáem promptamente nos laços do inimigo! Quantas outras que enfraqncccm até á morte nos primeiros elementos dn vida espiritual, sem jámais adiantar um passo, porque ninguém as inslrue, nem as anima n uma vida mais perfeita, para n qual aliás ellas léem recebido da graça as mais felizes disposições! Para excitar vosso zelo a esle importante trabalbo, Icmbrac-vos que Deus é algumas vezes mnis honrado por uma só pessoa que o sirva perfeita­mente, do que por mil outras que são libias c isentas dc fal­tas graves, mas de uma virtude commum. Muitas vczcs, para santilicar uma familia inteira, c mesmo um grande numero de almas, uma só pessoa fervorosa fará mais por seus exem­plos, seus conselhos, seus discursos, seu zelo, do que muilas outras simiillaneamcnlc, mas frias e sem experiencia. Um só pae de familia acostumado por vossos cuidados á recitação dinrin do rosário; ao exame de sua consciência á noite; á meditação ou ao menos á leitura dc algumas verdades eter­nas de manbã; á arte dc negociar para o céo pela pureza da intenção, renovada muilas vczcs duranle o dia; á mortifica­ção não sómenlc nns cousas proliibidns, mas lamitcm nas cousas permillidas; ao modo dc santilicar por alguns bons exercicios as festas dc nosso Senhor, da Santa Virgem c dos santos, um tal pae não será para seus lilbos c seus domésti­cos um grande principio de sanlilicação? Dc suas lições não se aproveitará sómente sun familia: instruidas e formadas cm tão boa escola, suas (ilhas levarão sun feliz influencia ás fa­milias dc seus esposos. Lembrac-vos que cultivando c con­duzindo á perfeição alguns penitentes, não é sórnenle seu bem que procuraes, 6 aquelle de um grande numero dc ou­tros. Mas para o conseguir, que melliodo, que meios deveis empregar? Perló d’aqui os vereis. Foi para vol-os ensinar que Scaramclli compoz seu Dircctorio ascctico, uo qual, n uma tbcoria erudita c solida, sc acham reunidos conselhos práticos para o direclor.

Caridade 13. (B. Leonawdo, n.” IB .) — São pois bem reprehensiveis nrademc* OS confessores que, por asperezas c exprobrações intcnípcsli- ■ vas, espantam os pobres penilenles. Sua conducla me admi­

ra; porque é com um espirito socegado, um rosto sereno e maneiras cheias de doçura que devem ser acolhidos, a lim de os persuadir que tudo se faz para seu bem. Esclarecei seu espirito de modo que ouçam voluntariamente vossas lições e

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por si mesmos se conformem a ellas; dizei-lhes: «Meu (ilho, são passados tantos annos que jazeis no lodaçal; nunca ten­des dado signal algum de emenda, pois que tendes quasi sempre levado aos pés de vossos confessores o mesmo nu­mero de peccados; prova certa de que não tendes até agora tido nem uma verdadeira dor, nem um firme proposito; é portanto muilo de receiar que vossas confissões sejam todas nullas ou sacrilegas: quereis vós sempre viver assim cm pe­rigo evidente de vossa salvação eterna? Para vosso bem, a fim de que melhor vos exciteis a uma sincera contrição, que seja 0 principio dc uma verdadeira conversão, cu vos exhor- lo, rogo c suppiico pelo amor que á vossa alma tendes, que vos experimenteis por alguns dias, fazendo violência a vós mesmo. Fazei alguma pequena penitencia: recilne cada dia uma corôa, c de manhã c a noile uma Avè-Maria cm honra da iinmaculada Conceição, com um acto de contrição. Pcla ma­nhã fazei um (irme proposito de não peccar durante o dia, c ao anoitecer de não peccar durante a noite. Pensac todos os dias na morle por alguns momentos, oii no inferno ou eter­nidade; principalmenle quando fordes assallado por alguma tentação, dizei dc repente: iVeu Jesus, misericórdia, ou al­guma outra oração jaculaloria, para chamar a Deus em vosso soccorro; e recolhereis um fructo maravilhoso.— Mas, meu padre, se acontece, morrer durante este lempo? — Ahl eis o que dcvc aiigmenlar vossa compunção, pois que, no cslado duvidoso em que vos achaes, seria muilo dc receiar que, não obslanle Iodas as minhas absolvições, vós fosseis condemna­do, emquanto que fazendo um aclo de contrição com uin firme proposito de verdadeiramente vos emendardes, c dc virdes receber a absolvição no dia indicado, embora fosseis pela morle surprendido, ha lodo o molivo de esperar que vos sal- varicis. Aníniae-vos pois, meu filho; não duvideis, cslac ccrlo dc que vos tralarci como pae, (|uc não vos ralharei, que vos consolarei, c lenho confiança de que vós n’csle e no oulro mundo me dareis agradecimentos.» A experiencia prova que os penitenlcs tratados com esla terna caridade se sujeitam .«em custo á demora da absolvição, c liraiii d'islo grandes fi uclos. Eu não pretendo que elles repentinamente desarraigiiem um habito inveterado, mas que façam, como devem, alguma violência a si mesmos para o desarraigarcm. Se, durante o intervallo, elles recáem algumas vezes menos que 0 costume, dnc-lhcs a absolvição; porque estas quédas provêem anles dc fragilidade, que dc malicia. Esla pouca resistência vos cerliíica que adest spes emendalionis. Eis aqui uma conducia cheia de prudência, igualmente afastada d’aquella dos lheologos que, debaixo do prelexlo de doçura,

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relaxam o zelo sacerdotal, e d’eslas opiniões demasiadamenle rigorosas, qnc tornam amarga a caridade mesmo. Adoptae-a pois e adoptae-a sem custo. Formemos entre nós esla santa liga de que os povos devem tirar as mais preciosas vanta­gens. Os penitentes mesmo vos pagarão um tributo de re­conhecimento, desejando-vos milha res e milhares de bênçãos. Quantas vezes me lôem dito: «0 meu padre, se desde o principio de meu mal, eu tivesse topado com um confessor caritalivo que mc tivesse dillerido a absolvição por alguns dias, e que me tivesse tratado com a mesma caridade de que lendes usado commigo, não me acharia n’e.ste miserável es­tado, não teria commettido tantos peccados.» Fallando assim, lagrimas dc consolação inundavam seu rosto. Andemos pois por este caminho trilhado pelos santos, e estejamos certos, que, unidos pelos mesmos principios, e bem providos d’este pão da verdadeira prudência, encheremos o paraiso com um grande numero de almas. Acaulclem-se os confessores que tôem uma conducla dilTerenle; temam, tremam, que por culpa sua vá uma mullidão dc almas povoar os abysmos eter­nos!

Auics da 16. (S. LiGonio, n.“® 2-B.) — Assim, pnra preencher o de- coiilissão. ver de hom pae, deve o confessor ser cheio de caridade. Ora,

já disse, elle deve mostrar esla caridade: 1.®, recebendo to­dos os penitentes, sejam quem forem, os pobres, os ignoran­tes, os peccadores. Muitos nâo querem confessar senão al­mas piedosas ou algumas pessoas de dislincção, a quem não ousariam recusar-se; mas se uin pobre peccador se apresenta, elles 0 ouvem de má vonlade, e o despedem com dureza. D’isto que resulta? Que esle desgraçado, que fez a si mesmo 0 maior violência para sc vir confessar, vendo-se tão mal re­cebido e lão duramente repellido, tome em odio o sacra­mento, lenha môdo á conlissão; depois, desesperando de achar quem o ajude c absolva, cllc se abandone a todas as desordens dc uma vida má e acnhe pela desesperação. Tal não é n conducla dos bons confessores. Sc algum peccador d’estc caracter se apresenta, elles o acolhem com a maior bondade; elles eslão no cumulo da alegria, quasi victor capta prceda, por sc acharem em posição de arrancar uma alma ao demonio. Elles sabem que, propriamente fallando, o sacra­mento de reconciliação não é insliluido para as almas piedo­sas, mas para os peccadores; pois que. para serem remidas, as faltas leves não exigem a absolvição sacramental. Elles sabem que nosso Senhor disse: Non veni vocare justos, sed peccalores. (Marc., ii, 17.)

Assim, tomando entranhas dc misericórdia, segundo o ex­horlação do Apostolo, elles mostram lanla mais caridade,

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quanto esta alma mais enterrada está no lôdo do vicio, a lim dc a attrahir para Deus. Coragem, Ihc dizem elles, estae sem receio, fazei uma boa confissão. Dizei tudo sem vos oppri- mir, de nada tenbaes vergonha. Pouco importa que vos não tenhaes examinado bem, basta que respondaes ao que vos per­guntar. Dae graças ao nosso bom Deus por vos ter esperado até este dia. E is o momento de mudar de vida. Não duvi­deis; Deus certamente vos perdoará, se tendes boas intenções.Elle não vos esperou tanto tempo senão para vos perdoar: dizei com animo e confiança.

17.— Duranle a conlissão deve o confessor usar de uma üuianica caridade ainda maior. Para islo é necessário, que sc absle-nha dc manifeslar impaciência, enfado, ou admiração das fal­tas que 0 penitente confessa. Todavia, se esle fosse lão in­sensivel e descarado, que declarasse um grande numero de peccados graves sem testemunhar nem horror, nem pezar, conviria fazcr-lbe notar a multidão e enormidade d’clles.N ’este caso, a correcção é nece.ssaria para o acordar de seu moral lethargo. É muilo verdade, como dizem os doutores, que 0 confessor deve absler-se de fazer a correcção no de­curso da conlissão, com receio dc que, aterrado o penitente, occulte 0 resto de .suas faltas; mas esla regra não é sem exce­pção. Com elTeito, convem algumas vezes não passar adiante e fazer logo a reprehensão; por exemplo, quando o peccador se confessa de algum peccado mais enorme ou que elle com- mellc por habito. Esla conducla lem por lim fazer-Ibe sentir a gravidade do mal, mas sem o escandalisar, nem aterrar.Assim, depois de lhe fazer as advertências necessárias, apres­se-se 0 confessor a animal-o a que diga o resto dc suas faltas:Coragem! Não é verdade que quereis renunciar a esle maldito peccado? Sim; tende confiança, dizei agorà tudo, nada dei­xeis sobre vossa consciência. Quereis fazer um sacrilégio?Ahl seria este um peccado maior que todos aquelles que tendes commeltido. Dizei tudo com coragem, fazei uma boa confis­são, e Deus vos perdoará.

18.— É no lim da conlissão que o confessor deve redobrar No Qm da 0 zelo para fazer conhecer ao penitente a grandeza e multi- conflssão. dão de suas faltas, assim como o miserável estado de conde­mnação em que se ncbn; mas sempre com caridade. Pódcentão servir-se dc expressões mais fortes para o fazer tornar a entrar em si mesmo. Deve csforçjir-sc por deixar-lhc ver que todas suas palavras são dicladas, não por indignação, mas

C compaixão e caridade. Por exemplo, Ibedira: «Meu fi- , vós 0 vêdes, não é esla a vida de um réprobo? Dizei-

me, que mal vos fez Jesus Christo para o tratar d estomodo?Se elle fosse o vosso mais nolavel inimigo, poderieis Iraial-o

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peior? Um Deus que morreu por vós! Ahl se morresseis n’es- le momento, n’esla noile, para onde terieis ido, onde esta- rieis agora? No inferno para sempre. Que vos re.sulta de to­dos estes peccados que tendes commellido? Um inferno no coração, c um inferno por toda a eternidade. Coragem, meu filho! E lempo de acabar; enlregac-vos a Deus, assás o ten­des ollendido. Eu vos ajudarei quanlo possa; vinde procurar- me todas as vezes que quizerdes. Trabalhac agora em tor­nar-vos santo, e sede feliz. Ah! nuanlo 6 doce estar na graça dc Deus!» 0 methodo particular de S. Francisco de Salles para allrahir o peccador para Deus consistia cm fazer-lhc compre­hender a felicidade d’aqucllcs que vivem na graça, e a desgra­ça d’aquelles que vivem longe de Deus. Acabada’s eslas cxbor- lações, 0 confessor ajudará o penilcnlc a formar o acto de con­trição, e, se estiver disposto, o absolverá, dando-lhe os meios de se emendar: nós os indicaremos no arligo seguinte. Se não podér absolvel-o, ou se julgar a proposito dilTerir-lhc a absol­vição, lhe fixará o lempo cm que dcvc vollar, dizendo-lhe: «Eu vos espero em lal dia; não falleis: lende muila coragem; como vos disse, rccommendac-vos á Sania Virgem, c vinde ler commigo. Se eu estiver no confessionário, aproxiniae- vos, eu vos farei passar; se não estiver ahi, fazei-mc chamar, eu deixarei tudo para vos ouvir.» É com esla doçura que de­veis despedil-o. Tralar os peccadores com caridade é o unico meio dc os salvar; porque sc topam com um confessor auste­ro, que, longe de os animar, os Irala com dureza, tomam cm odio a conlissão, abandonam os sacramentos, c cil-os perdi­dos.

Caridade 19. (S. Caiilos, pag. 8-10, 64-70.)— Agora comprchcndeis Mcriílcio *1'’® confessores devem receber aquelles, que sc aprc-

■ sentam para sc confessar, com grande promptidão c facilidade, e abslcr-se não sómenle dc os despedir, aborrecendo esle tra­balho, ou de icslemunbar-lbes mesmo por signaes ou por pa­lavras, que os não ouvem com vontade; mas, pelo conlrario, devem portar-se de modo que seus penitentes se persuadam que recebem uma sensivel consolação c um singular prazer no Irabalho que tomam para o bem c ailivio dc suas almas. Para que os penitentes não possam nllcgor por desculpa dc não se terem confessado, principalmenle nos tempos que são obriga­dos, a difliculdade de acharem confessores, admoestamos a es­tes, que, embora sejam chamados a outras parles para assis­tir a funeraes ou outros oflicios, não devem todavia, fóra de um caso de necessidade, cessar de ouvir as confissões nos tem­pos em que ellas ordinariamente são mais freqüentes.

Cnridade 20. — Ora, segundo a obrigação de verdadeiros paes espiri- quc ajude luaes, os confessores devem ler um cuidado particular de in-

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slruir c eocaminhar nas virtudes chrislãs e na vida espiritualas almas a todos os seus peuilentes, mas particularmente aquelles que tiverem escolhido para seus directores e que se coufessam or- p, dinariamente a elles, ou os consulUim em dúvidas e outras oc-m corrcncias que dizem respeito á salvação de suas almas. De­vem portanto procurar conliruiar aquelles cuja direcção espi­ritual tôem a seu cargo, eui lal estado, que sejam verdadeira­mente constantes na resolução de perder antes, não sómente seus hens e sua honra, mas ainda sua própria vida, do que oITendcr mortalmente a magesladc dc Deus, e que tenham um ardente c generoso desejo de ser sempre conformes á sua sanla vontade.

Para islo os instruirão do íim para o qual o lioraera e todas as oulras cousas foram crcadas; que o homem não foi creado por Deus senão para o servir e ol)edccer-lhe n'esla vida, e go- sal-o eternamente na oulra, e que elles devem por esta razão resolver-sc a Iralralhar para chegar a esle lim, e a não estimar senão as cousas que podem servir-lhes para ahi se aproximar, e ahandonar aquellas que podem desvial-os; c devem fazer de modo que seus penitentes sejam sempre inclinados de si mes­mos a este lim, e que a elle dirijam todas suas acções, e jun­tamente tudo 0 que elles lôem n’este mundo; e que assim el­les se conduzam de lal sorle em seu viver, em seus vestidos, em suas couversações, em seus negocios e em todos os outros exercicios, que todas eslas cousas lhes sirvam a lodos como de oulras tantas azas e soccorros para lá chegar, e que este­jam sempre promptos a moderar o uso destas cousas,e a re- gulal-as ou nhaudonal-as inteiramente em todas as occasiões que seu direclor julgar necessário para sua salvação. E elle, da sua parte, considerando o estado dc cada um, os conduzi­rá, em conformidade a este estado e a esta condição, ao lim que acahamos de dizer. E necessário que os directores in­struam aquelles, dc que tôem a couducln espiritual, segundo 0 alcance de seu espirito, sohre o modo de fazer a oração, e

ãue os acostumem a enlregar-sc a este exercicio pelo menos uas vezes no dia, de manhã quando se levantam, e á noite

quando se forem deitar; além de que os devem exhortar a que ouçam todos os dias Missa, e nos dias de festa assistam aos oflicios divinos; devem lambem particularmente instruir aquel­les que forem capazes, homens c mulheres, sobre o modo de fazer oração mental, e ensinar aos outros como se deve reci­tar devotamente o rosário, a corôa e o oflicio da Virgem, os sete psalmos penilenciaes ou oulras semelhantes orações, e exhorlal-os lodos geralmente a fazer o exame de sua consciên­cia, indicando-lhes para islo, como uma hora commoda e con­veniente, 0 tempo da noite em que pelo toque do sino são

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convidados a fazer oração com toda sua familia. Devom ex­hortal-os a freqüentar assiduamente os sacramentos da Peni­tencia e Eucharistia. e procurar rcsolvcl-os, segundo o conse­lho de Santo Agostinho, a commungar todos os domingos; e se encontrarem algum que não esteja disposto, haver-sc-hão de. modo que o disponham pouco a pouco, exhortando-o pri­meiramente a confessar-se e a commungar nas festas princi­paes do anno, como, além d’aquclla da Paschoa, a fazel-o tam­bem nas festas da A.ssumpcão, dc Todos os Santos, de Natal, e 110 primeiro domingo de quaresma, para ganhar a indulgên­cia plenaria e preparar-sc para o saiilo jejum; depois do que, obrigando-o a fazer um pouco mais a miudo esta santa acção, 0 poderão reduzir á communhão dc cada mez, o que tendo obtido delle, não lhe será dillicil de o levar a freqüentar este sacramento todos os oito dias. ().s directores devem ter um cuidado particular em fazer que aquelles que são por elles di­rigidos se occupcm nos dias festivos em tributar honra c ser­viço a Dens; para isto os exhortarão n alistar-se em algumas dessas sociedades que téem por instituto parlicular o entre­gar-se nos dias fe.slivos á oração c exercicios de piedade; e devem particularmente recommniendar aos paes de familia que se entretenham na honra e temor de Dens, c qne tenham um cuidado particular em fazer ir seus (ilhos ouvir a doutrina christã, e em os levar comsigo nos dias festivos para ouvir as práticas, as Iciiuras espirituaes, c para assistir a vesperas, e em educal-os no sanlo habito de se confessarem c commun- garem com frequencia.

Devem lambem persuadir áquelles que são casados, que empreguem todos os seus cuidados para altrahir suas mulhe­res á frequencia do sacramento, e ás mulheres que façam o mesmo a respeito de seus maridos, fazendo-os recordar d'csta sentença de S. Paulo, que o bom marido lucra sua mulher para Jesus Cbristo, e que da mesma sorte a mulher lucra mui­tas vczcs 0 marido. Poderão obrigar aquelles que souberem ler, e que tèem meios para isso, a comprar alguns livros es­pirituaes e de devoção para os lerem ou fazerem ler á noite a toda a sua familia, e principalmente nos dias festivos, como vidas dos Santos, a Imitação de Christo, ns obras de Luiz de Granada, os exercicios da vida espiritual, o Rosário de Gaspar Loart, e a Prálica da oração mental, composta por F. Malhias, capuchinho, c outros semelhantes.

Representarão muilas vezes áquelles que forem ricos, que não são mais que os dispensadores de Deus nos bens que pos­suem, e que, não obstante poderem legitimamente sustentar seu estado com estas riquezas, devem comtudo usar d’ellas com a modéstia digna de um christão; de sorte que não só-

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mente não devem despender niais do qiie os redditos que seus bens produzem, mas antes menos, em conformidade com o que foi sabido e ensinado pelos mesmos pagãos. Devem tam­bem fazer-lhcs conhecer a grande obrigação que lôem de fa­zer esmolas, e que, para não faltarem a um man(la|iicnlo de tão grande importância, devem regular-se pelo conselho de pessoas virtuosas e intelligentes. E linalmente o director deve dar a todos aquelles que debaixo de sua conducta eslão, se­gundo 0 eslado c condição de cada nm, as instrucções e soc­corros que julgar poderem ser-lhcs uleis e necessários para conservar c fazer progressos na vida espiritual.

21. (S. Imiancisco de S alles, t. II, p. 622, edição dc 1836, Caridade e E spiiiito de S. F rancisco de Salles. )— Tende pois um ar-dente desejo da salvação das almas, e principalmenle d’aquel- v,i.Ias que se apresentam á penitencia, rogando a Deus que se digne cooperar em sua conversão e em seu progresso espiri­tual. Lembrae-vos que os pobres penitentes, no principio dc sua conlissão, vos chamam pae, e que deveis ler cllectivameii- te um coração paternal a seu respeito, rccebcndo-os com ura extremoso amor, supportando com paciência sua ruslicidade, ignorancia, imbecilidade, estupidez e outras imperfeições, não vos cansando jámais de os ajudar e soccorrer, emquanlo que n'elles ha alguma esperança de emenda. Segundo a expres­são de S. Bernardo, a carga dos pastores não é das almas for­tes, mas das fracas e debeis; porque as fortes vão por seu pé, mas é necessário conduzir as fracas. Assim, ainda que o íillio prodigo voltasse inteiramente nú, immiindo e nojento como um porco, seu bom pae não obstante o abraça c beija amoro­samente, e chora por cima dellc, porque era seu pae, c o co- raç.ão dos paes excede em Icrmira o dos lilhos.

22. — S. Francisco de Salles não advertia que, dando estes i’f.ixo do conselhos, elle traçava a historia de sua conducta. üuçamospessoa qne melhor o conheceu: Santa Cbanlal se exprime em í(.g ‘ ' seu depoimento d’esle modo: «Eu digo que nosso bemavcn- turado fundador foi a Iodos os respeitos incomparável na ca­ridade que exercitou no confessionário e no zelo com que n’elle se empregava. Dava-se todo a esle exercicio sem me­dida nem limite, olhando só á necessidade de quem recorria Q elle; para islo deixava ludo, excepto se estivesse occupado com algum negocio mais importante para a gloria de Deus, porque sabia qiie n’este sacraraeulo sc fazia o grande provei­to das almas. Todos os domingos e festas, grande numero dc pessoas que alli vinham, senhores, damas, cidadãos, soldados, creadas, paisanos, mendigos, pessoas doentes, lazarentas, no­jentas e cheias de grandes misérias, elle as recebia a todas sem differença, nem accepção de pessoas, com igual amor e

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doçura; porque nunca sc recusava a creatura alguma, por des­prezível que fosse; pelo contrario, creio firmemente que a re­cebia com a maior caridade interior, c a acariciava mais ter­namente do que aos ricos e bem íigiirados, e dizia que era onde se exercitava a verdadeira caridade. Os mesmos meni­nos não eram excliiidos pelo Beniaventurado; assim elle os re­cebia com tanta amnbilidadc,que tomavam prazerem voltar.

«Dava a seus penitentes todo o tempo c vagar para bem se declararem; nunca os apressava. E além dos sobreditos dias, n’aquclle dia e bora que o procurassem deixava ludo, algu­mas vezes mesmo dc ir ao oflicio á cathedral; demorava o di­zer a santa .Missa, ninda que estivesse revestido; deixava suas refeições, ainda que estivesse n ir para a mesa, não obstante seus familiares se queixarem c quererem desvial-o d’islo.

«Nas grandes festividades, jubileus e outras occasiões se- mclbanlcs, era necessário que elle confessasse de dia c de noite, pelo que uma vez o vi inteiramente desfallecido: «Es­tes dias, mc dizia elle, são para mim do peso do ouro pela mullidão das confissões.. Dizia lambem a seus penitentes para lhes dar conliança: «Não façaes dilferença entre vosso coração e o meu; eu sou lodo vosso: nossas almas são iguaes.»

«Com alguns chorou seus peccados, e tão amavelmente tra­tava seus penitentes, que se desfaziam em pranto diante d’el- le. Um dia me escreveu elle: «Temos aqui lido um grande jubileu que me lem lido occupado, mas consolado na recepção de muitas conlissões geraes e reformas dc consciências, a pon­to de ter colhido lagrimas, parte dc alegria, parle de amor, en­tre nossos penitentes.»

«Escreveu-me uma oulra vez: «Ila quatro dias que eu re­cebi no grcmin da Igreja, c em conlissão, um cavalheiro de vinte annos. Ó Salvador de minha alma! que alegria vcl-o tão santamente accusar seus peccados, e no decurso d'aquellcs fa­zer ver uma providencia de Deus tão especial e lão particular em retiral-o por movimentos e molas lão occultas á vista hu­mana, tão sublimes e lão admiravcisI elle me puuha fóra de mim mesmo. Que osculos de paz eu lhe dei!»

«Quando elle conhecia que alguem tinha dilliculdade em confcssar-se ou por vergonha ou receio, procurava por todos os meios abrir-lhe o coração e augmentar-lhe a confiança. Não sou eu vosso pae? e dizia isto alé que lhe dissessem sim: e depois: Não quereis vós livremente dizer-me ludo? Deus es­pera que abraes vosso coração; Elle tem os braços abertos para vos receber. Vede, eu estou no logar de Deus', e lendes vergo­nha de mim! mas saindo d’aqui eu sou peccador, e ainda que tenhaes feito todos os males não me admiro.

«Elle ajudava mesmo com uma doçura não igual a explicar

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OS peccados, quando via que por ignorancia ou vergonha ti­nham dilliculdade era dizcl-os.

23.— «Depois da conlissão dizia palavras lão cordiaes: Conünua- «Oh! quanto vossa alma me é cara, e tudo o que ella rae de- 5®°- clarou! e os anjos agora se regosijam e festejam estn acção, e eu vos felicito com elles; mas é por consequencia necessário prometter a nosso Senhor c a mira lambem de não voltar ao peccado.»

«Quando via que não tinham contrição, elle mandava dizer algumas curtas palavras, como: Terieis grande desejo de não ter offendido a Deus, não é assim'/ o algiimas vezes mandava repetir alguma cousa de que se tivessem accusado, para fazer perder a rcpugnancia que tinham em dizcl-a.

«Dava muilo pequenas penitencias, e dizia: Fareis com gosto 0 que cu vos disser? dizei portanto islo ou aquillo, que era algunia oração vocal que podessem facilmente dizer, e não ordenava que lizessem considerações sobre algum mysterio ou cousas semelhantes por penitencia.

«Fallava pouco na conlissão, a não ser para desvanecer os vãos escrupulos, e para esclarecer seus penitentes do que era ou não era peccado; c o que elle dizia tocava mais o coração do que os grandes discursos; e saia-se de seus pés com gran­de animo, e muitas vezes cora recolhimento e grande senii- mcnlo por Deus.

«Gostava muilo que na conlissão fossem claros, simplices e singelos, e dizia a seus penitentes que era muilo necessário manifeslar os movimentos pelos quaes se commeltem faltas, e que sc não confessassem á ligeira; assim que fizessem ver a seu confessor todas as molas e movimentos pelos quaes se fa­zem os peccados; que se fizessem de outro modo, nunca po­deriam ser bem lavados. E por esle zelo que elle tinha de apurar as almas por conlissões claros, arrancou paixões más, que outros teriam podido deixar por não terem este methodo.

«Com esla incomparável alfabilidade, abria os corações mais fechados, tirava todo o mal que dentro d’clles eslava, e n’el- les estabelecia alTeições e resoluções sólidas. Era incompara­velmente resoluto, e esclarecia as dúvidas e escrupulos do consciência promptamente, inspirando em seu interior ura perfeito adiantamento e repouso.

«Continuando sobre o mesmo artigo, digo que não seria possivel nomear o grande cumero de pessoas que, por meio aesle Bemavenlurado, se tôem adiantado na perfeição chris­tã; verdadeiramente islo não é crivei senão para aquelles que 0 léem vislo como nós, que temos visto muitos de seus peni­tentes com ardentes desejos, já de reforma de vida, já de adiantamento na perfeição. Cada ura que se aproximava de-

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vidamente saia com grande proveito de sua alma e desejo de voltar novamente a elle, e reciprocamente davam uns aos ou­tros coragem e união para isto.

«Eu digo n’isto o que vi em Paris, onde elle confessava muitas vezes em nossa igreja, c da mesma sorte em Greno- ble; era uma allliicncia dc lodo o genero de pessoas de qua­lidade de um e oiitro sexo. Só Deus póde saber o numero inlinilo de almas que a Mngeslade divina adquiriu por me­diação d’esle Bemavenlurado; porque sua reputação, por toda a parte espalhada de que elle era singular em doçura e pie­dade, e que na matéria de bem governar as almas era incom­parável, fazia que de todas as partes concorressem a elle.

«Quando sabiam que elle devia passar por cidades, e que elle ia em aldeias estar na casa de seus amigos, em toda a parte era necessário ouvir conlissões geraes; e, como elle di­zia, sempre guardavam para elle o fundo de suas consciên­cias, e 0 que tinham grande dilliculdade de dizer a outros. E isto é verdadeiro, nolorio e publico.

Continua- 24.— «Tambem arrebatava o ouvil-o fallar de Deus e da perfeição. Elle tinha termos lão precisos e intelligiveis, que fazia comprebender com grande facilidade as cousas mais de­licadas e sublimes da vida espiritual. Elle não tinha sómente para si esla luz tão subtil; cada um tem visto e conhecido

Sue Deus lhe linba communicado ura dom especial para con- uzir almas, e que elle as guiava com uma dexteridadc toda

celeste. Penetrava o fundo dos corações e via claramente seu estado, c por que movimento elles obravam: e todo o mundo sabe sun caridade incomparável para cora as almas, e que suas delicias eram trabalhar na volta d'ellns. N ’isto era infa­tigável, e jámais cessava sem que lhe tivesse dado a paz e posto suas consciências em estado de salvação. Quanto aos peccadores que se queriam converter, c que elle via frágeis, que não fazia na volta d’clles? Fazia-se peccador com elles; chorava com elles seus peccados, e de tal sorte identificava seu coração ao dos penitentes, que nunca alguem soube oc- cultar-lhe cousa alguma: ora, segundo meu juizo, parece-me que 0 zelo da salvação das almas era a virtude dominante do nosso bemavenlurado Padre; porque em certo modo vós te- rieis algumas vezes dito que elle deixava o serviço que im- mediatamente diz respeito a Deus, para preferir aquelle do proximo. Meu Deus, que ternura! que doçura! que paciên­cia! que trabalho! finalmente n'elle acabou» (•).

(<) Diversos supplemeiUos ás obras de S. Francisco de Salles, compilados pelo Abbadc dc Dandri. Lyou, 1837, pag. ICO e seguintes, e pag. 233.

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Citemos alguns rasgos d’csta incompnravel caridade do santo Bispo para com os pobres peccadores. Elle praticava á letra este conselho sagrado: Dae a todo aquelle que vos pe­dir; e este outro: Parti vosso pão áquelle que necessita d’elle. Quanlo ao pão espiritual, não era simplesmente liberal, era prodigo; porque jámais recusava a consolação espiritual fosse a quem fosse, seja era particular, seja em publico, tanto medo elle linha d’esta arguição. Os meninos pediram pão e nin­guém lh’o partia. Elle tinha um tão abundante celleiro d’cste pão de vida e de inteiligencia, que sempre estava prompto a distribuil-o, asscmelh.ando-sc a essas amas que abundam em leite, e que nada desejara tanto como communical-o. Um dia que lhe pediam que attende.ssc á sua saude, respondeu: «Não devemos nós mirrhar corpo e alma por este caro proximo, que nosso Senhor tanto amou, e que morreu de amor por

«Se as forças de seu corpo podessem igualar as de seu es­pirito, diz 0 Padre Talou, um de seus historiadores, elle em cada dia, em cada momento teria corrido de um ao outro polo para alliviar os allliclos e adquirir almas para Deus, porque não se poupava Iraiando-se d’este sanlo objecto, e andou uma vez mais de sessenta leguas para confessar um bom velho que 0 desejara, e que lhe fizera saber por um de seus ami­gos que não queria confessar-se senão com elle. Anima tanti vales !r>

A tal ponto se coramovia pela pouca caridade que se teste­munha para coro o peccador, que dizia gemendo: «Só eu e 0 bom Deus amamos os peccadores.» Assim, com que eifusão do coração os acarinhava!

Fazendo a visita de sun diocese, recebeu grandes queixas contra um ecciesiastico, cuja vida era escandalosa, c cujo procedimento não correspondia á sciencia de que era ornado. Esle ecciesiastico se apresenU ao Bemavenlurado com uma firmeza lão graude, como se fosse innocente de tudo o que o tinham accusado perante o santo Prelado, c altamente grila que era calumnia.

0 Santo 0 recebeu com um acolhimento muito favoravel e cheio de sua bcuignidade ordiuaria; mas vendo seu descara­mento em defender-se, córou na presença d'elle. Este só gesto, sem outra correcção, toca o coração d’esle imperti­nente; resolve-se a prevenir a face do juiz pela confissão; pede ao sanlo Bispo que o ouça no tribunal da penitencia. 0 ouvido promptamente lhe é aberto, e ainda mais o coração; e sáe d esta piscina salutar como Naamau das aguas do Jor­dão; e ao sair d’alli, coberto d’esta santa vergonha que con­duz á gloria, lhe disse; — Ah, senhor! que pensaes vós

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do maior peccador da terra? — Que Deus derramou sobre vós, ó meu irmão, sua grande misericórdia, disse o Bem- aventurado; vós sois a meus olhos todo refulgente dc graça. — Mas, lhe disse elle, vós sabeis quem cu so u l- So is tal como eu digo, lhe respondeu o Santo.— Eu queria dizer, 0 que eu fui. — É de que eu já me não lembro, responde o Bemoventurado; e para que guardarei em minha memória o que Deus pôz no esquecimento? Comparar-me-heis vós cora esse phariseu que julgava Magdalcna pelo que ella tinha sido, e não pelo que era quando com suas lagrimas banhava os pós do SaK ador ?

«E para vos testemunhar, acrescentou elle, que vos vejo todo cheio de graças celestes, das quaes em vosso coração recebestes uma medida cheia, cuculada e trasbordaudo por todos os lados, rogo-vos que me façaes participante d’cllas, dando-me vossa benção.» E dizendo isto sc lançou n seus pés, do que o outro licou inteiramente confuso. «Não, disse 0 Sanlo, e sem (ingimeulo; rogo-vos que me façaes o mesmo ollicio que acabaes de receber dc mira, e de rae ouvir dc cou- fissão.» Recusando o outro, elle o obriga a acquicscer, do que recebeu uma edificação incxprimivel. E para lhe mostrar que cra sincera a estima em que o tinha, se confessou a elle duas ou Ircs vezes consecutivas á vista de todos, que não sa­biam 0 que admirariam mais, se a humildade prodigiosa do santo Bispo, se a conversão miraculosa d’csle ecciesiastico.

Outro 2S.— E uma regra entre os directores das almas, de fazer exemplo, jj correcção sómente no lim dn conlissão. Temos vislo mais

acima (n.° 17) que esta regra não é sem excepção. Como prova, e tambem como exemplo d’esla correcção, citemos ainda o facto seguinte do sanlo Bispo de Genebra. Úm dia se lhe apresentou para se confessar um personagem que rela­tava seus peccados com tal desembaraço, por não dizer im- pudencia, e com lão pouco sentimento e arrependimento, que parecia que contava uma historia, esculando-se a si mesmo e com prazendo-se era seu discurso.

0 Bemavenlurado, conhecendo n’este tora a indisposição interior d’esta alma, se pôz a chorar, a suspirar, a soluçar; esta pessoa lhe pergunta o que elle linha, e se se tinha achado mal? «Ah! meu irmão, lhe diz elle, eu estou bom, graças a Deus; raas vós estaes mal.» 0 outro lhe replicou atrevida­mente, que eslava bom tarabem. Ah!... disse o Demaventu- rado, continune.» Elle proseguiu cora a mesma liberdade, sem algum sentimento de dor, e dizia terriveis cousas. 0 Bemavenlurado se pôz a chorar fervorosa e abundantemente. Esla pessoa lhe perguntou ainda, por que chorava? «Ah! diz 0 Bemavenlurado, é por vós, que não choracs.»

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Aquelle que linha sido insensível á primeira reprehensão, sendo, como é de crer, chegada a hora da visila, não o foi a esta segunda; e este rochedo, locado com esla vara, deu ligeiro aguas, e exclamou: «Ai de mim, miserável que não lenho pezar de meus enormes peccados, e elles arrancam lagrimas aquelle que é inuocentc!» Isto o locou com tanta força, que esteve a ponto de cair desacordado, se o Bemavenlurado o não consolasse; e ensinando-lhe o aclo de contrição, que elle fez com uma compunção miraculosa, o lornou à pôr em es­tado de receber a graça do sacramento, e desde este mo­mento se deu todo a Deus, e se lornou um modelo de peni­tencia.

26. (ViD.v DE S, Filippe de Neri, liv. X, e liv. II, cap. Oulro mo VI.) — 0 grande confessor de Roma c da Igreja calbolica,S. Filippe de Neri, era a lal ponto assiduo no tribunal, que, não satisfeito de confessar de dia, empregava ainda ncsle santo ministério uma grande parle da noite. Tanto assim que antes da aurora linba já confessado ordinariamente um bom numero de penitentes era seu quarto; elle os ouvia mesmo antes de se levantar. Para sua commodidade, e a lim de que elles podessem entrar quando quizesscm, cllc linha 0 costume de deixar a chave debaixo da porta de seu quarto.

Demais, linha prohibido a seus padres de responderem já­mais: 0 Padre Filippe está a descansar; oü : elle não póde agora apparccer. Um dia, não obstante, o Padre Anlonio Gallonio disse a cerla pessoa que não entrasse, com receio de que ella fosse importuna. Filippe soube d’islo e o rcpre- hendeu severamente: «Não sabeis, llie disse elle, que não quero ler hora nem momento que seja meu?» Uma oulra vez, tendo um de seus discípulos fechado o quarto do Santo, a fim dc que ninguém viesse inconmiodal-o, Filippe soube que um penilenle o esperava; chamou o discípulo, por nome Francisco, e, na presença do penilenle, lhe deu umn aspcra reprehensão, porque seu maior desgosto era saber que al­guem se linha mortificado á espera d'elle.

Quando a igreja eslava aberta, elle descia ao apontar do dia pnra o confessionário, sómente saia d’ellc para dizer mis­sa, que celebrava pelo meio-dia, ou para algum negocio de grande imporlancia, dizendo sempre para onde ia. Se não havia penitentes, permanecia ao pé do confessionário, occu­pado, ou a ler, ou a rezar o rosário, ou a recitar o oiTicio.Algumas vezes dava alguns passos a distancia para os espe­rar, e para mais facilmente ser visto por elles. D’aqui resul- tava que toda aquella pessoa que desejava fallar-lhe o podia encontrar facilmente e a toda a hora. As enfermidades, de qualquer genero que fossem, não lhe faziam ahandonar o

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tribunal senão quando os médicos expressamente ih’o prohi- biam. Se por compaixão alguem lhe dizia: «Meu padre, para que vos daes a tanto trabalho?» — Não é trabalho, res­pondia elle, é antes uin prazer e uma recreação.— Ora elle comportava-se d’estc modo para entreter os penitentes no fervor, e para não dar occasião de se resfriarem ou descui­darem, debaixo do pretexto de que o não podiam facilmente encontrar.

Continua- 27.— Um dia seus padres lhe diziam: «Padre, vós não vos cao. poupaes quanlo deveis.» — Eu sou bem contente de vos re­

cordar, lhes respondeu, que os meus penitentes os mais pie­dosos são aquelles que eu lucrei para o Senhor, esperando-os mesmo durante a noite para os converter; crôde-me, nada procura tão doces consolações ás almas que amam a Deus, como deixar Jesus Christo por Jesus Christo.

Não era sómente esperando na igreja ou em seu quarto,

r ii 03 confessar, que Filippe fazia uma abundante colheita peccadores; elle arrostava ainda, para os lucrar, todas as

fadigas, por maiores que fossem. Nem as chuvas, nem os ventos, nem o frio, nem os perigos de perder a vida ou a re­putação, nada, era uma palavra, era capaz de o embaraçar quando se tratava dc converter ura peccador e dc attrahir uma alma para Jesus Christo.

Quem poderá exprimir a bondade com que elle recebia os penitentes! Elle se amoldava a todos: aos nobres e aos po­bres, aos mancebos e aos velhos, aos inferiores e aos supe­riores, aos sabios e aos ignorautcs; acolhia aquelles mesmos que nunca tinha visto com tanta alTabilidade e os abraçava com tanta ternura, como se ha muito tempo os amasse. Se lhe vinha algum peccador, o pensamento do estado d'esta pobre alma, e sobretudo da oITensa de Deus, o enternecia a tal ponto, que chorava fervorosas lagrimas, «como costuma fazer, diz singelamente o auctor de sua vida, ura menino que é castigado por seus paes». 0 Cardeal Frederico Borromeu aflirraa ser d’isto muitas vezes testemunha. Dous annos antes de sua morte, o saulo velho dizia, chorando, a ccrta pessoa que elle julgava estar em uma perigosa illusão: «Ainda que tão velho, lomarei não obstante muitas vezes n disciplina por vós.» Tinha elle setenta annos.

Uma outra vez soube elle que ura cavalheiro não usava franqueza com seu confessor ordinário, mas que por vergo­nha occultava alguns de seus peccados. Ora, aconteceu que um dia este mancebo se achou só no quarto de Filippe, a quem de tempos a tempos visitava. 0 Santo lhe lançou fixa­mente a vista, e se pôz a chorar. Com esle espectáculo o mancebo foi enternecido: Deus lhe tocava o coração; de

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sorte que (icaratn algum tempo um e outro sem poderem de outro modo fallar senão por suas lagrimas. Finalmente o moço peccador caiu de joelhos aos pés do santo, confessou-se de tudo 0 que tinha occultado, rccommendando-se de todo o seu coração ás orações de seu caritativo confessor. Era seu turno, 0 Santo o abraçou ternamente, e o consolou com sua doçura e caridade ordinaria.

28.— Foi pela mesma doçura que elle converteu ura outro Çontinua- mancebo extremamente dissoluto. 0 Santo se contentou di- zendo-lhe que rezasse cada dia seis vezes a Salvè-Rainha, e que beijasse a terra, pronunciando estas palavras; Posso amanhã estar morlo. 0 rapaz peccador obedeceu; em pouco tempo tornou-se muilo piedoso, e, passados quatorze annos, teve uma morte preciosa diante do Senhor. Taes foram os meios pelos quaes S. Filippe conduziu ao caminho da virtude um numero quasi iniinilo de peccadores. Elles confessavam publicamente que lhe eram devedores de sua salvarão. Na nora da morte um grande uumero delles dizia; «Bemdilo seja 0 dia c a hora em que conheci o Padre Filippe!» Admi­rados das conversões cxlraordinarias que operava o caritativo confessor, oulros diziam; «0 Padre Filippe altrahe as almas como 0 iman altrahe o ferro; no momento em que alguem se confessa cora elle experimenta como uma necessidade de tor­nar a vir.» Assim elle não gostava que os confessores lizes­sem muilo dillicil 0 caminho da virtude, principalmente aos penitentes ha pouco convertidos; nem que os afugentassem, tralando-os com dureza; nem que fossem rigorosos na confis­são. Elle queria, pelo contrario, que se compadecessem d’el- les, e que com doçura e caridade procurassem caplival-os, e que tivessem com elles todas as possiveis condesccndcncias, não prohibindo aos homens de repente e com rigor de traze­rem ricos vestidos, colleirinhos cora pregas, espadas e outras cousas semelhantes, com receio de que, aterrados pela dilli­culdade, voltassem airaz, c, abandonando a confissão, ficas- ■ sem mais tempo no miserável estado do peccado.

É pelo mesmo principio que elle não costumava invectivar contra certas vaidadcs dc que as mulheres costumam fazer ostentação em seu vestir e no ornato de sua cabeça. Elle dis­simulava 0 melhor que podia, a fim de poder, com o tempo, conduzil-as mais facilmente ao fim a que se propunha. «E’ necessário, dizia elle, supportar algumas vezes estes defeitos nos oulros, como supporlamos a nosso pezar as deformidades naluraes; quando alguma piedade tem entrado nesUsalmas, ellas deixam espontaneamente estas cousas, c vão mesmo além do que o confessor teria desejado.» É n razão por que, perguntando-lhc um dia certa dama se ella estava elegante.

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apresse, um ar de enfado, uma palavra, um aclo qualquer que manifestasse a mais leve impaciência, bastaria para ser nocivo á sua sinceridade. Para a favorecer, não tenhaes mes­mo 0 ar de conhecer o penitente, ainda que aliás o conhe- çaes, se elle mesmo não começar por vos dizer quem é. Elle não veio talvez procurar-vos senão na esperança de ser incó­gnito. Se 0 ouvirdes fóra do confessionário, ponde, durante a confissão, vossa mão enlre vós e o seu rosto, a íim de não augmentar por vosso olhar seu embaraço e sua vergonha.Pela mesma razão fazei uma regra invariavel de demorar para 0 fim, e quando bem certo eslejaes de que elle nada mais tem a dizer, todas as admoestações e a declaração de suas obri­gações. Esta regra não sollre exccpçào sciiào em alguns ca­sos raros, ou por circumslancias particulares, nas quaes a prudência suggcre uma conducia dilTerenle.

31.— É necessário lambem que vos saibaes aproveitar ha- Habilidade bilmenle do que o penitente vos diz para descobrirdes o que ® não diz. Se, por exemplo, se accusa de ter lido um grande o pcniton- odio contra alguem, vós, que conheceis o.s efleilos naturaes ic não diz. de uma lal paixão, pergunlae-lbe se elle desejou muito mal, se injuriou, se recusa a saudação a seu inimigo, sc o não vi­sitou mais ainda que seja seu proximo pareule, e islo com escandalo d’aquelles que conhecem sua conducia. Em vossas interrogações será muilo ulil suppor sempre alguma cousa mais na especie e cm o numero das faltas. Por islo vós fazeis a confissão da verdade mais facil ao penitenle, que antes que­rerá louvar-se diminuindo, do que humilliar-se acresccnlaudo alguma cousa a vossas supposições. Vamos mais longe. Vossa habilidade deve saber descobrir lodo o mal, não sómente quando ha declarações começadas, mas ainda quando as não ha; que digo eu? quando mesmo o pcnilente nega tudo, mas que as circumslancias vos dão razões prováveis de rccciar que elle cale ou negue por vergonha, e por uma ignorancia culpavel: Diligens inquisilor el subtilisinvestigaiorsapienler et quasi astule interrogai a pcenitente, quod [orsitan ignorat, vel prce verecundia velU occullare. (Aug., lib. de Vera et falsa panit.)

E porque na maleria de impureza todos são sujeitos a ten­tações, e porque custa mais o accusar eslas faltas do que as outras, se um desconhecido vier ler comvosco sem cousa al­guma vos dizer sobre o que dito fica, c que não obstante as circumstancias vos dão logar de suppor um criminoso silen­cio; por exemplo, se o penitente 6 moço, mal educado, se ora pouco, se raras vezes freqüenta os sacramentos, se está cer­cado de perigos, como é quasi impossivel que, durante um tempo notável, elle não lenlia experimentado ao menos len-

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tações, eis aqui o que fareis: anles de acabar a confissão, in- terrogae-o, suppondo sempre o peior, e abri o caminho, fal- lando-lhe assim: Tendes ouvido conversas más, e tendes tido máus pensamentos, não é verdade? Se elle negar, não deixeis de tomar suas negações por affirraações; conlinuae, e dizei ainda duas ou tres vezes: Tendes-vos demorado com gosto n'estes máus pensamentos, não é assim? Ainda que elle vos responda que não, conlinuae sempre, e dizei-lhe: Não vos perturbeis, não desanimeis, quando mesmo tenhaes nelles consentido. Aconteceu-vos isto muitas vezes? E depois tendes feito alguma acção má, não é assim? Resultará que o peni­tente, siirprcndido de ver que vós, ouvindo mal, adivinhasles a verdade, vos dirá em voz baixa; «Sim, meu padre.» Não vos queixeis; mas conlinuae a pesqiiizar novas faltas, ou o numero d’aquellas que elle confessa; depois dae-lhe confian­ça, e com toda a caridade e altenções possiveis dizei-lhe: «Não estaes contente que eu vos tenba feito confessar estes «peccados? Dizei a verdade: no principio tivestes a desgraça «de deixar escapar uma mentira; mas cousolac-vos. Deus vos «fez a graça de que, em vez de acreditar em vossas dcnega- «ções, cu vos lenha ajudado a dizer a verdade. Consolae-vos, «é uma prova dc que Deus quer perdoar-vos: mas dizei a «verdade, vós tendes já occultado estes peccados era outras «conlissõe.s? Apesar d’isto, nada temaes; estamos cm tempo «de remediar tudo, basla tornar a fazer todas estas más con- «lissões. üoje, ainda muito perturbado por estas mentiras, não «eslarieis disposto; tomemos oilo ou nove dias para o bem da «vossa alma. Durante esle tempo recitarcis taes orações, fa- «reis taes práticas. Para preparar vossa conlissão geral, segui «0 conselbo que vou dar-vos. Separae os peccados de uma «mesma especie, e ponde-os juntos, a (im de os dizer, não «um a um, mas todos simultaneamente; por exemplo, com- «raetli esle peccado pouco mais ou menos tantas vezes. Se «não podérdes mesmo recordar-vos pouco mais ou menos do «numero de vezes, dizei duas cousas: desde quanlo tempo «corameticis lal peccado, por exemplo, ha tantos aunos; e a «frequencia das quédas, de modo que deis um termo medio «eutrc 0 mais e o menos, por exemplo, cai tantas vezes «pouco mais ou menos cada mez, cada semana, cada dia: e «basta islo. Vollae no dia indicado, eu vos ajudarei quanto «ás circumstancias e quanto ao mais, c sereis consolado.»

E.xemplo. 32.— Oh! quantas almas devem a estas industrias sua cura e sua saude! Tal devia ser a habilidade de medico espiritual do conego de Rossi. Era sun oração fúnebre, pronunciada em Roma em 1SC2, se vô que elle conseguiu fazer confessar sin­ceramente todos seus peccados a uma pessoa que linha já re-

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cebido a cxlrema-unção treze vezes, e que tinba sempre ca­iado peccados na conlissão. Vôde agora quanto é importante, quanto é vantajoso possuir esla caridade de pae, e esta habi­lidade de medico. Sem estas qualidades, o mais habil lheo­logo teria podido jámais descobrir todo o mal occullo no fundo d’estc coração culpado?

33.— Depois de ter habilmente sondado a ferida, desco- Julçar berto e posto como manifesto o mal do penitente, resta-vos 0 julgal-o sensatamente, a fira de não vos enganardcs na ap-n,a| pbcação dos remedios. Com elTeito, ha muita dilTcrença cnlre peniien- 0 curativo de um peccado que degenerou em habito, seme- ic. Ihanle a uma chaga gangrenada, e aquelle de um pcccado commettido sómente por accidenle. Uma occasião proxima exige muita mais attenção do que uma occasião remota. Cer­tos peccados extremamente perigosos requerem um bem dif- ferenle Iralamcnlo d’aquelle dos peccados ordinários c com­muns. A cada peccado grave que vos disser o penilenle não vades pois de repente conceber receios e fatigal-o com per­guntas, se vêdes que a occasião é accidental, como, por exem­plo, se elle disse grandes injurias a alguem que passando o oITendeu. Pelo contrario, quando a occasião é permanente, e que desde a ultima conlissão o peccado foi commellido muitas vezes, tendes uma jusla razão de duvidar. Assim, examinae se 0 mal é mais grave do que parece ao primeiro golpe de vista. Para isto fazei-lhe prudentemente algumas interroga­ções; dizei-lhe, por exemplo: «Tinheis já peccados semelhan­tes era vossa ultima confissão, e mesmo ha muilo tempo?Tendes caído em falta outras vezes cora esla pessoa? No ul­timo anno, pela Paschoa, havia lambem um anno que vos não tinheis confessado, não é assim?» E em proporção do peccado applicareis o remedio. Algumas vezes o mal apenas começa, ainda por consequencia é fraco; mas, desgraça se elle conlinúa e toma novas forças! brevemente sc torna gra­ve; é obrigação de um medico habil aprecinl-o desde o prin­cipio. Tal era S. Filippe de Neri. Quando alguns de seus pe­nitentes se desculpavam de certas familiaridades de mãos com pessoas de differenle sexo, debaixo do pretexto de que não tinham intenção má, e não experimentavam alguma ten- Ução: «Vós não sois tentado, lhe dizia o habil direclor, é o que é mais de lastimar; é uma prova de que o demonio se quer aproveitar de vossa imprudência para vos attrahir a grandes faltas. Elle .se demora a mostrar-se, a lim de que, adiantando-vos lemerariaraente, possa atacar-vos de impro­viso e fazer-vos cair no laço.» Assim n paixão do jogo, por exemplo, começa u’este rapaz, a da vaidade n’esta rapariga, preveni o mal que poderia resultar d’ella, dae admoestações

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convenientes. Por vossos conselhos, bem mais do que por uma reprehensão severa do que em si não é ainda um grande mal, obrigae este mancebo a mortilicar sua paixão nascente, p para que ella se não torne nociva, recommendae-lhe que se abstenha do jogo nos dias de communhão, ou na sexta feira, em honra da Paixão de nosso Senhor, ou ao menos que sc modere quanlo á duração, quanlo á despeza, e quanlo ao nu­mero de companheiros. Dizei do mesmo modo a esta rapari­ga, para vencer sua vaidade, que não traje mais todos estes ornalos de que fazia uso, e algumas vezes, em honra da Santa Virgem, que traga o que tiver menos apparenle c menos ri­co. Em certos peccados a continuação é mais de Icmcr do que 0 augmento; ainda que pequenos, podem, sendo conti- nuado.s, tornarem-se muilo nocivos. Taes são, por exemplo, certas pequenas aversões que não terão oulro elTeito senão de fazer evitar o encontro da pessoa, de lhe fallar sôcamenle e em poucas palavras; mas se esla aversão é habitual e conti­nua, pódc levar a grandes excessos pela subtracçâo das gra­ças especiaes dc Deus, principalmente sc as pessoas fazem profissão dc piedade: 6 o que aconteceu ao prcsbylcro Sa- pricio. Um rancor que ha muito lempo conservava'contra o leigo Nicephoro Ibe fez perder a constancia na occasião do martvrio; renegou sua fé, e tornou-se um apóstata. Sabei portanto apreciar cm seu justo valor o mal que achardes no penitenle,

1’rudcncia 34.— E na applicação dos remedios aos males do penitenle™ -^PljJj^quc deve sobretudo manifestar-se n habilidade de medico. Eremedios P'''®’®'''® fl®® ®‘*® lr®l®-se de curar a dureza do coração, de

■ modo que exciteis no penitente esta dor sem a qual o sacra­mento é inutil; é enlão que vosso zelo, até alli relido para não obslar á integridade da conlissão, póde e deve animar-se de um justo ardor pelo interesse do culpado. Todavia, que ande sempre adiante a caridade, a fim dc fazer lomar em bom sentido o que tiverdes a dizer-llie. Com elTeito, segundo o Concilio de Trento.- Sape plus erga corrigendos agil benevo- lentia quam auclorilas, plus exhortatio quam còmminalio, plus charitas quam polestas. Começareis pois felicilando-o de se ter confessado bem; depois, como a conliança é aqui um ponto importante, a lim de determinar o pcnilente ao mais dillicil, não deixeis de lhe fazer logo esperar seu perdão, com- tanlo que sc arrependa sinceramente. 0 melhor meio de o conseguir, é obrigal-o a fazer justiça a si mesmo, a liai de obter sua grnça, certo de que Deus lh’a concederá. Depois d’islo representae-lhe brevemente, mas com força, os motivos que a fé suggere para um verdadeiro arrependimento, quero dizer, motivos de confusão, de temor, de confiança e dc amor.

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Começando: 1.“, a reprehender, não cada ura de seus pecca­dos, se elle confessou muitos, mas os principaes, llie mostra- reis seu numero e gravidade, e lhe fareis sentir que elle é menos desculpável por ser christão e mais favorecido de Deus; 2.', expondo-lhe os castigos que merece da parte de Deus, este Senhor tão graode e lão bom, a cujas anticipações elle não correspondeu mais do que cora ingratidão e despre­zo; castigos inevitáveis e talvez bem proximos, sc não se ar­repende como deve; 3.“, as vantagens igualmente certas que tirará da conlissão: o perdão, a paz, uma boa morte, a vida eterna.

Fallae á sua imaginação, represenlae-lhe Deus, que, len­do-o suspenso era cima do inferno, lhe mostra no fundo dos abysmos uma multidão de condemnados culpados nas mes­mas faltas, talvez faltas menos graves que as d’ellc; que lhe recorda os benclicios da crenção, da rcderapção, etc., de que 0 cumulou, c as ingralidões e oITensas cora que lhe pagou; que em sua juala e inexorável cólera o ameaçava com os mesmos castigos, mas que se mostra prompto a perdoar-lhe e a dar-lhe o céo, comtanto que era seu peccado elle não veja sómente o mal que a si mesmo fez, mas lambem a injuria, o ultraje que fez ao Senhor, e se arrependa d’elle sobre todas as cousas. Que se volte pois para Deus, e lhe diga; Ne pro- jicias me a fade lua, etc. Pater, peccavi, etc. D'aqui ser-vos- ha facil cleval-o até á contrição perfeita. Para islo lhe recor- darcis o amor de Deus a nosso respeito; amor lão generoso, que 0 levou a dar sua vida por nós; amor lão especial e lão prodigo, que o levou a cumular-nos de benelicios com prefe­rencia a tantos outros; amor tão desinteressado e lão con­stante, que, cm sua intenção, os favores passados não são senão penhores de favores novos, cujo (im é fazer-nos felizes com elle por toda a eternidade. Ora esle Deus, que nos re­vela sua inliuila bondade por tão tocantes provas, não é me­nos iniinilo cra suas outras perfcições, era magestade, era sa­bedoria, era poder, era santidade, etc. Que vem isto a dizer, senão que é por si mesmo inlinitamenle diguo de respeito, de estima e de amor? E não obstante, como o temos nós tra­tado? Por nossos peccados de novo o temos crucilicado e co­berto de opprobrios. Dizei-lhe pois que, penetrado de dor por haver tão mal correspondido a tantas bondades, não é tanto 0 pensamento do paraizo e do inferno, como a dor de ler oITendido um Deus lão grande e lão bom, que vos faz de­testar sincera e eflicazmeute vossos peccados; tomae pois a resolução, etc.

33.— Mas para vos servirdes a proposilo d’estas exhorla- Coniinua- ções, observae o seguinte: 1.“, cora aquelles que sa beis serem

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cuidadosos de se preparar bem, ou que vôdes actualmente cheios de compunção, não falleis ou não façaes mais que in- dical-as, ellas seriam supérfluas; 2.® com outros, rogae e es­tendei-vos mais sobre o motivo que lhes é mais adaptado: as­sim, com os pusilianimes, faliae pouco do temor e muito da confiança em Deus; 3.®, que a qualidade ou dignidade dos pe­nitentes não obste a que os exciteis á contrição se a não lêem, mas fazei-o de modo que não os humilheis demasiadamente. Esta circumspecção vos dará pouco a pouco sobre estas pes­soas uma auctoridade paternal e sagrada, que as fará doceis em todas as cousas. Reprchensões fortes terão melhor resul­tado com os penitentes teimosos, obstinados ou grosseiros, que quasi não comprehendem raciocinios; mas ainda n’estc caso todas as vossas palavras devem ser adoçadas pela caridade, de modo que elles vejam que os não desprezaes; porque as pessoas mesmo da mais baixa condição são zelosas de sua honra. E pois dando-lhe signaes de vosso zelo por seu bem, que abrireis o caminho de seu coração, e que obtereis o que descjaes. Se notardes qne a exposição dos motivos da contri­ção nenhuma impressão faz sobre o penitente, não percaes aiiimo: resta-vos um meio que, empregado como devemos, é infallivel, assim como a fé o ensina, quero fallar da oração. Sim, 0 valor da oração, a necessidade da oração são cousas de que nunca podereis assás penetrar-vos, nera a vossos pe­nitentes. Ora, ha dous meios de servir-vos d’esla arma omni­potente: 1.®, no decurso da confissão, orando ambos junta­mente, e algumas vezes vos acontecerá ver promplamenle os eíTeilos; 2.®, se não obtiverdes no momento, entre oulras pre­cauções de que eu vos fallarei, para não expor a absolvição, tomae a seguinte: dae ao penitente um certo tempo para orar, mas dizei-lhe como se deve n’islo haver; por exemplo, que se dirija, por modo de colloquio, á Santa Virgem, ao Santo Anjo da Guarda, e a cada uma das tres pessoas da Santissima Trin­dade; tende cuidado de lhe suggerir o que deverá dizer, e re­commendae-lhe que falle a cada uma como se a seus pés es­tivesse.

ncmcdios 30. _ Sc o penitente carece de coragem para cumprir gra- miM.* do"''®® obrigações, não basta fazer-lh’as conhecer cora Ioda a pre- coração. cisão de um juiz esclarecido, é necessário que, como habil me­

dico, saibaes empregar os motivos e os meios mais proprios parn lhe aplanar este passo diflicil. Se vos conlenlaes era di­zer-lhe: Sois obrigado a restituir, a deixar esta occasião, a perdoar esta injuria, a resistir a tal tentação, a perder tal máu habito, quasi nunca se aproveitará de vossas advertên­cias. E aqui sobretudo que vós tendes necessidade da scien­cia ascética que trata das tentações, das paixões, de sua ori-

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gera, de seu progresso e de seus remedios; das virtudes, dos motivos dc nos alTeiçoarraos a ellas, dos meios dc as praticar; dos vicios, das razões para os abominar, e dos meios para os venoer e evitar. Para vos dar uma idéa d’isto, qunndo tiver- . des intimado ao penitente a obrigação de restituir, Forlificae-o pelo duplicado motivo da confiança e do temor; dizei-lhe:«Meu lilho, quando esle dinheiro,'que deveis, sair de vossa «casa, a protecção de Deus entrará n’ella e se dilTiindirá so- «bre vós e sobre vossa familia. Emquanto o que pertence a «outrem estiver em vosso poder, será a perda do vosso, grita- «rá maldição sobre vós e sobre vossos negocios. Uma doença,«que Deus póde enviar-vos, e que elle vos evita, vos faria «despender mais do que perdeis resliluindo; ora não sc «brinca com Deus. Se vem a morte, vossos bens e os que «são de outrem ficarão n’este mundo, mas o peccado vos «acompanhará ao juizo para vosso condemnação. Vôde Za- «cheo, elle não diz de futuro: Reddam, mas de presente:•‘Reddo quadruplum; b logo merece ouvir: Uodie liuic do- <‘mui salus fada est, etc.» Indicae-lhe depois os meios, como cortar as despezas supérfluas, vender algum movei para ler com que restituir, pagar ao menos pcuco a pouco, se não po­dér de uma só vez reembolsar de tudo. Nunca vos oITereçaes a receber, nem a fazer a restituição. Se elle vos pedir isto, cobrae um recibo do credor e moslrae-o ao penitente, para Iranquillisar perfeitamente sua consciência, e arredar de vós toda a suspeita de avareza.

37.— 0 demonio costuma estender mais laços aos lieis nos Remedios dias de communhão: elle espera d’islo dous eiVeilos muilo no- FoYiapjjês civos: ura, de lhes roubar por algum peccado o fructo da com- (,uc so- munhão, c de os fazer mais ingratos c mais culpados para cora l>revecm 0 santo Sacramento; o outro, de lhes fazer perder a estima para os sacramentos, concluindo de sua prompta recaida que n iu i S elles são menos vantajosos do que se diz, e por isto de os afas­tar d’cstes, a (im de que permaneçam em seus peccados, pri­vados do melhor meio de sair d’elles. Da vossa parle preveni vossos penitentes de serem mais acautelados, e de exercerem n‘estes dias uma maior vigilancia sobre si mesmos; dizei-lhes que se peccarem, não 6 á pouca eflicacia dos sacramentos que se deve allribuir a falta, mas á sua pouca vigilancia sobre si mesmos depois que os recebem, e que para reparar sua quéda devem recorrer a elles com maior promptidão e hu­mildade. Tende sempre presente no espirito os meios espe­ciaes de ajudar os penitentes segundo a diversidade de suas precisões. Podeis ver em S. Ligorio e em Seigneri as re­gras que deveis seguir com aquelles que vivem em odios, cm occasiões próximas, no escrupulo, na blasphemia, na obriga-

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ção de restituir, etc. Entre outras práticas de piedade é util prescrever-lhes, ou no nienos aconselhar-lhes curtas, mas freqüentes orações; por exemplo, de manhã, ao meio-dia e á noite, tres Avè-Marias, de joelhos ou de pé, em honra da Santa Virgem; o exame de consciência á noite, ou ao nienos um acto dc contrição bem feito. Quanlo áquelles que são ten­tados, dizei-lhes que cruzem as mãos sobre o peito logo que se metterem na cama; que pensem brevemente que tal será sua posição no esquife e no tumulo, c que elles podem mor­rer n’nqiiella mesma noite; que acrcsceiilcm a islo alguma curla ornção á Santa Virgem, ou ao Anjo da Guarda. Se a tentação vier ou continuar, como enlão não seria facil fazer longas orações, que produzam ao menos algumas aspirações, propondo-se orações c boas obras que farão no dia seguinte, como são uma visita ao Santissimo Sacramento, ou uma ora­ção á Santa Virgem, e que depois de ter feito o signal da cruz, pensem em outra cousa, e fixem sua imaginação sobre negocios e occupaçõcs lemporícs, innocentes, mas agrada- véis c próprias a occupar o espirito: será bom aconselhar- lhes que sc assoriem a alguma piedosa congregação, que ou­çam n palavra de Deus, que recitem algumas orações sobre uma sepultura, pensando um pouco na morte. Dc resto a leitura de livros ascéticos vos fornecerá outras industrias para vantagem do penitente: eu mesmo vos indicarei algu­mas no decurso d’esta obra.

Uegras 38.— Quanlo mais arredado da frequencia, c familiaridadegeraes dc dos seculares vive um confessor, lanlo mais é por elles esti- com os* conliança lhes inspira pelo que diz respeito aosdoentes, negocios dc sua alma. A prudência portanto vos fará uma lei

os ricos c de não ir n casa de vossos penitentes, excepto se fordes pro- os pohrcs. curado c bem seguro de que vos desejam: mesmo n’este caso

ide com moderação, seja porque as pessoas mesmo dc alta pie­dade não gostara dc se encontrar, fóra do sagrado tribunal, era presença d’aquelle que é o cnnlidente dc suas misérias es-piriluaes, seja porque n’estas visitas ellas podem descobrir em vós algum defeito que diminua sua estima. Se vossos pe­nitentes se acharem enfermos, é enlão que deveis abster-vosde ir a suas casas, excepto se souberdes que o doente mesmo vos deseja, e não seus parentes. Com cITeilo, póde acontecer que algum d’aquelles que vós julgavcis ter em vós a mais completa conliança queira n’esta conjuntura dirigir-se a um oulro. Em uma occasião lão importante é dever vosso deixar- lhe toda a liberdade; mas se elle vos pedir fozei -lhe toda a as- .sislencia possivel. Se mesmo conhecerdcs ou desconfiardes que, sem estarem doentes, vossos penitentes se confessam al­gumas vezes cora outros, abstende-vos de lb’o pcrgunlar, e

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mais ainda de lhes testemunhar por isto desgosto: seria nm meio de perder sua confiança. Não lhes deixar a liberdade de se confessarem a quem lhes pareça, seria olTende!-os no ponto mais delicado e mais importante, que é a sua consola­ção espiritual. Indispostos por islo contra vós, ou vos dei­xarão por uma vez, ou jámais estareis bem certo de sua sin­ceridade. Se, ao inverso, approvardes esla liberdade, elles vos amarão por isso mais, e ao menos quando elles vierem, podereis julgar que vem com franqueza. Dc resto, podeis muito hem, por vossos cuidados paternaes, por vossa pru­dência e vossa discrição, fazer de modo que elles nunca te­nham motivos de recorrer a outros confessores, Se penitentes pobres vos pedirem soccorros temporaes, respondei-lhes cora bondade, que se elles vos querem por pae espiritual, presla- reis á sua alma todos os cuidados possiveis, mos, quanlo a soccorros temporaes, que recorram a outros. Sem isto é bem de temer que os pobres se vos apresentem, não por um de­sejo sincero de seu bem espiritual, mas para obter uma es­molo corporal; que assim elles se aproximem aos sacramen­tos sem as disposições convenientes, fingindo piedade e mi­séria parn vos tocar de compaixão. Mas se em algum caso nada semelhante tiverdes a temer, vinde em seu soccor­ro, e será ainda melhor que o façaes por uma terceira pes­soa, 0 fim de livrar a confissão de lodo o motivo humano.Aos penitentes ricos hem podeis, deveis mesmo inculcar a obrigação e vantagens da esmola, mas nunca lh’a peçaes, seja para quem for: de oulra sorte vos acontecerá como a bas­tantes outros confessores, que o rico, não querendo, por mo­tivo do respeito, dar-vos uma resposta negativa, nem lão pouco privnr-sc dc seu dinheiro, tomará o partido de vos deixar. 0 receio dc semelhantes petições llic fará dilTerir por muito tempo a escolha de um oulro direclor. Assim, os po­bres não serão soccorridos, e o rico perderá talvez sun alma.É com a mesma prudência que deveis evitar o metter-vos em negocios lemporaes de vossos penitentes, excepto se for­des rogado, e mesmo n’este caso sede muilo circumspecto.Por isto fareis mais seguro e mais livre o accesso aos sacra­mentos: não sc aproximarão a elles senão com vistas do grande negocio de sua consciência e de sua salvação.

39. (S. L igorio, n.°> 6-16.)— Conclui de tudo o que dito Conhecer fica, que, para hera tratar vosso enfermo, deveis primeiro hemoc.s- que tudo informar-vos da origem e das causas de todas as auas enfermidades espirituaes. Certos confessores sc conlen- tam de perguntar a especie e o numero dos peccados: se vêem 0 penitente disposto, o absolvem; se não, o de.spedem sem lhe darem algum conselho, dizendo-lhe: Ide, não posso

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absolver-vos. Tal não é a conducta dos bons confessores. E l­les começam por indagar o principio e gravidade do mal; perguntam ao penitente que habito, quaes occasiões teve de peccar, em que tempo, com que pessoas, com que circum­stancias, a fim de poder melhor fazer a correcção, dispor o pe­nitente á absolvição e appiicar-lhe os remedios convenientes,

«eprchen- 40. — Depois d'estas interrogações, o confessor, instruido resoeUo orifÇem e da gravidade do mal, passa á correcção necessa- humano, ri®- Ainda que por sua qualidade de pae deva ouvir com bon- mascom dade os penitentes, é todavia obrigado, como medico, a ad- bondadc. vertil-os e reprehendel-os segundo suas necessidades, aquel­

les principalmente que se confessam raras vezes, e que estão carregados de um grande numero de peccados mortaes. Este dever lhe é imposto mesmo a respeito de pessoas de uma classe elevada, magistrados, priucipes, sacerdotes, parochos e prelados, quando se confessam de alguma falta grave, com muito pouca contrição. Nosso Soberano Pontifice actualmente reinante. Bento X IV , diz que as admoestações dos confesso­res são mais eilicazcs do que os sermões. {Bul. Aposlol., § 12.) Elle tem razão. 0 prégador não conhece como o confessor as circurastancias particulares que põem o confessor bem mais em estado de fazer a correcção e de appiicar o remedio ao mal. 0 confessor não deve dar attenção aos outros penitentes que es­peram, porque vale mais, como diz S. Francisco Xavier (Tours, In Vita, lib. V I, cap. xvii), ouvir poucas conlissões., mas que sejam boas, do que um grande numero mal feitas. E tambem aqui 0 logar de notar quanto são reprehensiveis os confessores que, achando um penitente mal disposto, o despedem logo no receio de algum trabalho. Ainda que ura penitente se apro­xime sem disposições, é um sentimento recebido entre os theologos, que o confessor é obrigado a fazer quanto póde para o dispor á absolvição, representando-lhe, por exemplo, a injuria que tem feito a Deus, o perigo da condemnação, etc. Pouco importa que os outros esperem e se vão embora: o con­fessor não dará contas a Deus senão do penitente que está a seus pés, sc elle o perder, c não dos outros. (Vôde nossa Theologia, liv. VI, n.® 608. V. llic adverte.)

Insiruir 4 1 .- 0 confessor é tambem obrigado a advertir aquelles fl®® ®s^®° ®®’ 'gncanc'® culpavel de alguma de suas obriga-

na igno- Ç®®®» ®®i® í*® direito natural, seja de direito positivo. Se esta cia. ignorancia não fosse culpavel, que sc deveria fazer? Se esta

ignorancia tem por objecto as cousas necessárias á salvação, 0 confessor deve sempre tirar d’ella o penitente; sc ella versa sobre outras matérias, mesmo sobre os preceitos divinos, e que 0 confessor julga com prudência que a adverteucia será nociva ao penitente, deve passar adiante e deixar p penitente

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na boa fé; é a opinião dos auclores mesmo os mais severos.A razão é, que vale mais evilar o perigo do peccado formal, que do peccado material; porque Deus não pune senão o pec­cado formal, pois que é o unico de que elle se tem oITendido.Tudo isto é abundantemente provado em nossa obra, pelo sentimento quasi uuanime dos doutores. D’aqui se infere sempre, segundo a opinião commum, que no caso que o pe­nitente tivesse contrahido um casamento nullo por causa de algum impedimento occulto, se estiver na boa fé, e que raa- nifestando-lhc a nullidade houver para elle perigo de escan­dalo, de incontinencia, ou de infamia, o confessor deve dei­xal-o na boa fé até que lhe tenha obtido dispensa. Deve ex- cepluar-se o caso em que fosse possivel obter facilmente e logo a dispensa. Em igual caso, quero dizer, quando ha boa fé, se 0 penitente sc confessar de ter sem justa causa recusado 0 debito conjugal, dizem os doutores que o confessor o deve obrigar a pagal-o. Agora, que conducta deve ter o confessor para com aquelles que vão contrahir um matrimonio nullo, se ha perigo de peccado formal ou dc escandalo em mauifes- tar-lhe o impedimento? Da mesma fórma deve, segundo a opinião commum, dispensar-se de advertir a obrigação de restituir o penitente que se acha em perfeita boa fé, sc se prevô com certeza que elle não fará caso da advertência.(Vôde nossa Theologia, liv. VI, n ." 6, 610, 611, 612, e Hom. apostoL, (ract. xvi, n.” 113.)

42.— Devem comtudo fazer-se as seguintes excepções: 1.® Excepções Se resultar d’esta ignorancia um damno para o bem publico a «s“ re- (S. Ligorio, lib. VI, n.® 613): n’este caso, o confessor, sendo encarregado dos interesses da republica christã, é obrigado a preferir o bem commum ao bem particular do penitente, quando mesmo prevô para cstc n inutilidade da adverlencia.Assim, é um dever advertir os principcs, os governadores, os confessores e os prelados que são omissos em suas obriga­ções; porque sua ignorancia, ainda que invcncivel, é sempre nociva á communidade, pelo menos cm razão do escandalo.Com elTeito, os inferiores se persuadirão facilmente que é permiltido fazer o que elles vèem praticar pelos superiores.Segundo nosso Santo Padre Bento X IV [Bnl. Apostol, § 60), deve pralicar-se o mesmo com aquelles que frcciiienlam os sacramentos, a fim de q ue os outros não derivem d’isto uma occasião de escandalo. 2.® Se o pcnilente pcrgunlar, porque então 0 confessor é obrigado a dizer-lhe a verdade: n’este caso n ignorancia não é absolutamente invcncivel, como deve ser a fim dc poder omittir a adverlencia. 3.® Se d’ahi a pouco a adverlencia deve scr util ao penitente, ainda que a princi­pio não aproveite. Que deve fazer o confessor na dúvida se

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a adverlencia será ulil ou nociva? (Vêde nossa Theologia, liv. VI, n.® 016.)

Dispor pa- 43. — Depois das admoestações e advertências convenien-virto ® confessor deve dispor o penitente para a absolvição, fa-

'' ■ zendo-lhe produzir um bom acto de contrição c de firme pro­posilo. Altendei que bem poucos penitentes, principalmente entre os ignoranles, têem o cuidado de fazer o acto de contri­ção antes de se confessar. Alguns confessores se contentam em perguntar-lhe: Eagorapedis perdão a Deus de ludo isto? 0 que não é um verdadeiro acto dc contrição. De todo vosso coração arrependeis-vos d'isto? e sem nada acrescentar, dão a absolvição. Tal não 6 a conducta dos bons confessores; elles põem todos os seus cuidados em excitar nos penitentes (en­tendo aquelles que estão carregados de peccados morlaes) um verdadeiro arrependimento e uma deteslação sincera do mal. Elles começam por fazcr-lbcs conceber um acto de attri­ção, dizendo-lhes, por exemplo: Ah! meu filho, onde deverieis vós estar agora? no inferno, no fogo, desesperado, abando­nado do universo inteiro, abandonado de Deus mesmo para sempre! Vós vos arrependeis pois de ler offendido a Deus por causa do inferno que tendes merecido? Notae aqui que se não faz hem o aclo dc allrição quando nos arrependemos do pec­cado por que merecemos o inferno, mas é necessário que nos arrependamos dc ter ollendido a Deus, porque merecemos o inferno. Depois d'islo niandnc fazer oo penilenle um aclo de contrição: À/eu filho, que tendes vós feito? lendes offendido um Deus infinitamente bom: lendes-lhe faltado ao respeito, tendes recusado obedecer-lhe, tendes desprezado sua graça; e agora por isso que o/fendesles um Deus, que é a bondade mes­ma, arrependeis-vos de todo o vosso coração, deleslaes mais que outra nenhuma cousa os ultrajes que lhe lendes feilo; j á ­mais vós, etc. É este o logar de vos lembrar: 1.*, que quando 0 penilenle se confessa de algum pcccado depois da absolvi­ção, embora seja immedialamenle, é necessário para ser ab­solvido que faça um novo neto de contrição, porque 6 um novo juizo; 2.®, que é a opinião provável de um grande numero de directores, que a confissão para ser sacramental deve ser in­formada pela contrição. (Vêde nossa Theol., liv. VI, n.“* 448 e 448.)

Assim, quando um penitente se confessa anlcs de fazer o acto de contrição, não basta, por isso que se trata do valor do sacramento, mandar-lh’o fazer depois da confissão; mas é necessário, depois de feito o aclo de contrição, mandar-lhe reiterar a confissão, dizendo-lhe ao menos: Accusae-vos nova­mente de todos os peccados que acabaes de me dizer?

Hcmcdio 44.— Quanto aos remedios que se devem indicar aos peni­

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tentes, uns são geraes, os outros particulares e proprios a Remedios cada vicio. Os remedios geraes que convem a todos são; 1.® Scraes. 0 amor de Deus, porque tal é o unico (im para que Deus nos creou. Fazei comprehender no mesmo tempo n felicidade d’aquelle qne vive na amizade de Dens, e o inferno antici- pado d’aqucllc que está d’ella privado; fallae tambem dos males mesmo temporaes que o peccado arrasta após de si.2." Encommendar-se com frequencia a Deus e á Sanla Vir­gem, recitando todas as noites o rosário; ao Anjo da Guarda e a algum santo que se escolha para protector especial. 3.® A frequencia dos sacramentos e a lidelidade cm confcssar-se com promplidão, caindo-se em alguma falta grave. 4.® A me­ditação das verdades eternas, principalmente da morte. Aos paes de familia aconselhae que façam todos os dias oração mental em commum com todos os seus domésticos, ao meuos que recitem a corôa com todos os seus (ilhos. 5.® A presença de Deus no momento da tentação com estas palavras'. Deus me está vendo. 6." 0 e.xarae de consciência em cada noite, com 0 nclo de contrição e firme proposilo. 7." Aos seculares aconselhae que entrem cm alguma irmandade, e aos sacer­dotes que façam oração mental e acção de graças depois da missa, ou ao menos alguma leitura de piedade anles e depois do santo sacrilicio.

43.— Quanlo aos remedios particulares, os assignareis a Remedios cada um segundo a diversidade dc seus vicios. Por exemplo, 'áquelle que guardou odio, direis que recommende a Deus essa pe.sson, recitando em cada dia por ella um Padre-Nosso e Avè-Maria. Quando se sentir commovido com a lembrança de uma alfronta, deve pensar nos ultrajes que elle mesmo tem feilo a Deus. .Aquelle que caiu em faltas de impureza, recommendareis que fuja da ociosidade, das más companhias e das occasiões. Aquelle que viveu em um longo babito d'este desgraçado peccado deve mesmo evitar certas occasiões re­motas que, em razão de sua extrema fraqueza, seriam próxi­mas para elle. É este principalmente que jámais deve deixar de recitar em cada dia, de manhã e á noite, tres Avè-Marias em honra da pureza da Santissima Virgem, renovando de cada vez ao pé de sua imagem suas boas resoluções e súppli­cas para obter a perseverança. Que lenha cuidado de receber com frequencia a sanla eucharistia, chamada com lão justo titulo vinum germinans virgines. Áquelle que vive no habito de blasphemar, dae por conselho que faça cinco ou nove si­gnaes dn cruz sobre o chão com sua lingua, e que diga cada dia um Padre-Nosso e Avè-Maria em honra dos santos con­tra quem tiver blasphcmado, e em cada manhã, levantando-se, que renove a resolução de não se impacientar, acrescentando

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‘6opejqui3| oçs sismBonnn anb aijos ap ‘jossajnoa op a enag ap aincip sops)-jndas OBS osssüüod bu sopuooad eo anb íaiuasajd ob bçs sapa anb 0 opnnSas sBin ‘opessad on uibjoj sapa anb ojad suara -oq so raoiunsa ogu ‘sajossajaoo so a ‘aioaraBJiaraud snaQ anb lopBDoad o oijaj Bquü o laAizojdsap anb op ‘osojaoq sjBra ajaaiuBiiapn! luarâoq o iubujoi Bpuaijuad b a OBsspuoo « anb íraanbad suaraoq so anb oquBJisã sacqoB obu anb lofuB ran ‘9 OBH apa ouioD uijsse ‘sras oea sça anb teSnBpuoo a BzajnojB aq|-aup ‘ofad ap 'uquõSjaA ap opuuuddo sapçA 0 ‘oídraaxa jod ‘siod as ‘spa opunSas jbibjí 6 BJsd ‘ainapuad ossoa BnuoSjaA op oBójsodsip B aiuaiuBiuaiiB aujapisnoo a ‘sauniujdsa ssp op opeA ■uaj a sBiuaop oçs sopBooad so raat ibui anb srad ‘ óolpara ap -nclsovisa apcpi|iqui| c 9 SOA Buessooan oiuBiib ‘jazip soa ap oquoB anb o|ad ‘!opnai|ajdraoo- (ixx -deo ‘n -Ap ‘ibbn aa addnij -g ooipLap aa vaiA :g5 a EE9 '^ed ‘sa iivs aa odsidnvbj 's ) - ij opépp.qBH

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48.— Se 0 virdes descarado e sera apprchensão, fazei-lhe Quandoel- coniprehender hem que é diante de Deus que elle vem pros- I T trar-se; que n'este acto se trata de sua salvação eterna; que nem temor na hora da morte de nenhuma cousa dará tão estreita conta de Deus. como das conlissões que tiver feito mal; que na absolvição se emprega o preço e o merecimento da morte e paixão de nosso Senhor.

49.— Se 0 virdes timido, abatido, e com alguma descon- Quando fiança dc obter o perdão de seus peccados, animae-o mos- Irando-lhe o prazer que Deus toma na penitencia dos grandeSgenjgcon- peccadores; que sendo maior nossa miseria, mais glorilicada Dança.é a misericórdia de Deus; que nosso Senhor rogou a Deus seu Pae por aquelles que o crucificavam, para nos fazer co­nhecer que ainda que com nossas próprias mãos o tivessemos crucificado, Elle muito liberalmente nos perdoaria; que Deus faz tanta estima da penitencia, que a menor penitencia, sendo verdadeira, lhe faz esquecer toda a casta de peccados; de modo que se os condemnados e os demonios a podessem ter, todos seus peccados lhes seriam perdoados; que os maiores santos foram grandes peccadores, S. Pedro, S. Matheus,Santa Magdalena, David, etc.; finalmente que o maior ag- gravo que sc póde fazer á bondade de Deus, á morte e pai­xão de Jesus Christo, é não ter confiança de obter o perdão de nossas iniquidades, e que por artigo de fé somos obriga­dos a acreditar na remissão dos peccados, a fim de não duvi­darmos de a receber, quando recorremos ao sacramento que nosso Senhor para este efieito instituiu.

BO. — Sc 0 virdes em perplexidade por não saber dizer Quandoel- seus peccados, ou por não ter sabido examinar sua conscien-le está in- cia, prestae-lhe vosso auxilio, e ccrtificac-o de que, mediando “ IFrosseL a ajuda dc Deus, não deixareis por isto dc conseguir que elle roeconfu- faça uma hoa e santa confissão. Sobretudo sede carilativo eson’nquH- discreto pnra com todos os penitentes, mas especialmente para com as mulheres, pnra as ajudar na confissão dos pecca­dos vergonhosos. Se por si mesmas sc accusam, ainda que pronunciem algumas palavras deshonestas, de modo nenhum façaes de delicado, nem algum indicio dc as achar estranhas, até que a confissão esteja acabada; então doce e amavelmente lhes ensinnreis um modo mais honesto de se expressarem n’estas matérias. Se n’cstes peccados vergonhosos misturam sua accusação com desculpas, pretextos e historias, tende pa­ciência, e de modo nenhum as perturbeis até que tenham dito tudo; c então começareis a intcrrogal-as sobre o pec­cado, para as obrigar a fazer mais perfeita e distinctamente a declaração dc suas faltas, mostrando-lhes amavelmente e fa- zendo-llies conhecer suas superQuidades, impertiuencias e

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imperfeições que tinham commeltido, desculpando-sc, pal- liando e disfarçando sua accusação, não as repreheadendo to-, davia de modo algum,

quando el- B I.— Se virdes que tôem dilliculdade de se confessarem slaccus“ íP ° ' ' ™®smas de seus peccados vergonhosos, comcçarcis in» peccados ^'■'■“ ^«ndo-as das cousas mais leves, como de ter tomado pra-

vergonlio-zer em ouvir fallar de cousas deshoneslas, de ter por causa sos oucs-d’ella.s pensamentos: e assim pouco a pouco descendo de nma M^o^dê ® ®P® pensamentos, ás delei-iwccados lações, ás acções, as ireis animando n passar mais adiante, enormes, dizendo-lhes estas ou semelhantes palavras: «Quanto sois fe-

«liz em vos confessar bem! Acreditae que Deus vos faz uma «grande graça. Eu conheço que o Espirito Santo vos toca no •coração para fazerdes uma boa conlissão: tende muito ani- «mo, meu lilho, dizei desafogadamente vossos peccados, e de «modo nenhum vos violenteis; d’aqiii a pouco tereis um «grande contentamento por vos haver confessado bem, e por «cousa nenhuma do mundo quererieis deixar de ter desone- «rado bem vossa consciência: isto será para vós uma grande «consolação na hora da morte ter feito esta humilde coníis- «são. Deus abençoe vosso coração, que tão disposto está a «occupar-se bem.» E assim forçareis muito bella e docemente suas bellas almas a fazer uma boa e perfeita confissão. Quando enconlrardes pessoas, que, por enormes peccados, como são as feitiçarias, cohabilações diabólicas, beslialidades, massacres, e outras taes abominações, estão excessivamente aterradas e opprimidas cm sua consciência, deveis por todos os meios animal-as e consolal-as, assegurando-as da grande misericórdia de Deus, que é infinitamente maior para per­doar-lhes, do que todos os peccados do mundo para conde­mnar; e promeltei-lhes de as ajudar em tudo aquillo de que de vós dependerem para a salvação de suas almas.

82. — E pelo que respeita aos conselhos que o confessor con lhos * ®'' ®® P®DÍlente em geral, eis aqui os mais uteis a lo- aos pciü-das as classes dc pessoas: confessar-se e commungar com tentes, frequencia, e escolher um bom confessor ordinário; freqüen­

tar os sermões e prédicas, ter e ler bons livros de devoção, como entre oulros os dc Granada; fugir das más companhias, e procurar as boas; rogar a Deus muilas vezes; fazer á noite exame de consciência; pensar na morte, no juizo, no inferno e no paraiso: ter e beijar muilas vezes as santas imagens, como 0 crucifixo e outras. Taes eram os conselhos do grandeS. Filippe de Neri. Esle excellente medico das almas não desprezava meio algum de assegurar a perseverança dc seus penilenles. Continuamente elle tinha na bôca este oráculo do Espirito Santo: «Não é aquelle que tiver começado bem, 6

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aquelle que liver perseverado alé ao fim que será salvo.» Para perseverar, dizia elle, o melhor meio é a discrição. Não se deve querer fazer ludo em um instante, nem pretender tor­nar-se um santo em quatro dias. Assim, não se deve carre­gar de ura grande numero de práticas de piedade, porque muito breve se cansam e as abandonam, ou se cumprem sem devoção. Fazei portanto poucas, mos nunca as deixeis. Se uma vez o demonio vos fizer oraillir um de vossos excrcicios, breve elle vos fará omittir uma segunda, depois uma terceira vez, alé que todas as vossas resoluções se tenham desvane­cido. Não cessarei pois de vos repetir; Xulla dies sine linea. Ponde-vos em vigias contra as pequenas faltas; de oulra sorte se vierdes a relaxar-vos sohre esle ponto e a desprezar estas pequenas cousas, vossa consciência sc endurecerá pouco a pouco, e acabareis por vos perder. Renovae porlanlo muitas vezes vossas boas resoluções, e nunca as abaudoncis, sejam quaes forem vossas tentações. Elle acrescentava que no prin­cipio 0 fervor é ordinariamente muilo grande, mas que mais tarde nosso Senhor fmgit se longius ire. E então que deve­mos estar firmes e não nos perturbarmos, porque Deus não retira suas doçuras senão para ver se somos rorajosos. Se resistirmos, se triumpharmos d’eslas dores e d’estas tentações, Elle nos reslilue suas consolações e seus favores. Quanlo ás pessoas novas, elle dizia que, para assegurar sua perseve­rança, a frequencia dos sacramentos era lão necessaria como a fugida das más companhias e a frequentação das lioas. Elle não cessava de recommendar a oração; é a razão por que no Oratorio elle introduziu o uso de recitar todas as noites cinco Fadre-Nossos e cinco Avè-Marias para pedir a Deus n perse­verança; e difia que, para começar bem e continuar melhor, era necessário ler uma grande devoção á Santa Virgem c ou­vir missa todos os dias, excepto quando sc estivesse impedi­do. As morlilicações do espirito lhe pareciam muito mais proveitosas do que as macerações da carne, e dizia que os confessores faziam mal, quando, podendo exercitar seus peni­tentes na obediencia, o não faziam, ou por fraqueza ou por humano respeito. «A mortificação de uma paixão, lhes dizia elle, ainda que pequena seja, vale mais quo muitos jejuns, abstínencias e disciplinas.»

' ARTIGO II I

83.— (Sacebdote santificado, n.” 42-62.)— E a sciencia Suaneces- da theologia que deve dirigir-vos nas funcçõcs do sagrado Iri- sidade sua bunal, pois que sera ella não podeis bem formar vosso juizo. e^ensao.

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0 estudo da theologia moral vos é portanto indispensável. Ainda que jámais devaes julgar-vos bastantemente instruidos n'cstas matérias, e vos convenha continuar o estudo d’ellas para conservar e augmentar vossos conhecimentos, todavia, para que o receio não vos impeça de vos entregar ao santo oilicio dc confessor, vos direi que basta, segundo o sentimento dos diversos auctores, que saibaes ao menos o que sc segue: 1.°, os casos reservados na diocese onde conlessaes, assim como os casos e censuras reservadas ao Papa, ao menos os mais ordinários; 2.', uue saibaes distinguir o que é mortal do que é sómente venial, de modo que conbeçaes o que de sua natureza é grave, e que o não confundaes com o que é leve; 3.°, as mais notáveis circumstancias do peccado, ao menos aquellas que mudam a especie; 4.®, o que traz comsigo a obri­gação dc restituir a reputação ou os bens de outro; 5.®, o que é occasião proxima, c, ao menos, seus principaes remedios;6.®, as disposições necessárias ao penitenle; 7.®, as penitencias e remedios, ao menos os mais usados; 8.® linalmente, que, não sendo embaraçado nos casos mais ordinários, não sejaes de lal sorte estranho áquelles que raras vezes se apresentam, que não saibaes mesmo duvidar que a cousa merece um exame particular; por exemplo,, que lal peccado póde ser um impedimento do matrimonio. É necessário ao menos que te- nhaes uma idéa confusa que vos faça duvidar immediata- mcnle que estaes exposlo a enganar-vos, e que assim tomeis tempo para melhor examinar c evilar todo o erro.

Sciencia 84.— Mas, primeiro que tudo, que seja vossa sciencia diri-dirígida gjda pcla discrição. De outra sorte ella será inutil ou mesmo mcão* funesta ao penitente, e caireis contra o escolho do laxismo ou

' rigorismo. Lancemos primeiramente uma vista sobre a ne­cessidade absoluta, indispensável d'esla discrição; nós vere­mos pois os casos e qual é a maneira mais ordinaria de fazer uso d’ella. Tomemos por guia S. Boavenlura, pois o que elle diz da consciência se applica admiravelmente ao confessor: Cavenda est conscientia nimis larga et nimis stricta; nam prima generat prasumptionem, secunda desperationem; prima scepe sàlvnt damnandum, secunda daninat salvandum. (Tora. I, Comp. theol. ver., lib. II, cap. lii.) E o mesmo a respeito do confessor relaxado e do confessor rigido. Seguindo caminhos dilTerenles, elles privam as almas de grandes bens, e as ex­põem a grandes males. 0 primeiro faz nascer a presumpção nos penitentes, não lhes inspirando senão pouco horror por suas faltas, deixando-os no adormecimento a respeito de suas obrigações, e por isto enfraquece muilo n'elles o temor chris­tão. 0 segundo, ao inverso, exagerando o temor, enfraquece a esperança christã e assim conduz á desesperação. É assim

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que a consciência larga e o confessor relaxado, não pelo mal que causa a presumpção, mas pelo hem dc que elln não pri­va, scBpe salvai damnandum; emquanlo que, pelo inverso, a consciência muilo apertada e o confessor rigido, não pelos males que elle lira, mas pelos bens que elle nos rouba, da­mnat salvandum. É esta uma verdade q ue se torna evidente não sómente pela auctoridade do santo Doutor, mas pela con­sideração dos elTeilos naluraes d’esles dous vicios, aliás tão grandes: a presumpção e a desesperação. A presumpção deixa a vonlade e a coragem de obrar; ella não lira, mas conserva a estima e o uso ao menos de alguns meios de sal­vação, entre outros o da confissão: é a razão por que o pre- sumpçoso, sustentado por taes soccorros, peiora menos e mais lentamente; pois lhe resta a esperança de que virá um dia em que, fazendo d’esles meios um mellior uso, se curará inteiramente e se salvará. Pelo contrario, a desesperação, pela tristeza c melancolia que a acompanham, lira de ordi­nário logo a coragem e a vonlade de fazer algum bem. Ainda mais: considerando tudo como inulil, aquelle que se deixa apoderar d'ella, perde a eslima c o uso da devoção e de lo­dos os meios de salvação, principalmente da conlissão. Elle abandona ludo, e, julgando-se perdido, desenfreia-se; peiora não só mais ligeiro, mas de muitos modos mais, e tudo isto sem esperança de remedio nem dc cura.

8o. — Com elTeito, dae-me um peccador desde muilo Conimua- tempo engolfado no vicio, cllc é damnandus, quero dizer, no 5®°-caminho da perdição; elle muitas vezes experimenta remor­sos de consciência que o obrigam a confessar-se; por(|ue é esle para elle o remedio necessário. Mas que extrema diíTi- culdade para sc resolver a isto, seja pela vergonha de accu­sar tantos peccados, seja pelo receio de receber reprchensões e penitencias severas! Ora, supponde que cllc ouve dizer:«Ohl quanlo é bom lal confessor, como elle rccehe com ca­ridade, como elle ajuda, como elle consola!» Com esla noti­cia seu coração se dilata: «Eis aqui, diz cllc, eis aqui o con­fessor que uie convem.» Elle se aiiima, prepara-se c vera.Assim relaxado como é, se o confessor, no aclo da accusação d’esles enormes peccados, lhe representa não obstante com doçura seu triste estado, elle concebe uma verdadeira com­punção; por oulro lado, como nada se lhe ordena muilo difli­cil, elle toma de lodo o coração a resolução de pôr em prática os meios indicados. Elle é absolvido, elle sáe lodo consolado; cheio de coragem cumpre todas as suas penitencias, muda de vida e salva-se. Eis aqui o scepe salvat damnandum. Pelo con­trario, dae-me um penilenle que observe actualmente os man­damentos de Deus; elle é salvandus ou está no caminho do

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céo. Ora supponde que seu confessor, que era discreto,.morre, e que aquelle cáe nas mãos de um confessor em demasia se­vero; nos casos em que o antigo confessor o desembaraçava em pouco tempo, este o prende durante duas horas com mil interrogações a respeito da fé; elle o quereria instruido como um thcologo sobre o jejum; e, sem respeito a seu estado, não lhe permitte á noite mais que tres onças, pouco mais ou me­nos, de alimento; nos dias festivos não lhe concede senão duas ou tres horas de tarde para passeiar ou recrear-se era algum jogo honesto. Elle entra depois nas obrigações do ma­trimonio e contratos, e não lhe quer passar o que outros con­fessores cstimaveis sempre Ibe passaram; mette-lhc na ca­beça mil escrupulos de peccados mortaes, e quer que elle faça conlissão geral. 0 pobre penitente não se conhece capaz nem de fazer, nem de deixar tantas cousas: volta para sua casa todo perturbado e desauimado; elle não tem ja o cora­ção propenso a fazer bem algum; elle omitte á noite o rosá­rio, de manhã a missa, nos dias festivos os sacramentos, com receio de preceitos ainda mais difliceis; elle se dissipa, e, para se divertir, vae a sociedades; sobrevem uma tentação, cáe em peccado mortal. Não tem coragem para ir confessar- se d’elle, demora, recáe e sc condemna. Eis aqui o damnat salvandum.

Continua- 56.— Que vossa moral não seja portanto nem relaxada, nem rígida; de outra sorte fareis nascer em vossos penitentes a presumpção ou a desesperação, e não sereis um (iel minis­tro de Jesus Cbristo. Com elTeito, assim como um mordomo póde prejudicar a seu amo não sómente por demasiada in­dulgência, deixando passar todas as faltas dos operários e dando-lhes muito grandes salarios, o nue occasiona excessi­vas despezas ao amo que é mal servido; mas tambem, pelo demasiado rigor, sobrecarregando os operários, e diminuindo sua recompensa, o que torna o patrão de tal sorte odioso, que ninguém quer mais scrvil-o, d'onde resulta que não só­mente é mal servido, mas tambem absolutamente abandonado: da mesma sorte vós cuidaes mal nos interesses de Deus. É verdade que pelo laxísmo lhe attrahis a confiança, mas não 0 respeito que elle merece; pelo rigorismo o fareis temer, mas não amar; que digo eu? vós fareis que se fuja d’elle. Sede portanto discreto e justo, a fim de preservar vossos pe­nitentes da liberdade e negligencia que nascem da presum­pção, assim como das perturbações e precipicios da desespe-fação.

Conciliac i;iliac para Deus simultaneamente respeito e amor, temor e confiança; impondc a vossos penitentes o jugo da lei, mas que não seja tão leve que elles o não sintam, nem

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se outros não pensam como elle, abre os olhos sobre seus proprios erros; se é relaxado, elle encontra em um outro ra­zões contrarias, que lhe fazem conhecer que sua opinião não se firma sobre motivos muito solidos, para que possa pruden­temente seguil-a na prática. Se cllc é rigorista, esclarecido pelas razões dos doutores oppostos, começa a ver que póde muito hem, por solidos motivos, permittir o que antes olhava como iilicito. D’aqui vereis a razão por que os mais sabios e mais versados no estudo dos auctores são ordinariamente os mais prudentes em decidir, c os mais reservados em conde­mnar os outros; é porque conhecem as razões dos sentimen­tos oppostos. Pelo contrario, a promptidão em decidir c em desprezar aquelles que são de um parecer dilTerente não nasce sempre dc uma abundancia, mas, a maior parte das vezes, de uma falta de luzes e de conhecimentos.

Precauções 58.— Mas lendo dilTerentes auctores, acontecer-vos-ha que rç do-muitas vezes encontrar opiniões controvertidas. E aqui que au w id o "h a le ve is recordar em primeiro logar d’esta utilissima raa- perigo ensinada por grandes mestres, tanto de moral, como de

peccado ascetismo, a saber: Que quando se trata do perigo de pec- formal. cado formal convem inclinar para a severidade, e isto para o

maior bem do penilenle, sendo para elle a severidade, no caso dado, muilo mais vantajosa do que a doçura. Cora elTeito, pela severidade o arredareis muito melhor do maior de lodos os males, que é oITendcr a Deus e merecer o inferno, onde póde aconlccer-lhe, como a tantos outros, cair no acto mesmo do seu peccado. Quando mesmo duvidaes, por exemplo, se uma occasião de peccado 6 já bastante forte para que se possa ou nâo chamar proxima, apcgae-vos ao mais seguro; obri- gae-o a dei.xal-a immcdiatamente, porque, como vôdes, ha

. para cllc perigo de peccado formal; por exemplo, de desejos ou acções que elle sabe e conhece muito hem ser-lhe prohi- bidas; porque póde ser que, cedendo aos encantos seduclores do objecto, dô seu consentimento, desprezando assim a Deus e sua prohihição. N ’cste caso c em outros semelhantes, não é do maior hem para o penitente arredal-o dc um lal perigo, recusando-lhe a absolvição, sc não quizer deixar esta occa­sião? Todavia, é verdade que deveis, mesmo n’estas occor- rencins, acaulclar-vos de lodo o rigor excessivo; melhor o comprehcndcreis pelos casos particulares que vos apresenta­rei em 0 n.° 60. Mas, em segundo logar, quando o penitente não corre mais que o perigo dc um peccado material, então, em vez de rigor, empregareis com muita mais vantagem a prudência e a discrição, de lal modo que nunca suggiraes ao penitente alguma opinião apoiada sómente sohre motivos fu- leis ou sobre uma auctoridade dc pouco peso: seria islo um

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laxismo intolerável, condeninado na terceira das proposições proscriptas por Innocencio X I. Quanto ás opiniões que se apresentam apoiadas sobre provas sólidas, e sustentadas por um grande numero de deleusores, ainda que combatidas por outros auctores, se quereis ser discreto, não tomeis por ma­xima nem seguir sempre as opiniões benignas, nem adberir sempre e exclusivamente ás opiniões severas: regulae vossa escolha c vossa determinação segundo a necessidade e van­tagem espiritual do penitente. É assim que aconseibareis as opiniões favoraveis a lei áquelle que póde seguil-as facilmen­te; emquanto que com aquelle que encontraria, para as se­guir, difliculdades capazes de fazer receiar que elle não as siga, comcçareis, sempre para maior precaução, a fazer (icl uso de um dos primeiros meios que vos tenho indicado pelo fim do n.° 57 e seguintes. Sc estes meios não forem npplica- veis, appiicae-lhe a opinião favoravel á liberdade, supposto, de uma parte, que ella seja solida e fundamentada (o que é sempre supposto, e eu o subentcuderei para o diante em igual matéria, quando mesmo, por evitar repetições, o não expresse); c, da outra, que as necessidades espirituaes do penitente o exijam assim. Mas desenvolvamos estes conse-

6‘J .— Quando se tratar do que é permittido, sc achardes Modo por sentimentos contrários fortemente disputados entre os douto-R®® ^ res, abstende-vos de vos pronunciar de tal modo em favor de^ jr nas um, que rejeiteis absolutamente o outro; de fórma que quei- qucstucs raes não sómente aconselhar, mas impor a opinião mais sc-conirover- vera como obrigação indubitavel e cerla, cmquanlo que ella tem contra si auctores respeitáveis tanto por seu merecimen­to, como por seu numero. Pelo que rae respeita, julgar- me-hia muito presunipçoso se, em igual caso, (izcsse aos pe­nitentes uma obrigação certa de uma cousa que, não um, mas muitos auctores recommendaveis tôem como permittida.Sobre um grande numero de iguaes controvérsias, a Igreja conhece muilo bem a diversidade de opiniões, comtudo ca­la-se. E cu, um simples confessor, decidirei, far-me-hei juiz dos doutores a ponto de pretender que todos aquelles que pensam de outro modo não tôem razão, estão no erro, e que meu proprio juizo deva valer e bastar para impor uma obri­gação grave e certa! Não sei como combinar uma igual pre­sumpção, seja cora a baixa opinião, que a humildade christã a mais bem fundada quer que eu tenha de mim mesmo e de meus sentimentos, seja com o respeito e estima que cu devo a personagens lão piedosas e lão Iliustradas que são de ura parecer contrario. Eu posso dizer: preliro lal sentimento; poderei suggeril-o aos outros por modo de conselho e por

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melhor; mas fazer disto uma obrigação a ponto de recusar a absolvição áquelle que recusa conformar-se-lhe, ohl isto nunca. Ãlém disto para que obrigarei eu sempre ao mais apertado e ao mais perfeito, apesar da opinião dc graves an» ctores? Seria para attrahir-me a reputação de homem de uma moral sã e severa? Mas eu serio bem digno de lastima se este fumo dc gloria humana fosse a regra da minha moral na conducia das almas. Seria para maior gloria de üeus e o maior hem das almas? Mas é nisto que, querendo arvorar- me em doutor mais habil que os outros, cu me mostro me­dico sem experiencia do coração humano. Quel se a natu­reza experimenta já tanta repugnância pelas obrigações cla­ras, certas c proclamadas pelo ensino universal, se vômos tão freqüentes transgressões de preceitos divinos, quem po­derá exprimir quanta maior aversão ella experimenta por obrigações díilicilimas, obscuras e controvertidas? Quanto pois não é de temer que os penitentes, advertidos de iguaes obrigações, nenhum caso fa^m d’cllas? E, n’este caso, que como medico habil deveis prever, que tereis obtido por tal rigor? Absolutamente nada, a não scr que cm vez de um mal que, feito na ignorancia e boa fé, não teria sido mais que um mal material c mesmo incerto por causa da opinião contra­ria, rcsuliiirá um mal e um peccado formal muito certo, qual é 0 dc obrar contra a consciência. D’aqui, emquanto que oo primeiro caso Deus não teria recebido alguma alTronla, e a alma alguma ferida, pois que não haveria mais que uma sim­ples falta da inteiligencia enganada, ficando a vontade sub­missa a Deus, vô agora o Senhor uma verdadeira malicia da vontade, que, apesar da sua luz, recusa submelter-se. É as­sim qm; Deus será desprezado, a alma manchada com o pec­cado, digna de condemnação, e culpada Uivez não de um só peccado. mas de uma longa serie de peccados bem certos, bem graves e bem formaes.

CasoacoM- 60.— Para vos provar que não exagero, ouvi o caso se- “ guinle, e.scolhido enlre mil. Um confessor linha resolvido

fessor" pçssoa a confessar seus peccados com uma sinceridade perfeita. Elle lhe disse que se ella recaísse em tal peccado era obrigada a confessar não sómente as circumslancias que mudam a especie, mas tambem aquellas que notavelmente o aggravam. Ora acontece que depois de um certo lempo esta pe.ssoa voltou a confessar-se. 0 confessor achou que du­rante cstc intervallo ella linha freqüentado os sacramentos; c que lendo reincidido em seu peccado, sempre tivera a co­ragem de confessar sua especie sem jámais se atrever a dizer a circuinstancia notavelmente aggravante; assim ella tinha commettido uma longa serie de duplicados sacrilégios em

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suas conlissões e em suas communhões. A esta declaração o confessor disse comsigo mesmo: Desgraçado! que ganhei eu em impor a esta alma n circumstancia aggrnvante? Se eu ti­vesse guardado o silencio, esta alma havendo tido a coragem de sempre dizer a especie, se teria confessado, teria com- mungado na hoa fé; e com a graça dos sacramentos hem re­cebidos se teria emendado inteiramente, ou ao menos em parte. Não lhe resultava pois algum mal, antes muilo bem da recepção dos sacramentos; pelo contrario, por isso que lhe intimei esta obrigação, cil-a privada deste bem, e, em seu logar, carregada não dc um, mas de uma multidão de sacri­légios, além de seu peccado. Com mais reserva minha, Deus não teria sido lão ollendido, e esta alma não se teria tornado tão culpada. Este pensamento de lal sorte o occupava, que em vão procurava trauquillisar sua consciência, dizendo, para se consolar: Estava na mão d’esla alma ter mais virtude e obedecer a ludo o que lhe ordenei. Parecia-lhe que a caridade e prudência exigiam que elle fosse mais circumspecto.

61.— Elle estudou novamente a questão para saber se de- Continua- via impor esla obrigação, c eis aqui o que achou. Além de S. Thomaz, que, seguindo a interpretação dc Melchior Cano, nega a realidade de uma igual obrigação, e o Concilio de Trento, que nada diz, Hcnto X I I I na Instrucção Italiana ad- dicionndn ao Concilio Romano, celebrado, governando elle, em 172o, depois dc dizer que, pelo que respeita as circum­stancias que mudam a especie, ha obrigarão induhitavcl de as confessar, conlinúa assim: Mas quanlo ás circumstan- cias. que sem mudar a especie do peccado, o augmenlain nota­velmente, ha duas opiniões entre os doutores: uns suslentam que ha obrigação de as especificar na confissão, os outros o negam. Em summa, tende por maxima que o penitente é sem­pre obrigado a responder com verdade quando o confessor o interroga sobre seus peccados, a fim de conhecer o estado de sua consciência. Depois d’esln leitura, esclarecido como por uma nova luz, exclamou: «Eu já muitas vezes linha ouvido dizer, que os mais sabios são os mais circumspertos e os mais reservados sempre cm decidir c em impor obrigações.Eu tenho agora a prova d’islo: minha ignorancia causou a ruina d’esta alma. 0 Papa, continuou elle, não decide entre as diins opiniões, e eu decidi 1 Quem me impõe esta obriga­ção? quem me dá esle direito? 0 Papa toma um termo me­dio, como se dissesse: Eu cm attenção á controvérsia não vos obrigo, segundo o primeiro sentimento, n dizer as cir- cumslancias aggravantes, de sorte que pequeis, se, não sendo interrogado, não as declarardes; mas não vos dispenso igualmente de seguir o segundo, de sorle que possaes dissi-

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niular sendo interrogado; porque o confessor póde ter neces­sidade d'este conhecimento para bem conbecer o estado de vossa alma. Estas reflexões, diz elle emiim, me ensinam com quanta discrição eu devo d’aqui em diaute conduzir-me. Se eu tivesse sido mais sabio, eu teria sido mais discreto; eu pouparia a Deus muitas oITensas, e a esta alma muilas feri­das. Eu seria para Deus um ministro bem mais prudente e mais util, e para esta alma um medico mais habil. Tudas es­tas oITensas, e todos estas feridas devem ser por csla alma indubitavelmente altribuidas á sua própria malicia; mas a mi­nha ignorancia lem n'ellas grande parle, porque ella me tor­nou menos prudente, e menos discreto.»

Conclusão 62.— D’islo que inferis? Que deveis ensinar aós peniten- les, que elles não são obrigados a confessar as circumstan-

cedeníe. C'«s aggra\anles do peccado? Não, de certo; irieis contra a minha intenção, e contra as regras que brevemente vos pro­porei relativas á prálica. 0 que eu desejo, é que ao menos, em geral, nas matérias e obrigações ainda mais difliceis do que esla, mas controvertidas enlre os auctores, vós apren- daes a prever as vantagens ou inconvenientes que na prática se seguiriam; que assim adopteis por maxima, que a moral sã é aquclla que, na prálica, serve mais para procurar a glo­ria dc Deus e a salvação das almas, impedindo mais cflicaz- raente a oITensa de Deus e a culpabilidade das almas, sem todavia prejudicar os direitos da lei. Ora, tal não é nem a moral relaxada, nem a moral severa. À primeira, lisonjeando muilo a delicadeza humana, não faz nem sullicicnlcmcute sentir, nem suflicientemenle respeitar a lei; a segunda, fa­zendo 0 jugo da lei demasiadamente pesado, dá occasião á fraqueza humana para abandonar a lei c o legislador. A mo­ral discreta é a unica que merece ser chamada sã e util ao senhor e aos súbditos, porque ella procura evitar os dous es­colhos. Ella não impõe, nem igualmente lira, obrigações sem justos molivos. É assim que ella tende n impedir o maior mal, que é 0 peccado formal, evitando quanlo é possivel o peccado material, que é mal menor, mas comtudo ura grande nial. De­ve-se concordar, que esta moral di.«creta custa mais do que as outras. Ella exige muito mais estudo, sejn para conhecer, seja para pesar as dilTerenles opiniões oppostas, a íim dc não se enganar na opção. Pelo contrario, para ser rigorista, ou rela­xado, 0 mais ligeiro estudo basta. Para prohibir uma acção basta ao primeiro uma razão por muito pequena que seja em favor da lei, sem se dar ao trabalbo de conhecer as razões em favor do homem. Para a permiltir, basla ao segundo uma razão, embora seja bem fraca, em favor do homem, scra se dar ao trabalho de conhecer o que póde pugnar contra o ho-

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mera em favor da lei. Não sómenle a moral discreta é mais custosa, mas é tambem menos lisonjeira para a ambição, porque sómente será louvada por um pequeno numero. Com elTeito, como ba muito poucos que reunam a um grande es­tudo um espirito imparcial, ha muito poucos que n conheçam e que a approvera. Ella será criticada mesmo por ura grande numero, ao menos por aquelles que eslão nos extremos, porque ella está longe dc um e do oulro. Tal é comtudo a moral que para vós deveis formar, se na prálica quizerdes sinceramente procurar a gloria de Deus e a salvação das al­mas.

63.— Assim, na prálica, para não ser relaxado, se a obri- .Uso pra- goção for certa e conhecida pelo penitenle, nunca o d e v e i s dis dispensar d’ella. A virtude de lodo o christão deve chegar alé esle ponto, e, pela qualidade de juiz, dc medico, de pae, decidindo, não podeis trabir a verdade; nem dispensar o enfermo dc um remedio necessário: obrar de oulro modo não é discri­ção, é relaxação intolerável. Quando mesmo prevejacs que 0 penitenle sc dispensará a si mesmo da lei de que já lem conhecimento, ou ao menos dúvida, não deveis trabir a ver­dade. As transgressões serão imputadas, não em parte á sua malicia e em parte á vossa imprudência, mas unicamente á sua falta, falta de que vos tomareis cúmplice, concedendo-lhe uma dispensa. Ah! anles, como pae e medico, procurae os motivos e meios de o animar a seu dever: mas não o dispen­seis d’elle.

64.— Se, pelo contrario, a obrigação é controvertida entre Das obri- graves auclores, será bom que façaes d’clla uma lei para vóseaçõesm- mesmo. Cora elTeito, é justo que sigaes o caminho mais es- ' treito e mais perfeito, e que primeiraiuentc ponhacs cm prá­lica aquillo que quizerdes prescrever aos outros; lalvez vossa experiencia vos fará algumas vezes mudar de sentimento.Podereis mesmo ser o primeiro a fallar e a propor eslas obri­gações controvertidas ás pessoas cujas altas virtudes vos de­rem motivo de esperar que as cumprirão: acaiilclae-vos to­davia de fazer d’ellas um dever rigoroso, a lim de não os ex­por a peccar; mas corn aquelles que não conhecem ainda se­melhantes devcrcs, anles de lhes fallar d’elles, que tendes vós a fazer? E necessário que vossa caridade ue pae das almas, c vossa (idelidadc de miuistro de Deus, appiiquem vossa habilidade de medico a examinar e a prever as vanta­gens ou inconvenientes de vossas palavras. Se previrdes que verosimilmente elles não satisfarão, c que era vez de um raal material incerto, devam seguir-se peccados formaes certos, não deveis, mesmo n’estas circumslancias, cujo embaraço e difliculdade podem fazer vossas palavras perigosas, não de-

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veis fazcr-vos protector das opiniões benignas, e pronunciar- vos altamente em seu favor. Uma igual conducta poderio expor-vos ao perigo de relaxação; acrescentae que ella de modo nenhum é necessaria pnra a direcção dos peuitentcs. Quereis pois evitar ao mesmo tempo o rigorismo c o laxismo? Segui as tres regras seguintes, ellas são cheias dc sabedoria: 1.®, ou nada absolutamente dignes; 2.®, ou tomae um termo medio entre os sentimentos oppostos; 3.°, ou se não achaes modificação, nada decidaes; contcnlac-vos de aconselhar o mais seguro e o mais perfeito, sem fazer d’isto umn obriga­ção.

SUcncio 63. — Guardareis portanto silencio, e não fareis conhecer prudente.y(,gg(j sentimento ao penitente que está na boa fé: por islo

não approvaes, quando muilo pcrmiltis o perigo de um mal mnlerial e incerto que não esperaes poder impedir fallnndo. Calae-vos portanto. Com elfeito, se quando a obrigação é incontestável e certa, graves auctores, depois de Santo .Agos­tinho, cujas palavras são estas: Ubi scirem tibi non prodesse, te non monerem, le non terrerem [Hom. xli inter l), dizem que se o confessor vé que o penilenle o ignora, e que, sendo advertido, o não cumprirá, póde, ao menos em certos casos licitamente, c deve mesmo prudentemente calar-se e deixar 0 penitente na hoa fé; com quanta mais razão deveis seguir esla conducta, quando n obrigação é incerta c negada por au- clores respeitáveis? Não digaes que será sómente culpado o penitente, se, sendo advertido, o não quizer cumprir. Scra dúvida elle deverá queixar-se de sua pouca virtude; mas vós dareis certamente contas a üeus da imprudência com que quereis suhmntter a frnea virtude dos penitentes n cousas difficcis e incertas, que Deus não exige talvez. Sereis como um medico que, vendo e devendo ver que um enfermo não tem forças parn digerir um remedio bom em si, mas que exige um eslomago robusto e grandes forças, e que, por ura lado, não é evidentemente necessário, se obstina não ob­stante cm nduiinislrar-IITo, dizendo: 0 remedio é bom em si, pouco importa que o doente não lenha forças para o conser­var e digerir. Se o doente morrer, não direis tamhem que é culpado' 0 medico, por isso que o remedio não é necessário? E 0 pae infeliz, que assim perdesse seu filho pela imprudên­cia do medico, diria jámais que e.sle medico seguiu fielmente suas intenções, quanlo no tratamento e curativo de seu fi­lho? Guardae porlanlo silencio; resultará d’islo, quando mui­to. um mal material incerto; mas prevenireis um grande nu­mero de peccados formaes e certos.

Termos 66.— Vós sereis feliz se, vendo-vos no caso de pronun- mcdioscn-ciar.yoj pgya evitar o laxismo e o rigorismo, souberdes, gra­

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ças a vossos csludos e á vossa discrição, achar um termo me-ire os sen- dio entre as opiniões opposlns; segiiireis enlão a regra dada ^ por Bento X IV em sna obra celebre De Synodo diwcesam (lib. X II, cap. IV, § 12). Este grande Papa nelia recom­menda aos bispos que ponham todos seus cuidados para que, na discussão dos casos de consciência, se faça prevalecer o sentimento que tem o meio termo enlre a demasiada indul­gência e 0 demasiado rigor. Nobis caulius consUiumAv/. elle, videretur, ut Episcopus controvérsias hujusmodi in collatio- nibus. seu conferentiis de casibus morniibus, qua; inler ipsius clericos haberi solent, disculiendas relinqueret. nec quidquam circa illas in synodo sine prmvio Apostolica; Sedis oráculo decernendum susciperel; hoc tamen studiose curando, ut in

r diclis collalionibus moralibus eorum Iheologorum senlen- vinceret, qui media viu inler rigorem el laxilalem ince-

dere norunt. N'o entender de Bento X IV, o caminho do meio é portanto 0 melhor, e aquelle que devem adoptar os bispos c os lheologos. Bento X II I o seguiu, como vistes, a respeito da obrigação de confessar as circiiniílancias aggravaiites.Podeis tambem usar de igual modiíicação em consequencia da proposição condemnada sobre a necessidade de explicar ou não na coníLssão o habito do peccado. Assim, para não 8cr rigorista, direis: «Eu não vos obrigo a seguir o primeiro sentimento de modo que se vos acontecer confessar-vos indo de viagem, ou por algum justo motivo, a um dilTerente de vosso confessor ordinário, façaes um sacrilégio no caso em que, accusando um peccado grave, não acresceuteis, sem mesmo ser interrogado: Notae, meu padre, que outras ve­zes lenho commettido e confessado esle peccado. Excepluo 0 caso em que dcvesseis accusar-vos de uma negligencia gra­vemente culpavel em emendar-vos do máu habiio. Mas para não serdes relaxado, dizei: Se o confessor vos interroga, eu não vos dispenso de responder; ao contrario, declaro que vos não é permittido dissimular, mas que sois. obrigado a confessar o habito.» É assim que sobre dilTerenles questões controvertidas, por exemplo, sobre a recitação das malinas antes da missa, sobre a administração do Viatico ao enfermo que no mesmo dia cnmmungou com saude, etc., Dento X IV refere e pcrniilte opiniões intermediárias entre os dous ex­tremos. Na famosa disputa que em França se suscitou em 17o6, relativamente á recusação dos sacramentos áquelles que recusavam subnieller-se ás constituições ponlilicias, to­mando uma especie de termo medio enlre o sim e o não, elle respondeu n’esles termos em sua encyclica Ex omnibus: «Becuae-se a eucharistia aos refractarios nolorios; não se conceda áquelles que são duvidosos e suspeitos, senão depois

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dc lhes ler feilo uma instrucção conveniente c própria a cu­rar 0 enfermo ou a juslilicar a conducia d’aquellc que, de­pois de semelhantes precauções, lhe administra o sacramento.

.Applicação 67.— Em conformidade a isto formae vossa conducta. Tra- ííraás oc- p e r i g o s a s em $i mes- ^iOcsílõ^íW, mas que de si não são um peccado? Não vades, como peccado. coufessor indulgente, permillil-as com toda a facilidade e

sem precaução, porque estas cousas não são indilTerentes; não vades igualmente, como confessor rígido, prohibil-as se­veramente em todos os casos, porque de si não são um pec­cado, e nenhum fructo colherieis de semelhantes prohihições. 0 melhor que tendes a fazer, 6, como confessor discreto, tornal-as difliceis e não os auclorisar senão com precauções capazes de tornar remoto o perigo Assim, em maleria dc occasião dc peccado, se, cm vinte vezes que se visitou uma pessoa, sc caiu com ella nove vezes consecutivas ou interme­diadas, serieis hem relaxado sc não visscis n’islo uma occa­sião proxima, e se não ohrigasseis a deixal-a, sob o pretexto de que o numero de vezes cm que sc não caiu é um pouco maior. Mas serieis demasiadamente severo, se em igual cir­cumslancia ohrigasseis a deixar a occasião áquclla que, re­sistindo um grande numero de vezes, peccou por actos in­ternos duas ou tres vezes sómente. Exceptuo o caso cm que uma circumstancia particular vos indicar diflerente conducta, e vos (izer julgar que, continuando suas visitas, o penitente não sc abslcrã de peccar. Como confessor discreto, obrigae 0 primeiro a deixar immediatamcnlc a occasião; ao segundo começae por tornar-lh’a diflicil, exhorlae-o a abandonal-a, advertindo-o do perigo. Mas se elle tem difliculdade em dei­xal-a, podereis pcrmillir-lh’a com precauções, por exemplo, imponde-lhc por penitencia dc nunca estar só com a pessoa, e de vir confessar-se se recair. Para dispensar um penitente de afastar uma occasião proxima, um confessor rigido não admilte oulra desculpa senão a impossibilidade physica; o confessor relaxado aceita mesmo aquella que não produz uma impossibilidade moral. Quanlo a vós, confessor discreto, recebei aquella que de fado constitue a impossibilidade mo­ral, ainda que não chegue alé á impossibilidade physica; mas indicae os meios de fazer remota a occasião.

. TeiJior 68.— Se uão achardes termos medios, se vos for impossi- nela scíen g''ardar silencio c que devaes responder ao penitente cia. que vos interroga sobre eslas questões obscuras e controver­

tidas; sei que vossa piedade e vosso respeito pela lei vos farão inclinar para o rigor. Mas se vosso temor não é acom­panhado d'esta sciencia que, unindo ao respeito pcla lei a commiseração pela fraqueza do peccador, pese a gravidade

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das obrigações que ella lhe impõe, ouvi o que vos diz Santo Amhrosio em seus Commenlarios sobre o psalmo 118 (Serm. 60 sohre o vers. C): ípse timor Domini, diz esle grande doutor, nisi sit secundum scienliam, nihil prodest, immo obest plurimum. Depois de ler demonstrado islo pelo exem­plo dos judeus, explica logo de que sciencia elle entende que 0 temor de Deus seja acompanhado. E t quid de Judwis di­co? Sunt etiam in nobis, qui habent timorem Dei, sed non secundum scienliam, statuenles duriora prcecepta quw non possit humana conditio sustinere. Timor in eo est, quia vi- dentur sibi consutere disciplina;, opus virtutis exigere; sed inscitia in eo est, quia non compaliuntur naturw, non cesti- mant possibilitalem. Non sit ergo irralionahitis timor. Ete- nim vera sapientia a timore Dei incipil, nec est sapientia sjiriluatis sine limore Dei: ita limor sine sapientia esse non

Porlanlo, para ler um temor segundo a sciencia, e uma sa­bedoria espiritual fundada sohre o temor de Deus, não de­veis decidir em semelhantes controvérsias com o tom de um legislador que faz uma lei e impõe uma obrigação. Mas, supposto que a opinião benigna seja fundada sobre fortes razões, e que tenhaes motivo dc receiar que a opinião seve­ra não seja seguida pelo penilenle, deveis em lal caso reco­nhecer que a opinião benigna lhe convem mais. Assim, não deveis |)rohihir-lh’a, mas permiltir-lh’a. Tal é o conselho for­mal do Papa Honorio: In his ubi jus non invenilur expres- sum, diz elle, procedas mquitate servata, semper in humanio- rem partem declinando, secundum quod personas et causas, et loca, el lempora, poslulare videris. (Cap. Ex parte lua, tin. de trnnsacl.) Ouvi tamhem o que dizem geralmente os Papas e doutores sohre o modo de vos portar nas questões obscuras e duvidosas. S. Raymundo, grande canonisla, vos diz: Non sis nimis pronus judicare mortalia peccata, ubi non constat per certam scripturam. (Lih. I I I De Pcenit.) Santo Anloni- no, que mereceu ser appellidado o Anjo dos conselhos, nos adverte: QucesHo in qua agüur ulrum sit peccatum morlale, nisi ad hoc habealur auctoritas expressa Scripturae, aut ca- nonis Ecciesia, aut evidens ratio, periculosissme delermina- tur. (Pnrl. 2.*, til. I, cap. ii.) Fallando do confessor (T il. IV, cap. v): St vero non potest clare percipere utrum sit mortale, non videlur tunc prcecipitanita senlentia, ut deneget propter hoc absolutionem, et cum promptiora sint jura ad soívendum quam ad tigandum (cap. i, ad llceretic. dist. 1), el melius sit Domino ralionem reddere de nimia misericórdia, quam de nimia severitate, ut dicit Chrysostomus, potius videlur absol- vendus.

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Bento X IV , lallando dos matrimônios nos tempos prohibi­dos, diz: «Não se devem pôr impedimentos, quando não é cerlo que a lei os imponha.» (Not. 80, n.® 19.) Em seu livro De Synodo dicecesana adverte muitas vezes aos me.smos bispos que não decidam de sua própria cabeça as questões controvertidas entre os doutores; por exemplo de censu per- sonali. de contractu trino, et altritione et amore inilia li, etc. Em outro logar, fallando da administração do sanlo Viatico áquelle que no mesmo dia commungára com boa saude, re­fere os diversos sentimentos; depois accrescenla: In tanta opiniomtm discrepanlia integram erit parocho eam amplecti sentenliam. qua; sibi magis arriseril... neque fas erit Episco- po... quidquam de ejusmodi controvérsia in sua synodo de- cernere. ne sibi videatur judieis arrogare partes inler gravis- simos hac supra re inter se contendenles theologos. (Syn. dicec., lib. V II, cap. xi, n.® 2.)

89 - Ora. s® B®®^® X IV não permitte aos Bispos o deci- dir, mesmo em seu synodo, as questões controvertidas; se elle mesmo, que era Soberano Pontilice quando publicou esta obra De Synodo dicecesana, deixou indecisa esla questão, as­sim como tantas outras igualmente conlroverlidas, quem vos obriga, vós que não sois mais que um simples doutor no tri­bunal da penitencia, a decidir sempre e n impor os senti­mentos severos, a ponto de nunca permiltir as opiniões be­nignas, mesmo quando, firmadas em razões sólidas, ellas são necessárias e vantajosas ao pcnilenle? Não sabeis que, na administrarão deste sacramento, deveis inseparavelmente unir ao caracter de doutor as qualidades de medico? Deveis portanto permillir-lhe a opinião benigna mais fundamentada, a íim de o preservar do peccado mortal. A isto o exporieis vós pela opinião de que tendes motivo de receiar que elle não cumprirá. Com elleito, a doença da alma é o peccado for­mal, e não 0 peccado material, quando esle não é imputa* vel. como no caso de que tratamos. Igualmente não deveis julgai 0 indigno da absolvição, quando, estando prompto a cumprir as obrigações certas, elle recusar sujeilar-se áquellas de que o dispensam, sobre boas razões, auctores respeitá­veis. Se lizerdes de outro modo, esperae que vosso temor, na verdade bom, mas destiluido d esta sciencia que, segundo a expressão de Santo Ambrosio, se compadece da fraqueza humana e não impõe preceitos muito duros (e que preceito mais duro do que aquelle que é incerto e mesmo negado por sabios doutores?) esperae, digo, que vosso temor verilique o nihil prodest, immo obest plurimum. Sabei por outra parte que 0 atrevimento, com que um tão grande numero dão como certas dilTerenles opiniões, não se deriva de modo algum de

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uma superioridade de sciencia, mas de Falta de conhecimen­tos e de luzes. Com efleito, atrever-se-hia alguem a susten­tar com lanla lirmcza, que a altrição não basta para a conlis­são, e que somos obrigados a confessar as circumstancias simplesmente aggravantcs, mas que não mudam a especie do peccado, se tivesse lido o que diz Beiilo X I I I na Insim- cção italiana, addicionada ao seu Concilio de Itoma? Eis aqui suas palavras: 0 sentimento commum hoje é que a dor e con­trição perfeita é boa. mas não é necessaria para a cOnfissão: a contrição imperfeita basta, quero dizer, a attrição, seja pura como mais acima explicamos, sejajunla a algum prin­cipio de amor de benevnlencia para com Üeus; queslão que a Santa Sé tem deixado alé aqui indecisa. Quanto ás circiim- slancias simplesmenle nggiavanles, tendes visto (n.® 57) cora que reserva o mesmo Pontilice falln; elle concliie sua instru­cção, ordenando aos pastores que sigam esla instrucção

Sando ensinarem aos fieis o modo de se confessarem. Cmno r por certo qne aquelle não satisfaz aos preceitos de santi­

ficar os dias festivos, que, ahslendo se n’eslcs dias das obras servis, se contenta com ouvir a missa, se se tiver lido que Bento X IV , na constituição PalerncB caritatis, querendo re­mediar os abusos da feira de Sinigaglia, depois de ter, por eslas palavras mandamus et jubemus, ordenado a suspensão das vendas, dos contratos e das obras servis, a (im de que, livres dos cuidados temporaes, podessem ouvir devotamente a santa missa, dá, não preceitos, mas simplices conselhos a respeito das outras obras de piedade? (/uin eliam exhorta- tnur, ut in precibus... audiendoque verbo Dei freqüentes sint ?É assim que eu vos poderia fazer ver, sobrc um cento de diflerentes questões, que lomar o partido de guardar silen­cio, ou escolher um termo nicdio, ou aconselhar c exhortar quando se trata de certos deveres difliceis, não é o procedi­mento de um homem ignorante, mas sabio; de um homem que, não citando sómenle um auctor, lem lido muitos, se­gundo 0-conselho de Bento X IV , mesmo em sua bnlla Apos­tólica; de um homem finalmente que, segundo Santo Ambro­sio, junta ao temor de Deus a sabedoria ulil ás almas.

70.— Por cansa da ligação e utilidade de meu assumpto Nccessida-permillir-nie-heis aqui umã curla digressão. Se a mais P®f* cri^ofeita discrição é lão necessaria a respeito de cada penitenle, quando se quem póde exprimir qu.mlo mais ella é indispensável quando lalla em üo alto do púlpito se dirige ao publico? Com efleito, aqui as publico. conseqüências funestas da relaxação ou rigorismo se esten­dem em razão da multidão, c se aggravam eni razão da in­crível variedade de caracteres e circumstancias dos ouvintes que podem abusar da condescendencia do prégador relaxado,

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OU cair em tortura e desesperação pela severidade do rigo­rista. Em publico, portanto, nunca entreis em alguma ques­tão duvidosa ou controvertida entre os auctores; tenha sem­pre vosso zelo por unico objecto cousas certas, conhecidas e communs a todos; digo, conhecidas e communs n todos os doutores. Quando achardes em certas obras opiniões que sabeis não serem conhecidas por todos, não sejaes muito prompto em adoptal-as, ainda que vos pareçam bem razoa­veis; acontecer-vos-ha muitas vezes, se lerdes outros aucto- rcs, achar pouco sólidas estas opiniões; que digo eu? acon- tecer-vos-ha achar os sentimentos oppostos muito mais fun­damentados. Poderia, para vol-o provar, acrescentar um cento dc exemplos áquelles que mais acima citei. Deixae pois dc parte semelhantes matérias, e, lançando mão das cousas sohre as quaes sabcis que todos os doutores são una­nimes, sereis ao mesmo tempo doutor de uma santa moral, medico experimentado das almas, c zelador sincero não da vossa gloria, mas da gloria de Deus. Sim, feliz de vós mes­mo, e por vosso meio feliz da Igreja, se conseguirdes dester­rar do meio dos (ieis os vicios certos e manifestos, c fazer cumprir os preceitos e obrigações induhitaveis. Se alguma vez deverdcs fallar de cousas incertas e debatidas entre os auctores, segui a regra indicada mais acima. Fallae em ge­ral, ou adoptae modilicaçõcs que tenham o meio entre os dous extremos, ou indicac precauções próprias a remover o perigo. Sc fordes pastor e vos acontecer chamar companhei­ros para prégar e confessar em vossa parochia, nunca em­pregueis relaxados, nem rigoristas; não vos dirijaes senão a sacerdotes prudentes, discretos, inimigos de innovações; que, deixando de parte as questões escabrosas, não tratem senão de assumptos certos, ordinários e práticos, taes como as dif- ferentes virtudes da caridade, da pureza (mas com uma grande reserva nas expressões), dn humildade, da paciência, etc., e que ataquem os vicios habituacs, a impureza (mas sem promenores perigosos á innncencia), o odio, as discór­dias, as injustiças (mas sem fallar dos titulos duvidosos do lucro), etc.; de oulra sorte, ou os relaxados ou os rigoristas encherão vossa frcguezia de inquietação e desordem, ainda que uns e outros sejam animados das melhores intenções.

Jnconvc- 71.— Não receiarei confessar-vol-o, estou bem convencido nientes dc «ue se os prégadores conhecessem as funestas conseqüências imiação discursos imprudentes, elles se espantariam, e lica-ouorigo-riam advertidos de serem para o futuro mais prudentes e rismo. discretos. Se o prégador em demasia indulgente soubesse:

1.", que os ouvintes tôem tomado, segundo suas palavras, a liberdade de fazer ou omittir muito além do que lhes permit-

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tiu; 2.°, que auctorisados, de algiim modo, por suas doutri­nas relaxadas, elles tôem tomado a ousadia de resistir ás justas restricçõcs que os pastores ou os outros ministros do Senhor queriam pôr a sua relaxação; 3.®, que elles se tôem feito um motivo de escandalo para os bons; que diversos abusos se vôem tornar-se comniiins c populares; sc o prega­dor relaxado soubesse tudo isto, certamente não teria conso­lação de sua imprudência; mas, profundamente afílicto, aprenderia a tornar-se mnis circumspccto. De seu lado, sc 0 prégador rigorista soubesse quanto são contrários os cITei- tos ao que por sua severidade pretendia, poderia diante de Deus ficar sem inquietação? Elle julgava ensinar a mais sã doutrina, por isso que ensinava a mais apertada; cllc julgava abater a presumpção e a demasiada liberdade de um grande numero, corrigir abusos, e ler adivinhado o verdadeiro meio de inspirar o lemor; elle imaginava que de repente todo o mundo adoptava sua doutrina; mas sabia: 1.°, que muitos experimentam a maior dilliculdade cm praticar o que cllc exigiu, c que, augmentando o demonio sun rcpugnancia, el­les cáem em tibicza; que, não se sentindo com n coragem de fazerem tantas cousas dilTiccis, não as fazem; que, lendo ces­sado sua boa fé, peccam, não já materialmente, mas formal­mente, omiltindo por sua falta cousas que talvez não são de obrigação; 2.“, que, com a consciência carregada destes pri­meiros peccados, elles não podem mais resolvcr-se a fazer o contrario, que lhes parece lão dillicil. D’aqui, carecendo dc firme proposito, consideram como inutil o confessar-se; não cuidam mais da confissão, ou ao menos, demorando-a de dia em dia, abandonam todas as outras devoções; em uma pala­vra, precipitam-se em toda a especie de desordens, conside­ram todas as boas obras como imiteis, não temem augmentar 0 numero dc seus peccados, porque seÇcm condemnados por um ou por dez lhes parece quasi o mesmo; 3.”, que uma vez caídos na desesperação, ninguém póde expressar as faltas dc que se tornam culpados contra os preceitos mais certos e mais importantes.

72.— .Mas ordinariamente nem um nem outro conhecem Quaes são as conseqüências de seu zelo imprudente. Elles encontram muilo funestos aduladorc.s, mas não amigos sinceros que, dores, animados de um verdadeiro espirito dc caridade, lhes mani­festem seus defeitos, a lim de que se emendem d’elles. Além d’isto, se nem um nem outro forem humildes, não se ren­dem aos conselhos que Ibes dão; pelo contrario concebem rescntimenlo contra o amigo verdadeiro: se forem orgulho­sos, se obstinam a sustentar suas doutrinas cora mais calor, por isso mesmo que são desapprovadas. Esperae um pouco.

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e adeus, bem das almas e gloria de Deus! Nunca porlanlo chameis confessores e prégadores d’eslc caracler; não ob- stanle suas boas intenções, elles nenhum bem farão, antes muito mal a vosso rebanho. Convidae pessoas que, a uma caridade de pae, a uma habilidade de medico, reunam uma moral discreta. A caridade faz escolher e tratar, não os as- sumplos proprios a allrahir a admirarão e appiausos, mas a produzir verdadeiros fructos para a gloria de Deus, paz e e salvação das almas. Aquelle que possue a habilidade de medico espiritual sabe que, sem esle caminho do meio, a natureza humana cáe ein um dos dous extremos: a libertina­gem ou a tibieza. Elle sabe que a virtude dos lieis, ajudada do soccorro ordinário da graça, Icnde ao cumprimento das obri­gações certas; que ella acaba por chegar a islo, ao menos na maior parle; mas sabe lambem qne elle não é bastante forte, mesmo nos bons, para passar além e submcltcr-se a obriga­ções incertas e penosa.s; algumas vezes mesmo, quando se trata de obrigações certas, mas difliceis e ainda não sabidas, não se lhe deve fallar d'ellas senão com reserva, com receio dc fazer peior mal com as advertências, imiteis para evilar o mal material, e nocivas por causa dos peccados formaes que poderiam resultar d'cllas. Com esta caridade e esla habili­dade nos faremos discretos, e, com a discrição, o povo é in­struido sem enfastiar, reprcbcndidi) com successo, santificado na verdade, e Deus mesmo glorilicado e servido.

Limitar-sc 7; ) . _ Isto vos ensina a conducia que deveis ter em pu- cfpios ge P»riicular a respeito das questões, em cujos prin-raes. cipios geraes todos são concordes; mas, apenas ha um ou ou­

lro que possa dirigir-vos na applicação d’esle principio aos casos particulares, ao menos de modo que faça uma regra geral para lodo o mundo. É assim que Iodos os doutores concordam que somos obrigados a fazer com frequencia os actos das virtudes Ihcolognes; que o luxo ó um peccado; que não dar esmola é um peccado; que a immodeslia nos vestidos é um peccado; mas depois para dizer de um modo absoluto: Commellcis um peccado grave, se não daes em esmolas tan­tos por cento de vossas rendas; se não fazeis os actos de fé com laes intervallos; se despendeis lanlo em vossos vestidos, em vosso mesa, na mobilia de vossa casa; se tendes tal nu­mero de domésticos; se Irazcis os braços nús alé tal sitio, qual é 0 doutor particular que podèrá jámais dar-vos sobre tudo islo regras certas? Quando pois Iralardcs em particular com vossos penitentes, com mais forte razão quando fallardes em publico, sede discreto. Suppo.slo que a cousa em geral seja certa e freqüente na prálica, fallae n’islo, mas com re­serva, quero dizer, não desçaes facilmente aos casos parlicu-

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lares, e não digaes: Tal cousa é peccado mortal; excepto tendo a Igreja mesmo fallado e decidido. Coiitcntac-vos de inculcar o principio geral, e (icae sem inquietarão. A graça de Deus fallará ao coração de cada um e fará a appiicação

Íue convem ao seu estado. É o que aconteceu a um préga- or cheio de tacto e discrição. Soube elle que muitos dos

seus collegas, para destruir certas modas vãs e pouco decen­tes que reinavam em certa cidade, as tinham censurado de­signando-as. Elles tinham visto frustrado .seu intento: hem mais ainda, elles tinham irritado, e mais que nunca sc mani­festava gosto por estas modas. Quanto a elle, resolveu-se a não fallar senão sobre as verdades eternas, e da modéstia nos vestidos sómente em geral, sem designar tal ou lal moda em particular. Em pouco tempo viu cair todas estas indeceiicias que elle não linha mesmo nomeado. Foi felicitado em razão de seus felizes successos. Os outros, respondeu elle, toca­vam nos ramos, e eu toquei na raiz. Por mais que corteis os ramos, se ficar a raiz cheia de vida, elles recobrarão vigor e se desenvolverão de novo; mas uma vez morla a raiz, os ra ­mos cáem j)or si mesmos. Tocae portanto na raiz, quero di­zer, nos vicios, pelos principios geraes, sem descer aos casos particulares; e se julgaes que deveis chegar a islo, fazei como os negociantes razoaveis que nâo exigem nem o preço su­premo, nem o preço minimo, mas o preço medio. É assim que obtereis o que procuraes, de oulra sorle nada obtereis.Voltemos agora ao nosso assumplo.

7 í. (S. L igorio, n.°‘ 17 e 18.) — laôta sacerdoHs custo- Imnortan- dient scienliam, et legem requirent ex ore ejus. {Malach., 2 e 7.) Para bem exercer o oílicio de doutor e evitar o dupli- joutor; cado escolho da relaxação e do rigorismo, o confessor deve sciencia porlanlo conhecer a lei; como póde ensinal-a aos outros que ella aquelle que a não sabe? É aqui que se deve recordar esle dito de S. Gregorio, que a direcção das almas no caminho da salvação é a arte das artes: Artium ars est regimen anima­rum. S. Francisco de Salles acrescenta que o oHicio de con­fessor é 0 mais importante e o mais diflicil dc todos. Isto é verdade: é o mais importante, aqui se dirigem todas as sciencias, pois que o íim de todas as sciencias é a salvação eterna; é o mais diflicil, porque, em primeiro logar, o minis­tério de confessor exige o conhecimento de todas as scicn- cias, de todas as artes e de lodos os outros empregos; era segundo logar, a sciencia da moral comprehende uma mulli­dão de matérias differenles; em terceiro logar, ella se com­põe em grande parte de uma multidão dc leis positivas, que é necessário interpretar cada uma em seu verdadeiro senti­do: além d'Í3lo, nenhuma d’estas leis deixa de apresentar

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grandes difliculdades em razão das numerosas graduações dos dilTerenles casos que exigem soluções dilTerenles. Alguns ha que, julgando-se lilleratos e lheologos dislinclos, não se dignara de ler os moralistas, que elles chamam por desprezo casuistas. Elles dizem que, para confessar, basla conhecer os principios geraes da moral, que se podem com estes deci­dir todos os casos particulares. Quem ha que negue que to­dos os casos devem resolvcr-se segundo os principios? Mas a difliculdade está em appiicar aos casos particulares os prin­cipios que Ibes convem. Isto. não póde fazer-se sem uma profunda discussão das razões cm que se fundam os senti­mentos oppostos; ora, é isto o que Idcm feito os moralistas; elles tôem procurado mostrar por quaes principios se devia decidir uma multidão de casos particulares. Acrcscentae que hoje ha tantas leis positivas, tantas bullas, tanlcs decretos, que é impossivel ler d’ellas conhecimento não lendo os ca- suislas que as citam; e, debaixo d’csta relação, os lheologos modernos são cerlamcnle mais uteis do que os antigos. 0 erudito auclor da Instrucção para os novos confessores, diz com razão, que não é raro encontrar grandes lheologos lão superliciaes cm moral, como profundos nas sciencias especu­lativas. (Part. 1.*, n.° 18 J Porque, segundo a nota de Ger­son, a moral é a mais dilucil de todas as sciencias, e não ha doutor, por sabio que seja, que não ache n’ella cada dia cou­sas novas; d’onde conclue que o confessor nunca deve dei.xar 0 estudo d’esta sciencia. [Tract. de Orat.) 0 sabio Sperelli tem a mesma linguagem. «Enganam-se estranhamente esses confessores, diz elle, que se dão todos ao estudo da escolas- tica, considerando quasi como um tempo perdido o estudo da moral, e que por consequencia não sabem distinguir «/e- pram a lepra: qui error, acrescenta elle, confessarios simul et pcenilentes in (eternum interitum traliet.o [De Episc., part.3.“. cap. IV.)

Extensão 75.— Não pretendo comtudo que seja necessaria tantasdeto?a P®’’® confessar as pessoas simplices e ignorantes,

■ como para os homens de leis, negociantes, ecclesiaslicos e outras pessoas semelhantes; tanto para confessar em uma al­deia, como em uma cidade, principalmente havendo uma tal penúria de confessores, que os penitentes sejam obrigados a esperar muito tempo sem se confessarem. Mas isto não basla para desculpar certos sacerdotes que, depois de terem lido de corrida algum pequeno resumo de moral, se põem Icme- rariamenle a confessar. É necessário ao menos que o confes­sor saiba: 1.°, ate onde sc estende sua jurisdicção, sobretudo deve attendcr que os sacerdotes seculares não podem absol­ver os religiosos sem permissão de seus superiores, excepto

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indo elles de jornada, ou vivendo fóra da communidade, e ainda é necessário que não icnham comsigo nem companhei­ro, nem sacerdote approvado de sua ordem. Neste caso os religiosos podem ser absolvidos por um simples sacerdote. Julga-se então que os superiores, segundo o costume, dão a seus inferiores licença de se confessarem a todo o sacer­dote approvado; além disto deve ser instruido dos casos c censuras reservadas, ao menos das mais ordinarias, taes como da excommunhâo papal em que incorre aquelle que cáe exteriormente em heresia, ou aquelle que lé, conserva, vende livros herelicos que tratam de religião ex professo, ou que contém uma heresia formal; os cinco casos papaes de Cle­mente V III, a saber: a percussão grave ou medíocre de um clérigo ou religioso; a simonia real ou conlidcncial; a viola­ção da clausura dos mosteiros de religiosas com más inlcu- çõcs; a violação das immunidades e o duello; a excommunhâo fulminada por Beulo X IV contra os confessores que absolvem seu cúmplice in matéria turpi, e contra aquelles que ensi­nam que 0 confessor póde perguntar o nome do cúmplice, mesmo recusando a absolvição áquelle que não quer fazcl-o conhecer, e as outras excommunhões.communs que se po­dem ver no Tract. de censuris. 2.® E necessário que saiba distinguir os peccados veniaes dos peccados mortaes, ao me­nos in (jenere suo, que sobrevem com mais frequencia: dos outros deve ao menos saber duvidar. 3.® As interrogações que se devem fazer, as circumstancias do peccado, ao menos aquellas que mudam a especie; o que constitue a occasião proxima, ou que traz comsigo obrigação de restituir; as qua­lidades da contrição e do (irme proposito; linalmente os re­medios proprios a operar a emenda. (S. Ligorio, Theol., lib. VI. n.«* 628, 576, oo3, 491.)

Em uma palavra, é certo que um confessor se acha em es­tado de condemnação quando se enlreraetle a ouvir confissões sem ter a sciencia suflicienle. Deus o reprova: Quoniam tu scientiam repulisti, repeliam le ne sacerdotio fungaris mihi. [Oseas, IV, 6.) A approvação do bispo não poderia dcscul- pal-o quaudo elle se conhece manifestamente incapaz: a ap­provação não dá a sciencia necessaria, ella a suppõe. Digo manifestamente, porque o confessor que sómenle tivesse dú­vidas poderia e deveria Iranquillisar-sc sobre o juizo de seu superior, comtanto que se esforçasse por adquirir ao menos a sciencia suíBciente por um estudo mais continuado. Mas nenhum confessor deve desprezar o estudo da moral. Com elTeito, nesta multidão de matérias diversas e sem ligação que pertencem a esta sciencia, muitas ha que, aiuda que estuda­das, nos escapam, porque se oITerecem poucas vezes na prá-

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lica; do que concluo que é necessário sempre fazer um estudo especial.

0 mesmo 76. (B. L eonardo, n.“ 26.) — A santidade e a prudência, objecto. aijás tão necessárias ao confessor, não bastam pois; é neces-atAins sari® lambem a sciencia. Sem ella, ministro de Deus, expon-

“ des vossa alma e a alma dc vossos penilenles ao perigo evi­dente da condemnação eterna. Mas qual é a extensão, quaes são as qualidades da sciencia necessaria ao confessor para preencber ps deveres de seu cargo, não é muito facil de de­terminar. É certo que assentado no tribunal da penitencia para ensinar a todas as classes de pessoas a lei natural e di­vina, para julgar todas as causas das consciências, que são outros tantos abysmos sem fundo; que digo eu? para regular todos os aclos humanos, lão dilTerenles e lão complicados, que ao primeiro golpe de visla parecem exigir uma sabedo­ria e uma appiicação quasi iniinilas, é cerlo que Ibe é neces­saria, na apparencia, a sciencia mais vasta c mais perfeita. Mas não; os santos cânones não rejeitam aquelle que possue uma sciencia medíocre, principalmente qunndo a falta da sciencia eminente é compensada pela santidade. Para escla­recer esla niatcria com toda a concisão possivel, digo que em virliiile da lei natural c divina lodo o confessor deve possuir a sciencia que, no juizo de seu bispo e no testemunho de sua própria consciência, o torne apto para ouvir as conlissões dos penitentes nos logarcs onde reside. Assim, é necessário que tenha estudado por um tempo conveniente, e com muila ap­piicação, 0 que diz respeito á moral. Ao conliecimenlo espe­culativo e metaphysico das dilTerenles opiniões deve juntar a sciencia prálica e o modo de fazer uso delia. Notae bem es­tas palavras, o modo de fazer uso d’ella, para appiicar conve­nientemente as regras geraes aos casos particulares; esle é o ponto essencial da moral. Nunca deve cessar de ler e de es­tudar os bons auctores, nem de procurar novas luzes, racioci­nando, discutindo, consultando sobre as difliculdades novas que podem apresentar-se de dia em dia. Nos casos mais or­dinários c mais freqüentes lodo o confessor deve poder deci­dir logo; nos casos mais dilliceis é bastante que cllc saiba du­vidar c suspender sua decisão até que tenba estudado a ques­tão, ou consultado alguma pessoa mais habil e mais experi­mentada. Deve sempre ter presentes as regras geraes para distinguir inler lepram et lepram, entre os dilTerenles pecca­dos, se são morlaes ou veniaes; pesando as circumslancias que mudam a especie, que o aiigmentam ou que o diminuem notavelmente. Deve, além d’islo, conbecer os casos reserva­dos ao Papa e ao ordinário; aquelles a que anda ligada uma censura reservada, aquelles que trazem obrigação de resti-

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tuir; 03 peccados mais ordinários em cada estado c em cada condição; as disposições essencialmente requeridas nos peni­tentes pnra serem capazes da absolvição; os casos cm que se devem reiterar as conlissões passadas; as proposições conde- mnadas pelos Soberanos Pontilices; as novas pastornes que se publicam nas dioceses e que podem interessar ã consciên­cia. Comtudo esta sciencia não deve ser igual em todos: aquelle que exerce o ministério de confessor em uma aldeia pode conlentar-sc com nienos; mas aquelle que se occtipa n’esle mini.<terio pelas cidades e em provincias inteiras por meio dc missões, deve possuir um fundo mais rico.

Em uma palavra, o confessor, assim como o medico, deve sempre estudar; é a razão por que deve assistir ás conferên­cias sobre os casos de consciência, que tèem lugar na maior parte das dioceses. 0 bispo mesmo é obrigado a cstnhele- ccl-as cm todas as cidades e em todos os logares mais consi­deráveis de sua diocese; elle deve ter cuidado que n’ellas se decidam os casos práticos, e que se ponham debaixo dos olhos dos confessores suas obrigações, estimulando-os a que se dôcm no estudo, ainda que aliás sejam instruidos. Com elTeito, não deixa dc ser muito verdadeiro, segundo a nota do chanceller Gerson (Tract. de Orat.), que os maiores theo­logos são algumas vezes tão superliciaes cm moral, como há­beis e profundos nas sciencias especulativas. Cheios de pre­sumpção desdenham as obras dos cnsuistns, e ncaham por commetter nn prática os maiores erros. íln da mesma sorte alguns velhos que, fatigados do estudo e descansando de mais sobre certa experiencia, tôem a pretensão dc tudo decidir só pela prática, como se elles podessem cortar todos os nós cora um só golpe. Sc elles não sabem, são muito atrevidos; e, se elles sabem, eu lhes direi com o .Apostolo, que elles não sa­bem ainda, quemadmodum oporleat eos sdre. (I. Cor. viii,2.) Querer sómente pela prática decidir todos os casos, é uma excessiva temeridade. Estudo portanto, estudo, sc quizermos satisfazer convenientemente as nossas obrigações. Com cf- fcito, da mesma fórma que todos os theologos crôem que é uma grande falta para um penitente o escolher de proposito um confessor de tal modo ignorante que não seja capaz de exercer seu ministério, assim todos conceituam como culpado de uma falta hera maior o confessor que se mette a ouvir a conlissão dc um penitente sem ter a sciencia sulliciente. Deus pôz reservas á auctoridade que lhe confia, quando diz: (Juo- niam tu scientiam repulisti. repeliam te, ne sacerdotio fun- garis mihi. [Oseas, iv, 6.) Elle não lhe diz: Ne sis sacerdos; Elle não lhe tira o ministério sacerdotal de que elle está re­vestido; conlenta-se em dizer-lhe: Repeliam te, ne sacerdotio

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fungaris mihi. Elle lhe prohibe exercel-o sem a conveniente sciencia, por causa do perigo emiueute ao qual exporia sua alma, a alma de seus penitentes e o respeito devido aos sa­cramentos. Estudo portanto, ainda outra vez, estudo; nSo passemos dia algum sem rever alguma queslão prático. 0 Ritual Romano nos adverte que o confessor é obriiado a pos­suir toda a sciencia e todos os conliecimcntos nece.ssarios para a boa e segura administração de um tão grande sacramento: Omnem hujus sacramenti doctrinam rede nosse sludebit, et alia ad áus reclam adminislrationem necessaria.

Obrigação 77. (S. Carlos, pag. 5 e Ü.) — Acrescentae á auctoridade e meio dedo Ritual Romano a de S. Carlos. Todos os confessores, diz es*ta s " c i e n - t e n h a m o s admittido como capazes, devem cia ' todavia ter continuamente entre suas mãos alguns bons livros,

e alguns auctores approvados que tratem dos casos dc con­sciência para a decisão de muitos casos que acontecem cada dia aos penitentes, o que muilas vezes são dilB-ilimos: e quando, com estes auctores e seu estudo particular, não po- aérem resolvel-os, recorrerão a pessoas mais intelligentes e mais versadas n’cslas matérias. É necessário lambem que os confessores examinem cuidadosamente suns próprias forças e 0 alcance de sua sciencia, a fim de que se não ingiram a ouvir a confissão de pessoas, de quem duvidarem que estarão envolvidas era casos, cuja resolução ignoram, e que tenham perfeito conhecimento das censuras c casos reservados, e pnrlicularmeute d'aquelles que se contém na bulia In coena Domini; elles devera tambem ler muitas vezes os cânones penitenciaes, e eslas instrucções que llies damos.

ARTIGO IVEXACTIDÃO DE JUIZ

Observa- 78. (Sacerdotb santificado, toda a segunda carta, e n."* ções sobro 38-41.) — Deveis unir á sciencia de doutor a exaclidão de "lismo e s®g®®<í® ® fl®® ®® co®tr® 0 laxismo e rigoris-iirobabi- ®io, me pergunlareis agora lalvez se eu tenho pretendido liorismo. que sejaes probabilisla ou probabiliorista em vossa conducta

para cora os penitentes; perguntar-me-heis talvez ainda em qual d’estes dous extremos, laxismo e rigorismo, é mais fa­cil e mais perigoso cair. Quanto ao primeiro ponto, que vos parece da maior iraportancia, por isso que se trata da maior parte da moral, onde as questões claras e certas são era pe­queno numero, cmquonto que ha uma multidão d’clla3 ob­scuras e duvidosas, eis aqui sem disfarce o meu sentimento. Deveis ser probabilisla, ou probabiliorista? Respondo que não tenho auctoridade para decidir esta grande queslão; que

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isto mesmo não é necessário ao meu inteuto. Com elTeito, até aqui icnlio feito estudo para não contradizer algum dos dous partidos, e para não proferir cousa alguma que não possa ser admittidn por um c pelo outro; brevemente vol-o farei ver em o u.° 92. Âgora ainda vos digo: Sede o que qui- zerdes, comtanio que o sejaes com as precauções convenien­tes. Sendo assim, evitareis, e é isto tudo o q*ue eu desejo, o verdadeiro laxismo e o rigorisrao rcprehensivel. Com estas precauções oão haverá mesmo uma grande dilTerença, seja flual for 0 partido que tomeis: sobretudo ides ver que não depende d’isto o terdes vós uma moral justa e sã, nem o ser­des um sabio mestre e um ministro util no tribunal da peni­tencia.

79. — Se quereis abraçar o probabilismo, eis aqui as pre-i’recauções cauções que deveis tomar: 1.® Não o appliqueis ás questões 9“® em que se trata não sómente de direito, mas tambem de fa- jj^io cto; ou, em outros termos, não só do licito, mas tambem do válido; como por exemplo, se se tratasse do valor dos sacra­mentos, ou das cousas necessárias á salvação, de necessidade de meio, tal como a verdadeira religião para um iniiel. Da mesma sorte um medico é obrigado a dar os remedios mais experimentados, e um juiz as sentenças mais seguras. Em todos 03 casos semelhantes, a boa fé d’aquelle que obra, e sua ignorancia, ainda que seja invencivel, de nada serviriam para obter o fim que é obrigado a procurar. Assim, todos os probabilistas, ao menos desde as proposições condemnadas por lunoceneio X I, são concordes que se deve seguir não a opinião mais provável, mas a mais segura e mais certa; e, não podendo obtel-a, ao menos a mais provável. 2." No caso em que se não trate do válido e licito, não deveis, para obrar licitamente e sem culpa diante de Deus, coutenlar-vos com uma probabilidade fraca e leve em favor dc vossa opinião: esta probabilidade deve ser grave e fundamentada. Ora, para distinguir esta probabilidade fundamentada d'aquella

Jue não o é, deveis attender: 1.°, que ella não seja contra- icta por alguma cousa certa, tal, por exemplo, como um

texto da Escriptura Santa, o canon de um concilio cuja in­terpretação não é duvidosa, uma decisão dos Soberanos Pon-tilices, ou uma razão evidente. N'esse caso, vosso opinião, seja qual for, poderá ter a apparencia da probabilidade, mas não a realidade. Quando muito, merecerá o nome de difli­culdade, mas não de verdade, sendo impossivel que hajam duas verdades contradictorias. 2.® Não é bastante que vossa probabilidade não seja contradicta por alguma cousa certa; deveis, além d’isto, comparar cuidadosamente vossas razões com as razões oppostas, consideral-as com todas as suas cir-

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7Qcumstancias especulativas e práticas; é necessário mais, n'esla comparação, que vossos motivos fiquem iguaes, ou quasi, aos motivos contrários, de modo qiie a par d’elles continuem a ser verdadeiramente prováveis, façam umn forte impressão sobre o espirito e ddem ás razões oppostas não uma resposta frivola, mas solida, e própria a tranquillisar, bem que não exclua toda a dúvida do contrario. Assim, ainda que compa­rativamente á probabilidade contraria a vossa seja inferior, é necessário que seja, absolutamente fallando, grave, solida e digna de um homem prudente: como uma montanha relati­vamente a outra póde ser mais pequena, mas não obstante ser em si, e absolutamente, uma massa bastaule grande para merecer o nome de montanha. Se, portanto, virdes sobre alguma questão um bom numero de auctores divididos cm opiniões contrarias, pretendendo, cada um de seu lado, que seu sentimento é mais provável, será islo uma grande prova de que as razões são igualmente on qnasi igualmente prová­veis. Tal é com elfeito a nalureza dos espirílos, que onde se encontra uma diderença notável, a maior parle a compre­hende e se reune; pcloxontrario, quando a diderença não é grande, a mesma razão faz mais impressão sohre este, me­nos sobre aquelle, de modo que continuam divididos de sen­timento.

Do menos 80.— São estas as principaes precauções indicadas pelos provável auctores que sustentam o probabilismo. Ainda que nenhum

provável* termos formaes que o menos provável, que■ elles consideram como licito, não didcre notável, mas fraca­mente, do mais provável, é todavia certo que é esle seu sen­tido. Com edeilo, todos são concordes em rejeitar como in- sudiciente a fraca probabilidade condemnada na terceira das proposições proscriplas por Innocencio X I. Vê-se por islo em que sentido o probabilismo permitte seguir a opinião menos segura. Islo não quer dizer que vos permitia obrar em dú­vida de peccado formal, que odcnde a Deus e faz o homem culpado, dúvida que consiste cm um aclo da vontade, a qual, conhecendo que em tal caso a lei divina o obriga, recusa suhmeller-se-lhe, e assim despreza o legislador e a lei. Não, de certo; seria este um erro intolerável. Nunca um probabi- lisla vos dirá que seja permillido expor-vos ao perigo de pec­cado formal, ainda que vos permilta de vos expor ao perigo de peccar materialmente, comlanlo que haja uma probabi­lidade fundada e prudente de que nenhuma lei é contraria, de modo que seja provável que vossa acção não é mesmo um pcccado material. Elle nega que, obrando d’este modo, vos exponhaes a perigo algum de commetter uma verdadeira of- fensa para com Deus. Por que? É porque a seus olhos uma

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lei verdadeiramente duvidosa não obriga, e que como senhor justiceiro. Deus exige, é verdade, nossa obediencia quando sua lei é certa ou muito provável; mas quando, feitas Iodas as diligencias, ella fica para o homem prudente verdadeira­mente incerta, deixa-nos em liberdade. Portanto, segundo a opinião solidamente provável, se o homem duvida que sua acção seja permitlida materialmente, é certo que lhe é per- millida formalmente. Desde então obra-sc na boa fé, .segundo 0 testemunho pr.itico de sua consciência, e com a certeza de não oITender a Deus e de não se tornar culpado, quando mesmo acontecesse que sua acção Tosse materialmente op- posta á lei.

81.— Se gostaes mais do probabiliorismo, scgui-o, com-Prccauçõcs lanlo que tomeis as precauções neccssarias para o reler em ‘l®® seus verdadeiros e justos limites. Primeiramente acaulelae- {jsmo. vos que não vades cair no luciorisrao, seja rígido, seja mo- deríido. 0 rigido é aquelle que nega o licito formal de uma acção agora e todas as vezes que ha uma dúvida, ainda que fraca e leve, dc alguma lei contraria. Assim, elle não vos permilte mcsme^eguir a opinião muito provável, porque po­deria ainda ser falsa; elle pois quer que sigaes sempre e cm tudo a opinião segura, e que desvie com certeza de todo 0 peccado material. 0 luciorismo moderado é aquelle que vos permilte o uso da opinião muito provável, mas que não se satisfaz com a probabilidade maior, porque ella deixa ainda subsistir 0 perigo do peccado material. Ora, ainda que estas duas opiuiões tenham uma tão bella apparencia da moral a mais sã, a mais segura e a mais perfeita, comtudo a primeira foi condemnada pela mestra infallivel da moral. A Igreja a proscreveu pelo orgão de Alexandre V III na terceira propo­sição, que é dc Sinnichio: Non licet sequi inler probabiles probabilissimam. A segunda, ainda que não condemnada, é todavia contraria a prálica dos Soberanos Pontifices e douto­res, mesmo os mais reservados e os mais veneráveis: acres- cenUc que ella traz comsigo mil inconvenientes. Enlre os Soberanos Pontifices, Alexandre I I I , Ilonorio II I , Celestino I I I , Clemente II, dispensaram do voto solemne de castidade;Gregorio V II, Martinho V, Adriano VI, dispensaram do ma­trimonio ralo, sed non consummato: elles sabiam todavia muilo bem que grandes doutores, príncipes mesmo da escola disputavam fortemente esle poder aos Soberanos Pontifices.Não obstante, elles dispensaram, sem previamente declara­rem improváveis as opiniões contrarias, opiniões que são certamente pelo menos solidamente prováveis. Quanto aos doutores e aos chefes da escola, elles tôem sempre, nas ma­térias obscuras da moral, dado como licito o uso do que lhe

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parecesse raais verosimil; elles sabiam todavia que não fal­tavam razões contrarias e não desprezíveis. Assim elles jul­gavam, na verdade, seu sentimento mais provável, mas não consideravam como improváveis os senliraenlos oppostos. S. Thomaz vae mesmo mais longe. Algumas vezes reconhece expressamente como provável a opinião contraria á sua. Não é pois conforme ao uso da Igreja, nem dos doutores exigir a mais nlla probabilidade. Acrescenlae que esle tuciorismo, mesmo assim mitigado, não é supportavel na prática; eis aqui a razão. Não é raro, ao contrario muito freqüente, en­contrar casos eni que fique alguma dúvida fundada cm favor da lei. Ora, se não é permittido obrar contra esta dúvida, ao menos, quando ha razões mais fortes para negar a existên­cia da lei, será a cada instante necessário impor aos (icis obrigações extremamente difliceis. Assim o jugo do Evange­lho não será já doce e leve, como o quer Jesus Christo, mas odioso e pesado. D'isto seria muito de receiar que (izcsse cair na desesperação, e da desesperação em uma relaxação geral dc costumes, pelos mesmos meios que pareciam pro­meller a maior reforma.

A mçsma 82.— Sc porlanto o quizerdes, separae-vos dos probabilis- materia. (as, não vos satisfazendo com a menor ou igual probabilida­

de; mas sc exigirdes a opinião mais provável, não vades até querer a opiuião muito provável; contentae-vos que a proba­bilidade seja maior, sem pretender que exceda notavelmente a contraria. De outra sorte seria querer que a vossa fosse tão forte, que chegasse á mais alta probabilidade dos tucio- rislas, e que a contraria fosse tão fraca, que não fosse soli­damente provável, mas que ficasse improvável; d’esta sorte serieis probabiliorisla cm nome, e tuciorisla de facto. É o motivo por que na prática, como não é justo dar por licito uma acção só por que um auclor novo e moderno a considera assim, sobretudo quando não produz razões convenientes, e que haja auctores de parecer contrario; da mesma fórma, quando um sentimento é sustentado por cinco ou seis aucto­res de merito que o examinaram diligentemente, não o de­veis rejeitar só por que um auclor moderno o rejeita c sus­tenta qne a opinião contraria é mnis segura. 0 mesmo é a respeito das matérias controvertidas, sobre as quaes os dou­tores se dividem; quando cada uma das opiniões contrarias é sustentada, não por um só, mas simulUineamenle por mui­tos, e que cada um considera a sua como a mais provável, podeis, sem fazer violência n vosso syslema, abraçar o par­tido que quizerdes, pois que um e outro é tido por mais provável por grandes homens. Finalmente, como não con­vem ter por maxima geral o seguir sempre as opiniões bení-

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goas, Dão convem igualmente que adopleis como principio immutavel o seguir sempre em iguaes controvérsias os senti­mentos mais severos. Mas brevemente, em o n.® 92, vos in­dicarei os expedientes de que podereis servir-vos em seme­lhantes occasiões.

83.— Segue-se do que dito (ica, que o probabiliorismo bem p proba- entendido c retido em seus justos limites não poderia ser al-Kp,^cnJ?n cunhado de rigorismo no sentido odioso e reprehensivel djdo não" d’esta palavra. Esta nota de rigorisrao deve ser reservada póde ser para o luciorismo, que, como temos visto, traz comsigo in- accusado numeráveis inconvenientes. Não é o mesmo a respeito do probabiliorismo: elle quer, na verdade, que se adhira á opi- 'nião mais provável; mas isto quer dizer, cm um sentido mo­derado e discreto, que sómcute rejeitando a opinião menos

Erovavel ou igualmente provável, não vá até exigir a proha- ilissima. Quando elle ensina que se deve seguir a opinião

mais segura, não diz isto em favor do tuciorismo, como se .elje adoptassc a maxima, que üeus imputa a peccado a acção feita na dúvida, mesmo fraca, do pcccado material; elle quer dizer sómente contra os probnhilistas que, na dúvida mais grave ou igualmente grave do peccado material, não é per­mittido obrar; que, para tornar uma acção formalmente líci­ta, é necessário que ns razões de seu licito material, ainda que Dão sejam nem certas, nem probabilissimas, sejam to­davia mais sólidas c mais prováveis que as suas contrarias.N'este caso o prohahiliori.sta sustenta a parte benigna de seu systcma. An opposto dos lucioristas, permitte o uso da opi­nião mais provável, favoravel á liberdade, ainda que ella não seja 0 meio mais seguro de evitar o peccado material; elle mostra como, seguindo a opinião mais provável contraria à lei, póde formar-se um juizo prático seguro sohre o licito for­mal da acção. Com esta moderação o probabiliorismo está longe do tuciorismo : permitte muito mais cousas do que elle, e prohibe oulras que o prohabilisla permitte. Comtudo suas prohibiçõcs são meuos numerosas e menos difliceis de guar­dar, do que aquellas dos lucioristas. Agora, se á razão se acrescenta a auctoridade, os auctores antigos c modernos que suslentam o probabiliorismo são lão numerosos e tão dis- tmclos, quo de modo uenhum sc poderia alcunhar de rigoris­mo, comtanto que seja hem comprchendido c relido cm seus justos limites. Acrescentae que a Igreja, que lem con- deninado o luciorismo rígido, nunca disse cousa alguma con­tra 0 probabiliorismo bem entendido.

84.— É justo que agora façamos justiça ao probabilismo. 0 probabi- Quaudo é hera entendido e acompanhado das precauções convenientes, não poderá ser accusado de verdadeira relaxa-

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sertaxadoção. Com efleito, deixando de parte o raciocinio, lançae um to relaxa-goipg jg yjju, g muilidão e qualidade de seus defenso- ^ ■ res, e vereis se é possivel que elle conleiiha uma verdadeira

relaxação sem que esla multidão dc illuslres apoiadores o te­nham conhecido. Ora, Tcrillc, em seu livro De Conscientia probabili, conta mais de cento e cincoenta auctores que o sustentam. Elle protesta que não sc guiou pelo dito de ou­trem, mas que leu e vcrilicou elle mesmo os textos originaes de cada um d’elles. Aflonso de Sarasa, que morreu em 1CC7, em sua obra Ars semper gaudendi (part. 2.*, tract. iv in fine, § 6.°) dá um catalogo intitulado: Auctorum centum ocloginta novem, qui impressis libris docucrunt licitum agere ex opi- nionc probabili. Elle os nomeia a todos, cila suas obras, in­dica com precisão o capitulo onde elles ensinam esle senti­mento; adverte além disto que sobrc os cento c oitenta c nove, ha cento e cincoenta e nove que ensinam rormalmenle que se pódc seguir a opinião menos provável. Finalmente, assegura ter lido quasi todos estes auclores, enlre os quaes faz observar que ha um Papa, seis cardeaes, quinze arce­bispos e bispos. Entre os outros achaes doutores de Iodas as universidades, de todas as ordens, de todas as nações, dos

3uaes um grande numero, celebres por sua sciencia e pie- adc, foram os mestres c oráculos de seu lempo. A estes au­

clores, que alé 16ü7 tinham ensinado o probabilismo em obras impressas, deve-se acrescentar hoje uma multidão de outros que, desde esta época até nós, quero dizer, durante o espaço dc mais de cem annos, c mesmo em nossos dias, tôem continuado a sustentar o mesmo sentimento. Ora, á vista d’esle grande numero dc theologos, cuja sciencia, piedade, caracter episcopal c experiencia, lão altamente mandam o respeito, quem ousaria dizer que semelhante doutrina é des- tiluida de fortes razões? quem ousará julgal-a infectada de relaxação?

A Igreja 85.— Mas eu vou mais longe; a Igreja, a quem só pertence 3“ "®“ ®°"'decidir infallivclmente do merecimento de uma opinião, a probabilis-íf?''®]® infligiu a nota de relaxação ao probabilismomo. bem entendido. Na verdade, condemnou o abuso e a falsa

applicação dc seus principios a certos casos e a certas ques­tões particulares, mas nunca o probabilismo era si mesmo e em tbese geral. Ella condemnou, por exemplo, o uso da opi­nião menos provável em maleria de sacramentos, etc.; mas não é isto condemnar o probabilismo bem entendido, pois que elle mesmo exceptua os casos de validade ou quasi vali­dade; nós 0 temos acima mostrado. A Igreja proscreveu um grande numero de proposições particulares como demasiada­mente relaxadas, tendentes a arruinar a observância da lei

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de Deus, e introduzindo a corrupção nos costumes. Isto é verdade; m«s estas proposições particulares eram um abuso, uma má appiicação do probabilismo, de modo nenhum a consequencia legitima de seus principios. E enéclivamcnte o probabilismo ensina muito em geral e condicionalmente, que é permittido seguir uma opinião solidamente provável; mas não diz.ím particular e de um modo absoluto, que csla ou aquella opinião particular é verdadeiramente provável; elle faz abstracçâo do particular e se limita ao geral. Os Sobera­nos Ponliliccs não lôcra pois condemnado o probabilismo em si mesmo. Orn, como seria absurdo concluir dn condenma- ção que elles tôem feito de certas proposições como demasia­damente severas, que elles por islo mesmo lem condemnado 0 probabiliorismo, do mesmo modo se não póde inferir da condemnação de proposições relaxadas que elles tôem repro­vado 0 probabilismo. Mais ainda, por isso mesmo qne entre as proposições condemnadas algumas ha em que se acham estas palavras, probabile esl, como são a 3.“, 44.* c 37.* das proposições condemnadas por Innocencio X I; outras com esla fórmula, probabiliícr exislimo. etc., como é a 2.* proscripla pelo mesmo Papa, est probabilis opinio, etc., que é a 40.* d'aquellas que Alexandre V II condemnou; por isto mesmo, digo eu, sc mostra que a Igreja não olha como reprovado o probabilismo. De outra sorte, sem outra condemnação, ella se contentaria dc deixar o probabile est a todas eslns propo­sições como um titulo de infamia e um signal de reprovação: estas palavras significariam o mesmo que damnatum est, da- mnata opinio est, etc., etc. Pelo contrario, prohibindo que semelhantes proposições sejam dadas como prováveis, a Igreja mostra por islo que o nome provável é um titulo de respeito e de recommendação nas Igrejas Calholicas.

86.— Acrescentemos a islo que ha raais dc setenta annos Ninguém muitas pessoas fazem inslancias á Sanla Sé para obter a con- o di- dcmnação do probabilismo. mas em vão; e a prova de que esla condemnação nunca foi obtida, é que, em todas ns par- mnaro tes do mundo calbolico, um grande numero de doutores lem probabi- sempre continuado, c ainda coniinúa a sustentar o prnbabi- osmo. lismo. Que! sc uma condemnação qualquer do probabilismo jámais tivesse saído do Vaticano, seria pois necessário dizer que tantos sabios e piedosos escriptores, lão instruidos de iodos os decretos ponlilicios e tão religiosamente exactos em regular tudo o que dizem sobre seu ensino, teriam sido so­bre esle unico ponto, de uma lão alta imporlancia por causa da sua inilucncia geral sobre toda a moral, ou bem ignoran­tes, ou bem atrevidos desprezadores das censuras pontifí­cias I Não seriam sómente reprehensiveis os lheologos, o

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corpo venerável dos primeiros Pastores, os bispos mesmos se teriam tornado culpados de uma tão insignc prevaricação, não publicando, como era seu dever, a decisão de Uoma, se ella existe, não se oppondo com toda a sua força a uma dou­trina lão perniciosa, que, ha mais de dous séculos, continua a apparecer impunemente, mesmo em nossos dias, em todos os paizes calholicos. Até aqui a Igreja nada disse do proba­bilismo bem entendido e tomado cm si mesmo. Ora, se a Igreja, ainda que excitada pela imporlancia da queslão c pe­las inslancias dos anliprobabilislas, julgou conveniente guar­dar silencio, quem ousará arrogar-se o dircilo de accusar o probabilismo bem entendido de theologia relaxada?

Nenhuma 87.— Assim, as duas opiuiões relativas ao uso do mais ou das duas menos provável são respectivamente isentas da nódoa de ri-

TfaUivcl 8“ «1® relaxação. E necessário todavia confessar quenos casos "®“ ’ u®’® "®®> odlr® pod®'® gloriar-sc de serem iiifailiveis parlicula- nos casos particulares. Na verdade seus principios geraes res. são santos e legítimos, e, quando são bem appiicados aos ca­

sos particulares, não podem jamais conduzir nem á relaxa- çào nem ao rigorismo; mas é na applicação dos principios geraes e abslractos aos casos dilTiceis e parliculares que o probabilisla e o probabiliorista eslão expostos a illudir-se. üm e outro podem enganar-se, ou por excesso de rigor não reconhecendo por solidamente provável o que para outros será mesmo mais provável, ou aliás lendo como mais con­forme á verdade uma opinião que, melhor julgada, não me­rece mesmo ser chamada solidamente provável. Que isto as­sim é, a experiencia o prova pelo facto mesmo das proposi­ções relaxadas, ou rígidas, enunciadas por uns e outros, sendo aliás em seu systema exactos e prudentes. Poderia ci­tar-vos muitos exemplos; porém limilar-me-hei áquelle que é referido por Arsdekin, em sua Theologia tripartila (tom. II, part. 3.", tract. i, cap. ii, § 6."). Esle auctor diz, que M. Nico- las Dubois, em sua erudita obra sobre as proposições conde- mnndas por Alexandre V II, explicando cada uma d’cstas pro­posições nomeia seus auctores e mostra claramente que a maior parto foram ensinadas por dous anliprobabilislas de­clarados. 0 primeiro é Vicente Baron em sua obra intitu­lada Theologia moralis adversus probabilistas. 0 segundo é Thomaz Furtado em Resoluções moraes. Não é mesmo raro ver em obras dc moral que, sobre dilTereules questões controvertidas, o probabilisla sustenta a opinião mais severa em favor da lei, porque a opinião contraria não lhe parece provável, emquanto que o probabiliorista dcfeude a mais be­nigna c a menos segura, porque a seus olbos ella gosa dc uma maior probabilidade. Eulre outros exemplos, S. Ligo-

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rio, cm sua Theologia moral (lib. VI, Iract. iv de Saer. pan., n.® 440), sobre esta questão: An sit mortale confileri oenia- lia sine ullo dolore, cita tres celebres antiprobabilistas. Na­tal Alexandre, Juenin e Gonet, e indicando o logar de suas obras onde respondem a esta questão, que não ha mais que um peccado venial em confessar-se das faltas leves sem al­guma conlricção. Ora, qual probabilista dirá jámais cousa semelhante? É certo, continua o mesmo S. Ligorio, que um tal sentimento é contrario ao sentimento commum dos theo­logos; elle cita um extenso catalogo, mesmo de probabilis- tas, que estão lirraes em ser uma grave irreverencia para com 0 sacramento o fazel-o nullo, ainda que era matéria leve.E 0 contrario do que ensinam os antiprobabilistas, acima ci­tados. Nem uns nem outros podem gahnr-se de serem infal- liveis, quando, mesmo encerrando sen systeiiia em seus jus­tos limites, elles o appiicam aos casos particulares.

88.— É necessário reconhecer que os erros de relaxação De queou rigorismo, em que uns e outros caíram, não devera ser at-depende atrihuidos nem ao probabiliorismo, nem ao probabilismo; peloj"®‘® contrario, quando se faz uso d’elles com as precauções conve-'"®'’® nientes, se evita igualmente a relaxação e o rigorismo. Com elTeito, é para isto que o probabiliorismo sustenta contra o tuciorisla, que é permittido seguir a opinião mais provável, ainda que não chegue alé á mais alta probabilidade. É tam­bem pela mesma razão que o probabilismo, para evitar a re­laxação, nega que seja permillido seguir a opinião fraca­mente prcvavel. Ora, nenhuma proposição que encrve a dis­ciplina e corrompa os costumes poderá jámais ser chnmada solidamente provável e digna da approvação do homem pru­dente; portanto nenhuma proposição semelhante é ndmillida pelo probabilismo hem entendido: pelo contrario elle rejeita todas aquellas d’esle genero; mas nenhuma proposição soli- damcDle provável causará jámais nem n relaxação dos cos­tumes, nem a ruina da piedade: da mesma fórma, a opinião que demonstra com mais probabilidade a existencia de uma leí que prohibe uma acção, não poderá jámais ser olhada como demasiadamenle severa. Uma igual accusação sómente ao rigorista se dirige; porque elle quer que sejamos obri­gados a adherir á opinião menos provável em favor da lei, porque a opinião favoravel á liberdade, ainda que mais pro­vável, não é todavia nem cerla, nem probahilissima. Certa­mente 03 Soberanos Pontífices, fulminando seus raios contra proposições particulares em demasia relaxadas ou cm dema­sia severas, não teriam poupado suas causas envenenadas, e teriam fulminado o probabilismo c o probabiliorismo, se os tivessem reconhecido como taes; portanto, devemos concluir,

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que nem um nem outro systema, em si mesmos são a origem do rigorismo ou da relaxação, e que os erros de seus defen­sores são um elTeilo da má appiicação dos principios geraes aos casos particulares. 0 mcio de evitar estes erros e estas illusões não é que o probabilismo abrace o probabiliorismo; apesar deste syslema póde-se cair, e elTectivamente se lem caído, como lemos visto, na relaxação. Muilo menos se deve dizer ao probabiliorisla, que se precaucione, que siga e abrace o luciorismo; este remedio seria peior que o mal por causa dos inconvenientes que o luciorismo traz após de si, como 0 mostramos em o n.® 81. 0 remedio consiste na intima união d’estas duas cousas, a saber: um complexo de sãos principios das precauções indicadas mais acima, e a prudên­cia para os appiicar aos casos particulares. Eu digo de prin­cipios sãos, porque sem isto os erros, nos casos particulares, são necessários e inevitáveis; depois prudência para fazer appiicação dos principios geraes, de modo que sensatamente se julgue qual opinião merece ou não ser chamada solida­mente provável. Para islo é nece.ssaria uma prudência acom­panhada dc sciencia, a lim de conhecer todas as opiniões op- poslas; exaclidão que tudo examine: linalmente piedade, que tem a duplicada vantagem de allrahir luzes particulares da parte de üeus, e de ter o coração livre de toda a preoccupa- ção e de todo o espirito de partido. Esle espirito de partido tem um poder incrivel para perturbar o juizo e o entendi­mento, e conduzir ao erro. Ora, todas estas condições de sãos principios, dc prudência, de sciencia, de exaclidão e de piedade, podem igualmente encontrar-se no probabiliorisla e no probabilisla. D’aqui devemos concluir, que um e outro, ainda que um pouco divididos sobre regras geraes, podem todavia, nos casos particulares, ter toda a moderação neces­saria para evitar toda a arguição de rigorismo e de rclaxa- çâo.

Conclusão 89.— Para passar ao verdadeiro lim de toda estn discus- d’esta dis- são. vôde se o que no principio eu vos dizia é verdade, a sa- eussao. tomando as precauções convenientes, não é da

questão do mais ou menos provável que depende, ou não, ter uma sã moral, ser um mestre sabio e um ministro util do sacramento da penitencia? Com elTeilo, se o probabilismo bem entendido não é o laxismo, a moral do probabilisla não póde só por isto ser defeituosa. Se de seu lado o probabilio­rismo Dão póde lisonjear-se de ser infallivel nos casos parti­culares, elle não póde ter a certeza de ser nas decisões par­ticulares mais feliz do que o probabilisla. Ora, como a mo­ral quasi toda versa sobre questões particulares, o corpo quasi inteiro d’esla sciencia poderá porUnlo ser puro no pro-

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babilist», assim como no probabiliorisla. Vôde agora a que vem reduzir-se a grande diiTereuça que se eslabelecc enlre um e oulro. Desde o principio são concordes: 1.", para excluir as questões de Facto e de validade ou quasi validade; 2.°, nas questões em que se não Irala senão do direilo e do licilo, el­les estabelecem unanimemente contra os relaxados, que a fraca probabilidade não basla; e contra os rigoristas, que não é necessário, para que uma acção seja formalmente licita, ter a certeza ou a suprema probabilidade do licito material. Bis aqui agora o unico ponto sobre o qual se dividem: para tor­nar a acção formalmente licita, um exige que a probabilidade que nega a existencia da lei seja maior do que a probabili­dade que a aflirma; o outro se contenta que c.lla seja igual ou mesmo menor. Mas um e oulro explicam o mais ou o me­nos com lanla moderação, que ura não deve chegar á cer­teza, nem á mais alta probabilidade, e que a oulra não deve ser sómente uma probabilidade fraca e leve, inns solida e grave.

90.— Esla differença, já tão pequena em theoria, sc reduz DilTcrença a nada nos casos particulares, ou, por oulra, é pouco prática do .P oha- e de pouco uso. Ella se reduz n nada, quando o prohahilistii Jjo ^oba- e 0 probabiliorisla permiltem a mesma opinião, um dizendo biiiorismo que ella é mais provável, o outro sustentando que ella é mc-na práiica. nos solidamente provável. Ella é de pouco uso e pouca prá­tica, (|uanüo se uão distingue bem qual dos dous partidos oppostos tem a seu favor mais probabilidade, e qual das ra­zões contrarias é a mais forte e mais grave. Islo acontece muitas vezes em moral, principalmente quando, divididos os auctores era sentimentos dillcrenles, cada um quer que sua . opinião seja mais provável. Em caso igual quem poderá já­mais adirmar com certeza de que lado está a maior probabi­lidade? Com elfeito, quer-se derivar a proh.nhilidade das ra­zões intrinsecas? Mas se nenhum dos doutores, que ordina­riamente são homens distinctos por seus talentos, suas scien­cias e seus estudos, póde conseguir esclarecer a questão a ponto de trazer os outros ao seu sentimento, quem póde es­perar de ser mais feliz e mais perspicaz para descobrir n ver­dade? Quer-se julgar d'ella pela auctoridade? Mas sohre cada questão controvertida, será para isso necessário ler lodos ou

Juasi lodos aquelles que a examinaram. Isto não é ludo: epois d’estc trabalho peuosissimo, faltará ainda calcular não

sóraenle o numero, mas o merito dos sequazes dc uma e de outra opinião. Ora, é isto possivel a um coufessor, que deve satisfazer a uma mullidão de penitentes e responder a mil questões? Em iguaes controvérsias é portanto impossivel na prática achar o probabiliorismo absoluto, objectivo e real,

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quero dizer, aquelle que é reconhecido por lodo o mundo como tal. Seria portanto ncce.ssario apegar-se ao probabilio­rismo relativo, privado, pessoal. Mas estabelecer como prin­cipio, que nas questões controvertidas cada um póde e deve seguir 0 que lhe parece raais provável, sem se importar com a opinião dos outros, não 6 um modo que, enlre mil inconve­nientes, abre um muilo nmplo caminho á relaxação? Quanlo não é (le temer que n ccga estima de cada um por sua pró­pria opinião, que sobretudo o amor proprio, iratando-sc de decidir em sua própria causa, que outra qualquer paixão perturbe n vista c faça achar mais razoavel e mais provável 0 que no realidade assim não é? Portanto, em iimitos casos não se póde pôr em prálica o probabiliorismo absoluto nem 0 relativo.

Probabilis- 91.— Por csla c por outras razões, muitos theologos, quemo modc-je bom grado seriam probabilioristas, se vêem obrigados na

■ prálica a contenlarrse com um probabilismo solido e mode­rado. E esla uma regra e um principio de moral que lhes parece, de uma parle, isento de toda a arguição de laxismo, e da outra, mais usual e raais praticavel. Com elleito, os li­mites e as dilTerenças que separam a solida e grave proba­bilidade da fraca c leve, sendo raais sensiveis, são raais faceis de reconhecer; por consequencia, é mais facil ver onde fir­mar 0 pé sem estar sempre na hesitação ou incerteza do mais ou do menos provável; finalmente, sem ser obrigado a passar aos rigores dos tiiciorislas, tanto mais que a estas dif- ficuldades práticas para reconhecer em mil circumstancias a maior ou menor probabilidade, eslão expostos não sómente os theologos imberbes e de ura pequeno saber, mas tambem 03 homens consummados no ensino e no estudo. Tal era cer­tamente 0 reverendo Padre Roncaglia; ouvi não obstante o que elle diz em sua Moral: Confessarius, poslquam diligenter morali stvduit lheotogiee, me auctore, non anxius sit circa illam tam agitatam qucestionem, an sit licitum sequi minus probabile in conspeclu probabilioris. Probabiliora sequenda docuit me meus preeceptor, et pariter ego pluribus ab hinc annis eamdem docui sentenliam; at experimento vidi nihil ad praxirn deservire. Quis elenim, vel studendo, el prcecipue dxm audit confessiones, potest omnia momenta utriusque partis librare, et inde definire: Hoc est minus probabile? Hoc est onus intolerabile. Satis milii fuit in praxi sequi sententias quos rationabili fundamento innixas pulavi, et ita credidi satisfecisse mem conscienlce absque eo quod judicem me con- stituerem inter minus probabilem et magis probabilem. (Tract. I, de Act. hum., cap. ii, § 2.)

Modifica- 92.— Eu não exijo tanto de vós; abraçae, se quizerdes, o

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Írobabiliorismo, mas evitae cair no tuciorismo. É para vos oücs ad-eixar esta liberdade, que eni todas as minhas instrucções ™ ‘J|das

precedentes cuidadosamente eliminei as palavras mais o«P j.iidos menos provável, a lim de não fazer depender d’esta questão 0 valor e o fructo do que eu tinha a dizer-vos. 0 mesmo será até ao fim; nada vos direi que não possaes confessar e ad- mittir como sendo o mais util para a gloria de Deus e salva­ção das almas. Eu tenho levado mais longe minhas vistas; para maior segurança, meu primeiro cuidado, em ludo, foi de reconhecer e seguir os sentimentos dc muitos doutores, igualmente respeitáveis por sua sciencia, por sua experien­cia no ministério do tribunal e direcção das consciências.

É lambem a razão da conducia que guardei quando che- li ao modo de vos dirigir nos casos forlemcule questiona-

entre os lheologos. Alli, onde parecia inevilal o pôr-mc em contrariedade com um dos dous syslemas, vos indiquei (□.”• 64 e seguintes) tres modificações igualmente admissí­veis pelos probabilistas e probabilioristas. Eil-as aqui; 1.", ou de guardar silencio c deixar o penitenle na boa fé, quan­do elle ignora a obrigação que faz o objecto da controvérsia, havendo motivo de receiar que, sendo advertido, a não cum­pra; 2.", 011 de procurar entre os sentimentos oppostos um partido medio que comprehenda o que tem de bom os outros dous; 3.", ou, se islo não é possivel, aconselhar a opinião mais segura, sem fazer d’ella uma lei, e permittir, segundo a ne­cessidade, 0 uso da opinião benigoa, ao menos quando á so­lidez das provas se reune a vantagem espiritual do penitente: tudo islo a (im de não o expor, pela opinião severa, ao p&>Tigo de peccar formalmente, se acontecer não se conformar com ella. Orn, esle terceiro partido não deve inspirar-vos inquietação alguma, se 1." altenderdes ao que acontece quasi sempre na prálica: é que nas questões vivamente agitadas, cada opinião é dada por seus sequazes, não sómente como provável, mas como mais provável: oro, n’este caso podeis, sem fazer violência a vossos principios, abraçal-a e scguil-a; se, 2.® á solida probabilidade da opinião benigna sc junta a vantagem e.^piritual do penitente, nãu podeis negar que seja ella a melhor, tanto para procurar seu maior bem, como para evitar um maior mah Ora, vós não tendes o direito de lhe impor vosso systema, nem de o julgar iudigno da absolvição, se elle quer gosar da liberdade que outros auctores lhe con­cedem, fundados em sólidas razões. Portanto, vós, que no tribunal da penitencia não sois sómente doutor, mas Umbem medico, podeis e deveis usar d’esla liberalidade discreta e prudente.

Com effeito, a principal enfermidade que em qualidade de

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medico deveis remediar, é o peccado Formal, que dá a morte á alma; não é o pcccado material, quando, como no caso de que se trata, não poderia ser imputado como peccado ao pe­nitente que de boa fé corre o perigo de o commetter. Não julgueis que eu sou demasiadamente indulgente com a fra­queza do penitente; não é esle o ensino de um doutor parti­cular, é a doutrina formal do trigesinio-sexto synodo de Mi­lão: cis aqui o que em seu terceiro decreto clle“diz: Confes- sarii ne nimis curiosi sint in indagandis circumstantiis, ma- xime personarum.... qua non faciunt ad inlegritalem confes- sionis et omnino acquiescant opinioni probabiti panitenlis, ne maxime reddant sacramentum tanta necessitatis odiosum. As­sim 0 altcsta um digno prelado desta cidade em sua obra: Selecta ex singulis theologia moralis traclalibm; Mediolani, iJ iS .ap u d Agnellxm Franciscum. Ficareis portanto livre em geral de seguir o probabiliorismo bem entendido e acompa­nhado de excepções convenientes; mas nâo façaes do proba­bilismo hem entendido um objecto de desprezo, um objecto de escandalo e de censura. Concordae que o probabilista póde tambem, na appiicação de seus principios, reunir uma prudência, uma sciencia, uma exactidão taes, que lhe dêem em suas opiniões uma verdadeira e solida probabilidade, e lhe façam assim evitar a relaxação. É por isto que eu sem­pre tive como injustos estes prohabilistas, assim como estes probahilioristas, que, admiradores exclusivos de seu syste- ma, assim que sabem que um auctor é de dilTerente opinião, logo, e sem oulro exame, o desprezam, não o lôem, desviam os outros de o lerem, e conceituam aquelle que o estuda como um homem illudido que pecca de relaxação ou rigoris­mo. Pela razão inversa, assim que sabem que um auctor é de sua opinião, imraediatamente e só por islo lhe consagram sua eslima, o exaltam e o preferem exclusivamente a mil ou­tros de um sentimento opposto.

Quaes sc- 93.— Quanto á vós, sereis mais justo, e me confessareis iam os mc-que não depende dc modo algum d'esta questão o ser um sa- ihores au- |)íq um auctor de moral. De uma parte fazer uso de pre- mora* “ cauções convenientes para pôr ao abrigo de relaxnção e de

rigorismo o probabilismo c o probabiliorismo; da oulra parle saber appiicar com prudência seus principios geraes ás ques­tões particulares, e ter muilo hom senso para não dar como provável ou como improvável o que assim não é: são estas as condições da sã moral. É o motivo por que, na escolha dos auctores para ler, se deve preferir aquelles que lèem pieda­de, por consequencia que não são inspirados pelo espirito de partido, mas por ura zelo sincero da gloria de Deus; que a uma grande sciencia reunem a prática do santo ministério,

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um bom juizo e o talento cie apreciar as cousas em seu justo valor. Ora, auctores d'cste caracter e d’estc merito os acha­reis entre os probabilioristas e entre os probabilistas. Assim vos privarieis de ura grande soccorro no estudo da moral, se, por aversão ao probabilismo, desdenhasseis ler seus aucto­res, como se n’elles houvesseis de encontrar tantos senti­mentos reia.xados, quantas decisões. Certamente não é assim que pensava Bento X IV. Muitas vezes o vereis era suas obras citar com louvor os auctores probabilistas. Quereis for­mar vós mesmo vossa convicção? basta-vos abrir as obras de um grande numero, nas quaes achareis, com a plenitude da sciencia, o conhecimento exacto dos Santos Padres, dos con­cilios e dos cânones, c uma sábia apreciação das razões dos dous partidos. Então sereis obrigado a concordar que os mo­tivos dc suas decisões são muito solidos, e que elles dão ás objecções respostas capazes de satisfazer a todo o homem justo e prudente, tanto quanto se póde pretender em maté­rias por tal fórma obscuras e controvertidas, que ninguém até hoje pôde esclarecel-as de modo que dissipe todas as dú­vidas. Mas quaes são estes auctores tão recommendaveis?Não vol-o direi. Podeis rcconbecel-os pelo credito universal de que elles tôem gosado c de que elles gosam ainda no pu­blico; porque a vista do publico, composta, para assim dizer, de tantos milhares de olhos, não se illude. Esla estima pú­blica sc manifesta tarabem pelas multiplicadas edições de suas obras, bem que volumosas e caras, sem que o espirito de partido tenha algum poder sobre o séquito d'esles aucto­res probabilistas; prova evidente que o prodigioso successo de seus escriplos deve ser allribuido a seu credito inlrinseco.

94.— Sede portanto, á vossa escolba, probabilisla ou pro- Conselho babiliorisla, raas não desprezeis os auctores de algum dos P.®''® ® dòus partidos. Toraae por objecto dc vossas leituras aquelles que, segundo o testemunho commum, tôem empregado as modilicações convenientes, a lim de evitar o rigorismo e a re- laxaçâo. Todavia ura erro particular não deve tirar-vos a es­tima' e fazer-vos renunciar ao uso de um auclor, comtanto que cllc seja exacto nos principios geraes c no todo dc suas decisões sobre esla multidão de matérias de que se compõe a moral. Não ha dúvida que deveis abandonnl-o quando erro; mas sobre o resto póde ainda ser-vos de ura graode soccorro: o sol tem manchas, e comludo é o pbarol do mun­do. Esla razão, portanto, não basta para o desprezar; de ou­tra sorte devcrieis abandonar quasi todos os auctores proba- bílistas c probabilioristas. Com elfeito, é bem dillicil e bem raro achar um que, tendo composto muilas obras, ou mesmo um só volume, ura pouco considerável, sobre todas as ques-

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lões, (que digo eu?) sobre as principaes questões da moral, não lenha mostrado em certos casos particulares que cra um homem sujeito ao erro, e que, cm certas decisões, não tenha exorbitado d’essa exactidão e d’esse juizo recto, de que dá provas em tudo o mais.

Necessida- 9o.— Por tudo o que dito fica, vôdcs claramente que, di- de da dis-zendo-vos que sejaes discretos em vossa moral, minha inten- fe Sd o ." ’ ?®® "®® "«j®®® probabilisla antes do que probabilioris-

ta; quero sómcnle que vos conserveis nos limites dos dous systcmas, a fim de evitar os extremos viciosos, inevitáveis sem esta precaução. Vossa primeira queslão fica portanto cla­ramente resolvida; quanto á segunda, a saber: cm qual dos dous extremos é mais facil cair, e qual é mais funesto para a gloria dc Deus e salvação das almas? achareis successiva- nienle a resposta no que me resta a dizer-vos. Todavia, como não deixa dc ser fncilimo cair cm um ou no oulro, e ambos sejam extremamente funestos, permilli que a todas as observações precedentes acrescente aqui seu retrato, a íim de vos inspirar por elles toda a aversão possivel.

ARTIGO V

Males cau- 90.— 0 confessor póde cair no rigorismo e no laxismo, in-®pf°® P?‘®terrogando. instruindo, absolvendo, despedindo o penitente.

■ A negligencia na interrogação impede de descobrir, de apre­ciar c de tratar convenientemente o mal no coração do peni­tenle. {Vêde n.®‘ 30 e seguintes.) 0 laxismo nas decisões que dá como doutor, prejudica n lei de Deus. As dispensas abusivas e imprudentes auginenlam, auctorisam n desmora- lisação c as desordens, escandalisam os bons e animam os máus. (N.»71.) A facilidade de absolver como juiz aquelles que não estão dispostos os enlretem por longos annos em seus máus hábitos: umn multidão dc obrigações graves e ur­gentes de restituição, de reconciliação, de reparação, de es­candalo, licam sem cumprimento. Assim lorna-sc para elles não sómente inutil, mas sacrilego, o uso dos dous maiores sa- cramento.s, a Conlissão e a Communhão. Que contas não terá de dar a Deus o sacerdote que, por se não dar ao trabalho do estudar mais, a lim ,1c ser mais exacto no exercicio de suas funcções, deixa commelter tantas oITensas de Deus, tantos peccados que, muitas vezes, conduzem as almas á condemna­ção! Que luto para n Igreja ver os mais augustos sacramen­tos freqüentados com tão pouco fructo I D iiqui os gemidos dos bons, o triiimpho dos impios e dos hereges que tomam por isto occasião dc negar, uns a eflicacia, outros a existen-

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cia mesmo dos sacramentos. Até os iníieis, vendo a corru­pção destes christãos por outra parte exactos em freqüentar 03 sacramentos, perdera toda a estima pela religião, e recu­sara abraçal-a.

97.— 0 rigorisrao não é menos funesto. Muitas vezes o Males cau- excesso nas interrogações ensina a malicia ás almas innocen-s?dos pelo tes, escnndalisa as pessoas casadas c pudicas, expõe o peni-tente c o confessor ao perigo dc peccar, desacredita o minis­tro e 0 ministério. A severidade nas decisões, cujo lira é evi­tar 0 perigo do peccado material incerto, expõe a peccados formaes certos, torna odiosa a lei e o legislador. (N.®* 59 e se­guintes.) 0 excesso de rigor nas senlença.s é nocivo áquelles que eslão bem dispostos, privando-os do benelicio da absol­vição. (N.®* 70 e seguintes.) Mas sobretudo o rigorismo n’es- tes tres pontos, ou mesmo cm um só, torna a conlissão difli­cil, penosa, odiosa aos lieis; ora, quando elle não produzisse mais do que este mal, islo só o tornaria inlinilamenle mais funesto que a rclaxação mais excessiva. Pnra o conhecer bem notae o seguinte.

98.— Se 0 sacramento da penitencia só fosse de simples Elle desvia conselho, ou se, sendo de obrigação, a prática d’elle fosse fa-cil, ou linalmente se, sendo obrigalorio e dilTicil, fosse de ' pouca imporlancia, seria um pequeno mal o tornal-o odioso e penoso aos lieis; mas tudo é pelo contrario. Esle sacramenio é ao mesmo tempo indispensavelmente necessário, não uma vez na vida como o baptismo, mas tantas vezes, quantas se trata de recuperar a graça perdida por um peccado mortal; elle é além d’isto extremamente diflicil, e Deus tem lodo o direito de exigir isto do peccador. Além da difliculdade de uma conversão sincera e eíTicnz que Iriumphc de todos os obstáculos, a conlissão exige a accusação não vaga, mas pre­cisa da qualidade, do numero e das circunislaucias dos pec­cados, com a aceitação de uma penitencia grave, imposta ao arbítrio, não do penitente, mas do confessor. Elle é tambem de uma utilidade inexprimível pelo que o precede, o acompa­nha e se lhe segue, seja por sun própria natureza, seja pelos felizes accidcnles a que elle dá logar. Muitas vèzes, antes de se confessar, só o pensamento de que se deve fazel-o, se torna um freio ao peccado e um estimulo para o bem. Cada um diz comsigo mesmo: Se eu pécco, será necessário confes­sar-me: eu vou fazer este bem, porque devo confessar-me tal dia. Depois da conlissão se diz lambem: Hoje ou honlem me confessei, e é este um motivo para não recair e para conti­nuar a praticar o bem. 0 exame, os aclos de arrependimen­to, a resolução mesma de se coi\fessar, procuram a Deus uma grande gloria e ao justo grandes merecimentos. Quanto ao

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peccador, é aos olhos da misericórdia divina o meio mais se­guro c mais poderoso para o dispor a ohter seu perdão. De­pois a conlissão, junta á absolvição, lava o peccado e liberta da pena eterna, da forças para não recair e para passar uma vida nova e fervorosa. Depois da conlissão, os bons conse­lhos do confessor sobre os meios de eviiar as occasiões, de cumprir seus deveres, de vencer as tentações e de alimentar a piedade; o pen.«amcnto de que sc póde subitamente morrer,

Jue Deus nos vigia sempre; a lembrança dos exemplos de csiis Christo c dos santos; as boas obras aconselhadas ou

imposlas por penitencia, como são leituras, meditações, mis­sa, rosário, etc.; tudo isto, graças á benção que Deus espalha sobre as palavras do sacerdote, que no sacramento é verda­deiramente seu ministro e seu representante, tudo isto, digo cu, tem uma efficacia particular para instruir c animar o pe­nitente na actualidadc e muilo tempo depois. Quantas novas graças não collie elle mesmo de sua lidelidade cm praticar todos estes conselhos! Finalmente, a conlissão das faltas gra­ves é necessaria por preceito divino para se apresentar á mesa eucharislica, a esta mesa, que, 1.” est antidotum quo a peccatis mortalibus prwsermmur et a quotidianis culpis li- beramur: 2.” cibus quo alunlur et confortantur viventes vita illius qui dixit: (Jm manducat me vivet propter me; A." est pignus ccelestis gloriw. (Cone. Trid., sess. 13, c. ii.) Muilas vezes lambem a communhão abre o thesouro das indulgên­cias; ora, se uma só confissão produz tantos bens, quem po­derá calcular todos aquelles que trazem comsigo a frequen­cia dos sacramentos, c o uso continuo d’esles meios simulta­neamente remedios para o passado, preservativos para o fu­turo, soccorros não sómente para evitar o mal, mas lambera para praticar o bem de obrigação e dc conselho?

Elle dá 99.— Ora, 0 rigorista augmenlando a dilliculdade, já tão grande P®r ®i mesma, do sacramento da penitencia, se expõe

desordens.®® pcrigo proximo de privar, por um só acto, de todas estas vantagens tão necessarias e tão preciosas quasi todos os peni­tentes que a elle sc dirigem, e islo não por uma vez sómen- le, mas quasi para sempre. Com cIFeito, apenas se atreve a absolver um só; e sc o absolve, dc lal sorte o faliga com in­terrogações, dc lal sorte o sobrecarrega de penosas e indis­cretas obrigações, que lhe lira o animo dc voltar, ou ao me­nos 0 gosto da prálica frequenle c sempre saluUir dos sacra­mentos. Ora, privar dc tantas vantagens quasi todos os pe­nitentes e quasi para sempre, é acaso um pequeno mal ? Mas eis aqui outro muilo mais grave: quem poderá imaginar as desordens dc todo o genero, que, multiplicnndo-se rapida­mente, arrastarão á sua ruina, tanto estes penitentes desani-

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niados, como aquelles a quem a vista de seus escandalos ti­ver seduzido? Devemos dizel-o cm uma só palavia. Não sc póde causar aos fieis um maior damno do que arredal-os dc um sacramento tão util, tão necessário, e por si mesmo tão diflicil. Ouvi em que termos o Catecismo Romano falia da conlissão (na parte 2.*, conf. n.® 36): Quantum vero curie et dilif/entia in ea expHcanda pastores ponere debeant, ex eo facile intelligant, quod omnibus fere piis persuasum est quid­quid hoc temporc sanclitatis, pielatis et religionis in Ecclesia summo Dei beneficio conservalum esl, id magna ex parte confessioni tribuendum esse, ut nulli mirandum sit humani generis hoslem, cum fidem calholicam fundilus evcrtere cogi­tai, per ministros impielatis sum, et salelliíes hanc veluli christiana: virtulis arcem lotis viribus impugnare conatum esse. E em 0 n.° 37: Constai enim, si sacramenlalem confcs- sionem e cbrisliana disciplina exemeris, plena omnia occul- tis et nefandis sceleribus futura esse, quie postea, et alia etiam multo graviora, homines, peccali consuetudine deprava- ti, palam committere non verebunlur. E em o n.® 50: Sed nulla res fidelibus adeo curce esse debet, quaà ut frequenti peccatorum confessione animam sludeanl expiare. Etenim, cuin aliquis mortifero scelere urgelur, nihil ei magis salutare esse potest ob multa, qua; impendent vilw pericula, quam sta- tim peccata sua confiteri.

100.— 0 confessor rigido corre portanto o risco de causar Exemplo indirectamente aos (ieis e á Igreja mais damno do que se here- impedisse as prédicas, a missa e todos os outros meios de® salvação. Julgando fazer servir a Deus mais perfeitamente, conspira, sem o querer, com os demonios e inimigos da Igreja, para a ruina do mais solido e mais forte esleio da re­ligião e do reino de Jesus Christo; elle abre a poria a desor­dens infinitas, secretas a principio, depois publicas e geraes.E quaes são elTeclivameute os mais perversos e os mais es­candalosos de ordinário? Não são aquelles que freqüentam os sacramentos, mesmo quando se confessam a um confessor um pouco indulgente e com pouco fructo; mas sim aquelles que só raras vezes se confessam ou absolutamente nunca.Eis aquelles que excedem infinitamente todos os outros pela gravidade, continuação, publicidade, e para assim dizer, in- corrigibilidade de suas desordens. Isto é verdade, que como refere Domingos Solo, os hereges mesmos, tendo visto por experiencia que, depois de ler abolido a conlissão na Alle- manha, o vicio pullulava de todas as parles, os roubos e as injustiças se multiplicavam cada dia enlre elles, e que nin­guém estava seguro de seu vizinho, os mesmos hereges suppiicaram a Carlos V que fizesse uma lei para os obrigar

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todos a confcssar-se, attendido que, desde que se nSo confes- savam, não podiam viver em paz uns com os outros. (Tom.I, in 4 sent. d. 18, q. 1. arl. v.)

Eis aqui o que aconteceria entre nós os catholicos: se o rigorismo se tornasse commum entre os confessores, os po­vos se arredariam cada vez mais da frequencia dos sacra­mentos, que é todavia o melhor freio para o peccado, e o mais forte baluarte contra toda a especie de desordens.

Compa- 101.— .Agora, não para defender os relaxados, que de ração dos modo nenhum o merecem, mas pelo mesmo espirito que mo-

^ jo | “ “ ’ veu S. Boaventurn a comparar entre si a consciência dema- relaxaçãocsiadamcnte larga e a consciência demasiadamente apertada, rigorismo. e a dizer da primeira que swpe salvat damnandum, e da se­

gunda que damnat salvandum, comparae os damnos causa­dos por um confessor relaxado com aquelles do confessor rí­gido, c vôde a differença. 0 relaxado priva, é verdade, os fieis de um bem muito maior que pela discrição e exaclidão poderia procurar-lhes, e dá occasião a grandes males por sua excessiva indulgência. Todavia, sómente porisso que deixa aos bons e aos máus um accesso facil e livre á conlissão fre­qüente, ainda que relaxado seja, é ainda util: 1.® aos bons, que de sua parte se preparam convenientemente; 2.® aos peccadores que o são, para assim dizer, por infelicidade e por accidenle, quero dizer, áquelles que, habituados a viver bem, cáem por accidenle em algum peccado mortal. Oppri- midos de um peso desusado, promplamcnte se arrependem e de lodo 0 seu cqração, sómente experimentam uma grande vergonha cm liioslrar-sc tão dilTerentes do que eram ordina­riamente: ora sua felicidade c sua grande consolação é saber de um confessor que os receba com bondade e com terna compaixão. 3.® Quanto nos grandes peccadores, ou que não cumprem as suas obrigações ou quo sc não lêem emendado de seus niãus hábitos, verdadeiramente por sua demasiada indulgência lhes é nocivo; comtudo não deixa dc lhes ser ainda de alguma utilidade. Com elTeito, 1.® se os não dispõe a que façam com Deus uma verdadeira paz que os justifi­que, ao menos fazem Iregoas de algumas semanas ou dc al­guns dias, durante as quaes se abslôcm de peccar, porque elles sáem animados pnra o bem e levando a lembrança de algum bom pensamento; as bons obras que lhes impôz de pe­nitencia os preservam dc novas faltas, ou ao menos tornam suas quédas menos freqüentes; 2.® demais, resta-lhes a es­perança de que se converterão um dia sinceramente. Eis aqui a razão d’isto. Perdendo, graças á sua bondade, exces­siva scra dúvida, a repugnância de se confessarem, não é diflicil que uma leitura de piedade excite n’elles ura desejo

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mais eflicaz dc sc emendar, que o rosário ou a missa im­posta por penitencia lhes obtenha a gr.ica, se recaírem no peccado, dc recorrerem mais promptamente no remedio da conlissão. É assim que, achando tudo Tacil com este confes­sor, e julgando que todos são como elle, não hesitam, em caso de necessidade, em dirigir-se a um outro. Deus os con­duz a um confessor discreto, que mistura o vinlio c oleo, abre-lhes os olhos, faz-lbes conhecer a evidente nullidade dc suas conlissões precedentes, e por uma conlissão geral re-

fiara de uma só vez todos os males que o confessor rcia.xado inba feito durante muito tempo, c salvnm-se.

102.— 0 contrario acontece ao coufessor severo. D’entre coniinua- cem não ha um, depois de exceptuados dous ou tres, que ção. volte aos pés delle. Isto não é tudo: siippondo que todosos outros são como elle, demoram o dirígir-sc a um confes­sor qualquer. Altendeudo: 1.', a que mais não ba d’estas tregons, duranle as quaes ao menos os peccadores cessavam de oITi-ndcr a Deus; 2.°, a que a volta á conlissão sc torna mais dillicil por novos peccados; 3.°, que, dimiiiuida a es­perança de uma conversão, eis ahi mais bem fundado o re­ceio de que a ninguém se confessem, excepto cm um caso extraordinário, excepto se Deus mesmo os não conduz a um confessor discreto, ou que, ouvindo fallar de confessor rela­xado, que tudo passa, não se disponham de seu molu-proprio e vão ler com elle. Assim relaxado como é, esle confessor não deixa de Ibes ser ainda, ao menos por accidenlc, bom e util. Os bons mesmos, debaixo da direcção dc um confessor rigido, perdem a facilidade e logo o habito de freqüentar os sacramentos; c, depois d’csla desgraça, se fazem, ai! tão perversos como os oulros.

103.— Assim, pondo de parle o que póde merecer ou des­merecer por sua boa ou ma intenção, não considerando mais d« _ que sua conducla para com os penitentes, de quem póde oni®' confessor rigido esperar a recompensa? De Deus não, cuja causo tão mal sustenta, que não sabe nem entreter os bons no uso dos sacramentos, uem obter dos máus algumas ire- goas a esla guerra contínua que fazem a Deus. Lougc d’islo, por seu rigorismo os conduz á desesperação, e os iuipelle ra­pidamente ás mais incomprchcnsiveis desordens. Dos lieis não, que ordinariamente não acbani no confessor rigido nem compaixão, nem remedio a seus males. Com elfeito, npenas elle ouve uma falta capaz de o embaraçar e de Ibe fazer te­mer de compromeller a validade do sacramento, logo, sem examinar mais se esle máu habito eslá já uolavelnienle emendado, se esla occasião próxima poderia tornar-se re­mota, se 0 pagamento d’esia divida poderia díifcrir-se, com-

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mummente tudo corta, dizendo: Ide, fazei, e voltae, sem de modo algum procurar os meios, nem os motivos os mais pro­prios a ajudar os penitentes. Finalmente, da Igreja não, que vô ns fontes da graça, seus sacramentos abandonados; os en­fermos, retirados dos mcdicos e privados dos remedios, peio- rarem manifestamente; as ovelhas, fugindo para longe de seus pastores, correr através dos precipícios até que n’elles encontram a morte. .Assim, emquauto que os hereges des­viam os cntiiolicos dos sacramentos, negando sua existencia e sua instituição divina, o rigorista, sem o querer c contra sun intenção, caminha a esle deplorável (im por uma outra estrada, fazendo seu uso muito diflicil nos lieis.

Historia 104.— Aqui eu vol-o confesso; ob! quantas vezes me te- coniadanho sentido penetrado da mais viva dor, vendo tantos dignos Pgonfe cheios de zelo e de piedade, mas cuja cduca-sor. Ção ou leitura exclusiva de auctores famosos por seu rigo­

rismo ou pouca habilidade na sciencia ascética, Ibes apertou 0 coração, animados por outra parte da mais santa intenção de conduzir as almas á perfeição, vendo-os, digo eu, incuti­dos de terror, não se atreverem a confessar, ou, se elles con­fessam, lançar, sem o querer nem o saber, as almas na per­turbação e terror! Ai! sem ao menos o suspeitarem, traba­lham para o mesmo lim que os inimigos secretos da Igreja Catholica. Resolvidos a aniquilal-a, estes põem em acção ar­tificies mais occultos e mais funestos que aquelles dc Luthero e de Calvino. Elles começam a arruinar o uso dos sacramen­tos, não negando sua existencia como fazem os hereges, mas exaltando de tal sorte sua santidade e a excellencia das dis­posições necessárias para os receber, que os fieis aterrados perdem a esperança c mesmo o pensamento de levar jámais semelhantes preparações, e abandonam a prática delles. E com este fim diabolico que elles tôem composto c dissemi- nádo uma multidão de obras sobre ns disposições para a con­fissão e communhão, sobre as qualidades nccessarias aos con- fessóres. Aquelles que não estão prevenidos, ou que estão mal instruídos de seu pensamento encoberto, não vôem n’isto mais do que a santidade n mais perfeita, c a moral a mais segura; mas na prática fazem que ninguém ouse mais apro­ximar-se aos sacramentos. Lembra-me a este proposito ter ouvido, ha muitos annos, contar o facto seguinte no confes­sor mesmo a quem aconteceu. Na guerra de 1733, um sol­dado francez passando pela Italia, foi confessar-se. Interro­gado desde que tempo o não tinha feito, respondeu n’estes termos: «Da dezoito annos; porque tendo ido confessar-me na minha terra, e não tendo faltas muito graves, meu confes­sor acabou perguntando-me se eu amava a Deus de todo o

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meu coração, de modo que não amasse creatura alguma em particular, minha mulher e meus lilhos. Eu lhe re^ondi, que na verdade sentia para com elles uma grande alfeição.Ide, me diz elle, rogae a /im de a perder e de poder amar a Deus só e puramente; assigno vos quinze dias e vollareis.Voltei; perguntou-me se eu tinha renunciado a esla alVeição por minha familia. Rcspondi-lhe que tinha orado; mas que quanto mais orava, menos me parecia estar áqiiillo obrigado: pelo contrario, mc parecia que era obrigado a amar minha mulher, meus filhos e as cousas dc minha familia. Ide, me diz então este confessor, não sois digno da absolvição. De tal sorte descorçoci com esta conducta, que desde então nâo voltei nem a elle, nem a outros.» Foi isto por que cllc era do numero d’aquellcs que, debaixo da apparencia da santidade, occultam o projecto de abolir o uso dos sacramentos, ou foi sem malicia e por ignorancia que esle confessor assim obra­va? Não sei. Mas o que sei com certeza é que esle pobre soldado linha sobre a consciência dezoito coniiiuinbôes omit- lidas, quero dizer, peccados que, por seu numero c qualida­des, eram muilo mais graves do que aquelles de que era cul­pado quando foi confessar-se na sua terra. Sei que este con­fessor conseguiu muilo bem, se tal era o seu lim, o desvial-o dos sacramentos; sei finalmente que, querendo tirar-lhe o amor dc siin familia, não sómente íicou mallogrado, mas tom­bem lhe fez perder o amor de Deus, e a obediencia á Igreja pelo espaço de dezoito annos.

105. — Um sabio escriplor refere que, viajando por certa Outraliis- provincia, perguntara a um homem se em sua terra eraraioria. piedosos. Elle lhe respondeu que ó parocho antigo, cujo go­verno era tão proveitoso, linha fallecido, e que o novo a ninguém dava a absolvição; que para a obter era necessário diabolice mentiri, quero dizer, com nlrevimcnlo c obstina­ção; que, tendo assim mentido na confissão, fora elle o pri­meiro que obtivera a absolvição do novo parocho. 0 peni­tente enganado por tua própria mentira! Mas, ó parocho im­prudente em teu rigor, que assim irapelles ou para o abuso do sacrilégio, ou para o abandono faUl dos sacramentos! Não vos deixeis portanto enganar com a apparenein dc santidade que odercce ao primeiro lance de vista a moral rígida; ella parece o meio mais seguro dc aquietar vossa consciência e a consciência dos outros, e de procurar a maior gloria de Deus. Sim, ella o parece; mas não é assim na prática. Pelo contrario, .é o meio de fazer abandonar a religião, dc des­animar e perverter os fieis. Julgaes directe et immediate pôr- vos, e tambem aos outros, fóra do risco do peccado. mas in- directe et consequenter vos fazeis culpado de mil peccados,

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VÓS por vossa imprudência, e vossos penilenles pela deses­peração.

Falsas ma- 106.—Vou preraunir-vos ainda mais contra as falsas ma- ximas dosximas dos rigoristas e relaxados. Tudo que até aqui tenho rigonsias. conhecer que debaixo d’esle nome não com-

prehendo nem os probabilioristas prudentes, nem os proba- bilislas discretos, mas sómente aquelles que ultrapassam os limites d’cstes dous sy.slemas. Bastantes instrucções vos te­nbo dado; mas pelo que respeita a vosso ensino como doutor, basta-vos conservar dc mcmorin a advertência dc Santo Am- brosio, que Ipse limor Domini, nisi sit secundum scienlinm, niliil prodest, immo obest plurimum. Sunt eliam in nobis, qui liabent timorem Dei, sea non secundum scientiam statuen- tes duriora prcecepta, quce non possit humana condilio susti- nere. Timor in eo esl quia viaentur sibi disciplina; consu­lere, opus virtutis exigere. Sed inscitia in eo est, quia non compatiuntur naturee, non eeslimant possibilitatem. [Com. in ps. H 8 , serm. o, vers. 6.) Quereis evitar os dous escolhos? Não façaes consistir nem a santidade, nem a cxactidão dc vossa moral em tirar ou cm multiplicar os mandamentos, mas em procurar a observância d’aquelles que são certos. Quanlo áquelles que são duvidosos, não vos contenteis com uma fraca probabilidade para os dispensar; mas embora seja solida e grave, não vos façaes por islo o protector das op - niões benignas: ou lomae um termo medio, ou guardae s - lencio e deixae na boa fé, ou permilli a opinião beuigna se a vantagem do penitente assim o pede. Ja vol-o disse (n ." 64 e seguintes). Passo agora á vossa qualidade de juiz no tribunal da penitencia. Para começar pelos rigoristas, não vos deixeis seduzir pelas maximas sobre ns quaes elles fun­damentam seu modo de administrar esle sacramento. Melius est, dizem elles, quod wger pereat oi morbi, quam vi medici- ncB. Esla maxima é verdadeira, mas csla outra c mais ver­dadeira c mais util ainda: Ne ccgcr pereat vi morbi, scire aplare medicinam, qua convalescat; e vos tenho mostrado o modo de o fazer pela discrição, caridade e habilidade reuni­dos. Com estas qualidades conbecem-se, põem-se em acção os meios os mais exactos e prudentes para bem dispor o pe­nitente e absolvel-o cora fructo. 0 rigorismo, que não os vê, que não os põe em acção, grila: Ide, não posso absolver-vos; raas se elle os conhecesse, se quizesse fazer uso crclles, di­ria como nós: Agora estaes disposto e eu vos absolvo. Nós não queremos, dizem alguns outros, encarregar direclamente nossa consciência por decisões muito largas, e absolvições suspeitas de nullidade. Muilo bem; mas não encarregaes tambem indirectamenle vossa consciência cora os peccados

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r occasiona o rigorismo. Elles nem sempre são ura elTeito pura malicia do penitente; bastantes vezes tambem pro­

vém da impericia e pouca caridade do confessor. Evilae por­tanto uma e outra cousa; esta é a melhor, (que digo eu?) é a unica conducta que podeis ter. E necessário, dizem alguns, fazer sentir ao peccador a gravidade de seus peccados; isto é verdade, mas de modo que elle se humilhe, e não desespere; uni portanto o temor á esperança.

107.— Muitos vos darão como regra, entre duas opiniões objcccõcs igualmente prováveis, de prescrever sempre a mais segura, porque o caminho do céo é estreito, e Alexandre VIÍ, no de­creto pelo qual condemna vinte e oito proposições, deplora e detesta o novo modo de pensar, que encrva' a disciplina e corrompe os costumes. Para não errar, observae que o que torna principalmente estreito o caminho do céo, o que sem­pre 0 tornou tal, mesmo antes que se tratasse do probabi- lismo, são preceitos claros e certos. Com edeilo, oppostos e onerosos a todas as paixões humanas, exigem que se faça uma grande violência para os observar, como guardar casti­dade, perdoar as injurias, restituir o que pcrtcuce a outro, deixar ns occasiões próximas, e outras cousas semelhantes.Ora, certamente sc alargaria, com desprezo dos oráculos evangélicos, o caminho do céo, se enfraqueccssemos estes mandamentos. A relaxnção se introduziria nos costumes christãos, sc nas questões duvidosas, que na moral se apre­sentam em multidão, alguem se contentasse dc umn Traca pro­babilidade em seu favor para se dispensar das leis, cuja e.xis- lencia é incerta. Mas que os costumes se relaxem, que o ca­minho do céo se alargue, quando a opinião benigna é Tun- dada sobre sólidas razões c dignas de um homem prudente, é 0 que não julgaram os cento c oitenta e nove auctores que até 1067 sustentaram como licito o uso do probabilismo, nem tantos outros Ibeologos que desde esta época até nossos dias lôem defendido e,defendem o mesmo syslema. Em o n.° 7 vos foliei d’islo. E lambera o que a Igreja, ainda que bem informada c instada, jámais decidiu.

Quanto ao Papa Alexandre V II, certamente não faz allu- são ao probabilismo cm seu decreto, pois que, em o n.° 83 o temos dito, a maior parte das proposições que n’clle conde­mna eram ensinadas por dous anliprobnbilislas declarados, por tal fórma avôssos de fazer uso em suas decisões dos prin­cipios do probabilismo, que elles se regulavam pelos princi­pios contrários, e não obstante tiveram a desgraça de os ap­piicar mal aos casos particulares, c de cair na relaxação. F i­nalmente, 0 novo modo de pensar reprovado pelo Pontífice não é outra cousa mais que o pouco bom senso e o máu dis-

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cernimento pelo qual se julgam, como sólidas e graves, razões vãs e leves, forçadas e sophisticas, segundo as quaes se dá como provável e mesmo como mais provável o que não é as­sim. É portanto dc facto que alé aqui a Igreja guardou si­lencio, e que um numero immenso dc auctores respeitáveis negam que se alargou o caminho do céo pelo uso do proba- bilismo prudente e bem entendido. Resta agora ver se ao menos é mais util ao bem das almas obrigal-as sempre ao mais provável. Ora, para isto recordae-vos dos testemuDhos da experiencia e das razões ciladas cm os n.“* 6'J c 60; tor- nae a ler o sentimento dos Soberanos Pontifices Ilonorio e Bento X IV , a advertência de Sanlo Ambrosio, e os conselhos que 0 trigésimo sexto svnodo de Milão dá aos confessores. Finalmente, ndmiltindc que não pertence aos confessores particulares dar como uma regra geral ulil e obrigaloria, de seguir as opiniões mais severas, lunçae mão dc um dos tres

Continua- 108.— Outros, para se justificarem de não conceder a ab-Ç5o. solvição aos penitenlcs senão depois de muilo longas provas,

vos dirão, que na verdade Deus póde cm um momento con­verter 0 peccador, mas que em geral Elle não faz assim; que pelo contrario, a ordem costumada da Providencia é que a grnça não opere senão por degráus a conversão do coração. Com elTeito, acrescentam elles, vêde como Deus dilTeriu por quatro mil annos a conversão do mundo; quão poucas pes­soas Jesus Christo converteu antes dc sua morle; como final­mente, no tempo das penitencias publicas, a Igreja dilTeriapor sete c dez annos a absolvição aos penitentes públicos,algumas vezes mesmo não lh’a concedendo senão no fim de uma vida passada nos mosteiros.

Mas como não vêem aquelles que raciocinam deste modo,

Sue elles confundem uma multidão de cousas que são muito ilTcreutes? Que elles expõem o peccador ou a cair na des­

confiança excessiva, ou a lançar cm grande parte sobre a graça de Deus a demora de sua conversão? Sc por conver­são .cntendeis não sómente o que é necessário para obter a remissão da culpa e da pena eterna, mas lambem de toda a pena temporal; não sómente a diminuição dos máus hábitos, mas tambem a sua destruição total e mesmo a formação de hábitos bons e virtuosos, é certo, n’esle sentido, que a graça não opéra senão lentamente; que enlão não bastam nem oito dias de exercicio, nem muitos mezes, nem annos inteiros; oue ordinariamente a maior parte dos peccadores, e mesmo dos bons morrem antes que esta conversão seja tão perfeita que os livre inteiramente do purgatorio. Ora, esta demora de modo nenhum vem da economia actual da Providencia na

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distribuição das graças; vem anles da resistência ou pouca correspondência das almas mesmo as mais justas aos soccor­ros de Deus. Mas se por conversão entendeis, como no coso de que se trata deveis entender, o que é necessário sómente á justificação do peccador no sacramento da penitencia, é absolutamente falso que a graça não opéra no coração que lhe corresponde senão por progressos tão lentos c lão demo­rados como se pretende. Para obter esla justificação, de modo nenhum é necessário qiie a satisfação das faltas a preceda.Isto resulta da 16.*, 1/.* c 18.* proposições condcmnadas por Alexandre V III em 1690.

109.— Em sua decima quarta sessão, o santo concilio de 1’clo Trento nos inslrue do que respeiUi ao sacramento da peni-cOp"®''!®**® tencia; depois no capitulo iv explica as disposições nccessa-rias e sulücientes para obter a justificação por incio d’esle sacramcuto. Elle nos diz que é necessaria uma contrição que é animi dolor, ac deleslalio esl de peccato commisso, cum pro­posilo non peccandi de cwtero. Basta ler esla contrição, que encerra non solum cessalionem a peccato, et novw vitce pro- posilum et inchoalionem, sed velerts eliam odium. Ora, para formar esle acto cllicaz c sincero da vontade que sc arre­pende e detesta o peccado com a resolução de não tornar a comnicllcl-o, não é bastante sem dúvida um só instante. É necessário algum tempo para orar, para meditar nos molivos da contrição c para sc excitar a ella; mas tudo islo não exige annos nem mezes. Aconsclhar-se-ha muito n um habiludi- nario e a um rccidivo que faça preceder sua confissão de exercicios espirituaes de oito dias, mas não sc dirá que é um meio obrigalorio c de necessidade geral para todos, e para cada vez que querem converter-se e confessar-se. Exige-se muilo, para fallar com S. Carlos, que o recidivo mostre al­guma emenda, como o explicaremos em o n.® 339, ou, para empregar os proprios termos do concilio dc Trento, inchoa- tionem vitce nova;; mas no curso ordinário da Providencia, este principio de vida nova se obtem era um tempo muito moderado. Tal é mesmo a dilTerença que a bondade divina pôz entre o que é necessário para n justificação do peccador, e 0 que pertence á sua perfeição, entre o que é util, mas não absolutamente necessário á salvação; ella quiz que o pri­meiro custasse muilo menos tempo do que o segundo, a íim de que a salvação e conversão fossem sempre possiveis a to­dos, e que a demora não fosse impulavel a Deus, mas ao ho­mem.

110.— Por outra parle, é cm vão que se allegam os exem- i'cio c.xa- plos acima citados. É verdade que depois de mais de quatro '"c ôas fai- mil annos foi que o Redemptor veio, que fundou um culto,

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estabeleceu um sacrificio e sacramentos novos, e converteu 0 mundo ao Evangcibo. Mas se este exemplo 6 concludente, que homem póde esperar converter-se no espaço de setenta ou oitenta annos dc vida, se não foram bastantes para n con­versão do mundo nem dous, nem tres mil annos, c sc foram necessários mais de quatro mil? Como não ver o erro em que n’islo cáe o rigorista? Os homens não empregaram estes quatro mil annos cm começar e continuar pouco a pouco sua conversão; conversão que não teria sido acabada senão de­pois de quatro mil annos desde a vinda do Messias. Longe d’isto, a maior parte dos homens empregaram este lempo em fazer ludo o que era opposto á sua conversão, quero dizer, a continuar sua idolatria, suas incontinencias e todo o genero de desordens. Por esla conta cem mil annos não bastariam para formar em semelhantes homens, sempre entregues ao peccado, mesmo um principio de conversão. Mas aqui falía­mos de um peccador que quer confessar-se, de um peccador que cessa dc peccar, e que se dispõe seriamente a passar uma vida nova. Ora, como este grande numero de justos e dc santos, mortos antes da vinda do Messias, nada tem per­dido quanto á sua salvação, em não ter visto o íim dos qua­tro mil annos, dn mesma sorte hoje não é necessário muito tempo, segundo o curso ordinário da graça, para scr perfei­tamente absolvido e justificado. Deve dizer-se o mesmo dos tres annos que durou a prédica dc nosso Senhor: para todos aquelles que quizeram ouvil-o, renunciar a seus vicios e ar­repender-se, pouco tempo foi preciso; para aquelles que não quizeram ouvil-o, nem aproveitar-se de sua prática, os tres annos não bastaram. Mas se os progressos da graça foram tão lentos, que foram necessários annos inteiros para conver­ter os judeus, foi por sua culpa, e não por falta do Salvador.

Pcla 111.— Finalmente, quando a Igreja diíTeria a absolvição Mnducia g(,g penitentes pelo espaço de sele e mesmo de dez annos, <»*ereja. julgava que isto fosse necessário á sua contrição nem

á sua justificação: era para n remissão completa mesmo da

Sena temporal devida ao peccado; era sobretudo para impe- ir, pelo rigor das penitencias canônicas, os novos fieis de

deshonrar, aos olhos dos pagãos, a santidade da religião por escandalos públicos; era finalmente para obter uma satisfa­ção exterior d’nquelle que n linha ultrajado por peccados enormes, laes como o homicidio, o adultério, a apostasia, quando semelhantes crimes se tornavam de notoriedade pu­blica. Mas esla absolvição, que se dilTeria alé ao fim da pe­nitencia canônica, não ern a absolvição sacramental; era a absolvição que a Igreja dava exteriormente e em publico, como provam as dilTerenças essenciaes entre uma e oulra.

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Com elTeito, 1." segundo a instituição divina, a absolvição sacramental é necessaria pnra todo o peccado grave, ainda que não seja dos mais graves, e ainda que seja secreto; a absolvição canônica e ecciesiastica não era senão para pecca­dos gravíssimos, taes em particular como os tres de que fal­íamos, e islo sómente quando eram públicos. 2.® A absolvi­ção sacraníental é tantas vezes necessaria, quantas se recáe e se quer obter a justilicação no sacramento da peniteucin: a canônica não .sc dava mais do que uma vez nn vida aos pec- cadorcs públicos. 3.® Ella só crn dada pelos bispos ou seus delegados, que, cm caso de necessidade, não i-ram algumas vezes mais (|ue simpliccs diaconos, como vemos na decima terceira carta de S. Cypriano. A absolvição sacramental,

Selo contrario, não póde, mesmo em caso de’ necessidade, ser ada por um diacono: é uma funcção própria de lodo o sa­

cerdote approvado, quero dizer, não só dos bispos, mas de seus delegados. 4.® A primeira não se concedia senão no lim da penitencia, n segunda antes que a penitencia fosse cum­prida, e Alexandre Y II I condemnou aquelles que dizem que este uso é contrario á instituição dc Jesus Christo. 3.® Mes­mo debaixo da antiga disciplina sc dava a absolvição sacra­mental e secreta aos peccadores públicos, muilo antes que elles tivessem acabado a penitencia pública. Ainda que nãose lhes permillia de se apresentarem á sanla mesa á medida de seus desejos, todavia durante o tempo de sua penitencia se Ibes permillia, e se lhes mandava mesmo que se apre­sentassem dc tempos em tempos á communhão. Achamos a prova d’isto nos decretos dos Papas referidos por Yvon na parle 2.®, cap. xxix, e por Burchard no liv. I I I , cap. xix. 0 quarto concilio dc Carlnago, cânone 68, diz que os peniten­tes que tiverem recebido o Viatico no decurso da enfermi­dade não devem julgar-se absolvidos sem a imposição das mãos. Se, porlanlo, a Eucharistia precedia a absolvição, esta absolvição não era sacramental; quanto a esla, como quanto á communhão, a Igreja não exigia os annos c as obras pe­nosas dn penitencia canônica, nem como meios necessários para obter uma verdadeira contrição, nem como signaes ne­cessários para manifestar a sinceridade d’ella ao confessor, e permittir-lhc de absolver o penitente no fôro interno.

112.— Í7;«a parle das confissões dos fieis, conlinúa algum a maior dos rigoristas, são inválidas ou sacrilegas; porlanlo a rari- parte das dade das confissões não é um mal, ou certamente é um menor mal do que sua frequencia. Mas aquelle que falia deste modo das, ousa­das conlissões de outrem, que pensa elle, quereria eu saber, crilcgas? das suas próprias? Julga-as elle válidas e uteis? Se assim é, por que se mostra elle tão facil em julgar suas conlissões

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boas, e más aquellas dos outros? Deus muda por acaso para elle as leis e as disposições para bem se confessar, ou é mais prodigo de suas graças cora elle do que com os outros, ou, finalmente, é elle mais fiel que os outros eni corresponder- lhe? Mas as leis são para todos o mesmo que para elle: Deus não restringe a elle suo liberalidade. Dos oulros não deve elle julgar mal, pois que julgo lão bem de si mesmo; de ou­tra sorte, que crime terá o phariseu admirador de si mesmo e desprezador do publicano? Se portanto ns suas são uteis e boas, com que direito condemna elle aquellas de seu pro­ximo? Se considera suas conlissões como imiteis c sacríle­gos, elle já começou, ou côdo conicçnrá a nbandonnl-ns, e a abandonnl-as não por fraqueza, mas por syslemn c por prin­cipio; mas syslema e principio que fazem peior mal n elle, aos lieis e á Igreja, do que sc como um berege declnrndo elle dissesse: Deixae a confissão,.porque não é sacramento; ou. como um impio manifesto: E um sacramento, mas deixae-o para viver em liberdade. Em. uma semeibnule linguagem o veneno se mostraria sem disfarce, elle não daria a morte nem aos penilenles, nem aos confessores, e se faria justiça d’a- quelles que o tivessem espalhado. Quando, pelo contrario, é um confessor calbolico que vos diz: Vale mais não se confes­sar; confessar-se e fazer nullidades e sacrilégios, é quasi sempre a mesma cousa; confessar-se com disposições necessá­rias é cousa extremamente rara, parece que é um santo que vos falia, um santo bem diirerenle do berege que nega, e do impio que despreza a conlissão. Ah! não ob.sianle é um ho­mem enganado ou enganador, que debaixo da apparencia da moral n mais sã, desanima tanto os penilenles, como os con­fessores. Conduzidos ao abandono do sacramento por um principio que lhes parece verdadeiro c santo, eil-os para sem­pre sem remorsos e sem esperança de conversão. Ora, póde haver um pensamento mais pérfido, mais cvidenlcmculc falso 0 contrario ao espirito de Jesus Christo c da Jgreja e ao bem dos lieis? Quando mesmo fosse verdade que n maior parle das conlissões fossem más, deveria um sacerdote esclarecido tirar para a salvação das almas estn consequencia: Portanto a raridade das confissões não é um mal? Não deveria elle, pelo contrario, dizer: Portanto é necessário reanimar o zelo dos penitentes, e pôr um freio á relaxação e ao rigorismo dos confessores, para evitar tanto a randade, como a nullidade das confissões; porque a nullidade é um grande mal, mas a raridade das confissões é tambem um grande mal. Oh! esla consequencia é verdadeira, util, conforme ao espirito de Je ­sus Christo e da IgrejaI Esta prática frequenle dos sacra­mentos tornará progressivamente melhor cada conlissão; em-

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quanto que pelo contrario ninguém corre com mais perigo de commetter sacrilégios do que aquelle que raras vezes se con­fessa.

113.— Por outra parte, pretender que a maior parte das Distincção confissões são nullas e sacrilegas, é primeiramente uma inju-imporian- ria feita a tantas almas piedosas que põem os maiores cuida- dos na recepyão dos sacramentos, e que tiram d’elles grandes vantagens. Além d’islo, restringindo a questão ás conlissõcs dos grandes peccadores, é necessário fazer uma distincção; se ellas são feitas a confessores cnritativos, experimentados, cxoctos e discretos, eu o nego; se os confessores arecem de alguma d’cstas qualidades, sem as quaes sc não remedeia, nem a ignorancia, nem a malicia, nem a negligencia que um grande nuniero de penitentes põem em preparar-se, eu o concedo. E o mesmo das enfermidades da alma que das do corpo. Supponde que ha um grande numero de doentes em uma cidade, c que os médicos ahi são ignorantes, ou negli­gentes, ou indiscretos; nâo se duvida dc que o maior numero dos doentes morreria, este por ser mal assistido, aquelle por não ter mesmo chamado este medico tão imprudente nos re­medios, nas dietas, c nas operações que prescreve como ne­cessárias, emquanto que haheis medicos sem recorrer a isto curam; mas se os médicos são diligentes, sabios e discretos, a maior parte serão curados. Da mesma sorte ngs enfermi­dades espirituaes, cujo remedio, muito dilTerente dos remc- dio® corporaes, é por si mesmo eílicaz, infallivel e seguro em seu elTeito, se os confessores forem babeis, os enfermos, mesmo os peiores, quero dizer, os peccadores se curarão to­dos, ao menos a maior parte. Que isto assim é, appéllo para os confessores revestidos das qualidades acima indicadas. E l­les na verdade dirão que esle ministério lhes custa muilas fa­digas, mas que. Deus abençoando seus esforços, tôem obtido os successos seguintes: 1.“ , a conversão de grande numero de peccadores que viviam em máus hábitos; á.°, a perseve­rança no bem d’aquelles que converteram; com outros tôem obtido que não se íizessem peiores, e que fizessem ao menos algumas tregoas com Deus; 3.® aquelles que converteram têem santificado sua familia, e resolvido a confessar-sc e converter-se seus antigos companheiros, que, successivamente, converte­ram outros. D'aqui um grande numero de almas salvas, mui­tas oflcnsas expiadas, e uma grande gloria procurada ao Se­nhor. Taes são os fructos que operam os bons confessores.E agora que mostrem os rigoristas, se podem, iguaes resul­tados de seu rigorismo; se não podem, que mudem portanto de moral, ou ao menos que não declamem contra aquella cu­jos felizes elTeilos provam infallivelmenle que ella é a mais

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Util e sã, segando esta sentença do Evangelho; A fruclibus eorum cognoscelis eos. Sc objecUindo a alguem os exemplos dos santos, taes como S. Francisco dc Salles, S. Filippe de Neri, etc., que foram confessores infatigáveis c discretos, ou­virdes desprezar sua moral como relaxada, contentae-vos de lhe responder que antes quereis a relaxação dos santos, que simultaneamente santificou estes grandes homens pelo exer­cicio da mais paciente caridade, e converteu c sanlilicou uma multidão de penitentes, do que a integridade de sua moral, tão commoda para poupar o trabalho do confessor, tão inutil, e mesmo tão nociva a perseverança dos bons e conversão dos máus. Eu vol-o fiz ver acima (n.« 98-100.)

Falsas ma- 114.— Mas o que lenho dito alé aqui para desenganar os rigoristas, que, com boas intenções, carecem de felicidade e

a d , prmigQgjj gua conducta com os penitentes, não deve ser um motivo de triumpho para seus adversários, os relaxa­dos. Ah! que motivo mais miserável de louvor do que não poder ser louvado senão em comparação com aquelles que ne­nhum merecem I A presumpção póde porventura subtrahir-se ao vituperio que merece, por isso que comparando-a ao vi­cio contrario, a desesperação, se diz que é nienos funesta em suas conseqüências? Cessa ella por isto de ser por si mesma um vicio muito detestável e muilo perigoso? Portanto, não ti­rem os relaxados vaidade da sua comparação com os rigoris-

, pois que elles mesmos fazem um mal incalculável. Eu 3 fallei d’islo principalmente em o n.® 71, onde os consi­

dero como doutores; em o n.® 96, onde, resumindo-me, vos mostrei quanto damno faz sua conducta aos penitentes. Eu vos fallarei ainda d’isto, em o n." 198 e seguintes, onde os considero como juizes. Podem dizer-me: «que os relaxados são originariamente a causa de todos os excessos dos rigoris- tns». As indignas condescendencias dos primeiros têem exci­tado 0 zelo dos segundos. Elles lôem querido impedir os males de que a Igreja e os fieis eram viclimas, ainda que, por uma consequencia da miscria humana, foram esbarrar contra o pcrfido escolho do rigorismo. Vós, porlanlo, que exercitaes o importante ministério dc confessores, esfor- çac-vos por evitar os dous extremos, a fim de não secundar, nem de um modo nem do outro, as vistas do demonio, e de permanecer um ministro fiel de Deus e util ao proximo.

Resposta 116.— Não vos deixeis seduzir pelas falsas maximas que ^ objcc- os relaxados põem no fronlispicio pnra vos desviar da exacti- relaxaXs *1“ ® deveis ter como doutor e como juiz. Elles vos dirão:

■ Que é necessário ter caridade; que Deus é bom; que o peccado materiat não faz culpado aquelle que está na boa fé; que para prevenir uma confissão inválida e sacrílega, que póde aconte-

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cer, não se devem impedir um cento de outras que são boas e válidas... E muito certo que se deve ter caridade, mas esta caridade deve consistir, como o tenho dito, em receber os penitentes com bondade, supportal-os com paciência, aju- dal-09 com zelo e habilidade a bem se disporem, a (im de os tornar justos e perfeitos. Longe de vós esta caridade que se importa pouco com as precauções para decidir como douto­res, da exactidão de juiz para apreciar as faltas e as disposi­ções do penitente, e da habilidade dc medico para appiicar os remedios convenientes. Assim, caridade, não de e.scravo, mas de pae, não de pastor mercenário, mas dc bom pastor, tal, e não outra, como aquella de Jesus Christo, que, sacri- íicando-se ás maiores dores para tornar suave o caminho do céo, 0 declarou estreito e espinhoso. Elle destruiu todos os rigores fal,«os dos phariseus, mas nada corta aos mandamen­tos de seu Pae, nem á verdadeira penitencia que tinha vindo prégar. Tende portanto esta caridade, que vos dá um verda­deiro merecimento diante de Deus, e que procura a verda­deira vantagem espiritual do penitente; não aquclla que na realidade não é mais do que o amor de vossa própria com- modidadc, e uma compaixão insensata e fatal ao penitente.Não 0 dispenseis de seus deveres para vos siibtrahir ao cum­primento dos vossos, como doutor e como juiz. Adorae, mas não tireis a amargura necessaria a uma sincera penitencia. Custar-vos-ha, mas é em consagrar-vos a todas estas fadigas que consiste a verdadeira caridade, que, como em os n.°* 11 e 12 0 disse, é o melhor preservativo contra a relaxação e rigorismo, dos quaes é proprio o cuidar da commodidade pessoal do confessor, e de nenhum modo do verdadeiro bem do penitente. Ella é tambem o mais seguro meio dc evitar o rigorismo ou relaxação, seja instruindo, seja julgando no sa­grado tribunal. Creio que tendes podido reconhccel-o na prática que até aqui vos tenho ensinado. 0 relaxado e o ri­gorista ignoram este meio; não que elle seja chimerico, mas porque não querem vêl-o, a fim de não tirarem a seu amor proprio sua melhor desculpa. Cora elfeito, para um e para uutro quasi nenhum trabalho com os penitentes; um se des­embaraça d’ellcs muito depressa, absolvcndo-os mal; o outro despedindo-os injustamente. Véde agora qual deve ser a vossa caridade.

116.— Deus é bom, dizeis vós; e quem póde duvidnl-o? Conünua-Mas sua bondade de Pae infinitamente bom não impede seus Ç®®-direitos de Senhor e Legislador perfeito e supremo. Como mi­nistro íiel, servi-vos de sua bondade para animar os pusilla- niraes, e pela esperança de seu soccorro c de suas recom­pensas procurae um prompto e fiel cumprimento dfc suas

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vontades ao mesmo lempo justas, sabias e perfeitas. Assim, não vos sirvacs da bondade de Deus contra Deus mesmo, derogando suas leis por uma indigna rclaxação de doutrina, não permillacs igiialmcnlc que sc provoque sua justiça pelo abnso dc sua misericórdia, não principiando jámais seria­mente a emendar-sc.

Conlimia- 117.- 0 peccado material, dizeis vós ainda, não tornaÇáo. culpado aquelle que o commelte na boa fé; mas quando isto

fosse sempre verdadeiro a respeito do penitente, não é o mesmo a respeito do confessor. Cerlamenle elle se torna cul­pado, elle que, sendo obrigado por dever, e podendo commo- damcnte impedir o mal material, é negligente em fazer isto. Que seria se elle o auctorisassc por seu ensino? E por isto que a Igreja tantas vezes se lem armado de um sanlo zelo contra os relaxados, condemnando tão justa e lão utilmente um tão grande numero de suas funestas proposições: por um oulro lado, quanto não é raro que o mal material seja intei­ramente desculpável no penitenle? Elle o commelte por uma ignorancia culpavel, seja descuidando-se de se instruir de seus deveres, seja procurando dc proposito um confessor ignorante c relaxado que não o esclareça, seja sulTocando os primeiros remorsos de sua consciência, que o adverte, ou ao menos que lhe causa dúvidas gritando-lhe: Acautela te, é tal­vez um peccado. Ora, pertence-vos impedir com discrição o mal material, dedicar a isto um zelo sincero, prudente e muilo attenlo á contrição. Se o pcnilente não o lem, sua ignorancia póde bem escusal-o de peccado, mas não supprir a falta de arrependimento, nem impedir a confissão de ser inválida.

Coniinu;'.- 118.— Sem dúvida não se devem impedir as boas confis- sõos pelo rigorismo, e eu não poderia recommendar-vol-o so­bejamente; mas, por um oulro lado, que ellas sejam tantas vezes boas como vós o dizeis, c não inválidas e sacrilegas, cu não vol-o concedo senão com a condição que os confessores sejam dotados das tres qualidades essenciaes. Não é sem ra­zão que os santos e os ministros do Senhor gritavam que o inferno está cheio de christãos condemnados por suas más confissões. Ah! não é senão muita verdade; a ignorancia, a negligencia e a malicia de um grande numero de christãos os impede de levar aos sacramentos as disposições convenien­tes. Pertence aos confessores prevenir um tão grande mal. Dever essencial que não cumpre nem o rigorista, nem o re­laxado; só póde conseguil-o um pae, um medico, um juiz tal como até aqui o lenho descripto.

Meios de 119.— 0 meio portanto de obter freqüentes e boas confis-obterboassões, é a discricão, interrogando, decidindo, proferindo sen-

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lenças; nias esta discrição vos custará um estudo mais pro­fundo para conhecer e evitar os dous extremos, o rigorismo e a relaxação; ella vos custará mais paciência pnra descobrir cuidadosamente as necessidades do penitente, c para formar n’elle as disposições convenientes, seja para lhe dar a absol­vição com vantagem, seja para lb’a didcrir com precaução; ella vos custará mais humildade, porque o confessor discreto está exposto nos tiros da critico, não sómente dos sequazes dos dous extremos, mas ainda, se posso expressar-me assim, d’aquelles que são neutros. Estes terão muitas vezes razões apparentes para vos condemnar. Com elTeito, vós vos regu- laes, para absolver, sobre as circumstancias, sejara exterio­res, como uma necessidade urgente da absolvição, sejam in­teriores, como desanimação, afllicção, principio de desespe­ração. Ora, estas circumstancias ou não são conhecidas, ou são avaliadas em nada; assim correis o risco dc que se falle mal dc vós, dizendo que vós deixaes commungar aquelles cuja perversidade conhecem bem os companheiros, mas não sabem, o que todavia é muito verdade, que se lhe não recu- sastes a absolvição, não lli’a tendes dado senão com precau­ção, depois dc ler posto tudo cm acção parn dispor o peni­tente c formar um juizo solido c prudente dn siuceridade dc suas disposições. Vós o vôdes, esta discrição vos custará muito mais do que a relaxação ou o rigorismo, tão commodos para a primeira, que não gosta do estudo, nem da appiicação cuidadosa da sciencia, para n vaidade, que acha sua vanta­gem na relaxação, porque apresenta sempre uma apparencia de caridade, para o rigorismo, porque tem sempre em seu fa­vor os bellos exteriores do zelo pela lei, do horror pela rela­xação, e da moral mais sã e mais segura. Finalmente, sc a discrição não é criticada, no menos nao é appiaudida. Seu caracter dc alguma sorte indiÍTcrente entre a relaxação e o rigorismo, entre o amor da lei c o amor da liberdade huma­na, nada oíTerecc que lhe attraia a repuUição de sã doutrina, nadá que a faça estimar dos homens vulgares. Acontcce-lhe como aos negociantes que vendem pelo preço medio; não se ralha d’ellcs como d’aquellcs que vendem pelo preço supre­mo, mas igualmente não se louvam como aquelles que ven­dem pelo preço iniimo. Ninguém falia d'elles.

120.— Pois que esta discrição c de uma parte tão düEcil, Exhor- e da outra tão necessaria, conclui que, para ser ura bom con- fessor, é necessário ter a caridade dc um pae, que cuida bem ros i!ra- menos em procurar sua vantagem, do que cm salvar por todo da de um 0 preço a vida de seu lilho; a caridade dc um bom pastor texto de que dá sua vida por suas ovelhas. Para vos exhortar eiDcaz- S- ' ““ 'o- mente a adquirir esla caridade, fonte da discrição, permil-

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ti-me que vos recorde as palavras de S. Paulo na epístola aos Gaiatas, cap. iv. Fallando d’aquelles que têem caído em grandes faltas, o Apostolo se exprime n’estes termos: Vos qui spiriluales estis, hujusmodi instruite in spiritu lenitatis, considerans te ipsum, ne et tu lenteris. Imaginae portanto vós, confessor rígido, que tivestes a desgraça de cair em um peccado mortal e que vos achaes em uma terra, cujos confes­sores todos são rigoristas, seja interrogando, seja decidindo, absolvendo e impondo a penitencia; dizei-me, quaes seriam vossos sentimentos? Era respeito ao estado sacerdotal quero persuadir-mc que vcncerieis todas as difliculdades para tor­nar a entrar em graça cora Deus. Entretanto não é inutil fa­zer-vos notar todos os perigos que corrieis. De uma parte, os remorsos de vossa consciência, que vos griUi: Tu estás m inimizade de Deus, podes morrer esta noite e condemnar-te, vos instigariam a confessar-vos, porque é o meio necessário para obter misericórdia; mas de outra parte, que alilicção! que repugnância! quando fo.sseis obrigado a dizer comvosco: k qualquer sacerdote que me dirija, todos são rigoristas; quem sabe como serei recebido? se me derem a absolvição, que obrigação me imporão? N ’este estado, se além do tèmor de seu rigorismo, o demonio viesse augmentar por suas sugges- tõcs a vergonha que cxperiincntaes em dizer que sois sacer­dote, e que apesar d’isso tendes caído em uma falUi tão ver­gonhosa, quanto seria dc receiar que comcçnsseis a dilicrir, e diíferindo, a perder a força de fazer bem aígum, depois a he­sitar se vos abslercis ou não dc dizer a missa: finalmente, depois de um longo combate, a vencer o passo, subindo ao altar com a contrição sem conlissão, debaixo do pretexto que vos é necessário celebrar para evitar a infamia e não dar es­candalo; e, uma vez vcncido este passo fatal, a continuar da mesma sorte por muitos dias, e vossa consciência gritando ainda mais forte por causa d’e.stcs sacrilégios, a experimentar mil vezes mais vergonha e temor em ir procurar um d’estes rigoristas? Antes mesmo de os ter aturado, os confessores d’este caracter seriam para vós uma pedra de escandalo: el­les vos exporiam ao perigo: 1.“, dc diflerir vossa conversão;2.“ , dc abandonar lodo outro bem; 3.°, de cair em faltas mais graves do que a primeira, por seu numero e por suas quali­dades; 4.“, de íicar quasi sem esperança de vos tornar a le­vantar, pois que a difliculdade dc vos confessar vae sempre augmentaudo; 3.®, de vos perder provavelmente para a eter­nidade.

Continua- 121.— Pelo contrario, se soubesseis que, entre todos estes cão- rigoristas, havia um confessor discreto, isto começaria a con-

solar-vos. Todavia a corrupção da natureza vos faria ainda

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experimentar alguma repugnância em apresentar-vos a elle; por que? Porque elle não 6 rigorista, é verdade, mas não é tambem ura relaxado que passa tudo; este vos consolaria in­teiramente. Dirieis no vosso interior: Eu supprirei ao que falta a esle relaxado, applicando-rae quanlo posso era ter a contrição e firme proposito. D’csta sorte não me será nocivo; receberei d’elle, pelo contrario, o beneficio da absolvição. Assim, 0 relaxado vos seria ainda menos nocivo do que o ri­gorista; e a facilidade de ir procural o faria: 1.°, que apenas caído, vos lornarieis a levantar por uma prompta confissão;2.“, que conservarieis a força dc fazer o bem; 3.®, que não serieis exposlo nem a novos sacrilégios, nem a desesperação. Reconhecei porlanlo que o mais inutil é o mais nocivo dos dous, e não é 0 relaxado, mas o rígido; reconhecei ao mesmo tempo que o mais util, (que digo eu?) o unico verdadeira­mente ulil por todos os modos, seria o confessor discreto.

E verdade que na parle corrompida expcrinienlarieis muita mais facilidade humana e natural em confessar-vos ao rela­xado; mas isto mesmo seria um mal para vós, seja porque esta escolha de ura confessor relaxado mostraria que não es­taes bem disposto para o sacramento, seja porque corrieis o risco de aproveitar-vos de sua condescendencia para conce­ber menos horror ao peccado, ter menos contrição d’elle, re­cair mais facilmente, e tornar-vos presumpçoso. Dizer que sabereis bem acautelar-vos de ludo isto é já ura principio de presumpção, pela qual vos julgaes ao abrigo dos arlilicios os mais subtis do amor proprio. Por outro lado, esla pequena repugnância que experimentarieis em dirigir-vos ao confes­sor discreto, seria se não agradavel á parle inferior, ao menos ulil á parle superior. Ella vos faria melhor sentir e melhor comprehender a gravidade de vossa falta: d’aqui uma humil­dade mais profunda, um arrependimento mais vivo, e uma maior precaução para evitar as recaídas. A exaclidão d'eslc confessor vos procuraria ainda diversas outras vantagens: elia vos ajudaria a dizer tudo, a conhecer vossas obrigações, a reparar o passado por penitencias medicinaes, c a tomar precaução para o fuluro. 0 confessor discreto seria portanto 0 melhor e o mais ulil para vós, comlanlo que fosseis pro- cural-o. Mas no receio de que, não indo, elle se vos torne inutil e que fiqueis no miserável estado do peccado, exposto ao perigo dc ir de mal a peior e vos condemnar, notae bem 0 que vou dizer-vos. Ainda que o confessor discreto nunca deva, por uma louca compaixão, trabir seu ministério em al­gum ponto essencial, 6 nccessorio comtudo que pela abun- dancia de sua caridade adoce de tal modo o qqe deixa de pe­noso ao sacramento, que vol-o faça, por esta caridade, tão

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facil, razoavcliueule fallando, como poderia fazel-o um rela­xado por seu pouco cuidado. É uecessario que, fazendo-vos lirar maiores fructos da coufissão bem feita, elle augmente em vós, mais ainda do que ó relaxado, a estima, o amor da confissão, 0 desejo de a fazer muitas vezes; é necessário que elle vos inspire demais em mais uma confiança lilial de tal modo que vades procural-o com certeza de achar n’elle, se­jam quaes forem vossas faltas, entranhas de misericórdia e um zelo ardente para vos inspirar liorror ao mal. E necessá­rio, finalmente, que mostrando-vos a gravidade, a lim de ex­citar-vos á compunção, elle mostre tambem eslima por vós e a mais viva esperança de vossa emenda.

Coiitiniia- 122.— Ora, do que vós quererieis que fossem para cora- vosco considerans te ipsum, ne el lu lenteris, aprendei o que vós deveis ser para com os outros. Não quererieis para vós um rigorista, nâo o sejaes portanto para com os outros, c se 0 fordes, acredilae que sois mais inutil c mais nocivo do que 0 relaxado. Não vos conleulareis, para vós, com um confes­sor que não seja discreto; vós o querereis lão benigno por sua caridade de pae, como lirme e prudente por sua exncli- dão discreta de doutor e de juiz. Sede porlanla discreto e nunca relaxado para com os outros. Mas quereis vós que el­les se aproveitem com ancia das vantagens que podeis pro­curar-lhes pela discrição? Tende lambem para com elles um coração dc pae. Mesmo nas cousas penosas á nalureza, que fordes obrigado a dizcr-lbes, que vejam claramente que é o amor c zelo de seu bem que vos fazem obrar, mas que es- laes sempre cheio de compaixão e de eslima para com elles. e conlacs com sua emeuda e sua santificação proxima. É portanto verdade que a reunião d’cslas tres qualidades de pae cheio de caridade, de medico habil e dc juiz exacto e discreto, póde só tornar-vos o que deveis ser, um confessor util á salvação dos almas, á vossa própria santificação c á gloria de Deus.

1'rãüca da 123.— Mais uma vez vós vôdes que a importante funcção 99® exerccis no tribunal ua penitencia, reclama a

críâo.'^ união c concurso das qualidades dc pae c de medico; é 0 unico meio de ser verdadeiramente util á salvação das almas. Tende, primeiro que tudo, uma exaclidão de juiz. Lembrae- vos que a remissão das faltas na coufissão uão se concede pelo mesmo modo que no baptismo. N’cste, ella é um bene­ficio puro e sem restricção; n’aquella, dá-se por modo de juizo. Ora, deveis ser exacto, a (im de bem conhecer as fal­tas e arrependimento do penilenle n’este negocio, 0 mais importante que póde ter, quero dizer, sua reconciliação com Deus. Àssim, cuidadosa exaclidão. Por que? Porque de-

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veis ler das faltas graves, que são a maleria do sacramento, não um conhecimento vago, mas dislincto, tanto de sua qua­lidade como de seu numero e de suas circumstancias. Toda­via tende cuidado dc evitar os dous escolhos da rcia.xação que despreza esle exame, e do rigorismo que o exagera; che­gue vossa exaclidão até conhecer o que é necessário ou muilo util ao penitente; mas não passeis d’nqui. Não sejaes d’a- quelles que, recebendo o que Ibes dá o penitente, não llie fazem pergunta algunia, e por isso não curam as feridas que elle occulla por ignorancia ou por vergonha. Nno sejaes igualmente d’aquelles que fazem a conlissão penosa e odiosa ao penitente. Assim, a respeito de qualquer pessoa, c muito menos ainda a respeito d'aquclle.s que pela primeira vez se dirigem a vós, não aggraveis a difliculdade com interroga­ções desnecessárias c mesmo imiteis. Dc outra sorte, para obter uma conlissão archiperfeila, de.sgoslareis o penitente de fazer outras suflicienles. mas necessarins, o que Ibe será muilo nocivo. Aqui, eu confesso, quando ouço dizer que cer­tos confessores não confessara mais que uma ou duas pessoas cm uma manhã, não posso deixar dc admirar sua paciente caridade de pae; mas não vejo n’islo a habilidade dc medico.A quem julgam portanto elles serem uteis? Não é a esla multidão, que não tôem tempo de confessar, c que todavia ti­nham talvez maior necessidade, e que, por se uão lerem con­fessado e assim se desanimarem, cáem eni graves desordens?Oxalá que ao menos sejam uteis a esle pequeno numero que confessam! Mas é precisamente a estes que, sem o quere­rem, fazem o maior mal. Exccpluando alguns casos rarissi- mos, faligam de tal modo o penitente, que elle não volta mais a confessar-se, principalmente se á minuciosidadc da interrogação elles juntam o rigor de impor obrigações muilo graves e muilo penosas, que oulros confessores sabios e ex­perimentados não teriam imposto.

124.— Sede portanto discreto mesmo na indagação do que Di^rição é necessário, o numero dos peccados, por exemplo. Assim, ''«laga- quando o penitente se examinou com cuidado, e que não ob- slanle não podeis conhecer o numero certo, nem mesmo pro­vável, contentae-vos de averiguar a duração do habito e a frequencia das quédas; e mesmo nos actos internos, como são os actos de odio e de impureza, é inutil informar-se d’esla frequencia coiu tanta precisão, porque se corre grande risco de se enganar muilo para mais ou para menos. Bastará perguntar quanlo tempo durou esla discórdia, esla ligação, e, pelo estado e condição do penitente, ver sc duranle lodo esse tempo permaneceu em suas alTeições criminosas sem al­guma nolavel inlerrupçAo. Quanto aos actos exteriores, po-

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dereis antes esperar alguma cousa mais pelo que respeita á sua frequencia; assim tereis o cuidado de vos informar d’isto. Todavia é necessário lembrar-vos quo as pessoas rudes e ignorantes, apesar de toda a sua diligencia era examinar-se, não poderão explicar-se com a precisão de um theologo in- struido e claro em suas idéas. Estae portanto certo de cum­prir bem vosso dever, satisfazendo-vos de os interrogar se­gundo sua capacidade.

Exactidão 12o.— Vossa exaclidão deve ser acompanhada de dexteri- P®’’" P®’’ prática os conselhos acima dados,

^xterida-® descobrir todo o mal do penitente, mas tambem ade. íim de fazer licilamenlc curla e simples a conlissão sem pre­

judicar a integridade, .\ssim, não interrogueis nem sobre os peccados puramente veniaes que o penitente não é obrigado a accusar, nem sobre os peccados graves que elle já devida­mente declarou em suas conlissõcs precedentes. Quanto ás faltas mortaes que ainda não confessou, contenlae-vos de uma exactidão discreta, á qual junlareis com grande proveito a dexteridade: eis aqui alguns exemplos. Se alguem em um dia de grande concurso vos perguntar se tal contrato que elle fez é licito, se é obrigado á restituição, e estes casos exigi­rem longo exame, podereis, para o absolver logo, obrigal-o a dizer duas cousas: 1.®, sc obrou contra os remorsos de sua consciencio, porque isto é matéria de conlissão; 2.®, se pro- raette sinceramente de fazer o que se achar que é obrigado depois do exame que tiver logar uma outra vez, porque isto pertence ás disposições neccssarias. Se elle se arrepende, e não tendes çazão de duvidar de suas promessas, dae-lhe a absolvição n’estc dia, impondo-lhe por penitencia, se o jul­gardes a proposito, que volte era um tempo designado, seja perante vós, seja perante outro, pára consultar sobre estes diflerentes casos. Da mesma sorte, se depois de ter já ou­vido em grande parle uma longa conlissão achardes que não podeis absolver o penitenle, seja porque vos não parece bem disposto, seja em rnzão de algum máu habito, seja porque tem um caso reservado para que tendes necessidade de um poder especial, fazei-lhe acabar sua accusação como se de­vesseis terminar com cllc, dae-lhe immediatamente todas as advertências convenientes, fazei-lhe conhecer todas as suas obrigações, imponde-Ibe umn penitencia proporcionada, e di­zei-lhe que volte em lal dia. que vos faça lembrar a peniten­cia e obrigações prescriptas, c que vos indique in confuso os peccados que acaba de vos dizer dislinclaraente; d’esta sorte basiar-vos-ha para o absolver, quando elle voltar, ter- vos munido do poder necessário para o caso reservado, e ver se 0 habitudinario dá os signaes convenientes de um arre-

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pendimento sincero e de uma disposição suflicienle. Ne­nhuma necessidade tereis dc o obrigar á repetição penosa e distincta de todos seus peccados: ella já vos não é necessaria para lhe impor uma penitencia conveniente, nem para conhe­cer sua malicia; basta que vos apresente uma matéria para a absolvição.

126. (S. L igobio, n.®» 19, 20, 110 c l l l . i - .Acabo de vos Errodcai- dizer: sois juiz no tribunal da penitencia. Ora, um juiz deve con- primeiramcnte conhecer as razões das duas parles, e.\aminar depois a imporlancia da causa, finalmente pronunciar a sen­tença. 0 mesmo é a respeito do confessor. Elle deve, pri­meiro que tudo, conhecer a consciência do penitente, d’isto inferir suas disposições, seja para Ibe dar, seja para llie recu­sar a absolvição. E primeiramenle sois obrigado a acluar-vos dos peccados do penitente. É verdade que a obrigação do exame pertence principalmente ao penilenle; todavia, digam 0 que quizerem alguns doutores, não se poderá duvidar que 0 confessor, quando conhece que o penitente não sc exami­nou suflicienleraenle, é obrigado a inlerrogal-o, primeira­menle sobre os peccados que elle póde coramcltcr, e depois sobre sua especie e seu numero. {Ap. Lohner, Instr. pract., pag. 33.) A prova d’isto está no canone: Omnis utriusque sexus fidelis, de Paenit., etc.; acha-se igualmente no Ritual

Aqui ha muitas notas a fazer. 1.® Fazem mal aquelles con­fessores, que despedem os penitentes pouco instruidos, a fim de que examinem melhor sua consciência. 0 Padre Seigneri chama a islo um erro intolerável. £ cora razão; porque os penitentes d’esle genero por mais trabalho que levem, dilli- cilmentc chegam a examinar-se como devem. 0 confessor póde porlanlo exarainal-os lão bem agora como passados al-

r s dias. Demais, se os despedis, é para temer que alerra- com a dilliculdade d’esle exame, se desviem da conlissão

e permaneçam no peccado. Assim, o confessor deve fazer elle mesmo o exame destes penitentes, interrogando-os se­gundo a ordem dos mandamentos, principalmente sendo la­caios, arreciros, cocheiros, domésticos, soldados, labcrneiros e outras semelhantes pessoas, que de ordinário vivera na in- ditferença de sua salvação, na ignorancia das cousas de Deus e apartados das instrucçõcs e das igrejas. Seria ainda maior erro despedir para se examinar alguma d'cslas pessoas que,

r vergonha, tiver occultado algum peccado. Acaulelae-vos cair n’islo, embora tenhaes de revalidar suas confissões

desde muitos aunos; porque seriam muilo expostas a não vol­tar e perderera-se. 0 confessor deve pór attenção em não ser demasiadamente minucioso, interrogando penitentes de tal ca-

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racler. Conlente-se de os interrogar sobre os peccados ordi­nários segundo sua condição e sua capacidade. Eu vou mais lougc: quando o penitente, ainda que rude, parece siillicien- lemenle instruido c cuidadoso dc confessar suas faltas com suas circumstancias, segundo seu estado e capacidade, o con­fessor não 6 obrigado a perguutar-llie mais. Com elfeito, ou­tro deve ser o exame dc uma pessoa bem educada, outro aquelle de uma pessoa que não recebeu educação. [Confes. inslr., cap. ii, cap. v, ad n.“‘ 1, 2, 111.)

2.° Mais vale que o confessor examine cada peccado á medida que o penitente se accusa, do que esperar pelo (im

Sara os examinar todos juntos. Sc elle aguardar para o (ira a conlissão, corre o risco dc esquecer o que Ibe tiverem dito,

ou deverá impor «o penitente a penosa obrigação dc lhe re­pelir duas vezes as mesmas faltas. [Confes. inslr., cap. v, ad n.“ 4.) Os confessores se enganam igualmente quando que­rem julgar da gravidade ou da leveza de uma falta, pergun­tando a estes penilenles .simplices e grosseiros se elles a ti­nham como mortal ou como venial. Elles respondem ao acaso aquillo que primeiro Ibes vem á boca. A experiencia o en­sina, mil vezes lenho lido a prova d’islo; porque sc um mo­mento depois 0 confessor repete a sua pergunta, dizem abso­lutamente 0 contrario.

3.® Quanlo ao numero dos peccados dos habitudinarios, obscrvne o que se segue: quando sc não póde obter numero certo, 0 confessor deve informar-se do estado do penitente, quero dizer, de seu modo dc viver, de sua appiicação a ou­tros negocios, o Icmpo de sua frequencia com seu cúmplice, do logar onde residiu mais tempo. Depois d’esles dados o in­terrogará sobre o numero, perguntando ao penitente quantas vezes, pouco mais ou menos, peccou por dia, por semana, por mez, c lhe dará dilTerenles números; por exemplo, tres ou quatro vezes, ou mesmo oilo ou dez, a (mi de ver em que numero o penitente sc lixará. Se o penitente se lixar no má­ximo numero, é bom que sc Ihc proponha um numero ainda mais elevado. Todavia o confessor deve acaulclar-se de que­rer fazer n’csle caso um juizo ccrlo; que conheça frequencia in genere, e que forme seu juizo in confúso, tomando os peccados por lão numerosos como são diante de Deus. Da quem diga que quando se trata de peccados internos dos ha- biludinarios, taes como os peccados de odio, de deleitação sensual c de desejos, basta ordinariamente perguntar quanlo tempo durou o máu habito. EsUi opinião não me satisfaz ple­namente, porque um será mais occupado do que outro, ou estará em uma posição onde haverá menos occasiões de se deixar levar de máus pensamentos; aquelle será mais apai-

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xonado do que este. É portanto necessário, em geral, inter­rogar sobre a appiicação, sobre o logar, sobre a paixão, etc., a lim de formar uma idéa da maior ou menor repetição d’es- les actos internos. De resto, depois dc duas ou tres interro­gações, 0 confessor póde estar sem inquietação, ainda que o juizo que forma lhe pareça muito confuso: é moralmente im­possivel tirar mais luz d’estas consciências tenebrosas e enre­dadas.

4.” Ainda que as confissões geraes sejam muito uteis, com­tudo 0 confessor não deve ser muito exigente para fazer re­pelir as confissões passadas. A presumpção está pela validade do acto todas as vezes que a nullidadc não é certa; (Lig., lib.VI, n." 603) 0 que faz dizer ao Padre Seigneri, que não ha obrigação dc repelir as confissões, excepto no caso de uma evidente necessidade e de um erro manifesto. .\s reincidên­cias mesmo não são uma prova cerla da nullidadc das confis­sões, sobretudo sc a pessoa esteve algum tempo sem recair, ou se antes dc succunibir fez alguma notável resislencia. De- ver-se-hia julgar de outra sorle, se o penilenle é ordinaria­mente logo reincidivo; por exemplo, dous ou tres dias depois de sua confissão, e sem alguma resislencia. Parece então mo­ralmente certo que não leve contrição, nem firme proposito.

127.— Para ser um juiz exacto deveis pôr a maior pru- Prmloncia dencia na escolha das opiniões. Eu não entro aqui na ques- na escollia tão hoje lão vivamente debatida, a saber, se podemos seguir a opinião menos provável c menos segura em concorrência com a opinião mais provável. A maior parte dos auctores a tóem tratado, assim como um grande numero de escriplores contemporâneos. Sómente eu desejaria que elles tivessem antes procurado esclarecer a verdade bem mais com razões, do que com mordazes inveclivas. Eu me contento dc repelir aqui 0 que em oulra parle digo da occasião proxima, a saber: que quando se trata de evitar o peccado material, vulgar­mente fallando, o confessor deve seguir, ao menos tanto como é licito, as opiniões mais benignas, porque só o peccado for­mal offende a Deus. Mas quando as opiniões benignas ex­põem 0 penilenle a perigo do peccado formal, o confessor deve seguir os sentimentos mais rigorosos, porque então o bem do penitente o exige. Não obstante, se o penitente qui­zer servir-se de alguma opinião provável, supposto que tem por outra parte as disposições convenientes, o confessor é obrigado a absolvel-o. Com elTeito, em razão mesmo da con­fissão, 0 penitente tem um direito certo e absoluto da absol­vição, a fim de não ser obrigado a reccbel-a de um oulro sa­cerdote, e a repelir a penosa manifestação de suas faltas.Esta é a opinião commum, admíttida mesmo por um grande

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numero de theoloços sequazes da opinião rígida, taes como Pontas, Cabassut, Victoria, e particularmente por Santo An- tonino. Póde-se ver em outro logar as provas minuciosas d’isto. (S. Lig., Theol. mor., lib. I, n." 23; lib. I I I , n.» 669; lib. VI, n.° 604.) Isto seria verdade, principalmente se o confessor quizesse obrigar o penitente a alguma restituição pecuniaria a que elle não esteja provavelmente obrigado; e este principio tem logar quando mesmo o confessor não con­siderasse como solidamente provável a opinião do penitente, se esle não é ignorante, e se elle tem este sentimento çomo provável sobre a auctoridade de auctores respeitáveis. E ne­cessário todavia que esta opinião lenha alguma probabilidade ao menos apparenle. Se o confessor a considerasse como absolutamente falsa; se elle tivesse contra ella um principio certo ou uma razão convincente, á qual julgasse que não ha­via resposta capaz de abalar a certeza de sua opinião, n'este caso não poderia absolver o penitente se elle recusasse abra­çar 0 seu parecer. Se o confessor prever que, longe de ser util ao penitente, a adverlencia deve tornar formal o peccado que ainda não é mais que material, deve guardar silencio: devem exceptuar-se alguns casos que temos designado em o n.» 42.

Prudência 128.— Se 0 confessor cáe inculpavelmentc em algum erro na repara- relativo á validade do sacramento, não é obrigado por justiça

advcrtil-0 ao penitente, mus sómente por caridade. Ora, a commelic-caridade não obriga cum gravi incommodo, (S. Lig., lib I, ram. n.” 2o) excepto sc o confessor for parocho do penitente, obri­

gado por consequencia a reparar o grave damno de seu pa- rochiano; excepto tambem se o penitente estiver em perigo de morle, ou de abandonar os sacramentos; em todos estes casos a caridade obriga mesmo cum gravi incommodo. Se, pelo contrario, o confessor enganando-se commetteu um pec­cado grave, é sempre obrigado, mesmo cum gravi incommodo, a reparar seu erro, principalmente se tivesse deixado o peni­tente em uma occasião proxima, excepto todavia se o peni­tente se tiver já confessado n outros e tiver commun^do. Mas não se deve, jámais se póde, sem permissão do peni­tente, dar a advertência fóra da confissão todas as vezes que lhe for penosa. Sc o erro apenas recáe sobre a integri­dade do confissão, seja porque o confessor não perguntou as especies e o numero dos peccados, embora fosse culpado, não é obrigado a reraedial-o fóra do'tribunal, porque sempre é humiliativo para o penitente o ouvir recordar seus pecca­dos. No caso que o confessor o tenha maliciosamente, ou por ignorancia culpavel, desonerado de uma obrigação de resti­tuir, ou injustamente o obrigasse, deve advertil-o depois de

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ler obtido permissão; de outra sorte é elle mesmo obrigado a restituir. Se, caindo n’esle erro, elle não commetteu uma falta grave, não é obrigado a ndvérlil-o cum gravi incommodo; mas se, podendo remediar este erro sine gravi incommodo, o não faz, é obrigado á restituição. Finalmente, se o confessor se esquecer de advertir o penitente que restitua, não é obri­gado a restituir elle mesmo, embora seja parocho e commet- tesse n’islo uma falta grave. Podeis ler o livro VI, fn.® 620) onde todos csles casos de consciência estão decifrados. Alli achareis tambem as razões e as auctoridades dos doutores sobre esla matéria.

CA PITULO I I

Das precauções qne o confessor dcvc tomar antes de confessar

Depois de ter fallado das qualidades do confessor, resta-me expor-vos as precauções que deveis tomar por vós mesmo, a fim de que o ministério da conlissão vos seja util, assim como a vossos penilenles. Entre estas precauções, umas devem preceder-vos, outras acompanhar-vos ao tribunal, c todas são tendentes a desviar de vós o perigo, ou de exercer mal este santo ministério, ou de não o exercer; linalmente a tornar- vos mais benigno e mais proveitoso.

129. (SACEnnoTE santificado, n.®' 101-118.) — Não care- .Não care­cer das qualidades necessárias, ter a estima conveniente por esle ministério, não o deixar por molivos humanos, não o ‘'necessa- deixar por molivos espirituaes mal fundados. rias.

E primeiramente não o exercer sem ler as qualidades ne­cessários. Assim tereis as qualidades que dizem respeito aç penitente, e que mais acima vos lenho explicado. Para isto enchei vosso coração de uma caridade de pae, de outra sorte abandonareis ou exercereis com negligencia este faligador ministério. Só a caridade pódc suavisal-o ao confessor e ao penitente, de modo que os torne assiduos, o primeiro a exer- cel-o, e 0 segundo a aproveilar-se d’elle, Immensos mereci­mentos são a recompensa do primeiro; a remissão de suas faltas passadas, a graça de não reincidir n’ellas, a perseve­rança na virtude são as vantagens do segundo: nara um e para o outro a gloria de honrar nosso Senhor. E verdade que a caridade não basta, mas tambem é verdade que sem a caridade tudo é insullicienle. É a disposição a mais dillicil e ao mesmo tempo a melhor, seja para adquirir a sciencia de juiz e habilidade de medico, sejn para fazer uso d’ellas, é a

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qualidade dc que com mais frequencia se carece. Entre um cento (le confissões, apenas se encontram duas ou tres que exigem uma sciencia mais que ordinaria, emquanto que quasi todas requerem uma grande caridade para acolher, para sup­portar e para ajudar efiicazmente o penitente.

Habilidade 130.— Ajuntae-lhe n habilidade dc medico. Póde dizer-se dc medico, com verdade que 6 ella que, em certo sentido, dirige a scien­

cia moral, de que ella é a força, o apoio, a riqueza, a perfei­ção e 0 complemento. Com elTeito, ella não é oulra cousa mais do que a sciencia ascclica que, ensinando quanlo dilTe- rem a theologia especulativa e a theologia prálica, nos faz co­nhecer qual 6, no exercicio do sanlo ministério, a moral a mais util á gloria dc Deus e á santificação das almas, quero dizer, aquella que não é nem relaxada, nem rigorista, mas prudente e discreta. Ella é a força e o soccorro da moral, porque ao conhecimento das matérias que fazem o objecto dc vossas interrogações, ella ajunla a astúcia, o discernimento, a reserva necessaria para descobrir e conhecer todo o mal, sem passar a ser nociva ao enfermo, quero dizer, ao peni­tente. Trata-se de ensinar e decidir na qualidade de doutor; ella vos ensina a evitar o duplicado escolho do rigorismo e da relaxação: umas vezes por uma firme linguagem, outras vezes por um silencio prudente, outras vezes acioplando al­gumas modificações ou contcntando-vos com simplices con­selhos. Mas è sobretudo como juiz, na absolvição ou conde­mnação do culpado, que cila vos fornece recursos para o dis­por á receber a absolvição sem expor o sacramento, ou a su-

ritar-se a uma dencgação sem perigo para a sua alma. Ella a riqueza da moral; graças aos motivos, aos exemplos e ás

industrias que ella põe á vossa disposição, ella vos dá nume­rosos meios dc facilitar ao pcuitcnte o cumprimento das mais penosas obrigações, de achar o remedio proprio a cada uma das enfermidades da alma, linalmente de tornar a penitencia mais conveniente e mais ulil, seja como reparação do passado, seja como preservativo para o fuluro. Isto nâo é tudo: em­quanto que a moral se limita a bem absolver o culpado, o ascetismo o conduz á perfeição; portanto esludae o ascetismo para ler a habilidade de medico.

Ksiudo. 131.— Todavia appiicae-vos ao estudo da moral, de oulrasorte é a vosso respeito que se verificaria esta ameaça do propheta Oseas, cap. iv: Quia turepulisli scierUiam, repel­iam te, ne sacerdotio fungaris mihi, ao menos no ministério da reconciliação. Para adquirir esta moral que é util ás al­mas, a moral discreta, empregae os meios que vos indiquei: a oração, um espirito imparcial e docil, a leitura de muitos auctores. É assim que evilareis o rigorismo e a relaxação.

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cujos funestos effeitos vos tenho demonstrado. Taes são as tres qualidades que devem sempre acompanhar-vos; com uma só de menos, embora tivesseis as outras em alto gráu, nunca serieis um confessor util; porque ou não quererieis, ou não saberieis estudar, nem pôr em prática os meies de curar as almas. Vós podereis ver isto claramente na conducta que eu vos dizia tivesseis com os peccadores particularmente, cujo estado requer uma prompta absolvição. Não se poderia de­cidir qual das tres qualidades é mais necessaria, ou a scien­cia de juiz, ou a habilidade de medico, ou a caridade de pae.Tudo 0 que se póde e sc deve dizer é que todas tres são in­dispensáveis para bem dispor e absolver prudentemente taes penitentes. Aqui eu vol-o confesso, que vendo certos eccie­siasticos ardentíssimos pelo estudo da moral, mas indilferen- tes para n sciencia ascética, que consideram como inutil, ou muito sabida por outros meios, além d’isto estranhos á vida espiritual, sem n qual é impossivel ler uma verdadeira cari­dade de pae. eu me lenho muitas vezes perguntado a mim mesmo: Mas esta grande sciencia da moral poderá jámais fa- * zer bons e perfeitos confessores? Estes ecciesiasticos, cujo espirito é tão illustrado, mas lão frio o coração a respeito de sua própria salvação, desempenharão bem a funcção mais diflicil e todavia mais freqüente de seu ministério? Terão el­les a paciência, a caridade, o zelo para ajudar o penilenle? 0 bello ardor pela sciencia de juiz, quanto mais uteis ministros prepararias para o Senhor, se fosses junto a uma vida de oração e dc leituras piedosas, próprias a formar médicos ba­beis e paes caritalivos! Quanto a vós, estudae a moral com assiduidade, mas não vos limiteis a isto; ajuntae-Ibe o estudo do ascetismo e os cuidados os mais diligentes para adquirir a caridade. A (im de vos animar n’este nobre trabalho, nada mais util do que aquillo que vou dizer-vos do alto apreço do ministério e da necessidade de ser um santo, ou ao menos um homem muito solidamente (irme no temor de Deus, para nunca peccar mortalmente.

132.— Para excitar em vós este apreço, que tanto merece Ter uma 0 ministério da conlissão, e que vos captive bastaule para alia idéa nunca o abandonar ou desempenhar com negligencia, lenho ''q santo tres cousas a dizer-vos, que me parecem bem importantes,e muito capazes de vos animar a islo fortemente.

133.— Primeiramente digo, que nada ha mais agradavel a xcnlmma Jesus Christo do que ter zelo pela salvação das almas, e por funcção consequencia ajudal-as eflicazmenle pelo ministério do tribu-nal a reconciliar-se com Deus. Saheis que depois de sua re- «usChristõ surreição, nosso Senhor, apparecendo a S. Pedro, lhe per-" guntou por tres vezes: Simon Joannis, diligis me plus his ?

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S. Pedro lhe respondeu: Domine, tu seis quia amo te. Em uma palavra, para unica prova de seu amor, Jesus lhe man­dou que apascentasse seus cordeiros: Pasce agnos, pasce agnos.pascepvesmeas. (Joan.,\\i.) Depois que está no céo, 0 Salvador não mudou. Pacilico sobre a terra, Elle foi todo amor c todo zelo pela salvação dos homens, até morrer por elles; da mesma sorte glorioso no céo, Elle de algum modo não eslá ahi senão para sua salvação. A direita de seu divino Pae, elle continua seu ministério de Redemptor: Interpellat pro nobis. (Ad ííebr., vii.) Advocalum babemus apud Pa- trem. Dominum noslrum Jesum. [Í.Jo a n .) No santo sacrifí­cio Elle dá a sua vida divina e a oITerece pelos mesmos lins que no Calvario, e no Sacramento do altar se faz nosso ce­leste alimento. Se portanto Elle vos apparecesse visivelmente e vos perguntasse: N. N. diligis me plus his? seria para vós um dever e uma honra o poder responder-lhe com verdade: Domine, tu seis quia amo te. Ora, sabei que se no Evange­lho Elle declarou o que quer de todos os seus discipulos: Hoc est prmceplum meum, ut diligalis invicem, sicut dilexi vos; in hoc cognoscent omnes quod discipuli mei eslis, si dileclionem habueritis ad invicem, de vós, sacerdote, além da caridade corporal, Elle exigiria a espiritual, e vos diria: Pasce, pasce, pasce agnos, oves meas. Pois bem, esta satisfação, á qual Elle tão grande premio liga, esle penhor unico de vosso amor, lh’o recusareis vós, cujo nome de servo, commum a todos os christâos, no dia de vossa ordenação elle trocou, pela bôca dc seu pontifice, n’aquelle dc amigo? Jam non dicam vos ser­vos... vos autem dixi amicos. {Joan., xv.) Elle não se con­tentou em dar-vos esle nome glorioso, Elle ao mesmo tempo vos concedeu os soccorros, os privilégios e todas as vanta­gens que distinguem os amigos e válidos dos servos d’este grande Rei. Se portanto, sem escusa legítima, recusnsseis empregar-vos n’esle ministério, poderieis vós julgar que o amaveis verdadeiramente e segundo seus desejos? Não, de de certo. S. Chrysostomo vos adverte d’isto. Ouvi-o desen­volvendo precisamente as palavras dc Jesus Christo a S. Pe­dro: Nullum enim officium hoc Deo charius... neque prorsus alia res est, qux perinde dectaret docealque quis sit fidelis et amans Christi, quam si fratrum curam agal, proque illorum salule gerat soliciludinem. Se não amaes a Jesus Christo se­gundo seus desejos, podeis estar satisfeito de vós mesmo, ou esperar rncionavelraente que Elle o esteja de vós?

Nenhuma 134.— Acrescenlae que nada é mais util e mais necessário funcção ao proximo que o zelo, e entre suas funcções aquella do sa-

ás*à1mas tribunal. Sem dúvida é muito necessário, muito van- ' tajoso ensinar e prégar; mas um pequeno numero basta para

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este emprego. Um só homem póde fallar simultaneamente a milhares de ouvintes; um pequeno numero de discursos du­rante 0 anno póde bastar para o anno inteiro, dado que os ouvintes conservem a lembrança d’elles, ou a suppram com a leitura de bons livros. Não é assim a respeito da confissão; aqui é necessário um muito grande numero de obreiros, e suas funcçõcs se reproduzem muitas vezes. Ao mesmo tempo não se coufessam muitas pessoas de cada vez, é necessário ouvir cada um em particular, e muitas vezes um só gasta tanto tempo como seria necessário para muitos discursos. De­mais, a necessidade de se confessar se renova frequentemen­te, seja para as almas piedosas que querem conservar-se no fervor, seja para os peccadores que querem converter-se e reconciliar-se com Deus.

Acautelae-vos portanto de vos subtrahir a este dever com 0 pretexto de que não faltam outros confessores. Não, de certo, nunca haverá bastantes para facilitar aos lieis o maior dc todos os meios de salvação, a frequencia dos sacramen­tos. Que digo eu? Vós mesmo tereis notado que muitos abandoDara o confissão, porque não acham um confessor, ou 0 vôem de lal modo cercado, que lhes seria necessário espe­rar muilo tempo: sejam negocios, seja enfado, nada fazem e vão-se. Deus sabe o damno que resulta para suas almas. Talvez, ah! como muitas vezes tem acontecido, elles não irão até ao dia seguinte; mas desde este mesmo dia. por te­rem sido privados das graças do sacramento e das boas ad­moestações do confessor, á primeira tentação cairão em pec­cado mortal, tornarão assim mais diflicil sua confissão futura, a sua condemnação mais facil e talvez mais prompta! Isto não é tudo: 0 pequeno numero dos confessores não é só nocivo aos penitentes, mas tamhem aos mesmos confessores que, achando-sc sobrecarregados, correm risco ou de cumprirem imperfeitamente seu dever, ou dc abandonarem este minis­tério a fim de não perderem sua alma e sua saude. Certa­mente lerieis como uma falta de conscieucia o não soccorrer vossos irmãos, se os visseis alllictos com graves enfermida­des ou outros males lemporaes; e sereis vós insensível ás necessidades das almas expostas, umas cm razão dc seus pec­cados morlaes, outras em razão de suas grandes tentações e occasiões dc fazer o mal, ao perigo contínuo de perder não a vida de um dia, mas uma vida eterna; ao perigo de cair não em uma desgraça presente c transitória, mas em uma desgraça futura e eterna I Além da necessidade das almas, as vantagens que os fieis colhera da confissão não são um novo motivo para vos animar a este ministério de caridade? Vêde, os logares onde ha um numero suflicienle de bons confesso-

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res assiduos no tribunal, se distinguem pela frequencia dos sacramentos, por costumes menos desordenados, por uma pie­dade maior, dos outros logares onde os confessores são em pequeno numero ou muito pouco zelosos. Se é certo, como dizia um santo Popa: Dae-me bons confessores, e depressa o mundo será reformado; nós podemos dizer, não com menos verdade: Tirae os numerosos e bons confessores; que elles se­jam em pequeno numero ou menos bons, e depressa o mundo estará em aesordem e corrupção. Sereis portanto mais ulil ao proximo desempenhando bem este ministério, do que espa­lhando cnpitaes no seio dos pobres, consumindo vossa vida no ailivio dos doentes, pois que procuracs ás almas a vida mil vezes mais nobre da graça, e as riquezas mil vezes mais preciosas da eternidade.

Nada mais 13o.— Finalmente, nada podeis fazer mais util para vós vantajoso mesmo do que preferir a todas os obras do zelo aquella da

conlissão, seja que considereis a Deus, ao proximo, ou ao ministério mesmo. Em relação a Deus; confessando, concor- reis para a obra que lhe é mais honrosa e mais querida, a salvação das almas, e isto de um modo mais immediato, mais proximo c mais directo do que por orações, sacrifícios ou sermões. Com elTeito, pela absolvição não dispondes sómente para a vida da graça, mas cITeclivamcntc a produzis n’aqucl- les que eslão bem dispostos. É aqui que o Salvador recolhe 0 fructo dc sua morle dolorosa; é aqui que Elle Iriumpba de seus inimigos e os expulsa da alma; é aqui que Elle entra para reinar nos corações dos fieis; é aqui que Elle torna a achar seus filhos perdidos, com tal fortuna, que põe todo o céo em festa para se regosijar d’islo com Elle. Ora, quanto a vós, ministro e medianeiro d’esta conversão, d’esta paz, d’esla victoria, que merecimento, que recompensa no decurso da vida, na morle e no céo, não rccebereis do divino Mestre, que promcttcu elogios e recompensas tão magniíicns ás obras as mais pequenas da caridade inferior, a caridade corporal?

ncconho- 136. — 0 proximo convertido por vosso ministério concor- cimcnto rerá lambem para augmentar vosso merecimento e embelle- te°iuèr"' soubesseis como os sentimentos da

natureza e da graça excitam os penitentes a este reconheci­mento espiritual para com os paes de sua alma! Allivindos por vossos cuidados da pesado carga de seus peccados, dos remorsos de suas conscieucias, desviados do perigo dc sua condemnação, elles gosam a paz do Espirito Sanlo, que no seu coração tornou a entrar; elles sentem renascer n’elles a força de trabalhar no grande negocio de sua salvação, de evitar o mal e de praticar o bem; elles esperam sempre achar em vós c por vós luz e conselho em suas dúvidas, consolação

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nas penas da vida, nas enfermidades e na niorle; auxilio e commiseração em suas reincidências; em uma palavra, soc- corroi para chegar á felicidade elernn. É a razão por que se senlem peneirados por vós do rcconliecimenlo o mais since­ro, mais vivo c mais seguro. Elles vos retribuem orando muilas vezes por vós, e seus anjos cuslodios enlrcleem n’cl- les esle sentimento para vos recompensar de vossa caridade a respeito dc pessoas que elles lão ternamente amam. Os pe­nitentes pois rogam por vós no estado dc saude, na doença e depois da vossa morte. Ora, quanlo taes orações, que par­tem de um coração purificado do peccado e ornado da graça á custa de vossas fadigas, não são agradaveis a Deus e pró­prias a allrahir-vos abundantes bênçãos! E na realidade, quantas vezes os bons e assiduos confessores uão se senlem penetrados de devoção, sem achar em si mesmos nem o me­recimento, nem o motivo, nada lendo feilo.em particular para obter esto favor cm lal circumstancia? É Jesus Christo que, já inclinado de si nicsnio a recompensar seus (icis mi­nistros, se acha a isto solicitado fortemente pelas orações e boas obras de seus penitentes. Cáe doènle o confessor? Oh! como seus lilbos agradecidos rcduplicam suas orações; como seus bons anjos as apresentam voluntariamente ao Ihrono de Deus, seja para lhe alcançar a saude, dc que ella faz ura uso tão util ás almas, seja uma morte sanla e um feliz transito á eternidade! A mesma niorlc não interrompe esle commercio de caridade entre os penitentes e o confessor. Se os confes­sores morrem primeiro, os penitentes por seus votos adoçam e abreviam seu purgatorio, e apressam sua entrada no céo; se 0 penitente precede a confessor, quem póde exprimir a doce violência que, na mansão da caridade, elle fará ao co­ração dc Deus para que Elle cncba seu pae espiritual de tan­tas graças, que venha cm seu tempo parlicipar da gloria, cuja posse, depois de Deus, elle Ihc deve?

137.— Vêdes quantas vantagens vos resultam do lado dqs Santillca- penilentes que tendes soccorido. Mas o mesmo minisierioção do con­tem alguma cousa singularmente própria a santilicar-vos.Com elfeito, elle exige de vós uma mortificação frequenle, para vos privar de outras occupações ou recreações de vosso goslo, a lim de estar sempre livre e prompto para esta fun­cção duplicadamcnlc penosa, não só pela fadiga que cila im­põe ao corpo, mas pela solicitude de que enche a alma do con­fessor sobre a sua consciência e sobre a do penitente. Aqui tendes a praticar uma viva caridade, uma grande paciência para acolher, supporlar e ajudar lodo aquelle que a vós re­corre. Depois, as verdades que inculcaes aos outros, as re- prehensões que lhes dirigís sobre seus defeitos, as exhorla-

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ções que lhes daes para a virtude vos são uteis, porque para vós rellectem. Este merecimento e esle proveito o podeis ter, comtanto que não temaes vosso trabalho, não de longe a longe, como prégando ou celebrando uma vez cada manhã, porém muitas vezes cada dia, e bem freqüente nas circum­stancias as mais urgentes e mais espinhosas para o proximo, por consequencia as mais santilicantes para vós. Demais, é bem menos de temer que a vangloria vos roube vossos me­recimentos, do que se vós prégasseis diante de um numeroso e brilhante audilorio. Aqui o trabalho nâo é conhecido senão de Deus, do penitente e de vós. Muitas vezes, em logar de louvores, resulta-vos ou viluperio, que deveis solTrer em si­lencio sem mesmo defender-vos para não trabir o sigillo sa­cramental, ou grandes incommodos para assistir a enfermos, ou para consultar casos de consciência; d’aqui, novas occa­siões de vos sanlilicar, trabalhando de dia e muilas vezes mesmo de noite.

Estima 138.— Discorrei agora por todas as funcções apostólicas, e dos santos nenhuma achareis que mais a peito devaes ter, seja para a nisteri™cia8’®'''® ^cus e befii do proximo, seja para vossa própria conQssão. vantagem durante a vida, na morte, no purgatorio e no céo.

Oh! quem dirá em que proporção crescerá vossa gloria, quando estiverdes cercado de uma multidão de almas que te­reis salvado por um ministério menos brilhante do que a pré­dica, porém mais freqüente, mais penoso, mais ao abrigo da vaidade, e feito para vos procurar mil vantagens da parte de Deus, da parle dos penitentes e por sua própria natureza! Tende pois por este ministério a alTeição c estima que elle tanto merece. 0 venerável Luiz Duponl tinha recebido de Deus luzes particulares para se alTeiçoar a esle emprego. Elle via todas as obras de misericórdia espiritual; consolar os afllictos, instruir os ignorantes, dar conselho áquelles que estão em dúvida, converter os peccadores, conservar os jus­tos, conduzil-os á perfeição, enchel-os de zelo e lornal-os uleis aos outros, cm uma palavra, elle via n’islo tantas c tão grandes vantagens para si mesmo c para o proximo, que, não podendo assentar-se por causa de uma indisposição, perma­necia de joelhos no confessionário cinco e seis horas conse­cutivas, antes do que privar a si mesmo de lanlo mereci­mento, e 0 proximo de tantas vantagens. Tenho-vos referido de S. Filippe de Neri, que, sem alguma attenção por si mes­mo, eslava sempre accessivcl c prompto a receber a todas as horas do dia c da noite todos aquelles que recorriam a seu ministério. 0 Padre Pinamonti confessava de ordinário onze horas por dia na maior parte do anno, lão paciente com o ul­timo como com o primeiro. S. João Francisco Regis, já apos-

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sado da febre de que morreu, não pôde eximir-se de confes­sar uma mullidão de paisanos que se tinham dirigido a elle.S. Francisco de Salles estava sempre tão prompto a confessar e era tão consolador no exercicio deste ministério, que elle não podia hospedar-se em casa alguma, mesmo indo de via­gem, sem ser obrigado a demorar-se por muito tempo para ouvir as confissões dos habitantes. João de Niville, tendo necessidade para sua saude do tratamento de tres mezes, o recusou antes do que deixar o confessionário por tanto tem­po. É assim que nosso Senhor esclarecia e confortóva os seus servos n’este ministério; é assim que elles testemunhavam a Deus seu sincero e solido amor, mostrando-se infatigáveis n’este santo emprego, e desempenhando-o de modo que se santificavam a si e a seus penitentes.

139.— A(Teiçoae-vos, pois, tanto a este ministério, que por Não aban- nenhum motivo humano o abandoneis, taes como são ns oc- õonar q cupações mais conformes a vossos gostos ou o temor da fa- „{!{“ mot?- diga c do enfado. Não nego que a necessidade da vida ou o {-os buma- cuidado da vossa saude nno possa algumas vezes desviar-vos nos.ou impedir-vos. Eu concordo, deveis tomar um cuidado ra- zoavel por vossa saude; mas como é muito para temer que vosso amor proprio vos engane, desejo que dilateis vosso co­ração por uma magnnnimn conliança cm Deus: eis aqui os motivos. Como podeis vós melhor conciliar sua protecção, mesmo cm vossas necessidades temporaes, do que empre­gando no menos uma parte dc vosso tempo, assim como as forças de vosso espirito e dc vosso corpo, em um ministério que lhe é tão honroso e tão querido? Os cortezãos põem uma tal conliança nos príncipes da terra, que, pnra seu serviço, desprezam seus bens e seus interesses pessoaes, c o Rei do céo será o unico que não ohlcrá dos sacerdotes, seus validos e seus ministros, bastante conliança para crerem que sc tra­balham para o fazer glorificar, de seu lado Elle cuidará d'el- les e de todas as suas necessidades? E quando vossa saude ou vossos hcns sodressem um tanto, poderieis vós perdel-os por uma causa melhor, mais nobre c mais vantajosa?

140.— Por outra parte, abandonareis vós este util ministe- Nem por rio por motivos espirituaes, quero dizer, pelo receio de en-"*?* carregar yossa consciência c a dos outros, pretextando que 5,533 espi* não tendes as qualidades nccessarias, e que tendes conhecido i-iiuacs. que praticaes muitas faltas; ou então, debaixo do pretexto

Sue este ministério é para vós uma origem dc tentações, ou nalmentc que elle vos impede de melhor vigiar sobre vós

mesmo? Eu principio por vos advertir que vosso amor pro­prio acha sua desculpa engrossando estas razões espirituaes.Ê com islo que elle occulUi e coloro, sem 0 conhecerdes, pri-

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meiraraenle esta preguiça, que teme os enfados e desgostos; depois esta inclinaç.ão a outras occupaçOes mais agradaveis, mais lucrativas, mais honrosas e mais conformes a vossos gostos.

0 demonio não deixará de unir-se ao amor proprio. Trans­formando-se em anjo de luz, elle vos representará de mais em mais os pretendidos perigos dc vos perder e aos outros pelo meio estabelecido para santificar o confessor e o peni­tente. N’islo acha elle a duplicada vantagem de privar o peni­tente de vosso soccorro e a vós mesmo de vossos merecimen­tos. Consequentemente, eis aqui suas esperanças: assenho- rear-se cada vez mais dos penitentes, que, por falta dc con­fessores, perscverarão em seus peccados; quanto a vós, de­pois de vos ter retirado do santo ministério, fazer-vos cair por mil arlilicios na inacção e ociosidade, e fazer-vos tanto ou mais vicioso do que os seculares. Isto não é tudo: fazendo passar a tentação de vós a outros confessores, elle não dei­xará a vós mesmo a commodidade de confessar-vos. Desde então, privado d’este remedio, que não querieis dar aos ou­tros, ficareis cm seus laços. É assim que o inimigo, enga- nando-vos debaixo do pretexto de santidade, faz que secun­deis seu falai designio de arrancar á Igreja csla columna da religião catbolica, a frequencia dos sacramentos. E assim que,' sem ser ura berege que negue o sacramento, nem um impio que o despreze, vós corrcis o perigo de ser um marlyr da illusno, que, debaixo do pretexto de santidade, abandona 0 sacramento mais necessário, depois do baptismo, para a santidade e salvação. Yós tendes portanto graves e sólidas razões dc temer que vossos remorsos não sejam a voz de Deus, nem da verdade, mas um artificio da natureza e do pae da mentira. Oh! desgraçada Igreja de Deus, se esle te­mor excessivo chegasse a generalisar-sel Abstende-vos de sacrificar lão promptamente a estes médos. Nolile, vos direi eu, omni spiritui credere, sed probale spirilus si ex Deo sint. (/. Joan., cap. iv, 1.} Vôde se os vossos molivos sustentam 0 exame e a prova de uma prudência conforme ao espirito de Jesus Christo, o qual quiz que o uso da conlissão fosse perpetuo, necessário em sun Igreja, e que cstc sacramento fosse administrado por homens e não por anjos.

Nem 141.— E primeiramente vejamos qual das tres qualidades relativas aos penilenles vos falta. Eu imagino que vóssobre-

se podem tudo temeis não ler a sciencia necessaria. Eu vos disse, erafazer. o n.“ B3, sobre a aucloridade de graves auctores, o que prin­

cipalmente vos 6 necessário saber. Se o ignoraes, não deveis aventurar-vos a confessar, a fim de não ser embaraçado, para assim dizer a cada passo, na maior parle das confissões. Mas

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se 0 sabeis, islo basta para exercer licitamente este ministé­rio. Com efleito, a experiencia ensina que de cem confissões mais de noventa não exigem mais do que uma sciencia abso­lutamente commum e para assim dizer vulgar, lão claras são as cousas. Poucas exigem uma sciencia mais ampla; c ainda, para esle pequeno numero, podereis o mais das vezes absol­ver logo 0 penitente, salvo o examinar com vogar o caso que se apresenta. Eu vol-o tenho demonstrado, com a reserva imperada pein prudência, em o n.® 125, fallando dos meios de fazer curtas e boas ao mesmo tempo as confissões. Obje- ctaes vós que vos tendes enganado no ensaio que tendes feito do tribunal: a isto vos respondo: Conheceis um confessor, embora seja sabio, que jámais não commella faltas? acres- cenlae que estes erros provém algumas vezes não da igno­rância, mas da perturbação, principalmenle no principio; e mesmo em um coufessor experimentado, ellas são occasiona- das pela irreflexão, ou pelo esquecimento de matérias muito sabidas, e mesmo muito imporlanles. seja por causa da mul­tidão de cousas que se ouviram, seja por causa de sussurro exterior que algumas vezes perturba. Desgraçada pois, eu 0 repito, da Igreja de Deus, se o unico remedio para seme­lhantes erros fosse abandonar o emprego; oh! antes o melhor remedio para eslas faltas é reanimar suas forças, encommen­dar-se um pouco mais a nosso Senhor, precaucionar-se para 0 fuluro, e adquirir, continuando suas funcções, esla facilidade que, deixando mais socego de espirito e de coração, torna mais apto a desempenhal-as dignamente. Se as faltas forem graves e numerosas, suspendei por algum tempo o exercicio do tribunal, para vos tornar mais habil, mas nunca o aban­doneis. Se as faltas forem leves ou raras, em tal caso, sup­posto que estaes approvado por vosso bispo, e que sabeis as cousas necessárias, podeis licitamente expor-vos.

142.— Para vos preservar de mais em' mais dos enganos. Meio de ai ponde cm prática os meios seguintes: 1.° Antes de vos en- evitar, tregardcs ao ministério, pedi a algum confessor antigo c ha­bil que vos faça uma confissão simulada, a íim de adquirir promptamente o uso prático do que já sabeis. É assim que aprendcreis, entre outras cousas, a principiar, interrogando pelo principal, e cuja negação vos dispensa de ir mais longe.Se, por exemplo, uma pessoa se accusa de ler máus pensa­mentos, anles de perguntar de que genero elles são, pergun­tae se tem ou não consentido; porque se não tem consentido, tudo por esta parle está acabado: é inutil ir mais longe.Aprendei depois a interrogar sobre as cousas práticas prova­velmente commettidas pelo penitente, sem vos demorar em cousas possiveis e que não acontecem senão raras vezes.

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Inslrui-vos (inalmente das admoestações as mais uteis, e das penitencias mais convenientes que se devem dar. 2.® Será bom, depois de ter confessado, que pergunteis a vós mesmo como vos tendes conduzido; mas nunca deveis perlurbar-vos, nem desanimar, ainda mesmo que tivesseis feilo mal. Exa­minae se 0 erro é essencial, ou se não é mais do que acci- denlal. No primeiro caso reparae-o logo que podérdes, se­guindo as regras que dão coramunimenle os doutores (vôde n.® 128); no segundo contentae-vos de vos humilhar por islo. Taes exames vos ensiuarào a praticar melhor para o futuro.3.® Nos casos diíTiceis, para sair do embaraço a sciencia ascé­tica ajuda muitas vezes mais do que a moral. E a razão por que vos traçarei a conducla, que, unindo estas duas sciencias, procure a saude espiritual do penitente; em relação ás pes­soas novas, n.® 202; ás pessoas virtuosas, n.® 210; aos pcc- cadores que tôem necessidade de uma prompta absolvição, n.®* 216 e seguintes; aos enfermos, n.® 371; áquelles que têem graves obrigações, n.® 310; áquelles que são negligen­tes em conhecel-as, n.® 312; aos recidivos, n.®’ 334 e seguin­tes. Já vos indiquei os meios de adquirir uma moral sã e util, n.® 67. Quanlo ao modo de inlerrogar, vos fallarei em os n."* 167 c seguintes. Eu vos traçarei o modo de instruir em 0 n.® 167; como se ha de fazer, seja para absolver sem expor 0 sacramento, seja para reter o peccado sem perigo para o penitente, o vereis em os n.®» 198 e seguintes. Com esles soccorros, dado que tenhaes a caridade dc pae, espero não vos ler pouco facilitado o caminho, e tenho conliança do que nunca sereis tentado a abandonar este emprego por falta de habilidade. Sómente estudae a moral em toda a vossa vi­da: sempre ha alguma cousa que aprender ou recordar.

Aos con- 143.— Sc vos queixaes que experimentaes no tribunal fessorcs uma multidão dc tentações, eu vos responderei primeira-

nmentam consoladoras palavras: Temeis as tentaçõestenlaçOcs. experimentaes no tribunal, porlanlo não succumbireis a

ellas. 0 temor dc cair é o primeiro dom que o Espirito Santo faz a seus escolhidos. Por islo Elle os premunc contra as qué­das, c os habitua a alcançar viclorias sobre si mesmos, a lim de os tornar mais compassivos para com os outros, e mais babeis em dirigil-os. Se vós nâo lemesseis, eu temeria por vós. Eu duvidaria sc devia animar-vos a um ministério em o qual cairieis facilmente por ftilla de temer os perigos, c de obvial-03 com as precauções convenientes; porque, devo con- fessal-o, lem muitos escolhos. Temei pois, e só com vossa vida termine o vosso temor: Beatus homo qui semper est pavi- dus. {Prov., xxxviii.) Mas tenba limites o vosso temor, a (im de não cair no abatimento e abandonar vosso emprego; que

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pelo contrario elle vos leve a esperar de mais em mais e a premunir-vos pela desconfiança de vós mesmo, pelas precau­ções convenientes e pela confiança em Deus. Vossa espe­rança não será vã. Todas as vezes que nos expomos ao pe­rigo por um motivo tão santo e em vista dc um hem tão necessário aos homens, como é a sua rccouciliação cora Deus, e que além d’isto se empregam as precauções "convenientes: fidelis Deus non patietur vos tenlari supra id quod potestis, sed faciel etiam cum lenlalione provenlum. ( I . Ad Cor.) Pro- ventum não sómente de soccorros para resistir, mas tambem de oulros merecimentos para vós, e dilTerentes vantagens para vós e vossos penitentes. Scaramclli refere em seu Dire- clorio ascético, que um sacerdote chamado Conon estava en­carregado de uma igreja dedicada a S. João Raplisln. Entre outras funcções, devia baptisar todas as pessoas adultas, se­gundo 0 uso dos primeiros séculos. Ora, este ministério era para elle a origem dc grandes tentações. Muilas vezes linha formado o projecto de renunciar a islo, quando S. João Ba- ptista lhe appareceu e lhe disse: So/frei e perseverae. Sua coragem se rcanimou por algum tempo c conlinunu. Mas em certo dia conhecendo dc longe uma rapariga que vinha pe­dir-lhe 0 baptismo, ah! d’csta vez, disse elle comsigo, não resistirei á tentação; é melhor que eu fuja. E cITeclivamente fugiu. No caminho ouviu S. João Baplisla, que, delendó-o instantaneamente, lhe disse: Vollae. E depois castigando o, acrescentou: Vollae a vosso emprego; para o fuluro não será máis para vós a origem de tentação alguma; mas sabei que tendes perdido a brilhante corda que a vicloria d'cstas tenta­ções vos faria ganhar. Conon reassumiu seu emprego, e o desempenhou sem ser atormentado; raas perdeu a recom­pensa preparada a seus combates victoriosos. Portanto fugi muito de desanimar por um semelhante motivo. Pelo contra­rio, esperae dc Deus não só a victoria, mas lambem a mais brilhante corôa, se continuardes vosso ministério. Todavia não vos esqueçacs de vos cercar com as precauções de que logo vos fallarei.

144.— Direis tambem que melhor seria estar desembara- Áquelles çado de vossas funcções, a fim de vos occupar mais seriamente q*'c não de vós mesmo e do‘vosso progresso espiritual. Eu não pode-ocS™sc ria sulTicientemenle louvar vosso zelo por vossa santificação, õesuapro- Trabalhar para vos santificar é sem dúvida vosso primeiro nria santi- dever; mas este é lambem o melhor meio para santificar os''®“5ã®- oulros. Chegado á verdadeira santidade, tereis a melhor de todas as sciencias, a experiencia das virtudes que sc devem praticar, dos vicios que se devem combater: achar-vos-heis mais em estado de instruir os oulros sobre isto. Chegado á

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verdadeira santidade, obtereis que Deus abençoe mais eíli- cazmente vossas palavras, que ellas toquem os penitentes, os commovam, os animem e santifiquem. Cheio do espirito de Deus, obtereis frequeutemente, dcsde logo e em poucas pa­lavras, 0 que oulro menos fervoroso não obterá por longos discursos muitas vezes repelidos. D’esle modo podereis em pouco lempo ser ulil a um grande numero de almas, em­quanto que 0 tibio apenas, depois de um longo espaço, será ulil para alguns.

Continua- 143.— Tende pois e nunca deixeis de ter este grande zelo Ç®®- por vossa snnlilicação. Os apostolos o tinham, bem que cheios

do Espirito Snuto c confirmados na graça. Todavia elles se desencarregaram sobre os sete diaconos do cuidado de dis­tribuir 0 alimento corporal aos novos lieis, já muito numero­sos, a fim dc terem elles mais lempo paro orar e para distri­buir 0 pão da divina palavra: Nos vero orationi et ministé­rio verbi instantes erimus. (Act., vi.) Quanta mais necessi­dade não temos nós de uma oração longa e freqüente, nós que somos lão inferiores aos apostolos em graça c em virtu­des? Mas 0. zelo da sanlilicação não deve impedir um sacer­dote de trabalhar na sanlilicação dos outros; é pelo contrario uma especie de dever, que Deus mesmo e a Igreja tem ligado ao vosso estado. iNão é em vão, nem para o esconder, que o sublime talento das chaves vos foi entregue. Ora, fazel-o ser­vir aos outros, principalmenle no sagrado tribunal, é um po­deroso meio de vos santificar, como mais acima vos mostrei. Para islo sede discreto; não desprezeis nem ura, nem o outro d’esles devcrcs, mas aprendei a unil-os sabiamente, traba­lhando allernadamcale em vossa santificação e na de vossos irmãos. Nós lêmos que um grande numero de santos, que reservavam a noite para orar, consagravam o dia ao serviço de Deus e ao serviço do proximo. Mas não é dado a Iodos poder, depois de duas ou tres horas de somno, enlregar-se ás longas orações dc noite e ás fadigas contínuas dc dia. Corlae com discrição o lempo que daes de mais ao somno, aos vãos divertimentos, ás occupaçõcs agradaveis, mas estranhas ás obrigações de vosso estado, que 6 um estado de santidade para vós, e de santificação para os outros. Depois d’islo acre- dilac que vos (icará muilo tempo para orar e pensar em vós de manhã, durante o din, assim como á noite, e para estar sempre livre a receber e ouvir os peuilcntes. Islo não quer dizer todavia que não possaes imitar o ccifador. Dc tempos a tempos deixa o campo, e asscnla-se á sombra de uma arvore para aíiar sua foucinha embolada. Esle momento de repouso não é um tempo perdido; elle, pelo contrario, dispõe n con­tinuar logo seu trabalho com mais desembaraço e facilidade.

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Assim podeis, deveis mesmo, para o bem de vossa alma,sus­pender, uma vez cada anuo, o miuistcrio do tribunal, para reanimar vosso fervor nos exercicios do retiro, por(|ue mesmo santo como é, este ministério póde tel-o diminuído algum tanto. Por isto, purificado e abrazado de um novo zelo, ireis trabalhar com mais succcsso na salvação das almas.

146. (S. Carlos, pag. 13-lS.) — Fazei lambem uteis a Oração, vós mesmos vossos trabalhos, purificando vossas intenções.0 confessor deve, na administração d’cste sacramento, orde­nar e regular de lal sorle sua intenção, que não se deixe le­var por algum respeito temporal, mas só pela gloria de Deus e pelo desejo da salvação das almas. E o motivo por que é necessário, todas as vezes que for rogado, ou espontanea­mente sc aprcscDtar a ouvir confissões, elevar seu espirito a Deus, e dirigir actualmente sua intenção a este fim, consi­derando com attcnção que vae lavar seus penitentes no pre­ciosíssimo sangue de Jesus Christo no.sso Salvador; c por isso que ha muitos perigos na administração (l'cslc sacramento, como errar na decisão dos casos c obrigações que se encon­tram, dar a graça da absolvição áquelles que são indignos d'ella, ou de (icar manchado de algum modo com ns impure­zas e immundicias que se ouvem dizer aos outros, o sacer­dote uão deve lambem jámais ir para ouvir confissões sem que antes tenha pedido a Deus, por alguma pequena oração, segundo n conimodidade que tiver, as luzes e graças de não commetter erros, e de lavar de tal sorte as manchas das al­mas dos penitentes, que não fique manchada a sua. Deve tambem orar pela verdadeira conversão d’aqucllcs, cuja con­fissão vae ouvir. É o motivo por que todos os confessores de­vem ter escriplos comsigo os versículos seguintes, tirados do psalmo 30, e a oração era todo o tempo usada na Igreja, da qual sc aílixará uma cópia na sacrislin de todas as igrejas onde ha confessores, e oulra dentro dos confessionários, a fira de que, antes de começar, a recitem cora attenção, ou alguma outra, segundo a devoção de cada um.

f . Cor mundum crea in me. Deus,n). E l spiritum rectura innova in visceribus meis.f . Nc projicias me a facic lua,n). Et spiritum sanctum tuum ne auferas a me.f . Rcddc mihi Imtitiam salutaris lui,n). Et spirilu principali confirma rae.f . Docebo iniquos vias tuas,i . E l impii ad te converlentur.f . Libera me de sanguinibus, Deus, Deus salutis mes,í). E t exultabit lingua mea jusliliam tuam.

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Domine, Deus omnipolens, propilius esto mihi peccatori, ut digne possim tibi gralias agere; qiii me indignum, propter tuam magnam misericordiam. minislrum fccisti officii sacer- dotalis, et me exiguum luimilemque mediatorem constituisti ad orandum et intcrcedenduni ad Dominum nostrum Jesum Chrislum Filium tuum pro peccatoribus et ad pocnitentiam revertentibus. Ideoque, dominator Dominus, qui omnes ho­mines vis salvos lieri et ad agnilioncm veritalis venire, qui non vis morlem peccatorum, sed ut converlantur et vivant, suscipe orationem meam, quam fundo pro famulis el famula- bus tuis, qui ad pcenitentiam venerunt; ut des illis spiritum compuüclionis, resipiscant a diaboli laqueis quibus adslricU tencnlur, el ad le per dignam satisfaclionera reverlantur. Per eumdera Dominum elc.

Dcsinle- U l . (Vid.a de S. F il ip p e de N e r i, liv. I I, cap. xv.} — Áressc. oração ajiinlae o desinteresse. Se o desinteresse é necessário

ao juiz secular, quanlo o não é mais ao confessor, juiz das consciências? S. Filippe de Neri coniprehendia lão bem sua necessidade, que não cessava de o recommendar aos padres de siia congregação: elle mesmo era um perfeito modelo de desinteresse. Entregue lodo ao ministério do tribunal, rece­beu muitas vezes, da parle de seus penitentes, os mais van­tajosos oITerecimenlos. Alguns, dc uma qualidade dislincla, lhe pediam que aceitasse grandes sommas, e mesmo muitos milhares de escudos, e isto não em attenção ao que por elles fazia, mas unicamente em respeito a elle, e por consideração para com sua pessoa. Recusou constantemente, dizendo que não queria receber n’esle mundo a recompensa de seus tra­balhos. Sc algumas vezes acontecia aceitar alguma cousa, logo 0 empregava para a igreja ou para os pobres. Elle que­ria que seus (ilhos seguissem a mesma conducta. Quando algum d’cllcs cra chamado ao santo tribunal, um dos princi­paes conselhos que lhe dava, era que não tocasse na bolsa do penitenle. Não se póde, dizia elle, ganhar ao mesmo tempo as almas e as riquezas. Quanto n seus penitentes, costumava repelir-lhes estas palavras de S. Paulo: «Não são vossos bens que eu quero, sois vós.» Aconselhava tambem a todos os confessores que nunca se mellessem em testamentos, sa­bendo quanlo ludo islo nos torna suspeitos aos seculares, ainda que se faça com a melhor e mais santa intenção. Elle acrescentava, que o escravo da avareza nunca faria algum proveito na piedade; que a experiencia lhe linha ensinado que os libertinos se convertem mais facilmente do que os

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avarentos. É o motivo por que elle chamava á avareza a peste das almas. Se algum penitente inclinado a este vicio lhe pe­dia a permissão de jejuar: «Não, meu lilho, lhe dizia elle, fa­zei esmolas.» Quando queria reprehendel-o indirectamente d’esta inclinação, lhe dizia: «Aquelle q ue ama o dinheiro, nunca terá piedade.» Outras vezes: «Que se livre da luxu- ria 0 mancebo, e da avareza o velho, e nós seremos santos.» Em uma palavra, elle considerava o desinteresse como uma virtude tão necessaria e lão vantajosa, que costumava repe­tir: «Dae-me dez homens verdadeiramente desapegados, e eu tenho força para converter o mundo.» Elle acrescentava, dirigindo-se aos confessores de sua congregação: «Deus não vos faltará com cousa nenhuma; sómente vos aeautelae que os bens que Elle vos der não extingam em vós seu espirito.»

Precauções que devem acompanhar o confessor no exercicio de suas fuucçõcs

148. (Sacerdote santificado, n.®‘ 120-129.) — 0 zelo de Zelo por vossa santiliração não exige sómente o estado actual de s®® graça, indispensável para administrar licitamente este sacra- mento, mas tambem o estado habitual de graça, de modo que não vos aconteça jámais perdel-o por um peccado mortal.Deve além d isto inspirar-vos um cuidado contínuo para evi­tar as faltas leves, ao menos aquellas que são notáveis e fre­qüentes, c para praticar as virtudes chrislãs uo gráu dc per­feição que convem a um sacerdote, mestre e ministro de santidade. Com elleito, como podereis vós inspirar a vossos penitentes um horror extremo ao vicio, se elle vos é familiar? um amor eflicaz á prálica da virtude que vós não praticaes, que mesmo desprezacs por vossa conducla? Como ensinar o esquecimento das injurias, se vosso orgulho com a menor palavra se irrita? Como prégar a paciência contínua nas fa­mílias, se vós não sabeis mesmo reprimir e dissimular o en­fado passageiro de ouvir o penitente, e se os signaes actuaes de vossa impaciência pregam o contrario do que Ibe recom- mendam vossas palavras? Como abrazal-o de amor divino, se vosso coração eslá vazio d’esle, e de tal modo cheio do amor do mundo e de suas dissipações, que os sentimentos que deveis inspirar-lhes são estranhos á vossa alma? Não é

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para temer que vós não saibaes senão dizer-lh’o, ou que o digaes com lanla frieza, que fique o penitente quasi insensí­vel? Pelo contrario, se fordes um homem lirmemenle esta­belecido na graça de Deus, e seriamente appiicado a fazer o que deveis recoiiimendar aos outros, oh! quanlo mais fecundo sereis em pensamentos, em expressões fervorosas e pene­trantes, próprias a insinuar-vos em seu espirito e a tocar seu coração? Conlae, por oulra parte, com a assistência especial que 0 Senhor concede a seus (icis ministros. Finalmente, vosso modo de vida retirada dos perigos do seculo e consa­grada ao exercicio da virtude fará que, fóra da confissão, vossos penitentes nada verão em vós que' contradiga o que lhes prégasles no santo tribunal. Que digo eu? Edilicados por vossos boDs exemplos, elles chegarão a vossos pés de melhor vontade e mais bem dispostos; porque estarão cheios de eslima c veneração por vós. Ora, esla vantagem em vão a esperarieis, se vos*so modo de viver podesse escandalisal-os, de.sacreditando o ministro c o ministério.

Esiadodc 149.— 0 estado dc graça habitual não vos é necessário graça ha-sómente para administrar este sacramenio de um modo mais

util, mas muitas vezes para o admiuislrar licitómente; por­que se vós 0 perdcis frequentemente por faltas morlaes, quanlo não estaes vós exposto a profanar vosso ministério, exerccndo-o n’esle miserável estado! Póde aconteccr-vos, no momento que menos o espereis, ser chamado para confessar. Eis-vos portanto na necessidade ou de vos recusar ao peni­tente, talvez com um damno para elle muito maior do que pensaes, ou de vos excitar de repente á contrição perfeita: ora, como poderieis vós julgar este aclo tão facil para vós, emquanlo que em igual caso o considerarieis tão diílicil para 0 penitente? Ou finalmente, eis-vos no perigo imminente de vos assentardes no sagrado tribunal em estado de peccado mortal. Se lal acontece, que nova falta, que desgraça e tal­vez que abysmo para vós! Isto é uma falta, pois que estando inimigo de Deus, vós dispensaes indignamente tanto o seu sangue, como a sua graça. É uma desgraça, pois que o cul­pado, quero dizer o penilenle, se está disposto, sairá justifi­cado do sagrado tribunal, e vós, seu juiz, saireis condemuado. E um abysmo, porque se este ministério ofTerece perigos mesmo a um confessor virtuoso, como saireis vencedor d el­les, vós que vos achaes em um estado tão miserável? Quanto não é de temer que vos carregueis de novas faltas, seja por uma condescendencia excessiva, tolerando nos outros o que não saheis emendar em vós mesmo; seja, o que seria o maior dos crimes, fazendo-vos por solicitações indignas, não um pae, mas um loho rapinador; não um ministro de Deus, mas

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ura rebelde e um ministro do demonio; não ura medico, mas um assassino das almas! Assim, o cuidado contínuo de vos conservar em estado de graça não vos é sómente necessário como aos simplices lieis para evitar a condemnação, que póde ser a consequencia subita de um peccado mortal, mas tam­bem para vos achardes sempre em estado dc ajudar os outros pela administração do sacramento. Eu vou mais longe: este ministério requer, mais que nenhum oiitro, um fervor posi­tivo; não ha comparação entre a linguagem que tereis no dia em que por fervorosas orações tiverdes abrazado vosso cora­ção. e a que tereis quando estiverdes libio c negligente.

150.— Tal é portanto a vantagem do estado da graça ha- continua- bitual, que torna sempre licita e sempre muito util a admi- ção. nistração d’este sacramento. Mas tal é para os (icis a neces­sidade de lhes não faltarem confessores, que. se por desgraça não fordes habitualmente piedoso, comtanto que isto não de­genere em escandalo, e que tenhaes cuidado dc vos tornar a pôr ao menos cm estado de graça actual, não vos aconselho que abandoneis inteiramente vosso emprego. Primeiramente achaes-vos ainda em estado dc fazer bem aos outros. Deus não faz depender da santidade do ministro o valor da absol­vição, c póde subsistir algum elTeito de sua divina palavra nos bons conselhos que se dão aos penitentes. 0 exercicio d’estc mini-stcrio póde ainda ser para vós um meio excellente de reparar o tempo perdido no peccado, e de obter a graça de uma conversão duradoura. Com elTeito, mesmo traba­lhando com zelo c caridade pelo bem dos oulros podeis ter a vós mesmo em mira, c procurar vosso proveito no bem que fazeis ao proximo, applicando secreta e principalmente a vós mesmo os bons conselhos, os santos alTectos, os industrias, os meios que suggcris aos penitentes n’esla escola de santi­dade. Comludo, sc careceis d’esla primeira precaução, quero dizer, do estado habitual da graça e do fervor, tendes ainda uma maior necessidade d’aquella que vou indicar-vos.

131.— Nenhum motivo humano deve conduzir-vos, nem neçtidão prender-vos ao sagrado tribunal, mas sómenlc o desejo de de inten- agrador a Deus e dc ajudar as almas. Intenção bem justa e5®®- bem conveniente n’este ministério, onde tendes o logar de Deus, e no qual, aos olhos dos anios e dos homens, repre- sentaes a mesma pessoa de Jesus Christo. Intenção absolu­tamente necessaria para altrahir sobre vós esta assistência do Espirito Santo, de que tanta necessidade tendes para não vos enganar cora detrimento vosso e detrimento dos outros; mas, pelo contrario, para vos salvar c a vossos penitentes.Ora, como poderieis vós esperal-a, se um motivo, não ura motivo divino, vos conduzisse a examinar as causas que os

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doutor, ou para excitar á compunção e prescrever o reme­dio como medico, seja para restabelecer e proferir a sentença ou impor a pcuitencia cm qualidade de juiz. Vossa.s orações não serão vãs. Não é raro que Deus faça experimentar sen­sivelmente sua assistência a seus fieis ministros n’este grande ministério de caridade.

134.— Cercado de todas estas precauções, entrae com con- Guarda do fiança no sagrado tribunal; mas vigiae habitualmente na coração, guarda de vosso coração, a fim dc excluir delle todo o máu movimento, e de vos conservar em ura santo fervor; porque muito bem podeis sentir n’elle movimentos desordenados de impaciência, de vaidade, de inclinações perversas, que, mes­mo sem 0 conhecerdes, vos farão inclinar para a relaxação, ou para uma demasiada severidade; absolver ou despedir mal a proposito o penitente; desprezar a instrucção de sua causa e a cura de suas feridas, ou mesmo mudar para vós era meio subtil c occulto de fomentar as paixões c o peccado, um sacramento estabelecido para excitar nos outros um hor­ror eflicaz ao peccado! Vigiae portanto na guarda de vosso coração. Muito mais, a fira de entreter em vós o fogo de um santo fervor que possaes accendcr nos outros, tende uma viva lembrança da presença dc Deus. Como vós dispensaes o san­gue divino para lavar as almas, ser-vos-ha muito util oITcre- cer cada confissão a uma das cinco chagas do Redemptor, formando com frequencia ternos alfectos, c orando cm nome d’esta chaga sagrada, umas vezes ao Salvador, outras vezes a seu divino Pae, a fim de que elles toruein vossos trabalhos gloriosos pnra Elle, meritorios pnra vós, e proveitosos para o penitente. Podereis tambem olferecer cada confissão a San­tíssima Virgem, ou ao bom Anjo, ou a algum outro santo, invocando sua protecção. Com isto, se tiverdes cuidado de acompanhar com o coração os actos de contrição, c de vos appiicar principalmente ás santas orações que suggeris aos penitentes, tendes achado o segredo de fazer da confissão uma cspecie de meditação e de oração contínua, que vos pre­servará de muitas faltas, e vos entreterá no fervor e atten­ção á presença de Deus. Por isto altrahireis grandes bênçãos sobre vós e sobre vossos penitentes.

133.— Em vão esperaes guardar vosso coração no sagrado Guarda tribunal, se não saheis guardar vossos sentidos. Primeira- ôos mente vossos olhos: não sómente os não deveis fixar sobre as pessoas de outro sexo que confessaes actualmeute, nem mesmo sobre aquellas que esperam; não deveis igualmente olhar para a igreja. Sem esta modéstia correis tres perigos: de perder a attenção necessaria ao que ouvis; de mal edificar as pessoas que, mesmo de longe, vos observam no confessio-

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nario, muito mais do que o pensaes. Certo penitente jámais quiz escolher por seu confessor o sacerdote a quem tinha visto lançar do confessionário vistas curiosas pela igreja. So­bretudo vos expondes ás mais perigosas tentações: porque n’este ministério tão fatal para elle, o inimigo da salvação está attento a surprender-vos por suggestões criminosas. A guarda dos olhos deveis acrescentar a da lingua. Isto não quer dizer que o temor das tentações deva impedir-vos de satisfazer a vosso dever para conhecer a qualidade, o numero e as circumstancias das faltas graves, principalmente aquel­las que põem o caso debaixo de reserva, ou que mudam a especie. Para esta indagação, que Deus mesmo exige, sua protecção especial está segura, seja ao penitente, que é obri­gado a manifestar, seia a vós, qne deveis julgar as cousas mais impuras. Mas n este caso tendes necessidade dc uma duplicada reserva, tanto para escolher as expressões de que vos deveis servir tratando semelhantes matérias, como para vos limitar a uma moderada indagação. Assim, não vades além do que a slricta necessidade e a precisão evidente ou a utilidade notável e manifesta do penitente exige de vós, prin­cipalmente nos casos em que, para melhor assegurar a inte­gridade material da confissão, vós arriscasseis bens mais im­portantes; a este respeito fallarei mais miudamenlc cm os n.°* 167 e 168. Se deveis ser lão reservados quando se trata da integridade material, quanlo mais o não deveis ser quando se não trata mais do que de reprehender e,instruir sobre es­tas matérias pessoas de dilTercnle sexo? E n’isto sobretudo que é necessário sermo brevis et austerus. Nada porém cor­teis do que é necessário para seu bem, mas tarabem evitae com 0 maior cuidado os longos discursos, mesmo de espiri­tualidade. É muilo facil que n’estcs longos entretenimentos, cujn necessidade não faz um dever, entre algum alTeclo me­nos puro, e que se perca muito mais do que se ganha.

Precaução 136.— Convem ainda que de tempos em tempos peçaes a com Deus suas luzes, a (im de não ser surprendido pelos arlificios

da paixão. Ella faz ver como curtos, reservados e sexo ‘ necessários, discursos muilo longos e supérfluos. £ assim

que julgam a vosso respeito as pessoas que estão esperando e que murmurara interiormente. Eu concordo que ordina­riamente são injustas, pois que condcranara sem conheci­mento de causa. Com elTeito, acontece muitas vezes que, apesar de todo o seu desejo, o confessor não póde ser breve, nem cortar todas as redundâncias inulcis. Certas pessoas, mesmo habituadas á frequencia dos sacramentos, são algu­mas vezes tentadas de tantos modos, outras vezes lão minu­ciosas, lão confusas, tão afllictas, tão susceptíveis de pertur-

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bar-se quando não dizem tudo, e ellas não podem tudo dizer de um só jacto, que é necessário muito tempo para appiicar 0 remedio a suas verdadeiras necessidades. N'este caso não deveis, pelo receio do que poderão dizer, fallar ao que exige, diante de Deus, vosso dever de juiz, dc pae e de medico.

Comtudo esla observação, junta ás precedentes, deve obri­gar-vos de mais em mais a ser breve e severo em vossos en- trelcnimenlos com as pessoas dc dilTerenle sexo, dizendo só­mente 0 necessário. Digo severo, não em sentido que devaes intimidal-as com palavras duras c comprimir esta plena con­fiança que ellas devem ler em vós, mas em sentido que não degenere em familiaridade, e que elln seja sempre misturada com 0 respeito devido a seu pae espiritual; pae que, dando a seus (ilhos um facil accesso pelo desejo sincero dc sua sal­vação, lhes inspira tanta mais veneração por sua qualidade de juiz, dc representante dc Deus, e de medico. Por islo afu- geniareis todo o alTecto vil c humano que poderieis sentir por ella, ou que ella poderia sentir por vós. Esla circumspe­cção é ainda mais necessaria quando a mocidade e enfeites das pessoas, ou as matérias que se tratam, ou a sua grande piedade, ou a sua malicia podem occasionar perniciosas im­pressões sobre o seu coração ou sobre o vosso. Não vos admi- reis se entre os perigos eu nomeio a piedade. Ella tem sido mais de uma vez o escolho de confessores imprudentes que, lendo principiado por uma eslima puramente espiritual, têem insensivelmente chegado a um amor sensivel e carnal.

E para vos preservar de uma tão grande desgraça, que vos deveis abster de toda a palavra que manifeste ternura. As­sim, emquanlo que podeis dizer meu caro filho a um mance­bo, a prudência quer que vos ábstenhaes de dizer minha cara filha a uma pessoa dc oulro sexo. Finalmente, sereis tanto mais conciso em vossos entretenimentos com ellas, quanto ellas vos fizerem a confissão de grandes faltas em matéria de impureza. Vossa brevidade, fallando d’estes peccados, ser­virá a inspirar-lhes mais horror, e vos preservará do pensa­mento que 0 demonio suggcre de abusar de sua facilidade para esla qualidade de crimes. Sem que eu diga mais, com- prehendeis quanlo este abuso seria sacrílego e digno das censuras que a Igreja fulminou contra os solicilanles, e dos castigos cora que Deus ameaça os profanadores de um sacra­mento estabelecido para expulsar das almas o peccado e o demonio, e fazer d’ellas o templo vivo do Espirito Santo.

157.— Se esta brevidade e esta austeridade de linguagem Continua- vos são nccessarias no confessionário, quanto mais não de- veis fazer d’ellas uma lei, quando tendes a fallar-lhes fóra d’elle para sua conducta espiritual! É aqui principalmente

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que deveis ser acautelados e fazer muila attenção sobre vós. 0 venerável Avila não admiltia jámais alguma mulher a con­ferenciar com elle em sua casa; cra sempre e sómente na igreja ou no confessionário, c assentado sobre um banco. Assim, primeira precaução: ura logar nâo isolado e solitário, mas exposlo á vista dc lodo o mundo; isto testemunhará a pureza dc vossas intenções. Segunda precaução: á guarda do coração ajunlae a da lingua, e a dos olhos modestamente baixos. Ide mais longe ainda: para prevenir Ioda a especie de murmuração externa, e lodo o perigo para vossa alma, sede sobrio para conceder, e laconico para aviar estas con­ferências espirituaes. Que a doçura e utilidade dc as ouvir sejam algumas vezes misturadas pela salutar amargura de freqüentes recusas, de tal modo que nada falte á sua direcção espiritual, e que nada haja supérfluo que possa dar logar a ura perigo commum, ao escandalo ou á critica.

ContíDua- 158. (S. Lmonio, n." 113.)— Vôdes quanto deveis ser ção. reservado tratando cora as pessoas de outro sexo. 1.” No

confessionário, cora aquellas que são novas, deveis em geral scr antes severo do que alTavel. Não deveis pcrmillir-lhes que venham fallar-vos de cara a cara, muilo menos beijar-vos a mão. Quando as confessacs, não deveis ter o ar de as co­nhecer. Algumas ha que fazem de piedosas, e que muilas vezes, percebendo que o confessor as conhece, não se accu­sam sinceramente. A prudência prohibe de olhar para os pe­nitentes, e de os acompanhar com a vista quando sáem do confessionário. Fóra do confessionário, o confessor não deve parar para lhes fallar na igreja. Deve evitar toda a especie de familiaridade, não lhes receber presentes, e sobretudo não ir a suas casas, excepto em graves moléstias. Então deve usar de toda a prudência possivel confessando-as, deixando a porta meia aberta, de modo que possa ser visto de fóra, e não ler o rosto virado para o lado da doente, principalmente se for uma pessoa piedosa, pcla qual mais facil é ter alTeição, «Para formar uma ligarão enlre as pessoas piedosas, dizia o venerável Padre Sertorio Caputo, o demonio principia servin- do-se do pretexto da virtude; depois, formada a ligação, faz passar o amor da virtude ao amor da pessoa.» Eis a razão da adverlencia de Santo Agostinho, referida por S. Thomaz: Sermo brevis et rigidus cum his mulieribus habendus est; nec tamen quia sanctiores sunt, ideo minus cavendce; quo enim sancliores fuerint, eo magis alliciunt. 0 Doutor angélico acrescenta: Licet carnalis affeclio sit omnibus periculosa, ipsis tamen magis perniciosa, quando conversantur cum per- sona, quae spiritm lis videtur; nam quamvis nrincipium vi- deatur purum, tamen frequens familiaritas aomesticum est

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periculum; quce quidem familiaritas quanto plus crescit, in- firmatur pnncipale moHvum, et puritas maculatur. As pes­soas de piedade, coniinúa o sanlo Doutor, não conhecera a principio tudo isto, porque o demonio não começa por lau- çar sellas envenenadas, mas sim frechas que ferem levemente 0 coração. D’islo se passa brevemente a não tratar um cora 0 oulrõ como anjos, mas como entes revestidos de carne. Correspondem-sc as vistas, dirigem-se palavras lisonjeiras que penetram até á alma, c que parecera ainda vir da pri­meira devoção: mutuamente se deseja encontrar-se um com 0 outro. E assim, conclue o Anjo da escola, que spiritualís devotio convertitur in carnalem. Quantos sacerdotes virtuo­sos, victimas d’estas alTeições começadas pela piedade, têera perdido não só a piedade, raas a Deus mesmoI 2.° 0 confes­sor não deve ser de tal sorte inclinado a confessar mulheres, que recuse confessar os homens quando se apresentam. Que lastima ver tantos confessores empregar toda uma manhã a ouvir beatas e despedir pobres homens ou mulheres casadas carregadas de occupações, e que cora grande sacrilicio têera deixado o governo dc sua casa e seu trabalho, dizendo-lhes:Tenho que fazer, dirigi-vos a outros! E por falta de confes­sores, estes infelizes vivem mezes e annos retirados de Deus e dos sacramentos. Isto não é confessar por Deus, mas por si. Não sei lambem que recompensa podem esperar os con­fessores que exercem assim o seu ministério. Eu não digo, como alguns, que é um tempo perdido; pelo contrario, digo

re é uma obra muilo agradavel a Deus o conduzir as almas perfeição. D’islo fallarei eu mais adiante e muito dilTusa-

menle. Mas os bons confessores, á imitação de um S. Filippe de Neri, dc um S. João da Cruz, e de um S. Pedro de Alcan- taro, confessam unicamente tendo a Deus era visla. Quando se apresenta uma alma que lem necessidade, a preferem ás almas piedosas, porque sempre ha tempo de as ouvir e de as ajudar com vagar.

139. (B. Leonardo, n.” 1, 5 e 8, 1.* pari.) — Assim, de- Santidade veis ser santo no tribunal da reconciliacão. A bondade ou úa vida. santidade dc vida, eis aqui o primeiro fundamento de vossa conducla. Com cITeito, o melhor meio de persuadir, é o bom exemplo: deveis dal-o. Os homens crêem muito mais facil­mente 0 que vêem com seus olhos do que o que ouvem com os ouvidos; julgam praticavel o que vêem fazer áquelle que os manda e dirige: é este o pensamento de S. Gregorio: Illa namque vox magis cor penelrat quam dicenlis vila comman- dat. (Past. curce, part. 2, cap. iii.) Esla bondade não con­siste sómente em viver em estado de graça, mas tambem em praticar a virtude, e em consagrar sua vida ás obras de pie-

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dade por um zelo ardente pela salvação das almas. Quando encontro um confessor que não sómente vive no estado ha­bitual dc graça, mas que lambem é todo fogo para cscogitar os meios dc conduzir as almas a Deus, encontro um Ihcsouro. Mas, ah! quauto é triste ver hoje um tão grande numero que, por sua vida desordenada, dcshonram á vista do povo 0 sagrado ministério! E que mais deplorável ainda c, não temerem ouvir algumas vezes as conlissões cm estado dc pec­cado mortal, ou na dúvida prática se o eslão! Ora, quem não sabe que, seguntlo a opinião mais commum, comnicllcm tan­tos sacrilégios, quantas absolvições dão, abrindo assim pa.-a elles as portas do inferno no mesmo logar onde abrem íão felizmente aos outros as portas do céo?

E uma maxima irrcfragavcl do Aujo dn escola, que o con­fessor, administrando o sacramenio da penitencia, é ura in­strumento animado que coopera com a. causa principal, que é Deus. (Pari. 3.®, q. Gí, arl. 8, ad I.) E o motivo porque não basta que elle viva cm estado dc graça pnra ser um ministro util á salvação dos peccadores; é necessário tambem que exercite a prática dc todas as virtudes. Um confe.ssor tibio e dislrahido, sem o habito da oração c da mortificação, uão póde exercer senão com negligencia esle divino ministério. A cari­dade não inflamniará spas palavras, o zelo não animará suas correcções, a conliança não auclorisará seus conselhos. Tal­vez chegará elle al6 a alterar o juizo sacramental, seja absol­vendo os indignos, seja não admoestando os culpados, ou condcscendendo com os obstinados. Em uma palavra, será mudo no divino tribunal, não tendo força de reprehender fal­tas de que elle leme ser culpado.

D ’islo que resultará? Que fazcudo os penitentes correra fama que tal confessor nada diz sobre lal pcccado, sobre o amor, por exemplo, ou sensualidade, ou paixão do jogo, to­dos virão confcssar-sc a elle, c accumularão confissões sacri­legas: porque é muito evidente que não tôem vonlade de se emendar aquelles que com aprazimenlo do coração procu­ram um confessor que nenhum cuidado toma de os tornar melhores. No livro da divina justiça os sacrilégios dos peni­tentes serão lançados na conta do confessor. Ob! quanlo me­lhor seria para elle nunca ler o poder de absolver, pois que suas absolvições só terão servido de ligar a cllc c aos oulrosf 0 Salvador dizia a Judas: Vm homini i l l i per quem Filius hominis tradetur, bonum eral ei, si natus non fuissel homo ille. {ila lh., XXVI, 24.) Poder-se-liia dizer o mesmo de um tal confessor, culpado da perda dc tantas almas: Bonum erat ei, si confessarius non fmsset. 0 oráculo do Espirito Santo é verdadeiro: Aquelle que não é bom para si mesmo, como

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será bom para os oulros? Qui sibi nequam est, eui alii bonus erit? {E cc l, xiv, 5.)

Perrailli-me porlanto que eu vos recorde esle grande pen- samenlo, que lautas vezes tenbo insinuado nos seculares nns missões, a saber: que todos devem fazer uma conlissão geral para se renovar na piedade e pôr sua consciência em ordem.Nada é mais impoi tanlc para gosar dc paz diuanle a vida, c principalmente para cslar tranquillo no momento da morte.Ora, esla renovação de fervor a julgo muilo mais necessaria aos sacerdotes. Não é que eu queira por islo obrigal-os a fa­zer sua conlis.são geral, que eu suppoubo já feita. No caso de alguDS a uão terem feito, eu Ibes cliria com toda a liberdade:Fazei-a por amor de Deus, fazci-a; iraporla-vos muilo ler paz do consciência, de que o priucipal fundamento é a boa vida, porque é este o primeiro pão de que se deve alimentar o sa­cerdote; sc tendes feilo vossa conlissão geral, fazei uma con­lissão cxtraordinaria, tornando a passar cm globo as obriga­ções de vosso esUido. Aqui vos proponho um methodo breve e facil.

160. — Eil-o aqui dividido em dous pontos: Deelina a Fugida aomato et fac bonum. (Ps. xxxvi, 27.) Examinac primeira- mal.mente se verilicaes esle deelina a mato, evitando tudo o que podesse dar o mais leve escandalo. Que desgraça! sc fordes d’aquelles a quem sc póde appiicar csla humilbadora compa­ração: Sieut populus, sic saeerdos! Elles appareccm em pu­blico com tanta arte e vaidade, que antes se deveriam tomar por sacerdotes de Venus e de Diana, do que por ministros de Jesus Cbristo; c não se envergonham de ser mais dissolulos e menos reservados era suas palavras e seus modos do que os mesmos seculares. Ai! ail não se póde nem deve dizer tudo; limitar-rae-hci a repelir, com as lagrimas nos olbos, estas pa­lavras de S. Gregorio: Nullum magis pncjudicium, quam a sacerdolibus suis lolerat Deus. (Lib. IV , epist. 31.) Vós rae direis que vossa consciência de nada semelhante vos argue; eu 0 creio muilo siuceramenle. Todavia discorrei com cui­dado por todos 03 deveres de vosso estado, c primeiramente examinae como rccitacs o Ollicio Divino.

Se 0 recitacs cm commum, vôde sc fazeis a pausa indicada pelo asterisco, ou se o rccilaes com precipitação, unicamente altento a principiar c acabar. Examinac se celebracs a sanla missa com o respeito, modéstia c recolhimento convenientes; so observaes exactamente as rubricas; se fazeis os signaes da cruz, as geniiflexões e as cercmonias de modo que testemu­nheis vossa veneração por um tão grande sacrilicio. Ob! que penoso contraste ver á noite assentados a uma mesa de jogo, menear as cartas e os dados, os mesmos sacerdotes que de

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manhã se viram no altar, com um penteado escandalosa­mente arranjado, menear os cálices e as patenas, e fazer vol- tejar a santa hostia como um vil boneco I João de Avila teve muita razão dc aproximar-se a um sacerdote que celebrava assim, c dizer-lhe ao ouvido: «Tratae-o melhor, é Filho de um Pae respeitável.» Ail lenho vergonha de referir seme­lhantes desordens. Entretanto, quantas vezes, emquanto que este sacerdote está no altar, se ouve dizer d’elle: Vêdes este sacerdote que celebra? é um lino caçador; não ha jogador que 0 aparceire; é um homem de gosto e de chalaça!» Ora, sabei que sentença está pronunciada contra elle: líeu! heu! Do­mine, diz S. Bernardo, gemendo, quia ipsi sunt in persecu- tione primi, qui in Ecclesia Dei viaentur gerere principalum. (Lib. I I I , Ad Eug.) E eu sei que iguaes desordens não existem entre vós; mas sei tambem que um só sacerdote d’este caracter basta para fazer perder o respeito ao sacerdó­cio todo inteiro. Permitii-me pois que repila a este sacerdote inliel: Declina a maio, meu caro irmão em Jesus Christo, declina a maio.

Prática do 161.— E l fac bonum. Não basta que o sacerdote seja vir- tuoso para si mesmo; deve tornar-se util ao proximo por seu exemplo, por sua doutrina, e por seus conselhos. Os mate- riaes de uma igreja não devera ser empregados senão para reedilicar uma oulra, de modo nenhum uma casa ordinaria; com maior razão o sacerdote consagrado a Deus pcla ordena­ção não deve empregar-se senão era cousas santos e uleis á gloria de Deus. Sua casa é a igreja; seus livros, as divinas escripluras; seus negocios, alliviar os pobres, instruir os igno­rantes, administrar os sacramentos. Para fazer ludo isto deve repartir o tempo entre o estudo, principalmente da theologia moral, a leitura de algum livro de piedade, o exame, a ora­ção; em uma palavra, deve regular sua vida, e não viver de alguma sorte ao acaso. Mas os dous eixos principaes sobre os quaes deve rodar toda a vida do sacerdote, é a oração e a mortificação. Quanlo á oração mental, que não é em ultima analyse mais que uma meditação séria do grande negocio da salvação, peço-vos para ella meia hora em cada dia. É certo que se um pobre visse lançar ao rio um grande numero de peças de ouro, não seria indiscreto se pedisse metade de uma pelo amor de Deus. Assim, quando vejo tantos sacerdotes que perdem a dormir, a jognr, a divcrlir-se horas inteiras, não julgo que haja temeridade da minha parle em pedir-lhes meia hora, não para roim, mas para sua alma. Se tivesseis um processo de grande imporlancia, chorarieis vós de empregar n'elle meia hora por dia? Ora, qual é o maior negocio que temos n'este mundo? Eil-o aqui: salvar nossa alma. Cada

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um portanto tome a resolução dc consagrar em cada dia meia hora a este grande negocio. Mas não adiantareis na oração, se não fordes verdadeiramente mortilicados. Feliz d'aquelle que é innocente, que nunca peccou! Minhas palavras não se dirigem a elle; eu fallo áquelle que tem peccado. .Não ha meio, ou fazer penitencia n’este mundo ou no outro. Onde vale mais fazel-a? Não é nosso corpo que, procurando seus prazeres, nos precipitou no mal? E portnnto elle que deve solfrer a pena. 0 jogador que perde, queixa-se loucamente das cartas, mas nós com mais sabedoria attribuimos nossa perdição ao corpo. S. Francisco de Assis costumava dizer, que aquelle que concede a seu corpo tudo o que é permil- tido, terminará por lhe conceder o que não é permittido; a experiencia sobejamente o prova. Coragem pois, entregue­mos-nos a uma generosa mortificação, enfraqueçamos nosso corpo, mortifiquemos tambem nossos olhos, nossa lingua, nossa bôca e todos os nossos sentidos: uma grande paz será nossa recompensa. Castigo corpus meum et in servi lutem re­digo, (/. Cor., IX, 27) dizia o Apostolo S. Paulo, este admi­ravel modelo dc virtudes; e nós nada teremos a fazer?

162.— A santidade ajuntae a prudência. A prudência dc Prudênciajuiz deve ser grande no confessor, mas muito maior ainda coufes-deve ser a de medico. Esta qualidade lhe é necessaria para examinar attentamente não só os peccados, mas tambem as raizes, as causas, as occasiões, a (im dc lhe appiicar os remedios convenientes. Elle deve ser reservado em suas palavras. Ura confessor inconsiderado póde, por uma só pa­lavra, fazer muito mal a si mesmo e aos penitentes: In fa­de prudentis lucet sapientia (Prov., xvir, 24), o que Lirano explica por maluritatem et honeslatem. Deve portanto ser circumspecto em suas palavras, ter um porte modesto e ho­nesto que inspire gravidade e devoção, e revestir-se, segundo 0 tempo e logar, de sua sobrepelliz e de sua estola, como se prescreve no Ritual Romano. Evitará- toda a acção menos grave, capaz de offender a modéstia, como tomar tabaco im- moderadamente, ter sua caixa á vista, ter flores na mão, um leque ou outras cousas semelhantes que não convem á digni­dade sacerdotal. Terá o maior cuidado de não confessar mu­lheres fóra do crivo sem uma necessidade, que nunca é forte se não for extrema; nem antes de ser dia, ao menos sc o lo­gar onde confessa não for alumiado; nem mesmo aquellas que estão doentes, se a porta do quarto não estiver aberta.Ém uma palavra, deve comportar-se em tudo como ura ver­dadeiro ministro de Deus, ter um ar araavel e modesto, que não devem jámais mudar, uera gestos, nem signaes exterio­res capazes de indicar aborrecimento e tristeza, a (ira de não

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dnr occasião áquelles que se achara em posição de ver, de suspeitar que o penitente lhe disse alguma cousa fastidiosa ou muito grave. Demais, deve ter cuidado que o penitente esteja a seus pés, com o rosto desviado do seu, de modo que não Ihc falle direclamente ao ouvido, e não se aproxime de­masiado d’elle. Estas precauções parecerão talvez minucio­sas, são porém todas necessárias para cercar de veneração um ministério lão sanlo, e tirar até a sombra do que poderia ser uocivo ao respeito do sacramento, ou á alma ou reputa­ção do confessor. Nossos mestres e nossos modelos todos nos fazem d’islo um dever sagrado. Elles não separam as pre­cauções exteriores das interiores; ouçamos seus conselhos.

Caminliar 163. (S. Carlos, pag. 6 e 7, 11 e 12.) — Sendo certo que para a per-aquelle que administra algum sacramento cm estado dc pec- feiçao. çjijg mortal pecca mortalmente, os confessores devem por

consequencia ter um graude cuidado de não ouvir a conlissão de ninguém, quando se sentirem n’cste desgraçado estado; e muilo menos ainda quando se sentirem ligados com alguma censura ccclesiastica. É a razão por que aquelle que tem o verdadeiro zelo das almas, que dcscjn ardculcmeute ajudal-as a conduzir-se nas virtudes cbristãs, dar-lhes remedios saluta­res para se arredarem do peccado, ensinar-lbes a conhecer as astúcias do inimigo de nossa salvação, c linalmente a des­pojar 0 penitente do velho homem para o revestir do novo, e rormar d’cllc um perfeito christão, não sc deve contentar de administrar cstc sacramento fóra do estado dc peccado mor­tal; mas conhecendo que imporia muito, para produzir os efleitos (jue acabamos de dizer, que elle primeiramente pra­tique em si mesmo aquillo que deseja no outro, porque os exemplos tocam muilo mais do qué as palavras, c não pode­mos sem difliculdade ensinar aos outros a virtude que nós não temos, dcvc ter um desejo muilo ardente de sua própria perfeição, e excilar-se á pratica das virtudes necessárias para a adquirir.

Precau- 164.— Assim, não se devera ouvir nas casas dos leigos as conlissões dc pessoas, sejam homens, sejam mulheres, de qualquer qualidade que sejara, excepto por motivo de doença, c n’esle caso mesmo aquelle que confessa mulheres deve ler aberta a porta do logar onde eslá, de tal modo que possa ser visto por aquelles que estão na próxima sola; e fóra d’este caso de doença não se devem ouvir as confissões de mulheres nas casas dos leigos, ainda que ellas só queiram reconciliar- se, mas sómente nas igrejas e confessionários. E deve mesmo evitar-se de o fazer antes do nascer do sol, e depois que elle se pozer, e ouvir ordinariamente nos confessionários todos aquelles que se confessarem na igreja. É a razão por que em

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todas as igrejas haverá um numero de confessionários corres- pon^dente ao dos confessores.

E necessário que os confessionários estejam postos em um logar da igreja tão patente, que possam ser vistos de todas as- partes, e tambem seria muito bom que estivessem em um logar onde podessem ter alguma guarda que impedisse que, emquanlo alguem se coufessa, os outros se aproximem de mais; e se islo não podér fazer-se, o confessor deve ler cui­dado dc remediar esle abuso, fazendo desviar aquelles que estiverem perto do confessionário, anles que vá para dentro d’ellc, e, se for necessário, mesmo no decurso da confissão.

16o, (S. Francisco de S alles, pag. 624.) — Sc não ha Conlinua- sacramenlü algum, em cuja administração deixe de ser ne- ÇS®- cessario mostrar gravidade e magcslade, mais necessário é no da penitencia, pois que somos aqui juizes deputados da parle de Deus. Porlanlo estareis em habito talar e sobrepel- liz, com eslola ao pescoço e barrete na cabeça, assentado em logar patente da igreja, com uma face amavel e grave, a qual nunca deveis mudar por alguns gestos ou signaes exte­riores que possam testemunhar aborrecimento nciii desasso- cego, com môdo de dar occasião áquelles que vos virem, de suspeitar que o penitenle vos disse alguma cousa enfadonha e execrável. Fareis que o penitente vire seu rosto ao lado do vosso, dc modo que não vos veja, nem vos falle direito ao ouvido, antes ao lodo d’elle.

166. (Y ida de s. F il ippe de Ne r i, liv. I I , cap. xiir.) — ConselliosS. Filippe de Neri recommendava aos confessores que nunca «'® ouvissem as mulheres sem haver uma grade enlre a penitente n®®®- ®” - e 0 confessor; que se abstivcssem de longos discursos; que nunca as olhassem de face, e que usassem com ellas anles de palavras severas do que de outras. 0 Padre Juvenal Ancina, achando-se cm Nápoles para exercitar o ministério do sanlo tribunal, escreveu ao sanlo. Pediu-llie conselhos para se des­empenhar com toda a circumspecção necessaria d’cslas au­gustas funcções, principalmente confessando mulheres. 0 sanlo lhe respondeu n’estcs termos: «Não vos inquieteis do que vos acontece, porque o mesmo acontece aos outros. Só­mente tende cuidado de não ouvir estas especies dc peccados mais voluntariamente do que os outros; de não ser curioso de saber além do que é rigorosamente necessário para appli­car 0 remedio. Não entreis era alguns promenorcs, excepto quando são necessários para conhecer a qualidade ou especie do peccado. De resto encomraendae-vos a nosso Senhor, que nunca deixa de vir em nosso soccorro por graças espcciaea em um semelhante ministério, todas as vezes que o desem­penhamos com amor e precaução.» Elle advertia igualmente

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OS confessores que nunca se fiassem em si mesmos, fossem quaes fossem aliás sua experiencia, sua idade, sua velhice, ou suas enfermidades. E necessário fugir da occasião, lhes dizia elle, emquanlo podermos abrir os olbos. Elle lhes re- commendava lambem que confessassem mesmo os rapazes no confessionário, a fim de que a vergonha, que lhes é tão natu­ral, lhes Dão fizesse occultar algum peccado.

C A P IT U L O IV

As interrogações

Das iiiicr- 167. (Sacerdote santificado, n.®' 21-23, 28-30.) — Do sobrca temos dito a respeito da pureza, em o n.° 31, podeis fa-rcza habilidade com a qual podeis, sobre outrasos mcni- matérias, supprir a iguorancia do penilenle. Mas nunca será nos. demasiada toda a reserva que se podér empregar nas inter­

rogações sobre a pureza, principalmente quando ha perigo de perder um maior bem. Ora, iião ensinar o mal áquelle que 0 ignora, e não acccnder a paixão n’aquelle que a expe­rimentaria, é um bem muilo maior do que a integridade ma­terial. A falta d’esUi, comtanto que nâo seja culpavel, não impede a integridade formal, necessaria e suflicienle para o valor e fructo do sacramenio. Nunca porUinlo exponhaes um bem maior para obter um mediocre. Assim, quando interro- gaes meninos, fazci-o dc modo que não sejaes entendido se­não por aquelle que for culpado contra esle mandamento. Se vos responder que leve máus pensamentos, pergunlae-lhe de que genero eram; porque muitas vezes não são mais que pensamentos de vinganças pueris. Então, não vades mais longe. Na dúvida de um maior mal, contentae-vos de lhe re­cordar que 0 Senhor está presente em toda a parte, a fim de nada fazerem que não se atrevessem a fazer na presença de seus naes.

Com os 16§.— Mas com os adultos mesmos sede prudente e reser- n^so^ ca ® ®*‘P®>'(lc®. “ em ao vosso penitente, aoMdas. 'perigo de uma deleiUição culpavel. Ouvi o conselho que vos

dá 0 Padre Seigneri no Conf. inslr.,c. ii, sobre a auctoridade de outros doutores: «Se vos acontecer algumas vezes não fallar de cerla circumstancia, aliás necessaria á integridade material da conlissão, não vos inquieteis: um bem maior deve prevalecer. Basta que pcrgualeis a especie d'esse pec­cado vergonhoso, mas não o modo por que foi commettido; e se, por falta de prudência ou de conhecimento, o penilenle

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quizer dizel-o, adverli-o caritalivamcule que isto não con­vem.» Que diremos aqui d’esses confessores ainda novos, que, sem necessidade, são os primeiros a interrogar as pes­soas casadas sobre o uso e abuso de seus direitos, com re­ceio de que elles vão além do que lhes é permittido? Elles portanto não pensam no perigo dos pensamentos e deleita- ções actuaes e más a que se e.xpõem e aos penitentes, nem na honra e respeito devido a seu caracter, ao qual prejudi­cam, dando ao penitente um justo motivo dc suspeitar, sc não malicia, ao menos curiosidade, n’estas indagações, por cousa neuliuma mandadas. Quanto a vós, desejando sabia­mente procurar um bem mais importante, não sejaes o pri­meiro a interrogal-as, a não ser qunndo muito por phrascs geraes, taes como esta: Enlre ambos trataes-vos christãmente e sem que a consciência vos argúa de cousa alguma? Não per­gunteis mais (*). Se elles vos propõem dúvidas, respondei com a maior brevidade*e com a maior reserva possivel. Nestas respostas sede discreto, quero dizer, igualmente ar­redado do rigorismo e da relaxação; de outra sorte, para evi­tar algum mal material e incerto, poreis as pessoas casadas em um grande perigo de commetter peccados formacs P).

(') Esle modo geral de interrogar basla sem dúvida quando o pe- nileiile tem sido insiruido de seus deveres; mas não o sendo, csla in­terrogação nos parecia iiisurilcienle. iNós pensamos que se póde pri- mciramenlc porgnnlar ao pcnitcnic sc foi instruido das obrigações do santo estado do malrimonio. Sna resposta e o conliccimcnto dc suas disposições decidem das interrogações que convem dirigir-llic. (Nota do traauctor portu/juez.)

(-1 Opera; prclium est bic rcfcrrc quatdam responsa dc usu ma- trimonii.

.1'cccalne morlaliteruxor, debitum carnale rcddcns viro, micm in actu ipso, fre(|nen(i expericnlia, novit se rctracturum, cum cnnsionc semims extra vas?

«It. Si ila se inlcrdum rclralicnli nullalciins consenlial uxor, imo vero quantum possit obsistat, nullius eam noxiam esse peccali certum videtur; quod exemplo Ilcr cl Onan probari potest; quamvis enim jm- nilio Onan terribilis fuerit, ejus tamen uxor Thamar a Deo ob nelan- dum viri scclus punitanon fuit. (Ita Pontas, Dict. dos Caaoa dc con­sciência, dc Debito conjugali.)

•Ha;c do cadem qu.x-slionc disscril S. Liguori, lib VI, n.« 947. Cntcri- lur an liceal uxori rcddcrc debitum vel petcre a viro volcntc scminare extra vas posl copulam incueplam? Prima sciUcntia afílrmat, ct hanc tcnent Pontius, Tamburinus et Sporcr, quia, ut aiunt, cum mulier rcd- dil, aul pelil, dat operara rei licito, nec ipsa proplcr maliliam viri de­bet suo jure privari. Secunda scnlculia, quam tcnent lloncaglia et El- bct, dixit uxorem non posse, nec reddere, nec petcre, nisi adsit gravis causa, quic ipsam cxcusat in pcrmittcndo peccatum viri, ct in coope­rando ad matcrialc peccali illius; alias tcnctur ex cliarilate, cum pos­sit sine gravi incommodo, viri peccatum impedire.

•Ego tamen dislingucndum pulo: si agatur de rcddcndo debito, dico uxorem probabiliícr posse et toneri negare debitum, si possit siue gravi incommodo, quia abusurus re sibi debita nou habet jus ad rcm

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Das inter- 169.— Não é sómente sobre a pureza, é tambem sobre s o b f ê S niateria que deveis abster-vos de ser o pri-quer maie-“ ®'''° interrogar, quando as circumstancias não vos dão ria. um justo molivo' de duvidar que o penitente peccou em al­

guma cousa, e que o occulta por vergonha ou o esquece por ignorancia. Se quereis interrogar sobre todos os peccados em que póde cair um penitente, não acabareis. Fareis o sa­cramento odioso a elle e a vós, fatigando-vos e cnfastiando-o com mil interrogações inúteis, dc que serieis o primeiro a queixar-vos sc vol as dirigissem quando vos confessaes. Con­tentae-vos de interrogar sobre as cousas nccessarias ou com

sibi vindicandani: sed probabilius videlur uxor non solum posse red- dcrc, ut dicit prima sentcnlia, quam .soquilur etiam Saiicbez,, scd eliam teneri. Ilalio, quia. quando culpa se tencl ex parte norsona; pctcntis, cum ipse babcat jiis ad copulam, ncqiiit allcr sine injuslitia debitum negare, si non possci monendo a lali culpa ilium averlerc; et luncpa- tel, quod rcddcns nec malerialilcr qiiidcm cooperciur peccato illius, cum non cooperctur scminationi c.xlra vas, sed lanium copulaí incoc- plm, quoe per sc omnino ulriquc licita cst. Si vero agalnr de pctiüone dcbili, dico. cum secunda senlenlia, uxorem non po.ssc pelcrc si non adsit jusla ct gravis causa; tunc enim rcvera Iciictur ex cbarilalc im- pedirc peccatum viri. Justam autem babebit causam pelcndi, si ipsa esset in periculo iuconlinonli;e, vcl si dcbcrcl alias privari suo jure; pcicnii plusquam scmel vel bis, cum perpetuo serupulo, an ci sit sa­tis grave incommodum, vcl nc, tunc se conlinerc.

«Km 1822, dirigiram dous professores do seminário de Desançon a consulla seguinte ao Grandc-I’cnilenciario: Derlba viriim liabct quem constanti cxpcrienlia coguoscit cs.so onanistam. In vanum omnia ten- tavit media ut illiini a tam ncfando crimine rctrabcrel; qninimo gra- vissima aul saltem gravia mala ci immincnt nimc probabililcr; ila ut vel ba;c mala incurà‘re debeal vcl fugcrc c domo marili, nisi pcrmit- tat sallem aliquando abnsiim malrimònii.

«.\ sagrada Penitenciaria respondeu, cm data dc 1 de fevereiro de 1823: Cum. in proposito casu, mnlier o sua quidem parte nibil contra naluram agat dctque operam rei licitíc; lota aulcm actus inordinatio ex viri malitia proccdat, qui, loco consummandi, relrabit se, et extra vas effundil; ideoquc si mulier po.st dcbilas admonilioncs. nibil prollciat, vir aulém instot, minando vcrbcra, aut morlcni, aut alia gravíssima mala, polcril ip.sa (ut probati Ibeologi doccnt) cilra peccatum permis- sivc sc babcrc, cum iu bis rcrum adjunclis, ipsa viri sui peccatum simpliciler pcrmilial, idtpic ex gravi causa qua; cam cxcuscl; quoniam cbarilas, qua illud impodire tenetur, cum tanto incommodo non obli-

•Datum Hom» in S. Poenitcnliaria, dic 1 februarii B. Bvrsis S. P. Regcns. In. Pio, S. P. secrct.

«Tendo sido consultado sobre esta questão: Potestne pia uxor pcr- miltere ut inaritus suus ad eam accedat, postquam cxpericntia insi consliterit eum more nefando Onan sc gererc... prwserlim si uxor, de- negando, se cxponat periculo sa;vitiarum, aut linicat nc marilus ad meretriccs accedat?

«0 mesmo tribunal respondeu a 23 de abril de 1822: Cum, in proposito casu, mulier c sua quidem parte, nibil contra naluram agat, (iciquc operam rei liciUc; tota autem actus inordinatio ex viri malitia proccdat, qui, loco cOnsümandi, rctrabit se, ct extra vas clTua-

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probabilidade acontecidas ao penitente. As interrogações mesmas que o Ititual Romano c S. Carlos em suas advertên­cias vos recommendam que Façaes no principio da confissão, se conhecerdcs que são inúteis no caso em que vos achaes, não as façaes. Por exemplo, se conheceis já a pessoa, se ella vos diz que sc confessou ha pouco, se tendes motivo de a julgar virtuosa c instruida, podeis deixar-lhe expor suas fal­tas. Então, se o julgardes necessário, lhe fareis as interroga­ções omittidas no principio. Observae aqui que para não ex­por 0 penitente a perturbar-sc c esquecer o que elle prepa­rou era seu exame, vale mais não o interromper, mas guar-

dit. Idco si mulier, posi dcbilas admoiiiüoiics, iiibil prodciat, vir au- tem inslcl, minando vorbera, aut morlem, aut alias graves s®vilias, poteril ipsa (iil probali Ibeologi docenil cifra pcccalnm passivo sc pricbcre, cum in his rcrum adjimclis, ipsa viri sui pcccalum simplící- tcr pcrinitlat, i(l(iuc ex gravi causa qme eam e.xcusel; (|uoniam cltari- tas, qua illud impcdire lenerclur, eum (anlo incommodo non obligat.

..M. Dlain. Vigário cm Chamber;-, lendo tambem consultado a Peni­tenciaria, obteve a resposta seguinte a 15 dc novembro de 1816: Pro­bali casligalíquc Ibeologi in hoc conscniiuni ut prairalo in casu liccat uxori dcbitum reddcrc, si ex ejus dcmegalioiie malc liabciida sit a viro suo. ct grave iiule incommodum sibi limcre possit; ncquc cnim, aiunt, hoc in casii, ccnsctnr uxor viri siii peccalo formalilcr coopcrari, sed illud laiilummndo ex justa ct ralioiiali causa ncnnillere. Moneat tamen orator Imju.smodi uxorem ut noii ccssot prudenlcr commoucrc virum suum ut ab hac lurpitiidiiie dcsislal.

«Datum llomrc iu Sacra Poeiiitentiaria, dic lõ novembris t8l6.=M - ehael, Cardinalis de Pedro, Major Puíuitentianus.

•Drincia, S. Pocnitenliaria: sccrct..0 Cardeal Pciiileneiario mór acrescentou: Dubia tua sacro tribu-

nali, cui auctoritate aposlolica prmsum, oxpcndeiida ct examinands proposui. Quid aiilem S. Poenilcntiaria dubiis tuis rcspondendum ccn- snerit balies in annexo rescriplo. Sed, quoniam poslrcmum dubium (circa qumslionem pnesenlemi a le pro|)Osilum binas comiileclcbatur partes, ac nrimum qiueicbat an uxor dcbitum licilc redderc possit vi­ro, si ei experieiiiia constei virum suum semcii extra vas elTuudcre ad impcdicndam goneralionem, liim vero inquirebal an posito quod in bis rcrum adjunclis, liccat uxori debiltim reddere, dari ne possit casus quo in iisdem eircumstaiitiis consliluta liccat ci quoque dcbitum a viro pclerc.

.Primic quidem parli S Panitenliaria.. . dislinctc respondit. Ast a danda resnonsione altenc cliam parli absiinuit, quoniam rem non pc- riiidc cxploralam crcdidil. Ipse igilur. ut picnius libi sali-sfaciam, ad- jungam bie privalam meam bac eliam de rc scnlcnliam. Sic ergo, cum non paucis gravibiis probalisquc Ibcologis scniio iu exposilis circum- slaiiliis posse uxorem dcbitum eliam a viro suo pelcrc.si ipsa in pcri- cnlo inconlincniiic versclur. Elcnim, ut tlicologi isli dixenint, hoc

,------ minimc censeliir uxor viri sui peccalo coopcrari, c f—

meam, qua, si tibi placct, utcrc in Uomino. Inlerim aulcm ipse singu-

*.’nomaj, 15 novembris ISIG. = Michacl de Pedro, clc.

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dar vossas interrogações para o fim, quando prevejaes que a conlissão 6 breve, julgando pelo pouco tempo desde que se confessou. N ’aquellas que são longas, a fim de não vos ex­por a algum esquecimento, podereis, quando muilo, inler- rompel-as brevemente para o interrogar sobre o que é neces­sário, como 0 numero c a especie, reservando o mais para o fim.

Sobre a 170.— Deveis lambem remediar a ignorancia do penitente, ignoranciae primeiramente a que tem por objecto as cousas mais im- rla de appiicac-vos á que diz respeito ás

cousas mais necessárias saber-se por necessidade de meio: tal é a ignorancia dos principaes my.«lerios. Mas n’islo, a fim de não vos atormentar, bem como"no vo.sso penitente, com­prehendei simultaneamente o mal e o remedio. Quanto ao mal, alguem ha que sabe em substancia o que é necessário, ainda que ao primeiro aspecto pareça ignoral-o. Taes são aquelles que, interrogados de um modo abslracto e geral, por exemplo: Qnaes são os principaes mysterios? Que fez por nós 0 Filho de Deus? Por que motivos somos obrigados a crer as verdades da fé? não sabem responder, seja, como tive a honra de o notar, que nos catecismos de .sua diocese estas perguntas não eslão assim formuladas, seja (|ue elles só raras vezes ouvem fallar d’estas cousas, e se occupam muito pouco com ellas. Então interrogados sem o esperarem, não se recordam immedialamenle, perturbam-se, respondem ao acaso, e se enganam. Entre oulros confuodem muilas vezes 0 verdadeiro motivo da fé, que é a auctoridade dc Deus, com 0 motivo da credibilidade, que é, ao menos para os igno­rantes, a aucloridade de seus pastores, que lhes dizem que isto é revelado. Assim, animae-os, dae-lhes tempo de consi­derarem, e dirigi-lhes perguntas mais simplices e mais posi­tivas, por exemplo: Quantos Deuses hn? Quantas pessoas em Deus? Não se fez homem por nós o Filho de Deus? Não foi Deus quem revelou as verdades da fé? Se elles não po- desscm responder a estas perguntas e a outras semelhantes, seria evidente que ignoram as cousas cssenciaes. Mas vereis muilas vezes que interrogados d’eslc modo vos responderão suflicientemenle para serem capazes de absolvição: vereis que sua fé é excellente, ainda que se explicam mal. Nolareis principalmente que na realidade não confundem de modo al­gum 0 motivo formal da fé com aquelle da credibilidade. E l­les 0 distinguem, não pela força de seu espirito, mas pelo soccorro sccrclo e inscnsivel da graça necessaria aos sabios mesmos, a fim de que, isolados da influencia de outro qual­quer motivo, seja a luz divina a causa e a fórma de sua in- abalavel adbesão ás verdades reveladas. Quanlo ás fórmulas

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dos aclos das virtudes lheologaes, anlcs de julgar indignos da absolvição aquelles que as ignoram, vôde se elles sabem ao menos o Symbolo dos Apostolos, a Oração dominical, e se elles compreliendem as cousas que ahi se contôem, sullicien- leraenle e em substancia, como sc póde esperar de leigos ignorantes, c se cllcs sabem o aclo de contrição. Com efreilo, 0 Credo é um exccllente aclo de íc sobre os mysterios neces­sários dc saber por necessidade de meio e mesmo por neces­sidade de preceito. A oração dominical é uma súppiica que comprcliende a esperança; não se pediriam a Deus seus dons se não sc esperasse n’Elle; a palavra Padre indica o funda­mento e 0 motivo da bondade divina; linalmente, o acto de contrição é ao mesmo tempo um acto de caridade perfeita e dc dor.

Não digaes que o motivo da fé e da esperança ahi se não acha expresso: primeiramenle vôdes contra quem seria diri­gida a objecção; depois é bem certo que esles motivos devem influir sobre seus aclos, que, sem islo, não seriam Ihcologicos e divinos. Ora, pnra influir cflicazmenle sobre esles actos, e ser a causa e a fórma d’elles, não é necessário que sejam ex­pressamente enunciados; basta qiic elles tenham sido bem sabidos e que permaneçam na memória. Então, seja virtual­mente, seja por aclos muito fracos e insensiveis que forma no fundo da alma o habito infuso d’cstas virtudes, influem sobre seus aclos mesmos; d'isto póde toda a pessoa, mesmo instruida, ter experiencia. Com elTeito, quando ella faz um acto de fé á presença real dc nosso Senhor no sacramento do altar, diz ordinariamente: «Creio que no.sso Senhor cííá presente^,; mas raras vezes acrescenta o motivo: porque Deus 0 revelou. Ainda que o não exprima, está persuadida que tem Teilo uni verdadeiro acto de fé lheologica; porque, na realidade, crô assim, porque sabe e crô habitualmente que é uma verdade revelada por um Deus infallivel em sua pala­vra. Muito mais, nos aclos exteriores de religião, taes como a genuflexão diante do Sanlissimo Sacramento, quando mesmo se não antepõe o acto expresso de fé na presença real, ninguém ha que duvide de que se faz um aclo de reli­gião. Não se dobra o joelho senão porque se crô. E verdade que se cré com uma fé'e por ura motivo que chamareis, como vos aprouver, habitual, virtual, implicilo ou fraco, mas toda­via suflicienle, ainda que se não sinta. Sc portanto achardes que 0 penilenle sabe o Credo, o Padre-Nosso, e o que elles encerram, assim como o aclo de contrição, quando mesmo ignorasse as fórmulas hoje em uso dos aclos de fé, esperança e caridade, abstende-vos de o mandar embora como indigno de absolvição. Qa quarenta ou sessenta annos que estas fór-

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niulas não cxisliam, não sc fallava d’ellas, como o attestam aquelles que nasceram anles dc 1720. Ainda que bem in­struídos em sua mocidade, nunca ouviram fallar d’ellas. Se­ria portanto necessário por esla falta condemnar todos os an­tigos, e accusar os pastores das almas de ter omiltido uma cousa essencial á justificação e á salvação; ora, é esla uma cousa em que não deveis mesmo pensar. Comtudo eu não poderia suIlicienleineDle louvar o uso aclual d’eslas fórmulas, que, exprimindo claramente os molivos c os objeclos da fé, da esperança, etc., são de uma grande utilidade para os fieis. E 0 motivo por que deveis recommendar a vossos penitentes que as aprendam bem, e as recitem com frequencia (').

Flemcdio 171.— Mas se for claro que o penitente ignora o que é para esta necessário para receber a graça sanlilicanle, tendes dous Ignorancia „ primeiro é fazer-lhe conhecer a obrigação em

que está de se instruir, e recomincudar-lhe ou mesmo im­por-lhe por penileucia que assista aos catecismos e ás inslru- cções, que leia c ouça ler obras que tratem da doutrina christã. 0 segundo meio é mais prompto; sèin esperar que elle tenha aprendido estas cousas de memória, inslrui-o bre­vemente, e fazei-lhe recitar comvosco lentamente e com de­voção as fórmulas de que temos fallado; de sorte que, actual- mente, elle creia, espere, ame, e se arrependa como deve; depois d’isto, se por outra parte nada se oppõe, dae-lhe a absolvição. Este segundo meio é o que deveis empregar a respeito dos adultos de uma condição mais que ordinaria, que se envergonhariam e perturbariam se ouvissem pergun- tór-lhes se sabem as primeiras verdades da fé, etc.. e que entretanto vos dão logar, por sua confissão, de duvidar de sua ignorancia. Ajudae-os suave e efficazmenle, fazendo-lhes dizer estes actos. Depois d’isto tendes aberto o caminho para Ibes perguntar se tôem o habito de recitar estas fórmulas ou outras semelhaoles, c, segundo sua resposta, providenciareis

0 signal da cruz cm iiomu da Santissima innuauc; oiuic o sigiiai augusto da no.ssa rcdcmpção so acha na igreja, nas ca.sas, no.s campos, muilas vozes com a imagem do Jesus Clinsto pregado na cruz, cm um estado próprio a c.xcitar a attenção; onde cm cada anno sc celebra a momoria do nascimento, da morte c da resurreição do Salvador; onde a imagem de Maria lendo Jesus cm seus braços, c outras imagens rcprc.scntando as diversas circiimslan- cias de sua vida, estão a cada passo debai.xo dos olbos; é dirilcil que se possa ignorar os grandes mysterios da Santissima Trindade ou da Encarnação, dn modo que as absolvições que se lOcm rcccbiJo sejam nulias. l’ódc-.sc ccriamcntc conlieccí-os e acredital-os sem estar em

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a suas necessidades, fazendo uso do primeiro remedio. A esta fatal ignorancia, que torna incapaz da absolvição, se reune tambem cm muitos aquella do que constitue a verdadeira contrição necessaria ao sacramento. Quantos não sc encon­tram que, levando até ao escrupulo o cuidado do exame, apenas pensam no arrependimento! Alguns ha que julgam que basta excitar-se á contrição depois de ter saído do sa­grado tribunal; outros esperam que o confessor os ajude a excilar-se, ou se contentam dc o fazer emquanto elle recita as breves preces que precedem a fórma da absolvição. Fa- zei-lhes conhecer a imporlancia d’ella, suggeri-lhes os meios de a ter, que são de a pedir a Deus, de pensar um pouco em seus motivos, e de se excitar a ella com cuidado. Aconsc- Ihae-lhes tambem que façam ao mesmo tempo os actos de at­trição e de contrição perfeita, c mesmo que os repitam muitas vezes. Adverlil-os-heis todavia que não é por obrigação, mas

?|ue é uma prática muilo ulil. Com eslas precauções terão undamcnlo para desprezar Iodas as dúvidas que*podcriam

vir-lhes sobre a contrição, e para aproximar-se aos sacra­mentos cora a confiança de estarem suíücienlemenle dispos­tos.

172.— Ainda ha uma oulra especie de iguorancin, que me- Remedio rece toda a vossa attenção; é aquella que poderia ser uma. para a occasião de peccado formal para o penitenle ou seus subordi-'®?®^®"®*® nados, ou de escandalo para os outros. Se, por exemplo, al-consuiueo guem enlretem uma amizade ou umn familiaridade que peccado. ameaça lornar-sc uma occasião de ollcnder a Deus, ainda que cllc 0 não conheça, não deveis deixal-o na boa fé; por­que, de que lhe servirá sua boa fé para resistir no perigo ás tentações que o inipeiliram n fazer o que elle muilo bem sabe ser-lhe prohibido? Adverli-o portanto cm termos claros. Cpmporlae-vos do mesmo modo a respeito dos paes e mães que por ignorancia e por negligencia não cuidam cm educar chrislãmenle seus filhos nos principios da fé, no uso da ora­ção e dos sacramentos, e não os apartam dos perigos domés­ticos ou externos. Seus filhos perderão facilmente a innocen- cia, c contrabirão máus hábitos, dc que talvez jámais se emendarão. Cumpre ao vosso zelo prevenir eslas desgraças.Oulro tanto digo dos senhores de casa ou fabricas que não impedem os máus discursos, nem a mistura perigosa das pes­soas de diderente sexo que estão a seu serviço, c que não lhes dão facilidade de freqüentarem os sacramentos, de ouvi­rem a palavra de Deus, etc. Remediae tambem com todo o cuidado possivel a ignorancia, que faz que se tornem por snas acções ou suas omissões um motivo de escandalo para os ou­tros. Por exemplo, se um sacerdote vae muito veloz ceie-

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brando, ainda que o faça por ignorancia ou falta de reflexão, 03 seculares se achara justamente escandalisados. Em geral, quanto mais uma pessoa está exposta a ser notada pelos ou­tros, com perigo para elles de julgarem licito aquillo que vôem fazer ou omittir, mais importa advcrtil-a: o máu exem­plo é igualmente nocivo, quer seja dado por ignorancia ou por malicia. É o motivo por que é da ultima importância que os chefes dc familia, aquelles que estão cm empregos públi­cos, ecciesiasticos ou civis, e mesmo, segundo a nota de Bento X IV [Bul. Apostolica, § 20), as pessoas que freqüen­tam os sacramentos, sejam inslruidas c convenientemente advertidas, a fim de que uão dôera máu exemplo, porque se­ria muilo mais nocivo ao publico. Se porlanlo, confessan­do-as, achardes que ellas lôem faltas em sua conducla exte­rior, corrigi-as o melhor que podérdes. Quanto a oulra qualquer ignorancia menos prejudicial do que esla, appiicae os remedios que vos indiquei em o n.® 63, e que vos indica­rei em 0 n.° 313.

INTKIinOfiAÇÕES QUE SE DEVEM FAZER AOS PENITENTES POUCO INSTRUIDOS

Sobre 0 173. (S. Ligorio, n.“" 21-60.) — Para vos ajudar no exer-primeiro cicio de vosso ministério, vou aqui notar as perguntas que o mpntn' co^fcssor dcvc Ordinariamente dirigir aos penitentes ignoran-

■ tes, e que elle julga não terem feito suflicienle exame. Eu acrescentarei algumas advertências ulilissimas na prática. Sobre o primeiro mandamento pergunlae:

1.® A vosso penitente, se elle sabe os principaes mysterios da fé; porque se ignora estas quatro grandes verdades, a existencia de um Deus, reraiinerador do hera e vingador do mal, 0 myslcrio da Santissima Trindade, o myslerio da En­carnação,"paixão e morte de Jesus Christo, não é capaz de absolvição, segundo a proposição 64, condeinnada por Inno- cenclo X I; além d’isto, se sabe o Credo, os Mandamentos, os Sacramentos, etc., ao menos era substancia. A este proposito 0 bemavenlurado Leonardo dc Porto Maurício faz observar que 0 confessor é obrigado a instruir os penitentes ignoran­tes dos mysterios da fé, ao menos dos quatro principaes; de­pois acrescenta que é um uso máu mandar embora estes po­bres ignorantes, a (im de os fazer instruir por outros, porque elles não colhem d’islo outro fructo mais do que permanece­rem em sua ignorancia. Esta é a razão por que convem ensi­nar-lhes em poucas palavras as principaes verdades, fazendo- lhes proferir um acto de fé, de esperança, de amor de Deus e de contrição, impondo-lhes a obrigação de procurarem in-

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DOS CONFESSORES 153

iiidamente das outras verdades necessáriasde necessitate prwcepli.

Quanto ás pessoas de uma condição mais elevada, mas ignorantes, que teriam vergonha de serem interrogadas so­bre isto, 0 mesmo auctor diz que o confessor póde fallar d’este modo: Façamos os actos aas principaes virtudes. Ao acto de fé acrescentará: «Ó meu Deus, porque vós sois a verdade mesma e o tendes revelado á santa Igreja, creio ludo 0 que ella me propõe; creio em particular que sois um só Deus ein tres pessoas; creio que o Filho se fez homem, que morreu na cruz por nós, que resuscilou, que subiu ao céo, d’opdc virá a julgar os homens, dar o paraiso aos bons e con- denmnr os máus no inferno por toda a eternidade.»

2.® Pergunlae-lbe se tem feito ou ensinado práticas su­persticiosas; se empregou outras pessoas, fazendo-as cooperar no seu peccado. Deve dizer-se aos ignorantes que as super­stições são sempre prohibidas, ainda que se façam por cari­dade e em caso de necessidade. Que sc deve considerar como superstição? Vêde nossa Theologia grande (lib. li l , n.® 14.)

3.® Perguntae se quanto ao passado occullou por vergonha algum peccado. E necessário fazer esla pergunta aos igno­rantes e ás mulheres que se confessam raras vezes. Podeis dizer-lhes: Terieis vós alguma inquiclação sobre vossa vida passada? Fazei hoje uma boa confissão; dizei livremente tudo 0 que vos mortifica; nada temaes, esclarecei bem Iodas as vos­sas dúvidas. Um santo sacerdote dizia que por esta pergunta tinha tirado e preservado do sacrilégio um grande numero de almas. Sc achaes o penitenle já culpado de sacrilégios, per- guntae-lhe, para saber o numero, quantas vezes se confessou e commungou durante o tempo em que occultava seus pecca­dos; se dc cada vez que se confessava ou commungava dava attenção ao sacrilégio, porque acontece a alguns fazer certa conlissão sacrílega, principalmente durante a infancia, e de­pois esquecer-se. Estes penitentes não são obrigados a repe­tir as confissões feitas durante o tempo do esquecimento. Pergunlac-lbcs tambem sc sabiam que, confessando-sc e coni- mungnndo, assim transgrediam o preceito paschal. É bom fazer eslas perguntas sobre os sacrilégios no principio da confissão, com receio de que, fazendo-as só no fim, e estando já commellido o sacrilégio, se lenha de repelir a confissão (>). E ' necessário fazer sentir áquelles, que tèem occultado seus

de conducta 6 a applicação do seuliraenlo referido ui

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peccados, toda a enormidade do crime que commctteram cal­cando aos pés 0 sangue do Salvador.

4.® Perguntae se fez a penitencia; se a esqueceu, se quiz deixal-n ou differil-a para a cumprir mais tarde, ou para a fazer commutar, e se julgava que fazia mal dilTerindo-a as­sim.

B.® Perguntae, sobre o escandalo, se procurou fazer pec­car os outros, e se para isto se serviu de outras pessoas; se cooperou para os peccados de outrem. Aos taverneiros, se têem dado vinho aos que costumam embriagar-se; ás mulhe­res, se com palavras pouco raodesUis, gracejos, riso, vistas fixas, vestidos decotados ou um peito muito descoberto, lôem dado occasião aos homens de terem máus pensamentos; se tôem recebido dadivas ofTerccidas para máu fim. Sobre o es­candalo podeis lamliem perguntar ao penitente se cooperou para os peccados de outrem; mas n’islo deviüs saber bem quando ha cooperação formal, e quando ha cooperação ma­terial. A cooperação formal lem logar quando se coopera actualmente para o peccado, como acontece na fornicação, ou quando se coopera para os máus designios de um oulro, por exemplo, se prolegeis o assassino ou o ladrão. Neste caso cooperarieis verdadeiramente para sua má intenção, animan­do-o a commetter o mal; esta cooperação é formal, portanto íilicita sempre, pois que é inlrinsecamenle má. A cooperação material tem logar quando sc coopera para a acção de um outro, indilTerenle por si mesma, mas que se serve d’ella para ura máu fim, como seria dar vinho áquelle que quer embria- gnr-se. Esta cooperação póde ser licita quando ha, para a permittir, uma razão legitima e proporcionada á cooperação. Este ponto é da maior imporlancia: eu tive muilo trabalho cm decifral-o. Vôde sobre isto nossas razões e nossas resolu­ções (*).

Sobre 0 174.— É necessário que o confessor interrogue sobre osmanda-°P.®''j®''‘°®> transgredidos e blasphemias. Sohre o perju- menlo. ri® perguntae ao penitente se lem feito falsos juramentos, e

se foi judicialmente ou em outra parte.Fazendo um perjúrio á face do tribunal, peccou contra a

religião e contra a justiça; por consequencia póde acontecer que seja obrigado a dcsdizcr-se ou a reparar o damno. Per­guntae tambem como foi que jurou, sc foi por Deus, pelos santos, ou por sua alma. Se jurou sobre sua consciência, on sobre sua fé, sem dizer pela sanla fé, ou a fé de Jesus Chris­to, é provável que não é perjúrio, nem peccado mortal. (Lib. I I I , n.® 135.) Deve aqui nolar-se que ura grande numero de

(•) Lib. 11, 11.» Cõ; V. ad dislinguendum; lib. 111, n.® 571.

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3 ignorantes não consideram como um peccado mortal0 perjúrio mesmo pelos santos, quando a ninguém causa da­mno; da mesma sorte quando dizem a seus íillios ou n seus domésticos: por Deus, por Christo, te matarei, se fores a tal parte, elles não tôem intenção de fazer um perjúrio, ainda que não queiram executar esta ameaça: ao menos uão llie dão attenção.

Quanto aos votos, o confessor deve primeiramente certifi- car-se se o que fez o penitente é verdadeiramente um voto; porque as pessoas simplices tomam muitas vezes como votos, desejos e resoluções. Para o saber, de pouco serve pergun­tar-lhes, como alguns confessores fazem, se tiveram intenção de se obrigar ao voto debaixo de peccado mortal. Interroga­das d’este modo, as pessoas ignorantes facilmente respondem que não: será portanto util perguntar-lhes se, quando fa­ziam 0 voto, peQ.savam que se tornariam ou não culpados de um peccado mortal não o cumprindo; d’este modo 6 mais fa­cil saber sc tiveram intenção de se obrigar ao voto sub gravi ou não. Se reconbeceis que hn n'isto ura verdadeiro voto, perguntareis ao penitente se julgava peccar mortalmente dif- rerindo o cumpril o, ou se por sua intenção se julgava descul­pado de 0 cumprir mais tarde.

E a proposito pôr aqui algumas observações sobre a com- mutação ou dispensa dos votos. Já sabeis que ha cinco votos reservados: o voto de religião, de castidade perpetua, das tres peregrinações, de Roma, de S. Thingo de Galiza, c de Jerusalem. A dispensa d’elles é reservada ao Papa, sendo absolutos, non autem pcenalia et conditionata. Os outros vo­tos podem ser commulados pelos bispos, que lambem os po­dem dispensar e delegar a oulros este duplicado poder; o mesmo é dos confessores regulares, e mesmo dos oulros con­fessores uo tempo de jubileu ou era virtude de algum outro privilegio. Quanlo a cummutação, não deveis ser escrupuloso sobre a causa. Todo o motivo razoavel é bastante; basta para commular o voto que o penitente seja um pouco exposto a infringil-o. Não vos inquieteis lambem para lhe substituir uma maleria igual; não se trata aqui de uma igualdade pe­sada á balança, basta uma igualdade moral. Pergunlae ao penitente quaes são as obras de subrogação que elle costuma razer ou para que tem mais goslo; é n’e.slas que commula- reis seu volo. A mais segura conimulaçào de Ioda a especie de votos é a fre(|ueneia dos sacramentos. Deve notar se que os votos perpétuos poderão muito bem commular-sc em vo­tos temporacs, comlanlo que haja uma justa proporçSo. Da mesma fórma os votos reaes podem commular-se em pcs- soaes, e vice-versa. Tratando-se de dispensa, é necessaria

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uma razão mais grave, tal como um grande perigo dc trans­gressão, uma grande difliculdade na execução, a ligeireza ou deliberação imperfeita cora que o voto foi feito, etc. Bom é a semelhantes dispensas acrescentar alguma commutação. Es­tas dispensas c cstns corarautações podem ter logar fóra da conlissão, comlnnlo que a faculdade não tenha sido dada de­baixo d’csta condição, como no jubileu. Todavia aconselho- vos qiie façaes ludo isto na conlissão. (S. Lig., Theol. mor., lib. III, n.» 261, 256, 257; V. Imo.\ 244 in line, 243, 247; V. Not.; 552 e 253, 557; V. Imo.)

Quanto ás blasphemias, perguntae ao penitente: 1.*, se blaspberaou dos santos, e como sc expressou; por exemplo, se disse: Malditos sejam, etc., isto cerlamcule 6 ura peccado mortal (').

Pergunlac-lhc: 2.', se blasphcmou os dias santos, taes como Paschoa, Natal, Epiphania, Sabbado Snnlo, etc., o que não póde ser escusado de peccado mortal, ainda que um grande numero de pessoas grosseiras não o consideram claramente como lal. Comtudo, sendo a cousa duvidosa, perguntae o nu­mero, e tomae-as pelo que são diante de Deus.

('I Kis a(|iil u quo o Dispo dc .Maus diz das palavras blasplie- malorias, laiilo em uso enlre o povo. «Qui, ira aliave passionc abre- plus, verba l)laspbemi;u proferi, coruin sigiiillcalioncm non advcr- tcns, pcceat tautiim veuialiter sub lioc rcspeclu, ut expn‘sse agiioscit S. Th., n.» 2, q. 13, art. 2. llcm qui ex iuvclorala consueludiiic blas- pliemandi, quam serio rciraclavil, cadcni tamen inadverteiUer prouun- liat verba, a morlali et quaudoqiie ab omiii peccalo e.xcusanlur. Potest içilur absolvi el ad sacram Eucliarisliam admitli saltem in Paschate. Sic ipse Col. Andeyav , t. IV.

•Similiter cx defeciu advcrlentia: sajpc flt ut formuUc vcrc blaspbc- maloriíu, in se borribiles. a gravi peccalo cxcuseulur: v. g. morldii (morte de Üeus), vciUredié (ventrc dc Deus), lêtcdié (cabeça de Deus), jarnidié (renego a Deus); niaugredié (apesar de Üeus), elc. Commiim- ter cnim qui liujusmodi formulis nunc utuntur, pravum eorum seu- sum nou iiilelliguiil.

Nunc cnim aliqiii credimt sc nou blasplicmarc diccudo simplicitcr: Nome dc üeus, mil nomes, si non pncccdat iiomeii ailjeclivnm sapror- do; vel e(iam sagrado iwme, si nou sequalur de Deus, vel simpliciter sagrado. ll:e lormulaj, muKum in rcgionibus noslris u.silaUc, quas re-

P'o apud D.Vernicr, t. I, inibi vidciilur cxcusari posse a morlali, ubi eruriliir sine ira, quia nou cxliibcnl sensum iu Deum conlumelio-

sum, el lldeles graviler non oITeuduiil, nisi raliouc slalus et coudilio- nis pcrsonm cas proferciilis scaudaium pra:beanl. .Si vero proferenlor iu ira, difllcilius cxcusari posscnt, quia Cx sensu (Idelium iu Deum sunt coulumeliosa:; a forliori illrc allcraj, «... nome de Deus «... mil nomes de Deus, a morlali cxcusari uci|ucunl nisi ex consueludinc re- traclala cx dcfcclu advertcntiic, ut modo nolavimus.

•Cmlerum bacc omnia ex circumstaiitiis jiidicanda sunt, ct S. Liguo- ri, lib. III, n.° I3Ü, cum aliis pliiribus, couleiidil quod, iu dubio an ali­qua formula sit vcl nou blasphcmia, ut blaspbemia uoii sit liabonda. Saltem qui ea utuntur, absquc formali inlculiouc Deum inboiiorandi, non repulandi sunt rei peccaü morlalis. (Inat. Theol., t. V, pag. 160.)

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Pergunlae: 3.', se, depois de ler proferido semelhantes blasphemias contra Deus, os santos, ou dias festivos, acres­centaram logo; Se eu o tenho feito, ou: Excepto Deus; por­que as pessoas grosseiras que dizem isto unico aclu são des­culpáveis de peccado mortal, ao menos eni razão de sua igno­rância, porque não lôem intenção de blasphemar. Eu linha dito em minha Theologia (lih. II I , n.“ 123. V. Sic quoque), que umn semelhante expressão era uma verdadeira hlasphe- mia; porque, para que haja hiasphemia, não é necessário ter intenção de blasphemar: basta que a proposição seja dc si injuriosa a üeus e aos santos. Porém, tendo feito mais ma­duras reflexões, parccc-mc provável, como n outros Iheolo- gos, que não é uma blaspliemia, pois que o verdadeiro sen­tido d esla proposição deve delerminar-se pelas ultimas pala­vras; ora, bem póde dizer-se que a proposição de que se trata, tomada em seu complexo, não importa uma verdadeira blasphemia. Dc oulro modo seria, se aquelle que tivesse pro­ferido uma verdadeira blasphemia dissesse, como para reme­diar 0 mal commettido: Se o tenho feito, etc.

4.® Quando estas pessoas grosseiras lôem dito: Maldita seja a fé; não considereis isto como uma blasphemia; elles não intentam fallar da fé chrislã, e por fé póde muilo hera enlender-se a fé humana. Dever-sc-hia julgar dc outra sorte se elles tivessem blasphemado a santa fé ou a fé de Christo. Da mesma fórma não 6 peccado mortal maldizer as mortes, excepto se aquelle que o diz faz entender preci.samcnte a morte de Jesus Christo, ou as almas do purgalorio, ou as al­mas dos mortos. Eis aqui a razão d’isto em poucas palavras: uma semellianlc maldição não encerra cm si, nem na inten­ção d’aquellcs que a proferem, uma injuria ás almas do pur­gatório: nós 0 temos demonstrado iio liv. I, n.® 130. Com elfeilo, na realidade elles fazem abslracção do corpo ou da alma, e não fazem attcnção aos mortos, mas aos vivos, a quem dirigem csUs maldições por fórma dc injurias. Tenho achado tres auctores que escreveram sobre esta maleria, e que di­zem 0 mesmo: é o Padre Mazolla em sua Theologia moral; 0 auctor do Tratado contra a blasphemia, e o auctor da /n- strucção para os confessores da aldeia. Esla instrucção foi re­cebida com applausos de todo o mundo, e principalmente pelo illustre e erudito Bispo Magr. I). Jiilio Torni. Eu lenho ido mais longe: eu me certiliquei que o Soberano Pontiiice reinante, Bento X IV, pensava como eu, que maldizer as mor­tes não era uma verdadeira blasphemia.

8.® Maldizer o mundo é blasphemar? 0 auctor da ínslru- cção acima citada o nega, mas eu lenho demonstrado o con­trario no liv. I I I , n.® 120, Sed hic. Comtudo, tcuho notado

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que Irolando-se do mundo inimigo de Deus, não era certa­mente peccado. Mas como é verosimil que as pessoas gros­seiras não 0 entendem assim, que pelo contrario entendem o mundo crcado por Deus, e se accusani d’isto como de uma grande falta, é por isto que eu disse e digo ainda que se deve mais provavelmente tel-o por um peccado grave.

6.® Maldizer as crcaturas iiiauimndas, como o vento, a chuva, os annos, os dias, o fogo, etc., não é uma blasphe- mia, excepto referindo-se expressamente estas crcaturas a Deus, por exemplo, dizendo-se: Maldito seja o fogo de Deus, 0 pão de Deus, etc. Não sc poderia duvidar que maldizer o paraiso ou a alma não seja uma blasphemia grave. (N.® 129).

7.® Maldizer o demonio não é uin peccado mortal, porque se costuma maldizer como o auctor do mal c o inimigo de Deus. Em si não é mesmo uin peccado venial, feita n abstra- cção do acto de impaciência, que n’isto facilmente se encon­tra. {Ib .y. Maledicere.) Dizer: Diabo santo ou omnipotente é certamente uma blasphemia muito grave, e mesmo here- tica, dizendo-se e crendo-o assim, o que de ordinário não se presume. Mas não é blasphemia chamar ao demonio po­deroso ou sabio, comtanto que não seja na intenção de o hon­rar; porque, de sua natureza, o demonio é sabio e poderoso; não menos o dizer Santo dia....

8.® Interrogae o penitente quantas vezes e em que occa­sião blasphemou, sc no jogo, na taverna, na caça, etc., e desde quanto tempo está n’este máu habito, a fim de ver se é rccidivo, e sc ha occasião próxima que seja obrigado a evitar.

9.® Perguntae-llie se blasphemou na presença de seus fi­lhos ou de seus domésticos. N ’este caso, além do peccado de blasphemia, ha tambem peccado de escandalo. Eu acrescen­to, com um sabio auctor, que os blasphemadores não são es­cusados de peccado grave, porque a força do máu habito ou um violento accesso de cólera os impediu de saber o que di­ziam. Ainda que tenham um conhecimento menos vivo do que aquelles que não estão habituados á blasphemia, rcsta- Ines sempre o conhecimento actual, que basta para que o acto seja deliberado c mortal. Fazendo pouco caso do pecca­do, este não faz sobre elles aquella viva impressão que pro­duziria sobre uma consciência menos estragada. D’aqui pro­cede que não fica em sua memória alguma lembrança d’este conhecimento actual do peccado, ou ao menos esta lembrança é tão fraca, que elles respondem facilmente que não adver­tiam. Mas um confessor esclarecido não deve acredital-os; não deve mesmo perguntar-lhes se o advertiram ou não: deve considerar suas palavras como outras tantas blasphemias, to­das as vezes que elles as conhecem por taes.

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175.— Sobre a obrigação de ouvir missa nos dias festivos, Sobrc o perguntae ao penitente se a ella fallou alguma vez, se adver- terceiro liu que a perdia, ou duvidou no momento em que podia ou- vil-a. Ainda que muitas vezes se lenha posto o penitenle era desleixo, acontece que por acaso acha uma missa e a ouve.Comtudo expoz-se sem uma justa causa ao perigo de faltar a ella, e o penitenle pouco instruido não sc confessa d’isto. Se 0 penitente se accusar de ler perdido a missa, perguntae-Ibe por que razão; se foi por necessidade, como acontece aos pastores que não podem abandonar seu rebanho; ás mães que não podem deixar seus (ilhos; aos paes que não podem deixar os doentes; aos viajantes que não podem separar-se da sua companhia sem graves inconvenientes, como dc se­rem despojados pelos ladrões, ou de não poderem acertar o caminho, etc.; ou a uma pessoa que não tiver vestidos con­venientes para apparecer na igreja. (Lib. I I I , n." íldO.)

Quanto ás obras servis, pergiintae-lhe sc trabalhou nos dias festivos. Respondendo que sim, pcrgunlac-lbe: 1.°, quanto tempo trabalhou e que trabalho fez. Segundo o sen­timento mais commum, desculpara-sc de peccado mortal aquelles que não trabalham mais que duas horas. (Lib. I I I , n.® 303.) Outros admittem ainda algum lempo mais, ao me­nos se 0 trabalho de si mesmo é leve, e se ha alguma razão mais considerável. Se o penitente se accusa de ter traba­lhado algumas vezes mais, algumas vezes menos, pergunlae- Ihe quantas vezes trabalhou, julgando fazer um peccado mor­tal. Deve explicar-se-lhe que trabalhar por muito tempo, mesmo occullamente, para seu recreio, e sem retribuição, é ura peccado. Perguntae-lhc: 2.“, por que razão trabalhou, se foi por necessidade, ou porque é costume geral do paiz. A pobreza póde desculpar, como o mais das vezes desculpa qs pobres, que não podem de outro modo prover á sua subsis­tência e a dc sua familia; como tambem aquelles que remen­dam seus vestidos n’esle dia, não o podendo fazer pela se­mana. (N.® 297.) Mas devem desenganar-se as pessoas pouco instruídas que falsamente julgam poder, sem peccar, traba­lhar nos dias festivos para sua própria casa e sem algum sa- lario. Muitos theologos desculpam aquelles que trabalham para evitar a ociosidade, que seria para elles uma occasião provável de peccado. Nós não admillinios este sentimento, senão no caso extremamente raro, cm que a pessoa fosse de tal modo atormentada pela tentação importuna, que não po­desse deserabaraçar-se d’ella senão trabalhando. Ha domés­ticos e jornalciros que são muitas vezes obrigados por seus amos a trabalhar nos dias festivos e mesmo a fallar á missa; elles lêem obrigação de deixar estes amos, excepto se em vir-

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lude dc um contrato são obrigados a servil-os, ou se, recu­sando-se, tiverem graves razões de temer um maior damno. Esta só razão póde desculpar os lilhos e mulheres obrigados a trabalhar nos dias festivos por seus paes ou maridos. (Lib. II I , n .° 296.) Perguntae-lhc tambem se comeu alimentos prohibi- dos na sexta feira e sabbado, nas vigilias e durante a qua­resma.

Sobre o 176.— Perguntae aos lilhos: 1.', se lôem tido odio contra quarto geus paes: n’oste caso tôem peccado duplicadanientc contra a menío’ c^rhiade c cuntra a piedade; 2.", se lhes tôem desobedecido

cm matéria grave, contra sua prohihição expressa, e em cousa justa, como de não sair dc noite, de não jogar jogos perniciosos, de nâo andar com niãs companhias ou com pes­soas de dilTerente sexo, e outras semelhantes. Eu disse em cousa jusla. porque para a escolha de um estado vitalicio os lilhos não são obrigados a ohedcccr a seus paes. Muito mais, os paes pcccam gravemente quando,- sem justas razões, con­strangera seus lilhos a casar-se ou ordenar-se, ou fazer-se re­ligiosos, desviando-os por meios injustos do estado que elles querem abraçar. (Lih. 111, n.® 3:io. Vide Prail., el lih. IV, n.® 77.) Perguülac-lhcs se lôem fallado ao respeito n seus paes e em sua presença, por acções, imprecações ou injurias graves, como chamar-lhes bebedos, brutos, malvados, feiticei­ros, ladrões, tolos, conlradizendo-os, ou dizendo lhes oulras palavras qnc os desgostem muilo. Não se deve condemuar absolutamente como peccado mortal o chamar-lhes velhos, ignoranles, imprudenles, excepto se elles com islo se oITendem gravemente. Notae que os lilhos que faltaram ao respeito a seus paes são obrigados a restiluir-lhes a honra que lhes de­vem, pedindo perdão, e mesmo na presença das pessoas, diante das quaes commelteram a falta Ila confessores pouco sabios, que n’csle caso impõem aos lilhos por penitencia que vão, quando voltarem a casa, beijar os pés a seus paes, e lhes dão a absolvição. Os lilhos nada fazem, c commettem ura novo pcccado. Vale mais que pcçara perdão antes de receber a al).solvição: mas sem os mandar beijar os pés ou as mãos, porque os lilhos que não lôem esle uso o fazem muilo dilDcil- mente. Todavia uão se podendo commodamente exigir que elles peçam perdão antes de receber a absolvição, não lhes façaes d’isto uma obrigação grave; contenlae-vos de lh’o acon­selhar, porque se presume com segurança, ao menos o mais das vezes, que os paes perdoam esla obrigação aos lilhos, a íim de os não ver novamente na inimizade de Deus.

Se forem os paes que se confessem, pergtinlae-lhcs: 1.®, se faltaram á educação de seus filhos, sendo negligentes em os instruir nas verdades da fé, em os fazer assistir á missa e

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freqüentar os sacramentos, em os desviar das más compa­nhias ou das pessoas de dilTerente sexo. Pergunlae lambem sc os tôem c.«candalisado, binspbcmando em sua presença, etc.; se não os tôem reprehendido quando peccaram, sobre­tudo qunndo commctteram algum furto; se tôem permittido aos futuros esposos dc suas filhas de entrar em sua casa,(noUi 1.* ao n.° 43S) e sobretudo sc lêem feilo deitar na cama os lilbos de dillcrentc sexo: se não Ibes tôem dado os alimentos necessários; se tôem obrigado seus lilbos por meios injustos a casar-se, a ordenar-se ou entrar em religião contra sua vontade. .\” islo terão peccado mortalmente. Mas os paes não fazem grande escrupulo do que causa a perda de seus fi­lhos e a ruina da Igreja.

Pergunlae aos amos se têem reprehendido os seus domés­ticos quando blaspbcmassem, ou não cumprissem o dever paschal, ou faltassem á missa, ou tivessem conversas dcsho- neslas, principalmente durante as vindimas. Os amos são obrigados a impedir quanlo podem os escandalos que se com- nieltcm então. Pergunlae aos maridos se tôem fornecido a subsistência á sua familia; ás esposas, se tôem dado occasião a seus lilbos de blasphemar, se tôem pago o debito conjugal. Ordinariamente pergunlae islo ás esposas, porque um grande numero se condemnam por causa d’islo, c são causa da con- demnaçãü dc seus maridos, que vendo recusar seu direito, commeltem mil ini(|uidadcs. Mas fazendo csla pergunta ser- vi-vos de expressões as mais modestas, por exemplo: Obede- ceis a vosso marido mesmo no malrimonio? oa : Tendes al­guma inquietação sobre vossos deveres matrimoniaes? Não fareis esla pergunta ás mulheres que passam uma vida ver­dadeiramente clirislã.

177.— Pergunlae ao penitente: 1.”, se desejou mal grave Sobre o ao proximo, ou sc se regosijou com o mal que Ibe acontecia.Deveis aqui notar, que se o penitente desejasse a seu ini- meuto.' migo diversas especies de males, taes como a morte, a infa- mia, a pobreza, é obrigado a explical-os. São peccados dif- ferenles e disliuctos por seu numero, quando realmente se desejou fazcr-lbe estes males, ou se desejou especificamente que lhe acontecessem. De outra fórma é, segundo a opinião provável dc alguns lheologos, se lhe desejou estes males sub uno genere mali, quero dizer, como meios de ruina. Ora aqui 0 tormento dus pobres confessores 6 julgar se ns impre­cações a que eslão habituados estes penitentes gro.sseiros são peccados mortaes ou veniaes. (Lib. V, n.° 50; V. Quari- tur, 6.) Para o saber pergunlae primeiramente ao penitente, se no momento desejou de proposilo deliberado vel-as cum­prir. Mas islo Dão basta para fundamentar um juizo certo.

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Assim, lhe perguntareis tambem se elle as lançou contra es­tranhos ou contra seus parentes; porque é raro que haja má intenção contra seus parentes, principalmente contra seus li- Ihos, sua esposa, seu pae e mãe. Perguntae-lhe mais por que as proferiu elle? Se foi por uma causa grave, e em uma grande cólera, póde muito bem ser que tivesse máu desejo. Quanto ao mais, não basta, para desculpar semelhantes im- precaçoes, dizer que não teriam querido vel-as realisar senão no inomenlo em que as proferiram, porque não c necessário mais para terem commettido uma falta grave n’esse momento. Esta a razão por que deveis perguntar o numero d‘ellas e to- mal-as ao menos pelo que ellas são diante de Deus. Se houve reincidência n’este peccado, não deis a ab.solvição senão quando tiverdes visto mudança ou algum signal extraordiná­rio de contrição.

Perguntae: 2.", se fez ou disse graves injurias ao proximo, e isto cm presença de outrem. N ’estc caso é obrigado a res- tituir-lhe sua honra na presença das mesmas pessoas, pedin­do-lhe desculpa ou dando-lhe outros signaes de estima, ex­cepto presumindo-se prudentemente que o injuriado o dis­pensa d'isto, ou recusa esta satisfação pública, a (im de não renovar n’elle o sentimento dc confusão, c nos outros a lem­brança da injuria que recebeu; ou linalmente havendo logar de temer que esta satisfação faça reviver o odio./ Se a injuria foi secreta, é obrigado a pedir sccrelamentc o perdão, se­gundo 0 sentimento verdadeiro. (Lib. III, n.°’ 98i, 988,985.)

Notae entretanto que as injurias que estas gentes rústicas dizem uns aos outros, embora sejam graves de sua natureza, não 0 são sempre para elles; taes são as seguintes: Ladrão, feiticeira, mulher de má vida, porque não fazem grande caso d’isto, c aquelles que as ouvem não as acreditam, excepto sc nomeassem as cousas e designassem os cúmplices. Pergunlae lambem se fomentou discórdias, levando mexericos de uns aos outros.

Finalmente perguntae-lhe se leve algunia inimizade, e se recusou a seu inimigo os signaes ordinários de bcnevolcncia. Trata-se de saber se o oITendido 6 obrigado a perdoar a of- fensa áquelle que lh’a fez. Os doutores de Salamanca dizem, que 0 offendido é obrigado a perdoar a injuria, mas não a pena pública, porq ue esla redunda cm bem geral. (Tract. 22, cap. ví, n.® 18.) Especulativamenle é verdadeiro este senli- menlo; mas na prática nunca me atrevi a absolver algum d’csles penitentes que dizem que pcrdonfh a seu inimigo, mas que querem que a justiça lenha o seu curso, a fira de que sejam punidos os máus. Nunca me pude persuadir que taes pessoas, que algumas vezes eslão cobertas de peccados.

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estejam animadas de um zelo pelo bem commum e pela jus­tiça, isento de todo o desejo de vingança, tanto que não Ibes importam senão aquelles que os ofTenderam e não os outros maireitores. Assim, seu amor do hem publico, dizem muitos doutores (lib. II, n.® 29. V. Licet), não é ordinariamente mais que um hello pretexto, debaixo do qual occultam o desejo da vingança pessoal. Comtudo, penso que se póde bem absolver 0 ollendido, se primeiro quizer perdoar a ollensa, preten­dendo não obstante a indemnisação prévia pelo damno que solTreu, comtanto que aquelle que o oITendeu não seja de lal sorte pobre, que esteja na impossibilidade de salisliizer; se, ém segiimio logar, sc lizer o perdão, debaixo da condição de que 0 aggressor lique longe d'aquella terra, seja porque elle tem irmãos ou lilhos homens cheios dc resentimcnlo, seja porque o aggressor é de um caracter tão vingativo c de tal sorle inclinado a contendas, que haja justas razões de temer, por causa de sua própria fraqueza, não poder solfrer suas in­solências.

178.— 1.® Inlerrogenlur de cogitalionibus, nnni dcsidera- Sobro verinl,aul moroso delectati fuerint de rebus iniioneslis, etan ° plane ad eas adverterint, et consenserint. Dcinde num con- mento.' ciipiverint puellns, aut viduas, aut nuptas; et quid mali cum illis se facturos intenderint. In quo advertenduui, quod rus- tici, comiminiter lonqucndo existimanl majus peccatum stu- prum, quam simplicem fornicationem; e contrario nesciunt raaliliam ndiillerii: ideo cum iís, qui hujus vilii consueludi- nera hahent. non expcdit eos monere de adultcrii malitia, cum praívidelur monilio parum profulura. De his autem co- gilalionihus, quibus assentili sunt, sumendus est numerus cerlus, si haheri polesl; sin autem, exquiratur quolies in die, vel hebdomada, vel in mense cogitalionibus consenserint. Scd si nec etiam id explicare possint, intcrrogenlur num concu- piverinl singulas, quse sibi occurrerunt, vel in mentem vene- runt; nul num hahilualiler turpilcr de aliqua in parliculari cogilarinl, nunqnam pravis consensibus resislcndo; et an sem­per illam conciipivcrint, vel an tantum quanlum ipsam con- spiciehnnl. Dcmum inlerrogenlur etiam, num media appo- suerinl ad malas cogitationes exsequcndns, nam, ut dixiraus in libro (lih. V, n.° 42), tunc illa media, etsi indilTccnlia, a malitia interna informanlur: et ideo explicanda ut peccata exteriia, sive opera incoepta.

Circa verba obscena; inlerrogenlur: 1.® Coram quibus, el quoties ila locuti sint, ralione scandali; an coram viris, an foeminis; uxoralis, aut non; pueris vel aduilis. Facilius enim scandalizantur puellae et pucri, quam adulti, prmserlim qui in hoc vilio sunt habituali. 2.® Qua dixerint verba, an v. g..

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nominarint pudenda sexus a suo divcrsi; hoc enim diíliculler excusalur a morlali. 3.° Num verba prolulerinl cx ira, vel

go; nam ex ira dillicilius aderil complacentia, et scandalum. veal confessarius ab absolvcndis hujusmodi rccidivis in col-

loqiiiis lurpibus, quamvis dicant ca prolulisse ex joco, nisi prius emendentur, vcl signura exlraordinarium doloris alTe- rant. 4.® Num jaclavcrint se de aliquo peccalo; tunc enim tria peccata frequenter concurrunl, sciliccl: ingens scandalum audicnlium, jaclantia de maio commi.sso, et complacentia de peccalo narralo: idcoque inlerrogandi sunt, de quo peccalo iu spccie se jactarint. (Lib. V, n.® 2ü.) Inlcrrogenlur etiam, an doleclali sint audiendi alios inhonesle loquenlcs, el an tum ndverlcrint ad corrcclionis proíceptura, puUinles eam profuturam.

Circa opera; inlcrrogenlur cum qua rem habuerint; num alias cum eadem pcccarinl; ubi peccatum fucril patraliim, ad occasiones removendas; quolics peccatum consumnialum, et quot aclus iulerrupli adfuerint, scorsim a peccalo; num pec­calo miillum ante consenserinl; nam tunc actus inlcrni inter- rumpiintur, juxta dicla. (N.® 36.) E l tum expcdil formare judicium, lolies muiliplicala esse peccata, quot morulm so- mni, dislracliouis, etc., adfueriiil, prout sunt coram Deo, tantum interrogando de Icmporis duralione in peccalo, secus si maium propositum fucril conccplum per duos vel Ires dies ante consummalioncin pcccali, ct inlra illud lempus non fue- rit relraclalum. Vide dicla ibid. Se polluenles inlerrogenlur etiam dc laclibus impudicis separalis a pollulionibus, el mo- neantiir, cos esse raorlalia. Item inlcrrogenlur, an in aclu polliilionis concupivcrinl, vel an dcleclali fuerint de copula cogilata cum aliqua vel pluribus mulieribus, aut pueris; tunc enim lol peccata dislincla commillunl. Circa aulem peccata conjugum respcclu ad debilum marilale, ordinário loquendo confessarius non tenelur nec dcccl interrogare nisi uxores, an illud reddiderint, modestiori modo quo possit, pula an fuerint obedientes viris in omnibus; dc áliis laceat, nisi in- lerrogalus fucril. (Vid. anuol. n.® 104.) Qua; aulem liceant, el qua; velenlur inler cônjuges circa idem debilum, vide quae fuse dicla sunt in libro. (Lib. VI, n.® 900.)

Sobro 0 170.— Perguntae ao penitente sc furtou os bens dc outro,seiimo a pertenciam; sc a uma ou muitas pessoas; uma vez mênio muitas vezes; porque se dc cada vez tirou o que constitue

maleria grave, cada vez pcccou mortalmente. Se, pelo con­trario, não tirou de cada vez senão pequena cousa, não pec- coii morlalineule senão quando os roubos chegam a formar maleria grave, dado que, desde o principio, não tenha inten­ção de chegar a matéria grave. Quando chegar a maleria

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grave, ainda que não tivesse peccado mortalmente, é não obstante obrigado sub gravi a restituir, ao mcnns esta ultima cousa que completou a maleria grave. (Lib. I I I , n.“ S33, et in íine.) Notae todavia que nos Iiirtos leves é necessaria uma somma mais considerável para constituir maleria grave, mais considerável ainda sendo leitos a diíTerenles pessoas. Assim se diz, qne nos pequenos furtos feitos por muitas vezes e a dilTerentes pessoas é necessário o dobro. Se cnlre cada furto se passou tempo considerável, dous mezes, por exemplo, é provável que os furtos não se tinissem a formar matéria grave. São provavelmente desculpados dc peccado mortal aquelles que comeram uvas nas vinhas dos outros, excepto sendo raras e caras, c levando grande quantidade. N ’esta especie dc bens, qne estão muilo expostos, é necessaria maior quantidade para constituir gravidade de matéria. Do mesmo modo se póde facilmente desculpar os domésticos e creadas que, para seu uso, tiram comcslivcis a seus amos, excepto sendo extraordinários ou em grande quantidade. Não se deve igualmente conceituar dc peccado mortal aquelles que tiram lenha ou fazem apascentar os rebanhos nos dominios do seu baldio, ainda que islo seja prohibido: são estas probibições consideradas como puramente pcnacs. A gravidade da maté­ria sc mede tambem segundo a qualidade da pessoa violada. Sc os furtos são feitos pelos lilhos ou esposas, é necessaria muilo maior somma para formar maleria grave, e raro é que obriguem a restituição sub gravi. (Lib. III. n.'* o30, 529, 545; n.® 614; V. in loco; 529, 539, 543 e 683.)

Quando tiverdes reconhecido a obrigação grave do peni­tente, vôde se elle póde restituir logo, ainda que com cerla di(ficuldade. N’csle caso não lhe deis a absolvição senão de-

r s dc ler reslituido, embora déssc signaes extraordinários emenda. Com elTeito, as riquezas são como o sangue, que

não se lira das veias sem grande custo c dor. A experiencia sobejamente o comprova, que não resiituindo antes da absol­vição, diUicilmcntc se fará depois. Deve cxcepliiar-se o pe­nitente, cuja consciência seja dc lal modo limorala, qne não haja logar dc duvidar de sua boa fé. Eu disse com certa dif- ficuldade, porque, sc não podér rcslilnir sem se constituir cm grande necessidade, sem decair de sua jerarchia justamente adquirida, poderá dilTerir a restituição, excepto se o mesmo credor estiver em grande necessidade. Demais, siippondo mesmo que o credor esteja cm grande necessidade, é prová­vel que 0 devedor não é obrigado a restituir quando se acha elle mesmo em grave necessidade, e que houvesse, resli- luindo, dc cair cm necessidade quasi extrema, excepto se a cousa furtada exlet in specie, e se o credor se acha n’esla

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grave necessidade, precisamente era razão d’este furto. (Lib. I I I , n.® 703.) Mas quando ha motivo de dilTerir a restituição, aconselhae ao penitente que restitua pouco a' pouco, ou que faça algum trabalho, ou que dê dc tempos a tempos algum presente ao credor.

Não é possivel expor aqui tudo o que é necessário saber n’esta matéria de restituição, ao mesmo tempo tão vasta e tão complicada. Vôde o que muito dilTusamentc eu disse cm minha Theologia. Quero sómente notar aqui alguns casos mais ordinários c mais práticos. 1.® Quando algum foi cora outros furtar, para saber se é ou não obrigado a restituir todo 0 damno, deve distinguir: Foi elle simplesmente induzido por seus companheiros, e sem elle o roubo seria da mesma maneira commetljdo? Neste coso não 6 obrigado a restituir mais do que a sua quota parle. Foi de combinação e cxcilan- do-se uns aos oulros que elles foram roubar? N’csle caso cada ura é obrigado in solidam á restituição. Mas na prática as pessoas pouco instruidas, principalmente aquellas que têcm uma consciência pouco limorala, se persuadem dillicil- mente que são obrigadas a restituir o que os outros tiraram. Por outra parte presume-se que os proprietários sc satisfa­zem com a sua porção, e eis aqui porque: se os obrigaes a restituir o todo, elles omiltirão facilmente o restituir no lodo ou em parte. Portanto direis a estes penitentes que são obri­gados a restituir sem lhes dizer quanto, acresceiilando-lhes sómente que restiluam segundo sua consciência. (Lib. I I I , n.° 579, c Inslr. para os confes. da ald., cap. vm.) 2.® No­tae que ninguém c obrigado a restituir o damno commeltido, quando não tirou d’cllc alguma vantagem pessoal, se não previu este damno, ao menos confusamente (lib. I I I , n.® 613), ou não foi condcmnndo por justiça a rcparal-o. (Lib. I, n.® 100, e lib. I I I , n.® 534.) 3.® Quando este furto é incerto, quero dizer, quando a pessoa que o soíTreu é incerta, deveis obrigar o penitente a rcsliluil-o cm missas, cm esmolas feitas aos pobres, ou em estabelecimentos pios. (Lib. I I I , n.° 589.1 Se for pobre, póde fazer a appiicação d’ellc a si mesmo ou a sua familia (ib. n.® 762); mas sc a pessoa é conhecida, é a ella que deve restituir. Não é muito para admirar que se en­contre um grande numero de confessores ignorantes que, no caso em que a pessoa lesada é conhecida, se contentam de obrigar o penitente a reparar a injustiça fazendo esmolas, ou mandando dizer missas? Se a cousa tem tido logar d’este modo, eu tenho sustentado (lib. I, n.® 39) que o penitente está obrigado a restituir segunda vez, porque em todos os casos, mesmo fortuitos, o ladrão é obrigado a indemnisar o senhor: nunca pude admitlir a opinião contraria. Sómente

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disse (lib. II I , D.® 53i) que sendo os roubos leves, aiuda que sua reunião formasse matéria grave, e que os senhores fos­sem conhecidos, mas diflerentes, D’esle caso desculparia de peccado mortal aquelle que quizesse restituir aos pobres: eu dei a razão d’isto no logar citado. Eu o desculparia mesmo de peccado venial, havendo um motivo razoavel, por e.\em- plo, não podendo restituir aos senhores sem um notável in­conveniente, ou se alguns pobres se acharem em tal necessi­dade, que sc presuma que os senhores auctorisariam que se fizesse áquelles a restituição. (Ib. 593.) Se alguem causou damno a um grande numero de pessoas desconhecidas de um mesmo logar, c isto por pequenos furtos, como vendendo vi­nho ou azeite, etc., tenho sustentado que era obrigado a res­tituir a estas mesmas pessoas, seja diminuindo o preço, seja augmentando o peso, e não aos pobres d’cste logar, como outros peruiiltcm. Comtudo, como acima disse, se o désse aos pobres não peccaria mortalmente, nem mesmo venial- mente, havendo uma justa razão. (Dicl. n.® 595.) 4.® Notae aqui que, tirando ou retendo cou.sa aibcia com presumpção que 0 senhor a daria voluntariamente, suppondo que se Ibe pedia, não se está obrigado á restituição. (Ib. n.® 700; V. Qmres hic, 1.) 5.® Não se deve igualmente obrigar á resti­tuição aquelle que deu a seu credor, como dom puramente gratuito, 0 que lhe devia, depois de ter contrahido sua dí­vida, ainda que não tivesse pensado em sua obrigação. (Ib. 11.) 6.® Notae que para ser obrigado á restituição sub gra­vi, desde que está cousumida a cousa furtada, e não se fez com ella mais rico, o penitenle deve ler commellido uma fòlla grave, interior, contra a justiça commutaliva. (Lib. I I I , n.® 350.) É mais nece.ssario que de sua pnrle a acção exte­rior ou a influencia tenha sido a causa eílicaz do damno (ib. n.®331), que esta influencia lenha sido completa ou grave­mente injusta, e que seja moralmente certo que ella tenha sido tal, eis aqui o quo diz respeito á accepção. (Lib. I, n.®* 83, 662 e 668 )

Quanto á detenção das cousas alheias, se o penitente lem em seu favor a opinião provável junta á posse legitima, quero dizer de boa fé, o confessor não póde obrigal-o a restituição. (Lib. I, n.® 83.) Muito mais, aquelle que começou de boa fé a possuir qualquer cousa, e que fez suas diligencias para des­cobrir a verdade, não é obrigado a restituir cousa alguma, menos se for certo de direito que a cousa pertence ao pro­ximo. Eu 0 provei em diversos logares. (Lib. IV , n.'* 547 e 669.) Sendo certa a obrigação de restituir, e estando o peni­tente com certeza na boa fé, e prevendo o confessor que a admoestação seria certamente inutil, então deve calar-se, a

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íim de que o peccado de material se não torne formal para a ruina d’esla alma. É esle o sentimento commum dos douto­res. (Lib. VI, n.® Ü12 in lin. 11.)

Finalmente, sobre a obrigação de rc-stiluir em razão dos contratos, é necessário consultar, estudar, depois decidir.

farei mais do que uma observarão: quando sc traln de certos contratos passados ha muito tempo em um paiz, onde principalmente tem havido missões, o confessor não deve ser mcil em os condemnar anlcs de examinar todas as circum­stancias. Muitos contratos parcccm lá primeira vista usura­rios ou injustos, mas depois de um mais duro exame não se acham taes. Pelo que respeita á prescripção, vôde livro I I I e n.“ 50í.

Sobre 180.— 1.® Perguntae ao penilenle sc tirou a reputação a ooitavo alguem, se lhe imputou uma falta verdadeira ou falsa; se a mento*' verdadeira, perguntae se era secreta ou púhlica, em

que logar, pela fama ou sentença do juiz; perguntae lambem se dilfamou em presença dc uma só pessoa ou de muitas, e de quantas: mais, se deu o facto como sendo por elle sabido, ou como contado por outros. Quanto á restituição da repu­tarão, se n falta contada é falsa, aquelle que dilfamou 6 ohri­gado a desdizer-sc. Se é verdadeira, deve remediar o mal o melhor que possa, mas sem meiitir; póde dizer, por exem­plo: Eu estava ittudido, eu me enganei, eu commelti um erro. Outros admitlcin ainda que póde dizer: Eu menti, fazendo um eq^uivoco, porque todo o peccado c uma mentira, como diz n Escriptura Santa. Quanlo a mim, aconselho ordionria- menle que digam: Eu o tirei de minha cabeça; é lambem um equivoco, porque todas as nossas palavras sáem de uosso espirito, pelo qual sc toma a cabeça. Considerando-se a res­tituição ua reputação como devendo ser provavelmente mais nociva do quo util ao diffamado, porque se presume que a cousa está esquecida, c islo sc presume quando a dilfaniação teve logar ha muilo tempo, e que não se tratou mais d’islo; n’este caso vale mais dizer hem da pessoa, a fim de dar uma boa opinião d’ella, do que expor-se a avivar a lembrança do passado, querendo fazer uma reparação directa. Quanto a esla especie de reparações, tereis cuidado de as mandar fazer antes de dar a absolvição, podendo ser commodamente; por­que depois dilDcilmente se fazem, ainda que são menos custo­sas do que a restituição do dinheiro. Notae, em ultimo logar, que fazer conhecer o mal do proximo, é propriamente maldi­zer, e 6 um peccado, diz S. Thomaz,-quando se tem intenção de denegrir a reputação de outrem, mas não quando se quer evitar algum mal, como quando sc diz aos paes, ao amo, ao superior, para fazer castigar o culpado ou prevenir o damno

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do9 outros, excepto quando o damno dos outros seja leve e muilo inferior no do dilfamado. (Lib. I l í , n.» 660.)

181.— Da obrigação de restituir ao proximo a hnnra que Continua- se lhe tirou por injurias, já falíamos no quinto mandamento Çá®- (n.“ 73.) Ao oitavo mandamento se referem lambem os jui- zos temerários. Muitos penitenlcs pouco instruidos sc accu­sam dc ler feito jiiizos temerários; deve-se adverlil-os: 1.", que, no caso cm que ha motivos suflicientes de julgar assim,0 juizo não c temerário, mas justo, por consequencia não é culpado; 2.®, que, ordinariamente, não são juizos, mas sus­peitas, que 03 amos e os paes são algumas vezes obrigados a formar, a fim de impedir o mal, por exemplo, a lim de im­pedir que seus domésticos roubem, suas (ilhas oITendnni a Deus enlretcndo relações com pessoas de dilTerenle sexo, e outras cousas semelhantes. Dizei-lhes sómente que a nin­guém comnuiniquem suas suspeitas.

Restaria fallar dos mandamentos da Igreja; mas já explica­mos 0 que respeita á obrigação de ouvir missa e santificar os dias festivos. Quanto ao jejum, vos recordarei tres cousas:1.®, que nem toda a especie de trabalho dispensa do jejum, mas aquelle sómente que exige muito movimento corporal;2.®, que os operários não são dispensados do jejum senão nos dias em que trabalham, ou quando devem trabalhar no dia seguinte, e que não podem fazel-o não comendo dc vespcrn;3.®, que não basta para satisfazer ao jejum o não comer cousa alguma fóra das refeições, c ceiar menos copiosamcnte do que dc ordinário, como um grande numero de pessoas falsa­mente julga: 0 jejum imporia a obrigação de não comer mais do que uma vez cada dia, e á noite não tomando mais do que uma simples collação dc oito onças, segundo o uso commum, ou dez ao mais para aquelle, cujo temperamento exige uma ceia mais copiosa do que a ceia ordinaria. São dispensados do jejum os pobres que dc manhã não tenham o alimento sufbcienlc e não possam suslenlar-sc pela collação da noite.Se á noite tivessem o alimento sufTicienle, muitos theologos dizem que são obrigados a jejuar fazendo a collação de ma­nhã; porém muitos outros o negam, porque o jejum praticado d’eslc modo seria para elles de uma difliculdade extraordina­ria (Lib. III, n.« 123; V. Sec.; 123, l i l , l i4 e 1034.)

E assim que cxaminareis os penitenlcs ignorantes. Eu vos direi mais ao diante como deveis excital-os á contrição, e que regra deveis seguir na imposição da penitencia (n.® 412).Mas sobretudo abstende-vos de omittir este exame, quando for necessário; é talvez o maior numero dos confessores que peccam n’esle ponto.

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DAS INTEnnOGAÇÕES QUE SE DEVESI KAZEH ÁS PESSOAS de diversos estados E COMJIÇÕES, QUE SÃO DE UMA CONSCIÊNCIA

POUCO DELICADA182.— Quanto ás obrigações do estado e da condição, não

basta sempre que o confessor pergunte em geral se cumpri­ram os deveres de seu estado. Quando virdes que o peni­tente é de consciência pouco delicada, ou tiverdes justas ra­zões dc pensar que elle falta ás suas obrigações, deveis interrogal-o cm particular, ao meno.s sobre seus principaes

A um sa-deveres. Se aquelle que se confessa for sacerdote, pergun- ccrclote. tae-lhe se satisfaz á obrigação do Ollicio c dc dizer as missas

de que se encarrega, e se as demorou por tempo considerá­vel; se se entrega a negocio; se é dado ao jogo; se diz a missa com precipitação; porque, celebrando cm menos dc um quarto de hora, não póde ser desculpado de falta grave, se-; gundo a opinião bem fundada dos doutores. (Lib. IX , n.” 400.) Com elleito, não é possivel, era tempo tão breve, dizer missa sem mutilar as palavras e ccremonias, ao menos é im­possivcl celebrar com a gravidade e decencia que convem a este augusto sacrilicio. D ’aqui resulta tambem escandalo dos fieis, nos quaes parece, diz o Cardeal Bcllnrmino, que taes sacerdotes não crêem na presença real do Filho dc Deus so­bre 0 altar.

Não será igualmente inutil perguntar-lhe se na terra onde vive ha grande penúria dc confessores, porque então este sa­cerdote póde estar obrigado a habilitar-sc para confessar; nós 0 temos esUibelecido com fortes provas (ib., n." 623), ás quaes se deve acrescentar a doutrina de S. Thomaz, cujas palavras são estas: E t ideo posuit ordinem in ea (ecclesia), ut quidem aliis sacramenta Iraderent. (In suppi., q. 34, r. 1.) É por isto que os sacerdotes são chamados luz do mundo, sal da terra, condjutores de Deus. Assim, o lim do sacerdote è administrar os sacramentos. Desde então como seria descul­pável, quando vô os habitantes dn sua terra privados de con­fessores, e por esta razão viver a maior parte no peccado, com grande perigo de sua salvação? quando elle mesmo priva 0 Senhor do fira que Elle se propôz elevando-o ao sacerdo- cic, recusando por preguiça pôr-se cm estado dc administrar 0 sacramento ua penitencia, o mais necessário de todos de­pois do baptismo! Oh! quanto são terriveis as ameaças de Deus contra estes sacerdotes, que tratara assim de re.«to a sal­vação de seus irmãos: S i dicente me ad impium: Morte mo- rieris, non annuntiaveris ei... ipse impius in iniquilate sua morietur, sanguinem aulem ejus de manu tua requiram.

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[Ezech., III, 18.) Se esle sacerdote se desculpar cora sua inhabilidnde e incapacidade, que ouça o que diz S. Francisco de Salles, que chama falsa a humildade d’aquelles que recu­sam empregar-se na salvação das almas debaixo do pretexto de fraqueza. Elle acrescenta, que tudo isto não é mais do que um artificio de seu amor proprio e uma má humildade, de que se serve como de um precioso pretexto para encobrir sua preguiça; elle diz tambem que, concedendo-nos talentos.Deus quer que façamos uso delles, e que aquelle que se mostra humilde se sirva d’cllcs e obedeça. 0 orgulhoso que confia em si mesmo tem muita razão em nada emprebender; pelo contrario, o humilde é corajoso, porque não põe sua conliança em si mesmo, mas em Deus, que se compraz cm manifestar seu poder em nossa fraqueza; assim, diz elle em conclusão, 0 homem humilde póde tudo emprebender.

Se esle sacerdote for confessor, perguntae-lhe em particu­lar se estudou sullicicntemenle e se continua a estudar.Acima dissemos (n ." 7o-76) que para bem confessar não basta ter estudado uma vez. Mais, se elle deu a absolvição áquelles que estavam em occasião próxima de peccado, ou que eram recidivos e não davam signaes extraordinários de emenda. Se por desgraça esle confessor tiver solicitado al­guma pessoa ad lurpia, perguntae-lhe se elle sabe que não póde celebrar, porque os solicilanles são castigados por nosso Santo Padre Bento X IV com irregularidade perpetua, reser­vada ao Papa (>). Esla pena, como temos demonstrado, se incorre antes de toda a especie'de sentença, e mesmo por aquelles que a ignoram, porque ella não é uma censura, mas um impedimento. (Lib. VI, n." 70S.)

183.— Se for um parocho aquelle que se apresenta, é bom A um pa pergunlnr-lhe: 1.”, se elle faz as correcções convenientes a seus parochianos que vivem no odio, que tôem más ligações, ou que entram nas casas de suas esposadas. A esle proposito recommendae-lhe muilo que não recebam as promessas de futuro casamento senão pouco tempo anles das núpcias, se­gundo a prática dos bons pastores, de outra sorte lodo o in- tervallo até ao casamento será um tempo de peccado; 2.®. se elle vigia que seus parochianos cumpram o dever paschal, sem accepção de pessoas. Quantos achamos nós nas missões, principalmente cnlre as pessoas dc uma posição elevada, que léem desprezado este dever pelo decurso de longos annos, sem que o pastor os tenha advertido nem procurado algum meio de lh’o fazer cumprir; 3.®, se administrou os sacramen-

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tos, parlicularracnle o da penitencia, por si mesmo, em perigo de morte e quando era chamado; (ib., n.® 623. V. Resp., 2 e 3) eu digo por si mesmo, porque, quando póde, não satis­faz a seu dever fazendo-o administrar por outros (*); 4.', se assiste aos moribundos; 5.®, se prega aos domingos, porque, não estando legitimamente impedido, se passar um mez con­secutivo sem prégar, e tres cm dilferenles vezes durante o anno, os theologos não o desculpam de fulla grave; se elle lem feito esmolas segundo seus meios c em razão de seu be­neficio; 6.®, se tem tido o cuidado de ensinar o catecismo aos meninos, e dc instruir os ignoranles nas verdades e.ssenciaes e meios de se salvarem; principalmente sc iustruiu os igno­rantes sobre a contrição, e os meninos sobre a communhão, quando são capazes d’ella, quero dizer, ordinariamente fal­lando, pela idade de dez annos alé aos onze, c quando muilo até aos quatorze. S. Carlos ordenou a todos os seus parochos ut ad communionem idoneos redderent pueros statim ac ad decimum annum pcrvenissent. (Lib. VI, n.® 301.) Ila paro­chos que põem dilliculdade de os admillir mesmo aos doze annos! Por que motivo? Para sc não darem ao trabalho de os instruir. 7.® Se léem facilmente em respeitos humanos dado certidões aos ordinando.-!. N isto os parochos não devem contenlar-sc com um conhecimento negativo, devem ler um conhecimento positivo dc sua probidade e fidelidade em fre­qüentar os sacramentos. Assim, são elles obrigados a alleslar de tudo islo em particular. Acham-se ás vezes ordinaudos carregados dc peccados, que lôem apenas commungado uma vez no anno, que tôem mesmo faltado ao preceito paschal, e que depois d’islo apresentam uma certidão dc seu parocho, alteslando a bondade de seus costumes e frequencia dos sa­cramentos! São ordenados, e tornam-se o escandalo dos po­vos. Ora, é 0 parocho quem dará contas a Deus de lodos 03 seus peccados, pornuc os bispos descansam a este respeito sobre os parochos. Todavia os bispos mais experimentados não descansam nos parochos sohre um ponto tão importante, do qual (Icpcndc a salvação de tnnlas almas.

A um 184.— Se vier uin bispo, que vos dô motivo de duvidar bispo, prudentemente que não cumpriu seus deveres, lhe pergun-

tareis: 1.®, se elle põe um cuidado conveniente, além do exame da sciencia, cm certi(icar-se da bondade positiva dos costumes dos ordiiiandos, segundo a obrigação imposta pelos santos cânones, concilio de Trento c o Aposlolo S. Pau­lo; não se contentando com a certidão dos parochos, que o

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niais das vezes, como o temos dito, é ou falsa ou suspeita;2.“, se admitlo para confessores sacerdotes de uma doutrina e costumes experimentados: os outros farão mais mal do que bem; 3.°, como emprega cllc as rendas. Nós o leinos esta­belecido (lib. y, n.® 492); tirando o que é necessário para sua honesta sustentação, o hispo é obrigado n dar o resto aos pobres; 4.®, como satisfaz a obrigação de residencia; o Soberano Pontilice reinante declarou que um bispo não podia ausentar-se de sua diocese por uma razão futil ou sómente para recreação, nem niesmo durante os tres mezes concedi­dos pelo concilio dc Trento; 5.®, que cuidado põe em conhe­cer se ha escandalo enlre suas ovelhas, a íim de o reparar o melhor possivel, recorrendo mesmo ao braço secular, se for necessário. Finalmente, pcrgunlar o que tem feito para dar bom exemplo; porque certamente ura prelado é obrigado de um modo especial a scr exemplar.

185.— Se a penitenle for uma religiosa, pcrguntac-lhe em A umare- parlicular se lem fallado ao voto dc pobreza, recebendo ou 1'giosa. dando sem permissão; sc recitou o Odicio divino, porque a opinião que pretende que as religiosas in privato não são obrigadas á recitação do Odicio, não é sudicicntcmcnle pro­vável, como 0 temos mostrado (lib. IV, n.® l i l ) ; sc ella en-trelera alguma alfeição perigosa, puta si adfuerint saltem verba, aut lilterw amatoriw. Se ella não quizer renunciar a isto, sede (irme era lhe recusar a absolvição; porque ainda que n’esta especie de relações o (im não seja gravemente máu, todavia ba sempre perigo: cra lodo o caso ha sempre escandalo e máu exemplo para suas companheiras. [Dian., p. 3.*, tr. 7, resp. 21 c 22.)

Aquellas que exercem algum oflicio, interrogae-as cm par­ticular sobre seus empregos; por exemplo, perguntae ás ro- deiras sc levam cartas, se fazem commissões suspeitas; á porteira, se deixa a porta aberta com perigo de escandalo para as religiosas ou pessoas dc fóra; às superiores, se não põem 0 cuidado necessário no que respeita á entrada e de­mora dos homens no convento; sc ellas deixam introduzir abusos, que, ainda que leves em si mesmos, são peccados mortaes para a superiora, por causa do grave detrimento da observância. (Lib. IV , n.® 13.)

186.— Sc vier um juiz, perguntae-lhc se fez accepção de A um juiz. pessoas, sc tratou as causas com ligeireza, se elle julgou por paixão, c scin estudo próvio; se for juiz dc instrucção, comose comportou tomando os depoimentos, sc elle fez perguntas capciosas, se diminuiu ou alterou os depoimentos.

Se for um medico, perguntae-Ibe: 1.®, se tem a sciencia c Aumme- prálica suflicientes para exercer, e se estuda nos casos mais «lico.

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difliceis que se enconlram, como é obrigado; 2.®, se lem dado permissão de comer carne, ou de deixar o ollicio ou a missa, movido de respeitos humanos e sem necessidade, ou ao me­nos sem ter dúvida de que o cumprimento d’estas obrigações podesse occasionar um grande mal, ou pelo menos ter algum grave inconveniente; 3.", se deu algum remedio perigoso ao doente, que não estava ainda sem esperança (Lib. I, n.® 28, q. 2); se enviou suas receitas a algum boticário iniicl ou pouco instruído, ou que tem remedios menos bons, unica- menlo porque era seu amigo; 4.®, se elle foi cuidadoso para com os pobres, sendo pago para isto; ou sem ser pago, quando os pobres estivessem em necessidade grave ou ex­trema. (Trul., t. I, lib. IV , c. I, dub. 6 ,11). 5.® Não deixeis principalmente de Ibe perguntar sc tem cuidado de que os doentes se confessem cm tempo opportimo, segundo a deter­minação dos Soberanos Ponlilice.s. Fallei d’csla obrigação em muitos logares de minha Theologia (Lib. I I I , n.® 182, e lib. VI, n.® 6ü4.), onde disse que Innoceucio I I I prohibe aos médicos que se encarreguem de algum doente antes que se tenha confessado; e que S. Pio V, confirmando esta determi­nação, obriga o medico a deixar de os visitar depois do ter­ceiro dia, não sabendo que elle se tenha confessado, e quer mais que todos os médicos, antes dc tomarem o gráu de dou­tor, jurem observar este preceito; c finalmente, que esta or­dem foi dada a todas as escolas.

Mas não ha conformidade sobre o modo de entender este

Sreceito e este juramento. Um grande numero de theologos izem que isto deve entender-se do caso em que a doença é

perigosa, ou ao menos quando ha dúvida que ella o seja. É n’este .sentido, dizem elles, que foi recebida 'a bulia de S. Pio V. Mas 0 sentimento mais commum quer que este preceito, bem que não obrigue cm toda a moléstia leve, não deve sómente cntender-sc para as moléstias aclualmeiite pe­rigosas, mas tambem quando se julga prudentemente que a moléstia póde vir a ser mortal. ,Eis aqui a prova d’isto. In- nocencio I I I ordena ao medico que obrigue o doente a con­fessar-se antes de tomar cuidado d’elles, a lim, diz o Pontí­fice, que a advertência de se confessar não ponha o doente em desesperação e o não faça mais facilmente cair no perigo de morte. Portanto, sua intenção é que se faça confessar o doente antes que a doença sc torne mortal. Esla opinião me parece ser verdadeira; comludo sei que a prálica universal dos médicos é contraria, ao menos em nosso reino, e pre- sumo que é o mesmo em toda a parte. Falto mesmo dos mé­dicos de consciência límorata, que não lêem costume de ad­vertir os doentes a que se confessem anles que a doença

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se torne provavelmente perigosa. N’isto não julgara peccar contra o juramento prestado em conformidade da bulla de S. Pio V. Fundara-se sobre o que dizem muitos doutores,(lib. VI, n.° 664) que este juramento não obriga mais que na parle em que por costume foi recebido. Seja o que for, é certo que os médicos pcccam gravemente não advertindo os enfermos a que sc confessem quando a enfermidade for grave ( ‘).

Ohl que miséria ver tantos enfermos, principalmente nas condições mais elevadas, reduzidos a regular seus negocios eternos quando já são cadaveres vivos, que apenas podem fallar, apenas ouvir, apenas conhecer o estado de sua con­sciência e conceber a dor de seu.s peccados! Ora, tudo islo é por culpa destes médicos que,para não dar cuidados aos en- termos ou aos parentes, não cs advertem do perigo, pelo con­trario os entrclftem na illusão al6 que estejam inteiramente sem esperança. Se, portanto, vos vier um medico pouco li- morato, tende cuidado dc o inlerrogar sohre esle importante ponto, e de lhe intimar, não dc passagem, mas com forr.a e calor, a obrigação cm que está dc ordenar a conlissão, ao nienos quando descobre que a doença é grave ou que duvida d’islo; porque a esle respeito lodos os doutores são concor­des. Digo com força, porque é d’este ponto decisivo que de­pende a salvação, não sómente do medico e do penilenle, mas d'aquelles a q'uera prestar seus cuidados (®).

Se for cirurgião ou boticário, perguntae-lhc se deu reme- A um ci- dios a mulheres gravidas para as fazer abortar; sc deu ura rurgião «u medicamento em vez de oulro, ou se vendeu mais caro do ‘>ot'o®rio. que valia. (Lib. I I I , n." 821.)

187.— Se vier um negociante, perguntae-lhc se elle enga- a um uc- nou no peso ou medida; se vendeu por mais do que o preço gociaulc.

(') Esta obrigação de advertir o enfermo 6 imposta ao medico pelo quarto concilio geral dc I.atrão, cm I2IG. o mesmo qnc prescre­veu a conlissão annual e a communhão paschal, ambas de disciplina geral. Eis aqui as palavras do concilio: -Oiioniam inGrmilas corporis non nunquam ex peccato provenit, mediei ante omnia ciirent advo- carc mcdicos animarum, ul posUinani intlrmis fucrit de spirilnale sa- lutc provisum, ad corporalis medicin® rcmedinm salubrius proecda- tiir, cum causa cessante cc.sset.» Caii. 22., aim. 1702. I.uiz XIV fez uma lei para assegurar a execução das disposições do Cardeal dc Noailles, arcebispo dc Paris, assim como a das dcicrminacõcs .scmcllianics que os bispos tficm feilo ou podem fazer. (Nota do traductor francez.)

ção de direito natural 6 imprescriplivel: Mandavit unicuique dc pro­ximo suo. 0'ianto á obrigação que resulta da lei ccclcsiaslica, cada um deve seguir a disciplina de sua diocese.

(Nota do traductor poriuçuez.)

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supremo, principalmenle vendendo fiado, quando as pessoas eram seguras e não soflria algum damno. Quanlo á queslão dc saber se vendendo a credito póde vender mais caro, era razão de que lal é o preço corrente da venda a credito, se­gundo a estimação commum, e se as mercadorias a retalho podem vendcr-se mais caras, vêde nossa Theologia (Lib. I I I , n.® 809.)

A um 188.— Se vosso penitente for alfaiate, pcrgunlae-lhe se alfaiate, trabalhou nos dias festivos para acabar suas obras e leval-as

aos freguezes, sem alguma razão extraordinaria (n.® 303); se observou os jejuns da Igreja, porque a occupação de coser não desobriga do jejum (n.® 1048); se alterou o preço, de­baixo do pretexto que o negociante, cm attenção a elle, lhe vendeu mais barato. Se fosSe verdade que esla parle do preço lhe tivesse sido dada, poderia rclel-a, comtanto que se ti­vesse informado de um modo moralmcule suflicienle, e que elle soubesse com certeza que os outros negociantes não dão igual fazenda mais barata. (Lib. I I I , n.® 81(1.) Mas isto deve ser mais do que certo, de oulra sorte nada mais póde exigir do que o preço por que a pagou. Sc elle ficou cora os reta­lhos ou restos das fazendas. Elle certamente os não póde guardar, se tal não é a vontade das pessoas, ou sc ellas não lhe pagam o feitio abaixo do mais baixo preço, tal como é re­gulado por estimação commum. Além d’islo, se não 6 para elle uma occasião proxima de peccado tomar medida ás mu­lheres, como não c raro nos mancebos pouco christãos.

K um 189.— Se vier um corretor ou regateira (por eslas palavras corretor eutende-sc aqui aquelles a quem sc dão objeclos para os adeíoúT perguntae-llie se nada guardou do preço da venda.

■ Nós temos sustentado, contra a opinião de outros theologos, que não póde guardar o excedente, mesmo no caso do se­nhor ler determinado o preço por que o objecto devia ser vendido, porque esla determinação sc faz a lim dc que não seja vendido por mais baixo preço, c não a fim dc que o ade- leiro retenha o supcríluo (n.® 82o, V. Qucer.) 0 mesmo tam­bem é, ainda que o senhor Icnba assignndo o logar onde o objecto deva ser vendido, e que o corretor, lendo feito toda a diligencia, o tenha vendido mais caro em logar mais dis­tante. N ’esle caso dizemos nós, que elle não póde guardar todo 0 excedente, mas sómcnle o que póde locar-lhe em razão d’este trabalho extraordinário, porque a cousa fruclilica sem­pre para seu dono. Nós temos admittido muilas excepções (n.® 82S. V. Bene aulem): 1.®, se o adcleiro tivesse melho­rado 0 objecto, e cm consequencia o tivesse vendido por mais do que valia antes; 2.®, se tivesse contratado cora o dono de não lhe dar além do preço determinado, e isto dc ura modo

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expresso ou tncito, como, por cxnmplo, sc o dono não Ihc ti­vesse assignndo salnrio por seu trabalho; 3.", se o excedente fosse pequena cousa, de sorte que fosse de presumir que o dono lh’a teria dado; 4.®, se o adcleiro, depois de ler usado da diligencia ordinaria, tivesse elle mesmo comprado o obje­cto pelo preço que encontrou, e que depois o tornasse a ven­der com vantagem em outro logar, ou em outro tempo.

As mesmas regras tôem logar, quando uma pessoa tivesse dado commissão a um corretor dc lhe comprar alguma cousa por preço marcado, e que cstc a comprasse mais barata.N'esle caso o corretor nada póde exigir além do seu desem­bolso, se não for cm razão do trabalho extraordinário que terá feilo para a comprar mais barata, ou lambem se tivesse comprado a cousa por sua conta, por seu risco c perigo. Islo comludo não se deve entender senão no caso cm que o com- missionado, tendo feilo moralmente o que podesse, não a achasse mais barata. (Lib. I I I ; V. Bene aul.)

1!)0.— Se vier um barbeiro ou cabelleireiro, perguniae-lhe A um sc elle barbeia ao domingo nos logarcs onde não é costume; harbemo porque se o uso d’isto for estabelecido, não lhe é prohibido. {‘g-pgfpQ ' 0 mesmo é se as pessoas fossem obrigadas a barbcar-se ao domingo, como são os operários que vivem dc seu trabalbo. Perguiilac-lbc mais se elle penteia mulheres, segundo o mal­dito uso introduzido em nossos dias pelo demonio. Eu estou persuadido, cummummenle fallando, que isto para os cabel- Icireiros novos é uma occasião próxima de peccar niortalmente por delcilaçõcs sensuaes, ou ao menos por máus desejos.Assim, digo que não se deve permiltir a algum que não le­nha experiencia do contrario. Se alguem tivesse experimen­tado, pelo decurso de. tempo nolavel, que não tinlia caído, não se poderia criminal-o de peccado mortal; todavia o con­fessor terá cuidado de o desviar, quanto podér, de uma se- melbanle funcção, que certamente é de si mesma perigosa.Eu não examino aqui se as mulheres, que se fazimi pentear pelos homens, podem ser ou não em segurança de consciên­cia; eu sei (|uc ellas o fazem ordinariamente, que ellas se confessam e commungam: Videant ipsie el ipsarum confes- sarii. Quanlo a vós, que islo lerdes, ao menos impnnde-lhe a obrigação dc diligenciarem para achar uma mulliur que saiba fazer islo, e se não a acharem, ao menos que se não sirvam de um mancebo, cujas maneiras lhe tenham dado mo­tivo para pensar que elle não trata com simplicidade. Final­mente, estou bem persuadido que as mulheres de uma con­sciência mais delicada nunca se servirão de homens para lhe enfeitarem a cabeça, mas se contentarão com o uiodo por que as mulheres o podérera fazer.

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OimtGAÇÃO DE INTERROGAR

Pialicas 191. (B. Leonardo, n.“* 7-23.) — A santidade dc vida é' ro*à?'p' ’ dú'’ida muito necessaria, mas sem uma verdadeira pru-

t,a.ücs. jgnçia q confessor pequenos fructos fará em seu ministério; porque a prudeucia é, pnra assim dizer, a alma d’este santo emprego. A prudência, não fallo aqui da prudência do se­culo, que degenera em astúcia e que 6 indigna dc um sacer­dote; a prudência espiritual é esta nobre virtude que ensina ao homem a fazer tudo do modo, tempo c logares convenien­tes. Suns qualidades essenciaes são a circumspecção e a re­serva, e seus elleitos principaes saber consultar c julgar hem. Ella se obtem de Deus, não sómente pelo estudo, mas ainda muilo mais pelas lagrimas e oração. 0 confessor exercendo tres oilicios, dc juiz, de medico e de doutor, como poderá sem uma verdadeira prudência, dirigida por uma luz sobre­natural, desempenhar dignamente seu ministério? E ver­dade que, como juiz, não lhe pertence o fazer leis; pelo con­trario deve conduzir-se de modo que não as infrinja. Achando seu penitente disposto, elle o desliga pela absolvição; sc não está disposto, o liga ou deixa ligado como o achou. Mas por que no tribunal da penitencia elle exerce uma justiça que tende á emenda do culpado, muito diderentc por consequen­cia da justiça ordinaria e coercitiva, quanta prudência não é necessaria para allingir o lim de seu ministério, que é a emenda do culpado? A imprudência é o escolho contra o qual naufraga a maior parle dos confessores. Considerae o que se passa na prática. Védc esse confessor precipitado e temerário que, por enfado, por um desejo inconsiderado de dar expediente a muitas conlissões, não deixa ao penilenle o tempo de fazer conhecer sua consciência, nílas o apressa, o aperta, não cessando de dizer-lhe: Tendes oulra cousa? ten­des outra cousa? D’onde resulta que o pobre penitente não accusa mais do que metade de seus peccados. Vôde esse ou­tro: apenas ouve algum peccado que lhe parece vergonhoso ou muilo grave, faz reprchensões penosas ao penitente e lhe aperta o coração sem deixar sair lodo o veneno. Outros di­rigem aos penitentes perguntas de mera curiosidade, inúteis c vãs, c querem saber tudo o que se passa. Elles sc expõem assim a mil perigos, sem attenção áquelles que esperara, e sem escrupulo de violar os regulamentos do ritual romano, que prohibe aos confessores de fallar no tribunal em cousas que não têem relação com a confissão. Porém merece muito

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maÍ3 ser notado de imprudência o confessor que não ajuda algum tanto o penitenle a manifestar as faltas que lhe custa mais pôr a descoberto. Um servo dc Deus dizia, que por uma só interrogação tinha ganhado mais almas para Deus, do que os cabellos que linha na cabeça. Eil-a aqui: Quando via a seus pés algumas caras uovas, e que pelo lodo da conlissão, ou por oulro iudicio suspeitava prudeulemente que havia al­gum peccado sepultado no fundo do coração, interrogava o penitenle d este modo: Não occuUasles jámais algum pec- catlo quando ereis menino... na idade a mais tenra; que vos parece? Dizei, nada temaes, eu vos ajudarei, eu vos tran- quiUisarei, elc. Por esta conducta admiravel, elle fazia sair alguma serpente infernal, que arrastava comsigo uma longa cauJa de confissões niillas ou sacrilegas, verificando assim a sentença do Espirito Santo: Obstetricante manu ejus, edu- ctus est coluber tortuosus. {Job., xxvr, 13.) Oh! que admira­vel prálica! Segui-a vós mesmo todas as vezes que a pru­dência vos dictar, c colhereis o maior fructo para a vossa alma e para a de vossos pcnileutes.

192.— .A imprudência dos confessores pouco experimenta- Continua­dos, que absolvem os penitenlcs mal dispostos, causa um 5“®-damno immenso ás pobres almas; porém maior ainda é o de uma absolvição dada áquelles que nâo estão instruidos das verdades necessárias dc saber-se necessitate medii. Citemos a esle proposito a proposição condemnada: Absolutionis ca­pax est Iwmo quantumvis laboret ignorantia mijsteriorum fi­dei, et eliamsi per negligenliam eliam culpabilem nesciat mysterium Sanclissimm frinitatis, et Incarnationis Domini nostri Jesu Christi. De vagar, meu padre, alguem me dirá. Pretendeis obrigar-nos a fazer o catecismo no confessioná­rio? iNão, sem dúvida; mas quero fazer-vos comprehender que é vosso dever ensinar aos penitentes Iodas as cousas que devem saber, debaixo de pena de serem incapazes de absol­vição. Ora, uma d’estas cousas c o conhecimeulo dos princi­paes mysterios da religião.

Assirâ, quando se apresentar uma pessoa rústica, como será um lavrador, um pastor, um carreiro ou outras pes­soas meias selvagens, que não tèem recebido alguma in- slrucção nem de seus paes, nem de seus parocbos, os recebercis com bondade e doçura, maudar-lhes-beis fazer 0 signal da cruz, ensinar-lhes-heis a pedir a Deus a graça de se confessarem bem; fareis que elles batam no peito, e por este ou por algum outro meio dc devoção sensível e material lhes fareis pedir perdão a Deus; intcrrogal-os-heís depois sobre os mysterios da fé, de que essa classe de pes­soas não lem ordinariamente mais do que um conhecimento

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muito imperfeito. Se elles ignoram as principaes verda­des, taes como a unidade dc Deus, a Trindade, a Encarna­ção, as penas e recompensas da outra vida, são incapazes de absolvição até que elles as conheçam, ao menos sufliciente- mente para fazerem um acto de fé. Isto quer dizer, como alguns 0 explicam, até que elles saibam tanto quanto póde permittir-lhes sua rusticidadc, que ha tres pessoas que se chamam: Padre, Filho, e Espirito Santo; que ellas não for­mam mais que ura só Dous, e não tres Deuses; que a se­gunda pessoa se fez homem e se chama Jesus Christo; e ainda que Jesus Christo seja Deus e homem, não ha todavia dous Christos: quanto a Deus remunerador, que Deus dá o paraiso aos bons e condemna os máus ao inferno. É ura modo máu o rcmetter a outros estes penitentes para os in- struirem; o unico fructo que d’isto colhera é permanecerem nas trevas da ignorancia até á morte. Assim, o melhor que se póde fazer, é ensinar-lhes brevemente e cora expressões apropriadas á sua capacidade, os mysterios de que acabamos de fallar, mandando-lhes fazer os actos de fé, esperança, cari­dade e de contrição. Imponde-lhes a obrigação de procurarem seus parochos, a fim dc serem instruidos mais perfeitamente tanto sobre estes mysterios, como sobre aquelles que se de­vem saber de necessitale prwcepti. Para tudo isto basta me­nos tempo do que parece ao primeiro aspecto, quando se faz com a brevidade possivel. Depois se lhes diz que se accusem da negligencia que tôem commettido em aprenderem estas verdades, e se lhes concede o beneficio da absolvição. Mas frequentemente acontece que se ache uma semelhante igno­rancia em pessoas de uma condição mais elevada e de um espirito mais cultivado; por outra parte, estas pessoas seriam muito humilhadas sendo interrogadas sobre estes mysterios. Ora, seja para me assegurar dc sua sciencia n’este ponto es­sencial, seja lambera porque estas pessoas do mundo, entre­gues á vaidade e libertinagem, deixam ordinariamente de fazer no tempo conveniente os actos de fé, etc., eu lhes in­sinuo com muita doçura, que o melhor meio de assegurar a validade e fructo do sacramento, é recitando primeiro os actos de fé, esperança, caridade e contrição; eu acrescento: Se quereis, façamol-os juntamente. Dizei portanto do coração o que eu vou dizer cora a bôca: Creio, ó meu Deus, porque sois üdí a verdade mesma, que á santa Igreja a revelastes, creio que sois um só Deus em tres pessoas tguaes, que se cha­mam Padre, Filho e Espirito Santo; creio que o Filho se fez homem, que morreu por nós sobre a cruz, que resuscitou e subiu ao céo, d’onde virá julgar todos os homens, e dar o paraiso aos bons e condemnar os máus ao inferno. Vós crê-

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des islo de lodo o vosso coração, não é assim?— Sim, meu pa­dre.— Façamos açora o aclo de esperança: Espero, ó meu Deus, porque sois infinitamente misericordioso e omnipotente, que me concedereis o perdão de meus peccados, a gloria eterna na outra vida pelos merecimentos de Jesus Christo, e pelas hoas obras que espero fazer com vossa graça. Vós esperaes verdadeiramente de um Deus lão bom o perdão de vossos peccados, não é assim? - Sim, meu padre.— Façamos agora 0 aclo dc caridade: 0 meu Deus, porque sois o soberano bem, eu vos amo mais que todas as cousas, e por amor de vós amo e quero amar o meu proximo como a mim mesmo. Vós amaes sinceramente e de lodo o coração um Deus lão bom, não é assim ? — Sim, meu padre.— Por estes aclos o peni­tente se acha muilo mais bem disposto a fazer o acto de con­trição. Pedi agora perdão a Deus de vossos peccados, e. pe­netrado da mais viva dor, dizei, batendo humildemente no peito: 0 meu Salvador Jesus, eu me arrependo de vos ter of­fendido, porque sois o soberano bem, e proponho de nunca mais vos tornar a offender. Eu faço repelir esle aclo duas vezes a lodos os meus penitentes; a primeira vez antes de lhes impor a penitencia, e a segunda iramedialamente antes de lhes dar a absolvição. Não pretendo que seja necessário observar o mesmo com todos aquelles que se confessam; mas sei muito hera que ás pessoas distrahidas e pouco cuidadosas de sua salvação será muilo vantajoso que o confessor faça repelir esles actos; elles serão sobretudo maravilhosamente consolados no caso de uma conlissão geral. 0 confessor mesmo licará mais satisfeito, altcndendo que eulre todos os sacramentos é o da penitencia de quem se póde dizer que a validade depende muilo mais dos actos do penilenle que o recebe, do que dos cuidados do confessor que o administra.Àssim a prudência do sacerdote na administração d’estc di­vino sacramento consiste essencialmente em certilicar-se o melhor possivel da disposição interna dos seus penitentes, que consiste em fazer bem os actos mencionados mais acima, de sorle que, alimentados por esle pão da prudência, possam emfim assegurar sua salvação eterna.

193. (S. Carlos, n.°" 24-33.) — No principio da confissão Doutrina e antes que os penitentes digam seus peccados, princip®' los mente sendo pessoas grosseiras, ou que não se confessam 35 intcrro- senão raras vezes, 0 confessor lhes deve fazer algumas inter- gações. rogações para saber melhor conduzir-se no decurso da con­fissão, as quaes são as seguintes. Primeiramente se 0 con­fessor não conhece se 0 peoitente é d’aquelles para quem tem jurisdicção, deve interrogal-o convenientemente, e achando que não é, o deve remelter áquelle que tem juris-

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dicção sobre e llc (‘). Achando que é, e todavia o não co­nhece, 0 deve interrogar de seu estado, de sua condição, de sua profissão, de seu ofBoio ou do exercicio cm que se oc- cupa. Perguntar-lhe-ha depois ha quanlo tempo se não con­fessou, representando-lhe o grande fructo que sc colhe das confissões freqüentes; se cumpriu a penitencia que Ibe foi imposta; se sabe os artigos da fé e os mandamentos dc Deus e da Igreja, c não os sabendo se conduzirá como diremos brevemente; se fez a diligencia necessaria para examinar a sua consciência, que deve ser tal como se costuma empregar cm um negocio de muilo grande importância, sendo sem dúvida importantíssimo o apresentar-se a este sacramento. Instruil-o-ha lambem n’esla occasião, segundo julgar neces­sário, do modo por que se deve fazer o exame dc consciên­cia para bem se recordar dc todos os peccados cummellidos e de suas circumslancias, como é o representar em si mesmo toda a sua vida, considcrando-n primeiramente na diversi­dade dc sua idade, cm sua infancia, cm sua adolescência, etc.; em segundo logar, na diversidade dos estados cm que se tiver achado, como antes que casasse; depois em seu ma­trimônio, etc.; terceiro, nos diversos accidcntes de prosperi­dade, de adversidade, dc saude e dc enfermidade, os diver­sos tempos, os diversos oQicios que exercitou, as companhias que frequeutou, os logares, os paizes, as casas oude esteve e onde viveu; deve finalmente em todas as cousas esquadri­nhar em que peccou por pensamentos, palavras ou obras. Deve tambem iustruil-o das condições que são necessárias para fazer uma boa confissão, declarando-lb’as com a maior brevidade e facilidade que possivel for, e poderá reduzir a quatro ou cinco principaes as dezeseis que os doutores cos­tumam referir, que são comprehendidas n’esles versos;

Sit simnlex, humilis confcssio, pura, fide.lis Atque frequens, nuda el discreta, libens, vcrccuiula, Integra, secreta et lacrgmaUlis, accclerata,Fnrlis Cl accusans, el sit parcre parala.

Pergiintar-lhe-ha se sabe que tenha caido em algum caso reservado, ou incorrido cm alguma excommunhâo, ou se co­nhece ler em si algum obice que possa irapedil-o de o absol­ver; e encontrando logo, ou pelo decurso da confissão, laes impedimentos, não deve passar mais além, mas advertir o penitente de que não tem jurisdicção para o absolver.

Continua- 194.— Deve lambem fazer interrogações a respeito das Ç ã o . _______________________________________________

(') Esta regra é sobretudo local ; ella quasi não tem applicação na

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confissões precedentes, que são uecessarias para conhecer se aconteceria algum caso que as tornasse nulias, e se por con­seguinte deverão ser reiteradas; como se elle se confessasse a alguem que não tivesse o poder de absolver, ou que não se servisse da fórma legitima da absolvição, a um sacerdote tão ignorante que não soubesse nem entendesse as cousas que são necessárias para administrar este sacramento; se elle ti­vesse de proposito supprimido algum peccado mortal na con­fissão, ou que elle a tivesse dividido, dizendo uma parte de seus peccados a um confessor e o resto a um outro; se elle se tivesse confessado sem ter alguma dor de seus peccados, sem proposito de se emendar, ou sem ter posto alguma dili­gencia para se recordar d’clles. E porque muitas vezes se é negligentíssimo em fazer as conlissões como se deve, princi­palmente quando se vive sem temor de Deus, e sc tem muilo pouco ou absolutamente nenhum cuidado de sua alma, de sorte que anles se confessam por um certo costume, do que por um conhecimento auc se tenba de seus peccados, e por um desejo de se emendar d’elles, e finalmente pela grande utilidade que resulta geralmente de se confessar, principal­mente quando principia a resolução de uma verdadeira emenda e da conversão para Deus: os confessores devera era tempo c logar exhorlar seus penilenles, segundo a qualidade das pessoas, a que façam uma conlissão geral, a íim de que por esle meio, tornando a por debaixo de seus olhos toda a sua vida passada, se convertam a Deus com mais fervor, e reparem todas as faltas que inlerviriam em suas confissões precedentes.

193.— Acabadas estas interrogações, que não são mais do Maleria que inlroducções e preparações para a confissão, o confessor neve, tanto quanlo lhe for possivel, inclinar o penitente a que ° sc accuse primeiramente dc todos os peccados que se lemora ter commettido. Feito islo, e acbando, como muilas vezes acontece, que o penitente tem necessidade de ser interro­gado, a (im de Ibe chamar á memória por este meio muitas cousas que Ihc terão esquecido ou Icra dito confusamente, tendo sempre cuidado de lhe perguntar o numero dos pecca­dos mortaes que tiver commettido, ainda que o penitente não lh’o saiba referir precisamente, lh’o fará todavia dizer por aproximação. E necessário que proceda n’cslas interrogações com ordem, principiando pelos mandamentos de Deus; ainda

ãue todos os pontos de que se deve interrogar se possam re- uzir, todavia tfendo a tratar com pessoas que freqüentam

raras vezes este sacramento, será bom que se discorra pelos sete peccados capitães, os cinco sentidos do homem, os man­damentos da Igreja e obras de misericórdia. 0 confessor

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deve portar-se com prudência, e ter um cuidado particular de interrogar o penitente a respeito dos peccados em que as pessoas de seu estado costumam com mais frequencia cair, e com esta prudência deve tambem usar dc grande precaução, quando interrogar sobre os peccados carnaes, a respeito dos quaes não deve examinar outra cousa, lendo entendido a es­pecie do peccado e as circumstancias que o aggrnvam nota­velmente. É a razão por que deve saber quaes são as circum­stancias que mudam a especie do peccado, ou que o aggra- vam notavelmente, porque esta qualidade de circumstancias se deve necessariamente explicar na confissão (*); sobre o que recorrerá aos logares dos Tratados dos casos de con­sciência, oude esle verso é explicado:

Quis, quid, vbi, quibus auxUiis, cur, quomodo, quando.

1’riidencia 196.— Deve lambem usar de uma circumspecção parlicu- nas imcr- lar, e ter cautela sobre o modo de inlerrogar as mulheres, e rogaçõcs. (,g pequenos meninos, a lim de que lhes não ensine o que el­

les ignoram; elle deve fazer estudo para evitar o servir-se de palavras que possam oITendcr os ouvidos do penitente, e abster-se, emquanlo confessa, de fazer gestos ou acções quaesquer, de que possam os que eslão presentes conjeclu- rar que a pessoa que se confessa a elle seja culpada de al­gum enorme peccado, e lambem para não aterrar o penitente de modo que islo seja causa de occullar elle algum outro grande peccado; mas deve, pelo contrario, animal-o a accu­sar-se de lodos 03 crimes, por mais euormes c immundos que sejam. 0 confessor, que lem algum privilegio, permissão ou auctoridade de commutar votos d’aquelles que se confessam a elle, e que lhe pedem islo, não os deve commutar senão em outras obras de piedade maiores, ou pelo menos igual­mente agradavcis a Deus, tendo muilo em vista as dcspezas,0 trabalho, as fadigas, e outros incommodos que passariam se os cumprissem ( ); e ainda que elle lenha poder de absol­ver dos pccivados mesmo enormes, das censuras, e dos penas ecclesiasticas, em virtude dc jubileus, ou dc alguns privilé­gios apostolicos, deve todavia advertir que não póde dispen­sar aquelles que incorreram era alguma irregularidade, a não se fazer expressa menção d’islo em suas letras apostólicas.

Conselhos 197. (S. FaANCisco de Salles, 1-11, pag. 624 e 625.} — de Chegado o penilenle, é mister inquirir-lhe, primeiro que tudo,

cí) ® condição, quero dizer, se é casado oules sobre“ 3o, ecciesiastico ou não, religioso ou secular, advogado ou

gaçoes. I opinião de S. Carlos, vôde o n.« C6 e o Prefacio.(*) Vide 0 n.« 174, onde a questão é tratada llieologicamcnle.

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procurador, artista ou lavrador; porque segundo sua vocação se deverá proceder de diflerente modo com elle. Dever-se-ha ver, depois d’isto, se elle não tem intenção de accusar-se de todas as suas faltas lembradas, como tambem de deixar e detestar inteiramente o peccado, e dc fazer o que lhe for de­terminado para sua salvação; se elle não tiver esta vontade é necessário parar aqui, e dispol-o, se for possivel; se não for possivel deve mandar-se embora, depois de lhe fazer compre­hender 0 perigoso e miserável estado a que está reduzido. É um abuso intolerável que os peccadores não se accusera de algum peccado por si mesmos, não sendo interrogados. E portanto necessário ensinar-lhes n accusarem-se primeira­mente elles mesmos no que podérem, e depois ajudal-os e soccorrel-os com perguntas e interrogações. Não bnsla só­mente que 0 penitente accuse o genero de seus peccados, como seria dizer que foi homicida, luxurioso, ladrão; mas é exigido que elle diga a especie, como por exemplo, se foi ma­tador de seu pae ou de sua mãe, porque é uma especie de homicidio diflerente dos outros, e se chama parricidio; se matou na Igreja, porque n’islo ha sacrilégio; ou se elle ma­tou ura ecciesiastico, porque é um homicidio espiritual, e lica excommungado. 0 mesmo a respeito do peccado da luxuria, se de.sflorou uma virgem, porque é um estupro; se conheceu uma mulher casada, porque é um adultério; e assim das ou­tras.

Não sómente sc deve actuar da especie do peccado, mas tambem do numero cfestes, a íim de que o penitente se ac­cuse, dizendo quantas vezes commetteu lal peccado, ou apro­ximadamente, mais ou menos, o mais aproximado que podér, segundo sua reminiscencia; ao menos dizendo quanto lempo perseverou em seu peccado, e se foi muilo dado a elle; por­que vae muita dilTerença enlre aquelle que só tiver bla.sphe- mado uma vez e aquelle que tiver blasphemado cem vezes, ou que faz d’islo prolissão. Deve-se mais examinar o peni­tente sobre a diversidade dos gráus do peccado. Por exem­plo, ha muila dilTerença enlre encolerisar-se, injuriar, bater bofetadas, ou com um páu, ou com a espada, que são diver­sos peccados de cólera. Item, ha muilo a dizer enlre a vista carnal, o loque deshonesto e a conjuncção carnal, que são diversos gráus do mesmo peccado. É verdade que aquelle que confessou uma acção má não tem necessidade de confes­sar as outras que são necessariamente exigidas para fazer isto. Assim, aquelle que se accusou de ter violado uma rapa­riga uma só vez não é necessário que diga os osculos, os lo-

..yg (-g2 Qg gggjg j-jgtg g g'ggm occasião; porque isto se í bem sem que se diga, e a accusação de laes pecca-

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dos é comprebendida na confissão da acção final do peccado. 0 mesmo digo dos peccados, cuja malicia se póde redobrar e multiplicar em uma só acção. Por exemplo, aquelle que furta um escudo faz um peccado, e aquelle que furta dous não faz tambem mais do que um peccado, e da mesma especie; po­rém a malicia deste segundo peccado é dobrada. Üa mesma fórma póde acontecer que com um máu exemplo sc cscanda- lise uma só pessoa, e com um outro exemplo da mesma es- pecie sc escandalisarão trinta ou quarenta, e não ha propor­ção cm um ou outro peccado. E ’ a razão por que se deve particularisar, tanto como sinceramente se possa fazer, a quantidade do que se furtou, e as pessoas que se escandali- saram por uma só acção; e assim consecutivamente dos ou­tros peccados, cuja malicia augmenta ou diminue, segundo a quantidade do objecto e da matéria.

Tambem se deve penetrar mais ávante, e examinar o pe­nitente sobre o que respeita a seus desejos e vontades pura­mente internas, como seria se desejou ou quiz fazer alguma vingança, deshonestidade ou cousas semelhantes; porque es­tes máus alTectos são peccado. Deve-se passar mais além, e esquadrinhar os máus pensamentos, ainda que elles não te­nham sido seguidos de desejos e da vontade. Por exemplo, nquelle que toma prazer cm pensar comsigo mesmo na morte, ruina ou desastre de seu inimigo, ainda que elle não deseje taes elTeitos. todavia se voluntaria e advertidamcnte se de­leita e regosija em taes imaginações e pensamentos, pecca contra a caridade, e deve nccusar-se rigorosamente d’isto. É absolutamente o mesmo d’aquelle que voluntariamente teve prazer cm pensamentos e imaginações do.s deleites carnaes; porque peccou interiormente contra a castidade, do que deve confessar-se, tanto mais que se não quiz appiicar seu corpo ao peccado, lhe applicou todavia seu coração e sua alma. Ora, 0 peccado consiste mais nn appiicação do coração, do que na do corpo, e de modo nenhum é licito ter advertida- mente prazer e contentamento no peccado nem por acções do corpo, nem pelas do coração. Eu tenho dito ndvertidamente, porque os máus pensamentos que nos sobrevem contra nossa vontade, ou sem que nós prestemos inteiramente altenção, não são peccados, ou não são peccados mortaes. Além de tudo isto, é necessário tambem que o penitente se accuse dos peccados alheios, a exemplo de David, porque se, por máu exemplo ou outro modo, provocou alguem a peccar, é cul­pado, e islo se chama propriamente escandalo. Pelo contra­rio é necessário impedir o penitente que nomeie, ou dô a conhecer seus cúmplices no peccado, tanto quanlo seja pos­sivel.

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Conducia que se deve ler com as dilTerenles especies de penitentes

198. (Sacerdote santificado, n.®* 03-67.) — Conhecendo, Regras por sua accusação, ou pelas interrogações que lhe tiverdes gçraes de dirigido, 0 estado do penitente, resta-vos proporcionar vossos ‘■‘scriçao. conselhos, vo.ssos meios, vossa conducia ás necessidades desua alma. E n’islo que tendes necessidade da maior discri­ção para hcni julgar de suas disposições, a lim de o ligar ou de 0 absolver. Notae primeiramente a dilTerença que existe entre o confessor relaxado e o confessor rígido. 0 primeiro absolve quasi todos aquelles que se apresentam, o segundo quasi nenhuns absolve. Quanlo a vós, sede bastante pru­dente para absolver nienos alguns do que o primeiro, porém muitos mais do que o segundo. Um é cheio dc compaixão para com o culpado, e não considera sullicienlemenle a gra­vidade dc suas faltas; o oulro é cheio de odio para com os vicios, mas sem compaixão pelos viciosos. Assim, para o cu­rar, 0 primeiro não emprega mais que o oleo da condescen­dencia, 0 segundo o vinho da reprehensão. Quanlo a vós, para compor o verdadeiro balsamo da Samaritana, mislurae 0 oleo e 0 vinho. Enchei-vos de compaixão pelo culpado; é isto proprio de um pae, e lambem é o espirito do Salvador: é a pedra de toque que faz distinguir o zelo de Jesus Christo do zelo dos phariseus, assim como o temos visto em o n.® 10.Mas tende cuidado de fazer detestar verdadeiramente o vi­cio; é isto necessário para o bem do culpado; e a caridade mesma, como cm o n.® 11o vimos, sabe misturar aos reme­dios fortes e encrgicos toda a doçura da compaixão. Assim, humilhando-se inteiramente e penetrando-se de compunção,0 penitenle não se desanima, não se irrita; pelo contrario, alTeiçoa-se ao sacramento; põe n’elle sua confiança, assim como em seu ministro. Confessio, é o parecer de Santo Agos­tinho, est per quam morbus latens spe veniw aperitur. [De ver. et fals. Pwnit., cap. x.)

199.— 0 confessor era excesso indulgente, acreditando fa-Scrdiscre- cilmenle no verdadeiro arrependimento, confunde a vellei-1®dade com n verdadeira vontade. 0 rigorista muilo difficil- mente crê na verdadeira contrição, porque confunde a von­tade efficaz com a vontade efficacissima; a vontade verdadeira e sufficienlc, mas commum e ordinaria, com a vontade plena e extraordinaria, singular e heróica. Preservae-vos d estes dous extremos. A verdadeira contrição não é tão facil, que

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possamos ordinariamente exeitar-nos a ella sem fazer algu­mas orações para a obtermos, e sem pensarmos, durante al­gum tempo, nos motivos de arrependimento que a fé nos apresenta; mas para aquelle que ora e reflocte, como acabo de dizer, ella cessa de ser uma cousa dillicilima. Deus con­cede elTectivamenle a graça de a conceber. Esta sábia discri­ção honra tanto a justiça de Deus, que exige que o culpado se humilhe, como sua misericórdia, que ouve a oração. Para dilTercnça do confessor imprudente, não deveis reconhecer por verdadeira vontade, mas por uma simples velleidade, aquella que não produz mais que algum ou quasi nenhum elíeilo, tal, por exemplo, o tomar os meios de se emendar e diminuir o numero das faltas ordinarias. Mas, bem dilTe- rente dos confessores sempre irresolulos, recebei como ver­dadeira, elBcaz e sulliciente a vontade que produz na reali­dade notáveis effeitos durante um certo tempo, ainda que ella não chegue a produzil-os lodos e a conserval-os sempre. Não exijnes portanto uma vonlade ellicacissima, extraordinaria e heróica, que produza uma mudança perfeita, total, immulavel e constante. Praza a Deus que lodos os peccadores tivessem uma lal vontade! Todos devem desejal-a e procural-a, mas nem todos a lêem. Ella não é necessaria para sun verdadeira, para sua aclual conversão e justilicação; basla um arrependi­mento cllicaz, ainda que commum e ordinário, inferior a esta contrição singular, que transforma os peccadores em heroes de penitencia.

Continua- 200.— Basla ao confessor relaxado, para absolver o cul- Ção. pado, que este proteste que se arrepende, sem prestar atten­

ção se oulra cousa se deve presumir. 0 rigorista, pouco con­tente de não ter algum motivo fundado de suspeitar da palavra do penitente, quer a certeza evidente de sua dispo­sição. Ter pcccado quanlo ao passado, e poder peccar para 0 futuro, são para elle razões suflicientes para pôr o penilenle a longas provas. Quanto a vós, antes dc dar plena conliança aos protestos do culpado, vêde sc hn alguma circumslaucia que possa fazer-vos duvidar prudentemente da sulBciencia de sua disposição. Mas se não achaes algum motivo solido de desconliar dc seus protestos de arrependimento, absolvei-o. Tal é a doutrina do Catecismo romano {De Pcenit., n.° 60). Fallando do confessor, se exprime n’c3les termos: S i audita confessione judicaverit neque in enumerandis peccatis dili- genliam, nec in detestandis dolorem omnino defuisse, absolvi poterit. Tal é a certeza moral que deveis procurar, e que deve bastar-vos na administração do sacramento, pois que, segundo o Anjo da escola: Certiludo non est similiter quce- renda in omnibus, sed in unaquaque matéria secundum pro-

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prium modum. Quia vero matéria prudentiw sunt singularia contingei\tia, área quw sunt operationes humanw, non potest certitudo prudentiw tantw esse, quo omnino solicitudo tolla- tur (2, 2, q. 23, art. 9.®). Em outra parte, fallando da cer­teza que deve ter um director das almas a respeito de seus penitentes, depois de ter dito que no fôro exterior não deve salisfazer-se com a affirmação do penitente, mas ir mais longe para se certificar da verdade, o Santo acrescenta que é muito.dillerente no fôro interno: Alio modo per confessio- nis manifestationem, et quantum ad hanc cognitionem non potest majorem certitudinem accipere, quam ut súbdito cre- dat, quia hoc est ad subveniendum conscientiw ipsius: unde in foro conscientiw creditur homini et pro se et contra se.(Sup., q. 8, a. 6 ad 2.) Assim, como ninguém é mais inte­ressado do que o penitente em dizer a verdade na confissão, se não tiverdes razão solida para duvidar de sua sinceridade, quando elle vos diz que está excitado ao arrependimento, que está resolvido a cmendar-se, e que está prompto a rece­ber os remedios e a penitencia que lhe derdes, tendes toda a certeza que deve desejar a prudência de um confessor exa­cto, mas discreto.

201.— Um é todo preoccupado pelo receio de desgostar o Dous esco- penilente se o despede, e não cogita senão nos damnos im-l|'03qucse menso.s que nas almas causa o apartamento dos sacramentos.0 outro não vê mais que o respeito devido ao sacramento; e todo penetrado do receio de o expor a nullidade, não presta attenção aos inconvenientes que ha em despedir o penitente sem absolvição. Quanto a vós, temei igualmente este dupli­cado perigo, de tornar diflicil aos peccadores o accesso ao sa­cramento, e de comproraetter a validade d’elle. Erapregae portanto vossa caridade dc pae, vossa habilidade de medico, e vossa discrição de juiz para dispor o penitente de tal sorte, que possaes prudentemente absolvel-o ou logo, ou com pe­quena demora. Por isto, podereis simultaneamente consolar 0 penitente e alfeiçoal-o a seu remedio, a confissão, c asse­gurar com prudência a validade do sacramento e o respeito que lhe é devido.

202.— Na prática, um absolve quasi toda a gente, e o ou- Conducta tro quasi ninguém absolve. Sede mais reservado do que o discreta primeiro, e mais liberal do que o segundo. Para principiarpelas cousas pequenas, trata-se dos meninos de sete a dez ou mancebos doze annos, o confessor relaxado procede com elles tão expe- e tapari- ditamente como cora um adulto culpado das mesmas faltas, sem se dar ao trabalho de supprir a falta dc disposições que póde resultar da ignorancia e da fraqueza d’esta idade. 0 rigorista tem por maxima o despedil-os a todos com a ben-

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ção sómente, porque os julga incapazes d’este arrependi­mento sublime c eHicacissimo que lhe parece necessário. Quanto a vós, ajudae-os de um modo especial, mas julgae-os capazes de um arrependimento sincero, ainda que não seia extraordinário. Com cITcito, eis aqui o que diz o Concilio ae Trento (sess. 13, cap. ix): S i quis negaverit omnes et singu- los fideles ulriusque sexus, cum ad annos discrelionis perve- nerinl, teneri singutis annis. saltem in Paschate ad communi- candum juxla prceceplum sanclae malris Ecclesia:, analhema sit. E em outra parte elle não declara isentos d’estas obriga­ções senão parculos usu ralionis carentes. (Sess. 21, cap. iv.) Quanto menos vos engnnacs vós, applicando proporcional­mente cstc preceito á conlissão? Podeis portanto absolvel-os com grande proveito para sua alma; tanto mais que o uso commum, e sempre respeitável dos lieis, é de os habituar a confessar-se desde a idade de sete annos. Seriam muito ne­gligentes os paes e mães que não os conduzissem a isto, mesmo na Paschoa, visto sobretudo que a contrição verda­deira e sufliciente é a obra da graça, que abunda onde ha pouca malicia, onde se encontra mesmo a innocencia baptis- nial. Assim, a boa conlissão 6 mais facil á alma mediocre- mente esclarecida, mas cuja vontade é ainda boa e flexivel, do que á alma esclarecida, cuja vontade é perversa e obsti­nada. É 0 motivo por que os adultos são menos satisfeitos de suas conlissões acluaes, do que d'aqucllas que faziam na idade da innocencia, c d’onde voltavam cheios de compun­ção e de consolação. De um outro lado, para supprir ao que falta, implorae a assistência de seu Anjo da guarda, aju­dae-os a examinar-se e mais ainda a arrepender-se, propon­do-lhes os motivos de contrição adaptados á sua idade. De­pois d’isto, se elles parecera sérios e vos dão signaes de in- telligencia e de devoção actual, não os priveis do grande beneficio da absolvição; pelo contrario, se nctualmcntc estão distrahidos e irreflectidos, contentae-vos em lhes dar a ben­ção. Em todos os casos, suggeri-lbcs bons pensamentos, de sorte que elles se apartem de vós com algum sentimento de devoção c um principio de respeito e dc amor pela conlissão. Estae certo que seus anjos vos tomarão conta de vossa cari­dade para com esta idade, em que tanto imporia que a alma comece a conceber horror pelo mal, estima e gosto pela pie­dade.

Continua- 203. (S. Ligohio, 86 e 87.) — Empregareis portanto comçáo. os meninos a maior caridade e a maior doçura possivel.

Pergunlar-lhes-hcis primeiramente se snbcra as principaes verdades da fé. Sc não as sabem, instrui-os com paciência e logo, se 0 tempo o permiltir, ou enviae-os a alguem para os

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instruir ao menos das cousas necessárias á salvação. Quanto á conlissão, deve-se fazer-lhes dizer no principio os peccados de que se lembram. Podereis depois dirigir-lhes as perguntas seguintes; 1.“, se tôem occultado algum peccado por vergo­nha; 2.”, se blasphemaram os santos ou os dias santos, ou se têem jurado contra a verdade; 3.“, se têem faltado á mi.ssa, se conversaram esUindo a ella, ou se trabalharam nos dias santos ou domingos; 4.®, se desobedeceram a seus paes, se lhes faltaram ao respeito levantando a mão contra elles; se lhes disseram injurias em sua presença, ou vomitaram contra elles pragas que elles ouviram, ou se mofaram d’elles: lem- brae vos aqui do que em o n.® 176 dissemos sobre o modo de lhes fazer pedir perdão a seus paes e mães; 5.®, se elles commetteram alguma indecência. Mas n’isto deveis pôr a maior reserva quanlo ás pergunta.s.

Gomeçae por interrogações remotas e mesmo um pouco va­gas. Primeiramenle se disseram más palavras, se brincaram com outros pequenos rapazes ou raparigas; sc era em logar occullo. Pergunlae depois .«e lizeram cousas feias on disse­ram más paíavras, porque é assim que os meninos chamam ás acções indecentes. E muitas vezes util, mesmo quando el­les tiverem negado, fazer-lhes algumas perguntas d'este ge­nero.' Ah! quantas vezes? dez vezes, quinze vezes? Pergun- tae-lhcs com quem elles dormem, e se, estando na cama, el­les se lêem divertido com as mãos; ás raparigas, se ellas têem lido amizade por alguem, e se houve n’islo pensamen­tos, palavras ou acções más; e, segundo suas respostas, ireis mais longe. Sed abstineant ab exquirendo a pueilis vel a pue­ris an adfuerit seminis effusio. Lembrae-vos d’islo bem, vale mais faltar á integridade material da confissão, do que ensi­nar-lhes 0 que elles ignoram, ou causar-lhes desejo de o sa­ber. 6.® Pergunlae tambem aos meninos se lêem levado com- missões ou preseules a mulheres, da parte de pessoas sus­peitas, e especialmente de homens casados, ecciesiasticos ou religiosos. 7.® Pergunlae-lhes se tôem roubado ou causado algum damno, seja com seu gado, seja por outro modo; 8.®, se lêem dito mal dc alguem; linalmente sobre os mandamen­tos da Igreja, se na Paschoa se confessaram e commungaram; se lêem comido carne ou ovos uos dias prohibidos.

204.— Quanlo a dar a absolvição a estes meninos, deve Sobrca pôr-se muita attenção. Quando é certo que elles lèem uso absolvição de razão sullicente, como se elles se coofessam com discer- nimento, ou se respondem justamente ás perguntas, e se vê que elles comprehendem bem que peccando lêem offendido a Deus e merecido o inferno, n’este caso, se elles estão dispostos, dae-lhes a absolvição. Pelo contrario, se elles li-

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verem reincidido em peccados mortaes, devem ser tratados como adultos. Assim, se não dão signaes extraordinários de contrição, deve-se dilTerir-lhes a absolvição. Se duvidaes que elles tenham o perfeito uso da razão, por exemplo, se ao con­fessar-se não estiverem compostos, mas voltarem os olhos para uma e outra parte, se se divertirem com as mãos, e vos disserem cousas que não tenham alguma relação com a con­fissão, então se estiverem em perigo de morte, ou se deve­rem satisfazer ao preceito paschal, deveis absolvel-os debaixo de condição, principalmente quando elles tèem accusado al­gum peccado mortal duvidoso (lib. VI, n.® 432, v. 4). Com effeito, é muito permitlido administrar o sacramento debaixo de condição, quando ha uma razão sufllciente, como a de ti­rar este menino do estado de condemnação, se realmente caiu n’elle. (.N.® 28.) Deveis obrar d’este modo. quando mesmo elle for recidivo; porque se não deve dilTerir a absol­vição áquelles que tèem um perfeito discernimento senão na esperança que depois d'esta demora voltarão mais bem dis­postas. Ora esta esperança é muito dillicil tel-a com aquelles que não gosam o pleno uso da razão. É provável, diz um grande numero de doutores (lib.VI, n.° 432 in fine), que es­tes meninos duvidosamente dispostos podem ser aosolvidos, ao menos todos os dous ou tres mezes debaixo de condição, quando mesmo não forem culpados senão de peccados ve­niaes, a fim de que não sejam privados da graça sacramental e talvez da graça santificante, se elles tiverem sobre a con­sciência algum peccado mortal ignorado. Deve-se fazer de­pois produzir a estes meninos o acto de contrição da maneira a mais apropriada á sua idade; por exemplo: Vós amaes a Deus, que é um Senhor tão grande, tão bom, que vos creou, que morreu por vós, etc.; e esle Deus vós o tendes o/fendido! Elle quer perdoar-vos, esperae que em nome do sangue de Je ­sus christo Elle üoí perdoará; mas i necessário que vos arre- pehdaes. Que dizeis? Arrependeis-vos agora de o ter o(fenf dido? etc. Sabeis bem que por estes ultrajes, que tendes feito a Deus, merecestes o inferno? Tendes pezar de o ter tratado deste modo? Nunca mais, etc. Imponde-lhes uma peniten­cia Uio leve como possivel, recomraendando-lhes que a cum­pram com a menor demora, de outra sorte elles se esquece­rão d’ella ou não a farão. Sobretudo tende cuidado de lhes inspirar devoção para com a Santissima Virgem, recitando o rosário e tres Avé-Marias de manhã e á noite com esta súp­plica : Minha boa Mãe, preservae-me do peccado mortal.

Coniinua- 20B. (S. Cahlos, pag. 22-24). — E pois um santo costume ção. 0 fazer vir perante o confessor os meninos e meninas um de­

pois do outro, ainda que sua idade não exceda cinco ou seis

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annos, a lira de que elles comecem côdo, que se instruam no conhecimento e se introduzam depois no uso do sacramento.Os confessores devem todavia acautclar-se dc dar a absolvi­ção sacramental áquelles nos quaes não notarem matéria nem um tão grande uso de razão, que se possam julgar capa­zes d’este sacramento. Tomarão tambem um cuidado parti­cular de instruir os meninos que tiverem tocado a idade de sete ou oito annos, segundo sua capacidade, da necessidade e da virtude d’este sacramento, e do modo por que devem apreseutar-sc a elle. Aquelle que ouve as conlissões dos me­ninos da idade dc dez a doze annos, os quaes elle conhece capazes dc poderem ser logo dispostos a receber a santissima communhão, deve fazer com que elles, por sua negligencia ou da dos paes e mães, não fiquem privados por mais tempo d’este thesouro espiritual. Mas elle os deve, o mais prompta­mente possivel, instruir das cousas neccssnrias para sc apro­ximarem ao Santissimo Sacramento, dos fructos admiraveis que sc tiram d’ellc, e com quanta humildade, reverencia e pureza de consciência sc deve receber; e depois de os ter confessado primeiramente tres ou quatro vezes, deve admi­nistrar-lhes a santa communhão, e dar-lhes um atlestado para mostrarem ao parocho, a fim de que sejam depois recebidos á communhão paschal, ou lhes dará um certificado de como el­les se acham instruidos e sulücientcmcntc dispostos para a receber, e os rcmetterá ao parocho.

206. (Vida db S. Filippe, liv. II, cap. vii.) — Persuadido de Modo dc os que a maior parte dos homens levam á sepultura os vicios de «parlar do sua mocidade, S. Filippe dc Neri tomava um cuidado parti- cular de converter para Deus os mancebos, ou de os manter na innocencia. Elle nada desprezava para ganhar sua amiza­de; sua felicidade era reccbel-os em sua casa; cntrctinha-se com elles em varias matérias, segundo a profissão de cada um; elle os conduzia a passeiar, obrigava-os a jogar algum iogo decente e conveniente: viu-se algumas vezes ser o santo homem quem principiava o jogo; retirava-sc depois a alguma distancia para ler e meditar. Se alguns não voltavam a con­fessar-se, elle punha tudo em exercicio para os trazer ao ca­minho do dever; elle os fazia advertir, elle orava e fazia orar para que elles recuperassem seu primeiro fervor. Quando elles voltavam, o santo tomava todo o cuidado possivel por ellès; mas cllc não ficava aqui, recommendava-os a algum de seus penitentes, cuja prudência e virtude conhecia, a fim de que vigiasse sobre elles e os apartasse de todas as compa­nhias perigosas. Quanto ao mais, sua paciência em suppor- tal-os era inexprimível. Um senhor de Roma, que ia muilas vezes visitar o santo, ouviu um dia os mancebos, que Filippe

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reunia em sua casa, fazer um lal barulho, que não pôde con­ter sua admiração. .Como, disse elle ao santo, podeis sup- porlar lodo esle tumullo? — Comlanlo que elles não olfendam a Deus, lhe respondeu rindo o venerável ancião, eu lhes per- mitliria que me rachassem lenha sobre as coslas.» Tanta bondade lhe ganhava o coração d’cstcs mancebos: elle tinha toda a sua conliança. Assim, um homem de qualidade, que em sua primeira mocidade linha freqüentado muilo o bom Padre, dizia um dia, com as lagrimas nos ollios, a um de seus amigos: «Quando eu era rapaz c me confessava ao Padre Filippe, nunca commcllia um pcccado mortal: mas, ah! ape­nas 0 deixei, comecei a vida licenciosa ein que vivi.»

Elle queria que os mancelios sc confessassem com fre- quencin; mas antes dc os admillir á communhão freqüente, esforçava-se por fazel-os humildes. Como direclor experimen­tado, sabia que 6 nos dias de communiião que o inimigo re­dobra de astúcia c multiplica as tentações. E ' a razão por que 09 advertia que se preparassem para o combate; elle acres­centava: «Aproximac-vos da sanla mesa com um grande de­sejo.. É a razão por que, quando lhe pediam pi-rmissão de commungar, lhes dizia: SUienles, silienles, venüe ad aquas. A liin dc excitar n’eilcs esta sòdc salutar, queria que lhe dissessem quatro ou cinco vezes anlicipadamcnle quando elles deviam commungar. Depois da communbão obrigava-os a fazer durante alguns dias certos excrcicios particulares, a fim de colherem proveito d’esle augusto sacramento, como de recitar o Pater e Avè com os braços estendidos, ou al­guma oulra oração que lhes ensinava. Para os apartar de lodo 0 perigo de impureza, lhes dizia que não estivessem só- sinhos depois de comerem, que não se retirassem logo, seja para ler, para escrever, ou pnra fazer oulra cousa em parti­cular; mas que ficassem em companhia e que conversassem com os outros. Prohibia-lhes igualmente lod 's os brincos de mãos. Gostava tambem que os irmãos não brincassem com as irmãs da mesma idade. A esle proposilo vou referir o caso seguiule: 0 Padre Velli, do Oratorio, confessava ura mancebo que tinha costume de folgar com suas irmãs. Fiel discípulo de Filippe dc Neri, esle confessor disse muitas ve­zes a seu joven penilenle, que o não tornasse a fazer; mas o mancebo, que era innocente, sc escandalisou de ouvir seu confessor repelir-lhe a mesma cousa. 0 Padre Velli o perce­beu, c um dia lhe disse: Vós não fazeis algum escrupulo d’isto, nâo? — Não, meu padre, nenhum escrupulo faço.— Ide ler com o padre Filippe, acrescentou o confessor, e per- gunlae-lbe o que elle pensa a este respeito.»

Foi, e Filippe tendo-o ouvido, lhe perguntou que andava

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elle estudando?— Logica, lhe respondeu o mancebo.— Pois bem, sabei, lhe dLsse o habil director, que o demonio é um habilissimo logico que ensina a fazer al)»tracções e a dizer mulher e não irmã. 0 mancebo licou convencido, e desde este momento deixou de folgar cora suas irmãs. E assim que, mestre experimentado, Filippe se mostrava severo quando se tratava de remover a occasião do peccado formal.

ARTIGO ICOM OS ADULTOS

207. (S. Licomo, n.® 88-81.)— Não pertence ao confessorcomaquel- deterininar a um mancebo o estado vilalicio que deve abra-Ics que co­çar; deveis regular-vos segundo os signaes de vocação queÇ*®") <1® elle vos apresenta, para lhe aconselhar aquelle para o qualpóde pensar prudentemente que Deus o chama. Se elle quer tazer-se religioso, sabei primeiro que tudo em qne ordem elle quer entrar; porque se a ordem é relaxado, vale mais, regra geral, que elle (ique no mundo. Entrando nessa religião, elle fará como os outros, e abandonará mesmo o pequeno bem que praticava anles: é o que acontece a um graude nu­mero. 0 confessor pois deve fazer escrupulo, priucipalmente se coopera por insinuação dos parentes, de lhe aconselhar que enlre em semelhantes communidades. Se a religião for regular e fervorosa, experimeutac bem a vocação de vosso penitenle, vôde se elle tem algum impedimento, pouca saude, poucos talentos, ou a pobreza de seus paes; examinae sobre­tudo se é boa sua intenção, como a de unir-se mais estreita­mente a Deus, reparar as desordens de sua vida passada, e pôr-se ao abrigo dos perigos do mundo. Se fo.sse mundana sua principal intenção, como de passar uma vida mais com- moda, ou de sair da condição dura de seus parentes, ou de condescendcr com seus paes, que o importunam, absten­de-vos de lhe permillir que vá avante, elle não lem uma verdadeira, vocação, elle sair-se-ba mal. Sendo bom o seu lim, e não tendo impedimento, nem vós nem oulra alguma pessoa, como diz S. Thomaz, (Quod. 3, art. 14} deveis nem podeis, sem peccado mortal, oppor-vos á sua vocação. Com­tudo, .será algumas vezes prudente retardar o cumprimento de seu projecto, a fim de o experimeular, principalmeute se souberdes que esle mancebo é inconstante, ou que formou sua resolução durante um retiro ou uma missão. N’eslas cir- ciimstanriãs formara-se muitas vezes bellas resoluções, que se desvanecem passado o primeiro fervor.

208.— Se ura mancebo tiver intenção de fazer-se sacer- conlinua-dote secular, não o auctoriseis senão depois de o ter por ção.

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muito tempo e devidamente experimentado debaixo da rela­ção da sciencia, da capacidade e da intenção. Os sacerdotes seculares têem as mesmas obrigações, (que digo eu?) maio­res obrigações do que os religiosos, e ficam todavia no meio dos perigos do mundo. Assim, para ser ura bom sacerdote secular, o que é raro (por nâo dizer rarissinio), é necessário ter passado uma vida muito regular, apartada dos prazeres, da ociosidade, das más companhias, e entregue á oração e frequencia dos sacramentos, mas quis cst hic, el taudabimus eum? Sem isto pôr-se-ha em estado quasi certo de condemna­ção, principalmente quando sc faz isto na intenção dc secun-

'dar as vistas de seus parentes, o adiantamento e apoio de sua familia. Acima, em o n.“ 176, vimos que os paes que forçam seus (ilhos a fazerem-se sacerdotes ou religiosos se tornara culpados de um peccado muito grande. Quanto aos raance- bo3 que querem consagrar sua virgindade a nosso Senhor, não lhes permittaes que façam voto de castidade perpetua, sem que estejam arreigndos na virtude, formados na prática da vida espiritual, e sobretudo muito íieis á oração. Para principiar, podeis permittir-lhes (|ue o façam por algum tem­po, como desde uma soleninidade a outra.

Continua- 209.— Passemos finalmonte aos mancebos que querem ou ção. que devem casar-se. Eu digo que devem, porque lenho expe­

rimentado que ha obrigação dc o fazer para aquelles que, es­tando entregues á incontinencia, não querem servir-se de outros meios de se conservarem castos. Da mesma sorle que os pae.s peccariam se os impedissem, sem justas razões, de contrahir um casamento conveniente, assim os filhos se tor­nariam culpados se quizesscm ca.sar-se com deshonra de sua familia: o confessor deve impedil-os d’isto; da mesma sorte tambem se o casamento nada liver de deshonroso, mas que elles queiram contrahil-o não obstante o desgosto e escan­dalo de seus parentes, sem ler alguma razão legitima que possa escusar sua conducla. Vôde a explicação de tudo isto na nossa Theologia, lib,. VI, n.®' 73 e 830; V. Conv.; n.® 849.

Comaqupl- 210. (Saceiidote santificado, n."* 48-77.) — 0 confessor les que só-severo trata os adultos virtuosos e habitualmente isentos de Sít'às vtí- mortal, mas culpados de muitas faltas leves, comoniacs são temos visto que se tratam os meninos. Não os absolve, por- culpados. que diz que não se arrependem de alguma d’estas faltas e

não sc emendam: mas se elles cáem em algum peccado mor­tal, se apressa a absolvel os, como se a malicia que faz com- meller uma falta grave facilitasse o arrependimento de uma falta mais considerável. Pelo contrario, o relaxado absolve todos estes penitentes sem alguma dilliculdade, dizendo que na verdade são sempre as mesmas faltas, mas que ellas não

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são morlaes. Quanto a vós, dae-lhes a absolvição, mas cora discrição. Com discrição, porque é muito de temer que el­les freqüentem o sacramento por habito, e o tornem niillo ou socrilego, quando, culpados de uma negligencia grave, ou advertindo que carecem de uma verdadeira contrição, se aproximam a elle sem as disposições necessárias. Comludo dae-lhes a absolvição, porque tendes um meio facil e prompto de assegurar, tanto quanlo é possivel, a validade e o fructo do sacramento, e deveis ler por maxima invaiiavel de nunca privar uma alma do grande nenelicio da absolvição senão por necessidade, ou por sun grande utilidade. Ora, aqui não ha necessidade, pois que o remedio eslá á vossa disposição. Consiste cm recommendar a estes penitentes que tenham cuidado, todas as vezes que vem ao sagrado tribunal, dc orar e humilbar-se, a lim de se arrependerem bem dc tudo, que façam recair principalmente sua contrição e seu lirme propo­sito sobre algum peccado particular, ou presente, ou passa­do, ou grave, ou mais notável entre os peccados veniaes vo­luntários, porque lhes é mais facil conceber o arrependimento necessário e cflicaz para assegurar ao menos sobre este pec­cado 0 valor do sacramento. Devem accusar esle peccado no íim da conlissão, cspecificando-o; por exemplo, uma grande murmurnção; ou, em geral: por exemplo, os pecca­dos notáveis contra a caridade e pureza, etc.; porque não é necessário explicar mais, se tudo isto lem sido já coufes-

É 0 partido que se deve tomar, primeiramente com as pes­soas, cujos peccados veniaes actuaes são pouco consideráveis, não sómente em razão da maleria, mas lambem da malicia; peccados antes feitos do que concebidos, peccados de um instante, cuja malicia por conseguinte dura pouco, interrom­pida como é pela subila cessação do mal; lal é, por exemplo, uma pequena curiosidade ou vaidade, uma curta impaciên­cia. Em segundo logar, com as pessoas, cujos peccados veniaes são pequenos em razão da malicia: por exemplo, uma mentira ofliciosa, mas estudada e preparada; uma impa­ciência leve, mas um tanto longa. Com elleito, a vontade mostra muila mais malicia na resistência reiterada aos re­morsos, cujo espinho se terá feito mais vezes sentir n’este longo inlervallo. É todavia verdade que se deve ser mais vigilante a respeito d'estas almas que recáem sempre n’estes notáveis peccados veniaes, e isto muito frequcalemenle, e se deve advcrtil-os que, não manifestando algum arrependi­mento eflicaz d’estas faltas, e não se emendando d’ellas de algum modo, não recebem o perdão recebendo a absolvição. Podeis algumas vezes ameaçai-os de lh’a recusar, a fim de os

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acordar, se comtudo elles se achara era estado de supportar este remedio. Se isto os lançasse em perturbação e acanha- menlo, restar-vos-hia um meio de assegurar a validade do sacramento, seria o fazer-lhes accusar alguma falta presente ou passada, de que têem um verdadeiro arrependimento, comtanto que nenhuma presumpção haja de que esta falta é um máu habito ainda vivo c não emendado.

Comaqucl- 211.— Praza a Deus que estes directores, que assim cslão les que são gos extremos, se tornassem ao menos uleis onde a necessi- de rallas maior, quero dizer, a respeito dos penitentes culpa- graves. dos de faltas graves. Mas é n’cstc caso que um é muito facil

e 0 oulro muito difficil em absolver, c que nenhum procura verdadeiramente o bem das almas e a gloria de Deus. Quanto a vós, tende como principio de conducia o exigir do penitente signaes de disposições sufficicntcs, para fundar ura juizo solido e prudente sobre sua contrição ncluni, c sobrc seu proposito cflicaz e sincero, ainda que commum e ordinário. Quando tendes de que formar um igual juizo, podeis e de­veis mesmo absolvel-o, excepto no caso de sua maior utili­dade; a razão é que lendo dn sua parte satisfeito a ludo, lauto pela accusação, como pela dor, tem direito aos fructos do sacramento. Se nâo tendes signaes sufficienles para for­mar este juizo prudente, não podeis absolvel-o emquanto as cousas permanecerem no mesmo ponto.

Trescoiisas 212.— Mas é n’islo que, reunindo todos os vossos cara- que se d c - e recordando-vos de todos os vossos devcrcs de pae, va™qua1idõ^® medico e de juiz, deveis considerar se a demora da absol- sc diucre a vição redundará in aedificalionem ou in deslructionem, in sa- absolvição./uí«m OU tn ruinam do penitenle. Se cntendeis que será tn

salutem, porque sua posição lhe permilte de voltar commo- damente a procurar-vos dentro de pouco lempo, lhe dilfcri- reis a absolvição. E esle o melhor meio para assegurar a va­lidade do sacramento e procurar o grande bem do culpado que lem necessidade de um vinho forle para expulsar o ve­neno do vicio. Ajiinlae-lhe todavia a ulil doçura do oleo, observando o que vou dizer-vos. 1.® Adoçae a demora, mos­trando-lhe que vos custa, mas que vosso dever e seu bem o exigem; que mesmo quando lhe dcsscis actualmente a absol­vição, elle não ficaria contente c consolado como o será quando voltar; 2.®, ensinae-Ibe a preparar-se melhor, pres­crevendo-lhe orações e boas obras analogas a suas necessida­des e a seu esUido; indicae-lhe as precauções para no inler- vallo não reincidir; e se elle tiver necessidade de uma con­fissão geral, dac-lhe o methodo abreviado c facil, exposto em 0 n.® 31; 3.°, recommcndac-lhe muilo que volte no dia em que ajustardes com elle, sendo possivel d’ahi a oito ou dez

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dias; acrescenlae que no caso de recair, não deixe nem dif- fira por islo de voltar no dia íixo; pelo contrario, é em tal caso que lem mais necessidade do medico; que assim não falte, que yós Ihc prodígalisarcis novos c mesmo maiores cuidados. É por esle modo que elle se retirará sem se vexar, nem entristecer, nem desanimar, mas instruido e animado a fazer tudo para receber o beneficio, que espera estar proxi­mo, da absolvição c dc sua reconciliação com Deus.

213.— Se prcverdes que a demora da absolvição deve ter Couiínua- um grande inconveniente cm virtude de sua posição, e queseja muito de temer que redunde in ruinam et destructio- nem, é em tal caso que o rigorismo ou a relaxação seria muito commodo para vós, mas funesto ao penitente. Digo commodo para vós. Com elTeito, o confessor relaxado se des­embaraça promptamente do trabalho de ajudar o penitente a arrepender-se, acreditando logo cm seus protestos de pezar, e absolvendo-o. Mais commodo vos seria ainda ser descon­fiado c severo. 0 confessor relaxado, querendo conceder a absolvição, diz poucas cousas, mas finalmente dá uma peni­tencia que póde ser salutar; suggcre algum bom pensamento que verdadeiramente não basta para converter o penitente, mas póde ajudal-o a recair menos vezes. 0 outro, pelo con­trario, decidido a não administrar o sacramento, não toma o trabalho de lhe dar conselhos e remedios, mas diz em poucas palavras: Não posso absolver-vos; ide; preparae-vos melhor, e vollae d'aqui a quinze dias ou um mez. Quem poderá dizer quão funesta é ao penitente uma lal conducta?

214.— Quando pois a prudência vos disser que dilTerir a Conünua- absolvição será in ruinam, tende cuidado em não desprezar 5*®- semelhante perigo. Ouvi a Igreja, que declara que todas as reservaçOes e censuras cessam no artigo de morte, porqueella.s n’eslas circumstancias seriam in ruinam, e não in cedi- ficationem. Ha mesmo bispos que, no receio que a reserva- çâo de seus casos possa algumas vezes ser nociva ao bem das almas, declarám que ella cessa em certos circumstancias cri­ticas, por e.xemplo, a respeito d’aquelle que deve casar-se em determinado dia, ou que vive em uma communidade d'onde não póde sair para se confessar sem occasionar admiração e escandalo. Em semelhante caso, nem a Igreja, nem vós mesmo podeis dispensar do que está prescripto pelo direito divino, quero dizer, dc uma sincera contrição, dc modo que possaes absolver aquelle que não a tem. Mas, penetrado de temor á visla dos males que ameaçam esta alma, não deveis nem absolvel-o logo, nem despedil-o immediatamente. De­veis demoral-o junto a vós, a (im de o dispor suflicientemenle bem para o absolver sem relaxação e sem rigorismo, conten-

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tando-vos com disposições reaes e eflicazes, sem exigir e sem confundir as disposições suflicientes e communs com as abun­dantes e exlraordinarias.

Continua- 215.— É pois em semelhante caso que serieis um pastor muilo mercenário, se deixasseis a ovelha defender-se sósinha contra os lobos; é n’islo que vossa caridade de pae deve fa- zer-vos um dever de tomar sobre vossas cosUs esla pobre enferma, segural-a com ambos os braços, e leval-a de algum modo com o geilo de medico e exaclidão de juiz; é n'isto que não basta ser um sapienlissimo moralista, é necessário ser um habilissimo ascético e um pae cheio de paciência para salvar a ovelha, e assim cumular de alegria o Pae celeste e lodo 0 paraiso, e enriquecer-vos de merecimentos.

Comaqucl- 216.— Mas para reduzir estas regras á prática, supponde les que nc-que chegam a vossos pés pessoas carregadas de faltas, com d^mom- press®' ® necessidade de serem absolvidas logo ou com pta absol-pç(]n(!na demora; por exemplo, é uma pessoa que deve cn- vição. sar-se em dia determinado, e que não o póde dilTerir, porque

todos os seus parentes estão convidados, etc.; ou é um sa­cerdote que, n’csta mesma manhã, deve dizer mis.sa a uma povoação que não lem oulro, e é um dia festivo; ou é um estrangeiro que parle no dia seguinte e não póde demorar-se sem perder tanto sua companhia, como a occasião de chegar a tempo onde seus interesses o chamam, ctc. Se os absolveis logo, a que perigos não expondes a validade do sacramento, que vós daes a pessoas que talvez por fraude vieram assim tão tarde? Sc os despedis, ah! quaulo não é de temer que vão, em estado de peccado aclual, ao matrimonio, á viagem! N ’este caso, vêde que .serie de crimes e de perigos; 1.“, para dous de entre elles, eis um sacrilégio; 2.®, para todos tres, quem sabe quando voltarão a confessar-se, e n’esle intervallo quantos novos peccados de lodo o genero? 3.®, que nova dif- íiculdade de se confessarem depois de tantos novos excessos I Mas, direis vós, que deixem seus empregos e seus negocios, que se demorem, que esperem seja a custo do que for, e sc preparem, a lim de melhor se confessarem. Mas quel Não vôdes que pnra isto c necessário um aclo heroico, e porlanlo uma graça muilo especial, e que não se obtem de repente? Ora, como farão elles para a obter, esles peccadores abando­nados a si mesmos, pois que logo os aparlaes de vós? Não seria melhor esperar e pedir a Deus uma graça singular, é verdade, porém menos extraordinaria, a graça do arrependi­mento actual, que, pondo-os em estado de serem absolvidos, os lira do embaraço? Sem dúvida é este o melhor partido. Esperae portanto em Deus, mas preparae-vos para o trabalho de plantar e regar bons sentimentos em seus corações, e es-

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perae que Deus dará o incremenlo. Em semelhantes casos lazci portanto como vou dizer-vos.

217.— 1.® Implorae dc todo o vosso coração o soccorro de Coniinua- Deus; 2.®, dissimulae ao penitente a vossa afllicção, c a in- o®®- quietação em que vos constituem semelhantes embaraços; occultae-a c oITerecei-a a Deus, que vos observa, a fim dc vos recompensar; 3.®, cnchei-vos dc compaixão por este enfermo;4.°, como um habil medico que, ein uma enfermidade cm que ha pericuium in mora, usa de remedios mais cllicazes e mais promptos do que em uma enfermidade menos urgente, sup- pri pelo fervor o tempo que escasseia, e começae voltando em vossa vantagem estas mesmas circumstancias que vos são contrarias; fallae ao penitenle pouco mais ou menos n’csle3 termos: «Oh! que bem tendes feito em confessar-vos, ao me- «nos hoje! Se ha uma conlissão que dc lodo o coração quei- «raes fazer boa, é esla. Que felicidade para vós, sc cntraes «no matrimonio, se vos pondes cm viagem, etc., com a graça «e benção de Deusl Pelo contrario, que bem sem Deus po- «dereis esperar? Que digo eu? quantos perigos para a alma «e para o corpo, se permaneceis em estado de peccado! Tende «muilo animo, dizei tudo: eu vos ajudarei.» E assim que começareis por assegurar a integridade da accusação. Quando ella estiver acabada, acrescentae: «Eis aqui agora o mais im- «porlanle, é a contrição: esperae-a com conliança, porque «não é em vào que Deus vos lem esperado e conduzido hoje «ao tribunal da reconciliação. E verdade que tendes neces- «sidade de uma graça extraordinaria, e vos tendes feito in- «digno delia por vossa demora e lalvez pela má intenção que «tendes lido vindo sómente hoje; mas não vos desanimeis;«ainda é lempo. EntreUinlo é justo que, para apasiguar a «Deus e obter sua assistência, useis dc todos os meios. Yós «usarieis d elles para salvar vosso corpo se caisseis em ura «rio; que não deveis fazer por vossa alma? Meu filho, Maria «é a Mãe dos peccadores que querem converter-se. Eu vos «dou uma hora, ide lançar-vns a seus pés, e pensac no que «vós quereis fazer, para que Ella vos obtenha a graça de ura «sincero arrependimento, e mc direis o que tiverdes esco- «Ihido, ou uma novena ou esmolas, elc. Rogae a Maria que «vos apresente ao Salvador, que vos ponha a seus pés, a lim «de que vos faça misericórdia. Fazei justiça a vós mesmo;«reflecti e argui a vós a enormidade de vossas faltas e o ul- «traje que tendes feito a Deus, retardando até esle momento;«fazei muitos actos de contrição, depois voltae, e acabarei «logo comvosco, e vos consolarei.»

218.— Para vos certificar de seu arrependimento, quando Continua- elle voltar, vêde o que proraelleu á Santa Virgem, e de Çã®-

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que modo empregou seu tempo. Espero «que achareis que elle fez maiores béns durante esta hora, do que faria durante uma semana; porque vós lhe tendes feito conhecer n impor­tância da contrição, assim como os meios de se excitar a ella, e 0 tendes animado pela promessa de uma próxima absolvi­ção. Ordinariamente o achareis muito dilTerente do que era antes, já não insensivel c atrevido, mas contrito, humilhado, docil e prompto a receber toda a especie de penitencia. Para vos certificar ainda mais de sua bon vontade, podeis dar-llie uma penitencia um tanto pesada, mas todavia tal, que o não aterre, e se elle a aceitar, como confessor discreto, diminui-a logo. Sua promplidão em accital-a vos tem feito obter o (im que vos propunheis, quero dizer, o conbecer sua boa von­tade. É assim que com a graça de Deus obtereis por estas pequenas industrias, que o Senhor sc dignará abençoar, signaes sulTicientes para formar um juizo prudente e se­guro. Agora eslá bem disposto. Vós portanto o absolvcis, e Deus, que por vossos cuidados terá outra vez achado cstc filho desencaminhado, saberá rccompensar-vos abundante; mente. Se vos restar ainda alguma dúvida, recorrei, comO» em 0 n.® 33 o dissemos, á oração com o penitente. Orae com fervor, c esperae com conliança que nosso Senhor cumprirá sua promessa: Que onde dous ou tres eslão reunidos em seu nome para orar, Elle eslá no meio d’elles para. os ouvir. Desta sorte podeis sem relaxação absolvel-o. Se apesar do tudo islo tendes ainda alguma inquietação, não já fundamen­tada e considerável, mas fraca, 6 o caso de vos recordar deste dito de S. Cbrysoslomo, que vale mais ler dc dar contas da muita misericórdia, do que do muilo rigor, e d’esle outro deS. Paulo: Oplabam enim ego ipse analhema esse a Christo pro fratribus meis. (Ad Rom., ix, 3.) Mas não teniaes, não sereis culpado diante de Deus, quando possaes dizer-lhe es­tas tres cousas: 1.°, Senhor, vós sabeis a razão por que o não despcço, riias o absolvo; 6 a (im de preservar esla alma de um grande numero de faltas, e a vós dc um grande numero de ultrajes; "2.®, sabeis como eu rae lenho conduzidoj^oâo me tenho poupado nem a oração, nem a cuidados; 3.®, iftsle sa­cramento me tendes feilo o ministro de vosso amor, c se vós me tendes feito tarabem ministro de vossa justiça, não é desta justiça vingadora que pune e que perde o impio, mas d’csL'1 justiça paterna que quer sua emenda c sua salvação. Nado temnes, tende confiança. Deus vos reconhecerá por seu liei ministro.

Continua- 219.— Se, apesar de todas as vossas industrias, o penitente se obstinasse evidentemente em não se arrepender, em não satisfazer a suas obrigações; inconsolável pelas desgraças que

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0 ameaçam e pelos futuras oITensas de Deus, passae aos últi­mos esforços. Offerecei-vos a Deus para fazer uma parte da penitencia com o culpado, ou promettei aignma cousa nolavel á Sania Virgem, a lim de que ella vos obtenha esla alma. Armae-vos depois de uma saula indignação, imiloe a phrase de Nalbiin a David, e, fingindo que o dcspedis, annunciae- Ihe, pinlae-lhe os castigos eternos que o esperam, e mesmo os lempornes dc que as almas obstinadas são mais locadas.Voltae depois ãs verdades consoladoras; fazei-lhe entrever mil bênçãos mesmo temporaes, se elle se render, a fim de o levar depois a obrar por motivos mais sublimes, e procurar ganha 1-0. Se o não conseguirdes, seja qnal for o vossa má- guo, despedi-o sem o absolver; dizei lhe entretanto que volte quando quizer, quando tiver concebido arrependimento. Re- tirae-vos depois para pedir a Deus que conduza esla alma em outro lempo, ou que a dirija a um ministro mais diguo, e que seja servido salval-a.

220. (S. Carlos, pag. 18-22 e 38-43.) — Se o penilenleCoraaqucl- se não acha em necessidade de receber uma prompta absol-<®s cpie se vição, lembrae-vos das regras seguintes. Os confessores não ^devem admiltir á conlissão aquelles que não se apresentam disposi- com a preparação exterior e interior que é necessaria, e os çõcsrc- exhorlarão o mais caritalivamenle que podérem, segundo o alcance do espirito de cada ura, a que vào preparar-se anles como dcvcni, e que voltem depois para se confessarem ('). acham em É a razão por que os confessores nunca devem receber á ncccssida- confissào mulheres que se apresentam com os cabellos frisa- dos (*), rosto caiado, brincos ou outros ornalos cheios de vai- prompta dade; nem lambem aquellas que trazem vestidos feitos de le- absolvi- cido de ouro, ornados dc rendas e dc bordados e de outros semelhantes excessos, e em uma palavra, não apparecendo grande modéstia e grande simplicidade em seus vestidos, não estando seus rostos com dcccocia cobertos com um véo que não seja notavelmente transparente, seja de fumo, de linha, de lã, ou pelo menos de algum tecido de seda de uma côr modesta, como é conveniente ao respeito que se deve ao sa­

(') Já nâo cslamos uo scculo dc S. Carlos, cm que ainda se confes­savam pcralmcnle. Vivemos cm um tempo cm que 0 rc.spcilo hu­mano, a avcrs;io pela conlissão 6 lal, que sc deve ícvar cm conia seu passo .áquelles que se apresentam ao santo Iribimal. Se, para sc pre­pararem, são despedidos, não ó para temer que não voltem, c não se­ria melhor, quando elles cslão aqui, procurar preparal-osV

(Nola do Iraductor francez.)(*) Outros tempos, outros costumes, üma parle dos impedimentos

designados aqui por S. Oarlos não passam boje por obstáculos ao sa­cramento: 6 facil ao confessor fazer a disliucção. (Idem.)

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cramento, e ao pensamento e contrição com que se devem apresentar no tribunal de Deus para Ibe pedir perdão e mi­sericórdia na qualidade de criminosas. Deve observar-se o mesmo a respeito dos bomens, não receber á confissão aquel­les que vierem cnleitados de ornnlos cheios de vaidade, de ouro, de prata, rendas e outras sumptuosidades; que se apre­sentarem outrosim com armas e cousas semelhantes. Mas procurarão com muilo mais cuidado a preparação interior, que é necessaria áquelles que se apresentam á este sacra­mento, a qual consiste em ter feito um exactissimo e dili­gente exame de seus peccados, ler concebido uma dor pro­porcionada á sua enormidade, com um lirme proposilo e uma resolução constante dc satisfazer pelos peccados que se com­melteram, e de sc emendarem pnra o futuro. É o motivo por que os confessores se esforçarão cm persuadir pela razão aquelles nos quaes notarem que esta preparação não existe, que se desviem para se prepararem dignamente. Os signaes para conhecer no principio se elles lêem esta preparação ne­cessaria, são: se elles se apresentam á conlissão acabando de deixar immedialamentc alguma occupação temporal, sem de­pois se terem entregado por algum tempo á oração; se se vè que elles não lêem algum conhecimento dc seus peccados; se 0 confessor sabe já que elles continuam sempre em exercicios iilicilos, ou que elles lêem em si algum peccado ou alguma occasião manifesta que n elle os conduza, sem ter intenção de sc tirar d’elln, ou sc, podendo restituir o alheio, não o fa­zem. 0 confessor deve todavia advertir que quando vê que os pcDÍleotcs lêem feilo de sun parte alguma ailigencia para se prepararem dignamente para a conlissão, e que não obs­tante, ou por sua incapacidade, ou por algum oulro motivo, não lhe parece que elles tenham as disposições nccessarias, deve supprir a islo, esforçando-se por cxcilal-os á contrição de .seus peccados, rcprcsenlando-lhes a enormidade d’elles, quanlo são dignos de castigo sendo commettidos contra Deus, e 0 infinito damno que elles causam, pois que por elles se in­corre na condemnação eterna; e com islo os deve inclinar e dispor de modo que pelo menos estejam lão pezarosos de lo­dos c de cada um de seus peccados morlaes, que os possa absolver com segurança de consciência. Além d’isto, deve ter cuidado de instruir os penitentes segundo a necessidade que tiverem, mas principalmente aquelles que só raras vezes se confessam, incuicando-lhes particularmente a imporlancia ^ue ha de a fazer inteira, e das oulras circumstancias que a

jquel- 221.— A bm dè que os confessores fiquem advertidos parale não que oão déem a graça da absolvição áquelles que são verda-

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deiramenle indignos d’ella, como acontece muitas vezes fa-sabem o zer-se, ou por inconsideração, ou por negligencia, ou porHucéne- alguma outra causa, d’onde frequentemente resulta que mui-“ ®®“ ‘ °‘ tos permaneçam por muito tempo nos mesmos peccados, com ruina deplorável de suas almas; por este motivo, consultando muitos theologos, seculares, e regulares de diversas congre­gações, temos especificado o que os confessores devem obser­var em alguns casos que mais ordinariamente acontecem.Portanto, quando se tratar de conceder ou de recusar a absol­vição nos casos seguintes, ficarão advertidos para se conduzi- renrdo modo que abaixo se prescreve.

E porque todos aquelles que tôem uso de razão são obri­gados, debaixo de pena de peccado mortal, a saber quaes são, ao menos em subsUincia, todos os artigos do Symbolo dos Apostolos que são ensinados pela Igreja, e os mandamentos de Deus e da Santa Igreja, que obrigam debaixo de peccado mortal, e que se ensinam ordinariamente nas escolas da dou­trina christã, 0 confessor tambem, achando que seu penitente Dão sabe estas cousas, e que não está disposto a aprendel-ss quanto antes, não o deve absolver. E quando mesmo elle testemunhasse querer-se instruir, se, tendo outra vez sido exhortado por seu confessor, ou o mesmo, ou um outro, ou em particular por seu parocho, do que deve ter cuidado de o interrogar, elle não tivesse entretanto feito a diligencia que teria devido para aprender eslns cousas, segundo o alcance de seu espirito, deve ainda dilTerir absolvcl-o, nlé que tenha satisfeito de algum modo a esta obrigação, mas não lendo sido advertido, lhe dará a absolvição, depois de Ibe ter dado as instrucções de todas as cousas que temos dito que Ibe se­rão necessárias para ser capaz de a receber.

222.— Achando o confessor paes dc familias que nenhum Com cuidado tôem de fazer aprender estas cou.sas áquelles que es-os paes c tão debaixo de seu governo, c que não as sabem, como a^Y®necU- seus filhos, ou a seus creados e creadas, sobre o que se lem-gentes em brarão os confessores de os interrogar particularmente, ouseusdevc- topando com alguns que tenham pouco cuidado de lhes fazer res. observar os mandamentos de Deus e da Igreja, ou, o que é muito peior, que os impedem de os observar, como são aquel­les que occupam Unlo seus creados c crendns, que de alguma sorte os põem na necessidade dc trabalhar nos dias festivos era seus proprios negocios, ou que não Ibes dão tempo dc poderem ouvir missa, em conformidade aos preceitos da Igreja; ou que, sem saberem quaes são aquelles de sua fami­lia que lêem legitimo impedimento de jejuar, lhes dão ou deixam dar a todos indilTerenlemonte ceia cm sua casa no tempo da Quaresma e em oulros dias de jejum, ou lhes dão

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0 jantar de manhã às mesmas horas, antes da hora ordinaria, ou que não os advertem ou castigam quando violarem os mandamentos, e que os não expulsam de sua casa quando são escandalosos c incorrigíveis: se em todos estes casos elles não promettcm de satisfazer elTectivamente a suas obriga­ções, e enicndareni-se da negligencia de que iCem usado na conducta de suas familias eni todos estes pontos, nâo os deve absolver. .Mas se elles pronieltem de o fazer, c que antes não tenham sido advertidos por seu confessor, ou por seu pa­rocho, como acabamos de dizer, os poderá absolver. Se mui­tas vezes tôem sido advertidos, sem comtudo se terem emen­dado de algum modo, deve dilTerir de lhes dar a absolvição alé que elles tenham começado e dado durante algum tempo provas e signaes verdadeiros de sua emenda.

Com as 223.— Deve observar o mesmo a respeito das pessoas que mulheres peccam mortalmente em pompas c ornatos supérfluos de

mundanas.gorpo g porque a suniptuosidade dos vestidos veio n’este tempo ao auge a que póde chegar, e aconteceu isto em parte por falta e por negligencia dos confessores que dão a absol­vição aos penitentes sem considerar cousa alguma, e talvez sem lhes fazerem mesmo conhecer que n’islo se compromotte sua consciência, especificaremos directamente aqui os casos cm que se pecca mortalmente no uso d’estas pompas, d’estas. magnilicencias e destes ornatos, a lim dc que os confessores, dando-lhes a absolvição, se conduzam segundo os conselhos

3ue acima temos dado. Todas as pessoas, pois, que se servem estas pompas e destes ornatos supérfluos para commetter

um peccado mortal, peccam morlalniente; ou quando osta es­pecie de ornato é causa de que ellas transgridam ou façam transgredir aos outros algum mandamento de Deus ou da Igreja, trabalhando por exemplo, ou fazendo trabalhar os ou­tros nos dias festivos, ficando sem missa, ou fazendo perdel-a aos outros para se ornar, ou sendo isto causa de que um ma­rido, ou alguma outra pessoa, que é obrigado a sustentar aquella que usa d’cstas magnilicencias, faça maiores despc- zas do que seus bens podem comportar, do que ella sabe ou deve razoavelmente saber, ou suspeitar provavelmente que nasçam odios e dissensõcs na familia, que istc mova o ma­rido, ou os outros que temos dito, a blasphemar o nome de Deus, a fazer lucros e contratos iilicitos, a cercear criminosa­mente as esmolas dc obrigação, a não cumprir os legados

Eos, ou outras dividas a que estão obrigados, a reter ou dif- rir os salarios devidos a operários, e a contrahir novas dí­

vidas que não possam depois pagar em seu tempo, o que frequentemente causa um damno considerável ao proximo; que elles não possam casar suas filhas quando chegam a idade

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nienles; e linalmente, quando nascera ou podem nascer para 0 futuro semelhantes peccados para aquelles que ordinaria­mente se vêem seguir estas pompas e estes soberbos orna- tos: ein todos estes casos é peccado mortal usar d’esla9 ma- gniliceucins e d’esla superOuidade de ornatos.

224.— E porque é quasi impossivel que uma pessoa, que Com ou- faz uma dcspeza que excede o alcance de seus bens, não co-J>os pení- nheça, ou não possa ou não deva conhecer que semelhantes peccados o são actualracnle, ou devem ser para o futuro causa d’elles, póde-se quasi geralmente julgar que eslas pes­soas se acham em peccado mortal, a não ser que pela exacta discussão que fará o confessor cora seu penitente, conheça com certeza o contrario por alguma razão particular. Uma pessoa pecca tambem mortalmente no modo de se enfeitar, ainda que o despeza que faz não exceda sua condição, nem seus bens; como se o enfeite de que se serve conduz de si á impureza, ou que sc interprete coramuramenle d’esle modo, ou ainda que dn si esle enfeite não conduza á impureza, a pessoa todavia que usa d’elle conjectura ou duvida com pro­babilidade que alguem será excitado a amal-n deshonesla- raenle, ou a eutreter-se no peccado por occasião deste or- nalo, que não é ordinário entre as pessoas de sua condição que gosam de estima, e não attende absolutamente, ou pelo menos muito pouco, á salvação da alma de seu proximo, que ella conhece estar em evidente perigo de perder-se por este ornato extraordinário era que ella persevera; como tambem quando esle ornato é feito com o designio de testemunhar as diversas paixões de um amor deshonesto, c para dar si­gnaes d’elle por vestidos dc dilTercutes córes ou por outros modos.

Os confessores devem tambem advertir que não podem dar a absolvição, não sómente áquelles que não lêem uma verda­deira e lirme resolução de deixar o peccado mortal, mas nem mesmo áquelles que, não obstante dizerem que se querem apartar d’elle, cerlilicara todavia que lhes parece que não o deixarão, se elles não querem receber os remedios sem os quaes o confessor julga que elles recairão no peccado.

223. (S. F hancisco de S alles, pag. 223 e 226.) — Da Continua- raesma sorte aquelles que estão com excommunhâo maior, c-ão.0 confessor não os póde absolver sem aucloridade do supe­rior, excepto não sendo ella reservada por este. Item, aquel­les que tèem algum peccado reservado ao papa ou ao bispo não podem ser absolvidos sem sua auctoridade. E portanto necessário remetlel-os áquelles que têem poder, ou então fa- zel-os esperar até que se lenha obtido, se facilmente podér

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ser. Item, os falsificadores, falsas testemunhas, usnrarios, usurpadores, os possuidores de bens, tilulos, direitos e hon­ras de outrem, e da mesma fórma os possuidores de legados pios, esmolas, prêmios, decinias, advogados iniquos, calu- mniadores, detraclores, e geralmente todos aquelles que tôem causado damno ao proximo, não podem ser absolvidos, se não fazem reparação da alfronta e damno pelo melhor modo que fazer se possa, ao menos que elles promettam elTectivamente satisfazer. Item, os casados que vivem em dissensão um com 0 outro, ou que não querem reciprocamente satisfazer os de­veres do matrimonio, não devem ser absolvidos emquanto perseveram nesta má vontade. Os ecclcsiasticos mal provi­dos eni seus bcneíicios, ou que sem dispensa legitima os têem inconipativeis, ou que não residem sem sufliciente desculpa, ou que costumam não recitar o Oflicio, e não vestir ecclesias- ticamente; todos estes não devem ser absolvidos, sem que promettam de pôr ordem a isto e dc emendar todos estes de­feitos. Item, os concubinarios, adúlteros e bebedos, não de­vem ser absolvidos, se elles não testemunharem um tão lirme proposito, não sómente de deixarem seus peccados, raas tam­bem de evitarem as occasiões delles, como são para os con­cubinarios e adúlteros as suas prostitutos, as quaes devem arredar de si; para os bebedos as tavernas; para os blasphe­madores os jogos; 0 que se entende (l’aquelles que são cos­tumados a taes peccados. Finalmente os bulhentos, que têem rancores e inimizades, não podem receber a absolvição, se não querem de sua parte reconcilior-se e perdoar a seus ini­migos.

Continua- 226.— Portanto, depois que o confessor tiver bem conhe- cido 0 esUdo da consciência do penitente, deve dispor e or­denar 0 que vô ser necessário para o tornar capaz da graça de Deus, tanto pelo que respeita á restituição da fazenda de outrem, como á reparação dos domnos e injurias que elle fez, como tambem o que diz respeito á emenda de sua vida e fu­gida ou remoção das occasiões. E quanlo ás reparações e restituições que sc devem fazer ao proximo, é necessário es- cogitar 0 meio, sc for possivel, dc as fazer secretamente, sem que 0 penitente possa ser dilTamado; c por consequencia, se for um furto, é necessário fazel-o restituir, ou cousa equiva­lente, por alguma pessoa discreta, que de modo nenhum no­meie nem descubra o reslituinte. Se for uran falsa accusação ou calurania, é necessário procurar habilmente que o peni­tente dê, sem manifeslar designio, contraria impressão áquel­les diaole de quem commellera a falta, dizendo o contrario do que tinha dito sem manifeslar outro designio. Mas pelo que pertence ás usuras, falsos processos, e oulros scmelhan-

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tes enredos de consciencio, é necessário ordenar as repara­ções com umn delicada prudência, da qual, não se arhaudo o. confessor suflicienlcmeule provido, deve com doçura pedir ao penitente algum tempo para pensar n’isto, depois diri­gir-se ao mais douto, como sãe os deputados terriloriaes, os quaes, se o caso o merecer, tomarão nosso conselho ou de nosso vigário geral. Mas, sobre todas as cousas. é necessário cuidado que aquelles de quem sc busca o conselho não pos­sam de modo algum conhecer ou adivinhar quem seja o pe­nitente, a uão ser por licença muilo expressa, e ainda se não deve fazer com sua licença, a não ser por uma grande neces­sidade, e que elle peça isto ao confessor fóra c depois da confissão.

227.— Os casos reservados a sua Santidade são em muiloComaquel- grande numero; mas são todavia a maior parte taes, que p a r a que têm cá dos montes quasi não acontecem, e quanlo áquelles que podem acontecer, não são em grande numero. Ha cinco, fóra 03 da bulia In cama Domini: 1.°, malnr ou ferir gravemente uma pessoa ecciesiaslicn, por malicia ou voluntariumcnle: eu disse gravemente, porque, quando o ferimento é leve e o mal de pouca imporlancia, póde ser absolvido pelo bispo; excepto se 0 ferimento, sendo leve de si mesmo, fosse muito escanda­loso, como por exemplo, sendo feito a um sacerdote no acto de celebrar, ou em um logar c companhia dc grande re-cpeilo e considerável; 2.°, a simonia e confidencia real; 3.°, o pec­cado de duello n’aquelle; que chamam, que provocam, e que fazem o combalc ( ‘); 4.°, os violadores da clausura dos mos­teiros de religiosas clausuradas, quando esla violação se faz com máu fim; B.®, a violação das immunidades da Igreja; o qual caso quinto sendo dillicil de discernir, e não acontecendo senão raras vezes, e sempre por actos públicos, quasi sc não decide na confissão, anles que lenha sido decidido fóra d elia pelos bispos ou seus vigários, üs casos da bulIa In cana Do­mini que podem acontecer são lambem em pequeno numero;6.®, a heresia, o scisraa, ler c ler livros herelicos; o falsifi­cação das bulias e letras aposlolicas; 7.®, a violação das li­berdades e privilégios da Igreja, bens e pessoas ccclesiasti- cas, que se faz voluntariamente; a usurpação dos bens dos ecciesiaslicos, emquanto ecciesiaslicos. Para todos estes ca­sos reservados deveis observar duas regras: 1.®, consolar os penitentes que os tiverem commellido, e não os desesperar, assim mandal-03 com doçura áquelles a quem temos dado o poder, 03 quaes são em grande numero em todos os logares

(1) Em muitas dioceses de França o duello não é reservado ao Papa.(Nota do iraductor portuguez.)

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de nossa diocese ( ‘]. Porque, ainda que elles não possam absolver dos casos reservados ao Papa, se o for, elles todavia lhe darão sempre traça para obterem a absolvição; 2.®, em caso de extrema necessidade, em artigo de morte, todo o sa­cerdote, ainda qne não seja approvado, dc qualquer sorte ou qualidade que seja, póde e deve absolver de todo o peccado geralmente. Mesmo aquelle que estando doente pedir con­fessor, se depois d’isto perder a falia e não podér dar algum signal. deve ser absolvido sobre o simples desejo que teve de se confessar. E, além d’este, deve absolver-se aquelle que, não tendo pedido confessor, vendo-o todavia e ouvindo-o, dá signal de querer a absolvição.

Cornos 228. (S. Liconio, n.°* 78-8o, e 92-93.) — Se o penitente “ Isuo’® censura ou caso reservado de que não tenhaes

IcsquctémP®**®'’ absolver, já vos disse que era um acto de caridade alguraadc-o recorrerdes vós mesmo ao bispo que póde absolver de to- nuncia a dos OS casos papaes occultos, e mesmo delegar este poder.

razcr. Devem-se exceptuar comtudo os casos especialmente reser­vados á Santa Sé, menos se o penitente não podér ir a Roma. E tambem um acto de caridade o escrever á Penitenciaria se 0 caso for papal, sobretudo se for occulto, a lim de obter a faculdade de absolver d’elle. Quanto ao modo de escrever á Penitenciaria, eu vol-o indicarei mais adiante, n.® 231. Eu me coütento de vos recordar aqui que atiuelle que não co­nhece a censura papal, não incorre igualmente no caso pa­pal, porque os casos papaes são reservados, principalmentepor causa da censura, o que não é o mesmo nos casos epis-copaes, nos quaes a ignorancia da censura não impede de incorrer, porque os bispos reservam pi iui'ipalmente os casos. Isto tem logar quando mesmo sc ignora a rescrvacão do caso, assim como o temos estabelecido. (Lib. VI, n.»* 380 e 581.) Mas a ignorancia invcncivcl impede de incorrer em censura alguma. (Lib. V II, n.® 43.) Notae além d’isto, que uma conlissão sncrilcga, feita durante o jubileu, não lira a reservação. É um ponto estabelecido, principalmente pela declaração de nosso Soberano Pontiiice Bento X IV. (Lib. VI, n.® B17‘, q. 11.) Nó.< temos sustentado que é o mesmo quando a conlissão do jubileu for invalida. (Ib.; V. S i aut.) Mas se fóra do jubileu um penitente se tivesse confessado invalida­mente a um confessor munido do poder de absolver os casos reservados, o sentimento commum e mais provável quer quo elle seja livre da reservação. 0 mesmo é, segundo o senti­mento mais commum e sulBcientemente provável, quando

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mesmo n confissão tivesse sido sacrílega, excepto se o peni­tente tivesse occultado por sua fnlln o peccado particular, objecto da reservarão. (Lib. VI, n.® 598, q. 4.)

229.— 0 confessor deve saber que é obrigado, debaixo de Continua- falta grave, a impor ao penitenle n obrigação de denunciar nos superiores aquelle que emilliu seriamente alguma propo­sição ou blasphcmia hcrelica, com erro de espirito e obstina­ção, e não por ignorancia, negligencia, aut lapsum lingua; porque, neste caso, basta que o penitenle o advirta de seu erro. (Lib. V II, n.® 254.) Prmterea debet imponere mulieri­bus aut pueris ut denuncient confessarios, qui eos solicita- verint ad turpia, vel cum eis inhonestos traclalus habuerint.Vôde 0 livro onde nós temos tratado esla matéria miuda- mente. (Lib. VI, ex n.® 67o.) Mas na prática deveis notar:1.®, que cm maleria de solicitação não deveis precipitar vo.sso juizo e impor ao penitenle a obrigação de denunciar, porque 0 não deveis obrigar n isto, na dúvida se é ou não uma ver­dadeira solicitação (ib., 702); excepto no caso cm que as pa­lavras e os actos importando dc si mesmos a solicitação, não houvesse dúvida senão sobre a intenção do solicilonle; ou tambem se houvesse violentos indicios, ainda que não evi­dentes, da solicitação, sem indicio do contrario; n’csle caso dão estes indicios nlé certo ponto umn certeza moral (ib.;V. Excip.y, 2.®, que não deveis facilmente encarregar-vos de fazer a denuncia, a não ser cm alguns casos raros, e por ca­ridade, por causa dn difliculdade que experimentaria o pe­nitente em comparecer elle mesmo perante os superiores;3.®, que não deveis jámais deixar de impor no penitente so­licitado a obrigação de denunciar, quando mesmo prcvisseis que elle o não cumprirá ('). Com crfcito, o Soberano Pontilice acrescenta direclaiuentc ao confessor que imponha esla obri­gação ao penitenle. (Lib. VI, n.® 674.) Assim, emquanto este a não cumpre, convem dilTerir-Ibe a absolvição. Se o confessor tem razões para pensar que elle com difliculdade a cumprirá, deve absolutamente diíferir o absolvel-o. Mas póde absolvel-o se o penitenle, presentemente impedido, está re­solvido a denunciar logo que o possa commodamentc. (Ib., n.® 693.) Estas denuncias devem fazer-se o mais tardar no espaço de um nicz. (Ib., n.® 491.) Notae tambem que nosso santo Padre Bento X IV ordena que se denuncie o confessor que tiver obrigado ura penitenle a revelar o seu cúmplice, excepto se o tiver feito por mera simplicidade ou imprudcn-

(') Póde haver uma obrigação de direito natural em fazer as de­nuncias determinadas nVste numero. Quanto à obrigação de direito ecciesiastico, o confessor sc conformará com a disciplina da sua dio­cese. ( m a do traductoT portugMz.)

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cia. Finalmente, quanto aos sortilégios feitos por leigos, eu vos faço observar qoe hoje eni iiosso reino de Nápoles, por insinuação do nosso rei Carlos II I , que Deus guarde, não ha obrigação de os denunciar, excepto quando ha abuso da Santa Eucbarislia, ou do oleo consagrado (').

Comaqiiel- 230.— Quando o penitente tem algum impedimento e não IcsqueiÇmestá ainda contrahido o matrimonio, ha muilas cousas a dis-

n">n(os tin;?»''': sc o impedimento é de consangüinidade, ou de pa- mairimó- rentesco espiritual, ou de affinidade per copulam licitam até

niaes. ao quarto gráu, ou de honestidade pública, qunndo mesmo fosse occulla, o confessor deve obrigar o penitente a revelar 0 impedimento ou a obter a dispensa da Dataria. Se o impe­dimento for de nflinidnde per copulam illicilam com uma pa- reuia da futura esposa alé ao segundo gráu, wodo «d/uení copula consummata cum seminalione perfecta; ou de crime, quero dizer, proveniente do bomicidio do esposo planisado por ambos, ou dc bomicidio com adultério, ou de adultério com promessa ou tentativa de casamento, assim como o lemos explicado; em todos estes casos, quando o impedimento é occullo. da Penilcnriaria se deve obter a dispensa. (Lib. VI, n.“‘ 103(), 1073 e 133.) 0'niesmo é se o penitente tem im­pedimento de voto de castidade ou de religião. Todavia se, em alguns casos raros, houvesse uma razão urgentíssima,como de escandalo, de rixa, ou de perigo inenle dc in-famia, e que não houvesse tempo ou meio de recorrer á Peni­tenciaria, 0 bispo poderia dispensar (n.®112); não havendo mesmo meio de recorrer ao bispo, vôde o que em outra parte dissemos (-).

(') As bullas «los Soberanos 1’onlillcos n-lalivas a esta maleria, não se tendo publicado em toda a parte, cada um sc deve eonrormar com a prálica dc sua diocese no que respeita á obrigaípio de direito ccclc- siaslii-o. .Mas nas dioceses me.smas onde ncniiuma lei ccclesiastica mandar a denuncia, podc-sc cslar obri-ado a ella por direito natural.

(Nota do Iradnctor portuguez-)(*) N.« G13. y. Sed Mc. Kis aqui a opinião rrrerida polo Sámo Di

íírqiiõd0 modo

cesset linis legis in communi; sed in parliculari, cum tamen cessat 11- nis legis in cónlrarium, lex etiam ccssat, ut omnes conveniunt cum Salni., de Leg., cap. iv, n." 0. Nolant tamen prmlali auctores, quod esto tone permiltatur conlralii matrimonium, lamen quantocius (sol­tem ad majorem securitatem, et ad salvandum rcverenliam legibos Ecclcsiai dcbilaml recurri debet ad Sacram Panitenliariam, utab illa

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231.— Se 0 penilenle liver já contrahido iim matrimonio Conünna- nullo em razão de um impedimento dirimcnte, provém este Ção. impedimento ex copula licita? vôde o que em outro logar dissemos (lib. VI, n.” 1147); si ex illicila, ou de crime, eque 0 pcniteute esteja na boa fé e que boja perigo de morte, de escandalo, ou de incontinencia, fazendo se-Ibe conhecer o impedimento, n’este caso o confessor deve calar-se, e no en­tanto pedir dispensa á Penitenciaria. Tendo-a obtido, deve descobrir o impedimento e tambem indicar o modo de reva­lidar 0 matrimonio. Para isto, assim como o temos provado, a assistência do parocho c das testemunhas não 6 necessaria.(II)., n.® 1100.) Mas, segundo 0 que nós temos dito (n.“ l l l ; ) ) , a parte que conhece o iiiipedimento é obrigada a manifestar á outra a nullidndc do matrimonio: é esta uma clausula or­dinaria da Penitenciaria: Ut dicla muliere de m llila lc prio- ris consensus certiorala, etc. É por isto que em geral não basta dizer, como pensam alguns doutores: Se me não lices- seis recebido por vossa esposa, receber-me-hieis agora? o ü : Dizei-me: En vos recebo; ou: Para minha consolação reno­vemos nosso consentimento; porque um lal conseniimenlo é sempre dependente do primeiro, que é nullo. A acção do ma­trimônio igualmente não hasta, etiam a/feclu marilali habita; mas hasta dizer: Nosso matrimonio foi nullo por uma certa razão, pois não se está ohrigado a manifestar a nalureza do impedimento. Renovemos nosso consentimento-, ou lambem:Duvido da validade do nosso matrimonio, etc. Com elíeilo, n’esle caso o consentimento que se dá é independente do primeiro. Mas, Icmendo-se cum fundamento que esles meios descubram a fulla, c resulte perigo de rixa, de infamia, ou de escandalo, c, por oulro lado, a parle instruida do impedi­mento não possa eximir-se de pagar o debito, hasta lhe, obtida a dispensa, fazer uso de algum dos modos primeira­mente indicados. Basta-lhe mesmo que dô só ella seu con­sentimento, porque em igual necessidade póde seguir a opi­nião de que seu consenlimcDlo se une para tornar válido o matrimonio, ao consentimento dado no principio pela parte ignorante, consentimento que subsiste virlualiler pela conti­nuação do uso do matrimonio e da cohabitação. (Lib. VI, n.» 1115.)

232.— Se 0 penitente estiver ligado pelo impedimento ad ConUnu.')- non petendum debitum causa copulce habites cum consanguinea Ção-in secundo gradu sues uxoris, deverá ser d’elle dispensado ou pela Penitenciaria, ou pelo bispo, ou por um confessor re­gular, que lenha recebido de seu superior esta faculdade.(Ib., 1076; V. ínsup.) Se o penilenle não conhece a lei ec- clesiastica, que de concerto com a lei divina prohibe um se-

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melhnnte incesto, não cáe no impedimento. (N .“ 1072.) Ainda mais, se elle conhece a lei, mas ignora esla pena, é provável que não incorre n’ella (n.° 1074): ao menos não se deve tiral-o de sua boa fé, se houver perigo de iucontinen- cia. Aqui damos as fórmulas das letras para obter da Peni­tenciaria a dispensa dos impedimentos dos votos e das irre­gularidades. Quaudo se tratar dos impedimentos matrimo- niaes, eis aqui o teor da carta:

Eminentissime el Eeverendissime Domine:y . N. rem habuit cum quadam muliere, el postea sponsa­

lia conlraxit cum ejus sorore, impedimentum esl occullum, et si conjugium non fierit, plura evenirení scandala. Supplicat ideo Eminenliam V. ut dignetur ei dispensalioncm concedere. Favebit rcsponsum miltere (indica-se o nome dn terra) ad N. N . (aqui se expressa o nome e sobrenome) confessariam approbatum. Estando já feito o casamento, póde escrever-se d esle modo: N. N. ignarus (aut concius) impedimenti ma­trimonium contraxit cum aliqua fcmina, cujus malrem (aut sororem) prius carnaliler coqnoverat. Ideo, cum impedimen­tum sit occullum, ct non possit separalio sine scandalo fieri, supplicat Eminent. V. pro absolutione et dispensatione.

Para os votos dc castidade: N. N. votum emisit castitatis sed nunc est in gravi et imminenti periculo inconlinenlia; ideo supplicat Eminent. V. ut dispensare dignetur in dicto voto, ut possit orator matrimonium inire. Notae que, para dispensar do voto de castidade, não basta um perigo ordiná­rio de inconlinencia; é necessário um perigo grave e immi- nente, como o damos a entender.

Para a irregularidade: N. N . sacerdos contraxit irregula- ritatem causa homicidii (aut violationis censurce, etc.); et cum adsit pericuium infamia;, si abslinel a celebrando, ideo supplicat, etc.

ISO sobrescripto se põe: Eminenlissimo et Eeverendissimo Domino colendissimo Domino Cardinali Pcenilentiario Ma- jo ri.

Romam.

0 confessor encarregado da execução da dispensa, depois de ter dado a absolvição sacramental, póde, para dispensar, servir-se da fórmula seguinte: E t insuper auctoritate apos­tólica mihi concessa dispenso tecum super impedimento primi (seu secundi, seu primi et secundi) gradus proveniente ex.co- pula illicita, a te habita cum soróre muUeris cum qua eon- traxisti (aut contrahere intendis), ut matrimonium rum illa rursus contrahere possis, renovato consensu; et prolem, si

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quam suscipies (vel suscepisti) legitimam declaro. In nomine Patris, etc. Se dispensar do volo de castidade, d irá: Insu­per Ubi votum castüatis quod emisisli, ut valeas mairimo- nium conlrahere, et illo ulx, in opera qua tibi praiscripsi dis­pensando commuto. In nomine, etc. Se o penitente, não ob­stante 0 voto de castidade, tiver contrahido malrimonio, dirá: Item non obstante caslitatis voto quod emisisti, in matrimo­nio remanere, et debitum conjugale exigere possis, auctoritate apostolica tecum dispenso. In nomine, etc.

Agora, para saber qonndo a Penitenciaria póde absolver, dispensar, etc., dos casos pnpaes, censuras, votos, irregula­ridades, juramentos, restituições incertas, vôde nossa Theo­logia grande. (Lib. V II, n.® 470.) Quando póde ella dispen­sar dos impedimentos matrimoniaes, vôde a mesma obra. (Lib. VI, n.® 1144.)

COM AQUELLES QUE SE ACII.AM EM CERTOS CASOS MAIS DIFITCEIS233.— Os doutores assignam muilas regras para a condu-Comos

cta dos escrupulosos; mas é certo que, depois da oração, ocrupulo' melhor c mesmo o unico remedio para os curar é a obedien­cia ao confessor. Esforçae-vos portanto, primeiro qoe tudo, por inculcar muilo ao escrupuloso duas maximas fundamen- taes: a primeira, que elle procede com segurança aos olhos de Deus, obedecendo n seu pae espiritual, todas as vezes que n’islo não ha peccado evidente. Com elTeito, não é ao homem

3UC elle obedece, mas a Deus mesmo, que disse: Qui vos au- it, me audit. Tal é a doutrina de todos os lheologos e de

todos os mestres da vida espiritual, apoiados sobre a auctori- dadc dc S. Dcrnardo, Santo Antonino, S. Francisco de Sal­les, S. Filippe de Neri, Santa Thereza, S. João da Cruz,Santo Ignacio de Loyola, do bemavenlurado Humberto, do venerável Padre Mestre Avila, do grande Gerson, etc. A se­gunda, que seu maior escrupulo deve ser dc não obedecer, em razão do grande perigo a que se expõe de perder não sómente a paz, a devoção, e o zelo por se adiantar na vir­tude, mas tómbem o juizo, a saude e mesmo sua alma. Os escrupulos podem chegar a ponto de o reduzir a suicidar-se, como tem acontecido a muitos, ou abandonar-se á torrente do vicio. Demais, fazei entender ao escrupuloso, como muito bem diz o erudito auctor da Inslrucção para os novos confes­sores (parle 1.*, n.® 76), que com Deus não se deve querer fazer contas com a penna na mão. 0 Senhor quer, para nosso maior bem, que vivamos na incerteza de nossa salvação. As­sim, quando fazemos o que nos é moralmente possivel para

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não 0 olfendcr, devemos abandonar-nos á sua misericórdia, e, reconhecendo bem que não podemos salvar-nos sem o soc­corro da graça, devemos sempre pedir-lh’a com perseve­rança, conliança e tranquillidade. 0 melhor, dizia S. Fran­cisco de Salles, é caminhar ás cegas debaixo da conducta da divina Providencia, no meio das irevas e perplexidades d’esta vida. Deve conlenlar-se de saber de seu pae espiritual que procede bem. sem procurar ver isto. Nunca erra aquelle que obedece. Aquelle que obedece a seu confessor, dizia em seu lurno S. Filippe de Neri, está seguro de não dar contas a Deus de suas acções. Pelo contrario, dizia S. João da Cruz, nâo se tranquiltisar sobre o que diz o confessor, é orgulho e falta de fé.

Quando o IV i .— Depois tereis cuidado: 1.® De fallar com frequen- escrupulo cia ao escrupuloso, da grande conliança que devemos ler em objficioos"®®®® Senhor Jesus Christo, morto para nos salvar, e em sua mauspcn-M<ãe Santissima, tão poderosa e tão hoa para aquelles que a samernos. invocam. Assim o exhortareis a viver tranquillo, comtanto

que recorra a Jesus e a .Maria. 2.® Prohibi lhc a leitura de obras próprias a suscitar o escrupulo, c a conversação com pes­soas escrupulosas. Se for excc.ssivamenle atormentado, che- gae alé a prohibir-lhe que assista a sermões cm que sc trate das verdades tcrrivcis, c que examine sua cousciencia sobre as cousas que lhe occasionam escrupulos mal fundados. 3.® Se 0 escrupulo consiste no receio dc consentir em máus pen­samentos, por exemplo, contra a fé, pureza ou caridade, de­veis, vós 0 confessor, passar com liberdade c afoutamente sobre tudo isto, e dizer-lhe que estes pensamentos são tenta­ções e penas, mas que não ha consentimento nem peccado nelias. E n’islo principalmente que deveis fazer uso d’esta regra dada pelos doutores, que, quando o penitente é uma pessoa que lem temor dc Deus, persona timoratw conscien- lice, se 0 peccado mortal não for mais do que certo, decidi

Sue nâo leve logar. (Lib. VI, n.® 476.) Com elTeito, diz o adrc Alvarez, não é possivel que um igual monstro entre

em uma alma que lhe lem horror, sem que elln o conheça claramente. Convem mesmo algumas vezes prohibir aos es­crupulosos que se accusem de semelhantes peccados, excepto sabendo com certeza e podendo dar juramento de que con­sentiram n’elles. Adverti que não é por meio dc regras par­ticulares, mas geraes, que se deve conduzir o escrupuloso. Com regras particulares os escrupulosos nunca podem deci­dir se; duvidam sempre sc tal regra particular é appiicavel ao caso aclual, sempre dilTerente a seus olhos do caso sup­posto pelo conTessor.

Quando 233.— Quanto aos escrupulosos que se atormentam sohre

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suas confissões passadas, quero dizer, que temem não terem objccio a explicado todos os seus peccados ou suas circumstancias, ou confi- sõc não terem tido a contrição necessaria, quando depois elles P®®-''®'*®®- tôem feito uma conlissão geral, c por um tempo notável tôem repetido as cousas da vida passada, deveis proliihir lhes que jámais pensem n’isto de proposilo deliberado, e destes pec­cados passados se confessem, excepto ppdendo fazer um ju­ramento que foram certamente peccados mortaes e além d’isto que estão certos de que nunca os confessaram. Com elTeito, 03 doutores ensinam (lib. I. n.® 87) que, no caso mesmo que tivessem por inadverlencia esquecido algum pec­cado mortal, os escrupulosos não são obrigados, ao menos quando não estão certos d’islo, sub tanto inoommodo et peri­culo, á integridade da conlissão. da qual um inconveniente menos grave póde dispensar. (Lib. VI, n.° 488.) N’esle ponto sede lirme em fazer-vos obedecer. Não obedecendo o peni­tente, rcprchendei-o fortemente, lirae-lbe a comiminbão e morlilicac-o o mais.que podérdes. üs escrupulo.«os devem ser tratados com grande severidade, porque, sc perdem a ancora da obediencia, eslão perdidos: ou endoudccem, ou se precipitam na desordem.

236.— Outros ha que temem peccar em todas ás suas Quando acções. A estes deve-se determinar que obrem com liberdade •á''.'!’ , P®’’ e que passem por cima de seus escrupulos; são mesmo obri-gados a isto todas as vezes que não vôem com evidencia que presentes, tal acção seja peccado. É esta a doutrina dos doutores. (Lib.I, n.® 86, e P. Segneri, cap. iill.) Pouco imporia que obrem com temor aclual, quero dizer, sem depor seu escrupulo, o que quasi nunca se deve esperar dos escrupulosos, porque um semelhante temor não é um verdadeiro diclamen da con­sciência, ou uma consciência formada segundo a joJiciosa distincção de Gerson [Dict., n.° 86), nem uma verdadeira dúvida prática. Ella igualmente não destroe o juizo previa­mente feito, e que persevera virtualmente, ainda que o te­mor impeça dc Ibe dar altenção. Ora este juizo eil-o aqui: que fazendo uma acção qualquer, que não conhecem com cer­teza ser má, não peccam. Com cITeiio, n'esle caso não obrara contra a consciência, mas contra um vão temor. (Lib. I, n.” 76; V. Jlinc duo.) Portanto mandareis ao penitente d’este caracter que despreze c vença o escrupulo, fazendo afoula- menlc o que o escrupulo Ibe prohibe: além d isto lhe prohi- bireis que em suas conlissões jámais falle n’islo.

237. (Vida de S. Filippe, liv. I, cap. xx.) — Aquelles que\obcdion- qucrem adiantar-se na perfeição, dizia S. Filippe dc Neri,devem entregar-se inteiramente e sem reserva nas mãos dos g.YrlIro pa- superiores. Aquelles que não vivem debaixo da obediencia ra” os es­

crupulosos

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de uma regra devem submetter-se voluntariamente a um douto e sabio couressor c obedecer-lhe como a Deus mesmo; descobrir-lhe com liberdade e simplicidade todos os seus ne­gocios e não lomar alguma determinação sem seu conselho. Todo aquelle que obra d este modo, acrescentava elle, está seguro de não dar contas a Deus de suas acções. Elle dizia comtudo, que anles. dc escolher um confessor era necessário pensar n’isto maduramente e recorrer á oração; mas uma vez escolhido, elle não queria que o deixassem sem razões muito fortes; que se tivesse n’elle uma inteira confiança, coníiando- Ihe até os menores negocios, porque o Senbor rião poderia permillir que elle se engane em cousa alguma que respeite á salvação da alma. Quando o demonio, continuava o Santo, não póde fazer cair uma pessoa em grandes peccados, em­prega todas as suas astúcias para pôr a desconliança entre o penitente e o confessor; por este meio vem pouco a pouco a fazer os maiores males. Elle dizia lambem que a obediencia é 0 caminho direito para chegar promptamente á perfeição. Elle estimava muilo mais umn pessoa que passava uma vida ordinaria obedecendo, do que aquella que fazia grandes pe­nitencias não seguindo mais qne sua própria vontade; e dizia que nada havia mais perigoso na vida espiritual do que que­rer conduzir-se por seu proprio juizo; emquanto que nada assegurava melhor as nossas acções e frustrava melhor as as­túcias do inimigo, do que fazer a vontade de outrem na prá­tica do bem. A obediencia, repetia elle finalmente, a obe­diencia, eis aqui o verdadeiro holocausto que devemos oITe- recer a Deus no altar de nosso coração.

Coma.snl- 238. (S. Fhancisco df. Salles, tom. II, pag. 633.) — Al­mas timo-rnns ha n qiiem Deus chama a uma maior perfeição. A me-

nor apparencia do mal sobresalta sua consciência limorala. Freqüentes vezes recorrem a seus confessores para obter d’elles conselhos e soluções que as Iranquillisem: esta parle da direcção, que não é a menos diflicil, é o triunipho deS. Francisco de Salles. Aprovcilcmos-nos dos preciosos con­selhos que nos deixou. Eis aqui a.s respostas que elle dirige a uma alma limorala, cuja perfeição lhe era bem cara: «Meu conselho cifra-se cm duas cousas: 1 ", fazei uma revista geral dc tbda a vossa vida, para fazer umn penitencia geral; é uma cousa sem a qual nenhum homem honrado deve morrer; 2.", procurae pouco a pouco desprender-vos das alTeiçõcs do mundo. Para isto é necessário, não inteiramente cortar os laços de ailiaiiça auc nos prendem aos negocios do mundo, mas descosel-üs e desatal-os.

«E uma caridade indispensável que vós deveis encami­nhar-vos a um feliz lim, e nenhum respeito vos deve impedir

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de vos empregardes n'isto com ardor. Porque, mandando-nos Deus amar nosso proximo como a nós mesmos, Elle suppõe que DÓS nos devemos amar; e a primeira parte que em vós deveis amar é a alma, e na alma a consciência, e na con­sciência a pureza, e na pureza a apprchensão da salvação eterna.

«Emquanto que nossas faltas existem em nossas almas, ellas são espinhos; saindo para fóra pela voluntaria accusa­ção, ellas são convertidas em rosas e perfumes, do mesmo modo que, assim como nossa malicia as attrahe a nossos cora­ções, lambem é a bondade do Espirito Santo que as lança para fóra.

■Confessando-vos a bons confessores, de modo nenhum duvideis: porque sc elles não tivessem a jurisdicção de vos ouvir, elles vos despediriam, e por oeohum motivo é neces­sário fazer estas revistas geraes na parochia, das quaes vós me escrcveis: basla cumprir ahi o preceito na paschoa, con- fessandü-se, ou no menos commungando ahi. Estando na al­deia, os sacerdotes que achardes nas parochins vos poderão lambem confessar. Não vos deixeis possuir dc cscrupulos, nem dc desejos excessivos: camiuhae doce e corajosamente.

■ Deveis ser lirme na resolução que vos dei, que o que se diz DO segredo da penitencia 6 de tal modo sagrado, que não se deve dizer fóra d’ella. E a quem quer que vos perguntar 0 que tendes dito na conlissão, podeis afoutamente e sem pe­rigo de duplicidade dizer que nada: nenhuma dilficuldade ha n’isto. Uma oulra vez pois, perseverae lirme, c tende por não dito e totalmente calado o que está coberto com o véo sacramental; c comtudo de modo nenhum vos ponhaes em escrupulo, porque dizcndo-o não tendes pcccado; ainda que porventura Icrieis feito melhor occultnndo-o, por causa da reverencia do sacramento, que deve ser tão grande, que fóra d’elle nada se menciouc do que ahi se diz.

239.— «Não vos perturbeis por que não nolaes todas as Confissões vossas pequenas faltas para vos confessar d’ellas. Não, por-. J*®® , que como muitas vezes caís sem o advertir, lambem não se diz na passagem que allegaes que o justo se vô ou se sente cair sele vezes ao dia, mas que elle cáe sele vezes: tambem elle se torna a levanUr sem attender que sc levanta. Não vos ponhaes porlanlo em lorinenlo por esta causa, mas ide humilde e francamente dizer o que tiverdes advertido; e quanto ao que não tiverdes notado, entregae-o á doce mise­ricórdia d’Aquclle que põe a mão por baixo d'aqucllcs que cáem sem malicia, a lim de que elles se não trilhem, e os levanta tão docemente e tão depressa, que nem advertem, terem caído, porque a mão de Deus os amparou em suas qué-

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das, nem haverem-se levantado, porque Elle os ergueu tão prestes, que não pensaram n'islo.

«Quanto a escrever a conlissão, é indilTcrente; c muitos não approvam que se escreva, quero dizer, gostam mais que se accusem de çór.

«As conlissões nnnuacs são muito hoas, ellas nos condu­zem á consideração dc nossa miséria, c fazem reconhecer se avançamos ou recuamos, fazem que refresquemos mais viva­mente nossos bons propositos, mas devem fazer-se sem in­quietação e escrupulos, não tanto para ser absolvidos, como para ser consolados. Não c necessário fazer tão exactamente 0 exame, mas sómente cm globo. Se as podérdes fazer d’csla maneira, eu vol-as aconselho; não sendo assim, desejo que não as façaes.

«Aebei cm vossa conlissão geral todos os indicios de uma verdadeira, boa e solida conlissão, e nunca alguma ouvi que mais me satisfizesse. E a pura verdade, c acredilae que em taes occasiões cu fallo com muita pureza. Se alguma cousa deixastcs de dizer, considcrac se foi com adverteucia c vo­luntariamente, porque n’cslc caso devereis repetir a conlis­são, se 0 que tivesscis omiltido fosse peccado mortal ou pcn- sasscis a esse tempo que o era; mas não sendo mais que peccado venial, oo tendo-o vós omitlido por esquecimento ou lalla dc memória, não duvideis; porque, n risco de minha ainm, de modo nenhum estaes obrigado a repetir vossa confissão; raas bastará dizer a vosso confessor ordinário o ponto que tendes omitlido. Por isto respondo cu. Não tenbaes igual­mente receio por não ler posto Ltnla diligencia como era ne­cessaria cm vossa confissão geral, porque eu vos repilo muito claramente c com muita segurança, que sc não (izcslcs omis­são voluntaria, de modo nenhum deveis reiterar a confissão, a qual por verdadeira foi muilo suíficienlemenlc feita. Ficae em paz por esla parle.

«Não vos esqueçacs de vos confessar todos os oito dias, c quando tiverdes alguma grande perturbação de consciência.

Preparação 240.— «Pelo que respeita á revista de vosso estado inlc- para a rc-pior: 1.”, prcparae bem tudo o que for necessário para tor- J ^ “o°"eral“ '” ' e.sta viagem, c tal que possa esta revista bastar

” para muitos annos; 2.*, rcconimendae-a a nosso Senhor; 3.*, esfolheac todas as dobras, e vôde todas as molas da vossa alma, c considerae tudo o que será mister de ser ou concer­tado ou composto; 4.®, da minha parle eu apresentarei a Deus muitos sacrilicios para obter dc sua bondade a luz e a graça neccssnrias para vos servir n’esta occasião; 5.®, prcparae uma grande, mas digo antes grandíssima e ab.soluta conliança na misericórdia dc Deus, depois de minha alTeição: mas eu sei

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que d'isto a provisão está já feita; 6.®, se vos parecer que á medida que vossa memória e vossa consideração vos sugge- rirem alguma cousa, vos seja util notal-a com a penna, eu o approvarei muito; 7.“, devereis pôr a maior abnegação ou indilfereüça dc vossa vontade, quero dizer, um desejo e re­solução de obedecer bem ás inspirações e instrucções que Deus vos der, sejam quaes forem, isto é o melhor; porque nosso Senhor opéra nas almas que são puramente suas c não prcoccupndns de alTcição c da proprin vontade; 8.®, mas so­bretudo fugi dc inquietar-vos n esta preparação: fazci-a com soccgo c liberdade dc espirito.

241.— «Por ter omittido algum versículo do Oflicio ou al- Das faltas guma ce.'-emonia, não ha mais que um peccado venial; ecsquecidas quando a lembrança dc laes faltas vos sobrevem depois da conlissão, não é necessário, para irdes á commimhão, que volteis ao confessor; pelo contrario é bom que não volteis, mas sim que n reserveis para n dizer na conlissão seguinte, sc vos Icmbrardes.

«Este grande temor, que ha pouco tão cruelmeute vos an­gustiou, deve para o futuro acabar, pois que tendes todas as seguranças que n’cste mundo sc podem ter de muito inteira- menle haverdes e.xpiado vossos peccados pelo santo sacra­mento da penitencia. Não, não .«e deve pôr cm dúvida que as dependencias de vossas faltas não tenham sido sufliciente- mcnte explicadas; porque todos os theologos são concordes que por nenhum modo é necessário dizer todas as dependen­cias ou preparações do peccado. Quem diz «matei um ho­mem», uão é necessário que diga que tirou sua espada, nem que foi causa de muitos desgostos aos parentes, nem que es- candalisou aquelles que o viram, nem que perturbou a rua era que fez a morte; porque tudo isto se entende bem sem que se diga: basta sómcnlc dizer que matou por cólera, ou á espera, por vingança, que elle era um simples homem ou ec­ciesiastico; e depois deixar o juizo áquelle que o ouve. Quem diz que incendiou uma casa, não é necessário que diga pelo miudo 0 que n’ella existia, mas basta que diga sc sim ou não estava geuie dentro. Vivei portanto em absoluta paz; vossas conlissõcs foram boas até ao excesso: cuidac para o futuro em vosso progresso na virtude, e não cogiteis em peccados passados senão para vos humilhar docemente na presença de Deus, c bcmdizer sua misericórdia, que vol-as perdoou pela applicação do divino sacramento.

«Esla boa alma, que vós e eu tanto amamos, me faz per­guntar se poderá esperar a presença de seu pae espiritual para se accusar de algum ponto de que se não lembrou era sua confissão geral, c, ao que vejo, muilo o desejaria. Mas

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dizei-lhe, eu vol-o rogo, que isto por modo uenhum é possi­vel: eu trahiria sua alma se lhe permittisse este «huso. É necessário que linalmente na primeira confissão que fizer, logo no principio cila se accuse do pcccado esquecido (o mesmo digo se forem muitos) pura e simplesmente, e sem repetir outra cousa de sua confissão geral, a qual fui muito hoa.

«Acabando, não deve esta alma, apesar das cousas esque­cidas, de modo algum perturbar-se; porque a verdade é que 0 primeiro e principal ponto da simplicidade christã consiste n’esta franqueza de accusar seiis peccados quando ha neces­sidade, sem receiar o ouvido do confessor, o qual não está apparelhado senão para ouvir peccados de todas as especies, e não virtudes.

«Portanto, que afoula e corajosamente se dcsencarregue por esta consideração com grande humildade e desprezo de si mesma, sem receio algum de fazer ver sua miséria áquelle por mediação do qual Deus a quer curar.

«Mas se seu confe.ssor ordinário lhe causa muita vergonha ou apprchensão, poderá ir a outro; porém u’isto quereria eu toda a simplicidade, e creio que tudo o que ella tem a dizer ellectivamcntc é pequena cousa, e a apprciiensão lh’a faz parecer extraordinaria: mas dizei-lhe tudo isto com grande caridade, e assegurac lhe que se n’cste ponto eu podesse condfcscender com sua inclinação, com muita vontade o fa­ria, segundo o serviço que á santissima liberdade christã con­sagrei. Se depois d’isto, na primeira vez que se encontrar com 0 seu pae espiritual, ella pensar que colherá alguma consolação em manifestar-lhe a mesma falUi, o poderá fazer; e, segundo o que de sua ultima carta soube, ella o deseja; e espero que lhe será util mesmo o fazer uma confissão geral de novo com grande preparação, a qual todavia não deve co­meçar senão pouco antes de sua partida, com receio de se embaraçar.

0 que nas 242.— «Não é mister dizer na confissão estes pequenos revistas se pensamentos que, como moscas, passam e vem diante de nos- acveaizcr. jjig olhos, nem o dissabor e desgosto que tendes em vossos

votos, porque tudo isto não são peccados, mas tristezas e in- commodos.

«A revista annual de nossas almas se faz, assim como cn- tendcis, por defeito das conlissões ordinarias, que por esta se supprc para sc provocar e exercer a uma mais profunda hu­mildade, mas principalmente para renovar, não os bons pro- positos, mas as boas resoluções que devemos appiicar como remedio ás inclinações, hábitos, e outras fontes de nossas of- fensas, ás quaes mais sujeitos nos achamos.

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«É verdíide que seria mais a proposito o fazer esta revista

Seranle aquelle que tivesse ouvido a confissão geral, a fira e que pela consideração e relação da vida precedente á se­

guinte, melhor se podessem tomar as resoluções por todos os modos requeridas; isto seria mais de desejar. Mas as almas aue, como vós, não tôem esta commodidade, podem valer-se de algum outro confessor, o mais discreto e sabio que acha­rem.

«Eu digo que de modo nenhum em vossa revista é neces­sário notar particularmente o numero nem as miudas cir- cumstiincias de vossas faltas; basta dizer em globo quaes são vossas principaes quédas, quaes são vossas primeiras desor­dens de espirito, e não quantas vezes caislcs, mas se sois muilo sujeita c iuelioada ao mal. Por exemplo, não deveis indagar quantas vezes tendes caido cm cólera, porque talvez haveria n'islo muito que fazer; mas simplesmente dizer se sois sujeita n esla desordem; sc, quando vos acontece, pcr- maneceis n’clla por muito tempo, se é cora muila amargura e violência, e linalmente quaes são as occasiões que mais frequentemente vos provocam a ella; sc é jogo, a altivez, oii orgulho; se é a melancolia, ou teima (o que se diga por exem­plo); e assim em pouco tempo lereis acabado vossa pequena revista, sem muilo atormentar nem vossa memoria, nem vosso descanso.

«E constante que algumas caídas em peccados mortaes, comtanto que não fosse com designio de adormecer nclles, nem com um endurecimento no mal, nãu impedem que se tenham feito progressos na devoção; a qual ainda que se perca peccando mortalmente, se recobra todavia no primeiro arrependimento sincero qne se leni do peccado, como eu disse, qnaodo se uão tem por muilo tempo estado mergu­lhado no mal: de sorte que as revistas annuaes são extrema­mente salutares aos espiritos que são ainda um pouco fracos; porque se as primeiras resoluções não os téem totalmente firmes, as segundas e terceiras os firmarão mais; e linalmente á força de resolver-se com frequencia, se persevera inteira­mente resolvido, e de modo nenhum sc deve perder a cora­gem, mas com santa humildade considerar a suo enfermi­dade, accusar-se, pedir perdão, e invocar os soccorros do OéO .

243.— Agora me dizeis vós que, quando tendes tido al-conlinua- gum grande sentimento de cólera, ou de alguma outra lenta- Ção. ção, vos vem sempre um escrupulo, se não o conlessaes.

«Eu digo que deveis dizel-o em vossa revista, mas não por modo de conlissão, ou então para tirar instrucção como n’isto deveis comportar-vos. Eu fallo de quando se não vè clara-

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raenlc ter dado consentimento: porque se vós ides dizer: Eu me accuso de que durante dous dias tive grandes movimen­tos de cólera, mas não consenti n’elles, dizeis vossas virtudes em vez de dizer vossos defeitos.

«Mas sohreveni-me dúvida se tenho tido n’isto alguma falta. É neces.sario considerar maduramente se esta dúvida tem algum fundamento. Talvez que pouco mais ou menos um quarto de hora no espaço d’estes dous dias tenhaes sido um pouco negligente em distrahir-vos de vosso sentimento. Se for assim, dizei .simplesmente que tendes sido negligente durante um quarto de hora em distrahir-vos de um movi­mento de cólera que tendes tido, sem acrescentar que a ten­tação durou dous dias, a não ser que o qiiciraes dizer, ou para tirar instrucção do vosso confessor, ou sendo em vossas revistas, porque então é bom que se diga. Mas nas confis­sões ordinarias seria melhor não fallar n’isto; pois qne não o fazeis mais que para vos satisfazer; c ainda que vos sobre­vem um pequeno desgosto não o fazendo, deve solTror-se como um outro que uão podesseis remediar. Deus seja bem- dito. (Enlret. v.)

«A conlissão é como um ajuste de contas. Deve haver igual simplicidade tanto cm ura como na outra. Ora per­gunto, dever-se-hia dizer: Se eu me confesso de tal cousa, que dirá meu confessor, ou que pensará de mim? De modo nenhum; pense e diga elle o que quizer, comtanto que rae tenba dado a absolvição, e que eu tenba cumprido o rneu de­ver, isto me basta: e como depois da conlissão não 6 Icmpo de examinar-se para ver se se disse tudo o que se fez, mas é tempo para estar altento na presença do Senhor, com o qual nos lemos reconciliado, e dar-lhe graças por seus benefícios, de modo nenhum é necessário fazer a indagação do que po­deremos ter esquecido: da mesma sorte é, depois de termos ajustado as nossas contas. Deve dízcr-se com muita simpli­cidade 0 que nos occorre; depois não pensar mais n'isto.

«Mas tambem, como não seria ir bem preparado para a conlissão, não querendo examinar-se com receio de achar al­guma cousa digna de confessar-se, da mesma sorte não de­verá ser negligente de entrar em si mesmo antes do exame, com módo de achar alguma cousa que seria penoso dizer-se. Não se deve tambem ser tão terno, que tudo se queira dizer, nem recorrer aos superiores para grilar d lá ao menor pe­queno solTrimento que lenhaes, o qual talvez terá passado dentro de um quarto de hora.

«E bem que se lenha a sofTrer um tanto generosamente estas pequenas cousas, que nós não podemos remediar, sendo producções ordinariamente do nossa natureza imper-

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feita, como são cstns inconstnncins dc humor, dc vontades, dc desejos, que produzem umas vezes algum pezar, outras vezes desejo dc falhir; e depois repentinamente grande aver­são de 0 fazer, e cousas semelhantes, a que estamos sujeitos, e 0 estaremos emquanto vivermos n’esta vida transitória.(Entret. xiv.)

244.— 0 Eu queria que na conlissão se tivesse grande honra Bespou-para com os confessores; porque (além dc que somos muito deracslas obrigados a honrar o saccrdocio) os devemos considerar como anjos; qnc Deus nos envia para nos reconciliarmos com sua divina bondade; e nãó sómente isto, mas tambem devemos olhal-os como logares-tenentcs dc Deus na terra; e portanto, ainda que lhes acontecesse algumas vezes mostrarem-se ho­mens, commettcndo algumas imperfeições, como pergun­tando alguma cousa curiosa que não seja da conlissão. como vossos nomes, se fazeis penitencias, praticaes virtudes, e quaes ellas são, sc tendes tentações, e cousas semelhantes, eu queria responder segundo o que elles perguntam, ainda que sc não esteja obrigado a isto; porque não nos é per­mittido dizer-lhes outra cousa mais do que aquillo de que vos tendes accusado. Oh! não, nunca se deve usar d’este de­feito, porque isto não é verdade; podeis dizer tudo o que quizerdes na conlissão, comtanto que não digaes senão o que diz respeito a vós mesma, c não o que pertence ao com­mum de vossas irmãs.

«Sc tcmeis dizer alguma cousa do que elles vos pergun­tam, com môdo de vos embaraçar, como seria o dizer que tendes tentações; sc apprchcndcis dizer-lb’as, no caso que elles as queiram saber pelo miudo, podeis responder-lhes:Tcnho-as, meu padre; mas, pela graça de Deus, julgo nâo ter oITendido sua bondade. Dizei na boa fé a vosso confessor tudo 0 que vos lizer peso, se assim o quereis; mas nova­mente vos digo, abstende-vos de fallar nem de terceiro, nem de quarto.

«Devemos certa reciproca obrigação aos confessores no acto da conlissão. de occultarmos o que elles nos disseram, excepto sendo alguma cousa edilicativa, c fóra d'isto não devemos fallar.

«Sc acontecer que elles vos décm algum conselho contra vossas regras c vosso modo dc vida, ouvi-os com humildade e reverencia, e depois fareis o que vossas regras pcrmilti- rem, e nada mais.

«Os confessores nem sempre tôem intenção de obrigar-vos debaixo de peccado ao que vos dizem; seus conselhos devem receber-se por modo de simples direcção: estimae todavia muito, e fazei grande apreço de tudo o que na conlissão vos

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for dito; porque não podereis imaginar o grande proveito que ha n'este sacramento para as álmas que chegam a elle com a humildade requerida.

«Se elles quizerem dar-vos em penitencia alguma cousa contra a regra, pedi-lhes com muila doçura que mudem esla penitencia em outra, mesmo porque sendo contra as regras, temerieis escandalisar vossas irmãs se a cumprisseis.

«Nunca se deve murmurar contra o confessor. Se por culpa sua vos acontecesse alguma cousa na conlissão, pode- rieis muilo simplesmente dizer á superiora que desejáveis, se fosse sua vontade, confessar-vos com algum oulro, sem outra cousa dizer; porque fazendo assim, não descobrireis a imperfeição do contessor, e tereis a commodidade de confes­sar-vos á vossa vontade: mas isto não deve fazer-se leviana­mente e por bagatelas, devera evilar-se os extremos; por­que, como não é bom supporlar na confissão defeitos notá­veis, tambem não se deve ser tão delicado, que se não possa supporUir alguns pequenos.

Partícula- 24S.— «Muito desejaria que as irmãs tomassem grande risnr os cuidado de parlicularisar seus peccados na confissão; quero

peccados. que aquellas que nada tenham manifestado que seja di­gno da absolvição, digam algum peccado particular, porque o dizer que se accusam de ter muitos movimentos de cólera, e assim dos outros, não é a proposito: porque a cólera e tris­teza são paixões, e seus movimentos não são peccados, em­quanto não cabe em nosso poder impedil-os.

«É mister que a cólera seja desordenada, ou que ella nos conduza a acções desordenadas para ser peccado. Portanto é mister particúlarisar alguma cousa que induza a peccado.

Simplicida- 246.— «.Muilo desejaria, que na conlissão se tivesse grande de na con- cuidado em ser muito verdadeiro, simples e cariiativo (verda- lissao. jgjpQ ç simples é uma mesma cousa), dizer muilo claramente

suas faltas sem dissimulação, .sem arlilicios, altendendo que é a Deus que falíamos, ao qual nada póJc ser occullo.

«Carilalivo, não introduzindo por modo algum o proximo em vossa confissão. Por exemplo, lendo a confessar-vos de haverdes comvosco mesmo murmurado, ou cora as irmãs, de que a superiora vos fallou muilo sôcamenle, não vades di­zer que murmurastes da corrccção gro.sseira que ella vos fez, mas simplesmente que murmurastes contra a superiora.

«Dizei sómente o mal que lizestes, e não a causa e o que a isto vos impeiliu. Nunca, nem dirccla nem indirectamente, descohraes o mal das outras, accusando o vosso, e não deis ao confessor motivo de suspeitar quem é que para o peccado contribuiu.

«Não façaes tambem na confissão accusação alguma inutil.

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Tendes tido pensamentos de imperfeição sobre o proximo, pensamentos de vaidade, até mesmo dos mais péssimos; ha­veis tido distracções em vossas orações: se deliberadamente vos demorastes n’ellas, dizei-o na boa fé, e não vos conten­teis em dizer que não pozcstcs bastante cuidado em estar recolhida duranle o tempo da oração; mas se tendes sido ne­gligente em expulsar uma distracção, dizei-o; porque estas accusações geraes dc nada servem para a confissão.

247.— Não sc deve ser tão delicado em querer confes-Tristeza na sar-se de tantas pequenas imperfeições, pois que mesmo não connssão somos obrigados a confessar-nos dc peccados veniaes, se não''' 1“®''"'''’- quizcrmos; mas quando se confessam é necessário ter a von­tade resolvida a cmendar-se d’ellcs, de outra sorte seria um abuso confessal-os.

«Não devemos igualmente atormentar-nos, quando nos não lembramos de nossas faltas para as confessarmos; porque não é crivei que uma alma que faz com frequencia seu exame deixe por tantos leves defeitos de notar bem as faltas de im­porlancia para se recordar d’ellas. Quanto áquelles podeis fallar com nosso Senhor todas as vezes que os perceberdes: um abatimento de espirito, um suspiro basta para isto.

«Perguniaes vós como podereis fazer vosso acto de contri­ção em pouco tempo. Eu vos digo que quasi não é necessá­rio tempo para o fazer bem, pois que não é necessário mais do que prostrar-se na presença de Deus em espirito de humil­dade e de arrependimento de o ler oITendido. (Enlret. xviii.)

«A tristeza da verdadeira penitencia não deve tanto cha- mar-se tristeza, como desgosto ou sentimento e delcstação do mal; tristeza que jámais enfastia ou aborrece; tristeza que não entorpece o espirito, mas o torna prompto e diligente, tristeza que não abale o coração, mas o eleva pela oração e pela esperança, e o move aos affeclos de fervor de devoção; tristeza, que, no auge de sua amargura produz sempre a doçura de uma incomparável consolação, segundo o preceito do grande Santo Agostinho: Que o penitente se entristeça, mas que sc regosije sempre de sua tristeza.

«A tristeza, diz Cassiano, que opéra a solida penitencia, da qual nunra nos arrependemos, é obediente, afiavel, tra- tavel, benigna, soffredora, paciente, como sendo derivada e descendida da caridade; de sorte que estendendo-se a toda a dor do corpo e contrição do espirito, de certo modo ella é alegre, animada e vigorisada pela esperança do seu proveito; ella conserva toda a suavidade da alfabilidade e longanimi- dade, tendo em si mesma os fructos do Espirito Santo, que são a caridade, alegria, paz, longanimidade, bondade, beni- gnidade, fé, mansidão, e continência.

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«Tnl é a verdadeira penitencia, c tal é a boa tristeza, que de certo não é propriamente triste, nem melancólica, mas sómente attenta, c alTeiçoada a detestar, repulsar c impedir 0 mal do peccado quauto ao passado e ao futuro. {Tlieol., lib. XI, cap. XXI.)

com os 248. (S. Liooiuo, n.«* 98-100, 104 e 10b.)— Se vier umsurdos e penitente que seja não sómente surdo, mas lambem mudo, o

que ordiniiriamenle acontece, será necessário, para o confes­sar, retirar-vos para um logar desviado, a lim de obter algum signal de seus peccados e de sua contrição o melhor que po­dér fazer-se. Mas fareis bem informando-vos previamente com pessoas que vivem com elle, de algum de seus vicios e do modo de se fazer comprebender c de o comprebender elle mesmo. Chegando a conhecer algum dc seus peccados em particular, com o signal de arrependimento, lhe dareis a absolvição. Mas eu o absolveria sempre debaixo de condição, se não tivesse certeza moral de suas disposições. Se o mudo souber escrever, sou de opinião que é obrigado a confes­sar-se por escripto; porque aquelle que é obrigado ao lim, é obrigado aos meios ordinários. (Lib. VI, n.® 479; V. Quísr.) Digo ordinários, porque a escripta não seria para o mudo um meio ordinário se devesse cuslnr-lhc muilo trabalho para escrever sua conlissão, ou se houvesse perigo de manifesta­ção.

Continua- 249.— Apresentando-se ao confessionário uma mulher Ção. surda ou que dilTicilmente ouça, surdastra, e vindo vós a co­

nhecer isto interrogando-a, pergunta-se se podeis dizer-lhe em voz alta que vòllc em tempo e logar conveniente. Este caso se apresenta com frequencia nas missões, e causa muita inquietação aos pobres missionários. Respondo que, se a confessor conhece a surdez no principio da conlissão, póde então dizer-lhe livremente que volte. Mas se elle a não co­nhece senão no decurso da conlissão, vendo que a penitente não responde a proposito ás suas perguntas, neste caso não póde dizer-lhe em voz álla que volte, porque daria logar de pensar ás pessoas que cercam o confessionário que ella se confessou de alguma falta grave ou ao menos gravemente duvidosa. Assim, se a penitente se accusar de algum pcc­cado mortal, dae-lhe a absolvição, achando-a disposta; dc ou­lra sorte, absolvei-a debaixo de condição. Com elfeilo, para não violar o sigillo sacramental, não podeis dizer-lhe que volte, e não podeis igualmente certilicar-vos de suas disposi­ções; imponde-lhe uma penitencia leve, pois que em razão da surdez, sois obrigado a fallar de modo que sejaes ouvido- pelas outras pessoas. (Lib. VI, n.® 463; V. Petes.)

Com os 2bO.— Se fordes chamado a assistir a algum d’es8es pobres-

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desgraçados condemnados á morte, tende cuidado de os tra-condemna- tar com toda a caridade e paciência, üesde vossa primeira {f°® visita, dae-llie a entender que a morte é uma graça que Deus ' lhe faz, porque Elle quer stin salvação. Dizei-lhe qtic todos devemos morrer, e brevemente, para entrar na eternidade, que não terá lim. Fallae-lhe depois na vida bemavenlurada dos santos c da vida desgraçada dos reprovados. E\horlae-o a que agradeça ao Senhor, que se dignou esperal-o até a esle momento, em vez de o fazer morrer quando sc achava em estado de peccado. Finalmente, movei-o a aceitar a morte em união d’nquclla que o Salvador solfrcu por seu amor.Reanimac sua coragem, dizendo-lhe que aceitando a morte será salvo, e salvo com um immenso merecimento, de que re­ceberá a recompensa no paraiso. Excitae-o depois a confes­sar-se e n dizer sem temor todos os seus peccados. Pergun- tae-lhc em particular se conserva odio contra nlgiiem; se conserva comsigo particulas consagradas de oleo bento ou escripla supersticiosa. Pergiinlae-lhe lambem se tem pacto com 0 demonio, etc. Depois de lhe ter dado a absolvição, tende cuidado de o fazer commungar muitas vezes (‘), di­zendo-lhe que se recommende com frequencia á Santa Vir­gem, a (im de que ella o ajude a bem morrer Saindo do cárcere com a justiça, dizei lhe: Agora, meu filho, sigamos Jesus Christo, que subiu ao Calvario a fim de morrer por vós.Chegado ao logar do supplicio, reconciliac-o e absolvei-o de novo, fazendo-lhe ganhar alguma indulgência, e depois di­zei-lhe : Consolae-vos, estaes na graça de Deus; já as portas do céo estão abertas para vos receber; lá vos esperam Jesus Christo e sua Santa Mãe. Uni vossa morte á do Salvador, que morreu por vosso amor no meio de humiliações e de tor-

n Sabaudia non adminisiralur Euclia-

consentancum est divinam Eucliari.stiam eis v

__..i iion concedere accusalis de crimine ct nondum jndicatis; qma 1.», eo ipso suspecti .sunt; 2.», pericuium esl ne eommunioncm appe- tcrcnt ex hyiiocrisi; 3.», limendum forcl seandaliim. Non ita jndiean-

(Jfbla do Iraducíor.J

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menlos. Vós o amaes, não é assim? JHzei-lhe commigo: Se­nhor, eu vos amo sobre Iodas as cousas, eu aceito a morte para cumprir vossa santa vontade: eu a aceito para expiar meus peccados. Espero que vós me tenhaes perdoado. De novo me arrependo das offensas que vos fiz. Desejo reunir me brevemente a vós no paraiso, para vos amar por toda a eter­nidade. Quando Itic vendam os olhos e que sobe a escada, dizei-lbe: Meu fHhç, dizei á Santa Virgem que venha em vo.íso soccorro. Aceitae a morte por vossos peccados. Pro- testae que não quereis consentir em alguma tentação do de­monio. Quando eslá sobre a escada e que a justiça vae cum­prir-se : E is aqui o Salvador, que abre os braços para vos receber; dizei: Senhor, eu vos offendi, eu me arrependo; eu vos amo de todo o meu coração. Deus da minha alma, cdí me chamaes, eis-me que vou. Santi Maria, ajudae-me; meu Pae, eu vos entrego meu coração e minha alma.

Continua- 2bl.— Se 0 condemnado recusar obstinadamente confes- Çáo- sar-se: 1.", orae por elle e encommendae-o ás orações dos

oulros, sobretudo das communidndcs religiosas, a Om de que venham em seu soccorro com missas, ladainhas, etc.; 2.', di­zei ao condemnado que, ou se confesse ou não, a justiça terá igualmente seu curso; 3.°, perguntae-lhe sc desespera por­que tenha dado sua alma ao demonio. Neste caso, dizei-lhe que um igual pacto é sem valor, porque a alma pertence a Deus, e que retratando sua má vontade. Deus lhe perdoa to­dos seus peccados; 4.®, se é causa de sua obstinação o odio que conserva contra alguem. Em vossas primeiras visitas tende cuidado de o não importunar para que elle se confesse, porque isto poderia fazer ainda peior; melhor será fallar-lhc da misericórdia de Deus, da felicidade do paraíso, das penas do inferno e da morte a que todos somos condemnados. Con- lae-lhe algum exemplo de peccadores mortos na impeniten- cia, ou de condemnados mortos como santos. Tal era esso condemnado que morria innocente, e que interrogado porque não havia provado sua innocencia, respondeu: Como? Ro­guei a Deus por espaço de muitos annos a graça de morrer nas humiliações como nosso Senhor; obtive o que pedia, e quererieis vós que eu perdesse tão bella occasião? N ’cstes sentimentos alegremente caminhou a morrer. Deixae-o de­pois a suas reflexões. Voltareis depois para ver se elle mu­dou, e lhe direis: Meu filho, a morte se aproxima: que que­reis fazer? Está na vossa mão escolher o paraiso ou o inferno. Pensae que se morrerdes na impenitencia, vos arre- pendereis por toda a eternidade, e vossa desgraça será sem recurso. Se o virdes ainda endurecido, fazei recitar em seu favor pelos assistentes a ladainha da Santa Virgem; lançae-

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VOS de joelhos, pedindo-lhe que se não perca. Se vossas pa­lavras 0 deixam inseiisivel, dirigi-vos a vosso crucifixo; linal- menle, se o condemuado é chegado ao logar do supplicio, dizei ao povo que se ponha de joelhos e que ore por este obstinado. Póde tambem ser util aterral-o, dizendo-lhe:Vae, maldito, para o inferno, já que te queres condemnar.Sabe que teu maior supplicio será por teres abusado d’estes últimos momentos que Ueus te concede para te converleres.Mas apressae-vo.s a voltar ao tom da doçura. Se o padecenle, chegado ao cadafalso, pede para se confessar, rogae aos mi­nistros da justiça que perniiltam que elle desça; porque n’este caso são obrigados a dar-lhe tempo para se confessar. Fallo d’aquelle que ainda não se tivesse confessado; se elle já se tiver confessado, lhe mandareis liizer um aclo de contrição, dizendo-lhe que se confesse bem de todos os peccados, prin­cipalmente d'nquclles que elle já disse, depois lhe dareis a absolvição.

232. (V ida de S. F hancisco de Salles, pelo Padre Tolon, Conducla pag. 86 e seguintes.) — Conduzido por esle caritalivo zelo, de S.Fran- que era a alma de sua vida, S. Francisco de Salles procurava todas as occasiões dc fazer conhecer a Deus e mover todas as crcaturas a amai o. Para isto ia com frequencia aos cárce­res. Em certo dia um de seus amigos o encontrou quando ia a entrar cm um calabouço, e lhe perguntou o que alli ia fa­zer. Nosso Santo lhe pegou na mão, c lhe disse, rindo-sc:«Vamos, senbor, vamos fazer-nos prisioneiros de Jesus Chris­to.» Esle lhe respondeu que ao menos esperasse um pouco até que trouxessem luz; então este bom prelado foi elle mesmo ao encontro d’aquelles que lb’a traziam, e pegou na luz cm sua mão: pedindo-lhe alguem que a desse a um la­caio, que os seguia, elle lhe disse que o não faria, e que tal­vez esla luz llic serviria para fazer melhor conhecer Deus a todos esles pobres presos que ia visitar.

Mas na verdade, suas palavras c suas acções espalhavam uma luz e umn claridade mais viva e mais penclraule do que todos os lanipeõcs; porque, quando cllc exhortava esta pobre gente, sc puiilia dc joelhos a seus pés, chorava com elles, enxugava suas lagrimas, despejava em seu favor toda a sua bolsa, dava-lhos de beber e dc comer, como uma boa mãe teria podido fazer a seus filhos; e depois, lendo ganhado seus corações, elle os movia a fazer confissões e aclos dc uma re­signação tão grande e lão generosa, que niuiUis vezes alguns se viram que, sendo condemnados á morte, pediam que au- gmenlassem seus supplicios e que redobrassem seus tormen­tos, comtanto, diziam elles, que M. dc Genebra quizesse ler 0 trabalho dc os acompanhar alé á morte. 0 que elle fazia

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com tanta doçura, tanto zelo e tanta caridade, que todo o povo coDcorria como a um sermão, e freqüentes vezes mui­tos dos assistentes, ao sair d’alli, lhe pediam que os ouvisse de confissão, e diziam em altas vozes, que seriam muilo fe­lizes se podessem esperar no (im de sua vida ter um lal con­solador, e um homem tão cheio de caridade e devoção.

Era lamhem um dc seus exercicios ir aos hospilaes e ás casas particulares para servir os pobres enfermos c ensinal-os a morrer santamente. Deus Ibe linha dado para isto uma graça tão extraordinaria, que bastava oiivil-o para (icar con­solado. Uma vez entre outras lhe pediram que assistisse a um homem que estava desesperado, e que não queria ouvir fallar nem de conlissão, nem dc medico. Elle sc apressou a ir, c logo qne este homem sentiu nosso Santo, lhe dissc: Ah! Senhor, ah! que não tenhaes vindo mais cédo! E depois saindo da cama e lançando-sc a seus joelhos, os abraçou com força, e lhe pediu que o não deixasse; o que promellendo-lh’o 0 Santo, este pobre bomcm recobrou seus espiritos; recebeu de sua mão todos os sacramentos, c morreu em paz. Suas

• ultimas palavras foram: Ah! bemdito seja Deus, que me faz a ^raça de morrer nos braços de meu bom pne e de meu bom

Continua- 233.— Seu segredo, em semelhantes casos, e mesmo com ção. aquelles que conduzia ao supplicio, consistia cm ganhar-lhes

primeiramente o coração; em segundo logar, fazendo-lhes ver docemente e em poucas palavras a imporUincia dc bem se prepararem, e o estado a que iam ser reduzidos depois da separação de seu corpo; em terceiro logar. insistia sobre ai- gum acto de fé que elle se esforçava por fazer-lhes pronun­ciar do fundo do coração, como sendo um ponto de que dependia sua salvação; cm quarto logar, sendo pessoas con- denmadas á morte, lhes propunha elle mesmo a situação de uma alma no mesmo estado que a d cllcs, a (im de que por este meio sua conlissão fosse mais facil, e insensivelmente soubesse 0 estado de suas consciências; feito isto, os ajudava em tudo 0 que podia; depois, abraçando-os ternamente e tendo-os enlre os braços ou sobre o peito, Ities dizia: «Está «bemi eis aqui o quadro da vida que tendes passado; na ver- «dade, não quererieis vós que ella fosse mais pura c mais in- «nocente, e nunca ter feito isto e aquillo? Ah! quanto Deus «é bom! sim! na verdade, não morrcrieis vós anles do que «fazel-o, se houvesseis dc tornar a começar vossa vida? Ahl «agora eu vos conheço miiilo bem, eu corpo por corpo c alma «por alma responderei por vós. Coragem pois, meus bons «amigos; ah! deste momento depende toda uma eternidade; «coragem pois, entreguemos-nos inteiramente a Deus; jure-

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«mos-llie junlos uma inviolável (idelidade. Sim! não «ceilaes «vós 0 supplicio de boa vonlade, e não darieis dez mil vidas,«se as tivesseis, para expiar vossos peccados? Dizeis isto de «lodo 0 vosso coração? Considerae-vos bem, todos quantos «homens vôdes serão outras tantas leslemunbas ou pró ou •contra vós, c eu mesmo que lão ternamente vos amo, sim,«eu mesmo, me levantarei contra vós: mas não, será antes «por vós; porque bem vejo que sois lodo dc Deus, que só a «Elle amaes, que deleslaes vossa vida passada, que lhe ofTe- «receis vossa morte, e que vos consagracs a Elle por uma «eternidade. SimI deixemos tudo de boa vonlade, paes,«mães, lilhos e amigos por seu amor.» Em quinto logar os persuadia a que pedissem perdão, mesmo áquelles que po­diam ter sido a causa de sua morte.

áo4.» (S. L igorio, n.°> lOC-109.) — Alguem ha a quem oComaquel- demonio alormeula com visões lerrivcis, com aUlicções cor-'®®9ucMo poraes, pancadas, dores, ctc. 0 remedio é facil; recommen- dae-lhe a oração, a paciência, e sobretudo a resignação com demonio. a vonlade de Deus. Não sejaes de lal sorte incrédulo, que considereis todas estas invasões ou infestações dos máus es­píritos como illusões ou enfermidades; porque não se póde negar mie haja verdadeiras possessões, mesmo entre os chris­tãos. È ’ para isto que a Igreja estabeleceu numerosos exor­cismos, que, segundo o Concilio de Trento (sess. 23, cap. n), sempre na Igreja se usaram. Acrescenlne, que se não hou­vesse possessão nem obsessão, em vão se teria estabelecido a ordem dc exorcista, que dá poder sobre os energuiiicnos e catccliumcnos. Ora, esta ordem é certamente uma das selo que sempre existiram na Igreja de Deus, como lambem o ensina o Concilio de Trento (sess. 13, cap. ii.) De resto, é prudência suspeitar sempre d’esla especie dc invasões; por­que não se póde negar que a maior porte sejam ou impostu­ras, ou illusões, ou enfermidades, principalmente nas mulhe­res.

2oo.— Qui tamen magis solent confessariorum mentem coniinua- gravioribus dilEcuIlatibus implicarc, sunt ii qui lurpibus vi- ção. sionibus, molibus, ac etiam laclibus vexanlur n dmmone, qui non solum fomitcm sensualem excitai, sed aliquando etiam cum eis carnalc commercium sub forma viri aut mu- lieris babel, quapropter succubus, vel incubus oppellolur.Quidam hos daemones incuboi, vel succubos dnri ncgarunt; sed communiler id aíTirmant auctores. ut Martinus Delrio (in Op. clisquis. mag.); P. Hyeronimus Mengbi (lib. I, VI, XV); Cordinalís Pelrucci [Epist., pari. 2.*, lib. II, opusc. 5.°, cap.XV, n." 5); el Sixlus Seneusis (lib. V, Bibt. sacr., annot. 77, ex S. Cvpr., S. Just., Terlull., etc.)

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Et hoc maxime confirmat S. Augustious, ubi sic scribit: Apparuisse hominibus angelos in lalibus corporibus, ut non solum videri, verum etiam tangi possunt, verissima scriptura teslatur, et muitos, quos vulgo incubos vocat, improbos sape extitisse mulieribus, et earum appetisse, ac peregisse concu- bitum. Quosdam dcemones hanc assidue immundãiam, et ten- tare et efíicere, plures talesque viri asseverant, ut hoc negare imprudentia videatur. (Lib. XV, de Civit. Dei, cap. xxiii.) Eqiiidem possunt da:moncs ad bunc improbum usum dcfun- ctoriini corpora assumere, vcl de novo sibi assumere ex a;re et aliis clcmenlis ad carnis simililudincm, ac palpabiliiim ct calidorum corporum humanorum specics pflingere, et sic ea corpora ad coiluni aplarc: imo lenet praíPalus Delrio, citans D. Tbomam, D. Bonavent.. Scotum, Abulens, aliosque plu­res, quod daíiiion potest etiam verum semen alTcrre alimide acceptum, naluralemque ejus cmissionem iniilari, et quod ex hujusmodi concubitu vera proles possit nasci, cum valenldai* mon illud semen acciperc, pula n viro in somno poilutionem patiente, et prolilicum calorem conservando, iilico in malri- ccm infundcre; quo casu proles illa non erit qiiidcm íilia dx- monis, sed iilius cujiis est semen, ut ait D. Tbomas apud ci- tatum auctorem. An autem, inspcctis legibus a divina Pro- vidcnlia constilulis pro propngationc generis humani, hxc aliquando cvcnissc nut evcuire posse credcndum sit, sapien- tiorum judicio remiltimus.

llic aulem lit dubium, an possit dxmon, permiltcntc Deo, absque hominis culpa manus iilius ndmovere ad sc laclibus polleundum. Allirmiit Pater Grnvina dominicanus, et quidem probnbiliter; si enim valei dxmon totum corpus alicujus mo- vere, ut narratur de Simone mago. ope dxmonis in xrem sublalo, cur non polerit et manum? Prxtcrea si dxmon po- tesl alicujus comniovcre linguam ut invilus proferat obsrocna verba, aut blasphemias contra Deum, quidni manus ut lurpia patrelur? idem senlil Canlin. Pelnicci (lib. VI, n.® 8), ubi sic inquit: Non semel compeilum fuisse, quod dcemon ali­quam partem in humano corpore cwperit quodammodo possi- dere, puta oculos, linguam vel etiam verenda. Jlinc fit, lin­guam obsccenissima verba proferre, licet mens taiia tunc non advertat. Ilinc impetus et a/fectus quandoque se turpiler de- nudandi proveniunt. Ilinc fcediora quce me conscribere pu- det.

Continua- 2o6.— Se portanto alguma vez se apresentar um penitente atormentado desta especie de tentação pelo inimigo que a Igreja chama espirito de fornicação, e que ella particular­mente pede ao Senhor que afaste de nós, deveis pôr todos os vossos cuidados para o fortificar em tão lerrivel combate.

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Coni elTeito, diz o Cardeal Pelriicci, eslas pessoas estão eni grande perigo, se não forem sustentadas com remedios muilo neroicos c alsiimas vezes mesmo extraordinários. (Lil). VI, n.®‘ 7 e 9.) Isto é facil de comprehender: para resistir 6 mis­ter nma graça poderosa da parle de Dciis, e uma grande vio­lência da parle do paciente. Sairá portanto com difliculdade vencedor de semelhante lucta, .se com perseverança não usar de grande mortilicação, e sobretudo de muitas orações, en- commendando-se mil e mil vezes a nosso Senhor e á Santa Virgem, pcdindo-lbes com lagrimas c gemidos que tenham compaixão d’elle. De outra sorte, relaxando-se, fallando á oração ou á mortificação, diz o Cardeal acima nomeado, corre 0 maior perigo de cair, ao nienos indirectamente, em alguma complacência secreta por suns deleilações contrarias á pu­reza. Portanto, passando aos remedios, sc virdes que de modo nenluim é por culpa do penitenle, cxhorlae-o primei­ramente a que recorra á oração, invocando com frequencia os santos nomes dc Jesus c dc Maria; depois movci-o a que fuja 0 mais que podér dos prazcrcs dos sentidos; que fre­qüente os sacramentos; que proteste muitas vezes que não quer jámais conscniir cm siiggestão ou deleitação alguma, de que o máu espirito possa fàzcr-llie sentir o ardor ou allra- ctivo; que sc forliliqiie a miudo com o signal da cruz, tra- zcndo-a mesmo comsigo; que lance agua benta sobre seu leito e pelo quarto; que traga comsigo alguma rcliquia e o Evangelho de S. João; que se defenda com exorcismos par­ticulares, dizendo: Animal immundo, em nome de Jesus Christo te ordeno, que le apartes de mim e que me não ator­mentes mais; linalmente, exliorlac-o a que faça com frcquen- cia aclQs dc humildade interiores c exteriores, porque o Se­nhor permilte algumas vezes estas tentações para curar a alma dc algum orgulho secreto.

2o7.— Mas maior difliculdade é curar o penitenle que Continua- consenle cm suas acções, ou mesmo as procura. É diflicil Çã°- que os penitentes d’esle caracter se convertam sinceramente; porque de umn parle o demonio adquiriu certo império sobre sua vontade, e de outra parle elles são muilo fracos para re­sistir. Ser-lhes-bia mister uma graça extraordinaria, que Deus muito diíliciiltosamenle concede a iguaes criminosos. Toda­via, se topardes com algum, não percae.s a conliança. Tra- lae-o com a maior caridade, rcanimae sua coragem, dizendo- lhe que onde não ha vontade não ba peccado; que todas as vezes que resistir não pecca. Começae fazendo contra o de­monio ao menos o exorci.smo particular; certamente é per- mitlido n’esta fórma: Ego, ut minister Dei, prwcipio tibi, aut vobis, spiritus immundi, ut recedatis ab hac creatura

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Dei. (N.® 103, de adj., ib., n.® 4.) Pergunlae depois ao pe- nilenle, se em algum tempo invocou o demonio, ou fez cora cllc algum pacto; sc renegou a fé ou fez alguma acção que lhe fosse contraria. Perguntae-lhe debaixo dc que fórma lhe apparece o demonio, se é debaixo da ligura dc homem, de mulher, de animal, ou de alguma outra creatura: porque en­tão ao peccado contra n castidade c contra a religião juntaria 0 peccado dc fornicação, ou de sodomia, ou de incesto, de adultério, ou dc sacrilégio alTeclivos. Perguntae-lhe era que tempo e em que logar leve semelhante commercio. Mostrar- Ihe-heis depois toda a enormidade de sua falta; movel-o-heis a converlcr-sc sinceramente e a fazer uma conlissão bem in­teira, porque estes penitentes facilmente occullam seus pec­cados. Finalmente, indicar-lhe-heis os mesmos remedios acima referidos: recorrer com frequencia a Deus e á Santa Virgem; pronunciar a miudo o nome de .lesus e Maria; fazer uso dc agua benta e do signal da cruz; trazer comsigo al­guma reliquia e o livro dos Evangelhos; linalmente, fazer re­pelidas vezes 0 exorcismo particular como acima dissemos. DilTerir-lhe-hcis a absolvição; mas o pcrsuadircis a que volte com frequencia para ver como elle resiste aos assaltos do de­monio, c como elle usa do remedio. Só depois de uma longa prova lhe dareis a absolvição, porque n'csta maleria, assim como já dissemos, 6 raro que as conversões sejam verdadei­ras, c rarissimo que sejam perseverantes.

ARTIGO IIICOM AS PESSOAS FAVORECIDAS DE GRAÇAS EXTRAORDliNARIAS

Conselhos 158. (V ida de S. Francisco de S alles, pag. 132).— çeracs dc S. Francisco de Salles, poucos dias depois que foi sagrado

fjY c lff fiispo. declarou a seu confessor que Deus Ibe tinha inspirado Ics sobre ã “ '“ ardente desejo de trabalhar na salvação das almas, e que conducla linha vislo, como em um painel, todas as feições e todas as

dasmullic-pbysionomias da virtude que em cada condição é necessaria, Goíiio sua vida era uma vida commum e podia, por meio de suas instrucções, tornar-se util não sómenlc nos homens, mas ás mulheres, cuja piedade foi sempre a base dos e.slados e da religião. Deus lhe deu uma industria incomparável para as formar nas mais sólidas virtudes, e ensinar-ibes que o hcrois- mo christão não é incompalivel com a fraqueza de seu sexo e delicadeza de seu temperamento. Que prova mais aulhenlica poderia eu d’islo dar do que essa Philothea, que ensina todos os dias tantas senhoras chrislãs, e lhes propõe uma virtude tão doce e uma devoção tão agradavel, que npenas se póde vel-a sem ficar caplivado de amor por ella? Foi isto o que

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moveu certa senhora muito nobre c muito virtuosa a escrever ao santo Prelado n'e$lC9 termos: «Seis vezes ha um anno te- «nho lido vossa Philoíhea; não sei se sua conversão me fez «melhor; mas ao menos eu queria parecer-me com cila. Li «tambem ha um mez todo vosso Theolimo, c liquei sabendo «que 0 amor do nosso bom Deus não é da natureza d’nqucl- «les do mundo c da côrte. Vou portanto diligenciar por con- «formar minha vida com a dc vossa Philoíhea, e não amar com «Theolimo cousa alguma, senão a Deus, ou por Elle, e se- «gundo sua santissima vontade. Pcço-vos, senbor, que me «ajudeis com vossas orações, c que me deis alguns conselhos «particulares. Finalmente, eu não vos faria esla petição, se «não estivesse certa dc que Deus vos abriu o livro das con- «sciencias, e que declarando-vos o meu nome, vos descubro «quem eu sou e o que sc passa no meu interior. Demais,«acho vossas práticas e vossa devoção lão adaptadas ao meu «humor c d fraqueza dc meu sexo, que julgo que nada me «podereis rccommcndar que eu nâo possa muilo facilmente «cumprir.

«Conheço muitas senhoras que Icem a fortuna dc viverem «debaixo de vossa sanla direcção, e que me tôem certificado «que Deus vos linha feito nascer n’esle seculo para nos ensi- «nar a virtude, c que cm nossa mão está o sermos santas, se «quizermos seguir as doces leis de vossa sanlid<sdc. Quanto «a mim, escolho-vos por meu hom pae e meu hom direclor,«e vos juro que, querendo ser toda de Deus, eu me proponho «ser vossa cara liíha, segundo Deus.

«Adeus, senhor e meu carissimo pae, e continuae n fazer,«como tendes principiado, tantas santas, quantas mulheres «ha no mundo.»

Nada se póde desejar no lim d'esla carta senão a resposta do nosso Santo, onde estou persuadido que elle resumiu tudo 0 que póde servir para a direcção espiritual de uma senhora; mas, continua o padre Talon, já que a não podemos encon­trar, devem conlcnlar-se que era nome do santo Prelado eu responda a todas as senhoras, e que eu lhes dô uma conducta geral, cujos pontos todos são colhidos dc seus escriplos.

2d(|. — Primeiramente, como a devoção das mulheres é Continua- muito sujeita á inconsUincia, elle procurava lirmar seu juizo 5®®- c prender sua vonUidc, a fim dc a conservar em um estado de perseverança.

Em segundo logar, elle mais as exercitava na prática das virtudes, do que na contemplação, e as fazia por muilo tempo servir a Deus na vida de Marlha, antes de as admillir á vida de Maria. Sua maxima era que deviam aproximar-se de Jesus antes de se unirem a Elle, e que era necessário ser-

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vir um Senhor tão bom, lavar seus pés com lagrimas e euxu- gal-os com os cabellos, antes de ser admittido sobre seu peito, c repousar com Elle na união do santo amor.

Em terceiro logar, elle removia tudo o que póde tornar a devoção ridicula ou odiosa, e dizia que Deus c a virtude não pódem existir em uma alma sem que o proximo sinta alguma doçura. Isto não impedia que elle pcrmitiissc deixar correr as lagrimas que os olhos costumam verter quando o coração está cheio do santo amor; mas elle queria que ellas corressem docemente, e á maneira d’esse rio das índias que trasborda de noite c que ao primeiro despontar do sol pára, ou pelo menos parece não ousar correr senão impcrceplivelmcnte.

A quarta condição que elle desejava na virtude de uma senhora cra uma grande simplicidade; elle dizia miiilas vezes que a sagacidade é como uma cnntbaridn que costuma demo­rar-se sobre a doçura de seu natural para n perverter; elle acrescentava que uma vez que as mulheres podessem afastar os (inginientos e byprocrisia, ellas eram mais fortes que os liomcns em sua devoção. Mas como sua simplicidade pódo facilmente degenerar em parvoice, e fazel-as cair cm illusões, elle queria que ellas fossem prudentes, e que nunca fizessem cousa alguma sem conselho; porque de oiilrn sorte se põem em perigo de tomar sonhos como revelações, e de imitar as aranhas, qne passam toda a sua vida a trabalhar em algumas pequenas teias, onde sómente caçam moscas.

Em quinto logar, queria que no meio dos assaltos do mun­do c dc suas vaidades ellas fossem como certos rochedos que crescem, dizem, no meio das ondas; e qne vivessem como se conta dos alcyões, que, estando cercados de agua, sómente respiram ar e contemplam sómente os céos, e que, nadando como os peixes, cantam como as aves. «Eis aqui, dizia este santo Prelado, a imagem dc uma senhora que, ainda que no meio do imindo, vive segundo o espirito de Deus, de modo que entre os engodos e todos os atlraclivos da terra, ella não tem olbos e coração senão para o céo, c que, vivendo com os homens, sómente tem bôca e um espirito para louvar c bcra- dizcr a Deus com os anjos.»

A sexta lição que Ibcs dava era que praticassem exacta- meule os conselhos de Salomão e os do Apostolo sobre a ex­cessiva curiosidade. Elle queria que ellas não desejassem sa­ber mais do que era necessário, e qne não occupassem inu­tilmente sen espirito na acqiiisição de uma vã sciencia, que, versando sobre objeclos inúteis para o cumprimento das obri­gações de seu estado, sómente póde enfatuar-lhes o coração.

Era setimo logar, elle era inimigo mortal de uma ccrla fnlsa piedade, cujo cnracterislico é a ociosidade; e freqüentes vezes

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ensinou que a verdadeira devoção das mulheres consistia em passar utilmente seu tempo, e empregal-o com uma santa economia, e tirar d’elle uma proveitosa usura para a eterni­dade.

Em oitavo logar, elle assegurava qne uma senhora christã deve principalmente fugir cora cuidado de tudo o que póde oITender o pejo. Elle considerava a honra e a pureza como a alma das mulheres, sem a qual ellas não são mais que sepul­turas vivas. Alguem lhe ouviu dizer unin vez a certa senhora que vivia liccncinsamente: «Meu Ucusl minha pobre íilha, alrevcis-vos a trazer um rosto dc mulber com um coração de furia? Na verdade, se promptamente não mudaes de* vida, pedirei a todos os vossos parentes que vos tirem um nome que dcshonraes.»

Em nono logar, não obrigava suas penitentes a passarem uma vida selvagem; pelo contrario, lhes recommcndava que vivessem segundo sua condição nns companhias, c que se prestassem a todos os entretenimentos c recreações conve­nientes á sua qualidade; mas queria que sua virtude fosse da natureza d’essa ave que se diz ser do paraiso, de que ella tem 0 nome, e que se pretende que passa toda n sua vida so­bre a terra, sem jámais pousar n’ella, de sorte que quando mesmo querem cansal-a, ella tem certos pequenos fios com os quaes se prende aos ramos de alguma arvore, onde fica por algum tempo suspensa. Da mesma sorte elle queria que se ellas chegassem n alTeiçoar-se a alguma creatura, não fosse senão para descansar em Deus e ligar-se a Elle, como aquel­les que pescam pérolas e achando-ns nas conchas das ostras, sómente estimam estes pequenos lhesouros que n'ellas estão encerrados.

260. — (S.LiGcnio, n.»* 96 e 97, í14-16o c 212-222.)- Com Ás mulheres piedosas que commungam com frequencia (lib. as pessoas VI, n.» 432. V. 4), rccommcndarcis cm geral que recebam oP*^®®*®- sacramento da penitencia ao menos cada semana. Quando não trouxerem mais do que imperfeições que não são pecca­dos veniaes certos, podeis, diz Bonacina, ( ') absolvel-as de-

(') k commuiilião que se faz uma vez todos os oilo dias não era considerada nos primeiros séculos como frequenle; santos auctores, mesmo muilo vizinhos a nossos tempos, não a consideram igualmente como tal. ..Nunca cu considerei como frequenle, diz S. Ligorio, a •communhão de cada semana: considcra-sc como lal aquella nue se •faz muitas vezes por semana. Sahc-sc, diz cllc lambem, que depois •do decimo seculo a tibicza dos Deis, que durou ale ao decimo sexto,«se tornou tão grande, que muito poucos haviam que commungassem «tres vezes no anno, c aquelle que commungava seis ou sete vezes no «anno era um prodígio; é o motivo por que na Vida de S. Francisco •de Salles se refere, como uma prova de grande piedade, que seu pae

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baixo de condição; mas eu não admitlo esta opinião senão cm casos raros, e quando estas pessoas não podessem em sua vida passada assignar umn matéria certa, ou sómente com grande custo. De resto digo, que quando o penitente não apresenta matéria cerUi, o confessor não é obrigado a ator­mentar-se para a achar, a lim de dar a absolvição; e no caso de a ter procurado sem a achar, não é obrigado n dar a absol­vição debaixo de condição. Isto tem logar quando o penitente se confessa de imperfeições dc que se duvida se chegam a peccado venial. Mas nccusando-se de peccados veniaes cer­tos e hahiliiaes, inipaciencias, giilodices, distracções, e cou­sas semelhantes, é necessário, para o absolver, que se veia se elle fez alguma vez violência e venceu sua paixão. N este caso podem considerar-se suas faltas antes como um elTeito da fragilidade humana, do que carência de contrição e (irme proposilo. Pelo contrario, caindo elle frequentemente em se­melhantes faltas, e isto sem resislencia, enlào deve ser tra­tado como recidivo (n.® 210).

Continua- 26 L — \hslende-vos de impedir as pessoas piedosas, e prin- Ção. cipalmenlc as mulheres, de se dirigirem a oulro confessor.

Quando ellas o (izerem, teslemunhae-lhes contentamento. Ainda mais, obrigae-as a ir algumas vezes a outros. Exce-

Stuo as almas mui escrupulosas, para as quaes haveria motivo c receiar grandes inquietações, se houvessem de dirigir-se

a um confessor que não conhecesse o estado de sua consciên­cia. A nenhuma pessoa testemunheis o desejo de dirigil-a. Nunca digaes mal dos outros confessores; pelo contrario, des- culpae prudentemente os erros nos quaes tenham podido cair. Não vos encarregueis d’aquelles que querem deixar seu con-

•commimgava (oilos os mnzos. Olhava-se como uma cousa muilo ad- «miravcl que S. Kraiicisco dc Bor<ria, sendo ainda secular, commun- «ga.<sc lodos os domingos, e o publico dizia que era c.xcessiva fre- •quencia; mas a grande Tricza d’cstcs tempos desgraçados não impede •que sc diga que a communiião mensal ou semanal não póde ser cba- «mada frequcMile, pois que, segundo a aniiga disciplina da Igreja, «deve ante.'! cliamar-se rara, do que frequeiile.» (Da communhão fre­qüente, pag. 7 e 31).

Esle opiiseulo do Saiilo foi apresentado ao Papa Clcmenlc. CllI, que Bcou satisfeito. Elle disse ao Santo, em uma cITusAo do coração, que ella mesmo por experiencia própria tinlia conhecido quanto esta prá­tica (da communhão freqüente; era vantajosa ao bem das almas, e o encarregou de refutar a opinião dos espíritos systcmaticos que sus­tentam 0 contrario. Voltando à sua re.sidencia, AlTonso se pôz ao tra- balho, c compò: uma erudita refutação, que togo foi impressa, c a apresentou cllc mesmo ao Soberano 1’ontillce, que llcou táo satisfeito deste opusculo, como admirado da facilidade com que elle o tinha acabado. |Vida do santo, pag. 234, extracto dos Principios de dire­cção por um professor de thcologia, pag. 4t, obra approvada por Mgr-. 0 bispo de Puy). (Nota do Iraductof francez.)

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fessor, sem ura urgente motivo, nisi adsit urgens causa; é esta a doutrina de S. Filippe de Neri, S. Francisco de Sal­les, e S. Carlos Borromeu. Com elTeito, daqui nascem a dis- sipaçào do espirito, os divisões c algumas vezes escandalos.NíIo c bastante, para mudar dc confessor, que o pcnilente sinta por elle uma especie de repugnância e de aversão, ou que não tenha conliança em suas palavras; porque Indo isto, diz Santa Thcreza, não é muitas vezes mais do mie nma ten­tação do demonio. D’aqiii este conselho de S. Francisco de Salles: «Não se deve mudar de confessor sem grande motivo; mas igualmente não se deve ser invariavel, quando sobrevem razões legitimas de perigo.» Dc resto, o falta de santidade, segundo Santa Thereza, póde ser um justo motivo de mudar de confessor. «Se o confessor, diz a santa, é sujeito a alguma vaidade, deve mudar se: sendo vaidoso, fará vaidosos seus penitentes.« A falta de sciencia póde lambem ser uma forle razão para mudar; mas 6 necessário que haja d’islo boas pro­vas. Finalmente, Santa Thereza diz que, em suas dúvidas, o penitenle póde, algumas vezes que lhe for util, lomar conse­lho de um oulro director erudito.

262. — Evitae lambem toda a parcialidade. Alguns ba que Coniinua- se ligam a algumas pessoas em particular. Para ellas lodo o zelo, tempo e cuidados. É verdade que certa pessoa póde ter necessidade de maior assistência do qne oulra; mas uma cousa é a assistência, e outra cousa é a alTeição, que faz des­prezar 0 cuidado dos outros. Assim, fareis bem assignando a essa pessoa mais necessitada um dia e hora particulares, a íim de que vo.ssos outros penitentes não solTram por sua cau­sa. Não levanteis muito a voz, confessando as pessoas piedo­sas, mesmo quando não fallaes de peccados; podereis fazer lenãer aos outros de confessar suns faltas. Não concedaes fa­cilmente ás pessoas novas a permissão de cortar os cabellos, nem de trazerem algum habito de religião. Antes dc chegar a isto, tende cuidado dc ns lirmar por muilo tempo na devo­ção e na virtude. Quantas não vemos que, em virtude desta condescendencia inconsiderada dos confessores, deixam seu uniforme e se rasam com grande escandalo do mundo! Não permittaes igualmente a estas pessoas novas que se façam ensinar a ler e muito menos a escrever por homens: quantas meninas innocentes lôcm achado a perda dc sua alma rece­bendo lições de leitura! Se isto não é uma occasião proxima de peccado, é ao menos uma muilo perigosa. Que se façam leccionar por uma mulher ou por um de seus jovens irmãos, e isto ainda cora precaução; de oulra sorte, não lhes deis a absolvição. Tralae da mesmo fórma as mães que permiUem isto. Finalmente, nâo permittaes ás pessoas novos que diva-

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guera ao acaso pelas igrejas, oem se demorem ahi muito tem­po, com risco de desgostar seus paes. Pelo contrario, exhor- tae-as a obedecer-lhes em tudo, e a fazerem de boa vontado tudo 0 que na casa se oITerccer. Como e quanto deveis fugir da familiaridade com vossas penitentes, ja vol-o disse cm os n.®' 136 c seguintes. Passemos agora á direcção das pessoas piedosas.

Motivos 263.— Eslns palavras, que o Senhor disse a Jeremias: Ecce ç meios dc constitui te super gentes, ut evellas et dissipes, et cedifices et ^r à confessores; porque elles de-feição. ' vem não sómenlc arrancar os vicios da alma de seus peniten­

tes, mas tambem plantar as virtudes. E portanto util indicar aqui, para os novos confessores, os meios de conduzir as al­mas piedosas á perfeição. Não se deve, como mais acima dis­semos, rcpellir os peccadores; mas é uma obra iniinitamcnte agradavel a Deus ornar suas esposas, quero dizer, cultivar as almas a (im de que sejam inteiramente snas. Uma alma perfeita lhe agrada muito mais do que mil imperfeitas. As­sim, quando virdes uma alma que vive isenta de peccados mortaes, nada deveis oinitlir para a introduzir no caminho da perfeição e do amor divino. Bepresentae Ibe as innumeraveis razões que temos de amar este Deus, que aliás é inlinita- mente amavel, e o reconhecimento que devemos a Jesus Christo, que nos amou até morrer por nós. Fazei-lhe com­prehender todo 0 perigo das almas que, chamadas por Deus a uma vida mais perfeita, ficam surdas á sua voz. Ora, a di­recção do confessor a respeito das almas piedosas consiste principalmente em tres cou.sas: na meditação ou contempla­ção, na mortilicação, e na frequencia dos sacramentos. Va­mos examinar cada uma em particular.

A medita- 264.— Quando encontrar uma alma que abomina o pcc- Ção. cado mortal, e que deseja adianlar-se no amor dc Deus, o

bom confessor deve primeiramente raovel-n a que faça ora­ção mental, quero dizer, a meditar nns verdades eternas c na bondade de Deus. Ainda que a meditação não seja necessa­ria á salvação como a oração, todavia parece que ella é ne­cessaria ás almas para se conservarem na graça dc Deus. 0 peccado é compatível com os outros exercicios de piedade; mas 0 peccado e a meditação duas cousas são que se excluem. Ou se deixará o peccado, ou se deixará n meditação. A alma me persevera na meditação, dizia Santa Tbercza, sejam quaes forem os peccados que o demonio the faça commetter, chegará certamente ao porto da salvação. Assim, de todos os exerci­cios de piedade, nenhum hn de que o demonio procure tanto desviar-nos; porque elle sabe bem. acrescenta a mesma Santa, que a alma fiel á oração é uma alma perdida para elle. Além

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d’isto, 0 amor é o laço que prende a alma a Deus. Ora, a fornalha onde se accende esle amor é a oração ou raedilação.In meclitatione mea exardescet ignis. (Ps. xxxviii, 4.)

265.— Começareis portnnlo iuiciaudo a alma na prálica da Modo de oração. Que faça a principio meia hora por dia: a duração fazer que a augraenlará com seu fervor. 0 penilcnlc vos dirá lalvez que“ "’®“*- não lem tempo, nem logar conveniente: não vos embaraceiscom estas dilliculdades. Dizei-lbe que ao menos dc manhã ou de scsla, quando está mais trnnquillo, ou mesmo durante 0 trabalho, quando de oulra sorte não o pújsa fazer, eleve sua alma a Deus, pense nas verdades da fé, nos novissimos, cuja lembrança, principalmente a da morle, é mais util aos principiautes, ou (inalnicnle na paixão do Salvador, cuja me­ditação convem a todos. Se a pessoa souber ler, fará bem servindo-se de um livro de piedade, ao menos para entrar em oração, como praticava Santa Thereza. Dizci-liie que escolha matérias que Ibe causem mais devoção; que se demore quan­do experimente algum bom sentimento, e que suppra as re­flexões com actos, orações, ou resoluções: 1.“ , com actos, quero dizer, aclos de humildade, graças, fé, esperança, prin­cipalmente multiplicados aclos dc contrição e de caridade, oITerecendo-sc c entregando-se inteiramente á vontade de Deus: terá cuidado de repelir as mais vezes possíveis o acto para o qual sentir mais allraclivo; 2.®, com orações. E da oração que depende toda a nossa perfeição, porque, diz Saulo Agostinho, 0 Senhor não concede ordinariamente suas gra­ças, c principalmente a graça da perseverança, senão á ora­ção. 0 Salvador nos diz: Petite et accipietis. Portanto, con- ciue Santa Thereza, aquelle que não pede não obtem. Se­gue-se d’aqui que se queremos salvar-nos, é necessário orar sempre, c pedir principalmente eslas duas graças, a perse­verança e 0 amor de Deus. Oro, o tempo mais proprio para a oração é certamente o da meditação. Aquelle que não faz oração raras vezes ora, porque raras vezes se applica a con­siderar as graças dc que tem necessidade, e a importância da oração. É por isto que aquelle que não faz oração, difli- cilmente persevera na amizade de Deus; 3.®, com resoluções, a lim dc que a meditação não lique esleril, c que a alma tire proveito das luzes hue na oração recebe. Nunca sc deve terminar a oração, diz S. Francisco de Salles, sem lomar al­guma resolução particular, como de evitar um defeito em que se cáe com frequencia, ou dc praticar uma virtude, na qual se conhece mais fraco. A esle respeito lereis os n.®’ 300 e se­guintes, onde vos darei instrucções para a oração mental.

266.— Exigireis d’eslas almas que vos dêem conta de sua Pcdh con- oração. Perguntar-lhes-heis como a Ozeram, ou mesmo sc a tas cfella.

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fizeram. Obrigae-as primeiramenle a accusar-se de lerem omillido sua oração, se islo tiver acontecido; porque se ellas deixam a oração, estão perdidas. A alma que abandona a oração, diz Santa Thereza, não tem necessidade do demonio para condemnar-se: etta por suas próprias mãos se cotioca no inferno. 0 Deus! que hciis poderiam fazer os confessores se fossem um tanto cuidadosos a esle respeito! Mas que contas não tôem a dar a Dons se não o fazem, pois que são obrigados a fazer todos os esforços para procurar a vantagem de seus penitentes! Quantas almas poderiam elles pôr no caminho da perfeição e preservar de reincidências em peccado mortal, se tivessem esta attenção lão pouco custosa de as iniciar na ora­ção e de lhes perguntar, ao menos no principio de sua vida espiritual, se ellas a tôem ou não feito! Quando umn alma está (irme na oração, é raro qne ella pcr&i a üeus. É o mo­tivo por que deveis aconselhar a oração não sómente ás almas tementes n Deiis, mas lambem aos peccadores. Por qne vol­tam elles a seu vomito? E ordioariamenle por que não refle- clem.

Consol.ar 267.— Esle cuidado dc pedir contas da oração, deveis prin-«ccufis empregal o quando vossos penitentes se acham

em desolação espiritual. 0 Senhor costuma allrahir a alma, que acahn dc sc lhe entregar, com luzes espcciacs, lagrimas e consolações sensiveis. Mas algum tempo depois Elle tapa a fonte d'cllns, n lim dc a elevar n maior perfeição, desapegnn- do-a d’estns doçuras sensiveis, nas quaes facilmente se intro­duz alguma imperfeição c algum novo apparecimenlo dc amor proprio. Sem.dúvida as consolações sensiveis, c principal­mente os allrnclivos naluraes, são dons dc üeus, mas não são 0 mesmo Deus. Assim, para desapegar suas esposas dc seus dons, e ohrignl as de aignma sorte a amar o Dador de um amor mais puro, permitte que ellas não encontrem mais na oração scns antigos gosos, mas desgosto, aridez, penas e algumas tentações. Tende o maior cuidado de exercitar a co­ragem d estas almas ndliclas, com receio de que ellas aban­donem n oração c as communhões prescriplas. Recordae-lhes 0 qne dizia S Francisco dc Salles, que uma onça de oração feita no meio da desolação pesa mais diante de Deus, do que cem libras feitas no meio de consolações. Com elTeito, aquelle

3ue ama a Deus pelns con.solaçõcs, mais ama as consolações e Deu.s, do que ao mesmo Deus; pelo contrario, mostra qiio

ama verdadeiramente a Deus aquelle que o ama e corre após d’Elle privado de toda a consolação: eis aqui quanto respeita á meditação. Julgo util dar aqui aos jovens conTessores al­gumas noções sobre a oração inTusa ou contemplação, sobre seus dilTerentes gráus e sobre os outros dons sobrenaturaes,

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com as regras Iraçadas pelos mestres da vida espiritual para a conducta das almas a quem Deus favorece com íguncs graças.

268.— Se encontrardes uma alma que lenha recebido o Conselhos dom da contemplação, deveis conhecer hem o modo de a di-rigir e de a preservar das illusões: de outra sorte lhe fareis piação.’ muilo mal, e dareis por isto grandes contas a Deus, diz S. João da Cruz. A contemplação dilTere muilo da meditação.Na meditação procura-se a Deus pelo esforço do pensamento; na contemplação se vê, sem fadiga, a Deus já ehcontrado. Na meditação, a alma obra por seu proprio poder; na contempla­ção é Deus que obra, emquanlo que a alma é passiva, rece­bendo os dons nelIa dilTundidos pela graça sem que ella de modo algum opere. Com elfeito, a luz e o amor divino de que ella eslá cheia a fazem amorosamente alleiila a contem­plar a bondade de seu Deus, que a cumula então de seus preciosos favores.

269.— Deveis lambem lembrar-vos que antes de conceder Seus difTe- ás almas o dom da contemplação, o Senhor ns introduz ordi- nariainente na oração de recolhimento ou de repouso contem- plativo. segundo a expressão dos mestres da vida espiritual.Não é isto ainda a contemplação infu.sa, porque a alma se acha ainda em estado activo. Este recolhimeulo (fallo aqui do recolhimento natural; fallarei mais adiante do sobrenatu­ral, n." 274) tem logar quando o e.spirito não precisa sair, de alguma sorte, fóra para considerar um niyslerio ou uma ver­dade da fé: mas que, desligado das crealiiras c retirado, para assim dizer, ao interior da alma, considera não sórnenle sem fadiga, mas com uma grande suavidade esla verdade ou este iny.slerio. 0 repouso contemplativo é quasi a mesma cousa.A unira dilTerença, é que no recolhimento a alma permanece applicada a um pensamento piedoso em parlimlar, emquanlo que no repouso um conhecimento geral dc Deus a lixa e a atlrahc amorosamente paia Deus. Ainda que este recolhi­mento ou este repouso contemplativo seja uma oração natu­ral, todavia qunndo a alma o experimenta deve cessar não sómenlc a meditação, mas lambem os actos da vontade, de amor, de oITereciinenlo, de resignação, e licar amorosamente unida a Deus em um repouso absoluto: eis aqui o que dizem alguns myslicos. Não me é po.ssivel quinhoar de sua opinião.

Eu não nego que a alma deva cessar de meditar quando ella está suíücicnlemenle recolhida, pois qne ella tem achado sem esforço o qne procurava; tanto que a meditação ordina­ria, como muito bem o diz o Padre Segneri (>), produz bre-

(') Concordância enlrc o trabalho c o repouso, parte 1.*, cap. i.

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vemcnle a contemplação que se chama adquirida, e que de uma só vista conhece as verdades, cujo conhecimento cra an­tes 0 fructo da reflexão e do trabalho; mas por que razão de­veria a alma n’estc estado abster-se dos bons actos da von­tade? Pelo contrario, que momento mais favoravel para os produzir do que este recolhimento? É verdade que S. Fran­cisco dc Salles aconselha a Santa Cbanlal, que não produ­zisse algum novo acto quando na oração ella se achasse unida a Deus. Por que motivo? Porque a santa gosava já da con­templação passiva. Mas quando a alma se acha ainda em es­tado activo, como poderiam os bons actos da vontade impedir as operações da graça? 0 mesmo Santo indicava ás almas piedosas entregues á sua direcção um certo numero de aspi­rações que deviam fazer durante este tempo. Se a alma sc acíia cm estado de contemplação passiva, então, ainda que ella não adquira algum merecimento, por isso que ella não obra, todavia recebe um grande vigor para obrar depois com mais perfeição; pelo contrario, no estado activo, para mere­cer deve ella obrar, produzindo actos de sua vontade. «As­sim, concilie muilo bem o Padre Segneri, quando Deus falia e obra, a alma deve calar-se e suspender suas operações; tudo 0 que ella deve fazer, 6 dar ao principio uma attenção cheia de amor ás operações divinas. Se Deus não falia, a alma deve, para unir-se a Elle, recorrer, segundo a necessi­dade, á meditação, aos alTeclos, ás orações e ás resoluções. Mas estes aclos, e isto se entende, devem fazer-se sem es­forço, escolhendo a alma com preferencia aquelles para que tiver mais allraclivo.»

Conducia 270.— Lembrae-vos que antes de fazer entrar a alma na de Deus. contemplação, costuma Deus experimenlal-a pela aridez so­

brenatural, a (im de a purilicar de suas imperfeições, que são obstáculos para a contemplação. Ora, dislingiic-se a ari­dez sensivel e a aridez substancial. Fallaremos d'esla ultima no seguinte numero. A aridez sensível, quando é naliirol, é acompanhada de fastio pelas cousas de Deus, de trevas me­nos espessas e menos duradouras. Quando ella é sobrenatu­ral, constitue a alma em umn ob.scuridnde profundíssima, mais aturada e sempre crescente. Todavia, n’este estado a alma se sente de uma parte mais desapegada das crenliiras c mais occiipada de Deus, a quem ella deseja com ardor e constancia amar perfeitamente; mas de outra parte ella se vê em uma especie de impotência de realisar seu desejo por causa de suas imperfeições, que lhe parecem allrnhir o odio dc Deus: apesar de tudo i<to não deixa de se exercitar cora­josamente na prática da virtude. Esta sensivel aridez é um raio dn graça, é uma luz sobrenatural, mas uma luz acompa-

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nhada dc sofTrimcntos c de trevas. Querendo conimunicar-se immcdiatnmentc, c encontrando os sentidos c facnldadcs da alma pouco próprias a recebel-a por causa das afleições sen­siveis e de alguma sorte materiacs, esta luz occasiona á alma estas trevas muito penosas, é verdade, mas utilissímns. Gra­ças a ellas, a alma se desata de todos os prazeres sensiveis, corporacs ou espirituaes. Ella adquire além d’islo um maior conhecimento de sua miscria, dc sua impotência para fazer algum bem, assim como um grande respeito por Deus, que ella representa magcstoso e terrivel. Ãnimae a alma que achardes n’cstc estado, e dizci-lhc que espere dc Deus gran­des cousas, pois a trata d’csta sorte; dizei-lhe que não se atormente a meditar, mas que se humilhe, que se oITcreça a Deus, e que sc abandone com absoluta resignação ás disposi­ções sempre henevolas de sua inlinitumcnlc aniavcl vonlade.

271.— Depois de ter puriiicado a alma de toda a alleição Coniiima- sensivel, o Senhor costuma communicar-lhe o dum da cõn- Ção. templação, do recolhimento sobrenatural, do repouso c da união. Mais nhnixo fnllaremos d’islo. .Mas antes da união e depois do recolhimento c do repouso, Elle a experimenta or­dinariamente pela aridez espiritual, chamada pur isto aridez substancial. Deus quer por isto que a alma sc aniquile em si mesma. \ aridez do sentimento é uma suhlracção da de­voção scDsivel: a aridez do espirito é uma luz celeste, pela qual Deus faz conhecer á alma o seu nada. É então que a alma se acha na maior e cruel agonia. De um lado ella se sente mais resolvida que nunca a vcncer-se cm tudo e a ser­vir a Deus; c dc oulro lado, conhecendo melhor suas imper­feições, parece-lhe que Deiis a abandona c despreza por causa dc suas ingrnlidões. Os c.xcrcicios dc piedade, as ora­ções, as communhões, as morlilicações não servem senão para mais a alDiglrem, porque fazendo-os com o maior des­gosto e maior tormento, julga que lodos elles a fazem mais culpavel e mais odiosa n Deus. Algumas vezes mesmo parece a estas pobres almas que ellas tôem odio a Deus, que Deus já as lem reprovado, e que principia n’esta vida a fazer-lhes experimentar as penas do inferno, abandonando-as. Outras vezes 0 Senhor permitte que esla desolação seja acompa­nhada de mil outras tentações c movimentos dc impureza, dc cólera, de blasphcmia, dc incredulidade, c principalmente de desesperação. Nesta estranha confusão c D’esla profunda obscuridade, não podendo bem distinguir n resislencia da vontade, temem ter consentido, e por consequencia se jul­gam muilo mais abandonadas dc Deus. Comtudo esla resis- teacia leve logar, mas as trevas que as envolvem as impedem de a conhecer ao menos com certeza.

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Conducta 272.— Se encontrardes uma alma d’este caracter, que, se- do ffuindo 0 caminho da perfeiçào, se julga abandonada por

comcssor. deixeis aterrar á vista d‘esta confusão, nemcom 0 recitado de seus sentimentos de temor e dc desespe- ração. Tende cuidado de não manifestar temor ou embaraço. Pelo contrario, exhorlae-a com força a que nada tema, e a que ponha mais qne niinca sna conliança em Deus, dizendo- lhe 0 qne o Salvador mesmo disse em um dia a Santa The­reza, que ninguém perde a Deus sem saber que o perde. Dizei-lhe que todas estas tentações de blasphemia, de incre­dulidade, de impureza, e desesperação, não são consenti­mentos, mas tormentos, que, siipportndos com resignação, tornam mais íntima sua união com Deus. Dizei-lhe que Deusnão poderia aborrecer uma alma que o ama e quo tem boavontade; que é assim que Elle trata as almas ns mais queri­das a seu coração. Ü com securas e tentações, diz Santa Thereza, que o Senhor prova seus amigos. Quando a aridez durasse toda a vida. a alma não deve abandonar a oração; tempo virá em que tudo será pago. Excellente instrucção para uma alma desolada. Exborlac-a portanto a esperar lirme- mente grandes cousas, pois que Deus a conduz pelo caminho mais seguro, o caminho da cruz. No entanto, dizei-lhe: 1.®, que se humilhe e reconheça digna de igual tratamento por causa de suas iniidelidades passadas; 2.°, que se resigne in­teiramente com a vontade de Deus, oITereccndo-se a solTrer seus tormentos e ainda maiores, segundo lhe agradar; 3.®, flue se abandone, como se estivesse morta, nos braços da divina bondade, e na protecção de Maria, a quem a Igreja chama a Mãe de misericórdia c a consoladora dos allliclos.

Differcntes 273.— A aridez sensivel dura até que os sentidos estejam de conícm P^rilicados e que a alma esteja prompta para a contempla-

ptação. 'Ç®o- 4 aridez do espirito dura até que a alma esteja própria para a união divina. Notae uue depois da união o Senlior permitte a repetição d’csla aridez, a lim, diz Santa Thereza, que a alma não se descuide, e sinta de tempos a tempos seu nada. Quando pois as nITeiçõcs estão purificadas, e extincta a aridez scnsivel, o Senhor admittc n alma á contemplação. A contemplação é affinnativa ou negativa. É affirmativa, quando, por meio da luz divina e sem esforço de sua parle, a alma vê alguma verdade creada, como a desgraça do inferno ou a felicidade do paraiso, etc., oii alguma verdade increada, como a bondade de Deus, sua misericórdia, seu amor, seu poder. É negativa, quando n alma conhece ns perfeiçõcs di­vinas, não em particular, raas em geral, e que este conheci­mento coufuso lhe dá uma alta idéa da grandeza de Deus. Esta especie de contemplação lhe faz tambem conhecer con-

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fusaraenle alguma verdade creada, por exemplo, os horríveis tormentos do inferno, etc. Fallcraos agora dos primeiros gráus da contemplação, a saber: o recolhimento c o repouso; fallaremos mais adiante da união.

274.— 0 primeiro gráu da contemplação é o recolhimento Primeiro sobrenatural. Em o n.® 2G9 temos fallado do recolliimento natural; elle tem logar quando a alma recolhe suas faculda- Xç®™ ’ des para considerar a Deus no intimo de si mesma. Deve o rccóllii- nolar-se que se chama natural, não porque a alma possa por menio so- suas próprias forças operal-o: toda a acção virtuosa para me-brenatural. rccer a vida eterna necessita da graça, c esla a razão por que, fallando em geral, ella é sobrenatural; mas dá-se-lhe esle nome, porque a alma se acha enlão cm um estado activo, e obra com o soccorro das graças ordinarias. 0 recolbimcnlo sobrenatural é aquelle que Deus mesmo opéra no meio dc uma graça extraordinaria que põe a alma cm um e.slado pas­sivo. Assim, 0 recolbimcnlo sobrenatural ou infiiso tem logar

Suando as potências da alma se recolhem não pelo esforço do ornem, mas pela luz que Deus dilTunde, e que accende na

alma um grande e sensivel amor. N ’este cslado a alma nada deve fazer para interromper esle enlrelenimeiilo Iranquillo in­spirado pela doce verdade; ella não deve igualmente fatigar-sc para ponderar cousas particulares, como sua indignidade ou as resoluções que póde fazer; ella não deve mesmo procurar saber o que é esle recolhimento: seu principal dever é dei­xar-se conduzir, seja a considerar as verdades, seja a produ­zir os aclos, pelos quaes Deus lhe dá maior allraclivo.

27o.— 0 segundo gráu é o repouso. iNo recolliimcnto, a Segundo força do amor é communicada immedialamenlc aos sentidos gráu o «- exteriores, que Deus mesmo obriga a recolber-se no intimo da alma. No repouso, o amor 6 communicado immediala- tnenle ao espirito no fundo da alma: o amor é mais ardente e se faz sentir aos sentidos mesmo. Comtudo nem sempre isto acontece. Algumas vezes a alma gosa da oração do re­pouso, sem alguma doçura sensivel. Santa Thereza diz que n'esta oração nem todàs ns potências da alma estão suspen­sas [ín Vita, cap. xiv); que a vontade está ligada, porque en­tão ella não póde amar senão a Deus, que a altrnhe a si; mas que 0 entendimento, a memoria ou a imaginação (icnm li­vres, c divagam por aqui e por alli. É por isto, diz a Santa, que a alma não deve inquielar-se, mas rir-se dc seus pensa­mentos, tel os como loucos, c (icar cm repouso: pois que a vontade impera, ella saberá rcconcenlral-os sem que tenhaes com isto trabalha. (Cam. daperf., pag. 200.) Com cffeito, sc a alma quer applicar-sc a recolher seus pensamentos, nada fará e perderá seu repouso. N’este estado, muilo menos ainda

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do que no recolhiraenlo, a alma não deve esforçar-se por for­mar resoluções ou outros actos dc sua escolha, deve conten­tar-se de fazer aquelles para os quaes sc sente docemente at- Irahida por Deus mesmo.

Oração dc 276.— Fallemos agora da oração de pura contemplação, quero dizer, da contemplação negativa, acima indicada, e que

P ç«o. perfeita do que a allirniativa. Esta contemplação ne­gativa se chama a clara obscuridade, porque a abundancia da luz obscurece o entendimento. Como aquelle que íi\a a vista no sol lica oifuscado por seu esplendor, nada vô, mas comprchcnde que o sol é um grande fóco de luz; assim, n’esta obscuridade. Deus communica á alma uma abundante luz, que não lhe dá a inteiligencia de alguma verdade parti­cular, mas uma noção geral e confusa da infinita bondade, de sorte que a alma forma de Dous uma idéa confusa, 6 ver­dade, mas muito perfeita. Quando a ahna conhece imperfei­tamente alguma das pcrfeições de Deus, ella tem certamente uma idéa de sua bondade; porém maior é esta idéa, quando ella conhece que a perfeição é incomprehensivel. Em suas admiravcis cartas, o Cardeal Petrucci diz que esta oração da obscuridade se chama assim, porque n’esta vida a alma é in­capaz de conhecer claramente a Divindade, de sorte que mesmo n’eslc estado ella a conhece scni a conhecer, sómente ella a conhece melhor do que por outro qualquer meio. Ella não a conhece, porque Deus não sendo uma cousa que possa revestir uma imagem ou uma figura, o entendimento não po­deria formar d’ella uma idéa perfeita; assim não compre- hende outra cousa senão que o não póde comprebender. É por isto que S. Diniz, o Areopagita, chama esta inteiligencia 0 conhecimento sublime de üeus por ignorancia. N’esta ora­ção de obscuridade, todas as potências interiores da alma es­tão suspensas, muitas vezes mesmo os sentidos exteriores; de sorte que a alma algumas vezes entra na embriaguez es­piritual, que se manifesta pelos acto.s de um amor em dclirio, taes como cantares, gritos, lagrimas abundantes, .saltos, e cousas semelhantes, como acontecia a Santa Magdalcna de Pazzi.

Oração 277.— Depois dc lhe ler feito percorrer estes diversos (te união, gráus, o Senhor conduz a alma á união. 0 unico lim da alma

deve ser de unir-se a Deus. Mas para salvar-se não é neces­sário que ella chegue á união passiva, hasta a união activa. Deus nâo conduz todas as almas por caminhos sobrenaturaes, diz Sanla Thereza; lia mesmo poucas que elle dirija por esle modo. No céo veremos muitas que, sem terem lido estas graças exlraordinarias, serão mais gloriosas do que aquellas que as tiverem recebido.. A união activa é a perfeita confor-

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midade com a vontade de Deus; é n’isto, sem dúvida alguma, que consiste toda a perfeição do am<ir divino. A perfeição, diz Santa Thereza (Pensam. 111), não consiste no exlasis; mas a verdadeira união da alma com Deus é a união de sua vontade com a vontade divina. Esla união é necessaria, mas não a união passiva. As almas que sómente gosam da união activa, diz em outra parle a mesma Santa, podem ter muito maior merecimento, porque ella é o fructo de seus esforços; o Senlior as trata como almas fortes, a quem Elle reserva, para lh'o dar juntamente, aquillo de que nesle mundo as priva. (Cons. 22.) 0 Cardeal Potrncci acrescenta qne, na conlem- plnção infiisa, n alma muilo hem póde chegar, com o soccorro da graça ordinaria, a destruir sua própria vontade, e a trans- formal a em Deus, não querendo mais do que aquillo que Deus quer. As paixões de (|ue ella experimenta os movimen­tos não a impedem de sc transformar em Dens. Ora, consis­tindo n’islo toda n santidade, a alma não deve desejar c pro­curar outra cousa, senão que Deus a conduza, e. faça d’ella segundo sua vontade.

A grande mestra da oração, Santa Thereza, diz que na união passiva a alma não vé, nem sente, nem percebe seu es­tado, porque a abundancía da luz c do amor formn csla bcm- avenluraüa obscuridade, na qual sc ariinm suspensas todas as potências dn alma. A memória não se lembra senão de Deus; a vontade de tal modo está nnida a Deus, que não póde amar outro objecto, e o entendimento é cheio dc tanta luz, qne não póde pensar em outra cousa, mesmo na graça de que gosa, de sorte que elle conhece, mas sem compre- hender. Em uma palavra, a alma n’esle estado possuo um conhecimento claro c cxpcrimcnlnl dc Dens presente, que une intimamente csla alma a si mesmo. Esta união, coniinúa a Santa, não dura senão, quando muito, meia hora. [Vida, cap. xviii.) Nas outras contemplações de que temos fallado, Dens se faz conhecer como vizinho; mas aqui é como pre­sente, e a alma tem o delicioso sentimento de sua união com Elle. É a razão, diz a Santa, por que nas outras contempla­ções a alma póde duvidar se é Deus, mas aqui não póde. Comludo, 0 confessor deve adverlil-a que ella não é por isto impeccavel; qne assim, quanto mais favorecida é, tanto mais deve ser humilde c desapegada, amar a cruz, ser cheia dc conformidade com as disposições da Providencia, temendo com justo titulo que suas iniidelidades sejam para o futuro punidas com mais severidade por causa dc sua ingratidão. A Santa diz que conhecera muilas que tinham chegado a este estado de união, c que tinham depois caido miseravelmente no desagrado de Deus.

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Tres 278.— Ha Ires especies de uniões: a união simples, a cspccies união ie esponsaes, e a união consummada, chamada matri- c uniao. gspiriiual. Á união simples é aquella de que até aqui

temos fallado. Expliquemos agora a união de esponsaes. 0 Senhor faz ordinariamente preceder esla união da aridez substancial, que serve de purilicação ao espirito: falíamos d’isto em o n.» 270. Nesta especie dc união se di.stinguem tres gráus, o exlasis, o arrebatamenlo, a elevação ou vôo do espirito. Na união simples as potências da alma cslão sus­pensas, mas não os sentidos corporaes, ainda que se achem (|uasi fóra do cslado dc obrar. No extasis se perde lambem 0 uso dos sentidos, de modo que se não vé, uão se ouve, e mesmo se é insensivel ás pancadas e agitações. 0 arrebata- mento é uma impressão mais forle da graça pela qual o Se­nhor eleva não sómente a alma até á união, mas lambem a arrebata por um movimento subilo e violento, de sorte que 0 corpo mesmo se acha algumas vezes levantado da terra e tornado leve como uma penna. 0 vào do espirito lem logar quando a alma se scnle como transportada fóra do corpo, e levantada acima de si mesma com muiUi força, o que, ao principio, Ibe causa grande terror. Assim, no vôo do espirito sc acha o exlasis, pois que ha perda dos sentidos, da mesma sorte que arrebatamenlo, quero dizer, movimento violento. Uma pessoa favorecida com iguaes graças me disse que no vôo espiritual lhe parecia que sua alma eslava arrancada do corpo, c impeilida com lanla violência, que ella julgava fazer uma viagem dc ura milhão de leguas em um momento, e isto com grande terror, porque não sabia onde devia pousar; mas que parando instantaneamente, ella eslava cercada de luzes que lhe faziam peneirar algum segredo divino. Pergunta-se, estando n’esla união, suspensas as potências e oITuscado o entendimento pela luz a ponto dc não pnder roflcclir no que vô, como pódc a alma considerar c referir esle divino se­gredo? Os auctores respondem que Deus quando quer fazer entender á alma algum segredo, ou dar-lhe alguma visão, Elle enfraquece um pouco sua luz, de sorte que a alma con­serve 0 poder de conhecer e reflcclir no que Deus quer fa­zer-lhe entender.

üniãocou- 279.— A união consummada é a mais perfeita, é a maissummada. intima que o Senhor póde conceder n’estc mundo a uma alma

viadora: chama-se matrimonio espiritual. A alma é transfor­mada em Deus, e sc torna uma mesma cousa com Elle, como um vaso de agua posto no mar se torna uma mesma cousa com a agua do mar. Nas outras uniões, as potências estão suspensas: não é o mesmo aqui, porque as potências, purifi­cadas do que ellas tôem de sensível e grosseiro, são próprias

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pnra a união divina. Assim, a vonlade ama seu Deus com uma suprema felicidade, e o entendimenlo conhece e redecte nesla união inlima. Ê como se alguem lixasse n visla no sol sem íicar deslumbrado e conhecesse todo o seu esplendor.Deve nolar-se que esla união não é passageira como ns ou­tras; ella é permanente, dc modo que a nima gosa hnhitual- menle, na maior paz, da presença de Deus, com quem ella está uuida. As paixões não a perturbam mais; ella as vè mos­trarem-se, mas sem a allligircm: como ura homem posto acima das nuveus que veria formarcra-sc as tempestades nas regiões inferiores, mas que não as sentiria.

280.— E util fallar aqui das visões, dos colloquios c das Visão. revelações, a lim de discernir as verdadeiras das falsas. En­tre as visões umas são externas, outras imaginarias, ou final­mente inlettecluaes. As visões externas s.ão aquellas que se vôem com os olhos; as imaginarias, aquellas que sc passamna imaginação; as iniettectuaes não se vôcm nem com os olhos, nciu com a imaginação, mas com o entendimento por meio da luz divina, que fornccc os objectos d’ellus. Esta es­pecie de visão, diz Sanla Thereza, 6 toda espiritual; os sen­tidos exteriores nenhuma parle tôem D'elln, oem igualmente os sentidos interiores, como a imaginação. Deve nolar-se que com os olhos ou imaginação a alma não póde ver os objectos senão debaixo de uma apparencia corporal, embora cstcs objectos sejam substancias espirituaes. Pelo contrario, com o entendimento as mesmas cousas maleriaes se vôem como se fossem espirituaes, ou, para melhor dizer, ellas sc conhecem e não sc vôem: ellas se conhecem mesmo mais perfeitamente, do que se com os olhos do corpo sc vissem.

281.— Deve saber-se que estas visões podem ser obra dc VerdadeL- Deus ou obra do demonio. 0 mesmo é das inlellcctuacs; aorasefaisas que parece, segundo S. João da Cruz, coulra a opinião do'^‘®"®®- Cardealíetrucci (Gráu, liv. II, cap. xxiv.) Comtudo as cor-poraes são mais sujeitas á illusão; o mais das vezes, nas mu­lheres principalmente, são parlo da imaginação. Os signaes para distinguir as verdadeiras das falsas são: 1.”, sc ellas veem subitamente e sem que a alma pense n’islo; 2.”, se ellas co­meçam por causar confusão c terror c acabam por constituir a alma cm paz; 3.“, se ellas são raras; porque aquellas que se repelem com frequencia são muito suspeitas; 4.', se du­ram pouco; porque, diz Santa Thereza, quando a alma con­templa por muilo tempo o objecto que lhe c representado, é um signal de que a visão é antes o elfeilo da imaginação: o mais das vezes, a visão divina passa como um relampago, mas fica fortemente impressa na alma; S.®, a visão verdadeira deixa na alma uma profunda paz e um vivo conhecimento de

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sua própria miséria com um grande desejo da perfeição; mui­lo diüerente das visões diabólicas, que não produzem mais do que impressões passageiras, e deixam na alma secura, in- quielação, movimentos de própria estima e um gosto sensivel por estas pretendidas graças. Comludo, estes signaes todos, diz Santa Thereza, não dão uma completa segurança. Muitas vezes 0 demonio sabe fingir um repouso, pensamentos de hu­mildade, desejos de perfeição, de que não é facil reconhecer 0 auclor: elle faz tudo islo para surprender a conliança e con­duzir a alma a algum laço. E a razão por que o direclor, re- gularnienle fallando, deve absler-se de prohibir á alma de lhe parlicipar esla especie de visões; deve, pelo contrario, mandar-lhe que diga o que ella vô, quer seja verdadeiro, quer falso: é o conselho de Santa Thereza. Por outro lado não deve mostrar-se curioso de saber esla especie de cousas, não as perguntar pelo miudo, nem prevenir a resposta, di­zendo: Islo talvez se passa d’este modo? Tendes vislo islo ou aquillo? Com elleilo, expondes a pessoa a responder allirma- tivamenle, seja por malicia, seja por simplicidade. Se co­nhece evidentemente que estas visões não são mais dn que o elfeito da imaginação, ou a obra do inimigo, seja porque el­las enfraquecem na alma a obediencia, a humildade ou as ou­tras virtudes, então deve dcclarar-lb’o sem demora. Se elle nada sabe, não deve dizer que ellas são diabólicas ou imagi-

. narias, como alguns que se mostram muito incrédulos, era- quanto que outros, excessivamente crédulos, as tomam por verdadeiras. Deveis dizer á vossa penitente que peça a Deus que a tire de um caminho tão perigoso, protestando que n’esle mundo não quer conhecel-o senão pela fé. Quanto ao mais, insinuae-lhe que tire de suas visões, verdadeiras ou fal­sas, um fructo certo, quero dizer, de ser mais liei a Deus. D ’csla sorte, se o demonio for o auctor, ella não será viclima de suas illusões.

Colloquios 282.— Quanto ao colloquio, póde ser successivo, formal c substancial. 0 collonuio successivo tem logar quando a alma, meditando uma verdade da fé, se ouve dc algum modo res­ponder por seu espirito, como se fosse outra pessoa. Se elle produz elTeilos de um amor ou de uma humildade extraordi­nária, póde ser uma luz especial de Deus; mas quando não sc experimenta mais que amor ordinário, é um signal dc que tudo vem do proprio entendimento. 0 colloquio formal tem logar quando a alma ouve certas palavras dislinctas, mas ex­ternamente a ella. Ora, póde ouvil-as com os ouvidos, com a imaginação, ou cora o entendimento. 0 meio de distinguir se 0 colloquio é divino ou diabolico, é prestar attenção ás cousas que elle expressa ou manda, e aos elTeitos que produz.

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Se elle vem de Deus, e se elle mauda actos dc pacicQcia, de espiritualidade, ou dc própria abjecção, communicará grande facilidade em sofTrer, em exercitar-se c cm humilhar-se. 0 colloquio substancial é o mesmo que o forilaal. Sómente dilTe- rem no elTeito; o colloquio formal instruc ou manda; o sub­stancial opéra subitamente o que elle exprime, por exemplo, se elle diz: Consolae-vos; não temaes; amae me; no mesmo in­stante a alma é consolada, socegada, inOammada. Este collo­quio é mais seguro do que o outro, que é muilo incerto; é mesmo muilo suspeito, principalmente quando manda certas cousas. Sc ellas são contrarias á prudenria chrislã, o confes­sor deve absolutamente prohibil-as; se ellas não forem contra­rias a esla virtude, é bom, não obstante, suspender o cum­primento até que haja maior certeza, principalmente Iralan- do-se dc cousas extraordinarias.

28 'J .— Finalmente, quanto á revelação de cousas occultasKcvclaçõcs ou futuras, por exemplo, dos mysterios da fé, do estado das consciências, da predestinação das almas dos mortos, da ele­vação a certas dignidades c outras semelhantes, podem ter logar dc tres modos: por visões, por colloquios, ou por vista clara da verdade. Deveis mostrar-vos muito reservado e muilo diflicil em acreditar esta especie de revelações, mais ainda cm dar-lhe impulso quando sc trata de aconselhar al­guma cousa em cousequencia. Sobretudo, probibi á pessoa de fallar d’isto seja a quem for. Procedei em tudo com a maior prudência, ajudando-vos mesmo do conselho dos mais sabios, porque estas revelações são o mais das vezes duvido­sas e suspeitas. Menos suspeitas .são as vistas claras pelo que respeita aos mysterios e allribulos de Deus, á malicia do peccado, á desgraça dos condemnados, e outros semelhantes.Se ellas são conformes á fc, a alma não deve esquadrinhal-as, diz S. João da Cruz; sc ellas Ibe são dadas, não as deve re­jeitar, mas recebel-as com humildade.

284 .— Deve rcjeilar-se ou admiltir-sc esla especie de gra- o que se ças e de communicações sobrenaluraes? Deve dislinguir-se, como diz um sabio auctor com S. João da Cruz e muitos ou- dasosia.': tros (Caslelvel., Dir. myst., I, 2 . p. 2 , cap. i), todos estes graças na- generos dc graças que desviam da fé, porque ellas consistem mraes. em certos conhecimentos dislinolos, sejam visões, colloquios, revelações, devera ser absolutamente rejeitadas; aquellas, pelo contrario, que são conformes á fé, laes como os conhe­cimentos confusos e geraes, os atlraclivos divinos que unem a alma a Deus, não devem ser rejeitadas; póde-se mesmo dc- sejal-as com humildade e procural-as, a (im de unir-se mais estreitamente com Deus, e (irmar-se em seu amor. Todavia entende-se isto das almas já favorecidas cora iguaes graças.

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Quanlo ás outras, o caminho mais seguro é desejar e procu­rar sómente n união activa, quero dizer, a união dc nossa vontade com a dc Deus. Se portanto vos vier uma nIma com suas commiinicações de contemplação ou de obscurida­de. não deveis ordnnar-lhe que as rejeite, mas sim que ns re­ceba com humildade e acção de graças. Nunca vossas pala­vras lhe dôem uma segurança completa, mas a entretenham em um certo receio que, sem lhe dar inquietação, a conserve na humildade o desapego. Quanto aos conhecimentos distin- ctos por meio de visões on dc outra sorte, assim como acima 0 dissemo.s, deveis mandar-lhe absolutamente qnc os rejeite, mas sem aclo dc desprezo, como cuspir na face, fazer Iregei- los, 0 que não é permittido segundo um grande numero de auctores, c que proteste a Dmis que o quer servir em pura fé. Quanlo ao mais, Santa Thereza diz [Vida, cap. xv), qne todas as vezes que na oração a alma sc sente docemente ahrazada de amor por Deus, ella deve ter a communicação por divina, não para sc julgar melhor do qne as outras, mas para se animar a nma maior perfeição; d'esla sorte o demo­nio, snpposlo venha islo d’clle, perderá muilo e cairá em seiis proprios laços.

Conclusão. 28d.— Concluamos: 1.“ , Ordenareis á alma, como acima 0 dissemos, de vos participar todas as communicações que na oração receber, sem comtudo vos moslrardes curioso de as conhecer. A ninguém digaes as graças sobrenaturaes con­cedidas á vossa penilenle; seria isto uma razão para que fos­sem recommendar sc a ella. e para ella um grande perigo de cair em vaidade; ou, descobrindo-se n’ella o menor defeito, será para um grande numero um motivo de escandalo c de escarneo. 2." Não testemunheis a esla alma privilegiada al­guma estima particular, com mais forte razão ahslende-vos de enviar vossos outros penitentes a pedir-lhe conselhos di- rcclivos; moslrae anlcs qne fazeis menos caso d‘ella, do que dos outros que andam pelo caminho da fé. Uegularmcnte fallando, estas almas privilegiadas devem ser entrelidas conslanlemcnle cm uma profunda humildade. 3.® Se virdes que a alma se conserva humilde e limida n’eslc genero de communicações, deveis ajiidal-a, e mesmo algumas vezes as­segurar-lhe que ella não está em illu.são,se achardes que islo seja util. Sanla Thereza diz, que a alma nunca fará grandes cousas para Deus, sc ella não reconhece que recebeu de Deus grandes graças; ora, não ha dúvida qne os favores particula­res servem muilo para inilammar o amor. Vôde esta Santa Thereza; apenas foi cerlilicada por S. Francisco dc Borgia e por S. Pedro de Alcantara, que os dons que elln recebia vi­nham de Deus, fez rápidos progressos na virtude. Quando

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mesmo a alma caísse de tempos em tempos em alguma falta, todas as vezes que estas faltas não são plenamente delibera­das nem commeltidas com alTeição, c sem adverlenein, não julgueis por islo qne todas as cummunicações sejam lacos e Illusões. 0 Senhor fa vorece com dons sobrenaturaes não só­mente as almas perfeitas, mas algumas vezes tambem as im­perfeitas, a lim dc as livrar de suas imperfeições e dc as ele­var a uma vida mais perfeita. Quando pois virdes que estas coramunicaçõcs libertam de mais em mais a alma dc suas paixões, a fazem progredir no amor divino e no desejo da perfeição, c signal de que são de bom quilate. Quanto ao mais, iralando-se de graças exteriores, Uies como visões, col­loquios, revelações, leslcmunhae qne nno fazeis caso d’islo; é 0 mais seguro, geralmente fallando. Recordae-vos do con­selho que depois de sua morte Santa Thereza dava do alto do céo a uma dc snas religiosas: Não soceguem as almas sobre as visões e sobre as revelações particuíares. e não fa­çam consistir n'isto a perfeição; sem dúvida alguma as ha verdadeiras, porém muitas são falsas e enganosas; ora, é dif- ficil distinguir uma verdade entre numerosas mentiras. As­sim, ba máis visões falsas do que verdadeiras. Quanto mais se procuram, mais se estimam, e mais se apartam do cami­nho estabelecido por Deus, como o mais seguro, o caminho da fé e da humildade.

Direis portanto a esta alma que peça a Deus o verdadeiro exlasis, que é o desapôgo completo das cousas da terra e de si mesma; sem isto cllii certamente não se salvará. Sobre­tudo se virdes qne ella não está bem fundnmcnluda no co­nhecimento de sua própria miséria, qne ella (pier ler como certo que as communicações veem de Dens, e se perturba ouvindo yos dizer qne não as considcraes como taes, é máu signal. E signal, on que ellas são a obra do demonio. e for­necem a prova d’ísto a alTeição e orgulho, que são iima con­sequencia, oti que a alma não anda em bom caminho. Com effeilo, ella deve ao menos duvidar quando seu confessor du­vida. É por islo qne em igual caso procurarcis inspirar-lhe a maior humildade c temor possivel. Se ella não se render, tirar-lhe-heis a conimunhão, e a tralareis severamente, por­que eslá muilo exposta a ser enganada pelo demonio. Final­mente, se julgardes a proposito assegurar á alma qiie suas communicações veem de Dens, cxhorlac-a todavia a propor- se sempre em suas orações, ao menos no principio, algum ponto da vida ou paixão de nosso Senhor. «Se a alma aban­dona a conducla do bom Jesus, dizia Santa Thereza, ella nunca chegará á perfeita união com Deus. As almas princi­piantes meditam na paixão do Salvador raciocinando; as con-

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templativos já não raciocinam; mas, lendo debaixo dos olhos algum myslerio, ellas admiram a bondade, a misericórdia e 0 amor divino: é d’aqui que Deus os eleva, quando quer, á contemplação de sua mesma divindade.»

DOAS OnnAS que as oevem occupaii

Morliflca- 280.— Eis aqui 0 que a respeito da mortificação deveis C5CS noiar. Quando as almas principiam a dar-se a Deus, o Se­

nhor costuma allrahil-as por consolações mais sonsiveis. N'esle primeiro fervor ellas quereriam malar-se com disci­plinas, cilicios, jejuns e outros exercicios alBiclivos. Deveis por consequencia moslrar-vos muilo reservado em conceder- Ibes semelhantes mortificações. Porque chegando o momento da secura, como ordinariamente acontece, é perigoso que a alma, privada do fervor sensivel, abandone lambem todas as mortificações, e que, caindo no desalento, deixe a oração e mesmo a piedade como cousas que não são feitas para ella, e assim perca tudo. Algumas vezes lambem esle fervor conduz os pessoas principiantes a indiscrições que as fazem adoecer; então, para se tratarem, abandonam todos os sciis exercicios de piedade com grande risco de os não reassumirem. Vosso primeiro cuidado portanto será lirmal-as na vida espiritual. Depois, segundo as circumslancias dc saude, dc empregos e de fervor, lhes permillireis algumas mortificações corporaes. Para saber aquellas que podem convir-lhe, consullae a pru­dência christã. Eu digo a prudência christã; com elTeito, en­lre os direclorcs imprudentes, alguns ha que parecem fazer consistir todo o progresso dc uma alma cm rarregal-a dc je­juns, de cilicios, de disciplinas sanguinolentas, etc.; outros parecem rejeitar todas as mortificações exteriores como inú­teis para o progresso espiritual, dizendo que toda n perfeição consiste na mortificação interior: elles se enganam. As mor­tificações corporaes ajudam a mortificação interior; ellas são até certo ponto necessárias, quando é po.ssivel pralical-as, para reprimir as paixões. Nós vemos que todos os santos as praticaram, uns mais, outros menos. Sem dúvida a mortifi­cação interior é a primeira que se deve exigir; ella consiste, por exemplo, em não responder ás injurias, em nada dizer que possa redundar em nossa vantagem, em ceder nas con­testações, em condescendcr com as vontades dos outros, quando sem damno espiritual se pódc fazer. Assim, dá-se o conselho de prohibir algumas vezes á alma todas as mortifi­cações exteriores, até que ella esteja livre de certa paixão que a domina, como a vaidade, o rancor, o interesse, a pro-

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pria eslima, a própria vontade. Mas dizer que as mortifica- çõe.s exteriores de nada ou pouco servem, c um erro muilo grande. Não acrediteis aquelle que desapprova as penilen- cias, dizia S. João da Cruz, embora tivesse o dom dos mila­gres.

287.— Logo no principio adverlireis o penitente que nada Eiia.s faça contra ou sem vossa ordem. Aquelles que fazem peniten- devem .sei cias contra a obediencia, dizia S. João da Cruz, adiantam pc\l o\ít muito mais depressa no vicio do que na virtude. Sede reser- diencia. vado em pcrmillir semelhantes mortilicações, ainda que os penitentes vos peçam com instancia. Basta (|uc a principio lh’as conccdaes raras e leves, taes como o cilicio, a disciplina ou abstinência, anlcs para lhes causar desejo, do que para os morlilicar como convem. Com o tempo vos tomareis mais fa­cil, segundo o progresso da alma na virtude; qiiando ella está firme na piedade, não se póde sem escrupulo recusar-llie as mortificações que lhe convem. Quanlo eo mais, tende como regra geral, ordinariamente fallando, não conceder as morti­ficações exteriores senão quando vos forem pedidas; porque ellas de pouco servem não sendo praticadas com grande ar­dor. Dando-as, concedei sempre menos do que vos pedirem; antes cai, como diz Cassiaiio, no excesso da recusação, do que da concessão. Inspirae sobretudo a mortificação da bôca: certas pessoas piedo.sas prestam a isto pouca attenção. Gom- ludo ella c na realidade a mais peuosa e ao mesmo tempo a mais util á alma, c muitas vezes mcsnio ao corpo; S. Filippe de Neri dizia: Aquelle que não morUfica sua bôca, nunca chegará á perfeição. Pelo contrario, sede diflicil em conceder um córle ao somno necessário; islo é nocivo á saude do corpo e mesmo á da alma. Quando se não toma o somno necessá­rio, a cnhcça solfre, e solTrendo a cahcça, lica-sc incapaz da meditação e dos outros excrcicios dc piedade. Mas sejam quaes forem as mortilicações que conccdaes ao penitente, di- zei-lhe, com receio de que elle sc ensohcrhcça, que islo nada é em comparação do que fizeram os santos, e dos solTrimen- l03 que no.sso Senhor experimentou por nosso amor. Tudo o que nós podemos fazer, dizia Sanla Thereza, não é mais do que uma nodoa em comparação de uma só golla do sangue que 0 Salvador por nós derramou.

As melhores morlilicações, as mais uteis c as menos peri­gosas, são as negativas. A obediencia mesma, ordinariamente íallando, não é necessaria para as exercitar. Eis aqui algu­mas: privar-se de ver ou ouvir cousas curiosas, fallar pouco, contenlar-sc com comidas que não são de seu gosto ou mal temperadas, não sc aquecer durante o inverno, escolher as cousas mais vis, alegrar-se quando falta alguma cousa mesmo

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necessaria; é n’isto que consiste a virtude da pobreza, se­gundo esta sentença de S. Bernardo; Viríus paupertatis non esl pauperlas, sed amor paupertatis; não se queixar dos in- commodos das estações, dos dcsprezos, das perseguições, dos trabalhos ou enfermidades. É com o martello do soífrimento que se quebram as pedras para a Jerusalem celeste. Santa Thereza dizia: Crer que Deus admitte á sua amizade as pes­soas amigas das suas commodidades, c loucura. A í almas que amam verdadeiramente a Deus não podem procurar re­pouso.

Coasobras 28$.— Aqui sc apresenta uma questão. Em nni logar o occilítas ® Evangelho diz: Brilhe vossa luz na presença dos homens, a

■ fim de que elles vejam vossas boas obras, e glorifiquem vosso Pae, que eslá nos céos. (tUath., v, 17.) Em oiilra parte elle diz: Quando derdes a esmola, não saiba vo.isa mão esquerda 0 que faz vossa direita. [Math., vi, 3.) Segundo isto, per­gunta-se se devemos manifestar as boas obras ou tcl-as oc- cultas. Eu dislinguo: as obras communs, necessárias á vir­tude christã, devem ser praticadas publicamente: como fre-

Sucntar os sacramentos, fazer oração mental, visitar o San- ssimo Sacramento, estar recolhido e ajoelhado ouvindo

missa, observar a modéstia dos olhos, guardar silencio na igreja, dizer que se quer salvar, evitar a loquacidade, as conversações perigosas, a curiosidade, e outras cousas seme­lhantes. Quanto ás obras de superrogação cxtraordinaria, c que tôem alguma cousa dc singular, como trazer cilicios, to­mar disciplinas, orar com os braços cm cruz, mastigar hervas amargosas, suspirar, chorar na oração, devem fazer-se tão ' occultamcnte como for possivel. As outras obras de virtude, como servir aos enfermos, dar esmola aos pobres, bumilhar-se quando se Veccbem injurias, etc., c melhor occultal-as quanto for possivel; mas não podendo cumprir-sc sem ser visto, não se deve abster d’cllas, comtanto que sc façam unicamente com vistas de agradar a Deus.

Frequcn- 289.— Fallemos em ultimo logar da conducta que deveis cia dos sa-ter com as almas piedosas em relação á frequencia dos sa- Regras da Penitencia e Eucharistia. Quanto á conlissão, éra a con- bom movel-as a fazer uma confissão geral, se ellas a não ti-flssão. verem já feito; se já a tiverem feito, ou se ellas estão ator­

mentadas de escrupulos, deveis prohibir-lh’a. Pelo que res­peita á confissão ordinaria, certas pessoas de uma consciência muito delicada tôem costume de se confessar todos os dias; mas bastará, regra geral, que as pessoas piedosas, principal­mente as mais escrupulosas, se confessem uma ou duas vezes em cada semana. Se ellas se achassem culpadas de uma falta venial sem terem a facilidade de se confessarem, o Padre

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Barisoni, cm seu Tratado da communhão, diz que ellas não devem privar-se da sania Eueharistia. Elle sc apoia na au- ctoridadc de Santo Ambrosio e de muitos outros. S. Fran­cisco de Salles dá o mesmo conselho em uma de suas cartós.Com elTeito, o santo Concilio de Trento ensina, que os pec­cados veniaes podem perdoar-sc por outros meios, taes como por aclos de contrição e de caridade. Assim, mais vale ser- vir-sc d’isto para puriíicar-sc dc semelhante falta, do que privar-se da communhão quando se não pódc confessar. Ura sabio director dizia mesmo que é algumas vezes mais util a uma alma dispor-se para a communhão por seus aclos pro­prios, do que pela conlissão mesma, altendendo a que ella faz talvez aclos mais fervorosos de arrependimento, de humil­dade e de conliança.

290.— Quanto á communhão, não falíamos aqui da obri- nclaliva gação imposta aos pastores de não recusarem a sania Eucha- rislia a algum de .seus inferiores que não 6 peccador publico, " 'e que razoavelmente a pede. Nós temos tratado esta questão em nossa Theologia, onde vimos que Innocencio X I ordenou que 0 uso da communhão frequcotc fosse inteiramente dei­xado ao juizo dos confessores. Assim não sei como os paro- clios podem cm boa consciência, excepto com uma razão evi­dente, recusar a communhão áquelle que a pede. Notae que em seu decreto o Papa prohibe aos bispos de determinarem, em geral, a seus inferiores os dias de communhão. Nós aqui sómente falíamos dos confessores e do modo por que elles de­vem conduzir-se para concederem a communhão a seus pe­nitentes. Uns se enganam por um excesso de indulgência, outros por excesso de severidade. É um erro evidente, como 0 nota Bento X IV em seu livro de ouro De Sgnodo, conceder a freqüente communhão áquelles que cáem com frequencia em peccados mortaes sem se darem ao trabalho de fazerem penitencia e emendarem-sei ou que vão á santa mesa com alTecto aos peccados veniaes deliberados sem desejo de os deixar. Todavia é algumas vezes util permittir a communhão áquelle que se acha em perigo de peccado mortal, a (im de lhe dar a força da resistência. Mas pelo que respeita ás pes­soas que não se acham n’este caso, que, pelo contrario, com- meltem ordinariamente peccados veniaes de proposito deli­berado, e em que se não vê nem emenda, nem desejo de emenda, é bom não lhes permittir a communhão mais de uma vez por semana. Póde mesmo ser util prohibir-lh’a por uma semana, a lim de que ellas concebam mais horror de suas faltas, e mais respeito pelo Santissimo Sacramento. Obje- cta-se ás palavras seguintes do decreto de Santo Anaclelo:Peracta eonsecratione, omnes communicent qui noluerint ec-

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clesiasticis carere liminibus; sic enim et Apostoti staluermt et sancla Romana tenet Ecciesia. Mas primeiramenle o Padre Soares e outros negam que os apostolos tenham jámais feito igual determinação; depois esle decreto, segundo a glosa do Catecismo Romano, não era para todos os (leis, mas sómente para os ministros que assistiam ao altar; finalmente, supposto que 0 decreto fosse para todos, é certo que hoje caiu em des­uso.

Continua- 291.— Por outra parle enganain-se certamente c se apar- Ção. tam muilo do espirito da Igreja os confessores que, sem al-

tcnção á necessidade nem ao proveito das almas, recusam indistinclamenle a communhão freqüente, unicamente por que é freqüente. 0 Catecismo Romano, explicando o desejo do Concilio dc Trento, qiic todos aquelles qnc assistem á missa commungucm a ella, ensina que c obrigação do paro- cho exhortar, com todo o zelo possivel, os fieis á communhão não sómente freqüente, mas ainda quotidiana, dizendo-lhes que a alma, assim como o corpo, tem necessidade de um ali­mento diario. Gn não reliro aqui as aucloridades dos Santos Padres e dos mestres da vida espiritual: acham-se cm todas as obras que tratam da freqüente communhão. Basla-mc sa­ber pelo Catecismo Romano c pelo decreto de Innoccncio X I, referido em nossa Tbeologia, que o uso freqüente e mesmo quotidiano da communhão tem sempre sido approvado pela Igreja c por lodos os Padres, e que, quando elles viram es­friar 0 fervor dos fieis a respeito da communhão diaria, elles fizeram os últimos esforços para o reanimar. 0 terceiro Con­cilio de Milão, celebrado governando S. Carlos, ordenou aos parochos que cxbortassem os fieis em suas práticas a este uso freqüente da sanla Eucharistia. Além d’islo manda aos bispos da província que prohihara que se prégue o contrario, e que punam severamente aquelle que o lizer, como se­meando 0 escandalo e contradizendo o sentimento da Igreja. Islo ainda não é tudo: Innocencio X I, eni seu decreto orde­nou aos bispos que tivessem o maior cuidado que a commu­nhão, mesmo quotidiana, a ninguém fosse recusada, e quo procurassem por todos os meios convenientes alimentar esta devoção em seus diocesanos. Certos rigoristas não negam o licito da communhão diaria; mas, dizem elles, é necessário levar as disposições necessárias. Ora, eu quereria saber o que elles entendem por disposição necessaria. Se entendem uma disposição que nos faça dignos dellá, quem jámais se atreverá a commungar? Jesus Christo só foi digno de com­mungar, porque só um Deus póde dignamente receber um Deus. Entendem elles as disposições convenientes? Nós dei­xamos dito que é muito conveniente recusar a communhão

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frequenle áquelles que lôem actualinenle faltas veniaes, ou que as amam sem dellas se emendarem. Mas quanlo ás al­mas que, lendo já arrancado o alTcclo aos peccados mesmo veniaes e Iriumphado da maior parte de suas más inclina­ções, tôem um grande desejo de commungar, S. Francisco de Salles diz que ellas podem, segundo o conselho de seu confessor, commungar todos os dias. Segundo S. Thomaz, quando uma alma reconhece por experiencia que a commu­nhão a faz progredir no amor de Deus sem diminuir seu res­peito pelo sacramento, ella não deve privar-se da commu­nhão (liaria. Eis aqui as palavras dn Santo doutor: S i aliquis experientia comperissel ex quotidiana communione augeri amoris fervorem et non minut reverentiam, talis deberet quo­tidie communicare.

292.— Sem dúvida, abster-se da communhão.por motivo Continua- de respeito, em certo dia, é virtude. Comludo, diz o Padre 5®°- Luiz de Granada em seu Tratado da communhão, é o senti­mento commum dos doutores, que vale mais aproximar-secoda dia da communhào por amor, do que abster-se d’ella cm respeito. S. Tbomaz confirma esla opinião quando diz: E t ideo utrumque pertinet ad reverentiam huius Sacramenti, et quod quotidie sumatur et quod aliquando ahstineatur... Amor tamen et spes, ad quem semper Scriptura nos provocat, prce- feruntur timori. 0 Padre Barisoni acrescenta mesmo que commuogando com o desejo de crescer no amor divino, se faz um acto dc respeito paro com Jesus Christo, e que este acto é positivo, emquanlo que, abstendo-se, elle é sómente negativo. Muitos santos, que sem dúvida tiveram o maior respeito pelo augusto Sacramento, não se privaram da com­munhão quotidiana. Taes eram Santa Gerlrudes, Santa Ca- Ibarina de Senna, Santa Thereza, Santa Joanna dc Chanlal c outras. Dirá alguem que hoje não hn já Santas Tberezas?0 Padre Barisoni, acima ciladio, responde que é temerário suppor que hoje o braço do Senhor se encurtasse. 0 vene­rável Padre Mestre Avila chega mesmo a dizer, que criticar aquelles que commungam todos os dias, é fazer o ollicio do demonio.

293.— Assim, considerado tudo, parece que o confessor Conducla não póde, sem escrupulo, recusar a communhão freqüente e P™dente. mesmo quotidiana n uma alma que a deseja para se adiantarno santo amor, todas as vezes que, estando desapegada do alTeclo aos peccados veniaes, cila faz muitas orações men- taes, tende á perfeição, e não cáe em algum peccado, nem mesmo venial, plenamente deliberado; porque tal é, diz S. Prospero, a perfeição a que póde chegar a fragilidade hu­mana. Deve exceptuar-se, geralmente fallando, um dia da

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semana, segundo a conducta de certos directores prudentes, e 0 caso em que se tire a communhão para experimentar a humildade e obediencia do penitente, ou para outro seme­lhante lim legitimo. Se julgardes util conceder a communhão freqüente ás pessoas de que acabamos de fallar, pouco im­porta, diz Innocencio X I, que ellas estejam ligadas ao nego­cio ou matrimonio: eis aqui suas palavras: Frequens (ad Eucliarisliam) accessus confessariorutn judicio esl relinquen- dus, qui ex conscientiarum puritate, et frequentice fruclu, et ad pietatem processu, laicis, negotiatoribus et conjugatis, (juod jirospicnint eorum saluti profuturum, id illis prcescri-

Continua- 294.— Quando mesmo a alma caisse algumas vezes por Ç«o- fragilidade em certo peccado venial voluntário, de que logo

se arrepende, e fórma a resolução de se emendar, se ella de­seja commungar para beber no sacramento a força dc não reincidir e adiantar-se na perfeição, com qne direito sc lhe recusaria a communbào? Não condemnou Alexandre V II a22." proposição de Baio, concebida n’esles termos: Sacrilegi sunt judicandi qui jus ad communionem percipiendam prce- tendunt, antequam de delictis suis pcenitentiam egerinl? E a23.*: Similiter arcendi sunt a sacra communione, quibus non­dum inest amor Deipurissimus, et omnis mixtionis expers? 0 santo Concilio de Trento chama este sacramento: Antido- tum quo liberamur a cuipis quotidianis, et a peccatis morla- libus prmervamur. Era tambem, certissimamcnlc na inten­ção de os preservar das recaidas, que os Apostolos faziam commungar todos os dias os primeiros christãos, cntrc os quaes alguns se achavam, sem dúvida alguma, que tinham as mesmás imperfeições, talvez maiores, como se vê pelas epístolas de S. Paulo e de S. Thiago. No Postcommunio da 23.* dominga depois do Pcntecostes, a santa Igreja pede: üt quidquid in nostra mente vitiorum est, dono medicationis hujus Sacramenti curetur. Portanto, a communiião é lambera para os imperfeitos, a lira de que a virtude d’este sacramento os cure de suas fraquezas. Ouvi o que sobre isto diz S. Frau- cisco de Salles em sua íntroducção á vida devota: «Se vos «perguntarem por que commungacs tantas vezes, dizei que «duas classes de pessoas lêem necessidade de commungar «com frequencia, os perfeitos e os imperfeitos: os perfeitos «a íim de se conservarem na perfeição; os imperfeitos a fim «de chegarem a ella; os fortes a lim de que se não tornem «fracos, e os fracos a lim de que se tornem fortes; os enfer- «raos a lim de sararem, e os sãos a fim de não adoecerem. «Quanto a vós, como sendo imperfeita, enferma e fraca, ten- «des necessidade de commungar com frequencia. Dizei que

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«aquelles que não eslão embaraçados nos negocios d’este «mundo devem commungar com frequencia, porque tôem fa- «cilidade, e que aquelles que léem negocios, porque elles «lôem necessidade da communhão.» 0 Santo concluc, di­zendo: «Coninuingae com frequencia, Philoíhea, e o maior «numero de vezes que podérdes com o conselho dc vosso pae «espiritual, c crôdc-me; as lebres de vossas monlanlias sc «fazem brancas, porque ellas não comem mais que neve; as- «sim á força de comer a pureza n’eslc sacramento, vireis a «ser inteiramente pura.» Em seu Tratado da comimnitão,0 Padre de Granada lem a mesma linguagem. «Nossa pro- «pria miséria não deve afastar-nos d’esle sacramento, pois «que é para os pobres qne este Ihcsouro foi deixado, é para «os enfermos qne este remedio foi dado. Assim, sejam quaes «forem snas imperfeições, ninguém deve, acrescenta elle, «abster-se d’este remedio sc deseja sinceramente sua cura.»0 auctor acima citado vae mais longe, diz elle qne quanlo mais fraca uma pessoa se sente, mais ella deve alimentar-se com esle pão dos fortes. Este sentimento é absoliilamenle conforme ao de Santo Anibrosio: Qui semper pecco, deheo semper habere medicinam; e de Santo Agostinho: Quotidie peccas, fpiotidie sume.

29o.— Esle sentimento é tanto mais bem fundado, que ElTeilos S. Thomaz ensina que o elTeito do sacramento, quanto ao ú» co|.n- augmenlo da graça, não é impedido pelos peccados veniaes, comlanlo (lue não se commcltam actualmente recebendo a communhão. Elles impedem sim, diz elle, em parte, mas nâo inteiramente o elTeito do sacramento. É a opinião commum de Solo, de Soares, dc Valentim, de Yasqiies, de Conink c de muitos outros, segundo os doutores de Salamanca. Além d’islo, um grande numero de auctores graves pensara com razão que esle sacramento perdoa immedialamenlc por si mesmo ex opere operalo os peccados veniaes para os quaes a alma não tem actualmente aíTcição. Isto é conforme ao que diz 0 Catecismo fíomano: Remüti vero Eucharistia et condo- nari teviora, quce veniatia dici sotent, non est quod dubitari debeat. Quidquid enim cupidüatis ardore anima amisit, to- tum Eucharistia, eas minores cutpas aVslerqens, reslituil.Ao nienos, como diz o Anjo da escola coin o commum dos doutores, a communhão produz o aclo de caridade qne lava os peccados veniaes: Qui (aclus charilalis) caicifaíur tii/loc sacramento, per quem peccata veniatia sotvunlur.

296. — Se chegardes a conhecer que pela communhão frc- Da alma quente a alma não progride na perfeição, e que ella não sc ,.9“®,',’®® emenda das fiiltas deliberadas ainda que veniaes, taes como prÔvcDo" procurar satisfazer seus sentidos comendo, olhando, ouvindo.

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vestindo-se com vaidade, etc., seria certamente prudente restringir-lhe o uso da communlião, embora não fosse mais do que para a tornar mais cuidadosa cm eniendar-sc e em adianlar-se mo bem. Quanto ao mais, lemhrae-vos d’islo: ainda que para commungar seja necessário, como ensina S. Thomaz, ut cum magna devolione accedat, comludo não é necessário (|uc esla devoção seja summa ou manifestada por elTeilos sensiveis. Basta que noteis na vontade de vosso pe­nitente uma determinação forte e constante de fazer prom- ptamenlc o que agrada a Deus. De outra sorte, diz o sabio Gerson, ahsler-se da communhão porque em si não acha um grande fervor, é a.ssemelhar-se áquelle que, lendo frio, recu­sasse aproximar-se do lume com receio de sentir calor. As­sim, acrescenta o Padre dc Granada, as pessoas pusillani- mes que, por temor immoderado de sua indignidade, abando­nam suas communhões, fazem grande damno a seu adianta­mento e.spiritual. Não é necessário, para continuar suas communhões, diz S. Jusliniano, que a alma sinta ou conheça claramente em si o augmcnlo do fervor, porque este sacra­mento opéra algumas vezes sem que nós o percebamos. S. Boavcnlura é admiravel n’csta maleria; Licet tenide, ta­men confidens de misericórdia Dei fiducialiter accedas, quia qui se indigmtm reputat, cogilet quod tanto magis eget me­dico, quanto senserit se agrotum. Neque ideo quaris tejun- gere Christo, ut tu eum sanctipces, sed ut tu sanctificens ab 'illo. Depois elle acrescenta: Neque pnelermillenda est san­cta communio, si quandoque non sentit homo specialem devo- tionem, cum se ad illam prieparare sludeat, vel in ipsa per- ceplione, vel posl forle minus devolus se sentit, quam velleL Assim, 0 Santo diz era termos expressos, (|uc quando mesmo se experimentasse menos devoção depois da communhão do que antes, não é islo uma razão para a deixar. Como é al­gumas vezes bom, quando a alma experimenta grande allrn- ctivo para a communhão, morlifical-n rccusando-lh’a, princi­palmente vendo-se que esta demora a inquieta, porque esla inquietação é um signal de orgulho que a torna indigna d’ella; da mesma sorte quando ella se sente árida e tihia para a communhão, é honrfazel-a commungar mais frcquenlcraenle, a lim de que receba novas forças.

Da alma 297.— Aprouvera a Deus, direi eu em conclusão, que hou- qucd’ella vesse no mundo muitas d’cslas almas, a quem certos rigoristas "vcito™ chamam irrespcilosas e temerarias, que, tendo horror mesmo

Conclusão.is f»lhi3 leves, pediriam a communhão freqüente, e mesmo quotidiana, com um verdadeiro desejo de se emendar e pro­gredir no amor divino; certamente Jesus Christo seria muito mais amado do que é sobre a terra I A prálica bem faz ver a

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iodos aquelles que lêem alguma experiencia das almas, as­sim como eu mesmo lenho visto, quanto aproveitam eslas pessoas que, animadas de um bom desejo, se aproximam da santa mesa; e de que modo admiravel o Salvador ns atlrnhe a seu amor, ainda que muitas vezes, para seu maior bem, não lb'o dá a conhecer, deixando-as nas trevas c desolação, sem alguma consolação sensivel. Orn, para as almas que se acham n’esto. cslado, não ha, dizem Santa Thereza c o bem- aventurado Henrique Suso, mais poderoso soccorro do (|ue a freqüente communhão. Para concluir, aconsclhae a cominu- nhão todas as vezes que a alma testemunha um verdadeiro desejo d’elln, c conhecendo vós que a communhão a faz pro­gredir na piedade. Rccomniendae-lbc que dê acção de gra­ças lodo 0 tempo que ella podér. São raros os confessores que n’islo cuidam, quero dizer, que rccommendem n seus penitenlcs (pic dediquem um tempo considerável á acção de graças depois dn communhão, porque são raros os sacerdotes que lêem cuidado dc dar graças a Jesus Clirislo depois da missa: elles teriam vergonha de rccommendar aos outros o que elles mesmos não fazem. A acção dc graças deveria ser ordinariamente de uma hora; que seja ao nienos de meia hora, qiic se passará em alTcclos c súppiicas. Santa Thereza diz, que depois da communhão o Salvador está em nosso co­ração como sobre um Ihrono de misericórdia para nos conce­der suas graças, dirigindo-nos eslas ternas palavras: Quid vis ut fadam tib i? E em outro logar: Depois da communhão, tende cuidado de não perder uma tão bella occasião de vos enriquecerdes: Sua Maqestade não costuma pagar mal a hos­pedagem, fazendo-se-lhe bom acolhimento. Exhortae lambem a que façam com frequencia a communhão espiritual, de que 0 Concilio de Trento tanto caso faz. A communhão espiritual, diz tambem Santa Thereza, é muilo proveitosa: não a des­prezeis; é por isto que o Salvador julgará quanto vós o amaes.

298.— 0 que vou dizer suppõe que não ha da parle da Rcgula-penitentc algum obstáculo de saude, de emprego ou de obe-mcnto pa-diencia; demais, que tudo isto se deve fazer com a permissão ngioM quê do pae espiritual, c mesmo da superiora do mosteiro, em quer se- tudo 0 que respeita ás morlilicações exteriores dc que n cora-piraper- miinidadc póde ler conhecimento. Quanto á oração: 1.“, tres horas ao menos de oração mental, quero dizer, uma hora de manhã, uma hora á noite, e uma hora depois do communhão;2.“ , a visita no Santissimo Sacramento e á Santa Virgem porespaço de meia hora, ou ao menos de um quarto de hora.Ella terá cuidado, n’estas dilTerenles orações c súppiicas, de renovar seus votos muitas vezes no dia, se ella for professa,

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OU OS votos que ella já tem feito; 3.“, o rosário, ao menos de cinco dezenas, com outras orações vocaes; iims que estas ul­timas sejam em pequeno numero, porque de outra sorte se recitam com pouco fructo, fatigam a cabeça e são um obstá­culo para a oração; 4.®, o uso freqüente das orações jaculalo- rias, por exemplo: Meu Deus, e meu tudo; meu Deus, quanto sois bom! Eu vos amo, ó meu Jesus, morto por mim. Se­nhor, como é possivel que nem lodos os homens vos amem? Oh! se eu vos não tivesse ollendido! Eu quero tudo o que vós quizerdes. Quando vos amarei? Quando vos verei face a face? Eis-mc aqui, fazei de mim o que for de vosso agra­do.» Recommendae-lhe instantemente esles alfectos dc amor e que faça grande caso d’isto; S.®, a leitura espiritual de meia hora no Padre Rodrigues ou Padre Saint-Jure, sohre os Avi­sos aos religiosos, ou era ontro livro dc piedade, ou ua Vida dos SaiUos, cuja leitura é talvez a mais util dc todas.

Quanto á communhão, cada manhã, c.xcepto um dia da se­mana; mas as novenas do Espirito Santo, do Natal, da Santa Virgem c dos santos Padroeiros, todos os dias, e cada dia ao menos Ires vezes a communhão e.spirilual.

Quanlo ás mortilicações: 1.®, a disciplina a séco cada dia por espaço de um quarto de hora pouco mais ou menos, e alé ao sangue uma ou duas vezes no mez; 2.®, o pequeno ci­licio alé ao jantar, e durante o dia um pequeno cilicio no braço para memória. Prohibi o cilicio da cinta, c os cilicios de cabello, porque são muito nocivos á saude; 3.®, o jejum a pão c agua no sabbado c uas vigilias das sele festas da Sanla Virgem, quando se podér fazer; ao menos coiilenlar-se n’es- tes dias com uma sopa sómente. 0 jejum ordinariamente to­das as noites, quero dizer, não exceder oito onças de ali­mento, a não ser por alguma causa urgente e extraordinaria. Âbster-se de sobre-mesa nas quartas e sextas feiras, e nas novenas de que temos fallado. N’esles dias póde-se mesmo deixar algumas iguarias, e misturar ao que se come hervas aniargosas, mas não cinzas. Nunca comer cnlre as refeições, porque mais vale, relativamente fallando, fazer cada dia a abstinência dc que temos fallado, do que jejuar uma ou duas vezes por semaua. Que o somno não dure mais do que seis horas, mas uão nienos dc cinco; menos somno faz a cabeça doente e impede os exercicios dc piedade. Guardar o silen­cio por tres horas cada dia, quero dizer, abster-se de toda a conversa não necessaria.

Conselhos 299.— I. Pôr toda a sua confiança em Deus, e desconfiar geraes pa-absolutamente de si mesmo e de suas hoas resoluções. Uma feição vonlade de se vencer, e de fazer violência nas occasiões.

Se a falta não vem de nós, diz Santa Thereza, não temamos

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que Deus falte em dar-nos as graças necessárias para nos santificar.

I I. Evilnr lodo o peccado. ainda que leve seja, commeltido de proposilo deliberado. Deus vos preserve, dizia a mesma Santa, de todo o peccado deliberado, ainda que minimo seja; porque é por pequenas cousas que o demonio faz brechas, pelas quaes entram as grandes cousas.

I I I . Não se inquietar depois de suas faltas; huuiilhar-sc logo, recorreudo a Deus por um acto de contrição e de lirme proposito, depois tranquillisar-se; fazer sempre o mesmo, ainda que se caísse cem vezes no dia. Além d’islo, Santa Thereza diz que não se deve fallar em suas tentações com as almas imperfeitas; por isto faz-se mal a si mesma e as ou­tras.

IV. Trabalhar por sc desapegar de tudo, dos parentes, dos bens, dos prazeres. Sem isto, diz Santa Thereza, a alma ca- ptiva do amor do mundo deixará bem depressa o caminho do céo. Fugir da familiaridade com pessoas dc dilferente sexo, embora sejam piedosas. Debaixo do vèo de alTeições espiri- tuaes 0 demonio introduz muilas vezes no coração certas pe-

Juenas inclinações que não .são puras. Vôde o que deixamos ito cm 0 n.» 2C0. Sobretudo é necessário desapegar-se de

sua própria estima e de sua própria vontade. 0 mesmo é das cousas espirituaes, como da oração, da communhão e das mortificações, quando a obediencia não as permitte. Em uma palavra, é necessário expulsar do coração tudo o que não é Deus, ou que não é segundo o maior gosto de Deus.

V. Regosijar-se interiormente de se ver desprezado, es­carnecido e considerado como o ultimo de todos, üb! que bella oração faz a alma que abraça o desprezo! Principal­mente nas communidades csla virtude é uma das mais ne­cessárias. £ mister com islo alimentar uma alTeição parti­cular para com os nossos inimigos c nossos perseguidores, prestar-lhes serviços, fazer-lhes bem, honral-os, ao menos dizer bem d’elles, e encommendal-os especialmente a Deus: lal foi a prálica de todos os santos.

VI. Ter um grande desejo dc amar a Deus de todo o seu coração c de lhe agradar. 0 Salvador, diz Sanla Thereza, ama os desejos tanto como se elles fossem realisados. Sem este desejo a alma nunca progredirá na perfeição, e Deus Dão lhe concederá alguma graça muilo especial. Ordinaria­mente, diz tambem a mesma Sanla, Deus não concede favores assignalados senão áquelle que deseja vivamente seu santo amor. Ao desejo é necessário sempre juntar a resolução de fazer tudo o que é possivel para agradar a Deus. 0 demo­nio, diz Sanla Thereza, tem grande mêdo das almas resolu­

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tas. E era oulra parle: 0 Senhor não exige de nós mais do que uma forle resolução, para fazer da sua parte tudo o mais. É misler lambem entreter um grande amor pela oração, é a fornalha onde se ateia o amor divino: todos os santos têem amado a oração, porque todos lêem ardido cm amor por Deus. Acrescentae tambem ura ardente desejo do paraiso, porque no céo nós amaremos a Deus com todas as nossas torças, felicidade a que nâo se pódc chegar sobre a terra. É por isto que Deus quer que tenhamos um grande desejo dcsle reino, que o Salvador por seu sangue nos conquistou.

V II. Ter grande conformidade com a vontade dc Deus cm tudo 0 que contraria nossos desejos. Fazer muitas vezes no decurso do dia o oITerecimento de si mesmo: Santa Thereza o fazia cinco vezes por dia. 0 progresso não consiste, dizia a Santa, em gosar mais do amor de Deus, mas em fazer sua vontade. E em oulro logar: A verdadeira união, é unir nossa vontade á de Deus.

V III. Ser perfeitamente obediente ás regras, aos superio­res e ao pae espiritual. A obediencia, dizia o Padre Vicente CaralTa, é a rainha de todas as virtudes, porque todas as vir­tudes obedecem á obediencia. E Santa fliereza: Deus não exige da alma, que quer amal-o. mais do que a obediencia. Ora, a perfeita obediencia consiste em obedecer prompla- raentc, ponlnalmcnlc, de boa vontade, cegamente e sem per­guntar a razão, todas as vezes que a cousa mandada não for um peccado evidente. É esta a doutrina de S. Bernardo, de S. Francisco dc Salles, de Santo Ignacio c de todos os mes­tres da vida espiritual. Nos casos duvidosos, tomar o partido que se presume que a obediencia diclaria, e quando não se póde ter esta presumpção, escolher o que é mais contrario a nossos gostos. E esle vince te ipsum, tão recommendado por S. Francisco Xavier e Santo Ignacio. Uma alma morti- ficada, dizia esle ultimo, aproveita mais em um quarto de hora de oração, do que uma alma não morlificada no espaço de muilas liòras.

IX . Audar conlinuanienle na presença de Deus. Todo o mal, dizia Santa Thereza, vem de não pensarmos na presença de Deus. Aquelle que ama verdadeiramente, se lembra sem­pre do objecto amado. Para conservar a lembrança d’esla divina presença, é bom collocar algum signal particular so­bre si, ou sobre sua mesa, ou em seu quarto. Mas sobre ludo deve entreter-se n’esla santa presença, fazendo muitas vezes ao dia aclos de amor dc Deus e orações em que elle respira; estas, por exemplo : Meu Jesus, meu amor, meu tudo, eu vos amo de todo meu coração, eu me consagro todo a vós; fazei de mim o que vos agradar; eu não quero mais do que a vós e

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vossa santa vonlade; dae-me vosso amor, e estou satisfeito: ou oulras semelhantes. Devera fazer-se estes actos sem es­forço, nem constrangimento, sem procurar nelles consolação sensivel, mas com suavidade e rectidão, unicamente para agradar a Dens. Santa Thereza dizia: Não tenhaes receio que Deus deixe sem recompensa um olhar para E ile acompanhado de uma lembrança.

X. Formar intenção de agradar a Deus cm tudo o que se faz, seja espiritual, seja temporal, dizendo: Senhor, é para vos agradar que eu o faço. A hoa intenção é chamada a pe­dra philosophal da alma, que transforma em ouro as acções, mesmo as mais materiaes.

X I. Fazer em cada anno os excrcicios espirituaes de dez dias, ou ao menos de oito dias, isolandn-se então, quanto seja possivel, dc toda a conversação c de toda a occupação capaz de distraliir, para sómente tratar com Deus. Fazer um dia de semelhante retiro uma vez cada mez. Fazer com uma devoção particular as novenas de Natal, do Espirito Santo, das sete festas da Santa Virgem, de S. José, do Anjo da gnarda, e do santo patrono. N ’estas novenas se poderá com­mungar todos os dias, fazer mais uma hora de oração, ou ao menos meia hora, algumas oulras orações vocaes, mas era pequeno numero: lirar-.se-ha mais fructo de ura numero de­terminado de aclos de amor e das oulras virtudes.

X II. Ter uma devoção particular a S. José, a seu Anjo da guarda, n seu patrono e o S. Miguel, protector universal dos chrislãos: mas especialmente á Sanla Virgem, a quem a Igreja chama nossa vida, nossa esperança. E moralmente impossivel que uma alma faça grandes progressos na perfei­ção sem uma devoção terna e especialissima para com a Mãe de Deus.

Seja tudo pnra gloria de Jesus Christo e de .Maria conce­bida sem peccado. Taes são os meios dc chegar á perfeição chrisUi; mas o meio que é a alma dc todos os outros, é a prá­tica da oração.

300.— E ’ certo que o esquecimento das verdades eternas é moüo de quem mancha a terra com crimes e povôa o inferno. Deío/a-fazcraora- tione desolata est omnis terra, quia nulius est qui recogitet 5“®- corde. [Jer. xii, 11.) Pelo contrario, diz o Espirito Santo, aquelle que muitas vezes sc lembrar da morte, do juizo e da eternidade, não cairá era peccado: Alemorare novissima tua, et in oeternum non peccabis. (Eccles., vii, 40.) Se nos repro­vados se perguntasse, diz um auctor: Por que cstacs no in­ferno? A maior parle responderia: Estamos no inferno, por­que não temos pensado no inferno. S. Vicente de Paulo diz, que se um peccador assistisse a uma missão ou a um retiro

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sem se converter, seria um milagre. Ora, na oração mental é Deus mesmo que falia á alma. Diicam eam in solitudinem, et loquar ad cor ejus (Oseas, ii, 13); c Deus certamente falia melhor do que nenhum prégador. E pela oração men­tal que todos os santos se santiíicaram. A experiencia mos­tra que aquelles que fazem oração cáem raras vezes em pec­cado mortal, c se por desgraça cáem n’elle, graças á oração, sc Icvnnlam promptamente c voltam a Deus. A oração men­tal c 0 peccado são duas cousas incompatíveis. Muitos, dizia um servo de Deus, recitam o Rosário, o Ofjicio da Santa Virgem, jejuam e perseveram no peccado: mas é impossivel que aquelle que faz oração permaneça na inimizade de üeus: ou abandonará a oração ou o peccado. Se elle não abando­nar a oração, não sómente deixará o peccado, mas tambem tirará seu coração ás creaturas c o dará a Deus. ín medita- tionem ea exardescet ignis. [Ps. xxxviii, 4.) A oração é a fogueira onde ns almas se abrnzam de amor divino.

Do logar 301.— 0 logar mais conveniente para fazer a oração é a c do icmpoigreja; mas aquelles que não podem ir ou demorar-se n’ella, cmquçcl- podem fazel a cm qualquer parle, nas casas ou nos campos, lazer wninhando ou trabalhando se póde fazer a ora­

ção; basta ler seu espirito elevado a Deus. Quantos pobres do campo, que não podem fazer de outro modo, fazem a ora­ção trabalhando ou viajandol Quem procura a Deus o acha em lodo o logar c em lodo o tempo. A manhã é o tempo mais conveniente para a oração: haverá muilo que notar nas acções do dia, não se fazendo a oração da manhã. A oração deveria regularmente fazer-se duas vezes no dia, de manhã c á noite; mas não podendo fazer-se de manhã, que sc faça ao menos á noite. 0 venerável Padre D. Carlos CaralTa, fun­dador dos Piedosos operários, dizia que um fervoroso acto de amor feito na oração de manhã hasta para manter a alma no fervor durante o dia. Quanto á duração da oração, pertence á prudência do pastor e do confessor determinal-a; é certo que meia hora não basta para chegar a um gráu sublime de perfeição. Finalmente, esle tempo bastará para as pessoas que principiam; mas tende o cuidado de recommendar-lhes

í sobre isto tudo. que não abandonem a oração quando senti­rem secura. Vôde o que deixamos dito em o n.° 266.

Modo dc 302.— Passemos ao modo prático de ensinar a oração, aprender a Ella encerra tres parles: a preparação, a meditação, a con- azcl-a. clusão. Na preparação ha tres aclos a fazer: 1.®, collocar-se

na presença de Deus; 2.®, humilhar-se; 3.® pedir as luzes do Espirito Santo. Para o primeiro se diz: Meu Deus, creio que vós estaes aqui presente, e vos adoro do abysmo do meu nada. Para o segundo: 5cnAor, eu deveria n’este momento estar no

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inferno por causa dos peccados que tenho commeltido; eu me arrependo de vos ter offendido; perdoae-me segundo vossa grande misericórdia. Para o terceiro: Padre Eterno, pelo amor de Jesus e de Maria, dae-me vossas luies no decurso d’esía medilnção, a fim de que eu aproveite com ella. Depois diz-se uma Avè á Santa Virgem, a íim de que ella nos obte­nha estas luzes, e uma Gloria-Palri em honra de S. José, do Anjo da guarda c do santo patrono. Fazem-se estes actos com attenção, mas em poucas palavras, c consecutivamente se passa á meditação. Quanto á meditação, aquelle que sabe ler póde servir-se utilmente de algum livro, íixando-se no que mais o edilica. S. Francisco de Salles diz que se devem imitar as abelhas, que param sobre uma flor emquanto ahi acham mel, c que passam depois a outra. Aquelle que não sabe ler deve meditar sobre os fins últimos, os bencficios de Deus, e especialmente sobre a vida e paixão de nosso Se­nhor. «Deve ser estn, diz S. Francisco de Salles, nossa me­ditação ordinaria.» Oh! que bello livro é a paixão do Salva­dor para as almas piedosas! E alli, melhor do que em outro qualquer livro, que se aprende a conbecer a malicia do pec­cado e 0 amor de um Deus pelos homens. 0 venerável frei Bernardo dc Corlion perguntava em certo dia ao Salvador, se devia aprender a ler? Jesus Cbristo crucificado lhe res­pondeu: «A ler? que livros? eu sou vosso livro; este vos basta.»

303.— Deve notar-se bem, que o fructo da oração não Km que consiste tanto em meditar, como em formar alTectos, era fa- consiste e zer súpplicas e resoluções. Nós o lemos dito, são estes os tres fructos da oração (n.“ 264). Portanto, depois de meditar sobre alguma verdade da salvação, e lendo-sc Deus feilo ou­vir ao coração, é necessário que o coração falle n Deus, for­mando alleclos, fazendo actos dc fé, de agradecimento, de adoração, de louvor, de humildade, e especialmente de amor e contrição, porque a contrição é lambem um acto dc amor.0 amor é essa cadeia de ouro que une a alma a Deus. Cha- ritas est vinculum perfectionis. Todo o acto dc amor é ura thesouro que nos faz participantes dn amizade de Deus. In- finilus enim est thesaurus quo qui usi sunt, participes facti sunt amicitiw Dei. (Sap.. vii, 14.) Ego diligentes me diligo![Prov., vm, 17.) Qui diligit diligitur a Paire meo. [Joan.,XIV, 21.) Charitas operit mullitudinem peccatorum. (/. Petr.,IV, 8.) Vêde 0 que sobre islo em nossa Theologia lemos dito.(Lib. VI, n.® 442.) A venerável irmã Maria do Crucifixo viu um dia um grande fogo que consumia em um pestanejar de olhos algumas fachas de palha que lhe lançavam. Esta visão tinha por fim fazcr-Ibe comprehender que um só acto de

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amor tirava c destruia na alma todas as faltas commcltidas. Além d’isto, S. Tliomaz ensina que cada acto de amor nos merece um novo gráu de gloria para a eternidade: Quilibet actus charüalis merelur vitam (eternam. Eis aqui algumas fórmulas: Afeu Deus, eu vos estimo mais que todas as cousas; eu vos amo de todo o meu coração; eu desejo ver-vos amado por todos. Senhor, fazei-me conhecer o que vós quereis, eu estou prompto a fazet-o. Eis-me aqui, fazei de mim e do que i meu 0 que vos aprouver. Este oITerecimeiito de si mesmo é sobretudo um acto de amor muito agradavel a Deus: assim, Santa Thereza se ollerecia a Deus cincoeuta vezes por dia. Se a alma se sentia unida a Deus pelo recolhimento sobrena­tural, tal como 0 deixamos explicado (n.“ 273), ella não de­veria empregar-se em fazer outros ncln.s, excepto aquelles a que Deus a inclina cora suavidade. Ella deve conlentar-se em estar attenta ao que Deus opéra n’ella, de oulra sorte po­ria obstáculo á operação divina. Deve noUir-sc tamhem com S. Francisco de Salles que, se o Espirito Santo inspirar al­gum hom affecto antes mesmo da consideração, deve dei­xar-se a consideração e entregar-nos aos allectos; porque a consideração não lem logar senão para conduzir-nos aos af- fcclos: ora,, quando se tem o lim, devem deixar-se os meios.

Conlinúa- 304.— É extremamente util na oração multiplicar as súp- t-ão. plicas, pedindo a Deus com humildade e conliança suas lu­

zes, 0 perdão, a perseverança, a graça de uma hoa morte, o paraiso, e sobretudo o dom de seu santo amor. S. Francisco de Salles exhortava a pedir a graça do divino amor com mais fervor do que as oulras, porque, dizia elle, obtida esla, se obtcem todas as oulras. Finalmente, se a alma sc achar na desolação espiritual, bastar-lhe-ha repelir a súppiica de Da- vid: Deus, in adjutorium meum intende. Senhor, ajudae-me: apressae-vos a soccorrer-me. Eu sei por experiencia, dizia o venerável Padre Paulo Seigneri, que nada ha mais util na meditação do que pedir e tornar a pedir, e pedir em nome e pelos merecimentos de Jesus Christo, que nos fez esla hella promessa: Amen. amen dico vobis, si quid pelieritis Patrem tn nomine meo, dabit vobis. No decurso, ou ao menos no fim da oração, deve tomar-se alguma resolução não sómente ge­ral, como de evitar toda a falta, mesmo leve, coramellida de proposilo deliberado, de sc consagrar lodo a Deus; mas lam­bem particular, como de evitar com mais attenção certa falta cm que se cáe cora mais frequencia, ou de praticar melhor certa virtude que mais freauentcracntc se lem occasião de exercer; por exemplo, de solfrer o máu humor dc lal pessoa, de obedecer mais exactamente a lal superior ou a lal regra, ou finalmente de se raortificar com mais cuidado em certa

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cousa, clc. Nunca saiamos da oração scra ter tomado uma resolução particular.

305.— A conclusão da oração se compõe de tres actos; Contjuuu- 1.", dão-se graças a Deus pelas luzes que durante a medita- Ç®” ' ção nos deu; 2.“ , faz-se a promessa de observar fielmente as resoluções que se tomaram; 3.“, pede-se a Deus, por inter­cessão de Jesus e de Maria, a graça de lhe ser liei. Termi­na-se encommendando-lhe as almas do purgatorio, os prela­dos da Igreja, os peccadores, nossos parentes, amigos e bem- feitores; recila-se por isto um Pater e uma Ave, que são as duas mais excelleutes orações que Deus e a Igreja nos têem ensinado. Deve-se tambem, saindo da oração, como diz S. Francisco de Salles, colher um ramo de flores para o chei­rar por todo 0 dia; quero dizer, deve tomar-se sentido cm uma ou duas cousas, nas quaes a alma achou mais unção, a lim de se recordar dellas e de reanimar seu fervor até á noite. Um outro cuidado não menos importante, é pôr logo em prática suas resoluções em todas ns occasiões, grandes e pequenas, que se olTerecerem; por exemplo, amaciar á força de doçura tal pessoa que está irritada contra nós, ou dc moV- tilicar seus olhos, seus ouvidos, sua lingua. Sobretudo é, quanto possivel, necessário conservar pelo silencio o senti­mento dos alTectos que se experimentaram. Distrahindo-sc logo por acções ou discursos inúteis, logo se desvanecerá este fervor de devoção que na oração se tinha concebido. Finalmente, sobre tudo isto exhorlareis vossos penitentes com todo 0 zelo possivel a nunca abandonarem a oração, a não a abreviar nas securas, a nunca se perturbar, ainda que longa ou grande seja a desolação em que possam achar-sc.Quantos cortezãos, diz S. Francisco de Salles, que vão fazer uma côrte aos principes, e que ficam satisfeitos sendo só­mente avistados! Nós vamos á oração para honrar nosso Deus e para lhe agradar: se Elle se dignar fallar-nos e favo­recer-nos com suas consolações, demos-lhe graças por tão grande favor; se de outra sorte acontecer, contentemo-nos de licar cm paz c cm sua divina presença, adorando-o e cxpou- do-lhe nossas necessidades. Se o Senhor não nos falia então, certamente lhe será agradavel nossa attenção e nossa fideli­dade, c concederá á nossa conliança o elTeito de nossas súp- plicas.

30G. (S. Francisco DE Salles, tom. II, pag. 628.)— Como Modo ilc é na oração que Deus de ordinário obra mais sensivelmente di. ceniir nas almas, deveis continuamente pedir-lhe suas luzes para “í Y'!™" bem conhecer as verdadeiras operações de seu espirito. Se, portanto, tiverdes a direcção de algumas pessoas favorecidas destes dons extraordinários e sublimes, de que acima vos

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fallei, tende cuidado: 1.°, que ellas se não portem mais se­gundo 0 sentido menos recebido da Escripliira, do que se­gundo aquelle que sendo o mais comnium é o menos peri­goso; porque a Escriptura Santa é a regra de conducta de Deus sobre as almas. 2.® E tambem uma regra do espirito de Deus o lançar um grande temor com uma extrema con­fiança n’aquelles que o amam; um vem do conhecimento de no.ssa enrermidade, c a outra dimana do santo amor. 0 diabo, pelo contrario, induz a altos pensamentos e a senti­mentos muito sublimes de virtude e de uma boa vida, per­suadindo a descansar em sua própria sufiiciencia e em suas boas obras. 8.® Mas a pedra de toque para experimentar o bom do máu espirito, e fazer a diderença d’aquelle que prin­cipia d’aquftiroutro que está muito adiantado, é o ser prom- pto em sollrer; porque o máu se torna peior pelas alilicções e murmura contra a.Providencia de Deus. Aquelle que prin­cipia se desgosta de solTrer, e depois tem pezar de se ter deixado possuir de impaciência; aquelle que está adiantado arrasta a principio um pouco sua cruz; todavia quando olha para seu Salvador c seu Mestre levando a sua ao Calvario, elle a levanta e toma animo, elle se resolve á paciência c a bemdizer a Deus. 0 perfeito, que é uma ave mais rara n’este seculo do que a phenix na Arabia, não sómente espera as alTrontas, as perseguições e as calumnias, mas vae mesmo sem temeridade ao encontro d’ellas, c corre a ellas como ao banquete das bôdas, julgando ainda que é inutil ter librés que 0 fazem tomar por um servo da casa de Deus.

Continua- 307.— 4.® É lambem um signal do espirito de Deus o serÇáo- alTavel e misericordioso para com o proximo, quando mesmo

elle está mais perto de cair debaixo do rigor de sua justiça, com receio de o sepultar sob suas ruinas. É lambem si­gnal de um espirito enganado pelo diabo em suas devoções, ou em suo conducta, quando, debaixo de certo zelo, elle ca­pricha de exacto, julga de tudo c quer tudo castigar, sem usar de piedade e sem alguma clemencia. o.® Não abando­nar 0 exercicio das virtudes pelas diíliculdades que nelias se encontram, é lambem o signal dc uma alma, cujo sacrificio é agradavel a Deus; porque esta bondade infinita não apre­senta a espada reluzente para impedir a entrada de seu pa­raiso áquelles que puramente o procuram; c ainda que Elle permitia que seus escolhidos vivam nos rigores, nos solTri- mentos c na cruz, Elle os enche de tantas graças, de força e doçura, que se julgam muito felizes e muito avantajados’empadecer por amor d’ellc. 0 diabo, pelo contrario, lhes fazver uma vingança muito terrivel em Deus para punir seus menores defeitos; elle lhes apresenta uma cólera e um rigor

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extremo n’Aquelle que não póde ouvir gritar a menor de suas creaturas sem lhe dar soccorro, e que se abranda á primeira lagrima de ura coração verdadeiramente contrito. Mas tende sentido com a astúcia do nosso inimigo; antes de os conduzir ao peccado lhes representa Deus sem mãos e sem raios, e quando os tem estendidos no chão, elle o faz vir a sua ima­ginação cercado de coriscos e de chammas, e todo coberto dc fogo para os reduzir a cinzas.

30S.— 6.® Examinae tambem se estas pessoas se perdera Coniinua- em sua própria estima, exagerando suas graças e seus pro- Ç“ °- prios dons, e os quaes pelo contrario tratam com desprezo ou tôem por suspeitos os favores que Deus reparte com os ou­tros; porque o signal mais certo da santidade, é quando ella é fundada sobre uma verdadeira e profunda humildade e uma ardente caridade. As operações sobrenalaraes, diz S. Ber­nardo, podem fazer-se pelas pessoas hypocrilas, assim como pelos santos. Os humildes dc coração fazem por isto reco­nhecer a solidez e a verdade. 7.® E pelo que respeita ás pes­soas illudidas, Deus mesmo, se lhe daes credito, lhes serve de íiador e de asylo; mas observae suas palavras espirituaes: em matéria d’estns expressões extraordinarias estae bem pre­venidos. Por exemplo, quando ellas dizem: «Eu estou certa do que Deus quer de mim; Elle vos adverte por rainha bôca do que é necessário á vossa salvação e á vossa conducta, fa­zei isto por meu aviso, eu respondo por isto diante dc Deus», e semelhantes palavras que mostram um grande esclareci­mento das cousas interiores c uma conversação nos céos; julgae com discrição se suas acções são conformes a estas altas luzes. 8.® Vôde sc o relatorio que a estas pessoas se faz da enfermidade de outros lhes causa mais movimento dc in­dignação e de horror, do que de compaixão e de piedade de suas misérias, porque é um falso zelo clamar contra o vicio dc seu irmão, c descobrir seus defeitos sem necessidade e contra a caridade. Taes pessoas ordinariamente querem fa­zer admirar sua virtude, publicando as faltas do proximo. 9.®Além d’isto examinae se, quando sc falia de Deus, estas pes­soas se entendem em termos alTectados, querendo fazer ver que seu fogo não póde occultar-se debaixo da cinza, e que por esta faisca se poderá descobrir a chamma que existe em seu interior.

309.— 10.® Se quereis cora probabilidade julgar se estas Coniinua- almas tôem verdadeiros sentimentos de Deus, e se as graças ção. que ellas dizem receber de sua bondade são verdadeiras, vôde se ellas não são apegadas á sua própria vontade e a es­tes mesmos favores; mas, pelo contrario, se elles lhes causam desconliança e as deixam irresolutas até que, pelo conselho de

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seus directores e de muilas pessoas piedosas, doutas e expe­rimentadas, ellas sejam confirmadas no credito do que ellas devem julgar de tudo isto; porque o Espirito Santo ama so­bre todas as cousas as almas humildes è obedientes; Elle ma­ravilhosamente se compraz na condescendencia e submissão, sendo principio de paz e de concordia. Pelo contrario, o es­pirito de soberba da segurança, e torna altivos, obstinados e muilo resolutos aquelles que quer enganar, e Ibes faz amar tanto 0 seu mal, que nada temem tanto como sua cura, per­suadindo-os que aquelles que lhes faliam, mais inveja tèem á sua felicidade, do que alTeição á sua saude: tal é o genio dos innovadores. 11.» Finalmente, para concluir lodo este dis­curso, vôde se estas pessoas são simplices e verdadeiras em suas palavras e em suas acções; se ellas não procuram men­cionar suas graças sem que seja necessário; se desejam o que se manifesta no exterior. E, muilo ao contrario, um elTeito da conducta benigna do Pae das luzes o inspirar por sentimentos interiores, derramar-se docemente na alma, e descer a ella como a chuva sobre a terra; S. João Chrysoslomo diz, que na verdade Deus fez ouvir aos hebreus seus mandamentos com grandes terrores e muitos bramidos do trovão; mas era isto necessário para aterrar homens que não se teriam rendido á composição senão por temor; e, que por outra parte, nosso Senhor veio docemente a seus Apostolos, que eram mais dó­ceis e menos ignorantes dos mysterios divinos. É verdade que houve algum som e um pequeno estrondo; mas Deus o permittiu por causa dos judeus, e por molivos expressos na Escriptura Santa. Vôde ainda sobre o modo de distinguir as operações da graça, e de conduzir as almas que são com ellas favorecidas, o que deixamos dito em os n.” 283 e seguintes.

Cornos 310. (Sacerdote santificado, n."‘ 80-83.)— Não é só- occasiona-mente com as almas piedosas e privilegiadas, é principal-

mente com os peccadores que tereis muitas vezes nece.ssidade de fazer uso de todas vossas qualidades de pae, de medico, etc., porque vosha conducta deve ser muito dilTcrente se­gundo as difTerentes enfermidades. Eis-vos portanto em pre­sença de pessoas que têem obrigações graves e difliceis, como de se emendar de máus hábitos, de tirar occasiões próximas de peccado, de perdoar a immigos, ou de restituir os bens ou a reputação de outrem. É n’isto que um confessor negli­gente corre risco de deixar semelhantes peccadores adorme­cer em seus vicios e na omissão de seus deveres. Da mesma

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sorte é tambem n’isto que um confessor excessivamente se­vero em seus principios, ou estranho á sciencia ascética e pouco caritalivo, corre risco, exigindo demasiado de seme­lhantes penitentes, ou ajudando-os pouco a cumprir suas obri­gações, dc os lançar em desanimação e desesperação. Quanto aos hábitos e recaídas, a frequencia e gravidade d’eslas en­fermidades espirituaes exigem que esta questão seja tratada á parte; eu o farei logo. Uma outra obrigação, que deve ser exposta com um cuidado muito particular, é a de arredar a occasião próxima do peccado quando ella é do numero d’a- quellas que S. Carlos chama occasiões in esse, como ter em sua casa uma pessoa com quem se costuma peccar. Em o n.” 67 vos indiquei o meio de conhecer se a occasião é pró­xima ou SC 0 não 6. Supposto que o seja, o rigor cora que exigircis a remoção d’ella é ternura para com as almas; a condescendencia seria crueldade. Assim, apesar dc todas as promessas que o penitente vos lizer de a despedir, regular­mente fallando, não deveis, mesmo da primeira vez, liar-vos em sua promessa, mas exigir que elle principie por a afastar antes de lhe dardes a absolvição. Com elfeito, irata-sc aqui de um objecto seductor que está sempre debaixo de seus olhos, por conseguinte que o excita continuamente no pcccado, não sómente de omissão não o removendo, mas tambem de com- raissão por novas faltas formaes interiores, ou mesmo exterio­res. Se cm certo caso elle não podesse tirar esta occasião por motivo dc uma impossibilidade physica ou moral, lal como a infâmia, ou o escandalo, ou algum outro inconve­niente muüo grave, n’este caso mesmo tomae, antes de o absolver, os meios os mais proprios a tornal-a remota, de próxima que ella era. Cerlilicae-vos primeiramente de al­guma emenda de sua parte. Se não podeis mesmo di(Terir-lhe a absolvição durante um certo tempo sem algum inconve­niente, em tal caso, se o achaes arrependido e disposto a re­ceber os remedios necessários e imperados pela prudência, como de não estar só com esla pessoa, de fazer alguma morti- licação, sobretudo de recorrer frequentemente á oração e á conlissão, podeis absolvel-o sobre sua promessa. Tal é, sobre estes dilTerentes casos, assim como o vereis em os n.®’ 330 e seguintes, a doutrina de S. Carlos em seus Avisos aos con­fessores.

311.— Tratando-se de remover outras occasiões de peccado Da expul- c de outras obrigações mais, acima enumeradas, sem dúvida são das oc- será sempre um excellenle conselho a seguir o fazer de modo ca®*®®®-

n o penitente as cumpra antes de receber a absolvição; to- ia, como lambem o pensa S. Carlos, póde o confessor

absolvel-o a principio uma e mesmo duas vezes sobre sua

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promessa siocera de as satisfazer. Fazei-o todas as vezes que, não tendo logar de duvidar prudentemente da sinceridade de suas promessas, tendes algum outro motivo para não lhe dif- ferir a absolvição; por exemplo, não podendo elle no decurso de algum tempo voltar a confessar-se. Neste caso, em logar de lhe dilTerir a absolvição, empregac todo o vosso zelo em augmentar nelle a contrição e lirme proposito, em dar-lhe meios, motivos, c exemplos capazes de lhe fazer cumprir promptamente seu dever. Eu vos tenho dado uma idéa de tudo isto em o n.” 36. Mas serieis muito relaxado sc, tendo 0 penitente faltado muitas vezes a semelhantes promessas, vos arriscasseis a ahsolvcl-o sem outra prova mais do que iguaes protestos. Eis aqui a razão fundamental d’isto. Estes penitentes podem ordinariamente cumprir suas obrigações por um só acto, quero dizer, despedindo, restituindo, sau­dando seu inimigo, etc.; e para cumprir este acto anticipada- mente elles tôem toda a facilidade de se preparar c fortilicar por meio de orações, etc. Se o não fazem, nenhum signal tendes de uma vontade verdadeira e eHicaz; assim não podeis prudentemente absolvel-os: a falta ás suas antigas promessas fórma uma presumpcão contraria a todos os seus protestos. Mas é em tal caso que, obrigado como juiz a differir-lhes uma sentença favoravel, deveis ajudal-os mais ainda do que da primeira vez por vossa caridade e habilidade. Dae-lhes novos motivos, a lim de que elles não dilliram mais; di­zei-lhes que logo depois dc terem satisfeito a seu dever, vol­tem, e que vós os consolarcis. Convencionarcis com elles so­bre 0 tempo, depois do qual, tenham ou não cumprido since­ramente sua obrigação, voltarão á vossa presença, ao menos para tomar fôlego, e dizer-vos as dilliculdades que tiverem achado, a (im de que possaes ajudal-os mais eíTicazmcntc ou mesmo dispensal-os, havendo razões sulTicientes.

Dificren- 312.— l*Bra isto tornae primeiramente conhecimento do obrieir -ô impediu dcsde a primeira vez. Notae aqui o dilTerença dercstimirfl“ ® deveis pôr enlre a obrigação de restituir c a de remover eadere-a occasião próxima. No ultimo caso, trata-se de um perigo mover a continuo e imminentc dc peccado, não material, mas formal, D ro a* que causa a perda de duas almas e a ofTensa de Deus. É a

razão por que deveis abster-vos de toda a indulgência, excepto quando ha impotência physica ou moral. Não é o mesmo a respeito da restituição. Se achardes suflicientes dilliculdades para dilTeril-a licitamente, ainda que não sejam bastante for­tes para dispensar d'ella, e se o credor, sc fosse instruido, teria como injusto o ser descontente da demora, não vos obstineis em recusar a absolvição; de outra sorte, sem ser util ao credor, que não será embolsado, causareis damno ao

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bem espiriUial do devedor. Assegurae anles a absolvição fi­xando-lhe um tempo para pagár. Até então dizei-lhe que ore cada dia ou muitas vezes, a íim de obter a coragem de pagar sua divida, e a graça de lembrar-se d’islo. Imponde-Ibe a obrigação de voltar a confessar-sc em uma época lixa, a íim de recobrar novas forças, e sabei indicar-lhe os meios de le­vantar as difliculdades que encontra no cumprimento de seus deveres. Por exemplo, tratando-se de uma reconciliação, e objectando-vos elle o receio de ser mal recebido de seu ini­migo, não 0 dispenseis do dever da caridade mesmo exterior, principalmente Iralando-se de fazer cessar um escandalo: mas movei-o a preparar um bom acolhimento por algum in­termediário, e a encontrarem-se depois em casa de uma pes­soa da amizade de ambos. Aquelle que descobriu cousas ver­dadeiras, mas secretas, para reparar sua maledicência com menos vergonha para elle e mais vantagem para o proximo toderá dizer áquelles que o ouviram, que não tornem a fal­ar n’isto, porque elle tem conhecido (|ue linha caido uo erro.<’islo não mente elle, porque realmente errou, se uão c cou-

tra a verdade, ao menos contra a caridade: para desvanecer a má opinião que do proximo havia dado, não convem que se explique mais. Aquelle que, despedindo de sua casa a pes­soa que é para elle uma occasião de peccado, leme dar sus­peitas ou confirmar aquellas que poderiam existir, deve fazer de modo que seja a mesma pessoa quem peça para sair.

313.— .Mas sobre o cumprimento das obrigações devo Discrição dar-vos alguns conselhos, a íim de que saibaes usar de uma cm ccrias salutar discrição em certas circumstancias criticas. .Aconle- cer-vos-ba portanto muilas vezes na conducta das almas, criticas, mesmo boas, acbal-ns rebeldes a certas cousas que exigireis d’cllas. Se vos obslinaes, e se as julgaes indignas da absol­vição por que ellas uão querem ceder, para obter uma cousa perdereis cem: que digo eu? perdereis tudo; ellas deixarão a devoção e os sacramentos, e não irão mais coufessar-se nem a vós, nem a outros, porque não querem fazer o que exi- gis. Ora, abandonando seus exercicios ordinários dc piedade, quanto não ficarão expostas a perder-se? E são muilas vezes as boas almas que, uma vez pervertidas, cáem nas maiores desordens. Em caso igual, sede muilo prevenidos contra um zelo indiscreto, que, no temor de encarregar vossa consciên­cia e a consciência dos outros por uma indigua relaxação, vos expõe ao perigo dc fazer morrer csla alma. Vôde se o que exigis é ou não uma obrigação certa, se ella é imposta sub veniali, e não sub gravi. Se o penitente uão é obrigado a accusar-se de a ter omitlido porque é leve, cedei-lhe sobre este ponto. Cora elTeito, esla alma póde ser capaz dc absol-

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vjção, comtanto que se arrependa e esteja sinceramente dis­posta a cumprir as outras obrigações, o que basta para a absolver do resto. Cedei portnnto, e aproveitae-vos mesmo d’esta condescendencia para a levar a cumprir com mais ar­dor seus outros deveres, e mesmo para fazer alguma boa obramais que as ordinarias para obter novas graças. Mas se a obrigação é ao mesmo tempo grave e certa, e que o penitente 0 reconheça sem ter a força de a cumprir, n’este caso é indi­gno dc absolvição, e não deveis dar-lb'a. Dizei-lhe que ore muito para obter a coragem necessaria; dae-lhe todos osmeios e todos os motivos de o animar a seu dever, e escogi-tac se ha algum meio licito de lhe facilitar seu cumprimento. Sc, pelo contrario, sendo grave e certa a obrigação, o peni­tente a ignora, c que julgueis com muito fundamento que sendo advertido não se resolverá a cumpril-a actualmente, nem talvez jámais, em razão de sua grande diíTiculdade, é então que a prudência vos faz um dever de ser mais reser­vado do que nunca em vossas palavras. Examinae iirimcira- mentc se a ignorancia do penitente é vencivel ou invcncivcl. Se for vencivel, por exemplo, se o penitente tem dúvidas, com mais forte razão se elle vos interrogo, é vosso dever instruil-o e manifestar-lhe a verdade; nias não vades além do que exige sua dúvida ou suas perguntas. Exemplo: se um homem, que contrahiu matrimonio com um voto simples de castidade, vos perguntar se é válido seu matrimonio, ou se póde pagar o de­bito conjugal, respondci-lhe aflirmativnmcnte a uma c outra cousa; mas nada lhe digaes da obrigação em que está de não pedir 0 debito até que lhe tcnhaes obtido a dispensa que o desate d’eslc laço c d’este impedimento. Se a ignorancia for invcncivcl e não tiver por objecto uma cousa de necessidade dc meio para a salvação do penitente, nem prejudicial a ter­ceiro, mas seja causa dc um simples pcccado material para o penitente, n’cslc caso podeis, c deveis mesmo, algumas vezes dissimular e calar-vos para evitar um maior mal. Por exem­plo, se no decurso da conlissão sabcis que o penitente conlra- hiu um matrimonio nullo por causa de um impedimento oc- culto de que elle não tem conhecimento, e prevedes que a manifestação d’estc impedimento o exporia a um grande pe­rigo de incontinencia, ou occasionnria graves desordens, de­veis deixal-o em sua boa fé e sua ignorancia não culpada. No entanto, procurae-lhe secretamente a dispensa necessa­ria, e quando ella chegar o adverlireis, fazendo-lhe conhecer 0 modo de revalidar seu matrimonio. Tal é a conducta que, segundo Bento X IV (*), o pastor deve ler quando descobre

(') Nol. 87, n.« 24, sobre o recurso á 1'eniteiiciaria.

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que um de seus parochianos contrahiu matrimonio com um irapedimenlo dirimente. Tenho-vos dado eslas instrucções, porque, empregadas a proposito no tribunal da penitencia, impedirão muitos peccados, e contribuirão para a gloria de Deus e salvação de vossos penitentes.

314.— Mas 0 ponto mais importante da direcção e o mais Diffcrcnles util á salvação das almas, é a boa conducta dos confessorescspeciesde com os occasionarios, os habitudinarios e os recidivos. occasionarios c os recidivos, eis dous escolhos contra os quaes a maior parte dos confessores vem naufragar faltando a seu dever. Logo vos fallarei dos habitudinarios e dos recidivos: vamos agora oc.cupar-nos daquclles que estão em occasião.É certo que se os homens tivessem cuidado dc fugir das oc­casiões, se evitaria o maior numero dos peccados que sc commcttem. Sem a occasião, o demonio ganha pouco; mas quando o homem se põe voluntariamente na occasião próxi­ma, 0 mais lias vezes, e quasi sempre, o demonio triumpha.A occasião, principalmente em matéria de prazcrcs sensuaes, é como um laço que arrasta ao peccado e que cega o espi­rito; dc sorte que sc faz o mal sem quasi o perceber. Mas vamos ã prática. A occasião se divide primeiramente em vo- luntaria c necessaria: a m lmtaria é aquella que facilmente sc póde evitar: a necessaria, é a que não se póde evitar sem um grave inconveniente ou sem escandalo. Ella se divide de­pois em próxima e em remota; a remota é aquella cm que ra­ras vezes se pecca ou que se encontra por toda a parte; a pró­xima. per se, é aquella na qual os homens communiler ut plurimum deficiunl; a próxima, per accidens, ou relativa, é aquella que, sem ser próxima para os outros, visto que por si mesma não arrasta commummente os homens ao peccado, é todavia próxima relativamente a certa pessoa, ou porque tem n’ella peccado frequentemente, ou porque póde temer pru­dentemente peccar, pela experiencia que tem dc sua fragili­dade. Alguns doutores querem que não se considere como occasião próxima senão aquella em que se cáe quasi sempre, ou ao menos as mais das vezes. Mas, segundo a opinião mais commum e a mais verdadeira, a occasião proxima é aquella em que se tem caido com frequencia. Deve comtudo notar-se duas cousas: 1.*, algumas vezes n occasião, que para outras pessoas é commummente proxima, póde não ser mais que remota para uma pessoa muito prudente e muito piedo­sa; i . \ certas occasiões, que para outras são per se commum­mente remotas, são talvez próximas para aquelle a quem nu­merosas quédas e a inclinação para algum vicio, principal­mente 0 vicio vergonhoso, tem feito muito fraco e muito facil em cair. (Lib. VI, n.°462.) Assim, elle é obrigado a fugir

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nSo sóracnle das occasiões próximas, mas lambem d’esla classe de occasiões remolas, que para elle são próximas.

Signaes 315.— Ullimaraenlc, eslá sem dúvida em occasião próxima <l.®socca-aquelle: 1.“ , que conserva em sua casa uma mullier com a |jj^|/'^°'qual tem coslume de peccar com frequencia; 2.“, aquelle que,

jogando muilas vezes, caiu cm blasphemia ou fraude; 3.® aquelle que em cerla eslalagem ou cm certa casa costuma cair na embriaguez, ou cm rixas, ou cm acções, ou em pensa­mentos, ou em palavras obscenas. Estes penitentes não podem ser absolvidos senão depois de lerem tirado a occasião. ou ao menos se não promcllem liral-a segundo a distincção estabe­lecida em 0 numero seguinte. Da mesma sorte não póde dar-se a absolvição áquelle que, indo a uma casa, embora fosse uma vez no anno, sempre ahi pcccou; porque para elle ir ahi é uma occasião próxima. Da mesma sorte lambem não podem absolver-sc aquelles que, sem peccar na occasião, são para os outros um grave motivo de escandalo. (Ib.) Alguns doutores (Ib.) acrescentam que deve lambem recusar-se a absolvição áquelle que-não deixa a occasião exterior quando se lhe junta um habito vicioso, ou uma grande tentação, ou uma violenta paixão, ainda que até então não lenha succum­bido. A razão é porque facilmente póde mais tarde cair não sc arrcdando da occasião. Elles dizem por consequencia, que uma creada fortemente tentada por seu amo, e que sente que ella póde ser facilmente arrastada, c obrigada a deixar esla casa, se livremente póde fazel-o; dc outra sorte é uma teme­ridade de .sua parle o julgar-sc em segurança.

Conducta 316.— É aqui que os confessores devem allender que não prática, permitiam aos futuros esposos irem a casa de suas futuras

esposas, nem a estas ou a seus paes de os admillirem ahi; porque é raro que era semelhante occasião estes esposos não se tornem culpados ao menos em palavras c pensamentos; porque entre estes futuros esposos, todas as vistas, todos os entretenimentos induzem ao peccado. Maralmcntc lhes é im­possivcl conversar um com o outro sem sentirem attractivos para os actos vergonhosos que devem scguir-sc ao tempo do malrimonio. Generalilcr autcm loquendo dc adnlesccnlibus et pucilis qui inviccm sc adamant, quippe non sunt isti omnes indistincle dc gravi culpa damnandi, sed ordinarie

Èulo, ipsos dilliculler esse extra occasionem proximam Iclha- ter peccandi. Id nimium experientia patel; nam ex ccnlum

adolescenlibus vix duo aul tres in occasione morlalibus inve- nienlur immunes; et si non in principio, saltem in progressu. Tales enim adamantes prius conversanlur invicem ob pro- pensionem, deinde propensio fil passio, et passio, poslquam radicem in corde (ixerit, mentem obtenebral, et illos in millc

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crimina ruere facit. Ilinc Cardinalis Picus dc Mirandula, Episcopus Albancnsis, in sua dioecesi per edictum suos adrao- nuil confessarios, ne lales adamantcs absolvercnt, si post- quam ler ab aliis jam sint admoniti, ab hujusmodi amore se- cUndo non abslinuissenl, prmsertim tempore nocturno, aut diu, aut ciam, aut intra domos (cum facili periculo osculorum et tacluum), aut contra parcnlum prmceplum, aut cum altera pars prorumpil in verba obscama, aut cum scandalo (prout si in ccclesia), aut cum conjugalis, claustralibus, aut clericis in sacris. A este proposilo é bem que se advirta em geral que, quando se trata de perigo dc peccado formal, c principal­mente de peccados vergonhosos, quanta mais severidade usar 0 confessor a respeito dos penitentes, quanto mais util será á sua alma; pelo contrario, tanto mais cruel será para com seu penitente, quanto mais facil for em pcrmillir-lhe que se constitua na occasião. S. Thomaz de Villa-nova chama impie pios aos confessores que sc mostram condescendentes n'cste ponto. Uma tal caridade é contra a caridade. Em igual caso os penitentes costumam representar ao confessor que a ex­pulsão da occasião próxima produzirá um grande escandalo; sede (irme, e não façaes caso de semelhantes escandalos; será sempre um maior escandalo o ver que o penitente não re­move a occasião mesmo depois de sc ler confessado. Ou seu peccado se ignora, e então não se formará alguma suspeita, ou é sabido; n’eslc caso o penitente anlcs recuperará sua re­putação, do que a perderá, removendo a occasião.

317.— Muitos theologos dizem que póde absolver-sc uma Disiincção primeira ou uma segunda vez o penilenle que esla na oc-importan- casião próxima volunlaria, antes mesmo que cllc a lenha ü- ®- rado, comlanlo qae esteja na íirmc resolução de a remover 0 quanto antes. Mas deve fazcr-sc dislincção, com S. Carlos Borromeu, entre as occasiões in esse, como se um homem tem era sua cosa uma concubina, ou se uma crcada cáe soli­citada por seu amo, e outros casos semelhantes; e as occa­siões que não são in esse, como se no jogo um homem blas- phema; nas tavernas se agonia e se embriaga; nas conversa­ções se torna culpado de palavras e pensamentos deshones­tos, ctc. N'eslas ultimas occasiões, que não são in esse,S. Carlos diz, que sc o penitente promelle com uma (irme resolução de as deixar, póde-se absolvcl-o duas e mesmo tres vezes: se, depois d’isto, não sc emenda, deve-se dilferir-lhe a absolvição até que se veja que cdeclivamente tirou a occa­sião. Quanto ás occasiões do primeiro genero, quero dizer in esse, diz o Santo, que não se deve absolver o penitente sem que antes lenha inteiramente tirado a occasião: não basta sua promessa. Ora este sentimento sempre o tive e tenho ainda

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por certo, ordinariamente fallando; e creio tel-o claramente estabelecido na Theologia. A razão é que um tal penitente é indigno da absolvição se quer recebe(-a antes de tirar a oc­casião; porque se expõe por isto ao perigo proximo de faltar ã resolução que formou de tirar a occasião, e assim dc ficar como antes. E certo que pecca mortalmente aquelle que está em occasião proxima voluntaria de peccado mortal e que não a desvia. Ora, a expulsão da occasião é uma cousa muito dillicil, e que exige uma grande violência; mas esta violência, uma vez absolvido o penitente, didicultosamente a fará; por­que, livre do receio de não receber a absolvição, elle se li- sonjcará facilmente de poder resistir á tentação sem arredar a occasião; assim permanecerá n’ella e com certeza cairá. Eis aqui o que a experiencia diaria prova de tantos infelizes que, absolvidos por confessores imprudentes, não desviam a occasião, e recáem mais abaixo do que antes. Portanto, pecca gravemente o penitente que recebe a absolvição antes de ter removido a occasião, por causa do perigo de faltar á sua resolução, c mais gravemente ainda pecca o confessor que lh'a dá. (Lib. VI, n.“ 4.34.)

Conünua- 318.— Eu disse ordinariamente fallando, porque os theo- ção. logos exceptuam primeiramente (ib., Dixit tam.) o caso de

dar 0 penitente .signaes tão extraordinários de contrição, que se podesse julgar com prudência que não está em perigo pro- xirao de faltar á re.solução de apartar a occasião. Com elTeito, estes signaes annunciam que o penitente recebeu umn graça mais abundante, com n qual sc póde esperar que será liei em remover a occasião. Comtudo. todas as vezes que é commo- damente possivel differir a absolvição, eu lh’a difTeriria, mes­mo n’este caso, até que realmente elle tenha desviado n oc­casião. Exceptuo tambem o caso de não poder o penitente voltar, ou ao menos só muito tempo depois. Em tal caso pó­de-se absolvel-o, julgando-se bem disposto e resolvido a re­mover a occasião sem demora. Neste caso considera-se como remoto 0 perigo de faltar á sua resolução por causa do grande incommodo, magni oneris, que deveria sodrer o penitente retirando-se sern absolvição. Com efleito, seria obrigado ou a repelir sua conlissão a outro sacerdote, ou a licar por muito tempo privado da graça do sacramento. Portanto, achando-se então cm umn necessidade moral de receber a absolvição, ha umn razão paro ser absolvido logo (ib., Excipiendus1)\ e pois que elle não póde tirar a occasião antes de receber a absol­vição, elle é considerado como era uma occasião necessaria. Comtudo, não é isto admissivel se o penitente, advertido já por outro confessor de tirar a occasião, não o tem feito, por­que elle é recidivo. Desde então não póde ser absolvido cm-

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qunnto não der signaes extraordinários de arrependimento, assim como o diremos mais adiante.

319.— Eis aqui o que diz respeito á occasião próxima vo- OccasiOcs luntaria. Se a occasião for necessaria ou physicamenle, por necessa- exemplo, se uma pessoa estiver em prisão, ou em artigo dc morte, sem ter nem tempo, nem meto dc expulsar sua con­cubina; ou moralmente, quero dizer, se n occasião não podér remover-se sem escandalo, ou sem grave inconveniente paraa vida, reputação, bens da forluna, como dizem commum- raente os doutores (lib. VI, n.” 4ün); n’este caso o penitente póde ser absolvido sem tirar a occasião. Com elleito, elle não é obrigado a removel-a, comlanlo que prometia empregar os meios necessários, a (im dc que cila sc torne remota, de pró­xima que era. Estes meios são, principalmente na occasião do peccado vergonhoso: evitar a Tamiliaridadc, e mesmo, quanto For possivel, n vista do cúmplice; freqüentar os sacra­mentos, e encommcndar-se muitas vezes a Deus, renovando cada dia, especialmente de. manhã, diante de um crucilixo, a resolução de não tornar a peccar e de evitar a occasião tanto, quanto o possa fazer. A razão d’isto é que a occasião do pec­cado não é propriamente um peccado cm si mesma, c não traz ligada a necessidade de peccar. Assim a occasião não é incompalivel com um verdadeiro arrependimento e um lirme proposilo de não recair. É verdade cada um ser obrigado a sair do perigo proximo de peccar, mas isto se entende qunn­do elle quer livremente, sponte, um semelhante perigo. Se portanto n occasião é moralmente necessaria. o perigo lor- na-se remoto pelo emprego dos meios convenientes, e Deus Dão deixa dc assistir com sua graça áquelle que verdadeira­mente está resolvido a não tornar a ollendel-o. A Escriptura não diz: Aquelle que está no perigo morrerá ucllc, mas aquelle que ama o perigo; ora, não se póde dizer que ama o perigo aquelle que se acha n clle a seu pezar. D’aqui esla sentença de S. Dasilio: Qui urgenti aliqua causa et necessi- tate se periculo objicit, vel permittit se esse in illo. cum la ­men alias nollel, non tam dicitur amare periculum, quam in- vilus subire; et ideo magis providebit Deus ne in illo pereat [In. const. mon., cap. iv.)

320.— Em consequencia os lheologos consideram como ca- Coniinua- pazes de absolvição aquelles que não querem deixar um em- prego, uma occupação, ou uma casa em que elles téem cos­tume dc peccar, porque não podem deixal-os sem um grave damno, todas as vezes que estão verdadeiramente resolvidosa emendar-se e a empregar os meios de o fazerem. Taes são, por exemplo, os cirurgiões, que, tratando mulheres, ou os parochos, que, confessando-as, têem caído em peccado, se

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abandonando estas fiincções, não podessem viver segundo seu estado. (Lib.VI, n.® 45S in fine.) Mas todos convem que é util, n'estes casos e outros semelhantes, dilTerir a absolvi­ção, quando não fosse senão para fazer o penitente mais at- tento a praticar os meios prescriplos. Quanto a mim, entendo que 0 confessor não sómente pode hizer isto, mas que é ohri­gado todas as vezes que podér commodamente, principal­mente quando se trata do vicio vergonhoso. Com effeito, o medico das almas, é ohrigado a administrar-lhcs os remedios mais convenientes. Ora, eu sustento que não ha melhor re­medio para aquelle que se acha em occasião próxima, do que a demora da absolvição. Isto mais que provado está pela ex­periencia de tantos*de.sgraçados, que, uma vez absolvidos, desprezam os meios indicados, e assim recáem com deplo­rável facilidade. Pelo contrario, se differirdcs a absolvição ao penilenle, elle será mais cuidadoso em praticar os meios prescriplo.s e cm resistir ás tentações, com receio de ser no­vamente despedido sem absolvição, quando voltar a confes­sar-se. Talvez sobre este ponto me acharão excessivamente severo; mas tal é a conducta que sempre tive e tenho ainda com aquelles que se acham na occasião próxima mesmo ne­cessaria, e ainda que elles me décin signaes extraordinários de contrição, todas as vezes que não ha uma necessidade particular de os absolver de promplo. Eu entendo ser assim muito mais util aos penitentes. Praza a Deus que lal fosse a conducta dc todos os confessores! Quantos peccados de me­nos sobre a terra, e quantas almas de mais no céo! Eu o re­pilo, quando se trata dc desviar o penilenle do pcccado for­mal, 0 confessor deve seguir as opiniões mais benignas tanto, quanto o permitte a prudência chrislã; mas quando as opi­niões benignas tornam mais proximo o perigo do peccado formal, como acontece principalmente em matéria de occa­siões próximas, eu digo que é soberanamente util e algumas vezes necessário que o confessor adople como regra de con- ducla os sentimentos mais severos: n’esle caso são mais van­tajosos para a salvação das almas. Se o penitente, posto na occasião necessaria, recáe sempre dp mesma maneira, ninda que empregando todos os meios, c com pouca esperança dc emenda, eu digo que se lhe deve recusar absolutamente a absolvição, se elle não principia por tirar a occasião. (Ih.) É aqui que sc deve applk-ar o preceito do Evangelho: S i oculus tuus scandalizat te, erue eum. {Marc. ix, 46.) Deve excc- ptuar-se o caso de dar o penitente signaes tão extraordiná­rios de contrição, que se podesse conceber uma prudente es­perança de sua emenda. (Lib. VI, n.® 435.)

Firmeza 321. (B. L eonardo, n.'® 19-24).— Vêdes que é necessa-

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ria uma grande prudência da parte do confessor para evitar ó duplicado escolho, ou de uma condescendencia excessiva e alTectada, ou de um rigor desmedido na direcção dc um des­graçado habitudinario, que, envolvido de toda’s as partes em seus máus hábitos, dá mais quédas do que passos. Mas para

r brar as cadeias que prendem e vergam um occasionario muitos aunos mellido nas occasiões do peccado, oh! que

piedade e firmeza é necessaria no ministro do sacramento!Para levantar todos os ob.staculos, sua coragem deve igualar sua prudência. Sem um santo rigor in-spirado por um cora­ção fortemente resolvido a triumphar, nunca elle alcançará a victoria. Que ha mais expressivo do que as palavras, pelas quaes o Salvador nos ensina o rigor de que se deve usar com estes enfermos quasi sem esperança? Os remédios que po­dem appiicar-se-lhes reduzem-se a tres, e eil-os aqui em tres palavras: fugida, ferro, e fogo. Si oculus Imis scandalizat te, erue eum, projice ahs te. Quando a occasião fosse mais que­rida a vosso penitenle do que a menina de seus olhos, elle deve absolutamente deixal-a. Fugida, ferro, e fogo. Si ma­nus tua scandalizat te, abscinde eam, et projice abs te. Se est’outro mancha continuamente sua mão nos jogos, nos ban­quetes, e nas impurezas, que a córte sem misericórdia. Fu­gida, ferro, c fogo. S i pes tuus scandalizat te, abscinde eum et projice abs te. Se elle freqüenta certa casa, certa taverna, certa companhia, onde cáe diariamente, que se retire a lodo 0 preço. Fugida, ferro, e fogo. Projice, abscinde Eslas pa­lavras são tão claras e tão imperiosas, que devem animar-nos a formar uma santa liga, e a nunca absolver aquelle que, achando-se em occasião proxima de peccado, póde e não quer dcixal-a. Tende portanto diante dos olhos a proposição con- demnada: Potest aliquando absolvi, qui in proxima occa­sione peccandi versalur, quam potest et non vult omittere, quinimo directe, et ex proposito qumril, aut ei se ingerit.Diz-vos esta falsa proposição: Potest aliquando absolvi. Qual será a verdadeira? Eil-a: Nunquam potest absolvi, qui in proxima occasione peccandi versalur, etc. Não, não, não se póde jámais absolver aquelle que na occasião proxima do pec­cado quer adormecer.

322.— Mas para proceder com prudência, e para e.Habele-signaesin- cer nossa doutrina sobre um fundamento solido, convem pri-tcriores e meiramçnte expor em que consiste realmente a occasião pro- xima. E um ponto soberanamente delicado e sobre o qual gi,:io proxi- todos os doutores não são concordes. Para nos pôr em segu-ma. rança, seguiremos o sentimento mais commum, e que os ad­versários mesmo não podem razoavelmente combater. Eu co- méço suppondo que ninguém ignora que não ha identidade

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enlrc o perigo de peccar e occasião próxima, nem mesmo en- Ire 0 perigo proximo e a occasião próxima. Com elTeito, a oc­casião depende necessariamente e sempre de alguma circum­stancia exterior que não traz comsigo o perigo, bem que elle seja proximo. Esclareçamos esla proposição por um exem­plo. David, do alto de uma galeria de seu palacio vô ao longe Bethsabée, que se banba. (// Heg., ii, 4.) Ah! como o olho nrrasta o coração! Ale alli sómente havia o perigo de peccar; mas logo, impeilido por sua concupiscencia, elle opéra, elle olha tanto, que, missis mnliis, tulit eam. Eis aqui a occasião próxima produzida pela circumstancia do logar e da presença do ohjeclo, supposto sempre comludo a frequencia das qué­das, sem a qual a occasião próxima não existe. Assim, duas cousas constituem a occasião próxima: a primeira, a propen­são interior para peccar, donde nasce o perigo; a segunda, a circumstancia exterior, que dá o impulso e apresenta a fa­cilidade de peccar. Apesar de toda a sua disposição interior para peccar, David nunca teria commettido o adultério sem a circumstancia exterior do logar e do objecto presente; como tambem posto na mesma circumstancia, nunca teria peccado sem a sua má disposição interior. Além d’islo, sua quéda não poderia ser chamada occasião próxima, se ella não fosse re­pelida muitas vezes e frequentemente; porque elle viveu com Bethsabée no decurso de mais de um anno com grande es­candalo do povo. Taes são os fundamentos sobre os quaes nós estabelecemos a definição da occasião próxima. Dá-se comraumraenle este nome dquella. onde, atlendidas as circum-

. a qual,cias, só raras vezes se pecca. Assim a occasião próxima nunca é tal senão quando tem, de um modo absoluto ou relativo, uma união freqüente com o peccado. Tal é o caracter pro­prio que assignara os lheologos para a distinguir da occasião remota. As outras definições, ainda que concebidas em ter­mos dilTerenles, todas vem a dar n’esla, porque todos os dou­tores exigem a frequencia das quédas, ao menos relativa, quero dizer, que as mais das vezes se cáia no peccado ao qual se expõe. Mas deve-se sempre ligar a este numero ma- thematico, de sorte que não sc caindo seis vezes em doze, não se possa chamar occasião próxima? ou deve-se formar seu juizo secundum id quod communiler accidit, por exemplo, a um mancebo ardente, dado a maus hábitos, que se consi­dera como devendo infaIlivcImenU; cair achando-se em tal lo­gar com tal pessoa? Tudo isto é deixado á prudência do con­fessor. Cumpre-lhe considerar que certas occasiões são abso-

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lulamenle próximas para Iodos: outras relativamente, quero dizer, em relação próxima para um mancebo não o será para um velho, porque a primeira condição da occasião proxima, quero dizer, a propensão para o peccado, falta a este. Para esclarecer toda esta matéria, convem explicar com todo o cuidado possivel os dous principios constitutivos da occasião proxima.

323.— E primeiramente, quanto á propensão interior queconiitma- arrasta comsigo o perigo proximo de peccar, digo que cada Ç“o- um a conhece por si mesmo. Com elTeito, ella sáe d’este fer­mento de peccado que herdamos de nosso primeiro pae. Emuns ella é mais, em outros menos forte, segundo a quali­dade dos máus hahitos que tôem contrahido; c algumas vezes somos obrigados a enfraquecel-a por actos contrários, como diremos fallando da occasião proxima necessaria ou involun­tária, porque então não podendo tirar a circumstancia exte­rior, devemos enfraquecer esta disposição interna, a (im dc que de necessaria a occasião não se torne voluntaria. Quanto a circumstancia, que é a segunda condição da occasião pro­xima, digo que não é necessário que ella seja sempre má e muito má; mas dc sua natureza, como dizem os theologos, ella póde ser algumas vezes hoa, mesmo santa e muito santa.A fim de não nos deixarmos seduzir pela apparencia do hem, tomemos por exemplo um confessor fraco. Elle ouve a con­fissão, eis aqui a circumstancia exterior qiic, considerada cm si mesma, é uma acção muito santa. Póde-se não obstante considera 1-0 como um occasionario, se, dominado por algum máu habito, elle muitas vezes consente cm pensamentos máus: mesmo ouvindo coníissócs está constituído cm occasião proxima de peccado. Ora, não é duvidoso que cllc seja obri­gado, n’estc caso, ou a deixar suas funcçõcs, ou a empregar todos os meios os mais proprios a emendar-se. Se alguem quizesse especificar estas circumstancias exteriores, ha tan­tas, para assim dizer, como cousas no mundo. Um encontra uma occasião proxima na circumstancia do logar; aquelle na circumstancia de certa pessoa; um outro na conversação; este no jogo, cm o negocio, na taverna, no amor, ctc. Não ha uma só cousa no mundo hoa ou indiÍTcrente de que a malicia do homem não possa abusar. Assim, todas as vezes que um peccador se acha cm uma circumstancia, de qualquer genero

n scja, em que elle cáe com frequencia, niercce o titulo onroso de occasionario; é indigno da absolvição se efli-

cazmente não deixa a occasião pelo modo e fórma que mais adiante notaremos.

324.— Falta desenvolver a frequencia das quédas, sem a Frequencia qual não ha occasião proxima, segundo a definição acima

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dada. Com elTeito, temos estabelecido que se chama propria­mente occasião proxima aquella em que se pecca sempre, ou quasi sempre, ou ao menos com frequencia. Convem por conseguinte explicar estas duas palavras, cair com frequen­cia. Quanto á primeira, creio que é nm grande erro, seja dos confessores, seja dos penitentes, que, imaginando que não ha verdadeira occasião proxima senão aquella em que o pec­cado se consumma pelos actos da mais asquerosa luxuria, não consideram como tal a occasião em que sc pecca sómente por palavras ou por vistas, ou por toques licenciosos, e muito menos quando não se commettem mais do que peccados de desejos ou dc omissões. Para dissipar as trevas de um erro tão grosseiro propomos o exemplo dc um mancebo díssoluto. Enamorado de uma rapariga, não lhe falia, não a sustenta, nenhum signal lhe dá de seu amor dcshoncsto; mas todas as noites vem postar-se cm sentinclla debaixo de sua janella: vendo-a, seu coração se inilamma, e frequentemente consente em pensamentos indignos. Por que não se cousideraria esta occasião como verdadeiramente proxima, pois que reune to­das as condições? Acha-se n’ella a disposição interior para o peccado; dá-se a circumstancia exterior do logar e a presença do objecto; dá-se a frequencia das quédas em peccados de pensamentos; eis aqui todos os membros que formam o corpo monstruoso da occasião proxima. Como duvidar que ella o seja? Outro exemplo para os peccados de omissão. Um pa­rocho, que é obrigado a instruir seu povo e a visitar os en­fermos em perigo, a lim de que não morram sem sacramen­tos, se entrega á caça; não á caça clamorosa e prohibido pelos Cânones, mas á caça de simples recreio: elle se entrega ao jogo igualmente licito; elle vae a uma sociedade muito ho­nesta, n’isto não ha sombra dc mal; mas todas as vezes, ou ao menos o maior numero que vae á caça, ao jogo, á socie­dade, omitte a instrucção de seu povo,'ou a visita de seus enfermos. Como duvidar que este parocho esteja em uma verdadeira occasião proxima, de sorte que pecca cada vez que vae á caça, ao jogo, á sociedade, pois que se expõe ao perigo proximo de comraetter um peccado de omissão tão grave como a negligencia da instrucção e da administração dos sacramentos aos enfermos que têem necessidade d’elles?

Tal é a explicação d'esta primeira palavra cair; resta a se­gunda, frequentemente. Para não nos desvairarmos, é a pro­posito notar que não entendemos aqui, que a frequencia das quédas seja sempre absoluta, quanto ao tempo ou quanto aos actos, de sorte que para constituir a occasião proxima seia necessário peccar todos os dias, ou quasi todos os dias, ou de fazer no mesmo espaço de tempo um certo numero de actos

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peccaminosos; não, mas basta que ella seja relativa, quero dizer, era proporção ao numero de vezes que se está exposto á occasião. Assim, um homem não tem, é verdade, cm sua própria casa a pessoa cora a qual tem costume de peccar, menos ainda elle a tem á sua conta em outro logar: o concu­binato seria muito evidente. Mas elle a visita em uma casa que não lhe pertence, e para occultar o seu commercio e il- ludir as vistas d’aquelles que vigiam seus passos, elle não a visita mais dq que uma só vez em cada mez, e mesmo mais raras vezes. É certo que se elle peccar o maior numero de vezes que vae a esta casa, se de doze vezes no anno não passa cinco ou seis sem cair, deve infailivelmcntc ser repu­tado em occasião próxima de peccado. Algumas vezes mesmo não se deverá ligar ao numero material das quédas, mas an­tes a examinar qual é a influencia da occasião sobre o pec­cado, e até que ponto o peccado depende da occasião. Todas estas considerações são deixadas á prudência do sabio con­fessor, que pesará maduramente o fado com todas as suas circumstancias.

323.— Estando solidamente estabelecidos estes principios. Prática que e bem explicada a doutrina commum relativa á occasião pro-sc deve se- xima, passemos á prática. Antes de passar adiante conside- rae de novo a proposição condemnada: Potest aliquando absolvi, qui in próxima occasione peccandi versalur, quam potest, et non vult omittere, quinimo directe, et ex proposito qucerit, aut ei se ingerit. É certo que, applicando esta propo­sição aos casos particulares, não deixarão de sc encontrar muitas difliculdades; mas todas se levantam com o auxilio de um só principio, que é este: Para desobrigar um peccador da obrigação de deixar uma occasião próxima de peccado mortal, não ha razão sufpciente senão a impossibilidade phy- sica ou moral. Com elfeito, se não é basUinte uma causa util, nem uma causa honesta, como o prova a censura de uma outra proposição, segue-se que uma causa necessaria é o unico motivo sufliciente; porque então, pondo a necessidade de uma porte, se fica da orftra preso pela impossibilidade.Dc resto, tudo isto será optimamente esclarecido pela dislin- cção que se costuma fazer entre a occasião próxima voluntá­ria e a occasião necessaria. Primeiramente rallnremos da oc­casião necessaria, e depois da voluntaria. A occasião próxima necessaria ou involuntária é aquella que um desgraçado pcc- cador não póde nem evitar nem destruir. Como deverá por­tanto conduzir-se? Rogo-vos que sejaes attentos, porque é este um nó muito complicado. Para o desatar bem deve no- tar-se que esta necessidade póde resultar de tres causas: ou ella depende do homem só, ou da mulher só, ou de ura e de

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oulro conjuntamente. De homem só: é um filho, que não póde, sem escandalo, deixar a casa paterna, e que não é o senhor de despedir a crcada, causa unica de suas quédas. Da mulher: é uma mulher casada, que não póde despedir da casa um doméstico, ou um homem que vem visital a por causa da amizade que tem com seu marido. Do homem e da mulher conjuntamente: quando o pcccado se commelte entre duas pessoas unidas pelos laços do sangue na mesma familia, por exemplo, um irmão e uma irmã, um cunhado e uma cu­nhada, que não podem scparar-sc, porque sua separação os exporia ao perigo evidente dc um grande escandalo e de in- famia, publicando sua conducta criminosa. È certo que era igual caso é necessaria ao confessor uma prudência sobre­humana: primeiramente, para discernir sc a occasião é ver­dadeiramente necessaria, ou .<0 é voluntaria, se a impossibi­lidade dc separar-se é verdadeira ou falsa, se é um pretexto ou uma verdadeira necessidade. Mas, supposto que a occa­sião seja verdadeiramente necessaria, quid agendum?

Aqui se acha tudo o que conslitue a occasião proxima: a propensão interior, que traz comsigo o perigo proximo de peccar; a circumstancia exterior do objecto presente e do lo­gar; finalmente, a frequencia das quédas. Vôde quanto im­porta estar bem certo nos principios de moral! Uma só con­sideração dissipará todas as nuvens e todas as difiiculdades, é esta": nos casos atraz citados não se póde tirar a circuni- slancia exterior, que é o segundo principio constitutivo da occasião proxima; é portanto necessário enfraquecer o pri­meiro, que é 0 perigo proximo produzido pela propensão in­terior para peccar, e assim fazer que a occasião, que é pro­xima por si mesma, se torne remota. Todavia o confessor deve ter com semelhantes occasionarios a mesma conducta que com os babitudinarios. Dão elles signaes de uma contri­ção especial, ou outros indicios de sua boa disposição inte­rior? absolvei-os, indicando-lhes os preservativos suilicientes para enfraquecer o perigo. Mas não sc vendo signaes sobre que se possa fundar um juizo prudente da realidade de suas boas disposições interiores, e sobretudo sc, depois de serem advertidos duas ou tres vezes, elles não tôem dado signaes de emenda, seria uma grande imprudência dar-lbes a absol­vição. 0 confessor deve di(l'erir-lh’a, assignando-lhcs os meios eflicazes de enfraquecer este perigo proximo. Elles podem reduzir-se a quatro: 1.®, não se achar só a só com a pessoa, evitando mesmo olhar para cila, ao menos fixamente, não lhe fallando sem necessidade, principalmente nos sitios retirados; 2.°, recorrer a Deus pela oração, pedindo-lhe muitas vezes seu soccorro por estas palavras: Meu Jesus, misericórdia, ou

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por alguma outra oração jaculaloria, e renovando muitas ve­zes 0 proposito de não tornar a peccar, proposito que não deve ser nem fraco, nem lânguido, de outra sorte seria sem successo; mas fervoroso, forte e pronunciado, que parta de uma grande dor de ter oITendido a üeus pelo que pertence ao passado, e de uma (irme vontade de mudar de vida; 3.®, receber com frequencia os sacramentos da Penitencia e da Eueharistia do mesmo confessor, aceitando voluntariamente todos os remedios que elle propozer, como recorrer aos san­tos, ou fazer visitas á igreja, ou aquelles outros exercicios de piedade que elle julgar mais uleis; 4.®, fazer alguma pequena penitencia, mortiíicando-se no alimento, ou impondo-se ou­tras morlilicações proporcionadas a suas forças, e sempre se­gundo os conselhos do pae espiritual. Eu não quero dizer que todos estes meios devam ser empregados simultanea, mas successivamente, até que se tenha obtido, com a graça dc Deus, 0 elTeito que sc desejava. Se elles obedecerem e se emendarem com o auxilio d’eslas práticas de devoção, devem ser absolvidos, observando o que adiante diremos, cm os n.®® 33Ü e 344. Se, apesar de todos estes preservativos, ne­nhum sigoal de emenda se nola, devem ser julgados incapa­zes de absolvição, e dizer-lhes abertamente: Perdüio Im ex te. Com elleito, n’esle caso, notae bem, a occasião de ne­cessaria se torna voluntária. É verdade que o mais diíücil é distinguir quando esla impossibilidade moral é real ou só- menle apparenle; tudo isto é deixado á prudência do confes­sor. Não lenbo sobre isto mais do que uma reflexão a com- municar-vos: quando, na prática, é mais dillicil o tirar a occasião do que o é, supposta a occasião, o evitar o peccado, então é evidente que ha uma verdadeira impossibilidade; dc outra sorte augmcntarieis o perigo de multiplicar o peccado pelos mesmos meios que são prescriplos para o destruir. As­sim, se 0 despedir a creada, o creado, o amante deve occa- sionar graves escandalos, não se deve exigil-o, mas pôr em acção os meios já indicados para diminuir o perigo proximo.Quando pois vos achardes em iguaes embaraços, elevae vosso coração a Deus, pedi-lhe uma verdadeira prudência, a lim de não vos enganardes, e estae certo que elle vos não faltará.Se duvidardes, tornae em lal caso o partido mais seguro, que é sempre o mais favoravel ao penitente, pois que o desvia do peccado. A experiencia vos ensinará, que cortando a cabeça de um só Ilolophcrnes alcançarcis uma victoria completa; quero dizer, que de um só golpe corlareis uma multidão de peccados.

326.— Vamos á occasião proxima voluntaria, quero dizer, Occasião que se póde, mas que não se quer deixar. É este o caso mais «««e-

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dilTicil que se póde encontrar no ministério da confissão. Ah! é aqui que se deve desembainhar a espada do santo zelo, a fím de cortar inteiramente o nó fatal, fonte de tantos pecca­dos. É incrivel quantas desculpas amontoam, quantos des­vios inventam os occasionarios a lim de aparar o golpe que deve separal-os da occasião. E portanto necessário que o confessor esteja prevenido, a íim dc não acreditar facilmente tudo 0 que se lhe disser: deve ser prompto em refutar e em pulverisar as objecções; fcrtil em achar e indicar expedien­tes, a fim de que o penitente fique convencido que as diCTi- culdadcs não procedem mais do que da falta de boa vontade. Com elTeito, sc o confessor não lhe acha uma vontade bem resolvida, não deve absolvcl-o. Ora, para proceder com or­dem deve distinguir as occasiões in esse, segundo a distin- cçào mesma dc S. Carlos cm seus Avisos aos confessores, e aquellas que não são in esse. Para destruir as primeiras, que são as mais perigosas, deve empregar o ferro e o fogo. 0 santo Arcebispo não quer que se lhes conceda algumas tré­guas. Elle entende por occasiões in esse as frequentações que tôem logar na própria casa, ou outras cousas que o occa- sionario confessa ler ao pé de si; tal é um concubinario que retem, em sua própria casa, uma mulher, com a qual pecca frequentemente, e que póde, querendo, despedir logo; tal é um libertino, que collocou o retrato de uma pessoa amada em seu quarto, onde muitas vezes está, e que póde tirar sem de­mora; tal é uma creada que, solicitada por seu amo, consente sempre ou quasi sempre, bem que ella não seja a provoca- dora c mesmo não goste dc ser solicitada, e que póde imme- diatamenlc deixar a casa, clc. Seguramente, em caso seme­lhante, deve-se recusar a absolvição até que tenham absolu­tamente tirado a occasião; acaulelae-vos de admillir suas desculpas. Elles vos dirão que, privados d’esla creada, não podem comer alguma iguaria preparada por outras mãos; que elles terão a maior dilliculdade em achar uma outra domes­tica; que despedindo-a perderiam uma somma notável que lhe anticiparam; que a casa solTrerá um grande damno, por isso que esla mulher é economica c concorre para um lucro considerável. Elles acrescentarão, que resultariam escandalos ou prejuizos que elles sahem maravilhosamente colorar: Que dirá 0 mundo? 0 publico se confirmará em suas suspeitas; a reputação será manchada: esta pobre creatura posta na rua ficará abandonada. Elles promettem, elles juram, que não tornarão a peccar; que virão confessar-se ao mesmo confes­sor. Razões frivolas, vãs resoluções são todas estas, se de perto se consideram. Se o publico tem já suspeitas, são por­tanto obrigados a fazer cessar o escandalo. A verdade é que

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slles não estão tocados da graça; porque se elles tivessem o loração contrito e estivessem decididos a largar a má ligação, Iodos os seus môdos se desvaneceriam, e a prudência do con- ftssor acharia meios para fazer a separação sem incorivenien- Us. Não nego que, era certos casos particulares, o zelo não deva ser moderado pela prudência. Âssim, é ura amo que len em sua casa uma creada que é para elle uma occasião proxima de peccado; mas não ha escandalo, nem suspeita, e um e a outra gosam no publico de boa reputação. Ora, se em ura tempo de missão o confessor persiste em recusar a absolvição a este amo se não manda logo embora esta creada, esta expulsão subiía, era occasião de penitencia publica, póde fazer nascer suspeitas; vendo despedir esta crcada tão preci- pilada-nente se julgará que ella sáe por dever de consciência e não de motu proprio. .Mas n’esle caso, que meio achará o confessor para nrocurar o bem do penitente sem encarregar sua consciência? Eu vou dizer-vos em duas palavras como se conduziu um liabil confessor em uma circumstancia seme­lhante. «Oavi, meu lillio, disse elle a seu penitente, na rea­lidade eu não deveria, eu não poderia absolver-vos; mas por­que vos vejo tão contrito e tão resolvido a expulsal-a, c vos confessacs com tanta dor de todos os peccados que tendes commettido no decurso de toda esta má ligação, quero per­suadir-me que uão ha (ingimento de vossa parte, e que fal- laes com toda a siuceridade de vosso coração; em outro tempo que não fosse o de uma missão, e se vos uão visse tão con­trito, eu não o acrcdiuiria. Eu vos absolverei portanto, com condição que me promettaes de a despedir quinze dias de­pois que a missão terminar, e, até a este tempo, de nunca a deixar entrar eni vosso quarto quando estiverdes só, de não lhe fallar, excepto para cousas necessárias, de uão olhar para ella lixaniente. Além d’isto, no decurso d’csles dias, confes- sae-vos ao menos duas vezes, para dar ao confessor conta de vossa conducta; fazei nascer, durante este tempo, alguma circumstancia favoravel para a despedir logo depois dos quinze dias. Passado este termo não deveis demoral-a mesmo uma hora: se lizerdcs outra cousa, sabei que não achareis mais confessor que vos absolva.» Este meio termo, diclado pela prudência em uma circumstancia em que ba uma espe­cie de impossibilidade moral de fazer outra cousa, merece até certo ponto ser louvado. Mas não sc deve fazer uso d’elle com toda a classe de penitentes, nera eni toda a occasião. Sede portanto acautelado, sc não quizerdes ser enganado; tende como regra geral, que na occasião proxima in esse deve empregar-se o ferro c o fogo, principalmente em duas matérias, a avareza e impureza. Quando o habito é muito

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forle, a tentação muito violenta, e a inclinação viva, não vos rendaes a bellas promessas, mas armae-vos de um santo ri­gor, e dizei em duas palavras ; Ide, tirae a occasião e vindf receber a absolvição. Se o penitente objectar a impossibili­dade moral, não acrediteis em sua palavra; porem medi, exc- minae attentamente esta difliculdade que elle engrossa. Mui­tas vezes reconbecereis que ella é maior do que aquella qie encontrava Abraliam cm expulsar sua escrava. Não havia n’isto uma verdadeira impossibilidade, da mesma sorte çue em nosso caso, onde tudo vem da má vontade: assim para obedecer a Deus, Abraham foi superior á paixão, e não dilTe- riu mesmo um só dia o despedil-a: Surrexil mane; el diniisit eam. (Gen., xxvii, 14.)

Occasiões 327.— Parece que as occasiões que não são in esse exigem que não nienos rigor e auctorisam mais condescendencia. ElLis con-

'"sistem em freqüentar as casas dc jogo e divertimentos, as assembléas, as tavernas, era formar ligações amorosas e cou­sas semelhantes. Segundo os Avisos de S. Carlos, quando o penitente comprchendido em taes occasiões promette, e pro- niette sinceramente deixal-as, póde absolver-sc ao nienos duas ou tres vezes, supposto sempre que o confessor conheça que semelhante promessa sãe de um coração resoluto e con­trito. Se já tiver promettido outras vezes sem emendar-se, o santo Arcebispo quer que se lhe recuse a absolvição até que inteiramente tenha deixado a occasião. Entre eslas occasiões, que não são in esse, creio que se póde pôr cm primeiro logar as ligações amorosas, tornadas em nossos dias a pedra dc es­candalo da mocidade. Não sc deve grilar tanto, dizem al­guns, contra os amores profanos, no receio que se ponha malicia onde não a ha, ou que se faça considerar como pec­cado 0 que na realidade o não é, d’onde resultará que as al­mas dominadas por uma consciência errônea c por uma ver­gonha indevida se precipitarão sem remedio em peccados e sacrilégios. Erro de homens que sem dúvida não conhecem todos os progressos e toda a malicia dn libertinagem de nos­sos dias! Não nego que o caso tenba algumas vezes aconte­cido, c que um confessor imprudente, conhecendo pela res­posta dc uma rapariga innocente que ella tem ligações amo­rosas, a tenha reprehendido com demasiada vehemencia, sem examinar primeiramente a natureza de suas ligações: mas esle caso é rarissimo, e não merece certamente a importân­cia que se lhe dá. 0 que faz gemer os ministros do Senhor é ver que a corrupção em nossos dias alagou todos os diques,

r ella se espalha por todas as partes e envolve a mocidade idade a mais tenra. Para que pois, dizem elles suspi­rando, para que reprehender com tanta acrimonia o zelo ex-

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cessivo de alguns, e passar em silencio, desculpar mesmo a connivencia de Innlos oulros, que cegamente absolvera todos aquelles que se acham raettidos em semelhantes ligações, cujo cdeito é mergulhal-os até acima da cabeça cm toda a casta de iniquidades? Haveria injustiça cm pretender que amorem facere seja sempre peccado, mas baveria outra muito maior em sustentar que elle seja sempre innocente. Sc de­vemos julgar secundum id quod communiler accidit, é mister considerar como uma proposição incontestável que estas liga­ções acompanhadas dc circurnstancias que hoje não se sepa­ram d’ellas, ut plurimum, são uma occasião próxima dc pec­cado. Praza a Dens que csla proposição não fosse provada por uma longa prática e uma lamentavcl experiencia! É ver­dade, 0 amor da mocidade é algumas vezes innocente em seu principio, mas lorna-sc culpado em seus progressos. Princi­pia-se por olhar com deleite, por brincar com prazer, o pra­zer se muda pouco a pouco em paixão, e a paixão precipita em um abysmo dc malicia, onde não se acha fundo. Ora, rea- niniae aqtíi vossa attenção, c dizei-me por favor: somos nós médicos das almas? Se nós o somos, como podemos pcrmit- lir uma igual desordem, que, semelhante á peste, põe o mundo em agonia por tantos matrimônios conlrabidos occul- tamente, por tantos assassinios, infamias, odios, escandalos e iniquidades de todo o genero? Assim, haja resolução de aper­tar os laços de uma santa associação c de ser unanimes em dilTerir e mesmo em recusar a absolvição áquelles que, acha­dos culpados, não querem prometter de cortar suas ligações.Ora, para conhecer sc suas inclinações são innocentes ou cri­minosas basta interrogar, c vós tocareis com o dedo que ha poucas e mesmo pouquissimas d’estas especies de amores, onde não inlervcnha, da parte de um ou do outro cúmplice, alguma circumstancia vergonhosa que torna absolutamente illicilo um commercio tão abominavel. A lim de que tenhaes debaixo dos olhos um modelo de prudência no modo dc in­terrogar, c vigor na recusação da absolvição, quando as cir­cumstancias 0 pedirem, quero referir-vos ad litteram o que diz 0 Cardeal Pic dc Mirandola, bispo de AIba, cm sua carla- pastoral, que merece ser lida por todos os confessores. Este prelado, tão dislincto por sua sciencia, como por sua pie­dade, decretou para sua diocese o seguinte. Eis aqui suas palavras:

328.— «Advertimos todos os confessores, que não absol-üecrcio do vam aquelles que têem ligações amorosas, quando ellas são C“ ''deai Pic para aquelles que se entregam a ellas gravemente illicitas, joia bís”põ se estes peccadores, depois de ler sido advertidos tres vezes dc Alba. por elles mesmos, ou por outros confessores, o que deverá

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sempre pergunlar-se-lhes, não se tiverem effectivãmente emendado: signiticando-llies que se não tratam verdadeira­mente de se emendar, não devera nem esperar, nem preten­der receber a absolvição de sua parte, nem da parte de ou­tros confessores. Eis aqui os casos mais ordinários em que as ligações amorosas são consideradas como absolutamente illi- citas. Expomol-as em poucas palavras e cm latim, por justos motivos. É este ura meio dc fazer uniforme n’esta matéria, assim como em todas as outras, a conducta dos confessores;

«1.® Quandocumque ita liat, etiam inter pares, et causa matrimonii, ut iutercedant oscula, vel tactus, vel amplexus, vel delectationes morosíc, aut periculum labeudi in quodvis grave peccatum;

«2.® Quando íit inter eos, qui sunt dispaiis conditionis propter scandaium, et periculum niortalilcr pcccaudi;

•3.® Si (iat cura illis, cum quibus impossibile cst contrahi matrimoniiini, ut sunt uxorati, claustrales, et in sacris ordi- nibus constituti, tum quia non potcst cohoneslari talis amor fine matrimonii, tum quia intcrccdil scaudalum, et periculum labendi in culpas Icthales;

«4.® Si (iat in ecciesia, tum propter irrcverentiam, tum propter periculum atidiendi sacrum sine debita attcntione, tum etiam propter scandaium;

«0.® Si adsit praeceptum patris, vel matris aut tutoris ra- tionabililer prohibens talem amorem; quia cliamsi reliqua sint honesta, (ilii familias et pupilli tenentur in re gravi, ut sine duhio hxc cst, ohedire parenlihus, vel tulorihus, sub pocna peccati mortalis;

«6.® Quando clara lit, et occullo, tum quia est expositus gravibus periculis, et occasioni proximac gravilcr pcccandi, tum quia, quando iUi (it, regulantur exercelur contra volun- talem parentum, vel tutorura, quibus (ilii, vel pupilli ohedire debenl;

«7.® Si tempore nocturno (iat, propter scandaium, et peri- culura cadendi, etc.;

«8.® Si (iat sul) praslextu honestm recrealionis et relaxandi aniraum, quia sempcr urgel periculum, ct occasio proxima labendi ex longa mora, in qua hahentur colloquia, mutui as- peclus, protesta tio amoris, etc.;

«9.® Si eo modo (iat, ut ex se involvat periculum proxi- raura osculorum, tactuum, ctc. Eliamsi aliunde illc amor es- sel licite exercitus, quia cst iuter solutos, et causa raatrimo- nii; si, verhi gratia, domi admittatur araasius vel ita apro- ximelur, ut nemo non videat, adcsse occasionem proximam tactuum, etc.;

«10.® Si amator, vel amatrix animadvertat, complicem

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amoris esse graviler lenialum, vel alteriim urgere verbis lur- pibus, vel alio modo ad inhonesta, elc. Eliamsi aller com- plex nihil tentelur, ct nuliam scotiat inclinationem ad pec- candum: in quo casu erit utrique iilicitus amor ille, propter pericuium proximum delectationis et scandali activi in uno, et passivi in altero, in quo graviler Imderetur charitas erga proximum;

«11.® Denique universaliter loquendo, quotiescumque ob causam amoris amalor, vel amatrix frequenter labitur in ali- quam gravem noxam, tunc amor induit rationem occasionis proxima; mali, el est omnino illicilus.»

Pesem-se bem todos estes dilTerenles casos, e interrogue-se sobre elles, com as convenientes precauções, os penitentes escravos d’esla paixão, c digara-me se é possivel contestar a proposição acima estabelecida, que as ligações amorosas, taes como tôem logar em nossos dias, são, ut plurimum, uma occasião proxima de peccado. Mas, sendo assim, como não reprehender com força o penitenle, que advertido, e adver­tido muitas vezes por seu confessor, não quer emendar-se, que mesmo quer questionar com seu confessor c arrancar-lhe uma absolvição? Eu cito para o tribunal de Deus estes con­fessores que, jaclando-se de uma facilidade tão perniciosa, absolvem sem alguma reflexão todos aquelles que se apresen­tam e causam a ruina dn mocidade e do mundo inteiro. Com elTeito, é da má educação da mocidade que dimanam todos os males e todas as desordens das familias, d’onde a desor­dem se propaga c infecciona o mundo inteiro.

329.— ÀDles dc terminar esta matéria da occasião proxima ouiras devo advertir que muitos confessores põem grande zelo não occasiões. sómente em separar, mas tambem em arredar seus peniten­tes dc toda a occa.sião proxima de peccado contra o castidade, mas são negligentes em fazer-lhes deixar as outras occasiões muito numerosas de peccar contra os diflerentes mandamen­tos de Deus. 0 glorioso S. Carlos tem grande cuidado de fa­zer esta nota. Ora, enlre as occasiões que não são in esse, conta aquellas em que se acha ura grande numero de pessoas que, exercendo suas prolissões, frequentemente cáem em peccados gravissimos, blasphemias, roubos, injustiças calu- mnias, odios, fraudes, perjúrios, e outros semelhantes. Elle quer que se lhes dillira a absolvição quaudo, advertidos duas ou tres vezes, não derem signaes dc emenda; ainda mais, se depois de reiteradas advertências não se emendam, devem ser obrigados a deixar eslas prolissões, que são para elles uma occasião proxima dc tantos peccados. Mas antes de pas­sar a esla resolução extrema deve usar-se de conselhos e de uma grande madureza. Se achardes que esle medico, este ci-

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rurgião, esle estalajadeiro, este negociante, este advogado, este procurador, etc., estão em uma especie de impossibili­dade moral de deixar seu estado, porque não têem outros meios de subsistência, deveis, durante algum tempo, tratar este occasionario como sc trata um recidivo que pecca sem ser induzido por uma causa exterior. Mas se, depois das con­venientes provas, elle conlinúa a accumular peccados sobre peccados sem que conheçaes n’elle alguma emenda, deveis obrigal-o a deixar este emprego, que se tornaria evidente­mente a causa de sua condemnação. 0 santo Arcebispo quer que sc u.se de um rigor muito maior com aquelles que vão ao hailc, que tratam com os hlasphemodorcs, que freqüentam as tavernas, que são para elles, ao menos relativamente, oc­casiões próximas de pcccado, por isso que cm razão dc sua má disposição cáem frequentemente na embriaguez, cm des­avenças, cm blasphemias. cm maledicências c outras faltas gravissimas. Assim, conlinúa o Santo, não se deve absolvcl-os sem que elles prometiam desviar-se; e se, depois de haverem promellido duas ou tres vezes, recaírem, quer elle que intei­ramente se lhes recuse a absolvição.

Ora, demoremos-nos um instante, e dizei-me se a prática de nossos modernos confessores concorda com a theoria dos antigos doutores? Tudo o que ale aqui temos dito c adopiado pelos mais sabios theologos; que digo eu? é fundado sobre as decisões da Igreja, que fulmina suas censuras contra aquel­le que ousa ensinar que se póde absolver o peccador que vive na occasião proxima do pcccado; c não obstante, que vemos nós na prática? como se conduzem em nossos confes­sionários? dilTere-se e recusa-se a absolvição era tempo c lo­gar, segundo a necessidade do penitente? Ah! que espinho no coração! Para julgar da grandeza do mal, altendei: abre- se a missão em um logar, Uma multidão do penitentes vem n vossos pés, enredados, ha muitos annos, cm ligações que os tôem cobertos de chagas, envenenadas e gangrenadas pelo tempo.— Ua quanto tempo, meu (ilho, pergunta o confessor, cnlreleis esla frequentação criminosa? — Iln oito ou dez an­nos.— Caís muitas vezes no peccado?... — Todos os dias, meu padre, ou ao menos duas ou tres vezes por semana.— Tendes-vos sempre confessado?-Sim, meu padre.— Con- fessaes-vos a miudo? — Uma vez todos os dous mezes.— Tendes sempre tratado com o mesmo confessor? — Não, meu padre; vou umas vezes a um, outras vezes a outro.-Assim, durante esles dez annos, tendes ido a quasi todos os confes­sores do terra? — Sim, meu padre.— Que vos tôem elles dito? — Que não tornasse a cair.— Tôem-vos elles dado sem­pre a absolvição? — Sempre, meu padre.— Pérfidos! diz,

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tremendo, em seu coração um zeloso confessor que não tem em vista senão a salvação das almas: perlidos! eis aqui uma pobre alma assassinada, que, no decurso de tantos annos, hominem non hahuü, nunca achou um confessor caritativo que lhe tenha dado um impulso misericordioso para lavar suas faltas na piscina sagrada de uma boa confissão. Sua dor augmenta com o numero dos penitentes assim trabidos, e dos confessores em excesso indulgentes; porque a má direcção de um penitente Ibe faz conhecer a fraqueza de quasi todos os confessores d’esta terra. Perdoae-me este movimento de zelo, c não vos admireis dc me ouvir tomar parte no senti­mento que acompanha um ministro do Senhor. Rellectindo na relaxação dc um grande numero dos confessores dc nos­sos dias, que absolvem com os olhos fechados todos os habi­tudinarios e os occasionarios, desprezando as decisões da Santa Se, elle dizia suspirando: Ou a Igreja se engana, ou uma grande parte dos confessores se coudemna. .Mas por isso que a Igreja, assistida pelo Espirito Santo, não póde errar, deve concluir-se que uma parle dos confessores serão conde- mnados. Com elfeito, muitos não obedecem á Igreja, que faz um preceito, e que manda, em virtude de santa obediencia, que não se absolvam os occasionarios que podem e não que­rem deixar a occasião próxima do peccado. Tal era o raciocí­nio d’esle ministro de Dens. Seu sentimento, que eu res­peito, é aliás confirmado pela experiencia de todos aquelles que se empregam no ministério apostolico e que vão em pro­cura das almas desencaminhadas. Ahl como não gemer vendo uma ruina tão universal, occasionada por confessores sem zelo, que, sem exame, sem discernimento, sem interrogações, absolvem indilTerenlemenle tanto as occasiões próximas, como as remolas, tanto os concubinarios, como os inconli- nenles, tanto as prostitutas, como as donzellas; cm uma pa­lavra, que coitam todos os nós das consciências com uma fouce de ceifador, e que, em vez de quebrarem as cadeias dos penitentes, as redobram sobre elles mesmos, e se põem era estado de condemnação? 0 remedio nós o temos na mão. Consiste em formar uma santa alliança, e quando encontrar­mos estes occasionarios, fallar-lhes singelamente, sem nos deixarmos desanimar por um terror pânico, ou por um vil respeito humano. Se a occasião for in esse, deve dizer-se- Ihes sem rodeio: «Ide, tirae a occasião e vollae para vos absolver.» Se ella não for in esse, c se elles, tendo muilas vezes sido advertidos por confessores zelosos, não tôem obe­decido, deve dilTerir-se-lhes a absolvição até que elles intei­ramente apartem a occasião e dêem signaes de uma verda­deira emenda. Eis o remedio. Seremos nós todos fieis em o

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empregar na prática? eu ouso esperal-o; mas que se prepare para a cólera de Deus aquelle que de outra sorte obrar e que voluntariamente quizer licar cego no meio de tantas luzes. (Sobre as principaes occasiões do peccado, vêde D. D. Bou- vier, episc. Coenom., Disserlatis in sextum pmceplum.)

Doutrina 330. (S. Cahlos, pag. 43-34.)— Assim, deve dilTerir-se a „ rnrinc ®5solviç3o, até que se veja alguma especie de emenda, áquel- sõbrc as t*® 9“ ®'" confessores com probabilidade julgarem que, occasiões. hinda que digam c promcltam que deixam o peccado, não o

deixarão todavia, como são certas pessoas, e particularmente os mancebos ociosos que passam a maior parle do tempo nos jogos c diverlimenlos, e ordinariamente enredados em ami­zades carnaes e peccados de impureza, em blasphemias, pa­lavras deshonestas. odios e maledicências, e que se apresen­tam nos últimos dias de quaresma para se confessarem; e tambem áquelles que têem perseverado muitos annos, e mui­tas vezes recaído nos mesmos peccados, e não têem empre­gado cuidado em se emendarem. Não podem absolver-se igualmente aquelles que não lêem uma verdadeira resolução de abandonar todos os peccados mortaes e juntamente todas as occasiões de os commelter; e porque para a instrucção dos confessores é muito importante que elles comprehendam bem este ponto, o explicaremos mais por extenso.

Chama-se occasião de peccado mortal todas as cousos que 0 podem causar, ou porque ellas de si mesmas induzem a peccar, ou porque o penitente, achando-se n'ellas, é de tal sorte acostumado a peccar, que o confessor deve racionavel- mente julgar, que em razão de seu máu habito nunca se absterá de peccar, emquanto que perseverar nas mesmas oc­casiões, quero dizer, d’aquellas que de sua natureza induzem a peccar, como são: fazer prolissào de jogar continuamente as cartas ou os dados; ter para os outros um logar preparado para este elTeito; ter em sua casa a pessoa com quem se of- fende a Deus, seja que ella assim o lenha desejado, ou que se resida com ella de qualquer modo que seja; continuar em seus entretenimentos, vistas, conversações e outras práticas lascivas e impuras. Estando portanto o penitenle implicado

■em alguma d’eslas occasiões, ou outras semelhantes, de modo que sejam presentes, como se em sua casa tiver uma concu­bina, ou outra semelhante, o confessor não lhe deve dar a absolvição sem que elle primeiramente tenha elTectivãmente deixado esta occasião. E quanto ás outras occasiões, como brinquedos, vistas, conversações, gestos, etc., não deve lam­bem conceder-lhe esta graça, sem que elle prometia abster-se d’islo; lendo elle iá outra vez promettido e comtudo não se tiver emendado, deve em tal caso, faça elle a promessa que

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fizer, dilTerir-lhc a absolvição alé que veja alguma e\E porque póde acontecer que com todas as instrucçõcs e con­selhos que um sabio e zeloso confessor lenha dado a seu pe­nitente, elle Dão possa todavia tirar-se da occasião do pec­cado sem grande perigo, ou sem escandalo, o confessor n’este caso deve servir-se dos remedios seguintes.

331.— Em primeiro logar dilTcrirá o dar-lhe a absolvição Remedios alé que veja provas certas de verdadeira emenda, e não po- para as dendo dilTerir o absolvel-o sem o pôr em perigo de infamia, occ®®*®®®- e por outra parle descobre n’elle tão grandes signaes de sua disposição e de sua proniplidão em receber os remedios que julgar necessários para sua emenda, deve ordenar-lhe aquel­les que lhe parecerem mais opporlunos e mais necessários: como, por exemplo, de nunca estar a sós com esta pessoa, prescrever-lhe certas orações, algumas mortificações da car­ne, e sobretudo que se confesse com frequencia, c outros se­melhantes; aceitando os quaes, o confessor o póde absolver.E se, depois dc haver feito esla diligencia, ou lendo-a feito antes um oulro confessor, este penitente não se emendou, não deve dar-lhe a absolvição sem que elle se lenha elTecti- vamente separado da occasião; excepto se, tendo-nos consul­tado sobre o que deve fazer em lal occasião, sem todavia des­cobrir quem é a pessoa, nós sejamos de parecer que lh’a dê.As occasiões de peccado da segunda especie, quero dizer, que 0 não são de si mesmas, mas sómente a respeito da pes­soa que sc encontra n'ellas, são as cousas que, ainda que li­citas em si, deixam comtudo julgar com fundamento que o penitente recairá nos mesmos peccados que já commelteu, perseverando n’ellas, como o fez quanto ao passado. Taes são ordinariamente para muitos, pela corrupção do seculo, a guerra, o negocio, a magistratura, a profissão de advogado, de procurador, e outros semelhantes exercidos, nos quaes aquelle que é habituado a peccar cora frequencia mortal­mente por blasphemias, roubos, injustiças, calumnias, odios, fraudes, perjúrios, e outras semelhantes oITensas de Deus, sabe que continuando esles mesmos exercidos se encontrará nas mesmas occasiões, e não tem motivo de crer que deva para o futuro resistir mais poderosamente ao peccado do que DO pretcrilo o fez, e ha razão de presumir que recairá por conseguinte nos mesmos peccados. É a razão por que estas pessoas devem, como diz Santo Agostinho, ou abandonar este exercicio que lhes é perigoso, ou pelo menos não o exer­cer senão com a permissão e conselho de ura direclor vir­tuoso e intclligenle, o qual não deve absolver uma pessoa que se acha n’este estado, se com probabilidade julgar que recairá nos mesmos peccados, permanecendo nas mesmas oc-

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casiões, mas deve aguardar por espaço de algum tempo pro­vas de sua emenda.

Continua- 332.— E tanto mais cuidadosamente n’isto devem ser ze- ç«o. losos, qunnto com frequencia succede que por culpa dos con­

fessores n’este ponto se commeltem muitos abusos, e muito grandes peccados quasi cm todas ns artes e cm todas as pro­fissões, nas quaes, por esta razão, parece que muitas pessoas não sabem satisfazer cousas que são justíssimas cm si mes­mas; como, por exemplo, entre os magistrados e oíficiacs se promette com juramento muitas cousas que não se observam. Quando sc dá conselbo, ou se exerce a profissão de advogado ou de procurador, lisonjeiam-se as más intenções das partes, e se favorece a injustiça contra sua pronria consciência. Nos empregos da guerra apoiam-se os ducllos, ns animosidadcs, os odios, os bomicidios, os jogos, as blasphemias, a rapina e 0 vicio de mulheres. Em o negocio praticam-se as usuras e dolos; mistura-se e vende-se o que é máu por bom; ven­dem-se as cousas por mais do que valem; perjura-sc com fa­cilidade; ilindcm-se as portagens c aquelles que arrecadam os impostos, e sc commcttem muitos outros peccados seme­lhantes. .Muitos artistas trabalham igualmente nos dias festi­vos, como nos que o não são, de sorte que não sc occupam jámais no serviço de Deus, e pela maior parle não ouvem sua palavra, c cnlrelem toda sua familia na mesma desor­dem. E assim muitas pessoas se encontrarão nestes exerci­cios, que terão sempre vivido em peccado mortal, as quaes por conseguinte não devem ser julgadas capazes de receber a absolvição, sem haver antes tomado o cuidado de as des­embaraçar d’eslas occasiões, ou dc as tornar mais fortes do que ellas são para Ibes resistirem. E o confessor, examinando com mais cuidado do que o ordinário estas pessoas, achará talvez algumas que nunca terão feilo uma conlissão boa; e n’este caso, além das provas de uma verdadeira emenda, que nós temos dito que elle devia aguardar, ou a cessação do exercicio que lhes é perigoso, deve-lhes fazer conhecer que, para começar verdadeiramente sua conversão, é importante

3ue façam uma conlissão geral de seus peccados, e se valham e remedios poderosos para sua salvação.

Continua- 333.— 0 confessor deve muito mais exactamente ser pre-Ção. venido n'esla qualidade de exercicios e acções, que não são

nem necessárias nem uteis, porque, ainda que não estejam na classe de occasiões que de si mesmas induzem ao peccado mortal, e que por conseguinte não devera ordinariamente ser evitadas por todas as pessoas, dão comludo uma inclinação para o mal, e arrastam com frequencia e facilmente a diver­sos peccados mortaes: como ir aos bailes, conversar com os

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blasphemadores, cora os bulhentos c outras más companhias, freqüentar as tavernas, viver na ociosidade, e cousas seme­lhantes, por occasião das quaes se costuma peccar mortal­mente, porque não deve absolver aquelles que se constituem n’ellas sem que previamente as renunciem, e promcttam ab- ster-se d’cllas cITectivamente. Se comtudo parecer ao confes­sor que póde dar credito a primeira e segunda vez á pro­messa que faz o penitente de sair d’esta occasião, o poderá absolver sob esta condição; mas não o deye tornar a fa­zer, e vendo da terceira vez que elle não lhe foi liei, dillerirá dar-lhe a absolvição, até que testifique actualmentc que se ha separado destas occasiões. 0 confessor terá cuidado em não dar a absolvição áquelles que fazem contratos prohibi­dos, nomeadamente por nossos concilios provinciaes, ou aliás claramente iilicitos, sem que previamente os rescindam e fa­çam a necessaria satisfação. Duvidando-sc se estes contra­tos são ou não legítimos, deve, antes de Ibe dar a absolvi­ção, remctter o coso a nosso penitenciário mór, que terá cuidado de haver nossa resolução, e n’este caso o confessor poderá absolver este penitente e admittil-o á communhão, dando elle bons provas de seguir a decisão que lhe houver sido dada. Não deve tambem dar a absolvição, mesmo em virtude de jubileu, áquelles que não tôem declarado o que elles sabem sobre as cousas que foram advertidos que de­nunciassem por um mandado publico ou por monitorios do Papa ou do Arcebispo, sem que primeiro tenham feito esta declaração, e satisfeito tudo o que são obrigados pelo damno que tiver causado a demora. Não deve ser concedida a mesma graça da absolviçAo, antes da restituição ou satisfa­ção, áquelles que estão na obrigação dc o fazer, se elles tôem possibilidade; excepto os enfermos que se acham cm perigo, aos quaes todavia se deve ordenar que satisfaçam quanto an­tes. (Sobre a doutrina de S. Carlos, vôde o prefacio d’esta obra.)

ARTIGO VIDOS IIAIUTUDINARIOS E RECIDIVOS

334. (S.ACEnnoTE santificado, n.®® 34-100.) — Deveis ter Conducta uma conducta mui dilTcrente, se vosso penitente for habilii-cqm os lia- diuario c recidivo. É tambem para vós uma obrigação grave e dillicil 0 dcsarraigar o máu habito e as recaídas. Esta obri- divos, gação não póde cumprir-se por um acto unico e premeditado, mas sómente por uma longa serie de actos contrários, succcs- sivos, freqüentes, inesperados; porque as paixões domadas hoje, renascem ámanhã, e vencidas em um momento, acom- metlem cm outro. Ora, é a respeito d’estes enfermos, que

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principalmente se deve empregar o balsamo composto do oleo da compaixão, a (im de que não desesperem, e do vinho das admoestações paternaes, a íim de que elles não sejam negligentes, e não deixem amortecer o zelo de sua emenda. Cora elTeito, elles .<ão siimillaneamenle sujeitos a dous males contrários, á desesperação por causa da grande dilliculdade que experimentam, ou á prcsumpção, procurando descul­par-se de sua fraqueza como de uma verdadeira impossibili­dade.

Quando 33o.— Quanto a vós, sempre penetrado dos mesmos prin- ri'7se‘*n'í f**® (levem dirigir vossos passos, não deveis absol-a absolvi- vel-os, quando não podérdes formar um juizo solido e pru- ção." dente de sua disposição actual ao menos sulliciente. Ora, não

podeis formar este juizo no concurso das circumstancias se­guintes: 1.®, quando o pcnitcnlc ncnhuns ou muito poucos dos meios prescriplos empregou; 2.®, quando não tiver dimi- nuido 0 numero de suos faltas; 3.“. quando não dá algum si- gual extraordinário de contrição. N ’este caso, não tendes al­guma provo de uma vontade firme que mostre, por esforços notáveis, que ella é eflicaz: a presumpção está contra todos seus protestos de arrependimento. Mas, dilTerindo-lhes a ab­solvição, cmpregac lodo vosso zelo para inovel-o a duas cou­sas: 1.°, a emendar-se, siiggerindo-lhe para isto os motivos e meios convenientes; 2.', a voltar o mais breve possivel, se­gundo 0 conselho de Bento XIV, em sua hulla Apostolica: Illos, quantolitis ut revertanlur, invitenl, ut ad sacramentale forum regressi, absotulionis beriefwio donentur; notae o quan- lolius. Àssim, não prcscrcvaes ordinariamente demora que exceda oito ou dez dias, porque nada é mais util ao enfermo do que ser com frequencia visitado pelo medico, o qual reco­nhece os novos symptonias do mal c as variedades que recla­mam dilTerentes "remedios. Pelo contrario, nada é mais no­civo ao enfermo do que a raridade das visitas do seu doutor.

Modo dc 336.— Sc ao cabo de oito dias volUir o penilenle, e não lb’a diíTc-acfiardes n’clle mudança alguma, recusae-lhe de novo a

absolvição, mas com mais precaução. E elle um enfermo que cnrecc dc visitas mais freqüentes. Bcnovae-lhe portanto não 0 de oito dias. mas um pra.so muito mais curto. Altendei: S. Bernardo, para curar um mancebo hahiludinario c reci­divo cm faltas de impureza, lhe disse que voltasse dentro cm tres dias, e, durante esle tempo, que se ahslivesse do pcccado, cm honra das tres pessoas Divinas, a quem tantas obrigações devemos. Elle volta sem haver recaido. 0 Santo lhe roga que faça o mesmo por espaço de outros tres dias cm honra da Sanla Virgem, de quem temos tanta necessidade e que me­rece toda a nossa confiança. Elle volta ainda sem recaída.

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Meu filho, llic disse então o Santo, eu vos peço ainda tres ou­tros dias em honra de vosso Anjo da guarda, a quem sois tão devedor; depois d’isto logo vos absolvo. No fim do terceiro Iriduum a intercessão da Santa Virgem e do Anjo da guarda foi tão poderosa para com Deus, que este mancebo voltou, e disse: Já não é por tres dias, mas para sempre que eu quero e que eu prometto abster-me do peccado. Agora vejo eu que não é a graça nem a força, mas a verdadeira vontade que me faltou até aqui: a quem sinceramente quer, nada é impossivel com a graça de Deus e intercessão dos santos. Feliz mancebo por teí caido nas mãos dc um pne c de um medico tão expe­rimentado, que soube ganhal-o por motivos ao mesmo tempo tão doces c tão fortes, c que, por esta engenhosa diminuição das difliculdades e da duração das provas, dividindo para as­sim dizer o remedio cm pequenas porções, soube adaptal-o á sua Iraca virtude e restituir-lhc a saude!

337.— Vèdes por isto quanto se enganam os confessores, Felizes que, acbando que seus penitentes reincidiram durante oito dias, os despedem por dezcseis ou por trinta, quero di-fi,o®jo zcr que, continuando a enfermidade, tomam como remedio visitar mais raras vezes o enfermo. Que seria se lhe disses­sem : Não espereis a absolvição, sc no decurso d’esle inter- vallo reincidirdes; neste caso não venhaes mesmo confessar- vos, 0 que seria inutil; não vades igualmente a outros até que vos tenhaes emendado, porque ninguém póde absolver-vos se­não um confessor relaxado, que vos perderia por sua benigni- dade e sua falsa compaixão'/ Que não vá mesmo confessar-se a outros! Mas quem vos disse que não haverá novos Bernar- dos, paes mais caritativos e médicos mais babeis do que vós, que, seguindo um methodo absolutamente contrario ao vosso, conseguirão cural-ó? Que não volte mais aos vossos pés se recair! E não temeis vós que seja falso vosso zelo, ou porque elle vem da iguorancia dos remedios, e vós não sereis um bom medico; ou da impaciência e do trabalho que vos causa a difliculdade do tratamento, e vós não serieis nem um ver­dadeiro pae, nem um juiz discreto? Eu o sei e o confesso, algumas vezes a negligencia de certos recidivos no emprego dos meios, ou, apesar de seu emprego, a força do máu habi­to, a fragilidade, a inclinação perversa de certos tempera­mentos atormentarão vosso coração de pae e vosso espirito de medico, porque não sabereis como acertar com remedios que lhes convenham; e vos sentireis fortemente inclinados a abandonal-os e a dcspedil-os, não sómente sem absolvição, mas tambem com aspereza, que n’esta circumstancia vos pa­recerá permittida c mesmo necessaria. Para comprehender que semelhante inspiração não vem de Deus, mas da impa-

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ciência mascarada debaixo dos exteriores do zelo, e de um zelo certamente pharisaico, tão contrario ao de Jesus Christo, lembrae-vos de que este recidivo, que considcraes indigno de vossa compaixão, Deus o supportava hontem e o supporta ainda boje; que mesmo o tem cercado e tão docemente mo­vido por sua graça, que o conduziu a vossos pés, apesar de todas as suas repugnancias, e determinou a apresentar-se de novo, c comtudo é a Deus sómente que elle oITendeu; e vós, n quem nenhum mal fez, não podereis supportal-o? Julgareis comprehender melhor os interesses do Senhor, de quem sois ministro, do que o mesmo Senhor? Podereis acreditar que vosso zelo, tão conimodo para vós e tão nocivo para este des­graçado, é dictado por uma moral mais sã do que a de Deus, cujo zelo é tão contrario ao vosso? Não deixeis portanto já­mais sair da vossa bôca estas expressões capazes de lançar o recidivo na dcsesperação, para a qual elle já tão inclinado está pela difliculdade de se emendar. Pelo contrario, tende sempre diante dos olhos, para vos servir de regra, a paciên­cia e a bondade de Deus para com elle. Tende vós mesmo, a lim de inspirar ao penitente os sentimentos de um vivo de­sejo de sua emenda e dc uma invcncivel constancia na em­preza, uma lirme conliançá em Deus, que continuando os cuidados e os remedios, a força do mal cederá linalmente, e 0 enfermo recuperará a saude. Sabei que vossa esperança iião será vã. A experiencia tem mostrado que depois de ura mez, outras vezes depois de um anno de paciência da parte do confessor e do penitente, se tem obtido uma completa e constante cura. Algumas vezes mesmo, quando em razão das recnidas mais graves ella parecia menos esperada, conti­nuando um e 0 outro a orar c a trabalhar. Deus lh’a tem concedido. Fazei-o portanto vir muito a miudo; em o n.“ 40o vos direi os motivos e vantagens que devem aniinal-o a apre­sentar-se de novo, se reincidir, quando mesmo não esteja ainda disposto para receber a absolvição, para sustar ao me­nos a força da tentação, reanimar-se e achar novos conselhos. Ouvi as exhortações que vos dá S. João Chysostomo: Aon erubescimus, si 6um diabolus nunquam desperet nostram per- niciem, sed indesinenter eam cxpectet, nos fralrum salutem desperaverimus? Qui nobis erit veniw locus, si, cum tanta sit dcemonis in nostrum exitium vigilantia, nos ne tantulum qui- dem similis diliqentiie adferamus ad salutem fratrum noslro- rum, prcBsertim cum Deum habeamus auxiliatorem? Assim falia este grande Santo. Em outra parle elle diz: Quando mesmo vos parecer que pouco ou nenhum fructo colhcis, não deixeis de reassumir e de trabalhar na salvação do proximo: Fervidissimce cujusdam, ac verissimce cliaritaíis argumentum

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prabet, qui cum nulla simili spe alilur, tamen ob vim amo- tís erga fratrem non desinit illius agere curam.

338.— Recebercis portanto estes penitentes sempre com Conliima- os braços abertos, sem jámais algum signal dardes de enfado ou estranheza de que elles tão depressa e tão miseravelmente reincidissem; bastaria isto para os impedir de se apresenta­rem de novo. Assim, louvareis sua proniplidão em voltar.Animado do desejo dc sua emenda, indagareis a causa de sua reincidência. Vôde qual dos meios prescriplos cllcs tôem des­prezado, era que tempo e de que modo a tentação os assaltou e venceu. Esles promenores podem ser necessários para me­lhor conhecer tanto a causa do mal, como o remedio. Rogae a Deus que vos inspire os meios convenientes, c cnlre outros fazei sempre grande apreço da freqüente confissão. Tal era a prática de S. Filippe dc Neri. Qual era seu resultado? 0 Padre Bacci, aiiclor de sua Vida, vae dizcr-nol-o (no liv. II, cap. VI, n.° 2). Eis aqui o que elle refere; Um penitente, que quasi todos os dias caia no peccado, veio apresentar-se ao santo. Elle deu-lhe quasi como unica penitencia que viesse confessar-se logo se reincidisse, e que não esperasse por que reincidisse uma segunda vez. 0 penilenle obedeceu, e F i ­lippe 0 absolvia sempre, dando-lhe a mesmà penitencia. Po r esle unico meio o penilenle foi curado em poucos mezes... e em pouco tempo se lornou como um anjo. A conducta d’esle mestre tão experimentado da vida espiritual uão póde, é ver­dade, fazer-vos comprebender por que signal um confessor prudente e discreto deve reconhecer que um pcnilcule lem a sufficienle disposição para ser absolvido; mas ella vos mos­tra que estas disposições podem realmente existir no recidivo que não deslroe inteiramente o seu máu habito desde a pri­meira confissão, mas que reincide ainda dc tempos em tem­pos. A constante c perfeita cura que elle finalmente obteve vos mostra o fructo das confissões particulares que elle veio fazer, e o proposilo elTicaz que era coda uma d’ellas trazia. Sobretudo, deveis d’aqui licar sabendo, ciue impôr ao reci­divo quasi como unica penitencia o contessar-se prompla- menle. depois do primeiro peccado sem esperar o segundo, não é para elle uma penitencia leve; é lambem n mais salu­tar. Ella não 6 leve por causa da repugnância particular que0 recidivo, mais do que os outros peccadores, experimenta em accusar-se de sua nova infidelidade a promessas muitas vezes renovadas. Quereis saber quanta dilliculdade c mere­cimento ha em vencer uma lal repugnaucia? Ouvi o decreto: Laborai mens erubescenlium, eí quoniam verecmdia magna est poena, qui erubescit pro Christo fU dignus misericórdia. (Can. 88, dist. 6, de Famil.) Assim, a conlissão não é só-

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mente uma penitencia leve, ella é tambem para o recidivo a mais salutar pelo soccorro que lhe procura o sacramento ex opere operato, aproximando-se a elle dignamente, quando mesmo não recebe a absolvição dc que o sacerdote o julga indigno. Ordinariamente a humildade que elle pratica e a vi- ctoria que alcança voltando aos pés do confessor depois de suas reincidências, os conselhos que rccehe d'ellc, apropria­dos a seu estado actual, lhe são mais uteis do que os jejuns c as outras austeridades. Portanto, seja qual for o numero dc suas reincidências, nunca o desanimeis. Não o carregueis dc um grande numero de penitencias obrigatórias, a lim dc lhe prescrever c de lhe facilitar a de uma prompta conlissão, que se lhe torna sempre dc mais cm mais penosa c de mais cm mais necessaria. Uh! quanto deveis temer, obrando dc outra sorte, que este desgraçado, atormentado interiormente por seu máu habito, ao qual sc esforça cm resistir mais do que o pensaes talvez, ou acabrunhado exteriormente pelas obriga­ções dilTiceis que lhe prescreveis, succumba linalmentc, caso reincida, á tentação a mais ordinaria nos recidivos, que é a dc dilferir, e (inalmentc abandonar a conlissão! Fica eutão como um enfermo sem medico, com uma febre rediiplicada, ou como uma ovelha sem pastor, depois de ler recebido no­vas mordeduras do lobo.

Quando 339.— Mas como a conlissão é principalmente util ao pcc- devcin sercador, quando, estando bem disposto, recebe a absolvição, gg vejamos quando e como o deveis julgar digno d’ella. Evitacvos. dous escolhos, ou de oITender ao recidivo pelo rigor, ou ao

sacramento pela relaxação. Lembrae-vos do grande principio, que podeis e deveis regularmente dar a absolvição, quando achaes signaes solidos e prudentes de uma vontade sincera c efficaz, ainda que ella não seja cílicacissima; sullicientc c or­dinaria, ainda que não seja nem cxtraordinaria, nem singu­lar. Se portanto o recidivo tiver praticado todos os meios, ou boa parte dos meios prescriptos, e se elle tiver diminuido so­bretudo de um modo notável o numero dc suas faltas, ten­des estes signaes claros e solidos que se exigem. Com elTei­to, é eflicaz esla vontade, que, apesar dos obstáculos do máu babito, produziu semelhantes cITeitos. Eu disse sobretudo de um modo notável; porque muitos auctores, e S. Carlos mes­mo, tão prudente e tão arredado d’esta especie de relaxação, em seus celebres Avisos aos confessores, não exige mesmo tanto. Fallando d’aquellcs que no decurso dc muitos annos perseveraram e reincidiram nos mesmos peccados, c não li- zerara algum esforço por se emendarem, elle ordena que se lhe dillira a absolvição até que se veja alguma emenda, etc. (n.° 330). Ora, quem se atreveria a dizer que o Santo não

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conhecia a força imiilo (lilferente d’cslas duas palavras, al­guma c notável, c que, coiiheceudo-a, elle tenha substituido, não obstante, a palavra muito mais fraca, a/i/umo, a esta muito mais forte, íio/atie/, e que elle tenha dado isto como regra aos confessores em uma matéria tão importante, quando tivesse julgado indispensável não alguma, mas uma notável emenda? 0 erudito auctor da Instrucção para os novos confessores, ci­tado por S. Ligorio (n.“ 333), explica esta moderação do Santo. Depois dc dizer (na part. 1.*, cap. ix, n.° 213) que se deve absolver aquelle que reincide pela força do máu habito todas as vezes que mostrar uma vontade lirme de empregar os meios dc se emendar, acrescenta; Somos de opinião que é ser excessivamente rígido obrando de oulra sorle, e que nisto 0 confessor se apartaria do espirito da Igreja e de nosso Se­nhor, assim como da nalureza do sacramenio, que não é só­mente um julgamento, mas um remedio salutar. Isto quer di­zer: não percaes de vista que o sacramento da penitencia tem dous principaes elTeitos: a graça santilicante, que lava os pec­cados passados c justilica o peccador, c a graça sacramental, que serve de remedio preservativo para o futuro, dando-lhe soccorros poderosos para não reincidir. 0 confessor deve ler em vista este duplicado elTeito, a fim de secundar os ama- veis designios do Salvador, que o instituiu. Examinae por­tanto altentamcntc a disposição presente do penitente, e vêde se actualmente sua vontade detesta sinceramente os peccados mortaes que commctteu; se elle tem uma resolução efiicaz de os evitar á custa de tudo, em todo o tempo, c por consequen­cia sc está pronipto a pôr em obra os meios necessários para isto. Tal é a disposição fundamental que deve preceder o sa­cramento. Elle n exige como julgamento, e se ella faltar actualmente, elle não remittc o peccado. Mas que o máu ha­bito esteja não sómente enfraquecido, mas destruído, c que 0 recidivo não peque mais, quero dizer, que na prática supérc todos 09 obstáculos, não sómente hoje ou ámanhã, mas du­rante mezes e annos, esta constancia não é a disposição pre­viamente necessaria ao sacramento, ella 6 o fructo delle. Esla perseverança, esla constancia em sua boa vontade, e esta emenda absoluta e cslavel deve o penilenle ler proposilo d’ella e espera l-a com a graça dc Deus c sua cooperação, so­bretudo no soccorro que Deus lhe dará cm tempo oppor- tuno, em virtude mesmo d’cslc sacramento, que é o manan­cial d'ella como remedio espiritual. Mas, nós o repelimos, esta constancia não é a disposição previamente necessaria ao sacramenio, ella é o fructo d’elle. Assim, considerando esle sacramento como julgamento, não absolvaes aquelle que em nada se corrige. Com elfeilo, não podendo ver in se a con-

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slancitt de sua boa vontade, deveis ccrtilícar-vos d’ella por algum elTeito que seja paro vós testemunho solido c firme para o julgar e para o absolver com prudência, como tendo actualmente a disposição necessaria e svfliciente. Mas consi­derando 0 sacramento como remedio para o futuro, não exi- jaes 0 fructo d’elle presentemente, quero dizer, a constan­cia na boa vontade, a perfeita emenda do máu habito, e a vi- cloria dc todos os ataques. Procurae antes este fructo, dan­do-lhe a alrsolvição que deve produzil-o, e vós o obtereis. De outra sorte vos asscmelhareis a um medico que quer cu­rar seu enfermo unicamente com purgantes, sem tomar cui­dado dc sustentar suas forças e que o faz morrer, não pela abundancia dos máus humores, mas á mingua dc alimento e de sustento. Purgae portanto o enfermo até que comeceis a achar ifcllc a disposição sullicicnte dc alguma emenda, tes­temunho de uma vontade cflicaz. Mas uma vez que a tenhaes achado, alimcnlac-o com a absolvição, e depois, se assim convier, pela communhão; exhortae-o' á prática freqüente dos sacramentos, utilissima para elle. Vossa imprudência seria muito maior se tal não fosse vossa conducta com os habitudi­narios, que só raras vezes cáem no mesmo peccado, por exemplo, de trinta cm trinta, ou de quinze em quinze dias. DilTerir-lhes a absolvição durante dous ou tres mezes seria errar sua cura inteiramente; porque cousa nenhuma tanto os livra e preserva de suas recaídas como a recepção dos sacra­mentos mais freqüente do que é dc ordinário. Fortilicae-os por este meio, que é entre os canaes da graça como o rio principal, ou como o sol entre os planetas, e entre os exerci­cios dc piedade a llor c a quinta csscncia a mais própria a communicar ás almas a força de não recair. E isto obrar se­gundo 0 espirito da Igreja, como se vô do Ritual Romano, que se exprime assim: In peccata facile recidenlibus utilissimum erit consulere, ut scepe conpteantur, et, si expediat, commu- nicent. (Ordo adm. sacram. panit., § Quare curet, etc.)

1’recauçOcs 340.— Supposto todavia que, para vossa maior segurança, que se dc-queiracs, antes dc absolver o penitente, que o numero de comosre'^®“ ®® faltas seja notavelmente menor, além da vontade actual cidivos. solida e firme de pôr em obra os meios prcscriptos: ao me­

nos não tomeis este notavelmente em sua accepção material por um numero arithmeticamente maior ou menor, mas for­malmente e em substancia como signal de uma vontade ver­dadeira, activa e cflicaz. Assim o notavelmente não deve ser tomado em um sentido tão absoluto, que façaes d’elle uma regra geral e immutavel a respeito de todos, sem attenção á ditferençji de sua posição; mas relativamente, quero dizer, tendo attenção ás circumstancias particulares em que se acha

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0 penileute, de sorte que era numero igual de recaídas se absolva um e não o outro. Ora, estas circumstancias são de duas especies: 1.“, aquellas que fazem ver se a causa das recaídas é antes a miséria humana do que a malicia; 2.°, ou se é 0 inverso. Porque aquelle que pecca por um babito mais antigo e por consequencia mais dillicil de arrancar; aquelle que 6 de um natural peior e mais violentamente inclinado ao mal; aquelle que, para fazer o mal, tem experimentado inte­rior e exteriormente um maior numero de assaltos no mesmo espaço de tempo, merece, em numero igual dc recaídas, mais compaixão, porque elle mostra mais fraqueza c menos mali- cia do que a(|uellc que se tem achado cm circumstancias dif- ferentes e mais favoraveis no hem. Assim, qunndo sc tratar de actos que se fazem muito facil e promptamente, como as recaídas no consentimento interior cm pensamentos de odio e dc impureza, ha ordinariamente iTisto menos malicia do que nos actos exteriores, que exigem da parle da vontade uma deliberação c uma determinação mais sensiveis, mais expressas c mais fortes do que para' os actos internos. Além d’islo, entre os actos externos ha menos malicia naqucllcs que se praticam com ligeireza, taes como as rccaidas nos pec­cados da lingua, as blasphemias, os perjúrios, as injurias, do que n’aquelles que exigem mais tempo e dão mais logar a reflexão, como beber e ombriagar-se, ou empregar as mãos em máus usos; menos mal cm peccar só do que com um ou­tro, menos em ser seduzido do que em seduzir. Todas estas circumstancias fazem conhecer se o penitente tem ou não a vontade cflicaz e activa de sc emendar, por consequencia a disposição sufliciente para ser absolvido. Na dúvida se elle

rsue ou não esta lirme vontade, exarainae a outra especie circumstancias que devem regular-vos para conceder ou para dilTerir a absolvição; depois considcrac o que será mais

util ou mais nocivo a esla alma, se o rigor ou a condescenden­cia; porque mesmo cm igualdade de malicia, se uma alma for pusillanime, já tentada á desconfiança c desesperação, ou af- flicla de alguma tribulação temporal dc fortuna, ou de enfer­midade, ou se ella tem um grande respeito humano a vencer para omittir a coramunhão, deveis usar de uma grande in­dulgência. Para assegurar a validade do sacramento, pode­reis empregar em ponto pequeno as precauções que temos indicado para os peccadores em aperto, e que tôem necessi­dade de uma prompta absolvição. Assim podereis determi­nar-lhes meia ou um quarto de hora para melhor se excitar á contrição, ou fazer-lh’a renovar comvosco, a lim de os ab­solver com a segurança de que elles lêem as disposições sufli- cientes. Elles são como enfermos, aos quaes não se deve con-

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tinuar por mais tempo a dieta, mas dar promptamcntc ali­mento e fortilicantes mais abundantes e mais solidos, taes como a absolvição c a communhão. k demora, pelo contrario, é quando muito um abalo ao coração do penitente, mas não 0 forlilica como a absolvição. Com as almas mais arredadas da dçsconfiança, ou que são de uma virtude mais solida, ou presumpçosas, hom c, antes de lhes dar alimento solido, con­tinuar ainda um pouco a abstinência.

Como deve 341.— Resulta d’aqui que podereis absolver ura penitente c íti habituado a dizer m<is palavras seis vezes, ou mesmoemcílda P®*' proferiu mais do que uma

vez pouco mais ou menos no dia pelo decurso de oito dias; e que será melhor dilTerir a absolvição áquelle que, habituado n peccar por acção quasi todos os dias, não recaiu mais que tres vezes nos oito dias; porque o primeiro mostra, relativa­mente a seu máu habito, mais esforços e mais eflicacia cm sua emenda do que o segundo. Comtudo, se aquelle que re­caiu tres vezes sc achar cm circumstancias cm que a demora 0 exporia a um maior damno espiritual, por exemplo, se elle está inteiramente abatido por uma desgraça temporal, de sorte que não carece que sc augmente sua afllicção, dcspe- dindo-o, ou sc elle deve partir para um outro logar onde pre­vedes que elle não ousará repetir as confissões que vos fez, em tal caso, supposto que dc seis ou sete peccados por se­mana está reduzido a tres, e que elle tenha necessidade dc absolvição, tratae não de lh’a recusar, mas dc lh’a assegurar, ajudando-o a excitar-sc a umn nova contrição mais cllicaz, e, por uma penitencia e remedios convenientes, de prevenir no­vas recaídas.

Metliodo 342.— Sobre este ponto tende principalmente attenção que se de-com as pessoas novas. A experiencia prova que se ura cou--

com“ " nusolvcndo-as com uma pouca mais d’esta prudenteas pessoas liberalidade, as move a freqüentar os sacramentos, não im-

novns. pede, é verdade, todo o peccado, mas é certo que elle dimi- nue muito mais seu numero do que o confessor que as trata como se faria a um homem mais solido e mais maduro. Des­pedindo-as, ellas raras vezes se aproximam aos sacramentos. Aqui a razão se une á experiencia. Em um mancebo na llor da idade, as paixões tôem toda a sua força como em um ho­mem feito; mas elle não tem nem a mesma madureza, nem a mesma reflexão na conducta. Os mancebos são physicamentc mais inconstantes para passar do hem ao mal c do mal ao bem. A isto acrescera muitas vezes impedimentos exteriores dc submissão, de depcndencia de seus paes, de seus supe­riores, de seus companheiros, que não impõem, é verdade, a necessidade, mas ao menos a conveniência de commungar

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no dia cm que se confessam, a lim de não serem o alvo de cscarnco, das indagações c das suspeitas. Assim, como o me­dico que sabe proporcionar os remedios ás doenças c aos temperamentos, mudae tambem de methodo com discrição; e quando, por semelhantes recaídas, diíferirdes prudente­mente a absolvição a um homem solido e rellectido, será mais prudente dal-a a um mancebo, com alguma das precauções acima indicadas, ao menos um certo numero de vezes, em­quanto que virdes que esta liberalidade, destinada a impedir a dcsesperação, não degenera em abuso, e não favorece a prcsumpção. Se vós lh’a diíferirdes, será por um tempo mais curto do que a um homem solido e judicioso.

343.— Em tudo o que deixamos dito achareis uma regra Consellioi discreta e segura para as conlissõcs geraes dos recidivos. bre isto observae o que sc segue: o relaxado nunca os obriga rjuíios rc a fazer conlissão geral, porque com suns falsas idéas sobre a ddivok disposição sullicientc elle considera de repente como disposto aquelle que o não está, c como válidas as conlissõcs mesmas que não tôem sido seguidas dc alguma emenda, mesmo du­rante um curto espaço dc tempo. 0 rigorista, enganando-se sobre as disposições áo seu parecer necessárias, obriga a cada instante á conlissão geral; porque as reincidências são para elle 0 signal de umn conlissão invalida, embora elle sómente recaisse depois de um tempo notável. 0 primeiro, se acaso obriga a fazer umn conlissão geral, tem muito pouca attenção ao numero c circumstancias; elle mede tudo em montão, e por assim dizer ao saco. 0 segundo, pelo contrario, como um agente do lisco, ou como um rabbino, quer contar grão por grão e fazer a somma. Quanto a vós, como confessor dis­creto, segui esta conducta: não obrigueis jámais a uma con­lissão geral, principalmente aquelles que pela primeira vez vem a vossos pés, e que, por consequencia, não tôem ainda em vós uma grande confiança; não os obrigueis, eu o repito, excepto por uma razão certa c evidente, como se elles tives­sem sempre, e de proposito deliberado, occultado um peccado grave, ou ao menos lendo sobre isto dúvida muito fundamen­tada. Eis aqui a razão: de uma parle para assegurar o per­dão dos peccados e a recuperação dn graça, quando um pe­nitente julga de boa fé que os confessou bem, e que assim não se julga obrigado a uma confissão geral, basta a confis­são ordinaria feita com uma contrição universal, quero dizer, que se estenda a todos os peccados commettidos, os quaes a absolvição presente remittc indirectamente, como acontece com as faltas esquecidas, depois de um exame diligente. Por este meio tudo é posto em segurança. De um outro lado, uma confissão geral é um onus penoso e algumas vezes pe-

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rigoso. Eu (ligo um onus penoso, por causa da rauilidão e confusão das cousas que se hao de examinar e da vergonha para descobrir muilas vezes grandes nódoas, já antigas e es­quecidas. Eu digo algumas vezes perigoso, seja acordando as paixões e as tentações pela recordação de certas matérias, seja fazendo nascer escrupulos, tristezas e desgostos que ex­põem 0 penitente a deixar as conlissões particulares, de que elle talvez tem uma necessidade mais urgente e mais real, só pelo receio dc fazer a conlissão geral. Não o obrigueis por­tanto a ella senão no caso de uma evidente necessidade, ou de uma dúvida muilo forte.

Para as 344.— Mas para pesar esta dúvida não empregueis a ba- couUssõcs lança nem do relaxado, nem do rigorista. Contra os princi-

V as. pios jo primeiro, tende por suspeitas de nullidade as conlis­sões que não fossem seguidas de alguma emenda, mesmo durante um certo espaço de tempo. Porque ha motivo de duvidar muilo fortemente, quando um recidivo sc confessa de muito tempo sem alguma ou quasi nenhuma diminuição de faltas graves e freqüentes, principalmente sendo commet- tidas com grande malicia, como quando elle mesmo procura a occasião. N’cste caso obrigae-o á conlissão geral. Dizei-lhe que a faça pelo amor que elle deve ler da Iranquillidade de sua alma. Mas, em opposição ao rigorista, não digaes que ha uma dúvida muito forte, quando houver alguma ou mesmo uma notável emenda, ainda que não seja continua nem per­feita. Considerae com confiança como válidas ns conlissões, depois das quaes o penitente notavelmente diminuiu o nu­mero de suas faltas, ainda que elle lenha reincidido. De ou­tra sorte seria confundir o fructo dc uma só confissão cora o fructo dc um grande numero, semelhante áquelle que não queria distinguir a vantagem (le um remedio tomado uma só vez, da vantagem do mesmo remedio tomado pelo decurso de muilo tempo. Ora, como se chama cflicaz o remedio que, tomado hoje, corta realmente c tira a febre, ainda que ella volte alguns dias depois, c que sua desapparição constante seja reservada para a continuação do remedio, cujo elTeito não é sómenlc curar a febre, mas lambem tirar os máus hu­mores que poderiam rcproduzil-a; da mesma sorte Deus não tem ligado a cada conlissão o poder iilimilado de produzir toda a casta dc cflcitos. Toda a confissão bem feita lava to­dos os peccados accusados com uma sincera dor, mas ella não tira todas as conseqüências d’ellas, a fraqueza e a inclinação para a recaida. Ella diminue, mas não toma inteiramente a força do máu habito. Este elTeito ulterior é reservado, no curso ordinário da Providencia, á continuação das conlissões, que purificam pouco a pouco das conseqüências mesmo do

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peccado, c fortilicani de .lal sorte, que n saude da alma sc torna forte e constante. E por isto que o Itilual Romano in­dica como remedio especifico para os recidivos a frequencia dos sacramentos, e que todos os santos c todos os mestres da vida espiritual são unanimes em recommcndal-a.

345.— Assim, tende por boa e válida a confissão que foi Para as seguidã de uma emenda notável, segundo o que deixamos confissões dito em o n.® 339; e não obrigueis á conlissão geral. Rodeissim aconselhai a; mas se o penitente Icsleraunhar repuguan-nòas e vã- cia, ohrigae-o, em logar d’islo, a pôr ao menos tudo ein se- lidas, gurança indireclamenle pela dor universal mesmo do pas­sado, ê dae-lhe o tempo de crescer era forças espirituaes. De outrn sorte se o ohrigacs, arruinareis esta alma por caiisn dc suas poucas virtudes e de vossa grande indiscrição; indiscri­ção que acharieis talvez deslocada a vosso respeito, se o con­fessor, ao qual pela primeira vez vos dirigisseis, vos obrigasse a fazer uma confissão geral. Se ouvirdes uma confissão geral, de obrigação ou dc conselho, conlcntac-vos, quanto ao nu­mero, de 0 avaliar como moralista c não como ngcntc fiscal. Lembrae-vos então das regras dc discrição que vos indiquei para os aclos internos, era o n.® 124, e qiie vos indicarei para as conlissões dos ignorantes, em o n.® 416. Tende como prin­cipio, que quando é moralmente impossivcl conhecer o nu­mero preciso ou provável dos peccados mortaes, basta que o penitente vos diga tres cousas: o tempo desde que n’esta falta cáe, a frequencia das quédas durante o máu habito, a fim dc ter um termo niedio entre o mais e o menos, moralmente fallando; emlim, as circumstancias, se as houver, que seja necessário explicar. Sómente por isto chegacs a conhecer tres cousas: o estado da malicia d’esla alma, a penitencia e os remedios que convem dar-lhe, se convem ou não dar-lhe a absolvição. Fudo isto saheis sem ter necessidade, nem vós nem vosso penilenle, dc contar arilhmclicamcntc o numero de tOAlos peccados multiplicados no decurso dc annos intei­ros. Deus não vos obriga a isto. Vós obtendes o fim principal para que a accusação do numero é prescripta.

346.-1.® Um excellcnle meio de converter e emendar os ncmcdios recidivos, principalmente os scnsuaes, é ohrigal-os a fazer osP.araosre- cxercicios espirituaes, e, podendo ser, aconselhar-lhes uma confissão geral se elles a não tiverem feito jámais, ou se ellesa tiverem feito ha muito tempo, lendo cuidado dc se prepa­rarem para ella alguns dias antes com preces, freqüentes aclos de contrição, alguma mortificação c um bom exame. A vista de todas as suas faltas confunde santamente o culpado, humilha-o, excila-o a ura arrependimento mais vivo, e o dis­põe a receber no sacramento graças exlraordinarias para não

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reincidir. 2.” Como não ha remedio mais poderoso para pre­servar do peccado, do que confessar-se ao mesmo confessor, recommendae áquelle que reincidir com muila frequencia, que sc confesse Ires vezes por semana, como dizem graves doutores experimeotados, ou o maior numero de vezes que podér; além d’isto, que á noite c pela manhã, depois de ha­ver invocado a Santa Virgem, diga a nosso Senhor: Meu Sal­vador e meu Juiz, que tendes preparado penas eternas para os peccadores, aqui prostrado em vossa presença, tomo reso­lução, em Itonra de vossa paixão e de Maria, minha prole- clora, de me abster, ao menos até á noite, ou até ámanhã, de tal peccado. Muitos auctores allcstani que este meio tem sido ulilissimo a um grande numero. 3.” Exhorlae o recidivo a cncommeudar-se com frequencia a Deus, e a não dar al­gum accesso á tentação; e se for assaltado por ella, que lhe resista logo, sem llie dar tempo dc se reforçar, pensando que Deus 0 vô, e que póde punil-o no mesmo instante dc seu peccado, como a outros muitos tem acontecido. 4.® Se elle recair, prescrevei-lhe logo n’esle mesmo dia confessar-se, ou ao menos aprescnlar-se-vos sem esperar uma segunda re­caída. \ lim de que elle não dillira nem por vergonha, nem por negligencia, prcveni-o, c recordae-lhe muitas vezes que sua volta, longe de vos causar enfado, vos dará, pelo contra­rio, a maior consolação, não por causa do mal que lhe tiver acontecido, mas por causa de sua hoa vontade em remedial-o immediatamente, e que em logar de perder vossa estima, sua humildade em apresentar-se não fará senão assegurar- lh’a mais. Dizci-lhc c rccordac-lhc dc tempos cm tempos, que não sc arrisque a dilTerir a vinda: a demora dcshonra a Deus e o irrita, anima o demonio, fortifica a paixão, lira a elle mesmo a vergonha dc suas faltas c a força de sc emen­dar, c pódc assim conduzii-o pouco a pouco ao inferno no momento em que elle menos o esperava. Pelo contrario, a força da promptidão honra a Deus, repelle c desbarata o de­monio, enfraquece a paixão, forlilica a elle mesmo, puri(ica-o do passado e o sustenta para o fuluro. Dizei-lhe que, ape­sar de suas recaídas, eraquánlo elle tiver a humildade de vir promptamente, tendes muila esperança de sua emenda c dc sua salvação; mas que se elle dillerir, ahl lemeis muito a seu respeito. Deus disse a uma santa, que Elle não deixava dc amar a certas almas que recaiam de tempos em tempos em faltas graves, mas que eram promptós cm arrepender-se d’cllas. 6.® A (im de que no meio dos trabalhos que experi­menta cm livrar-se inteiramente de seu máu habito, elle não desanime, e não considere como inúteis os esforços que faz, rcanimae-o muitas vezes, dizendo-lhe que é de fé, que

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aquelle que pede como deve, cora confiança, humildade e perseverança, e que ao mesmo tempo corresponde ás inspi­rações de Deus, obterá com certeza mais côdo ou mais tarde as cousas necessárias á salvação. Que espere portanto, e se emendará, como tem acontecido a outros peccadores maiores do que elle; que esperando, reconheça já o fructo de suas orações e de seus esforços, pois que sem isto elle teria pec­cado mais, e talvez não teria nem o tempo, nem a graça de se confessar. Ora ter commettido menos peccados, e haver tido tempo para os remediar, é certamente uma vantagem de um preço infinito. C.® Inspirae-lhe uma devoção constante á Santa Virgem, a Mãe dos peccadores que querem conver­ter-se. Em tudo 0 que precede vos tenho indicado outros meios; Deus mesmo vos suggerirá novos para vossa vantagem e do penitente.

347.— A respeito dos recidivos, resta ainda fallar dos ca- Conducla sos em que. mesmo sem alguma diminuição prévia das fal-9“ las, podeis sem relaxação absolver o peccador. É quando quando o achardcs n’elle um signal extraordinário de contrição. Vós o peniicMitc sabeis, a misericórdia de Deus não tem limites. Deus algu-dá sipuaes mas vezes entra no coração dos peccadores, quando elles me- nos 0 merecem, e produz n elles, não pouco a pouco, se-contiirào. gundo 0 curso ordinário de sua providencia, mas repentina­mente, uma sincera mudança. Quando pois tiverdes signaes solidos e prudentes d’esla operação da graça no peccador, que vos auclorisarão a dizer com fundamento: Esla alma está verdadeira e sinceramente arrependida, a presumpção que forma contra elle a vida má que até então passou, é destruída e desvanecida por sua conversão presente, manifestada por meio de provas não equivocas, uem leves, mas sólidas e pru­dentes. Se portanto vier a vossos pés um penitente que vos diga: Meu padre, cu sou um f/rande peccador, e ainda esta manhã pequei; mas tendo ouvido a instrucção de um santo homem, me senti penetrado de terror e de compunção, e me resolvi a mudar de vida a todo o custo; e se vós o virdes, como um outro David ás palavras de Nalhan, testemunhar por amargosas lagrimas e profundos suspiros a sinceridade cora que elle disse: Peccavi; ou for um outro que vos diga:Eu venho de uma terra d’aqui arredada tantas leguas, não por algum motivo de interesse, mas porque não posso suppor- tar 0 peso de meus peccados. Esta noite não fiz mais que cho­rar, e apenas appareceu o dia, me puz a caminho; finalmente, é ura terceiro que vos diz: Jlqje, festividade da Santissima Virgem, recitando como costumo o santo rosário, unica prá­tica religiosa que eu conservei no meio de uma vida desorde­nada, eti me senti, e reconheço que sou d'isto devedor a esta

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Mãe dos peccadores, eu me senti muito enternecido e inspi­rado a que viesse confessar-me, e principio por dizer-vos, que ha muitos annos que não tenho mesmo cumprido os preceitos paschaes, ou, que sempre calei tal peccado: nesles casos e outros semelliantcs não vôdes vós uma grande mudança e uma grande dilTcrença entre o estado passado c o presente d’esla pessoa? Ora, não é cílicaz e sincera uma mudança, que produziu resultados tão didiceis c tão notáveis n’este pe­nitente? Não é evidente que foi a mão de Deus que operou uma mudança verdadeira c muito sufliciento para merecer a absolvição ? Ministro (icl, imiUic vosso Mestre, elle se mos­trou liberal dispcnsador da graça para converter esta alma; raostrae-vos liberal, não a privando por mais tempo dos elfei- tos da justificação e da paz reservada aos peccadores arre­pendidos; é isto 0 que vos diz o canon 26 Alliqanl: S i Deus henignus est, xU quid sacerdos erit austerus? Quando muito, podereis, para maior seguranç.a, excilal-os dc novo á contri­ção, firmar sua boa vontade, carregando um pouco a peniten­cia, sómente para os experimentar, e depois diminuil-a, ou dar-lhe um quarto de hora para sc excitar á contrição, e vol­tar para ser absolvido logo. Quantas vezes uão tem aconte­cido em caso igual ver, algumas horas depois da absolvição, morrerem estes peccadores, por um accidcnte imprevisto, com todos os signaes da predestinação, como sc Deus tivesse

3ucrido justificar dc um modo visivcl e approvnr a conducta 03 confessores discretos que, calcando aos pés os escrupulos

de um rigor excessivo, os haviam absolvido sem demora? Os bispos de Flnndres reunidos em 1697 tamhem declararam: Deum in conversione peccaloris non lam considerare mensu­ram temporis, quam doloris; e muito tempo antes d’elles S. Leão Magno tiuha dito na Epist. 83, cap. iv: Nullas pa- titur venim moras vera conversio. el in dispensandis Dei do- nis non debemus esse difficiles, nec accusanlium se lacnjmas gemilusque negligere, cum ipsam pxnitendi affeclionem ex Dei credamus inspi)'atione conceplam.

Uma pala- 348.— Um dos meios mais poderosos dc que Deus se serve operar estes golpes extraordinários da sua graça, são os

ciosespiri-®^®’'®*®'®® espirituaes e as missões. Tirac d’aqui duas instru- tuacs c ascçõcs preciosas. 1.° Quando todos vossos cuidados são in- missões. uteis para a emenda de um peccador. movei-o a fazer exercí­

cios espirituaes ou a seguir uma missão, não de passagem, mas constantemente, ao menos durante a maior parte, e ve­reis finalmente a maravilhosa mudança, pela qual suspiraes. 2.® Sc sois parocho, além do bem que n vosso povo podeis fazer por vossos discursos, não deixeis dc lhe procurar de tempos em tempos o soccorro extraordinário dos exercícios

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públicos ou missões. Para vos dar uma idéa de sua extrema iraportancia, rogo-vos que noteis o que vou dizer-vos.Grande numero de peccadores não tôem mais do que um ou dous passos principaes a dar para entrar no bom cam.inho, depois do que o resto não lhes custa grande trabalho. É , por exemplo, confessar um peccado calado ha muitos annos, fazer uma restituição, reconciliar-se com um inimigo, arredar uma occasião, vencer um respeito humano que impede dc se de­clarar pela piedade, substituir pelo fervor uma tibieza contí­nua no serviço de Deus. Mas experimentam n'isto uma re­pugnância inéxpnmivel, e os meios ordinários não bastam para a vencer. E mister uma graça singular e algum abalo mais forle, de outra sorte diderem até á morle o fazerem aquillo que tinham idéa de cumprir. Ora, os retiros c as mis­sões, quando são confiadas a obreiros, taes como em o n.» 72 deixamos dito, cheios de caridade, dc habilidade c discrição, são os nicios mais proprios a fazer vingar uma tal cinpreza.Além da novidade, c alta opinião dos missionários que Ibe dão vantagem sobre os prégadores ordinários que se tôem ouvido cem vezes, a multidão dos exercicios, e sua proximi­dade não dão tempo de resfriarem, nem de se dislrahirem.Pelo contrario um dispõe para o outro, e esle conserva e aperfeiçoa a obra do primeiro. A verdade, a força das maxi- raas eternas continuamente prégadas no decurso de muitos dias são como um assalto geral dado de todas as parles ao coração hiimauo com toda a qualidade de armas, que acabara de triumpbar d’elle. Não é esle um remedio passageiro, mas um tratamento metiiodico e completo, composto de dilícren- tes remedios administrados em muitas dóses, e que operam a cura espiritual.

34!).— A experiencia ensina que, quando os obreiros são ConHnua- dotados das qualidades acima indicadas, as conversões são Ção.numerosíssimas. Sc alguns permanecem eni seus vicios, or­dinariamente são aquelles que não tôem mesmo assistido aos exercicios, ou sómente a alguns. Mas aquelles que os seguem todos, ou ao menos a maior parte, Iriumpham, aplanain os passos difliceis que os tinham na escravidão do peccado.Taes são pois as vantagens que resultam d’eslas prédicas;1.°, a conversão sincera e efucaz de um grande numero de pessoas; 2.°, a perseverança constante de muitas; 3.°, para aquelles mesmos que tôem a desgraça de reincidir, resulta ainda um grande bem, o de fazerem ao menos umas tréguas notáveis dc muitas semanas, ou de muitos mezes com Deus, durante as quaes elles o honram cora actos dc devoção, e se absleem de seus peccados ordinários. Depois não lhes é tão difficil de voltar e tornar-se a levantar, como lhes seria antes

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de se converterem, porque elles tôem já quebrado suas mais fortes cadeias. Para se reconciliarem com Deus, elles não tôem já a fazer, por exemplo, um exame tão laborioso, nem uma confissão tão burailbadora como a confissão geral para se converter; elles se lembram ainda das grandes verdades que tôem ouvido, elles tambem são testemunhas dos bons exemplos de um grande numero que permaneceram constan­tes; 4.“ , se cm uma parocbia ba muitos confessores bons, que, semelhantes ás amas providentes, conservem e augmen- tem as forças d’estes novos convertidos, que são na virtude como meninos recera-nascidos na vida espiritual, os fructos da missão se perpetuam visivelmente pelo decurso de muitos annos. Tanto quanto possaes, não priveis pois vosso rebanho d’este meio extraordinário de salvação. Se encontrardes ura escandaloso no tribunal da penitencia, vós não poderieis sug- gerir-lhe ura melhor meio de restituir a Deus almas por al­mas, do que procurar a sua custa os exercicios públicos de uma missão.

Exemplo 350.— 0 famoso Arnaud experimentou os elTeilos e a clli- dcAriiaud. cacia das missões para locar os peccadores dc compunção.

Forçado pelas inslancias de seu irmão, que era bispo, para que viesse confessar á sua cidade durante uma missão, veio elTectivamente. No primeiro dia a ninguém deu a absolvição; no segundo dia fez outro tanto; no terceiro começou a dal-a a dous ou a tres; no quarto, chegou até cinco ou seis: no quinto deu-a a todos. Mas tendo vindo a noite: Ahl disse elle como um homem que entra em si mesmo, eu me fiz relaxado, e não quiz absolutamente confessar mais. Quanto mais sábia teria sido a resolução contraria, se elle tivesse mudado e ado- çado sua lheoria, a lira de continuar, para sua maior vanta­gem e do proximo, o ministério que Mvia encetado! Com elleilo, quem jámais poderá julgar util, sã e conforme ao es­pirito de nosso Senhor e da Igreja uma doutrina que aterra ao mesmo tempo o confessor e o penitente, e os impede de se aproximarem a este sacramento, o mais necessário á sal­vação depois do baptismo? Elle teria feilo melhor se entrasse nos sentimentos que Deus linha começado a dar-lhe, e os fortificasse dc dia em dia pela participação que Deus lhe com- raunicava de sua infinita caridade para com os peccadores. Graças a ella, começava a compadecer-se d’elles com um co­ração de pae e a trabalhar em seu bem. Com o espirito me­nos preoccupado de seu rigorisrao, começava a ver que Deus opéra muilo bem no coração dos penitentes, e produz n’elle uma mudança de que ura juiz discreto se satisfazqirudente- mente para absolver com discrição, sem relaxação nem rigo- rismo. Quanto a vós, sede mais prudente. Se sois parocho.

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e chamardes vosso povo á penitencia, persuadi-vos bem de que 0 melhor meio de recolher e conservar os fructos d’estas prédicas extraordinarias, é ter confessores dotados das quali­dades de que tantas vezes vos tenho fallado, a caridade, a habilidade e a exactidão discreta.

ARTIGO V IIos QUE SE DEVEM ENTENDER POR IWUITUDINARIOS E RECIDIVOS

331. (S. Lioonio, n.®’ 68-77.) — Para bem applicar os DilTerença princípios que acabo de vos expor, devem dislinguir-se os os Habitudinarios dos recidivos. Os^abitudinarios são aquellesque tôem contrahido o habito de algum peccado de que ainda recidivos. se não tôem confessado. Ora, bem se póde, dizem os douto­res, absolvel-09 a primeira vez que se confessam de seu máu habito, ou quando se accusam d’elle depois dc o ter occul­tado, comtanto que tenham uma verdadeira contrição e um firme proposito de usar dos meios eflicazcs de se emendarem.(Lib. VI, n.® 453, in pn.) Mas se o habito for muilo invete­rado, póde tambem o confessor dilTerir-lhcs a absolvição para ver como o penitente praticará os meios prcscriptos, e a fim de que elle conceba mais horror ao peccado. Altendei que cinco quédas em um mez podem constituir o máu habito, tratando-se de peccados exteriores, comtanto que haja algum intervallo entre as quédas. Em matéria de fornicação, de so- domia, de bestialidadc, um numero muito inferior póde con­stituir 0 máu habito. Aquelle, por exemplo, que caisse na fornicação uma vez por mez no decurso de um anno, deve ser considerado como habitudinario.

332.— Os recidivos, pelo contrario, são aquelles que, dc- Continua- pois dn confissão, léem recaído pelo mesmo modo, ou com Ção. pequena dilTerença, sem emenda. Segundo n doutrina com­mum, não podem ser absolvidos sobre signaes ordinários,quero dizer, a confissão c protestação de que se arrependera e estão resolvidos a emendar-se. (Ib., n.® 459; V. Dicunt.)Isto resulta da proposição 62.*,condemnada por InnocencioXI.A razão d’islo é que o habito formado, c as recaidas anterio­res sem alguma emenda fazem desconfiar muilo da sinceri­dade do arrependimento e do lirme proposito que o peni­tente assevera ter. Assim deve dilTerir-se-Ibe a absolvição por algum tempo, até que se veja algum signal prudente dc emenda. Eu não poderia impedir-me de aqui deplorar o mal espantoso que fazem tantos máus confessores que absolvem indislinctamente estes recidivos. Por esla culpavel facilidade, elles perdem o horror ao peccado, c perseveram até á morte em seus máus hábitos. Alguns doutores admittem que se

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póde, sobre signaes ordinários, absolver os recidivos até tres ou quatro vezes; mas nunca eu pude nccommodar-me a esta opinião. Cora elíeilo, o habitudinario que depois de uma só confissão recaiu, sem emenda, é um verdadeiro recidivo que dá logar a desconfiar com fundamento que está mal disposto. Notae que esta regra lem logar mesmo a respeito dos pecca­dos veniaes, porque as occasiões d'ellcs são mais freqüentes. Comtudo, como ha, segundo o sentimento commum, peccado grave e sacrilégio em confessar peccados veniaes verdadeiros sem arrependimento e firme proposito; e além d’isto não basta arrepender-se da multidão ou do numero excessivo de semelhantes faltas, sem sc arrepender de alguma era parti­cular, assim como, contra a opinião de alguns, havemos sus­tentado, deve-se facilmente rcceiar que estas confissões se­jam sacrílegas, ou pelo menos invalidas. (Lib. VI, n.“ 449; duh. 1, 2.) Assim tereis cuidado cm não absolver indislin- ctamente esta casta de penitentes; porque supposto elles es­tejam na boa fé, vós nem por isso deixaes de commetter um sacrilégio dando a absolvição a indignos. Tende portanto cuidado, se quizerdes absolver o penitente, de fazer de modo que elle sc arrependa em particular de alguma falta venial de ((uc tem mais horror, ou fazei-lhe accusar algum pec­cado de sua vida passada contra tal virtude (basta que se confesse em geral sem expressar o numero), a fim de ter uma matéria sulliciente, sobre a qual possa recair a absolvição; de outra sorte deve recusar-sc-lhes a absolvição por algum tempo.

Qucdcmo- 333.— Eu digo por algum tempo: porque seja que se trate ra sc (Icvcjos recidivos em faltas leves, ou em faltas graves, não é ne- Po yggij í^cessario dilTcrir-lhes a absolvição no decurso de annos ou vos. mezes. como quer o muito severo Jucnnin. (Lib. VI, n.® 363.)

Se 0 peccado nasce da fragilidade intrínseca, basta, geral­mente fallando, uma demora de oito ou dez dias: é este o conselho do sabio auctor da Instrucção para os novos confes­sores, impressa em Roma (parte 1.®, cap. ix, n.® 213.) 0 auctor da Instrucção para os confessores da aldeia (no cap. i, § 4.®) pensa da mesma fórma, e cita Ilabert em favor d’este sentimento. { In p ra x .'p w n it .,l.iy ,p u s .ín .) Estes auctores acrescentam que a demora de um mez é excessiva e phri- gosa, porque é diílicil que os penitentes voltem depois dc tão longo intervallo. Bento X IV favorece esle sentimento. (Bulia Apostolica, ia Buliar., tom. I I I , pag. 443, § 22.) Fallando dos confessores que recusam justamente a absolvição aos pe­nitentes, os exhorta: Illos quantolius ut revertantur invitent, et ad sacramentale forum regressi absolutionis beneficio do­nentur. Quando muito, digo que póde differir-se-lhes a absol-

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vição duranle quinze ou vinle dias. Devem excepluar-se aquelles que se confessam para satisfazer o preceito paschal: estes carecem de uma prova mais longa; porque justamente se póde desconfiar de que elles sc abstôem do peccado anles pelo receio dc incorrer na censura, do que por uma verda­deira resolução de mudar de vida. Devem lambem ser exce- ptuados aquelles que cáem por motivo de uma occasião pró­xima exterior: estes tôem necessidade tambem de mais longa prova; porque a occasião, assim como acima lica dito, 6 ura poderoso estimulo para o peccado. Em todos os casos a prova de um mez ê sufliciente. Mas não direis ao penitente que espere um mez para voltar: irtha demora tão longa o aterra­ria. Dizei-lhe que volte passados oito, ou quando muilo, quinze dias, c assim o conduzireis docemente al6 ao lim do mez anles de lhe dar a absolvição.

3Ü4.— Para absolver os recidivos não bastam signaes or- Quando dinarios de contrição e de lirme proposilo, são precisos ex- traordinarios. Segundo a opinião conmium. estes signaes' "® extraordinários certamente são sullicientes para dar a absol­vição. (Lib. VI, n.“ 4b'J; V. Recidivus.) Com elTeito, se el­les forem solidos c fundamentados, tiram a suspeita da má disposição occasionada pelas recaídas. Em um decreto que fizeram para a direcção dos confessores de suas dioceses, os bispos de Flandres, reunidos em 1697, declararam com ra­zão, fallando d’csla matéria: fJeum in conversione peccaloris non tam considerare mensuram temporis, quam doloris.{Apud Croix, lib. VI, pari. 2.", n.” 1824.) Em consequencia prohibiram aos confessores de exigirem immutavelmenle dos penitentes, mesmo dos recidivos, a prova de um tempo no­tável, antes de lhes darem a absolvição; e isto com razão,

r que a prova do tempo não é o signal unico da mudança vontade. A vontade do peccador muda pela impressão da

graça divina, que não precisa de tempo, mas que opéra al­gumas vezes em ura instante. Assim, a mudança da vontade póde muito bem manifestar-se por oulros signaes, sem que seja necessaria a prova do tempo. Algumas vezes mesmo es­tes oulros signaes da disposição aclual do penitente leslerau- nham muito melhor a mudança da vontade, do que a prova do tempo. Com efTeilo, elles manifestam direclamente a dis­posição, emquanto que a prova só indirectamenle a mani­festa; porque não é raro que ura penitente se abstenha do peccado, durante muito tempo, sem que por isto esteja bem disposto. É isto 0 que faz dizer ao auclor da Instrucção para os novos confessores, na parle 1.*, cap. xv, n." 366: Se a recaida vem da própria fragilidade, sem outra causa extrin- seca voluntaria, é uma especie de temeridade o dizer que todo

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0 recidivo é indigno da absolvição. Em outra parte elle diz (ib., cap. IX, n.” 210), que aquelle que recaiu pela força do máu hanito deve ser absolvido todas as vezes que elle mostra a firme vontade de empregar os meios para se emendar; de­pois acrescenta: E nós julgamos que seria rigor excessivo proceder com elles de oulro modo, e que o confessor, fazen­do-o, se afastaria do espirito da Igreja e de nosso Senhor, assim como da natureza do sacramento, que não é sómente um juizo, mas um remedio salutar.

Signaes 33o.— Os doutores enumeram muitos d’estes signaes ex- cxiraordi-iraorjjnarios (lib. VI, n.® 4G0L- 1.°, uma maior contrição ma- narios. nifestada por lagrimas, comtirato que ellas venham de uma

verdadeira compunção, ou por palavras que partam do cora­ção: ellas podem scr algumas vezes signaes mais certos do que as lagrimas; 2.®, a diminuição do numero das faltas; isto se entende quando o penitente se acha nas mesmas occasiões e nas mesmas tentações do peccado, ou se o penitente não tiver caido senão depois dc um grande combate contra a ten­tação; 3.®, 0 cuidado de se emendar: por exemplo, se o pe­nitente tiver evitado a occasião, sc elle pôz em prática os meios prcscriptos pelo confessor, ou se elle fez jejuns, esmo­las, orações, dizer missas, para fazer uma boa conlissão; 4.®, se elle pede remedios, ou novos meios para se emendar; sc elle promette fazer uso dos meios que o confessor Ibe dá actualmente, principalmente não tendo sido advertido por ou­tros a que os tomasse. Comtudo é raro que sc possa dar a estas promessas um credito sufTicienle,se algum oulro signal não houver; porque para ter a absolvição os penitentes facil­mente prometlera, mas dillicilnientc depois satisfazem; 3.®, a confissão esponlanea, particularmente sc o penitenle tiver feito uma longa jornada para vir confessar-se, ou se para isto se tiver privado de um grande lucro, ou tiver solTrido um grande damno, ou vier depois dc um grande combalc; C.®, se tiver vindo forçado por um movimento extraordinário, por exemplo, por ter ouvido um sermão, ou sabido da morle de alguma pessoa, ou pelo môdo de algum llagello ameaçador, um terremoto, a peste, etc.; 7.®, se elle sc accusa de pecca­dos graves, calados por vergonha em outras suas conlissõcs; 8.®, se elle faz conhecer que nos conselhos do confessor adquiriu um novo conhecimento, um novo horror dc seu peccado, e um novo receio de condemnar-se. Alguns ha que acrescentara ainda outros signaes: por exemplo, se o peni­tente aceita voluntariamente uma grande penitencia, sc elle certifica de se haver arrependido logo depois de commctter 0 peccado, se elle protesta de querer antes morrer do que tornar a cair n’elle. Mas eu não sei se taes signaes podem

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ser suflicienles quando forem os unicos; eu direi antes gue elles poderiam fortilicnr outros signaes que sós não seriam suflicientes.

336.— Em duas palavras, todas as vezes que ha algum si- Continua- gnal pelo qual podeis julgar prudentemente que a vontade Ção. do penitente está mudada, podeis hera absolvel-o. E verdadeque, para absolver o penitente, o confessor deve estar mo­ralmente certo de sua disposição; todavia deve notar-se que nos outros sacramentos em que a matéria é physica, a cer­teza deve ser lambem physica. Mas no sacramento da peni­tencia, sendo moral a maleria, como são os aclos do penitente, basla, nós o icmos provado, ter uma certeza moral ou rela­tiva, quero dizer, basta que o confessor tenha uma probabi­lidade prudente da disposição do penitente, sem algum temor prudente do contrario. (Lih. VI, n.» 63.) Se fosse de outra sorte, não sc poderia quasi nunca absolver algum peccador, porque todos os signaes dados pelos penitentes não fundam mais do que uma probabilidade de sua disposição. Não é necessaria outra cousa, diz o auctor da Instrucção para os novos confessores, para dar a absolvição, do que um juizo prudente da disposição do penilenle. Se portanto as circum­stancias não estabelecem uma dúvida prudente de que o peni­tente não está su/pcientemente disposto, o confessor não deve nem alormentar-se, nem atormentar o penitente para ter a evidencia que não é possivel. (Ib., n.® 68.) Eu vos farei no­tar aqui, a respeito- do máu habito, que se póde mais facil­mente absolver os recidivos na binsphcmia, do que nos ou­tros peccados, taes como o odio, o roubo, a impureza, aos quaes o habito prende mais fortemente cm razão da maior concupiscencia.

337.— Eu vos tenho dito que o confessor póde dar a absol- Esiá-sc vição ao habitudinario e ao recidivo, quando algum signal extraordinário allesta sua disposição; mas não vos tenho dito soIvíçüo ' que elle seja obrigado a isto. Com elTeito, póde diflerir-lh’a quando ha quando o julgar util. Tal é a doutrina commum. (S. Thom., signaescx- 22, q. 18‘J, a. 1 e 33.) Sem dúvida o penitente tem direitoá absolvição quando tem confessado seus peccados, mas não tem 0 direito de ser absolvido immediatamcnte. 0 confes­sor, cm qualidade de medico, póde muito hera, algumas ve­zes mesmo deve dilTerir-lhe a absolvição: é quando entender que um tal remedio será necessariamente util ao penitente.Agora é conveniente usar ordinariamente de um tal reme­dio, ou não usar d’elle sem o consentimento do penitente?E certo que não, quando a demora póde ser mais nociva do que útil. 0 mesmo é, dizem os doutores, quando da demora houvesse de resultar para o penitente alguma nota ou perigo

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de infamia. (Sup., q. 38, a. 1 ad 3.) Exceptuados estes ca­sos, querem alguns que seja melhor diíferir a absolvição a semelhantes recidivos. Outros mais commummenle sustentam que isto raras vezes é util. Este 6 o sentimento do grande missionário dc nossa época, o Padre Leonardo de Porlo-Mau- ricio, em sua erudita obra, impressa era Roma {Advert. aos confessores). Todavia o mais sabio é dizer, que não sc póde estabelecer regra geral sobre este ponto. Compete ao con­fessor conduzir-se segundo as circumstancias. Que se en- commende a üeus c faça como se sentir inspirado. Quauto a mim, eis meu parecer: Eu digo em conformidade com o sentimento mais commum, communissima, dos doutores (22, q. 184, a. 8), que se o penitente reincidiu por fragilidade intrínseca, como acontece nos peccados da cólera, de odio, de blasphcmia, dc pollução, ou dc deleitação morosa, que raras vezes é util dilTerir a absolvição ao recidivo quando elle está disposto; porque se deve esperar que a graça do sacramento lhe aproveitará mais do que a demora da absol­vição.

Continua- 358.— Eu digo por fraf/ilidade intrínseca, porque de ou- tro modo se deve conduzir cora aquelle que reincidiu por causa dc uma occasião exlrinseca mesmo necessaria. A razão d’islo é que a occasião excita pensamentos muito mais vivos, e a presença do objecto commove muilo mais fortemente os sentidos, por consequencia torna mais intenso o alTccto ao peccado, do que o faz o máu habito iulrinscco. Assim o pe-

. nitente precisa de fazer uma grande violência, não sómente para vencer a tentação, mas lambem para sc arredar da fa­miliaridade da presença do objecto, a íim de tornar remoto 0 perigo proximo. Isto é tanto mais wcrdadc, se a occasião for voluntaria e deva ser absolutamente removida; porque então aquelle que recebe a absolvição antes de tirar a occa­sião acha-se em grande perigo de faltar á sua resolução de a remover. Nós o havemos provado em o n.®315. Não é o mesmo a respeito do habiluainario por causa intrínseca: para este 0 perigo de faltar á sua resolução é mais remoto. Com elTeito, de uma parte o objecto exterior, que tão violenta­mente impelle ao peccado, não existe; de outra parle não depende d’elle o conservar o máu habito, como depende o tirar a occasião. Assim, Deus concede soccorros mais pode­rosos ao habitudinario que se acha cm uma igual necessi­dade. Póde-se portanto esperar sua emenda antes da graça do sacramento, do que da demora da absolvição. 0 sacra­mento dará mais forças e mais ellicacia aos meios que se em­pregarem para extirpar seu máu habito. Por que motivo, perguntam com muila sensatez os doutores de Salamanca

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Í3.* parle, q. 86, a. 5 ad 1), se deveria antes esperar que a demora da absolvição seja util a um peccador, que não tem a graça, do que a ura amigo de Deus a absolvição que lhe dá a graça? E o Cardeal Tolel (lib. VT, n.®’ 67 e 461), fal­lando precisamente do peccado da pollução, julga que não ha remedio mais eflicaz para um tal vicio do que forti(icar-se com frequencia pelo sacramento da penitencia; elle acre.s- centa que este sacramento é o freio mais forte para aquelle que cáe no peccado, e que a não ser por um milagre, aquelle que não faz uso d’elle não deve esperar emendar-se. Com elfeito, lemos na Vida de S. Filippe (parle 1.“, cap. xv, n.” 60), que elle se servia principalmente da frequenle conlis­são para curar os recidivos em igual falta. A isto vem ainda muilo a proposilo o que diz o Rilua l Romano a respeito da penitencia: In peccala facile recidenlibus ulilissimum fuerit consulere, ut scepe confUeanlur; et si expediut, communicent. Ora, por estas palavras facile recidenlibus se entende certa­mente aquelles que ainda não tôem extirpado o babito. Cer­tos auctores, que parece não quererem salvar as almas senão pelo rigorismo, dizem que todos os recidivos se tornam peio- res quando são absolvidos anles de se haverem emendado. Mas eu quereria saber d’esles mestres, se todos os recidivos, despedidos sem absolvição e privados das graças do sacra­mento, se tornam mais fortes e se emendam todos. Quantos não lenho eu achado no decurso de nossas missões, que, tendo sido despedidos sem absolvição, se haviam dado á desordem e á desesperação, e arredado da conlissão ha longos annos! Finalmente, eu o repilo, cada um deve conduzir-sc n'este ponto segundo as luzes que o Senhor lhe concede. 0 que não tem dúvida é que«n’esla matéria aquelles que são muito faceis em dar a absolvição, assim como aquelles que são muilo difliceis, estão igualmente no erro. lla muitos confes­sores, cuja demasiada facilidade causa a ruina de uma multi­dão de almas. Ora, não se póde negar que sejam elles os mais numerosos e os que fazem maior mal, porque a elles é que os habitudinarios allluein em maior numero. Mas, por outra parle, os rigoristas fazem lambem muilo mal. E eu não sei se um confessor deva sómente fazer escrupulo quando absolve penitentes mal dispostos, e não lambem quando des­pede sem absolvição penitentes que a merecem. Concluo, dando meu parecer sobre a matéria que nos occupa: 1.° Não nego que algumas vezes possa ser util recusar a absolvição ao recidivo bem disposto; 2.°, digo que é sempre util que o confessor lhe cause receio, moslrando-se como na impossibi­lidade de 0 absolver; 3.®, que ordinariamente fallando, os recidivos por fragilidade intrínseca, e que se mostram dis-

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postos por algum signal extraordinário, tiram mais proveito da absolvição do que da sua recusaçio. Praza a Deus que os confessores sóraenle dessem a absolvição aos recidivos quando ha signaes extraordinários! 0 mal vem de que um grande numero de confessores absolve todos os recidivos sem dislincção, sem signaes extraordinários, sem lhes fazer nem uma admoeslação, nem mesmo dar remedios para se emen­darem. É d'is'to, c não da absolvição dada áquelles que são digoos d’ella, que procede a ruina de tantas almas.

Dos ordi- 339.— As regras que havemos estabelecido a respeito dos iiandoslia-habiludinarios e recidivos em geral não se appiicam aos cle- rio7c rcd-'■'6®® habituados a algum vicio, principalmente em maleria divos. de impureza, c que querem chegar a uma ordem sacra. Com

esles deve ter-se dilTerente conducta. 0 secular habitudina­rio póde ser absolvido todas as vezes que tiver as disposições necessárias ao sacramento; emquanlo que o clérigo habilu- dinario que quer receber uma ordem sacra não deve estar sómcDle disposto para o sacramento da Penitencia, mas tam­bem para o sacramento da Ordem: sem isto, nem para um, nem para o oulro está disposto. Cora elTeito, sendo indigno de subir ao altar aquelle que sáe apenas do estado de pec­cado, e que carece da santidade positiva necessaria a gran­deza do ministério a que aspira, se torna culpado de peccado se quizer, sem esta disposição, receber uma ordem sacra, ainda que elle se ponha cm estado de graça. Assim o con­fessor não póde ahsolvel-o sem que elle prometia de sc abster da ordenação, á qual não poderá ser admillido senão depois da prova de um tempo muilo longo, ao menos de muitos me­zes, plurimum mensium. £ esta uma thesc plenamente de­monstrada era nossa dissertação (lib. VI, n.® 462), e apoiada no sentimento commum dos doutores, cujos palavras referi­mos. (N.® 463.) Dizem elles, que para subir ás ordens sacras não basta ter uma santidade commum, quero dizer, estar siraplesinenlc isento de pcccado mortal, mas que é necessa­ria uma santidade particular que tenha puriiicado o ordi- nando dc seus máus hábitos. Tal 6 a doutrina de S. Thomaz: Ordines sacri pneexigunt sanctitatem mde pondus ordinum imponendum parietibús jam per sanctüatem desiccatis, id est ab humore vitiorum. (Ib., tn fine.) A razão d’islo c que o ordinando desprovido d’esta santidade especial lornn-se indi­gno de ser elevado acima do povo para exercer as sublimes funcçõcs do altar. Sicut illi , é o mesmo doutor quem Taila, qui ordinem suscipiunl, super plebem consliluuntur gradu or- dinis, ita et superiores sint merito sanctitatis. E em outra parle cllc assigua esta mesma razão em termos ainda mais lortes: Quia per sacrum ordinem aliquis deputatur ad di~

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gnissima ministeria, quibus ipsi Christo servitur in sacra­mento altaris, ad quod requiritur major sanctitas interior quam requirat etiam religionis status. {De Pcenit., cap. v, n.® 67 in fine.)

360.— üeve exccptuar-se o caso em que Deus désse a ura Continua- tal ordinando uma compunção tão extraordinaria, que ella o Ção. curasse de sua ultima fraqueza; porque, como o diz tambem0 doutor angélico: Quandoque tanta commotione convertit (Deus) cor hominis. ut subtto perfeçle consequatur sanctita- tem spiritualem. (Lib. V, cap. xiii.) E verdade que eslas con­versões são raras, e principalmente nos ordinandos, ainda que elles venham encerrar-se em uma casa religiosa para fa­zer ahi os exercicios espirituaes, porque as mais das vezes vem por força. Mas, supposto que algum de enlre elles re­ceba de Deus, cujas misericórdias são indnilas, uma graça que 0 liiude de lal sorte, que, experimentando mesmo ainda ura certo movimento desordenado em seus sentidos, todavia está peneirado de um grande horror ao peccado, e o ardor da concupiscencia tão diminuído está, que cora os soccorros da graça elle resiste facilmente ás tentações; supposto que por outra parte elle está lirraemente resolvido não sómente a evitar o peccado e as occasiões, mas lambem a tomar os meios mais eflicazcs para viver como bom sacerdote; sup- poslo linalmente que elle tem já começado a pedir com in- slaucia a Deus a perseverança, e que 6 lal sua conliança era Deus, que lhe dá a certeza moral de uma grande mudança de vida: n’este caso o confessor póde absolvel-o, quando mesmo elle queira receber uma ordem sacra immediatamente depois da conlissão. Não obstante tudo isto e toda a sua cora- punção profunda, deve o confessor fazer quanto seja possivel para o resolver a que delira sua ordenação, a (im de puriíi- car-sc mais perfeitamente do máu habito, c de melhor cum­prir suas resoluções. N'csle intuito, sc cllc não quizer demo­rar sua ordenação, o confessor, em qualidade de medico, póde mesmo dilTerir-lhe a absolvição, a (im dc o impedir a que vá ás ordens. Comtudo o confessor não deverá assim obrar se uma tal demora expozcr o penitente á infamia; por­que n’esle caso elle tem direito a uma absolvição subita, nós 0 temos visto em o n.® 357. Finalmente, os confessores de­vem ser tão difliceis, quanto podércm, era absolver estes or­dinandos, que ordinariamente provam muilo mal c são a ruina dos povos e da Igreja. {In Vita, cap. vi, n.® 2.)

361. (B. Leonardo, n.®® 6 e 8, segunda parte. 14).— Exa- Examinar minae severamente seus motivos, dizci-lhcs; Vós pretendcis jjjofjxos ser alistados entre os sacerdotes de Jesus Christo; mas que motivos vos hão impeilído a abraçar um estado tão santo? ás santas

ordens.

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Talvez vossos paes vos tenham dito, que a vida dos sacerdo­tes é a mais bella de todas; que, isentos do embaraço de uma familia e da severidade do claustro, elles não tôem a cuidar senão em viver e passar bom tempo; que o meio de chegar á fortuna é entrar n'esta carreira, que conduz ás maiores hon­ras; que um sacerdote póde fazer muito para os seus, pagar as dívidas de sua familia, augmenUir o dote de suas irmãs, fazer-lhes achar melhores partidos, e outras cousas semelhan­tes. Pobres manccbos, prestae muita attenção: ou mudae se­melhante intenção, ou mudae de carreira. 0 íim principal que deveis ter em vista, abraçando o sacerdocio, é o de con­sagrar-vos inteiramente a Deus, de vos entregar sem reserva a seu serviço, e de assegurar o grande negocio de vossa sal­vação eterna. De outra sorte, ir por este caminho seria para vós 0 mesmo que dirigir-vos no inferno. Isto não é tudo: pa- rece-vos que tendes bastante força para poder com tão gran­de peso, principalmente para guardar uma perfeita castida­de? Que monstruosidade o ver um mancebo liabitundo desde seus primeiros annos ás mais vergonhosas immundicias, cor­rer atrevidamente a ligar-se com um voto perpetuo de casti­dade! Que! quando se trata de um voto simples de castidade, e que aquelle que o faz não póde, em razão do máu habito, viver na continência, basta uma verdadeira dúvida no peni­tente e um receio provável no confe.ssor de que com elfeito elle se não conterá, para lhe obter dispensa de seu voto ad inetmdum matrimonium, e atrever-se-ha um mancebo, es­cravo do mesmo habito, a onerar-se com um voto solemne que lhe tira toda a esperança de dispensa? Que temeridade! Lonfessores, 6 a vós que agora me dirijo. Eu não digo que quando encontrardes um clérigo habitudinario não possaes absolvel-o, dando-vos elle signaes especiaes de uma verda­deira contrição; eu acrescentarei mesmo que, apesar do máu habito; se elle espera com a graça de Deus emendar-se; se mesmo elle tem, desde o presente, a lirme vontade de pôr tudo em prática para chegar a isto; linalmente, se elle vos dá signaes de uma dor especial, elle tem as disposições necessá­rias para ser absolvido. Mas eu digo tambem, que para ir mais longe e receber as ordens sacras, a lirme resolução de não tornar a peccar é insulliciente. É necessário que o ordi- nando creia sinceramente e era boa consciência., que, ajudado da graça, se emendará de seu máu habito. É verdade que esta crença não é necessaria para receber o sacramento da penitencia, porque póde estar o coração fortemente resolvido a uma emenda sobre a qual o espirito experimenta ainda al­guma he.sitação; mas ella é necessaria para receber as ordens sacras. De outra sorte estaria o ordinando decidido a abra­

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çar um estódo, cujas obrigações julga que não cumprirá.Porlanlo queria ouerar-se com um peso que muito bem sa­beria que não podia levar, cm razão dc seu máu habito; e quereria expor-se a commetter uma inliuidadc de sacrilégios.Ora, quem se atreverá a dizer que elle póde ser ordenado? e se persistir em querer sel-o, como se poderá absolver? Con­fessores, tendes vós jámais redectido seriamente n'esta ver­dade? que se deve portanto fazer?

Experimentac vossos clérigos; e quando elles vem confes­sar-se carregados de todas estas úlceras infeccionadas, dizei- lhes sem disfarce: Meu irmão, não basta que me promettaes de não peccar mais, deveis fazer grandes esforços para des­truir vo.cso máu habito, de modo que possaes persuadir-vos firmemente que com a graça de Deus vos emendarcis. Segui portanto meus conselhos: antes de ser elevado ao subdiaco- nato, e com mais forte razão sendo elle diacono, antes de re­ceber 0 caracter sacerdotal, provae vossa castidade pelo de­curso de um anno ou dous; fazei uma grande violência a vós mesmo; é então depois de uma tal prova que podereis ter esta verdadeira, esta piedosa e lirme persuasão que eu exijo de vós. Se elle recusar submetler-se, e que, apesar de seu máu habito, que dá motivo de crer que elle não poderá viver em contineucia, elle queira ser ordenado, dcspedi-o como in­digno da absolvição. Cega mocidade: prestae toda a alten- ção: se não tendes a força de viver casto, o estado ccclcsias- tico não é feito para vós; este cabeção que trazeis será para vós um collar de fogo por toda a eternidade. Pensac bem n’islo.

362.— Mas voltando aos simpliccs fieis, um prudente con- Douirma fessor deve certilicar-se se o seu penitente é recidivo, ou ha- da Igroja

bitudinario; se está em occasião proxima de peccado; se ex- ' plicitamentc sabe as cousas de necessidade de meio. E este dos habi-

0 ponto mais importante que temos a esclarecer em nossa ludinarios conferência, porque nós não nos temos reunido senão para ®*'®®‘d‘'’°® formar uma santa liga, que fará nossa prática uniforme. Mas, para caminhar com segurança, adverti que minha intenção não é discutir probabilidades, a opinião de tal ou tal doutor;

.não, eu quero lixar os principios da moral seguidos pelo com­mum dos doutores, corroborados pelo sentimento dos Santos Padres, e sobretudo fixados pelos oráculos da Sanla Sé. As­sim eu torno a pôr debaixo dos olhos as tres proposições con- demnadas. Ellas nos servirão de guia, lançarão uma grande luz sobre nossas decisões, e impedirão de nos enganarmos.A primeira diz respeito aos babitudinarios: Paenitenti ha- henti consuelvdinem pcccandi contra legem Dei, naturoe, aut Ecclesice, etsi emendationis spes nulla appareat, nec est me-

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qanda, nec di/ferenda absohUio, dammodo ore proferat se do- lere, et proponere emendationem. Ella é a sexagesima conde- mnada por Innoccncio X I. A segunda tem por objecto os oc­casionarios. Ella é a sexagesima primeira condemnada pelo mesmo Pontilice; Potest aliquando absolvi, qui in proxima occasione peccandi versalur, quam potest, et non vult omitte­re: quinimo directe, et ex proposito qucerit, aut ei se ingerit. A terceira é a respeito d’aquelles que ignoram os mysterios da fé: Absolulionis capax est liomo quantumvis laboret igno- rantia mijsteriorum fidei, et etiainsi per negligenliam, etiam culpabilem, nesciat mysterium sanctissinuB frinitatis et In- carnalionis Domini nostri Jesu Christi. Ella é a sexagesima quarta fulminada pelo mesmo Pontilice. Assim se acham cor­tadas as tres cabeças da hydra infernal, que tantas almas ar­rastava ao inferno, enganadas por esla falsa doutrina.

Analysemos estas proposições, a (im de fazermos a verdade conhecida. Comecemos pela primeira, que diz respeito aos habitudinarios. Eu vos pergunto a razão por que a Santa Sé condemna esta proposição, que não quer que jámais se dif- (ira a absolvição ao penitente, ainda que recidivo e habitudí- nnrio, comtanto que vocalmente diga que se arrepende, e que tem o lirme proposito? Não o duvidemos, é unicamente porque um confessor prudente, em sua qualidade de juiz e medico das almas, deve, antes de pronunciar a sentença, for­mar um juizo prudente e provável de que o penitente tem uma verdadeira disposição interior, sem a qual a absolvição dc nada serve, e o sacramento torna-se inutil. Ora, como as freqüentes quédas c recaídas de um desgraçado recidivo e habitudinario dão uma presumpção muito grande dc que elle carece realmente d’esta disposição interior, da verdadeira contrição e do (irme proposito. matéria proxima do sacramen­to, é com toda a especie dc razão que esta proposição foi con- dcmnada como temerário, erroncn e escandalosa. A razão de tudo isto nos é claramente dada pelo Anjo da escola, que con- cisaraente decide, que o confessor non potest ligare el solvere ad arbitrium suum, sed tantum sicut a Deo sibi príescriplum est. (Part. 3, q. 18, árt. 3, 4.)

0 santo Doutor quer que antes de absolver, o confessor te­nha um motivo sufliciente de formar este juizo prudente e

Êrovavel sobre a disposição do penitente. Mas porque só eus intuetur cor, emquanto que o homem não póde conhe­

cer os segredos d’elle senão por certos indicios exteriores, creio que nosso lim será perfeitamente alcançado se dermos aos confessores as luzes suíDcientes para reconhecer estes in­dicios. Será este para elles o meio de decidirem, na prática, quando se póde absolver um penitente, ainda que habitudina-

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rio, e quando deve dilTerir-se-Ihe a absolvição, a fiui de obe­decer á Igreja, que prohibe expressamcnle (|iie na prálica si­gamos a proposição condemnada. Orn, cu nssigno sele d’estes indicios favoraveis aos habitudinarios, c sele que lhes são contrários. Digo portanto que um peccador rccidivo e habi­tudinario em uma especie de peccado qualquer, que sejapo- iitivamente tal porque frequentemciile cáe em perjúrios, cm blasphemias, em odios, em JpolluçOes, em roriiicaçõcs, em roubos, e oulros semelhantes; ou (|ue sómente se hâbeal pri- valive, porque voluntariamente não cuida dc restituir o alheio, a reputação, a honra, (|ue náo cumpre legados pios que impõem missas, votos, etc., digo ()uc póde ordinaria­mente ser absolvido, sc o conressor notar n clle algum dos in- dicios seguintes, sobre o qual possa apoiar um jui/.o prudente de sua disposição interior.

363.— Í . ° Se esto iiecaidor nunca foi riíprcbendido, nem Iodicio.s advertido de seu nmu estado por algum confessor, e se aclual-favoraveis mente esclarecido por adnioeslaçóeH eilicazes promelle «c vòsnfábi- corde emendar-se e aceita com muita vontade toda a es()ccie nuiiiiarios. do penitencia preservativa e salisfactoria, lesleniunbando uma firme resolução de emcndar-sc; 2.°, se elle manifesla uma dor especial; se elle sc confessa com lagrimas excitadas por alguns molivos sobrenaturaes, e não sejam nem o elleilo dc um coração elTerainado, nem de alilicção, nem de outros mo­tivos leraporaes, mas que se vejo que é verdadeiramente Deus quem o loca e lhe faz detestar seus peccados; 3.“, se elle se confessa era um tempo de missão ou de retiro por ter ouvido um sermão, ou uma meditação que o locou, encheu de temor dos juizos de Deus e o determinou a mudar de vida. Dever-se-hia formar diUerenle juizo, se, não obstante todos os sermões e todas as meditações, elle nenhum signal désse de compunção, com mais forte razão, se, duranle estes santos dias, cllc continuasse a peccar sem de nada se emendar; 4.°, se, advertido prccedonlcmcnle por outros confessores, elle letn feito uso dos remedios prescriptos, e se ha emendado, não digo absolutamente, mas cm parte, diminuindo o numero de suas quédas; 6.°, sc elle vem confessar-se consecutiva­mente a um acontecimento desastroso, ou porque soube da morte repentina de algum peccador obstinado, principal­mente sendo cúmplice, ou porque a elle mesmo ou a outros acontece uma grande desgraça, que elle considera como um verdadeiro castigo de Deus por causa de seus peccados, e ou­tros motivos semelhantes; 6.°, se tendo sido interiormente in­spirado a que fosse procurar um bom confessor, ollc vem vo­luntariamente lançar-se a seus pés, não porque é o tempo pan- chal, ou porque seu pae, sua mãe, seus superiores, ou outras

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poMon* A mondam, ou porque está no uso de confessarae na* vigilias das festas da Santa Virgem, ou todos os oito dias, otc.i mas unicamente por sentir-se animado de um vivo de­sejo de mudar de vida e de pôr-se na graça de Deus; 7.®, no artigo de morte ou de um perigo provável de morte, porque então se presume que cada um tem cuidado de sua salvação e se propõe sinceramente a emendar-se. Não é duvidoso que nos casos precedentes lenha o confessor um motivo sulliciente para julgar prudentemente da boa disposição interior do pe­nitente e podel-o absolver, porque adest spes emendationis. Assim, nós não adherimos á má doutrina da proposição con- demnada, que quer que se dô a absolvição etiainsi non adsit spes emendationis. Todavia ha doutores de reputação que susteolam com razão, que mesmo nos casos referidos licita­mente sc póde dilTerir a absolvição em vista do maior bem do penitente; mas de ordinário isto não convem na prática, principalmente temendo-se que o pobre penitente irritódo e desanimado caia na desesperação, ou sc afaste dos sacramen­tos. Vôde 0 que em o n.“ 3a7 deixamos dito.

Indícios 3(i4.— Taes são os indicios de um coração verdadeiramente dcsfavora-tocado de compunção. Ilcsln examinar aquelles que deno-

tam 0 falso penilenle, que ninguém póde absolver sem des­obedecer á Igrejn, que prohibc que se ponha em prática a proposição cilada: l.°, se, depois de ser rcprchcndido duas ou tres vezes por um zeloso confessor, c advertido de seu máu estado, o penilenle volta sempre com o mesmo numero, talvez com um numero maior de reincidências no mesmo pec­cado, e não se vô, nem se espera alguma emenda; 2 ®, se elle não leslcmunlia mais horror pelo peccado do que d’antes, e que sc conheça claramente que é sua bôca e não seu coração que detesta o mal; 3.®, se fez pouco caso dos remedios que 0 mesmo confessor ou muitos lhe tôem dado, sem se mortifi- car por havel-os desprezado; 4.®, se quanto ao passado viveu sempre cora a mesma negligencia, c se, todo occupado em satisfazer suas paixões, nada tem feito em tempo algum para se emendar; se mesmo, fortificando sempre de mais em mais seus máus hábitos, tem deixado ver que pouco se lhe dá dc sua salvação eterna; 3.“, se elle vem confessar-se por neces­sidade, ou porque é o tempo paschal, ou porque é mandado por seu superior, seu pae, sua mãe, ou outras pessoas; ou tambem porque está em uso de freqüentar os sacramentos todos os oito dias, ou por outros semelhantes motivos, funda­dos sobre o respeito humano, com pouca ou nenhuma inten­ção de mudar de vida e de cumprir seus deveres como um bom christão; C.®, se elle se desculpa de suas faltas, discute com 0 confessor, não quer aceitar a penitencia preservativa

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OU sniisfuctoria, nenhuma docilidade testemunha, ou mesmo se mostra incorrigivcl c obstinado em seus hábitos crimino- . sos; 7.®, finalmente notando-se n’elle uma grande propensão para o peccado, c uma má inclinação tão violenta, que se veja bem que lhe está fortemente alTeiçoado; de modo que não se pódc prudentemente dar credito a seus protestos de arrepen­dimento, mas antes que uma afleição tão manifesta faz julgar que não está realmente contrito. Oro, vós convireis que es­tes indicios claramente expostos me dão ura amplo caminho para decidir afoutamente, que se o confessor, nos casos acima citados, pesadas bem todas as circumstancias, não póde for­mar este juizo provável da disposição de seu penitente, com maior razão, se o julgar verdadeiramente indisposto, Ibe deve recusar a absolvição. Se duvidar, deve recorrer a carilativas admocstacücs, a fervorosas exhortações para o dispor. Se apesar d’islo a dúvida subsistir, deve dilTerir absolvel-o até que 0 penitente dô signaes mais certos de sua disposição.

36S.— Eis aqui portanto tirada toda a difliculdade; eis aqui Errosportanto posto á luz o erro de tantos confessores que que- de certosrem estabelecer uma regra geral sobre um ponto que não é susceptivel dcllai Dizer que se deve sempre dar a absolvi­ção aos recidivos, ou dizer que se deve sempre dilTcrir-ih’a, duas proposições igualmente falsas, mal sonantes e escandalo­sas. A primeira principalmente, já fulminada pelas censuras da Igreja, deve ser absolutamente rejeitada. Tudo deve ser proposto á prudência do confessor, que, nos casos particula­res, não deverá seguir nem a inclinação, nem a natureza, nem o interesse, nem o exemplo dos outros; mas a só inspi­ração do Espirito Santo, acompanhada de uma boa doutrina e de uma fervorosa oração. Comtudo, a experiencia de mui­tos annos assás me tem ensinado, que uma grande parte dos confessores tôem uma extrema inclinação para darem imme- diatamcntc a absolvição, sem examinarem o estado do peni­tente, sem 0 admoestarem, sem o excitarem, sem, por assim dizer, lhe dar canccira sua emenda. D’aqui vem a ruina com­pleta 'de uma multidão de almas que, habituadas ao mal, não procuram mais do que receber a absolvição de um sacerdote desleixado, para voltarem depressa o suas primeiras desor­dens. Apenas absolvidas, ellas se deitam de novo no leito do peccado, dormiunt sommm suum (ps. lxxv , li); e final­mente in pmclo ad inferna descendunt. (Job., xxi, 13.) Eu trahiria portanto minha consciência se vos não dissesse o meu sentimento, e eil-o aqui: estes confessores se condemnam, e são causa de que o luundo catholico cáia em ruinas. Perdoac- me este impulso de zelo. Como se ha de crer que cumpre seus deveres o confessor que, depois de ouvir a confissão de

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seu peuilente, e vendo-o envolvido em um cháos de desor­dens e de peccados de toda a especie, não o interroga, não 0 ajuda, não procura conhecer a causa de suas quedas-, nem desde que tempo elle se revolve assim no lôdo, a (im de se assegurar se é hahitudinario ou occasionario, e de lhe dar re- medios proporcionados a seus males? Quando se apresentou a nosso Senhor esse possesso do demonio, de que falia S. Mar­cos, elle teve cuidado de perguntar ao pae ha quanto tempo seu lilho se achava n’este miserável estado: Quanhim lempo- ris est, ex quo ei hoc accidit? (Marc., ix, 20.) Ah! Senhor, respondeu o pae alHicto, ab infantia. Qual é pois o erro de um grande numero de confessores, que não interrogam já- mais sobre o habito do peccado? Oh! quantos peccadores res­ponderiam ab infantia: Desde minha infancia comecei a commetter estas iniquidades, e tenho continuado até agora, e desgraçadamente sempre trouxe era todas as minhas con­fissões 0 mesmo numero de peccados. E dar-se-ha immedia- tamente, e, para assim dizer ao acaso, a absolvição a esta classe de peccadores, que não dão o menor signal de com­punção, nem de emenda? Cum, confessarius sit judex, et inedicus, debet cognoscere statum pcenitentis in ordine ad cort- suetudinem prwteritam, ut sciat quwnam medicina sit UH ap- plicanda hic et nunc et an indigeat dilationejibsolutionis, et noc tandem modo curetur. (DeXu//., disp. 14,1.173.) Assim se exprime o Cardeal de Lugo. Conforme com Corregia e ou­tros doutores, elle quer, segundo a regra acima estabelecida, que se difUra pelo decurso de algum tempo a absolvição ao

Seccador que, muitas vezes advertido de seu máu estado, não á signal de emenda, a fira de que elle entre em si mesmo,

conceba um maior horror ao peccado, e tome a resolução efC- caz de mudar de vida. Lembrem-se portanto d’isto aquelles confessores, que, logo que vôem a seus pés um penitente d’este genero, .se apressara a levantar a mão para o absolver. Como, á vista de tantas quédas e recaídas, podem elles for­mar um juizo prudente de sua disposição? Como julgar eHi- caz uma vontade que não põe era prática meio algum para obter 0 (im ? Na verdade, isto não é levar á conlissão ura firme proposito gravado sobre mármore, nem mesmo sobre cera, mas escripto sobre agua. Saibam pois que é esta uma das maiores faltas que se commettem era nossos dias na ad­ministração do sacramento da penitencia, e que é o caminho por onde um numero infinito de christãos vae para o inferno. São estas almas inconstantes de que falia o Principe dos Apos- tolos, que, correndo perpetuamente de ura confessor a outro, por falta de acharem ura q ue lhe convenha, só param no in­ferno. { I I Petr., II, 14.) No ultimo dia será pedido seu san-

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tua?! SOA anb JOAjosqo soa ap saine sbk — -ajpBd nam ‘raig — ^opiAiosqc ajdiuas soA-uiaçi sajossajnoa sajsa ‘am-iazip CJQ — 3<iped nam ‘uns — ^seãacqaiziA ^ p ouisam a ‘êjjai c)sa,p sajossajnoa so sòpoi opi) siaxinj souuu some) uq ‘uiissv — -opoiumoa smiu oqoe opunâas 'o.i)no e bjo ‘mn e bjo otuip ara na ‘ajpud nara ‘oç\[— iJossajnoa ps ran sapuoi--ajpÚQ nara‘uijs — d^Jdraas opessojuoD soA-sapuai— -suip so sop -0) orasaiu sazaA seranS(B ‘Buuuias bu sazoA saj) nò sboq — iopuoaad aisa.n sazoA sciinra sil>o — -souub ajuiA ‘zap ‘o)io eq ‘aiped naw — isoi|cj samBqiaraas sianaraiuoa anb ‘oqiq nara ‘cq odraa) oiuiinf) — : saqi-OB)an8jod isnera somaiues •uad ap a oipo ap ‘o)jnj ap ‘Bzajndrai ap soJino muníjad ap ‘sBjraaiidsefq ap snn ‘soiiqcq snçra ap soACJasa siurâ no e)ua) •lO sazoA scran8|u siajeqbu saiuaiinad raaa aJiua Isagssijuoa SB JiAiio BJed oiJBuóissajuoa ran uia soA-ianaiu ‘obssiui uran B oSnuraoa apniA ^saiuaSqâau sajossajuõa ap oepninra BUin jozip j|Ano ara ap zdaib) soBJirapB soa spA jOBjiAiosqB ep sBJABjBd SB JBpnnuojd a obui ú ubiubaoi ahb op sibui Bsnoa BJ)no raazBj obu anb ‘saiuoSqSaa sajossajnoa ap' ospi)|nra Buin aaaaJBiosa BJcd sBuuad uiau ‘sBnSuq wau nq oen a íob5 -njossip ap aiuajjo) Bisa b anbjp ran joddo BJBd a ‘ps biubs Bp snapjo SB Joaapaqo op ray b OBJjAjosqB b uiajajjjp anb saiianbB,p oiaranu ouanbad o BJinoa zBpjora sibiu uapua ep soJ!) soas-raeSuBi ‘jo|bo raoa as-uraB|aap jsnaa opuBJO í.sBÍa -IB SBIUB) ap Buraj u opuoA BiuaS no anb siojanb oun spA g iBso|BpuBDsa ogi BaijBJd BUin aqiqoJd anb ‘'Bfaj8i Bp saosiaap EB ojjaqoasap o)soj Vja)Bqraoa õ)si p obu ‘BaQ oisodíip obu no pisa amaimad o as juinbui os tuas ogôiAiosqn n JBp a ‘op -unra 0 opo) Íb|osuod ‘jBSijqosap apuaiaad as anbjod ‘sB)unâ -jad sBisa sepo) as-raazBj’:opuaiua no ‘uns ‘opuaiua no sbh •SBAjijSnj 6BJAB|ud sBUin8|u Jod sopiiJOAtioa objds obu ‘obs -snu Bum ap sapBpjOA sb sBpo) Jod sopBao) obs sBuode anb ‘oiajA op oppi ou sopBJJOiua ‘sojopBooad saiso ‘oijojja raog •Baiiçjd eu iiobj p onu sbiu ‘JBfasap ap Buas oisj iOBãB)Joqxa BsojOAjaj Buin Jod ogiumoa p aiuaimod o JBipxa pjopod as OBU SBK -oiuaiuBJaBs ouiAip aisa^p oBJBJisjuirapB BU sbuiib sBp oaipara ap a i;qBq zmf ap ogSeâpqo p jbi|bj p jeSajdraa 0 OBU :oo!un ojporaoj o' p oiparaaj ’|Bng'i lun anb opuodsai ‘ogãisodsjp BjppBpjOA Buin ap pABAOJd ozinf ran jbiujoj appd OBU aiuapnjd jossajuoa 0 anb raa a ‘ogãundraoa BJiapBpJOA Boin ap aioaiagns oiaipui ça as ogn anb raa ‘opB)ia osbo ou anb ‘opuodsaj ng -sojinò so sopo) opBiuarauadxa JOAoq ap

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'soJino sop a sorasara IS ap soujssBSSB a ‘ojaz raas ‘ samoSiiSou sajossajnoa sob anâ

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elles dito? — Elles me lêem dito que não tornasse a cair.— Mas não vos tôem feito conhecer vosso máu estado? não vos tôem elles dado meios para vos emendardes? não tôem elles tido cuidado de excitar vosso coração á contrição?-Eu vos digo, meu padre, que dous ou tres me lêem feito alguma ex­horlação, mas emiira me deram a absolvição.— E os outros tôem-vos absolvido sem nada vos dizer? — Sempre, meu pa­dre.— Pobres crealuras assassinadas! Este só penilenle vos revelará a fraqueza de quasi todos os confessores d’este logar e vizinhanças. E que indignarão, que dor experimenlareis vós, sabendo que entre oitenta babitudinarios talvez ha mais de setenta que se lêem perdido d’este modo por confessores ignorantes e sem zelo! Parece-vos que este dialogo é uma ficção? não é, não. Ah! que dizeis vós? praza a Deus que

' elle fosse menos prático, e que não fosse fundado sobre uma deplorável e continua experiencia! 0 piedoso Cardeal Bona deplora com razão uma conducta tão prejudicial á salvação das almas. (Princ. VUíb Clirist, cap. xv.) «Esla falsa cari­dade, diz elle, e esla damnofsa condescendencia, fazem que a maior parte dos chrislãos passem a vida em uma desordem contínua, e em uma alternativa sem íim de sacramentos e de peccados, de confissões e de reincidências.» A estas tristespalavras vem juntar-se os gemidos c lagrimas de ura outrocardeal, nem menos piedoso, nem menos sabio. Bellarmino, considerando que a demasiada facilidade para absolver os pe­nitentes sem dar attcnção á sua disposição anterior era a ruina dos pobres almas, escreveu e proclamou em altas vo­zes, (|ue non esset hodie tanta facilitas pcccandi, si non esset etiam tanta facilitas absolvendi.

Conducta 367.— Que se deve pois fazer? Eis aqui o ponto importan- treral (|ucip„ Deve fazer-se uma sanla liga, a (im de terem todos uma

conducta uniforme na administração de um tão grande sacra- bitudina- mcnlo. É d'aqui que depende todo o fructo das missões, por

rios e reci- conseguinte o bem geral de lodo o povo. A (im de serdes bem. <Dvos. convencidos d’isto, ouvi a passagem seguinte, acontecida em

ura logar onde o santo nome de Deus e dos maiores santos era calcado aos pés como a lama: porque a maior parle dos habitantes eram habituados a proferir as mais borriveis blas­phemias com uma publicidade tão escandalosa, que fazia hor­ror. Deus inspirou a alguns religiosos cheios de zelo, que se achavam n’este logar, a convidarem todos os confessores a formar uma sanUi liga para abolir esla criminosa desordem, que, ganhando de dia em dia mais forças, ameaçava invadir todo 0 paiz. Elles convencionaram que se algum d’estcs blas-

Shemadores viesse confessar-se sem dar signaes particulares í seu arrependimento, se lhe dilíeriria a absolvição por oito

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dias, assignando-lhe uma penitencia salutar e preservativa, acompanhada de uma fervorosa exhortação sohre a gravidade de seu peccado. Chega uma festividade da Santa Virgem. Eis que estes blaspheraadores vem accusar-se de suas hlasphe- mias, e pedem a absolvição. «Ah! meu (ilho, dizia o confessor, pelo amor da Santissima Virgem abstende-vos de blasphemar por oito ou dez dias, fazei lal penitencia e voltae, eu vos darei a absolvição: não o duvideis, meu (ilho, eu vos consolarei, eu não vos ralharei, eu vos receberei com a maior caridade, etc.— Como, meu padre, não me daes a absolvição? — .Não, meu filho, não vol-a posso conceder n’este momento.— Mas, meu padre, é hoje uma festividade da Santissima Virgem, quero commungar. — Entendo, mas tende paciência, d’aqui a oito dias vos darei a absolvição, e commungareis.— Vós mc cau- saes admiração, meu padre; irei a outro.» Elle vae com ef- feito, c ouve cantar a mesma antiphona. Acontecendo outro tanto aos outros, viam-se contritos, c fóra de si dizerem mu­tuamente: «Oh! que grande peccado: ninguém quer absol- ver-nos; oh! que grande peccado!» Este povo concebeu tanto horror á blasphcmia, que passado um mez já se não blasphe- mava n’esta terra. Para um grande numero de peccadores o mal existe mais no entendimento, do que na vontade, porque elles não conhecem a enormidade do peccado mortal. Ora, nada ha que os acorde c que os faça melhor entrar em si mesmos, do que a demora da absolvição por alguns dias; crôde firmemente que 6 um dos meios mais eflicazcs para tor­nar a por no bom caminho um peccador desvairado. Ainda que de curta duração, esta demora da absolvição produz or­dinariamente 0 mesmo elTeito que um cauterio, que, appiicado a proposito, abala maravilhosamente o enfermo e dissipa seu lethargo, que estava perto de se mudar em somno de morte.0 penitente confuso aprende a conhecer seu máu estado, pensa n’elle, e toma as precauções para sair dclle. Esta de­mora 0 toca de compunção, e se está já contrito, augmenta singularmente a contrição. Assim seu arrependimento, que até alli fraco e lânguido o teria facilmente deixado succum- bir aos simplices attractivos do objecto presente, se fortifica, e sabe resistir aos mais temiveis assaltos. Emfim, elle alcança a victoria, obtem uma perfeita emenda, e torna o peccador mais diflicil em reincidir, porque é muito verdade que non essel hodie tanta facilitas peccandi, si non esset etiatn tanta facilitas absolvendi.

368.— Todavia é mister não estabelecer como regra geral, Continua- que se deve recusar a absolvição a todos os habitudinarios. Ção. Em todos os casos a prudência do confessor deve exercer sua acção, e ver se o penitente oITerece algum signal de disposi-

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ção interior sufliciente para lhe dar a absolvição, em confor­midade com 0 que acima (ica dito; mas não vendo estes in- dicios, a prudência faz uma regra que se dillira. Esta prática não transforma nossos confessionários em logares de tortura, mas antes em tribunaes dc misericórdia; porque póde-se exercer uma maior misericórdia a respeito do penitente, do que usar do meio o mais proprio a introduzir a graça cm seu coração? Tal ha sido a conductn constante dos confessores os mais zelosos e os mais virtuosos, c mesmo dos maiores san­tos. S. Bernardo recusou a absolvição a uma personagem en­tregue ao habito do vicio impuro; elle não quiz absolvcl-a se­não depois da prova dc algumas semanas e quando lhe viu signaes de uma verdadeira emenda. ( In Vila, liv. VI, cap. xvii.) S. Francisco Xavier não absolvia ordinariamente esta casta de habitudinarios senão depois de alguns dias, a fim de que elles tornassem a entrar cm si mesmos, e concebessem um forte horror por suas faltas. S. Francisco de Salles, cujo coração era tão cheio de doçura, diz suspirando a ura pecca­dor obstinado que não dava signaes de compunção: «Meu filho, cu chóro, porque vós não choracs, e julgo a proposito que tomeis um pouco de tempo para melhor vos preparar- des.» 0 mesmo methodo foi constantemente seguido por dif- fercntes outros servos de Deus. Elle é mais conforme ao es­pirito da Igreja. Fulminando censuras contra aquelle que ousa ensinar que nunca se deve dilTerir a absolvição a semelhantes habitudinarios, é ura signal evidente de que era certos casos ella quer que lhes seja dilTerida. Por outra parte attendei a que por isto o confessor se salva a si mesmo e se torna util ao penitente. Salva-se a si mesmo, porque se elle póde, para 0 maior bem do penitente, dillcrir-lhe a absolvição no caso mesmo que elle dô indícios de uma verdadeira disposição, segundo a opinião de diversos auctores ( ‘), com mais razão quando elles faltam. Por outro lado, que esta prática seja vantajosa aos desgraçados habitudinarios, eu appóllo para o testemunho de todos aquelles que, por caridade e por cura- mir seus deveres, difTercm a absolvição nos casos precitados. Todos vos dirão que obrigando com a doçura c caridade, que convém, os penitentes a receberem por algum tempo uma penitencia salutar e preservativa, elles voltam quasi sempre com uma emenda especial. Mas alguns não voltam. Se elles não voltam a vós, vão a outros e vão muito melhor dispostos pela penitencia preservativa, e recebem assim a absolvição com mais fructo. Se elles uão voltara, nem a vós, nem a ou-

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tros, não vos deveis atormentar por isto, porque é um signal evidente de que estes penitentes, obstinados no mal, não ti­nham nem a boa disposição, nem a vontade de a adquirir.Vossa conducta não deixa todavia de Ibes ser util. Vós ha­veis depositado era seu coração o germcn de um santo temor,

Íue a seu tempo produzirá fructos de penitencia. 0 erudito versa nos assegura, que uma demora prudente é da maior

utilidade para o penitente: Ipsa enim praxi consíat, lianc di- lationem sxpejuvare.

369. (Vida dk S. Filippe de Neri, liv. I I I , c. 237.)- Ha- Conselhos veis visto em o n.° 338 como S. Filippe de Neri chegou a cu-c conducta rar um mancebo entregue a máus hábitos; eis aqui «gora p® jç seus conselhos e sua praxe a respeito das dilTerentes classes a respeito de penitentes. Quando lhe caíam nas mãos certos grandes . de peccadores entregues aos pciores máus hábitos, contenta-^' ormtes va-se, no principio, com recommendar-lhes que se abstives-pcpitemel. sem dos peccados mortaes, e pouco a pouco os conduzia, com uma arte admiravel, á perfeição que elle tinha cm vista. Um dia curou um mancebo muito dissoluto, pedindo-lhe com muita doçura que recitasse em cada dia sete vezes a Salve Rainha, c depois que beijasse a terra, dizendo: Ámanhã posso estar morto. Ü homem obedeceu, e depressa se tornou muito edificante.

Quanto nos cscrupulos, dizia que quando uma pessoa es­crupulosa tivesse uma vez julgado que não havia consentido na tentação, não devia tornar a considerar sobre isto para se assegurar de novo se tinha ou não consentido; porque muitas vezes estas reconsiderações trazem a tentação. Mas como um grande numero são atormentados pelo escrupulo, porque não sabem se consentiram ou não, principalmente quando se trata de máus pensamentos, elle dava as duas regras seguin­tes: A primeira, é ver se no momento da tentação a pes­soa conservou um vivo amor pela virtude contra a qual era tentada, e odio pelo vicio. N ’csle caso ha razões sulLcicnles para julgar que não consentiu. A segunda, é ver se ella fa­ria juramento de haver ou não consentido na tentação, sup­posto que ella saiba que é um peccado muito grande jurar como certa uma cousa duvidosa. No caso de ella não querer jurar, é um excellcnle signal de que não consentiu, üemais, além do remedio ordinário, que consiste em se referir em tudo e por tudo ao juizo do confessor, elle dava um outro, que era exhortar os penitentes a que desprezassem os escrú­pulos. Assim prohibia aos penitentes escrupulosos que se confessassem com tanta frequencia, a íim de os habituar a esquecer seus escrupulos e a não fazerem caso algum d’el- les. Pela mesma razão, quando elle conhecia que na coníis-

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são elles chegavam aos escrupulos, elle os mandava commun­gar sem querer ouvil-os. Emfim, elle dizia em geral que o escrupulo é uma enfermidade que concede sim algumas tré­guas, mas raras vezes a paz, e que a humildade só póde cu- ral-os.

Ambicio- Quanto ao amor das riquezas, elle recordava muitas vezessos. a seus penitentes esta maxima, que elle mesmo tinha quasi

sempre na hôca: Tanto amor damos ás creaturas, quanto ti­ramos a Deus. Ura mancebo, chamado Francisco Spazzara, dava-se com ardor ao estudo de direito. Nada era omittido de sua parte para se aperfeiçoar n’elle, e chegar por isto aos primeiros cargos da côrte pontifícia. Um dia o Santo o cha­mou: fez-lhe caricias extraordinarias, c lhe fallou de seus grandes projectos de fortuna, acrescentando sempre: Quanto sois feliz! agora estudaes; não tardará que sejaes doutor e comeceis a ganhar; vós adiantareis vossa familia, vireis a ser advogado, e podereis ainda um dia entrar na prelazia: quanto sois felizl Elle lhe nomeava assim successivamente todas as grandezas que o mundo podia dar-lhe, e cuja idéa tinha pas­sado pela cabeça do mancebo, e lhe repetia sempre: Quanto sois feliz! Francisco imaginava que o santo fallava seriamen­te. Mas a final Filippe, apertando-o contra seu coração, lhe disse ao ouvido: E depois! Estas duas palavras ficaram tão profundamente gravadas na alma do joven Francisco, que voltando para sua casa, começou a repetir a si mesmo: Eu estudo agora para me elevar no nrundo, e depois! Elle ptts- sou assim em revista todos os seus projectos e toda esta longa serie de grandezas que sua imaginação lhe representava, sem Mder tirar de seu coração estas duas palavras: E depois! Convencido do nada das grandezas, se resolveu a voltar to­dos os seus pensamentos para Deus. Cumpriu eflectivaniente sua resolução entrando na congregação do Oratorio, onde vi­veu e morreu santamente.

Seus avisos 370.— Elle recommendava aos confessores que não con- aos confes duzissem seus penitentes pelo mesmo caminho que se havia

feito seguir a elles mesmos; porque muitas vezes os confes- sores que encontram attractivo e fervor para certos exercicios de piedade, ou certas meditações, arruinam a saude de seus penitentes; querendo habitual-os a isto; e não queria igual­mente que 03 confessores deixassem fazer a seus penitentes todas as práticas que elles pediam. E muito vantajoso, dizia elle, fazer-lhes interromper seus exercicios de piedade, seja a lim de os mortificar, se elles estiverem muito alTeiçoados a isto. Elle queria tambem que os penitentes não mudassem facilmente de confessores, e que os confessores não recebes­sem facilmente, exceptuados certos casos, os penitentes dos

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outros. Assim, qunndo um penitente vinha ter com elle, se elle tinha seu confessor o mandava a elle.

Elle dizia aos penitentes que não deviam atormentar seu confessor, a lim de obter d’elle a permissão de fazer uma cousa para a qual elle experimentava repugnância, e que se elles não podiam recorrer a elle, era bom, em tal caso, que interpretassem sua intenção, e se conduzissem em conformi­dade; mas que depois deviam participar-lhe tudo. Dizia-lhes tarabem que não tomassem diseiplinas, ou se impozessem outras mortilicações sem a permissão do confessor; que fa- zendo-o por seu proprio arbítrio se arruina a saude, ou então se cáe no orgulho; que não nos devemos lixar nos meios de modo que esqueçamos o lim, quero dizer, o amor dc Deus c do proximo, e a mortificação interior. Não gostava (|ue qs penitentes fizessem votos sem o conselho de seu pae espiri­tual; raras vezes lhes concedia permissão de us fazer, por causa do grande perigo de os violar. Se elles o faziam, os movia a que os fizessem condicionaes, por exemplo: Faço voto de mandar dizer duas missas em tal igreja, com a con­dição de que me lembre, porque se me não lembrar, não te­nho intenção dc me obrigar. Conselho cheio dc sabedoria, e muito proprio a prevenir inquietações. Não permitlia facil­mente que se mudasse de modo de vida, c queria cm geral que cada um permanecesse na vocação á qual Deus primei­ramente 0 havia chamado, comtanto que se vivesse n’clla sem peccado. No meio do mundo, dizia elle, póde-se cami­nhar á perfeição; nem as artes, nem o trabalho manual são obstáculos no serviço de Deus. Aconselhava ás mulheres que se recolhessem em suas casas, que tivessem cuidado dc sua familín, e que não saíssem voluntariamente a publico. E a razão por que, louvando em certo dia uma dama de grande virtude, lhe perguntaram seus discípulos: Meu padre, por que fazeis tantos elogios d’esta dama? — Porque ella se occupa a fiar, respondeu elle, fazendo allusão a esta passagem da Es- criptura: Manum suam misit ad fortia, et digili ejus appre- henderunt fusum. Elle dizia que não se deviam deixar, por qualquer pequeno motivo, seus e.xercicios de piedade, como a conlissão nos dias marcados, ou a missa pela semana adiante; que se queriam ir passeiar ou outra cousa, primeiro deviam fazer sua conlissão e cumprir seus outros exercicios; que to­davia não deviam carregar-sc de ura grande numero de prá­ticas, porque pouco a pouco se desgostam d’ellas, e ou as abandonam absolutamente, ou as fazem sem devoção. Acon­selhava portanto que emprehendessem pouco, mas que nunca 0 deixassem; porque se o demonio faz omittir uma só vez ura exercício, elle o conseguirá facilmente uma segunda vez,

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depois um.! terceira, até que tenha reduzido tudo a nada. D ’aqui este provérbio,que elle repelia muitas vezes aos seus: Nulla dies sine linea. Elle admoestava lambem a que se acaulelassem muito das pequenas faltas, porque desprezan­do-se, se endurece a consciência e se cáe nos maiores males. Renovae muitas vezes vossas resoluções, acrescentava elle, e nunca vos desanimeis por causa das tentações que as com­batem. Tende confiança em Deus, que é sempre o mesmo, e de nada vos perturbeis; porque Deus costuma, quando quer conceber uma virtude, permittir que sejamos atormentados por tentações contrarias; logo, pois, que ellas vem, lem- brae-vos das consolações que tendes experimentado em outro tempo na oração, e Iriumpharcis d’ellas sem custo.

Quanto aos mancebos, dizia elle, que, para pcrseverar na virtude, a frequentação de boas companhias, a fugida das más e a recepção freqüente dos sacramentos lhes eram igual­mente necessaVias. Élle não contava facilmente em sua per­severança, ainda que elles mostrassem uma grande piedade. Assim, quando lhe diziam que taes mancebos se adiantavam com zelo no bom caminho, respondia: Esperae que elles te­nham lançado as pennas, e vereis como elles voarão; acres­centando que não era diflicil dar uma grande piedade a toda a classe de pessoas, mas que o importante era fazel-as perse- verar.

ARTIGO V IIICONDUCTA COM OS EXFEHMOS E MODIIIUNDOS

Conducta 371.— Se fordes chamado para junto de ura enfermo era com os en-perigo de morte, serieis muito relaxado, quando o mal deixa termos, enfermo tempo e força, se não exigisseis todas as partes

do sacramento, a integridade da accusação, o arrependimento sincero, etc. É n’esle momento que, reunindo mais que nunca a caridade, a habilidade, a exaclidão discreta, deveis procurar o bem do enfermo; porque se vos enganaes, o erro é para sempre irreparável; se, pelo contrario, lhe procuraes a graça de bem morrer, não tendes mais a temer de perder 0 fructo de vossos trabalhos. Mas serieis muito severo e muito enganado, se, achando vosso enfermo carregado de faltas e de máus hábitos continuados até este momento, qui- zesseis exigir as delongas e as provas de contrição que exigi- rieis prudentemente se elle estivesse com saude. Não vôdes vós 0 perigo de o lançar na desesperação, para a qual n’este momento elle já está muito propenso, tanto mais que o de­monio nada omitte para o conduzir a ella? Elle acha-se aba­tido pela moléstia e temor da morte, e quererieis augmenlar

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seus tormentos recusando-lhe a absolvição! Mas, direis vós, sobre que fundamento pnderei eu dal-a a um homem sur- prendido pela doença no meio mesmo de seus peccados I Eu 0 confesso, é um dos casos mais difliceis que podereis encon­trar. Entretanto, eu o repito, recusar-lhe a absolvição é o partido mais nocivo para esta alma, que se acha na maior de todas as necessidades. Como pae e como medico deveis primeiramente tentar outro qualquer meio. Recordae-vos portanto aqui de tudo quanto vos tenho dito, fallando dos peccadores com boa saude que tèem necessidade de uma prompta absolvição, a fim de voltar em vosso favor todas es­tas circumstancias tão contrarias; não mudeis mais do que uma cousa exigida pela doença: a fim de não fatigar o en­fermo, usae de grandes precauções, fallae docemente, inter­rompei-vos de tempo em tempo. Tanto cuidado deveis ter de vos certificar de sua sinceridade, a fim de obter a integri­dade formal, tanto deveis ser discreto quanto á material, a (im de não fatigar o enfermo por um exame e interrogações muito minuciosas, etc. Podeis mesmo, se o mal o permittir, dilTerir a absolvição de manhã para a tarde, ou da tarde para a manhã, comtanto que não tenhaes algum receio de uma morte subita. È aqui que deveis implorar de todo vosso co­ração 0 soccorro de Deus e dos santos, e fareis bem proraet- tendo a Deus alguma cousa notável, a fim de arrancar esta preza ao lobo infernal. Dissimulando vosso embaraço, deveis começar por inspirar-lhe a esperança do perdão, pois que Deus não o feriu subitamente, e assim dispol-o para uma ac­cusação sincera. Quanto á dor, tirae partido da circumstan- cia mesmo da doença. Vós lhe fallareis d’ella habilmente, de modo que o não aterreis, como se elle estivesse já sem espe­rança; mas tambem sem o lisonjear, de sorte que elle tenha um certo temor de morrer e se disponha assim para um ar­rependimento que assegure sua salvação eterna. É aqui que deveis abster-vos de o aterrar por grandes penitencias, e se­guir 0 meio que vos suggerirei em n.” 402.

372. (Sacerdote santificado, n.”‘ 78 e 79.) — Se o mal Continua- se accelera e o enfermo já não tem forças, seria muito im- Cão. prudente occupar-vos da integridade material a ponto de vos expordes a escassear o tempo para a cousa mais importante, a contrição, e se, para vos assegurardes de sua dor, vos po- zesseis em perigo de não ter tempo para lhe dar a absolvi­ção. Em igual caso, tendes umn necessidade extremo de ser discreto e prudente, e bem decidido a começar pelo mais im­portante, preferindo a contrição á integridade da accusação.Não podendo o enfermo dar algum signal positivo de contri­ção, nem de accusação, não deveis deixar de prevenir, o me-

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lhor que vos for possivel, a perda d’esla alma. Dae-lhe a absolvição sub conditione, já que não podeis prover ao mais, e talvez, por uma graça secreta, tenha o moribundo entrado interiormente em boa disposição. Quanto ao exterior, ainda que elle não possa dar outro signal scnsivel mais do que sua penosa respiração, põdc-se comtudo regularmente conside- ral-a como um signal sufliciente, pelo qual talvez quer pedir a absolvição, assim como algumas vezes tem acontecido: ora, póde isto presumir-se de todos aquelles que tôem vivido chris- tãmente, menos que não se esteja certo do contrario. N’este caso, pela absolvição sub conditione, se provô suflicicnte- mente ao respeito do sacramento e á necessidade do enfermo. Para justificar esia prática, lembrac-vos que Mgr. de Gram-mont, arcebispo dc Uesançon, tinha feilo uma lei pela qualprohibia que so désse a absolvição aos moribundos que antesa não tivessem pedido e não désse ao confessor algum signal formal de conlissão, a lim de não expor a validade do sacra­mento. Foi este prelado surprcndido por uma doença, du­rante a qual desejava ardentemente confessar-sc, mas não podia nem por palavra, nem por outro signal manifeslar seu desejo aclual, interior, ardente, sincero. Tendo recuperado a saude, publicou uma lei contraria, pela qual, revogando a primeira, mandou que dessem a absolvição nos moribundos mesmo que não olfereciam algum signal formal e manifesto, e que não tinham antes pedido a confissão, comlanlo que houvessem tido uma conducta christã: porque póde muito bem acontecer que a graça cumpra cm seu coração os actos necessários paru a absolvição, sem que d’islo possam dar al­gum signal particular; e elle provava tudo isto com o seu exemplo. Comprebendei portanto que em igual caso Deus vos dispensa de conbecer com certeza os actos do penitente, mas vos obriga da vossa parte a fazer vosso dever, dando a absolvição, ao menos debaixo de condição.

Conünua- 373. (S. Liconio, n.»> 101-103 e 233-273.) - Como vos Ção. tenho dito, quando fordes chamado para junto de um mori­

bundo, não vos atormenteis para obter tanta exaclidão sobre 0 numero e circumstancias, principalmente lendo chegado o sacerdote com o Vialico, ou o medico insistir para que o en­fermo 0 receba promptamente. N’esle caso vale mais occu- par-vos das disposições interiores, do que da integridade; imponde ao moribundo a obrigação de repetir sua conlissão quando lenha sarado. Quando seja leve a penitencia, impon- de-lhe uma outra, proporcionada a suas faltas, para o tempo em que esteja são, ou bastará que lhe deis aquella do ir pro- cutar-vos quando estiver restabelecido. Com os feridos e mu­lheres pandas que não podem ser abandonadas por aquelles

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que lhes assistem, hasta que as façaes accusar ein geral de seus peccados e em particular de alguma falta leve, por exem­plo, de impaciência ou de mentira, com a resolução de se confessarem inteiramente se tornarem a ter saude. Se o mo­ribundo é obrigado a alguma restituição de que póde desen- carregar-se actualmente, tende cuidado de o obrigar a fazel-a logo, não basta que deixe a obrigação de fazel-a a seus her­deiros, de outra sorte não lhe deis a absolvição (‘). Se vir- des que o moribundo está no caso de receber a Extrema-Un­ção, e que elle recusa, representac-lhe os grandes elTeilos ,<l’este sacramento. Dizei-lhe que elle communica á alma uma grande força para resistir ás tentações do inimigo n’este ul­timo combate; que elle lava as faltas veniaes e mesmo as mortaes que não se conhecem; além d’isto, que dá mesmo a saude ao corpo, quando é conveniente para a salvação da alma. Comtudo, elle não dá esta saude quando o moribundo se acha em estado de não poder ser curado senão por mila­gre; porque este sacramento opéra por via ordinaria ajudando as causas naluraes. Sc apesar de tudo isto o enfermo recu­sar, é muito provável que elle peque mortalmente, ao menos contra a própria caridade, privando-se de um soccorro tão poderoso na maior das necessidades. (N.“‘ 733 e 285, dub.4.) Se 0 enfermo houvesse de experimentar uma grande af- flicção sabendo que communga por vialico, é provável que póde dar-se-lhe a communhão sem dizer as palavras: Accipe viaticum, etc., mas segundo a fórma ordinaria: Corpus Üo- mini noslri Jesu Christi, etc.

374.— Ajudar os enfermos a bem morrer é de certo a obra Iraportan-de caridade a mais agradavel a Deus e a mais util á salvação ,‘1?.das almas. Com elTeito, no momento da morte, d’ondc de- ,03 cnfer- pende a eternidade, os assaltos do inferno são mais temiveis mos. e os enfermos menos em estado de Ibes resistirem por si mes­mos. Para fazer comprebender quanto a assistência dos en­fermos lhe é agradavel, nosso Senhor fez ver muitas vezes a5. Filippe de Neri os anjos que suggeriam as palavras aos piedosos ministros dos enfermos. Esta obra não é sómente obrigação dos pastores, mas tambem de todos os sacerdotes.Fallando dos primeiros, 0 Ritual Romano diz que a assistên­cia aos enfermos é uma das principaes obrigações do paro- cho. Em consequencia elle quer, logo que souber que algum dos seus parochianos está doente, que vá elle mesmo visital-o sem esperar que 0 chamem, que va com frequencia, se 0 en­fermo estiver alienado. Se estiver impedido, deve mandar

confessores das aldeias.

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um outro sacerdote piedoso e prudente; porque alguns ha que são algumas vezes mais nocivos do que uleis aos enfer­mos, a si mesmos, e aos parentes do enfermo, cuja salvação deve tambem o sacerdote assistente procurar n’esta occasião. Não podendo haver um sacerdote, acrescenta o R ilm l que 0 pastor deve ao menos fazer assistir o enfermo por algum leigo piedoso e prudente, que possa ajudal-o inspirando-lhe

Avisos ao 375.— 1.” 0 sacerdote assistentesacerdote mar-se secretamente do medico se a moléstia é mortal. Éu assistente, jjgg secretamente, porque o uso detestável dos médicos é li-

sonjear os enfermos em sua presença, a fim de não attrahi- rem sobre si seu odio ou dos seus parentes. Como se annun- ciar aos enfermos a obrigação de confessar-se, que elles de­veriam então intimar-lhes, fazendo-lhes conhecer o perigo, fosse 0 mesmo que annunciar-lhes a morte.

2." üeve ter cuidado de se informar com os parentes, cora 09 amigos, e cora o enfermo mesmo, de quem elle é, de seu caracter e de seus defeitos; a que paixões é sujeito, e sobre­tudo se está obrigado a alguma restituição de bens ou de re­putação; se elle tem tido algum odio ou ligação criminosa, a fim de remediar a tudo. Mas não havendo necessidade deve evitar o recordar-lhe as pessoas para as quaes teve odio ou alTeição desordenada. Com aquelles que tôem sido feridos, se occupará do que diz respeito ao perdão, sem perguntar ao doente por quem, nem como foi ferido. Se o doente fallar n’isto, procurará o sacerdote divergir o discurso. Da mesma sorte, não havendo necessidade, desviará a conversação dos bens, das demandas, dos filhos, e de todas as cousas que não convem.

3.® Tendo sabido que a enfermidade é perigosa, não fal- lará primeiro no enfermo para que se confesse, mas o inter­rogará sobre sua doença e seus solTrimeotos. Depois o ex- hortará a resignar-se com a vontade de Deus, a unir seus pa- dccimentos aos de nosso Senhor sobre a cruz, e a oITerecel-os em expiação de seus peccados. Pouco a pouco o disporá para a confissão, perguntando-lhe ha que tempo se não tem con­fessado. Elle 0 moverá a pôr sua confiança em Deus, que póde cural-o; mas no mesmo tempo lhe fará entender doce­mente, que a moléstia é grave, e que não deve a este res­peito liar-se muito nos médicos, nem em seus parentes, que 0 lisonjeiam talvez para não o perturbarem. Dir-lhe-ha pois, que fará bem prevenir-se emquanto tem o espirito mais livre para fazer uma boa confissão, que servirá mesmo para resli- tuir-lhe a saude se for util para sua salvação. Refere-se que um moribundo se levantou de repente do leito tendo-se con-

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fessado, e que um cavalheiro, a quem todos os remedios ti­nham sido inúteis, se confessou e ficou são.

376.— Se 0 enfermo pedir alguma demora, e não havendo Se o enfer- perigo imminente de morte ou de lethargia, ou delirio, póde mo pe^r conceder-lh'a; mas deve haver cuidado de lhe determinar o “ • tempo em que ha de confessar-se, por exemplo, á tarde, ou no dia seguinte de manhã. Se o perigo for imminente, deve dizer-se-lhe, com Santo Agostinho, que Deus prometleu o perdão ao peccador penitente, mas que não o promelteu no dia seguinte: Crastimm non pramisit, forlasse dabit, [or­lasse non dabit. Se o enfermo se obstinar em não querer confessar-se, não se deve abandonar até ao ultimo momento, mas admoestal-o de tempo em tempo, süggerindo-lhe moti­vos de temor ou de conliança: deve-se tambem fazel-o auxi­liar com preces publicas e particulares.

4.° Se a doença vae adiantada, é necessário tambem re- solvel-o a pôr em ordem seus negocios temporãos, quando isto é util a paz de sua familia; com mais razão sendo isto necessário para descargo de sua consciência. Mas ii’isto deve 0 sacerdote ter grande cuidado de arredar de si toda a sus­peita de interesse pessoal. Se o enfermo tiver irmãos ou ir­mãs em uma grave necessidade, é bom que o adviria que é obrigado sub gravi a deixar-lhe seus bens, ao menos na pro­porção necessaria para alliviar suas necessidades. Esta obri­gação grave parece não existir a respeito de outros parentes mais remotos. (Lib. II, n.“ 946.) Se o enfermo quizer fazer legados pelo repouso de sua alma, deve exhorlal-o a não en­carregar d’elles seus herdeiros, porque a experiencia mostra que se cumprem raras vezes os legados pios; raas que desi­gne antes um fundo ou somma de dinheiro para a satisfação das missas e das outras boas obras que elle quer fazer. 0 sacerdote deverá ter cuidado em nada aconselhar que possa redundar em prejuizo de terceiro: não convem aos ministros de Jesus Christo allrahir sobre si o odio do proximo.

6 .“ Com as pessoas ignorantes e rústicas, o sacerdote sug- gerirá todos os actos em lingua vulgar. Pelo contrario com as pessoas instruidas empregará de tempo em tempo algum texto latino, mas curto e proprio a produzir a compunção. 0 Ritual adverte ao sacerdote que não se faça importuno ao enfermo, como fazem alguns que, fallando muito ou muilo alto, faligam mais os enfermos do que os ailiviam e conso­lam. 0 Padre Rempilo, da companhia de Jesus, conta de si mesmo, que estando uma vez em perigo de morte não ouvia 0 que lhe diziam, mas sómente um sussurro confuso que o fatigava, de sorte que foi obrigado a pedir um pouco de re­pouso..

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6 .° Além do pequeno crucifixo e da pequena imagem da Santa Virgem, que elle fará collocar ao pé do leito do en­fermo, terá cuidado de pôr ao seu alcance uma imagem grande d’esta bemaventurada Virgem, a (im de que possa facilmente olhar para ella e encommendar-se-lhe; o mesmo será de uma imagem grande do Salvador em sua paixão, sendo possivel.

7.® Fará tirar do quarto do enfermo todos os objectos pe­rigosos, como as armas, as pinturas pouco decentes, princi­palmente as pessoas que poderiam ser-lhe uma occa.sião de peccado; estas não sómente se devem desviar, mas expul- sal as absolutamente da casa. Quando o enfermo toca seu fim, terá cuidado de que não haja em seu quarto mais do que as pessoas absolutamente necessárias para lhe assistir; probibirá a entrada aos parentes, mesmo os mais proximos, cuja vista excitaria n’elle algumas paixões.

ncmcdios 377.— Os remedios geraes contra as tentações é invocar com frequencia os santos nomes de Jesus e de Maria, e fazer

■ muitas vezes o signal da cruz; mas é bom indicar aqui osremedios contra muitas tentações. Para as tentações contra a fé. Esta tentóção, a mais terrivel de todas, ataca de ordi­nário aquelles que têem passado uma vida disspluta, e prin­cipalmente se foram sabios c aferrados a suas próprias idéas. Deve dizer-se-lhes, se o demonio lhes propozer alguma dú­vida, ou alguma diíBculdade, que não raciocinem, mas que respondam imraediatamenlc, em geral: Creio o que crê a Santa igreja, porque ella cré a verdade; que dêem graças a Deus por havel-os feito nascer no seio da verdadeira Igreja, e que protestam que querem viver e morrer em sua fé. 0 melhor meio de expulsar esta tentação, é occupar o tempo em outra cousa, por exemplo, em fazer actos de contrição, de confiança, de amor de Deus, c outros semelhantes. Bel- larmino refere que um certo doutor querendo, no artigo de morte, disputar com o demonio sobre um artigo de fé, foi conduzido ao erro pelo inimigo, e se condemuou. .Se, apesar d’isto, a tentação conlinúa, o sacerdote deve dizer-lhe que as provas da nossa fé, tão justa e tão santa, propagada por po­bres pescadores no meio de tantas perseguições, confirmada por tantos milagres, sellada por tantos milhares de liiarlvres mortos em sua defeza, são tão claras, que tornam evidente a verdade d’ella, ainda que não tornem evidentes as cousas que

■ ella ensina; porque, se os mysterios que ella ensina fossem evidentes para nós, onde estaria o merecimento da fé, que não é tal senão porque é obscura? Beati qui non viderunt et crediderunt. {Joan., xx, 29.)

Tentação 378.— Contra a tentação da desesperação. É a tentação

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pela <]ual o ‘demonio ataca mais os moribundos. Assim, pou* da deses- cas vezes convem fallnr-lhes da justiça de Deus, das penas pernção. dos condemnados, da enormidade de suas faltas. Antes se lhes deve inspirar com frequencia sentimentos de conliança na misericórdia de Deus, na paixão do Salvador, nas pro- messaf divinas, e na intercessão da Santa Virgem e dos san­tos, C< primeiro motivo de nossa esperança é portanto a mi­sericórdia divina, porque Deus se chama Paler misericórdia- rim [ I I Cor., xvii), c se faz achar por aquelles que não o procuram: Invenermt qui non qumierunt me. [Isa., lxv, 1.)Elle deseja mais do que nós mesmos salvar-nos. Elle se la­menta dc se ver abandonado por aquelles que elle quereria apertar contra seu coração, segundo a expressão de S. Ber­nardo: Amplecti qucBril a quibus desertum esse se queritur.Elle está sempre prompto a perdoar: MuUus ad tgnoscen- dum. [Isa., lv , 7.) Elle protesta que não quer a morte do peccador: Nolo mortem impii, sed ut converlatur et vivat,[Ezech., xxxi, 1 1 .) Elle diz que quando um peccador se ar­repende, Elle esquece Iodas as suas faltas: S i impius egerit pcenitentiam, omnium iniquitatum ejus non recordabor. (Ib.,XVIII, 21.) Depois de taes promessas, como descoiiliar da mi­sericórdia divina? Um só acto de contrição basta para fazer que nos sejam perdoados iniinitos peccados. 0 Publicano dizendo: Propitius esto mihi peccatori, ío\ iusiUiraiio. 0 li- Iho prodigo, apenas se lança aos pés de seu pae, é apertado contra seu coração. David não disse antes peccavi, que Na- than lhe responde: Dominusquoquetranslulitpeccatum luum.[ I I Reg., XII, 13.) 0 segundo motivo é a paixão de Jesus Christo; Elle nos assegura que não veio sobre a terra senão para salvar os peccadores: Non veni vocare justos sed pec- catores. [Math., ix, 13.) Elle promette não repeilir nenhum d'aquelles que vierem lançar-se a seus pés: Eum qui venit ad me non ejiciam foras. [Joan., vi, 37.) Elle diz em S. Ma- theus (xviii, 12) que Elle procura suas ovelhas perdidas, e que qiiando acha alguma lhe faz festa, abraça-a, e a leva ás costas. Parece anial-a com uma ternura particular, como Elle mostrou com Santa Maria Egypciaca, com a bemavenlurada Angela de Fuligno, Santa Margarida de Cortona, e com tan­tas outras almas peccadoras. Assim, aquelle que tiver boa vontade não tem que temer o ser condemnado por este bom Senhor, que, para não nos condemnar, se condemnou Elle mesmo a morrer sobre uma cruz.

379.— 0 terceiro motivo são as promessas de Deus. Em Contimia- uma multidão de logares, o Evangelho promette graça áquelle ?“<>• que a pedir: Petite et accipielis. [Joan., xvi, 24.) Amen, amen dico vobis, si quid petieritis Patrem in nomine meo,

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dabit vobis. (Ib., xiv, 23.) Estn promessa é feila a todos os jiistos ou peccadores: Omnis quipetit accipit. [Math., vii, 8.) Basta portanto pedir a Deus a graça de se salvar para a obter: Bonus est Dominus animce quwrenti illum. {Tliren., iii, 2S.) 0 quarto motivo é a intercessão dos santos e sobretudo da Santa Virgem, a quem Deus quer que chamemos, com a Santa Igreja, nosso refugio, nossa vida e nossa esperança: Refuqium peccatorum, ora pro nobis: Vita, spes noslra, sal­ve. É ’ 0 motivo por que ella se chama com razão a esperança dos desesperados: Spes desperantium (Blos.); o apoio dos abandonados: Adjutrix destitutorum. (S. Ephr.) Maria mes­mo revelou a Santa Brigida que, como uma mãe defende seu lilho quando o vè no meio das espadas inimigas, assim Ella defende uma alma que recorre a Ella; e acrescenta que quando um peccador se dirige a Ella, nenhuma altenção dá aos peccados de que está manchado, mas unicamente á in­tenção que 0 acompanha: Non attendo quantum peccaverit, sed cum quali intentione venit. Deus mesmo fez conhecer a Santa Catharina de Senna, que tinha concedido a Maria, que nenhum peccador que recorresse a Ella fosse arrebatado pelo demonio.

Tentação 380.— Contra a tentação da vangloria. A vangloria, diz da . S. Bernardo, é uma frecba que leviter penetrat, sed non levi-

vangiona. ^uinerat, principalmente se a pessoa tem virtude. Se o sacerdote pois vir que o enfermo conta demasiadamente com sua salvação, por causa de suas boas obras, lhe dirá que só os peccados nos pertencem, mas que todo o bem procede de Deus: QtUd babes quod non accepisli? (/ Cor., iv, 7) que é verdade que ninguém está infallivelmenle certo de se achar em graça de Deus: Nescit homo, ulrum amore, an odio di- gnus sit [EccL, ix, 1) que assim cada um deve temer e tra­balhar em sua salvação com temor e tremor: Cum metuet tremore salutem vestram operamini. [Phil., ii, 12.)

Tentação Contra a tentação da impaciência. Recordae áquelles que da impa- gg impacientam por causa de seus padecimentos, tudo o que Ciencia. gggreram os martyres. Um foi esfolado vivo, outro cortado

aos bocados, ou queimado a fogo lento. Sobretudo ponde-Ibe debaixo dos olhos tudo o que solTreu o innoccnte Jesus, que por amor de nós padeceu mais que todos os martyres reuni­dos. Dizei ao enfermo que as dores da doença são inevitá­veis; que suas impaciencias não farão mais que augmental-as e expol-o a maiores penas na outra vida. Pelo contrario, se elle as aceitar em respeito a Deus, Elle as adoçará n’esta vida, abreviará seu purgatorio, e augmentará sua recom­pensa no céo: Tristitia vestra vertetur in gaudium. [Joan., XVI, 20.) As dores da ultima enfermidade rematam nossa

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corõa eterna; porque, segundo S. Boavenlura, solTrer com paciência é a mais perfeita de todas as obras: Patientia au­tem opus perjectum habet. [Jac., i, 4.) E assim que Deus trata seus melhores amigos, porque a cruz é o penhor seguro da salvação. Santa Clara passou vinte e oito annos victima das mais violentas dores, e Santa Ludovina trinta e oito. A Santa Virgem disse á bemaventurada Brigida: Sabeispor que vossa enfermidade se prolonga'/ E porque meu Filho e eu vos amamos. Momentaneum et lève tribulattonis nostrw, íeternum glorias pondus operatur in nobis. { I I Cor., iv.) Non sunt condigna passiones hujus temporis ad futuram gloriam quce revelabitur in nobis. {Rom., viii, 18.) E assim que se deve insistir ao pé do enfermo, a lim de que se resigne com a von­tade de Deus, não sóraenle na dor que c.vperimenta, mas tambem nas faltas dos médicos que o traUim c nas negligen­cias d’aquelles que lhe assistem. Recommendae-lhe sobre­tudo que peça a Deus a santa virtude da paciência.

381.— Recordae aos mancebos, que acham muito duro o Coniinua- morrer, as misérias d’esta vida, as enfermidades, os dcsgos- 5“” - tos, e sobretudo os perigos de peccar e perder-se. E por istoque tantos santos desejavam morrer. Em cada instante que viva, dizia Sanla Thereza, eu posso perder a Deus. Assim quando o relogio tocava, elln se regosijava pensando que uma hora de perigo havia passado. Os santos marlyres lam ale­gres á morte, animados do duplicado desejo de"serem livres de lodo 0 perigo e de possuirem a Deus: Reati mortui qui in Domino moriunlur... ut requiescant a laboribus suis. {Apoc.,XIV, 13.) Nós sobre a terra não somos mais qqe passagei­ros: Non habemus hic manentem civitatem. {ílebr., m i i, 14.)Rei ou Papa, cada um deve morrer. Movei o enfermo a que dô graças a Deus por não o ter feito morrer quando se achava em estado de pcccado, mas pelo contrario, de o chamar a Elle munido de todos os sacramentos e com tanta esperança de salvação. .N’esla vida oITendemos sempre a Deus, ao nienos por faltas leves; assim devemos, para nos purificarmos, acei­tar e mesmo desejar a morte. Devemos resignar-nos muito com a vontade de Deus, que tudo faz para nosso maior bem.Quem sabe, meu irmão, lhe direis vós, se permanecendo so­bre a terra vos perderieis? Mas, dirá elle, eu quereria viver ainda algum tempo para fazer penitencia de meus peccados, e alguma cousa para Deus, porque até aqui nada tenho feito.Vós lhe respondereis que não ha mais hella penitencia do que aceitar voluntariamente a morte em expiação de seus pecca­dos, nem octo mais perfeito e mais agradavel a Deus, do que aceitar a morte para cumprir sua vontade.

382.— Contra a tentação do apégo aos bens e aos parentes. Tentação

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do apêgo Se 0 enfermo rcpugna morrer por causa de seu apêgo aos aos bens c bens da terra, dizei-lhe que estes bens não são verdadeiros a^ paren- jç lheatro, que se desvanecem, ou que cau­

sam mais penas do que gosos. Os verdadeiros bens que nos satisfazem plenamente, e que jámais deixam de existir, são aquelles que üeus nos reserva no céo. Se elle se aflligir por deixar sua esposa, seus (ilhos, ou alguma outra pessoa amada, dizei-lhe: Meu irmão, todos elevemos morrer; procurae vossa salvação, e no céo rogareis por elles, e um dia sereis felizes juntos por toda a eternidade: que cousa mais bella do que ir habitar com Deus, com nosso Senhor, com a nossa boa Mãe e com todos os santos do paraiso! Se elle se alRigir por deixar pobres seus parentes, dizei-lhe: Se vos salvardes, como es­pero, vós lhes sereis mais util no céo do que n’esle mundo. Nada tenuxes: o Deus que alimenta as pequenas aves, não os abandonará. Se os amaes. Deus os ama mais do que vós.

Tentação 383.— Contra a tentação do odio ou da vingança. Recor­do odio. áquelles que forem tentados ao odio por cãusa de alguma

oITensa recebida: 1.“ , o preceito do Salvador: Diligiteini- micos vestros; t.", que aquelle que não perdoa, não tém a es­perar dc Deus perdão, o qual diz: Foris canes. [Apoc., xxn, 13.) Os cães, symbolo dos vingativos, são expulsados do pa­raiso; pelo contrario. Deus proinetteu perdão áquelle que per­doa: Dimittite et dimittemini. [Luc., xxxvii.) Que se seus inimigos lhes tem feito damnos ou injurias, quanto não são maiores aquelles que elles mesmos tem feito a üeus! Se por­tanto querem que Deus lhes perdôe, quanto mais não devem elles perdoar a seu proximo! Sicut Dominus donavit vobis, ita et vos. [Col., iii, 13.) Finalmente, dizei-lhes quanto se faz agradavel a Deus aquelle que perdoa. S. João Gualberto, tendo perdoado ao assassino de seu irmão, viu Jesus crucifi­cado que inclinava a cabeça cm signal de agradecimento; Santo Estevão rogou por aquelles que o apedrejavam; S. Thiago, antes de morrer, abraçou aquelle que o havia accu­sado; S. Luiz, rei de França, fez o mesmo a um homem que tinha feito uma trama contra sua vida; Santo Ambrosio sus­tentou por muito tempo um pcriido que havia armado em­boscadas contra seus dias; mas é sobretudo o Salvador que deu 0 exemplo dc um generoso perdão, rogando do alto da cruz por seus algozes.

Motivos e 384.— Da confiança. Havemos fallado dos motivos da con- sentiracn- (jança em o n.® 378; póde acrescentar-se-lhe as passagens se-

dcvcm‘ 6“ '“ ‘e3 da santa Escriptura: Nullus speravit in Domino et suggcrir confusus est [Eccl., ii, 11): Ninguém esperou no Senbor,

aos cnfer-que lenha sido abandonado. Ipse est propitiatio pro peccatis nostris. {Joan., ii.) Jesus Christo morreu para nos obter o

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perdão. Fro ngbis omnibus Iradidit illum, quomodo non etiam cum illo omnia nobis donavit? [Itom., vm, 32.) Deus, que nos deu seu proprio Filho, como nos recusará o perdão?

Sentimentos de confiança. Dominus iltuminatio mea, et sa- lus mea, quem timebo! (Ps. xxvi, 1.) In manus tuas com- mendo spiritum meum; redemisti me. Domine Deus verítatis.Te ergo quwsumus. Domine, famulis tuis subveni, quos pre- tioso sanguine redemisti. In te, Domine, speimvi, non con- fundar in (eternum. 0 bone Jesus, intra vulnera tua absconde me. Vulnera tua merita mea. (S ‘ Boav.) Meu Jesus, vós não rae recusareis o perdão, pois que não me haveis recusado nem vosso sangue, nem vossa vida. Paixão de Jesus Christo, vós sois minha esperança; merecimentos de Jesus, vós sois minha esperança; chagas de Jesus, vós sois rainha esperança; morte de Jesus, vós sois minha esperança. Misericórdias Domini in (eternum cantabo. Maria, minha hoa Mãe, pcrlen- ce-vos salvar-me, tende piedade de mim. Salve Regina, spes nostra, salve; Sancta Maria, ora pro me peccatore; refugium peccatorum, ora pro me. Sub tuum prccsidium confugimus,Sancta Dei (jenilrix. Maria, Mãe de Deus, rogae a Jesus por mim.

38o.— Da contrição. Santo Agostinho diz que ninguém SeiUimcn- deve cessar até ao seu ultimo suspiro de chorar seus p e c c a - de con- dos. Non intres in judicium cum servo tuo. (Ps. cxlii.) 'Meu Jesus c meu juiz, pcrdoae-me antes de me julgar. Cor contritum et humiliatum, Deus, non despicies. Meu Deus, oh! se eu vos não tivesse oITendido! Vós não merecieis ser tratado como eu o íiz; eu me arrependo de todo o meu cora­ção de vos haver oITendido; hondade infinita, eu tenho d’isto mais pezar do que de outra qualquer cousa. Pater, non sum dignus vocari r ilius tuus. Eu vos tenho abandonado, lenho desprezado vossa graça, tenho-vos perdido voluntariamente; perdoae-mc pelo amor e em nome do sangue do vosso Filho.Eu me arrependo dc todo o meu coração; malditos peccados, que me tendes feilo perder a Deus, eu vos detesto, eu vos abor­reço, eu vos abomino. Meu Deus, que mal me Unheis vós feito, para eu vos oITender tanto! pelo amor de Jesus tende piedade de mim. Nunca mais. Senhor; d’aqui em diante, ou lenha ainda muilo ou pbuco tempo de vida, quero amar-vos. Era expiação de meus peccados, eu vos oITereço a minha morte e os solTrimenlos que até ella experimentarei. Senhor, vós ten­des razão de me castigar, eu vos oITendi muilo; raas eu vos suppiico, puni-me n'esia e não na outra vida. ô Maria, ob­tende-me uma verdadeira contrição dc meus peccados, o per­dão e a perseverança.

386.— De amor. Meu Deus, porque sois a bondade infi- Sentimen-

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(osdc Dita, digno de ura amor infinito, vos amo mais que tudo,amor. amo-vos mais do que a mim mesmo, amo-vos de todo o meu

coração. Meu Deus, eu não sou digno de vos amar, pois que vos oITendi; mas pelo amor de Jesus fazei que eu vos ame. Oh! eu quereria que todos os homens vos amassem! Eu me regosijo cm pensar que vós sois infinitamente feliz. Meu Je ­sus, eu quero sollrer e morrer por vós, que tanto sollrestes e que morrestes por mim. Tratae-me, Senhor, como vos aprouvcr, mas não me priveis da felicidade de vos amar. Meu Deus, salvae-me; amar-vos 6 minha salvação. Eu desejo 0 paraiso para vos amar eternamente e com todas as minhas forças. .Meu Deus, não me mandeis para o inferno, como eu mereço; alli eu vos aborreceria, e eu não quero aborrecer- vos; que mal me tendes vós feito, Senbor, para que eu vos aborreça? Fazei que eu vos ame, e mandae-me para onde vos aprouver. Eu quero sodrer tanto como for vossa vontade, eu quero morrer para vos agradar. Meu Jesus, uni-me a vós; não permiltaes que eu jamais me separe de vós. Fazei-me todo vosso, ó meu Deus, antes que eu morra. Quando será que eu poderei dizer: Meu Deus! eu não posso mais perder- vosl? 0 Deus! eu queria amar-vos tanto como vós mere- ceis. ô Maria! altrahi-me lodo inteiro para Deus. Minha boa Mãe, eu vos amo muito, muito; eu quero ir amar-vos para sempre no parai.so.

Senlimen- 387. — De resignação. Toda a nossa perfeição, toda a tos de rcsi-nossa felicidade, o unico fim de nossa vida, consiste em nos gnaçao. conformarmos com a vontade de Deus. Vila in volmlale

ejtis. (Ps. XXIX, B.) Deus quer tudo o que ha de melhor para nós. 0 Salvador appareceu a Santa Gertrudes oITere- cendo-lhe a morte ou a vida. Eu quero, Senhor, respon­deu a Sanla, o que vós quizerdes. Da mesma fórma appa­receu a Santa Catharina de Senna, apresentando-lhe uma corôa de gôso e uma outra de espinhos, a fim de que ella escolhesse. Eu escolho, respondeu a Santa, aquella que vos agradar.

Affectos. E agora N., se Deus vos chamar a si, não estaes vós contente? — Sim, meu padre.— Dizei pois sempre: Se­nhor, eis-rae aqui; fazei de mim tudo o que vos aprouver. Seja sempre feita a vossa vontade; eu quero tudo o que vós quereis. Eu quero soffrer tanto como vós quizerdes; eu quero morrer quando vós quizerdes. Eu entrego em vossas mãos minha alma e meu corpo, minha vida e minha morte. Bene- dicain Dominun in omni tempore. Quer vós me consoleis, quer me afflijaes, ó meu Deus! eu vos amo e quero sempre amar-vos. Padre Eterno, eu uno minha morte á do meu Sal­vador, e assim unida eu vol-a oITereço. 0 vontade de Deus!

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VÓS sois meu amor. Ó bom beneplácito de meu Deusl eu me sacrifico todo a vós.

388.— De desejo do paraiso. Blosio {iMors spir., cap. Senümen- xiii), refere muitas revelações, que mostram que no purgato-'®? «fe­rio ha almas que solTrem uma pena particular, chamada pena P“" de desejo ou de languidez, por causa de sua tibieza cm dese­jar 0 paraiso. Esta vida é uma prisão, onde não podemos vera Deus. D’aqui vem esta súpplica do rei David (no ps. cxli,8): Educ de custodia animam meam; e de Santo Agostinho:E ia ! Domine, moriar ut te videam. S. Jeronymo chamava á morte sua irmã, c lhe dizia: Aperi mihi, soror mea; e com razão, porque é a morte que nos abre o paraiso. E o motivo por que S. Carlos Borromeu, vendo um quadro onde a morte estava pintada com uma fouce na mão, ordenou ao pintor que riscasse a fouce e a sub-sfiluisse por uma chave de ouro, como sendo a chave do céo. E portanto bom fallar com frequencia aos enfermos da felicidade do paraiso, recordando-lhes o que diz S. Paulo aos Cor., i i : Oculos non vidit, nec auris audi- vit, nec in cor hominis ascendit quw prceparavit Deus dili- gentibus se.

A/fectos. Quando veniam et apparebo ante fadem Dei?(Ps. xLi.) Quando será, ó meu Deus, que eu vos verei? belleza infinita, quando será que eu vos amarei? Eu vos amarei sempre no paraiso, e sempre vós me amareis; assim, nós nos amaremos eternamente, ó meu Deusl meu amor, meu tudo. Meu Jesus, quando beijarei eu estas chagas rece­bidas por minha causa? Ó Maria 1 quando será que eu esta­rei aos pés d’esta Mãe, que tanto me tem amado e protegido?E ia ! advocata nostra, tUos tuos misericordes oculos ad nos converte, el Jesum benedictum fructum ventris tui nobis post hoc exilium ostende.

389.— Affectos que se devem suggerir dando a beijar o Sentimcn- crucifixo. Meu Jesus, não olheis para meus peccados, mas tos que sc para o que haveis solfrido por mim. Lembrae-vos de quesou uma dc vossas ovelhas, por quem déstes a vida; eu aceito quando se morrer por vós, ó meu Jesus! que por mim quizestes morrer, dá a beijar Vós vos déstes todo a mim, eu me dou todo a vós. Senhor, ocruciOxo. vós tendes solfrido mais do que eu soffro: vós sois innocente, e eu peccador. Meu irmão, beijae estes pés, que tanto se têem fatigado a procurar-vos para vos salvar. Dizei: Meu amavel Redemptor, eu abraço os vossos pés como a Magdalena; fa­zei-me ouvir que vós mc haveis perdoado. Meu Deus, pelo amor de meu Salvador, perdoae-me e concedei-me a graça de uma boa morte. Padre Eterno, vós me haveis dado vosso Filho, eu mesmo me dou a vós. Meu Jesus, eu vos tenho pagado cora ingratidão, tende piedade de raiml Eu mereci

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tantas vezes o inferno, casligae-me n’esta vida e não na ou­tra. Vós não rae haveis abandonado quando eu vos fugia; não nie abandoneis agora, que vos procuro. Jesu dulcis- sime, ne permittas me separari a te. (Juis me separabit a charilale Christi? Domine Jesu Christe, per illam amaritu- dinem quam sustinuit nobilissima anima tua, quando egressa est de benedicto corpore tuo, miserere aninue mea; peccatrici in egressu de corpore meo. Amen. Meu Jesus, vós morres­tes por amor de mim, eu quero morrer por amor de vós.

Sentimen- 390.— Sentimentos que se devem suggerir aos religiosos e Tje SC moribundos. In pace dormiam et requiescam.

suggerir Quanto «u sou feliz se perder tudo para vos possuir, ó meu aos rcli- soberano liem! In manus luas commendo spiritum meum. Ne giosos 0 projicias me a fade lua. Jesu dulcissime. ne permittas me se-

mes^^mo 0 te. Como S. Francisco: Amore amoris lui moriar,ribuiidos. amore amoris mei dignatus es mori. Cor conlritim et hu-

miliatum Deus, non despicies. In te. Domine, speravi; non confundar in oeternum. Diligam te. Domine, fortitudo mea. E ia ! moriar. Domine, ut te videam. (Juid mihi est in calo? E t a te quid volui super terram? Deus cordis mei et pars mea Deus in alernum. Dominus illuminatio mea et salus mea; quem timebo? Pater, peccavi, non sum dignus vocari Filius tuus. Averle fadem luam a peccalis meis. Tuus sum ego, salvum me fac. Quis nos separabit a charilale Christi? Ámorem lu i solum cum gratia tua mihi dones, et dives sum satis. Dile- ctus meus mihi, et ego illi. Misericórdias Domini in mter- num cantabo. Sancla Maria, mater Dei, ora pro nobis pec- caloribus. Vila, dulcedo, spes nostra, salve. Itefugium pec- catorum, ora pro nobis. Alaria, mater gratia, mater miser ricordia. tu nos ab hoste protege, et hora mortis susdpe. 0 salus te invocanlium! (S . Boavenl.)

Aviso 391.— Eu vos tenho dito, em o n.® 373, que quando haa rcspoh.o perigo proximo de morte, ou que tenha chegado o sacerdote mos sacra- 0 santo Viatico, não é necessário, se a conlissão for menlos c longa, fazel-a inteira. (Lib. VI, n.® 89.) Lembrae-vos mais, do modo 1.®, de que em artigo de morte lodo o sacerdote póde absol- “ “ ^{“ '■ver de todos os casos e censuras reservadas, segundo a de- comfructo claração do Concilio de Trento (sess. 14, cap. vii); e isto não

sómente em artigo, mas simplesmente em perigo de morte, assim como nós o havemos provado no lib. VI, n.® 561. Só­mente, quanto ás censuras reservadas, se deve impor aos en­fermos a obrigação de se apresentarem ao superior, no caso de sarar, sem que lenba reincidido nas mesmas censuras ( ‘};

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2.', 0 simples sacerdote não póde absolver o moribundo em presença do sacerdote approvado, excepto tendo aquelle principiado a ouvir sua conlissão (n.° 5G2); mas isto não tem logar, quando o sacerdote approvado é o cúmplice da pessoa enferma, in peccato tnrpi, segundo a decisão de Bento X IV (n.° 5o3); 3.“ , o moribundo, privado dos sentidos, póde bem ser absolvido, ao menos sub conditione, o que parece sempre 0 mais seguro, quando alguem attcsta que elle teslemuuliou 0 desejo da absolvição, dando signaes de arrependimento, ou pedindo confessor; e isto quando mesmo o moribundo tivesse perdido os sentidos no acto mesmo do peccado, assim como 0 havemo.s sustentado (n.® 471), apoiado sobre a aucloridade de Santo Agostinho e da razão. Com elleito, de uma parte a condição impede a irreverencia pelo sacramento; de outra parte" presume-se sempre que em igual caso cada um quer prover a sua salvação eterna, e que elle dá algum signal sensivel, ainda que a enfermidade impede dc o distinguir.Se depois do terceiro dia o enfermo, advertido dc perigo, não tivesse querido confessar-se, seria bom que o sacerdote advertisse ao medico que, segundo a bulia de S. Pio V, é obrigado a cessar suas visiuis. (Lib. VI, n.® 664.) Se apesar d’islo 0 enfermo permanecesse obstinado, então o medico póde continuar-Ibe seus cuidados. (Ib.; V. Notant, ad vi.)

392.— Prestae muita attenção ás advertências seguintes; A respeito1." Para receber o santo Viatico não é necessário esperar o t*® com- momento em que já não haia esperança, basta que haja pe- rigo de morte. (Ib., n.“ 284.) 2.® Quando ha perigo proximo de vomito, não é permittido dar o Viatico, ainda que seja permittida a prova da particula não consagrada. (Ib., n.°282.) 3.® Póde-se dar o Viatico aos meninos que tôem uso de razão, da mesma sorte aos freneticos que tôem vivido bem, ou que se tôem confessado pouco antes, comtanto que não haja perigo de irreverencia para o sacramento. Assim, com elles é provavelmente permittido fazer a experiencia da particula não consagrada. (N .° 282.) 4.® Póde-se, deve-se mesmo dar o Viatico em sexta feira santa aos enfermos, se­gundo 0 decreto da santa Congregação dos Hitos, de 19 de fevereiro de 1622. [Ap. Gav., collecç. n.® 60.) 5.® 0 senti­mento commum é que se póde na mesma enfermidade dar muitas vezes o Viatico ao enfermo que não está em jejum, ao menos todos os seis ou oito dias. Muitos auctores dizem que se póde mesmo fazel-o com mais frequencia. (N.®* 384 e 285.) Se o enfermo tivesse commungado de manbã por de­voção, não póde commungar por Viatico no decurso do mesmo dia, excepto se o perigo de morte sobrevier em consequencia de um mal violento, como um ferimento, o veneno, ou uma

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quéda. (N.®285, dub. 3.) 6.® Quando o enfermo não tem ainda recebido mais do que o sacramento da penitencia, e continuando a moléstia a ser perigosa, é bom que o sacer­dote 0 disponha a receber o Yialico quanto antes, a (im de que, estando em perfeito juizo, aproveite mais. Terá por­tanto cuidado de lhe inspirar o desejo de o receber, a (im de se fortificar contra os assaltos do demonio, unindo-se a Jesus Christo. Este bom Senhor, lhe dirá elle, quer ir visitar-vos, a fim de trazer-vos os thesouros de suas graças, e conduzir- vos ao paraiso, se for chegado o tempo; se ainda não for, para vos restituir a saude, supposto que isto vos seja util. S. Cyrillo de Alexandria diz que a Santa Eueharistia etiam morúos depellit, el cegrolos samt. E S. Gregorio Nazianzeno refere que seu pae foi repentinamente são pela recepção da Santa Communhão.

Continua- 3!)3.— Assim, o sacerdote poderá dizer ao enfermo; Meu irmão, vossa doença não é sem esperança, mas é perigosa; fareis portanto bem recebendo a communhão o mais breve possivel, porque o Salvador vos restitnirá a sande, se for util para vossa salvação; e se deveis morrer, vos fortificará con­tra as tentações, e vos conduzirá ao paraiso. Que dizeis vós? desejacs rccebel-a? Sim.— Está bem, preparae-vos para lan­çar-vos nos braços de vosso Redemptor, que morreu por vós. Dizei-lhe com amor: Vinde, meu Jesus, vinde; meu amor, meu unico bem, vinde á minha alma, que vos deseja: Quid mihi est in calo, et a te quid volui super terram? Deus cor- dis mei, et pars mea Deus in celernum. Quando o Viatico ti­ver chegado, o sacerdote terá cuidado de fazer arredar do quarto os parentes que poderiam excitar alguma paixão no enfermo, como sua esposa, suas filhas, suas irmãs, etc. En­tão poderá dizer-lhe que S. Filippe de Neri, vendo entrar o Santissimo Sacramento em seu quarto, exclamou: Eis aqui 0 meu amor. Vós deveis dizer outro tanto: Meu irmão, eis aqui o Filho de Deus, que por amor dc vós desceu do céo á terra; que quiz morrer por vós, e que agora vera visitar- vos. Regosijae-vos, Elle vos tem perdoado tudo. Vós vos ha­veis arrependido das offensas que lhe tendes feito, e vos ar- rependeis ainda mais; e agora o amaes de todo o vosso cora­ção, não é assim? Dizei-lhe pois: Sim, meu Jesus, eu vos amo, e porque eu vos amo, me arrependo de todo o meu co­ração de vos ter offendido; aceito a morte por amor de vós; eis-me aqui prompto; desejo mesmo morrer, se for vossa santa vontade, a (im de ir amar-vos eternamente no paraiso. Ao que 0 sacerdote acrescentará: Ora bem, N ..., pois que amaes a Jesus Christo, perdoaes por amor d’Elle a todos aquelles que vos têem oITendido, não é assim? e ao mesmo tempo pe-

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dis perdão das oITensas que tendes feito aos outros. Voltae- vos agora para o Salvador, que quer dar-se-vos; dizei-lhe que não sois digno. Domine non sum dignus. Não obstante isto,Elle quer vir a vós. Charaae-o portanto: Vinde, meu Salva­dor, meu amor, meu tudo; eu não quero outra cousa senão a vós. Quando o enfermo tiver commungado, será bom aju- dal-o a fazer sua acção de graças. Agora, meu irmão, dae graças ao Salvador, que se deu a vós com tanta bondade. 0 Santissimo Sacramento é chamado o penhor do paraiso, fu­tura gloricB pignus. Regosijae-vos: Deus quer dar-vos o pa­raiso, e como penhor Elle mesmo acaha de se dar a vós; dizei commigo: Meu Senhor, meu amor, eu me lanço em vos­sos braços, eu vos agradeço, eu vos amo. e espero amar-vos eternamente; eu me arrependo de vos haver oITendido, e proponho consagrar o resto da vida, quer seja longo ou curto, em vos amar. Meu Salvador, eu vos ollercço minha vida, se vos aprouver tirar-m’a; seja sempre feita vossa vontade; dae- rae somente, eu vos rogo, a santa perseverança e vosso amor, a lim de que cu espere amando-vos, e vá continuar a amar- vos no paraiso por toda a eternidade; vós não me abandona- rcis, eu igualmente não vos abandonarei, assim nós nos ama­remos eternamente, ó Deus de minha alma.

394.— Como a Extrema-Unção é o ultimo dos sacramentos A rci que recebemos, é elle, segundo S. Thomaz, o complemento Jdo tratamento espiritual que dispõe o homem para entrar na gloria eterna. É necessário pois que o enfernio o receba em-

rmto está em seu juizo, a lim de tirar d’elle mais proveito, verdade que não se póde receber este sacramento senão em um perigo grave ou ao menos provável de morte pró­

xima, ou de perda de sentidos; todavia, não se deve esperar pelos últimos momentos de vida. (Lib. VI, n.° 714.) Assim 0 Catecismo Romano diz que peccam gravemente os parocbos que não dão a Extrema-Unção senão qunndo já não ha espe­rança, e quando o enfermo começa já a perder os sentidos.0 sacerdote terá pois cuidado de persuadir ao enfermo que o primeiro elTeito da Extrema-Unção será de lhe restituir a saude do corpo, se ella for util á alma. 0 Concilio de Trento, na sess. 14, cap. ii, o declara em termos expressos: Inter- dum sanitatem corporis consequitur ubi saluti animce expe- dierit. Mas este elleito não tem logar quando o enfermo não póde sarar sem milagre. João Herold refere que um defunto havia revelado que a Extrema-Unção o teria sarado se lh’a tivessem dado a tempo; mas que tendo dilTerido recebel-a, havia morrido, e fora condemnado a cem annos de purgato­rio. 0 segundo elTeito será lavar os restos de seus peccados, e por consequencia seus peccados mesmos, ainda que mor-

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laes, 3C elle os ignora. S. Thomaz o diz expressamente non.° Tol. Assim, deve-se advertir ao enfermo, que durante asunções que sc fazem sobre cada um de seus sentidos, deve arrepender-se dos peccados commettidos por este sentido, respondendo Amen. 0 terceiro elleito será fortifical-o contra as tentações do inferno, mais temiveis n’este ultimo momento, de sorte que é muito provável que não se poderia escusar de peccado mortal aquelle que recusasse receber este sacra­mento. Vôde 0 n.» 373.

Conünua- 3Uo. — E util dar aqui muitas advertências sobre a adrai-fão- nistração d’este sacramento. 1.® Na prática não é provável

3ue se possa administrar este sacramento com uma só gotta e oleo sem o espalhar em partes, porque não seria isto uma

verdadeira unção. (S. Th. n.® 709). 2.® A unção dos cinco sentidos, segundo a opinião mais commum, é de necessidade de sacramento. Assim é só cm tempo de peste, ou no caso de um perigo de morle imminenlc. que se póde contentar com uma simples unção e sobre um só sentido (seria melhor fazel-a na cabeça), mas debaixo da condição si valet, e com uma só fórma, por exemplo: Per islam saneiam unclionem, et suam piissimam misericordiam, indulgeat tibi Dominus quidquid deliquisti per sensus, nempe per visum, per audi- tum, gustum, odoratum el laclim. Sc o moribundo sobrevi­ver, deve-se repetir, lambem debaixo de condição, as unções sobre os cinco sentidos com as orações costumadas. (Ib. n.® 710; V. Qucer.) Não é de necessidade de sacramento fazer a unção sobre ambos os orgãos; mesmo licitamente se póde satisfazer ungindo um só olho, ou uma só mão, etc., quando ha urgência ou perigo de infecção, ou se o enfermo não po­dér voltar-se para o outro lado. Nas mulheres se omitte a unção dos rins, e mesmo nos homens, quando infirmus comr mode moveri non potest, como o prescreve o Ritual Romano. Segundo a opinião commum, a unção dos pés não é de no- cessidade de sacramento: sobre este ponto deve seguir-se e uso das dioceses. Da mesma sorte a ordem das unções não é essencial, todavia deve-se observar sub gravi. (Ib.) Póde-se muito bem dar a Extrema-Unção aos meninos que tôem uso de razão, ainda que elles não tenham commungado. Na dú­vida se elles têem uso de razão, póde-se dar-lh’a condicional­mente, mas não áquelles que são ainda privados absoluta­mente de razão. (Ib. n.®» 719 e 720.) S.® Póde-se tambem dal-a aos dementes, áquelles que se achara em delirio, aos freneticos, que, tendo sua razão, a pediram ou deram signal de contrição, comtanto que não haja perigo de irreverencia para o sacramento; com mais razão póde-se dal-a debaixo de condição. Póde-se tambem dal-a áquelles que estão ebrios, e

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que se acham em perigo de morte, comtanto que não seja certo que elles perdessem qs sentidos no acto mesmo do pec­cado mortal; porque deve-se recusal-a absolutamente aos im- penitentes, e áquelles que morrem em ura peccado mortal manifesto, como diz o Ritual Romano. (Ib. n." 73o.) As mu­lheres de parto póde-se tambem dal-a se as dores as põem em perigo de morte. 6.® No caso de necessidade se omittem as orações, excepto a fórma. (Ib. n.” 728.) Recitam-se depois as orações, havendo tempo; e n’esle caso póde-se tambem administrar este sacramento sem luzes e sem ministros, (Ib.) e mesmo provavelmente sem sobrepelliz e sem cstola. (Ib. n.® 726.) 7.” Não se póde reiterar a Extrema-Unção na mesma doença, excepto tendo o enfermo sarado, ao menos que seja isto provável, e que recaísse em um semelhante pe­rigo de morte, como diz o Concilio de Trento na sess. 14, cap. III, e n.® 715. 8.® 0 sacerdote deve ser acautelado era fazer voltar o enfermo para lhe ministrar as unções. Mas portando-se com prudência, e por acaso se seguir a morte, não deve temer a irregularidade; ella suppõc uma falta de que não é culpado aquelle que obra por dever de caridade.(11). n.® 72o.) Finalmente, o parocho póde muito bem guar­dar em sua residência os santos olcos durante a noite, te­mendo com probabilidade que não possa de outra sorte dar o sacramento ao enfermo. (Ib. n.® 730.)

396.— Quando o enfermo tiver entrado em agonia, o sa- Aviso para cerdole se revestirá de todas as armas da Igreja para o ajudar a agonia 0 melhor que possa. 1.® Aspergirá muitas vezes sobre elle ‘■amorle. agua benta, principalmente sendo elle atormenUido por appa- rições diabólicas, e dirá: Exurgat Deus et dissipcnlur ini- miei ejus. 2.® Fará muitas vezes sobre elle o signal da cruz, e mesmo o abençoará dizendo: Benedicat te Deus Pater qui te creavit; benedicat te Pilius qui te redemit; benedicat Spiritus Sanctus qui te sanctipcavit. 3.® Dar-lhe-ha muitas vezes a beijar o crucifixo ou a imagem da Santa Virgem. 4.® Terá cuidado de lhe fazer ganhar todas as indulgências que podér, ánnexas a medalhas, escapularios, etc., e sobretudo a ben­ção de Bento X IV in articulo mortis, com a indulgência ple- naria. 6.® De tempo em tempo lhe suggerirá algum senti­mento de contrição, de resignação, de oITerecimcnto de suas dores, de confiança na paixão do Salvador, e na intercessão da Santa Virgem; mas sempre com pausa, a fira de lhe dei­xar tempo de rellectir e de descansar. 6.® Com frequencia lhe fará invocar do coração, não podendo fallar, os santos no­mes de Jesus e de Maria, e muitas vezes repetir a oração:Maria, mater gratia, etc. 7.® No decurso da agonia fará re- ciUr muitas vezes pelos assistentes as ladainhas da Sanla

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Virgem em favor do moribundo. Seria bom tambem tocar á agonia, a (im de que todos orem para lhe obter uma feliz pas­sagem: 0 que póde ser tambem utilissimo para aquelles que estão com boa saude. Notae aqui que, regra geral, uma vez que 0 enfermo tenha perdido os sentidos, vale mais ajudal-o com orações do que com palavras. 8.® Aproximando-se o en­fermo a seu ultimo suspiro, o sacerdote recitará com uma voz lugubre, e de joelhos ao pé do leito, as orações da Igre­ja: Proficiscere, anima, etc.; Suscipe, etc., que se acham no fim do Ritual c do Rreviario. 9.® Será acautelado em tocar 0 nariz, as mãos ou os pés do enfermo, para observar se es­tão frios, porque esta acção, ao menos sendo freqüente, po­deria perturbal-o; abstenha-se de o fazer mover u’este estado de agonia, porque isto poderia occasionar-lhe a morte. 10.® Quando o enfermo está a ponto dc passar, lhe fará pegar, ao menos por algum tempo, na vela benzida, para significar que quer morrer na fé. 11.” Quando o enfermo gosa ainda dos sentidos, é bom dar-lhe muitas vezes a absolvição, depois dc uma curta reconciliação, a lim de lhe assegurar o estado da graça, se as suas conlissões passadas não fossem boas, ou ao menos para augmenlar n’elle a graça e diminuir as penas do purgatorio. Se por desgraça o enfermo caisse então em pec­cado mortal, não o aterreis, mas cxborlae-o a invocar Jesus e Maria; se elle dc novo for tentado, animae sua conliança, fa- zei-lhe produzir o acto de contrição e absolvei-o immediata- raente. Sc o enfermo tiver perdido os sentidos, e não dá al­gum signal de arrependimento, nem de desejo da absolvição, não convem rcilerar-lh’a muitas vezes; porque, ainda que então se dá a absolvição debaixo dc condição, todavia, para administrar o sacramento condicionalmente, é necessaria uma causa grave. Assim, deve-se esperar que entre uma c outra absolvição se passe um tempo notável. N este caso o confes­sor deve regular-se segundo o conhecimento que tem da con­sciência do enfermo; por exemplo, se elle tem sido habituado a máus pensamentos, se elle morre em consequencia de feri­das, ou com uma forte paixão de odio ou de amor deshones- to, se a enfermidade é muito cruel, e o enfermo não tenha paciência, póde dar-se-lhe com mais frequencia a absolvição: de outra sorte bastará dar-lh’a todas as tres ou quatro horas; com mais frequencia se elle estiver proximo a expirar. Será tambem conveniente advertir no enfermo, cmquanlo está em juizo perfeito, que quando não podér fallar, dô algum signal convencionado todas ns vezes que desejar a absolvição, ou quando o sacerdote quizer dar-lh’a; por exemplo, fechar os olhos, inclinar a cabeça, levantar, a mão, e outros semelhan­tes. Finalmente, quando o enfermo parecer que passou, o

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sacerdote se absterá de dizer logo que elle morrera, e menos ainda dc lhe fechar immediatamente os olhos e a bôca, ou de lhe cobrir o rosto, porque poderá ser que elle ainda não te­nha expirado, e assim apressaria sua morte. Finalmente, de­pois de se haver certificado de que a alma passou, dirá aos assistentes que a encommendem a Deus, e, pondo-sc dc joe­lhos, recitará a oração Subvenite,e{c., que se acha no Ritual e no Rreviario.

397.— Creio em vós, meu Deus, infallivel verdade; espero Ancctos era vós misericórdia sem limites; eu vos amo, bondade inii- «iuc sc de- nita: In te, Domine, speravi, non confundar in ''Quid mihi est in calo et a te quid volui super terram? Deus inomcnlo cordis mei et pars mea Deus in alernum. Amore amoris tui da agonia. moriar, qui amore amoris mei dignatus es mori. In pace in idipsum dormiam et requiescam. Meu Deus, não permittaes que eu vos perca; eu não quero senão a vós. Bondade infi­nita, eu vos amo, eu vos amo, eu vos amo.

Notae bem, que os actos que mais vezes se devem sugge­rir aos agooisnntes são os actos dc amor c de arrcpeudi- racnto. Meu Salvador, que d’aqui a poucos iustanles sereis meu juiz, perdoae-me. Eu vos amo, c porque vos amo me arrependo de vos haver oITcndido. Jesu mt dulcissime, ne permittas me separari a te. Sangue de Jesus, lavae-me; pai­xão de Jesus, snlvae-me. In manus tuas. Domine, commendo spiritum meum. Moriar, Domine, ut te videam. .Maria, .Mãe de Deus, rogae a Jesus por mim. Illos tuos misericordes oculos ad nos converte, et Jesum benedictum fructum ventris tui nobis post hoc exilium ostende. Ó Maria! c chegado o tempo dc auxiliardes vosso servo. Minha boa Mão, não me desampareis. Ó bella patria, patria de amor, quando vos ve­rei eu? Meu Deus, quando vos amarei eu no céo ? .Meu Sal­vador, quando não terei eu a temer de vos perder? Deus meus et omnia. Eu estou contente era deixar tudo, ó meu Deus, para ir gosar-vos. Meu Deus, pelo amor de Jesus, tende piedade de mim. Enviac-me, Senhor, ao purgatorio por todo 0 tempo que quizerdes, mas não me priveis da feli­cidade de vos amar. Te ergo quwsimus, famulis tuis subveni, quospretioso sanguine redemisti. 0 Deus clemente! eu quero e espero amar-vos por toda a eternidade. Amor meus cruci- fixus est. Meu Jesus, meu amor morreu por mim. J)eus in adjutorium meum intende; Domine, ad adjuvandum me fes- tina. Padre Eterno, pelo amor de Jesus Christo dae-me vossa graça. Eu vos amo, eu me arrependo. Como posso eu, ó meu Deusl agradecer-vos todos os beneficios que me tendes feito?Eu espero ir para o céo para vos dar graças eternamente.Maria, mater gratia, mater misericórdia, etc., miserere mei.

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secundum magnam misericordiam tuam. Misericórdias Do­mini in (Btermm cantabo.

No mo- 398.— In manus tuas, Domine, commendo spiritum meum. mento do Meu jesus, eu vos recommendo esta alma resgatada com ummosus-yjjgg sangue. Notae que quando o enfermo está no momento

de dar o ultimo suspiro, devem suggerir-se-lhe os actos sem pausa c com uma voz mais forte. Domine, Jesu Christe, sus- cipe spiritum meum. Meu Deus, ajudae-me, permitti-rac que eu vã amar-vos por toda a eternidade. Meu Jesus, meu amor, eu vos amo, e me arrependo. Ah! se eu nunca vos ti­vesse odendidol .Maria, minha esperança, .salvae-mc; rogae a Jesus por mim. Meu Jesus, salvae-me por vossa paixão; eu vos amo. Maria, rainha hoa Mãe, ajudae-me n’este momento. S. José, salvae-me. S. Miguel Archanjo, defendei-me. Meu bom Anjo, assisti-me. S. N... (aqui se nomeia o patrono ou protector principal do agonisante), cncommcndae-me a nosso Senhor. Todos os santos do céo, rogae a Deus por mim. Je ­sus, Jesus, Jesus, Jesus, Maria, eu vos dou meu coração e minha alma.

Signaes do 399.— É bom que o sacerdote assistente conheça os si- P''°-gnacs de morte próxima, a (im de se tornar mais util ao en-

.xima. quando elle se aproxima ao seu (im. Os signaes prin­cipaes e os mais universacs são tres: 1.“, a respiração difli­cil; 2 ®, ter 0 pulso fraco, ou inlermiltenle, ou formicanle;3.®, os olhos encovados e envidraçados, ou mais abertos do

r ordinariamente, ou muito brilhantes, e vendo os objectos outra sorte do que elles são, ou quando a palpebra supe­

rior se relaxa e sobrepõe na inferior. Eis aqui tambem ou­tros signaes de morte próxima: 0 nariz alilado com a ponta branca e as ventas assoprando; as fontes contrahidas, as mãos trêmulas, as unhas lividas, a face amarellada, livida ou alte­rada; 0 halilo felido e frio; o corpo immovel, o suor frio ou suando-lhe a testa; o grande calor do peito sobre a região do coração; tirar os pélios aos cobertores; o esfriamento de todas as extremidades.

Os signaes mais proximos do ultimo suspiro são: a respi­ração intermittente e menos sonora, a perda do pulso, a con- tracção e rangido dos dentes, o humor na garganta, um sus­piro triste ou gemido; as lagrimas que correm de si mesmas, a contorsão da bôca, dos olhos e de todo o corpo. Notae:1.», que aquelles que são alTectados de hydropesia, de tisica, de alguma ferida, de aslhraa, de pleuriz, de vomito, de es- quinencia, de rheuraatisrao, de espasmo, morrem algumas vezes com alguns dos symptoraas precitados e o pulso vigo­roso; 2.®, que aquelles que tôem uma pleuriz estão no mo­mento de expirar, quando sua respiração se torna diflicil e

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0 luoo ainaniçs no 'BDçq b raoo juojojd sB.qi-opnozBj sozoa SBJino ‘sBiJno 0)intu sBUO]Binout sÕoôbjo no sagÍBJidsB so||0.p oíDBip opnozBj SOZOA sÊcun ‘.sepiqiooso uioq SBJABjBd SBasnb -ad ódcna) luo odcuo) op soqi-dpuozip tsonãejiüsui EOAens a saoop Jod ‘sofuB tuoq so ooioa ‘opBpiaiaaixo liu uÍBABqoB as anb soiujajna Eo luoo BiznpnoD as opBjniuaABiuod ossoj;!»

«■(iBxiBdiuoD ap anb op ‘ BfaAni ap sonSjp sicin oçs sapa ‘ snaQ jod iiiOAjas sou sano os ebÍu ;iubj[|Õs sana anb opeSajduia uiaq 9 a ‘ soqjBqBJi snas ibiu opiuil luuSaad -toa ‘ sou-jbpbj8 b anb op sibui uiBJnoojd oyu a ‘ siion b obu 0 ‘ sçu B anb op smui bjsja uia iua?i obu ‘ Bãuaop tua Bfas ‘ apnBs toa Bfas ‘ niSAjas sou anb saqanbB as ‘apupjOA b,sj síoabpbjSb o)inui obs aqi SBiisoq saB) siod ‘ uiazBj aiu sana'anb' Biauajsis -SB B|ad aiuaiuuâJBi BJBsuaduioaaj so snaQ anb las na 'a|[a napuodsaj ‘onbjod g i :oisi,p obzbj b souiBjunSjod aqi sç^j»

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coração, se o fallar os incommodava, e depois deixando-os por um pouco em repouso, «ô Jesus! eu me dou, eu me abandono a vós. 0 Deus! eu sou vosso, salvae-me para vossa gloria. 0 Pael enlrego minha alma, meu corpo, lodo o meu sêr em vossas mãos. ô Deus! vossa vontade seja feita; sim, Senhor Jesus, vossa vontade, não a minha.» E entre cada aspiração elle deixava uma muito longa pausa para lh’a dei­xar saborear.

«Elle com difliculdade solTria que atormentassem um po­bre agonisante com longas exhortações. Não é este o tempo de lhe prégar, nem mesmo de lhe fazer longas orações; de­ve-se sómente mantel-o na submissão á divina vontade, que deve ser seu elemento eterno, e sua occupação perpetua no céo.

«Elle prestava algumas vezes este oflicio de piedade e de misericórdia aos criminosos de os acompanhar ao supplicio, e de os ajudar a bem morrer, e servia-se da mesma conducta que acabamos de dizer a respeito dos enfermos. Depois de ter ouvido suas culpas, elle os deixava um pouco respirar; depois, com intervallo, lhes suggeria actos de fé, depois de esperança, depois dc amor, e depois de arrependimento e de resignação á vontade de Deus, de abandono á sua misericór­dia, sem augmentar sua alllicção com a importunidade inse­parável de um discurso continuado.»

Continua- 401. — (In., parle 18.®, cap. xxvi e x x v ii.)- « A uma ção. alma que, no decurso de uma grande enfermidade, se quei­

xava de não poder entregar-se á oração mental, exercicio que ella amava deliciosamente e sem o qual seu espirito es­lava como em languidez, elle disse: «Não vos desgosteis por estar de cama sem poder fazer a meditação; porque solTrer os açoules de nosso Salvador não é menor bem do que meditar; não, sem dúvida, porque é melhor estar sobre a cruz com nosso Salvador, do que contemplal-o sómente. Mas eu sei que sobre o leito vós lançaes mil vezes no dia vosso coração nas mãos dc Deus, isto é o bastante. Obedecei pontualmente aos médicos; e quando elles vos probibirera algum exercicio, 011 de jejum, ou de oração mental, vocal, ou mesmo o Oflicio, excepto a oração jaculaloria, eu vos rogo quanto posso, e pelo respeito e pelo amor que me consagraes, que sejaes muito obediente, porque Deus assim o tem ordenado. Quando estiverdes sã e bem fortificada, tornae a seguir muito deva­gar vosso caminho, e vereis que iremos muito longe com o auxilio de Deus.

«Elle respeitava muito os enfermos na qualidade de mem­bros do Salvador. Elle exprimia assim seus sentimentos de respeito e de honra para com uma pessoa doente: «Emquanto

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eu pensar que estaes alllicta no leilo, eu vos tributarei, mas é muito consciamente que eu fallo, eu vos tributarei uma re­verencia particular, e uma honra extraordinaria, como a uma creatura visitada por Deus, vestida com sua tunica, e sua es­posa especial. Quando nosso Senhor esteve sobre a cruz, foi declarado rei, mesmo por seus inimigos, e as almas que es­tão em cruz são declaradas rainhas. Vós não sabcis de que os anjos nos tôem inveja? de nenhuma outra cousa mais é do que de podermos nós sollrer por nosso Senhor, c não terem elles jámais sollrido alguma cousa por Elle. S. Paulo, que ti­nha estado no céo e no meio das felicidades do paraiso, não se julgava feliz senão em suas enfermidades e na cruz de nosso Senhor.» E depois lhe recommenda um negocio de im­portância: «Eu vos peço, lhe diz elle, que encommendeis a Deus uma boa obra que desejo ver cumprida, c principal­mente durante vossos tormentos; porque n’este tempo vossas orações, ainda que breves e do coração, serão infinitamente bem aceitas. Pedi tambem n’este tempo a Deus as virtudes que vos são mais necessárias.»

ARTIGO IX

SOIinE AS PENITENCIAS E A AIISOLVIÇÃO

402. (Sacerdote santificado, n.“’ 31-34.)— Passemos Discrição agora ás penitencias que deveis impor como juiz. Como me- na imposi- dico, tereis cuidado de medir sua qualidade e quantidade,Com elTeito, o medico não attende sómente á doença, mas tambem ao doente, e á força ou á fraqueza de seu tempera­mento. Ao fraco, mesmo em uma grande febre, elle não dá os remedios que ordenaria ao forte. Nas moléstias complica­das elle proporciona de tal sorte os meios, que não augmenta uma querendo curar a outra. Se elle não tivesse respeito a estas dilTerentes circumstancias, correria risco de ser mais nocivo do que util. Elle antes quer fazer em muitas repeti­ções 0 que a fraqueza do enfermo não lhe permitte fazer de uma só vez. Elle começa dispondo-o, fortilicando-o, a fim de poder supportor remedios mais fortes. Da mesma sorte vós serieis muito imprudente se impozesseis grandes penitencias a um peccador convertido muito recentemente, que tem uma dor suíEciente, mas ordinaria, e não extraordinaria ou he­róica; isto seria afastal-o da devoção. Deveis portanto ter cm vista, não sómente punir os peccados passados, mas tambem alTeiçoar o penitente aos sacramentos e á piedade, a fira de que, tratado cora doçura e moderação, elle volte com mais frequencia e adquira assim novas forças espirituaes. Então,

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não 0 duvideis, elle será o primeiro a.pedir-vos penitencias mais graves e a aceitnl-as cora gosto. E assim que fareis dar a Deus mais satisfação por uma demora prudente, do que por uma exigcncia prompta e prematura. Vossa moderação não será relaxação, mas uma admiravel união da sciencia dc juiz e da habilidade de medico. Esta comparação e esta doutrina são uma e outra de S. Thomaz. (Sup., q. 28 c 24.) Em ou­tra parle recommenda elle o mesmo nestes termos: Sicut exiguus ignis extinguilur, si multa ligna super imponantur, ita accidere posset, quod parous pcenitenlis contrilionis afTe- ctus, pondere poenilentice deficial. Melius est quod sacerdos pcenilenti indtcet quanta pcenilentia esset injungenda, et in- jungat nihilominus quod poenitens tolerabiliter ferat. (Quod- lib., 3 e 28.) Sc de outra sorte vos conduzirdes, sabei de S. João Chrysoslomo qual será a consequencia de vosso ri­gor: Muitos recensere possem in extrema mala deductos, quod ab eis pcena peccatis par exposceretur. Neque enim te- mere ad peccatorum modum oportet et poenam adhibere, sed peccantium propositum explorandum est; ne, dum quod scis- sum est consuere vis, deteriorem scissuram fadas; dum la- psum emendare studes, majorem ruinam pares: nam qui in- firmi sunt, ac retnissi, magisque mundi deliciis irretili, quique ex genere et potentia altum sapere possunt, i i sensim paula- timque a peccandi consuetudine retrahi, ac si non penitus, partim saltem ab iis, quibus detinentur malis, liberari pos­sunt; quibus si statim correptionem inducas, minore illa emendatione privabis. Anima quippe confestim in ruborem acta, in indotentiam labitur, neque blandis postea verbis pa- ret, neque minis ftectitur, neque beneficiis movetur. Se, por­tanto, coufcssacs um penitente gravemente enfermo, cujos numerosos peccados mereciam uma grande e louga peniten­cia, tende em consideração o estado perigoso em que elle se acha, e não vades alcrrni-o impondo-lhe as penitencias que merece. Contentae-vos de lhe ordenar alguma breve oração, e que oITereça seu mal a Deus com resignação; acrcscentae que SC elle sarar, volte a vossos pés, e que então lhe ordena- reis alguma outra cousa para cumprir suo dívida para com Deus; se o não podér, que se confesse com frequencia, c faça outras boas obras, e solTra as adversidades com paciência, em expiação de suas faltas. De outra sorte, prescrevendo-lhe penitencias de muitos mezes c de muitos annos, poderieis, como tem acontecido, estou certo d’isto, diminuir sua con­fiança a ponto que, se chega a recordar-se de algum peccado grave que lhe tenha esquecido, não se atreverá a chamar-vos para se reconciliar, e assim estará em perigo de ter uma morte má. Ora, este perigo presente e gravissimo prevalece

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ao receio que tendes de que elle não volte a vossos pés de­pois de são.

403.— Tende a mesma precaução para lixar a qualidade Qualidadeda penitencia. Assim, não imponhaes jámais como obrigação .da .cousas difficcis, com o risco de serem omittidas; contenlae-P'^"“ ®"‘ ‘®‘ vos de as aconselhar. Por exemplo, aconselhae aos filhos,mas não lh’o mandeis, que peçam perdão de suas desobe­diências a seus paes; a um ehrio não digaes que não beba cousa alguma em tal dia, mas limitae e lixae com discrição a medida que elle não deverá exceder. Outras cousas ha que imporeis de um modo absoluto, mas debaixo de condição.Por exemplo: Fareis tal esmola, voltareis a confessar-vos em tal dia, ou recilareis o rosário, se reincidirdes em tal pec­cado antes de tanto tempo. Muito nienos deveis prescrever penitencias que descubram aos outros o peccado do penitente.Poderieis sim impor o jejum do sabbado a um pae que de ninguém depende em sua casa; mas não o prescrevereis a um lilho: seus paes poderiam adivinhar a causa d’isto. At- tendei tambem que, quando impondes cousas faccis de fazer, como cinco Pater e Ave, podcreis prescrevel-as para cada dia durante algum tempo. Não será o mesmo se as cousas forem um tanto menos faceis, como ouvir missa, fazer meditação ou leitura. Deixae alguma liberdade, a lim de não pôr o pe­nitente em oppressão, e algumas vezes em perigo de uma omissão culpavel. Em logar de lh’as prescrever para cada dia, dizei-lhes: Fareis estas boas obras durante tal tempo, pouco mais ou menos todos os dias, ao menos quatro ou cinco vezes por semana, ou por outra, todas as vezes que não tiver­des desculpas razoaveis. Se ordenardes dilTerentes cousas, a fim de não confundir a memória, guardae o mesmo numero para cada uma: por exemplo, cinco missas, cinco jejuns, cinco rosarios) etc. Na dúvida se deveis dar maior penitencia, di­zei-lhe que lhe impondes como obrigação de ollerecer desde então, e em geral, todo o bem que lizer durante a semana.É assim que, sem o sobrecarregar, fazeis que elle dê no Se­nhor uma maior satisfação. Tal é n advertência de S. Thomaz de Villa-nova: Sic itaque rigorem paenitenlice temperato, «I neque levitas delicli contemplum, neque gravitas omittendi pe- riculum creet: hoc judicium eo ita perpcies, si facilem unam injtmxeris, et acriorem alteram peccatori consuiueris: ita ta­men ad omnem ejus voluntariam et spontaneam pcenitentiam sacramenti applices efficaciam. (•)

404.— Tende cuidado sobretudo de que satisfazendo a Peniicnda Deus pelo peccado, as penitencias preservem tambem para o

(0 s. Tüom. de Villa-nova, Cone. Fer. G, post 4, dom. quadrag.

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futuro. Assim, ás penitencias corporaes, principalmente a respeito das pessoas delicadas, preferi aquellas que cntrcteem bons pensamentos no espirito e santos alTeclos no coração, e que tôem uma força particular para obter o soccorro de Deus, como leituras espirituaes, a meditação, a missa, a devoção a algum santo protector, principalmente á Santa Virgem e á paixão de nosso Senbor. Quantos devem sua santificação á leitura espiritual! Quantos que se conservaram no temor de Deus, emquanto foram exactos em honrar a Santa Virgem, recitando todos os dias seu oflicio e o rosário, e meditando em suas dores, mas apenas cessaram de tributar suas home­nagens a esta Mãe dc graças, sollreram a pena, recaindo logo em seus pcccadosl Clericato refere ter visto muitos peccado- rcs, que tiveram no artigo de morte o dom dc uma grande contrição. Examinando depois o bem que elles tinham feito em sua vida para obterem de Deus uma tão grande miseri­córdia depois de tantos peccados, achou que elles haviam sido assiduos em ouvir devotamente a missa. E assim experimen­taram 0 elTeito proprio d’cste sacriíicio expiatorio: foi muito tarde, c verdade, por causa dc sua malicia, mas todavia ainda a tempo, que o sangue divino bradou para sua saWação, e a obteve.

Quat é a 40o.— Entre todas as penitencias a mais salutar é a fre- das nen'-' «*05 sacramentos. E uma verdade constante que detencias.' ' aquelles que tôem podido frcquental-os e o não tèem

feito, apenas ha um só que tenha conseguido sustentar-se no bem com todos os outros soccorros. Pelo contrario vereis côdo ou tarde, que aquelles que são fieis em frequental-os, sejam quaes forem seus máus hábitos, não sómente não se fazem peiores, mas recáem mais raras vezes, e acabam por se emendarem inteiramente; porque os sacramentos são os meios mais poderosos e mais fecundos para nos dar a graça. Mas elles não são de alguma utilidade para aquelles que os recebem sem as convenientes disposições. Assim, nada omit- taes para lhes inspirar estima por elles, para os fazer amar e freqüentar, e fazer que se preparem com toda a diligencia possivel. É principalmente com os recidivos que deveis em­pregar todos os recursos de vossa caridade e de vossa habili­dade para lhes facilitar o accesso ao santo tribunal, porque elles tôem a toda a hora uma extrema necessidade de se apro­ximarem a elle, e uma extrema difliculdade em fazel-o. Di­zei-lhes pois, que se reincidirem, é então que, vindo confes­sar-se logo, elles vos dão uma grande consolação, não pelo mal que tiver acontecido, mas pela humildade christã e boa vontade que testemunham recorrendo immediatamente ao re­medio. Acrescentae mesmo que não importa que elles ainda

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não estejam dispostos para confessar-se; que principiem sem­pre por apresentar-se e por dizerem que a febre voltou. E mcrivel quanto esta prompta humildade enfraquece o demo­nio, anima os penitentes e dispõe Deus a conceder-lhes maio­res graças. Sua humildade, junta aos bons conselhos que lhes daes c que Deus abençoará, lhes obterá muito breve a victoria da tentação. Pelo contrario, se elles demoram, esta­rão em grande perigo de cair rapidamente, e de perder abso­lutamente a vontade e a força de emendar-se. Mas cumpre- vos afagal-os de modo que nunca vos mostreis surprendido de suas recnidas, que nunca os desprezeis, nunca os mandeis embora com azedume. Um só d’estes defeitos bastaria para lhes tirar a força de voltar a vossos pés. Entretanto nada é mais util a todos os penitentes em geral, e principalmente aos recidivos, como continuar sempre com o mesmo confes­sor. Àcarinhando-os, mostrae-lhes portanto sempre que vos dão gosto, compadecei-vos sempre d’ellcs, mas ajudae-os tambem sempre. Examinae d’onde provém a rccaida, para remover a causa; assignae novos remédios, e antes de os absolver, tornae as precauções de que temos fallado em os n.'® 340 e seguintes.

406.— (S. Licoiiio, n.“‘ 11-14).— A proposito das peniten-obrigações cias, devo fazer-vos notar muitas cousas: l.°Q u e , dando a de impor absolvição, é o confessor obrigado a impor a penitencia, como 0 declara o Concilio de Trento, na sess. 14, cap. vi. Pecca portanto não a impondo; pecca gravemente quando o peni­tente houver confessado peccados mortaes; não se accusando mais do que de faltas veniaes ou de faltas mortaes já confes­sadas, é provável que não peque mortalmente. (Liv. VI, n.®606.) Se, immediatamente depois da absolvição, o penitente se confessa de um novo peccado, o confessor deve dar-lhe nma nova penitencia, ao menos leve. Deve ordinariamente dar-se a penitencia antes da absolvição, para ver como o pe­nitente a receberá; comtudo algumas vezes póde-se impol-a sómente depois, porque ella lhe lica moralmente unida. 2.®Que se deve sempre impor a penitencia debaixo de uma obri­gação qualquer; mas pergunta-se se o confessor póde dar uma penitencia grave sub obligatione tevi? A opinião mais commum e muito provável está pela allirmativa, porque no sacramento da penitencia o sacerdote não é simples ministro de Jesus Christo, como nos outros sacramentos, mas verda­deiro juiz estabelecido pelo Salvador com poder de ligar ou desligar pela penitencia; de sorte que sua obrigação depende totalmente da ordem do confessor. (Ib., n.® 618.) 3.® Que a penitencia deve ser proporcionada ás faltas; mas aqui consi- derae attentamente as palavras do Concilio de Trento, na

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sess. IB , cap. v i ii: Debent ergo sacerdotes Domini, quantum spiritus et prudentia suggesserit pro qualitaíe crimtnum, et patnitentium facultate, salutares et convenientes satisfactiones injungere; ne si forte peccatis conniveant, et indulgentius cum pcenitenlibus agant, levissima quwdam opera pro gravis- simis delictis injungendo, alienorum peccatorum participes efíciantur. Àssim, ai quaolidade da penitencia é deixada pelo Concilio ao arhitrio do confessor. Prout spiritus et prudenlia suggesserit. Por difTerenles razões se póde diminuir a peni­tencia. A primeira, se o penitente tem muita contrição, ou se antes d e vir, fez muitas obras satisfactorias. A segunda, em tempo de jubileu ou de indulgência plenaria. Mas sem­pre é necessário impor alguma penitencia, assim como Bento X IV 0 declarou, seja porque ninguém póde esta .certo dc ga­nhar a indulgência plenaria, seja porque scnq v»; é necessário dar ao sacramento sua integridade. Se o penitente tiver ne­cessidade de penitencia medicinal, sempre se deve impor- lh’a. A terceira, se o penitente se acha iifermo, porque o Ritual Romano diz que não se deve impor grande penitencia aos enfermos, mas quando estiverem sãos. Se o enfermo es­tiver em artigo dc morte ou privado de sentidos, póde[ser absolvido sem penitencia alguma. [S. Lig., liv. VI, n.° 507.) Comtudo será sempre bom impor-lbj alguma pequena cousa, como beijar o crucifixo, ou invocar os santos nomes dc Jesus e de Maria, ao menos cora o coração, etc. Não convem impor aos enfermos por penitencia solTrer com paciência sua enfer­midade; seria lançal-os em uma n iltidão de inquietações e de escrupulos. Os doutores de Suiamanca notam, c com ra­zão, que se o enfermo póde sat sfazer com esmolas, o confes­sor deve impor-IITas, porque cada um é obrigado a fazer a penitencia que está em seu poder.

Continua- 407.— A quarta, póde-se diminui'" a penitencia se o pcni-Ção. tente for fraco na piedade, de sorte .• c se receie prudente­

mente que elle não faça a satisfação iroporcionada. Tal é, com muitos outros, o parecer de S. C.. los e de S. Thomaz, cujas palavras logo vou referir-vos. E vei <ade que o Concilio de Trento diz que a penitencia deve coi sponder á quali­dade das faltas; mas elle acrescenta logo, q.,e as penitencias devem ser pro panilentium faculale, satulai >,s et convenien­tes. Salutares, quer dizer uteis á salvação do penitente; et convenientes, quer dizer proporcionadas não sómente ás fal­tas, mas tambem ás forças do penitente. Segue-se d’aqui que não são nem salutares, nem convenientes as p-' iter.cias que os penitentes não estão dispostos a aceitar por c ':sa de sua fraca piedade, antes são a causa de sua ruina. N ’ > sa­cramento se intenta muito mais a emenda do que a sn fa-

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çlo. 0 Ritual Romano tambem diz, de Sacr. Pcenit., dando o confessor a penitencia, deve attender ás disposições do penitente: e S.Thomaz {Supp., q. 18, a. 4): Sicut medicus non dat medicinam ita efficacem, ne propter debilitatem na- turae majus periculum oriatur: ita sacerdos divino inslinctu motus non semper totam panam, qua uni peccato debetur, in~ jungit, ne infirmus desperet et a panitentia totaliter recedat. £ em outra parte diz, que assim como um pequeno fogo se extingue quando se lhe põe uma muito grande quantidade de lenha, da mesma sorte póde acontecer que o fraco sentimento de contri( Ão do penitente se extinga pelo peso da penitencia; depois acrescenta: Alelius est, quod sacerdos indicet quanta panitentia esset sibi injungenda, injungat nihilominus quod panitentes tv nabiliter ferat. E em outro logar: Reclius est imponere min, em debito, quam majorem, quia melius excu- samur apud Deiím propter multam misericordiam, quam pro­pter nimiam sevcdiatem, quia talis defectus in purgalorio supplebitur. (Ib., Opusc., o5, a. 4.) 0 mesmo sentimento é commum a Gerson, Caetano c principalmente Santo Anto- nino, que diz se deve dar a penitencia que se pensar verosi- milmente que o penitente cumprirá, e aceitará de bom gra­do. (Liv. VI, n.° 610.) Se o penitente protesta que não tem força para cumprir a penrencia que convem, Santo Antonino remata concluindo: Tunc quantumcumque deliquerit, non de­bet dimitti sine absolutione, ne desperet. «Basta em tal caso, diz elle, impor-lhe em gc-al todo o bem que elle lizer, ser­vindo-se das palavras niefímo do Ritual: (Juidquid boni ege- ris, etc. Estas boas obras, apnlicadas na administração do sacramento, como o ensina o doutor Angélico, terão em vir­tude do sacramento mais eflicacia para expiar seus peccados. (Quodiib. V. 1, a. 38.) A'^ra d’isto, é provável ser tambem uma justa razão para diminuir a penitencia o julgar que o penitente será por isto >iais alTeiçoado ao sacramento. Final­mente, quanto é bello e conselho de S.Thomaz de Villa-nova: Facilem unam injunr^*ris, acriorem consuiueris! {Serm. fer. 6, et dom. L a l.)

Bom é fazer c. 'Tiecer ao penitente a penitencia que elle mereceria; para isio póde ser util recordar-lhe as penitencias dos cânones pemtenciaes. Será igualmente util seguir o con­selho de S. Thomaz, e aconselhar ao penitente uma peniten­cia mais grave; mas depois não se deve impor-lhe mais do que aquella que se julga prudentemente que elle cumprirá. S. Fr(tnc' .'o de Salles insinua, e o Ritual Romano diz o mes­mo, qi"" convem perguntar ao penitente se tem força para fazer .' .openitencia: se elle disser que não, deve-se commu- tal-n' 'S . Carlos Borromeu dá o mesmo conselho: Tandem

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imponat pmnilentiam, qualem a pmitente prmstari posse ju- dicet, proinde, aliquando, si ita expedire viderit, illum inter- roget, an possit, an ne dubitet pcenitentiam sibi injunctamper- agere, alioquin eam mutabit, aut minuet. Algumas vezes tamhem scra ulil impor, enlre as obras prescriptas, uma pe­nitencia grave, mas não sub gravi, ou então alguma obra por outra razão já mandada ou obrigatória, como em o n.® «14 vos direi.

impruden- 408. — Notae 4.®, quanto são imprudentes os confessores cia de at- que impõem penitencias desproporcionadas ás forças do pe-

"■ nitente. Absolvera com uma deplorável facilidade os recidi­vos mal dispostos e aquelles que se acham em occasião pró­xima do peccado; depois cuidara loucamente poder cural-os dando-lhes as maiores penitencias, apesar da certeza de que não as cumprirão. Por exemplo, impõem que sc confessem todos os oito dias no decurso de um anno, áquelles que ape­nas se confessam uma vez pela Paschoa; o rosário áquelle que nunca recita a corôa; jejuns, disciplinas, meditações áquelle que nem sabe o nome a estas cousas. Que resulta? Resulta que estes penitentes aceitam forçados a penitencia, a lim de obter a absolvição; mas não a fazem, e julgam por isto ter caído em um novo peccado; elles consideram mesmo, principalmente os ignorantes, sua conlissão como nulla, por­que não cumpriram a penitencia. N ’esta persuasão, reinci­dem cm suas primeiras desordens: aterrados pela difliculdade dc cumprir sua obrigação, tomam a conlissão em odio e con­tinuam a entorpecer-se em suas iniquidades. Tal é, para um grande numero de infelizes, o fructo d’estas penitencias que se chamam proporcionadas, e que antes sc deviam chamar soberanamente desproporcionadas. Finalmente, fóra do caso de umn gravíssima enfermidade ou de uma contrição extraor­dinária, 0 confessor não faria bem se impozesse, por faltas graves, uma penitencia leve em si mesma, que não obrigaria senão sub levi. Sem dúvida, quando isto for util, póde im- por-se uma obra que, relativamente aos peccados, é leve, mas deve sempre ser grave em si mesma c sub gravi. (Lib. VI, n.® 610, infine.)

Outras ob- 469.— Notae 5.®, pelo que respeita á qualidade da peniten- scrvaçücs cia, que não se devem impor penitencias perpetuas ou muito às ocnf-* difliceis, como entrar em religião, e menos ainda contrahir ma- tcncias. trimonio, o que exige uma inteira liberdade: da mesma sorte

não se devem impor votos perpetuos. Muito mais, quando o penitente mesmo quizesse fazer voto, por exemplo, de não reincidir, não o auctoriseis senão temporariamente, para ver como elle o cumprirá. Póde muito bem impor-seuma peniten­cia condicional, por exemplo, de soccorrer ou de fazer esmo-

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Ias depois da recaída. Quando se lh’a dá é obrigado a aceital-a e a curapril-a. Mas não é prudente dar-lh’a por muito tem­po, porque elle Facilmente a esquece, e os peccados se mul­tiplicam. Póde-se portanto impor-lh’a sómente por um tempo muito curto, um mez, por exemplo, ou até á primeira con­fissão. (Ib., n.° 524.) Notae além d’isto que não se podem dar penitencias publicas por faltas secretas, mas sim por pec­cados públicos; ba mesmo obrigação de as impor quando de outra sorte não se póde reparar o escandalo ou a reputação publicamente tirada ao proximo. Mas não se deve forçar o penitente a fazer uma penitencia pública qunndo elle resiste, e póde 0 escandalo ser reparado de outro modo, por exemplo freqüentando os sacramentos, visitando as igrejas, entrando cm alguma associação, etc. (Ib., n.° 512.)

410.— Notae C.°, que as obras prescriptas pelo confessor Conlinua- devem ser penaes; porque, segundo o Concilio de Trento, na 5®°- sess. 14, cap. vm, a penitencia não deve ser sómente me­dicinal e guarda da vida nova, mas tambem vindicativa em expiação das faltas passadas. Ora, estas obras penaes se re­duzem ao jejum, á esmola e á oração. Debaixo do nome dejejum se entende toda a especie dc mortilicações corporaes.Pela oração se entende tambem as conlissões c communbões, as visitas ao Santissimo Sacramento e todos os actos interio­res de caridade, de contrição, ou dc amor dc Deus: segundo a doutrina commum, todos os actos sobrcdilos podem muito bem dar-se em penitencia. (N.® 515, dub. 1.) Notae que a oração, assim como a esmola e toda outra boa acção é consi­derada como obra penal: esta é tambem a doutrina commum dos thcologos. Com elfeito, para nós outros, lilbos de Adão, depois da quéda de nossa natureza, toda a acção virtuosa ha­bet rationem panai, porque lendo perdido a justiça original, somos todos inclinados ao mal e amigos de nossos vicios.S. Francisco de Salles conlirma tudo isto dizendo, na Introd. á vida devota, cap. iii, 23: Um tem mortificação em jejuar,0 outro em servir os enfermos, visitar os prisioneiros, confes­sar, prégar, assistir aos desamparados, orar, e semelhantes exercicios: esta oração vale mais do que aquella (quer dizer 0 jejum), porque além de que ella faz igual colheita, ella tem fructos muilo mais appeteciveis.

411.— Na prática é regra impor obras de mortificação pe- o ijue se los peccados dos sentidos, esmolas pelos peccados de avare- .Í-Y za, orações pelas blasphemias, etc. Mas em todos os casos {cncia se deve ver o que é mais conveniente e mais util ao peni­tente. A frequencia dos sacramentos, a oração mental, a es­mola são sem dúvida penitencias muito uteis; comtudo, na prática ellas se tornam nocivas áquelle que nenhum ou

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pouco USO tem d’ellas. As penitencias uteis a todos era ge­ral são, por exemplo, entrar era alguma associação, fazer to­das as noites, ao menos no decurso de algum tempo, um acto de contrição, renovar cada manhã suas resoluções, dizendo com S. Filippe de Neri: Senhor, prendei-me muito hoje a fim de que eu vos não atraiçoe. A visita diaria ao Sanlissimo Sacramento e Santa Virgem para pedir a perseverança; a co­rôa e tres Avè-Marias, de manhã e á noite, em honra da Santa Virgem, acrescentando: Minha boa Mãe, ajudae-me hoje a não offender a Deus. Eu tenho costume de impor esta penitencia de tres Avè-Marias, com a pequena oração, com

Soucas excepçõcs, a todos aquelles que não a praticam; que igara ao deitar-se: Fa í deveria estar agora no fogo do in­

ferno, ou então: Um dia eu devo morrer talvez sobre este lei­to; áquelles que sabem ler, principalmente aos ecciesiasticos, que façam todos os dias uma leitura de piedade. S. Francisco de Salles adverte que não se sobrecarregue o penitente com muitas cousas, com receio de que se perturbe e aterre.

1’enilençias 412. (B. Leonardo, n.”‘ 27-29.) — Entre as cousas que o confessor deve necessariamente saber para não se tornar cul­pado no exercicio de seu ministério, é necessário estabelecer as regras que elle deve seguir, a (im de impór penitencias proporcionadas aos penitentes. Como temos visto, o santo Concilio de Trento, na sess. 14, cap. viu, adverte aos con­fessores que se acautelem muito de darem penitencias leves por faltas gravissimas; elle quer que a penitencia tenha al­guma proporção com o peccado que se ouve e com o pecca­dor que'o accusa. E certo que seria uma penitencia muito leve um Padre-Nosso e uma Avè-Maria para um grande nu­mero de adultérios ou de outras impurezas: ou um Aliserere áquelle que fez ura grave damno ao proximo seja nos bens, seja na reputação. D’aqui se seguiria a desordem pelo mesmo Concilio declarada, a saber: que os homens perderiam o hor­ror que devem ter ao peccado, consideral-o-hiam como ba­gatela, e tomariam pretexto para se entregarem aos mais graves excessos. Assim as penitencias não devem ser muito leves relativamente ao peccado, como tambem não devem ser muito graves relativamente ao peccador, a (im de que elle não seja acabrunhado por um peso desproporcionado á sua fraqueza. Deve d’isto concluir-se que o confessor deve muito rellectir na penitencia que ha de impor, e que não se deve dor a mesma a todos, como não dá o medico a todos os en­fermos 0 mesmo remedio. 0 santo Concilio diz que os conse­lheiros das penitencias salutares e convenientes são o espirito do Senhor e a prudência de seu ministro. Como acontece pois que sejam dadas com tão pouca reflexão? Aprendam

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d’isto certos confessores imprudentes a não impor penitencias extravagantes e indiscretas. Eu entendo por penitencias ex­travagantes todas aquellas que se afastam do uso ordinário da Igreja e da prática commum dos bons e sabios confessores. A lim de lançar alguma luz sobre este ponto, que, em uma palavra, é deixado absolutamente ao arbitrio do confessor, não conheço regra mais segura do que seguir o uso da sa­grada Penitenciaria. Para peccados occultos, ainda que gravís­simos, ella não lixa outras penitencias mais do que orações, jejuns, esmolas, sendo possivel, c a frequentação dos sacra­mentos; seus rescriptos provam isto. Ora a sagrada Peniten­ciaria, sendo ura tribunal apostolico que julga no fôro da con­sciência, todos os confessores devem tomal-a como regra de sua conducta neste mesmo fôro interior. Por isto evitarão tambem um outro escolho, a saber: de darem penitencias in­discretas, como seria, por exemplo, obrigarem domésticos a ouvirem missas ou a fazerem outras obras com que solTreria 0 serviço de seus amos; a uma mulher prenhc ou criando, que jejue no decurso de muitos dias; a uma rapariga que vá visitar umn igreja remota e solitaria; a uma mulher casada que faça certas austeridades corporaes que podem desagra­dar, ou causar suspeitas a seu marido; ou outras semelhantes penitencias, que não convem ao penitente, seja cm razão do tempo, do logar, da idade, do estado e das forças corporaes, a que não se dá attenção.

Mas que penitencia se deverá portanto impor? Parece que é regra geral escolher aquellas que são oppostas aos peccados commettidos, como a esmola nos avarentos, aos scnsuaes al­guma pena alllictiva, e assim dos mais. Geralmente fallando, as melhores são aquellas que, punindo o peccado passado, ao mesmo tempo preservam tambem o penitente dft peccado fu­turo. Portanto se o penitente for recidivo, será bom que a penitencia dure por certo tempo: Nedum ad vulnus curan- dum, sed eliam ad cicatricem sanandam, segundo a expres­são de S. Chrysostomo (na hom., 2 in ps. l . ) Com elTeito, cura-sc mais facilmente o vicio, repetindo a applicação do re­medio; vemos tambem que tal é a conducta da sagrada Peni­tenciaria. Ella não dá penitencias dc muitos annos, a não ser em casos rarissimos; mas sim dc alguns dias, outras vezes mesmo de alguns mezes, segundo a necessidade do peniten­te. Para passarmos é prática: quando tiverdes ouvido a con­fissão do penitente, lhe fareis uma breve, mas fervorosa ex­hortação, pondo-lhe debaixo dos olhos a gravidade de suas faltas, e, segundo o conselho dc S. Carlos, citando-lhe os câ­nones penitenciaes e fazendo-lhe saber as penitencias rigoro­sas impostas antigamente por um só dos peccados que elle

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commelteu. Depois acrescentareis com doçura: Écerloque mcrccerieis uma penitencia muito mais grave, porém eu me contento com uma mais leve. É assim que o disporeis a re- cchel-a voluntariamente. As penitencias mais convenientes a meu ver, excepto certos casos extraordinários, são as seguin­tes, não todas simultaneamente, mas ora uma, ora outra, ou muitas ao mesmo tempo, segundo a qualidade das pessoas e as necessidades particulares de cada um.

Diversas 413.— 1.” Se o penitente commetteu um grande numero ospccics de peccados mortaes, será muito conveniente impor-lhe por tcnciaT' penitencia que recite, por oito ou quinze dias, o terço do

rosário, mas que o recite com compunção, rogando á San- tissima Virgem que lhe obtenha o perdão dos peccados pas­sados e a graça dc não os tornar a commetter para o futuro; se elle tem sido habitudinario e que faça uma conlissão geral necessaria, ou por ter occultado peccados por vergonha ou por outro semelhante motivo, póde-se prolongar a mesma penitencia por dous ou tres mezes, mais ou menos, segundo a qualidade do máu habito. Com isto acontecerá muitas ve­zes que 0 penitente tomará o habito de recitar o santo rosá­rio todos os dias, e não faltará mais a elle, com grande pro­veito de sua alma, durante o resto de sua vida.

2.® Que recite á noite e pela manhã tres Avè-Marias em honra da immaculada Conceição da Santa Virgem, com um acto de contrição; e que as acompanhe de manhã com uma muito firme resolução de não peccar durante o dia; e á noite, de não peccar durante a noite, impondo-lhe que as recite de joelhos, ou em uma postura incommoda. Póde-se dar esta penitencia salutar a todos sem cxcepção, porque ella é um preservativo cllicaz para curar as almas de seus máus hábi­tos. Eu queferia ser ouvido por todos os confe.ssorcs, para lhes pedir que imponham isto a seus penitentes durante o tempo que julgarem conveniente; elles colherão o maior fru­cto, como 0 prova a experiencia.

3.® Que ouça tantas missas, comtanto que isto não o im­peça dc cumprir suas obrigações, assim como acima deixamos dito, persuadindo-o a que as ouça nos dias festivos, quando mais commodamente podér.

4.® Que faça todas as manhãs o acto de oITerecimento de todos os seus solTrimentos c dc todas ns suas acções, ou al­gum outro exercicio christão que comprehcnda os actos de fé, de esperança c de caridade; e todas as noites o exame de consciência, tendo cuidado de lhe fi.xar o tempo que devem durar estas práticas.

5.® Que recite todos os dias, no decurso de certo tempo, cinco Padre-Nossos e cinco Avè-Marias, era honra das cinco

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chagas de nosso Senhor, demorando-se em cada chaga para meditar na paixão do Salvador; que visite tantas vezes uma igreja, pela qual tiver uma devoção particular: que leia, se for capaz d’isto, no decurso de algum tempo, um livro de piedade.

Todas as penitencias de que até aqui temos fallado podem impor-se aos penitentes de qualquer condição que sejam, advertindo-os que, esquecendo-se de as fazerem nos dias marcados, não façam d’isto escrupulo, podendo suppril-as em outro dia, e que se por alguma razão não podérem fazel-as, não se persuadam que commettem uma falta grave. D’este modo a consciência do penitente não é atormentada, ainda que se prolongue o tratamento de que elle tem uma extrema necessidade. Outras ha que se impõem ordinariamente a cer­tas pessoas que se acham em estados particulares; por exem­plo, a um ecciesiastico, ou a uma pessoa instruida, que faça meditação em certos dias, durante meia hora; áquelle que gosa de certa saude e que não tem obstáculos, que jejue nos sabbados durante algum tempo: a um senhor de casa, que faça recitar a corôa todas as noites á sua familia; a um blas- phemador, que faça tantos signaes da cruz com a lingua so­bre a terra; a um bebedo, que se prive de vinho Unlas ve­zes, ou que 0 beba misturado com agua; a certas pessoas ignorantes convem dar penitencias que tenham um tanto de mais sensiveis, por exemplo, fazer-lhes recitar alguns Padre- Nossos e Avè-Marias sobre uma campa, pensando que elles morrerão muito breve. Todavia lembrae-vos da observação que acima temos feito, a saber, que o confessor nunca deve dar penitencias extravagantes e indiscretas, capazes de ar­redar os lieis dos sacramentos e de deshonrar o sauto minis­tério.

414. — Costuma-se fazer esta pergunta: Vale mais dar Devcpen- uma penitencia grave, do que uma penitencia leve? R e s - P ® ’ pondo que, salvas as regras geraes acima indicadas, valera ou parã mais inclinar para a benignidade, principalmente se o peni-a severt- tente não aceitar voluntariamente uma penitencia mais forte, dadc? ou se elle não se julgar cm estado de a cumprir. N’este caso póde-se commutal-a ou impol-a, como acima dissemos, sem obrigação de falte grave. Exceptuo o caso cm que se trata de certos peccadores recidivos e babitudinarios. Com estes é necessário usar de maior rigor, e, como diz um habilissimo casuista, deixal-os antes expostos ao perigo de omittir a pe­nitencia, quam ne peccata contemnendo, ea sapius perpetrent et sine legitimo dolore confileantur, quod in talibus scepe li- mendum est. (Conink, de Sacram., dist. 10, dub. 8, n.° 73.)Todavia, circumstancias ha em que o confessor póde alargar

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a mão, e dar penitencias mais leves, principalmente quando 0 penitente tem grande horror a seus peccados. Em tal caso, segundo S. Thomaz (in 4, dist. IB , q. 1, a. 3), a penitencia póde diminuir em proporção: Quanto est major contritio, tanto magis diminuit de pana, et minoris pana fit debitor. Lembrae-vos do exemplo que se lô na Vida de S. Vicente Ferreira. Este santo impoz uma penitencia austera de tres annos a um grande peccador. Tocado de uma viva dor, este respondeu que era isto muito pouco. 0 santo a resumiu logo, de tres annos a tres dias. 0 penitente lhe pediu, lhe suppli- cou que a augmentasse, dizendo que com uma tão pequena penitencia temia não se salvar. 0 santo a diminuiu ainda e a reduziu a tres Padre-Nossos e tres Avè-Marias. No mesmo instante morreu o penitente por um excesso de contrição, e foi vista sua alma subir ao céo, sem passar pelo purgatorio. Mas para tirar toda a casta de escrupulo, seja aos penitentes, seja aos confessores, sobre a imposição e aceitação de peni­tencias mais ou menos leves, basta fazer uso das indulgên­cias. Tal é a doutrina de S. Thomaz: Quod indulgenlia va- lent, et quantum ad forum Bcciesiw, et quantum adjudicium Dei, ad remissionem pana residua post contritionem et con- fessionem. (Ib., in 3, dist. 20, q. 1, a. 3.) Assim todo o mundo convem que, em tempo de jubileu ou em uma occa- siào em que o penitente póde ganhar uma indulgência plena- ria, póde-se dar uma penitencia mais leve, que lica não ob­stante proporcionada, em razão dos merecimentos de nosso Senhor, appiicados á remissão de nossos peccados pelo the- souro da Igreja. E o motivo por que em todas as nossas mis­sões estabelecemos o santo exercicio da Via-Sacra, ao qual os Soberanos Pontifices tôem ligado as maiores indulgências. Por este meio sc facilita aos penitentes a expiação de seus peccados, e se dá aos confessores a faculdade de serem mais indulgentes na imposição da penitencia. Com cITeito, ha duas razões que fazem da Via-Sacra uma das mais preciosas penitencias que os confessores possam impor; a primeira, pelo valor das indulgências, que lira inteiramente o resto da pena que se devia soffrer no purgatorio; a segunda, pela lembrança da paixão de nosso Senhor, que é não sómente salisfactoria, como diz Blosius, pois que pensar devotamente na paixão, embora por tempo mui curto, é uma obra mais proveitosa c mais meritória do que jejuar a pão e agua, to­mar disciplinas até ao sangue e recitar todos os psalmos; mas que é lambem o preservativo mais poderoso contra as reinci­dências. Suppiico portanto a todos os confessores que se sir­vam de um tão grande thesouro, para enriquecerem seus pe­nitentes de graças e merecimentos, impondo-lhes a salutar

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penitencia de fazerem um certo numero de vezes a Kio-51»- cra. Depois d’isto, que não se atormentem para saberem se as outras penitencias são proporcionadas ou não: esta só serve por muitas obras. Terão igualmente cuidado dc não usar dc excessivo rigor, quando o penitente faz uma conlis­são geral de conselho, e sómente para sua maior utilidade; seja porque o penitente tem dc ordinário uma contricão mais viva; seja porque não sendo obrigado a confessar tod‘os estes peccados, não é o confessor obrigado a impor-lhe uma peni­tencia proporcionada á sua enormidade, pois que elles têera já sido confessados. Quanto ás penitencias condicionaes que SC costuma impor aos recidivos, como jejuar ou fazer esmolas em cada reincidência, alguem as approva, como Diana c ou­tros; mas sobre isto diiaâ observações são necessárias: a pri­meira, que ellas não sejam muito difliceis, de outra sorte não as fazem; ora. uma vez que o penitente falte a ellas, imagina ter violado a promessa dada ao confessor, desanima-se e principia a peccar sem reserva. A segunda é que ha peni­tentes que consideram csUis penitencias como uma contribui­ção; e comtanto que paguem a contribuição, fazendo sua es­mola, por exemplo, etc., continuam a peccar como antes.Assim, deve pôr-se n’isto muita reserva e circumspccção; e instruir bem o penitente sobre o modo dc fazer uso d’ellas.0 confessor terá ainda mais cuidado de evitar, quando im­põe aos penitentes esmolas ou fazer celebrar missas, de nunca as pedir para si, nem para sua igreja, nem para seu con­vento. Deve deixar tudo isto ao livre arbitrio do penitente, como 0 prescrevem muitos concilios. Termino instando-vos a que falleis muitas vezes em vossas conTerencias ordinarias sobre o modo dc vos conduzirdes com os penitentes, a lim de ter uma direcção uniforme, seja para impor as penitencias, ou para dar conselhos, ou para regular as outras cousas ne­cessárias ao alimento das almas, e estae certos que tirareis d’isto as maiores vantagens.

41Ü. (S. Carlos, pag. 37-62.)— Do que deixamos ditoRegrasque conclui que o confessor deve ser muito discreto, quando or- sc dcyem denar alguma satisfação, ou impozer alguma penitencia, a consultar, lim dc que não as imponha tão leves, que a força dos cânones lique desprezada, ou participe dos peccados de seus peniten­tes. Não deve tambem impol-as tão asperas ou tão longas, que os penitentes recusem executal-as, ou accitando-as não as cumpram inteiramente. E a razão por que o confessor deve saber os cânones penitenciaes, porque não obstante possam e devam as penitencias ser moderadas pela prudência e dis­crição, segundo a contrição que notar no penitente, a quali­dade e dilTerença das pessoas, e as outras circurastancias que

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se podem encontrar, é bom todavia que elle observe os câno­nes, que se conforme com elles, tanto quanto julgar que con­vem: e ainda que elle" não imponha a penitencia ordenada pelos antigos cânones, é necessário comtudo que advirta mui­tas vezes 0 penitente para o mover a uma maior contrição de seus peccados, e a cumprir com mais fervor uma menor pe­nitencia que lhe tiver ordenado, exhortando-o a aproveitar-se da benignidade de que o Igreja usa hoje com elle, modificando em seu favor a severidade de sua antiga disciplina. Faça tam­bém de modo que as satisfações sejam proporcionadas aos pec­cados commettidos, impondo, por exemplo, por penitencia dos peccados da carne, jejuns, vigilias, peregrinações, cilicios, e cousas semelhantes, que possam macerar e debilitar a carne. Pelos peccados de avareza, além das restituições a que os penitentes forem obrigados, ordenará esmolas conforme as commodidades de cada um. A soberba e outros peccados do espirito é bom que se imponham orações, pelas quaes a alma, humilhando-se na presença de Deus, obtenha a força e vigor necessário para lhes resistir. Deve impor por penitencia áquelles que tiverem sido negligentes em aprender as cousas que todos os christãos são obrigados o saber, que ouçam ser­mões, que vão ao menos no decurso de certo tempo ás esco­las de doutrina christã. Ordenará áquelles que são faltos de devoção, e não são fervorosos nas cousas que pertencem á salvação, que visitem muitas vezes as igrejas, que assistam aos oflicios divinos, que sejam assiduos no exercicio da ora­ção.

Continua- 416.— Deve particularmente impor asperas penitencias 5“ ° ’ aos blasphemadores, segundo a qualidade de seu crime, con­

formando-se com a disposição dos sagrados cânones, decre­tos dos Papas, do Concilio de Latrão, e outras constituições de nossos concilios provinciaes. 0 confessor todavia deve obrar com prudência, tendo em vista a qualidade das pessoas, de sorte que não deve obrigar os pobres a fazer esmolas, nem impor jejuns áquelles que ganham sua vida pelo proprio tra­balho, e guardar a mesma conducta na imposição das outras penitencias. Que se abstenha de absolver peccadores públi­cos e escandalosos, sem lhes impor uma sati.sfação pública, e uma penitencia proporcionada a seus crimes, a fim de que, emendando-se elles mesmos, satisfaçam tambem ao escandalo que tôem causado aos outros, era conformidade do Concilio de Trento (sessão 21, cap. viii), e ao que sobre esta matéria tem sido ordenado pelo primeiro e terceiro de nossos conci­lios provinciaes, e não commutem as satisfações, nem estas penitencias publicas em outras secretas, sem haverem nossa expressa permissão. E a fim de que o confessor seja mais li-

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vre para fazer o que deve para com o penitenle, e com isto mais auctorisaüo em todas as cousas que ordenar para sua salvação, deve não sómente arrcdar-sc de toda a qualidade de avareza, mas ainda evitar tudo o que póde dar a menor suspeita a tal respeito, e particularmente que não peça, mesmo com disfarce, dinheiro ou alguma outra qualquer cousa na conlissão, nem por occasião d'ella. Mas, pelo con­trario, que testemunhe tanto quanto podér, não sómente por suas palavras, porém muito mais por suas acções, que abo­mina semelhantes cousas. Quando por penitencia ordenar que mandem dizer missas, deve abster-se de as applicar di­recta ou indirectamente a si, á sua igreja ou a seu mosteiro. Guardará a mesma conducta quando for obrigado a ordenar satisfações por dividas incertas, por commutação de votos, ou por cousas semelhantes. Menos ainda sc deve encarregar de dinheiro ou de outra cousa para restituir, excepto sendo necessário para não descobrir o penitente; c, n’este caso, terá cuidado de haver um recibo d’aquelle a quem tiver feito a restituição, para o entregar ao penitente; e linalmente, conduzir-se-ha de modo que evite toda a sombra e toda a ap- parencia de avareza. É a razão por que se o parocho encon­trar algum de seus parochianos que seja evidentemente seu devedor, ainda que a respeito de dizimos, primicitts, ou cousa semelhante, o qual não tendo designio dc o satisfazer, e ao qual, por conseguinte, não póde em consciência dar a absol­vição, se apresenta comtudo a elle para a receber, antes de lh’a recusar n’esta occasião em que seu interesse particular é envolvido, deve envial-o a um outro confessor, no qual deve deixar o cuidado de obrar n'isto com o penitente, c como lhe dictar sua consciência.

417. (S. F ra n cisc o db Salles, n.» 629.) — 0 confessor Como se deve impor a penitencia cora palavras doces e consoladoras, principalmente (piando vô o peccador bem arrependido, e lhe |,itencia. deve sempre perguntar se elle a fará voluntariamente; por­que no caso que o veja mortiíicado, fará melhor dando-lhe umn outra mais facil; sendo muito melhor ordinariamente tratar os penitentes com amor c benignidade, sem comtudo os lisonjear em seus peccados, do que trntal-os asperamente; e todavia não sc deve esquecer de fazer conhecer ao peni­tente que, segundo a gravidade de seus peccados, mereceria uma maior penitencia, a fim de que elle faça o que se lhe im­põe mais humilde e devotamente. As penitencias não devem ser complicadas e misturadas de diversas especies de preces e orações, como por exemplo, que diga tres Padre-Nossos, um hymno, orações, collectas, antiphonas, psalmos; nem de­vem ser dadas em variedade de acção, como, por exemplo,

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dar tres dias esmola, jejuar tres sextas feiras, mandar dizer uma missa, discinlinar-se cinco vezes; porque resultam dous inconvenientes d esta multidão de acções e orações, um que 0 penitente se esquece d’ellas, e depois (ica escrupulo; o ou­tro, é que elle pensa mais no que tem a dizer ou a fazer, do que no que diz ou faz; e entretanto que vae procurando em sua memória o que deve fazer, ou nas suas horas o que deve dizer, sua devoção se esfria. E portanto melhor impor pre­ces todas da mesma especie, como tudo Padre Nossos, ou tudo psalmos que sejam seguidos, que não seja necessário procu­rar aqui e acolá uns depois dos outros; e mesmo será hom dar alguma destas cousas em penitencia, como ler tal ou tal livro, que se julgar proprio para ajudar o penitente, confes­sar-se todos os mezes no decurso de um anno, mettcr-se em uma confraria, e semelhantes acções, as quaes não servem sómente de punição pelos peccados passados, mas de preser­vativos contra os futuros. Entre as obrigações que deveis im­por, uma ha muito importante: é a conlissão geral.

Conselhos 418. (Sacerdote santificado, n.® 33.) — Deveis algumas P®''®. vezes obrigar o penitente a fazel-a, outras vezes sómente I „;!"aconselhal-a. Eu vos fallarei d’isto em o seguinte numero.

õconfcssorMas em qualidade de medico, deveis: 1.® Facilitar-lh’a, indi- dcvc algii- cando-lhe orniodo de se examinar e de se excitar á contrição: mas vczps 0 que era o n.® 31 vos deixo dito. 2.® Adverti-o de que impor. jgpore de sua conlissão geral os peccados commettidos depois

da ultima confissão particular, e que não tôem mesmo sido accusados, e de que os diga no principio ou no fim da con­fissão geral. A razão d’isto é que c muito util, para melhor appiicar os remedios, conhecer não sómente os males passa­dos, mas tambem o estado aclual c as doenças presentes de sua alma. 3.® Pelo que respeita aos ignorantes, lede os ex­cellentes conselhos, que vos dá o Padre Seigneri (cap. ii), apoiado sobre outros auctores. «Se o penitente, diz elle, por causa de sua pouca capacidade não tiver em suas confissões precedentes explicado o numero de seus peccados senão de um modo confuso, como fazem os ignorantes, não é necessá­rio por isto fazer-lh'as repetir com mais exaclidão; porque esles peccados, explicados assim confusamente, tôem sido directamente perdoados, e não c necessário descobril-os de novo.» Goraludo se o penilenle, ajudado por vós, conhecer actualmente seu numero cora mais exaclidão, deverá em tal caso descobril-os de novo. Mas ordinariamente isto não acon­tece a esta qualidade de pessoas, e em suas confissões, sejam ordinarias, sejam geraes necessárias, podeis, cora interroga­ções, obter em pouco tempo muito mais conhecimento sobre seus peccados, seu numero, suas circumstancias, do que elles

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mesmos poderiam dar-vos de um exame muito longo. Não vos aUlijaes pois se elles se vos apresentarem mal prepara­dos; se os despcdirdes, acontecerá muitas vezes perturba­rem-se e não tornarem a voltar. Assim, interrogae-os, e ordi­nariamente será isto com tal successo, que podeis absolvel-os n’esse mesmo dia, o que lhes será muito mais vantajoso e mais agradavel; sc não podeis fazel-o, serão para elles vossas interrogações um laço para que elles voltem no tempo que lhes houverdes prescripto. 4.® Mas quereis vós que as con­fissões geraes sejam verdadeiramente uteis áquelles que as fazem? não vos contenteis de os instruir e de os mover a pre­parar-se para ella com um cuidado particular, persuadi-os bem que agradeçam no decurso de alguns dias a Deus e a seu santo protector pelos soccorros recebidos, a lim de que este signal de gratidão lhes obtenha a perseverança. Será mesmo muito a proposito recommendar esta prática para as conlissões particulares, que sempre são uma acção dc grande importância, e que exige graças especiaes.

419. (B. LEONAnno, Tratado da confissão geral.) — Ser- l.mportan- vos-ha algumas vezes dillicil fazer comprehcnder a necessi- dade da conlissão geral. Gom elleito, para que, dirá certo ,.a|. 'penitente convidado por seu confessor nara que faça uma conlissão geral, para que inquietar minha consciência com estn confissão geral? Graças a Deus, nunca occultei cousa alguma; tenho sempre empregado cuidado para ter em cada conlissão uma verdadeira dor e um lirme proposito dc não reincidir. Até aqui tenho vivido na boa fé; assim, para que lançar-me em inquietação por uma conlissão geral? Se real­mente for assim, tendes razões mais que sullicientes para ter esta linguagem. Comtudo eu vos asseguro que ura missioná­rio muito experimentado costumava dizer: Tenbo em minha vida ouvido a conlissão geral de ura numero muito grande de pessoas, algumas das quaes me diziam no principio: Meu pa­dre, não é por necessidade que eu faço esta conlissão geral, é por devoção e por simples conselho. Mas depois estes mes­mos penitentes, auxiliados pelo bom padre a examinar bem suas consciências, e a rcflcctir sobre todos os desvarios de sua vida passada, diziam suspirando no lim de sua conlissão geral: Ohl quanto sou desgraçado! quanto me enganava quando dizia que nunca tinha occultado cousa alguma a meu confessor, que sempre tivera uma verdadeira contrição e um

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firme proposito! Não, eu não dizia a verdade: eu estava perdido se tivesse morrido antes d’esta confissão geral. Ahl eu por todo o ouro do mundo não quereria deixar de a ter feito.

Quereis saber o que tem logar em uma conlissão geral? 0 mesmo que acontece a um caçador que vae caçar a um bos- ciue muito cspe.sso, mas cheio de uma multidão de animaes. Vós 0 vereis algumas vezes voltar durante um dia inteiro a este bosque emmaranhado sem encontrar ao menos uma peça de caça; apenas pôde atirar uma ou duas vezes. Mas linal- mente se, enfastiado de suas estafas inúteis, se resolve a pôr 0 fogo aos quatro ângulos do bosque, e que, ajudado pelo vento, 0 incêndio se communica, vereis n’este instante saí­rem de todas as partes javalis, lobos, gamos e toda a especie de animaes; então, admirado de um tal espectáculo, direis: Vôde, vôde que multidão de feras se acoutavam n’este bos­que! Quem 0 teria acreditado? agora eu o vejo. para desco­brir a terra é mister pôr o fogo aos quatro ângulos. 0 mesmo tem logar na confissão geral. Quantas cousas se manifestam, cousas em que o penitente, sobretudo que vive era negligen­cia, não teria jámais pensado, c que o teriam lançado era terriveis inquietações no momento da morte! Eis aqui por­tanto 0 que produz a confissão geral: ella põe o fogo era to­dos os ângulos da consciência e a purifica perfeitamente. Vós me dizeis que tendes sempre estado na boa fé? Mas sabeis vós bem o que quer dizer estar na boa fé? Estar na boa fé é ter quanto ao passado empregado todas as diligencias neces­sárias para se confessar bem, não sómente accusando-se cora exactidão de todos seus peccados, mas tambem excitando em seu coração, tanto quanto a fraqueza humana o permitte, uma verdadeira dor e um firme proposito de se emendar, de tal sorte, que depois de ser ajudado da graça de Deus, recti- ficada sua conducta, se viva na paz da consciência, sem al­guma dúvida sobre a validade das confissões precedentes. Ora vós, que haveis principiado a sacudir o jugo do Senhor desde vossa infancia, que tendes manchado vossa juventude, que haveis tido a mesma conducta na idade madura, e que talvez continueis em vossa velhice a viver peior do que d’an- tes, sem jámais haver dado algum signal de emenda, podeis dizer que não tendes razão alguma de duvidar de vossas dis­posições, nem da validade de vossas confissões passadas? Póde suppor-se em vós esta boa fé? Mas com um motivo tão poderoso e tão legitimo de duvidar, como acreditar que amaes vossa alma, se não tomaes a resolução de reparar o mais breve possivel, por uma boa confissão geral, todas as confis­sões mais mal feitas umas do que as outras?

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420.— Todavia convem advertir que a confissão geral é Conflssão fioctüo a alguns, ulü a um grande numero, indispensável- ep™! "o- mente necessaria a outros. Nociva a alguns. Taes são certas pessoas escrupulosas e por outra parle tementes a Deus, que lêem já feito muitas confissões geraes e que sempre tornam de novo a alormeular-se, assim como a seu confessor. As pessoas d’esle caracter são pouco numerosas, é verdade, mas se alguma se apresentar ao confessor, deve recebel-as com caridade, e procurar adoçar-Ibe seus solTrimenlos, dando-lhe todas as consolações possiveis. Hegulae-vos sobre isto por vosso maior ou menor vagar e pelo concurso mais ou menos nuraetoso dc penitentes. Fazei-lhe bem comprehender que em matéria de escrupulo a desobediencia ao pae espiritual não é devoção, mas teima; que se ellas não submeltem seu proprio juizo, nunca na vida terão paz. Estas pessoas dão a entender que ellas se curariam de seu escrupulo, tornando a fazer uma conlissão geral, emquanlo que é este o mais se­guro meio de augmentar suas inquietações. Com elleito, a doença do escrupulo é semelhante a certas purgações de que os olhos são algumas vezes atócados: quanto mais se esfre­gam os olhos, mais se augmenta a purgação; da mesma sorte, quanto mais se bole em sua consciência repelindo as conlis­sões geraes, mais se augmenlam os escrupulos e as afllicções do espirito. Assim, lomae como regra nunca permiltir con­fissão geral áquelle que já a fez, que se emendou, que gosou da paz do espirito, e que cousa nenhuma particular constilue em má fé sobre suas conlissões passadas. Mas é um raetbodo excellente o exhorlar estes penitentes a fazerem uma revista desde sua ultima confissão geral, a fira de bem conhecer to­dos os escondrijos de sua consciência. Se n’esle caso quereis conceder alguma consolação a estas almas aUliclas, podeis permillir-lhes que digam o que lhes faz mais peso, impondo- lhes silencio sobre tudo o mais. Isto mesmo deve ser deixado á prudência do confessor esclarecido, que, nos casos particu­lares, saberá discernir se deve permiltir ou não o repelir al­guma cousa da vida passada. Era uma palavra, o melhor conselho que a todos estes penitentes se póde dar, é que fa­çam cora frequencia actos de contrição. Cora isto, muilo me­lhor do que com tantas accusaçõcs e exames, introduzirão o socego era sua alma. Incuti-lhes bem no espirito esta dou­trina de S. Thomaz, explicada por Santo Anlonino, a saber: que quando uma pessoa animada de um verdadeiro desejo de se reconciliar com Deus tem feilo o possivel para fazer uma boa conlissão, e empregado todos os meios para ter uma verdadeira contrição e tem julgado lel-a, em primeiro logar sua conlissão é isenta de falta; em segundo logar nenhuma

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obrigação ha de a repelir, basta renovar sua contrição para assegurar o valor d’ella. Assim, reiterando muitas vezes o acto de contrição, acontecerá fazel-o bem alguma vez, e isto basta, sem que seja necessário repelir peccados já submelli- dos ás chaves da Igreja. Tudo isto deve entender-se dos es­crupulosos verdadeiros e tementes a Deus, que, em suas con­fissões passadas, tôem obrado de boa fé; não dos escrupulosos falsos, embusteiros c bypocritas que associam a libertinagem ao escrupulo, que judàisam sobre minúcias e que bebem a iniqüidade como agua, prccipitando-sc sem modo nas mais graves desordens. Taes escrupulosos tôem necessidade de ser esclarecidos e bem convencidos da necessidade do temor de Deus, de uma verdadeira mudança de vida, c de uma boa conlissão geral que repare tantas conlissões mal feitas c de nenhum valor.

421.— A confissão geral é util a um grande numero. Não é possivel dizer todas as vantagens que uma boa confissão geral nos procura. Primeiramente, vantagens no decurso da vida; em segundo logar, vantagens muito maiores no artigo da morte. No decurso da vida, ella é para muitos o principio de uma vida santa, porque a experiencia comprova que de­pois de sua conlissão geral um grande numero persevera por muito tempo e se emenda de muitas cousas. 0 mesmo é d*aquelle que faz uma confissão geral como d'aquellc que se reveste com um hcllo vestido novo: por muito tempo tem um cuidado particular para não o sujar. Da mesma sorte a alma ornada com o vestido da graça de Deus, por meio da confis­são geral, toma precauções maiores para não cair no iodo do peccado. Quem poderia dizer o numero d’aquelles que, por uma boa confissão geral, tôem reformado sua vida sobre os principios do Evangelho, c tôem chegado a emcndar-se de certos vicios, aos quaes já quasi não conheciam remedio! As­sim, 0 primeiro conselho que se costuma dar áquelles que querem mudar de vida, é que se despojem do velho homem para se revestirem do novo. fazendo uma boa conlissão geral. A mesma conducta se observa para com aquelles que abra­çam 0 estado religioso ou ecciesiastico, ou mesmo que se prendem nos laços do niatrimonio; com outros tambem que, depois de haverem vivido muito tempo nos embaraços dos negocios, querem tornar a entrar em uma vida mais Iran- quilla, occupar-se de sua alma e dar-se inteiramente a Deus; porque não ha meio mais eíDcaz para esla renovação interior do que uma boa conlissão geral. A razão d’islo é que uma boa confissão geral inspira mais dor das faltas passadas e um maior desejo de uma vida melhor. Ver de um só lance de vista todos os seus peccados simultaneamente, produz sobre a

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alma um elTeito mui dilTereule do que considernl-os um a um. Espalhado por aqui e por alli um exercito de soldados, nenhum terror inspira, mas postos todos juntos em ordem de batalha, lançam ao longe o sobresalto. Tal é o motivo por que muitos santos lizeram muitas vezes em sua vida confis­sões geraes. Lô se na Historia do venerável Arcebispo de Va- lença, ü. João de Jlibera, cuja santidade faz a admiração de toda a llespanha, que lizera seis vezes sua conlissão geral;S. Carlos Borromeu fazia uma todos os annos. Ora, não era 0 escrupulo que movia estes santos a fazer conlissõcs geraes; n’isto nós dilTerimos de alguns: eram as grandes vantagens que tiravam dellas; um maior desprezo de si mesmos, uma contrição muito mais viva dc suas faltas passadas, uma de­terminação mais forte de passar uma vida mais perfeita. É por isto que entre outros elogios da conlissão geral, S. Fran­cisco de Salles diz, que ella nos inspira uma salutar confusão de nossa vida passada, e nos faz admirar os rasgos da mise­ricórdia de Deus, que nOs levam a amal-o para o fuluro com mais fervor. Ainda mais: Deus mesmo experimenta uma sa­tisfação particular da conlissão geral de uma alma penitente.Santa Margarida dc Cortona desejava que Deus a chamasse com 0 doce nome de lilha, cm vez d’aquclle de pobre rapa­riga, que até então lhe tinha dado. Deus lhe fez entender, que nunca lhe daria este doce nome sem que ella lizesse an­tes, com toda a exactidão possivel, uma confissão geral de todos os peccados de sua vida criminosa. A Santa a fez com muitas lagrimas. Então o Senhor lhe disse com uma doçura extrema: F ilia mea Margarila, remilluntur tibi omnia pec­cata tua. Margarida, minha lilha, em virtude da confissão geral que lize.stc, eu te perdôo todos os teus peccados. Ô preciosa conli.ssão geral! quem não sc resolverá a fazel-a com toda a exactidão possivel, a fim de se enriquecer com tantos bensi

422.— Em segundo logar a confissão geral é util para o ConUnua- futuro, quero dizer, no momento da morte. Quem não que- Ção. reria n’esta ultima hora ter feito uma confissão geral com al­gum cuidado! Oh! que consolação para ura moribundo haver curado todas as suas chagas 1 Mas se se espera para esta extremidade para fazel-a, como lisonjear-se de o conseguir?Prever o que deve acontecer, e precaucionar-sc antes que aconteça, tal 6 a perfeição da prudência christã. Nosso Se­nhor nos repete no Evangelho: Vigilate, esloteparati. {Mat.,XXIV, 42.) Notae bem; Elle não diz que abramos nossos olhos quando estivermos a ponto de os fechar para sempre; Elle não nos diz que nos preparemos para a morte quando uma longa enfermidade não nos permittir duvidar de sua apro-

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ximação. Não, não: Elle diz que vigiemos e nos preparemos de modo que a morte, seja qual for a sua liora, nos ache pre­viamente preparados. Tal é a maxima da verdadeira prudên­cia. 0 homem que a segue merece elle só o nome de sabio. No reino de Aragão, um fidalgo da côrte veio lançar-se aos pés de um missionário, n lhe disse: Meu padre, se o appro- vaes, quereria fazer uma conlissão geral. 0 padre lhe per­guntou que motivo tinha para dar esse passo. Ah! meu pa­dre, respondeu elle suspirando, não devo eu morrer? ora, depois de uma vida tão culpada, como poderia eu morrer tranquillo sem uma confissão geral? Se espero pelos últimos momentos, minha esposa, meus filhos, o môdo, a violência da enfermidade me tirarão a presença de espirito; que im­prudência seria a minha se adiasse o fnzel-a no meio de tan­tas difliculdades e embaraços! Assim approvae, eu vós rogo, que não perca tão bella occasião. Tal foi a linguagem d’este prudente fidalgo. Mas não sómedte as pessoas sensatas, al­gumas vezes mesmo as mais negligentes, quando se vêem cm face do morte pensam logo na confissão geral. Um bom religioso tendo ido visitar os presos, acbou um que devia ser executado no dia seguinte. Immediatamentc este infeliz pe­diu ao padre que ouvisse sua conlissão geral. Mas que mo­tivo tendes vós? lhe perguntou o religioso.— Ah! meu padre, lhe respondeu elle, é ámanhã que eu devo passar d’este mundo para o outro! e sc eu dou mal este passo decisivo, que será de mim? Não é justo que cu tome todas as precauções possiveis? Vós 0 vêdes, ninguém ha, mesmo os ladrões e as­sassinos, que não considerem como um grande bem a confis­são geral na hora da morte. E com elTeito, Jesus Christo, nosso Senhor, chama bemavcnturados áquelles que morrem bem preparados. Ora, a quem melhor se póde appiicar o texto do Evangelho, do que áquelles que morrem depois de ter feito uma boa confissão geral: Bea/i servi illi, quos cum venerit Dominus invenerit vigilantes? [Luc., xii, 37.) Elles deixam a vida com tanta consolação, tanta paz c resignação á vontade divina, que estes signaes evidentes de predestina­ção fazem ambicionar o morrer como elles! SolTrei pois que eu fira vosso coração, ensinando-vos um bom meio para aca­bar de resolver-vos: esta noite, indo deitar-vos, lomae em vossa cama a mesma posição que brevemente tereis no tu- mulo; fechae os olhos, estendei os pés, ponde as mãos sobre vosso peito, e depois pergunlae a vós mesmo: Que quereria eu ter feito no momento dc me achar n’este estódo? Se vos vier ao espirito que seria uma felicidade para vós o ler feilo uma conlissão geral, não a diíüraes por mais tempo. Não vos deixeis enganar pelo demonio. Vê elle que uma pessoa tem

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concebido o salutar desejo de fazer uma conlissão geral? im- medialamente lhe persuade que terá sempre tempo. Demo­rando, elle faz nascer embaraços, obstáculos, umas vezes é um negocio, outras vezes ura outro, até que chega uma doença mortal. A cabeça já não regula, o coração desfallece, e morre-se miseravelmente. Preveni-vos bem contra este ar­tificio diabolico. Estae certo que niugueni se arrepende já­mais de ter feito a tempo sua conlissão geral, emqnanto que um grande numero experimenta pezar de a ter dilicrido, por uma deplorável negligencia, até ao artigo da morte.

423.— A outros finalmente a conlissão geral é absoluta-Necessaria mente necessaria, quero dizer, que sua salvação eterna de­pende d'elln; mas quaes são elles? nós distinguimos sete clas­ses: 1.*, aquelles que por vergonha ou por outro motivo ma­liciosamente têem occultado a seu coufessor algum pcccado mortal, ou que julgavam, ou mesmo duvidavam ser mortal, sem jámais o terem declarado em suas confissões seguintes;2.*, aquelles que se confessam sem ter examinado sua con­sciência, aliás carregada de peccados mortaes, ou mesmo que põem em seu exame uma negligencia notável, expondo-se por isto a não fazerem uma confissão inteira; 3.‘ , aquelles que de proposito dividiram sua confissão, dizendo uma parte de seus peccados mortaes a ura coufessor, e outra parte a ou­tro, a fim de não fazer tudo conhecer ao mesmo; 4.*, aquel­les que se confessam sem dor, sem ter antes feito nem acto de contrição, nem acto de attrição, confessando-se por cos- ’ tume e por ceremonia, como se bastasse dizer todos os seus

r cados ao sacerdote, e que algumas vezes vão em busca confessores surdos, mudos, que não sabem abrir a bôca

mais do que para pronunciar as palavras da absolvição; 5.‘ , aquelles que se confessam sem um verdadeiro e firme propo­sito, que não se applicaiii jámais a emendar seus máus hábi­tos, que de proposito mudara de confessores, a lim de não mudarem de vida, e que querem viver e morrer em suas dis­posições criminosas; 6.*, aquelles que tôem vivido em uma occasião próxima de peccado que podiam e que jámais tôem querido deixar, e que, não obstante uma alleição tão crimi­nosa, tôem freqüentado a confissão; 7.‘ , aquelles que, sendo obrigados á restituição, não tôem querido fazel-a, bem que tenham possuido os meios, ou que, tendo odio contra seu pro­ximo, não tôem jámais querido perdoar, e apesar de tão más disposições não têem por isso deixado, no decurso de muitos annos, de se aproximar ao tribunal da penitencia. Todos estes penitentes se acham em necessidade absoluta de fazer uma confissão geral de Iodos os peccados mortaes coraractli- dos desde o momento em que com uma plena adverlencia co-

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alguma cousa em vossa confissão? — Não, meu padre, res­ponde 0 penitente. — Depois d’isto o despedem, dizendo que a conlissão geral não lhe é necessaria, como se a falta dc sin­ceridade fosse a unica razão que torne esta especie dc con­lissão indispensável. Maior mal ainda fazem estes outros con­fessores que não querem mesmo ouvir nomear a conlissão geral, que a desapprovam, que a criticam, que desviam d’ella 0 maior numero que podem, baptisando a com o nome de quebra cabeça dos confessores. Ô ministros do meu Deusl acaso não vêdes que damno immenso podeis fazer a estas po­bres almas que repellis com tanta indiscrição? Quantos pe­nitentes sc encontram, aos quaes um confessor pouco in- struido, ou ignorante, ou muito imprudente, bavia dito que a confissão geral não era necessaria, emquanto que ella lhes era por muitos tiUilos de uma indispensável necessidade! se tivessem morrido n’este estado, se teriam condemnado. Ora se esta alma, que tão indignamente repellis, vem a perder- se, que será de vós? Ao menos não desvieis da conlissão ge­ral duas classes dc pessoas; aquellas que nunca a fizeram, porque todos os mestres da vida espiritual concordam em aconselhar o uso d'ella ao menos uma vez na vida, e c com razão. Com elleito, como é muito possivel que por uma ne­gligencia culpavel se tenha caido cm alguma falta confessan­do-se mal, a confissão geral repara esta falta. Menos ainda se deve dissuadir da confissão geral aquelles que, tendo vi­vido em algum máu habito, têcm continuado a confessar-se dc tempos a tempos com pouca ou nenhuma emenda. Se­gundo 0 conselho de S. Carlos, não deveis sómente rccebel-os com caridade, mas tambem exhortal-os a reparar por uma confissão geral todas as suas conlissões particulares, altendido que ellas são muilo duvidosas, ou invalidas, ou sacrilcgas. Supposlo mesmo que ella não seja absolutamente necessaria, quantas vantagens não procura a conlissão geral, assim como acima deixamos dito? Não sois vós medico das almas? não é obrigação do medico fazer uso de tudo o que póde ser util a seu doente? Sendo assim, devemos portanto exclamar com Jesus Christo; F ilii hujus sceculi prudenliores filUs lucis in generatione sua sunt (').

(‘) Esla nota não tem por ílm impedir o.s confessores de ordena­rem confissões ■reracs, quando ha lof/arpara isto; a experiencia to­dos os dias ensina (|iianto ellas são jt/eis, c sul).scrcvemos plenamcnic aos molivos allegados a este respeito pelo bemavenlurado Leonardo dc l’orlo-Mauricio em o numero precedente. Tudo o (pic desejamos, 6 Iranquillisar a consciência do confessor e prcvenil-o contra um zelo que, não sendo segundo a sciencia, poderia tornar-se fatat ao peni­tente. .\ssim dizemos com S. I.igorio, que não sc devem obrigar os penitentes a repetir suas conlissões senao quando é moralmente certo

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Metliodo 424.— Agora que eu supponho os confessores e os neni- tentes igualmente persuadidos da necessidade e utilidade da

zer Dcin. gonfjjggo gepj,| ngo resta mais do que indicar ura curto me­thodo para pôr mão á obra: porque, fallando sem disfarce, aue montanhas de difficuldades não vos porá o demonio diante dos olhos, a lim de impedir um tão grande bem! A uns parece impossivel desenredar uma consciência, cuja con­fusão e inexlricaveis embaraços fazem o tormento de sua al­ma; outros sentem-se gelados só ao nome de conlissão geral. Pois bem, permitti que por vós eu ponha a mão á obra, e, com a graça de nosso Senhor, vereis brevemente desappare- cer todas estas montanhas. Neste negocio todas as dillicul- dades se reduzem a duas; fazer o exame, e dizer o numero dos peccados. Quanto ao exame, aquelle que leve uma vida muito uniforme tem mais facilidade para bem a desempe­nhar; em poucas palavras póde fazer uma confissão geral de muitos annos. Pelo contrario, aquelle cuja conducta não apresenta a mesma uniformidade encontrará na prática maio­res diíliculdades por duas razões: a primeira, é que lendo uma consciência embaraçada por tantos peccados commetti-

quc cilas lecm sido imiteis. uSedulo advcrteiuhim no7i esse cogendos paniileiites ad repeteiidas coiifessiones, ntsi mnraliler certo constet eas finssc invatidas. nt recte dicunl Croix, Gubal, Ilotzmann, Maz- zolta, Elbel cum Pillucio et communi (contra Antouium qut, inter riffidos auctores nosti-i temporis, infimum non habet locum). Ratio,

âe earum nullitate^non constat.- (Úl). IV, n. ãO').) 0 padre Seigneri não ó menos expresso: «Devo cvilar-sc, diz este sabio c piedoso mis­sionário, ser excessivamente curioso de indagar sobre as conlissões

't quoad oblif/ationem repctendi confcssiones recidivorum, de ■um valore sccpc dubüari pofcsl, lianc rcqulam op/ime tradit rrl l.y i, pag.dGõ, sic diceus; «Rijxenitens aliquandiuposlcon-

m dignos pcenilenlüe fructus fecil, hoc est strenue adversuamlaliones, et pcccandi occasioncs pugnaveril, confessa) il vaiidam fuisse confessionem. Scvus si pauto post ct M data pi-ima occasione, lapsus fueril.» Tunc entm, ego

„.nendationem, saltem per aíiquod tempus a peccato se abstincl, saltem aliquem conalum adhibet aiUe relapsnm; uiule, qui post suas confcssiones ut plurímum cito et sine aliqua resisletUia ilerum cecidit, cerle consendus est mdlum, vel ni- mis íenuem habuisse dolorem, vel proposifum. Aliter vero dicendum si per aliquod tempus perseveravcrit, vel ante casum aliguam saltem resistenliamprwsliterit. (Sanctus Liguorius, lib. VI, n.» o85.)

(Nota do traductor.)

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otaqo R03IJ anb ‘jossajnoo oo sopoi 60-|ai oia* ‘laABJioipB BJnp -nB3 Biiin 0103 ‘siodap qadud oa naA3J3sa B||a soinunb ‘apsp -luijona BI16 assoj |cnb aseoj ‘ojai| nas ma sopBinodB noqoB sbpeaaad soiuenO ‘OAaiqo c G||'a -oJAq owaa mn ap oisi BJBd as-jiAJ3s ap a ‘|BJaâ oBssqaoa Bns jazBj ap oBssimjad B jossajuõa nas u nipad b||3 'OJiaisoiu mn ma Bisiodisaad omoD BAuisa onl) uuinam essa jeiim; BJOAap as obõ ‘missy •ainamoAUOo osn oiii sapa.p jozbj BJBd oiuammjaDSjp óijbs -saoaõ oisj,p ma|B g •oRsnjnoo ma sajuaimad so mahinsuoa ‘luaâBssBd op oíip jas BuoAap anb o Bzaphiiu BAissaoxa raoa opoaAOJOsap o ‘saeiuaA so uioo sanijora sopBooad so opuipnnj •U03 ‘anb nq sDn8|B anbjod loBânuaajd ap as-jBsn OAop ‘soja -i| SOB oíDBnO 'osoiaojd oduiai mn aiaamijinra Jiransnoa b a ób5bjo3 0 judjssjp B sBudojd SBiJOssaooB sBjonBisranojjD SBp 0 S013BJ sop niJÕisiq B ‘sapBpiiiino! sb SBpoj aBaojoo ‘‘ojara -nn OB a opadsa B oiOBnb ‘Jazjp ojanb ‘apBpquBnb b a apap -lIBnb B oiiiBnf) -oBãBsnooB up saBdpuud soiõod so aioauiçs opuB3JBUi ‘ouinsoj raa soBAajosa b anb oiuBiraoo ‘osssynoo BSSOA soBAOJOsa onb OAOJddBsap oeo ng -Bisodsaj Bqojra mbB sm ‘0)61 ojqos oqiasnoo sjpad am ag ^cpiopsnoo ap aiÕBxa 0 JOZBJ luati op opoiú 0 ainsua onb ojai| iunS|B ap soa-jiajos 0)m)U! oisa.n smpod ^OESsijnoD bssoa JOAajoso siOAap bjoSv •sòpB33ad sossÕa so sopoi JBoqdxa ap a JBpjooaj ap opora 0 sjajoqoB ‘siajooaqnooaj aip.n zoaibi anb ‘o)bj)8j ossoa raog -oiapora o jajup soa ainaiuaAOjq anb ap ‘ainaiioad o a jossajuoo 0 ajjna o8o|Bip o a ajuaipodxa ojjno o JÍnnnSjad SOA a||3 onb sesnoo sb õjqos soA-JBoqdxa a japnodsaj 8)nam -aiuamaAuoo soussod anb opom ap JBUiranxa soa ap opapino BiAupoi opuox •poBj a OABiis BJas SOA òpni OJJ0D30S nas raoo ahb sjOJBqoB :an8ojjaiu! o opiifB soa anb aqi-jpad ‘soçra SBns uio soA-opnBSojina ‘sradap íapnpooq b Epõapnjd b aiunf anb J0SS3JU03 ran ap Bqjoosa jozbj 9 ojjoraiJd 0 •saioajpadxa snop soA-oi|uodojd soq|03sa snop saisa jeiiao bjbj -sBJABiBd azjoinnb raa jazjp raBuopod anb sopBoood ozjoiBiib JBsnooB BJBd sBuoisjq azjoiBiib sazoA sBiun8|B bjbj raanSiB ‘raissy *sBi3nBisran3Ji3 a saiaadsa sbiis Jiraudxa BJod saiuamaÃnoa a sõijdojd sodijoi z3A|bi luaqBs oBu ‘sopB33od snas ap oiBp -J038J as anb upipara b anb a sapupinoiDip ap ajnoj BJjno y BJSaj raas a 'raapjo raas ‘ainaraBsnjuoo soiuaiuBiuodo snas

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de horror com igual relação. «Minha (ilha, haveis na verdade commellido todos estes peccados?— Deus mc livre, meu pa­dre: escrevi-os, porque os achei cm meu livro.* Quanto a vós, se quereis eu vos indicarei um livro que não engana, é 0 livro da consciência. Lôde-o, n’elle encontrareis fielmente todos os vossos peccados, auxiliado principalmente, como ha­vemos dito, pelas interrogações de um hom confessor. 0 que digo sc dirige principalmente ás pessoas pouco esclarecidas que, sc não são interrogadas, não sahcm abrira boca. Os confessores devem lembrar-se, que por esla razão as pessoas simplices são obrigadas a menos do que as outras, c que suas conlissõcs geraes podem aviar-se mais depressa. Não somos obrigados a interrogal-as senão em proporção de sua capaci­dade, para supprir o exame que ellas deveriam fazer. Isto quer dizer que ainda que pouco sejam auxiliadas, é o bas­tante para satisfazer á obrigação c mandal-as tranquillas.

Dúvida 423.— Não resta mais do que esclarecer uma dúvida a a respeito respeito do exame. Deve-se permiltil-o sobre os peccados do exame, deshoneslos, altendendo que esla matéria é perigosa, e facil­

mente sc póde deleitar examinando-se ou confessando-se? Mas, se esla dúvida fosse bem fundada, não se deveriam exa­minar sobre estes peccados, nem confessar-se d’clles nas con­fissões ordinarias, altendendo que o perigo seria igual, e mesmo maior, por causa da lembrança mais recente do pra­zer prohibido. Longe que seja assim, penso pelo contrario que a maior parte dos peccadores sepultados n este atoleiro, estão em necessidade de fazer uma confissão geral. Quem são com elTeito aquelles que ordinariamente occultam pecca­dos por vergonha, que dividem a confissão, ou que se confes­sam sem dor e sem firme proposito, reincidindo algumas ve­zes no mesmo dia da confissão, não são os peccadores d’esle caracter? Se em algum livro se acha a opinião contraria, deve cnlender-se d’aquelles que, lendo feito cm outro tempo a conlissão geral, se emendaram c vivem chrislãmenle em seu estado. Mas como é necessário confessar uma vez estes pec­cados nas confissões ordinarias, é muito ulil, supposto mesmo não lenha alguma das necessidades acima mencionadas, que os confesse uma vez na confissão geral para maior segurança de sua consciência. Todavia o confessor terá precaução de não perguntar, e o penitente de não dizer mais do que o pu­ramente necessário, quero dizer, o numero e a especie dos peccados, sem muito se explanar e sem entrar cm certas par­ticularidades obscenas que de si mesmas se entendem. A imitação d’aquelles que vão a logares infeccionados, e que tôem na mão um pouco de almiscar, terão cuidado dc ter prompta alguma piedosa consideração para dissipar as ima-

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gens que semelhantes narrações fazem nascer, que, era uma palavra, feitas por modo de accusação, causam antes horror e confusão, do que deleilações criminosas. Um outro conse­lho, é desenvolver primeiramente nas confissões geraes esta matéria do sexto preceito, e passar depois aos outros man­damentos. Assim, não approvo o raethodo dos confessores que, para hem fazer a confissão geral, querem que os peni­tentes voltem sohre as épocas da vida, notando em separado os peccados da infancia, da adolescência, da idade madura e da velhice. É verdade que se deve examinar sobre todas as idades; mas como ha certos peccados que sempre tòera com- mettido em razão do máu habito, seguindo este methodo se deveria muitas vezes dizer o mesmo peccado, c isto sem ne­cessidade alguma, porque a diversidade das idades não muda a especie. Outros fazem ainda peior: assignam dilTerentcs dias para fazer a confissão geral, um para confessar os pecca­dos commettidos antes do casamento, outro para aquelles com- mettidos depois; ou se um penitente commetteu vinte pec­cados da mesma especie, lh’os fazem dizer um a um, fazen­do-lhe explicar todas as circumstancias pouco ou nada impor­tantes. D aqui vem no povo este falso temor que faz consi­derar a confissão geral como uma empreza diíliciliraa. É as­sim que a pouca habilidade do confessor torna penoso e duro 0 jugo 0 mais suave e mais leve, o jugo de Jesus Christo.Mas todas estas dilEculdades se desvanecem á vista do dia­logo que vae seguir-se, onde damos ao confessor noviço e ao penitente um methodo facil para fazer amavel a confissão ge­ral. Finalmente, exhorto-vos a não vos examinardes sobre os peccados veniaes, que é muito prudente confessar exacta- mente nas confissões ordinarias; mas se quercis fazer d’elles um exame minucioso para os accusar na confissão geral, será para vós um embaraço inutil e talvez um laço do demonio, que quereria por isto tornar-vos a confissão mais fastidiosa e mais penosa. Como elles não são a matéria necessaria, basta ter delles uma contrição universal e accusal-os era geral no fira da confissão. Estae certos, que por este meio, como o en­sina S. Thomaz (in 4, d. 21, q. 1, art. 1), vos serão todos perdoados.

426.— A maior difliculdade da confissão geral é a accusa- Accusação ção do numero dos peccados. Eis aqui uma regra muito clara, do numero que tirará todo o embaraço. Se sabeis o numero certo de vossos peccados, deveis dizel-o como certo. A isto faltara muitos penitentes, que, interrogados pelo confessor quantas vezes léem commcttido o mesmo peccado, respondem quatro ou cinco vezes, estando certos de o haverem commettido cinco vezes; não é isto confessar-se bem: deve-se dizer

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cinco vezes, não de um modo duvidoso, mas absoluto. Se não souberdes o numero preciso, procurae ao menos dizer um numero provável, e aproximar-vos á verdade o mais que podérdes. Dizei, por exemplo: Coramelti este peccado dez ou doze vezes pouco mais ou menos, vinte ou vinte e cinco ve­zes pouco mais ou menos; porque com o pouco mais ou me- nos se explica siiincientcmenle, e uão se expõe a mentir. Mas não se podendo achar este numero provável sem errar consideravelmente, que se deve fazer? Deve-se eyrlicar a duração e frequencia de tal peccado. Por exemplo: Tinha eu quinze annos, quando um desgraçado companheiro, peior do que 0 demonio, rae ensinou a commetter taes iniquidades, e continuei a commettcl-as até á idade de trinta annos duas ou tres vezes na semana, c com intervallos uma vez sómente; ou­tras vezes passava uma semana inteira sem cair n’elle. Na idade de vinte annos formei uma ma ligação, e tive-a até aos vinte e cinco; ordinariamente caía no peccado uma vez por semana, algumas vezes todos os quinze dias, passei mesmo um mez sem o commetter; mas, meu padre, basta accusar-me d’este modo?— E por que não? Praza a Deus que todos se accusassem assim! — Oh! seja Deus louvado! já me não pa­rece tão didicil.-Não vos dizia eu que havia de aplanar es­tas montanhas? Não se devem portanto admirar de ouvir di­zer que algumas vezes nós, os missionários, no espaço de meia hora.e mesmo menos, terminamos uma confissão geral, principalmente quando se trata de pessoas siraplices. Eis aqui 0 methodo caritativo que seguimos: basta que a pessoa saiba responder: «m, meu padre; não, meu padre; porque nós as interrogamos sobre todas as especies de peccados, que nos simplices se reduzem a ura pequeno numero. Por isto, conhe­cendo 0 numero provável, ou a duração e frequencia, se des­enredo facilmente todo este cháos de peccados. Eu acrescen­to, mesmo para vossa consolação, que na confissão geral esta distincção numérica de peccados não exige tão grande minu- ciosidade da parle dos penitentes, como na confissão ordiná­ria, em razão muitas vezes da impossibilidade moral: porque a bondade de Deus nada exige que seja superior ás nossas forças, e quando um pobre penitente se acha embaraçado, não é prudente fazer-lhe violência por isto. Se perguntardes a um velho, que toda a sua vida foi habituado a pensamentos deshonestos, quantas vezes consentiu, elle não poderá res-

Sonder-vos: elle dirá precisamente o que vós lhe perguntar- es. Pergunlac-lhe vós se mentiu mil vezes? elle vos respon­

derá mil vezes; se disserdes dez mil, elle dirá dez mil vezes; porque elle não sabe o que ha de dizer-vos. N’este caso, que se deve fazer? Quando não se póde obter o numero certo,

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nem o numero provável, nem mesmo a freqiiencia, digo que é baslanle conhecer o máu habito, c saber quantos annos elle durou. Por isto comprehenderá o confessor, o melhor possi- vel, 0 estado do penitente, entendendo por máu habito o que se costuma entender em igual matéria, comtanto que o nu­mero maior ou menor das quédas não tenha conseqiiencia como no furto, porque em tal caso seria mister pôr mais c\a- ctidão. Mas nos outros casos, supposta a ignorancia ou o embaraço do penitente, basta que o confessor tenha um co­nhecimento aproximado do numero. Eu digo mais, se prevê que, interrogando-o mais sobre o numero, o porá em maior embaraço, pôde passar além, conjecturando comsigo mesmo um numero aproximado, sem ter mais tempo este infeliz na tortura, attendido, como diz S. Thomaz, que in confessione non exigitur ab homine plusquam possit. (In i , q. 17, q. 3, a. 4.)

427.— Eis aqui pois tudo o que diz respeito á conlissão ge- Preciosas ral esclarecida. Agora qual de nós se não esforçará para cx-vantagens citar em seu coração a contrição do penitente? Ezechias, di- zendo a Deus com lagrimas e suspiros: RecogUabo tibi omnes amos meos in amaritudine animcB mew. {Isa., xxxviii.) Ahl auanto era sincera a contrição de Ezechias! Segundo a nota de S. Bernardo, apenas pronunciou esta conlissão derra­mando grande abundancia de lagrimas. Deus, para mostrar quanto estava tocado de uma tal contrição, lhe prolongou a vida por quinze annos, a fim de que elle a passasse em uma dor continuada de o haver offendido. É por isto que quasi to­dos os santos lançaram por primeiro fundamento de sua san­tidade uma confissão geral de todas as suas faltas. Santo Ignacio de Loyola, em seu livro de ouro dos Exercidos espi- riluaes, cxhoría todos aquelles que querem converter-se per­feitamente para Deus a que principiem fazendo uma confissão geral de todos os seus peccados. S. Vicente de Paulo, funda­dor da venerável Congregação dos missionários, tendo ouvido uma conlissão geral, segundo se diz em sua Vida, tomou d’aqui motivo para fazer suas primeiras missões, e de fundar depois sua santa congregação, na qual se faz uma profissão expressa de ouvir as confissões geraes das pessoas mais ignorantes e cuja consciência é mais enredada. Com elTeito, vêem-se esles excellentes operários prestar seus cuidados a todos com uma paciência infatigável, e com um fructo admi­rável de tantas almas que confessam ingenuamente, que se não houvessem feito uma conlissão geral, se teriam con- demnado. E não se creia que isto é uma invenção moderna.A conlissão geral já estava em uso entre os santos monges e padres do deserto, como nol-o prova um exemplo de que

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S. João Climaco diz haver sido testemunha ocular. Escreve elle, que um grande peccndor se apresentou em um mosteiro para se fazer monge. 0 ahbade, que era um homem de emi­nente virtude, quiz subraettel-o a uma pesada prova: elle o obrigou a fazer a confissão de todos os peccados de sua vida. Este mancebo, cheio de fervor, não hesitou, escreveu logo todas as suas faltas, e as leu na presença de toda a communi- dade. Isto se passou com tantas lagrimas e suspiros, que es­tes bons religiosos não duvidaram mais que sua vocação vi­nha de Deus. Mas o que vem a proposilo á nossa matéria, é que á medida que o mancebo ha seus peccados, um ancião viu um anjo que os riscava da lista que elle tinha na mão. Vôde agora se S. João Ghrysostomo não tem razão em cha­mar á confissão geral um segundo baptismo, que purifica nossa alma de todas as faltas passadas, c nos faz recuperar o tempo perdido pela desordem de nossa vida passada. (In cap. 5, Ep. ad Cor., c. v.) Redimenles tempus, quoniam dies mali sunt, diz S. Paulo. (Epli., v, 16.) Mas como se póde recupe­rar 0 tempo perdido? Pela confissão geral, responde S. Ber­nardo. Com elTeito, que faz então o penitente? Repara o tempo passado por um serio exame de suas faltas, reforça o presente por uma verdadeira contrição, e assegura o futuro por um firme proposilo: Tempus in ir ia dioidilnr, in pr(s- sens, prateriíum et fulurum, horum, mllum perdil qui recte patnilenliam agil. {Sentim. de trip. slal. animae.) Em uma pa­lavra, aquelle que faz uma boa confissão geral chega de al­guma sorte ao estado feliz da innocencia baptismal, e sua alma se torna bella e candida aos olhos de Deus. É o que o exemplo referido por Cesario prova. Um joven estudante de Paris, extremamente desmoralisado, de repente tocado da graça de Deus, foi lançar-se aos pós de um religioso da or­dem de Cister, para fazer sua confissão geral. Suas lagrimas eram tão abundantes, que apenas podia proferir uma palavra. Este bom padre lhe aconselhou que escreve.sse todos os seus peccados, o que elle fez. Trouxe-lhe a lista delles. Lendo-a, 0 confessor achou nelia crimes Uio enormes, e casos tão ex­traordinários, que, não ousando decidir cousa alguma por si mesmo, pediu ao penitente permissão de a coramunicar a seu abbade, a fim de receber seus conselhos; elle os obteve facil­mente. 0 abbade, tomando este papel paro o ler, o achou todo branco, não restavam n’elle mais do que alguns traços semelhantes áquelles que se lançariam para riscar palavras. Que quereis vós que eu leia n’este papel? disse o abbade; nada n’elle está escripto. 0 confessor que acabava de o ler, eslava fóra de si com admiração. Chama o mancebo para lhe perguntar se era este o papel, no qual havia escripto sua con-

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fissão geral. Sem duvida, lhe respondeu elle. Oh! quanto sois feliz! lhe diz o confessor; Deus, por um milagre eviden­te, riscou d'esle papel todos os vossos peccados, para vos si­gnificar que da mesma sorte os riscou do livro de sua justiça, e a alvura d’estc papel denota a alvura de vossa alma, que se tornou hella e pura aos olhos de Deus, pela grande contrição que sua misericórdia vos deu. Todavia confessae vossos pcc- cados taes como vos lembram, a fim de receber a absolvição sacramental. Depois de a ter recebido, o pobre penitente se prostrou em terra, derramou uma torrente de lagrimas, re- solveu-se a mudar inteiramente de vida para dar satisfação ao mundo, que havia escandalisado pela enormidade de suas faltas, ó santa confissão geral, que produzes tão bellos elTei- tos em nossa alma! Ella revalida as confissões precedentes feitas sem as disposições necessárias: ella excita a alma com mais eflicacia á contrição de suas faltas; ella dcsarreiga do coração todos os vicios e todas as afleições criminosas; ella determina a divina misericórdia a conceder-nos um perdão geral de todas as nossas iniquidades; finalmente, ella consola 0 pobre penitente, e, fazendo-o puro como ao sair da fonte baptismal, o dispõe para receber novas graças e novos favo­res n’esta vida e a gloria eterna na outra. Pese cada um es­tas preciosas vantagens da coufissão geral, e depois que se descuide 'de fazel-a, se tem coragem para isto. Aquelle que receia encontrar diíliculdades na prática, lance uma rapida vista sobre o dialogo seguinte, e todos os seus receios se des­vanecerão.

DIALOGO ENTRE 0 CONFESSOR E 0 PENITENTE

Ambos assistidos pelo dircctor, que suggcrc ao confessor o modo de interrogar, c ao penitente o modo de responder para facilitar a con­fissão geral.

428. — Eis aqui reduzida á prática a maneira de fazer a Dialogoconfissão geral. Para dissipar as falsas apprehensões que o cnirepovo costuma formar de uma empreza tão santa, e para faci- " ^litar seu uso fazendo-a ver tal qual ella é, quero dizer, suave penitente, e araavel, dou ao publico o seguinte dialogo. Servirá ao pe­nitente como de espelho, onde poderá ver toda a deformidade de sua consciência, a fim de que por este modelo e reflexões prudentes que elle contém, possa facilmente examinar-se e fazer exactamente sua confissão geral. Aprenderá o modo prático de responder e de se explicar com o confessor, e, o que é muito mais importante, o modo de produzir os açtos necessários para receber dignamente a absolvição. Servirá

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aos confessores principiantes para aprenderem o modo de in­terrogar os penitentes e a ordem que devem seguir para fa­zer breve e facilmente a conlissão geral; porque nós resumi­mos aqui todos os conselhos que havemos dado em nossas instrucções precedentes. É certo que o melhor meio de aprender a prégar é ouvir um bom prégador, que falia do alto do púlpito; mas para aprender a confessar não c possi- vel applicar o ouvido para ouvir o que diz o confessor no si­lencio do tribunal e debaixo do mais inviolável sigillo. Ora, é para dar uma idéa do que se passa entre o confessor c o penitente que se (iguram aqui como se um e outro estives­sem mesmo no acto da conlissão. Esta conlissão ideal in­struirá os penitentes a confessarem-se bem, e os jovens con­fessores a dirigirem utilmente seus penitentes, c a facilitar- lhes 0 uso da conlissão geral; comtanto que se observem as regras da prudência, e que o que se dá aqui por exemplo não se tome por uma regra lixa que se deva rigorosamente observar com toda a classe de pessoas. Porque, nos casos particulares, o confessor deve umas vezes restringir, outras vezes angmentar o numero das interrogações, variando-as segundo a necessidade especial do penitente que se confessa. Expõe-se cm primeiro logar o que respeita ao sexto preceito, porque uma vez saido o penitente d’este atoleiro, caminha mais livremente e de nada se aterra. Por justos fnotivos as perguntas e respostas sobre esta matéria perigosa são expos­tas em latim: é para não prejudicar as almas simplices e in- Docentes. A letra D indica quando falia o director; a letra C, quando é o confessor; o principio das respostas do peni­tente é marcado com a letra P . Agora, qual seja a utilidade que do presente dialogo se póde tirar, deixamos ao juizo dos penitentes e confessores que o experimentarem.

J i . A primeira regra que vos dou para ouvir com fructo as conlissõcs geraes, é tratar vosso penitente como quererieis que vos tratassem, se vos achasseis em seu miserável estado. Acariciae-o com um rosto risonho, com uma doçura cheia de caridade; mostrae-lhe um bom coração, a lim de que elle te­nha conliança em vós e vos descubra todo o seu interior. Abstende-vos de certas expressões rústicas e incivis, dictadas por um zelo amorgoso, que são muito mais próprias para ir­ritar e exasperar o penitente, do que a tornal-o docil, obe­diente, e contrito. Quando mesmo elle fosse grosseiro, ta­pado, ignorante, e algumas vezes rebelde ás vossas exhorta- ções e mesmo obstinado a não querer cumprir seus deveres, não deveis nem reprehendel-o duramente, nem aterral-o por uma severidade excessiva. Lembrae-vos que no confessioná­rio deveis ser um martyr de paciência, procurando sempre

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auxiliar vosso penitente por maneiras doces e honestas e por uma conducta que propenda mais para a benignidade do que para a severidade. Persuadindo-o suavemente pela força de vossas razões, fazei penetrar no intimo de sua alma as santas maximas da fé, e o vereis humilhado e convencido; em uma palavra, tratae-o como quererieis ser tratado. Iiiterrogae-o depois sobre os peccados commettidos desde a ultima confis­são, a fim de conhecer desde o principio em quo estado se acha sua alma. No caso de se achar em uma occasião pró­xima de peccado, ou sujeito a alguns máu habito, sem ter a firme resolução de se emendar, c sem mostrar algum signal de compunção, não devereis, em conformidade ás regras acima expostas, dar-vos ao trabalho de ouvir sua confissão geral (>), seria uma fadiga inutil; porque a confissão geral não se faz sómente para remediar o passado, mas tambem para começar uma verdadeira mudança de vida. Ora tirae ao penitente esta verdadeira disposição, e toda a obra carece de alicerce. Sc o penitente se acha disposto, perguniae-lhe primeiramente qual é sua idade, seu estado, sua profissão. Começae pelo sexto preceito. Interrogae-o primeiramente sobre os peccados commettidos na infancia, e depois sobre os pensamentos, palavras, acções obscenas, mas por degráus segundo o accesso que por suas respostas elle vos der e que eu mesmo vos suggerirei. E vós, penitente, deveis vir aos pés de vosso confessor com um espirito de obediencia e uma lirme resolução de lhe abrir inteiramente vosso coração, fa­zer vossa confissão geral corr.o se ella houvesse de ser a ul­tima, e se devesseis brevemente apparecer no tribunal de Deus; mas especialmente com a resolução inabalavel de mu­dar verdadeiramente de vida. Não vos entretenhaes com in­úteis narrações. Se mesmo tiverdes escripto vossos peccados, mas sem ordem e com historias cstrauhas, e que cm sua. pru­dência vosso confessor julgue que é melhor pôr de jfarte vosso escripto, e seguir o methodo seguinte, ajudado de suas interrogações, obedecei: vós não podeis enganar-vos. Lendo uma exposição tão enredada, não farieis mais do que au- gmentar vosso embaraço. Finalmente, eis aqui vossa regra : calae-vos quando o confessor fallar, e fallae quando elle vos

(') Parecc-nos que esta regra pódc e deve soITrcr cxccpçõcs. Com cfl'cíto, ó possível ([uc no decurso da conlissão, à vista de suas Tallas e pelos consellios do contessor, conceba o penitente os sentimentos c‘ ......... ■ •■■■'■a. Por outra parte, liojc

s, despedil-o sem o ou-.0 voltar?

(Nola do Iraductor fraucez.)

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inlerrogar; segui a ordem que vos será traçada, e que vou indicar-vos.

C. Viesles pois para fazer vossa confissão geral? Eu me re- gosijo, estae certo que ella vos servirá como de um segundo baptismo. Tomae animo; não tcnhaes inquietação, confiae em mim, eu vos ajudarei quanto for po.ssivel: espero que se­reis consolado. Ora dizei-me: já haveis feito alguma confis­são geral?

P. Não, meu padre, e não posso viver tranquillo, se me não descarrego d’esta pesada carga de tantos peccados, que me pesa sobre o coração.

C. Sois casado ou livre? que idade tendes? que profissão é a vossa? a fim de que eu possa ajudar-vos com interroga­ções convenientes a vosso estado.

P. Sou casado e tenho trinta e seis ou trinta e sete annos; tenho exercido diversas profissões, como conhecereis pela continuação de minha conlissão.

C. Quanto tempo ha que vos não haveis confessado?P. Pouco mais ou menos dous mezes.C. Haveis cumprido a penitencia?P. Faltei a ella, meu padre, omittindo alguns rosários e

alguns jejuns. Não é sómcnte n'esta confissão, mas tambem nas outras que eu tenho omittido as penitencias que meus confessores me haviam imposto.

C. Eu deveria despedir-vos para cumprirdes primeira­mente vossa penitencia, mas como não poderieis fazel-o em pouco tempo, e supponho que fazendo vossa confissão geral estacs resolvido a satisfazer todas as faltas de vossa vida pas­sada, nós tudo remediaremos dizendo-me no fim da confissão 0 numero aproximado de vossas confissões mal feitas e peni­tencias omittidas. Comcçac dizendo os peccados commettidos desde a ultima confissão, a fim de que eu possa acluar-me do estado de vossa alma.

D. Depois d’estas interrogações, que ordinariamente de­vem ser feitas a todos os penitentes, e que servem como de preâmbulo a toda a confissão, deve o confessor certificar-se se 0 penitente faz a confissão geral por necessidade ou só- mente por conselho. No primeiro caso deve pôr maior exa- ctidão no exame, e maior attcnção nas interrogações. No se­gundo caso não ha necessidade de tanto cuidado, porque não sendo obrigado o penitente a confessar de novo todos os seus peccados já legitimamente submettidos ao poder das chaves, não é igualmente obrigado o confessor a interrogal-o com tanta miudeza, e póde passar mais ligeiramente. Vossa pri­meira interrogação terá por objecto saber se elle occultou por vergonha algum peccado em suas confissões precedentes, ou

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se haverá algum dos casos indicados nas instrucções preceden­tes que torne necessaria a confissão, a fim de proceder com or­dem ás outras interrogações. Alguem principia interrogando sobre o conhecimento das verdades da fé, particularmente dos mysterios que é necessário saber necessUate medii. Mas a ex- periencia me desenganou que estas interrogações feitas a prin­cipio esfriam muito o penitente, e que no fim da conlissão, quando elle está descarregado do peso enorme de suas faltas, sujeita-se mais facilmente a aprender tudo com mais atlen- ção. Assim eu vos aconselho, todas as vezes que não tiverdes dúvida alguma sobre a docilidade do penitente em sujeitar-se a tudo 0 que lhe ordenardes, que deixeis esta matéria para o fim, e estae certo que este methodo vos dará muito melhor resultado. E vós, penitente, sede sincero na accusação de vossas faltas: uma só circumstancia das que mudam a espe- cie, que vós caleis ou pailieis, basta para arruinar completa­mente a obra de vossa conlissão. Abri portanto vosso cora­ção ao confessor, e dizei vossos peccados com uma simplici­dade e candura filial: absolutamente como um amigo costuma manifestar a outro amigo liei e do coração os segredos de seus mais importantes negocios, porque espera d’elle toda a especie de conselho e apoio. Se souberdes o numero certo de vossos peccados, dizei-o como certo; não espereis que de alguma vez o confessor vos pergunte: Quantas vezes liaveis commettido este peccado? quantas vezes este outro? Se não souberdes o numero certo, dizei um numero provável, tantas vezes pouco mais ou menos, ou em ultimo recurso o tempo e a frequencia de vossas quédas. Se a confusão de vossas idéas não vos permiltir mesmo dizer isto, dizei que haveis tido este máu habito durante tantos annos, e que haveis succumbido a elle um grande numero de vezes, a lim de que o confessor conheça o melhor possivel o estado de vossa consciência, se­gundo 0 que acima deixamos dito.

C. Dizei-me, haveis occultado algum peccado mortal por vergonha ou por temor? ou por outra, na dúvida se elle era mortal, o haveis occultado a vosso confessor?

P. Sim, meu padre. Eis aqui o espinho que em cada con­fissão sempre me picou no coração, e é isto o que me faz crer que todas as minhas confissões foram invalidas ou sacrí­legas; tanto mais que eu nunca tive nem dor, nem firme pro- posito; porque não me esforçava por me emendar de meus máus hábitos, e permanecendo na occasião próxima freqüen­tava os sacramentos; de sorte que conheço ha muitos annos que esta confissão geral é para mim absolutamente necessá­ria.

C. Pois bem, deixae-me dirigir-vos; e para remontar á

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origem, lembra-vos, quando Unheis seis ou sete annos, haver commellido alguma acção deshonesla?

P. Sim, meu padre, e muitas vezes; e é precisamente este 0 pcccado que nunca confessei. Oh! quanto me pczal

C. Muito bem; mas é mister que vos expliqueis ainda me­lhor, e que dignes: An cum mascuh, vel femina, forte eum fralre, vel sorore, iniionestum aliquid perpelraveris, an la- ctibus tantum vel opere consummato: e, não obstante então, por falta de conhecimento e por impotência natural, o pec­cado não tenha sido consummado em sua cspecie, desejo to­davia, para mais vos humilhardes, que confesseis as circum- stancias aggravantes, a lim de que fiqueis tranquillo, e não vos lembreis mais d’islo. Se souberdes o numero certo do vezes, dizei-o; se não, fazei como acima fica dito. Accusaes- vos pois de toda a malicia que houvesse n’esU» idade, como é aos olhos de Deus; não é assim?

P. Sim, meu padre, accuso-me de tudo, e se podesse ex­plicar-me melhor, eu o faria.

C. Crescendo cm idade, cresceu tambem comvosco a ma­licia, e 0 deraonio começou a encher-vos o espirito de pensa­mentos deshoncstos; ora dizei-me: como vos haveis compor­tado n'estcs máus pensamentos? tendel-os sempre repellido, ou tendes consentido n’elles, deleitando-vos nas representa­ções impuras que elles excitavam em vossa imaginação, e al­gumas vezes mesmo desejando os objectos do peccado? e acontecia isto raras ou freqüentes vezes?

P. Ah! meu padre, é este ura abysmo sem fundo, e quanto mais penso n’elle, mais embaraçado me sinto, não sabendo como sair d’ellc. Tudo o que posso dizer, é que desde a idade de sete ou oito annos até esta hora lenho sempre con­sentido, seja deleilando-me n’elles, seja desejando objectos de toda a especie, e sobre esta malcria não poderia explicar- me de outra sorte.

C. Tendes-vos suílicienlemente explicado, porque não sois obrigado ao que vos é moralmente impossivcl. Accusaes-vos pois de todas as dcleitações e de todos os desejos que haveis tido com esles máus pensamentos; como tamhem da negli­gencia cm os repeilir, c da occasião que lhe haveis dado com vossas vistas e máu uso de vossos sentidos; não é assim? Eu supponho que elles vos viriam todos os dias, e porventura muitas vezes no dia, e que elles eram de todas as especies imagináveis; não é verdade?

P. Sim, meu padre, é assim, e não posso dizer outra cousa.

C. Depois de vosso casamento haveis continuado a con­sentir n’ellcs com a mesma frequencia?

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P. Não, meu padre: ha sete ou oito annos que estou ca­sado, e tenho consentido com menor frequência; dômos tres ou quatro vezes por semana, pouco mais ou menos.

C. Quanto a palavras deshonestas, haveis tido o habito de as proferir diante de mancebos, de mulheres, e particular­mente na presença de pessoas innocentes?

P. Sim, meu padre: é um máu habito que contrahi desde minha juventude. Encontrando mulheres, achando-me em conversações, tenho dito palavras obscenas, equivocas, e Deus sabe quantas por minha causa terão concebido máus pensa­mentos e aprendido o mall Assim, accuso-me de tantos es­cândalos que tenho dado ao proximo. Eu tenho caído n’isto tres ou quatro vezes por semana e mesmo mais, e nunca mo esforcei por desarreigar.cste máu habito, nem pôr a esta lin- gua indigna um freio. E do que me arrependo.

D. Á accusação dos pensamentos e dos discursos desho- nestos deve seguir-se a das acções obscenas. Ella requer uma duplicada precaução, seja da parte do confessor, seja da parte do penitente. Vós, confessor, deveis ser reservado in­terrogando sobre esta matéria, como acima havemos dito; assim deveis servir-vos de termos honestos. Assim como os prégadores no púlpito estudam certos rodeios de phrases pró­prias a atacar o vicio sem oITender a honestidade, da mesma sorte os confessores devem empregar certos modos de fallar que não odendam a modéstia. E verdade que não deveis, por um temor excessivo, omittir de perguntar o que julgaes necessário para conhecer a especie c o numero dos peccados de vosso penitente; evitae comtudo o fallar de certas parti­cularidades obscenas que acompanham o modo de peccar, não sendo isto necessário, mas pelo contrario, indecente e muito reprehensivel. E vós, penitente, deveis ser reservado explicando esta especie de peccado; tende cuidado de evitar dous laços que o demonio vos armará, a vergonha e o des­caramento. Primeiramente não vos deixeis illudir por um falso temor de que o confessor ou não quererá, ou não po­derá absolver-vos, ou que vos ralbará, ou se escandalisará: tudo isto 6 falso. Estae certo de que, fossem embora vossos peccados duas vezes mais enormes, vosso confessor teria compaixão de vós. Que digo eu? quanto mais profundo for 0 fôsso em que tenhaes caído, tanto mais zelo e caridade elle empregará para vos tirar d’elle. Tende coragem e dizei vos­sas fraquezas com uma grande conliança: vós experimenta- reis que apenas tiverdes aberto a bôca para vos accusardes, todos os vossos receios e repugnancias se desvanecerão. Não caiaes todavia no extremo opposto, que consiste em dizer vossos peccados com uma especie de aescaramento, como se

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OS conUisseis por demais, ou lizesseis gloria do mal. Deveis confcssar-vos cora humildade e compunção, dizendo succinla e modestamente tudo o que julgaes necessário para descargo de vossa consciência. 0 modelo que aqui vos dou será muito util para isto. Eu o ponho cm latim, não porque se deva fal- lar latim na conlissão, mas a fim de que caindo este dialogo nas mãos de um grande numero de pessoas, não possa ser nocivo aos simplices c innocentes, como acima tenho dito.

C. In tua jiivenlute hahuistine pessimam consiietiidinem te poiluendi? quot annis perseverasti in conimitlenda tam gravi enormilatc? et quanta cum frcquentia commiltebas il- lam? quolics in niense aul in hebdomada? Dic sincere id quod tibi videtur probabilius, et explica eliam in qiialia objecta mens lua ferebatur in illo aciu indigno ollcndendi Deum.

P. Ita, pater, scmcl a malediclo quodam socio hanc didici iniquilalem, nec unquam amplius emendatus siim. Circa duodecimum aut lerlium decimum ajlatis annum lioc pccca- lum commiltere conpi, illudque bis vel ler in hebdomada com- miltebam, aliquolies vero eliam quotidie: aliquando lamen nec semel in hebdomada: mens aulem mea in diversa fere­batur objecta diversm spcciei, modo in unam, modo in alte­ram foeminam; iiihilque curans, essentne piiella;, vel conju- galm, cunclas desiderabam, nec ullam tolo annorum illorum tempore diligentiam adhibui, ut me emendarem; quinimo ex proposilo nusquam ad eumdem redibam confe.ssorem, sed semper novos quairebam, et quos ad me absolvendum pro- pensiores judicabam. Ociilorum lenus in lioc luto immersus rui, et ignoro an necesse sit explicare, me illud scplies, vel oclies eliam, in loco sacro coramisisse.

C. Príccisa iilique necessitas esl explicandi circumstantiam loci sacri; proiit etiam necesse est explicare qualitalem obje- ctorum, in qum tuiim ferebatur dcsidcrium, aul scilicct crant personae sacrae, vel tibi consanguinilale conjunctai, etc. Quia vero a quodam tuo socio de hac iniquilate te edoctum fuisse dicis, necessário pariler explicare lencris, an simiil cum illo, vos invicem excitando, hoc perpetraveris peccatiim: nec non alios, et quot tu similiter docucris; et an inler hos a te sedu- clos aliquis liius fuerit consanguineus in primo praccipue vel secundo gradu. Insuper an primus fueris ad inducendum, et an cum aliquo ex islis sociis active vel passim sodomiam commiseris, et quolies. Dic sincere omnia: tibi enim compa- tior, et ex corde compalior; quamvis te cum brulis, et cum malilia indicibili ac inexcogilabili hajc delicta commisisse con- lltearis; ideo nc paveas.

P. Gratias libi ago, pater, quia confortasli me; sane mui-

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tum egeo, prajcipue propter ultimam speciem bestialitalis prmnotatam, quam decies vel duodccies in pueritia commisi, nec usquam pr® pudore confcssus sura. Insuper coníiteor de- cera vel duodccim juvenes de malitia a me edoctos fuisse, al- ternatim cum omnibus quadragesies, vel quinquagcsics pol- lulionem committendo, et unus ex ipsis meus eral consangui- neus, cum quo septies, vel octies peccavi, et ego fere sempcr primus fui ad illos induceudos: immo cum tribus, aut qua- tuor ex supradictis quindecim, aut viginti vicibus ncrandum commisi peccatum, fere seraper me active concurrente, licet Don sempcr complete: in omnibus autem hiscedclictissuper- abundavi in malitia, quaproptcr ex toto corde doleo, et sum- ma cum erubcsccntia me accuso.

C. Cum aliquo ex prmdictis juvenibus ruistine in occasione próxima pcccandi, id cst frequenlerne, et a multo tcmpore peccatum commisisti?

P. Ita, pater, cum uno septem aut octo mensibus quoli- die conversatus sum, omni fere hebdomada peccatum com­mittendo.

C. Post conlractum matrimonium commisistinc aliquando a te ipso peccatum poilutionis?

P. Utique, scd rarius, serael videlicet, aut bis in mense: aliqua autem mense, nec semel; mens vero mea in diversa ferebatur objecta, ut supra.

C. ílabuistine inhoncstam conversationcm cum mulieribus, ipsas tangendo, vel osculando? Explica saltem cum quot, et an raro, vel frcquenler.

P. Cura muilis utique mulieribus, nempe cum Iriginta cir- ciler has nugas smpius exercui, ipsas et tangendo, et oscu­lando; et pauc® cllluxerunt hcbdomad®, in quibus talem non commiserim errorem.

C. Ultra dictos lactus, et oscula inhoncsta, habuistine ali­quando copulam perfectam? explica numerum mulierum, et statum earum, et an habueris cum aliqua ex ipsis occasionem proximam pcccandi.

P. Ita, pater, cum quinquc vel sex mulieribus habui co- pulam perfectam, ex quibus du® crant liber®, et cum ipsis peccavi viginti, aut triginhi vicibus circiter; tres, vel quatuor eranl conjugat®, cum quibus totidem circiter vicibus pecca­vi, cum una autem puella fui in occasione próxima septem vel octo annis: et quia in uxorem ipsam ducere cupiebam, cum ipsa inhoneslum fovebam amorem, eani quotidie visi­tando, quotidie tamen non peccavi ex defcctu opportunitatis, sed bis tantum, aut ter in mense cum ipsa copulam imperfe- clam, committebam, frcquenter vero cam tangebam.

C. Cum ipsam te quotidie visitasse dicas, licet non semper

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peccatum consummaveris, nihilominus quolidie peccasli, ob pericuium peccandi, cui te exponebas. Dic lomcn an ipsam ad copulam induxeris cura promissione illam desponsandi, et num po3t sponsalia solerania cum ipsa peccnveris, et quot pejus est, an tacendo in confcssione hujusmodi peccata, sa- cramentum matrimonii receperis. Insuper explica, an post illud rite celebratum cura aliis raulieribus iterura peccaveris; et an de facto cum aliqua ex ipsis sis in occasione próxima.

P. Ita, paler, ego illam induxi variis proraissionibus illam desponsandi; peractisqiie sponsalibus ter autquater cum ipsa pcccavi; et quod iniquissimum est, talibus peccatis inquina- tus matrimonii sacraraentum recepi. Post contractum vero matrimonium, ter aut quater cum soluta peccavi. Duo insu­per sunt, vel tres anni, quibus inhonestam habeo amicitiam cura ligata, cum qua ter vel quater in raense copulam habeo; quindecim nutem jam perncti sunt dies, quibus, Deo adju- vante, liber sum ab boc peccalo, ct mc non amplius peccalu- rum jurejurando proraitto.

C. Non suflicit juramentura de non amplius peccando, sed neccsse est quod promittas, te non amplius conversationem habituram cum illa. Ego te absolvere non debercm, cum haíc sit próxima occasio peccandi; verum quia suppono te ab aliis de péssimo tuo sUitu, in quo his duobus, vel tribus annis vi-- xisti, admonitum non fuisse: et quod nunc (irmiler proponas, non amplius doraura illam adeundi imo amicam omniraodo declinandi, nec amplius cum illa loquendi; et credo quod in hac tüa confessione generali mihi promittas ex corde; bac igi- tur de causa, et proptcr specialem dolorcm, quem sensibiliter demonstras, pro hac vice te absolvam; scito tanien, quod re- labendo, non amplius reperies qui te absolvat. Nunc vero, cum tu conjugatus sis, dic mihi, num cum tua cônjuge matri­mônio honeste sis usus, et an haheas circa hanc materiam, de quo tua reraordeat conscientia?

P. Audivi aliquando, quod in usu matrimonii committi possunt peccata mortaliu, et ideo obsccro patcrnitatem tuam, ut me instrucre dignctur, nam ego sincere rcspoudebo ad tua quaesita. (Vide annot. n.” 1C8.)

D. Quando viri pctunt instrui, debet confessarius ipsos clarius instruere; in ipsis cnim intcrrogandis non tantum adest pericuium, sicut in imdieribus: ct ideo licitum erit ab eis qumrere, an in usu matrimonii alias foeminas prmter pro- priam concupierint, et quot, et quoties, ct ciijus erant condi- tionis aut status; an in dicto usu, cum própria uxore serva- verint vas naturale; an voluntarie semen foras elTuderint; vel in evidenti periculo talem errorem coramittendi se constitue- rint? Cum mulieribus vero interrogationes isUc fieri non so-

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lent, nisi ills a seipsis de bis cinrum praebeant indicium. Idcm pariter dic de aliis intcrrogationibus pro hominibus su­pra notalis, quai licet etiam cum mulicribus, scrvatis scrvan- dis, fieri possint, cura raajori tamen cautela lieri debent. Ali- qua enim sunt consideratione digna, quae et a mulieribus quidem quajrenda, sed cura magna prudenlia, modéstia et circumspcctione, et non ab omnibus, ne ipsas edoceat ea, quaj a multis ignorantur. Gradatim igitur procedat; si namque muUer conliteatur, se impuris cogitationibus consensura prae- buisse, interrogari potest, an in pueritia res inhonestas cum pueris commiserit, et in quali aetate. Aliquando enim maium in aetate puerili perpetralum asserunt, quod tamen commis- sum fuit pnst annos duodecim, quando malitia erat omnino completa. Insuper est interroganda, an cum sociabus habuerit inhonestos discursus; et si aliqualis malitia indicium praebeat, ab ea qumratur, an seipsam iilicite ob meram delectationem tetigerit; quamplures namque raulieres in hoc vilio miscrrime acentl Non est lamen ullcrius quaircndum, an inlerfuerit loilulio, nisi forte in ipsamet cernatur malitia; libertas, et psamet aperlius loquendo occasionem prmbeat inlerrogandi:

elenim non omnes mulieres, ut fatcnlur perili, hanc patiun- tnr miseriam, saltem ita sensibilem, ut ab iis possit agnosci. S i postea ad interrogaliones prmdiclas respondeal se ulique illicite telegisse, ignorasse lamen hoc esse peccalum, non il- lico ipsi credalur, sed raodeste inslruatur quod illicite sei­psam tangere, ob meram scilicet delectationem, et non ob aliquam necessitalem, gravissimum sit peccatum; nam alias confessio foret grave sacrilegium; et hoc modo omne evacua- bitur venenum. Si poenitcns alleri fomentum dederil araoris, ab ipsa qumrendum est an indignis consenseril cogitalionibus vel amasio fuerit occasio lalis conscnsus; an cum deleclalione prolulerit, vel audieril verba ob.scena, aut mquivoce nugalo- ria; an choreas pcrgens, malitiose amasii manum slrinxerit, et an in locis secrelis sola cum solo consistcre consucverit, surgendo noctis tempore ad colloquendum, etiam cum magna forsan majorum suorum amaritudine, quibus non obedire parvi pendebat; et alia plura similia. Si tandem poenitens la­pso est in peccala completa cum hominibus, interroganda est de abortu, an scilicet sit secutus, vel soium allentalus; an foelus essel animatus, et quolies periculo se cxposuerit abor- tum patiendi. Cum conjugalis, qui nollenl babere muitos (i- lios, non erit supérflua interrogatio, an conjugibus occasio­nem dederint semen foras cfTuDdendi, aul saltem tale babue- rint desideriura. Interrogenlur ultimo, dcderinlne scanda- lura, aliis opporlunilalem praebendo peccandi in domo sua, vel deferendo epistolas amatorias, annunlioliones, salutatio-

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nes, ctc. In hoc deficere solent ancili®, vetul®, necnon et pucll®, ac sorores sibi inviceni una alleri obsequiuni exhi- Bendo ad confovendos impuros amores. Omnes pr®dicl® in- terrogationes licite fieri possunt mulieribus in bac Iam lubrica matéria, non tamen omnibus: ideo confessarius prudenter discernere tenetur, secundum lumen ipsi communicatum a Deo, quem enixis precibus exorabit, qu®nam talibus indí- geanl interrogationibus, et qu® non, etc.

Depois d'estas interrogações communs, deve o confessor persuadir ao penitente, se alguma cousa lhe resta sobre esta matéria, a que a diga com toda a liberdade; deve repetir-lhe isto muitas vezes, a lim de que elle nada omitia. E vós, pe­nitente, não deveis deixar todo o trabalho ao confessor, mas dizer-lhe livremente tudo o que pesa em vossa consciência, ainda que por inadvertencia o confessor vos não interrogue sobre isto. Se portanto tiverdes amizades perigosas com re­ligiosas ou com outras pessoas ligadas com votos de casti­dade; se tiverdes impedimentos secretos de niatrimonio, ou se lizcsseis pactos implicilos ou expressos com o demonio: se cm vosso poder guardaes bilhetes ou outros penhores de amor, pinturas obscenas, livros deshonestos, e outras cousas semelhantes, deveis dizer tudo isto, se quereis que o reme- dio seja cflicaz e vos reslitua uma perfeita saude. Final­mente, para sair de lodo este atoleiro, o confessor terminará d’este modo.

G. Accusaes-vos de todos os peccados deshonestos que hn- veis commettido, e de todos aquelles que haveis feito com- mettcr aos outros por palavras obscenas, por conselhos cri­minosos, solicitando, tentando pessoas de dilTercnte sexo, ou, por outros meios, procurando as occasiões em vez de fugir d’ellas, expondo-vos tantas vezes ao perigo de peccar, dando aos outros occasião de formarem suspeitas, juizos, maledi­cências contra vossa honra e contra a das pessoas que vós frcquentaveis? De tudo isto e de tudo o que não conheceis, ou não saheis explicar bem, vos accusaes: não ê assim?

P. Sim, meu padre, eu me accuso geralmente de todos os peccados que tenho commettido contra este sexto manda­mento, e sinto não me recordar de todas as particularidades para as explicar mais claramente, accusando-me de todos os meus hábitos máus, do grande malicia com que pequei, as­sim como Deus me reconhece culpado.

C. Sobre a fé haveis tido alguma vez duvidas ou senti­mentos contrários ao que a Igreja ensina?

P. Não, meu padre, passaram-me, é verdade, pelo espirito certos pensamentos volantes; mas, pela graça de Deus, creio não haver consentido n'elles voluntariamente.

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C. Haveis aprendido a fazer superstições diabólicas por

Ktlavras e signaes, para curar doenças ou para inspirar amor? aveis em algum tempo trazido comvosco feitiços ou escri-

ptos para impedir o elTeito das armas ou outras cousas seme­lhantes?

P. Sim, meu padre, trouxe um escripto coraraigo por al­guns annos; tinham-me dito que era uma devoção muito po­derosa contra as armas de fogo: se não devo trazel-o, eu o lançarei ao lume.

C. Haveis lido livros prohibidos, ou conservael-os sem li­cença ?

P. Sim, meu padre, tenho lido alguns, mas não sabia que eram prohibidos; logo que o soube os larguei.

C. Haveis feito falsos juramentos judicialmente com damno do proximo, ou, sem ser judicialmente, abusando do santo nome de Deus e dos santos?

P. Sim, meu padre, muitas vezes tenho dado juramento; não era sempre falso, mas umas vezes verdadeiro e outras falso. Duas ou tres vezes (iz que outros o déssem falso era prejuizo do proximo; ou mesmo uma vez prestei um para fa­zer serviço ao proximo.

C. Haveis sempre peccado jurando umas vezes a verdade e outras vezes a mentira, era razão do perigo a que vos ten­des exposto de ser perjuro? Dizei o tempo c a frequencia, o se haveis reparado o damno causado por vós ou por aquelles que haveis induzido a fazer falsos juramentos. Ainda que não tcnhaes occasionado algum damno, que lenhaes mesmo jurado a mentira para fazer serviço aos outros, haveis toda­via peccado; porque isto se não deve fazer ainda que se tra­tasse do interesse do mundo inteiro. Além d’islo haveis blas- phemado o santo nome de Deus e dos sautos, e quaes foram vossas blaspheinias?

D. Attendei que os ignorantes tomam por blasphemias as simplices imprecações, ou qualquer outra expressão em que entre o santo nome de Deus. E a razão por que é neces­sário que 0 confessor lhes faça explicar o que entendem por blasphemia. a lim de saber se suas palavras tèem sido verda­deiras blasphemias, e, n'esle caso, se foram simplices ou he­réticas.

C. Tendes costume de proferir imprecações c maldições? haveil-as feito desejando que ellas se cumprissem, ou sómente por desabafo de cólera? tendel-as proferido contra vossos fi­lhos, e principalmente contra vosso pae e vossa mãe, com escandalo d’aquelles que vos ouviam?

P. Sim, meu padre, tenho-as feito muitas vezes, mas pou­cas com a intenção de que se cumprissem. Ordinariamente

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era por cólera, e algumas vezes contra meu pae e minha mãe, e muitas vezes contra meus lilhos. Accuso-me do es­cândalo que dei aos vizinhos e a todos aquelles que mc ouvi­ram; accuso-me tambem d’este máu habito, que eu não tenho procurado desarreigar, d’onde procede o eu não me haver jámais emendado.

C. Haveis faltado á missa nos dias de obrigação, por ne­gligencia, ou tendel-a ouvido sem devoção?

P. Sim, meu padre, faltei a ella dez ou doze vezes, e quasi sempre a tenho ouvido com distracção; algumas vezes tenho dormido ou olhado para aquelles que entravam e saiam, sem devoção alguma; assim eu me accuso d’isto.

C. Haveis trabalhado nos dias festivos mais de duas horas, ou tendes obrigado outros a trabalhar?

P. Sim, meu padre, sou culpado n’isto, e, havendo exer­cido dilTerentcs oITicios, tenho trabalhado muitas vezes pelo anno, e tenho feito trabalhar meus oQiciaes, principalmente quando era alfaiate. Para satisfazer aquelles que me davam obras, profanei as principaes festas até oito e dez vezes por anno, e isto por sete ou oito annos, e fazia trabalhar toda a minha familia; é a razão por que Deus me puniu, reduzin­do-me á miséria. Eu me arrependo da oITensa feita a meu Deus.

C. Haveis observado os jejuns mandados pela Igreja, prin­cipalmente quando ereis alfaiate, e que vosso trabalho era compativel com o jejum? Além da transgressão do jejum ha­veis comido carne nos dias prohibidos?

P. Haras vezes observei o jejum em rigor, e posso com verdade dizer, que tenho transgredido mais de metade. Te- Dho comido carne nos dias prohibidos sete ou oito vezes em toda a minha vida.

C. Lembraes-vos de ter dado graves desgostos a vosso pae, a vossa mãe, ou a vossos outros superiores?

P. Sim, meu padre, eu lhes tenho desobedecido e dado desgostos muitas vezes, furtando em casa objcctos c dinheiro para me divertir. Oito ou dez vezes me revoltei contra elles, dizendo-lhes palavras injuriosas, c cinco ou seis vezes lhes desejei mesmo a morto do fundo de meu coração.

C. Tendes andado com armas prohibidas, provocando ri­xas com vossos rivaes, expondo-vos ao perigo de ferir ou ser ferido, e de causar grande damno a vosso corpo, a vossa alma, e mesmo a toda a vossa familia?

P. Sim, meu padre, oito ou dez vezes tive desordens com outros, e feri dous gravemente, mas reparei todos os damnos. No decurso de dous annos trouxe armas prohibidas, com risco de ser preso.

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C. Frequenlaes os botequins, as tavernas, jogando as car­tas e outros jogos abomináveis, embriagando-vos muitas ve­zes, e proferindo palavras obscenas e blasphemias?

P. Sim, meu padre, tudo isto é verdade, embriago-me a miudo até duas ou tres vezes no mez. Jógo as cartas e da­dos, e isto é occasião de minhas blasphemias; mas estou in­teiramente resolvido a não me tornar a embriagar, e a não blasphemar mais.

C. Não é bastante que promettaes não tornara embria­gar-vos e a blasphemar, é necessário tambem prometter de não tornar ao botequim e á taverna, e de não jogar mais as cartas c os dados. Não poderieis ser absolvido, se, advertido por outros, vos não tivesseis emendado; mas por isso que me dizeis que nunca fostes advertido d’esta obrigação, e por ou­tra parte vos vejo arrependido e decidido a obedecer, eu vos absolverei por esta vez. Comtudo, lenibrae-vos bem de não tornardcs a pôr o pé na taverna, excepto no caso de absoluta necessidade; de outra sorte não achareis alguem que queira absolver-vos. Além dMsto, n’estas tavernas ou botequins, nas conversações ou nas assembléas, haveis dito do proximo grave mal e prejudicial á sua honra?

P. Sim, meu padre, tenho este fraco. Não posso enfrear a minha lingua; digo muitas vezes mal do proximo; o mais das vezes são cousas verdadeiras e públicas; mas outras vezes tambem tenho descoberto cousas graves e occultas: démos trinta ou quarenta vezes, pouco mais ou menos. 0 que é peior, tres ou quatro vezes calumniei o proximo, imputando- lhe faltas de que elle era innocente.

C. Não é bastante accusar-vos: é necessário que repareis a reputação que haveis roubado. Quando dissestes cousas verdadeiras e públicas, não haveis peccado mais que venial- mente; mas descobrindo cousas graves e secretas, haveis pec­cado gravemente, e deveis restituir a reputação ao menos di­zendo bem das pessoas de quem haveis fallado mal, supposto comtudo que o facto não tenha esquecido ás pessoas com quem estáveis; porque, se as pessoas já não pensam n’isto, haveria maior mal do que bem em recordar-lh’o. Paro repa­rar vossas calumnias deveis retratar-vos claramente, dizendo que faltastes á verdade, e sendo necessário alTirmal-o com juramento. Mas essa appetencia de fallar me faz suspeitar que tendes o coração ferido. Dizei-me portanto: haveis guar­dado odio a vosso proximo, desejando-lhe grave mal, regosi- jando-vos com o que lhe acontecia, e entristecendo-vos com 0 seu bem?

P. Sim, meu padre. Ha cinco ou seis annos que estou ern inimizade com duas pessoas; eu não fallo com ellas, não as

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saúdo, e se podesse fazer-lhes mal, eu o faria; mas deveis sa­ber, meu padre, que ellas lambem me lêem feilo muilo.

l). 0 confessor não deve permiltir ao penitente que refira as causas de seu odio, seja porque nenhuma razão póde jus­tificar 0 odio que se tem ao proximo, seja porque recordando as injurias recebidas se irrita a paixão. Longe de tirar d’isto compunção, não se faz mais do que aggravar a ferida, e mul­tiplicar os peccados mesmo na conlissão. Deve comludo or- denar-lhe que se reconcilie se quer ser absolvido, obrigan­do-o a dar signaes de alTeição ordinaria, principalmente se a inimizade ou o odio for contra seus parentes; porque sau- dal-os não basta. E necessário tarabem fazer-lhes as visitas de estylo e uso entre parentes; e se o penitente recusar, não deve "dar-lhe n absolvição; se elle promeller seriamente, principalmente se nunca promelleu a outros, póde-se absol- vcl-o. Isto se entende, comludo, quando o tempo não per- milte fazcl-o reconciliar antes com o proximo; porque ordi­nariamente deve-se exigir que a reconciliação preceda sem­pre a absolvição. Quanto ao numero d’estes peccados de odio, basta fazer dizer a duração e frequencia, porque é mo­ralmente impossivcl, em igual caso, obter um numero certo ou provável.

C. A respeito dos bens alheios nada tendes a arguir-vos?P. Sim, meu padre. Devo fazer uma restituição de trinta

escudos, e promelto salisfazel-a.C. Não nos apressemos, porque sobre isto ha muitas cou­

sas que devemos elucidar: é necessário primeiramente que digaes por quantas vezes furlastes estes trinta escudos.

P. Tirei dez escudos por uma vez a um pobre homem, ou­tros dez a dilTerenles por muitas vezes, uma libra a um, duas a outro, e não posso dizer ao certo a quantas pessoas. Tirei dez a meu amo, mas por pequenas quantias, umas vezes uma libra, outras vezes dous ou tres soidos; mas promelto, meu padre, tudo restituir ou fazer esmolas com isto.

C. É com vossos bens e não com os alheios que deveis fa­zer esmolas. Assim, os dez escudos que haveis furtado a esse pobre homem, deveis resliluir-lh’os a elle mesmo por inteiro, assim como aquelles que haveis roubado a vosso amo. Quanto aos outros dez, como não conheceis os verdadeiros senhores, podereis empregal-os em esmolas. Mas não basta que pro- metlaes: dizei-me ha que tempo estaes obrigado a restituir estes trinta escudos?

P. Ha seis ou sele annos.C. No decurso d’este tempo haveis tido facilidade de os

restituir, ou poderieis tel-a diminuindo as despezas de vossa casa?

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P. Sim, meu padre. Eu podia ter reslituido ao menos em parte, e não o (iz; mas hoje prometto tudo satisfazer.

C. Meu (ilho, esta promessa não basta, com maior razão se, tendo-a já feito a outros confessores, não haveis sido liei a ella; porque deveis saber que todas as vezes que podeis res­tituir, e não 0 fazeis, outras tantas vezes peccaes. Assim, deveis accusar-vos deste peccado continuado de injustiça que haveis commettido em todo o tempo em que podieis restituir e não 0 lizestes. E, para entrar em alguma miudeza, dizei- me que somma podeis agora pôr de parte para restituir?

P. Sete ou oito escudos, não mais: o resto não o posso restituir por falta de meios.

C. Pois bem, estes oito escudos restitui-os hoje a esse po­bre homem que foi o primeiro a quem damnificastcs. Eu não deveria absolver-vos antes que a restituição fosse feita; mas lio-me em vós por causa da compunção que vos vejo. Com­tudo, para maior segurança não quero que commungucis an­tes de haver restituido. Quanto ao resto, c verdade que não podeis restituil-o de uma vez, e eu quero acreditar no narra­ção de vossa falta de meios; mas deveis fazel-o por muitas parcellas. Dizei-mc: quanto despendeis na taverna em cada semana?

P. Umas pelas outras, posso despender em cada semana duas libras, e mesmo mais.

C. Pois bem, não torneis á taverna, como já m’o promet- testes, e ponde á parte estas oito libras por mez para fazer á restituição, e brevemente vos vereis desempenhado para com Deus e para com o pro.ximo. Depois, se algum motivo plau- sivel vos impedir de fazer vós mesmo a restituição, servi-vos de um bom confessor a quem entregarcis cada mez as oito libras, a lim de que as reslitua ás pessoas lesadas; d’este modo porcis em segurança vossa consciência e vossa honra.

P. Sim, meu padre, concordo n’isso. Ainda mais, eu vos agradeço e vos asseguro, que se os outros confessores me houvessem tratado com esta mesma caridade, eu não teria vivido tanto tempo debaixo da escravidão do demonio.

D. Mesta matéria do setimo mandamento poder-se-hiam fazer muitas interrogações ao penitente; mas seria entrar em um labyrintho sem esperança de sair d’elle, visto o numero quasi iniinito de casos enredados que acontecem áquelles que tocam nos bens alheios. Pelo pouco que deixo dito pretendo sómente dar ao joven confessor algumas luzes sobre uma multidão de outros casos que elle encontrará, porque deve ser mais prudente n’cste ponto, do que cm qualquer outro. Se 0 caso for duvidoso, não deve liar-se em si mesmo: mas quando se trata do damno de outrem, deve primeiramente

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tomar tempo para decidir, consultando os auctores e outros confessores mais sabios e mais babeis. Se a dúvida for co­nhecida por duas partes, deve o confessor abster-se de acei­tar louvações e compromissos, e de se erigir em juiz; deve aconselhar a ambos que deixem o processo, e que se compo­nham, entregando a causa a outros. Não se metta, sendo-lhe possivel, com os interesses de seu penitente, a (im de evitar embaraços e desgostos que poderiam fazel-o arrepender. Se no acto mesmo da conlissão não se podérem remover todas as diíliculdades, póde adiar-se a decisão para outro tempo. Basta que o penitente, para ser absolvido de sua falta, se accuse d’ella; e quanto á restituição, que elle esteja disposto a fazer o que se lhe ordenar em boa consciência. Deve-se tambem rellectir sobre o modo de fazer as restituições. Apre­sentando-se negociantes, regatões, artiliccs e outros d’esta especie que tôem feito darano ao proximo com pesos muito fracos ou por falsas medidas, tirando um pouco a cada ura, devem ser obrigados a dar outro tanto em esmolas em pro­veito dos pobres, ou a servir-se na venda de medidas maio­res, principalmente se foi a classe pobre a que foi lesada. Mas se os pequenos furtos foram feitos a uma só pessoa, se­ria ura grande erro, conforme ao que acima dissemos, orde­nar ao penitente que faça a restituição era esmolas ou em missas, quando na realidade esta restituição deve ser feita á pessoa lesada. Se o penitente for pobre, e se estes furtos são pouco numerosos e não consistem mais do que em bagatelas, como fructas e lenhas, póde dizer-se-lhe que appiique por esta intenção alguma obra de piedade, a corôa que resar, as missas que ouvir, fazendo-lhe prometter seriamente de se emendar para o futuro. Bem que seja necessário usar de se­veridade com alguns que nenhuma medida guardam nos da- mnos que causam, cortando arvores de fructa ou plantas ver­des para fazer lenha, ordinariamente, com os pobres, que são realmente taes, devem deixar-se de parte certas theolo- gias mais rígidas, e usar a seu respeito de mais caridade e moderação. E vós, penitente, não deveis fazer de lheologo sobre estes peccados que trazem comsigo a obrigação de res­tituir. Deveis submetter-vos ã direcção de um bom confessor, e expor-lhe o caso que vos inquieta com franqueza e since­ridade, porque uma só circumstancia que vós caleis bastaria para falsificar o juizo do conlessor, e mzer má a absolvição. Se experimentaes uma forte repugnância em restituir, suavi- sae 0 que ella tem de penoso pela consideração d’esta grande maxima, que non remiltiliir peccatum, 7iisi restituatur abla- tum, ou restituir ou condemnar-se.

C. Depois de haver confessado os peccados que commet-

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(estes, é necessário confessar aquelles que fizestes commetter aos outros. Ilnvcis dado escandalo ao proximo? Quantas ve­zes haveis ridicularisado as práticas de devoção? Haveis sido 0 primeiro a conduzir os outros ás tavernas, aos bailes, a conversações licenciosas, fazendo de vossa casa um logar de passatempo e dc libertinagem? Haveis dado a mão aos filhos familias que roubavam a seus paes para ir jogar ou divertir- se? Âccusaes-vos de todos estes peccados que baveis dado aos outros occasião de commetter? Não podendo conhecer nem o numero, nem a frequencia, vos accusaes de haver sido habituado a estas faltas; não 6 assim?

P. Sim, meu padre, eu ma accuso d’isto. É muito verdade que tenho sido um escandaloso ao menos no espaço de dez ou doze annos, e se me faz ímpossivel recordar o numero de escandalos que dei; assim me accuso como sou culpado diante de Deus.

D. Finalmente, deve o confessor interrogar sobre os de- veres do estado particular, e principalmente sobre aquelles que podem ser de conseqüência, perguntando ao penitente se é tutor, lestamenleiro, ou administrador de algumas ca- pellas, medico, tabeilião, advogado, juiz, procurador, syndico de communidadc, porque todos estes empregos tôem deveres especiaes que o confessor deve conhecer. A este respeito vos tenho dado os promenores em os n.°’ 182 e seguintes. Se tem feilo votos sem os cumprir, ainda que sobre csla matéria os simplices se enganam muitas vezes. £ a razão por que se deve perguntar ao penitente se, quando elle disse faço voto, teve intenção de se obrigar por uma verdadeira promessa feita a Deus debaixo de pena de peccado morUil, a lim de distinguir por este meio se foi um verdadeiro voto, ou uma simples promessa. Vôde o que sobre isto deixo dito em o n.« 174. Se, sendo rico, não fez as esmolas convenientes, ou se dilferiu por muilo tempo pagar suas dívidas, podendo fa- zel-o, e, 0 que é muilo peior, se recusou ou diminuiu o sala- rio devido ao trabalbo dos pobres. Se o penitente for eccle- siaslico, ainda que a obrigação de interrogar semelhantes pessoas não seja a mesma que a de interrogar os ignorantes, comludo se o confessor conhecer que seu penitente não se explica suHicientcmente, deve interrogal-o sobre as obriga­ções de seu estado: se tem celebrado cm estado de peccado; se, tendo recebido esmolas de missas, não as satisfez; se omit- tiu 0 ollicio divino; se enlrcteve ligações escandalosas; se in­correu em censuras, ou commelleu simonia, e outras cousas semelhantes, cujas explicações acharcis em o n.° 182. De­ve-se principalmente interrogar os senhores de casa, se vi­vera era paz com sua esposa; se a maltratam; se léem dado

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boa educação a seus filhos, ou se não se tèem dado ao traba­lho de os mandar aos catecismos, deixando-lhcs o freio solto, permittindo-lhes namorar, ir aos bailes, ás lavernas e outros logares públicos e escandalosos, em uma palavra, de se en­tregarem á libertinagem de nossos dias. Deve pcrguntar-se 0 mesmo nos amos, tios c outros superiores; se vigiam sobre seus creados, domésticos, sobrinhos e outras pessoas que lhes estão sujeitas; se fazem despezas superiores a seu estado, pondo-se por isto fóra da possibilidade de pagar os salarios a seus operários e de satisfazer aos legados pios. Finalmente, advirto que esle dialogo não deve servir de regra infallivel que se deva observar indislinclamenle a respeito de todos os penitentes, attendido que muitas interrogações ha que não devem fazer-se a toda a gente, como tambem muitas outras, que poderiam fazer-se. são deixadas á prudência do confes­sor, que, nos casos particulares, deverá regular-se segundo a necessidade e qualidade dos penitentes. Bem que tenhamos tocado cm todas as faltas e transgressões que se commettera mais ordinariamente contra os mandamentos de Deus e da Igreja, o confessor não é obrigado a perguntar, nem o peni­tente a accusar os peccados por ordem, quero dizer, em pri­meiro logar, aquelles que commetteu contra o primeiro man­damento, c depois os outros, isto poderia opprimil-os: assim 0 confessor e o penitente são igualmente livres. Todavia, an­tes de terminar, o confessor deverá fazer comprehender bem a seus penitentes, que se elles tèem ainda alguma cousa que não tenham accusado, ou sobre que não foram interrogados, a digam com toda a liberdade, a fim de que não fiquem in­quietos por não haverem dito tudo, e terminará do modo se­guinte:

C. Agora conheço todo o estado de vossa vida passada, e para completar vossa conli.«sào geral é necessário que vos ac- cuseis de todas as confissões e communhões niai feitas cm todo 0 tempo de uma vida tão criminosa. Dizei-me portanto: haveis freqüentado muitas vezes os sacramentos da peniten­cia e Eueharistia?

P . Tenho-me confessado e commungado sete ou oito vezes por anno.

C. Accusaes-vos pois de todas estas confissões e commu­nhões mal feitas, pois que occultaveis peccados, e não tinheis nem dor, nem lirme proposito? Da mesma sorte vos accusaes de não haver satisfeito, em todos estes annos, ao preceito paschal, tendo feito então outras tantas conlissõcs e commu­nhões sacrílegas, e de não ter cumprido as penitencias que vossos confessores vos impozeram: supponho que haveis omittido metade d’ellas; não é assim?

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P. Sim, meu padre, eu me accuso e arrependo d’islo tanto quanto posso. Queria tornar a nascer pura melhor regular minha vida, que tão mal hei empregado.

C. Antes de vos dar a absolvição é necessário que eu saiba se tendes o conhecimento necessário dos principacs myste­rios de nossa santa fé: sabeil-os verdadeiramente?

P. Meu padre, eu os sabia quando era rapaz, mas esque­ceram-me.

C. Essa desculpa de nada serve, a não ser de mostrar que sois mais culpado: porque é uma prova de que nunca haveis feito os actos de fé, esperança e caridade, como todo o bom christão deve fazer, ao menos de tempos a tempos no decurso do anuo. Deveria mandar-vos aprender primeiramente estes mysterios; porém como vos supponho muito disposto a fazer tudo 0 que podérdes para os aprender bem, vou ensinar-vos já 0 que é necessário que saibaes para bem receber o sacra­mento da penitencia. Mas primeiramente arrependei-vos da negligencia que haveis posto em os aprender, e de não ter freqüentado os catecismos como ereis obrigado. Accusaes-vos de tudo isto, e vos arrependeis do fundo do vosso coração; não é assim?... Ora sabei que os principaes mysterios de nossa santa fé, que todo o bom christão deve saber explicita­mente, são: a unidade de Deus e a Trindade, Deus remune- rador, a encarnação, a morte e n resurreição do Redemptor, quero dizer, que não ha mais do que um Deus em tres pes­soas dislinctas, o Padre, o Filho e o Espirito Santo. Este grande Deus é remunerador, quero dizer, que dá o paraiso aos bons e o inferno aos máus. D’estas tres pessoas, a se­gunda. quero dizer, o Filho, veio ao mundo, onde tomou a natureza humano, e se chama Jesus Christo, nosso Senhor; soUreu a morte por nós, e resuscitou. É necessário saber e crer tudo isto explicitamente, se queremos salvar-nos. Vós o entendeis agora, e para melhor o aprender me prometleis de procurar vosso parodio, ou alguma pessoa que seja capaz de vos instruir; não é assim?

P. Sim, meu padre, eu o prometto, e o farei, não duvideis d’isto.

C. Façamos agora os actos de fé, esperança, caridade e contrição, que não haveis feito em vossa vida: assim repeti com a bôca e com o coração o que vou siiggerir-vos.

«Creio, ó meu Deus, que sois um só Deus em tres pessoas • iguaes, 0 Padre, o Filho e o Espirito Santo; creio que o Fi- «Iho se fez homem, que morreu por nós sobre a cruz, que «resuscitou, que subiu ao céo, d'onde virá a julgar todos os «homens, para dar aos bons seu santo paraiso e aos máus as «penas eternas do inferno. Creio tudo isto, porque é verda-

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«deiro, ó verdade infallivel, que o haveis revelado á vossa «sanla Igreja.»

Crôdes íirmemente Iodos estes mysterios; não é assim?P. Sim, meu padre.C. Façamos agora o aclo de esperança.«Espero, ó meu Deus, que me concedereis o perdão de

«meus peccados, a graça n’esta vida e a gloria eterna na ou- «tra, pelos merecimentos de Jesus Christo e pelo meio das «hoas obras que espero fazer com vossa graça; eu espero «isto, ó meu Deus, porque sois misericordioso e omnipo- «tente.»

Esperacs verdadeiramente de um Deus tão misericordioso 0 perdão de vossos peccados; não é verdade?

P. Sim, meu padre.C. Façamos agora o acto de amor de Deus.«Meu Deus, eu vos amo sobre todas os cousas, porque sois

«0 soberano bem, e, por amor de vós, amo e quero amar o «meu proximo como a mim mesmo.»

Amaes verdadeiramente de todo o vosso coração um Deus tão bom; não é assim?

P. Sim, meu padre.C. Façamos agora 0 acto de contrição. Arrependei-vos, de

todo 0 vosso coração, de vossos peccados, e dizei batendo no peito:

«Meu Senhor Jesus Christo, eu me arrependo de vos ha- «ver offendido, porque sois um bem infinito, e proponho «nunca mais vos oITcnder.»

Arrependeis-vos de todo o vosso coração; não é assim?P. Sim, meu padre.C. 0 Senhor vos abençoe, etc.D. Com as pessoas que se suppõem já inslruidas d’estes

mysterios não é necessaria a interrogação supra; ella mesmo as oITeuderia. Todavia, para pôr em segurança um ponto tão importante, se ellas têem vivido no descuido de sua salvação, e se, pelo lodo de sua confissão se póde conjccturar que quanto ao passado tôem deixado de fazer os aclos preceden­tes, será muito a proposilo insinuar-lhes docemente, que para tornar sua eonfissão mais util é bom começar pelos actos de fé, etc. E se lhes convem fazel-os com o confessor para se excitar mais á devoção, póde servir-se d’aquelles que acaba­mos de indicar. Acabados estes aclos poderá o confessor fa­zer-lhes uma breve exhorlação para os mover mais ellicaz- menle a detestar sua vida passada e a começar uma vida nova em tudo; depois terminará do modo seguinte:

C. Accusaes-vos pois de todos os peccados morlaes com- mettidos cm toda a vossa vida, tanto d’aquelles que haveis

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confessado, como d’aquelles que não conheceis, ou de que vos não recordaes, ou que não sabeis explicar bem; como igualmente de todos os peccados veniaes, mentiras, impa- ciencias, curiosidades, vaidades, golodices e outros semelhan­tes? Prometteis-me de deixar todas as occasiões de que te­mos fallado, e de fazer todas as restituições do modo que havemos convencionado, com a firmissima resolução de mu­dar absolutamente de vida, e o prometleis de todo vosso co­ração; não é assim?

P. Sim, meu padre, eu o prometto de todo o meu coração; sim, de todo o meu coração quero mudar de vida e viver de ora avante como bom christão.

C. Se tendes alguma outra cousa, dizei-a com plena con­fiança, não temaes.

P. Pela graça de Deus, parece-me que tudo disse e que nada mc esqueceu.

C. A penitencia que vos imponho deve ser proporcionada em parte a tantos máus hábitos que haveis entretido por um tão grande numero de annos, a tantas penitencias omittidas, e, 0 que é muito mais grave, a tantas iniquidades e sacrilé­gios de que vos tornastes culpado. Assim, no decurso de um anno vos confessareis ao menos uma vez cada mez, e se mais vezes vos aproximardes ao sacramento da penitencia, me­lhor será ainda para vós. No decurso de dous mezes recita- reis todos os dias o terçx) do rosário, c se ao recital-o pensar- des ura pouco nos mysterios, ohl que fructo colhereis para vossa alma! No decurso d’estes dous mezes reciuireis de ma­nhã e á noite tres Avè-Marias em honra da immaculada Con­ceição da Santissima Virgem Maria, formando em vosso co­ração um acto de contrição; e de manhã uma lirme resolu­ção de não peccar no decurso do dia, e á noite de não peccar durante a noite. Oh! que admiravel prática! oh! que pode­roso preservativo para não tornar a peccar! Se em vossa terra se acha estabelecido o salutar exercido da Via-Sacra, visitae por cinco vezes as estações para ganiiar as indulgên­cias; se não está ahi erigida, visitae cinco vezes n igreja mais freqüentada do logar, recitando de cada vez cinco Padre- Nossos e cinco Avè-iMarias era honra das cinco chagas de nosso Senhor. Eis aqui vo.ssa penitencia. Pondo-lhe todavia esta condição: se alguma vez acontecer esquecer-vos, ou es­tar impedido por alguma grave occupação, podeis adial-a para outro tempo mais opportuno, sem que façaes d’isto es­crúpulo. Merecerieis jejuns, disciplinas e outras austerida- des: eu as farei por vós; conlcnto-me que façaes esta peni­tencia tão suave e tão leve. Eu vol-a dou por algum tempo, porque desejarei que depois d’estes dous mezes a façaes por

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devoção no resto de vossa vida. Renovae agora vosso aclo de contrição, c dizei do coração: Meu Senhor Jesus Christo, eu ine arrependo, etc. Feliz de vós se estas palavras parlem do fundo do vosso coração. Dominus noster Jesus Christus, etc.

Deus vos abençoe; ide em paz; reflecti que haveis recebido um novo baptismo, e que acabaes de nascer para uma nova vida; não commeltaes mais peccado mortal, tende uma com­pleta conliança na misericórdia de Deus que vos salvareis. E ’ inulil que façaes para o futuro uma conlissão geral. Crô- de-me, vós haveis feito bem esta, não penseis mais no passa­do; aconselho-vos, comtudo, que façaes todos os annos a con­fissão annual, a lim de que, lendo vossa consciência pura e limpa aos olhos de Deus, oblenhacs a vida eterna; Deus vol-a conceda.

Eis aqui, meu caro leitor, um modelo da conlissão geral. Lôde-o, tornac a lel-o de uma ponta a outra, e se não é de vosso gosto, porque não vos parece adaptado a vossas neces­sidades, sabei que é livre ao confessor diminuil-o, augmen- lal-o e accommodal-o em tudo e por tudo a vosso estado. Se, apesar de tudo isto, vo.ssa delicadeza não fica satisfeita, no me­nos não vos pareça máu que os outros se aproveitem d’elle, e quando entre todos aquelles que o Icrem não houvesse mais do que um que se servisse d’elle com proveito de sua alma, fazendo com pontualidade e integridade sua conlissão geral, eu julgaria ter empregado meu tempo e meu trabalho, por­que não lenho outro lim senão dar algumas luzes aos confes­sores noviços para bem dirigirem as pobres almas, e ensinar- lhes a fazer devidamente a conlissão geral; e ao mesmo tempo ser util aos penitentes, a lim de que elles se entreguem intei­ramente á direcção dos confessores, sobretudo dos missioná­rios, que passara sua vida a trabalhar em um ministério tão santo, tão glorioso a Deus, e tão vantajoso ao pro.ximo. Se eu me lenho enganado, emendem meu erro. Eu receberei a correcção como um favor de que vos serei humildemente obrigado, e orae por mim, a lim de que, querendo ser util aos outros, não venha a perder minha alma, porque receio com 0 Aposlolo: Ne forte cum aliis prwdicaverim, ipsere- probus e/ficiar.

Sobre 429. (S . FiuN Cisco de S a lle s , pag. 629.) — Eis-nos che- 0 modo de gados ao lim da conlissão; não se trata mais do que de dar a

absolvição. Ora, antes de dar a sanla absolvição pergunlareis ■ ao penitente .se requer humildemente que seus peccados lhe

sejam perdoados, se espera esta graça do merecimento da morte e paixão de nosso Senhor, se tem o desejo de viver para o futuro no temor e obediencia de Deus. Depois d’isto

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podeis fazer-lhe saber, que a sentença da absolvição, que vós pronunciaes na terra, será approvada e ratilicada no céo; que os anjos e santos do paraiso se regosijarão dc o ver voltado á graça de Deus, e que portanto viva de ora ávanie de modo que na hora da morte possa gosar o fructo d’esta conlissão; e por isso que lavou sua consciência no sangue do cordeiro immaculado, Jesus Christo, que tome cuidado cm não tornal-a a sujar. Taes ou semelhantes palavras dc consolação ditas, tirae o barrete para dizer as preces que precedem a absolvi­ção. E tendo proferido estas palavras: fíominus noster Jesus Christus, vos cobrireis e estendereis a mão direita sobre a cabeça do penitente, prosegiiindo a absolvição como vem no Ritual. E verdade, como diz o doutor Manoel dc Sá, que nas conlissões d’aquelles que se confessam a miudo, se podem cortar as preces que so fazem antes e depois da absolvição, dizendo simplesmente: Ego te absolvo ab omnibus peccatis tuis, in nomine Patris, et F ilii, et Spiritus Sancti. Deve di- zer-se o mesmo quando ha uma multidão dc penitentes e o tempo é breve; porque póde-se prudentemente resumir a ab­solvição, não dizendo senão: Dominus noster Jesus Christus te absoloat, et ego auctoritate ipsius te absolvo ab omnibus peccatis tuis, in nomine Patris, etc. Como tambem, quando ha aperto de penitentes que se confessam com frequencia, póde advertir-se-lhes que digam o Confiteor á parte para si, antes de se apresentarem ao confessor, a lim de que imme- diatamente chegando diante d’elle e fazendo o signal da cruz, comecem a accusar-se, porque assim nenhuma omissão se faz e se lucra muito tempo. 0 Padre Valerio Regnauld, da Companhia de Jesus, leitor de theologia em Dôle, novamente deu á luz um livro da Prudência dos Confessores, que será muito util áquelles que o lerem.

C.\PITULO V I

Sobre o sigillo sacramental

430. (Sacerdote SANTIFICADO, n.” 130-133.) — A cautela Respeito dos olhos c da lingua deveis juntar no confessionário a pos-peto sigillo tura modesta de toda a vossa pessoa, a lim de que tudo con- ®XÍSrante tribua para a bonra dc um ministro de Deus, para a santi-^conlissão dade de um tão grande sacramento, e para o segredo das cou­sas que não são de outra alçada mais do que do tribunal di­vino. Assim, seja o que for o que ouçaes e experimenteis, não deis o menor signal exterior que possa não edificar o pe-

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nitente, ou aquelles que vos vôera, nem prejudicar ao mais inviolável segredo. Se sois d’aquelles que, para não se es­quecerem das interrogações, mandatos, ou conselhos que re­servam para o lim, os marcam pelos dedos da mão fazei-o de modo que não deixeis adivinhar áquelles que podem ob­servar-vos. Quando tiverdes acabado vossas funcções, prin­cipalmente nos dias em que as tiverdes exercido por muito tempo, dae graças a Deus e ao.s santos patronos de vossos penitentes por sua assistência, a fim de a merecer para outra vez; finalmente, resta-vos guardar com o maior cuidado o si- gillo sacramental. Sc portanto vos acontecer o consultar ou­tros confessores sobre alguns casos, nunca falleis de circum- stancias imiteis que possam fazer de.scobrir o culpado, ou fa­zel-o suspeitar; por exemplo, o primeiro ou o ultimo que con­fessei, uma pessoa bem vestida ou vestida de tal modo. Con­clui de tudo 0 que dito lica, que não se podem empregar de­masiadas precauções para tornar inviolável o sigillo da con­lissão.

Abusos 431.— Deveis tambem concluir quanto os confessores se- sobre este riam reprehensiveis entretendo-se das cousas que ouviram ponto. conlissão. Quando não seja manifestação directa e evi­

dente do sigillo sacramental, poderiam comtudo prejiidical-o indirectamcnte, ou diminuir o respeito por uma tão santa acção, e augmentar n’aqiiellcs que os ouvem a difliculdade já tão grande de se confessar com sinceridade. Que seria se, por exemplo, dissesseis: N esta manhã, entre um grande nu­mero de penitentes, dei apenas a absolvição a alguns, tenho ouvido grandes iniquidades confessando em tal logar? Ah! quantos peccados neste genero! Estes modos de fallar não são evidentemente contrários ao sigillo? Parece innocente di­zer: Uoje confessei tal pessoa; tem acontecido que esta só palavra tem dado,suspeitas ao confessor ordinário d’csta pes­soa, a qual se havia confessado a elle no mesmo dia. Muito menos deveis permittir-vos gracejar á mesa, e na presença de seculares, dizendo, por exemplo, a uma creada: Olá, con- fessastes tudo? vosso confessor deu-vos uma boa penitencia? Este sacramento c muito augusto, para fazer d’elle motivo de um gracejo. Seria ainda mais reprehensivel o fallar á mesa com outros confessores d’aquillo que haveis ouvido, ainda que de um modo geral. Com elTeito, póde acontecer facil­mente que os seculares, em vez de darem attenção á precau­ção que tomaes de não fallar senão de um modo geral, notem sómente o que vós dizeis, e por consequencia creiam, ou ao menos suspeitem, que tomamos a liberdade de fallar uns com os outros de um modo claro. Ora, quem poderá dizer quanto uma tal desconfiança é capaz de lhes tirar a sinceridade em

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suas confissões, e de os levar ou a commcllerem um sacrilé­gio, calando alguma cousa, ou a não se tornarem a confessar, no receio de um igual crime? Se isto acontecesse, que mal horrivel para a Igreja! Certamente, nós os sacerdotes seria­mos os primeiros a recusar confessar-nos, se não estivesse- mos muito certos do sigillo. Comprehendei pois quanto im­porta sermos reservados em nossas palavras, a lim de arredar todo 0 receio dc manifestação, e dar uma maior certeza do sigillo inviolável que guardam os confessores.

432.— Lemhrae-vos aqui do zelo com que Bento X IV em Abuso do suas tres constituições. Suprema, Ubi primum. E t ad eradi- perguntar candum, se eleva contra o abuso de procurar que se lhes diga n;te"L’’os na confissão o nome do cúmplice, debaixo do pretexto de o nomes reprehenderera c de evitarem o mal. Elle estabeleceu que dos seus aquelle que ensina que uma tal conducla é licita, incorre í/)so‘''«"'P''ces fado ( ’) em excommunhão reservada ao Soberano Pontilice, de que não póde ser absolvido por confessor algum, de qual­quer auctorisação e dignidade que seja, excepto no artigo de morte. Elle declara além d’isto, que os confessores que perguntam aos penitentes o nome de seus cúmplices, e que lhes recusam a absolvição não o declarando, são culpados de peccado mortal, c devem ser denunciados ao santo ollicio por qualquer que tenba d’isto conhecimento, a lim de que sejam suspensos de suas funcções de confessores. Comtudo, elle perraitte aos penitentes a quem o confessor houver obrigado a manifestar o nome de seu cúmplice, que não denunciem seu confessor, sabendo que elle o fez por imprudeneia ou simplieidade, e se as circurastancias mostrarem que elle o não tem de costume. £ com razão que o Soberano Pontilice de­clara que é um peccado mortal digno das censuras da Igreja, e que deve ser denunciado a seus tribunaes, porque, além dos males que faz á Igreja e aos fieis, elle torna odiosissirao um sacramento tão necessário á salvação, e isto debaixo do pretexto de um zelo absolutamente proprio a enganar os jgnorantes. Traz além d’isto comsigo as cinco desordens enu­meradas pelo Soberano Pontilice {Synod.diaic., liv. VI, cap. xi), e que o determinaram a fazer as tres constituições acima citadas. Elle diz que: Proximi leedebatur fama; arctum sacra- menti confessionis sigillum periditabatur; absterrebantur fi- deles a suis culpis confessarto integre, prout cceteroquin opus est, manifestandis: rixa; et discórdia; disseminabanlur; et tota demim perturbabatur communitas. Nunca portanto pergun­teis ao penitente o nome de seu cúmplice; e se elle mesmo

(') Esta censura não existe ei

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quizer dizer-vol-o, adverli-o que não o faça. Se elle vos pe­dir que lhe façaes a correcção, nunca vos encarregueis d’islo, mas indicae-lhe antes algum meio de chegar ao mesmo lim. Eu vou mais longe; se o penitente vos pedir em confissão que digaes, ou façaes alguma cousa por elle, recommen- dae-lhe que vos falle n’isto fóra do santo tribunal, a lim de melhor assegurar o sigillo e de não fazer odioso o sacramento.

Exhorlação 433.— Premunido com todas estas precauções, c revestido aos con- Jas qualidades necessárias ao bem do penitente, alleiçoae-vos ressoies. adniini.»lração assidua d’este sacramenio; n’elle consegui-

reis uma grande vantagem vossa e do proximo; de sorte que na hora da morte sereis mais consolado por isto, do que por todas as vossas outras boas obras. 0 crucifixo, que tereis na mão n’esle ultimo momento, vos inspirará a maior con­fiança, dizendo-vos ao coração: «Servo liei, haveis, á custa de vossas fadigas, procurado a salvação de vossos irmãos; tende confiança, eu vou salvar-vos e conduzir-vos commigo a meu reino.» Praza a Deus que seja assim para vós e para mimi

0 quede- 434. (S. Liaoaio, n.“ 113.)— Vós o vôdes, deve o con- baixo do fçssor ter o maior cuidado em guardar o sigillo sacramental.

bem sabido e certo que o confessor não póde fallar das cousas ouvidas na conlissão, havendo perigo de revelação di­recta ou indirecta, ou de desgosto para o penitente, e isto mesmo no caso em que o confessor duvide sómente se o ou­viu ou não em conlissão, ou, em relação á conlissão, o que elle revela. (Lib. VI, n.» CS3.) Na verdade, não é prohibido ao confessor dizer, de um modo geral, algum peccado ouvido em confissão, quando é impossível conhecer o penitente; ou quando o penitente mesmo lhe houver dado uma permissão expressa; comtudo, n’este caso mesmo deve usar de discri­ção. Assim, 1.°, não se deve fallar dos peccados, que se ou­viram, diante de pessoas simpliccs que poderiam suspeitar que se revela a conlissão; 2.“, não dizer de cima do púlpito que em tal logar reina tal vicio de que se tem conhecimento pela conlissão: isto se entende quando só por este meio se tem sabido, e for pequeno o logar (Ib., n.® 632); principal­mente pregando em uma communidade, não se deve inve- ctivar extraordinariamente contra um vicio que pela conlissão se soube ser ahi mais commum (Ib.); 3.”, o confessor deve abster-se de importunar o penitente para obter d’elle a per­missão de fallar do que se ouve em conlissão, porque não lhe é mesmo permittido servir-se d’esta permissão quando ella não for absolutamente espontanea e plenamente livre. Deve portanto ser muito reservado, a fim de não pedir esta per­missão, excepto havendo absoluta necessidade. N’este caso

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mesmo é mais seguro resolver o penitente a fallar n’isto fóra da conlissão. É sabido lambem que, fóra da conlissão, não póde 0 confe.ssor fallar ao penitente mesmo de sua conlissão, sem sua permissão expressa; mas na conlissão póde fallar-lhe d’islo, se 0 julgar util ao penitente (n.» 191; vède a nola do n.* 432); 4.», não póde o confessor perguntar o nome do cúmplice, c se elle recusar a absolvição áquelle que não quer dizel-o, incorre em suspensão ferendw sentenliw; e aquelle que ensina que isto se póde lazer, incorre em ex- communbão papal ipso facto. Se o penitente for obrigado, debaixo de peccado mortal, a manifestar seu cúmplice para reparar um damno commum, tenho sustentado (n.° 192) con­tra outros theologos, que mesmo n’este caso não pódc o con­fessor obrigal-o a revelar seu cúmplice; sómente póde e deve obrigal-o a fazer conhecer seu cúmplice a outras pessoas em circumstancias de pôr termo ao escandalo. Mas se o peni­tente mesmo quizer revelal-o ao confessor, este póde ouvil-o e remediar o mal pelos meios convenientes. Notae todavia que por isto não 6 prohibido ao confessor perguntar ao peni­tente as circumstancias que são necessárias para saber se há uma especie diflerente de peccado, ou para assegurar a sal­vação do penitente, interrogando-o, por exemplo, se o cúm­plice é seu parente, se é ligado com voto de castidade, se ha­bita na mesma casa, se é uma creada, e outras cousas seme­lhantes, ainda que estas perguntas devam fazer conhecer in- directamente a pessoa cúmplice; mas em nenhum caso se deve perguntar seu nome. (Ib.)

43o. (S. Carlos, pag. 62 e 63.)— Assim, livre-se o confes- Conselho sor sobretudo de descobrir por palavras ou por signaes, de sobrequalquer modo que seja, ou o peccador ou o peccado, ou al- guma circumslancia que possa fazer conhecer a pessoa com quem foi commellido, ou, em uma palavra, alguma cousa que tenha ouvido na confissão, que possa dar algum conhecimento do menor peccado confessado; e quando for obrigado a pedir conselho para a resolução de algum caso dillicil que lhe hou­ver sido dito em confissão, deve abster-se muito de pedir es­clarecimentos a laes pessoas, e de tal modo que possu ser descoberto o penitente: é o motivo por que é bom que se abstenha inteiramente de fallar com outras pessoas dos pec­cados que ouviu na conlissão, e quando 6 necessário fallar d’isto, mesmo com o penitente, não o faça todavia sem sua permissão, nem de outro modo mais do que no acto, e de­baixo do mesmo sigillo da confissão.

436. (B. L eonardo, 1.* parle, n.“‘ 30 e 31.)— Sem me es- Continua-lender desmedidamente sobre o sigillo sacramental, creio de- Cho­ver propor-vos algumas considera^es práticas, dictadas pela

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prudência, próprias a prevenir todo o erro sobre esta maté­ria e toda a inquietação dc consciência. Vós sabcis já a dou­trina commum dos doutores sobre o sigillo sacramental, ao qual somos obrigados por direito natural, divino e ecciesias- tico. Em consequencia digo que devemos adoptar este axio­ma, que as cousas ditas em conlissão serão para nós como se nol-as não houvessem dito. Como não estranhar a impru­dência d’aquelles que fallarem sem discrição do que se diz em conlissão, como se houvesse sido dito cm uma praça pu­blica!? Quero persuadir-mc que é com boa intenção, e sem fazer conhecer as pessoas. Seja o que for, nunca se deve dar logar de suspeitar de que se falia do que se diz no tribunal, e todo 0 confessor deve lembrar-se bem d’esta maxima ca­nônica : Illud quod per confessionem seio, mims seio, quam illud quod nescio. (Cap. S i sacerd. de o/fic. jud. or.)

Com elTeito, segundo o papa Eugenio, o que o confessor sabe por meio da conlissão, o sabe ut Deus, e lóra da confis­são não falia senão ut homo, como o explica admiravelmente 0 doutor Angélico. Assim, como homem póde dizer que não sabe 0 que soube como representante de Deus. Eu digo mais: Ut homo potest jurare absque Icesione conscienlice se Mscire quod scit tantum ut Deus. (Quodiib. X II, art. 16, sup. 3.) Mas quando póde o confessor fallar para pedir con­selho sobre os casos que elle não poderia resolver por si mes­mo? Eu digo que o canon Omnis utriusque (Ib., De pwnit.) auctorisa a consultar, comtanto que nunca se exponha a fa­zer conhecer o penitente.

Por consequencia, que necessidade ha para dizer que este caso vos aconteceu na confissão? Exponde-o como se hou­vesse acontecido a outros, ou podesse acontecer. Quando ha muitos sacerdotes, como em uma missão, não o exponhaes publicamente, mas sómente áquelle que é mais capaz de vos dar conselho, e abstende-vos de toda a expressão imprópria na bôca de um confe.ssor, por exemplo: 0 primeiro penitente que hoje confessei, etc. A primeira mulher que hontem con­fessei, etc. S ’esta manhã achei um caso espantoso no confes­sionário, etc. Um mancebo que em tal logar fazia commigo uma confissão geral, etc. Um nobre que em tal missão vèio ter commigo, etc. Áquelle que se apresenta com tantos pecca­dos costumo dar tal penitencia, etc. A primeira mulher que confessei este anno era culpada de adultério, etc. Entre este grande numero de penitentes que hoje confessei, apenas achei dous ou tres culpados sómente de peccados veniaes, etc. Não vêdes vós que, fallando assim, expondes o penitente a ser fa­cilmente reconhecido, e portanto a violardes o sigillo tão sa­grado da conlissão? Comtudo, fallar sómente em geral dos

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peccados ouvidos na confissão sem nomear alguem, mas com 0 simples perigo de mauifeslar o penilenle, é contrario ao si­gillo? Theologos muito estimaveis sustentam a affirmativa, ainda que outros sejam de sentimento opposto. Fagnan de­cide, que fallar mesmo em geral dos peccados ouvidos cm confissão, com a certeza de que o peccador ficará desconhe­cido, raro faciendum est a viro gravíssimo, rarius a viro gravi, rarissime a viro levi. (Gap. Off. de pcenit. et rem.)

Concluamos pois e recordemos-nos que não ha n’isto par- vidade de matéria; que com o penitente mesmo não podemos dar algum signal dos peccados que nos disse no santo tribu­nal, e muito menos fallar d’elles sem uma livre, clara e ex­pressa permissão sua, porque uma permissão tacita não basta; que os prégadores mesmos, fallando contra os vicios, não de­vem dizer a menor cousa que possa fazer suspeitar que se servem do conhecimento havido no confessionário; que os confessores não podem entreter-se uns com os outros dos de­feitos das pessoas que dirigem; que com maior razão não po­dem os superiores servir-se do que tôem sabido na confissão para o governo exterior da communidade, mesmo quando o penitente não experimentasse com isto algum enfado. Em uma palavra, o confessor deve ser silencioso e circumspecto em tudo. No confessionário mesmo deve fallar tão baixo, que não possa de modo algum ser ouvido por aquelles que o cer­cam, em razão do sigillo devido ao respeito sacramental, tendo sempre presente no espirito o axioma acima enuncia­do : que as cousas ouvidas na confissão sejam para nós como se não as tivessemos ouvido.

Eis-nos chegados ao fim de nossas instrucçõcs. Eu as ter­mino por um caso bem sabido, mas que não poderá ser re­petido de mais. É o de um fidalgo que vivia em occasião próxima com uma mulher culpada, e que, por sua desgraça, tinha achado um confessor de uma condescendencia sem igual, que o absolvia sempre. A esposa do fidalgo, senhora de uma alta piedade, não se esquecia de aguilhoar a con­sciência de seu marido, fazendo-lhe suspeitas todos estas absolvições dadas sem a separação da occasião; seu marido ria-se de seus esforços. «Vós quereis fazer de lheologoI lhe dizia elle. Tende cuidado de vossa alma, que eu o terei da minha; se meu confessor não podesse absolver-me, não me absolveria.» Elle continuou a viver como até alli, e a confes- sar-se como d'anles. A mesma confissão que fez no artigo de morte foi semelhante áquellas que havia feito no decurso da vida. Ficando viuva a senhora, e estando um dia era oração em seu oratorio, viu entrar, no meio de um enorme turbilhão de chammas, um homem monstruoso ás costas de um outro

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homem. A boa senhora queria fugir. «Não, lhe disseram, não, delende-vos: sabei que eu sou a alma de vosso marido, e aquella que me conduz é a alma de meu confessor; estamos ambos condemnados, eu por me haver confessado mal, e elle por me haver absolvido mal a proposito.» E a visão desappa- receu.

C A P IT U LO VII

Resumo geral

Aviso aos 437. (S. Liconio, n.”’ 166-211.) — Eu resumo aqui todas confesso- as nossas instrucções precedentes, e aponto algumas das prin-

cipaes cousas que devem fixar vossa attenção no exercicio do santo ministério.

1.® Antes de tudo usae da maior caridade a respeito dos peccadores, seja recebendo-os, seja inspirando-lhes confiança na misericórdia de Deus. Mas tambem nunca o respeito hu­mano vos estorve de os advertir com força, e de fazer-lhes conhecer o miserável estado em que se acham, indicando-lhe§ os meios mais convenientes para quebrar as cadeias de seus máus hábitos; sobretudo sede firme em recusar-lhes a absol­vição, quando isto for necessário.

2." Aos ignorantes perguntae ordinariamente se elles sa­bem os principaes mysterios da fé. Lembrae-vos do que em os n.<" 170 e seguintes deixamos dito.

3.® A estes mesmos ignorantes, assim como ás pessoas que se descuidam dos negocios de sua consciência, não deixeis de perguntar as faltas em que esta classe de gente costuma cair, se ellas não se accusam d’isto.

4.® Sede reservado interrogando sobre a pureza, princi­palmente com raparigas e rapazes, a lim de lhes não ensinar 0 que elles ignoram. Se, interrogando sobre esta matéria, ex- perimentaes tentações, elevae muitas vezes vosso coração a Deus. Lançae vossos olhos sobre alguma santa imagem, e, antes de entrar no confessionário, tende sempre cuidado de purificar vossas intenções.

B.® Quanto aos paes e mães, não vos contenteis de os in­terrogar em geral sobre a educação de seus lilhos, mas per- guntae-lhes em particular se elles os reprehendem como de­vem; se têem cuidado de lhes fazer aprender o catecismo, de os impedir de freqüentar más companhias, e sobretudo sendo raparigas, de entreterem conversações com rapazes, e a for-

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tiori com pessoas suspeitas, homens casados, religiosos ou ecclesiaslicos.

6.” Aos penitentes dc quem se podér suspeitar que por vergonha occultariam algum peccado, taes como os ignoran­tes, as mulheres e rapazes, pergunUie se tôem alguma in­quietação sobre sua vida passada, animando-os a dizerem tudo. Quantas almas tem livrado do sacrilégio esta per­gunta!

438 .-7 .“ Quando mesmo houver um grande concurso de Conünua- penitentes, não vos apresseis mais do que é devido, de sorte Ç“0- que, para aviar um maior numero, falteis á integridade da conlissão, ou ao cuidado que deveis dedicar ao penitente para 0 dispor convenientemente, ou finalmente ás admocstações e conselhos de que elle carece.

8.“ Quando um penitente accusa um peccado mortal, prin­cipalmente se elle o commetteu muitas vezes, não vos con­tenteis de lhe perguntar a especie e o numero, perguntae-lhe tambem se, quanto no passado, foi habitual; além d’isto, com que pessoa pcccou e em que logar, para ver se ha um habito a destruir, ou uma occasião a afastar. Muitos confessores são omissos n’estc ponto. D’aqui provém a perda de muitas al­mas; porque 0 confessor que é negligente em fazer estas per­guntas não póde conhecer se o penitente é rccidivo, por con­sequencia não poderá dar-lhe os meios convenientes para des­truir 0 habito e tirar a occasião. Lembrne-vos dos principios estabelecidos era o n.“ 3o4, onde vimos que o penitente recidivo não póde ser absolvido senão depois da prova de emenda, ou dando algum signal extraordinário de sua disposição. Quando se trata de occasião próxima, não tenbaes respeito humano para com pessoa alguma, e sede firme em recusar a absolvi­ção até que o penitente haja retirado a occasião, se ella for »n esse, como havemos dito em o n.“ 317; se a occasião for necessaria, recusac tambem a absolvição até que de próxima ella se torne remota, pelo uso dos meios para isto designa­dos. Sobretudo sede firme cm recusar a absolvição aos futu­ros esposos que se visitam (•), e a seus parentes que o per- mittem. Se elles vos disserem que não resulta d’isto algum mal, não os acrediteis, porque isto é moralmente impossível, como a experiencia o prova.

9.0 Não deis a absolvição áquelles que querem receber

(') Póde acontecer que as visitas entre futuros esposos sejam muito raraSj muito curtas c cercadas de bastantes precauções, para que ellas nao se tornem uma occasião de peccado: cumpre ao con­fessor 0 julgar a este respeito segundo as circumstancias.

(Nota do traductoT francez.)

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uma ordem sacra, c que estão no habito de algum vicio, se não vôdes antes que elles tôem adquirido esta santidade po­sitiva necessaria á jerarchia a que aspiram. (Vôde os n.” 3B9 e seguintes.)

10." Livrac-vos de desviar alguem, por via de respeito humano, da vocação ao estado religioso. S. Thomaz diz que uma uil conducta não póde ser escusada de peccado mortal. (Quodiil). II I , arl. 14.) Quantos confessores ignorantes talvez não fazem escrúpulo algum de desviarem mancebos da voca­ção a um estado perfeito, para comprazer com seus parentes, dizendo-lhes que os (ilhos são obrigados a obedecer a seus paes e mães! Comtudo a doutrina commum dos doutores, fundada sobre a auctoridade de S. Thomaz, é que na escolha do estado vitalicio cada um é livre e deve antes obedecer a Deus, que o chama, do que a seus paes. Por outra parte, notae que não podeis absolver aquelle que, sem vocação, quizesse tomar ordens sacras. (Lib. VI, n." 803.)

Continua- 439.— 11.® Confessando sacerdotes, sede respeitoso, mas Ção. firnie era fazer-lhes as correcções necessárias e era recusar-

lhes a absolvição, sendo necessário. Não deixeis de interro­gar aquelles que são pouco timoratos sobre tres cousas em particular: 1.®, se lêem dilTerido por ura mez o celebrar mis­sas, se forem por defunto, e por dous mezes, se forem por vivos, porque esta demora não se escusa de peccado mortal (ib., n.° 317, q. 11); 2.®, se elles tôem aelebrndo com preci- pitação, porque ha peccado mortal em dizer missa em menos de um quarto de hora, quando mesmo fosse uma missa vo- liva de nossa Senhora, ou uma missa de defunto (ib., n.® 40); com effeito, é impossivel, gastando tão pouco tempo, não faltar notavelmente ás cereraonias, ou ao menos á gra­vidade com que se devera fazer, ou finalmente ao respeito que é devido a este augusto sacrificio; 3.®, se elles têem sa­tisfeito á obrigação do oíücio, principalmente sendo benefi­ciados. Não deixeis de lhes rccomraendar que se habilitem

C trabalhar na salvação das almas, segundo o talento que lhes deu; que façam preparação antes da missa e acção

de graças depois, assim como oração mental, sem a qual dif-

12." Em matéria de restituição de bens alheios, ordinaria­mente não absolvaes o penitente, que póde restituir, antes que 0 faça; porque, uma vez absolvido, diOicilmente o fará. Notae cointudo que um grande numero deixa de ser obri­gado á restituição por causa da prescripção feita na boa fé; sobre o que deveis notar: 1.®, que os bens moveis, quando ha um titulo presumido, prescrevem em tres annos, e os im- moveis em dez annos inter pmsentes, e em vinte annos in-

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ter absentes; 2.®, que é provável que esla prescripção seja válida no fôro da consciência, mesmo quando no fôro exterior a lei da prescripção não esteja em uso, como no reino de Ná­poles, por causa da difliculdade de provar a boa fé. Excepto comtudo as pre.«cripções expressamente prohibidas por al­guma lei particular, como no reino de Nápoles, onde a pre- scripçào de herdeiro não é reconhecida quando o testador possuiu de má fé. Vôde, quanto ao mais, o que sobre as prescripções havemos dito. (Lib. I I I , n.® BÜ4 até 517.)

13.® Se 0 penitente recebeu alguma oITensa, pela qual seu inimigo está entregue á justiça, não o absolvaes ordinaria­mente sem que elle lhe dô o perdão. (Vôde o n.® 177.)

14.® Quando prcvirdes que a advertência será inutil, e que 0 penitente está na boa fé, não a façaes, principalmente ouando se trata da nullidade de um casamento já contrahido. Deve exceptuar-se a obrigação de denunciar confessores so- licilanles in matéria turpi, porque ha uma determinação di­recta que ordena ao contessor que imponha esta obrigação a todos aquelles que fossem solicitados. (Vôde os n .°‘ 41, 42 e

lo!® Fazei recitar a todos o acto de contrição, a não pre- sumirdes com certeza que o penitente o tenha feito como deve. Não deixeis de lembrar motivos de attrição e de con­trição, assim como os havemos exposto cm o n.® 43. Notae sobretudo que se-o penitente se apresentar sem disposição, sois obrigado, quanto em vós cabe, a dispol-o para a absol­vição. (Vôde 0 n.® 41.)

16.® Não deis n absolvição aos penitentes que não accu­sam mais do que peccados veniaes, mas a que estão habitua­dos, não testemunhando elles uma verdadeira contrição e um lirme proposito de se emendarem, ao menos de algum em particular, ou não dando por matéria da absolvição alguma falta mais grave da vida passada. (Vôde o n.®353.) Quantas conlissõcs inválidas, que em si são verdadeiros sacrilégios, tôem por este modo logar pela negligencia dos confessores I

17.® Não iraponhaes senão as penitencias que podeis ju l­gar que 0 penitente facilmente cumprirá, assim como o ha­vemos dito cm 0 n.° 407; mas tende cuidado que ellas sejam medicinaes, como a frequencia dos sacramentos, as visitas a nosso Senhor, o encommendar-se a Deus de manhã e á noite, fazer leituras de piedade, alistar-se em alguma associação, e outras cousas semelhantes.

18.® Ás pessoas piedosas, que freqüentam os sacramentos, recommendae o uso da oração mental, e pedi-lhes conta d’islo ao menos interrogando-as se a tôem feito. Por este pequeno cuidado não ha confessor que não possa salvar muitas almas.

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Não sejaes diilidl em conceder a comraunhão frequenle todas as vezes que notardes ou que julgardes prudentemente que 0 penitente tirará d’isto proveito.

19.® Aos escrupulosos recommendae sobretudo a obediên­cia; dizei-lhes que desobedecendo se põem em perigo de per­der-se. Sede lirme e severo para vos fazer obedecer; sede resoluto e decisivo em vossas palavras, porque se fallaes com timidez, augmenlareis suas inquietações. Dae-lhes regras geraes para depor suas dúvidas, segundo a necessidade de cada um; por exemplo, áquelles que estão sempre em escrú­pulo sobre suas conlissões passadas, prohibi-lhes o accusarem alguma de suas faltas passadas, exccpto se estiverem certos que são peccados mortaes, e com certeza nunca os confessa­ram; e sede firme para não os ouvir, se elles recusarem obe­decer. Se uma só vez cederdes, o penitente estará sempre inquieto; ha confessores que perdem estas almas confessan­do-as. Áquelle que teme que todas as suas acções sejam ou­tros tantos peccados, ordenae que vençam o escrupulo e obrem livremente em tudo o que não vôem evidentemente ser peccado.

20.” Quanto á escolba de opiniões, tratando-se de desviar 0 penitente do perigo do peccado formal, segui raras vezes as opiniões benignas, tanto ao menos como vol-o permiltir a prudência christã. Tornando uma opinião mais proximo o perigo de peccado formal, deveis sempre aconselhar a opi­nião mais rigida. (Vôde o n.“ 320.) Eu digo aconselhar, por­que se a opinião é provável, e o penitente a queira seguir, não podeis recusar-lhe a absolvição, a que adquiriu um direito certo pela conlissão de seus peccados. ÍN.® 228.)

21.“ Confessando mulheres, e tratando com ellas, usae de toda a severidade que a prudência vos permitte. Assim, re- cusae seus presentes, fugi dc sua familiaridade e de tudo que póde ser causa de alTeição. Quantos confessores, por serem descuidados sobre este ponto, tôem perdido suas almas e as de suas penitentes!

22.° Sede humilde e não presumacs de vossa sciencia. Assim, pedi muitas vezes a Deus, pelos merecimentos de Je ­sus Christo, principalmente nos casos duvidosos, a luz npces- saria para o decidir hem. Invocam, et venit in me spiritus sapientive. {Sap.,\u, 6.) 0 ’isto deveis concluir, que um con­fessor que não faz oração carecerá muitas vezes de prudên­cia e discrição. Nos casos mais embaraçados ou mais graves não deixeis de consultar aquelles que são mais doutos e mais experimentados. Sede especialmente liei a este conselho, quando se tratar de dirigir uma alma mais adiantada, a quem Deus favorece com dons sobrenaturaes, quando vós não sois

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mais do que noviço n’esta maleria. Alguns ha que tôem ape­nas uma tintura da sciencia ascética, e que se envergonham de consultar. Os sacerdotes verdadeiramente humildes se acautelam muito de terem semelhante conducta. Não só­mente consultara mesmo muitas pessoas quando é mister, mas enviam as almas d’esta classe a directores mais haheis para serem dirigidas por elles, ou ao menos para receberem seus conselhos. Não ouçaes estas almas nos dias festivos; re- servae estes dias para as pessoas mais necessitadas, princi­palmente os pobres jornaleiros.

440.— Para completar nossas instrucçõcs, vou recordar Aviso aos em resumo algumas das obrigações particulares dos parochos paroclios. a respeito de suas ovelhas.

1.“ 0 pastor é ohrigado a instruil-as dos mysterios da fé e das cousas necessárias á salvação; taes são," por exemplo:1.®, os quatro principaes mysterios, que não ha mais que ura Deus, e que este Deus é õmnipolente, infinitamente snbio,Creador e Senbor de Iodas as cousas, misericordioso e sobe­ranamente amavcl; sobretudo que Elle recompensará os bons e castigará os máus: que ha tres pessoas em Deus iguaes em tudo; que o Filho, segunda pessoa, tomou um corpo e uma alma semelhantes ás nossas; que morreu por nós; 2.®, os sa­cramentos necessários, o Baptismo, a Eucharistia, a Peniten­cia, e os outros, quando se hajam de receber; 3.®, os artigos do Credo, entre outros a virgindade de nossa Senhora; o lo­gar de Jesus Christo á direita do Padre, quero dizer, que iElle gosa no cóo' uma gloria igual á do Padre; a resurreição dos corpos, no juizo final, que será feito por Jesus Christo; a unidade da Igreja romana, na qual só se acha a salvação; fi­nalmente, a eternidade do paraíso e do inferno: ha obrigação grave para todo o christão de saber estes artigos; 4.”, os mandamentos de Deus e da Igreja; li.“ , o Padre-Nosso e a Avi-Maria, assim como os actos de fé, esperança, caridade e contrição. Ora como ha peccado mortal para o christão que não aprende estas cousas quanto á letra e quanto ao sen­tido, da mesma sorte ha peccado mortal para o pastor, se­gundo a doutrina commum dos theologos, se, por si mesmo ou por outros, quando está legitimamente impedido, como diz 0 Concilio de Trento, se descuida de os ensinar ao menos em substancia a seus parochianos, meninos e adultos que não os sabem. E a razão por que, se elle notar que os paes ou amos não enviam seus filhos ou seus domésticos ao cate-’" cismo, é obrigado a tomar as medidas convenientes com o bispo, 0 qual póde, segundo o Concilio de Trento (sess. 24, cap. iv), forçar os paes mesmo com censuras ecclesiasticas.Os bons parochos devem ter um registo dos meninos para

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saber aquelles que faltam. Lacroix diz mesmo que, havendo pessoas ignorantes que nSo possam vir á igreja, porque são obrigadas a guardar o casa ou o gado, deve o pastor ir in- struil-as cm particular, cum quantocumque suo incommodo, segundo a expressão d’este sabio auctor. (Lib. I I I , q. 149; et lib. II I , p. 1, n.» 767.)

Nós diremos ao menos que sendo-lhe isto muito diCGcil, por causa do grande numero d’estes ignorantes, deve ao menos examinal-os e instruil-os no tempo do preceito paschal, ou quando elles vem pedir attestados para a confirmação ou ma­trimônio. E bom tambem que o pastor se certifique se os amos e as amas se acham em estado de ensinar bem a seus domésticos o catecismo e os meios rde viver no temor de Deus.

2.® E obrigado o parocho a administrar os sacramentos por si mesmo todas as vezes que os parochianos o pedirem com justiça. Sc tem coadjutor, deve examinar bem sua vida e sua conducta, de outra sorte dará contas a Deus de todas as im­prudências que tiverem logar. Além d’isto, é obrigado a as­sistir aos moribundos, a não haver para isto uma outra pes­soa capaz que o faça. Deve empregar cuidados particulares com os peccadores moribundos e habitudinarios, porque elles estão em grave necessidade de receber seus soccorros. Quan­to á Extrema-Unção, deve recordar-se do que diz o Catecis­mo romano: Gravissime peccant qui illud lempus cegrolos un- gendi observare solent, cum jam, omni salulis spe amissa, vita et sensibus carere incipiant. (Part. 2.®, cap. vi, n.° 9.) 0 pa­rodio é tambem obrigado a informar-se se seus parochianos têem cumprido o preceito paschal. (Barb., De 0/jic. paroch., cap. II, n.® 7; Seig., Past. instr., cap. xxiit.) Tenha cuidado de não confiar indistinctamcntc os bilhetes de conlissão a todo 0 clérigo.

3.® Deve impedir que se dé o habito clerical aos mancebos e meninos em quem não se notarem disposições para o estado ecciesiastico. Deve dar um grande cuidado á instrucção de seus clérigos, que usam já de habito clerical; de outra sorte estes mancebos, sem instrucção e sem disciplina, irão ás or­dens per fas e per nefas, e se tornarão o escandalo dos po­vos. Não fallo aqui da conta terrivel que darão a Deus os pa- rochos que passam attestados aos ordinandos, cuja indigni­dade conhecem, ou antes de se haverem certificado, por cui­dadosas informações, da bondade de sua conducta.

4.® 0 parocho é obrigado a inquirir n este respeito d’aquel- les que vivem em peccado, a fim de os reprehender: a res­peito das inimizades e escandalos que reinam entre os espo­sos, a fim de os remediar quanto for possivel. Eis aqui o que

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diz s. Thoraaz: Qui habet specialein curam alterius, debet eum quwrere ad hoc, ut corrigat de peccato. (2,2, q. 15, a. 1.) Se exislir algum escandalo dado por uma pessoa poderosa, principalmente por um sacerdote, e ao qual não póde reme- diar, deve ao menos prevenir o bispo a íira dc que dô provi­dencias. Nem 0 temor, nem o respeito humano poderão au- ctorisar que se omitia esta ohrigação. 0 boin pastor é obri­gado a dar sua vida pela salvação de suas ovelhas.

B.° Deve abster-se de receber as promessas de futuros es­posos muito tempo antes de casamento, porque todo o tempo que se passar entre os esponsaes e o malrimonio será um tempo do peccado para os noivos e seus parentes.

fi.° Quando ha na parochia desordens graves que o pastor não póde remediar, deve fazer quanto em si cabe para ter uma missão, não achando outro meio dc fazer cessar o mal. Será sempre util chamar de tempos em tempos confessores desconhecidos para as pessoas a quem a vergonha prende, principalmente se o pregador da quaresma não costuma con- lessar; mas o parocho que recusa a missão dá grande motivo de suspeitar de sua virtude.

7.0 0 parocho não deve sómente dcsarreigar o mal, deve tambem procurar o bem, á imitação de todos os bons pasto­res, que não se cansam de exhorlar á frequencia dos sacra­mentos, á assiduidade nas assembléas religiosas, á visita do Santissimo Sacramento c de nossa Senhora, ás novenas, a acompanhar nosso Senhor quando se leva aos enfermos, e es­pecialmente a que façam oração mental, cujo methodo have­mos dado em os n.“* 300 e seguintes.

8.° 0 parocho é obrigado a prégar nos domingos e festas principaes. Assim, dizem os doutores (lib. IV , n.°* 260 c 360) que pecca gravemente o parocho deixando de prégar per mensem continuum, aut per tres menses discontinuos, excepto comludo os dous mezes durante os quaes o Concilio de Trento permitte aos parochos que se ausentem de sua residencia por uma causa justa e approvada pelo bispo. Deve nolar-se tam­bem que 0 mesmo Concilio (na sess. 5, cap. u. De Reform.) ordena aos pastores que alimentem suas ovelhas com o pão da palavra divina, segundo sua capacidade, fazendo sermões simplices e claros, a fim de serem entendidos; porque a fé se conserva e estende pelo meio da prédica, fides ex auditu. As­sim os povos não colherão senão pequeno fructo de discursos que não forem semelhantes aos de Jesus Christo e dos apos- tolos, que prégaram non in doctis humance sapientiw verbis, sed in ostensione spiritus et virtutis, como diz o apostoloS. Paulo. E por isto que o venerável Padre M. Avila tinha razão em chamar não ministros, mas traidores de Jesus Chris-

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to áquelles que pregam por vaidade; o padre Gaspard Saneio acrescentava, que iguaes prégadores são os maiores perse­guidores da Igreja. Com elTeito, prégando como elles fazem, occasionam a perda de um grande numero de almas, que cora sermões feitos á apostolica se teriam salvado. As palavras vãs, os periodos sonoros, as descripções inúteis, dizia S. Fran­cisco de Salles, são a perda da prédica, cujo fim unico deve ser inclinar para o bem a vontade dos ouvintes, e não recrear 0 espirito com cousas inúteis: e a experiencia prova que es­tas palavras Doridas ninguém convertem, porque Deus não dá 0 concurso de sua graça á vaidade. Isto se entenda para todos os prégadores que faliam com vaidade, mas principal­mente com os parochos, aos qiiaes o Concilio de Trento or­dena no logar acima citado: Archipresbyleri quoque, plebani, et quicumque curam animarum obtinent, per se vel alios ido- neos, si legitime impediti fuerint, diebus saltem dominicis et festis solemnibus, plebes sibi commissas pro sua et earum cor pacitate pascant salutaribus verbis. Prestae attenção a este pro earum capacitate, porque d'isto resulta evidentemente que contraveem as determinações do Concilio os pastores que não descem á capacidade do povo que os ouve.

0 que Cl- 441. — E bom indicar aqui algumas das cousas mais ira- portanles que o pastor deve inculcar mais frequentemente a

maisamiu-®C“ s"®® prédicas: 1.®, que para mudar de vida nãodo ao seu basta fazer proposito de fugir do peccado, mas que é tambem

povo. necessário evitar a occasião do pcccado. Fallando dos futuros esposos que freqüentam as casas de suas futuras esposas, deve dizer que nem elles, nem seus paes, que o sabem, po­dem ser absolvidos antes que tirem uma tal occasião.

2.® Que insista para impedir os homens de irem ás taver­nas, representando-lhes os numerosos peccados que se com- mettem ordinariamente ahi; sem fallar da crapula, é a blas- phemia, as desordens, os escandalos, as obscenidades, as dis­córdias da familia e a impotência de a sustentarem, etc.

3.® Que prégue e se eleve muitas vezes contra o habito geralmente espalhado, principalmente nas aldeias, de profe-

■ rirem discursos deshonestos nos campos, lojas e oilicinas; dis­cursos mais culpados ainda quando se proferem diante de meninos, de raparigas e de pessoas de dilTerente sexo. Ohl quantos mancebos pervertidos por semelbantes práticos! Te­nha cuidado de admoestar os paes, os amos e os mestres de olHcios que sejam cuidadosos em reprehender e castigar seus filhos ou seus operários que usam de semelhante linguagem, principalmente no tempo das vindimas.

4.® Que represente com força a enormidade do sacrilégio de que se fazem culpados aquelles que se confessam e com-

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DiuDgam depois de terem calado por vergonha algum peccado mortal; e a fim de inspirar mais temor e horror por um mal tão grande, que tenha cuidado de referir a miudo algum exemplo terrivel d’aquelles que tôem feito confissões sacríle­gas por haverem occultado. Póde servir-se para isto do pe­queno livro do Padre Vega, intitulado Exemplos a respeito da confissão, etc.

5.° Que recorde a miudo a necessidade da contrição e do firme proposito, mesmo nas confissões de peccados veniaes, dizendo que ninguém deve receber a absolvição não tendo um verdadeiro arrependimento ao menos de algum dos pec­cados veniaes de que se accusa, ou não dando matéria certa, quero dizer, algum peccado da vida passada, de que tem uma dor verdadeira, necessaria para a validade da confissão. Ora, como os ignorantes comprehendem pouco o que deve ser esta dor, dirá muitas vezes que todo o penitente, para vali­damente se confessar, seja que tenha contrição ou attrição, deve ter um tal pezar de seu peccado, que o abomine e abor­reça mais que outro qualquer mal.

6.° Que exhorte a substituir, nos transportes da cólera, as blasphemins e as imprecações por palavras boas e innocen- tes; por exemplo: Maldito seja o peccado, maldito seja o diabo, ou: Santa Virgem, ajudae-me; Senhor, dae-me paciên­cia.

7.® Que inspire horror por toda a especie de superstições, ou vãs observancias que o povo emprega para curar enfer­midades, ou para conhecer os ladrões, etc.

8.® Que recommcnde aos paes c mães que castiguem seus filhos, principalmente quando são pequenos, se elles blasphe- marem ou roubarem, etc.; além d'isto, ter cuidado de obser­var e informar-se quaes são as suas companhias, c prohibir- Ihes de freqüentarem as más e as pessoas de diflerente sexo; finalmente, de não deitarem comsigo na cama seus filhos, quando são muito novos, por causa do perigo de os sullocar, ou muito grandes, por exemplo, depois dos seis annos, por causa do perigo de os escandalisar; com maior razão, que não façam deitar juntos os rapazes e raparigas.

9.® Que exhorte continuamente seus parochianos a expul­sar suas tentações, principalmente contra n pureza, pela in­vocação dos santos nomes de Jesus e de Maria. É este ura grande remedio contra as tentações.

10.® Que diga continuamente e cora instancia, que se al­gum cair em peccado mortal, faça logo um acto de contrição para recuperar a graça perdida, com a firme resolução de se confessar o mais breve que podér. Que ponha a descoberto esta illusão do demonio, que persuade aos peccadores que

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Deus perdoa com a mesma facilidade dous peccados como um; porque póde muito bem acontecer que o Senhor, pa­ciente depois de um primeiro peccado, os lira ou os abandone depois de um segundo.

11.“ Que ensine os actos que cada um deve fazer de ma­nhã, levantando-se: actos de graças, de offerecimento e de súpplica, com tres Avè-Marias, e a lirme resolução de evitar todo 0 peccado e principalmente aquelle em que se cáe mais a miudo, pedindo a nossa Senhora que o livre d’elle; que ex- horte todas as mães a que façam praticar isto todas as ma­nhãs a seus filhos. Que pregue lambera que os paes são obrigados a fazerem aproximar seus filhos dos sacramentos, porque se os não freqüentam, cairão brevemente no des­agrado de Deus: desgraça horrivel que os paes devem pre­venir. Que diga lambem que os paes se fazem culpados quando, sem jusUis razões, .«e oppõem ao casamento de .seus filhos, forçando-os a casar contra sua vontade; que o mesmo é a respeito dos filhos que conlrahem matrimonio contra a justa vontade de seus paes. (Lib.VI, n.“ 849; V. Conven. adVI.)

12.“ Por isso que é verdade, como acima havemos dito, que 0 pastor é obrigado não sómente a impedir o mal, mas lambem a procurar o bem, que exhorte seu povo á visita quotidiana do Santissimo Sacramento e de nossa Senhora; póde fazer esta visita em commum com seu povo, á noite, por exemplo, escolhendo o momento mais commodo, do modo que se pratica em muitos logarcs; que acrescente que aquel­les que não podem vir á igreja façam a visita em sua casa. Sobretudo que recommende aos homens a assiduidade á mis­sa conventual, a todos a comraunhão com a preparação con­veniente e acção dc graças composta dos actos dc fé, de amor, de ofTerecimeulo e petição, ensinando-lhes o modo prá­tico de os fazer.

13 “ Que tenha cuidado de alTeiçoar seu povo á devoção para com a Santa Virgem, recordando-lhe quanto são gran­des 0 poder e misericórdia d’esta divina Mãe, quando ella está disposta a ajudar seus fieis servos. Que recommende por consequencia que recitem todas as noites o rosário em com­mum com suas familias, que jcjuem aos sabbados, e que fa­çam novenas ás festas d’esta boa Mãe; e advertirá o povo quando são estas novenas. Seria bom que no sabbado fizesse um pequeno discurso, no qual referisse algum rasgo da bon­dade e poder da Santa Virgem, e uma vez em cada anno uma novena solemne em sua honra, com sermão e exposição do Santissimo Sacramento. Poderá para isto servir-se do livro impresso com o titulo de Gloi ias de Maria, onde se acharão

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matérias e exemplos. Feliz o pastor que enlretem seus paro­chianos na devoção para com Maria! com o auxilio d’esta terna Mãe viverão santamente, e elle mesmo terá uma pode­rosa advogada no momento da morte.

Finalmente, nada se omitta para fazer tomar a seu povo o santo uso de se encommendar com frequencia a Ueus, pe­dindo a perseverança pelo amor de Jesus e de Maria. Dirá a miudo que as graças, e especialmente a perseverança, se ob- têem pedindo-se. Petüe el accipielis. Que publique a miudo esta grande promessa do Salvador, que tudo o que pedirmos a seu Pae em seu nome, seu Pae nol-o concederá. Amen, dico vobis, si quid pelieritis Pairem in nomine meo, dabit vobis. {Joan., xvi, 23.) ,Que recommende tambem muito a prática da oração mental, e que procure fazel a todos os dias na igreja com seu povo, ou ao menos nos dias festivos, ensi­nando igualmente o modo de a fazer em casa; é por isto que tenho indicado em os n.®’ 300 e seguintes a necessidade da oração mental e o modo prático de a fazer.

442.— A graça e o amor de nosso Senhor Jesus Christo se- Avisos de jam comvosco. A caridade me interessa muito em tudo o que s. Francis- vos diz respeito, para vos deixar ir a esta missão de Ormuz, co- -a icr. tão laboriosa e importante, sem participar-vos o que julgo po­der servir-vos de auxilio.

Tenho portanto a dizer-vos em primeiro logar, que volteis os primeiros e os mais elDcazes de vossos cuidados sobre vós mesmo, não fazendo caso mais que da gloria de Deus, e de vosso progresso nas virtudes para seu maior serviço. Sendo movido por estas duas intenções, sereis igualmente feliz e sa­bio no comraercio das almas, e descereis voluntariamente a todos os exercicios da humildade e piedade chrislã. E a ra­zão por que vos recomniendo que façaes vós mesmo o cate­cismo aos meninos portuguezes, ao povo miudo, aos crea­dos e creadas, e aos pobres escravos. Para estes (ins todos os dias, pouco mais ou menos ao meio dia, tomareis uma cam­painha na mão, e.fareis um giro pela cidade com vosso com­panheiro, convidando-os em voz alta a irem á igreja, onde lhes fareis recitar a todos juntamente as orações quotidianas, e algum artigo da doutrina, que pronunciareis alta e vagaro­samente, a lim de que elles possam repetir comvosco. Seja qual for a occupação que tenhaes, não vos priveis do mereci­mento d’este santo exercício, nem delegueis em algum outro uma commissão tão santa e honrosa: porque, instruindo os pequenos, vós ediíicareis muito os maiores, e estas funcções de humildade têem recebido de Deus esta vantagem sobre as outras, que ellas ganham mais almas, não sómente para Deus, mas para aquelle mesmo que as pratica.

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Mas para seguir alguma ordem nas advertências que pre­tendo dar-vos n’cste escriplo, e para começar por vossa na­vegação. no decurso de viagem em o navio sereis cuidadoso de vos informar habilmente dos costumes do povo de Orrauz, e dos vicios que reinam dentro e fóra da cidade. Dirigi-vos portanto a pessoas que possam fallar d’islo com conhecimento e sem paixão, e sabei que genero de iralicos, de contratos e de sociedades ahi estão em uso; que corrupções, delongas, chicanas e falsidades se praticam nos tribunaes; que desor­dem haverá em todos os ramos da republica; porque não ignorando vós os males, achareis mais facilmente os reme- dios, e este conhecimento, que vos fará mais fervoroso não sómente em orar a Deus, mas tambem em tratar com as al­mas. e em lhes prégar segundo suas necessidades, vos servi­rá, estou certo, tanto ou mais do que a leitura de livros, a qual todavia não se deve esquecer. Quanto a mim, sempre conheci que esta descoberta me era muito u.t>l> e que sem ella eu caminhava ás apalpadelas nas cousas de nossas fun- cções.

Visitareis a miudo os enfermos, mesmo os do hospital pu­blico; e bavendo-lhes advertido que as fontes mais ordinarias dos males do corpo são os da alma e os peccados, os attrahi- reis docemente a procurar a paz de suas consciências, a fira de que, tirando a causa, se livrem do elTeito. Assim, quando os tiverdes confessado de vagar, os fareis participantes do Pão da vida; e depois recommendando-os com alTeição ao hospitaleiro, procurareis tambem de vossa parte prover a suas necessidades.

Portae-vos da mesma fórma para com os presos, exhortan- do-os a que se ponham em plena liberdade de espirito pela confissão geral; porque achareis muitos entre os grilhões e enxovias, que se acham desde muito tempo nas cadeias de Satanaz, e mais presos da alma do que do corpo; a maior parte d’aquclles que alli apodrecem não se tendo talvez já- mais confessado bem dos crimes que os levaram a este logar.

Esforçae-vos por ganhar a amizade dos mesarios da Mise­ricórdia, a fim de que possaes recommendar-lhes com fructo vossos presos e vossos enfermos do hospital, e que sua au­ctoridade vos sirva para enfrear a paixão d’aquelles que os tratarem mal. Mas, além d’esle apoio, prociirae-lhes tambem vós mesmo alguns allivios de esmolas, sem comtudo as tirar- des da confraria da Misericórdia: porque deveis absoluta­mente conservar-vos em boa inteiligencia com ella; e para isto, quando alguem vos trouxer uma restituição notável, não loqueis n’ella, mas fazei depositar a somma nas mãos do the- soureiro da confraria. Porque não obsUnte que na cidade

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encontrareis muitas pessoas e necessidades graves em quem este dinheiro poderia ser empregado muito a proposito, seria comtudo facil enganar-vos, porque ha muitas vezes mendigos que fazem tralico de uma pobreza affectada, e que tôem bas­tante artificio para abusarem de nossa simplicidade em damno dos verdadeiros pobres. Os mesarios da Misericórdia, sendo pessoas que alli conhecem a todos, não se deixarão tão facil­mente enganar; é a razão por que vos livrareis do trabalho e do perigo, encarregando-os de taes distribuições, e pelo co­nhecimento mais particular que elles tôem das necessidades de cada um, elles desempenharão isto com mais igualdade e menos critica. Vós só depois de uma longa e penosa expe­riencia poderieis acreditar de quantos incommodos vos tcreis Jivrado, confiando isto á prudência d’esles senhores; porque primeiramente, se vos metteis a ser o fornecedor dos pobres, sereis esmagado por uma infinidade de importunos, que só vos procurarão para lhes dardes pão, em logar de usardcs de vossa caridade para o bem dc suas almas; o que não aconte­cerá sabendo elles que vós sómente manejacs os negocios da consciência, e não vos importaes senão de procurar seu bem espiritual. Em segundo logar, não poderieis impedir as lin- guas de lançarem pcçonha em vossas intenções, e de acha­rem em toda’ a vossa administração cousas que critiquem, até aquelles mesmos que vos tiverem entregado o dinheiro serão os primeiros a conceberem suspeitas e a formarem murmu- rações, se não lizerdes a distribuição segundo seu pensa­mento, ainda (lue elles vol-o não hajam revelado. E depois sabeis vós se baverá quem diga que vós os haveis violentado

Eara vos entregar tal somma, e que vosso confessionário, de- aixo do pretexto de piedade e de restituição, não é mais

que ura tribunal de exacção e dc avareza, para converter em vossos usos e comraodos toda a colheita que ahi fizestes? Vale pois muito mais encarregar toda esta administração a pessoas a quem a inveja e a prevenção menos poderão mor­der. Isto não quer dizer que, se uma vez ou duas a necessi­dade c a disposição das cousas vos levarem a fazer o contra­rio, não vos seja licito seguir os movimentos da caridade c as regras da prudência para o maior bem das almas e gloria de Deus.

Usae tambem de muilo recato e circuraspecção em todos os vossos entretenimentos, embora seja com os melhores ami­gos; medi de tal sorte todas as vossas palavras e acções com elles, como se aquelles que hoje são os mais inliraos houves­sem de ser ámanhã vossos inimigos e delatores. Esta pre­caução, além dc que ella manterá vosso espirito no dever, quando as familiaridades e caricias dos amigos corrompem.

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para assim dizer, a prudência e desatam a lingua a toda a casta de liberdades e indiscrições irreparáveis, tambem será causa de que vossos bons amigos, que sempre vos virem nos termos da modéstia, vos consagrarão muito mais respeito e amor; e quando elles tivessem algum designio de renuneiar a vossa amizade, não o poderão fazer senão com vergonha e sem motivo. Eis aqui portanto como esta maxima de pru­dência vos resultará sempre em proveito e honra, e não im­pedirá sómente que os outros vos prejudiquem, mas fará que sejaes muito mais util a vós mesmo; porque quanto menos distrahirdes vosso coração, tanto mais elle se encherá de Deus e do conhecimento de vós mesmo, sem o qual o coração hu­mano não pare mais que monstros e vicios, e não produz mais que vaidades e libertinagens que desgostam os amigos, irritam os inimigos, e lhes fornecem matéria para nos des­acreditarem.

Quanto ao senhor vigário geral, eu não me satisfarei que lhe tributeis respeito e obediencia, se ella não for extraordi­nária e muito perfeha. Logo pois que chegardes ao logar de sua residencia, prostrae-vos a seus pés, com ambos os joe­lhos em terra, e beijae-lhe muito humildemente a mão, pe­dindo-lhe, com sua benção, licença de prégar e confessar. Nenhuma oITensa ou recusa vos ponha a mal com elle: mas pelo contrario, sejam estas desgraças, se Deus as permittir, novos motivos de procurardes mais ardentemente o favor de sua omizade por todo o meio de humildade e de honestidade religiosa, procurando ganhar-lhe o coração, e pedindo com instancia a Deus esta graça para o attrahir aos exercicios es- pirituaes, e tornal-o mais piedoso e favoravel a vossos desí­gnios.

Praticae o mesmo em proporção com todo o clero, não dei­xando escapar occasião de os servir, a (im de que elles se en­treguem em vossas mãos para receberem a cultura das mes­mas meditações e beberera mais solida devoção n’estas fontes salutares.

Quanto aos governadores, vossos serviços e obediencia devem mesmo, se for possivel, prevenir seus mandatos em tudo o que respeita á sua nuctoridade, mostrando-vos tão exemplar n’isto, que em qualquer parte onde se vir uma ordem sua se possa tirar consequencia infallivel de vossa obediencia e submissão. Assim, de súbdito seu vos tomareis seu amigo, até podel-os obrigar aos exercicios, e pelo incre­mento de sua devoção tornal-os mais uteis ao serviço de Deus e da Igreja. Acontecendo que elles caiam em alguma falta escandalosa, aproveitae habilmente a occasião de fazer sobre isto versar a conversa para lhes testemunhar, primei-

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ramenle a grande mágua que recebeis de sua dilTaraação, depois continuae com o mesmo respeito e sentimento; pin- tae-lhes de tal modo todo o mal na referencia dos diversos boatos que d’elles circulam, que elles possam ver e reconhe­cer n’isto a fealdade de seu vicio. Mas por grande doçura e habilidade que possaes empregar n’estas admoestações, ainda não se devem emprehender sem grande esperança de as ver aproveitar: porque de outra sorte mais vale abster-se d’isto absolutamente, do que comprar caro um arrependimento des- agradavel, e penalisar-se muito para se malquistar.

Ensinae a miudo ao povo o modo de bem orar e de exami­nar sua consciência, a íim de que, quando o souberem suf- íicientemente, possaes ordenal-o por penitencia áquelles que se confessarem: porque tenho experimentado que, come­çando por via de obrigação durante algum tempo, continuam a fazel-a por devoção. Será bom tambem aflixar ás portas das igrejas o mesmo methodo de oração e de exame, a íim de que cada um o possa ver e copiar para seu uso.

Quanto aos sermões, porque maior numero de almas toma n’elles parte do que nas outras funções, é conveniente que os façaes tantas vezes, quanto vossas forças o permittirem. A palavra de Deus é o pão de seus filhos, que se lhes deve partir por tal arte, que n’elle achem gosto e alimento. As­sim, não sómente a dicção, mas tambem a doutrina, deve ser singela, certa, moral e proveitosa: deixando as subtilezas, as cousas duvidosas e pontinhos para a escola. Reprehen- dendo o vicio no púlpito, ninguém nomeeis, e raostrae que duas cousas vos movem a isto: a oITensa de Deus, soberana­mente bom, e a compaixão dos peccadores, que por causa de um nada chamam sobre suas cabeças um mal extremo e eterno. Tocae a miudo na incerteza d’esla vida, e na certeza e surprezas da morte, mesmo quando ella não é repentina. Ainda que ligeiramente, narrae em vossos sermões alguma passagem da santissima Paixão de Jesus, quando não seja senão por modo de colloquio, umas vezes do peccador com o Salvador moribundo, outras vezes do Senhor com ou contra 0 peccador; misturando os attractivos da doçura com os sti- gmas da cólera e azedume, e lendo sempre por fim a con­trição e transformação dos corações, com a recommendação dos sacramentos e práticas da Igreja, principalmente do uso da confissão e da Eucharistia.

Nunca deixeis os sermões para ouvir confissões, pospondo 0 bem commum ao particular. Não deixeis igualmente o exercicio da doutrina chrislã por outras obras do serviço de Deus; porque este é um dos mais proveitosos e necessários ao publico, e dos mais proprios de nosso instituto.

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Empregae todo o tempo que podérdes na conversão dos infiéis e na amplificação do reino de Jesus Christo; dae conta exacta do successo dc vossas industrias e de vossos trabalhos a Mgr. de Goa.

Sejam vossas maneiras agradaveis, cheias de alegria e de serenidade, a fira de que não sejaes d’cstas caras carrancudas que aterram e repellem a gente, a qual por outra parte já tem muita aversão ás cousas boas, não se lhes fazendo sua­ves e muito faceis. Não deixeis portanto jámais a santa ale­gria que convem aos servos de Deus, nem mesmo quando for necessário reprehender o vicio de algum particular; porque em tal caso é mister empregar tanta caridade e amizade, que se veja que odiaes a falta e não a pessoa.

Empregae todos os dias uma parte de vosso tempo desoc- cupado e de vossos cuidados á composição dc pleitos, pro­cessos e inimizades, a fim dc que partindo do logar dc vossa missão, possaes dizer como nosso Senhor: Eu vos deixo a paz. E porquanto, para pacificar os espiritos é necessário muitas vezes comhatcr suas paixões por outras paixões mais violentas, serve admiravelmente o Icval-os pelo lado do inte­resse, fazendo-lhes ver que um processo lhes causará mais despezas e cuidados do que a cousa vale. Eu sei muito bem que estes pacificadores e amaveis conciliadores de causas não são do gosto dos advogados e procuradores; mas é necessário atacar o mal em sua origem, c fazer grandes esforços para reduzir lambem estas pessoas á vida devota e temor de Deus, por meio dos exercicios e do uso dos sacramentos; porque convertendo estes, que são os fabricadores de toda a chicana, será facil sulTocar estas guerras civis de processos, e livrar o

r 'o d'este quarto llagello dc Deus, que perde maior numero almas do que a peste e a fome.

Sc enconlrardes algumas vezes d’esles peccadores que tôem feito alliança. com a morte e com o inferno, e que não querem ouvir fallar dc serem separados de suas immundicias, ae suas rapinas, usuras e inimizades, ainda que tenham em horror tanto os remcdios, como aquelles que lhes faliam d'el- les, é mister porfiar, com a graça de Deus, era cural-os, e fa­zer pelo menos Uintos esforços por sua salvação, como o diaho faz para sua perda. Portanto, empregareis n’isto todos os soc- corros divinos e humanos, c fareis d’isto como a principal de vossas acções, applicando-lhe todos os vossos suspiros, cui­dados, devoções, penitencias e industrias: parece-me que, não sendo elles inteiramente insensatos, se deverá começar com muita doçura pelas considerações do amor c da reveren­cia que devem a seu Senhor e Salvador unico, Jesus Christo, expondo-lhes as clemencias infinitas d’esle Rei da gloria e

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seu poder inevilavel. Deve-se passar d'islo ás ameaças de uma morle desastrosa que está já pendente sobre suas cabe­ças, e propor-lhes as penas eternas, que á sua morte se hão de seguir. Se nem o amor de Deus, nem o temor do inferno amolleccm estes corações de rocha, ainda aproveitará talvez 0 estimulal-os com as penas sensiveis que a vingança do Céo envia côdo ou tarde áquelles que a provocam. E ’ mister por­tanto patenlcar-lhes todos os instrumentos da cólera de Deus, que fazem d’esta vida um inferno anticipado, como são as longas e incuráveis enfermidades, as perdas irreparáveis, as pobrezas, as infamias, a destruição das familias, as mortes dos paes e dos lilhos, as prisões, os naufragios, as aflrontas sanguinolentas, a traição de um falso amigo, os ultrajes de um inimigo victorioso e crucl, a dcshonra das mulheres ou das filhas, os frenesis, as raivas, e mil outros accidcntcs que estão como ao soldo da justiça divina para tirar vingança dos impios que ousara desalial-a; porque uma viva representação d’estas cousas, que ferem os sentidos, muitas vezes loca es­tas almas carnaes, que não philosopham senão conforme as maximas dos irracionaes, e não sentem mais que os males presentes, ainda que os da eternidade sejam infinitamente mais temiveis.

Mas para sondar a chaga até ao fundo, como esta insensi­bilidade não provém senão de um inteiro esquecimento de Deus e de um total abandono de sua consciência, é muito conveniente acccnder n'clles as faiscas da fé, se ella não está de lodo cxtincta, c fazer-lhes comprehender que o alheismo é a paga de se haverem habituado ao peccado; porque é muito verdade que Deus entregando estas almas rebeldes ao mais cruel de todos os algozes, que é o remorso, permilte justamente que a mesma razão lhes falte assim como a luz sobrenatural, e, não se elevando mais que as feras brutas, e não crendo mais do que aquillo que podem tocar ou apalpar, perdem com a razão o temor da mais extrema das desgraças, que é perder a Deus, e perderem-se elles mesmos para sempre.

Eu vou mais longe; pois entre estas gentes perdidas de consciência algumas achareis tão sagazes e hypocrilas, que procurarão mesmo vossa amizade por todos os meios, não para chegarem á amizade de Deus por meio da vossa, mas para vos tapar a bôca ás justas reprehcnsõcs que lhes pode- rieis fazer, e para adquirir a reputação de pessoas de bem á custa de vosso tempo e familiaridade. Mas o remedio a este mal é estar prevenido para não vos dcixardes surprender pelos encantos e arlilicios d’esles embusteiros. E se alguma vez vos convidarem para jantar, ou vos mandarem presentes, fugi d’isto como de laços que se armam á vossa liberdade e

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obrigação que tendes de reprehender. aquelles que fazem o mal; não que se devam repeilir de uma assentada, mas acei­tando 0 primeiro convite que vos fizerem de comcrdes em sua casa, os convidareis igualmente á confissão; e quando vós reconhecerdes, depois de muitas rogativas e convites, que sua vontade não se move a isto, c então que lhes dcclara- reis, que se não querem de outro modo dar exercicio á vossa amizade e serviços, é mais a proposito que se abstenliam d’isto, e que de vossa parte renunciacs inteiramente á ami­zade d’aquclles que querem viver na inimizade de Deus. Ora, a reciisação dos presentes não se entende dos pequenos, como fructas e outras leves gratificações, que não obrigam tanto rcccbendo-sc, como ofiendem q'uando são rejeitados. Uas fallo d’aquelles donativos de grande preço, que prendem aquelles que os tocam, c vos forçarão a ser ou ingrato, ou escravo. Se alguma vez vos mandarem uma grande quanti­dade de viveres, será bom que os mandeis descarregar ás prisões 011 ao hospital, a fim de que se saiba que os pobres têem a melhor parte, e que apenas alguma cousa reservaes para vós. Esta obra de misericórdia vos deixará a occasião de praticar a abstinência e a pobreza; e entretanto, dando ailivio nos outros pobres, vós dareis tambem bom exemplo a todo 0 mundo, e não causarcis áquelles que vos tiverem en­viado a esmola o desgosto que lhes darieis sem dúvida recu- sando-lh’a, ou recambiando-a para sua casa.

Agora quando emprehenderdes a cura de alguma consciên­cia muito ulcerada, e que tiver por muito tempo apodrecido em seus vicios, não lhe ponhaes a mão sem que conheçaes perfeitamente todas as suas inclinações, nlTeições e humores. E a razão por que é necessário sondar se esta pessoa está en­tão possuida de alguma má paixão que lhe possa causar ou distracção, ou mesmo horror ás cousas de sua salvação; por­que SC esta alma se acha com juizo, c tem tanto soccgo e re­pouso interior como é mister para ouvir com paciência e pe­sar sabiamente uma admoeslação bem feita e nem assentada, podcreis em tal caso dizer-lhe prudentemente tudo o que convier; mas se ella está agitada de cólera ou de amor des­ordenado, ou de alguma dor aguda, será mister dilferir para outro tempo, e, adiando a admoeslação, não fazer por então outra avançada sobre este coração, do que por meio de insi­nuação e de algum doce e amavel entretenimento. Se elle se deixar tocar por esles primeiros attractivos, podcreis apro­ximar-vos um tanto mais, representando-lhe quanta impor­tância e merecimento, cnlre todos os pensamentos e os mais justos cuidados dos homens, incomparavelmente tem sobre qualquer outro o negocio da salvação, c quanto esqueci-

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menlo, desprezo, ou mesmo conlradicção acha, não obstante em nossos espiritos, fazendo-lhe cm particular insinuar al­guma leve sentença que o avise muito docemente e que não faça mais que fcril-o um tanto. Se esta segunda tentativa tiver bom exito, é necessário passar além, e dar-lhe alguma admoestação um pouco mais forte e séria. Finalmente, quando 0 tiverdes inteiramente reduzido ao vosso poder, lhe proporeis as leis de uma inteira emenda, e lhe prescrevereis não só­mente remedios para o passado, mas tambem preservativos para o futuro.

Quanto ás paixões da alma, o methodo que deveis seguir para as apaziguar e curar, é procurar a ausência do objecto que as inllamma, e depois diminuir a estima excessiva que se faz do objecto que suscita estas perturbações e desordens no espirito, não havendo cousa alguma que adocc mais de­pressa ou a tristeza ou a cólera, do que fazer ver claramente que a causa não é tão grande em si como é em nossa appre- hensão. Sc for uma oITensa recebida o que accende a cólera, deve dizer-se ao oITendido que seria erro imputar a malicia 0 que sómente é devido a descuido e imprudência; que é Deus que tira viugança das oITcnsas que tem recebido por esta que lhe faz soUrer; que porventura elle se queixa de um estranho, quando elle talvez terá feito peior para com seus mais proximos parentes e seus melhores amigos; que se to­dos os dias tantas pessoas innocentes sodrem corajosamente injurias bem mais sensiveis, por que motivo recusará elle satisfazer á justiça de Deus, que tantas queixas tem contra elle e que o trata tão moderadamente?

E porque as paixões participam de alguma sorte da sur­dez, adormecendo a alma e dissipando os bons pensamentos, é mister usar dc tantas insinuações e repetições d’estas cou­sas, quantas vossa prudência e sua paciência permitlir. 0 que deixo dito da cólera facilmente se póde appiicar ao cura­tivo de outras paixões. Mas vós insistireis sobre este ponto, que, ainda que pareça ao vosso homem que sua paixão é le­gitima, e que a injuria de que se queixa tenha tanto de ver­dadeira como de sensivcl, todavia, se elle quizer dar-se ao trabalho de se mirar um pouco e de consultar a verdade com muito socego depois de haver dc mais perto revistado as cir­cumstancias do fado, achará que a maior parte das cousas que fazem tanto barulho em sua imaginação não téem outra substancia mais do que aquclla que elle mesmo lhes dá. As­sim, depois de o desenganardes pouco a pouco, talvez com um sorriso e face alegre, podereis dissipar toda a nuvem d’este agastamento, c depois, segundo a condição da pessoa e sua inclinação, lhe represcntareis amigavelmente tudo o

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que ella deve fazer para apaziguar inteiraraenle esla pertur­bação.

Além dos preparativos que é mister oppor ás paixões, eu estimo sobretudo o metbodo de bem purificar as consciên­cias, mesmo as dos mais insignes peccadores. Quando pois tiverdes a tratar com taes penitentes, principalmente sendo abonados, negociantes, juizes, recebedorcs, capitães ou go­vernadores, desejo que façaes certas cousas antes da confis­são, outras em seu decurso, e outras depois d’ella.

Antes de vos assentardes no tribunal, onde a mesma pes­soa que comparece deve ser o delator, a testemunha e o cri­minoso, desde que tiverdes reconhecido que é uma alma muito carregada, e pouco versada n’este tribunal, vós lhe prescrevereis que tome o tempo de dous ou tres dias pelo menos, a fim de recordar todos os pontos da accusação que deve fazer, e de discorrer por todas as acções, tcmpòs, loga- res c negocios de sua vida passada, para recordar os pecca­dos e redigil-os por ordem sobre um papel, se aliás sua me­mória não for feliz; simultaneamente lhe reprcsentareis que a melhor parte da preparação não consiste sómente na in- strucção do processo, nem na recordação dos peccados, mas ainda mais na dor e confusão interior que é mister procurar sentir, e pedil-a com instancia ao Espirito Santo, que sabe locar os corações quando lhe apraz, a fim de que a confissão não se faça como a narração de uma historia iudilferente, mas como uma accusação cheia de sentimento e de um justo odio de si mesmo. É conveniente tambem para taes pessoas, como são os financeiros e outros ofTiciaes da corôa, ou aquel­les que traficam com o alheio, informar-vos plenamente como elles fazem; se pagam ás partes; se fazem monopolios, frau­des, depredações e retardações de finanças; se são conniven- tes em falsos pesos, injustiças, roubos, contratos usurarios e iilicitos, interrogando-os em particular no que lhes póde di­zer respeito; porque, de outra sorte, como as desordens pas­sara a costumes e leis, elles não fazem escrupulo d’isto.

Se no decurso da confissão a amargura e vergonha tocar de tal sorte o coração do penitente, que chegue a prender-lhe a lingua, como acontece muitas vezes quando a qualidade e quantidade dos peccados é enorme, é mister evitar o con­tribuir de sorte alguma para este temor por signaes de admi­ração, por palavras, nem por suspiros, mas antes com um rosto cheio de amor e compaixão é mister ajudar a alma n’oste doloroso estado, e usar de todos os encantos da alTabilidade e doçuras do Espirito Santo, para tirar de seu covil a ser­pente tortuosa. É necessário portanto publicar as grandezas da misericórdia de Deus, a qual não tem outros limites.

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quando ella quer, do que seu poder. Outras vezes é mister abater c diminuir a opinião excessiva que a alma tem de seus excessos, e attribuir uma parte da falta á fraqueza, outra ás astúcias de Salanaz e á violência das paixões, até que recu­pere 0 animo para se descarregar inteiramente, e vomitar todo 0 veneno de seus peccados.

Serve tambem muito o fazer-lhe comprehender que o maior de todos os peccados é abusar do soberano remedio dos peccados, fazendo a conlissão não sómente imperfeita, mas inteiramente nulla, não inutil sómente, mas tão nociva como fazer de um sacramento um sacrilégio peior do que to­dos os crimes que se pretendem extinguir, porque é conver­ter a medicina em veneno. Mas para combater esta vergonha tão perniciosa e mortal por todos os meios, um dos melhores poderia ser assegurar ao penitente que temos muitas vezes tratado de almas muito mais criminosas e perdidas. Se o môdo e a deshonra são para elle ainda um demonio surdo e mudo, é mister pôr cm acção, como ultimo remedio, um santo atrevimento (ainda que raras vezes e com grande precaução) que é confessar ao penitente nossas próprias misérias, e, em

Soucas palavras, descobrir-lhe tudo o que podcsse haver mais illicil de confessar em nossas rapaziadas passadas. Este ar­

tificio carilalivo algumas vezes tem tido bom resultado; eu mais diria se quizesse prevenir tudo o que a expcriencia vos deve ensinar; mas ao menos lembrar-vos-beis de ter sempre 0 espirito de vosso penitente desembaraçado, emquanto o virdes perplexo e com difliculdade em declarar-se, umas ve­zes engrandecendo-lhe a caridade do Salvador, que quiz morrer com os braços e coração abertos para o receber a toda a hora; outras vezes produzindo os nomes de tantas al­mas grandes, sobre as quaes, depois da infamia de mil abo- minações, a graça e santidade superabundaram com excesso; que elle poderá ser d’este numero, usando agora para com Deus de outra tanta confiança e franqueza cm manifestar seus peccados, e de outro tanto esforço em fugir d’elles para 0 futuro.

Mas lambem, depois de lhe haverdes cassado todo o seu depoimento, e tiverdes inteiramente espremido c suppurado a podridão de suas chagas, virae-vos então para a sua con­sciência, e representae-lhe a vergonha, a multidão e atroci­dade de seus peccados, com tanta força e acrimonia como for necessário para o reduzir ao termo da contrição e inteira delestação de sua vida, lembrando-lhe os golpes inevitáveis da justiça de Deus, o qual póde tomar satisfação, se o pecca­dor não lh’a dá.

Ora, como é conveniente muitas vezes tratar em particular

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com os magistrados, ou grandes negociantes, de certos pon­tos de imporlancia de que é necessário esclarecel-os antes de entrar no tribunal da conlissão, tanto a fim de auxiliar sua memória, dcsiindando-lhes as matérias geraes que podem pertencer-lhe, como tambem para combinar com elles sobre muitas maxiraas e resoluções de consciência, de que talvez elles estariam mal informados; tambem é muitas vezes ne­cessário, depois da conlissão, dilTerir por alguns dias a absol­vição, quando o peccador não estiver tocado dc uma sufli- ciente dor e desejo de emenda, ou mesmo se tendo já muitas vezes promettido fazer restituições, ou deixar as occasiões de peccado, está sempre em falta culpavel. Porque a taes pes­soas é muito bom, e muitas vezes necessário, dar-lhes tres ou quatro dias, no decurso dos quaes poderão ler e meditar nas razões que ha para derramar lagrimas sohre o sangue do Filho de Deus, para inteira expiação de suas oITensas; e além dos diversos motivos de contrição, que elles trarão á memó­ria, obrigal-os n’cste tempo a reconciliar-se com seus inimi­gos, a separar-se da má companhia que conservam em sua casa, a satisfazer áquelles, cujos bens reteem em seu poder, e a quebrarem assim as outras cadeias, das quaes jámais se hão soltado bem: porque, como vae muito do prometter ao cumprir, depois que elles tôem sido inlieis aos outros confes­sores, é forçoso fazer-lhes executar antes da absolvição aquillo que sempre se tôem esquecido de cumprir, não ha­vendo no mundo melhor fiança das promessas do que a exe­cução anticipada.

Achareis tambem almas (Deus queira que haja poucas 1) que duvidarão dos fundamentos da fé, não sahendo crer mais do que cousas do seculo Mssado, nem sacramentos, espe­cialmente 0 da santissiraa Eucharistia, tanto porque elles te­rão perdido o gosto e uso delle, tendo-lhes o coração em- magrecido pelo esquecimento de comer d’este pão, como por causa do contagio dos diversos espiritos que elles respiram em Orrauz, como são os judeus, os pagãos, os sarracenos, os armênios, os georgianos, os abyssinos, os atheus, ou pela má vida dos sacerdotes, a qual desacredita incrivelmente a magestade d’esle auguslissimo mysterio. 0 meio pois de os converter, é tirar-lhes suavemente da bôca e do coração to­dos os espinhos das dilSculdadcs e dúvidas que elles possam ter; e depois, accomraodando-se á sua fraqueza, ensinal-os com clareza, e resolver as objecções e suas ignorancias: não os largando sem que os deixeis na firme persuasão de que o verdadeiro corpo de nosso Senhor está realmente debaixo d’estas especies. Mas logo que houverdes feito reviver n’elles o germen da fé, o soberano meio de a alimentar e

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segurar, é o freqüente e piedoso uso do mesmo sacra­mento.

Itcsla ainda uma perigosa parte da conversação, sobre a qual a prudência do servo de Deus deve muito vigiar; é pelo que respeita ás mulheres, ás quaes nunca fallareis (de qual­quer condição que sejam) senão em logar publico, e que seja patente á vista de todo o mundo, como é a igreja; porque ir a suas casas, é o que não se póde permittir nem aconselhar, senão em caso de enfermidade muito urgente, para ouvir suas confissões, e ainda é mister prevenir cautelosamente que seus maridos estejam presentes, ou algum de seus pa­rentes ou vizinhos. Se porventura for mister visitar alguma rapariga ou viuva, não entrareis em sua casa senão em com­panhia de alguns homens honrados, e de tal virtude, que sua presença vos livre, não do perigo sómente, porém mesmo da suspeita das más lioguns. Mas fazei sobretudo que as occa­siões de taes visitas sejam raras e absolutamente nccessarias; porque é um negocio melindroso e delicado, do qual posso assegurar-vos que se perde muito com pequeno lucro.

E porque a leviandade de seu espirito e de seu humor dá ordinariamente muito trabalho aos confessores, uma das me­lhores precauções que podem n’isto empregar, é cultivar mais as almas dos maridos que são chrislãos, do que as de suas mulheres: porque tendo a natureza dado mais peso e firmeza ao espirito do homem, ha mais proveito cm instruil-os, visto mesmo que a boa ordem das familias c a piedade das mulhe­res depende commummente da virtude dos homens; havendo dito 0 sabio com muita razão: Tal como é o governo de uma cidade, taes são todos os habitantes d’ella. Acresce que não instruindo as mulheres senão por seus maridos, se evitam milhares de motivos de palavras e de ralhações, que nasce­riam infailivelmcnte de um uso contrario.

Havendo algum motivo de divorcio entre elles, a primeira cousa que se deve fazer para o apaziguar, é dispol-os por al­gumas boas meditações a confessarem-se ambos muito exa­ctamente, mesmo de toda a sua vida, e dilatar-lhes a absol­vição por algum tempo, a fim de que, por esta demora, elles sejam melhor dispostos a emendarem-se e a viverem juntos em boa inteiligencia. Quando as mulheres vos asseverarem que ellas viveriam com muito mais repouso, e se entregariam melhor ao serviço de Deus se podessem ficar livres da com­panhia de seus maridos, não as acrediteis; porque, além de que é um pequeno calor de devoção que no dia seguinte es­friará, teriam os maridos motivo de se oITendercm cora isto.

Nunca culpeis o marido em presença de sua mulher, seia elle embora o mais culpado do mundo; mas, dissimulando

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designios e acções, com uma sabedoria digna d’esta corpora­ção c nome que ella tem. Servindo a todos quanto podérdes, abstende-vos de incommodar a pessoa alguma, e por isso que 0 rei de Portugal vos dá um ordenado suflicicnte para vossa sustentação, vale mais que o aceiteis de sua magestade, do que importunar particular algum; porque a recusação que fizesseis d'esle ordenado não reverteria senão em proveito dos thesoureiros, e vós perderieis uma parte de vossa liber­dade, dependendo da liberalidade dos cidadãos.

Já que tenho tocado em quasi todas as partes de vossas obrigações, finaliso reiterando-vos a recommendação de uma maxima geral, tão importante como notoria; é que, como não podemos nem devemos fazer tudo, tenhaes em vista, na escolha das occupações que emprehenderdes para gloria de Deus, preferir sempre aquellas que dizem respeito ao bem commum áquellas que não tendem mais do que á commodi- dade de um ou dous particulares; porque é muilo claro que 0 mesmo é das boas obras como das sciencias: tanto mais forem universaes, tanta mais excelleucia e merecimento tôem.

Mas como eu vos lenho recommendado o cuidado dos vi­vos, eu vos peço que abraceis ainda mais estreitamente o dos finados, por isso que é isto uma boa parle do pensamento de nossa Companhia, que tem por fim amar as almas em tòda a parte onde sua caridade póde chegar.

Pegae portanto todas as noites em vossa campainha com o nosso irmão Raymundo, c encommendando em alta voz pelas ruas, quando for noite fechada, as almas que estão no pur­gatório, fazei repelir a cada um dos meninos do catecismo a mesma cncommendação, acrescentando tambem que se diga um Padre-Nosso e uma Avè-Maria por aquelles que estão em peccado mortal, sem dor nem sentimento de sua miséria. Com estas cousas, e com aquellas que o Espirito Santo vos subministrará, espero que vejaes tanto fructo dc vossa mis­são como eu vos desejo, pedindo a nosso Senhor que nos con­ceda a graça de fazermos em tudo a sua santa vontade.

CONCLUSÃO

(B. L eonardo, 2.* parte, n.“ 31.) — Sacerdote dc Jesus Christo, pastores e confessores, eis aqui nossos deveres. Nosso ministério é muilo laborioso. Que desgraça, se elle não houvesse de servir senão para conduzir mais facilmente ao inferno as almas de nossos parochianos e de nossos

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penitentes! Que desgraça! eu o repito, que grande desgraça! Ora, sendo assim, me direis vós, exerça quem quizer o minis­tério da confissão; de ora ávante nos occuparemos da salva­ção de nossa alma sem nos expormos a tantos perigos. Ah! será este o fructo que colherieis de nossas instrucçõcs? Isto me causa espanto. Seria possivel que apreciasseis tão pouco a vantagem de cooperar para a salvação das almas tão ama­das por üeus! Que obra maior, mais santa, mais heróica, do que soccorrer uma alma e ajudal-a a salvar-se? Divlnomm aivinissimum est cooperari Deo insalutem animarum. (Dion. Areop., De Cwlest. hier., cap. iii.) Estae certos que adquiri- reis mais merecimentos em uma manhã passada no confessio­nário, do que em um anno por outras obras, ainda que boas e santas sejam. Eu vou mais longe, c chego a dizer que para ouvir uma confissão, vale mais algumas vezes interromper a meditação, a leitura, o oílicio divino e qualquer outra funcção sanla; eu não o diria, se não tivesse a citar-vos um exemplo da maior auctoridade. Conheceis vós uma acção mais sublime e mais sanla do que o augusto sacrificio da missa, no qual se oITcrece ao Padre Eterno o corpo e sangue de seu divino F i­lho? Pois bem, ouvi a narrarão de um acontecimento refe­rido por Baronio, succedido noa nno de 103i. 0 Soberano Pontiiice celebrava em S. Pedro de Roma, com grande pompa, a segunda festa de Paschoa. Elle estava sentado sobre seu Ihrono, depois do Evangelho, quando um peregrino veio lan­çar-se a seus pés. Peneirado de compunção, elle exclamou gemendo: Misericórdia! Saníissimo Padre, misericórdia! eu quero confessar-me e receber a absolvição de meus peccados. Quem não julgaria que o Papa lhe respondesse que não era tempo, nem logar de ouvir penitentes, e por isso que se reti­rasse e voltasse cm outra occasião? Não foi assim. 0 Sobe­rano Ponlifice interrompeu a sanla missa, ouviu o penitente, e não voltou á oblação da Augusta Victima senão depois de o consolar e absolver. 0 erudito annalisla declara, que refere este facto como um exemplo edificante, referam ad wdi/ica- tionem; e com receio que elle seja censurado por escrupulo­sos ou ignorantes, eu o reforço com a approvação de S. Gre- gorio: Quía secundum Gregorium nullum gratius Deo sacri- pcium offertur, quam animarum salus, et tpsa conversio pec- catorum. Mas que digo eu? que é necessário interromper a oração e toda outra occupação para trabalhar na salvação das almas? Eu digo que deveriamos aceitar com alegria o ser privados por algum tempo da vista mesmo de Deus para con­solar os pobres peccadores. Santo Ignacio asseverava que para cooperar na salvação de uma alma teria muito volunta­riamente diíTerido entrar em posse da gloria eterna; que te­

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ria consentido era viver com alguma incerteza de sua salva­ção, comtanto que permanecendo sohre a terra tivesse aberto aos outros as portas do céo. Um de nossos religiosos costu­mava dizer: «Quando eu pozessc os pés sobre o limiar do paraiso, se um pobre peccador me puxasse pela tunica pe­dindo-me que ouvisse sua conlissão, eu retiraria muito ligeiro 0 pé, c não entraria no céo sem ter consolado este miserável peccador.» E vós não sereis tocados? não repeilireis vossa ti- bieza? Não vos aterra o Evangelho pela condemnação d’esse servo que não fez rendoso no commercio o unico talento que lhe havia sido conliado? E vós, que tendes recebido dc nosso Senhor não um, mas tres, quatro e talvez dez talentos, que­reis estar ociosos? Que vos acontecerá no tribunal de Deus? Mas, meu padre, é este um emprego muito santo, é verdade, mas tambem muito perigoso! Ah! trepidas timore, ubi non est timor. Ponde de parte vosso terror pânico; animae-vos, ponde toda vossa conliança em Deus, c não vos faltará na urgência o seu soccorro omnipotente. Minhas instrucções vos tèem aplanado essas montanhas de difllculdadcs. Se*de pru­dente na direcção dos habitudinarios e dos occasionarios; são estes os dous escolhos contra os quaes naufragam c se per­dem com mais frequencia os confessores. Se deparardes com esses casos mais difliceis de simonia, de contratos, dc matri­monio, de collação em benefícios e outros semelhantes, não decidaes sem que tenhaes removido todas as vossas dúvidas pelo estudo e conselho de homens mais doutos; c estae certos dc que seguindo lielmente as regras até aqui indicadas, che- gareis felizmente ao porto sem perigo dc naufragio. Mas se por desgraça sois d’aquelles que, notunt intelligere, ut bene agant, c que, sem se darem a tantas reflexões, não fazem ou­tra cousa mais do que levantar o braço nara desligar todo o mundo e ligarera-se a si mesmos, em tal caso vos direi sem disfarce, largae este emprego todo divino, que não é feito para vós: o abuso de um ministério tão augusto não serviria mais do que de carregar-vos com o peso de uma infinidade de almas que tcrieis precipitado no inferno. Mas não, eu es­pero que não haja de ora ávante ninguém d’este caracter; eu espero que, animados todos dc um santo zelo, vós sabereis iraficar melhor do que eu tenho sabido dizer, c que traba- hando com ardor em salvar as almas dos outros, tereis a fe- icidade de salvar a vossa. 0 Senhor vol-o conceda. Assim seja.

F IM

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ín d ic e

S capítulos E ARTIGOS EM QUE SE DIVIDE E SUDDIVIDE ÉSTA ODRA

Gap. T — Devcrcs e qualidades de nm bom confessor comopae, como medico, como doutor e como ju i z ................ 1

Art. I — Caridade de pae...................................................... 3Art. II — Habilidade de medico............................................ 26A rt. III — Sciencia de doutor.................................................. 43Art. IV — Exaclidão de ju iz ................................................... 68A rt. V — Retrato do rigorismo e do lax ism o................... 84

Gap. II — Das precauções que o confessor deve tomar antesde confessar........................................................................... H 3

Gap. III — Precauções que devem acompanhar o confessorno exercicio dn suas funcções........................................... 129

Gap. IV — Das interrogações........................................................ 144Art. I — Interrogações que se devem fazer aos peniten­

tes pouco instru idos............................................................ 152A rt. II — Interrogações que se devem fazer às pessoas

de diversos estados e condições, que são de uma con­sciência pouco delicada........................................................ 170

Art. III — Obrigação de in te rroga r....................................... 178Gap. V — Conducta que se deve ter com as diflerentes espe-

cies de penitentes.................................................................. 187Art. I — Com os a d u lto s ......................................................... 195‘Art. II — Com aquelles que se acham em certos-,casos

mais dilH ceis.......................................................................... 215Art. III — Com as pessoas favorecidas de graças extraor­

dinárias.................................................................................... 236Art. IV — Boas obras que as devem oc cu p a r .................... 258Art. V — Com as almas mais necessitadas..................... 278Art. VI — Dos habitudinarios e recidivos............................ 307Art. VII— Os que se devem entender por habitudinarios

e rec id ivos .............................................................................. 325- Art. VIII— Conducta com os enfermos e m oribundos... . 348

Art. IX — Sobre as penitencias e absolvição ' . ......... 373Art. X — Da confissão geral..................................................... -391

Gap. VI — Sobre o sigillo sacram’ental....................................... 431Gap. V II— Resumo g e ra l............................................................... 438CoNCLUslo.......................................................................................... 463.

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