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Revista Pensar Gestão e Administração, v.5, n.2, jan. 2017
Consumo Colaborativo: Aspectos Relevantes e Implicações Sobre o
Comportamento do Consumidor
Collaborative Consumption: Relevant Aspects and Implications on the
Consumer Comportment
Bruno Rodrigo dos Santos1
Juliana Cristina de Andrade1
Lucimar Aparecida da Silva1
Armando Sérgio de Aguiar Filho2
Resumo: O consumo colaborativo consiste em um modelo econômico contemporâneo, baseado em premissas que remetem à otimização do uso de recursos, redução dos níveis de produção e descarte, aproveitamento da capacidade ociosa, valorização de experiências e interações interpessoais, e consciência ambiental. Ao participar deste mercado, o consumidor é encorajado a desenvolver uma nova forma de enxergar as relações de consumo, quebrando paradigmas e rebuscando antigos conceitos sociais. Neste contexto, o presente estudo propôs-se a identificar as transformações no comportamento do consumidor promovidas pelo advento do consumo colaborativo. Para tanto, utilizou-se de pesquisas descritiva e bibliográfica na construção de um pano de fundo teórico, bem como, da aplicação de questionários e entrevistas suscitando uma análise de dados quali-quantitativa. Como principais resultados, foram obtidos aspectos conceituais e características básicas e dados estatísticos sobre o tema, além de opiniões e relatos de gestores que vivenciam e atuam neste mercado. Palavras-chave: Consumo; colaborativo; comportamento; consumidor.
Abstract: The collaborative consumption consists in a contemporary economic model, based on premises that remit to the resources use optimization, reduction of the production and discard levels, idle capacity exploitation, valorization of experiences and interpessoal interactions, and ambiental conscience.When taking part of this market, the consumer is encouraged to develop a new way to see the consumption relations, breaking paradigms and reviewing old social concepts. In this context, this article proposes to identify the transformations in the consumer comportment promoted by the collaborative consumption advent. For that, were used descriptive and bibliographic researches in the construction of a teoric background, as well as the application of questionnaires and interviews arousing a quali-quantitative data analysis. As main results, were obtained conceptual aspects, basic characteristics and statistics data on the theme, besides opinions and narratives of managers that experiences and work at this market. Keywords: Collaborative; consumption; consumer; comportment.
1 Alunos formandos do curso de graduação em Administração na Faculdade Promove, em Belo Horizonte/MG.
E-mails: [email protected]; [email protected]; [email protected]. 2 Doutor em Gestão da Informação e Conhecimento pela Escola de Ciência da Informação da UFMG; Professor
Orientador da Faculdade Promove, em Belo Horizonte/MG.
E-mail: [email protected]
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1. INTRODUÇÃO
O consumo colaborativo é um modelo econômico contemporâneo, construído em
torno do consumo consciente e do compartilhamento de produtos, serviços e até
mesmo de ativos pouco tangíveis. Pautado por valores como integração e
sustentabilidade, permite que pessoas, comunidades e empresas interajam em um
sistema colaborativo, tanto como provedoras, quanto utilizadoras dos recursos.
Do ponto de vista econômico, o consumo colaborativo em muito se contrapõe ao
capitalismo tradicional, pois valoriza mais as experiências vivenciadas e o acesso
aos benefícios dos produtos, em detrimento do antigo ciclo de compra e descarte.
Assim, a posse e acúmulo de bens são substituídos por relações de propriedade
compartilhada, aluguel, troca e atividades coletivas, por exemplo.
Soma-se a isso, o fato de o consumo colaborativo possuir um viés ambientalista,
visando à redução do impacto ambiental causado pelo modelo capitalista tradicional.
No consumo colaborativo, o bem não pertence a um indivíduo, mas a uma coletividade que faz uso do mesmo. Ao compartilhar um produto que, durante toda sua vida útil, só seria utilizado algumas vezes, evita-se a produção de um novo bem e essa maximização do uso é benéfica para a natureza (CALAZANS; LINS; LIMA, 2014).
O consumo colaborativo tem nas pessoas seu elemento fundamental, uma vez que,
confiança, respeito e vontade de compartilhar são essenciais para o funcionamento
do sistema. No entanto, as plataformas de interação proporcionadas pelo
desenvolvimento tecnológico e o crescimento da internet também possuem um papel
importantíssimo, conforme destacam Guimarães e Scalco (2014):
A invenção de novas tecnologias e a popularização das mesmas, trouxe
consigo a possibilidade de conectar os interesses de diversos e dispersos
indivíduos, em escala global, tornando simples o que na década de 1940,
por exemplo, não teria apenas um custo monetário alto, mas também um
custo de oportunidade alto [...].
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Além disso, Botsman e Rogers (2011) apontam que o consumo colaborativo tem
potencial para influenciar, também, aspectos sociais e comportamentais dos
consumidores, pois promove alternativas para que as pessoas façam economia ao
mesmo tempo em que criam conexões interpessoais, tornando-se socialmente ativas
novamente. Ainda neste sentido, Calazans, Lins e Lima (2014) destacam que:
As pessoas que aderem ao consumo colaborativo estão usufruindo mais daquilo que compram ou mesmo deixando de comprar, uma vez que o acesso tem se tornado mais fácil. A sociedade já tem consciência de que a demasiada busca por bens materiais traz consigo um alto custo para as suas relações familiares, de amizade e até mesmo com o meio ambiente.
Tendo em vista os aspectos apresentados, define-se como problema de pesquisa a
seguinte questão: de que forma a disseminação do modelo de consumo colaborativo
tem modificado e transformado o comportamento do consumidor?
2. JUSTIFICATIVA
A importância da pesquisa reside na possibilidade de coletar e discutir informações
acerca de uma estrutura econômica contemporânea, que tende a tornar-se cada vez
mais presente no Brasil e no mundo, transformando a dinâmica do mercado através
de novas formas de interação e consumo. Neste ponto, ressalta-se que o cenário
econômico e socioambiental demonstra propensão ao crescimento do consumo
colaborativo, tendo em vista o desgaste do modelo atual, o aumento do nível de
acesso à informação por parte dos consumidores e a escassez de recursos naturais.
Acrescenta-se, ainda, o valor da pesquisa para administradores e empreendedores,
ao fomentar o entendimento sobre este modelo de consumo e suas implicações no
mercado, bem como as oportunidades que podem surgir em sua decorrência.
3. OBJETIVOS
3.1 Objetivo geral
Descrever de que forma o comportamento do consumidor vem sendo transformado a
partir do advento do consumo colaborativo.
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3.2 Objetivos específicos
• Relatar pontos referentes à origem e evolução do consumo colaborativo;
• Descrever suas principais características e componentes;
• Elencar plataformas de negócios do mercado colaborativo;
• Traçar o perfil de pessoas e organizações que atuam neste meio.
4. REFERENCIAL TEÓRICO
4.1 Origem e desenvolvimento
No ano de 1999, Robin Chase fundou, juntamente com sua amiga Antje Danielson, a
empresa Zipcar, provendo um serviço de compartilhamento de veículos. A empresa
tinha por base a premissa de que, a grande maioria das pessoas, na realidade, não
precisa da posse de determinado bem, mas sim, usufruir do benefício por ele
proporcionado. Em pouco tempo, pessoas começaram a perceber a vantagem de
alugar um carro apenas pelo tempo necessário à sua utilização, em lugar de possuir
um, que ficaria ocioso na maior parte do tempo, e ainda geraria custos adicionais.
Conforme descrito em seu livro, ao fundar a Zipcar, Robin estava sendo, sem saber,
pioneira de um movimento que viria a se tornar muito maior: “O que eu desconhecia
na época era o movimento muito maior possibilitado pela internet. A Zipcar foi uma
pioneira. Quando você pode conectar e compartilhar bens, pessoas e ideias tudo
muda, não só o jeito como você aluga um carro” (CHASE, 2015 p.11).
Nos anos seguintes houve dois fatores determinantes para o desenvolvimento e
expansão do consumo colaborativo: a crise econômica mundial em 2008, e o avanço
tecnológico com crescimento exponencial da internet e o advento das redes sociais.
4.1.1 Crise econômica mundial
Botsman e Rogers (2010 apud. CALAZANS; LINS; LIMA, 2014), acreditam que “após
a crise mundial de 2008, uma parte da população percebeu que tanto a natureza
quanto a economia não aguentariam mais o modelo de comprar, usar, jogar fora e
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comprar novos produtos”. Houve uma espécie de choque de realidade, que levou à
percepção de que os recursos naturais de fato são finitos e que, portanto, se fazia
necessário um novo modelo de consumo que fosse mais racional e sustentável.
A Revista Filantropia3 (2015) acrescenta, ainda, que a crise econômica colocou
frente a frente uma situação de desemprego e falta de dinheiro, com uma
capacidade excedente de recursos detida pelas pessoas na forma de bens em
estado ocioso. Apartamentos com quartos vazios, veículos ociosos durante a maior
parte do tempo, cd’s, dvd’s, livros e roupas guardados com pouca ou nenhuma
utilidade para seus atuais donos, tudo isso poderia ser transformado em uma fonte
de renda extra, e as pessoas começaram a se dar conta disso.
O consumo colaborativo configura uma inovação na forma de consumir: ao invés de comprar novos produtos ou serviços, os indivíduos podem procurar quem já os possua para alugá-los, trocá-los por outros bens ou emprestálos por um período. Todos ganham. Quem empresta ou aluga um carro ou um quarto ganha renda ou poupa despesas ou, então, garante um benefício parecido para si próprio no futuro. Quem aluga ou pede emprestado preenche sua necessidade sem arcar com o custo da compra e manutenção. Mas, talvez, os principais ganhadores sejam a sociedade e o meio ambiente: afinal, mais compartilhamento significa menos. Isso minimiza as grandes produções de bens, extração de recursos naturais e desperdícios (REVISTA FILANTROPIA, 2015).
4.1.2 Avanço tecnológico
Entretanto, o fato de as pessoas perceberem a finitude dos recursos naturais e a
possibilidade de gerar renda através de seus bens ociosos ainda não era o bastante.
Eram necessárias redes de participação por meio das quais as pessoas pudessem
conectar-se, compartilhar recursos e transformar sua capacidade excedente em
benefício disponível para outras e, para tanto, o avanço tecnológico foi fundamental.
Neste sentido, Sales (2013, p.29) observa que “deve-se buscar o aproveitamento
máximo da utilidade dos bens, fazendo com que o desperdício seja o menor
possível. A crescente tecnologia funciona como um agente facilitador para a
obtenção desse aproveitamento ótimo”.
3Disponível em: <http://www.revistafilantropia.com.br/secoes/artigos/item/8271-consumo-colaborativo-
atend%C3%AAncia-compartilhada>Acesso em: 01 mai. 2016
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No cerne do consumo colaborativo está o cálculo de como podemos aproveitar esta capacidade ociosa e redistribuí-la em outro lugar. A tecnologia moderna, incluindo as redes sociais online e os dispositivos portáteis habilitados por GPS, oferece uma infinidade de maneiras para resolver esse problema. A onipresença da conectividade barata que nos rodeia pode maximizar a produtividade e a utilização de um produto e enxugar o excedente criado pelo hiperconsumo sem criar custos ou inconveniências (BOTSMAN; ROGERS, 2001, p.71).
Além disso, o consumo colaborativo aproveita-se das plataformas tecnológicas para
estreitar a interação interpessoal nas relações comerciais, estimulando situações de
convivência, troca de experiências e cooperação. A proposta é transcender a
simples troca de posse de bens ou prestação de serviços, passando a envolver um
contato mais pessoal e reinventando antigos conceitos, tais como escambo,
compartilhamento, comunidades de troca e colaboração.
Nessa nova ordem, resolveremos finalmente o dilema da colaboração versus a competição e passaremos a gerar riquezas a partir da sabedoria das multidões, a entender como promover a participação sem envolver dinheiro [...] O ser humano nasceu para conversar, convergir, viver em grupo, ou simplesmente ficar sentado em volta de uma fogueira trocando percepções. [...] (GIARDELLI, 2012, p.16).
4.2 Os três movimentos do consumo colaborativo
Haddad4 (2016) defende que o consumo colaborativo pode ser dividido em três
grandes movimentos que podemos observar no mercado atual, sendo eles:
4.2.1 Economia baseada em serviços
O movimento da economia baseada em serviços está diretamente relacionado ao
dilema da posse versus utilização de bens. Assim, o pressuposto adotado pela
Zipcar replica-se nos mais diversos tipos de negócio.
Se você for como a maioria das pessoas, provavelmente usará uma furadeira elétrica algo entre 6 e 13 minutos durante toda a sua vida útil. E, ainda assim, supostamente metade dos domicílios nos EUA comprou a sua própria furadeira elétrica. Existem aproximadamente 50 milhões de furadeiras em casas por todos os Estados Unidos acumulando poeira. Possuir um produto que você usa por apenas alguns minutos não faz
4Disponível em: <http://www.salvias16.com/#!Consumo-
Colaborativo/ffzeo/5711023c0cf2e66d024f142e>Acesso em: 03 mai. 2016.
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sentido. Há o custo óbvio do dinheiro gasto com a furadeira em si, [...] e depois o custo de comprar uma versão mais recente quando a atual parece velha ou não funciona mais [...]. E, no final das contas, o que a maioria de nós realmente quer é, conforme afirmou o lendário designer Victor Papanek, “o buraco, não a furadeira” (BOTSMAN; ROGERS, 2011, p.70).
A economia baseada em serviços representa um grande passo na direção da
sustentabilidade, visto que, produtos de propriedade individual, ociosos ou deixados
de lado por seus donos, passam a ter um novo papel no ciclo de consumo, à medida
que são compartilhados ou alugados, maximizando seu aproveitamento e
minimizando a prática da obsolescência programada. Neste sentido, Chase (2015,
p.78) acredita que através do consumo colaborativo “temos o poder de melhorar a
qualidade de vida em megacidades e satisfazer as necessidades dos mais de 7
bilhões de pessoas que hoje vivem no planeta [...]”.
De acordo com Botsman e Rogers (2011, p.61), o sistema econômico baseado em
serviços oferece também benefícios aos usuários, uma vez que, “[...] remove os
encargos da propriedade, como manutenção, conserto e seguro, e nos permite
aproveitar ao máximo os ativos que são efetivamente nossos”. Aliado a isso,
observa-se que ao substituir a posse pela utilização, o usuário passa a ter um leque
maior de possibilidades para satisfazer suas necessidades específicas.
Botsman e Rogers (2011) relatam, ainda, que cada vez mais pessoas das mais
diversas idades, origens e regiões, estão adotando uma “mentalidade de uso”, na
qual pagam pelo benefício proporcionado por um produto, sem ter de possuí-lo.
4.2.2 Mercados de redistribuição
A ideia dos mercados redistributivos, assim como a economia baseada em serviços,
apresenta uma perspectiva para o aproveitamento da capacidade excedente. No
entanto, este movimento apoia-se na premissa de que um determinado bem que não
possui mais valor para seu atual dono, pode ser exatamente aquilo que outra pessoa
deseja e, portanto, funciona através de compra e venda, trocas e doações.
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O desenvolvimento e ampliação do acesso à internet tem papel fundamental nos
mercados redistributivos, facilitando o agrupamento de pessoas com interesses
semelhantes e minimizando o efeito das barreiras geográficas. Neste sentido,
Scheffler, Verschoore e Silva (2014, p.2) apontam que “as plataformas das
empresas dos mercados de redistribuição buscam agrupar indivíduos com alguma
semelhança, visto que nos grupos homogêneos existe uma probabilidade maior de
confiança entre os desconhecidos”. Tanabe (2013) acrescenta que a venda ou troca
itens em desuso é uma forma inteligente de descarte e, embora seja uma prática
antiga, ganha alcance global com a utilização da internet.
Scheffler, Verschoore e Silva (2014) descrevem que a principal diferença entre os
mercados redistributivos e a economia baseada em serviços está justamente na
posse. Assim, nos mercados redistributivos o usuário detém a posse do bem
enquanto este lhe for útil, podendo posteriormente passá-la para outra pessoa por
meio de venda, troca ou doação.
Botsman e Rogers (2011, p.108) definem que “o benefício ambiental óbvio de
mercados de redistribuição é que eles mantêm as coisas circulando, maximizando o
uso e ampliando a longevidade de itens individuais”, e complementam ao afirmar
que “[...] a redistribuição reduz o desperdício e as emissões de carbono e a
necessidade de recursos que acompanham uma nova produção”.
4.2.3 Estilo de vida colaborativo
O movimento do estilo de vida colaborativo nos leva a perceber que o consumo
colaborativo não se limita somente ao compartilhamento de bens tangíveis. Botsman
e Rogers (2011, p.62) explicam que “pessoas com interesses semelhantes estão se
reunindo para compartilhar e trocar ativos menos tangíveis, como tempo, espaço,
habilidades e dinheiro, o que chamamos de estilos de vida colaborativos”.
No centro deste movimento estão atividades como o crowdfunding (financiamento
coletivo), o crowdsourcing (solução de problemas coletiva), o crowdlearning (ensino
e aprendizado coletivo), o couchsurfing (onde viajantes podem encontrar pessoas
dispostas a oferecer um lugar para dormir ou até mesmo companhia) os sistemas de
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carona (onde pessoas compartilham espaço disponível em seus veículos com outras
que fazem trajetos semelhantes), dentre outras modalidades de compartilhamento.
Por envolver um maior nível de contato entre pessoas, muitas vezes desconhecidas,
o estilo de vida colaborativo está diretamente relacionado a valores como confiança,
respeito e honestidade, como ressaltam Botsman e Rogers (2011, p.62):
Com frequência, é necessário haver um grau elevado de confiança quando se trata de estilos de vida colaborativos, pois muitas vezes o foco da troca é a interação entre seres humanos e não um produto físico. Consequentemente, eles geram uma infinidade de relacionamentos e de conectividade social.
Haddad (2016) defende que ao adotar um estilo de vida colaborativo o indivíduo
deixa um pouco de lado sua zona de conforto, e abandona individualização do
consumo e da posse, passando a estabelecer conexões com outras pessoas e a
consumir de forma sustentável. Bagó (2013, p.9) complementa ao afirmar que
“compartilhar é divertido e te faz se sentir bem, o que explica seu sucesso”.
4.3 Comportamento do consumidor no consumo colaborativo
No modelo colaborativo o consumidor tem papel mais ativo nas interações
comerciais, e maior consciência sobre os impactos socioambientais de suas ações.
Para Menezes (2015), embora ainda reduzidos em relação ao capitalismo
tradicional, os esforços já existentes para o desenvolvimento do modelo colaborativo
são um importante passo para a criação de conexões sociais de compartilhamento.
[...] O consumo colaborativo tem a vantagem de fazer parte do interesse pessoal do usuário, não enfatizando a culpa nem o sacrifício pessoal. Além disso, mudanças de hábito precisam ser fáceis e convenientes para a pessoa média e devem, ao mesmo tempo, criar valor tanto para a empresa quanto para a sociedade [...] (BOTSMAN; ROGERS, 2011, p.63).
Para Calazans, Lins e Lima (2014) diversos motivos levam os consumidores a
participar do mercado colaborativo, mas é certo que esta participação promove uma
mudança comportamental ao demonstrar que suas necessidades e desejos podem
ser alinhados ao bem-estar da sociedade e à sustentabilidade.
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Esse tipo de consumo baseado no compartilhamento reforça o valor à
experiência em detrimento a noção de possuir algo. Buscando experiências
os indivíduos estão procurando mais do que bens ou serviços que uma troca
comercial oferece, eles buscam satisfazer suas reais necessidades por meio
da experiência intangíveis (COUTINHO, 2015, p.4).
Botsman e Rogers (2011, p.64) definem que, embora em geral demonstrem certo
ceticismo, “uma vez que as pessoas começam a adotar timidamente o consumo
colaborativo, como trocar roupas ou compartilhar carros, outros comportamentos
também começam a mudar gradualmente”.
Ainda de acordo com Botsman e Rogers (2011) existem alguns princípios básicos,
essenciais para o funcionamento do mercado colaborativo, dentre os quais cabe-se
citar: a massa crítica, a crença no bem comum e a confiança entre desconhecidos.
No consumo colaborativo a massa crítica se manifesta na variedade de escolhas e
na prova social. Botsman e Rogers (2011, p.64) defendem que “para o consumo
colaborativo competir com as compras convencionais, deve haver escolhas
suficientes para que o consumidor sinta-se satisfeito com o que está disponível”, ou
seja, é necessário que certa quantidade de pessoas participe do sistema, tornando-o
atraente e viável para outras. Já a prova social acontece, sobretudo, nos registros de
avaliações dos usuários, visto que o consumidor tende a acreditar mais em um
produto ou serviço, se este já tiver sido utilizado e aprovado por outra pessoa.
O princípio da crença no bem comum fundamenta-se na premissa de que, ao
disponibilizar algo para a comunidade, seja um bem tangível ou um ativo intangível,
o consumidor tem como retorno não só a possibilidade de acessar um bem ou ativo
que lhe interesse, como também, um sentimento de satisfação por estar ajudando a
criar valor para outras pessoas. “Por meio de nossas experiências digitais, estamos
reconhecendo que, ao fornecer valor para a comunidade, permitimos que o nosso
próprio valor social se expanda em troca” (BOTSMAN; ROGERS, 2011, p.76).
Segundo Botsman e Rogers (2011), “a maioria das formas de consumo colaborativo
exige que confiemos em alguém que não conhecemos em diferentes graus”.
Calazans, Lins e Lima (2014, p.13) acrescentam que “essa mesma confiança está
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fazendo com que as pessoas interajam mais umas com as outras, gerando relações
sociais que começam no ambiente online, mas migram para o off-line”.
5. METODOLOGIA
Para a construção do corpo do trabalho definiu-se a utilização de pesquisa
descritiva. Gil (2008) define que este tipo de pesquisa tem por objetivo estudar
características de um determinado evento ou população e estabelecer relações entre
variáveis, o que a torna adequada para o propósito do trabalho.
Quanto aos dados a serem coletados, estabeleceu-se o uso de pesquisa
bibliográfica. Gil (2008) esclarece que este modelo de pesquisa se desenvolve
através de material já elaborado por outros autores, compreendendo principalmente
livros e artigos científicos, permitindo a construção de um embasamento teórico.
Ainda em relação à coleta de dados, determinou-se a adoção de uma abordagem
mista de pesquisa. De acordo com Creswell (2007) a abordagem mista ocorre
quando são coletados dados de forma quantitativa e qualitativa para o estudo de um
único evento, dando maior profundidade ao trabalho, visto que as características
próprias de um tipo de abordagem poderiam neutralizar as do outro.
Na abordagem mista definiu-se o uso de entrevistas constituídas por doze
perguntas, aplicadas a seis gestores de empresas do mercado colaborativo, e
distribuídas nas quatro seguintes categorias para estruturação da análise: a)
Conceituação e características; b) elementos influenciadores; c) o consumidor
colaborativo; d) perspectivas para o futuro. Em paralelo estabeleceu-se a aplicação
de questionários, compostos por dezesseis questões, aplicados a sessenta
consumidores do mercado colaborativo, agrupados nos seguintes blocos objetivando
facilitar sua interpretação: a) perfil; b) interação com o mercado colaborativo; c)
percepção sobre o consumo colaborativo; d) comportamento e perspectivas.
Para a etapa de análise definiu-se o cruzamento e comparação dos dados
qualitativos e quantitativos, identificando pontos comuns, divergências e conexões.
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6. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
A coleta de dados qualitativa deu-se através da realização de entrevistasaplicadas a
seis gestores de empresas que atuam no mercado colaborativo. O caráter aberto
das perguntas, bem como seu conteúdo e enfoque prático, estimulou os gestores a
descrever experiências, conceitos, ideias, opiniões e perspectivas acerca do tema.
Já a coleta dos dados quantitativos foi desenvolvida por meio de questionário
aplicado a sessenta indivíduos, usuários das empresas abordadas.
A fase de análise desenvolveu-se por meio de estudo das entrevistas, com
abordagem comparativa entre as respostas de cada gestor, e estabelecendo
conexões com a revisão de literatura e com o resultado dos questionários. Por fim,
realizou-se a tabulação e análise dos dados, buscando quantificar as informações
obtidas e estabelecer relações entre as variáveis estudadas.
6.1 Empresas abordadas
6.1.1 Bla Bla Car
Plataforma de compartilhamento de viagens de carro através da qual, viajantes
encontram condutores que tenham destino em comum, e oferecem uma participação
nos custos da viagem em troca de um lugar no carro.
6.1.2 Wairon
Sistema de intermediação, conectando pessoas que disponibilizam-se como
lavadores ou passadores de roupas, e aquelas que precisam destes serviços. A
plataforma proporciona operacionalização, cuidando das partes burocráticas.
6.1.3 Bookshare
Rede social para compartilhamento de livros, promovendo interação entre pessoas
que possuem preferências literárias semelhantes, permitindo aos usuários emprestar
seus livros e também tomar emprestados livros de outras pessoas.
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6.1.4 Virtuozas
Espécie de estante virtual, onde é possível alugar ou disponibilizar para aluguel
roupas e acessórios, bem como receber orientações profissionais de estilo e obter
serviços adicionais, como cabelo, maquiagem e depilação. As usuárias pagam uma
taxa anual e, em troca, a empresa faz a intermediação das locações.
6.1.5 Retroca
Brechó e outlet de peçasinfantis, no qual é possível comprar ou vender roupas novas
ou seminovas. A empresa acredita na premissa de que nos primeiros anos de vida
as crianças trocam de roupa muito rápido, fazendo com que muitas peças acabem
se perdendo tendo sido pouco utilizadas e, a partir de tal premissa, oferece uma
alternativa para converter isto em geração de renda.
6.1.6 Troca Casa
Plataforma que permite aos usuários a experiência de trocar de casa com outras
pessoas de todo o mundo. A empresa oferece intermediação, suporte e garantias de
segurança, deixando os usuários livres para negociar os termos das trocas.
6.2 Análise das entrevistas
6.2.1 Conceituação e características
Dois gestores conceituaram o consumo colaborativo com enfoque na substituição da
posse pelo acesso, indo de encontro à linha de pensamento de Botsman e Rogers
(2011, p.70). Três citaram outros aspectos, como aproveitamento de recursos e
interação. O último gestor acrescentou sua percepção sobre uma distinção entre
consumo colaborativo e economia compartilhada, considerando o primeiro como um
modelo não necessariamente monetizado, além de menos formal e organizado.
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Quanto aos pontos positivos do consumo colaborativo, cada gestor apresentou
variados fatores, dentre os quais destacam-se: economia e utilização inteligente de
recursos; geração de renda através de capacidade ociosa; redução do impacto
ambiental; interação entre as pessoas; acessibilidade e democratização do mercado.
“Logo à primeira vista ressalta-se uma redução de gastos que,
naturalmente, permite alcançar algo que de outra forma não estaria ao
nosso alcance. Com a troca de produtos não há tanto desperdício e
consequentemente um menor impacto ambiental. Além disso, esta
economia aproxima as pessoas ao mesmo tempo em que contribui
para um mundo cada vez melhor.” (Gestor do Troca Casa).
Já em relação aos obstáculos, três gestores apontaram a questão cultural como o
principal fator, ressaltando que, notadamente no Brasil, o comportamento de
consumo excessivo e a associação da posse de bens ao status estão ainda bastante
arraigados na sociedade. Dois abordaram as dificuldades encontradas na
manutenção da segurança e normatização para o mercado colaborativo. O gestor
restante citou a complexidade de se estabelecer pontes de conexão entre quem
precisa e quem oferece produtos ou serviços no mercado colaborativo.
6.2.2 Elementos influenciadores
Ao serem questionados sobre a relação entre consumo colaborativo e tecnologia, os
gestores foram unânimes ao apontá-la como elemento imprescindível para a
potencialização deste mercado, destacando sua importância na conexão de
pessoas, bem como na disseminação de ideias e plataformas em nível global.
“A tecnologia facilita a disseminação da ideia do consumo
colaborativo, assim como permite a interação mais prática e fácil entre
cada ponta da cadeia interligada do mercado.” (Gestora do Retroca).
Quanto à relação entre consumo colaborativo e sustentabilidade, quatro dos
gestores reforçaram as ideias propostas por Botsman e Rogers (2011, p.108), ao
definir que a otimização do uso de recursos promove uma redução nos impactos
prejudiciais ao meio-ambiente. Os dois gestores restantes acreditam que as
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premissas do modelo colaborativo são capazes de despertar nas pessoas uma
forma mais consciente de consumo, conforme abordado por Haddad (2016).
Todos os gestores concordaram que a confiança é um elemento essencial para o
modelo colaborativo. Um deles destacou, ainda, que tanto usuários quanto
empresas avaliam e são avaliados a todo o momento neste mercado, e o resultado
destas avaliações constitui um indicador conhecido como “capital de reputação” ou
“capital confiável”, responsável por tornar tangível e mensurável o fator confiança.
“A confiança é a mola propulsora do consumo colaborativo. Pela
primeira vez na história a confiança se tornou algo escalável. Antes,
confiávamos apenas em pequenos grupos, hoje em dia, confiamos em
pessoas que nunca vimos pessoalmente, mas que acumulam “capital
confiável” na internet.” (Gestor da Bla Bla Car).
6.2.3 O consumidor colaborativo
Dois dos gestores descrevem o perfil do consumidor colaborativo através de
características que denotam pessoas mais arrojadas, com espírito aventureiro, e que
estão dispostas a experimentar coisas novas.
“Eles são os primeiros que adotam, tem um perfil empreendedor,
adoram colaborar e não tem medo de conhecer e testar coisas novas”.
(Gestor da Wairon).
Dentre os demais gestores, três citaram aspectos demográficos, delimitando um
perfil de pessoas entre 25 e 45 anos, em geral de classes sociais mais altas e com
maior acesso a informação e conhecimento de diferentes culturas. O último gestor
definiu que o consumidor colaborativo possui um comportamento mais consciente,
uma maior preocupação com os impactos de suas ações sobre o meio em que vive.
Sobre a aceitação do consumo colaborativo, dois dos gestores avaliaram que,
embora algumas barreiras tenham sido superadas, o mercado colaborativo ainda
está em fase inicial, sobretudo no Brasil. Outros dois compartilham a perspectiva de
Botsman e Rogers (2011, p.64), de que há certo grau de aceitação, porém com
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caráter de curiosidade, tornando necessários esforços para minimização da
desconfiança. Por fim, um acredita que a aceitação do consumo colaborativo tem
sido muito boa no Brasil, enquanto o outro aponta a classe A como principal adepta.
Quanto às influências do consumo colaborativo sobre o comportamento do
consumidor, três gestores determinaram que, ao serem apresentados a uma nova
alternativa, os consumidores deixam de lado a cultura de consumo desenfreado e
enxergam a possibilidade de contribuir para o benefício da sociedade. Dois gestores
restantes acreditam que o consumidor colaborativo é levado a conhecer novas
pessoas e culturas, vivenciar experiências e resgatar valores, conforme descrito por
Giardelli (2012, p.16). O último gestor apresenta uma definição mais ampla,
enfatizando que, além das transformações no modo de pensar e agir dos
consumidores, o modelo colaborativo tem potencial para produzir grandes mudanças
na própria sociedade de consumo.
“A colaboração entre empreendedores, fornecedores e consumidores
irá definir o futuro da economia. No futuro, palavras como ‘consumo’ e
‘compra’ serão substituídas por ‘compartilhamento’ e ‘troca’. No
âmbito pessoal, as pessoas se tornarão mais solidárias e altruístas,
além de terem uma consciência ecológica [...]” (Gestor da Bookshare).
6.2.4 Perspectivas para o futuro
Cada um dos gestores trouxe diferentes fatores que consideram importantes para o
crescimento do consumo colaborativo, dentre os quais destacam-se: a superação de
barreiras culturais; melhorias na segurança e normatização; desenvolvimento
tecnológico e democratização de acesso; e apoio governamental. Além disso, houve
consenso de que ainda há muito a ser explorado neste mercado e que não há um
limite para sua expansão.
“O céu é o limite! [...] Vejo inúmeras oportunidades de crescimento, em
todas as áreas e setores. Tudo pode ser viabilizado em um modelo
colaborativo.” (Gestora da Virtuozas).
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6.3 Análise dos questionários
6.3.1 Perfil
Os consumidores abordados apresentaram maioria feminina, com 61,7% dos
respondentes. A faixa etária predominante está entre 25 a 65 anos, sendo 31,7%
entre 25 e 40 anos e 50% entre 41 e 65 anos. Em relação ao grau de instrução,
destacam-se 31,7% graduados em nível superior e 25% pós-graduados. A faixa de
renda predominante foi entre 1 e 3 salários mínimos, com 43,3% dos respondentes.
6.3.2 Interação com o mercado colaborativo
A maioria dos respondentes (58,3%) conheceu o consumo colaborativo através da
internet e utiliza, principalmente, plataformas de transporte (60%), turismo (46,7%) e
trocas (43,3%). A frequência predominante de utilização do mercado colaborativo foi
a esporádica com 25%, seguida pela semanal com 23,3% dos respondentes.
6.3.3 Percepção sobre o consumo colaborativo
Em relação às vantagens do consumo colaborativo a maioria das respostas
concentrou-se no fator custo x benefício, correspondendo a 70%. Já quanto às
desvantagens, o fator desconfiança/insegurança foi predominante, com 66,1%.
6.3.4 Comportamento e perspectivas
Nesta categoria, os consumidores através de escala Likert graduada de 0 a 5, sua
concordância com cada uma das seguintes proposições: a) após utilizar uma
plataforma colaborativa eu faço recomendações ou contraindicações de acordo com
minha satisfação com a experiência; b) acredito que é possível confiar em um
desconhecido com quem terei uma interação comercial, tendo como base avaliações
feitas por outros consumidores; c) para mim, é mais importante ter acesso ao
benefício proporcionado por um produto do que ter a posse do produto em si; d) se
tenho algo que está ocioso ou que não tem mais utilidade para mim, acho vantajoso
vender, trocar, alugar ou doar; e) através do consumo colaborativo já fiz novas
amizades ou tive boas experiências socioculturais; f) me preocupo com as
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consequências do hiperconsumo sobre o meio ambiente; g) acredito que o consumo
colaborativo tende a ganhar cada vez mais espaço na economia.
As proposições ‘d’ e ’g’ apresentaram os maiores níveis de concordância, tendo a
proposição ‘d’ alcançado 49 respondentes com total concordância enquanto a
proposição ‘g’ não teve nenhuma resposta de discordância total ou parcial.
Quanto aos níveis de discordância, os mais impactantes foram observados nas
proposições ‘b’ e ‘e’. A proposição ‘b’, além de apresentar o maior número de
respostas neutras, foi também aquela onde houve menor quantidade de
respondentes com total concordância, sendo a única na qual o grau de concordância
parcial superou o de concordância total. Já a proposição ‘e’ foi a que apresentou
maior número de respondentes com discordância total e parcial.
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6.4 Análise quali-quantitativa
A maior parte dos consumidores abordados é do sexo feminino, com idade entre 41
e 65 anos, renda mensal na faixa de 1 a 3 salários mínimos e ensino superior
completo. Algumas destas características, no entanto, divergem um pouco do perfil
de consumidor colaborativo traçado pelos gestores que, em geral, definiram pessoas
entre 25 e 45 anos da classe A. Houve certo alinhamento em relação ao nível de
escolaridade, já que os gestores apontaram o consumidor colaborativo como um
indivíduo com bom grau de instrução e acesso a informação.
Um dos gestores entrevistados ressaltou, ainda, que o consumidor colaborativo
possui maior consciência ambiental, o que se confirma dado o alto índice de
concordância dos respondentes com a proposição de se preocuparem com as
consequências do hiperconsumo sobre o meio-ambiente. Esta mesma proposição
reforça, ainda, a opinião de três dos gestores de que, ao participar do mercado
colaborativo, o consumidor tende a deixar de lado a cultura de consumo excessivo.
A definição de consumo colaborativo proposta pelos gestores entrevistados, pautada
por conceitos de compartilhamento, acesso, consumo consciente e interação
confirma-se, ainda que com ressalvas, pelo posicionamento de predominante
concordância dos consumidores em relação a questões como a possibilidade de
confiar em desconhecidos, abrir mão da posse em detrimento do uso, vivenciar boas
experiências nas relações comerciais e preservar o meio-ambiente.
Os principais pontos positivos observados pelos consumidores foram custo x
benefício, interação com outras pessoas e preservação ambiental, o que se reflete
nos benefícios de economia e utilização inteligente de recursos, experiências
interpessoais e redução dos impactos ambientais, elencados pelos gestores.
Quanto aos pontos negativos, a questão da cultura consumista, apontada como
principal fator para os gestores pode de certa forma, ser relacionada à falta da
sensação de posse e status, descrita por uma pequena parte dos consumidores
respondentes. Já o fator tido como principal desvantagem para os consumidores
reside na sensação de desconfiança e insegurança, aspecto destacado, também,
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por dois dos gestores ao definirem a manutenção da segurança como um dos
grandes obstáculos do consumo colaborativo, e reforçado por um terceiro, ao
descrever a confiança como a mola propulsora deste mercado.
Entretanto, apesar de o fator desconfiança/insegurança ter sido apontado como
aspecto negativo preponderante no consumo colaborativo, um número considerável
de consumidores concordou que é possível confiar em desconhecidos através de
avaliações feitas por outras pessoas, refletindo, também, a premissa proposta por
um dos gestores sobre a confiança através do capital de reputação construído.
A opinião dos gestores sobre a relação entre consumo colaborativo e
sustentabilidade teve foco na otimização do uso de recursos para redução dos
impactos ambientais, sendo, também, validada pelos consumidores, tendo em vista
que estes, em sua maioria, valorizam mais o acesso do que a posse, são abertos a
alternativas para minimizar os níveis de produção e descarte e preocupam-se com o
impacto de suas ações sobre o meio-ambiente.
Sobre as perspectivas para o futuro, a ampla concordância dos consumidores diante
da hipótese de que o consumo colaborativo tende a se expandir, ganhando cada vez
mais espaço na economia corrobora a visão dos gestores, visto que, entre eles
houve consenso de que ainda há muito a ser explorado, e não há um limite para até
onde este mercado pode chegar.
7. CONCLUSÃO
Tendo como base o levantamento teórico e a análise dos dados coletados, conclui-
se, em resposta ao problema de pesquisa definido, que a disseminação do modelo
colaborativo de consumo estimula os consumidores a uma série de mudanças
conceituais e comportamentais, notadamente em relação à consciência ambiental, à
valorização de experiências e conexões com outras pessoas e ao máximo
aproveitamento de produtos, recursos e da capacidade ociosa.
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Assim, o indivíduo que participa do mercado colaborativo tende a adotar ou acentuar
os seguintes comportamentos: buscar produtos e serviços que atendam suas
necessidades com menores custos e evitando despesas acessórias; encontrar
opções para converter seus recursos ociosos em fontes de renda; estabelecer
relações de consumo pautadas em confiança e interações mais próximas, mesmo
que com desconhecidos; compartilhar seus ativos pouco tangíveis, tais como tempo,
espaço e conhecimentos, muitas vezes em troca do acesso aos ativos de outras
pessoas; e optar por alternativas de consumo com menores impactos ambientais.
Em resposta aos objetivos propostos, foram descritos fatores históricos e conceituais
sobre o consumo colaborativo, tais como seu desenvolvimento a partir da crise
econômica mundial de 2008 e amparado pelo avanço tecnológico, algumas de suas
características relevantes distribuídas em seus três movimentos, bem como diversos
exemplos de empresas que atuam neste mercado. Além disso, embora não tenham
esclarecido plenamente o perfil das empresas colaborativas, os dados coletados
possibilitaram identificar inúmeros traços do perfil e comportamento dos
consumidores deste mercado.
Os principais obstáculos encontrados no desenvolvimento do artigo foram a
escassez de publicações literárias tratando da temática, e a dificuldade em se
abordar consumidores deste mercado para a aplicação de questionários. Por fim,
definem-se como recomendações para futuros estudos uma melhor preparação para
os questionários, de forma a atingir um número mais representativo de
consumidores, além de uma maior similaridade entre as perguntas presentes nas
entrevistas e questionários, de forma a facilitar a análise quali-quantitativa.
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